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Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa Unidade de Investigação Educação e Desenvolvimento Programa Doutoral em Ciências da Educação Projecto de Investigação para a elaboração da Tese de Doutoramento A Complexidade do Pensamento Matemático Avançado no Ensino Não Superior AUTOR: Miguel Ângelo Velhinho Silva ORIENTADOR: Professor Doutor António Manuel Dias Domingos Setúbal Abril de 2010

Projecto de Investigação para a elaboração da Tese de ... · esquemas mentais já existentes, ou uma completa reestruturação desse mesmo esquema, quando o “input”

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Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa Unidade de

Investigação Educação e Desenvolvimento Programa Doutoral em Ciências da

Educação

Projecto de Investigação para a elaboração da Tese de Doutoramento

A Complexidade do Pensamento Matemático Avançado no Ensino Não Superior

AUTOR: Miguel Ângelo Velhinho Silva

ORIENTADOR: Professor Doutor António Manuel Dias Domingos

Setúbal

Abril de 2010

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Índice 1.Relevância do estudo. ................................................................................................................. 3

2 - Objectivos. ............................................................................................................................... 5

3 - Revisão da literatura................................................................................................................ 6

3.1 O que é o pensamento matemático avançado? .................................................................... 7

3.1.1 Abstracção Reflexiva Teoria APOS ............................................................................. 8

3.1.2 Abordagem Proceptual dos Conceitos Matemáticos .................................................. 11

3.1.3 Conceito Definição e Conceito Imagem .................................................................... 14

3.1.4 Representação e Abstracção ....................................................................................... 18

3.2 Implicações escolares das teorias cognitivas de construção do conhecimento Matemático. ................................................................................................................................................. 20

3.3 O papel das TIC ................................................................................................................ 24

4 – Abordagem qualitativa como metodologia na investigação. ................................................ 26

4.1 Características da Metodologia Qualitativa ...................................................................... 26

4.2 Métodos de recolhas de dados na Investigação Qualitativa .............................................. 29

4.2.1 Trabalho de Campo .................................................................................................... 29

4.2.2 Sistemas de Observação ............................................................................................. 30

4.2.3 Entrevistas .................................................................................................................. 32

4.2.4 Análise de Dados ........................................................................................................ 34

4.3 Cientificidade, Validade e Fiabilidade .............................................................................. 35

5 - Escolha dos participantes. ..................................................................................................... 37

6 - Recolha e análise de dados. ................................................................................................... 37

7 – Cronograma das acções do projecto ao longo do tempo. ..................................................... 38

8 - Recursos. Que recursos serão necessários para implementar o estudo? .............................. 38

9. Bibliografia ............................................................................................................................. 39

10. Índice de Figuras .................................................................................................................. 40

3

1.Relevância do estudo.

A compreensão das razões do (in)sucesso na disciplina de Matemática, tem

despertado o interesse de investigadores em todo o mundo. Conhecem-se análises

curriculares, sociais, culturais e até antropológicas que procuram contribuir para uma

melhor compreensão do fenómeno. A inegável complexidade que a disciplina envolve,

fruto das diferentes representações de um mesmo ente matemático, concorre porventura

para esse (in)sucesso. Pretende-se estudar essa complexidade, procurando através da

compreensão das ligações entre os vários conceitos, conhecer a noção que os alunos do

ensino não superior fazem dos mesmos. O conhecimento da forma “ de como os alunos

pensam”, sobre determinados conceitos, torna-se relevante para a implementação de

medidas que promovam o sucesso à disciplina. Dada a recente massificação das TIC nas

escolas como elemento facilitador das aprendizagens, o estudo de como as TIC poderão

promover as conexões entre as várias representações de um mesmo objecto matemático

contribui como elemento relevante para a pertinência do estudo

Em Portugal, as sucessivas reformas que o sistema educativo e organizativo das

escolas tem sofrido, sobretudo com o surgimento dos agrupamentos de escola definido

no Decreto-Lei nº 115-A/98 de 4 de Maio, vem promover uma estrutura mais autónoma

e organizada, onde o Decreto-Lei nº 115-A/98 de 4 de Maio pretende ter como um seus

dos objectivos a suavização das transições de ciclo, permitindo uma melhor articulação

entre o que era ensinado em cada ciclo de escolaridade.

Consequentemente, e em particular na disciplina de Matemática, uma das acções

definidas no Plano de Acção de Matemática é a implementação do novo Programa de

Matemática do Ensino Básico que para além de garantir a articulação com o Currículo

Nacional do Ensino Básico, aparece também como uma “necessidade de melhorar a

articulação entre os programas dos três ciclos” sendo essa “uma das razões que

justificavam a sua revisão” (Educação, Ministério da, 2007) Em consequência disso,

surgem já no Ensino Básico preocupações que serão também parte integrante da

investigação que se pretende desenvolver.

• As diferentes representações do mesmo objecto matemático

Os alunos devem conhecer e compreender os diferentes tipos de

representações, ser capazes de as utilizar em diferentes situações e de

seleccionar a representação mais adequada à situação. (Educação,

Ministério da, 2007)

4

• as conexões entre as representações diferentes do mesmo ente matemático

Os alunos devem reconhecer a Matemática como um todo integrado,

estabelecendo conexões entre aquilo que já aprenderam e aquilo que estão

a aprender em cada momento, mas também ser capazes de a usar em

contextos não matemáticos. O estabelecimento de conexões é essencial

para uma aprendizagem da Matemática com compreensão e para o

desenvolvimento da capacidade de a utilizar e apreciar. (Educação,

Ministério da, 2007)

• a utilização de ferramentas tecnológicas, como ferramenta que promove

conexão e a aquisição do conhecimento.

Ao longo de todos os ciclos, os alunos devem usar calculadoras e

computadores na realização de cálculos complexos, na representação de

informação e na representação de objectos geométricos. O seu uso é

particularmente importante na resolução de problemas e na exploração de

situações, casos em que os cálculos e os procedimentos de rotina não

constituem objectivo prioritário de aprendizagem, e a atenção se deve

centrar nas condições da situação, nas estratégias de resolução e na

interpretação e avaliação dos resultados. A calculadora e o computador

não devem ser usados para a realização de cálculos imediatos ou em

substituição de cálculo mental. (Educação, Ministério da, 2007)

Também Bass (1998) apresenta esta área como necessitada de investigação As calculadoras gráficas, a visualização e manipulação geométricas, o

software simbólico, etc.,são cada vez mais comuns. O uso destas

tecnologias é defendido por uns que destacam o papel destas ferramentas

para realçar a compreensão matemática dos alunos, enquanto que outros

consideram que as capacidades e intuições sobre a matemática são

enfraquecidas devido à dependência que estas ferramentas criam. Muito

pouco se sabe sobre a utilização destas tecnologias no ensino superior,

pelo que é importante saber como é que os alunos são ensinados a usar a

tecnologia, quando esta é usada, e como é que eles se relacionam com a

matemática assim ensinada. Noutras questões a investigar pretendem-se

saber como é que o desenvolvimento matemático dos alunos é afectado

pelo uso de diferentes ferramentas tecnológicas e como é que os alunos

aprendem com uma ferramenta tecnológica particular comparativamente

com aqueles que não usam tecnologia.

5

Estudos sobre a forma como os alunos raciocinam, articulam conhecimentos e os

significados que atribuem aos conteúdos matemáticos que vão encontrando no seu

percurso escolar, é uma área necessitada de investigação, sobretudo neste nível de

ensino. Reconhecer e compreender as razões do enraizado (quase aceite como

inevitabilidade) insucesso à disciplina, são motivação mais que suficiente para o

trabalho que me proponho realizar.

2 - Objectivos.

Na temática que me proponho investigar, será importante perceber, quais os

significados que os alunos dão aos entes matemáticos que lhes vão sendo apresentados,

e que tipo de conexões poderão fazer entre eles. Será que quanto maior/melhor forem as

conexões entre as várias representações dum mesmo objecto, melhores serão as

competências matemáticas do aluno? Pretende-se ainda, perceber se essas vias de

ligação entre os vários objectos contribuem decisivamente para um aumento do nível de

abstracção dos alunos que os transportem para um nível de complexidade mais elevado.

Será que a linguagem específica da matemática, empregue nas diferentes representações

dum mesmo objecto, é demasiado complexa, para que essas relações se possam fazer de

uma forma menos tumultuosa? Uma melhor articulação entre as várias representações

do mesmo objecto, permitirão uma melhor apreensão de futuros conhecimentos?

Poderão contribuir as TIC, para uma melhor articulação entre as várias representações,

nomeadamente algébrica e gráfica? Estas são algumas das questões que se pretendem

abordar.

Os objectivos desta investigação prendem-se sobretudo, com a forma como os

alunos adquirem o conhecimento. Esta investigação será então dirigida tendo em conta

os seguintes objectivos:

Caracterizar os processos envolvidos na compreensão dos conceitos

matemáticos por parte dos alunos do Ensino Básico e Secundário;

Caracterizar as acções que o aluno desenvolve na apropriação dos conceitos

matemáticos;

Compreender se existe e de que forma é feita a articulação entre as várias

representações do mesmo objecto matemático

6

Compreender de que forma as TIC, influenciam no processo de articulação e

conexão dos vários conceitos

É com base no que atrás foi dito que me proponho a identificar, compreender e

clarificar as diferentes formas de apropriação dos conceitos matemáticos de alunos do

ensino não superior. Esta identificação e explicação tenderá a ajudar a tomada de

decisões, sobretudo no que se refere às abordagens que se devem promover por forma a

potenciar a construção do conhecimento através do fortalecimento das ligações entre os

diversos conceitos matemáticos. As TIC, deverão ter um papel importante

nomeadamente, como veículo potenciador dessa flexibilidade, que caracteriza a

competência matemática.

3 - Revisão da literatura.

É ainda pouco significativo o trabalho realizado em Portugal, sobre a temática da

complexidade do pensamento matemático avançado, no ensino não superior. No ensino

superior, é conhecido o trabalho de Domingos (2003), sobre Compreensão de conceitos

matemáticos avançados. Internacionalmente os trabalhos de David Tall, Ed Dubinsky,

S. Vinner, Ann Sfard são algumas das referências nesta temática.

Para desenvolver este trabalho será necessário centramo-nos no processo de

apropriação que o aluno faz, das mensagens que lhe são transmitidas, bem como das

experiências por si vivenciadas, e das conexões que consegue fazer de tudo isso.

Entenda-se aqui por mensagens, todo o conjunto de interacções que o aluno pode

absorver na sala de aula, quer seja de forma escrita, oral, ou mesmo visual através da

performance do professor-actor, que por vezes utiliza a sua linguagem corporal para

levar o aluno à compreensão do conceito. Ter uma ideia operacional ou abstracta da

matemática será determinante para o significado que o aluno dará às suas

aprendizagens. Assim sendo, a revisão bibliográfica centrar-se-á em algumas teorias de

construção de conhecimento matemático.

7

3.1 O que é o pensamento matemático avançado?

Vários autores têm-se debruçado sobre o conceito de pensamento matemático

avançado, não sendo consensual as características distintivas de um e outro pensamento,

nem quando, ou de que forma, se faz a transição de um para o outro. Assim, Dreyfus

(1991) defende que não é fácil fazer uma clara distinção sobre os processos do

pensamento matemático avançado e o pensamento matemático elementar, embora

conclua que no pensamento matemático avançado é dado maior ênfase à abstracção, às

definições e deduções. Por outro lado Tall (1991) defende que essa transição de nível,

ocorre quando a preocupação se transfere da descrição para a definição, do

convencimento pela observação à prova através de deduções e definições de conceitos

mais ou menos abstractos. Por outro lado Dubinsky (1991), que segue uma abordagem

Piagetiana, adopta uma visão predominantemente construtivista, onde os indivíduos,

conforme a sua maturação vão ultrapassando etapas de desenvolvimento que lhes

permite adquirir diferentes graus de reflexividade. Dreyfus (1991) por seu lado, associa

ainda aspectos do desenvolvimento do pensamento matemático a aspectos psicológicos.

Acrescenta ainda, que são observáveis processos de abstracção noutras ciências como

na Física, ou noutras áreas como são o caso das Artes. Além disso, são encontrados

complexos processos de abstracção em problemas envolvendo matemática elementar,

como ocorre em problemas propostos nas Olimpíadas da Matemática. Assim sendo, é

defensável que o pensamento matemático avançado possa surgir nas mais diversas

etapas do desenvolvimento cognitivo, estando muito mais dependente da complexidade

do problema proposto, do que do nível de escolaridade ou tema que é estudado. A

maneira como lidamos com essa complexidade é que permite fazer a transposição de

um nível de pensamento para outro. Os processos psicológicos associados ao

pensamento matemático descritos por Dreyfus (1991) associam um conceito

matemático que obedece a regras definidas com um conceito imagem que se forma no

nosso consciente que nos ajudará a lidar com o conceito formal de uma forma mais

suave. Esta visão dos aspectos de imagem associados ao conceito matemático, apresenta

características comuns com a teoria apresentada por Vinner, da complementaridade

entre conceito imagem e conceito definição. Na secção seguinte apresentaremos

algumas teorias cognitivas relevantes para a aprendizagem de conceitos matemáticos.

8

3.1.1 Abstracção Reflexiva Teoria APOS

Partilhando uma abordagem construtivista da construção do conhecimento

matemático, como a de Piaget, Dubinsky (1991) adopta uma visão de que o

conhecimento matemático se vai construindo de uma forma quase biológica, onde o

“input” do novo conhecimento pode gerar apenas uma simples reorganização dos

esquemas mentais já existentes, ou uma completa reestruturação desse mesmo esquema,

quando o “input” provoca um conflito total como o conhecimento residente.

Ed Dubisnky, conhecido como o grande impulsionador da teoria APOS (Action

Process, Object, Scheme), defende que o conhecimento matemático é construído através

de acções que se produzem sobre os objectos matemáticos já conhecidos, que depois de

reorganizados são capsulados em novos objectos matemáticos, tal como ilustra a figura

1

Dubinsky parte do trabalho de Piaget que distinguia três tipos de abstracção

a) Abstracção Empírica

b) Abstracção Pseudo Empírica

c) Abstracção Reflexiva

Estas abstracções surgem da acção que o sujeito exerce sobre os objectos. A partir

desse primeiro contacto, o sujeito é capaz de formar algumas opiniões/conclusões sobre

o objecto. Essa observação, numa primeira fase leva-nos a uma abstracção empírica.

Não obstante, poderá conduzir-nos a outro grau de profundidade como o atingido pela

Figura 1- Teoria APOS

9

abstracção reflexiva. De uma forma geral e sucinta podemos caracterizar os três tipos de

abstracção apresentados por Dubinsky da seguinte forma.

a) A Abstracção Empírica

Esta tipologia de abstracção advém da experiência que temos com o objecto, e

com as suas propriedades exteriores. No entanto o conhecimento desse objecto é dado

depois da nossa interpretação dessas mesmas propriedades. Essa interpretação, não é

linear, pois depende das experiências dos indivíduos.

b) Abstracção Pseudo Empírica

Esta abstracção, podemos situá-la como um meio caminho entre a abstracção

empírica, onde existe grande parte de uma componente sensorial, e a abstracção

reflexiva que apresentaremos em seguida.

c) Abstracção Reflexiva

Esta abstracção é induzida pelas acções que o indivíduo produz nos objectos,

inferindo daí propriedades e generalizações nascidas das novas relações que o indivíduo

criou desse objecto. Esta abstracção actua sobre os objectos, incidindo não sobre as suas

propriedades, mas sobre as suas generalizações, construindo com base nisso, novas

estruturas ou objectos matemáticos.

O primeiro passo da abstracção reflexiva delineia propriedades provenientes das

acções mentais de manipulação sobre os objectos. Não se preocupando com a forma, o

seu conteúdo é o combustível para a abstracção reflexiva. A abstracção reflexiva tem

como grande riqueza, o poder de gerar novos objectos, a partir das generalizações de

outros.

Tanto Piaget como Dubisnky acreditam que estruturas sofisticadas, da matemática

podem ser encontradas nas crianças de tenra idade. Para Dubisnky, a abstracção

reflexiva pode-se considerar como sendo: a construção mental de objectos e as acções

mentais sobre esses objectos.1 (Dubinsky, 1991) A essa colecção de objectos e

processos Dubisnky chama-os de Esquemas2

1 No original “the construction of mental objects and of mental actions on these objects”.

. A importância que Dubisnky atribui a

esses Esquemas é tão grande que considera que o conhecimento matemático consiste na

colecção desses Esquemas.

2 Schemes no original

10

Por sua vez Piaget considera, que existem quatro, catalisadores na construção do

pensamento matemático, através da abstracção reflexiva: a) Interiorização, b)

Coordenação, c) Capsulação, d) Generalização.

Dubisnsk acrescenta-lhe um quinto factor: e)Reversão.

A visão de Dubisnky dos seus cinco factores obedece às seguintes características:

A Interiorização pode ser evidenciada na utilização e manipulação de símbolos e

de imagens mentais como forma de representar o que a sua mente lhe segreda. Um

exemplo de interiorização, que pode ser encontrada no estudo de funções, é evidenciada

quando o sujeito, começa a interagir com o mesmo objecto, conforme este se lhe depara,

seja ele na forma algébrica analítica ou gráfica.

Piaget fala-nos da Coordenação, quando se refere à acção coordenada e

concertada de processos e acções que permitem a construção de novos entes

matemáticos a partir dos objectos estudados/conhecidos. Para este autor, por exemplo, a

composição de funções é resultado da coordenação de processos e que no fim irá

resultar numa nova função que depois de sofrer um processo de Capsulação nos

permitirá trabalhar com ela.

Como Capsulação, podemos entender o processo de conversão de um objecto

dinâmico num objecto estático. As diferentes viagens entre as várias entidades

matemáticas conhecidas, conjuntamente com as operações que lhe são aplicadas,

resultam na construção de estruturas mais fortes que irão servir de ponte de suporte a

novas construções. Neste processo, Piaget e Dubinsky consideram que a forma perde a

sua importância, ganhando relevo, o conteúdo.

A Generalização por seu turno, é a percepção de que determinada propriedade

apresentada por um determinado objecto, não se apresenta como válida apenas para si,

mas para uma muito maior colecção de objectos e entes matemáticos. Por exemplo a

passagem da representação numérica na recta real, a sua passagem para o plano, depois

para o espaço, e finalmente para uma dimensão n, poderá ser considerado um processo

de generalização.

Dubisnky, entende também a Reversão como uma forma adicional de construção

matemática. Não de uma forma a quebrar o processo, mas a ideia de percorrer o

caminho contrário, permitirá ao sujeito, reflectir sobre uma perspectiva diferente sobre

11

aquele ou aqueles objectos matemáticos. Por vezes esse processo torna-se bastante útil.

Relembremos como podemos estudar a integração como o contrário da derivação

Segundo este autor, as construções matemáticas podem ser explicadas utilizando

estas cinco formas de abstracção reflexiva. Todo este processo de construção do

pensamento matemático, obedece a uma ordem circular com constantes interacções

entre as diferentes formas, objectos e procedimentos. Assim sendo, esta organização,

não é uniforme sendo altamente influenciada pelas diferentes interacções que as

diferentes formas de reflexão exercem entre si. O feedback que os vários entes vão

dando uns aos outros, vão influenciar a dinâmica entre eles.

3.1.2 Abordagem Proceptual dos Conceitos Matemáticos

A noção de proceito trabalhada por Gray e Tall, assenta no duplo papel entre

processos e conceitos que os objectos matemáticos podem tomar. É a simbologia

matemática que serve de promotor desta dupla face, ora processo ora conceito.

Parecendo de certa forma ambíguo, é a simbologia que permite uma muito conveniente

e flexível alternância entre as duas vertentes do objecto. A noção conceptual de símbolo

matemático torna-se por isso um facilitador do manuseamento que se quer realizar com

a noção matemática envolvida. Perante a representação simbólica 5 × 4, podemos estar

presente o processo de adicionar cinco vezes o quatro, ou apenas considerando-o como

forma de representar o número 20. Esta dualidade entre processo e conceito, começa

muitas vezes pela simples operacionalidade, passando duma fase em que o símbolo

comprime e atenua a carga dada à parte física, para uma fase onde o conceito é operado

num todo. Na primeira fase, os procedimentos que primeiramente são realizados com

todo o cuidado, são numa etapa subsequente, “despreocupadamente descurados”

adoptando-se aí, uma perspectiva mais globalizante, onde o carácter compactador do

símbolo permite uma maior agilidade na manipulação do conceito. Numa primeira

abordagem, podendo parecer por vezes ambíguo, esta manipulação simbólica, torna-se

bastante conveniente, permitindo viajar entre o operacional e o conceptual de forma

bastante leve, tornando-a numa relação bastante apertada. A essa ligação agregadora e

comprimida que o símbolo oferece, podemos considerá-la como uma das características

enriquecedoras do pensamento matemático. Consequentemente, simbologia matemática

dotada desta bivalência e flexibilidade (Conceito-Processo) é denominada por Tall de

proceito.(Tall, 1991)

12

Hoje em dia o matemático eficiente, utiliza a ambiguidade e dicotomia nas

representações, que ora a usa como processo ou como conceito. Por exemplo, o seno =

cateto oposto/hipotenusa, que tanto representa uma instrução para cálculo, como

simboliza um resultado. Assim, temos que o simbolismo representa o processo de

manipulação e o resultado de um processo.

Vejamos o que acontece com o simples acto de fazer 4+5.. Esta acção pode ser

vista como um processo se encaramos como a operação de adição entre o número 4 e o

número 5, ou tomar uma visão de conceito se dominarmos o conceito de número

podemos decompor esta adição numa outra coisa qualquer, porventura outra operação

ou até mesmo criar um problema mas complexo envolvendo estes números. Se o aluno

para somar 4+5 começar por soletrar, 4,5,6,7,8,9, continua apenas a usar a vertente

operacional ou processual da contagem do número. Este aluno está preso ao processo de

contagem não tendo uma visão mais abrangente e generalizadora dos objectos

envolvidos. Desta forma 4+5 pode ser considerado de proceptual Estamos perante

aquilo que Dubinsky chamaria de um processo não capsulado, que produz respostas,

não através da manipulação dos objectos, mas apenas como resultado dos processos.

Nestes casos, em que o foco do aluno está todo concentrado na operacionalidade ( como

por exemplo, no procedimento soma) e em que a notação não é dominada, torna-se claro

que surgirão problemas quando se confrontar com 2+3x.

Sob esta perspectiva também uma função é um proceito. O termo proceito refere-

se à combinação entre a vertente processual e conceptual do mesmo ente matemático

que pode ser representada pela mesma simbologia mas que pode ser encarada de forma

diferente conforma a situação. Esta visão não pretende ser dicotómica de ora processo

ora conceito. Pretende sim ser compactadora e facilitadora da sua manipulação

conforme as situações. Poderemos considera-la de processo se pensarmos sob uma

perspectiva de cálculo, onde nos preocupamos com aspectos pontuais e operacionais de

uma determinada função (como sejam os seus zeros, a imagem de um determinado

objecto “x”); ou por outro lado ter uma visão mais abrangente do conceito se for algo

que possamos manipular, de forma global. Essa manipulação, torna-se possível quando

se olha para a função como sendo uma meta-estrutura onde os pormenores ou

características de uma função em particular, são desprezados.

Os alunos mais hábeis serão então aqueles que usam essa ambiguidade e

flexibilidade em seu proveito, consoante a situação que se lhe depara. Por isso mesmo,

são construtores de conhecimento através da sua capacidade de desenvolver novo

13

conhecimento aritmético, a partir do conhecimento existente. Estes alunos facilmente se

apercebem que não necessitam de decorar complexos algoritmos, achando-os até

maçadores e fastidiosos, pois a flexibilidade das estruturas “proceitos” que dominam

serve-lhes para enfrentar os novos desafios. Estes alunos recusam-se, e têm até mesmo

dificuldade, em decorar procedimentos e processos, baseando o seu conhecimento na

capacidade de deduzir o que quer que seja a partir do que foram construindo. Este tipo

de alunos ganha confiança nas suas ferramentas matemáticas encarando as novas tarefas

com motivação e a determinação de quem sabe que vai ser bem sucedido. Algumas das

características do pensamento processual e proceptual estão ilustradas na tabela1.

Pensamento Processual Pensamento Proceptual

• Preocupação com os passos do processo.

• Raciocínio rígido.

• Direccionado para a operacionalização.

• Dificilmente introduz variantes.

• Dificuldades em articular novos conceitos.

• Visão operacional do símbolo

• Pensamento mais flexível

• Maior facilidade na articulação de novos conceitos

• Raciocínio rico em relações

• Simbolismo como agente compressor de conceitos e processos.

• Visão generalizadora.

Figura 2 Características do Pensamento Processual vs Pensamento Proceptual

Consequentemente, fica claro que os alunos mais capazes, são aqueles que

atribuem significado às suas ideias e conhecimento. Essa atribuição de significado pode,

para além de deter importante papel na catalogação e arrumação, das estruturas que vai

construindo, é de extrema utilidade quando a elas têm de recorrer numa outra

oportunidade. Essa arrumação ou empacotamento permite que o processo e o conceito

permaneçam no mesmo nível, facultando ao indivíduo a flexibilidade de os usar ora um

ora outro, ou mesmo a combinação dos dois (proceito) conforme o que a situação apela.

Esta nivelação, onde se perde o conceito hierárquico de atribuição de importância à

parte conceptual ou operacional, permite que a simbologia ajude a simplificar em vez de

complicar.

14

3.1.3 Conceito Definição e Conceito Imagem

Shlomo Vinner apresenta-nos a sua teoria da construção de conhecimento

matemático através da bivalência entre o conceito definição e o conceito imagem. Este

autor defende que quando nos é apresentado qualquer conceito matemático,

imediatamente é estimulada uma parte cognitiva que nos permite fazer uma imagem,

por ténue que seja, desse mesmo conceito. Tall e Vinner (1991), falam do “conceito

imagem invocado3

O conceito imagem, é algo individual e não é seguro que o mesmo estímulo irá

sempre despoletar a mesma imagem no mesmo indivíduo. Por maioria de razão,

facilmente se compreende que o mesmo se passará de indivíduo para indivíduo. Cada

indivíduo, tem um conceito imagem diferenciado. Para além disso, perante um estímulo

que apele ao mesmo conceito, iremos invocar o conceito imagem que mais se adequa à

situação que se encontra. Tall e Vinner acreditam que quando um indivíduo se apropria

de um conceito, obrigatoriamente forma um conceito imagem desse conceito. Saber

“reproduzir” o conceito, não é condição necessária e suficiente para a apreensão desse

conceito. Os autores acreditam que para que essa apreensão seja efectiva, terá que ser

gerado o seu conceito imagem.

, (Vinner, 1991) para se referirem à parte do nosso consciente que é

activada perante determinado contexto. O estímulo desperta no individuo uma imagem

do conceito, não da definição do conceito, porque por vezes nem a dominamos, mas

uma imagem de uma representação visual ou gráfica, se a tiver, ou pode apenas surgir-

nos como uma associação de experiências ou sensações. Esse conceito imagem pode até

ser traduzível para uma linguagem verbal, ou matemática, no entanto, essa linguagem

verbal, poderá não ter sido a primeira coisa que nos surgiu no nosso consciente.

Apesar disso, trabalhar apenas com o conceito imagem, poderá ser bastante pobre

e limitador. Vinner, no entanto, defende que depende do contexto mais ou menos

formal, a necessidade de trabalharmos com mais ou menos profundidade o conceito

definição ou o conceito imagem. Num contexto mais formal, o conceito definição,

poderá ser de grande utilidade. Por exemplo, poderá impedir-nos de cair em

incongruências a que o nosso conceito imagem nos possa levar. Por exemplo, o conceito

imagem de uma função pode, sugerir-nos a existência de continuidade num ou noutro

ponto (que pode ser até corroborado, por alguma limitação do instrumento tecnológico

que usemos para ver a sua representação gráfica), e no entanto a definição garante-nos a

existência de um ponto de descontinuidade. Porém, Vinner alerta-nos para o facto de

3 No original “evoked concept image”

15

numa primeira fase, e seguindo hábitos provenientes da experiência do dia-a-dia, a

nosso conceito imagem ter uma maior prevalência e influência nas nossas tomadas de

decisão.

Desejavelmente o conceito imagem e o conceito definição deveriam ter igual

prevalência, agindo em constante interdependência e interacção (figura 3), o que

tornaria as tomadas decisão, assentes de igual forma nos dois conceitos.

Não obstante o que foi dito anteriormente, por vezes o conceito imagem, pode

permanecer vazio. Isso pode ocorrer quando o aluno, memoriza uma definição, não lhe

atribuído qualquer sentido, senão a de um conjunto de palavras sequenciais. A não

atribuição de significado à definição formal, deixa o nosso conhecimento carente de

uma imagem que seja associável ao conceito definição. Porém, também pode acontecer

o contrário, ou seja, poder-se-á construir um conceito imagem sem sequer ter tido

contacto com o conceito definição. Essa construção, ocorre do facto do aluno ter

contactado muitas vezes com exemplos de imagens do conceito, e ter construído por

analogia ou inferência o seu próprio conceito definição. Assim sendo, quando

confrontados com o conceito de definição formal, Vinner sugere-nos que outros três

cenários podem ocorrer. Num primeiro cenário, O conceito imagem facilmente se

molda e acrescenta/clarifica pontos específicos que anteriormente eram difusos. Dá-se

neste caso uma acomodação suave. Uma segunda perspectiva verifica que o conceito

imagem continua inalterável, sendo o conceito definição, derrotado, distorcido e

porventura esquecido. Neste caso, torna-se evidente que o conceito definição não foi

assimilado. No terceiro caso, Os dois conceitos coexistem de uma forma algo

desgarrada. Quando o professor apela ao conceito definição, o aluno repete o

ensinamento do professor, no entanto quando lhe é pedido para aplicar o conceito, é o

conceito imagem que prevalece. De forma análoga, ocorre se o conceito definição surge

primeiro, e o conceito imagem vai ser construído a partir de exemplos que vão sendo

apresentados.

Figura 3 – Relação recíproca entre o Conceito Imagem e o Conceito Definição

16

Vinner (1991) também se mostra crítico, quanto ao que ele chama de conceito

imagem controlado pelo conceito definição (figura 4), e que ele apresenta como sendo a

estratégia utilizada por muitos professores, que através de uma apresentação sólida do

conceito definição espera, que os alunos sustentados nessa definição, construam per si o

conceito imagem.

Também a resolução de problemas ou de tarefas, é apontada como estratégias da

construção do conhecimento, que consoante a sua natureza, apela de forma prioritária

ou precedente a um ou outro conceito. As figuras 4, 5 e 6 são ilustrações desses

processos.

A figura 5 mostra-nos como perante um desafio, a interacção entre os dois

conceitos, permite, uma maior flexibilização de raciocínio, utilizando o sujeito, ora uma

ora outra, ou mesmo as duas concepções simultaneamente, para resolver a tarefa.

Na figura 6, estamos perante uma tarefa puramente formal, onde o conceito

imagem, não é utilizado.

Figura 4 – Construção do Conceito Imagem baseado no Conceito Definição

Figura 5- Interacção recíproca entre o Conceito Imagem e o Conceito Definição

Figura 6 – Dedução puramente formal

17

Na figura 7, temos uma tarefa que segue uma linha intuitiva, mas que se socorre

do conceito definição, de forma a enviar uma resposta válida.

Apesar de conhecidas e identificadas estas formas de construção de conhecimento,

Vinner adverte que é bastante difícil treinar as mentes, para deixarem de pensar como é

usual, e passar a pensar matematicamente.

A figura 8, ilustra essa forma “tradicional”de pensar. Aqui a resolução da tarefa é

apenas apresentada com base no conceito imagem. Vem assim, à superfície, o hábito

adquirido de dar predominância ao conceito imagem, que muitas vezes é coroado de

sucesso. Vinner acrescenta que apenas problemas, não rotineiros que ponham, a nu

fragilidades de conceitos imagem pouco consistentes, poderão encorajar o indivíduo a

procurar com mais frequência a segurança no conceito definição.

Figura 7 – Dedução construída através de um caminho de originariamente intuitivo

Figura 8 – Resposta de carácter intuitivo

18

3.1.4 Representação e Abstracção

Tommy Dreyfus não apresenta uma distinção clara entre o que é o pensamento

matemático avançado e o processo matemático elementar. A forma de gerir a

complexidade do pensamento matemático é que nos permite fazer a viagem entre um e

outro tipo de pensamento. Para Dreyfus, o pensamento matemático avançado consiste

num grande conjunto de interacções entre processos4

Dreyfus (1991) apresenta três componentes como figurativas no processo de

representação: as representações simbólicas; as representações mentais e a visualização.

A representação simbólica apresenta-se bastante importante na medida que simplifica a

representação de conceitos. Como refere Tall (1991), o simbolismo ajuda a compactar o

conceito tornando-o mais manipulável, trabalhando ora como conceito ora como

processo. No entanto poderá trazer um problema de comunicação entre interlocutores

que não dominem com o mesmo grau de entendimento o simbolismo matemático.

Também constituinte do processo de representação, é a representação mental. Esta

representação mental que Dreyfus associa a processo psicológicos, é a forma como cada

indivíduo organiza o seu pensamento e comunica consigo mesmo. Esta representação,

poderá trazer problemas quando verbalizada. Sendo uma representação individual

(diferindo de professor para professor, e por maioria de razão diferindo de professor

para aluno), torna-se imperioso perceber que essa representação do conceito que é mais

apelativa e clara para nós, possa não o ser para outro. A representação mental é em

grande parte das vezes, diferente da fotografia que o nosso olho envia para o nosso

cérebro. A edificação da imagem mental, é resultante das interacções das experiencias

passadas em confronto/paralelo com a fotografia visual. A visualização, por seu lado, é

constituída por “artefactos” que ajudam à criação das imagens mentais. Nas funções,

por exemplo será importante a visualização da representação gráfica da função, para que

a imagem mental do conceito, seja enriquecida pela informação dada pelo gráfico.

(Dreyfus, 1991). Apesar disso

Dreyfus considera que a representação e abstracção estão presentes nos dois tipos de

pensamento, diferenciadas apenas pelo grau de complexidade que invocam.

Dreyfus defende que o sucesso matemático está intimamente ligado com a riqueza

das representações mentais que o indivíduo possui. Essa riqueza, é mensurável, não pela

quantidade mas pela qualidade das ligações que consegue criar entre os vários

conceitos. Mesmo que um aluno consiga narrar virtuosamente as definições dos 4 No original: “Advanced mathematical thinking consists of a large array of interacting component process”,pp-30

19

conceitos, a pobre flexibilidade de raciocínio resultante das fracas ligações entre as

várias representações do mesmo conceito, levam o aluno a pensar matemática em

função da quantidade de fórmulas que consegue ou não operar. São essas ligações,

permitem relacionar as várias representações do mesmo objecto de forma simultânea

e/ou complementar, permitindo ao indivíduo ser mais eficiente no manuseamento dos

conceitos e consequentemente mais competente perante uma ou outra tarefa. Ao invés,

se essas ligações não forem efectivas, as diferentes representações poderão ser mesmo

antagónicas e conflituosas.

Quanto à abstracção, considerado por Dreyfus, como o mais importante processo

do pensamento matemático avançado, apresenta a generalização e a síntese como pré

requisito para que se possa atingir essa fase. Na síntese o individuo procura combinar e

compor as partes por forma construir um todo. Neste caso, o todo é mais rico que a

soma das partes. Comprimindo diversas propriedades, este novo ente matemático,

contém a riqueza das propriedades dos seus componentes, acrescida da possibilidade

resultante deste processo de compressão, que é o facto desta nova entidade poder ser

manipulada de uma forma mais ágil. Por seu lado a generalização, nasce da

identificação de características particulares dos objectos que passam a estar relacionados

através desses pontos comuns. Por exemplo, quando trabalhamos com uma família de

funções, a designação matemática induz que estão assim categorizadas, por terem uma

série de características comuns. Sem embargo da importância dos processos de síntese e

generalização, o autor defende que o processo de abstracção é muito mais exigente a

nível cognitivo. Esta abstracção é construtora de novas estruturas mentais em cima de

estruturas já existentes. O processo de abstracção pressupõe que o indivíduo salte de um

olhar focado no objecto para uma visão que se concentra nas suas propriedades e nas

possíveis relações que dai se podem construir. Esse processo construtivo, despreza

pormenores individuais dos objectos fixando-se nas propriedades que encontram

similitudes noutros objectos. Estas propriedades, não particulares, vão permitir uma

ligação entre objectos nascendo daí uma nova estrutura. Esta triagem de propriedades

não particulares pode ser um processo difícil. Tentar perceber quais as propriedades que

têm peso suficiente para serem comuns e geradoras de novos objectos e as que não o

têm, pode ser um problema irresolúvel na tentativa de atingir a abstracção.

20

3.2 Implicações escolares das teorias cognitivas de construção do conhecimento Matemático.

Se olharmos pela perspectiva de Dubisky (1991) constatamos que é dizimado todo

o processo de imitação e de memorização, que segundo o autor não promove o conflito

gerador da construção matemática. Dubinsky acrescenta ainda, que esta forma de

encarar a matemática (imitando e memorizando) destrói potenciais matemáticos. Esta

forma desprendida de encarar a matemática, pode resolver problemas pontuais, mas não

promove a construção matemática, num movimento de crescimento do indivíduo.

De acordo ainda com Dubinsky (1991), este sugere que grande parte dos

professores tem como objectivo que os alunos consigam desenvolver processos

mecanizados que perante problemas tipo, consigam resolve-los por forma ter boas

notas. Apesar de perceber que a pressão criada pelos alunos, pais, sociedade, tem como

objectivo último a obtenção de boas classificações que permitam ter sucesso escolar e

posteriormente profissional, à conta dessa classificação escolar, julgo ser uma prática

cada vez menos enraizada. Entende-se por isso ser necessário, paralelamente aos

objectivos processuais, construir uma cultura de construção de estruturas de raciocínio,

que permitam resolver qualquer problemática. Dubisnky (1991) advoga, que o professor

necessita de ocupar esse papel de facilitador das construções mentais do aluno. Aqui se

foca o papel da motivação. As aprendizagens proporcionadas pela acção do professor

terão que partir dos Esquemas que o aluno já entende e domina, para que possa através

desses processos ir construindo alicerces mais fortes e versáteis.

Julgamos, no entanto, que esta metodologia poderá falhar se o percurso escolar do

aluno não for linear. Podemos talvez perguntar, o que acontece se os Esquemas que o

aluno tem de determinado assunto, são Esquemas com imprecisões, ou até mesmo

falhas estruturais? Tal como uma estrutura que está insuficientemente consolidada,

construir o novo conhecimento com base em algo que não é suficientemente forte, é

muito perigoso, pois podemos levar o aluno a um conflito, que em vez de provocar a

construção de algo superior, poderá desaguar num conflito inconciliável que para além

de não construir uma nova estrutura, destrua o Esquemas anteriormente existentes.

Alguns outros entraves que podem surgir relativamente à aprendizagem, prendem-

se com a linguagem matemática que por vezes não sendo intuitiva, é noutros casos,

conflituosa com termos homógrafos ou homófonos na língua materna. Também as

21

figuras ou representações de conceitos (representações essas, que são as que o professor

construiu na sua cabeça, não sendo por isso impolutas), poderão ser mais um embaraço,

se se der o caso de não fazerem sentido na cabeça do aluno, que por isso não lhe atribui

qualquer significado. A não atribuição de significado por parte do aprendente, torna-se

assim, num factor de desmotivação e desinteresse pelo que lhe está a ser apresentado.

Dubisnky chega mesmo a afirmar que os exemplos apresentados para alguns conteúdos

poderão ser contraproducentes, uma vez que (não sendo possível ilustrar todos os

possíveis casos) o aluno poderá inferir dos exemplos, propriedades que não são

generalizáveis mas sim particulares, inerentes aos exemplos apresentados.

O aluno faz sempre alguma construção quando algo lhe é transmitido. Contudo o

Esquema construído pelo aluno, poderá não ser aquele que o professor ou o currículo

espera que ele construa. Esse erro, pode ainda ser potenciado pela apresentação de

vários Esquemas que por infeliz sorte poderão corroborar o Esquemas do aluno. Esse

processo, leva a que o professor mais tarde, leve mais tempo a desfazer os equívocos

dessa forma criados. Desta forma os alunos podem crias bugs nos seus processos,

infelizmente reforçados por esses exemplos. Não defendendo que deverão ser

abandonados os exemplos, pode sim o professor, redobrar a sua atenção para as

justificações que os alunos apresentam, tendo o cuidado de perceber se os alunos

acertam pelas razões correctas. Vide o exemplos da área de um quadrado com 16 cm2,

perguntando qual o lado. O aluno que reponde 4, fez a raiz quadrada ou dividiu por

quatro, porque o quadrado tem 4 lados? A não atribuição de significado, pode levar o

aluno a centrar-se no método de resolução perdendo a noção do conceito. Vejamos o

que acontece que um aluno troca um termo de membro numa simples equação de

primeiro grau. Será que ele compreende o que está por detrás da obrigatoriedade da

passagem à operação inversa do termo?

Por seu lado Tall(1991), defende que na sua generalidade, os professores não

promovem a discussão dos conceitos apresentados, por terem medo do desconhecido.

Promover o debate nas aulas é caminhar no arame e sem rede, nunca sabendo onde nos

leva esse debate. Para além disso, a promoção do debate, leva a que a gestão do tempo

seja bastante difícil, existindo pois constrangimentos de vária ordem. Seja a nível do

cumprimento programático, seja da necessidade instituída de registos avaliativos desses

momentos, serão sempre factores que poderão desincentivar o professor a promover

esse mesmo debate. Acresce a isto, o medo da mudança. As comparações com colegas e

instituições que seguem linhas mais institucionalmente e culturalmente aceites, por

alunos pais e supervisores, são fontes de desencorajamento de aulas que promovam o

22

debate. Não sendo certo que os alunos atinjam os objectivos para que o debate foi

proposto, este poderá ser considerado pelos menos familiarizados com a riqueza deste

processo como uma perca de tempo.

Se teoricamente todos os temas, poderão promover debate entre os alunos, na

realidade há temas que se dispõem, melhor a uma metodologia de debate. No entanto o

mesmo Tall(1991) defende que o professor o pode fazer sempre que quiser

independente do tema. Curiosamente ele relata que, por vezes abandona a sala de aula

para que os alunos debatam um tema sem o constrangimento da presença do professor.

Sustenta ainda que mesmo que o debate não seja extremamente profícuo e

impulsionador de grandes descobertas, a tentativa dos alunos em participar na discussão

fez que todos, pelos menos, se apropriassem das ideias e construíssem sobre elas um

ponto de vista que pudessem defender no debate.

Por outro lado Vinner apresenta uma visão particular do ensino da matemática,

defendendo que não acredita na matemática para todos. Acredita nalguma matemática

para determinados estudantes. E mesmo assim, isso apenas é conseguido com a

pedagogia adequada e sob condições de aprendizagem apropriadas5

No entanto, a divisão entre futuros matemáticos e outros alunos, é justificável,

segundo Vinner pela necessidade, ou não, de apresentar tarefas que apelem

necessariamente à manipulação formal dos conceitos. Assim, a futuros matemáticos o

treino com a manipulação da formalidade é uma ferramenta imprescindível. Se o

conceito imagem for sempre suficiente para que o aluno resolva as tarefas, dificilmente

o conseguimos convencer a trabalhar com o conceito formal, pois, a maneira mais

(Vinner, 1991).

Desta forma, defende que o ensino da matemática terá que ser diferenciado, se ensinado

a futuros matemáticos, ou alunos com menos vocação matemática. Este autor apresenta

como um dos objectivos do ensino da matemática, a promoção da mudança de hábitos

de resolução das tarefas de um modo assente na experiência do dia-a-dia, para uma

metodologia que enfatiza as virtudes do conceito formal. Não quer isso dizer que estes

conceitos por si só, consigam criar uma estrutura bivalente conceito definição/conceito

imagem que consiga resolver qualquer tarefa. Pretende-se isso sim, que os conceitos

formais sejam apreendidos dentro de um contexto do dia-a-dia que seja facilitador da

sua apropriação, e não rodeados de um ambiente de abstracção técnica e formal que

sejam mais um entrave à efectiva apropriação dos conceitos por parte dos alunos.

5 We do not believe in “mathematics for all”. We do believe in some mathematics for some students. And even this can be achieved only by appropriate pedagogy under appropriate conditions for learning

23

natural de pensar é fazendo apelo sobretudo ao conceito imagem. Da mesma forma, o

professor deverá discutir exaustivamente os possíveis conflitos entre o conceito imagem

e o conceito definição, se estiver presente perante um conjunto de futuros matemáticos,

ou simplesmente evitar falar nesses conflitos, (que porventura, poderia ter mais

implicações negativas que positivas) se a sua plateia não tiver vocação matemática.

Dreyfus (1991), por seu lado defende que os professores apesar de saberem que o

processo de construção matemática envolve etapas, de tentativa e erro, resultando em

respostas parcialmente correctas, desenhos e esquemas imprecisos e afirmações vagas,

insistem em ensinar através de processos pouco flexíveis e altamente balizados. Este

tipo de ensino, tem virtudes, uma vez que permite uma melhor planificação do trabalho,

e apresenta um resultado completamente aceitável, quer pelos seus pares, quer pela

restante comunidade educativa. No entanto apresenta uma enorme desvantagem, que

resulta desta inflexibilidade. A linguagem utilizada, e a notação matemática nela

empregue poderão ser um entrave intransponível para alguns alunos. E claro que essa

dificuldade não se porá com alunos mais experimentados, e que dominem a linguagem

específica da disciplina, mas que infelizmente representam uma minoria.

Consequentemente, por vezes os professores, apresentam alguma dificuldade em

conseguir atribuir o “verdadeiro” grau de dificuldade às questões que levanta. Se para

um matemático experimentado como o professor, a dificuldade da questão que levanta,

poderá estar apenas nos conceitos matemático que está a abordar, na perspectiva do

alunos, existem barreiras de comunicação/compreensão decorrentes de factores como

interpretação frásica, incompreensão de notação matemática, desconhecimentos de

conceito básicos, e até mesmo dificuldades em perceber as limitações de um qualquer

objecto tecnológico entretanto utilizado. Apesar disso, há alunos que dominam os

“rituais” dos testes e as “perguntas tipo”, e que por isso são bem sucedidos no seu

percurso escolar, não sendo no entanto, matematicamente competentes. Na verdade o

que o aluno aprende no seu actual percurso escolar é uma fastidiosa lista de

procedimentos que os ajuda a ter sucesso. Estes alunos categorizam questões, resolvem-

nas de uma forma mais ou menos mecanizada, conforme o problema que lhes surge.

Consequentemente apresentam-se com grande rigidez de procedimentos, denotando

algumas dificuldades em realizar novas tarefas, devido à sua falta de flexibilidade de

raciocínio. Apesar de serem bem sucedidos escolarmente, onde aprenderam a chegar

aos resultados de uma forma mecânica, não desenvolveram uma atitude de “pensador

matemático”

24

Por outro lado Dreyfus apresenta a síntese e a generalização como pré requisitos

para atingir o pensamento abstracto. Essa síntese que permite uma manipulação de

grandes quantidades de conceitos interligados entre si pode ser um “Handicap” à

tomada de consciência das dificuldades inerentes à aprendizagem de determinados

conceitos. O matemático que consegue fazer esta compressão dificilmente consegue

fazer o percurso inverso, ficando no mesmo patamar que o aluno que vê os objectos

compartimentados e sem ligações significativas. Ainda assim, Dreyfus coloca uma

questão pertinente. Como podemos gerar estruturas mentais pelo processo de

abstracção, se as estruturas existentes estão demasiadamente ancoradas a uma noção

visual do conceito? E prossegue ainda perguntando, qual será o papel da imagem visual

no processo de abstracção? Não encontramos resposta para esta questão, no entanto, as

imagens podem servir como força agregadora que ajuda a manter a nova construção.

3.3 O papel das TIC

Dubinsky (1991) acredita que está nas TIC o caminho que ajuda os alunos a lidar

com os conflitos entre Esquemas que se contradizem. Assim, as TIC, poderão fazer com

que se suavizem esses conflitos, permitindo uma construção mais confortável dos novos

Esquemas ou estruturas matemáticas. O não acompanhamento de uma representação

física ou visual de uma determinado objecto matemático, pode tornar essa

aprendizagem, mais difícil. É nessa construção visual de entes eminentemente

algébricos, que as TIC, poderão ter um papel importantíssimo. Segundo Dubinsky,

actividades assistidas pelas TIC que complementem as diferentes representações dum

mesmo objecto, poderão permitir um capsular mais consistente dos conceitos

envolvidos.

Também David Tall, considera que o computador veio alterar a maneira de pensar

a matemática. Tall (1991) mostra-se espantado por perceber que as várias ilustrações

que fazia para precisar os conceitos que estava a leccionar, nem sempre ajudavam os

alunos a perceber a mensagem que este lhes queria transmitir. Tall, assenta grande parte

do seu trabalho, preocupado com a visualização dos conceitos. Para este autor, e julgo

que seja uma ideia consensual, a ideia de verbalizar, não visualizado os conceitos é tão

mau, quanto o inverso, ou seja ter uma ideia visual do conceito, sem perceber o que

aquela representação gráfica, implica.

Pelo que foi dito atrás, as TIC, que oferecem alternância a possibilidade efectiva

de uma alternância constante entre as várias representações do mesmo objecto,

permitindo uma consolidação de ligações entre as mesmas, desempenharão um papel

25

importante na construção das representações defendidas por Dreyfus. A Modelação de

um problema real, por exemplo, que toma forma utilizando as TIC poderá também

segundo Dreyfus ser considerado um caso de transferência de representações. A

modelação do caso real, que apesar de ser “apenas” a representação matemática do

fenómeno real, (e que pode mostrar-se ser bastante difícil para um aluno), permite a

criação da imagem mental do fenómeno real, por intermédio da representação

matemática.

Cada passagem de nível representada na figura anterior, reflecte grande parte das

propriedades da representação anterior, sendo que cada um deles envolve um diferente

grau de manipulação mental.

Representação matemática

Representação real

Representação mental

MODELAÇÃO PROCESSOS MENTAIS

Figura 9 – Diferentes níveis de representação de um objecto

26

4 – Abordagem qualitativa como metodologia na investigação.

4.1 Características da Metodologia Qualitativa A investigação utilizando uma metodologia qualitativa, surge da necessidade que

a ciência começou a sentir em descrever fenómenos de natureza social, centrado no

modo como as pessoas interpretam e atribuem significado aos acontecimentos que as

envolvem no seu quotidiano, e que não eram fielmente descritos pelas metodologias

qualitativas que emergiam das Ciências Exactas. A complexidade de comportamentos,

perspectivas e fenómenos sociais, assim o exigiam. A subjectividade inerente ao

comportamento do indivíduo, é visto a partir dessa altura, pelos investigadores das

ciências sociais e humanas, como sendo parte de um complexo conjunto social, onde as

interacções e reflexões que o indivíduo faz consigo e com os outros ajudam a explicar e

a prever as sua conduta.

Sendo eminentemente interpretativa, não se pode afirmar que a abordagem

qualitativa como metodologia de investigação, tenha uma origem específica, (existem

relatos de descrições pormenorizadas de problemas laborais e sociais na sociedade

Norte Americana do século XIX) mas podemos considerar que foi sendo construída ao

longo do século XX, influenciada por várias correntes: Filosófica, Antropológica,

Psicológica, Sociológica (com realce para a escola de Chicago) que começaram por

estudar os conturbados anos da primeira metade do século XX, atravessando duas

guerras mundiais, estabilizando na segunda metade do século, sendo a partir daí a sua

utilização na investigação em Educação, mais presente. É no entanto a partir dos anos

setenta que a investigação utilizando uma abordagem qualitativa teve um grande

desenvolvimento. As modificações surgidas nas disciplinas de Sociologia e

Antropologia, bem como o surgimento de uma preocupação mais vincada dos

investigadores educacionais, pela forma como os alunos faziam as aprendizagens, levou

a um maior desenvolvimento da investigação qualitativa.

Independentemente da sua influência primária, vários autores dividem-se

epistemologicamente no que concerne à utilização das metodologias. Enquanto que

alguns utilizam uma abordagem de “continuum” 6, outros preferem uma abordagem

“dicotómica entre abordagens qualitativas e quantitativas”. Autores como Miles e

Huberman7

6 Expressão utilizada por Wade e Evertson e generalizada por diversos autores, para ilustrar diferentes formas de observação e abordagens utilizadas de forma conjugada

deixam clara a sua posição ao afirmarem que “ as duas abordagens de

7 Miles, Matthew B e Huberman, Michael surgem na obra de (Lassard-Hérbert, Goyette, & Boutim, 2008) referenciados com o seu trabalho: “drawing valid meaning from qualitative data:toward a shared craft” in Education resarcher, pp20-30

27

investigação, a neopositivista e a neo-idealista, representam um continuum

epistemológico e não uma dicotomia”. Ao invés, Erickson8

A metodologia qualitativa, é apesar de tudo, bastante diferente da metodologia

quantitativa. Segundo, Bogdan e Biklen (2006), a metodologia qualitativa apresenta

cinco características da investigação qualitativa. A primeira característica, alude ao

facto que na investigação qualitativa, a fonte directa de dados é o ambiente natural e o

investigador é o elemento principal do processo. Na investigação em meio escolar, o

investigador emprega, grande parte do seu tempo na sala de aula, ou noutros locais onde

decorra a acção que quer estudar. Apesar de poderem utilizar vários instrumentos de

recolha de dados, muitas vezes esses dados recolhido de forma “mecânica”, sendo

frequentemente complementados por observações pontuais mais ou menos descritivas

que o investigado faz da situação no seu bloco de notas. Esta investida no terreno, é

fundamental no estudo qualitativo, pois a cena onde decorre a actividade necessita de

ser contextualizada e compreendida, sendo que as acções observadas, não podem ser

vistas fora do seu contexto, sob o perigo de perderem o seu significado.

advoga uma “distinção

dicotómica entre as duas famílias” (Lassard-Hérbert, Goyette, & Boutim, 2008). Na

verdade, será talvez mais sensato entender que a riqueza da conjugação poderá ser

claramente mais rica do que a rigidez da separação.

A segunda característica aponta para o facto de a investigação qualitativa ser

descritiva. Os dados recolhidos pelos investigadores, são na maioria descrições de

cenários ou acções, onde se destacam os relatos escritos, ou imagens em vez de dados

numéricos. Esses dados que aparecem sob a forma de palavra, podem ser

representativos de entrevistas, notas de campo, citações, transcrições de documentos,

documentação oficial. A análise de todos este dados é minuciosa, por forma a não

desprezar qualquer elemento, mesmo que este seja à partida pouco relevante. A ideia da

não trivialidade das recolhas, permite que todas elas sejam analisadas no pressuposto

que todas poderão auxiliar na busca do conhecimento. A descrição, torna-se assim no

meio mais adequado ao estudo de uma realidade onde a densidade de pormenores é

elevada.

A terceira característica refere-se ao facto de que os investigadores qualitativos

interessam-se mais pelo processo do que simplesmente pelos resultados. Tomando

como exemplo a investigação que é realizada na sala de aula, compreender o modo foi

feita a negociação e implementação de certas normas que passaram a estar enraizadas, e

8 Erickson, Frederick surge na obra de (Lassard-Hérbert, Goyette, & Boutim, 2008) referenciado com o seu trabalho “Qualitative methods in research on teaching” in M.C. Wittrock, Handbook of reasearch on teaching, Nova Iorque, Macmillan pp.119-161.

28

inquestionavelmente aceites por todos os actores da sala de aula, torna-se mais

importante do que enumerar as próprias normas.

A penúltima característica diz respeito à forma como os investigadores

qualitativos tendem a analisar os seus dados de forma indutiva. Este tipo de

investigação não é realizado com o intuito da confirmação de hipóteses ou teses,

altamente estruturadas à partida. O investigador que utiliza uma abordagem qualitativa,

não prende provar qualquer hipótese previamente estabelecida. O seu intuito, prende-se

com o facto de à medida que vai recolhendo dados sobre a sua investigação, ir

construindo a tua teoria. Esses dados, depois de analisados, vão marcando a cadência e a

direcção da investigação. Não se caindo no absurdo de investigar algo sobre o qual não

se tem qualquer ideia, é no entanto desejável que o investigador não apresente

preconceitos quanto ao caminho que o seu trabalho possa vir a, obrigado a tomar,

depois de uma análise da recolha de dados. É pois desejável que se parta para a

investigação com uma abertura de espírito que permita que seja o encadeamento das

evidências recolhidas a orientar o caminho rumo à compreensão dos fenómenos. A

investigação é conduzida através de permanente “debate” entre o investigador e os

dados que recolheu. Poderíamos chamar-lhe de “debate condutor da investigação”.

Finalmente a quinta característica, apresenta o significado como de importância

vital na abordagem qualitativa. Os investigadores qualitativos, receiam que a sua visão

dos acontecimentos apresente um significado para si diferente, do que o significado

atribuído pelos sujeitos objectos do estudo. Essa inquietação, lava-os por vezes a

apresentar os dados recolhido aos sujeitos por forma a que eles “validem” a

interpretação e descrição feita pelo investigador do fenómeno. A condução do processo

de investigação, muitas vezes, reflecte essa preocupação com as experiências vividas

pelos sujeitos, e o significado que é atribuído a cada uma das suas acções.

No trabalho que me proponho realizar tentarei assistir a aulas de colegas por

forma a estar mais liberto e atento para factores de aprendizagem, que por vezes escapa

ao olhar, mesmo do professor mais experimentado, uma vez que a sua atenção está

desperta para outros factores, como sejam o sucesso do alunos em testes e exames,

realização de tarefas específicas, cumprimento das regras do regulamento interno da

escola… A atenção do investigador, poderá estar mais preocupada com registos que os

alunos façam, ou por comentários mais ou menos audíveis que os alunos compartilhem

com os colegas sobre uma ou outra actividade. Ainda a envolvência espacial, ou a

29

utilização de meios TIC deverão ser alvo de análise, podendo daí advir pistas para a

compreensão do pensamento matemático do aluno.

Consequentemente julgo que numa investigação deste género, uma abordagem

qualitativa, poderá ser aquela que melhor poderá servir os interesses da investigação.

Entrevistas, análise presencial da performance dos alunos, análise documental

(cadernos, testes, fichas de trabalho), deverão ser utilizadas como forma de recolha de

dados. Também experiências de ensino poderão vir a ser utilizadas.

4.2 Métodos de recolhas de dados na Investigação Qualitativa

4.2.1 Trabalho de Campo A abordagem utilizando uma metodologia qualitativa “obriga” o investigador a

realizar um trabalho de campo, podendo ele tomar várias formas (retomaremos isso

mais a diante).

Um investigador quando vai para o trabalho de campo terá que se consciencializar

que esse trabalho poderá vir a ser duro, de um ponto de vista físico, mas sobretudo

mental. O embrenhar-se num mundo ou numa realidade que possa a não vir ser a sua,

exige uma mentalização árdua e obriga a um forte rigor pessoal. Vários têm sido os

relatos de investigadores que após terem terminado o trabalho de campo, se sentem

pessoas diferentes em relação ao princípio da investigação. Muitas vezes a reflexão que

este tipo de trabalho compele, leva a alterações do self do investigador. O investigador

deve-se apresentar em campo numa postura de humilde aprendente e de não

superioridade, em relação aos sujeitos que vai estudar, utilizando um estilo de

proximidade preferencialmente informal. O objectivo é de compreender o que é ser

como o sujeito, sem fazer juízos de valor, de aceitação, ou de reprovação sobre

quaisquer dos seus procedimentos, sejam eles complexos, ou mesmo, mais simples. A

postura do investigador em campo pode ser mais ou menos participante, dependendo,

sobretudo, da metodologia escolhida para fazer o estudo e numa primeira fase, da

estratégia escolhida para realizar a recolha de dados. Neste tipo de estudo, o

fundamental é que o investigador não seja visto como um intruso devendo seguir as

regras e os horários vigentes, de modo a que a sua presença não seja um factor de

destabilização e que turve ou altere os processos naturais da população ou indivíduos a

estudar.

30

O investigador que poderá ser observador, ou participante, não o deverá fazer de

forma excessiva, para que não corra o risco de não conseguir registar tudo o que é

realizado, absorto que está na sua participação. Outro risco que deverá evitar é o de se

tornar demasiado “nativo” (Geertz, 1989) subvertendo assim a sua imparcialidade de

investigador, que tinha como primeiro objectivo descrever sem obrigatoriamente

explicar, o processo escolhido a estudar. O investigador de campo terá que ser bastante

imaginativo, na medida que conduz a sua investigação. O observador, as suas

convicções, formação, aptidões e ferramentas utilizadas para a recolha e análise de

dados é o grau de subjectividade inerente a esta metodologia.

Apesar da abertura na formulação do estudo, o investigador não vai totalmente

“despido” para o campo, na total expectativa do que vai acontecer. Antes dessa partida,

existe pelo menos uma ideia conceptual do que se pretende estudar e como o fazer.

Haverão certamente questões alinhavadas e outras que surgirão com o decorrer da

investigação. Esta abordagem tenta encontrar um compromisso entre a indução e a

dedução.

Não sendo consensual, o momento da revisão bibliográfica, julgo que fará sentido

ser feita ainda com o investigador em campo, uma vez que essa revisão poderá permitir

o levantar de novas questões, a consciencialização de outras perspectivas e até mesmo

para junto dos sujeitos, aproveitar para explorar caminhos novos na investigação.

4.2.2 Sistemas de Observação

Em relação à observação realizada pelo investigador no terreno, ela pode ser directa

(quando o investigador, não toma parte da acção) ou participante ( em que, como o

nome indica, é um actor no processo a investigar).

Utilizemos para ilustrar esta temática as quatro classes de sistemas de observação

categorizadas por Evertson e Green9

9 Evertson, Caroline e Green, Judith L. surgem na obra de (Lassard-Hérbert, Goyette, & Boutim, 2008) referenciadas com o seu trabalho “Observation as inquiry na method” in M.C. Wittrock, Handbook of reasearch on teaching, Nova Iorque, Macmillan pp.162- 213.

:1) categoriais, 2) descritivos; 3) narrativos; 4)

tecnológicos. Paralelamente, estas formas de recolha de dados na observação, poderão

ser consideradas de abordagens fechadas e mais ou menos abertas, sendo que as

categoriais, são as fechadas e as outras três consideradas de abertas, dentro das quais a

abordagem de recolha tecnológica se destaca pelo seu maior grau de liberdade.

31

Erickson, no entanto, crítica uma abordagem que envolva uma organização por

categorias, por considerar que a existência de uma categorização pré-definidas

pressupõe uma uniformização de comportamentos, e uma previsão real dos mesmos. No

extremo oposto, encontramos os registos tecnológicos (gravações áudio, gravações

vídeo etc.) que reproduzem fielmente o que se passou no terreno não estando sujeito à

interpretação mais ou menos subjectiva do investigador. É óbvio, que a hora, o dia, a

forma, a colocação dos meios tecnológicos estão sujeitos à vontade do investigador,

mas a partir desse momento, o investigador não interfere mais na interpretação da

realidade.

Segundo Evertson e Green, os três sistemas abertos (descritivos, narrativos,

tecnológicos) poderão conter uma preparação ou pré-categorização à partida, mas estão

sempre disponíveis para a (re)formulação e até à criação de (sub)categorias.

Os sistemas descritivos, desempenham um papel importante na reformulação de

caminhos e estratégias, pois o esforço de reflexão realizado pelo investigador ao

descrever os acontecimentos, pode gerar novos pontos de interesse para a sua e novas

investigações.

Os sistemas narrativos, são transcrições integrais da situação, recorrendo a uma

linguagem utilizada pelos actores no momento dos acontecimentos. Essa riqueza poderá

ser fundamental para a interpretação dos factos.

Os sistemas tecnológicos, são aqueles que apresentam a “fotografia” fiel do

momento. É capaz de captar várias perspectivas, perpetuando integralmente o momento,

permitindo a sua (re)análise, tantas vezes quanto o necessário.

A outra forma de observação (mais activa) é a observação participante. Aqui “ é o

próprio investigador o instrumento principal de observação” (Lassard-Hérbert, Goyette,

& Boutim, 2008 p.155). A observação participante obriga o investigador a tornar-se

“nativo” (Geertz, 1989). O investigador vai compreender melhor o meio social dos

sujeitos, pois vai viver e “sentir” o decorrer dos acontecimentos tal e qual os sujeitos.

Mesmo a observação participante, poderá segundo Evertson e Green, ser considerada de

mais ou menos envolvida, sendo que, se o investigador se preocupa fundamentalmente

em retirar as suas notas e recolher dados no momento, será designada de “menos

envolvida”, enquanto que se a prioridade do investigador for estar enleado no

acontecimento e retirar as suas notas à posteriori, isso poderá ser apelidada de

observação participante “mais envolvida”.

32

É fundamental, na observação participante, o observador minimizar o efeito da

sua presença no terreno, conhecido pelo “ efeito do observador” (Bogdan & Biklen,

2006 p.68). Por muitos cuidados e integrado que esteja na realidade a estudar, o

investigador terá que ter sempre presente que não pertence ali e que não poderá de

forma alguma turvar o normal decorrer dos acontecimentos sob pena dos dados

recolhidos não serem fiáveis.

Também a entrevista, pode ser muitas vezes utilizada na observação participante.

Esta entrevista, tal como acontece quando existe mais que uma modalidade de

observação, poderá servir, quer de complementaridade de outros dados, bem como

factor de triangulação e validação de outras formas de recolher dados. A entrevista vista

desta perspectiva, poderá dessa forma corrigir impurezas que possam ter surgido através

de outras modalidades de recolha de dados.

4.2.3 Entrevistas As entrevistas podem ser usadas como estratégia dominante na recolha de dados, ou

conjuntamente com a análise de outros documentos. Na observação participante,

geralmente a entrevista tem um carácter aberto e informal, podendo-se assemelhar a

uma conversa entre amigos. No entanto elas podem variar bastante no seu grau de

estruturação. Poderemos ter entrevistas muito estruturadas seguindo um guião

previamente estabelecido e com perguntas escolhidas previamente e direccionadas para

aspectos específicos da vida do entrevistado; ou como já foi referido anteriormente,

bastante abertas, em que o investigador encoraja sobretudo o adulto a falar, dando

liberdade à sua narrativa, e acompanhando apenas o raciocínio utilizando porventura

anuências quer gestuais, faciais ou mesmo frásicas. Obviamente que o entrevistador,

poderá entrevir, mas fá-lo-á sobretudo no sentido de pedir ao entrevistado para clarificar

alguma ideia que não tenha percebido, partindo do princípio que foi o seu entendimento

da situação que não lhe permitiu perceber o discurso do entrevistado, e não que este

tenha dito algo fora de sentido. Neste tipo de entrevista, o entrevistado, tem como é fácil

de perceber, um papel fulcral.

Não é necessário usar-se um tipo de entrevista em detrimento do outro. Podemos

arranjar uma situação de compromisso entre as duas perspectivas. No entanto, deverá

ser o âmbito do estudo a “decidir” o grau de estruturação da entrevista.

Porventura numa primeira fase, poderá optar-se por uma entrevista mais aberta,

ajudando a conhecer os sujeitos e de forma a poder encontrar novos pontos de interesse

33

para o estudo. Consequentemente, numa segunda fase, a entrevista poderá assumir uma

condição mais estruturada e focalizada nos objectivos que se pretendem estudar.

O entrevistador terá que promover um tal ambiente na entrevista que irá fazer com

que minimize um dos problemas que a entrevista pode trazer; o facto do entrevistado

dizer, não o que realmente sabe e pode transmitir, mas apenas referir aquilo que o

entrevistador espera que ele diga. Esta situação é frequente e passou-se comigo há uns

anos quando fazia entrevistas a candidatos a determinados cursos de informática.

Sabendo os entrevistados, que tinham que mostrar competências mínimas para poderem

ser aceites para a frequência do curso, não eram verdadeiros nas suas respostas quando

questionados sobre os seus pré-requisitos, afirmavam ter bastantes conhecimentos de

novas tecnologias, de modo a serem aceites. Assim sendo, a expectativa da resposta,

terá que ser algo que o entrevistador terá que evitar de modo a encorajar o entrevistado a

explanar o seu raciocínio de forma livre e sem constrangimentos, tornando-se assim

numa entrevista bastante mais rica na perspectiva da investigação. Mesmo que o

entrevistado seja “hostil” ou que profira afirmações desagradáveis de índole religiosa,

pejorativa ou racista, o investigador deverá reprimir qualquer impulso de criticar o

entrevistado, procurando, isso sim, compreender o porquê daquela atitude ou

declaração. De qualquer forma, o entrevistador, não deverá desistir de uma entrevista,

pois até uma “má” entrevista, poderá levantar hipóteses e apontar caminhos novos à

investigação.

Como já vimos, a entrevista pode ser mais ou menos elaborada e orientada

conforme os objectivos traçados para a mesma. Werner e Shoepfle10 consideram que a

entrevista poderá servir para o investigador assegurar se a sua interpretação dos factos

corresponde àquilo que os sujeitos estudados na realidade sentem ou experimentam.

Curiosamente, estes autores defendem que a entrevista pode ser utilizada não só para

corroborar dados anteriormente recolhidos, mas sobretudo para descobrir

incongruências resultantes dessas recolhas. Esta entrevista é bastante directiva e tenta

esclarecer pontos específicos da investigação. Uma outra perspectiva é apresentada por

Pourtoid e Desmet11

10 Werner,Oswald e Shoepfle, G. Mark surgem na obra de (Lassard-Hérbert, Goyette, & Boutim, 2008) referenciados com o seu trabalho “Systematic fieldwork, volume1, Foudations of ethnography and interviewing, Newbury Park, Sage .

, que defendem que a entrevista deverá decorrer a montante de

outros tipos de recolha de dados pois o seu carácter aberto, é um instrumento primordial

para abrir caminhos na investigação e até mesmo organizar categorias de observação.

Condensando um pouco as duas perspectivas anteriores temos o trabalho de Powney e

11 Pourtois, Jean-Pierre e Desmet, Huguette surgem na obra de (Lassard-Hérbert, Goyette, & Boutim, 2008) referenciados com o seu trabalho “Épistemologie et instumentation en sciences humaines, Bruxelas, Pierre Mardaga 235 p.

34

Watts12

que apresentam duas propostas: 1) a entrevista orientada para a investigação

(mais aberta, e que possibilita uma abertura de rumos na investigação); 2) a entrevista

orientada para a resposta (mais estruturada e dirigida).

4.2.4 Análise de Dados

A análise de dados depois da saída de campo, envolve uma organização,

categorização e síntese dos vários documentos, notas, relatos, entrevistas, etc. Esta

tarefa pode ser suavizada se alguma da triagem for sendo feita durante a recolha dos

mesmos. Este processo de crivagem terá que ser feito com o máximo de critério e de

ponderação de modo a que nenhuma informação importante ou potencialmente

importante possa vir a ser perdida. Esta triagem em campo, poderá parecer um

paradoxo, em relação ao que foi dito atrás, no que concerne à preocupação mestra que

orienta a actividade de campo, que é a da recolha de máxima informação. Na verdade,

não é um contra censo, pois nalguns casos e quando isso é possível, o investigador,

retorna ao campo depois de uma primeira análise da documentação. Estes regressos ao

campo, visam esclarecimentos sobre acontecimentos e processos que não ficaram

esclarecidos numa primeira abordagem. Este novo aparecimento do investigador em

campo poderá estruturar-se de uma forma um pouco diferente em relação à sua primeira

aparição. Nestas fases posteriores, o estudo já vai à partida mais orientado, categorizado

e segmentado, por forma a ajudar o investigador na nova recolha de dados. O que atrás

foi dito, não invalida que se mantenha o objectivo da metodologia qualitativa, centrado

na interpretação de costumes processos e procedimentos e não na procura de causas

para esses mesmos processos.

Esta análise de dados ainda em campo, pode ser extremamente orientadora dos

passos subsequentes. A ida-e-volta entre o campo de investigação e a análise de

informação recolhida é fundamental no que toca à orientação da investigação em si,

ajudando à formulação de novas questões e à reformulação de outras, já anteriormente

colocadas aos sujeitos. Pode ser ainda importante, a definição dos tempos da pesquisa e

dos tempos do “backoffice”, fazendo com que aquela sensação de incerteza sobre qual a

altura ideal para abandonar o terreno, seja mais convincentemente tomada.

O material conseguido em campo não são dados, mas sim uma fonte de dados que

efectivamente passarão a dados depois de peneirados. Na obra de (Lassard-Hérbert, 12 Powney,J. e Watts,M. surgem na obra de (Lassard-Hérbert, Goyette, & Boutim, 2008) referenciados com o seu trabalho “Interviewing in educational Research , Londres, Routledge & Kegan Paul

35

Goyette, & Boutim, 2008), podemos conhecer a perspectiva de Van der Maren13

A interpretação dos dados poderá implicar o regresso (ou a continuação) do

investigador ao campo. Da interpretação dos dados nascem novas questões ou

conclusões, provisórias ou temporárias, que apenas poderão ser esclarecidas

regressando ao campo e recolhendo novos dados utilizando os mesmos ou outros

métodos de recolha. Nesta altura de aclaração de informação, a entrevista poderá ser

uma técnica bastante utilizada e valorizada, dado o seu carácter argumentativo entre

entrevistador e entrevistado. Esta fase interpretativa dos dados posterior à sua

organização é “criadora de sentido” (Lassard-Hérbert, Goyette, & Boutim, 2008, p.123).

que

defende a recolha e redução de dados de forma simultânea, chamando-lhe “redução das

particularidades” que nos transporta para a codificação dos dados no momento da sua

recolha, para uma melhor compreensão dos mesmos.

Uma segunda fase de interpretação de resultados (posterior e diferente da

preconizada numa primeira fase por Van der Maren que serve sobretudo para uma

codificação e triagem dos dados), está num nível superior e espera-se que dessa

interpretação possam sair novas conclusões.

4.3 Cientificidade, Validade e Fiabilidade

Algumas das críticas, realizadas a este tipo de metodologia, prende-se com a

cientificidade, com a validade e fiabilidade dos dados obtidos. Há quem advogue que

não se deve perder tempo com critérios que assegurem a cientificidade do método, uma

vez que o paradigma se sobrepõe a um conjunto de regras que poderão ser pré-

estabelecidas e que certamente não terão aplicabilidade a todos os casos em

investigação. Estes partidários, acham que a concepção paradigmática do estudo garante

ética e cientificidade, mais do que qualquer regra.

Também a subjectividade inerente a este tipo de metodologia de investigação, é por

vezes atacada por vários autores. Porém, a objectividade pode ser atingida, pela

consciencialização da subjectividade que a metodologia comporta. A riqueza da

descrição, e as técnicas de recolha, permitem uma discussão e explicitação na

construção do conhecimento. A busca da objectividade (não como a conhecemos nas

13 Van der Maren, Jean-Marie surge na obra de (Lassard-Hérbert, Goyette, & Boutim, 2008) referenciado com várias obras editadas pela Universidade de Montereal.

36

metodologias quantitativas) mas como descrição exaustiva e “ densa” (Geertz, 1989) da

realidade está intimamente ligada à validade e cientificidade (tão atacadas) desta

metodologia.

A fiabilidade e validade, são também algo que preocupa os investigadores que

utilizam metodologias qualitativas. A fidelidade tenta assegurar se os dados foram bem

recolhidos, e se não houve algures no processo algo que pudesse turvar a sua lealdade,

ou seja, aquilo que se pensa e como se pensa dos dados.

Convictos que todas as metodologias poderão ter os seus pontos mais fortes e mais

fracos, investigadores qualitativos reagem às críticas contra-atacado as metodologias

quantitativas. Erickson por exemplo citado na obra de (Lassard-Hérbert, Goyette, &

Boutim, 2008) “critica a validade teórica da abordagem positivista/behavorista que

pretende inferir significados a partir de comportamentos (acções) dos sujeitos inquiridos

sem tomar em consideração a perspectiva dos próprios indivíduos, ora é precisamente

nessa tomada em linha de conta das perspectivas destes que se baseia a validade teórica

da abordagem interpretativa”. Além disso, outras críticas são apresentadas aos

investigadores quantitativos como sejam: a não procura de dados que contrariem as suas

hipóteses, apenas procurando dados que as confirmem; a falta de triangulação de dados,

recolhendo dados por vezes só com um instrumento; o investigador qualitativo tenta

confirmar as suas hipóteses, não reformulando as mesmas à medida que vai

interpretando resultados. Estas criticas às metodologias quantitativas, são por seu lado,

tomadas como pontos fortes a favor da validação e cientificidade da metodologia

qualitativa. Também as longas temporadas que o investigador por vezes necessita de

passar em campo, acredita-se contribuir para a fiabilidade dos dados recolhidos, pois o

tempo tende a atenuar algum do grau de subjectividade que o investigador leva consigo.

O aspecto da triangulação, toma assim um relevo particular, seja a triangulação feita

através de recolha de elementos através de mais de uma técnica de recolha (entrevistas,

observação participante, observação sistémica, análise documental, etc.) bem como

através da presença de um outro investigador que perante os mesmos dados, deverá

apresentar não obrigatoriamente as mesmas conclusões, mas que obrigatoriamente não

poderá apresentar conclusões diametralmente opostas. Também a devolução das

interpretações que o investigador fez da sua jornada no terreno aos sujeitos estudados,

por forma que eles consigam expressar se aquilo que quiseram transmitir, foi de facto a

mensagem que o investigador captou, tornou-se um meio muito apreciado e que

consistencía a qualidade dos dados recolhidos.

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Outro aspecto por vezes “atacado” e que está muitas vezes associado à ideia de

cientificidade, é a ideia de universalidade das conclusões retiradas de uma investigação

utilizando uma metodologia qualitativa. É necessário que fique claro que, não se

pretende por isso, com este tipo de metodologia uma “ universalidade de princípios”,

mas sim a interpretação de “pequenas” realidades que ajudem a compreender as

problemáticas que as afectam. Domingos refere que “desta forma, em vez de estarem

preocupados com o facto de os seus resultados serem generalizáveis, procuram saber se

outros contextos e sujeitos podem ser expostos a estes resultados” (Domingos, 2003)

5 - Escolha dos participantes.

Os participantes serão alunos de uma ou mais turmas de Escola(s)

Básicas/Secundárias do ensino público em Portugal. Não estando certo ainda do(s)

ano(s) de escolaridade a estudar, a selecção dos alunos será uma escolha de

conveniência, atentando também às suas classificações internas e externas. Iremos

categorizar, os grupos de alunos por forma a obtermos resultados com alunos de vários

“níveis”

6 - Recolha e análise de dados.

Tal como foi referido anteriormente, a recolha directa de informação bem como, a

análise documental, serão elementos primordiais na recolha de dados. Tentarei assistir a

aulas leccionadas por outros professores registando as dúvidas, e questões levantadas

pelos alunos. A análise das respostas escritas dos alunos também será uma ferramenta

de trabalho. Entrevistas, mais ou menos estruturadas, conforme a informação que se

queira aferir, poderão ser utilizadas, em qualquer altura do processo.

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7 – Cronograma das acções do projecto ao longo do tempo.

A calendarização poderá a todo o momento ser alterada, mas numa primeira

abordagem podemos esquematiza-la no seguinte diagrama Gantt

8 - Recursos. Que recursos serão necessários para implementar o estudo?

Por ora ainda não estão equacionados os recursos a utilizar

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9. Bibliografia

Bass, H. (1998). Research on university-level mathematics education: (Some of) what is need,and why? On the Teaching and Learning of Mathematics at University Level. (Pre-proceedings). ICMI, (pp. 7-8). Singapura.

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Domingos, A. M. (2003). Compreensão de Conceitos Matemáticos Avançados - A Matemática no Ensino Superior. Dissertação apresentada para a obtenção do grau de Doutor em Ciências de Educação . Lisboa.

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Vinner, S. (1991). The role of definitions in the teaching and learning of mathematics. In D. Tall, Advanced Matehmatical Thinking (pp. 65-81). Dordrecht, Netherlands: Kluwer Academic.

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10. Índice de Figuras Figura 1- Teoria APOS ................................................................................................................... 8 Figura 2 - Características Pensamento Processual vs Pensamento Proceptual .......................... 13 Figura 3 – Relação recíproca entre o Conceito Imagem e o Conceito Definição ........................ 15 Figura 4 – Construção do Conceito Imagem baseado no Conceito Definição ............................ 16 Figura 5- Interacção recíproca entre o Conceito Imagem e o Conceito Definição ..................... 16 Figura 6 – Dedução puramente formal ....................................................................................... 16 Figura 7 – Dedução construída através de um caminho de originariamente intuitivo .............. 17 Figura 8 – Resposta de carácter intuitivo .................................................................................... 17 Figura 9 – Diferentes níveis de representação de um objecto ................................................... 25