Prefacio Dicionario Etimologico Dos Nomes de Ocupacao Em Portugues

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Prefacio Dicionario Etimologico Dos Nomes de Ocupacao Em Portugues

Citation preview

  • Villalva, Marquilhas, Correia, Albino 1

    Dicionrio Etimolgico dos Nomes de Ocupao em Portugus

    Prefcio

    I. Questes gerais

    O Dicionrio Etimolgico dos Nomes de Ocupao em Portugus constitudo,

    exclusivamente, por nomes encontrados em fontes de diversa natureza, que identificam

    ocupaes nos domnios dos txteis, da pesca e da agricultura e pecuria1. Trata-se, pois, de

    um lxico de formas atestadas, pelo que as propriedades atribudas a cada entrada

    correspondem s propriedades das ocorrncias registadas.

    A informao associada a cada entrada informao de natureza lexical,

    morfolgica e etimolgica, e ainda sobre casos de variao. A informao lexical explicita a

    categoria das palavras e o seu valor de gnero; a informao morfolgica, que acompanha

    apenas as palavras complexas composicionais2, mostra simplificadamente a sua estrutura

    interna; a informao etimolgica d indicaes sobre a lngua de origem e sobre as

    atestaes conhecidas e relevantes. Sempre que os dados disponveis o justificaram, h

    informaes sobre variao fontica, morfolgica ou lexical e sobre as ocorrncias de um

    dado nome de ocupao como cabea de outros nomes de ocupao.

    II. Informao lexical

    Todas as entradas do presente dicionrio pertencem categoria gramatical dos

    nomes (n.), sendo listados na forma do singular, que corresponde sua forma de citao.

    Tambm dada indicao relativa ao gnero, estabelecendo-se uma distino entre nomes

    masculinos (e.g. aprendiz n. m.) e nomes femininos (e.g. mestra n.f.). A especificidade do

    presente dicionrio, enquanto dicionrio de formas atestadas, particularmente relevante

    no que respeita ao tratamento dos contrastes de gnero. Note-se que, dado que as formas

    registadas no correspondem a formas de citao3, mas ao registo das ocorrncias, (i) se

    regista s a forma masculina quando s a forma masculina foi atestada (e.g. batedor n. m.);

    1 V. as fontes consultadas pelos autores dos trs volumes dos dicionrios PACO. 2 So complexas as palavras que possuem uma estrutura interna analisvel. So composicionais as palavras complexas cuja forma e interpretao correspondem ao produto regular de processos morfolgicos de formao de palavras. 3 No portugus, a forma de citao dos nomes sempre a forma do singular e a forma do masculino sempre que o contraste de gnero possvel. Por exemplo, aluno a forma de citao de aluno, alunos, aluna e alunas; casa a forma de citao de casa e casas; e livro a forma de citao de livro e livros.

  • Villalva, Marquilhas, Correia, Albino 2

    (ii) s a forma feminina quando s a forma feminina foi atestada (e.g. curadeira n. f.); e

    (iii) as duas formas quando h atestaes do feminino e do masculino (e.g. brunideira n.f.,

    brunidor n.m).

    Note-se ainda que aos chamados nomes comuns de dois, ou seja, aos nomes que,

    independentemente do sexo da entidade referida, dispem de uma nica forma lexical, que

    s sintacticamente pode ser desambiguada (cf. (um / uma) ajudante, (um / uma) auxiliar),

    foi atribudo o valor de gnero encontrado nas fontes:

    ajudante n. m.

    auxiliar n. m.

    Note-se, por ltimo, que alguns nomes ocorrem com um valor de gnero que

    resultante da interveno de um processo de converso:

    segurana n. m. por converso do feminino [segurana]

    III. Informao morfolgica

    Sendo o portugus uma lngua romnica, espervel que a maior parte das palavras

    que constituem o seu lxico tenha origem em palavras latinas. o que se verifica no

    presente dicionrio4. Note-se, porm, que a relao entre as palavras do portugus e o seu

    timo no sempre a mesma: trata-se de uma relao directa nos casos em que a palavra

    existente no portugus j existia numa lngua de origem (e.g. a palavra mestre

    proveniente da forma latina magister, tri:5); e trata-se de uma relao mediada nos casos em

    que a palavra em questo foi gerada por um processo morfolgico, no portugus, a partir

    de uma base herdada de outra lngua (e.g. turbineiro uma palavra derivada por sufixao

    de -eiro ao radical de turbina, do fr. turbine)6.

    A descrio lingustica que foi elaborada para cada entrada explicita esta distino

    entre palavras simples e palavras complexas, registando de modo simplificado a estrutura

    morfolgica destas ltimas. Assim, a entrada de uma palavra simples, como mestre, regista

    apenas a informao morfolgica e etimolgica relevante, enquanto que a entrada

    correspondente a turbineiro acrescenta uma representao da sua estrutura morfolgica:

    mestre n. m. Do lat. magister, tri: 4 Neste dicionrio das ocupaes ligadas aos txteis, cerca de 70% das palavras portuguesas tm origem latina (60% vernculas e 10% eruditas). Os restantes 30% dizem respeito a vocabulrio proveniente de outras lnguas e de onomatopeias, incluindo-se tambm nessa percentagem as etimologias desconhecidas. 5 O smbolo de ":" assinala uma vogal longa (v. tt. VII, "Convenes e abreviaturas"). 6 Cerca de 13% so palavras directamente herdadas de uma lngua de origem.

  • Villalva, Marquilhas, Correia, Albino 3

    turbineiro n. m. [turbin(a)+eiro]. Do fr. turbine

    A representao da estrutura morfolgica das palavras complexas estabelece ainda

    uma distino entre palavras derivadas ajudante, e palavras compostas, como

    fotogravador, branqueador-tintureiro, guarda-livros. No caso das palavras derivadas,

    indicada a forma de base e o sufixo derivacional que est presente.

    ajudante n. m. [ajuda(r)+nte]. Do lat. adju:ta:re

    No caso dos compostos morfolgicos, identificam-se os diversos radicais presentes,

    bem como os seus timos, podendo ainda estar presente um sufixo derivacional:

    fotogravador n. m. [foto+[gravador], atest. no s. XX. Do gr. (cult.) pho:s, pho:ts +

    gravador v. gravador.

    Relativamente aos compostos morfo-sintcticos com estrutura coordenada,

    identificam-se os nomes que os compem e remete-se para cada uma das entradas

    autnomas, onde se encontra o tratamento lingustico de cada um deles:

    branqueador-tintureiro n. m. [branqueador]+[tintureiro] v. branqueador,

    tintureiro

    branqueador n. m. [branquea(r)+dor]. Do germ. blank

    tintureiro n. m. [tintur(a)+eiro] Do lat. tinctus, a, um

    Quanto aos compostos morfo-sintcticos com estrutura de reanlise, identificam-se

    as palavras que os integram, geralmente um verbo e um nome flexionado no plural, bem

    como o timo de cada uma delas:

    guarda-livros n. m. [guarda]+[livros]. Do germ. wardn+lat. liber v. guarda

    IV. Informao etimolgica

    A indicao da forma etimolgica para cada nome de ocupao baseou-se

    sobretudo nas etimologias do Diccionario Crtico Etimolgico de Joan Corominas e Jos A.

    Pascual7. Nos casos em que este dicionrio se revelou insuficiente, recorreu-se a bibliografia

    complementar8.

    7 Joan Corominas e Jos A. Pascual , Diccionario Crtico Etimolgico Castellano e Hispnico. Madrid, Gredos, 1980, vols. I-VI. 8 Antnio Geraldo da Cunha, Dicionrio Etimolgico Nova Fronteira da Lngua Portuguesa. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1986. Vv. Aa. Dicionrio da Lngua Portuguesa. Porto, Porto Editora, 1989 (6 edio). Aurlio Buarque de Holanda Ferreira, Novo Dicionrio da Lngua Portuguesa. Rio de Janeiro, Editora Nova Fronteira S.A., 1989 (2 edio). Jos Pedro MACHADO, Dicionrio Etimolgico da Lngua Portuguesa. Lisboa, Livros Horizonte, 1995, vols. I-V, 7 edio. Wilhelm Meyer-Lbke, Romanisches Etymologisches WrterBuch. Heidelberg, Carl Winter UniversittsVerlag, 1935.

  • Villalva, Marquilhas, Correia, Albino 4

    Os timos latinos foram registados nas formas do nominativo e genitivo singulares

    no caso dos substantivos (ex: gumma, ae, timo de engomador), dos nominativos masculino,

    feminino e neutro para os adjectivos (ex: tinctus, a, um, timo de tintureiro) e do infinitivo

    para os verbos (ex: texere, timo de tecedeira). Quando as designaes portuguesas tm

    origem em formas conjecturadas, ou ento em formas do latim vulgar ou do latim tardio,

    remete-se frequentemente para um timo nico (ex: *cacculus, timo de escachador).

    Em relao aos timos rabes, a transliterao usada foi sempre a do Dicionrio

    Etimolgico da Lngua Portuguesa de Jos Pedro Machado; as transliteraes encontrveis em

    Corominas e Pascual no se compatibilizam com os teclados normalmente disponveis, o

    que j no acontece com a soluo adoptada por Jos Pedro Machado, que se preocupou,

    logo em 1952, em escolher um [sistema] simples ao mximo, altura de qualquer tipografia9.

    V. Atestaes

    No que diz respeito s atestaes mais antigas para cada nome de ocupao, teve de

    se seguir um critrio que contemplasse um problema j acima referido: a maioria dos

    nomes de ocupao, em portugus, constituda por palavras derivadas. Por exemplo, vara

    forma atestada em textos portugueses desde o sculo XIII, mas vareadoro s comea a

    aparecer em documentos do sculo XVIII. Se apenas se mencionasse a data setecentista

    para este nome de ocupao, dava-se uma impresso errada sobre a idade da sua base

    lexical. Por conseguinte, adoptou-se a soluo de desdobrar, nos casos necessrios, a

    indicao da data e da forma da primeira atestao: quando um nome de ocupao foi

    sujeito a um processo de formao de palavras j dentro da histria da lngua portuguesa,

    indicou-se em primeiro lugar a mais antiga atestao do seu radical, independentemente do

    afixo que tivesse:

    vareador n. m. [varea(r)+dor], atest. desde o s. XVIII. Do lat. varus, a, um (s. XIII

    varas)

    Da mesma forma, alguns nomes de ocupao provm de palavras, j existentes em

    portugus, que vieram a sofrer processos de converso ou que originaram formas

    compostas. A palavra caixa, por exemplo, que passa a funcionar como nome de ocupao

    apenas no sculo XVIII, est abonada como nome feminino desde o sculo XIV:

    9 Machado, "Nota sobre o mtodo de transcrio do alfabeto arbico", op. cit., vol. I, pp. 9-10.

  • Villalva, Marquilhas, Correia, Albino 5

    caixa n. m. por converso do feminino [caixa], atest. desde o

    s. XVIII caixas. Do prov. caissa (s. XIV qajxa)

    As fontes utilizadas nas atestaes foram - alm dos dicionrios etimolgicos de

    Jos Pedro Machado e de A. G. Cunha10, geralmente pouco teis para nomes de ocupao -

    as bases de dados constitudas pelos historiadores do ISCTE e da Universidade do Porto

    que colaboraram no projecto PACO.

    VI. Variao

    Quando as primeiras atestaes de um nome ou de uma palavra de base relativa a

    esse nome tm, nas fontes, grafias diversas, d-se conta dessa variao grfica. A indicao

    das diferentes grafias surge em itlico, a seguir ao sculo a que pertencem as fontes ex. s.

    XVII tintoreira, tintoreyra - e rodeada de parntesis se estiver em causa a primeira atestao

    da palavra de base - ex. (s. XIII olhos, ollos):

    tintureira n. f. [tintur(a)+eira], atest. desde o s. XVII tintoreira, tintoreyra. Do lat.

    tinctus, a, um (s. XIII tinto)

    olheiro n. m. [olh(o)+eiro], atest. desde o s. XVI. Do lat. oculus, i: (s. XIII olhos,

    ollos)

    Por vezes, algumas variantes grficas encontradas nas fontes posteriores s da

    primeira atestao revelam uma variao na pronncia do nome que est em causa. Nestes

    casos, o fenmeno fica registado com a indicao de variantes fonticas (var. fon.):

    carpinteiro n. m., atest. desde o s. XV. Do lat. carpenta:rius, ii:; var. fon. carpemteiro,

    carpenteiro, carpenteyro, carpenteyrro

    Sempre que os dados o justificam, inclui-se informao sobre variao morfolgica,

    que geralmente corresponde a uma nica forma de base que ocorre com diferentes sufixos

    derivacionais concorrentes:

    prensador n. m. [prensa(r)+dor], atest. desde o s. XVIII. Do lat. (cult.) prehendere (s.

    XVII prensa); var. morf. imprensador, prenseiro, prensor

    Pode acontecer, ainda, que um nome de ocupao tenha sofrido na sua histria um

    processo de analogia11, dando origem a uma nova designao para um conceito que se

    manteve. Para estes casos, usou-se a indicao variantes lexicais (var. lex.):

    10 V. supra, nota 8. 11 A analogia lexical corresponde a um fenmeno de mudana em que os falantes, influenciados por uma palavra semelhante, reanalisam outra palavra da sua lngua, modificando-a.

  • Villalva, Marquilhas, Correia, Albino 6

    fiadeiro n. m. [fia(r)+deiro], atest. desde o s. XVI. Do lat. tard. fi:lare (s. XIII fiar);

    var. lex. fiandeiro

    Por fim, h ainda casos em que os nomes de ocupao que integram o dicionrio

    ocorrem cabea de outros nomes de ocupao. Essas formas, modificadas por adjectivo,

    por frase relativa ou por sintagma preposicional, so listadas no final de cada entrada:

    cordoeiro n. m. [cordo(n=cordo)+eiro], atest. desde o s. XVI. Do fr. ant. cordon (s.

    XIII cordon); modific. cordoeiro de esparto de pia, cordoeiro de linho, cordoeiro de obra delgada,

    cordoeiro de obra grossa

    VII. Convenes e abreviaturas

    Adoptaram-se as convenes habitualmente utilizadas para identificar a estrutura

    morfolgica e aquelas que tradicionalmente permitem assinalar casos de conjectura de

    timos, de quantidade voclica e de datao duvidosa:

    [] - os parntesis rectos delimitam constituintes morfolgicos

    + - sinal que indica uma fronteira entre constituintes morfolgicos

    * - sinal que precede uma forma reconstruda por conjectura; no estando registada

    em nenhum texto conhecido, seguro que esteja historicamente relacionada com

    uma descendncia vocabular, essa sim atestada.

    : - sinal que se inscreve depois da letra de uma vogal de quantidade longa; sendo a

    vogal breve, no se assinala a sua quantidade.

    (?) - sinal que indica que determinada datao duvidosa.

    Abreviaturas gramaticais

    n. f. nome feminino

    n. m. nome masculino

    modific. modificao (sujeito a)

    Abreviaturas de nomes de lnguas:

    r. rabe

    cast. castelhano

    cat. catalo

    fr. francs

  • Villalva, Marquilhas, Correia, Albino 7

    fr. ant. francs antigo

    germ. germnico (a lngua germnica que mais emprstimos deu ao romance

    galego-portugus foi a dos invasores visigticos; os invasores suevos

    influenciaram muito pouco o vocabulrio do futuro portugus)

    gr. grego

    ingl. ingls

    ital. italiano

    lat. latim

    lat. hisp. latim hispnico

    lat. tard. latim tardio

    lat. vlg. latim vulgar

    pr-rom. pr-romano

    prov. provenal

    Outras abreviaturas

    atest. atestado

    cult. cultismo (designao que, correspondendo a um conceito erudito, entra

    no vocabulrio da lngua de uma forma artificial, tomada de uma lngua

    clssica)

    s. sculo

    text. texto

    A. V. R. M. C.N.C. C. A.