REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E TRABALHO DOCENTE: Um

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLNDIA

    FACULDADE DE EDUCAO

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM EDUCAO MESTRADO

    ROSANA MENDES MACIEL

    REESTRUTURAO PRODUTIVA E TRABALHO DOCENTE:

    Um estudo sobre a reestruturao na educao bsica e os impactos no

    trabalho docente na rede estadual de Patos de Minas MG a partir da

    dcada de 1990

    Uberlndia

    2012

  • ROSANA MENDES MACIEL

    REESTRUTURAO PRODUTIVA E TRABALHO DOCENTE:

    Um estudo sobre a reestruturao na educao bsica e os impactos no

    trabalho docente na rede estadual de Patos de Minas MG a partir da

    dcada de 1990

    Dissertao, apresentada ao Programa de

    Ps-Graduao em Educao da

    Universidade Federal de Uberlndia, como

    requisito parcial para a obteno do ttulo de

    Mestre em Educao.

    rea de concentrao: Polticas e Gesto em

    Educao.

    Orientadora: Professora Dr Fabiane Santana

    Previtali.

    Uberlndia

    2012

  • Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)

    Sistema de Bibliotecas da UFU, MG, Brasil.

    M152r

    2012

    Maciel, Rosana Mendes, 1983-

    Reestruturao produtiva e trabalho docente : um estudo sobre a

    reestruturao na educao bsica e os impactos no trabalho docente na

    rede estadual de Patos de Minas MG a partir da dcada de 1990 / Rosana

    Mendes Maciel. - 2012.

    135 f. : il.

    Orientadora: Fabiane Santana Previtali.

    Dissertao (mestrado) Universidade Federal de Uberlndia, Programa

    de Ps-Graduao em Educao.

    Inclui bibliografia.

    1. Educao - Teses. 2. Educao de base Patos de Minas (MG)

    Teses. 3. Professores de ensino fundamental Teses. 4. Educao e estado Teses. I. Previtali, Fabiane Santana. II. Universidade Federal de

    Uberlndia. Programa de Ps-Graduao em Educao. III. Ttulo.

    CDU: 37

  • ROSANA MENDES MACIEL

    REESTRUTURAO PRODUTIVA E TRABALHO DOCENTE:

    Um estudo sobre a reestruturao na educao bsica e os impactos no

    trabalho docente na rede estadual de Patos de Minas MG a partir da

    dcada de 1990

    Dissertao, apresentada ao Programa de

    Ps-Graduao em Educao da

    Universidade Federal de Uberlndia, como

    requisito parcial para a obteno do ttulo de

    Mestre em Educao.

    rea de concentrao: Polticas e Gesto em

    Educao.

    Uberlndia, 06 de maro de 2012.

    Banca Examinadora

    _______________________________________________________

    Prof Dr Fabiane Santana Previtali Orientador

    Universidade Federal de Uberlndia - UFU

    _______________________________________________________

    Prof. Dr.Carlos Alberto Lucena Avaliador

    Universidade Federal de Uberlndia - UFU

    _______________________________________________________

    Prof. Dr. Ricardo Luiz Coltro Antunes

    Universidade Estadual de Campinas -UNICAMP

  • Aos meus pais Pedro e Samira, pela fora,

    apoio e carinho e por suportarem minha

    ausncia e acalentarem meu corao nos

    momentos da caminhada dessa conquista.

    Vocs so eternos em meu corao.

  • AGRADECIMENTOS

    O caminho longo e conta com a participao ativa de vrios atores. Este trabalho

    parte de minha histria de vida, importante agradecer a participao de diversas pessoas

    neste processo de evoluo, que no s acadmico e profissional, mas principalmente,

    humano e pessoal.

    Agradeo a Deus pelas bnos derramadas em minha vida e pela fora para sempre

    continuar lutando. Sem Ele, nada na vida seria possvel.

    Aos meus pais, Pedro e Samira, pelo apoio incondicional, principalmente nos

    momentos mais difceis. Obrigada por estarem sempre presentes em minha vida! No existem

    palavras para expressar o amor e a gratido que sinto por vocs.

    s minhas irms Patrcia e Isabella, pelos exemplos de superao e fora, e por me

    apoiarem nos momentos mais importantes dessa caminhada. A vocs, meu amor eterno.

    minha orientadora Professora Fabiane Santana Previtali, um exemplo de dedicao

    profissional, agradeo primeiramente pela confiana em acreditar no meu trabalho,

    encorajando-me nos momentos de encruzilhadas e incentivando a entrar cada vez mais no

    fascinante mundo da pesquisa. Obrigada pela clareza de suas explanaes!

    todos os companheiros do Grupo de Pesquisa Trabalho Educao e Sociedade que

    compartilharam discusses e contriburam bastante para o desenvolvimento deste trabalho.

    Aos meus amigos e afilhados Cinval e Jane, pelo exemplo de vida e garra! Agradeo

    por acreditarem em mim e me incentivarem a lutar por meus sonhos.

    Aos meus tios queridos, Carlos e Patrcia, pelo carinho e por acreditarem em mim

    desde o incio e me mostrarem que, se construirmos uma base slida, todos os sonhos so

    possveis.

    A minha madrinha Cleide, pelo exemplo de profissional da educao e pesquisadora

    dedicada. Obrigada por clarear meus caminhos para a pesquisa.

    Aos funcionrios e docentes do programa de Ps Graduao da Faculdade de

    Educao da UFU, pela cordialidade e dedicao com que executam seus trabalhos. Aos

    professores, muito obrigada por proporcionar-me o aprendizado do conhecimento e da

    pesquisa nos caminhos da educao.

  • A Carlos Lucena e Robson Frana pela rica contribuio no momento da

    qualificao.

    A todos os meus familiares, tios, primos, que compem uma grande e maravilhosa

    famlia.

    Aos meus amigos queridos, pela compreenso da minha ausncia e incentivo nessa

    jornada. Principalmente Maristela, Elis e Vanessa.

    s amigas Amanda, Kelly e Juliana, pelo grande auxlio nessa caminhada. A vocs,

    muito obrigada!

    diretoria do Sindicato nico dos Trabalhadores de Minas Gerais, regional Patos de

    Minas, em especial, Sheyla, Maria Mnica e Mnica, pela ateno, cordialidade e por

    enriquecerem essa pesquisa.

    Capes, pelo incentivo por meio da bolsa concedida no perodo de maro de 2010 a

    maro de 2012.

    A todos que estiveram comigo nesta caminhada, muito obrigada!

  • O significado das coisas no est nas

    coisas em si, mas sim em nossa atitude

    com relao a elas.

    Antoine de Saint Exupry

  • RESUMO

    O presente trabalho consiste na concretizao de uma pesquisa de Mestrado, pertencente ao

    Programa de Ps-Graduao Stricto Sensu em Educao da Universidade Federal de

    Uberlndia, na linha de pesquisa intitulada Polticas e Gesto em Educao. Trata-se do

    trabalho realizado atravs de leituras, debates e reflexes desenvolvidas no Grupo de Pesquisa

    Trabalho, Educao e Sociedade GPTES e conta com o apoio da Coordenao de

    Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior - CAPES. O estudo discute a reestruturao

    produtiva na esfera educacional e seus impactos no trabalho docente da rede pblica estadual

    de Minas Gerais, a partir de 1990 quando se intensificam as reformas educacionais no Brasil,

    particularmente em Patos de Minas - MG. Mais especificamente visa discutir os processos de

    proletarizao e precarizao do trabalho docente no que se refere intensificao do

    trabalho, condies de trabalho e controle sobre o processo de trabalho; contextualizar e

    reestruturao da educao e do trabalho docente no cenrio de mundializao do capital,

    especialmente no mbito nacional, face s reformas educacionais dos anos 1990. O estudo

    inclui reviso de literatura, anlise de documentos tais como Constituio Federal de 1988,

    LDB 9.394/96, Projeto Poltico Institucional, Plano de Carreira, Plano de Gesto, Resolues,

    Diretrizes de rgos responsveis por deliberar sobre polticas pblicas educacionais no

    Brasil. Tais reflexes esto fundamentadas em uma pesquisa emprica, realizada no municpio

    de Patos de Minas/MG. A hiptese que norteia a pesquisa que as mudanas introduzidas

    neste contexto tm conduzido intensificao e precarizao do trabalho docente uma vez

    que as exigncias do Estado frente s reformas educacionais ocorridas em Minas Gerais tem

    implicado em acrscimo de funes e maior controle do capital sobre o trabalho do professor.

    A pesquisa foi desenvolvida atravs da discusso terica acerca da articulao dialtica entre

    educao e trabalho, demonstrando tambm as modificaes ocorridas com o processo de

    reestruturao produtiva.

    PALAVRAS-CHAVE: Educao bsica. Trabalho docente. Reestruturao Produtiva.

  • ABSTRACT

    This work is the realization of a Master's Degree research , belonging to the Post-graduate

    studies in Education at the Federal University of Uberlndia, in the line of survey entitled

    "Policies and Management in Education." This is the work done through readings, discussions

    and reflections developed in the Research, Labor, Education and Society Group GPTES and

    have the support of the Coordination of Improvement of Higher Education Personnel -

    CAPES. The study discusses the restructuring of production in the educational sphere and its

    impact on teaching the public state of Minas Gerais, since 1990 when they intensify the

    education reforms in Brazil, particularly in Patos de Minas -MG. More specifically: to discuss

    the processes of proletarianization and impoverishment of the teaching regarding to the

    intensification of work, working conditions and control over the work process; context and

    restructuring of education and teaching in the scenario of globalization of the capital,

    especially at the national level, regarding to the educational reforms of the 1990s. The study

    includes literature reviews, analysis of documents such as the Federal Constitution of 1988,

    LDB 9.394/96, Institutional Policy Project, Career Plan, Management Plan, Resolutions,

    Guidelines for agencies responsible for deciding on educational policies in Brazil. Such

    reflections are grounded in empirical, research conducted in the city of Patos de Minas / MG.

    The hypothesis guiding the research is that the changes introduced in this context have led to

    intensification and precariousness of teaching, since the requirements of the State, in

    accordance with the educational reforms in Minas Gerais, have generated an increase of

    functions and greater control of capital over the teacher's work. The survey was developed

    through a theoretical discussion about the dialectical link between education and work, also

    showing the changes that occurred with the restructuring process.

    KEYWORDS: Basic education. Teaching. Productive restructuring.

  • LISTA DE ILUSTRAES E TABELAS

    FIGURA 1 - Processo de trabalho coletivo ........................................................................... 36

    FIGURA 2 - PIB mesorregies de Minas Gerais .................................................................. 84

    TABELA 1 - Composio da SEE-MG 2011 ....................................................................... 80

    TABELA 2 - ndice de desenvolvimento humano em Minas Gerais em 2011 ....................... 85

    TABELA 3 - Populao residente por faixa etria e sexo-2009 ............................................ 85

    TABELA 4 - Relao de Estabelecimentos de Ensino (ativos), segundo a SRE, o municpio, a

    dependncia administrativa e a localizao, por etapa, nvel e modalidade de ensino. Minas

    Gerais - Outubro de 2011 ..................................................................................................... 89

  • LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

    ADI Avaliao Individual de Desempenho

    Aneb Avaliao Nacional da Educao Bsica

    Anresc Avaliao Nacional do Rendimento Escolar

    BIRD Banco Interamericano de Desenvolvimento

    CCQs Crculos de Controle de Qualidade

    CNTE Confederao Nacional dos Trabalhadores na Educao

    CUT Central nica dos Trabalhadores

    FJP Fundao Joo Pinheiro

    IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

    ICMS Imposto sobre Circulao de Mercadorias e Servios

    IDF ndice de Desenvolvimento Familiar

    IDH ndice de Desenvolvimento Humano

    IPEA Instituto de Pesquisas Econmicas Aplicadas

    LDB Lei de Diretrizes e Bases

    MEC Ministrio da Educao

    MG Minas Gerais

    ONU Organizao das Naes Unidas

    PIB Produto Interno Bruto

    PNUD Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento

    PROECI Programa Estadual de Centros Intermedirios

    SAEB Sistema Avaliao da Educao Bsica

    SEE/MG Secretaria Estadual de Educao de Minas Gerais

    SEMEC Secretaria Municipal de Educao, Cultura, Esporte e Lazer

    SindUTE/MG Sindicato nico dos Trabalhadores em Educao de Minas Gerais

    UNESCO Organizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a Cultura

  • SUMRIO

    INTRODUO .................................................................................................................. 23

    CAPTULO 1 - MUNDO DO TRABALHO E EDUCAO........................................... 27

    1.1 Consideraes sobre trabalho e educao.................................................................. 27

    1.2 Trabalho produtivo X trabalho improdutivo .............................................................. 35

    1.3 Trabalho material X trabalho imaterial ..................................................................... 37

    1.4 Dialtica entre educao e trabalho ........................................................................... 39

    CAPTULO 2 - REESTRUTURAO PRODUTIVA NA EDUCAO E O

    TRABALHO DOCENTE .................................................................................................. 45

    2.1 A Reestruturao Produtiva do Mundo do Trabalho.................................................. 45

    2.2 As reformas educacionais no contexto da reestruturao produtiva nos anos 1990 .... 56

    2.3 Trabalho docente e classe proletria ......................................................................... 67

    2.4 A especificidade do trabalho docente ........................................................................ 69

    2.5 Condies do trabalho docente e o processo de intensificao .................................. 74

    2.6 As reformas educacionais em Minas Gerais .............................................................. 76

    2.7 As condies de trabalho dos professores sob a tica da Secretaria Estadual de

    Educao de Minas Gerais - SEE/MG ...................................................................... 78

    CAPTULO 3 - A REESTRUTURAO NA EDUCAO BSICA E OS IMPACTOS

    NO TRABALHO DOCENTE EM PATOS DE MINAS/MG ........................................... 83

    3.1 Patos de Minas: uma histria ligada agropecuria e agricultura ........................... 83

    3.1.1 O surgimento da cidade e a educao pblica ......................................................... 86

    3.2 O olhar do Sindicato dos Trabalhadores da Educao de Minas Gerais- SindUTE

    sobre o trabalho docente ........................................................................................... 90

    3.2.1 Informaes gerais sobre o SindUTE Patos de Minas .......................................... 90

    3.2.2 A natureza do trabalho docente em Minas Gerais ................................................... 92

    3.2.3 O processo de reestruturao produtiva na educao em Minas Gerais: a viso do

    sindicato .................................................................................................................. 94

    3.2.4 Polticas de controle de qualidade em Minas Gerais ................................................ 95

    3.2.5 Sobre os processos de precarizao e intensificao do trabalho docente ................ 97

    3.2.6 As inovaes tecnolgicas ...................................................................................... 99

    3.2.7 Ao do SindUTE Patos de Minas frente ao Estado de Minas Gerais .................. 100

  • CONSIDERAES FINAIS ........................................................................................... 103

    REFERNCIAS ............................................................................................................... 107

    ANEXOS .......................................................................................................................... 119

    ANEXO A - Questionrio .................................................................................................. 119

    ANEXO B SindUTE Subsede Patos de Minas ................................................................. 128

  • INTRODUO

    O presente estudo insere-se no mbito das investigaes sobre polticas e gesto em

    Educao e tem como temtica a reestruturao produtiva na Educao, particularmente as

    reformas educacionais na educao bsica a partir da dcada de 1990 e seus impactos sobre o

    trabalho docente na rede estadual de Patos de Minas MG.

    O interesse por essa temtica iniciou-se na atuao como docente do ensino superior

    lecionando a disciplina Estgio Supervisionado para o curso de Educao Fsica por meio da

    qual, tive a oportunidade de conhecer mais de perto a realidade vivenciada pelos docentes nas

    escolas de educao bsica da rede estadual de Minas Gerais acerca das polticas pblicas

    educacionais brasileiras e principalmente nesse estado.

    Em 2008, j engajada nesse contexto participei do IV Simpsio Internacional: O

    Estado e as Polticas Educacionais no Tempo Presente da Universidade Federal de

    Uberlndia. Esse evento aguou minha curiosidade profissional em aprofundar na temtica da

    reestruturao produtiva do mundo do trabalho verificando como esse processo modifica o

    trabalho docente nas escolas estaduais do Estado de Minas Gerais, principalmente com o

    chamado Choque de Gesto do Governo Acio Neves.

    Sendo assim, o objetivo geral desse trabalho foi analisar a reestruturao produtiva,

    particularmente as reformas educacionais e seus impactos no trabalho docente da rede pblica

    estadual de Minas Gerais, a partir de 1990 quando se intensificam as reformas educacionais

    no Brasil e em Minas Gerais. Entende-se nesse trabalho que a partir das reformas

    educacionais dos anos 1990 tem havido um crescente processo de precarizao do trabalho

    docente no que se refere intensificao do trabalho, s condies de trabalho mais precrias

    e perda do controle sobre o processo de trabalho. Para tanto, buscou-se contextualizar a

    reestruturao da educao e do trabalho docente no cenrio de mundializao do capital,

    especialmente no mbito nacional, face s reformas educacionais dos anos 1990.

    O estudo incluiu reviso de literatura e anlise de documentos tais como Constituio

    Federal de 1988, LDB 9.394/96, Projeto Poltico Institucional, Plano de Carreira, Plano de

    Gesto, Resolues, Diretrizes de rgos responsveis por deliberar sobre polticas pblicas

    educacionais no Brasil.

  • 24

    Realizou-se ainda uma pesquisa emprica sobre a temtica junto ao Sindicato nico

    dos Trabalhadores em Educao - Sind-UTE da cidade de Patos de Minas/MG. Foram

    realizadas entrevistas com trs membros da diretoria do sindicato no 2 semestre de 2011.

    O estudo bibliogrfico envolveu a discusso sobre a temtica do capitalismo, inserida

    no conceito histrico da reestruturao produtiva do mundo do trabalho frente

    reconfigurao do cenrio poltico mundial. Analisou-se os peridicos de maior relevncia na

    rea em articulao com a atual literatura referente temtica abordada, com fundamentos

    tanto no pensamento clssico ou interpretaes do desenvolvimento brasileiro (Ricardo

    Antunes, Karl Marx, Harry Braverman, Franois Chesnais, Joo Bernardo, entre outros).

    Por fim, foram realizadas entrevistas com trs membros da diretoria do Sindicato

    nico dos Trabalhadores em Educao de Minas Gerais SindUTE/MG na cidade de Patos

    de Minas para anlise comparativa entre a literatura existente sobre a temtica e o discurso do

    SindUTE/MG.

    As entrevistas foram norteadas por questes fechadas e semi-abertas (Anexo 1), de

    forma a compreender-se como o sindicato que representa os professores da rede estadual,

    analisa a reestruturao produtiva na educao e seus impactos no trabalho docente, bem

    como de sua funo poltica em relao a esse processo. Foram analisados tambm,

    documentos fornecidos pelo sindicato (Anexo 2)

    De posse dos referenciais tericos e documentos legais, foi realizado um confronto e

    anlise de todos os dados encontrados no desenvolvimento da pesquisa.

    Para a anlise das entrevistas semi-estruturadas, foi verificada a freqncia das

    respostas apresentadas, bem como uma anlise crtica do contedo dessas respostas. As

    perguntas das entrevistas destinadas aos membros do Sindi-UTE foram construdas

    objetivando fornecer um diagnstico da situao vivenciada pelos professores frente s

    polticas pblicas de carter neoliberal em mbito nacional e estadual.

    importante destacar que a opo metodolgica por tais instrumentos e tcnicas

    proporciona uma maior liberdade e autonomia aos entrevistados quando confrontados pela

    temtica e questes abordadas. Foi diante desses aspectos que se estruturou a reviso da

    literatura pertinente ao tema abordado, trabalho e educao, dando a oportunidade de

    contextualizao do sistema educacional de Minas Gerais.

    O trabalho est dividido em trs captulos. No primeiro captulo apresentado o

    contexto do mundo do trabalho e da educao. analisada a especificidade do trabalho do

    educador de forma a possibilitar seu controle pelo capital nessa fase de acumulao

    capitalista.

  • 25

    No segundo captulo so analisados autores que se debruaram sobre o processo de

    reestruturao produtiva e os impactos no trabalho docente.

    J no terceiro captulo, discute-se a reestruturao produtiva na esfera educacional, e

    os impactos no trabalho docente na rede estadual de ensino de Patos de Minas/MG, atravs de

    entrevistas realizadas com membros da diretoria do Sind-UTE de Patos de Minas/MG.

    Por fim, nas consideraes finais, apresenta-se um balano geral da pesquisa

    desenvolvida, essencialmente fundamentada na anlise crtica de um entre vrios fenmenos

    que se desdobram das contradies do sistema de produo capitalista, por meio do qual

    possvel pensar nos rumos que a educao est tomando e nas condies de trabalho dos

    profissionais da educao.

  • CAPTULO 1

    MUNDO DO TRABALHO E EDUCAO

    1.1 Consideraes sobre trabalho e educao

    Os estudos sobre a temtica do trabalho demonstram uma contradio contextualizada

    de que o trabalho constri o homem, mas tambm o destri. Antunes (2006) afirma que o

    trabalho a categoria central para a formao do ser social, para a compreenso do sentido do

    processo de humanizao, libertao.

    Navarro e Padilha (2007) afirmam que no h trabalho humano sem conscincia

    (enquanto finalidade), na medida em que todo trabalho busca a satisfao de uma necessidade.

    O fator positivo do trabalho se encontra em seu sentido ontolgico. O trabalho a forma

    fundante do ser social, forma primeira ou protoforma da atividade humana, da prxis

    (ANTUNES, 2002). O trabalho se torna humano atravs do intercmbio entre o homem e a

    natureza, no qual ele a transforma de acordo com as suas necessidades e como consequncia,

    ele tambm se transforma.

    Para Marx (1989) o trabalho possui uma dimenso ontolgica, de criao da vida

    humana, considerando que o trabalho um processo histrico, atravs do qual o homem

    transforma a natureza e a si mesmo, tornando-se humano. Por ser o trabalho resultado do que

    j estava na mente humana, imprimindo na natureza seu prprio fim, o trabalho assume uma

    posio teleolgica, que d origem a uma nova objetividade.

    O trabalho humano teleolgico possui inteno, ele primeiramente planejado pelo

    homem como um projeto, com a finalidade de alcanar determinados objetivos. O homem

    adapta a natureza em funo de suas necessidades, influenciado pelas relaes sociais nas

    quais est envolvido. Assim, atravs do trabalho, os homens produzem historicamente a sua

    existncia e suas relaes sociais.

    A partir da leitura de Marx proposta por Lukcs, pode-se observar a emergncia do

    trabalho, compreendido enquanto prxis social humana, como principal categoria e centro da

    anlise materialista-histrica. O trabalho aparece aqui como forma de diferenciao entre o

    trabalho realizado pelo ser social e o trabalho executado pelo ser natural. Enquanto o segundo

    expressa a realizao de um trabalho instintivo, no primeiro observa-se a existncia de uma

  • 28

    teleologia, pois ao constituir-se em processo de mediao, converte-se em um processo que

    no existe na natureza.

    Ressalta-se a compreenso da prxis humana enquanto processo teleolgico. Ou seja,

    o ser social intervm na natureza atravs de construes mediadoras que a transformam.

    Trata-se de uma relao social estabelecida entre o homem e a natureza que realizada pelo

    trabalho. Neste sentido, a interveno humana baseada em uma teleologia transformadora

    que compreende o trabalho enquanto prxis, estabelecendo-se assim, uma relao dialtica

    entre o ser e o saber.

    Para Lukcs

    [...] o ser social em seu conjunto e em cada um dos seus processos singulares pressupe o ser da natureza inorgnica e orgnica. No se pode

    considerar o ser social como independente do ser da natureza, como antteses

    que se excluem o que feito por grande parte da filosofia burguesa quando

    se refere aos chamados domnios do esprito. Mas, de modo igualmente

    ntido, ontologia marxiana do ser social exclui a transposio simplista,

    materialista vulgar, das leis naturais para a sociedade, como era moda, por

    exemplo, na poca do darwinismo social. As formas de objetividade do ser

    social se desenvolvem, medida que surge e se explicita a prxis social, a

    partir do ser natural, tornando-se cada vez mais claramente sociais. Esse

    desenvolvimento, porm, um processo dialtico, que comea com um salto,

    com o pr teleolgico do trabalho, no podendo ter nenhuma analogia na

    natureza [...] (LUKCS, 1979, p.17).

    O trabalho compreendido como momento decisivo na relao do homem com a

    natureza, pois ele modifica a sua prpria natureza ao atuar sobre a natureza externa quando

    executa o ato de produo e de reproduo. Nesse sentido, o trabalho um ato que pressupe

    a conscincia e o conhecimento dos meios e dos fins aos quais se pretende chegar.

    Marx (1989) definiu o trabalho como

    ... um processo de que participam o homem e a natureza, processo em que o

    ser humano com sua prpria ao impulsiona, regula e controla seu intercmbio material com a natureza. Defronta-se com a natureza como uma

    de suas foras. Pe em movimento as foras naturais de seu corpo, braos e

    pernas, cabea e mos, a fim de apropriar-se dos recursos da natureza,

    imprimindo-lhes forma til vida humana. Atuando assim sobre a natureza

    externa e modificando-a, ao mesmo tempo modifica sua prpria natureza.

    (MARX, 1989, p. 202).

    Braverman (1980) entende que o trabalho , primeiramente, concebido como um

    projeto, no qual, atravs da significao humana, o homem se altera e altera o mundo como

    resultante desse processo.

    O trabalho apresenta-se como atividade essencialmente humana, por meio dele,

    defende-se a luta pela sua existncia. O homem na condio de ser social produz e reproduz a

    sua vida em sociedade e nesse processo, possibilita as prprias condies de sua reproduo.

  • 29

    esse aspecto que conota ao trabalho uma dimenso teleolgica (LUKCS, 1979). O

    homem determina um projeto previamente planejado intencionalmente por sua mente com um

    determinado fim. Esse fator de intencionalidade que o diferencia o trabalho humano do

    trabalho animal.

    O trabalho animal conseqncia do objetivo de um ato por instinto no qual o

    raciocnio inaltervel. J a construo realizada pelo homem pertencente a um projeto

    previamente gerado, que se torna complexo a todo o momento, visto que o homem sempre o

    aperfeioa atravs de suas construes mentais (LUKCS, 1979). Assim sendo pode-se

    afirmar que essa concepo resulta da materializao de sua subjetividade que

    invariavelmente influenciada e determinada pelas relaes sociais na qual est introduzido.

    Previtali e Vieira (2009) afirmam que nesta atividade construda da existncia

    humana que o trabalho obtm forma e atributos condicionados pelos fatores histricos e

    sociais. A partir do instante em que o homem interatua com a natureza modificando-a para

    satisfazer suas necessidades primordiais e por conseguinte altera sua prpria natureza, que os

    seres humanos se relacionam uns com os outros com a mesma finalidade, ou seja,

    estabelecem relaes sociais produtivas.

    exatamente nesse movimento que aparece a dimenso do trabalho como fator de

    negatividade do potencial do homem, esse o momento que separa o lugar no qual os homens

    se dividem em duas classes, com interesses opostos. De um lado encontra-se a chamada classe

    capitalista, que retm a propriedade dos meios de produo e, de outro, a denominada classe

    proletria, que possui apenas sua fora de trabalho. A relao entre as duas classes permite o

    dinamismo histrico.

    De acordo com Navarro e Padilha (2007)

    O capitalismo traz consigo uma srie de contradies, muitas delas

    relacionadas ao mundo do trabalho. Ao mesmo tempo em que o trabalho a

    fonte de humanizao e o fundador do ser social, sob a lgica do capital se torna degradado, alienado, estranhado. [] O trabalho perde a dimenso

    original e indispensvel ao homem de produzir coisas teis (que visariam

    satisfazer as necessidades humanas) para atender as necessidades do capital.

    Por conseguinte, o resultado final do trabalho no pertence ao trabalhador; o

    trabalho ento tem carter exterior ao do trabalhador. Essa ento, uma

    manifestao de alienao. Para o trabalhador proletrio, o trabalho algo

    penoso, que o remete ao sacrifcio. (NAVARRO, PADILHA, 2007, p. 15)

    Nos moldes capitalistas, o trabalho adquire outro significado, de alienao, sendo visto

    como mercadoria, venda da fora de trabalho em troca de um salrio. A fora de trabalho

    passa a significar acumulao de capital e as relaes sociais transformam-se em relaes de

    explorao. (BERNARDO, 1998).

  • 30

    A mercadoria a forma mais elementar do capitalismo e apresenta caractersticas

    especficas: primeiro, a mercadoria um objeto que, a partir de suas particularidades

    materiais, satisfaz as necessidades humanas. Essa caracterstica conhecida como valor de

    uso. Em segundo lugar, a mercadoria apresenta a propriedade de troca por outras mercadorias

    diferentes dela mesma. Essa caracterstica denominada de valor de troca. Assim, a

    mercadoria definida como unidade de valor de uso e valor de troca.

    Segundo Marx, os valores de uso constituem o contedo material da riqueza,

    qualquer que seja a forma social desta. Na forma de sociedade a ser por ns examinada, eles

    constituem, ao mesmo tempo, os portadores materiais do valor de troca. (MARX, 1989, p.166)

    O valor de uso uma propriedade da riqueza independente do perodo histrico no

    qual est inserido. Independente do modo de produo; o homem produz riqueza com o

    objetivo de satisfazer suas necessidades direta (meio de subsistncia) ou indiretamente (meio

    de produo).

    importante ressaltar que quando se fala da dimenso do trabalho como categoria

    primeira est se pensando em atividade que cria valor-de-uso e que desencadeia relaes entre

    o homem e a natureza, ou seja, refere-se aqui ao trabalho concreto que divergente do

    trabalho abstrato, uma atividade estranhada e fetichizada, que cria valor-de-troca. (SANTOS,

    2005)

    De acordo com os princpios marxianos, o trabalho central na vida das pessoas, por

    meio do trabalho que o homem torna-se um ser social. O trabalho colocado exclusivamente

    como atividade humana, sendo mediador entre homem e natureza.

    Segundo Previtali (2011)

    No processo de produo o homem no apenas modifica o material ao qual

    deseja satisfazer suas necessidades, ele concretiza nesse material um projeto anterior criado conscientemente. Coloca em ao no apenas as suas

    potencialidades naturais, mas tambm retira as potencialidades existentes na

    natureza e as coloca em seu favor. nesta atividade fundante da existncia

    humana em que o trabalho adquire forma e atributos condicionados scio-

    historicamente. no momento em que o homem interage com a natureza

    alterando-a para a satisfao de suas necessidades essenciais e alterando

    concomitante sua prpria natureza, que os homens entram em relaes uns

    com os outros com o mesmo fim, ou seja, instituem relaes sociais de

    produo. (PREVITALI, 2011, p.37)

    Nesse processo o trabalho se caracteriza como elemento mediador da relao entre o

    Homem e a Natureza no processo de produo e reproduo existencial, visto que atravs dele

    possvel que incorpore sobre a natureza transformando-a de acordo com suas necessidades e

    ao mesmo tempo transformando-se.

  • 31

    Nas palavras de Marx

    O processo de trabalho, que descrevemos em seus elementos simples e abstratos,

    atividade dirigida como fim de criar valores-de-uso, de apropriar os elementos

    naturais s necessidades humanas; condio necessria do intercmbio material

    entre o homem e a natureza; condio natural eterna da vida humana, sem depender,

    portanto, de qualquer forma dessa vida, sendo antes comum a todas as suas formas sociais. (MARX, 1989, p. 208)

    Nesse sentido, a mercadoria pode ser definida como uma riqueza mercantil, que possui

    ao mesmo tempo, valor de uso e valor de troca. Um produto que seja capaz de proporcionar a

    satisfao das necessidades, mas que no apresente a propriedade de ser trocado por outro,

    no um elemento que constitui uma economia mercantil, mesmo que coexista com ela.

    Sendo assim, no pode ser considerado como uma mercadoria.

    Por outro lado, Carcanholo (1998) ressalta que

    De outro lado, difcil pensar em um produto que no tenha valor de uso e

    possua valor de troca, j que nenhum produtor desejar comprar, pagando por isso algo correspondente a um valor de troca, se a mercadoria em

    questo no satisfizer suas necessidades, isto , nenhum produtor troca uma

    mercadoria sem reconhecer na mercadoria alheia um valor de uso. Trata-se

    de uma pr-condio para a troca. Desta maneira, pode-se definir a

    mercadoria como a unidade de dois elementos: valor de uso e valor de troca.

    Deve-se salientar que o valor de uso uma propriedade da riqueza

    independente de sua forma histrica. No importa qual seja o modo de

    produo; o homem produz riqueza com o objetivo de satisfazer suas

    necessidades, seja de forma direta (meio de subsistncia) ou indireta (meio

    de produo). (CARCANHOLO, 1998, p. 22)

    Porm o valor de troca tem sua determinao especfica, como relatada acima. Essa

    descoberta do valor, como algo especfico da mercadoria, abaixo da aparncia do seu valor de

    troca, permite redefinir a mercadoria. Se inicialmente a mercadoria podia ser definida como

    uma unidade entre o valor de uso e o valor de troca, agora ela fica esclarecida como uma

    unidade entre o valor e o valor de uso, que surge como unidade entre o valor de troca e o valor

    de uso. Mais do que isso, trata-se de uma unidade de contrrios. Valor e valor de uso

    apresentam uma contradio na unidade mercadoria. Para se definir como unidade deve

    corresponder necessidades - ser um valor de uso e tambm se trocada por outras

    mercadorias- ser um valor.

    H a uma ruptura entre o valor de troca, baseado na quantidade, e o valor de uso,

    baseado na qualidade. Acontece que, na troca, relao essencial na sociedade capitalista, as

    mercadorias no so consideradas pelo seu valor de uso, mas subsumidas apenas por seus

    valores de troca. O uso passa a ser secundrio na relao social capitalista.

  • 32

    Com o desenvolvimento do capitalismo, atravs do avano das foras produtivas a

    dimenso do trabalho concreto que produz objetos teis perde espao para a dimenso do

    trabalho abstrato, com a produo direcionada ao valor de troca.

    Segundo Marx (1977)

    ... o trabalho de qualquer indivduo, quando se manifesta no valor de troca,

    possui este carter social de igualdade e s se manifesta no valor de troca

    quando, relacionado com o trabalho de todos os outros indivduos, e

    considerado como trabalho igual.(MARX, 1977, p.35)

    O trabalho realizado em valores de troca fica reduzido a valores de tempo, pois ...

    enquanto valores de troca so apenas as diferenas de grandeza de trabalho nelas

    materializados. (MARX, 1977, p.33). Em consequncia, quando o trabalho concreto

    transforma-se em trabalho abstrato, este se torna estranho e insensvel ao seu criador. O

    produto do trabalho perde a qualidade de valor de uso e transforma-se em mercadoria, a qual

    considerada apenas como resultado.

    O trabalho concreto transforma-se em objetivo do trabalho enquanto mercadoria

    atravs da utilizao da nica mercadoria que pertence ao homem, sua fora de trabalho. Na

    fora de trabalho est contido tanto o trabalho concreto (valor de uso) quanto o trabalho

    abstrato (valor de troca).

    O que transforma a fora de trabalho em mercadoria especial que o seu valor de uso

    consiste na manifestao da capacidade de trabalho, isto , o trabalho em si. O capital busca

    sua demanda de mercado em uma mercadoria que lhe acrescente valor (valor de uso) e

    encontra a fora de trabalho com um valor de uso prprio (formal) de objetivar trabalho.

    Sobre a mercadoria fora de trabalho, Carcanholo (1998) afirma que

    No que se refere mercadoria fora de trabalho pode-se afirmar trs coisas.

    Em primeiro lugar, a mais-valia que define a economia mercantil-capitalista

    decorrncia da contradio entre o valor e o valor de uso que forma a

    mercadoria fora de trabalho. Assim como nas outras mercadorias, o comprador (capital) demanda a fora de trabalho objetivando apropriar-se do

    seu valor de uso, pagando por isso o seu valor. Por outro lado, o vendedor

    (trabalhador) aliena o valor de uso de sua mercadoria procurando apropriar-

    se do seu valor. Assim como antes, a mercadoria nega o seu valor de uso

    para afirmar seu valor.A mais-valia como fruto da contradio valor-valor de

    uso na mercadoria fora de trabalho nos leva ao segundo ponto. O capital

    no consegue apropriar-se de um excedente porque pague pela fora de

    trabalho algo inferior ao seu valor. Ele paga este ltimo e, mesmo assim,

    consegue apropriar-se da mais-valia. este o grande desafio de uma teoria

    que explica a origem do excedente, assumindo a troca de equivalentes.

    Como visto, essa explicao torna-se no mnimo complicada at negando-se a troca de equivalentes. (CARCANHOLO, 1998, p. 38)

  • 33

    Marx (1988) afirma que o carter material, concreto, do trabalho deve ser concentrado

    para que cheguemos a igual trabalho humano, a trabalho humano abstrato (MARX, 1988,

    p. 46-7). A problemtica da homogeneidade do trabalho apresenta, portanto, explicitao o

    conceito de trabalho abstrato como igual trabalho humano, trabalho do qual abstrado seu

    carter material, concreto, til, de atividade produtiva aplicada a um fim especfico.

    (MARX, 1988, p.47)

    A abstrao, conduzida pelo trabalho concreto em suas diferentes formas ao

    trabalho abstrato no sentido da realizao da prpria realidade. O trabalho abstrato no deve

    ser visto somente como uma abstrao mental, seno o valor ficaria reduzido a uma

    construo da mente. necessrio que o trabalho apresente uma caracterstica de realidade

    para que possa se constituir como valor.

    Segundo Marx (2002) os homens produzem historicamente sua existncia atravs do

    trabalho. Para que isso acontea, atravs do trabalho que eles executam e tambm de acordo

    com sua histria, eles so divididos entre duas classes sociais e econmicas que apresentam

    interesses antagnicos.

    De um lado esto os proprietrios dos meios de produo, ou seja, os capitalistas, e do

    outro esto os proletrios, possuidores apenas de sua fora de trabalho. A relao entre essas

    duas classes expressa uma notvel relao de desigualdade social e econmica. Como

    exemplos dessa afirmao, temos dois fenmenos: o primeiro que o trabalhador proletrio

    trabalha sobre o controle do capitalista e o segundo que o produto fabricado diretamente

    pelo proletrio no propriedade dele, mas sim dos capitalistas. (ANTUNES, 2002)

    Consequentemente, o resultado final do trabalho possui um carter exterior ao do

    trabalhador, sendo, portanto uma manifestao de alienao. Esse processo de exteriorizao

    do trabalho torna-o sofrido, resignado para o proletrio, que no se reconhece na condio de

    sujeito do produto de seu trabalho.

    Nesse contexto, est exposta a contradio central do trabalho no capitalismo, ou seja,

    de um lado, encontra-se um elemento de sua positividade, que a possibilidade dada ao

    trabalho coletivo de poder libertar o homem das amarras naturais, estritamente biolgicas,

    pela possibilidade de produzir condies materiais de vida em larga escala e, ao mesmo

    tempo, o elemento de sua negatividade, ou seja, a prpria materialidade do regime capitalista

    em que essa potencialidade ocorre que no tem por objetivo a coletivizao dos produtos do

    trabalho humano, mas a acumulao de capitais e a reproduo do sistema que a possibilita.

    Todo o restante do sistema subordinado a esse objetivo.

  • 34

    Antunes (2006) coloca que

    Quando concebemos a forma contempornea do trabalho como expresso do trabalho social, que mais complexificado, socialmente combinado e ainda

    mais heterogneo e intensificado nos seus ritmos e processos, no podemos

    concordar com as teses que desconsideram o processo de criao de valores

    de troca. (ANTUNES, 2006, p.35)

    As relaes de produo e alienao acontecem de vrios modos e o estranhamento a

    forma especfica de alienao no sistema capitalista. O trabalhador produz algo estranho, que

    no seu, que ele no pode possuir e com o qual ele no consegue se identificar como

    produtor direto que reproduz para um desconhecido, que , na maioria das vezes, o possuidor

    dos bens de produo. (ANTUNES, 2002).

    A fora de trabalho transformada pelas relaes sociais e pelas relaes de produo

    em mercadoria essencial ao processo de acumulao capitalista. Essa transformao promove

    um processo de humanizao da coisa e coisificao do homem, criando o fetichismo da

    mercadoria e a consequente desumanizao dos indivduos envolvidos em tal processo. O

    produto adquire uma vida prpria. J os trabalhadores possuem sua subjetividade descartada,

    so cada vez mais desumanizados em detrimento do que produziram.

    O processo de trabalho consiste na atividade concreta que o homem executa orientada

    para uma finalidade especfica, para produzir determinado produto. Com essa finalidade, esse

    processo utiliza os meios de trabalho, que so objetos que procuram facilitar esses meios de

    trabalho. Em detrimento do resultado, o objeto e o meio de trabalho so considerados meios

    de produo.

    Segundo Carcanholo (1998)

    O processo de trabalho , portanto, a efetivao (objetivao) do trabalho

    concreto e, conseqentemente, tem como fim a produo de valores de uso.

    Por outro lado, o processo de valorizao diz respeito criao de valor, ao

    trabalho abstrato. Como o valor de uso um suporte material para o valor, o

    processo de trabalho um meio para o de valorizao. Pode-se dizer que a lgica do processo de trabalho se submete do processo de valorizao.

    Assim, as leis da acumulao de capital influem na evoluo do processo de

    trabalho. O objetivo primordial o ganho crescente de produtividade.

    Quanto maior seja a proporo entre os meios de produo e a fora de

    trabalho empregada, maior a produtividade desta ltima, j que conseguir

    operar e transformar uma maior quantidade de meios e objeto de trabalho.

    (CARCANHOLO, 1998, p.30)

    Em contrapartida, o aumento da produtividade implica na diminuio do tempo de

    trabalho para a produo da mercadoria e, consequentemente, do valor da mesma. Esse fato

    aumenta a competitividade do capital para conseguir executar essa alterao no seu processo

  • 35

    de trabalho, pois a mercadoria vendida pelo valor de mercado, pelo tempo de trabalho

    socialmente necessrio para produzi-la. Com a reduo do valor individual de sua mercadoria,

    o capital poder apropriar-se de um valor extra.

    1.2 Trabalho produtivo X trabalho improdutivo

    Outra questo fundamental na categoria trabalho a contextualizao do trabalho

    produtivo e do trabalho improdutivo. Marx (1978) afirma que

    O trabalhador produtivo aquele que emprega a fora de trabalho, que

    diretamente produz mais-valia; portanto s o trabalho que seja consumido

    diretamente no processo de produo com vistas valorizao do capital.

    (MARX, 1978, p.70)

    Em oposio ao trabalho improdutivo, a categoria de trabalho produtivo torna-se

    importante para entendimento da sociedade capitalista. O trabalho produtivo o produtor no

    apenas do valor fundamental para a reproduo da fora de trabalho, da mais-valia, mas

    tambm para o valor excedente do qual se procede ao lucro de capitais diferenciados, alm

    dos gastos improdutivos pblicos e privados. Entre esses gastos improdutivos incluem-se at

    mesmo o salrio dos trabalhadores improdutivos que constituem uma deduo do excedente

    produzido na sociedade, disponvel para o capital.

    Antunes (2002) afirma que

    De fato, se trata de um processo de organizao do trabalho cuja finalidade

    essencial, real, a intensificao das condies de explorao da fora de

    trabalho, reduzindo muito ou eliminando tanto o trabalho improdutivo, que

    no cria valor, quanto suas formas assimiladas, especialmente nas atividades

    de manuteno, acompanhamento e inspeo de qualidade, funes que

    passaram a ser diretamente incorporadas ao trabalhador

    produtivo.(ANTUNES, 2002,p.39, grifos do autor)

    necessrio que o trabalho produza mais valia para que seja considerado trabalho

    produtivo, precisa ser trabalho assalariado e necessita-se efetuar a troca de capital para capital

    produtivo. Dessa maneira, para ser produtivo o trabalho necessita produzir valores de uso e, ao

    mesmo tempo, ser trocado por capital. Precisa, ento, ser assalariado, mas ser assalariado do

    capital.

    Na sociedade capitalista, a categoria de trabalho produtivo fica restrita, pois nem todo

    trabalho que produz valor de uso submete-se diretamente ao capital, como seria o caso dos

  • 36

    produtores familiares (camponeses ou artesos), do trabalho domstico e do trabalho em alguns

    setores do servio pblico (educao, sade).

    Para que se possa compreender como o trabalho produtivo se amplia no capitalismo

    necessrio entender primeiramente a categoria de trabalhador coletivo. Segundo Marx

    O homem isolado no pode atuar sobre a natureza sem pr em ao seus

    msculos sob controle do seu crebro. ... o processo de trabalho conjuga o

    trabalho do crebro e o das mos. Mais tarde se separam e acabam por se

    tornar hostilmente contrrios. O produto deixa de ser o resultado imediato da

    atividade do produtor individual para tornar-se produto social, comum, de um trabalhador coletivo, isto , de uma combinao de trabalhadores,

    podendo ser direta ou indireta a participao de cada um deles na

    manipulao do objeto sobre o que incide o trabalho. A conceituao do

    trabalho produtivo e de seu executor, o trabalhador produtivo, amplia-se em

    virtude desse carter cooperativo do processo de trabalho. Para trabalhar

    produtivamente no mais necessrio executar uma tarefa de manipulao

    do objeto de trabalho; basta ser rgo do trabalhador coletivo, exercendo

    qualquer uma das suas funes fracionrias. (MARX, 1989, p. 584)

    Isso demonstra que, se a princpio, era necessrio trabalhar efetivamente para ser

    trabalho produtivo, ou seja, colocar a mo diretamente na matria prima atravs dos meios de

    trabalho, agora, vrios servios realizados por trabalhadores assalariados devem ser

    considerados parte do que realiza o trabalhador coletivo. Produzem valor, produzem mais-

    valia e, em conjunto com os outros membros do trabalhador coletivo, produzem valores de

    uso, conforme demonstra a figura 1.

    FIGURA 1 - Processo de trabalho coletivo

    Fonte: CARCANHOLO, 2007

    Quando se trata de sade e educao, segundo Carcanholo (2007) fica claro que,

    quando esses servios so prestados diretamente pelo setor privado ao consumidor e quando

    acontecem com trabalhadores assalariados, constituem atividades capitalistas produtivas e

    seus trabalhadores so considerados produtivos. Segundo Carcanholo (2007, p.19)

    Essas atividades produzem servios que, quando prestados a trabalhadores

    que sero trabalhadores produtivos (tambm para demais) contribuem para a

    reproduo de suas foras de trabalho, ou mesmo, no caso da educao, transformam fora de trabalho simples em potenciada ou

    complexa.(CARCANHOLO, 2007, p.19)

    Trabalho

    produtivo

    capitalista

    Contedo

    forma = Produz valores de uso

    Produz mais-valia

  • 37

    De outro lado, importante considerar o caso de professores e profissionais da sade que

    trabalhem como profissionais autnomos e que, em princpio, para Marx, seriam considerados

    trabalhadores improdutivos. Esses trabalhadores produzem valor e caso no pretendam vender

    seus servios pelo valor de produo, alm de produzir valor - excedente o transferem, pelo

    menos em parte, para sua clientela.

    De acordo com Carcanholo (2007)

    No momento em que os trabalhadores, agora com o valor de sua fora de

    trabalho reposto ou ampliado, forem receber seus salrios de parte do capital

    que os emprega, no precisam ser ressarcidos inteiramente, pois no

    pagaram nada pelo excedente-valor produzido por aqueles profissionais (ou

    no o pagaram todo). O capital poder pagar-lhes um salrio inferior quele correspondente ao verdadeiro valor da fora de trabalho. Isso reduz o tempo

    de trabalho necessrio para repor o valor correspondente ao salrio recebido

    e aumenta o trabalho excedente, fonte do lucro capitalista.

    (CARCANHOLO, 2007, p.20)

    O valor-excedente produzido pelos profissionais, apropriado transitoriamente pelos

    trabalhadores produtivos do capital, finalmente ressurgem nas mos do capital na forma de lucro

    adicional. Os profissionais autnomos que contribuem para elevar o montante total dos lucros do

    capital: so trabalhadores produtivos e explorados indiretamente pelo capital, embora no

    assalariados.

    1.3 Trabalho material X trabalho imaterial

    O trabalho imaterial e intelectual, o conhecimento e seus atores sociais colocam-se no

    lado do trabalho improdutivo mesmo com a produo da mais-valia, pois no intervm na

    transformao da natureza, portanto, na sua converso em meios de produo e de

    subsistncia. Ao contrrio, esse fato acontece apenas com o trabalho produtivo manual do

    proletrio.

    Em contrapartida, Braverman (1980) afirma que

    Embora o trabalho produtivo e o improdutivo sejam tecnicamente distintos, embora o trabalho produtivo tenha tendido a decrescer na razo do aumento

    de sua produtividade, enquanto improdutivo tenha aumentado apenas como

    consequncia do aumento dos excedentes jorrados pelo trabalho produtivo

    a despeito dessas distines, as duas massas de trabalho no esto

    absolutamente em flagrante contraste e no precisam ser contrapostas uma

    outra. Elas constituem uma massa contnua de emprego que, atualmente e

    diferentemente da situao nos dias de Marx, tm tudo em comum.

    (BRAVERMAN, 1980, p.357, grifos do autor)

  • 38

    Os processos de transformaes para explorao do trabalho material ou imaterial no

    Brasil, por meio da acumulao flexvel, ocorreram atravs do aumento da possibilidade da

    explorao do trabalho abstrato. Fato que intensificou o limite da auto-explorao do

    trabalhador orientado pela nova sociedade produtiva.

    Segundo Lazzarato (1997) no aspecto objetivo das relaes sociais, a mais-valia

    [...] se esconde sob a iluso de uma sociedade de produtores independentes de

    mercadorias, uma sociedade de vendedores de trabalho materializado. Uma

    sociedade sem vendedores de fora de trabalho, posto que o contrato de

    compra e venda de fora de trabalho est metamorfoseado num contrato de

    fornecimento de mercadorias. (LAZZARATO, 1997, p. 34)

    O autor demonstra que o processo ideolgico torna velado o fetichismo da mercadoria

    fora de trabalho e a negao da intensificao humana. E ainda nos possibilita refletir sobre a

    condio do professor pesquisador a partir do trabalho imaterial quando afirma que

    No contexto do trabalho imaterial, o contrato trabalhista no estabelece uma

    relao imediata entre produtividade e improdutividade; ao contrrio,

    hoje redimensionado por novas formas de controle do capital,

    essencialmente a partir de sua subjetividade criativa e participativa no

    processo de produo. Em dimenso no indita, no caso do artista em geral [e do professor em particular], altamente qualificado, isso se aprofunda por

    meio de elementos como a intensificao do trabalho, a precarizao das

    relaes de produo (carreira, prestao de servio, etc.) no interior das

    instituies s quais prestam servios. Em resumo, um trabalho que j

    dependia da subjetividade produtiva [o do professor] do trabalhador resulta,

    no atual processo de estratgias de mudanas no trabalho produtivo, em

    profunda sujeio da subjetividade do artista [professor] aos meios e

    controles do capital. (COLI, 2006, p. 317)

    Para Braverman (1980) a desqualificao do trabalho docente entendida como uma

    perda na capacidade de realizar todas as etapas e tarefas da profisso docente, e pelas formas

    descontrole sobre o coletivo docente institudas com o tecnicismo (BRAVERMAN, 1980,

    p.235). O autor afirma que

    Toda a fase do processo do trabalho divorciada, to longe quanto possvel,

    do conhecimento e preparo especial, e reduzida a simples trabalho. Nesse

    nterim, as relativamente poucas pessoas para quem se reservam instruo e

    conhecimento so isentas tanto quanto possvel da obrigao de simples

    trabalho. Desse modo, dada uma estrutura a todo o processo de trabalho

    que em seus extremos polariza aqueles cujo tempo infinitamente valioso e

    aqueles cujo tempo quase nada vale. Esta poderia at ser chamada a lei geral

    da diviso do trabalho capitalista. No a nica fora atuando sobre a organizao do trabalho, mas certamente a mais poderosa e geral

    (BRAVERMAN, 1980, p.80).

    Porm, quando se trata da posio de classes, Braverman (1980) coloca a categoria

    docente em posio igual dos engenheiros, tcnicos, supervisores e gerentes, que ocupam

  • 39

    um lugar intermedirio na estrutura de classe capitalista. Essa posio de intermdio participa

    dos interesses e das caractersticas tanto da fora de trabalho operria, como os da burguesia.

    Nesse contexto, essa posio seria determinada por sua relao com o poder e a riqueza que

    os comandam de cima, e com a massa de trabalho sob eles, que eles, por sua vez, ajudam a

    controlar, comandar e organizar (BRAVERMAN, 1980, p. 343).

    No entanto, de acordo com Braverman, mesmo essas chamadas classes mdias sociais

    tambm estariam sujeitas a um processo de proletarizao, pois iniciariam a despeito dos

    privilgios que restam, a conhecer aqueles sintomas de dissociao popularmente chamados

    de alienao com que tem vivido a classe trabalhadora por tanto tempo (...)

    (BRAVERMAN, 1980, p.345).

    Ferreira (2002) afirma que a proletarizao promoveu um abandono do docente da

    identificao com categorias mais profissionais, atravs da substituio do sistema associativo

    utilizado no incio do sculo XX, por um modelo sindical aos moldes dos sindicatos

    operrios. Porm, Enguita (1991) afirma que nada leva a crer que os professores se convertam

    em um grupo profissional nem que se transformem em um grupo proletariado.

    O autor coloca que para se falar de professores importante realizar uma maior

    especificao para no ocultar as grandes diferenas que separam os diversos grupos de

    professores, diferenas que dizem respeito a seus salrios, suas condies de trabalho, seu

    prestgio, suas oportunidades de promoo e outros bens e vantagens sociais desejveis (

    ENGUITA, 1991, p. 55). Para Sron (1999), nesse debate entre a profissionalizao e a

    proletarizao, existe ainda uma outra possibilidade que a colocao da ocupao docente

    como um grupo de status, ou seja, um grupo de pessoas com uma mesma imagem social, que

    dispem de senhas de identidade prprias, expressas pelos mesmos estilos de vida, e uma

    morfologia de conjunto, produto de uma similar e homognea imagem social (SRON,

    1999, p.50).

    1.4 Dialtica entre educao e trabalho

    Nos ltimos anos a educao ganhou prestgio acadmico sendo um das principais

    temticas discutidas no meio acadmico-cientfico. Entre os aspectos mais estudados

    encontra-se a temtica sobre o papel da educao perante a sociedade, como transformadora

    dos padres sociais ou simples reprodutora desses padres.

  • 40

    A educao compreendida como aprendizado atravs do qual o ser social, por meio

    do seu trabalho, incorpora certos conhecimentos que lhe permitem compreender e agir sobre a

    realidade a qual se situa, uma atitude que assinala a prpria materialidade do homem

    (SANTOS, 2005). Dessa maneira, entende-se a educao percebida como esfera que permite

    ao indivduo estabelecer a ligao com suas condies materiais de existncia.

    necessrio estabelecer a discusso entre as categorias trabalho e educao devido

    dicotomia da sociedade diante das esferas organizacionais da educao e do trabalho, bem

    como diante dos padres sociais impostos. De acordo com Kuenzer (1997), os avanos das

    tecnologias proporcionados pelo saber cientfico no acontecem na escola, mas dentro das

    relaes sociais entre o homem e a natureza, o homem e os outros homens e o homem consigo

    mesmo. Inserido nesse contexto, o capital apropria-se estrategicamente deste referido saber,

    apresentando como prioridade, o aumento da lucratividade. Consequentemente, a educao

    oferecida pelas instituies escolares reproduzem esses padres econmicos, com o enfoque

    na educao enquanto criadora de fora de trabalho.

    Se o saber produzido socialmente, pelo conjunto de homens nas relaes

    que estabelecem no trabalho para garantir sua sobrevivncia, ele elaborado,

    sistematizado previamente. Historicamente, a classe social que detm a

    posse dos instrumentos materiais tambm, e no por coincidncia, detm a

    posse dos instrumentos intelectuais que lhe permitem sistematizar o saber

    socialmente produzido, transformando-o em teoria. Assim mesmo

    existindo nas relaes sociais, o saber elaborado pela classe dominante,

    passando a assumir o ponto de vista de uma classe social, que o utiliza a seu

    favor. (KUENZER, 1997, p. 27).

    Para problematizar a dialtica entre educao e trabalho fundamental realizar uma

    anlise sobre a diferena entre Educao no trabalho e Educao para o trabalho, pois se

    trata de dois antagonismos que promovem, atravs de sua diferenciao, as contradies do

    carter educativo do trabalho.

    A educao no trabalho uma vantagem concernente lgica do capitalismo, a qual

    objetiva uma formao desenvolvida, tcnica e limitada a partir do conhecimento tcito.

    Segundo Kuenzer (1997) esse conhecimento concebido

    atravs da observao dos companheiros, da ao dos instrutores, de

    treinamentos eventuais, ele vai experimentando, analisando, discutindo,

    refletindo, descobrindo e, desta forma, desenvolvendo um conjunto de

    modos prprios de fazer e de explicar esse fazer, que extrapola o mbito do

    prprio trabalho, a partir das necessidades determinadas pela vida em

    sociedade. Assim, o trabalhador vai elaborando um saber eminentemente

    prtico, fruto de suas experincias empricas, que, sendo parciais em funo

    da diviso tcnica do trabalho, originam um saber igualmente parcial e fragmentado. (KENZER, 1997, p.23)

  • 41

    Percebe-se que, no contexto do trabalho, a educao fica sujeita a um processo

    educativo passvel de problematizao, pois o trabalhador torna-se responsvel pela sua

    formao em seu campo de trabalho. Esse o principal objetivo da educao: preparar o

    trabalhador apenas qualificando-o para realizar a funo que lhe delimitada. Braverman

    (1980, p. 124) aponta que

    A transformao da humanidade trabalhadora em uma fora de trabalho,

    em fator de produo, como instrumento do capital, um processo

    incessante e interminvel. A condio repugnante para as vtimas, seja qual

    for o seu salrio, porque viola as condies humanas do trabalho; e uma vez

    que os trabalhadores no so destrudos como seres humanos, mas

    simplesmente utilizados de modos inumanos, suas faculdades crticas,

    inteligentes e conceptuais permanecem sempre, em algum grau, uma ameaa ao capital, por mais enfraquecidas ou diminudas que sejam.

    (BRAVERMAN, 1980, p.124)

    Em contrapartida, a educao para o trabalho funda-se na reflexo da amplitude do

    processo educacional que inerente ao trabalho. Assim sendo, formao para o trabalho um

    processo de vrias dimenses contextualizadas por seu carter histrico e por estabelecer as

    condies materiais de existncia (FIDALGO; MACHADO, 2000).

    Realizar a anlise da educao no trabalho consiste em refletir de forma crtica sobre o

    sentido do trabalho na sociedade capitalista atual e, ao mesmo tempo, demonstrar a

    importncia em se refutar a essa crtica atravs de um processo educacional no qual o homem

    na condio de trabalhador se realize nessa atividade.

    Reis (2011) coloca que

    Educao no trabalho implica em negar o sentido alienante e precarizado da

    formao no trabalho, pois muito mais do que treinamento e adaptao ao

    sistema de produo, nessa atividade, o trabalho e seu princpio educativo se

    remete ao fato do prprio trabalhador direcionar um olhar crtico sobre os

    determinantes histricos, econmicos e polticos presentes na sociedade. (REIS, 2011, p.28)

    Meszros (2002, 2010) desenvolve a partir da teoria marxiana da categoria trabalho

    no Sistema Sociometablico do Capital uma pesquisa sobre o homem na condio de alienado

    atravs do trabalho sob a lgica capitalista. As primeiras mediaes so as relaes do

    homem com a natureza para garantir a satisfao de suas necessidades bsicas de reproduo

    da espcie. o trabalho concreto construindo a prpria humanidade, e que Meszros (2010, p.

    8) relaciona com:

    a regulao necessria, mais ou menos espontnea, da atividade biolgica

    reprodutiva e o tamanho da populao sustentvel, em conjuno com os recursos

    disponveis;

  • 42

    a regulao do processo de trabalho por meio do qual o necessrio intercmbio da

    comunidade com a natureza possa produzir os bens necessrios para a satisfao

    humana, como tambm as ferramentas de trabalho, empreendimentos produtivos e

    conhecimento apropriados pelos quais o prprio processo reprodutivo possa ser

    mantido e aprimorado;

    o estabelecimento de relaes de troca adequadas sob as quais as necessidades

    historicamente cambiantes dos seres humanos possam ser interligadas com o

    propsito de otimizar os recursos naturais e produtivos disponveis incluindo os

    culturalmente produtivos;

    a organizao, a coordenao e o controle da multiplicidade de atividades por

    meio das quais as exigncias materiais e culturais do processo de reproduo sociometablico bem-sucedido de comunidades humanas progressivamente mais

    complexas possam ser asseguradas e protegidas;

    a alocao racional dos recursos materiais e humanos disponveis, lutando contra

    a tirania da escassez por meio da utilizao econmica (no sentido de economizar)

    dos modos e meios de reproduo da sociedade dada, na medida do vivel sobre a

    base de um nvel de produtividade alcanvel e dentro dos limites das estruturas

    socioeconmicas estabelecidas;

    e a promulgao e a administrao de regras e regulamentos da sociedade dada

    como um todo, em conjuno com outras funes e determinaes primrias

    mediadoras. (MESZROS, 2010, p. 8)

    J as mediaes de segunda ordem do capital so as que relacionam o homem com a

    natureza com a finalidade de satisfazer as necessidades capitalistas. No capitalismo, o

    trabalho apresenta como principal motivador a reproduo do prprio mecanismo de

    acumulao, em que as necessidades humanas se satisfazem por meio da compra e venda da

    fora de trabalho. Meszros (2010) apresenta o contraste entre as duas formas de mediao

    demonstrando tambm as caractersticas das mediaes de segunda ordem:

    a famlia nuclear, articulada como o microcosmo da sociedade, o qual, alm de

    seu papel na reproduo da espcie, participa em todas as relaes reprodutivas do

    macrocosmo social, incluindo a mediao necessria das leis do Estado para

    todos os indivduos e, assim, diretamente necessria tambm para a reproduo do

    Estado;

    os meios de produo alienados e suas personificaes por meio das quais o

    capital adquire vontade frrea e conscincia rgida, estritamente demandado a

    impor sobre todos a conformidade com relao s exigncias objetivas

    desumanizantes da ordem sociometablica dada;

    o dinheiro assumindo uma multiplicidade de formas mistificantes e

    progressivamente mais dominantes no curso do desenvolvimento histrico, chegando ao domnio total do sistema monetrio internacional dos dias de hoje;

    objetivos de produo fetichistas, submetendo de uma forma ou de outra a

    satisfao de necessidades humanas (e a proviso correspondente de valores de uso)

    aos imperativos cegos da expanso e acumulao do capital;

    trabalho estruturalmente divorciado da possibilidade de controle, seja nas

    sociedades capitalistas, nas quais deve funcionar como trabalho asssalariado

    coagido e explorado pela compulso econmica, seja sob o controle pscapitalista

    do capital sobre a fora de trabalho politicamente dominada;

    variedades de formao de Estado do capital em seus terrenos globais, nos quais

    podem confrontar-se uns contra os outros (por vezes com os mais violentos meios,

    deixando a humanidade beira da autodestruio), como Estados nacionais orientados a si mesmos;

    e o descontrolado mercado mundial em cuja estrutura os participantes, protegidos

    por seus respectivos Estados nacionais por meio das relaes de poder dominantes,

    devem se acomodar s precrias condies de coexistncia econmica enquanto se

  • 43

    empenham em obter a mais alta vantagem praticvel para si ao ludibriar suas

    contrapartes concorrentes, aqui lanando inevitavelmente as sementes de mais

    conflitos destrutivos. (MESZROS, 2010, p.8-9)

    O conflito entre a mediao de primeira ordem e de segunda ordem se demonstra pela

    complexidade da organizao do modo de produo capitalista. Na mediao de primeira

    ordem fica claro que planejamento e a execuo do trabalho no se dissociam, enquanto que

    na mediao de segunda ordem h uma grande valorizao das especializaes, atravs de

    formas mais explcitas ao longo do desenvolvimento do capitalismo. Este fato pode ser

    observado no aperfeioamento das estratgias gerenciais tayloristas/fordistas, exigncias da

    modernizao do capitalismo, que se baseavam na rigidez do controle e no parcelamento do

    trabalho, que em dado momento tornaram-se insuficientes e passaram a coexistir com as

    atuais formas de gesto, mais sutis, porm no mais brandas, denominadas de gesto

    participativa, flexibilizao, entre outros. (ANTUNES, 2006).

    Nesse contexto, o mercado exige uma qualificao diferenciada dos trabalhadores para

    ocupar as tarefas de direo e de execuo. Assim, a escola bsica forma o trabalhador nos

    conhecimentos gerais necessrios para se inserir nas atividades produtivas, e as habilidades

    especficas de cada cargo so formadas pelas prprias empresas ou por cursos tcnicos

    profissionalizantes (SAVIANI, 2002).

    Embora na atualidade j se procure relacionar escolaridade e emprego, a articulao

    entre trabalho e educao continua como temtica no resolvida nos sistemas educacionais.

    As reformas da educao brasileira no fornecem privilgios para o desenvolvimento de

    vnculo entre esses dois campos, conforme se verifica na discusso do captulo dois.

  • CAPTULO 2

    REESTRUTURAO PRODUTIVA NA EDUCAO E O TRABALHO DOCENTE

    2.1 A Reestruturao Produtiva do Mundo do Trabalho

    A partir da crise dos anos 1960, surgiu um novo cenrio de fragmentao das polticas

    pblicas de Estado e uma rpida desregulamentao da economia mundial. O capitalismo

    passou do modelo de internacionalizao a um modelo voltado para a universalizao ou

    mundializao do capital. (CHESNAIS, 1996).

    Bernardo (1998) coloca que nesse novo contexto, surgiram as chamadas empresas

    transnacionais, com uma nova base produtiva, estruturas cooperativas e formas

    organizacionais diferenciadas, que se tornaram importantes agentes no comrcio mundial.

    Esse novo modelo empresarial exigiu a reconfigurao do prprio papel do Estado,

    cuja gesto passou a se realizar em meio ao capital transnacional, o que interferia no apenas

    em sua atuao, mas tambm levava redefinio dos conceitos a ele referentes.

    O sistema capitalista internacional, que se sustenta na acumulao incessante de

    capital, precisa, para reproduzir-se, desses ajustes estruturais e, ao mesmo tempo, da sua

    expanso ilimitada. Desde o perodo da acumulao primitiva, existe no sistema capitalista

    uma tendncia ao aumento constante das foras produtivas, passando-se da manufatura

    grande indstria e, desta, aos conglomerados internacionais.

    Ao analisar os aspectos adquiridos pelas polticas pblicas nesse novo contexto,

    percebem-se as mudanas ocorridas pelo processo de globalizao e pela configurao das

    ideias neoliberais e, consequentemente pela pulverizao e flexibilizao do trabalho.

    A grande concentrao de capital permite que as grandes empresas se relacionem

    diretamente, sem depender da interveno direta do Estado. Esse fator promove a ascenso

    das classes dominantes, caracterizada pela desestruturao do setor pblico e pelas

    privatizaes (BERNARDO, 1998). Essas modificaes ocorridas no modo de produo

    capitalista encontram-se diretamente associadas ao universo da produo e ao mundo do

    trabalho.

    Nesse contexto, Braverman (1980) afirma que foi preciso uma administrao cientfica

    do trabalho, com finalidade de ajustar o trabalhador s novas necessidades do modo de

  • 46

    produo capitalista. A partir do momento em que um determinado modelo entra em

    decadncia, outro modelo surge como resposta crise, acarretando transformaes no

    processo produtivo.

    Frederick Taylor (1865-1915) foi um grande estudioso sobre a organizao e controle

    do trabalho. O taylorismo estabelecia que era necessrio impor de maneira rigorosa como

    deveria ser a execuo do trabalho, promovendo uma separao entre planejamento e

    execuo do trabalho. Os gerentes preocupar-se-iam com a superviso do trabalho, com a

    finalidade de garantir mximo rendimento. Os trabalhadores deveriam ser treinados para

    executar o trabalho, numa sequncia de tempo e movimento previamente elaborada, evitando

    desperdcio operacional, com vistas a assegurar a mais elevada produtividade. (BRITO, 2008,

    p.39).

    O taylorismo apresentava como principal caracterstica a individualizao dos

    salrios, com o objetivo de aumento da produtividade do trabalho. Segundo os princpios do

    taylorismo cada tarefa e cada movimento de cada trabalhador possuem uma cincia, um

    saber fazer profissional.

    Assim havia mtodos como: mtodo de racionalizar a produo, logo, de possibilitar o

    aumento da produtividade do trabalho economizando tempo, assegurando definitivamente o

    controle do tempo do trabalhador pela classe dominante. (SANTOS, 2005)

    No taylorismo o trabalhador adquire caractersticas de fragmentao, apenas

    executando tarefas simples e rotineiras. Nesse modelo gerencial de trabalho, surge o conceito

    de operrio-massa, no qual o trabalho de um depende do trabalho do outro.

    Nesse contexto, o modelo assume caractersticas alienantes como a fragmentao do

    trabalho atravs do parcelamento das tarefas e consequentemente o parcelamento do saber.

    Outro fator importante do taylorismo foi a racionalizao do tempo, atravs da

    introduo do cronmetro, para regular o tempo de trabalho e os movimentos dos

    trabalhadores. Os trabalhadores passam a ser vistos como mquinas tendo seu controle

    centralizado na gerncia. Esse gerenciamento, por sua vez, apresentava como caracterstica

    principal a separao entre o trabalhador manual e o trabalhador intelectual. Tanto que,

    No sempre necessrio, para esse fim, que a mquina seja um modelo bem

    aperfeioado ou requintado de sua espcie. A esteira rolante, quando usada numa

    linha de montagem, embora seja primitivssima parte da maquinaria, corresponde

    perfeitamente s necessidades do capital na organizao do trabalho que no pode

    ser mecanizado de outro modo. Seu ritmo est nas mos da gerncia, e

    determinado por um dispositivo mecnico cuja construo no poderia ser mais

    simples, mas que capacita a gerncia a aproveitar-se do nico e essencial elemento de controle do processo. (BRAVERMAN, 1980, p. 169)

  • 47

    O principal objetivo do taylorismo era de eliminar as fraes de tempo gastas com

    suprfluos, reduzindo os chamados por Taylor de tempos mortos, que era o tempo no

    utilizado na execuo do trabalho. As principais caractersticas deste processo de

    desumanizao constante do trabalho capitalista so: separao entre planejamento e

    surgimento da gerncia enquanto controladora do processo; processo de trabalho parcelar,

    rotineiro e fragmentado, portanto extremamente cronometrado.

    A consequncia inexorvel da separao de concepo e execuo que o processo

    de trabalho agora dividido entre lugares distintos e distintos grupos de

    trabalhadores. Num local, so executados os processos fsicos da produo; num

    outro esto concentrados o projeto, planejamento, clculo e arquivo. A concepo

    prvia do projeto antes de posto em movimento; a visualizao das atividades de

    cada trabalhador antes que tenham efetivamente comeado; a definio de cada

    funo; o modo de sua execuo e o tempo que consumir; o controle e a verificao

    do processo em curso uma vez comeado; e a quota dos resultados aps concluso

    de cada fase do processo todos esses aspectos da produo foram retirados do

    interior da oficina e transferidos para o escritrio gerencial. Os processos fsicos so agora executados mais ou menos cegamente, no apenas pelos trabalhadores que o

    executam, mas com freqncia tambm por categorias mais baixas de empregados

    supervisores. As unidades de produo operam como a mo, vigiada, corrigida e

    controlada por um crebro distante. (BRAVERMAN, 1980, p. 112-113)

    A partir dos pressupostos de gerncia colocados por Taylor na estruturao industrial,

    ocorreram vrias modificaes, colocando sinteticamente o planejamento de racionalizao da

    organizao do trabalho com a finalidade de aproveitar ao mximo o tempo a favor da

    produtividade. Esse processo promoveu a intensificao da alienao no trabalho. Braverman

    (1980) afirma que o trabalho executado mais ou menos cegamente pelos operrios

    subordinados a essa nova lgica. Contudo, essa dinmica no passou despercebida: de acordo

    com Braverman (1980), com a generalizao das novas condies da produo, muitos deles

    se conscientizaram do que perderam em suas relaes sociais de trabalho.

    Henry Ford (1863-1947) utilizou os princpios tayloristas para acelerar ainda mais a

    produo ao introduzir um processo de esteira rolante na Ford Motor Company, no ano de

    1914, no qual o trabalhador ficava fixo e os veculos se movimentavam nas esteiras rolantes.

    Essa nova organizao de trabalho, conhecida por fordismo teve como principal caracterstica

    o aceleramento da produtividade o que, consequentemente, resultou na intensificao do

    trabalho e no processo de desqualificao operria.

    O fordismo apresenta, assim como o taylorismo, caracterstica da diviso do trabalho

    e da atribuio de funes segmentares, quase sem nenhum contedo para trabalhadores de

    uma maneira permanente, rotineira e montona. Nesse contexto, um modelo complementa o

    outro, pois enquanto Ford se ateve a inovaes e incrementaes tecnolgicas da produo,

  • 48

    Taylor se ateve s inovaes e incrementaes no mbito da gesto da produo, visando

    alteraes hierrquicas na relao do gestor com o trabalhador (SILVA, 2001).

    A eficcia do fordismo consiste na qualificao e envolvimento mnimos dos

    trabalhadores e de envolvimento dos mesmos com o sucesso da produo e da empresa;

    exige-se dos trabalhadores que cumpram as tarefas de contedo prescritas pela administrao

    da produo. Consequentemente houve uma intensificao no ritmo do trabalho com a

    reduo do tempo improdutivo da jornada de trabalho.

    Ford atraiu trabalhadores para sua fbrica atravs de um significativo aumento de

    salrio, para obter mo-de-obra suficiente para a produo em massa. Mas somente receberia

    esse salrio o operrio que comprovasse ter boa conduta, distante de certas vicissitudes como

    beber e fumar. Com essa ttica ele consegue atrair fora de trabalho para a fbrica, mas no

    paga esse salrio para muitos operrios, alegando que no deram boas provas de uma conduta

    disciplinada (GOUNET, 2002). Dessa maneira, Ford estava concretizando os fundamentos

    bsicos desse modelo: aumento da produtividade, dos salrios reais dos trabalhadores e do

    consumo de massa.

    Os sistemas de administrao gerencial taylorismo e fordismo apresentam como

    caractersticas comuns: a intensificao do ritmo de trabalho, racionalizao do tempo,

    hierarquizao, fragmentao do processo de trabalho, que geram o trabalho como fator de

    negao da potencialidade humana e consequentemente causa manifestaes de alienao no

    sentido de alheamento e desumanizao dos trabalhadores.

    O Fordismo provocou manifestaes de alienao dentro de uma fbrica e a

    precarizao do trabalho que nela ocorre de forma generalizada; a exigncia do perfil de um

    operrio padro que cumpre cotas; um ritmo de trabalho enlouquecido; a influncia negativa

    do trabalho na subjetividade dos operrios, que afeta at mesmo suas relaes ntimas e

    interpessoais; a impregnao do tempo de trabalho ao tempo livre do trabalhador; e como

    ponto positivo, a tentativa constante e persistente de lutar pelo estabelecimento de uma forte

    unidade sindical, mas que no consegue ser objetivada.

    O taylorismo concentrou-se nas inovaes de gerncia, enquanto que, focado na

    dinamizao do processo de produo face organizao dos trabalhadores e do processo de

    trabalho, o fordismo trouxe profundas inovaes na produtividade. Esse modo de organizao

    do trabalho se implantou como uma das expresses mximas dos anos dourados:

    A difuso internacional do fordismo ocorreu em um contexto histrico e poltico-

    econmico particular, no qual os Estados Unidos tinham uma posio dominante,

    pelas alianas militares e pelas relaes de poder. O mercado de trabalho era

    dividido em um setor de monoplio e um outro setor competitivo, os dois muito

  • 49

    diferentes, em que os trabalhadores viviam em desvantagem. O Estado, ento, tinha

    de garantir um mnimo de bem-estar social a todos e tratar de transmitir os

    benefcios do fordismo, assegurando, sobretudo, assistncia sanitria adequada,

    moradia e instruo. (VASAPOLLO, 2005, p. 23)

    Como forma de continuidade aos princpios tayloristas de organizao do trabalho,

    Ford concretizou os conhecimentos estabelecidos pela Administrao Cientfica no processo

    de trabalho ocorrido em sua fbrica. Nesse contexto, seu objetivo foi adquirir um maior

    controle de regulao do trabalho, supervisionando todo o processo produtivo e, a partir disso,

    obter ganhos de produtividade.

    Introduziu a esteira no processo de montagem, inovao que possibilitou intensificar

    ainda mais a produtividade do trabalho e diminuir os tempos mortos na produo. Essa inovao permitiu o deslocamento da pea trabalhada at o trabalhador, a

    diminuio do tempo de produo, a sincronizao do ritmo de trabalho e a

    eliminao do controle realizado anteriormente mediante o uso do cronmetro,

    introduo feita por Taylor. (FIDALGO; MACHADO, 2000, p. 161)

    As inovaes criadas por Ford constituram no aumento da produtividade. Entretanto

    essas novas estratgias dependiam, alm das transformaes da organizao do trabalho, do

    controle por parte da gerncia, supervisionando a intensidade do trabalho.

    Um s exemplo, o da primeira linha de montagem numa esteira mvel completa,

    bastar como ilustrao de que retirada violenta dos trabalhadores de suas condies

    de anteriores e seu ajustamento s formas de trabalho projetado pelo capital um

    processo bsico no qual os principais papis so desempenhados no pela

    manipulao ou bajulao, mas por condies e foras socioeconmicas.

    (BRAVERMAN, 1980, p. 130).

    Os pontos principais das mudanas promovidas pelo fordismo foram a esteira e o

    Modelo T: O elemento chave da nova organizao de trabalho era a interminvel esteira

    transportadora, na qual os componentes do carro eram transportados e que, medida que

    passava, com paradas peridicas, os homens executavam operaes simples.

    (BRAVERMAN, 1980, p. 130). Sinteticamente, Ford utilizou de velhas tecnologias para

    racionalizar a produo e incrementar na produtividade. Trabalhadores estticos executavam

    seu trabalho em nveis altamente acelerados e mais distantes do controle do processo

    produtivo. Na mesma proporo o capitalista tem um maior controle sobre o ritmo de trabalho

    de seus empregados com a utilizao da esteira. O sistema fordista, estabelecido depois de

    um longo e complicado processo que durou quase meio sculo, em virtude de alguns

    obstculos que teve de superar, era tambm reforado pelas modalidades e mecanismos das

    intervenes estatais. (VASAPOLLO, 1995, p. 22).

  • 50

    O binmio taylorismo-fordismo foi to importante para o capitalismo monopolista que

    se expandiu para diversas reas da vida social, alterando o processo educativo, a ao dos

    indivduos e at mesmo o perfil do Estado.

    Em oposio aos instintos animais do homem, a industrializao fomentada pela racionalizao fordista era voltada para a rigidez e rotinizao no somente do trabalho, mas da prpria maneira de viver. Isto porque o

    industrialismo tinha como pressuposto incutir no trabalhador normas e

    hbitos que favorecessem o processo e os objetivos capitalistas a serem

    alcanados. O homem da indstria tinha de ser educado para um novo modo

    de viver e trabalhar, baseado na disciplina e submisso. Essa imposio

    deveria ser acatada pelos trabalhadores, porque estava em questo a

    manuteno da sua prpria sobrevivncia. (SANTOS, 2008, p. 28)

    A partir da crise dos anos 1960, iniciou- se um novo cenrio de fragmentao das

    polticas pblicas de Estado e uma rpida desregulamentao da economia mundial. O

    capitalismo passou do modelo de internacionalizao a um modelo voltado para a

    universalizao ou mundializao do capital. (CHESNAIS, 1996). Esse regime promoveu o

    envolvimento de diversas prticas poltico- institucionais e de controle de trabalho. Alm

    disso apresentou-se como interveno e resistncia por parte dos trabalhadores, que

    proporcionaram a produo massificada e acumulao capitalista at esgotar-se no final dos

    anos 1970. (PREVITALI, 2009)

    Silva Jnior (2002) deixa claro essa fragmentao ocorrida no cenrio mundial:

    1)a universalizao do capitalismo, particularmente por meio do capital produtivo

    macrogerido pelo financeiro, imps profundas mudanas no metabolismo social do

    mundo todo(...) 2) a profunda mudana no metabolismo social imps um novo

    processo de reproduo social que, por sua vez, implicou alteraes intensas nas

    estruturas sociais; e 3) isso ps em movimento reformas institucionais em vrias

    reas da atividade humana. (SILVA JNIOR, 2002, p.61)

    No final dessa dcada as classes operrias comearam a rearticular os movimentos

    trabalhistas com movimentos de contestao aos processos de trabalho autoritrio. Bernardo

    coloca que:

    Nas dcadas de 1960 e 1970, desenvolveu-se em todo o mundo um vasto

    movimento de contestao que, em vez de se limitar a exigir uma maior

    participao nas riquezas, teve como caractersticas principais colocar em causa a

    disciplina reinante nas empresas e processsar-se fora das instituies reivindicativas

    oficiais, ou at contra elas. (BERNARDO, 2004, p. 77).

    O novo quadro de revoltas e contestaes dos trabalhadores obrigou o capitalismo a

    passar por um processo de reestruturao produtiva, com objetivo de assegurar os altos

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    padres de lucro e conseguir novamente o controle social da classe trabalhadora. (BRITO,

    2008).

    Um modelo de organizao do trabalho voltada para os moldes da reestruturao

    produtiva do mundo do trabalho foi o toyotismo, implantado na fbrica da Toyota, no Japo e

    difundido para todo o mundo capitalista. (ANTUNES, 2001)

    As principais caractersticas do toyotismo so a horizontalizao do processo de