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FUNDAÇÃO ESCOLA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO PARANÁ RAÍZES DA POSIÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA ATUAL CONSTITUIÇÃO FEDERAL HUGO LEONARDO GUIMARÃES E SILVA

RAÍZES DA POSIÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA ATUAL ... · Relações entre História e Filosofia na evolução do Ministério Público brasileiro atual. ... após realizado um

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FUNDAÇÃO ESCOLA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO PARANÁ

RAÍZES DA POSIÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA ATUAL CONSTITUIÇÃO FEDERAL

HUGO LEONARDO GUIMARÃES E SILVA

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HUGO LEONARDO GUIMARÃES E SILVA

RAÍZES DA POSIÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA ATUAL CONSTITUIÇÃO FEDERAL

Projeto de Monografia apresentado à Fundação Escola do Ministério Público como requisito para obtenção do título de especialista.

Curitiba 2008

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Sumário

RESUMO...................................................................................................... iv INTRODUÇÃO ............................................................................................. 1 CAPÍTULO 1 ........................................ ........................................................ 3 Seção 1.1 ..................................................................................................... 3 Seção 1.2 ..................................................................................................... 4 Seção 1.3 ..................................................................................................... 9 Seção 1.4 ..................................................................................................... 10 Seção 1.5 ..................................................................................................... 12 CAPÍTULO 2 ........................................ ........................................................ 15 Seção 2.1 ..................................................................................................... 15 Seção 2.2 ..................................................................................................... 17 Seção 2.3 ..................................................................................................... 19 Seção 2.4 ..................................................................................................... 21 Seção 2.5 ..................................................................................................... 23 Seção 2.6 ..................................................................................................... 24 Seção 2.7 ..................................................................................................... 24 Seção 2.8 ..................................................................................................... 26 CAPÍTULO 3 ........................................ ........................................................ 27 Seção 3.1 ..................................................................................................... 28 Seção 3.2 ..................................................................................................... 31 Seção 3.3 ..................................................................................................... 32 Seção 3.4 ..................................................................................................... 33 Seção 3.5 ..................................................................................................... 34 CONCLUSÃO ......................................... ..................................................... 39 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................ .................................... 42

iv

Resumo

Raízes históricas do Ministério Público. Análise do regime das Constituições brasileiras de 1824 até 1969. Antecedentes próximos à Constituição da República de 1988. Relações entre História e Filosofia na evolução do Ministério Público brasileiro atual. Palavras-chave: Ministério Público; Constituições do Império e da República; Análise Constitucional; Direito; História; Filosofia.

1

Introdução

O professor Otacílio Paula Silva coloca duas características para as funções

do Ministério Público atualmente: amplidão e contraditoriedade. Por um lado, essas

funções são muito amplas, o que leva a um desconhecimento e ignorância na

sociedade e também nos meios forenses do alcance das atribuições da instituição.

Por outro lado, essas funções são aparentemente contraditórias muitas vezes –

ambíguas na expressão de Carnelutti –, levando à confusão em relação ao seu

exercício1.

Essa característica das funções da instituição coloca um problema do

Ministério Público: por que a instituição possui funções muito amplas e, muitas

vezes, contraditórias? A resposta parece ser a formação progressiva da instituição:

“a história dessa instituição está associada à própria evolução do Estado moderno

até nossos dias2”. Então o problema das funções amplas e contraditórias do

Ministério Pública é um problema com determinação histórica. Por isso, na esteira da

lição do professor Carlos Alberto de Salles3, a compreensão do papel da instituição

na sociedade atual deve tomar em conta suas raízes históricas, isto é, as razões e

condições históricas que levaram ao seu aparecimento.

Tudo que essa monografia busca, portanto, é expor o problema do Ministério

Público brasileiro atual de uma maneira imanente: conjugando os contornos da

instituição nos diplomas legais e na Carta Magna com os problemas aos quais ele

deve ser uma resposta, uma solução. Enfim, jogar nova luz sobre aqueles problemas

pela análise do Ministério Público como uma resposta a uma situação específica de

uma sociedade e um Estado Democrático de Direito em construção.

De um lado, como veremos, os problemas aos quais a instituição de um

Ministério Público com as características que ele possui na Constituição da

República de 1988 são problemas novos: se não surgidos próximos à discussão da

constituição, pelo menos colocados como inspiração do texto. Do mesmo modo, os

diplomas legais que tratam do Ministério Público também visam a estabelecer

1 SILVA, Otacílio Paula. Ministério Público: estudo pragmático da instituiçã o. São Paulo: Sugestões Literárias, 1981, pp. 1-3. 2 SALLES, Carlos Alberto de. Entre a Razão e a Utopia : a formação histórica do Ministério Público. In: MENEZES VIGLIAR, José Marcelo e MACEDO JÚNIOR, Ronaldo Porto (Coords.). Ministério Público II : democracia. São Paulo: Atlas, 1999, pp. 13-41, p. 13. 3 SALLES, Carlos Alberto de. Obra Citada, p. 13.

2

contornos da instituição de modo a responder àqueles problemas colocados e,

talvez até, a alguns novos que se colocam.

No entanto, apesar de nossa monografia estar construída em cima dessa

idéia de que devemos conjugar a instituição com os problemas aos quais ela

responde, não trataremos de modo abstrato essa questão. O objeto desta

monografia é exatamente colocar os problemas em si e mostrar como eles influíram

no texto da atual Constituição, após realizado um histórico da instituição nas

diversas constituições brasileiras.

Por isso, poucas páginas serão dedicadas à questão em si e muitas às

condições históricas, à matéria que compõe essas raízes históricas do Ministério

Público atual.

3

I Do problema da origem

Tema comum entre os diversos livros que tratam do Ministério Público e

assuntos correlatos à atuação ministerial e à vida profissional do membro do

Parquet1 é a origem da instituição2. A grande ocorrência do tema parece remeter a

uma metodologia comum, a uma visão comum do modo como o tema deve ser

investigado.

De qualquer modo, comum também é a afirmação de que a tarefa não é fácil

e a citação de diversas fontes como possíveis origens do Ministério Público3. Por

outro lado, a maioria da doutrina situa as origens da instituição na França, ao fim do

medievo4.

Sendo assim, analisaremos de maneira rápida as diversas opções, detendo-

nos mais nos comentários às raízes italianas e francesas, para, ao final, concluirmos

com considerações pertinentes às opções metodológicas desse caminho e do

caminho proposto nessa monografia.

1.1 Egito

A possibilidade mais antiga aventada na doutrina que trata sobre o tema

remete ao Egito antigo: em 1933 foram encontrados textos de leis em escavações

levadas a efeito no vale dos reis que mencionam deveres de funcionário real,

chamado Magiaí5.

1 Assoalho, em francês. 2 Cf. SAUWEN FILHO, João Francisco. Ministério Público brasileiro e o estado democrátic o de direito . Rio de Janeiro: Renovar, 1999, pp. 11-46; MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime jurídico do Ministério Público . São Paulo: Saraiva, 2007, pp. 35-44; SILVA, Otacílio Paula. Obra Citada, p. 4; MACEDO JUNIOR, Ronaldo Porto. Evolução institucional do Ministério Público brasileiro. In: MELLO DE CAMARGO FERRAZ, Antonio Augusto (Coord.). Ministério Público : instituição e processo. São Paulo: Atlas, 1997. pp. 36-65, p. 37 e ss; GARCIA, Emerson. Ministério Público : organização, atribuições e regime jurídico. 3ª ed. ampl. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris Editora, 2008, p. 7 e ss; RITT, Eduardo. O Ministério Público como instrumento de democracia e garantia constitucional . Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002, p. 114 e ss; e o artigo do professor Carlos Alberto de Salles: SALLES, Carlos Alberto de. Obra Citada. 3 Cf. SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 11 e ss; MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 35 e ss; SILVA, Otacílio Paula. Obra Citada, pp. 4 e ss; GARCIA, Emerson. Obra Citada, p. 7 e ss; RITT, Eduardo. Obra Citada, p. 114 e ss; e SALLES, Carlos Alberto de. Obra Citada, p. 13 e ss. 4 Cf. SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 11; SILVA, Otacílio Paula. Obra Citada, p. 4; e MACEDO JUNIOR, Ronaldo Porto. Obra Citada, p. 38. 5 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 37 e SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 11. Importante notar que ambos citam o saudoso promotor Roberto Lyra, dando crédito a ele por introduzir essa fonte na doutrina nacional, embasado no mestre italiano Berto Valori: LYRA, Roberto.

4

Esse funcionário real, como ele é chamado na doutrina nacional, tinha

funções, deveres análogos a alguns deveres afetos ao Ministério Público atual. São

esses deveres:

I - É a língua e os olhos do rei; II – Castiga os rebeldes, reprime os violentos, protege o cidadão pacífico; III – Acolhe os pedidos do homem justo e verdadeiro, perseguindo os malvados e mentirosos; IV – É o marido da viúva e o pai do órfão; V – Faz ouvir as palavras da acusação, indicando as disposições legais em cada caso; VI – Toma parte nas instruções para descobrir a verdade6.

Como vemos, as funções desse funcionário real eram assemelhadas

àquelas hoje exercidas pelo Ministério Público. Ainda assim, é difícil dizer se havia

algo como um Ministério Público, como uma instituição ministerial entre os egípcios,

uma sociedade tão distante da nossa. Vários problemas se colocam como: qual o

significado que devemos dar a funcionário real e outros termos? Qual a natureza do

vínculo deste “funcionário” com o poder constituído? Como podemos entender sua

relação com suas funções? Podemos entender os termos de maneira próxima a qual

os usamos, tecnicamente, hoje em dia?

Uma abordagem a esses problemas será dada na última seção dessa

primeira parte da monografia.

1.2 Grécia e Roma

A segunda opção, em relação ao período histórico, que surge é situar a

origem na Antiguidade clássica, berço da civilização ocidental: Grécia antiga e

Império Romano. Como afirma o doutor João Francisco Sauwen Filho7, duas razões

principais podem levar o estudioso que busca a origem do Ministério Público a

procurá-la entre as duas civilizações.

De um lado, a Grécia é o berço da democracia, que floresceu na cidade de

Atenas. Ora, o Ministério Público tem hoje, entre nós, um caráter fortemente

democrático, de defesa do cidadão e das suas garantias em diversos níveis, não

Teoria e Prática da Promotoria Pública . Rio de Janeiro: Livraria Jacintho, 1937, p. 9 – apud SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 12. 6 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 12. 7 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, pp. 12 e 13.

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apenas judicial8. Não seria despropositada a busca da origem da instituição entre os

gregos.

Do outro lado, Roma foi a civilização antiga que mais importância deu ao

direito, construindo um arcabouço jurídico que foi se aperfeiçoando ao longo da

história romana. Muitas instituições romanas se constituem em inspirações para as

nossas devido à influência do Direito Romano no direito Europeu posterior, não se

constituindo um pensamento desprovido de sentido buscar uma origem da instituição

entre os romanos.

Primeiramente, cabe dizer que o nosso Ministério Público conhece duas

principais atribuições: a promoção da ação penal pública com exclusividade; e a

defesa do regime democrático enquanto garantidor dos direitos do cidadão e da

sociedade. Iremos analisá-las a luz das instituições da Antiguidade Clássica.

Começando pela Grécia, por critérios temporais, temos que os gregos não

conheceram a figura do acusador público: a iniciativa do processo era deixada às

vítimas ou à família da vítima. Esses, por sua vez, deixavam a atuação no

julgamento a oradores9 que atuavam “movidos pelo interesse na causa ou pela

paixão que o crime desencadeava10”.

Em relação ao outro aspecto, os gregos de Atenas, a única democracia

grega, também não pareciam necessitar de um Ministério Público. Atenas tinha um

nível de democracia direta que os cidadãos não precisavam de instituição que

defendesse suas prerrogativas: na maioria das questões, entre o princípio

democrático e uma escolha baseada no mérito, as leis de Atenas não hesitavam em

preferir muito mais o primeiro11.

O que ocorre é que Atenas é uma cidade pequena, em comparação com

nossas democracias atuais. E, além disso, as pessoas consideradas cidadãs eram

uma minoria entre a população total da polis grega: mulheres, crianças, escravos e

estrangeiros estavam excluídos da cidadania.

Então, além de Atenas possuir uma democracia fortemente direta,

preferindo, na maioria das vezes, o princípio democrático à escolha baseada no

8 Podemos citar o art. 129 da Constituição da República que traz atuação não só perante o Judiciário, como também perante o Executivo, bem como o art. 73, § 2º, I que menciona a atuação da Instituição perante órgão do Poder Legislativo. 9 LYRA, Roberto. Obra Citada, p. 10. 10 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 19.

6

mérito e, também conjugando o tamanho da democracia de Atenas, seria difícil o

surgimento da instituição do Ministério Público.

Outra característica da democracia ateniense é a razão de seu

estabelecimento: ela não foi criada pelo anseio popular de participar; para levar o

povo ao poder como no caso das nossas democracias atuais12. A democracia

ateniense é uma instituição inventada para remediar a situação existente de tiranias

que ameaçavam os direitos dos cidadãos: ela tinha a função de evitar que algum

cidadão, por sua popularidade extrema e seu grande carisma, viesse a usurpar o

poder e tornar-se um ditador. A democracia ateniense era uma instituição inventada

para proteger a liberdade do cidadão.

Entendida assim, faz sentido o estabelecimento do ostracismo, instituição

que permitia à sociedade afastar de seu convívio, ou seja, banir qualquer um que,

por seu carisma e popularidade pudesse vir a se tornar um usurpador da liberdade

do cidadão13.

Realmente, juntando as duas características da sociedade ateniense e o

instituto do ostracismo, parece difícil que os gregos pudessem precisar de uma

instituição como o Ministério Público para defender a liberdade do cidadão, realizar a

acusação penal ou defender o regime democrático.

Passando a Roma, são cinco as instituições que os autores em geral

colocam como possíveis ancestrais do Ministério Público: os censores; os

defensores da cidade; os irenarcas; os presidentes das questões perpétuas; e os

procuradores dos césares14.

De acordo com o primeiro aspecto que separamos para a análise, isto é, o

da existência de um acusador público, podemos afirmar que os romanos não

conheceram a figura do acusador público. Assim como em todas as civilizações

antigas de que temos conhecimento, a persecução criminal, isto é, a instauração de

11 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, pp. 19-23. 12 FUSTEL DE COULANGES, Numa Denis. A cidade antiga : estudo sobre o culto, o direito e as instituições da Grécia e de Roma. Tradução de J. Cretella Júnior e Agnes Cretella. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 298 e ss. 13 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 22. 14 CUNHA RODRIGUES, José Narciso da. Ministério Público . No prelo. – apud SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 25.

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procedimento próprio contra o autor do crime, era competência da vítima ou de sua

família15.

No segundo aspecto principal que caracteriza o nosso atual Ministério

Público, a defesa do regime democrático existe dissonância entre os autores: alguns

acreditam existir em Roma, entre essas instituições, algumas que desempenhem

funções de defesa de interesses que hoje cabem ao Ministério Público.

Apesar da inegável autoridade desses autores, devemos ressaltar que

funções esparsas não podem constituir uma verdadeira origem do Ministério Público:

quando falamos do Parquet, falamos de uma instituição que tem por principais

atribuições a defesa de um regime democrático e a persecução penal de forma a

garantir os direitos dos cidadãos e da sociedade.

Quando olhamos características separadas do todo, podemos descobrir que

algumas realmente parecem indicar que uma daquelas instituições poderia ser

considerada origem do Ministério Público. Mas ao fazermos isso, desconsideramos

características que nos levam exatamente na direção oposta. Por exemplo, quando

vemos que os procuradores dos césares cuidavam dos bens dominiais, podemos

acreditar que eles desempenhavam função análoga ao Ministério Público ao

defender interesses da sociedade e do Estado. Mas ao fazermos isso, estamos

transportando nossas concepções de sociedade e estado para Roma.

Negligenciamos outras características que nos permitem uma visão de todo: aqueles

procuradores agiam no interesse privado do príncipe16.

Entretanto, ainda no esteio da excelente tese do Doutor Sauwen Filho,

precisamos de uma análise mais pormenorizada dessas civilizações, antes de

podermos nos pronunciar definitivamente17: precisamos de uma visão ampla

daquelas sociedades para não cairmos no erro de transportar nossas noções de

sociedade, democracia, liberdade, por exemplo, para analisar as instituições

daquelas épocas e civilizações.

As próprias noções que fundam nossas democracias atuais, que tem como

base a filosofia iluminista dos séculos XVII e XVIII que inspirou as revoluções

Gloriosa, Americana e, principalmente, a Francesa, não se mantêm as mesmas

15 GARCIA, Emerson. Obra Citada, pp. 7 e 8. 16 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 24 e MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 37. 17 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada. p. 13.

8

tendo passado por muitas transformações nesses últimos 200 anos18. Assim, tudo

parece indicar que qualquer instituição, funcionário ou órgão dessas duas

civilizações referem-se a conceitos e noções tão distantes das de nosso direito e

democracia que dificilmente uma instituição tão caracteristicamente democrática e

de defesa de conceitos caros a nossa sociedade – como cidadania, por exemplo –

possa encontrar origem em lugares e épocas onde estes conceitos não existiam.

De qualquer modo, podemos fazer como Sauwen Filho e nos arrimarmos na

autoridade de Fustel de Coulanges, que tão brilhantemente descreveu ambas as

civilizações, para tecermos comentários mais profundos e sólidos sobre a natureza

das instituições daquelas sociedades, analisando se os conceitos básicos de nossa

sociedade poderiam existir entre os antigos, especialmente aqueles de Estado e

cidadão que estão no centro da dicotomia que permeia os conceitos liberais de

igualdade e liberdade. De um lado, igualdade dos diferentes indivíduos perante o

Estado, isto é, na maneira como o Estado trata esses diversos indivíduos. De outro

lado, liberdade do cidadão em relação ao Estado e nas mínimas (menores possíveis)

intervenções do Estado nessa liberdade.

Tudo parece demonstrar que essas sociedades não conheceram tais

conceitos: em primeiro lugar, não parece que o status do homem antigo se pareça

em nada com o do homem-indivíduo construído pela filosofia iluminista e que hoje é

objeto de conhecimento19. O homem antigo é um homem que pertence a um clã e a

uma cidade: família e polis ou urbe, são as unidades mais simples das sociedades

antigas20. O homem antigo é inicialmente um homem de uma família e, depois, de

uma cidade: ele não possui liberdade de não crer nos deuses da cidade, de sair da

cidade e incorporar-se em outra. Uma vez fora de sua cidade, ele será sempre um

estrangeiro21.

18 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada. p.14. Podemos citar os conceitos de liberdade e igualdade como exemplos. No século XIX, muitas democracias ocidentais aceitavam a escravidão de pessoas advindas da África ou afro-descendentes e, no entanto, tinham os valores de liberdade e igualdade como bases de seus sistemas de governo. Hoje em dia, seria impensável a existência de escravidão naquela forma entre as democracias ocidentais e, também, podemos notar que formas de trabalhos forçados e em regime de quase servidão também não são tolerados. 19 Assim, por exemplo, FOUCAULT, Michel. As palavras e as coisas : uma arqueologia das ciências humanas. Tradução Salma Tannus Muchail. 8ª Ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999. 20 FUSTEL DE COULANGES, Numa Denis. Obra Citada, p. 41 e ss e 123 e ss. 21 FUSTEL DE COULANGES, Numa Denis. Obra Citada, p. 177 e ss.

9

Forma-se uma comunidade simpática22 de famílias, de indivíduos-familiares:

isso não dá origem a uma grande família e nem a uma soma de várias famílias. O

todo aqui não é a soma das partes: a polis e a urbe são novas organizações que

identificam o indivíduo e permitem a convivência simpática, permitem que as várias

famílias se identifiquem em um todo. Temos deuses da cidade e a cidade como algo

mais que uma organização política; uma organização político-religiosa23.

Nesse quadro em que um indivíduo não é livre da organização político-

religiosa a qual ele pertence não podemos falar em Ministério Público. Para terminar

com o tema da Antiguidade Clássica, citaremos Roberto Lyra, com sua sempre

mordaz ironia:

Os gregos e os romanos não conheceram propriamente a instituição do Ministério Público. Os procuradores de César, mordomos qualificados, defendiam o patrimônio do príncipe, perante juízes afeiçoados. Os procuradores de Augusto, distintos, embora dos advogados do fisco, zelavam, também, pela pecúnia imperial. Ao povo quando não o ofendido - cuibilet ex populo competia a iniciativa do procedimento penal e os acusadores eram um César, um Hortêncio, um Catão, que, movidos pelas paixões ou pelos interesses, abriam caminho à sagração popular em torneios de eloqüência facciosa. A técnica da função confundia-se com a arte de conquistar prosélitos pela palavra24.

1.3 Idade Média

Na Idade Média, são três as possibilidades citadas pelos autores: os Saions;

os Balios e os Senescais; e os Missi Dominici25. Analisaremos brevemente as

características de cada um.

Os Saions são uma evolução dos procuradores dos césares romanos, na

lição de Sauwen Filho, e exercem algumas funções assemelhadas das de nosso

Ministério Público, já que defendem os órfãos, os tutelados e as viúvas26.

A segunda figura é a dos Balios, instituição existente nos povos

escandinavos, e os Senescais, da região conhecida como Gália à época27, que

existiram ao tempo dos reis merovíngios. Tratamos os dois conjuntamente porque

22 O conceito de simpatia usado aqui é tributário de HUME, David. Tratado da Natureza Humana : uma tentativa de introduzir o método experimental de raciocínio nos assuntos morais. Trad. Débora Danowsky. São Paulo: Editora UNESP, 2001, Livro II, Parte II, Seção IV, pp. 385-391. 23 FUSTEL DE COULANGES, Numa Denis. Obra Citada. p. 109 e ss e 143 e ss. 24 LYRA, Roberto. Obra Citada, p. 9. 25 "Enviados do senhor", em tradução livre. 26 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 28. 27 Sul da França atual.

10

ambos serviam aos senhores feudais, sua principal diferença em relação ao nosso

Ministério Público.

Enquanto nosso Ministério Público é uma instituição de Estado, ou seja,

exerce suas funções vinculadas a um conceito de Estado inexistente à época;

aquelas instituições tinham suas funções vinculadas ao senhor feudal, exercendo

um tipo de "ministério privado28".

Por último, temos os missi dominici que se estabeleceram no reino dos

francos ao tempo de Carlos Magno. O império desse grande monarca abarcava toda

a França atual e parte da antiga Germânia, sendo um território muito grande. Uma

das inovações administrativas que Carlos Magno criou para controlar tão vasto

território foi substituir os antigos duques tribais por homens ligados diretamente ao

soberano29.

Essa inovação criou a necessidade de controle desses condes e, para isso,

Carlos Magno ressuscitou a instituição dos missi dominici, que na verdade já existia

desde a época merovíngia30, mas não com a regularidade que Carlos Magno

imprimiu à instituição.

Essa instituição era formada por dois enviados, um leigo e um clérigo que

visitavam os condados e cumpriam diversas funções:

1 - De pace infra patriam - Da paz no interior do país; 2 - De canonicis et monarchis - Dos cônegos e dos monges; 3 - De falso testimonio et perjurio - Do falso testemunho e do perjúrio; 4 - De his qui se fraudulenter ingennuare volunt - Daqueles que querem, por fraude, fazer-se passar por ingênuos; 5 - De falsis monetis - Sobre as falsas moedas; 6 - De latronibus et disciplina eorum - Dos ladrões e de seu comportamento31.

1.4 Itália e França

Passando as mais citadas pela doutrina32 como possíveis origens do

Ministério Público, temos a Itália, mais especificamente a República de Florença e a

França do final da Idade Média até a época napoleônica.

28 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 29. 29 GARCIA, Emerson. Obra Citada, p. 8. 30 Dinastia fundada por Clóvis, primeiro rei dos francos, e que foi sucedida pela dinastia Carolíngia, a dinastia de Carlos Magno. 31 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 33.

11

Na República de Florença do final da Idade Média existia uma instituição

denominada conservatori delle leggi33. Ao que tudo parece, eles estavam

subordinados a uma espécie de executor supremo de justiça, o Podestá, e tinham

funções de executores de justiça34.

Entretanto, analisando o governo da República de Florença, podemos

perceber que não se tratava de uma democracia, mas sim um tipo de oligarquia

onde os comerciantes governavam, num sistema representativo em relação às

diversas guildas que existiam na cidade, e onde três quartos da população da cidade

estavam alijados do processo de formação do governo - entre trabalhadores comuns

e nobres35.

Num sistema de governo desses, nos parece pouco provável que uma

instituição como o Ministério Público pudesse surgir, instituição que é aparentada de

um regime democrático e da existência de um Estado organizado, conforme dito por

nós acima.

A opção mais citada entre os doutrinadores é a da origem francesa do

Ministério Público, mais especificamente na Ordenança de 25 de março de 1302, de

Filipe, O Belo. Esse é considerado o primeiro texto legal a fazer referência à

instituição. Ele representa o momento em que o rei "reuniu tanto seus procuradores,

encarregados da administração de seus bens pessoais, quanto seus advogados,

que lhe defendiam os interesses privados em Juízo e que, em conjunto, eram

conhecidos pelo nome genérico de les gens du roi36, numa única instituição37".

Com o tempo, ela parou de cuidar dos interesses privados do soberano para

cuidar dos interesses do próprio Estado, passando a desenvolver um "mister

público". A instituição manteve-se praticamente inalterada durante vasto período,

apesar de que existiram outras ordenanças que lhe deram corpo e delinearam os

seus contornos38.

32 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, pp. 38 e 39; SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 38; SILVA, Otacílio Paula. Obra Citada, p. 4; e MACEDO JUNIOR, Ronaldo Porto. Obra Citada, p. 37 e ss. 33 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 38. 34 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 36. 35 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 36. 36 As pessoas do rei, em tradução livre. 37 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 38. 38 Como, por exemplo, a de 28 de dezembro de 1335 de Felipe IV de Valois, a de Carlos VIII, em 1493, a de Luís XII, em 1498 e a ordonnance criminelle (ordenança criminal) de Luís XIV, de 10 de agosto de 1670.

12

Isso veio mudar apenas com a Revolução Francesa quis mudar a natureza

da instituição para "um simples órgão judiciário39". Mas o quê de mais importante

ocorreu com a revolução, foi que o governo revolucionário deu garantias aos

integrantes do Ministério Público40.

Os novos governos que se seguiram a revolução modificaram bastante não

apenas o Ministério Público como as outras instituições francesas na tentativa de

criar o melhor governo possível. Entre as modificações pelas quais a instituição

passou a mais importante e digna de nota é a separação da figura do Acusador

Público, que era eleito pelo povo na primeira constituição, daquela do Comissário do

Rei, que era nomeado pelo soberano e tinha a função de custos legis41.

Por último, os textos napoleônicos vieram a fixar a organização da instituição

de um modo mais ou menos parecido com o atual e vindo, inclusive, a servir de

modelo para as legislações de outros Estados e para a organização de seus

Ministérios Públicos42.

1.5 Conclusão

Com tudo que foi dito acima, parece que devemos concordar com a

autoridade da grande maioria dos doutrinadores e assentir que a origem do

Ministério Público se deu mesmo na França, em fins da Idade Média. Mas, antes de

fazermos isso, podemos levantar alguns questionamentos relativos à metodologia

utilizada e sobre o nosso próprio percurso até aqui.

Quando dizíamos que a Grécia não podia ser considerada a origem do

Ministério Público, ou Roma, por exemplo, nós nos reportávamos a características

que havíamos considerados essenciais à instituição: seu caráter de defesa do

regime democrático e a atuação na ação penal pública.

Pois bem, a opção mais citada pelos doutrinadores também não se coaduna

com tais requisitos: a França de Filipe, o Belo, não era uma democracia. Longe

disso, tínhamos ali uma monarquia absolutista em formação. Por outro lado, ainda

não tínhamos um Estado completamente formado, entendendo Estado como o

entendemos hoje.

39 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 42. 40 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 39. 41 Fiscal da lei, em tradução livre.

13

Isso quer dizer que a maioria dos doutrinadores está errada? Ou que nossos

critérios estão errados? Arrisco-me a dizer que o que está errado é o problema que

foi colocado. Ao colocarmos um problema de origem da instituição, nós estamos

supondo que as instituições se mantêm, essencialmente, as mesmas enquanto as

sociedades mudam.

Assim como escrevemos acima, quando tratávamos de Grécia e Roma,

podemos encontrar em todos os tempos características que lembrem nosso

Ministério Público, mas, ao fazermos isso, ignoramos outras tantas que são

contraditórias. O que ocorre é que o problema de origem é um falso problema

porque não nos permite uma visão do centro da questão. E qual é o centro da

questão? Citando Hugo Nigro Mazzilli, devemos ver que o problema central "(...) é

identificar, não os precursores remotos, mas o momento histórico em que surgiu seu

ofício de forma completamente autônoma, como efeito de uma necessidade idêntica

e nova43”.

Em cada caso, em cada possibilidade de origem podemos identificar algum

problema, algum contexto histórico ao qual a instituição responde: na democracia

grega o ostracismo responde a um problema de carisma e liberdade; em Roma os

procuradores dos césares respondem a um problema de organização e de tutela dos

bens do Imperador que se tornavam cada vez mais numerosos; os missi dominici

também respondem a um problema de fiscalização dos condes que agiam em nome

do imperador; e etc.

Assim, também a ordenança de Filipe, o Belo, tem que ser vista em razão de

um problema ao qual ela se conjuga como resposta:

(...) os soberanos começaram a instituir tribunais regulares para distribuir a justiça em nome deles, soberanos. Para contrabalançar a progressiva autonomia que os tribunais acabaram chamando para si próprios, em virtude da qual muitas vezes contrariavam os interesses da Coroa, os reis instituíram procuradores deles próprios, para promover a defesa de seus interesses, podendo, inclusive, recorrer44.

Além disso, as instituições são primeiras45, as leis apenas as regulamentam,

as limitam e as organizam: “socialmente, portanto, a lei não é primeira; supõe uma

42 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 46 e MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 39. 43 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 43. 44 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 42. 45 Sobre as instituições, HUME, David. Obra Citada, Livro III, Parte II, Seção III.

14

instituição que ela limita46”. Assim, as ordenanças de Filipe, o Belo, visam colocar

uma ordem em uma instituição já preexistente47.

Cada configuração histórica específica leva a instituições específicas, a

sociedades diferentes, a problemas diferentes. Aqui, com o passar dos anos, vamos

tendo a formação do Ministério Público: a instituição vai se formando, adquirindo

novas competências, novas funções por aglutinação48.

Por isso, apesar de elogiarmos a excelente tese do doutor Sauwen filho, não

podemos concordar com a simples afirmação que a França é o berço do Ministério

Público. Embora possamos encontrar raízes longínquas para as funções exercidas

atualmente pelo MP, acreditamos que devemos conjugar o aparecimento do MP

como uma resposta a problemas formulados contemporaneamente: é uma

instituição inventada, paulatinamente, para responder a uma situação relativamente

nova. Devemos, portanto, conjugar o problema com uma situação histórica

determinada e não com um problema de origem.

Por isso, acreditamos que devemos tratar a formação do nosso Ministério

Público como uma resposta aos anos de autoritarismo em nosso país com a ditadura

militar e a necessidade de fortalecer nossa democracia. Nosso próximo passo será,

então, mostrar a evolução histórica da instituição nas constituições que nosso país

teve e, em relação ao sistema da última constituição antes da atual49, trataremos

também de alguns diplomas legais, para entrarmos nas discussões da constituinte e

dos movimentos existentes antes da nossa atual carta magna.

46 DELEUZE, Gilles. Empirismo e subjetividade : ensaio sobre a natureza humana segundo Hume. Tradução de Luiz B. L. Orlandi. São Paulo: Editora 34, 2001, p. 43. 47 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 42. 48 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 42. 49 Consideramos a emenda n° 1 de 1969 uma verdadeira constituição.

15

II Análise da situação do Ministério Público no reg ime das constituições brasileiras anteriores

Prosseguindo com o tema, vamos realizar uma análise da posição do

Ministério Público, ou das atribuições do procurador-geral, quando Ministério Público

não havia.

Começaremos com a Constituição do Império de 1824 e analisaremos o

modo como a instituição é tratada em cada Carta. Analisaremos mais

pormenorizadamente a última constituição antes da Constituição da República de

1988, para que possamos ter um panorama melhor da situação antes da

Constituinte.

2.1 Constituição do Império de 1824

A Constituição outorgada pelo Imperador Dom Pedro I não tratava do

Ministério Público de forma institucional. Único dispositivo esparso é o art. 48,

inserido no Título 4º, "Do Poder Legislativo", Capítulo III, "Do Senado": "No juízo dos

crimes, cuja acusação não pertence à Câmara dos Deputados, acusará o procurador

da Coroa e Soberania Nacional".

Esse dispositivo trata apenas de atribuições do "Procurador da Coroa e

Soberania Nacional", não trazendo nada a constituição sobre a instituição, como

dito, e silenciando mesmo sobre os membros, deixando tudo à legislação ordinária.

Apenas em 1828 sobreveio legislação que "determinava o funcionamento de um

Promotor de Justiça junto a cada uma das Relações1, inclusive na da corte, e ainda

em cada Comarca, junto aos Juízos2".

Entretanto, não havia instituição, "sem unidade ou mesmo sem qualquer

controle central3". Nem mesmo atribuições desses funcionários eram colocadas

nessa lei. Situação muito difícil encontrava o Ministério Público, igual, na verdade, a

praticamente todas as instituições nos primeiros anos de nosso país independente.

Careciam recursos financeiros e, sobretudo, humanos para o funcionamento a

contento de grande parte do país.

1 Antigo nome dado aos tribunais de segunda instância, cf. HOLLANDA FERREIRA, Aurélio Buarque de. Pequeno dicionário brasileiro da língua portuguesa . 11ª Ed. Rio de Janeiro: Gamma, [1988?]. 2 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 117. 3 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 117.

16

Em 1832, já durante a regência, foi promulgado o Código de Processo

Criminal do Império que tratava dos promotores de justiça em seção própria, a

Seção III, "Dos Promotores Públicos", inserida na Parte Primeira, "Da Organização

Judiciária", Título I, "De várias disposições preliminares, e das pessoas

encarregadas da Administração da Justiça Criminal, nos Juízos de Primeira

Instância", Capítulo III, "Das pessoas encarregadas da Administração da Justiça nos

Termos".

Essa seção continha requisitos para a nomeação desses promotores

públicos (art. 36) e elenco das principais atribuições (art. 37), além de caso especial

de nomeação, na falta ou impedimento do promotor (art. 38). Basicamente o que

temos de importante aqui é que podiam ser promotores os que podiam ser jurados,

não sendo exigido o diploma de bacharel em direito; e que eles eram nomeados e

demitidos ad nutum4 pelo chefe do executivo.

A primeira característica parece mostrar a falta de recursos humanos

qualificados no país, já que a não exigência de diploma de bacharel parece mostrar,

certamente, a inexistência de bacharéis em número suficiente para prover os cargos

do judiciário e do Parquet. Existe apenas uma "preferência" pelos "instruídos nas

leis". De outro lado, a segunda característica vai de encontro à necessária

independência da instituição (que efetivamente não existia à época) e do membro

numa sociedade democrática. O promotor não era visto como promotor de justiça,

mas sim como mero acusador público e fiscal da execução da justiça.

Em 1841, foi promulgada lei que reformava o Código de Processo Criminal,

e trazia algumas mudanças para a disciplina dos Promotores Públicos: aquela

"preferência" do código, por aqueles "que forem instruídos nas Leis", transformou-se

numa preferência com caráter mais absoluto e por bacharéis idôneos, já que a lei diz

"preferindo sempre os Bacharéis formados5". Também houve mudança em relação à

duração da nomeação dos promotores públicos que passou de três anos para

"servirão pelo tempo que convier".

O professor Sauwen Filho fala em subordinação do promotor em relação ao

juiz6 nestes diplomas legais e no diploma legal subseqüente, o último Império que

4 À vontade de, em latim; CARLETTI, Amilcare. Obra Citada, p. 90. 5 Grifo nosso. 6 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 122.

17

falava do Ministério Público, a lei 2.033 de 1871. Ela não alterou em nada o

tratamento dado pelo Império à instituição. Podemos aqui, concluir dizendo que no

Império não existiu Ministério Público organizado como instituição e nem

independência dos seus membros. Sempre que deles se falaram, não se deixou de

estabelecer sua livre nomeação e demissão.

2.2 Constituição da República Velha de 1891

Com a proclamação da República, antes mesmo da Constituição ser

promulgada, o governo provisório, motivado pelo seu Ministro da Justiça, Campos

Sales, que viria a ser Presidente da República anos mais tarde, editou o decreto nº

848 de 1890, que reformava a justiça federal e, praticamente, criava o Ministério

Público como instituição entre nós.

Através deste diploma legal, foi criado o cargo de Procurador da República,

determinando o funcionamento de um procurador em cada seção da Justiça Federal.

Além disso, determinando ainda "o provimento desses cargos, para um período de

quatro anos, durante os quais somente a seu requerimento o nomeado poderia ser

removido7".

Além disso, o decreto 1.030 de 1890, editado mais de um mês após aquele

primeiro decreto, organizou a justiça do distrito federal e, ao falar do Ministério

Público, colocou as seguintes atribuições:

advogado da Lei, o fiscal de sua execução, o procurador dos interesses gerais, o promotor da ação pública contra todas as violações do direito, o assistente dos sentenciados, dos alienados, dos asilados e dos mendigos, requerendo o que for a bem da Justiça e dos deveres de humanidade8.

Com esse texto tudo leva a crer que uma instituição realmente democrática

parecia estar nascendo. Ocorre que não foi bem assim. A República Velha, assim

como o Império antes dela, sempre demonstrou estar alheia aos reais problemas do

país e de qualquer real base popular de apoio. Juntando isto à forma de provimento

do cargo do procurador geral, podemos ter idéia da configuração da instituição

naquele período: servindo apenas como fiscal da fiel execução da lei e dos julgados,

7 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 127. 8 LYRA, Roberto. Obra Citada, p. 16, apud SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 128.

18

ou seja, subserviente aos interesses do executivo – e com isso de quem detinha o

poder econômico – e do judiciário9.

Nesse panorama, esperava-se que a carta constitucional trouxesse

dispositivos que instituíssem o Ministério Público dando-lhe um papel de relevância

no cenário político nacional. Mas o que houve foi exatamente o contrário: a

Constituição promulgada em 1891 apenas veio garantir a dependência da instituição

em relação ao Executivo e ao Judiciário. Dizia o artigo 58, § 2° daquela carta: “O

Presidente da República designará, dentre os membros do Supremo Tribunal

Federal, o Procurador-Geral da República, cujas atribuições se definirão em lei”.

O Executivo detinha o poder de nomear e demitir o Procurador-Geral, que

era escolhido dentre os ministros do Supremo Tribunal Federal, nomeados estes

pelo presidente da República com a aprovação do Senado. Sendo assim, todo o

poder concentrado no Ministério Público por aqueles diplomas legais estava, na

verdade, a serviço do Poder Executivo.

Além desse dispositivo, a única outra menção ao Parquet10 era o artigo 81, §

1° que dispunha, ao falar da revisão criminal em be nefício do réu, que “A lei marcará

os casos e a forma da revisão, que poderá ser requerida pelo sentenciado, por

qualquer do povo, ou ex officio11 pelo Procurador-Geral da República”.

O que chama atenção nesse período é que a instituição teve sua

configuração alterada em quatro oportunidades: justamente em quatro períodos

conturbados da história do país12. Isso parece demonstrar que o Ministério Público

era utilizado como instrumento de controle social pelo Executivo: nos momentos de

maior crise, ampliavam-se os poderes da instituição.

O primeiro destes diplomas legais é a Lei nº 18 de 1891, que entrou em

vigor na primeira crise de monta da República: aquela que iria levar à renúncia do

primeiro presidente, Marechal Deodoro. Naquela ocasião, o presidente fechou o

Congresso e foi obrigado a renunciar pela ausência de qualquer apoio da sociedade

ou dos quartéis. Essa lei colocava entre atribuições do Ministério Público a tutela de

9 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 129. 10 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 49. 11 De ofício, em latim; CARLETTI, Amilcare. Obra Citada, p. 169. 12 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 129.

19

direitos classicamente colocados na esfera privada, o que gerou reações na

sociedade e, em especial, no mundo jurídico13.

O segundo momento foi com o Decreto nº 2579 de 1897 que ampliou as

atribuições do Ministério Público. Este decreto destoa um pouco dos outros porque,

apesar do governo Prudente de Moraes ter enfrentado uma crise com a Guerra de

Canudos chegando, inclusive, a um atentado contra a vida do presidente no Arsenal

de Guerra, o mandato presidencial decorreu de forma até pacífica, saindo o

presidente admirado por muitos14.

Tempos depois, durante o governo do Marechal Hermes da Fonseca, viria a

edição do Decreto 9263 de 1911 que, apesar de conservar as atribuições do

Ministério Público, procurava dar mais agilidade e rapidez "adequando-o, como

instrumento de ação do Governo, para fazer frente a dificuldades relativas à

segurança pública15".

A última oportunidade foi durante o mandato de Arthur Bernardes, que

transcorreu praticamente todo na vigência de estado de sítio, com a edição do

Decreto 13.273 de 1923 que ampliou enormemente as atribuições do Parquet ao

reorganizar a Justiça do Distrito Federal.

Assim, na República Velha, como já dissemos acima, a instituição não

passou de instrumento do Executivo para controle social16.

2.3 Constituição promulgada de 1934

A Carta de 1934, promulgada pela Assembléia Constituinte quatro anos

após a Revolução de 1930, que encerrou o período da República Velha, também

conhecida como "República café-com-leite" – porque o centro do poder estava em

São Paulo (produtor de café) e Minas Gerais (produtor de leite) –, e dois anos após a

Revolução Constitucionalista, foi um grande avanço, em termos democráticos, para

o país em geral e também um grande avanço na independência do Ministério

Público.

13 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, pp. 130 e 131. 14 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 133, nota. 15 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 135. 16 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, pp. 138 e 139.

20

A Constituição tratou da instituição em seção própria (artigos 95 à 98),

inserida no Título I, “Da Organização Federal”, Capítulo VI, “Dos Órgãos de

Cooperação nas Atividades Governamentais”.

Foi prevista lei federal para organização do Ministério Público Federal e leis

locais para organizar a instituição nos Estados (art. 95). A escolha do Procurador-

Geral da República continuava a ser feita pelo chefe do Executivo, apenas agora

havia a necessidade de uma espécie de aprovação do Senado, o que garantia um

mínimo de “pesos e contrapesos” na organização do Estado brasileiro (art. 95, § 1°).

Além disso, os vencimentos do Procurador-Geral seriam iguais aos dos Ministros do

Supremo Tribunal Federal (art. 95, §§ 1° e 2°). Fix aram-se garantias aos membros

da Instituição e impedimentos para o Procurador-Geral (art. 95, § 3° e art. 97). Por

último, organizou-se a instituição perante as Justiças Militar e Eleitoral, essa recém-

criada; e cuidou-se de inserir o quinto constitucional que garantia a participação do

Ministério Público, bem como da advocacia, na composição dos Tribunais

Superiores17.

Consolidava-se, também, outra importante atribuição do Ministério Público,

que vinha expressa no artigo 76, alínea 3, que disciplinava a iniciativa do Ministério

Público na revisão criminal em benefício do réu, repetindo regra já estabelecida na

primeira constituição republicana de 1891.

Mas o ponto mais importante no regime da nova Carta era uma visível

separação em relação ao Poder Judiciário que fora conquistada pela instituição no

texto daquela constituição18. O novo texto constitucional não mais colocava o

Parquet como um apêndice do Judiciário: o Procurador-Geral não era mais escolhido

dentre os Ministros da Corte Suprema; e garantia-se independência do restante da

instituição em relação ao judiciário, com garantias e organização própria.

Ainda assim, mesmo com essa independência relativa, isto é, em relação ao

Poder Judiciário, o Ministério Público estava ainda vinculado ao Executivo, como

vemos pela livre nomeação e demissão do Procurador-Geral pelo chefe daquele

poder. A Constituição via a instituição como órgão que fazia parte do Executivo,

17 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 49. 18 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 139.

21

sendo seu chefe subordinado ao Presidente da República, em nível federal, ou ao

Governador de estado da Federação, em nível estadual19.

2.4 Constituição outorgada do Estado Novo em 1937

Getúlio Vargas, que encabeçou o movimento de 1930 e foi eleito presidente

pela Assembléia Nacional Constituinte, dissolveu o Senado, a Câmara e as

Assembléias dos Estados, com o apoio castrista, e outorgou nova Constituição, a

terceira da República. Essa Carta aumentava enormemente os poderes do

Presidente e, portanto, inchava o Executivo em relação aos outros poderes

constitucionais, permitindo ao chefe daquele poder governar por decreto, já que

usurpava grande parte da função legislativa.

Em relação ao Ministério Público, a nova constituição representou um

retrocesso em termos de independência e organização funcional já que grande parte

daquilo que a Constituição de 1934 trazia em relação ao Parquet não foi reproduzido

pela nova carta.

Houve a perda das diversas garantias que a instituição conquistara na Carta

de 1934, como a estabilidade e a inamovibilidade do membro. Também

desapareceu a entrada na carreira somente por concurso público, o que certamente

contribuiu para que o Ministério Público tivesse seus quadros comprometidos por

influências políticas, tendo em vista a dependência em relação ao Executivo que a

constituição trazia para o Parquet.

Não tinha mais a instituição seção que a disciplinasse entre os dispositivos

ali trazidos. Voltava-se a falar do Ministério Público apenas de forma esparsa. Entre

os dispositivos estão o artigo 99 que tratava da livre escolha e demissão do

Procurador-Geral da República, agora excluindo o Senado do ato de nomeação do

chefe da instituição. Outro dispositivo vinha no artigo 101, I, b que previa a

competência do Supremo Tribunal Federal para julgar o Procurador-Geral nos

crimes comuns e de responsabilidade, o que, formalmente, equiparava-o aos

Ministros daquela corte e ao próprio Presidente da República20.

19 Inclusive, a maioria da doutrina inclinava-se em ver o Ministério Público como instituição do Executivo, cf. SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, pp. 140-143. 20 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 49.

22

Uma das conquistas mantidas pela Carta de 1937 é o quinto constitucional

que garantia a participação do Parquet e da advocacia na composição dos tribunais.

Entre as inovações está a permissão para que a lei cominasse ao Ministério Público

a representação da Fazenda Nacional (artigo 109, parágrafo único), o que não é

nenhuma surpresa visto o papel que a Constituição reservava à instituição, isto é,

como um apêndice do Executivo nos tribunais.

Outra inovação desse período, agora num panorama infraconstitucional,

foram as atribuições que a instituição foi ganhando nos processos civil e penal, cujos

códigos foram publicados durante a vigência do Estado Novo.

Em relação ao processo civil, o Ministério Público passou a ter uma atuação

marcante, ora como parte, ora como órgão interveniente nos casos tutelados pela

codificação processual civil de 1939, conforme explica Sauwen Filho:

Também o estatuto procedimental civil anterior, o Decreto-lei nº 1.608, de 18 de setembro de 1939, cometia ao Ministério Público o funcionamento compulsório no processo civil, ora como parte, ora como interveniente, nos feitos em que houvesse interesse de incapazes, Art. 80, § 2º; nas ações de usucapião, Art. 445, § 3º; nos processos de emancipação, Art. 621; nas remissões de hipoteca legal, Art. 404; na sub-rogação de bens inalienáveis, Art. 631; na organização e fiscalização das fundações, Art. 742, todos do anterior Código de Processo Civil21.

Enquanto isso, no processo penal, à instituição foi atribuído o poder de

requisição do inquérito policial e também de realização de diligências pela

autoridade policial. Passou a ser a regra a titularidade do Parquet na promoção da

ação penal pública, apesar de que ainda existiam casos particulares, exceções

previstas na legislação. Também foi prevista a função de promover e fiscalizar a

execução da lei22.

Todas essas atribuições que o Ministério Público ganhou nesse período

parecem remeter a mesma situação da República Velha: a instituição fica muito

dependente do Executivo e acaba virando órgão de política para repreensão da

sociedade. Aqui, com os novos códigos de processo, ela acaba se tornando um

braço do Executivo dentro dos tribunais e um modo de defender seus interesses no

processo, transformando o direito em instrumento de controle social.

21 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 148. 22 GARCIA, Emerson. Obra Citada, p. 33.

23

2.5 Regime da Constituição de 1946

Com o fim da guerra e a derrota do fascismo o governo brasileiro tornou-se

ideologicamente insustentável. A volta da democracia se deu com a deposição de

Vargas e a convocação de eleições para uma Assembléia Constituinte. Em 1946, foi

promulgada uma nova constituição democrática.

Com a nova Carta o Ministério Público ganhou uma independência em

relação aos outros poderes que jamais tivera: foi a instituição tratada em título

próprio (arts. 125 a 128). Retornávamos para um regime muito próximo ao da Carta

democrática anterior, com garantias aos membros e independência em relação aos

poderes constituídos do Estado.

A nova Constituição trouxe a organização do Ministério Público da União nas

diversas justiças federais através de lei Federal (art. 125); retornaram as regras de

ingresso na carreira mediante concurso público (art. 127); também as garantias de

inamovibilidade e estabilidade funcional (art. 127); garantiu-se a participação da

instituição na formação dos tribunais (arts. 103 e 124, V); bem como a observância

desses princípios e a promoção de entrância a entrância na organização dos

Ministérios Públicos dos Estados (art. 128)23.

De outro lado, permanecia a nomeação e demissão ad nutum do

Procurador-Geral da República pelo Presidente da República, mas voltava a

aprovação do Senado no primeiro ato (arts. 63, I e 126). No parágrafo único do

mesmo artigo, cometia a Carta a representação da União em juízo, no que, na

época, já não foi seguida por alguns Estados, como São Paulo e Guanabara24. Em

dispositivos esparsos, foram delineadas algumas atribuições do Procurador-Geral da

República (arts. 8º, parágrafo único; 204, parágrafo único).

A lei que a constituição pedia para organização do Ministério Público da

União nas justiças federais foi publicada em 30 de janeiro de 1951 como lei nº 1341.

Nesta lei, aclararam-se melhor as atribuições do Procurador-Geral da República,

com seu funcionamento perante o Supremo Tribunal Federal, não só nas atribuições

23 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 49. 24 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 153.

24

do Ministério Público, como também na defesa dos interesses da União em juízo;

auxiliado por procuradores adjuntos25.

2.6 Constituição promulgada de 1967

Com o golpe militar de 1964, instituiu-se para decidir os rumos do país o

"Comando Supremo da Revolução26" que baixava uma ordem institucional autônoma

em relação ao ordenamento jurídico pátrio. Não é a toa que o professor Sauwen

Filho escreve que aquele regime "institucionalizou a Revolução27".

Pois um desses atos institucionais transformou o Congresso Nacional, já

desconfigurado por diversas cassações e suspensões de direitos políticos, em

Assembléia Nacional Constituinte limitada. Essa Assembléia promulgou nova

constituição, que viria a ter vida curta.

Nesta Carta, o regime, em linhas gerais, foi mantido o mesmo da Carta

democrática anterior28. Com a solitária diferença da extensão do regime de

aposentadoria da magistratura aos membros do Parquet. Mudou-se, também, o

tratamento dado a instituição já que os dispositivos que dela tratavam foram

inseridos em seção no Capítulo concernente à organização do Poder Judiciário.

2.7 Emenda Constitucional outorgada nº 1 de 1969

Outro golpe de Estado sobreveio quando, com a morte do presidente da

República eleito indiretamente pelo Congresso – o Marechal Costa e Silva, junta

militar – exatamente o tal "Alto Comando da Revolução" – assumiu o poder e

impediu a posse do vice-presidente eleito juntamente com aquele militar. Essa junta

militar, em 17 de outubro daquele ano de 1969, outorgou nova Carta Constitucional,

a sexta do período republicano, e a segunda do período de exceção.

O regime da instituição é muito parecido com aquele das últimas duas

constituições republicanas. Mantiveram-se as garantias e as atribuições dos

membros do Ministério Público, bem como o tratamento dado à instituição. O que

mudou bastante foi a independência funcional: de um lado, eliminou-se a

25 GARCIA, Emerson. Obra Citada, p. 33 e SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 150. 26 Art. 181 da EC nº 01/1969. 27 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 159. 28 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 50.

25

participação do Senado no ato de escolha do Procurador-Geral da República; por

outro lado, tratou-se da instituição em seção inserida no capítulo que cuidava do

Poder Executivo.

Outro movimento significativo da Carta foi o aumento das atribuições do

Procurador-Geral: previu-se a ação direta interventiva, para declaração de

inconstitucionalidade de lei ou ato normativo estadual (art. 11, § 1º, c) e para prover

a execução de lei federal, ordem ou decisão judiciária (art. 11, § 1º c, c/c com o art.

10, VI); representação para intervenção nos Estados (art. 15, § 3º, d); representação

para requerer declaração de inconstitucionalidade (art. 119, I, l) e a suspensão de

direitos políticos (art. 154)29.

É intrigante o repentino aumento das atribuições do chefe do Ministério

Público. Hugo Nigro Mazzilli acredita que isso se dá "porque [o Procurador-Geral é]

nomeado e demitido livremente pelo presidente da República30". E realmente tudo

demonstra que essa característica é preponderante para a decisão de ampliar as

competências do cargo. A própria organização da Constituição, como bem dissemos

acima, leva-nos a acreditar que o governo pretendia utilizar-se de forma política da

instituição, mantendo-a como um apêndice do Executivo, na sua política de

"segurança nacional".

Em 1977, com o Congresso Nacional fechado, foi decretada a Emenda

Constitucional nº 7 que, novamente, ampliou as atribuições do Procurador-Geral da

República. Por outro lado, uma reivindicação da classe vocalizada pelas diversas

associações estaduais de Ministério Público31, a existência de norma federal que

unificasse as características gerais dos diversos Parquet's país afora, foi

contemplada no texto daquela emenda que alterou o artigo 96 da Carta de 1969

para acrescentar um parágrafo único ao texto original.

Entre as atribuições que foram cometidas ao Procurador-Geral temos: a

representação, tanto para interpretação de lei ou ato normativo federal ou estadual

(art. 119, I, l), seja para avocação de causas pelo Conselho Nacional da

Magistratura, junto ao qual oficiava o chefe da instituição (arts. 119, I, o, e 120, § 2º);

como também a possibilidade de formular pedido cautelar nas representações que

29 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 50. 30 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 50. 31 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 51; e SILVA, Otacílio Paula. Obra Citada, p. 10.

26

eram por ele oferecidas (art. 119, I, p)32. Outra dessas inovações, que aumentavam

os poderes do Procurador-Geral, seria a emenda nº 11 do ano seguinte que previa

que, em casos de crime contra a segurança nacional, ele poderia requerer a

suspensão do exercício de mandato parlamentar.

Quanto à lei para fixar normas gerais que ficou prevista no parágrafo único

do artigo 96, ela era de iniciativa do Presidente da República – e não de algum

órgão da classe como seria desejável – e acabou se perfectibilizando na lei

complementar nº 41 de 1981.

2.8 Conclusão

Nossa tese é que, embora existam retrocessos no caminho percorrido entre

a Carta de 1824 até a atual Constituição da República de 1988 – sendo que os

principais ocorreram nas épocas mais autoritárias – quatro características principais

que melhoram a análise do período podem ser separadas: há um gradual aumento

das funções atribuídas ao Ministério Público como um todo; existe uma mudança

paulatina no tratamento do Parquet que passou de um conjunto de órgãos – os

promotores de justiça – a ser tratado como uma instituição; um movimento de

ampliação das garantias aos membros, possibilitando uma maior autonomia e

independência no exercício de suas funções; e, finalmente, uma separação das

esferas dos outros poderes, em especial do Judiciário e do Executivo, aos quais

esteve muitas vezes vinculado.

32 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p.51.

27

III Análise das dos textos próximos

Com o fim do regime militar que se iniciara em 1964, o país ansiava pela

redemocratização e pela modernização de suas instituições. O governo eleito

indiretamente pelo Congresso Nacional em 1984 simbolizava a volta aos governos

civis, mas ainda faltava uma Constituição realmente fundada na vontade popular e

imbuída da tarefa de construir uma democracia, coisa que a Emenda Constitucional

nº 1 de 1969 não era.

Em primeiro lugar, a velha carta era obra de um órgão institucional não eleito

e havia sido outorgada após um golpe de Estado que estabeleceu as bases do que

viria a ser realmente o nosso regime militar, após os anos iniciais de experiência

entre 1964 e 1969. Em segundo lugar, ela representava a vontade de construir um

regime que se baseava na manutenção do statu quo1 e daquilo que na própria

constituição era chamado de "segurança nacional".

Assim, o governo eleito na eleição indireta, composto pela oposição ao

regime – com a exceção do vice-presidente da chapa, José Sarney –, tinha como

principal intenção a de convocar uma Assembléia Constituinte e promulgar uma

verdadeira constituição democrática para o país. Quando a comissão de notáveis foi

formada para preparar um anteprojeto que auxiliasse os trabalhos da constituinte, os

vários setores da sociedade organizada mandaram suas sugestões e o Ministério

Público não foi diferente2.

O regime jurídico da instituição na Constituição de 1988 é fruto de dois

textos principais: primeiro, o texto original da Comissão Afonso Arinos – cuja

principal fonte é o projeto Pertence, do Procurador-Geral da República à época da

Constituinte –, e, em segundo lugar, o texto que ficou conhecido como Carta de

Curitiba3.

Este último texto é fruto da composição de cinco fontes principais, a saber:

os diplomas positivos, a Carta de 1969 e a Lei Complementar 40/81; as teses

aprovadas no VI Congresso Nacional do Ministério Público de 1985; as respostas ao

questionário que a CONAMP enviou aos membros do Parquet; o anteprojeto

1 No estado em que se encontrava, em latim; CARLETTI, Amilcare. Obra Citada, p. 261. 2 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, pp. 85 e 86 e SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, pp. 168 e 169. 3 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 86 e SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 169.

28

Pertence apresentado a Comissão Afonso Arinos; por fim, texto elaborado por uma

Comissão da CONAMP, que era uma tentativa de harmonizar as quatro fontes

precedentes, como base do 1º Encontro Nacional dos Procuradores-Gerais de

Justiça e Presidentes de Associações do Ministério Público, realizado em 1986 na

capital paranaense4.

Para concluir o presente trabalho, portanto, analisaremos cada uma dessas

fontes de modo a permitir concluirmos sobre as raízes da posição constitucional do

Ministério Público na Constituição da República de 1988.

3.1 Principais dispositivos da Lei Complementar nº 40 de 1981

Começando pelos diplomas positivos, como já falamos da Constituição de

1969, passaremos direto à análise da Lei Complementar nº 40 de 1981 que é a lei

contendo normas gerais mencionada pelo artigo 96, parágrafo único da Carta de

1969, na redação dada pela emenda nº 7 de 1977, detendo-nos em alguns

dispositivos da lei que inspiraram a Constituição atual ou que representam a

evolução desta Carta em relação àquele diploma legal.

A lei complementar em si representava uma evolução no tratamento dado ao

Ministério Público e na organização da instituição dentro do ordenamento jurídico do

país. Ela foi a primeira tentativa legislativa de moldar a instituição e dar um caráter

nacional a ela.

Apesar disso, vários dispositivos ainda são tímidos em relação,

principalmente, a: atribuições5; participação da carreira na escolha do Procurador-

Geral6; equiparação de vencimentos com a Magistratura7; e em relação às vedações

aos membros da carreira.

Ainda assim, devemos considerar essa lei um avanço, como veremos, assim

como foi a própria emenda que previu a possibilidade de sua edição, como

anteriormente visto.

A lei complementar nº 40 estabelece um conceito de Ministério Público; sua

organização e estrutura; atribuições dos seus membros; garantias e vedações;

4 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 86 e SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, pp. 169 e 170. 5 SILVA, Otacílio Paula. Obra Citada, pp. 325 e 326. 6 SILVA, Otacílio Paula. Obra Citada, p. 323.

29

assim como, procedimento disciplinar para apurar faltas dos membros da carreira,

bem como enumeração dessas faltas.

Iniciando com a conceituação, devemos ressaltar, em primeiro lugar, a

opinião de alguns autores que as leis deveriam eximir-se em expressar conceitos

abstratos dos institutos e instituições8. Deveria ser deixada à doutrina tal tarefa, vez

que permite uma fluidez maior dos conceitos e diminuem a necessidade de reformas

constantes da legislação.

O conceito exposto neste diploma legal possui um problema central: ele faz

referência ao Ministério Público apenas perante o judiciário.

"O Ministério Público, instituição permanente e essencial à função jurisdicional do Estado, é responsável, perante o Judiciário , pela defesa da ordem jurídica e dos interesses indisponíveis da sociedade, pela fiel observância da Constituição e das leis, e será organizado, nos Estados, de acordo com as normas gerais desta Lei Complementar. (grifo nosso)

Ao fazer essa referência explícita somente a atuação da instituição no

judiciário o conceito diz menos do que deveria e revela um dos problemas nos quais

toda conceituação legal pode incorrer: ao limitar o conceito e ignorar parte da

realidade, ela acaba por deformar o objeto. Aqui, ao ignorar a atuação administrativa

do Ministério Público, perante o Executivo; bem como a atuação perante os

Tribunais de Contas, perante o Legislativo; o conceito incorreu em erro.

Outro ponto no qual merece comentário a lei é em relação aos princípios que

regem a atuação do Ministério Público. Ela faz menção aos três princípios básicos

da instituição: unidade, indivisibilidade e autonomia funcional. O primeiro princípio

define-se pela unidade da atuação: mesmo sendo integrada por diversos órgãos, a

instituição mantém uma unidade de vontade, de orientação e direção, na lição de

Otacílio Paula Silva9.

O segundo princípio diz respeito a inseparabilidade de cada órgão dentro da

instituição: pode um membro substituir o outro sem prejuízo para a atuação da

instituição como um todo10.

7 Os dispositivos que asseguravam essa equiparação no projeto foram vetados pelo Presidente da República. 8 SANTOS, Juarez Cirino dos. A moderna teoria do fato punível . Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2002, pp. 64 e 65. 9 SILVA, Otacílio Paula. Obra Citada, pp. 11 e 12. 10 GARCIA, Emerson. Obra Citada, pp. 61-63.

30

Por último, o princípio da independência ou autonomia funcional prescreve

que o órgão do Ministério Público tem autonomia no exercício de suas funções, ou

seja, ele não presta obediência ao seu superior hierárquico, nem ao chefe do poder

ao qual a instituição esteja formalmente vinculada – como do Executivo, no caso do

sistema da Carta de 196911. Toda subordinação hierárquica que existe dentro da

instituição é meramente de caráter organizacional.

Em relação às funções dos membros a lei faz menção a diversas,

colocando-as esparsamente ao longo do texto, bem como mencionando três

"funções institucionais" no artigo 3º ou colocando outras no artigo 15, que fala das

atribuições dos membros da instituição.

As funções institucionais são apenas citações das funções mais básicas e

comuns dos órgãos do Ministério Público: aquela de fiscal da lei (inciso I); a

promoção da ação penal pública, sem garantir a sua exclusividade (inciso II); e a

promoção da ação civil pública (inciso III).

As funções citadas no artigo 15 são de caráter secundário e muito tímidas,

muitas mais devendo ser citadas numa lei que pretende regulamentar e uniformizar

o exercício da função no país inteiro. Como ensina Otacílio Paula Silva, "a falta de

homogeneidade e sobretudo de fiel cumprimento das funções básicas são um dos

fatores básicos de comprometimento das altas finalidades da Instituição12".

Entre as garantias, estão algumas já clássicas como: concurso público de

provas e títulos; promoção por lista tríplice e critério alternativo entre merecimento e

antiguidade; e a estabilidade. Entre as novidades e conquistas da carreira, as duas

mais importantes são a garantia da nomeação obedecendo a ordem de classificação

no concurso; e a vedação ao exercício das funções por pessoas estranhas à

carreira.

A primeira mudança é importante para evitar interferências de natureza

política nas nomeações. A segunda novidade vem endereçada para eliminar as

figuras dos promotores indicados, ad hoc13. A única exceção que permaneceu na lei

foi quanto à designação de promotor adjunto para oficiar em casos de processo de

habilitação de casamento fora da sede da comarca. Ainda assim, cuidou-se de

11 SILVA, Otacílio Paula. Obra Citada, p. 13. 12 SILVA, Otacílio Paula. Obra Citada, p. 325. Cf. também MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, pp. 57-84 para uma visão crítica da instituição e da atuação dos membros.

31

aumentar o controle dessa hipótese garantindo que a nomeação tem que ser feita

pelo promotor de justiça, com autorização do procurador-geral14.

O último ponto que analisaremos neste diploma legal consiste nas vedações.

Importante que a lei insira vedações que moralizem a carreira e aumentem o seu

comprometimento com a defesa do estado democrático e da coisa pública. Entre as

vedações estão a acumulação de outros cargos ou funções públicas que seja

proibida; o exercício da advocacia e do comércio, com exceções.

Em relação à primeira vedação, interessante notar que, na questão de quais

são os cargos ou funções não passíveis de acúmulo, ela remete a outro dispositivo

legal tacitamente, isto é, sem indicação expressa do dispositivo – que seria o artigo

99 da Constituição da República de 1969.

Na segunda vedação que analisaremos, muito importante a inexistência de

exceções ao dispositivo, já que o exercício da advocacia militante parece ser

incompatível com as funções do Parquet. A última vedação, da proibição do

comércio mereceu comentário de Otacílio Paula Silva no sentido de criticar a

inclusão de participar de sociedade como quotista: poderia o membro participar da

direção da sociedade deste modo, já que a maior parte das sociedades por quota

são pequenas sociedades15.

3.2 Teses do VI Congresso Nacional do Ministério Público

A segunda fonte da Carta de Curitiba são as teses aprovadas no encontro

ocorrido em São Paulo, em 1985, no VI Congresso Nacional do Ministério Público16.

Nesse encontro, foram propostas diversas teses sobre a instituição e sua posição

numa futura Constituição da República, já que o tema do Congresso era "Justiça e

Constituinte".

De todas as teses propostas, foram aprovadas 49 teses assim divididas:

- Com relação à participação de membros da Instituição no Quinto Constitucional da composição dos Tribunais: 1 (uma) tese; - Sobre a atuação do Ministério Público em relação ao direito do menor: 1 (uma) tese; - Relativas a direitos humanos: 2 (duas) teses;

13 A propósito (para isto), em latim; CARLETTI, Amilcare. Obra Citada, p. 87. 14 SILVA, Otacílio Paula. Obra Citada, p. 331. 15 SILVA, Otacílio Paula. Obra Citada, p. 327. 16 VÁRIOS AUTORES. Justiça e constituinte: teses do 6º congresso nacio nal do ministério público . São Paulo: [s.n.], 1985.

32

- Versando sobre a representação da União: 3 (três) teses aprovadas; - Referentes a direitos difusos: 4 (quatro) teses; - Sobre direitos pessoais, de uma maneira geral: 4 (quatro) teses; - Com referência a direito civil e a atuação do Parquet no processo civil foram aprovadas 5 (cinco) teses; - Quanto ao processo penal: 7 (sete) teses. Finalmente, no que se respeita à organização e posição constitucional do Ministério Público, foram aprovadas 18 (dezoito) teses17.

Como se vê, a grande maioria das teses aprovadas foi sobre organização e

posição constitucional, o quê, como dissemos acima, se explica pela proximidade

em relação à Constituinte e pelo tema do Congresso.

3.3 Pesquisa da CONAMP

A pesquisa da CONAMP foi um questionário padrão enviado aos quase seis

mil membros do Ministério Público à época, sendo que em torno de mil questionários

foram respondidos e devolvidos18. O questionário envolvia os mais diversos

aspectos, desde a localização da instituição no novo texto constitucional até

garantias e vedações aos membros.

Os principais pontos que ficaram estabelecidos pela resposta foram:

figuração da instituição em título a parte dentro do texto Constitucional; que o

procurador-geral fosse escolhido dentre os membros da carreira, e apenas entre os

procuradores de justiça; que as garantias fossem colocadas no próprio texto

constitucional, ao invés de deixadas ao legislador infraconstitucional – sendo as

principais a vitaliciedade, inamovibilidade, irredutibilidade de vencimentos e

equiparação à magistratura –; a presença das vedações também no texto da Carta,

para evitar que fossem deixadas ao legislador ordinário; que constassem as

principais funções institucionais na Constituição, permitindo que o Ministério Público

tivesse a sua atuação definida já em nível Constitucional, ao invés de depender dos

“sabores” da política nacional; e, por último, a manutenção da participação do

Parquet e da advocacia nos tribunais, com o chamado quinto constitucional19.

17 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 172. 18 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 87. 19 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 88 e SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, pp. 172-182.

33

3.4 Anteprojeto da Comissão de Estudos Constitucionais Afonso Arinos

Como dito acima, com a eleição indireta da chapa de oposição para a

Presidência da República, abriu-se caminho para a completa redemocratização do

país, através da promulgação de uma constituição que realmente estabelecesse um

Estado Democrático de Direito entre nós, já que este era um compromisso assumido

pelo presidente eleito, Tancredo Neves.

Com a morte prematura deste, o seu vice, José Sarney, manteve a

promessa do presidente e nomeou a Comissão de Notáveis, responsável por realizar

estudo constitucional e apresentar anteprojeto, servindo, portanto, como trabalho

preparatório à Assembléia Constituinte a ser eleita.

Essa comissão ficou conhecida como Comissão Afonso Arinos, em

homenagem ao seu presidente. Com relação ao Ministério Público, o então

Procurador-Geral da República, Sepúlveda Pertence, que fazia parte da Comissão,

ficou responsável por apresentar um projeto para comitê que cuidava da parte

relativa ao Ministério Público. Ele realizou um projeto que colocava a instituição em

título próprio e, antes de submetê-lo ao comitê, apresentou-o a CONAMP e ouviu

sugestões que foram incorporadas.

A Proposta Pertence, como ficou conhecida, foi aprovada no comitê com

algumas modificações, sendo a principal a inclusão da proibição da advocacia, que

não constara da proposta original20. Esse texto foi então levado ao plenário da

Comissão que aprovou o texto nas suas linhas gerais, mas inseriu importantes

modificações: retirou a figura de defensor do povo das funções da instituição; limitou

o princípio da independência funcional com a figura das designações; e eliminava a

proibição à advocacia.

Esse texto final, que ficou conhecido como anteprojeto Afonso Arinos, foi

uma das fontes da Carta de Curitiba.

Como podemos perceber, o texto trazia alguns avanços (já que enumerava

funções do Ministério Público, estabelecia garantias e vedações e equiparava o

Parquet à magistratura, mas possuía alguns pontos que estavam muito aquém do

texto final que foi aprovado pela Assembléia Constituinte para a Carta de 1988.

20 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 88.

34

3.5 Carta de Curitiba

De 20 a 22 de junho de 1986 realizou-se o 1° Encont ro Nacional dos

Procuradores-Gerais de Justiça e de Presidentes de Associações do Ministério

Público, que tinha por pauta harmonizar num único anteprojeto as diversas fontes

selecionadas pela CONAMP, com vistas a estabelecer um texto de consenso que

unisse a classe em torno de uma única proposta, tornando mais forte suas

reivindicações.

A Carta de Curitiba representa marco de unidade da instituição em torno do

seu futuro e de seu destino entre as instituições do Estado brasileiro.

Seguindo com a análise da Carta de Curitiba, ela trazia um conceito

funcional da instituição, isto é, conceituava o objeto utilizando para tal das funções

exercidas pela instituição, sendo consideradas as principais a defesa do regime

democrático e do interesse público, e a função de zelar pela observância das leis e

da ordem jurídica:

Art. 1° O Ministério Público, instituição permanent e do Estado, é responsável pela defesa do regime democrático e do interesse público, velando pela observância da Constituição e da ordem jurídica21.

Esse conceito funcional permite que eventuais funções que venham a ser

atribuídas à instituição no futuro, por meio de legislação ordinária, não venham a

desconfigurar o perfil constitucional da instituição, já que a colocação constitucional

desse conceito tornaria essas novas atribuições incompatíveis com a natureza da

instituição.

As atribuições da instituição vinham disciplinadas no artigo 3° da Carta,

divididas em funções privativas e não exclusivas. As funções privativas eram a

representação contra lei ou ato normativo incompatível com normas de hierarquia

superior – aumentando a amplitude do texto da Carta de 1969 que previa

representação apenas em relação à inconstitucionalidade –; promoção da ação

penal pública, bem como supervisão dos procedimentos investigatórios – como uma

maneira de aumentar a participação da instituição nos inquéritos policiais –; a

intervenção em processos judiciais em geral nos casos previstos em lei ou “quando

21 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 90.

35

entender existir interesse que lhe caiba defender” – uma tentativa de aumentar a

intervenção da instituição no processo em geral e impedir que a legislação

infraconstitucional pudesse vir a limitar sua atuação –; e a promoção do inquérito

para instruir a ação civil pública.

Entre as mudanças em relação aos textos legais vigentes, a primeira

mudança é louvável porque permite um maior controle sobre os atos normativos

exarados pelo Estado em todas as suas esferas e um controle maior da ordem

jurídica como um todo, harmonizando-se com o conceito dado no texto para

Ministério Público.

A segunda mudança parece endereçada a uma realidade na qual muitas

ilegalidades eram cometidas nos procedimentos investigatórios pela autoridade

policial o que, além de violar direitos da população, levava a investigações mal

conduzidas que limitavam a efetividade da ação penal pública. Nesse ponto, talvez a

melhor solução fosse melhorar os quadros da polícia e, principalmente, a

independência dos delegados de polícia em relação à chefia da instituição e ao

Poder Executivo.

A terceira mudança amplia a participação da instituição no processo, o que

aumenta o poder exercido através do Parquet, mas também pode funcionar para

aumentar a defesa dos interesses tutelados pela instituição.

As atribuições não exclusivas eram a de defensor do povo e a promoção da

ação civil pública.

Entre as garantias, a proposta da classe trazia a independência funcional; a

vitaliciedade; a irredutibilidade de vencimentos e paridade destes com os da

magistratura; e a inamovibilidade no cargo e nas respectivas funções.

Em relação à primeira, o texto final da Constituição a trouxe como princípio

regente da instituição, tal qual a Lei Complementar n° 40 de 1981. A vitaliciedade

também foi adotada pelo texto da Carta de 1988, equiparando o regime do Ministério

Público com aquele da magistratura nesse ponto, já que agora não bastava

processo administrativo com garantia de ampla defesa: apenas por sentença judicial

transitada em julgado poderia um membro da instituição perder o seu cargo.

Também a irredutibilidade de vencimentos foi adotada pela Carta, juntamente com a

antiga reivindicação da paridade com a magistratura. Por último, a inamovibilidade

do modo como estava colocada visava ao reconhecimento do princípio do promotor

36

natural entre nós22, mas não foi aceita no texto final do modo como estava na Carta

de Curitiba. Optou-se pelo já tradicional sistema entre nós de remoção

fundamentada em interesse público e com garantia de ampla defesa decidida pelo

órgão colegiado em maioria de dois terços – depois modificada para maioria

absoluta pela reforma do Judiciário, Emenda n° 45 d e 2004.

Entre as vedações incluíam-se: exercício de outras funções públicas, com as

exceções de cargo público eletivo, cargo administrativo de excepcional relevância,

ou de magistério; recepção de honorários, percentagens ou custas processuais a

qualquer título; exercício do comércio; e da advocacia.

Em relação à primeira vedação, o texto constitucional aprovado nos parece

muito superior a proposta da Carta de Curitiba: em primeiro lugar, não está vedado o

exercício de cargo eletivo – o que nos parece incompatível com o exercício

independente das funções da instituição –; e em segundo lugar, a expressão “cargo

administrativo de excepcional relevância” é indefinida e, portanto, abre caminho para

interpretações muito extensivas. Muito melhor a opção do constituinte de vedar o

exercício de atividade político-partidária – inicialmente com a previsão da

possibilidade da lei estabelecer exceções – e do exercício de qualquer outra função

pública, salvo uma de magistério – o que garante a dedicação à função com o

ensino das experiências adquiridas ao longo do seu exercício.

A segunda vedação foi acolhida com inteireza pelo constituinte e consta da

nossa Carta de 1988. Em relação à terceira vedação, a Constituição preferiu deixar a

legislação ordinária estabelecer os critérios e o modo do exercício da participação

em sociedade comercial pelo membro do Parquet. Por último, uma das resistências

de parte da categoria à época, a vedação ao exercício da advocacia foi adotada

tanto pela Carta de Curitiba como pelo Constituinte.

Em relação à nomeação do Procurador-Geral da República, o professor

Hugo Nigro Mazzilli assevera:

(...) a forma de escolha do procurador-geral da República, prevista na Constituição de 1988, é bem superior à da Carta de Curitiba, porque nesta matéria infelizmente pesou a influência conservadora do Procurador-Geral da República da época, presente ao encontro, sendo ele próprio o último chefe de Ministério Público escolhido fora dos quadros da carreira que passara a chefiar23.

22 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 91, nota. 23 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 97.

37

A carta de Curitiba mantinha a tradicional escolha do Procurador-Geral

dentre qualquer cidadão maior de trinta e cinco anos de idade, com notável saber

jurídico e reputação ilibada, com a volta da participação do Senado no ato. Existia

uma mitigação do poder de nomeação do Procurador-Geral ao enumerar no

parágrafo único as hipóteses de destituição – ainda que com termos indefinidos

como “omissão grave no cumprimento dos deveres do cargo”.

Por último, vale notar que o texto da Carta de Curitiba trazia proposta até

então inédita de unificar o nome dos chefes da instituição em promotores-gerais em

completa inovação em relação à nossa tradição jurídica. Realmente, a denominação

foi criada a partir da Ordenança de Filipe, o Belo, que estabelecia procuradores do

rei para cuidar da administração dos interesses do soberano perante os tribunais.

Assim como os outros procuradores, ele deveria cuidar dos interesses do outorgante

dessa procuração. Acontece que hoje em dia o Procurador-Geral não cuida dos

interesses do chefe do Poder Executivo ou do próprio Poder Executivo: essa função

é exercida entre nós pelo Advogado-Geral da União. Se a intenção do texto era de

separar a figura do procurador da União, que a representa em juízo, da figura do

promotor de justiça, completo sentido fazia a mudança de denominação.

Além do mais, evita a confusão com tantos outros procuradores-gerais que

existem entre nós e são estranhos à instituição: Procurador-Geral da Fazenda

Nacional, do Estado membro, de Município, de autarquia, etc.24. Ao contrário da

respeitável opinião do professor Sauwen Filho25, acreditamos que a confusão entre

os diversos procuradores não é um risco pequeno tendo em vista a tradição a ser

mantida. O cidadão comum não tem tempo o suficiente para dedicar-se ao estudo

aprofundado das leis e das instituições do país. A dificuldade destes textos, causada

pelo uso de termos não correntes, termos em língua estrangeira (como o latim,

principalmente) e confusões como esta, levam à incompreensão do alcance dos

direitos e a problemas de efetividade destes direitos conferidos. Leis não são

escritas para “grupos de iniciados” em suas práticas, mas para que todos possam as

compreender.

24 MAZZILLI, Hugo Nigro. Obra Citada, p. 96 e 97, bem como p. 398 para explicação da diferença entre os diversos procuradores que existem entre nós. 25 SAUWEN FILHO, João Francisco. Obra Citada, p. 186.

38

Infelizmente, a simplificação do nome do chefe da instituição não foi adotada

pelo Constituinte que preferiu a tradição do Procurador-Geral.

39

Conclusão

De tudo que foi dito aqui nessa monografia, acreditamos que podemos

separar três conclusões principais.

Em primeiro lugar, quanto às fontes históricas a instituição está ligada ao

aparecimento e desenvolvimento do Estado moderno, portanto, ao final da Idade

Média, momento no qual a burocracia do Estado moderno começava a desenvolver-

se. Assim, procurar seu desenvolvimento entre os gregos e os romanos pode ser

justificável de diversos pontos de vista, sendo o principal deles a influência

romanística e de sua matriz grega sobre a cultura jurídica européia do final da Idade

Média1. Mas tal busca ignora o fato do Ministério Público, assim como todas as

nossas instituições jurídicas, estar ligado a nossa forma de Estado e sociedade.

Portanto, tal busca não passa de analogia com as funções que a instituição exerce

nos dias atuais: pelo mesmo critério poderíamos estabelecer uma semelhança com

os magiaí, como dissemos, ou com funcionários do início da Idade Média, quando o

Império Romano estava em derrocada2.

Entretanto estamos certo que a instituição formada na França em fins da

Idade Média é a matriz do atual Ministério Público, sem ser já a própria instituição de

nossos dias. Confundir isso pode ser perigoso aqui: essa instituição é a que vai ser

transformada, com o tempo, naquela do Ministério Público que defende o regime

democrático. Mas, mesmo por isso, ela não é já a instituição: dela levará o nome e

algumas funções o nosso Ministério Público, mas totalmente transformadas essas

funções já que agora se ligam a outro contexto histórico e a outra forma de Estado e

sociedade.

Em segundo lugar, quanto ao tratamento dado nos regimes das

constituições brasileiras entre 1824, com a Constituição do Império, e 1969 –

inclusive –, com a Emenda Constitucional n° 1 – ver dadeira Constituição –, podemos

perceber que a disciplina do Ministério Público no Brasil sempre foi, no dizer do

professor Carlos Alberto de Salles3, instável, imprecisa e incompleta.

1 SALLES, Carlos Alberto de. Obra Citada, p. 13. 2 SALLES, Carlos Alberto de. Obra Citada, pp. 15 e 16. 3 SALLES, Carlos Alberto de. Obra Citada, p. 29.

40

Instável porque submetido às condições políticas dos momentos em que

foram outorgadas ou promulgadas as nossas diversas Constituições no período e às

contingências da política nacional em diversos momentos, passando de momentos

mais autoritários para momentos mais democráticos; de avanços para recuos.

Impreciso porque essa variabilidade no tratamento do Ministério Público –

ora tratado como instituição; ora trazido próximo ao Executivo; ora próximo ao

Judiciário; ora tendo suas funções ampliadas de modo atípico; ora tendo suas

funções diminuídas e vendo aquelas do chefe da instituição sendo ampliadas; ora

vendo suas garantias serem diluídas – não contribuía para um tratamento mais

científico da instituição e mesmo para um tipo de tratamento que propiciasse

instrumentos e garantias, e que vedasse condutas indesejadas no seio do Ministério

Público para permitir o exercício de suas funções e o correto desempenho do seu

múnus público.

Enfim, incompleto porque antes de 1988 não tinha a instituição limitadas

suas funções por um conceito, não que definisse o que era o Ministério Público de

forma abstrata, mas que desse um sentido finalístico à instituição4: que definisse

aquilo que era e aquilo que não era parte das funções do Ministério Público. Isto,

feito com a Constituição de 1988 – ainda que a Lei Complementar n° 40 de 1981

tivesse conceituado a instituição, mas não de forma funcional –, contribui muito para

que a instituição tenha um perfil de atuação, diferenciando-se das demais

instituições do cenário jurídico-político nacional.

Em terceiro lugar, que a conscientização da classe, começada com o V

Congresso Nacional do Ministério Público, em setembro de 1977 – por ocasião da

reforma constitucional vindoura –, propiciou um melhor tratamento da instituição pela

Assembléia Constituinte, e que os fundamentos da Carta de Curitiba – e a própria

Carta –, foram decisivos para as mudanças de rumo que a instituição tomou com a

Constituição de 1988 e as legislações posteriores imbuídas daquele espírito

democrático da Carta.

Assim, acreditamos que um tratamento imanente, isto é, conjugando

problemas e soluções – sem recorrer a princípios e a gêneses transcendentes –, é a

melhor forma de lidar com o problema da formação e aparecimento do Ministério

4 SALLES, Carlos Alberto de. Obra Citada, p. 31.

41

Público, de modo a colocar a descoberto aquela densa nuvem “a-histórica”, no dizer

do filósofo Gilles Deleuze5, que se coloca como condição para toda transformação

histórica e da qual essas transformações históricas são como que o signo, a marca

que mostra sua passagem e ação, enfim, sua efetuação.

5 DELEUZE, Gilles. Conversações . Tradução de Peter Pál Pelbart. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1992, pp. 118 e 119.

42

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