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Pôncio Pilatos

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Pilatos teve de presidir ao mais importante julgamento da história, mas agiu como um louco e fraco homem. Condenou à morte de cruz o mais inocente de todos os homens

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Pôncio Pilatos

No suposto evangelho de Pedro, lemos: “Dentre os judeus, porém, ninguém lavou as mãos; nem Herodes ou nenhum outro daqueles juízes. E por não quererem lavar-se, Pilatos se levantou. O rei Herodes mandou que se encarregassem do Senhor, dizendo-lhes: “Executai o que acabo de ordenar que façais com ele.”

Dizem alguns que nas oportunidades em que o Evangelho menciona o nome de Pilatos, faz-se transmitir a impressão de uma boa imagem para aquele estúpido e desumano gover-nador romano da Judéia. Não nego. Os evangelistas não se preocuparam em mencionar as atrocidades que esse Procu-rador loucamente autorizou entre os judeus, e ao que parece, até fora de sua jurisdição. Lemos, porém, de um massacre de judeus cujo sangue “Pilatos misturou ao sacrifício”, nada mais.

Isso sugere que os apóstolos mantinham uma boa im-pressão acerca de Pôncio Pilatos? Negativo. A verdade é que só podemos conjeturar sobre os motivos que os levaram a deixar à parte do Evangelho as mais cruéis atividades do governador da Judéia, porque Pilatos certamente foi o mais odiado dentre todos os representantes imperiais na Terra Santa.

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Os críticos encontram novamente razões para desconfiar da veracidade dos evangelhos, considerando que historicamente a conduta de Pilatos era bem oposta às coisas que sobre ele se lê na escritura apostólica. Irascível, obstinado contumaz e desinteressado pela prática da justiça, ele foi odiado até de seus compatrícios, o que veio a ser determinante quando de sua substituição no governo daquela província. Assim, a ima-gem de um Pilatos nobre e quase piedoso, tal como às vezes se pode deduzir através do Evangelho, não corresponde aos fatos.

É o que costumo chamar de desvio de atenção, pois tendo os judeus tratado o Mestre como escória, e Herodes o encarado com desdém, veio retumbante a voz de Pilatos (um homem incrivelmente estúpido) a declarar que Jesus é inocente, e que pretende libertá-lo de suas acusações. Encarando assim, não há como não imaginar que esse governador romano tenha sido um bom homem e perfeito juiz.

Essa imaginação, todavia, só deve ocorrer ao leitor comum, já que submetendo o comportamento que Pôncio Pilatos teve durante o julgamento de Jesus a um frio exame, concluir-se-á que ele não passou de um patife, e se revelará a grotesca caricatura de um governador débil, bajulador, oportunista, e de pusilânime caráter; alguém capaz de entregar à morte um homem cuja inocência estava a toda prova, e isso por puro e simples prazer de tentar agradar a gregos e troianos, visto que destas coisas se podiam extrair vantagens.

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Em sua monumental obra: “História dos Hebreus”, Flávio Josefo nos conta da aparição de Pilatos na Judéia com as seguintes e lacônicas palavras: “Valério Grato, após ter durante onze anos governado a Judéia, voltou a Roma, e Pôncio Pilatos o sucedeu.”

Josefo testemunha contra Pilatos, asseverando que era de natureza violenta, e teimoso ao extremo, e que o seu governo foi marcado por constantes turbulências, sempre ocasionadas por atritos contínuos que ele mesmo criava, provocando a turba dos judeus.

Para piorar, Pilatos não tinha prestígios junto a Herodes, tetrarca de Roma na vizinha Galiléia. Quanto aos judeus, que deviam ser seus subalternos, o desprezavam ainda mais, pois ele era rude e não considerava as leis desta gente. Mas acima de tudo, o governador da Judéia era um fraco, e as classes representantes do judaísmo cedo aprenderam a manipulá-lo, pois o povo perdoará muitos defeitos em um governante, mas nunca a fraqueza.

Partindo da premissa mantida por muitos pesquisadores, Pilatos havia sido escravo antes de se tornar dignitário Roma-no. A possibilidade existe, e se pudesse ser comprovada, com-preenderíamos que ele deve ter sido obrigado a conviver num desconfortável inferno moral, tendo-se em conta que em qualquer lugar do Império, a história demonstrará, explodia como o cúmulo dos insultos o ser alguém governado por um ex-escravo. Mas principalmente entre os obstinados judeus.

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Provas definitivas não existem, e consenso geral jamais houve, mas acredita-se que esse governador foi escravizado antes de se tornar representante imperial no Médio Oriente. Isso, decerto, não quer significar que tenha nascido escravo, pois é fato comprovado que durante a época imperialista romana, muitos homens livres se vendiam espontaneamente como escravos se viam nesta condição a oportunidade de fica-rem ricos.

Acontecia de muitos cidadãos pobres ou falidos, venderem seus dotes culturais a senhores ricos que mais tarde os nomeariam mordomos sobre seus negócios, podendo inclusive mencioná-los em seus testamentos, ou na maior das venturas adotá-los como filhos e os transformar em legítimos herdeiros. O próprio nome “Pilatos” seria uma referência à sua antiga condição escravocrata. A despeito de outras interpretações que se tem dado, essa palavra deriva do latim “pileus”, uma espé-cie de boné ou viseira que servia para distinguir o escravo liberto do homem genuinamente livre.

Verdade ou não, ficou evidente que Pilatos se apavorava ante a idéia de ter de prestar contas aos seus superiores, e foi justamente esse temor que o tornou débil perante a turba dos judeus, quando aos gritos o fizeram ceder, ameaçando-o:

“Se libertares a Jesus, não serás amigo de César!”

Igualmente irritante era a rapina, comum em todas as esferas do governo romano, encontrando-se no ofício a opor-tunidade de enriquecer a custa de seus governados. E no caso

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de estar atuando nas periferias do Império, podia-se surrupiar em dois anos o que jamais se conquistaria em toda uma vida de trabalho na Itália. Pilatos não seria uma exceção.

Apático governador de uma nação servil, e sem consi-deração pela vida alheia, Pilatos foi encarregado de presidir o julgamento de Jesus. E vejam quão digno de nota é o fato de pessoas, até então insignificantes, tornarem-se importantes na história unicamente por haverem cruzado a estrada do Naza-reno.

E qual não deve ter sido a sua exclamação quando tão cedo do dia os sinedritas apareceram em sua residência, levando-lhe um Galileu manietado. Pelas palavras com que o Procu-rador os recebe, é possível acreditar que os judeus faziam aquilo costumeiramente. E Pilatos já estava cansado da coisa.

_ Que acusação trazeis contra este?

Ao que lhes respondem:

_ Se este não fosse criminoso não o traríamos a ti.

Diante do governador da província, eles foram expondo as acusações contra o Mestre:

1_ Ele perverte a nação;

2_ Ele é contrário aos tributos romanos;

3_ Ele se declara Rei dos judeus.

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A tríplice acusação era bem séria, e fundamentada em maquinações, visavam impedir que o Nazareno escapasse da severa condenação. E se antes disso Pilatos mostrara-se indi-ferente às querelas dos judeus, sugerindo inclusive a que eles mesmos se ocupassem de tal julgamento, agora já não podia encarar o assunto sem a devida seriedade.

Não sabemos se lhe ocorreu com estranheza o fato de te-rem os judeus apresentado um homem para ser morto se-gundo o regime de Roma, pois ante a sugestão de eles mesmos executarem o acusado, disseram: “A nossa Lei não nos permite matar a alguém.”

A curiosa afirmação fez com que pesquisadores acredi-tassem que o sinédrio realmente não possuía autoridade para pronunciar a pena de morte, sendo assim obrigado a recorrer aos ditames do Procurador. Mas duvido que tenha sido assim. Todos sabem que para os judeus os preceitos de sua religião estavam muito acima das leis temporais, e Josefo se encar-regará de expor que os representantes do judaísmo fizeram questão de deixar isso bem claro a Pôncio Pilatos.

Em todo caso, Roma sempre permitiu que as nações por ela subjugadas continuassem a manter os princípios de suas leis e até suas exigências religiosas. Os que defendem a hipótese da incapacidade do sinédrio em anunciar a pena de morte, argu-mentam contra as execuções de Estevão e de Tiago, o irmão de Jesus. Mas vejam bem se precisamos insistir com isso; pode-se imaginar Roma condenando, por exemplo, um judeu à morte por haver adorado a Júpiter? E se uma mulher fosse apanhada

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em adultério, quem deveria se encarregar da sua condenação? Imaginem ainda que os judeus aparecessem diante de Pilatos pedindo a pena de morte para um homem acusado de pede-rastia; não iria o governador ordenar-lhes a que se encar-regassem do assunto, posto que tal prática além de ser muito comum no mundo greco-romano, não constava na lista de crimes do código penal do império?

As leis da Miznah dão testemunho de que o sinédrio podia, sim, pronunciar a sentença de morte em muitos casos e de várias formas. Portanto, a declaração dos judeus diante de Pilatos é emblemática, e está maquiada de propósitos. O que aconteceu foi que embora a profecia mosaica já tivesse anun-ciado a morte do Messias sob o madeiro, a prática de penalizar um condenado com a morte na cruz, não era típica de Israel, apesar de existirem informações de que algumas vezes eles podiam pregar criminosos em estacas, como penalidades de certos delitos.

Amparados em suas leis, os judeus podiam sentenciar alguém à morte, por espada, por fogo, por apedrejamento, e, supõe-se, por enforcamento; mas nunca por crucificação. O apóstolo João explica que eles disseram a Pilatos que não podiam matar a alguém, dando-lhe a entender (em resposta à evasiva do governador) que queriam uma morte por cru-cificação. E para que não restasse a menor chance de absol-vição, apresentaram-lhe queixas às quais não podia ignorar.

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Mas em meio àquele inquérito, Pilatos ficou sabendo que Jesus era oriundo da Galiléia, fora de sua jurisdição, e como não estava mesmo interessado no caso, ordenou que o levas-sem a Herodes, a quem chamavam de rei, sendo ele apenas governador da Galiléia, e possuindo residência muito próxima ao palácio do governo. Disseram-lhe que Jesus se proclamava Rei dos Judeus, e a família herodiana vivia em uma constante e silenciosa guerra particular pela supremacia desde o seu mais antigo representante, e uma vez que Roma dividiu o governo de Israel em dois (Judéia e Galiléia), retirando o título de rei da dinastia dos Herodes, orgulhos ficaram feridos. Muito antes disso, o primeiro Herodes havia lançado ao fogo os registros oficiais dos judeus, o que impossibilitaria a muitos de provarem as suas respectivas genealogias, evitando, sobre-tudo, que alguém pudesse aparecer a reclamar o trono que tinha pertencido à casa de Davi.

Não menos desconhecido é o fato de haver o atual Herodes se interessado pela impressionante pessoa do Pregador Gali-leu. Primeiro por acreditar que se tratava de João Batista, cuja cabeça ele fez decepar a pedido de Salomé; o tetrarca julgava que o filho de Zacarias havia retornado dos mortos. Além disso, Herodes ficou informado que esse Jesus era um pretenso Rei dos Judeus; mui provavelmente aquele mesmo descen-dente de Davi, a quem os magos do oriente foram homenagear no palácio herodiano há cerca de trinta e três anos. Todos devem se lembrar que na época um decreto foi emitido, no qual era ordenada a execução de todos os meninos de até dois anos de idade que morassem nas redondezas de Belém.

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O Herodes a quem Pilatos enviou Jesus chamava-se Antipas; era neto de Herodes Magno e filho de Arquelau, o mesmo que havia ordenado a matança dos inocentes, na qual Jesus devia ser a principal vítima. Agora, por uma inusitada circunstância, os dois pretendentes ao trono estavam frente a frente. Herodes como senhor e juiz; Jesus como escravo e réu. Mas o governador da Galiléia fez pouco caso daquele que diziam ser o prometido Rei de Israel, e depois de humilhá-lo, mondou-o de volta a Pilatos.

Nos evangelhos não lemos sobre a solução que Herodes tomou a respeito de Jesus. Se o considerava inocente, por que não o pôs em liberdade? Se achou nele culpa, por que não o condenou? Lemos, porém, que Pilatos quis se valer da suposta indecisão de Herodes, propondo dar-lhe alguns açoites e o deixar ir em liberdade. Mas no apócrifo de Pedro se diz que a intenção de Herodes em devolver Jesus ao Procurador romano era fazê-lo morrer na cruz. E ainda que essa informação não proceda, devemos atentar que depois daquele dia, a amizade antes estremecida entre Herodes e Pilatos, ficou fortalecida.

O problema, no entanto, permanecia nas mãos do pusilâ-nime Pôncio, pois outra vez se via no encargo de decidir sobre a vida do Nazareno. Sendo a sua intenção libertar o acusado, foi coagido pelos judeus a reconsiderar, visto que o denun-ciavam como a alguém que se opunha ao poder do imperador. Foi por esse motivo que eles bradaram:

_ Se soltas a este, não és amigo de Tibério César!

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Como fosse grave a acusação, Pilatos teve de interrogar ao próprio Jesus:

_ És tu o Rei dos Judeus?

Ao que ele responde:

_ Tu é que estás a dizê-lo.

_ Mas foram os teus que te denunciaram!

_ O meu reino não é deste mundo.

_ Ah, então és de fato rei?

_ Se tu insistes em dizer, é porque eu o sou. Mas foi para isso que nasci, e vim ao mundo para dar testemunho da verdade. Todos os que amam a verdade escutam o que eu digo.

Pilatos exclamou:

_ Quid est veritas? (ou: Ti estin aleteia) - que é a verdade?

Mas Jesus não lhe dá explicações. Então ele se dirige aos acusadores, asseverando-lhes que o Galileu é inocente. Mas afinal, o que teria provocado essa repentina reação no inso-lente Procurador de Roma? Ou que impacto teriam aquelas palavras de Jesus causado em sua confusa imaginação? O Mes-tre apenas lhe disse ter vindo ao mundo para dar testemunho do que é verdadeiro, e isso deixou Pilatos curioso.

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Seja como for, Pilatos se dirige aos que condenavam Jesus e faz-lhes uma proposta no mínimo irrecusável. Eles deveriam decidir entre Jesus Cristo e um famoso bandido chamado Barrabás. Por se tratar de um criminoso de alta periculosidade, era de se esperar que optassem pela soltura do Mestre. Con-tudo, ainda que nem o mais pessimista dos homens pudesse duvidar, eles escolheram dar a liberdade a um temido inimigo público, e condenaram o meigo Pregador da Galiléia.

Certamente Pilatos ficou decepcionado, pois acreditava que contra Jesus, Barrabás não teria a menor chance. Ele estava enganado! E deve ter sido por essa razão que a Escritura mais tarde declarará que o Procurador desejou libertar o Mestre, ainda que os judeus, contrariando as lógicas, o condenaram a morrer em lugar do vil assassino chamado Barrabás.

A revelação que o Evangelho faz sobre haver existido entre os judeus o costume de se libertar um preso durante a Páscoa, tem gerado desconforto em muitos investigadores. Do ponto de vista ideal, semelhante costume não pode ser razoável, mesmo porque está escrito no Evangelho que a oferta se esten-dia a qualquer criminoso que os judeus decidissem libertar. Ora, é certo que a ninguém em todo o império, era dado o poder de pôr em liberdade a determinados criminosos, dentre os quais se conta Barrabás, senão ao próprio César. Pilatos, por mais que quisesse, não possuía poder para tanto. E se por conta própria tomasse semelhante decisão, ficaria em apuros perante seus superiores. E como agravante em favor dos céticos, não existe prova histórica de que Roma algum dia

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tenha adotado a política de se libertar um criminoso anualmente entre os judeus. Isso é dito no que se refere ao pla-no ideal.

Na esfera real, nos perguntamos: A troco de quê os evangelistas teriam mencionado essa resolução de Pilatos se ela de fato não estivesse em conformidade com a história? Para os que duvidam do Evangelho, a explicação é que os escritores do Novo Testamento pretendiam promover o ódio contra os judeus, culpando-os pela morte de Jesus. Essa explicação, en-tretanto, não pode ser sustentada, pois tanto o grande historiador Josefo quanto os livros apócrifos dão-nos teste-munhos de que os judeus realmente pediram a crucificação de Jesus diante de Pilatos. Além do mais, na biblioteca de Roma existiu por muito tempo um documento (bastante conhecido nos primeiros séculos, mas que infelizmente foi destruído) no qual o imperador Tibério responsabilizava o Procurador Pôn-cio Pilatos por haver cedido à pressão dos judeus durante o juízo e condenação de Jesus Nazareno. Há ainda outros docu-mentos antigos que asseguram que a condenação do Mestre só foi possível por que os judeus conseguiram deixar o gover-nador Pilatos numa verdadeira saia-justa. Isso não é uma declaração antijudaica; é o testemunho historicamente com-provado de que alguns judeus, incentivados ou enganados por seus líderes, pressionaram Pilatos para que Jesus fosse conde-nado. Em todo o caso, parte da intimação que Tibério fez ao Procurador romano, ainda pode ser lida nos fragmentos dos registros vulgarmente chamados de “Atos de Pilatos”.

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Explicar que o governador da Judéia negociasse a liber-dade de criminosos com os judeus, não é fácil, mas é possível. E mesmo que para alguns tipos de crimes não existisse perdão, o Procurador romano deve ter caído em sua própria teia ao propor para os judeus uma escolha entre Jesus e Barrabás; foi como uma bola de neve, e quando se deu por conta, já era tarde. Foi a contragosto que ele teve de libertar um perigoso inimigo do estado.

Agora, lendo com atenção o julgamento segundo testemu-nhou João, percebe-se que Pilatos fez a seguinte observação, quando propôs a liberdade de Jesus: “Vós estás acostumados a que vos solte um preso durante a Páscoa...” Vejam que Pilatos não diz que é um costume romano, e ainda nos deixa suspeitar que tal prática era recente, pois de outra maneira teria dito: “Segundo o vosso costume o governador deve libertar um preso durante a Páscoa...”. Se essa forma de raciocinar pode ser aceita, então se entenderá a razão de os registros históricos não men-cionarem que os romanos algum tempo adotaram uma medi-da legal pela qual criminosos pudessem ganhar a liberdade entre os judeus. Além disso, em se tratando de um costume iniciado no governo de Pilatos, não é de se estranhar se antes ou depois dele jamais se tenha falado de sua existência. Outros governadores não tinham que observar tal acordo. Essa é a minha sugestão. E sei que os governos podiam, quando queriam, dar liberdade aos seus presos. Quanto a beneficiar Barrabás com esse favor, certamente jamais havia ocorrido a

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Pôncio Pilatos. Em nossa gíria diríamos que ele atirou no próprio pé.

Uma coisa, porém, é muito evidente neste julgamento: Pilatos tentou libertar Jesus. Mas por que apenas tentou, se podia fazê-lo? Talvez devêssemos acrescentar mais uma ques-tão ao nosso rosário de indagações: O que Jesus representava para Pilatos? Decerto, nada além de um réu indefeso, sem o direito de sonhar com a possibilidade de escapar da conde-nação, já que de seus juízes não se podia esperar clemência. Além do mais, o governador era frio, inconseqüente e sem afeição à vida de seus súditos.

Mesmo assim, lemos nos evangelhos que Pilatos se dirigia a Jesus chamando-o de Rei dos Judeus. E vejam só, mesmo aqueles pesquisadores que duvidam da boa intenção do Pro-curador, convencem-se de que ele realmente acreditava que o Nazareno era o legítimo herdeiro de Davi! É muito estranho, porém, que Pilatos pudesse acreditar na realeza de Jesus e ainda assim pretendesse livrá-lo da condenação iminente. O mais provável e lógico é que estando certificado das intenções do acusado, imediatamente ordenasse a sua execução.

O Evangelho nos diz que Pilatos chamava Jesus de rei apenas para provocar aos judeus; era como se estivesse apro-veitando-se da ocasião para ensaiar uma pequena vingança. Sendo isso verossímil, não nos restará alternativa senão admitir que em vez de os evangelistas terem transmitido uma boa imagem de Pilatos, como afirmam muitos críticos, eles o caricaturaram ainda mais, fazendo-nos saber que mesmo

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perante um julgamento tão sério, esse Procurador romano se deixava levar por seus sentimentos mais mesquinhos. E acima de tudo, conseguia desdenhar do próprio réu, chamando-o de rei, mas tratando-o como lixo.

Não. Pilatos não acreditava na realeza de Jesus. Logo, o que podia o réu significar para o seu juiz? Um santo homem? Um sábio? Um mágico? - Talvez um pouco de tudo isso. É evidente que não acreditando que o acusado fosse rei, ainda assim podia anunciar a sua morte, se por confissão própria Jesus ao menos dissesse ter interesse pelo reino da Judéia. Mas seu comportamento em tentar libertá-lo da condenação nos faz pensar que o Mestre de certo modo conseguiu despertar a curiosidade daquele ímpio juiz.

Num apócrifo que o vulgo atribuiu a Nicodemos, está escrito que Jesus realizou milagres na presença de Pilatos. Sabendo que ele havia feito o mesmo no momento de sua captura no Getsêmani, não vejo porque disto duvidar. Mas Pilatos foi de antemão advertido pelos líderes judaicos de que o Galileu era mágico, podendo fazer coisas impressionantes aos olhos humanos. Se isso realmente aconteceu, será com-preensível que o governador tenha até certo ponto se inte-ressado por Jesus.

Mas acima de tudo, Pilatos não tinha dúvidas quanto à inocência do Rabbi de Cafarnaum. E daí? Não seria essa a pri-meira vez que os romanos condenariam um inocente à morte. Se os pesquisadores frisam sempre que Pilatos era frio e impla-cável, desconsideram que por trás de todo homem prepotente

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há um ser fraco e inseguro. Mesmo assim, não era ingênuo a ponto de não perceber a astuta manobra dos judeus, que, mesmo querendo ver Jesus morto, não desejavam ser seus executores.

Ora, Jesus havia se tornado famoso em todo Israel e até fora dele, como podia então Pilatos ignorar a sua existência; entendia que não era pretenso rei, mas notava nele um ser especial, e foi aí que tomou a medida desesperada de tentar substituir a sua morte pela de Barrabás, um ignóbil homem que por seus crimes alcançou notoriedade nacional na época. E é forte a suspeita de que não tenha sido criminoso comum, já que a palavra grega empregada no quarto evangelho para descrever a sua condição de bandido, é “lestes”, que para muitos é uma variação de “lestai”, vocábulo que as autorida-des romanas usavam para identificar os extremistas judeus que tanto na Bíblia quanto em Josefo são chamados de zelotas ou sicários. Então é compreensível que Barrabás tenha sido um criminoso ao qual Roma certamente não concederia perdão; e se estava reservado à morte de cruz, devia mesmo não ser um bandido comum.

Fato curioso encontra-se nos escritos de Michael Baigent, que se valendo de textos antigos que desconheço, informa-nos que no evangelho de Marcos o primeiro nome de Barrabás também era Jesus. Sei que, como ocorreu a mim, muitos des-confiarão desta informação de Baigent, mas descobri poste-riormente que o dicionário bíblico de James Strong confirma tal constatação. Se assim for, explicar-se-á que Pilatos tenha

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pronunciado a seguinte frase diante dos judeus: “Que farei de Jesus, a quem chamais de Cristo?” Como se a sua intenção fosse tão somente fazer distinção entre os dois possíveis “Jesus”.

Ali Pilatos sofreu dupla derrota perante os judeus. Primeiro ele foi obrigado a pôr em liberdade um criminoso de índole inalterável; depois, teve de se colocar a mercê de seus súditos, como marionete, permitindo-lhes pronunciar a sen-tença que só a ele cabia:

_ Mas, o que farei com Jesus? – inquiriu desnorteado.

Ao que o povo exclamou:

_ Crucificai-o!

Como não lhe deixaram saída, ele pediu uma bacia com água e lavou as mãos, num gesto simbólico que de acordo com alguns, era típico do povo hebreu, e com isso demonstrou ainda mais a proporção de sua fraqueza como governador, pois estava assinando a condenação de um inocente apenas para satisfazer a vontade dos que queriam vê-lo morto. Assim, seu gesto de lavar as mãos diante do povo, ao invés de fazê-lo alheio àquela condenação, aumentou ainda mais a sua respon-sabilidade pela morte do Messias.

E havendo ordenado a que o açoitassem, não com trinta e nove chibatadas, como nos é comumente ensinado, o entregou aos líderes do povo, dizendo-lhes:

_ Aqui está o homem. Crucificai-o por conta própria.

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Nisso, os judeus gritaram:

_ Nós temos uma Lei pela qual ele deve morrer, pois disse ser o Filho de Deus!

Essa nova declaração provocou calafrios em Pilatos, fazendo-o conduzir Jesus para uma consulta em particular. Mas o Mestre não quis lhe dar outras explicações.

_ Não vais te defender? Vê que tenho autoridade para te condenar e também para te absolver!

Ao que Jesus lhe responde com um frêmito de sua voz:

_ Não tens nenhum poder contra mim se meu Pai não o permitir.

Reconhecendo a própria debilidade, Pilatos tenta provar a si mesmo que está no controle da situação; iria ordenar ime-diatamente que o soltassem, mas foi coibido pela turba dos acusadores, que disseram:

_ Ele disse que é o rei dos Judeus. Como podes ser fiel a César, se o queres pôr em liberdade?

Desorientado, Pilatos os deixou e voltou ao tribunal, a fazer sabe-se lá o quê. E ao retornar, perguntou-lhes:

_ Como desejais crucificar o vosso Rei?!

O mais incrível foi que aquele ajuntamento de judeus apostatou de sua fé e de toda a filosofia de vida que os tinha

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mantido como nação até àquele dia, quando inadvertidamente exclamaram:

_ Tirai esse impostor daqui, pois só temos um rei, que é César!

Na excelente obra: “A História da Vida Privada (do Império

romano ao ano mil)”, há um trecho que ilustra bem a situação de Pilatos frente à condenação de Jesus. Reza assim:

“Libertar escravos constitui um mérito, mas não um dever. Um rei está em seu direito quando condena à morte um criminoso, e é adorável se o perdoa; contudo, o perdão é gratuito, e o rei não age errado se não perdoa.”

Ficou comprovado que para Pilatos, condenar o Nazareno foi temerário, mas libertá-lo seria um erro ainda mais grave. Portanto, para o seu próprio bem, e de todos aqueles que Açu-savam o Mestre, foi tomada a decisão que não sendo a melhor, era pelo menos a mais conveniente. E como o sacerdote José Caifás havia imaginado, era necessário a Jesus morrer em lugar do povo.

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