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Instituto Ludwig von Mises Brasil http://www.mises.org.br Por que os intelectuais odeiam o capitalismo? por Jesús Huerta de Soto, quarta-feira, 19 de dezembro de 2012 N. do T.: o artigo a seguir foi adaptado de um discurso improvisado feito pelo autor, daí o seu tom mais coloquial. Por que os intelectuais sistematicamente odeiam o capitalismo? Foi essa pergunta que Bertrand de Jouvenel (1903- 1987) fez a si próprio em seu artigo Os intelectuais europeus e o capitalismo . Esta postura, na realidade, sempre foi uma constante ao longo da história. Desde a Grécia antiga , os intelectuais mais distintos -- começando por Sócrates, passando por Platão e incluindo o próprio Aristóteles -- viam com receio e desconfiança tudo o que envolvia atividades mercantis, empresariais, artesanais ou comerciais. E, atualmente, não tenham nenhuma dúvida: desde atores e atrizes de cinema e televisão extremamente bem remunerados até intelectuais e escritores de renome mundial, que colocam seu labor criativo em obras literárias -- todos são completamente contrários à economia de mercado e ao capitalismo. Eles são contra o processo espontâneo e de interações voluntárias que ocorre de mercado. Eles querem controlar o resultado destas interações. Eles são socialistas. Eles são de esquerda. Por que é assim? Vocês, futuros empreendedores, têm de entender isso e já irem se acostumando. Amanhã, quando estiverem no mercado, gerenciando suas próprias empresas, vocês sentirão uma incompreensão diária e contínua, um genuíno desprezo dirigido a vocês por toda a chamada intelligentsia, a elite intelectual, aquele grupo de intelectuais que formam uma vanguarda. Todos estarão contra vocês. "Por que razão eles agem assim?", perguntou-se Bertrand de Jouvenel, que em seguida pôs-se a escrever um artigo explicando as razões pelas quais os intelectuais -- no geral e salvo poucas e honrosas exceções -- são

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http://www.mises.org.br

Por que os intelectuais odeiam o capitalismo?por Jesús Huerta de Soto, quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

N. do T.: o artigo a seguir foi adaptado de um discurso improvisado feito pelo autor, daí o seu tom

mais coloquial.

Por que os intelectuais

sistematicamente odeiam o

capitalismo? Foi essa pergunta

que Bertrand de Jouvenel (1903-1987) fez a si próprio em seu

artigo Os intelectuais europeus e

o capitalismo.

Esta postura, na realidade,

sempre foi uma constante ao

longo da história. Desde a Grécia

antiga, os intelectuais maisdistintos -- começando por

Sócrates, passando por Platão e

incluindo o próprio Aristóteles --

viam com receio e desconfiança tudo o que envolvia atividades mercantis, empresariais, artesanais ou

comerciais.

E, atualmente, não tenham nenhuma dúvida: desde atores e atrizes de cinema e televisão extremamente bem

remunerados até intelectuais e escritores de renome mundial, que colocam seu labor criativo em obras

literárias -- todos são completamente contrários à economia de mercado e ao capitalismo. Eles são contra o

processo espontâneo e de interações voluntárias que ocorre de mercado. Eles querem controlar o resultadodestas interações. Eles são socialistas. Eles são de esquerda. Por que é assim?

Vocês, futuros empreendedores, têm de entender isso e já irem se acostumando. Amanhã, quandoestiverem no mercado, gerenciando suas próprias empresas, vocês sentirão uma incompreensão diária e

contínua, um genuíno desprezo dirigido a vocês por toda a chamada intelligentsia, a elite intelectual, aquele

grupo de intelectuais que formam uma vanguarda. Todos estarão contra vocês.

"Por que razão eles agem assim?", perguntou-se Bertrand de Jouvenel, que em seguida pôs-se a escrever um

artigo explicando as razões pelas quais os intelectuais -- no geral e salvo poucas e honrosas exceções -- são

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sempre contrários ao processo de cooperação social que ocorre no mercado.

Eis as três razões básicas fornecidas por de Jouvenel.

Primeira, o desconhecimento. Mais especificamente, o desconhecimento teórico de como funcionam os

processos de mercado. Como bem explicou Hayek, a ordem social empreendedorial é a mais complexa queexiste no universo. Qualquer pessoa que queira entender minimamente como funciona o processo de

mercado deve se dedicar a várias horas de leituras diárias, e mesmo assim, do ponto de vista analítico,

conseguirá entender apenas uma ínfima parte das leis que realmente governam os processos de interação

espontânea que ocorrem no mercado. Este trabalho deliberado de análise para se compreender como

funciona o processo espontâneo de mercado -- o qual só a teoria econômica pode proporcionar --

desgraçadamente está completamente ausente da rotina da maior parte dos intelectuais.

Intelectuais normalmente são egocêntricos e tendem a se dar muito importância; eles genuinamente creem

que são estudiosos profundos dos assuntos sociais. Porém, a maioria é profundamente ignorante em relação

a tudo o que diz respeito à ciência econômica.

A segunda razão, a soberba. Mais especificamente, a soberba do falso racionalista. O intelectualgenuinamente acredita que é mais culto e que sabe muito mais do que o resto de seus concidadãos, seja

porque fez vários cursos universitários ou porque se vê como uma pessoa refinada que leu muitos livros ouporque participa de muitas conferências ou porque já recebeu alguns prêmios. Em suma, ele se crê uma

pessoa mais inteligente e muito mais preparada do que o restante da humanidade. Por agirem assim, tendema cair no pecado fatal da arrogância ou da soberba com muita facilidade.

Chegam, inclusive, ao ponto de pensar que sabem mais do que nós mesmos sobre o que devemos fazer e

como devemos agir. Creem genuinamente que estão legitimados a decidir o que temos de fazer. Riem doscidadãos de ideias mais simplórias e mais práticas. É uma ofensa à sua fina sensibilidade assistir à televisão.

Abominam anúncios comerciais. De alguma forma se escandalizam com a falta de cultura (na concepçãodeles) de toda a população. E, de seus pedestais, se colocam a pontificar e a criticar tudo o que fazemosporque se creem moral e intelectualmente acima de tudo e todos.

E, no entanto, como dito, eles sabem muito pouco sobre o mundo real. E isso é um perigo. Por trás de

cada intelectual há um ditador em potencial. Qualquer descuido da sociedade e tais pessoas cairão natentação de se arrogarem a si próprias plenos poderes políticos para impor a toda a população seus

peculiares pontos de vista, os quais eles, os intelectuais, consideram ser os melhores, os mais refinados e osmais cultos.

É justamente por causa desta ignorância, desta arrogância fatal de pensar que sabem mais do que nós todos,

que são mais cultos e refinados, que não devemos estranhar o fato de que, por trás de cada grande ditadorda história, por trás de cada Hitler e Stalin, sempre houve um corte de intelectuais aduladores que se

apressaram e se esforçaram para lhes conferir base e legitimidade do ponto de vista ideológico, cultural efilosófico.

E a terceira e extremamente importante razão, o ressentimento e a inveja. O intelectual é geralmente uma

pessoa profundamente ressentida. O intelectual se encontra em uma situação de mercado muito incômoda:na maior parte das circunstâncias, ele percebe que o valor de mercado que ele gera ao processo produtivo

da economia é bastante pequeno. Apenas pense nisso: você estudou durante vários anos, passou váriosmaus bocados, teve de fazer o grande sacrifício de emigrar para Paris, passou boa parte da sua vidapintando quadros aos quais poucas pessoas dão valor e ainda menos pessoas se dispõem a comprá-los.

Você se torna um ressentido. Há algo de muito podre na sociedade capitalista quando as pessoas não

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valorizam como deve os seus esforços, os seus belos quadros, os seus profundos poemas, os seus refinadosartigos e seus geniais romances.

Mesmo aqueles intelectuais que conseguem obter sucesso e prestígio no mercado capitalista nunca estão

satisfeitos com o que lhes pagam. O raciocínio é sempre o mesmo: "Levando em conta tudo o que façocomo intelectual, sobretudo levando em conta toda a miséria moral que me rodeia, meu trabalho e meu

esforço não são devidamente reconhecidos e remunerados. Não posso aceitar, como intelectual de prestígioque sou, que um ignorante, um parvo, um inculto empresário ganhe 10 ou 100 vezes mais do que eu

simplesmente por estar vendendo qualquer coisa absurda, como carne bovina, sapatos ou barbeadores emum mercado voltado para satisfazer os desejos artificiais das massas incultas."

"Essa é uma sociedade injusta", prossegue o intelectual. "A nós intelectuais não é pago o que valemos, ao

passo que qualquer ignóbil que se dedica a produzir algo demandado pelas massas incultas ganha 100 ou200 vezes mais do que eu". Ressentimento e inveja.

Segundo Bertrand de Jouvenel,

O mundo dos negócios é, para o intelectual, um mundo de valores falsos, de

motivações vis, de recompensas injustas e mal direcionadas . . . para ele, oprejuízo é resultado natural da dedicação a algo superior, algo que deve ser feito,ao passo que o lucro representa apenas uma submissão às opiniões das massas.

[...]

Enquanto o homem de negócios tem de dizer que "O cliente sempre tem razão",nenhum intelectual aceita este modo de pensar.

E prossegue de Jouvenel:

Dentre todos os bens que são vendidos em busca do lucro, quantos podemosdefinir resolutamente como sendo prejudiciais? Por acaso não são muito maisnumerosas as ideias prejudiciais que nós, intelectuais, defendemos e avançamos?

Conclusão

Somos humanos, meus caros. Se ao ressentimento e à inveja acrescentamos a soberba e a ignorância, não

há por que estranhar que a corte de homens e mulheres do cinema, da televisão, da literatura e das

universidades -- considerando as possíveis exceções -- sempre atue de maneira cega, obtusa e tendenciosa

em relação ao processo empreendedorial de mercado, que seja profundamente anticapitalista e sempre seapresente como porta-voz do socialismo, do controle do modo de vida da população e da redistribuição de

renda.