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7937 REFLEXÕES ACERCA DA TERCEIRIZAÇÃO TRABALHISTA NA ESFERA PÚBLICA. PENSANDO EN LA SUBCONTRATACIÓN DE TRABAJO EN LA ESFERA PÚBLICA. Lilian Katiusca Melo Nogueira RESUMO Entre tantas transformações no mundo do trabalho vivenciadas na contemporaneidade, merece destaque aquelas decorrentes da implantação da terceirização trabalhista, enquanto forma de organização da produção e da mão-de-obra, pautada nas propostas do modelo toyotista. Tal dinâmica trouxe graves conseqüências para a figura do trabalhador, precarizando direitos decorrentes das relações empregatícias pactuadas. Tal precarização reflete em um incessante embate de princípios constitucionais e trabalhistas, inviabilizando a consolidação do trabalho enquanto suporte de valor e fundamento das ordens econômica, social e do próprio Estado Democrático de Direito. Assim, torna-se imprescindível traçar um paralelo de princípios e demonstrar, entre tantos, qual deve prevalecer na ordem justrabalhista brasileira, sobretudo na esfera pública, no contexto da terceirização trabalhista. Serão propostas algumas medidas, a partir das breves reflexões traçadas, no sentido de legitimar a terceirização e fazer com que esse processo de organização e exploração do trabalho humano deixe de ser responsável pela violação do trabalho enquanto como fonte de (re)construção de identidade e inserção social. PALAVRAS-CHAVES: TERCEIRIZAÇÃO TRABALHISTA; ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA; PRINCÍPIOS; PROPOSTAS. RESUMEN Entre los muchos cambios en el mundo del trabajo contemporáneo, merece mencionar los derivados de la aplicación de la subcontratación de trabajo, como una forma de organización de la producción y la mano de obra, sobre la base de propuestas del modelo de Toyota. Esta dinámica ha traído graves consecuencias para la figura del trabajador, con la precariedad de los derechos que se deriven de las relaciones laborales. Esto refleja en un choque incesante de los principios constitucionales y laborales, dejando el labor que se valor y la base de órdenes económico, social y del Estado de Derecho democrático. Por lo tanto, es imprescindible trazar un paralelo de principios y Trabalho publicado nos Anais do XVII Congresso Nacional do CONPEDI, realizado em Brasília – DF nos dias 20, 21 e 22 de novembro de 2008.

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REFLEXÕES ACERCA DA TERCEIRIZAÇÃO TRABALHISTA NA ESFERA PÚBLICA.

PENSANDO EN LA SUBCONTRATACIÓN DE TRABAJO EN LA ESFERA PÚBLICA.

Lilian Katiusca Melo Nogueira

RESUMO

Entre tantas transformações no mundo do trabalho vivenciadas na contemporaneidade, merece destaque aquelas decorrentes da implantação da terceirização trabalhista, enquanto forma de organização da produção e da mão-de-obra, pautada nas propostas do modelo toyotista. Tal dinâmica trouxe graves conseqüências para a figura do trabalhador, precarizando direitos decorrentes das relações empregatícias pactuadas. Tal precarização reflete em um incessante embate de princípios constitucionais e trabalhistas, inviabilizando a consolidação do trabalho enquanto suporte de valor e fundamento das ordens econômica, social e do próprio Estado Democrático de Direito. Assim, torna-se imprescindível traçar um paralelo de princípios e demonstrar, entre tantos, qual deve prevalecer na ordem justrabalhista brasileira, sobretudo na esfera pública, no contexto da terceirização trabalhista. Serão propostas algumas medidas, a partir das breves reflexões traçadas, no sentido de legitimar a terceirização e fazer com que esse processo de organização e exploração do trabalho humano deixe de ser responsável pela violação do trabalho enquanto como fonte de (re)construção de identidade e inserção social.

PALAVRAS-CHAVES: TERCEIRIZAÇÃO TRABALHISTA; ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA; PRINCÍPIOS; PROPOSTAS.

RESUMEN

Entre los muchos cambios en el mundo del trabajo contemporáneo, merece mencionar los derivados de la aplicación de la subcontratación de trabajo, como una forma de organización de la producción y la mano de obra, sobre la base de propuestas del modelo de Toyota. Esta dinámica ha traído graves consecuencias para la figura del trabajador, con la precariedad de los derechos que se deriven de las relaciones laborales. Esto refleja en un choque incesante de los principios constitucionales y laborales, dejando el labor que se valor y la base de órdenes económico, social y del Estado de Derecho democrático. Por lo tanto, es imprescindible trazar un paralelo de principios y

Trabalho publicado nos Anais do XVII Congresso Nacional do CONPEDI, realizado em Brasília – DF nos dias 20, 21 e 22 de novembro de 2008.

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demostrar, entre muchos, aquèl que debe prevalecer en el orden justrabalhista brasileña, especialmente en la esfera pública, en el contexto de la subcontratación de la mano de obra. Algunas medidas se propone, a partir de breves reflexiones extraídas a fin de legitimar la subcontratación y que este proceso de organización y explotación del trabajo humano dejará de ser responsable por la violación trabajo como una fuente de (re) construcción de la identidad y la inclusión social.

PALAVRAS-CLAVE: SUBCONTRATACIÓN DE TRABAJO; EL GOBIERNO; LOS PRINCIPIOS; LAS PROPUESTAS.

INTRODUÇÃO

As transformações econômicas e sociais fortalecidas pela globalização e pelo neoliberalismo, sobretudo em meados dos séculos XX e XXI, fizeram com que os clássicos contratos de emprego perdessem o seu caráter teleológico, pautado na melhoria das condições de trabalho em favor dos empregados.

Surgiram, então, inúmeras precarizações na celebração desses contratos, tornando-os vagos e frágeis, em verdadeira afronta ao valor social do trabalho, fundamento do Estado Democrático de Direito, da Ordem Econômica e da Ordem Social[1]. Tais precarizações são conseqüências da flexibilização negativa das normas trabalhistas, fortalecida pela expansão de práticas desvantajosas ao trabalhador como, por exemplo, a terceirização trabalhista.

Entende-se por terceirização trabalhista a principal manifestação do modelo toyotista de produção. Segundo esse modelo, a empresa, na busca de maiores lucros e melhor qualidade diante de um mercado globalizado, deve se organizar horizontalmente: concentra suas forças nas atividades principais e elimina atividades consideradas supérfluas, periféricas, tornando-se uma empresa “enxuta”. Contrata, assim, empresas especializadas para desenvolver essas atividades, aumentando a produtividade em uma escala temporal menor.

O modelo toyotista ficou mundialmente conhecido e, no Brasil, sua maior expressão é a terceirização trabalhista, implantada ao final da década de 60 e início da década de 70. Era, pois, reflexo de uma busca incessante, por parte de empresas públicas e privadas, de auferir maiores lucros em um menor espaço temporal, sem que houvesse queda na qualidade da produção. A expectativa de maior lucratividade advinha, regra geral, do valor da mão-de-obra terceirizada, considerada mais barata, mas não necessariamente menos qualificada.

A terceirização é um fenômeno representante da modernização acelerada pela qual passa a sociedade brasileira, mas não acompanhada pela evolução jurídica. A insuficiência das previsões legais regedoras da terceirização serve como válvula

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intensificadora do fenômeno e, na mesma medida, da violação dos direitos trabalhistas, precarizando ainda mais as relações de trabalho.

Diante desse quadro de supressão de direitos trabalhistas, conquistados ao longo da história, torna-se necessária a imposição de limites à prática da terceirização, nos âmbitos privado e público, como fim precípuo de (re) estabelecer o valor social do trabalho enquanto instrumento de promoção de um trabalho digno, fundamento das ordens econômica e social.

Assim, esse trabalho apresentará as problemáticas da terceirização especificamente no setor público, propondo soluções viáveis à luz de princípios constitucionais e trabalhistas. São propostas que não visam erradicar a terceirização nos setores públicos, mas sim inibir fenômeno cuja incidência reflete, na atual conjuntura, o grande descaso atribuído às relações de trabalho.

Primeiramente, será desenvolvido um breve panorama histórico-normativo da terceirização. Após, serão evidenciados os princípios constitucionais e trabalhistas mais relevantes à abordagem do tema, cuja observância deve ser obrigatória em toda e qualquer relação de trabalho no âmbito público. Será, pois, o momento oportuno para apresentação da teoria axiológica de Robert Alexy.

Em um terceiro momento, serão traçadas as hipóteses legais de incidência da terceirização especificamente na Administração Pública, bem como os efeitos advindos de sua aplicabilidade. No item seguinte, ponto central do trabalho, serão apresentadas propostas que, uma vez aplicadas de forma conjunta, possivelmente reestruturarão as relações de trabalho triangulares na esfera pública e, vias de conseqüência, também na esfera particular.

É de suma importância o estudo da ocorrência da terceirização trabalhista em âmbito público, exigindo dos operadores do Direito uma total mobilização no sentido de impor limites à sua incidência. São alternativas capazes de promover a (re) construção do valor social do trabalho (trabalho enquanto instrumento de inclusão social e construção de identidades) na sociedade contemporânea.

I – EVOLUÇÃO NORMATIVA DA TERCEIRIZAÇÃO TRABALHISTA

A terceirização, enquanto principal manifestação do modelo toyotista, recebeu as primeiras regulamentações legais na esfera estatal, como reflexo do movimento de descentralização administrativa, com o Decreto-Lei 200, de 1967. Nesse sentido, MAURÍCIO GODINHO DELGADO afirma:

No quadro da reforma administrativa, intentada em meados da década de 1960, no âmbito das entidades estatais da União (...), foram expedidos dois diplomas que estimulavam a prática de descentralização administrativa, através da contratação de serviços meramente executivos ou operacionais perante empresas componentes do segmento privado da economia.[2]

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Esses diplomas legais mencionados pelo autor referem-se ao Decreto-Lei 200/67, e à Lei 5.645/70 (estabelece quais são esses serviços executivos ou operacionais: transporte, conservação, custódia, operação de elevadores, limpeza, e outras atividades semelhantes). Não se falava, claramente, em terceirização de serviços, mas já se previa a dinâmica trilateral, que fugia da relação de emprego clássica (bilateral) e evidenciava o nascimento de fenômeno ainda hoje em ascensão.[3]

Posteriormente, em 1974, promulgou-se a Lei 6.019, regulamentando o trabalho temporário, e, em 1983, a Lei 7.102, regulamentando o trabalho de vigilância, a princípio apenas bancária. Esta foi alterada, já em 1994, pela Lei 8.863, ampliando a hipótese de se terceirizar serviços de vigilância não apenas para instituições bancárias, mas para toda e qualquer empresa, e ainda por pessoas físicas.

Em 1986, editou-se a Súmula 256 do TST, substituída, em 1993, pela Súmula 331, também do TST, e atualmente em vigor com o seguinte texto:

TST Enunciado nº 331 - Revisão da Súmula nº 256 - Res. 23/1993, DJ 21, 28.12.1993 e 04.01.1994 - Alterada (Inciso IV) - Res. 96/2000, DJ 18, 19 e 20.09.2000 - Mantida - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003

Contrato de Prestação de Serviços - Legalidade

I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).

II - A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da administração pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988). (Revisão do Enunciado nº 256 - TST)

III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20-06-1983), de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.

IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título executivo judicial (art. 71 da Lei nº 8.666, de 21.06.1993). (Alterado pela Res. 96/2000, DJ 18.09.2000)

A edição da Súmula 331 do TST, que recebeu sua última alteração no ano de 2000, é considerada um avanço na regulamentação da terceirização trabalhista. Isso

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porque ela incorporou todas as hipóteses de terceirização, inclusive da esfera pública, distinguiu[4] atividades-meio de atividades-fim e busca esclarecer a fundamental diferença entre terceirização lícita e ilícita.[5]

A terceirização tornou-se a principal marca das organizações empresariais a partir das décadas de 60 e 70, mas não mereceu o devido respaldo legal. Assim, tem-se um fenômeno precariamente orientado por legislações infraconstitucionais e Súmula, causador de relações trabalhistas, na mesma medida, precárias.

A recorrência dessa modalidade precária de contratação exige posturas da sociedade e dos operadores do Direito no sentido de limitá-la, reestruturando-a aos moldes dos valores e princípios constitucionais.

II – PRINCÍPIOS RELEVANTES

Após desenvolver um breve panorama histórico-jurídico da terceirização, imprescindível fazer uma análise de alguns princípios essenciais à condução de uma boa Administração Pública e, ainda, no contexto da terceirização trabalhista, os princípios que regulamentam as relações de trabalho a fim de torná-las mecanismos de promoção da dignidade e inclusão social.

2.1 PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA.

Como bem afirmou CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, os princípios componentes do regime jurídico-administrativo possuem raízes constitucionais, sejam elas implícitas ou explícitas[6].

Dar-se-á ênfase aos princípios constitucionais da legalidade, moralidade e eficiência, constantes no artigo 37, caput, da CR/88 (ao lado de outros dois princípios: impessoalidade e publicidade) e, também, ao princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, por ser ele “implicação evidente do próprio Estado de Direito, e, pois, do sistema constitucional como um todo”.[7]

Trata-se o princípio da legalidade de princípio específico do Estado de Direito, do qual se pode aduzir que o Estado deve também se subordinar às leis. É, pois, uma imposição de limites à atuação estatal, como forma de orientar suas condutas e garantir o equilíbrio das relações administrador-administrado. Nas palavras de BANDEIRA DE MELLO,

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Para avaliar corretamente o princípio da legalidade e captar-lhe o sentido profundo, cumpre atentar para o fato de que ele é tradução jurídica de um propósito político: o de submeter os exercentes do poder em concreto – o administrativo – a um quadro normativo que embargue favoritismos, perseguições ou desmandos. (...) Pretende-se através da norma geral, abstrata e por isso mesmo impessoal, a lei, editada, pois, pelo Poder Legislativo (...) garantir que a atuação do Executivo nada mais seja senão a concretização da vontade geral.[8]

Assim, também a atividade administrativa deve se submeter às leis, vez que estas emanam do povo e correspondem à vontade geral. Não pode haver excessos, arbitrariedade por parte do administrador. Completando, BANDEIRA DE MELLO afirma que “o princípio da legalidade, no Brasil, significa que a Administração nada pode fazer senão o que a lei determina.”[9]

Nesse caso, só poderá haver contratação de mão-de-obra por meio de realização de concurso público de provas ou de provas e títulos, conforme disposto no art. 37, II, da CR/88[10]. Caso contrário, deverão ser estabelecidos alguns critérios para que essas contratações sejam limitadas, assegurando aos contratados maior segurança e garantia de seus direitos.

Ao lado do princípio da legalidade, tem-se o princípio da moralidade, segundo o qual “a Administração e seus agentes têm de atuar na conformidade de princípios éticos”[11]. Qualquer ato que importe em inobservância do princípio da moralidade[12] deverá ser devidamente punido, considerado ato de improbidade administrativa, aos moldes do art. 37, §§ 2º e 4º, da CR/88, e Lei 8.429/92[13].

Nas contratações feitas sem observância do requisito concurso público e que causem supressão de direitos, além de violar o princípio da legalidade – sob a ótica constitucional -, atenta também contra o princípio da moralidade. A Administração e seus agentes perdem a atribuição que lhes é imposta – resguardo de direitos - em atos totalmente desprovidos de ética, lealdade e boa-fé.

A contratação de mão-de-obra terceirizada é, muitas vezes, forma de se garantir a eficiência dos serviços públicos prestados. Os serviços devem ser de boa qualidade e satisfatórios para a sociedade. Além disso, devem ser prestados em tempo hábil. São, pois, exigências que se aproximam dos objetivos de se terceirizar em âmbito privado e que, de alguma forma, poderia favorecer o desenvolvimento de atividades no setor público. Assim, tem-se como respaldo o princípio constitucional da eficiência, enfatizado nesse tipo de dinâmica.

Porém, os princípios devem ser aplicados de forma conjunta, e a inobservância de qualquer um deles compromete a efetivação dos demais. A ênfase dada ao princípio da eficiência acarreta a negação do princípio da legalidade e da moralidade e, na prática, há negação da própria eficiência, causada pela insatisfação dos trabalhadores que se inserem nessa dinâmica. Deve-se prezar pela observância de todos os princípios, e não apenas um, de forma excludente.

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Além da obrigatoriedade de se observar os princípios da moralidade, legalidade, eficiência, publicidade e impessoalidade, cabe à Administração ainda orientar seus atos como forma de se garantir a supremacia do interesse público em detrimento do interesse privado.

Significa que a Administração não poderá agir em defesa de interesses particulares. Deve-se visar à proteção e garantia dos interesses da coletividade, do todo social, o interesse, pois, público. Assim, nas palavras de Bandeira de Mello,

Como expressão dessa supremacia, a Administração, por representar o interesse público, tem a possibilidade, nos termos da lei, de constituir terceiros em obrigações mediante atos unilaterais. Tais atos são imperativos como quaisquer atos do Estado.[14]

Não se trata apenas de poderes que determinam algumas prerrogativas essenciais ao bom funcionamento e condução do Estado; são, na verdade, “deveres-poderes” que se orientam pelo “dever de buscar, no interesse de outrem, o atendimento de certa finalidade”. Como via para se cumprir esse dever, são atribuídos alguns poderes à Administração, que serão nada mais que meios para o cumprimento das finalidades do Estado.[15]

Assim, quanto ao princípio da supremacia do interesse público, pode-se afirmar que a Administração tem o “dever-poder”, mediante atos unilaterais que lhe são peculiares – como manifestação de poder -, de constituir terceiros para desenvolvimento de algumas atividades. Tem, todavia, o dever de garantir que esses atos estejam em consonância com o ordenamento jurídico, sobretudo aos princípios.

Essa lógica é extremamente importante ao se pensar na terceirização trabalhista. A Administração tem o poder de constituir terceiros, mediante contratação de empresas prestadoras de serviços (ou empresas terceirizantes) para desenvolvimento de algumas atividades[16]. Porém, terá o dever de garantir aos prestadores de serviços a manutenção de direitos que, pela dinâmica triangular, são suprimidos.

Porém, na atual conjuntura, o que ocorre é um desequilíbrio entre o poder e o dever atribuídos à Administração Pública. Esta atua apenas na esfera do poder que lhe é conferido, mas não na esfera do dever. Há, pois, a não observância dos direitos e princípios promovedores do trabalho digno – dever não observado pela Administração -, decorrentes da aplicação equivocada da supremacia do interesse público.

O interesse público, nessa perspectiva, não deve se restringir à atividade estatal. Ele envolve, sobretudo, a garantia de direitos dos administrados, e não violação.

Há sacrifícios dos princípios da moralidade, da legalidade e da eficiência em prol da supremacia do interesse público. Porém, há sacrifício inclusive do interesse público, vez que a Administração atua apenas como detentora de poder, e não de “dever-poder”.

Não há, pois, que se falar em valorização do interesse público nas hipóteses de terceirização na esfera pública. O sacrifício dos demais princípios não se justifica,

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inexistindo fundamento para tal conduta. Em decorrência, tem-se a supressão do valor social do trabalho com a precarização do labor humano.

Diante desse diagnóstico, serão apresentadas propostas para limitar a ocorrência da terceirização na Administração por meio da observância de todos os princípios constitucionais e trabalhistas. Claro que esses princípios incidirão em graus diferenciados, conforme cada circunstância. Deve-se, pois, haver um critério de ponderação de princípios, conforme previsto na axiologia de Robert Alexy, a seguir analisada (item 2.3).

2.2 PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO.

No ramo justrabalhista, fundamental a abordagem de alguns princípios, sejam eles especiais ou constitucionais, como instrumentos eficazes à promoção do trabalho decente[17] (denominado por Gabriela Neves Delgado de “trabalho digno”[18]). Segundo Alice Monteiro de Barros, esses princípios “têm como funções informar o legislador, orientar o juiz na sua atividade interpretativa, e, por fim, integrar o direito, que é sua função normativa”.[19]

São pertinentes à abordagem do tema os princípios da proteção e da continuidade da relação de emprego, e, ainda, o valor social do trabalho.

Quanto ao princípio da proteção, visa ele corrigir desigualdades nas relações de trabalho, “criando uma superioridade jurídica em favor do empregado, diante de sua condição de hipossuficiente”.[20] Trata-se, pois, de princípio “que influi em todos os segmentos do Direito Individual do Trabalho, influindo na própria perspectiva desse ramo ao construir-se, desenvolver-se e atuar como direito”.[21] É, em síntese, o inspirador no complexo de regras, princípios e institutos que orientam o Direito do Trabalho.[22]

O princípio da continuidade da relação de emprego visa à preservação do emprego, atribuindo maior segurança econômica ao empregado.

A permanência do empregado na dinâmica e estrutura empresariais provoca, segundo MAURÍCIO GODINHO DELGADO, “três correntes de repercussões favoráveis ao empregado envolvido”.[23] Primeiro, há uma tendencial elevação de direitos, decorrentes de negociações coletivas, promoções e vantagens reconhecidas ao empregado; segundo, presume-se o investimento educacional e profissional, qualificando a mão-de-obra do obreiro. Segundo o autor, “(...) esse investimento na formação do indivíduo cumpre a fundamental faceta do papel social da propriedade e da função educativa dos vínculos de labor, potenciando, individual e socialmente, o ser humano que trabalha”.[24]

A terceira “corrente de repercussões favoráveis” relaciona-se à afirmação social, vez que, por meio de seu trabalho e da estabilidade econômica advinda dele, a pessoa se

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sente incluída no meio em que vive; é reconhecido a ela o sentido de pertencimento social.

A manutenção da continuidade da relação de emprego é, dessa maneira, imprescindível para reconhecimento e extensão dessas conseqüências positivas advindas da relação empregatícia.

O valor social do trabalho está previsto no art. 1º, inciso IV, da CR/88, como fundamento do Estado Democrático de Direito, da Ordem Econômica (art. 170, caput, CR/88) e base da Ordem Social (art. 193, CR/88).[25]

Assim, o trabalho, enquanto valor social, deverá ser protegido. É necessário, para tanto, consolidar um rol de direitos denominados por Delgado de “direitos trabalhistas de indisponibilidade absoluta”, organizados em três eixos jurídicos, capazes de garantir o direito fundamental ao trabalho digno. O primeiro eixo é compreendido pelos direitos trabalhistas estabelecidos nas normas de tratados e convenções internacionais ratificadas pelo Brasil; o segundo eixo está previsto pelo rol dos direitos constitucionais trabalhistas; finalmente, segue o terceiro eixo, presente nas normas infraconstitucionais, em especial na Consolidação das Leis do Trabalho.[26]

A extensão desses três eixos de direitos trabalhistas de indisponibilidade absoluta a qualquer trabalhador promoverá o trabalho digno (ou trabalho decente), por meio do qual há (re) construção de identidades e inclusão social.[27]

Quando se fala em extensão de direitos a qualquer trabalhador, estão incluídos aqueles trabalhadores contratados, via terceirização trabalhista, pela esfera pública. Trata-se de consolidar, na referida esfera, o valor social do trabalho, como orientação superior aos próprios princípios da Administração Pública, pois o trabalho, nas palavras de GABRIELA NEVES DELGADO, “em sua vivência individual e social, valoriza o homem, assegurando-lhe a mais ampla sociabilidade. (...) Por isso é o trabalho entendido como critério essencial da vida humana”.[28]

Essa essencialidade deve ser resguardada, sobretudo pelo Estado. A forma de se resguardá-la, não há dúvida, será pela efetivação do valor social do trabalho enquanto valor supremo das dinâmicas trabalhistas, principalmente, como “um dos mais notáveis marcos de estruturação da democracia social no mundo contemporâneo”.[29]

Para evidenciar a predominância do valor social do trabalho, sem que haja supressão de outros valores e princípios, fundamental a análise da filosofia dos valores de Robert Alexy, a seguir.

2.3 TEORIA AXIOLÓGICA DE ALEXY: BREVE ABORDAGEM.

Trata-se a terceirização trabalhista de modalidade que independe de realização de concurso público de provas e provas e títulos. Há, nessa dinâmica terceirizante desenvolvida pela esfera pública, inobservância do princípio da legalidade, da

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moralidade e da eficiência, decorrente da deturpação da verdadeira noção de supremacia do interesse público, momento em que a Administração deveria atuar enquanto detentora de “dever-poder”.

Assim, como efeito dominó, há violação de outros princípios, como o da proteção ao empregado e da continuidade da relação de emprego.

Essa inaplicabilidade de princípios, em detrimento da supremacia do interesse público[30], não se justifica ao se pensar da teoria axiológica de Robert Alexy, segundo a qual não há que se falar em sobreposição, sacrifício de princípios, mas sim concorrência. Nesse caso, deve-se promover um ato de escolha, preferência, ponderação[31]. No mesmo sentido, afirma FELIPE SILVA DA CONCEIÇÃO: “Os princípios (...) possuem ‘dimensão de peso’, ou seja, admitem a ponderação de forma que seja aplicada ao caso concreto na exata medida de sua proposição”.[32]

No caso em análise – terceirização em âmbito público – devem-se considerar os fins do Estado, enquanto democrático e de Direito, em consonância com os fins sociais do trabalho, valor constitucionalmente previsto, e garantido por meio de princípios peculiares à esfera trabalhista: proteção e continuidade da relação de emprego.

O trabalho, na acepção constitucional, é suporte de valor. Nessa perspectiva, imprescindível a diferenciação entre valor e normas, feita por Elza Maria Miranda Afonso:

Onde há normas, há valores, embora a recíproca não seja verdadeira. A vivência dos valores preenche nosso mundo de significado e torna a vida de uma riqueza inesgotável, na medida em que eles podem ser descobertos e apreendidos em uma pluralidade incontável. Os valores não necessitam de normas para se manifestarem, para serem apreendidos e vivenciados. Mas as normas não podem existir sem eles.[33]

Por essa abordagem, pode-se afirmar que o valor encontra-se em uma esfera superior às normas; logo, em uma esfera superior aos princípios.[34] Assim, não há que se falar em sacrifício de princípios, mas em atos de escolha, ponderação, por meio de critérios racionais, razoáveis e proporcionais.

A terceirização em âmbito público requer a efetivação dos princípios da legalidade, da moralidade, da eficiência, da proteção e da continuidade da relação de emprego. Mas, ao se fazer a ponderação, à luz da teoria axiológica de Alexy, deve-se prezar pelos princípios da proteção e da continuidade e por uma efetiva supremacia do interesse público, como forma de se garantir o valor social do trabalho, superior aos princípios regedores da própria máquina estatal.

Dessa forma, ter-se-á, certamente, a consolidação do valor-trabalho, enquanto fundamento do Estado Democrático de Direito, da Ordem Econômica e Social. Em outras palavras, cumprirá o trabalho seu fim precípuo: o social, enquanto mecanismo de afirmação de identidade e inclusão social, tornando “a vida de uma riqueza inesgotável”[35] e determinando a valorização do “próprio sujeito que labora”[36].

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III – A INCIDÊNCIA DA TERCEIRIZAÇÃO NO SETOR PÚBLICO

A terceirização é modalidade que prescinde a realização de concurso público[37] de provas ou de provas e títulos para investidura em cargo ou emprego público e que, nas palavras de CONCEIÇÃO, “representam verdadeira reestruturação do Estado no que diz respeito aos seus objetivos e às suas obrigações”. Assim, para o mesmo autor, terceirização, na esfera pública, deve ser entendida em sentindo estrito, ou seja, deve se restringir a atividades destituídas de qualquer prerrogativa de Poder Público[38], enumeradas a seguir.

3.1 HIPÓTESES DE INCIDÊNCIA.

Assim como no âmbito privado, é legal a terceirização de serviços em situações que autorizam a contratação de trabalho temporário, previstas no art. 2º da Lei 6.019/74 (necessidade transitória de substituição de pessoal regular e permanente ou o acréscimo extraordinário de serviços – art. 2º, Lei 6.019/74). É, pois, modalidade de terceirização temporária.

Permitida também a terceirização segundo disposto na Súmula 331 do TST, na modalidade permanente, que assim estabelece em seu inciso III:

III - não há vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei 7.102/83) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.

O inciso supracitado identifica as três hipóteses legais de terceirização permanente: a) serviços de vigilância; b) serviços de conservação e limpeza; c) serviços especializados ligados à atividade meio do tomador.

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São, pois, permissivos legais que se enquadram perfeitamente nas hipóteses previstas no Decreto-lei 200/67 e na Lei 5.645/70, que enumeram um rol taxativo de atividades terceririzáveis, por serem destituídas (em tese) de prerrogativas do poder público. Assim prevê o art. 3º, § único, da Lei 5.645:

Art. 3º (...)

Parágrafo único: As atividades relacionadas com transporte, conservação, custódia, operação de elevadores, limpeza e outras assemelhadas serão, de preferência, objeto de execução mediante contrato, de acordo com o art. 10, §7º, do Decreto-Lei 200 (...).

Essas atividades são, pois, atividades-meio da Administração Pública. Nesse sentido, DELGADO afirma que “todas as atividades referidas nesse rol encontram-se unificadas pela circunstância de dizerem respeito a atividades de apoio, instrumentais, atividades-meio”.[39]

São atividades consideradas subalternas, apesar de essenciais para o bom funcionamento da esfera estatal. Assim, questiona-se sobre a admissibilidade de se terceirizar essas atividades, sobretudo devido à violação de princípios e valores, gerando efeitos drásticos ao se pensar no sujeito que labora.

3.2 EFEITOS.

A terceirização de serviços, talvez por ausência de regulamentação precisa, talvez pela burla à previsão atual, mostra-se como prática extremamente precarizante das relações de trabalho. Sob esse prisma, afirma JORGE LUIZ SOUTO MAIOR que:

(...) a idéia de precarização é da própria lógica da terceirização, pois, como explica Márcio Túlio Viana, as empresas prestadoras de serviços, para garantirem sua condição, porque não têm condições de automatizar sua produção, acabam sendo forçadas a precarizar as relações de trabalho, para que, com a diminuição do custo-da-obra, ofereçam seus serviços a um preço mais acessível, ganhando, assim, a concorrência perante outras empresas prestadoras de serviços.[40]

No mesmo sentido, afirma RUTE GUSMÃO:

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As empresas terceiras tendem, em geral, a reproduzir a lógica da empresa-mãe de evitar encargos trabalhistas e produzir lucros. Uma pesquisa do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) mostrou que a subcontratação no Brasil tem conduzido, na maioria das vezes, ‘à redução de salários, à perda de benefícios sociais, à piora das condições de trabalho, à fragmentação da representação sindical, ao ataque às organizações e às conquistas sindicais’.”[41]

Assim, essa precarização de direitos, conseqüência da terceirização impensada de serviços, na esfera pública e privada, provoca um grande embate de princípios constitucionais e especiais, do direito trabalhista e administrativo, impossibilitando a efetivação do trabalho enquanto suporte de valor.

Há, ainda – e aqui também na esfera privada – um agravamento da acepção da mão-de-obra como sendo descartável, substituível a qualquer momento. Como bem afirmou MÁRCIO TÚLIO VIANA, “o problema é que dentre o material descartável se inclui o trabalho humano. E as conseqüências são drásticas.”[42]

Ademais, há significativa redução dos postos de trabalho e dos salários, fragilizando também a situação dos permanentes. Dobra-se a carga de subordinação[43] e, na mesma medida, degrada-se ainda mais as condições de saúde e higiene no trabalho.[44]

Na esfera coletiva, há fragmentação das categorias, inibindo o sentimento de classe e restringindo o exercício de greve, devido à alta rotatividade e à ausência de previsão legal quanto à sindicalização dos terceirizados.[45]

Percebe-se, pois, que os efeitos são perversos, tanto para a esfera individual quanto para a coletiva, razão pela qual se torna medida imprescindível a propositura de mecanismos capazes de coibir seu exercício.

IV - PROPOSTAS PARA PRÁTICAS TERCEIRIZANTES AOS MOLDES DO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO.

A terceirização, enquanto modelo de gestão, mostra-se como prática carente de regulamentação eficaz ao combate das fraudes trabalhistas, sobretudo ao que concerne às especificidades da Administração Pública. Sendo assim, propõem-se algumas medidas que certamente inibirão prática que suprime os denominados direitos de indisponibilidade absoluta. São as seguintes propostas:

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4.1 ATIVIDADE-MEIO VERSUS ATIVIDADE-FIM.

A primeira proposta prevê o fim da dicotomia “atividade-meio” x “atividade-fim” para configurar a ilicitude da terceirização. Essa diferenciação não é suficiente para configurar a licitude ou ilicitude da terceirização. Independente do tipo de atividade terceirizada, seja ela meio ou fim, qualquer relação orientada pelo fenômeno trilateral deve ser declarada nula, ou então que seja a responsabilidade, em qualquer hipótese, solidária. Nesse sentido, afirma JORGE LUIZ SOUTO MAIOR:

No que tange à terceirização, é preciso, urgentemente, reconhecer o equívoco da Súmula 331 do TST, que transforma o empregado em coisa (“coisificação do ser humano”), declarando nulo qualquer tipo de intermediação de mão-de-obra, afirmando o vínculo de emprego diretamente com o tomador de serviços, seja em atividade-fim, seja em atividade-meio, pois o ser humano não pode ser mercantilizado. No mínimo, não se chegando ao resultado anterior, há de se declarar a responsabilidade solidária entre as empresas tomadoras e prestadoras e conferir aos empregados da empresas prestadoras os mesmos direitos, individuais e coletivos, dos trabalhadores das empresas tomadoras.[46]

Não há que se negar a grande contribuição do citado autor e sua visível indignação diante das práticas terceirizantes. Nessa mesma perspectiva, propõe aqui o rompimento da dicotomia atividade-fim x atividade-meio[47], para fins de configuração da ilicitude da terceirização e da responsabilidade do tomador de serviços, mas não em toda e qualquer circunstância.

Considerar-se-á ilícita qualquer terceirização que viole os direitos trabalhistas de indisponibilidade absoluta, seja ela de atividades-meio, ou atividades-fim. Para essa configuração, deve-se analisar, criteriosamente, o caso concreto, mas sempre à luz do valor social do trabalho e da observância dos três eixos de direitos trabalhistas de indisponibilidade absoluta.

4.2 A RESPONSABILIDADE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA.

A dinâmica exige a análise das duas formas de manifestação da terceirização: a lícita e a ilícita.

A) Terceirização lícita

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A terceirização é considerada lícita desde que esteja restrita às hipóteses legais. Segundo DELGADO, “as situações-tipo de terceirização lícita estão, hoje, claramente assentadas pelo texto da Súmula 331 do TST”.[48]

Para essas hipóteses, a mesma Súmula prevê a responsabilidade da empresa tomadora como sendo subsidiária, mais precisamente em seu inciso IV.[49] A responsabilidade decorre de um ato lesivo a um interesse patrimonial e moral e, por esse motivo, deve ser reparado. Nesse sentido, Barros afirma que:

(...) toda atividade lesiva a um interesse patrimonial ou moral gera a necessidade de reparação, de restabelecimento do equilíbrio violado, que é o fato gerador da responsabilidade civil. (...) A função da responsabilidade é, portanto, servir como sanção civil, de natureza compensatória. Essa sanção funda-se na culpa (responsabilidade subjetiva) e também no risco (responsabilidade objetiva).[50]

Importante lembrar, ainda, que para configuração da licitude da terceirização não pode haver pessoalidade e tampouco subordinação direta do trabalhador em relação à tomadora de serviços.[51]

Em âmbito privado, cabe à empresa tomadora, em caso de inadimplência da prestadora, pagar as verbas decorrentes da relação de emprego como se empregadora fosse. Poderá, pois, reclamar a restituição dessas verbas por meio de ação de regresso contra a prestadora de serviços.

O mesmo ocorrerá na esfera pública, por incorrer, assim como os particulares, em culpa in eligendo e in vigilando. Nesse sentido, BARROS afirma que:

O tomador de serviços responderá, na falta de previsão legal ou contratual, subsidiariamente, pelo inadimplemento das obrigações sociais a cargo da empresa prestadora de serviços. Trata-se de uma responsabilidade indireta, fundada na idéia de culpa presumida (in eligendo), ou seja, na má escolha do fornecedor da mão-de-obra e também no risco (art. 927, § único, Código Civil de 2002), já que o evento, isto é, a inadimplência da prestadora de serviços, decorreu do exercício de uma atividade que se reverteu em proveito do tomador.[52]

Assim, é melhor reconhecer a validade da terceirização, implicando na responsabilidade subsidiária, à sua ilicitude, conforme demonstrado a seguir.

B) Terceirização ilícita

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Restará configurada a terceirização ilícita uma vez excluídas as quatro situações-tipo previstas na Súmula 331 do TST e, ainda, presentes a pessoalidade e a subordinação direta do trabalhador em relação ao tomador.

Nesse caso, haverá desconstituição da relação trilateral para celebração de relação empregatícia diretamente com o tomador de serviços. Porém, tal regra não pode ser aplicada na terceirização de serviços da esfera pública.

Já que para essa contratação não se exige concurso público, não poderá ser reconhecido qualquer vínculo entre trabalhador e tomadora de serviços. Caso contrário, haveria violação expressa a preceito constitucional (art. 37, inciso II, CR/88); conseqüentemente, o não reconhecimento de direitos importa em incentivo à irregular contratação. Deve, portanto, punir os responsáveis. Nesse sentido, afirma CONCEIÇÃO:

Tendo em vista que a terceirização de serviços pela Administração Pública apresenta um risco assumido pelo administrador, que prefere repassar o exercício de uma atividade ao invés de criar um corpo burocrático próprio para seu desempenho, tal risco deve ser assumido em sua plenitude, sem que haja prejuízos para aqueles que puseram, indiretamente, sua mão-de-obra a serviço do interessado.[53]

Porém, não é o que ocorre na prática. Quando configurada a ilicitude da terceirização (circunstância de contratação irregular), mesmo sendo ela beneficiária direta dos serviços prestados, o trabalhador faz jus apenas ao salário e ao FGTS, nos termos da Súmula 363 do TST.[54] O risco, pois, não é assumido em sua plenitude.

Percebe-se que, dessa forma, mesmo sendo a terceirização ilícita, é menos danosa ao trabalhador a configuração da licitude da terceirização, como forma de se reconhecer a responsabilidade subsidiária da Administração.

Caso contrário, deve-se desprezar a Súmula 363 do TST e invocar a aplicação da responsabilidade solidária combinada com aplicação atenuada da teoria trabalhista das nulidades. Segundo essa teoria, a aplicação restrita (ou atenuada) ocorrerá quando atingir interesses privados e, na mesma medida, interesses públicos.[55]

A solução, ao aplicar essa teoria, é a de se reconhecer todas as verbas devidas ao longo do pacto laboral, mas não reconhecer o direito às verbas rescisórias (aviso prévio, 40% FGTS e seguro desemprego). Terá a Administração que arcar com os custos da irregularidade, como forma de se punir e coibir a incidência de contratações irregulares.

4.3 ALTERAÇÕES NA LEI 6.019/74.

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Omissa a Lei, devem-se promover algumas alterações essenciais para limitar a terceirização.

Para as atividades a serem terceirizadas, deve-se manter um percentual mínimo de trabalhadores permanentes, para que estes sirvam de paradigma para o reconhecimento de direitos dos temporários. Ademais, as hipóteses devem se abster apenas naquelas previstas pelo Decreto-Lei 200/67. Vale dizer: não basta que se trate de necessidade transitória de substituição de pessoal regular e permanente ou o acréscimo extraordinário de serviços (art. 2º, Lei 6.019/74); a contratação deve ser restrita ao rol taxativo previsto no art. 10, § 7º, do Decreto-Lei 200.

Quanto à renovação do contrato, é, atualmente, permitida por mais três meses, desde que autorizada pelo Ministério do Trabalho e Emprego. Porém, se realizada a contratação temporária pela Administração Pública, não será permitida a renovação do contrato. Além disso, deve-se estabelecer um intervalo, de no mínimo doze meses, entre uma contratação e outra (sucessividade dos contratos). Caso contrário, deixarão de ter o caráter da excepcionalidade, previsto na lei.

Para reforçar, é necessário prever a impossibilidade de, além de contratar a mesma pessoa, contratar outra para o exercício da mesma atividade. Para tanto, deve-se cumprir o prazo mínimo de doze meses entre uma contratação e outra.

São alterações que, certamente, propiciarão avanços significativos ao se pensar na terceirização. Claro que não de forma isolada. É necessária a implementação de outras medidas que ao mesmo passo inibem o fenômeno e garantem direitos em casos de sua ocorrência.

4.4 OUTRAS PROPOSTAS.

Além das propostas já anunciadas, propõe-se também determinar um percentual máximo de trabalhadores que podem ser terceirizados, de acordo com o número de trabalhadores necessários ao desenvolvimento da atividade. Essa limitação visa garantir efetiva igualdade entre servidores e terceirizados, em consonância com o Regime Jurídico adotado (seja ele estatutário ou celetista), exceto ao que concerne à estabilidade decorrente do concurso público.

Ademais, plausível o remanejamento dos servidores “ociosos”, reabsorvendo a mão-de-obra por meio de cursos de atualização e especialização, ofertados pela própria máquina estatal[56]. Trata-se de uma forma de se prezar pelo princípio da eficiência e pela qualidade dos serviços prestados, diminuindo a necessidade de se terceirizar algumas atividades.

Não há que se dispensar a punição da autoridade administrativa, aos moldes do § 2º, art. 37, CR/88 e Lei 8.429/92 (enriquecimento ilícito) e também § 4º, art. 37, CR/88.

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Por fim, essencial a atuação dos sindicatos dos servidores enquanto fiscal dos contratos entre Administração Pública e empresa prestadora de serviços, verificando, em cada caso, a necessidade da contratação e a prescindibilidade de realização de concurso público. Deverá, juntamente com a Administração, promover a capacitação dos servidores e autorizar o remanejamento, obedecendo as particularidades de cada caso.

V - CONSIDERAÇÕES FINAIS

A conjugação das propostas apresentadas certamente inibirá as práticas precarizantes da terceirização, sem que as torne inviáveis. São, na verdade, fórmulas que conciliam a proteção do trabalhador - mais precisamente do valor social do trabalho - e as prerrogativas da Administração Pública à terceirização trabalhista, adequando-a aos interesses públicos e particulares, efetivando o sistema harmônico de valores que regem as relações jurídicas e sociais contemporâneas.

Entre a concorrência de princípios, relevante zelar, via critérios de ponderação, pela predominância dos princípios especiais trabalhistas em detrimento de outros princípios, como forma de se prezar pela efetivação do valor social do trabalho (valor constitucional responsável pela promoção do trabalho decente), em qualquer esfera (pública ou privada). Fala-se em predominância de um princípio, o que equivale a dizer que os demais princípios continuarão a reger a relação, porém em níveis diferenciados. Constituirão, pois, uma base principiológica rígida, capaz de assegurar o valor-trabalho enquanto instrumento de promoção da dignidade e estrutura do Estado Democrático e de Direitos.

Espera-se, por meio das reflexões traçadas, que haja uma mobilização da sociedade e dos operadores do Direito no sentido de fortalecer o movimento de luta pela proteção do trabalhador, sobretudo daquele inserido na dinâmica triangular atualmente pactuada, em grandes proporções, pela Administração Pública.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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_________________________Direito do Trabalho e inclusão social: o desafio brasileiro. In HENRIQUE, Carlos Augusto Junqueira, et al (coord.) Trabalho e Movimentos Sociais. Belo Horizonte: Del Rey, 2008.

GUSMÃO, Rute. A terceirização de serviços na contra-reforma do Estado. In Revista Quadrimestral de Serviço Social. Ano XXIII, nº 70, jul. 2002. São Paulo: Cortez Editora, 2002.

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MAZUR, Maurício. O Contrato de Trabalho Nulo com a Administração Pública e o recente Enunciado 331 do TST. Sínese Trabalhista. Ano XII, nº 139. Porto Alegre: Síntese, jan. 2001.

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SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. A seita secreta para a Efetivação dos Direitos Sociais. Síntese Trabalhista. Ano XVII, nº 198. Porto Alegre: Síntese, dez. 2005.

________________________ Sobre o tema, consultar: SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. A terceirização sob uma perspectiva humanista. In Revista de Direito do Trabalho. Ano 30, jul. set. 2004. São Paulo: Editora RT, 2004.

SÚMULAS. Disponível em: http://www.dji.com.br/normas_inferiores/enunciado_tst/tst_0331a0360.htm. Consultado em: 12 dez. 2007.

VIANA, Márcio Túlio. Velhos e Novos Enfoques sobre o trabalho temporário.

[1] Art. 1º, inciso IV; art. 170, caput; e art. 193, caput, todos da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, respectivamente.

[2] DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2008. p. 431.

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[3] A ascensão refere-se à celebração de contratos via terceirização pela Administração Pública, com índices crescentes na atual conjuntura. Sobre o tema, consultar matéria específica no Jornal Estado de Minas, do dia 23 de setembro de 2007, intitulada “Terceirização perde status, mas não para o governo”, p. 06 e seguintes do Caderno Economia.

[4] Será que há mesmo essa distinção?

[5] DELGADO, Maurício Godinho. Op. Cit. p. 438.

[6] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 17ª ed. São Paulo: Malheiros Editores LTDA, 2004. p. 86.

[7] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. Cit. p. 86.

[8] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Idem. Ibdem. p. 91.

[9] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Idem. Ibdem. p. 95.

[10] Art. 37, II: “a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas e de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração”. (CR/88) As contratações que serão aqui analisadas escapam à previsão legal do art. 37, inciso IX, da CR/88 (exceção à previsão do inciso II do mesmo artigo, já citado).

[11] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. Cit. p. 109.

[12] Esse compreende dois outros, fundamentais para orientar a atuação da Administração e seus agentes: o da lealdade e boa-fé. Sobre o tema, consultar MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. Cit. p. 109.

[13] Art. 37, § 2º: “A não observância do disposto nos incisos II e III implicará a nulidade do ato e a punição da autoridade responsável, nos termos da lei”. § 4º: “Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”. Quanto à Lei 8.429/92, veda o enriquecimento ilícito dos administradores.

[14] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. Cit. p.87.

[15] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. Cit. p. 88.

[16] Tais atividades estão previstas no Decreto-Lei 200, sendo aquelas consideradas de natureza executiva ou operacional. A Lei 5.645/70 estabelece quais são esses serviços executivos ou operacionais (transporte, conservação, custódia, operação de elevadores, limpeza, e outras atividades semelhantes).

[17] “Trabalho Decente é um trabalho produtivo e adequadamente remunerado, exercido em condições de liberdade, eqüidade, e segurança, sem quaisquer formas de

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discriminação , e capaz de garantir uma vida digna a todas as pessoas que vivem de seu trabalho. Os quatro eixos centrais da Agenda do Trabalho Decente são a criação de emprego de qualidade para homens e mulheres, a extensão da proteção social, a promoção e fortalecimento do diálogo social e o respeito aos princípios e direitos fundamentais no trabalho, expressos na Declaração dos Direitos e Princípios Fundamentais no Trabalho da OIT”. (Trabalho Decente. Disponível em: http://www.oit.org.br/news/nov/ler_nov.php?id=1277. Acesso em 17 jun. 2007)

[18] DELGADO, Gabriela Neves. Direito Fundamental ao Trabalho Digno. São Paulo: LTr, 2006.

[19] BARROS, Alice Monteiro. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2007. p. 176.

[20] BARROS, Alice Monteiro. Idem. Ibdem. p. 177.

[21] DELGADO, Maurício Godinho. Op. Cit. p. 198.

[22] DELGADO, Maurício Godinho. Idem. Ibdem. p. 199.

[23] DELGADO, Maurício Godinho. Idem Ibdem. p. 209.

[24] DELGADO, Maurício Godinho. Op. Cit. p. 209.

[25] Art. 1º: “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa.” Art. 170: “A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios (...)”. Art. 193: “A ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem estar e justiça sociais”. (todos da CR/88).

[26] Sobre o tema, consultar: DELGADO, Mauricio Godinho. Op. Cit. p. 1321.

[27] Na verdade, a inclusão social e afirmação social se dão, no atual contexto, pelo poder aquisitivo e classe social ocupada pelo indivíduo, decorrente do trabalho por ele exercido. Portanto, deve-se proteger, arduamente, o trabalho, fazendo com que ele cumpra suas funções.

[28] DELGADO, Gabriela Neves. Op. Cit. p. 138-139.

[29] DELGADO. Maurício Godinho. Direito do Trabalho e inclusão social: o desafio brasileiro. In HENRIQUE, Carlos Augusto Jusqueira, et al (coord.) Trabalho e Movimentos Sociais. Belo Horizonte: Del Rey, 2008. p. 15.

[30] Há, conforme demonstrado no item 2.1, inobservância também desse princípio, sendo, uma vez configurada tal violação, fator suficiente para a invalidação dos atos da Administração Pública.

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[31] ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Apud DELGADO, Gabriela Neves. Op. Cit. p.103-106).

[32] CONCEIÇÃO, Felipe Silva da. Responsabilidade Trabalhista da Administração Pública decorrente da terceirização de serviços. In Estudos. V. 32, nº 08. Goiânia: Editora da Universidade Católica de Goiás, ago. 2005. p. 1441.

[33] AFONSO, Elza Maria Miranda. O Direito e os valores (reflexões inspiradas em Franz Brentano, Max Scheler e Hans Kelsen. In Revista do CAAP. p. 17.

[34] Essa conclusão decorre da concepção de possuírem as normas duas esferas: a de princípios e regras.

[35] AFONSO, Elza Maria Miranda. Op. Cit. p. 17.

[36] DELGADO, Gabriela Neves. Direito Fundamental ao Trabalho Digno. São Paulo: LTr, 2006. p. 111.

[37] Segundo Maurício Mazur, “o concurso é o meio técnico posto à disposição da Administração Pública para se obter moralidade, eficiência e aperfeiçoamento do serviço público e, ao mesmo tempo, propiciar igual oportunidade a todos os interessados que atendam aos requisitos da lei. (MAZUR, Maurício. O Contrato de Trabalho Nulo com a Administração Pública e o recente Enunciado 331 do TST. In Sínese Trabalhista. Ano XII, nº 139. Porto Alegre: Síntese, jan. 2001)

[38] CONCEIÇÃO, Felipe Silva da. 2005. p 1445.

[39] DELGADO, Maurício Godinho. Op. Cit. p. 433.

[40] SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. A terceirização sob uma perspectiva humanista. In Revista de Direito do Trabalho. Ano 30, jul. set. 2004. São Paulo: Editora RT, 2004. p. 92.

[41] GUSMÃO, Rute. A terceirização de serviços na contra-reforma do Estado. In Revista Quadrimestral de Serviço Social. Ano XXIII, nº 70, jul. 2002. São Paulo: Cortez Editora, 2002. p. 94.

[42] VIANA, Márcio Túlio. Velhos e Novos Enfoques sobre o trabalho temporário. p. 99.

[43] Segundo Gusmão, “o detalhamento contido na Instrução Normativa nº 18/97 sobre as atribuições dos terceirizados na área de vigilância, limpeza e conservação, mostra que há previsão para uma fiscalização rigorosa do trabalho subcontratado.” (GUSMÃO, Rute. Op. Cit. 2002. p. 105) Essa subordinação direta, por si só, já constitui fundamento para desconfigurar a terceirização junto à Administração Pública, à luz da Súmula 331 do TST.

[44] VIANA, Márcio Túlio. Op. Cit. p. 101.

[45] VIANA, Márcio Túlio. Idem. Ibdem. p. 102.

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[46] SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. A seita secreta para a Efetivação dos Direitos Sociais. In Síntese Trabalhista. Ano XVII, nº 198. Porto Alegre: Síntese, dez. 2005. p. 39.

[47] Rompimento que se demonstra necessário por argumentos também do Jorge Luiz Souto Maior: “(...) para diferenciar terceirização lícita da ilícita, partiu-se de um pressuposto muitas vezes não demonstrável, qual seja, a diferença entre atividade-meio e atividade-fim. É plenamente inseguro tentar definir o que seja uma e outra”. (Sobre o tema, consultar: SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. A terceirização sob uma perspectiva humanista. In Revista de Direito do Trabalho. Ano 30, jul. set. 2004. São Paulo: Editora RT, 2004. p. 92)

[48] DELGADO, Maurício Godinho. Op. Cit. p. 439.

[49] “IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária por parte do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também no título executivo judicial.”

[50] BARROS, Alice Monteiro. Op. Cit. p. 444.

[51] A ausência de pessoalidade e subordinação diretas são amplamente questionadas, sobretudo sob a ótica da Instrução Normativa nº 18, de 1997. Se se analisar, na prática, a ausência de subordinação, todas as contratos celebrados via terceirização serão considerados irregulares, vez que há dobra da carga de subordinação.

[52] BARROS, Alice Monteiro. Op. Cit. 2007. p. 445.

[53] CONCEIÇÃO, Felipe Silva da. Op. Cit. p 1454.

[54] Súmula 363, TST: “A contratação de servidor público, após a CF/88, sem prévia aprovação em concurso público, encontra óbice no respectivo art. 37, II e §2º, somente lhe conferindo direito ao pagamento da contraprestação pactuada, em relação ao número de horas trabalhadas, respeitado o valor da hora do salário mínimo, e dos valores referentes ao aos depósitos do FGTS.”

[55] Delgado conceitua a teoria das nulidades trabalhistas de acordo com os diferentes graus de aplicação e de reconhecimento dos direitos trabalhistas. Sobre o tema, consultar: DELGADO, Maurício Godinho. Op. Cit. 2005 p. 507-511.

[56] Claro que, nessa proposta, não se está desconsiderando os quadros de carreira. É uma alternativa que deve ocorrer obedecendo, rigorosamente, os limites legais.