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Sonho ou realidade?
Era uma vez uma escola encerrada há muitos anos, numa pequena aldeia
minhota…
Era uma vez um livro muito especial, esquecido numa das prateleiras da biblioteca
da velha escola…
Tomás veio passar as férias de verão à aldeia com o seu avô paterno. Era um
menino muito inteligente, muito curioso e muito irrequieto.
Certo dia, perguntou ao seu avô por que motivo estava a escola fechada. Ele
explicou‐lhe que as crianças, que em tempos lhe deram vida, eram agora adultos a
viverem nas grandes cidades. Na aldeia, moravam apenas pessoas idosas que nunca
quiseram abandonar a terra que os viu nascer.
Tomás apressou‐se a pedir‐lhe que o levasse a visitar o velho edifício, mas o seu
desejo teve de ser adiado, porque o avô era um homem bastante ocupado e tinha uma
reunião marcada na associação «Esperança», uma pequena e humilde instituição da
aldeia que acolhia os idosos sem lar.
Impaciente, Tomás não resistiu e resolveu partir à aventura sozinho.
As paredes exteriores da escola estavam cobertas de hera, um manto de verdura
densa que lhe dava um aspeto misterioso. As portas eram velhas. As janelas tinham os
vidros partidos. Tomás entrou por uma janela e logo sentiu o cheiro a velho e a mofo.
No entanto, ficou maravilhado com as salas de aula, que ainda exibiam teimosamente
nas paredes os desenhos e os textos dos antigos alunos. Imaginou, então, como seria o
seu avô em criança, como teria ele brincado naquela escola e quem seriam os seus
amigos.
Foi andando e explorando…
Cada cantinho da escola parecia ter uma história para contar, mas a biblioteca
chamou particularmente a sua atenção, pois Tomás ficou encantado ao ver tantos,
tantos livros, muitos deles em bom estado. Ele adorava ler. A leitura era a sua paixão.
Tomás observou, observou e, numa prateleira lá bem no alto, estava um livro fora do
comum. A capa parecia muito antiga e era um livro bastante mais grosso do que os
restantes. Com a ajuda de uma cadeira, Tomás pegou no livro e, de imediato, sentiu
algo de especial, algo que ele não conseguia explicar! Abriu‐o e deparou‐se com uma
página toda ela minuciosamente ilustrada. Era uma magnífica floresta. Parecia tão
real! Tomás não se cansava de admirar o livro e esqueceu‐se de tudo à sua volta.
Subitamente, uma luz intensa, vinda do interior das folhas, encandeou o rapaz.
Esfregou os olhos várias vezes e apercebeu‐se que não estava no mesmo lugar. Tinha
ido parar a um sítio desconhecido. Não percebia como tal acontecera e não acreditava
no que estava a ver. Tudo parecia mágico. Ao longe, ouvia o som embalador de uma
cascata; as árvores, altas e esbeltas, davam‐lhe as boas‐vindas, agitando suavemente
os seus ramos; no ar, lindas borboletas e pássaros multicolores chilreavam e conviviam
amistosamente. Ele ficou um pouco assustado, é certo, mas também feliz, pois aquela
paisagem era verdadeiramente encantadora e mágica.
A certa altura, um barulho estranho chamou a atenção do menino. Parecia ouvir
passos. Recuou cuidadosamente e viu um vulto que, de repente, ganhou forma. Era
um menino índio. Teria talvez a sua idade, dez anos. Tinha a pele morena e, na cabeça,
usava uma faixa vermelha com uma pena. O menino índio questionou Tomás sobre a
sua origem, pois nunca tinha visto pessoas de pele clara, olhos azuis e cabelos loiros.
Tomás contou‐lhe a sua aventura na escola abandonada e explicou‐lhe que não
percebia como tinha vindo ali parar. O índio sorriu, parecia que sabia a resposta, e
apresentou‐se:
─ Pertenço à tribo Tupi. O meu nome é Iaciara que, na tua língua, significa
“Espelho da Lua”.
─ Tens um nome bem engraçado e fora do comum! Mas … onde está a tua família?
Por que estás sozinho no meio da floresta? ─ perguntou Tomás muito intrigado.
O menino índio contou, então, toda a sua história.
─ Eu e a minha família íamos em caravana à procura de uma nova terra onde
pudéssemos acampar. Sabes, a civilização não gosta de índios, por isso fomos expulsos
da terra onde eu nasci e cresci. A minha mãe ficou muito triste com a partida. Tenho
dois irmãos mais novos do que eu e o meu pai é um dos guerreiros da Tribo Tupi, por
todos muito respeitado. A certa altura, fiquei com sede e afastei‐me da caravana em
busca de água. Quando me apercebi, já não havia sinais do meu povo. Agora, estou
sozinho e não sei como posso encontrar de novo a minha família. Podes ajudar‐me?
─ Claro que sim! Mas como? ─ prontificou‐se de imediato o rapaz.
Tomás e Iaciara procuraram no chão pegadas deixadas pelos cavalos e seguiram‐
lhes o rasto. Caminharam juntos longas horas. O céu começou a escurecer e, lá no alto,
já se via a primeira estrela, a Estrela Polar. A Lua, bem redondinha, começou a brilhar e
a iluminar toda a floresta. A noite parecia dia.
A certa altura, Tomás sentiu no ar o cheiro a fumo e a carne assada que se
misturavam com os aromas intensos daquele lugar. Seguiram um pouco mais e
avistaram uma grande fogueira. O coração de Iaciara alegrou‐se de imediato, pois
reconheceu um dos cavalos que ainda pastava, tranquilamente, num campo de erva
fresca. Soltou um grito de vitória ─ que era costume usar na Tribo Tupi ─ e foi
imediatamente reconhecido por toda a sua família que ali estava acampada.
Todos correram ao seu encontro. A sua mãe abraçou‐o e beijou‐o, enquanto
lágrimas de alegria corriam pelo seu rosto. Abraçaram também Tomás, pois estavam‐
lhe eternamente gratos por ele ter ajudado Iaciara a encontrar a sua Tribo. Festejaram
durante toda a noite e, sentados à volta da grande fogueira, escutaram atentamente
Tomás que lhes contou a sua aventura, as histórias e os costumes da sua terra.
Na manhã seguinte, seguiram todos viagem. Tomás sentia‐se bem‐vindo no seio
dos Índios, mas começava a ter saudades da sua família e da sua casa. Iaciara
apercebeu‐se da tristeza do seu amigo e quis, também ele, ajudá‐lo a regressar ao seu
mundo.
Entretanto…
Ao regressar a casa após mais um longo dia a servir os mais necessitados da aldeia,
o avô apercebeu‐se de que o neto ainda não tinha chegado. Ficou muito preocupado e
foi até ao campo de futebol que havia perto de casa, na esperança de o encontrar ali a
jogar à bola. Não estava lá ninguém. Bateu às portas de todas as casas, mas nenhum
vizinho o tinha visto. Uma grande tristeza começou a apoderar‐se dele. Então, os
habitantes da aldeia depressa se reuniram para ajudar este pobre avô que já não sabia
mais onde procurar.
A noite caiu, escura e fria. O avô continuava muito preocupado e o seu coração
batia mais forte só de pensar que o seu neto poderia estar em apuros.
Enquanto todas as pessoas da aldeia procuravam Tomás, este e os seus novos
amigos índios, lá no mundo do livro mágico, traçavam um plano para encontrar o
caminho de regresso a casa.
Depois de algum tempo a ouvir Tomás a descrever a sua aldeia, um velho índio, o
mais sábio da tribo, disse que talvez o poderia ajudar. Mandou os guerreiros selarem
os seus cavalos e partiram rumo a uma pequena localidade não muito longe dali, uma
povoação desconhecida pela maioria dos índios, pois não era habitual irem a terras
civilizadas. O pai de Iaciara, o grande guerreiro Ruda, fez questão de levar consigo
Tomás no seu valente cavalo branco, o Tinga.
Quando avistaram a aldeia, Tomás depressa a reconheceu e ficou feliz por poder
regressar a sua casa. Os dois rapazes prometeram amizade eterna um ao outro, depois
de um longo e forte abraço de despedida.
Tomás esfregou os olhos e… viu‐se novamente na biblioteca. Perplexo, retomou
então o caminho de casa, pensando nos amigos que fizera e na aventura que vivera.
Subitamente, ouviu vozes que gritavam: «O Tomás chegou! Viva! Viva!»
O avô ajoelhou‐se e tomou o neto nos seus braços. Queria repreendê‐lo pelo susto
que lhe pregara, mas a alegria de o encontrar são e salvo era tão grande que foi
incapaz de falar. O pequeno Tomás estava confuso, não conseguia perceber como
estava ali, se realmente tinha estado na floresta, se Iaciara realmente existia ou se foi
simplesmente um sonho.
Nos seus braços, o menino ainda tinha aquele maravilhoso livro e não o queria
largar. Pediu se podia ficar com ele. O avô explicou‐lhe que aquele livro era património
da aldeia e que isso não era possível.
O Presidente da Junta presenciou tudo e, muito emocionado com o que acontecera,
pronunciou‐se em nome do povo:
─ Tomás, se gostas tanto desse livro, tenho a certeza que ninguém se irá opor a que
fiques com ele. Sei que o estimarás, por isso é teu!
─ É teu, é teu! ─ aprovaram prontamente os aldeões.
Tomás saltou de alegria e fez logo outro pedido.
─ Senhor Presidente, por que não pode esta escola ser uma escola de novo?
O Presidente ficou pensativo e, por uns instantes, sem saber o que dizer. Depois de
uma breve pausa, lembrou‐se:
─ Mas, Tomás, não há crianças na aldeia. Para que serve uma escola sem crianças?
‐ Esta é a escola onde o senhor, o meu avô e o meu pai estudaram. Não é justo que
esteja assim abandonada.
Toda a aldeia estava ali reunida. Aplaudiram a ousadia de Tomás e olharam para o
Presidente, à espera de uma resposta. Então, o avô, que era um homem de grande
coração, tomou a palavra e propôs que o velho edifício fosse também ele usado em
benefício dos mais necessitados, com cozinha, salas de convívio e quartos, que a
biblioteca fosse recuperada e que toda a aldeia pudesse consultar e ler os livros lá
guardados. O povo acolheu a ideia com muito agrado e prontificou‐se a contribuir para
as obras de requalificação com o que pudesse. O Presidente logo concordou e sugeriu
que todos se reunissem para dar início ao projeto. O pequeno Tomás não deixou
perder esta oportunidade e juntou‐se a esta nobre causa.
E, todas as noites, Tomás vivia uma nova aventura cada vez que lia uma história do
seu livro. Tornaram‐se grandes amigos!
No dia da inauguração da escola, o povo da aldeia fez uma grande festa. Tomás
sentiu um enorme orgulho no seu avô. Olhou para a colina, lá bem no horizonte, e
avistou os seus amigos índios montados a cavalo a piscarem‐lhe os olhos.
Tomás sorriu. Só ele podia vê‐los. Estava felicíssimo e, pela primeira vez, sentiu e
compreendeu que a colaboração e a solidariedade são fundamentais para a união
entre os povos.