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VALTER DA ROSA BORGES A REALIDADE MÚLTIPLA RECIFE - 1995

Realidade Multipl A

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Realidade multipla

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  • VALTER DA ROSA BORGES

    A REALIDADE MLTIPLA

    RECIFE - 1995

  • INTRODUO

    Este livro uma das tantas propostas que, durante sculos, tm sido feitas para uma reflexo sobre a realidade.

    Parti do pressuposto de que, essencialmente, h uma s realidade, mas que, operacionalmente, existe um ilimitado nmero de nveis da realidade, cada qual com as suas caractersticas prprias e interaes recprocas. Apenas, para fins didticos, distingui quatro nveis gerais da realidade: o fsico, o social, o psquico e o transcendental.

    Cada ser percebe a realidade segundo a sua estrutura ntica e o nvel da realidade onde esteja inserido e, por isso, levado a crer que esta a nica realidade.

    Em sua vivncia emprica, o homem convive, simultaneamente, nos trs primeiros nveis gerais da realidade - o fsico, o social e o psquico -, embora pressinta ou presuma a existncia de outro nvel geral mais abrangente, denominado de transcendental, o qual postulado a partir da natureza da mente humana, notadamente em suas manifestaes para mais.

    Procurei evidenciar que o principal equvoco na abordagem da realidade consiste em se querer compreender todos os seus nveis possveis a partir do referencial de um deles - o universo fsico -, como se este fosse o padro nico ao qual se subordinam todos os demais. Assim, como conseqncia desta premissa, conclui-se que se algo impossvel no nvel padro deve, necessariamente, ser impossvel em qualquer outro nvel da realidade.

    Cada nvel da realidade tem seus problemas especficos, mas tambm problemas nas suas reas de interconexes recprocas, exigindo novas reflexes sobre essas complexidades emergentes.

    Tentei ser, ao mesmo tempo, panormico e sinttico na discusso de uma temtica extremamente complexa e fascinante, num convite ao leitor para, de maneira crtica e reflexiva, corrigir os equvocos, suprir as omisses, preencher as lacunas e aprofundar as questes tratadas neste livro, cujo nico propsito consiste em servir de iniciao investigao da realidade, utilizando, para isso, os subsdios da cincia, da filosofia e da religio, numa parceria cognitiva, em busca de uma compreenso sempre mais abrangente de cada um de seus nveis.

  • CAPTULO PRIMEIRO

    A REALIDADE E SEUS NVEIS

    A realidade como axioma

    A realidade o axioma fundamental. Axioma toda proposio que, por ser evidente por si mesma, no necessita de demonstrao.

    H, no entanto, os que afirmam que nada existe e tudo iluso. Tal afirmativa se constitui num evidente paradoxo, visto que se teria de admitir que o que no existe declara que nada existe. Ou que s existe o que afirma que nada existe, importando em nova contradio, pois invalida a proposio de que nada existe, dado que existe aquele que declara que nada existe.

    Duvidar do real absurdo. Afinal o que quem nega o real? Um no-real? Como o que no existe pode afirmar ou negar ou que quer que seja? S o que real pode negar ou afirmar alguma coisa, at mesmo negar a sua prpria realidade.

    Procurou-se provar o axiomtico, ou seja, que o real real. Assim, algo real afirmou a realidade e, a partir de si mesmo, inferiu que:

    a) ele era a nica realidade e tudo o mais reflexo de si mesmo; b) havia uma realidade maior que ele e da qual fazia parte. No primeiro caso, se cai no absurdo do solipsismo, onde o observador se

    julga ser todo o real, questionando se h outra realidade alm dele e postulando ser o mundo exterior uma mera projeo de si mesmo.

    O homem, na condio de observador, se fez testemunha e garante da realidade. Mas, para isso, buscou, inicialmente, provar-se a si mesmo como real. A certeza, assim, da realidade se alicerou na certeza da existncia do prprio observador.

    J dizia Aristteles: "sou, porque penso". Do mesmo modo, Agostinho: "duvido, logo sou." E, finalmente, Descartes: "penso, logo sou."

    Para Descartes, o homem s pode ter certeza da realidade do seu prprio pensamento. A existncia de algo fora do homem decorre de uma certeza moral ou metafsica: a de que Deus no nos enganaria, fazendo-nos perceber um mundo fictcio.

    Descartes argumentou que o mundo no uma iluso, porque Deus no nos daria sentidos enganosos. O fundamento da realidade, para Descartes, tem, portanto, uma premissa metafsica: a crena de que Deus no nos enganaria, fazendo-nos perceber o que no existe. Reconheceu que o mundo sensvel no esgota toda a realidade, mas apenas um modo de perceb-la.

    A certeza do ser apodtica, axiomtica. absurda a idia de um observador real e tudo o mais irreal (solipsismo). Ou de um observador real, criando uma

  • realidade que apenas existe enquanto ele existe.

    Perguntar-se o observador a si mesmo se ele existe uma falsa questo. Como algo irreal pode questionar o real? Para que o ser ter a certeza de sua prpria seidade? Ou especular que a realidade comeou com ele e com ele terminar? Tudo isso no passa de lixo metafsico. As afirmativas de Aristteles, Agostinho e Descartes so inutilidades filosficas, apesar de famosas. O mesmo se diga da assertiva de Hume de que a nossa realidade uma crena prtica. Como se explicar uma crena sem crente? Eu no existo, mas creio que existo, uma afirmao que nos leva ao absurdo do no-existente acreditar na iluso de que existe. Infelizmente, h existentes que, por mero folguedo intelectual, duvidam solenemente da prpria existncia.

    Realidade & Ser

    Procurou-se identificar a realidade com o Ser. H, porm, muitas acepes do Ser.

    Pitgoras procurou estabelecer uma relao entre a matemtica e a realidade, afirmando que o Ser o nmero.

    A realidade ou Ser, para Parmnides, um Todo eterno, uno, homogneo, pleno, imvel, imutvel, esfrico e, portanto, limitado. Por conseguinte, a divisibilidade, a multiplicidade e a mutabilidade das coisas, assim como o vazio, no passam de aparncias. Nada existe alm do Ser: ele um continuum ininterrupto, mas limitado e esfrico. Para Parmnides, como para o pensamento grego da poca, o crculo e a esfera eram figuras geomtricas perfeitas e smbolos da perfeio. Por isso, sendo o Ser perfeito, no poderia ser ilimitado.

    Asseverava, ainda, Parmnides que Ser e pensar so a mesma coisa, afirmando que o real racional e o racional real.

    Melisso discordou de seu mestre Parmnides, argumentando que o Ser infinito, pois no pode ser limitado por outro Ser e nem pelo no-ser. O Ser infinito espacial e temporalmente.

    Segundo Empdocles, o Ser eterno, imutvel, mas no uma substncia nica. Ele procurou conciliar as doutrinas do Ser e do Devir, asseverando que tudo se origina de quatro elementos - terra, gua, fogo e ar -, os quais, assim como suas combinaes, so determinados pelas foras do amor (Philtes) e do dio (Neikos), que, por sua vez, ciclicamente, se alternam na natureza - o que lembra o Yang e o Yin, da filosofia oriental. Esses elementos so imutveis, embora mutveis sejam as coisas resultantes de suas relaes. Os seus antecessores procuraram um elemento nico como causa de todas as coisas: Tales, a gua; Anaxmenes, o ar; Herclito, o fogo; Xenfanes, a terra; Anaximandro, o infinito. O pluralismo de Empdocles , no entanto, diferente do de Demcrito. Para este, a pluralidade meramente quantitativa - os tomos - e, para aquele, qualitativa - os quatro elementos.

  • A Escola Atomista, de Leucipo e Demcrito, negava o Ser homogneo e pleno de Parmnides. A realidade constituda de tomos esfricos e de vazio. Em outras palavras: a realidade no o todo parmendeo, mas a multiplicidade de todos os tomos, formando combinaes entre si, em seus movimentos no vazio. Parmnides no aceitava o vazio no Todo ou fora do Todo, pois o que no o Ser o no-ser e, por isso, no real. Para a Escola Atomista, a alma e os deuses so tambm constitudos de tomos.

    Plato asseverava que o Ser, na sua essncia, no substncia, mas Idia, pensamento.

    As Idias no existem nas coisas, mas fora delas. Elas transcendem o mundo sensvel das coisas e o mundo inteligvel dos conceitos.

    As Idias so modelos ou paradigmas de todas as coisas. Elas so entes reais e no meros conceitos mentais. As coisas, por isso, nada mais so do que imitaes das Idias.

    As Idias so necessrias e universais e as coisas so contingentes.O mundo em que vivemos um mundo ilusrio de sombras e aparncias. O mundo real o mundo das Idias, que so modelos e paradigmas de todas

    as coisas. o chamado mundo inteligvel.Plato no claro sobre a natureza das Idias: se elas existem por si mesmas

    ou se apenas existem na mente de Deus.Assinalou que o Ser estruturado em categorias ou atributos universais, a

    saber: o prprio Ser, o movimento, o repouso, a identidade e a alteridade.

    Aristteles sustentava que o Ser substncia. A idia do Ser est nele prprio.

    Discordando de seu mestre Plato, argumentava que no possvel que as idias estejam separadas das coisas, pois, se assim o fosse, no seriam causa do mundo sensvel. Ao contrrio: idias e coisas formam uma unidade inseparvel. Ademais, se as idias so modelos das coisas, deveriam existir tantos modelos quanto fossem as coisas existentes.

    Aristteles tambm o criador da teoria da essncia. A essncia a possibilidade do ser e a existncia, a atualizao de sua possibilidade. A essncia das coisas se encontra nelas mesmas. A idia de uma coisa est imanente na prpria coisa e no transcendente a ela. Porm, adverte que "no necessrio que todas as potencialidades se atualizem". Tambm "a mesma coisa pode ser potencialmente dois contrrios simultaneamente, mas no atualmente." Cada ser, portanto, pode existir em potncia ou ato.

    O Ser uno e esta unidade material. Ele permanece uno apesar de observado sob vrios de seus aspectos.

    O Ser constitudo pela substncia e seus acidentes, os quais constituem as dez categorias ou "gneros supremos do Ser". Os acidentes so: qualidade, quantidade, relao, lugar, tempo, estado, posse, ao e passividade.

    Os seres dependem de quatro causas; a) a causa material, que diz respeito quilo de que uma coisa feita; b) a causa formal, que se refere ao modelo, a essncia ou substncia da

  • coisa; c) a causa eficiente, que produz o movimento ou repouso de uma coisa; d) a causa final, que determina a finalidade de uma coisa. Para a Escola Vaisesica, ser existir (o que lembra o pensamento

    existencialista) e existir ser conhecido (o que sugere a concepo de Berkeley: as coisas so enquanto so percebidas).

    Proclo afirmava que cada ser exprime todo o universo, constituindo manifestaes do Uno em diferenciaes seriais reguladas por leis.

    Al Farabi introduziu a noo de ciso no Ser: o Ser de Deus e o Ser das criaturas, o Ser por si e o Ser por participao, o Ser necessrio e o Ser possvel.

    Oken afirmava que cada ser um microcosmo em relao ao Universo. Quanto mais complexo o ser, mais perfeito ele . Na hierarquia ontolgica da Natureza, cada grau dos seres possui qualidades e propriedades dos graus inferiores.

    Fichte identificava o ser com a conscincia. A conscincia o fundamento do ser. E a conscincia, por sua vez, se alicera na autoconscincia, que a conscincia de si mesma.

    Schopenhauer concebia o ser como vontade e esta como a essncia de todas as coisas. Assim, tudo o que existe uma objetivao da vontade.

    Para Rosmini, a idia do ser inata.

    Herbart advertia que a experincia nos apresenta uma pluralidade de seres, cada um dos quais uma "posio absoluta". Mas cada ser sempre ele mesmo na sua simplicidade e imutabilidade. A realidade pluralstica. As aes e reaes dos seres individuais formam o acontecer.

    Hegel, em acordo com Parmnides, afirmava que o ser o pensamento e o pensamento, o ser.

    Segundo Sartre, "o ser sem razo, sem causa e sem necessidade." A existncia seus fenmenos e o ser um dos fenmenos da existncia. No h somente o fenmeno do ser, mas o ser do fenmeno. E existe um ser da conscincia, pois a conscincia sempre conscincia de algo.

    Heidegger argumentava que no a essncia que d significado existncia, mas, sim, o contrrio.

    A existncia tem por fundamento um estar a (dassein), em ser no mundo, onde homem se encontra jogado para realizar a possibilidade de sua existncia. O ser, portanto, existir. O existir o fundamento do ser. O ser da essncia um estar a.

    O ser se faz no tempo e, por isso, pura historicidade, mundaneidade,

  • temporalidade. O Ser o Nada que o constitui.O existir que possibilita o ser. Tudo o que existe, possibilidade de ser. O

    existir do ser o seu existencializar-se.O ser do nada o nada. A angstia resulta da revelao dessa verdade. A

    angstia a nica emoo autntica, porque faz o homem compreender a sua existncia, o seu ser no mundo.

    A existncia a possibilidade que, em se determinando, adquiriu uma essncia.

    Ortega y Gasset assinalava: "O ser das coisas no um presumido ser em si, mas o seu evidente ser

    para. O ser, assim, no a substancialidade, mas a servialidade." A realidade no uma substncia. A realidade humana histria. O ser da

    vida humana o "fazer-se." O real um infinito nmero de perspectivas. Todas elas so verdadeiras. A

    perspectiva falsa a que pretende ser a nica verdadeira.

    Para Merleau-Ponti, "ser sinnimo de estar situado."

    Na concepo de Edgar Morin, "a idia do ser no uma noo substancial. uma idia organizacional."

    Pietro Ubaldi distinguia trs aspectos no universo: a) o esttico, que diz respeito sua estrutura e forma;

    b) o dinmico que se refere a seu desenvolvimento e transformao;c) o mecnico, que se relaciona a seu princpio e sua lei.

    A esses trs aspectos correspondem trs modalidades do ser: a estrutura ou forma, o movimento ou transformao e o princpio ou lei, os quais podem ser denominados de matria, energia e esprito e, na direo inversa, em pensamento, vontade e ao.

    O primeiro modo do ser esprito, pensamento ou lei. O segundo, energia, vontade e movimento. O terceiro, matria, ao e estrutura ou forma. Esta a trindade da Substncia, alternando-se na passagem de uma fase a outra, no, porm, num circuito fechado, mas num movimento em espiral. Isto quer dizer que, a cada retorno, no se volta exatamente ao ponto de partida, porm um pouco mais acima, nisto consistindo o princpio da evoluo universal. No se trata, portanto, de um movimento retilneo, nem circular, mas espiralide, onde cada descida recapitulao e fixao do aprendizado e cada subida, uma nova conquista.

    Huberto Rohden aduzia:"Tudo o que , essencialmente eterno. Nada pode comear a ser, e nada

    pode deixar de ser. No h transio do ser para o no ser, como no h transio do no ser para o ser. H apenas transio do no existir para o existir, e vice-versa."

    Danah Zohar procura conciliar a dualidade ser/no-ser, postulando a hiptese do ser quntico. E argumenta:

  • "O aspecto partcula da matria quntica d origem aos indivduos, a coisas que, de alguma forma, podem ser apontadas e s quais se pode atribuir uma identidade, mesmo que brevemente. O aspecto onda d origem aos relacionamentos entre esses indivduos por meio do entrelaamento das funes de onda de seus componentes."

    O ser, por conseguinte, na concepo de Zohar, , ao mesmo tempo, ser e devir, partcula e onda. Assim:

    "Em seu "aspecto partcula" o ser quntico revela uma significativa integridade individual e, no entanto, atravs de seu "aspecto onda", revela-se simultaneamente em relacionamento com outros seres e com a cultura como um todo."

    O ser, portanto, como sinnimo de realidade, se apresta s mais diversas concepes, de conformidade com a perspectiva de cada abordagem cognitiva.

    A realidade o Todo ou Ser, essencialmente homogneo, onde tudo igual a tudo e se interrelaciona com tudo, embora existencialmente tudo parea uma infinidade de seres e coisas separados entre si, semelhantes e diferentes entre si.

    Sabe-se que certos metais e ligas, se arrefecidos a temperaturas prximas do zero absoluto, perdem sua resistncia eltrica e se tornam supercondutores. Assim, a corrente eltrica que os atravessa no sofre nenhuma perda devida ao atrito.

    Como simples analogia, podemos considerar a homogeneidade como a supercondutividade do Ser em seu estado de essencialidade.

    A substancialidade da realidade

    Parmnides, ao postular o Ser, o primeiro substancialista do Ocidente. Ele negava o devir, afirmando que no passa de mera aparncia.

    Melisso sustentava que a substncia contnua e o vazio iluso. O vcuo nada e o nada no pode existir.

    Para Melisso, no h vazio, mas partes densas e partes sutis.

    Aristteles, fundador da teoria da substncia, definia a substncia como aquilo que existe por si mesmo. "o substrato ltimo, que j no predicado de nenhuma outra coisa." "aquilo que no se predica de um substrato, mas de que tudo se predica." A substncia o real.

    A substncia o Ser. Ela o quid, o ser de todas as coisas.

    Hermes Trimegisto ensinava que, no universo ilimitado, no existe sequer a espessura de um dedo de espao vazio.

    Descartes definia substncia como uma coisa que no precisa de nenhuma outra para existir.

    Espinosa entendia a substncia como "aquilo que em si e se concebe por si mesmo: ou seja, aquilo cujo conceito no precisa do conceito de uma outra coisa

  • pelo qual deva ser formado." Espinosa sustentava que a substncia tem infinitos atributos dos quais s

    conhecemos dois: o pensamento (res cogitans) e a extenso ou matria (res extensa). Cada um deles se manifesta numa multiplicidade de aspectos ou modos singulares. Os modos so os entes individuais: ns e as coisas.

    Para Espinosa, h uma s Substncia - Deus -, da qual o pensamento e a matria so atributos. As coisas particulares constituem to somente modos da Substncia. Pensamento e matria so apenas os atributos de Deus que o homem capaz de conhecer.

    Entendia Pietro Ubaldi que o movimento a essncia da Substncia. O que chamamos de matria no passa de movimento e o ter uma forma de transio entre a energia e a matria. A radioatividade uma propriedade universal da matria, a qual, portanto, no indestrutvel. Somente a Substncia indestrutvel.

    O fenmeno, dizia Ubaldi, "uma das infinitas formas individuadas da substncia, a sua transformao e a lei que a rege."

    Para o realismo, a substncia uma realidade metafsica objetiva ou independente da conscincia cognoscente.

    Para o idealismo subjetivo, a substncia somente uma representao em ns, um contedo da conscincia.

    Para o idealismo lgico, a substncia pura relao lgica. Assim, o conceito de funo matemtica substitui o conceito de substncia.

    Segundo Eddington, atualmente, na Fsica, a energia substituiu o conceito de substncia.

    Lembra Jean Charon que a teoria quntica "substituiu a noo de contedo fsico pela idia de ponto-acontecimento."

    Por sua vez, Fritjof Capra adverte que, no nvel atmico, "os objetos slidos da Fsica clssica dissolvem-se em padres de probabilidades, e esses padres no representam probabilidades de coisas mas, sim, probabilidades de interconexo." Na verdade, diz ele, uma partcula elementar ", em essncia, um conjunto de relaes" e, por isso, "o mundo afigura-se assim como um complicado tecido de eventos." Tudo parece sugerir que "as partculas so processos em vez de objetos."

    No h essncia da realidade. No h nada em si. Tudo est em relao a. Sentimos que somos reais na nossa interao com os outros seres e as coisas

    chamadas materiais. A essncia do real a relao dos seres do mesmo nvel fenomnico. A essa

    relao damos o nome de matria e, por isso, nos sentimos como seres materiais.Nada do que , foi. Nada do que , ser. Tudo o que no foi e nem ser.

    Cada coisa sempre outra coisa a cada instante por mais que se assemelhem entre si.

    Tudo morre. Tudo sempre novo. Nada igual: tudo semelhante ou diferente, pois tudo se assemelha ou se diversifica, segundo as peculiaridades e

  • circunstncias do processo transformista.

    Fsica clssica & Fsica quntica

    Para a Fsica clssica, o universo constitudo de elementos fundamentais, as partes determinam as propriedades do Todo e toda causalidade local.

    Segundo a Fsica quntica, o universo um Todo, constitudo de interaes, no havendo elementos fundamentais. O Todo determina as propriedades das partes. A causalidade no-local, mas se origina do Todo, sendo, portanto, de natureza estatstica.

    Sustenta a Escola de Copenhague que a realidade quntica estatstica e no exata. No faz sentido falar sobre as propriedades fsicas de um objeto quntico, sem especificar o dispositivo experimental atravs do qual se pretende observ-lo, visto que a realidade quntica , em parte, criada pelo observador. Ou seja, o mundo no possui um estado de existncia bem definido, independente da nossa observao, porque, no mundo atmico, a realidade resulta do modo que a observamos ou daquilo que decidimos observar e segundo o dispositivo experimental que utilizamos para essa observao.

    As teorias qunticas mais importantes so o princpio da indeterminao, de Heisenberg e o princpio da complementaridade, de Bohr.

    Ressalta Paul Davies que a Fsica quntica " o nico ramo da cincia no qual faz sentido falar em efeito sem causa."

    As previses da Fsica quntica se referem distribuio global dos acontecimentos e no aos acontecimentos individuais.

    As propriedades da Fsica quntica so:a) a falta de objetividade do mundo fsico;b) a indeterminao;c) a realidade criada pelo observador

    Realidade: vazio ou potencialidade?

    Digenes de Apolnia pregava a existncia de um vazio ilimitado e admitia tambm que nada sai do nada e volta ao nada.

    Argumentava Bergson: "Se entendemos por vazio uma ausncia de utilidade e no de coisas, pode-

    se dizer, nesse sentido inteiramente relativo, que vamos constantemente do vazio ao pleno."

    Mario Schenberg definia o vazio como "o estado fundamental do campo." E

  • relembrava:"O vazio teve sempre um papel fundamental na ndia. Para o pensamento

    hindu o vazio corresponderia a Deus. Deus era aquele vazio onde as coisas se moviam."

    Esta concepo est em acordo com a de certos pensadores que conceituam Deus como o Nada.

    Hubert Reeves comenta:"Com efeito, observa-se a "criao" espontnea de energias chamadas

    "energias do vazio". "Estas energias manifestam-se em geral pelo aparecimento de pares de partculas, por exemplo de eletres e positres. A energia implicada no aparecimento de um tal par de 1 milho de eltres-volt. Aps um tempo muito curto, este par aniquila-se e o sistema recupera o estado inicial. O fenmeno de "flutuao quntica" reproduz-se assim numerosas vezes. Diz-se que o vazio "ronrona".

    E assinala:"As observaes de laboratrio confirmam com grande preciso a realidade

    deste fenmeno."

    O ter era o meio invisvel que punha em contato todas as coisas por mais distantes que estivessem entre si, explicando, assim, a ao distncia, sem necessidade de qualquer intermedirio fsico.

    O ter, que consistia na afirmao do pleno, no sendo sua existncia confirmada pelas experincias de Albert Michelson e Edward Williams Morley, foi substitudo pelo conceito de um vazio inerte, o qual, mais tarde, tambm foi substitudo pela concepo de um vazio dinmico. O vazio, assim, deixou de ser um nada para constituir-se uma potencialidade.

    O real tanto o atual quanto o possvel ou potencial.

    A realidade infinita

    Brahmanaspati afirmava que tudo se origina de Aditi, o infinito invisvel, que a matria primordial.

    Melisso, discpulo de Parmnides, discordou do seu mestre, argumentando que o Ser infinito, pois no pode ser limitado por outro Ser e nem pelo no-ser. O Ser uno, porque infinito e infinito, porque uno. Se no fosse uno, seria limitado por outro e, por ser infinito, s pode ser uno. E, porque pleno, no se move: o movimento no passa de aparncia. O ser infinito espacial e temporalmente.

    Anaximandro asseverava que o princpio de tudo o infinito (peiron). Tudo sai do infinito e a ele retorna.

    Do ilimitado nasce a multiplicidade de todas as coisas.

    Aristteles estabeleceu relao entre o infinito potencial e o infinito atual, admitindo apenas a existncia do primeiro. Afirmava ele a potencial infinitude de

  • uma srie numrica como de uma srie de pontos de uma linha. No admitia, contudo, o infinito na srie causal, pois postulava a existncia de uma causa no causada.

    Anaxgoras postulava a existncia de trs infinitos: a) o infinitamente grande; b) o infinitamente pequeno; c) o infinito nmero das coisas.

    Poderemos postular a existncia de um quarto infinito: o infinito nmero dos nveis da realidade.

    Zeno de Elia foi quem levantou o problema da infinita divisibilidade do continuum.

    Os Esticos conceberam a infinitude do vazio onde se movimenta um nmero infinito de mundos.

    Epicuro sustentava que o Todo infinito.

    Para Hegel, o infinito a substncia de todas as coisas. A essncia o que permanece idntico e invarivel no processo dialtico, sempre presente no conjunto das aparncias. Em cada mudana, algo permanece, porque, se tudo desaparecesse, no haveria evoluo. Esse ncleo imutvel, porm, no o Infinito, mas participa, de alguma forma, da essncia do Infinito, porque no se transforma e permanece imutvel em todas as transformaes.

    O infinito , necessariamente, indivisvel, pois, se fosse divisvel, no seria infinito. Assim, o finito no passa de aparncia.

    O infinito, por indivisvel, tambm imutvel. Nele, no h onde e quando. Tudo sempre tudo. No h centro nem periferia.

    O infinito, por indivisvel, imvel, homogneo, no admite posio, dimenso, distncia. Assim, ningum est em qualquer parte do infinito, porque no existe indivduo ou parte no infinito.

    Leis gerais da realidade

    Segundo o Hermetismo, a realidade constituda de sete princpios:a) o princpio do mentalismo - tudo Mente;b) o princpio da correspondncia, expresso na conhecida frmula - "o que

    est embaixo como o que est em cima, o que est em cima como o que est embaixo";

    c) o princpio da vibrao que afirma que tudo se move e tudo vibra;d) o princpio da polaridade, o qual afirma que tudo tem o seu oposto e estes

    so idnticos em natureza, mas diferentes em grau;e) o princpio do ritmo - tudo se manifesta por oscilaes compensadas;f) o princpio de causa e efeito - "toda causa tem seu efeito, todo efeito tem

    sua causa";g) o princpio do gnero - tudo, em todos os planos, tem seu princpio

    masculino e seu princpio feminino.

  • Toms de Aquino concebeu trs espcies de leis:a) a lei eterna, de natureza divina, e apenas conhecida parcialmente atravs

    de suas manifestaes;b) a lei natural, conhecida atravs da razo;c) a lei humana, criada pelo prprio homem.

    Teilhard de Chardin dizia que h quatro leis fundamentais do universo:a) a lei de complexidade crescente, que se aplica cosmognese;b) a lei de complexidade consciente, que se aplica biognese;c) a lei de cefalizao, relativa aos seres vivos superiores;d) a lei de socializao, que rege a antropognese.

    Lawrence LeShan assim definiu o critrio de realidade:"Do ponto de vista da fsica clssica, admitimos que um objeto existe ( real)

    se se verificar uma das seguintes condies possveis e coincidentes: (1) se pudermos perceb-lo diretamente; (2) se pudermos perceber diretamente seus efeitos; (3) se pudermos formular uma hiptese que nos permita explicar os efeitos que percebemos, e que no temos condies de explicar de qualquer outra maneira. Em outras palavras, no o consideramos "real" a menos que se trate de uma percepo ou de algo necessrio para explicar uma percepo.

    A nica exceo a esses trs critrios de existncia se baseia na experincia. Se deixarmos um objeto num lugar onde no podemos mais observ-lo ou a seus efeitos (por exemplo, guardar os sapatos num armrio, fech-lo e sair de casa), presumimos, baseados em experincias passadas, que ele estar no mesmo lugar quando voltarmos (deixamos de lado condies especiais, tais como a ao de assaltantes ou a evaporao de um lquido). O objeto existe, portanto, real naquele intervalo que decorreu entre o ato de fechar e abrir o armrio. A no ser por essa exceo, devemos considerar que as coisas existem somente se as percebemos ou se elas forem necessrias para explicar aquilo que percebemos."

    A pluralidade dos nveis da realidade

    Quando falamos em realidade, referimo-nos a uma infinidade de coisas dos mais diferentes aspectos e formas, reunidas sob uma nica palavra. A realidade , assim, o conjunto de todas as realidades, sejam elas atuais ou meramente possveis.

    Podemos conceituar a realidade como o Todo, como os sub-sistemas do Todo e como cada coisa individual. O conceito de realidade, por conseguinte, pode variar ad infinitum, de conformidade com o referencial escolhido. ocioso, portanto, o questionamento sobre o que a realidade, pois o modo de perceber cada um de seus inmeros aspectos o seu prprio contedo.

    Aristteles foi quem primeiro distinguiu dois tipos de realidade: a realidade potencial e a realidade atual. Denominou de matria ou essncia a possibilidade do ser e de forma ou existncia a atualizao dessa possibilidade.

  • O real no s o realizado, mas o realizvel. No s o percebido por nossos sentidos e suas extenses artificiais, ou seja, o manifesto ou objetivo, mas tambm a programao preexistente no ser, oculta ou subjetiva.

    O real eterno, infinito e constitudo de infinitas formas e nveis fenomnicos.

    Por ser infinito o real, no existe o tomo, pois a individualidade de algo invalidaria o infinito.

    O tomo no o contrrio do vazio ou seu limite. Ele o contrrio do infinito e este no sinnimo de vazio como inexistente, mas, sim, como potencialidade.

    Habitamos um dos infinitos nveis da realidade e s conhecemos este tipo de realidade. Por isso, somos levados a pensar que somente o nosso nvel da realidade a prpria realidade.

    A realidade , para cada espcie de ser, segundo ela a percebe. No h, portanto, uma nica realidade, mas mltiplas realidades em razo da multiplicidade das espcies. Eis por que certas drogas, denominadas alucingenas, por desorganizar nossos padres habituais, nos fazem perceber novas nuanas da realidade.

    Da, a assertiva de Pietro Ubaldi: "Todo mundo real no seu nvel, e iluso se visto de outros planos."

    Ilya Prigogine assim se expressou: "Na poca em que a mecnica clssica reinava inconteste, podia-se falar de nvel fundamental. No presente, a Fsica se abriu, e somos levados a falar de pluralidade de nveis interconexos, sem que nenhum deles possa mais se colocar como prioritrio ou fundamental."

    Com arrimo na Fsica quntica, h os que admitem que o que fisicamente possvel inevitavelmente acontecer em alguns dos universos cujo nmero infinito. Esses vrios universos so realidades paralelas ou coexistentes, mas s nos dado perceber um s deles, ou seja, aquele que habitamos. Assim, as nossas possibilidades de ser acontecem em outros universos, embora no as possamos conhecer.

    A realidade um Todo unificado em todos os seus nveis. Tudo interage com tudo, sob formas e condies as mais diversas.Nada existe isolado e o individual no passa de aparncia.No h uma realidade objetivamente organizada, mas uma realidade

    objetivada segundo a estrutura perceptual de cada espcie, produzindo a impresso de uma realidade objetiva e comum aos seus indivduos.

    Tem razo Stanislav Grof, quando denuncia um outro problema: "O que cria a aparncia de solidez, separao e individualidade num

    universo essencialmente vazio e imaterial cuja verdadeira natureza uma unidade indivisvel?"

  • Alguns cientistas cogitam que a passagem de um universo a outro se processa atravs de tneis ou space-time worm-holes (buracos de minhoca espao-temporais).

    As pessoas que passaram pela morte clnica aparente tambm relatam que passaram por um tnel que as conduziu a um outro lado da realidade.

    Raymond A. Mood Jr. foi o pioneiro na investigao dessas experincias que fornecem sugestivos indcios para a investigao da sobrevivncia post-mortem.

    Na interao entre nveis diferentes da realidade que, possivelmente, ocorrem fenmenos inslitos e que so denominados de paranormais e milagrosos.

    William McDougall e Scott Rogo procuraram explicar os milagres como um efeito psi-kapa de massa, produzido por forte emoo religiosa de uma comunidade. (O psi-kapa uma modalidade de fenmeno paranormal que consiste na ao extracorprea da mente humana, agindo sobre os seres vivos e as coisas materiais.)

    O efeito massivo de uma multido pode desencadear fenmenos paranormais de grandes propores. Isto pode aplicar-se, por exemplo, na liquefao anual do sangue de So Janurio, quando uma multido expectante comparece Catedral de Npoles para observar o acontecimento milagroso. E o milagre, de fato, acontece e interpretado como um bom augrio para a cidade. Somente por trs vezes o milagre no ocorreu: nos anos de 1835, 1944 e 1976.

    Poder o homem, um dia, conhecer todas as possibilidades da natureza? Somente em caso afirmativo e quando isto se der, poder afirmar, com plena segurana, a impossibilidade de alguma coisa. Alis, o simples pensar em algo que fisicamente no existe, j torna este algo psiquicamente real.

  • CAPTULO SEGUNDO

    A REALIDADE FSICA

    A matria como realidade

    Aitareya definiu a matria como tudo o que capaz de manifestao. E asseverava que ela o fundamento da pluralidade e diversidade de todas as coisas.

    Entre a matria original e a matria final h inmeras gradaes.

    Na acepo de Uddalaka, a matria um todo indivisvel onde esto misturadas todas as coisas, as quais, por sua vez, so infinitamente divisveis e qualitativamente distintas.

    Aristteles conceituou a matria como tudo aquilo com o qual fazemos algo. A forma essncia necessria ou a substncia da matria. Corpo o que tem extenso em todas as direes - altura, largura, profundidade -, sendo divisvel em todas elas. (Os esticos, posteriormente, acrescentaram ao conceito de corpo o atributo de solidez e os epicuristas, o de impenetrabilidade.)

    Tudo se constitui de potncia e ato. A matria pura potencialidade e o movimento a atualizao de uma potencialidade. Por isso, no h movimento separado das coisas.

    A matria, dizia Aristteles, o princpio da individualizao e a forma, a essncia do indivduo. Por conseguinte, qualquer indivduo sntese de matria e forma.

    O devir a passagem do princpio individualizante (matria) manifestao individualizada (forma). Logo, a forma a individualizao da matria. O devir, portanto, a passagem da potncia ao ato, ou seja, da matria forma. a tendncia que tem todo indivduo de realizar a forma que lhe peculiar.

    S existe movimento, enquanto h matria a transformar-se em forma. Quando toda potncia se atualiza, ou seja, se transforma em ato, desaparece o movimento. Por isso, movimento imperfeio. A perfeio o ato.

    Tudo o que potencialmente foi. Tudo ser o que potencialmente . Atualidade e potencialidade so aspectos complementares.

  • Para o Jainismo, h seis estados da matria: a) o denso-denso ou fsico; b) o denso; c) o denso-sutil; d) o sutil-denso; e) o sutil; f) o sutil-sutil.

    Lecionava a Escola Vaisesika que os tomos so minsculos e indivisveis. Enquanto isolados, no tm dimenses fsicas e espaciais. Quando se combinam, formam tomos maiores e adquirem dimenses.

    Os tomos so homogneos, isto , da mesma espcie e natureza. Mesmo quando se combinam, no se misturam, conservando cada qual a sua individualidade.

    Os tomos finais ou elementares no foram criados por Ishvara, o Deus pessoal, porque so coeternos a ele. Ishvara, porm, tem o poder de formar as combinaes atmicas.

    Anaxgoras foi quem primeiro concebeu a matria como constituda de um nmero infinito de partculas elementares semelhantes (homeomerias), cujas combinaes do origem a todas as coisas. Essas partculas ou smenes so pequenssimas, invisveis e divisveis ao infinito. (A cincia hoje discute se toda a famlia atmica no passa de modificaes do hidrognio e ainda no encontrou uma partcula indivisvel.)

    A diferena entre as coisas, dizia Anaxgoras, no reside na qualidade, mas na quantidade dessas partculas elementares.

    Cada uma das homeomerias eterna e, por isso, "coisa alguma nasce e coisa alguma perece"- o que faz lembrar Lavoisier: "no universo nada se cria, nada se perde, tudo se transforma." Nascimento e morte nada mais so do que a reunio e a separao dessas partculas.

    Leucipo e Demcrito no separaram o Ser do Devir: eles no se excluem, mas se completam. O cheio e o vazio esto em todas as partes. Tudo constitudo de Ser (tomos, cheio) e de Devir (no-ser, vazio).

    Os tomos so slidos, indivisveis, qualitativamente idnticos e apenas diferindo entre si na forma, na ordem, na posio, no tamanho e no peso. Eles se movem no espao vazio, segundo uma lei necessria e natural. Tudo, portanto, ocorre na natureza, mecanicamente, sem qualquer finalidade ou interveno divina. (O materialismo da Escola Atomista substituiu a viso teleolgica do universo pelo determinismo mecanicista.)

    Os tomos so eternos, mas os corpos constitudos por eles, numa infinidade de formas e combinaes, so sempre efmeros. Nada, portanto, nasce do nada e nem volta ao nada. Tudo permanente transformao.

    Tudo o que existe no universo unio e separao de tomos.Leucipo argumentava que somente o indivisvel (tomo) pode ser limite do

    vazio (meatos ou poros). Se no houvesse o indivisvel, tudo se dissolveria no vcuo. Se no houvesse o vcuo, no se explicaria o movimento. E, porque existe o movimento, h necessariamente corpos em deslocamentos. E, se tudo fosse vcuo, no haveria movimento.(Aristteles reprovava os atomistas por no explicarem a natureza e a razo do movimento espontneo dos tomos, que se chocam mutuamente, repelindo-se em seus entrechoques contnuos, num eterno vai-e-vem. A cincia moderna, ainda influenciada pela Escola Atomista, tem buscado,

  • afanosamente, descobrir a partcula indivisvel, a qual, medida que o tempo passa, vai-se tornando uma abstrao matemtica.)

    Segundo o Epicurismo, os tomos e o vcuo so eternos e realizam combinaes pelo processo de erro e de acerto. Se no houvesse o tomo, tudo seria o nada. Por isso, a divisibilidade infinita um absurdo. (Atribui-se a Epicuro a teoria do cliname ou declinao, que consiste na possibilidade de desvio espontneo dos tomos de sua direo inicial.)

    A natureza , assim, um conjunto de tomos materiais, cujos movimentos so aleatrios e no regidos por um determinismo rgido como afirmavam os atomistas. (O Epicurismo, neste aspecto, se aproxima do princpio da incerteza de Heisenberg.) A ordem csmica no , portanto, teleolgica e nela apenas sobrevivem os mais aptos. (Trata-se de uma antecipao de Darwin da sobrevivncia dos mais fortes.)

    Lucrcio declarava que a matria eterna e ela e o espao existem por si mesmos.

    Giordano Bruno, antecipando-se a Descartes, definiu a extenso como atributo diferencial da matria. Para ele, a matria una e tudo dela provm.

    Descartes afirmava, ainda, que a matria suscetvel de diviso ilimitada. Ela contnua e possui qualidades primrias ou objetivas e qualidades secundrias ou subjetivas.

    Na Fsica moderna, o atomismo surgiu, pela primeira vez, na discusso entre Newton e Huygens sobre a natureza da luz.

    No vislumbramos razes convincentes para a assertiva de que o nvel fsico da realidade de importncia secundria e caracterizado por imperfeies. Trata-se de mero juzo de valor, decorrente da nossa inabilidade de lidar com os problemas existenciais do mundo material e suas leis. Porque adoecemos, envelhecemos, sofremos e morremos, repudiamos estes fatos e, por um mecanismo de compensao, asseveramos que o mundo fsico necessariamente mau. E, assim, postulamos um mundo ideal, superior e perfeito, onde no adoecemos, no envelhecemos, no sofremos e no morremos.

    A irrealidade da matria

    Mahidasa Aitareya definia o real como tudo o que capaz de desenvolvimento. a transio do oculto ao manifesto. (Esta concepo de Aitareya se aproxima da doutrina aristotlica da matria e da forma.)

    Para o Budismo, o real a impermanncia. A mutabilidade a essncia de todas as coisas. Tudo um processo em permanente transformao.

    O que impermanente, porm, no irreal. Tudo o que passa e enquanto

  • passa, real. O que no mais no significa o que nunca foi.

    Herclito o primeiro insubstancialista do Ocidente: no h ser, tudo vir-a-ser. A realidade um permanente devir. O Ser o devir. O que real a mudana e s a mudana permanente. Tudo se move. Tudo muda. Tudo se resolve na alternncia dos contrrios. Ningum se banha duas vezes no mesmo rio.

    Lucrcio foi quem primeiro explicitamente observou:"Parece difcil aceitar que haja nos corpos alguma coisa toda slida."E repetiu:"Nada no Universo parece slido nas coisas."

    Nagarjuna asseverava que todas as coisas so destitudas de natureza prpria", pois s existem em relao umas com as outras.

    Leibniz j advertira que a matria no extensa, mas movimento e multiplicidade. Ela um conjunto de fenmenos logicamente ordenados. Um conjunto infinito de centros de fora, denominados de mnadas. A matria, assim, na sua essncia, fora.

    As mnadas so substncias simples, eternas, diferentes entre si qualitativamente e seu nmero infinito. Cada mnada fechada em si mesma. Elas no exercem ao recproca, porm se relacionam mutuamente, mediante o princpio da harmonia preestabelecida. Este princpio foi estabelecido por Deus, no ato da criao, determinando que as modificaes internas de cada mnada correspondam exatamente s modificaes internas de todas as demais. Assim, no necessrio que as mnadas interajam externamente.

    O universo uma hierarquia de mnadas, desde aquelas dotadas de pura percepo s mais elevadas, providas de razo e conscincia.

    H quatro tipos de mnadas: a) as mnadas nuas, que constituem o reino mineral e vegetal;b) as mnadas sensveis, constitudas das almas dos animais;c) as mnadas racionais, constitudas pelas almas humanas;d) a mnada suprema ou Deus.

    Giordano Bruno, antes de Leibniz, apresentou uma monadologia em que cada mnada espelho do universo. As mnadas tm alma e vida e esto sempre em transformao, sendo diferentes entre si e concorrendo para a harmonia e perfeio universal.)

    Com Leibniz, comea a derrocada da matria como substncia. A unidade da matria no mais de natureza fsica: o tomo de Leucipo e de Demcrito. Perde seu atributo de extenso, postulado por Descartes.

    Berkeley afirmou que a matria no existe: ela um conjunto de qualidades sensveis. Sua existncia no pode ser provada nem pela percepo sensvel, nem pela razo. As qualidades primrias e secundrias da matria so de natureza subjetiva. No h substncia material (por isso, a doutrina de Berkeley chamada

  • de "imaterialismo"), pois a nica Substncia o Esprito, o percipiente.Berkeley proclamava que o mundo uma representao de Deus e s existir

    enquanto Deus pensar nele. (Esta concepo de Berkeley idntico ao ensinamento da Escola Vedanta de que o mundo real enquanto Brahman pensa nele.)

    Hume afirmava que a natureza no passa de uma fico. A realidade so fenmenos subjetivos. No h substncia e o prprio eu um feixe de impresses psquicas. A substncia apenas uma constante associao de percepo resultante da experincia.

    Causa e substncia, tempo e espao no passam de criaes psicolgicas, poeira de fenmenos subjetivos. Acalentamos, porm, a crena de que existimos e de que o real existe. E isto o bastante para as nossas necessidades prticas.

    Para Fichte, o conceito de realidade o mesmo de atividade.

    Afirmava Hegel que a vida um processo dialtico. Cada momento, em si mesmo, no real, mas somente o no processo de que faz parte.

    O Universal no existe em si mesmo a no ser como abstrao. Ele no existe separado dos particulares, nem os particulares do Universal. Assim, o Absoluto tem por contedo os seus prprios momentos, mediante os quais se realiza.

    Embora imanente ao processo da realidade, o Absoluto , ao mesmo tempo, transcendente ao real, pois, em nenhum momento, o desenvolvimento da Natureza e da Histria o esgota ou com ele coincide plenamente.

    Deus e o homem, por isso, so momentos de um mesmo processo de realizao do Absoluto.

    Entendia Bergson que a realidade um fluxo incessante, onde nada persiste. um processo em perene criao.

    Afirmava ainda: "A realidade um processo de perene criao sem princpio nem fim, que

    no tem duas vezes a mesma fisionomia, mas assume a cada instante um aspecto imprevisvel: um fluxo incessante, onde nada persiste, uma continuidade mvel e viva, sem nenhuma diviso ou parte."

    Sustentava Bergson que a matria "lastreada de geometria". "Coisas e atos so apenas perspectivas tomadas por nosso esprito de tudo o que se transforma. No h coisas, apenas atividades."

    Bergson afirmava que a natureza, como exterioridade ou espacialidade, uma degradao do esprito.

    Assinalou Pietro Ubaldi que no se pode encontrar o ltimo termo da matria, "porque ele no existe." Na verdade, a substncia da matria "trajetria e relaes."

    E asseverou ainda: "A cincia da matria se reduz a uma cincia de relaes, a um puro processo

    lgico." Para Pietro Ubaldi, "o que real na vida no a forma, mas a trajetria do

    seu tornar-se."

  • E mais:"Todo mundo real no seu nvel, e iluso se visto de outros planos." "Todo

    mundo torna-se ilusrio, logo que olhado de um mundo mais alto."

    Allan W. Watts define a natureza como "um campo de relaes e no uma coleo de coisas."

    George Santayana argumentava que no h qualquer prova objetiva da existncia do mundo sensvel. Apenas aceitamos sua realidade por uma espcie de f animal.

    John Gribbin informa:"No mundo do quantum, s possumos aquilo que vemos e nada real. O

    mais que se pode conseguir ter um conjunto e iluses concordantes entre si." E, mais adiante: "Nada real, seno enquanto vemos."

    O poeta T.S. Elliot assim se expressava: "O real real apenas por um tempo e apenas para um lugar."

    Dizia S. Alexander que o mundo um conjunto de eventos e que o elemento primordial da realidade no o tomo, mas o evento.

    Edmund Husserl concebeu a realidade como um conjunto de atos e experincias do sujeito.

    Heisenberg comentou ser "difcil considerar a matria como verdadeiramente real".

    E arrematou:"Para a cincia natural moderna no h mais, no incio, objeto material,

    porm forma, simetria, matemtica."

    Bertrand Russel defendeu a "indubitvel realidade momentnea dos objetos sensoriais."

    Para ele, "a matria, em seu centro, est reduzida a uma simples fico matemtica."

    E sentenciou: "Agora, devido principalmente a dois fsicos alemes, Heisenberg e

    Schrdinger, os ltimos vestgios do velho tomo slido dissolveram-se e a matria tornou-se to fantstica quanto uma viso esprita."

    Por fim, assinalou:"O ponto principal para o filsofo na moderna teoria o desaparecimento da

    matria como "coisa". Ela foi substituda por emanaes de uma localidade - a espcie de influncias que caracterizam os quartos enfeitiados nas histrias de fantasmas."

    E concluiu:"A fsica moderna, por conseguinte, reduz a matria a um conjunto de

  • eventos que se deslocam para o exterior provenientes de um centro. Se existe algo mais no centro, ns ignoramos e irrelevante para a fsica."

    Para Ortega y Gasset, Simmel e Bertrand Russel, o real o conjunto de todas as perspectivas possveis.

    Alfred North Whitehead via o acontecimento como "a unidade das coisas reais." "Toda realidade unidade complexa" e o mundo " a multiplicidade das atualidades finitas que buscam uma perfeita unidade."

    Dizia Teilhard Chardin:"Atingindo o extremo de suas anlises, os fsicos no sabem mais se a

    estrutura que eles alcanaram a essncia da Matria que eles estudam ou, ento, reflexo de seu prprio pensamento."

    Arthur Koestler escreveu um rquiem final para a matria:"Todo um coro de laureados do Prmio Nobel da Fsica ergue sua voz para

    nos anunciar a morte da matria, a morte da causalidade, a morte do determinismo."

    Diz Jean Charon que a teoria quntica substituiu a noo de contedo fsico pela idia de ponto-acontecimento.

    Michael Talbot informa que Jahn e Dunne "acreditam que, em vez de descobrir partculas, os fsicos na verdade podem cri-las. Como evidncia, citam uma partcula atmica recentemente descoberta chamada anomalon, cujas propriedades variam de laboratrio para laboratrio."

    Em entrevista dada a Rene Weber disse David Bohm: "Homens como Heisenberg assumiram a postura, que consideravam

    platnica, de que a matemtica a essncia da realidade. Sentiam que a ordem matemtica se constitua em entidade objetiva na matria, sua entidade essencial. Mas a ordem matemtica alguma coisa muito, muito sutil, aproximando-se pela abstrao daquilo que em geral entendemos por esprito. Sempre se considerou o esprito uma coisa sutil, a que s vezes denominamos inteligncia. Depois os cientistas retrucaram: "No, no passa de um amontoado de molculas que avaliam as coisas"; mas por trs dessas molculas h algo ainda mais sutil, a matemtica, que governa tudo."

    Einstein criticou a vinculao da matemtica com a realidade, argumentando que "tanto quanto as leis da matemtica referem-se realidade, elas no so certas; e na medida em que so certas, no se referem realidade."

    Blavatsky lembrava que "o Ocultismo se baseia na natureza ilusria da matria e na divisibilidade infinita do tomo."

    A iluso a demonstrao de que nossos sentidos podem, em certas

  • circunstncias, descodificar de maneira diferente os estmulos recebidos do mundo exterior. A chamada "realidade virtual" outra constatao de que podemos ter percepes que sabemos no se originar do mundo exterior, mas de um programa de computador.

    A alucinao tambm nos proporciona uma descodificao de estmulos que, apesar de se originar de nossa mente, de uma sugesto hipntica ou ainda de uma vivncia teleptica, nos fornece uma forte impresso de experimentar um acontecimento objetivo.

    A realidade no apenas o que percebemos, mas tambm o que no percebemos. No somente o visvel, mas ainda o invisvel.

    Os progressos da cincia e da tecnologia vm, gradativamente, aumentando a nossa capacidade perceptual, visibilizando o que era invisvel e comprovando que o real no to somente o que reage nossa sensorialidade. A nossa estrutura sensorial detecta apenas uma insignificante parcela da realidade.

    A realidade virtual, oferecida por programas de computadores, se torna sucednea da realidade fsica e tambm simulaes de situaes que, um dia, podero tornar-se concretas. O computador antecipa vivncias e propicia amostragens experienciais de futuros provveis. O real fsico sofre a concorrncia do real virtual e passa a ser controlado, at certo ponto, por ele. Os futuros passam a ser experimentados como roupas e sapatos e, assim, escolhidos sob medida. E, (quem sabe?) at os gneros de morte possam ser, do mesmo modo, previamente experimentados e livremente escolhidos.

    Ento, de se perguntar: se a matria a forma como os nossos sentidos descodificam a realidade, o que so, afinal, a realidade e o observador? Eis, por certo, uma questo embaraante. Sentimo-nos reais, mas no sabemos o que a realidade, do mesmo modo como somos seres vivos e no sabemos o que a vida. Por conseguinte, se no sabemos o que a realidade, embora sintamos que somos seres reais, no sabemos tambm o que somos e porque somos estruturados deste jeito, percebendo a realidade segundo nosso modo de ser.

    Sob este ponto de vista, a realidade, para ns, sempre material, pois matria o modo como descodificamos a realidade. medida, portanto, que ampliamos as nossas extenses sensoriais, com o auxlio do arsenal tecnolgico, enlarguecemos o nosso mundo material, tanto a nvel microcsmico quanto a nvel macrocsmico. A matria, portanto, no ilusria. Ilusria a crena de que a matria, isto , a nossa forma de interagir com a realidade, toda a realidade. Assim, h, possivelmente, infinitos nveis de realidade e cada qual com a sua "materialidade" prpria.

    A matria como um modo de perceber a realidade

    Na verdade, chamamos de matria tudo aquilo que apreensvel pelos nossos sentidos ou por extenses artificiais dos mesmos. Matria, portanto, tudo aquilo que perceptualizamos. Por isso, medida que aumentamos a capacidade da nossa instrumentao tecnolgica, aumentamos o nosso universo material. Matria , assim, nosso modo de interagir com a realidade. A realidade no pois a matria, mas um modo de perceb-la, na conformidade de nossa estrutura sensorial.

  • A rigor, no existe uma matria em si como substncia da realidade, mas, sim, como forma de apreenso da realidade. A matria um constructo sensorial. Com isso no se quer dizer que no exista um mundo exterior, uma realidade objetiva. Afinal, o observador real. Mas a realidade no apenas o observador. A matria a maneira como a realidade se apresenta ao observador. Este no organiza a realidade tal como ela se apresenta aos seus sentidos. Ele a organiza como significado para si mesmo.

    Para Henry Margenau, a matria um constructo da mente.

    A matria, portanto, no existe l fora. So os nossos sentidos que criam a nossa realidade, descodificando os estmulos recebidos do mundo exterior. O conjunto de todos esses estmulos nos proporciona a impresso da "realidade" da matria. Assim, as "propriedades" da matria - forma, cor, peso, aroma, sabor, impenetrabilidade - so descodificaes da nossa estrutura sensorial e no de uma matria real fora de ns. A matria o modo como descodificamos a realidade.

    A unidade da realidade fsica

    Digenes de Apolnia postulava que "todas as coisas so diferenciaes de uma mesma coisa e so a mesma coisa."

    Giordano Bruno tambm afirmava que "tudo est em tudo, mas no totalmente e sob todos os modos em cada indivduo."

    E ainda: "Toda coisa una, mas no sob o mesmo modo."

    Fritjof Capra alerta que, na Fsica moderna, o universo experimentado como "um todo dinmico e inseparvel, que sempre inclui o observador, num sentido espacial", o que nos faz lembrar o Ser homogneo e indivisvel de Parmnides.

    Diz ainda: "Na teoria quntica, somos levados a reconhecer a probabilidade como uma

    caracterstica fundamental da realidade atmica, que governa todos os processos e at mesmo a prpria existncia da matria. As partculas subatmicas no existem com certeza em pontos definidos; em vez disso, apresentam "tendncias a existir"; de forma semelhante, os eventos atmicos no ocorrem com certeza em momentos definidos e de um modo definido mas, em vez disso, apresentam tendncias a ocorrer."

    E, mais adiante:"A teoria quntica revela assim um estado de interconexo essencial do

    universo. Ela mostra que no podemos decompor o mundo em suas menores unidades capazes de existir independentemente."

    Esclarece ainda: "No nvel atmico, ento, os objetos materiais slidos da Fsica clssica

    dissolvem-se em padres de probabilidades, e esses padres no representam probabilidades de coisas mas, sim, probabilidades de interconexes." Uma partcula elementar, portanto, ", em essncia, um conjunto de relaes" e "o

  • mundo afigura-se assim como um complicado tecido de eventos." E prossegue:"O campo quantizado concebido como entidade fsica fundamental, um

    meio contnuo que est presente em todos os pontos do espao. As partculas no passam de condensaes locais do campo, concentraes de energia que vm e vo, perdendo dessa forma seu carter individual e se dissolvendo no campo subjacente. Nas palavras de Einstein: "Podemos ento considerar a matria como constituda por regies do espao nas quais o campo extremamente intenso. [...] No h lugar nesse novo tipo de Fsica para campo e matria, pois o campo a nica realidade."

    Geoffrey Chew, com a sua filosofia do "bootstrap" ou "presilha de bota" rejeita a idia mecanicista do universo e o entende como uma teia dinmica de eventos interrelacionados, onde nenhuma das propriedades desta teia fundamental. Na verdade, estas propriedades so aparentes e decorrem das propriedades das outras partes. a consistncia global destas inter-relaes recprocas que determina a estrutura de toda a teia. Assim, cada partcula consiste em todas as demais partculas.

    Por sua vez, j observara Schrdinger:"Uma partcula no individual. Realmente, as mesmas partculas nunca

    so observadas duas vezes."

    A partcula, como tal, no existe. A realidade constituda da interao recproca de campos: o campo eletrnico, o campo protnico, o campo eletromagntico e o campo gravitacional. A substncia destes campos vibratria e as partculas aparecem como manifestaes "materiais" dos mesmos. Os fsicos j comeam a observar que o que caracteriza um campo a sua simetria invarivel.

    A realidade uma substncia qualitativamente contnua e quantitativamente descontnua. Ela constituda de mltiplos nveis fenomnicos.

    J se admite, cientificamente, que no h vcuo absoluto: h sempre um campo eletromagntico residual.

    No existem tomos, pois, como reconhece Fritjof Capra, tudo parece sugerir que "as partculas so processos em vez de objetos."

    A Fsica quntica, postulando uma nova viso da realidade, inverteu toda a estrutura da Fsica clssica. Assim, enquanto para a Fsica clssica, o universo constitudo de elementos fundamentais, onde as partes determinam as propriedades do todo e toda causalidade local, a Fsica quntica estabelece que o universo um todo, constitudo de interaes, no existindo elementos fundamentais, onde o todo determina as propriedades das partes e a causalidade no-local, decorrente do prprio todo e, portanto, estatstica.

    Por isso, Paul Davies ressaltou:"A fsica quntica o nico ramo da cincia no qual faz sentido falar em

    efeitos sem causa."Esta observao se concilia com o "princpio da sincronicidade" de C.G.

    Jung.

  • A fsica quntica, ao postular a interconexo de todas as coisas e, conseqentemente, o princpio da inseparabilidade, validou a concepo do ser homogneo de Parmnides.

    Cleve Backster, inventor do polgrafo, descobriu que as clulas removidas do corpo e colocadas em outro aposento apresentavam as mesmas reaes aos estmulos recebidos pelo organismo, como se ainda estivessem ligadas a ele, numa espcie de telepatia celular.

    Isto nos leva a uma reflexo sobre os processos de bruxaria, que utilizam secrees humanas para influir sobre o organismo de onde se originaram. Evidentemente, estes dejetos orgnicos - sangue, smen, cuspe, cabelos - devem ser utilizados enquanto as clulas estiverem vivas e em conexo teleptica com o organismo de origem. Ou seja, o feitio deve ser feito em tempo curtssimo, a menos que as clulas sejam, artificialmente, preservadas vivas.

    Natureza, universo, vida

    A Escola Vaisesika distinguiu seis categorias do universo:a) a Substncia (Drava);b) as qualidades da Substncia;c) a ao (karma), que o movimento inerente Substncia;d) a generalidade inerente Substncia;e) a separabilidade ou individualidade atmica; f) a coerncia (Samavaya).Separabilidade - Todas as substncias so constitudas de um nmero

    ilimitado de tomos, de cujas combinaes surgem todas as formas fsicas e mentais, como tambm todos os fenmenos.

    Coerncia - Todas as partes de certas coisas inseparveis so conservadas juntas nos seus respectivos lugares.

    Natureza e universo, na verdade, so sinnimos. Podemos, ento, dizer que eles so a universalidade de tudo o que existe e o conjunto de leis e princpios que regem o mundo material.

    Podemos chamar de Vida a um conjunto de seres dotados de propriedades especiais, no constituindo, porm, uma categoria isolada da realidade. No h, assim, uma separao essencial, mas conceitual, entre o que chamamos de orgnico e inorgnico.

    Sob este enfoque, morte no o que deixou de ser, mas o que perdeu as propriedades do que se conceituou por vivo. "Morto" ou inorgnico, "vivo" ou orgnico so entidades reais e interagem entre si, sob aspectos especiais.

    Lynn Margulis e Dorion Sagan destacam o importante papel das bactrias no universo biolgico, demonstrando o que temos aprendido com elas:

    "Os sistemas informativos humanos s atualmente principiam a aperceber-se dos antigos sistemas bacterianos que tm procedido ao intercmbio de

  • informao, tal como uma rede de computadores com memria acumulada ao longo de bilies de anos de funcionamento contnuo. Ao transitarmos da idia puramente mdica acerca dos micrbios para a idia de estes representarem os nossos antepassados, os nossos ascendentes planetrios, isso faz mudar tambm as nossas emoes, que passam do medo e do dio ao respeito e admirao.

    As bactrias inventaram a fermentao, a roda - sob a forma de motor protnico rotativo a que j aludimos - a respirao do enxofre, a fotossntese e a fixao do azoto muito tempo antes de havermos aparecido na Terra. As bactrias so no s seres muitssimos sociais como se comportam tambm como uma espcie de democracia descentralizada escala mundial. As clulas permanecem basicamente separadas, mas podem ligar-se e permutar genes com organismos dotados de antecedentes muito distintos. A conscincia de que tambm os seres humanos individuais se acham separados, mas podem associar-se e trocar conhecimentos com outros muito diferentes representar, porventura, um passo rumo antiga sabedoria do microcosmo."

    Observaram a extrema capacidade de as bactrias se adaptarem a novas situaes emergentes, permutando, rapidamente, informaes entre si, "demonstrando de forma inequvoca o poder e a eficcia da sua rede de comunicaes." Porque, dizem eles, "na natureza, a bactria nunca funciona como indivduo singular."

    E destacam, ainda:"O meio ambiente est to interligado s bactrias e to importante a

    influncia exercida por estas que, em boa verdade, se torna impossvel dizer com certeza onde termina a vida e onde principia o reino inorgnico da no vida."

    As bactrias so os tijolos inteligentes da vida, a memria microcsmica da vida, sua fonte mantenedora e criativa.

    O nosso corpo uma nao de bactrias, que trabalham harmoniosamente dentro de um invejvel princpio de solidariedade social. Como as bactrias so basicamente instrues, geralmente, de maneira inconsciente, "falamos" com elas, transmitindo-lhes ordens atravs da nossa conduta perante a vida. E elas se comportam segundo as instrues recebidas, assegurando a estabilidade orgnica ou produzindo os mais diversos tipos de patologia.

    Os vrus so os grandes viles do universo informtico das bactrias, pois constituem um conjunto de informaes degeneradas e a personificao da anti-ordem.

    A grande iluso do homem de vencer as bactrias, motivada pelas descobertas de Pasteur, hoje de desvaneceu ante a realidade do fenmeno da resistncia bacteriana aos mais poderosos antibiticos. As bactrias so mais experientes do que o ser humano. E tudo nos aconselha a conviver pacfica e produtivamente com elas do que tentar destru-las, quando, na verdade, somos os responsveis por sua rebelio. As bactrias, por sua experincia de quatro bilhes de anos, conhecem mais a vida do que os seres humanos, os quais muito lucraro se agirem como seu scio na milenar aventura da evoluo biolgica.

  • A afirmao de Lynn Margulis e Dorion Sagan sobre o ser humano dolorosamente verdadeira:

    "No verdadeiro sentido, somos parasitas do microcosmo."

    E tambm no somos os melhores, porque de todos os organismos multicelulares os insetos so os mais bem sucedidos, existindo, at o momento, mais de setecentas mil espcies. Isaac Asimov, no entanto, estimou o nmero de espcies em trs milhes e sua quantidade em um bilho de bilho, cujo peso total maior do que o de todos os demais seres biolgicos juntos.

    O que a natureza

    Ensinava Aitareya que a natureza um todo interrelacionado.

    Plotino concebeu a natureza como o esprito tornado "exterior" e, por isso, degradado de seus caracteres.

    Para Giordano Bruno, "a natureza ou o prprio Deus ou a virtude divina que se manifesta nas coisas."

    Nicolau de Cusa definia a natureza como "o Esprito esparso e contracto por todo o universo e por todas as suas partes em particular.

    Galileu interpretava a natureza como a ordem do universo, uma ordem que nica e que nunca foi e nem ser diferente.

    Kant distinguiu, na natureza, duas modalidades: a) o conjunto de todos os fenmenos;b) a regularidade dos fenmenos no tempo e no espao.

    Hegel via a natureza como apenas necessidade e acidentalidade, destituda de qualquer liberdade.

    Schelling, um dos representantes da escola dos filsofos da natureza, fundada por Oken, afirmava que a Natureza o "Esprito adormecido", que emerge, ao longo da evoluo, at tomar conscincia de si mesmo no homem. Ela no uma representao da conscincia, como pensava Fichte, mas a pr-histria da conscincia e os graus de sua evoluo.

    A Natureza a manifestao exterior da razo em sua totalidade, desenvolvendo-se por fora de sua dialtica interna. A realidade, assim, no depende da subjetividade emprica, porque da Natureza nasce o Esprito e no o contrrio. Ela a inteligncia petrificada.

    O mundo no apenas a revelao, mas a realizao de Deus.A Natureza to real quanto o eu. Ela que fornece ao eu o material que ele

    o reproduz. A essncia do eu o esprito. A da Natureza, a matria. E a da matria, a fora.

    Originalmente, a Natureza e a conscincia formam uma unidade.

  • A Natureza, e no o eu, que possui uma atividade infinita.A Natureza dotada de vida autnoma e criadora.

    Goethe concebia a Natureza como um grande todo, que se manifesta num infinito nmero de formas em constante evoluo

    No h simetria na natureza. Toda simetria aparente e, via de regra, resulta de uma criao da mente humana.

    Os gregos geometrizaram a natureza. Hoje, a geometria fractal desfez este milenar equvoco.

    A geometria, como bem acentuara Poincar uma questo de comodidade. E enfatiza que nenhuma geometria mais verdadeira que outra e, sim, mais vantajosa. Por conseguinte, a geometria euclidiana " e continuar sendo a mais cmoda."

    Tem razo Heinz R. Pagels:"Se as simetrias da natureza fossem perfeitas, ns no existiramos."(A dissimetria que produz o movimento. A sutil predominncia de um plo

    sobre outro em cadenciada alternatividade.)E diz ainda: "Os fsicos acreditavam que conseguiam capturar toda a natureza na sua

    rede de matemtica. Tudo o que tivesse ocorrido, at ao mais nfimo pormenor, podia ser determinado. Mas, surpreendentemente, com a moderna fsica quntica foi abandonada a idia de uma descrio matemtica de toda a natureza. Acontecimentos qunticos individuais, como a desintegrao de um ncleo atmico, no esto sujeitos a nenhuma lei matemtico-fsica; s a distribuio desses acontecimentos, mdias tomadas em relao a um grande nmero deles, est sujeita s leis da teoria quntica. As leis da fsica no so determinsticas, mas sim estatsticas, descoberta que implica o fim da descrio matemtica de toda a natureza."

    A geometria euclidiana uma simplificao formal da Natureza. Uma ordem imposta Natureza.

    A geometria dos fractais, postulada por Mandelbroth a conscientizao da multiplicidade formal da Natureza.

    O universo um ser vivo

    Ensinava Aitareya que entre o universo fsico e o universo orgnico s h diferena de grau.

    Pitgoras foi quem primeiro concebeu o universo como um ser vivo.Dizia que os planetas so filhos do sol, tendo sido gerados pelas foras de

    rotao e de atrao inerentes matria. Dotados de semiconscincia, derivada da alma solar, cada um deles possui um carter distinto e um papel especfico na evoluo. Cada planeta uma expresso diferente do pensamento divino e exerce uma funo especial na cadeia planetria.

  • O Jainismo tambm sustentava que o universo um organismo vivo, animado em todas as suas partes por mnadas vitais e eternas.

    Para o Estoicismo, o universo um animal vivente, racional e constitudo de alma (fogo e ar) e de corpo (gua e terra).

    Para Giordano Bruno, todas as coisas tm alma, porque tudo vivo no Todo.

    As religies orientais se reportam a existncia de uma memria da natureza a que deram o nome de registros akashicos. Tudo o que ocorreu no universo estaria registrado nesta memria csmica.

    Ramacharaca fez a seguinte observao:"A Natureza nos fornece muitos exemplos desta presena da vida no mundo

    inorgnico. Basta olharmos ao redor de ns para ver a verdade da afirmao que tudo vivo. Nos metais h um fenmeno chamado fadiga de elasticidade". A navalha cansa e requer repouso. As forquilhas tonantes perdem, at certo grau, a sua fora de vibrao e precisam descansar tambm por algum tempo. Os mecanismos nos moinhos e nas fbricas exigem seus "dias feriados". Os metais esto sujeitos a molstias e infeco, e foram envenenados e restaurados por antdotos. O vidro das vidraas, principalmente estando com manchas, est sujeito a infeces que se espalham de vidraa a vidraa."

    Jagadis Chandra Bose demonstrou que uma barra de ferro to sensvel como o corpo humano, podendo ser irritada e estimulada, envenenada e morta.

    E questionou:"Entre tais fenmenos como pode ser traada uma linha de demarcao que

    possa indicar onde termina o fsico e comea o fisiolgico?"

    Ramacharaca forneceu outro exemplo de vida mineral. Disse ele:"O mundo qumico e mineral fornece-nos muitos exemplos do crescimento

    e desenvolvimento de formas que se assemelham muito ao mundo vegetal. A chamada "vegetao metlica", como se v na "rvore de chumbo", nos d um interessante exemplo deste fenmeno. O experimento se faz, colocando numa garrafa de largo gargalo uma clara soluo acidulada de acetato de chumbo. Fechamos a garrafa com uma rolha, qual amarramos um arame de cobre; deste arame suspendemos um pedao de zinco de tal maneira que venha a tocar o centro da soluo do acetato de chumbo. Quando a garrafa estiver fechada com a rolha, o arame de cobre comea imediatamente a ser rodeado de um chumbo metlico, parecido com musgo fino. Deste musgo plmbeo nascem ramos e galhos, os quais, por sua vez, emitem folhas, at que se forma um arbusto ou uma rvore em miniatura. Semelhante "vegetao metlica" pode ser reproduzida tambm por outras solues metlicas."

    Wendell M. Stanley descobriu, experimentalmente, que a cristalizao no era a linha divisria entre a vida e a no-vida, pois os vrus so uma forma de vida

  • to simples que podem cristalizar-se. Por seu trabalho, ele recebeu, em 1946, parte do prmio Nobel da Qumica, juntamente com Northrop e Sumner.

    O padre Franois Brune assegura que os seus colegas Gemelli e Ernetti, da Universidade Catlica de Milo, inventaram uma mquina fantstica - o cronovisor - que era capaz de captar imagens e sons do passado. No entanto, em face ao perigo do mau uso desta mquina, na revelao de fatos pretritos, os seus autores resolveram desmont-la e silenciar sobre o esquema de sua construo.

    Se este fato verdadeiro, constitui uma prova experimental da existncia dos registros akashicos, conforme ensina o Ocultismo.

    James Lovelock, ao propor a sua hiptese de Gaia, restaurou, numa abordagem cientfica, a concepo anmica, que considera a Terra um organismo vivo e, portanto, auto-regulado.

    A Vida o Todo homogneo, indiferenciado. Os organismos vivos so individualizaes da Vida. O vivo a Vida encapsulada.

    Por isso, afirmam Lynn Margulis e Dorion Sagan que "desconhecem-se formas de vida destitudas de membranas de um ou de outro tipo". A individualidade biolgica nasceu de uma 'bolha de lpido", contendo, em seu interior, os aminocidos, os nucletidos, os acares simples, os fosfatos e seus derivados, valendo-se da energia fornecida pelo Sol e absorvendo, como alimento, o TFA e outros componentes de carbono e azoto, oriundos do exterior.

    Um ser vivo sem membrana no existe, como tambm no existe um ser vivo impermeavelmente fechado, sem contato com o mundo externo. Ou seja: o ser vivo s pode continuar vivo como indivduo se interagir com a Vida na qual ele est inserido.

    O que quer que nos parea absolutamente fechado no passa de uma iluso perceptual.

    O caos original

    Para a religio egpcia, o mundo se originou do caos.

    Anaxgoras concebeu o caos original, onde todas as coisas estavam juntas. Ento, o Nous (a mente) imprimiu um movimento na mistura original, resultando na criao do universo. Esta concepo se assemelha moderna teoria cosmolgica da singularidade.

    Georges-Henri Lemaitre, em 1927, lanou a idia de que o universo teria surgido de um ovo csmico que, explodindo, iniciou o processo de expanso. Esta hiptese de Lemaitre foi precedida, de sculos, pela concepo indiana de que cada universo um ovo de Brahman.

    A hiptese de que o universo nasceu de uma singularidade, que a mxima densificao da matria, implica na admisso de uma matria primordial e eterna,

  • na qual o tempo e o espao existiam em potencial at que se atualizaram com o big-bang.

    H uma hiptese cosmognica que afirma que no so as galxias que se afastam uma das outras, mas que elas se afastam entre si, porque o espao que se expande.

    Se o espao se expande, ele algo do qual as galxias, estrelas e planetas nada mais so do que condensaes do mesmo. O que disto resulta a concluso da existncia de uma expanso do Todo, seja pelo afastamento das galxias, seja pelo crescimento do espao.

    Se a singularidade a mxima contrao do espao e a mxima compresso da gravidade, o espao a substncia do Todo. Ou seja, todas as coisas nada mais so do que densificao do espao, no seu processo de expanso e descontrao ou de criao.

    A hiptese da singularidade, pois, no explica a criao do universo, pois a singularidade, mesmo que seja o mnimo algo, algo. E este algo eterno?

    Caos tudo aquilo no conseguimos ordenar ou descobrir uma ordem, dentro dos nossos padres convencionais. Caos a infinita variedade da natureza e ordem, a nossa forma peculiar de perceber uma dessas infinitas formas da natureza.

    Vivemos num tipo de ordem a qual, para muitos, parece ser a nica no universo. Por isso, o vezo de se denominar de caos tudo o que no se enquadra na nossa concepo de ordem. Na verdade, pode-se admitir outros tipos de ordem que a nossa estrutura ontolgica - sensorial e racional - no pode conhecer. Logo, o caos uma expresso genrica para balizar as fronteiras do cognoscvel e do incognoscvel.

    O que chamamos de caos a reciclagem da realidade.A teoria do caos, revelando a imprevisibilidade e a instabilidade de todas as

    coisas, rompe as estruturas do lgico, do racional e prestigia o milagre. Na verdade, o milagre um tipo especial de acaso.

    A natureza no ordem. A natureza no caos. A natureza ordem e caos.

    A eternidade do universo

    Ensinava o Vedismo que o universo, em si mesmo, eterno. Mas os mundos so efmeros. So os ovos de Brahman. Cada ovo um mundo.

    Brahman o Absoluto. No se deve confundi-lo com Brahma, o seu aspecto criador ou o Deus pessoal.

    O Jainismo pregava a eternidade do universo.

    Xenfanes assinalava que o universo imutvel e, por isso, no teve princpio e nem ter fim.

  • Criao & tempo

    Plato e Agostinho afirmavam que o mundo no foi criado no tempo, mas com o tempo. O mundo, portanto, no existia antes do tempo e nem tempo houve antes da criao do tempo.

    A hiptese de que o universo foi criado de algo no conflita com a de que ele foi criado com o tempo. Cada universo em particular tem seu tempo prprio, o qual est inserido no tempo de outro universo que o seu referencial e do qual faz parte como subsistema. Este, por sua vez, foi criado no tempo de outro universo, do qual se originou e seu referencial e assim indefinidamente. Para por fim a este regresso infinito, h de se admitir um universo-me do qual se originaram todos os demais universos. Este universo-me no foi criado no tempo, mas com o tempo, o tempo primordial e referencial de todos os tempos subseqentes ou tempos-universos. Neste universo-me no h que se questionar o seu quando, mas o de que ele foi criado

    Hubert Reeves assinala:"Mas, falando do universo, no se pode dizer que ele ocupa o espao e que se

    insere no tempo. Assim como a matria, tais dimenses que esto includas no universo. Seria mais apropriado dizer que o universo cria ele mesmo o espao que ocupa e o tempo em que se insere."

    A criao contnua do universo

    A Escola Snquia dizia que o universo criado, destrudo e recriado periodicamente - o Dia e a Noite de Brahman.

    Empdocles, em acordo com Anaxgoras, ensinava que o universo se formou pela reunio de corpos sutis e destrudo pela separao destes. Esse processo eterno, o que exclui a idia de nascimento e morte do universo como um todo. Demcrito e Epicuro tambm se filiaram a essa concepo.

    Clment Rosset observa que, para Empdocles, "o que existe no suscetvel nem de aumentar, nem de diminuir; no existe nada que seja realmente produzido pela natureza, apenas existem elementos que passam de uma forma (isto , de uma mistura, no de uma essncia) outra; nada existe que nasa, morra, perca-se, crie-se." (Trata-se de uma antecipao do pensamento de Lavoisier: na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma.)

    O Tantrismo ensinava que a criao contnua e que o Dia e a Noite de Brahman no diz respeito ao Universo inteiro, mas a cada um dos universos em particular.

    Para Leibniz, o universo um pleno contnuo. O vcuo, portanto, no existe. A criao uma ao contnua de Deus, porque todas as coisas n'Ele existem como possibilidades.

  • Entre todos os mundos possveis, Deus escolhe, por necessidade moral, o melhor de todos, dando-lhe existncia ou atualidade. Vivemos, por isso, no melhor dos mundos possveis. Esta concluso, embora metafisicamente racional, foi ridicularizada por Voltaire no seu romance "Cndido".

    A hiptese da criao contnua, de Thomas Gold e Hermann Bondi, postulando a existncia de um universo estacionrio, sem comeo nem fim, no satisfatria, pois a matria criada para preencher os espaos gerados pela expanso do universo, a fim de manter a densidade mdia da matria no universo, criada no tempo de um universo total.

    Universo infinito e infinidade dos mundos

    Anaximandro foi o primeiro a postular que o nmero de mundos infinito, asseverando, ainda, que o devir do universo cclico.

    Digenes de Apolnia, Leucipo e Epicuro tambm sustentaram que o universo infinito e constitudo de uma infinidade de mundos.

    Nicolau de Cusa e Giordano Bruno foram defensores da idia do universo infinito.

    Dimenses do universo

    A Escola Vaisesica ensinava que o universo composto de seis categorias: a) a Substncia (Drava); b) as qualidades da Substncia; c) a ao (Karma), que o movimento inerente Substncia;d) a generalidade inerente Substncia; e) a individualidade atmica ou separatividade (Vishesha), demonstrando

    que todas as substncias so constitudas de um nmero ilimitado de tomos minsculos e invisveis, de cujas combinaes procedem todas as formas de substncias, tanto fsicas quanto mentais, assim como todos os fenmenos;

    f) a coerncia (Samavaya), segundo a qual as partes de certas coisas inseparveis so conservadas juntas nos seus respectivos lugares.

    Os tomos, enquanto isolados, carecem de dimenses fsicas e espaciais. Mas, quando se combinam, formam tomos maiores e adquirem dimenses. Os tomos so homogneos, isto , da mesma espcie e natureza, e, mesmo quando se combinam, no se misturam, conservando cada qual a sua individualidade. Os tomos finais ou elementares no foram criados por Ishvara, mas so coeternos a ele. Ishvara, porm, tem o poder de formar as combinaes atmicas.

    Ishvara desaparecer com o seu universo, quando cessar o Dia de Brahman.Na Fsica, surgiu, recentemente, a hiptese das onze dimenses, segundo a

    qual ao nosso universo de trs dimenses espaciais e uma temporal, se acrescentam mais sete dimenses espaciais. Estas dimenses, apesar de ocultas, se manifestam atravs das foras, como, por exemplo, a fora eletromagntica.

  • Everett formulou a teoria dos universos paralelos, com base na Fsica quntica, mediante a qual, para cada possibilidade, existe um mundo paralelo, onde o evento realmente acontece. Assim, tambm, cada possibilidade do ser humano existe em seus mundos prprios e estes mundos e seus habitantes se desconhecem reciprocamente.

    H uma hiptese ocultista que afirma que o homem ocupa simultaneamente vrios corpos em dimenses diferentes.

    Para Pietro Ubaldi, h limites espaciais e limites evolutivos no universo. A matria no tem limites na direo espacial, mas somente na direo evolutiva. Isto : esse limite "no pode ser situado em determinado ponto do espao, mas pode s-lo em qualquer lugar onde ocorra a transformao da matria na sua superior fase de evoluo." Por conseguinte, "a dimenso que sucede terceira dimenso espacial no se encontra no espao", porque o universo individuado em trindades sucessivas ou unidades trinas. O espao acaba "num ponto em que o "onde" se muda em "quando", ou seja, no momento em que a dimenso espao se transforma em dimenso tempo.

    Diz Ervin Laszlo:"O processo que os cenrios clssicos consideram como representando o

    Universo na sua totalidade revela-se no ser, de fato, mais do que um elemento de uma seqncia de ciclos potencialmente infinita num universo multicclico. A realidade, de que pensvamos se constitua o universo, torna-se um "multiverso" - um todo indivisvel que elabora certas configuraes de matria em ciclos oscilantes, que avanam para os znites de vida e de complexidade e, portanto, para crebros e conscincias cada vez mais evoludos."

    Universo e ordem

    Pitgoras concebia o universo como uma ordem e, por isso, teria sido o primeiro a falar na "harmonia das esferas". A ele atribuda a criao da palavra "kosmos", significando ordem, beleza, correspondncia.

    Para Stephan Lupasco, no universo tudo constitudo de sistemas e subsistemas fsicos, biolgicos e psquicos e todo sistema funo de duas foras antagnicas, interagindo entre si, de tal maneira que, quando uma se atualiza, a outra se potencializa e, assim, alternadamente.

    Em 1956, Ludwig von Bertalanffy elaborou uma teoria geral dos sistemas, partindo da premissa da existncia da organizao em todos os nveis. Afirmou que o Universo uno, pois todos os nveis da realidade refletem a isomorfia de suas leis. Dizia ele que "se um objeto um sistema deve ter certas caractersticas gerais dos sistemas, qualquer que seja o sistema." Por isso, "uma grande parte do comportamento biolgico e humano situa-se alm dos princpios de utilidade, homeostase e estmulo resposta."

    Os sistemas vivos, portanto, so sistemas abertos e estes consistem numa atividade de troca da matria com o meio ambiente. Um sistema aberto pode,

  • assim, tender para um estado de organizao superior, passando de um estado inferior para aquele.

    Ilya Prigogine teorizou a existncia do que denominou de estruturas dissipadoras, que so sistemas abertos, onde sua forma ou estrutura mantida por uma contnua dissipao (consumo) de energia, constituindo, assim, uma integridade flutuante. Quanto mais complexo o sistema, maior a sua instabilidade, pelo aumento crescente das interaes de seu interior. Uma vez atingido o ponto crtico, essas flutuaes perturbam o sistema, resultando na reorganizao de suas partes e surgindo um novo sistema de ordem mais elevada.

    Quanto mais complexa uma estrutura qumica ou humana, maior quantidade de energia ter de utilizar para manter todas as conexes envolvidas.

    Prigogine postula a existncia de um princpio de auto-organizao nos organismos vivos, mediante o qual, embora interajam com o meio ambiente continuamente, so relativamente autnomos. Ou seja: essa interao com o meio ambiente no a causa de sua organizao como sistema. Eles, na verdade, se auto-organizam.

    David Bohm apregoa a existncia de dois tipos de ordem: a ordem explcita e a ordem implcita ou envolvida.

    A ordem explcita a que habitualmente se encontra na experincia ordinria e na fsica clssica.

    A ordem implcita aquela que se encontra alm do tempo e do espao e de natureza transcendente. Bohm acredita que exista uma srie indefinida de ordens implcitas devidamente hierarquizadas.

    Pierre de Latil reconhece: "A tendncia para a ordem o antiacaso, uma estruturao da causalidade

    interna para fugir s influncias externas e seguir apenas uma lei interna."

    Todo sistema uma priso. Mas, uma priso necessria.Porque somos seres limitados, a nossa experincia tambm limitada e

    limitante. Assim, organizamos nossa experincia segundo a nossa limitao. O que importa saber que a realidade transcende todos os sistemas. Mas,

    precisamos de um sistema como o nosso nicho da realidade. A teia a realidade da aranha. uma parte biolgica da aranha. Nela, a aranha vive, como se ela e a teia fossem um s organismo. Mas a teia no prende a aranha. Tal a lio.

    A teia do homem o sistema. O homem sistematiza seu viver e se locomove dentro do sistema. Depois, passa a acreditar que o sistema a nica realidade. O erro, portanto, no est no sistema, mas no homem que nele se aprisionou.

    Ordem e desordem so conceitos funcionais. Caos, para o homem, tudo aquilo que no se ajusta aos seus padres de ordem, a esquemas perceptuais inatos ou adquiridos.

    O caos no existe em si, mas referenciado a um dado sistema. Pensamos que a natureza paradoxal, porque acreditamos na repetibilidade absoluta das coisas. Pensamos que s verdadeiro aquilo que se repete.

    Se permanecermos, durante algum tempo, naquilo que denominamos de

  • caos, em breve descobriremos uma ordem no caos. A ordem hbito.

    Ordem e finalidade

    Aitareya j observava que a natureza "um sistema de finalidades."

    Plato apregoava que tudo tem uma finalidade e uma ordem inteligveis.

    Aristteles complementava o pensamento de seu mestre, afirmando que a natureza nada faz sem finalidade e que tudo tende ao timo.

    Ele ensinava que os seres eram dotados de entelquia (en = dentro e telos = finalidade), ou finalidade