123
1 Escola e Violência conceitos, políticas, quotidianos Relatório de Pesquisa Abr il 2004 João Sebastião, Joana Campos, Mariana Gaio Alves e Patrícia Amaral centro de investigação e estudos de sociologia

RelPesq_Violencia na Escola.pdf

  • Upload
    leanh

  • View
    217

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

1

Escola e Violência

conceitos, políticas, quotidianos

Relatório de Pesquisa

Abr il 2004

João Sebastião, Joana Campos, Mar iana Gaio Alves e Patr ícia Amaral

centro de investigação e estudos de sociologia

Page 2: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

2

Índice

i. Índice

ii. Índice de Quadros e Gráficos

1. Introdução

2. A investigação sobre a violência na escola em Portugal

2.1. Linhas de investigação: temáticas e problemáticas

2.2. Perspectivas, conceitos e dimensões de análise

2. 3. Âmbito empírico, opções metodológicas e principais resultados das pesquisas

3. ­ Políticas e estratégias de intervenção

3.1­ As políticas de combate à violência na escola

3.2 – O Programa Escola Segura: alguns resultados da sua implementação

3.2.1 – Origem e pressupostos do programa

3.2.2 – A informação produzida no âmbito do programa

4 – Encontros e desencontros: a violência no quotidiano escolar

4.1­ Nota introdutória

4.2 ­ Caracterização do estabelecimento escolar

4.3– Escolarização, norma e violência

4.3.1­ Os alunos alvo de processos disciplinares

4.3.2­ Relação com escolaridade

4.4.3 ­ Representações de indisciplina e violência

4.4.4 ­ A violência e a agressividade no quotidiano

4.4.5. ­ Relação com as normas

4.5 – Nota final

5. Conclusão

6. Bibliografia

Page 3: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

3

7. Anexos

Anexo A ­ Metodologia do Estudo de Caso

Anexo B ­ Caracterização dos alunos objecto de processos disciplinares

Anexo C – Tipo de ocorrências objecto de processos disciplinares

Anexo D ­ Guiões de entrevista

Page 4: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

4

Índice de Quadros e Gráficos

Quadros

Quadro nº1 ­ Recursos Humanos e Materiais afectos em exclusividade ao Programa

Escola Segura ­ 2000

Quadro nº2 ­ Recursos da PSP afectos em exclusividade ao Programa Escola

Segura para o ano de 2003

Quadro nº3 ­ Número de ocorrências de situações de violência em meio escolar,

segundo a sua distribuição regional (1995­1998)

Quadro nº4 ­ Número de ocorrências por tipo de situação de violência em meio escolar

1995­1998

Quadro nº 5 ­ Ocorrências da PSP – Todos os estabelecimentos de ensino

Quadro nº 6 – Ocorrências registadas pela PSP nas Escolas do Protocolo MAI/ME 1996/99

Quadro nº 7 – Ocorrências registadas pela GNR em 2000

Quadro nº 8 – Ocorrências registadas pelo GSME, 2000

Quadro nº 9 ­ Acções contra as pessoas por DRE (Direcção Regional de Educação), 2000

Quadro nº 10 – Acções contra pessoas por tipo de ocorrência, em percentagem, 2000

Quadro nº 11 ­ Acções contra pessoas dentro da escola, em percentagem, por regiões, 2000

Quadro nº 12 ­ Acções contra pessoas no exterior da escola, em percentagem, por regiões,

2000

Quadro nº 13 – Acções contra bens, por Direcção Regional de Educação, em percentagem,

2000

Quadro nº 14 – Âmbito de actuação da PSP tipo e número de estabelecimentos por número

de alunos e grau de ensino, no ano lectivo 2002/03

Quadro nº 15 – Registo de ocorrências da PSP em valores absolutos por ano lectivo, 2000/03

Quadro nº 16 – Registo de ocorrências pela PSP por distrito, no ano lectivo 2002/03

Quadro nº 17 – Número de detenções efectuadas pela PSP em áreas escolares por tipo de

ocorrência no ano lectivo 2002/03

Quadro nº 18 – Registo de ocorrências do Programa Escola Segura pela GNR, 2001

Quadro nº 19 – Registo de ocorrências do Programa Escola Segura pela GNR, 2002

Quadro nº 20 – Registo de ocorrências do Programa Escola Segura pela GNR, 2003

Quadro nº 21­ Número de alunos por anos de escolaridade (1999/2000)

Quadro nº 22 ­ Número de professores por ciclo em função das suas categorias profissionais

Quadro nº 23 ­ Número de funcionários em função da sua situação profissional

Page 5: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

5

Quadro nº 24 ­ Número de processos disciplinares por aluno segundo o número de

reprovações

Quadro nº 25 ­ Número de alunos objecto de processos disciplinares no ano lectivo de

1999/00

Quadro nº 26 ­ Grupos profissionais dos encarregados de educação dos alunos objecto de

processos disciplinares no ano lectivo 99/00

Quadro nº 27 ­ Grupos socioprofissionais dos pais dos alunos entrevistados

Gráficos

Gráfico nº 1 – Nº de alunos abrangidos pela A.S.E ­ Ano lectivo de 1999/00)

Gráfico nº 2 – Número de participações por ano de escolaridade ( 2º período) ano lectivo de

1999/00)

Page 6: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

6

1. Introdução

A expansão progressiva da frequência do sistema educativo nas últimas décadas

concretizou um esforço prolongado para promover a escolarização da população

portuguesa. Passámos assim de uma escola circunscrita a um número limitado de alunos

para uma escola massificada, em que, pelo menos no ensino básico, a diversidade é a

norma. Como noutros países esta transição não se realizou sem que daí tivessem

resultado situações de conflitualidade, fosse pelas dificuldades em implementar infra­

estruturas, formar docentes e outros funcionários, ou pelo simples facto de que fazer

conviver e aprender largos agregados de alunos com características pessoais e grupais e

percursos escolares muito diferentes, se tem vindo a mostrar uma tarefa de difícil

concretização. Em particular, as situações de forte agressividade e violência ou

indisciplina grave, algo que até aí era pouco mais que um assunto privado das escolas,

transformaram­se lentamente em elementos recorrentes na agenda política e educativa.

O crescendo das referências às situações de violência na escola tem sido acompanhada,

em paralelo, pela exposição mediática dos fenómenos de delinquência juvenil,

coincidindo na ideia de que ambas convergem e constituem uma ameaça grave para a

própria estrutura da instituição escolar, encontrando­se fora de controlo. 1 Tal

visibilidade radica, em nosso entender, na utilização do tema como mais um elemento

da lógica de concorrência entre os diferentes meios de comunicação social e,

frequentemente, pela tentativa de exploração eleitoral dos sentimentos de insegurança e

incerteza partilhados por partes significativas da sociedade portuguesa. Do cruzamento

destes elementos resultou o aumento significativo do sentimento de insegurança no seio

das comunidades educativas e à crescente exigência de tomada de medidas políticas e

disciplinares mais severas (M. E., 1999; Sebastião e outros, 1999).

Foi neste contexto que se desenhou no CIES uma linha de investigação que procurou

questionar estas concepções de um ponto de vista sociológico 2 , consubstanciada num

conjunto de projectos que analisaram algumas das dimensões que o fenómeno assume,

em particular no que respeita à sua dimensão teórica (Sebastião e outros, 1999), às

1 A este propósito veja­se a discussão destas concepções realizada em Sebastião e outros, 1999 2 CIES: Centro de Investigação e Estudos de Sociologia, centro associado do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE).

Page 7: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

7

políticas de combate à violência e à sua dimensão relacional (Sebastião, Alves e

Amaral, 2001a) (Sebastião, Alves, e Amaral (2001b).

Em Portugal os estudos científicos relativos à violência em meio escolar são recentes e

escassos, tendo sido desenvolvidos sobretudo na última década no âmbito da Psicologia,

da Sociologia e das Ciências da Educação. O facto natural de as diferentes disciplinas

recorrerem a quadros teóricos, perspectivas analíticas e âmbitos empíricos muito

diferenciados, tem resultado numa elevada disparidade da informação existente, o que

dificulta ou mesmo impossibilita a produção de análises comparativas, mas igualmente

tem contribuído negativamente para que apenas raramente se tenham desenvolvido

pontos de vista interdisciplinares.

De igual forma as políticas públicas de combate à violência em meio escolar são

igualmente incipientes, pouco mais existindo que a aplicação de medidas de articulação

entre a gestão administrativa da educação e as forças de segurança interna.

A apresentação que faremos procurará, em primeiro lugar, realizar a leitura transversal

possível da investigação realizada em Portugal sobre o tema. Serão abordadas as

concepções e problemáticas teóricas, assim como as metodologias adoptadas, o âmbito

empírico e os principais resultados das pesquisas.

Em segundo lugar será realizada a análise das políticas públicas de combate à violência

em meio escolar, procurando compreender a articulação das diferentes medidas.

Por último, analisaremos o quotidiano de uma escola da cidade de Lisboa, tentando

apreender a extensão e permanência quotidiana das situações de agressividade e

violência nas escolas.

Page 8: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

8

2. A investigação sobre a violência na escola em Portugal

2.1. Linhas de investigação: temáticas e problemáticas

A análise transversal da investigação realizada em Portugal sobre violência na escola,

ainda que de forma breve, permite encontrar alguns equívocos e descontinuidades

constitutivos desta área de estudo. A análise veio a evidenciar dificuldades resultantes

da compartimentação disciplinar, dos quadros teóricos e dimensões empíricas utilizadas

pelos estudos, e, não menos importante, a sua efectiva raridade. O tema, apesar da

relativa visibilidade mediática e política, só lentamente tem vindo a captar a atenção da

comunidade científica portuguesa. Este conjunto de equívocos referidos não se limita às

concepções de senso comum que preenchem os diferentes discursos, tendo mesmo

contaminado, no nosso entender, algum do debate científico que se realiza em Portugal

sobre o tema. Os estudos relativos à violência em meio escolar são recentes e escassos,

tendo sido desenvolvidos, sobretudo, no âmbito da psicologia e da sociologia. Estes

estudos caracterizam­se por uma profunda fragmentação, em que os autores não se

referem e reconhecem entre si como produtores de um mesmo campo de saber. A

utilização corrente de conceitos vizinhos, cujas dimensões se recobrem parcialmente

sem que se procurem pontos de contacto, concorre para uma delimitação teórico­

metodológica pouco clarificadora e empobrecedora

Tendo estas limitações sempre presentes procurámos então identificar as principais

linhas na investigação realizada em Portugal, para o que tentámos realizar agregações

que permitissem uma visão mais ampla. Assim foi possível referenciar duas grandes

abordagens, cujas pesquisas se centravam mais em redor dos campos teóricos da

psicologia e da sociologia da educação.

A perspectiva psicológica orienta a sua leitura primordialmente para as dimensões

organizacionais, relacionais e individuais, desenvolvendo­se as pesquisas com base em

conceitos como o de auto­estima, agressividade e auto­conceito.

Os estudos centrados na dimensão organizacional entendem a escola como produtora de

condições que contribuem para a ocorrência de situações de violência, estudos esses

principalmente desenvolvidos em torno do conceito de bullying. As dimensões relacional e pedagógica têm como enfoque analítico, essencialmente, as relações

pedagógicas entre professores e alunos, e as relações entre pares. É no âmbito destas

Page 9: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

9

dimensões que têm vindo a ser desenvolvidos estudos que encontram nas problemáticas

do insucesso escolar, da (in)disciplina e da promoção de competências e condutas pro­

sociais o cerne das suas análises, utilizando para isso como unidade analítica principal a

sala de aula.

A perspectiva sociológica sublinha a importância da complexidade do fenómeno e a

necessidade de nas pesquisas desenvolvidas sobre o fenómeno da violência escolar

serem consideradas dimensões tão diferenciadas como institucional, organizacional,

simbólica, relacional e pedagógica.

Apesar da chamada de atenção para as condições sociais, económicas e culturais das

famílias e área de residência dos alunos, procurando assim contextualizar o fenómeno

da violência escolar, os diferentes autores rejeitam que a análise se possa centrar

exclusivamente numa leitura marcada pela anterioridade e exterioridade do fenómeno

da violência relativamente à realidade escolar. Sublinham a necessidade de questionar o

funcionamento do sistema educativo, entendendo a violência como uma das

consequências do processo de massificação do sistema de ensino. É realçada a

importância de analisar as discrepâncias entre os quadros normativos e os quotidianos

escolares, de questionar o desencontro entre as políticas educativas e modelos

centralmente definidos de organização e gestão e a inserção local da escola.

Em primeiro lugar é hoje cada vez mais importante analisar o crescente desânimo

daqueles que olhavam para a escola como um dos raros canais de mobilidade social ao

seu alcance. A cada vez mais visível desvalorização dos diplomas escolares e o aumento

da correlativa dificuldade em garantir de forma imediata uma inserção profissional

prestigiada ao público escolar, tem­se vindo a traduzir em atitudes de descrença, revolta

e questionamento dos objectivos globais da instituição escolar, mesmo em sectores

sociais em que esta ocupa um papel central nas estratégias de reprodução social.

Uma segunda dimensão, sem dúvida a mais importante, diz respeito à ruptura entre os

quadros culturais e os sistemas de valores de um conjunto significativo de camadas

sociais e a chamada cultura escolar. Este facto ganha maior relevância com a crescente

multiculturalidade das sociedade portuguesa, já que a escola tem vindo a demonstrar um

incapacidade efectiva para promover processos de integração efectiva na sociedade

portuguesa (como a aceitação prática de que é necessário ensinar o português como

segunda língua no sistema educativo português);

Page 10: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

10

Este quadro, aqui sumariamente descrito, traduz­se frequentemente no aparecimento de

conflitos no interior dos estabelecimentos, alguns dos quais evoluem para situações de

violência física e psicológica. Deve ser contudo sublinhado que os actores deste tipo de

situações não se revêm em movimentos de resistência à instituição, antes os assumem

como estruturalmente anómicos, sem qualquer tipo de finalidades que não sejam

imediatas.

A estas dimensões de análise deve ainda ser acrescido o debate em torno dos conceitos

de poder e dominação, com a discussão das bases de legitimidade do exercício do poder,

sejam elas formais ou informais.

2.2. Perspectivas, conceitos e dimensões de análise

A leitura efectuada permitiu constatar algum consenso entre os diversos autores quanto

à necessidade de clarificação conceptual relativamente ao campo de estudo da violência

na escola, a um maior interconhecimento das linhas de investigação em

desenvolvimento, e ao aumento da investigação. Ainda assim foi possível identificar

algumas linhas que poderíamos designar como pontos de convergência na investigação

realizada em Portugal.

Um primeiro passo para a clarificação do conceito de violência diz respeito à

compreensão da multidimensionalidade do fenómeno. Vandalismo, incivilidade,

agressão/perseguição psicológica, agressão física, assalto/roubo, indisciplina grave, são

manifestações do fenómeno que o conceito de violência procura descrever. À

diversidade de situações há ainda que adicionar a alta variação dos contextos em que

estas se desenrolam, das causas e sentidos que os diferentes agentes atribuem às suas

acções. Este quadro complexo coloca problemas teóricos e metodológicos que se

encontram espelhados nas linhas de pesquisa que se têm desenvolvido. É patente, em

alguns estudos, o escasso trabalho de objectivação das informações recolhidas junto dos

intervenientes em situações de violência, resultando a sua aceitação acrítica na

promoção de discursos marcados pela subjectivização do fenómeno. 3 Ainda assim, foi

3 É de referir que na única pesquisa de âmbito nacional até hoje realizada (Costa e Vale, 1998) não foram consideradas, quer para a selecção da amostra, quer para a análise da informação recolhida, variáveis tão significativas como as relativas às trajectórias escolares dos alunos, origem social ou outro tipo de variáveis relativas às famílias e aos contextos escolares e socioculturais. O estudo considerou apenas o género, idade e ano de frequência da escolaridade, o que face à multidimensionalidade do fenómeno é manifestamente insuficiente. De salientar ainda a

Page 11: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

11

possível identificar algumas linhas que poderíamos designar como pontos de

convergência na investigação realizada em Portugal.

Violência e poder Uma primeira distinção conceptual encontra­se no centro de algumas pesquisas que

discutem a proximidade entre os conceitos de violência e poder, sendo questionada a

confusão, por vezes feita, entre desordem e conflito. Como afirmámos noutro local:

A violência é o excesso que, numa relação social, condensa uma visão do mundo como um espaço social de

relações conflituais que tendem para uma qualquer forma de ruptura com a normalidade social considerada

legítima. É uma relação de poder que, pretendendo ser irreversível, visa a constituição de um estado de

dominação; é uma relação em que a coacção é imperativa (...) (Sebastião e outros, 1999: 123).

A proximidade entre os conceitos de violência e de poder insere o primeiro no campo

semântico do segundo, obrigando a distinção entre relações de poder, de carácter

reversível, e relações de dominação, de carácter unilateral. A experiência da violência

pode ser, nesse sentido, objectiva ou subjectiva, simbólica ou física.

Afonso (1991) parte de uma abordagem weberiana para a compreensão das relações de

poder no quotidiano escolar, ao recorrer às tipologias que distinguem as fontes de

legitimidade para a dominação legítima, e as fontes fundadores do exercício do

controlo: o poder coercitivo, remunerativo e normativo. O mesmo autor sublinha ainda

que, face a um controlo positivo ou negativo, podem surgir fenómenos de resistência,

cujas fontes de poder são diversas. O autor propõe a aplicação destas tipologias ao

contexto escolar, de modo a que possamos ler o poder do professor, de base formal, e o

poder do aluno, de base informal. Este debate pode, aliás, já ser referenciado no início

da década de 80, com a publicação, por Formosinho, de um artigo de discussão das

“bases do poder do professor” (Formosinho, 1980).

Os estudos desenvolvidos na confluência semântica dos conceitos de violência e poder,

sublinham as dimensões organizacional e relacional, no primeiro caso, quando são

considerados os aspectos normativos, no segundo, quando o enfoque incide sobre a

relação pedagógica. No que diz respeito à dimensão relacional, Afonso (1991) encontra,

na sala de aula, a ilustração do desequilíbrio de poder existente na relação entre

professor e aluno. O autor entende a desigualdade como condição da relação

pedagógica, sublinhando o carácter coercivo da interacção, o desenvolvimento de

subjectividade, não explicada, presente em várias dimensões de análise, o que nos deixa fundadas dúvidas sobre a validade da informação produzida.

Page 12: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

12

estratégias de distância social entre professores e alunos e, ainda, a possibilidade de

accionamento de sanções disciplinares.

Relativamente à dimensão organizacional, (Domingues, 1995; Sebastião e outros, 1999)

afirmam que existe uma indefinição normativa nas escolas, resultante da existência de

quadros normativos pouco claros ou inapropriáveis pela sua complexidade e linguagem,

pelo desconhecimento ou releitura e usos quotidianos privativos, desenvolvidos pelos

diferentes actores presentes na cena educativa. Esta indefinição cria, no entender destes

autores, um espaço de possibilidades para a ocorrência de situações de conflito.

Sebastião e outros (1999), apresentam o conceito de norma enquanto mecanismo de

categorização da acção social, caracterizado pelo seu carácter obrigatório, a exigência

de obediência, e que permite a distinção entre os actos violentos e os não­violentos. O

incumprimento da norma acarreta a potencial estigmatização dos sujeitos em

inconformidade.

Pires (2000), procurou compreender as práticas de agressividade, violência e vitimação

em meio escolar, definindo no enquadramento teórico da sua pesquisa o conceito de

violência. Na sua definição, o autor enfatiza o uso repetido de força, a intencionalidade

da acção e a possibilidade de os seus resultados serem físicos ou psicológicos. Se

teoricamente este autor situa a definição do conceito no âmbito do conjunto de autores

tratados nesta secção, metodologicamente aproxima­se dos autores que têm vindo a

desenvolver a perspectiva psicológica, em particular, os que têm trabalhado em torno do

conceito de bullying, na medida em que recorre aos instrumentos metodológicos

construídos pelos especialistas da área, nomeadamente o questionário de Oleuws.

Indisciplina As investigações desenvolvidas no âmbito da problemática da indisciplina não abordam

explicitamente as questões da violência, contudo estas duas problemáticas são vizinhas

e surgem muitas vezes referidas em alguns estudos pela sua ligação. Neste momento,

parece­nos que importará mais compreender o que o debate sobre a indisciplina poderá

trazer de útil à análise dos fenómenos de violência, relegando para segundo plano um

eventual meticuloso trabalho de delimitação conceptual. 4

4 Neste momento, parece­nos que importará mais compreender o que o debate sobre a indisciplina poderá trazer de útil à análise dos fenómenos de violência, relegando para segundo plano um eventual meticuloso trabalho de delimitação conceptual.

Page 13: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

13

A importância desta relação surge na temática proposta pela AFIRSE para o Colóquio

de 2001, Violência e Indisciplina na Escola. 5 Podemos afirmar que este colóquio constitui um passo significativo para o reconhecimento da problemática, na medida em

que reuniu investigadores das diversas áreas disciplinares.

Neste encontro Barroso (2001) sublinhou a excessiva simplificação em torno dos

fenómenos da (in)disciplina e violência na escola. À preocupação de “medir” a

indisciplina ou a violência, o autor contrapõe a necessidade da sua problematização

enquanto fenómenos socioeducativos (Barroso, 2001). No mesmo colóquio, Estrela

(2001) ressaltou a importância e escassez da investigação desenvolvida, no nosso país,

em torno da problemática da indisciplina em contexto escolar. Também neste campo

cientifico, podemos identificar um conjunto de pesquisas, de um leque disciplinar

alargado, que contribuem para a análise das dimensões organizacional e relacional,

anteriormente referidas.

Numa tentativa de conhecer as perspectivas dos alunos acerca das relações de poder na

sala de aula, Freire (1995) recorre aos conceitos de poder, relações de poder e

(in)disciplina enquanto alicerces da sua investigação. Distingue a importância do papel

da escola ao realçar um conjunto de regularidades e de idiossincrasias, relativas quer aos

percursos escolares quer ao ambiente académico (Freire, 2001). Outro autor, Curto

(1998), sublinha ainda a dimensão relacional, defendendo que, na relação pedagógica,

há que reconhecer tanto os professores como os alunos como fontes de (in)disciplina, e

que esta pode ser lida como resultado do exercício do poder por parte dos alunos. A

dimensão organizacional é também focada por este autor, que alerta para a desconexão

entre o nível formal, objectivada em documentos como o Regulamento interno de

escola, e o nível informal, onde encontramos as práticas quotidianas no espaço escolar,

como elemento explicativo para os fenómenos de (in)disciplina escolar.

Também Domingues (1995) aborda esta dimensão de análise a partir dos conceitos de

controlo disciplinar e disciplinação, partindo da asserção de que a disciplina e a

indisciplina são fenómenos socio­organizacionais e psicossociais. Na sua pesquisa o

autor identifica três níveis de análise das práticas disciplinares: o do Ministério da

Educação, o da escola e o dos actores. No nível da escola o autor distingue dois planos:

o plano das orientações para a acção organizacional e o plano da acção organizacional.

Próximo desta abordagem, Sampaio (1997) propõe três “lentes” de focalização do

5 AFIRSE: Association Francophone Internationale de Recherche Scientifique en Education.

Page 14: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

14

problema da indisciplina: “grande angular”/contexto; “lente média”/escola “focar mais

perto”/sala de aula; e “zoom”/aluno.

Estrela sintetizou (1992 e 2001) as várias correntes e perspectivas teóricas que se

ocuparam do estudo da (in)disciplina e a relação pedagógica, com as diversas definições

dos conceitos de disciplina e indisciplina. A autora sublinhou a importância da

dimensão relacional, na medida em que centra a sua leitura na relação pedagógica

elegendo o grupo­turma como espaço relacional e unidade de comunicação (Estrela,

1992). Também Barroso, em 1995, enfatiza a dificuldade em gerir pedagogicamente a

diversidade dos alunos da “classe”, nomeadamente no tocante à divisão do espaço da

sala de aula, da hierarquização dos saberes e aos dispositivos de vigilância (Barroso,

1995: 85). Já Mendes (1998) associou as situações de indisciplina à relação entre a

gestão do tempo na sala de aula e os ritmos biológicos das crianças. Barroso (2001)

retoma a discussão afirmando que existe uma relação estreita entre o recrudescimento

dos chamados fenómenos de indisciplina e os modos de organização pedagógica e

gestão escolar, ainda dominantes nas nossas escolas.

Amado (1998), cuja análise se centra no ponto de vista dos alunos acerca dos

procedimentos dos professores face à indisciplina na sala de aula, apresenta três níveis

de tipificação da (in)disciplina: um primeiro, considera os desvios às regras de

“produção” escolar; um segundo, os conflitos interpessoais e o terceiro, situa os

conflitos professor­aluno. Relativamente aos procedimentos, identifica a partir do

critério da modalidade de correcção accionada pelos professores, procedimentos de

integração/estimulação; procedimentos de dominação/imposição; e, procedimentos de

dominação/ressocialização. O mesmo autor (Amado, 2000 e 2001) apresentou os

resultados de um estudo etnográfico cujo enfoque incide sobre a dinâmica do grupo­

turma. Podemos enquadrar analiticamente este estudo na dimensão relacional e

pedagógica, na medida em que, teoricamente, alicerça­se na triangulação das

interacções turma/professor/aluno.

Ainda focalizados na perspectiva dos alunos, há a referir outros estudos como o de Seabra, Casa­Nova e Martins (2001) que, analisando a avaliação que os alunos fazem

dos comportamentos dos professores, identificam o papel do professor enquanto

potenciador de comportamentos de (in)disciplina, evidenciando as características

pessoais e profissionais (des)valorizadas pelos alunos, indo ao encontro de Amado

(2000). Pedro e Pedro (2001) procuraram, na sua apresentação ao já referido colóquio

da AFIRSE de 2001, dar voz aos alunos a partir dos resultados encontrados sobre o

Page 15: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

15

questionamento em torno de situações de violência na escola (do 1º ciclo ensino básico).

Na mesma perspectiva, Cortez e Vilhena (2001) procuraram conhecer, através da

análise de composições de crianças, o processo de compreensão destes conceitos

(indisciplina e violência) por parte dos alunos.

Um conjunto de autores desenvolveu as suas pesquisas em torno das perspectivas de

professores acerca da (in)disciplina na sala de aula. Lopes (1998), identifica, nas percepções dos professores, uma relação entre os problemas de comportamento e as

dificuldades de aprendizagem, lidas a partir dos resultados escolares obtidos pelos

alunos. Rego e Caldeira (1998) procuraram, igualmente, conhecer as opiniões dos

professores, acerca dos problemas de comportamento escolar, os quais, segundo as

autoras, se têm acentuado nas últimas décadas. Oliveira (2001) situa­se nesta

perspectiva, realçando o segmento dos professores mais novos. Também Gonçalves e

Gonçalves (2001) elegem este grupo procurando conhecer as representações dos

conceitos de disciplina e indisciplina dos professores em início de carreira (no 1º ciclo

do ensino básico), assim como a sua atitude face aos “comportamentos desviantes” dos

alunos. No cruzamento das perspectivas de professores e alunos situam­se as pesquisas

desenvolvidas por Rego (2001), sobre a realidade escolar açoriana.

Por fim, é de salientar a recomendação de Afonso (1991), acerca da necessidade de

integração do conceito de (in)disciplina na formação (inicial) de professores, enquanto

conteúdo programático essencial, criticando o facto de este ser apresentado apenas na

sua dimensão prática. Carita e Fernandes (1997), numa perspectiva de formação de

professores, destacam a importância do auto­conhecimento do professor, na medida em

que, tal como Curto (1998), entendem o professor como fonte de (in)disciplina. Estrela

(2001) vai ao encontro desta perspectiva ao salientar a importância das figuras de

autoridade, situando a intervenção no âmbito da formação de professores. Veiga

(2001a) apresenta a este propósito os principais estudos nacionais e estrangeiros em

torno da problemática, propondo um conjunto de ideias e procedimentos no âmbito da

formação de professores (2001b).

Bullying, espaços de recreio e os tempos livres A psicologia e as ciências da educação têm vindo a desenvolver um conjunto de

pesquisas em torno do conceito do bullying, cujo enfoque incide nos chamados comportamentos disruptivos e nos problemas disciplinares entre os professores e os

alunos (Almeida, 1999). Este conceito tende a ser usado, segundo Blaya e Debarbieux

Page 16: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

16

(2001), nos países da Europa do norte e até muito recentemente, não era utilizado

noutros países, como França, Alemanha ou Grécia. Em Portugal, a tradução para o

conceito de bullying proposta por Almeida, aproxima­o das expressões: “abusar dos colegas”, “vitimizar”, “intimidar” e “violência na escola” (Almeida, 1999: 178). Na

comunicação que apresentou no Colóquio da AFIRSE, Marchand (2001) procurou

analisar e discutir o conceito de bullying , entendendo­o como coacção. Pereira, Neto e outros (2001) no mesmo encontro apresentaram o conceito de bullying como agressão sistemática e intencional entre pares.

Pereira e outros, num artigo que discute a disseminação do fenómeno de bullying nas

escolas portuguesas, referem os recreios como os espaços escolares com maior

incidência de ocorrência de bullying, particularmente quando se situam em espaços no exterior dos edifícios (Pereira e outros, 1997: 239). Estes resultados enfatizam a

importância dos factores de contexto, organizacionais e comunicacionais, assim como a

necessidade de reflexão sobre o clima de escola. As hipóteses explicativas avançadas

apontam para as restrições e falta de diversificação de oferta educativa que os recreios

apresentam; para a superlotação; fraca supervisão, assim como para a falta de

consideração pelas necessidades das crianças no traçado arquitectónico dos espaços de

recreio, interiores e exteriores. Os mesmos autores consideram que a falta de

organização dos espaços e tempos de recreio resultam na desvalorização do poder

educativo que encerram e “são convidativos para a existência de comportamentos

agressivos (bullying) entre as crianças" (idem: 238). Na mesma linha de

problematização, Marques e Neto (2000) procuraram estabelecer a relação entre as

características dos recreios escolares e os comportamentos agressivos dos alunos.

Ainda de um ponto de vista psicopedagógico, Pereira e Neto (1999), num artigo de

revisão de literatura, apresentam a distinção entre os tempos livres, o lazer e as rotinas

de vida das crianças. Consideram, ainda, que os tempos livres vividos pelas crianças e

jovens na escola são efectivamente longos, o que deveria traduzir­se na prioridade de

melhoramento dos espaços de recreio e na diversificação da oferta de práticas (Pereira,

Neto e Smith, 1997). Estes autores sublinham mesmo que tais medidas constituem um

mecanismo de prevenção das práticas agressivas das crianças. Contudo, o que esta

equipa verificou foi a desvalorização por parte da escola quer dos tempos de recreio,

quer do poder educativo das zonas exteriores (idem). Num artigo anterior, Pereira e Neto (1994) procuraram identificar as práticas prioritariamente realizadas e preferidas

pelas crianças, distinguindo entre práticas de trabalho, semi­trabalho e recreação. Para

Page 17: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

17

estes autores, a análise sobre os tempos livres, a partir das conclusões acima

apresentadas, aproxima­se da análise sobre a violência na escola, na medida em que

trata, também, de situações de violência entre pares e de danificação do património

escolar.

Page 18: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

18

2. 3. Âmbito empírico, opções metodológicas e principais resultados das pesquisas

Em termos metodológicos e empíricos a investigação realizada sobre a realidade

portuguesa caracteriza­se por um significativa subrepresentação das pesquisas

extensivas, estando estas quase restritas às levadas a cabo por equipas de investigação

ligadas à Universidade do Minho e outro pelo Instituto de Inovação Educacional. De

forma desigual e limitada contribuem para preencher algum do vazio de informação

existente, seja pela sua incidência regional no primeiro caso, seja pelas opções

metodológicas no segundo.

Costa e Vale (1998) apresentam no seu livro A violência nas escolas os resultados de uma pesquisa de carácter extensivo com âmbito nacional, realizada no âmbito do

Instituto de Inovação Educacional, com o objectivo de proceder à caracterização do

fenómeno da violência escolar. A informação apresentada resultou da aplicação de um

questionário a uma amostra composta por 4925 alunos de 142 escolas do 3º Ciclo do

Ensino Básico e do Secundário. De salientar que nesta pesquisa não foram

consideradas, quer para a selecção da amostra quer para a análise da informação

recolhida, variáveis tão significativas como as relativas às trajectórias escolares dos

alunos, origem social, ou outro tipo de variáveis relativas às famílias e aos contextos

escolares e socioculturais. O estudo considerou apenas o género, idade e ano de

frequência da escolaridade, o que face à multidimensionalidade do fenómeno é

manifestamente insuficiente. De salientar ainda a subjectividade não explicada presente

em algumas das dimensões de análise, o que nos deixa algumas dúvidas sobre a

qualidade da informação produzida.

Os alunos seleccionados frequentavam, à época da pesquisa, o 8º e 11º anos de

escolaridade. Os critérios de selecção da amostra procuraram garantir a presença de

alunos dos dois níveis de ensino Básico e Secundário, e das áreas geográficas definidas

pela equipa (Norte/Sul; Litoral/Interior; Urbano/Rural). A distribuição da amostra fez­se

do seguinte modo: 20 escolas do Interior Norte, com 599 alunos inquiridos; 34 escolas

do Litoral Norte, com 1476 inquiridos; 24 escolas do Litoral Centro, com 665

inquiridos; 48 escolas de Lisboa e Vale do Tejo, com 1687 inquiridos; e 16 escolas do

Sul, com 498 inquiridos. As variáveis de caracterização consideradas pelo estudo foram

a idade, sexo, nível de escolaridade e local de residência dos alunos.

Page 19: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

19

Os resultados do estudo relativos à agressão física mostram que cerca de 63% dos

alunos afirmam ter sido batidos e 6% afirmam ter sido ameaçados com uma arma, no

interior da escola. No seu exterior os valores encontrados revelam que cerca de 8% dos

alunos afirmaram ter sido batidos, 32% empurrados e 8% ameaçados com arma. No que

respeita aos docentes 8% dos alunos afirmam ter visto um professor ser empurrado

dentro da escola, e 1,7% fora da escola. Foi ainda referido por 3,5% dos alunos que

viram bater num professor dentro da escola, e 1,4% fora da escola. Relativamente à

violência sobre os funcionários das escolas, 11% dos alunos afirmam ter visto um aluno

a empurrar um funcionário dentro da escola e 3 % fora desta. 4% viram bater num

funcionário dentro da escola e 1,6% viram bater no exterior da escola.

A agressão verbal revela­se mais significativa com 67% dos aluno a afirmarem já ter

sido insultados no interior da escola, e 45% no exterior. Quanto às ameaças verbais ou

gestuais, cerca de 54% dos alunos afirmam já ter sido vítimas no interior da escola, e

33% fazem a mesma afirmação para o exterior.

As conclusões centrais apontam para o grupo dos rapazes como os mais agressores. Os

agressores são na sua maioria colegas quando a agressão ocorre no interior da escola, e

estranhos à escola quando a ocorrência se verifica no exterior desta. As agressões físicas

e verbais ocorrem com maior incidência no interior, enquanto que os confrontos

violentos e entre grupos se registam mais no exterior da escola. Os mais agredidos

fisicamente são os rapazes mais novos. As vítimas de agressões sexuais são na sua

maioria as raparigas mais novas.

Relativamente aos actos de vandalismo 80% dos alunos já constataram os seus efeitos:

paredes riscadas, vidros partidos, material escolar destruído, aulas interrompidas, etc.

Cerca de 25% já assistiram a actos de vandalismo contra as instalações e equipamento

escolar. Também 25% assistiram à vandalização de viaturas de professores. Da

totalidade da amostra 25% dos alunos já foram roubados ou viram os seus pertences

serem destruídos no interior da escola, e 9,5% foram roubados e 5,6% viram os seus

pertences serem destruídos no exterior da escola. Por fim o consumo de substâncias

ilícitas. A 8% dos alunos já tentaram vender ou oferecer droga no interior da escola,

nesta situação colegas, assim como a mesma percentagem no exterior, aqui por

estranhos. Cerca de 18% dos alunos já viu colegas a consumir droga, e 29% viram ser

consumidas bebidas alcoólicas no recinto escolar.

Page 20: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

20

Questionados sobre o grau de segurança que sentiam na escola 20,1%responderam

sentir­se muito seguros, 66,3%mais ou menos seguros, 9,5%pouco seguros e muito

pouco seguros 3,9%. Os locais indicados como os mais seguros são as salas de aula no

período lectivo, com cerca de 90,2% de respostas e a biblioteca com 87,9%. Os locais

considerados menos seguros são para 33,3% dos alunos o percurso entre a escola e a

casa, para 19% as casas de banho, para 17,2% os balneários e o recreio para 10,4%.

Um outro conjunto de pesquisas, realizadas no âmbito do Instituo de Estudos da

Criança/Universidade do Minho dão um contributo para o conhecimento do fenómeno.

Pereira, Almeida, Valente e Mendonça (1996) e Almeida (1999) apresentam os

resultados de uma pesquisa desenvolvida em Escolas 1º e 2º Ciclos do Ensino Básico do

Distrito de Braga, cujos objectivos se organizaram em três eixos distintos:

• diagnosticar os níveis de agressão e de vitimação;

• compreender da influência dos factores determinantes das práticas de agressão e

vitimação;

• identificar os tipos de agressão sofrida e os locais de ocorrência.

O análise realizada a partir do conceito de bullying considerava as situações de agressão

física, directa verbal e indirecta, ou seja, foram contabilizados também os relatos das

situações de agressão psicológica.

Em termos empíricos possuiu um carácter extensivo com a aplicação de um

questionário em 18 escolas do 1º e 2º Ciclos do Ensino Básico a uma amostra de 6200

alunos. O questionário aplicado resultou de uma adaptação para a realidade escolar

portuguesa do questionário de Olews. As variáveis consideradas foram a idade, sexo,

local de residência, origem socioeconomica (grau instrução e profissão/ocupação dos

pais) e a condição de agressor/vítima para a caracterização dos alunos. Relativamente às

escolas o estudo compreendia as áreas rurais, urbanas, suburbanas e industrializadas do

distrito de Braga.

Os resultados produzidos por esta pesquisa indicam que, nos 3 meses anteriores à

aplicação do questionário, 21% dos alunos consideravam­se vítimas de agressão em

pelo menos 3 situações distintas; 36% afirmaram ter sido vítimas de agressão nesse

período de tempo e cerca de 42% não foram vítimas de agressão no mesmo período de

tempo. Quando questionados sobre se se auto­definiam como agressores 46%

Page 21: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

21

afirmaram nunca ter agredido ninguém, 36% afirmaram que já tinham atacado uma ou

duas vezes nesse período de tempo, 6,7% agrediram 3 ou 4 vezes e 10,7% agrediram,

também, 5 ou mais vezes nesse período de tempo.

As conclusões centrais deste estudo apontam para uma maior concentração nos rapazes

da autoria da agressão assim como da experiência de vitimização, frequência que é

aproximadamente o dobro da existente no grupo das raparigas.

A agressão física encontra números mais significativos para os rapazes, enquanto que

no caso das agressões verbais os valores são aproximados para rapazes e raparigas,

embora estas utilizem esta modalidade mais precocemente. Relativamente à variável

idade o estudo concluiu que os agressores são normalmente mais velhos, constatando­se

contudo uma diminuição dessa prática com o aumento da idade, excepção feita às

agressões verbais para as raparigas.

As situações de agressão são maioritariamente protagonizadas por um rapaz que agride

sozinho (47,7%) ou por um grupo de rapazes (30, 5%), embora outras situações tenham

sido identificadas situações em que a agressão efectuada por grupos mistos (12,1%),

rapariga isolada (12,1%) ou grupo de raparigas (4,4%). O agressor caracteriza­se por ser

mais velho (41%); pertencer à mesma sala de aula (39%) ou frequentar o mesmo ano de

escolaridade, embora pertencendo a outra turma (24%).

A análise permitiu, assim, estabelecer o perfil tipo de agressores e vítimas. O agressor

encontra­se maioritariamente entre os alunos de sexo masculino, proveniente de classes

sociais mais baixas, a frequentar escolas suburbanas no 1º Ciclo, verificando­se uma

correlação positiva entre o aumento do número de anos em atraso e os alunos

agressores.

A posição de vítima corresponde mais aos alunos do sexo masculino, das escolas

urbanas que frequentam os primeiros (4) anos de escolaridade. O mesmo estudo

verificou ainda que os alunos vítimas de violência na escola pouco comunicam com

adultos acerca das ocorrências, sejam eles os pais (50,4%) ou os professores (46,1%).

Relativamente à atitude dos professores face às situações de agressão os resultados do

estudo indicam que 24,6% dos alunos referiram que os professores nunca procuraram

impedir as agressões entre alunos; 36, 4% consideravam que os professores o fazem às

vezes e 39% consideravam que os professores muitas vezes procuram impedir as

Page 22: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

22

agressões entre alunos. Estes valores complementam os valores encontrados para a fraca

comunicação dos alunos de situações violentas.

Entre as formas de agressão mais frequentes foram identificados, por ordem, chamar

nomes/ofensas verbais (37, 6%), agressões corporais (bater, dar murros, pontapés, etc.)

(29, 6%), levantar rumores ou divulgar segredos de alguém (28,1%), tirar objectos

pessoais (26, 4%), meter medo (17, 5%) e não lhe falarem (12,5%). Como principais

locais de ocorrência das agressões encontram­se: os recreios (50, 8%), as salas de aula

(21, 6%), os corredores e escadas (18%) e o refeitório (3, 6%).

Os valores do bullying encontrados por esta pesquisa são significativos e aproximam­se aos encontrados para outros países europeus, nomeadamente Itália e Espanha. A mesma

equipa aplicou o mesmo questionário em Lisboa, em 1996, e encontrou valores

semelhantes, embora com um agravamento das ocorrências no 6º ano de escolaridade.

O mesmo questionário, utilizado pela equipa do estudo anteriormente apresentado

(Olews, 1989), foi aplicado por Pires (2000) em duas escolas do 2º Ciclo do Ensino

Básico, a uma amostra de 440 alunos, numa pesquisa desenvolvida em torno da

compreensão dos factores que influenciam os problemas de agressividade, violência e

vitimação em meio escolar, tendo sido consideradas escolas que diferiam nos seus

equipamentos e espaços escolares. Foram identificados dois tipos de factores que

influenciam as práticas agressivas dos alunos, distinguido­se os de carácter extrínseco

(supervisão do recreios, dimensão da escola e a distribuição espacial do edifício), e os

de carácter intrínseco (currículo não­formal).

Um outro conjunto de pesquisas de dimensão empírica mais reduzida, normalmente

fazendo apelo a metodologias de carácter qualitativo, fornece igualmente um conjunto

de pistas para a compreensão do fenómeno.

No que respeita às situações de vitimação é de destacar a contribuição de Sani (2000)

que procurou conhecer as percepções e representações construídas pelas crianças após a

experimentação directa, ou indirecta, de crimes envolvendo violência interpessoal. A

investigação, de natureza qualitativa foi desenvolvida a partir da análise do discurso das

crianças, pelo abrangência dos resultados, relativos ao crime em geral, optámos por não

integrar na presente publicação, ficando apenas a referência.

Page 23: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

23

As pesquisas relativas ao bullying enfatizam a importância dos espaços de recreio, nomeadamente, como vimos nas conclusões de Pires, a sua organização pode mesmo

constituir um dos factores que influenciam as práticas agressivas dos alunos. A

resultados semelhantes chegaram Marques e Neto (2000). Estes autores desenvolveram

uma pesquisa que teve como unidades de análise 4 recreios distintos: o recreio livre, o

recreio com supervisão, o recreio com materiais e o recreio com supervisão e materiais,

observados em 4 semanas distintas. Após as 4 semanas foi aplicado um questionário

sobre as agressões praticadas e sofridas aos 2º, 3º e 4º anos de escolaridade. Os

resultados verificaram a correlação positiva entre a existência de materiais e de

supervisão e os baixos níveis de agressão. Os alunos afirmaram uma clara preferência

pelos recreios organizados com materiais e com supervisão. Os materiais propiciaram

uma maior união entre as crianças a supervisão permitiu apoio na resolução de conflitos

e na organização de situações de aprendizagem.

Pereira, Neto e Smith (1997) concluíram que é na zona dos recreios que ocorrem mais

comportamentos de bullying, em particular nos espaços exteriores. Os resultados

apontam como factores explicativos deste fenómeno os factores de contexto e

organizacionais, tais como: as restrições dos espaços de recreio e consequente

aborrecimento dos alunos; a falta de diversificação de oferta de actividades; a

superlotação dos recreios resultante das dificuldades de gestão do tempo e ausência de

competências que promovam o jogo, a cooperação, o conhecimento e aceitação de

regras; ausência de supervisão; imposição de regras que não servem aos alunos, logo,

não aceites ou compreendidas; e por fim, a arquitectura do espaço que não considera as

necessidades das crianças.

Pereira e Neto (1994) procuraram identificar as práticas prioritariamente realizadas e

preferidas pelas crianças No estudo que desenvolveram procuraram conhecer essas

práticas e verificar a existência de uma relação com o meio (rural ou urbano) e o nível

de ensino (Jardim de Infância ou 1º Ciclo do Ensino Básico). Metodologicamente a

pesquisa de natureza qualitativa teve como unidades de análise 2 grupos de crianças,

dos 3 aos 6 anos de idade, e dos 6 aos 10 anos de idade, em escolas e Jardins de Infância

situados em áreas urbanas e rurais. Na pesquisa realizaram­se entrevistas às crianças e

aos pais. Os resultados revelam que as práticas prioritariamente realizadas e preferidas

Page 24: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

24

pelas crianças são na generalidade coincidentes, concluindo­se assim que não há

variações significativas, sejam elas crianças habitantes em áreas rurais ou urbanas,

frequentadoras do Pré­Escolar ou no 1º Ciclo Ensino Básico.

Em síntese podemos afirmar que estatisticamente o fenómeno da violência em meio

escolar tem uma incidência territorial mais significativa nas áreas urbanas e suburbanas,

das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto. No interior dos estabelecimentos escolares o

fenómeno apresenta uma concentração de ocorrências nas áreas com fraca presença de

adultos, como os recreios, balneários e casas­de­banho, ou seja, a frequência de

ocorrências de situações de violência no exterior da escola é menos significativa embora

os valores tendam a aproximar­se dos encontrados para o interior da escola, em

particular no percurso casa/escola. Os estudos apresentados revelam tratar­se de um

fenómeno predominantemente masculino na medida em que seja para os agressores,

seja para os agredidos encontramos sempre valores mais elevados para os rapazes.

Em síntese, a produção científica em Portugal em torno da problemática da violência na

escola é, como vimos, escassa e pouco sistemática. Consequentemente, não há um saber

comum aos investigadores que sobre esta problemática se debruçam; seja no sentido da

construção de uma malha teórica que questione e suporte a análise deste fenómeno, seja

no sentido da reunião de informação de carácter empírico, o que nos impede de

conhecer o fenómeno na sua multidimensionalidade e extensão.

Page 25: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

25

3. ­ Políticas e estratégias de intervenção

3.1­ As políticas de combate à violência na escola

A ausência de uma produção científica, que faculte informação de natureza teórica e

empírica acerca do fenómeno contribui, também, para a falta de clarificação conceptual

subjacente à definição de políticas de combate à violência na escola. Os termos

equivocados encontrados nos documentos oficiais, reflectem o peso das noções de senso

comum na definição de políticas educativas. No que respeita à procura de soluções,

têm­se vindo a estruturar dois discursos acerca das situações designadas por violência

na escola, discursos estes que resultaram em diferentes medidas políticas. Identificamos

então duas abordagens contrárias em coexistência

Abordagem pedagógica Assenta na ideia de que uma parte significativa das situações de violência tem a sua

origem no insucesso da escola em conseguir atingir os objectivos educativos que lhe são

determinados. O argumento central é o de que o sistema educativo português teve, nas

últimas décadas, um razoável sucesso na implementação de mecanismos que

promoveram o crescente acesso de todos à educação escolar, mas falhou na criação de

oportunidades para democratizar o sucesso escolar. A permanência de elevadas taxas de

insucesso e abandono escolar (particularmente no ciclo final da escolaridade

obrigatória) constituem problemas ainda longe de estarem solucionados, facto que

condiciona e orienta uma parte significativa das medidas políticas e pedagógicas

tomadas nos últimos anos. A procura de soluções é concebida dentro de um quadro

político e pedagógico com o objectivo final de obter a democratização do sucesso

escolar (compreendendo este não apenas as aprendizagens cognitivas, mas também

sociais e culturais). Genericamente, os defensores deste ponto de vista (um misto de

noções sócio­psico­pedagógicas) consideram que é dentro do campo pedagógico que a

violência pode ser resolvida, ou pelo menos prevenida, dando importância reduzida a

medidas baseadas no uso do policiamento dentro dos limites da escola (somente

admitido em situações muito específicas). A estratégia defendida é centrada na

promoção das competências sociais e na formação cívica e educativa dos alunos. As

situações violentas resultam da frustração dos alunos e traduzem­se em actos violentos

Page 26: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

26

por estes não serem capazes de lidar com o insucesso e sentirem­se agredidos durante o

seu percurso escolar.

Esta perspectiva sublinha assim, essencialmente, a necessidade de medidas do tipo

organizacional e pedagógico. As primeiras são compostas por legislação sobre gestão

escolar descentralizada e pelos os territórios educativos de intervenção prioritária. 6 As

segundas compreendem medidas como a gestão flexível do currículo (particularmente a

sua adaptação local); a possibilidade de promover “currículos alternativos” para alunos

com dificuldades de aprendizagem; a mudança de processos de avaliação dos alunos

procurando reduzir a exclusão prematura; o “estudo acompanhado”, que procura

promover competências individuais e hábitos de estudo nos alunos; o “Regulamento dos

direitos e deveres do aluno”, fornecendo a orientação para promoção de competências

sociais.

Durante a última década e meia podem igualmente ser identificadas algumas medidas

que, apesar de não serem especificamente dirigidas para a resolução do problema da

violência na escola, tomavam em conta algumas das suas dimensões.

A tentativa de implementação de programas de formação social e pessoal, na sequência

da aprovação da Lei de Bases do Sistema Educativo, traduziu­se, em 1989, 7 na

aprovação dos planos curriculares para o ensino básico e secundário que consideravam

na sua estrutura um espaço disciplinar com uma hora semanal designado por

“desenvolvimento pessoal e social”. Com a mudança de orientação política governativa

operada em meados da década de 90, podemos encontrar um conjunto de orientações

curriculares que procuram romper com este modelo. A “educação para a cidadania”

retoma, em parte, os princípios e objectivos da “formação pessoal e social”, embora

procure consagrar uma perspectiva transversal e de complementaridade curricular, para

que, em todos os ciclos, as actividades de instrução e de educação para a cidadania

sejam combinadas de modo consistente e permanente (DL 6/2001).

6 Os Territórios Educativos de Intervenção Prioritária”(TEIP) foram criados, a título experimental, no ano de 1996/97 pelo Despacho nº 147­B/ME/96 e pelo Despacho Conjunto nº 73/96 dos secretários de estado da educação e inovação e da administração educativa. Foram então definidos 34 territórios, distribuídos pelas 5 direcções regionais de educação. Os territórios foram concebidos como espaços comunitários de intersecção entre as estruturas do sistema escolar dos 3 ciclos do ensino básico e da educação pré­escolar e as estruturas comunitárias de educação extra­escolar para o desenvolvimento de populações social e economicamente desfavorecidas. A filosofia subjacente ao modelo de criação dos TEIP em Portugal aproxima­se das ZEP francesas (Zones d’Éducation Prioritaires) e das EAZ inglesas (Education Action Zones). Para conhecer o quadro comparativo das medidas políticas centrais, assentes numa lógica de territorialização e de autonomia das escolas, em diversos países europeus, ver Barroso (org.), 1999; AA.VV., 2000; e Canário e outros, 2001. 7 DL 286/89, que só virá a ser regulamentado em 1991 (Despacho 65/ME/91) dando­se início a um período experimental apenas em 1993 com a aprovação do Despacho 171/ME/93, marcado por sucessivas dificuldades e controvérsias, que bloquearam qualquer eficácia.

Page 27: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

27

Abordagem policial Esta segunda linha de argumentação sobre as situações de violência na escola reenvia,

no essencial, a responsabilidade de tais actos para aqueles que ocupam posições

desfavorecidas no espaço social. Tal concepção sustenta que:

a violência aumenta, em particular nas escolas situadas junto de zonas da periferia

degradada, marginal ou de bairros sociais;

a violência preexiste à escola, é­lhe exterior, existe uma inevitabilidade na

reprodução da violência contextual em violência escolar;

são os alunos de insucesso escolar os mais violentos, e, em particular os

provenientes de minorias étnicas.

Tais asserções partem do pressuposto de que as situações de violência na escola

resultam de uma “agressão” à comunidade escolar por elementos marginais,

provenientes desses bairros, razão pela qual aquela deve ser defendida. O “programa

escola segura” constitui a mais emblemática das medidas políticas decorrente desta

abordagem.

A primeira medida política, especificamente tomada para controlar o crescimento das

situações de violência dentro das escolas, é de 1992, e baseou­se num protocolo entre o

Ministério da Educação e o Ministério da Administração Interna. 8 Criado com o

objectivo de coordenar esforços das autoridades escolares e forças policiais, este

protocolo era bastante sumário e excluía qualquer dimensão pedagógica. Dele resultou o

“programa escola segura”, coordenado pelo Gabinete de Segurança do Ministério da

Educação (criado em 1984), e implementado num número progressivamente maior de

escolas, durante os anos seguintes. A partir de 1995, o governo, de centro esquerda,

manteve na sua essência, as medidas políticas tomadas pelo anterior executivo,

nomeadamente este último programa.

Representando um significativo esforço financeiro por parte do estado e mobilizando

um número significativo de recursos policiais e guardas do gabinete de segurança do

ME, na sua forma actual, representa a defesa do modelo centralista de gestão do sistema

8 Politicamente a sua origem e implementação foi realizada por um governo de centro direita o que explica, em parte, a prevalência que a administração interna tem tido no seu desenvolvimento. Explicará também algumas das dificuldades sentidas na sua transformação de um programa de vigilância policial para um programa de educação cívica comunitária.

Page 28: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

28

educativo. A mobilização dos diferentes agentes educativos existentes na comunidade, a

implementação de programas de educação cívica, a diversificação dos espaços

educativos escolares e extra­escolares, simplesmente, não são contemplados,

privilegiando­se antes uma abordagem policial. É interessante verificar, que o discurso

da segurança parece manter as diversas forças políticas “atadas” à “inevitabilidade” da

necessidade do seu crescimento, mesmo aquelas que preconizam visões alternativas do

sistema educativo. Trata­se da aprendizagem, nos espaços escolares, da cidadania

policiada.

A concepção centralista assim traduz­se, aliás, pela dificuldade da instituição em aceitar

a diversidade sociocultural como um bem, pressupondo que aquela dificulta os

processos de socialização de massas. Uma posição que se mantém mesmo quando

formalmente as directivas políticas e os quadros normativos parecem promover o

respeito pela diversidade. A escola defende­se da comunidade com gradeamentos,

guardas e cartões de identificação, ensinando, assim, aos alunos os princípios da

cidadania desconfiada. O encerramento da escola parece ser, para alguns, a condição da

sua sobrevivência.

Alguma evolução legislativa foi entretanto efectuada, nomeadamente a publicação do

Decreto Lei nº 16/2001 ­­ combate à insegurança e violência em meio escolar ­­, que

mantém o Programa Escola Segura sob a tutela do Ministério da Educação, em

coordenação com os da Administração Interna, da Cultura, Saúde, do Trabalho e

Solidariedade e da Juventude e Desporto; com a estrutura de acompanhamento ao

Programa Escola Segura agora integrada no Observatório do Ensino Básico e

Secundário.

Para além da investigação, está prevista ainda a elaboração de um guia sobre as medidas

contra a violência nas escolas, um acréscimo de qualificação das equipas especializadas

de apoio sociopedagógico; a consolidação da autoridade do pessoal docente; o

acompanhamento e responsabilização das famílias de alunos com comportamentos

violentos; ao mesmo tempo que se prevêem acções de apoio para os alunos vítimas de

violência escolar. O Decreto Lei nº 16/2001 recomenda ainda a concepção e integração

de módulos sobre violência e indisciplina na escola nos cursos de formação inicial e

contínua de professores.

Apesar do significativo avanço que tal programa representaria face à actual situação, é

de salientar que, mais uma vez, se procurava uma solução longe das comunidades

Page 29: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

29

educativas. Sobre a situação actual pouco se sabe, já que o actual governo não se

pronunciou até ao momento sobre a sua visão para o problema.

A violência nos documentos oficiais Para identificar o uso de terminologia sobre violência, foram analisados diferentes tipos

de documentos e estatísticas. Primeiro, um grupo de documentos oficiais produzidos

durante a concepção e execução do “programa escola segura” (protocolos inter­

ministeriais, regulamentos dos guardas escolares, questionários utilizados para registar

situações marginais e estatísticas). Segundo, a análise das regras nacionais para a

definição dos direitos e deveres dos alunos nos Regulamentos internos de escola e no

Regulamento disciplinar do aluno.

Os documentos oficiais caracterizam­se pela ausência de uma definição de violência ou

pela não utilização do termo. Os documentos do “programa escola segura” utilizam,

sistematicamente, os termos (in)segurança ou marginalidade para descrever todas as

situações consideradas desviantes da norma escolar. Dentro da mesma categoria geral,

são considerados acontecimentos tão diferentes como alarmes de bomba, tráfico de

drogas ou roubos e assaltos. Esta situação é corrente nos questionários utilizados pelo

gabinete de segurança para relatar situações marginais, desde 1986. A revisão destes

questionários realizou­se, com a progressiva compreensão, pelas autoridades, de que a

maioria das situações registadas eram perpetradas dentro da escola, por alunos, e não

eram resultados de acções de estranhos, vindos de bairros problemáticos da vizinhança.

Termos como bullying ou violência aparecem, pela primeira vez, como categorias independentes, em finais dos anos 90, mas ainda misturados com indisciplina, racismo

ou abuso sexual, e dentro da categoria mais geral de acções contra pessoas.

As regras nacionais para a definição dos direitos e deveres dos alunos nos regulamentos

internos de escola e no regulamento disciplinar do aluno, que constituem documentos

centrais para a produção de regulamentos locais, também nunca mencionam o termo

violência. A sua estratégia é centrada na promoção de competências sociais e na

formação cívica e educativa dos alunos, em vez de procurar categorizar os seus

comportamentos.

Em síntese, podemos afirmar que a presença de situações violentas nas escolas

portuguesas levou, durante a última década e meia, a um conjunto de medidas políticas

caracterizadas pelas diferentes compreensões das suas causas e filosofias de

intervenção. Cada uma das duas perspectivas tem os seus defensores e torna­se difícil

Page 30: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

30

afirmar que trabalhem em conjunto, sendo as diferentes medidas geralmente pouco

coordenadas e apresentando um elevado potencial de desperdício de recursos; expresso

na “confusão” terminológica evidenciada nos documentos oficiais.

3.2 – O Programa Escola Segura: alguns resultados da sua implementação

3.2.1 – Origem e pressupostos do programa

É a partir de meados dos anos 80 que a questão da segurança nas escolas começa

lentamente a transformar­se numa questão que merece a atenção das autoridades

educativas. De facto, após um crescendo “invisível” de actos violentos (assaltos,

agressões, destruição de propriedade, etc), e da pressão resultante das reclamações das

escolas, associações de pais e sindicatos, o poder político toma as primeiras medidas

tendentes a minimizar o problema 9 . São momentos centrais desse processo a criação do

Gabinete de Segurança do Ministério da Educação em 1984; a colaboração não

sistemática para garantir segurança às escolas durante os anos 80 entre o Ministério da

Educação e o Ministério da Administração Interna, seguido pela assinatura de um

protocolo em 1992 que estruturou a cooperação, reafirmado em 1996 sob a designação

de Programa Escola Segura. Os objectivos deste protocolo consistiam na promoção de condições de segurança nas escolas para que a liberdade de aprender e ensinar pudesse

ser efectivamente possível. Os promotores do Programa Escola Segura consideraram

que a violência escolar era provocada por jovens marginais provenientes de bairros

problemáticos da vizinhança dos estabelecimentos escolares, sendo necessário evitar o

que consideravam como verdadeiras agressões às comunidades escolares. Inicialmente

os responsáveis do programa entendiam que a metodologia adequada para lidar com a

situação seria centrar a sua atenção em sensibilizar escolas, famílias e comunidades para

este problema. Simultaneamente com estas medidas três linhas de intervenção foram

definidas:

­ em primeiro lugar, a presença regular de polícias no exterior da escola,

­ em segundo, a criação de um corpo de guardas escolares dependente

directamente do Gabinete de Segurança do Ministério da Educação;

9 De salientar que apesar da relativa frequência de casos estes nunca obtiveram uma mediatização significativa, o que contribuiu para os manter numa relativa penumbra.

Page 31: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

31

­ por último a tentativa para treinar os funcionários das escolas para lidar com

ameaças vindas do exterior.

Até meados dos anos 90 o Programa Escola Segura constituiu a única política para lidar

com as situações de violência, e, no essencial, acabou por se basear numa perspectiva

preventiva de base policial. A sua implementação ficou a cargo do Gabinete de

Segurança do Ministério da Educação (GSME) em cooperação com o Ministério da

Administração Interna (Forças Policiais e Governadores de Distrito).

Âmbito de actuação e estrutura organizacional do programa Todas as escolas públicas do país do ensino não­superior, geridas directamente pelo

Ministério da Educação (2º e 3º ciclos do Ensino Básico, Ensino Secundário). Apesar de

as escolas do 1º ciclo do Ensino Básico não serem da responsabilidade directa do

Ministério da Educação existem escolas com programas de segurança negociados com

as respectivas Câmaras Municipais.

O conjunto das escolas encontra­se classificado em quatro níveis de segurança,

conforme o tipo e extensão dos problemas detectados. Os níveis de segurança

organizam­se da seguinte forma:

­ escolas com problemas no interior e exterior;

­ escolas com problemas só no interior;

­ escolas em observação inicial;

­ todas as outras escolas.

Estrutura organizacional O Programa Escola Segura possui duas vertentes articuladas entre si, embora independentes. A primeira é coordenada pelo Gabinete de Segurança do Ministério da

Educação e apoia­se numa estrutura de delegados de segurança existentes em todas as

escolas do país, assim como nas Direcções Regionais de Educação e nos Centros de

Área Educativa. O Gabinete de Segurança possui ainda na sua dependência hierárquica

directa um corpo de agentes de segurança através do qual desenvolve o essencial da sua

actuação dentro dos espaços escolares. Enquanto presentes nas escolas, os agentes

dependem também operacionalmente do Conselho Directo das mesmas.

A selecção e recrutamento dos agentes de segurança é feita essencialmente entre ex­

agentes da polícia que se encontram na situação de reforma. A sua selecção realiza­se

Page 32: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

32

através de análise curricular, de informações sobre o seu desempenho enquanto se

encontravam na polícia e das avaliações regularmente fornecidas pelas direcções das

escolas sobre o seu desempenho, integração e sensibilidade para as funções. Ao

iniciarem funções é­lhes fornecida formação sobre os objectivos prioritários de

actuação, estratégias de intervenção e procedimentos em situações de risco. A formação

sobre princípios e regras de segurança foi também já possibilitada aos auxiliares de

acção educativa em algumas regiões do país e a algumas associações de pais e de

estudantes.

O objectivo principal da actuação dos agentes de segurança é a prevenção das situações

de violência e delinquência dentro dos espaços escolares. Para isso a recolha de

informações sobre potenciais situações de risco, o estabelecimento de boas relações com

a comunidade educativa (em particular com os alunos), as famílias e a restante

comunidade exterior à escola, constitui um elemento fundamental. Cada agente deve

pois possuir uma visão clara das situações de risco existentes na escola e no seu

contexto exterior, a qual é prioritariamente transmitida ao Conselho Directivo da

respectiva escola.

A actuação destes agentes não se confunde com a actuação disciplinar própria da escola,

não podendo encontrar­se em conflito com esta, sendo a intervenção apenas possível a

pedido expresso do Conselho Directo. Os agentes apenas intervêm quando se deparam

com situações inesperadas de violência entre alunos, destruição de bens/vandalismo,

assaltos, utilização de armas, ataques de carácter sexual. O essencial da sua actividade

procura prevenir o aparecimento desse tipo de situações, procurando identificar e

dialogar com os eventuais líderes de grupos, ganhando a sua confiança, ou afastando

elementos exteriores às escolas considerados perturbadores. Em qualquer dos casos a

sua actuação deve ser discutida com o Conselho Directo da escola. Os agentes de

segurança pública dependentes do GSME coordenam também a sua actividade com as

forças de segurança da área (PSP ou GNR) e os guardas nocturnos, não se substituindo

a estes, pois não possuem o mesmo estatuto legal.

A segunda dimensão diz respeito à actuação das forças de segurança. A actividade das

forças policiais diz respeito ao patrulhamento do espaço envolvente das escolas e dos

percursos casa­escola. Existe ainda um conjunto de viaturas (cerca de 200) fornecidas

Page 33: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

33

pelos governos civis que estão identificadas com o logotipo do programa e que circulam

junto às escolas com os piquetes de segurança, possuindo um efeito essencialmente

dissuasor.

É de assinalar o elevado e crescente número de recursos humanos e materiais afectos ao

programa, como podemos constatar pela leitura dos quadros seguinte.

Quadro nº1 ­ Recursos Humanos e Materiais afectos em exclusividade ao Programa

Escola Segura ­ 2000

PSP GNR GS/ME Total Recur sos Humanos 295 ­­­­­­­ 411 706 Recursos Mater iais Viaturas 167 187 7 361 Recursos Mater iais Ciclomotores 116 ­­­­­­­ ­­­­­­­­ 116 Recursos Mater iais Telemóveis 70 38 11 119

Fonte: Ministério da Educação, 1999

Para o ano de 2003, e tomando como referência a PSP, no âmbito do Programa,

encontramos a seguintes distribuição de Recursos.

Quadro nº2 ­ Recursos da PSP afectos em exclusividade ao Programa Escola

Segura para o ano de 2003

Recursos Total Número de agentes do Programa Escola Segura 310 Número de viaturas 114 + 16 carros patrulha Motociclos 39 Scooters 48 Fonte: Relatório PSP ­ 2002/03

Page 34: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

34

3.2.2 – A informação produzida no âmbito do programa

A informação produzida pelo Gabinete de Segurança do Ministério da Educação

constitui o único exemplo institucional de recolha extensiva de informação relativa à

violência em meio escolar, sendo constituída pelas comunicações de ocorrências

realizadas pelas escolas a nível nacional nos anos entre 1995 e 2000. Esta informação

possui um alcance e fiabilidade limitadas na medida em que as informações disponíveis

resultam apenas das ocorrências declaradas e não das efectivamente ocorridas, facto que

se pode atribuir, essencialmente, a motivos de carácter organizacional.

O desconhecimento da obrigatoriedade dos Conselhos Executivos de procederem à

comunicação da totalidade dos incidentes à Direcção Regional de Educação (DRE), ao

Centro de Área educativa (CAE) e ao Gabinete de Segurança do Ministério da

Educação (GSME), a burocratização dos processos de comunicação; a adopção de

estratégias de ocultação de situações de violência que possam contribuir para a

degradação da imagem da escola, e para a prática de actos retaliatórios contra os

queixosos; a tentativa de limitar o efeito de difusão do fenómeno por imitação,

encontram­se entre as causas que levam à prática generalizada de não comunicação das

ocorrências.

Outro factor que condiciona a fiabilidade dos dados resulta da dificuldade em encontrar

uma definição de violência (ou acto violento) comum a todos os intervenientes. Assim a

subjectividade inerente à avaliação individual de cada situação e a banalização da

utilização desta noção no quotidiano escolar (em que, por excesso, tudo é violento, ou,

tudo é relativizado) contribui igualmente para o baixo empenhamento de algumas

escolas na recolha da informação, reforçando assim para o enviesamento dos dados

disponíveis.

Os instrumentos de recolha constituem igualmente uma fonte importante de problemas

no que respeita à fiabilidade dos dados recolhidos. A sua estrutura; as categorias

utilizadas, que muitas vezes se recobrem ou são totalmente subjectivas; a utilização de

terminologias que remetem para diferentes leituras (bullying, por exemplo.), torna­as

frequentemente desadequadas.

Page 35: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

35

Apesar destas insuficiências, consideramos que na ausência de outra informação de

nível nacional, se justifica a sua utilização, mesmo que a sua leitura não possa fornecer

mais que algumas indicações pouco fiáveis.

As ocorrências registadas O Gabinete de Segurança do Ministério da Educação registou 433 ocorrências para o

ano de 1995, 914 em 1996, 949 em 1997, e em 1998 foram registados 816 casos. Para o

ano 2000 o Gabinete de Segurança registou 1873. Relativamente aos anos de 1999 e

2000 o Gabinete de Segurança introduziu alterações nos instrumentos de recolha,

nomeadamente com a inclusão de novas categorias como gangs e grupos, drogas lícitas. Para os anos escolares posteriores a 2000 destaca­se a organização dos dados a

partir dos registos efectuados pelas forças policiais como a PSP e GNR.

Há, portanto, ou uma contabilização deficiente das ocorrências, ou os fenómenos

designados por violência tem uma representação reduzida no universo escolar, mesmo

considerando que este tipo de estatísticas subavalia sempre as situações efectivamente

ocorridas. Contudo, pela leitura dos registos existentes podemos concluir que há uma

tendência de aumento das ocorrências registadas 10 , e algumas variações interessantes.

Em primeiro lugar constatam­se as diferenças significativas na distribuição regional das

ocorrências (Quadro nº1), com incidência especial nas áreas abrangidas pelas Direcções

Regionais de Educação de Lisboa e do Norte, que apresentam sempre os valores mais

elevados para todos os anos referidos.

Quadro nº3 ­ Número de ocorrências de situações de violência em meio escolar,

segundo a sua distribuição regional (1995­1998)

Direcções Regionais Educação

1995 1996 1997 1998

Lisboa 198 (45,73%)

557 (60,94%)

548 (57,74%)

488 (59,80%)

Nor te 147 (33,95%)

192 (21,01%)

236 (24,87%)

185 (22,67%)

Centro 32(7,39%)

96(10,50%)

76(8,01%)

61(7,48%)

10 À qual não será alheia a tentativa do GSME para melhorar a recolha de informação, podendo apenas representar um aumento de eficácia no seu registo.

Page 36: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

36

Algarve 48(11,09%)

45(4,92%)

58(6,11%)

48(7,11%)

Alentejo 8 (1,85%)

24(2,63%)

31(3,27%)

24(2,94%)

Total 433 914 949 816 Fonte: Ministério da Educação, 1999

Face à sobre­representação nestas duas Direcções Regionais de Educação, que em parte

coincidem com as Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto, poder­se­ão levantar

algumas hipóteses: em primeiro lugar a própria dimensão da população escolar e dos

estabelecimentos aí existentes; em segundo a maior diversidade de públicos, com o

consequente aumento da conflitualidade, à existência de situações graves de exclusão e

conflitualidade social; e, finalmente a uma maior ocorrência de situações de

marginalidade infantil e juvenil. Na situação oposta encontra­se a Direcção Regional de

Educação do Alentejo onde se encontra o maior número de escolas rurais isoladas do

país, correspondente a uma área marcada pela profunda desertificação, em particular em

toda a sua faixa interior. Seria contudo fundamental compreender melhor as dinâmicas

internas particulares das diferentes regiões e estabelecimentos escolares, através de uma

necessária desagregação da informação, já que de outra forma poderemos incorrer em

análises pouco esclarecedoras.

Para além da distribuição das ocorrências no território nacional os relatórios do GSME

consideram também na sua análise o tipo de situação violentas, informação apenas

disponível para os anos de 1995 a 1998 (Quadro nº2).

Quadro nº4 ­ Número de ocorrências por tipo de situação de violência em meio escolar

1995­1998

Tipos/Situações de violência 1995 1996 1997 1998 Roubo e vandalismo 248

65,59% 408 44,64%

376 39,62%

258 31,74%

Violência no inter ior da escola 5713,16%

586,35%

117 12,33%

161 19,73%

Violência nos acessos à escola 368,31%

475,14%

925,14%

161 19,73%

Droga 276,24%

616,67%

808,43%

435,27%

Disparos 1 5,56%

9 0,98%

5 0,53%

192,33%

Ameaça de bomba 184,16%

312 34,14%

238 25,08%

819 93%

Assédio sexual 5 1,15%

101,09%

262,47%

435,27%

Fogo posto 4 2 1 5

Page 37: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

37

0,92% 0,22% 0,22% 0,61% Alcoolismo 1

0,23% ­­­­­­­­­­­ 20

21% ­­­­­­­­­

Racismo ­­­­­­­­­­­ 1 0,11%

1 0,11%

3 0,37%

Outros ­­­­­­­­­­­­ 6 0,66%

111,16%

415,02%

Fonte: Ministério da Educação, 1999

No que diz respeito ao tipo de ocorrências registadas verifica­se uma lenta

transformação das suas características. A categoria que recolhe maior número de

registos, Roubo e Vandalismo, vem de forma mais ou menos rápida a registar uma

redução significativa. Esta resultará provavelmente do facto de as escolas terem vindo a

desenvolver maior atenção à guarda do material escolar, à colocação de guardas

nocturnos, assim como da implementação do Programa Escola Segura que garante a

vigilância das escolas pelas forças policiais e por guardas escolares.

Paralela à perca de importância da categoria atrás referida há a registar o aumento

significativo das situações de violência (agressão física, assaltos, ...), sendo que a categoria agressão mantém em geral um valor mais expressivo, com excepção da

Direcção da Região do Norte. Os relatórios referem que as estações de Outono e

Inverno são a época de maior incidência de ocorrências nos acessos às escolas,

facilitadas pela redução da luminosidade no final do dia.

Cerca de 80% das ocorrências de Ameaças de Bomba dão­se nos períodos lectivos, coincidindo com o início do ano lectivo, as épocas de avaliação e com o Carnaval. É de

referir que apesar de inúmeras ameaças de bomba nunca se registou qualquer incidente

deste tipo.

Para os anos de 1999 e 2000 contamos com as informações produzidas pelo Programa

Escola Segura que reúne os registos de ocorrências da PSP e GNR e do Gabinete de

Segurança do Ministério da Educação. O relatório final de avaliação do Programa

sublinha a inexistência de uma metodologia uniforme na recolha e tratamento dos dados

seja das diferentes forças policiais, seja do próprio Ministério da Educação. Por este

motivo não há possibilidade de se proceder a uma análise comparativa, seja a nível

nacional ou local, o que obriga ainda à apresentação dos dados separados por força

policial.

Page 38: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

38

Quadro nº 5 ­ Ocorrências da PSP – Todos os estabelecimentos de ensino

Tipo de Ocor rências 98/99 99/00

Ameaça de bomba 76 111

Posse/uso de armas 16 18

Ofensas corporais 126 282

Danos 129 135

Posse/ Consumo de estupefacientes 12 44

Fur to 523 666

Ameaça/injúr ia 47 108

Rapto/ sequestro ­ 3

Roubo 49 178

Ofensa sexual 3 42

Vandalismo 31 116

Outro 48 30

Total 1060 1733

Fonte: Relatório Final Programa Escola Segura, MAI/ME, 2000

Os quadros nº 4 e nº 5 resultam do registo de ocorrências da PSP, sendo que o primeiro

se refere à totalidade das escolas, e o segundo apresenta os valores encontrados apenas

para as escolas abrangidas pelo Protocolo MAI/ME. Contudo, não é possível a

comparação das escolas do Protocolo face à totalidade de escolas, na medida em que as

categorias são diferentes apesar de as directrizes de actuação provirem do mesmo

organismo. Por exemplo, se para a PSP contamos com posse e consumo de

estupefacientes, ofensa sexual e ameaça de bomba, já nos formulários de registo de ocorrências do Programa da Escola Segura estas categorias estão ausentes. Ainda, como

distinguir entre furto e roubo? Como diferenciar danos de vandalismo? Por fim, como interpretar a categoria posse/consumo de estupefacientes, na perspectiva da violência na escola (violência auto­inflingida?).

Se no quadro nº 4 a categoria cuja frequência mais elevada é relativa aos furtos, tanto para 98/99 com 523, e para 99/00 com 600, destacando­se significativamente dos

restantes, já no quadro nº 5 encontramos a mesma categoria modal mas já não tão

distanciada, sendo que, a que mais se aproxima é a relativa a outros.

Page 39: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

39

Quadro nº 6 – Ocorrências registadas pela PSP nas Escolas do Protocolo

MAI/ME 1996/99

Tipo de Ocor rências 96/07 97/98 98/99

Danos 6 8 7

Vandalismo 1 1 3

Fur tos 24 36 29

Roubos 4 4 9

Injúr ias/ameaças 7 10 7

Ofensas corporais 14 33 17

Outros 53 47 35

Total 109 139 107

Fonte: Relatório Final Programa Escola Segura, MAI/ME, 2000

A GNR, tal como a PSP, é responsável pelo registo de ocorrências, porém, esta força

policial apresenta uma modalidade distinta de registo. Assim, e como se pode ler no

quadro seguinte, distingue entre Acções Contra Pessoas e Acções Contra Bens, contudo

a presença de categorias tais como greve de alunos, drogas lícitas ou acidentes, e ainda pequena violência levantam­nos algumas reservas e interrogações.

Quadro nº 7 – Ocorrências registadas pela GNR em 2000

Acções sobre bens

Roubo e furto sobre instalações e equipamentos 129

Vandalismo sobre instalações e equipamentos 48

Fogo posto 2

Acções sobre as pessoas

Extorsão 4

Ameaça 4

Chantagem 1

Pequena violência 38

Violência sobre os professores 1

Violência sobre os funcionários 3

Violência sobre os alunos 41

Indisciplina sobre os professores 8

Indisciplina sobre os funcionários 5

Violação 3

Assédio 2

Aliciamento 7

Grupos/gangs de alunos 2

Page 40: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

40

Grupos/ gangs de estranhos 2

Tráfego/ consumo de droga 3

Ameaça de bomba 13

Armas brancas detectadas 23

Armas de fogo 1

Greves de alunos 22

Acidentes 5

Outros 10

Fonte: Relatório Final Programa Escola Segura, MAI/ME, 2000

Para o ano de 2000 o Gabinete de Segurança do Ministério da Educação introduziu

alterações significativas na recolha e tratamento da informação relativa à violência

escolar passando a distinguir entre Acções Contra Bens e Acções Contra Pessoas, e, pela primeira vez, são diferenciadas as acções contra funcionários, professores e alunos.

Quadro nº 8 – Ocorrências registadas pelo GSME, 2000

Acções sobre bens

Roubo e furto sobre instalações e equipamentos 269

Vandalismo sobre instalações e equipamentos 158

Fogo posto 17

Disparos 8

Sobre bens de professores 24

Sobre bens de funcionários 10

Sobre bens de alunos 87

Total 573

Acções sobre as pessoas

Bullying 179

Violência na escola 336

Violência no exterior da escola 238

Assédio/abuso sexual sobre discentes 20

Grupos/gangs 77

Droga ilícita 232

Droga lícita 42

Atitudes racistas 9

Ameaça de bomba 105

Armas brancas detectadas 56

Armas de fogo detectadas 6

Total 1300

Page 41: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

41

Fonte: Relatório Final Programa Escola Segura, MAI/ME, 2000

No que diz respeito às Acções contra pessoas (quadro nº 7), tal como para os anos escolares anteriores, destacam­se de forma significativa a DRE de Lisboa e Vale do

Tejo e a DRE Norte.

Quadro nº 9 ­ Acções contra as pessoas por DRE (Direcção Regional de Educação), 2000

Região Frequência Percentagem

Nor te 1195 37,7%

Centro 213 6,7%

Lisboa 1596 50,4%

Alentejo 34 1,1%

Algarve 129 4,1%

Fonte: Gabinete de Segurança do Ministério da Educação, 2001

Os dados integrados sob a designação genérica Acções contra pessoas (Quadro nº 8) exemplificam bem as dificuldades em analisar a informação disponível. Misturam­se

aqui categorias relativas a acções violentas, sem que estas sejam devidamente

explicitadas, com categorias respeitantes aos locais onde essas acções foram cometidas.

Quadro nº 10 – Acções contra pessoas por tipo de ocorrência, em percentagem, 2000

Acções contra pessoas Percentagem

Acções de bullying 19,2%

Acções contra pessoas no interior da escola 28,6%

Acções contra pessoas no exter ior da escola 23,7%

Outras acções contra pessoas 28,4%

Fonte: Gabinete de Segurança do Ministério da Educação, 2001

A desagregação da categoria Acções contra pessoas no interior da escola, ao distinguir entre professores, funcionários e alunos, permite realizar algumas observações

interessantes. Podemos encontrar variações significativas que mostram discrepâncias

importantes entre regiões. É em Lisboa que as acções contra professores e funcionários

são mais significativas, sendo as acções contra os alunos mais frequentes na região

Norte.

Page 42: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

42

Quadro nº 11 ­ Acções contra pessoas dentro da escola, em percentagem,

por regiões, 2000

Regiões Professores Funcionár ios Alunos

Nor te 30,9% 23,5% 49,5%

Centro 4,3% 1,2% 4,5%

Lisboa 61,2% 70,5% 39,4%

Alentejo 3,6% 1,2% 0,3%

Algarve ­ 3,6% 6,3%

Fonte: Gabinete de Segurança do Ministério da Educação, 2001

As ocorrências registadas para o exterior da escola mostram uma inversão em relação ao

interior da escola, é na região Norte que professores e funcionários são mais agredidos,

e em Lisboa os alunos.

Quadro nº 12 ­ Acções contra pessoas no exterior da escola, em percentagem,

por regiões, 2000

Regiões Professores Funcionár ios Alunos

Nor te 72,0% 80,6% 29,4%

Centro ­ ­ 3,5%

Lisboa 20,0% 12,9% 65,9%

Alentejo ­ 3,2% 0,1%

Algarve 8,0% 3,2% 1,2%

Fonte: Gabinete de Segurança do Ministério da Educação, 2001

As situações mais frequentes no que diz respeito às Acções contra bens são globalmente

as relativas a Roubo/furto e Vandalismo sobre instalações e equipamentos. De destacar que na região de Lisboa, apesar dessa tendência também se afirmar, assume particular

importância o Roubo/furto e vandalismo sobre bens de alunos.

Quadro nº 13 – Acções contra bens, por Direcção Regional de Educação,

em percentagem, 2000

Acções contra bens Nor te Centro Lisboa Alentejo Algarve Roubo/fur to sobre instalações e equipamentos

11,2% 3,4% 14,8% 1,2% 2,7%

Vandalismo sobre instalações e equipamentos

13,9% 3,6% 9,2% 0,6% 2,0%

Roubo/fur to e vandalismo sobre bens de professores

1,3% ­ 1,7% ­ ­

Roubo/fur to e vandalismo sobre bens de funcionár ios

0,7% 0,1% 1,2% 0,2% 0,1%

Roubo/fur to e vandalismo 11,7% ­ 18,0% 0,2% 1,7%

Page 43: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

43

sobre bens de alunos Total 38,8% 7,2%% 44,9% 2,2% 6,8% Fonte: Gabinete de Segurança do Ministério da Educação, 2001

A informação relativa ao Programa para os anos lectivos a partir de 2000/01 encontra­se

disponibilizada por cada uma das forças policiais. Assim, embora digam respeito ao

mesmo âmbito apresentamo­los segundo as fontes.

Relativamente à PSP é considerada, no âmbito do Programa, como área da sua

responsabilidade um total de 832.082 alunos encontrando­se distribuindo­se da seguinte

forma:

Quadro nº 14 – Âmbito de actuação da PSP tipo e número de estabelecimentos por número de

alunos e grau de ensino, no ano lectivo 2002/03

N.º de Estabelecimentos de Ensino Público Pr ivado

Nº de Alunos

Básico (1.º Ciclo) 1.245 266 173.056 Básico (2.º Ciclo) 334 131 113.825 Básico (3.º Ciclo) 371 124 131.405 Secundár io 289 117 200.404 Super ior 125 73 213.392 TOTAL 2.101 599 832.082 Fonte: Relatório PSP ­ 2002/03

O registo de ocorrências acompanhadas pela PSP são, desde o ano lectivo de 2000/01,

reunidas por esta força segundo o mesmo instrumento. O quadro seguinte apresenta a

evolução das ocorrências nas áreas escolares de intervenção desta força, até ao ano

lectivo passado.

Quadro nº 15 – Registo de ocorrências da PSP em valores absolutos por ano lectivo, 2000/03

Tipo de ocor rência 2000/01 2001/02 2002/03 Total Ameaça de bomba 79 103 49 875 Fur to 777 797 868 4773 Roubo 466 662 654 2082 Posse/uso de arma 45 48 39 183 Vandalismo/danos 272 310 262 1606 Injúr ias/ameaças 182 169 199 774 Ofensas integr idade física 411 467 519 2002 Posse/Consumo de estupefacientes 60 98 76 308 Ofensas sexuais 77 105 73 321 Outro Tipo 65 59 58 353

Total 2434 2818 2797 13277 Fonte: Relatório PSP ­ 2002/03

Page 44: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

44

Em termos territoriais a distribuição geográfica de ocorrências no ano lectivo 2002/2003

não se distancia significativamente dos valores anteriormente discutidos, mantendo­se o

destaque para as zonas mais urbanizadas.

Quadro nº 16 – Registo de ocorrências pela PSP por distrito, no ano lectivo 2002/03

Distr ito Total de ocor rências Percentagem Aveiro 136 4,9% Beja 22 0,8% Braga 172 6,1% Bragança 49 1,8% Castelo Branco 18 0,6% Coimbra 40 1,4% Évora 28 1,0% Faro 112 4,0% Guarda 3 0,1% Leir ia 56 2,0% Lisboa 1056 37,8% Por talegre 8 0,3% Por to 707 25,3% Santarém 35 1,3% Setúbal 168 6,0% Viana do Castelo 5 0,2% Vila Real 3 0,1% Viseu 11 0,4% Madeira 99 3,5% Ponta Delgada 32 1,1% Angra Heroísmo 32 1,1% Hor ta 5 0,2%

TOTAL 2797 Fonte: Relatório PSP ­ 2002/03

Ainda no ano lectivo 2002/2003, a PSP realizou cerca de 371 detenções de suspeitos,

relativas a ocorrências em áreas escolares. O tratamento de informação deste tipo, assim

como a sua disponibilização evidenciam a preocupação das forças policiais com a

apresentação de informação relativa à sua intervenção.

Quadro nº 17 – Número de detenções efectuadas pela PSP em áreas escolares por tipo de ocorrência no ano lectivo 2002/03 Tipo de ocor rência Número de detenções Fur to 81 Roubo 33 Ofensas à integr idade física 110 Injúr ias/Ameaças 57 Tráfico de Estupefacientes 8 Posse/Uso de arma 13 Vandalismo/Danos 26 Ameaça de Bomba 7 Ofensas Sexuais 18

Page 45: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

45

Outro tipo 18 TOTAL 371 Fonte: Relatório PSP ­ 2002/03

Por fim, a informação reunida e tratada pela GNR no mesmo âmbito para os anos de

2001 a 2003. Esta força policial utiliza um conjunto de categorias distinto da anterior,

embora, ao contrário da PSP, não tenha conseguido ainda estabilizar as categorias dos

instrumentos de recolha.

Quadro nº 18 – Registo de ocorrências do Programa Escola Segura pela GNR, 2001 Tipo de ocor rências Número de ocor rências

Acções sobre bens Instalações e equipamentos Fur to 235 Vandalismo 78 Fogo posto 2 Disparos 10

TOTAL 325 Bens da Comunidade Educativa Professores 15 Funcionár ios 5 Alunos 63 Escola 215

TOTAL 298 TOTAL 623

Acções sobre pessoas Extorção 5 Humilhação 7 Ameaça 6 Pequena Violência 14 Indisciplina sobre: Professores 3 Indisciplina sobre: Funcionár ios 1 Assédio/abuso sexual: Violação 1 Assédio/abuso sexual: Assédio 9 Assédio/abuso sexual: Aliciamento 1 Tráfico/consumo droga 5 Ameaças de bomba 13 Armas Brancas 2 Armas fogo 3 Diver sos 6

TOTAL 76 TOTAL 699

Fonte: GNR, Relatório Programa Escola Segura 2001

Quadro nº 19 – Registo de ocorrências do Programa Escola Segura pela GNR, 2002 Tipo de ocor rências Número de ocor rências

Acções Sobre os Bens Furto/Roubo 422 Vandalismo 27 Fogo Posto 75

TOTAL 528 Acções Sobre as Pessoas Ameaça 17

Page 46: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

46

Pequena Violência 57 Actividades Pertubadoras ­ Acção Escolar 13 Acidentes Viação­ Alunos 4 Ofensa Sexual 14 Assédio 11 Violação 3 Tráfico/consumo droga 6 Ameaças de bomba 25 Armas Brancas/Fogo 7 Diversos 64

TOTAL 221 TOTAL 749

Fonte: GNR, Relatório Programa Escola Segura 2002

Quadro nº 20 – Registo de ocorrências do Programa Escola Segura pela GNR, 2003

Tipo de ocor rências Número de ocor rências Acções Sobre os Bens Furto 346 Roubo 28 Vandalismo 77 Fogo Posto 1

TOTAL 452 Acções Sobre as Pessoas Ofensa Corporal 22 Ofensa Sexual 3 Assédio 1 Violação 1 Injúrias/Ameaças 16 Tráfico/consumo droga 4 Ameaças de bomba 14 Armas Brancas/Fogo 3 Acidentes Viação Alunos 2 Outras acções não criminais 19 Outras acções criminais 22

TOTAL 107 TOTAL 559

Fonte: GNR, Relatório Programa Escola Segura 2003

Podemos concluir afirmando que as diferenças e problemas metodológicos respeitantes

à recolha de informação pelas diferentes forças policiais, GNR e PSP, ou pelo Gabinete

de Segurança do Ministério da Educação, não nos permitem proceder com rigor a uma

análise comparativa esclarecedora.

Apesar de a maioria das pesquisas sublinhar a importância de estruturar redes locais

para apoiar a intervenção articulada dos agentes educativos e uma gestão integrada dos

recursos para atingir o sucesso escolar, há uma forte resistência de diferentes agentes

Page 47: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

47

educativos à descentralização nos diferentes níveis do sistema educativo, resultante dos

modelos de organizacionais e pedagógicos profundamente arreigados.

Page 48: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

48

4 – Encontros e desencontros: a violência no quotidiano escolar 11

4.1­ Nota introdutória

A ocorrência de situações de violência nas escolas tem dado origem a variados

discursos mediáticos e políticos que se traduzem numa orientação selectiva da opinião

pública para estabelecimentos e contextos socialmente desfavorecidos, ocultando ou

ignorando as raízes e extensão do problema. A importância destes discursos é tal que se

constitui num obstáculo à própria progressão da pesquisa 12 e intervenção social.

A associação frequente entre violência na escola e contextos socialmente desfavorecidos

levou­nos a orientar a nossa pesquisa para meios escolares que à partida não se

encontrassem estigmatizados por este tipo de concepções. Por esta razão optámos pela

realização de um estudo de caso numa escola que não se situasse na proximidades de

bairros degradados e onde a multiculturalidade não constituísse um traço distintivo, pois

os fenómenos de violência são correntemente associados, nos discursos mediáticos e de

senso comum, a estas características. circunstâncias a que os já referidos discursos

associam os fenómenos de violência. A selecção uma escola do 2º e 3º ciclos ensino

básico, situada no centro urbano de Lisboa, justifica­se ainda, pelas indicações teóricas

e empíricas 13 disponíveis, que apontam estes ciclos de ensino como aqueles em que as

situações violência são mais frequentes.

4.2 ­ Caracterização do estabelecimento escolar

O estabelecimento escolar localiza­se em plena baixa de Lisboa, numa freguesia

marcada pelo reduzido número de residentes (apenas 1168 recenseados) e uma

população flutuante muito significativa ligada ao comércio tradicional ou de lazer.

Inicialmente ligada à Escola Francisco Arruda, funcionou como secção desta no

Conservatório Nacional e posteriormente no Palácio Cabral. Autonomizou­se em 1976,

sediando­se então na Rua das Chagas, no palacete anteriormente ocupado pelo Instituto

11 Este capítulo resulta de um projecto de investigação financiado pelo Instituto Inovação Educacional, no âmbito da Medida 2, do Programa SIQE, com o título “A produção da violência na escola”, realizado por João Sebastião, Mariana Gaio Alves, Patrícia Amaral. 12 Charlot e Émin (1997) 13 Pereira, Mendonça, Neto, Almeida, Valente (1996); Gabinete de segurança do Ministério da Educação (1999).

Page 49: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

49

Comercial de Lisboa. No ano lectivo de 1997/98, passou a Escola do Ensino Básico dos

2º e 3º ciclos, assim se mantendo até hoje. A escola integra­se num território educativo

de intervenção prioritária (TEIP) desde 1997/98, do qual também fazem parte 3 escolas

básicas do 1º ciclo e um jardim de infância.

Os alunos No ano lectivo de 1999/2000, a escola era frequentada por 434 alunos do 2º e 3º ciclos,

com um total de 22 turmas. Houve uma redução acentuada do número de alunos

comparativamente ao ano de 1998/99, em que se encontravam 650 alunos inscritos.

Quadro nº 21­ Número de alunos por anos de escolaridade (1999/2000)

Anos de Escolaridade Número de Turmas Número de alunos

5º ano 6 126 6º ano 8 160 7º ano 2 38 8º ano 3 55 9º ano 3 55

Total 22 434

A escola integra essencialmente alunos provenientes de freguesias do centro de

Lisboa 14 , contudo, o facto de se situar numa zona comercial central, leva a que muitos

alunos sejam provenientes da periferia, acompanhando os seus pais quotidianamente

nos movimentos pendulares casa­emprego.

Serviço de Acção Social Escolar

O facto de mais de metade dos alunos da escola serem apoiados pelo SASE (Serviço de

Acção Social Escolar) constitui um indicador através do qual se pode inferir da sua

origem socioeconómica e evidencia uma população escolar com carências materiais.

Com efeito, no ano lectivo de 1999/00 foram apoiados 69,6% dos alunos do 2º ciclo

(escalão A e B), percentagem que se reduz ligeiramente no 3º ciclo para 62,9%

14 Freguesias de Santa Catarina, Mercês, Sacramento, São Paulo, São José, Mártires, Santa Justa, Encarnação, Coração de Jesus, Madalena, Santiago, Santo Estevão, Santos­o­Velho, São Nicolau, S. Mamede, São Cristovão, São Lourenço, Socorro e Sé.

Page 50: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

50

Gráfico nº 1 – Nº de alunos abrangidos pela A.S.E ­ Ano lectivo de 1999/00)

0 20 40 60 80 100 120 140 160 180

5º ano 6º ano 7º ano 8º ano 9º ano

Anos de escolaridade

Nº d

e alun

os

Nº alunos ASE

Os Professores O corpo docente da escola é constituído por 62 professores, encontram­se destacados

noutras escolas e serviços 6 professores do 2º ciclo e 5 professores do 3º ciclo.

Salienta­se que o corpo docente em funções na escola é em grande parte constituído por

41 professores do quadro de nomeação definitiva, seguindo­se os contratados com um

total de 12 professores de ambos os ciclos. Apenas 8 professores estão destacados nesta

escola e somente 1 é professor de quadro de zona pedagógica.

Esta situação confirma o panorama de estabilidade relativa dos quadros de docentes das

escolas das zonas urbanas centrais, estabelecimentos mais desejados pela sua

acessibilidade, prestígio e eventual inexistência de problemas com as populações

escolares.

Quadro nº 22 ­ Número de professores por ciclo em função das suas categorias

profissionais

Categorias 2º Ciclo 3º Ciclo Total

Professores do Quadro Nomeação Definitiva 27 14 41 Professores Destacados 5 3 8 Professores Contratados 9 3 12 Professores de Quadro de Zona Pedagógica 1 1 Total 41 21 62

Page 51: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

51

Pessoal não docente Consideramos relevante o facto de a escola contar com o apoio de duas Psicólogas, uma

Técnica Superior de Serviço Social, um Professor de Apoio Educativo e uma Técnica

do SASE, todos pertencentes ao quadro, facto que em escolas de maior dimensão muitas

vezes não será fácil encontrar.

Além do pessoal não docente com funções educativas a escola conta ainda com um

elemento do Pessoal da Limpeza, dois Guardas Nocturnos e seis Auxiliares de Acção

Educativa.

Quadro nº 23 ­ Número de funcionários em função da sua situação profissional

Categor ias Do Quadro Contratados Total

Psicólogas 2 2 Técnica Superior do Serviço Social 1 ∗ 1 Professor do Apoio Educativo 1 1 Técnica do ASE 1 1 Pessoal de Administração Escolar 8 8 Auxiliares de Acção Educativa 13 6 19 Técnicos de Laboratório 1 1 Pessoal de Limpeza 1 1 Guarda­ Nocturno 2 2 Total 27 9 36

∗ A Técnica Superior do Serviço Social, pertence ao SPO (Serviço de Psicologia e Orientação) da Escola Secundária David Mourão Ferreira, prestando parcialmente apoio a esta escola. Dos treze auxiliares de acção educativa do quadro, dois funcionários encontravam­se de licença prolongada.

As instalações O edifício, com três pisos, é um antigo palacete bastante degradado, possuindo a

particularidade de alojar uma inquilina no 2º andar, que, para entrar em casa, tem

forçosamente de utilizar a entrada da escola.

No rés do chão funciona a reprografia, secretaria, sala de convívio para alunos, sala de

convívio para pessoal não docente, refeitório, gabinete de apoio educativo, gabinete do

Serviço de Psicologia e Orientação, gabinete da Acção Social Escolar e o pátio. Existem

ainda salas de aula e o bar.

No primeiro andar existem as salas do Conselho Executivo, dos professores, dos

directores de turma, material didáctico, audiovisuais, a biblioteca e uma sala de

computadores. Funcionam neste andar outras salas de aula.

Page 52: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

52

No segundo andar situa­se a Ludoteca, as salas de estudo, sala de projecção e a sala de

Educação Musical.

No projecto educativo que a escola disponibilizou, constava uma lista de problemas

com que a escola se depara no seu quotidiano, dos quais destacamos:

­ salas de aula de pequena dimensão;

­ o acesso feito por escadas estreitas e sem a devida protecção.

­ As varandas do 1º andar encontram­se degradadas e sem protecção.

­ Necessidade de urgente intervenção no pátio, na sala de convívio de alunos,

cantina, corredores e salas de aula.

Em termos de segurança o projecto educativo da escola indica que: “O edifício não tem

qualquer sistema de alarme de incêndio e extintores em número suficiente e

devidamente vistoriados. A boca de incêndio no r/c e o carretel do 2º andar não estão

em condições de funcionamento. Não dispõe de escada de emergência e no seu interior

não existe nenhum marco de incêndio” 15 .

Frequência de actos violentos registados Segundo dados recolhidos na escola, no ano lectivo de 1999/ 2000, o número de

participações feitas ao conselho executivo no 2º período por motivo de comportamento

violento a colegas resultou num total de 67 participações, distribuídas pelos vários anos

de escolaridade, com excepção do 8º ano, no qual não foi registada qualquer ocorrência.

Salienta­se que o 2º ciclo é claramente o que revela dados mais preocupantes em relação

às participações, pois é neste ciclo de ensino que se registam 85% dos casos, uma

diferença significativa comparativamente ao 3º ciclo que regista apenas 5% das

participações.

Esta constatação pode ser um indício de que o 2º Ciclo constitui um momento crítico já

que os alunos têm que se adaptar a um funcionamento escolar diferente daquele que

conheciam no 1º Ciclo, em aspectos da vida escolar como a divisão do tempo lectivo, a

sua distribuição por várias salas, os saberes compartimentados com professores

diferentes para cada área. A análise dos casos de abandono escolar revela que este

fenómenos é particularmente significativo no 2º Ciclo. Durante o ano lectivo de

1999/2000 foi registado um abandono escolar de 4,4% do total de alunos. Contudo este

15 Projecto Educativo, 1999/2002

Page 53: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

53

abandono é mais frequente no 2º ciclo, já que aí se verifica uma percentagem de 5,2%

de casos de abandono, facto que no 3º ciclo se reduz para 2,7%.

Gráfico nº 2 – Número de participações por ano de escolaridade

( 2º período) ano lectivo de 1999/00)

4.3– Escolarização, norma e violência

Um pressuposto importante desta pesquisa dizia respeito à existência e disseminação de

situações caracterizadas como violentas nas escolas. Longe de partilharmos visões

psicologistas que assentam a compreensão dos comportamentos violentos em distúrbios

e desequilíbrios internos ao indivíduo (sem negar contudo que em algumas situações o

seu poder explicativo possa ser relevante), pensamos que estes não podem ser

entendidos fora da rede de interacções em que se produziram. Considerar tais

comportamentos isolados levaria a desprezar a importância que os factores contextuais

assumem (a leitura que os diferentes intervenientes fazem de uma determinada situação

de interacção a partir do lugar ocupado por cada um na rede de relações sociais) ou

estruturais (como os resultantes da posição que ocupam na estrutura social, dos quadros

culturais e de valores de que são portadores). Procurámos assim, embora que ainda de

0

5

1 0

1 5

2 0

2 5

3 0

3 5

4 0

Nº d

e participações

5 º a n o 6 º a n o 7 º a n o 9 º a n o

Page 54: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

54

forma exploratória, realizar uma primeira avaliação da importância relativa das

diferentes dimensões envolvidas na sua génese.

4.3.1­ Os alunos alvo de processos disciplinares

Tendo com base a consulta dos processos disciplinares relativos ao ano lectivo de

1999/2000, procurámos obter informação mais alargada sobre o clima disciplinar da

escola. É verdade que este indicador não é exaustivo, pois uma parte significativa dos

conflitos não chega a conselho disciplinar. A grande maioria são resolvidos

informalmente pelos docentes/directores de turma ou directamente, entre alunos,

chegando apenas a conselho disciplinar os considerados mais graves.

Porém considerámos que a consulta dos processos disciplinares poderia fornecer

informações interessantes.

Recolhemos informação sobre os alunos alvo de processos, tendo sido possível na

generalidade dos casos obtê­la segundo o género, idade, escolaridade, número de

processos de cada aluno e local de residência. Analisámos ainda, através das fichas

individuais dos alunos, a inserção profissional e o grau de parentesco dos encarregados

de educação dos alunos.

Dos 23 alunos que foram objecto de processos disciplinares, 20 eram do sexo masculino

e apenas 3 do sexo feminino. Um total desses 18 alunos teve de cumprir 1 pena

disciplinar durante o ano lectivo, dos quais 5 acumularam mais do que 1 processo

disciplinar.

Quadro nº 24 ­ Número de processos disciplinares por aluno segundo o número

de reprovações

Nº de alunos Nº de r eprovações

Nº de processos por aluno

Nº de processos

8 0 1 8 2 0 2 4 1 0 3 3 1 1 1 1 4 2 1 4 3 3 1 3 1 3 2 2 1 4 2 2 1 5 1 1 1 4 1 1

Page 55: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

55

Total 23 Total 29

Analisando os 29 processos disciplinares que decorreram no ano lectivo de 1999/00

constatamos que 11 alunos nunca reprovaram, 1 aluno reprovou 1 vez, 4 reprovaram 2

vezes, 7 reprovaram mais de 2 vezes.

Contudo, dos alunos que nunca reprovaram 3 foram alvo de 2 ou mais processos

disciplinares neste ano lectivo, o mesmo número de processos que registam os alunos

que reprovaram 3 vezes e outro que reprovou 4 16 .

As idades dos alunos variam entre os 10 e os 17 anos, mas é na faixa etária entre os 10 e

os 14 anos que mais alunos foram penalizados disciplinarmente e se encontram alunos

com mais de 1 processo.

Quadro nº 25 ­ Número de alunos objecto de processos disciplinares no ano lectivo de 1999/00

Ano de escolaridade Nº de processos disciplinares 5º ano 6 6º ano 10 7º ano 5 8º ano 2 9º ano 0 Total 23

É no 2º ciclo que se verifica um maior número de processos disciplinares (16) e apenas

(7) no 3º ciclo. Convém salientar que no 3º ciclo não se registaram processos

disciplinares no 9º ano de escolaridade.

Isto significa que 10,5% do total dos alunos do 2º ciclo foram penalizados com

processos disciplinares, enquanto que a percentagem no 3º ciclo se reduz para 2,4%.

Os encarregados de educação destes alunos são na sua maioria o pai ou a mãe do aluno,

tendo apenas 3 alunos como seu encarregado outras pessoas da família ou não

familiares. Assim, 11 alunos têm como encarregado de educação a mãe, 9 têm como

16 Este facto por si só mereceria uma avaliação extensiva, já que questiona um dos estereótipos mais fortes sobre as situações de indisciplina e violência, que os considera como o resultado quase linear das situações de insucesso escolar.

Page 56: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

56

encarregado o pai, 1 tem a avó e 2 alunos têm como encarregado uma pessoa não

familiar.

Relativamente à situação perante o trabalho dos encarregados de educação dos 23

alunos objecto de processos disciplinares, verificámos que 5 encarregados de educação

não exercem actividade profissional (3 empregados e 3 desempregados), sendo que o

grupo profissional mais representado é o pessoal dos serviços e vendedores que regista

7 indivíduos, existindo ainda 4 trabalhadores não qualificados. Os restantes distribuem­

se por outros grupos profissionais.

Nas fichas individuais dos alunos apenas 1 encarregado não tinha qualquer informação

relativa à sua situação perante o trabalho, razão que se prende com o facto do

encarregado não ser da família do aluno.

Quadro nº 26 ­ Grupos profissionais dos encarregados de educação dos alunos

objecto de processos disciplinares no ano lectivo 99/00

Em síntese, verificamos que é sobre os rapazes, sobretudo os mais novos que

frequentam o 2º ciclo que recaem mais penalizações disciplinares.

Existe uma sobrerepresentação das mães entre os encarregados de educação dos alunos,

contudo a análise dos processos disciplinares não contempla a informação detalhada da

Grupos profissionais Nº de encarregados

educação em situação

profissional

1­ Quadros superiores da administração pública, dirigentes e

quadros superiores de empresas

1

2­ Especialistas das profissões intelectuais e científicas

3­ Técnicos e profissionais de nível intermédio

4­ Pessoal administrativo e similares 1

5­ Pessoal dos serviços e vendedores 7

6­ Agricultores e trabalhadores qualificados

da agricultura e pescas

7­ Operários, Artífices e trabalhadores similares 1

8­ Operadores de instalações e máquinas e trabalhadores da

montagem

1

9­ Trabalhadores não­qualificados 4

Total 15

Page 57: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

57

participação dos encarregados de educação da escola e em particular nos conselhos

disciplinares. O registo das presenças nos conselhos disciplinares indica que a maioria

dos encarregados de educação esteve presente.

Existem também semelhanças relativamente à situação perante o trabalho dos

encarregados de educação dos alunos entrevistados e dos encarregados dos alunos

objecto de processos disciplinares, ambos apresentam valores mais elevados no grupo

profissional do pessoal dos serviços e vendedores e dos trabalhadores não­qualificados.

4.3.2­ Relação com escolaridade

Uma das concepções mais vulgares no universo pedagógico considera que um dos

factores que mais contribuem para o despoletar de comportamentos agressivos em

contexto escolar é o designado “mal­estar escolar” dos estudantes, produto directo da

massificação, da degradação das condições materiais e pedagógicas das escolas e do

insucesso escolar. A situação de indisciplina grave e violência resultaria da presença

crescente em níveis cada vez mais elevados do sistema educativo de grupos de crianças

originárias das camadas populares, tradicionalmente dele afastados e a sua consequente

desadequação aos quadros normativos, culturais e de valores maioritariamente vistos

como desejáveis na escola.

Este “mal­estar”, esta desadequação, constituem um elemento central das

representações e expectativas dos docentes face às crianças originárias de meios

populares e traduz­se frequentemente em práticas organizacionais e pedagógicas

discriminatórias. Convém realçar que uma parte dessas representações é ela própria

partilhada pelas próprias camadas populares, constrangidas pela falta de recursos

(materiais, culturais e simbólicos) que permitam resolver a contradição resultante do

desejo de ver os filhos atingir escolaridades mais elevadas e qualificantes e a resignação

face ao veredicto escolar, confirmador de percursos e posições sociais dominadas.

Procurámos então aferir que tipo de relação possuíam estes alunos com a escola e os

saberes, que papel assumia a escola no seu universo quotidiano, quais as expectativas

face ao futuro. Nesta análise procurámos sempre que possível, confrontar os discursos

de agressores, agredidos e outros não participantes (alunos, professores e auxiliares de

Page 58: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

58

educação). Tentámos ainda compreender a forma como professores e auxiliares

caracterizavam a relação da escola com as famílias e restante comunidade.

A relação dos alunos com a escola No respeitante à relação dos alunos com a escola é interessante referir a diferença de

opiniões entre agressores e agredidos. Os primeiros entendem a escola essencialmente

como um espaço de sociabilidade, onde brincam e se encontram com os amigos, sem

que a escola pareça assumir um papel significativo nos seus interesses e projectos

futuros.

“Gostar gosto, assim em termos de amigos e isso gosto, agora em termos de aulas não (...) Sou malandro

(...) Comecei a ter mais amigos e a começar­me a desviar­me mais das aulas (...) Pronto ia com os meus

colegas para alguns lados fumar e isso. Não íamos ás aulas”. (Aluno, agressor)

“Se for pela escola não, das aulas também não gosto muito, mas estar na escola mais por causa dos

colegas, apesar de ter boas notas”. (Aluno, agressor)

Os agredidos, ao falarem da escola, referem sobretudo o desconforto e desânimo de

quem tem que frequentar um espaço desagradável, seja pelo seu estado de conservação,

seja pelas situações de que são vítimas. Ressalta a sua visão crítica da escola em que

andam, destacando o seu ambiente, o facto das casas de banho estarem degradadas, de

sentirem dificuldades em certas disciplinas, receio de serem mal tratados e insultados.

“Isso são os testes e ter de estudar todos os dias. Se quer que lhe diga sinceramente, não tenho assim

nenhum gosto nesta escola, esta escola é muito má, não gosto nada aqui nesta escola. Acho que está assim

um bocado velha”. (Aluno, não participante)

“Não gosto de algumas pessoas. Umas que pedem dinheiro, nós não lhes damos e depois começam a

revistar­nos. Tiram­nos o que nós temos”. (Aluno, agredido)

“…se calhar é o ambiente, às vezes forma­se um mau ambiente aqui na escola, é um ambiente de racismo,

mais ou menos”. (Aluno, agredido)

Relativamente às expectativas quanto ao futuro dos onze alunos entrevistados apenas

um revelou que gostaria de fazer um curso superior, o aluno mais velho que frequenta o

9º ano de escolaridade. Quatro querem terminar os seus estudos no 9º ano, um no 10º

Page 59: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

59

ano, três querem seguir até ao 12º ano, um não sabe e outro pretende desistir no final do

ano lectivo, frequentando actualmente o 5º ano de escolaridade.

Quanto às expectativas dos pais face à escolaridade dos seus filhos, quatro alunos

disseram­nos que os pais gostavam que tirassem um curso superior, três que

completassem o 12º ano e dois que acabassem o 9º ano. Dois alunos disseram que não

sabem até que ano os pais gostavam que estudassem.

“Superior, de Jornalismo, Comunicação Social”.(Aluno, não participante)

“Não, não se importa, ao menos quer é que eu tire o 9º ano” (Aluno, agressor)

“Acho que os meus pais gostavam que eu estudasse até ao 12ºano e gostavam que eu fosse até à

Universidade, mas a área que eu quero acho que não dá”. (Aluno, não participante)

Devido ao reduzido número de entrevistas realizadas não é possível estabelecer

associações entre os percursos escolares e comportamentos violentos, contudo nos casos

analisados era visível que os agressores tinham percursos mais complicados (dois deles

tinham reprovado três e quatro vezes, respectivamente), as suas expectativas quanto ao

prosseguimento da escolaridade eram aparentemente menores e as conversas com os

pais menos explícitas que nas outras duas categorias. É contudo óbvio que se torna

necessário aprofundar estas relações e alargar a análise a um número significativo de

casos.

Relação escola­famílias Procurámos conhecer, na perspectiva dos docentes, a forma como as famílias destes

jovens se relacionavam com a escola e se esta desenvolve actividades conjuntas com a

comunidade a que pertence.

Para além da opinião dos professores sobre as famílias não ser particularmente positiva,

a informação acerca das mesmas é reduzida. Os professores declaram que as famílias

colaboram pouco com a escola, que os pais dos alunos que criam mais problemas não

comparecem nas reuniões, impossibilitando a solução conjunta dessas questões. A

informação também não parece ser muita, uma das professoras entrevistadas

desconhecia a existência da associação de pais.

“Que não existe, que não presta, que os pais acham que a escola… uma mentalidade à moda antiga, têm

Page 60: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

60

de pedir licença e faz favor e desculpe senhor professor, isto de um modo geral, porque também há

aqueles …que talvez porque como têm essa mentalidade, sentem­se forçados e então revoltam­se e então

põem processos em cima dos professores e porque “ o professor não pense que é o maior! E o professor

não pense que manda no meu filho! E o que ele diz é que está certo e eles é que têm o poder!”

(Professora)

“Pouca, pouca relação com os pais de maneira geral (...) um problema que é difícil nos pais, revêm o

problema na escola com aquilo que acontece com os seus filhos e não vêm os outros problemas mais

globais e a presente associação de pais tem essa visão...” (Membro do Conselho Executivo)

“Pessoalmente eu acho que os pais não estão devidamente educados para, para…para já não há

associação de pais aqui, ou se há é muito pouco representada, isto pelo que me consta, depois e mesmo se

houvesse, eu não, e se calhar por isso é que eles não se entusiasmam muito bem qual é que seria o tipo de

conversa, porque facilmente se comenta e dificilmente se constrói, tá a perceber?”. (Professora)

Colaboração Escola/ Comunidade Relativamente à relação entre a escola e a comunidade dos sete professores apenas dois

se lhe referiram e a apreciação não é particularmente positiva.

“Tem havido projectos em colaboração com a Câmara, este ano não houve assim nada de muito

específico mas há dois anos “Viver o verde”, em que se fez acções de sensibilização para aspectos da

poluição e acções de combate à poluição... este ano não tenho ideia nenhuma que tenha havido uma

colaboração estreita entre a comunidade e a escola”. (Professora)

“Isso temos sempre como eu digo professores teimosos que mantêm apesar das condições físicas não

agradáveis, têm feito projectos, vários projectos, áreas de estudo, projectos com a Câmara Municipal de

Lisboa, mesmo parcerias que temos tido com a ESE em relação à formação de professores na disciplina

de Ciências e Matemática, já há vários anos que temos essa parceria, jornal da escola, oficina de

humanidades”. (Membro do Conselho Executivo)

A perspectiva do pessoal auxiliar Para o pessoal auxiliar, a relação entre a escola e os encarregados de educação é

“basicamente boa”, referindo que são os pais dos alunos do 5º e 6º ano que participam

mais nas reuniões. No entanto, há ainda quem pense que na escola decidem os

professores e em casa os pais.

“Muito, preocupam­se bastante. Sim e a escola procura os pais, por acaso tenho notado bastante”.

Page 61: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

61

(Pessoal auxiliar)

“Os pais não era na escola que deviam participar, era em casa. Porque na escola estamos cá a gente e os

professores, os pais estão a trabalhar, não podem participar nada. Nas reuniões vou­lhe dizer uma coisa é

raro cá estar, mas o que me consta é que vêm cá mais os pais do alunos do 5º e 6º anos do que do 7º, 8º ou

9º anos...” (Pessoal auxiliar)

Em síntese, a escola em estudo parece caracterizar­se pela existência de ténues relações

quer com as famílias quer com a comunidade envolvente, o que provavelmente não

contraria tendências mais globais a nível do sistema educativo. É importante notar,

porém, a relevância para os alunos (em especial para os agressores) da escola enquanto

espaço de sociabilidade, muito embora as aspirações no sentido do prosseguimento de

estudos não sejam muito elevadas. O discurso dos alunos parece revelar em alguns

casos alguma descoincidência entre as expectativas de pais e filhos quanto ao

prolongamento do percurso escolar, esperando os pais que os filhos atinjam níveis de

escolaridade mais elevados. A esta descoincidência não deverá ser alheia a importância

que crescentemente assumem os contextos de socialização não familiares pelos quais os

jovens circulam, veiculando frequentemente valores alternativos e mesmo opostos aos

transmitidos pela socialização familiar.

Page 62: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

62

4.4.3 ­ Representações de indisciplina e violência

Tratando­se de uma investigação com um carácter exploratório sobre a violência na

escola, o presente estudo tem como um dos seus objectivos a delimitação dos conceitos

de violência e de indisciplina. Para tal, consideramos importante analisar as

representações dos actores da comunidade escolar sobre as definições de indisciplina e

violência.

A análise das entrevistas realizadas, permite perceber que, para os professores e para o

pessoal auxiliar, indisciplina e violência são fenómenos distintos. De um modo geral, a

indisciplina é considerada como sendo menos grave do que a violência, sendo que a

primeira se traduz num comportamento considerado incorrecto e a segunda implica

agressividade física ou verbal.

“Eu acho que nunca tive alunos violentos, mas já ouvi casos em... violentos para mim

conduz um pouco à agressão, não apenas verbal mas também física. Os indisciplinados

é mais aquela coisa do interromper a aula, o dizer qualquer coisa que não vem a

propósito”(Professor)

“um aluno violento é desde logo o confronto físico, agressão física, se bem que agressão

verbal também os há” (Professor )

“um aluno indisciplinado é o aluno que está irrequieto na cadeira, que não consegue

concentrar­se e ouvir o professor, ou põe­se a falar para trás e para a frente, não está ali

com o mínimo de atenção. O aluno violento é aquele aluno que chega á aula, puxa pela

cadeira, põe as cadeiras para o ar e atira as cadeiras pela janela, sei lá...” (Professor)

Parece ser consensual entre a maior parte dos professores, e é também referido por 2 dos

3 membros do pessoal auxiliar entrevistados, que a indisciplina se circunscreve ao

espaço da sala de aula. Na maior parte dos casos, a indisciplina tem a ver com

perturbações ao funcionamento das aulas e traduz­se em actos como “estar irrequieto

nas aulas”, “bichanar com os colegas” , “mandar bocas”, e “não aceitar regras”. Quando

interrogados sobre o que é um aluno indisciplinado, dizem os professores e o pessoal

auxiliar:

Page 63: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

63

“É um aluno que se recusa a participar nas actividades lectivas, mostra desrespeito pelos

colegas, perturba o normal funcionamento da aula” (Professor)

“Será aquele aluno que está constantemente irrequieto na aula, é portanto uma coisa

constante, não é uma coisa pontual” (Professor)

“Um aluno que intervem sem estar na sua vez, um aluno que não pára de falar

constantemente, não se auto­domina nas suas intervenções, está sempre na brincadeira

na sala de aula” (Professor)

“O aluno indisciplinado é aquele que trata mal o professor e não tem comportamento,

não sabe estar nas aulas e que perturba as aulas” (Pessoal auxiliar )

“É aquele que entra dentro da sala de aula e não se senta correctamente, não ouve o que

o professor diz” (Pessoal auxiliar)

É interessante notar que a maior parte dos alunos (8) afirmam que os professores têm a

mesma definição de indisciplina do que eles próprios. No entanto, é notório que, para os

alunos ao contrário do que se verifica entre os professores, a indisciplina não se

circunscreve ao espaço da sala de aula, mas tem também em conta o espaço da escola

em geral. Ou seja, os actos de indisciplina têm a ver com a relação com o professor (é

indisciplina “gritar com o professor” ou “gozar com o professor”) mas têm também a

ver com o comportamento na escola para além do espaço da sala de aula (é também

indisciplina “faltar às aulas” e “dizer asneiras”). Sobre o que fazem os alunos

indisciplinados, dizem os alunos:

“Faltam às aulas, alguns vão fumar para a casa de banho, saem da escola sem os

porteiros verem, é isso...” (Aluno, não participante)

“Refilam com as professoras, saem por trás da escola” (Aluno, não participante)

Page 64: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

64

“Chamam­nos nomes, gozam connosco, há certas coisas que eles dizem que nós não

fazemos. Por exemplo, eles é que tiram uma coisa e depois dizem que fomos nós que tirámos.” (Aluno, agredido)

É curioso notar também que os alunos em geral se referem aos indisciplinados como

“eles”, ou seja, como um grupo a que não pertencem. Mas 2 dos 3 alunos agressores

entrevistados assumem­se claramente como alunos indisciplinados, dando como

exemplos de actos de indisciplina as suas próprias acções:

“A mesma coisa que eu, às vezes. Faço distúrbios nas aulas, faço coisas nas aulas,

gritar, uma vez gritei aos ouvidos da professora, ela não estava a ouvir, fui ao pé dela e

gritei. Porque fartei­me de chamá­la, ela não estava com atenção, estava a olhar para um

livro e não sei quê, eu fui lá e gritei­lhe aos ouvidos. O “Canelas” mandava a professora

para um certo sítio. A professora estava sempre a chatear­lhe a cabeça, ele estava quieto

sem fazer nada, ela estava sempre a dizer: “Ricardo escreve!” e ele: “Está bem, já

escrevo.” E ela: “Ricardo escreve!” e ele: “Professora vá...”, depois mandou­o para a

rua.” (Aluno, agressor)

“É assim, os que são indisciplinados, a maior parte andam todos em grupo, eu assim sou

indisciplinado e ando sempre num grupo. Somos um grupo de quatro e somos todos

indisciplinados.” (Aluno, agressor)

Reacções perante a indisciplina Do ponto de vista dos professores e pessoal auxiliar, as formas de resolver as situações

de indisciplina parecem obedecer a um procedimento geral e comum à maioria. Os

docentes procuram, em primeiro lugar, resolver a situação através do diálogo com o(s)

aluno(s), tanto no espaço da aula como fora dela. Caso a conversa não resulte optam

pelo contacto com o Director de Turma ou Encarregado de Educação e, em casos

considerados insustentáveis pela sua gravidade ou persistência, enviam os alunos para o

GAF 17 .

17 Gabinete de Acompanhamento e Formação, tem como função receber alunos que por motivos de comportamento são colocados fora da sala de aula. O aluno é recebido por um professor, preenche uma ficha na qual explica o motivo de saída da aula e realiza exercícios determinados pelo seu professor.

Page 65: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

65

“Tento primeiro chamar a atenção do aluno, posso também fazer algum recado para o

encarregado de educação ou algum director de turma para chamar a atenção do aluno, e

se ele continuar, pronto tenho de o mandar para o GAF” (Professor)

No caso dos auxiliares de educação, quando o diálogo não resulta, acabam por recorrer

à realização de uma participação do(s) aluno(s) em causa.

“Chamo­lhes a atenção, falo com eles a bem. Temos que fazer a participação, mas

primeiro a pessoa fala com o menino, faz­lhes ver as coisas para que entenda e se porte

melhor, mas quando eles ainda depois insistem a pessoa tem de fazer participação

deles.” (Pessoal auxiliar )

No entanto, todos os professores concordam em que as estratégias e “limites” perante

situações de indisciplina não são idênticos e, de um modo geral, os alunos constatam as

diferentes reacções dos professores perante situações de indisciplina semelhantes 18 .

“Há pessoas mais tolerantes, há pessoas que sabem muito bem lidar com situações de

indisciplina, não perdem a calma, há pessoas que se exaltam muito mais por tudo e por

nada mandam um aluno para o GAF, há outras pessoas que sabem lidar com pequenas

situações na aula e o aluno não tem de ir para o GAF, não se justifica sair da sala de

aula” (Professor)

“Há professores que gritam muito mais e nem ponho a hipótese, por que não posso

gritar, ficava sem voz. Há professores que não fazem nada e que aguentam para não

terem de ouvir... não terem de aparecer nos top ten dos que mandam muitos para o

GAF.” (Professor)

“Eles têm reacções diferentes.” (Aluno, não participante)

“A stôra de Inglês é assim, qualquer coisinha que nós fazemos vamos logo para o GAF

e a stôra de Português ainda dá outra oportunidade.” (Aluno, não participante)

18 Só para um aluno – um agressor – todos os professores reagem da mesma forma e enviam de imediato para o GAF.

Page 66: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

66

“Ou mandam para a rua ou não fazem nada. A directora de turma não faz nada, deixa­os

estar. Mas a professora de Ciências, ela está a falar, se nós dizemos qualquer coisa, ela

manda­nos logo para a rua..” (Aluno, agredido)

“Há professores que parecem que têm medo dos alunos e eles até podem fazer o que

quiserem nas aulas que os professores não ligam, só mandam parar quietos e nãodizem

mais nada, e aí eles começam a fazer mais e mais que é para ver se conseguem

enfurecer o professor, mas de um certo modo eu acho que o professor faz de propósito,

que é para ver se o aluno pára quieto, mas há professores que parecem que têm mesmo

medo dos alunos.” (Aluno, agredido)

O factor idade e experiência profissional dos professores aparece referenciado em

diversas entrevistas de alunos e professores como sendo explicativo de diferentes

reacções perante situações de indisciplina. Na visão dos professores, são aqueles que

têm maior experiência que melhor lidam com estas situações.

“Eu acho que os professores com mais tarimba, com mais experiência de escola e que

não estão ligados a estes casos excepcionais de falta de controle de uma turma, acho que

lidam melhor com estas situações, comportamentos complicados, ou falando com eles

ou chamando a atenção ou falando de uma certa maneira, utilizando a tal ironia no

sentido de humor se pode conseguir levá­los a bom porto.” (Professor)

“temos professoras novas aqui muito problemáticas” (Membro do Conselho Executivo)

Porém, na visão dos alunos a questão não se coloca da mesma forma. O que mais

apreciam são sobretudo os professores que conversam com eles e que não resolvem o

assunto recorrendo de imediato à participação ou à falta disciplinar, e, entre os

professores mais novos identificam esses dois tipos de atitudes contrastantes.

“Eu acho que os mais novos são mais severos (...) Não é severos, severos, mas pronto

têm mais tendência a marcar falta por comportamento mau.” (Aluno, não participante)

Page 67: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

67

“Depende da mentalidade do professor (...) por exemplo o aluno é indisciplinado, para

já não se preocupam muito, já não quero conversas contigo, já não interessa, faz o que

quiseres, faço participações, marco faltas disciplinares, telefonemas para casa, pronto, é

assim que agem! E os professores com uma mentalidade mais nova tentam resolver as

coisas de outra maneira, falando com o aluno.” (Aluno, não participante)

Razões da Indisciplina Relativamente às razões que conduzem a situações de indisciplina, é geral entre alunos,

professores e pessoal auxiliar, a tendência para atribuir as causas a factores exteriores à

escola. A indisciplina é nesse discurso maioritário entre a população escolar, no

essencial trazida de fora da escola e geralmente resultante do ambiente e educação

familiar. A adopção por alunos desse discurso mais não é do que uma entre outras

formas de inculcação ideológica, legitimadoras das desigualdades escolares e com o

efeito prático de obscurecer e/ou diminuir as responsabilidades da escola enquanto

produtora de comportamentos desviantes.

“Isso eu penso que há questões de base e em relação às regras de base da própria

família, os miúdos se não têm essa referência dos pais, não há hipótese, referências,

regras básicas de funcionamento, os pais chegam a casa cansados, não estão para se

maçar” (Professor )

“Tem a ver com a formação, com os princípios que eles têm, a educação, o ambiente em

que foram criados ou por situações da vida, por vezes também o ambiente dentro da

própria casa, os pais” (Pessoal auxiliar)

“Por causa das famílias, principalmente os pais não se importam muito com os filhos e

deixam os filhos à vontade sem manter a rédea curta como se costuma dizer, e eles vão

abusando, abusando e ás tantas já ninguém se preocupa, os pais também não se

importam se telefonam lá para casa” (Aluno, não participante)

“Porque não lhes dão educação. Os pais.” (Aluno, agressor)

Entre os professores, a maior parte dos entrevistados apontam causas ligadas à família,

ao clima em casa e à educação familiar, mas há outros que referem também aspectos

Page 68: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

68

relativos à relação entre professor e aluno e à importância de uma relação negativa com

a escola e a escolaridade.

“Fundamentalmente clareza na transmissão de regras á partida, aulas bem preparadas e

uma relação de empatia com os alunos podem fazer com que estes elementos

conjugados funcionem bem numa aula, construir um ambiente saudável. A base familiar

é a sustentação, muitos são oriundos de famílias em que o pai ou a mãe estão separados

e as coisas estão muito articuladas e eles não têm suporte, não é?” (Professor)

“Bem, tem as próprias razões temperamentais e tem a educação em sentido lato, que

têm desde que nasceram... é fundamental a educação que têm, o saber estar que

deveriam já trazer quando chegam a uma escola do 2º ciclo, deviam ter aprendido já no

jardim de infância, há coisas que...“ (Professor)

Entre o pessoal auxiliar, todos eles referem a educação familiar e o ambiente em casa

como razão da indisciplina e um deles salienta, para além disso, a importância da

personalidade como factor a ter também em conta.

“Acho que é uma questão de personalidade, de educação, de factores exteriores que os

influenciam, portanto os pais, a família, a parte humana e a parte material, eles são

influenciados por tudo isso, vai­se repercutir na vida deles no futuro e no presente”

(Pessoal auxiliar)

Entre os alunos, a maior parte aponta o factor falta de atenção dos pais como razão de

indisciplina, alguns referem a necessidade de serem autoritários e de se afirmarem e 1

deles refere que se trata de uma questão de solidariedade de grupo (trata­se de um

agressor).

“Talvez porque queiram ser conhecidos ou talvez porque queiram armar­se em bons”

(Aluno, não participante)

“Querem­se tornar mais autoritários, se calhar.” (Aluno, não participante)

Page 69: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

69

“Agora se houver porrada assim do género, entre algum do nosso grupo, o resto do

grupo mete­se” (Aluno, agressor)

Em síntese, as representações dos professores e pessoal auxiliar quanto à definição de

indisciplina e violência são semelhantes, isto é, para ambos a indisciplina é considerada

menos grave do que a violência. A primeira prende­se com a perturbação do normal

funcionamento da aula, atitudes de incorrecção e a segunda implica agressividade física

e verbal.

Contrariamente à opinião de professores e pessoal auxiliar, para os alunos a indisciplina

não se circunscreve à sala de aula, mas acontece também fora do seu espaço.

Perante situações de indisciplina professores e auxiliares de acção educativa afirmam

que procuram em primeiro conversar com os alunos, mas no caso de esta ser

insuficiente o pessoal auxiliar participa do aluno, sendo que os professores optam por

contactar a Directora de Turma ou Encarregado de educação, enviando os alunos para o

G.A.F. apenas quando a situação é insustentável.

As explicações avançadas pelos três grupos de entrevistados para a ocorrência de

situações de indisciplina são sobretudo as variáveis ligadas ao ambiente e educação

familiar que são consideradas mais importantes, tendo um destaque menor as relativas à

relação com a escola e com os professores (estas são referidas de forma secundária por

alguns professores) e as variáveis referentes à personalidade dos alunos.

A este propósito procurámos compreender como é que nas famílias dos alunos

entrevistados se resolvem os conflitos e que estratégias adoptam os pais em situações

nas quais não concordem com os comportamentos e atitudes dos filhos. Constatámos

que a maioria refere a aplicação de castigos, que os proibem de jogar à bola, consola, de

ver televisão e de se ocuparem com actividades com as quais habitualmente se ocupam.

4.4.4 ­ A violência e a agressividade no quotidiano

Um dos objectivos desta pesquisa consistia na compreensão das concepções e

percepções dos vários elementos que compõem a comunidade educativa sobre as

situações de violência e indisciplina nas escolas.

Das entrevistas realizadas, junto dos professores constatámos que a maioria é da opinião

de que as situações de indisciplina/ violência nas escolas têm vindo a agravar­se. É

Page 70: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

70

contudo de realçar que essa “constatação” resulta não de uma vivência na escola desse

tipo de situações mas de uma sensação difusa de insegurança que se traduz num

sentimento de mal­estar.

“Aumentaram! A escola é um reflexo da sociedade e eu penso que a sociedade está mais

violenta, não há dúvida nenhuma, portanto temos mais casos...” (Professora)

“Eu acho que têm vindo a aumentar desde que estou a trabalhar há vinte e sete anos,

sempre foi assim, sempre houve violência. Mas noto que nestes últimos anos há um

crescendo bastante acentuado”. (Professora)

“Nas escolas no geral, têm vindo a aumentar, aquilo que nós vimos nos jornais é que em

média por semana, um professor é violentado ou agredido fisicamente, não sei se isto é

correcto, mas é no mínimo frustrante”. (Professora)

Também para o pessoal auxiliar de acção educativa a indisciplina e a violência nas

escolas em geral tem vindo a agravar­se, contudo associam mais estas situações a

escolas localizadas na proximidade de bairros degradados.

“Ah! Em geral não, têm­se agravado, segundo eu ouço dizer ao nível de outras escolas,

para a Damaia, para aqueles bairros mais degradados dizem que é uma coisa horrível, os

roubos, droga, salvo seja, deus nos livre disso tudo”. (Pessoal auxiliar)

“Têm, mas depende dos bairros em que as escolas estão localizadas. Houve um caso ali

em Chelas, um aluno bateu no professor, foi uma situação mesmo muito feia. Eu acho

que em todas as escolas há casos de violência, em todas, uns casos mais sérios numas

do que noutras, mesmo na altura que eu andava na escola havia violência, mesmo entre

colegas, entre alunos e professores...”. (Pessoal auxiliar)

Quando questionámos a situação nesta escola em especial, as opiniões dividem­se, por

um lado os professores que desconhecem casos concretos de violência, por outro os

professores que afirmam que a situação nunca esteve tão preocupante como agora.

Page 71: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

71

“Olhe comparando com aquilo que eu leio, que se passa noutras escolas de violência

urbanizada, eu penso que esta até não é muito significativa, não tem parece­me, pelo

menos é o que eu oiço dos meus colegas, não tem essas características, ainda não

tem”.(Professora)

“Pelo que eu ouço dizer é que isto está horrível, está muito pior mesmo este ano. Várias

professoras, dizem que este ano foi o pior e que nunca viram coisas assim”. (Professora)

“... desde o primeiro ano até este terceiro ano as coisas têm melhorado, tem vindo a

fazer­se um esforço da parte de funcionários e professores, tentar controlar melhor as

coisas, agora os casos pontuais de indisciplina que me têm chegado aos ouvidos, de

alunos de 5º e 6º ano, que eu acho que são muito graves, nomeadamente relatos de aulas

que eu vejo, que é uma coisa impensável com obscenidades claras para o professor,

coisas que eu nunca pensaria que se passam e que efectivamente se passam e o

professor faz de conta que não ouve, etc”. (Professora)

Para o pessoal auxiliar de acção educativa as situações de indisciplina e violência nesta

escola mantêm­se ou melhoraram comparativamente a anos anteriores.

“Não, não aumentou, mantém­se. Não vamos só falar da situação que se deu, está muito

melhor, nem pensar. Noutros tempos que eu já vi nesta escola. A droga, por exemplo”.

(Pessoal auxiliar)

“Melhorou. Porque saíram alunos mais velhinhos que se aproveitavam de qualquer

coisa, como grande parte desses alunos já cá não estão a coisa melhorou”. (Pessoal

auxiliar)

Agressão / Conflitualidade / Intimidação Procurámos também perceber se ocorriam situações de agressividade no quotidiano

escolar. A esse respeito indagámos sobre a ocorrência de agressões, assaltos e

intimidação entre os alunos ou por terceiros.

Page 72: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

72

Dos 11 alunos entrevistados, 6 afirmaram já terem estado envolvidos em situações de

pancadaria e agressões com os seus colegas, motivadas por insultos, provocações ou

questões de namoros às quais não se atribuem grande importância.

(Aluno, não participante)

“Eu já andei à porrada por causa da bola, já houve um que começou­se a armar em

esperto e levou. Estava a tirar­me a bola, nós estávamos a jogar e ele chegou lá e disse:

“Quero jogar!” e eu disse: “agora esperas, fazes equipa a seguir” e ele disse: “ Não, não

faço” e eu disse: “ Deves ter a mania, tu!”, depois ele veio de lá a armar em esperto e

levou porrada. Dei­lhe porrada, meti­o no chão e comecei a dar­lhe pontapés na boca.

Então arma­se em esperto, pensa que passa todos!” (Aluno, não participante)

“Uma vez estava um colega meu… com a minha namorada. A minha namorada pôs­me

os palitos. Lá fora dei­lhe três socos na boca. “Ah Carlos porque é que fizeste isso?”, e

eu: “Eu explico­te, estavas a namorar com a minha gaja, não estavas?”, “Ah é mentira”

e eu Pumba, toma outro.” (Aluno, agressor)

Poucos professores que dizem ter conhecimento de casos de agressão, por parte dos

alunos. Contudo, uma professora referiu ter sido vítima de agressão à entrada da escola.

Também estas situações de agressão não são consideradas frequentes nem preocupantes.

A maioria das situações relatadas assumem contornos pouco claros, pois a maioria

afirma não terem a certeza porque também ouviram de outras pessoas, isto é, não

presenciaram.

“Eu acho que havia aí uma colega minha que teve um problema nos pulsos aqui há uns

tempos atrás. Acho que ela ia fazer não sei o quê, o aluno agarrou­lhe e depois puxou­

lhe o braço para trás e ela não teve uma boa reacção e depois torceu o braço. (...) Olhe,

no princípio, eu ia lá nesse sítio, ia de costas e acho que me amandaram com fruta ou o

que é que foi. Lá fora. Agora cá dentro, não. Cá dentro, não.(...) Não, foi logo no

“Andei à porrada com um aluno, mas foi no 2º período e ele partiu­me a cabeça. Estava

na fila no bar, então ele começou a empurrar­me, eu empurrei­o, ele deu­me um soco e

eu bati com a cabeça na parede. Levou quatro dias de suspensão.”

Page 73: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

73

princípio, eles não gostaram da maneira… e resolveram atirar qualquer coisa à

professora.” (Professor)

“Eu conhecimento não tive, tive zum­zuns de que houve, agora não tenho informação

formal e precisa, nem em que circunstâncias foi, nem como é que foi.” (Professor)

“Assaltado, não tenho conhecimento nenhum. Agredido fisicamente? Verbalmente

penso que sim.” (Professor)

Não obstante, uma auxiliar de acção educativa partilhou connosco a experiência

negativa de que foi alvo por parte de um aluno que a agrediu.

“ele vai com uma mão, atira contra mão a esquerda, este dedo que ainda está cheio de

artrose, olhe tenho alturas em que ele se verga todo para baixo e dá dores horríveis, de

ele ter feito assim e deu­me um pontapé no braço esquerdo, são dores horríveis”

(Pessoal auxiliar)

“A Dona Ivone que lhe falei há pouco, a Dona Albertina mas já foi há mais tempo que

já se reformou, também foi agredida aqui na escola, mas são poucos os casos.” (Pessoal

auxiliar)

Por conseguinte e no que diz respeito a agressões de professores sobre alunos,

verificámos que para os segundos não existem situações preocupantes de agressão, mas

sim as designadas “palmadinhas”, “carolos”, “tostas” e “caldinhos”. Aliás, é comum a

referência de acontecimentos ocorridos em anos lectivos anteriores de professores que

agrediram alunos. Estas práticas são consideradas normais e de certa forma é­lhes

atribuída pouca importância pelos dois grupos.

“Por acaso já houve uma história, mas contaram­me, não sei se é verdade, o ano passado

um dava uns caldinhos e umas chapadinhas a um aluno, mas não sei se é verdade, não

tenho certezas, mas contaram­me que esse professor foi apanhado lá fora e também

levou uma surrazita e pronto, de amigos do aluno”.

(Aluno, não participante)

Page 74: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

74

“Ah! Eles só dão assim chapadinhas, não dói nada” (Aluno, Agredido)

“O meu professor de Educação Visual e Tecnológica dá tostas aos miúdos. Começam a

falar um com o outro, depois o outro dá uma chapada no outro e depois o professor vai

lá e dá uma tosta em cada um.” (Aluno, agressor)

“Há muitos professores assim como o professor de Educação Física…há miúdos que

fazem qualquer coisa mal, miúdos pequeninos e dá­lhes com o apito na cabeça dos

miúdos. Isso aconteceu com um miúdo (...)Foi assim provas a correr, estafetas. Ele fez

qualquer coisa mal e o professor deu­lhe com o apito, eu já avisei a mim é que ele não

fazia isso. “ (Aluno, agressor)

“À não ser aquele professor de Educação Física que andava a bater nos alunos com um

apito. Quando os alunos se portavam mal ele dava com o apito. Não, foi o ano passado.

Doía­lhes, era um apito de metal, tinha um de plástico, mas como partiu na cabeça de

um, comprou um de metal.” (Aluno, não participante)

“Uma vez no quarto ano... uma vez a professora bateu no meu colega. Porque ele não

conseguia ler. Deu­lhe um estalo.” (Aluno, não participante)

Para os professores também é natural a utilização de procedimentos como a

“chapadinha”, “estalada” e o “tabefe”. No entanto, todos desconhecem que os seus

colegas batam ou utilizem formas mais agressivas de controlar a indisciplina na sala de

aula.

“Bater como? É que há bater e bater. É chegar assim por trás e dar­lhe assim (palmada

no pescoço) para se acalmar, aí isso eu sei, eu faço, faço e dá um resultadão”

(Professor)

“Não vi, mas ouço dizer, assim uma palmada ou um puxão de orelhas. Sim, dar uma

estalada ou uma palmada nas costas ou no ombro, isso ouço os alunos dizerem e ouço

vários alunos a dizer.” (Professor)

Page 75: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

75

“Conhecer situações em que batam, não. Mas é assim, é no contexto em que as coisas

são efectivamente feitas, tipo ou presta mais atenção e dá­se uma “festinha” na cabeça

do aluno, mas bater penso que não.” (Professor)

“Também acontece, eu não lhe chamaria bater, chamaria perder o controle, mas chegam

a agarrar, pelo menos agarram, bater não. Temos tido aí umas queixas bastante fortes.”

(Professor)

No que se refere ainda à relação entre alunos, foi­nos dito que é prática corrente as

situações de intimidação. Geralmente dos mais velhos sobre os mais novos.

“...um puto chamou­me filho da… amandei­lhe um soco. Eu dei­lhe um empurrão sem

querer à saída da casa de banho e ele disse: “Filho da…” e eu dei­lhe um “pêssego” na

boca. Partiu um dente. Foi ao conselho directivo fazer queixa de mim. E depois eu fui lá

e disse que ele tinha­me chamado o tal nome e ele é que foi suspenso.”(Aluno, agressor)

“São os mais velhos nos mais novos, porque os mais velhos pensam que são

assim…alguns como andam hà mais tempo aqui, pensam que são as vedetas da escola

entre aspas, porque como que já são maiores e isso podem bater nos outros, porque os

outros não me vão bater, mas às vezes até se enganam.” (Aluno, vítima)

Verificámos que para além da intimidação frequente dos alunos entre pares é vulgar

pedirem para intervir em diversas circunstâncias pessoas exteriores à escola, por

exemplo, irmãos, primos e grupos amigos do bairro, no sentido de agredirem os colegas

da escola com os quais existem conflitos.

“No outro dia esse colega meu que chamou­me nomes, chamou outro colega dele o Rui

para me vir “dar na boca” hoje, às 18:30 h. Se vierem estão lixados também, eu conheço

malta de Chelas, Zona J, da Amadora, do Miratejo, Pontinha. A jogar à bola às vezes dá

soco, dá pau, dá cacetada.” (Aluno, agressor)

Page 76: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

76

“..Um dia bateram­me ai, fui chamar o meu irmão, o meu irmão deu­lhe, depois o gajo

ainda começou a ameaçar­me, fui chamar o meu irmão e o meu primo Vasco que você

fez a entrevista no outro dia e ele deu­lhe.” (Aluno, não participante)

“Porque às vezes há alunos que os maiores vão influenciar para andar à porrada, mas há

uns que chamam os irmão, chamam os pais, os irmãos e isso, depois acontece um

bocado de… pancada.” (Aluno, vítima)

A maioria dos alunos, professores e pessoal auxiliar afirmam que não ocorrem assaltos

na escola, no entanto, são habituais os pequenos roubos, nomeadamente o

desaparecimento de material escolar, jogos e outros objectos de baixo valor. Estas

situações são frequentes, mas encaradas como normais.

“Muitas coisas, walkmans, telemóveis, dinheiro, já o ano passado havia muitos roubos,

era mais as mochilas, depois ficam com as canetas, agora livros mandam todos para o

lixo. Desaparecem mais é malas.”(Aluno, agressor)

“Mas às vezes aqui é mais roubar canetas, dinheiro e isso, mas não são grandes

coisas.(...) Ah! É por causa de roubarem as canetas e as borrachas, correctores e isso,

eles batem. Há porque alguns metem­se com as namoradas dos outros e começam a as

apalpar e a fazer­se a elas, eles não gostam e batem, mas eles também arranjam sempre

um motivo para andarem à porrada.” (Aluno, vítima)

“...mas há poucos dias um colega meu perdeu uma mochila, acho que lhe roubaram.

Não sei, ele esteve a dizer­me que ficou sem a mochila e não sei quê…e eu perguntei­

lhe: “Mas roubaram­te?”, ele não responde nada, mas deve ter sido roubada.” (Aluno,

não participante)

“A carteira. Pediram­me dinheiro, eu disse assim, queres ver e tudo? E eles disseram:

“Então deixa cá ver!”, ele tirou­me a carteira e tudo o que tinha lá dentro. Não, ele

disse: “Se vais fazer participação estás lixado”. (Aluno, vítima)

Page 77: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

77

“Que desapareça um ou outro material, uma caneta, não sei quantos, ás vezes nem se

sabe muito bem se foi o aluno que o perdeu ou se roubaram. Mas assaltos, mesmo

assaltos, não.” (Professor )

Já fui roubada por um aluno, mas também foi descuido meu, tenho que dizer a realidade

não é? Não fechei a gaveta da escrivaninha e eles espreitaram, fui meter lá a carteira e

roubaram­na.” (Pessoal auxiliar)

Sentimento de segurança Relativamente à segurança da escola, quisemos saber se alunos, professores e pessoal

auxiliar sentiam medo ou receio de estar na sua escola. É interessante verificar que a

principal preocupação relativa à segurança não diz respeito a ameaças provenientes de

terceiros vistas como pontuais, mas está principalmente relacionada com o espaço físico

da escola, resultado da degradação em que se encontra o edifício.

Alguns professores afirmam que não têm medo, mas já passaram por situações mais

complicadas.

“Quanto muito tenho medo que alguma coisa me caía em cima. Atenção, eu estou

sempre a bater na mesma tecla, tenho algum receio, mas isso, não é (…) tenho algum

receio de algum pontapé, alguma cotovelada indevida, como tinha uma colega minha

que há uns tempos atrás estava grávida e tinha muito receio em descer as escadas,

porque é muito estreita e os alunos sobem e descem de uma maneira muito desordenada

e pode haver sempre qualquer coisa que…”. (Professora)

“Não, tinha cuidado. Já me chamaram nomes na rua e eu tinha um certo cuidado porque

(…) por causa do grupo chamar­me nomes e mostrar que até é mesmo capaz de bater e

não sei o quê. Mas quando está sozinho, eu sei que ele não é capaz de fazer”.

(Professora)

“Já me pintaram o carro, também se estragarem não estragam grande coisa, este ano já

ameaçaram “Ah o seu carrito!” e eu disse: “está bem vocês estragam e eu vou atrás de

vocês, eu sei quem é que vocês são”.

(Membro do Conselho Executivo)

Page 78: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

78

Dos alunos entrevistados, somente uma aluna revelou sentir medo no primeiro dia de

aulas, os restantes disseram­nos que não sentem medo, nem receio de estar na sua

escola. As justificações prendem­se com a proximidade do quartel da GNR e com o

facto de terem amigos mais velhos que os protegem.

O pessoal auxiliar tal como os alunos também não sentem medo nem receio de estar na

escola.

“Medo, não. (...) Porque conheço os mais velhos (...) Por exemplo, se alguém me quiser

bater eu depois chamo­os”. (aluno, não participante)

“Medo? Não (...) eu tenho amigos. Antes de vir para esta escola já os conhecia da

primária e isso”.

(aluno, não participante)

“Já, um bocadinho só. Foi no primeiro dia, porque eu tenho medo. Há miúdos maiores

que eu que obrigam­nos a fumar, como há miúdas daqui que obrigam a fumar. Eu já vi

uma miúda a ir para a casa de banho, que convidaram ela a entrar e obrigaram­na a

fumar”. (aluno,agredido)

“Houve uma altura que eu tive, mas não do tempo desta escola. Agora não, não tenho

medo, posso ficar aí sozinha que não tenho receio”. (Pessoal auxiliar)

Ainda em relação à segurança, os professores dizem que em termos de relações

interpessoais não existem problemas, a insegurança mais uma vez prende­se com as

condições do edifício. Dos sete professores entrevistados, apenas uma professora

manifestou receio face às atitudes dos alunos.

“Pois ao nível dos comportamentos é como lhe digo, eu estou aqui descansada a dar

aulas, os alunos decidem o que quiserem fazer e se a professora tiver alguma reacção,

cai­lhe tudo em cima, é o que lhe digo”. (Professora)

“Sim, segura pelo facto de não sermos atacadas e não levar­mos com uma faca? Sim,

acho que sim. Onde não é segura é porque a tábua pode cair em cima de nós. Isso acho

Page 79: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

79

que não é segura, porque como o corredor é apertado e como há muitos alunos, posso

levar um pontapé como já levei, pontapés e cotoveladas, mas é sem querer, porque eu

vou ao bar e toda a gente me aconselha para não ir ao bar e a caminho do bar levo com a

bola, pontapé, cotovelada”. (Professora)

Para o pessoal auxiliar a escola é segura, no entanto os alunos na sua maioria não

partilham da mesma opinião. Para uns a insegurança está relacionada com o aspecto

físico da escola, para outros com a facilidade com que se saí dos portões da escola.

Dos onze alunos entrevistados, só três nos disseram claramente que achavam a escola

segura, os restantes responderam que não ou mais ou menos.

“Mais ou menos. Dá para entrar na escola com facilidade e sair”. (Aluno, não

participante)

“Mais ou menos. Aquele portão de saída, alguns que enganam e deviam de mostrar o

cartão. Por exemplo, tínhamos aulas e eu não queria ir para as aulas, eu saio porque digo

que não tenho aulas e eles deixam­me ir”. (Aluno do 5º ano, não participante em actos

de agressão)

“...depois a escola está no estado em que está, pode cair o tecto ou não, não podemos ir

às varandas, as varandas podem cair e depois os mais novos não se sentem muito

seguros, havendo o problemas dos que vão lá e os ameaçam, que lhes pedem dinheiro e

lhes batem”. (Aluno do 9º ano, não participante em actos de agressão)

Deste modo, quisemos saber como eram as relações entre colegas no contexto da escola,

se existem situações de agressividade e/ou perseguição (colegas que andam sempre a

embirrar com eles ou com outros). A maioria dos alunos respondeu que não, opinião

que já não é partilhada pelos alunos vítimas de agressão, os quais afirmam ser

regularmente vítimas de intimidação.

“Comigo não, com os outros colegas às vezes. São outros, os repetentes”. (Aluno, não

participante)

Page 80: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

80

“Os mais novos é que têm a mania de intimidarem os outros mais velhos, porque eles

sabem muito bem que a gente não lhes vai bater, não é? São pequenos, não lhes vamos

fazer mal nenhum, só que eles às vezes gostam de empurrar as pessoas e chamar nomes,

mas nada de especial”. (Aluno, não participante)

“Há um da minha turma que embirra sempre comigo, está sempre a chamar­me nomes, ‘Dentolas’ e manda a minha mãe para uns certos sítios” . (Aluno, vítima de actos de agressão)

“Começam a chamar­me preta e mais… só que eu não ligo e digo­lhes ‘Olha sou preta

com muito gosto!’, não ligo ao que eles dizem, eu tenho a minha cor e eles têm a deles”.

(Aluno, vítima de actos de agressão)

Em síntese, embora os professores e o pessoal auxiliar considerem que as situações de

indisciplina e violência têm vindo a agravar­se nas escolas e sociedade em geral, tal

tendência não é unanimemente aceite para descrever a situação na escola em que

trabalham. Todos os grupos entrevistados referiram que já foram confrontados e

estiveram envolvidos em situações de violência e agressividade na escola, no entanto,

este fenómeno é encarado como normal, isto é, não suscita grandes preocupações, no

sentido em que nunca ameaçou o modo de funcionamento da instituição, não questiona

a sua existência, hierarquias e objectivos.

Naturalizados foram também os pequenos roubos de mochilas, canetas, correctores e de

pequenas quantias de dinheiro que habitualmente desaparecem.

É prática corrente entre alunos a intimidação, perseguição e ameaça, geralmente de

alunos mais velhos sobre os mais novos, dos mais fortes sobre os mais fracos,

(bullying).

Assim, relativamente à escola são desvalorizadas e consideradas insignificantes as

situações de assaltos e agressões, sendo que para todos o sentimento de insegurança

prende­se sobretudo com as degradadas instalações da escola e as péssimas condições

físicas e espaciais.

Page 81: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

81

4.4.5. ­ Relação com as normas

Como se entendem as normas A forma como o quadro normativo é entendido pelos diferentes sujeitos varia, no nosso

entender, em função da posição ocupada por cada um no espaço de relações sociais que

designamos por comunidade educativa.

Para os professores as regras mais valorizadas são aquelas que promovem o

conhecimento e a interiorização dos direitos e deveres associados à posição ocupada por

cada indivíduo nesse espaço. Para eles o conhecimento destas regras orienta tanto o

pessoal docente como não docente na forma de agir dentro e fora da sala de aula, nos

corredores e no pátio da escola, diminuindo assim a incerteza.

Na perspectiva dos alunos está associado à possibilidade de enfrentar uma pena que se

terá de cumprir caso se verifique o incumprimento das regras da escola. Esse aviso parte

dos professores, mas também dos pais dos alunos, cujas recomendações aos filhos

realçam as possíveis sanções.

“«Ah agora vais para a escola lá para baixo tens de te portar bem senão eles metem­te

dispensa». Aqui nesta escola se eu me portar mal fico suspenso.” (Aluno, envolvido em

actos de agressão)

“Sim, a minha mãe disse que eu tinha que me portar bem senão ia para a rua e se eu

fizesse muitas coisas podia ser suspenso.” (Aluno, não participante)

“Se infringíssemos, ainda tínhamos uma falta disciplinar ou conselho disciplinar”.

(Aluno, vítima de actos de agressão)

Conhecer as normas Todos os alunos, professores e pessoal da acção educativa revelaram conhecer a

existência de um regulamento interno da escola. Contudo quando questionados a

propósito das regras mais importantes desse regulamento os professores referiram

exemplos tão gerais como o “cumprimento dos deveres”, “conhecer os direitos e os

deveres” e “fala sobre as regras em relação aos alunos”. Dos 7 professores

entrevistados, dois disseram não se lembrar do regulamento, um porque não o tinha e

Page 82: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

82

outro porque a última vez que o lera já tinha sido há algum tempo. Pelo contrário, os

alunos referiram inúmeros exemplos das regras apresentadas no regulamento interno.

Tanto os alunos como professores coincidiam no acto de não o terem voltado a ler

depois de este lhes ser entregue.

“Sim, deram­me o regulamento da escola e todos os anos mesmo que estejamos aqui

nesta escola há muito tempo, lemos sempre o regulamento da escola. Foi a nossa

directora de turma. Leu e explicou como é que nos devíamos de comportar e que

devíamos respeitar as regras”. (Aluno, não participante)

“Eu por acaso tive o azar do meu regulamento estar incompleto e ainda não fui buscar

outro sinceramente...deixe­me pensar...sinceramente não tenho assim nenhuma opinião

formada”. (Professora)

“Eu penso que as mais importantes são o cumprimento dos deveres dos alunos, dos

professores e do pessoal auxiliar”. (Professora)

No início do ano lectivo os directores de turma entregam o regulamento interno e falam

acerca do mesmo com os alunos, no entanto, só alguns professores de outras disciplinas

abordaram esta questão nas suas aulas. Foram poucos os que o fizeram no decorrer do

ano lectivo.

“Só a directora de turma é que disse, os outros professores não disseram nada.” (Aluno,

vítima de actos de agressão)

“Deram­me uns folhetos, peguei neles e foram directamente para o caixote do lixo.”

(Aluno, envolvido em actos de agressão)

No que diz respeito aos professores a falta de homogeneidade na forma como encaram

as regras foi patente quando questionados sobre os modos de aplicação do regulamento

interno. As razões estão associadas, no entender dos entrevistados aos anos de serviço e

situações de eventual saturação, bem como a facilitação por parte dos professores no

que respeita ao cumprimento das regras ao longo do ano lectivo, que resulta num

aumento dos casos de indisciplina.

Page 83: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

83

“Não isso não posso dizer, até porque, sei até por experiência própria que cada pessoa

tem a sua maneira de actuar.” (Professora)

“Não dão a mesma importância e depois também há uns que chegam à sala e os alunos

já entraram, há outros que só quando os alunos estão bem comportados cá fora é que

começam a deixar entrar os alunos, há outros que entram ao mesmo tempo que os

alunos, não há assim muita coerência, mas era importante que houvesse, não porque um

tivesse uma opinião mais eficaz ou mais correcta do que os outros, mas por causa dos

miúdos é importante haver uma certa coerência, eles depois modificam­se quando vão

de sala para sala, sabem com que professor é que vão estar e sabem que com este posso

fazer barulho com o estojo e com o outro não podem fazer barulho com o estojo e que

este se eles disserem que a mesa tem um risco vai logo chamar o funcionário e o outro

vai dizer está bem, está bem!” (Professora)

“Não decididamente não. Por exemplo uma regra que é não deixar os alunos saírem

durante as aulas… às vezes passam imensos miúdos que vêm de salas de aula, que os

professores deixaram os miúdos ir, isto repete­se e não é uma vez. Se fosse uma vez

para irem à casa de banho, tudo bem, agora quando as coisas começam a ser muito

frequentes é um bocado complicado, começam a ganhar essa mania e depois é a

continuação”. (Professora)

“...isso depende dos professores, mas de uma maneira geral não é má, temos é quatro ou

cinco professores que estão bastante fragilizados, quer por muitos anos de serviço, quer

pela sua idade, quer pelas duas coisas, quer pelas suas facetas idiossincráticas que a

relação torna­se difícil e há problemas a nível disciplinar”. (Membro do Conselho

Executivo)

“No princípio do ano quando toda a gente está a cumprir as regras estabelecidas, as

coisas são muito calmas ai até Novembro e depois quando… não sei se falta…ou os

professores acham que está tudo feito, começam a facilitar e começa a desabrochar a

indisciplina, pronto e depois há um crescendo…vai num crescendo que só pára no fim

do ano”. (Professora)

Page 84: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

84

Atitudes face à norma Procurámos saber junto dos professores e pessoal auxiliar se os alunos partilham

aceitam e compreendem das normas do regulamento interno ou se pelo contrário

desenvolvem comportamentos que no seu critério indiciam resistência e/ou rejeição.

No entender da maioria dos professores este aceitam genericamente as normas,

havendo, contudo, casos em que a indisciplina surge como resultado da gestão das

regras efectuada pelos docentes.

“Não senti isso, não, antes pelo contrário, eles aderem, o que é necessário é que haja de

facto por parte dos professores essa…quer dizer, essa situação sempre presente, para

que os chamar à responsabilidade e a fazerem sempre cumprir”. (Professora)

“...eles são juizes acutilantes e não lhes passa nada, portanto, eles podem aceitar neste

momento qualquer observação que lhes seja feita, mas numa situação parecida ou que

eles achem que é parecida se não for aplicado o mesmo, eles sentem e o processo de

indisciplina começa”. (Professora)

Já o pessoal de acção educativa, cuja posição subordinada na estrutura hierárquica do

estabelecimento escolar lhes proporciona menor poder e margens limitadas de gestão do

quadro normativo, tem uma opinião contrária aos professores. Todos os entrevistados

consideram que os alunos manifestam resistência em relação ao cumprimento da norma.

“Pelo contrário, alguns não seguem as regras, por exemplo, na questão de entrarem para

uma sala com pouco comportamento, atiram com as portas, estragam, tentam tirar

fechos, tentam danificar, uma pessoa está a limpar dão um pontapé no balde e a água vai

por fora, enfim!” (Pessoal auxiliar)

“Em relação aos bonés, às vezes os professores têm de os mandar tirar, as pastilhas, mas

também não ligam a mínima se entram ou não com pastilhas, a única coisa que eles

sabem fazer é quando toca vão logo para o bar para poderem ficar no corredor a comer,

para entrar mais tarde na sala de aula, temos que os mandar embrulhar a comida e

mandá­los entrar...”. (Pessoal Auxiliar)

Page 85: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

85

Interessava­nos saber, ainda em relação às normas, se existe alguma regra na escola

com a qual os alunos, os professores e o pessoal auxiliar não concordassem. Existe da

parte da maioria dos alunos entrevistados uma aceitação genérica das regras da escola,

referindo a importância dessas para o normal funcionamento da escola. Contudo,

algumas regras são alvo de críticas, por considerarem que possuem um carácter

arbitrário. Nomeadamente:

“Entrar com bonés para o pátio, isso eu não concordo, porque é que não se pode entrar

com bonés para a escola? Menos para as aulas, para as aulas tira­se”. (aluno, envolvido

em actos de agressão)

“Não concordo com o dizerem que não podemos andar aqui nos corredores, porque de

Inverno se está a chover não podemos ir lá para fora e acho que devíamos de poder estar

nos corredores, porque não há espaço nenhum lá fora e se estivermos nos corredores nós

estamos calmos a conversar...” (Aluno, não participante)

A maioria dos professores entrevistados concorda igualmente com a generalidade das

regras do regulamento interno. Quanto à proposta de alguma regra que não esteja

definida presentemente na escola, apresentaram sugestões:

“... poderá haver um toque a seguir…no primeiro tempo, uma tolerância maior, isso

acontece na generalidade das escolas (...) tanto para professores como para alunos”.

(professora)

“Olhe, por exemplo, a proibição de usar telemóvel pelos alunos e pelos professores

dentro da sala de aula, eu nunca vi, mas ouço dizer que há quem atenda o telefone

dentro da sala de aula, eu penso que a postura do professor em relação aos alunos é

fundamental”. (Professora)

“... não concordo coma as medidas educativas disciplinares, com as suspensões, etc,

mas vejo­me obrigada a fazer. Porque não servem para nada, só servem para os tirar de

cá e para termos uma vida mais descansada, vejo­me obrigada a concordar com isso,

mas não concordo, eu na minha direcção de turma tive um aluno com três suspensões

neste ano e eu sei que a suspensão não servia para nada”. (Professora)

Page 86: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

86

Para além da aplicação destas regras ser muitas vezes diferente de professor para

professor, verifica­se que as regras informais são transmitidas e comunicadas em sala de

aula nem sempre coincidem com as normas formais e não formais.

Segundo, Ivo Domingues existem três tipos de normas: as regras formais (provenientes

do Ministério de Educação) que circulam em forma de decretos, portarias e despachos.

As regras não formais (elaboradas pelos órgãos da escola) que visam solucionar os

problemas que surgem no estabelecimento de ensino e as regras informais, comunicadas

verbalmente na sala de aula ou no pátio da escola. “Estas últimas, confundem­se com as

regras sociais. São estabelecidas por quem detém poderes para as formular, impor e

defender” (Domingues, 1995:16).

Quando perguntámos aos professores quais as diferenças entre eles nos modos de

aplicação das normas do regulamento, as respostas variam. Para alguns tem a ver com a

idade, para outros tem a ver com a experiência, habilidade, para outros ainda com o

rigor.

“Aqui nesta escola, ao contrário da minha experiência que os professores mais novos

eram mais permissivos, tenho certas reservas, penso que há professores aqui, porque

estão mais desgastados ou porque não têm condições no momento e no contexto em que

estão de ter mão nos miúdos, isso também se verifica em certos casos e são pessoas já

de uma certa idade, mas muita experiência de ensino, não são exactamente o pessoal

jovem”.(Professora)

“Isso a idade aí, alguns como estão fragilizados não se lembram disso, não têm

capacidade por mais que queiram, as pessoas querem, mas não são capazes de

defenderem o que ali está, os mais novos também por falta de experiência não

conseguem controlar uma turma e levá­los a trabalhar...” (Membro do Conselho

Executivo)

“Existe, existe. As que valorizo mais é a relação das pessoas, das relações humanas,

entre pessoal, alunos e professores. Não faltar ao respeito, ser correcto com toda a gente,

isso são regras tanto dos empregados como dos alunos”. (Pessoal auxiliar)

Page 87: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

87

Quanto à eventual contribuição dos alunos na definição das regras da escola, a resposta

dos professores é muito positiva. Todos partilham a ideia de que os alunos devem ter

palavra sobre um assunto que lhes diz directamente respeito. Esta opinião é também

partilhada pelo pessoal de acção educativa.

“Ah sim! devem com certeza. A participação deles é muito importante e eles são muito

mais rigorosos nas regras de funcionamento até do que propriamente os professores,

porque eu faço isso na minha disciplina e há coisas que eu não poria e eles põem,

portanto eles têm noção do que é que devem e não devem fazer, e essa participação

ajuda com certeza a eles interiorizarem esses valores e a responsabilizá­los

simultaneamente pelo cumprimento das mesmas”. (Professora)

“Sim. Porque foram eles que decidiram, conheciam as regras e fixavam melhor as

regras, depois interiorizavam mais, como sendo uma coisa deles e levavam aquilo mais

a sério quando alguém fizesse batota, como eles costumam dizer”. (Professora)

“Sim. Porque eles também têm regras como nós temos. Terem um bom comportamento,

respeitarem­nos, nós temos que os respeitar para sermos respeitadas, não é?” (Pessoal

auxiliar)

Em síntese, alunos, professores e pessoal auxiliar sabem que existe um regulamento

interno da escola e qual a sua finalidade. Quanto à sua aceitação por parte dos alunos,

professores e pessoal auxiliar têm uma opinião diferente. Para os professores, os alunos

aceitam na generalidade as regras no contexto da sala de aula, excepto situações em que

percebem as fragilidades dos professores e nas quais apresentam comportamentos de

indisciplina e de resistência. Na opinião do pessoal auxiliar, os alunos não aceitam o

cumprimento das regras e os professores têm constantemente de lhes lembrar o

regulamento.

Os alunos concordam com a existência de regras na escola e são eles que referem mais

espontaneamente as regras que consideram mais importantes no regulamento. Apesar

dessa concordância genérica mencionaram algumas que consideram arbitrárias,

nomeadamente, entrar com bonés para a escola e não poderem circular nos corredores

durante os intervalos.

Page 88: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

88

Os professores concordam com o regulamento, mas alguns sugerem outras regras que

deveriam ser tidas em conta, por exemplo, proibição do uso do telemóvel nas salas de

aula e a existência de um segundo toque de tolerância.

As diferentes formas dos professores realizarem o controlo dos comportamentos na sala

de aula traduz a diversidade do próprio corpo docente na percepção e aplicação das

regras no quotidiano.

A participação dos alunos na definição das regras da escola é uma opinião partilhada

pelos professores e pelo pessoal auxiliar, no sentido de se familiarizarem mais com as

regras e interiorizarem determinados valores vistos como desejáveis .

4.5 – Nota final

A realização deste estudo de caso procurava, antes de mais, compreender qual a

incidência das situações de violência no quotidiano de uma escola, procurando

aprofundar o conhecimento sobre os contextos concretos que resultam na produção

desse tipo de situações.

A participação no quotidiano de uma Escola Básica 2/3 do centro de Lisboa foi a este

propósito profundamente interessante. Após primeiros contactos pareceu­nos que a

escola confirmava os pressupostos que tinham levado à sua escolha, ou seja, não estar à

partida referenciada (em particular não ser socialmente designada) como registando

problemas graves de indisciplina e violência. Este era aliás um pressuposto importante,

pois não nos encontrávamos à procura de um estabelecimento em que a ocorrência de

situações de violência se enquadrasse no tipo de situações que regularmente vemos

serem ultra­mediatizadas. A razão de ser dessa opção radica na ideia de que o essencial

das situações violentas na escola não são constituídas por situações de grande violência

cometidas por grupos de jovens marginais, mas antes se traduzem em situações de

pequena violência quotidiana entre alunos (pequenos roubos e agressões, intimidação

quotidiana).

Se é verdade que a primeira imagem que construímos da escola se manteve ao longo do

tempo, a permanência mais prolongada no terreno veio possibilitar uma visão mais

aprofundada sobre o seu quotidiano.

A análise realizada durante o ano lectivo de 1999/00, traduziu­se na ideia de nos

encontrarmos perante uma escola organizada, que não “enferma” da maioria dos males

frequentemente atribuídos à escola portuguesa: instabilidade directiva, elevada rotação

Page 89: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

89

dos docentes, fraca cooperação entre docentes, inexistência de serviços de apoio. Já no

que diz respeito às instalações as queixas sobre a sua degradação e desadaptação eram

frequentes e comuns a toda a comunidade escolar.

É de referir que a escola conta com uma assinalável estabilidade do corpo docente (no

essencial efectivo), possui diferentes serviços de apoio, nomeadamente um gabinete de

acompanhamento e formação, gabinete de serviço de psicologia e orientação e o

gabinete de acção social escolar com recursos superiores a muitas escolas de maior

dimensão. Existe um regulamento de escola que é discutido com os alunos, o projecto

educativo parece ser partilhado pela comunidade educativa.

Este panorama positivo, de uma escola que funciona, poderia levar à partida a pensar

que as situações de agressividade e violência seriam reduzidas ou mesmo inexistentes.

Esta concepção seria ainda mais forte se tomarmos em conta as asserções pedagógicas

que consideram estar na origem dessas situações o chamado “mal­estar escolar”,

resultante das situações de desorganização da escola e de percursos escolares marcados

pelo insucesso, que quando resolvidos, levariam ao seu desaparecimento. Muitas destas

concepções vão de par com a ideia de que existe uma relação de causalidade entre as

situações de indisciplina e violência e a proveniência dos alunos de zonas marcadas por

situações de carência económica e cultural. A melhoria destes indicadores traduzir­se­ia

quase automaticamente na mudança ou desaparecimento desses comportamentos 19 .

A discussão teórica e a avaliação empírica destas concepções levará, necessariamente, à

percepção do grau de autonomia que o fenómeno possui um face a essas dimensões e

até que ponto implica programas próprios para a sua redução.

Do trabalho desenvolvido ressaltam algumas conclusões:

Em primeiro lugar diz respeito à amplitude da disseminação das situações violentas.

Com efeito, através das entrevistas realizadas percebemos que a violência é recorrente,

quotidiana e atinge toda a população escolar. São situações de conflitualidade que

poderemos designar globalmente como de reduzida gravidade e de um modo geral de

baixa intensidade Os “empurrões”, “pontapés”, “tostas” e pequenos roubos são

considerados habituais, o que leva a que se verifique uma certa naturalização das

situações de violência. Estas não são geralmente objecto de grande preocupação e não

19 Concepções semelhantes podem ser encontradas nos discursos relativos à evolução da delinquência infanto­juvenil, analisados em Sebastião, João (2000) “A infância em Portugal: alguns equívocos e interrogações” in Forum Sociológico nº3/4, Lisboa, IEDS/UNL.

Page 90: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

90

lhes é atribuída grande relevância nem qualquer programa particular por parte da escola.

Apenas em situações de maior gravidade é convocado um conselho disciplinar. Esta

circunstância poderá dever­se ao facto de a instituição considerar que estas situações

não põem em causa nem os seus objectivos nem as hierarquias nela existentes.

Em segundo lugar parece­nos que o espaço pequeno e degradado do edifício da escola é

um elemento facilitador do aparecimento destas situações de conflitualidade. Os

constrangimentos físicos são evidentes quando entramos na escola e percebemos o

estado de degradação do edifício antigo, as más condições de acesso pelas estreitas

escadas e corredores sem as devidas protecções e o reduzido espaço do pátio, local de

recreio dos alunos. É notória ainda a deterioração das salas de aula e da sala de

convívio, bem como a inexistência de saídas de emergência, condição essencial de

segurança.

Em terceiro lugar será importante questionar algumas concepções correntes entre a

comunidade escolar. As explicações avançadas pelos três grupos de entrevistados para a

ocorrência de situações de indisciplina grave e violência são sobretudo relacionadas

com o ambiente e educação familiar dos alunos. Este facto, em particular entre os

alunos, parece constituir a incorporação do discurso de professores e funcionários sobre

as famílias (ou pelo menos sobre uma parte delas). Contudo, verificamos através das

entrevistas aos alunos que os pais não recorrem correntemente ao uso das punições

físicas, e que, em caso de conflito, optam por aplicar­lhes castigos que se prendem

com a proibição de realizar as actividades de tempos livres mais apreciadas pelos

jovens. Assim sendo, parece­nos que outras razões explicativas para a ocorrência de

situações de indisciplina e violência a que é conferido menor destaque nos três grupos

de actores entrevistados, como a relação desses alunos com a escolaridade; as relações

interpessoais com os professores e colegas; outras causas ligadas à própria

personalidade dos alunos deveriam ser objecto de uma maior atenção e reflexão por

parte da escola.

Page 91: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

91

Em quarto lugar, seria importante ter em atenção a sobre­representação de situações

violentas no 2º ciclo, a qual origina a necessidade de a escola (re)pensar a recepção e

acompanhamento dos alunos na transição do 1º para o 2º ciclo do ensino básico 20 .

Em quinto lugar, as entrevistas realizadas tornaram notório que alunos, professores e

pessoal auxiliar sabem que existe um regulamento interno da escola e qual a sua

finalidade. Porém, a inexistência de um consenso sobre este regulamento e de um

critério comum quanto às normas de comportamento, faz com que os vários

professores tenham regras próprias e interpretações pessoais do regulamento da

escola. Tal facto traduz­se na dissolução da norma, na necessidade de os alunos criarem

uma lista das exigências particulares de cada docente, na indefinição que leva à perca de

relevância dos quadros normativos na gestão das relações entre os diferentes membros

da comunidade escolar.

Em sexto lugar, devido ao reduzido número de entrevistas realizadas não é possível

estabelecer associações entre os percursos escolares e comportamentos violentos,

contudo nos casos analisados era visível que os agressores tinham percursos mais

complicados (dois deles tinham reprovado três e quatro vezes, respectivamente), as

suas expectativas quanto ao prosseguimento da escolaridade eram aparentemente

menores e as conversas com os pais menos explícitas que entre os agredidos e os não­

participantes em situações de violência.

Em sétimo e último lugar, com a realização do projecto, fica­nos a convicção da

necessidade de aprofundar a análise destes fenómenos de violência e indisciplina,

alargando a análise a um número significativo de casos. Torna­se claro que a violência

não constitui uma situação esporádica, antes é recorrente e necessita medidas

específicas. Por outro lado as limitações desta pesquisa impediram que fossem

abordados em conjunto com os diferentes agentes educativos existentes na comunidade

(associações de pais, autarquias, associações comunitárias dos mais variados tipos,

polícia, etc..) as medidas que, dentro dos seus âmbitos particulares de actuação,

poderiam ser realizadas em articulação. Estas constituem linhas de investigação e

20 Já em outros momentos este aspecto foi alvo de análise e realçada a sua importância. Ver a propósito Benavente, Ana, Campiche, Jean, Seabra, Teresa e Sebastião, João (1994), Renunciar à Escola ­ o abandono escolar no Ensino Básico, Fim de Século, Lisboa.

Page 92: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

92

intervenção que pensamos constituirão no futuro aspecto incontornáveis da vida das

escolas e comunidades respectivas.

Page 93: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

93

5. Conclusão

A gradual visibilidade sobre as situações de violência na escola adquiriu

progressivamente na última década uma importância social crescente, traduzida na

ocorrência de alguns debates públicos sobre o tema e em numerosas referências nos

meios de comunicação social. O trabalho de que se dá conta nesta publicação, resultante

de uma linha de investigação desenvolvida pelo Centro de Investigação e Estudos de

Sociologia, permitiu o confronto com algumas das pré­noções socialmente

disseminadas sobre os fenómenos de violência na escola, contribuindo esse esforço, a

nosso ver, para uma visão mais aproximada da real situação existente. Neste desejo de

objectivação pudemos ainda verificar dois obstáculos de monta a esse objectivo: em

primeiro lugar a dificuldade para a agenda da investigação incorporar a problemática;

em segundo, a quase inexistência de informação extensiva 21 , facto ainda mais agravado

pela fraca qualidade da disponível a nível nacional.

O percurso de investigação realizado levou­nos, num primeiro momento, a analisar a

investigação realizada no campo da educação em Portugal (parte 2); depois a questionar

as políticas públicas (parte 3), e, finalmente, à realização de um estudo de caso numa

escola do centro de Lisboa (parte 4). Como afirma Marie Duru­Bellat (2000: 26) “se

admitirmos que a especificidade da aproximação científica se situa na tomada em conta

de dados empíricos permitindo controlar a prazo as construções teóricas, logo a questão

da validação/refutação externa das construções teóricas é central. Procurámos, por isso,

com este percurso, confrontar os desenvolvimentos teórico­conceptuais e a investigação

empírica realizada em Portugal, tentando ressaltar o que, em nosso entender, poderiam

ser consideradas as suas virtualidades e insuficiências.

A investigação sobre violência em Portugal

Relativamente ao campo da investigação em torno da violência na escola pudemos

constatar que este se caracteriza pela oscilação entre dois pólos opostos. Num dos

extremos regista­se alguma tendência para o isolacionismo teórico, evidenciado pela

utilização de um número limitado e fechado de referências conceptuais. Por vezes esta

tendência traduz­se na reprodução, para a realidade nacional, de conceptualizações

21 Facto que em termos educativos não se reduz apenas a este aspecto, mas que se estende a quase toda a informação básica sobre o sistema educativo

Page 94: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

94

produzidas por autores estrangeiros com a tentação da sua utilização em quase regime

de exclusividade.

No outro extremo constata­se a utilização indiferenciada e não justificada de conceitos

provenientes de quadros teóricos pouco relacionáveis 22 . Consideramos que a

diversidade teórica e metodológica em torno da violência em meio escolar pode resultar

num profícuo e estimulante espaço de pluralidade e discussão científicas, e pode mesmo

ser considerada como desejável no sentido em que pode resultar uma visão mais

completa do fenómeno violência na escola, bem como tem um potencial efeito de

confronto entre resultados, de todo desejável. A constatação, por diversas pesquisas, da

multidimensionalidade do fenómeno aconselha abordagens sensíveis a diferentes

posturas teóricas e metodológicas, possibilitando, assim, em nosso entender, o cruzar de

olhares que permitem analisar as diferentes configurações que este assume. Contudo,

no caso português, a prática dominante no campo da investigação em educação no

sentido de evitar o confronto e o questionamento dos resultados de pesquisas, leva a que

os diferentes autores raramente refiram os resultados de outras pesquisas, anulando,

assim, o que de positivo se poderia encontrar na diversidade de abordagens.

A superação desta polarização até agora característica deste campo de investigação em

Portugal é, em nosso entender, decisiva para a construção de indicadores estáveis

necessários ao desenvolvimento de análises longitudinais e comparativas do fenómeno

em estudo, a qual é uma lacuna central da pesquisa que tem sido desenvolvida sobre o

tema no nosso país.

Noções equívocas sobre a ocorrência de situações de violência

A pesquisa realizada permitiu ainda questionar algumas noções habitualmente

associadas a este fenómeno:

Em primeiro lugar, embora o fenómeno da violência na escola seja objecto de discursos

alarmistas nos meios de comunicação e na comunidade educativa que lhe atribuem uma

expressividade crescente e assustadora, os dados de que dispomos não permitem

suportar estes discursos. Na verdade, não encontramos dados nem indícios de que as

situações de violência em meio escolar tenham assumido nos últimos anos uma

22 Esta situação de imprecisão teórica surgiu de forma exemplar num número significativo de comunicações apresentadas ao XI colóquio da AFIRSE “Violência e indisciplina na Escola” realizado em Lisboa em Novembro de 2001.

Page 95: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

95

dimensão que possa ser considerada como correndo o risco de se encontrar fora de

controlo 23 . Os dados oficiais, apesar das suas deficiências, dão conta de um número

reduzido de situações violentas nas escolas do país. No mesmo sentido, o estudo de caso

realizado revelou que as situações de violência grave são raras, embora revelando a

existência de situações que poderíamos designar globalmente como violência de

reduzida gravidade e de baixa intensidade. Este tipo de violência é recorrente e

quotidiana, atingindo toda a população escolar. É contudo interessante constatar que não

lhe é atribuída grande importância pela própria escola, verificando­se uma certa

“naturalização” das situações de violência pelos diferentes actores presentes no espaço

educativo. Aqui sim, impõe­se a tomada de medidas orientadas para a sua resolução, já

que esta se traduz para uma parte dos alunos na diminuição efectiva dos seus direitos de

acesso à educação.

Em segundo lugar, os dados de que dispomos não nos permitem associar, de forma clara

e inequívoca, a ocorrência de situações de violência na escola a indivíduos com

percursos escolares marcados pelo insucesso escolar. Isto, embora no estudo de caso

surjam indícios de que os agressores entrevistados era protagonistas de percursos

escolares com algumas reprovações e portadores de projectos de futuro em que a escola

não tem um papel central. O estudo de caso indica, para além disso, que outras variáveis

como o género 24 , a idade e o nível de escolaridade 25 , poderão estar associados à maior

ou menor ocorrência de situações de violência.

Em terceiro lugar, existe alguma contaminação da investigação por noções ideológicas e

de senso comum, respeitantes nomeadamente à origem da violência. É comum a

aceitação, sem questionamento, da ideia segundo a qual a violência na escola é um

fenómeno recente e desviante, cuja origem se encontra mais ou menos directamente nos

contextos sociais em que as escolas se integram, designadamente contextos socialmente

desvalorizados e excluídos. A violência decorre, deste ponto de vista, de causas

“sociais” exteriores à escola, normalmente de condições materiais de vida deficientes da

socialização familiar resultante dos modelos culturais dessas famílias, ou, então, a

características individuais, definidas como “natureza selvagem” de algumas crianças.

23 Facto que confirma tendências igualmente sublinhadas por diversas pesquisas a nível europeu. 24 Tanto entre os agresssores como entre as vítimas de situações violentas encontramos um número de rapazes superior ao de raparigas. 25 Verifica­se um maior número de situações violentas no 2º ciclo, o que poderá estar relacionado com a mudança em termos de regime e quotidiano escolar dos alunos.

Page 96: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

96

Tais concepções, que fundamentam a existência de medidas políticas como o programa

Escola Segura obscurecem a investigação e bloqueiam a intervenção, resultando delas,

frequentemente, a ideia de que a escola não é capaz de alterar o rumo das coisas. O

estudo de caso mostrou claramente que as situações de violência não existem apenas

nestes contextos. Ao contrário caracterizam­se pela sua transversalidade a diversos

contextos sociais, em resultado, não apenas, de conflitos interpessoais, mais ou menos

pontuais, mas também, de causas relacionadas com a qualidade dos espaços escolares e

com os modelos organizacionais e pedagógicos seguidos pela escola.

Não ter em consideração estes aspectos, sobrevalorizando ou tomando apenas em conta

o que resulta de alguns particularismos próprios de certas camadas sociais, obscurece as

diversas experiências positivas e programas de carácter não policial que se têm

desenvolvido a nível nacional e internacional, os quais constituem, sem dúvida, uma

alternativa eficaz na prevenção do desenvolvimento de comportamentos violentos nas

escolas.

De salientar, também, a transversalidade que a violência possui nos discursos dos

diferentes actores presentes no espaço educativo. Todos se referem a acontecimentos

que podemos classificar como violência (agressões físicas voluntárias, ou não, roubos,

agressão psicológica, etc). Contudo, raramente assume para os intervenientes contornos

de algo intolerável, antes, sendo alvo de um processo de naturalização, quer na sua

dimensão quer nas suas consequências (facto que tem que ser matizado, já que os alunos

vítimas de agressão encaram o assunto de forma um pouco diferente).

Deste conjunto de aspectos resultam hipóteses interrelacionadas que necessitam, no

nosso entender, de ser exploradas em futuros estudos de forma a esclarecer a relação e

peso relativo das diferentes variáveis. A este propósito, é de salientar que a

complementaridade de estudos extensivos e intensivos permitiria uma compreensão

mais apurada da forma como se entrecruzam, nas situações de violência na escola, a

actuação de elementos estruturais, respeitantes aos quadros de vida dos indivíduos e à

actividade socializadora da instituição escola, com a acção de quadros culturais e

interaccionais particulares.

Políticas e estratégias de combate à violência

Na dimensão de análise respeitante aos programas e iniciativas oficiais que procuram

intervir sobre a violência em meio escolar, concluímos que as mesmas estão centradas

Page 97: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

97

em duas linhas de intervenção (de carácter pedagógico e policial), verificando­se que as

diferentes medidas são geralmente pouco ou nada coordenadas e apresentam um

elevado potencial de desperdício de recursos. Em particular importa chamar a atenção

para o progressivo desenvolvimento do Programa Escola Segura pelo relativo relevo em

termos de políticas públicas que lhe é atribuído, em particular nos recursos

disponibilizados. Representando o essencial do esforço de intervenção por parte do

Estado nesta área e mobilizando um número significativo de recursos materiais e

humanos, do seu desenvolvimento têm resultado tendências contraditórias. Contudo

esse relevo não é acompanhado de uma estrutura organizativa que corresponda a esse

esforço, continuando o Gabinete de Segurança do Ministério da Educação reduzido a

uma estrutura artesanal.

Um aspecto mais importante tem ainda marcado negativamente o seu desenvolvimento.

A preponderância da Administração Interna no protocolo estabelecido com a Educação

tem imposto uma perspectiva marcadamente policial que, no nosso entender, não se

adapta ao tipo de instituições em que desenvolve a sua actividade nem às situações

ocorridas. A ideia de que as situações violentas resultam da actividade de grupos

marginais exteriores à escola é profundamente desadaptada e raramente fundamentada.

Este tipo de medidas políticas resulta em boa parte da ignorância da realidade educativa

demonstrada por uma parte significativa da classe política, que, sempre que confrontada

com a questão, resvala para o discurso da extensão da presença policial. O discurso

conservador e autoritário da “segurança” parece manter as diversas forças políticas

“atadas” à “inevitabilidade” da necessidade do seu crescimento, mesmo aquelas que

preconizam visões alternativas do desenvolvimento do sistema educativo. Trata­se da

aprendizagem, nos espaços escolares, da cidadania policiada. A preponderância deste tipo de concepções parece aliás reforçar as tendências de

fechamento dos espaços escolares à comunidade, solução essa vista por muitos como

garantia da sobrevivência face a uma iminente ameaça de dissolução das regras do seu

funcionamento. Assim, a solução tem sido a escola defender­se da comunidade com

gradeamentos, guardas e cartões de identificação. Ensina­se, assim, aos alunos os

princípios da cidadania desconfiada 26 .

26 A este respeito é de realçar o programa Abrir a escola ao fim de semana, levado a cabo pela EB 2+3 de Armação de Pêra, em que esta se encontra aberta durante o fim de semana à utilização pela comunidade sem que nela se encontrem presentes quaisquer tipo de vigilantes, num exercício de educação e participação cívica a todos os títulos notável.

Page 98: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

98

Esta concepção traduz­se na dificuldade da instituição em aceitar a diversidade

sociocultural como um bem, já que parte do pressuposto de que esta dificulta os

processos de socialização de massas, posição que se mantém mesmo quando

formalmente as directivas políticas e os quadros normativos parecem promover o

respeito pela diversidade.

Alguma evolução legislativa foi entretanto efectuada, nomeadamente a tentativa de

coordenação entre iniciativas de ministérios diferentes 27 , contudo nunca implementado.

De salientar que mais uma vez se procurava uma solução longe das comunidades

educativas, sendo antes privilegiada a articulação de serviços centrais.

Daqui decorre a necessidade de sublinhar que, para além da importância de programas

de âmbito nacional como o Escola Segura que é objecto de análise neste trabalho, existe

um amplo espaço de intervenção possível a nível de cada escola nas suas dimensões

pedagógica e organizacional que, em nosso entender, podem permitir de forma eficaz o

combate à ocorrência de situações de violência. A coordenação da actividade

desenvolvida pelos programas de carácter nacional com a mobilização dos diferentes

agentes educativos existentes na comunidade, a implementação de programas de

educação cívica, a diversificação dos espaços educativos escolares e extra­escolares

constituem alternativas que necessitam de ser apoiadas para que possam construir os

seus próprios espaços de legitimidade. A afectação de recursos para os diferentes tipos

de iniciativas pressupõe igualmente a reorientação do Programa Escola Segura,

reduzindo a sua preponderância policial e fornecendo­lhe um carácter eminentemente

civil, aberto à participação das comunidades locais. Só assim se poderá promover a

cidadania democrática, de forma a que os diferentes participantes do processo educativo

se sintam responsabilizados e parte activa de processos educativos abertos e integrantes

do desenvolvimento das respectivas comunidades.

Pistas para o desenvolvimento da investigação

O que diferencia então um empurrão (mesmo que violento) durante uma brincadeira de

um empurrão intencional para agredir um colega? Como separar a agressividade

recorrente na infância e adolescência de situações reiteradas de agressividade e coacção

sobre determinados indivíduos ou grupos? A discussão (principalmente a nível

27 Decreto Lei nº 16/2001 ­ Combate à Insegurança e Violência em Meio Escolar

Page 99: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

99

internacional) surge eivada de considerações ideológicas e morais que contaminam o

debate, deslizando, frequentemente, da análise para a tentativa de produzir modelos de

intervenção, nos quais esses pressupostos assumem peso crescente. Apesar das

tentativas realizadas por alguns autores para definir o que designamos por violência na

escola, não nos parece de todo fácil encontrar uma norma universal para classificar os

comportamentos violentos, já que a classificação de determinados comportamentos

varia com os quadros culturais dos diferentes grupos assim como com os contextos e

momentos em que se produz. 28 A rejeição da centração exclusiva da pesquisa no ponto

de vista unilateral das vítimas, pela subjectividade que introduz na análise, deverá

constituir uma precaução prévia.

A este respeito, e utilizando em parte a proposta que Peter Aggleton realizou para

ultrapassar o fechamento dos debates realizados na sociologia sobre as concepções de

desvio (Aggleton, 1991), seria de interesse delinear um programa de pesquisa que

procure ultrapassar, para o caso português, as limitações anteriormente referidas, o qual

tomasse em conta:

os determinismos estruturais da violência na escola, entendidos de forma ampla,

nos quais incluiríamos, particularmente, os quadros de vida das crianças, os

modelos de socialização escolar e as condições de acesso à escolaridade;

o processo de reacção societal à violência, ressaltando aqui a forma como as

escolas e comunidades lidam com este tipo de situações;

a psicologia social do envolvimento na violência, que nos possibilite compreender

que processos levam a que algumas crianças se transformem em agressores ou em

vítimas.

28 Sobre os quadros culturais dos diferentes grupos, veja­se, por exemplo, os frequentes conflitos das crianças ciganas com os modelos comportamentais que a escola se esforça por impor.

Page 100: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

100

6. Bibliografia

Afonso, A (1991) “As relações de poder no quotidiano da escola e da sala de aula:

elementos para uma análise sociológica e organizacional” in Caderno Ciências Sociais, nº 10­11, pp 133­154

Almeida, A T (1995) “O que sabemos da violência na escola e como podemos intervir”

in Seminário Nacional Contra a Violência, CEFOPE, Universidade do Minho

(policopiado)

Almeida, A T (1999) “Portugal”, in Smith, P e outros, The nature of school bullying – a

cross­national perspective, London: Routledge, pp 174­186

Amado, J. S. (1998) “Pedagogia e actuação disciplinar na aula” in Revista Portuguesa de Educação, vol. 11, nº 2, pp 35­56

Ballion, R. (1997) “Les difficultés de lycées vues à travers les transgressions” in

Charlot, B. e Émin, J­C (org) Violences à l’école – état des savoirs, ed. Armand Colin, Paris.

Barroso, J. (1995) “Organização pedagógica e disciplina escolar – uma abordagem

histórica” in Colóquio, educação e sociedade, Fundação Calouste Gulbenkian, nº 10, pp 75­98

Benavente, A., Campiche, J., Seabra, T., Sebastião, J. (1994). Renunciar à escola ­ o abandono escolar no ensino básico. Lisboa, Fim de Século.

Bourdieu, P. (1972) Esquisse d’une théorie de la pratique, Genéve, Lib. Droz.

Bourdieu, P. (s.d.). O poder simbólico. Lisboa: Difel.

Brederote Santos, M.E. (1979) “O desejo dos alunos” Raiz e Utopia, 9/10, 3­36.

Page 101: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

101

Candeias, A. M.A. (1997). Atitudes face à escola: um estudo exploratório com alunos

do 3º ciclo do ensino básico. Évora: Universidade de Évora. Tese de Mestrado.

Carita, A , Fernandes, G (1997) Indisciplina na sala de aula. Como prevenir? Como remediar?, Lisboa: Editorial Presença

Carvalho, A. M.R. (1995) “Violência: a família ausente, o jogo esquecido”, O Professor nº 47 (3ª série).

Charlot, B. e Émin, J­C (org) (1997) Violences à l’école – état des savoirs, ed. Armand Colin, Paris.

Costa, E. e Vale, D. (1994) “A violência nos jovens contextualizada na escola” in Dinis,

Luís L. (1989, Novembro). Imagem do Professor (I) ­ resultados de um inquérito aos alunos. O Professor, 125, 13­34.

Costa, Mª E. e Vale, D. (1998) A Violência nas Escolas, Lisboa, IIE.

Curto, P M (1998) A escola e a indisciplina, Porto: Porto Editora

Debarbieux, È., Dupuch, A. e Montoya, Y.(1997), “Pour en finir avec le «handicap

socio­violent»: une approche comparative de la violence en milieu scolaire” in Charlot,

B. e Émin, J­C (org) Violences à l’école – état des savoirs, ed. Armand Colin, Paris

Dinis, L. (1989, Dezembro). “Imagem do Professor “ O Professor, 126, 38­58.

Domingues, I., (1995) Controlo disciplinar na escola – processos e práticas, Porto: Texto Editora

Dubet, F. (1987) La galére: jeunes en survie, Fayard, Paris.

Dubet, F., e Martucelli, D. (1996) À L’ École. Sociologie de l’experience scolaire, Editions du Seuil, Paris.

Page 102: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

102

Estrela, A (1984). Teoria e Prática de Observação de Classes. Uma estratégia de

formação de professores. Lisboa: Instituto Nacional de Investigação Científica.

Estrela, M T (1992) Relação pedagógica, disciplina e indisciplina na aula, Porto: Porto Editora

Formosinho, J. (1980) “As bases do poder do professor” in Separata Revista Portuguesa

de Pedagogia, Universidade Coimbra, pp 301­328

Freire, Isabel (1995) “Perspectivas dos alunos acerca das relações de poder na sala de

aula: um estudo transversal” in Estrela, A. , Barroso, J. E Ferreira, J. A Escola, um objecto de estudo, Lisboa, AFIRSE/FPCEL.

Giddens, A (1987) La Constitution de la societé, Paris, PUF.

Girard, R. (s.d.). Le bouc émissaire , Paris, Grasset.

Goffman, E. (1988). Estigma. Rio de Janeiro: Editora Guanabara.

Grignon, C.; Passeron, J. C. (s.d.). Lo culto y lo popular. Madrid: La Piqueta.

Leal, J. A. (1994) A atitude dos alunos face à escola, à Educação Física e aos comportamentos de ensino do professor. Lisboa: Universidade Técnica de Lisboa ­ F.M.H.. Tese de Mestrado.

Lobo, A S. (1998). AAA (Aprendizagem Assistida pela Avaliação), Um Sorriso Difícil

para o Novo Modelo de Avaliação. Porto: Porto Editora.

Lobo, A S. e Gomes, C. A. (1997). Se os alunos mandassem.... Educação, Sociedade & Culturas, 7, 157­186.

Lopes, J (1998) “Indisciplina, problemas de comportamento e problemas de

aprendizagem no ensino básico”, in Revista Portuguesa de Educação, vol. 11, nº 2, pp 57­82

Page 103: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

103

Marques, A R, Neto, C. (2000) “Características do recreio escolar e os comportamentos

agressivos das crianças” in Congresso Internacional Os Mundos Sociais e Culturais da Infância, Braga: Instituto Estudos da Criança, Universidade do Minho

Martins, Mª J. (1999) “Delinquência juvenil, ‘tribos urbanas’ e violência escolar”, Aprender nº23.

Matos, F. S. (1992). “O perfil do professor nas composições dos alunos” Ler Educação,

7, 45­52.

Mendes (1998) “A gestão do tempo e os comportamentos de indisciplina dos alunos” in Revista Portuguesa de Educação, vol. 11, nº 2, pp 109­122

Monteiro, V. (1993). “A imagem do professor na escola primária: imagem dada pelos

alunos, imagem social” in Análise Psicológica, XI (3). 343­349.

Pereira, B, Neto, C., Smith, P., (1997) “Os espaços de recreio e a prevenção do bullying na escola” in Neto, C., (coord.) Jogo e Desenvolvimento da Criança, Lisboa, Faculdade de Motricidade Humana, pp 238­ 257

Pereira, B, O, Neto, C. (1994) “O tempo livre na infância e as práticas lúdicas realizadas

e preferidas”, in Ludens, vol. 14, nº 1, Jan­Mar., pp 35­41

Pereira, B., Neto, C. (1999) “As crianças, o lazer e os tempos livres” in Pinto, M.,

Sarmento, M. J,. (coord.) Saberes sobre as crianças: para uma bibliografia sobre a

infância e as crianças em Portugal (1974­1998), Braga: Centro de Estudos da Criança da Universidade do Minho, pp 85­107

Pereira, B.O, Almeida, A T, Valente, L., Mendonça, D. (1996) “O bullying nas escolas

portuguesas: análise de variáveis fundamentais para a identificação do problema”, in

Almeida, S, Araújo (org.) Actas II Congresso Galaico­Português de Psicopedagogia, Universidade Braga, pp 71­81

Page 104: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

104

Pires, M F A (2000) “Práticas de agressividade/violência/vitimação no espaço escolar”

in Congresso Internacional Os Mundos Sociais e Culturais da Infância, Braga: Instituto Estudos da Criança, Universidade do Minho

Rebelo, J. 1995, “Violência e Media” in Noesis, Out./Dez. 1995

Rego, I, E, Caldeira, S, N (1998) “Perspectivas dos professores sobre indisciplina na

sala de aula, in Revista Portuguesa de Educação, vol. 11, nº 2, pp 83­108

Ribeiro, J. L., Campos, B.P. (1987) “Características dos professores e percepção da sua

competência social pelos alunos” in Cadernos de Consulta Psicológica, 3, 45­53.

Sampaio, D. (1995) “Stress e violência nos jovens: perspectivas preventivas na família e

na escola”, Simpósio Internacional Stress e Violência na Criança e no Jovem, Lisboa.

Sampaio, D. (coord.) (1996). Escola, Família e Amigos. Lisboa: Ministério da Educação

­ PES (não publicado).

Sampaio, D (1997) Indisciplina: um signo geracional?, Cadernos de Organização e Gestão Escolar, Lisboa: IIE

Sani, A I (2000) “Os significados de experiência de vitimação: discurso das crianças

face ao crime” in Congresso Internacional Os Mundos Sociais e Culturais da Infância, Braga: Instituto Estudos da Criança, Universidade do Minho

Santiago, R. (1987). Representações sociais da escola nos alunos em situação de insucesso escolar no ensino preparatório. Aveiro: Universidade de Aveiro. Tese de Mestrado.

Santiago, R. (1996). A escola representada pelos alunos, pais e professores. Aveiro: Universidade de Aveiro.

Page 105: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

105

Schmid, W. (1994). “De l éthique comme esthétique de l existence”, Magazine

Littéraire, 36­39.

Seabra, T., Sebastião, J., Teixeira, L. (1998) Dinâmicas de mudança numa escola secundária, Lisboa, Ministério da Educação.

Sebastião, J. (1995) “Modos de vida marginais: o caso das crianças de rua na cidade de

Lisboa”, in Infância e Juventude, 95­2, Lisboa: DGST/ME

Sebastião, J. (1998) Crianças da Rua – Modos de vida marginais na cidade de Lisboa, Oeiras: Celta

Sebastião, J., Seabra, T., Alves, M.G., Tavares, D., Martins, J. M., Portas, M.J. (1999)

“A produção da violência na escola” Revista da ESES, Santarém,.

Sebastião, J. (2000) “A infância em Portugal: alguns equívocos e interrogações” in Forum Sociológico, nº 3­4, Lisboa:IEDS/UNL

Serrano, J. e outros (1991) “La representación de la escuela y el trabajo en los jóvenes

de classe obrera” in Sanchéz, J. (org) La Sociologia de la Educación en España­actas de la I Conferência de Sociologia de la Educación, Jesús Martin e Escalona Ed., Madrid

Silva, F. (1995) “Violência – a escola e o seu papel” in Colóquio, educação e sociedade, Fundação Calouste Gulbenkian, nº 10, pp 13­31

Silva, R, E, (1992) Os Meninos da Rua na Cidade de Lisboa. Um Fenómeno Específico

de Exclusão Social, Lisboa: ISCTE (policopiado)

Veiga, F. (1988) “Disciplina Materna, Autoconceito e Rendimento Escolar” in Cadernos de Consulta Psicológica, 47 ­ 56.

Veiga, F. H. (1999) Indisciplina e Violência na Escola. Práticas comunicacionais para professores e pais, Coimbra, Almedina.

Page 106: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

106

Ventura de Pinho, L. (1988). Empatia do professor e mobilização do aluno: estudo

experimental a partir da indução de representações prévias. Aveiro: Universidade de Aveiro. Tese de Doutoramento.

Ventura de Pinho, L. (1997). Afectividade e cognição: as representações sociais e o

envolvimento socioafectivo dos professores e dos alunos na escola. Psicopedagogia, Educação e Cultura, I, 1, 77­85.

Watzlawick, P. et al. (s.d.). Pragmática da comunicação. S. Paulo: Editora Cultrix.

Willis, P. (1988) Aprendiendo a trabajar, Akal, Madrid.

Page 107: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

107

7. Anexos

Anexo A ­ Metodologia do Estudo de Caso

Tendo em conta o reduzido número de pesquisas disponíveis sobre o caso português e

os fracos recursos disponíveis, optámos por realizar um estudo de caso com carácter

exploratório, privilegiando a análise mais intensiva, de forma a possibilitar o

desenvolvimento de perspectivas analíticas inovadoras na abordagem das diferentes

dimensões do fenómeno de violência na escola.

A estratégia metodológica seguida apoiou­se na articulação de diferentes técnicas de

forma a maximizar os reduzidos recursos disponíveis. Assim foram utilizadas:

­ entrevistas semi­estruturadas, a alunos (agressores e agredidos), docentes e

funcionários;

­ conversas informais com os vários elementos da escola, inclusive o conselho

executivo que forneceu os dados e o material de suporte à investigação;

­ análise documental, tendo sido analisados o projecto educativo; os processos

disciplinares do qual constavam as participações feitas por vários

intervenientes da escola dos alunos; os processos individuais e os

regulamentos internos da escola.

Foram realizadas 21 entrevistas, sendo 11 a alunos, 6 a professores e 3 a pessoal

auxiliar de acção educativa. A escolha destes três grupos de entrevistados explica­se

pelo facto de interagirem quotidianamente no espaço da escola, por terem participado

directamente nas situações de violência, por serem informantes privilegiados

relativamente à realidade da escola.

As entrevistas foram realizadas segundo os seguintes critérios:

­ Docente membro do Conselho Executivo da escola. Informante privilegiado pelo

profundo conhecimento que resulta de uma ligação com mais de vinte anos a esta

escola, exercendo funções no Conselho Executivo.

­ Professores que leccionam a diferentes anos de escolaridade ( 3 entrevistas).

Page 108: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

108

­ Directores de turma, por contactarem mais com os alunos, os pais e professores e

terem acesso a mais elementos sobre estes ( 3 entrevistas).

­ Alunos de vários anos de escolaridade, segundo os quais diferenciámos, os agressores

(3 entrevistas), vítimas (4 entrevistas) e 4 alunos não participantes em situações de

violência. A escolha foi feita com base na consulta prévia dos processos disciplinares,

assim como das fichas de aluno dos directores de turma.

­ Pessoal auxiliar, porque contactam diariamente com os alunos, tendo 2 deles sido

vítimas de actos violentos fornecendo pistas e dados interessantes para a pesquisa.

Na medida do possível entrevistámos os alunos agressores e aqueles que foram suas

vítimas, procurando desta forma ter acesso aos dois lados dos incidentes.

Neste estudo não foi possível falar com as famílias dos alunos entrevistados, dado os

recursos disponíveis (materiais, temporais e humanos). No entanto, tal seria importante

pois através dessa informação poderíamos compreender melhor a relação da família

com a escola e as suas representações sobre os actos violentos e os modos que estas

consideram aceitáveis na solução de conflitos.

Caracterização da amostra

Os alunos Realizámos 11 entrevistas a alunos com idades compreendidas entre os 10 e os 14 anos

de idade, sendo 8 deles do sexo masculino. A maioria destes jovens vivem em bairros

populares de Lisboa, como o Bairro Alto (4), Bica (2), e outras freguesias próximas,

como por exemplo São Bento e Campo de Santana.

Quanto ao percurso escolar, salienta­se que dos 11 entrevistados, quatro alunos

reprovaram, três deles mais de uma vez.

A inserção socioprofissional das famílias destes jovens entrevistados distribui­se pelo

pessoal de serviços e vendedores (7), dos trabalhadores não qualificados (4) e do

pessoal administrativo e similares (3). Os restantes distribuem­se por outros grupos

socioprofissionais como por exemplo artífices e trabalhadores similares (2), quadros

superiores da administração pública e operários (1),.

Page 109: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

109

Quadro nº 27 ­ Grupos socioprofissionais dos pais dos alunos entrevistados

Entrevistados Ent. 1 Ent. 2 Ent. 3 Ent. 4 Ent. 5 Ent. 6 Ent. 7 Ent. 8 Ent. 9 Ent. 10 Ent. 11

P M P M P M P M P M P M P M P M P M P M P M

1.Quadros superiores da administração pública, dirigentes e quadros

1

2.Espcialistas das profissões intelectuais e científicas 3. Técnicos e profissionais de nível intermédio 4. Pessoal administrativo e similares

1 1 1

5. Pessoal dos serviços e vendedores

1 1 1 1 1 1 1

6. Agricultores e trabalhadores qualificados da agricultura

1

7. Operários, artífices e trabalhadores similares

1

8. Operadores de instalações e máquinas e trabalhadores de montagem 9. Trabalhadores não qualificados

1 1 1 1

Relativamente às qualificações escolares dos pais dos alunos, o nível de escolaridade

mais elevado é o 12º ano, com apenas 1 caso, situando­se os restantes entre a 2º classe e

o 9º ano de escolaridade.

No entanto um dado significativo a assinalar é o facto de alguns destes jovens não

saberem o nível de instrução e a profissão dos seus pais, circunstância que se prende

com o facto de não terem contacto com estes ou por terem falecido. Esta ausência de

respostas verifica­se nas crianças que pertencem a famílias monoparentais femininas e

naquelas que vivem com outros elementos da família, como por exemplo, tios, avós,

etc.

Os professores Em relação aos 6 professores entrevistados, a idade varia entre os 27 e os 52 anos.

Realizámos 3 entrevistas a professoras do 2º e 3º ciclo e 3 entrevistas a directoras de

turma, o único professor entrevistado é membro do Conselho Executivo da escola. Do

conjunto dos professores entrevistados (7), a maioria pertence ao quadro de nomeação

definitiva desta escola (4), uma outra ao quadro de zona pedagógica (1). Das

entrevistadas não pertencentes ao quadro (2), encontrando­se uma a leccionar por

miniconcurso (1) e outra professora destacada pertencente ao quadro de outra escola (1).

Dos entrevistados dois participam em órgãos de gestão da escola, um como membro do

Conselho Executivo e outra como membro da Assembleia de Escola.

Page 110: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

110

Relativamente aos anos de serviço na totalidade, verificamos que 3 têm mais do que 20

anos de serviço, enquanto que os outros 4 entrevistados têm entre 2 a 9 anos de serviço.

No entanto, os dados recolhidos em relação aos anos de serviço nesta escola em

particular indicam que apenas 2 entrevistados se encontram ao serviço desta escola há

mais de 18 anos e que os outros 5 entrevistados leccionam nesta escola há 5 ou mais

anos.

Para melhor caracterizar os professores entrevistados, recolhemos informação

relacionada com a formação que os mesmos têm para a docência e verificámos que a

maioria dos professores tem a profissionalização, apenas um professor tem só a

licenciatura sem habilitações pedagógicas.

Pessoal Auxiliar Para este estudo entrevistámos 3 auxiliares de acção educativa, 2 do sexo feminino e 1

do sexo masculino com 32 anos.

Uma das auxiliares entrevistada tem 13 anos de serviço, os outros têm menos de 3 anos

de serviço. Nenhum tem mais de 3 anos de serviço nesta escola. Tendo os mais novos o

12º ano escolaridade enquanto a auxiliar com mais tempo de serviço possui a 4º classe.

Page 111: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

111

Anexo B ­ Caracterização dos alunos objecto de processos disciplinares

Aluno Ano Idade Número de processos

Grau de parentesco do encar regado de educação.

Profissão do encar regado de educação

Bruno 6º 11 1 Mãe Ajudante de cabeleireira Marco 6º 14 1 Mãe Reformada

Luís 6º 10 3 Pai Empregada de balcão

Daniel 5º 10 1 Mãe Doméstica Paulo 6º 13 1 Pai Serralheiro

Hugo 6º 14 2 Pai Agente da PSP

Abdul 5º 10 2 Avó Reformada

Victor 5º 14 2 Pai Assessor de Presidente da Câmara

Eder 6º 11 2 Não familiar Nuno 7º 17 1 Pai Des

José 6º 15 1 Pai Manobrador de máquinas

Feliciana 8º 15 1 Freira do Instituto de internato de menores

Educadora religiosa

Ricardo 6º 14 1 Mãe Cozinheira

Ricardo 6º 13 1 Pai Desempregado

Page 112: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

112

Aluno Ano Idade Número de processos

Grau de parentesco do encarregado de

educação

Profissão do encarregado de educação

Luís 7º 11 1 Mãe Cozinheira

Mário 7º 12 1 Mãe Empregada de Balcão

Miguel 7º 11 1 Pai Vigilante

Soraia 7º 12 1 Mãe Auxiliar de Infantário

Luís 5º 13 1 Mãe Empregada de Limpe

Frederico 5º 10 1 Mãe Empregada Hospitalar

António 6º 13 1 Mãe Doméstica

Sadjo 5º 10 1 Pai Desempregado

Mónica 8º 14 1 Mãe Empregada de Escritório

Page 113: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

113

Anexo C – Tipo de ocorrências objecto de processos disciplinares

Tipo de ocorrência 5ª ano 6º ano 7º ano “...insultou o colega agredindo­o fisicamente...deslocando e arremessando pelo ar algumas cadeiras pela

sala com as quais pretendia atingir o colega”. (R.I.) x

“...envolve­se numa troca de insultos e agressões físicas com outro colega, demostrando dificuldade em

controlar a sua agressividade face a eventuais provocações. (R.I.) x

“...o aluno agrediu com um murro, partindo um dente, deixando­lhe um olho negro e o nariz inchado e

negro, rompeu a mala da aluna” (D.T.)

“...agredia verbalmente a prof. de Inglês., Matemática e Educação Musical e fisicamente a de Ciências da

Natureza. Empurrando­a quando esta tentava controlar uma situação de perturbação à entrada da sala de

aula”. (R.I.)

É agressivo verbalmente quando confrontado com eventuais contrariedades e repreensões, inclusivamente

ameaçou agredir fisicamente de matemática que é a sua Directora de Turma. Partiu um extintor da escola

propositadamente. Agrediu um colega, provocando­lhe um traumatismo craniano ao ser responsável pela sua

queda nas escadas. ( R.I.)

x

“...desobedeceu aos auxiliares que o acompanhavam ao G.A.F., tendo fugido e chegado mesmo a agredir

com pontapés um auxiliar, com a agravante de ter seguido a referida auxiliar, insultando­a e agredindo

novamente com um pontapé”. (R.I) x

“É insolente e provocador com professores e auxiliares, utilizando muitas vezes, uma linguagem verbal pouco adequada. Muitas vezes está na escola, mas falta às aulas curriculares”. (R.I)

x “...falta de respeito pelos colegas de turma e da escola, ou agredindo­os verbalmente e fisicamente. É ainda

um aluno pouco pontual, o que agrava o seu comportamento desestabilizador”. (R.I)

“O aluno não cumpriu as normas, manifesta total desrespeito para com os professores, colegas, funcionários

revelando um comportamento agressivo, perturbador do regular funcionamento das actividades escolares”.

(R.I)

x

“O aluno perturbou a aula, agredindo uma colega e saindo da sala sem autorização.” entrou para as aulas gritando e recusando­se a trabalhar, foi agressivo com o professor e deu... pontapés nas

cadeiras nas aulas de Português”

“Agrediu a colega Maria na aula de História... voltou a agredir esta colega no bar quando esta se preparava

para adquirir a senha de almoço, deu­lhe pontapés e puxou­lhe os cabelos. Nesse dia voltou a agredir a

colega no bar . (R.I)

x

Page 114: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

114

Tipo de ocorrência 5ª ano 6º ano 7º ano “O aluno demonstrou também uma certa dificuldade em controlar a sua agressividade face a eventuais

contrariedades e repreensões. Conforme consta do auto do inquirido ele acaba por aceitar que deu o pontapé

na funcionária e que tal procedimento foi muito incorrecto”. (R.I) x

“... em situação de aula desobedeceu aos professores, comportou­se de modo a que as aulas não podiam

funcionar normalmente, com a sua presença gritando e usando linguagem imprópria”. (R.I) x

“o arguido, no pátio da escola encheu uma garrafa com urina e água. Deitando de seguida a garrafa com o

líquido para cima da colega”.

“o arguido nas escadas do refeitório da escola lançou uma pedra que atingiu na cabeça a aluna que teve de

ser transportada ao hospital” . (R.I)

x

“... o arguido provocou a vítima dando­lhe calduços e quando este reagiu empurrando­o, agrediu­a com

violência provocando­lhe um traumatismo na cabeça”.

“...empurrou a cabeça do aluno Marco contra a parede provocando­lhe também um traumatismo”. (R.I) x

“...atitude inadequada à hora de entrada na sala 9 tenho como consequência que um aluno se magoou”. “...atitude inconsciente quando provocada pela colega, lançou a mochila pela janela da referida sala”. (R.I)

“...apresenta um comportamento incorrecto, recusando­se a participar nos trabalhos proposto e por consequência desestabilizado a desenrolar da aula e da turma”. “estes serviam­se do caixote do lixo para transportar o aluno em questão e uma outra aluna enquanto os restantes empurravam o caixote de uma das portas do pátio até ao centro do mesmo”. (R.I)

x

“o aluno agrediu uma colega dando­lhe um pontapé e espetando­lhe um lápis na perna...este saltou a rede da

escola e saiu”.

“o aluno forçou a entrada na Ludoteca e tendo sido impedido foi mal educado com a funcionária, recusando­ se a descer e tendo danificado um pedaço da parede e do pavimento.”

x

“provocando e ofendendo verbalmente um colega de turma. Fora da sala de aula continuou a sua provocação

e atitude imprópria, como consta das participações.” (R.I) x

“...começou a provocar o colega Luís, tendo este respondido às provocações. No seguimento dos actos o

aluno Mário deu um estalo ao aluno Luís. As confrontações terminaram após repreensão por parte da

professora. Já no pátio, as confrontações foram reatadas, tendo o Mário e o Luís entrado em confrontação

física violenta. Segundo as testemunhas, os confrontos físicos no pátio foram iniciados pelo Mário, tendo o

Luis respondido às agressões. (R.I)

x

Page 115: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

115

Tipo de ocorrência 5ª ano 6º ano 7º ano “...proferindo palavrões em voz alta e quando advertido prosseguiu, acumulou 6 participações disciplinares

associadas a atitudes de incorrecção e insolência. Estas atitudes têm maior incidência na aula de

Inglês...considerada de um comportamento de carácter grave, em que o aluno, ao ter sido enviado ao GAF,

decidiu sair da escola sem autorização.” (R.I)

x

“A aluna recusou­se a seguir as orientações da prof. de Inglês na sala de aula...não zelou pela conservação e

asseio da escola, no pátio. No corredor, agrediu a Ana Filipa de forma violenta e gratuita. Adoptou atitudes

muito incorrectas na aula de Inglês. No mesmo dia adoptou um comportamento de risco, ao brincar no muro

do pátio for escola da protecção da rede.” (R.I)

x

“...o aluno esteve sentado em cima das casas de banho, cuspindo todos os colegas que por ali passavam.... o aluno teve uma ordem de saída da sala de aula, por estar a perturbar a aula, quando advertido pela prof. de matemática, replica agressivamente e quando esta lhe solicita a caderneta , ele atira­a para o chão, quando recebe ordem de saída , saí batendo com a porta.” (R.I)

x

“...provocou de uma maneira impressionante o colega Ricardo, chegando ao ponto do agredir (...) recusou­se a sentar no lugar, respondendo muito mal ao prof. , não acatou nada do que este lhe pedia( ...) numa aula o aluno passou o tempo todo a falar, a rir alto, a provocar os colegas e a fazer “palhaçadas”. (...) entra na sala de aula aos saltos, dá a volta à sala, recusa­se a sentar e vai conversando com os colegas. Dá arrotos propositadamente e responde com maus modos à prof..(...) Deu arrotos alto e quando o prof. o mandou ir para o GAF, provocou­a dizendo: “ Está armada em boa!” (R.I)

x

Atitude inadequada e fez gestos impróprios na sala de aula de Português (...) atitudes que prejudicam o

normal funcionamento da aula, recusando­se a cumprir a ordem da prof. em ir para o GAF. (...) destruiu por

completo um fio de electricidade que já estava um pouco solto na sala de Ed. Musical. (R.I) x

“Agressões físicas (pontapés, estalos, murros, socos, agressões com elástico) a oito colegas.” “Agressões verbais a dois professores e um auxiliar.” “Recusa de trabalhos na aula. Destruição de objectos pertencentes a colegas.” (R.I) x

“...o prof. de matemática, ao corrigir o teste da aluna, deparou­se com um texto redigido na folha de teste

que a aluna deveria utilizar para a resolução do mesmo.”(R.I)

Page 116: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

116

Anexo D ­ Guiões de entrevista

Guião de entrevista para alunos

1. Gostas de andar na escola?

2. O que é que gostas mais aqui na tua escola?

3. O que é que gostas menos aqui na tua escola?

4. Já alguma vez reprovaste?

5. Quantas vezes? Em que anos?

6. Até que ano pensas estudar?

7. Os teus pais gostariam que estudasses até que ano?

8. Quando vieste para esta escola, alguém te explicou como deverias comportar­te?

Quem disse (pais/professores)? O que disseram?

9. Sabes se existe algum regulamento interno na escola? Já o lês­te?

Já falaste dele com os professores?

Lembras­te de alguma coisa? De quê?

10. Existe alguma regra na escola com a qual tu não concordas? Qual? Porquê?

11. Há colegas teus que tu consideras indisciplinados?

O que fazem? Dá exemplos.

12. Porque achas que se comportam assim?

Page 117: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

117

13. E os teus professores pensam da mesma maneira? Também acham que eles são

indisciplinados?

Pensam todos assim ou só alguns?

O que fazem quando isso acontece?

14. Já alguma vez tiveste medo/receio de estar na tua escola? Porquê?

15. Achas que a tua escola é segura? Porquê?

16. Costuma haver assaltos e/ou pancada entre alunos?

Já foste assaltado? Já te bateram?

Porquê? Por quem?

17. Há colegas teus que costumam bater nos outros? Porquê?

18. Há colegas teus que andam sempre a embirrar contigo ou com outros colegas?

Quem são? (mais velhos/ grupos/ outros)

19. Já viste os funcionários e os professores bater nalgum aluno? Porquê?

20. Quando fazes alguma coisa que os teus pais não gostam o que é que eles fazem

normalmente?

(pai/mãe)

(bater/ ralhar/ castigar – como?)

21. Quando os teus amigos se zangam como é que resolvem a situação?

(Bater/ discutir/ etc)

22. Quando acabas as aulas, fica ainda algum tempo na escola, vais logo para casa,

como é?

23. Como costumas ocupar habitualmente os teus tempos livres?

Page 118: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

118

Caracterização do aluno:

Idade

Género

Profissão de pai e mãe

Nível de instrução de pai e mãe

Dimensão do agregado familiar

Local de residência

Ano de escolaridade que frequentas

Page 119: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

119

Guião de entrevistas para professores

1. Há quanto tempo lecciona nesta escola?

2. Quais são os aspectos que considera mais positivos e mais negativos nesta escola?

(Espaço físico, equipamentos, ambiente entre alunos/ professores; escola/

comunidade/ pais)

3. Do seu conhecimento sobre o regulamento interno da escola, quais as regras que

considera mais importantes?

4. Acha que esses aspectos são os mais valorizados pelo resto da escola? Ou são

outros? Porquê?

5. Acha que todos os professores aplicam as normas do regulamento interno da mesma

forma? Quais as diferenças? Quem aplica como?

6. Existe alguma regra na escola com a qual não concorde? (Qual? Porquê?)

7. Gostaria de propor alguma regra que não esteja definida presentemente na escola?

8. Acha que os alunos também devem contribuir para a definição das regras da escola?

Porquê?

9. Parece­lhe que os alunos compreendem, partilham e aceitam as normas do

regulamento interno, ou pelo contrário encontra algumas resistências por parte dos

mesmos?

10. Na sua opinião, o que é um aluno indisciplinado? Dê exemplos.

11. Quando está em sala de aula como é que normalmente reage perante estas situações?

Page 120: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

120

12. Todos os professores agem da mesma maneira perante situações de indisciplina?

Quais as diferenças? Quem age como?

13. No seu entender, porque razão os alunos são dis/indisciplinados?

14. Acha que as alterações no processo de avaliação/ regime de progressão de alunos

tiveram consequências nos seus comportamentos na escola?

15. O aluno indisciplinado é diferente ou igual a um aluno violento? Porquê?

16. Na sua opinião, as situações de indisciplina/ violência nas escolas em geral têm

vindo a agravar­se ou pelo contrário? Quais? (aumentaram, diminuíram ou

mantiveram­se)

17. E nesta escola em especial como descreveria a situação?

18. Sabe se algum professor foi agredido e/ou assaltado na escola? O que faz a escola

nesta situação?

19. Conhece situações em que os professores batam nos alunos?

20. Costuma haver agressões entre alunos? E assaltos? O que faz a escola nesta

situação?

21. Que ideia tem da relação entre os alunos e o pessoal auxiliar? Acha que é uma

relação pacífica ou não?

22. Existe alguns alunos a que associe mais frequentemente situações de violência e

indisciplina? Quais?

23. Existem grupos organizados na escola? Quais? Como os reconhece?

24. Alguma vez sentiu medo/receio de estar na escola? Em que situação?

Page 121: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

121

25. Acha que esta escola é segura? Explique. Diga em que sentido afirma isso.

26. Quais os recursos que a escola tem para fazer face a situações de violência e

indisciplina grave? São eficazes? Porquê?

27. Acha que devia haver outros mecanismos? Quais?

28. Quem poderia colaborar com a escola na sua resolução de situações de violência e

indisciplina grave?

Caracterização do professor:

Idade

Género

Anos de serviço

Anos de serviço nesta escola

Formação específica para a docência ou não? (profissionalização ou curso via de

ensino)

Professor do quadro ou não/situação profissional

Participou em órgãos de gestão nesta escola? E noutra?

Page 122: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

122

Guião de entrevistas para Pessoal Auxiliar

1. Há quanto tempo trabalha nesta escola?

2. Quais são os aspectos que considera mais positivos e mais negativos nesta escola?

(Espaço físico, equipamentos, ambiente entre alunos/ professores, escola/

comunidade/ pais)

3. Sabe se existe um regulamento interno da escola? Já o leu?

Quais as regras que considera mais importantes?

Existe alguma regra com a qual não concorde?

4. Gostaria de propor alguma regra que não esteja definida presentemente a escola?

5. Acha que os alunos também devem contribuir para a definição das regras da escola?

Porquê?

6. Parece­lhe que os alunos, compreendem, partilham e aceitam as normas do

regulamento interno, ou pelo contrário encontra algumas resistências por parte dos

mesmos?

7. Na sua opinião, o que é um aluno indisciplinado? Dê exemplos.

8. Como é que normalmente reage perante estas situações quando ocorrem fora das

salas de aula? Todos os seus colegas agem da mesma maneira perante situações de

indisciplina? Quais as diferenças? Quem age como?

9. No seu entender, porque razão os alunos são dis/indisciplinados?

10. O aluno indisciplinado é diferente ou igual a um aluno violento? Porquê?

Page 123: RelPesq_Violencia na Escola.pdf

123

11. Na sua opinião, as situações de indisciplina ou violência nas escolas em geral têm

vindo a agravar­se ou pelo contrário? Quais (aumentaram, diminuíram ou

mantiveram­se)?

12. E nesta escola em especial como descreveria a situação?

13. Alguma vez foi agredido e/ou assaltado na escola?

14. Sabe se algum colega seu foi agredido/ou assaltado na escola? O que faz a escola

nesta situação?

15. Existem alguns alunos a que associe mais frequentemente situações de violência e

indisciplina ? Quais?

16. Existem grupos organizados na escola? Quais? Como os reconhece?

17. Alguma vez sentiu medo/receio de estar na escola? Em que situação? Porquê?

18. Acha que esta escola é segura? Explique. Diga em que sentido afirma isso.

19. Acha que os mecanismos de que a escola dispõe são suficientes e adequados para

fazer face a situações de indisciplina e violência? Porquê?

Que outros mecanismos poderiam existir?

Caracterização do funcionário:

Idade

Género

Anos de serviço

Anos de serviço nesta escola

Ano de escolaridade mais elevado que concluiu