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Trabalho Inscrito na Categoria de Artigo Completo ISBN: 978-85-68242-94-0 840 EIXO TEMÁTICO: ( ) Acessibilidade e Mobilidade Urbana ( ) Bacias Hidrográficas, Planejamento e Gestão dos Recursos Hídricos ( ) Biodiversidade e Unidades de Conservação ( ) Campo, Agronegócio e as Práticas Sustentáveis ( x ) Cidade, Arquitetura e Sustentabilidade ( ) Educação Ambiental ( ) Gestão dos Resíduos Sólidos ( ) Gestão e Preservação do Patrimônio Arquitetônico, Cultural e Paisagístico ( ) Novas Tecnologias Sustentáveis ( ) Planejamento da Paisagem ( ) Saúde, Saneamento e Ambiente Princípios para uma arquitetura contemporânea: A relação arquitetura, homem e natureza Principles for contemporary architecture: The relation architecture, man and nature Principios para una arquitectura contemporanea: La relación arquitectura, hombre y naturaleza Patricia Daniela Debastiani Arquiteta e Urbanista, UNOESC, Brasil [email protected] Patrícia Dalmina de Oliveira Professora Mestra, UCEFF, UNOESC, Brasil. [email protected] Franciele Rohr Mestranda UFSM, Professora UCEFF, Brasil. [email protected]

Princípios para uma arquitetura contemporânea: A relação

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EIXO TEMÁTICO: ( ) Acessibilidade e Mobilidade Urbana ( ) Bacias Hidrográficas, Planejamento e Gestão dos Recursos Hídricos ( ) Biodiversidade e Unidades de Conservação ( ) Campo, Agronegócio e as Práticas Sustentáveis ( x ) Cidade, Arquitetura e Sustentabilidade ( ) Educação Ambiental ( ) Gestão dos Resíduos Sólidos ( ) Gestão e Preservação do Patrimônio Arquitetônico, Cultural e Paisagístico ( ) Novas Tecnologias Sustentáveis ( ) Planejamento da Paisagem ( ) Saúde, Saneamento e Ambiente

Princípios para uma arquitetura contemporânea: A relação arquitetura, homem e natureza

Principles for contemporary architecture: The relation architecture, man and nature

Principios para una arquitectura contemporanea:

La relación arquitectura, hombre y naturaleza

Patricia Daniela Debastiani Arquiteta e Urbanista, UNOESC, Brasil

[email protected]

Patrícia Dalmina de Oliveira

Professora Mestra, UCEFF, UNOESC, Brasil. [email protected]

Franciele Rohr

Mestranda UFSM, Professora UCEFF, Brasil. [email protected]

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RESUMO Com a expansão das cidades houveram modificações na rotina e na qualidade de vida dos seres humanos, ao passo que ocorreu a desconexão natural da Arquitetura/Homem/Natureza, ao passo que surgiram diversas técnicas construtivas insustentáveis que, como consequência levaram a maior degradação ambiental. Atualmente, tornou-se necessário restabelecer o equilíbrio ambiental e, para isso surgem os princípios ecológicos que promovem a arquitetura de baixo impacto ambiental. A percepção ambiental do espaço afeta o comportamento humano, assim, considerar a percepção do espaço relacionada aos cinco sentidos humanos, promove uma arquitetura que possibilita experiências ao indivíduo, sendo portanto, algo a ser sentido. O presente artigo discorre sobre os princípios para uma arquitetura contemporânea mais humanista, relacionando-a com a percepção do espaço e a arquitetura ecológica, entendendo a relação existente entre arquitetura, natureza e ser humano. Para isso, o artigo estrutura-se de forma qualitativa exploratória, revisando os conceitos embasados em autores chaves. PALAVRAS-CHAVE: Arquitetura e natureza. Arquitetura e os sentidos. Percepção do espaço.

ABSTRACT With the expansion of cities there were modifications in the routine and the quality of life of human beings, while the natural disconnection of Architecture / Man / Nature occurred, while several unsustainable construction techniques emerged which, as a consequence, led to greater environmental degradation. Nowadays, it has become necessary to reestablish the environmental balance, and for this the ecological principles that promote the architecture of low environmental impact arise. The environmental perception of space affects human behavior, thus, considering the perception of space related to the five human senses, promotes an architecture that allows experiences to the individual, and therefore, something to be felt. This article discusses the principles for a more humanistic contemporary architecture, relating it to the perception of space and ecological architecture, understanding the relationship between architecture, nature and human being. For this, the article is structured in an exploratory qualitative way, revising the concepts based on key authors.

KEY WORDS: Architecture and nature. Architecture and the senses. Perception of space. RESUMEN

Con la expansión de las ciudades hubo cambios en la rutina y la calidad de vida de los seres humanos, mientras que ocurrió la desconexión natural de la Arquitectura / Hombre / Naturaleza, mientras que surgieron diversas técnicas constructivas insostenibles que, como consecuencia llevaron a la mayor degradación ambiental. Actualmente, se ha vuelto necesario restablecer el equilibrio ambiental y, para ello surgen los principios ecológicos que promueven la arquitectura de bajo impacto ambiental. La percepción ambiental del espacio afecta el comportamiento humano, así, considerar la percepción del espacio relacionada a los cinco sentidos humanos, promueve una arquitectura que posibilita experiencias al individuo, siendo por lo tanto algo que se siente. El presente artículo discurre sobre los principios para una arquitectura contemporánea más humanista, relacionándola con la percepción del espacio y la arquitectura ecológica, entendiendo la relación existente entre arquitectura, naturaleza y ser humano. Para ello, el artículo se estructura de forma cualitativa exploratoria, revisando los conceptos basados en autores claves. PALABRAS CLAVE: Arquitectura y naturaleza. Arquitectura y los sentidos. Percepción del espacio.

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INTRODUÇÃO

O presente artigo tem como objetivo discorrer a relação existente entre homem e natureza, a

partir da atuação da arquitetura ecológica e sensorial no desenvolvimento comportamental

humano. Especificamente, busca-se uma reflexão sobre o papel da arquitetura como eixo de

equilíbrio para a existência da vida humana e natural. A pesquisa consiste em uma revisão

bibliográfica discutida a partir de autores bases dos respectivos assuntos: Richard Louv,

entendimento da relação natureza/ser humano; Juliana Duarte Neves e Juhani Pallasmaa,

arquitetura para os sentidos; Jun Okamoto, comportamento humano e percepção do espaço.

Este estudo é inspirado pelo repensar da arquitetura ao que diz respeito a relação das pessoas

com os espaços, e vice-versa, ressaltando o viver na arquitetura. Ao mesmo tempo em que a

arquitetura é desconhecida pelas pessoas, o mesmo ocorre inversamente, a arquitetura

desconhece as pessoas, fenômeno este que já era mencionado por Zevi (2009), no livro Saber

ver Arquitetura, onde o autor discorre sobre a ignorância da arquitetura, fato que revela o

desconhecimento tanto por parte da sociedade como pelos próprios arquitetos o que é a

arquitetura.

Atualmente, conforme Okamoto (2002, p.12) “cria-se a obra em si, esquecendo-se de expressar

o mundo interior do usuário”, assim sustenta-se o repensar sobre a arquitetura. Entende-se que

explorar diferentes princípios da arquitetura, permite com que se expanda o campo perceptivo

desta, inspirando uma nova perspectiva que ressignifica a arte de ser a arquitetura.

Contribuindo, indiferente do período temporal em que a obra é projetada, a arquitetura vai além

do edificável, pois, influencia a percepção do indivíduo em relação ao espaço que se encontra

(ZEVI, 2009). Segundo Montaner (2007, p.27) “uma obra é, ao mesmo tempo, uma criatura viva

e algo a ser vivido; uma peça que cada geração verá e interpretará de maneiras distintas”. Assim,

entende-se a importância da arquitetura no papel ambiental e sociocultural, pois esta sensibiliza

e deixa um legado para as futuras gerações. Para entender esse processo, optou-se por entender

a arquitetura ecológica, que busca harmonizar a arquitetura, a natureza e o ser humano em um

processo de evolução sustentável.

1 ARQUITETURA, NATUREZA E SER HUMANO

A arquitetura correlaciona o ser humano ao viver, pois, a história da evolução humana é

diretamente associada à arquitetura, percebe-se isso desde a pré-história, onde houve o

desenvolvimento das relações em sociedade, e em consequência, a necessidade do abrigo e,

logo as primeiras edificações foram criadas. Nesse contexto, Roaf et. al. (2009) complementa ao

referir que a arquitetura é a “terceira pele” do indivíduo, associando esta ao edificar.

Glancey (2001) vai além ao relatar que a arquitetura é o momento em que o edifício carrega uma

magia sábia que transforma o simples abrigo em uma obra de arte, que é consciente em si.

Assim, entende-se que a arquitetura é uma evolução poética do construir.

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A história da arquitetura é a história do notável esforço humano, um

dos caminhos pelos quais tentamos criar ordem e dar sentido ao

infinitamente curioso e, não obstante, confuso mundo. [...] a

arquitetura, que é diferente do mero edificar, eleva nossos espíritos e

nos emociona. (GLANCEY, 2001, p.7).

A poética da arquitetura está na não constância, pois, a arquitetura é uma arte que se

transforma, e o mesmo ocorre com natureza e com o ser humano. Para melhor compreensão, é

válida a afirmação de que “não se entra duas vezes no mesmo rio”, pois, o rio e o próprio

indivíduo já não são os mesmos, provérbio de Heráclito de Éfero (DIAS, 2015). Eis então, a relação

arquitetura, natureza e ser humano, qual se apresenta na afinidade do movimento e da

constante evolução.

A arquitetura é conceituada por refletir significados nas entrelinhas, sendo associada às

questões existenciais (PALLASMA, 2011), como o discorrido sobre a transformação do ser

humano e da natureza em relação ao tempo e espaço. De acordo com Glancey (2001) essa

expressão conceitual é existente na arquitetura desde a Idade de Bronze, por volta de 3000 a.C,

período em que segundo o autor as construções, especialmente os templos, eram projetadas

com o intuito de estarem em harmonia com o cosmos, alinhando-se a eventos astrológicos e/ou

estrelas, elementos utilizados como referência projetual. Deste modo, percebe-se que a

arquitetura foi associada à natureza com o objetivo de representar o preceito do ser humano, e

assim, estabelecendo a relação arquitetura/homem/natureza.

Posteriormente, a natureza na arquitetura deixou de ser tão subjetiva e passou a ser mais

objetiva, à medida que foi sendo associada a condicionantes naturais (vento, clima, luz e

topografia), assim, conforme Montaner (2007), sendo algo a ser sentido e vivido. De acordo com

Corbella e Corner (2011, p.7):

[...] a preocupação em harmonizar o edifício com o clima existia até nas estruturas urbanísticas das cidades, para que todos tivessem acesso a um condicionante natural de suas residências, [...] infelizmente, pouco a pouco foi-se ensinando se construírem edifícios onde o homem poderia ser um mero espectador, e não um protagonista do inter-relacionamento homem-edifício.

Nesse contexto percebe-se que houve a transição da arquitetura que adapta a edificação ao

meio em que está inserida, para uma arquitetura inserida a qualquer espaço, e deste modo,

deixa a desejar na questão ambiental. Conforme Gomes (2006), a natureza passa a ser associada

à economia e ao ‘desenvolvimento’, à medida que o termo refletia a ideia de progresso alusivo

ao crescimento de prédios de concreto.

Novas técnicas estruturais possibilitaram novas formas de projetar, após a Segunda Guerra

Mundial grandes transformações sociais e econômicas mudaram a arquitetura. Muitos

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profissionais limitaram arquitetura a uma conquista de vãos cada vez maiores em concreto

armado, sem se preocupar mais com o conforto ambiental (LAMBERTS; DUTRA; PEREIRA, 2013).

“Mies van der Rohe, com suas cortinas de vidro, criou [...] ícone de edifícios de escritórios. Seu

formalismo clean foi seguido por várias gerações de profissionais que internacionalizaram o que

era distinto para algumas culturas” (LAMBERTS; DUTRA; PEREIRA, 2013, p. 13). Apesar das linhas

limpas, a arquitetura de Mies van der Rohe, revela a arquitetura relacionada a estética, aos

elementos estruturais, as linhas e formas de um período, esquecendo muitas vezes que a

arquitetura é abrigo. Conforme Montaner (2012, p. 31):

Há ainda os pilares de aço de Mies van der Rohe, em que a planta em cruz persegue ao máximo uma solução isotrópica, assegurando a presença de dois eixos de simetria até nos menores detalhes, o que permite a Mies conseguir o máximo de leveza e a desmaterialização do pilar.

Apesar do resultado estético conseguido em muitas obras de Mies van der Rohe, destaca-se aqui,

os problemas relatados na obra Farnsworth, onde o arquiteto não conseguiu suprir as

necessidades da sua moradora, a arquitetura então não se relaciona ao espaço de abrigo

(FONTENELE, 2017).

Neste sentido, Glancey (2001, p.10-11) ressalta a importância de reavaliar como é considerada

a arquitetura:

É paradoxal que justamente na época da história em que a tecnologia permite que as construções sejam mais emocionantes do que nunca existam tantas que sejam tão insípidas e degradantes. [...] Os arquitetos precisam redescobrir o campo elevado da imaginação, ser os xamãs e mágicos que seus predecessores foram[...].

Montaner (2012) relaciona, a importância de pensar no lugar no desenvolvimento do projeto,

diferente do que era elaborado no modernismo, onde projetava-se apenas o espaço. O espaço

moderno, baseia-se nas medidas, posições e relações, é quantitativo, desdobra-se diante em

geometrias tridimensionais. Já o lugar, objeto de estudo do arquiteto e do urbanista, é definido

por substantivos, pelas qualidades das coisas, possui valor simbólico e histórico, é ambiental,

está relacionado com o corpo humano.

Associado aos problemas ambientas atuais, muitos conceitos sobre a forma de projetar estão

mudando, buscando uma arquitetura mais humana e que busque eficiência energética e

sustentabilidade nas edificações. Entende-se que para redescobrir a arquitetura é primordial

explorar seus sentidos, em como essa se relaciona com o ser humano e com o planeta,

repensando sobre o legado que será deixado as gerações futuras. A poética da arquitetura se

expande além da questão natural, a arquitetura é, segundo Okamoto (2002, p.15), “um meio de

favorecer e desenvolver o equilíbrio, a harmonia e a evolução espiritual do homem, atendendo

às suas aspirações, acalentando seus sonhos, instigando as emoções de se sentir vivo [...]”.

Okamoto (2002, p.11) ainda ressalta que:

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Acima de tudo, o objetivo da arquitetura não se restringe exclusivamente à construção de abrigo para as necessidades básicas e utilitárias do homem. Mais do que à exteriorização material e formal de todas as suas atividades concretas, deveria a arquitetura atender às suas aspirações. Principalmente, deveriam os arquitetos desenvolver o desejo de atender à permanente necessidade de uma interação afetiva do homem com o meio ambiente, favorecendo seu crescimento pessoal, a harmonia do relacionamento social e, acima de tudo, aumentando a qualidade de vida

Conforme Charles et.al (2008) a qualidade de vida é influenciada pela aproximação à natureza,

que por sua vez beneficia tanto a saúde física, emocional e mental do ser humano. Assim, a

relação da arquitetura com a natureza é essencial para o reequilíbrio e a reconexão do ser

humano além de despertar uma consciência sustentável, beneficiando diretamente o planeta.

Reflexo disso, é o fato da sociedade estar rompendo com a visão antropocêntrica de que o ser

humano domina a natureza e, criando uma consciência sustentável, na qual o ser humano

coexiste com a natureza e nutre a preocupação com o legado e o planeta a ser deixado para as

próximas gerações (GOMES, 2006). Assim, percebe-se que a arquitetura deve estar associada

além de um espaço de sobrevivência, mas como um lugar que reflita a arte de viver, neste

processo, percebe-se uma vertente da arquitetura se destacando, a arquitetura ecológica.

1.1 ARQUITETURA ECOLÓGICA

A busca pela arquitetura ecológica marca, conforme Montaner (2012) a maior parte da evolução

histórica da arquitetura, exemplo disso é a própria composição arquitetônica das civilizações

antigas, todas elas relacionavam seus elementos compositivos à imitação de elementos da

natureza. O conceito de arquitetura ecológica, pode até se tornar obsoleto, mas talvez, pois está

arquitetura esteja associada a boa arquitetura, assim como declara Kwok, Grondzik (2013, p. 9):

No futuro, o que é universalmente considerado como uma edificação ‘boa’, ‘econômica’ ou

‘eficiente em custo’ também inclua o conceito de que ela é ecológica [...].

A arquitetura vernacular é um exemplo da busca dos preceitos da natureza na arquitetura,

muitos princípios bioclimáticos e sustentáveis podem ser observados nas edificações onde povos

buscavam adaptar suas construções as condições climáticas do seu local. Sistemas de

aquecimento, construções que aproveitavam a iluminação natural, outras que buscavam

conforto térmico em construções abaixo da superfície do solo, aproveitamento da ventilação

natural, entre outros. (LAMBERTS; DUTRA; PEREIRA, 2013)

O vernacular passou a ser difundido por movimentos ambientalistas, que influenciaram o

desenvolvimento de técnicas construtivas e correntes arquitetônicas com conceitos sustentáveis

e ecológicos (KEELER, BURKE, 2010).

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Para Montaner (2012, p.157) a consciência ecológica contemporânea se formou a partir da

crítica da falsa eficiência de muitos edifícios, bem como, da falta de interação entre o edifício e

o ambiente. “[...] com a difusão do pano de vidro, da moda dos edifícios integralmente em vidro

e despeito da sua orientação, e com o uso abusivo da climatização artificial. Uma involução

tecnológica, portanto.”

A arquitetura ecológica tem como percursor a dois movimentos que aconteceram a partir de

1970: o low tech, e o high tech. Duas correntes as quais pensamentos são opostos, porém ambos

juntos influenciaram na definição dos princípios da arquitetura ecológica. O low tech, consistia

na rejeição da tecnologia no processo construtivo das edificações, sendo que os arquitetos desse

período rejeitaram a ‘rigidez e frieza’ da arquitetura modernista, portanto, eram priorizados

materiais naturais, como a terra, a madeira e as coberturas com vegetações. O high tech,

defendia que melhor desempenho energético nas edificações era proporcionado com o uso de

estruturas metálicas e fachadas de vidro duplo, porém o conforto ambiental de tais edificações,

durante as diferentes estações no ano, era comumente questionado por pensadores da corrente

oposta (GAUZIN-MULLER, 2011).

Ambos os movimentos dão um novo significado a arquitetura, de modo que não há necessidade

de mudar o estilo de como as pessoas vivem para que haja uma relação ambiental da edificação

e, “se estamos preparados para aceitar que vai fazer mais calor no verão e mais frio no inverno,

[...] podemos atingir um grau aceitável de conforto seguindo as regras da natureza” (Behinish,

apud. GAUZIN-MULLER, 2011, p.31).

A arquitetura ecológica é definida como “aquela que utiliza os materiais respeitando sua

natureza e extraindo deles seu melhor comportamento [...]”, sendo as edificações eficientes em

consumo de energia e água, defendendo a racionalização e o uso dos materiais naturais

(GAUZIN-MULLER, 2011, p.10; KWOK, GRONDZIK, 2013).

A arquitetura com princípios ecológicos promove o ato de projetar e construir edificações de

baixo impacto ambiental, visando minimizar a degradação e a agressão ambiental (GAUZIN-

MULLER, 2011), promovendo a conscientização de que o ser humano é passageiro e o planeta

permanece. Portanto, o pensamento de respeitar e coexistir com a natureza e com o planeta,

surge com o pensar de um futuro para as próximas gerações.

Porém, apesar dessa consciência ser muitas vezes discutida e amparada pela academia, o que

percebe-se é que muitos dos prêmios arquitetônicos correm em sentido contrário. Conforme

Montaner (2012, p. 157):

[...] muitas entre as obras admiradas, premiadas e tomadas como referência pelos meios de comunicação o são exclusivamente pelas suas qualidades formais, ignorando-se o alto custo energético da sua produção, o seu desempenho do ponto de vista da economia de energia, bem como a sua funcionalidade, a sua salubridade e a sua integração ao meio.

A chave para uma boa arquitetura, neste sentido, é perceber a arquitetura como uma criação de

objetos únicos e singulares, onde cada edifício é único, autônomo, espaço que vai além da

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composição arquitetônica, e sim que este seja um lugar, uma arquitetura que desenvolva

espaços habitáveis, ambientes transformadores e saudáveis. Montaner (2012, p. 159) declara:

É preciso almejar uma arquitetura que construa sem destruir, que ative o existente, que recicle o construído, que restitua as coberturas vegetais ao território urbanizado, que entenda os recursos como patrimônio e que interprete o meio existente como um complexo sistema de relações entre os seres humanos e o entorno construído.

Assim, a arquitetura ecológica não é definida por normas e regras, pois esta, se relaciona com o

contexto vivenciado, com as necessidades amparadas, com o entorno encontrado, e também

com o ser humano e suas percepções do espaço.

1.2 A PERCEPÇÃO E A ARQUITETURA

A percepção é definida por Neves (2017, p.44) como “o processo que registra e interpreta as

informações sensoriais do ambiente”, ao passo que o espaço fornece ao indivíduo uma

pluralidade de estímulos, a percepção funciona como um ‘filtro’, separando os estímulos e

repassando estes aos sentidos, com o propósito de permitir uma relação proveitosa do espaço

pelo indivíduo. Ao considerar que, a pluralidade material que cerca a vida de um indivíduo,

guarda memórias e cria emoções, compreende-se que os espaços escrevem histórias e

exprimem significados sobre o indivíduo e, assim os espaços se tornam inseparáveis deste,

espaços que se tornam lugares.

Porém, conforme Botton (2007) muitas vezes os sentidos são esquecidos e o ser humano tenta

se adaptar ao ambiente em que se encontra, ignorando o quanto a identidade do ser está

associado ao lugar onde vive, e o quanto o lugar auxilia na sua transformação.

A premissa para se acreditar na importância da arquitetura é a noção de que somos, queiramos ou não, pessoas diferentes em lugares diferentes – e a convicção de que cabe à arquitetura deixar bem claro para nós quem poderíamos idealmente ser mundo. (BOTTON, 2007, p.12-13).

Por conseguinte, é essencial que a arquitetura dos espaços seja pensada considerando a

percepção e o modo de ver do indivíduo, uma vez que o espaço é sentido sem que o indivíduo

tenha consciência disto, ou seja, o espaço garante que as impressões sentidas sejam organizadas,

nomeadas e definidas a uma forma ou a um objeto. (OKAMOTO, 2002).

O impacto sensorial da arquitetura intervém na definição de como o espaço é sentido, uma vez

que conforme Damazio (2017, apud. NEVES, 2017, p.9) “O que nos conecta emocionalmente

com o meio construído é, acima de tudo, a qualidade das experiências por ele promovidas”.

Assim, entende-se que os espaços promovem experiências pessoais e individuais, criando

memórias que refletem aos espaços e aos sentidos. Cita-se como exemplo, o cheiro, que em um

determinado espaço pode provocar uma lembrança de algo que o indivíduo presenciou quando

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era criança. Jaime Lerner (2011), em seu livro Acupuntura Urbana, relata sobre a identidade do

cheiro e o espaço em que se vive:

Durante anos morei em frente a uma fábrica de bolachas no bairro Cabral, em Curitiba. Cada dia da semana era produzido um tipo de bolacha. Quinta-feira, por exemplo, era dia de bolacha de coco, e a região inteira sentia aquele cheiro gostoso. A fábrica fechou, mas toda quinta-feira ainda sinto o cheiro de bolacha de coco. Já na parte sul da cidade, todo mundo sentia o cheiro do Matte Leão sendo fabricado. Muitos têm histórias semelhantes das suas cidades (LERNER, 2011, p. 39-40).

Assim compreende-se a complexidade da arquitetura em projetar o espaço, com intuito de

explorar o campo sensorial humano, instigando sensações e permitindo que o indivíduo

realmente sinta o espaço e não apenas o perceba. Como cita Lerner (2011, p. 40): “Terrível é

uma cidade que não cheira nem fede”, todos os sentidos devem ser explorados no espaço a ser

projetado pela arquitetura. Porém de acordo com Neves (2017) e Pallasmaa (2011) o inverso

acontece, ao passo que a arquitetura frequentemente prioriza a visão e, portanto, “cria-se a obra

em si, esquecendo-se de expressar o mundo interior do usuário” (OKAMOTO 2002, p.12).

A falta de humanismo da arquitetura e das cidades contemporâneas pode ser entendida como consequência da negligencia com o corpo e os sentidos e um desequilíbrio de nosso sistema sensorial. [...] O predomínio dos olhos e a supressão dos outros sentidos tende a nos forçar a alienação, ao isolamento e a exterioridade. A arte da visão, sem dúvida, tem nos oferecido edificações imponentes e instigantes, mas ela não tem promovido à conexão humana ao mundo (PALLASMAA, 2011, p. 17-18).

A dominância da visão sobre os demais sentidos advém de aspectos culturais, pois

historicamente o sentido da visão era correlacionado a glorificação e ao elevar-se a Deus, na

antiguidade, por exemplo, Platão associava a visão com a conexão com os deuses, o sol e a lua.

Porém, Aristóteles ressaltou a divisão dos cinco sentidos conhecidos (visão, audição, olfato,

paladar e tato), pois, apesar de também enaltecer a visão, discorria sobre a relação da visão com

os demais sentidos (NEVES, 2017).

Assim, a visão foi o único sentido no qual o ser-humano foi induzido a confiar, porém conforme

Neves (2017, p.44) “os sentidos humanos não funcionam isoladamente - todos influenciam na

percepção do espaço”, deste modo, compreende-se a importância de considera-los ao projetar,

considerando a conexão do espaço com o indivíduo. A arquitetura que instiga os cinco sentidos,

é conceituada por Pallasmaa (2011) como uma arquitetura que intensifica a vida, uma vez que o

indivíduo está sentindo e vivendo a arquitetura.

A impressão visual de pertencimento da edificação à natureza inspira uma consciência

sustentável, visto que é compreendida a arquitetura como integrante do espaço em que está

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inserida e, de baixo impacto ambiental. A consciência sustentável é essencial, considerando que

de acordo com Keeler e Burke (2010, p. 14), em algum momento “todas as atividades que

realizamos afetam, seja de maneira imediata ou latente, o delicado equilíbrio da natureza”.

A interação dos sentidos é intensificada quando o indivíduo está em contato com a natureza,

pois, entende-se a existência de uma conexão entre o ser-humano e a natureza. Com base nisto,

compreende-se a relevância de materiais naturais (madeira, pedra e tijolos) ao projetar a

arquitetura, uma vez que além de expressar a conexão ser humano-natureza, tais materiais

estabelecem estímulos que atuam na percepção do espaço (PALLASMAA, 2011).

Os materiais naturais também refletem a poética da temporalidade arquitetônica, no sentido de

que tudo está em constante mudança, pois, conforme Neves (2017) o uso de materiais naturais

remetem a edificação como parte do ciclo da natureza, visto que da mesma forma que os

materiais, a arquitetura envelhece e se reinventa com o tempo.

De acordo com Charles et. al - (2008) pessoas que tendem a praticar ações sustentáveis tiveram

experiências ligadas a natureza antes dos seus 11 anos, deste modo o autor afirma que o contato

com a natureza influência no desenvolvimento comportamental do indivíduo e, conforme

Okamoto (2002) o mesmo acontece em relação a arquitetura, sendo que a percepção do espaço

também possui influencia no comportamento do indivíduo.

Contribuindo, Pallasma (2011, p.39) afirma que a arquitetura é “uma extensão da natureza”,

assim reflete-se a essência de considerar o todo ao projetar o espaço, pois, por fim, a arquitetura,

natureza e ser-humano são um só, pois, cada um com sua peculiaridade, refletem da sua maneira

a arte de viver.

A arquitetura é uma arte que se impõe (WEISSHEIMER, 2015), uma vez que o primeiro contato

com a edificação é visual. Com base nisso, conclui-se que a arquitetura ecológica reflete a

naturalidade, ao passo que os materiais naturais (pedra, madeira, adobe e terra) e as edificações

integradas ao espaço, promovem uma atração aos mais diferentes sentidos ao que diz respeito

a sensação de pertencimento.

Do mesmo modo, considerando a arquitetura como um legado, enfatiza-se o uso da ecologia nas

edificações visando o resgate do contato com a natureza, uma vez que conforme Louv (2014) as

gerações de hoje passam por menos experiências na natureza do que as gerações passadas.

Assim, é compreendida a importância de cuidar da natureza dentro da arquitetura, assimilando-

a à relação com o ser-humano, ao compreender que “[...] o controle da natureza e o controle do

comportamento estão mutuamente ligados, assim como a alteração provocada pelo homem

sobre a natureza altera a própria natureza do homem” (VYGOTSKY, 1991, p. 62 apud OKAMOTO,

2002, p.18).

É constatado que a arquitetura proporciona uma perspectiva ao pensamento humano em

relação a si e a natureza. Ampliar o conceito da arquitetura permite com que o ato de projetar

passe a explorar os sentidos humanos, de modo com que a mesma deixe de ser apenas

percebida e passe a ser integrante do espaço e parte da vida do indivíduo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

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A arquitetura está em constante transformação, onde busca-se tendências e soluções, que

pautam as mais diversas modificações na forma de projetar. Exemplo disso, ocorreu no

Modernismo, onde o automóvel e forma muitas vezes superaram o projeto de espaços que

busquem sua relação com a apropriação do homem. Na atualidade, há uma grande discussão

sobre princípios sustentáveis e arquitetura voltada para pessoas, caso do urbanista Jan Gehl,

porém ainda percebe-se um campo em aberto, em como projetar a arquitetura no mundo

contemporâneo.

Diante dos assuntos abordados percebe-se como a arquitetura influencia no equilíbrio ambiental

e, na definição comportamental dos seres humanos, qual por sua vez, posteriormente afeta

ações realizadas pelo indivíduo. Estudar diferentes princípios da arquitetura faz com que o

campo perceptível da arquitetura seja expandido, inspirando uma nova perspectiva que

ressignifica a arquitetura como arte de viver.

A percepção do espaço e dos cinco sentidos humanos envolve a natureza em si, pois, o meio

natural inspira o aconchego e a naturalidade que habita a essência de ser. A arquitetura ecológica

representa a busca por espaços próximos ao natural e, além de ser uma arquitetura de baixo

impacto ambiental a mesma influencia na percepção do espaço.

Estar em um estado consciente significa ter a percepção constante de todos os cinco sentidos

humanos e, a percepção do espaço em que o indivíduo está inserido é essencial para que isso

aconteça. A arquitetura abrange todos os cinco sentidos, visto que a mesma possui ferramentas

que permitem a valorização sensorial do espaço. Assim, considerar que o espaço se relaciona

com o indivíduo significa refletir a arquitetura como uma arte e algo a ser vivido e sentido e,

integrar a edificação com a natureza promove uma reconexão, promovendo a relação entre

arquitetura, natureza e ser humano.

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Trabalho Inscrito na Categoria de Artigo Completo

ISBN: 978-85-68242-94-0

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