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RECADO DO REI DOS PIRATAS...RECADO DO REI DOS PIRATAS Unir pessoas com ideais de trazermos novas ideias ao Libertarianismo foi uma das coisas mais especiais que aconteceu comigo em

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RECADO DO REI DOS PIRATAS

Unir pessoas com ideais de trazermos

novas ideias ao Libertarianismo foi uma das coisas

mais especiais que aconteceu comigo em 2018. O

artigo a seguir trata do assunto da

compatibilidade do cristianismo de Jesus com duas

vertentes: o Capitalismo e o anarco-comunitarismo.

A análise parte com algumas análises de textos da

doutrina cristã, e também de alguns textos de

autores anarco-comunitários e anarco-

capitalistas.

Por último e não menos importante,

desejo que você curta e acompanhe nossa página no

Facebook PIRATAS DO ROGER e se possível DOE AQUI em

nosso website (www.piratasdoroger.com/doacoes)

para que nosso trabalho, site, aquisições e

distribuição de conteúdo, continuem com todo o

empenho e dedicação.

NOS AJUDE NESTA LUTA. Nosso adversário

gasta trilhões de reais anualmente contra nós para

impressionar as pessoas de como o estado é bonzinho

e funciona. O que temos para rivalizar é uma ideia

pura, libertadora e forte, contamos com seu apoio.

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ÍNDICE

1.INTRODUÇÃO 4

2. VISÕES CONTRASTANTES SOBRE A PROPRIEDADE

PRIVADA 7

3. IMPLICAÇÕES 12

4. CONCLUSÃO 17

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1.INTRODUÇÃO

O livro Christian Anarchism: A

Political Commentary on the Gospels (Anarquismo

Cristão: Um Comentário Político dos Evangelhos),

de ALEXANDRE CHRISTOYANNOPOULOUS, sintetiza várias

perspectivas sobre o Cristianismo que possuem

implicações radicais para a filosofia política e

para a política do mundo real. Ao trazer as ideias

de vários autores importantes juntas em um único

volume, Christoyannopoulous traz uma visão

coerente de um conjunto eclético de escritos de

natureza popular e acadêmica. Ele também foi capaz

de preservar as diferenças de interpretação e de

abordagem, tecendo as disparidades em uma

narrativa consistente. A implicação dessa

narrativa é exemplificada nesta citação de Liev

Tolstói na primeira página do manuscrito.

"Cristianismo em seu senso real põe um fim ao

Estado. Isso fora entendido desde o princípio, e

por isso Cristo foi crucificado."

Ainda que haja muitas diferenças de

pensamento entre os autores que

Christoyannopoulous pesquisa, um é

significativamente mais divisível que os outros:

a forma das instituições que sociedades não

estatizadas deveriam promulgar. De importância

particular aos libertários está a disputa pela

propriedade privada. Em um lado da disputa estão

os anarcocomunitários, que afirmam que a

propriedade deve ser coletiva e posta a serviço do

coletivo. Por outro lado, estão os

anarcocapitalistas, que sustentam que a

propriedade privada é perfeitamente consistente

com os ensinamentos de Cristo. Meu objetivo aqui

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não é resolver definitivamente a disputa, mas

abordar esta pequena margem da discussão1. Sugando

das fontes consideradas por Christoyannopoulous,

eu digo que os cristãos anarcocapitalistas, até o

presente, desenvolveram uma teoria mais

consistente à que foi proposta pelos

anarcocomunitários. Essa consistência é nutrida

por suas ideias acerca da natureza da propriedade,

que é lastreada na tradição da lei natural. Em

contraste, cristãos anarcocomunitários não têm

qualquer teoria acerca da propriedade, logo não

podem estabelecer nenhuma relação consistente

entre propriedade, direitos do indivíduo e o bem-

estar da comunidade.

Enquanto meu objetivo é razoavelmente

estreito, o problema é de fato importante. A

relação entre grupos ideológicos e propriedade

privada é obviamente importante ao aprendizado de

uma sociedade livre. Mas devido a influência de

autores como Rand (1982) e Posner (1996), o estudo

do cristianismo partindo de uma perspectiva

libertária foi desencorajado de meios positivos.

Como Stringham (2006: 3) reconhece, isso é um erro:

"As ideias do Ocidente e suas instituições foram

pesadamente influenciadas e podem até mesmo

depender da religião...então desconsiderar

escritores religiosos significa ignorar potenciais

trabalhos importantes." Omitir estudos da tradição

1 A seguir, apresento vários dos argumentos mais importantes a favor e contra a propriedade privada na tradição anarquista cristã. Mesmo dentro dessa tradição, a questão mais estreita da propriedade privada recebe menos atenção do que o projeto político maior de justificar o anarquismo a partir de uma cuidadosa análise bíblica ou outros exercícios hermenêuticos. Obras famosas incluem Tolstói (1902? 2001) e Ellul (1991); menos fundamentalistas, mas ainda dignos de nota, são Yoder (1998), Eller (1987), Elliot (1990) e Andrews (1999). Veja Christoyannopoulous (2011: 14-17) para resumos, bem como a cobertura de “companheiros de viagem” (26-30) do anarquismo cristão que não se encaixam no escopo deste artigo.

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central da história e dos pensamentos do Ocidente,

leva para uma imagem incompleta do Libertarianismo

e limita a possibilidade do surgimento de discurso

intelectual relevante.2

2 *Alexander William Salter ([email protected]) é doutorando no Mercatus Center da George Mason University.

INFORMAÇÃO PARA CITAÇÃO DESTE ARTIGO:

Alexander William Salter. 2012. “Christian Anarchism: Communitarian or Capitalist?” Libertarian Papers. 4 (1): 151-162. DISPONÍVEL ONLINE: libertarianpapers.org e http://piratasdoroger.com/traducoes/anarquismo-cristão-comunistario-ou-capitalista

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2. VISÕES CONTRASTANTES SOBRE A

PROPRIEDADE PRIVADA

“Tudo, portanto, quanto desejais que os outros vos façam, fazei-o, vós

também, a eles. Isto é a Lei e os Profetas.”3

A crítica comunitarista à propriedade

privada feita pelos anarquistas cristãos é

decididamente de tom marxista.4

Christoyannopoulous nota que Liev Tolstói, o mais

prolífico (e provavelmente o mais importante)

escritor anarquista cristão, assume esta posição.

Tolstói alega que a própria instituição de

propriedade privada é exploradora: “Enquanto ela

afirma proteger o direito do indivíduo para com o

produto do trabalho dele ou dela, é na verdade

usada como um método para extrair, à força, esse

produto do seu proprietário legítimo, o

trabalhador” (Christoyannopoulous 2011:122). De

fato, Tolstói vai longe o bastante para

classificar o sistema econômico de sua época como

“escravidão” (citado em Christoyannopoulous 2011:

123) e argumenta que o dinheiro, ao invés de um

meio de trocas benéfico e (moralmente) inocente,

é outro instrumento de escravidão devido a sua

inseparável conexão com a extração violenta da

produção do trabalhador pelo Estado (124). Hugh

3 Mateus 7:12, Tradução CNBB.

4 Apesar deste tom, há pouca evidência de que os mais proeminentes pensadores anarquistas cristãos (com a exceção de Jacques Ellul, como será discutido mais adiante) admiravam as ideias de Marx. Tolstói em particular é cético ao marxismo (Christoyannopoulous 2011: 164, nota de rodapé 116). A maioria dos anarquistas cristãos rejeitam o chamado para a revolução de Marx, preferindo, ao invés disto, a mudança pacífica através do testemunho ao que eles consideram a verdadeira mensagem de Cristo (164-171).

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Pentecost, outro importante pensador anarquista

cristão, repete essas ideias, argumentando que a

maior injustiça é o direito (protegido pelo

Estado) de propriedade à terra: “um cobrador de

aluguel é exatamente como uma pessoa que compele

um homem faminto a entregar seu saco de ouro em

troca de uma migalha de pão” (citado em

Christoyannopoulous 2011: 122).

Outro anarcocomunitário citado por

Christoyannopoulous, considerado pelo autor como

estando apenas atrás de Tolstói em importância

(2011: 16), é Jacques Ellul, um influente

sociólogo e teólogo leigo do século XX. Ellul, ao

contrário de outros anarcocomunitários, foi

fortemente influenciado pelo pensamento marxista,

em especial a teoria da alienação. Esse tema é

evidente em seu trabalho mais extenso no assunto,

Anarchy and Christianity (1991) e se apresenta

proeminentemente na sua visão sobre economia. Em

Money and Power (1984: 20, ênfase no original) ele

escreve, “Um dos resultados do capitalismo que

vemos se desenvolver ao longo do século XIX é a

subserviência do ser ao ter. Esse resultado faz a

fidelidade ao capitalismo ser praticamente

impossível para um cristão.” Para que

“praticamente” não seja entendido erroneamente,

Ellul (1969: 31-31) faz uma explanação ainda mais

clara:

“O dever dos cristãos é demonstrar o real socialismo, isto é, o

cristianismo vivido inteiramente com a justa divisão de bens e igualdade

básica. Vamos alegremente adotar uma forma de vida social que se

encaixa melhor ao nosso tempo e que seja mais coerente com o

espírito do Evangelho. Deste modo nós evitaremos que confundam

Deus e a religião com os opressores dos pobres e dos trabalhadores.

Feudalismo, capitalismo e imperialismo são, de fato, os opressores.”

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Ao invés de ser exceção,

Christoyannopoulous mostra que essas crenças são

comuns entre anarquistas cristãos:

Anarquistas cristãos são, por esta

razão, céticos às teorias mais convencionais sobre

economia. Essas teorias tendem a ser articuladas

pelas classes sociais mais confortáveis,

previsivelmente exaltam o status quo como

sacrossanto, mesmo se reconhecido como levemente

injusto, e levam a propostas de emendas nem de

longe radicais o suficiente, já que elas se prendem

à preservação das bases do status quo. Enquanto

isso, a escravidão econômica das massas continua

inabalável. (124)

Deste modo, é visível que

anarcocomunitários cristãos são a voz predominante

entre as interpretações anarquistas do Evangelho.5

Por outro lado, Christoyannopoulous

aponta um longo ensaio de James Redfold como a mais

significante defesa do anarcocapitalismo cristão

(24).6 Redfold (2011:8) argumenta que a Regra de

Ouro, articulada por Cristo durante o Sermão da

5 Um autor incluído por Christoyannopoulous que não pode ser deixado de lado tão facilmente é Vernard Eller. Enquanto a mais importante contribuição dele ao pensamento anarquista cristão, Christian Anarchy: Jesus’s Primacy over the Powers (1987), lida com a resposta cristã apropriada às estruturas de poder mundiais, ele discorre sobre propriedade e posse em The Simple Life: The Christian Stance Towards Possession (1973). O tema do trabalho é a vida simples, e sua análise não descarta explicitamente a instituição da propriedade privada. Tampouco não se pode deixar de sentir a tradicional desconfiança anarco cristã da acumulação de riqueza em sua análise.

6 A apologia de Redfold, enquanto não publicada, é (até agora) a única defesa sistemática do anarcocapitalismo cristão. O trabalho dele essencialmente se encaixa com outras importantes elaborações online do pensamento anarcocapitalista cristão, como “Vine and the Fig Tree.”

Em contraste, outros escritores que publicam obras online neste assunto são frequentemente anarcocapitalistas na tradição de Murray Rothbard, que algumas vezes apresenta defesas bíblicas deste sistema.

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Montanha, leva naturalmente ao princípio de não

agressão - o reconhecimento de que a iniciação de

violência contra outro ser humano é, por

definição, imoral. Redford continua para mostrar

que, ao seguir esse princípio, a apropriação de

recursos não apropriados e a transferência

consensual (pacífica) destes recursos naturalmente

surge como consequência de seres humanos tentando

satisfazer seus desejos. Ademais, qualquer

tentativa de coletivizar a propriedade dos

recursos contra a vontade daqueles que

legitimamente os adquiriram seria uma violação do

princípio de não agressão e, deste modo, da Regra

de Ouro. Nesse sentido, a opinião de Redford é

coerente com as de Rothbard (1998) e de Hoppe

(2010).

Por conseguinte, a interpretação

capitalista do anarquismo cristão complementa a

filosofia da lei natural e sua visão sobre

propriedade.

De modo geral, esse ponto de vista

considera a autopropriedade como uma

característica auto evidente da existência. Desde

que alguém tenha propriedade de si mesmo, ele tem

o direito de iniciar quaisquer ações que acredita

que vão melhorar sua vida, desde que tais ações

não violem o princípio de não agressão, i.e., não

iniciem agressão contra a propriedade

(legitimamente adquirida) de outros. Neste

sentido, a propriedade privada é uma relação entre

homem e natureza que surge naturalmente, não um

instrumento artificial de exploração. Conquanto é

de fato possível que sua propriedade seja usada

para explorar ou ainda agredir outros, não existe

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uma razão a priori para que este seja o caso.7 De

fato, a instituição da propriedade privada,

devidamente compreendida, é a evasão do conflito

e da exploração, ao invés de sua fonte (Hoppe,

2004; ver também Demsetz, 1967, pela decisiva

elucidação positiva).

Essas crenças distintas sobre a

natureza da propriedade privada são melhor

ilustradas através da comparação com a posição de

cada lado sobre uma das mais controversas tensões

no pensamento anarquista cristão: o chamado de

Cristo por pacifismo de um lado e Sua limpeza do

templo de outro.

7 Essa formulação também vale para os “companheiros de viagem” da filosofia da lei natural, como a ética da virtude aristotélica (por exemplo, Rasmussen e Den Uyl 1991, 2005) e, desde que se limite apenas à teoria da propriedade, Objetivismo (por exemplo, Peikoff 1993).

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3. IMPLICAÇÕES

“Ouvistes que foi dito: 'Olho por olho e dente por dente'. Ora, eu vos

digo: Não ofereçais resistência ao malvado! Pelo contrário, se alguém

te bater na face direita, oferece-lhe também a esquerda! Se alguém

quiser abrir um processo para tomar a tua túnica, dá-lhe também o

manto!” 8

“Jesus entrou no templo e expulsou todos os que ali estavam vendendo

e comprando. Derrubou as mesas dos que trocavam moedas e as

bancas dos vendedores de pombas.” 9

Os anarcocomunitários cristãos são

quase exclusivamente pacifistas, tomando por

literal o mandamento de Cristo que diz para não

resistir ao mal pela força.10 Como

Christoyannopoulous observa: “De acordo com

anarquistas cristãos, o anarquismo está mais

próximo da 'ordem social' imaginada por Jesus do

que qualquer alternativa em que a força é um

componente’. Eles acreditam que o anarquismo

8 Mateus 5-38:40, Tradução CNBB.

9 Mateus 21:12, Tradução CNBB. Relatos alternativos, mais os ensinamentos de Cristo que se seguem, podem ser encontrados em Marcos 11:15-19 e 11:27-33, e Lucas 19:45-48 e 20:1-8.

10 Até mesmo Ellul, o anarcocomunitário cristão mais simpático ao marxismo, rejeita a violência. Ellul (1969: 127-128) reconhece as expedições da violência, mas a rejeita como um método de mudança social, preferindo resistir à violência ao abraçar a doutrina de Cristo:

“O que Cristo faz por nós é acima de tudo para nos libertar. O homem se torna livre através do Espírito de Deus, através da conversão e comunhão com o Senhor. Este é o único caminho para a verdadeira liberdade. Mas

ter a verdadeira liberdade é escapar da necessidade ou, ao contrário, estar livre para lutar contra a necessidade. Por isso, digo que apenas

uma linha de ação está aberta ao cristão que é livre em Cristo. Ele deve lutar contra a violência precisamente porque, à parte de Cristo, a

violência é a forma que as relações humanas normalmente e necessariamente assumem. Em outras palavras, quanto mais

completamente a violência parece ser da ordem da necessidade, maior é a obrigação dos crentes no Senhorio de Cristo de superá-la desafiando a

necessidade.”

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cristão é 'uma inevitável consequência do

pacifismo cristão’ (46). Assim, os anarquistas

cristãos comunitários rejeitam a força tanto no

nível da sociedade (guerra) quanto no nível

individual (direito de autodefesa ou ação penal

nos tribunais).11 Como eles conciliam essa posição

com o uso da força de Cristo em Sua limpeza do

templo?

A resposta, considerando as

justificativas apresentadas por

Christoyannopoulous, é “muito mal”.

Christoyannopoulous inclui a defesa de Elliot

(1990: 166) deste ato baseado na condenação de

Cristo do status do templo como um símbolo de um

sistema político-econômico repressivo. Outros

relatos (Yoder 1994: 42-43; Christoyannopoulous

2011: 85) titubeiam sobre se as ações de Cristo

podem realmente ser consideradas violentas. Ellul

(1969: 17) menciona a limpeza do templo como um

exemplo de justificativa da violência usada por

outros cristãos (normalmente não-anarquistas), mas

não a concilia com seu argumento pela não-

violência, além de fazer a suposição de que os

mandamentos de Cristo têm precedência sobre Suas

ações. Os versos mais reveladores, no entanto, são

as afirmações de Christoyannopoulous de que “a

maioria dos anarquistas cristãos… argumenta que

qualquer violência é extremamente limitada, e que

nunca é dirigida a pessoas” (85) e “… qualquer

violência usada tem como único propósito expulsar

animais e nunca é dirigido a seres humanos”. Esta

é uma tentativa desajeitada de racionalizar a

11 Tolstói (1902?; 2001), e, mais recentemente, Yoder (1960, 1992, 1994), são sem dúvida os pensadores fundamentais sobre esta questão.

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divergência entre as ações de Cristo e Seus

mandamentos.

A explicação anarcocapitalista cristã

evita esse problema ao empregar um argumento da

lei natural. Na tradição da lei natural, qualquer

agressão à propriedade de uma pessoa é equivalente

a uma agressão à pessoa em questão. A razão é

simples: a aquisição de propriedade requer o

dispêndio de recursos, mais fundamentalmente

esforço (trabalho) e tempo. Este investimento só

é realizado com base na premissa de que a

propriedade a ser adquirida irá mais do que

compensar a redução no bem-estar exibido pelo

gasto de esforço. Agredir as propriedades de

alguém, por exemplo, roubá-lo, deixa o

proprietário sem os frutos de seu trabalho, embora

ele já tenha gasto os recursos necessários para

adquiri-lo. A agressão contra a propriedade reduz

o bem-estar do proprietário através de uma redução

em seu sustento; é em essência uma agressão contra

o proprietário do imóvel enquanto ser humano. É

verdade que, em muitos casos, é menos grave do que

um ataque físico ao proprietário, mas essa

abordagem reconhece implicitamente que é apenas

uma diferença de magnitude. Conceitualmente, não

há diferença de tipo.12

Tomando o princípio de não-agressão

como primário, a única justificativa para um ato

de agressão é em resposta a uma agressão anterior.

O relato de Redford (2011: 33-34) defende a

agressão de Cristo contra os vendedores do templo

baseados nos atos de fraude dos vendedores, que na

12 Veja Rothbard (1970: 240-256; 1998: Parte II, especialmente os Capítulos 8-9) para um tratamento mais aprofundado.

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tradição da lei natural podem ser mostrados como

uma forma de agressão. Bryan Caplan (2009),

defendendo Rothbard, fornece um exemplo:

Se você aceitar a definição libertária inicial de “coerção” como o uso

não consensual da propriedade de outros, então a impossibilidade de

fraude segue. Se você me oferecer um projetor Mitsubishi 5500 em troca

de $2000 e me entregar uma caixa de palha, você está usando meus

$2000 sem meu consentimento (que estaria pressuposto, é claro, se

você me entregasse o projetor).

Assim, o uso da força de Cristo foi

justificado pelo ato anterior de agressão por

parte dos vendedores do templo. Essa agressão dos

vendedores do templo anulou qualquer título

legítimo de sua propriedade. Mas e o mandamento de

Cristo de dar a outra face? Redford (2011: 34)

afirma que a natureza divina de Cristo deu-lhe uma

visão sobre a fraudulência dos vendedores do

templo que não estaria disponível para os homens

mortais. Em outras palavras, Cristo estava na

posição única de saber que os vendedores do templo

estavam se comportando de maneira fraudulenta, de

modo que o uso da violência por Cristo era justo

e não violava o princípio de não-agressão (que,

lembre-se, provém diretamente da Regra de Ouro).

Mas homens mortais com conhecimento limitado só

poderiam suspeitar de comportamento fraudulento,

de modo que o mandamento de não-violência de Cristo

ainda se aplica a eles.13 Deste modo, os

13 Outra possível reconciliação afirma a interpretação consequencialista da mensagem pacifista de Cristo. Retaliação física a uma agressão sem fundamento, concebivelmente, se justifica com o argumento que a mensagem de Cristo postula um ideal para ser perseguido, não uma regra inflexível que deve ser aceita incondicionalmente, embora esta interpretação seja menos convincente.

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anarcocapitalistas cristãos da tradição da lei

natural, através da sua compreensão da instituição

da propriedade privada como fundada no princípio

da não-agressão, recorrem a uma teoria que mostra

que esta contradição não é contradição alguma. Os

anarcocomunitários cristãos, sem quaisquer

fundamentos coerentes fora de uma análise direta

das Escrituras, têm uma questão muito mais difícil

com a qual lutar.

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4. CONCLUSÃO

Anarcocomunitários cristãos são

forçados a confrontar a aparente inconsistência

entre os mandamentos de Cristo no Sermão da

Montanha e Suas ações durante a limpeza do templo.

Esta não é uma contradição por si só, mas um

resultado da falta de uma teoria sobre a natureza

da propriedade e sua relação adequada com o

indivíduo. Os anarcocapitalistas cristãos, que

incorporaram contribuições dos campos do direito,

da filosofia e da economia, encontraram uma

maneira de tornar coerentes essas ações

aparentemente opostas.

É claro que a posição

anarcocapitalista cristã está longe de estar

segura. A filosofia da lei natural é um programa

de pesquisa em andamento, o que significa que

existem questões não respondidas e desafios de

outras escolas de pensamento que também são

internamente consistentes. Tampouco são

inquebrantáveis as afirmações de Redford. Há amplo

espaço para divergências sobre as interpretações

de Redford, especialmente sua ênfase nas parábolas

de Cristo como uma justificativa para as

instituições do capitalismo. Também não foi

considerado aqui o devido lugar dos Atos dos

Apóstolos, das Epístolas de Paulo e do Apocalipse

dentro da tradição anarquista cristã. No entanto,

das duas tradições, o anarcocapitalismo cristão

tem pelo menos uma estrutura teórica que, devido

a seus fundamentos na lei natural, oferece uma

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explicação mais coerente de como um cristão que

deseja viver de acordo com os mandamentos de Cristo

deve estruturar sua vida e de como uma sociedade

cristã que vive fora do domínio do Estado deve

ordenar a si mesma. É certamente concebível que um

pensador na tradição anarcocomunitária cristã

descubra e adote uma estrutura teórica que supere

o dos anarcocapitalistas cristãos. No entanto,

seus atuais argumentos sobre a exploração do

trabalhador, que são inerentemente fundados em uma

comprovadamente falsa teoria do valor (apesar de

sua rejeição a Marx), não têm fundamento. Como diz

o ditado, é preciso uma teoria para vencer uma

teoria. Até que os anarcocomunitários cristãos

adotem uma estrutura teórica consistente, a sua

atual tende a ser a interpretação menos

justificável.