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Curso Praetorium 1 | Page Direito Constitucional – 17 de Julho de 2007 Curso: Praetorium Professor: Rodrigo Brandão E-mail: [email protected] Bibliografia: TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. Ed. Saraiva.; Jurisprudência (STF). Evolução do Constitucionalismo O Constitucionalismo Moderno surge com as revoluções burguesas (Revolução Gloriosa – Inglaterra; Revolução Francesa; e Revolução Norte-Americana). Com estas revoluções, institui-se o Estado de Direito, que é a antítese do Estado anterior: o absolutista. Definição: Estado de Direito é limitação jurídica do poder do Estado. No Estado Absolutista não havia limites jurídicos à vontade do rei/soberano (Legibus Solutos). Com o Estado de Direito, o único soberano é o povo. A idéia de Estado de Direito significa que a lei se aplica igualmente a governantes e governados. Outra idéia importante para o Constitucionalismo é a de Contrato Social. Segundo esta idéia, o povo é o titular do Poder Constituinte. No momento em que o povo edita uma Constituição, ele entrega seu poder aos governantes. A edição de uma Constituição é uma celebração de contrato social no sentido de que ele sai do Estado de Natureza e entra no Estado Civil. Primeira fase do Constitucionalismo Moderno: Constitucionalismo Liberal. É marcada pela tese de John Locke de que quando os indivíduos celebram um contrato social, entregam condicionalmente seus diretos aos governantes; condicionalmente porque a finalidade do Governo é tutelar os direitos naturais dos indivíduos. Assim, quando o Governo viola os direitos individuais, o povo pode exercer o Direito de Resistência, ou seja, pode se opor ao exercício ilegítimo do poder pelo Estado. O Jusnaturalismo era a corrente de filosofia do Direito que prevalecia na fase do Constitucionalismo Liberal. O Jusnaturalismo é sustentado por uma ordem de valores supra-positivos, ou seja, que estão acima do Direito Positivo, porque qualquer norma jurídica que contrariar a ordem de valores (Direito Natural) será nula. Na primeira fase do Constitucionalismo os Direitos Naturais são compostos basicamente pelos Direitos Fundamentais, chamados Direitos Humanos de Primeira Geração. Há dois elementos essenciais ao conceito de Estado de Direito:

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Direito Constitucional – 17 de Julho de 2007 Curso: Praetorium Professor: Rodrigo Brandão E-mail: [email protected] Bibliografia: TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. Ed. Saraiva.; Jurisprudência (STF).

Evolução do Constitucionalismo

O Constitucionalismo Moderno surge com as revoluções burguesas (Revolução Gloriosa – Inglaterra; Revolução Francesa; e Revolução Norte-Americana). Com estas revoluções, institui-se o Estado de Direito, que é a antítese do Estado anterior: o absolutista. Definição: Estado de Direito é limitação jurídica do poder do Estado. No Estado Absolutista não havia limites jurídicos à vontade do rei/soberano (Legibus Solutos). Com o Estado de Direito, o único soberano é o povo. A idéia de Estado de Direito significa que a lei se aplica igualmente a governantes e governados. Outra idéia importante para o Constitucionalismo é a de Contrato Social. Segundo esta idéia, o povo é o titular do Poder Constituinte. No momento em que o povo edita uma Constituição, ele entrega seu poder aos governantes. A edição de uma Constituição é uma celebração de contrato social no sentido de que ele sai do Estado de Natureza e entra no Estado Civil. ► Primeira fase do Constitucionalismo Moderno: Constitucionalismo Liberal. É marcada pela tese de John Locke de que quando os indivíduos celebram um contrato social, entregam condicionalmente seus diretos aos governantes; condicionalmente porque a finalidade do Governo é tutelar os direitos naturais dos indivíduos. Assim, quando o Governo viola os direitos individuais, o povo pode exercer o Direito de Resistência, ou seja, pode se opor ao exercício ilegítimo do poder pelo Estado. O Jusnaturalismo era a corrente de filosofia do Direito que prevalecia na fase do Constitucionalismo Liberal. O Jusnaturalismo é sustentado por uma ordem de valores supra-positivos, ou seja, que estão acima do Direito Positivo, porque qualquer norma jurídica que contrariar a ordem de valores (Direito Natural) será nula. Na primeira fase do Constitucionalismo os Direitos Naturais são compostos basicamente pelos Direitos Fundamentais, chamados Direitos Humanos de Primeira Geração. Há dois elementos essenciais ao conceito de Estado de Direito:

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Direitos Fundamentais

Os Direitos Fundamentais de primeira geração tem uma finalidade específica: a de proteger a liberdade individual contra o exercício arbitrário do poder do Estado, delimitando uma área de livre atuação do indivíduo – porque na área em que incidem os direitos fundamentais, o indivíduo pode atuar livremente. Deve prevalecer a liberdade do indivíduo, e não normas obrigatórias do Estado. Estas normas são também chamadas de Normas de Competência Negativa. Os Direitos Fundamentais de primeira geração são também chamados de Normas de Competência Negativa porque esses direitos geram ao indivíduo o direito de exigir do Estado uma prestação negativa (não fazer). ► Exemplos de Direitos Fundamentais de Primeira Geração:

1. Direito à liberdade e suas conseqüências: ir e vir; reunião; religião; economia; etc. 2. Propriedade; 3. Vida; 4. Integridade física; 5. Igualdade formal ou igualdade perante a lei. Esta foi uma evolução de grande importância do

que os anteriores porque antes a sociedade era estamental (ex.: França pré-revolucionária), ou seja, dividida em Primeiro, Segundo e Terceiro Estado, de acordo com o critério de nascimento (“privilégios de Deus”). Com o Constitucionalismo, isso acaba, aplicando-se o princípio de que todos são iguais perante a lei.

Separação de Poderes (Montesquieu)

Premissa básica – e atualíssima – de Montesquieu: Todo homem que tiver um poder absoluto, sem fiscalização, tenderá a abusar dele. Por isto, a melhor forma de garantir a limitação do poder estatal é fracioná-lo em vários órgãos distintos, evitando um acúmulo excessivo de poderes de um determinado órgão e garantindo uma fiscalização mútua dos poderes (mecanismo de Freios e Contrapesos ou “Checks and Balances”).

Lembrete: Constitucionalismo não é Democracia! A finalidade do Constitucionalismo é limitar o poder do Estado pelo direito; enquanto que a Democracia (= governo do povo) preocupa-se não propriamente com a limitação do poder, mas com a origem dele. A democracia preocupa-se que seja o povo a exercer o poder. Sobre a Democracia, pode-se dizer que, na primeira fase do Constitucionalismo Moderno (séc. XVIII), os revolucionários trouxeram da Grécia a idéia de Democracia. Havia apenas um “problema”: Na Grécia, a Democracia era direta, ou seja, as pessoas se reuniam em praça pública e deliberavam sobre assuntos de interesse público; o que era possível devido ao tamanho populacional das Cidades-Estado (muito menores do que os Estados que temos hoje). Para adaptar a Democracia ao crescimento dos Estados, criou-se a Democracia Representativa, que “pegou emprestado” do Direito Privado um conceito, que é o contrato de mandato. Por uma ficção, se entendeu que, no momento da eleição, os eleitos são representantes do povo.

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Trata-se esta da fase do Constitucionalismo Liberal. Porém, há de se falar em dois tipos de liberalismo. Liberalismo Político: Objetiva o governo limitado. É a limitação do poder público para a tutela do indivíduo. (BOBBIO, Norberto. Liberalismo e Democracia). Liberalismo Econômico: Significa Estado mínimo, ou seja, mínima intervenção do Estado na economia (“O mercado tem uma mão invisível”. Adam Smith). (BOBBIO, Norberto. Liberalismo e Democracia). Adam Smith dizia que o mercado tem suas leis próprias e trata, por si só, de trazer uma maior riqueza para as pessoas, evitando uma desigualdade flagrante. Isto não ocorreu, na prática. De fato, o que ocorreu foi uma profunda exploração do homem pelo homem, nesse liberalismo, as partes economicamente mais fortes exploravam as partes mais fracas. Um exemplo disso eram as relações de trabalho.

Obs.: Na primeira fase do Constitucionalismo Moderno, os dois tipos de liberalismo estavam juntos. Defendia-se tanto um como o outro. Tendo em vista os problemas dados pelo Liberalismo Econômico, surge a segunda fase do Constitucionalismo: o Constitucionalismo Social. Enquanto o Constitucionalismo Liberal estava preocupado em limitar o poder do Estado para proteger a liberdade individual, a preocupação do Constitucionalismo Social é reduzir as desigualdades sociais, promovendo não apenas uma igualdade formal, mas também uma igualdade material, substantiva. Esta fase tem alguns marcos jurídicos: → Constituição Mexicana (1917); → Constituição de Weimar – Alemanha (1919); → Constituição Brasileira (1934). A segunda fase do Constitucionalismo moderno (Constitucionalismo Social) traz uma segunda geração de direitos: os direitos de Segunda Geração (direitos da igualdade), que têm um conteúdo diferente dos de Primeira Geração. Enquanto estes cuidam de prestações negativas (abstenção), os de Segunda Geração cuidam da exigência de prestações positivas (dar e fazer). Se o Estado não cumprir as prestações positivas, torna-se inadimplente. ► Exemplos dos Direitos Fundamentais de Segunda Geração:

1. Saúde; 2. Educação; 3. Previdência e assistência social.

O Estado chama para si essas atividades e as qualifica como serviço público. Há uma mudança na visão sobre o Estado, que – quando absolutista – era visto como inimigo, violador de direitos; e – quando Estado de Direito – é visto como amigo, o principal promotor dos direitos individuais. Por volta de 1950, surge uma Terceira Geração de Direitos Fundamentais: direitos difusos e coletivos.

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► Características dos Direitos Difusos e Coletivos (ver art. 81, CDC):

Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente ou a título coletivo.

Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:

I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste Código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;

II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste Código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;

III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.

1. Transindividualidade → Direitos cuja titularidade é coletiva, e não do indivíduo.

Nos direitos difusos, o titular é uma coletividade indeterminada porque as pessoas estão ligadas por relações meramente de fato. Ex.: Direito ao meio ambiente. Nos direitos coletivos, a titularidade é determinada porque os titulares estão unidos por uma relação jurídica.

Exemplos de direitos de terceira geração: Direito ao meio ambiente; direito ao patrimônio histórico, direito ao desenvolvimento, direito à paz, direito a autodeterminação dos povos. 2. Indivisibilidade.

Mais recentemente no fim da década de 1970, surge a crise do Estado de bem estar social (Constitucionalismo Social). Isso fica claro com a ascensão dos governos que são contrários ao estado de bem estar social como, por exemplo, o governo da Margareth Tatcher, na Inglaterra e do Reagen, nos EUA. ► O que é a crise do Constitucionalismo Social? O Estado criado pelo Constitucionalismo Social (Estado de bem estar social) recorrente torna-se obeso e ineficiente porque para que o Estado possa cumprir todos os serviços públicos – o que custa muito dinheiro – ele precisa dos contribuintes (quem paga os impostos). Sendo assim, aumenta-se a carga tributária e desvia-se muito dinheiro da economia, gerando, assim, a inflação.

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A partir de então, surgem as propostas neoliberais, resgatando o liberalismo clássico e, junto a elas, o crescimento da globalização, o que acelera e acentua a crise do Estado de bem estar social.

A Constituição (1988) frente à evolução do Constitucionalismo A Constituição de 1988 foi pega no contrapé em relação à crise do Constitucionalismo social porque, apesar de ter sido editada em 1988, no auge da crise, ela é uma Constituição dirigente. (Oscar Vilhena Vieira). Há dois modelos básicos de Constituição: de garantia e dirigente. Constituição de Garantia: típica do Estado Liberal (primeira fase do Constitucionalismo). Normalmente são sintéticas, com poucos artigos, que se limitam a estruturar e limitar o poder do Estado. Ex.: Constituição norte-americana (1787). Constituição Dirigente: típicas do Constitucionalismo social. Não se limitam a estruturar e limitar o poder. Atuam como guia de ação futura para o Estado. São muito mais amplas do que a Constituições de Garantia, tratando de um número muito maior de questões. Ex.: Constituição brasileira (1988), que não positiva apenas uma geração de diretos fundamentais, mas incorpora, pelo menos, as três primeiras gerações do Direito. Não há, à luz da Constituição brasileira, uma hierarquia entre os direitos fundamentais. Há, ao contrário, uma relação de interdependência entre as relações de direito. Em caso de conflito entre direitos de diferentes gerações, deve-se fazer uso do método da ponderação de interesses. A Constituição de 1988 preocupou-se igualmente em limitar o exercício arbitrário do poder do Estado e em diminuir as diferenças sociais e materiais. Em seu texto original, tinha um caráter mais social do que hoje, com emendas – em especial, as EC 5, 8 e 9 (quebra do monopólio do gás, do petróleo e das telecomunicações), as EC 20 e 41 (reformas previdenciárias) e a EC 19 (reforma administrativa) – que são respostas à crise do Estado de bem estar social.

Teoria da Constituição A Teoria da Constituição é um esforço iniciado, principalmente, na Alemanha, a partir de 1920, a fim de identificar os pontos em comum entre as várias experiências constitucionais. Apesar das peculiaridades de cada Constituição, a Teoria da Constituição tenta “pegar” o que há de comum entre os vários Constitucionalismos e criar conceitos. Existem dois tópicos básicos da Teoria da Constituição:

1. Os diversos conceitos de Constituição; 2. As classificações das Constituições.

Os conceitos de Constituição:

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1°: Conceito Sociológico (Ferdinand LaSalle – 1863) → Constituição significa os fatores reais do poder. Ela deve ser um retrato/diagnóstico da realidade política de um país; ou seja, a finalidade da Constituição não é alterar a realidade social e jurídica, mas simplesmente retratá-la. A Constituição teria, assim, um papel descritivo, e não normativo. Vale lembrar que, em 1863, as Constituições não tinham força normativa. 2º: Conceito Concretista (Hesse) → Faz uma crítica ao LaSalle: “Se as Constituições se limitam a descrever a realidade, então não servem para nada. São meros tratados de Sociologia, de Ciência Política.”. Constituição é norma jurídica! E as normas jurídicas têm como característica principal a coercitividade. A Constituição não deve se limitar a descrever uma realidade que é prévia a ela; ao contrário, as Constituições são normas obrigatórias. Logo, elas têm a função de modificar a realidade política e social, adequando-a ao seu feitio, não podendo – é claro – exagerar ou fazer uso de uma “insinceridade normativa” (Barroso). Há, para Hesse, uma relação de mútua implicação entre direito e realidade, ou seja, um influencia o outro. 3º: Conceito Ideal → É aquele previsto no art. 16 da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão. Diz que os países cujas Constituições não previrem direitos fundamentais e separação de poderes não têm Constituições. Esses dois são os elementos básicos que uma Constituição deve ter. 4º: Conceito Jurídico (Hans Kelsen) → A Constituição é fundamento de validade de toda ordem jurídica. Para Kelsen, a norma jurídica é hierarquizada e a Constituição ocupa o cume da ordem jurídica. Cada norma busca fundamento de validade na norma que lhe é hierarquicamente superior. A Constituição é, portanto, ainda que indiretamente, o fundamento de validade de todas as normas. 5º: Conceito Político ou Decisionismo Político (Karl Schmidt) → A Constituição é o conjunto de decisões políticas fundamentais e estabelece as características básicas de um Estado. Faz distinção entre Constituição e leis constitucionais (assemelha-se à distinção entre normas materialmente e formalmente constitucionais). Para Karl Schmidt, Constituição seriam as normas materialmente constitucionais, ou seja, seriam as normas que têm a natureza de norma constitucional; enquanto que leis constitucionais (normas formalmente constitucionais) seriam normas que estão na Constituição “por acaso”, ou seja, estão na Constituição não por necessidade, mas porque o constituinte assim o quis.

As classificações das Constituições: 1ª: Quanto à forma: Escrita → Constituição escrita NÃO É aquela composta por textos escritos. É mais do que isso: é aquela composta por um documento único e sistemático, editado em determinado momento histórico. Ex.: CF brasileira (1988). Não Escrita → A Constituição não escrita NÃO É não ter textos escritos, mas o fato dela não ser composta por um único texto e sim por vários textos escritos, costumes, tradições, etc., que se consolidam ao longo da prática histórica do país. Ex.: Constituição inglesa. 2ª: Quanto ao modo de elaboração: Dogmática → É a síntese dos dogmas das idéias políticas fundamentais sistematizadas em texto produzidas pelos constituintes originários. Normalmente, são escritas. Ex.: CF brasileira.

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Histórica → Resulta da evolução das tradições das práticas sócio-políticas que foram cristalizadas em determinados costumes constitucionais. Normalmente, não são escritas. 3ª: Quanto à origem: Promulgadas → São aquelas que têm origem democrática. Resultam da vontade soberana do povo, ainda que este se manifeste por seus representantes legitimamente eleitos, por Assembléia Constituinte, por exemplo. Ex.: CF de 1891, CF de 1934, CF de 1946 e CF de 1988. Outorgadas → São Constituições impostas por um Governante, editadas unilateralmente. Têm origem autoritária. Ex.: CF de 1934, CF do Estado Novo (Getúlio Vargas) de 1937. Cesaristas → Um governante edita uma Constituição, mas para a comunidade internacional, lhe interessa dizer que tal Constituição foi promulgada, e não outorgada, para dizer que seu governo é democrático. Para tanto, ele submete sua Constituição a um plebiscito ou referendo popular, para que o povo aprove. Majoritariamente, não se considera que, mesmo aprovada pelo povo, tal Constituição seja promulgada. 4ª: Quanto à estabilidade (principal classificação): Rígidas → São aquelas sujeitas a um processo de alteração mais dificultoso do que o processo necessário à edição de leis, em geral. É mais difícil se aprovar uma emenda à Constituição do que uma lei. (Ver art. 60, CF). A Constituição goza de uma supremacia hierárquica em relação às demais normas. Flexíveis → São aquelas cujo processo de alteração é idêntico ao processo necessário à elaboração de leis. Ex.: Constituição inglesa; Constituição israelense. Neste caso, não há hierarquia entre normas constitucionais e infraconstitucionais. Em caso de conflito, utiliza-se o método cronológico: a lei posterior revoga a anterior. Semi-rígidas ou Semi-flexíveis → São, em parte, rígidas e, em parte, flexíveis. Partes dessa Constituição podem ser alteradas pelo mesmo processo necessário à formação de leis e, outras partes, por um processo mais dificultoso. Ex.: CF de 1824 (Constituição Imperial). 5ª: Quanto ao conteúdo: Simples → São frutos de uma ideologia unitária, ou seja, refletem uma única ideologia, sem conflitos. Normalmente são editadas após revoluções porque, desta forma, não há muito espaço para conflitos ideológicos. Compromissórias → São frutos do consenso possível entre grupos de ideologias distintas. Têm como conseqüência o reflexo dos conflitos ideológicos, ou seja, há vários princípios conflitantes (ver art. 170, CF). Relevância para o método de ponderação de interesses. Ex.: CF de 1988. 6ª: Quanto à eficácia:

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Obs.: Efetividade ou Eficácia Social não é a mesma coisa que Eficácia. Eficácia jurídica é a aptidão que uma norma tem para produzir os seus efeitos. Efetividade significa que a norma de fato está sendo aplicada, ou seja, que ela conseguiu adequar a realidade social ao seu feitio. Normativas → São aquelas que têm plena efetividade. Tiveram grande sucesso ao adequar a realidade social e política às suas disposições. Nominais → São aquelas que ainda não têm tanta efetividade, ou seja, ainda não deram tão certo; porém, regulam projetos sérios para os seus respectivos países. Estão em fase de ganhar cada vez mais efetividade. Ex.: CF de 1988. Semânticas → São “disfarces”. Não se destinam a cumprir a finalidade principal das Constituições: limitar o poder do Estado, mas a tentar dar uma falsa legitimidade democrática a um Governo, na verdade, autoritário. 24 de Julho de 2007

Poder Constituinte

Poder Constituinte Originário ► Conceito: Este conceito foi criado no período pré-Revolução Francesa e significa “o poder que o povo tem de editar a sua própria Constituição e de, desta forma, criar/recriar um novo Estado e uma nova ordem jurídica”. O PCO não é uma competência porque não precisa ter nenhuma norma que diga que o povo tem o poder de criar sua própria Constituição; o Poder Constituinte é inerente ao povo. (Lembrete → Competência = poder delimitado pelo Direito, concedido à determinada autoridade. Quando se fala que cabe ao STF declarar a inconstitucionalidade das leis, isso é uma competência, um poder que lhe foi concedido pela CF ). O titular do PCO (Poder Constituinte Originário) é o povo. Ver art. 1º, parágrafo único, CF:

Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

Contudo, não necessariamente é o povo quem exerce o Poder Constituinte Originário. Os agentes do PCO podem ser representantes do povo (Assembléia Constituinte), se a Constituição for promulgada ou por governantes, caso seja outorgada. ► Características: 1ª: Caráter inicial → O PCO dá origem a um novo Estado e a uma nova ordem jurídica. O caráter inicial levanta questões interessantes de direito intertemporal, como a relação entre a nova e a antiga

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Constituição. Havia uma tese (Tese da Desconstitucionalização, de Pontes de Miranda) que dizia que as normas da Constituição anterior que fossem compatíveis com a nova Constituição seriam recepcionadas com status de lei ordinária. Hoje, sabe-se que a criação de uma nova Constituição revoga, em bloco, a Constituição anterior, e não apenas as normas incompatíveis. Já as normas infraconstitucionais não são revogadas com a nova Constituição porque isso geraria um “vácuo de normas”, o que seria péssimo para a segurança jurídica. O caráter inicial tem que ser conciliado com o princípio da segurança jurídica. Para tanto, Kelsen criou a Teoria da Recepção, segundo a qual, as normas infraconstitucionais anteriores à Constituição, que sejam com ela materialmente compatíveis, serão recepcionadas pela nova ordem Constitucional. A não recepção decorre sempre de uma incompatibilidade material, ou seja, de conteúdo. Em relação aos requisitos formais para a edição de uma norma, aplica-se o princípio do tempus regis actum, ou seja, aplica-se a norma constitucional em vigor no momento em que ela foi editada. O fato de um dispositivo ter sido recepcionado não significa que o Judiciário deva dar a ele a mesma interpretação que dava antes porque o judiciário faz duas análises distintas: a primeira, é se há uma compatibilidade material. Se o Judiciário entender que há, essa norma vai ser recepcionada. A segunda é uma releitura (“filtragem constitucional”) dessa norma à luz dos novos princípios constitucionais para saber se a interpretação se mantém, ou não. Obs.: O termo “filtragem constitucional” significa o dever que o intérprete tem de submeter todas as normas infraconstitucionais ao filtro da Constituição. O fato de uma norma ter sido recepcionada não significa que o Judiciário manterá a mesma interpretação que fazia dela antes da nova Constituição, justamente pelo dever que tem de adaptar sua interpretação aos novos princípios constitucionais. Um dos problemas da interpretação constitucional brasileira é a interpretação retrospectiva, ou seja, o fato do Judiciário não promover a já citada filtragem constitucional. (Barbosa Moreira)

● A não recepção significa um vício de inconstitucionalidade superveniente ou de revogação? Resposta: A inconstitucionalidade é um vício de validade, enquanto a revogação está no plano da existência. De acordo com o STF, pelo critério cronológico, trata-se a hipótese de revogação.

● Uma nova Constituição pode produzir efeitos retroativos? Resposta: Sim, desde que a retroatividade esteja expressa. Se a norma nada disser, a regra geral é a da aplicabilidade imediata, ou seja, a norma produz efeito com sua promulgação.

● Qual é a relação entre uma emenda constitucional e uma norma constitucional originária? Resposta: E, regra, se uma emenda constitucional se dispõe de forma contrária a uma norma constitucional que se faz válida desde sua promulgação, a emenda constitucional revoga essa norma, já que a função das emendas é justamente atualizar a Constituição. A única exceção é se a norma originária for um dos limites ao poder de reforma da Constituição. 2ª: Caráter ilimitado → Há divergência entre jusnaturalistas e positivistas. Os jusnaturalistas entendem que o PCO não está limitado pelo direito positivo anterior, ou seja, entendem que o PCO pode revogar qualquer norma do direito positivo anterior, inclusive normas constitucionais. Porém, para o Jusnaturalismo, o PCO está limitado por um direito natural (Direito Suprapositivo), superior ao direito

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positivo. Já os positivistas entendem que não há limitação alguma ao PCO. O STF manifestou-se sobre esta questão e a causa foi a seguinte:

Art. 45. A Câmara dos Deputados compõe-se de representantes do povo, eleitos, pelo sistema proporcional, em cada Estado, em cada Território e no Distrito Federal. § 1º - O número total de Deputados, bem como a representação por Estado e pelo Distrito Federal, será estabelecido por lei complementar, proporcionalmente à população, procedendo-se aos ajustes necessários, no ano anterior às eleições, para que nenhuma daquelas unidades da Federação tenha menos de oito ou mais de setenta Deputados.

O art. 45, §1º, CF, estabelece um número mínimo (oito) e um número máximo (70) de deputados por estado. Foi proposta, logo após a promulgação desta Constituição, uma ADI pelo ex-governador do estado do Rio Grande do Sul dizendo que esse dispositivo violava o princípio da igualdade do voto porque, ao estabelecer os limites mínimo e máximo, gerava-se uma “super” representação de estados menos populosos e uma “sub-representação” de estados mais populosos. O STF entendeu que o pedido da declaração da inconstitucionalidade de norma originária é juridicamente impossível, pois, segundo o relator Moreira Alves, o PCO é absoluto. Provavelmente, se houvesse uma norma constitucional que violasse um direito fundamental, o STF não adotaria uma visão radical e positivista como ele o fez com o caso proposto pela ADI. Hoje em dia, há uma tendência de se considerar que os direitos fundamentais são limites ao PCO. A posição do STF em relação ao caso da ADI não foi, por exemplo, como a posição do Tribunal Constitucional Alemão, que adotou uma tese mais jusnaturalista, segundo a qual o PCO não é ilimitado. Se uma norma do PCO suprimir os direitos fundamentais do povo, essa norma será inválida e o Tribunal Constitucional pode declarar sua inconstitucionalidade. 3ª: Caráter incondicionado → Significa que o PCO não está sujeito a nenhum procedimento pré-estabelecido. Pouco importa como o PCO é exercido: o importante é que ele é exercido e que o seu exercício resulta em uma nova Constituição. A prova do caráter incondicionado do PCO é que muitas vezes seu exercício resulta na quebra da realidade anterior (Ex.: Revolução). Há uma tese (absurda) de Manoel Gonçalves Ferreira Filho que sustenta que a Constituição de 1988 não é uma Constituição, mas uma emenda à Constituição de 1969 porque a Assembléia Nacional Constituinte – que deu origem à Constituição de 1988 – foi convocada por uma emenda à Constituição anterior. A doutrina majoritária diz que pouco importa como a Constituição de 1988 foi convocada; o que importa é que a Assembléia Nacional Constituinte manifestou, legitimamente, o PCO. A forma do exercício é irrelevante.

Poder Constituinte Decorrente ► Conceito:

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É o poder dos estados-membros elaborarem suas próprias Constituições e, assim, se auto-constituirem, ou seja, criarem sua estrutura básica. É o poder de se alterar a CF. É outra modalidade de Poder Constituinte. A primeira distinção que se deve fazer sobre este tópico é quanto aos mecanismos de alteração formal e os de alteração informal: Mecanismos de alteração informal → É a chamada mutação constitucional. Ocorre quando há uma modificação da interpretação de uma norma constitucional sem que haja alteração no seu texto. Isso porque, apesar de não haver uma alteração formal, há uma alteração da realidade subjacente à norma. O Ministro Gilmar Mendes entende que o art. 52, CF1, sofreu uma mutação constitucional. A doutrina sempre considerou que esse dispositivo conferia ao Senado poder de dar eficácia erga omnes a uma decisão do STF que só tinha eficácia inter partes. Hoje, entende-se que a decisão do STF já tem eficácia erga omnes. Mecanismos de alteração formal → São, basicamente, três: 1º: Plebiscito → Foi disciplinado no art. 2º, que: “no dia sete de setembro de 1993, o eleitorado defenderá, através de plebiscito, a forma de República ou Monarquia Constitucional e o sistema de governo Parlamentarista ou Presidencialista, que devem vigorar no país”. Nesta ocasião, o povo optou pela República como forma de governo e pelo Presidencialismo como sistema de governo.

● O Congresso Nacional pode instituir, por emenda constitucional, o parlamentarismo ou a monarquia? Resposta: Há duas teorias sobre isso. A primeira diz que pode, com base em dois argumentos. O art. 60, §4º, CF2, não cita nem a República nem o Presidencialismo; portanto, ambos não são cláusulas pétreas (1º argumento) e estas devem receber uma interpretação restritiva (2º argumento) porque elas são restrições ao poder da geração atual de ser de acordo com suas próprias normas. “As cláusulas pétreas podem instituir o governo dos mortos sobre os vivos” porque a geração atual estaria vinculada a normas estabelecidas por uma geração passada. O STF diz que o simples fato da existência das cláusulas pétreas não gera um “governo dos mortos sobre os vivos”, ou seja, não significa uma lesão inafastável à democracia, desde que sejam interpretadas restritivamente. Como conseqüência, o Congresso, por emenda, poderia alterar “República” e “Presidencialismo” – o que não parece legítimo, já que o povo é o titular do PCO.

1 Art. 52. Até que sejam fixadas as condições do art. 192, são vedados:(Redação dada pela Emenda Constitucional

nº 40, de 2003)

I - a instalação, no País, de novas agências de instituições financeiras domiciliadas no exterior;

II - o aumento do percentual de participação, no capital de instituições financeiras com sede no País, de pessoas

físicas ou jurídicas residentes ou domiciliadas no exterior.

Parágrafo único. A vedação a que se refere este artigo não se aplica às autorizações resultantes de acordos

internacionais, de reciprocidade, ou de interesse do Governo brasileiro.

2 § 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

I - a forma federativa de Estado;

II - o voto direto, secreto, universal e periódico;

III - a separação dos Poderes;

IV - os direitos e garantias individuais.

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2º: Revisão Constitucional → Está regulamentada pelo art. 3º, ADCT:

Art.3º. A revisão constitucional será realizada após cinco anos contados da promulgação da Constituição pelo voto da maioria absoluta dos membros do Congresso em sessão unicameral.

Trata-se, portanto, a revisão constitucional de uma previsão do constituinte de que cinco anos após a promulgação, a Constituição seria revista. Compare o art. 3º, ADCP com o art. 60, CF:

Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: I - de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal; II - do Presidente da República; III - de mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros.

Em suma, na revisão, é muito mais fácil alterar a Constituição do que no processo de criação de emenda constitucional. Alguns autores sustentavam que a revisão constitucional tinha um propósito específico, o de adaptar a Constituição a mudanças na forma e no sistema de governo introduzidas pelo plebiscito. Porém, se algumas mudanças não ocorreram – tanto o Presidencialismo quanto a República foram mantidos – a revisão não deveria ter sido feita. Contudo, a tese que prevaleceu a que sustentava que não há nenhum artigo da Constituição sobre a vinculação entre a realização da revisão a mudanças no sistema e na forma de governo. Portanto, se o constituinte não estabelece essa relação, não cabe ao intérprete fazê-la. A revisão não dependia de alterações no sistema e na forma de governo, mas deveria respeitar as cláusulas pétreas.

● O Congresso pode, por uma nova emenda constitucional, aprovar uma nova revisão constitucional (“mini constituinte”)? Resposta: A posição majoritária é de que não pode porque se entende que as próprias normas constitucionais, que instituem limites ao poder de reforma, não podem ser alteradas por emenda constitucional. Esta tese é uma rejeição a uma outra tese: a Tese da Dupla Reforma (adotada por Manoel Gonçalves Ferreira Filho) que sustenta que não se pode suprimir uma cláusula pétrea ou modificar o processo de alteração da Constituição. Por exemplo, o art. 60, §2º, CF3, diz que o quorum para se aprovar uma emenda constitucional é de 3/5, em dois turnos de votação. Pode-se revogar o §2 do art. 60 e, então, aprovar uma nova emenda constitucional para estabelecer um novo quorum. Esta tese é uma hipótese clássica de fraude à Constituição, de acordo com o entendimento do STF.

3 § 2º - A proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos,

considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros.

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A forma tradicional de se alterar a Constituição é por emenda à Constituição. O art. 60, CF prevê três tipos de limitações ao poder de se emendar a Constituição: 1º tipo: Limitações formais → Iniciativa, disciplinada no art. 60, I, II e III. A iniciativa de emenda constitucional é muito mais rigorosa do que a iniciativa de lei. Por exemplo: um deputado, isoladamente, pode apresentar um projeto de lei, mas não pode apresentar um projeto de emenda constitucional. E o quorum, que para aprovar uma emenda constitucional é de 3/5, em dois turnos de votação; enquanto o quorum para aprovação de uma lei é de maioria simples, em um único turno de votação. 2º tipo: Limitações circunstanciais → São previstas no art. 60, §1º, CF:

§ 1º - A Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio.

Estando em vigor alguma das hipóteses do §1º, não cabe aprovação de emenda à Constituição porque a alteração da Constituição é algo muito sério, que só pode ser feita em período de estabilidade. Logo, em período de instabilidade, a Constituição não deve ser alterada, sob pena do risco de determinadas decisões apressadas serem tomadas e, por ventura, vierem a prejudicar a Constituição. 3º tipo: Limitações materiais (cláusulas pétreas) → Estão previstas no art. 60, §4º, CF:

§ 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I - a forma federativa de Estado; II - o voto direto, secreto, universal e periódico; III - a separação dos Poderes; IV - os direitos e garantias individuais.

Com base nesse dispositivo, o STF passou a entender que cabe um controle preventivo da constitucionalidade dos projetos de emenda constitucional, ou seja, mesmo que o projeto ainda não tenha sido aprovado, deve haver um controle – que tem como instrumento o Mandado de Segurança – quanto à sua constitucionalidade. O STF entende que quando um projeto de emenda violar uma cláusula pétrea, o parlamentar pode impetrar um Mandado de Segurança perante o STF pedindo o trancamento daquele processo legislativo. Além desse caso de projeto de emenda que viola o limite ao poder de reforma, o STF admite também que o Mandado de Segurança seja impetrado quando um projeto de lei violar uma norma constitucional sobre processo legislativo. O STF entende que o parlamentar tem o devido direito ao processo legislativo. Atenção: Esta é uma hipótese muito importante de controle preventivo de constitucionalidade do Judiciário. Em regra, o controle de constitucionalidade feito pelo Judiciário é repressivo e não cabe controle de projeto de lei/emenda. Nos dois casos acima, o Judiciário admite controle preventivo de constitucionalidade. ► Questões: 1. Qual é a interpretação correta da expressão tendência a abolir? Resposta: “Tendente a abolir” não é qualquer restrição.

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2. Uma emenda constitucional só pode aumentar o grau de proteção da cláusula pétrea ou pode restringir também? Resposta: A posição majoritária é de que uma EC pode restringir o grau de proteção da cláusula pétrea. 2.1. Se for entendido que pode restringir, até que pondo as restrições são legítimas? Resposta: Para dar legitimidade às restrições, existem os “limites dos limites”, ou seja, são os limites das restrições às cláusulas pétreas, especialmente aos direitos fundamentais. Os “limites dos limites” são, principalmente, os princípios da isonomia, da proporcionalidade da proteção do núcleo essencial. 3. O Judiciário pode declarar a inconstitucionalidade de uma emenda à Constituição? Resposta: Há várias posições sobre isso. A Suprema Corte Norte-Americana, por exemplo, diz que não cabe o controle da constitucionalidade à emenda. Portanto, não caberia ao Judiciário regulamentar sobre isso. Esta não é a posição do STF brasileiro. O STF entende que as cláusulas pétreas e os demais limites ao poder de reforma são limites jurídicos e não meramente limites políticos. Ou seja, se uma emenda constitucional violar um desses limites jurídicos e políticos de reforma, essa emenda constitucional é inconstitucional e o Judiciário pode, sim, declarar tal inconstitucionalidade. O simples fato das cláusulas pétreas existirem não é “governo dos mortos sobre os vivos”; porém, se o judiciário puser muita coisa dentro do hall de cláusulas pétreas, aí, sim, há um risco de existir um “governo dos mortos sobre os vivos”. 4. Quais direitos e garantias individuais são cláusulas pétreas? Resposta: (Ver o artigo “Direitos fundamentais, cláusulas pétreas e democracia”, na Xerox ou no site: www.direitodoestado.com.br). 5. Quais são as principais teses sobre o art. 60, §4º, IV? Resposta: A primeira diz que são direitos e garantias individuais, ou seja, são cláusulas pétreas todos os incisos do art. 5º, CF, e nada mais. Esta tese tem um problema grave: exclui direitos fundamentais que são, igualmente, direitos fundamentais, como os direitos sociais; e inclui normas que não têm natureza fundamental, como a competência do Tribunal do Júri. A segunda tese, defendida por Gilmar Ferreira Mendes, por exemplo, diz que são cláusulas pétreas os chamados direitos de defesa (direitos de primeira geração), que são os direitos a prestações estatais negativas. O problema desta teoria é que exclui, por exemplo, os direitos sociais (direitos de segunda geração) e os difusos e coletivos. A terceira tese é de que todos os direitos materialmente fundamentais mais todos os direitos formalmente fundamentais são cláusulas pétreas. O problema desta tese é que o hall de cláusulas pétreas fica demasiadamente extenso. Outra tese é de que nem tudo o que está no título dos direitos fundamentais é cláusula pétrea. Apenas os direitos materialmente fundamentais, ou seja, os direitos que têm natureza fundamental, são cláusulas pétreas. O fato de o direito ter sido incluído no título II da Constituição gera uma presunção relativa (o intérprete tem que ver qual é a natureza daquele direito) de que aquele direito é materialmente fundamental. Esta tese parece ser a melhor porque permite alterações na Constituição, não a enrijece demais e, ao mesmo tempo, preserva os direitos mínimos. É uma tese que faz com que as cláusulas pétreas sejam respeitadas sem instituir um “governo dos mortos sobre os vivos”, sem vincular demais a geração atual às normas estabelecidas no passado.

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Direito Constitucional – 31 de Julho de 2007 Curso: Praetorium Professor: Rafael Oliveira

I. Direitos individuais como cláusulas pétreas Lembrete → Direitos materialmente fundamentais: são aqueles intimamente ligados à dignidade humana. Linha de decisões do STF: Art.14, EC 20:

Art. 14 - O limite máximo para o valor dos benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201 da Constituição Federal é fixado em R$ 1.200,00 (um mil e duzentos reais), devendo, a partir da data da publicação desta Emenda, ser reajustado de forma a preservar, em caráter permanente, seu valor real, atualizado pelos mesmos índices aplicados aos benefícios do regime geral de previdência social.

● A licença maternidade está incluída neste teto salarial? Resposta: Para resolver essa questão, foi proposta uma ADI que alegava a inconstitucionalidade da inclusão da licença maternidade nesse teto. O STF julgou essa ADI parcialmente procedente porque fez uma interpretação conforme o próprio art. 14, EC 20. O STF disse que a inclusão da licença maternidade nesse teto é uma interpretação inconstitucional porque geraria uma discriminação das mulheres no mercado de trabalho, dando a entender que os direitos sociais são cláusulas pétreas.

ADI 1943-5 “... se se entender que a Previdência Social doravante, responderá apenas por R$ 1.200,00 (hum mil e duzentos reais) por mês, durante a licença gestante, e que o empregador responderá, sozinho, pelo restante, ficará sobremaneira, facilitada e estimulada a opção deste pelo trabalhador masculino, ao invés da mulher trabalhadora. Estará, então, propiciada a discriminação que a Constituição buscou combater, quando proibiu diferença de salários, de exercício de funções e de critérios de admissão, por motivo de sexo (art. 7º, inc. XXX da CF/88), proibição que, em substância, é um desdobramento do princípio da igualdade de direitos, entre homens e mulheres, previsto no inciso I do art. 5º da Constituição Federal. Estará, ainda, conclamando o empregador a oferecer à mulher trabalhadora, quaisquer que sejam suas aptidões, salário nunca inferior a R$ 1.200,00, para não ter de responder pela diferença. ...” (ADIN 1946-5, Rel. Min. Sydney Sanches).

A controvérsia está encerrada e a decisão do STF impõe àquele que realmente deve pagar a conta - INSS - o ônus da integralidade do salário-maternidade.

Outro caso importante é a ADI 939/DF (1993). Foi o primeiro caso em que o STF declarou efetivamente a inconstitucionalidade de uma Emenda Constitucional. Até então, o STF apenas tinha afirmado, em tese, a possibilidade de declarar inconstitucionalidade de uma emenda.

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ADIN nº 939-DF, o STF concluiu "verbis":

a) "Uma emenda à Constituição, emanada, portanto, de Constituinte derivado, incidindo em violação à Constituição originária, pode ser declarada inconstitucional pelo STF, cuja função precípua é a guarda da Constituição (art.l02,I,"a" da CF (...)",cfe RTJ 151/755);

b) "Se na vigência da lei anterior, o servidor preenchera todos os requisitos exigidos, o fato de, na sua vigência, não haver requerido a aposentadoria não o faz perder o seu direito que já estava adquirido (...)", in RMS n. 11.395, in RTJ 48/392.

Resumo: existe sim direito adquirido contra Emenda Constitucional, pelo limite material constante do art.60,IV da CF/88 referente à cláusula pétrea – direitos e garantias individuais c/c art.5º, XXXVI (a lei não prejudicará o direito adquirido, entendido esse em seu sentido amplo), tendo o STF entendido que os direitos individuais são limites (limites formais, materiais e circunstanciais) à emenda e não se restringem aos do art.5º, podendo, neles, estarem inclusos outros, a exemplo dos direitos tributários (ADIN 939-7-DF,Rel. Min.Sydney Sanches e ADIN 829-DF,Rel. Min.Moreira Alves, já referidas).

A questão era a seguinte: a EC 3 criou o IPMF (antecedente da CPMF) e disse que este tributo não precisaria observar o princípio da anterioridade tributária. Foi, então, proposta essa ADI e o STF a julgou procedente porque considerou que o princípio da anterioridade tributária é cláusula pétrea – o que significa que, para o entendimento do STF, o hall de cláusulas pétreas não se restringe ao art. 5º ou ao Título II da Constituição. Alguns doutrinadores acham que, neste caso, o STF “foi longe demais” porque por natureza, as garantias fundamentais são instrumentos para proteção de direitos fundamentais. A anterioridade tributária é uma garantia fundamental porque é um instrumento de proteção da segurança jurídica, ou seja, é o instrumento que visa a garantir que o empresário tenha tempo para fazer um planejamento tributário. Porém, a anterioridade tributária é uma garantia muito frágil porque, hoje em dia, é comum que haja alteração, por exemplo, na legislação do imposto de renda ao dia 31 de dezembro. Sendo assim, não pode ser tratada como cláusula pétrea. Outra decisão relevante diz respeito à EC 52. O STF declarou a inconstitucionalidade do art. 2º4 e disse que a EC 52, apesar de anterior à eleição de 2006, não pode se aplicar a essas eleições, mas somente às eleições seguintes porque, de acordo com o princípio da anterioridade eleitoral (art. 16 CF5), as leis que regulam o processo eleitoral devem ter antecedência mínima de um ano. ADI 3685/DF, rel. Min. Ellen Gracie, 22.3.2006 Fonte: STF, Info 420

EC 52/2006: “Verticalização” e Princípio da Anualidade - 1

O Tribunal, por maioria, julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil para declarar a inconstitucionalidade do art. 2º da

4 Art. 2º Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de sua publicação, aplicando-se às eleições que

ocorrerão no ano de 2002. Vide ADIN nº 3685-8 5 Art. 16. A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se

aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência. (Redação dada pela Emenda

Constitucional nº 4, de 1993)

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Emenda Constitucional 52/2006, que alterou a redação do art. 17, § 1º, da CF6, para inserir em seu texto, no que se refere à disciplina relativa às coligações partidárias eleitorais, a regra da não-obrigatoriedade de vinculação entre as candidaturas em âmbito nacional, estadual, distrital ou municipal, e determinou a aplicação dos efeitos da referida Emenda “às eleições que ocorrerão no ano de 2002”. Inicialmente, tendo em conta que a requerente demonstrara de forma suficiente como a inovação impugnada teria infringido a CF, afastou-se a preliminar da Advocacia-Geral da União quanto à ausência de fundamentação da pretensão exposta na inicial. Rejeitou-se, da mesma maneira, a alegação de que a regra inscrita no art. 2º da EC teria por objeto as eleições realizadas no ano de 2002, uma vez que, se essa fosse a finalidade da norma, certamente dela constaria a forma verbal pretérita. Também não se acolheu o argumento de que a aludida referência às eleições já consumadas em 2002 serviria para contornar a imposição disposta no art. 16 da CF, visto que, se a alteração tivesse valido nas eleições passadas, não haveria razão para se analisar a ocorrência do lapso de um ano entre a data da vigência dessa inovação normativa e as próximas eleições (CF: “Art. 16. A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência.”).

ADI 3685/DF, rel. Min. Ellen Gracie, 22.3.2006. (ADI-3685)

EC 52/2006: “Verticalização” e Princípio da Anualidade - 2 Quanto ao mérito, afirmou-se, de início, que o princípio da anterioridade eleitoral, extraído da

norma inscrita no art. 16 da CF, consubstancia garantia individual do cidadão-eleitor — detentor originário do poder exercido por seus representantes eleitos (CF, art. 1º, parágrafo único) — e protege o processo eleitoral. Asseverou-se que esse princípio contém elementos que o caracterizam como uma garantia fundamental oponível inclusive à atividade do legislador constituinte derivado (CF, artigos 5º, § 2º, e 60, § 4º, IV), e que sua transgressão viola os direitos individuais da segurança jurídica (CF, art. 5º, caput) e do devido processo legal (CF, art. 5º, LIV). Com base nisso, salientando-se que a temática das coligações está ligada ao processo eleitoral e que a alteração a ela concernente interfere na correlação das forças políticas e no equilíbrio das posições de partidos e candidatos e, portanto, da própria competição, entendeu-se que a norma impugnada afronta o art. 60, § 4º, IV, c/c art. 5º, LIV e § 2º, todos da CF. Por essa razão, deu-se interpretação conforme à Constituição, no sentido de que o § 1º do art. 17 da CF, com a redação dada pela EC 52/2006, não se aplica às eleições de 2006, remanescendo aplicável a estas a redação original do mesmo artigo. Vencidos, nessa parte, os Ministros Marco Aurélio e Sepúlveda Pertence que julgavam o pedido improcedente, sendo que o Min. Marco Aurélio entendeu prejudicada a ação, no que diz respeito à segunda parte do art. 2º, da referida Emenda, quanto à expressão “aplicando-se às eleições que ocorrerão no ano de 2002”.

ADI 3685/DF, rel. Min. Ellen Gracie, 22.3.2006. (ADI-3685)

II. Direitos adquiridos como cláusulas pétreas7

● Poder Constituinte Originário pode suprimir direito adquirido? Resposta: Sim, desde que a norma constitucional nova o faça expressamente.

6 § 1º É assegurada aos partidos políticos autonomia para definir sua estrutura interna, organização e funcionamento e para adotar os critérios de escolha e o regime de suas coligações eleitorais, sem a obrigatoriedade de vinculação entre as candidaturas em nível nacional, estadual, distrital ou municipal, devendo seus estatutos estabelecer normas de disciplina e fidelidade partidária. 7 XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;

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● Emendas constitucionais podem suprimir direitos adquiridos? Resposta: A posição amplamente majoritária considera que direitos adquiridos são, sim, cláusulas pétreas porque estão no hall do art. 5º, CF, e, além disso, são instrumentos fundamentais para a segurança jurídica. Para esta corrente, emenda constitucional que suprima qualquer direito adquirido é inconstitucional. A corrente minoritária diz que essa proteção aos direitos adquiridos foi voltada apenas contra a lei, e não contra emenda da Constituição. A primeira ação em que o STF teve que se pronunciar sobre essa questão foi a Contribuição Previdenciária dos Nativos. A EC 41 instituiu a Contribuição Previdenciária dos Servidores e Nativos, que antes não pagavam. O principal argumento era que os contribuintes tinham direito adquirido a receber a integralidade dos seus proventos. O STF disse que, neste caso, não havia direito adquirido, a não ser tributado. Este é o melhor caso para ilustrar como a idéia de direitos adquiridos pode tender tanto para o lado do bem quanto para o lado do mal. O STF decidiu bem, mas não se pronunciou sobre a questão de serem os direitos adquiridos cláusulas pétreas ou não. Ele teve que se pronunciar sobre essa questão numa decisão recente, num caso politicamente delicado: um Mandado de Segurança impetrado por quatro ex-ministros do STF sobre a questão do teto remuneratório. Obs.: Os direitos adquiridos podem ser perigosos para a democracia. Tratar os direitos adquiridos como cláusulas pétreas pode gerar uma lesão grave à democracia, chamada de entrincheiramento constitucional de privilégio. Ou seja, colocar os privilégios de uma elite no hall de cláusulas pétreas, só é possível com uma nova Constituição. Nem todo direito adquirido é cláusula pétrea; apenas as modalidades qualificadas de direito adquirido, como o direito à irredutibilidade de vencimento. Como o STF não define quais são as modalidades qualificadas de direito adquirido, cabe à doutrina fazê-lo. Até hoje, poucas pessoas trataram desta questão. O STF diz que “há casos e casos”. Determinadas emendas que suprimem direitos adquiridos são inconstitucionais; outras não. Um bom caminho para se entender as modalidades qualificadas de direito adquirido é perceber que há uma ponderação de princípios constitucionais. OBS.: Nesta primeira parte da aula foram dados apenas exemplos ilustrativos da matéria da aula anterior.

III. Interpretação Constitucional A interpretação constitucional é uma espécie de interpretação jurídica (assim como toda norma constitucional é uma norma jurídica). Isto significa que os elementos tradicionais da interpretação são também utilizados na hermenêutica constitucional.

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O problema é que esses elementos não são suficientes para resolver todas as complexidades da hermenêutica constitucional e suas peculiaridades. Por esta razão, a doutrina desenvolveu os chamados princípios específicos de interpretação constitucional.

IV. Elementos tradicionais de interpretação constitucional

1. Elemento Gramatical → É o texto da norma. A interpretação literal é a interpretação desse texto. Contudo, essa interpretação não é suficiente. Muitas vezes, sozinha, ela vai até contra o espírito da norma. Hoje, a hermenêutica jurídica diz que o elemento literal é um limite à atividade criativa do intérprete. Kelsen dizia que é como se o elemento literal fixasse uma moldura normativa porque define as possibilidades de interpretação da norma que são legítimas. Fora da “moldura”, há interpretações que não podem ser adotadas pelo juiz porque são interpretações contra legem. O texto é, na verdade, o limite para a atividade criativa do intérprete.

2. Elemento Histórico → Consiste na busca da vontade histórica do legislador, através da análise

de vários elementos, como as normas anteriores, as discussões travadas no parlamento, a disposição de motivos da lei, etc. Este elemento é mais importante quanto mais perto se estiver do momento da edição da lei. Muitas vezes, em relação a leis antigas, a utilização deste elemento de forma dividida, sem critério, pode gerar um prejuízo à atualização da interpretação da norma.

Como exemplo, há um caso, já julgado pela Suprema Corte Norte-Americana: Uma das emendas à Constituição norte-americana estabelece uma vedação ao uso de provas ilícitas, dizendo que não serão admitidas interceptações nos meios de comunicação telegráfica e similares. A Suprema Corte disse que a vedação à prova ilícita não se aplica à interceptação telefônica porque na época da edição da Constituição (1787) não havia telefones. Neste caso, a grade ênfase ao elemento histórico prejudicou uma interpretação mais cabível da norma, segundo um novo contexto.

3. Elemento Teleológico → Permite a adaptação da interpretação da Constituição e das normas em geral ao novo contexto. O intérprete deve descobrir o fundamento racional da norma (racio legis), ou seja, o bem jurídico protegido pelo legislador. Este método é importante porque permite a atualização da norma.

4. Interpretação Sistemática → Parte do pressuposto de que o Direito não é um amontoado de

normas, mas sim um sistema, um conjunto harmônico de normas. Sendo assim, o intérprete deve zelar pela coerência do sistema, pela permanência dessa harmonia. Isso gera, basicamente, dois deveres para o intérprete: 1. Não interpretar um dispositivo de forma isolada; ao contrário, deve inserir tal dispositivo num sistema ou subsistema referente a ele. 2. Harmonizar tensões e conflitos entre as normas jurídicas.

Obs.: A princípio, os elementos objetivos (sistemático e teleológico) prevalecem sobre os elementos subjetivos (histórico e gramatical).

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O primeiro passo de um intérprete é fazer a interpretação literal, ou seja, a moldura normativa (ler o texto e tirar as interpretações possíveis). Os outros elementos serão utilizados para escolher uma dessas interpretações possíveis. A partir de então, se estabelece uma hierarquia: se o elemento histórico levar à interpretação x e os elementos sistemático e teleológico a uma interpretação y, a princípio, prevalece a interpretação y. A prevalência de um elemento sobre o outro se dá devido ao peso ou à solidez do argumento para o juiz.

► Indicação bibliográfica: 1. VIEIRA, Oscar Vilhena. A Constituição e sua reserva de justiça. 2. Artigo (na Xerox ou no site: www.direitodoestado.com.br): “Direitos fundamentais, cláusulas pétreas e democracia”. 3. BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. 07 de Agosto de 2007

Peculiaridades das Normas Constitucionais As normas constitucionais apresentam algumas peculiaridades que justificam a criação de princípios específicos de interpretação constitucional. Essas peculiaridades são: 1. Supremacia Jurídica → Significa que as normas constitucionais gozam de uma supremacia hierárquica em relação às demais normas jurídicas. A relevância prática disto é que se houver um conflito entre uma norma constitucional e qualquer outra norma, ele pode ser resolvido através de três critérios: cronológico, hierárquico e da especialidade. Tratando-se da Constituição, o critério utilizado será o hierárquico, pois a mesma está acima de qualquer norma infraconstitucional. Então, se houver um conflito entre norma constitucional e lei, prevalecerá a norma constitucional porque ela é uma norma de hierarquia superior às leis. Outra conseqüência disso é que uma lei inconstitucional, a princípio, é nula de plenos direitos. Assim, uma decisão do Judiciário que declara a inconstitucionalidade de uma lei, a princípio, tem natureza declaratória (porque declara um vício de nulidade preexistente) e efeitos retroativos (porque, a princípio, essa decisão judicial irá invalidar todos os efeitos produzidos pela lei inconstitucional). 2. Natureza da Linguagem → As normas constitucionais, normalmente, são mais abertas e fluidas do que as demais normas jurídicas. Em outras palavras, encontra-se, com mais freqüência, nas normas constitucionais do que nos códigos, princípios (normas de caráter mais abstrato). Como conseqüência para a interpretação da Constituição, sendo o elemento gramatical um limite à atividade criativa do juiz e as normas constitucionais mais abertas, o juiz passa a ter, na interpretação constitucional, maior liberdade de criação. O juiz tem mais criatividade na aplicação do princípio da razoabilidade. Isso prova que, como as normas constitucionais são mais fluidas, mais abstratas, de caráter principiológico, há um espaço maior para a criatividade do juiz na aplicação da CF do que na aplicação das leis. 3. Conteúdo → O conteúdo típico das normas jurídicas são as normas de conduta. A norma jurídica típica é uma regra de conduta que proíbe ou permite determinada prática. As normas constitucionais

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possuem também regras de conduta, mas não possuem APENAS regras de conduta; possuem, também, dois outros tipos de norma: normas programáticas8 e normas de organização9. 4. Caráter Político e Moral → As normas constitucionais têm um caráter político muito mais forte do que s demais normas jurídicas. Isso porque o Poder Constituinte Originário faz a transição de um poder político para um poder jurídico10. O poder do STF, por exemplo, proferir um acórdão ou do Poder Executivo expedir um decreto ou do Congresso Nacional editar uma lei são poderes limitados pelo direito (competências que foram conferidas a esses órgãos pela CF). A Constituição transforma um poder que é puramente político num poder jurídico, delimitado pelo direito. Só que essa tentativa de transformar um poder político em poder jurídico nunca é completa; ou seja, quando o Legislativo edita uma lei, há um conteúdo político nessas leis. Então, o que se diz é que na jurisdição constitucional, em virtude do caráter político da CF, o tribunal, de alguma forma, vai exercer um papel político. Esse aspecto político da jurisdição constitucional torna especialmente complexa a aplicação da Constituição. Caráter moral: A Constituição é a norma de maior densidade moral da ordem jurídica. Exemplo: A polêmica das cotas em universidades públicas. Isto prova que uma das características das sociedades contemporâneas é o pluralismo, ou seja, as pessoas divergem sobre questões morais (liberdade de expressão). O pluralismo citado no exemplo acima faz com que a aplicação da CF seja muito complexa porque as pessoas divergem sobre a melhor forma de se aplicar, por exemplo, o princípio da igualdade. De todas as peculiaridades acima, conclui-se que os elementos tradicionais de interpretação do direito não bastam para a interpretação constitucional. Eles até são utilizados na interpretação constitucional, mas não são suficientes. A hermenêutica constitucional precisa de princípios específicos de interpretação constitucional para dar conta da complexidade adicional trazida pelas quatro peculiaridades vistas.

● Só o Judiciário interpreta a Constituição ou os demais poderes do Estado também a interpretam? Resposta: O Judiciário tem a última palavra, mas não a única porque suas decisões fazem coisa julgada e são obrigatórias para os demais poderes. Quando o Legislativo edita uma lei, esta lei é uma forma específica de se interpretar/aplicar a Constituição. Assim, as leis são atos de concretização da Constituição, segundo o legislador. O Executivo, por sua vez, também aplica a Constituição. Há até um capítulo específico para administração pública na CF (arts. 37 a 41). O Poder Executivo, no exercício da função que lhe é típica (administrar), observa e segue/interpreta, assim, a Constituição. Quanto ao Judiciário, este aplica a Constituição basicamente de três formas: 1. Caso de aplicação direta da Constituição: A primeira ocorre quando o Judiciário utiliza uma norma constitucional para resolver a lide que lhe foi submetida. A Constituição é aplicada diretamente a um caso concreto para resolvê-lo.

8 Normas programáticas são aquelas que definem finalidades aos poderes do Estado. Estabelecem orientações para os poderes do Estado. 9 Por exemplo, a norma que cria o Poder Judiciário e dispõe sobre suas competências. Em geral, as normas de organização são normas que dispõem sobre competência e procedimento. São normas que atribuem competências aos órgãos públicos e estabelecem o procedimento para o exercício dessas competências. 10 Lembrete → O Poder Constituinte Originário é um poder político, pois não há nenhuma norma que diga que o povo pode elaborar sua própria Constituição. Este é um poder inerente à idéia de democracia.

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2. Eficácia interpretativa: Neste caso, o Judiciário se utiliza de uma norma constitucional para interpretar uma norma infraconstitucional. 3. Controle de constitucionalidade: É a hipótese em que o Judiciário declara a invalidade de uma norma por ela contrariar uma norma constitucional. “Todo ato de interpretação do Direito é um ato de interpretação constitucional”. (BARROSO) A explicação para a afirmação de Barroso é que para que o Judiciário possa aplicar a lei, antes ele tem que declará-la constitucional. Por esta razão, há sempre um juízo prévio de controle de constitucionalidade.

● Qual é o papel da Doutrina na Hermenêutica constitucional? Resposta: Fala-se numa interpretação doutrinária, que é exatamente o papel da doutrina fornecer parâmetros/subsídios para ajudar o juiz na interpretação e aplicação da Constituição.

● Cabe interpretação autêntica quanto à Hermenêutica constitucional? Pode ser editada uma emenda constitucional cujo papel não seja alterar uma norma constitucional, mas simplesmente esclarecer o seu significado? Resposta: Há duas correntes sobre esta questão. A primeira corrente – de Luiz Roberto Barroso – diz que a interpretação autêntica é incabível por duas razões: a primeira é que essa interpretação não é propriamente autêntica, ou seja, não provém do mesmo órgão. Isto porque a norma que está sendo interpretada pode ser oriunda do poder originário, enquanto a norma “interpretativa” é oriunda do poder derivado. A eficácia temporal das normas interpretativas tem efeito ex tunc. Barroso diz que essa eficácia retroativa viola o art. 5º, XXXVI, CF11. A preocupação do Barroso é que o constituinte derivado se utilize, abusivamente, desses efeitos retroativos; que ele edite uma emenda que diz que simplesmente interpreta, mas que, na verdade, altera. Lembrete → A interpretação autêntica ocorre quando determinado ente edita uma lei x e, depois, edita uma outra lei (lei y); só que esta outra lei não se destina a modificar a lei x. O único papel dessa segunda lei é interpretar a lei x. Esta interpretação é chamada de interpretação autêntica porque o órgão que expediu essa interpretação foi o mesmo órgão que editou a lei. A segunda corrente – de Paulo Bonavides – se tratar-se de uma norma exclusivamente interpretativa, que não altera, mas apenas esclarece, não há opsi à interpretação autêntica em matéria constitucional, desde que não seja alteração/revogação, mas apenas interpretação.

● O que significa “sociedade aberta dos intérpretes da Constituição”? Resposta: Esta é uma expressão de Peter Häberle (constitucionalista alemão) sobre sua tese. Para entendê-la, é necessário observar algumas premissas:

11 XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;

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Hoje, a Constituição tem força normativa, mas isto foi uma longa batalha no direito brasileiro. As Constituições, hoje, não são meros conselhos legislativos; são normas jurídicas obrigatórias. Por outro lado, as Constituições atuais (neoconstitucionalismo) são muito amplas; ou seja, as Constituições tradicionais do Estado neoliberal (1ª fase do constitucionalismo) são Constituições de garantia, que apenas estruturam e limitam o poder – o que não é o caso da CF/88. Hoje, as Constituições são decisivas não só para os órgãos públicos, mas para os próprios cidadãos. Sendo as Constituições tão importantes para a vida de todos, o Häberle diz que é razoável que se abra o processo de interpretação da Constituição à sociedade civil e não fique restrito ao Judiciário. Então, todos os instrumentos da sociedade civil que chamam a sociedade civil para o processo de controle de constitucionalidade concretiza a idéia de “sociedade aberta dos intérpretes da Constituição”. No Direito Brasileiro, os principais instrumentos que concretizam essa idéia são dois: 1. O amicus curi → expressão em latim que significa “amigo da corte”. É a possibilidade do relator do processo em ADI admitir que entidades da sociedade civil, de alta representatividade na matéria, se pronunciem. Por exemplo: Uma ADI proposta pelo PV contra uma lei que autoriza a comercialização de um pesticida. O PV sustenta que essa lei é inconstitucional porque viola o meio ambiente, já que o pesticida tem efeitos maléficos para a saúde do cidadão. Neste caso, por exemplo, o relator do processo pode autorizar que uma ONG de proteção ao meio ambiente se manifeste e exponha suas razões. A relevância disso é que o Judiciário, quando exerce o controle de constitucionalidade apresenta o que se chama de dificuldade contramajoritária12. Em países em que não há uma previsão constitucional expressa autorizando o Judiciário a declarar a inconstitucionalidade da lei – como os EUA, por exemplo – essa discussão entra para saber se o Judiciário pode ou não declarar a inconstitucionalidade da lei. Na Constituição brasileira há previsão expressa do controle de constitucionalidade. Isto significa que, para o direito brasileiro, toda essa discussão é relevante para saber até que ponto (legítimo) o Judiciário pode declarar a inconstitucionalidade de uma lei. Há situações em que estabelecer um limite para o Judiciário é muito difícil, como, por exemplo, o estabelecimento de cotas em universidades públicas. Os instrumentos da sociedade aberta, como o amicus curi, minimizam a dificuldade contramajoritária porque eles legitimam a decisão do Supremo, de modo que todos os interessados possam expor suas opiniões durante o processo. 2. Ampliação do hall dos legitimados → O controle de constitucionalidade abstrato, no Brasil, foi criado pela EC16/75 que introduziu a chamada representação de inconstitucionalidade. Contudo, de 1975 até 1988, o controle de Estado não foi muito importante para o Brasil porque o Procurador Geral da República era o único legitimado; só ele podia propor a representação – numa época em que o procurador não tinha tanta independência. Fato é que as decisões não chegavam ao Supremo, principalmente aquelas contrárias ao interesse do governo, diferentemente da atualidade, quando é impossível uma questão contrária ao interesse do governo não chegar ao Supremo. Hoje, qualquer partido com representação no Congresso Nacional pode propor ADI.

12 Dificuldade contramajoritária significa que quando o Judiciário declara a inconstitucionalidade de uma lei, com

base num princípio abstrato, há o risco do Judiciário substituir o juízo político do legislador pelo seu próprio juízo

político. Caso isto aconteça, a democracia será violada.

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Hall dos legitimados: art. 103, CF:

Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) I - o Presidente da República; II - a Mesa do Senado Federal; III - a Mesa da Câmara dos Deputados; IV - a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) V - o Governador de Estado ou do Distrito Federal; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) VI - o Procurador-Geral da República; VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; VIII - partido político com representação no Congresso Nacional; IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional. § 1º - O Procurador-Geral da República deverá ser previamente ouvido nas ações de inconstitucionalidade e em todos os processos de competência do Supremo Tribunal Federal. § 2º - Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias. § 3º - Quando o Supremo Tribunal Federal apreciar a inconstitucionalidade, em tese, de norma legal ou ato normativo, citará, previamente, o Advogado-Geral da União, que defenderá o ato ou texto impugnado.

Essa ampliação do hall dos legitimados fez com que, hoje, praticamente toda questão relevante chegasse ao Supremo por ADI.

● Há lacunas na CF? Resposta: Alguns autores sustentam que não há a possibilidade de existência de lacunas na Constituição, já que se a CF não tratou foi porque se delegou a questão ao legislador. Elevar uma questão à Constituição é excepcional e a alteração da constituição é levada a foro especial. O normal é ser tratado em lei. Esta é uma corrente minoritária. A posição majoritária (Barroso) entende que é possível a existência de lacunas na Constituição. É preciso porém, diferenciar o silêncio intencional do silêncio não intencional do legislador. Só se fala em lacuna na hipótese de silêncio não intencional, ou seja, no caso em que o constituinte se esqueceu de tratar da questão. Na hipótese de silêncio intencional, em que o constituinte não quis tratar da questão, não há que se falar em lacuna porque, neste caso, ele submeteu a matéria ao legislador. Há um caso em que o STF já admitiu a hipótese de lacuna na lei da CF, o que reforça a segunda tese (majoritária). É o caso do processo de incorporação de tratados internacionais. A CF tratou, expressamente, de duas fases da incorporação de tratados: a celebração – que é competência do Presidente da República – e a ratificação – que a aprovação pelo Congresso. A Constituição nada dispôs sobre a promulgação do tratado. Então, em virtude desse silêncio não intencional do constituinte, surgiu um costume constitucional, que é exatamente o costume que serve para suprir uma lacuna: a edição de um decreto presidencial para promulgação do tratado.

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Princípios específicos de interpretação constitucional 1. Supremacia da Constituição → A norma constitucional possui uma supremacia hierárquica em relação às demais normas da ordem jurídica. Exatamente em virtude dessa supremacia, se houver um conflito entre norma constitucional e qualquer outra norma jurídica – por exemplo, um conflito entre constituição e lei – a Constituição, apesar de mais antiga, prevalece sobre a lei porque tem superior hierarquia. Conclui-se que do princípio da supremacia decorre que a decisão que proclama a inconstitucionalidade tem natureza declaratória porque reconhece um vício preexistente e efeitos retroativos. Ou seja, a decisão que proclama inconstitucionalidade invalida todos os efeitos produzidos pela lei inconstitucional. Esta é uma regra relativa – foi aprovado o art. 27 da lei 9.868 que possibilita a relativização desses efeitos temporários. Esses princípios específicos de interpretação constitucional são princípios constitucionais implícitos, que não estão expressos em nenhuma norma jurídica. Os fundamentos do princípio da Supremacia são: a) Divisão entre Constituições Rígidas e Constituições Flexíveis → A diferenciação entre esses dois tipos de Constituição está no processo de alteração da Constituição. As Constituições rígidas são aquelas sujeitas a um processo de alteração mais rígido do que o processo legislativo ordinário. As flexíveis são o contrário: são Constituições cujo processo de alteração é idêntico ao legislativo ordinário. Só se fala em Supremacia da Constituição nas Constituições rígidas porque, se o processo de alteração for igual, a hierarquia é a mesma. b) Divisão entre Poder Constituinte e Poder Constituído (Poder Constituinte Originário e Poder Constituinte Derivado) → As Constituições são superiores às leis porque se considera que a Constituição é fruto da vontade constituinte do povo; enquanto as leis são resultantes da vontade dos representantes do povo (Parlamento). 2. Presunção de Constitucionalidade → As leis são presumivelmente constitucionais porque é dever do legislador seguir a Constituição. O Judiciário só deve declarar a inconstitucionalidade de uma lei se ela for manifesta/evidente. Na dúvida, o Judiciário não deve declarar a inconstitucionalidade da lei. Os fundamentos do princípio de constitucionalidade são: a) Separação de Poderes → A presunção de constitucionalidade atua como um fator de auto-limitação do Judiciário. Ao se auto-limitar, ele respeita as atribuições do Legislativo. b) Supremacia da Constituição → Se o legislador tem o dever de cumprir a Constituição – porque ela é suprema em relação às leis – se presume que, de fato, a tenha cumprido. Existem alguns dispositivos na Constituição que concretizam este princípio: art. 103, §3º, CF/8813 e prevê o AGU na ADI14. Na medida em que se tem a pessoa defendendo que aquela lei é constitucional, isso dificulta a declaração de inconstitucionalidade, prestigiando a presunção de constitucionalidade. Outra norma que

13 § 3º - Quando o Supremo Tribunal Federal apreciar a inconstitucionalidade, em tese, de norma legal ou ato normativo, citará, previamente, o Advogado-Geral da União, que defenderá o ato ou texto impugnado.

14 Defende a constitucionalidade da lei que é impugnada.

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concretiza este ideal é o art. 97, CF15 (princípio da reserva de plenário). Essa presunção é relativa, ou seja, pode ser desconstituída. Se ficar claro que a lei é inconstitucional, o Judiciário não só pode como deve desconstituir essa presunção e declarar a lei inconstitucional.

● Pode o chefe do Poder Executivo editar um decreto autorizando seus subordinados negar cumprimento a uma lei constitucional? Resposta: Antes da Constituição de 1988, sim, porque o Presidente da República não tinha legitimidade para propor ADI e, sendo assim, ele não poderia ser obrigado a cumprir uma lei inconstitucional. A Constituição de 1988 deu legitimidade ao chefe do Executivo (presidente e governadores). Com isso, os autores que defendem que o chefe do Executivo não pode editar tal decreto, dizem que se ele tem legitimidade para propor a ADI, então ele deve fazê-lo e remeter a questão ao Judiciário e não simplesmente expedir um decreto. Esta é a posição minoritária. A posição majoritária, no Brasil (e do STF), é a que afirma que o chefe do Executivo pode, sim, editar o decreto porque ao negar cumprimento a uma lei inconstitucional, ele zela pela supremacia da Constituição. O Supremo, porém, faz uma ressalva: o chefe do Executivo pode expedir o decreto, mas ele pode ser punido por crime de responsabilidade. 3. Interpretação (da lei) Conforme (a Constituição) → Atua no seguinte caso: quando uma norma jurídica qualquer comporta mais de uma interpretação – uma constitucional e outra inconstitucional – são chamadas de normas plurissignificativas. Neste caso, é dever do juiz adotar a interpretação que seja constitucional e afastar a interpretação que seja inconstitucional. Esta interpretação é uma tentativa de salvar uma norma sobre a qual haja uma forte suspeita de inconstitucionalidade. O caso que se aplica à Interpretação Conforme é quando uma norma tem uma primeira interpretação (literal) – que leva o intérprete a crer que ela é inconstitucional – mas a segunda (sistemática, teleológica, etc.) descobre uma outra interpretação, que é a constitucional. Contudo, há um limite para o esforço do intérprete: o texto da lei, que o impede de adotar uma interpretação contra legem. Quando o STF faz uma Interpretação Conforme, o resultado da ADI é parcialmente procedente. (Na interpretação conforme, a lei fica intacta). É parcial porque o Judiciário declara a inconstitucionalidade de uma determinada interpretação da norma.

● Qual a diferença entre Interpretação Conforme e declaração de inconstitucionalidade sem redução de texto? Resposta: Em ambos os casos, o Judiciário não retira nada da norma; mas, em ambos os casos, a ADI é julgada parcialmente procedente. Na Interpretação Conforme, o Judiciário declara inconstitucional uma determinada interpretação da norma. Na Declaração de Inconstitucionalidade sem redução de texto, uma determinada incidência/aplicação da norma. Exemplo (interpretação conforme): Aborto de fetos anencéfalos. Existem duas interpretações possíveis do art. Do Código Penal que criminaliza o aborto. Uma é considerar que esse tipo de aborto é simplesmente aborto porque o CP só abre duas exceções: o caso de risco de vida para a mãe e estupro.

15 Art. 97. Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público.

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Este seria, portanto um terceiro caso, ainda não positivado. A outra é nos sentido de que a primeira interpretação viola a integridade física e moral da mãe porque ela teria que carregar, durante nove meses em seu útero, um feto inviável. O STF trata a Interpretação Conforme e a Declaração de Inconstitucionalidade sem redução de texto como sendo a mesma coisa, porém, pela própria lei, há uma distinção. Há, também, a possibilidade de uma Interpretação da Constituição conforme a lei, quando uma norma constitucional fala do matrimônio, ela se refere ao matrimônio brasileiro e suas regras – dispostas pelo Código Civil. É o caso em que, para interpretar uma norma constitucional, o intérprete terá que recorrer a uma lei infraconstitucional. 14 de Agosto de 2007 ► Indicação bibliográfica:

1. ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios. (É o melhor). 2. BARROSO, Luiz Roberto; BARCELLOS, Ana Paula. O começo da história. (Artigo).

Princípios específicos de interpretação constitucional (continuação)

4. Unidade da Constituição → O ordenamento jurídico não é um amontoado de normas; é um sistema. Isto significa que é um conjunto de normas que aspira ter coerência, harmonia. Para o sistema jurídico, basicamente, a coerência gera dois deveres internos: a) Não interpretar isoladamente um determinado dispositivo. Quando o intérprete for tratar de uma questão de rescisão de contrato (Direito Civil), ele não deve apenas analisar o dispositivo do Código Civil que trata da rescisão de contratos; ele tem que inserir esse dispositivo no sistema sobre rescisão de contratos, nos princípios a respeito dos contratos e nos princípios constitucionais que regulam a matéria. Essa necessidade se dá porque, se interpretarmos isoladamente esse dispositivo, haverá o risco de se adotar uma interpretação que seja contrária a determinados princípios do Direito Civil e dos constitucionais. Isso levaria a interpretações contraditórias dentro do ordenamento jurídico. Então, o dever de inserir um dispositivo isolado no sistema, tem o objetivo de preservar a coerência da ordem jurídica. b) Dever de harmonizar conflitos entre normas jurídicas. A resolução dos conflitos entre regras NÃO se dá da mesma forma que a resolução dos conflitos entre princípios. Esta é uma das diferenças fundamentais entre regras e princípios. A Constituição é o centro da ordem jurídica; é quem dá, a esta, coerência. “Se a ordem jurídica fosse o sistema solar, a Constituição seria o Sol”. Exemplo → A constitucionalização do direito civil (foi o processo que mais se desenvolveu): No Código Civil de 1916 havia a pretensão de uma “Constituição do Direito Civil”. Este código pretendia disciplinar totalmente o Direito Civil. No início, este código até exerceu bem essa função porque, além de ser um conjunto bem amplo de dispositivos, nas hipóteses em que não havia uma regra específica, eram

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aplicados os princípios gerais, que eram coerentes entre si. Porém, o Direito Civil perdeu essa coerência porque surgiram normas que fugiam completamente dos princípios que inspiravam o Direito Civil, como o CDC (Código de Defesa do Consumidor). Os princípios que inspiraram este código (proteger a parte mais fraca) não foram os mesmos que inspiraram o CC/1916 (proteção da propriedade, autonomia privada, etc.). Então, o advento de uma série de normas que seguia uma gama de princípios diferentes fez com que surgisse um fenômeno que Gustavo Tepedino chama de “quebra do monossistema”, ou seja, a quebra de um sistema único e completo (o Código Civil). Este fenômeno foi o responsável pela perda de coerência do CC. Cada vez mais o Direito Civil foi se tornando um amontoado de normas e deixando de ser um sistema. Por isto alguns autores defenderam a “filtragem” do Direito Civil pela Constituição. Através desta filtragem, os princípios constitucionais deram a coerência que o Direito Civil não tinha mais. A conseqüência prática dessa filtragem é um outro fenômeno que, hoje, se chama despatrimonialização do Direito Civil. A CF/88 é mais voltada para a dignidade humana do que para o patrimônio, ou seja, há uma preponderância de questões existenciais na CF/88 em detrimento de questões patrimoniais. Consequentemente, o Direito Civil também passou a ser mais voltado para a dignidade humana. O caso do Direito Civil mostra o papel da Constituição de dar coerência e harmonia ao direito infraconstitucional. Não só a ordem jurídica é um sistema com também a Constituição o é. O intérprete da Constituição não pode interpretar um de seus dispositivos de forma isolada. Ele tem que harmonizar os conflitos entre as normas constitucionais.

● As normas constitucionais têm hierarquia entre si? Resposta: Não. Sob o aspecto jurídico, uma conseqüência do princípio da unidade da Constituição é que todas as normas constitucionais têm igual hierarquia.

● Pode-se dizer, por exemplo, que a norma constitucional que diz que o Colégio Pedro II continua da União tem a mesma importância que o direito fundamental à liberdade? Resposta: Não, porque há uma hierarquia não jurídica, mas valorativa (ou arqueológica) na Constituição. As normas sobre os direitos fundamentais estão no topo desse tipo de hierarquia. Há, basicamente, duas importâncias práticas quanto à hierarquia valorativa constitucional: a primeira diz respeito à eficácia interpretativa dessas normas, ou seja, as normas de maior hierarquia valorativa têm maior eficácia interpretativa. As normas que incorporam os valores mais importantes da ordem jurídica são mais relevantes na interpretação do direito constitucional e estabelecem, com mais freqüência, parâmetros que guiam o intérprete na interpretação do direito infraconstitucional. A outra aplicação diz respeito às ADIs. Cabe à ADI cuidar da violação de todas as normas constitucionais. Já a ADPF, cuida só dos preceitos fundamentais, que são estabelecidos pelo STF, na sua jurisprudência. Esses preceitos são as normas de maior hierarquia valorativa, como as normas sobre os princípios fundamentais (arts. 1º a 4º, CF); cláusulas pétreas; princípios constitucionais sensíveis (art. 34, VII, CF) – cujo descumprimento gera intervenção federal; e normas sobre a estrutura do Estado (sistema de governo, forma de Estado, forma de governo, etc.). 5. Efetividade → A idéia de que as normas constitucionais têm força normativa, ou seja, a idéia de que elas são normas jurídicas obrigatórias aos seus destinatários é uma idéia relativamente nova no Brasil.

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Na verdade, a Constituição só afirmou a sua força normativa ao longo dos anos 1980, especialmente depois da CF/88. Cláudio Pereira de Souza Neto fala em uma doutrina brasileira da efetividade, que é uma parte importante da doutrina do Direito Constitucional brasileiro.

Essa doutrina significa o conjunto de esforços de autores como José Afonso da Silva, Paulo Bonavides, Luiz Roberto Barroso, etc. para afirmar que a Constituição é uma norma jurídica obrigatória e não apenas uma diretriz para o legislador. Muitas vezes, a norma constitucional é dirigida ao próprio juiz, que pode fazê-la valer mesmo sem lei que a regulamente.

Breve histórico sobre as classificações das normas constitucionais: Da primeira Constituição republicana (1891) até a década de 1960, havia no Brasil a divisão de dois tipos de normas constitucionais: normas constitucionais diretórias e normas constitucionais mandatórias (classificação adotada por Rui Barbosa). Estas classificações são importantes porque ajudam a entender, depois, a classificação de José Afonso da Silva. O critério de divisão desses dois tipos de normas constitucionais era o grau de densidade normativo, ou seja, as normas de baixo grau normativo são princípios – porque não estabelecem, no próprio dispositivo, qual a conduta que ele exige do destinatário. O princípio se limita a estabelecer uma finalidade com um valor a ser atingido. Ao fim, quem define a conduta é o aplicador da norma. Os princípios dão ao aplicador uma margem de liberdade de interpretação muito maior do que as regras. Estas têm alta densidade normativa, ou seja, elas próprias estabelecem condutas exigidas por elas mesmas. Por exemplo: “É proibida a tortura”. Ela simplesmente proíbe uma conduta. Em suma, é muito mais fácil aplicar uma regra do que um princípio porque, numa regra, a própria conduta está prevista expressamente; já no princípio, é o aplicador quem vai dizer qual conduta é necessária para promover um fim que o princípio reserva. Então, as normas diretórias são normas de baixa densidade normativa (normas mais próximas aos princípios), enquanto as normas mandatórias têm alta densidade normativa (normas mais próximas às regras). A posição tradicional que foi adotada de 1891 até a década de 1960 era de que as normas mandatórias (mais concretas) produziam plenos efeitos desde a promulgação da Constituição, enquanto as normas diretórias (mais abstratas) eram normas que não produziam nenhum efeito até que fossem regulamentadas pelo legislador; o Judiciário não poderia, ele próprio, estabelecer a conduta, sendo obrigado a esperar pelo Legislativo. Na década de 1960, foi publicada a obra clássica de José Afonso da Silva: “A aplicabilidade das normas constitucionais”. Esta é uma das obras mais importantes sobre direito constitucional, apesar de são ser original do José Afonso da Silva, mas de um italiano chamado Vezio Crisafulli. A tese básica de Vezio Crisafulli dizia que a tese anterior – que dividia as normas constitucionais em mandatórias e diretórias – era insustentável porque, segundo ele, não se pode admitir que uma norma constitucional não produza nenhum efeito jurídico desde sua promulgação, ou não seria, de fato, uma norma jurídica, mas um simples “conselho” facultativo. As normas jurídicas obrigatórias têm que produzir um efeito desde logo.

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A partir de então, José Afonso da Silva elaborou a tão citada e cobrada em concursos públicos classificação das normas constitucionais em três tipos:

1. Normas constitucionais de eficácia plena e aplicabilidade imediata → Essas normas têm alta densidade normativa (parecidas com as normas mandatórias). São normas que, por si só, estabelecem a conduta que é exigida do destinatário e não se limitam a uma única finalidade. Por ser norma concreta, produz efeitos desde logo, sem precisar de regulamentação por lei.

2. Normas constitucionais de eficácia contida (ou restringível) e aplicabilidade imediata → São

normas que também têm alto grau de densidade normativa, sendo bastante específicas e concretas e que, por isto, também produzem efeitos desde logo. A diferença delas para as normas de eficácia plena é que, ao contrário destas, as de eficácia contida admitem uma restrição futura por parte do legislador, já que prevêem expressões como “na forma da lei”, “nos termos da lei”, “mediante lei”, etc.

Daniel Sarmento diz que esta classificação “morreu e esqueceu de cair”. Segundo Virgílio Afonso da Silva (filho de José Afonso da Silva) a distinção entre normas de eficácia

plena e normas de eficácia contida não é um distinção consistente porque pouco importa se a norma constitucional tem uma autorização expressa para que o legislador a restrinja, já que o legislador pode, sim, restringir normas constitucionais desde o fundamento dessa restrição seja uma outra norma constitucional.

OBS.: Esta tese de Virgílio ainda não foi publicada.

3. Normas constitucionais de eficácia limitada e aplicabilidade mediata → Estas normas se dividem em outras duas espécies: a) normas programáticas e b) normas de princípio institutivo. Estas normas são normas de baixa densidade normativa, ao contrário das duas primeiras, ou seja, são normas muito abstratas e fluidas, próximas aos princípios. São normas que estabelecem apenas finalidades a serem atingidas, mas não a forma como devem ser atingidas. Essas normas só produzem efeito com sua regulamentação pelo legislador. Porém, ainda assim, essas normas produzem algum efeito desde logo – ao contrário das normas diretórias. Tratam-se esses efeitos de: a) Gerar a não recepção de normas anteriores à Constituição que sejam com ela materialmente incompatíveis. Um caso sempre lembrado é o CTN (Código Tributário Nacional): na época em que ele foi editado, a Constituição em vigor exigia apenas lei ordinária. Ele foi editado com normas de eficácia de lei ordinária. Veio a Constituição seguinte que passou a exigir lei complementar. O CTN acabou sendo recepcionado com o status de lei complementar, exatamente porque não há não recepção formal, só há não recepção material. b) Gerar a inconstitucionalidade de leis posteriores à Constituição que sejam com ela formal ou materialmente incompatíveis.

● Por que, em relação à inconstitucionalidade que se refere a leis posteriores à Constituição, a incompatibilidade pode ser material ou formal? Resposta: Porque há dois tipos de inconstitucionalidade: material (por vício de conteúdo) e formal (por vício de forma).

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c) Não gerar direitos de forma direta, mas apenas de forma indireta. O que se pode exigir do governo não é que determinados direitos sejam concedidos, e sim que o governo não adote medidas que inviabilizem a finalidade que ele deveria fomentar. Por exemplo: se o governo institui um tributo altíssimo sobre tickets de teatro e cinema, a instituição do tributo sobre essas atividades culturais significa que boa parte da população que costuma ter acesso a essas atividades, não mais terá a mesma facilidade. 4. Normas constitucionais de eficácia interpretativa → Essas normas são utilizadas para a interpretação do direito infraconstitucional. Por fim, tem uma modalidade de eficácia mais polêmica, que é o chamado princípio da vedação de retrocesso.

6. Princípio da vedação do retrocesso → Para melhor compreensão deste princípio, é preciso estudar o contexto em que ele surgiu. Lembrete → Direitos prestacionais: direitos a prestações positivas. Exemplo: direito à saúde. O governo constrói hospitais, compra medicamentos, equipamentos, etc. Para isto, não basta que a Constituição de 1988 diga que o sistema de saúde pública brasileiro será igual ao da Suécia. Para efetivar esses direitos prestacionais, é necessário um custo financeiro. A orientação geral nesta questão é que, como esses direitos têm custos financeiros, são direitos que se submetem a uma aplicação progressiva, ou seja, o estado vai, na medida de suas possibilidades financeiras, a cada vez melhorando a prestação desses serviços públicos. Numa democracia representativa, há uma prioridade dos poderes legitimados pelo voto para definirem as prioridades do gasto público. O instrumento através do qual essas prioridades são definidas são os direitos fundamentais. Isto significa que o papel do Judiciário é um papel subsidiário porque o papel fundamental é o do Executivo e do Legislativo, através do orçamento. O princípio da vedação do retrocesso foi concebido para dar maior eficácia aos direitos prestacionais. Este princípio diz que quando uma norma constitucional de eficácia limitada é regulamentada pelo legislador, este não pode simplesmente revogar esta norma. Neste caso, o legislador não pode revogar uma lei que é dele próprio porque essa lei não é uma lei qualquer: é uma lei que regulamentou uma norma constitucional de eficácia limitada, ou seja, é uma norma que deu maior eficácia a uma norma constitucional. Ao dar maior eficácia a uma norma constitucional, mesmo sendo lei, ela não pode ser revogada por uma lei superveniente. Para Ana Paula Barcellos, o que é vedado pelo retrocesso é apenas uma revogação daquela lei sem colocar nada em troca. A vedação do retrocesso NÃO significa uma vedação a todo e qualquer retrocesso. Por exemplo, pode-se tirar dinheiro de uma área para se investir em outra. Se a vedação do retrocesso fosse aplicada rigidamente, não poderia retroceder em nada. A visão radical da vedação do retrocesso é incompatível com a democracia.

Tipologia das Normas Constitucionais

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1º tipo: Normas Constitucionais de Organização → São normas que, por exemplo, instituem órgãos públicos ou dispõem sobre suas competências e procedimentos. Cumprem a função da Constituição de estruturar o Estado. 2º tipo: Normas Definidoras de Direitos → São as normas que conferem a seus destinatários direitos subjetivos. Alguns autores se utilizam do conceito dos direitos privados de direitos subjetivos. O conceito de direitos subjetivos dos direitos privados é o direito que corresponde ao dever jurídico (dar, fazer ou não fazer). Da lesão ao direito subjetivo nasce a pretensão de que tal direito subjetivo seja garantido pelo Judiciário e a toda pretensão corresponde uma ação judicial. 3º tipo: Normas Programáticas → São normas que definem finalidades ou valores a serem atingidos. Esta é uma classificação quanto às normas constitucionais, em geral. Há uma outra classificação, específica em relação aos princípios constitucionais.

Tipologia dos Princípios Constitucionais 1º tipo: Princípios Fundamentais → Eles representam as decisões políticas fundamentais do constituinte. São normas que dão a estrutura fundamental do Estado. Por exemplo: o sistema de governo (presidencialista ou parlamentarista), a forma de governo (república ou monarquia), a forma de Estado (federal ou unitário), etc. 2º tipo: Princípios Gerais → Estão num patamar de abstração um pouco menor; são um pouco mais específicos do que os princípios fundamentais. Na verdade, os princípios gerais são aplicações dos princípios fundamentais. Exemplo: legalidade, irretroatividade das leis, isonomia, segurança jurídica, etc. 3º tipo: Princípios Setoriais → Estes não incidem sobre todo o sistema constitucional, mas apenas sobre áreas específicas da Constituição. Porém, no âmbito daquele setor, são os princípios básicos. Por exemplo: os princípios da administração pública (art. 37, caput, CF16).

(Encerra aqui a parte mais tradicional sobre Hermenêutica Constitucional)

Introdução A área de Hermenêutica Constitucional é a área que vem sofrendo a maior mudança. A interpretação constitucional é uma espécie de interpretação jurídica, ou seja, as normas constitucionais são normas jurídicas que se utilizam dos critérios tradicionais de interpretação (gramatical, teleológico, histórico, sistemático, etc.). As normas constitucionais têm peculiaridades que justificam princípios específicos de interpretação constitucional. Hoje, a doutrina percebe que as complexidades são maiores do que se percebia. Isso aconteceu com a evolução do Positivismo para o chamado Pós-positivismo.

16 Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

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A posição clássica do positivismo quanto à interpretação dos direitos era não criativa, ou seja, o juiz deveria se limitar a descobrir a solução para a controvérsia com a qual lidava, que o legislador já teria estabelecido. A idéia era de que o legislador sempre tivesse vislumbrado todas as situações de fato que iriam ocorrer e tivessem preestabelecido na ordem jurídica a solução para aquela controvérsia. Esta afirmação parte de duas premissas: uma quanto ao papel do direito (ou da norma) e outra quanto ao papel do intérprete. A premissa quanto ao papel da norma é que o ordenamento jurídico seria completo, havendo sempre nele uma solução preestabelecida pelo legislador. Se não tiver uma regra específica, cabe ao intérprete descobrir essa solução através dos critérios de interpretação da ordem jurídica (princípios gerais do direito, analogia, costumes, etc.). Dessa idéia de completude da ordem jurídica decorre uma outra idéia quanto ao papel do juiz (intérprete): se o ordenamento jurídico é completo, a função do juiz é meramente suprir a solução que já existe. Em suma, essas duas são as teses básicas do Positivismo jurídico quanto à interpretação do direito: a completude da ordem jurídica e o fato da interpretação do direito ser uma atividade puramente de conhecimento e não uma atividade criativa. Para o Pós-positivismo, essas duas teses não são mais sustentáveis. Hoje, se afirma que a idéia de completude do ordenamento jurídico é uma farsa. Nem o legislador mais cuidadoso vai conseguir antever todas as situações e preestabelecer uma solução para elas. Essa percepção de completude do ordenamento jurídico fez com que fossem introduzidos, no direito, elementos que antes estavam fora do direito. Além disto, hoje também não se admite que a atividade judicial seja puramente de conhecimento. Quando um juiz se pronuncia sobre um caso para o qual não há uma regra específica preestabelecida pelo legislador, há alguma criatividade do Judiciário. Hoje, o juiz é visto como um co-participante, junto ao legislador, do processo de criação dos direitos, já que este processo não termina quando as leis são editadas, mas quando são aplicadas. É importante lembrar que, hoje, o direito é composto não apenas pelo direito positivo, mas também pela jurisprudência.

● Qual é o problema de se admitir que o juiz cria direitos? Resposta: É um problema democrático, já que o juiz não foi eleito. Portanto, ele não pode decidir como acha melhor, mas com base na ordem jurídica. Por esta razão, o foco da doutrina neoconstitucionalista (pós-positivismo) é trazer parâmetros objetivos para a resolução pelo Judiciário de casos difíceis e não óbvios.

Teoria dos Princípios (pós-positivista) A teoria dos princípios é uma concepção pós-positivista que tem dois grandes “pais”: Ronald Dworkin e Robert Alexy. Uma premissa básica na tese de ambos é a distinção entre regras e princípios. O positivismo fazia uma distinção entre regras e normas, como se os princípios não fossem normas. Hoje, esta forma de colocar a questão está superada, e se distingue apenas regras de princípios, ambos como espécies de normas. Os princípios também são normas jurídicas obrigatórias. Uma das grandes características do pós-positivismo é essa reabilitação da força normativa dos princípios.

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Existem, basicamente, duas linhas na distinção entre regras e princípios. Uma linha que é importante no Brasil é a linha do Humberto Ávila, que tem uma tese um pouco diferente da tese de Dworkin e Alexy. Humberto Ávila tem vários critérios, mas o critério fundamental para distinguir princípios de regras é a forma da descrição da conduta exigida pelo destinatário da norma. No caso das regras, o próprio dispositivo legal que a prevê também a conduta que é ou exigida ou proibida do destinatário. Por exemplo: “O prazo de apelação é de quinze dias”; “Não pisar na grama”. Isto são regras. Já o dispositivo legal dos princípios não traz a conduta; traz apenas uma finalidade ou valor a ser atingido. Exemplo: Princípio da moralidade administrativa. A moralidade é um valor. Quem diz quais são as condutas necessárias à aplicação de um princípio é exatamente quem o aplica. Portanto, há uma margem maior de interpretação na aplicação de princípios. Por isto se diz que princípios promovem mais a justiça e as regras promovem mais a segurança jurídica. Princípios demais colocam em risco a segurança jurídica e, ao contrário, regras demais colocam em risco a justiça. A distinção de Robert Alexy e de Ronald Dworkin utiliza os dois critérios: a forma de aplicação e a forma de resolução de conflitos. As regras e os princípios se diferem quanto à forma de aplicação porque as regras se aplicam segundo uma lógica do “tudo ou nada”, enquanto os princípios se aplicam segundo uma lógica do “mais ou menos”. Para compreender isto, é preciso compreender a estrutura das normas jurídicas. Normalmente, as normas jurídicas têm a seguinte estrutura: uma hipótese em incidência e uma conseqüência jurídica. Exemplo: Norma jurídica que diz “Não pisar na grama. Multa = R$200,00” → hipótese em incidência e conseqüência jurídica/sanção, relativamente. Para Robert Alexy e de Ronald Dworkin, se no mundo dos fatos ocorrer a chamada subsunção17, o juiz não tem opção e tem que aplicar a devida conseqüência jurídica. Isto é o que faz com que a aplicação das regras siga a lógica do “tudo ou nada”: ou ocorre a hipótese em incidência e o juiz aplica a devida conseqüência, ou não há nada e a regra não se aplica. Já os princípios se aplicam segundo a lógica do “mais ou menos” porque não basta a ocorrência da hipótese em incidência para eles serem aplicados. Exemplo: A atividade de pintar é protegida pela liberdade artística, mas o indivíduo não pode fazê-lo em qualquer hora ou lugar. Todo princípio está sujeito a limitações que não se aplicam às regras. Essas limitações são, geralmente, conflitos de alguns princípios com outros. O segundo critério é a forma de resolver conflitos.

● Podem subsistir, na ordem jurídica, duas regras que digam o seguinte: “é proibido pisar na grama” e “é permitido pisar na grama”? Resposta: Não, porque violariam o princípio da unidade da ordem jurídica. Na resolução de conflito entre regras, uma das regras em conflito – ou parte delas – é excluída da ordem jurídica. Os critérios utilizados para resolver esse tipo de conflito são: a especialidade (prevalece a mais específica), a hierarquia (prevalece a de maior hierarquia), a cronologia (prevalece a posterior), etc.

17 Subsunção = realização concreta de uma hipótese em incidência

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OBS.: Sabe-se que esses critérios não são suficientes para resolver conflitos entre princípios constitucionais. O critério para resolução de conflito entre princípios começa pela ponderação de interesses, de princípios constitucionais. Quando se pondera princípios jurídicos, nenhum dos princípios em conflito é excluído. Exemplo: O caso da Cicarelli. Ponderação entre intimidade, vida privada e honra versus liberdade de informação. Se o juiz autoriza a veiculação da imagem, ele afasta daquele caso concreto os demais princípios; se a decisão é contrária, ele afasta a liberdade de informação. 28 de Agosto de 2007 Bibliografia: Daniel Sarnento

Barroso (O começo da história – artigo) Jane Reis (texto na Xerox) Roberto Ávila (Teoria dos Princípios) Barroso (Controle de Constitucionalidade)

Ponderação Recapitulando...: O conflito entre regras se resolve de uma forma; o conflito entre princípios se resolve de outra forma. O conflito entre regras se resolve pelos três critérios tradicionais (cronologia, especialidade e hierarquia). O conflito entre princípios não são resolvidos sempre apenas por esses critérios, mas pelo método de ponderação de princípios/ interesses. Quanto à ponderação de interesses, um grande esforço da doutrina é trazer parâmetros racionais, objetivos, para a ponderação de interesses, a fim de evitar que a ponderação de interesses se transforme naquilo que o juiz quer decidir, ou seja, num instrumento de decisionismo judiciário. Quando os princípios são fluidos, abstratos, dão uma margem de liberdade maior para o juiz achar a decisão mais justa para o caso concreto. Contudo, essa margem de liberdade maior não pode ser simplesmente o que o juiz quer, o que ele acha melhor ou mais justo. Isso porque o juiz não foi eleito. A legitimidade da decisão judicial está atrelada à aplicação da ordem jurídica e não à vontade do juiz. Então, ele (o juiz) tem que justificar racionalmente a aplicação dos princípios. Esse é o principal objetivo da doutrina contemporânea, não só no Direito Constitucional, mas em toda a hermenêutica jurídica. Segundo esse objetivo – de racionalizar e tornar minimamente objetivo e controlável a aplicação dos princípios – a doutrina estabelece uma rotina, um roteiro, para a ponderação.

● Em outras palavras, qual será o itinerário lógico a ser percorrido pelo juiz? Resposta: A primeira coisa que o juiz deve fazer, quando ele pondera princípios, é identificar os princípios em colisão. O juiz deve reunir dois grupos (Exemplo: grupo A e grupo B): os princípios que colidem. Normalmente, se utiliza a imagem da balança para designar a ponderação. Então, o juiz define quais princípios estão em um prato da balança e quais estão no outro prato. Não necessariamente é um

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só princípio a ser ponderado; pode haver dois, três ou até mais. O segundo passo é identificar os fatos que são relevantes para a ponderação. Por exemplo: Um ministro é flagrado, por um papparazzo, saindo de um motel com uma mulher que não é a sua esposa. O papparazzo pretende publicar a foto, que tirou dos dois, na primeira página de um jornal de grande circulação. O ministro, então, entra com uma ação de pedido de liminar para que aquela imagem não seja divulgada.

● Esse é um caso de ponderação de princípios constitucionais? Resposta: Sim. Envolve a intimidade e proteção da vida privada, de um lado; e, de outro lado, a liberdade de informação e de imprensa. Quanto ao segundo passo (identificar os fatos relevantes), no exemplo, deve relevar que o ministro é uma pessoa pública. Isso é um fato importante porque é um parâmetro de ponderação para essa ponderação específica. As pessoas públicas têm um nível de proteção à sua intimidade menor do que os anônimos, já que elas têm que se expor mais. Se um jornalista tira foto do Presidente da República para publicar num livro de História, o Presidente não pode dizer que o jornalista violou sua intimidade. A partir do momento em que você se dedica a algo que tenha uma exposição pública, você tem que tolerar alguma exposição – o que não significa que as pessoas públicas não tenham intimidade. Tirar foto de uma triz tomando banho de sol na piscina de sua casa, por exemplo, é violação de privacidade. Outro fato importante é quanto à relação entre a imagem da foto tirada (e da situação em si) e a função pública exercida pelo ministro. No caso do exemplo, a princípio, não haveria relação e aquela situação diria respeito apenas ao ministro e sua família. Para provar quanto os fatos são importantes para a ponderação, Lembrete → A ponderação é sempre feita à luz das particularidades do caso. Ou seja, num determinado contexto fático, a ponderação pode ser resolvida pela aplicação dos princípios envolvidos. Mudando os fatos e aplicando os mesmos princípios de ponderação, outros princípios podem prevalecer. Exemplo: A mulher que foi flagrada com o ministro é funcionária de uma empreiteira que participa de uma concorrência milionária no Ministério que é dirigido por essa pessoa. Digamos que a funcionária estava se utilizando de recursos de convencimento “não previstos no edital”. Percebe-se, aqui, que os fatos mudaram. À luz desses fatos, há um interesse público na divulgação daquela situação. A identificação dos fatos relevantes para a ponderação é decisiva para saber quais princípios vão prevalecer. A terceira etapa é a interação entre os princípios e os fatos. Exatamente através da interação, que nós identificamos o peso específico18 dos princípios. O que a doutrina diz é que essa fórmula é oca, ou seja, esse roteiro não a questão muito fundamental para que a ponderação seja racional, objetiva e controlável.

●Qual é o critério racional/ objetivo que o juiz vai utilizar para atribuir peso aos princípios? Resposta: Esse roteiro não diz; ele ajuda, mas não é suficiente. (É o que diz a doutrina).

18 Peso específico = é o peso que o princípio assume depois da ponderação, o seja, é o peso que o princípio possui no caso concreto. É exatamente o que vai determinar qual princípio vai ganhar na ponderação (o princípio que tiver maior peso específico).

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Exemplos sobre a relevância da ponderação (discussões teóricas): Aplicação dos direitos fundamentais nas relações entre particulares (eficácia horizontal dos direitos fundamentais); Atribuição de efeitos ex nunc às decisões de inconstitucionalidade; Aplicação do princípio da isonomia. Hoje, os principais debates no Direito Constitucional envolvem ponderação entre princípios constitucionais. Os critérios racionais e objetivos que fazem com que a ponderação não seja uma “varinha de condão”, ou seja, que o juiz decida da forma como queira, são vários. A doutrina divide em dois tipos: Parâmetros ou standarts de ponderação – São vários. A doutrina divide em parâmetros genéricos e específicos (falaremos só dos parâmetros genéricos). Parâmetros específicos são para ponderações específicas; Parâmetros genéricos são aqueles aplicáveis a qualquer ponderação. 1º parâmetro: Quanto maior a restrição que um princípio sofrer no caso concreto, maior será o seu peso. Crítica a uma decisão do STF: Em determinada decisão, o STF afirmou que no caso da ação de investigação de paternidade o réu não está obrigado a fazer exame de DNA. Mas, se ele se recusar a fazer esse exame, isso será interpretado contra ele. Nesse caso, os princípios em conflito são a integridade física (do suposto pai) e o direito à real identidade (do filho) – direito da personalidade.

● Qual o grau de restrição imposto pela realização do exame à integridade física do pai, ou seja, quanto a integridade física do pai vai estar restringida se ele for obrigado a fazer o exame? Resposta: Quase nada. O grau de restrição à integridade física é mínimo.

● Qual o grau de restrição ao direito do filho de conhecer sua real identidade se não for realizado o exame de DNA? Resposta: É enorme! O STF, em decisão recente, admitiu o exame de DNA contra a vontade da pessoa titular (caso da Glória Tevez). A cantora teve um filho e alegou que aquele filho foi resultado de um estupro que ela sofreu na carceragem da Polícia Federal, cometido por um agente de lá. O agente da Polícia Federal alegou que queria que fosse feito o exame de DNA nela para saber se ele era o pai, a fim de provar sua inocência. Nesse caso, o STF autorizou o exame de DNA na placenta. Nesse caso, a restrição é ainda menor, já que, depois do nascimento, o “material” vai ser descartado. 2º parâmetro: Quanto maior a hierarquia valorativa do princípio, maior o seu peso. Faz-se aqui uma distinção entre peso geral e peso específico. Peso geral é o peso que um princípio tem antes da ponderação. É aquele peso que decorre da hierarquia valorativa existente na Constituição. Por exemplo: A CF/88 deu maior ênfase à tutela da liberdade, ao invés da tutela da propriedade. É uma Constituição mais voltada para as questões existenciais do que para questões patrimoniais. Pode-se dizer, então, que a liberdade tem uma hierarquia /peso geral maior do que a propriedade, à luz da CF/88. Isso não significa que, numa ponderação entre propriedade e liberdade, a liberdade vai sempre ganhar, porque o

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que decide a ponderação não é o peso geral, mas o peso específico. E esse peso específico só é aferido à luz do caso concreto. Isso revela que todos esses parâmetros são parâmetros relativos, e não absolutos. Nenhum parâmetro é absoluto! Dizer que quanto maior é a hierarquia valorativa do princípio, maior é o seu peso, isso é apenas um indício de que, por exemplo, a liberdade tem mais chance de ganhar a ponderação, e não que ela vai ganhar. Será que é inconstitucional a criminalização do furto? Resposta: Poderia se sustentar que a criminalização do furto é inconstitucional porque o furto é uma lesão leve ao patrimônio e a privação de liberdade seria absurda porque o valor da liberdade é maior do que o do patrimônio. Essa sustentação é ABSURDA! É obvio que a criminalização do furto é constitucional porque, apesar da liberdade sair na frente da propriedade, isso não significa que nessa ponderação ela vai ganhar. No caso concreto do furto, a propriedade ganhou da liberdade. Vimos a questão dos conflitos entre regras e a questão dos conflitos entre princípios. Há, além dessas duas, uma terceira possibilidade de conflito: conflito entre regra e princípio. Num conflito entre regras e princípios, quase que intuitivamente achamos que quem tem mais chances de ganhar é o princípio. Mas não é bem assim. Isso porque, nesse conflito – segundo alguns autores – a regra tem até mais chances de ganhar. As regras têm uma prevalência primaface19 em relação aos princípios. Não há uma garantia de que a regra vá ganhar, mas apenas uma afirmação de que a regra tem mais chance de ganhar. Uma coisa que as pessoas não percebem é que não é só o juiz que pondera princípios constitucionais. O legislador, por exemplo, também pondera princípios constitucionais. A atividade de interpretação da Constituição não é exclusiva do Judiciário; os três poderes interpretam a Constituição. Muitas vezes, as regras são frutos de ponderações feitas pelo legislador. Exemplo: Quando o legislador demarca uma área, na Amazônia, como de proteção ambiental, ele faz uma ponderação de princípios constitucionais (proteção ao meio ambiente e desenvolvimento econômico). Se ele demarcar como área de proteção ambiental a Amazônia inteira, ele vai proteger demais o meio ambiente e vai prejudicar o desenvolvimento econômico. Se ele demarcar uma área “ridícula”, ele vai proteger demais o desenvolvimento econômico e vai prejudicar muito o meio ambiente. No momento em que ele define a área de proteção ambiental, ele pondera.

● Será que, no exemplo anterior, o juiz pode dizer que o legislador demarcou uma área muito pequena e, então, ele (o juiz) deve aumentar aquela área? Resposta: Não, porque além dele atuar como legislador positivo, ele tem que respeitar a ponderação feita pelo legislador.

● Isso significa que o juiz nunca pode afastar uma regra para aplicar um princípio? Resposta: Não. Excepcionalmente, o juiz até pode afastar a regra e aplicar um princípio, em casos de inconstitucionalidade flagrante da regra; mas, a regra geral é de que ele deve respeitar a regra editada pelo legislativo. Esses são os principais parâmetros de ponderação.

19 Primaface = relativo.

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Os princípios mais importantes que faltam à ponderação são os quatro: proporcionalidade, razoabilidade, concordância prática e proteção do núcleo essencial.

● Qual o papel que esses princípios exercem na ponderação? Resposta: Há uma divergência na doutrina mais quanto à nomenclatura e menos quanto ao conteúdo. Por exemplo, Luiz Roberto Barroso chama esses princípios de princípios instrumentais; Ricardo Lobo Torres chama de princípios de legitimação; Humberto Ávila chama de postulados normativos. O sentido que esses autores atribuem a esses princípios é o mesmo. Esses princípios são normas de segundo grau. Por exemplo, dizer que o princípio da proporcionalidade é uma norma de segundo grau significa dizer que a proporcionalidade não é um dos princípios que entra em ponderação, ou seja, ela não é um dos pratos da balança, mas sim a própria balança. Isso porque a proporcionalidade serve, exatamente, para atribuir peso aos outros princípios, para definir qual princípio tem maior peso específico no caso concreto e, conseqüentemente, qual princípio vai ganhar aquela ponderação. Nos casos clássicos de ponderação entre liberdade de informação e direito à intimidade – como o caso da Cicarelli, por exemplo – existem duas opções: ou autoriza a divulgação do vídeo, ou veda. Se autorizar a divulgação, vai defender a liberdade de informação; se vedar, vai defender o direito à intimidade. Essas são normas de primeiro grau. As normas de primeiro grau são normas utilizadas pelo juiz para resolver a lide.

● Por que a proporcionalidade é utilizada como norma de segundo grau? Resposta: Porque ela atua antes, na escolha da norma que vai resolver a lide. Por isto seria errado dizer que o juiz autoriza a divulgação pelo princípio da proporcionalidade. Na verdade, ele autoriza a divulgação do vídeo pela liberdade de imprensa. A não aplicação do princípio de liberdade de imprensa violaria o princípio da proporcionalidade.

● Qual é o conteúdo/ diretriz que a proporcionalidade gera ao intérprete? Resposta: A proporcionalidade se divide em três “subprincípios”:

1. Adequação → Uma medida adotada pelo legislador é adequada quando for apta a concretizar a finalidade a qual ela se destina. Ela não precisa, necessariamente, atingir a finalidade; basta que ela tenha o potencial para atingir.

2. Necessidade → Significa a inexistência de um meio menos gravoso entre os igualmente aptos

para o atingimento de uma finalidade legal. O “teste” da necessidade é mais complicado do que o “teste” da adequação, porque na adequação você analisa, isoladamente, a regra adotada pelo legislador; já o exame da necessidade é comparativo. No exame da necessidade, o juiz pensa da seguinte forma: o legislador adotou a medida x, mas ele poderia ter adotado outras medidas. O juiz tem que cogitar medidas alternativas que o legislador não adotou, mas poderia ter adotado (exemplo: y e z). O juiz vai se perguntar se as outras medidas alternativas protegem igualmente o princípio x e restringem menos os princípios y e z. Se isso acontecer, não passa pelo teste da necessidade.

3. Proporcionalidade em sentido stricto → É uma relação de custo-benefício. Esse é um caso de

ponderação entre princípios constitucionais porque essa medida adotada pelo legislador protege um princípio constitucional x e restringe um princípio constitucional y. O exame da

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proporcionalidade em sentido stricto indaga se as vantagens da proteção ao princípio x superam as desvantagens da restrição ao princípio y. Para que uma medida adotada pelo legislador passe pelo teste da proporcionalidade, ele tem que passar, concomitantemente, pelos três “subprincípios”. Ou seja, um ato só vai observar a proporcionalidade se for adequado, necessário e proporcional em sentido stricto. Se o ato parar em qualquer um desses “subprincípios”, já não observa a proporcionalidade. Portanto, o exame dos “subprincípios” é cumulativo.

Exemplo: (Caso julgado pelo STF) → Uma lei estadual que determinava a obrigatoriedade da pesagem dos bujões de gás, na frente do consumidor. A medida (M1) adotada pelo legislador foi a obrigatoriedade da pesagem dos bujões de gás. Qual o princípio constitucional (P1) que essa medida busca proteger? Resposta: Proteção ao consumidor. E por que M1 precisa proteger o P1? Resposta: Para evitar que o consumidor seja enganado, levando para casa um volume de gás inferior ao que ele está pagando. Qual é o outro princípio (P2) que, por outro lado, é restringido pela M1? Resposta: O princípio da iniciativa (00:59:50), que sofre uma restrição porque isso vai gerar um custo para o empresário, que vai ter que comprar as balanças. Essa medida é adequada para proteger o consumidor? Resposta: A princípio, sim. Nesse caso concreto, porém, havia um problema fático que era quanto às balanças, que não seriam adequadas à pesagem do gás. Esse caso passaria pelos três exames? Resposta: Em tese, passaria pelo exame da adequação. Quanto ao exame da necessidade, fica mais difícil. O STF entendeu que existia uma medida alternativa (M2), a chamada fiscalização por amostragem (um fiscal pegaria aleatoriamente alguns bujões do depósito de gás, levaria para um outro local onde seriam pesados e, depois, devolveria os bujões). Para o empresário, o custo seria mínimo; assim, restringiria menos a livre iniciativa. A crítica que alguns doutrinadores fazem a esse raciocínio do STF é não há a menor dúvida que essa medida restringe menos a lei de iniciativa, mas será que protege igualmente o consumidor? Será que o grau de proteção a consumidor é igual da pesagem do botijão de gás à fiscalização por amostragem. Haveria poucos fiscais para tantos botijões. Na prática, a aplicação do teste da necessidade é mais complicado do que a doutrina diz. A doutrina diz que necessidade significa a inexistência de um meio menos gravoso entre os igualmente aptos para o atingimento de uma finalidade. Porém, quando a doutrina fala isso, ela pressupõe que todas as medidas são igualmente aptas a promover P1; que faltaria o grau de restrição, mas haveria protecao, o que não é verdade: uma medida pode restringir menos o P2, mas também pode proteger menos o P1. Esse caso observa ou não a proporcionalidade em seu sentido stricto, ou seja, os benefícios ao consumidor, trazidos por essa medida, superam as desvantagens da restrição administrativa?

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Resposta: O STF entende que não, por vários argumentos. O principal argumento foi o seguinte: o empresário vai embutir o custo no preço e, então, quem vai pagar vai ser o consumidor. Os malefícios, já que quem arcaria com os custos seria o consumidor, superariam os benefícios. A colocação do STF, no entanto, fora perigosa, pois necessitaria de um grande conhecimento sobre o mercado de gás no Brasil (e não se sabe se o STF tinha esse conhecimento). Isso revela um aspecto importante sobre a proporcionalidade: como diz Barroso, a proporcionalidade é controle do mérito do ato. A proporcionalidade serve para invalidar atos que não violam a letra da lei, mas que mesmo assim são arbitrários. Essa foi a primeira vez que o STF julgou uma lei inconstitucional que violava a proporcionalidade, o STF citou a proporcionalidade e aplicou esse raciocínio dos três subprincípios. Qual é o fundamento normativo da proporcionalidade? Resposta: Há, basicamente, três correntes. A primeira, que é a jurisprudência adotada pelo STF e por Barroso(e, portanto, a que deve ser usada), afirma que o fundamento normativo da proporcionalidade é a cláusula do devido processo legal, no sentido material. Devido processo legal tem duas vertentes: a primeira (tradicional) é a vertente instrumental ou processual. Essa primeira vertente significa as garantias processuais que o devido processo legal contém (direito à defesa, réplica, direito à produção de provas, etc.). A outra vertente é uma vertente substantiva ou material: é exatamente a proporcionalidade. Esta tese surgiu na jurisprudência da Suprema Corte Norte-Americana, na segunda metade do século XIX. A segunda tese surgiu na segunda metade do século XX, pelo Tribunal Constitucional Alemão. Essa tese considera como fundamento da proporcionalidade a cláusula do Estado de Direito. O propósito básico do Estado de Direito é o mesmo propósito do constitucionalismo: limitar, juridicamente, o poder do Estado. O propósito da proporcionalidade é invalidar atos arbitrários/ caprichosos que promovam, por exemplo, distinções arbitrárias entre as pessoas. Então, o objetivo é limitar o poder do Estado pelo Direito; não apenas o direito expresso, mas também o conteúdo de justiça. No Brasil, há uma terceira tese, adotada por Susana de Barros Toledo e por Robert Alexy . Para este, o princípio da proporcionalidade é uma conseqüência natural da previsão de princípios numa ordem jurídica. Isso significa, basicamente, que em qualquer orem jurídica que preveja princípios, existirá a proporcionalidade, ainda que como um princípio implícito. Essa tese é importante e, no Brasil, é adotada por vários autores, com Humberto Ávila e...? Uma das características fundamentais dos princípios é a sua conflituosidade. Isso significa que dificilmente o juiz vai aplicar um princípio sem realizar a ponderação de um princípio com outro princípio. É difícil um princípio ser aplicado sem que se resolva a colisão de um princípio com outro. As Constituições brasileiras as constituições comprimossórias, ou sejam, derivam de ideologias diversas e isso muitas vezes irá gerar conflitos. Com isso, o princípio da proporcionalidade evidencia um papel muito importante na ponderação desses interesses, quando houver colisão entre princípios. (Ver art. 170, CF). É quase inevitável que, na aplicação de um princípio, esse princípio colida com outro. Sem a proporcionalidade, dificilmente o juiz vai resolver essa colisão, ou seja, a proporcionalidade é o principal instrumento de controle da resolução de conflitos. Sem a proporcionalidade, a aplicação dos princípios vai virar “varinha de condão”. A proporcionalidade é um princípio constitucional implícito. O fato da proporcionalidade ser inevitável não impede que se fundamente a proporcionalidade em uma norma constitucional.

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Portanto, esta terceira tese não exclui as outras, mas pode ser com elas usada de forma complementar.

● Razoabilidade e proporcionalidade são sinônimos? Resposta: Para o STF, o conteúdo jurídico da proporcionalidade e da razoabilidade é o mesmo. Para Barroso, a diferença não seria quanto ao conteúdo jurídico, mas apenas quanto à sua origem histórica. A razoabilidade surgiu no Direito Constitucional Norte-Americano, através de uma interpretação construtiva feita pela Suprema Corte da vertente material do devido processo legal; e a proporcionalidade surgiu, também, por interpretação construtiva, feita pelo Tribunal Constitucional Alemão, da cláusula do Estado de Direito. O Tribunal Constitucional Alemão pegou uma idéia de proporcionalidade do direito administrativo e trouxe para o direito constitucional, principalmente para o controle das leis restritivas de direitos fundamentais. Há uma outra posição (minoritária) adotada, por exemplo, por Humberto Ávila, Luis Virgílio Afonso da Silva, Jane Reis, etc. Eles entendem que a diferença não é apenas de origem histórica, mas quanto ao conteúdo. Humberto Ávila, analisando o inteiro teor de decisões judiciais sobre proporcionalidade e razoabilidade e as dividiu em dois grupos, não de acordo com o nome que o STF deu, mas de acordo com o raciocínio que os ministros desenvolveram. Para Humberto Ávila, proporcionalidade significa adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido stricto e envolve, sempre, uma relação de causa e efeito. Para esse autor, há três espécies de razoabilidade:

1. Razoabilidade com eqüidade: Significa a adaptação da generalidade do direito positivo às características particulares do caso concreto. As normas são genéricas e abstratas. As normas são, também, generalizações do caso concreto, lembrando que não há como o legislador prever todos os casos concretos possíveis. A doutrina tradicional diz que não se pode ponderar regras, mas apenas princípios. Há uma outra posição crescente no Brasil, defendida por Humberto Ávila, Barroso, Ana Paula de Barcellos, Daniel Sarnento, etc., que afirma a possibilidade de ponderação de regras, chamada de superação ou derrotabilidade das regras. Humberto Ávila admite a superação de regras em dois casos: quando a aplicação da regra em nada promove a sua finalidade e causa uma grande injustiça (restrição séria); o segundo caso é o caso em que a aplicação de uma regra fere o princípio que lhe é superior.

04 de Setembro de 2007 O Direito Constitucional contemporâneo tem três grandes vertentes: interpretação constitucional, controle de constitucionalidade e direitos fundamentais. Na aula de hoje:

▪ Interpretação constitucional (fechamento);

▪ Controle de Constitucionalidade (início). Vimos, na aula passada, a razoabilidade como congruência (segunda hipótese de razoabilidade, na classificação de Humberto Ávila). A razoabilidade como congruência significa a adaptação do direito à realidade social; ou seja, o direito deve ser fundamento e não pode estar completamente descolado da realidade. O exemplo que Humberto dá é uma decisão do STF que invalidou uma lei estadual que dava um terço de férias para aposentados – pressupõe-se que os aposentados estejam sempre de “férias”.

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Neste caso, a lei concedeu um benefício que tinha como pressuposto fático a atividade, já que só os ativos tiram férias. 3ª espécie de razoabilidade → Razoabilidade como equivalência. O exemplo que Humberto dá disso foi um aumento excessivo da taxa judiciária, no RJ. O valor das taxas é calculado com base no custo do serviço. Então, tem que ter uma relação de equivalência na definição do valor da taxa com o custo do serviço. Como, nesse caso, houve um aumento excessivo da taxa judiciária, deixou de haver essa relação de equivalência entre critério e medida. A taxa passou a ser muito superior ao custo do serviço. Outro princípio aplicável à ponderação é o princípio da concordância prática. Este princípio diz que, num conflito entre princípios constitucionais, o intérprete deve promover a mínima restrição possível entre os princípios em jogo. Em outras palavras, ele deve otimizar, ao máximo, a aplicação dos princípios que entram em conflito. O exemplo que o Barroso dá o seguinte: Quando ele próprio morava em Copacabana, havia um pastor que, rigorosamente, às sete horas da manhã de domingo fazia uma pregação na praça, em frente à sua casa, com um megafone. Neste caso, há um conflito entre direitos: ao exercício do culto religioso e o direito ao repouso. Não é razoável, por um lado, proibir o pastor de fazer aquele culto aos domingos, já que é um dia especial para sua religião. Por outro lado, vê-se que há uma restrição do direito ao repouso. O que se tem que fazer, na verdade, é, ao invés de se afastar totalmente a aplicação do princípio, tentar conciliar; restringir um pouco para acomodar outros princípios. Então, mais razoável do que qualquer uma das duas soluções radicais é, por exemplo, dizer que ele pode pregar a partir do meio-dia. Esse exemplo prova que a solução preferencial na resolução de um conflito entre princípios é a acomodação entre os princípios, ou seja, estabelecer restrições mínimas aos princípios para que amos sejam aplicados. Só se admite a não aplicação de um princípio se essa for a única solução possível. Um outro princípio, mais complexo, é o princípio da proteção ao núcleo essencial. Este princípio foi objeto de expressa norma constitucional, por exemplo, na Alemanha e na Espanha. Não Brasil, não há uma norma constitucional específica que preveja esse princípio; mas, segundo a doutrina amplamente majoritária, esse é um princípio constitucional implícito. A doutrina diz que os princípios constitucionais têm um núcleo essencial, que é um âmbito mínimo de proteção que é intangível ou seja, que não pode ser restringido. Para entender o sentido desse princípio, é necessário entender uma discussão anterior:

● Os princípios constitucionais podem ser objeto de restrição do legislador, por exemplo? Resposta: Há duas teorias quanto a esta questão: teoria interna e teoria externa. O principal autor da teoria interna é Frederich Miller. Ele diz que o legislador não pode restringir um princípio constitucional porque o princípio constitucional é hierarquicamente superior à lei. Sendo assim, ele só pode ser restringido por outra norma constitucional. Na verdade, a única hipótese em que a teoria interna admite a restrição de um princípio constitucional é na hipótese da própria norma constitucional prever essa restrição. Ou seja, a princípio, só uma norma constitucional pode restringir outra norma constitucional, exceto se a própria norma constitucional restringida tiver uma previsão autorizando a restrição pelo legislador. Por exemplo: A norma constitucional tem a expressão “na forma da lei” ou “mediante lei” ou “nos termos da lei”. São expressões que permitem que o legislador, no futuro, restrinja essa norma constitucional. Fora deste caso, o legislador só pode configurar a norma constitucional, porque a

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configuração ou regulamentação é apenas um esclarecimento do que diz a norma constitucional. Trata-se do princípio da supremacia da constituição: se ela é superior à lei, esta não pode restringi-la. Esta tese também é defendida, no Brasil, por José Afonso da Silva (em “A aplicabilidade das normas constitucionais”). Antigamente, esta era a posição majoritária. Hoje, está quase em mesmo nível em relação à teoria externa. A teoria externa é defendida por Jane Reis, Humberto Ávila e Luiz Virgílio Afonso da Silva. Os adeptos da teoria externa dizem que os princípios constitucionais podem ser restringidos pelo legislador mesmo que não haja uma autorização expressa da norma constitucional – são as chamadas restrições implicitamente autorizadas pela Constituição. Apesar de parecer que a teoria externa viola a supremacia da Constituição, Alexy (outro defensor desta teoria) diz que a teoria interna seria ótima se fosse factível, porque, na prática, ela é inviável. As restrições feitas pelo legislador são inevitáveis, principalmente no âmbito de Constituições compromissórias, o legislador tem que ponderar princípios constitucionais. É muito comum, na doutrina, o equívoco de achar que só o Judiciário pondera. O legislativo também pondera princípios constitucionais quando edita leis. Para provar que não uma violação à supremacia constitucional, Alexy diz que lei pode restringir um princípio constitucional, mas o fundamento desta restrição tem que ser uma outra norma constitucional. Para ele, a lei pode ser instrumento dessa restrição, mas o fundamento dessa restrição é sempre uma norma constitucional. Hoje em dia, esta parece ser a melhor tese. A teoria externa diz que o legislador pode restringir os princípios fundamentais, dentre os quais, os direitos fundamentais. O problema é saber até que ponto o legislador pode restringir os direitos fundamentais. Este é o chamado problema do limite dos limites. Os limites dos limites são os limites às restrições aos direitos fundamentais. Uma restrição a um direito fundamental só vai ser legítima se observardo o princípio da proporcionalidade, da razoabilidade, da isonomia, a concordância prática e a proteção do núcleo essencial. A proteção do núcleo essencial – serve para saber até que ponto o legislador pode restringir um princípio constitucional – tem um âmbito mínimo de proteção que o legislador nunca pode restringir. Qualquer restrição legislativa sobre o núcleo essencial vai ser inconstitucional. Além disso, há duas grandes divergências, na doutrina, sobre o que significa essa proteção. A primeira divergência se refere ao objeto de proteção, ou seja, o que o núcleo essencial protege. (OBS.: O melhor livro sobre este assunto é o da Jane Reis).

Há três teorias sobre esse assunto: A primeira teoria é a teoria objetiva. Esta teoria diz que o princípio do núcleo essencial protege apenas a norma que prevê o direito e não o próprio direito subjetivo. Então, o princípio do núcleo essencial, segundo a teoria objetiva, significa apenas uma proteção contra a revogação da norma. Existem casos de ponderação entre direitos fundamentais em que não é possível se aplicar o princípio da concordância prática, ou seja, tem que se afastar a aplicação de um dos princípios. Exemplo: O caso da Cicarelli. Não tem jeito: ou o juiz vai autorizar a veiculação do vídeo (protegendo a liberdade de informação), ou vai proibi-la (protegendo o direito à intimidade). Em casos assim, é difícil dizer que o princípio do núcleo essencial protege o direito subjetivo em si. Como, então, justificar que aquele direito está sendo protegido, se há um afastamento completo? Tendo em vista esse problema, a teoria objetiva diz que só o que se protege é a norma.

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O problema da teoria objetiva é criticado pela teoria subjetiva. Esta sustenta que o objeto de proteção do princípio do núcleo essencial é o direito subjetivo conferido ao indivíduo. Por certo ponto de vista, esta teoria é até melhor, pois protege mais. Para o indivíduo, pouco importa se a norma vai ser revogada ou não: ele apenas quer a tutela do seu direito. Por outro lado, ele tem o problema de justificar os casos em que se afasta completamente um dos direitos. Exemplo: A prisão perpétua (supressão completa do direito da liberdade). A teoria subjetiva não justifica este caso. A teoria que a Jane Reis adota é uma teoria mista, que conteria as duas teorias anteriores. Esta teoria diz que os direitos fundamentais têm duas dimensões complementares: dimensões subjetivas e dimensões objetivas. Dimensão subjetiva é a dimensão tradicional (os direitos fundamentais são os direitos subjetivos do cidadão contra o Estado). A dimensão objetiva diz que os direitos fundamentais incorporam valores que se irradiam por toda a ordem jurídica. Se essas dimensões são complementares, ambas as dimensões devem ser objeto de proteção do núcleo essencial (tanto a norma que protege o direito fundamental quanto o direito subjetivo). Ao fim, a teoria mista é a mais protetiva de todas. Essa divergência é quanto ao objeto de proteção. Uma segunda vertente se refere quanto à intensidade ou quanto à natureza da proteção. Quanto a isto, existem duas teorias: teoria relativa e teoria absoluta. A teoria relativa é a de Robert Alexy e é adotada, no Brasil, por Luiz Virgílio Afonso da Silva. Alexy diz que proteção do núcleo essencial é igual à proporcionalidade. Em outras palavras, núcleo essencial “é aquilo que sobra depois da ponderação”. Para saber o que é o núcleo essencial de um direito fundamental, por exemplo, é preciso ponderar esse direito fundamental com outros direitos fundamentais e, então, o resultado dessa ponderação será o núcleo essencial. O problema desta teoria é que o princípio do núcleo essencial em nada acrescenta à proporcionalidade. O princípio do núcleo essencial seria apenas um reforço da necessidade de utilizar a proporcionalidade. Portanto, esta é uma teoria que protege pouco. A outra teoria – que é a majoritária, no Brasil (Humberto Ávila, Daniel Sarnento, etc.)– é a teoria absoluta. Sustenta que o núcleo essencial é um âmbito de proteção intangível e que é determinado mesmo antes da ponderação. Humberto Ávila dá um exemplo: uma lei promove uma restrição ao âmbito de proteção do núcleo essencial do princípio constitucional X, com base no princípio constitucional Y. Essa restrição é constitucional? Resposta: Depende de ser observada a proporcionalidade. E se a restrição, feita por lei, tocar no núcleo essencial será constitucional ou inconstitucional? Resposta: Segundo a teoria absoluta, qualquer intervenção legislativa que toque o núcleo essencial vai ser inconstitucional sempre, porque para a teoria absoluta, o núcleo essencial é um âmbito de proteção intangível. Humberto Ávila dá um exemplo interessante para diferenciar o nível de proteção do núcleo essencial: Uma lei estadual que institui a obrigação dos supermercados etiquetarem os produtos. Essa lei observa o princípio da proporcionalidade e o princípio do núcleo essencial? Resposta: Com esta medida, o legislador buscou proteger o consumidor. O princípio constitucional restringido por essa medida foi a livre iniciativa (já que isso gera um custo para o empresário). Essa restrição não fere o núcleo essencial porque o custo não é tão grande a ponto de gerar quebra. Quanto à proporcionalidade, é preciso observar o exame dos três subprincípios. Conforme ou não o mérito da

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solução, esse exemplo serve para mostrar que o exame da proporcionalidade é diferente do exame do núcleo essencial, já que proporcionalidade não se confunde com núcleo essencial, ao contrário do que diz a teoria relativa. Uma restrição feita por lei, que esteja no âmbito de proteção mais amplo, vai ser condicional desde que observe o princípio da proporcionalidade. Barroso e Ana Paula Barcellos têm uma tese de que o núcleo essencial dos princípios constitucionais tem natureza de regra e não de princípio. Ou seja, os núcleos essenciais não podem ser objetos de nenhuma restrição feita pelo legislador e são imediatamente aplicáveis, mesmo sem lei que os regulamente. Princípios e valores são sinônimos? Resposta: Não. Princípios são normas jurídicas, ou seja, princípios estabelecem algo que é obrigatório, já que são normas jurídicas. Os valores determinam apenas coisas que são boas/ desejáveis, mas não são normas jurídicas, não sendo, portanto, obrigatórios. Contudo, indubitavelmente, princípios incorporam valores morais.

CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE ► Indicação bibliográfica:

▪ BARROSO;

▪Jurisprudência do STF (ler sempre os informativos!);

▪CLÉVE, Clemerson Merlin. A fiscalização abstrata da constitucionalidade. ;

▪BINENBOJM, Gustavo.A nova jurisdição constitucional. Teoria Geral da Inconstitucionalidade das Leis (Nova jurisdição constitucional) Essa teoria se mantém – pelo menos nas características principais – inalterada há mais de duzentos anos. Essa teoria remonta o caso Marbury X Madson. Este caso foi julgado pela Suprema Corte Norte-Americana em 1803 e ele é tido como o primeiro caso de reparação da inconstitucionalidade das leis pelo Judiciário (relator: juiz Marshal). Hoje, muitas vezes, esta teoria é chamada lógica de Marshal. O raciocínio foi o seguinte: a Constituição dos EUA (1787) não previa expressamente o controle da constitucionalidade pelo Judiciário. Havia alguns dispositivos que davam pistas, nesse sentido – principalmente a chamada cláusula da supremacia. Mais importante do que isso, porém, foi o raciocínio desenvolvido (que está, até hoje, nos livros e manuais sobre controle de constitucionalidade, como fundamento da inconstitucionalidade das leis). A primeira coisa que o juiz Marshal disse foi o seguinte: a Constituição resulta da vontade suprema ou da vontade constituinte do povo; enquanto as leis resultam da vontade dos representantes do povo. As Constituições têm uma finalidade específica: implantar um Estado de Direito (limitação jurídica do poder do Estado pelo Direito para a proteção do indivíduo). A Constituição é obrigatória para os três poderes do Estado (Judiciário, Executivo e Legislativo). Marshal dizia que, se a Constituição tem esse propósito, havendo conflito entre um ato desses poderes (principalmente leis) e a Constituição, esta tem que ganhar esse conflito, ou então, não limitaria nada. A idéia de que a Constituição ganha da lei é uma

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conseqüência da supremacia da Constituição. Portanto, uma lei inconstitucional, por exemplo, é nula de pleno direito porque contraria o seu fundamento de validade. A questão é: Por que cabe ao Judiciário – e não ao Executivo ou ao próprio Legislativo – declarar essa inconstitucionalidade? Resposta: Marshal respondeu que, na verdade, o que se tem na hipótese de inconstitucionalidade de uma lei é um conflito entre normas jurídicas (norma constitucional e lei); e a resolução do conflito entre normas jurídicas é atividade típica do Poder Judiciário. Com isso, Marshal sustenta que a competência do Judiciário de declarar a inconstitucionalidade das leis é inerente ao Judiciário. Esta é, portanto, a teoria geral da inconstitucionalidade das leis, que vem sendo repetida até hoje. A doutrina que estudou a questão da supremacia da Constituição com mais profundidade teria a seguinte objeção: a supremacia da Constituição parte de uma premissa que é, no mínimo, controvertida. A premissa fundamental de toda essa tese é que a Constituição resulta da vontade do povo, enquanto as leis resultam da vontade dos representantes do povo. Mas, por que a Constituição resulta da vontade do povo se ela é escolhida por uma Assembléia Constituinte? Esta é a grande questão. Então, surgiu uma tese dos chamados pré-compromissos constitucionais, que foi trazida para o constitucionalismo por um cientista político chamado John Elster e que foi, no Brasil, adotada de forma pioneira por Oscar Vilhena Vieira. Na verdade, John Elster traz um conto mítico de Ulisses e as sereias. Foi relatado, na “Odisséia” (Homero), que Ulisses, marinheiro, ao passar por um lugar onde as sereias residiam, temeroso por seduzir-se pelo canto das sereias, pede à sua tripulação para ser amarrado ao mastro para que ele não ceda ao canto das sereias. O paralelo que se faz entre o ato de pedir para ser amarrado e o momento em que o povo edita sua Constituição é que, no momento em que o povo edita sua Constituição, ele estabelece um pré-compromisso para que neste momento de lucidez se afaste possibilidades de ceder a atitudes irracionais. No momento em que o povo edita uma Constituição, ele retira do dia-a-dia da política valores fundamentais. O constituinte, inspirado por um momento mais racional, retira valores fundamentais do dia-a-dia do processo político.

Espécies de inconstitucionalidade A primeira distinção que se faz é entre inconstitucionalidade formal e inconstitucionalidade material. Inconstitucionalidade formal → Representa um vício de procedimento ou de competência na edição de uma norma de lei. Exemplo 1: Um projeto de lei é aprovado pela Câmara, com modificações feitas pelo Senado. O que deve ser feito neste caso é uma devolução à Câmara para que ela aprecie as modificações. Supondo que isto não tenha sido feito e que o projeto tenha sido encaminhado diretamente ao Presidente da República para receber a sanção ou o veto. A hipótese, neste caso, é de inconstitucionalidade formal. Digamos – pelo mesmo exemplo – que os artigos 1º ao 8º tenham sido aprovados pela Câmara e, então, o Senado introduziu os artigos 9º e 10º. Todo o projeto de lei foi enviado ao Presidente da República e este sancionou, promulgou e publicou, fazendo entrar em vigor a nova lei.

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A inconstitucionalidade incide só sobre os dispositivos inseridos pelo Senado ou sobre todo o projeto de lei? Resposta: A princípio, só incide sobre os dispositivos inseridos pelo Senado. Exemplo 2: Determinadas matérias só podem ser tratadas por lei complementar. Digamos que seja aprovada uma lei ordinária sobre uma dessas matérias. A hipótese, aqui, também é de inconstitucionalidade informal. O caso mais freqüente, na prática, de inconstitucionalidade formal é o de vício de iniciativa. Existem matérias cujo projeto de lei só pode ser apresentado por determinadas autoridades. A hipótese de iniciativa privativa ais importante é a iniciativa privativa do chefe do Poder Executivo (art. 61, §1º, CF20). A inconstitucionalidade formal pode se dar, também, por vício de competência. Alguns autores chamam as primeiras hipóteses tratadas aqui de inconstitucionalidade formal procedimental, porque o vício é de procedimento. Esses autores consideram que há outra hipótese: a inconstitucionalidade formal orgânica, quando o vício é de competência. Exemplo 1: Quando o Executivo edita uma medida provisória sobre uma matéria que não pode ser objeto de MP, só de lei. Trata-se de um vício de competência porque só é permitido que o Legislativo legisle, neste caso. Exemplo 2: Um Estado edita uma norma de competência da União. Análise de caso: Digamos que a Constituição anterior diz que a competência para legislar sobre determinada matéria é da União. Vem a nova Constituição e transfere a competência para os Estados. Essa lei federal foi recepcionada pela nova Constituição? Resposta: Como a incompatibilidade é formal, a lei foi recepcionada pela nova Constituição. Não há não recepção formal; a não recepção é sempre pela incompatibilidade material. Neste caso, lei estadual pode revogar lei federal? Resposta: Pode. A própria CF autorizou ao transferir a matéria para a competência legislativa do estado.

20 § 1º - São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que: I - fixem ou modifiquem os efetivos das Forças Armadas; II - disponham sobre: a) criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração; b) organização administrativa e judiciária, matéria tributária e orçamentária, serviços públicos e pessoal da administração dos Territórios; c) servidores públicos da União e Territórios, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria;(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998) d) organização do Ministério Público e da Defensoria Pública da União, bem como normas gerais para a organização do Ministério Público e da Defensoria Pública dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios; e) criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública, observado o disposto no art. 84, VI (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001) f) militares das Forças Armadas, seu regime jurídico, provimento de cargos, promoções, estabilidade, remuneração, reforma e transferência para a reserva.(Incluída pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)

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Imagine que, de acordo com o caso em análise, o Estado do Rio de Janeiro legisle e o Estado de São Paulo não. O que acontece é que, no Estado do Rio de Janeiro, vale a lei estadual e no Estado de São Paulo continua valendo a lei federal, até que o Estado edite sua lei. E se a hipótese for invertida: a competência que era dos Estados, pela nova Constituição, passa a ser da União. As leis estaduais terão sido recepcionadas? Resposta: A lógica é a mesma. Se a incompatibilidade é formal, sim, porque não há não recepção formal. Nesse caso, lei federal pode revogar lei estadual que foi recepcionada? Resposta: Pode, porque a competência passou a ser da União. Inconstitucionalidade material → Ocorre quando há uma incompatibilidade de conteúdos entre a lei e norma constitucional. A distinção mais importante se dá entre inconstitucionalidade por ação e inconstitucionalidade por omissão. Antes dessa discussão é preciso entender que as normas constitucionais são normas coercitivas/ obrigatórias, ou seja, não são normas que podem ser afastadas por vontade das partes. Elas se apresentam, basicamente, em duas versões: normas proibitivas (proíbem determinada conduta) e normas preceptivas (impõem a prática de determinada conduta). A conseqüência disto é que a Constituição tanto pode ser descumprida, caso se pratique a conduta que é vedada pela CF ou caso se deixe de fazer aquilo que a CF impõe. A inconstitucionalidade de por ação ocorre quando se pratica algo que é proibido pela CF, ou seja, quando se descumpre uma norma proibitiva. Mais interessantes são as hipóteses de inconstitucionalidade por omissão. Para caracterizar a inconstitucionalidade por omissão basta uma inércia, por não agir, do legislador? Resposta: Não, porque, a princípio, não legislar é uma opção legítima do legislador. Os requisitos para caracterizar a inconstitucionalidade por omissão são:

1. Descumprimento de um dever constitucional específico de legislar. 2. Estado de mora legislativa.

OBS.: Mora legislativa – Será que alguém, um dia depois de editada a CF/88 pode entrar com uma ADI ou com um Mandado de Injunção, sustentando que há uma inconstitucionalidade por omissão? Resposta: Não, porque não houve tempo de legislar. Deve haver um prazo razoável para legislar. Uma distinção muito importante dentro da inconstitucionalidade por omissão é uma que nem toda a doutrina faz. Quem melhor trata disso é o Gilmar Ferreira Mendes. Ele diz que há dois tipos de inconstitucionalidade por omissão: total e parcial. A inconstitucionalidade por omissão total é a mais fácil: é o caso em que estão presentes os dois requisitos: dever constitucional específico de legislar e mora legislativa.

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A inconstitucionalidade por omissão parcial é mais complicada: neste caso, alguma norma foi editada. Então, se há norma, por que a hipótese não é tratada como inconstitucionalidade por ação? Resposta: Porque essa norma tem dois possíveis vícios. O primeiro é a não extensão do benefício nela contido a grupos, por força do princípio da isonomia, deveriam recebê-lo. Este é um vício que se dá no plano subjetivo, do destinatário. O outro vício que pode se dar é no plano objetivo, que é o fato da lei que regulamenta a norma constitucional não explorar plenamente todas as potencialidades da norma constitucional. Exemplo (plano subjetivo): A lei regulamentando o art. 37, X, CF21. O legislador faz a revisão dos vencimentos dos medicos pediatras, por exemplo. E, sem justificativa alguma, não promovem a revisão dos vencimentos dos médicos cardiologistas, que estão com os vencimentos igualmente defasados, havendo uma violação à isonomia. As possibilidades de decisão do Judiciário, aqui, são três:

1. Invalidar a lei que deu o benefício, alegando ser inconstitucional (viola o princípio da isonomia). O problema prático desta decisão é que não resolveria a inconstitucionalidade, mas a agravaria, porque não estenderia a quem merecia e, ainda, tiraria de quem recebeu. Por isso o Judiciário não trata esta hipótese como de inconstitucionalidade por ação.

2. Estender o benefício. Como os médicos pediatras estão na mesma situação que os médicos cardiologistas, houve uma violação à isonomia, pelo fato destes não terem sido incluídos pelo legislador. O problema dessa possibilidade de decisão é que o Judiciário atuaria como legislador positivo. Há, inclusive, uma súmula (Súmula 339/STF), que impede o Judiciário de tomar esta decisão a pretexto de concretizar a isonomia.

3. Considerar a hipótese como de inconstitucionalidade por omissão parcial. É a possibilidade de decisão que o STF entende ser a melhor. O Judiciário nem invalida a lei nem estende os benefícios; ele apenas declara a omissão do legislador em não estender ao grupo o benefício que mereceria, pela isonomia.

Se o Judiciário adotar sempre a terceira posição, isso significa que o princípio da isonomia vai ser observado quando quiser, pelo legislador, já que este não vai ter obrigatoriedade nenhuma. De fato, o STF oscila entre a segunda e a terceira técnica de decisão. O problema é que o STF não fundamenta o porquê que ele, às vezes, se limita a declarar e o porquê que ele, outras vezes, estende. Por exemplo: O aumento de 28,86% dado aos militares do governo de Fernando Henrique. O STF estendeu para todos os servidores federais civis e não citou a súmula 339. O STF teria que criar parâmetros para fundamentar suas escolhas de solução. Praticamente não existe doutrina sobre isso. Ouve uma discussão que gerou alguns parâmetros para definir quando o Judiciário deveria estender e quando ele deveria se limitar a declarar. Na verdade, o que se tem, neste caso, é uma ponderação entre o princípio constitucional da isonomia e o princípio da

21Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) X - a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) (Regulamento)

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separação de poderes (legalidade orçamentária). Se a isonomia ganhar, se estende; se a separação de poderes ganhar, se limita. Há dois parâmetros específicos para essa ponderação:

1. A repercussão financeira da extensão do benefício pelo Judiciário. Ou seja, quanto maior a repercussão financeira da extensão do benefício, menor deve ser o Judiciário em estender.

2. Quanto mais clara e evidente for a violação à isonomia, mais propenso o Judiciário vai ser em estender o direito.

Exemplo (plano objetivo): É o caso do salário mínimo. Religiosamente, quando é editada uma lei de salário mínimo, o PDT entra com uma ADI, dizendo que o valor do salário mínimo não atende o que o art. 7º, IV, CF22 manda. Portanto, há uma inconstitucionalidade. Neste caso, o STF também tem as três possibilidades de decisão. O STF deve invalidar esse valor do salário mínimo? Resposta: Não. Se o STF declarar a inconstitucionalidade do salário mínimo, voltaria a viger a lei revogada anterior que fixava um salario ainda menor para salario minimo(efeito repristinatorio). Ao invés de sanar a inconstitucionalidade, esta seria agravada. A outra possibilidade é o STF encomendar um estudo para o IBGE para saber qual valor atende aos requisitos do art. 7º, IV, CF. Não seria viável, porque o Judiciário não tem legitimidade democrática para isso. O mais viável, portanto, seria simplesmente declarar que o salário mínimo não atende ao art. 7º, IV, CF. 18 de Setembro de 2007 Nas outras aulas de controle de constitucionalidade, abordamos aspectos mais gerais. Hoje, entraremos do controle de constitucionalidade do direito brasileiro. Relembrando...

Controle incidental e difuso Apesar de se falar no direito brasileiro do controle incidental e difuso como se fossem a mesma coisa, não são; são classificações diferentes. Ao falar do controle incidental, nos referimos ao modo do exercício do controle, ou seja, como esse controle é exercido. Essa forma incidental do exercício do controle significa que o juiz analisa a questão do controle de constitucionalidade como uma questão prejudicial à resolução do mérito, no caso concreto. Então, há uma lide posta perante o Judiciário e o juiz, com uma questão prejudicial à resolução do mérito dessa lide resolve a questão de inconstitucionalidade de uma lei ou de um ato normativo.

22 Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: IV - salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim;

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Essa forma de exercício tem várias conseqüências. A primeira delas, que é importante, é o seguinte: o controle incidental se dá no exercício normal da jurisdição. O que se quer dizer com isso é o seguinte: o exercício normal da jurisdição é a aplicação da lei a um caso concreto para resolver uma lide. Nos processos, em geral, é isso o que o juiz faz, também, no controle incidental. Outra questão importante é que se é uma questão prejudicial, o juiz decide na fundamentação, e não no dispositivo da decisão. Se o juiz decide na fundamentação, não faz coisa julgada. Conseqüentemente, para a doutrina majoritária, os efeitos serão inter partes, e não erga omnes. O fato de o controle ser difuso é uma questão relativa à competência, ou seja, que órgãos podem declarar a inconstitucionalidade de uma lei. Então, quando se fala que o controle é difuso, se quer dizer que todo juiz do tribunal tem competência para declarar a inconstitucionalidade da lei. Então, no direito brasileiro, o controle incidental é difuso. Pode-se dizer, portanto, que no direito brasileiro todo juiz de um tribunal pode, com uma questão prejudicial à análise julgada do mérito de uma lide, declarar a inconstitucionalidade de uma lei. Essas são as características gerais do controle incidental e difuso. Qual é o dispositivo na Constituição que prevê o controle difuso e incidental? Resposta: Na verdade, não tem dispositivo que preveja esse controle de forma expressa, porque essa é uma tradição que o Brasil herdou da Constituição norte-americana. No caso Marbury X Madson, o juiz Marshall construiu o controle de constitucionalidade por vários dispositivos, mas não havia a previsão expressa, assim como não há, na Constituição brasileira, sobre o controle incidental. Mas, apesar de não haver uma previsão expressa, há dispositivos nos quais se pode inserir/ construir o controle incidental de constitucionalidade. O principal deles é uma das hipóteses de cabimento de recurso extraordinário, que o art. 102, III, b, CF23. Cabe recurso extraordinário de decisão que declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal. Se cabe recurso extraordinário de decisão que declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal, é porque os juízes dos tribunais, em geral, podem declarar a inconstitucionalidade das leis. Não há uma positivação expressa: inserimos num dispositivo à cerca do cabimento do recurso extraordinário o controle incidental e difuso de constitucionalidade. Quem pode suscitar a inconstitucionalidade no controle incidental? Resposta: Tanto o autor quanto o réu podem alegar a inconstitucionalidade de uma lei para que o juiz a declare inconstitucional incidentalmente. Por isso que tem algumas denominações que não estão adequadas, como, por exemplo, controle por via de exceção ou por via de defesa. São nomes que são usados como sinônimos do controle incidental, mas, na verdade, o controle incidental é uma denominação mais técnica do que controle por via de exceção ou por via de defesa, porque nem só o réu pode alegar. O autor também pode alegar a inconstitucionalidade da lei.

23 Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida: b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal;

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Além do autor e do réu, o MP, terceiros interessados e mesmo o juiz de ofício pode declarar a inconstitucionalidade de uma lei porque se trata de uma questão de ordem pública. Qual é o momento adequado para a alegação do autor ou do réu? Resposta: Na inicial e na contestação, respectivamente. Se eles não fizerem nos momentos adequados, isso gera a preclusão? Resposta: Não, pois é questão de ordem pública. Contudo, deve conciliar essa questão (ser de ordem pública) com uma outra questão, que é o pré-questionamento. Conciliando essas duas idéias, as partes devem alegar até o segundo grau de jurisdição, porque caso as partes aleguem em apelação ou contra-razões, elas vão dar oportunidade do tribunal se pronunciar sobre a constitucionalidade ou não da lei. Então, se ele não se pronunciar – apesar de provocado – cabe embargo de declaração, com efeito de pré-questionamento. Quem pode declarar a inconstitucionalidade no controle incidental e difuso? Resposta: Se o controle é difuso, qualquer juiz de um tribunal pode declarar a inconstitucionalidade da lei. Um desembargador ou Ministro do STJ ou do STF pode declarar, sozinho, a inconstitucionalidade da lei? Resposta: Só se já houver decisão do STF. Se não houver, a regra geral é que não. Há um princípio chamado princípio da reserva de plenário (art. 97, CF24) – também criado pela jurisprudência da Suprema Corte Norte-Americana – que já está, desde a CF de 1934, previsto no Brasil. Ele diz que somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público. Então, um tribunal só pode declarar a inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo pelo voto da maioria absoluta dos seus membros. Logo, um órgão fracionário, por exemplo, não tem competência para declarar a inconstitucionalidade de uma lei. Este princípio (reserva de plenário) causa, de certa forma, um espanto porque um juiz de primeira instância pode afastar uma lei por inconstitucionalidade, mas um desembargador não pode. O que acontece quando se chega uma alegação de inconstitucionalidade no tribunal, por exemplo, no âmbito de uma apelação cível? Resposta: O tribunal deve apreciar essa alegação de inconstitucionalidade. Se o órgão fracionário entender que não é plausível, ou seja, que a lei é flagrantemente constitucional, então o órgão fracionário pode apreciar as outras questões, inclusive o mérito. Então, o órgão fracionário pode reconhecer a constitucionalidade, mas não pode reconhecer a inconstitucionalidade, pelo princípio da reserva do plenário. Já se o órgão fracionário entender que a lei é inconstitucional, ele assim não a pode declarar. O que o órgão fracionário deve fazer é submeter a questão a órgão especial ou tribunal pleno. O que o órgão fracionário deve submeter a órgão especial ou tribunal pleno é apenas a questão prejudicial de inconstitucionalidade, e não todo o julgamento da lide. Isso é o que Barbosa Moreira chama de cisão funcional de competência. Isso porque a competência, para julgar uma lide só é dividida em dois órgãos judiciais: o órgão especial, que vai julgar a questão prejudicial de inconstitucionalidade e

24 Art. 97. Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público.

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o órgão fracionário, que vai julgar as outras questões, incluindo o mérito. A cisão funcional de competência é, portanto, uma divisão entre órgãos judiciais da competência para julgar a mesma lide. O procedimento disso se dá da seguinte forma: o órgão fracionário aprecia a questão prejudicial de constitucionalidade. Considerando-a constitucional, julga logo as outras questões, inclusive o mérito. Considerando-a inconstitucional, como ele próprio não pode declarar – pelo princípio da reserva do plenário – submete só a questão prejudicial ao órgão especial e, então, o órgão especial vai se pronunciar quanto à questão prejudicial. Depois do órgão especial se pronunciar sobre essa questão prejudicial, devolve a questão ao órgão fracionário para apreciar as demais questões. Cabe recurso extraordinário da decisão do órgão especial? Resposta: Os pressupostos de recuso extraordinário são até preenchidos, mas não cabe por sua natureza jurídica: isso é uma cisão funcional de competência, ou seja, o julgamento da lide vai ser composto por dois julgamentos, na verdade. É como se a decisão do órgão especial e a decisão do órgão fracionário se fundisse em um acórdão só, que é o acórdão que vai decidir a lide. Então, o órgão especial vai se pronunciar só sobre a questão prejudicial de constitucionalidade e o órgão fracionário sobre as demais questões. Não cabe recurso extraordinário porque essa é uma decisão parcial, que julgou apenas parte da causa (só a questão prejudicial de constitucionalidade). Na verdade, falta ainda o órgão fracionário decidir as demais questões. E só caberá recurso especial aqui da decisão do órgão fracionário. Exemplo: O órgão especial julgou a lei constitucional, mas eu acho que o órgão especial errou: ele deveria ter julgado a lei inconstitucional. O recurso em que eu vou questionar isso é o recurso extraordinário, só que eu não vou interpor recurso extraordinário da decisão do órgão especial; eu vou esperar voltar para o órgão fracionário, deixar que ele se pronuncie sobre o mérito da questão e, então, será possível interpor recurso extraordinário, ainda que eu questione uma questão que foi discutida pelo órgão especial. Há uma exceção em que o órgão fracionário pode, ele próprio, reconhecer a inconstitucionalidade da lei: é a hipótese do art. 481, parágrafo único, CPC25. É a hipótese em que o STF ou próprio órgão especial já tenha declarado a inconstitucionalidade da lei. Essa decisão do órgão especial ou do STF que declarou a inconstitucionalidade – que autoriza que o próprio órgão fracionário também declare – é uma decisão de controle abstrato ou tanto faz, ou seja, o controle tem que ser abstrato ou pode ser incidental? Resposta: Pode ser também incidental, porque no controle abstrato, a decisão já tem efeito erga omnes. Na verdade, a grande inovação do art. 481, parágrafo único, CPC foi autorizar que, mesmo nas hipóteses em que o STF ou órgão especiais tenham conhecido incidentalmente a inconstitucionalidade de uma norma, o órgão fracionário possa seguir a orientação do STF ou órgão especial sem enviar, novamente, o processo.

PAPEL DO SENADO

25 Parágrafo único. Os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário, ou ao órgão especial, a argüição de inconstitucionalidade,

quando já houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão. (Incluído pela Lei nº 9.756, de

17.12.1998)

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Se formos ao art. 52, X, CF, veremos que a CF disse que cabe ao Senado suspender a execução de lei declarada inconstitucional pelo STF. O STF suspende essa execução através de uma resolução. Na verdade, essa competência do Senado foi introduzida pela CF/1934 para resolver um problema (brasileiro) da importação do modelo norte-americano de controle incidental e difuso de constitucionalidade sem a doutrina dos precedentes vinculantes, que é exatamente a doutrina do Estado de exercícios. Estado de exercícios é a idéia de que os juízes e tribunais estão vinculados às decisões da Suprema Corte. No Brasil, não tínhamos essa idéia de que as decisões da Suprema Corte tinham efeito vinculante. Essa era uma idéia dos sistemas jurídicos da common law (direito costumeiro). No Brasil, adoramos o controle incidental e difuso de constitucionalidade sem a idéia dos efeitos vinculantes das decisões da Suprema Corte. Ainda existe esse problema no Brasil; porém, hoje, um pouco menor – com a introdução da EC03/93 – que era o seguinte: Exemplo: Surge uma controvérsia, no direito brasileiro, sobre a constitucionalidade de uma lei previdenciária que atinge cinqüenta mil pensionistas e aposentados. Metade do Judiciário brasileiro entende que aquela lei é inconstitucional e a outra metade entende que é constitucional. Assim, leva dez anos para a questão chegar ao STF. Chegando, finalmente, ao STF, este decide pela constitucionalidade ou inconstitucionalidade da lei. A expectativa é que a decisão do STF seja final, pacificando a controvérsia, porque é função do STF uniformizar a jurisprudência constitucional. O efeito das decisões do controle incidental é inter partes. Como essa questão chegou ao STF como recurso extraordinário, aquela decisão do STF só produz efeitos para as partes daquele processo. Em outro processo que é substancialmente idêntico, a decisão do STF não se aplica, só porque as partes não são as mesmas. Esse é um sistema caótico, que não prestigia os princípios da isonomia e da segurança jurídica. Isso porque casos iguais podem receber decisões diferentes do judiciário e não se tem a mínima previsibilidade da decisão que o Judiciário vai proferir. Para tentar sanar ou minimizar esse problema, o constituinte de 1934 criou essa competência para o Senado Federal. A possibilidade de o Senado suspender a eficácia de lei declarada inconstitucional pelo STF é exatamente a possibilidade do Senado estender os efeitos das decisões proferidas no controle incidental, ou seja, transformar uma decisão que só tinha efeitos inter partes em uma decisão de efeitos erga omnes. O problema é que o Senado nunca deu muita atenção a essa competência, exercendo-a poucas vezes. Então, o problema não foi sanado completamente. Hoje, a tendência é dar efeito vinculante à própria decisão do STF, sem necessidade de resolução do Senado. Quais decisões do STF o Senado pode estender eficácia por essa resolução: só no controle incidental ou também no controle abstrato. Resposta: Só no controle incidental, porque o controle abstrato já tem efeito erga omnes.

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Há uma posição recente do Min. Gilmar Mendes no sentido de que teria havido uma mutação constitucional do art. 52, X. CF26. Lembrete → Mutação constitucional = é uma alteração na interpretação sem que tenha havido interpretação no texto. A alteração que ocorreu no art. 52, X, CF, para Gilmar Mendes, foi que hoje, a interpretação correta não é essa que a doutrina dava, ou seja, que essa competência serve para dar efeito erga omnes a uma decisão que tinha efeito apenas inter partes. Hoje, para ele, essa competência serve apenas para dar maior publicidade à decisão do STF. O Min. Gilmar entende dessa forma porque as decisões do controle incidental já têm efeito erga omnes. Para a doutrina majoritária e para a jurisprudência do STF, as decisões do controle incidental têm apenas efeitos inter partes. Exemplo: Uma decisão proferida por recurso extraordinário, por habeas corpus, produziria efeitos para todos aqueles sujeitos à norma constitucional. A posição do Gilmar esvazia a s’umula vinculante e torna o art. 103-A, CF27 inócuo. Isso porque a súmula vinculante serve para dar efeitos erga omnes vinculantes às decisões do controle incidental, já que as decisões abstratas já têm efeito erga omnes vinculante. O constituinte derivado (EC45) estabeleceu alguns requisitos para concessão de súmula vinculante, como quorum qualificado (2/3), reiteradas decisões de matéria constitucional e uma controvérsia cuja demora na solução acarrete insegurança jurídica e multiplicação de processo (art. 103-A, CF). O problema da posição do Gilmar Mendes se dá por uma interpretação judicial; dá efeitos erga omnes vinculantes a toda decisão do controle incidental, sendo que foi aprovada uma EC que diz que só as decisões do controle incidental que se tornem súmula vinculante têm efeitos erga omnes vinculantes. Qual é a razão de ser da repercussão geral sem efeito vinculante?

26 Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal: X - suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal; 27 Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) (Vide Lei nº 11.417, de 2006). § 1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica. § 2º Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento de súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor a ação direta de inconstitucionalidade. § 3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso."

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Resposta: Estamos caminhando, no Brasil, para a adoção do efeito vinculante em todas as decisões do STF. Mas, para isso, tem que haver, pelo menos, lei. Gilmar se inspira no efeito vinculante alemão. Tem alguma serventia a repercussão geral sem o efeito vinculante? Resposta: Sim. Há um instrumento, também inspirado no direito norte-americano, que é uma espécie de recurso extraordinário; um instrumento de acesso à Corte norte-americana. A Suprema Corte Norte-Americana aprecia discricionariamente esse instrumento. Tendemos a achar que isso é um absurdo, entendendo que, preenchidos os requisitos do recurso extraordinário, tem-se o direito subjetivo a que o tribunal conheça e julgue tal recurso. Isso é inviável! Hoje, há uma tendência dos tribunais constitucionais dos próprios tribunais constitucionais fazerem sua própria agendam ou seja, deles decidirem os casos que vão julgar. Apesar de parecer absurdo, não há outra solução melhor, já que o STF apresentou um quadro de cento e trinta mil processos julgados por ano – enquanto que outros países têm cerca de cento e cinqüenta ou quatrocentos (EUA e Alemanha, respectivamente). A EC45 da reforma do Judiciário estabeleceu um conceito jurídico indeterminado como requisito de admissibilidade. Só serão conhecidos os recursos extraordinários que apresentarem repercussão geral. Então, há uma finalidade nesse requisito, mesmo sem o efeito vinculante, para que o STF só aprecie as questões mais relevantes. Lembrete → Esta tese (do Min. Gilmar Mendes) é minoritária, tanto na doutrina quanto no STF. Têm algumas questões práticas que envolvem essa competência do Senado que são importantes. Exemplo: Quem deve comunicar ao Senado a decisão do STF? Resposta: O próprio STF. Cabe ao STF comunicar ao Senado da sua decisão para que ele suspenda ou não. (Isto está no Regimento Interno do STF). O art. 52, X, CF diz que cabe ao Senado estender a eficácia de lei declarada inconstitucional pelo STF. E se o STF declarar a inconstitucionalidade de um outro lado, de uma emenda constitucional ou de um decreto autônomo ou de medida provisória, o Senado também pode suspender a eficácia ou só de lei em sentido estrito? Resposta: O STF e o próprio Senado fazem uma interpretação extensiva: não só lei, mas outro ato declarado inconstitucional pelo STF. O Senado pode revogar essa resolução? Por exemplo: A decisão do STF só tem efeito inter partes. O Senado deu efeito erga omnes, através dessa resolução. Ele pode digitar uma outra resolução que revoga a primeira para que os efeitos não sejam mais erga omnes, mas apenas inter partes (voltar ao que era antes)? Resposta: Não. Senão, seria uma situação muito complicada para a segurança jurídica. Essa é uma competência discricionária ou vinculada do Senado? Ou seja, o Senado tem que suspender a eficácia da lei ou pode ou não dependendo do juízo político? Resposta: É uma competência discricionária, política do Senado. É importante distinguirmos os juízos que são feitos. O juízo do STF é o juízo técnico-jurídico de constitucionalidade. O juízo do Senado é o

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político, sobre a conveniência e a oportunidade de estender os efeitos da decisão do STF, de dar efeito erga omnes àquela decisão que só tinha efeito inter partes. Outra questão importante é quanto aos efeitos da resolução. Há duas correntes: Para Nagib Slaib, Jose Afonso da Silva e Ana Cândida Ferraz, os efeitos são ex nunc (daqui para frente). Isso porque eles fazem uma interpretação literal do dispositivo. Mas, a posição que parece melhor – adotada, inclusive, pelo STF – é a posição do Clemerson Cleve e do Gilmar Mendes, que fazem uma interpretação teleológica, ou seja, que atende às finalidades do dispositivo. A finalidade do art. 52, X, CF é trazer segurança jurídica, fazendo com que a decisão seja a mesma para todas. A eficácia que melhor promove esse ideal é a ex tunc. O STJ pode exercer controle incidental da CF ou isso é usurpação de competência do STF, que só poderia ser exercida em recurso extraordinário? Resposta: Pode, porque o controle é difuso. Mas, ele tem que fazer isso como uma premissa à solução de questão que seja de sua competência. O STF entende a mesma coisa para o Tribunal de Contas. Este também pode, incidentalmente, ou melhor, como uma questão prejudicial à resolução de uma outra questão que é de sua competência uma lei por inconstitucionalidade. Porém, o tribunal de Contas – apesar do nome – não é tribunal, ou seja, não é órgão judicial, logo sua decisão não faz coisa julgada e pode ser revista por tribunal. Então, o Tribunal de Contas pode, para o STF, deixar de aplicar uma lei por inconstitucionalidade, desde que seja uma premissa necessária para resolver uma questão que é competência sua; mas, como o Tribunal de Contas não é órgão judicial, essa decisão do Tribunal de Contas não goza da imutabilidade inerente à coisa julgada. Há, no STF, uma diferença de procedimento em relação os tribunais, em geral. Se chega perante à turma do STF a alegação de inconstitucionalidade de uma lei, a turma do STF não pode declará-la inconstitucional, porque o princípio da reserva do plenário se aplica a todos os tribunais, inclusive ao STF. Então, a turma do STF, como órgão fracionário que é, não pode declarar uma lei inconstitucional. Então, chegando a questão à turma, esta a submete ao pleno do STF. Só que o pleno do Supremo, ao contrário do pleno de outro tribunal ou dos órgãos especiais, decide não só a questão prejudicial, mas toda a questão, incluindo o mérito.

CONTROLE ABSTRATO E CONCENTRADO (NO BRASIL)

Características gerais É o modelo baseado no sistema austríaco. O que significa dizer que se trata de um controle abstrato (e não de um controle incidental ou concreto) ? Há lide no controle abstrato? Há um conflito de interesses? Resposta: Não. Controle abstrato dá origem a um processo objetivo, sem partes. O STF diz isso porque não há lide ou conflito de interesses no controle abstrato. Por isso que se diz que, no controle abstrato

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não há um controle regular da jurisdição como há no controle incidental. Fala-se no exercício atípico da função jurisdicional, ou numa função de legislador negativo. O que significa essa função do legislador negativo? Um juiz diz que quando julga uma ADI, atua mais como legislador negativo do que como juiz, porque a função jurisdicional é resolver lide; como não há lide, não há que se falar em uma função jurisdicional em sentido estrito. O STF analisa, em tese, a compatibilidade de uma lei ou ato normativo com a constituição. Isso significa que o STF vai amparar a lei com a Constituição, para ver se há algum vício de compatibilidade formal ou material. O STF não vai cogitar de uma aplicação específica da lei. Ele vai analisar em tese, independente da aplicação da lei. A grande vantagem desse controle é a geração de efeitos erga omnes, porque o STF julgando uma ADI julga, às vezes, milhares de recursos extraordinários. Então, em período de jurisdição de massa, isso é muito importante. No Brasil, o controle abstrato é concentrado, ou seja, só um órgão judicial pode exercê-lo. E esse órgão é o Supremo Tribunal Federal. Portanto, é competência privativa do STF julgar ADI e ADPF. Só que existe, também, controle abstrato à luz da Constituição Estadual, que é chamada representação de inconstitucionalidade. O que acontece é que a ADI, por exemplo, é cabível de lei federal ou estadual, em face da Constituição Federal. E a representação de inconstitucionalidade – que é competência do órgão especial ou do Tribunal de Justiça – é cabível de leis estaduais ou municipais, em face da Constituição Estadual. Mas, há um problema: em relação à lei estadual, ambas são cabíveis. Se essa lei estadual violar, concomitantemente, uma norma da CE e uma norma da CF, qual ação pode ser proposta – em caso de normas idênticas ADI ou RI? Resposta: Ambas as ações são cabíveis. Se, de fato, as duas forem propostas, suspende-se a RI e o STF julga a ADI. Se só a RI for proposta, isso – principalmente na hipótese em que a norma da CE e a norma da CF forem idênticas – gera usurpação de competência do STF, já que o TJ vai estar se pronunciando sobre a norma da CE que é idêntica à norma da CF? Resposta: Não, porque cabe recurso extraordinário da decisão do TJ para o STF. Então, da decisão do TJ que julga uma representação de inconstitucionalidade, cabe recurso extraordinário no STF. Vale lembrar que os efeitos dessa decisão são erga omnes, porque esse RE foi interposto de uma decisão no controle abstrato, que já produzia efeitos erga omnes. Então, como a decisão recorrida tem efeitos erga omnes e foi produzida pelo controle abstrato, a decisão do RE também vai ter efeitos erga omnes. Atenção: Normalmente, RE é um instrumento por meio do qual o STF exerce o controle incidental, cujos efeitos são inter partes. No caso acima, excepcionalmente, o RE tem efeitos erga omnes.

ADI – AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE

Competência

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Quem tem competência privativa e originária para julgar uma ADI é o STF. Quem tem competência privativa e originária para julgar RI (representação de inconstitucionalidade) é o TJ – órgão especial do tribunal pleno. Por isso o controle é concentrado.

Legitimidade Lembrete → Nunca esqueça que se trata de um processo objetivo. Isso vai ter várias conseqüências processuais, porque é um processo que não tem uma lide. É importante ter em mente a natureza jurídica, porque isso vai facilitar o entendimento da ADI. Então, quando falamos em legitimidade, temos que prestar atenção no seguinte: sendo o processo objetivo, não há partes no sentido processual clássico. Neste, o autor é quem formula uma pretensão. Não há que se falar nisso, numa ADI, porque não há pretensão. Isso não quer dizer que não haja um legitimado passivo e um legitimado ativo. Existe alguém que ocupa o pólo passo e alguém que ocupa o pólo ativo, só que não são partes, no sentido processual. Na ADI, quem ocupa o pólo passivo é o AGU (Advogado Geral da União), por exemplo, que defende a constitucionalidade da lei? Resposta: Não. Isso é um erro comum. A função do AGU é defender a constitucionalidade da lei impugnada pela ADI. Já que ele tem o dever de defender a constitucionalidade da lei impugnada na ADI, isso não significa que ele ocupa o pólo passivo. O AGU é um mero defensor ou curador da constitucionalidade da norma. Quem, então, ocupa o pólo passivo são os órgãos/ autoridades que expediram os atos questionados. Se for uma lei, por exemplo, pode ser o Congresso Nacional e o Presidente da República. Um pouco mais complicada é a legitimidade ativa. (Esse rol está no art. 103 da CF). Uma das grandes inovações – como já vimos – da CF/88 foi a ampliação do rol dos legitimados. Isso foi um fator decisivo para a afirmação do controle abstrato de constitucionalidade, no Brasil. Antes da CF/88, só o PGR (Procurador Geral da República) tinha legitimidade para propor a antiga representação de inconstitucionalidade. Então, só com a CF/88 é que as questões mais relevantes, constitucionalmente, começaram a chegar ao STF, através de ADI. Hoje, então, o STF tem uma importância política que nunca teve na República brasileira. Ver art. 103, CF:

Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) I - o Presidente da República; II - a Mesa do Senado Federal; III - a Mesa da Câmara dos Deputados; IV - a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

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V - o Governador de Estado ou do Distrito Federal; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) VI - o Procurador-Geral da República; VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; VIII - partido político com representação no Congresso Nacional; IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional. § 1º - O Procurador-Geral da República deverá ser previamente ouvido nas ações de inconstitucionalidade e em todos os processos de competência do Supremo Tribunal Federal. § 2º - Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias. § 3º - Quando o Supremo Tribunal Federal apreciar a inconstitucionalidade, em tese, de norma legal ou ato normativo, citará, previamente, o Advogado-Geral da União, que defenderá o ato ou texto impugnado.

Havia uma divergência sobre a legitimidade do Governador do Distrito Federal e da Câmara Legislativa do Distrito federal, porque essas autoridades não estavam na redação original do art. 103 da CF. O STF, então, disse que o rol do art. 103 é taxativo. Mas, apesar disso, o STF já fazia uma interpretação extensiva desse rol para incluir o Governador do DF e a câmara Legislativa do DF, porque entendeu que o Constituinte esqueceu de fazê-lo. Essa discussão teve fim com a EC 45. A questão mais importante sobre legitimidade ativa é a questão da pertinência temática, que foi requisito criado pela jurisprudência do STF, em legítima defesa. O STF distingue dois tipos de legitimados: legitimados universais e não universais. Os legitimados universais não precisam provar o requisito da pertinência temática. Isso porque essas autoridades e órgãos têm como função institucional proteger a supremacia da CF. Então, se esses órgãos/ autoridades têm essa finalidade, eles podem propor ADI, qualquer que seja o teor/ objeto da lei. Pertinência temática é a relação de afinidade entre a questão constitucional debatida e as finalidades do legitimado. O legitimado não universal tem que provar que aquela questão constitucional repercute diretamente nos interesses zelados por aquela instituição. Legitimados não universais (art. 103, IV, V e IX, CF):

• Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal

• Governador de Estado ou do Distrito Federal

• Confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional

Legitimados universais (art. 103, I, II, III, VI, VII e VIII, CF):

• Presidente da República

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• Mesa do Senado e da Câmara

• Procurador Geral da República

• Conselho Federal da OAB

• Partido Político com representação no Congresso Nacional Por exemplo, a Associação Nacional de Magistrados tem legitimidade para questionar uma lei que aprovou a desapropriação da Vale do rio Doce? Resposta: Não, pois não existe pertinência temática. A Associação Nacional de Magistrados tem legitimidade para questionar a imposição do teto constitucional remuneratório? Resposta: Sim, tanto que questionou. A Associação Nacional de Dentistas tem legitimidade para questionar um aumento de imposto de renda? Resposta: Não, porque tem que haver uma repercussão específica e direta na entidade. Portanto, não há pertinência temática. Se a lei for do próprio Estado, o Governador tem legitimidade? Resposta: Sim, pois a pertinência temática é presumida. Ele vai ter que demonstrar pertinência temática se a lei for federal ou de outro Estado. Qual é a crítica que se pode fazer ao requisito da pertinência temática, que foi criada pelo STF? Resposta: A pertinência temática está próxima do interesse de agir (condição da ação). Há que se falar em interesse de agir em um processo objetivo? Resposta: Não, pois não há causa/ interesse jurídico. A doutrina diz que o STF trouxe algo que é pertinente ao interesse geral de agir para um processo objetivo, que não discute interesse jurídico de quem quer que seja. Há umas questões pontuais sobre a legitimidade: Os partidos políticos são divididos em diretórios nacionais, estaduais e municipais. Qual deles tem legitimidade para propor ADI? Resposta: Só o nacional. Só as confederações sindicais têm legitimidade. Federações sindicais e Sindicatos de caráter nacional não têm legitimidade. Vimos que têm legitimidade entidades de classe de âmbito nacional, mas o que significa âmbito nacional? Resposta: O STF utilizou aqui, por analogia, a lei orgânica dos partidos políticos: deve estar representado em, pelo menos, nove Estados. O que significa classe? Reposta: Significa um grupo com homogeneidade de interesses econômicos ou profissionais.

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OBS.: O STF entende que a UNI não tem legitimidade para propor ADI, ou seja, que os estudantes não formam uma classe. Atenção! O STF alterou duas linhas jurisprudenciais que ele tinha – muito restritivas – sobre legitimidade ativa. 1ª: O STF negava legitimidade às chamadas “Associações de Associações”, que são associações cujos membros são outras associações, ou seja, são pessoas jurídicas. Exemplo: Associação Nacional do MP. É composta, pelo seu estatuto, pelas associações estaduais. Hoje, o STF reconhece tanto as associações de pessoas físicas quanto de pessoas jurídicas, superando a jurisprudência restritiva. 2ª: Só tem legitimidade – como consta na CF – os partidos políticos com representação no Congresso (pelo menos um Deputado ou Senador). Exemplo: O PV tinha várias propostas de ADI. Seu único deputado saiu depois da propositura da ADI, mas antes do julgamento. O STF entendia que, nesse caso, havia perda do objeto. Caso houvesse a perda no Congresso Nacional depois da propositura da ADI, isso implicava a perda do objeto da ADI. Hoje, o STF entende que a perda do superveniente da representação no Congresso Nacional não implica a perda do objeto da ADI. Mesmo assim, o STF julga a proposta. A ADI está sujeita ao princípio da indisponibilidade, que é uma decorrência do fato de se tratar de um processo objetivo, porque o interesse que está em jogo é um direito indisponível. A ADI serve para garantir a supremacia da Constituição. 25 de Setembro de 2007

OBJETO DA ADI O que significa a pergunta: “qual é o objeto da ADI?”? Significa saber quais atos podem ser impugnados na ADI, ou seja, quais atos podem ser a sua constitucionalidade questionada na ADI. Antes dessa discussão, temos que estabelecer uma premissa: qual é o paradigma na ADI? Essa pergunta é diferente da primeira. Paradigma é a forma condicional violada, ou melhor, a norma condicional cuja violação autoriza propositura da ADI. Qual é o paradigma constitucional na ADI, ou seja, qual norma constitucional cuja violação autoriza a propositura da ADI: toda e qualquer norma constitucional ou só algumas normas constitucionais? Resposta: O STF entende que todas as normas constitucionais são paradigmas, inclusive o ADCT, excluindo apenas o preâmbulo da CF, que não tem natureza normativa. Sua violação autoriza e propositura da ADI excluindo o preâmbulo que não tem natureza normativa. Quanto ao objeto, que atos podem ter sua constitucionalidade impugnada na ADI? Resposta: Há duas formas de estudar essa questão: ou decorando ato por ato ou entendendo porque alguns atos podem ser questionados em ADI e outros não. Há uma “fórmula” que explica bem porque

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alguns atos podem ser questionados na ADI e outros não. Essa fórmula é a seguinte: podem ser questionados na ADI os atos estatais, genéricos, abstratos e primários. Um ato genérico e abstrato é um ato que tem natureza de lei – uma lei em sentido material, ou seja, um ato de caráter normativo. É a chamada “lei em tese”, ou seja, uma norma genérica e abstrata porque não se destina a uma situação específica, mas sim a um grupo indeterminado de situações e pessoas. Uma norma primária é aquela que tem fundamento de validade diretamente na Constituição e o fundamento imediato de validade da norma primária é norma constitucional, ou seja, não seria uma norma numa hierarquia intermediária entre a norma primária e a norma constitucional. O fundamento de validade imediato da norma primária é a norma constitucional. Já as normas secundárias ou normas infralegais têm como fundamento imediato de validade uma norma de hierarquia inferior à Constituição. Por exemplo: Um decreto executivo é uma norma secundária porque o fundamento de validade é a lei e não a norma constitucional. Já a lei ordinária é uma norma primária porque o fundamento de validade da lei ordinária é a norma constitucional. Pode ser objeto de ADI:

• Lei ordinária

• Lei complementar

• Lei delegada

Não basta, porém, conhecer essas espécies normativas para caber ADI. Isso porque uma lei ordinária pode não ser objeto de ADI porque, além dessas espécies, essas normas têm que ser genéricas e abstratas. Então, se for uma lei ordinária chamada lei de efeitos concretos – que é uma lei que não tem caráter normativo, não cabe ADI contra essa lei. Exemplo: Uma lei que desaproprie um imóvel X. A lei que desapropria o imóvel X tem natureza não de lei, mas de ato administrativo. Não é um ato normativo; é um ato concreto. Então, apesar de ser lei (norma primária), ela não pode ser questionada em ADI porque sua natureza não é normativa, não é genérica e abstrata. Pode questionar em controle incidental, numa ação ordinária. Cabe ADI, no Brasil, em face de emenda constitucional. Aqui, há algo que foi afirmado pela jurisprudência do STF e nem todos os tribunais constitucionais admitem o controle da constitucionalidade de emendas. Exemplo: A Suprema Corte Norte-Americana não admite o controle de constitucionalidade de emendas por considerar o assunto uma questão política. Já o STF admite controlar a constitucionalidade de emendas, mas não o controle de normas originárias. Assim, se a norma foi introduzida pelo poder constituinte originário, o STF não admite o controle de constitucionalidade; mas se a norma foi introduzida pelo poder constituinte derivado, admite-se o controle. Se uma emenda constitucional contraria uma norma constitucional originária, necessariamente essa emenda constitucional vai ser inconstitucional? Resposta: Não, porque só vai gerar inconstitucionalidade se essa norma originária for um limite ao poder de reforma. Pode ser um limite formal, circunstancial ou material. Um erro muito comum das pessoas é achar que se uma emenda constitucional contraria uma norma constitucional, ela é inconstitucional. Não acontece dessa forma porque a função da emenda constitucional é revogar uma

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norma constitucional, para atualizar a Constituição. Então, a princípio, uma emenda constitucional revoga uma norma constitucional originária, exceto se esta for limite ao poder de reforma. Cabe ADI em face de medida provisória? Resposta: Cabe, pois medida provisória é ato primário, que busca fundamento de validade imediatamente na Constituição, com força de lei. O STF apenas exige que se a MP for convertida em lei, o autor adite o pedido da inicial; ou seja, ele tem que aditar o pedido da inicial para que se peça não mais a declaração da inconstitucionalidade da MP, mas da lei que resultou da MP. Também cabe ADI de decretos legislativos e de resoluções (que são atos internos do Congresso Nacional e das suas Casas) e de leis federais e leis estaduais (se for estadual, cabe tanto ADI quanto RI – REPRERSENTACAO DE INCONSTITUCIONALIDADE). Cabe ADI em face de tratados internacionais? Resposta: A hierarquia com a qual os tratados internacionais estão recepcionados no direito brasileiro é a de lei ordinária (teoria do monismo moderado). Os tratados internacionais, no direito brasileiro, são recebidos com status de lei ordinária. Assim, se eles contrariarem a constituição, eles são inconstitucionais por serem hierarquicamente inferiores à CF. Há apenas uma peculiaridade processual: a ADI não é proposta contra o tratado em si, mas contra o decreto legislativo que ratificou o tratado. Os tratados sobre direitos humanos têm um regramento próprio, que foi introduzido pelo art. 5º. §3º, EC 45. Isso será tratado quando se falar em direitos humanos. Cabe ADI de ato administrativo? Resposta: Depende: se for um ato administrativo autônomo ou primário (decreto autônomo), que busca fundamento de validade diretamente na Constituição – ou seja, ele não tem respaldo em lei – cabe ADI, porque são normas primárias. Porém, se for um ato administrativo ou um decreto meramente executivo, que simplesmente regulamenta a lei, não cabe ADI, porque de trata de uma norma secundária ou infralegal; e o STF entende que nos atos secundários ou infralegais o que se tem é uma inconstitucionalidade reflexa, ou seja, a questão é de ilegalidade e não de inconstitucionalidade. Não cabe ADI:

• De leis de efeitos concretos (normas que não têm natureza normativa, ou seja, genérica e abstrata, mas uma natureza ou um conteúdo específico). Exemplo: A lei que desapropria o imóvel X.

• De atos infralegais ou normas secundárias (inconstitucionalidade reflexa).

• De leis anteriores à CF. O STF entende que a não recepção é exatamente a incompatibilidade material de lei anterior à CF com a nova Constituição gera um vício de revogação e não de constitucionalidade.

• De norma constitucional originária (fruto do poder constituinte originário).

• De norma revogada. O STF entende que só cabe ADI de norma que esteja em vigor; nunca de norma revogada.

• De lei municipal.

• De projeto de lei ou de emenda constitucional.

Existe algum instrumento de controle abstrato?

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Resposta: Sim, a ADPF (Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental). O STF apreciou uma ADI quanto ao art. 45, §1º, CF: estabelece limite mínimo e máximo de deputados por estado. Nessa ADI, o STF falou que o pedido da declaração da inconstitucionalidade de normas originárias é um pedido juridicamente impossível e que foge à sua competência. O STF entende que se a norma for revogada no curso do julgamento da ADI, ou seja, entre sua propositura e seu julgamento, a ADI perde o objeto. Então, não só não cabe ADI de norma revogada como se ela for revogada no curso do julgamento da ADI, ela perde seu objeto. Isso acontece porque a finalidade da ADI é privar a lei inconstitucional de qualquer eficácia – é como se ela fosse expelida da ordem jurídica. Se a lei já foi revogada, ela já saiu da ordem jurídica. A crítica que se pode fazer é essa norma é que a norma revogada produziu efeitos enquanto estava em vigor e o julgamento de méritos da ADI tem efeitos ex tunc. Então, seria conveniente que o STF se pronunciasse quanto aos efeitos produzidos pela norma – se eles são ou não válidos. Nesse caso em que a lei foi revogada, portanto, só cabe controle incidental.

Os instrumentos de controle em abstrato de lei municipal são a ADPF que é um controle em absttrato à luz da CF e a representação de inconstitucionalidade. Cabe ADI de projeto de lei ou de emenda constitucional? Resposta: Não. O controle de constitucionalidade é repressivo e não preventivo. Há duas exceções em que se admite o controle de constitucionalidade pelo Judiciário de caráter preventivo; só que o instrumento do exercício desse controle não é a ADI, mas o Mandado de Segurança impetrado por parlamentar. Esses dois casos são: os projetos de emenda constitucional que violam os limites ao poder de reforma e os projetos de lei que violam norma constitucional sobre processo legislativo. O STF justifica o MS por parlamentares porque há um direito (subjetivo) líquido e certo destes à regularidade do processo legislativo. A crítica que a doutrina faz a essa jurisprudência do STF é de que isso não é, de fato, um direito subjetivo dos parlamentares porque todo cidadão tem esse direito. Portanto, o controle deveria ser via ADI e não por MS. Cabe ADI em face de súmula do STF? Resposta: Em súmula não vinculante, sabemos que não cabe, pois não têm caráter normativo; sua eficácia é meramente persuasiva, ou seja, é só uma orientação para o juiz e não uma norma obrigatória. Já em relação às súmulas vinculantes, é mais complicado porque a súmula vinculante tem caráter normativo, ou seja, ela é obrigatória para o juiz. Muitas vezes, ela tem caráter genérico e abstrato, não decidindo apenas aquele caso concreto, mas vários outros. Alguns autores, então, passaram a sustentar que, tendo a súmula vinculante caráter normativo (ato estatal genérico e abstrato), seria cabível a ADI. A posição majoritária da doutrina faz duas críticas a isso: a primeira razão (questionável) é que súmula vinculante não é norma, mas interpretação de norma – o que é diferente. O segundo argumento (mais definitivo) é que as súmulas (vinculantes e não vinculantes) têm um procedimento próprio de cancelamento – inclusive, a lei que disciplina a súmula vinculante disciplina também o cancelamento ou

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a revisão da súmula. Então, se o STF entende que a sua súmula não mais é correta, ele tem que seguir esse procedimento, e não julgar procedente uma ADI contra essa ação. Cabe ADI em face de lei distrital (DF)? Resposta: Depende do teor da lei. O Distrito Federal acumula competências de estado e município. Cabe ADI em face de lei estadual, mas não de lei municipal. A conseqüência disso é que só cabe ADI contra lei do DF se a matéria tratada na lei for de competência do estado. Se a matéria ali tratada for de competência do município, aquilo substancialmente é uma lei municipal, não cabendo ADI. Cabe ADI em face de sentença normativa? Resposta: Também é um ato normativo genérico, abstrato e primário; mas não cabe ADI porque há uma sistemática própria de recursos no processo trabalhista para se impugnar as sentenças normativas. Cabe ADI contra acordos coletivos (trabalhistas)? Resposta: Não, porque não são atos estatais, mas atos privados. Não cabe ADI contra contratos, em geral.

PROCEDIMENTO DA ADI

Na verdade, a lei que disciplina o procedimento na ADI é a lei 9.868/99. Só que essa lei só foi editada em 1999 e a CF é de 1988. Então, o STF teve que, nesse período, criar jurisprudencialmente as características de procedimento da ADI. A lei 9.868/99 é – boa parte – sistematização e positivação do que era a jurisprudência do STF. O art. 2º traz o rol dos legitimados para propor ADI (mesmo rol do art. 103, CF):

Art. 2o Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade: (Vide artigo 103 da Constituição Federal) I - o Presidente da República; II - a Mesa do Senado Federal; III - a Mesa da Câmara dos Deputados; IV - a Mesa de Assembléia Legislativa ou a Mesa da Câmara Legislativa do Distrito Federal; V - o Governador de Estado ou o Governador do Distrito Federal; VI - o Procurador-Geral da República; VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; VIII - partido político com representação no Congresso Nacional; IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional. Parágrafo único. (VETADO) Art. 3º: Art. 3o A petição indicará: I - o dispositivo da lei ou do ato normativo impugnado e os fundamentos jurídicos do pedido em relação a cada uma das impugnações; II - o pedido, com suas especificações.

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O STF, em relação ao pedido, aplica o princípio processual da congruência na ADI. Princípio da congruência é aquele que veda sentenças extra, ultra ou cita petita; que diz que o juiz ou tribunal deve se ater ao pedido. Dizer que esse princípio se aplica à ADI significa dizer que, a princípio, o STF só pode declarar a inconstitucionalidade dos dispositivos que forem impugnados na ADI. Então, se a lei tem dez artigos e o autor só impugna os artigos primeiro ao oitavo, a princípio, o STF só pode declarar a inconstitucionalidade de primeiro a oitavo, não podendo se pronunciar sobre a inconstitucionalidade dos artigos nono e décimo, pois não estão contidos no pedido da ADI.

Essa é uma regra geral que o STF aplica, mas admite exceções. A principal delas é chamada inconstitucionalidade por arrastamento. Ela ocorre quando há uma inconstitucionalidade que decorre da inconstitucionalidade que foi suscitada na ADI. Exemplo: Existem dois artigos numa lei e esses artigos estabelecem uma isenção condicionada, ou seja, o art. 1º dá a isenção de um tributo e o art. 2º estabelece as condições para o contribuinte fruir essa isenção. Digamos que o autor propõe ADI contra o art. 2º, apenas (apenas contra as condições para a isenção e não contra a isenção em si, que está no art. 1º).

O STF pode julgar procedente a ADI apenas contra o art. 2º? Resposta: Não. Se assim o fizesse, ele transformaria uma isenção condicionada em incondicionada. Mas o legislador não quis assim: ele quis dar uma isenção condicionada. Assim, o STF atuaria como legislador positivo, alterando o teor da lei. Então, nesse caso, mesmo que só o art. 2º tenha sua constitucionalidade suscitada, o STF vai poder, também, declarar a inconstitucionalidade do art. 1º, mesmo que ele não tenha sido incluído no pedido. A inconstitucionalidade por arrastamento é exceção. A regra é que: não está no pedido, então o STF não pode declarar a inconstitucionalidade.

Outra questão que decorre desse dispositivo é a seguinte: não cabe ADI genérica. Isso significa que a ADI tem que tem fundamentação, obrigatoriamente. Isso deve ser conciliado com outro princípio que rege a ADI, que é o princípio da causa petendi aberta que diz que o STF não está vinculado aos motivos deduzidos na ADI. Exemplo: Uma lei pode ser questionada por inconstitucionalidade formal e o STF vislumbrar uma inconstitucionalidade material. Os fundamentos expostos na inicial não vinculam no STF. Ele pode declarar a inconstitucionalidade na norma sob outro fundamento que não foi suscitado na inicial; mas ele não pode declarar a inconstitucionalidade de dispositivo que não foi citado no pedido, exceto em hipóteses excepcionais.

Art. 3º, parágrafo único:

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Parágrafo único. A petição inicial, acompanhada de instrumento de procuração, quando subscrita por advogado, será apresentada em duas vias, devendo conter cópias da lei ou do ato normativo impugnado e dos documentos necessários para comprovar a impugnação.

Nem sempre a intervenção do advogado é obrigatória, ou seja, nem sempre o advogado tem que assinar a inicial da ADI. Isso acontece porque há legitimados que têm o que se chama de capacidade postulatória plena, ou seja, que podem postular mesmo sem o patrocínio de um advogado. Esses legitimados estão no art. 2º, I, II, III, IV, V, VI e VII. As demais têm que atuar mediante intermediação de advogado. Art. 4º:

Art. 4o A petição inicial inepta, não fundamentada e a manifestamente improcedente serão liminarmente indeferidas pelo relator. Parágrafo único. Cabe agravo da decisão que indeferir a petição inicial. Essa decisão do relator, porém, não é definitiva, pois cabe agravo para o plenário. Art. 5º: Art. 5o Proposta a ação direta, não se admitirá desistência.

Não se admite desistência na ADI por ela é regida pelo princípio da indisponibilidade. A finalidade da ADI é zelar pela supremacia da Constituição, expelindo uma norma inconstitucional da ordem jurídica. Sendo essa a finalidade, este é um interesse indisponível (nenhum legitimado tem disponibilidade sobre esse interesse).

Art. 6o O relator pedirá informações aos órgãos ou às autoridades das quais emanou a lei ou o ato normativo impugnado. Parágrafo único. As informações serão prestadas no prazo de trinta dias contado do recebimento do pedido.

Esses órgãos ou autoridades ocupam a posição de pólo passivo na ADI. E eles serão intimados a prestar informações em trinta dias.

Art. 7o Não se admitirá intervenção de terceiros no processo de ação direta de inconstitucionalidade. § 1o (VETADO) § 2o O relator, considerando a relevância da matéria e a representatividade dos postulantes, poderá, por despacho irrecorrível, admitir, observado o prazo fixado no parágrafo anterior, a manifestação de outros órgãos ou entidades.

Não cabe intervenção de terceiros na ADI porque o pressuposto genérico da intervenção de terceiros é o interesse jurídico que estes tenham na causa. Não há, no entanto, que se falar em interesse de

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terceiros na ADI, já que nela não se está discutindo direitos subjetivos de qualquer um. Os interesses nela discutidos são objetivos. O § 2o prevê a presença do amicus curiae (amigo da corte). Porém, isso não se trata de intervenção de terceiros, pois “amicus curiae” significa a possibilidade do relator por despacho irrecorrível autorizar a intervenção escrita ou oral de entidades que sejam altamente representativas sobre a matéria. Exemplo: Uma ADI sobre questão ambiental. Pode ser conveniente ouvir o Greenpeace. Exemplo 2: Uma questão que envolva o mercado imobiliário. Uma grande construtora pode ser ouvida. O amicus curi tem um papel importante na jurisdição constitucional, que é amenizar a chamada dificuldade contramajoritária do judiciário. Lembrete → Dificuldade contra majoritária: Os juízes não são eleitos. Eles invalidam atos aprovados pela maioria dos membros do parlamento (representantes eleitos do povo) com princípios abstratos, muitas vezes (razoabilidade, proporcionalidade, etc.) – que ninguém sabe ao certo o que é. Isso gera, então, uma dificuldade contra majoritária, ou seja, gera um risco dos juizes substituírem o julgamento dos representantes do povo pelo seu. Por isso vivemos numa aristocracia judicial em que quem manda são os ministros do STF. O amicus curiae vem amenizar esse problema porque a sociedade civil (pessoas diretamente interessadas nas decisões do STF) passa a ter voz no STF.

Art. 8º: Art. 8o Decorrido o prazo das informações, serão ouvidos, sucessivamente, o Advogado-Geral da União e o Procurador-Geral da República, que deverão manifestar-se, cada qual, no prazo de quinze dias.

Depois que o STF ouve os órgãos que citaram o ato, ele vai ouvir sucessivamente, no prazo de quinze dias, o AGU e o PGR. As funções exercidas pelo AGU e pelo PGR são as seguintes: o AGU defende a constitucionalidade do ato impugnado e o PGR atua como fiscal da lei, se pronunciando sobre a constitucionalidade. Se o STF já tiver declarado a inconstitucionalidade, o AGU não está obrigado a defender a constitucionalidade do ato. Vale lembrar que isso é uma exceção, pois a regra é que o AGU sempre tem que defender a constitucionalidade do ato.

Art. 9o Vencidos os prazos do artigo anterior, o relator lançará o relatório, com cópia a todos os Ministros, e pedirá dia para julgamento. § 1o Em caso de necessidade de esclarecimento de matéria ou circunstância de fato ou de notória insuficiência das informações existentes nos autos, poderá o relator requisitar informações adicionais, designar perito ou comissão de peritos para que emita parecer sobre a questão, ou fixar data para, em audiência pública, ouvir depoimentos de pessoas com experiência e autoridade na matéria.

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Esse artigo foi uma evolução muito importante trazida pela lei 9.868/99. Por que o esclarecimento de matéria de fato e a produção de provas é uma inovação? Resposta: O STF e a doutrina amplamente majoritária entendiam que a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade da lei era uma questão puramente de direito. As repercussões dessa assertiva são que se a questão é puramente de direito, não cabe discussão de matéria de fato nem produção de provas. Exemplo: É proposta uma ADI contra atos que autorizam a comercialização de determinados pesticidas. Não tem como o STF julgar essa questão de forma segura sem ouvir um biólogo. O STF não é obrigado a ter essa informação. Hoje, é pouco discutível que cabe discussão de matéria de fato e produção de provas quando isso for imprescindível para a resolução da questão constitucional, posta na ADI. Inclusive, o § 1o do art. 9 prevê expressamente. Esse é o dispositivo que prevê também audiência pública. É também um instrumento para trazer legitimidade democrática ás decisões do STF, apesar do STF não prestigiar muito as audiências públicas (até hoje, só fez uma).

LIMINAR NA ADI Qual é a natureza da liminar na ADI? Resposta: Tem natureza de medida cautelar. A primeira questão importante sobre a natureza cautelar na ADI é que também está sujeita ao princípio da reserva de plenário. Isso é algo que as pessoas – em geral – não percebem. A princípio, um ministro não pode dar liminar em ADI porque isso é de competência do pleno (maioria absoluta dos ministros do STF). Admite-se a concessão monocrática de liminar apenas em período de recesso.

Art. 10. Salvo no período de recesso, a medida cautelar na ação direta será concedida por decisão da maioria absoluta dos membros do Tribunal, observado o disposto no art. 22, após a audiência dos órgãos ou autoridades dos quais emanou a lei ou ato normativo impugnado, que deverão pronunciar-se no prazo de cinco dias.

Podemos dizer que a cautelar na ADI tem (ou deveria ter, pelo menos) natureza excepcional porque ela excepciona o princípio da presunção de constitucionalidade. A regra é preservar os efeitos produzidos pela lei, já que ela é presumivelmente constitucional. Na prática, os requisitos para conceder liminar – que são requisitos normais – devem estar muito fortes, porque em caso de dúvida, a norma deve permanecer como está, mantendo seus efeitos. A princípio, o tribunal – como diz o §1º, deve ouvir as autoridades que emitiram o ato, o AGU e o PGR e, depois, apreciar a liminar. Esse é o procedimento padrão.

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Excepcionalmente, caso o periculum in mora for enorme, o tribunal pode dar uma medida que ultradita altera partes ou seja, tem a oitiva dessas autoridades. Vai ser muito mais fácil provar o periculum in mora se a lei foi recente. Então, STF criou uma espécie de terceiro requisito que, em algumas situações, substitui o periculum in mora (que é o requisito da conveniência administrativa). O requisito da conveniência administrativa pode substituir o periculum in mora, principalmente nos casos leis que estão em vigor há muito tempo. Quais são os efeitos temporais das liminares? Resposta: Se o STF não se pronunciar sobre os efeitos da liminar, ela produz efeitos ex nunc (prospectivos, daqui pra frente). Portanto, se o tribunal quiser dar efeitos ex tunc a uma liminar, ele deve fazê-lo de forma expressa. Na decisão de mérito, é exatamente o contrário. Se o tribunal não se pronunciar sobre os efeitos, eles serão ex tunc (retroativos). Mas, de forma expressa, ele pode dar efeitos ex nunc. As decisões liminares também têm efeito erga omnes vinculante. O que significa, em relação à lei que foi questionada, quando o STF dá uma liminar numa ADI? Resposta: A liminar suspende a eficácia da lei com efeitos erga omnes vinculantes, ou seja, aquela decisão se aplica não só às partes do processo, mas a todos os destinatários da lei e aos órgãos responsáveis pela aplicação da lei. Então, se o STF dá liminar numa ADI e o juiz, depois dessa liminar, aplica a lei – considerando constitucional a lei que o STF considerou inconstitucional – cabe reclamação dessa decisão do juiz, já que descumpriu uma decisão do STF. Há um outro efeito (efeito repristinatório) que está no art.11, §2º:

§ 2o A concessão da medida cautelar torna aplicável a legislação anterior acaso existente, salvo expressa manifestação em sentido contrário.

As liminares, na ADI têm efeito repristinatório, ou seja, a liminar na ADI faz com que volte a viger a lei que foi revogada pela lei que é objeto da ADI.

DECISÃO (tanto na ADI quanto na ADC) O art. 2228 traz o chamado quorum de instalação, ou seja, o número mínimo de ministros que têm que estar presentes para que o STF possa deliberar sobre a ADI e esse quorum é de oito ministros. Com menos de oito ministros no plenário, o STF não pode julgar uma ADI. O art.2329 traz o quorum de votação que, por força do princípio de reserva do plenário, é o quorum de maioria absoluta, ou seja, uma lei só pode ser declarada inconstitucional pelo STF se, no mínimo, seis ministros votarem pela inconstitucionalidade.

28 Art. 22. A decisão sobre a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade da lei ou do ato normativo somente será tomada se presentes na sessão pelo menos oito Ministros.

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Art. 24. Proclamada a constitucionalidade, julgar-se-á improcedente a ação direta ou procedente eventual ação declaratória; e, proclamada a inconstitucionalidade, julgar-se-á procedente a ação direta ou improcedente eventual ação declaratória.

O art. 24 positiva a chamada natureza ambivalente ou dúplice da ADI e da ADC. Isso significa que “a ADI e a ADC são ações idênticas, mas com sinais trocados” (Gilmar Mendes), ou seja, as ações são, de fato, similares; porém, a decisão de procedência da ADI corresponde à decisão de improcedência da ADC. Isso porque quando o tribunal julga improcedente uma ADI ou procedente uma ADC, o que ele faz, na prática, é declarar a constitucionalidade da norma, com efeitos erga omnes vinculantes. Isso se dá porque o pedido na ADI e na ADC é inverso: na primeira, o pedido é declarar a inconstitucionalidade e, na segunda, é declarar a constitucionalidade. Por que não há natureza dúplice na liminar? Resposta: Se o tribunal defere a liminar na ADI, isso gera suspensão cautelar de eficácia da lei. Então, um juiz não pode declarar aquela lei inconstitucional se o STF suspendeu sua eficácia em ADI. Mas, de ele indefere a liminar, nada impede que o juiz, depois, incidentalmente declare a inconstitucionalidade dessa lei. Nesse caso, cabe reclamação da decisão. A decisão na ADI não desfaz, automaticamente, a coisa julgada; há que ser proposta uma ação rescisória.

Art. 26. A decisão que declara a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade da lei ou do ato normativo em ação direta ou em ação declaratória é irrecorrível, ressalvada a interposição de embargos declaratórios, não podendo, igualmente, ser objeto de ação rescisória.

A decisão de mérito, pelo STF, de ADI ou ADC é irrecorrível, salvo embargos declaratórios. Isso também era jurisprudência do STF antes de se tornar lei. A decisão de mérito também não pode ser objeto de ação rescisória. Isso significa que a decisão do STF é imutável? Se o STF considera uma lei constitucional, ele pode, depois, considerar essa mesma lei inconstitucional?

29 Art. 23. Efetuado o julgamento, proclamar-se-á a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade da disposição ou da norma impugnada se num ou noutro sentido se tiverem manifestado pelo menos seis Ministros, quer se trate de ação direta de inconstitucionalidade ou de ação declaratória de constitucionalidade. Parágrafo único. Se não for alcançada a maioria necessária à declaração de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade, estando ausentes Ministros em número que possa influir no julgamento, este será suspenso a fim de aguardar-se o comparecimento dos Ministros ausentes, até que se atinja o número necessário para prolação da decisão num ou noutro sentido.

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Resposta: O STF pode modificar sua decisão. O STF não está sujeito ao efeito vinculante de suas próprias decisões. Ou seja, o efeito vinculante da decisão do STF vincula todos os juizes e tribunais, exceto o próprio STF. Já que não cabe recurso nem ação rescisória, qual é o instrumento processual? Resposta: Uma nova ADI. Exemplo: O STF julgou uma ADI improcedente sobre a lei X, julgando-a, portanto, constitucional. Cinco anos depois, um legitimado pode propor uma outra ADI e o STF pode julgar essa mesma lei, agora, inconstitucional. A recíproca não é verdadeira. Se o STF julga inconstitucional uma lei; depois, numa ADI ou numa ADC, ele não pode julgá-la constitucional, pois na primeira vez, ele tirou a norma da ordem jurídica e fez com que ela perdesse a eficácia. Re-introduzir essa norma no ordenamento jurídico seria atuar como legislador positivo. Isso significa que a decisão do STF, no caso em que ele julga inconstitucional, é imutável, eterna? Resposta: Não. A hipótese em que pode o STF modificar a jurisprudência é uma nova lei. O STF pode declarar uma lei inconstitucional e, depois, o legislador edita uma lei idêntica. Apesar de parecer, o legislador não descumpre uma decisão do STF ao fazer isso, porque o legislador não está sujeito aos efeitos vinculantes das decisões do STF. Os efeitos vinculantes da decisão do STF se aplicam a todos os órgãos judiciais – exceto o STF – e aos órgãos de administração pública, mas não ao legislador. Então, no caso em que o legislador edita uma lei idêntica àquela declarada inconstitucional, o legislador, na verdade, reabre o debate no STF sobre a constitucionalidade da norma (Sepúlveda Pertence).

EFICÁCIA TEMPORAL DAS DECISÕES DE INCONSTITUCIONALIDADE Há no direito comparado, basicamente, duas teses:

• Tese norte-americana → Os efeitos retroativos (ex tunc) das decisões de inconstitucionalidade são uma conseqüência do princípio da supremacia da Constituição. Se a norma constitucional é superior à lei – por exemplo – num conflito entre lei e norma constitucional, a lei inconstitucional não pode produzir nenhum efeito válido, porque se ela o fizer, ainda que por tempo limitado, nesse lapso de tempo terá prevalecido a lei inconstitucional, e não a norma constitucional. Isso violaria a supremacia da Constituição. Essa é a tese amplamente majoritária em todo o mundo, inclusive no Brasil.

• Tese austríaca (Hans Kelsen) → Kelsen entendia – ao contrário dos americanos – que a decisão de inconstitucionalidade não tinha natureza declaratória. Para Kelsen, a decisão de inconstitucionalidade é constitutiva negativa, ou seja, só há inconstitucionalidade com a decisão judicial. Antes dela, não há sequer que se falar em inconstitucionalidade. É como se a decisão judicial criasse a inconstitucionalidade. Por isso ela é constitutiva, e não declaratória. Isso decorre, por sua vez, da natureza da inconstitucionalidade de Kelsen. Para os americanos, a inconstitucionalidade gera um vício de nulidade absoluta; para Kelsen, o vício é de nulidade relativa ou de anulabilidade. Daí, a natureza constitutiva negativa da decisão. Nesse caso, portanto, os efeitos são ex nunc porque se antes da decisão judicial não havia inconstitucionalidade, é obvio que a decisão só pode produzir efeitos depois de proferida.

A diferença prática entre os dois modelos é: (O PROFESSOR FEZ UM GRÁFICO NO QUADRO PARA EXPLICAR).

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Exemplo: Há uma lei que foi publicada em 01/01/2004. E a decisão judicial pela inconstitucionalidade em 01/03/2007. No modelo norte-americano, a lei vinha produzindo efeitos até aqui. A decisão judicial, no modelo americano, retroage até o momento da edição da lei. O modelo de Kelsen preserva os modelos produzidos pela lei e impede que, daqui pra frente, ela produza efeitos.

02 de Outubro de 2007

A DECISÃO DO CONTROLE ABSTRATO E SEUS EFEITOS Falamos dos efeitos temporais das decisões de inconstitucionalidade. Para relembrar: Existem, basicamente, duas teorias que se balizam sobre os efeitos temporais das decisões de inconstitucionalidade. Uma é a norte-americana, que diz que os efeitos são necessariamente retroativos. Essa teoria considera incompatível com a supremacia da Constituição se admitir que uma lei inconstitucional produza efeitos válidos. Por isso, a declaração de inconstitucionalidade deve retroagir até o momento de decisão da lei. Por outro lado, há a posição de Kelsen (teoria austríaca) que sustenta que as decisões de inconstitucionalidade têm efeitos ex nunc nas declarações de inconstitucionalidade, prevalece a lei contrária a CF e ela só vai ser invalidada no momento em que for prolatada a decisão judicial. Em todo o mundo – e especialmente no Brasil – houve uma clara preponderância da teoria norte-americana. No Brasil, sempre foi dogma que as decisões declaratórias de inconstitucionalidade têm efeitos retroativos (até o momento da edição da norma). No Brasil, sempre se entendeu que se a lei inconstitucional contraria o seu fundamento de validade – que é a CF – ela não pode produzir efeitos jurídicos válidos. Apesar dessa teoria ser majoritária não só no Brasil como em todo o mundo, esse foi um caso em que “os fatos derrotaram as teorias”. A teoria de que as decisões judiciais têm efeitos necessariamente retroativos é, teoricamente, perfeita. Se a lei inconstitucional contraria a Constituição, que é seu fundamento de validade, ela não pode produzir efeitos jurídicos válidos; se não, prevalece a lei inconstitucional ao invés de prevalecer a Constituição. O problema dessa teoria é prático. Isso porque surgiram, perante as principais forças constitucionais, casos em que a concessão de efeitos retroativos ao invés de sanar o vício de inconstitucionalidade iria agravá-lo. A evolução foi igual para EUA, Alemanha e Brasil: inicialmente, se entendeu que a eficácia necessariamente é retroativa; e, depois, se relativizou. Exemplos: Na Suprema Corte Norte-Americana (pragmáticos), foi o caso Madison versus Marbury. A Suprema Corte, desde o primeiro caso em que se declarou a inconstitucionalidade da lei (1803), sempre afirmou que as decisões de inconstitucionalidade tinham efeitos retroativos. A partir desse caso, ela passou a

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relativizar essa afirmação, ou seja, admitiu a atribuição de efeitos ex nunc às decisões de inconstitucionalidade. O caso dizia respeito à inconstitucionalidade de uma lei que dispunha sobre a produção de provas em processos penais. Nesse processo, constatou-se que essa lei era inconstitucional. O dilema que se colocou para a Suprema Corte foi o seguinte: A lei era inconstitucional. Mas, se a Suprema Corte declarasse a inconstitucionalidade com efeitos retroativos, automaticamente, a declaração de inconstitucionalidade com efeitos retroativos invalidaria todas as condenações criminais feitas com base naquela lei. A Suprema Corte disse que se invalidasse a lei com efeitos retroativos, isso agravaria o vício de inconstitucionalidade, ao invés de saná-lo. Seria mais prejudicial à supremacia da Constituição colocar todos os presos na rua. Então, a Suprema Corte de absteve de dar efeitos retroativos, declarando a retroatividade com efeitos ex nunc, em preservação àquelas condenações criminais. Então, ao declarar a inconstitucionalidade com efeitos ex nunc, a Suprema Corte convalidou todas as condenações criminais pretéritas e impediu que a lei, a partir daquele momento, fosse aplicada. A partir desse caso, a Suprema Corte Norte-Americana (aproximadamente em 1950) começou a entender que a atribuição de efeitos ex tunc ou ex nunc era uma questão de política judiciária. Isso quer dizer que é uma análise que seguia pela conveniência política. O Judiciário dará efeitos ex tunc ou ex nunc de acordo com o que for mais conveniente para o caso concreto. Essa posição, por exemplo, que o Carlos Roberto Siqueira Castro (professor da UERJ) defende, no Brasil. Hoje, a Suprema Corte voltou para sua concepção tradicional de que os efeitos são retroativos – ainda que num caso ou outro, ela relativize. No Tribunal Constitucional Alemão (teóricos), foram criadas duas técnicas de decisão para a relativização dos efeitos temporais30: o apelo ao legislador e a declaração de inconstitucionalidade sem pronuncia de nulidade. O apelo ao legislador corresponde à nossa inconstitucionalidade progressiva. Ou seja, são aqueles casos em que a lei ainda é constitucional, mas está caminhando, aos poucos, para um estado de inconstitucionalidade. É o exemplo da legitimidade do MP propor ação civil ex delicto. Um caso emblemático, na Alemanha, sobre essa questão foi o de uma lei que dispunha sobre os distritos eleitorais – que dividia a Alemanha em distritos. Essa lei estava há muito tempo sem sofrer uma atualização demográfica (era a mesma lei há vinte anos). E houve grandes fluxos entre esses distritos: distritos que eram mais populosos se tornaram menos populosos e vice versa. Quando essa lei foi impugnada, o Tribunal Constitucional Alemão disse que essa lei ainda era constitucional, mas se o Congresso Nacional não atualizasse aquela lei em um prazo determinado, ela se tornaria inconstitucional. É o típico caso da inconstitucionalidade progressiva. OBS.: A mutação constitucional é mais ampla do que a inconstitucionalidade progressiva porque aquela engloba esta; ou seja, pode haver casos de mutação constitucional que são sejam de

30 Isso é muito bem relatado pelo Min. Gilmar Mendes, no livro “Jurisdição Constitucional”.

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inconstitucionalidade progressiva. O caso do exemplo anterior (do tribunal Constitucional Alemão) é de inconstitucionalidade progressiva e de mutação constitucional. Exemplo: Pode-se alterar a interpretação de uma norma constitucional e isso é, também, mutação constitucional. O art. 52, X, CF31, é um caso de mutação constitucional e não de inconstitucionalidade progressiva porque, nesse caso, há duas interpretações: a primeira é de que esse dispositivo serve para dar efeito erga omnes a uma decisão que só tem efeito inter partes. Já a posição de Gilmar Mendes é de que esse dispositivo serve apenas para dar maior publicidade às decisões do STF. Então, houve uma alteração da interpretação da Constituição pela realidade fática e não por alteração da norma. Isso é mutação constitucional. Só que as duas interpretações são constitucionais. Então, não é um caso de inconstitucionalidade progressiva, mas simples mudança de interpretação por alteração da realidade fática. No caso da declaração de inconstitucionalidade sem prenuncia de nulidade, ao contrário do apelo ao legislador, já há inconstitucionalidade no momento da decisão judicial. Só que o STF se abstém de dar efeitos retroativos. O STF declara a inconstitucionalidade, mas sem pronuncia de nulidade, ou seja, sem conceder efeitos ex tunc. Existem, basicamente, três casos em que isso se verifica: (OBS.: Gilmar Mendes defende a aplicação dessas técnicas no Brasil; e, de fato, são adaptáveis à realidade brasileira desde que sejam traduzidas nossas nomenclaturas).

• Inconstitucionalidade por omissão total

• Inconstitucionalidade por omissão parcial

• Lacunas jurídicas ameaçadoras

Já vimos inconstitucionalidade por omissão total e parcial, sendo que o exemplo mais interessante é o de inconstitucionalidade por omissão parcial. Exemplo: Lei de salário mínimo. Por que o Judiciário não deve declarar a inconstitucionalidade com efeitos retroativos (ex tunc) à lei do salário mínimo? Resposta: Por causa dos efeitos repristinatórios. Efeito repristinatório da decisão de inconstitucionalidade significa a volta da vigência da lei revogada pela lei declarada inconstitucional. Para visualizar: Lei Y revoga lei X. É proposta uma ADI impugnando a lei Y. A ADI é julgada procedente, com efeitos ex tunc. A lei X, portanto, é repristinada, ou seja, volta a viger. No caso do salário mínimo, há um efeito repristinatório indesejado porque a última lei aumentou o valor do salário mínimo em relação à lei anterior. Então, a concessão dos efeitos retroativos à declaração de

31 Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal: X - suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal;

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inconstitucionalidade da lei Y, ao invés de resolver, agrava a inconstitucionalidade; porque se R$380,00 não eram suficientes para satisfazer todos os pressupostos do art. 7º, IV32, CF, que dirá R$350,00. Então, nesse caso, declarar a inconstitucionalidade da lei com efeitos retroativos significa não sanar, mas agravar a inconstitucionalidade. Por isso o tribunal não pode dar efeitos retroativos. O Tribunal Constitucional Alemão chama isso de declaração de inconstitucionalidade sem pronuncia de nulidade; nós chamamos de inconstitucionalidade por omissão parcial. O nome que se dá, de fato, não é importante. Importante é o raciocínio que o tribunal desenvolve. Isso é anulabilidade ou declaração de nulidade? Resposta: Sempre se disse, no Brasil, que a declaração de lei inconstitucional era um caso de nulidade absoluta. Com a relativização dos efeitos ex tunc, essa afirmativa também deve ser relativizada. Quando se dá efeitos ex nunc, a hipótese é de anulabilidade. Mas não dá para aplicar a teoria das nulidades do direito civil, totalmente, no direito constitucional. É possível, portanto, utilizar essas nomenclaturas com algumas adaptações necessárias ao direito constitucional. Outro caso de declaração de nulidade sem pronuncia de nulidade – como dizem os alemães – ou de concessão de efeitos ex nunc – como dizem os brasileiros – é o das chamadas lacunas jurídicas ameaçadoras. Muitas vezes, a declaração de inconstitucionalidade de uma lei – que implica a retirada na norma da ordem jurídica – pode gerar um vazio de regulamentação sobre determinada matéria, que pode ser muito prejudicial à segurança jurídica. Exemplo de jurisprudência do STF: O caso do processo de criação dos Municípios (art. 18, §4º33, CF). Como o número de Municípios estava aumentando demais, o constituinte se viu obrigado a “brecar” esse aumento. Para tanto, criou a EC nº15/96, alterando a redação do art.18, §4º da CF. Assim, tornou mais difícil a criação de Municípios. Foi prevista nesse artigo uma lei complementar federal que estabeleceria os requisitos para a criação de municípios – além dos já estabelecidos pelo referido artigo. Apesar da EC ser de 1996, até hoje a lei complementar citada pelo artigo não foi editada. Então, surgiu uma situação caótica, no Brasil. O processo é o seguinte: os Municípios devem respeitar os requisitos do art. 18, §4º, mas eles são efetivamente criados por uma lei estadual. Na prática, com a falta de lei complementar, os municípios não deixaram de ser criados. O que aconteceu foi que cada Município passou a ser criado com a lei do seu Estado.

32 Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: IV - salário mínimo , fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim; 33 4º A criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de Municípios, far-se-ão por lei estadual, dentro do período determinado por Lei Complementar Federal, e dependerão de consulta prévia, mediante plebiscito, às populações dos Municípios envolvidos, após divulgação dos Estudos de Viabilidade Municipal, apresentados e publicados na forma da lei. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 15, de 1996)

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É conveniente declarar a inconstitucionalidade desses Municípios com efeitos retroativos? Resposta: Não. Não é possível fingir que esses Municípios não existem. Já existem prefeitos e vereadores eleitos... Esses Municípios prestam serviços públicos – saúde, educação, assistência social, etc. Em relação a isso, foi proposta uma ADI por omissão contra o art.18, §4º, CF e várias ADIs contra as leis estaduais que criaram os Municípios. O STF julgou essas ADIs de forma conjunta e proferiu a seguinte decisão: na ADI por omissão, o STF julgou procedente – e é óbvio que a hipótese era de procedência porque os dois requisitos para caracterização da inconstitucionalidade por omissão estavam presentes (o dever específico de legislar a lei complementar e mora, pois tinha passado mais de dez anos). Essa decisão é um marco na jurisprudência do STF porque, pela primeira vez, o STF fixou prazo (dezoito meses) para que o legislador legislasse, quando a CF não o fez. Não se sabe exatamente o que acontece caso o legislador não edite a lei. Deve-se esperar por uma ação do STF. O que o STF fez nas ADIs contra as leis estaduais? Resposta: O STF deu a chamada eficácia pró-futuro. Sob o aspecto temporal, existem as seguintes possibilidades de decisão:

• Efeito ex nunc (a decisão judicial vale a partir do momento em que for proferida). Os efeitos produzidos pela norma inconstitucional, entre sua edição e sua prolação ficam convalidados.

• O STF pode citar um momento no passado a partir do qual valerá a decisão judicial. Exemplo: O momento do deferimento de medida cautelar. Nesse caso, só ficam convalidados os efeitos produzidos pela lei inconstitucional no período mais curto; daqui pra frente, vale a decisão judicial.

• Eficácia pró-futuro. Possibilidade do STF fixar um momento no futuro a partir do qual valerá a decisão judicial. Nesse caso, o STF convalida os efeitos produzidos pela lei inconstitucional em todo o período: desde a edição da lei até determinado momento no futuro. A lei inconstitucional – apesar de inconstitucional – produz efeitos válidos.

O que acontece se o tribunal não falar nada sobre os efeitos? Resposta: Os efeitos serão ex tunc (retroação). O tribunal pode se utilizar do art. 27 da lei 9.868/9934 e optar pelas três outras possibilidades de decisão. Foi exatamente a eficácia pró-futuro o que determinou o STF no caso das leis estaduais que criaram Municípios, em observância ao art. 18, §4º, CF. Qual foi o raciocínio desenvolvido pelo STF – em especial pelo Gilmar Mendes?

34 Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.

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Resposta: Dar dezoito meses para o Congresso Nacional editar a lei complementar e, consequentemente fixar os critérios para a criação dos Municípios; e dar mais seis meses para o legislador estadual definir, à luz desse critério, se mantém ou não os Municípios criados. Esses Municípios podem ser remembrados, incorporados a outros Municípios, etc. Gilmar Mendes chamou isso de declaração de inconstitucionalidade sem pronuncia de nulidade. Tem vários outros casos na jurisprudência do STF nesse sentido, não das lacunas jurídicas ameaçadoras, mas da concessão de efeitos ex nunc. Exemplo: A teoria do funcionário de fato. Digamos que um servidor público que está nesse serviço desde os vinte cinco anos completa setenta anos e ele não avisa a ninguém e nem alguém percebe o fato. Ele continuou a celebrar contratos em nome do Estado. Quando ele completou setenta e um anos, perceberam que seu provimento era irregular. O que fazer com os contratos firmados dos setenta aos setenta e um anos do funcionário? Resposta: Há um vício de competência. Os atos não devem ser anulados, mas convalidados, visando à segurança jurídica, à boa fé, etc. Outra questão é a seguinte: havia uma divergência, logo após a CF/88, acerca da obrigatoriedade ou não de concurso público para o preenchimento de empregos públicos na administração indireta. Essa controvérsia só foi resolvida cinco ou dez anos depois da promulgação da Constituição. O problema era o seguinte: e as pessoas que haviam sido providas nesses empregos mas já estavam trabalhando há mais de dez anos? O vício do provimento era inequívoco. Eles entraram num emprego sem concurso público e, então, o STF falou que o concurso era obrigatório. Ninguém discutia que o provimento era irregular. Mesmo sendo irregular o provimento, aquelas pessoas deveriam ser lá mantidas? Ou, em virtude da irregularidade do provimento, elas deveriam ser demitidas? A pergunta era se o Tribunal de Contas podia modular os efeitos dessa declaração de inconstitucionalidade e convalidar o provimento dessas pessoas. A resposta era que sim: poderia e deveria, pelo princípio da segurança jurídica. O fundamental é que havia uma controvérsia sobre obrigatoriedade ou não de concurso público para empregos públicos, sendo que os servidores estavam de boa fé. E, tendo em vista o longo lapso de tempo já decorrido, não seria razoável para a segurança jurídica que se demitisse todos os funcionários. Esse caso, o STF declarou a inconstitucionalidade antes do art. 27 da lei 9.868. Outro caso é o de auxílio de alimentação e transporte para inativos. O Tribunal de contas queria fazer a tese de que, na verdade, quem vinha recebendo até agora, continuaria a receber e, depois da decisão, ninguém receberia mais. Mas a questão é diferente porque uma coisa é auxílio alimentação e transporte e outra coisa é mandar para a rua quem estava antes lá, de boa fé. Não se pode tratar os dois casos na mesma forma.

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Há um projeto de emenda constitucional, que está em tramitação há mais de dez anos, que dá estabilidade a funcionários contratados a menos de cinco anos da CF/88 sem concurso público35. O problema é que o art. 19 da ADCT deu estabilidade àqueles que tinham sido contratados sem concurso público há mais de cinco anos da promulgação da CF/88. Fizeram emendas para que servidores cedidos da União para o Município, por exemplo, ficassem estabilizados no órgão de origem. Nesse caso, a emenda constitucional seria muito inconstitucional, pois talvez nem fosse possível calcular o rombo que isso geraria. Lembrete → A estabilidade não tem efeito financeiro; o efeito da estabilidade é a impossibilidade de demissão sem processo administrativo. Há algumas discussões sobre a constitucionalidade do art. 27 da lei 9.868/99. Uma das suposições contrárias sobre a constitucionalidade desse artigo é de Manoel Gonçalves Ferreira Filho. Ele diz que o artigo 27 desnatura o caráter rígido da CF e transforma o STF num órgão político. Manoel Gonçalves adota a teoria tradicional sobre os efeitos ex tunc e diz que a supremacia da Constituição exige a declaração de inconstitucionalidade com efeitos retroativos; senão, vai prevalecer uma lei inconstitucional, ainda que por um espaço de tempo limitado. É a visão tradicional da teoria norte-americana sobre os efeitos retroativos. Essa teoria, em tese, é perfeita; mas, na prática, existem casos em que a concessão de efeitos retroativos, ao invés de sanar a inconstitucionalidade, a agrava. Na verdade, o que se tem aqui não coloca em risco a supremacia da Constituição, como disse Manoel Gonçalves Ferreira Filho porque o que há na modulação dos efeitos é uma ponderação em princípios constitucionais. Portanto, sempre irá prestigiar a supremacia da Constituição. Se são ponderados dois princípios constitucionais e se vai ganhar a ponderação que tiver maior peso para a Constituição, naquele caso concreto, sempre se vai prestigiar a supremacia da CF. O difícil é saber quais princípios estão nessa ponderação. Para tanto, há uma divergência na doutrina. Qual princípio conduz o STF ao efeito retroativo (ex tunc)? Resposta: Gilmar Mendes entende que é o princípio da nulidade da lei inconstitucional. Já Luis Roberto Barroso e Ana Paula Ávila entendem que é a própria norma constitucional violada. Exemplo: No caso do funcionário de fato, que é o artigo que prevê a aposentadoria compulsória aos setenta anos. É o caso da criação do Município (art. 18, §4º, CF). Não é tão importante saber qual é o princípio ponderado, mas é importante saber que há uma ponderação entre princípios constitucionais que sempre vai prestigiar a supremacia da CF. Do outro lado da balança, o princípio que se coloca – ou seja, o princípio que conduz aos efeitos ex nunc – é o da segurança jurídica, principalmente. Porque aquela lei, apesar de inconstitucional, vinha sendo aplicada e seguida por todos, de boa fé.

35 Esta emenda abrange cento e sessenta mil servidores.

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O art. 27 não fala só em segurança jurídica. Ele fala, também, em excepcional interesse social. Na verdade, aqui, o legislador se utilizou de um contexto indeterminado de forma proposital, porque é impossível se prever de antemão que princípio pode entrar em ponderação. A intenção do legislador era pode abranger várias hipóteses. Há uma ADI perante o STF questionando a constitucionalidade do art. 27 da lei 9.868/99, que prevê a possibilidade de relativização dos efeitos temporais. Tem um voto nessa ADI do ex-ministro Pertence em que ele vota pela inconstitucionalidade do art. 27, com base em outro argumento: só uma emenda constitucional poderia prever a relativização dos efeitos temporais; nunca uma lei ordinária. Essa era também a posição originária do Barroso, mas ele já mudou. Provavelmente o STF não vai adotar esse argumento porque o próprio STF já fazia isso sem lei, sem norma alguma que o autorizasse a modular os efeitos. De fato, não precisa de lei sequer, porque o que se faz é uma ponderação de princípios constitucionais e para isso não é necessário lei. Isso é inerente à aplicação e interpretação da Constituição. Essa é a atual posição do Barroso. A questão final sobre a validade do art. 27 é a seguinte: Qual é o quorum para declarar a inconstitucionalidade de lei? Resposta: Maioria absoluta (princípio da reserva do plenário) – art. 97, CF36. Qual é o quorum para se modular os efeitos (ex nunc, pró-futuro ou momento no passado)? Resposta: É um quorum especial de dois terços – art. 27, 9.868/99. Alguns dizem que se o quorum de maioria absoluta está no art. 97 da CF, um quorum específico só poderia ser criado por uma emenda constitucional, nunca por uma lei ordinária. Gustavo Bijenborn diz que o quorum de maioria absoluta é para hipótese normal de declaração de inconstitucionalidade com efeitos retroativos. As hipóteses de pró-futuro, momento no passado ou ex nunc são hipóteses excepcionais porque o STF convalida os efeitos de uma lei inconstitucional. E exatamente para que essa exceção não se banalize, ou seja, para que ela não vire regra, se justifica um quorum mais rígido.

EFEITOS GERAIS (efeitos erga omnes e vinculantes) Esse tema revela algumas complexidades que estão no auge, no direito brasileiro, que é a dificuldade de compatibilidade do controle incidental no controle abstrato. Exemplo: Sobre o tema que foi debatido em aula (pág.9), pode haver coisa julgada individual, às vezes. E, depois, vem uma ADI em sentido contrário. Essa ADI desconstitui, imediatamente, essa coisa julgada? Desconstitui atos administrativos contrários à decisão da ADI? A propositura de uma ADI suspende o processo? Há muitas questões complicadas na conciliação do nosso modelo.

36 Art. 97. Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público.

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Esse é um tema muito rico, pois a jurisprudência do STF está em evolução, mas ninguém sabe exatamente onde vai parar. A maior parte da doutrina não entendeu toda essa discussão; por isso há tanto desentendimento. Questões importantes: Efeito erga omnes e efeito vinculante são sinônimos? Resposta: Essa questão foi decidida pelo STF na ADC nº1, relatada pelo Min. Moreira Alves. Nessa ocasião, o STF estabeleceu a seguinte distinção:

• Efeito erga omnes significa que a decisão se aplica não só às partes do processo, mas a todos os destinatários da norma.

• Efeito vinculante é um plus de eficácia em relação aos efeitos erga omnes. Na verdade, o efeito vinculante determina, também, a vinculação dos órgãos responsáveis pela vinculação da norma.

Hoje, a tendência é de equiparação do efeito erga omnes com o efeito vinculante, ou seja, que eles se tornem a mesma coisa. Porém, o STF ainda aplica essa diferenciação. Outra questão importante é a seguinte: Que decisões do STF têm essa eficácia geral? Resposta: As decisões que têm eficácia geral são as de controle abstrato. Exemplos: ADIs, ADCs e ACPF. Que decisões do controle incidental têm eficácia geral? Resposta: As que tiverem suas eficácias suspensas pelo Senado, no exercício da competência descrita no art. 52, X, CF e decisões que tenham se transformado em súmulas vinculantes (EC nº45). O Min. Gilmar Mendes tem uma tese mais abrangente. Ele entende que toda e qualquer decisão no controle incidental tem eficácia geral. Isso é uma “revolução” no direito brasileiro, porque sempre se considerou que essas decisões têm efeitos apenas inter partes. A posição majoritária ainda é a primeira: só têm eficácia geral as decisões do controle incidental que tenham sofrido resolução do Senado ou que tenham virado súmula vinculante. Isso é muito importante para um efeito prático do efeito vinculante: o cabimento de reclamação. Se houver os efeitos gerais, dessa decisão cabe reclamação. Exemplo: O STF profere uma decisão pela inconstitucionalidade de uma lei. E, após essa decisão ser publicada, o juiz de primeira instância decide que essa lei é constitucional, adotando uma posição diametralmente antagônica à do STF. Se essa decisão do STF tem efeito geral, cabe reclamação, ou seja, pode-se entrar com um instrumento processual diretamente para o STF. Se o juiz não estiver vinculado a essa decisão do STF, não cabe reclamação.

LIMITES SUBJETIVOS DOS EFEITOS VINCULANTES Ou seja, que órgãos estão sujeitos à decisão do STF, com efeito vinculante? Resposta: Executivo (administração pública federal, estadual, municipal, direta e indireta) e Judiciário. Hoje, se um órgão administrativo descumpre uma decisão do STF, por exemplo, em ADI, cabe reclamação.

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Se um juiz de primeira instância declara constitucional uma lei, depois do STF ter declarado inconstitucional e vice versa, também cabe reclamação. Existe uma auto vinculação do STF, ou seja, o próprio STF está vinculado às suas decisões? Resposta: Não, pois isso significaria a petrificação da jurisprudência do STF. Podemos dizer que o efeito vinculante das decisões do STF se aplica a todos os juizes e tribunais, exceto ao próprio STF. Se o STF julga uma lei constitucional, ele pode depois julgar a mesma lei inconstitucional? Resposta: Pode, pois não se aplica o efeito vinculante a ele próprio. Contudo, a recíproca não é verdadeira, porque ele atuaria como legislador positivo. Se o STF declara uma lei inconstitucional, ele não pode declarar a mesma lei constitucional porque quando ele declarou inconstitucional, ele negou qualquer eficácia à lei. Se depois ele declarasse a mesma lei constitucional, ele não atuaria como legislador negativo, mas como legislador positivo, já que ele re-introduziria a lei declarada inconstitucional pela ordem jurídica. Existe alguma possibilidade do STF ter declarado alguma lei inconstitucional e depois essa jurisprudência ser revertida? Resposta: Sim, na hipótese em que o legislador legisla de novo. Isso porque o efeito vinculante não se aplica ao legislativo. A não aplicação do efeito vinculante ao legislativo, além de estar prevista expressamente na CF (ela só fala dos efeitos vinculantes aos órgãos da administração pública e do Judiciário), se justifica exatamente para garantir a possibilidade do legislador reabrir o debate constitucional sobre a matéria.

LIMITES OBJETIVOS DOS EFEITOS VINCULANTES Que parte da decisão do STF vincula: só o dispositivo ou também a fundamentação? Resposta: Apesar de haver uma briga enorme no STF sobre essa questão, a posição tradicional que – apenas em tese – o STF ainda adota é de que só o dispositivo vincula. Qual é o dispositivo de uma decisão de procedência de uma ADI, por exemplo? Resposta: “A lei X é inconstitucional”. O porquê da inconstitucionalidade – se ela é material ou formal – está na fundamentação e não no dispositivo. Na prática, nem só o dispositivo vincula, para o STF – embora alguns ministros ainda não tenham falado expressamente que também parte da fundamentação vincula. É aqui que entra a questão dos efeitos transcendentes dos motivos determinantes (expressão de Gilmar Mendes). Trata-se do seguinte: não os dispositivos produzem efeitos gerais, mas também parte da fundamentação. É importante fazer a distinção entre dois tipos de motivos:

• Razões de ratio decidendi

• Razões obter dictum São dois tipos de argumentos diferentes que podem embasar as decisões judiciais. As razões obter dictum são “coisas ditas de passagem”, segundo Gilmar Mendes. Ou seja, são razões que até ajudam a decidir, mas não são essenciais para a tese defendida pelo STF. Essas não vinculam.

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As razões de ratio decidendi representam o alicerce argumentativo da decisão, ou seja, na tese jurídica principal se extrai da solução daquele caso concreto, pelo Judiciário. Exemplos: Havia uma instrução normativa do TST que equiparava a preterição da ordem no precatório a duas outras hipóteses, que eram as de não pagamento ou pagamento irregular do precatório. O que o TST queria com essa instrução normativa era comparar isso ao seqüestro de verbas públicas. A CF só prevê o seqüestro de verbas públicas para hipótese de preterição da ordem de pagamento. O Judiciário entende que a Constituição não prevê o seqüestro de verba pública em outras hipóteses, como a não inclusão de precatório em orçamento. Foi proposta uma ADO contra essa instrução normativa e o STF julgou procedente a ADI, dizendo que a única hipótese em que a CF admite o seqüestro de verba pública é a preterição da ordem de pagamento, de forma que a equiparação feita pela instrução normativa, na verdade, significa criação por um lado infraconstitucional de outras hipóteses não previstas na Constituição. Distinguindo essa decisão, o que está no dispositivo e o que está na fundamentação? Resposta: O dispositivo só declara a inconstitucionalidade na instrução normativa e o porquê está na fundamentação. Exemplo: Um juiz de primeira instância trabalhista determinou depois da decisão do STF seqüestro de verba pública pelo não pagamento de precatória. Ou seja, deu uma ordem contrária à decisão do STF. Só que o juiz não citou a instrução normativa do TST que foi declarada inconstitucional. Cabe reclamação no STF?

Resposta: Depende. Para caber, não só os dispositivos, mas tambem os fundamentos devem vincular. Isso porque se so o dispositivo vincular, o que foi declarado inconstitucional foi a decisão X e essa decisão não foi fundamento da decisão do juiz. Então, o juiz não aplicou uma lei que foi declarada inconstitucional pelo STF.

Então, apesar de alguns ministros não admitirem expressamente, há uma tendência inevitável de que também a ratio decidendi vincule. 02 de Outubro de 2007 Na aula passada, falamos sobre efeitos vinculantes. Hoje, entraremos em tópicos finais dentro de ADI, sobre controle abstrato e, depois, entraremos nas outras ações do controle abstrato.

Dica de leitura: Livro de Gilmar Mendes sobre o controle da constitucionalidade.

A Ação Direta é prescritível? Ou seja, pode-se propor uma ADI, por exemplo, quinze anos depois de editada uma lei? Resposta: A doutrina majoritária (inclusive o STF) entende que a ADI é imprescritível, ou seja, ela não está sujeita a nenhum prazo prescricional; portanto, ela pode ser proposta em qualquer momento.

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Barroso tem uma posição minoritária quanto a essa questão. Ele sustenta que se aplica a ADI o prazo geral prescricional estabelecido no art. 20537 do novo CC, que é o prazo de dez anos. O fundamento da aplicação do prazo geral de prescrição é que, para Barroso, a regra geral é a prescritibilidade e não a imprescritibilidade porque isso é uma conseqüência da segurança jurídica. Restringe muito a segurança jurídica a possibilidade eterna da propositura da ação, gerando insegurança. Disso decorre que a prescritibilidade é a regra geral. Logo, no silêncio da lei, se aplica a regra geral que é a prescritibilidade em dez anos. A imprescritibilidade deveria ter uma norma expressa, mas não há nenhuma norma que diga se a ADI é prescritível ou imprescritível. Pode-se entrar com uma ADI quinze anos depois da sua edição, mas o periculum in mora tem que ser provado. Quanto mais antiga for a lei, mais difícil será de se provar o periculum. (Mas o STF conhece a ADI). Para Barroso, que entende que é um prazo prescricional, qual seria o termo a quo? Ou seja, qual seria o marco inicial da contagem desse prazo? Resposta: Depende do tipo de inconstitucionalidade. Se ela foi originária, que é aquela inconstitucionalidade que acomete a norma desde sua edição, o termo a quo é a publicação da lei, quando ela passa a produzir efeitos. Então, para Barroso, o termo a quo seria a publicação da lei, no caso da inconstitucionalidade originária. No caso da inconstitucionalidade superveniente ou progressiva (por exemplo, mutação constitucional), o termo a quo seria o momento em que o vício de constitucionalidade se confirma, ou seja, o memento em que a lei vai avançando e atinge o estágio de inconstitucionalidade.

Lembrete: Inconstitucionalidade superveniente ou progressiva é aquele caso em que a lei nasce constitucional mas, aos poucos, vai se tornando inconstitucional.

Outra discussão diz respeito aos efeitos da decisão no plano abstrato e no plano concreto. No direito brasileiro, há um sistema híbrido de controle de constitucionalidade. Temos, então, um sistema de controle abstrato e de controle concreto. Isso gera algumas complexidades na compatibilização dos dois modelos. Exemplo: A ADI produz imediatamente efeitos no controle abstrato? Ou seja, qual é o efeito da ADI quando ela é julgada procedente? Resposta: O tribunal nega qualquer eficácia jurídica da lei declarada inconstitucional. Isso significa que a ADI produz efeitos imediatos no plano abstrato. Isso porque quanto à publicação de procedência da ADI, a lei perde a sua eficácia jurídica imediatamente – salvo se a decisão for pró-futuro. No plano concreto, os efeitos são imediatos?

37 Art. 205. A prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor.

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Exemplo: Uma lei vigeu durante dez anos. Durante esse período, ela foi eficaz. Foram editados atos jurídicos com base nela. A ADI sobre essa lei é declarada procedente, ou seja, a lei é considerada inconstitucional. O que acontece com esses atos jurídicos e os efeitos nascidos nesse período? Exemplo: Um ato jurídico foi produzido com base numa lei que, depois, é declarada inconstitucional. Não há coisa julgada sobre esse ato jurídico. Com a decisão na ADI – no controle abstrato – automaticamente esse ato jurídico é desfeito? Ou seja, a decisão da ADI produz efeitos imediatos no plano concreto, invalidando todos os atos editados com base na lei inconstitucional? Resposta: Para a corrente majoritária, sim. Porque não que não há que se falar em ato jurídico perfeito cujo fundamento é uma lei inconstitucional. Então, para a corrente majoritária a decisão no plano abstrato produz efeitos imediatos no plano concreto. Ou seja, a decisão da ADI imediatamente invalida todos os atos jurídicos praticados com base na lei inconstitucional. Porém, na prática, isso tem uma conseqüência muito séria que não vem sendo observada. Quanto aos efeitos imediatos, as autoridades administrativas têm o dever d invalidar os atos administrativos editados com base numa lei declarada inconstitucional. Então, se a decisão na ADI produza efeitos imediatos no plano concreto, uma das conseqüências dessa afirmação é que as autoridades administrativas têm o dever de ex officio invalidar atos administrativos praticados com base em lei declarada inconstitucional. Exemplo: Se uma lei que institui um tributo é declarada inconstitucional, a administração pública tem o dever de invalidar todos os autos de infração lavrados com base na lei declarada inconstitucional. Se a decisão do STF tem efeitos imediatos no plano concreto, a administração pública teria o dever de invalidar os autos de infração lavrados naquela lei. A posição de Barroso e de Gilmar Ferreira Mendes é de que a ADI produz efeitos imediatos nos planos abstrato e concreto. O fundamento, aqui, é a vinculação dos três poderes à Constituição. A administração pública também está vinculada à Constituição, tendo o dever de observar as decisões do STF. A idéia de efeitos vinculantes reforçou essa idéia. Inclusive, Barroso sustenta que é dever da autoridade administrativa devolver administrativamente valores indevidamente pagos. Exemplo: Você pagou em crédito tributário e, depois, o STF julga essa lei inconstitucional, a administração pública deveria devolver os valores pagos, aplicando a decisão do STF. A lei que regulamentou a súmula vinculante prevê expressamente a reclamação ao contrato administrativo. A única restrição que lei da súmula vinculante prevê é o esgotamento da instância administrativa. Então, deve-se esgotar a instância administrativa para depois, propor reclamação ao STF.

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Ver lei 11.417/0638. Há uma discussão sobre a constitucionalidade desse dispositivo, se a exigência de esgotamento da instância administrativa prejudica ou não a garantia do amplo acesso ao judiciário. Opinião do professor: Deve-se aplicar, por analogia, a discussão que tem sobre o cabimento do mandado de segurança. O art. 5º da lei de mandado de segurança prevê que não cabe mandado de segurança em efeito de decisão de matéria disciplinar. O que a doutrina majoritária faz é sustentar que esse dispositivo deve sofrer uma interpretação conforme a Constituição. Essa interpretação é que só se exclui o acesso ao judiciário se couber em recurso administrativo com efeito suspensivo (Ou extensivo?) e sem caução. Pode-se interpor um recurso administrativo com efeito suspensivo e sem caução, com a interposição de recursos administrativos vai suspender os efeitos da decisão. Mesmo se couber recurso administrativo sem caução e com efeito suspensivo, pode-se desistir do recurso. Uma ressalva que a doutrina faz é que, apesar da autoridade administrativa ter o dever de aplicar imediatamente a decisão do STF, ela tem que observar seu devido processo legal. Então, se a aplicação da decisão do STF prejudicar interesses subjetivos, ela deve dar aos interessados a oportunidade de defesa. Exemplo: Se a decisão do STF implica a supressão de benefícios distribuídos a vários servidores públicos, ela não deve anular imediatamente esses benefícios. Ela deve, antes, ouvir os servidores e, se for o caso, anular ou não. Mas, antes de anular, ela deve dar oportunidade de defesa aos servidores – que é uma conseqüência do devido processo legal. Trata-se aqui dos casos em que o STF não falou nada quanto aos efeitos, ou seja, eles são efeitos ex tunc (retroativos). Se o STF der efeitos ex nunc à decisão, surge um problema, porque se o STF disser que a decisão só será aplicada a partir de sua publicação, ele convalidará todos os atos praticados no passado. Então, nesse caso, o próprio STF diz, expressamente, que todos os atos praticados no passado têm seus efeitos convalidados. O problema surge quando o STF não diz nada quanto aos efeitos das decisões, pois não se sabe se elas invalidam todos os atos produzidos no passado. Outra questão, muito próxima à anteriormente tratada, é a questão da inconstitucionalidade em abstrato e em concreto. Uma norma pode ser constitucional em abstrato e inconstitucional em concreto.

38 Regulamenta o art. 103-A da Constituição Federal e altera a Lei no 9.784, de 29 de janeiro de 1999,

disciplinando a edição, a revisão e o cancelamento de enunciado de súmula vinculante pelo Supremo Tribunal Federal, e dá outras providências.

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O STF decidiu dessa forma em dois casos, sendo um deles mais rumoroso (ADC nº04). Era a ADC proposta contra a medida provisória que deu origem à lei 9.494. Essa norma estabelece restrições na concessão de liminar contra (Fazenda Pública/ 00:28:23). O que aconteceu foi que boa parte do Judiciário passou a entender que essa norma era inconstitucional porque violava o poder geral de cautela do juiz, que, segundo a doutrina majoritária foi constitucionalizado pelo art. 5º, XXXV, CF39. A lei 9.494, ao estabelecer restrições à concessão de liminar a determinados casos contra a Fazenda, restringiu excessivamente o poder geral de cautela dos juízes e, consequentemente, violou o art. 5º, XXXV, CF. O Presidente da República, sentindo que essa norma não ia vingar, propôs uma ADC para que o STF declarasse a constitucionalidade dessa norma com efeitos vinculantes e erga omnes e, consequentemente, os juízes estariam obrigados a seguir a decisões do STF pela constitucionalidade. A decisão do STF nessa ADC foi pela constitucionalidade, ou seja, julgou procedente a ação declaratória. O problema é que as decisões em ADC têm efeito vinculante, ou seja, todos os juízes e tribunais estão obrigados a seguir a decisão do STF. Então, isso significa que os juizes ou tribunal nunca poderia dar liminar à Fazenda Pública? Resposta: Não. O próprio STF estabeleceu uma “válvula de escape” dizendo que, em controle abstrato, essa norma é constitucional; todavia, nada impede que, em concreto, a lei seja inconstitucional. Ou seja, nada impede que uma determinada incidência da norma, que um determinado caso de aplicação da norma seja inconstitucional. Dessa forma, o STF abriu uma exceção para o juiz não seguir a orientação do STF e não ser acusado de descumprir decisão do STF. Basta ele dizer que, em seu caso, a aplicação da norma é inconstitucional. Há casos em que a vedação à concessão de liminar a Fazenda é inconstitucional e há casos em que não. Exemplo: Uma demanda do pedido de liminar para o fornecimento de um medicamento essencial à saúde. Uma liminar aqui seria inconstitucional, pois se a liminar for concedida o sujeito morre – atentando contra o direito a vida. Assim, a análise deve ser feita caso a caso para saber se aquela incidência sobre a norma é inconstitucional. Ou seja, criou a distinção entre a inconstitucionalidade em abstrato e em concreto. Em abstrato a norma pode ser constitucional, mas ao ser verificada no caso concreto mostra-se inconstitucional. É óbvio que a antecipação de tutela, nesse caso, viola o direito à vida e, portanto, é inconstitucional. Por isso, a análise deve ser feita de acordo com cada caso, a fim de saber se aquela incidência da norma é inconstitucional. Se for inconstitucional e o fundamentar isso bem, ele pode dizer que a incidência é inconstitucional e que, por isso, ele não aplica a decisão do STF.

CONTROLE ABSTRATO E COISA JULGADA

39 XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;

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Essa hipótese revela – melhor do que todas as outras – como é complicado o nosso mecanismo livre do controle de constitucionalidade, ou seja, como essa convivência entre controle incidental e controle abstrato não é nada pacífica. Exemplo: Digamos que transite em julgado uma decisão do TJRJ que declara uma lei constitucional. Depois que essa decisão transita em julgado, vem o STF e declara, em ADI, a mesma lei inconstitucional. Vimos que, a princípio, se um tribunal declara a inconstitucionalidade de uma lei com efeitos ex tunc, não há que se falar em direito adquirido nem em ato jurídico perfeito. Então, a regra é que os supostos direitos de atos jurídicos praticados com base numa lei declarada inconstitucional pelo STF estão devidamente invalidados. Com a aprovação de uma decisão pelo STF pela inconstitucionalidade da lei, essa decisão do STF imediatamente desfaz coisas julgadas contrárias a ela? Resposta: O STF (principalmente Gilmar Mendes) sempre entendeu que não; que a coisa julgada é uma fórmula de preclusão, ou seja, era um limite à retroatividade das decisões declaratórias de constitucionalidade. Ou seja, mesmo que a coisa julgada fosse contrária à decisão do STF em ADI – como no exemplo anterior – a decisão da ADI não desfaz imediatamente a coisa julgada. Isso significa que a coisa julgada não pode ser desfeita, em hipótese alguma? Resposta: Não, pois há a ação rescisória. A jurisprudência tradicional do STF é a seguinte: a decisão da ADI não desfaz automaticamente a coisa julgada e pode-se fazê-lo através da propositura de uma ação rescisória, com base na violação à literal disposição do direito. Inclusive, boa parte da jurisprudência do STF não aplica a súmula 34340 do próprio STF a esse caso. Quando interpretação for sobre matéria constitucional, pouco importa se é controvertida ou não. O problema é se já tiver “estourado” o prazo de dois anos para a propositura da rescisória e se tiver formado a coisa soberanamente julgada. É possível desfazer a coisa soberanamente julgada contrária à decisão do STF? Resposta: O primeiro caso que surgiu no direito positivo brasileiro foi o art. 79141, parágrafo único do CPC, que previu a possibilidade de discutir embargos à execução. Então, uma hipótese é discutir o embargo da execução, se for um caso de execução. Se não for um caso de execução, há como se desconstituir essa coisa soberanamente julgada? Resposta: Recentemente, vem se discutindo a questão da coisa julgada inconstitucional ou a relativização da coisa julgada – o que é uma evolução em relação à posição tradicional. Surgiu um caso que mostra bem porque passa essa idéia a ser relativizada. Foi quando o Estado (ou o Município) de São Paulo propôs uma ação de desapropriação contra um imóvel. A ação correu normalmente; as partes

40 Não cabe ação rescisória por ofensa a literal dispositivo de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais. 41 Parágrafo único. Findo o prazo sem cumprimento da obrigação, o processo retomará o seu curso. (Incluído pela

Lei nº 8.953, de 13.12.1994)

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discutiram o valor da indenização e o juiz fixou o quantum indenizatório. Essa decisão transitou em julgado e se passou o prazo de dois anos. Depois de ter se passado o prazo de dois anos (para propor ação rescisória) a Fazenda Pública descobre que aquele imóvel que foi desapropriado já era seu. É certo a Fazenda Pública pagar por um imóvel que já era seu? Ela entrou com uma ação de querela nulitatis para declarar a nulidade daquela decisão fixada em prevenção, já que ela partiu de um falso pressuposto de que o imóvel era de terceiro. E o STJ anulou essa decisão. Esse é um caso em que cabe a relativização da coisa julgada. Outro caso que vem se admitindo a relativização da coisa julgada é exatamente o caso que temos aqui. Tem uma decisão que vai seguir em julgado no controle incidental, se passa mais de dois anos; e o STF, em ADI, decide uma ordem diversa. Qual é o instrumento processual cabível para desfazer coisa julgada? Resposta: A doutrina tem sido liberal. Alguns autores falam em querela nulitatis e outros autores falam em ação rescisória, mesmo fora do prazo. De fato, a questão do instrumento processual não é a mais importante. Mais importante do que isso é saber o tipo de raciocínio que o juiz faz no momento em que ele recebe uma postulação em relativização da coisa julgada. Para entendermos o raciocínio que o juiz faz, temos que entender o que é a coisa julgada. Qual é a natureza jurídica da coisa julgada para o Direito Constitucional? Resposta: Ela é, na verdade, uma garantia fundamental. Isso porque ela tem a função de ser um instrumento de proteção aos interesses fundamentais. Então, a coisa julgada – assim como o direito adquirido e o ato jurídico perfeito – são instrumentos de proteção da segurança jurídica, que é um direito fundamental. Só que a segurança jurídica é um princípio constitucional que não foi colocado num pedestal pelo constituinte em 1988. A segurança jurídica é um princípio que pode ser ponderado por princípios constitucionais. Uma das características essenciais desses princípios é a ponderabilidade; o fato de estarem sujeitos à ponderação. Então, se a coisa julgada é um instrumento de garantia da segurança jurídica e se a segurança jurídica é ponderável, é óbvio que a coisa julgada não é absoluta. Ela pode ser afastada em casos em que a segurança jurídica for ponderada com outros princípios constitucionais. Então, na verdade, o que se tem aqui é uma ponderação entre a segurança jurídica e outros princípios constitucionais. O que podemos dizer é que a segurança jurídica “larga na frente” nessa ponderação, ou seja, ela tem a prioridade primaface. A coisa julgada é uma garantia muitíssimo importante da segurança jurídica. Na prática, isso significa que só se deve admitir a quebra da coisa julgada em hipóteses excepcionalíssimas, em que for muito clara a violação ao princípio constitucional. A regra é a manutenção da coisa julgada.

AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE A ADI (já estudada) serve como modelo genérico para tratar de várias questões do controle abstrato. Então, nas outras ações específicas ( ADICON, ADI por omissão e ADPF), nos ateremos apenas às peculiaridades, pois o resto é igual à ADI.

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O processo e o julgamento da ação declaratória também foi regulamentado pela lei 9.868/99 (artigos 13 a 21). Se compararmos esses dispositivos aos dispositivos que tratam da ADI, veremos que boa parte é reprodução literal. Uma primeira comparação importante que deve ser feita entre ADI e ADICON é que “essas ações são idênticas, com sinais trocados”42. Isso está no art. 2443 da lei 9.868/99. Isso significa que a procedência da ADI, que é a declaração da inconstitucionalidade da norma, é rigorosamente igual à improcedência da ação declaratória (ADICON). Tanto faz se o Judiciário julga procedente uma ADI ou improcedente uma ADICON. Nos dois casos, ele declara a lei inconstitucional, com efeitos vinculantes erga omnes. E a recíproca é verdadeira. A procedência da ação declaratória corresponde à improcedência da ADI. Em ambos os casos, o tribunal declara a constitucionalidade da norma com efeitos vinculantes erga omnes. Também se chama essa questão de efeito dúplice ou bivalente da ADI e da ADICON. Uma questão fundamental para compreender diversas questões ligadas às Ação Declaratória de Constitucionalidade é entender o porquê do surgimento. O contexto que suscitou o surgimento da ação declaratória e, principalmente, a finalidade do legislador. A Ação Declaratória não foi criada pela Constituição de 1988. Ela é criação da EC nº03, concedida por Gilmar Mendes. O exemplo a seguir, apesar de posterior à criação da EC nº03/93, ilustra bem pra que serve. Exemplo: As privatizações do governo de Fernando Henrique Cardoso (a privatização da Vale do Rio Doce, especificamente). Logo antes da privatização da Vale, houve uma enxurrada de ações públicas, populares, mandados de segurança, etc., pedindo a suspensão do leilão da Vale. Na véspera do leilão, a AGU teve que mobilizar advogados do Brasil inteiro para cassar liminares e não se sabia se o leilão ia acontecer ou não. Um sistema como esse, gera insegurança jurídica, obviamente. Que investidor vai botar dezenas de milhões de reais num investimento que o juiz da comarca de Quissamã pode dar liminar suspendendo? Esse é um sistema irracional, que gera insegurança jurídica. Então, a ADC foi criada exatamente nesses casos em que haja uma controvérsia inicial relevante sobre a constitucionalidade de uma norma. Esse é um pressuposto específico da Ação Declaratória que não está presente na ADI. Só cabe ADC se se instalar no Judiciário uma controvérsia sobre a constitucionalidade da norma. É óbvio que, se todo mundo concordar que a lei é constitucional, e tendo em vista o fato de que as leis já têm presunção de constitucionalidade, para quê propor uma ADC? Para que serve, então, a ADC? Resposta: Serve exatamente nesse caso, em que se instala perante o Judiciário uma controvérsia judicial relevante sobre a constitucionalidade de uma norma. E a ADC foi concebida para se levar essa questão

42 Expressão criada por Gilmar Mendes. 43 Art. 24. Proclamada a constitucionalidade, julgar-se-á improcedente a ação direta ou procedente eventual ação

declaratória; e, proclamada a inconstitucionalidade, julgar-se-á procedente a ação direta ou improcedente eventual

ação declaratória.

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de forma direta e rápida ao STF. Só que o STF tem um instrumento para pacificar essa controvérsia de forma séria e definitiva. Isso traz segurança jurídica e coerência ao sistema (o fato do Judiciário dar de forma rápida uma decisão sobre a matéria). Em suma, este é o propósito da Ação Declaratória: ser um instrumento que propicie que o STF decida de forma rápida e definitiva a constitucionalidade de uma lei que vinha gerando controvérsias no Judiciário. É por isso que a ADC tem uma condição específica de pressupositividade (art. 14, III, CF44). Então, o autor tem que comprovar na inicial que há uma controvérsia judicial relevante sobre a constitucionalidade daquela norma. Como que o autor prova isso? Resposta: Juntando decisões judiciárias que tenham declarado a lei inconstitucional. Qual é o pedido na ADC? Resposta: Que se declare a lei constitucional. Só que ele vai ter que juntar decisões que tenham declarado a lei inconstitucional para provar que há uma controvérsia judicial relevante sobre a constitucionalidade da norma. Logo após a EC nº03, houve uma reação muito grande entre juízes e advogados quanto a essa emenda, sendo feitas várias críticas a ela. Uma delas é que a EC nº 03, ao criar ADC, violaria os princípios do juiz natural e da liberdade de convicção do juiz natural. Argumentava-se que o juiz viraria um calibrador de decisões do STF. Exemplo: Há ma ação popular na Vara de Fazenda Pública cujo juiz natural é o da comarca da capital do Rio de Janeiro, questionando o caráter incidental à constitucionalidade de uma norma.

(Lembrete: O efeito principal da liminar, na ADC, é suspender os processos).

É proposta uma ADC perante o STF e este dá liminar suspendendo o processo. Depois, o STF declara a lei constitucional. Como a decisão na ação declaratória tem efeito vinculante, o juiz está obrigado a acatar de plano a decisão do STF, não podendo julgar inconstitucional. Se ele julgar constitucional uma lei que o STF declarou inconstitucional, cabe reclamação. O STF acolheu essa crítica dos juízes e advogados? Resposta: Na verdade, essa crítica não se opõe apenas à ADC, mas é uma crítica genérica às decisões de efeito vinculante do STF. O STF não acolheu a crítica e disse que isso é só mais um instrumento de controle abstrato sujeito à competência originária do STF. Outros dois argumentos que poderiam ser utilizados são que os efeitos vinculantes não geram, necessariamente, uma “camisa de força”. Há mecanismos, válvulas de escape, como os seguintes:

44 Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual

para todos, e, nos termos da lei, mediante:

III - iniciativa popular.

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• A não vinculação do STF às suas próprias decisões (superação de precedente).

• O efeito vinculante não se aplica ao legislador. Ele pode legislar de forma contrária à jurisprudência do STF e até alterá-la.

• A técnica do “distinguish” (ou distinção). Significa dizer o juiz que seu caso é diferente daquele da jurisprudência do STF, pois seu caso tem peculiaridades fáticas diferentes das do caso julgado pelo STF e essas peculiaridades justificam uma decisão diferente.

Outra crítica que se faz à ADC é que ela seria inócua. Alguns autores dizem que há presunção de constitucionalidade e, por isso, não haveria necessidade de declarar constitucional uma lei assim já é presumida. Contudo, isso não é, de fato, uma redundância. Isso porque a ADC está sujeita a um requisito, que é a existência de controvérsia judicial sobre a constitucionalidade da norma. Se não houver controvérsia, a ADC é inócua. Mas, se a divergência é grande quanto a constitucionalidade da norma, há imenso interesse em se levar a questão ao STF para que ela seja pacificada, visando à segurança jurídica. Dizem uns autores que a ADC transforma a presunção de constitucionalidade – que era relativa – em quase absoluta, tendo em vista os efeitos vinculantes.

Será que a ADC é inconstitucional e viola o princípio do contraditório? Resposta: Na ADI o pedido do autor é a declaração de inconstitucionalidade de uma norma, o AGU defende a constitucionalidade. Assim, a ADI se estabelece por um “contraditório”, uma oposição de argumentos. Já na ADC, o pedido é a declaração de constitucionalidade. Não existe nenhum órgão que tenha a função de defender a inconstitucionalidade da lei (opostamente ao que ocorre com a ADI). Então, na ADC, não há o “contraditório”. Há duas formas de se opor ao argumento de que a ADC seria inconstitucional ou violaria o princípio do contraditório. A primeira foi utilizada pelo Ministro Moreira Alves (relator), que disse que o princípio do contraditório é uma garantia fundamental, ou seja, é um instrumento de proteção dos direitos fundamentais, porque garante que o indivíduo não vá ter um direito subjetivo seu suprimido senão depois de ter a oportunidade de se defender.

Há direitos em jogo na ADI e na ADICON? Resposta: Não, porque o controle é abstrato e o processo é objetivo.

Conclui-se, então, que o contraditório não de observância necessária na ADC porque não há direitos subjetivos a serem defendidos.

Há outro argumento que minimiza esse problema, que é exatamente o requisito do art. 14,III, CF: a necessidade de demonstração de controvérsia judicial relevante. Na prática, o que acontece é que o autor vai sustentar da ADC a tese da constitucionalidade da norma e vai juntar decisões que a tenham declarado inconstitucional. O resultado disso é que, mal ou bem, chegam ao STF as duas teses – tanto a da constitucionalidade quanto a da inconstitucionalidade. Isso é o que minimiza o problema de não ter uma autoridade que defenda a inconstitucionalidade da norma. Qual é o efeito da liminar na ADC?

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Resposta: Fazendo uma análise comparativa, o efeito de liminar na ADI é a suspensão cautelar da eficácia da lei que é objeto da ação. Na prática, essa suspensão significa que o juiz não pode aplicar aquela lei. Na ADC, o que acontece é a suspensão dos processos em que se discute a constitucionalidade da norma. Os processos ficam suspensos e o STF tem cento e oitenta dias para decidir o mérito da ADC. E, depois, o juiz do tribunal – a princípio – vai ter que seguir a decisão do STF pelo efeito vinculante. Uma outra diferença entre a ADC e a ADI refere-se ao seu objeto. A ADI pode ser proposta em face de leis ou atos normativos federais e estaduais. A ADC só pode ser proposta em face de leis ou atos normativos federais. Outra questão importante é quanto à legitimidade. O art. 13 da lei está com um rol antigo de legitimados, que foi alterado pelo art. 103 da CF (pela EC nº45). Isso foi necessário porque o art. 13 CF previa um rol mais restrito de legitimados para propositura da ADC. A EC nº45, na alteração que fez ao art. 103, CF, equiparou os legitimados da ADI aos da ADC.

ADI POR OMISSÃO Os requisitos são a existência de um dever constitucional específico de legislar e mora legislativa. A inconstitucionalidade pode, também, ser total ou parcial. A CF/88 foi uma das constituições mais progressistas na tutela da inconstitucionalidade por omissão. A CF/88 buscou inspiração na Constituição Portuguesa de 1976, que também é uma Constituição muito ativa na tutela da inconstitucionalidade por omissão – mas com razão história fácil de entender ( o projeto da Constituição foi socialista). A CF/88 adotou, basicamente, dois instrumentos de tutela da inconstitucionalidade por omissão: um instrumento de controle em abstrato (ADI por omissão) e o instrumento de controle em concreto (mandado de injunção). O STF restringiu muito a eficácia desses instrumentos.

Ver art. 103, §2º, CF:

§ 2º - Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias.

A Constituição fixa prazo para o Executivo cumprir a sua função normativa (trinta dias), mas não fixa prazo quando o órgão omisso é o Legislativo. Por isso que tradicionalmente o STF entendeu que a decisão na ADI por omissão do legislativo tem uma natureza puramente declaratória. Como a Constituição não fixa prazo para que o Legislativo supra a omissão, o STF sempre entendeu que a decisão na ADI por omissão, quando esta era do Legislativo, tinha uma natureza meramente declaratória. Ou seja, o tribunal se limitava a dar ciência ao Legislativo de que ele estava omisso. Isso

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gerou um descrédito do próprio STF, pois a decisão é declarada e nada se faz a respeito disso, já que o Legislativo não tem prazo para apresentar novos projetos de lei.

O STF vem dando sinais de avanço – principalmente no Mandado de Injunção – também aqui, na ADI por omissão. Ver art. 18, §4º, CF:

§ 4º A criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de Municípios, far-se-ão por lei estadual, dentro do período determinado por Lei Complementar Federal, e dependerão de consulta prévia, mediante plebiscito, às populações dos Municípios envolvidos, após divulgação dos Estudos de Viabilidade Municipal, apresentados e publicados na forma da lei. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 15, de 1996) .

Uma das decisões mais importantes do STF, neste ano, foi sobre a criação de Municípios (ver artigo acima). A questão da criação de Municípios estava muito mal amparada. A EC nº15/96 alterou a redação do art. 18, §4º. Sabe-se que o Brasil tem Municípios demais. Num determinado momento, o Congresso Nacional resolveu limitar a criação de novos Municípios. Exatamente para isso, criou a EC nº16/95 que tornava mais difícil a criação de novos municípios, estabelecendo novos requisitos. Uma nova exigência foi a necessidade de edição de Lei Complementar Federal. A emenda que exigiu essa lei complementar é de 1996. Até hoje (2007) essa lei não foi editada. Nesse ínterim, os Municípios não deixaram de ser criados. Cada Estado a que pertenciam os novos Municípios tinha sua própria legislação para criação de Municípios. Assim, apesar da Constituição exigir Lei Complementar Federal, os Municípios têm sido criados de acordo com as leis estaduais, de forma aleatória. Essa questão chegou ao STF da seguinte forma: foi proposta uma ADI por omissão em relação ao art. 18, §4º e foram propostas várias ADIs em face das leis estaduais que criaram os municípios. O STF, então, optou por julgar todas as ADIs juntas. O STF não tinha como não declarar a inconstitucionalidade por omissão. Essa decisão é um marco na jurisprudência do STF porque ele não se limitou a dar ciência ao Congresso Nacional de que ele estava em mora. O próprio STF fixou o prazo de dezoito meses para que o Congresso Nacional legisle, sem que a CF estabeleça esse prazo. O STF declarou a inconstitucionalidade das leis estaduais que criavam Municípios, com efeito pró-futuro (art. 27 da lei 9.868/99).

Lembrete:

Eficácia pró-futuro: O STF fixou um momento no futuro a partir do qual valerá a decisão. Assim, ele convalidou todos os efeitos produzidos pela lei

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inconstitucional de criação dos Municípios, desde sua edição até esse momento no futuro, que foi de vinte e quatro meses a partir da publicação.

Portanto, apesar da lei ser inconstitucional, ela continua a valer por todo o lapso de tempo. A doutrina critica, dizendo que o STF eternizou uma lei inconstitucional, violando a supremacia da Constituição. O problema é que não seria possível dar eficácia ex tunc e fingir que os Municípios criados nunca existiram. Nesse período, prefeitos e vereadores foram eleitos, tributos foram recolhidos, serviços públicos foram prestados, etc. O STF fez bem em dar a eficácia pró-futuro porque essa decisão foi articulada com a decisão da ADI por omissão. Ele deu dezoito meses para que o Congresso Nacional editasse os critérios nacionais para criação de Municípios e mais seis meses (totalizando vinte e quatro) para que o legislador estadual decida, à luz dos critérios fixados pelo Congresso Nacional, se mantém ou não aquele Município. Cabe liminar na ADI por omissão? Resposta: A jurisprudência tradicional do STF diz que não porque o efeito adicional da decisão é dar mera ciência e não faz sentido antecipar a mera ciência da decisão. E não há participação do AGU. O argumento tradicional é que, como a ADI é por omissão, não há ato cuja constitucionalidade deva ser defendida pelo AGU.

02 de Outubro de 2007 Na aula passada, falamos sobre efeitos vinculantes. Hoje, entraremos em tópicos finais dentro de ADI, sobre controle abstrato e, depois, entraremos nas outras ações do controle abstrato.

Dica de leitura: Livro de Gilmar Mendes sobre o controle da constitucionalidade.

A Ação Direta é prescritível? Ou seja, pode-se propor uma ADI, por exemplo, quinze anos depois de editada uma lei? Resposta: A doutrina majoritária (inclusive o STF) entende que a ADI é imprescritível, ou seja, ela não está sujeita a nenhum prazo prescricional; portanto, ela pode ser proposta em qualquer momento. Barroso tem uma posição minoritária quanto a essa questão. Ele sustenta que se aplica a ADI o prazo geral prescricional estabelecido no art. 20545 do novo CC, que é o prazo de dez anos. O fundamento da aplicação do prazo geral de prescrição é que, para Barroso, a regra geral é a prescritibilidade e não a imprescritibilidade porque isso é uma conseqüência da segurança jurídica.

45 Art. 205. A prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor.

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Restringe muito a segurança jurídica a possibilidade eterna da propositura da ação, gerando insegurança. Disso decorre que a prescritibilidade é a regra geral. Logo, no silêncio da lei, se aplica a regra geral que é a prescritibilidade em dez anos. A imprescritibilidade deveria ter uma norma expressa, mas não há nenhuma norma que diga se a ADI é prescritível ou imprescritível. Pode-se entrar com uma ADI quinze anos depois da sua edição, mas o periculum in mora tem que ser provado. Quanto mais antiga for a lei, mais difícil será de se provar o periculum. (Mas o STF conhece a ADI). Para Barroso, que entende que é um prazo prescricional, qual seria o termo a quo? Ou seja, qual seria o marco inicial da contagem desse prazo? Resposta: Depende do tipo de inconstitucionalidade. Se ela foi originária, que é aquela inconstitucionalidade que acomete a norma desde sua edição, o termo a quo é a publicação da lei, quando ela passa a produzir efeitos. Então, para Barroso, o termo a quo seria a publicação da lei, no caso da inconstitucionalidade originária. No caso da inconstitucionalidade superveniente ou progressiva (por exemplo, mutação constitucional), o termo a quo seria o momento em que o vício de constitucionalidade se confirma, ou seja, o memento em que a lei vai avançando e atinge o estágio de inconstitucionalidade.

Lembrete: Inconstitucionalidade superveniente ou progressiva é aquele caso em que a lei nasce constitucional mas, aos poucos, vai se tornando inconstitucional.

Outra discussão diz respeito aos efeitos da decisão no plano abstrato e no plano concreto. No direito brasileiro, há um sistema híbrido de controle de constitucionalidade. Temos, então, um sistema de controle abstrato e de controle concreto. Isso gera algumas complexidades na compatibilização dos dois modelos. Exemplo: A ADI produz imediatamente efeitos no controle abstrato? Ou seja, qual é o efeito da ADI quando ela é julgada procedente? Resposta: O tribunal nega qualquer eficácia jurídica da lei declarada inconstitucional. Isso significa que a ADI produz efeitos imediatos no plano abstrato. Isso porque quanto à publicação de procedência da ADI, a lei perde a sua eficácia jurídica imediatamente – salvo se a decisão for pró-futuro. No plano concreto, os efeitos são imediatos? Exemplo: Uma lei vigeu durante dez anos. Durante esse período, ela foi eficaz. Foram editados atos jurídicos com base nela. A ADI sobre essa lei é declarada procedente, ou seja, a lei é considerada inconstitucional. O que acontece com esses atos jurídicos e os efeitos nascidos nesse período? Exemplo: Um ato jurídico foi produzido com base numa lei que, depois, é declarada inconstitucional. Não há coisa julgada sobre esse ato jurídico. Com a decisão na ADI – no controle abstrato – automaticamente esse ato jurídico é desfeito? Ou seja, a decisão da ADI produz efeitos imediatos no plano concreto, invalidando todos os atos editados com base na lei inconstitucional?

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Resposta: Para a corrente majoritária, sim. Porque não que não há que se falar em ato jurídico perfeito cujo fundamento é uma lei inconstitucional. Então, para a corrente majoritária a decisão no plano abstrato produz efeitos imediatos no plano concreto. Ou seja, a decisão da ADI imediatamente invalida todos os atos jurídicos praticados com base na lei inconstitucional. Porém, na prática, isso tem uma conseqüência muito séria que não vem sendo observada. Quanto aos efeitos imediatos, as autoridades administrativas têm o dever d invalidar os atos administrativos editados com base numa lei declarada inconstitucional. Então, se a decisão na ADI produza efeitos imediatos no plano concreto, uma das conseqüências dessa afirmação é que as autoridades administrativas têm o dever de ex officio invalidar atos administrativos praticados com base em lei declarada inconstitucional. Exemplo: Se uma lei que institui um tributo é declarada inconstitucional, a administração pública tem o dever de invalidar todos os autos de infração lavrados com base na lei declarada inconstitucional. Se a decisão do STF tem efeitos imediatos no plano concreto, a administração pública teria o dever de invalidar os autos de infração lavrados naquela lei. A posição de Barroso e de Gilmar Ferreira Mendes é de que a ADI produz efeitos imediatos nos planos abstrato e concreto. O fundamento, aqui, é a vinculação dos três poderes à Constituição. A administração pública também está vinculada à Constituição, tendo o dever de observar as decisões do STF. A idéia de efeitos vinculantes reforçou essa idéia. Inclusive, Barroso sustenta que é dever da autoridade administrativa devolver administrativamente valores indevidamente pagos. Exemplo: Você pagou em crédito tributário e, depois, o STF julga essa lei inconstitucional, a administração pública deveria devolver os valores pagos, aplicando a decisão do STF. A lei que regulamentou a súmula vinculante prevê expressamente a reclamação ao contrato administrativo. A única restrição que lei da súmula vinculante prevê é o esgotamento da instância administrativa. Então, deve-se esgotar a instância administrativa para depois, propor reclamação ao STF. Ver lei 11.417/0646. Há uma discussão sobre a constitucionalidade desse dispositivo, se a exigência de esgotamento da instância administrativa prejudica ou não a garantia do amplo acesso ao judiciário. Opinião do professor: Deve-se aplicar, por analogia, a discussão que tem sobre o cabimento do mandado de segurança.

46 Regulamenta o art. 103-A da Constituição Federal e altera a Lei no 9.784, de 29 de janeiro de 1999,

disciplinando a edição, a revisão e o cancelamento de enunciado de súmula vinculante pelo Supremo Tribunal Federal, e dá outras providências.

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O art. 5º da lei de mandado de segurança prevê que não cabe mandado de segurança em efeito de decisão de matéria disciplinar. O que a doutrina majoritária faz é sustentar que esse dispositivo deve sofrer uma interpretação conforme a Constituição. Essa interpretação é que só se exclui o acesso ao judiciário se couber em recurso administrativo com efeito suspensivo (Ou extensivo?) e sem caução. Pode-se interpor um recurso administrativo com efeito suspensivo e sem caução, com a interposição de recursos administrativos vai suspender os efeitos da decisão. Mesmo se couber recurso administrativo sem caução e com efeito suspensivo, pode-se desistir do recurso. Uma ressalva que a doutrina faz é que, apesar da autoridade administrativa ter o dever de aplicar imediatamente a decisão do STF, ela tem que observar seu devido processo legal. Então, se a aplicação da decisão do STF prejudicar interesses subjetivos, ela deve dar aos interessados a oportunidade de defesa. Exemplo: Se a decisão do STF implica a supressão de benefícios distribuídos a vários servidores públicos, ela não deve anular imediatamente esses benefícios. Ela deve, antes, ouvir os servidores e, se for o caso, anular ou não. Mas, antes de anular, ela deve dar oportunidade de defesa aos servidores – que é uma conseqüência do devido processo legal. Trata-se aqui dos casos em que o STF não falou nada quanto aos efeitos, ou seja, eles são efeitos ex tunc (retroativos). Se o STF der efeitos ex nunc à decisão, surge um problema, porque se o STF disser que a decisão só será aplicada a partir de sua publicação, ele convalidará todos os atos praticados no passado. Então, nesse caso, o próprio STF diz, expressamente, que todos os atos praticados no passado têm seus efeitos convalidados. O problema surge quando o STF não diz nada quanto aos efeitos das decisões, pois não se sabe se elas invalidam todos os atos produzidos no passado. Outra questão, muito próxima à anteriormente tratada, é a questão da inconstitucionalidade em abstrato e em concreto. Uma norma pode ser constitucional em abstrato e inconstitucional em concreto. O STF decidiu dessa forma em dois casos, sendo um deles mais rumoroso (ADC nº04). Era a ADC proposta contra a medida provisória que deu origem à lei 9.494. Essa norma estabelece restrições na concessão de liminar contra (Fazenda Pública/ 00:28:23). O que aconteceu foi que boa parte do Judiciário passou a entender que essa norma era inconstitucional porque violava o poder geral de cautela do juiz, que, segundo a doutrina majoritária foi constitucionalizado pelo art. 5º, XXXV, CF47. A lei 9.494, ao estabelecer restrições à concessão de liminar a determinados casos contra a Fazenda, restringiu excessivamente o poder geral de cautela dos juízes e, consequentemente, violou o art. 5º, XXXV, CF.

47 XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;

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O Presidente da República, sentindo que essa norma não ia vingar, propôs uma ADC para que o STF declarasse a constitucionalidade dessa norma com efeitos vinculantes e erga omnes e, consequentemente, os juízes estariam obrigados a seguir a decisões do STF pela constitucionalidade. A decisão do STF nessa ADC foi pela constitucionalidade, ou seja, julgou procedente a ação declaratória. O problema é que as decisões em ADC têm efeito vinculante, ou seja, todos os juízes e tribunais estão obrigados a seguir a decisão do STF. Então, isso significa que os juizes ou tribunal nunca poderia dar liminar à Fazenda Pública? Resposta: Não. O próprio STF estabeleceu uma “válvula de escape” dizendo que, em controle abstrato, essa norma é constitucional; todavia, nada impede que, em concreto, a lei seja inconstitucional. Ou seja, nada impede que uma determinada incidência da norma, que um determinado caso de aplicação da norma seja inconstitucional. Dessa forma, o STF abriu uma exceção para o juiz não seguir a orientação do STF e não ser acusado de descumprir decisão do STF. Basta ele dizer que, em seu caso, a aplicação da norma é inconstitucional. Há casos em que a vedação à concessão de liminar a Fazenda é inconstitucional e há casos em que não. Exemplo: Uma demanda do pedido de liminar para o fornecimento de um medicamento essencial à saúde. Uma liminar aqui seria inconstitucional, pois se a liminar for concedida o sujeito morre – atentando contra o direito a vida. Assim, a análise deve ser feita caso a caso para saber se aquela incidência sobre a norma é inconstitucional. Ou seja, criou a distinção entre a inconstitucionalidade em abstrato e em concreto. Em abstrato a norma pode ser constitucional, mas ao ser verificada no caso concreto mostra-se inconstitucional. É óbvio que a antecipação de tutela, nesse caso, viola o direito à vida e, portanto, é inconstitucional. Por isso, a análise deve ser feita de acordo com cada caso, a fim de saber se aquela incidência da norma é inconstitucional. Se for inconstitucional e o fundamentar isso bem, ele pode dizer que a incidência é inconstitucional e que, por isso, ele não aplica a decisão do STF.

CONTROLE ABSTRATO E COISA JULGADA Essa hipótese revela – melhor do que todas as outras – como é complicado o nosso mecanismo livre do controle de constitucionalidade, ou seja, como essa convivência entre controle incidental e controle abstrato não é nada pacífica. Exemplo: Digamos que transite em julgado uma decisão do TJRJ que declara uma lei constitucional. Depois que essa decisão transita em julgado, vem o STF e declara, em ADI, a mesma lei inconstitucional. Vimos que, a princípio, se um tribunal declara a inconstitucionalidade de uma lei com efeitos ex tunc, não há que se falar em direito adquirido nem em ato jurídico perfeito. Então, a regra é que os supostos direitos de atos jurídicos praticados com base numa lei declarada inconstitucional pelo STF estão devidamente invalidados.

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Com a aprovação de uma decisão pelo STF pela inconstitucionalidade da lei, essa decisão do STF imediatamente desfaz coisas julgadas contrárias a ela? Resposta: O STF (principalmente Gilmar Mendes) sempre entendeu que não; que a coisa julgada é uma fórmula de preclusão, ou seja, era um limite à retroatividade das decisões declaratórias de constitucionalidade. Ou seja, mesmo que a coisa julgada fosse contrária à decisão do STF em ADI – como no exemplo anterior – a decisão da ADI não desfaz imediatamente a coisa julgada. Isso significa que a coisa julgada não pode ser desfeita, em hipótese alguma? Resposta: Não, pois há a ação rescisória. A jurisprudência tradicional do STF é a seguinte: a decisão da ADI não desfaz automaticamente a coisa julgada e pode-se fazê-lo através da propositura de uma ação rescisória, com base na violação à literal disposição do direito. Inclusive, boa parte da jurisprudência do STF não aplica a súmula 34348 do próprio STF a esse caso. Quando interpretação for sobre matéria constitucional, pouco importa se é controvertida ou não. O problema é se já tiver “estourado” o prazo de dois anos para a propositura da rescisória e se tiver formado a coisa soberanamente julgada. É possível desfazer a coisa soberanamente julgada contrária à decisão do STF? Resposta: O primeiro caso que surgiu no direito positivo brasileiro foi o art. 79149, parágrafo único do CPC, que previu a possibilidade de discutir embargos à execução. Então, uma hipótese é discutir o embargo da execução, se for um caso de execução. Se não for um caso de execução, há como se desconstituir essa coisa soberanamente julgada? Resposta: Recentemente, vem se discutindo a questão da coisa julgada inconstitucional ou a relativização da coisa julgada – o que é uma evolução em relação à posição tradicional. Surgiu um caso que mostra bem porque passa essa idéia a ser relativizada. Foi quando o Estado (ou o Município) de São Paulo propôs uma ação de desapropriação contra um imóvel. A ação correu normalmente; as partes discutiram o valor da indenização e o juiz fixou o quantum indenizatório. Essa decisão transitou em julgado e se passou o prazo de dois anos. Depois de ter se passado o prazo de dois anos (para propor ação rescisória) a Fazenda Pública descobre que aquele imóvel que foi desapropriado já era seu. É certo a Fazenda Pública pagar por um imóvel que já era seu? Ela entrou com uma ação de querela nulitatis para declarar a nulidade daquela decisão fixada em prevenção, já que ela partiu de um falso pressuposto de que o imóvel era de terceiro. E o STJ anulou essa decisão. Esse é um caso em que cabe a relativização da coisa julgada.

48 Não cabe ação rescisória por ofensa a literal dispositivo de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais. 49 Parágrafo único. Findo o prazo sem cumprimento da obrigação, o processo retomará o seu curso. (Incluído pela

Lei nº 8.953, de 13.12.1994)

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Outro caso que vem se admitindo a relativização da coisa julgada é exatamente o caso que temos aqui. Tem uma decisão que vai seguir em julgado no controle incidental, se passa mais de dois anos; e o STF, em ADI, decide uma ordem diversa. Qual é o instrumento processual cabível para desfazer coisa julgada? Resposta: A doutrina tem sido liberal. Alguns autores falam em querela nulitatis e outros autores falam em ação rescisória, mesmo fora do prazo. De fato, a questão do instrumento processual não é a mais importante. Mais importante do que isso é saber o tipo de raciocínio que o juiz faz no momento em que ele recebe uma postulação em relativização da coisa julgada. Para entendermos o raciocínio que o juiz faz, temos que entender o que é a coisa julgada. Qual é a natureza jurídica da coisa julgada para o Direito Constitucional? Resposta: Ela é, na verdade, uma garantia fundamental. Isso porque ela tem a função de ser um instrumento de proteção aos interesses fundamentais. Então, a coisa julgada – assim como o direito adquirido e o ato jurídico perfeito – são instrumentos de proteção da segurança jurídica, que é um direito fundamental. Só que a segurança jurídica é um princípio constitucional que não foi colocado num pedestal pelo constituinte em 1988. A segurança jurídica é um princípio que pode ser ponderado por princípios constitucionais. Uma das características essenciais desses princípios é a ponderabilidade; o fato de estarem sujeitos à ponderação. Então, se a coisa julgada é um instrumento de garantia da segurança jurídica e se a segurança jurídica é ponderável, é óbvio que a coisa julgada não é absoluta. Ela pode ser afastada em casos em que a segurança jurídica for ponderada com outros princípios constitucionais. Então, na verdade, o que se tem aqui é uma ponderação entre a segurança jurídica e outros princípios constitucionais. O que podemos dizer é que a segurança jurídica “larga na frente” nessa ponderação, ou seja, ela tem a prioridade primaface. A coisa julgada é uma garantia muitíssimo importante da segurança jurídica. Na prática, isso significa que só se deve admitir a quebra da coisa julgada em hipóteses excepcionalíssimas, em que for muito clara a violação ao princípio constitucional. A regra é a manutenção da coisa julgada.

AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE A ADI (já estudada) serve como modelo genérico para tratar de várias questões do controle abstrato. Então, nas outras ações específicas ( ADICON, ADI por omissão e ADPF), nos ateremos apenas às peculiaridades, pois o resto é igual à ADI. O processo e o julgamento da ação declaratória também foi regulamentado pela lei 9.868/99 (artigos 13 a 21). Se compararmos esses dispositivos aos dispositivos que tratam da ADI, veremos que boa parte é reprodução literal.

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Uma primeira comparação importante que deve ser feita entre ADI e ADICON é que “essas ações são idênticas, com sinais trocados”50. Isso está no art. 2451 da lei 9.868/99. Isso significa que a procedência da ADI, que é a declaração da inconstitucionalidade da norma, é rigorosamente igual à improcedência da ação declaratória (ADICON). Tanto faz se o Judiciário julga procedente uma ADI ou improcedente uma ADICON. Nos dois casos, ele declara a lei inconstitucional, com efeitos vinculantes erga omnes. E a recíproca é verdadeira. A procedência da ação declaratória corresponde à improcedência da ADI. Em ambos os casos, o tribunal declara a constitucionalidade da norma com efeitos vinculantes erga omnes. Também se chama essa questão de efeito dúplice ou bivalente da ADI e da ADICON. Uma questão fundamental para compreender diversas questões ligadas às Ação Declaratória de Constitucionalidade é entender o porquê do surgimento. O contexto que suscitou o surgimento da ação declaratória e, principalmente, a finalidade do legislador. A Ação Declaratória não foi criada pela Constituição de 1988. Ela é criação da EC nº03, concedida por Gilmar Mendes. O exemplo a seguir, apesar de posterior à criação da EC nº03/93, ilustra bem pra que serve. Exemplo: As privatizações do governo de Fernando Henrique Cardoso (a privatização da Vale do Rio Doce, especificamente). Logo antes da privatização da Vale, houve uma enxurrada de ações públicas, populares, mandados de segurança, etc., pedindo a suspensão do leilão da Vale. Na véspera do leilão, a AGU teve que mobilizar advogados do Brasil inteiro para cassar liminares e não se sabia se o leilão ia acontecer ou não. Um sistema como esse, gera insegurança jurídica, obviamente. Que investidor vai botar dezenas de milhões de reais num investimento que o juiz da comarca de Quissamã pode dar liminar suspendendo? Esse é um sistema irracional, que gera insegurança jurídica. Então, a ADC foi criada exatamente nesses casos em que haja uma controvérsia inicial relevante sobre a constitucionalidade de uma norma. Esse é um pressuposto específico da Ação Declaratória que não está presente na ADI. Só cabe ADC se se instalar no Judiciário uma controvérsia sobre a constitucionalidade da norma. É óbvio que, se todo mundo concordar que a lei é constitucional, e tendo em vista o fato de que as leis já têm presunção de constitucionalidade, para quê propor uma ADC? Para que serve, então, a ADC? Resposta: Serve exatamente nesse caso, em que se instala perante o Judiciário uma controvérsia judicial relevante sobre a constitucionalidade de uma norma. E a ADC foi concebida para se levar essa questão de forma direta e rápida ao STF. Só que o STF tem um instrumento para pacificar essa controvérsia de forma séria e definitiva.

50 Expressão criada por Gilmar Mendes. 51 Art. 24. Proclamada a constitucionalidade, julgar-se-á improcedente a ação direta ou procedente eventual ação

declaratória; e, proclamada a inconstitucionalidade, julgar-se-á procedente a ação direta ou improcedente eventual

ação declaratória.

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Isso traz segurança jurídica e coerência ao sistema (o fato do Judiciário dar de forma rápida uma decisão sobre a matéria). Em suma, este é o propósito da Ação Declaratória: ser um instrumento que propicie que o STF decida de forma rápida e definitiva a constitucionalidade de uma lei que vinha gerando controvérsias no Judiciário. É por isso que a ADC tem uma condição específica de pressupositividade (art. 14, III, CF52). Então, o autor tem que comprovar na inicial que há uma controvérsia judicial relevante sobre a constitucionalidade daquela norma. Como que o autor prova isso? Resposta: Juntando decisões judiciárias que tenham declarado a lei inconstitucional. Qual é o pedido na ADC? Resposta: Que se declare a lei constitucional. Só que ele vai ter que juntar decisões que tenham declarado a lei inconstitucional para provar que há uma controvérsia judicial relevante sobre a constitucionalidade da norma. Logo após a EC nº03, houve uma reação muito grande entre juízes e advogados quanto a essa emenda, sendo feitas várias críticas a ela. Uma delas é que a EC nº 03, ao criar ADC, violaria os princípios do juiz natural e da liberdade de convicção do juiz natural. Argumentava-se que o juiz viraria um calibrador de decisões do STF. Exemplo: Há ma ação popular na Vara de Fazenda Pública cujo juiz natural é o da comarca da capital do Rio de Janeiro, questionando o caráter incidental à constitucionalidade de uma norma.

(Lembrete: O efeito principal da liminar, na ADC, é suspender os processos).

É proposta uma ADC perante o STF e este dá liminar suspendendo o processo. Depois, o STF declara a lei constitucional. Como a decisão na ação declaratória tem efeito vinculante, o juiz está obrigado a acatar de plano a decisão do STF, não podendo julgar inconstitucional. Se ele julgar constitucional uma lei que o STF declarou inconstitucional, cabe reclamação. O STF acolheu essa crítica dos juízes e advogados? Resposta: Na verdade, essa crítica não se opõe apenas à ADC, mas é uma crítica genérica às decisões de efeito vinculante do STF. O STF não acolheu a crítica e disse que isso é só mais um instrumento de controle abstrato sujeito à competência originária do STF. Outros dois argumentos que poderiam ser utilizados são que os efeitos vinculantes não geram, necessariamente, uma “camisa de força”. Há mecanismos, válvulas de escape, como os seguintes:

• A não vinculação do STF às suas próprias decisões (superação de precedente).

52 Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual

para todos, e, nos termos da lei, mediante:

III - iniciativa popular.

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• O efeito vinculante não se aplica ao legislador. Ele pode legislar de forma contrária à jurisprudência do STF e até alterá-la.

• A técnica do “distinguish” (ou distinção). Significa dizer o juiz que seu caso é diferente daquele da jurisprudência do STF, pois seu caso tem peculiaridades fáticas diferentes das do caso julgado pelo STF e essas peculiaridades justificam uma decisão diferente.

Outra crítica que se faz à ADC é que ela seria inócua. Alguns autores dizem que há presunção de constitucionalidade e, por isso, não haveria necessidade de declarar constitucional uma lei assim já é presumida. Contudo, isso não é, de fato, uma redundância. Isso porque a ADC está sujeita a um requisito, que é a existência de controvérsia judicial sobre a constitucionalidade da norma. Se não houver controvérsia, a ADC é inócua. Mas, se a divergência é grande quanto a constitucionalidade da norma, há imenso interesse em se levar a questão ao STF para que ela seja pacificada, visando à segurança jurídica. Dizem uns autores que a ADC transforma a presunção de constitucionalidade – que era relativa – em quase absoluta, tendo em vista os efeitos vinculantes.

Será que a ADC é inconstitucional e viola o princípio do contraditório? Resposta: Na ADI o pedido do autor é a declaração de inconstitucionalidade de uma norma, o AGU defende a constitucionalidade. Assim, a ADI se estabelece por um “contraditório”, uma oposição de argumentos. Já na ADC, o pedido é a declaração de constitucionalidade. Não existe nenhum órgão que tenha a função de defender a inconstitucionalidade da lei (opostamente ao que ocorre com a ADI). Então, na ADC, não há o “contraditório”. Há duas formas de se opor ao argumento de que a ADC seria inconstitucional ou violaria o princípio do contraditório. A primeira foi utilizada pelo Ministro Moreira Alves (relator), que disse que o princípio do contraditório é uma garantia fundamental, ou seja, é um instrumento de proteção dos direitos fundamentais, porque garante que o indivíduo não vá ter um direito subjetivo seu suprimido senão depois de ter a oportunidade de se defender.

Há direitos em jogo na ADI e na ADICON? Resposta: Não, porque o controle é abstrato e o processo é objetivo.

Conclui-se, então, que o contraditório não de observância necessária na ADC porque não há direitos subjetivos a serem defendidos.

Há outro argumento que minimiza esse problema, que é exatamente o requisito do art. 14,III, CF: a necessidade de demonstração de controvérsia judicial relevante. Na prática, o que acontece é que o autor vai sustentar da ADC a tese da constitucionalidade da norma e vai juntar decisões que a tenham declarado inconstitucional. O resultado disso é que, mal ou bem, chegam ao STF as duas teses – tanto a da constitucionalidade quanto a da inconstitucionalidade. Isso é o que minimiza o problema de não ter uma autoridade que defenda a inconstitucionalidade da norma. Qual é o efeito da liminar na ADC? Resposta: Fazendo uma análise comparativa, o efeito de liminar na ADI é a suspensão cautelar da eficácia da lei que é objeto da ação. Na prática, essa suspensão significa que o juiz não pode aplicar aquela lei.

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Na ADC, o que acontece é a suspensão dos processos em que se discute a constitucionalidade da norma. Os processos ficam suspensos e o STF tem cento e oitenta dias para decidir o mérito da ADC. E, depois, o juiz do tribunal – a princípio – vai ter que seguir a decisão do STF pelo efeito vinculante. Uma outra diferença entre a ADC e a ADI refere-se ao seu objeto. A ADI pode ser proposta em face de leis ou atos normativos federais e estaduais. A ADC só pode ser proposta em face de leis ou atos normativos federais. Outra questão importante é quanto à legitimidade. O art. 13 da lei está com um rol antigo de legitimados, que foi alterado pelo art. 103 da CF (pela EC nº45). Isso foi necessário porque o art. 13 CF previa um rol mais restrito de legitimados para propositura da ADC. A EC nº45, na alteração que fez ao art. 103, CF, equiparou os legitimados da ADI aos da ADC.

ADI POR OMISSÃO Os requisitos são a existência de um dever constitucional específico de legislar e mora legislativa. A inconstitucionalidade pode, também, ser total ou parcial. A CF/88 foi uma das constituições mais progressistas na tutela da inconstitucionalidade por omissão. A CF/88 buscou inspiração na Constituição Portuguesa de 1976, que também é uma Constituição muito ativa na tutela da inconstitucionalidade por omissão – mas com razão história fácil de entender ( o projeto da Constituição foi socialista). A CF/88 adotou, basicamente, dois instrumentos de tutela da inconstitucionalidade por omissão: um instrumento de controle em abstrato (ADI por omissão) e o instrumento de controle em concreto (mandado de injunção). O STF restringiu muito a eficácia desses instrumentos.

Ver art. 103, §2º, CF:

§ 2º - Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias.

A Constituição fixa prazo para o Executivo cumprir a sua função normativa (trinta dias), mas não fixa prazo quando o órgão omisso é o Legislativo. Por isso que tradicionalmente o STF entendeu que a decisão na ADI por omissão do legislativo tem uma natureza puramente declaratória. Como a Constituição não fixa prazo para que o Legislativo supra a omissão, o STF sempre entendeu que a decisão na ADI por omissão, quando esta era do Legislativo, tinha uma natureza meramente declaratória. Ou seja, o tribunal se limitava a dar ciência ao Legislativo de que ele estava omisso. Isso gerou um descrédito do próprio STF, pois a decisão é declarada e nada se faz a respeito disso, já que o Legislativo não tem prazo para apresentar novos projetos de lei.

O STF vem dando sinais de avanço – principalmente no Mandado de Injunção – também aqui, na ADI por omissão.

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Ver art. 18, §4º, CF:

§ 4º A criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de Municípios, far-se-ão por lei estadual, dentro do período determinado por Lei Complementar Federal, e dependerão de consulta prévia, mediante plebiscito, às populações dos Municípios envolvidos, após divulgação dos Estudos de Viabilidade Municipal, apresentados e publicados na forma da lei. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 15, de 1996) .

Uma das decisões mais importantes do STF, neste ano, foi sobre a criação de Municípios (ver artigo acima). A questão da criação de Municípios estava muito mal amparada. A EC nº15/96 alterou a redação do art. 18, §4º. Sabe-se que o Brasil tem Municípios demais. Num determinado momento, o Congresso Nacional resolveu limitar a criação de novos Municípios. Exatamente para isso, criou a EC nº16/95 que tornava mais difícil a criação de novos municípios, estabelecendo novos requisitos. Uma nova exigência foi a necessidade de edição de Lei Complementar Federal. A emenda que exigiu essa lei complementar é de 1996. Até hoje (2007) essa lei não foi editada. Nesse ínterim, os Municípios não deixaram de ser criados. Cada Estado a que pertenciam os novos Municípios tinha sua própria legislação para criação de Municípios. Assim, apesar da Constituição exigir Lei Complementar Federal, os Municípios têm sido criados de acordo com as leis estaduais, de forma aleatória. Essa questão chegou ao STF da seguinte forma: foi proposta uma ADI por omissão em relação ao art. 18, §4º e foram propostas várias ADIs em face das leis estaduais que criaram os municípios. O STF, então, optou por julgar todas as ADIs juntas. O STF não tinha como não declarar a inconstitucionalidade por omissão. Essa decisão é um marco na jurisprudência do STF porque ele não se limitou a dar ciência ao Congresso Nacional de que ele estava em mora. O próprio STF fixou o prazo de dezoito meses para que o Congresso Nacional legisle, sem que a CF estabeleça esse prazo. O STF declarou a inconstitucionalidade das leis estaduais que criavam Municípios, com efeito pró-futuro (art. 27 da lei 9.868/99).

Lembrete:

Eficácia pró-futuro: O STF fixou um momento no futuro a partir do qual valerá a decisão. Assim, ele convalidou todos os efeitos produzidos pela lei inconstitucional de criação dos Municípios, desde sua edição até esse momento no futuro, que foi de vinte e quatro meses a partir da publicação.

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Portanto, apesar da lei ser inconstitucional, ela continua a valer por todo o lapso de tempo. A doutrina critica, dizendo que o STF eternizou uma lei inconstitucional, violando a supremacia da Constituição. O problema é que não seria possível dar eficácia ex tunc e fingir que os Municípios criados nunca existiram. Nesse período, prefeitos e vereadores foram eleitos, tributos foram recolhidos, serviços públicos foram prestados, etc. O STF fez bem em dar a eficácia pró-futuro porque essa decisão foi articulada com a decisão da ADI por omissão. Ele deu dezoito meses para que o Congresso Nacional editasse os critérios nacionais para criação de Municípios e mais seis meses (totalizando vinte e quatro) para que o legislador estadual decida, à luz dos critérios fixados pelo Congresso Nacional, se mantém ou não aquele Município. Cabe liminar na ADI por omissão? Resposta: A jurisprudência tradicional do STF diz que não porque o efeito adicional da decisão é dar mera ciência e não faz sentido antecipar a mera ciência da decisão. E não há participação do AGU. O argumento tradicional é que, como a ADI é por omissão, não há ato cuja constitucionalidade deva ser defendida pelo AGU.

29 de outubro de 2007. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE (continuação)

Mandado de Injunção

O Mandado de Injunção está disciplinado no art. 5º, LXXI, CF:

LXXI - conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania;

A primeira questão que surgiu a respeito do art. 5º, LXXI, CF dizia respeito à auto-aplicabilidade ou não desse inciso, ou seja, se ele se aplicaria por ele mesmo ou se precisaria de uma lei regulamentadora de si. Até hoje, não foi editada uma lei que regulamentasse o MI (Mandado de Injunção). O STF entendeu que o MI era auto-aplicável, pois o contrário seria um paradoxo: o MI foi concebido para dar auto-aplicabilidade às normas constitucionais. Se ele próprio não fosse auto-aplicável, seria um desprestígio do próprio MI. Portanto, STF entendeu que, mesmo sem lei regulamentadora, deveria aplicar por analogia à lei do Mandado de Segurança (lei 1.533). Para o MI, quem é o legitimado ativo? Resposta: É o titular do direito cuja fruição está impedida pela ausência de norma regulamentadora. Ou seja, o indivíduo recebeu o direito por uma norma constitucional e não pode usufruir esse direito por falta de lei que regulamente essa norma constitucional.

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E quem ocupa o pólo passivo do MI? Resposta: É o órgão ou autoridade omisso (a) no cumprimento do dever constitucional de legislar. Se a omissão interferir no cumprimento de uma lei, será competência do Congresso Nacional; Se a lei for de iniciativa privativa do Executivo, há um litisconsórcio passivo entre o Congresso Nacional e o Presidente da República. Qual é o critério para definir a competência no MI? Resposta: É similar ao do mandado de Segurança - ratione personae - ou seja, o que falta o órgão judiciário competente para julgar um MI é autoridade omissa no dever de legislar. Exemplo: Art. 102, I, q, CF: são hipóteses de MI de competência do STF; Art. 105, I, h, CF: são hipóteses de MI de competência do STJ. Qual é a diferença de cabimento de Mandado de Injunção, Habeas Data e Mandado de Segurança por ato omissivo? Resposta: Todas são cabíveis em face de atos omissivos do poder público. A diferença está no tipo de omissão que enseja em cada uma dessas ações. O MI é cabível em face de omissões normativas. Portanto, para saber sobre o cabimento, o que interessa não saber qual é o órgão omisso, mas sim qual é a natureza da omissão. O que significa uma omissão da edição de atos normativos (atos genéricos e abstratos, com natureza de lei)? Resposta: Se a omissão se referir a edição de atos normativos, a hipótese é de cabimento de MI. Já se a omissão for de atos administrativos (atos específicos e concretos), a hipótese é de cabimento ou de (MS) Mandado de Segurança ou de Habeas Data. A diferença entre eles é que o Habeas Data tem a hipótese mais específica de cabimento, o seja, é cabível em face de omissões na divulgação ou na retificação de informações pessoais constantes de bancos de dados de caráter público. Já o MS tem um cabimento residual, ou seja, cabe MS em face de omissões administrativas que não sejam objeto de Habeas Data. Que tipo de omissão administrativa, que não seja objeto de Habeas Data, pode existir? Exemplo: Um construtor preenche os requisitos legais para adquirir o direito a construir um determinado empreendimento imobiliário. Ma, a administração municipal se recusa, de forma injustificada, a expedir esse ato de licença para construir. O ato de licenciamento é um ato vinculado ou discricionário? Resposta: É vinculado. Se o construtor preenche os requisitos legais para a edição da licença para construir, a administração não tem discricionariedade para dar ou não a licença: ela está obrigada a dar. Qual é a ação cabível para obrigar a administração a expedir esse ato? Resposta: Mandado de Segurança por ato omissivo. O MS é ação cabível sempre que a administração pública estiver obrigada a editar um ato vinculado e não o fizer de forma injustificada (desde que não seja o caso de Habeas Data).

Natureza e eficácia da decisão

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Logo após a edição da CF/88, surgiram três teses sobre a natureza e a eficácia da decisão no MI. 1ª → Tese Abstrata. A decisão, no MI, tem natureza constitutiva, no sentido de que o Judiciário deveria suprir a omissão normativa, com efeitos genéricos e abstratos, ou seja, a decisão no MI produziria efeitos não apenas para as partes do processo, mas erga omnes. Essa é uma solução que, claramente, viola a separação de poderes, já que o Judiciário usurparia a competência do legislador. Essa tese sempre foi minoritária e não foi adotada pelo STF. 2ª → Tese Concretista. Era a majoritária, logo após a edição da CF/88. Essa tese sustenta que o Judiciário poderia suprir a omissão, mas apenas com efeitos inter partes. Ou seja, o Judiciário entregaria ao titular o direito que foi concedido pela CF, mesmo sem lei regulamentadora – mas aquela decisão só beneficiaria o impetrante e não outras pessoas que estivesses na mesma situação, mas que não fossem partes integrantes daquele MI. Essa decisão também tinha natureza constitutiva, já que o Judiciário supria a omissão, mas com efeitos apenas inter partes. Apesar de ser majoritária na doutrina, o STF também não a adotou. 3ª → Tese da Natureza Declaratória. Segundo essa tese, a decisão, no MI, teria a mesma natureza da decisão na ADI por omissão. Ou seja, em ambos os casos, o Tribunal se limitaria a declarar a omissão, dando ciência ao órgão omisso de que ele estava em omissão com o dever de legislar. Assim, o direito só seria efetivamente fruído quando o Congresso Nacional decidisse legislar, sem que este estivesse sujeito a qualquer tipo de sanção. A doutrina criticou muito essa posição. José Carlos Barbosa Moreira chegou a dizer que o STF transformou o MI em um “sino sem badalo”. Não faz sentido a interpretação que o STF deu ao MI, porque pressupõe que o constituinte tenha criado dois instrumentos (MI e ADI por omissão) para declarar a omissão e nenhum instrumento para entregar de fato o direito. O STF tanto foi criticado pela doutrina que avançou. Hoje, o STF tem alguns casos importantes em que deu efeitos concretos ao MI. O primeiro caso foi o MI 283/5, que dizia respeito ao art. 8º, §3º, ADCT53. O prazo de doze meses passou, sem que o Congresso Nacional editasse essa lei. Uma das pessoas que foi caçada com base em um dos decretos cotados no art. 8º, §3º, ADCT, entrou com um MI dizendo que esse artigo o atribuía o direito a receber indenização e que ele não estava usufruindo dessa indenização porque o legislador não cumpriu o prazo de doze meses para editar a norma, de forma que ele estava sendo prejudicado pela mora do Legislativo. Esse é o típico caso de MI por omissão. Quando isso chegou ao STF, ele não teve como negar que a hipótese era de inconstitucionalidade por omissão; era óbvia a incidência do art. 8º, §3º. O STF,

53 § 3º - Aos cidadãos que foram impedidos de exercer, na vida civil, atividade profissional específica, em

decorrência das Portarias Reservadas do Ministério da Aeronáutica nº S-50-GM5, de 19 de junho de 1964, e nº S-

285-GM5 será concedida reparação de natureza econômica, na forma que dispuser lei de iniciativa do

Congresso Nacional e a entrar em vigor no prazo de doze meses a contar da promulgação da Constituição.

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então, fixou prazo para que o Congresso Nacional legislasse e disse que se o Congresso não legislasse nesse período editado pelo STF, o impetrante do MI poderia perseguir, na Justiça Federal de 1ª instância, o seu direito à indenização. Caberia, portanto, segundo o STF, ao juiz federal liquidar o dano, fixando o quantum indenizatório, e não mais ao legislador. Essa decisão do STF foi uma evolução em relação à jurisprudência que ele adotava porque, antes, o STF se limitava a declarar a omissão. Se ele tivesse feito isso, sua decisão, nesse caso, seria declarar a omissão ao Congresso Nacional em regulamentar o art. 8º, §3º, CF, e não teria entregado o direito ao impetrante. Só que, nesse caso, o STF foi mais além. O STF entregou o direito ao titular, dizendo que o impetrante podia receber indenização mesmo sem lei regulamentadora, cabendo ao juiz federal definir o quantum indenizatório. Portanto, foi uma decisão em que o Judiciário supriu a omissão do legislador, dando efeitos concretos ao MI. O segundo caso foi o MI 232/1, que dizia respeito ao art. 95, §7º, CF. Esse dispositivo estabelecia um direito de entidades beneficentes de assistência social gozarem de imunidade tributária em relação às contribuições sociais. Só que esse dispositivo falava “na forma da lei”, ou seja, ele determinou que um outro dispositivo determinasse as condições para o exercício desse direito. E esse dispositivo deve ser combinado com o art. 59 do ADCT54. No caso do MI 232/1, passou um ano sem que a lei fosse editada. Então, uma entidade que se julgava beneficente de assistência social entrou com um MI dizendo que a CF lhe dava imunidade tributária, mas que ela estava pagando as contribuições porque ainda não tinha sido editada a lei que estabeleceria as condições. Portanto, a inércia do legislador estava lhe impedindo de exercer o direito que a CF lhe tinha dado. Também é este um típico caso de inconstitucionalidade por omissão. O STF, então, fez o mesmo que no caso anterior: fixou um prazo. Disse que se o Congresso Nacional não observasse o prazo (e, mais uma vez, ele não observou), a entidade poderia, desde logo, gozar de sua imunidade, com base no dispositivo do CTN que estabelece a imunidade tributária das entidades beneficentes de assistência social. Aqui, o STF aplicou por analogia a norma do CTN que dispõe sobre a imunidade tributária. Mais uma vez, o STF não se limitou a declarar a inconstitucionalidade por omissão; ele supriu a omissão e entregou o direito. Um outro caso importante foi o caso da greve dos servidores públicos. A greve dos servidores públicos está disciplinada do art. 37, VII, CF55. Antes, esse artigo previa que haveria uma lei Complementar, mas

54 Art. 59. Os projetos de lei relativos à organização da seguridade social e aos planos de custeio e de

benefício serão apresentados no prazo máximo de seis meses da promulgação da Constituição ao Congresso

Nacional, que terá seis meses para apreciá-los.

Parágrafo único. Aprovados pelo Congresso Nacional, os planos serão implantados progressivamente nos

dezoito meses seguintes.

55 Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do

Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e

eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

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agora prevê apenas uma lei ordinária para regulamentar a greve no serviço público. O problema é que nenhuma das duas foi editada. E o STF tinha o entendimento ativo de que o art. 37, VII, CF era uma norma constitucional de eficácia limitada, ou seja, o direito ali previsto só poderia ser fruído pelo servidor público depois que fosse regulamentado por lei. A doutrina criticava muito essa posição. Então, o STF mudou de opinião, adotando a posição que era majoritária na doutrina: essa norma não é uma norma de eficácia limitada, mas uma norma de eficácia contida. A diferença é que a norma de eficácia contida produz efeitos desde logo podendo, no futuro, ser restringida pelo legislador. Então, os servidores públicos poderiam desde logo exercer o direito à greve, com base na lei de greve de iniciativa privada. O STF, mais uma vez, utilizou uma lei já existente por analogia. Então, os servidores públicos podem, com base na própria norma constitucional, sem precisar de uma lei regulamentadora, exercer o direito de greve. E esse direito vai ser pautado na lei de iniciativa privada. O grande problema da greve no serviço público é a continuidade, que seria prejudicada. Só que esse problema é mitigado pelo fato da lei de greve da iniciativa privada prever um sistema de revezamento de serviços públicos essenciais. Então, como há essa previsão, não há um prejuízo significativo à continuidade. Barroso tem uma proposta de emenda constitucional que acabe com o MI e altere a redação do art. 5º, §1º, CF56. A redação sugerida por ele é a seguinte:

As normas definidoras de direitos subjetivos constitucionais têm aplicação direta e imediata. Na falta de norma regulamentadora, necessária ao seu pleno exercício, formará o juiz competente a regra que regerá o caso concreto, submetido a sua aplicação, com base na analogia, nos costumes e nos princípios gerais do direito.

O que Barroso propõe é acabar com o MI e admitir que o juiz, em qualquer ração judicial, venha a suprir a omissão com base nos critérios de integração da ordem jurídica (aqueles que o juiz utiliza para suprir as lacunas). A tese de Barroso seria inconstitucional por suprimir o MI, que é uma garantia fundamental e, consequentemente, uma cláusula pétrea? Resposta: Ela é constitucional porque não retira um direito fundamental, pelo contrário: aumenta o seu prazo de proteção. As cláusulas pétreas não são garantias contra uma intangibilidade absoluta. É

VII - o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica; (Redação dada pela

Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

56 § 1º - As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.

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possível alterar uma norma de direito fundamental sem que isso viole a cláusula pétrea. A cláusula pétrea, na verdade, é uma garantia do núcleo essencial do direito.

ADPF (última ação de controle abstrato)

A ADPF estava prevista no art. 102, §1º, CF57. Só que esse dispositivo fala muito pouco sobre a ADPF – praticamente só dá o nome da ação e diz que é de competência do STF. O STF sempre entendeu que a ADPF era uma norma de eficácia limitada, ou seja, só produziria plenos efeitos quando fosse regulamentada pelo legislador. A lei regulamentadora só veio em dezembro de 1999 (lei 9.882/99). A ADPF tem uma origem próxima à ação declaratória de constitucionalidade, no sentido de que é um instrumento de governabilidade, ou seja, é um instrumento concebido para levar uma questão rapidamente ao STF, para que ele decida rápido, com efeitos erga omnes e vinculantes. Há certo consenso na doutrina de que existem dois tipos de ADPF:

• ADPF autônoma. É uma ação direta de constitucionalidade, com perfil idêntico ao da ADI e a ADC.

• ADPF incidental. É a mais diferente. O STF não vem julgando a ADPF incidental.

Exemplo: Digamos que haja um MS e o juiz exerce, na decisão do MS, o controle incidental de constitucionalidade e considera uma lei inconstitucional. Um dos legitimados para ADPF (que são os mesmo para ADI e ADC) entraria com uma ADPF incidental em face dessa decisão judicial. Foi proposta uma ADI perante o STF em face da lei 9.882/99 (lei que regulamenta a ADPF) e o relator (o Min. Néri da Silveira – aposentado) entendeu que a ADPF incidental era inconstitucional porque violava o princípio do juiz natural. O STF, então, decidiu por enquanto não houver o julgamento de mérito dessa ADI contra a lei da ADPF, julgar apenas as ADPFs autônomas. E isso é o que ele vem fazendo. Um aspecto importante sobre a ADPF diz respeito à legitimidade. No projeto que foi ao Congresso Nacional, havia a previsão de legitimidade do cidadão para propor ADPF. Esse dispositivo foi vetado pelo Presidente da República. Então, hoje, a legitimidade da ADPF é idêntica a da ADI e da ADC.

57 § 1.º. A argüição de descumprimento de preceito fundamental, decorrente desta Constituição, será

apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei. (Transformado em § 1º pela Emenda Constitucional nº

3, de 17/03/93)

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O procedimento da ADPF é muito parecido com o procedimento da ADI e da ADC, com algumas diferenças em relação à ADI. Por exemplo: Não há a participação do AGU, como há na ADI. O AGU, na ADI, é o defensor da norma questionada. Na ADPF, a lei não prevê que o AGU exerça essa função. Além disso, os prazos, na ADPF são mais curtos, mais exíguos. A principal diferença entre ADPF e ADI/ADC, é o princípio da subsidiariedade. Esse é o princípio que regula o cabimento da ADPF (art. 4º, §1º, lei 9.882/9958). A ADPF tem natureza subsidiária: ela só cabe quando não for cabível algum outro meio para sanar a lesividade. O que seria um “meio efetivo para sanar a lesividade”? Será que em qualquer ação em que possa ser revertido um controle incidental de constitucionalidade pode ser considerado meio efetivo para sanar a lesividade? Resposta: Não podemos dizer que qualquer instrumento de controle incidental é efetivo para sanar a lesividade, por dois motivos: primeiro, porque sempre vai caber uma ação (MS, ação ordinária, etc.); segundo porque “meio efetivo para sanar a lesividade” é decisão com efeito erga omnes e não apenas come feito inter partes. Quais são as decisões eficazes para sanar a lesividade? Resposta: As decisões do controle abstrato. As decisões em ADI e ADC são erga omnes e, portanto, são eficazes. Assim, o cabimento de ADI ou ADC exclui o cabimento de ADPF. Além de ADI e ADC, também podemos contar com a eficácia de súmulas vinculantes, ação civil pública e ação popular. As decisões da ação civil pública e da ação popular, apesar de serem controle incidental e não controle abstrato, têm efeito erga omnes. Há outras duas diferenças importantes da ADPF para a ADI. Comparando as duas, podemos dizer que a ADPF tem um paradigma mais estreito do que a ADI.

Quais são as normas constitucionais cuja violação autoriza propositura de ADI? Resposta: Qualquer norma constitucional, inclusive as normas do ADTC. Quais são as normas constitucionais cuja violação autoriza propositura de ADPF? Resposta: Só cabe ADPF quando for violada uma norma constitucional que tenha natureza de preceito fundamental. Há alguma norma que arrole quais normas constitucionais têm esse status? Resposta: Não. Quem define isso é o STF em sua jurisprudência. Certamente, algumas normas têm natureza de preceito fundamental. Exemplo: os princípios fundamentais do art. 1º a 4º da CF/88, os direitos fundamentais (arts. 5º e 6º da CF), as cláusulas pétreas (art. 60, §4º) e os princípios constitucionais sensíveis (art. 34, VII, CF – autorizam a intervenção federal nos Estados). Então, comparando ADI e ADPF, podemos dizer que o paradigma da ADPF é mais estreito, pois nem toda norma constitucional violada gera o cabimento de ADPF. Entretanto, se o paradigma é mais

58 § 1o Não será admitida argüição de descumprimento de preceito fundamental quando houver

qualquer outro meio eficaz de sanar a lesividade.

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estreito, o objeto é mais amplo. Ou seja, há casos de atos do poder público que podem ser questionados em ADPF que não podem ser questionados em ADI. Os atos que podem ser questionados em ADPF são atos normativos federais, estaduais e municipais. Em relação a atos estaduais e federais de caráter normativo, vai ser difícil o cabimento em ADPF, porque cabe ADI e o cabimento de ADI diminui o cabimento de ADPF. A grande inovação, aqui, foram os atos municipais, porque antes da ADPF só podíamos fazer o controle abstrato de leis municipais em face da Constituição Estadual, por representação de inconstitucionalidade. Com a ADPF, há um instrumento que promove o controle abstrato de leis municipais diretamente em face da CF. Essa inovação, de certa forma, foi freada porque náo se deu (.../ 00:55:40) ao prefeito. Com isso, certamente algumas questões não serão levadas ao STF. Vimos que náo cabe ADI em face de atos particulares, mas só em face de atos do poder público. Cabe ADPF em face de atos de particulares? Resposta: A princípio, não; mas, excepcionalmente, cabe. Na verdade, se aplica quanto ao cabimento de ADPF a jurisprudência a respeito do MS. Ou seja, cabe ADPF de atos praticados por particulares no exercício de função pública. Cabe ADPF em face do direito pré-constitucional, ou seja, de norma anteriores à Constituição? Resposta: Há previsão expressa na lei 9.882./99 pelo cabimento. Essa foi outra grande inovação da ADPF. O STF entendia que não cabia ADI de leis anteriores à CF. Então, não havia um intrumento de controle abstrato da compatibilidade de leis anteriores à CF com a nova CF. O STF só resolvia isso no controle incidental. Com a ADPF, hoje há um instrumento de controle abstrato, ou seja, uma decisão do STF com efeitos erga omnes e vinculantes a respeito da compatibilidade de uma lei anterior à CF com a nova CF. Cabe ADPF em face de atos administrativos de caráter infralegal? Resposta: O STF entende que só cabe ADI em face de decretos autônomos, ou seja, em face de normas primárias, que buscam o fundamento de validade diretamente na CF. Não abe ADI em face de um decreto que executa a lei, porque a hipótese não é de inconstitucionalidade direta, mas de inconstitucionalidade indireta. Essa regr não se aplica à ADPF. Cabe ADPF em face de atos administrativos. É valido lembrar que só cabe ADPF em relação a preceito fundamental. Então, só quando for uma questão de grande relevância constitucional é que vai caber ADPF. Portanto, nem todo atos administrativo pode ser questionado por ADPF. Cabe ADPF em relação a projetos de lei? Resposa: A melhor posição é a de que não cabe ADPF em relação a projetos de lei porque, na lei 9.882/99, havia uma previsão expressa de cabimento de ADPF contraprojeto de lei. Só que esse dispositivo foi vetado pelo Presidente da República, sob o argumento de que o cabimento de ADPF sobre preojeto de lei geraria uma intervenção do STF em questões interna corporis do Poder Legislativo. Isso seria uma usurpação do Poder Legislativo pelo STF, que violaria a separação de poderes. Em relação aos atos de natureza política, cabe ADPF?

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Resposta: O STF entente, também, que não cabe ADPF em face de atos de natureza política. Isso o STF decidiu em uma ADPF proposta contra um veto e motivado pelo ex-prefeito Conde (RJ). Conde vetou o projeto de lei e não motivou, quando a CF exige a motivação. Foi , então, proposta uma ADPF dizendo que aquele veto era nulo porque a CF exige uma motivação e o ex-prefeito não motivou. O STF disse que não cabe controle judicial do veto porque trata-se de um ato político. A crítica que se pode fazer a essa decisão é que a CF estabelecia um parâmetro jurídico e constitucional para a xecução desse atos, que era a motivação e isso não foi cumprido. Nesse caso, o STF deveria ter anulado o veto por falta da motivação exigida pela Constituição. Quanto às omissões legislativas/ normativas, qual era a questão mais óbvia? Resposta: A princípio, a questão mais óbvia era de que não caberia ADPF porque existe ADI por omissão e MI. Então, pelo princípio da subsidiariedade, se há outros meioseficazes para sanar a lesividade, não cabe ADPF. Só que o STF proferiu uma decisão, relatada pela Ellen Gracie, em que o STF se colocou numa “sinuca de bico”. O argumento de que se poderia fazer uso frente ao STF é que, apesar de haver ADI por omissão, essa ação não seria eficaz porque a decisão se limita à declaração, não resolvendo o problema. A grande questão é que esse argumento, sendo aceito pelo STF, nos leva a entender que a ADPF tem uma eficácia maior do que a ADI por omissão.

O Controle De Contitucionalidade À Luz Da Constituição Estadual

Exemplo: O que acontece se houvesse uma lei estadual X que violasse uma norma da CE (Constituição Estadual) Y que é idêntica a uma norma da CF (Constituição Federal), Z. Qual seria a ação cabível: ADI ou RI (Representação de Inconstitucionalidade)? Resposta: Ambas as ações são cabíveis. A diferença é que a competência para julgar RI é do TJ e a competência parajulgar ADI é do STF. E se ambas forem propostas, o que acontece? Resposta: Suspende-se a RI. O STF julga a ADI. E se só a RI for proposta? Isso gera uma ususpação de competência do STF pelo STJ? Resposta: O STF disse que se só for proposta a RI, não há usurpação de competência sua porque da decisão na RI cabe recurso extraordinário do STF. Qual é a eficácia da decisão do STF nesse recurso extraordinário? Resposta: A eficácia é erga omnes. Normalmente, as decisóes do STF em recurso extraordinário têm efeitos inter partes, porque o recurso extraordinário é um intrumento, por excelência, no qual o STF exece o controle incidental. Esses recurss extraordinário, excepcionalmente, têm efeitos erga omnes, porque ele é interposto de uma decisão que tinah efeitos erga omnes. Vimos que no caso de ambas as ações serem propostas, suspende-se o julgamento da RI para que o STF julgue a ADI, a fim evitar decisões contraditórias. Depois que o STF julgara ADI, o TJ terá que seguir a decisão do STF, a princípio. Portanto, por exemplo, havendo normas idênticas, se o STF

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disser que não há violação, o TJ deverá manter a posição do STF, visto que as normas federal e estadual são idênticas. Isso quer dizer que sempre que o STF julgar ADI improcedente, o TJ deve lulgar a RI também imprcdente? Resposta: Não. Exemplo: Digamos que haja um duplo fundamento na RI. O autor se utiliza de dois fundamentos para alegar a inconstitucionalidade da lei estadual. Essa lei estadual viola duas normas da CE: Y e A. A norma constitucional Y é idêntica a uma norma da CF. A norma A não tem paralelo na CF. Nesse caso, pdoe ser proposta tanto a RI e ADI. Se o STF julga a ADI improcedente. Porém, o STF nada disse se a norma constitucional X viola a norma da constituição estadual A, porque essa norma não está contida na CF. E pode ser que a lei estadual X não viole essas normas, mas viole essa norma. Nesse caso, o TJ pode julgar a RI procedente, apesar da ADI ter sido julgada improcedente sem violar a decisão do STF. O rol dos legitimados da RI deve seguir, necessariamente, o rol dos legitimados da ADI? Exemplo: O rol dos legitimados para ADI está no art. 103, CF, que diz que só um terço dos membros da Câmara e do Senado têm legitimidade para propor ADI. Então, um deputado ou senador, isoladamente, não tem legitimidade para propor ADI. Uma CE que dê legitimidade a um deputado estadual para propor RI é inconstitucional por não ter seguido o modelo de legitimidade do art. 103, CF? Resposta: Não. A RI está prevista no art. 125, parágrafo 2, CF. E esse dipositivo veda aenas a atribuição da legitimidade para um único órgão. Então, a única exigência contida na CF sobre a legitimidade para propor a ADI é que a CE não pode atribuí-la a um únic órgão. Fora isso, cabe à CE decidir para quem ela vai atribuir. Ou seja, o art. 103, CF não se aplica por simetria à RI. Em outras palavras, cabe à CE definir o rol dos legitimados para propositura de RI, sendo que a única vedação estabelecida na CF é que a CE não pode dar legitimidade para (.../ 01:21:25). A RI é como se fosse a ADI no plano estadual. É uma ação direta cujo pedido é uma declaração da inconstitucionalidade de uma lei com relação à orma estadual. Cabe uma espécie de Ação Declaratória de Constitucionalidade ou uma ADPF no âmbito estadual? Resposta: Há, pelo menos, três posições sobre essa questão. A primeira posição diz que não cabe, segundo dois fundamentos distintos. O primeiro fundamento é o seguinte: só caberia se houvesse uma previsão específica na CF – e, como não há essa previsão, não cabe. Segundo essa perspectiva, só uma emenda constitucional à CF poderia prever essas ações no âmbito estadual. O outro argumento é que não cabe porque a competência para legislar sobre processo é da União. Então, teria que ter, segundo essa perspeciva, uma lei federal que instituísse essa competência. Uma outra posição é de que essas ações são cabíveis desde que haja previsão na Constituição Estadual. Em contraposição aos dois argumentos da primeira posição, cabe à CE e não à CF instituir a (.../ 01:23:57) porque a finaliade dos instrumentos de controle abstrato é zelar pela supremacia da Constituição. Com esse objetivo, no fundo, essas ações são instrumentos de proteção a própria Constituição. Então, nada impede que uma Constituição crie seus próprios instrumentos de proteção. O outro argumento é que não há nenhuma vedação na CF a que as CEs criem esses

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intrumentos. Portanto, se não há vedação na CF, cabe ao Poder Constituinte Decorrente disciplinar a matéria. A terceira posição diz que essas ações são aplicáveis na esfera estadual mesmo sem previsão expressa, ou seja, com aplicação imediata. Questão de concurso: Cabe controle incidental da CF no âmbito do controle abstrato da CE (RI*)? Resposta: Cabe. Exemplo: A lei estadual X viola uma norma da CE (Y), que viola uma norma da CF (Z). O TJ deve julgar procedente ou improcedente a RI? Resposta: “Como ele não pode controlar em abstrato a norma da CF, ele esquece a norma da CE que viola a norma da CF e como a lei estadual viola a norma da CE, ele julga procedente a RI.” Essa resposta NÃO ESTÁ CORRETA, porque ele não pode dizer que uma lei estadual viola uma norma da CE , pois se a norma da CE viola outra norma da CF, essa norma é nula e não pode ser aplicada. Portanto, o TJ deve declarar incidentalmente a inconstitucionalidade da norma da CE. O mais importante, aqui, é que o TJ não vai declarar a lei X inconstitucional. *O que é o controle abstrato na CE? Resposta: É RI. O PGE (Procurador Geral do Estado) exerce na RI a mesma função que o AGU exerce na ADI (defesa da constitucionalidade do ato impugnado)? Resposta: Não, porque – pelo menos à luz da CE/RJ – ao contrário do AGU, o PGE tem legitimidade para propor a RI. No âmbito federal, quem tem legitimidade para propor ADI é o Presidente da República. Então, a posição que se afirma, no RJ, é que o PGE, mesmo se não propuser ADI, ele é intimado para falar na RI, devendo atuar de acordo com os interesses do Estado, seja pela constitucionalidade ou pela inconstitucionalidade. (PERGUNTA DE ALUNO): Deve constar na inicial a arguição de violação à norma da CE? Resposta: Não, porque se aplica o princípio da (causa de vertente aberta/ 01:37/50). Portanto, o TJ pode dizer que o fundamento foi esse e o STF já disse que não viola essa norma, mas há uma outra norma na CE que é violada pela lei estadual.

DIREITOS FUNDAMENTAIS

Gerações de Direitos Bibliografia:

1. Professor Ingo Sarlet 2. Paulo Gustavo Gonet Branco. Teoria Geral dos Direitos Fundamentais (artigo – pasta do

professor)

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A primeira classificação dos direitos fundamentais é a que os divide em GERAÇÕES DE DIREITO. O critério é o momento histórico em que esses direitos foram concebidos. Os direitos de primeira geração foram criados no constitucionalismo liberal. O objetivo principal era limitar juridicamente o poder do estado, para preservar a liberdade individual. A partir dessa idéis, são concebidos os direitos de primeira geração. Os direitos de primeira geração, em regra, são direitos de defesa. O crério, aqui, se refere ao conteúdo da prestação e não mais ao momento histórico do surgimento. No caso do direito de defesa, significa que são direitos a prestações estatais negativas, ou seja, são direitos que o indivíduo tem em face do Estado de exigir abstenções estatais. O principal exemplo de direito de defesa (na primeira geração) é a liberdade e suas diversas manifestações. Essas normas de direito de primeira geração são também chamadas de normas de competência negativa, porque ela visa a delimitar uma área em que deve prevalecer a livre atuação do indivíduo. Além da liberdade, há outros direitos típicos da primeira geração, como a vida, a integridade física, o patrimônio (propriedade) e a igualdade formal (igualdade perante a lei). A época da primeira geração foi a época das revoluções burguesas (segunda metdade do séc. XVIII). A segunda fase do constitucionalismo é bem mais recente: é a fase do constitucionalismo social e data da primeira metade do século passado. Tem como marcos juridicos a Constituição Mexicana (1917), a Constituição de (.../ 01:49:30), na Alemanha, (1919) e a Constituição Brasileira de 1934. A segunda fase é bem distinta da primeira. A finalidade do constitucionalismo social não é limitar o poder do Estado, mas prover ao indivíduo as suas necessidades básicas. Os direitos típicos de segunda geração são os direitos prestacionais, ou seja, direitos a pretações estatais positivas. Como exemplo, temos a saúde, a educação, a previdência e a assistência social, etc. Aqui, há uma muudança na perspectiva segundo a qual se vê o papel do Estado. Para os direitos de primeira geração, o Estado era um violador em potêncial dos direitos fundamentais, tendo em mente o Estado Absolutista. No âmbito do Estado Social, este existe não como um violadorem potencial, mas como principal promotor dos direitos sociais, já que esses direitos serão satisfeitos por intermédio da atuação do Estado. Outa importante alteração de perspectiva é que esses direitos se fundam não mais no conceito de igualdade formal, mas de igualdade material, ou seja, um conceito de igualdade que entende que é papel do Estado não apena stratar de forma igual todos os indivíduos, mas tratá-ls desigualmente, na medida em que se desigualam. Portanto, estado tem o dever de proteger os mais economicamente desfavorecidos.

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Mais recentemente, na segunda metadde do século XX, surge uma terceia geração de direitos: os direitos difusos e coletivos, cujo principal exemplo é o direito à proteção do meio ambiente. Esses direitos têm duas características típicas:

• Transindividualidade. Ao contrário dos direitos de primeira e de segunda geração cujo titular é o indivíduo, o titular dos direitos difusos e coletivos é uma coletividade.

• Aqui, há uma distinção entre direitos difusos e coletivos: nos direitos difusos, o titular é uma coletividade indeterminada e nos coletivos, o titular é uam coletividade determinada.

• Indivisibilidade. Significa que esses direitos ou são entregues a toos os seus titulares ou não são entregues a ninguém.

Um outro processo importante que sofreram os direitos fundamentais foi o processo da internacionalização ou da tutela internacional dos direitos humanos e que também teve início na Segunda Guerra Mundial. A experiência do nazismo foi muito traumática, inclusive para o Direito Constitucional. Chegou-se à seguinte conclusão: até a Segunda Guerra Mundial, havia uma concepção de soberania absoluta em que o Estado era visto como o único responsável pela proteção dos direitos fundamentais, porque não se concebia que um órgão internacional pudesse condenar um Estado por ele não ter respeitado os direitos fundamentais de seus cidadãos. O que se fazer quando o Estado – único responsável pela proteção dos direitos fundamentais – é o principal violador desses direitos (como foi o caso do nazismo)? A quem se devia recorrer? As pessoas não tinham a quem recorrer. Surgiram vários conflitos étnicos, recentemente, que geraram até guerras civis. Esse é, portanto, um risco presente e atual. Exatamente por isso, criou-se um mecanismo internacional de tutela dos diretos fundamentais, inclusive contra o Estado. E há alguns marcos jurídicos nesse processo, como por exemplo, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1948) e os pactos internacionais de direitos civis e políticos e de direitos econômicos, sociais e culturais (1976). Hoje, há um duplo sistema internacional de proteção dos direitos fundamentais. Um é o sistema universal (órgãos globais, muitas vezes vinculados à ONU). É um tribunal da ONU ao qual a CF/88 faz alusão em seu art. 5º, §4º. Além do sistema global, há sistemas regionais de proteção dos direitos humanos. No nosso âmbito, a Corte Intra-Americana de Direitos Humanos (OEA) e, no âmbito da União Européia, há a Corte de Direitos Humanos que é, hoje, fundamental. A grande discussão é a seguinte: Quando um tribunal internacional “condena” um Estado por violação aos direitos humanos de seus cidadãos, isso viola a soberania desse Estado condenado?

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Resposta: A primeira coisa que se tem que ter em mente quanto ao conceito de soberania é relativizar esse conceito. Esse conceito foi criado por Jean Bodin, no século XV, para justificar o Estado absolutista. Portanto, esse conceito deve ser adaptado aos tempos atuais. Hoje, a idéia de Estado de Direito está se globalizando. Isso faz com que os direitos fundamentais sejam vistos como limite à soberania do Estado. Hoje, é difícil sustentar que um Estado tem soberania para violar os direitos fundamentais dos seus cidadãos. Mas, há dois fatores mais concretos que justificam uma resposta negativa a essa pergunta: o Estado se submete voluntariamente á jurisdição dessa Corte Internacional e para ele ser condenado, ele tem que ratificar o tratado que criou a Corte; e há um princípio que rege as demandas internacionais sobre direitos humanos, que é o princípio da subsidiariedade, que diz que só cabe uma demanda internacional sobre direitos humanos se as instâncias nacionais não forem aptas a prevenir ou a punir uma violação a direitos humanos em seu território. Ou seja, ela só entra em caso de insuficiência das instituições nacionais. 20 de novembro de 2007.

Direitos fundamentais na CF/88

A Constituição de 1988, como era natural, deu uma ênfase significativa na tutela dos direitos fundamentais. Costuma-se dizer que a CF/88 é um marco no processo de redemocratização do Brasil, no sentido de que é o principal marco jurídico da transição de um regime ditatorial para um Estado democrático de Direito. Tradicionalmente, no nosso constitucionalismo, os catálogos de direitos fundamentais vinham no final do texto. A CF/88 trouxe o catálogo de direitos fundamentais, que ficava no final, para o início do texto (art. 5º e seguintes). Esse é o primeiro aspecto topográfico que tem o efeito simbólico dado pela mudança de posição dos direitos fundamentais na CF. A CF/88 colocou a tutela da dignidade humana – que é o fundamento dos direitos fundamentais – como fundamento da República Federativa do Brasil. A CF/88 positivou um maior rol de direitos fundamentais, englobando direitos de primeira, segunda e terceira geração. Havendo conflito entre um direito de primeira e de segunda geração, por exemplo, não se deve resolvê-lo com a escolha de um dos direitos pura e simplesmente, pois não há hierarquia entre as gerações de direito (princípio da unidade da CF). Uma das grandes preocupações do constituinte foi limitar o poder do Estado, evitando seu exercício arbitrário. Há na CF/88 uma profunda preocupação com a transformação social do Brasil, havendo, claramente, um caráter dirigente, ou seja, uma preocupação de que o Estado atenda às necessidades básicas do cidadão. Os direitos fundamentais são submetidos a um regime constitucional único e reforçado. Único porque os direitos têm nova hierarquia. Quais são as normas que atribuem uma eficácia reforçada aos direitos fundamentais?

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Resposta: São basicamente duas: art. 5º, §1º, CF59 e art. 60, §4º, IV, CF60. Há, também, outros dois dispositivos que são bem importantes: o primeiro é o art. 5º, §2º, CF61, que é a chamada cláusula materialmente aberta. Esse parágrafo é assim chamado porque abre o catálogo de direitos fundamentais a outros direitos, sejam ou decorrentes das normas constitucionais ou previstos em tratados internacionais. É a partir daqui que surge a importante distinção entre diretos formal e materialmente fundamentais. Direitos formalmente fundamentais são aqueles colocados pelo constituinte no catálogo dos direitos fundamentais. Exemplo: Os direitos previstos no art. 5º da CF/88. Direitos materialmente fundamentais são aqueles direitos em que pouco importa a sua positivação, ou seja, se eles estão previstos em lei ou em qualquer lugar ou em lugar nenhum. O que importa mesmo é o seu conteúdo. São os direitos que têm a essência de direito fundamental. Então, surge um problema: se o critério não é formal, ou seja, se o critério não é o fato desse direito estar positivado, mas sim o conteúdo, qual é o critério material que possibilita a identificação dos direitos materialmente fundamentais? Resposta: É o princípio da dignidade da pessoa humana. É ele que permite identificar novos direitos fundamentais. Então, se o direito for uma decorrência direta da dignidade humana, pouco importa se ele está ou não previsto no catálogo constitucional. Assim, passamos de um problema para outro: afinal, o que é “dignidade da pessoa humana”? Podemos citar a segunda formulação do imperativo categórico kantiano, que normalmente é colocada para definir “o que é a dignidade da pessoa humana”.

“Dignidade humana significa que os homens devem sempre ser tratados como fins em si mesmos, nunca como meios.”

Isso tem uma implicação muito importante: não se pode utilizar os indivíduos como instrumentos mesmo que a utilização dessa forma promova alguma finalidade coletiva. Isso significa que nem para satisfazer uma necessidade positiva é possível suprimir a dignidade do indivíduo.

59 § 1º - As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.

60 § 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

IV - os direitos e garantias individuais.

61 § 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos

princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

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Exemplo: Aprova-se um plebiscito e a polícia militar aprova a tortura para se obter confissão, sendo comprovado por estatísticas que, dessa forma, há uma redução de trinta por cento da violência. Essa é uma medida possível? Resposta: Não. Apesar de ser uma medida que vai obter um benefício social, este pouco importa. Há direitos mínimos que nem a satisfação do bem estar coletivo justifica a sua supressão. Mesmo que se atinja uma finalidade coletiva, não se pode sacrificar um direito do indivíduo, pois isso significaria tratar os indivíduos não como fins em si mesmos, mas como meios/ instrumentos para alcançar uma finalidade coletiva – o que violaria a dignidade da pessoa humana. A conclusão disso tudo é que todos os indivíduos têm o mesmo valor moral. E esse valor moral é irredutível, ou seja, não se pode abrir mão desse valor moral nem para satisfazer o “interesse público”, o bem estar da coletividade. A ênfase dada à dignidade humana gera fortes críticas62 atuais à SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO. Isso significa, de acordo com Celso Antônio Bandeira de Melo, ser como uma das pedras de toque jurídico-administrativo. A doutrina mais moderna vem elaborando uma crítica à supremacia do interesse público. O problema dela é que ela, interpretada de certa maneira, pode ser incompatível com a ênfase dada pela CF/88 aos direitos fundamentais. Há um risco. Se entendermos que o interesse público significa interesse da coletividade/ sociedade e entendermos que a supremacia do interesse público – que é diferente do interesse individual – sempre prevalece sobre o interesse individual, isso pode dar margem a concepções políticas totalitárias. Se a supremacia do interesse público fosse interpretada dessa forma, seria incompatível com o regime constitucional brasileiro. Há, no direito comparado – por exemplo, na jurisprudência constitucional alemã – uma jurisprudência muito firme, no sentido de que não se pode submeter a tutela dos direitos fundamentais a cláusulas gerais. Há uma jurisprudência alemã chamada “cláusula geral da comunidade”, que é mais ou menos uma supremacia do interesse público, entendida dessa forma. Ou seja, entender que só se pode exercer os direitos fundamentais caso ele não viole o interesse público. Exemplo: Houve um caso, à época da Segunda Guerra Mundial – em que a Suprema Corte Norte-Americana, com base na supremacia do interesse público, determinou que os cidadãos americanos de descendência japonesa poderiam ser recolhidos a campos de concentração sem acusação formal. Se um particular postula uma indenização contra a Fazenda Pública, isso é interesse público ou particular? Resposta: Depende. Se a indenização for dirigida, é pública.

Dica de leitura: “Desconstruindo o princípio da supremacia do interesse público” (Daniel Sarmento).

62 Há doutrinadores que não aceitam ser criticados, o que gera verdadeira briga acadêmica no Direito brasileiro.

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Dworkin ganhou a cadeira de professor titular de filosofia do direito em OXFORD fazendo uma crítica estrutural à tese do (.../ 00:33:05). Fazer uma crítica estrutural à obra de alguém é uma demonstração de reverência, já que o crítico estudou a obra – o que não costuma acontecer no Brasil, pois os autores vêem as críticas como um insulto. Isso leva o Brasil a apresentar um atraso em relação a outros países. Outro dispositivo importante é o art. 5º, §3º, CF63. Só é possível entender esse dispositivo se conhecermos a evolução desse debate sobre a hierarquia dos tratados sobre direitos humanos. Qual é a hierarquia em que os tratados, em geral, são recebidos no Direito Brasileiro? Resposta: De acordo com a teoria do monismo moderado, eles têm força de lei ordinária. Então, havendo conflito entre tratado e Constituição, prevalece a Constituição, que é a norma de maior hierarquia. Havia uma discussão sobre a hierarquia específica dos tratados sobre direitos humanos. O STF entendia que esses tratados – assim como os tratados em geral – tinham hierarquia de lei ordinária. Havia uma posição minoritária, mas de grande importância, de que os tratados sobre direitos humanos tinham hierarquia de norma constitucional. Porém, essa posição foi vencida no STF. Só que a doutrina “bateu” tanto nessa jurisprudência do STF, que foi aprovada, dentro da EC 45, a introdução do §3º do art. 5º. Mas há muitas discussões sobre a interpretação desse dispositivo. Por exemplo: e os tratados anteriores à introdução desse parágrafo? Qual é a hierarquia que eles têm? Resposta: Há, basicamente, duas teses. A primeira delas é aplicar a lógica que o STF vinha aplicando, dizendo que aos tratados anteriores à EC 45 aplica-se a jurisprudência tradicional do STF, ou seja, são recebidos com status de lei ordinária. Porém, também pode-se entender que eles valem como norma constitucional e há várias razões para sustentar isso. Uma delas é a aplicação da teoria da recepção qualificada. Foi o que aconteceu com o CTN. Ele foi aplicado como lei ordinária; depois, veio uma nova Constituição e decidiu como lei complementar. O CTN não deixou de ser recepcionado; ele o foi com o status de lei complementar. Aqui, teria ocorrido mais ou menos a mesma coisa. Ou seja, os tratados foram recebidos originalmente com o status de lei ordinária, mas depois de uma EC, veio uma hierarquia constitucional sobre os tratados. Então, teria havido uma recepção qualificada desses tratados, com hierarquia de norma constitucional. Além dessas duas, ainda há uma terceira tese. Nela, os tratados anteriores à CF/88 também têm hierarquia constitucional, mas a fundamentação é diferente (não é pelo princípio da recepção qualificada). Aqui, é feita uma distinção entre tratados materialmente fundamentais e tratados formalmente fundamentais. Os tratados materialmente fundamentais (ou constitucionais) são aqueles que versam sobre direitos humanos e que, na forma do art. 5º, §2º, têm hierarquia constitucional. E,

63 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do

Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às

emendas constitucionais. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004).

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além dos tratados apenas materialmente constitucionais, há aqueles que são materialmente e formalmente constitucionais: são os tratados que observaram o procedimento especial do art. 5º, §3º, ou seja, são tratados aprovados pelo quorum de três quintos e dois turnos. Portanto, são tratados que não apenas versam sobre direitos fundamentais como forem formalmente incorporados à CF/88. Segundo esta teoria, ambos os tratados (formalmente e material mente constitucionais) têm hierarquia constitucional. A diferença é que, como os formalmente constitucionais foram incorporados à CF/88, eles não podem ser livremente denunciados no plano internacional. Enquanto eu os materialmente constitucionais, como não foram incorporados, podem ser denunciados no plano internacional. Há uma discussão complicada que é a seguinte: o que acontece se houver conflito entre norma constitucional sobre direitos humanos e tratado sobre direitos humanos? Resposta: Adotando a tese do STF - antes da EC 45 – de que existem dois tipos de tratados: os que têm hierarquia constitucional (aqueles tratados que observaram o procedimento especial do art. 5º, §3º) e os que têm hierarquia de lei ordinária (aqueles que não observaram o procedimento especial do art. 5º, §3º), pode-se responder a essa pergunta da seguinte forma: DEPENDE. Se o tratado tiver hierarquia de lei ordinária, ganha sempre a norma constitucional, por uma questão de hierarquia. Se o tratado tiver hierarquia de norma constitucional e não for possível uma ponderação, ocorre a prevalência da norma mais favorável ao cidadão (in dúbio pro dignitate). No caso do depositário infiel, o STF complicou demais o debate, de forma desnecessária, adotando uma tese anterior à instauração do §3º, de que os tratados sobre direitos humanos tinham uma hierarquia supralegal e infraconstitucional. O Min. Pertence adotada essa tese antes do §3º para dar algum sentido ao art. 5º, §2º, CF. A tese que o STF adotou agora, não faz nenhum sentido depois da criação do §3º. O intuito desse parágrafo foi uniformizar, dizer que atualmente não tem mais a “história” de tratado de hierarquia de lei ordinária ou constitucional. A hierarquia é uma só. O STF, portanto, foi no sentido oposto, dividindo em três tipos de hierarquia: de lei ordinária, supralegal e de norma constitucional. Há dois outros dispositivos que devemos analisar, sobre temas mais complicados. O primeiro é o art. 60, §4º, IV, CF. Ele trata de um tema da maior relevância teoria e prática. No Brasil, há uma média de emendas, por ano, superior a três. É um número muito alto, no direito comparado! Por outro lado, o que significam os direitos e garantias individuais? É um conceito abstrato. São normas que, além de abstratas, apresentam um denso conteúdo moral. Em uma sociedade pluralista, há uma divergência muito grande sobre o conteúdo moral dos direitos fundamentais. Por exemplo: Cotas em universidades públicas promovem ou violam a igualdade? Não se chegará a um acordo quanto a isso nunca. Então, o que se pode dizer é que sempre que alguém for prejudicado por uma emenda constitucional, essa pessoa vai dizer que essa emenda viola uma cláusula pétrea. Por isso, é importante distinguir o que, de fato, são direitos e garantias individuais e o que são privilégios. Essa definição é fundamental porque toca um dos pontos mais sensíveis do constitucionalismo contemporâneo, que é a relação entre constitucionalismo e democracia. Quando se fala em Estado Democrático de Direito, seu conceito é a síntese histórica entre dois ideais que são coniventes, que são os ideais do constitucionalismo e da democracia. Em poucas palavras, constitucionalismo significa um governo limitado, devendo respeitar direitos fundamentais. Então, as cláusulas pétreas, de certa forma, são a tentativa mais ousada do constitucionalismo, pois elas visam a evitar que o poder mais elevado previsto na ordem jurídica – que é o poder de reformar a CF – não pode suprimir direitos individuais do cidadão.

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Por outro lado, as cláusulas pétreas restringem a democracia porque há um risco de as cláusulas pétreas implementarem um “governo dos mortos sobre os vivos”, pois na medida em que a geração atual não pode viver de acordo com as suas normas, ela tem que se guiar por normas estabelecidas pela geração constituinte. Seria gerado um conflito intergeracional. O STF decidiu bem quando se alinhou à jurisprudência do Tribunal Constitucional Alemão e se afastou da jurisprudência constitucional norte-americana ao dizer que as cláusulas pétreas per se não violam a democracia. Ou seja, o simples fato de a CF/88 prever cláusulas pétreas não significa um “governo dos mortos sobre os vivos”. O risco é que se as cláusulas pétreas sofrerem uma interpretação muito elástica, ou seja, se o STF colocar muita coisa dentro do rol de cláusulas pétreas, aí, sim, há um risco do “governo dos mortos sobre os vivos”, pois ele estará vinculado a um campo normativo muito amplo. O desafio do intérprete é achar um ponto de equilíbrio entre preservação de direitos mínimos do cidadão sem violar o direito de autodeterminação dos vivos. O Judiciário deve achar um equilíbrio entre a tutela dos direitos mínimos do cidadão, preservação de direitos mínimos contra maiorias ocasionais e, por outro lado, não estender demais esse rol para gerar o “governo dos mortos sobre os vivos”. As principais teses sobre a interpretação do art. 60, §4º, IV, CF são as seguintes:

• São cláusulas pétreas todos os incisos do art. 5º, CF. Direitos e garantias individuais que são cláusulas pétreas são os setenta e oito incisos do art. 5º e nada além disso.

Esta é a pior tese – apesar de defendida por Virgílio Afonso da Silva – porque dá uma relevância muito grande ao elemento jurídico literal, uma tese formalista, já que atém muito ao texto da CF, pois pega a expressão “direitos e garantias individuais”, que está no art. 60, §4º, IV, CF e se vincula essa expressão ao capítulo I, título II da CF, que é o capítulo do art. 5º, que também é o capítulo dos direitos e garantias individuais. Porém, há um equívoco, pois se dá um valor muito grande ao elemento formal. Primeiro porque a interpretação literal, hoje, coloca balizas para a criatividade do intérprete. A interpretação literal isolada pode levar a interpretações diversas ao espírito da norma. Mas esse não é p principal problema desta tese. O maior problema é que exclui do rol de cláusulas pétreas direitos que são, inegavelmente, fundamentais como, por exemplo, os direitos sociais, políticos, difusos e coletivos. Ainda pior que excluir os direitos fundamentais é incluir direitos que não são fundamentais, como a competência do Tribunal do Júri.

• A segunda tese é a tese do Gilmar Ferreira Mendes. Ele diz que o que importa não é a localização do direito, mas a estrutura do direito, sendo cláusulas pétreas os direitos de defesa – direitos a prestações estatais negativas.

Para Gilmar Mendes, estão excluídos do rol de cláusulas pétreas os direitos prestacionais – direitos a prestações estatais positivas, como são, em regra, os direitos sociais. A crítica que se faz é que o constituinte positivou os direitos fundamentais num regime único e de eficácia reforçada. Isso significa dizer que não há hierarquia entre as gerações de direito. Não seria correto estabelecer uma hierarquia entre direitos de defesa e direitos prestacionais, já que o constituinte deu igual ênfase a eles. Por um lado, o constituinte se preocupou em limitar o poder do

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Estado (direitos de defesa) e, por outro lado, se preocupou em atender às necessidades básicas do indivíduo (direitos prestacionais).

• A tese do Ingo Sarlet, é a tese de que os direitos de diferentes gerações são cláusulas pétreas. Também é defendida por Daniel Sarmento, Luiz Roberto Barroso, José Afonso da Silva, etc. Ela inclui os direitos civis e políticos (liberdades fundamentais, direito à vida, integridade física, etc.), direitos sociais e direitos difusos e coletivos. Além disso, esta tese defende que todos os direitos fundamentais são cláusulas pétreas e estes direitos são todos aqueles previstos no título II da CF/88. Para esta tese, se o constituinte colocou no catálogo de direitos fundamentais, atribuindo a nota de fundamentalidade formal, o STF não pode dizer que não é direito fundamental. Esta tese entende que não só os direitos formalmente fundamentais são cláusulas pétreas como também o são os direitos materialmente fundamentais, ou seja, os direitos que não estejam no catálogo da CF, mas que tenham natureza de direito fundamental.

A tese que defendemos é só os direitos materialmente fundamentais são cláusulas pétreas. Os direitos que estão no título II têm uma presunção relativa de serem direitos materialmente fundamentais. O fato de o direito estar no título II da CF não é uma garantia absoluta de que ele é uma cláusula pétrea. Exemplo: Digamos que o Congresso Nacional resolve transferir a das inexigibilidades, nos parágrafos do art. 14 do plano constitucional para o plano legal. O objetivo do legislador não é nem mudar a disciplina, mas apenas dizer que aquelas normas não mais serão tratadas pela CF e, sim, pela lei ordinária. O simples fato da desconstitucionalização dessas normas gera inconstitucionalidade dessa emenda constitucional? Resposta: Essa tese inflaciona demais o rol de cláusulas pétreas, colocando coisas demais nele. Exemplo: Um tema em que isso se torna ainda mais relevante é quanto ao art. 7º, CF: direitos do trabalhador. Digamos que o Brasil enfrente uma crise econômica gravíssima. Será que um projeto de emenda constitucional que suprima o terço de férias, por exemplo, é constitucional? Isso viola cláusula pétrea? Resposta: Se entendermos que os direitos formalmente fundamentais são cláusulas pétreas, há violação ao título II da CF. O problema é essa ampliação desmedida do rol de cláusulas pétreas. O acontece quando se inflaciona o rol de cláusulas pétreas são dois riscos sérios. O primeiro risco é à democracia (“governo dos mortos sobre os vivos”). O segundo é o prejuízo à segurança jurídica. Não é que a perda do terço de férias não seja importante, mas não deve ser considerada cláusula pétrea porque se o trabalhador perder esse direito, a dignidade do seu emprego não estará sendo violada. Situação diferente se for salário mínimo. Uma EC que suprima o salário mínimo, sim, seria inconstitucional. Isso viola a dignidade do trabalhador. Direitos em Espécie

• IGUALDADE. Pode-se dizer, basicamente, que a igualdade passou por três fases principais: a igualdade formal, a igualdade material e as chamadas políticas de ação afirmativa.

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• A primeira fase da igualdade, que é a igualdade formal, foi uma conquista do constitucionalismo liberal porque, antes do constitucionalismo liberal, ou seja, antes das revoluções burguesas, admitia-se que o Estado fosse dividido em estamentos. Por exemplo: a sociedade francesa antes da Revolução Francesa. Existiam três estamentos: Primeiro, Segundo e Terceiro Estado. Se você fosse nobre, estaria sujeito a um ordenamento jurídico mais favorável do que se você fosse um plebeu. Isso acaba na Revolução Burguesa, com o advento do constitucionalismo moderno. A partir do constitucionalismo moderno a lei passa a ser a mesma para todos, independentemente de raça, sexo, cor e idade. A segunda fase foi a da igualdade material, também chamada de igualdade na lei, que parte da premissa desenvolvida por Aristóteles e citada por Rui Barbosa em que ele diz que a igualdade não está em tratar igualmente a todos, mas em tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida em que se desigualam. Esse conceito de igualdade material tem uma relevância grande na medida em que autorizou o direito a proteger as partes economicamente mais fracas. O exemplo maior disso é o direito do trabalho. Há um caso clássico que representa bem a evolução de uma concepção puramente liberal, de uma concepção social, de igualdade, que é o caso Lochner versus NY. Foi um caso tão importante, julgado pela Suprema Corte Norte-Americana, que uma fase da jurisprudência dessa Corte foi chamada “Lochner Era”. Tratava-se da lei de NY que estabelecia jornada de trabalho para padeiros. A Suprema Corte Norte-Americana julgou inconstitucional essa lei porque partia de uma visão liberal sobre a autonomia da vontade. O contrato de trabalho que tem uma jornada de trabalho superior à fixada em lei é um contrato firmado entre partes capazes, o objeto é lícito, tem forma prescrita em lei. Não pode a lei limitar a autonomia das partes contratantes. Essa jurisprudência foi concebida num momento de crise econômica grave (1929), em que havia no âmbito das relações de emprego uma situação gravíssima: trabalho infantil, falta de normas de segurança, etc. As normas de proteção ao trabalhador vinham sendo declaradas inconstitucionais pela Suprema Corte. Então, foi apresentado um projeto de “empacotamento” da Suprema Corte, que era o seguinte: a cada juiz que tivesse mais de setenta anos, esse teria direito de nomear mais um. Assim, a Suprema Corte mudou de opinião e passou a considerar que essas normas que introduziam normas de proteção ao trabalhador eram inconstitucionais. A Lochner Era e sua superação representa bem o advento do Estado Social, ou seja, a produção de normas que visam a proteger a parte economicamente mais fraca, buscando a igualdade, já que esta representa não tratar igualmente a todos, mas desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam. Só que a lógica dessa segunda fase é completamente diferente; a lógica, aqui, não é igualar a todos, mas desigualar, a fim de proteger a parte mais fraca. Essa, sim, é a função típica do legislador: diferenciar pessoas, com determinado critério, e dar tratamento diferenciado a elas. O problema é estabelecer um critério para diferenciar essas pessoas. Não há nenhum critério que sempre viole ou que sempre promova a isonomia. Portanto, não é possível analisar, em tese, essa questão. Por exemplo: art. 3º, IV, CF64.

64 Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

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Mesmo esse critério pode ser utilizado para criar distinções entre pessoas? Resposta: É possível, por exemplo, criar distinções em razão da raça. Se o governo fizer uma propaganda reverenciando negros, por exemplo, isso não viola a igualdade. Ou dizer que só mulheres podem fazer concurso para guardas penitenciárias femininas. Isso também não violaria a isonomia, já que isso protegeria a intimidade das mulheres. O que se pode dizer é que não há nenhum critério que esteja de acordo ou que seja contrário à isonomia. Essa análise é sempre feita à luz do caso concreto. Deve-se questionar se o critério diferenciador, o discrimini tem um vínculo de pertinência lógica como o tratamento legal e diferenciado. Esse vínculo entre discrimini e tratamento legal e diferenciado é sempre feito à luz do caso concreto, nunca em tese. Limite de idade em concurso público é constitucional? Resposta: Depende do concurso. Teste físico é constitucional para concurso público? Resposta: Depende. Para juiz, não. O fato de o candidato estar bem fisicamente não contribui para o exercício de suas atividades como juiz. Porém, contribui para agentes da polícia. Isso é o vínculo de pertinência lógica. Uma área em que a aplicação da igualdade é especialmente complicada é a aplicação da igualdade no direito privado. É o chamado direito à não discriminação. Exemplo: Será que uma escola judaica pode vedar a matrícula de não judeus? Será que uma empresa pode não contratar negros? Essas questões são, não só para o Direito, mas também para a Filosofia, muito complicadas. E mais complicada a ainda é a aplicação dos direitos fundamentais na relação entre particulares. Deve-se lembrar que a tese adotada no Brasil é a da aplicabilidade direta, ou seja, a norma de direito fundamental se aplica diretamente na relação entre particulares, mas nem sempre se aplica o direito fundamental. O que há, na verdade, é uma ponderação entre a norma de direito fundamental – no caso, a igualdade – e a liberdade/ autonomia individual. No caso do exemplo, pondera-se a liberdade de acesso a uma escola com a liberdade do dono da escola de admitir a matrícula de um aluno pertencente a qualquer outra religião. A ponderação deve ser feita à luz do caso concreto. Um caso famoso em que se aplicou a igualdade entre particulares foi o chamado caso da Air France (já discutido em aula passada). Vale lembrar que aplicar sempre a igualdade entre particulares, sufoca a liberdade individual.

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas

de discriminação.

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A última fase da igualdade é a chamada política de ação afirmativa, cujo exemplo mais comum é o das cotas. Uns entendem que essas políticas promovem a igualdade. Há duas formas de se justificar, principalmente as cotas: primeiro é que há uma reparação a grupos que foram historicamente discriminados. Essa justificativa é especialmente importante para os afro-brasileiros, por exemplo. Uma outra forma de justificar é a de se promover uma igualdade de acesso, de oportunidades. Então, por exemplo, as cotas promoveriam uma igualdade de oportunidades a pessoas que não tiveram, por exemplo, a mesma formação. Nos EUA, por exemplo, as cotas deram muito certo, quando havia uma política de Aparthaid. É importante frisar que a cota é concebida para ser temporária. Ela não é para durar pra sempre. Ela serve para dar aos indivíduos que estão em posição mais prejudicada uma mínima igualdade de oportunidades. Quando se atinge uma mínima igualdade de oportunidades, a cota não mais se justifica. Há uma outra posição que sustenta que as cotas são inconstitucionais, por piorarem a desigualdade. Assim seria porque, segundo a visão tradicional de igualdade, um critério conservador que observa a igualdade, se houver um vínculo de pertinência lógica. O critério que apresenta um vínculo de pertinência lógica no vestibular, por exemplo, é o mérito, a aprovação. Assim, a cota não se justifica por se rum vínculo de pertinência lógica, mas por ser ou uma reparação a grupos historicamente discriminados ou por ser um instrumento da igualdade de oportunidades.

27 de novembro de 2007

Direito à Nacionalidade:

Nacionalidade é uma ligação jurídica do indivíduo ao Estado. Então nacional no Estado é uma

pessoa que guarda uma relação jurídico com um determinado Estado. Logo estrangeiro é aquele que não possui ligação jurídica com o Estado.

O conceito de nacional é um conceito mais restrito que o de população. Pois população

abrange os nacionais e estrangeiros residentes no Brasil. Já o conceito de cidadania é mais restritivo. Cidadãos são apenas os nacionais no exercício dos

direitos políticos. A disciplina dos critérios para a aquisição da nacionalidade é questão de direito público interno.

É matéria definida por cada Constituição Nacional. Então cabe à Constituição definir os critérios para aquisição da Nacionalidade. Logo pode haver conflito entre as Constituições de diferentes países.

Existem basicamente dois critérios para a aquisição da nacionalidade: - IUS SOLIS:

É nacional do país aquele que nascer em território nacional. - IUS SANGUINIS:

É nacional do país os filhos dos nacionais daquele país.

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Imaginemos a seguinte situação: Uma criança nasce em um país que adota o IUS SANGUINIS e o país dos seus pais (que não é

aquele) adota o IUS SOLIS. Qual será a nacionalidade desta menina? Nenhuma. Ela será apátrida. O que aconteceria com uma criança que nasce em um país que adota IUS SOLIS e a nação de

seus pais adota IUS SANGUINIS? Ela teria dupla nacionalidade. Então a falta de uma disciplina única para a análise da aquisição da nacionalidade no meio

internacional, entre outras palavras, o fato do direito a nacionalidade ser um direito público interno gera esses tipos de problemas.

Existem dois tipos de nacionalidade: - NACIONALIDADE ORIGINÁRIA

É aquela detida pelos brasileiros natos. É a nacionalidade adquirida no momento do nascimento. Tal nacionalidade está no Art 12, I da CRFB. E o principal critério está na alínea “a”.

CRFB - Art. 12 - São brasileiros: I - natos: a) os nascidos na República Federativa do Brasil, ainda que de pais estrangeiros, desde que estes não estejam a serviço de seu país; b) os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que qualquer deles esteja a serviço da República Federativa do Brasil; c) os nascidos no estrangeiro de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que sejam registrados em repartição brasileira competente ou venham a residir na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, depois de atingida a maioridade, pela nacionalidade

Então, a princípio, se a criança nasce no Brasil ela é brasileira. Mas há exceção. Por exemplo: filho do embaixador francês nascido no Brasil não é brasileiro, pois o embaixador francês está a serviço do seu país.

Na alínea “a” o critério é IUS SOLIS. Alínea “b”: esse critério é IUS SANGUINIS. Podemos dizer que o critério nacional do Brasil é o IUS SOLIS, mas há também a adoção do

critério IUS SANGUINIS como consta na alínea “b”. O que significa pai ou mãe brasileiros a serviço da República Federativa do Brasil? Um funcionário da EMBRAER, por exemplo, nos EUA. Tem seus filhos nascidos lá. O filho é ou

não brasileiro? Não, pois a EMBRAER é uma empresa privada. A serviço da RFB significa trabalhar para o governo brasileiro, exercício de função pública. Alínea “c”: sofreu alteração recente pela EC 54. A emenda constitucional de revisão (Ecr) nº 03 de 1994 fez uma grande besteira. Caso por

exemplo de filho de jogador de futebol que nasce no estrangeiro. A ECr nº03 exigiu residência no Brasil e opção pela nacionalidade brasileira, não permitiu o que a redação original da Constituição permite: o registro na repartição brasileira, no consulado, do respectivo país.

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Então o que se fazia em relação aos filhos de brasileiro nascidos no exterior sem estar a

serviço do país? Fez-se um registro de nascimento (certidão de nascimento) na embaixada e quando o filho fosse maior ele poderia optar ou não pela nacionalidade brasileira, mas ele já adquiria condicionalmente a nacionalidade brasileira desde o momento do seu nascimento.

Só que a ECr nº03 não previu o registro na repartição competente brasileira. Este erro foi

corrigido pela EC 54. Que diz: desde que registrado em repartição brasileira competente, ou venham a residir no Brasil e optem, depois de atingida a maioridade, pela nacionalidade brasileira.

Então pela redação atual da alínea “c” o sujeito pode registrar o seu filho na repartição

brasileira no exterior, ele adquire condicionalmente a nacionalidade brasileira e, depois de maior, ele pode optar por esta, desde que formule a sua opção e venha residir no Brasil.

No Art 95 do ADCT foi acrescido uma norma transitória dizendo que os nascidos entre

05/06/94 e a data da EC 54 podem ser registrados em repartição diplomática ou consular brasileira, se vierem a residir no Brasil. Então essa norma veio pra poder englobar os atingidos pela ECr nº03.

Art. 95. Os nascidos no estrangeiro entre 7 de junho de 1994 e a data da promulgação desta Emenda Constitucional, filhos de pai brasileiro ou mãe brasileira, poderão ser registrados em repartição diplomática ou consular brasileira competente ou em ofício de registro, se vierem a residir na República Federativa do Brasil.

- NACIONALIDADE DERVIADA NATURALIZAÇÃO: os que, na forma da lei, adquiram a nacionalidade brasileira exigindo aos

originário dos países de língua portuguesa apenas a residência de ordem ininterrupta (um ano) e idoneidade moral.

A naturalização é hipótese da nacionalidade derivada. Que é a nacionalidade adquirida em

momento posterior ao nascimento. E é um regime jurídico diferente dos que são originários. Pais estrangeiros de qualquer nacionalidade os requisitos são mais rígidos: 15 anos

ininterruptos de residência e ausência de condenação penal. Observação: residência ininterrupta não significa vedação à saída do país. A uma norma específica sobre os portugueses no Art 12, §1º: § 1º - Aos portugueses com residência permanente no País, se houver reciprocidade em favor dos brasileiros, serão atribuídos os direitos inerentes ao brasileiro, salvo os casos previstos nesta Constituição. Essa hipótese não é de aquisição de nacionalidade brasileira por portugueses, mas sim de

equiparação entre portugueses e brasileiros naturalizados. PERGUNTA: atualmente é possível essa equiparação ou não?

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Não, pois exige reciprocidade. E hoje Portugal não pode dar sozinha a reciprocidade que pertence à União Européia. Então equiparação com direitos do português tem que ser concedido pelos países que integram a União Européia. O governo português não poderia isoladamente promover essa reciprocidade.

(Essa matéria do Art 12, §1º consta no Estatuto do Estrangeiro – Lei 6815/80 do Art. 112 em

diante) Lei pode estabelecer distinção entre brasileiro nato e naturalizado? Não, apenas a

Constituição pode. Isto consta no §2º do Art 12 da CRFB:

§ 2º - A lei não poderá estabelecer distinção entre brasileiros natos e naturalizados, salvo nos casos previstos nesta Constituição. A Constituição criou algumas distinções, como por exemplo, Art 12 §3º, que estabelece os

cargos públicos que são privativos de brasileiros natos: § 3º - São privativos de brasileiro nato os cargos: I - de Presidente e Vice-Presidente da República; II - de Presidente da Câmara dos Deputados; III - de Presidente do Senado Federal; IV - de Ministro do Supremo Tribunal Federal; V - da carreira diplomática; VI - de oficial das Forças Armadas; VII - de Ministro de Estado da Defesa. E também o Art 89, VII que prevê cadeiras do Conselho da República para brasileiros natos: Art. 89 - O Conselho da República é órgão superior de consulta do Presidente da República, e dele participam: VII - seis cidadãos brasileiros natos, com mais de trinta e cinco anos de idade, sendo dois nomeados pelo Presidente da República, dois eleitos pelo Senado Federal e dois eleitos pela Câmara dos Deputados, todos com mandato de três anos, vedada a recondução.

Há também uma diferenciação quanto à possibilidade de extradição, brasileiros natos não

podem ser extraditados, enquanto brasileiros naturalizados podem. E há restrições também quanto à titularidade de exercício de funções em empresas jornalísticas, órgãos da mídia. Está no Art 222.

Art. 222 - A propriedade de empresa jornalística e de radiodifusão sonora e de sons e imagens é privativa de brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos, ou de pessoas jurídicas constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sede no País. § 1º - .Em qualquer caso, pelo menos setenta por cento do capital total e do capital votante das empresas jornalísticas e de radiodifusão sonora e de sons e imagens deverá pertencer, direta ou indiretamente, a brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos, que exercerão obrigatoriamente a gestão das atividades e estabelecerão o conteúdo da programação

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§ 2º - A responsabilidade editorial e as atividades de seleção e direção da programação veiculada são privativas de brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos, em qualquer meio de comunicação social. § 3º Os meios de comunicação social eletrônica, independentemente da tecnologia utilizada para a prestação do serviço, deverão observar os princípios enunciados no art. 221, na forma de lei específica, que também garantira a prioridade de profissionais brasileiros na execução de produções nacionais § 4º Lei disciplinará a participação de capital estrangeiro nas empresas de que trata o § 1º. § 5º As alterações de controle societário das empresas de que trata o § 1º serão comunicadas ao Congresso Nacional. No Art 12, §4º prevê que pode haver perda da nacionalidade.

§ 4º - Será declarada a perda da nacionalidade do brasileiro que: I - tiver cancelada sua naturalização, por sentença judicial, em virtude de atividade nociva ao interesse nacional; II - adquirir outra nacionalidade, salvo nos casos: a) de reconhecimento de nacionalidade originária pela lei estrangeira; b) de imposição de naturalização, pela forma estrangeira, ao brasileiro residente em Estado estrangeiro, como condição para permanência em seu território ou para o exercício de direitos civis.

A 1ª hipótese de cancelamento de naturalização que consta no inciso I no §4º só se aplica a

brasileiros naturalizados. E essa hipótese está sujeita a uma cláusula de reserva judicial. Só o judiciário pode declarar o cancelamento da nacionalização.

A 2ª hipótese é a perda da nacionalidade brasileira pela aquisição de outra nacionalidade.

Então se o sujeito é brasileiro e adquire outra nacionalidade, a princípio ele perde a nacionalidade brasileira. A princípio, pois há duas exceções.

A primeira é se ambas as nacionalidades forem originárias, ambas foram adquiridas no

momento do nascimento. A segunda exceção é um pouco mais complexa. Por exemplo, se o sujeito tem a nacionalidade

originária brasileira e se naturaliza nacional de outro país, a princípio ele perde a nacionalidade brasileira, essa é a regra geral. As únicas hipóteses que o indivíduo se naturaliza nacional em outro país e mantém sua nacionalidade brasileira é, se o processo de naturalização for imposto pelo respectivo governo como condição para permanência neste território ou para exercício de direitos civis.

Asilo Político

Está disciplinado no Art 4º, X:

Art. 4º - A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: X - concessão de asilo político.

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Mas o que é o asilo político? É a admissão de ingresso de estrangeiros no território nacional independentemente do cumprimento dos requisitos originários para protegê-lo de perseguição política que sofria em seu país de origem.

Por exemplo: você está em um governo autoritário, há perseguição política e oposição, para evitar que você seja preso, morto ou torturado, você pede asilo político para um país vizinho. É um instrumento muito importante de cooperação internacional contra o abuso do poder político.

Há uma distinção entre asilo político e asilo diplomático. O asilo político tem caráter

permanente enquanto o asilo diplomático tem caráter precário. Então o asilo político é o que diz respeito ao ingresso do estrangeiro no território nacional.

Os 3 institutos que serão tratados a seguir revelam o movimento oposto, ou seja, a retirada compulsória de pessoas do território nacional. São eles: extradição, expulsão e deportação.

Extradição

Ato pelo meio do qual o Estado entrega o indivíduo para outro Estado para que o mesmo

responda processo criminal ou cumpra pena. Extradição ativa x Extradição passiva

A extradição ativa é aquela em que o Estado requer que o outro Estado lhe entregue o

indivíduo para responder processo ou cumprir pena. No Brasil, quem tem legitimidade para formular o pedido de extradição ativa? O Presidente da

República ou autoridade que receba delegação deste. A extradição passiva quando um outro Estado pede ao Estado brasileiro para entregar um

indivíduo para que lá ele responda processo criminal ou cumpra pena. Neste caso quem formula o pedido é o Supremo (STF). Algumas distinções importantes entre a extradição do brasileiro e a do estrangeiro estão no

Art. 5º, LI:

LI - nenhum brasileiro será extraditado, salvo o naturalizado, em caso de crime comum, praticado antes da naturalização, ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, na forma da lei;

Então nenhum brasileiro nato pode ser extraditado. Na verdade veremos que nenhum

brasileiro nato pode ser extraditado, expulso ou deportado. À luz da Constituição de 88, a expulsão compulsória do brasileiro nato é apenas banimento que foi vedada pela Constituição de 88.

Já os brasileiros naturalizados podem ser extraditados. Em dois casos: crime comum praticado

antes da naturalização ou comprovado envolvimento com tráfico de entorpecentes na forma da lei e neste caso pode ser anterior ou posterior à naturalização.

Já em relação aos estrangeiros, em regra, eles podem ser extraditados, desde que não se trate

de crime político ou de opinião.

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Art 5º, LII - não será concedida extradição de estrangeiro por crime político ou de opinião;

Principais exigências do estatuto do estrangeiro e da jurisprudência do STF sobre a extradição: 1ª) O Estado requerente deverá basear o seu pedido em tratado internacional ou prometer

reciprocidade. O que o Supremo tem feito é não satisfazer apenas uma mera promessa. Se há no caso concreto indícios de que esta promessa não será cumprida o STF não autoriza a extradição.

2ª) A justiça do Estado do requerente deve ter, segundo a ordem jurídica brasileira,

competência exclusiva para o julgamento do indivíduo. 3ª) Deve ocorrer a chamada dupla tipicidade, ou seja, o fato deve ser crime, não apenas no

estrangeiro, mas também no Brasil. 4ª) Não pode ter ocorrido a prescrição da pretensão punitiva do Estado. Aí pode surgir a

dúvida: segundo qual lei, a brasileira ou a estrangeira? A que for mais favorável ao acusado. 5ª) O extraditando deve ser julgado pelo juiz natural, além disso, o julgamento observa as

garantias do devido processo legal (ser um julgamento justo e imparcial). Este é um requisito fundamental para a extradição.

6ª) A lei brasileira não Pode fixar pena igual ou inferior a um ano. 7ª) O estado requerente deve celebrar um compromisso formal que contenha os seguintes

itens: - Efetuar a chamada detração penal. A detração penal é a dedução da pena a ser cumprida no

estrangeiro no período em que o indivíduo for preso no Brasil. - Colocar pena de morte em pena privativa de liberdade. Se a lei estrangeira condenar o crime com pena de morte, o Supremo só autoriza a extradição se houver o compromisso formal de convolação dessa pena em privativa de liberdade - Não agravar a pena por motivos políticos. - Não efetuar a chamada re-extradição, ou seja, o governo requerente não pode formular a extradição para repassar o indivíduo para outro Estado. Ele formula a extradição para ele próprio julgar ou aplicar a pena ao sujeito.

Uma questão interessante diz respeito ao tribunal penal internacional. O Estatuto de Roma

prevê o envio de brasileiros para a jurisdição penal internacional. Será que o envio de brasileiros para a jurisdição do TPI contrasta com a vedação de extradição

de nacionais? Será que seria inviável o envio de brasileiros para serem julgados pelo TPI, já que a Constituição veda a extradição de brasileiros natos? O envio é permitido, pois não é extradição. Extradição é o envio do individuo para ser julgado ou sofrer uma pena de uma justiça de um Estado estrangeiro. O Poder Judiciário de um determinado Estado. O Tribunal Penal Internacional não é um órgão do Poder Judiciário de um Estado Soberano. É um Tribunal internacional é um órgão multinacional. Então a entrega de um brasileiro ao TPI não é uma extradição. Logo não há conflito.

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Caso se entenda que há conflito, fica mais complicado. Vimos que em um conflito entre

Normas Constitucionais sobre os Direitos Humanos e Tratado sobre os Direitos Humanos, se entendermos que os Tratados tem hierarquia constitucional prevalece aquele que for mais favorável. Agora o difícil é saber qual é a norma mais favorável. Certamente, se olharmos pela perspectiva da pessoa que será enviada ao TPI, é mais favorável uma norma Constitucional que veda o envio.

Só que o TPI serve para julgar as relações dos direitos humanos, principalmente quando as

instâncias nacionais não foram eficientes na repressão a esse fimEntão se por um lado o não envio prestigia o direito daquele que seria enviado, o envio prestigia o direito de todo aqueles que sofreram com os atos criminosos dos dirigentes políticos (ou o que quer que seja).

Segundo a opinião do professor cabe o envio. Primeiro por não ver todo aquele conflito,

segundo porque mesmo que se entenda que há conflito, a existência do TPI estaria completamente variada no Brasil se não coubesse o envio. O TPI serve para julgar pessoas e não para julgar Estados.

Quem é que provavelmente vai cometer esses crimes? Os dirigentes políticos: Presidente da

República, Governador, etc. Presidente Da República é cargo privativo de brasileiro nato. Então se não puder enviar brasileiro nato, esvazia a norma do Art. 5º §4º que diz que o Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão.

- Expulsão

Art. 64 ao 74 do Estatuto do Estrangeiro.

TÍTULO VIII

Da Expulsão

Art 64. É passível de expulsão o estrangeiro que, de qualquer forma, atentar contra a segurança nacional, a ordem política ou social, a tranqüilidade ou moralidade pública e a economia popular, ou cujo procedimento o torne nocivo à conveniência e aos interesses nacionais.

Parágrafo único. É passível, também, de expulsão o estrangeiro que:

a) praticar fraude a fim de obter a sua entrada ou permanência no Brasil;

b) havendo entrado no território brasileiro com infração à lei, dele não se retirar no prazo que lhe for determinado para fazê-lo, não sendo aconselhável a deportação;

c) entregar-se à vadiagem ou à mendicância; ou

d) desrespeitar proibição especialmente prevista em lei para estrangeiro.

Art 65. Caberá exclusivamente ao Presidente da República resolver sobre a conveniência e a oportunidade da expulsão ou de sua revogação.

Parágrafo único. A medida expulsória ou a sua revogação far-se-á por decreto.

Art 66. Desde que conveniente ao interesse nacional, a expulsão do estrangeiro poderá efetivar-se ainda que haja processo ou tenha ocorrido condenação.

Art 67. Os órgãos do Ministério Público remeterão ao Ministério da Justiça, de ofício, até trinta dias após o trânsito em julgado, cópia da sentença condenatória de estrangeiro autor de crime

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doloso ou de qualquer crime contra a segurança nacional, a ordem política ou social, a economia popular, a moralidade ou a saúde pública, assim como da folha de antecedentes penais constantes dos autos.

Parágrafo único. O Ministro da Justiça, recebidos os documentos mencionados neste artigo, determinará a instauração de inquérito para a expulsão do estrangeiro.

Art 68. O Ministro da Justiça, a qualquer tempo, poderá determinar a prisão, por noventa dias, do estrangeiro submetido a processo de expulsão e, para concluir o inquérito ou assegurar a execução da medida, prorrogá-la por igual prazo.

Parágrafo único. Em caso de medida interposta junto ao Poder Judiciário que suspenda, provisoriamente, a efetivação do ato expulsório, o prazo de prisão de que trata a parte final do caput deste artigo ficará interrompido, até a decisão definitiva do Tribunal a que estiver submetido o feito.

Art 69. Compete ao Ministro da Justiça, de ofício ou acolhendo solicitação fundamentada, determinar a instauração de inquérito para a expulsão do estrangeiro.

Art 70. Nos casos de infração contra a segurança nacional, a ordem política ou social e a economia popular, assim como nos casos de comércio, posse ou facilitação de uso indevido de substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, ou de desrespeito a proibição especialmente prevista em lei para estrangeiro, o inquérito será sumário e não excederá o prazo de quinze dias, dentro do qual fica assegurado ao expulsando o direito de defesa.

Art 71. Salvo as hipóteses previstas no artigo anterior, caberá pedido de reconsideração no prazo de dez dias a contar da publicação do decreto de expulsão no Diário Oficial da União.

Art 72. O estrangeiro, cuja prisão não se torne necessária, ou que tenha o prazo desta vencido, permanecerá em liberdade vigiada, em lugar designado pelo Ministro da Justiça, e guardará as normas de comportamento que lhe forem estabelecidas.

Parágrafo único. Descumprida qualquer das normas fixadas de conformidade com o disposto neste artigo ou no seguinte, o Ministro da Justiça, a qualquer tempo, poderá determinar a prisão administrativa do estrangeiro, cujo prazo não excederá a noventa dias.

Art 73. O Ministro da Justiça poderá modificar, de ofício ou a pedido, as normas de conduta impostas ao estrangeiro e designar outro lugar para a sua residência.

Art 74. Não se procederá à expulsão se implicar em extradição inadmitida pela lei brasileira.

A expulsão tem um ponto em comum com a extradição: também é hipótese de retirada

compulsória do indivíduo do território nacional. Mas possui algumas diferenças: na extradição o fato que gera a extradição normalmente

acontece no estrangeiro e depende de um pedido do Estado estrangeiro. Na expulsão o fato, em regra, acontece no próprio país, Brasil no caso, e pode ser ex officio, ou seja, que depende de requerimento do país que vai receber o indivíduo.

Então isto pode definir a expulsão como a retirada compulsória de um indivíduo do território

nacional quando sua permanência for considerada inconveniente aos interesses nacionais ou quando ele for condenado criminalmente pelo território nacional.

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A decisão pela expulsão ou não é ato discricionário e político do Presidente da República, mas

eventual ilegalidade ou abuso de poder pode ser corrigida por hábeas corpus. O Supremo não admite a expulsão nos casos em que a extradição for vedada, com o objetivo

de que não se utilize a expulsão como um subterfúgio nos casos em que a extradição não é permitida.

- Deportação

Consiste na devolução do estrangeiro ao seu país de origem caso ele se encontre de maneira

irregular no território nacional. Então, por exemplo, o sujeito entra de maneira irregular, sem visto, no território nacional então a hipótese neste caso é de deportação. Ver Art. 102, I, g:

Art. 102 - Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar, originariamente:

g) a extradição solicitada por Estado estrangeiro;

Direitos Políticos e Democracia

Resumindo: são três as principais vertentes da democracia contemporânea. Tem uma quarta também, mas que pela opinião do professor, não é democracia. 1º caso – Democracia Direta

Que foi a origem da idéia da democracia na Grécia Antiga. As pessoas se reuniam em praça pública, os próprios cidadãos, e eles próprios votavam em leis, decretos, proferiam sentenças judiciárias. Então o povo, diretamente, exercia o Poder Político. Isso era viável na Grécia, onde o território era pequeno e a população também. Por isso a democracia direta só foi usada na Grécia e em alguns lugares do Estado da Itália Renascentista. Já na Modernidade, depois das revoluções burguesas, esse modelo não era viável, os territórios e as populações tornaram-se grandes demais. E aí se criou o conceito de democracia representativa.

2º caso – Democracia Representativa

Buscava tornar viável a democracia, ou seja, buscava implementar as idéias básicas que estavam por trás da democracia, que seria a idéia de um governo do povo, para o povo e pelo povo. Idéia de autonomia popular. O titular do poder é o povo, mas já que este não pode exercer de maneira direta a soberania popular, se criou a idéia da democracia representativa, ou seja, o direito público tomou de empréstimo do direito privado, a idéia de um contrato de mandato. Da mesma forma como eu posso fazer uma procuração para que um indivíduo seja representante do meu interesse perante o município do Rio de Janeiro, por exemplo, eu, através de uma eleição majoritária, posso eleger determinada pessoa como o representante, para atuar em meu nome no espaço público, na arena política. Então, o conceito de democracia representativa pegou de empréstimo do mandato do

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direito privado essa idéia, para criar a idéia de mandato eletivo, atuando em nome do povo no processo político. Segundo esse poder de democracia representativa, as principais formas de atuação do povo no poder político são as eleições e os partidos políticos. Então dentro das eleições se insere as chamadas capacidades eleitorais ativa e passiva. Esses são os direitos políticos por excelência de uma democracia representativa, direito de votar e de ser votado. Nesse conceito de democracia representativa os partidos políticos são o principal meio de intermediação de diálogo entre a sociedade e o poder público. Só que hoje há uma tendência de achar que democracia não significa apenas eleição e partido político. Esse seria o conceito formal de democracia. Há 2 linhas de se superar esse tipo de conceito.

Democracia Participativa: Como diz o sociólogo Boaventura de Sousa Santos: é preciso democratizar a democracia. O que ele quer dizer com isso? Um grande problema das democracias representativas, principalmente aquelas que funcionavam mal, aquelas em que o processo político é amplamente dominado por oligarquias partidárias econômicas, há um risco de o poder não estar na mão do povo, e sim dessas elites. Se o poder não está no povo, mas concentrado em determinados grupos que manipulam o processo eleitoral, isso vira democracia de fachada. Então a solução para esse problema seria criação de instrumentos de participação direta do povo no processo político. Fazer com que não apenas os representantes do povo deliberem em seu nome, mas que o próprio povo delibere diretamente. Chamados de instrumentos de democracia semi-direta.

A Constituição de 88 cria alguns mecanismos como: plebiscito e referendo, iniciativa popular

de lei, ação popular, audiência pública,... vários instrumentos do direito infra-constitucional que visam permitir que o povo delibere diretamente no processo político e não apenas através de seus representantes. Só que isso não resolve ainda o problema das chamadas democracias plebiscitárias como é o caso do Hugo Chávez.

Se você entender que democracia significa eleição, partido político ou participação direta do

povo, todos os conceitos formais de democracia, a Venezuela possui o regime mais democrático do planeta e não é essa a verdade.

Então hoje há uma tendência de adotar um conceito de democracia deliberativa. Democracia Deliberativa: É um conceito de democracia definido por um filósofo alemão

Jürgen Habermas. Ele possui um livro importante sobre o direito chamado “Direito e Democracia”. Habermas sustenta que há uma relação de co-originalidade entre direitos fundamentais e democracia. O que ele quer dizer com isso? Sem direito fundamentais não há democracia. Pois os direitos fundamentais são pressupostos para a regularidade do processo democrático. Então é óbvio que um país pode ter tantas eleições e plebiscitos quanto quiser, se não tiver liberdade de expressão, não tiver garantido o devido processo legal não há regime democrático. Democracia não é apenas o que o parlamento, ou o que o presidente majoritariamente eleito quer estabelecer. Mesmo as pessoas eleitas, os legítimos representantes do povo, têm que respeitar os direitos fundamentais.

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Como que a Constituição de 88 se posiciona sobre essas discussões? Claramente, a CRFB/88 adotou o regime de democracia representativa. E que as principais formas do indivíduo no espaço público são direito de voto e direito de votar.

Agora podemos dizer que a CRFB/88 não adota uma democracia representativa pura. Ela tem

instrumentos de democracia direta como os já citados anteriormente: referendo, plebiscito, ação popular, etc. E veremos também que a CRFB/88 tem traços da democracia deliberativa na medida em que deu uma ampla ênfase à tutela dos direitos fundamentais.

A CRFB/88 deu uma eficácia reforçada aos direitos fundamentais na medida em que disse que

estes são normas de aplicabilidade imediata e são cláusulas pétreas. Então dessa eficácia reforçada do regime constitucional dos direitos fundamentais fica claro que democracia e direitos fundamentais são indissociáveis.

Aquisição dos direitos políticos:

O Art. 14 da CRFB diz o seguinte:

Art. 14 - A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: I - plebiscito; II - referendo; III - iniciativa popular.

Prestem atenção nas definições de plebiscito e referendo que estão na Lei 9.709/98. E a

grande diferença entre plebiscito e referendo é que o plebiscito é anterior ao ato estatal enquanto o referendo é posterior a um ato já produzido.

Art. 2º - Plebiscito e referendo são consultas formuladas ao povo para que delibere sobre matéria de acentuada relevância, de natureza constitucional, legislativa ou administrativa. § 1º - O plebiscito é convocado com anterioridade a ato legislativo ou administrativo, cabendo ao povo, pelo voto, aprovar ou denegar o que lhe tenha sido submetido. § 2º - O referendo é convocado com posterioridade a ato legislativo ou administrativo, cumprindo ao povo a respectiva ratificação ou rejeição.

Um detalhe importante: ambos os casos, plebiscito e referendo, são consultas formulados ao

povo para que delibere sobre matéria relevante, de natureza constitucional, legislativa e administrativa. Então eles não estão restrito à matéria constitucional.

Quais são os requisitos para aquisição dos direitos políticos? O direito de votar é adquirido com o alistamento eleitoral. O registro do indivíduo na justiça

eleitoral. Não podem se alistar como eleitores os estrangeiros, e durante o exercício militar os conscritos (aqueles que prestam serviço militar obrigatório). Art. 14, §2º.

§ 2º - Não podem alistar-se como eleitores os estrangeiros e, durante o período do serviço militar obrigatório, os conscritos.

Já a capacidade eleitoral passiva, ou seja, o direito de ser votado, se adquire com o

preenchimento das requisições de elegibilidade. Estas estão no Art. 14, §3º:

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§ 3º - São condições de elegibilidade, na forma da lei:

I - a nacionalidade brasileira; II - o pleno exercício dos direitos políticos; III - o alistamento eleitoral; IV - o domicílio eleitoral na circunscrição; V - a filiação partidária; VI - a idade mínima de:

a) trinta e cinco anos para Presidente e Vice-Presidente da República e Senador; b) trinta anos para Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal; c) vinte e um anos para Deputado Federal, Deputado Estadual ou Distrital, Prefeito, Vice-Prefeito e juiz de paz; d) dezoito anos para Vereador.

Art. 14, §4º:

§ 4º - São inelegíveis os inalistáveis e os analfabetos.

Dois comentários importantes: os analfabetos podem votar, mas não podem ser votados. Possuem capacidade eleitoral ativa, mas não possuem passiva. Além disso seu voto é facultativo.

Art. 14, § 1º - O alistamento eleitoral e o voto são:

I - obrigatórios para os maiores de dezoito anos; II - facultativos para:

a) os analfabetos; b) os maiores de setenta anos; c) os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos.

O voto é obrigatório para aqueles entre 18 e 70 anos que sejam alfabetizados. É facultativo

para os analfabetos, para aqueles entre 16 e 18 anos e mais de 70 anos. Há algum caso em que se admite a dispensa da filiação partidária para que o indivíduo

concorra a cargo eletivo? Apenas no caso de cargo militar. No caso do militar se admite a sub-inscrição da filiação partidária, pelo registro da candidatura

do partido, porque aos militares é vedada a filiação partidária. Interessante notar também que os requisitos para aquisição da capacidade eleitoral passiva

são mais amplos do que os requisitos para aquisição da capacidade eleitoral ativa. Porque para aquisição da capacidade eleitoral ativa basta o alistamento eleitoral. Para a capacidade eleitoral passiva, além do alistamento eleitoral a pessoa deve preencher todos os outros requisitos do Art.14, §3º.

Escala da aquisição dos direitos políticos:

• Aos 16 anos o sujeito adquire o direito de votar e de propor ação popular.

• Aos 18: o que era apenas uma faculdade de votar se torna um dever cívico. Surge também o dever de cumprir o serviço militar obrigatório e o direito de se candidatar vereador.

• Aos 21 anos: o sujeito pode se candidatar aos cargos previstos no Art. 14, §3º, VI, “c”.

§ 3º - São condições de elegibilidade, na forma da lei:

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VI - a idade mínima de: c) vinte e um anos para Deputado Federal, Deputado Estadual ou Distrital, Prefeito, Vice-Prefeito e juiz de paz;

• Aos 30 anos: nos casos previsto no mesmo Art., só que na alínea “b”:

§ 3º - São condições de elegibilidade, na forma da lei: VI - a idade mínima de:

b) trinta anos para Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal;

• E aos 35 está na alínea “a” do Art. 14:

§ 3º - São condições de elegibilidade, na forma da lei: VI - a idade mínima de:

a) trinta e cinco anos para Presidente e Vice-Presidente da República e Senador;

Outros parágrafos também presentes no Art. 14 da CRFB/88:

§ 5º - O Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem os houver sucedido ou substituído no curso dos mandatos poderão ser reeleitos para um único período subseqüente. § 6º - Para concorrerem a outros cargos, o Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal e os Prefeitos devem renunciar aos respectivos mandatos até seis meses antes do pleito. § 7º - São inelegíveis, no território de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes consangüíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do Presidente da República, de Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de Prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à reeleição. § 8º - O militar alistável é elegível, atendidas as seguintes condições: I - se contar menos de dez anos de serviço, deverá afastar-se da atividade; II - se contar mais de dez anos de serviço, será agregado pela autoridade superior e, se eleito, passará automaticamente, no ato da diplomação, para a inatividade. § 9º - Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta. § 10 -O mandato eletivo poderá ser impugnado ante a Justiça Eleitoral no prazo de quinze dias contados da diplomação, instruída a ação com provas de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude.

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§ 11 - A ação de impugnação de mandato tramitará em segredo de justiça, respondendo o autor, na forma da lei, se temerária ou de manifesta má-fé.

04 de dezembro de 2007 O que será abordado na aula: - Parte final de Direitos Políticos - Poder Executivo

Na última aula paramos em perda dos direitos políticos. Art. 15 da CRFB, hipóteses de perda ou suspensão dos direitos políticos.

Art. 15 - É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos

casos de: I - cancelamento da naturalização por sentença transitada em julgado; II - incapacidade civil absoluta; III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos; IV - recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa, nos termos do Art.

5º, VIII; V - improbidade administrativa, nos termos do Art. 37, § 4º.

A diferença entre perda e suspensão é que a perda é definitiva. As hipóteses de perda estão

nos incisos I e IV. Logo, as de suspensão estão nos incisos II, III e V. Nesses 3 casos (incapacidade penal, condenação criminal e improbidade administrativa) a suspensão dos direitos políticos são aefeito reflexo da sentença.

Primeira controvérsia que surgiu refere-se à exigência de trânsito em julgado. Quando o

Marcus Faver foi presidente do tribunal houve uma orientação que dizia que candidatos que não tinham bons antecedentes, que tinham uma longa ficha criminal, era negado registro a candidatura.

O TRE pode negar registro à candidatura para candidatos que não tenham bons antecedentes? O TSE e o Supremo entenderam que não, pois a Constituição só suspende os direitos políticos na hipótese de condenação criminal transitada em julgado. Logo o indivíduo está em pleno exercício de seus direitos políticos e tem direito de registrar sua candidatura.

Outro caso recente foi um de infidelidade partidária. Será que a troca de partido implica a

perda dos direitos políticos? O Supremo sempre entendeu que não, pois no Art. 15 não consta a troca de partido como uma das hipóteses de perda ou suspensão dos direitos políticos. Recentemente o Supremo passou a entender que a troca de partido implicava a perda do mandato, porque segundo o sistema proporcional (se aplica a parlamentares: vereador, deputado estadual, federal), o mandato pertence ao partido, pois a votação acontece neste, de forma que se houvesse a troca de partido, este poderia manter a sua cadeira na Casa. Percebam que essa não é uma hipótese de perda dos direitos políticos, não está no Art. 15. É de perda do mandato.

Art. 15 - É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de: I - cancelamento da naturalização por sentença transitada em julgado; II - incapacidade civil absoluta; III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos;

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IV - recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa, nos termos do Art. 5º, VIII; V - improbidade administrativa, nos termos do Art. 37, § 4º.

Inelegibilidade:

As inelegibilidades são condições que obstam a capacidade eleitoral passiva. Ou seja, são

condições que afastam o direito da pessoa de candidatar-se a um determinado cargo público. As inelegibilidades podem ser de dois tipos: absoluta e relativa. Inelegibilidade Absoluta: Se refere a qualquer cargo público e só podem ser previstas na

Constituição. Por exemplo, a hipótese do §4º do Art. 14: “São inelegíveis os inalistáveis e os analfabetos.” Os analfabetos têm capacidade eleitoral ativa, mas não têm passiva. Podem votar mas não podem ser votados.

As outras inelegibilidades são relativas, ou sejam, se aplicam apenas a determinados cargos

públicos, em virtude de determinadas situações concretas. As inelegibilidades relativas não precisam vir previstas na Constituição Federal como consta no §9º: “Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.”

O objetivo da inelegibilidade sempre, é o de proteger a probidade administrativa, a

normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico e do poder político. Essas hipóteses de ineligibilidade estão na Lei Complementar 64/90 e LC 81/94.

A primeira condição de inelegibilidade relativa da Constituição está no §5º do Art. 14, que é a

regra da reeleição: “O Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem os houver sucedido ou substituído no curso dos mandatos poderão ser reeleitos para um único período subseqüente.”

O que se extrai da regra da reeleição com a da inelegibilidade? Que há uma vedação a um

terceiro mandato consecutivo. Não há um limite máximo de mandatos, mas 3 deles não podem ser consecutivos.

Se o Presidente Lula, por exemplo, renunciar há mais de 3 meses do pleito, persiste a

inelegibilidade? Não, a renúncia do chefe do Poder Executivo não afasta a inelegibilidade. Para concorrer a outros cargos o Presidente da República, Governadores dos Estados, Distrito

Federal e Prefeitos devem renunciar aos respectivos mandatos até 3 meses antes do pleito. Essa é a desincompatibilização, ou seja, é a necessidade do chefe do Poder Executivo de renunciar ao mandato para concorrer a outros cargos, mas não ao próprio cargo.

Então, por exemplo, se o Presidente da República for candidato à reeleição ele não precisa de

desincompatibilidade, ele pode continuar no cargo. Agora se ele quiser se candidatar a Governador, por

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exemplo, ele precisa se desincompatibilizar 3 meses antes e isto será um afastamento definitivo e não uma licença.

O §6º está na Constituição desde a sua redação original, já a redação do §5º foi introduzida

pela Emenda 16/97. Na verdade, a introdução da emenda 16/97 tornou o nosso sistema sobre inelegibilidade incoerente. Mas por que é dito isso? O pressuposto da inelegibilidade é o abuso do poder. Na reeleição a possibilidade do indivíduo abusar deste é bem maior. Então fica incoerente, quando o candidato tem o poder de abusar menos da máquina que é o caso de candidatura para outro cargo, ele tem que se afastar e quando ele tenta reeleição, que vai continuar no mesmo cargo e o abuso de poder tem proporções bem maior, ele não precisa se afastar. É uma contradição que existe na Constituição, mas ambas as normas são aplicadas.

§ 6º - Para concorrerem a outros cargos, o Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal e os Prefeitos devem renunciar aos respectivos mandatos até seis meses antes do pleito.

E o vice, por exemplo, um vice-prefeito quer se candidatar a deputado estadual, ele precisa

renunciar seu atual cargo ou não? Em outras palavras: se aplica a desincompatibilização ao vice? A princípio não, o artigo só fala em chefe do executivo, agora para que ele seja elegível, ele não pode ter substituído o seu titular. Aí acontece uma situação curiosa: nesse entendimento, ele não pode assinar nenhum decreto substituindo o chefe do executivo, ou seja, em menos de 6 meses ele não pode assinar nenhum decreto substituindo o chefe do executivo. Então, às vezes acontece determinada situação que o sujeito está fugindo de substituir o chefe do executivo para não se tornar inelegível.

O §7º é a chamada inelegibilidade por parentesco.

§ 7º - São inelegíveis, no território de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes consangüíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do Presidente da República, de Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de Prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à reeleição.

Então a quem se aplica essa inelegibilidade? Ao cônjuge, parentes consangüíneos ou afins até

o 2º grau ou por adoção do chefe do Executivo. Primeira questão: companheira equipara o cônjuge para fins de inelegibilidade? Sim. A

inelegibilidade se estende às companheiras. Obviamente que as viúvas estão fora. Para que cargos se aplica essa inelegibilidade? Pois na Constituição não está clara: são

inelegíveis no território de jurisdição do titular. Mas o que significa esse “no território de jurisdição do titular”? Se o marido foi governador do estado, é óbvio que a mulher fica inelegível, por exemplo, para deputado estadual. Governador do estado e Deputado estadual são cargos do mesmo território. Mas este é um caso fácil. Fica mais complicado se, por exemplo, a gente indagar se sendo o esposo governador do estado do Rio de Janeiro, a mulher poderia se candidatar a senadora do estado do Rio de Janeiro ou deputada federal do RJ. A rigor, o deputado federal e o senador exercem sua competência no território nacional, enquanto que o governador só exerce no território do estado. Nesse caso se aplica a inelegibilidade. Aí surge a pergunta: mas como é inelegível se o território não é o mesmo? Na verdade deve-se prestar atenção para a finalidade das coisas, que é evitar o abuso do poder político. Então no

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caso de concorrer ao senado ou a câmara dos deputados pelo estado do Rio de Janeiro pouco importa se ele vai exercer ou não sua competência sobre todo o território nacional, o que interessa é que a eleição é no âmbito do estado, então há um risco do governador de estado poder manipular a eleição no âmbito do estado.

E no caso do Garotinho e da Rosinha, por exemplo? Por que a Rosinha pôde ser eleita

governadora de estado? Como que se afastou a aplicação desse dispositivo? O Garotinho renunciou seu mandato 3 meses antes para concorrer à presidência da república, então se o chefe do executivo renunciar até 3 meses antes do pleito se afasta a inelegibilidade. E há uma ressalva expressa além dessa possibilidade de afastamento que está no Art. 14, §7º: “(...) salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à reeleição.”

Então por exemplo: O marido é governador do estado, a mulher a princípio seria inelegível

para deputada estadual exceto se, como diz o final do §7º já titular de mandato eletivo e candidata à reeleição.

Analisando agora o §8º + Art 142:

§ 8º - O militar alistável é elegível, atendidas as seguintes condições: I - se contar menos de dez anos de serviço, deverá afastar-se da atividade; II - se contar mais de dez anos de serviço, será agregado pela autoridade superior e, se eleito, passará automaticamente, no ato da diplomação, para a inatividade. Art. 142 - As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.

Tem uma dificuldade no §8º: se você ler o Art 142 da CRFB vocês vão ver que militares não podem filiar-se a partidos políticos. E aí surge um problema: como que militares não podem filiar a partidos políticos se eles são elegíveis? Em outras palavras, como ele vai se eleger sem se filiar? Há uma aparente contradição entre o Art 142 e o Art 14, §8º da CRFB. O TSE criou uma solução para desfazer esse conflito: ele pode suprir a falta de filiação partidária com o registro da candidatura no partido. Outro detalhe: qual a diferenciação entre o tempo do militar? Se ele tiver menos de 10 anos de serviço o que acontece? Se ele tiver menos de 10 anos de serviço haverá um afastamento definitivo. Se ele tiver mais de 10 anos, o afastamento será provisório. Falando sobre o Art. 16:

Art. 16 - A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até 1 (um) ano da data de sua vigência.

Esse é o princípio da anualidade eleitoral. Quais são os fundamentos deste princípio? Primeiro

segurança jurídica, ou seja, é uma garantia da estabilidade das regras do jogo eleitoral, ou seja, que haverá possibilidade dos atores políticos, incluindo cidadão conhecerem as regras do processo eleitoral com antecedência. A anualidade eleitoral é também uma garantia da democracia e pra que a garantia

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dessa democracia? Um exemplo: determinado grupo está no poder, sente que perderá a eleição, pode ficar tentado em mudar as regras do processo eleitoral para evitar que a oposição ganhe a eleição.

E se uma emenda constitucional alterar o processo eleitoral tem de se aplicar também a

anualidade ou não? Essa questão foi colocada com a EC 52 que acabou com a verticalização. Qual foi a história da

verticalização? Ela não está prevista expressamente em lei nenhuma, ela foi criada por uma interpretação construtiva dada pelo TSE à lei eleitoral (Lei 9.504), e o fez há menos de um ano da eleição de 2002 E a verticalização foi aplicada à eleição de 2002.

Houve evidentemente uma reação no meio político, foi proposto um projeto de emenda

constitucional para acabar com a verticalização em 2002. Só que esse projeto de emenda constitucional só foi aprovado em 2006. E essa EC 53 tem 2 artigos. O Art. 1º que alterou a redação do Art. 17 §1º, acabando com a verticalização. E o Art. 2º diz que isto já se aplica nas eleições de 2002. A primeira questão que surgiu foi? Como que essa lei aprovada em 2006 diz que ela se aplica em 2002? A questão que se colocou perante o Supremo é que se o Art. 2º autorizava a aplicação da EC 52 às eleições de 2006? Em outras palavras: será que uma emenda constitucional pode-se aplicar à eleição seguinte, mesmo a emenda constitucional tendo antecedente inferior a um ano? O Art. 16 é ou não cláusula pétrea? Isso que foi discutido perante o Supremo.

O Supremo entendeu que nem a emenda constitucional pode alterar o processo eleitoral a

menos de um ano. O Supremo entendeu que não só a lei como também a EC não pode alterar o processo eleitoral antes de um ano. Essa vedação aplica-se também ao poder de reforma da constituição.

A inconstitucionalidade foi declarada da EC 52 EM RELAÇÃO à eleição seguinte, não foi

declarada inconstitucionalidade da EC 52 em si. Então hoje prevalece o Art. 17 - §1º que afasta, expressamente, a verticalização.

Verticalização é a obrigatoriedade de pertinência, de coerência entre as coligações federal e

estadual. Por exemplo: se o PMDB se coliga com o PT para Presidente da República, não pode se coligar com os democratas para governador do estado. Então, segundo a EC 52, isto agora é permitido. Não há mais a obrigatoriedade da verticalização.

Partidos Políticos:

Art. 17 - É livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos, resguardados a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo, os direitos fundamentais da pessoa humana e observados os seguintes preceitos: I - caráter nacional; II - proibição de recebimento de recursos financeiros de entidade ou governo estrangeiros ou de subordinação a estes; III - prestação de contas à Justiça Eleitoral; IV - funcionamento parlamentar de acordo com a lei. § 1º - É assegurada aos partidos políticos autonomia para definir sua estrutura interna, organização e funcionamento e para adotar os critérios de escolha e o regime de suas coligações eleitorais, sem obrigatoriedade de vinculação entre as candidaturas em âmbito

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nacional, estadual, distrital ou municipal, devendo seus estatutos estabelecer normas de disciplina e fidelidade partidária. § 2º - Os partidos políticos, após adquirirem personalidade jurídica, na forma da lei civil, registrarão seus estatutos no Tribunal Superior Eleitoral. § 3º - Os partidos políticos têm direito a recursos do fundo partidário e acesso gratuito ao rádio e à televisão, na forma da lei. § 4º - É vedada a utilização pelos partidos políticos de organização paramilitar.

Vocês devem combinar o Art.17, caput com o §1º, pois o caput prevê o pluripartidarismo e o §1º prevê a autonomia partidária, essas são características fundamentais do regime partidário brasileiro.

Pluripartidarismo – liberdade de criação, fusão, incorporação e extinção dos partidos políticos. Autonomia Partidária – liberdade do partido para definir a sua estrutura interna, organização,

funcionamento, etc. Qual a natureza jurídica dos partidos políticos? Pessoa de direito privado, que exercem

funções constitucionais. Só que existem as peculiaridades, os partidos políticos são registrados no registro civil como qualquer pessoa de direito privado, agora há necessidade também de registro no TSE.

No §4º diz que os partidos políticos não podem ter caráter paramilitar. Isso é óbvio, pois

partido político não pode se armar. E a última questão em relação aos partidos diz respeito à cláusula de barreiras. No Brasil existe um número grande de partidos políticos e nem todos eles são partidos sério,

alguns não tem consciência ideológica, e existe um certo receio na restrição do número de partidos. É muito comum, como já foi dito, o pluripartidarismo no país, só que num ponto que têm-se partidos demais, vários sem essa consciência ideológica nenhuma, aí uma tentativa de colocar ordem na casa foi essa cláusula de barreiras.

A Cláusula de Barreiras foi uma exigência instituída por lei ordinária e teve o seguinte sentido: os partidos que não obtiverem um número mínimo de cadeiras na câmara de deputados, que era 5%, perderiam um volume substancial de recursos financeiros e um tempo também substancial de propaganda gratuita no rádio e na televisão.

O Supremo declarou inconstitucional a cláusula de barreira, por violação a vários princípios,

como por exemplo, o pluripartidarismo. Mas por que ele se preocupou da cláusula de barreiras violar o pluripartidarismo? O Partido Verde por exemplo, provavelmente não ia obter 5% das cadeiras na câmara dos deputados, conseqüência que este partido, com o tempo, deixaria de existir, porque a restrição é muito ampla, então partidos que representam parcelas importantes da sociedade brasileira, ainda que minoritários, deixariam de existir. A outra razão para o Supremo ter tomado essa decisão, foi por conta do Art. 17, IV e do Art. 17, §3º admitirem que lei disciplinem o funcionamento parlamentar e a concessão de recursos de fundo partidário e o acesso gratuito ao rádio e à televisão. O Supremo diz que lei pode regulamentar e não abolir os direitos. A cláusula de barreiras ao promover uma restrição tão intensa, ela acabou extinguindo esse direito quando ela só poderia regulamentar.

Poder Executivo:

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O Sistema de Governo no Brasil é o Presidencialista. Isso foi decidido quando e por quem? Foi um plebiscito em 1993. Este está previsto no Art. 2º do ADCT.

Art. 2º - No dia 7 de setembro de 1993 o eleitorado definirá, através de plebiscito, a forma (república ou monarquia constitucional) e o sistema de governo (parlamentarismo ou presidencialismo) que devem vigorar no País.

As opções ficaram entre monarquia ou república e parlamentarismo ou presidencialismo. E

ganhou a república presidencialista. Quais são as principais características do presidencialismo? Há uma união da função de chefe

de governo e chefe de estado em torno da mesma pessoa, que é o Presidente da República, ou seja, o Presidente da República representa o Brasil no plano internacional e exerce a função de chefe de governo e chefe da administração pública federal interna.

Por exemplo, o Art. 84 da CRFB estabelece as competências do presidente da república, vocês vão ver que ali claramente há competências de chefe de Estado e chefe de governo provando que no Brasil há o regime presidencialista.

Art. 84 - Compete privativamente ao Presidente da República: I - nomear e exonerar os Ministros de Estado; II - exercer, com o auxílio dos Ministros de Estado, a direção superior da administração federal; III - iniciar o processo legislativo, na forma e nos casos previstos nesta Constituição; IV - sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução; V - vetar projetos de lei, total ou parcialmente; VI - dispor, mediante decreto, sobre: a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos; b) extinção de funções ou cargos públicos, quando vagos; VII - manter relações com Estados estrangeiros e acreditar seus representantes diplomáticos; VIII - celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional; IX - decretar o estado de defesa e o estado de sítio; X - decretar e executar a intervenção federal; XI - remeter mensagem e plano de governo ao Congresso Nacional por ocasião da abertura da sessão legislativa, expondo a situação do País e solicitando as providências que julgar necessárias; XII - conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos em lei; XIII - exercer o comando supremo das Forças Armadas, nomear os Comandantes da Marinha do Exército e da Aeronáutica, promover seus oficiais-generais e nomeá-los para os cargos que lhes são privativos XIV - nomear, após aprovação pelo Senado Federal, os Ministros do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais Superiores, os Governadores de Territórios, o Procurador-Geral da República, o presidente e os diretores do banco central e outros servidores, quando determinado em lei XV - nomear, observado o disposto no Art. 73, os Ministros do Tribunal de Contas da União; XVI - nomear os magistrados, nos casos previstos nesta Constituição, e o Advogado-Geral da União;

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XVII - nomear membros do Conselho da República, nos termos do Art. 89, VII; XVIII - convocar e presidir o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional; XIX - declarar guerra, no caso de agressão estrangeira, autorizado pelo Congresso Nacional ou referendado por ele, quando ocorrida no intervalo das sessões legislativas, e, nas mesmas condições, decretar, total ou parcialmente, a mobilização nacional; XX - celebrar a paz, autorizado ou com o referendo do Congresso Nacional; XXI - conferir condecorações e distinções honoríficas; XXII - permitir, nos casos previstos em lei complementar, que forças estrangeiras transitem pelo território nacional ou nele permaneçam temporariamente XXIII - enviar ao Congresso Nacional o plano plurianual, o projeto de lei de diretrizes orçamentárias e as propostas de orçamento previstos nesta Constituição; XXIV - prestar, anualmente, ao Congresso Nacional, dentro de sessenta dias após a abertura da sessão legislativa, as contas referentes ao exercício anterior; XXV - prover e extinguir os cargos públicos federais, na forma da lei; XXVI - editar medidas provisórias com força de lei, nos termos do Art. 62; XXVII - exercer outras atribuições previstas nesta Constituição. Já no parlamentarismo, as funções de chefe de Estado e chefe de governo são dividias, cada

uma é exercida por uma pessoa diferente. A função de chefe de Estado cabe ao presidente ou ao rei, dependendo de se tratar de uma república parlamentarista ou de uma monarquia parlamentarista. Já a função de chefe de governo é atribuída, em regra ao 1º ministro, que é escolhido pelo parlamento.

A segunda distinção importante entre o parlamentarismo e o presidencialismo é que no

presidencialismo o presidente é eleito para cumprimento de um mandato fixo, ou seja, ele é eleito para cumprir um mandato de tantos anos. No Brasil são 4 anos, ele só perde o caro em hipóteses excepcionais, como por exemplo: crime de responsabilidade. O Presidente da República não perde o cargo por falta de uma lei parlamentar. No parlamentarismo, a investidura no 1º Ministro não é por tempo certo, é baseado na confiança que o parlamento deposita no 1º Ministro.

Então se o parlamento considerar que o 1º Ministro não mais deve ser aquela pessoa, ele cai,

por falta de apoio político, gera queda do 1º Ministro, o que não acontece no presidencialismo. Não cabe aqui ficar discutindo quais são as vantagens e desvantagens de um e outro que isso

seria uma discussão desnecessária. Mas só falando de forma geral, qual a grande vantagem do presidencialismo? É que ele traz uma certa estabilidade. Então, o problema do parlamentarismo é que, se os partidos não forem fortes, pode gerar instabilidade. Agora há uma grande vantagem no parlamentarismo em relação ao presidencialismo. Ele garante uma sintonia mais fina entre a opinião pública e poder público, pois se o sujeito tentar se afastar muito da opinião pública, ou seja tentar adotar medidas não populares, ele cai.

O Congresso Nacional pode aprovar uma emenda instituindo o parlamentarismo ou a

monarquia no Brasil? Não, pois o povo decidiu no plebiscito que o Brasil é uma república presidencialista. Se o povo decidiu isso, em manifestação direta, só o próprio povo pode aprovar o parlamentarismo ou a monarquia em outro plebiscito. Não se pode dar ao representante do povo mais poderes que o próprio povo.

Eleição do Presidente da República:

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O Presidente da República é eleito para um mandato de 4 anos podendo ser reelegido uma única vez. O Presidente da República é eleito pelo sistema majoritário IUS PUBLICUM, que se aplica além do Presidente da República a governadores e prefeitos de municípios com mais de 200 mil eleitores. Esse sistema existe para que o sujeito se eleja com maioria absoluta de votos. Se ele não obtiver maioria absoluta de votos, há um segundo turno entre os dois mais votados. Já o sistema majoritário simples se aplica a senadores e prefeitos com menos de 200 mil eleitores. Nesse sistema, basta que o sujeito seja o mais votado.

Vacância do cargo de Presidente:

Art. 78, §único: “Se, decorridos dez dias da data fixada para a posse, o Presidente ou o Vice-Presidente, salvo motivo de força maior, não tiver assumido o cargo, este será declarado vago.”

Então essa é a hipótese em que nem presidente nem vice assumem o cargo. Se o presidente

não assumir o cargo, o vice assume. Se ambos não assumirem, o cargo é declarado vago. Essa declaração de vacância é um ato político do Congresso Nacional, cabe ao Congresso Nacional declarar a vacância do cargo.

Nessa hipótese de vacância do cargo de presidente o Art. 80 prevê uma linha sucessória, ou

seja, as autoridades que, nessa ordem, irão suceder o Presidente da República. São elas: Presidente da Câmara dos Deputados, do Senado Federal e do Supremo Tribunal Federal.

Art. 80 - Em caso de impedimento do Presidente e do Vice-Presidente, ou vacância dos respectivos cargos, serão sucessivamente chamados ao exercício da Presidência o Presidente da Câmara dos Deputados, o do Senado Federal e o do Supremo Tribunal Federal.

Agora essas autoridades assumem o mandato até o final ou não? Não, elas têm que convocar

eleições presidenciais que tem de acontecer no prazo de 90 dias depois de aberta a última vaga.

Art. 81 - Vagando os cargos de Presidente e Vice-Presidente da República, far-se-á eleição noventa dias depois de aberta a última vaga. § 1º - Ocorrendo a vacância nos últimos dois anos do período presidencial, a eleição para ambos os cargos será feita trinta dias depois da última vaga, pelo Congresso Nacional, na forma da lei. § 2º - Em qualquer dos casos, os eleitos deverão completar o período de seus antecessores.

Há uma diferença significativa em relação ao tempo da vacância, ao momento da vacância. Se

a vacância se deu nos dois primeiros anos do mandato, faz-se outra eleição direta. Agora se a vacância se der nos dois últimos anos de mandato, haverá uma hipótese excepcional de eleição indireta para Presidente da República, o Congresso Nacional é que elegerá o Presidente da República para terminar o mandato. Essa é a única hipótese de eleição indireta para Presidente da República. O Art. 84 da CRFB trata das competências do Presidente da República como mostrado anteriormente.

É importante saber que o Poder Executivo é uma estrutura hierarquizada. O Poder Executivo

tem chefes que é o Presidente da República, Governador do Estado ou o Prefeito. Então por isso que na forma do Art. 84, II cabe ao chefe do Executivo promover direção superior da administração pública.

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Atribuições do Vice:

Art. 79 - Substituirá o Presidente, no caso de impedimento, e suceder-lhe-á, no de vaga, o Vice-Presidente. Parágrafo único - O Vice-Presidente da República, além de outras atribuições que lhe forem conferidas por lei complementar, auxiliará o Presidente, sempre que por ele convocado para missões especiais.

Atenção, pois a Constituição utilizou dois termos diferentes. Na hipótese de impedimento do

Presidente da República, a CRFB diz que o vice substituirá o presidente. E no caso de vacância que haverá sucessão do cargo do Presidente da República.

Além disso deve-se combinar o Art. 79 com o Art. 89, I e Art. 91, I

Art. 89 - O Conselho da República é órgão superior de consulta do Presidente da República, e dele participam: I - o Vice-Presidente da República; Art. 91 - O Conselho de Defesa Nacional é órgão de consulta do Presidente da República nos assuntos relacionados com a soberania nacional e a defesa do Estado democrático, e dele participam como membros natos: I - o Vice-Presidente da República;

Que é a participação do vice nos Conselhos da República e Defesa Nacional? O Art. 79, §único

fala que o vice deve cumprir missões especiais convocadas pelo Presidente da República e além de outras atribuições citadas por lei complementar.

Ministro de Estado

Art. 87 - Os Ministros de Estado serão escolhidos dentre brasileiros maiores de vinte e um anos e no exercício dos direitos políticos. Parágrafo único - Compete ao Ministro de Estado, além de outras atribuições estabelecidas nesta Constituição e na lei:

I - exercer a orientação, coordenação e supervisão dos órgãos e entidades da administração federal na área de sua competência e referendar os atos e decretos assinados pelo Presidente da República; II - expedir instruções para a execução das leis, decretos e regulamentos; III - apresentar ao Presidente da República relatório anual de sua gestão no Ministério; IV - praticar os atos pertinentes às atribuições que lhe forem outorgadas ou delegadas pelo Presidente da República.

Então para ser Ministro de Estado, a princípio, basta ser maior de 21 e estar no exercício de

seus direitos políticos. Precisa ser brasileiro nato? Não, só para Ministro de Defesa. (Art. 12, §3º).

§ 3º - São privativos de brasileiro nato os cargos: I - de Presidente e Vice-Presidente da República; II - de Presidente da Câmara dos Deputados; III - de Presidente do Senado Federal;

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IV - de Ministro do Supremo Tribunal Federal; V - da carreira diplomática; VI - de oficial das Forças Armadas; VII - de Ministro de Estado da Defesa.

Tem uma divergência relevante sobre as atribuições do vice que é a seguinte: referendar decreto assinado pelo presidente da República. Então por exemplo, um decreto, em matéria de educação. O vice deve assinar junto com o Presidente da República, o Ministro da Educação deve assinar junto com o Presidente da República. Decreto da área de saúde, o Ministro da Saúde, .... etc.É condição para esse decreto que os dois devem assinar.

E se o Ministro não assinar? Isso gera invalidade do decreto? Não, mas gera invalidade formal.

Isso é óbvio, pois o Ministro é uma autoridade subordinada ao Presidente da República. Não faz sentido o subordinado referendar a decisão politicamente superior.

Criação de Órgãos Públicos:

Art. 88 - A lei disporá sobre a criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública.

Então para criar Ministério ou Órgão da administração pública só lei. Combinar Art. 88 com o Art. 84, VI.

Art. 84 - Compete privativamente ao Presidente da República:

VI - dispor, mediante decreto, sobre: a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos; b) extinção de funções ou cargos públicos, quando vagos;

Mas para que combinar esses Artigos? Para chamar atenção para o seguinte fato: para criar

Ministério ou órgão da adm. pública, como foi dito só lei, mas para expor sobre organização e funcionamento desses órgãos, pode ser por decreto, desde que não importe em aumento de despesa, nem em criação de cargo.

Então, por exemplo, se o Presidente da República quer transferir uma sentença

LIDE(1h:13min:30seg)??? de um Ministério para outro sem criar despesa, nem criar cargo, ele pode fazer isso por decreto.

Imunidades e Responsabilidades do Presidente da República:

A primeira imunidade do Presidente da República refere-se à prisão:

Art.86, § 3º - Enquanto não sobrevier sentença condenatória, nas infrações comuns, o Presidente da República não estará sujeito a prisão.

O presidente da República só pode ser preso com trânsito em julgado de condenação criminal.

Até aí não tem nenhuma grande novidade.

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A imunidade que é um pouco mais complicada é do Art. 86, §4º.

§ 4º - O Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções.

Essa imunidade é a imunidade material, pois exclui a responsabilização do presidente da

República por atos que não tenham relação com o exercício da função. Então se o Presidente da República praticar um crime que nada tenha a ver com a função do serviço público se aplica a imunidade. Significa que ele vai ficar impune? Não, significa apenas que ele não vai poder responder por aquilo durante a vigência de seu mandato. E obviamente que a prescrição é suspensa. Esta fica suspensa até o fim de seu mandato, após essa data, a prescrição volta a correr normalmente.

A quem cabe julgar o Presidente da República por crimes comuns? O Supremo. E por crime de

responsabilidade? O Senado. E em relação à ações propostas contra atos do Presidente, que ações são de competência

privativa do Supremo? Por exemplo, mandando de segurança contra ato do Presidente a quem cabe julgar? Hábeas Corpus contra ato do Presidente? Se aplica a competência privativa do Supremo em caso de mandado de segurança, hábeas corpus, hábeas data e mandado de injunção contra ato do Presidente. Não há competência privativa do Supremo em ação popular e em ação civil pública.

Duas questões são problemáticas:

A primeira é o foro por prerrogativa função de ex-detentores de cargos públicos. Por exemplo, o sujeito é Presidente da república. Responde a processo criminal perante o

Supremo. O supremo ainda não julgou o mérito. O sujeito termina o mandato. O supremo continua o julgamento ou manda para um regimento estanque? Essa questão sofreu uma evolução na interpretação do Supremo. A primeira orientação do Supremo foi a Súmula 394, que o Supremo disse que o fim do mandato não implicava na perda do foro por prerrogativa.

Súmula 394 - Cometido o crime durante o exercicio funcional, prevalece a competencia especial por prerrogativa de função, ainda que o inquerito ou a ação penal sejam iniciados apos a cessação daquele exercicio.

Então segundo esse desentendimento, terminava o mandato e o processo continuava no

Supremo, que julgava por mérito mesmo o sujeito já tendo deixado o cargo. Só que o Supremo cancelou essa Súmula no Inquérito 687. O Supremo entendeu que o fim do mandato implicava no fim do foro por prerrogativa.

Então no fim do mandato o Supremo mandava o processo para um juiz da instância e este

tocava o processo a partir dali, ou seja, aproveitava todos os atos já praticados e tocava os atos seguintes. Isso gerou uma repercussão nos meios políticos, e foi aprovado no final do governo do Fernando Henrique a Lei 10.628/02 que introduziu os Parágrafos 1º e 2º no Art. 84 do CPP.

Art 84 – Código de Processo Penal (CPP)

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§ 1º A competência especial por prerrogativa de função, relativa a atos administrativos do agente, prevalece ainda que o inquérito ou a ação judicial sejam iniciados após a cessação do exercício da função pública. § 2º A ação de improbidade, de que trata a Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992, será proposta perante o tribunal competente para processar e julgar criminalmente o funcionário ou autoridade na hipótese de prerrogativa de foro em razão do exercício de função pública, observado o disposto no § 1º.

O §1º estabelecia exatamente o foro por prerrogativa de função de ex-ocupantes de cargos

públicos e o §2º estabelecia o foro por prerrogativa de função na ação de improbidade administrativa. O Supremo declarou tanto o §1º quanto o §2º do Art. 84, CPP inconstitucionais na ADIN 2797,

com base em vários argumentos. O principal deles foi que só a Constituição podia inovar no hall de competência originária do Supremo, lei não pode criar isto.

Então prevalece o entendimento do Inquérito 687. Findo o mandato, acaba o foro por

prerrogativa de função.

Duas ressalvas sobre isso:

1- Em caso recente o Governador do estado estava prestes a ser condenado pelo Supremo em um processo criminal, aí ele renunciou o cargo, pois sabia que se aplicaria essa jurisprudência do Supremo, com a renúncia o processo seria enviado para a 1ª instância e teria vários recursos e provavelmente o crime iria prescrever. 2- Uma outra questão importante se refere à cumulação entre a ação de improbidade e crimes de responsabilidade. Será que os agentes políticos podem ser processados cumulativamente por ação de improbidade e por crime de responsabilidade? O Supremo decidiu que não, ele decidiu que os tipos são muito parecidos e significaria bis in idem o cabimento de ambas as responsabilizações. Então o Supremo entender que para os agentes públicos há um regime especial de responsabilização por infrações por agentes administrativos, que é exatamente o regime de crime de responsabilidade. Só que essa decisão do Supremo foi por uma maioria muito estreita, 1 ou 2 votos, e agora com a mudança da composição da corte, há uma expectativa, principalmente do MP, de reverter isso.

Processo contra o Presidente da República por crime comum: Este processo está disciplinado no Art. 86 da CRFB e na Lei 8038/90.

Art. 86 - Admitida a acusação contra o Presidente da República, por dois terços da Câmara dos Deputados, será ele submetido a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal, nas infrações penais comuns, ou perante o Senado Federal, nos crimes de responsabilidade. § 1º - O Presidente ficará suspenso de suas funções:

I - nas infrações penais comuns, se recebida a denúncia ou queixa-crime pelo Supremo Tribunal Federal; II - nos crimes de responsabilidade, após a instauração do processo pelo Senado Federal.

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§ 2º - Se, decorrido o prazo de cento e oitenta dias, o julgamento não estiver concluído, cessará o afastamento do Presidente, sem prejuízo do regular prosseguimento do processo. § 3º - Enquanto não sobrevier sentença condenatória, nas infrações comuns, o Presidente da República não estará sujeito a prisão. § 4º - O Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções.

Tem um juízo preliminar. O processo de competência do Supremo, mas o Supremo não julga o

mérito, há o juízo de admissibilidade feito pela Câmara dos Deputados a respeito da instalação ou não do processo, só será admitido o processo se a câmara autorizar por 2/3 dos membros.

O Supremo está vinculado à decisão da câmara? Ou seja se a câmara decide pela instalação do

processo o Supremo pode não acatar isto? Pode, pois os juízos são diferentes. Uma coisa é o juízo político, da conveniência e oportunidade da instalação do processo. Outra coisa é o juízo técnico-jurídico da presença ou não dos requisitos para acatar a denúncia. Então o Supremo não está vinculado à decisão da câmara. A câmara pode autorizar a instalação do processo e o Supremo pode não receber a denúncia.

Agora, se o Supremo receber a denúncia, tem efeito prático irrelevante, porque o Presidente

da República recebendo a denúncia pelo Supremo, fica suspenso de exercer suas funções por 180 dias. O que significa crime comum? Significa infrações criminais. Estão inclusos: crimes eleitorais,

contratações penais, etc. Agora esses crimes têm que ser praticados no exercício da função, pois se forem antes do exercício não tem imunidade. Aí que se aplica o Art. 86, §4º mostrado acima.

Condenado à pena privativa de liberdade, o Presidente da República será preso. E como efeito

reflexo da condenação, ele perderá o cargo. Crime de Responsabilidade:

Não tem natureza criminal, mas sim político-administrativa. Quais são as sanções para o crime de responsabilidade? Perda do mandato e inabilitação para o exercício de função pública por 8 anos.

O que significa função pública? Mandato eletivo com certeza. Cargo em comissão também.

Cargos efetivos. Ou seja, todas as hipóteses são funções públicas. A quem cabe formular uma representação contra o Presidente da República por crime de

responsabilidade? Processo está disciplinado na Lei 1.079/50, trata de presidente de outras autoridades federais. O Decreto 201/67 trata do crime de responsabilidade por prefeitos. Voltando a Lei 1.079, quem pode formular contra o Presidente da República? Qualquer cidadão. Art. 14 da Lei 1.079. Qualquer cidadão pode representar o poder da república por crime de responsabilidade.

Art. 14. É permitido a qualquer cidadão denunciar o Presidente da República ou Ministro de Estado por crime de responsabilidade, perante a Câmara dos Deputados.

Cabe a câmara, por 2/3 dos seus membros, autorizar ou não a instalação do processo. Se

aplica a mesma coisa que a crime comum.

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Se a câmara autorizar, o Presidente da república fica suspenso do exercício de suas funções por 180 dias. Art.86, §1º, II.

Se a câmara decidir pela instauração do processo, o Senado, que é quem julga o Presidente

por crime de responsabilidade, está vinculado à decisão da câmara? Sim, o Senado está vinculado à decisão da câmara.

O Senado tem competência para julgar o Presidente da República, outras autoridades são

julgadas pelo Supremo por crime de responsabilidade. Por exemplo: Art. 102, I, “c” da CRFB: Art. 102 - Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar, originariamente: c) nas infrações penais comuns e nos crimes de responsabilidade, os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, ressalvado o disposto no Art. 52, I, os membros dos Tribunais Superiores, os do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente;

Cabe controle judicial no processo de impeachment por crime de responsabilidade? Você

pode propor uma ação judicial questionando um ato praticado pelo Senado? Nesse particular o Supremo se afastou da tese prevalecente na suprema corte norte americana, o STF admite o controle do processo de impeachment, porque é uma questão meramente política que não cabe controle judicial. O Supremo admite controle no processo de impeachment, mas um controle ligado apenas à legalidade do processo. Então o controle é só sob a legalidade do processo e que enfatiza na verdade ter a garantia do devido processo legal, ampla defesa e contraditório observados. O Supremo não pode substituir o mérito da decisão, pois essa é uma competência política do Senado que o Supremo não pode ocupar. Então o Supremo pode até anular uma decisão do Senado, que por exemplo condenou o Presidente da República por impeachment, se ele entender que este não teve oportunidade de defesa.

Esse processo será presidido pelo Presidente do Supremo. E a decisão do Senado será

veiculada por uma resolução. O Collor renunciou o mandato no dia do julgamento pelo Senado. E se colocou a questão: será

que com a renúncia há a perda do objeto, no caso o processo? Pois foi o que o advogado do Collor alegou: com a renúncia, o ato produz efeitos imediatos, ele já é um ex-presidente, não cabe o processo de crime de responsabilidade contra ele. O Senado não apoiou esses argumentos, pois ele diz que a perda do cargo não é a única pena. ???? Na verdade o que o Collor queria era fugir dessa pena, fraudar o processo.

E em relação ao governador do estado? Quem cabe julgar o governador do estado por crime

comum? O STJ. E por crime de responsabilidade? Assembléia Legislativa. Agora se existe também autorização da Assembléia Legislativa para se instalar processo

criminal contra o governador no STJ, assim como se exige a autorização da câmara dos deputados para se instaurar processo criminal contra o Presidente no Supremo? A Alerj por exemplo tem que autorizar a

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instauração de processo criminal contra governador do estado do Rio de Janeiro? Depende, só se houver previsão na Constituição Estadual.

A Constituição do Estado pode reproduzir a imunidade do Art.86, §4º para o governador? (§ 4º - O Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções.) Não, se a Constituição Estadual prever uma norma como esta, ela será inconstitucional. A

Constituição Estadual não pode estender essa imunidade aos governadores, pois o Supremo entendeu que essa imunidade foi concedida especificamente ao Presidente da República e só a Constituição federal pode estabelecer a imunidade.

Por que só a CRFB pode estabelecer imunidade? Pois as imunidades são exceções ao princípio

republicano. O Principio republicano exige que uma autoridade que conheça a legislação seja punida. E a quem cabe julgar os prefeitos por crime de responsabilidade? Câmara dos Vereadores.

Princípio da Simetria. E por crime comum? Tribunal de Justiça. Art. 29, X.

Art. 29 - O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos: X - julgamento do Prefeito perante o Tribunal de Justiça;

E se for um crime eleitoral? A quem cabe julgar? TRE, Súmula 702 do Supremo. Se for um

crime federal, TRF.

Constitucional em 11-12-07 Poder Legislativo

Funções e estrutura do PL: O PL está disciplinado no capítulo I, título IV da CR. Vejamos o art 44:

Art. 44. O Poder Legislativo é exercido pelo Congresso Nacional, que se compõe da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.

Parágrafo único. Cada legislatura terá a duração de quatro anos.

O PL brasileiro é bicameral, é composto por duas casas: CD e SF. A CD é o órgão por excelência de representação popular. O SF é o órgão cuja função é representar os estados, é a Casa onde os estados se manifestam na formação nacional.

Esse modelo de legislativo federal em que uma casa é representante do povo e a outra casa é representante dos estados na União foi importado dos EUA.

As competências exclusivas do CN estão no art 49:

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I - resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional;

II - autorizar o Presidente da República a declarar guerra, a celebrar a paz, a permitir que forças estrangeiras transitem pelo território nacional ou nele permaneçam temporariamente, ressalvados os casos previstos em lei complementar;

III - autorizar o Presidente e o Vice-Presidente da República a se ausentarem do País, quando a ausência exceder a quinze dias;

IV - aprovar o estado de defesa e a intervenção federal, autorizar o estado de sítio, ou suspender qualquer uma dessas medidas;

V - sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa;

VI - mudar temporariamente sua sede;

VII - fixar idêntico subsídio para os Deputados Federais e os Senadores, observado o que dispõem os arts. 37, XI, 39, § 4º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I;

VIII - fixar os subsídios do Presidente e do Vice-Presidente da República e dos Ministros de Estado, observado o que dispõem os arts. 37, XI, 39, § 4º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I;

IX - julgar anualmente as contas prestadas pelo Presidente da República e apreciar os relatórios sobre a execução dos planos de governo;

X - fiscalizar e controlar, diretamente, ou por qualquer de suas Casas, os atos do Poder Executivo, incluídos os da administração indireta;

XI - zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes;

XII - apreciar os atos de concessão e renovação de concessão de emissoras de rádio e televisão;

XIII - escolher dois terços dos membros do Tribunal de Contas da União;

XIV - aprovar iniciativas do Poder Executivo referentes a atividades nucleares;

XV - autorizar referendo e convocar plebiscito;

XVI - autorizar, em terras indígenas, a exploração e o aproveitamento de recursos hídricos e a pesquisa e lavra de riquezas minerais;

XVII - aprovar, previamente, a alienação ou concessão de terras públicas com área superior a dois mil e quinhentos hectares.

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O CN é a união das duas casas. As competências do CN estão no art 48 e 49 da CF. Há uma diferença entre o artigo 48 e 49. As matérias do art 49 são de competência exclusiva do CN e isso quer dizer que essas matérias

podem ser tratadas, disciplinadas por atos internos do CN. Como, por ex, decretos legislativos e resoluções. Já as matérias do art 48 exigem a sanção do presidente da república. Então essas matérias devem ser aprovadas por lei. Pq necessitam da sanção ou veto do chefe do executivo.

As competências exclusivas da CD estão no art 51:

I - autorizar, por dois terços de seus membros, a instauração de processo contra o Presidente e o Vice-Presidente da República e os Ministros de Estado;

II - proceder à tomada de contas do Presidente da República, quando não apresentadas ao Congresso Nacional dentro de sessenta dias após a abertura da sessão legislativa;

III - elaborar seu regimento interno;

IV - dispor sobre sua organização, funcionamento, polícia, criação, transformação ou extinção dos cargos, empregos e funções de seus serviços, e a iniciativa de lei para fixação da respectiva remuneração, observados os parâmetros estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias;

V - eleger membros do Conselho da República, nos termos do art. 89, VII.

As competências exclusivas da SF estão no art 52:

I - processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles;

II processar e julgar os Ministros do Supremo Tribunal Federal, os membros do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, o Procurador-Geral da República e o Advogado-Geral da União nos crimes de responsabilidade;

III - aprovar previamente, por voto secreto, após argüição pública, a escolha de:

a) Magistrados, nos casos estabelecidos nesta Constituição;

b) Ministros do Tribunal de Contas da União indicados pelo Presidente da República;

c) Governador de Território;

d) Presidente e diretores do banco central;

e) Procurador-Geral da República;

f) titulares de outros cargos que a lei determinar;

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IV - aprovar previamente, por voto secreto, após argüição em sessão secreta, a escolha dos chefes de missão diplomática de caráter permanente;

V - autorizar operações externas de natureza financeira, de interesse da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios;

VI - fixar, por proposta do Presidente da República, limites globais para o montante da dívida consolidada da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

VII - dispor sobre limites globais e condições para as operações de crédito externo e interno da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, de suas autarquias e demais entidades controladas pelo Poder Público federal;

VIII - dispor sobre limites e condições para a concessão de garantia da União em operações de crédito externo e interno;

IX - estabelecer limites globais e condições para o montante da dívida mobiliária dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

X - suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal;

XI - aprovar, por maioria absoluta e por voto secreto, a exoneração, de ofício, do Procurador-Geral da República antes do término de seu mandato;

XII - elaborar seu regimento interno;

XIII - dispor sobre sua organização, funcionamento, polícia, criação, transformação ou extinção dos cargos, empregos e funções de seus serviços, e a iniciativa de lei para fixação da respectiva remuneração, observados os parâmetros estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias;

XIV - eleger membros do Conselho da República, nos termos do art. 89, VII.

XV - avaliar periodicamente a funcionalidade do Sistema Tributário Nacional, em sua estrutura e seus componentes, e o desempenho das administrações tributárias da União, dos Estados e do Distrito Federal e dos Municípios.

Parágrafo único. Nos casos previstos nos incisos I e II, funcionará como Presidente o do Supremo Tribunal Federal, limitando-se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis.

Essas competências privativas podem ser tratadas por atos internos, não precisa ser por lei. O que é uma legislatura? É o período de 4 anos que coincide com o mandado do parlamentar.

Está no 44, parágrafo único: cada legislatura terá a duração de quatro anos. O que é uma sessão legislativa ordinária? Está no art 57, caput: O Congresso Nacional reunir-

se-á, anualmente, na Capital Federal, de 2 de fevereiro a 17 de julho e de 1º de agosto a 22 de dezembro.

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Além dessas sessões ordinárias, há a possibilidade de sessões extraordinárias no CN. Está no art 57, parágrafo 6º:

§ 6º A convocação extraordinária do Congresso Nacional far-se-á:

I - pelo Presidente do Senado Federal, em caso de decretação de estado de defesa ou de intervenção federal, de pedido de autorização para a decretação de estado de sítio e para o compromisso e a posse do Presidente e do Vice-Presidente- Presidente da República;

II - pelo Presidente da República, pelos Presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal ou a requerimento da maioria dos membros de ambas as Casas, em caso de urgência ou interesse público relevante, em todas as hipóteses deste inciso com a aprovação da maioria absoluta de cada uma das Casas do Congresso Nacional.

Vejamos agora o parágrafo 7º: § 7º Na sessão legislativa extraordinária, o Congresso Nacional somente deliberará sobre a matéria para a qual foi convocado, ressalvada a hipótese do § 8º deste artigo, vedado o pagamento de parcela indenizatória, em razão da convocação. Como se dá a eleição dos membros do CN? Qual o sistema eleitoral? É proporcional ou

majoritário? É proporcional. Para entendermos esse sistema é necessário assimilar alguns conceitos: Coeficiente eleitoral – é o número obtido mediante divisão dos votos válidos de todos os

partidos pelo número de cadeiras do parlamento. Seria o número necessário para se eleger um parlamentar. Digamos que haja 100.000 votos válidos para 100 cadeiras no parlamento. O coeficiente eleitoral é de 1.000. O coeficiente eleitoral dirá quantos votos em tese seriam necessários para se eleger um parlamentar.

Coeficiente partidário – é, em tese, o número de cadeiras obtidas pelo partido. Divide o número de votos válidos no partido, que podem ser votos nos parlamentares do partido ou na legenda partidária, pelo coeficiente eleitoral. Digamos que o partido tenha conseguido 10.000 votos válidos, o coeficiente partidário será de 10.000/1.000 = 10. Esse é o número de parlamentares que o partido elegeu.

Como eu consigo aferir quais parlamentares do partido foram eleitos? Os 10 mais bem votados. Percebam que um candidato, isso aconteceu com o PRONA na época do Enéas, pode ser um puxador de votos para o partido. Digamos, pegando os números acima, que o PRONA tenha tido 10.000 votos e o Enéas sozinho teve 7.000 votos. E o menos votado obteve 200 votos. A princípio 200 votos não seriam suficientes para ele se eleger. O coeficiente eleitoral é de 1.000 e não de 200. Mas, como o voto é computado no partido e não na pessoa do candidato, com 200 votos ele se elegeu, pq houve um puxador de votos que sozinho obteve 7.000 votos.

Esse é um fator que gera uma crise de legitimidade. Foi exatamente por causa desse sistema que o STF proferiu a decisão sobre a fidelidade partidária. Como o voto é no partido, o parlamentar que se elegeu com 200 votos não pode simplesmente mudar de partido.

Vejamos o art 45:

Art. 45. A Câmara dos Deputados compõe-se de representantes do povo, eleitos, pelo sistema proporcional, em cada Estado, em cada Território e no Distrito Federal.

§ 1º - O número total de Deputados, bem como a representação por Estado e pelo Distrito Federal, será estabelecido por lei complementar, proporcionalmente à população, procedendo-

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se aos ajustes necessários, no ano anterior às eleições, para que nenhuma daquelas unidades da Federação tenha menos de oito ou mais de setenta Deputados.

§ 2º - Cada Território elegerá quatro Deputados.

O 1º caso de arguição de inconstitucionalidade de norma constitucional originária foi justamente esse limite colocado pela CR: para que nenhuma daquelas unidades da Federação tenha menos de oito ou mais de setenta Deputados. O ex governador do estado do RS propôs uma ADIn contra o 46, parágrafo 1º, dizendo que ele violava o pricípio superior da igualdade do voto.

Violaria esse princípio pq isso gera uma distorção. Gera uma super representação de estados menos populosos e uma sub representação de estados mais populosos. Para vc se eleger deputado no Acre, por exemplo, vc precisa de menos votos do que se eleger deputado federal por SP. Então o voto do cidadão do Acre vale mais que o voto do cidadão de SP e isso viola o princípio da igualdade do voto. Esse é o primeiro argumento que não foi acolhido pelo STF. O Supremo disse que pode até haver essa distorção, mas o pedido de declaração de inconstitucionalidade de norma originária é juridicamente impossível. O STF recebeu suas competências do poder constituinte originário e não pode dizer que o poder constituinte originário errou. O STF entendeu que não poderia ser o fiscal de inconstitucionalidade do poder constituinte originário.

Art 46:

Art. 46. O Senado Federal compõe-se de representantes dos Estados e do Distrito Federal, eleitos segundo o princípio majoritário.

§ 1º - Cada Estado e o Distrito Federal elegerão três Senadores, com mandato de oito anos.

§ 2º - A representação de cada Estado e do Distrito Federal será renovada de quatro em quatro anos, alternadamente, por um e dois terços.

§ 3º - Cada Senador será eleito com dois suplentes.

Aqui, e tb em relação aos prefeitos, se aplica o princípio majoritário simples. Para se eleger não se exige a maioria absoluta dos votos. Um senador pode se eleger, por ex, com 30% dos votos, desde que seja o mais votado.

Enquanto o mandato de um deputado é de 4 anos, o mandato de um senador é de 8 anos. Para que haja uma renovação da casa, de 4 em 4 anos tem eleição para senador para eleger 1/3 dos membros da casa. Na eleição seguinte 2/3, e assim sucessivamente. Parágrafo 2º do art 46.

Um órgão que é fundamental na estrutura de ambas as casas é a mesa diretora. Existe uma mesa diretora na CD, SF e no CN. As mesas diretoras compete a realização de serviços administrativos (realização de compras, concurso público, etc...) e a direção superior dos trabalhos da casa como a elaboração da ordem do dia, definir o que vai ser votado, o que vai ser colocado em pauta. É um poder político bem significativo.

Uma discussão interessante é a seguinte: parágrafo 4º do art 57: § 4º Cada uma das Casas reunir-se-á em sessões preparatórias, a partir de 1º de fevereiro, no primeiro ano da legislatura, para a posse de seus membros e eleição das respectivas Mesas, para mandato de 2 (dois) anos, vedada a recondução para o mesmo cargo na eleição imediatamente subseqüente. O mandato dos cargos na mesa diretora é de 2 anos, então não coincide com o mandato parlamentar que é de 4 anos. O que se veda é a recondução para o mesmo cargo. Se o sujeito hoje é presidente do SF, ele pode participar na

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próxima eleição para o cargo de vice ou de 1º secretário. A vedação é apenas para o mesmo cargo. Outra questão trata do seguinte: será que a vedação à recondução se aplica à mesma legislatura? Ou só uma outra legislatura. O sujeito á eleito para a presidência da CD numa primeira legislatura, a legislatura dura 4 anos. O mandato como presidente da mesa dura só 2. Dentro dessa mesma legislatura, ele pode se reeleger? Não, nisso todo mundo concorda. Se ele se eleger presidente da CD pros 2 últimos anos de uma legislatura, e na próxima eleição para deputado ele se reelege. Inicia-se uma nova legislatura. Ele é elegível para presidente da mesa diretora da CD? Não se aplica à vedação à recondução a legislaturas distintas.

Art 58:

Art. 58. O Congresso Nacional e suas Casas terão comissões permanentes e temporárias, constituídas na forma e com as atribuições previstas no respectivo regimento ou no ato de que resultar sua criação. Cada casa possui suas comissões que são órgãos menores, fracionários.

§ 1º - Na constituição das Mesas e de cada Comissão, é assegurada, tanto quanto possível, a representação proporcional dos partidos ou dos blocos parlamentares que participam da respectiva Casa. Nas comissões, devem refletir, na medida do possível, a divisão de forças partidárias existentes em toda a casa. Devem manter a proporcionalidade que existe no plenário.

§ 2º - às comissões, em razão da matéria de sua competência, cabe:

I - discutir e votar projeto de lei que dispensar, na forma do regimento, a competência do Plenário, salvo se houver recurso de um décimo dos membros da Casa;

II - realizar audiências públicas com entidades da sociedade civil;

III - convocar Ministros de Estado para prestar informações sobre assuntos inerentes a suas atribuições;

IV - receber petições, reclamações, representações ou queixas de qualquer pessoa contra atos ou omissões das autoridades ou entidades públicas;

V - solicitar depoimento de qualquer autoridade ou cidadão;

VI - apreciar programas de obras, planos nacionais, regionais e setoriais de desenvolvimento e sobre eles emitir parecer.

§ 3º - As comissões parlamentares de inquérito, que terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas, serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros, para a apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores.

§ 4º - Durante o recesso, haverá uma Comissão representativa do Congresso Nacional, eleita por suas Casas na última sessão ordinária do período legislativo, com atribuições definidas no

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regimento comum, cuja composição reproduzirá, quanto possível, a proporcionalidade da representação partidária.

Comissões Parlamentares De Inquérito (Cpi)

As comissões mais relevantes são as comissões parlamentares de inquérito (CPI) – art 58, parágrafo 3º, fazer remissão com art 49, X que diz o seguinte: Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional: X - fiscalizar e controlar, diretamente, ou por qualquer de suas Casas, os atos do Poder Executivo, incluídos os da administração indireta; É competência do CN fiscalizar a administração pública. As CPIs são o principal instrumento por meio do qual o CN exerce essa função fiscalizatória.

Requisitos para instalação das CPIs:

1- Quorum – obtenção de 1/3 das assinaturas dos parlamentares da casa. Esse é um quorum minoritário. O STF extraiu desse quorum minoritário uma importância muito grande: o direito de instalar uma CPI é um direito subjetivo público das minorias, das oposições. As minorias fiscalizam as maiorias. As oposições fiscalizam os governos. Ex: CPI do apagão aéreo instalada com o quorum de 1/3 na CD e demais requisitos preenchidos. O lider do governo não queria a CPI do Apagão e interpôs um recurso contra uma decisão do presidente da casa que admitiu a CPI. O presidente da casa tb admitiu esse recurso e o submeteu ao plenário para que este deliberasse sobre o provimento ou não do recurso. Parlamentares da oposição impetraram MS no STF contra o ato do presidente da casa que recebeu esse recurso. O STF entendeu que esse MS não é questão interna corporis do CN. Entendeu por conceder a ordem. O STF entendeu que o direito de instalar a CPI é um direito subjetivo pb das minorias. Se esse recurso fosse cabível, quem ia julgar o recurso seria o plenário que delibera por maioria. Logo, a decisão da maioria iria substituir a decisão da minoria. Isso o STF não admite que a maioria dos membros da casa enterrem a decisão da minoria de instalar a CPI. A CPI é instrumento das minorias.

2- Fato determinado – não existe CPI para investigar irregularidades no governo federal. Esse é um requisito que não raro é descumprido. A exigência de fato determinado não exclui que se investigue fatos conexos que vebham a surgir no decorrer da investigação. O STF admitiu investigação sobre fato conexo, ou seja, o fato conexo não é o fato que deu ensejo àquela investigação, mas é o fato que mantém com relação a ele uma conexão probatória. Fez isso na CPI do narcotráfico, em que não houve investigação só do tráfico ilícito de substância entorpecente, houve investigação, também, sobre tráfico ilícito de armas, de mulheres, sobre homicídios e sobre grupos de extermínio, que não eram fatos que deram ensejo àquela investigação, mas eram fatos conexos (conexão probatória entre eles).

Cabe CPI para investigar contratos privados? A investigação de uma CPI tem que ter um interesse público (ex. CPI Nike/CBF – caso prático de desconsideração desse limite – Nike é uma entidade multi-nacional e CBF é uma entidade nacional que não recebe um tostão público. Se havia um contrato privado entre duas entidades privadas, não há que se criar uma CPI para isso).

Cabe CPI para investigar teor de sentença judicial? Não. Essa investigação não pode incidir sobre matérias reservadas ao Judiciário – STF: princípio da reserva constitucional da

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jurisdição (ex. CPI do Judiciário – excesso da CPI estava nos meios investigatórios que foram utilizados – caso prático de desconsideração desse limite). O controle externo do Judiciário já existe (ex. Presidente do STF nomeado pelo Presidente da República é sabatinado pelo Senado Federal). O que está sendo previsto agora é um reforço dele. O que a CPI não pode investigar é o mérito das decisões judiciais, porque o mérito é soberano. Em outras palavras, a CPI pode investigar atos judiciários, o que não pode é investigar atos jurisdicionais (ato praticado pelo Judiciário no exercício típico da sua função, que é jurisdicional). Então, quando o Judiciário pratica um ato administrativo (ato judiciário), este pode ser objeto de controle externo. Mas quando pratica um ato jurisdicional, só é cabível controle interno, através de recurso, ação revisional, ação rescisória, etc. Quais os poderes que a CPI tem? As comissões parlamentares de inquérito, que terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais. Significa dizer que as CPIs têm os mesmos poderes que o juiz tem para instruir o processo. Mas a CPI não tem os poderes decisórios do juiz. Segundo o STF, o que as CPIs podem fazer? A) Quebra de sigilo bancário, telefônico e fiscal, desde que motivado: A CPI tem

poderes e deveres inerentes à autoridade judicial. A Quebra de sigilo bancário e fiscal: O STF autorizava duas hipóteses em que era possível a quebra do sigilo bancário e fiscal desde que motivada. Uma era com fundamento no art. 58, § 3º, e outro o art. 129, VI, ambos da CRFB. Através da CPI e de requisição Ministerial. Essas eram as hipóteses permitidas, desde que motivadas. Poderia haver requisição Ministerial para quebra de sigilo bancário e fiscal, desde que houvessem fundadas suspeitas de que o dinheiro público estava circulando em contas privadas. Ex: caso Jader Barbalho. O STF reviu a posição quanto a possibilidade do MP quebrar sigilo bancário e fiscal. O poder do MP não alcança mais a quebra de sigilo. Ele, a partir de agora, deve solicitar em juízo. Porém, manteve a posição quanto a possibilidade de quebra de sigilo bancário e fiscal pela CPI, desde que motivado, porém numa decisão apertada de 6 a 5, o que pode indicar uma mudança de jurisprudência também quanto a CPI daqui para frente.

A quebra de sigilo telefônico � São três conceitos diferentes: a) Interceptação telefônica � Autorizada em juízo. Não é do conhecimento dos

interlocutores. É prova lícita porque foi autorizada em juízo. b) Gravação clandestina de conversa telefônica � É do conhecimento de um dos

interlocutores. É prova ilícita. Com relação ao processo penal, uma coisa é prova ilícita e outra coisa é prova inadmissível. Por ponderação a prova ilícita pode ser aceita in dubio pro reo. Porém atenção: pela primeira vez o STF admitiu prova ilícita in dubio pro societates, desde que provado o ato ilícito contra o outro interlocutor ou a sociedade. Maior atenção ainda: o STF, em seu acórdão diz: “Desde que haja prova do ilícito”. Ele não fala ilícito penal, o que significa que abre o precedente para o ilícito civil. Ex: duas pessoas conversam, uma grava. O assunto é improbidade administrativa. O MP pode promover ACP com base nesta fita? Pode, segundo esta última decisão do STF. Admissão da prova ilícita pro-societate.

c) Quebra de sigilo telefônico � É a quebra do sigilo junto a companhia telefônica, das chamadas efetuadas e recebidas. Atenção: a CPI pode quebrar o sigilo telefônico, porém quanto ao conteúdo da conversa, só com autorização judicial.

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B) Oitiva de indiciado e testemunha (inclusive coercitiva): Deve motivar pq a testemunha é imprescindível para a investigação.

A diferença entre indiciado e testemunha gira em torno da possibilidade de não auto incriminar-se (indiciado tem esse direito) daí pode não responder a perguntas que o incriminem. Possui inclusive o direito de permanecer calado. Já a testemunha tem o dever de prestar informações. Caso Chico Lopes � foi preso por desobediência, visto que seu advogado entregou uma carta aos membros da CPI, afirmando que ele não iria responder a nenhuma pergunta. Antes de iniciar o seu depoimento, os integrantes da CPI perguntaram se ele ratificava o que continha na carta. Ele respondeu que sim e foi preso por desobediência em flagrante delito. O seu advogado falhou duas vezes: uma por ter providenciado o salvo-conduto e outra, porque desobediência é crime de menor potencial ofensivo. Caso Pitta � neste caso o próprio Pitta providenciou o HC preventivo e foi depor com o salvo-conduto. Ouviu as perguntas, uma a uma, aquilatando qual poderia lhe prejudicar, como deve ser feito. No final do depoimento, perguntaram a ele o que ele faria se fosse acusado de roubo e ele respondeu o mesmo que o senhor faria se fosse acusado de bater na sua mulher (o senador tem processos a respeito disso). O Pitta foi preso, porém a prisão foi totalmente ilegal. Primeiro quem devia ter sido preso era o senador por falta de respeito, segundo porque além do Pitta possuir o salvo-conduto, desobediência é crime de menor potencial ofensivo. O Pitta está movendo uma ação de responsabilidade civil contra este senador. Qualquer pessoa pode, a qualquer momento, deixar de ser indiciado e passar a ser testemunha. A CPI deve respeitar as prerrogativas impostas por determinadas autoridades. A CPI pode decretar prisão provisória? Somente prisão em flagrante delito. Não pode decretar prisão preventiva ou temporária. Deve requerer no bojo do inquérito parlamentar para que o juiz decrete. A CPI não pode conceder medidas cautelares típicas ou atípicas:

• Indisponibilidade de bens

• Arrestos

• Sequestros

• Hipotecas judiciárias

• Proibição de ausentar-se do país

Isto ocorre devido ao princípio da reserva constitucional da jurisdição. Quanto à restrição ou proibição de advogado privado ou defensor público (assistência judiciária) � os dois estatutos prescrevem a prerrogativa de assistir ao seu cliente em juízo. Desta forma, eles têm a mesma prerrogativa perante a CPI.

C) Busca e apreensão de documentos em domicílios – Desde que o faça de forma fundamentada. Quem decide é a CPI e quem executa é a polícia. Há doutrina minoritária que não admite que CPI faça isso. O STF admite.

Para finalizar, a CPI é uma comissão parlamentar de inquérito. O que a CPI faz é inquérito parlamentar, colhendo provas para que o MP entre com a ação cabível. A CPI não condena ninguém.

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Pode haver CPI estadual e municipal? O STF decidiu que sim, desde que haja previsão expressa na CERJ e na LO, obedecido o princípio da simetria, ou seja, os mesmos pressupostos, os mesmos meios.

Dos deputados e dos senadores

Art. 53. Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos. Trata das imunidades materiais do parlamentar. Essa imunidade só se aplica a opiniões, palavras e votos. Essa é uma imunidade material. É uma cláusula de irresponsabilidade de direito constitucional material, ou seja, ela exclui a responsabilização.

A Constituição Federal prevê serem os Deputados e Senadores invioláveis por suas opiniões, palavras e votos (art. 53, caput), no que a doutrina denomina imunidade material ou inviolabilidade parlamentar que é uma maximização da liberdade de expressão.

A imunidade material implica subtração da responsabilidade penal, civil, disciplinar ou política do parlamentar por suas opiniões, palavras e votos. Explica Nélson Hungria, que nas suas opiniões, palavras ou votos, jamais se poderá identificar, por parte do parlamentar, qualquer dos chamados crimes de opinião ou crimes da palavra, como os crimes contra a honra, incitamento a crime, apologia de criminoso, vilipêndio oral a culto religioso, etc. , pois a imunidade material exclui o crime nos casos admitidos; o fato típico deixa de constituir crime, porque a norma constitucional afasta, para a hipótese, a incidência da norma penal. Desta maneira, também, entendem Celso Bastos e Ives Gandra, para quem, "a Constituição atual, ao disciplinar o instituto das imunidades, já no caput do artigo sob comento funda a regra principal, norteadora de todo o regime, qual seja, a da latitude da imunidade material que, como sabido, é aquela que impede a própria formação do caráter delituoso do comportamento. O que seria crime se cometido por um cidadão comum, não o é sendo cometido por um parlamentar".

Importa ressaltar que da conduta do parlamentar (opiniões, palavras e votos) não resultará responsabilidade criminal, qualquer responsabilização por perdas e danos, nenhuma sanção disciplinar, ficando a atividade do congressista, inclusive, resguardada da responsabilidade política, pois trata-se de cláusula de irresponsabilidade geral de Direito Constitucional material.(EC 35)

Em síntese, a imunidade material é prerrogativa concedida aos parlamentares para o exercício de sua atividade com a mais ampla liberdade manifestação, através de palavras, discussão, debate e voto; tratando-se, pois, a imunidade, de cláusula de irresponsabilidade funcional do congressista, que não pode ser processado judicial ou disciplinarmente pelos votos que emitiu ou pelas palavras que pronunciou no Parlamento ou em uma das suas comissões.

A imunidade parlamentar material só protege o congressista nos atos, palavras, opiniões e votos proferidos no exercício do ofício congressual, sendo passíveis dessa tutela jurídico-constitucional apenas os comportamentos parlamentares cuja prática possa ser imputável ao exercício do mandato legislativo. A garantia da imunidade material estende-se ao desempenho das funções de representante do Poder Legislativo, qualquer que seja o âmbito dessa atuação - parlamentar ou extraparlamentar - desde que exercida ratione muneris

O Pretório Excelso tem acentuado que a prerrogativa constitucional da imunidade parlamentar em sentido material protege o parlamentar em todas as suas manifestações que

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guardem relação com o exercício do mandato, ainda que produzidas fora do recinto da própria Casa Legislativa, ou, com maior razão, quando exteriorizadas no âmbito do Congresso Nacional.

Da mesma forma, o depoimento prestado por membro do Congresso Nacional a uma Comissão Parlamentar de Inquérito está protegido pela cláusula de inviolabilidade que tutela o legislador no desemprenho do seu mandato, especialmente quando a narração dos fatos, ainda que veiculadora de supostas ofensas morais, guarda íntima conexão com o exercício do ofício legislativo e com a necessidade de esclarecer os episódios objeto da investigação parlamentar

No tocante à extensão da imunidade material, serão beneficiados os parlamentares , nunca as pessoas que participam dos trabalhos legislativos, sem contudo exercerem mandato. Esta extensão, porém, é absoluta e perpétua, não podendo o parlamentar ser responsabilizado pelos seus votos e opiniões praticados no exercício do mandato, mesmo depois que tenha cessado o seu mandato.

Além disto, a imunidade material é de ordem pública, razão pela qual o congressista não pode renunciá-la, e cobre ainda a publicidade dos debates parlamentares, tornando irresponsável o jornalista que as tenha reproduzido em seu jornal, desde que, se limite a reproduzir na integra ou em extrato fiel o que se passou no Congresso.

Necessário, neste sentido, trazer à colação a lição de Celso de Mello Filho, para quem "o instituto da imunidade parlamentar atua, no contexto normativo delineado por nossa Constituição, como condição e garantia de independência do Poder Legislativo, seu real destinatário, em face dos outros Poderes do Estado. Estende-se ao congressista, embora não constitua uma prerrogativa de ordem subjetiva deste. Trata-se de prerrogativa de caráter institucional inerente ao Poder Legislativo, que só é conferida ao parlamentar ratione muneris, em função do cargo e do mandato que exerce. É por essa razão que não se reconhece ao congressista, em tema de imunidade parlamentar, a faculdade de a ela renunciar. Trata-se de garantia institucional deferida ao Congresso Nacional. O congressista, isoladamente considerado, não tem, sobre a garantia da imunidade, qualquer poder de disposição".

http://www.tj.ro.gov.br/emeron/sapem/2001/setembro/0709/Artigos/09.htm

OBS: Se aplica essa imunidade, posição majoritária, também no âmbito administrativo.

A imunidade é extensiva aos Deputados Federais e Senadores, bem como aos Deputados Estaduais (art 27, parágrafo 1º). Com relação aos Vereadores, a imunidade material está restrita aos limites do município no qual exerce seu mandato (art 27, VIII).

§ 2º Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão. Esta é a imunidade formal relativa à prisão. Garantia de que os parlamentares não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. E mesmo nesse caso, os autos serão remetidos à casa que decidirá sobre o seu prosseguimento. O STF relativizou essa imunidade. Falou que ela não se aplica às prisões definitivas (após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória). Assim, tem sido o Supremo Tribunal Federal favorável à tese da prisão de Parlamentar em virtude de sentença judicial trânsita em julgado, tendo em vista que a imunidade relativa não abarca a proibição de execução de pena privativa

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de liberdade imposta ao membro do Congresso Nacional após o devido processo legal. Há muita crítica em relação às imunidades formais. Surgiu para evitar a prisão por dívida, para evitar que o parlamentar virasse uma marionete nas mãos de seu credor. Ressalte-se que referida imunidade abrange a prisão civil e penal, inclusive em casos como o do depositário infiel, constitucionalmente prevista.

§ 3º Recebida a denúncia contra o Senador ou Deputado, por crime ocorrido após a diplomação, o Supremo Tribunal Federal dará ciência à Casa respectiva, que, por iniciativa de partido político nela representado e pelo voto da maioria de seus membros, poderá, até a decisão final, sustar o andamento da ação. A EC 35 restringiu bastante essa imunidade ao acrescentar ”por crime ocorrido após a diplomação”. Agora a imunidade não mais se aplica a crime anterior à diplomação.

Qual é a única consequência para o parlamentar da diplomação, se o crime que ele cometeu for anterior a esta? O processo sobe para o STF devido ao foro por prerrogativa de função que está no parágrafo 1º: Os Deputados e Senadores, desde a expedição do diploma, serão submetidos a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal . Outra alteração importante desse parágrafo foi a seguinte: A mudança significativa que ocorreu com a alteração da Lei Maior pela Emenda Constitucional 35/01 se deu, entretanto, com relação ao processamento dos membros do Congresso Nacional. Exigia o § 1º do art. 53 uma licença por parte da Casa a qual pertencia o Parlamentar acusado de ilícito para que este pudesse, então vir a ser processado pelo Órgão competente. O Supremo Tribunal Federal antes de receber a denúncia, ou para prosseguir no feito contra o membro do Congresso Nacional, solicitava a mencionada licença, que se não fornecida ou negada, provocava a suspensão do prazo prescricional enquanto durasse o mandato. A atual redação do art. 53, em seu § 3º, retirou expressamente a necessidade de prévia licença da Casa para efeito de processar o Parlamentar acusado de ilícito. O Órgão de Cúpula do Poder Judiciário brasileiro recebe a denúncia por crime ocorrido após a diplomação e dá ciência à respectiva Casa Legislativa que, por iniciativa de partido político nela representado, poderá, pelo voto da maioria de seus membros , até a decisão final, sustar o andamento da ação. Agora se a casa quiser suspender o processo tem de fazê-lo expressamente. Se jogou o ônus político no colo da casa. Havendo a sustação do processo, haverá a conseqüente suspensão do lapso prescricional, enquanto durar o mandato, segundo o § 5º do mencionado dispositivo legal.

Outra questão é a do parlamentar licenciado, por ex, para ser ministro de estado, se beneficia das imunidades? Para o STF não pois as imunidades não beneficiam a pessoa do parlamentar, servem para garantir o livre exercício do mandato.

O art 54 trata de incompatibilidades:

Art. 54. Os Deputados e Senadores não poderão:

I - desde a expedição do diploma:

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a) firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público, salvo quando o contrato obedecer a cláusulas uniformes;

b) aceitar ou exercer cargo, função ou emprego remunerado, inclusive os de que sejam demissíveis "ad nutum", nas entidades constantes da alínea anterior;

II - desde a posse:

a) ser proprietários, controladores ou diretores de empresa que goze de favor decorrente de contrato com pessoa jurídica de direito público, ou nela exercer função remunerada;

b) ocupar cargo ou função de que sejam demissíveis "ad nutum", nas entidades referidas no inciso I, "a";

c) patrocinar causa em que seja interessada qualquer das entidades a que se refere o inciso I, "a";

d) ser titulares de mais de um cargo ou mandato público eletivo.

Art 55 trata da perda do mandato:

Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador:

I - que infringir qualquer das proibições estabelecidas no artigo anterior; Se praticar qq um desses atos em relação aos quais ele tem incompatibilidades, ele perde o mandato.

II - cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar; O decoro parlamentar é o conjunto de regras legais e morais que regem o exercício digno da função legislativa. Essas regras vem disciplinadas nos regimentos internos das casas.

III - que deixar de comparecer, em cada sessão legislativa, à terça parte das sessões ordinárias da Casa a que pertencer, salvo licença ou missão por esta autorizada;Hipótese de inassiduidade.

IV - que perder ou tiver suspensos os direitos políticos;

V - quando o decretar a Justiça Eleitoral, nos casos previstos nesta Constituição;

VI - que sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado.

§ 2º - Nos casos dos incisos I, II e VI, a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa. O professor acha um absurdo que o inciso VI esteja incluído aí.

§ 3º - Nos casos previstos nos incisos III a V, a perda será declarada pela Mesa da Casa respectiva, de ofício ou mediante provocação de qualquer de seus membros, ou de partido

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político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa. Ato vinculado, obrigatório.

Fonteles opina PGR é contra voto aberto para perda de mandato de deputados

O parágrafo 2º, do artigo 104, da Constituição do estado do Rio de Janeiro, que institui o voto aberto na Assembléia Legislativa para as decisões sobre a perda de mandato parlamentar, é inconstitucional. A opinião é do procurador-geral da República, Claudio Fonteles, que enviou parecer ao Supremo Tribunal Federal.

A Ação Direta de Inconstitucionalidade foi proposta pelo Partido Democrático Trabalhista. O PDT alegou que o dispositivo viola o artigo 27, parágrafo 1º e o artigo 55, parágrafo 2º, da Constituição da República. De acordo com o partido, o processo de cassação de mandato de deputados estaduais deve seguir as mesmas normas definidas na Constituição Federal para cassação de deputados federais e senadores.

Para Fonteles, a Constituição do RJ, ao decretar o voto aberto para decidir a cassação de mandato, contraria as diretrizes fixadas pela Carta da República, que no parágrafo 2º do artigo 55 prescreve o voto secreto por maioria absoluta, assegurada a ampla defesa, para a perda do mandato parlamentar. O parecer de Fonteles será analisado pelo ministro Gilmar Mendes

ADI 3.208 - http://conjur.estadao.com.br/static/text/30542,1

Percebam que no art 55 não há a hipótese de perda de mandato por troca de partido. Mas em decisão recente o STF admitiu essa hipótese.

Fidelidade partidária: veja como votou cada ministro do STF

BRASÍLIA - Veja como votou cada ministro na sessão desta quinta-feira em que o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o mandato pertence ao partido e não ao parlamentar eleito:

CELSO DE MELLO - Relator da ação proposta pelo PSDB, defendeu que o mandato pertence ao partido, e não ao eleito. Para ele, a regra deverá ter validade apenas para quem trocou de partido depois de 27 de março, quando o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) declarou que os mandados pertencem às legendas. No entanto, a decisão de deixar o cargo vago não seria imediata: dependeria, ainda, de decisão do TSE. A tese foi abraçada pela maioria dos ministros. "O ato de infidelidade, quer ao partido político, quer ao eleitor, traduz um gesto de intolerável desrespeito à vontade soberana do povo", afirmou.

EROS GRAU : Relator da ação do PPS afirmou que não caberia ao STF, num mandado de segurança, cassar mandatos. Defendeu o amplo direito de defesa dos deputados. "Não encontro na Constituição nenhum preceito para o presidente da Câmara declarar a vacância e convocar o suplente sem a prévia manifestação da mesa e do plenário, com exercício de ampla defesa dos deputados" , disse. Para ele, a Constituição não contempla a troca de legenda como causa de perda do mandato.

CARMEN LÚCIA - Ela foi a relatora da ação proposta pelo DEM. Afirmou que o mandato pertence ao partido, não ao eleito. "Quem prepara as listas de candidatos são os partidos, e a ele deve ser

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dado o mandato", declarou. Carmem Lúcia considerou que não se tratava de cassação de mandato. Seguiu o raciocíno de Celso de Mello, que defendeu que a norma passe a valer a partir de 27 de março. Por isso, defendeu o encaminhamento do caso da deputada Jusmari Oliveira (PR-BA), que se desfiliou em 29 de março de 2007, ao TSE.

CARLOS ALBERTO DIREITO - Para ele, o mandato pertence ao partido. "A obrigação da filiação partidária significa que a origem da representação popular está indissoluvelmente ligada aos partidos políticos". Ele negou que os juízes estivessem legislando e disse que o que estavam fazendo era interpretar, " de forma coerente com o que está dito na Constituição". Votou com a sugestão de Celso de Mello.

RICARDO LEWANDOWSKI - Para ele, seriam nulos todos os atos que exerceram de forma ilegítima. Ele acompanhou o raciocínio de Eros Grau e apontou que não se pode cassar o mandato do eleito, que somente o plenário da Câmara tem esse poder, pela Constituição. Negou o mandado de segurança, na mesma linha de Eros Grau

JOAQUIM BARBOSA - Como Eros Grau, entende que os partidos não têm predominância do mandato. Chegou a falar em partidocracia. Considerou que a Câmara dos deputados compõe-se de representantes do povo, não de partidos. " Qual seria o modelo dessa partidocracia de que tanto fala o TSE? O modelo soviético? O modelo cubano? Ou o mexicano?", questionou. Negou o mandado de segurança.

CARLOS AYRES BRITTO - O ministro atacou a infidelidade partidária e defendeu que ela seja punida com a perda do mandato de quem trocou de partido a partir do início dessa legislatura. Ou seja, para Ayres Britto, deveriam ficar sem o cargo todos os deputados que mudaram de legenda neste ano - inclusive os 23 parlamentares alvo das ações do DEM, PSDB e PPS julgadas ontem. Ele ressaltou que a Constituição consagra o modelo de eleição proporcional, segundo o qual os votos pertencem ao partido, e não ao candidato. "Se falo do parlamentar como representante do partido, e não somente do povo, é porque a Magna Lei assim o diz com todas as letras", afirmou no voto.

CEZAR PELUSO - Disse que o eleito não pode mudar de partido e continuar no mandato. Lembrou que muitos dos eleitos obtiveram votos " insignificantes", mas chegaram à Câmara graças ao coeficiente eleitoral atingido pelas legendas. Ele considerou que os deputados representam o povo porque foram escolhidos por critérios partidários. E fez um questionamento sobre os infiéis: " O deputado que se desliga do partido e se liga mais de uma vez a outro partido, representa o povo? Em qual sentido?". Ele seguiu o entendimento de Celso de Mello, para que a norma passe a valer a partir de 27 de março. Negou o mandado para os partidos.

GILMAR MENDES - Votou da mesma forma que Celso de Mello. Explicou que o sistema proporcional faz do candidato refém dos votos do partido. "Ninguém é obrigado a ingressar em um partido e nem a ele permanecer, mas não se pode dispor do mandato como se fosse seu. O abandono da legenda, levando em conta as exceções, a meu ver, deve dar ensejo à extinção do mandato", declarou. O ministro ainda ressaltou que o troca-troca partidário ameaça o direito das minorias, pois os deputados eleitos por partidos menores acabavam cooptados para integrar a base do governo.

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MARCO AURÉLIO DE MELLO - Disse que o mandato pertence ao partido. Lembrou que as campanhas são financiadas, em parte, pelas legendas e que o horário eleitoral é distribuído aos candidatos pelos partidos. Para ele, o funcionamento parlamentar prevê a existência de bancada e voto de lideranças, constituídas por vontade popular, na hora do voto. Ele disse que se considerasse a data de 27 de março como marco daria aos partidos uma vitória de Pirro. Por isso, acompanhou o voto do Ayres Britto para conceder o Mandado de Segurança e, por conseguinte, sujeitar os infiéis à perda dos mandatos.

ELLEN GRACIE - A presidente do STF foi a última a votar e definiu o placar em prol do fim do troca-troca partidário. A opinião dela é a mesma de Celso de Mello. "A vinculação entre candidato e partido político prolonga-se após a eleição, sendo de toda inadequada a desenfreada migração partidária", afirmou. Ela também ressaltou que, quando há mudança de partido após as eleições, o resultado das urnas é modificado sem legitimidade. Defendeu que os que trocaram a partir de 27 de março devem ser considerados infiéis.

Nessa decisão, o STF entendeu que o mandato é do partido. O mandato continua no partido. O parlamentar não tem direito subjetivo a troca de partido. Segundo o sistema proporcional, o mandato é do partido. Vc não pode perder algo que vc não tem. Atenção: isso é para troca de mandato sem justificativa!!!!

Art. 56. Não perderá o mandato o Deputado ou Senador:

I - investido no cargo de Ministro de Estado, Governador de Território, Secretário de Estado, do Distrito Federal, de Território, de Prefeitura de Capital ou chefe de missão diplomática temporária; um parlamentar pode se licenciar para ocupar esses cargos. Se for para ocupar outros cargos que não esses, ele tem que renunciar.

II - licenciado pela respectiva Casa por motivo de doença, ou para tratar, sem remuneração, de interesse particular, desde que, neste caso, o afastamento não ultrapasse cento e vinte dias por sessão legislativa.

§ 1º - O suplente será convocado nos casos de vaga, de investidura em funções previstas neste artigo ou de licença superior a cento e vinte dias.

§ 2º - Ocorrendo vaga e não havendo suplente, far-se-á eleição para preenchê-la se faltarem mais de quinze meses para o término do mandato.

§ 3º - Na hipótese do inciso I, o Deputado ou Senador poderá optar pela remuneração do mandato.

O critério de suplência de deputado é diferente do critério de suplência de senador. O senador tem uma espécie da chapa, vc elege o senador e dois suplentes. Pq o sistema é majoritário. Para deputados, o sistema é proporcional. Os suplentes são suplentes do partido. O partido elegeu 10, os suplentes são os seguintes.

Tribunal de Contas

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O legislativo é o poder da República quem tem duas funções típicas. A função do legislativo não é legislar à toa. O legislativo tem duas funções, quais sejam: legislar e fiscalizar, controlar. Controle esse que se subdivide em dois ângulos: o controle financeiro e o controle administrativo propriamente dito. O controle financeiro é exercido com o auxílio do tribunal de contas, enquanto o controle administrativo, o controle dos atos, ele é exercido por algumas prerrogativas especiais que tem o congresso, como, por exemplo, o poder de convocar ministros de estado para comparecer e prestar esclarecimentos sob pena de cometer crime de responsabilidade; por exemplo, as comissões parlamentares de inquérito.

Art 70 e seguintes da CR:

Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder.

Quem está sujeito a ação fiscalizatória do TC? Parágrafo único do art 70. Prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária. Se houver dinheiro pb em jogo, cabe ação fiscalizatória.

O tribunal de contas da união (TCU) é composto por 9 ministros. Os requisitos estão no art 73, parágrafo 1o:

§ 1º - Os Ministros do Tribunal de Contas da União serão nomeados dentre brasileiros que satisfaçam os seguintes requisitos:

I - mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade;

II - idoneidade moral e reputação ilibada;

III - notórios conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos e financeiros ou de administração pública;

IV - mais de dez anos de exercício de função ou de efetiva atividade profissional que exija os conhecimentos mencionados no inciso anterior.

O parágrafo 2º diz quem deve escolher:

§ 2º - Os Ministros do Tribunal de Contas da União serão escolhidos:

I - um terço pelo Presidente da República, com aprovação do Senado Federal, sendo dois alternadamente dentre auditores e membros do Ministério Público junto ao Tribunal, indicados em lista tríplice pelo Tribunal, segundo os critérios de antigüidade e merecimento; Dos nove, três são escolhidos pelo presidente com aprovação do SF. E desses três, dois têm que ser escolhidos dentre auditores e membros do MP, alternadamente ora por antiguidade e

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ora por merecimento. O presidente da república recebe uma lista tríplice de auditores. Daí ele pode escolher qq um dos três. O mesmo para membros do MP. Uma vaga é de livre escolha.

II - dois terços pelo Congresso Nacional. A escolha é livre.

Os tribunais de contas estaduais têm sete conselheiros. A aplicação da proporção acima vai resultar num número fracionário. Como decidir quantas vagas cabe ao governador e quantas cabem à assembléia Legislativa? O STF legislou e editou a súmula 653: No Tribunal de Contas estadual, composto por sete conselheiros, quatro devem ser escolhidos pela Assembléia Legislativa e três pelo Chefe do Poder Executivo estadual, cabendo a este indicar um dentre auditores e outro dentre membros do Ministério Público, e um terceiro à sua livre escolha.

Uma questão intertemporal: CR anterior era o chefe do executivo que escolhia os membros dos TC. Nove ministros estão empossados desse modo e vem a nova CF, com novas regras. Agora só três cadeiras são nomeadas pelo presidente da república, as outras seis são nomeadas pelo CN.

Como decidir a quem cabe a ordem para troca dos ministros. Vagou a primeira cadeira, o sujeito se aposentou. Para definir essa questão, o STF se utiliza do princípio da mais rápida aplicação do modelo constitucional. O legislativo vai nomear as seis primeiras vagas pq tem um método mais rápido que chega à proporcionalidade exigida pela CR.

Digamos que as seis vagas já foram providas pelo legislativo depois da CF. Morre um desses seis empossados. A quem cabe nomear o novo ministro? Ao legislativo, a cadeira é do legislativo. Isso para manter a proporcionalidade, senão seriam quatro nomeados pelo executivo e cinco pelo legislativo. Diferente do que a CF determina.

Existem tribunais de contas municipais? A Constituição Federal de 1988, a fim de evitar a criação indiscriminada de Corte de Contas pelos municípios, prescreveu em seu artigo 31, § 4º : § 4º É vedada a criação de Tribunais, Conselhos ou órgãos de Contas Municipais.

A vedação constitucional está dirigida aos legisladores municipais, que não mais poderão instituir Cortes de Contas, ressalvados os Tribunais de Contas dos Municípios de São Paulo e do Rio de Janeiro, criados antes do advento da Carta Política de 1988.

Dessa forma, com exceção dos Municípios de São Paulo e do Rio de Janeiro, todos os demais devem ter as suas contas fiscalizadas pelas respectivas Câmaras Municipais, com auxílio do Tribunal de Contas do Estado.

Nada impede, contudo, de o Estado-membro instituir Tribunais e Conselhos de Contas dos Municípios, para apreciar e julgar exclusivamente as contas dos municípios integrantes de seu território que farão parte da administração estadual e não municipal.

De fato, um Estado-membro que contenha grande quantidade de municípios acabaria por sobrecarregar o exercício de atribuições de seu órgão específico, o Tribunal de Contas do Estado, que tem por função controlar e fiscalizar a execução orçamentária, no âmbito estadual. Daí existe a faculdade de os Estados-membros, nessas condições, criarem Tribunais e Conselhos de Contas dos Municípios, unicamente com o fito de desafogar a Corte de Contas do Estado.

É oportuno esclarecer que, para os efeitos de limites de despesas com pessoal por Poder, fixados pela Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000), os

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Tribunais de Contas estão incluídos na esfera dos respectivos Poderes Legislativos. E aqui é importante observar que esse fato não faz dos Tribunais de Contas meros órgãos auxiliares do Legislativo, com sustentado por alguns doutrinadores, pois aqueles Tribunais de Contas receberam atribuições próprias, diretamente da Constituição Federal (arts. 71 e 75).

O TC exerce um controle externo, conforme art 74:

Art. 74. Os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário manterão, de forma integrada, sistema de controle interno com a finalidade de:

I - avaliar o cumprimento das metas previstas no plano plurianual, a execução dos programas de governo e dos orçamentos da União;

II - comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto à eficácia e eficiência, da gestão orçamentária, financeira e patrimonial nos órgãos e entidades da administração federal, bem como da aplicação de recursos públicos por entidades de direito privado;

III - exercer o controle das operações de crédito, avais e garantias, bem como dos direitos e haveres da União;

IV - apoiar o controle externo no exercício de sua missão institucional.

§ 1º - Os responsáveis pelo controle interno, ao tomarem conhecimento de qualquer irregularidade ou ilegalidade, dela darão ciência ao Tribunal de Contas da União, sob pena de responsabilidade solidária. O TC é um órgão do poder legislativo que auxilia a casa legislativa no controle externo das contas públicas. Esse controle externo não exclui o controle interno do pp poder. Que é exercido no âmbito contábil pela controladoria geral da união. Além do controle político que é feito pela AGU e pelas procuradorias. Se uma autoridade que é responsável pelo controle interno não dá ciência ao TC, ela responde solidariamente. Para não ser responsabizada deve fazer duas coisas: instaurar o processo administrativo e dá ciência ao TC.

§ 2º - Qualquer cidadão, partido político, associação ou sindicato é parte legítima para, na forma da lei, denunciar irregularidades ou ilegalidades perante o Tribunal de Contas da União. Esse rol é bem amplo.

Constitucional em 18-12-07 Tribunal de Contas

Na última aula eu parei nas atribuições do TC que estão no art 71 da CR:

Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete:

Vocês têm que interpretar os incisos I e II de forma conjunta.

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I - apreciar as contas prestadas anualmente pelo Presidente da República, mediante parecer prévio que deverá ser elaborado em sessenta dias a contar de seu recebimento;

II - julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público federal, e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público;

Pq cabe ao TC julgar as contas de todos os administradores públicos, exceto o chefe do executivo que será julgado pela casa legislativa. Julgar as contas do Presidente da República cabe ao Congresso Nacional. No caso de chefe de executivo, o TC exibe apenas um parecer, com caráter não vinculativo. Em relação as demais autoridades, o TC aprecia as contas e pode aplicar determinadas penalidades. Lembrar do caso do Garotinho e da Benedita cujas contas foram reprovadas no parecer do TC, mas a casa legislativa ALERJ entendeu pela aprovação das contas com ressalvas.

Vamos agora ao inciso III:

III - apreciar, para fins de registro, a legalidade dos atos de admissão de pessoal, a qualquer título, na administração direta e indireta, incluídas as fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, excetuadas as nomeações para cargo de provimento em comissão, bem como a das concessões de aposentadorias, reformas e pensões, ressalvadas as melhorias posteriores que não alterem o fundamento legal do ato concessório;

Cabe ao TC apreciar para fins de registro os atos de admissão de pessoal e concessão de aposentadoria e pensão. Nesse item surgiu uma controvérsia entre o TC do Estado e a Procuradoria geral do Estado do RJ. Quando havia divergência de entendimento quanto à aposentadoria, por ex, o órgão da administração previdenciário, o IPERJ, enviava para o TC um determinado valor de aposentadoria que incluia a incorporação de um cargo em comissão. O TC entendia que aquela incorporação não era cabível. Havia, assim, uma divergência entre órgãos do TC sobre o cabimento ou não da incorporação daquela gratificação. Quando havia essa divergência, o TC emitia uma ordem para adequar o ato da aposentadoria ao seu entendimento, ou seja, para excluir aquela gratificação. E aí surgiu a questão para a PGE. Isso é verdadeiramente uma ordem do TC? O administrador público deve obedecer essa determinação do TC? É uma ordem ou uma orientação? Para o PGE é uma mera recomendação. O TC não pode impor o seu entendimento à administração pública. Havendo divergência de entendimento entre o TC e a administração pb cabe ao judiciário dirimir.

Vejamos o inciso VIII:

VIII - aplicar aos responsáveis, em caso de ilegalidade de despesa ou irregularidade de contas, as sanções previstas em lei, que estabelecerá, entre outras cominações, multa proporcional ao dano causado ao erário;

O TC pode aplicar com relação aos administradores públicos, exceto chefe do poder executivo, sanções.dentre essas sanções, há a aplicação de multa pecuniária. Combinar esse inciso com o parágrafo 3º.

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§ 3º - As decisões do Tribunal de que resulte imputação de débito ou multa terão eficácia de título executivo.

Inciso X combinado com o parágrafo 1º:

X - sustar, se não atendido, a execução do ato impugnado, comunicando a decisão à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal;

§ 1º - No caso de contrato, o ato de sustação será adotado diretamente pelo Congresso Nacional, que solicitará, de imediato, ao Poder Executivo as medidas cabíveis.

Interpretando: se for ato administrativo, o próprio TC pode anulá-lo ou fixar prazo para que ele seja corrigido. Se for contrato administrativo, o TC comunicará a suposta irregularidade à casa legislativa. E esta decidirá a respeito, pela anulação ou não. E se o TC comunicar a casa legislativa e ela nada fizer? Nesse caso, vejam o parágrafo 2º:

§ 2º - Se o Congresso Nacional ou o Poder Executivo, no prazo de noventa dias, não efetivar as medidas previstas no parágrafo anterior, o Tribunal decidirá a respeito.

“Decidirá a respeito” significa que quando a casa legislativa não fizer, os TC entendem que eles têm uma competência supletiva, subsidiária. Não é esse o entendimento da PGE do RJ. A PGE entende que nessa hipótese, o parágrafo não atribuiu ao TC uma competência supletiva para atuar na omissão da casa. O parágrafo 2º deu ao tribunal a possibilidade de reprovar as contas da autoridade administrativa que celebrou o contrato, aplicando, inclusive multa, mas não anular o contrato pois essa é uma competência da casa legislativa.

O TC tem poder normativo? No RJ, o TC aprovou uma deliberação dizendo que quando ele resolvia uma consulta, aquele decisão tinha eficácia normativa. Ou seja, segundo a resolução no 45 do TC, quando ele resolvia o caso X aquela decisão tinha efeito normativo, ou seja, se aplicava a todos os casos iguais ao caso X. Então a administraçào pública deveria obrigatoriamente seguir a orientação do TC em casos análogos. Para o STF, isso é inconstitucional, o TC só tem o poder normativo interno. Poder de editar normas com efeitos internos ao TC. Mas não poder normativo externo que atinja terceiros ou a administração pública.

O TC pode fiscalizar o conteúdo de contrato de concessão de serviço público? Ele pode fiscalizar e aplicar multas numa concessionária que presta serviço público e não atende as condições de prestação de serviço público estabelecidas no contrato de concessão? A princípio não. A natureza dessa atividade é fiscalizatória que integra o poder regulatório do Estado. Essa função reguladora cabe a princípio ao próprio poder executivo. Só será possível a atuação do TC se houver repasse de dinheiro público.

Federação

Características gerais do estado federal: Há dois modos de formação de um estado federal: 1º) Federalismo por agregação – ou processo centrípeto– é o processo de formação do Estado federal norte americano. É por agregação pq nos EUA as 13 colônias se tornaram independentes da Inglaterra por um período curto, um pouco mais de 10 anos. Depois disso, elas resolveram se agrupar em um único estado soberano. 13 colônias que eram

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independentes, que eram soberanos, abriram mão de sua soberania, concederam sua soberania para um órgão comum e ficaram apenas com autonomia. 2º) Federalismo por desagregação – ou processo centrífugo - O processo de formação do estado brasileiro foi inverso. O estado imperial brasileiro era um estado unitário, não havia federalismo. O estado federal brasileiro se formou por desagregação do estado unitário. Essa é uma das razões que explica porque o federalismo norte americano é muito mais forte. Os estados membros norte americanos têm muito mais competência do que os estados membros brasileiros.

Existem três classificações para definir uma federação em centrípeta ou centrífuga.

A primeira classificação considera a realidade interna de uma federação, ou seja, como se distribuem as competências e poderes entre União e Estados Membros. Sendo assim, se uma federação concentra poderes e competências na União, ela é mais centralizada e, denominada de federação centrípeta. Se uma federação desconcentra competências e poderes da União, conferindo maior autonomia aos Estados Membros, ela é mais descentralizada e, denominada de federação centrífuga. A segunda classificação não leva em conta a realidade interna de cada federação e sim qual o movimento histórico que levou à formação do Estado federado.

Assim, se uma federação se originou a partir de vários Estados Soberanos que abdicaram de suas soberanias para formar um Estado federado, o movimento realizado para se formar essa federação foi de fora para dentro e, por isso, em face à sua formação histórica, essa federação é centrípeta (caso americano). Todavia, se uma federação se originou de um Estado Unitário que se desmembrou, cedendo autonomia aos Estados-membros, o movimento realizado para se formar essa federação foi de dentro para fora e, por isso, em face à sua formação histórica essa federação é centrífuga (caso brasileiro).

A terceira classificação, adotada pelo professor Luiz Quadros de Magalhães, baseia-se no movimento atual existente numa federação. Em conformidade com esse posicionamento, a federação dos EUA é uma federação centrípeta (buscar centralizar poderes e competências na União) e a federação brasileira é uma federação centrífuga (busca descentralizar poderes e competências da União em favor dos Estados e Municípios).

Dessa forma, com base no professor Luiz Quadros de Magalhães, pode-se concluir que o federalismo norte-americano é um federalismo centrípeto, exatamente por ser descentralizado e ter por objetivo a busca de um pouco mais de centralização. Essa descentralização se dá pela história do federalismo norte-americano que surgiu de Confederações que abriram mão de suas soberanias para se tornarem Estados federados. O movimento nessa federação é de busca de centralização em momentos frágeis, no intuito de fortalecer a União, haja vista a grande descentralização já existente em seus Estados Membros.

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...”O federalismo centrípeto, justamente por tais motivos é o mais descentralizado, pois se originou historicamente de Estados soberanos que se uniram e abdicaram de sua soberania” (Magalhães, 2002, tomo I).

O federalismo brasileiro é um federalismo centrífugo, ou seja, há muita centralização de poder na União e por isso se busca uma maior descentralização. Essa centralização, também, se dá pela história do federalismo brasileiro que surgiu de um Estado Unitário que conferiu autonomia aos Estados Membros para se tornar um Estado Federado. O movimento nessa federação é de busca de descentralização, no intuito de fortalecer os Estados Membros e os Municípios, haja vista a grande centralização já existente nas mãos da União.

Assim, federações de formação histórica centrífuga, possuem uma realidade de centralização de poder (muita centralização/centrípeto) e fazem um movimento atual de busca de maior descentralização (centrífugo). Esse é quadro do federalismo brasileiro.

Já, federações de formação histórica centrípeta, possuem uma realidade de descentralização de poder (muita descentralização/centrífugo) e fazem um movimento atual de busca de menor descentralização (centrípeto). Esse é quadro do federalismo americano.

Outra divisão do modelo de federalismo se dá entre federalismo dual e federalismo cooperativo. O modelo de federalismo dual surgiu nos EUA. Se caracteriza por um sistema horizontal de divisão de competência. O modelo fundamental de divisão de competência dual é o de competências privativas ou exclusivas. São modelos reciprocamente excludentes de concessão de competência. Se eu dou uma competência privativa para a União, não dou para os estados e vice versa.é o modelo de federalismo que tem como principal propósito limitar o poder do estado. Define as atribuições de cada ente e limita a o poder do estado. Da mesma que a separação de poderes separa as funções do estado (executivo, legislativo e judiciário), o federalismo dual divide as atribuições entre união e estados membros. Para dividir o poder e evitar o exercício abusivo do poder do estado contra as liberdades individuais. Surgiu no estado liberal preocupado em conter o poder do estado. O outro modelo é o federalismo cooperativo. Se caracteriza por um sistema vertical de distribuição de competência. Se eu dou a competência X à União, eu não excluo a possibilidade do estado exercer também a competência. O modelo típico das competências é de competências comuns ou concorrentes. A concessão da competência a um ente não exclui a possibilidade de concessão dessa competência a outro ente. As competências comuns ou concorrentes se caracterizam pela conjunção de esforços entre os entes federativos para atingir um objetivo comum. Esse federalismo se desenvolveu no estado social em que a preocupação era a união de esforços entre os entes públicos para a satisfação das necessidades básicas da população. Não é à toa que serviços públicos qualificados como tal no estado de bem estar social, saúde e educação, são matérias de competência comum dos entes. Outra classificação mais recente é entre federalismo simétrico e federalismo assimétrico. Se fala que o federalismo é simétrico quando não houver diferenças culturais, sociais e econômicas significativas dentro do país. Há uma simetria entre as diversas partes do país no que toca esse aspecto. Essa não é uma característica do federalismo brasileiro. O federalismo

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brasileiro é claramente um federalismo assimétrico. Há uma forte assimteria desses aspectos nas diversas partes do país. Que elementos devem estar presentes para que nós tenhamos a certeza de que se trata de

um estado federal? 1- Descentralização política – é a transferência de competências políticas, legislativas para

entes menores. Este requisito não é suficiente. Estados unitários podem ter descentralização política. Nada impede isso. Esse primeiro requisito deve ser somado ao segundo.

2- Concessão de autonomia aos entes federativos – autonomia é um poder que se fraciona em 3 ou 4.

I - A primeira vertente é o poder de auto governo. Poder que o ente federativo tem de eleger seus próprios dirigentes. Ex: poder que o estado tem de eleger seu governador, seus deputados. Não há uma vinculação hierárquica entre governador e presidente da república, entre união e estado. Se houvesse hierarquia entre estado e união não haveria federalismo. O que há é uma relação de coordenação nos termos da partilha constitucional de competência. Todos os entes federados são autônomos. Nenhum dos três é soberano. Quem é soberano é a República Federativa do Brasil. Qual a diferença entre soberania e autonomia? Soberania é o poder político ilimitado. É o poder que o povo tem de elaborar sua própria constituição. É o poder constituinte originário. A autonomia é o poder limitado pelo direito. O poder que a união, estados e municípios têm é um poder autônomo, que é um poder limitado pela CR. II - poder de auto-organização ou de auto-constituição – é o poder do ente dispor sobre sua própria estrutura. Poder de se auto-estruturar, se auto-constituir. Esse poder é exercido através do poder constituinte decorrente. Que é exercido com a edição de uma constituição estadual, por ex, o estado membro exercendo seu poder constituinte decorrente. Pq é através da constituição estadual que ele cria a sua estrutura básica. Dentro desse poder, alguns autores colocam o poder de auto-legislação, ou seja, edição de normas sobre matérias de sua competência. III – Poder de auto administração – é o poder que o ente tem de dispor sobre seus próprios serviços e sobre o seu próprio pessoal. A mioria dos doutrinadores citam esses três poderes. Alguns autores citam um quarto. IV- autonomia financeira – poder de instituir e arrecadar os seus próprios tributos. É um pressuposto para as demais vertentes da autonomia. Concede ao ente recursos para a execução de suas competências.

3- Participação dos entes locais na formação da vontade nacional – o Senado é uma casa legislativa cuja função é garantir que os estados membros estejam representados no Congresso Nacional.

4- Supremacia da Constituição – a CR é uma norma hierarquicammente superior onde estão descritas as separações de competência. É fundamental para a existência de um estado federal que a partilha de competências entre os entes federativos esteja prevista numa norma hierarquicamente superior. Digamos que a divisão de competência esteja prevista numa lei ordinária. A União poderia alterar essa divisão de competência por lei ordinária. Então o fato da partilha de competências estar prevista numa norma hierarquicamente superior é uma garantia que um ente não vai se imiscuir na área de atuação do outro. O controle de constitucionalidade também é uma garantia do estado federal pq é um

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mecanismo que se destina a zelar pela supremacia da constituição. Pois é através deste que as leis inconstitucionais são invalidadas.

5- Unidade de território e de nacionalidade – para que se tenha um estado federal deve haver unidade territorial e de nacionalidade.

6- Existência de uma nítida divisão geográfica. As fronteiras entre os estados membros devem estar bem definidas para que eu possa saber qual o âmbito territorial de cada estado.

Características do federalismo brasileiro: nós vimos que o processo de formação do federalismo brasileiro é por desagregação (de estado unitário para federal).

O federalismo brasileiro adota tanto o federalismo dual como o cooperativo. É um federalismo misto. O federalismo brasileiro é profundamente assimétrico. Há muita desigualdade social, econômica e cultural no Brasil. A finalidade do federalismo é justamente buscar uma unidade e uma pluralidade. Ou seja, buscar unidade pq determinadas competências são atribuídas à união. Isso sem prejudicar a pluralidade, possibilidade de entes menores adotarem soluções diferentes, de acordo com as particularidades daquela localidade.

Como a CR/88 tratou da federação? Primeiro no art 60, parágrafo 4º deu à federação a hierarquia de cláusula pétrea. Uma EC que queira institur um estado unitário é inconstitucional.

Em relação à partilha constitucional de competência, o critério que orientou o constituinte foi o princípio da predominância do interesse. Ou seja, se o interesse for predominantemente nacional, atribui-se a competência à união. Se o interesse for regional ou estadual, competência do estado membro. Se interesse predominantemente local, atribui-se a competência ao município. Normalmente os estados federais são divididos em dois níveis – união e estados membros – no Brasil são divididos em três níveis: União, estados e municípios. Essa é uma peculiaridade do federalismo brasileiro.

Qual a natureza jurídica dos territórios? São autarquias territoriais. São pessoas jurídicas de direito público que não detém autonomia política. Hoje, no Brasil, nós não temos territórios.

O princípio da subsidiariedade vem ganhando muita força no trato da competência. Vem da União Européia e significa o seguinte: a competência é transferida para o ente maior, se o ente menor não tiver condições de exercê-la bem.

Outro critério que tem importância é a teoria dos poderes implícitos. Sempre que uma competência for pressuposto do exercício de uma competência explícita, aquela deve ser considerada uma competência implícita de determinado ente.

Esses são os principais critérios de atribuição de competência. O artigo 1º da CR diz:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I - a soberania;

II - a cidadania;

III - a dignidade da pessoa humana;

IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

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V - o pluralismo político.

Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

“União indissolúvel” daí se extrai o princípio da indissolubilidade do pacto federativo. Significa que a CR vedou as chamadas guerras de secessão. Secessão é a quebra do vínculo federativo. Não há possibilidade de um estado se tornar independente. Isso é tido pela CR/88 como um ato ilícito. Se isso acontecer é caso de intervenção federal.

Como é a divisão de competências na CR? A primeira forma de divisão se dá entre competências administrativas e competências legislativas. As competências administrativas exclusivas da União (art 21), competências administrativas exclusivas dos municípios (art 30, III, 2ª parte e seguintes) e em relação aos estados, a competência administrativa se dá como competência reservada ou remanescente, método derivado do sistema norte americano. Nesse método, as competências enumeradas são da União. No caso brasileiro, também os municípios e o que sobrar é dos estados. (art 25, parágrafo 1º):

§ 1º - São reservadas aos Estados as competências que não lhes sejam vedadas por esta Constituição.

Além das competências administrativas exclusivas, temos as competências administrativas comuns. (art 23 CR):

Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:

I - zelar pela guarda da Constituição, das leis e das instituições democráticas e conservar o patrimônio público;

II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência;

III - proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos;

IV - impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte e de outros bens de valor histórico, artístico ou cultural;

V - proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação e à ciência;

VI - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas;

VII - preservar as florestas, a fauna e a flora;

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VIII - fomentar a produção agropecuária e organizar o abastecimento alimentar;

IX - promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico;

X - combater as causas da pobreza e os fatores de marginalização, promovendo a integração social dos setores desfavorecidos;

XI - registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e exploração de recursos hídricos e minerais em seus territórios;

XII - estabelecer e implantar política de educação para a segurança do trânsito.

Parágrafo único. Leis complementares fixarão normas para a cooperação entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional.

Essas matérias são competências comuns da União, estados e municípios. Os entes federativos devem unir esforços para desempenhar essas atribuições. A redação dada pela EC 53/2006 diz que leis complementares complementares irão dispor sobre como essas competências comuns serão exercidas.Há duas leis complementares anteriores a EC que são fundamentais, dispõem sobre as competências comuns: Lei do SUS (Lei 8080) que disciplina qual o papel de cada ente federativo no desempenho da saúde e a Lei de diretrizes e bases da educação.

As competências legislativas privativas da União estão no art 22:

I- direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;

II - desapropriação;

III - requisições civis e militares, em caso de iminente perigo e em tempo de guerra;

IV - águas, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão;

V - serviço postal;

VI - sistema monetário e de medidas, títulos e garantias dos metais;

VII - política de crédito, câmbio, seguros e transferência de valores;

VIII - comércio exterior e interestadual;

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IX - diretrizes da política nacional de transportes;

X - regime dos portos, navegação lacustre, fluvial, marítima, aérea e aeroespacial;

XI - trânsito e transporte;

XII - jazidas, minas, outros recursos minerais e metalurgia;

XIII - nacionalidade, cidadania e naturalização;

XIV - populações indígenas;

XV - emigração e imigração, entrada, extradição e expulsão de estrangeiros;

XVI - organização do sistema nacional de emprego e condições para o exercício de profissões;

XVII - organização judiciária, do Ministério Público e da Defensoria Pública do Distrito Federal e dos Territórios, bem como organização administrativa destes;

XVIII - sistema estatístico, sistema cartográfico e de geologia nacionais;

XIX - sistemas de poupança, captação e garantia da poupança popular;

XX - sistemas de consórcios e sorteios;

XXI - normas gerais de organização, efetivos, material bélico, garantias, convocação e mobilização das polícias militares e corpos de bombeiros militares;

XXII - competência da polícia federal e das polícias rodoviária e ferroviária federais;

XXIII - seguridade social;

XXIV - diretrizes e bases da educação nacional;

XXV - registros públicos;

XXVII - normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1°, III; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

XXVIII - defesa territorial, defesa aeroespacial, defesa marítima, defesa civil e mobilização nacional;

XXIX - propaganda comercial.

Há possibilidade de a União delegar a Estados o exercício de competências privativas? Sim. Os requisitos para que essa delegação seja válida estão no art 22, parágrafo único: Lei complementar

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poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias relacionadas neste artigo. Não existe delegação genérica, isso implicaria em renúncia ao poder de legislar.

As competências legislativas privativas dos municípios estão no art 30, I e III:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

No estado as competências legislativas são remanescentes ou residuais. (art 25, parágrafo 1º): § 1º - São reservadas aos Estados as competências que não lhes sejam vedadas por esta Constituição.

Há uma competência administrativa do Estado que está enumerada expressamente na CR no art 25, parágrafo 2º: Cabe aos Estados explorar diretamente, ou mediante concessão, os serviços locais de gás canalizado, na forma da lei, vedada a edição de medida provisória para a sua regulamentação.

Por fim, competência legislativa concorrente que está no art 24: Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:

I - direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico;

II - orçamento;

III - juntas comerciais;

IV - custas dos serviços forenses;

V - produção e consumo;

VI - florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição;

VII - proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico;

VIII - responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;

IX - educação, cultura, ensino e desporto;

X - criação, funcionamento e processo do juizado de pequenas causas;

XI - procedimentos em matéria processual;

XII - previdência social, proteção e defesa da saúde;

XIII - assistência jurídica e Defensoria pública;

XIV - proteção e integração social das pessoas portadoras de deficiência;

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XV - proteção à infância e à juventude;

XVI - organização, garantias, direitos e deveres das polícias civis.

Os municípios fazem parte dessa competência concorrente? Fazer remissão ao art 30, II: suplementar a legislação federal e a estadual no que couber. Combinando o 30, II com o art 24, a conclusão é que os municípios participam sim dessa competência legislativa concorrente.

A competência concorrente funciona conforme os parágrafos do art 24:

§ 1º - No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais.

§ 2º - A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados.

§ 3º - Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.

§ 4º - A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário.

O que acontece se a União não edita normas gerais? Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades. Só um parêntesis aqui: essa competência que os estados têm de editar normas específicas que complementem as normas gerais da União é chamada de competência suplementar. Se a federais não editar normas gerais, o estado tem a chamada competência supletiva. Ou seja, excepcionalmente, se a União não editar normas gerais, o estado poderá fazê-lo para suprir essa lacuna decorrente da ausência de normas gerais.

E se depois de o estado editar norma geral específica, a União edita norma federal específica sobre a mesma matéria? Prevalecerá a norma geral federal. As normas gerais federais suspendem a eficácia das normas gerais estaduais.

Em relação as normas federais específicas, derrogam as normas estaduais específicas? Não, elas convivem harmonicamente pq as normas federais específicas aplicam-se apenas à união, enquanto as normas estaduais específicas aplicam-se apenas aos estados.

A superveniência de norma geral federal suspende a eficácia de norma estadual estadual, mas não derroga. Se há suspensão de eficácia e não revogação, se a norma federal é revogada, a norma estadual volta a valer. Se fosse revogação isso não valeria pq não há repristinação tácita no direito brasileiro.

Intervenção federal

Está no art 34 CR: A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para:

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I - manter a integridade nacional;

II - repelir invasão estrangeira ou de uma unidade da Federação em outra;

III - pôr termo a grave comprometimento da ordem pública;

IV - garantir o livre exercício de qualquer dos Poderes nas unidades da Federação;

V - reorganizar as finanças da unidade da Federação que:

a) suspender o pagamento da dívida fundada por mais de dois anos consecutivos, salvo motivo de força maior;

b) deixar de entregar aos Municípios receitas tributárias fixadas nesta Constituição, dentro dos prazos estabelecidos em lei;

VI - prover a execução de lei federal, ordem ou decisão judicial;

VII - assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais:

a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático;

b) direitos da pessoa humana;

c) autonomia municipal;

d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta.

e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde.

Sistema constitucional de contenção de crises: intervenção federal mais estado de sítio mais estado de defesa. Esses três institutos foram concedidos pelo constituinte para debelar crises constitucionais. Na intervenção se restringe drasticamente, temporária e excepcionalmente, a autonomia dos entes federativos para se proteger a indissolubilidade do pacto federativo. A regra é a não intervenção. O rol desse artigo é taxativo. Não se admitem outras hipóteses de intervenção federal.

Não se admite a chamada intervenção federal per salto. Não se admite que a união intervenha em municípios, exceto em municípios que integrem territórios. Esse é o motivo pq o município do RJ anulou a intervenção nos hospitais municipais no governo Lula. O governo Lula requisitou que os hospitais deixassem de ser geridos pelo município e passassem a ser pela união. Saúde pública Supremo suspende intervenção em hospitais do Rio

por Vicente Dianezi

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O governo Lula sofreu uma derrota nesta terça-feira (20/4). Por unanimidade, o Supremo Tribunal Federal julgou inconstitucional o decreto que determinou a intervenção federal em hospitais municipais do Rio de Janeiro. Os ministros determinaram o restabelecimento da administração da prefeitura do Rio de Janeiro nos hospitais municipais.

O governo havia decretado, no dia 11 de março, intervenção federal em seis hospitais do Rio de Janeiro — quatro federais e dois municipais. Alegou que houve calamidade pública no setor. A intervenção tranferiu para o governo federal toda a gestão da rede municipal.

Com a decisão do STF, a prefeitura do Rio de Janeiro retoma a administração dos hospitais Souza Aguiar e Miguel Couto. A União fica proibida de usar servidores municipais nos quatro hospitais federais que continuará administrando na cidade.

A prefeitura do Rio de Janeiro pediu, justamente, que os dois hospitais municipais voltassem para o seu comando. O pedido foi totalmente atendido.

Relator muda voto

Foi um dos mais agitados debates do Pleno do STF neste ano. O ministro Joaquim Barbosa, nomeado para o tribunal pelo atual governo e relator da matéria, iniciou a votação considerando parcialmente inconstitucional o Decreto nº 5.392/05 (veja íntegra abaixo), que estabeleceu a intervenção nos hospitais cariocas.

Barbosa afirmou que não queria apontar culpados pela situação calamitosa da saúde naquela capital e que partia da presunção de que tanto a União quanto o Município se preocupavam com o setor. Mas, em conseqüência da situação, reconheceu a constitucionalidade do decreto no que se referia à “requisição” pela União dos bens, serviços e servidores dos hospitais municipais. “A União tem competência para requisitar”, afirmou.

O ministro, paralelamente, apontou dois vícios constitucionais no expediente presidencial. Em primeiro lugar, disse que o decreto carecia de insuficiência na motivação, pois “não há nem uma exposição de motivos”. Em segundo, que feria princípios constitucionais por não determinar um prazo para a vigência da medida excepcional. E sugeriu que, por intermédio de um novo decreto, o ato de requisição fosse corrigido pelo Executivo.

Concluído o voto, estabeleceu-se o debate. O ministro Sepúlveda Pertence queria entender como um ato podia ser constitucional, enquanto o texto que o veiculou continha as inconstitucionalidades apontadas pelo próprio relator.

“A União fez uma intervenção como se o município fosse uma autarquia federal!”, exclamou o ministro Marco Aurélio. “O pacto federativo, assim, vai por água abaixo”, emendou o ministro Carlos Velloso, que acrescentou: “Quer dizer que não houve intervenção porque o prefeito ficou?”

A divergência foi aberta pelo ministro Carlos Ayres Britto, o segundo a votar. “O ato é uma intervenção disfarçada”, sentenciou. Segundo ele, a União não pode se apoderar de bens, serviços e servidores de outros entes federados, a não ser nos casos previstos pela Constituição: os Estados de Sítio e de Defesa.

Acrescentou que o SUS (Sistema Único de Saúde), um condomínio dos entes federados criado para atender ao princípio da descentralização, estava, ao contrário, sendo centralizado pelo ato

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presidencial. “E de uma forma desapegada de qualquer processo administrativo ou judicial. Não há nada a salvar desse decreto”, afirmou.

A partir da divergência de Britto, os ministros utilizaram os próprios argumentos de Joaquim Barbosa para detonar o decreto. “Um fato dessa gravidade [a intervenção] não independe de motivação expressa”, afirmou o ministro Cezar Peluzo. Ele lembrou que mesmo a intervenção deve ter prazo determinado e considerou o decreto “uma fraude” que retirou do requerente [a Prefeitura do Rio de Janeiro] o poder de gerir os seus bens.

O ministro Gilmar Mendes, por sua vez, manifestou a sua apreensão, uma vez que a regra constitucional da requisição destina-se à utilização de bens em situações emergenciais, mas em atividade diversa da qual estão sendo empregados, que não foi o caso. Já a ministra Ellen Gracie, que também atendeu integralmente o pedido, afirmou que o fracasso do diálogo político não pode justificar a quebra das regras legais.

O ministro Marco Aurélio afirmou que “se a moda pega, poderemos ter intervenções tópicas e setorizadas quando a noção de intervenção é linear e voltada para quem dirige”. O ministro Carlos Velloso também argumentou que o decreto é uma intervenção disfarçada, enquanto o ministro Celso de Mello reforçou a tese da ofensa à autonomia constitucional dos municípios.

Último a votar antes do presidente, o ministro Sepúlveda Pertence afirmou que o ato de requisição refere-se apenas a bens de particulares ou de pessoas jurídicas e não aos bens públicos de entes federados. “Mas não vou gastar mais velas com um defunto tão ruim”, concluiu.

Antes que o presidente do STF, ministro Nelson Jobim, que também acompanhou a divergência, proclamasse o resultado, o relator Joaquim Barbosa reformulou o seu voto e concedeu totalmente o pedido feito pela prefeitura. Ao anunciar a decisão, Jobim fez uma ressalva. Disse que, no caso em julgamento, aceitava a opinião da maioria da Corte, mas que a decisão não poderia ser aplicada, automaticamente, para outras situações. “Ficamos assim até que os fatos provem o contrário”, afirmou.

No julgamento, como em tantos outros, ficou claro o inconformismo dos ministros da corte com a atuação do colega Joaquim Barbosa que, com frequência, socorre-se de teses pouco jurídicas para respaldar suas conclusões.

A intervenção visa impedir as chamadas guerras de secessão (inciso I); Repelir invasão estrangeira ou de uma unidade da Federação em outra (inciso II); III - pôr termo a grave comprometimento da ordem pública. Isso quer dizer uma séria crise que não pode ser debelada pelas instituições ordinárias; IV - garantir o livre exercício de qualquer dos Poderes nas unidades da Federação – ou seja, se houver, por ex, uma coação de um poder sobre o outro; V - reorganizar as finanças da unidade da Federação que: a) suspender o pagamento da dívida fundada por mais de dois anos consecutivos, salvo motivo de força maior - dívida fundada é dívida que supere o exercício financeiro. Alguns autores como GERALDO ATALIBA vem dando uma interpretação mais robusta: dívida fundada é também uma dívida de alto vulto que possa colocar em risco a saúde financeira do ente federativo; b) deixar de entregar aos Municípios receitas tributárias fixadas nesta Constituição, dentro dos prazos estabelecidos em lei – quando o estado não promove o repasse obrigatório para os municípios; VI - prover a execução de lei federal, ordem ou decisão judicial; VII - assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais : a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático; b) direitos da pessoa humana; c) autonomia municipal; d) prestação de contas da administração pública,

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direta e indireta; e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde.

Quem tem competência para decretar a intervenção federal? Presidente da República, por decerto. O parágrafo 1º do art 36 estabelece os requisitos que esse decreto deve observar: O decreto de intervenção, que especificará a amplitude, o prazo e as condições de execução e que, se couber, nomeará o interventor, será submetido à apreciação do Congresso Nacional ou da Assembléia Legislativa do Estado, no prazo de vinte e quatro horas. O interventor é aquele que substitui o governador eleito enquanto durar a intervenção federal. Nem sempre há nomeação de interventor. Isso é algo que restringe bastante o poder de auto-governo. Para se nomear um interventor deve ser absolutamente necessário. Percebam que há um controle político a posteriori pelo Congresso Nacional ou pela Assembléia legislativa do Estado, em 24 horas.

Art. 36. A decretação da intervenção dependerá:

I - no caso do art. 34, IV (art 34, IV - garantir o livre exercício de qualquer dos Poderes nas unidades da Federação;), de solicitação do Poder Legislativo ou do Poder Executivo coacto ou impedido, ou de requisição do Supremo Tribunal Federal, se a coação for exercida contra o Poder Judiciário; havendo a solicitação do Poder Legislativo ou do Poder Executivo coacto ou impedido o Presidente da República pode ou não promover a intervenção federal. Se a coação for contra o poder judiciário, o STF requisitará a intervenção federal. Isso significa que nesse caso a intervenção federal é vinculada, é obrigatória e não discricionária como no caso anterior.

II - no caso de desobediência a ordem ou decisão judiciária, de requisição do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do Tribunal Superior Eleitoral; Nesse caso específico, a intervenção é vinculada. Observe que o constituinte tb usou o termo requisição. STF decidiu que para caracterizar intervenção federal no caso de descumprimento de decisão juduciária não basta o não pagamento do precatório. O estado pode não ter pago por falta de condições financeiras. Isso deve ser provado.

III - de provimento, pelo Supremo Tribunal Federal, de representação do Procurador-Geral da República, na hipótese do art. 34, VII (art 34 - VII - assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais : a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático; b) direitos da pessoa humana; c) autonomia municipal; d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta; e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde.) , e no caso de recusa à execução de lei federal. Se houver violação a princípio constitucional sensível ou recusa à execuçào de lei federal, o procedimento de intervenção vai ser um pouco diferente. Nesse caso é cabível a chamada ação direta interventiva. Essa ação só cabe nesses casos. Essa ação é de legitimidade ativa exclusiva do procurador da república. Competência privativa do STF. Esse é um caso de intervenção vinculada. Pq o presidente da república está adstrito à requisição do STF.

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