19
alizção e Prática Liberdade Religiosa 1- Transfusão de Sangue Testemunhas de Jeová 2- Adventista de Sétimo Dia Profa. Adriana Galvão Moura Abílio

Profa. Adriana Galvão Moura Abílio - legale.com.br · homens e mulheres são vistos como donos de si mesmo e não mais pertencentes a um superior. Ocorpoé livre, oser humanoélivre

  • Upload
    vancong

  • View
    215

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Profa. Adriana Galvão Moura Abílio - legale.com.br · homens e mulheres são vistos como donos de si mesmo e não mais pertencentes a um superior. Ocorpoé livre, oser humanoélivre

alizção e Prática

Liberdade Religiosa

1- Transfusão de Sangue – Testemunhas

de Jeová

2- Adventista de Sétimo Dia

Profa. Adriana Galvão Moura Abílio

Page 2: Profa. Adriana Galvão Moura Abílio - legale.com.br · homens e mulheres são vistos como donos de si mesmo e não mais pertencentes a um superior. Ocorpoé livre, oser humanoélivre

FUNDAMENTOS QUE JUSTIFICAM A RECUSA DAS TESTEMUNHAS DE JEOVÁ DE RECEBEREM SANGUE HUMANO

• A recusa por tratamento usando sangue humano não se iniciou juntamente com a religiãoem 1870, é um conceito relativamente novo. Foi no ano de 1942 que começaram a vagarcomentários a respeito da proibição do uso de sangue em tratamentos médicos; até entãoas Testemunhas de Jeová não tinham nenhuma ressalva quanto a isso. Os estudiosos dareligião aprofundaram os estudos na Bíblia Sagrada e descobriram que realmente aliexistia uma proibição.

• No ano de 1945 foi publicado pela revista Torre de Vigia uma matéria dizendo que “atransfusão do sangue humano constitui violação do concerto de Jeová, ainda que estejaem jogo a vida do paciente”. A matéria dizia também que os sangues animais e humanoseram proibidos por Deus, mencionando uma passagem da Bíblia:

• Pois, pareceu bem ao Espírito Santo e nós vos acrescentar nenhum fardo adicional, excetoas seguintes coisas necessárias: de persistirdes em abster-vos de coisas sacrificadas aídolos, e de sangue, e de coisas estranguladas, e de fornicação. Se vos guardastescuidadosamente dessas coisas, prosperareis. Boa saúde para vós! (Gên. 9:3-5)

• O trecho da Bíblia deixou claro para os fiéis a necessidade de se absterem do uso desangue sob pena de não prosperarem espiritualmente. Posteriormente várias publicaçõesforam feitas defendendo a tese da não transfusão de sangue em tratamentos médicos porrespeito aos preceitos espirituais. Defendiam em seus textos que Deus queria os seus fiéispuros e sem os pecados que as outras pessoas carregam em suas veias, pois só assimhaveria salvação após a morte .

Page 3: Profa. Adriana Galvão Moura Abílio - legale.com.br · homens e mulheres são vistos como donos de si mesmo e não mais pertencentes a um superior. Ocorpoé livre, oser humanoélivre

A COLISÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS

• Os direitos fundamentais garantidos na Constituição Federal de 1988são uma categoria jurídica instituída com a finalidade de proteger adignidade humana em todas as dimensões.

• O Estado não pode passar por cima desses direitos por interessepróprio, tanto é que os direitos vêm acompanhados com as garantiasfundamentais, que são mecanismos de efetivação destes direitos. Comotudo no direito brasileiro, nada é absoluto. Assim sendo, os direitosfundamentais, apesar de serem cláusulas pétreas, têm suas limitaçõesquando contrapostos com outros direitos.

• Portanto, sempre que nos deparamos com conflitos de direitosfundamentais, deve o aplicador do direito ponderar os interesses deambas as partes, chegando sempre a uma conclusão que vise àdignidade da pessoa humana. O conflito, na presente pesquisa, gira emtorno do direito à vida e o direito de dignidade garantido àsTestemunhas de Jeová.

• De um lado temos o Estado com a tutela de preservar a vida através daprestação de tratamentos médicos, do outro lado temos o fiel quedeseja exercer o seu direito de liberdade física e psíquica ao escolherqual tratamento lhe é mais benéfico, mesmo que isso possa causar-lhe amorte.

• A defesa por parte dos Jeovistas é que viver sem dignidade não ésuficiente e por isso é relevante que sejam tratados por médicos querespeitem suas convicções religiosas, já que a lei assegura tal preceito.

Page 4: Profa. Adriana Galvão Moura Abílio - legale.com.br · homens e mulheres são vistos como donos de si mesmo e não mais pertencentes a um superior. Ocorpoé livre, oser humanoélivre

LIBERDADE RELIGIOSA E AUTONOMIA DO PRÓPRIO CORPO

• O modelo adotado pelo Estado é laico, portanto, não há que se falar em imposição dereligião. Nesse mesmo diapasão a Constituição assegura às pessoas o direito à vida, à liberdadede escolha e pensamento e também a liberdade religiosa. A lei permite ao individuo existir cominterferência estatal mínima, preservando sempre a dignidade.

• Com a evolução das leis e da vontade do povo, evoluiu também o conceito de autonomia. Hojehomens e mulheres são vistos como donos de si mesmo e não mais pertencentes a um superior.O corpo é livre, o ser humano é livre.

• Se existe a salvaguarda constitucional garantindo a liberdade, por que não aplicá-la também aocorpo e a maneira como tratá-lo? Os Jeovistas buscam um esclarecimento que justifique omotivo de não se permitir que optem entre usar sangue alheio e não usar, já que se trata doscorpos de si mesmos.

• As Testemunhas de Jeová não se importam com a posição e o desejo do Estado, elas buscam oque lhes foi garantido na Lei Suprema e, claro, com os dizeres de seu Deus Jeová a respeito donão uso de sangue. A sociedade tem uma visão equivocada do pedido dos Jeovistas. São fiéisque querem e levam uma vida normal, trabalham, estudam, constituem famílias e querem tersaúde, mas querem saúde de modo que as suas crenças religiosas sejam respeitadas.

• Através disso a comunidade médica deve atentar-se aos pedidos feitos por pacientesTestemunhas de Jeová que exigem um tratamento diversificado, porém, com qualidade. Osmédicos devem cuidar do paciente e trata-lo não visando somente o seu físico, mas também oseu psíquico, pois, de modo contrário estariam violando os direitos à intimidade, à religião edignidade do referido paciente.

Page 5: Profa. Adriana Galvão Moura Abílio - legale.com.br · homens e mulheres são vistos como donos de si mesmo e não mais pertencentes a um superior. Ocorpoé livre, oser humanoélivre

DIREITO DE RECUSA EM SE SUBMETER A TRATAMENTO MÉDICO-TERAPÊUTICO

• O Poder Público não tem condão de decisão sobre o que é mais importante parauma Testemunha de Jeová: convicção religiosa ou vida. Cabe somente ao fieldecidir o que acha certo para si. Em relação aos menores e incapazes:

• Quanto aos pais ou demais responsáveis, é preciso deixar certo que não hánegligência ou qualquer espécie de culpa quando solicitam aos médicos queusem meios alternativos para o tratamento de sangue em seus filhos. A recusa auma determinada técnica médica pelos pais ou responsáveis, quando não setem algumas outras vias, que atingem até melhores resultados do que a técnicapadrão (sempre presente um alto risco de contaminação por diversas doenças),não é suficiente para configurar a culpa em qualquer de suas modalidades. Emverdade, o que os pais querem é salvar a vida dos seus filhos por métodosalternativos, sem que com isso tenha-se de pagar um alto preço que seria aviolação de princípios religiosos que lhe são por demais caros.

• O artigo 15 do Código Civil de 2002 diz que ninguém pode ser constrangido asubmeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica,deixando claro que o paciente é quem escolhe qual caminho seguirá em relaçãoà sua saúde. Temos aqui a aplicação do princípio da liberdade.

Page 6: Profa. Adriana Galvão Moura Abílio - legale.com.br · homens e mulheres são vistos como donos de si mesmo e não mais pertencentes a um superior. Ocorpoé livre, oser humanoélivre

A ÉTICA MÉDICA

• O avanço da tecnologia ao longo dos anos vem mostrando as vantagens edesvantagens do uso de sangue em tratamentos médicos. Em muitas das vezes o usode sangue significa um tratamento mais rápido, porém, não o único tratamento parasalvar a vida. É isso que adentra no direito das Testemunhas de Jeová, porque seremsubmetidas a tratamentos que atinjam sua integridade psíquica se podem usar demeios alternativos para manterem sua saúde?

• A partir do aprimoramento de vários estudos, foi constatado que a transfusão desangue oferece o risco de doenças transmissíveis. A avaliação de “salvar a vida aqualquer custo” deve ser repensada. De maneira indireta, a decisão de Jeovistas atémelhoram a grande dificuldade de se conseguir banco de doadores.

• Diante disso muitos médicos e hospitais vem tratando os fiéis da maneia comodesejam e respeitando também os princípios médicos de salvar a vida, mas não aqualquer custo, já que o custo pode “sair caro” para o paciente. O Estado devecustear o tratamento médico adequado, já que resguarda o direito à saúde e àreligião. Não há que se falar em conflito de direitos e sim de preponderação deinteresses do paciente face ao Estado.

Page 7: Profa. Adriana Galvão Moura Abílio - legale.com.br · homens e mulheres são vistos como donos de si mesmo e não mais pertencentes a um superior. Ocorpoé livre, oser humanoélivre

DIREITOS FUNDAMENTAIS E A RESPONSABILIDADE PENAL DO MÉDICO

• É dever do médico informar ao paciente com risco de vida quais são as consequências de sua opçãopor tratamento alternativo e alertá-lo da possibilidade de morte, caso o procedimento não logresucesso. Se houver concordância do paciente, não há o que se falar em responsabilidade civil ou atémesmo penal do médico que o tratar, caso haja morte por falta de sangue.

• O Código Penal Brasileiro , em seu artigo 135, diz que:

• Art. 135. Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonadaou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou nãopedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública:

• Pena – detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, ou multa.

• Parágrafo único. A pena é aumentada da metade, se da omissão resulta lesão corporal de naturezagrave, e triplicada, se resulta morte.

• No entanto, não se vê aqui, neste caso, uma omissão de socorro e sim uma concordância com avontade do paciente. Não há como ajudar uma pessoa com tratamento de sangue sendo que ela nãoquer ser ajudada desta maneira. A lei deve ser interpretada de maneira expansiva e não restritiva,analisando o contexto fático.

• O Brasil carece de jurisprudências e doutrinas que defendam a não punição do médico nestes casos,afinal, o médico apenas cumpriu com o seu dever de respeitar direitos alheio, o que deveria serentendido como correto.

• Assim como já exposto anteriormente, não há o que se falar em vida sem qualidade de vida. Não bastaestar vivo, é necessário ir mais além, o ser humano tem o direito de ter sua dignidade, seja ela física oumental. Em momento algum os Jeovistas mostram serem superiores aos outros, o que buscam é aigualdade.

Page 8: Profa. Adriana Galvão Moura Abílio - legale.com.br · homens e mulheres são vistos como donos de si mesmo e não mais pertencentes a um superior. Ocorpoé livre, oser humanoélivre

STJ - HABEAS CORPUS Nº 268.459

• Testemunhas de Jeová, os pais de Juliana, o militar aposentado Hélio Vitória dos Santos e a donade casa Ildelir Bonfim de Souza, moradores em São Vicente, litoral de São Paulo, internaram-nano Hospital São José em julho de 1993, durante uma crise causada pela anemia falciforme,doença genética, incurável e com altos índices de mortalidade, que afeta afrodescendentes. Amenina tinha os vasos sanguíneos obstruídos e só poderia ser salva mediante a realização deuma transfusão de emergência.

Os médicos que atenderam Juliana explicaram a gravidade da situação e a necessidade datransfusão sanguínea, mas os pais foram irredutíveis. A mãe chegou a dizer que preferia ter afilha morta a vê-la receber a transfusão. A transfusão não foi feita. Fez-se a sua vontade.

Isso posto, está claro que a decisão do STJ tem menos a ver com a afirmação do direito àliberdade de crença e muito mais a ver com a primazia do direito à vida sobre todos os demais.Assim, a mãe poderia até preferir ter a filha morta a vê-la passando por um processo detransfusão. Mas a Justiça brasileira, não! E o médico também não!

Revista Eletrônica de Jurisprudência HABEAS CORPUS Nº 268.459 - SP 2013⁄0106116-RELATORA : MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA IMPETRANTE : ALBERTO ZACHARIASTORON E OUTROS ADVOGADO : ALBERTO ZACHARIAS TORON IMPETRADO : TRIBUNAL DEJUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO PACIENTE : HÉLIO VITÓRIA DA SILVA PACIENTE : ILDELIRBOMFIM DE SOUZA RELATÓRIO MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA (Relatora):

Page 9: Profa. Adriana Galvão Moura Abílio - legale.com.br · homens e mulheres são vistos como donos de si mesmo e não mais pertencentes a um superior. Ocorpoé livre, oser humanoélivre

STF vai decidir se liberdade religiosa justifica custeio de tratamento de saúde pelo Estado

• O Supremo Tribunal Federal (STF) irá decidir se o exercício da liberdade religiosa pode justificar o custeio detratamento de saúde pelo Estado. A questão será analisada no Recurso Extraordinário (RE) 979742, que teverepercussão geral reconhecida pelo Plenário Virtual. O recurso foi interposto pela União contra acórdão daTurma Recursal do Juizado Especial Federal do Amazonas e Roraima, que a condenou, juntamente com oEstado do Amazonas e o Município de Manaus, a custear um procedimento cirúrgico indisponível na redepública, pois a religião do paciente (Testemunha de Jeová) proíbe transfusão de sangue.

• De acordo com a Turma Recursal, os três entes federativos devem se responsabilizar pelo custeio de umacirurgia de artroplastia total primária cerâmica sem transfusão, em hospital público ou particular, namodalidade Tratamento Fora do Domicílio, pois o procedimento não está disponível na rede do estado. Aindasegundo a decisão, a administração pública deve disponibilizar cobertura assistencial integral (inclusiveconsultas, rotinas médicas e medicamentos) para a completa recuperação de sua saúde, além de custear, aopaciente e a um acompanhante, passagens aéreas, traslados, hospedagem, alimentação e ajuda de custo até acompleta realização do seu tratamento.

• Com fundamento no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal, o acórdão recorrido estabelece que o PoderPúblico deve garantir o direito à saúde de maneira compatível com as convicções religiosas do cidadão, “umavez que não basta garantir a sua sobrevivência, mas uma existência digna, com respeito às crenças de cadaum”.

• No recurso apresentado ao STF, a União afirma que o acolhimento do pedido de custeio de tratamento médicocriará uma preferência em relação aos demais pacientes, afrontando o princípio da isonomia. Aponta, ainda,violação ao princípio da razoabilidade, já que qualquer procedimento cirúrgico pode ter complicações e,eventualmente, exigir a transfusão de sangue. A Procuradoria Geral da União opinou pelo desprovimento dorecurso, pois entende que não foi demonstrada a impossibilidade da realização da cirurgia sem transfusão desangue.

Page 10: Profa. Adriana Galvão Moura Abílio - legale.com.br · homens e mulheres são vistos como donos de si mesmo e não mais pertencentes a um superior. Ocorpoé livre, oser humanoélivre

• Manifestação (07/08/2017)

• Em manifestação ao Plenário Virtual, o relator do processo, ministro Luís Roberto Barroso,destacou que a questão constitucional reside na identificação de solução para o conflitopotencial entre a liberdade religiosa e o dever do Estado de assegurar prestações de saúdeuniversais e igualitárias. Em seu entendimento, é necessário determinar se a extensão dasliberdades individuais, prevista no artigo 5º, inciso VI, da Constituição, pode justificar o custeiode tratamento médico indisponível na rede pública. Para o ministro, a matéria "é de evidenterepercussão geral, sob todos os pontos de vista (econômico, político, social e jurídico), em razãoda relevância e transcendência dos direitos envolvidos”.

• O ministro observa que as liberdades individuais, entre elas a religiosa, pode ser restringida casoa conformação das políticas públicas de saúde desconsidere concepções religiosas e filosóficascompartilhadas por comunidades minoritárias. Ressalta que admitir que o exercício de convicçãoautorize a alocação de recursos públicos escassos coloca em tensão a realização de outrosprincípios constitucionais.

• Segundo ele, a demanda judicial por prestação de saúde não incorporada ao sistema públicoexige a ponderação do direito à vida e à saúde de uns contra o direito à vida e à saúde de outros.“Nessa linha, exigir que o sistema de saúde absorva toda e qualquer pretensão individual, comose houvesse na Constituição o direito a um trunfo ilimitado, leva à ruína qualquer tentativa deestruturação de serviços públicos universais e igualitários. Dessa forma, deve-se ponderar nãoapenas qual bem constitucional deve preponderar no caso concreto, mas também em quemedida ou intensidade ele deve preponderar”, apontou o relator.

• Por unanimidade, o Plenário Virtual reconheceu a existência de repercussão geral da questãoconstitucional suscitada no RE 979742.

Page 11: Profa. Adriana Galvão Moura Abílio - legale.com.br · homens e mulheres são vistos como donos de si mesmo e não mais pertencentes a um superior. Ocorpoé livre, oser humanoélivre

• CIVIL E CONSTITUCIONAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PACIENTE INTERNADO.TRATAMENTO APLICADO PELA INSTITUIÇÃO DE SAÚDE. DETERMINAÇÃO JUDICIAL.TRANSFUSÃO DE SANGUE COMPULSÓRIA. RECUSA DA PESSOA ENFERMA. OPÇÃO PORMODALIDADE DIVERSA DE TRATAMENTO. POSSIBILIDADE. OBSERVÂNCIA DO DIREITOFUNDAMENTAL À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E À LIBERDADE. DIREITO DE ESCOLHADA ESPÉCIE DE TRATAMENTO MÉDICO. LEGALIDADE. AGRAVO DE INSTRUMENTOCONHECIDO E PROVIDO.

1. A opção de escolha pela modalidade e características do tratamento médico que lhapareça mais conveniente, sob os aspectos biológico, científico, ético, religioso e moral, éconduta que possui a natureza de direito fundamento, protegida pelo Princípio daDignidade da Pessoa Humana e da Liberdade, na forma preconizada no art. 1º, inciso III,da Constituição Federal.

2. É lícito que a pessoa enferma e no pleno exercício de sua capacidade de expressão emanifestação de vontade, de modo claro e induvidoso, recuse determinada forma detratamento que lhe seja dispensado, não se evidenciando nesse caso lesão ao bem maiorda vida, constitucionalmente tutelado, mas se configurando, de outro modo, o efetivoexercício de conduta que assegura o também constitucional direito à dignidade e àliberdade pessoal.

3. Com relativa frequência o Poder Judiciário é chamado a dirimir conflitos que remontama profundos e complexos questionamentos subjetivos e dúvidas existenciais, e dizemrespeito à própria finitude humana, contudo, a grande envergadura dessa missão nãopode resultar em omissão na direção legal a ser adotada, mas exige pronta e efetivaresposta, que também deve ser erigida à expressão da relevância inserida no conflito debens caros, essenciais e igualmente agasalhados pela Constituição Federal.

Page 12: Profa. Adriana Galvão Moura Abílio - legale.com.br · homens e mulheres são vistos como donos de si mesmo e não mais pertencentes a um superior. Ocorpoé livre, oser humanoélivre

• 4. Na hipótese dos autos, uma paciente acometida de LeucemiaLinfoblática Aguda – LLA, em razão de sua convicção religiosa(Testemunha de Jeová) e científica – biológica – existência de meiosterapêuticos sem os riscos transfusionais-, recusou, mediantedeclaração escrita e verbal, tratamento médico que prevê a transfusãode sangue, e, optou por tratamento médico diverso e alternativo, firmena preservação de sua dignidade e de suas convicções pessoais efilosóficas ante o evento da vida. Não acolhendo esses fundamentos, foiproferida no processo de origem Decisão antecipatória da tutela queautorizou o procedimento forçado de transfusão sanguíneo, provimentojudicial que, no entanto, mereceu reforma nos presentes autos deAgravo de Instrumento.

5. Recurso de Agravo de instrumento conhecido e provido, para o fim dedesconstituir, integralmente a Decisão agravada.A Turma, porunanimidade, conheceu do recurso e, no mérito, deu-lhe provimento.(ACÓRDÃO 0017343-82.2016.4.01.0000 , DESEMBARGADOR FEDERALKASSIO NUNES MARQUES, TRF1 – SEXTA TURMA, e-DJF1DATA:08/07/2016)

Page 13: Profa. Adriana Galvão Moura Abílio - legale.com.br · homens e mulheres são vistos como donos de si mesmo e não mais pertencentes a um superior. Ocorpoé livre, oser humanoélivre

Regime de aulas para aluno adventista – 01/JUNHO/2015

• A criação de privilégios em favor de determinada crença religiosaviola os princípios constitucionais da igualdade e da legalidade. Comesse entendimento a 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ªRegião negou a uma estudante universitária e membro da IgrejaAdventista do Sétimo Dia o direito a alteração do regime de aulas eprovas estabelecido pela instituição de ensino.

• A estudante ingressou com Mandado de Segurança pedindo que lhefosse assegurada o previsto na Lei 12.142/05 do estado de São Paulo. Anorma estabelece horários em que as provas devem ser aplicadas com ointuito de se respeitar a guarda sabática — período que se estende dopôr-do-sol de sexta-feira ao pôr-do-sol de sábado.

• No entanto, ao analisar o caso no TRF-3, o relator desembargadorfederal Johonsom Di Salvo, destacou que o artigo 5º da ConstituiçãoFederal prevê que a lei deve ser igual para todos e que ninguém seráobrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude delei. Por isso, segundo o magistrado, não é possível estabelecer privilégiona área de ensino superior para um determinado grupo religioso.

Page 14: Profa. Adriana Galvão Moura Abílio - legale.com.br · homens e mulheres são vistos como donos de si mesmo e não mais pertencentes a um superior. Ocorpoé livre, oser humanoélivre

• “Não é dado ao Judiciário compelir entidade de ensino superior a atuar fora de seusregulamentos e da Lei 9.394/96 — Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB),impondo-lhe encargos e ônus materiais que beneficiem determinado aluno destacando-o dasatividades a que devem se dedicar os seus colegas à conta da confissão religiosa voluntária dequem deseja ser privilegiado”.

• O desembargador federal ressaltou que ao ingressar no curso oferecido pela universidade, aestudante tinha pleno conhecimento de que deveria submeter-se aos critérios e exigências dareferida instituição de ensino, dentre eles, os horários em que as aulas seriam ministradas — oque incluía as sextas-feiras à noite e sábados de manhã — sendo descabida a alegação tardia deofensa ao direito à liberdade de crença.

• “A universidade que faz cumprir seus regulamentos — aos quais o discente voluntariamenteaderiu ao se inscrever na instituição de ensino — não está violando qualquer direito líquido ecerto do aluno que posteriormente não os deseja cumprir, à conta de prática religiosa. Aderir aqualquer confissão religiosa, ou permanecer sem crença alguma, é direito fundamental dequalquer brasileiro. Mas a opção adotada não outorga mais direitos ou privilégios do quepossuem os demais cidadãos”, acrescentou.

• A decisão destaca jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a relação queexiste entre a pessoa e a igreja que profetiza a crença que elegeu não cria qualquer obrigaçãopara terceiros, razão pela qual não há de se falar que a qualidade de membro da IgrejaAdventista do Sétimo Dia, por si só, confira direito líquido e certo do aluno de não participar dasaulas, durante o período de guarda religiosa.

Page 15: Profa. Adriana Galvão Moura Abílio - legale.com.br · homens e mulheres são vistos como donos de si mesmo e não mais pertencentes a um superior. Ocorpoé livre, oser humanoélivre

• ADI no Supremo Apelação Cível 0005478-28.2013.4.03.6106/SPADI 3.714

• Em 2006, a Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino(Confenen) ingressou com Ação Direta de Inconstitucionalidade contra aLei 12.142/05 de São Paulo. A Confenen alega que a lei estadualquestionada invade a competência privativa da União para legislar sobrediretrizes e bases da educação nacional. Além disso, no que diz respeitoaos estabelecimentos de ensino superior, a Confenen argumenta que alei paulista ofendeu o princípio da autonomia universitária, comoprevisto no artigo 207 da Constituição Federal.

• Considerando a relevância do tema e de seu especial significado para aordem social e a segurança jurídica, o então relator da ADI 3.714,ministro aposentado Carlos Ayres Britto, submeteu o processodiretamente ao Plenário do STF. Hoje o processo está sob a relatoria doministro Teori Zavascki.

• Em 2007, a procuradoria-geral da República deu parecer favorável, emparte, à ADI. Para o então procurador-geral da República AntonioFernando Souza, no que diz respeito às universidades, “a lei paulista éafrontosa ao princípio da autonomia de tais estabelecimentos deensino, na medida em que lhes é imposta a observância de regras sobrea sua própria gestão administrativa”.

• Por outro lado, ele afirma que a ação não deve ser analisada no pontoque se refere às datas e horários para a realização de concurso públicoou processo seletivo para provimento de cargos públicos, dada aausência de legitimidade da Confenen para impugnação, por falta depertinência temática.

Page 16: Profa. Adriana Galvão Moura Abílio - legale.com.br · homens e mulheres são vistos como donos de si mesmo e não mais pertencentes a um superior. Ocorpoé livre, oser humanoélivre

Em decisão tomada no dia 16/09/2014, o Conselho Nacional de Justiça – CNJ – Adventista de Sétimo Dia.

• O Conselho Nacional de Justiça - CNJ sinalizou que passará a não maisautorizar horário diferenciado para que candidatos que professam a féAdventista do Sétimo Dia concorram em concursos públicos para ocargo de juiz de direito.

• Tratava-se de membro da Igreja Adventista do Sétimo Dia que seinscrevera em concurso para o cargo de juiz de direito substituto doTribunal de Justiça do Ceará.

• Após lograr êxito nas fases preliminares, avançou para a etapa de provaescrita, a qual estava designada para ocorrer em horário quecompreendia o sábado. O Candidato, então, formulou pedido ao TJCEpar que ingressasse na sala de aplicação de prova no mesmo horárioque os demais candidatos, mas que pudesse iniciar sua realizaçãosomente após o pôr-do-sol, haja vista reservar tal período para estudo ereflexão dos dogmas da religião que pratica, dentre outras atividades decunho eclesiástico.

• Na prática, o candidato se submeteria a um confinamento e se quedariaincomunicável, sem acesso a qualquer material de estudo ou similar,resguardando a lisura do certame.

Page 17: Profa. Adriana Galvão Moura Abílio - legale.com.br · homens e mulheres são vistos como donos de si mesmo e não mais pertencentes a um superior. Ocorpoé livre, oser humanoélivre

• Ou seja, ingressaria na sala de prova junto com os demais candidatos, mas permaneceriaisolado e incomunicável até o crepúsculo, quando então iniciaria o exame, com o mesmotempo assegurado aos demais candidatos.

• O TJCE negou o pedido, motivando a instauração de Procedimento de ControleAdministrativo - PCA perante o CNJ (processo 0003657-86.2014.2.00.0000), no qual seconcedeu liminar nos moldes requeridos pelo candidato.

• Antes mesmo do julgamento do mérito do aludido PCA, sobreveio a notícia de que ocandidato requerente fora reprovado em fase intermediária, interrompendo sua trajetóriano certame, o que, a rigor, acarretaria a perda de objeto do PCA, dada a ausência deobjeto.

• Não obstante, em um inédito protagonismo que assume feições discriminatórias, oPresidente do Conselho Nacional de Justiça, Ministro Ricardo Lewandowski, que também épresidente do Supremo Tribunal Federal, propugnou que mesmo assim o conselhodeliberaria sobre o tema. Após vencer a resistência da Corregedora-Geral da Justiça(Ministra Nancy Andrighi), que entendia ser competência de cada tribunal resolver oassunto, o Presidente do STF e do CNJ iniciou o debate e proclamou a perda de objeto,mas não sem antes enfatizar que não seria dado aos tribunais adaptar os concursos asdistintas religiões, em obséquio ao princípio da eficiência.

Page 18: Profa. Adriana Galvão Moura Abílio - legale.com.br · homens e mulheres são vistos como donos de si mesmo e não mais pertencentes a um superior. Ocorpoé livre, oser humanoélivre

Candidata pode prestar prova em horário diferenciado por motivo religioso -03/05/2018

• A 5ª turma do TRF da 1ª região, por unanimidade, negou provimento à remessa oficial doCebraspe - Centro Brasileiro de Pesquisa em Avaliação e Seleção e de Promoção deEventos e manteve sentença que permitiu que candidata de concurso realizasse provasmarcadas em horário diferenciado.

• A candidata impetrou MS contra ato do Cebraspe e teve seu pedido deferido pelo juízoFederal da 17ª vara da SJ/DF.

• No TRF da 1ª região, ao analisar o caso, o relator, juiz Federal convocado Rodrigo NavarroOliveira, expôs que a liberdade de crença religiosa está assegurada "como direito egarantia fundamental prevista na CF". O magistrado endossou que os membros da igrejaAdventista do Sétimo Dia têm como dia sagrado e santificado o sábado natural, períodoque se estende do pôr do sol da sexta-feira até o pôr do sol do sábado. Sendo assim,durante esse período, os membros da igreja se abstêm de realizar qualquer atividade quede alguma forma possa conflitar com a observância do dia de guarda, incluindo provas deconcursos, sustentou Rodrigo Oliveira.

• O magistrado ressaltou que a impetrante não invoca sua profissão religiosa para eximir-sede obrigação legal a todos imposta, ao contrário, pede para cumprir prestação alternativa(realizar a prova em igualdade de condições com os demais candidatos, só que em outrohorário).

• A sentença decidiu a questão com inegável acerto, assegurando a impetrante o direito deprestar o concurso, determinando-lhe que chegasse no horário normal de realização dasprovas e ficasse isolada em sala diversa dos demais candidatos até o pôr-do-sol, quandosomente então iniciaria as provas, com o mesmo tempo de duração conferido aos demaiscandidatos."

• Diante do exposto, o colegiado, acompanhando o voto do relator, negou provimento àremessa oficial.

• Processo: 0011170-37.2010.4.01.3400

Page 19: Profa. Adriana Galvão Moura Abílio - legale.com.br · homens e mulheres são vistos como donos de si mesmo e não mais pertencentes a um superior. Ocorpoé livre, oser humanoélivre

Empresa pública deverá indenizar uma funcionária dispensada por discriminação religiosa. A decisão é da 1ª turma do TST.

• A trabalhadora afirmou que foi admitida pela empresa estadual através de umconcurso público. No ato da contratação, informou pertencer à IgrejaAdventista, cuja doutrina proíbe o trabalho entre o pôr-do-sol de sexta-feira e ode sábado. No entanto, a empresa passou a exigir que ela trabalhasse aossábados e diante da impossibilidade foi demitida por justa causa. Ela alegoudiscriminação por crença religiosa.

• A empresa considerou a alegação da funcionária "fruto de sua mente fértil eimaginária" e que por ela ter entrado através de concurso "estava ciente dascondições, local e horário de trabalho definidos pela empresa."

• Para o TRT da 3ª região, não ficou comprovada a real necessidade da funcionáriatrabalhar aos sábados, entendendo que a dispensa foi “arbitrária, ilegal ediscriminatória”.

• Em recurso ao TST, a defesa da companhia alegou que a contratação porconcurso público "não impede a empresa pública, de livremente despedir seusempregados e que não há determinação expressa do artigo 37 da CF quanto ànecessidade de motivação dos atos praticados pela Administração Indireta."

• Contudo, o relator do caso, ministro Hugo Carlos Scheuermann, assinalou que acontrovérsia não é propriamente sobre a necessidade ou não de ato motivadopara dispensa, e sim sobre discriminação. “A empresa não contestou no recursoo fundamento do TRT de que a dispensa foi discriminatória”, afirmou. Sendoassim, manteve decisão para reintegração da funcionária. A decisão foiunânime.

• Processo: TST-RR-745-84.2011.5.03.0066 – 143/08/2017