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FACULDADE INTEGRADA TIRADENTES – FITs CURSO DE SERVIÇO SOCIAL Clyssiane Karoline Gomes Cavalcanti Dulce Tatiana de Souza Ferreira Mônica Barbosa de Carvalho PRISÃO FEMININA NA SOCIEDADE CAPITALISTA: UM ESTUDO SOBRE O ESTABELECIMENTO PRISIONAL FEMININO SANTA LUZIA MACEIÓ/ AL 2011

Prisão Feminina na Sociedade Capitalista: Um estudo sobre o estabelecimento prisional feminino Santa Luzia

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Page 1: Prisão Feminina na Sociedade Capitalista: Um estudo sobre o estabelecimento prisional feminino Santa Luzia

FACULDADE INTEGRADA TIRADENTES – FITs

CURSO DE SERVIÇO SOCIAL

Clyssiane Karoline Gomes Cavalcanti

Dulce Tatiana de Souza Ferreira

Mônica Barbosa de Carvalho

PRISÃO FEMININA NA SOCIEDADE CAPITALISTA: UM ESTUDO SOBRE O

ESTABELECIMENTO PRISIONAL FEMININO SANTA LUZIA

MACEIÓ/ AL

2011

Page 2: Prisão Feminina na Sociedade Capitalista: Um estudo sobre o estabelecimento prisional feminino Santa Luzia

Clyssiane Karoline Gomes Cavalcanti

Dulce Tatiana de Souza Ferreira

Mônica Barbosa de Carvalho

PRISÃO FEMININA NA SOCIEDADE CAPITALISTA: UM ESTUDO SOBRE O

ESTABELECIMENTO PRISIONAL FEMININO SANTA LUZIA

Trabalho de Conclusão do Curso, apresentado para obtenção do grau de Assistente Social no Curso de Serviço Social da Faculdade Integrada Tiradentes – FITs.

Orientadora: Profª Msc. Marli de Araújo Santos

MACEIÓ/ AL

2011

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Esse trabalho é dedicado a todos aqueles que

contribuíram para sua realização, seja através do

auxílio teórico durante sua construção, seja pela

compreensão por nossa ausência ou ainda com

palavras de incentivo e encorajamento.

Dedicamos à nossa família, a todos os

professores que passaram por nossa vida

acadêmica, em especial à nossa orientadora

Professora Marli de Araújo Santos, à Assistente

Social Jeane Sena, responsável pela supervisão

de estágio no Estabelecimento Prisional Feminino

Santa Luzia – EPFSL, certamente esse trabalho

tem um pouco dos ensinamentos de cada um.

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Enquanto os homens se contentaram com suas

cabanas rústicas, [...] se limitaram a coser suas

roupas de pele com espinhos ou cerdas, [...], a

esculpir com pedras afiadas alguns botes de

pescadores [...], enquanto se dedicaram apenas às

obras que um único homem podia criar, e a artes

que não necessitavam do concurso de várias mãos,

eles viveram livres, sãos, bons e felizes, tanto

quanto o poderiam ser pela sua natureza, [...] mas

desde o momento em que um homem teve

necessidade do auxílio de um outro, desde que se

apercebeu de que seria útil a um só indivíduo contar

com provisões para dois, desapareceu a igualdade,

a propriedade se introduziu, [...] as vastas florestas

se transformaram em campos aprazíveis, que foi

preciso regar com o suor dos homens e, nos quais,

viu-se logo a escravidão e a miséria germinarem e

crescerem com as colheitas.

(Jean-Jacques Rousseau)

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FACULDADE INTEGRADA TIRADENTES – FITs

CURSO DE SERVIÇO SOCIAL

Clyssiane Karoline Gomes Cavalcanti

Dulce Tatiana de Souza Ferreira

Mônica Barbosa de Carvalho

PRISÃO FEMININA NA SOCIEDADE CAPITALISTA: UM ESTUDO SOBRE O ESTABELECIMENTO PRISIONAL FEMININO SANTA LUZIA

Monografia aprovada em ____/____/____ para obtenção do título de Bacharel em Serviço Social.

Banca Examinadora:

_______________________________________

Profª Msc. Marli de Araújo Santos

_______________________________________

Profº Msc. Albani de Barros

_______________________________________

Profª Msc. Francisca dos Santos Sobral

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AGRADECIMENTOS

Algumas pessoas marcam a nossa vida para sempre, umas porque vão nos

ajudando na construção do nosso caminho, outras porque nos desafiam a

construí-lo. Quando nos damos conta, já é tarde para lhes agradecer.

Agradeço...

... A Deus por permitir a conclusão deste trabalho, certamente a primeira de

muitas vitórias.

... Aos meus pais e aos meus avós pelo amor incondicional sempre ofertado

nos bons e nos maus momentos; pelas broncas, quando necessárias; e, acima de

tudo, pela compreensão por minha ausência nos últimos meses.

... À nossa orientadora Professora Msc. Marli de Araújo Santos, por

compartilhar seus conhecimentos, por sua paciência e dedicação.

... A todos os professores, amigos e familiares que, de forma direta ou

indireta, contribuíram para a minha formação profissional.

... Às minhas companheiras de luta, Dulce e Mônica, pelo companheirismo

e cumplicidade durante esses quase quatro anos de convivência, em especial

pelos últimos meses, tão exaustivos para todas nós.

... A todos que fazem meu coração sorrir... Aos que sempre estiveram junto

até mesmo quando eu não mais estava disposta... À pessoa que eu esperava que

me chutasse quando caí, e que foi uma das primeiras que me ajudou a levantar...

Aos que fizeram a diferença em minha vida... Às pessoas que amei... Às pessoas

que abracei... Agradeço às pessoas que encontro apenas em meus sonhos e

aquelas que encontro todos os dias e não tenho a chance de dizer tudo o que

sinto olhando nos olhos... Para mim, o que importa não é o que eu tenho na vida,

mas QUEM eu tenho na vida... MUITO OBRIGADA!!!

Clyssiane Karoline Gomes Cavalcanti

Page 7: Prisão Feminina na Sociedade Capitalista: Um estudo sobre o estabelecimento prisional feminino Santa Luzia

AGRADECIMENTOS

“A vida nos leva a construir todos os dias, pois a própria vida é

desconstruída todos os dias.” (Pe. Fábio de Melo, 2010). É na desconstrução que

aprendemos a reconstruir, com isso nos é possível compartilhar com algumas

pessoas a necessidade de amar, a essas pessoas o meu muito obrigado.

Agradeço...

Em especial a Deus por não desistir de mim e acreditar que eu conseguiria

quando eu mesma não acreditava mais, por ser meu porto seguro e me carregar

tantas vezes no colo.

Aos meus pais, meu pai (em memória), por jamais sair do meu pensamento

nos momentos de oração e a minha mãe, hoje com mal de Alzheimer talvez não

entenda mais que é e sempre será meu exemplo de perseverança e luta.

Ao meu filho Cristiano, meu grande amigo e herói, pois mesmo separados

continuou sendo meu grande incentivo rumo à vitória que hoje alcanço.

A todos os professores, a coordenadora e família FITS que compartilharam

conosco seus conhecimentos, sua paciência e seu servir de maneira exemplar ao

ponto de hoje estarmos nos tornando profissionais de conhecimento ímpar.

A supervisora de campo – assistente social Jeane Sena pelo acolhimento

profissional e grande contribuição no despertar da nossa visão crítica da realidade,

através do convívio diário.

A nossa orientadora Professora Msc. Marli de Araújo Santos, para mim,

uma luz que se acendia todas as vezes que me sentia no escuro diante de tantos

teóricos, aos quais tivemos que nos reportar para construção deste trabalho, o que

fez com grande louvor.

As minhas colegas Clyssiane e Mônica, pelos momentos de “gotas de

sangue” das amarras na construção e desconstrução deste trabalho,

compartilhados com tantas alegrias e tristezas, porém, nunca desistido

Dulce Tatiana de Souza Ferreira.

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AGRADECIMENTOS

“A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios. Por isso cante,

chore, dance, ria e viva intensamente antes que a cortina se feche e a peça

termine sem aplausos.” (Charlie Chaplin)

Agradeço...

A Deus, por está sempre do meu lado e por ter me dado forças para vencer

as barreiras, superar as limitações e tornar possível a realização desse trabalho.

Aos meus filhos Maxwell, Monique e Monyse, minha razão de viver, pela

paciência, compreensão, confiança e acima de tudo muito amor e carinho,

especialmente nesses últimos meses, no qual a minha ausência foi uma

constante.

A minha mãe e minha irmã, Benedita e Madalena, mulheres guerreiras e

batalhadoras, para mim um exemplo, que sempre acreditaram na minha

capacidade.

A todos os nossos mestres que nessa longa caminhada contribuíram para

nossa formação, socializando seus conhecimentos e experiência de vida.

Em especial, à nossa orientadora Professora Msc. Marli de Araújo Santos,

por ter nos recebido de braços abertos, por compartilhar seus conhecimentos, por

sua paciência, dedicação, confiança e reconhecimento dos nossos esforços.

À Assistente Social Jeane Sena, supervisora do campo de estágio, pelo

grande apoio e incentivo e que apesar das adversidades e inúmeros obstáculos

não desistiu de nós, suas estagiárias.

Às minhas eternas amigas Clyssiane e Dulce, companheiras de estudo,

angústias e alegrias, por me permitirem alcançar junto com elas esse sonho tão

árduo, mas tão gratificante e maravilhoso que é a conclusão do nosso curso.

Enfim, a todos que, direto ou indiretamente, colaboraram para a realização

desse trabalho, os meus sinceros agradecimentos.

Mônica Barbosa de Carvalho

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LISTA DE SIGLAS

Casa de Detenção de Maceió – CDM

Centro Psiquiátrico Judiciário Pedro Marinho Suruagy – CPJ

Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária - CNPCP

Estabelecimento Prisional Feminino Santa Luzia – EPFSL

Exército Industrial de Reserva – EIRE

Intendência Geral do Sistema Prisional - IGESP

Lei de Execução Penal – LEP

Ordem dos Advogados do Brasil – OAB

Penitenciária Masculina de Baldomero Cavalcanti de Oliveira – PMBCO

Presídio de Segurança Média de Arapiraca Desembargador Luis de Oliveira

Sousa – PSMADLOS

Presídio de Segurança Média de Maceió Professor Cyridião Durval e Silva –

PSMMPCDS

Secretaria de Estado de Defesa Social – SEDS

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CARVALHO, Mônica Barbosa de. CAVALCANTI, Clyssiane Karoline Gomes.

FERREIRA, Dulce Tatiana de Souza. Prisão feminina na sociedade capitalista:

um estudo sobre o Estabelecimento Prisional Feminin o Santa Luzia. Maceió-

AL, 2011. Monografia de Graduação em Serviço Social – Trabalho de Conclusão de

Curso, Coordenação de Serviço Social – Faculdade Integrada Tiradentes – FITS.

RESUMO

O presente texto registra o resgate histórico do surgimento e evolução das

penas, no que se refere à criação das prisões bem como sua função na sociedade

de classes. Contextualiza as várias formas de sociedades, desde a primitiva até a

capitalista e, consequentemente, o considerável avanço dos direitos humanos e

sociais no âmbito jurídico por meio da Lei de Execução Penal – LEP, esta

abordagem refere-se, principalmente, a não efetivação da referida Lei. Contempla o

surgimento das prisões femininas, com sua história ligada à Igreja católica e suas

especificidades quanto às relações sociais de gênero existente nos presídios. Relata

a realidade do Estabelecimento Prisional Feminino Santa Luzia, situado em Maceió,

no estado de Alagoas, no tocante a sua organização estrutural, características da

sua população carcerária, bem como no que se refere à superlotação do mesmo.

PALAVRAS -CHAVE: evolução das penas, sociedade de classes, Lei de Execução

Penal, prisões femininas, relações sociais de gênero, Estabelecimento Prisional

Feminino Santa Luzia.

CARVALHO, Monica Barbosa de. Cavalcanti, Clyssiane Karoline Gomez.

FERREIRA, Dulce Tatiana de Souza. Women's prison in capitalist society: a

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study of the Female Prison Santa Luzia. Maceió-AL, 2011. Monographs in

Undergraduate Social Work - End of Course Work, Social Service Coordination -

Integrated College Tiradentes - FITS.

ABSTRACT

This text records the historic recovery of the creation and the evolution of

prison sentences, in regard to the creation of prisons and its role in class society.

This work contextualizes the various types of societies, from the primitive to the

capitalist, and with this the considerable progress of human and social rights within

the legal framework through the Law of Penal Execution - LEP, this study refers

primarily to the non-realization of this act. It includes the creation of women's

prisons, with its history linked to the Catholic Church and its specifications as to the

social relations hips of class societies existing in prisons. We report the reality of the

Santa Luzia Female Prison, located in Maceió, in the state of Alagoas, in terms of its

structural organization, characteristics of its prison community, as well as in regard to

the population overcrowding of this institution.

KEY WORDS: evolution of prison sentences, class society, the Penal Execution Law,

women's prisons, social relations hips in class societies, Prison Female Santa Luzia.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 13

1. FORMAS DE SOCIABILIDADE, PENAS E PRISÕES: DA IDA DE ANTIGA ATÉ A CONTEMPORANEIDADE .................................................................................. 16

1.1 – Formas de Sociabilidade ................................................................................ 16

1.2 – A História das penas ....................................................................................... 25

2. O SURGIMENTO DAS PRISÕES FEMININAS .................................................. 39

2.1 – Relações de gênero e as mulheres presas .................................................... 41

3. A LEI DE EXECUÇÃO PENAL E O ESTABELECIMENTO PRIS IONAL FEMININO SANTA LUZIA ...................................................................................... 48

3.1 – Lei de Execução Penal - LEP ......................................................................... 48

3.2 – Estabelecimento Prisional Feminino Santa Luzia - EPFSL ............................ 55

CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 64

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................... 67

ANEXOS ................................................................................................................. 71

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INTRODUÇÃO

O presente Trabalho de Conclusão de Curso surgiu a partir da inserção no

campo de estágio - Estabelecimento Prisional Feminino Santa Luzia – EPFSL,

localizado na cidade de Maceió, Alagoas, durante os anos de 2009 e 2010, o que

possibilitou a aproximação não apenas com a realidade carcerária, mas com a

especificidade da mulher quando esta se encontra privada de liberdade, ou seja, a

percepção que a prisão de mulheres mantém as contradições das relações de

gênero, bem como os determinantes da sociedade de classes. Assim, o presente

trabalho é composto por três seções, iniciaremos a primeira seção abordando sobre

as várias formas de sociabilidade humana e organização social, desde a primitiva

até a capitalista, como também, o surgimento das penas, a origem das prisões e a

sua função na sociedade de classes.

Durante o processo de evolução social encontramos a sociedade primitiva,

escravista, feudal e, por fim, a capitalista.

A sociedade primitiva era nômade e vivia da caça e da pesca. Com o

descobrimento do fogo e o surgimento da necessidade de domesticar os animais

começaram a fixar-se em determinados locais.

Durante a sociedade escravista encontramos uma sociedade dividida entre

classes, eram os senhores detentores da propriedade privada que exploravam a

força de trabalho gratuita dos escravos negros, trazidos do continente africano,

assim como dos seus descendentes.

No feudalismo constatamos também uma sociedade de classes, formada por

senhores feudais e servos, na qual os servos recebiam parte da produção do seu

trabalho como pagamento, mas não deixavam a condição de explorados.

A sociedade feudal deu lugar à sociedade capitalista, que tem a obtenção de

lucro e acúmulo de riqueza como objetivos principais. Assim como nas duas últimas

formas de sociabilidade, o capitalismo também é marcado pela divisão de classes,

dessa vez é a classe burguesa – detentora do poder – explorando a classe

trabalhadora – classe dominada.

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As regras da sociedade de classes são sempre ditadas pela classe mais forte,

a classe dominante, e a classe dominada é obrigada a obedecer todos os ditames

impostos, sob pena de sofrer coerção legalmente determinada. Essa coerção se

materializa através das forças de repressão do Estado, onde as prisões também são

mecanismos usados para a manutenção da ordem vigente.

Por isso, ainda na primeira seção, faremos um resgate da história das

prisões, através de uma explanação sobre a evolução das penas, desde os suplícios

cometidos na Idade Antiga até o surgimento e evolução das prisões.

A segunda seção estará voltada para a historicidade das prisões femininas e

as relações de gênero a que são submetidas as mulheres da sociedade capitalista.

A submissão feminina perante os homens não é algo inerente às formações sociais,

durante as fases inferior, média e até em parte na superior da Barbárie as mulheres

eram quem comandavam os clãs.

A sociedade permanece com a descendência matrilinear, do direito materno,

até a época do surgimento da propriedade privada, quando a descendência passa a

ser patriarcal, o homem assume a liderança da família e tem início a submissão da

mulher.

Essa submissão feminina impôs que a mulher deveria manter fidelidade

sexual em relação ao ‘seu’ homem, para que os filhos vindos dessa união pudessem

ter garantido o direito aos bens e riquezas vinculadas à linhagem masculina, isso foi

necessário para que a classe dominante pudesse garantir à sua descendência,

agora paterna, o direito à herança familiar. A partir daí, fica caracterizada a

desvalorização da mulher e a sua submissão ao homem cada vez mais naturalizada.

Com o advento da Revolução Industrial, a classe dominante percebeu que a

força de trabalho da mulher também poderia ser explorada. A mulher então passa a

trabalhar fora de casa, vendendo sua força de trabalho para o grande capital, porém

sem abandonar suas ‘obrigações’ dentro do lar, enquanto mãe e esposa. Na

contemporaneidade, as mulheres muitas vezes são as únicas responsáveis pelo

sustento da família, sustento este que pode vir também através da criminalidade,

quando não conseguem suprir as suas necessidades básicas e dos seus familiares

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– não queremos afirmar, contudo, que essa seja a única razão para a mulher

envolver-se com o mundo do crime.

A violação da ordem vigente leva a mulher a perder a sua liberdade, e isso se

materializa quando estas são direcionadas para instituições destinadas à reclusão

da criminosa – as prisões.

Para entendermos as particularidades existentes em uma prisão feminina,

contextualizamos o surgimento dessas instituições enquanto meio de clausura e

arrependimento da criminosa pelo ato cometido.

A terceira seção abordará a Lei de Execução Penal, seus diversos artigos e

sua importância para a manutenção do interesse capitalista, pois reforça os

conceitos de justa reparação pelo crime cometido, o caráter social preventivo e a

idéia de ressocialização do usuário privado de liberdade. Proporciona ao Estado

instrumentos para a individualização da execução da pena, aponta deveres,

‘garante’ direitos, dispõe sobre o trabalho dos presos, dentre várias outras

resoluções que direcionam o cumprimento da pena privativa de liberdade.

O EPFSL não se diferencia dos demais presídios brasileiros, a falta de

implementação de vários artigos da LEP também é uma realidade vivenciada pela

população carcerária daquele local, diante disso, ainda na terceira e última seção

relacionaremos a legislação brasileira com o EPSFL, enfatizando o que está e o que

não está sendo efetivado.

Por fim, ainda na terceira seção, trataremos da caracterização do EPFSL, seu

funcionamento e como essas mulheres cumprem as suas penas privativas de

liberdade, dentro do referido contexto carcerário.

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1. FORMAS DE SOCIABILIDADE, PENAS E PRISÕES: DA IDA DE ANTIGA ATÉ

A CONTEMPORANEIDADE

Nesta seção trataremos do surgimento das sociedades de classes, os

diferentes modelos societários, com suas evoluções, começando pela sociedade

primitiva, escravista e feudal, chegando, finalmente, à sociedade capitalista.

Discutiremos também o surgimento das penas e prisões, bem como sua função na

sociedade de classes.

Abordaremos ainda, as significativas mudanças ocorridas na vida do homem

no que se refere ao período da industrialização, por meio do novo modo de

produção, o aparecimento do pauperismo e das mazelas da Questão Social.

1.1. Formas de Sociabilidade

Na sociedade primitiva1, segundo Lessa e Tonet (2008), a primeira forma

humana de organização social, ainda não havia a possibilidade de existência de

classes sociais, haja vista a baixa condição de sobrevivência humana, que era

vinculada à manutenção da vida por meio da coleta do que já existia na natureza,

como frutas e a caça. No entanto, a escassez de alimento, muitas vezes levava o

homem a passar fome e a se deslocar constantemente para lugares cada vez mais

distantes obrigando-o a fazer grandes caminhadas em busca de outros suprimentos.

Neste tipo de sociedade existiam dois interesses fundamentais, a

sobrevivência humana e a preservação do bando e isso se conseguia através do

trabalho coletivo. O trabalho desenvolvido no começo dessa sociedade, ainda não

era o de transformar a natureza, mas, “É importante acentuar: o que caracterizava o

trabalho (tomado socialmente) nessa comunidade primitiva era o fato de que todos

trabalhavam e também usufruíam do produto do trabalho.” (LESSA; TONET, 2008,

p. 55). 1 Conforme Lessa e Tonet (2008), a sociedade primitiva era composta por pequenos bandos que migravam de

um lugar para outro em busca de comida. Nessa forma de sociabilidade, “[...] Os homens permaneciam,

ainda, nos bosques tropicais ou subtropicais [...]. Os frutos, as nozes e as raízes serviam de alimento; o

principal progresso desse período é a formação da linguagem articulada. [...]”. (ENGELS, 2005, p. 22)

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Eram povos nômades, quando os alimentos do local em que estavam

instalados tornavam-se escassos ou o clima não era mais favorável, buscavam outro

local onde pudessem se instalar.

Diante das suas necessidades objetivas de sobrevivência, os homens

primitivos perceberam que a natureza poderia lhes oferecer bem mais que a simples

coleta de alimentos, então passou a explorá-la de tal maneira que pudesse

transformá-la para um determinado fim, antecipado na consciência, ou seja, os

homens passaram a objetivar as suas prévias-ideações conforme suas reais

necessidades.

A prévia-ideação é sempre uma resposta, entre outras possíveis, a necessidade concreta. Portanto, ela possui um fundamento material último que não pode ser ignorado. Nenhuma prévia-ideação brota do nada, ela é sempre uma resposta a uma dada necessidade que surge em uma situação determinada. (LESSA; TONET, 2008, p. 20).

Segundo Lessa e Tonet (2008), o homem é um ser social e em constante

evolução e enquanto ser social tem o trabalho como base fundante para a sua

existência e da coletividade. “O trabalho é o fundamento do ser social porque

transforma a natureza na base material indispensável ao mundo dos homens. Ele

possibilita que, ao transformarem a natureza, os homens também se transformem.”

(LESSA; TONET, 2008, p. 26).

Mediante a transformação da natureza, o homem evoluiu seus

conhecimentos, descobriu o fogo, adquiriu a habilidade de modificar pedras e metais

produzindo ferramentas para utilizá-las como utensílios para caça e pesca.

Com a evolução, ocorreram várias descobertas na sociedade primitiva, dentre

elas a descoberta das sementes, que proporcionou ao homem o conhecimento da

agricultura, a preparação da terra para o plantio, separação dessas sementes, entre

outras atividades humanas, trouxe também a descoberta da pecuária, a criação de

animais, no qual passou a domesticá-los e essa domesticação possibilitou-os a

instalação em locais fixos, dando origens às tribos e clãs.

Mas a sociedade ainda não era dividida em classes, e apesar de na

sociedade primitiva também existir aqueles que possuíam o poder de dar ordens e

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se fazer obedecer, não existia a exploração humana, tudo era compartilhado

igualmente com todos os membros do grupo, portanto,

Vale notar que, na comunidade primitiva, também existia a autoridade, [...]. Nela, a autoridade, baseada na idade, na sabedoria, na experiência de vida, nos dotes físicos etc. não estava a serviço da exploração do homem pelo homem, [...]. (LESSA; TONET, 2008, p. 56).

A partir da descoberta da agricultura e pecuária foi possível ao homem a

produção de um excedente e com isso ele, o homem, passou a explorar seu

semelhante, de acordo com Lessa e Tonet (2008) se estabelece a exploração do

homem pelo homem.

Com o desenvolvimento das forças produtivas, o homem começa a produzir

mais que o necessário para a sua sobrevivência e o interesse da classe dominante

passa a ser a apropriação deste excedente. Apropriação esta que só pode ser

conseguida por meio da exploração da força de trabalho humana.

A partir da exploração do homem pelo homem, tem-se o fim da sociedade

primitiva e o começo da sociedade escravista – marcando o surgimento da

sociedade de classes - visto que se torna necessário aos dominantes a exploração

da força de trabalho para obtenção da produção excedente. Os interesses tornaram-

se antagônicos e o bem comum já não fazia mais parte dessa nova forma de

sociabilidade. Não bastava ao homem apropriar-se de terras e bens materiais, ele

agora queria apropriar-se de outros homens, fazendo-os seus prisioneiros. Dessa

forma,

Enquanto os homens se contentaram com suas cabanas rústicas, [...] se limitaram a coser suas roupas de pele com espinhos ou cerdas, [...], a esculpir com pedras afiadas alguns botes de pescadores [...], enquanto se dedicaram apenas às obras que um único homem podia criar, e a artes que não necessitavam do concurso de várias mãos, eles viveram livres, sãos, bons e felizes, tanto quanto o poderiam ser pela sua natureza, [...] mas desde o momento em que um homem teve necessidade do auxílio de um outro, desde que se apercebeu de que seria útil a um só indivíduo contar com provisões para dois, desapareceu a igualdade, a propriedade se introduziu, [...] as vastas florestas se transformaram em campos aprazíveis, que foi preciso regar com o suor dos homens e, nos quais, viu-se logo a escravidão e a miséria germinarem e crescerem com as colheitas. (ROUSSEAU apud NASCIMENTO, 2009, p. 207).

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Dentre as principais sociedades escravistas podemos citar a grega e a

romana, as quais eram constituídas de duas classes antagônicas: os senhores e os

escravos. Toda a produção dos escravos era apropriada pelos senhores, com isso

os escravos não tinham interesse em produzir muito, então para aumentarem suas

riquezas os senhores por meio da força conquistavam e escravizavam novos

impérios, aumentando assim o número de escravos cada vez mais explorados.

Esse aumento trouxe algumas preocupações quanto à segurança dos

senhores, pois o número de escravos era muito grande2. “Em Roma, havia mais de

700 escravos para cada senhor e, se todos se revoltassem, não haveria suficientes

senhores para enfrentá-los” (LESSA; TONET, 2008, p. 59), por isso, os senhores

contrataram um exército para defender seus interesses e manter a ordem se, por

eventualidade, essa gama de escravos resolvesse se rebelar contra seus senhores.

No entanto, o custo de manutenção dos exércitos era muito alto, muito além

das posses de um único senhor e a saída encontrada foi, que todos os senhores de

escravos se unissem economicamente para custear o exército em benefício de

todos os senhores,

Para isso contrataram pessoas que deveriam recolher todo ano a contribuição de cada um, garantindo que ninguém passaria a perna nos outros; e, também, que deveriam administrar esse dinheiro de modo a manter os exércitos. Essa contribuição anual é o ‘imposto’ e essas pessoas contratadas, os funcionários públicos. (LESSA; TONET, 2008, p. 60).

Houve também a necessidade de se criar um instrumento que tivesse como

função a regulação das relações entre os senhores e a manutenção da ordem na

sociedade, principalmente em relação aos escravos, conservando-os na mais

profunda submissão e foi assim que surgiu o Direito e suas leis regulamentadoras.

Segundo Lessa e Tonet (2008) todo esse aparato, ao qual se cercou os

senhores de escravos para evitar ou mesmo defender-se de uma revolta dos

escravos e também para continuarem a adquirir mais escravos e assim enriquecer

2 Lessa e Tonet (2008) ressaltam que durante o escravismo, devido às precárias condições objetivas, ou seja, o

pouco desenvolvimento das forças produtivas, a ausência de tecnologia, tinha como fator determinante a

necessidade de um grande número de escravos.

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cada vez mais, constituiu o Estado, ou seja, o Estado era “O conjunto dos

funcionários públicos, somado aos instrumentos de repressão dos escravos

(exército, polícia, prisões etc.) e ao Direito [...].” (LESSA; TONET, 2008, p.60).

Conforme Costa (1997), o Estado surge enquanto organização política da

sociedade para proteger a propriedade privada, assim como o direito civil ou direito

individual. Desde que foi criado, o Estado sempre esteve ao lado da classe

dominante, sendo assim até os dias atuais, regulando as relações sociais para que o

mercado continue com sua doutrina de exploração da classe trabalhadora.

Com o passar do tempo, o Estado, na sociedade escravista, já não conseguia

ser tão eficiente para aquilo ao qual foi criado, pois o número de escravos e o

tamanho do império aumentavam consideravelmente, na mesma proporção em que

o exército e o Estado. Os impostos cobrados aos senhores de escravos ficavam

cada vez mais altos, impossibilitando o pagamento, pois “[...] o exército e o Estado

haviam crescido tanto (e, com eles, a corrupção) que a riqueza que eles – os

escravos3 - propiciavam aos senhores já não era suficiente para mantê-los” (LESSA;

TONET, 2008, p. 60).

O exército e os funcionários públicos passaram a receber cada vez menos,

gerando assim grande revolta, bem como o crescimento desenfreado da corrupção,

isso desencadeou,

[...] o aumento tanto das invasões do império pelos povos que viviam nas suas fronteiras, quanto das revoltas dos escravos. A desorganização do comércio, resultante das invasões e das revoltas no interior do império, diminuiu ainda mais o lucro dos senhores, de modo que eles tinham ainda menos dinheiro para pagar os soldados e os funcionários públicos. (LESSA; TONET, 2008, p. 61).

O sistema escravista era desenvolvido em meio a várias contradições, pois à

medida que o mesmo crescia, a crise também se instalava, levando-o “[...] a um

‘beco sem saída’.” (LUKÁCS apud LESSA; TONET, 2008, p. 61), ao seu inevitável

fim. No entanto, por não possuírem uma classe revolucionária e tampouco um

projeto para um novo modo de produção, a mudança dessa forma de sociabilidade

para outra foi lenta, fragmentada e caótica, afinal de contas:

3 Grifo nosso.

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21

Naquela situação histórica, o desenvolvimento das forças produtivas ainda não atingira o patamar que possibilitasse aos homens o conhecimento indispensável ao surgimento de uma classe revolucionária para liderar a transição da velha sociedade para uma nova. (LESSA; TONET, 2008, p. 63).

Com o fim da Idade Média no século XV, entra em cena a Idade Moderna,

que vai do século XVI ao XVIII, caracterizada pelo progresso das invenções e

aperfeiçoamento das ciências, bem como, com a substituição do poder dos nobres

para o poder centralizador dos reis do feudalismo, o absolutismo4.

A transição do escravismo5 para o feudalismo demorou mais de três séculos

para se concretizar definitivamente. E esse novo modo de produção – o feudalismo

– tinha características totalmente diferentes do escravismo, dentre eles, Lessa e

Tonet (2008), citam a principal como sendo,

A organização da produção em unidades auto-suficientes, essencialmente agrárias e que serviam também de fortificações militares para a defesa: os feudos. O trabalho no campo era realizado pelos servos. Estes, diferente dos escravos, eram proprietários das suas ferramentas e de uma parte da produção. A maior parte dela ficava com o senhor feudal, proprietário da terra, e também líder militar, a quem cabia a responsabilidade da defesa do feudo. [...]. O servo estava ligado à terra e o senhor feudal, ao feudo. (p. 63-64).

Essa auto-suficiência das unidades nesse novo modo de produção se tornou

necessária, pois “com o desaparecimento da estrutura produtiva e comercial do

Império Romano, o comércio e o dinheiro praticamente desapareceram.” (LESSA;

TONET, 2008, p. 63), por isso os feudos precisavam suprir toda necessidade

produtiva existente. 4 O Estado absolutista representou a resposta dos senhores à rebeldia dos servos: seu caráter de classe

mostrou-se óbvio – foi um notável reforço para combater as mobilizações camponesas. No entanto, esse

instrumento repressivo a serviço da nobreza fundiária se constituiu reduzindo o poder dos nobres tomados

singularmente; na verdade, concentrando o poder político nas mãos de um deles (o rei, que, até então,

detinha uma reduzida autoridade), diminuiu significativamente a capacidade interventiva de cada um dos

senhores feudais. Com isso, abriu-se ao mesmo tempo o campo para uma maior influência do grupo dos

comerciantes/mercadores que, gradualmente, tornaram-se os financiadores do Estado absolutista,

juntamente com as principais casas bancárias da época [...], que cresceram na mesma medida em que o

comércio ganhava dimensões internacionais. (NETTO E BRAZ, 2008, p. 72).

5 O fim do escravismo está intrinsecamente ligado a desestruturação política, econômica e militar.

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22

Diferente do escravismo, no qual os escravos não tinham participação na

produção, levando-os ao desinteresse na produtividade, no feudalismo os servos

ficavam com uma parte da produção, o que de certa forma servia de incentivo para

que trabalhassem mais nos feudos, porém tanto os servos quanto os escravos não

perderam a sua condição de explorados.

Segundo, Lessa e Tonet (2008), a população dos feudos aumentou

consideravelmente, porém, a produção era maior que o consumo, o que acarretou

um prejuízo considerável para o senhor feudal e consequentemente para os servos,

levando o próprio sistema a uma crise. O senhor feudal quebrou o acordo com os

servos e expulsou parte deles dos feudos.

Os que foram expulsos não tinham para onde ir, nem como sobreviver, dando

início a uma série de roubos, cometidos por esses servos, que trocavam o produto

dos seus roubos com outros servos. As trocas eram feitas entre os que roubavam e

os que tinham o excedente da produção, fortalecendo o comércio antes

enfraquecido, pois,

Como todo mundo estava produzindo mais do que necessitava, todos tinham o que trocar e voltou a florescer o comércio. Em pouco mais de dois séculos, as rotas comerciais e as cidades renasceram e se desenvolveram em quase toda a Europa. (LESSA; TONET, 2008, p. 65).

Surge então o burguês, termo utilizado para identificar os artesãos e

comerciantes que surgiram no processo de reaparecimento do comércio,

possibilitando o processo de transição do feudalismo para o capitalismo.

Diferente do processo transitório do escravismo para o feudalismo, no qual,

não houve uma classe revolucionária para adiantar o processo, neste último, os

detentores do poder revolucionaram a economia, tornando inevitável a transição, de

forma consciente, para esse novo modo de produção, o sistema capitalista

Na primeira metade do século XVIII, na Inglaterra, deu-se início a Revolução

Industrial, marcada pelo acúmulo de riquezas, substituição parcial do trabalho vivo

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23

por máquinas, e consequentemente houve o aumento do número de trabalhadores

desempregados, ou seja, o aumento do Exército Industrial de Reserva - EIRE6.

Com a industrialização, parte dos trabalhadores camponeses migrou para as

cidades em busca de emprego, a força de trabalho empregada, geralmente vinha

destes trabalhadores camponeses, que possuíam apenas sua força de trabalho para

oferecer. Os meios de produção, como máquinas e matéria-prima, eram de

propriedade dos burgueses. Os trabalhadores que conseguiam empregos nas

fábricas saíam de suas cidades e mudavam-se para locais próximos às fábricas,

caracterizando um grande êxodo rural. Criaram-se, então, cidades em volta das

indústrias de maneira tão desordenada que resultou em vários problemas com

relação à moradia, abastecimento de água, entre outros.

Segundo Engels (2008), a situação que se formou foi de exploração e miséria

para o operariado em submissão aos capitalistas, donos dos meios de produção,

enquanto que o proletariado só tinha a sua força de trabalho para vender. No início,

os capitalistas conseguiam explorar toda força de trabalho possível, inclusive as

mulheres e crianças que de maneira desumana trabalhavam de 14 a 18 horas

diárias.

Porém com a continuidade do êxodo rural o número de trabalhadores tornou-

se maior que o número de empregos o que resultou em baixa de salários, além de

que com a substituição de homens por máquinas, os trabalhadores que não eram

absorvidos no mercado de trabalho ficavam às margens da sociedade, vivendo de

ajudas e esmolas das damas da sociedade e da Igreja, e ou, em alguns casos, de

atos como assaltos, considerados crimes pela burguesia, dando início ao que hoje

conhecemos como as expressões da questão social. De acordo com Carvalho e

Iamamoto,

6 A essência da lei capitalista da população é que a acumulação do capital conduz, obrigatoriamente, a que haja

sempre uma parte da população operária excedente, afastada da produção e, por esta razão, condenada a

condições bastante precárias de existência. E o chamado "exército industrial de reserva" cuja existência, em

quantidade controlável, garante as condições de exploração do operariado pelas classes dominantes, através

da regulação dos salários (FONSECA, 2005, p. 24)

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24

A questão social não é senão as expressões do processo de formação e desenvolvimento da classe operária e de seu ingresso no cenário político da sociedade, exigindo seu reconhecimento como classe por parte do empresariado e do Estado. É a manifestação, no cotidiano da vida social, da contradição entre o proletariado e a burguesia, a qual passa a exigir outros tipos de intervenção mais além da caridade e repressão. (CARVALHO; IAMAMOTO, 1983, p. 77).

Os trabalhadores contestavam as péssimas condições de trabalho e

organizavam greves e revoltas. Esse movimento era visto, pela classe dominante,

como anarquia, e os participantes tidos como criminosos. Esta criminalidade, que

como expressão da questão social é reprodução das relações sociais do modo de

produção capitalista, extremamente consumista, onde os valores éticos e morais são

substituídos pelo poder de compra, no qual o indivíduo vale apenas o que possui.

Se um marciano tivesse caído naquela ocupada ilha da Inglaterra teria considerado loucos todos os habitantes da Terra. Pois teria visto de um lado a grande massa do povo trabalhando duramente, voltando à noite para os miseráveis e doentios buracos onde moravam, que não serviam nem para porcos; de outro lado, algumas pessoas que nunca sujaram as mãos com o trabalho, mas não obstante faziam as leis que governavam as massas, e viviam como reis, cada qual num palácio individual. (HUBERMAN, 1986, p. 162).

Outras expressões da questão social surgiram no mesmo período, como o

desemprego, o pauperismo e a violência que constituem fatores importantes para o

entendimento da criminalidade, assim como a grande desigualdade social existente

entre o proletariado e a burguesia, resultantes do processo de acumulação de

riqueza, da precarização do trabalho, e de jornadas de trabalho exaustivas.

O capitalismo ampliou ainda mais o antagonismo entre as classes sociais

existentes, ou seja, classe dominante e classe explorada. Conforme os

trabalhadores tomavam consciência enquanto classe explorada pelo capital, surgia a

intenção de um movimento contra a classe dominante. O Estado reagia com a

repressão policial, que é a materialização da força de coerção do mesmo, afinal de

contas, como afirmou Marx e Engels (1998) em seu livro: O Manifesto do Partido

Comunista, o Estado é o ‘Comitê Executivo da Burguesia’ e como tal têm como

principal função manter a ordem e resguardar a propriedade privada.

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25

Já não foi Marx e sim Engels, em seu companheiro apóstolo desacanhado, quem afirmou: ‘Como o Estado surgiu da necessidade de por fim à luta de classes, mas surgiu também no meio da luta de classes, normalmente o Estado é a classe dominante economicamente mais poderosa, que por seu intermédio se converte também em classe politicamente mais forte e adquire novos meios para submeter e explorar a classe oprimida.’ (AZAMBUJA, 2005, p. 102).

E para que a ordem fosse mantida, era necessário punir aqueles que

insistiam em suas revoltas e infringiam as regras postas pela classe dominante,

principalmente quando essas revoltas violavam a propriedade privada, estes

serviriam como exemplo para que outros não seguissem o mesmo caminho, ou seja,

essa punição vinha através da determinação do Estado que assumiria o seu

verdadeiro papel, que era a defesa da classe dominante feita através da mais

profunda coerção. As formas de punições foram mudando conforme evoluía a

sociedade de classes, como veremos a seguir.

1.2. A História das Penas

Para entendermos o surgimento das penas é preciso compreender o

surgimento da sociedade, ou seja, é preciso entender como os homens se

relacionam como são construídas as relações sociais. Assim, não seria possível a

compreensão das penas e prisões sem buscar a raiz da sociedade de classes, visto

que as punições estão ligadas a ela diretamente, ainda que não possa ser associada

de forma direta à sociedade de classes como iremos discutir neste item. Para tanto

buscaremos suporte teórico na obra Vigiar e Punir do autor francês Michel Foucault.

A Antiguidade e a Idade Média possuíram características comuns no que diz

respeito às formas de punição. Ambos os períodos históricos atingiam diretamente

os corpos, através de torturas ligadas ao crime cometido, por exemplo, em casos de

roubo, suas mãos deveriam ser decepadas. A pena privativa de liberdade também

não fazia parte desse contexto histórico, pois o encarceramento servia apenas para

assegurar que o ‘criminoso’ aguardasse a sua punição sem o risco de fugir.

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26

Durante o século XVIII, na Europa, as prisões (masmorras, cativeiros e

calabouços) tinham basicamente a função de punir e torturar aqueles que tinham

cometido algum tipo de crime ou delito – entenda-se também como crime blasfêmia,

heresias, traição, desobediência, e até mesmo o fato de ficar endividado e

consequentemente não conseguir pagar os impostos cobrados pela coroa – realeza.

A partir de 1893, as prostitutas também passaram a ser consideradas criminosas.

Como não existia uma legislação para definir as punições a serem dadas aos

presos, o encarceramento servia como represália por não haverem se comportado

conforme as determinações do soberano, principalmente o não pagamento de

impostos. Era uma forma de manter não só o domínio físico como também o

ideológico sobre o prisioneiro.

Segundo Foucault (2008), em meados do século XVIII, os condenados,

homens ou mulheres, eram submetidos a torturas imensuráveis para pagar por seus

atos criminosos. Na França, como forma de punição, os corpos eram esquartejados,

enquanto o condenado agonizava de dor, posteriormente seus membros e troncos

eram queimados até tornarem-se cinzas e estas, por fim, eram ‘lançadas ao vento’ e

todo esse espetáculo de horror era assistido por dezenas de pessoas durante o

período medieval. Essa era a estratégia encontrada para evitar que novos crimes

fossem cometidos, no intuito de que os que assistiam tivessem medo, ficassem

horrorizados com as cenas e, com isso, não cometessem crimes.

Léon Faucher7, segundo Nardi (2009), “foi o responsável por redigir o

regulamento que tornava mais ‘humana’ as condições dos presos pouco antes de

sua execução, não impedia, contudo, as torturas durante a execução”, esse

regulamento foi redigido para a Casa dos Jovens Detentos em Paris, baseado no

Código Penal Francês de 1810 e tinha o trabalho como agente de transformação

carcerária. Ele já apresentava grande diferença para o sistema de torturas

apresentado anteriormente, pois já não havia o suplício dos corpos, mas um grande

disciplinamento dos detentos através de horários pré-definidos e controlados,

obrigatoriedade do trabalho e do estudo nas prisões, além de orações ou leituras de

cunho moral e religioso. Era a necessidade de se atingir a alma, não apenas o

corpo.

7 Primeiro ministro da França no ano de 1851

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27

A substituição do suplício de corpos por penas mais leves, em Paris, não

ocorreu de forma homogênea, o suplício foi sendo substituído aos poucos e só foi

abolido definitivamente, na Europa, em abril de 1848, porém são cometidos ainda

hoje em alguns países do Oriente fundamentados por questões culturais.

Mas, de modo geral, as práticas punitivas tornaram-se pudicas. Não tocar mais no corpo, ou o mínimo possível, e para atingir nele algo que não é o corpo propriamente. [...] Segundo essa penalidade, o corpo é colocado num sistema de coação e de privação, de obrigações e de interdições. O sofrimento físico, a dor do corpo não são mais os elementos constitutivos da pena. O castigo passou de uma arte das sensações insuportáveis a uma economia dos direitos suspensos. (FOUCAULT, 2008, p. 14)

De acordo com Foucault (2008), nos de casos de reincidência, o castigo

recebido poderia variar entre o indivíduo ter uma letra ‘R’ marcada com ferro quente

em seu corpo, ter sua pena dobrada, o máximo da pena, ou, ainda, a pena

imediatamente superior à recebida anteriormente.

Desde o século XV até o século XVIII o processo criminal era mantido em

sigilo, nem o próprio acusado tinha acesso às informações, assim não tinha como se

defender. Os únicos a terem acesso aos depoimentos e provas eram os

responsáveis pela acusação, os juízes da época.

O acusado era convocado apenas uma vez para ser interrogado e logo após

era determinada a sentença. Não havia espaço para contestação de provas. A pena

imposta ao condenado correspondia a uma soma de fatores, podendo variar de leve,

como o pagamento de uma multa, até a mais severa, que é a morte. A confissão era

um elemento de extrema relevância nesta aritmética penal, porém,

O interrogatório é um meio perigoso de chegar ao conhecimento da verdade; por isso os juízes não devem recorrer a ela sem refletir. Nada é mais equívoco. Há culpados que têm firmeza suficiente para esconder um crime verdadeiro [...]; e outros, inocentes, a quem a força dos tormentos fez confessar os crimes de que não eram culpados. (FERRIÈRE apud FOUCAULT, 2008, p. 36)

Apesar da extinção do suplício de corpos, na Europa no ano de 1848, alguns

outros casos de torturas seguidas de morte continuaram a ser promovidos, foram

guilhotinas, cadafalsos, mãos cortadas, enfim “tudo isso torna bem irregular o

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28

processo evolutivo que se desenvolveu na virada do século XVIII ao XIX”.

(FOUCAULT, 2008, p. 17)

Com o fim do século XVIII, a população já não aceitava as condições

impostas pelo absolutismo e clamava por democracia, queria participação nas

decisões. Já no século XVIII era possível verificar a indignação da população com as

penas consideradas pesadas ou injustas e também com o tratamento diferenciado

dado aos mais ricos. Essa indignação acabava deixando as pessoas exaltadas,

resultando em manifestações violentas, que não faziam nada além de reproduzir as

cenas repugnantes das condenações.

Na França, os condenados, momentos antes de sua morte, eram obrigados a

ler sua própria sentença ou a confessar e pedir perdão pelos crimes cometidos, o

que causava comoção em alguns que assistiam.

O condenado se tornava herói pela enormidade de seus crimes largamente propalados, e às vezes pela afirmação de seu arrependimento tardio. Contra a lei, contra os ricos, os poderosos, os magistrados, a polícia montada ou a patrulha, contra o fisco e seus agentes, ele aparecia como alguém que tivesse travado um combate em que todos os reconheciam facilmente. Os crimes proclamados elevavam à epopéia lutas minúsculas que as trevas acobertavam todos os dias. Se o condenado era mostrado arrependido, aceitando o veredicto, pedindo perdão a Deus e aos homens por seus crimes, era visto purificado; morria, à sua maneira, como um santo. (FOUCAULT, 2008, p. 55)

Percebe-se, então, que a morte como forma de punição não mais

amedrontava a população do século XVIII, mas transformava os criminosos em

heróis aclamados e aqueles que eram responsáveis pela execução eram

amaldiçoados e, por vezes, agredidos.

É preciso punir de outro modo: eliminar essa confrontação física entre soberano e condenado; esse conflito frontal entre a vingança do príncipe e a cólera contida do povo, por intermédio do supliciado e do carrasco. O suplício tornou-se rapidamente intolerável. Revoltante, visto da perspectiva do povo, onde ele revela à tirania, o excesso, a sede de vingança e o ‘cruel prazer em punir’. (FOUCAULT, 2008, p. 63)

Durante o século XVIII são alteradas as medidas de punição, a partir de

então, não bastava uma confissão por parte do acusado (algumas eram arrancadas

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forçadamente e/ou falsas), era necessário que houvesse uma investigação para que

se provasse a culpa ou a inocência do indivíduo.

Para Foucault (2008), com a diminuição da brutalidade das penas, tem-se a

impressão de que também foi reduzida a violência dos crimes cometidos. Porém, ela

está apenas camuflada, mas tão presente quanto antes.

Entretanto, a justiça dos séculos XVIII e XIX revela-se incoerente, feita de

forma abusiva e arbitrária, pois era administrada por juízes e reis soberanos, que

permitiam que o aspecto pessoal ultrapassasse o limite da ‘neutralidade’ que se

deseja de quem julga, condenando ou absolvendo pessoas com base em

motivações pessoais, sem levar em conta o processo de investigação e a realidade

dos fatos.

Porém, hoje já é possível se entender porque não existe uma justiça neutra

por essência, haja vista vivermos em uma sociedade de classes, onde a justiça é

feita pela e para a classe dominante, deixando clara a sua autonomia mediante a

sociedade.

A neutralidade da justiça é uma idéia de justiça formal. A neutralidade não existe, pois quem se diz neutro e não defendendo mudanças sociais, está defendo a ordem vigente, pois a aceita (é uma atitude política). Para que haja justiça, verdadeiramente, é necessário que se assuma uma justiça parcial, enquanto expressão legítima da banda dos oprimidos, dos excluídos. (MELO, 2001, p. 37)

Conforme Foucault (2008), a realidade da justiça arbitrária do século XVIII é,

então, criticada pela classe proletária, que clama por uma reforma jurídica. Essa

reforma foi preparada por magistrados, filósofos, e outros que se opunham ao poder

soberano de julgar, “a partir de objetivos que lhes eram comuns e dos conflitos de

poder que os opunham uns aos outros” (p. 69).

A reforma não pretendia punir menos, mas punir de forma que o indivíduo

pare para pensar se realmente o ilícito vale à pena. Não deveria haver diferença em

ser rico ou pobre, todos teriam uma punição equivalente ao delito cometido, uma

pena não deveria mais ser abrandada quando o infrator fosse um burguês influente.

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Considerando o século XVIII, Foucault (2008) afirma que se uma boa parte da

burguesia aceitou, sem muitos problemas, a ilegalidade dos direitos8, ela a

suportava mal quando se tratava do que considerava seus direitos de propriedade.

Foi uma época em que a burguesia investiu maciçamente em máquinas e matéria-

prima, armazenava suas mercadorias produzidas em galpões, devendo, portanto,

ficarem protegidas contra saques e roubos. Assim, “a ilegalidade dos direitos, que

muitas vezes assegurava a sobrevivência dos mais despojados, tende, com o novo

estatuto da propriedade, a tornar-se uma ilegalidade de bens. Será então necessário

puni-la”. (FOUCAULT, 2008, p. 72)

Segundo Lessa e Tonet (2008), os conservadores defensores do capitalismo

afirmam que a lei não deve privilegiar uma classe ou outra e que todos devem ser

tratados da mesma forma, porém

ao proceder assim a lei não garante a igualdade entre os homens, mas sim a reprodução das desigualdades sociais. Onde todos são politicamente iguais, mas socialmente divididos entre burgueses e proletários, a igualdade política e jurídica nada mais é do que a afirmação social, real, das desigualdades sociais. (LESSA; TONET, 2008, p. 88)

Mesmo investindo para manter a segurança dos seus bens, a burguesia se

deparava com saques e roubos dentro de suas propriedades, tendo como autores

dos crimes seus próprios empregados. Estes tomavam para si sobras de material

para posterior comercialização, visando adquirir meios de complementar a renda e

assim garantir a subsistência de sua família, haja vista sua condição de

miserabilidade, resultante da superexploração do seu trabalho por parte do

capitalista.

Na verdade, a passagem de uma criminalidade de sangue para uma criminalidade de fraude faz parte de todo um mecanismo complexo, onde figuram o desenvolvimento da produção, o aumento das riquezas, uma valorização jurídica e moral maior das relações de propriedade, métodos de vigilância mais rigorosos, um policiamento mais estreito da população, técnicas mais bem ajustadas de descoberta, de captura, de informação: o deslocamento das práticas ilegais é correlato de uma extensão e de um afinamento das práticas punitivas. (FOUCAULT, 2008, p. 66)

8 Neste caso são favoráveis à burguesia

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Surge, então, para a classe dominante, a necessidade de se definir com

clareza quais os atos considerados ilícitos e qual a punição adequada para cada um

deles.

Crimes, antes cometidos contra homens, são rigorosamente condenados

quando passam atingir os bens privados. Segundo Foucault (2008, p. 74),

A economia das ilegalidades se reestruturou com o desenvolvimento da sociedade capitalista. A ilegalidade dos bens foi separada da ilegalidade dos direitos. Divisão que corresponde a uma oposição de classes, pois, de um lado, a ilegalidade mais acessível às classes populares será a dos bens – transferência violenta das propriedades; de outro a burguesia, então, se reservará a ilegalidade dos direitos: a possibilidade de desviar seus próprios regulamentos e suas próprias leis; de fazer funcionar todo um imenso setor da circulação econômica por um jogo que se desenrola nas margens da legislação – margens previstas por seus silêncios, ou liberadas por uma tolerância de fato.

Portanto, o novo sistema penal, criado após a reforma, não visava acabar

com a ilegalidade de forma geral, mas para controlá-la. As penas são, então,

calculadas para que se possa reparar o prejuízo à sociedade e para minimizar as

chances de reincidência.

Para que alguém seja punido é necessário que seja comprovado que ele é

realmente o culpado e para isso o juiz precisa ser imparcial, guiado por provas que o

levem a uma única conclusão: culpado ou inocente.

Porém, é preciso considerar as determinações de classe, ou seja, em uma

sociedade capitalista, as condições objetivas dos seres humanos em larga medida

irão determinar também seus valores éticos e morais. Com a forte pressão e

influência sofrida pelos profissionais da justiça dos que detém o poder financeiro e

político, esta imparcialidade torna-se algo muitas vezes ilustrativa, além da

interferência do juízo de valores oriundo da formação ética e moral do homem,

enquanto ser social.

Se declarado culpado, o indivíduo tem que ser punido; para que a punição

seja feita de maneira correta é necessário analisar a natureza do crime e a sua

aplicação mais viável. Essa é a necessidade de se classificar os crimes e a punição

para cada um deles, “em conformidade com as características singulares de cada

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criminoso” (FOUCAULT, 2008, p. 83), ao contrário da jurisprudência antiga, que

“usava uma série de variáveis para ajustar o castigo, as da ‘circunstância’ e as da

‘intenção’. Ou seja, elementos que permitam classificar o ato em si mesmo.” (ibidem)

Constitui-se, então, uma tabela, onde são listados todos os crimes ocorridos

em cada região, separando de acordo com suas semelhanças. Paralelamente é

criada outra tabela, que deverá conter as punições existentes e posteriormente uma

relação entre ambas as tabelas, identificando assim, qual o crime cometido e qual a

punição direcionada para ele. “Encontrar para um crime o castigo que convém é

encontrar a desvantagem cuja idéia seja tal que torne definitivamente sem atração a

idéia de um delito.” (FOUCAULT, 2008, p. 87)

Em 1775, a Inglaterra acrescenta ao modelo de prisão o isolamento, evitando

assim as más influencias e a cumplicidade. Ainda na mesma década, a Inglaterra

sugere a construção de duas penitenciárias, uma para homens e outra para

mulheres, mas só uma foi construída e que “só parcialmente correspondia ao

esquema inicial: confinamento total para os criminosos mais perigosos; para os

outros, trabalho em comum durante o dia e separação à noite”. (FOUCAULT, 2008,

p. 102)

Quando Foucault (2008) trata a nova legislação criminal, formulada por Le

Peletier9 em 1791, nos diz que,

Tem que haver relações exatas entre a natureza do delito e a natureza da punição; aquele que foi feroz em seu crime sofrerá dores físicas; aquele que tiver sido preguiçoso será obrigado a um trabalho penoso; aquele que foi abjeto sofrerá uma pena de infâmia. (p. 88)

É daí que surge como pena a reclusão, a prisão, uma jaula de ferro destinada

para crimes como rapto “ou que resultam do abuso da liberdade (a desordem, a

violência)” (FOUCAULT, 2008, p. 94). Esse tipo de pena foi criticado por não

produzir ‘efeitos sobre o público’, não haveria mais as cenas dos suplícios, das

torturas, para animar ou repugnar a sociedade. Houve certo descontrole na

aplicação das penas e, segundo o Código Penal de 1810, a detenção ocupa quase

9 Em 3 de maio de 1791, o deputado Louis-Michel Le Peletier de Saint-Fargeau, relator do Comitê de Legislação

Criminal, vai mesmo além ao pedir à Assembléia Constituinte a abolição pura e simples da pena de morte.

(EICHENBERG, 2008)

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todo o campo das punições possíveis, variando das breves às de longa duração,

chegando até o momento da morte do detento.

Surgem as Workhouses10 ou Casas de correção, que tinham a disciplina

como ponto central. Elas têm como função encarcerar com o intuito de disciplinar o

trabalhador camponês para que este possa se adaptar ao novo regime de trabalho,

transformando o camponês servil em trabalhador fabril adaptado ao regime de

acumulação primitiva. Sua essência era similar à das prisões.

No século XIX a prisão muda de aspecto, o que antes era uma jaula de ferro

suspensa no ar, torna-se um grande ‘edifício carceral’, com “arquitetura fechada,

complexa, e hierarquizada que se integra no próprio corpo do aparelho do Estado”

(FOUCAULT, 2008, p. 96), cercada por muralhas intransponíveis. “Alguns anos mais

tarde, haviam sido previstos créditos para construir, à altura do poder que deviam

representar e servir, esses novos castelos da ordem civil” (Ibidem). A transição foi

feita aos poucos, primeiro em uns países, depois em outros, a depender de seu

contexto histórico.

Nestas prisões, o trabalho era obrigatório e, segundo Foucault, possuía

quatro vantagens:

Diminuir o número de processos criminais que custam caro ao Estado [...]; não ser mais necessário adiar os impostos para os proprietários dos bosques arruinados pelos vagabundos; formar uma quantidade de novos operários, o que ‘contribuiria, pela concorrência, a diminuir a mão-de-obra’, enfim permitir aos verdadeiros pobres ter os benefícios, sem divisão, da caridade necessária. (FOUCAULT, 2008, p. 100)

A justificativa dada para o trabalho nas prisões era que ele contribuiria para a

vida do detento, após o seu regresso para a sociedade. Devido a essa justificativa,

não havia mais penas de detenção de curta duração, pois impediria a aquisição das

técnicas e do gosto pelo trabalho, não haveria tempo suficiente para essa

10

A sociedade inglesa criou para os pobres que não se adaptavam ao mercado as Workhouses que eram “casas

de trabalho” onde os trabalhadores eram forçados a trabalhar e tinham direitos mínimos, pois se resumiam

ao recebimento de auxílios como alimentação e material para higiene. (BEHRING e BOSCHETTI, 2008.)

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34

aprendizagem. A função essencial do controle disciplinar é governar o corpo

enquanto produtor da mais-valia.

Essa disciplina de trabalho nas prisões favorece a burguesia, pois enquanto

afasta aqueles que poderiam pôr em riscos suas propriedades, também os

preparava para uma vida de trabalho árduo, de onde se poderia extrair mais

facilmente a mais-valia.

O modelo de prisão mais famoso daquela época foi o da Filadélfia, Walnut

Street, que, ao contrário dos outros, obteve sucesso e “foi continuamente retomado

e transformado até as grandes discussões dos anos 1830 sobre a reforma

penitenciária.” (FOUCAULT, 2008, p. 102),

A prisão da Filadélfia tinha traços do modelo americano, o que contribuiu com

o seu sucesso. Os detentos tinham hora certa para cada atividade e vigilância

constante. O isolamento era destinado apenas aos que recebiam punição especial

ou cometeram crimes extremamente graves.

Em Walnut Street,

A condenação e o que a motivou devem ser conhecidos por todos, a execução da pena, em compensação, deve ser feita em segredo; o público não deve intervir nem como testemunha, nem como abonador da punição; a certeza de que, atrás dos muros, o detento cumpre sua pena deve ser suficiente para constituir um exemplo: terminados aqueles espetáculos de rua criados pela lei de 1786, quando impôs a certos condenados obras públicas a executar nas cidades ou estradas. O castigo e a correção que este deve operar são processos que se desenrolam entre o prisioneiro e aqueles que o vigiam. Processos que impõem uma transformação do individuo inteiro – de seu corpo e de seus hábitos pelo trabalho cotidiano a que é obrigado, de seu espírito e de sua vontade pelos cuidados espirituais [...]. (FOUCAULT, 2008, p. 103).

Pretendia-se executar um processo de correção para que o indivíduo fosse

regenerado de corpo e de espírito e não voltasse a cometer crimes, por isso lhes era

dado o trabalho e também Bíblias e outros livros de cunho religioso.

Page 35: Prisão Feminina na Sociedade Capitalista: Um estudo sobre o estabelecimento prisional feminino Santa Luzia

35

Em todo caso, pode-se dizer que os encontramos no fim do século XVIII diante de três maneiras de organizar o poder de punir. [...] poderíamos dizer que, no direito monárquico, a punição é um cerimonial de soberania; ela utiliza as marcas rituais da vingança que aplica sobre o corpo do condenado; e estende sob os olhos dos espectadores um efeito de terror ainda mais intenso por ser descontínuo, irregular e sempre acima de suas próprias leis, a presença física do soberano e de seu poder. No projeto dos juristas reformadores, a punição é um processo para requalificar os indivíduos como sujeitos de direito; utiliza não marcas, mas sinais, conjuntos codificados de representações, cuja circulação deve ser realizada o mais rapidamente possível pela cena do castigo, e a aceitação deve ser a mais universal possível. Enfim no projeto de instituição carcerária que se elabora, a punição é uma técnica de coerção dos indivíduos; ela utiliza processos de treinamento do corpo – não sinais – com os traços que deixa, sob a forma de hábitos, no comportamento; e ela supõe a implantação de um poder específico de gestão da pena. (FOUCAULT, 2008, p. 107-108)

Segundo Foucault (2008), na segunda metade do século XVIII surgiu a

necessidade de se moldar o homem, para que esse atendesse às expectativas da

classe dominante. Deveria ser um homem ágil, disciplinado, habilidoso, de imagem

imponente, que pudesse ser obediente, manipulável, submisso ao poder monárquico

e profundamente ligado ao catolicismo.

O Estado tinha a função de manter a ordem social e proteção da propriedade

privada. Possuidor de um caráter essencialmente opressor e repressivo, e sendo

responsável pela manutenção da repressão da classe trabalhadora, contava com a

ajuda das escolas, dos meios de comunicação e, principalmente, da Igreja. Daí,

surgiram os militares, os homens do exército e uma gama de escolas que poderiam

transformar o corpo humano em corpos submissos e exercitados, corpos ‘dóceis’,

como diria Foucault.

Esses métodos que permitem o controle minucioso das operações do corpo, que realizam a sujeição constante de suas forças e lhe impõe uma relação de docilidade-utilidade, são o que podemos chamar as ‘disciplinas’. Muitos processos disciplinares existiam há muito tempo: nos conventos, nos exércitos, nas oficinas também. Mas as disciplinas se tornaram no decorrer dos séculos XVII e XVIII fórmulas gerais e dominação. (FOUCAULT, 2008, p. 118).

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36

Essas escolas disciplinadoras visavam minimizar a força de reação contra o

que era imposto aos homens. Eram locais cercados por altas muralhas, isolados de

contatos externos.

Na disciplina, os elementos são intercambiáveis, pois cada um se define pelo lugar que ocupa na série, e pela distância que os separa dos outros. A unidade não é portanto nem o território (unidade de dominação), nem o local (unidade de residência), mas a posição na fila: o lugar que alguém ocupa numa classificação, o ponto em que se cruzam uma linha e uma coluna, o intervalo numa série de intervalos que se pode percorrer sucessivamente. (FOUCAULT, 2008, p. 125).

Os alunos eram dispostos em filas, sua colocação variava constantemente,

pois o alinhamento era organizado segundo a idade, desempenho, dificuldade de

cada um, etc. “As disciplinas, organizando as ‘celas’, os ‘lugares’ e as ‘fileiras’ criam

espaços complexos [...] que realizam a fixação e permitem a circulação; recortam

segmentos individuais e estabelecem ligações [...]” (ibidem, p.126). “[...] mas ainda

no século XIX, quando se quiser utilizar populações rurais na indústria, será

necessário apelar a congregações, para acostumá-las ao trabalho em oficinas; os

operários são enquadrados em ‘fábricas-conventos’.” (Ibidem, p. 128).

Assim como nas prisões, as escolas disciplinadoras tinham grande rigor

quanto a horários. Cada minuto era contabilizado e deveria corresponder ao que era

imposto, havia um controle constante sobre o tempo empregado nos serviços, para

evitar que algo pudesse atrapalhar ou interromper o curso de cada atividade. Havia

também uma ‘humanização’ dos indivíduos através dos preceitos da Igreja Católica.

[...] o mecanismo complexo da escola mútua se construirá uma engrenagem depois da outra: confiaram-se primeiro aos alunos mais velhos tarefas de simples fiscalização, depois de controle do trabalho, em seguida, de ensino; e então no fim das contas, todo o tempo de todos os alunos estava ocupado seja ensinando seja aprendendo. A escola torna-se um aparelho de aprender onde cada aluno, cada nível e cada movimento, se estão combinados como deve ser, são permanentemente utilizados no processo geral de ensino. (Ibidem, p. 140).

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37

Havia, então, uma espécie de ‘adestramento’ dos indivíduos, para que se

tornasse mais fácil a apropriação de seu trabalho e a reprodução da ideologia

dominante.

O poder disciplinar é com feito um poder que, em vez de se apropriar e de retirar, tem como função maior ‘adestrar’; ou sem dúvida adestrar para retirar e se apropriar ainda mais e melhor. Ele não amarra as forças para reduzi-las; procura ligá-las para multiplicá-las e utilizá-las num todo. [...] A disciplina ‘fabrica’ indivíduos; ela é a técnica especifica de um poder que toma os indivíduos ao mesmo tempo como objetos e como instrumentos do seu exercício. (FOUCALT, 2008, p. 143).

A vigilância contida nesses locais era exacerbada e abrangia todas as

atividades, o responsável por tal função ficava em um local privilegiado, donde

poderia ver toda a movimentação.

Esse tipo de vigilância também pode ser visto no interior das grandes oficinas

e das fábricas e, para tanto, foram contratadas pessoas especializadas, para

prevenir erros, desvio de funções, ociosidade, etc.

Na essência de todos os sistemas disciplinares, funciona um pequeno mecanismo penal. È beneficiado por uma espécie de privilégio de justiça, com suas leis próprias, seus delitos especificados, suas formas particulares de sanção, suas instâncias de julgamento. As disciplinas estabelecem uma ‘infra-penalidade’; quadriculam um espaço deixado vazio pelas leis; qualificam e reprimem um conjunto de comportamentos que escapava aos grandes sistemas de castigo por sua relativa indiferença. (Ibidem, p. 149).

Segundo Foucault (2008), nas oficinas, escolas, ou nos exércitos,

consideravam-se punições todas as atitudes que faziam com que as crianças

sentissem seus erros, podendo inclusive chegar a humilhações.

Em suma, a arte de punir, no regime do poder disciplinar, não visa nem a expiação, nem mesmo exatamente a repressão. [...] A penalidade perpétua que atravessa todos os pontos e controla todos os instantes das instituições disciplinares compara, diferencia, hierarquiza, homogeniza, exclui. Em uma palavra, ela normaliza. (Ibidem, p. 152 – 153).

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38

Foucault (2008) diz que, inicialmente, as instituições disciplinadoras serviam

para conter as agitações sociais, evitar roubos, “fazer respeitar os regulamentos e as

autoridades, [...] tende a fazer crescer as aptidões, as velocidades, os rendimentos

e, portanto, os lucros.” (p. 173) Essa função é muito útil durante a Revolução

Industrial, pois prepara homens para servir a senhores detentores dos meios de

produção.

Esses mecanismos de disciplina, sempre formados por grupos religiosos,

exerciam a função de disciplina social, que deveria ser prestada pelo Estado. Na

França do século XVIII esse papel foi assumido pelo sistema policial.

A organização do aparelho policial no século XVIII sanciona uma generalização das disciplinas que alcança as dimensões do Estado. Se bem que a polícia tenha estado ligada da maneira mais explícita a tudo o que, no poder real, excedia o exercício da justiça regulamentada, compreende-se por que a polícia pôde resistir com um mínimo de modificações à reorganização do poder judiciário; e por que ela não parou de lhe impor cada vez mais pesadamente, até hoje, suas prerrogativas; é sem dúvida porque ela é seu braço secular; mas é também porque bem melhor que a instituição judiciária, ela se identifica, por sua extensão e seus mecanismos, com a sociedade de tipo disciplinar. Seria entretanto inexato pensar que as funções disciplinares tenham sido confiscadas e absorvidas definitivamente por um aparelho de Estado. (FOUCAULT, 2008, p. 177).

Aos poucos a justiça penal vem se moldando, primeiro penalizava-se afligindo

os corpos, ceifando vidas, posteriormente as penas corporais foram amenizadas,

buscava-se atingir a alma ao invés dos corpos, veio o controle disciplinar, a pré-

definição de crimes e penas, as jaulas de ferro, prisões com obrigatoriedade de

trabalho, o isolamento nas prisões e o disciplinamento.

O ponto extremo da justiça penal no Antigo Regime era o retalhamento infinito do corpo do regicida: manifestação do poder mais forte sobre o corpo do maior criminoso, cuja destruição total faz brilhar o crime em sua verdade, O ponto ideal da penalidade hoje seria a disciplina infinita: um interrogatório sem termo, um inquérito que se prolongasse sem limite numa observação minuciosa e cada vez mais analítica, um julgamento que seja ao mesmo tempo a constituição de um processo nunca encerrado, o amolecimento calculado de uma pena ligada à curiosidade implacável de um exame, um procedimento que seja ao mesmo tempo a medida permanente de um desvio em relação a uma norma inacessível e o movimento assintótico que obriga a encontrá-la no infinito. (Ibidem, p. 187).

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39

A instituição ‘prisão’ que se forma no final do século XVIII e início do século

XIX deixa implícita (muitas vezes com o consenso social da época) todas as formas

de punição existente anteriormente, porém, não podemos considerá-la como a

melhor solução para os problemas sociais. Ela teria a função de transformar os

indivíduos, para readequá-los a vida em sociedade.

Uma justiça que se diz igualitária, mas que pune diferentemente indivíduos de

classes sociais diferentes, ou seja, há uma seletividade na punição de crime, devido

à estratificação social, servindo para o controle da classe trabalhadora, embora a

legislação parta do princípio da igualdade formal.

A prisão não deve ser vista como uma instituição inerte, que volta e meia teria sido sacudida por movimentos de reforma. [...] Ao se tornar punição legal, ela carregou a velha questão jurídico-política do direito de punir com todos os problemas, todas as agitações que surgiram em torno das tecnologias corretivas do indivíduo. (FOUCAULT, 2008, p. 198).

Segundo Foucault (2008), a pena de prisão não deve ser interrompida, antes

que seja totalmente cumprida e que o isolamento leva o detento a refletir e a sentir

remorso devido aos seus crimes. Põem-se em xeque alguns conceitos dos modelos

de prisão anteriores, como a questão religiosa predominante, a necessidade do

isolamento, qual a forma de permite uma melhor vigilância com baixos custos. Ele

nos diz que o encarceramento penal que teve início no século XIX servia tanto para

a privação de liberdade enquanto forma de castigo, como para a transformação

técnica dos indivíduos.

2. O SURGIMENTO DAS PRISÕES FEMININAS

Nesta seção iremos tratar do surgimento das prisões femininas e suas

especificidades, sendo sua demanda mais uma expressão da questão social,

consequência da sociedade capitalista na qual estamos inseridas, que impõe a

todos a filosofia do consumo desenfreado a qualquer custo, inclusive sob a forma de

violência e criminalidade, bem como as relações de gênero neste contexto, ou seja,

como as relações hierárquicas entre homens e mulheres contribuem diretamente no

contexto da prisão feminina.

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40

As prisões femininas originaram-se dos conventos, portanto, sua gênese está

profundamente ligada às normas da Igreja Católica.

Entre o século XVI e XVIII, as prisões femininas, enquanto instituições

edificadas não existiam, as mulheres que contestassem as normas morais vigentes,

eram enclausuradas em conventos, no qual, ficavam isoladas do mundo exterior,

voltadas para a oração diária e purificação do corpo.

Uma das proibições da Igreja Católica, na época, era a vivência da

sexualidade, sendo assim, as mães solteiras e as mulheres que ousassem fazer uso

do seu corpo conforme sua própria vontade eram presas, juntamente com as

criminosas e com as religiosas.

Esses espaços que eram compartilhados com as religiosas (freiras) que ali

viviam, tinha um misto de sentimentos contraditórios, o convívio voluntário das

religiosas e das mulheres forçadas ao enclausuramento, permitia

[...] o afloramento de todos os ódios e ciúmes, os mais variados e inimagináveis. Toda casa de reclusão feminina vivenciou estas contradições abrigando o desejo de buscar a Deus, o amor ao próximo, conjuntamente ao ódio aos homens, e até ao próprio Deus. (ALMEIDA, 2007, p. 2).

Esses conventos-prisões também puniam com severidade aquelas que por

ventura não seguissem as regras impostas no âmbito religioso, como por exemplo,

terem encontros furtivos com homens através das grades do convento, e essas

punições se configuravam em “[...] quase sempre ficar a pão e água, imputação de

culpa, chegando-se à prisão domiciliar e açoites.” (Ibidem, p. 4).

De acordo com Almeida (2007), o trabalho também fazia parte do dia-a-dia

dessas mulheres, pois além das orações que ocupavam boa parte do seu dia, as

atividades como costura e bordado também contribuíam para discipliná-las à vida no

interior dos conventos.

Segundo Espinoza (2002), quando se concebeu a prisão como instituição,

entendeu-se que era necessária a separação de homens e mulheres, devendo ter

tratamento diferenciado para ambos. Enquanto as prisões masculinas buscavam

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41

restaurar, nos homens, o sentido de legalidade, nas mulheres elas buscavam

reinstalar o sentimento de pudor.

2.1 Relações de Gênero e as mulheres presas

Não é possível falar da relação de gênero sem levarmos em consideração

fatores determinantes que contribuíram para a formação da família, haja vista a

história da mulher ter passado por mudanças dentro das sociedades, principalmente

no que diz respeito a evolução histórica, por não ter tido sempre uma condição de

subordinação em relação ao homem, como foi nas sociedades em que prevalecia a

família matriarcal.

A origem da família é analisada por Engels (2005) como uma construção

social, na qual o sistema de parentesco é resultado da evolução histórica das

mudanças ocorridas na dinâmica da sociedade primitiva e posteriores. Assim sendo,

a família mudou seus laços de parentesco de acordo com a conveniência da classe

dominante.

Engels (Ibidem) retrata a sociedade primitiva como uma época que, “homens

praticavam a poligamia11 ao mesmo tempo em que suas mulheres praticavam a

poliandria12 e, portanto, os filhos de uns e de outros tinham de ser considerados

comuns.” (p. 40). A família começava, então, a sua evolução histórica para união

monogâmica13. Porém, antes da família chegar a esta construção, passou por várias

etapas, como nos relata Bachofen14 apud Engels (2005), a mulher tem sua linhagem

definida dentro da família no casamento grupal, haja vista ser reconhecida

exclusivamente a filiação materna, já que a paternidade era algo inexato nas

relações poligâmicas.

A importância e o poder que a mulher tinha na era dos clãs, passaram

despercebidos para alguns filósofos do século XVIII, pois estes expressavam

11

Homem que possui várias mulheres.

12

Mulher que possui vários homens.

13

Homem que tem apenas uma mulher.

14

Segundo Engels, foi um grande pesquisador do tema família.

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42

algumas idéias nas quais a mulher teria sido escrava do homem. Porém o que se

viu, segundo Wright15 apud Engels (2005), foi que

Habitualmente as mulheres mandavam na casa e as provisões eram comuns. Mas infeliz do pobre marido ou amante que fosse preguiçoso ou demasiado inábil para contribuir com a sua parte das provisões. [...] As mulheres constituíam o grande poder dentro dos clãs (gens) como, aliás, em toda parte. Elas não hesitavam, quando a ocasião o exigia, em destruir um chefe e rebaixá-lo à condição de simples guerreiro. (p. 56).

Para reforçar, Engels (Ibidem), ainda diz que “Entre todos os selvagens e em

todas as tribos que se encontram nas fases inferior, média e até em parte na

superior da Barbárie, a mulher não só é livre, mas também muito considerada.”

(p.56).

E assim, a família passou por vários processos para sua formação,

começando pela família consanguínea, que segundo Engels (2005), “só os

ascendentes e os descendentes, os pais e os filhos, estão reciprocamente excluídos

dos direitos e deveres (como poderíamos dizer) do casamento.” (p. 45). Esse tipo de

família passou por várias mudanças até transformar-se em família punaluana, que

tinha como características básicas, ainda na compreensão de Engels (Ibidem), a

exclusão de relações sexuais entre irmãos uterinos (isto é, irmãos por parte de mãe), [...] e terminando pela proibição do casamento entre irmãos colaterais, quer dizer, segundo nossos atuais designativos de parentesco, entre irmãos carnais, primos em segundo e terceiro graus. (p.46).

Quanto à família pré-monogâmica, que substituiu os casamentos por grupos,

Engels (Ibidem), relata que,

15

Arthur Wright foi um missionário que estudou a relação familiar dos iroqueses-senekas, índios da América

do Norte.

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43

Nesse estágio, um homem vive com uma mulher, mas de forma tal que a poligamia e a infidelidade ocasional permanecem um direito dos homens, embora a poligamia seja raramente observada, também por causas econômicas, ao passo que, na maioria dos casos, exige-se das mulheres a mais rigorosa fidelidade enquanto durar a vida em comum, sendo o adultério destas, castigado de maneira cruel. O vínculo conjugal é, porém, facilmente dissolúvel por qualquer das partes e, tal como anteriormente, os filhos pertencem exclusivamente à mãe. (p. 54)

Uma característica observada por Engels (2005) nesta forma de família é a

dificuldade dos homens em encontrar mulheres, fato que não foi visto nas formas de

família anteriormente citadas. Contudo, para este autor, a família pré-monogâmica

teve sua importância por surgir

No limite entre o estado selvagem e a barbárie, na maioria das vezes durante a fase superior do primeiro, apenas em certos lugares durante a fase inferior da segunda. É a forma de família característica da barbárie, como o casamento por grupos é a do estado selvagem e a monogamia é a da civilização. (p. 60)

A passagem da forma de família pré-monogâmica para a monogâmica foi

baseada em alguns fatos econômicos e históricos, que fundamentaram a construção

de certos valores relacionados à preservação das riquezas adquiridas no período.

Citamos como exemplo a descoberta de que os homens podiam domesticar os

animais e criar gado e, com isso, passaram a tê-los em abundância, constituindo

assim as riquezas, ou seja, o surgimento da propriedade privada.

A partir deste momento, segundo Engels (Ibidem) começou-se a reavaliar os

valores da descendência da família, até então matrilinear, seguindo a descendência

do direito materno. Para que os filhos da descendência paterna tivessem seus

direitos de herança garantidos, era necessário que o direito materno fosse

suprimido. Desta maneira, a sociedade estabelece o patriarcado, uma forma de

garantir não apenas a herança, mas a submissão feminina.

Na realidade, a família monogâmica era necessária para que se restringissem

os parentescos, agora a mulher teria que ser fiel, no sentido sexual, e seus filhos

teriam apenas uma mãe e um pai, o que garantiria o direito à propriedade privada,

herança direta do pai.

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44

Dessa forma, à medida que as riquezas iam aumentando, por um lado conferiam ao homem uma posição mais importante que aquela da mulher na família e, por outro lado, faziam com que nele surgisse a idéia de valer-se dessa vantagem para modificar, em favor dos filhos, a ordem tradicional da herança. Isso era, porém, impossível de se realizar enquanto permanecesse em vigor a descendência segundo o direito materno. Esse direito teria de ser supresso, e assim o foi. (ENGELS, 2005, p. 63)

Assim, a mulher passa a ser sexualmente fiel e a descendência, antes

materna, passa a ser paterna e a família a ter sua herança vinculada à linhagem

masculina e não mais feminina. O homem, com o domínio sobre a criação de

animais e agricultura, passa a acumular riquezas e a ter o direito de transmiti-las aos

seus descendentes.

Engels (2005) relata que,

A derrocada do direito materno foi a derrota do sexo feminino na história universal. O homem tomou posse também da direção da casa, ao passo que a mulher foi degradada, convertida em servidora, em escrava do prazer do homem e em mero instrumento de reprodução. (p.64)

A desvalorização da mulher é definida com a família monogâmica, na qual o

homem passa a ter, definitivamente, o poder sobre a família constituída pela mulher

e os filhos, herdeiros diretos, segundo Engels (Ibidem), são eles que irão tomar

posse dos bens paternos. Por meio do casamento monogâmico, o homem torna-se

o único a poder romper os laços conjugais, como também lhe é concedido o direito à

infidelidade.

A submissão da mulher foi para a classe dominante, segundo Engels

(Ibidem), algo que era muito conveniente, pois os casamentos, até então, eram

feitos como se fossem um negócio, nem de longe era algo que se relacionasse ao

amor conjugal. Tudo funcionava em torno dos interesses na preservação da riqueza

e da propriedade privada. Já nas relações da classe oprimida, desaparece por

completo o interesse nos bens e riqueza, pelo fato de não estarem presentes na vida

cotidiana destes.

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45

Segundo Engels (2005), a mulher só ganhou novamente um espaço no

convívio social com o advento da industrialização, quando sua força de trabalho se

torna necessária para a geração de riquezas socialmente produzidas.

A passagem da manufatura para a grande indústria foi o momento de incorporação do trabalho feminino à produção social. A força motora necessária para a produção havia sido transferida dos músculos do trabalhador para a máquina, abrindo caminho para a incorporação de mulheres e crianças ao processo produtivo. (TOLEDO, 2008, p. 40)

A partir da industrialização, a mulher passa a ter um novo papel a

desempenhar na sociedade fora de casa, vendendo sua força de trabalho, ou como

diria Engels (2005), “convertendo-a frequentemente em sustentáculo da família”.

Para sociedade capitalista a mulher é trabalhadora e como tal produtiva,

desde a época da Revolução Industrial. Hoje estão em todas as funções dentro do

mercado de trabalho, nas diversas áreas como pecuária, agricultura, saúde e

educação, entre outras. Porém, a inserção da mulher no mercado de trabalho não a

excluiu de suas antigas obrigações, enquanto responsável pelo lar, existe agora uma

acumulação de funções, a mulher além de continuar sendo a responsável direta por

cuidar da casa, das crianças, dos idosos e da educação, ainda tem que suprir as

necessidades materiais de sua família. E mesmo no mercado de trabalho tem o

salário regulado pelo sexo, como explica Camurça e Gouveia (2004):

Estando o mercado de trabalho organizado por sexo, o preço da mão-de-obra também irá variar conforme seja um homem ou uma mulher quem faz o serviço. A observação cotidiana nos mostra que são as mulheres quem recebem os salários mais baixos. É o trabalho delas que é desvalorizado. (p.26).

As mulheres aprendem desde cedo nas relações de gênero que devem ser

submissas e sendo assim esse processo se naturaliza, porém, também sentem que

por outro lado têm algum ganho em relação a ser mulher dentro da sua identidade

feminina nos padrões da sociedade que se encontra inserida. Quando essas

mulheres trocam de papel com os homens, no sentido de ficarem responsáveis pelo

sustento da família, sentem que perdem o direito a algumas coisas que para o seu

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universo feminino são importantes, por isso, “melhor não questionar o velho modelo

de ser mulher”. (CAMURÇA; GOUVEIA, 2004, p. 40).

Hoje, porém, encontramos mulheres que são responsáveis pelo sustento de

sua família e nesta condição as coisas mudam de figura, já que essas mulheres em

sua maioria sobrevivem de uma atividade ligada ao mercado informal16, e estas,

quando privadas de liberdade não possuem direito ao auxílio-reclusão, ficando sua

família muitas vezes desprovida das condições mínimas financeiras para suprir as

necessidades básicas de sobrevivência. Estas mulheres, geralmente, são

provenientes de famílias da classe trabalhadora, até mesmo em condições de

miserabilidade, favorecendo assim as péssimas condições de sobrevivência e

estrutura familiar.

Mesmo sendo muitas vezes o ‘homem’ da casa, a mulher não consegue se

libertar das raízes de sua construção nesta sociedade machista, que a faz

subordinada, ou melhor, ‘dominada-explorada’ 17, onde segundo Carloto (2009):

A tentativa de construir o ser mulher enquanto subordinado, ou melhor, como Saffioti (1992), como dominada-explorada, vai ter a marca da naturalização, do inquestionável, já que dado pela natureza. Todos os espaços de aprendizado, os processos de socialização vão reforçar os preconceitos e estereótipos dos gêneros como próprios de uma suposta natureza (feminina e masculina), apoiando-se, sobretudo na determinação biológica. A diferença biológica vai se transformar em desigualdade social e tomar uma aparência de naturalidade. (p.2).

No universo feminino e das relações de gênero, a mulher é considerada um

ser frágil, nascido para cuidar da família e incapaz de cometer atos violentos,

próprios do universo masculino. Ao ingressar na criminalidade, a mulher acaba

adentrando no espaço antes ocupado por homens e estar privada de liberdade

significa, entre outras coisas, deixar de cuidar da família, já que esta atribuição faz

parte de sua gama de responsabilidades.

Segundo Espinoza (2002), a situação da mulher presa é mais grave do que a

do homem preso, pois ela já é excluída socialmente antes da prisão, permanece

16

Trabalho que não possui vínculo empregatício.

17

SAFFIOTI (1992) apud CARLOTO.

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47

durante o período de reclusão e a situação se pereniza ainda depois da obtenção da

liberdade.

A este contexto soma-se a violação dos direitos contidos na Lei de Execução

Penal – LEP, pois nos presídios as condições desumanas de sobrevivência trazem

várias consequências negativas para o indivíduo, que por vezes se revolta com o

sofrimento vivido dentro dos presídios e transfere essa revolta contra a sociedade.

Nas prisões convivem

[...] indivíduos de diferentes procedências, quer de família, de ambiente ou religião, com idade, costumes e nível sócio-econômico-cultural os mais diversos, separados de forma abrupta da sociedade livre e desenvolvendo obrigatoriamente uma vida própria. (OLIVEIRA, 1996, p. 75)

Outro ponto importante a ser considerado é que as mulheres, privadas de

liberdade, necessitam de uma atenção à saúde diferenciada, haja vista a sua

condição de reprodução humana (gestação/maternidade), onde, por lei, lhe é

assegurado o direito de acompanhamento durante o pré-natal e após o nascimento

do bebê, este deve permanecer em companhia da mãe pelo período de seis meses,

que corresponde ao período de aleitamento materno.

Uma característica relevante é que mesmo sendo as usuárias privadas de

liberdade – em sua maioria – cúmplices dos seus companheiros, estes, quando

detidos e ainda depois de soltos, não as procuram mais, por isso elas recebem

menos visitas que os presos masculinos.

Devemos ressaltar que houve uma mudança nas condutas deletivas realizadas por mulheres; os crimes cometidos por elas não mais se encaixam nos denominados ‘delitos femininos’ (infanticídio, aborto, homicídio passional), havendo se incrementado os índices de condenação por crimes como tráfico de entorpecentes, roubos, sequestros, homicídios, entre outros. (ESPINOZA, 2002, p. 53)

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3. A LEI DE EXECUÇÃO PENAL E O ESTABELECIMENTO PRIS IONAL

FEMININO SANTA LUZIA - EPFSL

A Política de Segurança Pública sempre foi um problema para o Estado

desde o Código Penal de 1940, onde após várias tentativas de melhoria por meio de

projetos lançados por alguns juristas, foi aprovado em 1930 o projeto do Ministro da

Justiça Ibrahim Abi-Hachel que se converteu na Lei nº 7.210 de 11 de julho de 1984

a atual e vigente Lei de Execução Penal – LEP, com os seus 204 (duzentos e

quatro) artigos tem como finalidade proteger os direitos dos detentos, sua dignidade,

e principalmente, proporcionar condições de reintegração social.

3.1 Lei de Execução Penal - LEP

Elaborada por legisladores com a visão positivista e normativista do Direito, a

Lei de Execução Penal – LEP, parte do princípio que, serão levados em

consideração os atos jurídicos que segundo Kelsen18 apud Bittar (2004), seriam os

fenômenos jurídicos puros e não os não-jurídicos, como os culturais, sociológicos,

antropológicos, éticos, meta-físicos e religiosos. Então,

Ser e dever-ser diferem entre si na mesma medida em que ciências sociais (humanas) diferem das ciências naturais (físico-matemáticas). Essa diferenciação repousa na distinção provocada pelos termos causalidade e imputação e suas conseqüências lógico-teóricas. De fato, condição e conseqüência ligam-se pela imputação de uma sanção a um comportamento, na esfera do Direito; nesse sentido, a sanção pode ser, como pode não ser aplicada. Causa e efeito, estudadas pelas ciências naturais, comportam-se com regularidade, e, então, o que é causa provoca necessariamente o efeito respectivo. (ALMEIDA; BITTAR, 2004, p. 337).

Sendo assim tudo o que a LEP preconiza teoricamente levaria a resolução de

todos os problemas da comunidade carcerária, bem como, a resolução da violência,

já que em seu contexto a LEP, direciona toda a responsabilidade para o indivíduo e

não para a sociedade de classes na qual estamos inseridos, partindo desse

princípio, entende-se que ‘tratando’ o detento, ou seja, ressocializando-o, a

18

“Hans Kelsen, como pensador do Direito, qualifica-se dentro do diversificado movimento a que se costuma

chamar de positivismo jurídico”. (ALMEIDA; BITTAR, 2004, p. 335).

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criminalidade estaria praticamente resolvida, dependendo apenas da vontade e do

esforço pessoal do próprio indivíduo.

Este pensamento nos leva de volta ao conservadorismo, no qual o problema

estaria no indivíduo que não se adequava à forma de sociedade, ele seria o

problema, não havendo questionamentos quanto à exploração exacerbada da classe

trabalhadora pelo capitalista, que só se preocupa em preservar seus interesses,

dentre eles acumulação de riquezas.

Contudo, quando partimos para verificar a execução do que está disposto nos

artigos e incisos da LEP, descobrimos que quase nada é efetivado, a começar pela

própria Assistência Jurídica que nela é garantida, que deve ser gratuita e prestada

pelo Estado para aqueles que não possuem recursos financeiros.

Art. 15. A assistência jurídica é destinada aos presos e aos internados sem recursos financeiros para constituir advogado.

A ausência desta Assistência Jurídica é uma das causas das rebeliões dentro

do EPFSL, a constatação desse fato foi possível através da experiência durante o

estágio curricular obrigatório vivida no referido estabelecimento, onde, mesmo

contando com um assessor jurídico, os atendimentos às usuárias privadas de

liberdade são mínimos.

A ineficiência desse e de diversos outros artigos constantes na LEP gera um

verdadeiro conflito dentro das penitenciárias, isso somado ao ambiente hostil,

próprio das instituições prisionais, forma um verdadeiro ‘barril de pólvora prestes a

explodir’.

Várias são as disposições constantes na LEP, garantindo o cumprimento da

sentença judicial, bem como a reintegração social do apenado. Em seu artigo

primeiro, a LEP deixa bem claro que a orientação baseia-se em dois fundamentos: o

estrito cumprimento dos mandamentos existentes na sentença e a

instrumentalização de condições que propiciem a reintegração social do condenado,

a saber:

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“Art. 1° A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou

decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do

condenado e do internado”.

No entanto, quando nos remetemos à realidade carcerária, não é bem isso

que observamos, visto que as condições oferecidas nos presídios não condizem

com o disposto na Lei. O EPFSL não se diferencia dessa realidade, pois vários

artigos e incisos da lei não são efetivados no contexto cotidiano daquele local.

Teoricamente, a LEP revela-se tão completa que tem, inclusive, a

preocupação quanto à classificação dos condenados e a Comissão Técnica de

Classificação, que será responsável por essa qualificação, como descrito abaixo:

Art. 5° Os condenados serão classificados, segundo os seus antecedentes e personalidade, para orientar a individualização da execução penal.

Art. 6° A classificação será feita por Comissão Técnica de Classificação que elaborará o programa individualizador e acompanhará a execução das penas privativas de liberdade e restritivas de direitos, devendo propor, à autoridade competente, as progressões e regressões dos regimes, bem como as conversões.

Art. 7º A Comissão Técnica de Classificação, existente em cada estabelecimento, será presidida pelo diretor e composta, no mínimo, por 2 (dois) chefes de serviço, 1 (um) psiquiatra, 1 (um) psicólogo e 1 (um) assistente social, quando se tratar de condenado à pena privativa de liberdade.

“Parágrafo único. Nos demais casos a Comissão atuará junto ao Juízo da Execução

e será integrada por fiscais do serviço social”.

A LEP é completa e não deixa margem para erros ou falhas, porém, para

entendermos a falta de interesse do Estado quanto a não efetivação da mesma,

devemos considerar que estamos inseridos em uma sociedade de classes que

valoriza o lucro e está baseada na exploração da classe trabalhadora, ou seja, não é

conveniente para o capital – representado pelo Estado – investir em uma camada da

sociedade que enquanto encarcerada, não produz riquezas.

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Podemos citar, ainda, que o Capítulo II, do Título II da LEP é classificado

como “Da Assistência”, e essa assistência consiste em: material, à saúde, jurídica

(como já comentada), educacional, social e religiosa, como veremos.

Na Assistência Material o interesse aparentemente é de suprir as

necessidades básicas de sobrevivência humana, pois refere-se a alimentação,

vestuário e instalações higiênicas o que garantiria de certa forma a vida do ser.

Então,

Art. 12. A assistência material ao preso e ao internado consistirá no fornecimento de alimentação, vestuário e instalações higiênicas.

Porém, quando chegamos ao EPFSL, eram fornecidas três alimentações por

dia, não havia vestuário para as usuárias privadas de liberdade e muitas ficavam

com a mesma roupa e descalças por vários dias sem ter para quem apelar, já que o

Estado não estava cumprindo com seu papel, alguns familiares não vinham vê-las e

em outros casos elas não queriam que estes soubessem que ali estavam. No que se

refere aos produtos de limpeza e higiene pessoal não eram fornecidos. E o que falar

da Assistência Educacional, que segundo a LEP, “compreenderá a instrução escolar

e a formação profissional do preso e do internado” (Art. 17). Uma realidade tão

distante dos presídios, pelo menos do EPFSL, no qual segundo informações da

assistente social existiu uma professora voluntária, mais por parte do Estado nada

foi implementado neste sentido.

A Assistência á Saúde é dada de maneira precária e ínfima pelo Estado, o

que agrava a situação de saúde daqueles que precisam da assistência, pois a

superlotação e a falta de higiene dos presídios favorecem o aparecimento e a

proliferação de doenças. Esta assistência compreende o atendimento médico,

odontológico e farmacêutico, serviços que deviam estar disponíveis dentro do

sistema penitenciário e se não estiverem o Estado tem a obrigação de levar o

usuário privado de liberdade até o atendimento necessário.

Para se ter uma ideia da precariedade citada, no EPFSL só existe um

médico19 clínico que atende um dia por semana, a medicação para as detentas não

19

Nos documentos do EPFSL constam dois médicos, porém, efetivamente, apenas um comparece para realizar

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chega, e o que é conseguido, vem em quantidade insuficiente. Já o atendimento

odontológico é feito dentro do próprio Complexo Penitenciário, sendo quase sempre

remarcado por falta de material para realizar os procedimentos, de escolta ou de

transporte.

Art. 14 - A assistência à saúde do preso e do internado, de caráter preventivo e curativo, compreenderá atendimento médico, farmacêutico e odontológico.

§ 1º - (Vetado).

§ 2º - Quando o estabelecimento penal não estiver aparelhado para prover a assistência médica necessária, esta será prestada em outro local, mediante autorização da direção do estabelecimento.

Contudo, não podemos esquecer-nos da Assistência Religiosa que deveria

ser supervalorizada, se levarmos em consideração que por meio dela poder-se-ia

conseguir algumas melhora na conduta dos usuários privados de liberdade. A LEP

preconiza que esta deve ser com liberdade de culto em local apropriado e nunca

deve ser imposta. Infelizmente inexistente no EPFSL.

Art. 24. A assistência religiosa, com liberdade de culto, será prestada aos presos e aos internados, permitindo-se-lhes a participação nos serviços organizados no estabelecimento penal, bem como a posse de livros de instrução religiosa.

Existe ainda o Art. 126, Sessão IV, parágrafo 1º, no qual “o condenado que

cumpre pena em regime fechado ou semi-aberto poderá remir, pelo trabalho, parte

do tempo de execução da pena”. Garantindo a este uma redução na pena de 1 (um)

dia de pena para cada 3 (três) dias trabalhados, o que não é permitido quando a

usuária privada de liberdade encontra-se sub-júdice.

Não podemos esquecer a Assistência Social, que com grande dificuldades é

conseguida nas secretarias de assistência social (Município/Estado), o que tem que

ser feito por meio de articulações, estas, imprescindíveis para a viabilização do

acesso aos direitos das usuárias privadas de liberdade. A articulação é necessária

consultas e procedimentos médicos.

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tendo em vista que a criminalidade é um fenômeno multifacético, no qual a própria

LEP torna-se um instrumento dessas articulações.

As ocorrências no EPFSL eram quase sempre referentes à documentação

das usuárias privadas de liberdade e seus filhos, muitas vezes para poder ter acesso

ao benefício do Bolsa-família20, a remuneração pelos trabalhos prestados no

presídio, dentre outros.

Art. 22. A assistência social tem por finalidade amparar o preso e o internado e prepará-los para o retorno à liberdade.

É necessário ainda falar da Assistência ao Egresso na SEÇÃO VIII, do

capítulo II, Art. 25, que como não poderia deixar de ser, só existe no papel, pois não

temos conhecimento de nenhum presídio que como preconiza a LEP, dá esta

assistência,

I - na orientação e apoio para reintegrá-lo à vida em liberdade; II - na concessão, se necessário, de alojamento e alimentação, em estabelecimento adequado, pelo prazo de 2 (dois) meses. Parágrafo único. O prazo estabelecido no inciso II poderá ser prorrogado uma única vez, comprovado, por declaração do assistente social, o empenho na obtenção de emprego.

A usuária privada de liberdade ao ser libertada volta para a mesma realidade

que vivia, com as mesmas dificuldades de sobrevivência e as mesmas facilidades de

se envolver com a criminalidade, já que a maioria da população carcerária é

proveniente de comunidades pobres.

E para estas pessoas a LEP trouxe o que nenhum outro Código Penal havia

previsto antes, algo que para os direitos humanos é de relevante importância, haja

vista a necessidade do usuário privado de liberdade sentir-se novamente parte

integrante da sociedade, consciente de que por meio da pena cumprida poderá

20

O Bolsa-Família é um programa de transferência direta de renda com condicionalidades, que beneficia

famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza. A depender da renda familiar por pessoa (limitada a

R$ 140), do número e da idade dos filhos, o valor do benefício recebido pela família pode variar entre R$ 22

a R$ 200. (Fonte: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome).

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novamente ser inserido nesta. Sem rotulações e com mais dignidade, já que em seu

artigo 202 a LEP garante que nada constará em sua folha corrida.

Cumprida ou extinta a pena, não constarão da folha corrida, atestados ou certidões fornecidas por autoridade policial ou por auxiliares da Justiça, qualquer notícia ou referência à condenação, salvo para instruir processo pela prática de nova infração penal ou outros casos expressos em lei.

E para tanto, fica evidente no Art. 3º, Parágrafo único o respeito à dignidade

humana, ao declarar que “Ao condenado e ao internado serão assegurados todos os

direitos não atingidos pela sentença ou pela lei”.

Outro ponto abordado é a individualidade da pena, pois é visada a

característica do respeito à dignidade humana. Para a Lei não se pode colocar em

um mesmo espaço presos reincidentes ou criminosos que cometeram crimes

hediondos e presos com delitos leves, portanto, ao classificar o condenado, o

legislador e, posteriormente, o juiz da execução penal, estará respeitando a

individualidade do ser humano, um dos direitos fundamentais elencados pela nossa

Constituição Federal, de 1988.

Contudo, a LEP na realidade é mais uma estratégia da burguesia para manter

a ordem dentro do Sistema prisional, como sempre cedendo um pouco, recuando

até o ponto de ter o controle sobre a situação. Podemos ver isso se observarmos a

realidade dos presídios e o compararmos com os direitos existentes na LEP, esta é

cumprida de maneira mínima a satisfazer as necessidades básicas do usuário

privado de liberdade para que este se mantenha calmo e não crie problemas por

meio das rebeliões que muitas vezes são formas de manifestações para a

reivindicação dos direitos. É também de certa forma uma resposta a sociedade

dando por meio da LEP a idéia de resolução dos problemas existentes no Sistema

Prisional, na realidade uma grande ilusão.

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3.2 Estabelecimento Prisional Feminino Santa Luzia – EPFSL

Inaugurado em Maceió por volta de março de 1975, o Estabelecimento

Prisional Feminino Santa Luzia – EPFSL, foi constituído para ser a primeira Casa de

Detenção reservada a mulheres, que antes existia como colônia penal na cidade de

Pilar (cidade situada a menos de 26 km de Maceió), transferido no governo de

Afrânio Lages, permanecendo até os dias atuais na capital - Maceió. A população

carcerária feminina em Alagoas representa pouco mais de 5% da população

carcerária geral21.

Atualmente está localizado na BR 101, Km 14, s/n, bairro do Tabuleiro dos

Martins, e funciona como Casa de detenção destinada a mulheres (condenadas ou

sub-júdice). O EPFSL caracteriza-se como estabelecimento penal de regime

fechado22, reservado a mulheres que cometeram crimes contra a sociedade, de

acordo com a Lei nº 7.210 de 11 de julho de 1984 – Lei de Execução Penal, e tem

por finalidade ‘dar cumprimento às decisões judiciais privativas de liberdade’, como

também proporcionar sua reintegração à sociedade conforme prescrito na Lei

supracitada.

O EPFSL surgiu da necessidade de ampliar o espaço para as mulheres,

devido ao crescimento do gênero feminino na criminalidade. O presídio tem

capacidade para comportar 74 (setenta e quatro) detentas e, hoje conta com uma

população carcerária em torno de 118 usuárias privadas de liberdade, sendo 28

condenadas e 90 sub-júdice23, ou seja, a maioria da população carcerária do EPFSL

é composta por presas sub-júdice, que estão aguardando julgamento, o que muitas

vezes demanda um longo tempo.

Para um melhor entendimento, exemplificaremos por meio de gráficos o

contingente de detentas, sub-júdices e condenadas:

21

Segundo dados da Secretaria de Estado da Defesa Social – SEDS, o Estado de Alagoas conta com uma

população de 2.142 usuários privados de liberdade.

22

Estabelecimentos penais destinados a abrigar pessoas presas com condenação em regime fechado, dotados

de celas individuais e coletivas.

23

Fonte: Secretaria de Estado da Defesa Social-SEDS, em 17/01/2011.

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Fonte: Pesquisa de campo. Situação carcerária do EPFSL em 11/02/2011. Maceió, 2011.

Vemos, nitidamente, que as usuárias privadas de liberdades em condição de

sub-júdice superam, em números, as condenadas, lembrando-nos a morosidade da

justiça quanto à oferta de um defensor público para as detentas desprovidas de

condições financeiras e o julgamento das mesmas, como preconiza a LEP.

Fonte: Pesquisa de campo. Situação carcerária do EPFSL em 11/02/2011. Maceió, 2011.

Quanto à faixa etária destas 90 usuárias privadas de liberdade em sub-júdice,

temos o maior percentual entre 19 e 28 anos, idade em que já deveriam estar

inseridas no mercado de trabalho formal. No entanto se deparam com um sistema

que não dá oportunidade para todos, inclusive criando uma camada da sociedade

aparentemente improdutiva para o capitalismo, consequentemente menos

importantes para os capitalistas.

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Fonte: Pesquisa de campo. Situação carcerária do EPFSL em 11/02/2011. Maceió, 2011.

Já das 28 usuárias privadas de liberdade condenadas em regime fechado, o

maior percentual é entre 23 e 35 anos.

Quanto aos crimes cometidos, temos uma realidade intrinsecamente ligada à

relação de gênero, pois o maior índice encontra-se no tráfico de entorpecentes onde,

em sua maioria, há, por trás do ato criminoso, uma relação de cumplicidade das

mulheres presas para com seus companheiros, sendo estes muitas vezes o

responsável direto pelo crime, também detidos no complexo penitenciário.

Fonte: Pesquisa de campo. Situação carcerária do EPFSL em 11/02/2011. Maceió, 2011.

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Os crimes de maior percentual, estão em sua maioria interligados,

normalmente, o tráfico de entorpecentes está ligado a formação de quadrilha, posse

ilegal de armas. Como podemos observar o tráfico de entorpecentes é em disparada

o maior índice. Segundo informações das próprias usuárias privadas de liberdade

isso se dar por necessidades mil, mas em sua maioria a manutenção da

necessidade de consumo, possuir bens como também obter a manutenção de sua

família. Mais uma vez conseguimos ver nitidamente o quanto este sistema capitalista

é desumano, repassando a idéia de que o ser só vale pelo que possui, criando a

ilusão do poder nas pessoas.

Fonte: Pesquisa de campo. Situação carcerária do EPFSL em 11/02/2011. Maceió, 2011.

Neste gráfico vemos um diferencial que é o crime de extorsão mediante

sequestro. No gráfico anterior ele está junto com outros, haja vista o percentual a ele

atribuído ser pequeno, já no caso das condenadas observamos que isso se

modifica, aparecendo, então, um percentual significativo de 8%.

As mulheres envolvidas com o tráfico – delito mais frequentemente

encontrado no EPFSL – ou com outros crimes, na maioria das vezes foi conduzida,

aliciada ou até mesmo obrigada por seus companheiros a enveredar por esse

caminho.

Neste contexto, vale registrar que o Complexo Penitenciário Alagoano é

constituído, além do EPFSL, pelo Centro Psiquiátrico Judiciário Pedro Marinho

Suruagy (CPJ), pela Penitenciária Masculina Baldomero Cavalcanti de Oliveira

(PMBCO), pelo Presídio de Segurança Média de Maceió Professor Cyridião Durval e

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Silva (PSMMPCDS), pela Casa de Detenção de Maceió (CDM) e pelo Presídio de

Segurança Média de Arapiraca Desembargador Luis de Oliveira Sousa

(PSMADLOS).

Sua estrutura administrativa está dividida conforme organograma a seguir:

Direção Geral Gerente Administrativo Gerente de Disciplina

Assessoria Jurídica

Prontuário Revista Serviço Social

Almoxarifado Recepção

Psicologia Refeitório Triagem

Lavanderia Celas especiais

Médico

Cozinha Alojamento reservado as

Gestantes

Enfermagem Módulo I

Módulo II

Quanto à equipe técnica, o EPFSL hoje, conta com uma equipe

multiprofissional composta por:

• dois médicos (clinico e ginecologista);

• uma enfermeira;

• quatro auxiliares de enfermagem;

• uma assistente social;

• uma psicóloga;

• um advogado.

Todos os profissionais mencionados acima, com exceção do advogado, são

ligados à Gerência de Unidade de Saúde do Sistema Penitenciário Alagoano24, a

qual é vinculada à Secretaria de Estado da Defesa Social – SEDS e a Intendência

Geral do Sistema Prisional – IGESP. Sendo assim, mesmo estando fisicamente

24

Responsável pela “Assistência integral à saúde dos reeducandos nas áreas médica, enfermagem, psicológica,

odontológica e social, adequando-a ao modelo assistencial estabelecido pelo Ministério da Saúde”.

(Fonte: ALCATRAZ).

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dentro do terreno do complexo penitenciário, ela não aparece no organograma do

EPFSL.

O estabelecimento conta, também, com o auxílio de profissionais que dão

suporte fora da unidade e que fazem parte do sistema prisional, como dentista e

ortopedista, estes atendem no CPJ. Sendo o atendimento fora do EPFSL, o

deslocamento das usuárias privadas de liberdade é feito com escolta e transporte do

próprio presídio, o que muitas vezes torna o atendimento inviável, devido ao

pequeno contingente de recursos humanos (agentes penitenciários) existente no

EPFSL, para fazerem a escolta. A quantidade de veículos no presídio para o

transporte das detentas também é insuficiente para a grande quantidade de

diligências diárias, tais como, exames de média e alta complexidade, atendimentos

médicos especializados, idas à cartórios, bancos, balcão do cidadão, dentre outras

compartilhadas com a administração.

Em Alagoas, no EPFSL, de acordo com a recomendação do Conselho

Penitenciário Nacional e em consonância com a Regulamentação do Sistema

Penitenciário Alagoano, implantou-se o cumprimento do direito à visita íntima para

os presos casados ou em união estável, porém este direito foi suspenso por

descoberta de atividades de agenciamento em prostituição dentro do próprio

presídio, feito pelas usuárias privadas de liberdade do EPFSL.

Na visita íntima, mais uma vez encontramos o preconceito e a discriminação

desta sociedade machista, já que na maioria dos casos ela é permitida aos homens

de maneira natural, em contra partida, quando se refere as mulheres, existe sempre

uma condição explicita como por exemplo, bom comportamento.

Uma sociedade que, embora garanta a igualdade entre os sexos no que tange direitos e deveres, ainda se constata a discriminação entre homens e mulheres no seu cotidiano. Quando essas visitas são concedidas para as mulheres, ocorrem de forma seletiva e condicionada, através de imposições que a direção do presídio permite utilizando sua autonomia sobre o assunto, [...]. (ALBUQUERQUE et al, 2003. p. 69).

A instituição é desprovida de creche/berçário o que faz uma enorme

diferença, visto que algumas usuárias privadas de liberdade engravidam ou já

chegam grávidas e após o parto ficam com seus filhos durante algum tempo na

instituição, o que leva a administração a improvisar, transformando, de forma

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precária, celas em berçários. Um dos únicos direitos contidos na LEP que realmente

é voltado para o gênero mulher é explicitamente violado dentro do EPFSL.

Vimos também que, os profissionais que trabalham no sistema penitenciário

para executarem suas funções como por exemplo a assistente social, lançam mão

das políticas que já existem como: saúde e educação, que em sua maioria não

levam em consideração a especificidade de se estar privado de liberdade. Como

também as limitações existentes na instituição como por exemplo, liberação de

transporte para as usuárias que necessitam sair do estabelecimento para

atendimento e atenção a saúde destas, o que de certa forma inviabiliza o acesso

aos direitos, comprometendo sobremaneira o desempenho do corpo técnico

profissional ali existente.

As celas de triagem são reservadas às presas recém chegadas, que

permanecem nestas celas por sete dias, sem manter contato com sua família ou

com outras presas. Depois de transcorrido o período de isolamento, elas são

transferidas para os módulos. Esse período, segundo a administração do EPFSL,

serve para a adaptação dessa usuária privada de liberdade ao encarceramento.

As usuárias privadas de liberdade só têm direito a ligações por meio dos

contatos feitos pela assistente social do estabelecimento, quando autorizado pela

gerência. Os módulos possuem 36 celas coletivas cada um, cada cela tem

capacidade para quatro usuárias, tem, também, uma cela ‘especial’ para usuárias

que possuem escolaridade de nível superior.

Pelo exposto, compreendemos que no EPFSL, a usuária privada de liberdade

não tem apenas restrito o seu direito de ir e vir (restringido pelo crime cometido)

mas, vários outros direitos que lhes são assegurados pela LEP e pelos Direitos

Humanos. Os quais são violados cotidianamente.

Como tantos outros presídios o EPFSL possui uma superlotação, a qual é

proveniente da falta de estrutura física para uma comunidade carcerária bem acima

da sua capacidade. Podemos também considerar que a mínima efetivação das

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penas alternativas25 e a morosidade da justiça tanto na constituição de um defensor

público como nos julgamentos, favorecem esta superlotação.

Podemos ainda ressaltar que o papel do assistente social no EPFSL é

muito importante, haja vista a crescente demanda existente. O Serviço Social tem

por finalidade promover o bem-estar social e físico das usuárias privadas de

liberdade.

Apesar das dificuldades inerentes ao sistema, o Serviço Social tem

desempenhado um importante papel no EPFSL, tendo como objetivos principais a

ressocialização das usuárias privadas de liberdade que se encontram inseridas

nesta realidade e minimizar por meio de um trabalho multiprofissional a frieza da

realidade vivenciada, garantindo o acesso aos direitos que todo cidadão possui.

As atribuições executadas pela assistente social, no EPFSL, são:

encaminhamentos das usuárias privadas de liberdade para unidades de saúde,

visitas domiciliares, promoção da cidadania (documentos), atendimentos individuais

às usuárias privadas de liberdade e aos seus familiares, reuniões com grupo de

convivência, reunião com a direção, articulação com órgãos da sociedade civil ou

pública para formação de parcerias, promoção de cursos, palestras e festas

temáticas. Não podemos esquecer que com a criação da LEP, o assistente social

passou a ter o embasamento legal para as suas ações de intervenção, haja vista,

trazer informações a cerca dos direitos e deveres dos presos (usuárias privadas de

liberdade), bem como princípios voltados as ações da assistência.

O Serviço Social no EPFSL tem o propósito de contribuir para a melhoria

da qualidade de vida das usuárias privadas de liberdade dentro do processo de

ressocialização. É com muito esforço que a assistente social consegue realizar

alguma intervenção, haja vista os entraves que acabam prejudicando o

compromisso que o profissional tem com a demanda. A realidade vivenciada trouxe

25 São substitutivos penais (cuja pena mínima não exceda a um ano) processo e Rito especialíssimo, para tipos

penais a que a lei denominou de infrações penais de menor potencial ofensivo que permitem às pessoas

que cometem pequenos delitos como exemplo: Lesões corporais culposas delito de trânsito (art. 129);

Periclitação da vida e da saúde (arts. 130 a 137); Crimes contra a honra (arts. 138 a 145); crimes contra a

liberdade pessoal (arts. 146 a 149); Crimes contra inviolabilidade do domicílio (art.150 e seus parágrafos);

Crimes contra inviolabilidade de correspondência (arts. 151 a 154); Do dano (art. 163 a 167); Da

apropriação indébita (art.168 a 170); Estelionato(art. 171); e contravenções penais. Todos do Código Penal

Brasileiro. Extraído do artigo escrito pelo juiz Caubi Arraes e publicado no Seminário do Nordeste sobre

Segurança, Justiça e Cidadania. Recife, 1997.p 31-37.

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situações em que só com a ética seremos capazes de intervir de forma coerente,

situações em que a moral é cobrada como valor natural da existência, por isso

diante da sociedade capitalista resta ao assistente social ser o agente de

intervenção que a classe trabalhadora necessita, colocando em prática os

instrumentos necessários para viabilizar e garantir o acesso aos direitos que ela

possui.

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Considerações finais

A crise no Sistema Penitenciário atinge não só a usuária privada de liberdade

e sua família, mas, a sociedade de um modo geral. A qual tem como perspectiva de

direitos para o sistema penitenciário as nossas leis e em especial a Lei de Execução

Penal – LEP. Esta com resoluções positivistas para os problemas vividos nos

presídios, em destaque o Estabelecimento Prisional Feminino Santa Luzia.

Neste trabalho podemos ver nitidamente que a LEP como tantas outras leis,

não passa de mais uma estratégia do sistema capitalista para manter seus

interesses de dominação e controle, desta vez, da comunidade carcerária. Podemos

constatar que o processo de evolução feminina passou por vários momentos, as

mulheres viram os valores que tinham na família matriarcal entrar em decadência

quando os homens passaram a dominar os meios de produção e acumulação de

riquezas.

Vimos também, que as penas surgiram antes das prisões e como sua

evolução aconteceu de maneira sempre direcionada ao que era conveniente para

classe dominante de cada contexto histórico, o que nos foi revelado com riqueza de

detalhes por Foucault. Este autor nos fez conhecer fatos e nos proporcionou, junto

ao embasamento teórico marxista adquirido no curso, a oportunidade de visão crítica

da realidade da época. Não foi difícil então entender que a lei foi criada juntamente

com o Estado para proteger a propriedade privada e consequentemente os

interesses da burguesia. Na qual como diz o próprio Foucault, “a ilegalidade dos

direitos, que muitas vezes assegurava a sobrevivência dos despojados, tende, com

o novo estatuto da propriedade, a tornar-se uma ilegalidade de bens. Será então

necessário puni-la”. (FOUCAULT, 2008, p. 76).

É relevante ressaltar que, o Estado passa a ilusão de uma justiça igualitária e

neutra, livre de preconceitos e seletividade, criando assim a idéia de que os

problemas evidenciados são de ordem conjuntural, ou mesmo circunstancial, porém,

nunca de ordem estrutural, como realmente é. Devemos sempre ter em mente que é

impossível a igualdade entre homens diante de uma sociedade dividida em classes.

Dentro deste contexto, parece-nos imprescindível destacar o universo dessas

mulheres privadas de liberdade e inseridas em uma realidade, tida como masculina,

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na qual o único diferencial é o direito a um berçário dentro do EPFSL, direito este

violado como tantos outros.

O EPFSL não foge a realidade da grande maioria dos presídios brasileiros,

onde a superlotação é uma constante. Nele também se convive, como em tantos

outros, com a correlação de forças e o descaso do Estado no que diz respeito a

investimentos financeiros, já que em sua maioria a comunidade carcerária é

composta por uma camada da sociedade desprovida de recursos e, por estarem fora

da dinâmica de produção e acumulação de riquezas, tornam-se seres sem nenhum

valor para este sistema puramente explorador e desumano.

Correlação de forças em presídio significa compreender que a prisão detém o poder como instituição estatal, que se configura em um lugar para pessoas criminosas, que serão corrigidas, moldadas, reeducadas e só então reintegradas à sociedade. A prisão estigmatiza, retira a identidade, classifica, em suma, sua prática é excludente, anuladora e restritiva. (ALBUQUERQUE et al, 2003, p. 75)

Considerando todo o exposto, concluímos que, para o capitalismo é

conveniente a manutenção da criminalidade, já que por meio desta foram criados

profissionais como: juiz, promotor, advogado, dentre tantos outros, bem como

ramificações de estudo, como o direito. Essas criações apesar de significarem

custos para o capital são convenientes para camuflar a própria criminalidade,

expressão da questão social, e expor ao mínimo a ineficiência do Estado e do

Sistema Capitalista.

Estes complexos sociais movimentam financeiramente os interesses na

construção ilusória da segurança pública não apenas no Brasil, mas em todo o

mundo. Estando o EPFSL inserido neste contexto, faz-se relevante seu

reconhecimento como instrumento de coerção do Sistema Capitalista. Realidade

que só será mudada, segundo Marx e Engels (1998), “pela derrubada violenta de

todas as condições sociais existentes.” (p. 65). O que significa que só será possível

por meio de uma revolução da classe proletária unida, pois Marx e Engels (1998)

afirmam, “Os proletários nada têm a perder fora suas correntes; têm o mundo a

ganhar.

PROLETÁRIOS DE TODOS OS PAÍSES, UNI-VOS!”. (p. 65)

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Enquanto classe trabalhadora, a classe explorada que depende do trabalho

para a sua sobrevivência, fazemos parte dessa camada social que tem a

responsabilidade de lutar pela mudança da sociedade em que vivemos.

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ANEXOS

• Lei de Execução Penal - LEP

• Mapeamento das prisões, dados da SEDS / 2011