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PRODUÇÃO DE CARVÃO VEGETAL A PARTIR DE PLANTAÇÕES DE EUCALIPTO EM MINAS GERAIS: VANTAGENS ECONÔMICAS DA CARBONIZAÇÃO E DO CULTIVO EM PEQUENA E EM LARGA ESCALA Thiago Fonseca Morello 1 ; Abigaïl Fallot 2 ; Marie-Gabrielle Piketty 3 1 Mestrando em teoria econômica, IPE/FEA- USP, R. Heitor Peixoto 725, 1206B, Cambuci, São Paulo-SP, 01543-001, [email protected]; 2 Pesquisadora do CIRAD (França) e professora do CATIE (Costa Rica), [email protected] ; 3 Pesquisadora do CIRAD (França), [email protected] CHARCOAL PRODUCTION FROM EUCALYPTUS PLANTATIONS IN THE BRAZILIAN STATE OF MINAS GERAIS: ECONOMIC ADVANTAGES OF THE CARBONIZATION AND THE CULTIVATION UNDER SMALL AND LARGE SCALE Resumo Procura-se comparar sistemas de produção de carvão vegetal e de lenha de eucalipto, que diferem pelo porte dos fornos de carbonização empregados e pelo tamanho das áreas anuais de colheita. Com base em dados referentes à produção de carvão vegetal de fins siderúrgicos em Minas Gerais, quatro sistemas de produção são considerados e comparados em termos de seu custo médio de produção. Chega-se à conclusão de que (i) a carbonização em pequena escala é a opção mais rentável, qualquer que seja a escala de silvicultura, e; (ii) a silvicultura de pequena escala fomentada apresenta o menor custo variável médio. Abstract The article aims to compare charcoal and eucalyptus firewood production systems that differ in terms of the scale of the kilns employed and the size of annual harvest areas. Data from steel and pig-iron aimed charcoal production of the Brazilian State of Minas Gerais is used to compare, in terms of average production cost, four charcoal production systems. The conclusions reached are: (i) small scale carbonization is the most profitable option whatever the forestry scale; (ii) small forest-farmer-based forestry allows for the least forestry average variable cost. Introdução O setor siderúrgico a carvão vegetal de Minas Gerais pode ser dividido em dois segmentos: (i) o das indústrias integradas, cuja linha de produção se estende até o aço, e cujo patamar para o consumo anual de carvão vegetal é de 1 milhão de metros cúbicos (m 3 ) de carvão/ano por firma; (ii) as indústrias independentes, cuja linha de produção estende-se até o ferro-gusa. O patamar para o consumo anual de carvão vegetal das últimas é o de 300,000 m 3 carvão/ano (Rosillo-Calle et al: 1996 e 2000, Morello et al: 2008, SINDIFER: 2009).

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PRODUÇÃO DE CARVÃO VEGETAL A PARTIR DE PLANTAÇÕES DE EUCALIPTO EM MINAS GERAIS: VANTAGENS ECONÔMICAS DA

CARBONIZAÇÃO E DO CULTIVO EM PEQUENA E EM LARGA ESCALA

Thiago Fonseca Morello1; Abigaïl Fallot2; Marie-Gabrielle Piketty3

1 Mestrando em teoria econômica, IPE/FEA- USP, R. Heitor Peixoto 725, 1206B, Cambuci, São Paulo-SP, 01543-001, [email protected];

2 Pesquisadora do CIRAD (França) e professora do CATIE (Costa Rica), [email protected];

3 Pesquisadora do CIRAD (França), [email protected]

CHARCOAL PRODUCTION FROM EUCALYPTUS PLANTATIONS IN THE BRAZILIAN STATE OF MINAS GERAIS: ECONOMIC ADVANTAGES OF THE CARBONIZATION AND

THE CULTIVATION UNDER SMALL AND LARGE SCALE

Resumo

Procura-se comparar sistemas de produção de carvão vegetal e de lenha de eucalipto, que diferem pelo porte dos fornos de carbonização empregados e pelo tamanho das áreas anuais de colheita. Com base em dados referentes à produção de carvão vegetal de fins siderúrgicos em Minas Gerais, quatro sistemas de produção são considerados e comparados em termos de seu custo médio de produção. Chega-se à conclusão de que (i) a carbonização em pequena escala é a opção mais rentável, qualquer que seja a escala de silvicultura, e; (ii) a silvicultura de pequena escala fomentada apresenta o menor custo variável médio.

Abstract

The article aims to compare charcoal and eucalyptus firewood production systems that differ in terms of the scale of the kilns employed and the size of annual harvest areas. Data from steel and pig-iron aimed charcoal production of the Brazilian State of Minas Gerais is used to compare, in terms of average production cost, four charcoal production systems. The conclusions reached are: (i) small scale carbonization is the most profitable option whatever the forestry scale; (ii) small forest-farmer-based forestry allows for the least forestry average variable cost.

Introdução

O setor siderúrgico a carvão vegetal de Minas Gerais pode ser dividido em dois segmentos: (i) o das indústrias integradas, cuja linha de produção se estende até o aço, e cujo patamar para o consumo anual de carvão vegetal é de 1 milhão de metros cúbicos (m3) de carvão/ano por firma; (ii) as indústrias independentes, cuja linha de produção estende-se até o ferro-gusa. O patamar para o consumo anual de carvão vegetal das últimas é o de 300,000 m3 carvão/ano (Rosillo-Calle et al: 1996 e 2000, Morello et al: 2008, SINDIFER: 2009).

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Enquanto que o primeiro segmento supre sua demanda por carvão vegetal predominantemente a partir de unidades de produção de carvão vegetal própria, para o segundo o acesso ao combustível ainda se dá em proporção considerável via aquisição de unidades de produção independentes.

A produção independente de carvão vegetal ainda hoje adota práticas condenáveis do ponto de vista socioambiental, como exploração não-autorizada de mata nativa e transgressão do código trabalhista. Contrariamente, as unidades de produção de carvão vegetal integradas parecem se colocar, ainda sob o ponto de vista socioambiental, como os modelos mais avançados. A difusão, entre elas, do cultivo de eucalipto em substituição à mata nativa é um dos principais atributos que as atribui uma posição de destaque (Rosillo-Calle et al: 1996 e 2000, Morello et al: 2008).

O exame dos relatórios de certificação das plantações de eucalipto mantidas por produtores de carvão vegetal revela que as áreas anuais de colheita de tais plantações ocupam extensões de terra contínuas não menores do que 1.000 hectares (Plantar-FSC: 2008, VMF-CERFLOR: 2007, AMF-FSC: 2003). Este modelo de silvicultura de larga escala, por um lado, é criticado por representantes da sociedade civil organizada como ameaça à estabilidade ecossistêmica. Por outro lado, tem, no empate de capital em terras e em outros entraves inerentes ao funcionamento local do mercado fundiário (como a concorrência entre múltiplos usos do solo por terras), entraves a seu desenvolvimento. O fomento florestal, por meio do qual é possível tanto descentralizar as áreas de plantação como evitar a aquisição de terras, coloca-se como uma alternativa à silvicultura de larga escala integrada às unidades de produção de carvão.

O objetivo do presente estudo é submeter à avaliação econômica a produção de carvão vegetal apoiada no cultivo de eucalipto. Para isso serão considerados quatro sistemas de produção, sendo eles:

(i) Silvicultura (de plantações de eucalipto) de larga escala integrada e carbonização de larga escala. Trata-se do modelo em que as unidades de produção de carvão vegetal são compostas por fornos retangulares de carga e descarga mecanizada, com capacidade produtiva de 30 toneladas de carvão por rodada, em média. Já as plantações de eucalipto se caracterizam por possuírem uma área de colheita anual não menor do que 1.000 ha;

(ii) Silvicultura de larga escala integrada e carbonização de pequena escala. Trata-se do modelo em que as unidades de produção de carvão vegetal são compostas por fornos circulares, com capacidade produtiva de 3 toneladas de carvão por rodada, em média.As plantações de eucalipto são do tamanho descrito em (i);

(iii) Silvicultura de pequena escala fomentada e carbonização de larga escala. Trata-se da alternativa para produção de lenha em que as plantações de eucalipto são realizadas nas propriedades de terceiros, os quais são contratados pelas empresas produtoras de carvão, de modo que as partes compartilhem os custos de produção. A lenha é adquirida pela empresa por um valor do qual geralmente se abate o principal de empréstimos contraídos, pelo fazendeiro, com ajuda da empresa, para financiar o cultivo. A área de colheita anual tomada por base para esse sistema é de, no máximo, 40 ha.

(iv) Silvicultura de pequena escala fomentada e carbonização de pequena escala.

Material e métodos

As possibilidades selecionadas para estudo diferem por sua estrutura técnica. Por conta disso, a ferramenta de análise econômica selecionada foi a de cálculo de custos de produção a partir de indicadores de performance técnica.

Os dados processados foram obtidos em trabalho de campo realizado junto a empresas localizadas no estado de Minas Gerais. Duas empresas cuja atividade fim é a produção de carvão vegetal, sendo elas integradas a produtores de aço, foram visitadas, bem como uma

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unidade de produção de carvão integrada a um produtor de ferro-gusa. Adicionalmente, colheram-se dados técnicos juntos a um programa de fomento florestal administrado por uma associação de produtores de ferro-gusa de Minas Gerais e entrevistaram-se os administradores do programa de fomento florestal de uma produtora de celulose. Outros atores do segmento de produção de carvão vegetal, bem como estudiosos do mesmo, foram contatados.

A análise resultante, portanto, não é extensiva, mas intensiva: não se cobrem todas as maneiras possíveis de produzir lenha de eucalipto e carvão vegetal, mas procura-se descrever e escrutinar com o máximo de detalhe as características econômicas e técnicas dos sistemas selecionados.

A representatividade dos resultados, ou seja, sua fidedignidade relativamente ao estado corrente e predominante da produção de carvão vegetal a partir da eucaliptocultura em Minas Gerais é garantida pelo procedimento de calibração com base em patamares de custo reportados pela literatura ou por entrevistas realizadas com atores do setor.

Resultados e discussão

Os resultados são apresentados na tabela abaixo.

Tabela 1 Custos de produção* obtidos para os sistemas de produção sob estudo.

Carbonização/

Silvicultura Larga escala integrada Pequena escala fomentada

Larga escala

Custo Variável médio de Silvicultura= R$217/t carvão

Custo Total médio de Carbonização= R$58/t carvão

Custo Variável médio de Silvicultura= R$123/t carvão

Custo Total médio de Carbonização=58/t carvão

Pequena escala

Custo Variável médio de Silvicultura= R$227/t carvão

Custo Total médio de Carbonização=42/t carvão

Custo Variável médio de Silvicultura= R$129/t carvão

Custo Total médio de Carbonização=42/t carvão

*t carvão = tonelada de carvão vegetal.

Como é perceptível, os sistemas de carbonização de pequena escala proporcionam o menor custo total médio de carbonização.

O fomento florestal possibilita para a empresa contratante arcar com um menor custo variável médio, em relação à alternativa em que o cultivo é financiado integralmente por ela (casos de silvicultura de larga escala), qualquer que seja a escala de carbonização. Porém é preciso levar em conta o custo fixo médio, o qual, no caso da silvicultura de larga escala integrada é dado pelo dispêndio referente à obtenção do direito de uso da terra sobre a qual se planta – seja esse direito referente à aquisição ou ao arrendamento da terra. No caso da silvicultura de pequena escala fomentada, o custo fixo médio é composto pelo desembolso, por parte da empresa contratante, na aquisição da lenha junto ao fazendeiro.

Sendo o custo de acesso a terra, por metro cúbico de lenha produzido, superior ao preço pelo qual a empresa fomentadora obtém a lenha, o fomento florestal se anunciará enquanto saída mais rentável para a parte interessada na lenha. Porém, valendo o cenário oposto, o cultivo integrado de eucaliptos se revelará a opção de menor custo.

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O custo variável médio da silvicultura mostra-se maior no fomento florestal, comparativamente ao custo de produção sob plantações de larga escala integrada, quando se considera tanto o investimento realizado pela empresa fomentadora, como pelo fazendeiro fomentado.

Tal evidência assinala uma característica fundamental dos contratos de fomento florestal, qual seja a repartição de custos entre as contrapartes. No contrato tomado por base, a empresa interessada na lenha contribui somente com insumos e serviços gerais necessários ao cultivo (assistência técnica ao fazendeiro, por exemplo), sendo que as despesas com mão-de-obra e colheita são de responsabilidade do fazendeiro (Morello et al: 2008).

Conclusões

Para o conjunto de dados que foi possível acessar, pôde-se concluir que: (i) os sistemas de carbonização de pequena escala registram o menor custo total médio de carbonização e; (ii) o sistema de silvicultura de pequena escala fomentada apresenta o menor custo variável médio de silvicultura. A escolha entre os dois sistemas de carbonização de pequena escala depende de variáveis de natureza conjuntural, sendo elas o preço da terra e o preço da lenha, tratando-se, portanto, de uma decisão local e particular.

Referências

ACESITA-SGS (2006) – Relatório de Certificação Florestal: Acesita Energética – Disponível em: http://www.forestry.sgs.com/sgs-ssc-9202-br-acesita-sa2008-11-ad36a-gm-psummary-en-09.pdf.

MORELLO, T.F, FALLOT, A., PIKETTY, M.G (2008) – Relatórios de trabalho de campo – Não publicado.

PLANTAR-FSC (2008) – Avaliação do manejo das plantações florestais e da cadeia de custódia da Plantar S.A. na região de Curvelo. Disponível em: http://www.scscertified.com/PDFS/forest_plantar_port.pdf

ROSILLO-CALLE, F., REZENDE, M. A. A., FURTADO, P. e HALL, D. O. (1996) – The charcoal dilemma: finding a sustainable solution for Brazilian industry – Londres: Intermediate technology publications.

ROSILLO-CALLE, F., BAJAY, S.V. and ROTHMAN, R. (eds) (2000) – Industrial uses of biomass energy: the example of Brazil. London; New York: Taylor & Francis, 2000.

SINDIFER (2009) – Estatísticas para a produção de ferro-gusa e aço em Minas Gerais – Disponível em http://www.sindifer.com.br.

VMF-CERFLOR (2007). Relatório de auditoria para certificação CERFLOR: Vallourec & Mannesmann Florestal. Bureau Veritas Certification. Disponível em: http://www.bureauveritascertification.com.br/arquivos/documentos/relatório%20final%20v&m%20%20pdf%2014-11-07.pdf.