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1Princípios básicos da terapia

cognitivo-comportamental

pelas opiniões sobre as coisas” (Epitectus 1991,p. 14). Também nas tradições filosóficas ori-entais, como o taoísmo e o budismo, a cog-nição é considerada como uma força primáriana determinação do comportamento humano(Beck et al., 1979; Campos, 2002). Em seu li-vro Uma ética para o novo milênio,* o Dalai Lama(1999) observou que “se pudermos reorientarnossos pensamentos e emoções e reorganizarnosso comportamento, então poderemos nãosó aprender a lidar com o sofrimento mais fa-cilmente, mas, sobretudo e em primeiro lugar,evitar que muito dele surja” (p. xii).

A perspectiva de que o desenvolvimentode um estilo saudável de pensamento pode re-duzir a angústia ou dar uma maior sensaçãode bem-estar é um tema comum entre muitasgerações e culturas. O filósofo persa da Anti-güidade Zoroastro baseou seus ensinamentosem três pilares principais: pensar bem, agir beme falar bem. Benjamin Franklin, um dos paisda constituição dos Estados Unidos, escreveuextensamente sobre o desenvolvimento de ati-tudes construtivas, as quais ele acreditava queinfluenciavam favoravelmente o comporta-mento (Isaacson, 2003). Durante os séculos XIXe XX, filósofos europeus – incluindo Kant,Heidegger, Jaspers e Frankl – continuaram adesenvolver a idéia de que os processos cog-nitivos conscientes têm um papel fundamentalna existência humana (D. A. Clark et al., 1999;

* N. de T. Traduzido para o português pela EditoraSextante, 2000.

A prática clínica da terapia cognitivo-com-portamental (TCC) baseia-se em um conjuntode teorias bem-desenvolvidas que são usadaspara formular planos de tratamento e orientaras ações do terapeuta. Este capítulo inicial temo foco na explicação desses conceitos centraise ilustra como o modelo cognitivo-compor-tamental básico influenciou o desenvolvimen-to de técnicas específicas. Começamos comuma breve visão do histórico da TCC. Os prin-cípios fundamentais da TCC foram ligados aidéias que foram descritas pela primeira vezhá milhares de anos (Beck et al., 1979; D. A.Clark et al., 1999).

ORIGENS DA TCC

A TCC é uma abordagem de senso comum quese baseia em dois princípios centrais:

1. nossas cognições têm uma influência con-troladora sobre nossas emoções e compor-tamento; e

2. o modo como agimos ou nos comporta-mos pode afetar profundamente nossospadrões de pensamento e nossas emoções.

Os elementos cognitivos dessa perspecti-va foram reconhecidos pelos filósofos estóicosEpíteto, Cícero, Sêneca, entre outros, 2 mil anosantes da introdução da TCC (Beck et al., 1979).O estóico grego Epíteto, por exemplo, escre-veu em seu Enchiridion que “os homens não seperturbam pelas coisas que acontecem, mas sim

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Wright et al., 2003). Frankl (1992), por exem-plo, afirmou persuasivamente que encontraruma sensação de sentido da vida ajudava aservir como um antídoto para o desespero e adesilusão.

Aaron T. Beck foi a primeira pessoa a de-senvolver completamente teorias e métodospara aplicar as intervenções cognitivas ecomportamentais a transtornos emocionais(Beck, 1963, 1964). Embora tenha partido deconceitos psicanalíticos, Beck observou quesuas teorias cognitivas eram influenciadas pelotrabalho de vários analistas pós-freudianos,como Adler, Horney e Sullivan. O foco destesnas auto-imagens distorcidas pressagiava o de-senvolvimento de formulações cognitivo-comportamentais mais sistematizadas dostranstornos psiquiátricos e da estrutura da per-sonalidade (D. A. Clark et al., 1999). A teoriados construtos pessoais (crenças nucleares ouauto-esquemas) de Kelly (1955) e a terapia ra-cional-emotiva de Ellis também contribuírampara o desenvolvimento das teorias e dos mé-todos cognitivo-comportamentais (D. A. Clarket al., 1999; Raimy, 1975).

As primeiras formulações de Beck centra-vam-se no papel do processamento de infor-mações desadaptativo em transtornos de de-pressão e de ansiedade. Em uma série de tra-balhos publicados no início da década de 1960,ele descreveu uma conceitualização cognitivada depressão na qual os sintomas estavam re-lacionados a um estilo negativo de pensamen-to em três domínios: si mesmo, mundo e futu-ro (a “tríade cognitiva negativa”; Beck, 1963,1964). A proposta de Beck de uma terapiacognitivamente orientada com o objetivo dereverter cognições disfuncionais e comporta-mentos relacionados foi então testada em umgrande número de pesquisas (Butler e Beck,2000; Dobson, 1989; Wright et al., 2003). Asteorias e os métodos descritos por Beck e pormuitos outros colaboradores do modelo cog-nitivo-comportamental estenderam-se a umagrande variedade de quadros clínicos, incluin-do a depressão, os transtornos de ansiedade,os transtornos alimentares, a esquizofrenia, otranstorno bipolar, a dor crônica, os transtor-

nos de personalidade e o abuso de substâncias.Foram realizados mais de 300 estudos contro-lados da TCC para uma série de transtornospsiquiátricos (Butler e Beck, 2000).

Os componentes comportamentais domodelo de terapia cognitivo-comportamentaltiveram seu início nos anos de 1950 e 1960,quando pesquisadores clínicos começaram aaplicar as idéias de Pavlov, Skinner e outrosbehavioristas experimentais (Rachman, 1997).Joseph Wolpe (1958) e Hans Eysenck (1966)foram pioneiros na exploração do potencial dasintervenções comportamentais, como a dessen-sibilização (contato gradual com objetos ousituações temidos) e treinamento de relaxa-mento. Muitas das abordagens iniciais ao usodos princípios comportamentais para a psico-terapia prestavam pouca atenção aos proces-sos cognitivos envolvidos nos transtornos psi-quiátricos. Pelo contrário, o foco era moldar ocomportamento mensurável com reforçadorese em eliminar as respostas de medo através deexposição.

À medida que a terapia comportamentalse expandia, vários investigadores proeminen-tes – como Meichenbaum (1977) e Lewinsohne colaboradores (1985) – começaram a incor-porar as teorias e estratégias cognitivas a seustratamentos. Eles observaram que a perspectivacognitiva acrescentava contexto, profundida-de e entendimento às intervenções comporta-mentais. Além disso, Beck defendeu a inclu-são de métodos comportamentais desde o iní-cio de seu trabalho, pois reconhecia que essasferramentas são eficazes para reduzir sintomas,e conceitualizou um relacionamento estreitoentre cognição e comportamento. Desde a dé-cada de 1960 houve uma unificação das for-mulações cognitivas e comportamentais napsicoterapia. Embora ainda existam algunspuristas que possam argumentar sobre os mé-ritos de se utilizar uma abordagem cognitivaou comportamental isolada, terapeutas maispragmáticos consideram os métodos cognitivose comportamentais como parceiros eficazestanto em teoria quanto na prática.

Um bom exemplo da combinação das teo-rias cognitivas e comportamentais pode ser en-

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contrado no trabalho de D. M. Clark (1986; D.M. Clark et al., 1994) e de Barlow (Barlow eCerney, 1988; Barlow et al., 1989) em seusprotocolos de tratamento para o transtorno depânico. Eles observaram que os pacientes comtranstorno de pânico normalmente apresentamuma constelação de sintomas cognitivos (p. ex.,medos catastróficos de calamidades físicas oude perda de controle) e sintomas comporta-mentais (p. ex., fuga ou evitação). Pesquisasextensivas demonstraram a eficácia de umaabordagem combinada que utiliza técnicascognitivas (para modificar as cognições de me-do) juntamente com métodos comporta-mentais, incluindo o treinamento da respira-ção, o relaxamento e a terapia de exposição(Barlow et al., 1989; D. M. Clark et al., 1994;Wright et al., 2003).

O MODELO COGNITIVO-COMPORTAMENTAL

Os principais elementos do modelo cog-nitivo-comportamental estão esquematizadosna Figura 1.1. O processamento cognitivo re-cebe um papel central nesse modelo, porque oser humano continuamente avalia a relevân-cia dos acontecimentos internamente e no am-biente que o circunda (p. ex., eventos estres-

santes, comentários ou ausência de comentá-rios dos outros, memórias de eventos do pas-sado, tarefas a serem feitas, sensações corpo-rais), e as cognições estão freqüentemente as-sociadas às reações emocionais. Por exemplo,Richard, um homem com um transtorno deansiedade social, teve os seguintes pensamen-tos enquanto se preparava para participar deuma festa em seu bairro: “Não vou saber o quedizer... Todo mundo vai ver que estou nervo-so... Vou parecer um desajustado... Vou travare querer ir embora imediatamente”. As emo-ções e as respostas psicológicas estimuladas poressas cognições desadaptativas eram previsí-veis: ansiedade severa, tensão física e excita-ção autonômica. Ele começou a suar, sentia umfrio na barriga e ficou com a boca seca. Suaresposta comportamental também foi proble-mática. Em vez de enfrentar a situação e ten-tar adquirir habilidades para dominar as situa-ções sociais, ele telefonou para a pessoa que oconvidou e disse que estava gripado.

A evitação da situação temida reforçou opensamento negativo de Richard e tornou-separte de um ciclo vicioso de pensamentos,emoções e comportamento que aprofundou seuproblema com a ansiedade social. Cada vez quefazia uma manobra para fugir de situações so-ciais, suas crenças sobre ser incapaz e vulnerá-vel se fortaleciam. Essas cognições de medo,então, amplificaram seu desconforto emocio-nal e tornaram menos provável que se envol-vesse em atividades sociais. As cognições, emo-ções e atitudes de Richard estão esquemati-zadas na Figura 1.2.

Ao tratar problemas como os de Richard,os terapeutas cognitivo-comportamentais po-dem partir de uma série de métodos voltadospara todas as três áreas de funcionamento pa-tológico identificadas no modelo básico deTCC: cognições, emoções e comportamentos.Por exemplo, Richard poderia ser ensinado areconhecer e mudar seus pensamentos ansio-sos, a utilizar o relaxamento ou a geração deimagens mentais para reduzir as emoções an-siosas ou a implementar uma hierarquia gra-dual para romper o padrão de evitação e de-senvolver habilidades sociais.

FIGURA 1.1 • Modelo cognitivo-comportamentalbásico.

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Antes de descrever teorias e métodos daTCC mais detalhadamente, queremos explicarcomo o modelo descrito na Figura 1.1 é usadona prática clínica e como ele se relaciona comconceitos mais amplos da etiologia e do trata-mento de transtornos psiquiátricos. O modelobásico de TCC é um construto usado para aju-dar os terapeutas a conceitualizarem proble-mas clínicos e implementarem métodos da TCCespecíficos. Como um modelo de trabalho, eleé propositalmente simplificado para voltar aatenção do terapeuta para as relações entrepensamentos, emoções e comportamentos epara orientar as intervenções de tratamento.

Os terapeutas cognitivo-comportamentaistambém reconhecem que há interações com-plexas entre processos biológicos (p. ex., ge-nética, funcionamento de neurotransmissores,estrutura cerebral e sistemas neuroendócrinos),influências ambientais e interpessoais e ele-mentos cognitivo-comportamentais na gênesee no tratamento de transtornos psiquiátricos(Wright, 2004; Wright e Thase, 1992). O mode-lo da TCC pressupõe que as mudanças cogni-tivas e comportamentais são moduladas pormeio de processos biológicos e que as medica-ções psicotrópicas e outros tratamentos bioló-

gicos influenciam as cognições (Wright et al.,2003). Pesquisas recentes confirmam essesdados.

Em um estudo, a tomografia por emissãode pósitrons (PET) revelou achados semelhan-tes (de fluxo sangüíneo cerebral regional di-minuído em áreas do cérebro associadas à res-posta à ameaça) em pacientes que responde-ram ao citalopram ou à TCC para fobia social(Furmark et al., 2002). Em uma outra investi-gação, a normalização do metabolismo docórtex orbitofrontal nas imagens da PET foipositivamente associada ao grau de melhoraem pacientes com transtorno obsessivo-com-pulsivo tratados com métodos comportamen-tais ou fluoxetina (Schwartz et al., 1996). Umestudo dos efeitos biológicos da TCC para de-pressão encontrou ativação cortical antes daestimulação do sistema límbico (Goldapple etal., 2004). Esses achados sugerem que as inter-venções biológicas e cognitivas podem interagirno tratamento de transtornos psiquiátricos.

Pesquisas sobre farmacoterapia e psico-terapia combinadas corroboraram as idéias so-bre as influências biológicas na implementaçãodo modelo da TCC. O tratamento combinadode TCC e medicação pode melhorar a eficácia,especialmente para quadros mais graves, comodepressão crônica ou resistente ao tratamen-to, esquizofrenia e transtorno bipolar (Kelleret al., 2000; Lam et al., 2003; Rector e Beck,2001; Wright, 2004). No entanto, benzodiaze-pínicos de alta potência, como alprazolam, po-dem comprometer a eficácia da TCC (Marks etal., 1993).

Para direcionar o tratamento, é extrema-mente recomendada uma formulação minu-ciosamente integrada, e bastante detalhada,que inclua considerações cognitivo-comporta-mentais, biológicas, sociais e interpessoais. Mé-todos para desenvolver conceitualizações mul-tidimensionais de caso são discutidos e ilus-trados no Capítulo 3, “Avaliação e Formulação”.O restante deste capítulo é dedicado à intro-dução das teorias e dos métodos centrais daTCC.

FIGURA 1.2 • Modelo cognitivo-comportamentalbásico: exemplo de um paciente com fobia social.

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CONCEITOS BÁSICOS

Níveis de processamento cognitivo

Foram identificados três níveis básicos deprocessamento cognitivo por Beck e seus cole-gas (Beck et al., 1979; D. A. Clark et al., 1999;Dobson e Shaw, 1986). O nível mais alto dacognição é a consciência, um estado de aten-ção no qual decisões podem ser tomadas raci-onalmente. A atenção consciente nos permite:

1. monitorar e avaliar as interações com omeio ambiente;

2. ligar memórias passadas às experiênciaspresentes;

3. controlar e planejar ações futuras (Stern-berg, 1996).

Na TCC, os terapeutas incentivam o de-senvolvimento e a aplicação de processos cons-cientes adaptativos de pensamento, como opensamento racional e a solução de problemas.O terapeuta também dedica bastante esforçopara ajudar os pacientes a reconhecer e mu-dar o pensamento patológico em dois níveisde processamento de informações relativamen-te autônomo: pensamentos automáticos e esque-mas (Beck et al., 1979; D. A. Clark et al., 1999;Wright et al., 2003). Pensamentos automáticossão cognições que passam rapidamente pornossas mentes quando estamos em meio a si-tuações (ou relembrando acontecimentos).Embora possamos estar subliminarmente cons-cientes da presença de pensamentos automá-ticos, normalmente essas cognições não estãosujeitas à análise racional cuidadosa. Esquemassão crenças nucleares que agem como matri-zes ou regras subjacentes para o processamentode informações. Eles servem a uma funçãocrucial aos seres humanos, que lhes permiteselecionar, filtrar, codificar e atribuir significa-do às informações vindas do meio ambiente.

Ao contrário da terapia de orientação psi-codinâmica, a TCC não postula estruturas oudefesas específicas que bloqueiam os pensa-

mentos da consciência (D. A. Clark et al.,1999). Em vez disso, a TCC enfatiza técnicasdestinadas a ajudar os pacientes a detectar emodificar seus pensamentos profundos, espe-cialmente aqueles associados com sintomasemocionais, como depressão, ansiedade ou rai-va. A TCC ensina os pacientes a “pensar sobreo pensamento” para atingir a meta de trazeras cognições autônomas à atenção e ao con-trole conscientes.

Pensamentos automáticos

Um grande número dos pensamentos quetemos a cada dia faz parte de um fluxo deprocessamento cognitivo que se encontra logoabaixo da superfície da mente totalmente cons-ciente. Esses pensamentos automáticos normal-mente são privativos ou não-declarados, e ocor-rem de forma rápida à medida que avaliamoso significado de acontecimentos em nossas vi-das. D. A. Clark e colaboradores (1999) usa-ram o termo pré-consciente ao descrever os pen-samentos automáticos, pois essas cognições po-dem ser reconhecidas e entendidas se nossaatenção for voltada para eles. Pessoas comtranstornos psiquiátricos, como depressão ouansiedade, freqüentemente vivenciam inunda-ções de pensamentos automáticos que sãodesadaptativos ou distorcidos. Esses pensamen-tos podem gerar reações emocionais doloro-sas e comportamento disfuncional.

Um dos indícios mais importantes de queos pensamentos automáticos podem estar ocor-rendo é a presença de emoções fortes. A rela-ção entre eventos, pensamentos automáticos eemoções é ilustrada por um exemplo do trata-mento de Martha, uma mulher que apresenta-va depressão maior (Figura 1.3).

Nesse exemplo, os pensamentos automá-ticos de Martha demonstram o achado comumde cognições negativamente tendenciosas nadepressão. Embora estivesse deprimida e ten-do problemas com sua família e seu trabalho,ela estava funcionando, na verdade, muito

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melhor do que aparentavam os seus pensamen-tos automáticos excessivamente críticos. Umgrande número de pesquisas confirmou que aspessoas com depressão, transtornos de ansie-dade e outros quadros psiquiátricos têm umaalta freqüência de pensamentos automáticosdistorcidos (Blackburn et al., 1986; Haaga etal., 1991, 1986; Wright et al., 2003). Na de-pressão, os pensamentos automáticos muitasvezes se centram em temas de desesperança,baixa auto-estima e fracasso. As pessoas comtranstornos de ansiedade normalmente têmpensamentos automáticos que incluem previ-sões de perigo, prejuízo, falta de controle ouincapacidade de lidar com ameaças (D. A. Clarket al., 1990; Ingram e Kendall, 1987; Kendalle Hollon, 1989).

Todas as pessoas têm pensamentos auto-máticos; eles não ocorrem exclusivamente empessoas com depressão, ansiedade ou outrostranstornos emocionais. Ao reconhecer seuspróprios pensamentos automáticos e empre-gar outros processos cognitivo-comporta-mentais, os terapeutas podem aprimorar seuentendimento de conceitos básicos, aumentarsua empatia com os pacientes e aprofundar aconsciência de seus padrões cognitivos e com-portamentais que poderiam influenciar a rela-ção terapêutica.

Ao longo deste livro, sugerimos exercí-cios que acreditamos o ajudarão a aprender osprincípios centrais da TCC. A maioria dessesexercícios envolve praticar intervenções de TCCcom pacientes ou fazer role-play com um cole-ga, mas em alguns você será solicitado a exa-minar seus próprios pensamentos e sentimen-tos. O primeiro exercício é colocar no papelum exemplo de pensamentos automáticos. Ten-te fazer isso para uma situação de sua própriavida. Se um exemplo pessoal não lhe vier àmente, você pode usar uma vinheta de um pa-ciente que tenha entrevistado.

• Exercício 1.1Reconhecendo os pensamentos automáticos:Um registro de pensamento em três colunas

1. Desenhe três colunas em uma folha de papel eescreva em cada uma delas “situação”,“pensamentos automáticos” e “emoções”.

2. Agora, relembre uma situação recente (ou umalembrança de um evento) que pareceu mexercom suas emoções, como ansiedade, raiva,tristeza, tensão física ou alegria.

3. Tente se imaginar estando de volta na situa-ção, exatamente como aconteceu.

4. Quais foram os pensamentos automáticos queocorreram nessa situação? Escreva asituação, os pensamentos automáticos e as

FIGURA 1.3 • Pensamentos automáticos de Martha.

Emoções

Tristeza, raiva

Ansiedade

Tristeza, ansiedade

Pensamentos automáticos

“Fiz besteira de novo. Não tem jeito, nuncavou conseguir agradá-la. Não consigo fa-zer nada direito. O que adianta?”

“É muita coisa para mim. Não vou conseguirentregar a tempo. Não vou conseguir en-carar meu chefe. Vou perder meu empre-go e tudo o mais na minha vida.”

“Ele está realmente decepcionado comigo.Estou fracassando como esposa. Não gos-to de nada. Por que alguém iria querer es-tar perto de mim?”

Situação

Minha mãe telefona e pergunta porque eu esqueci o aniversário deminha irmã.

Pensando sobre um grande projetoa entregar no trabalho.

Meu marido se queixa de que estouirritada o tempo todo.

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emoções nas três colunas do registro depensamento.

Às vezes, os pensamentos automáticospodem ser logicamente verdadeiros e podemser uma percepção adequada da realidade dasituação. Por exemplo, poderia ser verdade queMartha estivesse em risco de perder seu empre-go ou que seu marido estivesse fazendo comen-tários críticos sobre seu comportamento. A TCCnão quer encobrir problemas reais. Se umapessoa estiver passando por dificuldades subs-tanciais, métodos cognitivos e comportamen-tais são usados para ajudá-la a enfrentar a si-tuação. Contudo, em pessoas com transtornospsiquiátricos, normalmente há oportunidadesexcelentes de apontar erros no raciocínio e ou-tras distorções cognitivas que podem ser mo-dificadas com as intervenções da TCC.

Erros cognitivos

Em suas formulações iniciais, Beck (1963,1964; Beck et al., 1979) teorizou que existemequívocos característicos na lógica dos pensa-mentos automáticos e outras cognições de pes-soas com transtornos emocionais. Pesquisassubseqüentes confirmaram a importância deerros cognitivos em estilos patológicos de pro-cessamento de informações. Por exemplo, fo-ram encontrados erros cognitivos muito maisfreqüentemente em pessoas deprimidas do queem indivíduos não-deprimidos (LeFebvre,1981; Watkins e Rush, 1983). Beck e colabo-radores (1979; D. A. Clark et al., 1999) des-creveram seis categorias principais de erroscognitivos: abstração seletiva, inferência arbi-trária, supergeneralização, maximização eminimização, personalização e pensamento ab-solutista (dicotômico ou do tipo “tudo-ou-nada”). A Tabela 1.1 traz definições e exem-plos de cada um desses erros cognitivos.

Como você provavelmente notará nosexemplos na Tabela 1.1, pode haver grandesuperposição entre os erros cognitivos. David,

a pessoa que estava utilizando pensamentoabsolutista, também estava ignorando as evi-dências de seus próprios pontos fortes eminimizando os problemas de seu amigo Fred.O homem que se tornou vítima da abstraçãoseletiva por não receber um cartão de boas-festas tinha outros erros cognitivos, como opensamento do tipo tudo-ou-nada (“ninguémse importa mais comigo”). Ao implementarmétodos de TCC para reduzir erros cognitivos,os terapeutas normalmente ensinam os paci-entes que o objetivo mais importante é sim-plesmente reconhecer que se está cometendoerros cognitivos – e não identificar todo e qual-quer erro de lógica que esteja ocorrendo.

Esquemas

Na teoria cognitivo-comportamental, osesquemas são definidos como matrizes ou re-gras fundamentais para o processamento deinformações que estão abaixo da camada maissuperficial dos pensamentos automáticos (D.A. Clark et al., 1999; Wright et al., 2003). Es-quemas são princípios duradouros de pensa-mento que começam a tomar forma no inícioda infância e são influenciados por uma infini-dade de experiências de vida, incluindo os ensi-namentos e o modelo dos pais, as atividadeseducativas formais e informais, as experiênciasde seus pares, os traumas e os sucessos.

Bowlby (1985) e outros observaram queos seres humanos precisam desenvolver esque-mas para lidar com as grandes quantidadesde informações com as quais se deparam acada dia e para tomar decisões oportunas eapropriadas. Por exemplo, se uma pessoa ti-ver uma regra básica de “sempre planejar comantecedência”, é improvável que ela passemuito tempo debatendo os méritos de entrarem uma nova situação sem prévia prepara-ção. Ao contrário, ela automaticamente come-çará a preparar o terreno para lidar com asituação.

Foi sugerido por D. A. Clark e colaborado-res (1999) que existem três grupos principaisde esquemas, conforme mostra a Tabela 1.2.

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1. Esquemas simplesDefinição: Regras sobre a natureza físicado ambiente, gerenciamento prático das

atividades cotidianas ou leis da naturezaque podem ter pouco ou nenhum efeitosobre a psicopatologia.

TABELA 1.1 • Erros cognitivos

Abstração seletiva (às vezes chamada de ignorar as evidências ou filtro mental)

Definição: Chega-se a uma conclusão depois de examinar apenas uma pequena porção das informaçõesdisponíveis. Os dados importantes são descartados ou ignorados, a fim de confirmar a visão tendenciosaque a pessoa tem da situação.

Exemplo: Um homem deprimido com baixa auto-estima não recebe um cartão de boas-festas de um velhoamigo. Ele pensa: “Estou perdendo todos os meus amigos; ninguém se importa mais comigo”. Ele ignoraas evidências de que recebeu cartões de vários outros amigos, que seu velho amigo tem lhe enviadocartões todos os anos nos últimos 15 anos, que seu amigo esteve muito ocupado no ano passado comuma mudança e um novo emprego e que ele ainda tem bons relacionamentos com outros amigos.

Inferência arbitrária

Definição: Chega-se a uma conclusão a partir de evidências contraditórias ou na ausência de evidências.

Exemplo: Uma mulher com medo de elevador é solicitada a prever as chances de um elevador cair com eladentro. Ela responde que as chances são de 10% ou mais de o elevador cair até o chão e ela se machu-car. Muitas pessoas tentaram convencê-la de que as chances de um acidente catastrófico com umelevador são desprezíveis.

Supergeneralização

Definição: Chega-se a uma conclusão sobre um acontecimento isolado e, então, a conclusão é estendida demaneira ilógica a amplas áreas do funcionamento.

Exemplo: Um universitário deprimido tira nota B em uma prova. Ele considera insatisfatório e supergene-raliza quando tem pensamentos automáticos como: “Estou com problemas nessa aula; estou ficandopara trás em todas as áreas da minha vida; não consigo fazer nada direito”.

Maximização e minimização

Definição: A relevância de um atributo, evento ou sensação é exagerada ou minimizada.

Exemplo: Uma mulher com transtorno de pânico começa a sentir tonturas durante o início de um ataque depânico. Ela pensa: “Vou desmaiar; posso ter um ataque cardíaco ou um derrame”.

Personalização

Definição: Eventos externos são relacionados a si próprio quando há pouco ou nenhum fundamento paraisso. Assume-se responsabilidade excessiva ou culpa por eventos negativos.

Exemplo: Houve um revés econômico e um negócio anteriormente de sucesso passa por dificuldades paracumprir o orçamento anual. Pensa-se em fazer demissões. Uma série de fatores levaram à crise noorçamento, mas um dos gerentes pensa: “É tudo culpa minha; eu deveria saber que isso iria acontecer eter feito alguma coisa; falhei com todos na empresa”.

Pensamento absolutista (dicotômico ou do tipo tudo-ou-nada)

Definição: Os julgamentos sobre si mesmo, as experiências pessoais ou com os outros são separados emduas categorias (por ex., totalmente mau ou totalmente bom, fracasso total ou sucesso, cheio de defeitosou completamente perfeito)

Exemplo: David, um homem com depressão, compara-se com Ted, um amigo que parece ter um bomcasamento e cujos filhos estão indo bem na escola. Embora o amigo seja muito feliz em sua casa, sua vidaestá longe do ideal. Ted tem problemas no trabalho, restrições financeiras e dores físicas, entre outrasdificuldades. David está se envolvendo em pensamento absolutista quando diz para si mesmo: “Tudo vaibem para Ted; para mim nada vai bem”.

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Exemplos: “Seja um motorista defensivo”;“uma boa educação é o que vale”; “abri-gue-se durante uma tempestade”.

2. Crenças e pressupostos intermediáriosDefinição: Regras condicionais como afir-mações do tipo se-então, que influenciama auto-estima e a regulação emocional.Exemplos: “Tenho de ser perfeito para seraceito”; “se eu não agradar aos outros otempo todo, então eles me rejeitarão”; “seeu trabalhar duro, conseguirei ter sucesso”.

3. Crenças nucleares sobre si mesmoDefinição: Regras globais e absolutas parainterpretar as informações ambientais re-lativas à auto-estima.Exemplos: “Não sou digna de amor”; “souburra”; “sou um fracasso”; “sou uma boaamiga”; “posso confiar nos outros”.

Em nossa prática clínica, normalmentenão tentamos explicar os diferentes níveis deesquemas (p. ex., pressupostos intermediáriosversus crenças nucleares) aos pacientes. Des-cobrimos que a maioria dos pacientes obtémmaior benefício ao reconhecer o conceito ge-ral de que esquemas ou crenças nucleares (uti-lizamos esses termos alternadamente) têm umaforte influência na auto-estima e no compor-tamento. Também ensinamos aos pacientes quetodas as pessoas têm uma mistura de esque-mas adaptativos (saudáveis) e crenças nuclea-res desadaptativas. Nosso objetivo é identifi-car e desenvolver os esquemas adaptativos eao mesmo tempo tentar modificar ou reduzir

a influência dos esquemas desadaptativos. ATabela 1.2 traz uma pequena lista de esque-mas adaptativos e desadaptativos.

O relacionamento entre esquemas e pen-samentos automáticos foi detalhado na hipó-tese diátese-estresse. Beck e outros sugeriramque, na depressão e em outros quadros, esque-mas desadaptativos podem permanecer ador-mecidos até que um evento estressante da vidaocorra e ative a crença nuclear (Beck et al.,1979; D. A. Clark et al., 1999; Miranda, 1992).O esquema desadaptativo é então fortalecidoao ponto no qual estimula e impulsiona o flu-xo mais superficial de pensamentos automáti-cos negativos. Esse fenômeno é ilustrado atra-vés do tratamento de Mark, um homem demeia-idade que ficou deprimido depois de serdemitido de seu emprego.

Mark não estava deprimido antes de per-der seu emprego, mas começou a ter muitasdúvidas sobre si mesmo depois de ter dificul-dades em encontrar outro trabalho. QuandoMark olhava a seção de empregos do jornallocal, era invadido por pensamentos automá-ticos como: “Eles não vão me querer”; “nuncavou conseguir um emprego tão bom quanto oúltimo”; “mesmo se conseguir uma entrevista,vou travar e não vou saber o que dizer”. De-pois de iniciar a TCC, o terapeuta pôde ajudarMark a trazer à tona vários esquemas profun-damente arraigados sobre competência, osquais pairavam sob a superfície por muitosanos. Um deles era “nunca sou suficientemen-te bom”, uma crença nuclear que esteve inerte

TABELA 1.2 • Esquemas adaptativos e desadaptativos

Esquemas adaptativos Esquemas desadaptativos

Não importa o que aconteça, consigo lidar Se decidir fazer alguma coisa, tenhode alguma forma. de ter sucesso.

Se eu trabalhar com alguma coisa, posso fazê-lo bem. Sou burro.Sou um sobrevivente. Sou uma farsa.Os outros podem confiar em mim. Nunca me sinto confortável com os outros.Sou digno de amor. Sem um homem (mulher), não sou ninguém.As pessoas me respeitam. Tenho de ser perfeito para ser aceito.Se me preparar antes, normalmente faço melhor. Não importa o que eu faça, não vou ter sucesso.Pouca coisa me assusta. O mundo é assustador demais para mim.

Nota: Adaptado de Wright et al., 2003.

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em tempos melhores, mas que agora estimula-va uma cascata de pensamentos automáticosnegativos toda vez que tentava encontrar umemprego.

Processamento de informações nadepressão e em transtornos de ansiedade

Além das teorias e dos métodos de pensa-mentos automáticos, dos esquemas e dos erroscognitivos, várias outras contribuições importan-tes influenciaram o desenvolvimento de inter-venções de tratamento cognitivamente orienta-das. Descrevemos rapidamente alguns desses re-sultados de pesquisas sobre depressão e trans-tornos de ansiedade para dar uma base teóricaampla para os métodos de tratamento detalha-dos nos capítulos posteriores. As principais ca-racterísticas do processamento de informaçõespatológico na depressão e em transtornos deansiedade estão resumidas na Tabela 1.3.

A ligação entre desesperança e suicídio

Um dos achados clínicos mais relevantesprovenientes de pesquisas sobre depressão é aassociação entre desesperança e suicídio. Vá-

rios estudos demonstraram que pessoas depri-midas têm probabilidade de ter altos graus dedesesperança, e que a falta de esperança au-menta o risco de suicídio (Beck et al., 1975,1985, 1990; Fawcett et al., 1987). Descobriu-se que a desesperança é o fator preditivo maisimportante de suicídio em pacientes deprimi-dos internados que foram acompanhados pordez anos após a alta médica (Beck et al.,1985). Achados semelhantes foram descritosem um estudo relacionado com pacientesambulatoriais (Beck et al., 1990). Recente-mente, Brown e colaboradores (2005) de-monstraram que uma intervenção cognitivo-comportamental, incluindo a tarefa de escre-ver um plano de ação anti-suicídio, reduz orisco de suicídio.

Estilo atributivo na depressão

Abramson e colaboradores (1978), alémde outros, propuseram que as pessoas deprimi-das colocam significados (atribuições) aoseventos da vida que são negativamente distorci-dos em três domínios:

1. Interno versus externo. A depressão é as-sociada a uma tendência de fazer atribui-

TABELA 1.3 • Processamento de informações patológico na depressão e nos transtornos de ansiedade

Predominante nos transtornos Comum à depressão e aos

Predominante na depressão de ansiedade transtornos de ansiedade

Processamento automático deinformações aumentado

Esquemas desadaptativosMaior freqüência de erros

cognitivosCapacidade cognitiva reduzida

para solução de problemasMaior atenção a si mesmo,

especialmente déficits ouproblemas

Medo de ferir-se ou de perigoMaior atenção a informações

sobre ameaças em potencialSuperestimações de risco nas

situaçõesPensamentos automáticos

associados a perigo, risco, faltade controle, incapacidade

Subestimações da capacidade deenfrentar as situações temidas

Interpretações errôneas dosestímulos corporais

DesesperançaBaixa auto-estimaVisão negativa do ambientePensamentos automáticos com

temas negativosAtribuições errôneasSuperestimações de feedback

negativoDesempenho comprometido

nas tarefas cognitivasque requeiram esforço oupensamento abstrato

Fonte: Adaptado de Wright et al., 2003.

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ções aos eventos da vida que são envie-sadas em sua própria direção interna. As-sim, indivíduos deprimidos comumenteassumem culpa excessiva pelos eventosnegativos. Por sua vez, pessoas não-depri-midas têm maior probabilidade de veracontecimentos nocivos como provenien-tes de fontes externas, como má sorte, des-tino ou as atitudes dos outros.

2. Global versus específico. Em vez de ver oseventos negativos somente com uma rele-vância isolada ou limitada, pessoas comdepressão podem concluir que essas ocor-rências têm implicações de longo alcance,globais ou totalmente abrangentes. Pes-soas que não são deprimidas têm uma ca-pacidade melhor de isolar eventos negati-vos e evitar que tenham um efeito exten-sivo sobre a auto-estima e as respostascomportamentais.

3. Fixo versus mutável. Na depressão, situa-ções negativas ou problemáticas são vis-tas como imutáveis e improváveis de me-lhorar no futuro. Um estilo mais saudávelde pensamento é observado em pessoasnão-deprimidas, que acreditam, mais fre-qüentemente, que as condições ou circuns-tâncias negativas regridirão com o tempo(p. ex., “isso vai passar”).

As pesquisas sobre os estilos atributivosna depressão têm sido criticadas, porque osprimeiros estudos foram realizados com estu-dantes e populações não-clínicas. Outras pes-quisas realizadas com pacientes cuidadosamen-te diagnosticados com depressão também pro-duziram resultados inconsistentes (Wright etal., 2003). No entanto, o peso das evidênciasdá suporte ao conceito de que as atribuiçõespodem ser distorcidas na depressão e que osmétodos de TCC podem ser úteis para reverteresse tipo de processamento cognitivo tenden-cioso. Em nosso trabalho clínico, descobrimosque muitos pacientes deprimidos conseguemassimilar prontamente o conceito de que seuestilo de pensamento está tendencioso na di-reção de atribuições internas, globais e fixas.

Distorções na resposta ao feedback

Uma série de pesquisas sobre como aspessoas respondem ao feedback revelou dife-renças entre pessoas deprimidas e não-depri-midas, as quais têm implicações significativaspara a terapia. Descobriu-se que indivíduos de-primidos subestimam a quantidade de feedbackpositivo recebido e despendem menor esforçoàs tarefas depois de lhe dizerem que seu de-sempenho é ruim (D. A. Clark et al., 1999;DeMonbreun e Craighead, 1977; Klein et al.,1976; Loeb et al., 1971; Wenzlaff e Grozier,1988). Indivíduos não-deprimidos apresentampadrões que podem indicar um viés positivo queserve a si mesmos – eles podem ouvir feedbackmais positivo do que aquele realmente dadoou minimizar a relevância de feedback negati-vo (Alloy e Ahrens, 1987; Rizley, 1978).

Como um dos objetivos da TCC é ajudaros pacientes a desenvolverem um estilo acu-rado e racional de processamento de informa-ções, o terapeuta precisa reconhecer e abordarpossíveis distorções de feedback. Um dos prin-cipais métodos para fazer isso – dar e solicitarfeedback detalhado em sessões de terapia – édescrito nos Capítulos 2 e 4. Estas técnicas uti-lizam a experiência da terapia como uma opor-tunidade para aprender a ouvir, reagir e darfeedback de maneira apropriada.

Estilo de pensamento emtranstornos de ansiedade

Pessoas que apresentam transtornos deansiedade demonstraram ter vários vieses ca-racterísticos no processamento de informações.Uma dessas áreas de disfunção é um nível ele-vado de atenção a informações no ambientesobre ameaças em potencial (Matthews eMacLeod, 1987). Por exemplo, a mulher comfobia de elevador, descrita na Tabela 1.1, podeouvir um rangido ou outros sons em um eleva-dor que a deixam preocupada com sua seguran-ça. Uma pessoa que não tenha esse medo pro-vavelmente prestará menos ou nenhuma aten-

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ção a esses estímulos. Pessoas com transtor-nos de ansiedade também, comumente, vêemos ativadores de seu medo como sendo perigo-sos de maneira não-realista ou com potencialpara feri-las (Fitzgerald e Phillips, 1991). Mui-tos indivíduos com transtorno de pânico têmmedo de que os ataques de pânico – ou as situa-ções que os induzem – possam causar danoscatastróficos, talvez até mesmo ataque cardía-co, derrame e morte.

Outros estudos de processamento de in-formações demonstraram que pacientes comtranstornos de ansiedade freqüentemente fa-zem uma estimativa reduzida de sua capaci-dade de enfrentar ou lidar com as situaçõescarregadas de medo, têm sensação de falta decontrole e alta freqüência de auto-afirmaçõesnegativas, interpretações errôneas dos estímu-los corporais e estimativas exageradas do ris-co de calamidades futuras (Glass e Furlong,1990; Ingram e Kendall, 1987; McNally e Foa,1987; Wright et al., 2003). Ter consciência des-ses diferentes tipos de processamento tenden-cioso de informações pode ajudar os terapeutasa planejarem e implementarem o tratamentopara transtornos de ansiedade.

Aprendizagem, memóriae capacidade cognitiva

A depressão geralmente é associada acomprometimentos substanciais na capacida-de de se concentrar e no desempenho das fun-ções de aprendizagem e memória, que exigemesforço ou abstração (Weingartner et al.,1981). Também foram observadas reduções nacapacidade de resolver problemas e no desem-penho de tarefas tanto na depressão como nostranstornos de ansiedade (D. A. Clark et al.,1990; Ingram e Kendall, 1987). Na TCC, essesdéficits de desempenho cognitivo são aborda-dos com intervenções específicas (p. ex.,estruturação, métodos psicoeducativos e en-saio) destinadas a melhorar a aprendizagem eauxiliar os pacientes a aprimorar suas habili-dades de solução de problemas (ver Capítulo4, “Estruturação e educação”).

VISÃO GERAL DOS MÉTODOS DE TERAPIA

Quando começam a aprender a TCC, osterapeutas às vezes cometem o erro de ver essaabordagem como apenas um conjunto de téc-nicas ou intervenções. Assim, eles passam ra-pidamente por alguns dos ingredientes maisimportantes da TCC e partem diretamente paraa implementação de técnicas, como o registrode pensamentos, a programação de atividadesou a dessensibilização. É fácil cair nessa arma-dilha, já que a TCC é conhecida por suas in-tervenções eficazes e pelo fato de os pacientesgeralmente gostarem de se envolver em exer-cícios específicos. Mas, se você se focar pre-maturamente ou muito fortemente na imple-mentação das técnicas, perderá a essência daTCC.

Antes de escolher e aplicar técnicas, é pre-ciso desenvolver uma conceitualização indivi-dualizada que conecte diretamente as teoriascognitivo-comportamentais à estrutura psico-lógica única do paciente e sua constelação deproblemas (ver Capítulo 3, “Avaliação e formu-lação”). A conceitualização de caso é um guiaessencial para o trabalho dos terapeutas cog-nitivo-comportamentais. Outras característicascentrais da TCC incluem um relacionamentoterapêutico altamente colaborativo, aplicaçãohábil de métodos de questionamento socráticoe estruturação e psicoeducação eficazes (con-forme Tabela 1.4). Este livro destina-se a ajudá-lo a adquirir as habilidades gerais cruciais naTCC, além de aprender intervenções específi-cas para quadros psiquiátricos comuns. Comointrodução às descrições detalhadas em capí-tulos posteriores, fornecemos aqui uma brevevisão geral dos métodos de tratamento.

Duração e foco da terapia

A TCC é uma terapia voltada para o pro-blema geralmente aplicada em um formato decurto prazo. O tratamento para depressão outranstornos de ansiedade descomplicados nor-malmente dura de 5 a 20 sessões. Entretanto,cursos mais longos de TCC podem ser neces-

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torno de pânico (Newman et al., 1997). Umoutro formato para sessões abreviadas de tera-pia às vezes é usado por psiquiatras experien-tes em TCC. São empregadas sessões curtascom medicações e auxiliares de tratamento,como a terapia assistida por computador e li-vros de auto-ajuda, como alternativa à tradicio-nal “hora de 50 minutos”.

A TCC concentra-se primordialmente noaqui-e-agora. No entanto, é essencial ter umaperspectiva longitudinal – incluindo a consi-deração do desenvolvimento na primeira in-fância, histórico familiar, traumas, experiênciasevolutivas positivas e negativas, educação, his-tória de trabalho e influências sociais – paraentender completamente o paciente e planejaro tratamento. É enfatizada uma abordagem vol-tada para o problema porque a atenção às ques-tões atuais ajuda a estimular o desenvolvimentode planos de ação para combater sintomas co-mo desesperança, desamparo, evitação e pro-crastinação. Além disso, as respostas cognitivase comportamentais a eventos recentes são maisacessíveis e verificáveis do que as reações aocorrências no passado distante. Um benefícioadicional de trabalhar primordialmente no fun-cionamento atual é uma redução da dependên-cia e da regressão no relacionamento terapêu-tico (Wright et al., 2003).

Conceitualização de caso

Quando estamos em sessões de TCC e fa-zemos um bom trabalho, sentimos que a con-ceitualização do caso norteia diretamente cada

sários se houver condições co-mórbidas ou seo paciente possuir sintomas crônicos ou resis-tentes a tratamento. A TCC para transtornosde personalidade, psicoses ou transtorno bipo-lar pode precisar ser estendida para além das20 sessões. Além disso, pacientes com doen-ças crônicas ou recorrentes podem se benefi-ciar com um desenho de terapia no qual a maiorparte da TCC é mais pesada nos primeirosmeses de tratamento (i.e., com visitas sema-nais), mas depois o terapeuta continua a aten-der o paciente em sessões de reforço intermi-tentes por períodos mais longos. Psiquiatras ex-perientes nesse método podem usar a TCC emcombinação com farmacoterapia em sessõescurtas durante a fase de manutenção de de-pressão recorrente, transtorno bipolar ou ou-tras doenças crônicas.

A TCC normalmente é aplicada em ses-sões de 45 a 50 minutos. Mas sessões mais lon-gas têm sido implementadas com sucesso parao rápido tratamento de pacientes com trans-tornos de ansiedade (Öst et al., 2001). Sessõesde menos de 50 minutos normalmente são re-comendadas para pacientes internados, pessoascom psicose e outros com sintomas graves queinterferem substancialmente na concentração(Kingdon e Turkington, 2004; Stuart et al.,1997; Wright et al., 1992). Além disso, comoserá detalhado no Capítulo 4, sessões curtasde 25 minutos provaram ser eficazes para otratamento de depressão se combinadas comum programa auxiliar via computador (Wrightet al., 2005). Uma forma breve de TCC aplica-da em combinação com um programa de com-putador foi descrita para o tratamento de trans-

TABELA 1.4 • Métodos principais de Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC)

Foco voltado para o problemaConceitualização de caso individualizadaRelacionamento terapêutico empírico colaborativoQuestionamento socráticoUso de estruturação, psicoeducação e ensaio para melhorar a aprendizagemEvocação e modificação de pensamentos automáticosDescoberta e modificação de esquemasMétodos comportamentais para reverter padrões de desamparo, comportamento autodestrutivo e evitaçãoDesenvolvimento de habilidades de TCC para ajudar a evitar a recaída

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pergunta, cada resposta não-verbal, cada in-tervenção e o conjunto de ajustes que fazemosno estilo terapêutico para aprimorar a comu-nicação com o paciente. Em outras palavras,temos uma estratégia cuidadosamente pensa-da e não fazemos terapia pela nossa cabeça,jogando com um conjunto de técnicas. Paraaprender a se tornar um terapeuta cognitivo-comportamental eficaz, é preciso praticar e de-senvolver formulações que reúnam informa-ções da avaliação diagnóstica, das observaçõessobre o histórico específico do paciente e dateoria cognitivo-comportamental em um pla-no de tratamento detalhado. Os métodos deconceitualização de caso são abordados no Ca-pítulo 3.

Relação terapêutica

Várias das características das relações te-rapêuticas adequadas são compartilhadas en-tre a TCC, a terapia psicodinâmica, as terapiasnão-dirigidas e outras formas comuns de psi-coterapia. Esses atributos incluem compreen-são, gentileza e empatia. Como todos os bonsterapeutas, os terapeutas da TCC também de-vem ter a capacidade de gerar confiança e de-monstrar serenidade quando sob pressão.Mas, em comparação com outras terapias co-nhecidas, a relação terapêutica na TCC se di-fere por ser orientada para um alto grau decolaboração, por seu foco fortemente empíricoe pelo uso de intervenções direcionadas para aação.

Beck e colaboradores (1979) utilizam otermo empirismo colaborativo para descrever arelação terapêutica na TCC. Eles trabalham jun-tos como uma equipe investigativa, desenvol-vendo hipóteses sobre a acurácia ou o valor deenfrentamento de uma série de cognições ecomportamentos. Eles então colaboram no de-senvolvimento de um estilo mais saudável depensamento e de habilidades de enfrentamentoe na reversão de padrões improdutivos de com-portamento. Os terapeutas cognitivo-comporta-mentais são normalmente mais ativos do queos terapeutas de outras formas de terapia. Eles

ajudam a estruturar as sessões, dão feedback eorientam os pacientes sobre como usar os mé-todos da TCC.

Os pacientes também são incentivados aassumir responsabilidade na relação terapêu-tica. Eles são solicitados a dar feedback aoterapeuta, a ajudar a estabelecer a programa-ção para as sessões de terapia e a trabalharna prática das intervenções da TCC em situa-ções da vida cotidiana. De modo geral, a rela-ção terapêutica na TCC se caracteriza pelaabertura na comunicação e por uma aborda-gem focada para o trabalho, pragmática e vol-tada para o senso de equipe no manejo dosproblemas.

Questionamento socrático

O estilo de questionamento usado na TCCbaseia-se em uma relação empírica colaborativae tem o objetivo de ajudar os pacientes a reco-nhecerem e modificarem o pensamento desa-daptativo. O questionamento socrático consisteem fazer perguntas ao paciente que estimu-lem a curiosidade e o desejo de inquirir. Emvez de uma apresentação didática dos concei-tos da terapia, o terapeuta tenta fazer com queo paciente se envolva no processo de aprendi-zagem. Uma forma especial de questionamentosocrático é a descoberta guiada, por meio daqual o terapeuta faz uma série de perguntasindutivas para revelar padrões disfuncionais depensamento ou comportamento.

Estruturação e psicoeducação

A TCC utiliza métodos de estruturação,como o estabelecimento de agenda e feedback,para maximizar a eficiência das sessões de tra-tamento, ajudar os pacientes a organizar seusesforços em direção à recuperação e intensifi-car o aprendizado. A agenda da sessão é feitade forma a dar um direcionamento claro à ses-são e permitir a mensuração do progresso. Porexemplo, itens bem-articulados da agenda po-dem ser “desenvolver um plano para voltar aotrabalho”, “reduzir a tensão no relacionamen-

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to com meu filho” ou “encontrar maneiras desuperar o divórcio”.

Durante a sessão, o terapeuta orienta opaciente no uso da agenda para explorar pro-dutivamente tópicos importantes e tenta evi-tar digressões que têm pouca chance de aju-dar a atingir os objetivos do tratamento. Con-tudo, os terapeutas têm bastante espaço paradesviar-se da agenda se novos tópicos ou idéiasimportantes forem identificados ou se o fatode permanecer na agenda atual não estiverproduzindo os resultados desejados. Tanto opaciente quanto o terapeuta dão e recebemfeedback para confirmar a compreensão e paramoldar o direcionamento da sessão.

São utilizados vários métodos psicoedu-cativos na TCC. As experiências de ensino nassessões normalmente envolvem usar situaçõesda vida do paciente para ilustrar os concei-tos. Comumente, o terapeuta dá breves expli-cações e as acompanha com perguntas que pro-movam o envolvimento do paciente no proces-so de aprendizagem. Várias ferramentas estãodisponíveis para auxiliar os terapeutas a pro-mover a psicoeducação. Alguns exemplos sãoa leitura de livros de auto-ajuda, apostilas,questionários de avaliação e programas decomputador. O Capítulo 4, “Estruturação eeducação”, traz uma descrição completa des-sas ferramentas.

Reestruturação cognitiva

Uma grande parte da TCC é dedicada aajudar o paciente a reconhecer e modificar es-quemas e pensamentos automáticos desadap-tativos. O método mais freqüentemente usadoé o questionamento socrático. Registros de pen-samento também são bastante utilizados naTCC. Identificar pensamentos automáticos soba forma escrita pode, muitas vezes, incitar umestilo mais racional de pensamento.

Outros métodos comumente usados in-cluem identificar erros cognitivos, examinar asevidências (análise pró e contra), reatribuição(modificar o estilo atributivo), listar alternati-vas racionais e ensaio cognitivo. Esta última

técnica consiste em praticar uma nova manei-ra de pensar por meio da geração de imagensmentais ou role-play. Isso pode ser feito em ses-sões durante o tratamento com a ajuda doterapeuta. Ou, depois de ganhar experiênciano uso de métodos de ensaio, o paciente podeter como tarefa praticar sozinho em casa.

A estratégia geral de reestruturação cogni-tiva é identificar pensamentos automáticos eesquemas nas sessões de terapia, ensinar habi-lidades para mudar cognições e, depois, fazeros pacientes realizarem uma série de exercí-cios intersessões planejados para expandir osaprendizados da terapia às situações do mun-do real. Normalmente, é necessária a práticarepetitiva até que os pacientes possam modifi-car prontamente cognições desadaptativas ar-raigadas.

Métodos comportamentais

O modelo de TCC enfatiza que a relaçãoentre cognição e comportamento é uma viade duas mãos. As intervenções cognitivas des-critas acima, se implementadas com sucesso,têm probabilidade de ter efeitos salutares nocomportamento. Da mesma forma, mudançaspositivas no comportamento normalmenteestão associadas a uma melhor perspectivacognitiva.

A maioria das técnicas comportamentaisusadas na TCC destina-se a ajudar as pessoas a:

1. romper padrões de evitação ou desespe-rança;

2. enfrentar gradativamente situações temi-das;

3. desenvolver habilidades de enfrentamento;4. reduzir emoções dolorosas ou excitação

autônomica.

No Capítulo 6, “Métodos comporta-mentais I: melhorando a energia, concluindotarefas e solucionando problemas”, e no Capí-tulo 7, “Métodos comportamentais II: reduzin-do a ansiedade e quebrando padrões de evita-ção”, detalhamos métodos comportamentais

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eficazes para a depressão e os transtornos deansiedade. Algumas das intervenções mais im-portantes que você aprenderá são ativaçãocomportamental, exposição hierárquica (des-sensibilização sistemática), prescrição gradualde tarefas, programação de atividades e even-tos prazerosos, treinamento de respiração etreinamento de relaxamento. Essas técnicas po-dem servir como ferramentas poderosas paraajudar a reduzir sintomas e promover mudan-ças positivas.

Desenvolvimento de habilidades de TCCpara ajudar a prevenir a recaída

Uma das vantagens da abordagem da TCCé a aquisição de habilidades que podem redu-zir o risco de recaída. Aprender como reconhe-cer e mudar pensamentos automáticos, utili-zar métodos comportamentais comuns e im-plementar as outras intervenções descritas an-teriormente neste capítulo podem ajudar os pa-cientes a lidar futuramente com ativadores dossintomas. Por exemplo, uma pessoa que apren-de a reconhecer erros cognitivos nos pensamen-tos automáticos pode ser mais capaz de evitaro pensamento catastrófico em situações estres-santes com as quais poderá se deparar após otérmino da terapia. Durante as fases finais daTCC, em geral o terapeuta se concentra espe-cificamente na prevenção da recaída ao aju-dar o paciente a identificar problemas em po-tencial, os quais têm uma alta probabilidadede causar dificuldades. Depois, são utilizadastécnicas de treinamento para praticar manei-ras eficazes de enfrentamento.

Para ilustrar a abordagem da TCC à pre-venção da recaída, pense no caso de uma pes-soa que está recebendo alta de uma unidadehospitalar após uma tentativa de suicídio. Em-bora o indivíduo possa estar bem melhor e nãoesteja apresentando ideação suicida, um bomplano de tratamento cognitivo-comportamentalincluiria a discussão dos possíveis desafios deretornar para casa e ao trabalho, seguido deorientação sobre as maneiras de lidar com es-ses desafios. É provável que a TCC com esse

paciente também inclua o desenvolvimento deum plano específico anti-suicida.

RESUMO

A TCC é uma das formas mais amplamen-te praticadas de psicoterapia para transtornospsiquiátricos. Essa abordagem de tratamentose baseia em preceitos sobre a função da cog-nição no controle da emoção e dos comporta-mento humanos, os quais foram traçados atra-vés de escritos de filósofos desde a Antigüida-de até os dias de hoje. Os construtos que defi-nem a TCC foram desenvolvidos por Aaron T.Beck e outros psiquiatras e psicólogos influen-tes, a partir dos anos de 1960. A TCC distin-gue-se por uma grande quantidade de pesqui-sas que examinaram suas teorias básicas e de-monstraram a eficácia do tratamento.

O processo de aprendizagem para se tor-nar um terapeuta cognitivo-comportamentalqualificado envolve estudar as teorias e os mé-todos básicos, examinar exemplos de interven-ções de TCC e praticar essa abordagem de tra-tamento com pacientes. Neste capítulo, intro-duzimos os conceitos centrais da TCC, como omodelo cognitivo-comportamental, a importân-cia de reconhecer e modificar pensamentos au-tomáticos, a influência dos esquemas no proces-samento de informações e na psicopatologia ea função-chave dos princípios comportamentaisno planejamento das intervenções de tratamen-to. Os capítulos seguintes trazem explicações de-talhadas e ilustrações a respeito de como colo-car os princípios básicos da TCC em prática.

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