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195 PAINEL AINEL AINEL AINEL AINEL 16 16 16 16 16 PROJETO PEDAGÓGICO: POR QUÊ, QUANDO E COMO – EDUCAÇÃO INFANTIL Cristina Mara da Silva Corrêa e Delba Rejania Santos Alessandra Latalisa de Sá e Ana Cristina Coura Cheib Sônia Regina da Silva Souza

PROJETO PEDAGÓGICO: POR QUÊ, QUANDO E COMO

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PROJETO PEDAGÓGICO:POR QUÊ, QUANDO E COMO –EDUCAÇÃO INFANTIL

Cristina Mara da Silva Corrêa e Delba Rejania Santos

Alessandra Latalisa de Sá e Ana Cristina Coura Cheib

Sônia Regina da Silva Souza

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A partir da segunda metade do século XX, foipreciso repensar o atendimento institucional àscrianças de 0 a 6 anos, em razão de alguns fatos,tais como: a incorporação das mulheres de clas-se média no mercado de trabalho, o crescimen-to rápido e desordenado das grandes cidades ea falta de espaço para brincadeiras de criançasnesses grandes centros. No Brasil, após o regi-me militar, o atendimento às crianças pequenasé pensado como uma necessidade para crian-ças carentes, numa atitude especialmente com-pensatória. A partir dessa concepção, ganharamincentivo do governo as entidades filantrópicasque atendiam as crianças em regime basicamen-te assistencialista.

Na década de 1970, as teorias de privaçãocultural contribuíram para explicações sim-plistas da marginalidade das camadas sociaismais pobres, reforçando, assim, o caráterassistencialista e compensatório das propos-tas de atendimento às crianças pequenas,oriundas de camadas sociais desfavorecidas.

Por causa desse contexto, as propostas detrabalho, tanto para as crianças em creche,como para as em pré-escolas públicas, cen-travam-se basicamente nos cuidados higiêni-cos e alimentares. Paralelamente a isso, hou-ve alguma ampliação do atendimento pré-es-colar privado não baseado nas mesmas con-cepções daquelas orientadoras das institui-ções públicas. Assim, as propostas de umaeducação voltada para a criatividade, a socia-lização e o desenvolvimento infantil orienta-vam quase que exclusivamente as condutaspara o atendimento das crianças de classessociais favorecidas. E eram propostas que sepautavam por estudos e pesquisas da psicolo-gia do desenvolvimento, bem como por novasestratégias pedagógicas.

Considerações sobre a organizaçãodo Projeto Educacionalna Creche Central da USP

Cristina Mara da Silva Corrêa e Delba Rejania Santos

Creche USP/SP

Também, durante esse período, os movimen-tos populares ganharam expressão como meca-nismos de pressão política. Uma das reivindica-ções presentes nesses movimentos referia-se àcreche como um direito do trabalhador. Foi nes-se cenário que o movimento de luta por crechesganhou força dentro da Universidade de São Pau-lo, iniciado por um grupo de mães funcionárias.Em 1982, foi inaugurada a primeira das quatrocreches existentes hoje na universidade. Desdea sua criação, a creche teve como pressuposto otrabalho centrado na criança e nas relações fa-mília/creche, criança/criança, adultos/crianças.

Com o objetivo de promover o desenvolvi-mento afetivo, físico e intelectual das crianças,a creche da USP foi planejada como espaço deinteração e respeito à criança e à família, con-siderando os direitos destas à atenção de qua-lidade, que conjugava o cuidado e a Educação.O espaço físico foi construído e organizadopara atender às necessidades das crianças, numambiente agradável e aconchegante. Outra ca-racterística dessa creche sempre foi a hetero-geneidade da população, com vagas destinadasa funcionários, docentes e alunos da universi-dade. Além disso, sempre foi função da crecheacolher investigações de pesquisa de alunosmatriculados nos cursos de graduação e pós-graduação das diversas faculdades.

Um aspecto igualmente importante, desdea implantação da primeira creche, foi a defesado livre acesso dos pais ao ambiente da insti-tuição, o que se evidencia na proposta de aco-lhimento/inserção da criança, feita semprecom a presença dos pais ou de adultos signifi-cativos para os pequenos. No que diz respeitoà formação da equipe de trabalho, atuam des-de o início, dentro das creches, profissionaisde Saúde, Nutrição, Psicologia e Pedagogia.

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Mesmo tendo sido organizada dessa manei-ra, nos primeiros anos de atuação, notava-se queo trabalho acabava por acontecer de forma que oatendimento às necessidades das crianças, prin-cipalmente os cuidados, eram os que orientavama rotina na creche, sendo que os trabalhos desti-nados às atividades pedagógicas ocorriam, namaioria das vezes, sem intencionalidade. As for-mações do grupo de funcionários aconteciam es-poradicamente e participavam delas somente aseducadoras, na época denominadas recrea-cionistas, segundo a carreira da universidade. Emgeral, as discussões se concentravam nas relaçõescom as crianças, em casos individuais ou nas ca-racterísticas de uma determinada faixa etária.

Apesar de não existir um espaço para pla-nejar e registrar o trabalho desenvolvido comas crianças, alguns educadores, por iniciativaprópria, cultivavam o hábito de trocar expe-riências e informações a respeito do trabalhoe da rotina do grupo ao qual pertenciam,usando para isso os momentos de sono dascrianças ou mesmo momentos fora de seuhorário de trabalho.

Com a ampliação da creche e o início doatendimento a crianças maiores de três anos,sentiu-se a necessidade de organizar o traba-lho. Muitas dúvidas foram surgindo, e, comelas, veio a necessidade de um projeto edu-cacional que pudesse interligar as diferentesáreas que atuavam na creche, bem como dadefinição de uma política de formação de to-dos os sujeitos implicados na educação dascrianças. Além disso, parecia necessária umaorganização equilibrada da rotina, que tradu-zisse melhor a concepção de criança, Educa-ção e família já presente na creche.

No momento em que se deu a estruturaçãodo projeto educacional, levaram-se em conta ocompromisso da instituição com a formação in-tegral da criança de 0 a 6 anos, o número de ho-ras que elas passam na instituição e quantosanos ficariam ali. A partir dessas considerações,foi necessário algo que organizasse o tempo, oespaço, as necessidades quanto aos cuidadosdas crianças e as ações que identificavam a cre-che como espaço educativo.

O atendimento em horário integral impli-ca a responsabilidade pelo desenvolvimento

dos cuidados e da aprendizagem, integrando-se, assim, as áreas de Saúde e Nutrição. Tor-nou-se também necessária a seleção dos con-teúdos a serem trabalhados com o objetivo degarantir experiências diversificadas a todas ascrianças que freqüentam a instituição. A for-ma como foi estruturada a rotina reflete a con-cepção que se tem da criança, como ser capaze competente, e do educador, como profissio-nal capacitado para intermediar as relaçõesentre as crianças e destas com o conhecimen-to. Além disso, garantia-se o direito de acessoao conhecimento. A rotina tem como objetivooferecer às crianças um equilíbrio entre ativi-dades dirigidas, brincadeiras, higiene, alimen-tação e tem como intenção garantir a interaçãodas crianças do grande grupo (todas as crian-ças do módulo) no pequeno grupo (cada umdos quatro grupos de um módulo) e a integra-ção de faixas etárias diferentes.

Várias ações deram formato ao projetoeducacional. Uma delas foi a implementaçãodo que se chamou Estudo da Realidade (ER),que, na época, compreendia discussões a res-peito das necessidades identificadas no coti-diano do trabalho, no que dizia respeito tan-to às suas organizações práticas, como àsinterfaces entre os diversos grupos da insti-tuição. Durante o tempo em que foi realiza-do, o Estudo da Realidade permitiu identifi-car essas necessidades e propor encaminha-mentos, garantindo a participação coletiva naorganização do trabalho. A partir de então, oentendimento sobre o trabalho com criançaspequenas ficou mais claro para todos os seg-mentos da creche.

Uma das conseqüências dessas discussõesfoi a organização de metas de trabalho ao lon-go dos anos, entre as quais está a formaçãode um espaço de conversa entre educadorese grupos de apoio. Surge, então, o projeto deOficinas, desenvolvido com os grupos de lim-peza, cozinha e lactário, que tinha como pro-posta não somente a confecção de materiaise brinquedos, mas um espaço para a forma-ção desses funcionários. Durante os traba-lhos, havia troca de experiências, discussõessobre o desenvolvimento infantil, bem comoo resgate da memória desse grupo em relação

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às suas brincadeiras de infância, que podiamdepois ser transmitidas às crianças.

Assim, a construção do projeto educacio-nal foi um processo coletivo e o Estudo daRealidade, ou seja, o levantamento de dis-cussões com a comunidade da creche, paraelaborar, discutir e desenvolver esse proje-to, foi um grande aliado. O tempo para a for-mação dos educadores foi uma das condiçõesapontadas, tendo sido implementado ao lon-go dos anos.

Em razão do horário de atendimento àscrianças, existe troca de turnos de educado-res entre os períodos da manhã e da tarde, e oplanejamento das atividades é feito em con-junto entre as equipes desses dois turnos. Aformação dos educadores acontece durantereuniões semanais e mensais. Atualmente, arotina está organizada em momentos de co-letivo dirigido (ateliês) e de coletivo livre (pá-tio), pequenos grupos (atividades dirigidasem sala com a mesma faixa etária), alimenta-ção, sono e higiene. O eixo condutor dessarotina é a interação, garantindo o contato dascrianças entre diversas faixas etárias e da cre-che com as famílias.

Os ateliês são organizados com diferentespropostas, que acontecem nos horários de en-trada (manhã e início da tarde) e saída da cre-che. Seus objetivos são a interação, a coope-ração e a livre escolha das crianças. Além dis-so, favorecem a recepção das crianças, poissão propostas oferecidas pelo educador, masnão dirigidas por ele, o que permite que elefique atento à circulação das crianças e dis-ponível para a recepção das famílias, tanto nachegada quanto na finalização das atividades.No momento de coletivo livre, as crianças dediversas faixas etárias brincam no pátio. Du-rante esse período, há revezamento de lanchedas educadoras e a troca e higiene das crian-ças. A presença de um número mínimo deeducadores no pátio deve permitir que eles

possam interagir com as crianças, bem comoobservá-las em suas brincadeiras. Durante opequeno grupo, acontecem as atividadesdirigidas pelo educador e planejadas previa-mente para cada faixa etária. São desenvolvi-dos, aqui, os projetos e as atividades seqüen-ciadas, considerando as diversas áreas do co-nhecimento, bem como os objetivos de tra-balho para cada faixa etária.

Consideramos que a estruturação da roti-na foi um dos eixos importantes para o de-senvolvimento do projeto educacional na cre-che, pois trouxe equilíbrio entre as atividadespropostas e o entendimento de seus signifi-cados, considerando nossa concepção deEducação. Vale dizer que a forma como estáorganizada a rotina não é estática, está sem-pre em constante avaliação e sujeita a mudan-ças. Exemplo disso foi a alteração, há poucosanos, do momento de sono, que antes era ofe-recido a todas as crianças, sem opção de es-colha. Entendemos, ao longo de discussões,que o sono não era uma necessidade de todasas crianças, o que gerou a possibilidade deofertas diferentes. Atualmente, há na crecheo que chamamos de “descanso”, com espaçosorganizados para o sono ou para brincadei-ras tranqüilas.

O processo de estruturação do projetoeducacional ocorreu nos diferentes segmen-tos da creche, resultado de um trabalho cole-tivo. Agora, temos diferentes espaços organi-zados para diálogo, discussões, planejamen-to e construção desse trabalho.

BibliografiaDUTOIT, R. A. A formação do educador de creche na dinâ-

mica da construção do projeto educacional. 1995. Tese

(Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação,

Universidade de São Paulo, São Paulo.

OLIVEIRA, Z. M. R. Para o educador de creche. Ribeirão

Preto: USP/INEP/MEC, 1991.

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IntroduçãoFundada em 1972, a Escola Balão Vermelho

tem como marca o exercício da reflexão sobre asua prática, o que lhe proporciona um ganhomuito significativo na melhoria de seu ensino,na medida em que antigas certezas do fazer pe-dagógico podem ser flexibilizadas e dar lugar anovas formas. E é investindo na formação de seuseducadores, promovendo encontros e congres-sos de ação pedagógica e estabelecendo umconstante diálogo com outros “saberes”, tantoacadêmicos quanto de outras instâncias, que aescola vem conseguindo realizar esse processo.

Como parte desse trabalho reflexivo, a esco-la reuniu seus educadores, no início do ano de1994, para discutir a respeito da necessidade detornar seus alunos ainda mais participativos noprocesso de aprendizagem, desde o planejamen-to. Apoiados, naquele momento, nos estudos deJosette Jolibert, deu-se início ao que podemoschamar de “Pedagogia de Projetos”.

Após seis anos de prática e de reflexão apoia-da em discussões sustentadas por estudiosos,como Fernando Hernández, Sacristán, entre ou-tros, em 1998, o novo desafio que nos envolveufoi delimitar diretrizes curriculares para a escolae explicitá-las melhor aos alunos, pais e educa-dores. A necessidade veio da prática com proje-tos. Desde que a escola assumiu essa pedagogia,muitas mudanças e escolhas foram sendo feitas.Após quatro anos de percurso, já era possível to-mar distância e buscar os eixos que estavam ori-entando o trabalho naquele momento.

Atualmente, a escola vem prosseguindo seutrabalho com projetos, porém numa concepção

Do formal ao cultural:a experiência da Escola BalãoVermelho com os Projetos de Trabalho*

Alessandra Latalisa de Sá e Ana Cristina Coura Cheib

Escola Balão Vermelho/MG

cada vez mais ampla de seu significado. Enten-demos que, mais do que ensinar os conteúdosdas disciplinas, a escola é um espaço de culturaviva, que acolhe toda a diversidade de relaçõespresentes na realidade em que está inserida. As-sim, trabalhar por projetos, hoje, mais que umaopção metodológica, é uma postura assumida naforma de conceber e concretizar a Educação,numa nova possibilidade de organização do es-paço e do tempo escolares.

Com a intenção de promover essa nova or-ganização, reestruturamos a forma de agrupar ascrianças, de coordenar o trabalho pedagógico, defacilitar a formação dos educadores, bem comoa reflexão contínua sobre os eixos curricularesque nos orientam.

Dessa maneira, passamos a agrupar nossosalunos por ciclos de formação, cada um delescom dois anos de duração. Tomamos essa deci-são em 1996, por acreditarmos que o processode formação exige um tempo maior e mais flexí-vel que aquele induzido pela organização dosestudos por série.

Organizamos as atividades escolares pormeio dos projetos de trabalho coletivos, proje-tos individuais e módulos de aprendizagem. Essaorganização do trabalho tem garantido a possi-bilidade de abordagens globalizadas dos diferen-tes conteúdos e a participação ativa das crian-ças no seu processo de aprendizagem.

Para esse contexto, modificamos, também,nossa forma de organização do trabalho da equi-pe pedagógica, buscando torná-la ainda mais co-letiva. A experiência atual conta com a coordena-ção de ciclos, que atua juntamente com a direçãopedagógica da escola. Essa função é ocupada, a

* Texto elaborado por Alessandra Latalisa de Sá e Ana Cristina Coura Cheib, em agosto de 2001.

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cada seis meses, por um professor da escola, queé eleito por seus companheiros do ciclo. Assim,acreditamos atender melhor às necessidades deformação e de reflexão sobre o trabalho realiza-do. Estão previstos, ainda, assessorias e grupos detrabalho para atender às necessidades de forma-ção e de reflexão sobre o trabalho realizado.

Nossos atuais eixos curriculares buscamdefinir as dimensões de formação dos edu-candos que estamos priorizando. Esses eixoscurriculares se estendem da Educação Infantilà Educação Fundamental e são, também, refe-rências para a avaliação do processo e do ren-dimento do trabalho. Como tais, eles não sãoestáticos e podem ser reformulados a partir daexperiência vivida.

Os eixos curriculares são os seguintes:• tratamento da informação;

• diversidade cultural;

• inserção na vida da cidade;

• experiências culturais e artísticas;

• instrumentalização para o estudo.

Entre as muitas práticas realizadas nessaperspectiva, escolhemos relatar o “Projeto Lixo”– trabalho que envolveu toda a comunidade es-colar e seu entorno na busca da construção deuma nova atitude no que diz respeito ao trata-mento dado ao lixo. A partir da proposta peloseducadores de reflexões a esse respeito, as cri-anças puderam identificar a necessidade de en-tendimento da relação entre coleta seletiva ereciclagem/reaproveitamento de materiais. Vi-sando resolver o problema levantado, os educa-dores instrumentalizaram as crianças, organi-zando com elas estratégias de pesquisa e propos-tas de ação que poderiam mobilizar a comuni-dade para a necessidade de se atentar para essaimportante questão ambiental.

Esse projeto foi realizado no primeiro semes-tre do ano letivo de 2001, na escola Balão Ver-melho, pelas turmas da Educação Infantil, comcrianças entre 5 e 7 anos de idade. Ele será, aqui,relatado por meio de um recorte do trabalho

desenvolvido em uma das turmas, com 19 cri-anças entre 5 e 6 anos de idade.

É indiscutível, nos dias atuais, a necessidadede uma intervenção direta da escola na forma-ção de sujeitos capazes de se relacionarem como meio ambiente, buscando sempre “a aquisiçãode conhecimento, de valores, de atitude, de com-promisso e de habilidade necessários para a pro-teção e melhoria do meio ambiente; a criação denovos padrões de conduta orientados para a pre-servação e melhoria da qualidade do meio am-biente” (MEC, 1991: 7).

Por esse motivo, já há algum tempo a escolavinha investindo na colocação de lixeiras para acoleta seletiva e, mais recentemente, aderiu aoprojeto Circuito Ambiental, que é uma parceriada agência de promoção “Asas Produções” coma Associação dos Catadores de Papel, Papelão ede Material Reaproveitável (Asmare) .1

No entanto, o trabalho que vínhamos fazen-do em torno da conscientização da necessidadeda coleta seletiva não vinha sendo suficiente paraque, efetivamente, ocorresse a coleta. Foi a par-tir dessa constatação que o grupo de professo-ras decidiu realizar um projeto durante o 1o se-mestre de 2001, em que esse tema pudesse sertrabalhado.

Portanto, a intenção do nosso grupo era ini-ciar um processo de mudança de atitude com acomunidade escolar e seu entorno, no que dizrespeito ao tratamento dado ao lixo na escola enas residências. Pretendíamos que as crianças:

• conhecessem o que é o trabalho de coleta sele-tiva e reciclagem;

• estabelecessem a relação entre a coleta seleti-va e a reciclagem;

• desenvolvessem boas estratégias para viabilizara coleta seletiva, tanto na escola quanto em suasresidências;

• conectassem o “problema” do tratamento quetem sido dado ao “lixo” com uma esfera maisampla, relacionada à preservação do meio am-biente e a formas de sobrevivência;

• tivessem um papel de multiplicador, divulgando

1 O projeto conta com a participação de diversas escolas, que receberam, cada uma delas, um contêiner para a coleta seletiva de lixo. O lixoé enviado à Asmare, onde são feitas tanto a triagem e a posterior venda de material, quanto a reciclagem de uma parte dele. Estima-se quemais 200 famílias se beneficiaram com o trabalho gerado pelo aumento da quantidade de material coletado.

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a necessidade da coleta seletiva e compartilhan-do o conhecimento adquirido durante o projetocom a comunidade escolar e extra-escolar.

A partir dessa decisão, cada professora de-senvolveu o trabalho com sua turma. Durantetodo o percurso, tivemos vários encontros emque foram discutidas as estratégias de interven-ção no processo de conscientização das crian-ças sobre o tratamento do lixo, oportunidadesem que cada uma de nós compartilhava o mate-rial utilizado no estudo e os avanços que a tur-ma havia realizado.

ProblematizaçãoO primeiro momento do projeto foi uma con-

versa com as crianças. Nessa conversa, fiz umasérie de perguntas às crianças a fim de saberquais informações elas tinham a respeito dotema (coleta seletiva e reciclagem do lixo).

Constatei que muitas delas tinham algumasinformações, principalmente no que diz respei-to à reciclagem, que, segundo elas, “é transfor-mar coisa velha em nova”. No entanto, quandoquestionadas sobre a coleta seletiva, todas re-velaram nunca a haver feito. Também, quandoperguntei sobre o objetivo daquele coletor quehavia na escola, todas disseram que era para se-parar o lixo, mas quando insisti perguntando“para que” separá-lo, nenhuma delas estabele-ceu conexão com a reciclagem.

Então, ao final dessa primeira conversa, in-formei às crianças que aquele lixo coletado naescola era destinado à Asmare e propus que es-tudássemos sobre o “lixo”, pois percebia que elaspoderiam compreender melhor por que se fazcoleta seletiva e o que é a reciclagem.

Organização do projetoNum segundo momento com as crianças,

retomei a conversa inicial e propus que, para re-alizarmos o nosso projeto, organizássemos umalista com tudo aquilo que não poderíamos es-quecer de fazer. Durante a confecção da lista,tanto eu quanto as crianças apresentamos suges-

tões e discutimos a importância de cada ação.A lista, que foi afixada no mural e serviu como

referência durante todo o percurso, tinha os se-guintes itens:

• estudar a reciclagem;

• marcar um dia para trazer lixo de casa;

• colocar duas lixeiras na sala;

• assistir ao filme da Asmare;

• visitar a Asmare;

• aprender a reciclar;

• contar o que aprendemos para outras pessoas.

O desenvolvimento do projetoA partir de agora, relatarei cada um dos itens

da lista como momentos importantes no decor-rer do projeto, fazendo uma abordagem das es-tratégias utilizadas para tratamento da questãocom as crianças e da relação delas com a pro-posta curricular da escola.

ReciclagemQuestionadas sobre “as coisas novas” nas

quais se transformavam as “velhas” na recicla-gem, as crianças informaram que viravam brin-quedos. Então, informei-lhes que diferentesmateriais, quando reciclados, eram matéria-pri-ma para diferentes produtos, e que alguns livroscontavam isso.

A essa altura, outra professora, com sua tur-ma, já havia solicitado à bibliotecária da escolaque separasse todo o material relativo a “lixo”disponível na biblioteca.2

De posse desse material, separei, com a par-ticipação das crianças, aqueles livros que trata-vam da reciclagem de diferentes materiais: plás-tico, papel, metal, vidro. Combinei com elas queleríamos cada um deles e anotaríamos as infor-mações relativas ao destino dos materiais, noprocesso de reciclagem.

As informações anotadas foram também afi-xadas no mural. Esse estudo, além de esclarecer odestino de cada material, informou às crianças adiferença entre reciclagem e reaproveitamento.

2 Esse material permaneceu disponível na biblioteca (separado em uma caixa) para todas as turmas envolvidas com o projeto.

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Instrumentalizar as crianças para o estudo eo tratamento dado às informações3 foram pon-tos abordados nesse momento do projeto, emque trabalhei, com as crianças, estratégias debusca e seleção de informação, bem como de seuarmazenamento para futuras recorrências.

Marcar dia para trazer lixo de casaFaz parte da cultura da escola a elaboração,

por turma, de um calendário semanal, em que sãoregistradas as principais atividades de cada dia.Um destes é o “dia do brinquedo” – dia escolhidopela turma e no qual cada criança pode levar paraa escola um brinquedo de casa. Estabelecendouma relação com esse dia, propus às crianças aescolha de um “dia para trazer lixo de casa”.

Para que os pais pudessem ajudar as crian-ças e compartilhassem da nossa empreitada,sugeri que lhes escrevêssemos um bilhete. Nele,além de falar sobre a importância da coleta sele-tiva, seria necessário informar o dia em que olixo deveria ser levado à escola.

Em conversa com outra professora envolvidano projeto, ela me informou sobre a estratégia desugerir aos pais que tivessem duas lixeiras emcasa: uma para os recicláveis (estes deveriam serlavados antes de colocados na lixeira)4 e outra paraos não-recicláveis. A sacola com os recicláveis se-ria levada para a escola, e as crianças se encarre-gariam de fazer a triagem para as respectivas par-tes do contêiner. Contei às crianças a idéia e es-crevemos essa sugestão em nosso bilhete aospais. E ressaltei para as crianças a importância douso de um instrumento adequado (no caso, o bi-lhete) para conseguirmos atingir o nosso objeti-vo: que os pais pudessem, de fato, ajudá-las.

Colocar duas lixeiras na salaSugeri que também levassem para o contêiner

o lixo produzido em nossa sala. Para isso, ele não

poderia estar todo misturado nem sujo. A primei-ra proposta foi de uma lixeira para plástico e outrapara papel, por serem os materiais mais utilizadospor nós. No entanto, ficamos sem ter onde colocaro não-reciclável. Após alguns dias de incômodo,fui até a sala de outra professora, que havia feitoda seguinte forma: uma lixeira para os recicláveise outra para os não-recicláveis (como na sugestãofeita aos pais). Levei as crianças até a outra sala paraverem a boa idéia que tiveram e fizemos o mesmoem nossa sala. Diariamente, ao final da aula, umacriança leva o lixo até o contêiner.

Assistir ao filme da AsmareAo organizarmos o roteiro com as principais

ações do projeto, contei às crianças sobre a pos-sibilidade de irmos até a Asmare, onde podería-mos ver o que, de fato, se fazia lá.

O filme, com uma matéria sobre a fundaçãoda associação e o trabalho realizado por ela, fa-zia parte da nossa caixa na biblioteca. Propus àscrianças que assistissem ao filme para conhece-rem o lugar aonde iriam e entenderem como elefuncionava, preparando-se para a visita. Ao pla-nejar a aula, assisti ao filme e programei saltos(das partes que continham longas entrevistas) eparadas (para chamar a atenção das criançassobre algum detalhe ou antecipar o que veriamna cena seguinte). Essa estratégia foi usada vi-sando à maior adequação daquele material parao uso com crianças.

Assistir a esse filme colocou as crianças di-ante de uma realidade muito diferente5 daquelana qual vivem e, além disso, explicitou, de umaforma contundente, o caráter solidário da açãode separar o lixo para que este, levado à Asmare,fosse fonte de trabalho para aquelas famílias li-gadas à associação.

A partir dessa constatação pelas crianças,procurei trabalhar com elas a importância dasatividades realizadas na Asmare para a preser-

3 Ambos os pontos são parte do currículo da escola, estruturado a partir de cinco eixos: experiências culturais e artísticas, instrumentalizaçãopara o estudo, diversidade cultural, tratamento da informação e relação cidade–escola.

4 Nos livros em que estudamos, as crianças obtiveram a informação de que todo material a ser reciclado ou reaproveitado deveria ser lavado,já que a sujeira poderia danificá-lo (mofo, ferrugem), inviabilizando seu aproveitamento.

5 Em nosso currículo, esse ponto tem relação com a diversidade cultural, em que procuramos trabalhar a construção de uma identidade tantoa partir do contraste com o diferente, quanto do reconhecimento desse diferente e do respeito a ele.

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vação do meio ambiente. Portanto, não eramapenas elas que ajudavam a Asmare, mas o tra-balho feito lá ajudava a todos nós, na medida quedava um tratamento adequado ao lixo, evitandoseu acúmulo e o desperdício de matéria-prima.A esse respeito, havia lido para elas uma repor-tagem da “Folhinha” do jornal Folha de S.Paulo,afirmando que, a cada dia, produzíamos maislixo e o planeta continua do mesmo tamanho;portanto, se isso continuar assim, um dia o pla-neta estará completamente coberto de lixo.

Visita à AsmarePermanecemos por duas horas nas depen-

dências da Asmare. Nossa visita foi monitoradapor uma das pessoas que trabalhavam com a tri-agem do material coletado.

Mais do que ao assistir ao filme, as criançasse surpreenderam com aquelas pessoas traba-lhando em meio a montanhas de material.Janete, a monitora da visita, explicou todo o pro-cesso de triagem, além de mostrar a reciclagemdo papel, o reaproveitamento da madeira e a lojaonde a produção era vendida.

Enquanto nos mostrava o espaço e falavasobre o trabalho lá realizado, a monitora chama-va a atenção das crianças para o quanto era bompoder trabalhar ali, e contou-lhes sobre um“lixão” que havia visitado, onde as pessoas vi-viam catando lixo no meio da sujeira.

Registrei a visita com fotografias. No dia se-guinte, já com as fotos na mão, reconstruí, comas crianças, o percurso da visita e as informaçõesque tínhamos obtido lá.

O processo que utilizei foi o seguinte: mos-trava a fotografia, e as crianças se lembravam,com a minha ajuda (por meio de perguntas ecomentários do que eu própria me lembrava),do que tinha sido fotografado e do que a Janetehavia dito sobre aquele lugar ou aquela tarefaespecífica.

Esse registro (fotografias acompanhadas detexto) foi afixado na parede externa à sala para queoutras turmas pudessem conhecer o trabalho daAsmare. O texto também foi digitado e distribuí-do para as crianças, para que fosse guardado emuma pasta com outros registros do projeto.

É necessário ressaltar que esse momento do

projeto tem relação com outro eixo curricular: a“relação cidade–escola”, em que é revelada a nossaintenção de levar as crianças ao reconhecimentoda possibilidade de inter-relação entre a escola eoutras tantas instituições e espaços da cidade. Por-tanto, é importante, para nós, que as crianças te-nham oportunidade de aprender a reconheceroutros espaços, além da escola, como possíveisfontes para a construção do conhecimento.

Aprender a reciclarNa Asmare, ao conhecer o lugar onde era fei-

ta a reciclagem do papel, as crianças puderamobservar todo o processo de reciclagem e acom-panhar as explicações de uma das pessoas quelá trabalhavam.

Para o registro da explicação, foi feita uma es-crita no formato de receita, e esta foi anexada àpasta de cada criança. Ao propor que guardassemo registro, deixei claro que iríamos recorrer a elequando, no segundo semestre, fôssemos realizaruma oficina de reciclagem de papel na escola.

A busca de um formato adequado para a es-crita do que haviam memorizado sobre “comose recicla o papel” foi um importante momentode aprendizado. Nesse momento, o confronto dediferentes gêneros textuais proporcionou umaescolha consciente pelas crianças do texto tipo“receita” como o mais adequado para o registro.

Contar para outras pessoaso que aprenderam

A essa altura, as crianças já tinham muitasinformações sobre reciclagem e já conseguiamestabelecer uma relação entre ela e a coleta se-letiva. Portanto, voltando ao mural onde estavao roteiro do projeto, retomei a discussão sobre anecessidade de contarem para outras pessoas arespeito do que haviam aprendido.

O primeiro público-alvo da nossa divulgaçãoforam as crianças e professoras de outras turmasda escola. Para isso, dividi a turma em equipes,para que cada uma delas fosse até uma das salas.A tarefa seria falar sobre a importância de se fazera coleta seletiva, para que a reciclagem fosse pos-sível, e marcar um dia para que a turma trouxes-se o lixo de casa para a escola. Depois, já em nos-

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sa sala, construímos uma tabela em que estavammarcados os dias de cada turma trazer o lixo. Essatabela foi afixada no corredor da escola.

No entanto, já feita a divulgação interna, erapreciso cuidar da externa. As crianças, quandoquestionadas sobre a melhor maneira de divulgar-mos a necessidade da coleta seletiva, disseram quebastava que contássemos a nossa experiência paraas pessoas com as quais nos encontrássemos.

Então, eu lhes disse que “contar” não era sufi-ciente, pois as pessoas acabariam se esquecendo,já que era preciso memorizar muitos dados (como,por exemplo, a cor da lixeira destinada a cada ma-terial). Sugeri a confecção de um panfleto que, alémde propagar a importância da coleta seletiva, po-deria ajudá-las a ensinar como fazê-la.

Recolhi e analisei com as crianças uma sériede panfletos para que elas pudessem produzir oseu próprio. Durante a análise, chamei a aten-ção para os aspectos característicos do tipo delinguagem utilizada e como as informações eramorganizadas. Todas as observações feitas eramanotadas para que, ao produzirmos o panfletoreferente à coleta seletiva, pudéssemos recorrera elas. As características anotadas foram:

• uso de ilustração;

• uso de escrita com letras grandes e com letrasmenores;

• uso de muitas cores para as pessoas enxerga-rem melhor;

• uso de números para mostrar o endereço, o te-lefone e o preço;

• uso de mapa para indicar caminhos;

• uso de símbolos (logomarcas);

• uso de palavras para “mandar” nas pessoas:compre, venha, não perca, venha agora, coma,experimente;

• uso de textos afirmando que o produto ou oserviço seria o melhor, o que nem sempre é ver-dade, sendo apenas uma forma de induzir aspessoas a comprar;

• uso de asteristo (*), seta ( ◊ ) ou splash ( )

para mostrar coisas importantes.

A produção do panfleto foi coletiva, numasituação em que todas as crianças davam palpi-tes e eu, além de realizar o registro por escrito,fazia intervenções no sentido de aproximar a lin-

guagem utilizada àquela própria de um textopublicitário, naquele suporte específico.

Feitos os panfletos, iniciamos sua distribui-ção pelas ruas e prédios em torno da escola. Paraque essa tarefa fosse viável, contei com a ajudade uma funcionária da escola, que, a cada dia,permanecia com parte das crianças na escola,para que eu pudesse sair com um pequeno gru-po. Esse trabalho de panfletagem é feito até hoje,semanalmente.

Além do panfleto, produzimos um cartaz quefoi afixado numa feira de verduras e legumes quefica em frente da escola. Para a sua confecção,da mesma forma como foi feito o panfleto, leveipara a sala diferentes cartazes que, depois deanalisados, serviram de referência para a produ-ção do nosso próprio cartaz.

Portanto, aprender a fazer panfleto e cartaznão foi uma situação descontextualizada deaprendizagem. Pelo contrário, ocorreu em umcontexto real de uso, em que uma comunicaçãofazia-se necessária e, para que fosse de fato efi-caz, era preciso que as crianças o fizessem deforma adequada. Dar acesso às crianças a essesobjetos sociais de escrita faz parte do que acre-ditamos ser indispensável para a formação denossos alunos.

AvaliaçãoAo final do semestre, quando já cuidávamos

da divulgação da coleta seletiva e aquele proble-ma inicial de saber o que era reciclagem e qual asua relação com a coleta seletiva já havia sidoresolvido, conversei com as crianças sobre o fi-nal do projeto. Ressaltei que esse final não signi-ficaria o fim do nosso investimento na conscien-tização da importância da coleta seletiva, e que,por isso, continuaríamos com a panfletagem ecom o “dia de trazer lixo de casa”.

A avaliação final foi feita tanto em termoscoletivos quanto individuais. Primeiramente,houve uma conversa e um registro coletivos,momentos em que as crianças falaram sobre oque haviam aprendido, e, depois, uma entrevis-ta individual em que cada qual respondeu o queconsiderou mais importante no nosso projeto.

Além dessa avaliação final, o processo deavaliação esteve presente durante todo o per-

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Projeto pedagógico: por quê, quando e como – Educação InfantilPAINEL 16

Projetos pedagógicosde linguagem oral e escritana Educação Infantil

Sonia Regina da Silva Souza*

Associação Verbo Divino/SP

curso. Exemplos: ao elaborarmos o panfleto, ascrianças avaliaram o que haviam aprendido àmedida que organizavam o conteúdo para sercontado a outras pessoas; quando colocamosduas lixeiras na sala, uma para plástico e outrapara papel, percebemos que o resultado nãoestava adequado à nossa necessidade e, apósuma avaliação, recorremos à solução encontra-da por outra turma. Portanto, avaliar é instru-mento necessário para a construção de sentidoe para a continuidade do processo, e não ape-nas uma situação estanque, localizada no finaldo processo.

BibliografiaDELVAL, J. Aprender na vida e aprender na escola. Trad.

Jussara Rodrigues. Porto Alegre: Artmed, 2001.

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rizonte: Editora Balão Vermelho, 1998. Cadernos de ação

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SACRISTÁN, J. Gimeno. Compreender e transformar o en-

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Artmed, 2001.

SANTOMÉ, Jurjo Torres. Globalização e interdisciplinarida-

de: o currículo integrado. Porto Alegre: Artmed, 1997.

IntroduçãoDurante muito tempo, nosso trabalho es-

teve totalmente voltado para os cuidados fí-sicos e as práticas assistencialistas. Procurá-vamos fazer o que sabíamos em relação aoatendimento das crianças, mas não havia umaproposta pedagógica nem mesmo espaçoonde poderíamos pensar sobre isso. Sentía-mos falta de uma proposta mais consistente,que nos permitisse olhar as crianças de umaforma diferente.

Em 1994, surgiu a oportunidade de transfor-mar nosso cotidiano. Recebemos um convite paraparticipar do Programa Capacitar 1, organizadopela Cooperativa de Entidades (Cooperapic), fi-nanciado pelo Instituto C&A de Desenvolvimen-to Social e posto em prática pela ONG Creche-plan, hoje, Instituto Avisa Lá! Nesse programa,todos os profissionais da nossa instituição pas-saram a receber formação em serviço. A partir daí,as mudanças foram acontecendo.

A cada encontro de formação, descobría-mos a importância de se pensar na creche como

* Coordenadora pedagógica da Creche da Associação de Mães Unidas do Novo Osasco (Amuno) e formadora da Creche Verbo Divino,associada à Cooperapic/SP

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espaço educacional. Foi se criando um olhardiferente para todos aspectos que envolviamas crianças. Começamos a elaborar um proje-to institucional mais consistente, do qual par-ticiparam todos os funcionários da creche.Além de todas as mudanças que envolvia re-pensar a concepção de criança, desenvolvi-mento, aprendizagem e ensino, as práticas pe-dagógicas foram modificadas. Dentre elas, gos-taria de destacar a incorporação dos projetospedagógicos em nosso cotidiano. A experiên-cia com projetos trouxe mais significado aotrabalho e nos permitiu ter outra visão em re-lação ao trabalho com Educação Infantil.

Concepção de projetopedagógicoHistoricamente, o trabalho com projetos

tem atravessado vários momentos da históriada Educação e vem se transformando ao lon-go do tempo. A concepção que adotamos en-tende o projeto como um trabalho pedagógi-co o mais próximo possível das práticas soci-ais. O projeto é um conjunto de situações con-textualizadas, em que há um objetivo compar-tilhado com as crianças desde o início. As cri-anças são envolvidas em uma seqüência deatividades com vistas a produzir um evento ou,então, um ou mais objetos, que dão visibilida-de ao processo de aprendizagem. Há um fortevínculo com uma área de conhecimento, mas,dada a sua natureza, os projetos pedagógicosintegram sempre diferentes áreas que colabo-ram com o produto final.

As crianças podem ser engajadas em umaseqüência de atividades para produzir umbaile de carnaval, uma fita cassete com músi-cas escolhidas, um livro de receitas etc.

Por que o trabalhocom projetos?Para as crianças, há um grande ganho, pois

se sentem atraídas e motivadas a participardas atividades, quando compreendem sua fi-nalidade e podem relacioná-las com as coi-sas que já conhecem.

Compartilhar com os outros também éimportante para as crianças, pois eles sabemque o seu trabalho terá outros leitores e apre-ciadores. Para isso, colocam em jogo tudo oque sabem, tomando decisões e dividindo ta-refas. Enfim, o comprometimento é maior, oque garante que as aprendizagens sejam maisefetivas e o resultado, o melhor possível.

É grande o envolvimento do educador,pois geralmente ele é o responsável pela es-colha do tema. Precisa desenvolver um estu-do prévio e organizado, pois, o tempo todo,está se confrontando com questões e desafiosque as crianças vão trazendo. Seu papel é ode promover situações de aprendizagem deforma significativa. O projeto nos permiteuma organização seqüenciada dos conteúdosmais importantes para cada faixa etária. Aprincípio, ele requer mais tempo por parte doeducador, mas, a partir de sua implantação,o trabalho flui, facilitando nossa ação, permi-tindo uma visão melhor de quanto e como ascrianças aprendem.

Resumindo as vantagens, podemos dizerque a prática de trabalho com projetos pos-sibilita:

• a promoção de aprendizagens significativas;

• o desenvolvimento de uma atitude favorá-vel para o conhecimento;

• a garantia de uma seqüência organizada deconteúdos;

• o acompanhamento mais fácil do que as cri-anças estão aprendendo;

• o aprendizado da busca de informações pe-las crianças;

• avaliação constante;

• maior envolvimento de educadores e crianças.

Quando e quanto trabalharcom projetosProjetos didáticos são mais adequados

quando as crianças já entendem a relação en-tre as atividades e o produto final. A partir dos3 anos, é possível pensar em organizar um tra-balho como esse. Em geral, desenvolvemos umprojeto por grupo, a cada três ou quatro meses.

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Projeto pedagógico: por quê, quando e como – Educação InfantilPAINEL 16

A organização do tempo didático envolve,além dos projetos, as atividades permanen-tes e diferentes seqüências. Se, por exemplo,estamos desenvolvendo um projeto de recon-to de histórias conhecidas, teremos muitasações envolvendo tanto a linguagem oralquanto a escrita. Portanto é preciso pensar ematividades permanentes e seqüenciais queenvolvam outras áreas, como movimento, ar-tes visuais, música etc., para que, em outrosmomentos do dia, as crianças tenham expe-riências diferentes.

Conteúdos possíveisna Educação InfantilO mais importante é que, na Educação In-

fantil, podemos diversificar muito, pois nãohá um currículo rígido a seguir. Isso permiteboas escolhas em relação aos projetos. É im-portante lembrar que todo trabalho pedagó-gico envolve conteúdos conceituais, proce-dimentais e atitudinais. Assim, ao produziruma fita cassete de poesias para doar a umgrupo de crianças menores, por exemplo, es-taremos trabalhando não só a linguagemoral e escrita, mas também a auto-estima, avalorização da cultura, a socialização etc.

Com as crianças de 4 a 6 anos, podemos ou-sar um pouco mais. Há possibilidade de tra-balharmos com mais conteúdos, pois espera-mos que elas avancem no conhecimento docódigo alfabético e da linguagem escrita. As-sim, são inúmeros os produtos ligados a dife-rentes gêneros textuais, como a produção detextos informativos, folders, livro de adivinhasou rimas etc.

A concepção que adotamos entende o pro-jeto como um conjunto de situações contex-tualizadas. Há um objetivo final, que é com-partilhado com as crianças desde o início. Ascrianças são envolvidas em uma seqüência deatividades com vistas a produzir um eventoou um ou mais objetos, que dão visibilidadeao processo de aprendizagem. Há um fortevínculo com uma área de conhecimento, mas,dada a sua natureza, os projetos pedagógicosintegram sempre diferentes áreas que colabo-ram com o produto final.

Quando esperamos que as crianças avan-cem no conhecimento do código alfabético eda linguagem escrita, podemos pensar emprodutos ligados a diferentes gêneros textu-ais, como a produção de textos informativos,folders, livro de adivinhas ou rimas, fita cas-sete com músicas etc.

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PROJETO PEDAGÓGICO:POR QUÊ, QUANDO E COMO –EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

Rosângela Pereira

Elizabete Monteiro

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Por quêEsse trabalho foi realizado em uma sala de

aula de jovens e adultos da empresa MétodoEngenharia, em convênio com a FundaçãoKellog e o Centro de Estudos Escola da Vila. Ogrupo era constituído, em sua maioria, por ho-mens que desempenhavam diversas funções naconstrução civil.

Nosso projeto pedagógico na Educação deJovens e Adultos consiste em utilizar o textocomo unidade básica e sua diversidade no usosocial, pois os educandos jovens e adultos, em-bora não tenham freqüentado a escola, entramem contato diário com diversos tipos de texto.

Esse trabalho proporciona aos educandosmelhorarem sua competência comunicativa, poisamplia seu repertório no mundo letrado, tantolendo como produzindo textos para se comuni-carem por meio de mais de uma linguagem.

Nessa modalidade de trabalho, os educandoscomprometem-se com o conteúdo trabalhado,já que esse conteúdo parte de seus conhecimen-tos prévios, e, por meio do aprofundamento dosestudos, ampliam esses conhecimentos.

QuandoO primeiro projeto que desenvolvemos foi

o “Estudo da Migração”, pois era latente, naclasse, o sentimento de solidão do alunos porterem deixado suas famílias em outras cidadese estarem morando em São Paulo. Trouxemospara a sala de aula livros, revistas e artigos dejornal sobre o tema para trabalharmos em clas-se. Estabelecemos, como produto final desseprojeto, a confecção de um almanaque. A idéiadesse tipo de portador surgiu por ser um ma-terial muito comum em algumas regiões do

Projeto pedagógico:por quê, quando e como

Rosângela Pereira

Projeto Kellog/SP

Brasil e possibilitar a inclusão de diferentes ti-pos de texto no mesmo material.

Após produzirmos esse primeiro material,fizemos uma “noite de autógrafos” em que oseducandos declamaram poesias de sua auto-ria e contaram como foi a experiência de pro-duzir um almanaque.

Outro projeto foi sobre a Aids, pois era umapreocupação nossa e deles saber mais sobre oassunto e divulgar os conhecimentos aprimo-rados em sala de aula, o que é um dos objeti-vos do estudo por projetos: ter um produto fi-nal que possa transmitir os assuntos estudadosem sala de aula para a comunidade em que aescola ou os educandos estão inseridos, com afinalidade de debater o assunto e, se possível,até modificar os hábitos e as atitudes dos mo-radores, por meio do conhecimento.

Ao concluirmos esse material, demos con-tinuidade ao estudo da reprodução humana eproduzimos um atlas desenhado pelos próprioseducandos.

Como – A escolha do temaA partir das primeiras conversas com os

educandos, foi possível detectar temas que se-riam de interesse da classe e, também, incluiro estudo de diversas áreas do conhecimento.

Depois de escolhido o tema, utilizamos di-ferentes tipos de textos: jornalísticos, contos,receitas, poesias, cartas.

Leituras feitas pela professorapara apreciação da classe

O primeiro livro escolhido para ser lidopela classe foi Vidas secas, por se tratar dotema da migração e ser um texto bem escri-

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Projeto pedagógico: por quê, quando e como – EJAPAINEL 17

to, pois o trabalho com bons textos servecomo modelo e dá a possibi l idade aoseducandos de se apropriarem da organizaçãotextual e de uma linguagem diferente, na horade produzirem textos de autoria. Depois, le-mos os livros As mil e uma noites e Estrela so-litária.

Houve também a leitura de diferentes con-tos (sem que estivessem, necessariamente, li-gados ao tema), para que a classe pudesse seapropriar da estrutura narrativa e da caracteri-zação dos textos.

As notícias de jornal trazidas tinham maté-rias relacionadas ao tema do projeto. Às vezes,trabalhávamos com todo o jornal para estudar-mos sua organização (divisão por cadernos), ainferência sobre o assunto da notícia por meiodas fotos ou das manchetes. Depois organiza-mos um mural em que os educandos escolhi-am uma notícia e faziam um pequeno comen-tário sobre ela.

CartasEra um grande anseio deles escrever e man-

dar cartas, assim como poder ler as que recebi-am. Escrevemos algumas cartas em classe e per-cebemos que os modelos utilizados eram fixose nem sempre expressavam a mensagem queeles gostariam de enviar. Um dos educandoslevou para a classe um livreto com modelos decartas de amor. Percebemos, então, que pode-ria vir daí uma escrita muito parecida entre ascartas. Passamos, então, a reescrevê-las, indi-vidual e coletivamente. A correção individualtratava do sentido daquilo que queriam trans-mitir e a coletiva dizia respeito à ortografia econcordância.

Receitas e textos instrucionaisEsse tipo de texto é direto e objetivo e pos-

sibilita a inferência do resultado por meio dosmateriais ou ingredientes usados ou da descri-ção da execução do prato ou objeto. Lemos tex-tos instrucionais para confeccionar objetos; le-mos ingredientes de receitas para descobrirqual prato seria confeccionado, e, pelo estudodo texto “A sopa de pedras”, criamos a receita eo modo de fazer esse prato.

PoesiasEstudamos diferentes poesias, exploramos

sua finalidade (despertar sentimentos), decla-mamos e reescrevemos algumas delas, troca-mos ou completamos algumas rimas que foramsubtraídas das poesias e, para o almanaque,publicamos versões feitas pelos educandos dapoesia “Cidadezinha qualquer”.

Trabalho com os textosAo trabalhar os diferentes textos, utilizamos:Reescrita. Era feita a leitura de um texto váriasvezes, até que eles o tivessem na memória.Depois, era solicitado que o reescrevessem,trabalho que possibilita que os educandos sepreocupem somente com a organização dotexto e até com a ortografia, pois o texto elesjá têm na memória.

Revisão textual coletiva. Ao produzirmos tex-tos em sala (mesmo os reescritos), selecioná-vamos alguns e, com autorização do autor, re-visávamos o texto com a classe toda, avalian-do a ortografia e a concordância e fazendo asmodificações, quando necessário.

Revisão textual individual. Na produção de tex-tos utilizados nos produtos finais, os educandosescreviam e nós fazíamos as revisões, discutin-do com cada educando. Ou digitávamos os tex-tos na forma como eles haviam escrito e discu-tíamos se estavam bons. Eles, então, percebiamas palavras, as frases e as concordâncias que pre-cisavam ser corrigidas e, normalmente, alega-vam que os erros deviam ser da digitação, poisnão acreditavam tê-los cometido.

Roda de leitura. Semanalmente, deixávamosexpostos todos os livros da classe para que oseducandos escolhessem um e o levassem paracasa. Na semana seguinte, um dos estudantescomentava a história que tinha lido e indica-va, ou não, o livro para os colegas.

É importante ressaltar que as atividadeseram as mesmas para toda a classe, indepen-dente da hipótese que os educandos tinhamsobre a língua escrita. O que diferenciava o tra-balho era a intervenção feita pela educadoracom cada um dos educandos e o nível de exi-gência para cada um deles.

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Contextualização

Um pouco da históriaA idéia de fazer uma escola para crianças

e adolescentes atendidos pelo Projeto Axé vi-nha sendo discutida há cinco anos. Nasceu deuma forte demanda dos educadores em razãoda observação e constatação das dificuldadespelas quais grande parte dessas crianças eadolescentes passava nas escolas públicasque freqüentavam.

Essa população costumava chegar ao Pro-jeto Axé com uma história de evasão e repe-tência escolar, história essa semelhante à demuitas crianças e jovens das comunidadespobres de Salvador.

A freqüência na escola é condição para par-ticipar das atividades do Projeto Axé, mas, comraras exceções, os educandos não ultrapassa-vam a 3ª série do 1° grau, ou estavam fora daescola. Esses dados, obtidos do relatório anualdo Projeto Axé (1998), revelam que grande par-te desses alunos, com defasagem de idade/sé-rie, passou por múltiplos fracassos na escola.Geralmente, esses alunos têm uma auto-esti-ma muito baixa e não acreditam que são capa-zes de aprender. Por causa disso, realizou-seuma parceria entre o Projeto e a Secretária Mu-nicipal de Educação e Cultura (SMEC), com oobjetivo de oferecer Educação formal do Ensi-no Fundamental de qualidade para as criançase adolescentes atendidos pelo Projeto Axé e dacomunidade na qual a escola estava inserida.

No início do ano letivo (abril de 1999), a es-cola funcionou em uma casa alugada pelo Pro-jeto Axé e, em razão de limitações das instala-

Projetos didáticos e aprática de letramento:experiência de uma escolapública de Salvador

Elizabete Monteiro

Projeto Axé/BA

ções, atendemos nove classes, sendo seis noturno matutino, com alunos que apresentavamgrande defasagem de idade/série, e três classes,no turno vespertino, de ensino regular.

Em 2000, ampliamos a capacidade de aten-dimento da escola para 29 turmas (dez pelamanhã, dez à tarde e nove à noite), com nú-mero de matrículas próximo a 800 alunos. Atu-almente, funciona num prédio bastante amplo,com instalações modernas e bem equipadas.

A escola hojeInserida num contexto socioeconômico pou-

co privilegiado, no bairro de São Cristóvão, queapresenta alto índice populacional, a escola estálocalizada, estrategicamente, na rua principal,que delimita duas áreas empobrecidas,marcadas pela miséria e pela marginalização.

Apesar desse contexto muito próximo darealidade das crianças e jovens atendidos peloProjeto Axé, percebem-se manifestações depreconceito e discriminação da comunidadeem relação aos alunos, meninos e meninas doProjeto Axé, que freqüentam a escola.

Tanto os alunos que vêm de outros bairrosda cidade quanto os da comunidade de SãoCristóvão estão expostos aos mesmos sintomasda patologia da nossa cidade (que coincidemcom os de outras metrópoles brasileiras): altastaxas de desemprego ou subemprego, moradiassem condições mínimas de habitabilidade e desuprimento dos serviços de água e luz, equilí-brio familiar fragilizado, convívio com a violên-cia e a miséria generalizada.

Um aspecto adicional que emerge das ori-gens históricas da cidade, importante tambémna construção da proposta pedagógica da Es-

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Projeto pedagógico: por quê, quando e como – EJAPAINEL 17

cola Municipal Barbosa Romeo, é a articulaçãoentre raça e pobreza como variáveis que defi-nem a participação precoce da criança no mer-cado de trabalho de Salvador. No interior des-sa conjuntura, os vínculos já frágeis dos nú-cleos familiares dificilmente resistem.

Nesse contexto, a definição da identidadedo Projeto IIê Ori, desenvolvido na Escola Mu-nicipal Barbosa Romeo, foi construída a partirda idéia da sociedade como uma totalidade naqual nossos alunos estão inseridos. Isso impli-cou pensar numa proposta pedagógica que pu-desse atender a essas crianças integralmente,não só no âmbito de conteúdos conceituais,mas, principalmente, em relação aos conteú-dos procedimentais e atitudinais, em que éti-ca, valores e estética estejam impregnandotoda a prática da escola.

Acreditamos que o movimento próprio doprocesso de construção do conhecimento devepermear a sala de aula, possibilitando ao alu-no aprender pensando.

O papel da teoria nesse processo é o de for-necer subsídios para que o professor observee reflita melhor sobre sua prática e perceba emquais pressupostos ela está respaldada. A in-tervenção do professor no processo educativoé fundamental, no sentido de orientar a buscade soluções, por meio da apresentação de no-vas informações e desafios a partir de estraté-gias pedagógicas.

Esse ponto de vista dá grande ênfase ao va-lor da atividade grupal, ressaltando-se a coope-ração em lugar da competição, como princípiobásico. A troca entre alunos é fator indispensá-vel para a construção do conhecimento. Den-tro dos grupos envolvidos em atividades signi-ficativas, há necessidade de expressar pontos devista, trocar idéias e discutir meios e modospara a resolução de problemas. Dessa forma, a“Pedagogia de Projeto”, opção metodológica daescola, atendeu a esses princípios.

Por que pedagogia de projetosNuma sociedade em constante transforma-

ção, o conhecimento é cada vez mais volátil e fle-xível. Como educadores deste novo milênio, pre-cisamos desenvolver uma pedagogia em que

professor e aluno possam dialogar problemati-zar e atualizar as questões e os desafios do co-nhecimento.

Segundo Fernando Hernandez:

A função do projeto é favorecer a criação de es-

tratégias de organização dos conhecimentos es-

colares em relação: 1. ao tratamento da informa-

ção; e 2. à relação entre os diferentes conteúdos

em torno de problemas ou hipóteses que facili-

tem aos alunos a construção de seus conheci-

mentos, a transformação da informação proce-

dente dos diferentes saberes disciplinares em

conhecimentos próprios (Hernández, 1998: 61).

Sendo assim, o trabalho com projetos cons-titui-se em excelente situação de uso social dosconteúdos, que são desenvolvidos de forma sig-nificativa.

Os projetos favorecem o necessário compro-

misso do aluno com sua aprendizagem. O fato

de o objetivo ser compartilhado desde o início

e de haver um produto final em torno do qual

o trabalho de todos se organiza, contribui mui-

to mais para o engajamento do aluno nas tare-

fas, como um todo (MEC, PCN, v. 2, 1997).

Optou-se pela organização do currículo pormeio de projetos didáticos por disciplina. Essaperspectiva de trabalho não pressupõe a fragmen-tação do conhecimento, muito pelo contrário.Está pautada na multirreferencialidade do currí-culo, que tem sua epistemologia na complexida-de e no movimento, defendida por Edgar Morin.Ela implica pensar complexo, dialogicamente,indo além da visão interdisciplinar, e entende asações didáticas como criação de instrumentospara a compreensão da realidade e do conheci-mento nas múltiplas relações.

A prática de letramentona escola públicaÉ possível desenvolver práticas de letra-

mento dentro da escola pública? E nas clas-ses de EJA, como essa proposta pode ser as-segurada?

As respostas a essas questões parecem ób-vias. No entanto, considerando os rumos que

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as práticas leitoras e escritoras tomaram den-tro da escola, fomos levados a refletir sobre anecessidade de repensarmos o nosso fazer pe-dagógico, no sentido de tornarmos o ensino daleitura e da escrita menos escolar, buscandonos aproximar das situações reais do uso dalíngua. Isso implica deixar de tratar o ensinoda língua da forma que só a escola o trata: me-canicamente, sem propósito comunicativo reale com interlocutores fictícios ou, na maioriadas vezes, inexistente.

Aqui relatamos dois dos vários projetos queforam desenvolvidos na Escola Municipal Bar-bosa Romeo, que tem como um de seus objeti-vos fazer com que crianças, jovens e adultos quepor ela passem sejam verdadeiros usuários dalíngua, leitores e escritores proficientes.

O primeiro projeto (Língua Portuguesa) foidesenvolvido em uma classe de Aceleração II(equivalente à 3a e 4a séries do Ensino Funda-mental). O segundo, cuja área de concentra-ção era a de Ciências, foi realizado em umaclasse de Alfabetização de Adultos (noturno).

O projeto “Era uma vez…” tinha como ob-jetivo geral: “Ler e escrever contos, garantin-do os elementos macroestruturais caracterís-ticos do gênero e o destinatário real das pro-duções” e foi aplicado numa classe com 25alunos, com idades variando entre 13 e 19anos, que chegaram à escola em 1999, em suamaioria com a hipótese de escrita silábica ousilábico-alfabética. No início de 2000, já alfa-béticos, apresentavam ainda grande dificul-dade de produção textual, sem fluência de lei-tura. Muitos escreviam sem a segmentaçãoconvencional das palavras e com muitas difi-culdades ortográficas.

O projeto teve como empreendimento fi-nal a produção de um livro de contos para serpresenteado às classes de Educação Infantil e1o ciclo.

Fica a pergunta: por que contos? O projetofoi pensado a partir da surpreendente consta-tação de que os alunos, apesar de terem idadeavançada, ficavam “embriagados” com a leitu-ra de contos infantis, especialmente os maistradicionais. Inicialmente, selecionamos paraa leitura contos menos infantis, partindo dopressuposto de que os alunos, já adolescentes,

teriam mais interesse por estes e não por aque-les. Grande engano! No levantamento dos co-nhecimentos prévios dos alunos, observamosque apenas um já ouvira falar da história de“Chapeuzinho vermelho”. Nenhum outro con-to era conhecido da turma!

Optaram pela leitura dos contos “O patinhofeio”, “Cinderela”, “João e Maria”, “Os trêsporquinhos”, “O gato de botas”.

Essa foi a nossa primeira aprendizagem:definir previamente o que ler, sem um pro-fundo conhecimento da turma, dos seus de-sejos latentes e das necessidades imbricadasna história de vida de cada criança, jovem ouadulto, pode comprometer um “grande pro-jeto de leitura”, elaborado com a melhor dasintenções!

As intervenções durante o desenvolvimen-to do projeto foram centradas nas estratégiasde leitura e em situações de leitura por prazer.Em relação às intervenções de leitura voltadaspara a escrita, enfatizamos os aspectos macro-estruturais característicos do gênero conto,especialmente aqueles que definimos comoindispensáveis para serem assegurados pelosalunos: marcadores cronológicos, seqüêncianarrativa, zonas de descrição com utilização deadjetivação.

Por fim chegamos à produção dos contos.Os alunos e a professora esperavam ansiosospor esse momento. A proposta de escrita – emduplas – possibilitou a escrita de textos ricos emrecursos lingüísticos, ambientação, trama e des-fecho bem definidos, seqüência narrativa bemarticulada, além do uso da intertextualidade,sem comprometer a autoria.

As escritas dos contos possibilitaram umespaço privilegiado de articulação das práticasde leitura, produção escrita e reflexão sobre alíngua: a revisão textual.

Foram desenvolvidos vários procedimen-tos de revisão até o ponto em que se decidiaque o texto estava suficientemente bem escri-to. Para isso eram feitos rascunhos, alteraçõesno conteúdo e na forma. A última etapa foi re-alizada com o apoio do computador, por meioda digitação dos textos e revisão ortográfica.

O mais surpreendente é que todos os alu-nos faziam, revisavam, refaziam os seus textos

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Projeto pedagógico: por quê, quando e como – EJAPAINEL 17

sem queixas. Pelo contrário, permaneciam en-volvidos e extremamente motivados. Algunsobjetivos não só conceituais, como procedi-mentais e atitudinais, foram alçados e um as-pecto ficou assegurado: o entendimento deque, quando escrevemos para alguém, preci-samos escrever de forma que sejamos enten-didos e, em se tratando de um conto, que nos-so texto provoque o deleite. E os contos dosnossos alunos, com certeza, nos encantaram!Basta lê-los.

Quanto ao segundo projeto, “Tartarugas ma-rinhas”, foi desenvolvido nas classes de PEB I(Programa de Educação Básica – EJA – equiva-lente à 1a série) e tinha como objetivo geral:“Valorizar a vida em sua diversidade e a pre-servação dos ambientes, por meio do estudosobre as tartarugas marinhas – animal amea-çado de extinção”. Os alunos tinham idade quevariava entre 17 e 59 anos.

Por um lado, os estudantes possuíam umrepertório de representações proveniente deconhecimentos intuitivos, adquiridos pelavivência, pela cultura e pela história de vida decada um. Por outro lado, desenvolveu-se umtrabalho em que os alunos confrontaram seusconhecimentos prévios com os conhecimentoscientíficos que foram construídos ao longo doprojeto. Incentivados a expor suas idéias paraexplicar determinado fenômeno e confrontá-lascom outras explicações, os alunos puderamperceber a necessidade e a importância de vá-rias leituras que tiveram de realizar.

Esse processo, construído com interven-ções intencionais e sistemáticas dos professo-

res, que criavam situações interessantes e sig-nificativas e forneciam informações, permitiua reelaboração e a ampliação dos conhecimen-tos prévios dos alunos. Foram desenvolvidasleituras de textos das mais variadas fontes (jor-nais, revistas, folhetos, enciclopédia etc.) pes-quisas na Internet, excursões (incluindo o Pro-jeto Tamar).

Por fim, chegou o momento da sistemati-zação das informações, para socializar os co-nhecimentos construídos: alunos e professo-res optaram pela realização de um grande se-minário, aberto à comunidade, a todos os alu-nos e aos funcionários da escola.

Nesse ponto, quero salientar os conteúdosprocedimentais desenvolvidos por meio dessaatividade (seminário), como também a interdis-ciplinaridade naturalmente alcançada, na me-dida em que os alunos elaboraram um folder,convites, ofícios, usaram retroprojetor, apren-deram a usar o microfone, a falar em público, aouvir seus interlocutores, a responder pergun-tas, enfim, a fazer uso de todo um repertório deconhecimentos, de forma significativa.

Essa atividade de fechamento do projeto(empreendimento final) teve a intenção dereunir e organizar os dados, respondendo aoproblema proposto inicialmente.

Podemos concluir, portanto, que é possí-vel desenvolver práticas de letramento na es-cola pública, seja ela de Educação Infantil,Ensino Fundamental ou de Educação de Jo-vens e Adultos. Tudo depende, evidentemen-te, da concepção de ensino que está por trásdo que se faz.

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PPPPP A I N E L A I N E L A I N E L A I N E L A I N E L 1818181818

PROJETO PEDAGÓGICO:POR QUÊ, QUANDO E COMO

Ivanete Carvalho e Andréa Guida Bisognin

Renata Sanches Silva e Maria Vânia Marques de Carvalho

Rosemere da Silva Vieira

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As supervisões deacompanhamento dos projetosdidáticos realizados em aula

Ivanete Carvalho e Andréa Guida Bisognin

Programa Escola que Vale – Fundação Vale do Rio Doce – Cedac/SP

ResumoEste projeto está sendo desenvolvido no Cen-

tro de Educação Infantil Municipal (CEI) Profª

Honorina Pacheco Corrêa, no bairro Rio do Ouro,

em Caraguatatuba/SP. A Secretaria Municipal de

Caraguatatuba e a Fundação Orsa são parceiras na

gestão pedagógica desse CEI, que respeita a políti-

ResumoO Programa Escola que Vale tem como eixo do

processo de formação de professores a realização de

projetos didáticos em aula, e seu desenvolvimento

é acompanhado por meio de reuniões mensais e

semanais com as coordenações regional e local.

Esses projetos necessitam de planificação de-

talhada, avaliação permanente e reorientação das

ações, em razão dos propósitos didáticos e dos ob-

jetivos compartilhados com os alunos. É nesse con-

texto que as supervisões cumprem papel funda-

mental, pois criam situações de análise que são, ao

mesmo tempo, favoráveis às transformações nas

práticas usuais e à construção de conhecimentos,

a partir dos quais pode-se refletir sobre elas e fazê-

las avançar.

Em situações de planejamento e de análise e re-

flexão sobre a prática documentada, por meio de vídeos

e relatórios, os professores que participam do progra-

ma discutem coletivamente sobre suas dúvidas e difi-

culdades e sobre os propósitos que guiam suas tare-

fas, antecipam possíveis situações que podem ocor-

rer na salas de aula, decorrentes de decisões tomadas

pelo grupo, trocam informações sobre as aprendiza-

gens das crianças a partir da análise de suas produ-

ções e passam a construir gradativamente novos ob-

serváveis sobre a relação ensino–aprendizagem.

Neste relato, serão destacadas algumas mu-

danças provocadas por essas estratégias forma-

tivas: a produção e a reflexão coletivas, a formação

de equipes colaborativas de trabalho nas escolas

que participam do PEQV e as possibilidades de

apropriação dos planejamentos como instrumen-

tos metodológicos de formação, pelos técnicos da

Secretaria de Educação de Açailândia/MA.

ca de Educação Infantil do município por meio da

presença de um programa de formação continua-

da e do atendimento à demanda para a faixa etária

de 0 a 3 anos.

A proposta pedagógica que está sendo imple-

mentada no Centro de Educação Infantil tem, como

As linguagens expressivasno cotidiano das crianças de 0 a 3 anos

Renata Sanches Silva e Maria Vânia Marques de Carvalho

SME – Caraguatatuba/SP e Fundação Orsa

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Projeto pegagógico: por quê, quando e comoPAINEL 18

referência, as diretrizes curriculares para o atendi-

mento às crianças e, como eixos norteadores, a cri-

ança de 0 a 3 anos, a família e a comunidade, a esco-

la e a família. Para o desenvolvimento do projeto

pedagógico, que tem como tema “Colorindo o nos-

so tempo – as crianças descobrindo cores, materi-

ais e o nosso espaço”, toda a equipe do CEI idealizou

e vem realizando planos de ação compostos por ati-

vidades de caráter interdisciplinar, que procuram

atender às necessidades, às expectativas e aos inte-

resses das crianças. Na concepção da criança como

cidadã, sujeito com direitos, a participação ativa é

um marco na seleção dos temas e das atividades pro-

postas. Descobrir, explorar, experienciar, perguntar,

interagir com o meio social e físico são atitudes pre-

sentes no cotidiano do CEI.

SituaçãoO Centro de Educação Infantil Municipal

Profª Honorina Pacheco Corrêa surgiu da par-ceria entre a Secretaria Municipal de Educaçãoe a Fundação Orsa, com 26 crianças. Esse nú-mero foi aumentando gradativamente e, atual-mente, o centro apresenta a seguinte situação:

Área geográfica atendida. Bairros: Rio doOuro, Jaraguazinho, Horto Florestal, PonteSeca, Caputera, Indaiá, Jardim Pimavera, Gai-votas, Estrela Dalva, Centro.

Clientela. Crianças de 3 meses a 3 anos e 11meses.

Proposta pedagógica. A proposta pedagó-gica irá se nortear pela concepção de cri-ança como ser humano completo, integran-do as dimensões afetiva, intelectual, física,moral e social, que, embora em processo dedesenvolvimento e, portanto, dependentedo adulto para sua sobrevivência e seu cres-cimento, deve ser ativo e capaz, para assimpoder ampliar seus conhecimentos e expe-riências e alcançar progressivos graus de

autonomia, frente às condições do meio,como um sujeito social e histórico. A pro-posta está de acordo com a política de Edu-cação Infantil do município, na qual estáinserida.

CotidianoOs horários previstos para

as atividades de alimentação,higiene, descanso e brincadei-ras são organizados de acordocom as necessidades das cri-anças, estando previstos tam-bém períodos de atividadeslúdicas, de maior e menorconcentração, em grupos e in-dividuais. Existe flexibilidadeem relação aos horários ofere-cidos às famílias, garantindoformas adequadas de receberas crianças em seus grupos ede organizar a saída.

As crianças recebem quatro refeições diá-rias, seguindo cardápio elaborado pela nutri-cionista. O descanso varia de acordo com as ne-cessidades individuais. Assim, os que não dor-mem são envolvidos em atividade mais rela-xante, para a qual é utilizado um dos cantinhosexistentes nas salas.

Diariamente, desde que as condições climá-ticas o permitam, todos têm oportunidade debrincar em área livre, desfrutando do sol e decontato com água, areia e terra.

Projetos são desenvolvidos de forma aabranger todas as turmas, respeitando a espe-cificidade de cada faixa etária, e com atividadesdirigidas e semidirigidas.

Cantinho das Conchinhas

Estrelinha-Azul

Cavalo-Marinho

Peixinho Dourado

Golfinho

Aquário

3 a 11 meses

12 a 15 meses

16 a 23 meses

2 anos a 2 anos e 11meses

2 anos a 2 anos e 11 meses

3 anos a 3 anos e 11 meses

15

18

20

27

27

26

03

3

2

2

2

2

2

Turmas IdadeNo de

criançasNo de

adultosNo de

adultosvolantes

Centro de Educação Infantil Municipal Profª Honorina Pacheco Corrêa

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A rotina é organizada em tempos de traba-lho, de recreio ao ar livre, de higiene, de refei-ção, de descanso, de pequenos grupos, granderoda, intercalados com o tempo de arrumar, pre-visto durante todo o dia, após cada atividade.

ReferenciaisUtilizamos, como referencial para o atendi-

mento às crianças, as diretrizes curriculares quetratam do educar e do cuidar engajados no de-senvolvimento do cidadão em potencial, sujei-to com direitos e digno de cuidados educacio-nais. A proposta se baseia nas diferentes formasde ver e compreender o mundo, unindo cuida-do, valores e conhecimento num ambiente emque as formas de expressão ocupem lugar pri-vilegiado, e crianças, famílias e educadores con-vivam prazerosa e criativamente da arte de cui-dar e educar.

A família tem atendimento individual, emque se procuram entender suas individualidades,seus anseios e suas necessidades, engajando-aprogressivamente no ambiente interno da esco-la e tornando-a cada vez mais parceira na artede educar, sem se esquecer de que o desenvolvi-mento é um processo integrado, que reúne di-versos aspectos da vida: biológico, motor, cultu-ral, emocional e social.

A comunidade também é envolvida no coti-diano do Centro de Educação Infantil, sendo in-formada dos principais acontecimentos e dasdicas de cuidados com as crianças de 0 a 3 anosem seus boletins bimestrais. Também buscamosna comunidade ajuda referente à participaçãovoluntária esporádica, por meio do “Amigos daEscola”, e à participação na confecção de mate-rial e brinquedos.

Objetivo geralEducação e cuidados básicos para o desen-

volvimento das crianças, respeitando suas in-dividualidades, entendendo a criança como umser total, completo, indivisível, e fornecendo-lhes os meios de desenvolver suas capacidadesfundamentais, ampliando-lhes as possibilida-des de acesso ao patrimônio cultural da socie-dade em que vivem.

Experiência em andamento:Projeto “Colorindo o nossotempo” (as criançasdescobrindo cores, materiais eo nosso espaço)Esse projeto está sendo desenvolvido no

Centro de Educação Infantil Municipal Profes-sora Honorina Pacheco Corrêa, Bairro Rio doOuro, Caraguatatuba/SP. A Secretaria Munici-pal de Caraguá e a Fundação Orsa são parceirasna gestão pedagógica deste CEI, que respeita apolítica de Educação Infantil do município pormeio da presença de um programa de forma-ção continuada e do atendimento à demandapara a faixa etária de 0 a 3 anos.

A proposta pedagógica que está sendoimplementada no Centro de Educação Infantiltem, como referência, as diretrizes curricularespara o atendimento às crianças, e, como eixosnorteadores, a criança de 0 a 3 anos, a família ea comunidade, escola e a família. Para o desen-volvimento do projeto pedagógico, que tem otema “Colorindo o nosso tempo – as criançasdescobrindo cores, materiais e o nosso espaço”,toda a equipe do CEI idealizou e realiza planosde ação compostos por atividades de caráter in-terdisciplinar, procurando atender às necessi-dades, às expectativas e aos interesses das cri-anças. Na concepção da criança como cidadã,sujeito de direitos, a participação ativa é ummarco na seleção dos temas e das atividadespropostas. Descobrir, explorar, experienciar,perguntar, interagir com o meio social e fisicosão atitudes presentes no cotidiano do CEI.

Quando acreditamos no potencial das cri-anças e deixamos que elas optem e criem am-bientes e formas de aprendizagem, respeitan-do o momento das crianças e propondo ativi-dades dirigidas e semidirigidas, deixamos li-vre o caminho para a criatividade.

Foi assim que se originou esse plano de açãodo projeto pedagógico intitulado “Colorindo onosso tempo – as crianças descobrindo cores,materiais e o nosso espaço”, já que buscamosnas ações propostas promover a aprendizagemativa das crianças, que nada mais é do que o ex-

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Projeto pegagógico: por quê, quando e comoPAINEL 18

perimentar, direto e imediato, dos objetos, daspessoas e dos acontecimentos.

O CEI do bairro Rio do Ouro tem sua rotinadividida em tempos, e um deles é o da granderoda, em que as crianças conversam sobre as-suntos variados e compartilham experiências.

Nossa proposta para aquele dia eram as co-res do mundo, que inicialmente deixaram as cri-anças pensativas, mas logo desencadeou-se umasérie de observações a respeito dos objetos dasala, das roupas dos amigos, dos espaços exter-nos da escola e também da natureza. Nessa con-versa, as crianças concluíram que, em tudo nomundo, havia cores. Foi fascinante ver aquelesolhinhos, que, apesar de já conhecerem as co-res, nunca haviam parado para observá-las, paraobservar a sua organização e presença em nossomundo. Aqui utilizamos a música “Arco-íris”, daXuxa, que fala das cores presentes em nosso co-tidiano, incentivando as crianças para que acom-panhassem o ritmo com o material da bandinhae depois registrassem, por meio de desenhos, oque mais lhes chamou a atenção na música.

Mais uma vez, pudemos perceber a importân-cia e a relevância das cores no cotidiano de nossascrianças, o que nos conduziu a buscar em revistaso que mais lhes chamava atenção. Confecciona-mos um mural com todas as figuras escolhidaspelas crianças e recortadas pelas professoras, e ummundo de cores surgiu diante de nossos olhos.

Pedimos a colaboração dos pais para quemandassem uma fruta para o CEI, a fim de fa-zermos uma deliciosa salada. Como sempre,fomos atendidos, e as crianças empenharam-se em fazer uma enorme salada de frutas comas cores que estávamos observando.

Foi então que uma criança observou que nemtodas aquelas cores estavam presentes nas tintasusadas por elas em pinturas a guache. A profes-sora, então, conduziu-as para o espaço das artese questionou como elas poderiam ter mais cores,usando apenas aquelas que tinham no momen-to. Imediatamente, quase um coro, algumas cri-anças disseram: “Vamos misturar as tintas”. E foio que aconteceu. Experimentaram e descobriramas cores que faltavam e prepararam tintas paraque as outras turmas pudessem utilizá-las.

A alegria gerada pela descoberta não parou poraí. As crianças são como mágicos e sempre têm algo

mais para nos mostrar. Pensando nisso, resolvemosaguçar esse potencial, questionando sobre o arco-íris, se sabiam o que era, se já tinham visto. Perce-bemos que algumas demonstravam algum conhe-cimento. Resolvemos, em um dia ensolarado, nosdirigir ao pátio externo com uma mangueira namão, para que elas pudessem experimentar maisessa alegria de ver surgir um arco-íris.

O dia estava perfeito, ensolarado, e nossa ex-periência deu certo. E agora, o que fazer? “Nãopodemos nem devemos parar por aqui” – comen-tavam as professoras envolvidas. Surgiu, então, aidéia de confeccionar um arco-íris com as crian-ças. Resolvemos integrar, mais uma vez, a famíliae a escola. Enviamos um convite para os pais quequisessem participar de uma tarde com seus fi-lhos no CEI. Aproveitamos o momento para quea massa de modelar fosse elaborada com ajudadeles. Inicialmente foram feitas as massas nascores do arco-íris, utilizando-se uma receita ca-seira e os conhecimentos adquiridos anterior-mente na mistura das cores, para conseguiremtodas as tonalidades. Foi uma parceria e tanto. Ospais aproveitaram para aprender e ensinar, na re-lação com seus filhos, e desfrutar de mais ummomento de integração escola–família.

Essa história, nesse momento, não nos pare-cia ter fim. Para isso, novas idéias precisavam sur-gir. Recordamo-nos da música “Aquarela”, deToquinho e Vinícius de Morais, que foi mais umaalavanca para a nossa imaginação. Começamosescutando a música com as crianças e tentandoreconhecer o vocabulário desconhecido para sertrabalhado. Dividimos o grupo, que já contavacom 26 crianças, fora os adultos envolvidos, e nosdebruçamos sobre mais uma aventura. Um gru-po ficou responsável por dramatizar a música.Para isso deveríamos confeccionar o material aser utilizado; o outro acompanharia, durante aapresentação, com a bandinha da escola, o ritmoda música. Foi uma experiência e tanto!

Em outro dia, dirigimo-nos à nossa sala parao momento da conversa, que foi a respeito do mar,peixes, aquários, conchinhas. Esses nomes sãoutilizados em cada grupo como identificação dosespaços do CEI e foram escolhidos pelos alunosde cada grupo, por meio de votação. Nossa turmado GII, inicialmente assim denominada, perten-cia ao grupo do aquário. Pensamos na importân-

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cia do contato com a natureza e com os seres vi-vos e concluímos que deveríamos experimentara sensação de cuidar de um animalzinho – e nadamelhor do que um peixinho! Montamos um aquá-rio em nossa sala, aprendemos a cuidar de nossonovo “amiguinho” e a dividir as tarefas.

Posteriormente, criamos o dia da visita. Pen-samos que essa vivência deveria extrapolar o es-paço da escola e adentrar o espaço da família.Para isso enviamos um comunicado aos pais,explicando sobre nosso novo companheiro epedindo autorização para que o filho pudesselevá-lo para casa e ficar com ele por um dia. Fi-zemos um sorteio em sala e colocamos, em umgrande cartaz, o roteiro do peixinho, para que ascrianças pudessem tomar conhecimento e saberquando seria a vez de cada uma levá-lo para casa.

O dia em que a criança saia com ele da escolaera uma alegria só: peixe, comida, alegria, res-ponsabilidade, e todos ao caminho de casa!

Acreditávamos que ainda tínhamos muito porfazer com as cores e nos preparamos para a nossapróxima etapa, que envolveu um pintor famoso:Volpi. Por ele ter, em seus trabalhos, a presençadas cores e ser um artista brasileiro, consideramosconveniente um primeiro contato com suas obras.Fizemos a reprodução parcial da obra intitulada“As bandeirinhas”, que foi de fácil visualização paranossas crianças, já que fazem parte da cultura bra-sileira e puderam, assim, ser confeccionadas pornossos alunos. Nessa fase, pretendíamos – e nosfoi possível – contar também com a ajuda dos paisna criação de um ambiente apropriado para pin-tura, com cavaletes, avental etc.

ResumoO Projeto Gonzagão foi desenvolvido no Ensi-

no Fundamental (3ª e 4ª séries) pela Escola Muni-

cipal de Ensino Fundamental e Médio Miguel

Matias, vinculada aos Parâmetros em Ação, visan-

do resgatar e valorizar nossas tradições, assim como

promover a aquisição de conhecimentos sobre a

origem, as curiosidades, os cancioneiros, as dan-

ças típicas das festas nordestinas e ampliar o voca-

bulário dos envolvidos.

O trabalho foi direcionado para o desenvolvi-

mento da leitura, da escrita e da produção de texto

de maneira interdisciplinar, integrando conheci-

mentos nas diferentes áreas de ensino, numa visão

crítica ao preconceito social e lingüístico que

permeia o Nordeste brasileiro.

Com esse acervo cultural, objetiva-se divulgar

a arte e o saber do nosso povo, conciliando-o com

os trabalhos escolares e envolvendo a comunidade

e o poder público nessa realização.

Projeto Gonzagão –Experiência PCN em Ação

Rosemere da Silva Vieira

SME – Campo Alegre/AL

Relato da experiênciaCom sua sanfona, Luiz Gonzaga descobriu,

há décadas, um país diferente, com uma emo-ção enraizada em seus costumes e em seus mo-dos de vida. Uma paixão que era colocada parafora em forma de música, de versos de pé-que-brado e literatura de cordel. Em suas andanças,Luiz Gonzaga viu o futuro do Brasil em suasentranhas, com paisagens e povos que aindaestavam por ser descobertos.

No Nordeste, as pessoas que sofrem com aestiagem não têm recursos para investir em altatecnologia e, com isso, enfrentam o fenômenoda emigração, que causa sofrimento e angústianos que partem e nos que ficam. Junto com elesseguem a insegurança do desconhecido e a es-perança de um futuro melhor, como retrata tãobem o cantor e compositor brasileiro LuizGonzaga, conhecido como o “Rei do Baião”.

No ápice dessa contextura, essa região so-

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Projeto pegagógico: por quê, quando e comoPAINEL 18

fre com o contínuo preconceito social e lin-güístico. Portanto, decidimos explorar esse uni-verso cultural, que divulga tão bem a vida donordestino, com suas dificuldades, seus senti-mentos e seus talentos, que comove todo o ter-ritório nacional.

Pretendemos, então, proporcionar aos nos-sos alunos, principalmente aos que não tiveramacesso ao cancioneiro de Luiz Gonzaga, a opor-tunidade de conhecer, perceber e resgatar ovalor cultural que ele representa para o Brasil,promovendo a aquisição de conhecimentos so-bre a origem, a linguagem, as curiosidades, ascanções e as danças típicas das festas nordes-tinas, ampliando o vocabulário e associando-o aos trabalhos escolares de maneira signifi-cativa e prazerosa.

Com esse acervo cultural, objetivamos es-pecificamente:

• explorar a biografia de Luiz Gonzaga e esti-mular a apreciação de seu cancioneiro;

• entender e respeitar o dialeto regional dosertão;

• discutir problemas sociais do Nordeste;

• estimular a consciência crítica e despertarpara a importância de preservar o meio am-biente;

• apreciar textos musicais, analisando-os apartir da aplicação real da gramática e pro-duzir novos textos;

• trabalhar a ortografia inserida nos textos;

• organizar um coral para interpretar os gran-des sucessos de Luiz Gonzaga;

• desenvolver um programa de caça-talentos;

• envolver a comunidade e o poder públicona realização dos trabalhos.

O projeto foi desenvolvido em etapas su-cessivas e obedeceu ao processo descrito a se-guir.

Inicialmente, foram detalhados os conhe-cimentos prévios dos alunos sobre o cantor ecompositor Luiz Gonzaga e as questões colo-cadas por ele sobre os problemas sociais en-frentados pelo nordestino. Os professores con-cluíram que esse conhecimento se limitava aalgumas músicas tocadas no mês de junho. Osalunos sabiam que o cantor e compositor era

sertanejo, mas não conheciam a sua história ea sua importância na cultura nordestina. Re-lataram que, em casa, tinham fitas cassete, masnão gostavam de ouvi-las, porque tinham pre-ferência por outros ritmos, como axé, pagodee reggae, que eram mais tocadas no momento.Em seguida, foi realizada uma reunião de paise professores para divulgar o tema do projeto,sua importância e a necessidade da ajuda dafamília com recortes de jornais, revistas, livros,CDs, vídeo etc.

Após esse contato, os professores selecio-naram material informativo como subsídio depesquisa para os alunos e lançaram as propos-tas de construção do conhecimento, por meiodas atividades solicitadas no decorrer do de-senvolvimento do projeto, ou seja, à medidaque eram solicitadas informações, os alunospesquisavam no banco de dados. Alguns tex-tos oferecidos foram retirados dos sites <http:/www.mpbnet.com.br/musicos/luiz.gonzaga/index.htm> e <http://www. bhnet.com.br/~expaco/oreiluizgonzaga.htm>, que informamtoda biografia do cantor e compositor, suas di-ficuldades e conquistas, até ser consagradocomo o “Rei do Baião”.

No site <http://www.tocasite.hpg.com.br/origem.htm>, conseguimos textos sobre a his-tória do forró e a mistura de ritmos, princi-palmente o baião, aliado ao xote, ao xaxado etambém ao coco. No site <http://www.vicepresidenciadarepublica.gov.br. português/ARTIGOS/luizgonzaga.htm>, oferecemos al-gumas publicações importantes de MarcoMaciel, vice-presidente da República, que re-lata a contribuição das composições de LuizGonzaga para a política e a cultura e destacaque foi na composição da música “Asa Bran-ca” que Luiz Gonzaga criou o hino do Nordes-te, o Nordeste na sua visão mais significati-vamente dramática, o Nordeste na aguda cri-se da seca.

Além desses textos, foi consultada a Enciclo-pédia Ilustrada do Conhecimento Essencial, 1998,by Reader’s Digest Brasil Ltda.; a revista NovaEscola, p. 34, 35 e 39, de abril de 2001, e dicioná-rios da Língua Portuguesa, na busca do signifi-cado de algumas palavras apresentadas. Com asinformações adquiridas, organizou-se uma ex-

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posição de gravuras, relatos e textos informati-vos no mural da escola. Partindo dos textos ofe-recidos, os alunos da 4ª série fizeram uma rees-crita individual da biografia de Luiz Gonzaga,que foi transformada em reescrita coletiva. Fo-ram expostos também trabalhos de produção ereescrita de textos sobre a seca no Nordeste, rit-mos, danças, entre outros, acervo cultural a quetodos que circulavam tinham acesso.

Além das apresentações e da entoaçãodas músicas cantadas e tocadas por ele e poroutros intérpretes, também foram apresen-tados instrumentos musicais utilizados nasdiferentes modalidades rítmicas, como forró,baião, xote e xaxado. Os instrumentos apre-sentados e explorados foram zabumba, san-fona e triângulo, sobre os quais, antecipada-mente, se fez pesquisa para saber o signifi-cado de suas denominações. Os alunos apre-ciaram e até mesmo treinaram o toque des-ses instrumentos.

Durante a exposição dos textos musicais,o trabalho com gramática e ortografia foi efe-tivado por meio de debates, reescrita e pro-dução de textos. Com a música “Asa branca” e“Triste partida”, os professores mostraram odialeto regional de Luiz Gonzaga, aproveitan-do para trabalhar a ortografia e a gramáticapor meio do texto lacunado. Os alunos, aospoucos, preencheram as lacunas obedecendoàs normas ortográficas da linguagem formal.

Com a letra da música “Assum preto”, fo-ram debatidos os crimes contra a flora e afauna e, nesse momento, as crianças relata-ram algumas maldades que presenciaram epraticaram. E quanto às que praticaram, pro-meteram não mais fazê-lo. Após esse traba-lho, foi feita a produção de texto sobre a mal-dade dos homens contra a natureza. Entre asmúsicas trabalhadas, a que mais comoveu foi“Fogo-apagou”, que conta a história do me-nino que matou uma rolinha para saciar a suafome e, assim, prolongar sua própria vida. Issogerou uma grande discussão. A música consi-derada de maior interesse pelos alunos foi “Oxote das meninas”, pelo ritmo e pela letra, queagradam as crianças e os adolescentes, vistoque ela fala da chegada da adolescência e dodespertar para o namoro.

Observamos que, durante a exposição dasmúsicas e as discussões sobre as letras, hou-ve sensibilização dos alunos. Eles se mostra-ram comovidos e solidários com os problemasque a miséria causa ao povo nordestino, quan-do ouviram, principalmente, a música “Tristepartida”, que conta a situação dos emigrantesda região, e quando alguns alunos expuserama situação de seus pais, que estão em outrasregiões, como Mato Grosso, São Paulo e Goiás,trabalhando para o sustento de sua família.Quanto a essa situação, uma criança disse:“Aqui não tem emprego para todos, estávamospassando fome e meu pai foi arranjar dinhei-ro em outro lugar”.

Consideramos que houve uma participa-ção ativa dos envolvidos, inclusive dos alunosque, nessa oportunidade, conheceram o Nor-deste, explorando-o de forma interdisciplinar,apresentando uma aprendizagem significati-va, que muito contribuiu para crescimentosocial, cultural e intelectual, questionandofatos e sugerindo alternativas de melhoria naqualidade de vida do povo nordestino.

O Projeto Gonzagão teve sua culminânciano dia 22 de junho e, como se tratava tambémdo estudo das tradições especificamente nor-destinas, nosso projeto destacou que, além dosproblemas que enfrentamos no dia-a-dia, te-mos também a alegria das festas juninas, comdesfile pelas principais ruas da cidade, mos-trando em alas a vida de Luiz Gonzaga, que éum exemplo vivo da vida do nordestino.

Os alunos e professores, caracterizados,carregavam faixas e cartazes que, além decontar a história, destacava também os pro-blemas sociais mais graves, como a fome, asede, a exploração do trabalho braçal, o pre-conceito e a tristeza da incerteza do amanhã.Após o desfile, já na escola, pais, professores,alunos e comunidade participaram da festa eapreciaram as danças, os pratos típicos, asvestimentas e os fogos que embelezam e atra-em multidões. Realizamos uma grande festacom a participação do sanfoneiro da cidade,que estava caracterizado a rigor.

Ao final do projeto, concluímos que nadaseria possível se não houvesse a participaçãocoletiva de diretores, professores, alunos,

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Projeto pegagógico: por quê, quando e comoPAINEL 18

como também a participação da família, o en-volvimento da comunidade e até mesmo depessoas influentes na cidade, como o prefei-to, os vereadores, a secretário de Educação, ogerente do Banco do Brasil e os comerciantesque contribuíram financeiramente e se fize-ram presentes no encerramento do projeto.

Consideramos esse projeto como umgrande avanço na formação continuada dosprofessores, que vem mostrando, de formaclara e objetiva, a importância de um traba-lho sistemático e coletivo, gerando situaçõesde conhecimento, ao mesmo tempo, reais e

diversificadas, e proporcionando, assim, umaaprendizagem ativa, interessante, significati-va, real e atraente para os alunos.

Os professores envolvidos no estudo dos PCNem Ação já entendem que ninguém começa a teriniciativa e autonomia sem ter tido a oportuni-dade de escolher, opinar, criticar e dizer o quepensa e sente. E o projeto pedagógico oferece ocaminho mais curto para o saber, como destacaDewey, quando diz: “Todo conhecimento verda-deiro deriva de uma necessidade. A humanida-de desenvolveu-se tratando de obter conheci-mentos que satisfizessem às suas necessidades”.

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PPPPP A I N E L A I N E L A I N E L A I N E L A I N E L 1919191919

LEITURA NA ALFABETIZAÇÃOJacinta de Fátima Camargo Barbieri e Luciana de Almeida Santos

Eliane Mingues

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228

ResumoO objetivo deste relato é apresentar o traba-

lho que vem sendo desenvolvido pelas professo-

ras da Educação Infantil e Ensino Fundamental de

1ª a 4ª séries, na rede municipal de ensino de

Itapetininga–SP, com o uso das práticas de leitura

na alfabetização.

Essas práticas de leitura são desenvolvidas em

atividades permanentes, asseguradas por um

organograma curricular semanal, com as seguin-

tes estratégias: “Roda da biblioteca”; “Reconto” (lei-

tura de conto infantil, de livre escolha do aluno, que

expõe à classe a sua compreensão do texto lido e

estudado em casa); “Momento da poesia”, que tem

por objetivo o prazer e o gosto pela poesia; “MPB”

– audição e leitura de repertório de compositores

brasileiros; “Hora da curiosidade”, que consiste na

leitura de textos científicos trazidos pelo professor

e pelos alunos; “Caderno de textos”, inicialmente,

com textos de memória, ao qual, no decorrer do

ano letivo, vão sendo agregados textos literários, ou

não, lidos com a ajuda do professor, que desper-

tam na criança o gosto pela leitura.

Além dessas, outras práticas vêm sendo desen-

volvidas pelos professores, contando, primeira-

mente, com a participação dos pais. Exemplo dis-

so é a “Leitura comunitária”: a criança leva o livro e

um caderno, no qual os pais relatam como foi o

momento de leitura feita para o filho. Depois, há a

participação da comunidade (radialistas, parentes,

professores, coordenadores, escritores regionais

etc.), que são convidados para a “Roda da leitura”.

Com o objetivo de despertar o gosto pela lei-

tura, o professor lê para seus alunos notícias e re-

portagens em evidência ou de interesse da classe,

de jornais e revistas, podendo ser, posteriormente,

comentadas pelo grupo. Esses suportes são colo-

cados no acervo da biblioteca da classe e lidos na

“Roda da biblioteca”.

Leitura, a alma da alfabetização:práticas de leitura nas escolas domunicípio de Itapetininga/SP

Jacinta de Fátima Camargo Barbieri e Luciana de Almeida Santos

SME – Itapetininga/SP

O objetivo deste relato é apresentar o trabalhoque vem sendo desenvolvido pelos professores daEducação Infantil, Ensino Fundamental de 1ª a 4ªsérie e da Educação de Jovens e Adultos, com ouso das práticas de leitura na alfabetização.

Não há a intenção de ensinar nada, apenasde confirmar que é possível ensinar a ler e alfa-betizar segundo alguns teóricos, que é possívelrealizar ações que pareciam utópicas.

Essas práticas de leitura são desenvolvidasem atividades permanentes, asseguradas por umorganograma curricular semanal, com as seguin-tes estratégias: “Roda da biblioteca”; “Reconto”;“Momento da poesia”; “MPB”; “Leitura de cader-no de textos”; “Leitura de jornais e/ou revistas”;“Curiosidades” e “Roda da leitura”.

Reunir-se para ouvir alguém ler nas escolasda rede municipal tornou-se uma prática co-mum e prazerosa. Como exemplo, a Escola Mu-nicipal de Educação Infantil (EMEIF) Professo-ra Nazira Iared, que vem conquistando a comu-nidade, tornando-a participativa e comprome-tida com o processo ensino-aprendizagem.

Toda a semana, na sala de aula da profes-sora Ana Maria, há a presença de pessoas quepertencem a diferentes segmentos da socieda-de, como jornalistas, radialistas, professores,escritores, pais, coordenadores, que são con-vidados para compartilhar um texto com ascrianças.

A grande conquista é a participação dospais. Eles vão à escola, escolhem livros, “estu-dam” e, no dia marcado com a classe, pedemdispensa do trabalho e fazem a leitura. Lêem àsua maneira. Muitos se emocionam junto comas crianças. O grupo, atento, ouve cada pala-vra. Após a leitura, alguns pais contam suas im-pressões espontaneamente e buscam ouvir oque as crianças acharam da história. A profes-

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Leitura na alfabetizaçãoPAINEL 19

sora, nesse momento, também é uma ouvinteatenta e compartilha, juntamente com as crian-ças, a “Hora da história”.

Os alunos vivenciam leituras, testemu-nhando o leitor como autor, ouvem as palavrascom sons e gestos diferentes dos da professo-ra e de seus amigos.

O objetivo da professora Ana Maria, comseus alunos de 3a série, além de despertar o gos-to pela leitura, de promover a escuta atenta,ouvir diferentes pessoas da comunidade conhe-cidas ou desconhecidas das crianças, para queelas aprendam os diferentes modos de ler, tam-bém motiva as crianças com idade avançada aprosseguir em seus estudos para aprender a lere escrever de maneira diferente das que já fo-ram por elas vivenciadas.

Como justificativa, a professora diz que hádiferentes maneiras de ouvir ou ler um texto, ea escolha do livro a ser lido não é feita ao acaso:é socialmente aceitável, tanto para o leitor,como para o público. A compreensão da fun-ção social da escrita só pode ocorrer se a crian-ça tem múltiplas oportunidades de interagircom diversos tipos de suportes de textos, pro-duzidos em diferentes situações discursivas.

A partir do conceito formado, a professorade 2ª série, Fabíola, da EMEIF do bairro daVarginha, zona rural, investiu para conquistarsua turma, no intuito de alfabetizá-la. Apostouna leitura. Levou para sua sala revistas, jornais,livros. Entre os livros apresentados, o que maischamou a atenção das crianças foi Matilda, deRoad Dahl. A classe ouviu atentamente cadapalavra do livro. Empolgada com a turminhaque falava e escrevia sobre a história lida, a pro-fessora levou o filme de mesmo nome. As cri-anças puderam fazer um paralelo entre o textoescrito e o filme, relatando que nem tudo o queestava escrito passou no filme e vice-versa. De-ram opiniões a respeito do livro e do vídeo. Nomomento, o que mais marcou foi a fala de umaaluna: “Gostei muito do vídeo, mas gostei mes-mo foi de ouvir a professora lendo a história,porque, enquanto eu ouvia, parecia que eu es-tava dentro da história. Eu ‘senti’ a história”.

As crianças puderam falar e expressar-se livre-mente, escrever sobre o livro e o filme, porque a pro-fessora não ficou apenas cumprindo uma função

burocrática. Ela propôs um momento prazeroso esignificativo, em que seus alunos tiveram a oportu-nidade de testar as suas hipóteses, de começar aentender que a ação de ler e escrever segue ummesmo caminho, possibilitando-lhes, por um mo-mento, verem-se como escritores e leitores.

Sabe-se hoje que só é possível aprender aler, lendo, e a escrever, escrevendo. Portanto, alinguagem concebida como atividade e meio deinteração deverá ser considerada em uso emsituações concretas e significativas. E como elase manifesta sob a forma de textos (orais e es-critos), eles serão tomados como unidades doensino de língua, destacadas suas funções,especificidades, seus modos de construção, osportadores (ou suportes) em que aparecem etc.

Como uma criança aprende a ler? Ou é pos-sível ler sem saber ler? Muitos são os que fazemtais perguntas. Ainda há muita dúvida em rela-ção à segunda questão.

O trabalho que a professora Vera, da EMEIFValter Aliberti Júnior, faz com sua turma de Pré,não responde objetivamente às dúvidas, porém,faz a professora refletir sobre a sua prática, le-vando-a a acreditar, sim, e a provar que é pos-sível ler mesmo sem saber, trabalhando comfolheto de propaganda, por exemplo, de prefe-rência um que não seja do conhecimento dacriança, mas pertença ao seu mundo. A classe,usando das estratégias de leitura, além da boaintervenção da professora, vai identificando oconteúdo do suporte de texto. Os alunos vãoreconhecendo o valor dos números dentro docontexto social (telefone, endereço, peso, me-didas etc.); identificam as letras dos nomes e,aos poucos, os pequenos conseguem fazer aqui-lo que parecia impossível: a leitura.

O que há por trás da ação da professora é ofato de ela acreditar que é possível, sim, lermesmo sem saber e, que, avaliando, observan-do, com conhecimento é possível saber como acriança aprende a ler.

Conceber um ato de leitura em que são dadasas oportunidades de acionar as estratégias de lei-tura determina um acionar pedagógico particu-lar, que, por certo, não vai consistir em “ensinaras letras” e os sons correspondentes, mas, sim, emoferecer às crianças situações que estimulem aantecipar, inferir, decodificar e avaliar.

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Utilizando o folheto de propaganda, a pro-fessora deu oportunidade às crianças para quecoordenassem a informação da imagem com ascaracterísticas do texto, a fim de anteciparem oque estava escrito no papel. Elegeram letrascomo índice para antecipar o conteúdo do tex-to, questionaram-se e corrigiram dados que nãoconferiam com suas antecipações; coordena-ram os dados gráficos – letras e sua configura-ção – com outros elementos (gráficos ou não),de modo a obterem significados.

Sabemos que o modelo cumpre um papelfundamental no processo de aprendizagem egarante muitas possibilidades de ampliar o uni-verso cultural e de entrar em contato com omaior número de informações, tanto na lingua-gem oral, como na linguagem escrita.

Portanto, é muito importante que os profes-sores criem momentos e planejem situações emque a interação com a escrita, em processos deleitura e produção, possibilite a construção pelacriança da escrita, da linguagem escrita e desuas propriedades, o que significa garantir queas relações entre o conhecimento que a criançatem sobre a escrita (hipóteses) e a escrita comoela é sejam relevantes, e não arbitrárias.

É importante também saber que ler e escre-ver como atividade de linguagem são faces deum mesmo trabalho, ainda que sejam proces-sos diferentes.

Foi de fundamental importância para o nos-so trabalho de coordenação o envolvimento comos programas do MEC, PCN em Ação e PROFA,com a finalidade de apresentar alternativas deestudo, promovendo o debate e a reflexão sobreo papel da escola e o do professor na perspecti-va de uma prática de transformação da ação pe-dagógica, pois foi possível complementar o pro-cesso de formação que a Rede Municipal de Edu-cação de Itapetininga vem desenvolvendo, hámuito tempo, com os professores da EducaçãoInfantil e, hoje, se estende ao Ensino Fundamen-tal e à Educação de Jovens e Adultos.

Muitos professores já adotaram em sua prá-tica pedagógica o uso de textos para alfabetizare incorporaram a prática de leitura, tornando-se leitores. Entre tantas, além das já menciona-das, citamos aqui aquelas que contribuíram deuma forma ou de outra com nosso relato: Leni,Bete, Silvana, Giseli, Tereza e Vanessa, da EMEIFProfª Nazira Iared; Lucilene e Ana Joaquina, daEMEF do bairro do São Roque; Tereza, da EJA.

O que significa mesmo ser um sujeito alfa-betizado, nos dias de hoje?

Será que o trabalho de alfabetização, comjovens e adultos, pode ter como pano de fundoa variedade de textos que circulam socialmen-te para que estes pensem sobre a leitura e a es-crita? Como? De onde retirar essa diversidade?O que propor que façam com tais textos? Comonão transformá-los em cartilha, repetindo comesses escritos aqueles mesmos exercícios me-

Mostrando a língua – possibilidadesde trabalho com a escrita e a leituracom jovens e adultos

Eliane Mingues

PCN em Ação/MEC

cânicos e sem sentido, que pressupõem que osujeito nada sabe sobre esse objeto com o qualele interage, cotidianamente, por meio dos es-critos espalhados pelo mundo e tão na frentede seus olhos e ao alcance de suas mãos?

Mas o que podemos afirmar e pensar queesses indivíduos não sabem? Não sabem jun-tar as letras? Desenhá-las? Não sabem comoelas se chamam?

E se pensarmos no contrário, ou seja, na expe-

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Leitura na alfabetizaçãoPAINEL 19

riência que eles têm com a escrita que está nomundo? O que podemos afirmar e pensar que sa-bem? Será que sabem o que é um jornal e o queencontrar nele? Será que sabem, só de olhar, se umescrito pode ser uma receita ou uma carta? Seráque conseguem ler nos grandes painéis, espalha-dos pela cidade onde vivem, o nome dos produtosque consomem? E o nome dos bancos onde po-dem ter conta, será que sabem identificar os dife-rentes estabelecimentos que existem lendo seusnomes, e entrar e resolver seus problemas na agên-cia certa? E as contas de consumo que costumamreceber em suas casas? O que será que podem re-tirar de informações dessas contas? Será que iden-tificam a escrita de seus nomes? São capazes depegar o ônibus certo para determinado lugar ondeprecisam ir? E comprar um disco do cantor quegostam? Será que podem fazê-lo sem errar, ou tro-cam todas as bolas, ou seja, todos os nomes?

Essas e outras questões costumam aparecercom freqüência, quando o assunto tratado diz res-peito ao como é possível alfabetizar com textos.

Pensar no conceito, ou seja, o que se enten-de por alfabetização, é determinante nesse con-texto. Se entendermos que, para aprender, o su-jeito deve pensar e ter bons problemas para re-solver, deve poder ter acesso a informações e aum bom modelo da língua que se lê e que se es-creve, e que o objeto a ser conhecido deve man-ter suas características de objeto social de conhe-cimento, faz todo sentido organizar situações etrazer para dentro da sala de aula os textos deverdade, aqueles retirados do cotidiano e quecostumamos usar para obter informações, co-municar, nos divertir, fazer pensar.

São os textos extraídos dos jornais, das le-gendas de fotos, os poemas, os textos informa-tivos, as piadas, as receitas, as regras de jogos,enfim, aqueles com os quais, mesmo sem sa-ber ler e escrever, os estudantes jovens e adul-tos têm contato, acesso e conhecimento prévio.

Se, por outro lado, o que ainda se acredita éque o sujeito nada sabe e precisa começar dozero, aprendendo primeiro o desenho de letras,o som que elas possuem e seus nomes, aí ficainviável pensar em situações de verdade, ou seja,situações em que os textos apareçam inteiros,carregados de significado, e com os quais já seconstruiu uma boa experiência durante a vida.

Por onde começar,ou possíveis conteúdos

A partir dessa concepção, algumas sugestões deconteúdos para esse trabalho são:

• Leitura diária, pelo professor e pelos alunos,dos textos de circulação social para aprecia-ção e diversão, para a busca de novas infor-mações, para aprender mais sobre um assun-to, para revisar os textos, para observar comoum autor resolve suas questões em relação àescrita etc.

• Escrita diária, do professor e dos alunos, dostextos de circulação social para saber escre-ver considerando a função e a estrutura dosdiferentes tipos de textos, para saber utili-zar a escrita como recurso no desempenhode suas funções, para aprender a resolverquestões impostas no ato da escrita (orto-grafia, pontuação, gramática etc.), para de-senvolver o papel de revisor, por meio doestudo de bons modelos de textos, da escri-ta em duplas, individual ou em grupos, darevisão coletiva, individual ou com o apoioda professora.

• Participação em eventos de oralidade paraaprender a ouvir e aprender a participar, ex-pressando opiniões de forma crítica.

Como avaliar nesse contexto?A avaliação, nesse processo de ensino e

de aprendizagem, torna-se constante a par-tir das produções dos alunos; da observaçãoem relação à participação, ao interesse e aodesempenho na realização das atividades; dapostura como membro de grupo, consideran-do-se sempre os avanços individuais e dogrupo.

Os instrumentos mais utilizados são: astabulações das aprendizagens ocorridas nasseqüências de atividades, feitas por meio de umquadro em que se pontua o que é mais signifi-cativo na produção de cada aluno; provas quesistematizam conteúdos aprendidos; bilhetesindividuais que apontam problemas a seremresolvidos ou salientam as boas soluções encon-tradas; observação e registro do desempenhodos alunos.

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Traduzindo em miúdos…A partir de tudo que já foi dito, como, en-

tão, o trabalho pode ganhar forma, contorno,vida? É no dia-a-dia, encontro após encontro,nas atividades, discussões, leituras e produçõesque os alunos vão tendo problemas a resolver.

Pode-se estruturar uma rotina que compre-enda, em Língua Portuguesa:

• Atividade permanente: leitura compartilhadada obra de um autor consagrado, feita peloprofessor.

• Leitura individual: diversidade textual.

• Escrita individual ou em pequenos grupos:diversidade textual.

• Análise e reflexão sobre a língua: revisão textual.

Exemplo de trabalho com a leituraEm que situações, além daquelas vivenciadas

por leitores particulares, pode-se ouvir em vozalta e acompanhar o texto, numa situação de lei-tura compartilhada dos livros O conto da ilhadesconhecida, de José Saramago, prêmio Nobelde literatura; Alexandre e outros heróis, deGraciliano Ramos, conhecido autor regionalista;Morte e vida severina, do consagrado João Cabralde Melo Neto; As janelas do Paratii, escrito porAmyr Klink; O Xangô de Baker Street, de Jô Soa-res, entre outras histórias?

Com muita sorte, isso pode ocorrer em al-gum momento da escolaridade, quando, cons-cientes do papel da leitura de autores consagra-dos, professores, bibliotecários ou outros com-partilham com os alunos suas experiências lei-toras, fazendo “rodas” ou seções de leitura emvoz alta. Com jovens e adultos que retomaramseus estudos, essa oportunidade poderá serúnica; portanto, os responsáveis por esse tra-balho não deveriam deixar de fora a literatura.Aquela que o professor aprecia, gosta e que senão for pela voz dele, o professor, esses alunosjamais terão a oportunidade de conhecer, gos-tar e mergulhar no mundo das letras.

Dispor de bons livros na sala de aula, teracesso a eles e poder conhecer alguns clássicosé sem dúvida uma situação privilegiada de tran-sitar pelo mundo dos livros e aprender com eles.Os textos citados acima são apenas algumas

possibilidades de concretizar esse trabalho. Es-sas leituras, realizadas pelo professor, se diáriase de boa qualidade, podem comunicar aos alu-nos comportamentos leitores muito importan-tes, além de servir como matéria-prima paraproduções futuras. Um aluno que tem um mo-delo pobre de língua que se escreve, normal-mente tende a apresentar uma produção pobrecomo resultado do que vivenciou. Já um alunoque tem contato com o que há de melhor nomundo da escrita poderá, quando solicitado,produzir textos de melhor qualidade.

Sobre a escrita, que sugestões deatividades podem ser propostas?

A elaboração de murais para o refeitório daescola, seus corredores, sua porta de entrada, ou,ainda, de um mural ambulante, que coloca à dis-posição das outras pessoas que freqüentam a es-cola parte do que estão aprendendo, pesquisando,descobrindo, podem propiciar ótimas situaçõesde produção de escrita e de uso desta.

Organizar um caderno de receitas ou umacoletânea dos poemas mais apreciados pela tur-ma, elaborar um baralho com dicas culturais dacidade, um livro de “o que é, o que é” ou de pia-das, montar um jornal ou um álbum de família,entre outros, podem ser situações de uso daescrita bastante interessantes.

Os jogos, como as cruzadinhas, a forca, o caça-palavras, podem ser situações interessantes deaprendizagem para se pensar nas letras, em seussons e nas suas posições nas palavras, e não dei-xam de ser situações de verdade do uso da língua.

Mas como propor tudo isso, se esses jovensadultos não ainda não lêem e não escrevem? Opapel do professor, como aquele que vai aju-dando, colocando problemas, dando forma aoque os alunos pensam, é fundamental. Ele seráuma peça básica, pois dele dependerá, em mui-tas ocasiões, a escrita do que os alunos podemproduzir oralmente, a leitura que eles sozinhosainda não podem fazer, enfim, a organização detudo que for proposto.

O que não se pode perder de vista é que ocardápio que se vai oferecer não muda nunca,ou seja, vamos continuar a propor que os estu-dantes leiam, escrevam, copiem, façam ditado,

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Leitura na alfabetizaçãoPAINEL 19

interpretem o que estão lendo. O que vai mudaré a qualidade do que será proposto, ou seja, tex-tos bem escritos e de verdade, a interferênciaconstante do professor durante todo o proces-

so e a consciência de que se aprende a ler len-do, e a escrever escrevendo, tendo como panode fundo bons problemas para se resolver e boasquestões para pensar.

Anexos

Exemplos de produções escritas de umgrupo de jovens adultos estudantes

A produção de autobiografias inspiradas notexto “Auto-retrato” de Graciliano Ramos, rea-lizada pelo grupo, possibilitou uma brincadei-ra divertida com a língua escrita: a leitura dostextos para que se adivinhasse quem eram seusautores. Os alunos leram o texto original doautor várias vezes e puderam consultá-lo nahora da produção.

Os alunos que ainda não escreviam conven-cionalmente produziram uma primeira versãoditando o texto para a professora. Outros produ-ziram o texto oralmente e depois, com a ajuda deum gravador, o professor foi dando forma escritaa ele. Os que já escreviam produziram autono-mamente seu próprio texto. Uma outra propostafoi a de que aqueles que já escreviam irem ano-tando o que ditavam os que não escreviam. De-pois dessa etapa, os textos foram lidos em voz altapela professora, para que todos os alunos comen-tassem o seu conteúdo. Todos passaram a limpoo texto revisado, que só posteriormente ganhoua formatação digitada que foi para um livretointitulado Adivinhe quem é quem…

A seguir, trechos do livreto.

Se você acha que conhece todos os que es-tão nesta turma, teste seu conhecimento. Abai-

xo de cada auto-retrato, existe um espaço paraser preenchido com o nome do personagemautobiografado.

Se tiver dúvidas e não conseguir resolver oenigma, vá até o final da sessão e recorte os no-mes que estão na ordem correta de apresentação

dos textos no livro e cole-os no lugar indicado.Boa sorte, e aproveite para conhecer mais

detalhadamente quem se apresenta, então, a

seguir…

Auto-retrato aos 38 anos(texto produzido em parceria)

Nasceu em 1960, em Lagedão, BahiaCasado duas vezes, tem quatro filhosAltura: 1,68Sapato nº 40Pesa 58 quilosGosta de andarGosta de vizinhos, sendo cada um na sua casaGosta muito de rádio e televisãoDetesta quem fala altoUsa óculosGosta de comida mineiraAdora frutasGosta muito de música sertanejaAma muito seus filhosÉ católico não-praticantePrimeiro livro que leu: “O Xangô”, de Jô SoaresFuma cigarros “Free”Gosta muito de praia e de marGosta de pescarTem uma gastrite nervosa que o incomoda muitoEspera morrer quando Deus quiser.

Autor:

Auto-retrato aos 33, quase 34 anos(texto produzido autonomamente)

Nasceu em 1965, em São Carlos do Ivaí, ParanáCasado uma única vez, tem dois filhosAltura: 1,80Sapato nº 40Colarinho não sabeGosta da cor azulGosta de andarGosta de vizinhos a distânciaTem horror às pessoas que falam altoNão usa óculos, não é calvo, mas tem os cabe-

los bem grisalhosNão tem preferência por nenhum tipo de co-

midaGosta de frutas ácidasAdora saladas verdes

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Só come coisas doces em raras exceções

Gosta de todo tipo de música, principalmente

as sertanejas antigas

Gosta de ler e os livros que mais gostou foram

“O Pássaro Pintado”, mas não se lembra do

autor, e “Ilusões”, de Richard Bach

Romancistas brasileiros que mais lhe agradam:

Jorge Amado, Jorge Amado e Jorge Amado

Detesta palavrões escritos e falados

Deseja a morte da violência, da corrupção e

do ódio

Escreve poucas coisas à noite bebendo e ou-

vindo música mas somente quando se sente

sufocado

Fuma cigarros “Derby” ou de qualquer outra

marca

Já foi office-boy, militar do E.B., guarda de car-

ro-forte, ajudante de tecelão, porteiro e, atual-

mente, supervisor de produção

Apesar de o acharem pessimista, prefere dizer

que é realista

Está sempre na defensiva e é extremamente

desconfiado

Detesta se sentir enganado ou ver os outros se-

rem enganados

É altruísta, idealista e sonhador

Gosta de roupas sociais, mas ainda não tem ne-

nhuma

Lê e relê o que sempre escreve, buscando uma

perfeição que nunca consegue

Nunca esteve preso

Gosta de polícia na maior distância possível

Seus maiores amigos: Pai, Mãe, Irmãs, Irmãos,

Tios e Primos

Tem muitas dívidas, a maioria de gratidão

Não espera morrer, pois só pensa na vida

Seu maior prazer é pescar com seu maiores ami-

gos

Gosta de cutucar a onça com vara curta, para

se fortalecer

Gosta de falar através de frases feitas

Gosta de falar, mas conserva o medo de não

ser bem compreendido

Sabe o que quer e vem abrindo portas a vida

inteira à procura das portas certas

Encerra observando a esposa, porque na sua

mente já entra o forte do seu ser, que é o de

buscar respostas para tudo.

Autor:

Auto-retrato aos 41 anos(texto ditado para a professora)

Nasceu em 1957, em Indaiatuba, São PauloCasado, tem duas filhas lindasAltura: 1,74Peso: 79 quilosSapato nº 39Gosta de carroGosta do trabalho que executaGosta da famíliaNão gosta de muito barulho nas horas de lazerGostava muito de seu pai, falecido há pouco tempoGosta de música, desde que seja em volume

baixoGosta de futebol, mas só assiste quando é de-

cisão de final de campeonatoGosta de viver todos os momentos, pois acha

que a vida é curta.

Autor:

Outro importante trabalho com a leitura e aescrita consistiu em aprender a selecionar infor-mações relevantes de um texto, que se traduziue materializou em textos informativos em formade “você sabia”. Aqui, os alunos tiveram acesso amuitos textos sobre animais; cada um escolheuum bicho para saber mais e, a partir dos escri-tos, selecionaram as informações que acharammais importantes. Assim como no exemplo aci-ma, a produção foi marcada por uma variedadede procedimentos escritores, de acordo com acompetência de cada um (produção autônoma,produção ditada para a professora ou parceiromais experiente, gravada e posteriormente trans-crita, ou, ainda, cópia de trechos do texto origi-nal – todas seguidas de revisão).

Seguem amostras de algumas produções:

ExposiçãoAnimal

Você sabia que o tatu peba é um dos poucos ani-mais que continuam sendo caçados apesar da legis-lação que proíbe a matança dos animais silvestres?

Geciel Viera Cassiano

Você sabia que o gambá foi o primeiro bichoamericano conhecido na Europa?

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Leitura na alfabetizaçãoPAINEL 19

O navegante Vicente Pinzón levou uma fê-mea no navio, e ficou encantado com a bolsa queela tinha na barriga, onde apareciam as cabeçasdos gambazinhos curiosos.

Você sabia que o gambá mede 47 cm, mais37 cm de rabo?

Judivan

Você sabia que, pelo tamanho, o leão parti-lha com o tigre o primeiro lugar entre os grandesfelinos?

Um macho adulto pode medir até três metrosde comprimento do focinho à ponta do rabo, epesar mais de 230 quilos?

Cícero Fernandes

Você sabia que o veado mateiro é castanho?Vive na América do Sul?Pesa até 25 quilos?Mede 90 cm de altura?Come folha e capim?Tem uma gestação de 217 dias?O veado é castanho tendendo para cor fer-

rugem, mas quando filhote é todo pintadinho.Essas manchinhas brancas sobre o pêlo mar-rom ajudam o veadinho a se camuflar no meioda mata.

Você sabia que o veado mateiro perde o chi-fre a cada ano e cada vez que o chifre nasce eleé maior?

Nadi

Exemplo do trabalho com poemasque resultou num livro

Apresentação do trabalho feita pelaprofessora

É com muito orgulho que apresento o pro-duto final de escrita do nosso trabalho de Lín-gua Portuguesa.

Em síntese, ele é parte da história deste gru-po que, durante um ano, leu muitos poemas,devorou crônicas, apreciou romances e, portan-to, pôde se dedicar com afinco à tarefa, mais doque árdua, de produzir textos escritos.

Espero, realmente, que apreciem os poemasinventados!!!

Só tenho elogios a fazer a quem, com de-

dicação, freqüentou as aulas e pôde descobrirou redescobrir os prazeres de conhecer…

Foi um ano em que pudemos, além de es-crever, visitar outros mundos por intermédio daleitura, e tenho certeza que muitos adoraram eaproveitaram muito a viagem.

A companhia de Graciliano Ramos, JoãoCabral de Melo Neto, Carlos Drummond deAndrade, Luís Fernando Veríssimo, Jorge Ama-do, Jô Soares e tantos outros nos foi muitooportuna!

No entanto, esse tempo de trabalho foi sóo começo, e é preciso seguir avançando. E issosignifica continuar lendo, se preocupandocom a escrita correta das palavras, com a pon-tuação, com a apresentação final dos textos,observando, enfim, como escrevem nossosmestres para que se possa aprender aindamais com eles.

Agora, é hora de colher os frutos das con-quistas e uma delas é poder apreciar este livro.Espero que gostem do resultado, que sem dú-vida representa muito de tudo que foi concre-tizado.

Parabéns, alunos!

Poemas para apreciar…

Os poemas que vocês lerão a seguir foramfeitos a partir da leitura e análise deste lindopoema de Carlos Drummond de Andrade.

Cidadezinha qualquer

Carlos Drummond de Andrade

Casas entre bananeiras,Mulheres entre laranjeiras,Pomar, amor, cantar.

Um homem vai devagar.Um cachorro vai devagar.Um burro vai devagar.

Devagar… as janelas olham…– Êta vida besta, meu Deus!

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Exemplos dos poemas dos alunos:

GenteCléo

Gente sem trabalharGente sem estudarEstudar, trabalhar, avançar

Homem precisa trabalhar,Pois, sem trabalho, não temComo de sua família cuidar

Criança precisa estudarPois, sem estudo,Não tem como trabalhar

– Êta vida sofrida sem estudar!!!

Aves no meio das árvoresValdemir

Aves no meio das árvoresQue passam o tempo a cantarE que não precisam pensar

Um carro vai devagarLevando gente para passearSem beber e sem fumarE sempre a cantar

Devagar as pessoas olham e dizem:– Êta vida corrida, cansada e sofrida,Meu Deus!!!

Claro que as aprendizagens desses jovensadultos ou adultos jovens não se encerram aqui.Por trás da língua que lhes foi mostrada, elespuderam ampliar, e muito, seu conhecimentode mundo. Mudaram atitudes, aprenderam pro-cedimentos, mas, sobretudo, foram contamina-dos pelo gostar de ler e puderam navegar emmares de palavras nunca dantes navegados ou,melhor dizendo, nunca dantes enfrentados…

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A EXPERIÊNCIA DO PROGRAMASALTO PARA O FUTURONA FORMAÇÃO CONTINUADADE PROFESSORES

Rosa Helena Mendonça

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Interatividade é uma palavra que está emvoga. Há muitos sentidos para esse termo. Aqui,vamos nos apropriar da seguinte noção, expres-sa por Bartolomé Pina: “[...] se entende porinteratividade o fato de que ambos os extremosdo canal de comunicação participam, emitin-do mensagens que são recebidas e interpreta-das pelo outro extremo e que, de alguma ma-neira, influem no modo como o diálogo conti-nua a se desenvolver” (Bartolomé Pina, 1998).

É a partir dessa citação que queremos falardo programa Salto para o Futuro, da TV Esco-la. O Salto para o Futuro é mais do que um pro-grama de televisão: é um programa de forma-ção continuada a distância, que utiliza diferen-tes mídias, como material impresso, tevê,Internet, além de fax, telefone e correio eletrô-nico. A idéia é estabelecer um diálogo, que co-meça antes do programa de tevê e que consti-tui o debate, prolongando-se após a suaveiculação em cada telessala, em cada escola,em cada sala de aula.

Quais são os limites e as possibilidades deum programa de tevê educativo, que pretendeter como marca a interatividade, estabelecen-do um diálogo entre professores de todo o país?O que podemos destacar de um projeto de for-mação continuada de professores que se cons-titui como um processo dialógico? Como essaparticipação tem interferido na concepção dosprogramas? E de que forma a discussão queacontece ao longo dos programas se reflete naprática dos professores?

A experiência do programaSalto para o Futurona formação continuadade professores

Rosa Helena Mendonça*

Seed/MEC

Essa prática, não faz muito tempo, era pau-tada na transmissão de conteúdos, previamen-te definidos pelos sistemas de educação. Mui-tos professores foram assim “reprodutores” deum saber cristalizado, respaldado nos rígidosrituais da escola.

No entanto, sempre houve quem se insur-gisse contra essa ordem, quer do ponto de vis-ta da reflexão teórica, quer da prática. Freinet,Makarenko, Paulo Freire, para citar alguns no-mes, e muitos, anonimamente, nas suas es-colas e salas de aula, ousaram e ousam bus-car alternativas para uma aprendizagem ver-dadeira.

E a escola não é só um espaço de aprendi-zagem para o aluno. É o locus privilegiado paraa formação do professor.

O que hoje parece consenso no campo te-órico da educação, apontando para a constru-ção e para a autonomia, tanto do projeto es-colar, quanto de professores e alunos nos seusprocessos de aprendizagem, é fruto dessa his-tória longa, complexa e certamente mutável,que os professores, esses eternos aprendizes,vêm registrando com seus erros e acertos.

Há aprendizagens que se vêm mostrandoessenciais, na contemporaneidade, para oexercício permanente e crítico do Magistério:aprender a aprender e criar condições para queos alunos aprendam, ou seja, uma formaçãocontinuada que tem na escola e no trabalho emequipe as condições essenciais para o seu de-senvolvimento.

* Mestre em Educação pela PUC-Rio; professora das disciplinas Estratégias de Educação Continuada e Novas Tecnologias e Educação naFaculdade de Pedagogia da Unesa e Supervisora Pedagógica do programa Salto para o Futuro – TV Escola – Seed/MEC.

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Salto para o Futuro na formação continuadaPAINEL 20

Orientar os alunos no sentido do cresci-mento e, portanto, do conhecimento é um de-safio que exige do professor competências es-pecíficas, que são desenvolvidas, sobretudo,no processo de formação continuada, a qualse dá ao longo do exercício profissional, em di-ferentes espaços. Na própria escola, nas tro-cas que nela acontecem, por meio de progra-mas específicos, na interação com a comuni-dade, no estabelecimento de parcerias e pormeio de projetos e programas voltados para aformação do professor.

O Salto para o Futuro, sendo ao vivo e comrecepção organizada, permite também umainterlocução com os outros programas do ca-nal e com outros projetos, tanto do próprioMEC quanto de outras instituições voltadaspara a educação.

Esse é um processo em permanente cons-trução. O Salto pretende ser uma contribuiçãonesse processo. Nas telessalas, em diferentesestados, são múltiplas as trocas que se estabe-lecem a cada dia e prolongam-se em outros es-paços de atuação do professor: a comunidade,a escola, a sala de aula…

Dessa forma, o Salto para o Futuro, ao lon-go de cada um desses dez anos, vem estabele-cendo esse diálogo com os professores de todopaís, buscando caminhos para discutir a edu-cação no Brasil. E esse diálogo com os profes-sores tem as mais diversas motivações.

O que deixam entrever as falas dos profes-sores? Questões de ordem meramente meto-dológica? Ou suas histórias profissionais, osconhecimentos de vida, as angústias e as ale-grias? O que os tem motivado na sua partici-pação ao longo de uma década? O que os pro-fessores esperam desse programa? O que suasdúvidas, suas inquietações, suas hesitações eseu desejo de obter respostas deixam perceber?O que os leva a participar de um projeto de for-mação continuada, por opção?

Podemos pensar em uma comunidade deprofessores, que trocam informações, experi-ências? Há também o desejo de ter voz e vez,por meio de questões que muitas vezes denun-ciam situações de trabalho que precisam sermelhoradas, como a falta de tempo para o es-tudo, a questão salarial, o número muitas ve-zes excessivo de alunos por turma. Há umaexpectativa permanente por respostas pontu-ais, que envolvem o cotidiano do professor.Existe, também, um freqüente entusiasmo defalar de experiências exitosas. Como pano defundo, percebe-se uma vontade de exercer odireito à formação profissional continuada,buscando uma sintonia com as tendênciasatuais da educação. Em busca de um entendi-mento desse processo, procurando conhecermelhor quem é o professor e como acontece otrabalho nas escolas, continuamos, a cada ano,a partir das avaliações e da análise dos progra-mas, a renovar esse diálogo. Investimos naconstituição de uma rede que vai sendo tecida,explicitando diferentes concepções de escola.As trocas, tão ricas quanto imprevisíveis, sãoos fios que tecem os discursos e deixam entre-ver as práticas.

BibliografiaBRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação

Fundamental. Referenciais para a formação de profes-

sores. Brasília, 1999.

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PINA, Bartolomé. Sistemas multimídia. In: SACHO, Juana

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SANCHO, Juana M. Para uma tecnologia educacional. Por-

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