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9 PROMEF SEMCAD SOMATIZAÇÃO E SINTOMAS FÍSICOS INEXPLICÁVEIS PARA O MÉDICO DE FAMÍLIA E COMUNIDADE INTRODUÇÃO LUÍS FERNANDO TÓFOLI SANDRA FORTES DANIEL GONÇALVES LUIZ FERNANDO CHAZAN DINARTE BALLESTER 1. Na sua opinião, a medicina de família e comunidade deve dedicar-se ao tratamento e apoio de pacientes com somatização e sintomas físicos inexplicáveis? Justifique sua resposta. ............................................................................................................................................................ ............................................................................................................................................................ ............................................................................................................................................................ ............................................................................................................................................................ Luís Fernando Tófoli – Psiquiatra e supervisor das Redes de Saúde Mental de Sobral e Fortaleza (CE). Professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC) Sandra Fortes – Psiquiatra e supervisora de Saúde Mental na Estratégia de Saúde da Família. Professora da Faculdade de Medicina da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) Daniel Gonçalves – Médico de família e comunidade. Preceptor da Residência em Medicina de Família e Comunidade da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Luiz Fernando Chazan – Psiquiatra e psicanalista. Professor da Faculdade de Medicina da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) Dinarte Ballester – Psiquiatra e médico de família e comunidade. Professor da Faculdade de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS)

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SOMATIZAÇÃO E SINTOMASFÍSICOS INEXPLICÁVEISPARA O MÉDICO DE FAMÍLIAE COMUNIDADE

INTRODUÇÃO

LUÍS FERNANDO TÓFOLISANDRA FORTESDANIEL GONÇALVESLUIZ FERNANDO CHAZANDINARTE BALLESTER

1. Na sua opinião, a medicina de família e comunidade deve dedicar-se ao tratamento eapoio de pacientes com somatização e sintomas físicos inexplicáveis? Justifique sua resposta.

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Luís Fernando Tófoli – Psiquiatra e supervisor das Redes de Saúde Mental de Sobral eFortaleza (CE). Professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC)

Sandra Fortes – Psiquiatra e supervisora de Saúde Mental na Estratégia de Saúde daFamília. Professora da Faculdade de Medicina da Universidade do Estado do Rio deJaneiro (UERJ)

Daniel Gonçalves – Médico de família e comunidade. Preceptor da Residência emMedicina de Família e Comunidade da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp)

Luiz Fernando Chazan – Psiquiatra e psicanalista. Professor da Faculdade deMedicina da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)

Dinarte Ballester – Psiquiatra e médico de família e comunidade. Professor da Faculdadede Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS)

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Sabemos que o cotidiano da maioria dos médicos de família e comunidade (MFC) no Brasil é permeado poruma grande sobrecarga de atendimento e outras dificuldades. Assim sendo, quando os MFC são confrontadoscom pessoas com sintomas físicos e problemas emocionais associados, mas sem qualquer evidência dedoença orgânica que os justifique – e isso acontece com grande freqüência, pode passar pela cabeçadesse médico a dúvida sobre se a medicina de família e comunidade deveria dedicar-se ao tratamento eapoio dessas pessoas, ou se o seu destino deveria ser o encaminhamento para tratamento exclusivo emum serviço secundário especializado.

Este capítulo irá tecer uma série de considerações e justificativas que irão demonstrar que o médico defamília e comunidade tem um papel central no tratamento na grande maioria das apresentações de sintomasfísicos inexplicáveis. Mesmo na pequena minoria de casos clinicamente mais severos, que sãocomparativamente raros na atenção primária, o MFC tem uma ação importante, ainda que o tratamentotambém possa estender-se a serviços secundários.

A principal razão para justificar que a medicina de família e comunidade tem uma grande responsabilidadenas queixas de pessoas às quais os médicos referem-se erroneamente como “não tendo nada” é o simplesfato de que os MFC já os atendem em grandes quantidades na atenção primária à saúde (APS). Em grandeparte dessas situações, os sintomas inexplicáveis são ignorados. Em outras vezes, os próprios pacientesidentificam o médico de família como aquele que pode ajudá-los. Encaminhá-los a um atendimentoespecializado em saúde mental não irá surtir efeitos, pois esses pacientes não consideram que precisamdesse tipo de cuidado e não irão aceitar esse encaminhamento.

A referência prematura ou o excesso de investigação pela propedêutica armada reforçarão umciclo que pode vir a cronificar esses mesmos tipos de queixas, não resolvendo, portanto, oproblema do paciente, ao contrário, e, além disso, aumentando os gastos do sistema de saúde.

Outro sério problema associado a todos os tipos e quadros de sintomas físicos inexplicáveis é ouso exagerado e inadequado de medicação, em especial os benzodiazepínicos – que, além denão resolverem o problema, podem gerar a dificuldade adicional da dependência química poração iatrogênica.

Por outro lado, é importante notar que quanto mais o MFC souber lidar com essas situações, melhor será aqualidade de seu atendimento, não só pelo cuidado adequado administrado ao paciente que sofre de sintomassem explicação orgânica – e que são fonte de grande sofrimento, mas também pela própria satisfação equalidade de vida do médico.

Saber lidar com pacientes que recebem o rótulo de “poliqueixosos” auxiliará o médico de famíliae comunidade a abandonar rótulos preconceituosos e a perceber e lidar com queixas tão comunse tão mal cuidadas, reconhecendo, por detrás delas, histórias de vida que merecem atenção,tanto no sentido humano quanto clínico.

2. Quais são os prováveis efeitos do encaminhamento do paciente com somatização e sintomasfísicos inexplicáveis a um atendimento especializado em saúde mental?

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3. Sobre a prescrição de benzodiazepínicos para pessoas com sintomas físicosinexplicáveis, é correto afirmar que:

A) é o tratamento de primeira escolha, devendo ser prescrito para uso continuado.B) se o paciente já for um usuário há mais de 6 meses, os benzodiazepínicos devem ser

retirados imediatamente.C) tem um perfil mais seguro do que os antidepressivos, no que se refere a efeitos

adversos.D) não é a melhor opção terapêutica, devido ao risco potencial de abuso ou dependência

química.

Resposta no final do capítulo

4. Retorne à questão que introduz este capítulo e confronte seus argumentos com asconsiderações feitas pelos autores, posicionando-se contra ou a favor do atendimentoprestado ao paciente com sintoma físico inexplicável.

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OBJETIVOS

Espera-se que, após a leitura do capítulo e a realização dos exercícios, o MFC seja capaz de:

■ identificar quadros de somatização/sintomas físicos inexplicáveis e, em especial, diferenciá-los nassuas formas aguda e crônica;

■ explicar quais são os fatores de risco associados à somatização;■ discorrer sobre como deve ser o manejo do paciente somatizador na atenção primária à saúde, em

especial quanto ao papel do MFC.

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ADE ESQUEMA CONCEITUAL

Abordagem dimensional dos sintomas inexplicáveis

Fatores de risco para a presençade sintomas somáticos inexplicáveis

Somatização e queixassomáticas inexplicáveis

Sintomas físicos inexplicáveise sofrimento mental inespecífico

Episódios depressivos oudepressões recorrentes (F32 e F33)

Agorafobia (F40.0)

Outras fobias específicas (F40.2)

Transtorno de ansiedadegeneralizada (F41.1)

Transtorno misto deansiedade e depressão (F41.2)

Reação a estresse/transtornode ajustamento (F43)

Outros transtornos

A abordagem do paciente

Manejo do pacientesomatizador pelo médico de famíliae comunidade

Manejo no diagnóstico:transcendendo o princípioda exclusão

Evitar o poder somatizadorda consulta médica

Tratar o sofrimento psíquicoassociado: recodificar o sintoma

Tratamento da somatização

Condutas para sintomasagudos inexplicáveis

Condutas para pacientessomatizadores crônicos

Tratar transtornos depressivose ansiosos associados

Técnicas de relaxamento/exercício físico

Intervenções terapêuticasde cunho psicológico

Grupos

Conclusão

Caso clínico

Síndromes psiquiátricas desintomas inexplicáveis

Síndromes funcionais

Somatização e transtornosmentais comuns

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CADSOMATIZAÇÃO E QUEIXAS SOMÁTICAS INEXPLICÁVEIS

Sensações corporais anormais são fenômenos comuns e benignos da vida cotidiana. A maioria das pessoastem sensações somáticas consideradas anormais muito freqüentemente. Na maior parte das vezes, essassensações não estão nem serão associadas a uma doença, tendendo a desaparecer espontaneamente,sem repercutir no sistema de saúde.

No entanto, em um grupo de pessoas com características muito diversas, a presença de sintomas físicossem explicação as leva à busca de auxílio médico e a comprometimento psicossocial em graus tambémvariados. De um modo geral, os sintomas apresentados por esses indivíduos – que aqui nomearemos comosomatizadores – recebem o nome de queixas somáticas inexplicáveis. Esse termo, utilizado nas DiretrizesDiagnósticas e de Tratamento para Transtornos Mentais em Cuidados Primários (CID-10-CP),3 daClassificação de Transtornos Mentais e de Comportamento da CID-10, vem sendo recentemente substituídona literatura pela expressão sintomas físicos sem explicação médica.

Na concepção contemporânea, o conceito de somatização é definido por uma tendênciapessoal a se apresentar e comunicar queixas somáticas, que geram sobrecarga pessoal e nosistema de saúde, diante de estresse psicossocial.1,2

Como, na grande maioria dos casos, as queixas somáticas inexplicáveis estão associadas a estressepsicossocial (como causa, efeito ou ambos), pode-se compreender que o conceito de somatização e o dequeixas somáticas inexplicáveis ou sintomas físicos inexplicáveis se sobreponham em grande parte. Dessaforma, levando em consideração o escopo deste capítulo, faremos a opção, ao longo deste texto, de utilizá-los como sinônimos.

5. Comente a afirmação dos autores segundo a qual os conceitos de somatização e os desintomas físicos inexplicáveis se sobrepõem em grande parte.

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SOMATIZAÇÃO E TRANSTORNOS MENTAIS COMUNS

Na atenção primária, as queixas somáticas constituem a principal justificativa apresentada pelosusuários para a busca de consultas médicas. No entanto, para apenas uma fração dessas queixasconseguem-se encontrar explicações orgânicas confiáveis.3 Além de serem causadas por alteraçõessomáticas normais ou por doenças orgânicas, sensações físicas anormais também estão comumenteassociadas a transtornos mentais.

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Transtornos ansiosos e depressivos (transtornos mentais comuns) são acompanhados de diversos sintomasfísicos – alguns deles fazem parte das próprias definições psiquiátricas – tais como:

■ cansaço;■ astenia;■ fadiga;■ palpitações;■ dores;■ dispnéia;■ sudorese de extremidades; entre vários outros.

São sintomas físicos difusos, pouco definidos, para os quais não se verificam alterações anatomopatológicasjustificáveis. A maioria desses sintomas inexplicáveis não são específicos para o diagnóstico dessaspatologias, pois elas não são “oficialmente” categorias de somatização. Elas representam, no entanto, agrande maioria dos transtornos mentais que se apresentam na APS com sintomas sem explicação orgânica.Por isso, é extremamente importante desconfiar da presença de transtornos mentais comuns (TMC) empacientes que somatizam na atenção primária.

Na presença de transtorno mental, muitos pacientes procuram os primeiros recursos a que têmacesso. Com a permeabilidade crescente da atenção primária no Brasil, mais e mais este primeirorecurso é a Unidade de Saúde da Família. No entanto, muitos dos casos podem não ser aparentes,especialmente se o diálogo for centrado nos sintomas físicos e a abordagem do MFC for centradana doença e não na pessoa. Muitos pacientes tendem a só falar de suas queixas físicas. Porém,é importante saber que essa tendência é, na maioria das vezes, influenciada pela própria conduçãodo médico.4, 5, 6

Os principais transtornos mentais que podem apresentar-se como sintomas inexplicáveis na APS serãoabordados a seguir, tendo sido adaptados dos Critérios Diagnósticos para Pesquisa da Classificação deTranstornos Mentais e de Comportamento da CID-10 (CDP-10).7 Não foram incluídas as cláusulas deexclusão.

EPISÓDIOS DEPRESSIVOS OU DEPRESSÕES RECORRENTES (F32 E F33)

Episódios depressivos ou depressões recorrentes são diagnosticados mediante a presença de, no mínimo,dois dos seguintes sintomas:

■ humor anormalmente deprimido por quase todos os dias;■ perda de interesse/prazer em atividades;■ energia diminuída.

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CADPresença de um ou mais sintomas (perfazendo, com os anteriores, o total de no mínimo quatro) da seguinte

lista também indica diagnóstico de episódio depressivo ou depressão recorrente:

■ perda de auto-estima;■ sentimentos exagerados de culpa;■ pensamentos de morte ou suicídio;■ perda de concentração;■ lentificação ou agitação psicomotoras;■ alterações do sono;■ alterações do apetite.

Os sintomas apresentados devem estar presentes por, no mínimo, 2 semanas.

Sintomas físicos como dores, palpitações, tonturas e outros podem estar presentes, mas nãosão necessários para o diagnóstico.

AGORAFOBIA (F40.0)

A agorafobia é um quadro caracterizado pelo medo de ir a lugares públicos, multidões ou viajar só, paralonge de casa. Há sinais de excitação autonômica, fazendo parte dos critérios de diagnóstico a presença dequatro dos seguintes sintomas físicos, tendo que estar presente pelo menos um dos quatro primeiros(excitação autonômica):

■ palpitações/taquicardia, sudorese, tremores e boca seca;■ dificuldade de respirar, sufocação, dor ou desconforto toráxico e náusea;■ tontura ou sensações de desfalecimento;■ ondas de calor ou frio e formigamento/entorpecimento.

Também fazem parte dos critérios os sintomas psiquiátricos de desrealização/despersonalização e os medosde perder o controle ou morrer.

O paciente reconhece o erro como irracional, o que causa angústia, e os sintomas se apresentam nasituação temida ou em sua contemplação mental.

OUTRAS FOBIAS ESPECÍFICAS (F40.2)

No caso de outras fobias específicas, os sintomas físicos e psicológicos de ansiedade estão presentessomente na presença do objeto temido ou em sua contemplação.

LEMBRAR

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ADE TRANSTORNO DE ANSIEDADE GENERALIZADA (F41.1)

Para o diagnóstico de transtorno de ansiedade generalizada (TAG) são necessários quatro sintomas (sendoum autonômico) da mesma lista de sintomas descritos para a agorafobia, com o acréscimo de algunssintomas físicos – tensão ou dores musculares, sensação de nó na garganta – e um maior número desintomas psicológicos:

■ inquietação/dificuldade para relaxar;■ sensação de “nervoso”/tensão;■ sobressaltos;■ dificuldade de concentração;■ irritabilidade;■ dificuldade de adormecer, por preocupação.

TRANSTORNO MISTO DE ANSIEDADE E DEPRESSÃO (F41.2)

Por não haver critérios diagnósticos de pesquisa específicos, os transtornos mistos de ansiedade e depressãonão são estudados com freqüência, mas a clínica indica que grande parte dos TMC, na atenção primária àsaúde, estão nessa categoria mista de sintomas depressivos e ansiosos, sem preponderância de nenhumdos quadros.

REAÇÃO A ESTRESSE/TRANSTORNO DE AJUSTAMENTO (F43)

A reação a estresse ou transtorno de ajustamento corresponde a um conjunto de transtornos mentais quetêm como característica a exposição a um estressor físico ou psíquico, seguido de sintomas mentais. Emboranão necessários para o diagnóstico, sintomas físicos também podem estar presentes.

No caso específico de um subtipo, o transtorno do estresse pós-traumático (F43.1), o evento estressantepode ter acontecido há muito tempo, mas o paciente segue relembrando-o involuntariamente (desperto ouem pesadelos), causando interferência na vida cotidiana.

OUTROS TRANSTORNOS

Há ainda vários outros transtornos mentais com sintomas físicos sem base orgânica, como o transtornoobsessivo-compulsivo, transtorno do pânico (os ataques de pânico sem fechar critério para o transtorno sãoainda mais comuns), transtorno afetivo bipolar e, mesmo, a esquizofrenia, além de outros.

Para desvendar essa demanda, que habitualmente passa despercebida até que apresente umdescontrole emocional mais evidente à consulta, é necessário perguntar sobre os seus outrossintomas característicos.

A presença de sintomas depressivos e ansiosos de natureza psicológica não está sendoconscientemente escondida por esses pacientes. Os sintomas estão presentes, e os pacientesresponderão positivamente à indagação de sua presença. Mas, para isso, é necessário que oMFC tenha a iniciativa de investigar, nos pacientes com sintomas de somatização, se elesapresentam queixas mentais.

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CADAssim sendo, é importante saber reconhecer os critérios e formas de rastreamento para transtornos

depressivos e ansiosos e suas apresentações usuais na APS. Para tal, recomendamos a leitura de doisoutros capítulos presentes em outros módulos do PROMEF, centrados nos transtornos ansiosos e nosquadros depressivos: Os transtornos da ansiedade na prática do médico de família (PROMEF, Ciclo 1,Módulo 2), e O médico de família e a pessoa com depressão (PROMEF, Ciclo1, Módulo 4).

6. Cite os motivos que podem justificar a suspeita da presença de TMC em pacientes quesomatizam na atenção primária.

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7. De que forma(s) o médico pode influenciar no relato feito pelo paciente no atendimento naunidade de saúde?

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8. Numere a 2a coluna de acordo com a 1a, correlacionando os TMC aos seus sintomasdiagnósticos específicos. Quando necessário, complete a lacuna a fim de tornar arelação possível.

9. Dentre os diversos sintomas que podem manifestar-se em episódios depressivos ou casosde depressões recorrentes, quais deles não são necessários para o diagnóstico?

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10. Em que medida se assemelham ao modo de apresentação/surgimento os sintomas daagorafobia e os de outras fobias específicas?

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Tontura ou sensações de desfalecimentoTensão ou dores muscularesHumor anormalmente deprimido por quase todos os diasLentificação ou agitação psicomotorasSensação de ____________________Ondas de calor ou frio e ____________________Energia diminuídaIrritabilidadePensamentos de morte e suicídioDesrealização e despersonalizaçãoPalpitações/taquicardia, ________________________,tremores e boca secaPerda de ____________________SobressaltosPerda de interesse/prazer em atividadesSensação de nervoso/tensãoAlterações do sonoInquietação/dificuldade para relaxarDificuldade de respirar, ____________________, dor oudesconforto torácico e náuseaSentimentos exagerados de ____________________Dificuldade de adormecer, por preocupaçãoPerda de concentraçãoAlterações do ________________________________

Episódiosdepressivosou depressõesrecorrentes

Agorafobia

Transtorno deansiedadegeneralizada(TAG)

(1)

(2)

(3)

Respostas no final do capítulo

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CAD11. Descreva a atitude a ser assumida pelo MFC cujo objetivo é reconhecer algum TMC que

possa estar presente no paciente com sintomas físicos inexplicáveis.

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SINTOMAS FÍSICOS INEXPLICÁVEIS E SOFRIMENTOMENTAL INESPECÍFICO

A associação freqüente entre TMC e sintomas SEM não significa que todos os somatizadores sejam pacientesportadores de transtornos depressivos ou ansiosos, embora eles representem uma parcela consideráveldos que apresentam sintomas físicos inexplicáveis.

Algumas das apresentações de sintomas inexplicáveis são quadros “subsindrômicos” dos transtornos mentais,mas que não chegam a preencher critérios suficientes para serem incluídos na nosografia psiquiátrica. Nãoobstante, essas “subsíndromes” estão associadas a:

■ sofrimento;■ incapacitação social;■ busca de serviços de saúde.

Genericamente, elas podem ser nomeadas pelo termo sofrimento psíquico ou sofrimento mental (traduçõesdo termo inglês mental distress).

Apesar da pequena gravidade – e até mesmo por causa dela –, esses pacientes compreendem amaior parte dos sintomas inexplicáveis de uma unidade de APS e uma quantidade considerável dademanda da unidade como um todo. A maioria dessas pessoas apresenta quadros transitórios eassociados a crises vitais, esperadas (adolescência, início da idade reprodutiva, senescência etc.)ou não (rompimento de relacionamentos, mortes inesperadas, mudanças de status social etc.).

Lidar com casos de sofrimento psíquico inespecífico é uma tarefa para a qual, em geral, a formação emMedicina ainda não está preparada. Se vistos pelo foco excessivamente organicista, esses pacientes desafiamo MFC com queixas que não parecem doença e, por vezes, não parecem justificar a demanda de atençãoque efetivamente causam – em especial quando também apresentam sintomas de natureza efetivamenteorgânica.

Os quadros de sintomas físicos inexplicáveis associados a sofrimento psíquico inespecífico têm,com freqüência – e principalmente se vistos apenas pela óptica de cada sintoma que se apresenta– resolução rápida e espontânea. Porém, uma observação mais cuidadosa dos prontuários queos descrevem mostram que seus portadores costumam responder ao estresse indo, comfreqüência, a serviços de saúde, resultando em um sem-número de visitas por queixas menorese vistas como “sem-importância” pela equipe. A importância desses sintomas está no fato deeles indicarem exatamente o que eles estão escondendo: o sofrimento psicossocial.

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Assim, pela quantidade de sofrimento difuso que esses problemas causam na população, é obrigatório queo médico de família e comunidade aprenda a lidar com apresentações desse tipo. Embora seja importantefrisar que a somatização, em especial no Brasil, não é um quadro exclusivo de pessoas de baixa renda ouescolaridade, vale mencionar que esses quadros de sofrimento psíquico com sintomas orgânicos inexplicáveisse associam freqüentemente a situações de perda de empoderamento e se apresentam em famílias derisco, ambas as situações com maior chance de ocorrer onde há maior sofrimento social. Para os usuáriosdo serviço nessas condições, os sintomas físicos podem transformar-se numa forma de negociar a atençãodo sistema de saúde – e da Medicina, em especial.

Feitas essas considerações, ainda assim deve-se refrear o impulso de incluir todos os somatizadores comsofrimento psíquico na categoria de portadores de diagnósticos psiquiátricos fechados de ansiedade edepressão, evitando tomar condutas clínicas para esses transtornos mentais sem antes examinar se elesestão, de fato, presentes.

O caminho, enfim, é pensar sobre todos os pacientes de forma integral, refletindo sobre quaisproblemas sociais e psicológicos poderiam estar associados aos casos de queixas somáticasinexplicáveis. O médico de família e comunidade, pela sua ligação fundamental com a saúde dacomunidade de seu território – e não só com o tratamento da doença, é com certeza o especialistada medicina que mais tem condições conceituais para romper com a visão simplificada e dicotômicado processo saúde/doença.

Sabendo que esse binômio está separado por uma série de matizes biopsicossociais, e se eleacolher a idéia, ao mesmo tempo simples e complexa, de compreender o paciente de uma formaintegral, ou seja, em suas relações com a comunidade e com o seu próprio organismo, eleconseguirá escapar da tendência de enquadrar o paciente em modelos biunívocos de “diagnóstico/conduta”.

12. Comente a seguinte afirmação: “a associação freqüente entre TMC e sintomas SEM nãosignifica que todos os somatizadores sejam pacientes portadores de transtornos depressivosou ansiosos”.

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13. Caracterize o sofrimento psíquico ou mental quanto às suas formas de apresentação.

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CAD14. Diante de um paciente que relata sintomas físicos inexplicáveis os quais podem estar

relacionados a sofrimento mental inespecífico, como reagiria um médico cujo enfoque éexcessivamente organicista?

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15. Quais podem ser as implicações da dissociação entre os sintomas relatados pelo paciente eo sofrimento psicossocial que eles podem estar mascarando?

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16. Descreva o papel desempenhado pelo MFC no que se refere à ruptura com um modelobiunívoco de “diagnóstico/conduta” no atendimento ao paciente.

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SÍNDROMES PSIQUIÁTRICAS DE SINTOMAS INEXPLICÁVEIS

Nos dois tipos de quadros anteriormente descritos (transtornos mentais e sofrimento psíquico), o MFC sedepara com pacientes geralmente com queixas recentes, agudas, cuja associação com o sofrimentoemocional pode ser até simples de ser estabelecida. No entanto, existem outros subgrupos de pacientescom queixas somáticas inexplicáveis que podem requerer seu cuidado, mas que apresentam característicasdistintas. Na Atenção Primária, como pode ser visto na CID-10-CP,8 a maioria desses pacientes estará nacategoria das queixas somáticas inexplicáveis e nos transtornos dissociativos. Porém, na assistênciaespecializada em Psiquiatria, na qual normalmente a Classificação de Transtornos Mentais e deComportamento da CID-10 (CID-10)7 é utilizada, iremos lidar com outras categorias nosológicas.

Essas categorias tentam caracterizar subtipos de patologias nas quais se verifica especialmente a presençade sintomas físicos inexplicáveis como principal critério para seu diagnóstico específico. Nesses casos,geralmente estamos diante de síndromes com um curso crônico, com grave comprometimento funcional(social, laborativo e pessoal) e caracterizadas pela recusa do paciente em aceitar uma associação dosofrimento emocional com esses quadros. Esses incluem: os transtornos somatoformes; alguns subtiposde transtornos dissociativos (ou conversivos); a neurastenia.

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ADE Os critérios diagnósticos para transtornos somatoformes estão listados no Quadro 1:

Quadro 1

CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS PARA TRANSTORNOS SOMATOFORMES

F45.0 – Transtorno de somatização (síndrome de Briquet, transtorno psicossomático múltiplo)

A. História de, pelo menos, 2 anos de queixas de sintomas físicos múltiplos e variáveis que não podem serexplicados por quaisquer transtornos físicos detectáveis (quaisquer transtornos físicos presentes não explicamgravidade, extensão, variedade e persistência das queixas, nem incapacidade associada). Na presença desintomas decorrentes de excitação autonômica, estes não são um aspecto importante do transtorno.

B. Busca repetida de consultas (três ou mais) ou conjuntos de investigações tanto em cuidados primários comocom médicos especialistas decorrente de preocupação com os sintomas (na ausência de serviços médicos aoalcance, automedicação persistente ou múltiplas consultas com curandeiros locais).

C. Recusa persistente em aceitar o reasseguramento médico de que não há nenhuma causa física adequadapara os sintomas físicos (ou aceitação de tal reasseguramento por curtos períodos de tempo).

D. Deve haver um total de seis ou mais sintomas de uma extensa lista seguinte, com sintomas ocorrendo em pelomenos dois grupos separados por aparelho.

F45.1 – Transtorno somatoforme indiferenciado

A. Os critérios A e C para transtorno de somatização (F45.0) são satisfeitos, exceto para a duração do transtornoque é de pelo menos 6 meses.

B. Um ou ambos os critérios B e D para transtorno de somatização (F45.0) são incompletamente preenchidos.

F45.2 – Transtorno hipocondríaco (hipocondria)

A. (1) Presença de crença persistente, de pelo menos 6 meses de duração, na presença de no máximo duasdoenças físicas sérias (das quais pelo menos uma deve ser especificamente nomeada pelo paciente); e/ou (2)preocupação persistente com uma deformidade ou desfiguração presumida.

B. Angústia persistente ou interferência com o funcionamento pessoal na vida diária causadas pela preocupaçãocom a crença e os sintomas; levando a busca de tratamento ou investigações médicas (ou ajuda equivalente).

C. Recusa persistente em aceitar o reasseguramento médico de que não há nenhuma causa física adequadapara os sintomas físicos (ou aceitação de tal reasseguramento por curtos períodos de tempo).

F45.3 – Transtorno neurovegetativo somatoforme

A. Deve haver sintomas de excitação autonômica que são atribuídos pelo paciente a um transtorno físico de umou mais dos seguintes sistemas ou órgãos:■ coração e sistema cardiovascular;■ trato gastrintestinal superior (esôfago e estômago);■ trato gastrintestinal inferior;■ sistema respiratório;■ sistema geniturinário.

B. Dois ou mais dos seguintes sintomas autonômicos devem estar presentes:■ palpitações;■ sudorese (quente e fria);■ boca seca;■ rubor;■ desconforto epigástrico;■ “frio” no estômago ou estômago revirando.

C. Um ou mais de sete outros sintomas autonômicos deve estar presente.D. Não há evidências de uma perturbação de estrutura ou função nos órgãos ou sistemas a respeito dos quais o

paciente está preocupado.

F45.4 – Transtorno doloroso somatoforme persistente

A. Dor persistente, grave e angustiante (por pelo menos 6 meses e continuamente na maioria dos dias), emqualquer parte do corpo, que não pode ser explicada adequadamente pela evidência de um processo fisiológicoou de um transtorno físico e que é consistentemente o principal foco de atenção do paciente.

Fonte: Adaptado da Organização Mundial da Saúde (1998).7 Não foram incluídas as cláusulas de exclusão.

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No caso específico dos transtornos somatoformes, verifica-se grande grau de cronicidade. Esses agrupamum conjunto de pacientes considerados mais graves e focalmente “especializados” do que os mencionadosanteriormente, especialmente pela estabilidade que eles demonstram em seus sintomas, e particularmentepela tendência a atribuírem a seus sofrimentos, de forma exclusiva ou quase exclusiva, a causas orgânicas.São pacientes cujo foco de tratamento não é a APS. No entanto, é importante termos em mente que ascategorias classificatórias desses transtornos estão sofrendo – há vários anos – críticas severas dosestudiosos, pela sua baixa utilidade clínica,9, 10 em especial na atenção primária.

Um outro tipo especial dentre esses pacientes são os portadores de quadros conversivos, incluídos na CID-10 com o nome de transtornos dissociativos/conversivos. Esses transtornos são caracterizados poruma perda da integração entre funções neuropsicológicas, neurológicas superiores ou neurológicasperiféricas, sem causa orgânica definida. Em alguns casos, quadros dissociativos não se aplicam exatamenteà presença de sintomas físicos, e sim a alterações da consciência e da memória.

No caso específico dos transtornos dissociativos de movimento e sensação, é necessário, para seudiagnóstico, a presença de sintomas de natureza pseudoneurológica que, em geral, se apresentam isoladose surgem de forma abrupta e com evidentes desencadeantes psicossociais. Geralmente, são queixas queatingem o sistema motor voluntário, ou funções sensitivas e pares cranianos, tais como anestesias; paresias;paralisias; mudez; cegueiras etc.

Os quadros dissociativos/conversivos são em geral mais freqüentes em emergências médicas, mas podemser eventualmente vistos no ambiente da APS. Os casos que se apresentam na atenção primáriafreqüentemente se resolvem espontaneamente.

Os critérios diagnósticos para outros transtornos mentais caracterizados por sintomas físicos inexplicáveissão apresentados no Quadro 2:

Quadro 2

CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS PARA OUTROS TRANSTORNOS MENTAISCARACTERIZADOS POR SINTOMAS FÍSICOS INEXPLICÁVEIS

F44.4 Transtornos motores dissociativos

A. (1) Ausência de evidências de transtorno físico que possa explicar os sintomas característicos; e (2) associaçõestemporais convincentes entre o início dos sintomas e eventos ou problemas estressantes.

B. (1) Perda completa ou parcial da capacidade de executar movimentos que estão normalmente sob controlevoluntário (incluindo fala); ou (2) vários ou variáveis graus de incoordenação, ataxia ou incapacidade de ficar depé sem ajuda.

F44.5 Convulsões dissociativas

A. (1) Ausência de evidências de transtorno físico que possa explicar os sintomas característicos; e (2) associaçõestemporais convincentes entre o início dos sintomas e eventos ou problemas estressantes.

B. Movimentos espasmódicos súbitos e inesperados, semelhantes a quaisquer das variedades de ataque epiléptico,mas não seguidos por perda de consciência.

C. Os sintomas do critério B não são acompanhados por mordedura de língua, contusão ou laceração séria decorrentede quedas, ou incontinência urinária.

F44.6 Anestesia e perda sensorial dissociativasA. (1) Ausência de evidências de transtorno físico que possa explicar os sintomas característicos; e (2) associações

temporais convincentes entre o início dos sintomas e eventos ou problemas estressantes.B. (1) Perda parcial ou completa de quaisquer ou todas as sensações cutâneas normais em parte ou em todo o

corpo; e/ou (2) perda parcial ou completa da visão, audição ou olfato.

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Fonte: Adaptado da Organização Mundial da Saúde (1998).7 Não foram incluídas as cláusulas de exclusão.

Já a neurastenia, que é um diagnóstico psiquiátrico muito freqüente nos países orientais, é poucodiagnosticada nos países do ocidente. Uma das razões é o fato dessa ter uma apresentação muito semelhanteà síndrome da fadiga crônica, da qual trataremos a seguir, junto com as demais síndromes funcionais.Embora não haja estudos que o confirmem, acreditamos ser bastante provável que pacientes com esse tipode sintoma venham a procurar os cuidados primários no Brasil.

17. Mencione características mais gerais que podem estar presentes nos transtornossomatoformes, em alguns tipos de transtornos dissociativos ou conversivos e naneurastenia.

..................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................

18. Tomando como base o Quadro 1 – Critérios Diagnósticos para TranstornosSomatoformes, complete as lacunas. Se for necessário, empregue a mesma palavramais de uma vez ou ignore alguma palavra.

A) Em casos de ____________________ evidencia-se a presença de sintomas de____________________ atribuídos pelo paciente a ____________________ nocoração e sistema cardiovascular, no trato gastrintestinal ____________________ou ____________________, no sistema respiratório ou ____________________.

F48.0 Neurastenia

A. Queixas persistentes e angustiantes de sensações de (1) exaustão após esforços mínimos (tais como tarefascotidianas que não exigem esforço mental inusual); e/ou (2) fadiga e fraqueza corporal após esforços físicosmínimos.

B. Pelo menos um dos seguintes sintomas: sensação de dores musculares, tontura, cefaléia tensional, perturbaçãodo sono, incapacidade para relaxar, irritabilidade.

C. Incapacidade de recuperar-se dos sintomas A (1) ou (2) por meio de descanso, relaxamento ou entretenimento.D. Duração mínima de 3 meses.

automedicação – foco de atenção – aceitação – transtorno neurovegetativosomatoforme – seis meses – síndrome de Briquet – transtornos físicos –identificação – cuidados primários – transtorno hipocondríaco – inferior – causafísica – dois anos – geniturinário – transtorno doloroso somatoforme persistente– desfiguração – recusa – queixas de deformidade – transtorno de somatização– processo fisiológico – excitação autonômica – curandeiros locais – superior

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B) O paciente com ____________________ pode manifestar preocupação persistentecom deformidade ou ____________________ presumida, sendo também possível acrença na presença de, no máximo, duas doenças físicas sérias por um período nãoinferior a ____________________.

C) A ____________________ do reasseguramento médico de que não há qualquer causafísica adequada para os sintomas físicos por curtos períodos de tempo se constituinum dos critérios diagnósticos empregados para _______________________ de____________________.

D) Tanto o paciente com transtorno de somatização como aquele com____________________ podem manifestar ____________________ persistente emaceitar o reasseguramento médico sobre a inexistência de ____________________adequada para os sintomas físicos.

E) No _____________________________ pode ocorrer uma história de, no mínimo,____________________ de queixas de sintomas físicos múltiplos e variáveis quenão podem ser explicados por quaisquer ____________________ detectáveis.

F) Um paciente com ____________________ ou transtorno psicossomático múltiplo podemanifestar uma atitude de busca repetida de consultas ou investigações tanto em_________________________ como com médicos especialistas, apelando para______________________ ou _____________________ na ausência de serviçosmédicos ao alcance.

G) O critério diagnóstico do ____________________ corresponde à dor persistente, gravee angustiante por um período de, no mínimo, ____________________ – o que semanifesta em qualquer parte do corpo, é o principal ______________________ dopaciente e não pode ser explicada de forma adequada por evidência de____________________ ou ____________________.

19. Preencha o quadro pontuando algumas particularidades do transtorno somatoforme.

Respostas no final do capítulo

Característica(s)do transtorno

Característica(s)do paciente

Transtorno somatoforme

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20. Analise as situações apresentadas a seguir a partir do Quadro 2 – Critérios diagnósticospara outros transtornos mentais caracterizados por sintomas físicos inexplicáveis,determinando o transtorno possivelmente manifestado pelo paciente.

A) Paciente com incapacidade de ficar em pé sem ajuda (sintoma isolado e comsurgimento abrupto). Relato de perda recente de emprego e roubo do carro –

............................................................................................................................................

............................................................................................................................................

B) Paciente com queixas persistentes e angustiantes de sensações de fadiga e fraquezacorporal após esforços mínimos, dores musculares, incapacidade para relaxar eirritabilidade. Presença dos sintomas há cinco meses –

.............................................................................................................................................

..........................................................................................................................................

C) Paciente com movimentos espasmódicos súbitos e inesperados à semelhança deataque epiléptico, ausência de perda de consciência –

...........................................................................................................................................

..........................................................................................................................................

D) Paciente relata perda parcial de todas as sensações cutâneas normais nos dois braços.Ausência de transtorno físico que explique o sintoma. Relato de separação dos paishá um ano e briga com as duas irmãs durante esse período –

..............................................................................................................................................

...........................................................................................................................................

E) Paciente com episódio de mudez por perda completa das capacidade de executarcertos movimentos que estão normalmente sob controle voluntário. Ausência deevidência de transtorno físico que possa explicar o sintoma. Relato de morte do filhohá quatro meses (acidente de carro) –

.............................................................................................................................................

.................................................................................................................................................

Respostas no final do capítulo

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21. Identifique a síndrome psiquiátrica a partir das informações fornecidas, classificando-a em Transtorno Somatoforme (TS), Transtorno Dissociativo ou Conversivo (TDC) eNeurastenia (NE):

A) ( ) Diagnóstico psiquiátrico que se apresenta de forma semelhante à síndrome dafadiga crônica.

B) ( ) Em algumas situações, o quadro clínico não se aplica exatamente à presença desintomas físicos, mas a alterações da consciência e da memória.

C) ( ) Um dos critérios diagnósticos desse transtorno é a incapacidade de o pacientese recupar das sensações de exaustão e/ou fadiga e fraqueza corporal apósesforços mínimos por meio de descanso, relaxamento ou entretenimento.

D) ( ) Ocorre perda da integração entre funções neuropsicológicas, neurológicassuperiores ou neurológicas periféricas, sem causa orgânica definida.

E) ( ) O foco do tratamento de pacientes que manifestam sintomas típicos dessetranstorno não é a APS.

Respostas no final do capítulo

SÍNDROMES FUNCIONAIS

Existem, em quase todas as especialidades médicas clínicas, pacientes que apresentam sintomas físicossem explicações médicas. Baseando-se no fato de que as assim chamadas doenças físicas apresentamlesão anatômica, orgânica ou um marcador mensurável (como a pressão arterial ou a glicemia), uma soluçãobiomédica para esses quadros, relativamente freqüentes nos ambulatórios de especialistas focais, foi nomeá-los de funcionais.

Com o tempo, várias síndromes foram descritas, e algumas delas passaram a receber atenção especialpela sua relevância no ambiente clínico, por seu grau de incapacitação e pela sua aparente consistênciasintomática. As mais famosas síndromes funcionais são:

■ a fibromialgia;■ a síndrome do intestino irritável;■ a síndrome da fadiga crônica.

Os pacientes nos quais são identificadas síndromes funcionais não configuram uma demanda específica daatenção primária à saúde. As pessoas diagnosticadas clinicamente com esses quadros costumam apresentaruma tendência a não aceitar origens não-orgânicas para os seus sofrimentos, além de manifestarem umainclinação à cronificação. Em geral, elas estão sob o cuidado das mais variadas especialidades da medicina.

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Ao serem atendidos na APS, principalmente por razões alheias à somatização, pacientescom síndromes funcionais poderão ser identificados pelo MFC, que deverá tomar as condutasdescritas adiante para casos de somatização crônica. Vale mencionar que, no caso da fadigacrônica, a SBMFC já elaborou e disponibilizou uma Diretriz Clínica Baseada em Evidênciaspara sua abordagem em APS.11

22. O que determinou a qualificação de algumas síndromes como funcionais?.................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................

ABORDAGEM DIMENSIONAL DOS SINTOMAS INEXPLICÁVEIS

Diante de toda esta confusão conceitual, o médico de família e comunidade pode chegar equivocadamenteà conclusão de que o universo das queixas físicas inexplicáveis é incompreensível. Porém, diante do caráterprovisório das classificações atuais, há espaço para novas propostas para a compreensão desses fenômenos.

Propomos, aqui, uma abordagem baseada em dois eixos (dimensões), a partir da qual poderemos entendermelhor os diversos subtipos de pacientes somatizadores e sua evolução. Posteriormente, iremos olharmais amiúde alguns dos fatores de risco já identificados como preditores de quadros de somatização. Éimportante frisar que essa divisão em eixos é um recurso didático para facilitar o entendimento dessespacientes e a caracterização mais precisa dos transtornos mentais de que eles são portadores.

Considerando um paciente que chega ao médico de família portando queixas físicas sem explicação orgânicaque as justifiquem, os possíveis diagnósticos a serem detectados se distribuem segundo dois eixos.

Um eixo a ser considerado, e que é o principal no que tange ao tratamento do paciente comqueixas somáticas inexplicáveis, como veremos a seguir, é o que inclui o curso e o grau deincapacitação dos sintomas. A cronicidade dos quadros de somatização é diretamenteproporcional à sua gravidade, medida principalmente em termos de incapacitação social. Assim,a distinção dos quadros nesse eixo se dá pelo quanto a evolução é crônica e incapacitante.

Na grande maioria das vezes, os sintomas inexplicáveis que chegarão à responsabilidade dos cuidadosprimários são de quadros agudos ou subagudos. As apresentações crônicas, em geral, já chegam apósterem passado por um ou vários especialistas. Como veremos adiante, é importante que os serviços eprofissionais da APS se responsabilizem para não facilitar a transformação dos casos agudos em crônicos.

O segundo eixo utilizado em nossa abordagem é o grau de atribuição somática ou psicológicaconferida à origem dos sintomas físicos por parte dos pacientes. Em geral, os pacientes que seapresentam à atenção primária têm variados padrões de resposta nesse quesito. Um pontoimportante a se considerar é que os sistemas de saúde – e em especial os médicos – têmtambém um papel fundamental em como se processará essa atribuição. Ao lado disso, sãoimportantes os fatores do paciente e de sua comunidade.

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CAD Idealmente, quanto mais o paciente puder reconhecer os componentes psicossociais de suas

queixas, melhor será a evolução. Como se verá na seção de manejo dos casos de sintomas físicossem explicação médica, grande parte das intervenções são direcionadas a aumentar a consciênciado paciente somatizador sobre a origem não-orgânica de suas aflições, deslocando-o do pólo daatribuição puramente somática para a direção da compreensão psicológica dos sintomas.

Como podemos ver na Figura 1, os diversos quadros de somatização apresentam algumas diferençasquanto às dimensões de curso e de atribuição etiológica.

Quadros somatoformes clássicos (cuja descrição se deu principalmente nos cuidados terciários à saúde)estão no extremo da cronificação, com baixa capacidade de atribuição psicológica.

Os pacientes das síndromes funcionais (em geral, sob os cuidados do nível secundário) também apresentambaixa aceitação de que seus sintomas possam ser de origem não-física, embora eles possam ser menoscrônicos ou incapacitantes.

Os quadros dissociativos costumam ter um grau também intermediário no curso, em especial aqueles vistosnos serviços de emergência, embora costume haver uma aceitação maior de causas psicológicas – até porquestões diagnósticas. Possíveis sintomas dissociativos na APS tendem a ter resolução mais rápida.

Quanto maior a cronicidade dos quadros, maior adesão o paciente tem ao papel de doente, jácom ganhos secundários e uma profunda dificuldade em se confrontar com suas questõespessoais. Isso terá implicações específicas no manejo desses pacientes, como se verá adiante.

Transtornossomatoformes

“puros” ou “clássicos”

ATRIBUIÇÃOPSICOLÓGICA

CURSO AGUDO/INCAPACITAÇÃO

CURSO CRÔNICOINCAPACITAÇÃO

ATRIBUIÇÃO SOMÁTICA

Reação ao estresse etranstorno de ajustamento

Ansiedade e depressãocom sintomas físicosproeminentes

Transtornos dissociativos

Síndromes funcionais

Queixas somáticasinexplicáveis semtranstorno mental(sofrimento psíquico)

↓↑

Figura 1 – Diagrama de classificação das apresentações dos sintomas físicos sem explicação médica segundo doiseixos: curso/incapacitação e atribuição etiológica. A área dos diagramas por diagnóstico representa a distribuição conformeos eixos, e não necessariamente sua prevalência

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Os quadros que, de longe, são os mais freqüentes na atenção primária à saúde são os que tendem para olado direito do gráfico. Essese incluem quadros de reação ao estresse – que são mais “psicológicos”, maspodem cursar com sintomas físicos também; casos agudos e transitórios de atribuição somática – queconfiguram, nos termos da seção anterior, a maior parte de queixas somáticas inexplicáveis em sofrimentopsíquico, mas sem diagnóstico específico; casos de transtornos mentais comuns (ansiedade/depressão).Os transtornos mentais comuns costumam cursar com um grau amplo de cronicidade/incapacitação.

Evidentemente, quanto maior o grau de gravidade e cronicidade, maior a tendência a que esses casossofram a intervenção de especialistas em saúde mental. Em geral, esses pacientes não costumam negarseus sintomas mentais – e, por conseguinte, a maior influência de fatores psicossociais em seus sofrimentos.Nesses casos, mais do que manejar a atribuição psicológica, o MFC deverá estar familiarizado com omanejo desses transtornos em cuidados primários.

Os casos agudos de atribuição somática merecem uma atenção especial, pois há evidências deque a postura do médico, durante os primeiros atendimentos, tem influência posterior no grau decronificação do caso. O caso de um paciente que procura um serviço de saúde com uma queixasomática nova pode desdobrar-se de várias formas. Ele pode remitir, desdobrar-se como umquadro depressivo/ansioso ou se cronificar. O MFC, por ser um dos primeiros médicos a atenderessa clientela, deve estar ciente do poder somatizador da consulta médica e aprender sobrecomo evitá-lo, como indica a seção sobre manejo.

Embora fatores de risco individuais estejam presentes, existe um grande abismo entre o médicoque procura mostrar alternativas psicossociais do problema ao paciente e aquele que ignorafatores não-orgânicos e reforça a concepção inadequada unicamente com prescriçõessintomáticas e exames desnecessários. Muitos casos cronificados de somatização um diacomeçaram como problemas agudos e relativamente banais.

Assim, da mesma maneira que é função do MFC prevenir que doenças controláveis comohipertensão se transformem em infartos e acidentes vasculares cerebrais, é também mister desseprofissional ter em sua mente a prevenção de quadros de somatização graves e crônicos.

FATORES DE RISCO PARA A PRESENÇA DE SINTOMASSOMÁTICOS INEXPLICÁVEIS

Diante de um quadro tão diverso de diagnósticos (e até não-diagnósticos), fica muito difícilfazer uma explanação convincente sobre as teorias etiológicas da somatização. Uma outrarazão que reforça essa dificuldade é o fato de nenhuma delas estar suficientementecomprovada, o que nos obriga à humilde constatação de que, apesar da enorme importânciada somatização em termos de sofrimento humano e gastos em saúde, nós ainda não sabemoscom precisão os mecanismos que operam a presença desses sintomas.

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Fatores individuais

■ Sexo feminino (menos marcante em populações de base cultural latina, como a nossa).■ Comportamento anormal de adoecimento (adesão ao papel de doente com ganhos secundários).■ Amplificação de sensações somáticas.■ Atribuição somática de sensações físicas anormais.■ Autoconceito de pessoa fraca e incapaz.■ Dificuldade de elaboração verbal do sofrimento psíquico.■ Transtornos mentais comuns (ansiedade/depressão).■ História pessoal de adoecimento físico, em especial na infância.■ História pessoal de abuso físico e sexual, em especial na infância.

Fatores familiares/coletivos

■ História familiar de doenças graves, com ganho de atenção diferenciada por esse motivo.■ História familiar de somatização/transtornos mentais comuns.■ Atribuição somática de sensações físicas anormais pelo grupo familiar e social.■ Estruturas sociais que favorecem situações de submissão e desempoderamento.■ Culturas latino-americanas e latino-européias.

Fatores ligados aos serviços de saúde

■ Condutas excessivamente centradas no adoecimento físico.■ Falta de manejo terapêutico para queixas físicas inexplicáveis.■ Diálogo médico sem sensibilidade psicossocial.■ Sistema de saúde pouco organizado.■ Vínculos com o paciente frouxos ou inexistentes.

Porém, já se conhece bastante sobre fatores que estão associados a uma maior presença de queixassomáticas inexplicáveis como forma de apresentação do sofrimento emocional. Também já se sabe quaisfatores trazem um maior risco para que os pacientes se cronifiquem na posição de somatizadores em suarelação com o sistema de saúde e seus profissionais.

É importante notar, entretanto, que a presença desses fatores não necessariamente determina que alguémse transforme em somatizador e nem que a sua ausência impedirá que isso aconteça. O mais importantesegue sendo o raciocínio clínico sobre a realidade individual de cada paciente – o que se torna extremamenteimportante, na seção seguinte, que tratará sobre o manejo desses casos.

Dessa forma, optamos por frisar somente quais são os fatores de risco associados à presença desses,procurando nos concentrar principalmente naqueles que estão associados aos quadros comuns da APS.

No Quadro 3, optamos por separar fatores individuais, familiares/coletivos e do serviço de saúde – lembrandoque é dever de todo profissional de saúde estar ciente, em especial, desses últimos, e zelar para que elesnão mais se perpetuem.

Quadro 3

FATORES DE RISCO PARA A PRESENÇA DE SINTOMAS FÍSICOSSEM EXPLICAÇÃO MÉDICA

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ADE 23. Que vantagens podem ser associadas à divisão da abordagem dos sintomas inexplicáveis

em dois eixos?

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............................................................................................................................................................

24. Diferencie os dois eixos ou dimensões da abordagem dos sintomas inexplicáveisquanto ao(s) critério(s) empregado(s) e à(s) responsabilidade(s) do profissional.

Respostas no final do capítulo

25. Explique os motivos que podem dificultar uma explanação convincente a respeito das teoriasetiológicas da somatização.

............................................................................................................................................

..........................................................................................................................................

..........................................................................................................................................

.................................................................................................................................................

MANEJO DO PACIENTE SOMATIZADOR PELO MÉDICODE FAMÍLIA E COMUNIDADE

O manejo dos pacientes com queixas somáticas inexplicáveis pelo médico de família deve serdiferente para os distintos tipos de pacientes que apresentam essas queixas. Os pacientes agudos,geralmente portadores de transtornos ansiosos e depressivos, irão responder de forma rápida eeficaz a uma abordagem diferenciada realizada ainda na atenção primária.

Os somatizadores crônicos, aderidos ao papel de doentes e negando a associação das queixascom seu sofrimento psíquico, provavelmente irão necessitar de tratamento especializado em saúdemental. Porém, o seu encaminhamento, para ser eficaz, deve seguir passos semelhantes àabordagem dos pacientes agudos, pois, se não houver uma preparação cuidadosa, esses pacientesnão só não irão aceitar tratamento em saúde mental como irão revoltar-se com o médico e continuarem seu caminho de busca incessante de diagnósticos orgânicos em novas consultas (“doctorshopping”), com cronificação dos quadros.

Critério(s)empregado(s)

Responsabilidade(s)do profissional

Eixo 1 Eixo 2

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CADAssim sendo, o cuidado destes pacientes se distribui em três diferentes níveis de ação:

■ abordagem das queixas médicas inexplicáveis;■ tratamento do somatizador agudo;■ tratamento do somatizador crônico.

A ABORDAGEM DO PACIENTE

A abordagem do paciente somatizador é o passo primordial para que uma estratégia terapêutica seja bemsucedida e requer uma atenção especial. Deve-se cuidar dos seguintes aspectos em sua trajetória.

Manejo no diagnóstico: transcendendo o princípio de exclusão

O principal problema para o diagnóstico adequado das queixas somáticas inexplicáveis localiza-se no modeloem que se baseia a prática tradicional dos profissionais de saúde. O modelo biomédico trabalha compressupostos cartesianos e considera que existe doença onde verificamos uma presença concomitante deuma lesão anatomopatológica. Ou seja, nesses moldes, se não se comprovar a existência dessa alteração,não se pode falar em doença. Porém, a somatização tem como característica intrínseca a ausência delesão física que explique as queixas apresentadas.

A principal conseqüência negativa desse modelo, em termos da assistência a esses pacientes,reside no fato de que, dentro dessa perspectiva, só se pode considerar uma queixa como sendoprovocada por causas psicogênicas se todas as possíveis causas orgânicas forem afastadas.

A superação desse princípio de exclusão, transformando a detecção e o tratamento da somatizaçãoem um processo positivo de diagnóstico, é fundamental para uma correta abordagem dessespacientes. Só assim se poderá entender que o sofrimento psíquico do paciente deve ser sempreexaminado detalhadamente, tanto em seus aspectos psicopatológicos quanto em seusdeterminantes psicossociais.

Quando o médico de família consegue detectar que as queixas somáticas inexplicáveis representam umamanifestação de transtornos mentais, como, por exemplo, o cansaço do paciente deprimido ou a dor decabeça causada por tensão de um paciente ansioso, podemos dizer que foi transcendido o modelo biomédicotradicional. Nesse momento, o médico está conseguindo trabalhar dentro de uma perspectiva integral, quelhe permite buscar construir, com o seu paciente, modelos explicativos para os sintomas físicos de seusofrimento psíquico, que englobem também os aspectos psicossociais desse processo.12

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Evitar o poder somatizador da consulta médica

A importância desta modificação no modelo e na forma de abordagem das queixas somáticasinexplicáveis tem sido reforçada por estudos que demonstram que o sistema de saúde e a relaçãomédico-paciente são fatores determinantes na presença da somatização. As formas como ospacientes apresentam seu sofrimento emocional aos médicos durante a consulta decorrem, emlarga escala, da maneira como esses profissionais lidam com esse sofrimento.

Em estudos realizados por Salmon, Ring, Dowrick e colaboradores,4, 5, 6 foi constatado que ospacientes apresentavam, durante as consultas, inúmeras informações e comentários relativosao seu sofrimento psíquico, porém, essas eram ignoradas pelos médicos, que se mantinhamligados nos aspectos físicos a eles relacionados. Interessantemente também não eram ospacientes que solicitavam exames e encaminhamentos, um comportamento que é tido comotípico dos pacientes somatizadores no folclore médico. Na maior parte do tempo, as condutasque reforçavam a somatização eram sugeridas pelos próprios médicos.

A estrutura do sistema de saúde, responsável pela organização da forma de atendimento e cuidado, tambéminterfere. Simon e colaboradores,13 ao analisarem, no estudo multicêntrico da OMS, quais fatores estavamassociados com apresentação da depressão na forma de queixas somáticas, verificaram que o tipo desistema de saúde era um dos mais importantes determinantes.

Se a relação médico-paciente era caracterizada por um vínculo estável, o acesso à consultaera fácil (tal como marcação de consulta por telefone, por exemplo) e a freqüência de queixassomáticas inexplicáveis como forma de apresentação do transtorno mental era menor. Asdificuldades de conseguir atendimento e a impessoalidade na relação terapêutica se associama uma maior presença de somatização.

Nessa linha de raciocínio, os estudos do grupo de Liverpool4, 5, 6 demonstraram que, ao contrário do que seconsiderava tradicionalmente – que a existência de uma dificuldade de expressão do sofrimento emocionalde forma mais psicológica por parte do paciente era a principal razão da gênese das queixas somáticasinexplicáveis –, os médicos é que tendiam a investigar as queixas somáticas desses pacientes, ignorandoos indicadores de sofrimento psicossocial trazido por eles. Esse poder somatizador da consulta médica,quando o profissional não apresenta condições de lidar com o sofrimento emocional do paciente, representao principal problema nos casos dos pacientes com somatizações agudas.

A abertura ao sofrimento emocional pode ser demonstrada através de perguntas simples,mas que revelam interesse e disponibilidade para ouvir os problemas pelos quais o pacienteestá passando, como por exemplo: Está acontecendo alguma coisa que você relacione aesse seu sofrimento? O que você acha que está causando esse mal-estar?

LEMBRAR

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CADTratar o sofrimento psíquico associado: recodificar o sintoma

Se a origem do sofrimento está nos problemas psicossociais e nos transtornos mentaisapresentados pelo paciente, é fundamental conseguir que eles possam ser abordados notratamento. Mas deve-se evitar entrar em um confronto com o paciente, tentando convencê-lo de que os sintomas são psicológicos e não físicos. Esse confronto, eminentemente biomédicoe presente antes de tudo nos profissionais, obscurece nossa capacidade de entendercorretamente o processo de adoecer presente nesses pacientes.

No somatizador, os sintomas físicos são parte do adoecer psíquico, são reais e devem ser objeto daintervenção terapêutica. Importa apenas que essa não se restrinja a eles, abordando também o sofrimentopsíquico associado. Não se trata de termos um ou outro tipo de sintoma, mas sim de entendermos queambos os sintomas são indicadores da presença de sofrimento e da necessidade de cuidado. Essa visãopermite inclusive que possamos lidar corretamente com uma das situações mais difíceis da ação médicaque é a presença concomitante de somatização em pacientes portadores de lesão, como é muito comumem pacientes com dor crônica. Voltaremos a essa questão posteriormente.

26. Determine as relações possíveis entre o manejo de somatizadores crônicos e a cronificaçãodos quadros apresentados por eles.

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LEMBRAR

27. O tratamento para pessoas com sintomas físicos inexplicáveis deve basear-se emqual princípio?

A) Respeitar, acima de tudo, as preferências do paciente, não recusando suas deman-das por medicamentos e exames complementares.

B) Reconhecer suas queixas, evitando a dissociação mente-corpo, a fim de que o paci-ente possa conviver melhor com seu sofrimento.

C) Encaminhar a pessoa para psicoterapia, a fim de esclarecer a origem dos sintomas.D) Centrar o atendimento exclusivamente no médico, evitando o envolvimento da famí-

lia e de outros profissionais da equipe de saúde.

Resposta no final do capítulo

28. O modelo biomédico tradicional auxilia ou dificulta uma melhor abordagem da somatização ede suas implicações na saúde e na vida do paciente? Comente sua resposta.

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29. O seguimento de pessoas com sintomas físicos inexplicáveis tende a melhores resul-tados quando é observada qual das seguintes recomendações?

A) Devem ser evitados contatos freqüentes com o serviço de saúde, pois isso estimula aformação de sintomas.

B) O médico deve evitar uma comunicação direta com os pacientes, atribuindo aos ou-tros profissionais a tarefa de lidar com as suas freqüentes demandas.

C) A facilidade de acesso ao serviço, através de um vínculo estável com o médico, tendea reduzir a apresentação de queixas somáticas inexplicáveis.

D) As demandas psicológicas dos pacientes devem ser referidas para o atendimentopela equipe de saúde mental.

30. Uma das maiores dificuldades de tratar pacientes com transtornos físicos inexplicáveis é (são):

A) o atual desconhecimento científico das bases orgânicas desses sintomas.B) os sentimentos de frustração gerados ao lidar com as dificuldades e complexidades

desses casos.C) que esses pacientes são pobres e com baixo grau de instrução.D) que as medicações indicadas são caras.

Resposta no final do capítulo

31. Que elementos podem contribuir para o obscurecimento da capacidade de entendimento doprocesso de adoecer dos pacientes por parte do médico?

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32. Sobre o manejo que o MFC pode realizar nos casos com sintomas de somatização,está correta qual afirmação?

A) O MFC não tem como evitar a cronificação dos casos agudos de somatização, pois aincapacidade de lidar com as emoções desses pacientes leva-os inevitavelmente aosquadros crônicos.

B) É importante deixar claro, desde o início, para evitar manipulações, que o MFC nãose submeterá a exigências indevidas de atendimento. O paciente deverá se restringirao horário agendado.

C) É necessário um equilíbrio nas condutas, buscando-se individualizar cada caso, poissó assim se saberá valorizar as questões psicossociais e "acertar a mão" no graunecessário de flexibilidade.

D) É importante começar sempre o processo terapêutico com alguma medicação, pois,aliviando os sintomas, o MFC deixa o paciente mais permeável à abordagem psicossocial.

Resposta no final do capítulo

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CAD33. Você está diante de um paciente que apresenta queixas somáticas inexplicáveis representa-

tivas de uma manifestação de transtorno mental. Organize, por meio de um fluxograma, a abor-dagem terapêutica mais adequada, considerando aspectos como o manejo no diagnóstico, podersomatizador da consulta e recodificação do sintoma.

A ABORDAGEM TERAPÊUTICA

Uma das primeiras linhas de abordagem terapêutica dos pacientes com queixas médicasinexplicáveis é a que foi delineada por Goldberg, Gask e Usherwood,14,15 e se centra nareatribuição, o que inclui a modificação do sentido dos sintomas dentro da relação terapêutica.Podem ser apontadas quatro fases desta intervenção:

1) sentir-se compreendido;2) ampliar a agenda;3) fazer novas associações;4) negociar o tratamento.

Cada uma dessas fases será descrita a seguir.

Sentir-se compreendido

O primeiro passo engloba que o paciente se sinta compreendido em seu sofrimento. Reconhecer alegitimidade da queixa física, que não é uma simulação ou uma criação consciente do paciente, é fundamentalpara que se possa compreender como ela está associada ao sofrimento psicológico. Sentindo-secompreendido e acolhido, o paciente aceita começar a discutir seus problemas psicossociais e a ligaçãodesses com seus sintomas somáticos.

É importante lembrar que encaminhamentos desses pacientes direto à saúde mental, sem que antes essetrajeto que estamos discutindo seja percorrido, resulta sistematicamente em fracasso, pois os pacientes osignoram e se sentem até agredidos. Evita-se assim, que a rejeição por parte do paciente ocorra por se sentirignorado em suas queixas físicas, sentindo-se taxado de mentiroso, simulador ou "maluco".

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No Quadro 4 são apresentadas formas de fazer o paciente sentir-se compreendido:

Quadro 4

FORMAS DE COMPREENDER O PACIENTE E DEFAZÊ-LO SENTIR-SE COMPREENDIDO

Fonte: Adaptado de Goldberg e colaboradores (2001); Gask e Usherwood (2002).14, 15

Ampliar a agenda

Estabelecido o vínculo terapêutico de aceitação e confiança, podemos prosseguir na construção de uma agen-da que permita que o sofrimento psíquico seja tratado. Como está demonstrado no Quadro 5, essa agendaserá refeita a partir dos seguintes passos nas consultas:

Quadro 5

AMPLIANDO A AGENDA COM O PACIENTE SOMATIZADOR

Fonte: Adaptado de Goldberg e colaboradores (2001); Gask e Usherwood (2002).14,15

■ Dar o feedback dos resultados dos exames/investigações: ao discutir com o paciente os resultados dos exa-mes, incluindo o exame físico, é importante evitar-se uma abordagem simplista de que não há nada de erradocom ele. Afinal, os sintomas são verdadeiros e, mesmo se determinados por transtornos mentais, como, porexemplo, fadiga na depressão ou taquicardia na ansiedade, necessitam ser tratados.

■ Reconhecer a realidade da dor/sintomas: essa aceitação da realidade do sintoma, superando o preconceitomédico de que na ausência de lesão não existe doença, abre as portas para o passo seguinte de superação,que envolve a decodificação dos sintomas como indicativo de doença orgânica e a compreensão de que é umsinal de sofrimento psíquico importante.

■ Retomar as queixas: resuma todos os sintomas (físicos e psicológicos). Ao reavaliar com o paciente seussintomas apresentados, é possível, nesse momento, se construir um modelo que explique o processo de ado-ecer presente. Esse modelo irá incluir a abordagem dos fatores psicossociais associados com as queixas.

■ Investigar a possibilidade de vínculo com eventos vitais/fatores psicossociais: esse é um momento crucial naabordagem desses pacientes. Trabalhar a associação do surgimento dos sintomas físicos com problemassociais e de relacionamento interpessoal, com momentos pessoais difíceis. Essa associação nem sempre éfácil, e é importante observar cuidadosamente a reação dos pacientes quando essas associações são aponta-das. Pacientes somatizadores agudos, opcionais, tendem a imediatamente descortinar os problemas pelosquais estão passando, enquanto os somatizadores crônicos, mais graves, tendem a recusar qualquer associa-ção entre seu sofrimento psíquico ou até mesmo a negar a existência desse sofrimento.

■ Analisar a forma do surgimento e apresentação da queixa: analisando os sintomas associados, dentro de um‘dia típico’, e avaliando alguns exemplos específicos da vida do paciente.

■ Responder a pistas emocionais: estar aberto a esses sinais, freqüentemente trazidos pelos pacientes, e quepermitem o estabelecimento de um vínculo a partir do qual o sofrimento emocional pode ser abordado, elabo-rado e superado.

■ Investigar os antecedentes psicossociais e as suas conseqüências, principalmente em termos de sua associa-ção com o surgimento de transtornos mentais como ansiedade e depressão, e do desencadeamento das quei-xas somáticas inexplicáveis.

■ Pesquisar crenças sobre saúde/agenda do paciente. Entender como o paciente compreende seu processo deadoecer é vital para o manejo correto de suas patologias e problemas, e não só naqueles associados àsomatização. Quando o médico e seu paciente conseguem construir um modelo explicativo do processo desaúde e doença em comum, a relação médico-paciente é sólida e duradoura.

■ Exame físico breve: fazer sempre, pois garante a confiança do paciente pelo fato de que suas queixas nãoestão sendo desconsideradas, de que se está atento a possíveis problemas físicos, e garante a tranqüilidadede não se negligenciar a percepção de possíveis novas alterações físicas que requeiram outra forma de cuida-do. Esse exame não deve ser substituído por exames complementares.

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CADFazer novas associações

Existem diversas formas a partir das quais uma nova relação entre os sintomas físicos e o sofrimento psíquicopode ser desvelada e trabalhada. Uma delas é o uso de conceitos compreensíveis que integrem sofrimentopsíquico e físico. Em nossa cultura, três conceitos se destacam e são úteis para a integração mente-corpo:estresse, nervoso e tensão; conforme mostra o Quadro 6.

Quadro 6

CONCEITOS ÚTEIS PARA INTEGRAÇÃO MENTE-CORPO

Associar eventos de vida aos sintomas também é um caminho para abordar os casos com sinto-mas físicos inexplicáveis. Construir essa ponte pode ser fácil, em especial no caso dossomatizadores agudos que, ao vislumbrarem um espaço de escuta de seus problemas, imedia-tamente estabelecem vínculos e se beneficiam de intervenções de caráter de apoio. Ou podeser difícil, no caso de somatizadores crônicos, que costumam aderir às queixas somáticas e serecusam a discutir seus problemas pessoais. Nesse caso, duas formas de intervenção têm de-monstrado eficiência na prática clínica: fazer associações temporais e fazer associações porfiguras de linguagem.

■ Estresse. O conceito de estresse (ou stress) é amplamente difundido e sabe-se que sintomas autonômicos ocor-rem na sua presença. A busca de estressores na vida do paciente também facilita que sejam identificados fatoresdesencadeantes de transtornos depressivos e ansiosos, e situações problemáticas na vida dos pacientes.

■ Nervos ou nervoso. Este conceito se apresenta de várias formas nas consultas, em geral como queixasfísicas associadas a problemas psicossociais. Esse tipo de queixa, tradicional na cultura brasileira, emborainicialmente tenda a ser fonte de problemas para os médicos, pode ser muito útil na recodificação dossintomas. A queixa de nervos é um tipo de sofrimento que integra componentes físicos e psíquicos. Utilizaresse conceito significa poder trabalhar dentro das representações culturais dos pacientes, o que em muitofacilita para que eles possam abordar os sofrimentos psicológicos associados às queixas físicas.

■ Tensões musculares. Tensões musculares causam dor física e, como a depressão, podem abaixar o limiar dador. Construir explicações que demonstrem que ansiedade e depressão causam alterações somáticas permiteque o modelo cartesiano seja rompido e que se abra um espaço para que o sofrimento psíquico seja trabalhado,sem que as queixas somáticas sejam descartadas como simulações ou invenções.

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Quadro 7

MANEJANDO EVENTOS VITAIS SIGNIFICATIVOS EM SOMATIZAÇÃO

Além de ser uma responsabilidade específica do MFC, a família é um fator importante para entender epoder tratar os pacientes com queixas médicas inexplicáveis. Esse tema foi por nós estudado de formamais profunda no livro Doença e Família,16 mas é necessário que entendamos que a família deve serincluída pelo médico no processo de abordagem, diagnóstico e tratamento.

Freqüentemente, as queixas somáticas inexplicáveis representam um padrão de comunicação de origemna família nuclear que pode ser mantido e reforçado em núcleos familiares posteriores. Essa atitude familiarinicialmente reforça os ganhos secundários com o papel de doente, mas, geralmente, acaba por gerarconflitos quando os familiares se sentem manipulados pelas queixas e pela crescente incapacidade dospoliqueixosos quando esses cronificam. Essa alternância de reforço inicial e posterior rejeição da família éparte do quadro dos somatizadores crônicos e deve ser diretamente abordada, sob risco de fracasso dasoutras intervenções terapêuticas.

Convocar a família, elucidar conflitos existentes, conversar e esclarecer sobre as queixas e ograu de sofrimento emocional de nosso paciente pode abrir novos caminhos de resolução dosproblemas, levando à redução do estado depressivo-ansioso e das queixas somáticas.

A elaboração de um genograma pode ser extremamente útil, por diversas razões. Do ponto devista da relação médico-paciente, ele contribui, em sua elaboração, para o estreitamento dovínculo com o paciente, bem como demonstra um interesse na sua vida familiar. Este tipo deinstrumento também auxilia a construir, ao longo do tempo, a história da sintomatologia, bemcomo associá-la a eventos significativos, além de mostrar as estruturas vinculares e conflitivas da família que podem contribuir para a existência dos sintomas.

Negociando o tratamento

Toda modalidade de tratamento bem sucedida se baseia em uma relação terapêutica centrada no conheci-mento das posições e opiniões do paciente acerca de sua doença, do reconhecimento das preocupaçõesdo paciente e da negociação do tratamento.

■ Vinculando no “aqui e agora”. As associações temporais consistem em buscar, junto com o paciente, analisaros eventos de sua vida que estão associados temporalmente ao surgimento das queixas médicas inexplicáveise das queixas psicológicas, vinculando-os no 'aqui e agora'. Esses eventos, desencadeantes de transtornosdepressivos e ansiosos, merecem ser analisados e discutidos com os pacientes. Muito freqüentemente serãoos problemas que devem ser aportados nas intervenções terapêuticas, como veremos a seguir.

■ Associação por figuras de liguagem. A utilização das associações por figuras de linguagem é por vezes comple-xa, porém bastante útil, em especial no caso de pacientes com quadros crônicos, que negam a existência deproblemas interpessoais em suas vidas. Colocando sempre a sua situação pessoal como "normal", esses paci-entes apresentam uma barreira à discussão de suas dificuldades pessoais, negando sua existência. Venceressa resistência pode necessitar a utilização de figuras da linguagem do dia-a-dia que estabelecem uma ponteentre problemas psicossociais e os sintomas somáticos.

■ Expressões tais como "estou com fulano atravessado na garganta" (representando muito bem a sensação doglobus histericus) ou "sicrano me dá náusea", em um paciente com problemas digestivos, são pontes a seremutilizadas na aproximação aos conflitos pessoais desses pacientes. Uma paciente certa vez referiu que "detanto engolir sapo, meu estômago virou um brejo" para explicar seus sintomas gastrintestinais.

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Compreender como nosso paciente está entendendo suas queixas somáticas é fundamentalpara podermos instituir os tratamentos necessários. Apenas quando ele puder entender quehá um sofrimento psíquico que necessita ser cuidado, poderemos instituir as intervençõesnecessárias.

Nesse sentido, é importante lembrar que uma série de atitudes pode piorar o tratamento dos pacientessomatizadores, como apresentado no Quadro 8:

Quadro 8

ATITUDES QUE PIORAM O TRATAMENTO DOS PACIENTES SOMATIZADORES

34. Que tipo de atitude caracteriza a reatribuição na abordagem terapêutica dos pacientes comqueixas médicas?

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35. Descreva a importância do tratamento da somatização para a construção de um modeloexplicativo do processo de saúde e doença pelo médico e pelo paciente.

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36. Por que razão o exame físico não deve ser substituído pelos exames complementares?

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■ Dizer "você não tem nada";■ Preocupar-se excessivamente com a remissão dos sintomas – os pacientes não querem necessariamente

alívio do sintoma, mas certamente buscam compreensão;■ Desafiar o paciente – concorde que há um problema;■ Explicar prematuramente que os sintomas são emocionais – em especial nos somatizadores crônicos;■ Diagnósticos orgânicos positivos não vão curar o paciente.

LEMBRAR

Fonte: Fortes e colaboradores (2005); Tófoli (2006); Tófoli (2006).17, 18, 19

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A intervenção terapêutica, pelos profissionais da equipe de atenção primária, nos problemasemocionais desses pacientes deve ser considerada de forma diferenciada conforme se trate depacientes com queixas agudas, recentes, pouco resistentes à abordagem de seus problemaspsicológicos ou de pacientes crônicos, mais arraigados ao componente físico de seu sofrimento.

CONDUTAS PARA SINTOMAS AGUDOS INEXPLICÁVEIS

No caso de pacientes com queixas SEM agudas, o tratamento a ser instituído pelo médico de família ecomunidade se apóia em quatro eixos:

1) tratar os transtornos depressivos e ansiosos associados;2) reduzir o stress e a angústia dos pacientes;3) ajudar os pacientes a lidar melhor com seus problemas pessoais através de técnicas terapêuticas;4) manejo em grupos.

Tratar transtornos depressivos e ansiosos associados

A correta detecção dos transtornos mentais comuns é fundamental para o correto manejo dessespacientes. A grande maioria dos pacientes com queixas médicas inexplicáveis na APS de nossopaís são portadores desses quadros, que apresentam seu sofrimento sob a forma de queixasfísicas.20 Nesse caso, a medicação antidepressiva e ansiolítica apropriada são fundamentais.

Porém, os pacientes somatizadores crônicos, uma percentagem pequena deste grupo – em torno de 7%20

– têm uma extrema sensibilidade a qualquer alteração somática, ampliando-a sistematicamente. Isso ostorna particularmente sensíveis aos efeitos colaterais destas medicações, em especial os antidepressivos.É necessário paciência, esclarecimento e perseverança para que suas dúvidas sejam superadas e a ade-são ao tratamento ocorra.

Muitas vezes, o paciente vai suportar certos efeitos colaterais apenas para "agradar" o médico que sepreocupa com ele, o que reforça a importância do vínculo.

Além da medicação, intervenções terapêuticas pela equipe do Programa de Saúde da Família podem serrealizadas. Três tipos de abordagem se destacam: técnicas de relaxamento/exercício físico; intervençõesterapêuticas de cunho psicológico; manejo em grupos.

37. Indique as funções desempenhadas pelas associações temporais e pelas associações porfiguras de linguagem no processo terapêutico do paciente somatizador.

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TRATAMENTO DA SOMATIZAÇÃO

Uma vez que o processo de abordagem, de estabelecimento do vínculo terapêutico e de recodificação dasqueixas físicas tenha sido realizado, podemos, então, iniciar o tratamento adequado do sofrimento mentalque esses pacientes apresentam e que motivam o surgimento das queixas.

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Intervenções terapêuticas de cunho psicológico

Os profissionais da atenção primária, em especial da Estratégia de Saúde da Família, desen-volvem fortes vínculos com seus pacientes. Esse tipo de vínculo, por si só, é terapêutico e,freqüentemente, os pacientes trazem seus problemas pessoais para serem conversados comseus médicos.

Por isso, podemos dizer que intervenções psicoterapêuticas podem ser desenvolvidas poresses profissionais, porém dentro da especificidade e dos limites de sua formação.

Não cabe a esses profissionais assumirem o tratamento psicoterápico de transtornos mentais graves deseus pacientes (essa é uma atuação específica dos profissionais especializados), a não ser que tenhamsido capacitados especificamente para isso, mas sim oferecer intervenções de apoio e abordagens quepermitam a esses pacientes superar os diversos problemas psicossociais que se associam às queixasmédicas inexplicáveis.

Nesse ponto, a utilização da técnica de resolução de problemas, associada a algumas intervenções decunho cognitivo-comportamental, tem revelado-se extremamente útil no manejo destes pacientes.21

A técnica de resolução de problemas22 se caracteriza por permitir ao paciente, com o apoio domédico, um espaço de análise de seus problemas e de construções de formas alternativas delidar com eles. Ao profissional não cabe dar soluções ao paciente.

Ao contrário, permitindo-se abandonar essa dolorosa posição de ter que resolver os problemas psicossociaisde seus pacientes, o médico de família vai deparar-se com um novo papel, que pode servir de apoio paraque seus pacientes reflitam e repensem suas vidas, relações e formas de lidar com os seus problemas,ampliando seus horizontes e construindo novos caminhos para suas vidas.

Grupos

Nessa mesma linha, um espaço de tratamento privilegiado que pode ser desenvolvido em APS é o dosgrupos terapêuticos. Muitas técnicas grupais têm sido aplicadas com sucesso na atenção primária, taiscomo a terapia comunitária, os grupos de convivência e as terapias breves baseadas nas técnicas cognitivascomportamentais e na técnica de resolução de problemas.

Técnicas de relaxamento/exercício físico

O relaxamento permite uma redução da ansiedade que é extremamente freqüente nesses pacientes. Essaredução se reflete diretamente na diminuição dos sintomas físicos relacionados a stress e tensão, tais comodores cervicais e lombares, cefaléias e dor torácica. São técnicas que não necessitam de profissionais desaúde mental especializados para serem realizadas e trazem bem-estar imediato aos pacientes.

Outras atividades físicas como caminhada, ginástica e alongamento também são especialmente benéficasa esses pacientes, tanto pela redução da ansiedade e tensão como pela melhora direta do condicionamen-to físico, o que também reforça a sensação de bem-estar, reduzindo as queixas somáticas.

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Araya e colaboradores23 desenvolveram, no Chile, uma intervenção grupal breve (9 sessões) que permiteàs pacientes com transtornos mentais comuns, a maioria com queixas somáticas, um espaço terapêutico. Éuma intervenção específica, adequada para ser realizada por médicos e enfermeiras das equipes de saúdeda família, e bastante eficaz.

CONDUTAS PARA PACIENTES SOMATIZADORES CRÔNICOS

No caso dos pacientes crônicos, qual deve ser a abordagem? Como encaminhar? O que compete ao MFCnesse caso?

Os somatizadores crônicos representam uma parte bastante reduzida dos pacientes com queixas médi-cas inexplicáveis que procuram atendimento com médicos de família. No entanto, quando presentes,esses pacientes são freqüentemente fontes de estresse e frustração para o MFC. Eles, geralmente,apresentam síndromes funcionais associadas e têm prognóstico mais reservado, pois são pacientesaderidos ao papel de doentes, freqüentemente com ganhos secundários com a doença e resistentes atrabalhar seus conflitos pessoais.

Nesses casos, a mesma abordagem inicialmente descrita nesse capítulo deve ser mantida, pois é necessá-rio que o paciente pelo menos perceba alguma conexão entre seu sofrimento físico e seus problemasemocionais. Mas um atendimento especializado em saúde mental está indicado, pois as intervençõespsicoterápicas apropriadas, sejam elas individuais ou em grupo, têm uma duração de mais longo prazo.

Vale lembrar que mesmo esses pacientes não devem perder o vínculo com seus médicos de família, e que,portanto, devem ser capazes de identificar situações de agudização e ter mecanismos de referência econtra-referência bem estabelecidos com os especialistas em saúde mental.

As mudanças nos pacientes somatizadores crônicos são lentas, a resistência a abordar seusproblemas emocionais é grande e a contratransferência que costumam suscitar em seuscuidadores é bastante negativa, trazendo sentimentos desagradáveis de rejeição e irritação.

Na maior parte das vezes, esses sentimentos são causados pela recusa do paciente em aceitar que nãoexiste nada orgânico, questionando a origem psicológica dos sintomas. Fica implícito que há algo que omédico não consegue descobrir, provocando uma incômoda sensação de impotência no profissional.

Deve-se evitar, principalmente nestes casos, os "cabos-de-guerra" em que se tenta convencer os pacientesde algo que eles não querem ou não podem ser convencidos. O processo de ressignificar os sintomas édifícil e tem que ser construído passo a passo.

LEMBRAR

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CADQuadro 9

PAPÉIS DO MFC EM SOMATIZAÇÃO CRÔNICA

38. Marque a opção correta quanto ao manejo de pacientes somatizadores crônicos pelomédico de família e comunidade.

A) Desenvolver o processo de reatribuição das queixas, ao mesmo passo em que sereforça o vínculo médico-paciente.

B) Manter postura firme e não ceder jamais a qualquer desejo do paciente.C) Ter em mente que o objetivo final é a remissão completa dos sintomas, da mesma

forma que na depressão.D) Após encaminhar para atenção secundária, evitar o atendimento regular pelo MFC.

39. Quanto ao tratamento de queixas físicas inexplicáveis a pacientes com queixas re-centes, o MFC pode ser responsável por:

A) tratar transtornos depressivos e ansiosos associados.B) utilizar técnicas de redução de angústia e estresse.C) aprender técnicas de abordagem grupal.D) Todas as opções estão corretas.

Respostas no final do capítulo

Em resumo, os papéis do médico de família e comunidade em somatização crônica são os seguintes:

■ Desenvolver o processo de reatribuição das queixas, pois esse é imprescindível para que o encaminhamentopara atendimento especializado em saúde mental seja acatado pelo paciente, já que menos de 30% destespacientes costumam aceitar esse encaminhamento.

■ Atender regularmente esses pacientes, realizando um exame clínico adequado e acompanhando seu estadode saúde, reforçando a origem emocional dos sintomas e apoiando o tratamento na saúde mental. A manuten-ção do tratamento com o médico clínico aumenta a adesão do tratamento na saúde mental.

■ Evitar exames desnecessários e encaminhamentos a especialistas. Esse processo reforça a convicção dopaciente de que pode estar havendo algo errado e, ao contrário do que se espera, não o tranqüiliza, apenasreforçando mais ainda sua convicção de que algo está errado com ele fisicamente, pois, afinal, "o doutor seguiupedindo exames e solicitando a opinião de outros especialistas, certo?"

■ Manter um canal de comunicação e atualização sobre o tratamento do paciente no serviço de saúde mental.Discussões interdisciplinares sobre esses casos entre as equipes de APS e saúde mental devem determinar umprojeto terapêutico comum e quais serão os papéis dos agentes terapêuticos envolvidos.

■ Organizar o tratamento na APS (até pela tendência destes pacientes em serem centrados na figura do médico),porém envolvendo também toda a equipe de APS, favorecendo paulatinamente ações interdisciplinares e, emespecial, recursos não-farmacológicos disponíveis no serviço e na comunidade. Deve, também, envolver afamília do paciente no tratamento.

■ Usar técnicas que mantenham a comunicação médico-paciente eficiente, como clarear, na consulta, quais sãoas áreas na qual você e o paciente concordam/discordam, elaborando uma agenda consensual; reforçar sem-pre com o paciente as associações entre queixas físicas e sofrimento psíquico; e fornecer um modelo claro eabrangente ao paciente sobre seus sofrimentos.

■ Convém lembrar que o médico não deve esperar uma cura. Mais do que a eliminação do sintoma, o objetivo épossibilitar ao paciente conviver com seus sofrimentos de uma forma equilibrada – assim como se costumapensar no tratamento de outras moléstias clínicas crônicas.

Fonte: Fortes e colaboradores (2005); Tófoli (2006); Tófoli (2006).17, 18, 19

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Quando questionada, relata fezes enegrecidas e muito mal cheirosas. Ao exame físico, nota-sesangue ao toque retal, FC 110bpm.

Com hipótese diagnóstica de hemorragia digestiva alta e com indicação de transferência paraum serviço de emergência, o irmão da paciente (que é enfermeiro) é contatado. Por telefone,mostra-se extremamente ansioso, dizendo que não se responsabiliza mais pela automedicaçãoda irmã, que desde sempre foi uma "desajustada" com as dores e formigamentos que não têmcausa.

Antes da remoção da paciente para a emergência, foi agendada uma consulta em 15 dias, paramelhor avaliação e cuidado continuado.

40. Considerando os dados apresentados no caso clínico até agora, qual é a sua suspeitadiagnóstica? Justifique sua resposta.

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CASO CLÍNICO

Dados da paciente

MIP, 57 anos, solteira, ensino médio completo, comerciária, católica, vive com a irmã e o cunhado,dos quais apresenta dependência econômica.

Primeiro contato com paciente

Consulta não agendada (acolhimento) no consultório do MFC.

Queixa

Intensa dor em epigástrio, em queimação há 2 dias, associada a tontura e fraqueza. Pacienteconta que "já está acostumada com dores", mas há três dias sente dor como nunca sentiu antes.Começou 2 dias após seu último atendimento médico, quando procurou a unidade de saúde dafamília para uma receita de diazepam.

Ela relata que, nesse dia, o médico responsável pelo acolhimento recusou-se a dar a receitacontrolada a ela. Desde então, está usando diclofenaco, aspirina e dipirona quando tem dor. Acefaléia apresentou discreta melhora, porém houve piora da dor abdominal.

Em breve revisão de prontuário, nota-se pelo menos uma consulta semanal por dor (cefaléia,precordialgia, dor abdominal, cervicalgia e dores nas pernas) e outras por "problemas nos nervos",palpitações e troca de receitas. Diz que achou estranho, pois sua pressão está sempre alta, mashoje estava 90 x 60mmHg.

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CAD41. O MFC identificou no prontuário que a paciente realizou consultas por "problemas nos ner-

vos". De que formas os conceitos de ‘‘nervos ou nervoso’’ podem contribuir para a conduçãodesse caso?

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42. Antes da remoção da paciente para a emergência, foi agendada uma consulta em 15 dias,para melhor avaliação e cuidado continuado. Comente a conduta adotada pelo MFC,posicionando-se.

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Após 2 semanas, MIP retorna contando que teve uma úlcera péptica por causa de remédio.Com o tratamento, a dor abdominal melhorou, porém mantém:

■ insônia;■ precordialgia;■ dor de cabeça;■ formigamento nos braços e mãos.

Foi avaliada por cardiologista e neurologista e foi dito a ela que "não tinha nada", do que apaciente duvida, dizendo: "São todos conhecidos do meu irmão, que quer mais é que eu morra".Acha que tem "começo de infarto e derrame" freqüentemente, sempre em ocasiões em que estásozinha e lembra do pai, que faleceu há 2 anos. Por isso, toma aspirina (uma amiga disse queafina o sangue e é bom). Às vezes, sonha com o pai, o que lhe dá muita angústia e saudade,piorando os sintomas. Depois do falecimento da mãe, há 10 anos, vem tomando diazepam para"depressão", prescrito inicialmente por psiquiatra – e depois mantido de forma fortuita pela buscaprópria de receitas controladas.

Recusa-se a acompanhamento médico regular, pois sempre dizem para ela que seu problema é"psicológico". Retornou hoje, pois, pela primeira vez, acharam uma doença (úlcera). Quadroálgico constante, variando de local e intensidade, às vezes acompanhado de palpitação e formi-gamento.

Diz-se hipertensa, em uso regular de hidroclortiazida, segundo ela sem efeito, pois está "semprecom a pressão alta". Nega dislipidemia, diabete, uso abusivo de tabagismo, álcool ou outros.Exames de rastreamento/prevenção em dia (solicitados pela ginecologista).

Nega humor deprimido, falta de vontade de fazer as coisas. Tem prazer em ver TV e costurar,apesar de lembrar do pai quando faz isso. Apetite mantido, sem idéia de culpa ou menos valia.Aumento de apetite (para doces e chocolates), principalmente quando muito nervosa.

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Acredita que se dedica muito a cuidar de sua saúde, mas que, apesar de todos os remédios,está debilitada e tem que descobrir as causas de seu sofrimento.

Exame físico

■ Bom estado geral.■ Pele e subcutâneo sem alterações.■ Corada, hidrata e eupnéica.■ Pressão arterial: 170 x 100mmHg;■ Freqüência cardíaca 110bpm.■ Índice de massa corpórea: 31kg/m2.■ Ausculta cardíaca e pulmonar normais.■ Abdome sem massas e indolor à palpação.■ Pulsos distais simétricos.

Exame neurológico sem alterações.

43. Considerando os novos dados incluídos no caso clínico, você confirma sua hipótesediagnóstica? Por quê?

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44. Analise os elementos relatados pela paciente quanto ao curso e grau de incapacitação dossintomas e, também, à atribuição etiológica dos sintomas físicos.

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Diz-se excessivamente preocupada e inquieta, há pelo menos 1 ano, com os vários problemasdo dia-dia. Sente-se com os nervos a "flor da pele". Seus irmãos dizem que ela se preocupademais com as coisas. Preocupações diárias. Insônia de longa data.

Dificuldade de concentração. Sente-se freqüentemente exausta e com os músculos tensos,piorando as dores. Nega medos específicos, eventos traumáticos recentes, ou crise súbita comsensação de morte iminente.

Não tem familiares com doença psiquiátrica ou câncer. Mãe falecida por AVC aos 71 e pai porIAM aos 75 anos.

Não faz atividade física regular, alimenta-se irregularmente em lanchonete, passando dias so-mente com doces. Não se vacina desde a adolescência, não usa protetor solar e há muito nãoprocura dentista.

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47. Em que medida técnicas de relaxamento e realização de exercício físico poderiam auxiliar apaciente no tratamento da somatização? Por quê?

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Após esta segunda consulta, é feita a seguinte lista de problemas:

■ úlcera péptica em tratamento;■ transtorno de ansiedade generalizada (TAG);■ sintomas físicos inexplicáveis com tendência à cronificação;■ HAS descontrolada;■ obesidade grau 1;■ conflitos no núcleo familiar;■ estilo de vida pouco saudável (alimentação e atividade física);■ cuidados preventivos insuficientes (saúde bucal, vacinas, exposição solar).

45. Que fatores de risco para a presença de sintomas físicos sem explicação médica podem seridentificados nesse caso clínico?

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46. Diante dessa paciente, que reluta, de que maneira pode ser realizada a intervenção tera-pêutica?

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Retorno em 20 dias

MIP relada discreta melhora dos sintomas, principalmente das palpitações e dos formigamentos.Está um pouco mais calma e dormindo melhor. Está muito feliz, pois, pela primeira vez, encontrapessoas preocupadas em "tratar suas doenças". A ACS é "muito simpática" e sempre perguntasobre sua saúde, os remédios e os grupos de atividade física.

Queixa-se de boca seca, tontura, tremores e constipação com a imipramina. Ainda brigandomuito com irmão. Sua irmã acha que tanto remédio é desnecessário. Não tem paciência para oLiang Gong, porém está caminhando todo dia e pensa em ir para academia.

PA 140 x 90mmHg, FC 62 bpm. ECG normal, exames bioquímicos, mamografia e colpocitologiaoncótica normais e recentes. Solicitado sangue oculto nas fezes e TSH (rastreamentos).

MIP é informada, neste momento, dos efeitos colaterais da medicação e sobre a importância deque se alimente de frutas e alimentos ricos em fibras. Aprofunda-se um pouco mais a percepçãosobre seus sintomas e dos fatores desencadeantes, principalmente aqueles relacionados à lembrançada morte do pai, e também se dá conta de que eles estão associados a discussões com os irmãos.

■ Manter o tratamento antiácido e evitar antiinflamatórios não-esteróides. Prescrito parace-tamol 750mg para dor.

■ É enfatizado que a paciente tem mesmo alguns problemas de saúde relacionados aoquadro de dores. Frisa-se que o estresse é um fator importante, que tanto pode causardores quanto ser causado por elas, ou, ainda, que ele pode modular a intensidade da suador. Para este quadro, é fundamental o tratamento adequado, que consiste em:• medicamentos;• mudança comportamental;• apoio psicológico.

■ Opta-se por trazer mais informações sobre somatização e ansiedade generalizada aolongo das consultas.Propõe-se:• imipramina 25mg, por 10 dias, aumento para 50mg até retorno em 20 dias. Dose no- turna.• participar do grupo de saúde mental que iniciará em 3 semanas.• atividade física regular: caminhadas diárias com a equipe da unidade e/ou ir grupo de Liang Gong (ginástica chinesa) do serviço.

■ Prescrito atenolol 50mg, para controle de PA e palpitações. Solicitado ECG (avaliaçãomiocárdica e ritmo cardíaco – prescrição de tricíclico).

■ Encaminhamento para nutricionista para orientação alimentar.■ Encaminhada à sala de vacina para vacinação dT e à triagem odontológica. É enfatizada

a importância do filtro solar na prevenção do câncer de pele.■ Pedido para trazer todos os exames solicitados pela ginecologista.■ Agente comunitária de saúde é contatada para realizar visitas semanais em apoio à ativi-

dade física e avaliação se o tratamento medicamentoso e encaminhamentos foram realizados.■ Paciente ciente e em concordância com apoio da ACS.

São, então, indicadas as seguintes orientações e tratamentos:

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CADDentro do plano de tratamento consensual fica claro que a medicação será usada por meses e

sob acompanhamento. Ainda não foi ao grupo de saúde mental. Assim, é reforçada a importânciade sua participação. É parabenizada pela iniciativa da caminhada e lhe é dito que academia éuma boa idéia. Em um retorno próximo, é solicitada a presença da irmã ou do irmão.

Após 6 meses

A paciente aderiu ao tratamento medicamentoso, apesar de ter sido necessário fazer troca daimipramina para fluoxetina 20mg/d devido à extrema sensibilidade com efeitos colaterais.Realiza atividades físicas três vezes por semana, mas não teve "paciência" para participar dogrupo de Liang Gong.

Depois de uma primeira desistência, após uma única participação no grupo de saúde mental("as mulheres do grupo só falam de depressão"), foi convencida da importância de sua participaçãoe passou a freqüentá-lo quase sem faltas. Lá, percebe a importância das relações familiaresconflituosas (que se mantêm difíceis) e aprende a valorizar a saudade dos pais como uma coisapositiva, buscando recordações agradáveis. Aprende também a manejar pensamentos negativos.

Sente-se muito mais estável, porém, às vezes, sente alguns sintomas físicos quando ansiosa.Mas aí faz os exercícios de relaxamento respiratório. Controla melhor seus pensamentosnegativos. O plano terapêutico redesenhado junto com a paciente indica manter o antidepressivopor mais 6 meses, sendo, então, programada uma retirada gradual, com apoio da ACS edisponibilidade da equipe.

48. Que elementos possibilitaram que o tratamento fosse bem-sucedido?

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ADE CONCLUSÃO

As queixas somáticas inexplicáveis, que tanto geram sofrimento nos pacientes e nos profissionais de saú-de, e em especial no médico de família e comunidade, não só podem como devem ter seu manejo dentro docabedal teórico e prático da especialidade. Porém, não é só isso. Pode-se afirmar, sem muita dúvida, que ofortalecimento dos cuidados primários à saúde no Brasil e no Mundo vem enriquecendo, ampliando e ques-tionando a forma pela qual se acostumou a ver a somatização. O exercício constante de comunicação eaperfeiçoamento sobre esse tema tem apresentado um grande potencial como fonte de crescimento parapacientes, médicos e os especialistas de saúde mental que vêm, cada vez mais, dialogando sobre taisquestões.

A Medicina tem assumido, no Ocidente e em sua história recente, o objetivo principal de tratar da doença,mas vem transformando paulatinamente suas responsabilidade para também cuidar da saúde. Para tal, orompimento com antigos paradigmas se faz necessário.

A Biomedicina tradicional e seu paradigma anátomo-clínico clássico tem oferecido poucas soluções àspessoas com sintomas físicos sem explicação orgânica. A nova geração de médicos de família e comunida-de, que tanto tem contribuído nestas mudanças, deverá certamente cumprir também o seu papel ao cuidar– com uma compreensão cada vez maior – destes casos tão desafiadores.

RESPOSTAS ÀS ATIVIDADES E COMENTÁRIOS

Atividade 3Resposta: DComentário: O tratamento farmacológico dos sintomas físicos inexplicáveis é fundamentalmente sintomáti-co, função que costuma ser mais adequada com o uso de antidepressivos. O uso de um psicofármaco emgeral se dá por períodos superiores a um mês, o que pode induzir as pessoas com sintomas físicosinexplicáveis ao abuso ou dependência dos benzodiazepínicos.

Atividade 8Respostas: (De cima para baixo) 2, 3, 1, 1, 3 (nó na garganta), 2 (formigamento/entorpecimento), 1, 3, 1, 2,2 (sudorese), 1 (auto-estima), 3, 1, 3, 1, 3, 2 (sufocação), 1 (culpa), 3, 1, 1 (apetite).

Atividade 17Resposta: Os transtornos somatoformes, alguns tipos de transtornos dissociativos ou conversivos e aneurastenia se caracterizam, amplamente, pela presença de sintomas físicos inexplicáveis como principalcritério para seu diagnóstico específico, geralmente apresentando um curso crônico com grave comprome-timento funcional e recusa do paciente em aceitar a associação do sofrimento com esses quadros.

Atividade 18Respostas:

A) Em casos de transtorno neurovegetativo somatoforme evidencia-se a presença de sintomas de excita-ção autonômica atribuídos pelo paciente a transtornos físicos no coração e sistema cardiovascular, notrato gastrintestinal superior ou inferior, no sistema respiratório ou geniturinário.

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Característica(s)do transtorno

Característica(s)do paciente

Transtorno somatoforme

Grande grau de cronicidade.

Mais grave em função da estabilidade dos sintomas e da forteatribuição de causa orgânica a seus sofrimentos.

B) O paciente com transtorno hipocondríaco pode manifestar preocupação persistente com deformidadeou desfiguração presumida, sendo também possível a crença na presença de, no máximo, duas doen-ças físicas sérias por um período não inferior a 6 meses.

C) A aceitação do reasseguramento médico de que não há qualquer causa física adequada para os sinto-mas físicos por curtos períodos de tempo se constitui num dos critérios diagnósticos empregados paraidentificação de transtorno de somatização.

D) Tanto o paciente com transtorno de somatização como aquele com transtorno hipocondríaco podemmanifestar recusa persistente em aceitar o reasseguramento médico sobre a inexistência de causafísica adequada para os sintomas físicos.

E) No transtorno de somatização pode ocorrer uma história de, no mínimo, 2 anos de queixas de sintomasfísicos múltiplos e variáveis que não podem ser explicados por quaisquer transtornos físicos detectáveis.

F) Um paciente com síndrome de Briquet ou transtorno psicossomático múltiplo pode manifestar umaatitude de busca repetida de consultas ou investigações tanto em cuidados primários como com médi-cos especialistas, apelando para automedicação ou curandeiros locais na ausência de serviços médi-cos ao alcance.

G) O critério diagnóstico do transtorno doloroso somatoforme persistente corresponde à dor persistente,grave e angustiante por um período de, no mínimo, 6 meses – o que se manifesta em qualquer parte docorpo–, é o principal foco de atenção do paciente e não pode ser explicada de forma adequada porevidência de processo fisiológico ou transtornos físicos.

Atividade 19Respostas:

Atividade 20Respostas:A) Transtorno motor dissociativoB) NeurasteniaC) Convulsão dissociativaD) Anestesia e perda sensorial dissociativaE) Transtorno motor dissociativo

Atividade 21Respostas:A) (NE)B) (TDC)C) (NE)D) (TDC)E) (TS)

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Atividade 24Respostas:

Atividade 27Resposta: BComentário: O reconhecimento do sofrimento do paciente é necessário para o estabelecimento de umarelação terapêutica, que será o fio condutor das intervenções que possam beneficiá-lo. Para tanto, é impor-tante evitar definições vagas como "problema psicológico" ou "você não tem nada", compreendendo osintoma como expressão da unidade mente-corpo. Intervenções farmacológicas ou psicossociais podemser úteis, mas geralmente não interrompem o curso prolongado desta condição clínica que se caracterizapor sintomas físicos inexplicáveis. Além disso, o clínico tem um papel fundamental na adesão ao tratamen-to, favorecendo e integrando as ações da família e da equipe de saúde.

Atividade 29Resposta: CComentário: O estabelecimento de um vínculo estável com o médico e a facilidade de acesso ao serviço,inclusive o agendamento de consultas, tem mostrado-se favorável a uma diminuição das queixas e deman-das do paciente ao longo do seguimento; a situação inversa pode estimular a crença de que há uma doençadesconhecida e ignorada pela equipe de saúde, acentuando os sintomas físicos inexplicáveis.

Atividade 30Resposta: BComentário: Os pacientes com transtornos físicos inexplicáveis demandam um conjunto de cuidados queabrangem vínculo, empatia e coerência das equipes. É comum rapidamente retornarem aos sintomas sesentirem alguma "falha" desses cuidados. Nesses momentos em que se deve reforçar esses conjuntos decuidados, é freqüente uma reação de mal-estar do médico, gerando um ciclo vicioso de insatisfação mútuae incremento dos sintomas.

Atividade 32Resposta: CComentário: Mesmo que os quadros de sintomas físicos inexplicáveis guardem muita semelhança, o pro-cesso terapêutico exige que se conheça o paciente em sua individualidade. A saúde tem parceria com aflexibilidade, porém os limites são necessários e úteis, dando consistência ao atendimento.

Critério(s)empregado(s)

Eixo 1 Eixo 2

Curso e grau de incapacitação dos sintomas.

Atribuição etiológica: graude atribuição somática oupsicológica conferida pelopaciente à origem dossintomas físicos.

Responsabilidade(s)do profissional

Processamento da atribuiçãosomática ou psicológica pelopaciente e desenvolvimentode consciência sobre a origemnão-orgânica das afliçõesdo paciente.

Não facilitar a transformaçãodos casos agudos emcrônicos.

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CADAtividade 38

Resposta: AComentário: Embora a minoria dos pacientes cronificados busque tratamento na atenção primária, muitosdesses tipos de somatizadores estão na clientela de um MFC. A organização do tratamento na APS podefacilitar o processo do paciente de conviver melhor com as suas queixas – e não necessariamente curá-las– se seu médico desenvolver habilidades de comunicação que permitam que se dê, paulatinamente, areatribuição dos sintomas.

Atividade 39Resposta: DComentário: Já existem evidências de que o MFC pode desenvolver as habilidades citadas nos itens daquestão, aplicando-as em benefício do paciente. É importante frisar que grande parte das condutas não émedicamentosa, e que até pacientes com depressão e ansiedade leves podem ser submetidos a técnicasnão-farmacológicas antes de um ensaio com antidepressivo.

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