Upload
regiao-de-turismo-do-algarve
View
216
Download
0
Embed Size (px)
DESCRIPTION
Artigo do jornal "Público" sobre o parque subaquático Ocean Revival.
Citation preview
Tiragem: 37998
País: Portugal
Period.: Diária
Âmbito: Informação Geral
Pág: 20
Cores: Cor
Área: 25,70 x 31,00 cm²
Corte: 1 de 3ID: 55803653 21-09-2014
Um minuto e dois segundos. Foi o
tempo que o antigo navio oceano-
gráfi co “Almeida Carvalho” demo-
rou a afundar ao largo de Alvor, em
Portimão, há precisamente um ano,
completando assim a “armada” do
parque subaquático Ocean Revi-
val. No fundo do mar repousavam
já uma corveta, uma fragata e um
patrulha oceânico, todos com mi-
lhares de horas a navegar em repre-
sentação da Marinha Portuguesa.
Mas mesmo reformados, os navios
continuam em missão.
Quando o PÚBLICO mergulhou no
Ocean Revival, numa manhã quente
de Junho, não se via uma onda no
mar, a três milhas de terra. Mas a
“piscina” não era de água quente -
estava a 13 graus - nem transparen-
te. “Tem estado pior”, dizem-nos.
Semanas antes, um boom de algas
deixou a água esverdeada, cheia de
matéria em suspensão. Resultado?
Junto à superfície, a visibilidade
ronda os dois metros. Mesmo assim,
descemos pelo cabo rumo à corveta
“Oliveira e Carmo”, que inaugurou
o parque subaquático a 30 de Outu-
bro de 2012.
O cenário melhora à medida que
nos aproximamos do fundo. Oito
metros de visibilidade deixam ver
toda a proa do barco. O mastro,
onde passeiam robalos, sargos e
peixes-porco, está a 15 metros da
superfície mas o casco assentou aos
30 metros. A carcaça imponente
jaz num fundo de areia, completa-
mente revestida por uma espécie
de musgo verde. As cracas, ostras
e outros organismos que se fi xaram
no metal já mal deixam ver a cor
original do barco.
Guiado por dois instrutores da
Subnauta - empresa promotora do
Ocean Revival através do seu fun-
dador, Luís Sá Couto -, o grupo de
mergulhadores segue por estibordo,
como combinado no briefi ng ainda
no centro de mergulho. Fazemos
sinal negativo ao guia quando este
nos convida a entrar na casa das má-
quinas. Também não entramos na
messe dos praças, onde estão ainda
mesas e cadeiras, nem na cozinha.
Só mais tarde, no segundo mergu-
lho, temos coragem para entrar na
ponte de comando e rodar o leme
da fragata “Hermenegildo Capelo”,
a terceira a ir ao fundo, em Junho
de 2013.
O interior dos navios foi prepara-
do para facilitar a vida aos mergu-
lhadores, com muitos pontos de en-
trada de luz e saídas à vista, mas um
só mergulho não chega para ver to-
dos os recantos. O tempo médio de
permanência aos 30 metros ronda
os 40 minutos, pelo que são precisas
três ou quatro visitas para conhecer
os barcos de uma ponta à outra.
Inquilinos à espreitaNa corveta, paramos sobre a pista do
heliporto, onde o mau tempo deste
Inverno deixou marcas. A parte tra-
seira do barco, uma secção com 20
metros de comprimento, foi afasta-
da uma centena de metros do resto
da corveta. Segundo Pedro Caleja,
guia da Subnauta e arqueólogo suba-
quático, a queda do barco no fundo
provocou uma rachadura naquela
zona da popa, que acabou por partir
totalmente e foi arrastada pelas cor-
rentes, o que não estava nos planos.
Terá estabilizado entretanto.
Basta explorar o exterior do “Oli-
veira e Carmo” para encontrar in-
quilinos. Um polvo escondido numa
caixa, com os olhos curiosos à es-
preita, outro encaixado numa prate-
leira, cabozes a passear no convés.
No interior há sargos, safi os e nudib-
rânquios (lesmas do mar). Segundo
o biólogo Gonçalo Calado, que con-
duz a monitorização dos barcos des-
À superfície, realizaram centenas de missões pela Marinha Portuguesa. Agora, no fundo do mar de Portimão, os quatro navios de guerra que compõem o parque subaquático Ocean Revival têm outra missão: dão abrigo a dezenas de espécies marinhas e atraem milhares de mergulhadores, portugueses e estrangeiros. Apesar da água turva
Polvos, safi os e bogas vivem em paz a bordo de quatro navios de guerra
Fonte: Ocean Revival PÚBLICO
Parque subaquático Ocean Revival ficou completo há um ano
2 m
ilhas
3,3 milhas
1 milha
PORTIMÃO
15m26-32m
Superfície
Fundo marinho
Localização dos navios
Navio Patrulha Zambeze
Corveta Oliveira e
Carmo
Navio Almeida Carvalho
Fragata Hermenegildo
Capelo
Nov2012 2013
Dez Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov
2 2
9
2
9
2
96
96
1112 1112 1113 1415
4
1617
22
5
20
5
2220
5 6
2220
5 6
Número de espécies residentes nos quatro navios
MergulhoMarisa Soares
DR
Tiragem: 37998
País: Portugal
Period.: Diária
Âmbito: Informação Geral
Pág: 21
Cores: Cor
Área: 25,70 x 31,00 cm²
Corte: 2 de 3ID: 55803653 21-09-2014
No total, seriam investidos 1,3 milhões de euros, com comparticipação de fundos comunitários
O projecto de afundar um avião ao
largo de Viana do Castelo, para criar
um recife artifi cial que atraísse mer-
gulhadores de todo o mundo, caiu
por terra. O promotor, a empresa
Costa Norte, diz que a ideia esbar-
rou nos entraves colocados pela ca-
pitania do porto local. No entanto,
o capitão contrapõe que nunca lhe
foi pedida autorização para afundar
uma aeronave, mas sim para uma lo-
comotiva.
Em Dezembro de 2012, o promo-
tor anunciou que já tinha luz verde
de todas as entidades competentes
para avançar com o afundamento de
um avião a duas milhas da costa de
Viana, em frente à praia de Carre-
ço. No entanto, ao que o PÚBLICO
apurou, os pareceres positivos não
diziam respeito ao afundamento de
uma aeronave, mas sim de uma lo-
comotiva.
A Comissão de Coordenação e De-
senvolvimento Regional do Norte,
por exemplo, foi um dos organis-
mos que emitiram parecer favorável.
Também a Autoridade Marítima Na-
cional se pronunciou favoravelmente
quanto ao afundamento da locomo-
tiva. Ao PÚBLICO, esta entidade diz
que o capitão Paulo Gomes da Silva,
responsável pela capitania de Viana,
“respondeu ao utente [um elemen-
to da Costa Norte] no sentido de o
afundamento ser autorizado, tendo
inclusive indicado as linhas de acção
a adoptar, mas o utente nunca mais
respondeu”.
“Nunca me chegou aqui nada so-
bre uma aeronave. Eu respondi ao
pedido para afundar uma locomo-
tiva e nunca mais tive resposta”, re-
força o capitão Paulo Gomes da Sil-
va, alegando que haverá na opinião
pública “desinformação” sobre este
projecto.
A ideia inicial da Costa Norte era
mesmo afundar uma locomotiva, ad-
mite Francisco Ponte, sócio da em-
presa e um dos “cérebros” do pro-
jecto anunciado em 2012. “Mas con-
cluímos depois que seria mais viável
afundar um avião, que este teria mais
atenção mediática e da comunidade
de mergulhadores”, explica. Insiste,
porém, que fez chegar à capitania um
Costa Norte desistiu de afundar avião...e locomotiva ao largo de Viana do Castelo
pedido para afundar uma aeronave.
“Eles não deram autorização e o pri-
meiro problema levantado foi o local
do afundamento”, acrescenta.
O avião de 48 metros, que a empre-
sa já tinha em vista, seria importado
dos Estados Unidos, limpa e colocada
no fundo do mar, “sem prejudicar a
navegação”. O local ideal, para Fran-
cisco Ponte, seria a Baixa do Parcel,
embora inicialmente estivesse pre-
vista a zona de Carreço. O objectivo
era criar um recife artifi cial à seme-
lhança do parque Ocean Revival no
Algarve, que levasse os mergulhado-
res “em romaria” a Viana. Previsto
para este ano de 2014, o projecto da
Costa Norte incluía também a criação
de uma escola de mergulho, even-
tos de pesca desportiva e passeios
turísticos a bordo de um hovercraft
(um veículo assente numa espécie
de colchão de ar que pode andar na
água e no solo).
No total, seriam investidos 1,3 mi-
lhões de euros. A empresa apresen-
tou uma candidatura a fundos co-
munitários que, segundo Francisco
Ponte, ainda chegou a ser aprovada,
mas teve de ser anulada. “Se não po-
díamos fazer as actividades a que nos
propusemos, não podíamos justifi car
as verbas que iríamos receber”, diz
Francisco Ponte.
“A capitania impede-nos de traba-
lhar”, acusa, queixando-se da posi-
ção daquela entidade não só em re-
lação ao afundamento do avião, mas
também às actividades de formação
desenvolvidas pela escola de mergu-
Marisa Soares
de o primeiro dia, a colonização co-
meçou poucas semanas depois dos
naufrágios. “Como o casco não era
limpo há muito tempo, a parte que
fi ca debaixo de água estava cheia
de mexilhões, que ali continuaram
depois do afundamento”, afi rma. Os
polvos aproveitaram o festim.
O efeito de atracção é quase ime-
diato, explica Miguel Neves dos San-
tos, biólogo do ex-Ipimar (integrado
no Instituto Português do Mar e da
Atmosfera), especialista em recifes
artifi ciais. Ao embaterem no barco,
as correntes marítimas provocam
um ruído não perceptível ao ouvido
humano. Mas os peixes ouvem e em
poucos minutos encontram a em-
barcação. Depois, uns aproveitam
para arranjar “casa”, outros usam-
na apenas como ninho ou para se
protegerem dos predadores, alguns
fazem só “visita de médico”.
A monitorização dos navios inclui
a contagem de espécies residentes.
No “Oliveira e Carmo”, até ao fi nal
do ano passado foram identifi cadas
22, com destaque para a boga, o sar-
go, o peixe-porco e a choupa. Pedro
Caleja conta que, há duas semanas,
viu pela primeira vez um peixe-lua
a passear junto à corveta. Ocasio-
nalmente, o barco tem visitas de lí-
rios, peixes-galo. “Há um mês três
golfi nhos roazes desceram com os
mergulhadores”, diz o guia.
No navio patrulha “Zambeze”,
afundado poucas horas depois da
corveta, foram identifi cadas 20 es-
pécies até ao fi nal de 2013. Tanto
a fragata “Hermenegildo Capelo”
como o navio oceanográfi co “Al-
meida Carvalho”, os dois últimos a
naufragar, “benefi ciaram das larvas
que já estavam a sair dos primeiros
e por isso a colonização foi mais rá-
pida”, diz Gonçalo Calado. Para este
biólogo, o recife artifi cial está a ter
“um impacto positivo no aumento
da biodiversidade” na zona, mas
ainda serão precisos mais dois anos
até que a comunidade de espécies
residentes estabilize.
Os impactos ambientais do Oce-
an Revival foram, desde o início,
uma das principais preocupações
de quem se opôs ao projecto. “Um
dos receios era o assoreamento à
volta dos navios, mas isso não se ve-
rifi cou”, diz Gonçalo Calado. Outra
preocupação era a toxicidade dos
materiais. Os navios, cedidos pela
Marinha à Câmara de Portimão a
custo zero, foram limpos e descon-
taminados antes do afundamento.
“Ninguém pode garantir que não há
nenhum impacto”, admite Miguel
Neves dos Santos, até porque faltam
estudos sobre casos semelhantes.
Mas até agora, segundo os biólogos,
o prato que mais pesa na balança
parece ser o dos benefícios.
Este parque subaquático com
quatro navios numa zona delimi-
tada, de acesso livre para todos os
centros de mergulho, foi pioneiro
a nível mundial. Financiado pela
Subnauta, por fundos europeus e
por “mecenas privados”, o projecto
implicou um investimento de dois
milhões de euros, que demorou vá-
rios anos a concretizar. “Não houve
qualquer dinheiro do município de
Portimão”, garante Sá Couto, ex-res-
ponsável da Accenture Portugal. Foi
ele o “cérebro” e o “músculo” do
projecto, considerado visionário
por uns e excessivo por outros. O
objectivo era dinamizar o turismo
subaquático na região, aumentan-
do as receitas da actividade de 2,6
milhões de euros em 2012 para 70,5
milhões de euros em 2022.
“Quem vem mergulhar ao Algar-
ve traz como referência o Ocean
Revival”, admite João Rosário, pro-
prietário do Pinguim Sub, centro de
mergulho com mais de 20 anos em
Portimão. Embora reconheça que o
projecto foi bem divulgado em Por-
tugal e no estrangeiro, João Rosário
critica a sua localização, próxima da
foz do Rio Arade e da Ria de Alvor,
que transportam muitos sedimen-
tos. “Quando um barco não tem
condições de visibilidade, os outros
também não têm”, lamenta.
Miguel Neves dos Santos, que aju-
dou a defi nir o local para os afunda-
mentos, explica que este foi “o me-
lhor compromisso” possível, tendo
em conta condicionantes relaciona-
das com o ordenamento do espaço
marítimo e imposições do promo-
tor. “Mas a falta de visibilidade é
um falso problema, porque não se
coloca a profundidades superiores a
20 metros [todos os barcos estão na
cota dos 30 metros]”, observa.
Desde Outubro de 2012 até Agosto
deste ano, a Subnauta realizou per-
to de dez mil mergulhos no Ocean
Revival, cinco mil só este ano, com
os quatro navios já instalados. “Dos
dez mil mergulhos, pelo menos me-
tade correspondem a pessoas que
vieram ao Algarve de propósito
para realizar a visita aos navios”,
diz Sá Couto. Para a Subnauta, os
portugueses - estima-se que ha-
ja 30 mil a 50 mil mergulhadores
certifi cados em Portugal - foram os
mais fáceis de convencer, mas os
espanhóis, alemães, escandinavos
e ingleses começam agora a chegar
em força.
lho da Costa Norte. “Nem sequer nos
deixam fazer baptismos no estuário
do Lima, temos que ir para Espanha.
Damos as primeiras aulas em piscina
e depois vamos para a Galiza fazer
as aulas no mar”, explica Francisco
Ponte.
Na Câmara de Viana do Castelo,
que assumiu como desígnio estratégi-
co a afi rmação de Viana como “cida-
de náutica”, o projecto nunca reuniu
consenso. No anterior executivo, os
vereadores do PSD consideraram
que se tratava apenas de “folclore”
e manifestaram receios em relação
ao impacto ambiental da submersão
de “sucata” no litoral do concelho.
O presidente da Câmara, José Maria
Costa, que estava também à frente da
autarquia no anterior mandato, con-
siderava em 2012 que o afundamento
seria “muito interessante” tendo em
conta a procura mundial por este ti-
po de atracções. O PÚBLICO tentou
contactar o autarca, que esteve sem-
pre indisponível nos últimos dias.
“Viana perdeu e penso que o país
também está a perder”, diz o sócio
da Costa Norte, sublinhando que “os
entraves foram tantos e tão grandes”
que a empresa resolveu mudar de
rumo. Agora a principal aposta da
empresa é em São Tomé e Príncipe,
onde tem já dois centros de mer-
gulho. É lá que pretende afundar o
tal avião, desta feita sem o apoio de
fundos comunitários. “É um inves-
timento nosso, e maior” do que o
que estava previsto para Viana, diz
o responsável.
DR
Tiragem: 37998
País: Portugal
Period.: Diária
Âmbito: Informação Geral
Pág: 1
Cores: Cor
Área: 4,97 x 4,74 cm²
Corte: 3 de 3ID: 55803653 21-09-2014
MERGULHOPOLVOS, SAFIOS E BOGAS QUE VIVEM EM QUATRO NAVIOS DE GUERRALocal,20/21