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Políticas Culturais

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A REPRESENTAÇÃO DA CULTURA NAS ESCOLAS PÚBLICAS DE SANTA MARIA: Um estudo sobre o programa “Mais Cultura”

Ângela Sowa 1

ReSUMO

O trabalho tem como objetivo mapear e analisar o processo de implantação e desenvolvimento da política pública “Mais Cultura” nas escolas públicas de Santa Maria/RS. A metodologia utilizada é composta pela pesquisa bibliográfica, análise documental de cartilhas fornecidas pelo MEC/MINC e entrevistas estruturadas com gestores. Concluímos que os projetos incentivam o desenvolvimento de individualidades e a produção colaborativa de jovens, contribuindo para a compreensão da diversidade cultural presente na sociedade e o quanto a cultura está atrelada ao descobrimento do “eu“ e do “outro“.

Palavras-chave: representação. Cultural. Mais Cultura. Cidadania Cultural.

ABSTRAcT

The study aims to map and analyze the implementation process and development of public politic Mais Cultura in public schools in Santa Maria – RS. The methodology consists of the bibliographic research, documentary analysis of the booklets provided by the MEC / MINC and application of structured interviews with managers of developed projects in Schools. We conclude that the projects encourage the development of individuals and the collaborative production of children and adolescents helping them understand the cultural diversity present in society and in the community and how culture is linked to the discovery of “self” and “other“.

Keywords: Representation. Cultural. Mais Cultura. Cultural Citizenship.

1 Mestranda em Comunicação Midiática pela Universidade Federal de Santa Maria. Email: [email protected]

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1. CULTURA E EDUCAÇÃO: VAMOS FALAR DE DIREITOS CULTURAIS?

Educar é introduzir o indivíduo na sua cultura, ensiná-lo a agir de forma com que siga as normas e valores coletivos, para que ele possa participar de grupos sociais e continuar sua educação. Porém, são as culturas que diferem os povos, os seres-humanos e fazem com que esses entrem em conflito desde o começo do tempo até a atualidade. Divergências culturais, religiosas, comportamentais, brigas de egos, todos defendendo que a sua cultura é a correta, sem pensar na miscigenação e aprendizado que uma poderia ter com a outra (SODRÉ, 2012). O direito à cultura está ligado ao pertencimento e as diferenças de cada grupo que defende o seu idioma, a história e solo, um sentimento que vai além da demarcação territorial, uma distância espacial que acaba resultando nas diferenças sociais e temporais, pela falta de identificação e aceitação.

Estudo do CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe), citado no livro Diferentes, Desiguais e Desconectados de García Canclini (2004), refere-se à ampliação da noção de direitos culturais, ligando a valorização das diferenças com os direitos conectivos. a conexão entre os direitos culturais, sociais e econômicos é responsabilidade do Estado vigente, pois está ligado ao exercício da cidadania, assim como a atuação dos sujeitos está ligada às oportunidades oferecidas pelo Governo.

para Canclini (2009), cultura é o conjunto de processos sociais de produção, circulação e consumo da significação da vida social, conceito escolhido para o entendimento desse trabalho. Dessa forma, entende-se que pela cultura identificamos os signos equivalentes para que os indivíduos criem relações e produzam conhecimentos a partir das informações trocadas, resultando na interação social.

Bourdieu (1979) considera que as diferenças de gostos para apropriação cultural se dão a partir da distinção dos públicos, pelo tipo de obra produzida e pela ideologia política adotada, formando um sistema coexistente dentro de uma sociedade capitalista que organiza a distribuição desigual desses bens materiais e simbólicos. Para que ações de acesso à cultura contribuam de uma forma coerente, precisa-se educar para entender o “capital cultural do que está sendo passado.

Segundo Bourdieu (2007) capital cultural é a herança puramente social que contém o conhecimento, informações, linguística, atitudes e posturas, que cada pessoa tem acesso no seu núcleo familiar. Bourdieu também relaciona a formação de redes e núcleos familiares com o capital cultural, dizendo que é partir do histórico cultural que o indivíduo vai definir seu capital cultural, mas que [...] só a escola pode criar uma aspiração à cultura, mesmo a cultura menos escolar” (BOURDIEU, 2007, p.60), sendo assim a escola pode educar e modificar o

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capital cultural dos alunos.

Marilena Chauí (2006) em seu livro Cidadania Cultural: o direito a cultura, apresenta um estudo de caso em que, durante (1889-1992), como Secretária Municipal da Cultura de São paulo, pretendeu focar na cidadania cultural, para reger sua administração e seus valores. Nesse sentido ela considera que, para que um órgão possa ser criador e multiplicador de símbolos, ele precisa colocar cultura como um direito do cidadão. Para estas definições, o direito à cultura se entenderá como:

O direito a produzir à cultura, seja pela apropriação dos meios culturais existentes, seja pela invenção de novos significados culturais; -o direito de participar das decisões quanto ao fazer cultural; -o direito de usufruir dos bens de cultura, criando locais e condições de acesso aos bens culturais para a população; -o direito de estar informado sobre os serviços culturais e sobre a possibilidade de deles participar ou usufruir; -o direito à formação cultural e artística pública e gratuita nas escolas e oficinas de cultura no município; -o direito à experimentação e à invenção do novo nas artes e humanidades; -o direito a espaços para reflexão, debate e crítica; - o direito à informação e à comunicação. (CHaUÍ, 2006, p. 70)

Para Chauí (2006) cidadania cultural é caracterizada por quatro perspectivas determinantes da proposta do conceito de cultura: não limitado a uma vertente de pesquisa, mas ligado a uma visão macro; uma visão de cultura pelo cunho democrático, de acessibilidade a todos os cidadãos; uma definição conceitual de cultura como trabalho de criação e uma definição dos sujeitos sociais como sujeitos históricos com a ênfase na historicidade.

O conceito de Cidadania Cultural é guiado por duas diretrizes: “[...] a cultura como direito dos cidadãos e como trabalho de criação dos sujeitos culturais” (CHAUÍ, 2006, p.75). Neste sentido, podemos relacionar os sujeitos culturais indicados pela autora, com o conceito de sujeito denominado por touraine (1998), que entende o entorno social em que vive e tem criticidade para se mobilizar e lutar por uma sociedade democrática.

O que diferencia as linhas de pensamento de Touraine (1998) e Chauí (2006) é o papel do Estado nessa relação. Nos relatos de Chauí, o mediador da cidadania cultural é o Estado, em concordância com Eagleton (2005) que considera que o cultivo ou mediação da cultura poder ser feito pelo Estado e não só pelos cidadãos, mas “[...] para que isso aconteça, o Estado já tem que ter estado em atividade na sociedade civil, aplacando seus rancores e refinando suas sensibilidades” (EAGLETON, 2005, p. 16), inserindo-se na cultura da sociedade.

No caso do Brasil, a intervenção estatal nos processos comunicacionais, caminhando para a cidadania cultural, por meio das políticas públicas, como uma forma de democratizar os meios e criar o capital cultural apresentado por Bordieu (1998). Essas políticas, como é o caso do

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Programa Mais Cultura, voltam-se à redução das desigualdades sociais, utilizando a escola como mediadora dessa relação por ser um local de formação e de desenvolvimento humano. Essas políticas visam garantir o direito humano e de cidadania a cultura, em igual nível de importância com os demais direitos.

1.1. A cultura nas políticas públicas educacionais

As políticas públicas sociais são implantadas para garantir os direitos ao bem-estar social, como saúde, educação, cultura. Segundo Demo (2011, p.41), as características principais de políticas participativas e emancipatórias são “[...] reconhecer que bem estar não é dádiva, mas conquista”, indicando a questão da democracia, tornando-a componente fundamental e parte do bem-estar social.

Nesse mesmo movimento, o governo federal vem investindo em políticas públicas educacionais e culturais como uma estratégia para implantação gradativa do ensino integral na rede pública. Em 2007, foi implantado o programa Mais Educação2 e em outubro de 2009 foi instituído pela portaria nº9713 o programa Ensino Médio inovador.

Já em 2013, foi implantado o Programa Mais Cultura, para fomentar a valorização da cultura brasileira e inclusão de projetos culturais no ensino regular, voltado ao desenvolvimento de cidadãos críticos, criativos e com percepção artística. Trata-se de uma iniciativa de caráter interministerial entre os Ministérios da Cultura (MinC) e da Educação (MEC), que objetiva incentivar práticas culturais e artísticas em escolas públicas que já integram os Programas Mais Educação e Ensino Médio inovador.

Essas políticas (Mais Cultura, Ensino Médio Inovador e Mais Educação), se diferem pelo rigor de periodicidade. No Programa Mais Cultura não há exigência de carga horária regular semanal, as atividades podem ser realizadas conjuntamente com as aulas regulares e também nos finais de semana, com durabilidade mínima de seis meses. Cada escola tem liberdade de escolher os eixos temáticos e modalidade mais adequados a sua realidade. Já as escolas integradas aos Programas Mais Educação e Ensino Médio Inovador, ativas no ano de 2012, puderam participar do Programa Mais Cultura, lançado em 2013. Considera-se que essas já adotam práticas de diversificação de espaços e tempos, bem como estão familiarizadas com a metodologia de projetos em turno integral. Nesse contexto, cinco mil projetos culturais foram selecionados das Escolas inscritas a serem implantados a partir do primeiro semestre de 2014.

2 Passo a passo mais educação. Disponível em: <www.portal.mec.gov.br/dmdocuments/passoapasso_maiseducacao.pdf> acesso em: 30 de ag. 20143 Ensino médio inovador. Disponível em: <www.portal.mec.gov.br/dmdocuments/ensino_medioinovador.pdf> Acesso em: 30 de ag. 2014.

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O axioma é desencadear o diálogo entre a iniciativa cultural e o projeto político pedagógico, tratando-se de um processo colaborativo entre a Escola e Entidades Culturais, decentralizando e democratizando a cultura. A Escola tem a liberdade na escolha do tema, da atividade, da periodicidade e aplicabilidade que melhor se adequar a realidade da sua comunidade educativa, cujo planejamento é concebido em conjunto com a entidade cultural selecionada.

Segundo Touraine (1998) o papel da educação é fundante para formar o que “[...] podría ser la escuela del Sujeto” (toUrainE, 1998, p. 22). nessa Escola o aluno seria preparado para compreender outras culturas e os direitos sociais e assim partiria para o entendimento da democracia e da cidadania. Nesse mesmo contexto, Touraine (1998, p.263) aborda a importância da democracia cultural, uma vez que ela luta �[...] por um lado para permitir a utilização das técnicas e dos meios de comunicação pelo maior número possível de culturas� e por outro para preservar a alteridade cultural a fim de torná-las não só criadoras, mas sim produtos da coletividade real. Para o autor (TOURAINE,1998 p.219), só conseguiremos viver juntos se nos construirmos como �sujeitos da nossa própria existência�.

1.2. O Programa Mais Cultura

O Mais Cultura segue a perspectiva do Programa Mais Educação que objetiva a educação integral e tem como princípio o diálogo entre os macrocampos para um ensino de qualidade voltado à redução das desigualdades sociais. Dessa forma, a escola pode contribuir na compreensão do direito de aprender e desenvolver-se intelectualmente, direito congênere ao direito à vida e a saúde.

Segundo o Manual de Orientações do Programa Mais Cultura nas Escolas (2014), o objetivo da parceria entre o Ministério da Educação e Ministério da Cultura é de fazer com que a escola seja reconhecida como um espaço de circulação e produção da diversidade cultural brasileira. Entre os pontos objetivados estão a promoção e consolidação de territórios educativos, com a valorização do diálogo entre saberes comunitários de escolares, na perspectiva da pedagogia das diferenças.

Outro ponto assinalado é das relações de vivências e manifestações artísticas fora do contexto escolar, podendo ocorrer a ampliação repertórios que abrangem a diversidade cultural para a promoção da interculturalidade, que segundo Candau (2012, p.14) são processos que reconhecem “[...] o direito à diferença e a luta contra todas as formas de discriminação e desigualdade social”, além de estar presente no documento do MinC/MEC:

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- Promover o reconhecimento do processo educativo como construção cultural em constante formação e transformação; - Fomentar o comprometimento de professores e estudantes com os saberes culturais locais; - Contribuir para a ampliação do número dos agentes sociais responsáveis pela educação no território, envolvendo iniciativas culturais dos territórios nos processos educativos em curso nas escolas; - Proporcionar aos estudantes vivências artísticas e culturais promovendo a afetividade e a criatividade existentes no processo de ensino e aprendizagem. (MANUAL DE dESEnVolViMEnto - MaiS CUltUra naS ESColaS, 2014).

Com estes objetivos os Ministérios acreditam que a cultura nas escolas será democratizada, promovendo incentivo à cultura, cooperando para a construção da igualdade. Como Escobar (2005) apresenta no conceito de participação cidadã, quando diversas partes utilizam percepções comuns para construir e negociar um ponto comum que beneficiará a todos, dessa forma, a cultura na escola se torna uma chave para o diálogo em diversas atividades e ações, desde o aprendizado até as relações humanas.

Para que esses conceitos atinjam a práxis educativa, as propostas de projetos elaboradas a partir da sinergia entre a coordenação escolar e entidade cultural devem estar afinadas com o projeto político-pedagógico da escola e deve seguir o Plano de Atividade Cultural concebido e desenvolvido em parceria entre a Escola e a organização promotora ou promotor cultural: pontos de cultura, museus, produtores culturais, artistas, mestres de cultura popular e tradicional, cinemas, bibliotecas, coletivos culturais. O Mais Cultura está estruturado em eixos temáticos: Residências de Artistas para Pesquisa e Experimentação nas Escolas; Criação, circulação e difusão da produção artística; Promoção cultural e pedagógica em espaços culturais: atividades aplicadas em pontos de cultura, centros culturais, museus e cinemas; Educação patrimonial - patrimônio material e imaterial, memória, identidade e vínculo social; Cultura digital e comunicação; Cultura afro-brasileira; Culturas indígenas; Tradição oral; Educação Museal.

Nesses eixos podem ser incluídas quaisquer linguagens de arte e manifestações culturais que aportem assuntos que necessitam da abertura para diálogo nas escolas e nas comunidades escolares colaborando para uma reflexão crítica dos conteúdos. Assim, o Programa Mais Cultura possibilita que produtores culturais, pontos de cultura, museus e manifestações culturais criem projetos com aplicabilidade no ambiente escolar ou fora dele, que tenham relevância e proporcionem o diálogo com o conteúdo abordado nas disciplinas curriculares.

O diálogo cultura-escola pode ser aproveitado de forma criativa, desenvolvendo potenciais efetivos, colaborando para um melhor aprendizado. Os profissionais, ao desenvolver os projetos culturais, partem da elaboração de um Plano de Atividade Cultural em conjunto com a escola e professores, para que a experiência contribua para as práticas de ensino e estímulo

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interdisciplinar ao aluno que frequenta o ensino público voltado a uma educação cidadã.

Em abril de 2014, com atraso de três meses, saiu o resultado do edital selecionando 5000 projetos para serem implementados em todo país pelo Programa Mais Cultura. Segundo dados do portal Brasil4 o programa tem investimento de R$ 100 milhões, sendo que cada projeto selecionado recebe entre R$20 mil e R$ 22 mil do Programa Dinheiro Direto na Escola do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação para executar os Planos de atividade elaborados durante o ano de 2014 por no mínimo seis meses.

foram 14 mil propostas enviadas à diretoria de Educação e Comunicação para a Cultura, cerca de 63% das escolas5 escolheram apenas um eixo temático, contabilizando cerca de 10.070 projetos no eixo mais procurado, o de Criação, Circulação e Difusão de Produção Artística. O segundo eixo com mais inscrições foi o de Cultura- Afro-brasileira, com 3.937 projetos apresentados, seguido do eixo de Promoção Cultural e pedagógicas em Espaços Culturais com 2.890 projetos e o eixo de Educação Patrimonial com 2.386 submissões.

O eixo Tradição Oral foi o quinto mais procurado, com 1.685 projetos inscritos, e em seguida, o eixo Cultura Digital e Comunicação, com 1.580 inscrições. Em sétimo lugar, ficou o eixo Educação Museal, com 982 projetos apresentados, seguido pelo eixo Culturas Indígenas com 834 inscrições. O eixo menos procurado foi o de Residências Artísticas para Pesquisa e Experimentação nas Escolas com 777 projetos inscritos.6

Segundo dados fornecidos pelo Ministério da Cultura, no rio Grande do Sul foram apenas setenta e três planos de atividade selecionados, sendo que 50 projetos apresentaram como eixo temático Criação, Circulação e Difusão de Produção Artística.

Em Santa Maria foram sete escolas selecionadas, sendo elas a Escola Estadual de Educação Básica Augusto Ruschi, Escola Estadual de Ensino Fundamental João Link Sobrinho, Escola Estadual de Ensino Fundamental Marechal Rondon, Escola Estadual de Ensino Médio Dr. Walter Jobim, Escola Municipal de Ensino Fundamental Duque de Caxias, Escola Municipal de Ensino Fundamental São Carlos e Escola Municipal de Ensino Fundamental Pão dos Pobres � Santo antônio.

Esse trabalho tem como base analisar cinco das sete escolas selecionadas com aplicação de questionários e análise dos projetos em desenvolvimento nas escolas de Santa Maria. As escolas escolhidas para a aplicação são: Escola Estadual de Educação Básica Augusto Ruschi, Escola Estadual de Ensino Fundamental João Link Sobrinho, Escola Estadual de Ensino Médio

4 Disponível em: <http://www.brasil.gov.br/cultura/2014/02/mais-cultura-nas-escolas-divulga-lista-de-selecionados.> Acesso em 03 de Outubro de 2014.5 Fonte: Portal Brasil. Disponível em: <http://www.brasil.gov.br/cultura/2014/02/mais-cultura-nas-escolas-divulga-lista-de-selecionados>. Acesso em 03 de outubro de 2014.6 Fonte: Portal Brasil. Disponível em:<http://www.brasil.gov.br/cultura/2014/02/mais-cultura-nas-escolas-divulga-lista-de-selecionados>. Acesso em 03 de outubro de 2014

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Dr. Walter Jobim, Escola Municipal de Ensino Fundamental Duque de Caxias, e Escola Municipal de Ensino Fundamental Pão dos Pobres � Santo Antônio, priorizadas pela localização e pesquisa da realidade local.

1.3. Análise das entrevistas aplicadas aos Coordenadores Escolares

nome do Projeto Área do Projeto

Atividades desenvolvidas duração

carga horária

semanal

escola A Vós na Escola

Música arte

audiovisualOficinas 2 meses 4 horas

escola B

Mais Cultura nas escolas

Música arte Oficinas 2 meses 3 horas

escola c *1 * * * *

escola d

projeto Circo do duque e

Sustentabilidade

dança teatro Música

Oficinas 2 meses 6 horas

escola e

orquestrariumMúsica

aulas de música, oficinas, ensaios

coletivos.

Cerca de 1 ano sem o edital,

30 horas

Tabela 1- Dados informativos do projeto fornecidos pelo Coordenador Escolar

fonte: autor

Durante o mês de setembro e outubro ocorreu a coleta de dados da pesquisa, dessa forma percorreu-se as cinco escolas para aplicação de questionários com o Coordenador Escolar e com a Iniciativa Cultural a fim de conhecer melhor o trabalho e entender qual a perspectiva de cada um sobre o Programa Mais Cultura nas Escolas. Os Projetos e os planos de trabalho foram solicitados para análise e leitura, para mapear o trabalho realizado nas escolas.

Algumas questões foram utilizadas em comum para ambas as partes, para verificar se ocorre o conhecimento do projeto tanto pela escola, quanto pela entidade cultural. Além disso, esperou-se compreender com os questionários a ligação que cada um entende entre educação e cultura e qual a ligação entre os termos igualdade e diferença ao se tratar de cultura, para entender se há dispositivos para tratar da cidadania cultural.

Como Boaventura de Sousa Santos (2003, p.10) apresenta as “[...] pessoas e os grupos

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sociais tem o direito a serem iguais quando a diferença os inferioriza, e o direito a serem diferentes quando a igualdade os descaracteriza�. Entende-se aqui a possibilidade de ocorrer a interculturalidade respeitando a alteridade de cada cultura, pensando que a percepção igualitária pode ser vista de forma equitativa na ambiência cultural.

Quanto às escolhas dos eixos temáticos nas escolas, três dos coordenadores escolares responderam que já haviam tido contato com a Entidade cultural, e por isso, selecionaram o eixo temático de acordo com as atividades anteriormente realizadas. Um ponto a se observar é que todas as escolas já tiveram algum tipo de contato com atividades culturais vindas de entidades da cidade, entendendo que o Programa Mais Cultura se tornou uma alternativa para firmar parceria e formalizar as atividades.

Referindo-se ao conhecimento do Programa, os responsáveis pelas escolas responderam que conheceram via internet (Portal SIMEC/MEC) e por informações repassadas pela Secretária da Educação, afirmando estarem sempre a par das atualizações via órgãos localizados na cidade.

Michel de Certeau explica que a cultura tem uma autonomia flexível, caracterizando-se como um não lugar representativo, onde há possibilidade de circulação do que quer que seja, trazendo o conceito de cultura plural sob a ideia de �[...] quanto mais a economia unifica, mais a cultura deve diferenciar� (1970, p.10). Trazendo a crítica a uma sociedade homogeneizada pelo capitalismo, inserindo a escola como um espaço de reeducação social, para que o ensino saia do entrincheiramento da sabedoria e do jogo de força, dando ênfase à diferença e também à alteridade de cada experiência.

Nessa perspectiva da relação entre cultura e educação, todos os representantes escolares definiram que há uma grande importância na ligação entre os dois conceitos frente a uma educação integral. Quando questionados sobre a cultura como direito humano representado na escola, comunidade, família, desenvolvimento humano da criança participante como futuro cidadão, engajamento dos professores e participação dos alunos, todos responderam que consideram muito importantes todos os aspectos.

Quanto à percepção dos coordenadores nesses dois meses de projeto, todos afirmaram estar em estágio inicial, mas os resultados, ainda que tímidos, são positivos, sendo que um dos coordenadores afirmou: “[...] ainda não temos uma avaliação, mas os alunos da Rima passam mais tempo na biblioteca� (Coordenador da Escola A, 2014). Indicando ainda no questionário que o nível de motivação/participação das crianças nas atividades é alto, contribuindo para a melhora nas notas, concentração, socialização e responsabilidade.

No questionamento sobre qual seria a contribuição desses Programas (Mais Cultura e Mais Educação) para a formação de um cidadão político, crítico e emancipado, capaz de contribuir na construção de uma democracia participativa e de uma cultura de paz, o coordenador escolar da Escola d apresenta:

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A escola é o melhor lugar para a criança depois da família, cada vez mais é evidente que com a mãe trabalhando fora, a escola supre a esse papel de educar com cultura o novo cidadão do mundo em permanente evolução. Esperamos o turno integral com condições físicas para exercer o direito do educando e o reconhecimento dos profissionais com dedicação exclusiva, comprometidos e adaptados às necessidades das novas gerações num novo tempo. (Coordenador Escolar, Escola d, 2014).

Em concordância, o Professor da escola A relata a educação integral presente, retomando a ideia de formar indivíduos críticos e cidadãos a partir do contato com diferentes saberes e convivências.

1.4. Análise das entrevistas aplicadas às entidades Culturais

Quanto às entrevistas aplicadas às entidades culturais, foram 05 entrevistas semiestruturadas aplicadas, um para cada responsável pela aplicação dos projetos na escola, com questões divididas entre a fase informativa e reflexiva, sendo que na fase informativa pediram-se informações do contato com a escola e do projeto e nas questões reflexivas de compreensão da importância do projeto e concepção sobre o andamento deste.

contato para atuar na escola

Experiência como conheceu o Programa Mais cultura

Metodologia utilizada Local de nível de motivação

escola A Já haviam trabalhado com a escola

dois anos pelo site do Ministério da Cultura.

Oficinas dialógicas e trabalho de formação a partir de debates.

Em sala de aula e nas localidades da escola.

alto

escola B o contato se deu a partir da procura da escola pela entidade.

dois anos a escola forneceu informações e apresentou o programa.

Trabalho em conjunto com os alunos, mesclando exercícios técnicos com ritmos conhecidos do folclore brasileiro e oficinas teóricas.

Espaço destinado a oficinas do Mais Educação � Ginásio.

Médio

escola c A escola conhecia o trabalho e manifestou interesse.

Onze anos Site do MinC/MEC e escola

Trabalho de formação a troca de saberes, entendendo que o aluno é co-produtor, por meio de aulas expositivas, debates e oficinas técnicas.

Sala de audiovisual e dependências da escola para gravação.

outros: Muito cedo para definir.

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escola d Já trabalha com projetos culturais em escolas desde 2005 e foi chamada pela escola.

Quinze anos

a escola forneceu as informações e posteriormente na internet.

roda de conversa, explanação multimídia, práticas de expressão corporal, terapia comunitária e oficinas.

Sala de aula, pátio, ginásio e Sala dos professores.

alto

escola e projeto já era desenvolvido na escola anteriormente.

Seis meses Via internet e sites do MinC.

Processo dialógico por meio de oficinas de música com prática instrumental e canto coral.

Salão da igreja do Bairro alto da Boa Vista

alto

Tabela 2- Análise reflexiva e informativa com as entidades culturais. Fonte: Tabela formulada por autora

Como visto na Tabela 2, as cinco entidades culturais pesquisadas foram procuradas pela escola, possuindo alguma relação anterior de trabalho com as unidades escolares, como já havíamos comentado, reforçando a ideia de que é recorrente atividades periódicas relacionadas à cultura em escola de Santa Maria. Outro ponto a ressaltar é que todas as entidades conhecem o Programa Mais Educação e conheceram o Programa Mais Cultura por meio da escola parceira ou por sites.

Percebemos pelas respostas das entidades culturais que os projetos são amplos quanto às questões metodológicas, valorizando a participação do aluno, chamando atenção para a entidade cultural da Escola C que utilizou termos coprodução, protagonismo, troca de saberes, fortalecendo a imagem da educação intercultural que busca a participação do aluno e a abertura do conhecimento para amplas culturas.

Nessa perspectiva, Banks (1999, apud Candau, 2012, p.39) indica que a falta de desempenho escolar está ligada a dois paradigmas: o primeiro de privação cultural que indica que o fracasso dos alunos está ligado à cultura em que foram socializados, que não os enriqueceu com experiências positivas quanto ao desempenho escolar e que indica cultura inferiores e superiores. E a de diferença cultural, que entende que cada cultura tem suas especificidades que devem ser entendidas na sua originalidade, sem uma definição hierarquizadora, dessa forma, a mudança deve estar na cultura escolar em passar a valorizar as diferenças de uma forma não monocultural.

Quanto às mudanças apontadas pelos Coordenadores culturais, estão as questões comportamentais, estruturais no que tange à família, destaque para o interesse pelo aprendizado, boas maneiras, participação e troca de saberes entre os alunos, que passaram a ser preocupar com o aprendizado de seus colegas, a partir da percepção do pertencimento a um lugar. Segundo a coordenadora cultural da Escola E (2014), “[...] as escolas mandam os alunos com problemas para cá, e eu digo: “podem enviar”; essas crianças precisam de

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compreensão, de que seus problemas sejam entendidos, tivemos alunos que não sabiam ler com nove anos e hoje temos esses mesmos lendo partituras musicais”.

Como observa Candau (2012),

[...] uma das implicações mais perversas para os alunos/as, principalmente aqueles oriundos de contextos culturais habitualmente não valorizados pela sociedade e pela escola, é excessiva distância entre suas experiências socioculturais e a escola, o que se traduz em elevados índices de fracasso escolar e na multiplicação de manifestações de desconforto e mal-estar em relação à escola (CandaU, 2012, p. 76).

Assim entendemos que a escola vê alguns alunos como �problemas� por não entender suas experiências socioculturais, estando ele em um não-lugar de pertencimento, se sentido mal compreendido e deslocado frente aos seus colegas. O que temos presente hoje é a falta de preparo quanto aos educadores e uma educação monocultural, que entende que as diferenças são negativas e devem ser anuladas.

Ao questionarmos as entidades culturais sobre a importância dessas Políticas Públicas para a classe cultural, os produtores independentes e entidades culturais, podemos entender que eles buscam espaço no meio escolar para promover e diversificar culturas, como afirma a coordenadora cultural da Escola E, � [...] a disseminação da música orquestral com um perfil mais jovial e menos formal, possibilitando o acesso a um público que em momentos anteriores não teria tal possibilidade�, promovendo assim o capital cultural dessas crianças, ensinando que a sua cultura não é inferior a outra, educando para a cidadania cultural.

2. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O ponto de reivindicação geral, tanto dos coordenadores escolares, quanto das entidades culturais, foi a falta de infraestrutura, algumas escolas estão em reforma, outras sofrem com a falta de sala de aula e falta de espaços na escola. Verificamos que parte dos alunos está tendo aulas na sala de professores, por falta de salas disponíveis em decorrência de destelhamentos em época de tempestade na cidade.

outro ponto em comum foi a falta de equipamentos, muitos projetos enfrentam a falta de material e a impossibilidade de comprá-los por meio do edital, pedindo uma reconfiguração na distribuição de verba na proposta de trabalho. Percebe-se que parte dos projetos tinha

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seus equipamentos por meio do Mais ou Educação e utilizou-os para ampliar seu uso com o Mais Cultura.

Também há preocupação quanto à rotatividade dos alunos que enfrentam inúmeras dificuldades e distanciamento entre a entidade parceira e a escola durante o desenvolvimento do projeto. Essa segunda observação foi verificada nas visitas e na dificuldade de encontrar informações na direção, quanto ao andamento no projeto, evidenciando a falta de percepção da importância do projeto e a valorização da cultura na escola, percebendo-se ambientes escolares monoculturais (Candau, 2012).

A partir das análises dos cinco projetos, entendemos que há uma prática de relacionar os conceitos de cultura e educação nas escolas de Santa Maria, visto que todas as escolas já haviam recebido projetos direcionados às temáticas culturais. Dessa forma, a aplicação de um projeto como o programa Mais Cultura tornou-se viável por dois motivos: pela prática recorrente na cidade e pelo Programa Mais Educação ter iniciado a ideia de oficinas extraclasse nas escolas.

Os professores das escolas pesquisadas demonstraram-se interessados em receber projetos culturais, geralmente com a justificativa de ajudar as crianças na sociabilidade e na dedicação durante os estudos, demonstrando uma pré-disposição por parte dos alunos a mudar seu comportamento com atividades culturais realizadas periodicamente. O Programa Mais Cultura é mais uma das iniciativas que abrem espaços culturais na cidade e fazem o diálogo entre educação e cultura, encaminhando para a alteridade social e cidadania cultural.

REFERÊNCIAS

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