Programa Diversidade Universidade e Construção Politica Educacional Anti-racista

Embed Size (px)

Citation preview

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    1/181

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    2/181

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    3/181

    Organizao:

    Maria Lcia de Santana

    Braga

    Maria Helena Vargas

    da Silveira

    O ProgramaDiversidade naUniversidade e

    a Construo

    de uma PolticaEducacionalAnti-Racista

    EDUC

    AOPARATOD

    OS

    CO

    LE

    O

    Braslia, abril de 2007

    1a Edio

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    4/181

    Edies MEC/Unesco

    SECAD Secretaria de Educao Continuada,Alfabetizao e Diversidade

    Esplanada dos Ministrios, Bl. L, sala 700Braslia, DF, CEP: 70097-900Tel: (55 61) 2104-8432Fax: (55 61) 2104-8476

    Organizao das Naes Unidas paraa Educao, a Cincia e a Cultura

    Representao no BrasilSAS, Quadra 5, Bloco H, Lote 6, Ed. CNPq/IBICT/Unesco,9 andar Braslia, DF, CEP: 70070-914Tel.: (55 61) 2106-3500Fax: (55 61) 3322-4261Site: www.unesco.org.brE-mail: [email protected]

    http://www.unesco.org.br/mailto:[email protected]:[email protected]://www.unesco.org.br/
  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    5/181

    O ProgramaDiversidade naUniversidade e

    a Construo

    de uma PolticaEducacionalAnti-Racista

    Organizao:

    Maria Lcia de Santana

    Braga

    Maria Helena Vargas

    da Silveira

    EDUC

    AOPARATOD

    OS

    CO

    LE

    O

    Braslia, abril de 2007

    1a Edio

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    6/181

    2007. Secretaria de Educao Continuada, Alfabetizao e Diversidade (Secad) eOrganizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a Cultura (UNESCO)

    Conselho Editorial da Coleo Educao para TodosAdama OuaneAlberto MeloClio da CunhaDalila ShepardOsmar FveroRicardo Henriques

    Coordenao Editorial da Secad/MEC:

    Maria Lcia de Santana Braga

    Diagramao: Supernova DesignReviso: Alessandro Mendes - 1375/99 DRT-DF

    1a EdioTiragem: 5.000 exemplares

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)(Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

    O Programa Diversidade na Universidade e a construo de uma poltica educacional anti-racistaOrganizao: Maria Lcia de Santana Braga e Maria Helena Vargas da Silveira. Braslia :Secretaria de Educao Continuada, Alfabetizao e Diversidade, UNESCO, 2007.

    190 p. (Coleo Educao para Todos ; v. 29)

    ISBN 978-85-60731-04-6

    1. Programas de Educao Superior. 2. Polticas pblicas em educao. 3. Educao inclusiva.4. Poltica de incluso social. 5. Critrios do vestibular. 6. Integrao racial. I. Braga, Maria Lcia

    de Santana. II. Silveira, Maria Helena Vargas da. III. Brasil. Secretaria de Educao Continuada,Alfabetizao e Diversidade.

    CDU 378.014.53

    Os autores so responsveis pela escolha e apresentao dos fatos contidos neste livro, bem comopelas opinies nele expressas, que no so necessariamente as da UNESCO e do Ministrio daEducao, nem comprometem a Organizao e o Ministrio. As indicaes de nomes e a apresentaodo material ao longo deste livro no implicam a manifestao de qualquer opinio por parte da UNESCO

    e do Ministrio da Educao a respeito da condio jurdica de qualquer pas, territrio, cidade, regioou de suas autoridades, nem tampouco a delimitao de suas fronteiras ou limites.

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    7/181

    Apresentao

    Nas ltimas dcadas, o Estado brasileiro assumiu compromissos que en-volvem diretamente a eliminao de prticas de racismo e das diversas formas dediscriminao, dentre elas as dirigidas a grupos tnico-raciais. Em balano recentesobre a agenda do Ministrio da Educao, com foco nas polticas pblicas afir-mativas, constatou-se que o enfrentamento desse quadro exige a integrao dasperspectivas universalistas e diferencialistas na elaborao de uma poltica educa-cional orientada pelos valores da diversidade e do direito diferena.

    Entre as aes do Ministrio da Educao, direcionadas a essas questes,figura o Programa Diversidade na Universidade. Criado em 2002, o desenho des-se Programa enfoca a promoo da eqidade e diversidade na educao supe-rior para afrodescendentes, indgenas e outros grupos socialmente desfavorecidosno Brasil. Alm de apoiar a formulao de polticas pblicas de incluso social ecombate discriminao tnico-racial para o ensino mdio e superior, foi definidocomo objetivo relevante do Programa o apoio, desenvolvimento e avaliao deProjetos Inovadores de Curso (PICs), idealizados para contribuir com a ampliao

    do nmero de estudantes negros e indgenas nas universidades brasileiras.Em 2002, para a realizao de projetos-piloto nos estados da Bahia, So

    Paulo e Rio de Janeiro, foram selecionadas seis instituies, com atendimen-to de aproximadamente 840 estudantes. J nos anos de 2003 a 2006, foramapoiados 95 PICs, desenvolvidos por 89 instituies, situadas em pelo menos10 estados da Federao, que beneficiaram 13.623 alunos(as). Como resultado,cerca de 15% dos alunos (aproximadamente 2.000) ingressaram em instituiesde ensino superior pblicas e privadas.

    O balano das experincias educacionais, realizadas no mbito do Progra-ma Diversidade na Universidade, est relatado neste livro, que tambm indicacaminhos inovadores, fomentados e criados por organizaes no-governamen-tais, universidades e prefeituras por meio dos Projetos Inovadores de Cursos.Com esta publicao, a Secad/MEC reafirma seu compromisso com uma educa-o de qualidade, baseada na diversidade social e regional, tnico-racial, cultu-ral, de gnero e de orientao sexual.

    Ricardo Henriques

    Secretrio de Educao Continuada, Alfabetizao e Diversidade

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    8/181

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    9/181

    Transversalidade da Temtica tnico-Racial com os Contedosdo Ensino Mdio e com Programas do Vestibular

    Srgio Pinheiro 111

    As Experincias Educacionais dos ProjetosInovadores de Curso

    Segregao Racial, Desigualdades Raciais e ParticipaoLourdes Brasil dos Santos Argueta, Cristiane de Barros Pereira,Giselle Pinto 127

    Aspectos Racistas Presentes em Algumas Obrasda Literatura de CordelAlcione Vilanova Souza Gonalves, Paulo Guimares de Azevedo,Reginaldo Ribeiro dos Santos 141

    Da Relatividade ao BerimbauHuyr Estevo de Arajo 161

    O Curso Pr-vestibular Milton Santos e a Festa Afro-Juninado Grupo TEZAna Maria Queiroz, Dina Maria da Silva 167

    Igualdade Racial s Possvel com um Povo Consciente,Sbio, OrganizadoLeci Brando 179

    Sobre Autores e Autoras 182

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    10/181

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    11/181

    12

    Este livro resultado do relato de experincias dos professores(as) de PICsem sala de aula; do dilogo nas oficinas pedaggicas; da reflexo e estudos das co-

    ordenaes pedaggicas desses projetos; do trabalho das consultorias e da equipetcnica da Secad/MEC. Prope-se a encorajar professores(as), especialmente doEnsino Fundamental e Mdio, a voltarem sua ateno para assuntos que podemser abordados em sala de aula, independentemente da disciplina que o professorlecione. E tambm subsdio para auxiliar na implementao da Lei de Diretrizese Bases da Educao Nacional (LDB), nos artigos 26A e 79B, alterados pela Lei10.639/2003, que institui a obrigatoriedade de ensino de cultura e histria africanae afro-brasileira.

    Os textos, a despeito da especificidade de seus contedos direcionadospara o trabalho educacional com a populao negra, no possuem caractersticassegregadoras, pois se dedicam educao para a diversidade, processo necess-rio para a mobilizao de todos os grupos tnicos a partir de valores como digni-dade e solidariedade, servindo para a educao de negros e no-negros.

    A escola, com todos os seus sujeitos, precisa ser a maior aliada das polti-cas pblicas de incluso educacional e de no-discriminao racial, uma vez quecongrega a prpria sociedade brasileira, estruturalmente marcada por uma discus-so equivocada das relaes raciais. Essa escola necessita repensar as atitudessociais discriminatrias e cooperar para que ocorram mudanas direcionadas a umolhar positivo para os(as) alunos(as) negros(as).

    Os textos aqui apresentados so originrios da reflexo e da prtica educa-cional e pedaggica em 27 Projetos Inovadores de Curso, 14 oficinas pedaggicase seis encontros estaduais realizados em seis estados brasileiros, no ano de 2005:Maranho, Bahia, Rio de Janeiro, So Paulo, Minas Gerais e Mato Grosso do Sul.Em conjunto, oferecem significativa colaborao prtica educacional e docente,comprometida com o desenvolvimento da populao negra como sujeito do espa-o escolar, agente ativo do acesso ao ensino em todos os nveis; uma populaovalorizada e integrada ao povo de que faz parte, com o respeito e a dignidade quemerecem de fato e por direito.

    Na primeira parte da publicao, intitulada O Programa Diversidade na Uni-versidade: Educao Bsica, atores da transformao e estratgias pedaggicas,apresentamos a reflexo da equipe do Programa Diversidade na Universidade. Noartigo Por uma Poltica de Ao Afirmativa na Educao Bsica, a antroploga,pesquisadora e subcoordenadora dos Projetos Inovadores de Curso, Renata de

    Melo Rosa, reflete sobre o Programa Diversidade na Universidade e o conjunto de

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    12/181

    13

    polticas afirmativas suscitadas para a Educao Bsica por meio das experinciase aes educacionais executadas. O segundo texto, Os Projetos Inovadores de

    Curso e seus Atores da Transformao, assinado pela sociloga Magda Fernan-des, responsvel pela equipe de Acompanhamento e Avaliao dos PICs, delineiaa trajetria do Programa Diversidade na Universidade. O artigo trata dos principaisaspectos do programa e avalia os resultados obtidos com os Projetos Inovadoresde Curso, balizando as aes implementadas, bem como suas progressivas rees-truturaes, decorrentes do prprio processo avaliativo. O texto tambm analisa operfil dos alunos atendidos a partir de aspectos demogrficos, grupo domstico,trabalho e estudo, de gnero e etrio. O ltimo texto, Estratgias Pedaggicaspara a Educao Anti-Racista nos Projetos Inovadores de Curso, de autoria da

    especialista em educao e consultora Maria Helena Vargas da Silveira, aborda asestratgias pedaggicas para uma educao anti-racista, oriunda das variadas ediversas experincias presentes nos Projetos Inovadores de Curso.

    A segunda parte da publicao, Os Cursos Pr-Vestibulares e os Desafiosdas Polticas Educacionais Afirmativas, tambm composta por trs artigos. Ale-xandre Nascimento assina o primeiro, intitulado Os Cursos Pr-Vestibulares Popu-lares como Prtica de Ao Afirmativa e Valorizao da Diversidade. Integrante doMovimento Pr-vestibular para Negros e Carentes (PVNC), doutorando em Servio

    Social e professor de Ensino Mdio, Nascimento analisa em seu artigo a produodo conceito de ao afirmativa, bem como o papel dos movimentos sociais emque os cursos pr-vestibulares acabaram se transformando na construo dasaes afirmativas. J Renato Emerson dos Santos, professor de Geografia da Fa-culdade de Formao de Professores da Universidade Estadual do Rio de Janeiro(UERJ) discute, no artigo Por uma Educao Anti-Racista: desafios aos cursospr-vestibulares populares para negros, os desafios e possibilidades desses cur-sos com corte racial, apoiados pelo Programa Diversidade na Universidade e osfatos limitadores da prpria dinmica dos vestibulares para uma educao anti-racista. No texto Transversalidade da Temtica tnico-Racial com os Contedosdo Ensino Mdio e com Programas do Vestibular, o gegrafo e educador SrgioPinheiro, que foi consultor da Secad/MEC, coloca em debate a transversalidadedas relaes tnico-raciais nos contedos do Ensino Mdio e a possibilidade deelaborao de um projeto didtico que incorpore essas vrias preocupaes.

    A terceira e ltima parte do livro, As Experincias Educacionais dos ProjetosInovadores de Curso, traz uma srie de experincias e relatos dos gestores, co-ordenadores pedaggicos, coordenadores administrativos e professores que par-

    ticiparam dos Projetos. Lourdes Brasil, Cristiane Barros e Giselle Pinto, discutem

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    13/181

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    14/181

    O ProgramaDiversidade na

    Universidade:atores datransformao

    e estratgiaspedaggicaspara a educao

    bsica

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    15/181

    Por uma

    poltica deao afirmativa

    na EducaoBsica

    Renata de Melo Rosa*

    Com muita satisfao venho representando o Ministrio da Educao no

    dilogo com os Projetos Inovadores de Curso, objeto de execuo doComponente 3 do Contrato de Emprstimo OC-BR 1406 celebradoentre o MEC e o Banco Interamericano de Desenvolvimento e posto

    em execuo desde 2002, dando incio ao Programa Diversidade na Universidade.

    Fruto de uma resposta governamental s presses polticas do movimento ne-gro representadas na Conferncia de Durban, ocorrida na frica do Sul, em 2001, oPrograma Diversidade na Universidade passou por momentos polticos e institucio-nais bastante interessantes, os quais valem a pena ser destacados neste artigo.

    O lugar poltico do Programa Diversidade na Universidade esteve semprecondicionado s polticas estruturantes do Ministrio da Educao. Isso no impli-ca em nenhuma crtica, visto que o desenho do programa indica que sua natureza de articulao no sentido de apoiar a formulao, de maneira participativa, depolticas e estratgias de incluso social e combate discriminao racial e tnicapara a educao mdia e superior1. Ademais, o reforo dessa misso do programa

    * Subcoordenadora de Projetos Inovadores de Curso MEC/Secad/DEDC/CGDIE.1 Contrato de Emprstimo n 1406/OC-BR, entre a Repblica Federativa do Brasil, e o Banco Interamericano

    de Desenvolvimento (BID), Programa Diversidade na Universidade, publicado em 18 de dezembro de 2002 Resoluo DE-57/02.

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    16/181

    18

    tambm vem estabelecido a partir da idia de fortalecer a capacidade do Ministrioda Educao para orientar a formulao de polticas afirmativas2.

    Instaurado inicialmente na Diretoria do Ensino Mdio, na antiga Semtec Secretaria de Educao Mdia e Tecnolgica, atual Setec Secretaria de Edu-cao Tecnolgica, o Diversidade, como carinhosamente chamado, cumpriu seuobjetivo primordial de programa para pensar polticas de valorizao da diversidadetnico-racial, apenas na modalidade do Ensino Mdio e promoo de estratgias deacesso da populao afrodescendente e indgena no Ensino Superior.

    Retirado da Semtec em fevereiro de 2004 e institucionalmente atribudo a Se-cad em agosto do mesmo ano, o Diversidade incorporou em sua agenda algumas

    misses que vo alm da articulao entre o Ensino Mdio e Superior. Essa agendaem si j exaustiva, mas o panorama das polticas do Ministrio da Educao sofreualteraes sensveis que tambm impactaram o programa. Por exemplo, a Secretariade Educao Superior avanou em muitos aspectos em direo a uma poltica de aoafirmativa no Ensino Superior, a saber: o Prouni criado em 2004, que oferece bol-sas de estudo em instituies de Educao Superior privadas a estudantes brasileirosde baixa renda sem diploma de nvel superior (...) que reserva, em cada Unidade daFederao, um percentual de bolsas igual quele de cidados autodeclarados negros,pardos ou ndios, segundo o ltimo censo do IBGE3. Somam-se a esse esforo o An-teprojeto de Lei da Reforma Universitria, em tramitao na Cmara dos Deputados,que prev em sua sexta diretriz a implantao de polticas afirmativas nas instituiesfederais de Educao Superior. O texto argumenta o combate das desigualdades so-ciais e raciais no Ensino Superior a partir de dados do Inep e do IBGE:

    Comparando os dados do Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais An-sio Teixeira Inep com os do instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica IBGE, conclui-se que a cor do campus diferente da cor da sociedade: osbrancos na sociedade somam 52% e no campus, 72,9%; os negros na socie-

    dade somam 5,9%, no campus, 3,6%; os pardos da sociedade somam 41%, nocampus, 20,5%4.

    A reforma prope ainda um Plano de Metas para as universidades alcana-rem, em um perodo determinado de dez anos, polticas de ao afirmativa visan-

    2 Idem.3

    Disponvel em: . Acesso em: junho/2006.4 Fonte: Exposio de Motivos Anteprojeto de Lei da Educao Superior.

    http://prouni-inscricao.mec.gov.br/prouni/inf_est.shtmhttp://prouni-inscricao.mec.gov.br/prouni/inf_est.shtm
  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    17/181

    19

    do uma correlao justa entre sociedade e populao universitria. Vale mencionartambm a instituio do Uniafro criado em conjunto pelas Secretarias de Educa-

    o Superior Sesu e Secretaria de Educao Continuada, Alfabetizao e Diversi-dade Secad, no sentido de apoiar as Instituies Pblicas de Educao Superiorno desenvolvimento de programas e projetos de ensino, pesquisa e extenso quecontribuam para a implementao e para o impacto de polticas de ao afirmativapara a populao negra5.

    Tendo em vista o avano de um conjunto de polticas de aes afirmativasno Ensino Superior e, sobretudo a compreenso da desigualdade racial por parteda Sesu, o Programa Diversidade na Universidade deve reorientar seu foco para a

    implementao de um conjunto de polticas afirmativas na Educao Bsica. Elasso necessrias e absolutamente indispensveis para se combater os equvocos susci-tados pela aplicao de outros sistemas de ao afirmativa, como o relatado por Ge-orge Andrews nos Estados Unidos6: a de que a poltica de cotas conseguiu alcanarapenas uma elite negra em ascenso e manteve ao mesmo tempo um bolso negrode pobreza dos afro-americanos.

    A partir das experincias de testes de polticas de ao afirmativa, podemospropor no mbito do Ministrio da Educao uma poltica mais orgnica de aesafirmativas, que combatam a evaso dos negros desde a Educao Infantil at oEnsino Mdio.

    Os dados dos Projetos Inovadores de Curso informam que o universo7 dosalunos divide-se a partir das seguintes caractersticas: aproximadamente 75% dosalunos so solteiros e no possuem filhos. Esse dado deve aproximar os alunos doPIC das polticas globais de juventude e especialmente daquelas ancoradas no Mi-nistrio da Educao.

    Em relao ao grau de escolaridade dos pais, nota-se que existe uma im-

    portante diferena entre o grau de escolaridade da me dos afrodescendentes emcomparao com a me dos alunos brancos. As mes dos primeiros compem68% daquelas que no estudaram ou no completaram a 4 srie do Ensino Fun-damental. O fosso maior encontra-se na diferena percentual entre as mes que jamais freqentaram o sistema escolar. Visivelmente, o impacto maior recai nasmulheres negras, que somam 31,18% deste universo contra 14,63% de mes dosalunos brancos. Estima-se que a mdia de idade dessas mulheres no ultrapassa

    5 Disponvel em: . Acesso em: maio/2006.6

    George Reid Andrews, Aes Afirmativas: um modelo para o Brasil? (mimeo)7 A pesquisa socioeconmica foi feita com o universo dos alunos do PIC, totalizando 5.370 alunos.

    http://www.mec.gov.br/uniafrohttp://www.mec.gov.br/uniafro
  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    18/181

    20

    a faixa de 45 anos8. Apesar das polticas de alfabetizao e educao de jovens eadultos institudas no Ministrio da Educao, por intermdio da Secad, nota-se

    que essas polticas ainda no conseguiram atingir de maneira uniforme as mulheresnegras, que ainda acumulam dficits grosseiros de excluso dos sistemas de ensino.Isso implica dizer que as polticas do Ministrio da Educao devem estar muitomais atentas, nas suas dimenses de raa e gnero, na construo de polticas espe-cficas, tanto no que diga respeito elevao do nvel de escolaridade e aumentosreais de ascenso social de mulheres negras acima dos 40 anos, como de polticas decombate evaso e incentivo matrcula de meninas negras na pr-escola e garan-tia de sua permanncia na Educao Bsica. Esse desenvolvimento desigual de raae gnero impacta tambm o desenvolvimento do pas como um todo e subdimen-

    siona os ndices de desenvolvimento humano do Brasil.De acordo com dados da PNAD (2002), 48% das mulheres negras brasileiras

    ocupam a funo de empregada domstica e esto sujeitas s piores cargas horriasde trabalho, s piores remuneraes e s piores relaes de trabalho. Para que essequadro se reverta, importante que as polticas de educao afirmativa cobam anaturalizao do esteretipo da mulher negra associada ao servio domstico e ofe-ream a esse grupo chances reais de ascenso social.

    Em relao ao lugar do PIC no quadro de expectativas de ascenso social,novamente a diferena entre os grupos de cor faz-se notar. Enquanto 20,38% dosalunos afrodescendentes enxergam no PIC a nica possibilidade de ingressar noEnsino Superior, apenas 7,94% dos alunos brancos depositam suas expectativasnessa modalidade de ao afirmativa. Isso mostra que a populao negra est des-provida de recursos emancipatrios para escolher quais sero suas opes de futuro,ficando, muitas vezes, condicionada s polticas de governo.

    A partir do sistema de monitoramento e avaliao dos PICs, podemos perce-ber que o abandono escolar (incluindo os cursinhos pr-vestibulares apoiados pelo

    MEC) impacta os alunos afrodescendentes de uma maneira mais sistemtica e per-centualmente maior que os alunos brancos. Em pesquisa realizada a respeito dosfatores condicionantes da evaso dos alunos dos PICs, constatou-se que, do mon-tante dos alunos que abandou o cursinho, 90% no foi notada a ausncia. Dos 10%em que a ausncia foi notada, 8% foram por colegas e apenas 2% por professorese coordenadores. Isso indica que polticas de combate evaso no so institucio-nalizadas na gesto escolar. O impacto da ausncia dessa poltica particularmente

    8 Brasil. Ministrio da Educao. Secretaria de Educao Continuada, Alfabetizao e Diversidade. Relatriodas Instituies de Acompanhamento e Avaliao dos PICs. Braslia: MEC, 2005.

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    19/181

    21

    significativa para a populao negra que deseja retornar os estudos. O depoimentoa seguir de um aluno evadido do PIC que, de dia, trabalha como jardineiro em

    um condomnio:Com toda a minha sinceridade, respondo que trabalho de jardineiro emum condomnio. Sou honesto e trabalhador, graas a Deus, mas sempretive problemas com lcool. Um professor do Departamento de EngenhariaAgrcola da UFU resolveu arrumar um servio para mim e s vezes ficoat oito horas da noite porque tenho que ajudar no experimento deles, nodando tempo para mim vir (sic) no cursinho. Eu quero tentar o Vestibulareste ano e quero passar em Geografia, se Deus quiser. Tambm vejo uma

    propaganda na TV em que um senhor de uma certa idade, de cor negraigual a mim est estudando. Ento, pensei comigo: Por que eu no es-tudo tambm?

    O depoimento desse ex-aluno revela a reproduo da desigualdade em todasas suas faces de silenciamento e descaso e da relao sujeito-objeto que tambm assumida nas escolas e universidades. paradoxal perceber que um professor uni- versitrio contribuiu para o abandono de um senhor negro do cursinho apoiado

    pelo MEC na Universidade Federal de Viosa. Da a extrema necessidade de quea discusso das polticas afirmativas deve estar centrada em trs focos: aluno, pro-fessor e gestor.

    O impacto do Diversidade conseguiu aumentar significativamente o desem-penho cognitivo dos alunos apoiados pelo PIC. Trata-se de uma melhora percentualde 20,6% do desempenho cognitivo dos alunos em provas iniciais e finais (tipoEnem). O programa prev bolsas que variam de R$ 40 a R$ 609, valorizao dadiversidade por meio de acesso a bens culturais e formao social relacionadas

    valorizao da negritude etc.O sucesso dos alunos no pode ser atribudo apenas ao repasse de recursos

    mediante uma bolsa mensal. Trata-se de um conjunto de aes que, coordenadas,corroboram para a melhoria de desempenho dos alunos. Portanto, a Educao B-sica, composta de 25.620.732 (56.15%) matrculas de alunos negros10, necessita deuma poltica de valorizao da diversidade tnico-racial e de polticas especficas depermanncia da populao afrodescendente em todas as suas modalidades de en-

    9

    Em conformidade com o Decreto 4.876/2003.10 Incluindo pretos e pardos. Dados do Censo Escolar 2005.

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    20/181

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    21/181

    23

    provocao de um debate nas escolas mediante a instaurao de um concurso deprofessores e alunos a respeito da temtica racial no ambiente escolar no sentido

    de diagnosticar o grau de reflexo de estudantes e alunos a respeito do tratamentodesigual entre negros e brancos no sistema escolar.

    Tambm necessria a formao de um grupo de trabalho para fazer ca-minhar as polticas que devero ser impulsionadas pelos subsdios dos dados doCenso Escolar para pensar polticas especficas por grupos de cor no mbito doEnsino Mdio.

    Por ltimo, vale a pena discutir tambm com o Frum Permanente de Curr-culo do Ensino Mdio e com o Frum de Professores a implementao da disciplina

    CCN Cidadania e Cultura Negra como disciplina optativa do currculo do En-sino Mdio. A experincia dos cursinhos pr-vestibulares oriundos do MovimentoNegro tem demonstrado que medida que trabalhada a auto-estima dos alunosnegros e combatido o silncio naturalizante que marca historicamente a trajetriadas(os) alunas(os) negras(os), o desempenho cognitivo aumenta sensivelmente.

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    22/181

    24

    Referncias

    BRASIL. Ministrio da Educao. Anteprojeto de Lei da Educao Superior. 29 jul2005. Disponvel em: .Acesso em: 27 abr. 2007.

    BRASIL. Decreto n 4.876, Dirio Oficial da Unio, Braslia, DF, 13 nov. 2003.

    BRASIL. Lei n 10.558/2002, publicada no DOU de 14.11.2002.

    Contrato de Emprstimo n. 1406/OC-BR entre a Repblica Federativa do Brasil

    e o Banco Interamericano de Desenvolvimento Programa Diversidade na Uni-versidade. 18 de dezembro de 2002.

    INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATSTICA. PesquisaNacional de Amostra por Domiclio (PNAD). [S.l.: s.n.], 2002.

    BRASIL. Ministrio da Educao. Secretaria de Educao Continuada, Alfabeti-zao e Diversidade. Relatrios das Instituies de Avaliao e Acompanhamento dosPICs. Braslia: MEC, 2005.

    http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/anteprojeto.pdfhttp://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/anteprojeto.pdf
  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    23/181

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    24/181

    26

    Para se compreender a concepo de inovao desses cursos tem-se que reco-nhecer os aspectos estruturais que a embasaram, a saber:

    1) Reserva de cotas de 51% de suas matrculas para afrodescendentes e ouindgenas;

    2) Concesso de bolsas de manuteno para estudantes de baixa renda1;

    3) Apresentao de contedos e atividades de formao social e valorizaoda diversidade cultural, priorizando a temtica de combate ao racismo.

    Em seu quarto ano, o Programa Diversidade na Universidade apoiou 95 Pro-

    jetos Inovadores de Curso, desenvolvidos em 89 instituies, e beneficiou 13.623alunos, dentre os quais aproximadamente 15%, cerca de 2 mil alunos, ingressaramem instituies de Ensino Superior.

    Evidentemente esses nmeros no tm dimenses grandiosas e no permitema avaliao do Programa Diversidade na Universidade estritamente pela conforma-o quantitativa. O entendimento sobre tais experincias apoiadas em suas prticasinovadoras requer reflexo e avaliao qualitativa complementares, a partir de qua-tro eixos bsicos de anlise, que envolvem o aspecto gerencial; o aspecto pedaggico;

    o aspecto relativo ao atendimento ao aluno; e, sobretudo, o aspecto tnico-racial.Nessa linha de reflexo, uma das discusses que acompanha o Programa Di-

    versidade na Universidade refere-se ao foco da populao atendida. Alinhado aosdebates que explicitaram ou reproduziram as mesmas contradies estruturais acer-ca da natureza do racismo brasileiro, a abertura do foco do programa para afrodes-cendentes, indgenas e outros grupos socialmente desfavorecidos remeteu ao velhodilema da excluso econmica versus excluso social.

    Ora, historicamente os negros no Brasil vivenciaram um processo de excluso

    que entrecruzou os campos econmico, educacional e cidado, e refletiu na quali-dade da sua insero nos espaos de poder, nas decises polticas e nos campos deconstruo do saber. Em relao a esse ltimo, torna-se importante que a discus-

    1 As bolsas de manuteno so para pessoas cuja renda familiar mensal per capitano ultrapasse o equi-valente a um salrio mnimo, variando entre R$ 40 (quarenta reais) e R$ 60 (sessenta reais). A dotao debolsas de manuteno foi um dos mecanismos inseridos no programa que objetivou garantir a freqnciados alunos, sendo inicialmente pensada para cobrir gastos de transporte. Alm dos custeios de transportes,que beneficiam, sobretudo, os alunos que moram distante do local de realizao, ou do custeio do prpriocurso, nos casos especficos de instituies pagas, muitas vezes as bolsas funcionaram como um adicional

    renda familiar, substituindo as atividades informais, normalmente desenvolvidas pelos alunos em suaslocalidades, pela sala de aula, conforme depoimento dos prprios alunos.

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    25/181

    27

    so aqui proposta se detenha nos campos diferenciados dessa excluso levando emconta os aspectos da negritude, gnero e classe, procurando identificar quem so

    diretamente os beneficiados do Programa Diversidade na Universidade e quais assuas especificidades que autorizam uma poltica diferenciada.

    A questo que se coloca saber em que medida efetivamente o ProgramaDiversidade na Universidade contribuiu para concretizar aes de combate exclu-so social, segundo o vis da raa, entre outros, promovendo a equidade e diversida-de na Educao Superior para afrodescendentes e ou indgenas.

    Para tanto, o restante do texto est estruturado em duas grandes sesses. Aprimeira delineia a trajetria do Programa Diversidade na Universidade, particu-

    larmente nos aspectos concernentes ao apoio aos Projetos Inovadores de Curso,balizando as aes implementadas, bem como suas progressivas reestruturaes de-correntes do prprio processo avaliativo para o aprimoramento da sua execuo.Dessa forma, parte das informaes relatadas foi extrada dos relatrios tcnicosproduzidos no programa.

    A segunda sesso trata da anlise do perfil do aluno relativa aos aspectos demo-grficos, grupo domstico, trabalho e estudo, observando as variaes tnico-raciais,de gnero e etrias. Os dados analisados foram coletados nos anos de 2004, 2005 e

    2006, mediante aplicao de questionrio a todos os alunos, e constitui uma amostrade 7.258 alunos, correspondente a aproximadamente 50% do total dos beneficiados.

    Mapeando o Programa Diversidade na Universidade2

    O Programa Diversidade na Universidade foi criado por meio da Lei 19.558,de 13 de novembro de 2002, e regulamentado um ano depois pelo Decreto 4.876,de 12 de novembro de 2003, fruto do acordo de emprstimo entre o Banco Inte-ramericano de Desenvolvimento e o Ministrio da Educao. Alocado na entoSecretaria de Ensino Mdio e Tecnolgico do Ministrio da Educao (Semtec), oprograma iniciou o apoio a Projetos Inovadores de Curso (PIC) com experincias-piloto ao longo de 20023.

    2 Dados extrados dos relatrios tcnicos produzidos pela Subcoordenao dos Projetos Inovadores de Curso PIC/CGDIE/DEDC/Secad.

    3 Assinatura dos Termos de Cooperao e dos Contratos de Financiamento de Atividades, em 4 de novembrode 2002, apoiando seis instituies selecionadas pela Semtec para a execuo dos PIC: Instituto Afro-bra-sileiro Afrobras e Ncleo de Conscincia Negra da USP, em So Paulo; Oficina da Cidadania e Instituto

    Cultural Steve Biko, na Bahia; e Pr-vestibular Educafro Curumim Palmares e Curso Pr-vestibular Didaqu,no Rio de Janeiro, sendo beneficiados 840 alunos.

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    26/181

    28

    A prpria condio experimental dos projetos deparou com instrumentostambm elaborados em carter experimental, resultando muitas vezes na inviabi-

    lidade do tratamento de alguns dados. Contudo, ainda que no houvesse mecanis-mos que pudessem avaliar com propriedade o desempenho dessas experincias, asinformaes levantadas permitiram obter uma viso geral dos projetos, das institui-es operadoras, dos professores e dos alunos. possvel, inclusive, afirmar que osprojetos-piloto tiveram boa atuao no tocante s metas propostas no Contrato deEmprstimo, particularmente no que concerne aprovao nos vestibulares, comtaxa superior a 15%.

    No ano seguinte, em 2003, as aes do programa foram estendidas e contem-

    plaram nove estados da Federao: Bahia, Maranho, Mato Grosso, Mato Grossodo Sul, Minas Gerais, Par, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e So Paulo, apoian-do 29 Projetos Inovadores de Curso4.

    O cronograma de financiamento do programa, juntamente com a execuodas atividades dos PICs, iniciou-se ao final do 2 semestre e ocasionou alguns pro-blemas operacionais, pois aquele perodo no estava em convergncia com o perodoletivo do calendrio do vestibular. O conseqente descompasso entre o transcorrerdo perodo letivo e a execuo dos projetos prejudicou o andamento dos cursos edificultou os processos de acompanhamento e avaliao.

    Naquele momento, o Programa Diversidade na Universidade preparava-separa agregar um grupo de novos tcnicos sua equipe. A primeira atuao dessaequipe se pautou na necessidade de cobrir a lacuna no processo de acompanhamen-to e avaliao dos Projetos Inovadores de Curso, uma vez que no haviam sido con-tratadas as instituies especficas de acompanhamento e avaliao dos processos deexecuo e de gesto dos referidos cursos. A avaliao desses projetos ocorreu pormeio de visitas tcnicas, aplicando instrumentos de coletas de dados e fornecendoorientaes das mais diversas ordens, sobretudo relativas prestao de contas dos

    recursos recebidos, assim como obtendo subsdios para a reformulao e ajustes doprocesso de execuo.

    Paralelamente estruturao tcnica, o Programa Diversidade na Universida-de, juntamente com o MEC, passou por uma reforma administrativa, que culminoucom a criao da Secretaria de Educao Continuada, Alfabetizao e Diversida-de (Secad). Focada especificamente nas questes relativas a diversidade, a Secad

    4 Os 27 Projetos Inovadores de Curso foram selecionados em 2003 mediante Convocatria Pblica, acresci-

    da de duas instituies, previamente selecionadas para desenvolver um projeto piloto indgena (PIC-PI) naBahia e outro no Alto Xingu, em Mato Grosso, beneficiando 3.413 alunos.

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    27/181

    29

    instituiu a Coordenao-Geral de Diversidade e Incluso Educacional (CGDIE)para tratar das questes tnico-raciais, e aportou dentro de suas aes o Programa

    Diversidade na Universidade. Dessa forma, a Coordenao-Geral de Diversidade eIncluso Educacional refletiu a ateno especial do Ministrio da Educao ques-to tnico-racial, mediante a consolidao de seu espao institucional, e atuou aten-dendo a demanda dos movimentos sociais organizados por intermdio do apoio adiferentes entidades e atores sociais, executores dos Projetos Inovadores de Curso.

    Tcnico e politicamente estruturado, o Programa Diversidade na Univer-sidade foi paulatinamente ampliando suas aes. No segundo semestre de 2004,foram idealizados e executados cinco Encontros Estaduais de PIC nos estados

    de Minas Gerais, Rio de Janeiro, So Paulo, Mato Grosso do Sul e Bahia, com oobjetivo de promover a troca de experincia entre os diversos atores dos ProjetosInovadores de Curso, integrando coordenadores, professores, alunos e os prpriostcnicos do Ministrio da Educao. De fato, osEncontros Estaduaisfuncionaramcomo canais de comunicao concorrendo para a melhoria da qualidade dos cursosem suas diversas dimenses, sobretudo na correo de rumos no processo de exe-cuo dos projetos.

    Os Encontros Estaduais tambm contriburam para a constatao das prti-

    cas didtico-pedaggicas voltadas para as questes da diversidade tnico-racial bra-sileira desenvolvida em paralelo e de forma transversal s Diretrizes CurricularesNacionais para o Ensino Mdio; alm de comprovar a diversidade de seu pblicode maioria negra.

    Uma das reflexes construdas durante os Encontros Estaduais alertou paraas limitaes das aes de acesso ao Ensino Superior e remeteu necessidade dese pensar estratgias para a permanncia desses alunos nas universidades. O pr-prio Programa Diversidade na Universidade j mencionava essa preocupao emseu regulamento operacional, e dispunha no Artigo 4 a concesso de prmios aosalunos para incentivo a permanncia no Ensino Superior, desde que tivessem con-cludo os Projetos Inovadores de Curso e tivessem sido aprovados e matriculadosem universidades.

    Dessa forma, era importante que o Programa Diversidade na Universidadeefetivasse a concesso desses prmios, conforme determinado em lei. Ao final doano, o ndice mdio de aprovao nos vestibulares de aproximadamente 15% dosalunos egressos dos Projetos Inovadores de Curso, a qualificao das instituiesde Ensino Superior que atenderam esses alunos e a disponibilidade de recursos dacontrapartida local para essa ao favoreceu as condies para sua efetivao.

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    28/181

    30

    Dando continuidade execuo do programa, outra atividade concretizadaem 2004 foi relativa seleo e contratao de mais 26 instituies operadoras,

    apoiando 29 projetos inovadores de curso e beneficiando 5.370 alunos5

    .H de se destacar que este processo seletivo foi bastante complexo, enfren-

    tando vrios problemas administrativos. Tais problemas resultaram no atraso dadivulgao dos resultados e terminaram por situar a contratao e execuo dosprojetos nas mesmas condies do ano anterior, em descompasso com o calendrioescolar. A fim de contornar dificuldades outrora evidenciadas na execuo e acom-panhamento dos Projetos Inovadores de Curso, optou-se por transferir o comeodas atividades para o ano seguinte, buscando harmonizar a relao entre liberao

    do financiamento e perodo letivo.Concomitantemente seleo das instituies operadoras, processou-se a

    seleo de Instituies de Acompanhamento e Avaliao dos Projetos Inovadoresde Curso (IAAs), a qual o Programa s teve oportunidade de realizar de modosistemtico no exerccio de 2005. As Instituies de Acompanhamento e Ava-liao previam aes conjugadas de monitoramento de processo e avaliao deimpacto, mediando a relao entre o MEC e as instituies operadoras, a fim depossibilitar agilidade administrativa, fornecer informao e ao em tempo real,assim como simplificar processos. Nesse sentido, uma das barreiras a transpor foiromper com a velha percepo da avaliao associada fiscalizao, em sentidoestrito. Entendia-se que a perspectiva do supervisor do MEC deveria ser subs-tituda por uma concepo de avaliao com vistas obteno de subsdios paraelaborao de polticas educacionais, orientadas para transformao, melhoria ecorreo de rumos. Dois problemas se interpunham efetivao dessa propos-ta: dificuldade na seleo e contratao de instituies e consultores habilitados,com fragilidade de formao na rea de avaliao e das questes tnico-raciais; efalta de afinidade das instituies e consultores com projetos sociais similares aos

    Projetos Inovadores de Curso. Para contornar tais percalos foram intensificadasreunies sistemticas de orientao, e aprimorados os instrumentos de coleta eanlise de dados.

    Outro aspecto a considerar no aprimoramento da execuo dos Projetos Ino-vadores de Curso esteve ligado s dificuldades relativas ao fechamento da prestaode contas dos recursos executados em 2003/2004, mostrando a necessidade de in-

    5 Embora prevista para contemplar os mesmos estados, a localizao das instituies operadoras seleciona-

    das se fixou em apenas sete estados, suprimindo Rio Grande do Sul e Par, decorrente da ausncia deprojetos aprovados naquelas localidades.

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    29/181

    31

    tensificar informaes por parte da Equipe do MEC em relao ao modo de gastodesses recursos.

    Considerava-se importante que as instituies se apropriassem das regras re-lativas ao uso de recursos estabelecidas pela Unesco, instituio responsvel pelogerenciamento financeiro do programa, com a finalidade de evitar equvocos e con-seqentes atrasos na liberao das parcelas, j que a ausncia de recursos compro-meteria sobremaneira a plena execuo do projeto.

    Nesse sentido, realizou-se uma oficina de capacitao de instituies opera-doras, fornecendo orientaes sobre prestao de contas dos contratos financiados6.Reconhecia-se que as limitaes temporais da capacitao no eram suficientes para

    que as informaes repassadas fossem satisfatoriamente incorporadas. Assim, almdo constante monitoramento da equipe do MEC7, foram acionadas as Instituiesde Acompanhamento e Avaliao com o intuito de redobrar a ateno no tocanteaos gastos elegveis do projeto.

    Durante o processo de acompanhamento, as Instituies de Acompanhamen-to e Avaliao, bem como o MEC, depararam em suas observaes com a ausnciado foco dos objetivos do programa, na qual a cor no apareceu como elementonorteador da poltica dos cursos. De forma geral, as distintas instncias da execuo

    dos projetos, tais como seleo dos alunos, seleo dos bolsistas e contedos cur-riculares, no refletiram a importncia da temtica racial, nem consolidaram efeti-vamente a prtica de combate ao racismo. Tal constatao levou a questionar qual o poder de ingerncia do MEC sobre os projetos, uma vez que o propsito doprograma no intervir, mas sim apreender as experincias inovadoras e aprendercom elas. No obstante, dois aspectos mnimos eram cruciais ao bom desempenhodos cursos e no poderiam ser descartados: instituir as diretrizes de abordagem datemtica racial como contedo transversal e inovador desses cursos, assim comodestacar a relevncia de ateno qualificada por parte dos professores acerca das

    diferenas raciais dos seus alunos. Em decorrncia disso e com o objetivo de superartal fragilidade, deu-se o chamado pontap inicial, a partir da realizao das oficinas

    6 A oficina de prestao de contas formalizou o incio das atividades dos Projetos Inovadores de Curso em2005 e congregou 100% dos envolvidos na execuo, monitoramento e avaliao, incluindo MEC, BID eUnesco, instituies operadoras e instituies de avaliao e acompanhamento.

    7 As visitas institucionais do MEC aos Projetos Inovadores de Curso apoiados em 2005 buscaram formalizara parceria e estabelecer canais de dilogos entre o MEC e as instituies operadoras, mediante a disponi-bilidade de informaes sobre procedimentos a serem adotados durante a execuo; coleta de informaessobre a estruturao das instituies operadoras; fornecimento de orientaes pedaggicas e administra-

    tivo-financeiras; visitao s instalaes fsicas dos cursos e observar o funcionamento do curso; alm decoleta de crticas e sugestes sobre o Programa.

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    30/181

    32

    pedaggicas Racismo e Educao8 para formao dos coordenadores pedaggicos eprofessores dos Projetos Inovadores de Curso. Dentre as limitaes assinaladas nas

    oficinas pelos professores para implementar a temtica racial, destacou-se a ausnciade material didtico disponvel que as relacionassem aos contedos curriculares doEnsino Mdio. Como resposta a essas observaes foi providenciada a distribuiode kits literrio e cinematogrfico, denominadosEducao e Diversidade9. Embora deforma tmida, as publicaes revelaram iniciativas institucionais, pblicas e privadas,de produo de conhecimento e acmulo no combate ao racismo.

    Associado a distribuio dos kits, estruturou-se uma coletnea de exercciosextrados dos materiais didticos utilizados nos projetos, especialmente das apostilas

    relativas s questes raciais e aos contedos disciplinares. De certo, tais aes con-correram para a implementao da Lei 10.63910, no que diz respeito acessibilidadedesse material didtico para subsidiar os professores dos pr-vestibulares nas ques-tes tnico-raciais, contribuindo para a prtica docente de uma poltica anti-racistae de valorizao da diversidade em sala-de-aula.

    Nessa mesma perspectiva, realizou-se a segunda edio dos Encontros Esta-duais11, aprofundando o debate entabulado nas Oficinas Racismo e Educao. Di-ferentemente dos Encontros Estaduais anteriores, substancialmente pautados nasquestes de melhoria do processo de execuo, as interlocues realizadas com asinstituies se voltaram para a apreenso de experincias pedaggicas afinadas comos objetivos do programa, e desenvolvidas com os alunos nos prprios Projetos Ino-vadores de Curso. Tratava-se de propiciar um espao de dialogo e fundamentaode experimentao inovadora, refletindo sobre as implicaes pedaggicas das mes-mas, ao mesmo tempo em que propunha encorajar outros professores, especialmen-te do Ensino Mdio, a voltarem sua ateno para assuntos relativos diversidade,em consonncia com os contedos dos vestibulares.

    Diante dessa trajetria de afinamento com os objetivos do programa, um as-

    pecto que no pde deixar de ser apreciado se refere ao desempenho dos alunos noscursos. Dentre as aes previstas para esse propsito foi aplicada prova cognitiva,

    8 Ao todo, foram realizadas 14 oficinas pedaggicas, atendendo aproximadamente 550 professores e coorde-nadores.

    9 O kit Educao e Diversidade contm 26 ttulos de literatura afro-brasileira e de diversidade, 12 vdeosabordando a temtica do racismo, um mapa do Brasil indgena e um calendrio quilombola.

    10 A Lei 10.639, de 9 de janeiro de 2003, inclui no currculo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade datemtica Histria e Cultura Afro-brasileira.

    11 Ocorreram 05 (cinco) Encontros Estaduais de Projetos Inovadores de Curso nas seguintes localidades:

    Salvador (BA), Rio de Janeiro (RJ), Belo Horizonte (MG), So Paulo (SP) e Caxias (MA), com cerca de 2mil participantes entre coordenadores, professores e alunos, no perodo de agosto a outubro de 2005.

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    31/181

    33

    no incio e final dos cursos para avaliar o desempenho dos mesmos. Para efeitos decomparabilidade ficou estabelecido que as provas cognitivas seriam do tipo Enem 12.

    Procurou-se assim saber em que faixas cognitivas se situavam os alunos do PIC naocasio da prova inicial e final, ponderando suas performances em relao ao de-sempenho nacional. Apesar de trazer elementos avaliativos no que tange potencia-lizao das aes do curso, sobretudo no que se refere ao apoio financeiro, a anlisedo desempenho cognitivo dos alunos, a partir dessa base comparativa, era insu-ficiente para se avaliar o impacto do programa. Assim, associado ao desempenhocognitivo foi imprescindvel incluir a anlise do perfil socioeconmico diferenciadodos mesmos para retratar especificidades qualitativas relativas aos contextos familia-res, escolares e profissionais de cada aluno. Outros focos de avaliao referente aos

    alunos se voltaram para o acompanhamento da freqncia e da evaso, e o ingressoem cursos de Ensino Superior.

    Seguindo as mesmas linhas de aes do programa, ao final de 2005 foi inicia-do novo processo seletivo de PICs (apresentar os resultados da avaliao dos PICs eas devidas alteraes do Edital) em todos os Estados da Federao.

    Concomitantemente execuo dos PICs, adicionou-se os Projetos Inovado-res de Fortalecimento de Negros e Negras no Ensino Mdio13, a serem desenvolvi-dos em parceria com as secretarias estaduais de Educao, com o fim de convergiresforos para o fortalecimento e a consolidao da temtica tnico-racial no MECe no sistema nacional de ensino. Os Projetos Inovadores de Fortalecimento de Ne-gros e Negras no Ensino Mdio consistem em apoio financeiro a alunos de escolaspblicas do Ensino Mdio e apresentam desenhos iniciais similares aos pr-vestibu-lares, assegurando reservas de vagas para afrodescendentes ou indgenas, bolsas demanuteno e atividades de acesso a bens culturais.

    Considera-se que os Projetos Inovadores de Fortalecimento de Negros e Ne-gras no Ensino Mdio constituem um avano significativo nas aes do Programa

    Diversidade na Universidade, uma vez que refletem a possibilidade de aplicao dosresultados das experincias dos Projetos Inovadores de Curso dos pr-vestibularesacatadas institucionalmente pelo MEC, e fomentam no mbito do sistema formalde ensino a construo de polticas pblicas que visam melhoria do Ensino M-dio, contemplando a diversidade tnico-racial.

    12 O Exame Nacional do Ensino Mdio (Enem). A articulao e reunies com a direo do Inep para discussode propostas para a elaborao das provas no contexto do programa iniciaram em 2003 e foram concludasem 2004, sendo as provas aplicadas em 2005.

    13

    A execuo dos Projetos Inovadores de Fortalecimento de Negros e Negras no Ensino Mdio est previstaem carter experimental a partir do ano letivo de 2006 nos estados do PA, MA, MS, SC e SP.

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    32/181

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    33/181

    35

    No que se refere ao sexo, majoritariamente, os alunos dos PIC so mulheres,correspondendo a 67,5% do total de aproximadamente 7.200 alunos que respon-

    deram questo. Quando separados por localidade, a predominncia feminina nosalunos dos PIC permanece inalterada. Esse quadro se coaduna com as projees deexpanso mundial dos nveis de Educao Secundria e Superior que tm favoreci-do as mulheres (UNESCO, 2005).

    Quando se relaciona sexo e cor, as mulheres negras corresponderam a 51,5%desse total de entrevistados, e os homens negros a 25%. Dessa forma, o ProgramaDiversidade na Universidade tem alcanado, enquanto poltica pblica, os grupos maisdesfavorecidos que historicamente esto situados na base da pirmide social brasileira.

    Embora tal constatao concorra para a igualdade de gneros e raa, e possaser encarado como bastante positivo, o problema se volta para a baixa participaode homens nos pr-vestibulares, particularmente no PIC. Considera-se que, de for-ma mais ampla, essa baixa participao sinaliza oportunidades desiguais na socieda-de e no mercado de trabalho para essa parcela da populao, resultando em acessolimitado escola e suspenso prematura dos estudos. Considera-se que dentre asaes desenvolvidas no PIC, as bolsas de manuteno nos cursos podem contribuirpara que os alunos, principalmente os homens, assegurem a continuidade da sua

    formao. No entanto, para uma defesa mais detalhada dessa suposio, necessita-sedo aprofundamento de informaes sobre o recebimento da bolsa de manuteno esua relao com a freqncia ao curso.

    No tocante faixa etria, predominantemente os alunos do PIC so jovens.Os grupos etrios mais significativos so os de 17 a 19 anos de idade e o de 20 a22 de idade, com um contingente de quase 4 mil alunos, correspondente aos per-centuais de 28,5% e 27%, respectivamente. O percentual de 45,5% restantes, querepresenta aproximadamente 3.200 alunos, tem 23 anos ou mais. Ponderando que aidade de concluso regular do Ensino Mdio de 18 anos, uma vez que o EnsinoBsico (Fundamental e Mdio) corresponde a 11 anos de estudos e que preferen-cialmente iniciada aos sete anos de idade, considera-se que os alunos dos PIC esto,em sua maioria, acima dessa faixa. Um aspecto a ser observado e que pode explicaresse perfil etrio est relacionado trajetria escolar dos alunos do PIC, conformeser apresentado posteriormente.

    Convm atentar ao perfil etrio dos alunos do PIC separado por cor. Do totalde alunos no-negros, aproximadamente 65% esto nas faixas etrias mais jovens,com idades entre 17 anos a 22 anos, enquanto apenas cerca de 50% de alunos ne-gros encontram-se nessas faixas etrias. A distribuio nas faixas etrias seguintes

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    34/181

    36

    sugere maior concentrao relativa de alunos negros em oposio a uma tendnciagradativa de reduo da participao de alunos no-negros mais velhos.

    Ao distribuir a faixa etria dos alunos por sexo se verifica que as mulheresesto proporcionalmente em maior quantidade que os homens nas faixas etriasmais jovens, e vo retraindo sua participao nas faixas etrias subseqentes, excetona faixa etria mais velha, de trinta anos ou mais, na qual a proporo de mulheres(17,5%) se inverte e torna-se ligeiramente superior dos homens (14,4%). Essaparticipao etria diferenciada por sexo pode ter suas explicaes fundadas na es-truturao tradicional das relaes de gnero que mantm o homem na condiode provedor e a mulher na condio de me e dona-de-casa. Com base nessa pers-

    pectiva, especula-se que as entradas e sadas de homens e mulheres do ambienteescolar so marcadas pelo atendimento satisfatrio dessa estruturao. No caso dasmulheres, uma possvel justificativa para a reduo da participao nas faixas etriasintermedirias (nem to jovem, nem to velha) pode ser vislumbrada mediante mol-dagem fase de formao do ncleo familiar, por intermdio do casamento e filhos,requerendo para tanto um distanciamento do ambiente escolar em detrimento doscuidados domsticos. Um dado que vem a fortalecer essa argumentao baseia-se nasituao conjugal dos alunos, particularmente na situao das mulheres14. Emboramajoritariamente os alunos sejam solteiros15, a distribuio dos alunos casados por

    sexo e por faixa etria constata que 66,8% dos alunos so mulheres e que destes,cerca de 90% esto com mais de 23 anos. De forma similar, a maior proporo dapresena de filhos ocorre freqentemente nas mulheres casadas com mais de 23anos. Lembrando que exatamente nessa faixa etria que h um ligeiro esvazia-mento da participao das mulheres nos PIC, h uma disposio a acreditar que amaternidade, associada conjugalidade, pode contribuir como fator intervenienteno fluxo de participao das mulheres nos PICs.

    Em relao ao homem supe-se que a sada prematura da escola e sua con-

    seqente participao proporcionalmente menor que as mulheres nas faixas etriasmais jovens se deve busca de acesso ao mercado de trabalho, conforme j sinali-zado anteriormente. Dessa forma, estima-se que o retorno ulterior realizado peloshomens de faixas etrias mais velhas motivado pela necessidade de mais qualifi-

    14 Existe uma correlao positiva moderada entre situao conjugal e faixa etria, em que quanto mais jovem,mais chance do aluno ser solteiro e quanto mais velho, mais chance do aluno estar casado, divorciado ouvivo.

    15 Cerca de 80% do total aproximado de 7.200 alunos que responderam questo so solteiros. Desses alu-nos solteiros, aproximadamente 65% concentram-se nas faixas etrias mais jovens, entre 17 e 22 anos. Os

    alunos casados, separados e vivos correspondem a quase 20% do total e esto predominantemente nasfaixas etrias mais velhas. Deles, cerca de 90% tm mais de 23 anos.

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    35/181

    37

    cao profissional para tanto. Tais afirmaes sero retomadas em seguida quandoanalisada a questo do acesso ao trabalho.

    Grupo domstico

    O tamanho mdio das famlias dos alunos do PIC de quatro pessoas. Asinformaes sobre os arranjos familiares mostram que, majoritariamente, os alunos vivem em companhia dos pais, sobretudo da me16. O arranjo familiar mais fre-qente entre os alunos, equivalente a quase 25%, cerca de 1.800 alunos, a vidaem companhia de me, pai e demais parentes. O segundo arranjo familiar mais fre-qente formado apenas pelos pais, seguido do arranjo formado pelas companhiasde me e parente, correspondendo a aproximadamente 17% e 14%, cerca de 1.200 emil alunos, respectivamente. Poucos so os alunos que moram sozinhos.

    Tratando-se de uma populao jovem, o percentual de arranjos familiaresque indicam a constituio de uma nova famlia proporcionalmente baixo. Apenas11,5%, cerca de 800 alunos, vivem sozinhos com seus cnjuges e, caso tenham filhos,em companhia deles. Contudo, no so raros os alunos casados e/ou com filhos vi-verem com outros arranjos familiares. Dos 1.300 alunos com filhos, correspondentea aproximadamente 20% do total, quase a metade, perto de 600 alunos, convive com

    outras formas de arranjos que no a conjugal. Tal configurao, em parte, se deve aoprprio perfil dos alunos com filhos, que predominantemente so mulheres, corres-pondendo a 68,5% do total (830 alunos), das quais 77% so solteiras (630 alunos), eque, por conseguinte, oferece maior vulnerabilidade dada a estruturao tradicionalfamiliar, conforme sugerido anteriormente.

    Os alunos com filho tm, em mdia, 1,7 filhos e esto abaixo da media nacio-nal, de 2,1 filhos por mulher (PNDS, 1996). Quando distribudos por localidades, osestados onde se encontram o menor percentual de alunos com filhos so Pernambu-

    co, Cear e Paraba, com respectivamente 2,6%, 5,2% e 11,2%. Por sua vez, os estadoscom maior proporo de alunos com filhos so: Mato Grosso (37,9%), Par (32,8%)e Rio Grande do Sul (29,3%). Esse quadro no se coaduna com a distribuio dataxa de fertilidade dos referidos estados e nem segue a tendncia tradicional de altastaxas de fertilidade de determinadas localidades, tais como dos estados do Nordeste.De forma geral, esse desacordo pode ser elucidado mediante o estabelecimento darelao inversa entre educao e fertilidade, averiguando o prprio nvel de escola-

    16

    A freqncia da companhia da me aparece em 70% dos arranjos familiares dos alunos, correspondendo acerca de 5 mil famlias.

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    36/181

    38

    ridade dos alunos sob a condio de concluinte do Ensino Mdio e a conseqentetendncia reduo no nmero de filhos, assim como observando a questo etria e

    a situao conjugal dos alunos, majoritariamente jovens solteiros.

    Renda

    De acordo com as diretrizes do programa, um dos critrios de seleo de alu-nos para dotao de bolsas nos PIC envolve a questo da pobreza relacionada a di-versos tipos de carncia, sobretudo a insuficincia de renda. Desse modo, a maioriados alunos dos PIC, quase 69%, tm renda familiar menor ou igual a dois salriosmnimos. Do restante dos alunos, 26% das famlias recebem entre dois a quatrosalrios mnimos e apenas 5% recebem mais de quatro salrios mnimos.

    Essa distribuio de renda tem um componente claramente racial. Quando as-sociada distribuio da renda a cor, os alunos negros (pretos e pardos) apresentamrendimentos inferiores ao contingente dos alunos no-negros Aproximadamente 70%das famlias dos negros tm renda familiar menor ou igual a dois salrios mnimos. Edestes, 40% tm renda familiar igual a at um salrio mnimo. Por sua vez, apenas 60%das famlias dos alunos no-negros tm renda menor ou igual a dois salrios mnimos,dos quais aproximadamente 34% tm renda familiar igual a at um salrio mnimo.

    Embora os diferenciais de renda constatados entre as famlias dos alunosnegros possam ser explicados pelo menor nvel de escolaridade dos seus familiares,conforme ser focalizado posteriormente, interessante observar que a distribuioda renda no Brasil nunca beneficiou igualmente todos os grupos, e que subsistemdiferenas associadas cor, considerando que o pertencimento racial estrutura sig-nificativamente a desigualdade social (HENRIQUES, 2001).

    Outro aspecto a ponderar em relao ao diferencial de renda dos alunos do

    PIC a dimenso regional, sendo mais elevada a proporo de pobres na regio Norte(63%) e Nordeste (37%), e reduzindo-se em direo ao Sudeste (19%) e Centro-Oes-te (11%). Os dados desagregados pelos estados da Federao evidenciam uma estrutu-ra com uma hierarquia bastante definida, na qual a Paraba apresenta a proporo depobreza mais alta 74% das famlias dos alunos tm renda de at um salrio mnimo;seguido do Par (63%), Maranho (57%) e Pernambuco (54%). Quando observada aproporo de famlias de alunos que recebem mais de dois salrios mnimos, Rio deJaneiro (53%) e So Paulo (47%) apresentam a proporo de pobreza mais reduzida.

    Especificamente no caso de Paraba, Maranho e Pernambuco, convm in-formar que a quase totalidade dos PICs foi desenvolvida em localidades situadas no

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    37/181

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    38/181

    40

    cursaram o Ensino Fundamental (1 a 4 srie) completo ou incompleto, totalizan-do 52%. Tais resultados so ainda mais diferenciados quando observado o nvel de

    escolaridade superior, completa e incompleta. Note-se que, a proporo de alunosnegros que declararam que o pai cursou o Ensino Superior completo ou incomple-to corresponde a aproximadamente 3,5% e quase duas vezes menor que entre osalunos no-negros, cuja informao indica prximo a 7%.

    A distribuio diferencial do nvel educacional entre mes de alunos negros emes de alunos no-negros assimila-se proporo diferencial dos pais nos diversosnveis de escolaridade. A proporo de mes de alunos negros que nunca estudaram prxima a 11%, e 46% cursaram Ensino Fundamental (1 a 4 srie) completo ou

    incompleto, totalizando 57%. Por sua vez, o percentual de mes de alunos no-ne-gros que nunca estudaram corresponde a 7% e 40% cursaram o Ensino Fundamen-tal (1 a 4 srie) completo ou incompleto, totalizando 47%.

    Outro aspecto a considerar no diferencial dos nveis de escolaridades de paise mes a dimenso regional. Desse modo, observou-se que a regio Nordesteapresenta a maior proporo de pais de alunos que nunca estudaram, corresponden-do a 14%. Esse dado aproxima-se da realidade nacional, na qual a regio Nordestetem a maior taxa de analfabetismo do Brasil, congregando cerca de 50% do total de

    iletrados do pas.As regies Sul e Sudeste apresentaram os menores percentuais de pais de

    alunos que nunca freqentaram a escola, prximo a 8% e 9%, respectivamente. Notocante aos estados, Pernambuco e Paraba foram os que apresentaram os percen-tuais mais elevados de pais que nunca estudaram. Cabe lembrar que foram exata-mente esses estados que apresentaram os menores nveis de renda, sugerindo umaassociao com nvel educacional dos membros das famlias dos alunos. O Rio deJaneiro e So Paulo foram os estados que apresentaram os menores percentuais depais que nunca estudaram. Esse resultado se contrape distribuio do analfabe-tismo contabilizada pelo IBGE (IBGE, 2000), que mostra que So Paulo e Rio deJaneiro so os estados com maior nmero absoluto de analfabetos.

    No caso das mes dos alunos do PIC, a proporo de mes com os maisbaixos nveis de escolaridade maior na regio Nordeste, tal como com os pais. Aregio Centro-Oeste aparece como sendo a segunda localidade de maior percentualde mes que nunca estudaram, alternando a posio com a regio Norte, se con-siderado o nvel educacional fundamental. Os estados que apresentaram a maiorproporo de mes que nunca estudaram foram Mato Grosso e Pernambuco, comrespectivamente 19% e 17%.

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    39/181

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    40/181

    42

    prio PIC, vai desde a questo financeira questo operacional dos alunos de estaremtrabalhando e irem s aulas todas as noites, de abrirem mo de estar em famlia ou

    de estarem descansando. Neste sentido, 53% dos alunos dos PICs realizaram ativida-des remuneradas durante o Ensino Mdio, enquanto 47% no realizaram nenhumaatividade remunerada. Formalmente, o restante dedicou seu tempo aos estudos. Isso,no entanto, no garante que a dedicao tenha sido feita integralmente, tendo emvista que as atividades domsticas comumente exploradas em famlias populares, e,por conseguinte, no remuneradas, possivelmente sobrecarregaram os alunos, parti-cularmente do sexo feminino, absorvendo boa parte do tempo de estudo.

    Um aspecto a ser acrescentado aqui se refere situao atual de trabalho, em

    que apenas 40% esto exercendo alguma atividade remunerada, enquanto 60% afir-mam que no esto trabalhando. Se compararmos a situao atual de trabalho com asituao de trabalho durante o Ensino Mdio, veremos que houve uma alterao noquadro, reduzindo em 7% o nmero de trabalhadores aps a concluso dos estudos.

    Esse dado traz luz um novo elemento: o desemprego, cujos efeitos acirramas dificuldades enfrentadas pelos alunos que compem os PICs, considerando quese refere a um grupo economicamente ativo e que est efetivamente procura deemprego. Tratar desse ltimo caminho tem sido o maior desafio das instituies, visto que suas trajetrias de trabalho convivem com altos ndices de desistncia eevaso dos alunos. A princpio, o que se pode extrair de positivo dessa situao que a educao dos PICs se consolida em instrumento de ascenso social para apopulao de jovens e adultos afrodescendentes e indgenas.

    Consideraes finais

    Para a maioria dos egressos do PIC, a universidade continua sendo um ideal.Tal perspectiva aponta para dois caminhos opostos, em que o xito universitrio,

    por um lado, mantm-se como meta; e, por outro, lanado para o plano do ina-tingvel. H, contudo, que perceber que no possvel depositar em um nico ele-mento a responsabilidade pelo xito dos alunos. Bourdieu (1989) deixa uma marcade profunda reflexo porque aponta para uma prtica transformadora em direo revoluo simblica, na qual os valores e os sentidos atribudos anteriormente comonegativos podem ser revalorizados de forma positiva. Muitos egressos do PIC japontam para esse caminho: unio, empoderamento e auto-estima j esto em con-sonncia com os objetivos do PIC. O que parece mais grave o fato desses alunosse perceberem e serem percebidos como elementos isolados nas universidades. Oque necessrio discutir a qualidade de insero desses alunos nas universidades.

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    41/181

    43

    As entradas pontuais so mais frgeis e passveis de evaso. As entradas coletivasconcorrem para o fortalecimento desses estudantes nas universidades, que podem

    responder coletivamente s violncias simblicas tanto de forma pontual ou cole-tiva. Para tanto, preciso que haja uma rede integrada com diversos atores e inter-locutores da sociedade civil organizada e das esferas de poder municipal, estadual efederal. Sozinhos, no se pode responder, mas deve-se construir coletivamente umaresposta que reflita a presena desses discursos no bojo das Polticas Nacionais doMinistrio da Educao.

    Quanto ao Programa Diversidade na Universidade, por intermdio dosProjetos Inovadores de Curso, acredita-se que j tenha contribudo para esse fim.

    O significado do Programa Diversidade na Universidade por parte das prpriasinstituies operadoras, e at mesmo por parte dos movimentos organizado, foidiferindo sensivelmente do Contrato de Emprstimo estabelecido entre o BancoInteramericano de Desenvolvimento e o Ministrio da Educao, no final de 2002.Gradativamente, o significado de inovao dos cursos alterou a concepo tradi-cionalmente difundida do ensino de pr-vestibular, percebido apenas como cursopreparatrio; e projetaram em seus coordenadores, professores e alunos potenciaisaes de mudana, mediante o exerccio da autonomia e reflexo. Um depoimentoque sintetiza os esforos do Programa Diversidade na Universidade e traduz os

    sentimentos da populao beneficiada :Os cursinhos pr-vestibulares (...) vieram com fora total, vm alcanandouma grandeza cvica, revelando, inclusive, uma unanimidade (...) em todo oterritrio nacional, por tratar-se de uma profunda aspirao da comunidadenegra brasileira, exatamente porque esto implementando medidas prticas eemergentes para um dos mais significativos setores de nossa educao, que o de se incluir negros, ndios e carentes em nossas universidades pblicas eparticulares, j que os indicadores concernentes a essa sentida rea de nossa

    vida em comunidade registram, ainda hoje, que esses segmentos populacionaisjamais atingiram sequer o patamar de 2% do corpo discente, de acordo com asmodernas e mais confiveis pesquisas. (Sem identificao Encontro Estadu-al de PIC em So Paulo, 2004).

    Sem dvida, a apropriao desse significado poltico elevou o Programa Di-versidade na Universidade ao status de responsvel pelo combate da desigualdadesocial segundo o recorte tnico-racial, de classe e de gnero na passagem do Ensino

    Mdio para o Ensino Superior como efetivo instrumento de transformao social.

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    42/181

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    43/181

    Estratgias

    Pedaggicaspara a Educao

    Anti-Racistanos Projetos

    Inovadoresde Curso Maria Helena Vargasda Silveira*

    Os Projetos Inovadores de Curso (PIC) oferecem aos estudantes que j concluram ou que esto concluindo o Ensino Mdio a oportu-nidade de preparo para acesso universidade, com o diferencial detrabalharem as competncias, habilidades e conhecimentos propostos

    nas Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Mdio (DCNEM), acrescidos decontedos e atividades direcionadas para o estudo das questes tnico-raciais dopas, com a valorizao da histria e cultura dos afrobrasileiros. O pblico alvo decada PIC, conforme especificao no edital de seleo, deve ser composto de pelo

    menos 51% de alunas e alunos que seauto-declaram afrodescendentes.As entidades da sociedade civil ou de rgos pblicos executoras destes PICs

    so chamadas de instituies operadoras e possuem um elenco de atribuies pe-daggicas, administrativas e financeiras junto aos PICs, ao Ministrio da Educao(MEC), ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e Organizao dasNaes Unidas para a Educao, a Cincia e a Cultura (UNESCO), no decorrer dodesenvolvimento dos projetos.

    * Responsvel pelo acompanhamento e avaliao dos eventos pedaggicos dos PICs.

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    44/181

    46

    Por outro lado, o Ministrio da Educao, por meio do Programa Diversi-dade na Universidade, possui atribuies junto s instituies para garantir que os

    PICs cumpram seu papel inovador.Os docentes do PIC, que eram inicialmente voluntrios, compem um mo-

    saico de ocupaes, alm do atendimento a esses projetos. Geralmente, lecionamem universidades, no Ensino Mdio, em escolas de Ensino Fundamental, sograduandos que fazem estgio nos PICs ou, ainda, os que neles encontram apossibilidade dos primeiros contatos com o magistrio. A formao desses profes-sores perpassa pelo doutorado, mestrado, especializao e graduao, cursos essesj concludos e/ou em andamento.

    As polticas educacionais que envolvem as questes tnico-raciais nem sem-pre so contempladas nas universidades que do origem aos docentes dos PICs,deixando uma lacuna que se transforma em demanda pedaggica para o Pro-grama Diversidade na Universidade, junto s instituies operadoras. O trabalhocom essas questes que fazem o diferencial dos Projetos Inovadores de Curso temimportncia para a construo de um processo de ensino em que os profissionaisda educao sejam capazes de corrigir posturas, atitudes e todas as formas queimpliquem em desrespeito e discriminao racial na sociedade.

    O Programa Diversidade na Universidade, por meio dos Projetos Inova-dores de Curso, vem auxiliar a provocar mudanas no ensino, estabelecendo odilogo mais prximo e consistente com todos os sujeitos envolvidos nos PICs,no somente em relao ao acesso dos afrodescendentes universidade e sua per-manncia nela, mas no sentido de fazer permear a diversidade tnico-racial nosprojetos de Ensino Bsico, Mdio e Superior.

    O contedo de carter inovador que o programa objetiva para o desen-volvimento dos PICs vital para a educao no pas e para o enfrentamento da

    dvida social e educacional em relao aos afrodescendentes. A afirmativa justificaque o componente de Projetos Inovadores de Curso dinamize estratgias na dire-o da poltica educacional anti-racista, de forma a contemplar todos os sujeitosenvolvidos nos PICs e, por extenso, beneficiando as comunidades de inserodesses sujeitos, quer sejam comunidades educacionais, profissionais, associativasou geogrficas.

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    45/181

    47

    Estratgias pedaggicas para a educao anti-racista naagenda dos Projetos Inovadores de Curso

    Um dos indicadores fortes e expressos no escopo do Programa Diversidadena Universidade est presente no seu objetivo imediato, que implantarpolticas eestratgias de incluso social e combate discriminao racial e tnica na EducaoMdia e Superior.

    Tendo em vista que a maioria dos professores, professoras, coordenadores,coordenadoras, alunos, alunas e gestores de PIC no estava preparada para o desen-volvimento de um trabalho dessa natureza, seja pela falta de formao e informao,seja pela no aceitao das referidas questes como motivadoras da desigualdade

    educacional, em nosso pas foi necessrio que se estabelecesse um dilogo oficiale compartilhado para a construo de conhecimento e de saberes sobre racismo eeducao, entre os atores do PIC, Programa Diversidade na Universidade e lideran-as do movimento negro nacional.

    As intervenes do Programa Diversidade na Universidade para tratar dasreferidas questes nos PICs no ocorrem para fortalecer o pr-vestibular como umramo isolado, mas para que os sujeitos envolvidos nos PICs sejam mobilizados paraque se efetive a ao educacional nos parmetros da inovao, em termos do fazer

    pedaggico que excede ao conteudismo, para buscar no sujeito afrodescendente agrande parcela de seu campo inovador.

    Uma das necessidades diagnosticadas em anlise de dados apurados nas vi-sitas tcnicas da equipe dos PICs s instituies operadoras aparece focalizada notrabalho com as questes raciais e educao. Como resposta, o componente de Pro-jetos Inovadores de Curso vem investindo na organizao de uma agenda de eventospedaggicos e integradores como estratgia para o desenvolvimento de atividadesque favoream o atendimento de uma demanda de atualizao dos professores re-

    lativa metodologia educacional anti-racista e implementao de atividades paraoperacionalizao da Lei 10.639/2003.

    As atividades programadas na agenda de eventos pedaggicos tm o propsitode auxiliar os envolvidos com os PICs a ter um novo olhar sobre os alunos afrodes-cendentes e, ainda, sobre a prpria atuao docente, de gesto e de relao com ascomunidades de insero geogrfica ou do contexto humano da clientela dos PICs.

    Existe uma preocupao do Programa Diversidade na Universidade, centradano fortalecimento das instituies, para que cumpram os objetivos dos PICs, de for-

    ma que permitam colocar em prtica as polticas pblicas de incluso, com possibi-

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    46/181

    48

    lidades de ofertar, adequadamente, com apoio financeiro do Estado, uma educaoanti-racista. Esse novo olhar somente ser possvel com a abertura de oportunidades

    de dialogar e conhecer os sujeitos dos PICs. Trata-se, pois, da necessidade de orga-nizar uma agenda de eventos que propicie o dilogo do Programa Diversidade naUniversidade com todos os atores de PIC.

    Nesse sentido, o programa vem se dispondo com afinco para que os PICscumpram seus objetivos, quer sejam dirigidos por entidades do movimento negro, deuniversidades, do movimento estudantil, de sindicatos, de organizaes de pesquisa-dores, de prefeituras municipais, enfim, por uma gama diferenciada de entidades quese tornaram parceiras do governo na construo e implementao de polticas em

    prol da educao anti-racista e do acesso de afrodescendentes universidade.No h como fugir da aproximao institucionalizada com os PICs, mais pela

    necessidade de aprofundamento das polticas de educao anti-racista do que pelamera execuo de atividades de um calendrio de eventos, a qual passa a ser estra-tgica para articulao das propostas polticas de incluso educacional.

    A extenso do dilogo anti-racista do Ministrio da Educao com as ins-tituies operadoras tem se efetivado principalmente em oficinas pedaggicas, en-contros estaduais de projetos inovadores de curso, distribuio de material didtico

    para subsidiar consultas, pesquisas e a prtica pedaggica, bem como a valorizaode atividades culturais da populao negra, com a visibilidade de seus sujeitos e ocontato com seus saberes e experincias.

    A realizao dos eventos pedaggicos que levam em seu bojo diferentes es-tratgias para consolidar o carter inovador dos PICs abrangem quatro focos prin-cipais: contextual, poltico, pedaggico e avaliativo.

    O foco contextual direciona para a anlise da conjuntura em que os eventospedaggicos vm acontecendo e as exigncias que vo surgindo no decorrer do de-

    senvolvimento dos PICs, o que abre possibilidades de correo de desvios para aorganizao de novas atividades.

    O foco poltico tem relao com a possibilidade desses eventos propiciarema escuta de todos os atores envolvidos com os Projetos Inovadores de Curso paralevantamento de dados que auxiliem na execuo de polticas pblicas educacionaisde acesso e na permanncia do pblico-alvo dos PICs na universidade, bem comofortalecer a metodologia e prtica da educao anti-racista no Ensino Mdio, almde fortalecer a relao do Ministrio da Educao com a sociedade civil e o movi-

    mento negro.

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    47/181

    49

    J o foco pedaggico permeia pela possibilidade de, por meio da concreti-zao das estratgias pedaggicas, elencar prticas, sugestes e ou alternativas para

    fortalecer a metodologia da educao anti-racista no Ensino Mdio, na EducaoSuperior e Educao Bsica.

    O foco avaliativo consolida o planejamento e a realizao dos eventos comoinstrumentos vivos de avaliao participativa dos PICs. Ressalta-se que, no momen-to em que os eventos pedaggicos so realizados e avaliados, est se promovendoum canal avaliativo, entre outros tantos, para somar-se avaliao geral do Progra-ma Diversidade na Universidade, no que tange ao desenvolvimento dos ProjetosInovadores de Curso e suas especificidades.

    Oficinas pedaggicas Racismo e Educao:exerccio poltico de incluso educacional

    As oficinas pedaggicas Racismo e Educao representam uma resposta fala dos atores dos Projetos Inovadores de Curso que pleitearam formao parapoder atuar nos PICs, dando ateno ao seu carter inovador. A expresso dasfalas dos sujeitos dos PICs foi determinante para que as oficinas se realizassem,a partir do ano de 2005, para coordenadores(as) e professores(as) das instituies

    dos estados do Maranho, Rio de Janeiro, Bahia, So Paulo, Mato Grosso do Sule Minas Gerais.

    J no ano de 2006, foram realizadas 21 oficinas Racismo e Educao ematendimento s instituies localizadas em 12 estados da Federao. O total deatendimento das oficinas foi at agora de 3.033 participantes, incluindo expres-siva representao do movimento negro em alguns locais em que as oficinas serealizaram, tais como Rio de Janeiro (RJ), Araraquara (SP), Salvador (BA), Coa-raci (BA), Ilhus (BA), Pelotas (RS), So Lus (MA), So Carlos (SP), Campina

    Grande (PB) e Cajazeiras (PB).As oficinas pedaggicas tm funcionado como respostas positivas demanda

    da populao afrodescendente, no sentido de reconhecimento e valorizao de suahistria, cultura e identidade, pois estimulam e levam subsdios para uma polticacurricular fundada em dimenses histricas, sociais e antropolgicas oriundas darealidade brasileira, buscando combater o racismo e as discriminaes que atingemparticularmente os negros. Nessa perspectiva, propem a divulgao e produo deconhecimentos e a formao de atitudes, posturas e valores que eduquem cidados

    orgulhosos de seu pertencimento tnico-racial.

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    48/181

    50

    necessrio sublinhar que as polticas de incluso educacional apregoam odireito dos negros, assim como de todos os cidados brasileiros, de cursarem cada

    um dos nveis de ensino, orientados por professores qualificados para o ensino dasdiferentes reas de conhecimentos e com formao para lidar com as tensas relaesproduzidas pelo racismo e discriminaes, sensveis e capazes de conduzir a reedu-cao das relaes entre diferentes grupos tnico-raciais. A partir do exposto, ficaevidente que as oficinas pedaggicas Racismo e Educao, realizadas no mbito dosPICs, esto na direo correta das polticas educacionais anti-racistas, atendendo auma demanda de formao de professores(as) explicitada como necessria no dilo-go do Programa Diversidade na Universidade com as instituies operadoras.

    Nas oficinas, so abordados assuntos que inexistem na literatura oficial doscursos de formao de professores, tais como movimentos de resistncia escra- vido, histrico do movimento negro, situaes-problemas para identificao depreconceito, discriminao, identidade, estima, raa, etnia e reais contribuies docontinente africano para a civilizao e para o Brasil, em especial. Outros assuntosabordados so as polticas de ao afirmativa para afrodescendentes, relao das dis-ciplinas do pr-vestibular, vestibular e Ensino Mdio com as questes tnico-raciais,exercitando a interdisciplinaridade de contedos. Tais contedos so elaborados,pesquisados e revisitados luz das Diretrizes Curriculares da Lei 10.639/2003.

    A troca de experincias e o fortalecimento das bases tericas da pedagogiaanti-racista, propiciados pelas oficinas pedaggicas, funcionam como instrumentoprovocativo para a atualizao dos professores e para firmar o carter inovador dosPICs. Desafiam o corpo docente para o comprometimento consciente com a for-mao diferenciada que o PIC requer para professores(as) e alunos(as) o trabalhocom a diversidade que necessita de conhecimento das diferenas raciais e dos novosparadigmas da eqidade para auxiliar na proposta de uma sociedade de relaesraciais igualitrias como alicerce do desenvolvimento.

    Cabe ressaltar que as oficinas pedaggicas Racismo e Educao foram cui-dadosamente planejadas e coordenadas por profissionais afrodescendentes especia-lizados em questes tnicas e educao anti-racista, representantes de diferentes es-tados da Federao: Alexandre Nascimento (RJ), Renato Emerson dos Santos (RJ),Benilda Regina Brito (MG), Jlio Reis (MG), Carlos Caetano (MT), TsindukaMuana Uta (MS); Slvio Humberto Passos (BA), Lzaro Raimundo Passos (BA),Maria Dorvalina Siqueira (BA), Valdecir Nascimento (BA), Silene Arcanjo (BA);Maria do Socorro Guterres (MA), Carlos Benedito Rodrigues da Silva (MA), Z-

    lia Amador de Deus (PA); Diony Maria Soares (RS); Neide Silva Rafael Ferreira

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    49/181

    51

    (DF); e Srgio Pinheiro dos Santos (SP), falecido em 15/07/2006. Mais do queuma relao nominal, o que se pretende evidenciar a oportunidade de dilogo que

    foi aberto pelo Programa Diversidade na Universidade para que as personalidadescitadas pudessem colaborar com suas experincias e saberes para a implementaodas polticas pblicas de incluso educacional, no Brasil, por meio dos PICs.

    Encontros Estaduais de PICs: breve histrico econtribuies educao inovadora

    Em 2004, a Coordenao de Projetos Inovadores de Curso programou cinco

    Encontros Estaduais de 27 PICs, nos estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro,Bahia, Mato Grosso do Sul e So Paulo, com o objetivo de integrar seus gestores,gestoras, coordenadoras, coordenadores, professoras, professores, alunas, alunos e re-presentantes do movimento negro para troca de experincias e consolidao do ca-rter inovador dos cursos. Esses Encontros Estaduais de PIC forneceram subsdiosque foram incorporados avaliao do Programa Diversidade na Universidade.

    Os Encontros Estaduais de 2004 trouxeram a fala dos atores dos PICs emdiferentes situaes com relao ao desenvolvimento dos projetos: dificuldades, as-pectos positivos, anlise dos recursos financeiros, relato de atividades pedaggicasrelacionadas com as questes tnico-raciais e as disciplinas do Ensino Mdio.

    As indagaes mais constantes direcionaram-se para os PICs e Ensino M-dio, cidadania, vestibular, acesso e permanncia de negros na universidade, formaode docentes, evaso escolar e escola pblica.

    Um dos questionamentos oriundos dos encontros estaduais de PICs foi anecessidade de formao de professores(as) para atuao no Ensino Mdio, a partirdo seguinte argumento:

    Se o PIC oportuniza a integrao dos alunos(as) com os professores(as) e dealunos(as) x alunos(as), se o PIC oportuniza a solidariedade, a dedicao e acriatividade para auxiliar os estudantes em termos de ensino-aprendizagem,se os docentes conseguem vislumbrar questes vivenciais da clientela, se reali-zam o trabalho com as questes raciais, diferentemente do Ensino Mdio quenem sempre oportuniza uma prtica pedaggica dessa natureza o que estfaltando para que professores(as) do Ensino Mdio se sensibilizem e possamatender a essa demanda de convivncia, alm do contedo das disciplinas?

    (SILVEIRA, 2005)

  • 8/14/2019 Programa Diversidade Universidade e Construo Politica Educacional Anti-racista

    50/181

    52

    Continuando...

    Se a prtica pedaggica dos PICs funciona como instrumento facilitador parao enfrentamento da discriminao racial nas universidades e, ainda, como ins-trumento que conscientiza que os afrodescendentes so capazes de chegar universidade,por que essa prtica de ensino no mais divulgada e incorpo-rada ao Ensino Mdio pblico?

    Se o PIC vem oportunizar o acesso universidade de alunos negros e no-

    negros socialmente desfavorecidos, qual o programa que lhes garante a per-manncia no sistema para evitar a frustrao para quem, a partir dos PICs,foi levado a ter um objetivo maior na vida e depois no consegue ir adiante?Assim como os PICs que oportunizam o acesso universidade, no seria omomento de garantir a permanncia na universidade dos alunos(as) egressosdos PICs? (SILVEIRA, 2005)

    Em meio s indagaes, destaca-se a insistente aspirao escola pblica

    de qualidade desde a Educao Infantil, considerando que o cidado leva para auniversidade a soma de tudo aquilo que recebeu em termos de ensino e educao,desde os anos iniciais.

    As palestras dos convidados e convidadas, os relatos de experincias de co-ordenadores e coordenadoras, de professores e professoras, juntamente com osdepoimentos dos alunos e alunas, dos ex-alunos e ex-alunas de PICs, trouxeramcontribuies culturais, sociais, pedaggicas e polticas que passam a fazer parte datrajetria dos Projetos Inovadores de Curso para a construo coletiva e democrti-

    ca de polticas educacionais inclusivas.A partir dos encontros de 2004, especialmente da coleta de dados dos instru-

    mentos de avaliao e das falas dos participantes, surgiram muitas propostas e crti-cas para melhoria do Programa Diversidade na Universidade, para o desenvolvimen-to dos PICs e atuao das instituies operadoras. Tendo em vistaaimportncia nocenrio do Programa Diversidade na