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Escola e Violência
conceitos, políticas, quotidianos
Relatório de Pesquisa
Abr il 2004
João Sebastião, Joana Campos, Mar iana Gaio Alves e Patr ícia Amaral
centro de investigação e estudos de sociologia
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Índice
i. Índice
ii. Índice de Quadros e Gráficos
1. Introdução
2. A investigação sobre a violência na escola em Portugal
2.1. Linhas de investigação: temáticas e problemáticas
2.2. Perspectivas, conceitos e dimensões de análise
2. 3. Âmbito empírico, opções metodológicas e principais resultados das pesquisas
3. Políticas e estratégias de intervenção
3.1 As políticas de combate à violência na escola
3.2 – O Programa Escola Segura: alguns resultados da sua implementação
3.2.1 – Origem e pressupostos do programa
3.2.2 – A informação produzida no âmbito do programa
4 – Encontros e desencontros: a violência no quotidiano escolar
4.1 Nota introdutória
4.2 Caracterização do estabelecimento escolar
4.3– Escolarização, norma e violência
4.3.1 Os alunos alvo de processos disciplinares
4.3.2 Relação com escolaridade
4.4.3 Representações de indisciplina e violência
4.4.4 A violência e a agressividade no quotidiano
4.4.5. Relação com as normas
4.5 – Nota final
5. Conclusão
6. Bibliografia
3
7. Anexos
Anexo A Metodologia do Estudo de Caso
Anexo B Caracterização dos alunos objecto de processos disciplinares
Anexo C – Tipo de ocorrências objecto de processos disciplinares
Anexo D Guiões de entrevista
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Índice de Quadros e Gráficos
Quadros
Quadro nº1 Recursos Humanos e Materiais afectos em exclusividade ao Programa
Escola Segura 2000
Quadro nº2 Recursos da PSP afectos em exclusividade ao Programa Escola
Segura para o ano de 2003
Quadro nº3 Número de ocorrências de situações de violência em meio escolar,
segundo a sua distribuição regional (19951998)
Quadro nº4 Número de ocorrências por tipo de situação de violência em meio escolar
19951998
Quadro nº 5 Ocorrências da PSP – Todos os estabelecimentos de ensino
Quadro nº 6 – Ocorrências registadas pela PSP nas Escolas do Protocolo MAI/ME 1996/99
Quadro nº 7 – Ocorrências registadas pela GNR em 2000
Quadro nº 8 – Ocorrências registadas pelo GSME, 2000
Quadro nº 9 Acções contra as pessoas por DRE (Direcção Regional de Educação), 2000
Quadro nº 10 – Acções contra pessoas por tipo de ocorrência, em percentagem, 2000
Quadro nº 11 Acções contra pessoas dentro da escola, em percentagem, por regiões, 2000
Quadro nº 12 Acções contra pessoas no exterior da escola, em percentagem, por regiões,
2000
Quadro nº 13 – Acções contra bens, por Direcção Regional de Educação, em percentagem,
2000
Quadro nº 14 – Âmbito de actuação da PSP tipo e número de estabelecimentos por número
de alunos e grau de ensino, no ano lectivo 2002/03
Quadro nº 15 – Registo de ocorrências da PSP em valores absolutos por ano lectivo, 2000/03
Quadro nº 16 – Registo de ocorrências pela PSP por distrito, no ano lectivo 2002/03
Quadro nº 17 – Número de detenções efectuadas pela PSP em áreas escolares por tipo de
ocorrência no ano lectivo 2002/03
Quadro nº 18 – Registo de ocorrências do Programa Escola Segura pela GNR, 2001
Quadro nº 19 – Registo de ocorrências do Programa Escola Segura pela GNR, 2002
Quadro nº 20 – Registo de ocorrências do Programa Escola Segura pela GNR, 2003
Quadro nº 21 Número de alunos por anos de escolaridade (1999/2000)
Quadro nº 22 Número de professores por ciclo em função das suas categorias profissionais
Quadro nº 23 Número de funcionários em função da sua situação profissional
5
Quadro nº 24 Número de processos disciplinares por aluno segundo o número de
reprovações
Quadro nº 25 Número de alunos objecto de processos disciplinares no ano lectivo de
1999/00
Quadro nº 26 Grupos profissionais dos encarregados de educação dos alunos objecto de
processos disciplinares no ano lectivo 99/00
Quadro nº 27 Grupos socioprofissionais dos pais dos alunos entrevistados
Gráficos
Gráfico nº 1 – Nº de alunos abrangidos pela A.S.E Ano lectivo de 1999/00)
Gráfico nº 2 – Número de participações por ano de escolaridade ( 2º período) ano lectivo de
1999/00)
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1. Introdução
A expansão progressiva da frequência do sistema educativo nas últimas décadas
concretizou um esforço prolongado para promover a escolarização da população
portuguesa. Passámos assim de uma escola circunscrita a um número limitado de alunos
para uma escola massificada, em que, pelo menos no ensino básico, a diversidade é a
norma. Como noutros países esta transição não se realizou sem que daí tivessem
resultado situações de conflitualidade, fosse pelas dificuldades em implementar infra
estruturas, formar docentes e outros funcionários, ou pelo simples facto de que fazer
conviver e aprender largos agregados de alunos com características pessoais e grupais e
percursos escolares muito diferentes, se tem vindo a mostrar uma tarefa de difícil
concretização. Em particular, as situações de forte agressividade e violência ou
indisciplina grave, algo que até aí era pouco mais que um assunto privado das escolas,
transformaramse lentamente em elementos recorrentes na agenda política e educativa.
O crescendo das referências às situações de violência na escola tem sido acompanhada,
em paralelo, pela exposição mediática dos fenómenos de delinquência juvenil,
coincidindo na ideia de que ambas convergem e constituem uma ameaça grave para a
própria estrutura da instituição escolar, encontrandose fora de controlo. 1 Tal
visibilidade radica, em nosso entender, na utilização do tema como mais um elemento
da lógica de concorrência entre os diferentes meios de comunicação social e,
frequentemente, pela tentativa de exploração eleitoral dos sentimentos de insegurança e
incerteza partilhados por partes significativas da sociedade portuguesa. Do cruzamento
destes elementos resultou o aumento significativo do sentimento de insegurança no seio
das comunidades educativas e à crescente exigência de tomada de medidas políticas e
disciplinares mais severas (M. E., 1999; Sebastião e outros, 1999).
Foi neste contexto que se desenhou no CIES uma linha de investigação que procurou
questionar estas concepções de um ponto de vista sociológico 2 , consubstanciada num
conjunto de projectos que analisaram algumas das dimensões que o fenómeno assume,
em particular no que respeita à sua dimensão teórica (Sebastião e outros, 1999), às
1 A este propósito vejase a discussão destas concepções realizada em Sebastião e outros, 1999 2 CIES: Centro de Investigação e Estudos de Sociologia, centro associado do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE).
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políticas de combate à violência e à sua dimensão relacional (Sebastião, Alves e
Amaral, 2001a) (Sebastião, Alves, e Amaral (2001b).
Em Portugal os estudos científicos relativos à violência em meio escolar são recentes e
escassos, tendo sido desenvolvidos sobretudo na última década no âmbito da Psicologia,
da Sociologia e das Ciências da Educação. O facto natural de as diferentes disciplinas
recorrerem a quadros teóricos, perspectivas analíticas e âmbitos empíricos muito
diferenciados, tem resultado numa elevada disparidade da informação existente, o que
dificulta ou mesmo impossibilita a produção de análises comparativas, mas igualmente
tem contribuído negativamente para que apenas raramente se tenham desenvolvido
pontos de vista interdisciplinares.
De igual forma as políticas públicas de combate à violência em meio escolar são
igualmente incipientes, pouco mais existindo que a aplicação de medidas de articulação
entre a gestão administrativa da educação e as forças de segurança interna.
A apresentação que faremos procurará, em primeiro lugar, realizar a leitura transversal
possível da investigação realizada em Portugal sobre o tema. Serão abordadas as
concepções e problemáticas teóricas, assim como as metodologias adoptadas, o âmbito
empírico e os principais resultados das pesquisas.
Em segundo lugar será realizada a análise das políticas públicas de combate à violência
em meio escolar, procurando compreender a articulação das diferentes medidas.
Por último, analisaremos o quotidiano de uma escola da cidade de Lisboa, tentando
apreender a extensão e permanência quotidiana das situações de agressividade e
violência nas escolas.
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2. A investigação sobre a violência na escola em Portugal
2.1. Linhas de investigação: temáticas e problemáticas
A análise transversal da investigação realizada em Portugal sobre violência na escola,
ainda que de forma breve, permite encontrar alguns equívocos e descontinuidades
constitutivos desta área de estudo. A análise veio a evidenciar dificuldades resultantes
da compartimentação disciplinar, dos quadros teóricos e dimensões empíricas utilizadas
pelos estudos, e, não menos importante, a sua efectiva raridade. O tema, apesar da
relativa visibilidade mediática e política, só lentamente tem vindo a captar a atenção da
comunidade científica portuguesa. Este conjunto de equívocos referidos não se limita às
concepções de senso comum que preenchem os diferentes discursos, tendo mesmo
contaminado, no nosso entender, algum do debate científico que se realiza em Portugal
sobre o tema. Os estudos relativos à violência em meio escolar são recentes e escassos,
tendo sido desenvolvidos, sobretudo, no âmbito da psicologia e da sociologia. Estes
estudos caracterizamse por uma profunda fragmentação, em que os autores não se
referem e reconhecem entre si como produtores de um mesmo campo de saber. A
utilização corrente de conceitos vizinhos, cujas dimensões se recobrem parcialmente
sem que se procurem pontos de contacto, concorre para uma delimitação teórico
metodológica pouco clarificadora e empobrecedora
Tendo estas limitações sempre presentes procurámos então identificar as principais
linhas na investigação realizada em Portugal, para o que tentámos realizar agregações
que permitissem uma visão mais ampla. Assim foi possível referenciar duas grandes
abordagens, cujas pesquisas se centravam mais em redor dos campos teóricos da
psicologia e da sociologia da educação.
A perspectiva psicológica orienta a sua leitura primordialmente para as dimensões
organizacionais, relacionais e individuais, desenvolvendose as pesquisas com base em
conceitos como o de autoestima, agressividade e autoconceito.
Os estudos centrados na dimensão organizacional entendem a escola como produtora de
condições que contribuem para a ocorrência de situações de violência, estudos esses
principalmente desenvolvidos em torno do conceito de bullying. As dimensões relacional e pedagógica têm como enfoque analítico, essencialmente, as relações
pedagógicas entre professores e alunos, e as relações entre pares. É no âmbito destas
9
dimensões que têm vindo a ser desenvolvidos estudos que encontram nas problemáticas
do insucesso escolar, da (in)disciplina e da promoção de competências e condutas pro
sociais o cerne das suas análises, utilizando para isso como unidade analítica principal a
sala de aula.
A perspectiva sociológica sublinha a importância da complexidade do fenómeno e a
necessidade de nas pesquisas desenvolvidas sobre o fenómeno da violência escolar
serem consideradas dimensões tão diferenciadas como institucional, organizacional,
simbólica, relacional e pedagógica.
Apesar da chamada de atenção para as condições sociais, económicas e culturais das
famílias e área de residência dos alunos, procurando assim contextualizar o fenómeno
da violência escolar, os diferentes autores rejeitam que a análise se possa centrar
exclusivamente numa leitura marcada pela anterioridade e exterioridade do fenómeno
da violência relativamente à realidade escolar. Sublinham a necessidade de questionar o
funcionamento do sistema educativo, entendendo a violência como uma das
consequências do processo de massificação do sistema de ensino. É realçada a
importância de analisar as discrepâncias entre os quadros normativos e os quotidianos
escolares, de questionar o desencontro entre as políticas educativas e modelos
centralmente definidos de organização e gestão e a inserção local da escola.
Em primeiro lugar é hoje cada vez mais importante analisar o crescente desânimo
daqueles que olhavam para a escola como um dos raros canais de mobilidade social ao
seu alcance. A cada vez mais visível desvalorização dos diplomas escolares e o aumento
da correlativa dificuldade em garantir de forma imediata uma inserção profissional
prestigiada ao público escolar, temse vindo a traduzir em atitudes de descrença, revolta
e questionamento dos objectivos globais da instituição escolar, mesmo em sectores
sociais em que esta ocupa um papel central nas estratégias de reprodução social.
Uma segunda dimensão, sem dúvida a mais importante, diz respeito à ruptura entre os
quadros culturais e os sistemas de valores de um conjunto significativo de camadas
sociais e a chamada cultura escolar. Este facto ganha maior relevância com a crescente
multiculturalidade das sociedade portuguesa, já que a escola tem vindo a demonstrar um
incapacidade efectiva para promover processos de integração efectiva na sociedade
portuguesa (como a aceitação prática de que é necessário ensinar o português como
segunda língua no sistema educativo português);
10
Este quadro, aqui sumariamente descrito, traduzse frequentemente no aparecimento de
conflitos no interior dos estabelecimentos, alguns dos quais evoluem para situações de
violência física e psicológica. Deve ser contudo sublinhado que os actores deste tipo de
situações não se revêm em movimentos de resistência à instituição, antes os assumem
como estruturalmente anómicos, sem qualquer tipo de finalidades que não sejam
imediatas.
A estas dimensões de análise deve ainda ser acrescido o debate em torno dos conceitos
de poder e dominação, com a discussão das bases de legitimidade do exercício do poder,
sejam elas formais ou informais.
2.2. Perspectivas, conceitos e dimensões de análise
A leitura efectuada permitiu constatar algum consenso entre os diversos autores quanto
à necessidade de clarificação conceptual relativamente ao campo de estudo da violência
na escola, a um maior interconhecimento das linhas de investigação em
desenvolvimento, e ao aumento da investigação. Ainda assim foi possível identificar
algumas linhas que poderíamos designar como pontos de convergência na investigação
realizada em Portugal.
Um primeiro passo para a clarificação do conceito de violência diz respeito à
compreensão da multidimensionalidade do fenómeno. Vandalismo, incivilidade,
agressão/perseguição psicológica, agressão física, assalto/roubo, indisciplina grave, são
manifestações do fenómeno que o conceito de violência procura descrever. À
diversidade de situações há ainda que adicionar a alta variação dos contextos em que
estas se desenrolam, das causas e sentidos que os diferentes agentes atribuem às suas
acções. Este quadro complexo coloca problemas teóricos e metodológicos que se
encontram espelhados nas linhas de pesquisa que se têm desenvolvido. É patente, em
alguns estudos, o escasso trabalho de objectivação das informações recolhidas junto dos
intervenientes em situações de violência, resultando a sua aceitação acrítica na
promoção de discursos marcados pela subjectivização do fenómeno. 3 Ainda assim, foi
3 É de referir que na única pesquisa de âmbito nacional até hoje realizada (Costa e Vale, 1998) não foram consideradas, quer para a selecção da amostra, quer para a análise da informação recolhida, variáveis tão significativas como as relativas às trajectórias escolares dos alunos, origem social ou outro tipo de variáveis relativas às famílias e aos contextos escolares e socioculturais. O estudo considerou apenas o género, idade e ano de frequência da escolaridade, o que face à multidimensionalidade do fenómeno é manifestamente insuficiente. De salientar ainda a
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possível identificar algumas linhas que poderíamos designar como pontos de
convergência na investigação realizada em Portugal.
Violência e poder Uma primeira distinção conceptual encontrase no centro de algumas pesquisas que
discutem a proximidade entre os conceitos de violência e poder, sendo questionada a
confusão, por vezes feita, entre desordem e conflito. Como afirmámos noutro local:
A violência é o excesso que, numa relação social, condensa uma visão do mundo como um espaço social de
relações conflituais que tendem para uma qualquer forma de ruptura com a normalidade social considerada
legítima. É uma relação de poder que, pretendendo ser irreversível, visa a constituição de um estado de
dominação; é uma relação em que a coacção é imperativa (...) (Sebastião e outros, 1999: 123).
A proximidade entre os conceitos de violência e de poder insere o primeiro no campo
semântico do segundo, obrigando a distinção entre relações de poder, de carácter
reversível, e relações de dominação, de carácter unilateral. A experiência da violência
pode ser, nesse sentido, objectiva ou subjectiva, simbólica ou física.
Afonso (1991) parte de uma abordagem weberiana para a compreensão das relações de
poder no quotidiano escolar, ao recorrer às tipologias que distinguem as fontes de
legitimidade para a dominação legítima, e as fontes fundadores do exercício do
controlo: o poder coercitivo, remunerativo e normativo. O mesmo autor sublinha ainda
que, face a um controlo positivo ou negativo, podem surgir fenómenos de resistência,
cujas fontes de poder são diversas. O autor propõe a aplicação destas tipologias ao
contexto escolar, de modo a que possamos ler o poder do professor, de base formal, e o
poder do aluno, de base informal. Este debate pode, aliás, já ser referenciado no início
da década de 80, com a publicação, por Formosinho, de um artigo de discussão das
“bases do poder do professor” (Formosinho, 1980).
Os estudos desenvolvidos na confluência semântica dos conceitos de violência e poder,
sublinham as dimensões organizacional e relacional, no primeiro caso, quando são
considerados os aspectos normativos, no segundo, quando o enfoque incide sobre a
relação pedagógica. No que diz respeito à dimensão relacional, Afonso (1991) encontra,
na sala de aula, a ilustração do desequilíbrio de poder existente na relação entre
professor e aluno. O autor entende a desigualdade como condição da relação
pedagógica, sublinhando o carácter coercivo da interacção, o desenvolvimento de
subjectividade, não explicada, presente em várias dimensões de análise, o que nos deixa fundadas dúvidas sobre a validade da informação produzida.
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estratégias de distância social entre professores e alunos e, ainda, a possibilidade de
accionamento de sanções disciplinares.
Relativamente à dimensão organizacional, (Domingues, 1995; Sebastião e outros, 1999)
afirmam que existe uma indefinição normativa nas escolas, resultante da existência de
quadros normativos pouco claros ou inapropriáveis pela sua complexidade e linguagem,
pelo desconhecimento ou releitura e usos quotidianos privativos, desenvolvidos pelos
diferentes actores presentes na cena educativa. Esta indefinição cria, no entender destes
autores, um espaço de possibilidades para a ocorrência de situações de conflito.
Sebastião e outros (1999), apresentam o conceito de norma enquanto mecanismo de
categorização da acção social, caracterizado pelo seu carácter obrigatório, a exigência
de obediência, e que permite a distinção entre os actos violentos e os nãoviolentos. O
incumprimento da norma acarreta a potencial estigmatização dos sujeitos em
inconformidade.
Pires (2000), procurou compreender as práticas de agressividade, violência e vitimação
em meio escolar, definindo no enquadramento teórico da sua pesquisa o conceito de
violência. Na sua definição, o autor enfatiza o uso repetido de força, a intencionalidade
da acção e a possibilidade de os seus resultados serem físicos ou psicológicos. Se
teoricamente este autor situa a definição do conceito no âmbito do conjunto de autores
tratados nesta secção, metodologicamente aproximase dos autores que têm vindo a
desenvolver a perspectiva psicológica, em particular, os que têm trabalhado em torno do
conceito de bullying, na medida em que recorre aos instrumentos metodológicos
construídos pelos especialistas da área, nomeadamente o questionário de Oleuws.
Indisciplina As investigações desenvolvidas no âmbito da problemática da indisciplina não abordam
explicitamente as questões da violência, contudo estas duas problemáticas são vizinhas
e surgem muitas vezes referidas em alguns estudos pela sua ligação. Neste momento,
parecenos que importará mais compreender o que o debate sobre a indisciplina poderá
trazer de útil à análise dos fenómenos de violência, relegando para segundo plano um
eventual meticuloso trabalho de delimitação conceptual. 4
4 Neste momento, parecenos que importará mais compreender o que o debate sobre a indisciplina poderá trazer de útil à análise dos fenómenos de violência, relegando para segundo plano um eventual meticuloso trabalho de delimitação conceptual.
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A importância desta relação surge na temática proposta pela AFIRSE para o Colóquio
de 2001, Violência e Indisciplina na Escola. 5 Podemos afirmar que este colóquio constitui um passo significativo para o reconhecimento da problemática, na medida em
que reuniu investigadores das diversas áreas disciplinares.
Neste encontro Barroso (2001) sublinhou a excessiva simplificação em torno dos
fenómenos da (in)disciplina e violência na escola. À preocupação de “medir” a
indisciplina ou a violência, o autor contrapõe a necessidade da sua problematização
enquanto fenómenos socioeducativos (Barroso, 2001). No mesmo colóquio, Estrela
(2001) ressaltou a importância e escassez da investigação desenvolvida, no nosso país,
em torno da problemática da indisciplina em contexto escolar. Também neste campo
cientifico, podemos identificar um conjunto de pesquisas, de um leque disciplinar
alargado, que contribuem para a análise das dimensões organizacional e relacional,
anteriormente referidas.
Numa tentativa de conhecer as perspectivas dos alunos acerca das relações de poder na
sala de aula, Freire (1995) recorre aos conceitos de poder, relações de poder e
(in)disciplina enquanto alicerces da sua investigação. Distingue a importância do papel
da escola ao realçar um conjunto de regularidades e de idiossincrasias, relativas quer aos
percursos escolares quer ao ambiente académico (Freire, 2001). Outro autor, Curto
(1998), sublinha ainda a dimensão relacional, defendendo que, na relação pedagógica,
há que reconhecer tanto os professores como os alunos como fontes de (in)disciplina, e
que esta pode ser lida como resultado do exercício do poder por parte dos alunos. A
dimensão organizacional é também focada por este autor, que alerta para a desconexão
entre o nível formal, objectivada em documentos como o Regulamento interno de
escola, e o nível informal, onde encontramos as práticas quotidianas no espaço escolar,
como elemento explicativo para os fenómenos de (in)disciplina escolar.
Também Domingues (1995) aborda esta dimensão de análise a partir dos conceitos de
controlo disciplinar e disciplinação, partindo da asserção de que a disciplina e a
indisciplina são fenómenos socioorganizacionais e psicossociais. Na sua pesquisa o
autor identifica três níveis de análise das práticas disciplinares: o do Ministério da
Educação, o da escola e o dos actores. No nível da escola o autor distingue dois planos:
o plano das orientações para a acção organizacional e o plano da acção organizacional.
Próximo desta abordagem, Sampaio (1997) propõe três “lentes” de focalização do
5 AFIRSE: Association Francophone Internationale de Recherche Scientifique en Education.
14
problema da indisciplina: “grande angular”/contexto; “lente média”/escola “focar mais
perto”/sala de aula; e “zoom”/aluno.
Estrela sintetizou (1992 e 2001) as várias correntes e perspectivas teóricas que se
ocuparam do estudo da (in)disciplina e a relação pedagógica, com as diversas definições
dos conceitos de disciplina e indisciplina. A autora sublinhou a importância da
dimensão relacional, na medida em que centra a sua leitura na relação pedagógica
elegendo o grupoturma como espaço relacional e unidade de comunicação (Estrela,
1992). Também Barroso, em 1995, enfatiza a dificuldade em gerir pedagogicamente a
diversidade dos alunos da “classe”, nomeadamente no tocante à divisão do espaço da
sala de aula, da hierarquização dos saberes e aos dispositivos de vigilância (Barroso,
1995: 85). Já Mendes (1998) associou as situações de indisciplina à relação entre a
gestão do tempo na sala de aula e os ritmos biológicos das crianças. Barroso (2001)
retoma a discussão afirmando que existe uma relação estreita entre o recrudescimento
dos chamados fenómenos de indisciplina e os modos de organização pedagógica e
gestão escolar, ainda dominantes nas nossas escolas.
Amado (1998), cuja análise se centra no ponto de vista dos alunos acerca dos
procedimentos dos professores face à indisciplina na sala de aula, apresenta três níveis
de tipificação da (in)disciplina: um primeiro, considera os desvios às regras de
“produção” escolar; um segundo, os conflitos interpessoais e o terceiro, situa os
conflitos professoraluno. Relativamente aos procedimentos, identifica a partir do
critério da modalidade de correcção accionada pelos professores, procedimentos de
integração/estimulação; procedimentos de dominação/imposição; e, procedimentos de
dominação/ressocialização. O mesmo autor (Amado, 2000 e 2001) apresentou os
resultados de um estudo etnográfico cujo enfoque incide sobre a dinâmica do grupo
turma. Podemos enquadrar analiticamente este estudo na dimensão relacional e
pedagógica, na medida em que, teoricamente, alicerçase na triangulação das
interacções turma/professor/aluno.
Ainda focalizados na perspectiva dos alunos, há a referir outros estudos como o de Seabra, CasaNova e Martins (2001) que, analisando a avaliação que os alunos fazem
dos comportamentos dos professores, identificam o papel do professor enquanto
potenciador de comportamentos de (in)disciplina, evidenciando as características
pessoais e profissionais (des)valorizadas pelos alunos, indo ao encontro de Amado
(2000). Pedro e Pedro (2001) procuraram, na sua apresentação ao já referido colóquio
da AFIRSE de 2001, dar voz aos alunos a partir dos resultados encontrados sobre o
15
questionamento em torno de situações de violência na escola (do 1º ciclo ensino básico).
Na mesma perspectiva, Cortez e Vilhena (2001) procuraram conhecer, através da
análise de composições de crianças, o processo de compreensão destes conceitos
(indisciplina e violência) por parte dos alunos.
Um conjunto de autores desenvolveu as suas pesquisas em torno das perspectivas de
professores acerca da (in)disciplina na sala de aula. Lopes (1998), identifica, nas percepções dos professores, uma relação entre os problemas de comportamento e as
dificuldades de aprendizagem, lidas a partir dos resultados escolares obtidos pelos
alunos. Rego e Caldeira (1998) procuraram, igualmente, conhecer as opiniões dos
professores, acerca dos problemas de comportamento escolar, os quais, segundo as
autoras, se têm acentuado nas últimas décadas. Oliveira (2001) situase nesta
perspectiva, realçando o segmento dos professores mais novos. Também Gonçalves e
Gonçalves (2001) elegem este grupo procurando conhecer as representações dos
conceitos de disciplina e indisciplina dos professores em início de carreira (no 1º ciclo
do ensino básico), assim como a sua atitude face aos “comportamentos desviantes” dos
alunos. No cruzamento das perspectivas de professores e alunos situamse as pesquisas
desenvolvidas por Rego (2001), sobre a realidade escolar açoriana.
Por fim, é de salientar a recomendação de Afonso (1991), acerca da necessidade de
integração do conceito de (in)disciplina na formação (inicial) de professores, enquanto
conteúdo programático essencial, criticando o facto de este ser apresentado apenas na
sua dimensão prática. Carita e Fernandes (1997), numa perspectiva de formação de
professores, destacam a importância do autoconhecimento do professor, na medida em
que, tal como Curto (1998), entendem o professor como fonte de (in)disciplina. Estrela
(2001) vai ao encontro desta perspectiva ao salientar a importância das figuras de
autoridade, situando a intervenção no âmbito da formação de professores. Veiga
(2001a) apresenta a este propósito os principais estudos nacionais e estrangeiros em
torno da problemática, propondo um conjunto de ideias e procedimentos no âmbito da
formação de professores (2001b).
Bullying, espaços de recreio e os tempos livres A psicologia e as ciências da educação têm vindo a desenvolver um conjunto de
pesquisas em torno do conceito do bullying, cujo enfoque incide nos chamados comportamentos disruptivos e nos problemas disciplinares entre os professores e os
alunos (Almeida, 1999). Este conceito tende a ser usado, segundo Blaya e Debarbieux
16
(2001), nos países da Europa do norte e até muito recentemente, não era utilizado
noutros países, como França, Alemanha ou Grécia. Em Portugal, a tradução para o
conceito de bullying proposta por Almeida, aproximao das expressões: “abusar dos colegas”, “vitimizar”, “intimidar” e “violência na escola” (Almeida, 1999: 178). Na
comunicação que apresentou no Colóquio da AFIRSE, Marchand (2001) procurou
analisar e discutir o conceito de bullying , entendendoo como coacção. Pereira, Neto e outros (2001) no mesmo encontro apresentaram o conceito de bullying como agressão sistemática e intencional entre pares.
Pereira e outros, num artigo que discute a disseminação do fenómeno de bullying nas
escolas portuguesas, referem os recreios como os espaços escolares com maior
incidência de ocorrência de bullying, particularmente quando se situam em espaços no exterior dos edifícios (Pereira e outros, 1997: 239). Estes resultados enfatizam a
importância dos factores de contexto, organizacionais e comunicacionais, assim como a
necessidade de reflexão sobre o clima de escola. As hipóteses explicativas avançadas
apontam para as restrições e falta de diversificação de oferta educativa que os recreios
apresentam; para a superlotação; fraca supervisão, assim como para a falta de
consideração pelas necessidades das crianças no traçado arquitectónico dos espaços de
recreio, interiores e exteriores. Os mesmos autores consideram que a falta de
organização dos espaços e tempos de recreio resultam na desvalorização do poder
educativo que encerram e “são convidativos para a existência de comportamentos
agressivos (bullying) entre as crianças" (idem: 238). Na mesma linha de
problematização, Marques e Neto (2000) procuraram estabelecer a relação entre as
características dos recreios escolares e os comportamentos agressivos dos alunos.
Ainda de um ponto de vista psicopedagógico, Pereira e Neto (1999), num artigo de
revisão de literatura, apresentam a distinção entre os tempos livres, o lazer e as rotinas
de vida das crianças. Consideram, ainda, que os tempos livres vividos pelas crianças e
jovens na escola são efectivamente longos, o que deveria traduzirse na prioridade de
melhoramento dos espaços de recreio e na diversificação da oferta de práticas (Pereira,
Neto e Smith, 1997). Estes autores sublinham mesmo que tais medidas constituem um
mecanismo de prevenção das práticas agressivas das crianças. Contudo, o que esta
equipa verificou foi a desvalorização por parte da escola quer dos tempos de recreio,
quer do poder educativo das zonas exteriores (idem). Num artigo anterior, Pereira e Neto (1994) procuraram identificar as práticas prioritariamente realizadas e preferidas
pelas crianças, distinguindo entre práticas de trabalho, semitrabalho e recreação. Para
17
estes autores, a análise sobre os tempos livres, a partir das conclusões acima
apresentadas, aproximase da análise sobre a violência na escola, na medida em que
trata, também, de situações de violência entre pares e de danificação do património
escolar.
18
2. 3. Âmbito empírico, opções metodológicas e principais resultados das pesquisas
Em termos metodológicos e empíricos a investigação realizada sobre a realidade
portuguesa caracterizase por um significativa subrepresentação das pesquisas
extensivas, estando estas quase restritas às levadas a cabo por equipas de investigação
ligadas à Universidade do Minho e outro pelo Instituto de Inovação Educacional. De
forma desigual e limitada contribuem para preencher algum do vazio de informação
existente, seja pela sua incidência regional no primeiro caso, seja pelas opções
metodológicas no segundo.
Costa e Vale (1998) apresentam no seu livro A violência nas escolas os resultados de uma pesquisa de carácter extensivo com âmbito nacional, realizada no âmbito do
Instituto de Inovação Educacional, com o objectivo de proceder à caracterização do
fenómeno da violência escolar. A informação apresentada resultou da aplicação de um
questionário a uma amostra composta por 4925 alunos de 142 escolas do 3º Ciclo do
Ensino Básico e do Secundário. De salientar que nesta pesquisa não foram
consideradas, quer para a selecção da amostra quer para a análise da informação
recolhida, variáveis tão significativas como as relativas às trajectórias escolares dos
alunos, origem social, ou outro tipo de variáveis relativas às famílias e aos contextos
escolares e socioculturais. O estudo considerou apenas o género, idade e ano de
frequência da escolaridade, o que face à multidimensionalidade do fenómeno é
manifestamente insuficiente. De salientar ainda a subjectividade não explicada presente
em algumas das dimensões de análise, o que nos deixa algumas dúvidas sobre a
qualidade da informação produzida.
Os alunos seleccionados frequentavam, à época da pesquisa, o 8º e 11º anos de
escolaridade. Os critérios de selecção da amostra procuraram garantir a presença de
alunos dos dois níveis de ensino Básico e Secundário, e das áreas geográficas definidas
pela equipa (Norte/Sul; Litoral/Interior; Urbano/Rural). A distribuição da amostra fezse
do seguinte modo: 20 escolas do Interior Norte, com 599 alunos inquiridos; 34 escolas
do Litoral Norte, com 1476 inquiridos; 24 escolas do Litoral Centro, com 665
inquiridos; 48 escolas de Lisboa e Vale do Tejo, com 1687 inquiridos; e 16 escolas do
Sul, com 498 inquiridos. As variáveis de caracterização consideradas pelo estudo foram
a idade, sexo, nível de escolaridade e local de residência dos alunos.
19
Os resultados do estudo relativos à agressão física mostram que cerca de 63% dos
alunos afirmam ter sido batidos e 6% afirmam ter sido ameaçados com uma arma, no
interior da escola. No seu exterior os valores encontrados revelam que cerca de 8% dos
alunos afirmaram ter sido batidos, 32% empurrados e 8% ameaçados com arma. No que
respeita aos docentes 8% dos alunos afirmam ter visto um professor ser empurrado
dentro da escola, e 1,7% fora da escola. Foi ainda referido por 3,5% dos alunos que
viram bater num professor dentro da escola, e 1,4% fora da escola. Relativamente à
violência sobre os funcionários das escolas, 11% dos alunos afirmam ter visto um aluno
a empurrar um funcionário dentro da escola e 3 % fora desta. 4% viram bater num
funcionário dentro da escola e 1,6% viram bater no exterior da escola.
A agressão verbal revelase mais significativa com 67% dos aluno a afirmarem já ter
sido insultados no interior da escola, e 45% no exterior. Quanto às ameaças verbais ou
gestuais, cerca de 54% dos alunos afirmam já ter sido vítimas no interior da escola, e
33% fazem a mesma afirmação para o exterior.
As conclusões centrais apontam para o grupo dos rapazes como os mais agressores. Os
agressores são na sua maioria colegas quando a agressão ocorre no interior da escola, e
estranhos à escola quando a ocorrência se verifica no exterior desta. As agressões físicas
e verbais ocorrem com maior incidência no interior, enquanto que os confrontos
violentos e entre grupos se registam mais no exterior da escola. Os mais agredidos
fisicamente são os rapazes mais novos. As vítimas de agressões sexuais são na sua
maioria as raparigas mais novas.
Relativamente aos actos de vandalismo 80% dos alunos já constataram os seus efeitos:
paredes riscadas, vidros partidos, material escolar destruído, aulas interrompidas, etc.
Cerca de 25% já assistiram a actos de vandalismo contra as instalações e equipamento
escolar. Também 25% assistiram à vandalização de viaturas de professores. Da
totalidade da amostra 25% dos alunos já foram roubados ou viram os seus pertences
serem destruídos no interior da escola, e 9,5% foram roubados e 5,6% viram os seus
pertences serem destruídos no exterior da escola. Por fim o consumo de substâncias
ilícitas. A 8% dos alunos já tentaram vender ou oferecer droga no interior da escola,
nesta situação colegas, assim como a mesma percentagem no exterior, aqui por
estranhos. Cerca de 18% dos alunos já viu colegas a consumir droga, e 29% viram ser
consumidas bebidas alcoólicas no recinto escolar.
20
Questionados sobre o grau de segurança que sentiam na escola 20,1%responderam
sentirse muito seguros, 66,3%mais ou menos seguros, 9,5%pouco seguros e muito
pouco seguros 3,9%. Os locais indicados como os mais seguros são as salas de aula no
período lectivo, com cerca de 90,2% de respostas e a biblioteca com 87,9%. Os locais
considerados menos seguros são para 33,3% dos alunos o percurso entre a escola e a
casa, para 19% as casas de banho, para 17,2% os balneários e o recreio para 10,4%.
Um outro conjunto de pesquisas, realizadas no âmbito do Instituo de Estudos da
Criança/Universidade do Minho dão um contributo para o conhecimento do fenómeno.
Pereira, Almeida, Valente e Mendonça (1996) e Almeida (1999) apresentam os
resultados de uma pesquisa desenvolvida em Escolas 1º e 2º Ciclos do Ensino Básico do
Distrito de Braga, cujos objectivos se organizaram em três eixos distintos:
• diagnosticar os níveis de agressão e de vitimação;
• compreender da influência dos factores determinantes das práticas de agressão e
vitimação;
• identificar os tipos de agressão sofrida e os locais de ocorrência.
O análise realizada a partir do conceito de bullying considerava as situações de agressão
física, directa verbal e indirecta, ou seja, foram contabilizados também os relatos das
situações de agressão psicológica.
Em termos empíricos possuiu um carácter extensivo com a aplicação de um
questionário em 18 escolas do 1º e 2º Ciclos do Ensino Básico a uma amostra de 6200
alunos. O questionário aplicado resultou de uma adaptação para a realidade escolar
portuguesa do questionário de Olews. As variáveis consideradas foram a idade, sexo,
local de residência, origem socioeconomica (grau instrução e profissão/ocupação dos
pais) e a condição de agressor/vítima para a caracterização dos alunos. Relativamente às
escolas o estudo compreendia as áreas rurais, urbanas, suburbanas e industrializadas do
distrito de Braga.
Os resultados produzidos por esta pesquisa indicam que, nos 3 meses anteriores à
aplicação do questionário, 21% dos alunos consideravamse vítimas de agressão em
pelo menos 3 situações distintas; 36% afirmaram ter sido vítimas de agressão nesse
período de tempo e cerca de 42% não foram vítimas de agressão no mesmo período de
tempo. Quando questionados sobre se se autodefiniam como agressores 46%
21
afirmaram nunca ter agredido ninguém, 36% afirmaram que já tinham atacado uma ou
duas vezes nesse período de tempo, 6,7% agrediram 3 ou 4 vezes e 10,7% agrediram,
também, 5 ou mais vezes nesse período de tempo.
As conclusões centrais deste estudo apontam para uma maior concentração nos rapazes
da autoria da agressão assim como da experiência de vitimização, frequência que é
aproximadamente o dobro da existente no grupo das raparigas.
A agressão física encontra números mais significativos para os rapazes, enquanto que
no caso das agressões verbais os valores são aproximados para rapazes e raparigas,
embora estas utilizem esta modalidade mais precocemente. Relativamente à variável
idade o estudo concluiu que os agressores são normalmente mais velhos, constatandose
contudo uma diminuição dessa prática com o aumento da idade, excepção feita às
agressões verbais para as raparigas.
As situações de agressão são maioritariamente protagonizadas por um rapaz que agride
sozinho (47,7%) ou por um grupo de rapazes (30, 5%), embora outras situações tenham
sido identificadas situações em que a agressão efectuada por grupos mistos (12,1%),
rapariga isolada (12,1%) ou grupo de raparigas (4,4%). O agressor caracterizase por ser
mais velho (41%); pertencer à mesma sala de aula (39%) ou frequentar o mesmo ano de
escolaridade, embora pertencendo a outra turma (24%).
A análise permitiu, assim, estabelecer o perfil tipo de agressores e vítimas. O agressor
encontrase maioritariamente entre os alunos de sexo masculino, proveniente de classes
sociais mais baixas, a frequentar escolas suburbanas no 1º Ciclo, verificandose uma
correlação positiva entre o aumento do número de anos em atraso e os alunos
agressores.
A posição de vítima corresponde mais aos alunos do sexo masculino, das escolas
urbanas que frequentam os primeiros (4) anos de escolaridade. O mesmo estudo
verificou ainda que os alunos vítimas de violência na escola pouco comunicam com
adultos acerca das ocorrências, sejam eles os pais (50,4%) ou os professores (46,1%).
Relativamente à atitude dos professores face às situações de agressão os resultados do
estudo indicam que 24,6% dos alunos referiram que os professores nunca procuraram
impedir as agressões entre alunos; 36, 4% consideravam que os professores o fazem às
vezes e 39% consideravam que os professores muitas vezes procuram impedir as
22
agressões entre alunos. Estes valores complementam os valores encontrados para a fraca
comunicação dos alunos de situações violentas.
Entre as formas de agressão mais frequentes foram identificados, por ordem, chamar
nomes/ofensas verbais (37, 6%), agressões corporais (bater, dar murros, pontapés, etc.)
(29, 6%), levantar rumores ou divulgar segredos de alguém (28,1%), tirar objectos
pessoais (26, 4%), meter medo (17, 5%) e não lhe falarem (12,5%). Como principais
locais de ocorrência das agressões encontramse: os recreios (50, 8%), as salas de aula
(21, 6%), os corredores e escadas (18%) e o refeitório (3, 6%).
Os valores do bullying encontrados por esta pesquisa são significativos e aproximamse aos encontrados para outros países europeus, nomeadamente Itália e Espanha. A mesma
equipa aplicou o mesmo questionário em Lisboa, em 1996, e encontrou valores
semelhantes, embora com um agravamento das ocorrências no 6º ano de escolaridade.
O mesmo questionário, utilizado pela equipa do estudo anteriormente apresentado
(Olews, 1989), foi aplicado por Pires (2000) em duas escolas do 2º Ciclo do Ensino
Básico, a uma amostra de 440 alunos, numa pesquisa desenvolvida em torno da
compreensão dos factores que influenciam os problemas de agressividade, violência e
vitimação em meio escolar, tendo sido consideradas escolas que diferiam nos seus
equipamentos e espaços escolares. Foram identificados dois tipos de factores que
influenciam as práticas agressivas dos alunos, distinguidose os de carácter extrínseco
(supervisão do recreios, dimensão da escola e a distribuição espacial do edifício), e os
de carácter intrínseco (currículo nãoformal).
Um outro conjunto de pesquisas de dimensão empírica mais reduzida, normalmente
fazendo apelo a metodologias de carácter qualitativo, fornece igualmente um conjunto
de pistas para a compreensão do fenómeno.
No que respeita às situações de vitimação é de destacar a contribuição de Sani (2000)
que procurou conhecer as percepções e representações construídas pelas crianças após a
experimentação directa, ou indirecta, de crimes envolvendo violência interpessoal. A
investigação, de natureza qualitativa foi desenvolvida a partir da análise do discurso das
crianças, pelo abrangência dos resultados, relativos ao crime em geral, optámos por não
integrar na presente publicação, ficando apenas a referência.
23
As pesquisas relativas ao bullying enfatizam a importância dos espaços de recreio, nomeadamente, como vimos nas conclusões de Pires, a sua organização pode mesmo
constituir um dos factores que influenciam as práticas agressivas dos alunos. A
resultados semelhantes chegaram Marques e Neto (2000). Estes autores desenvolveram
uma pesquisa que teve como unidades de análise 4 recreios distintos: o recreio livre, o
recreio com supervisão, o recreio com materiais e o recreio com supervisão e materiais,
observados em 4 semanas distintas. Após as 4 semanas foi aplicado um questionário
sobre as agressões praticadas e sofridas aos 2º, 3º e 4º anos de escolaridade. Os
resultados verificaram a correlação positiva entre a existência de materiais e de
supervisão e os baixos níveis de agressão. Os alunos afirmaram uma clara preferência
pelos recreios organizados com materiais e com supervisão. Os materiais propiciaram
uma maior união entre as crianças a supervisão permitiu apoio na resolução de conflitos
e na organização de situações de aprendizagem.
Pereira, Neto e Smith (1997) concluíram que é na zona dos recreios que ocorrem mais
comportamentos de bullying, em particular nos espaços exteriores. Os resultados
apontam como factores explicativos deste fenómeno os factores de contexto e
organizacionais, tais como: as restrições dos espaços de recreio e consequente
aborrecimento dos alunos; a falta de diversificação de oferta de actividades; a
superlotação dos recreios resultante das dificuldades de gestão do tempo e ausência de
competências que promovam o jogo, a cooperação, o conhecimento e aceitação de
regras; ausência de supervisão; imposição de regras que não servem aos alunos, logo,
não aceites ou compreendidas; e por fim, a arquitectura do espaço que não considera as
necessidades das crianças.
Pereira e Neto (1994) procuraram identificar as práticas prioritariamente realizadas e
preferidas pelas crianças No estudo que desenvolveram procuraram conhecer essas
práticas e verificar a existência de uma relação com o meio (rural ou urbano) e o nível
de ensino (Jardim de Infância ou 1º Ciclo do Ensino Básico). Metodologicamente a
pesquisa de natureza qualitativa teve como unidades de análise 2 grupos de crianças,
dos 3 aos 6 anos de idade, e dos 6 aos 10 anos de idade, em escolas e Jardins de Infância
situados em áreas urbanas e rurais. Na pesquisa realizaramse entrevistas às crianças e
aos pais. Os resultados revelam que as práticas prioritariamente realizadas e preferidas
24
pelas crianças são na generalidade coincidentes, concluindose assim que não há
variações significativas, sejam elas crianças habitantes em áreas rurais ou urbanas,
frequentadoras do PréEscolar ou no 1º Ciclo Ensino Básico.
Em síntese podemos afirmar que estatisticamente o fenómeno da violência em meio
escolar tem uma incidência territorial mais significativa nas áreas urbanas e suburbanas,
das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto. No interior dos estabelecimentos escolares o
fenómeno apresenta uma concentração de ocorrências nas áreas com fraca presença de
adultos, como os recreios, balneários e casasdebanho, ou seja, a frequência de
ocorrências de situações de violência no exterior da escola é menos significativa embora
os valores tendam a aproximarse dos encontrados para o interior da escola, em
particular no percurso casa/escola. Os estudos apresentados revelam tratarse de um
fenómeno predominantemente masculino na medida em que seja para os agressores,
seja para os agredidos encontramos sempre valores mais elevados para os rapazes.
Em síntese, a produção científica em Portugal em torno da problemática da violência na
escola é, como vimos, escassa e pouco sistemática. Consequentemente, não há um saber
comum aos investigadores que sobre esta problemática se debruçam; seja no sentido da
construção de uma malha teórica que questione e suporte a análise deste fenómeno, seja
no sentido da reunião de informação de carácter empírico, o que nos impede de
conhecer o fenómeno na sua multidimensionalidade e extensão.
25
3. Políticas e estratégias de intervenção
3.1 As políticas de combate à violência na escola
A ausência de uma produção científica, que faculte informação de natureza teórica e
empírica acerca do fenómeno contribui, também, para a falta de clarificação conceptual
subjacente à definição de políticas de combate à violência na escola. Os termos
equivocados encontrados nos documentos oficiais, reflectem o peso das noções de senso
comum na definição de políticas educativas. No que respeita à procura de soluções,
têmse vindo a estruturar dois discursos acerca das situações designadas por violência
na escola, discursos estes que resultaram em diferentes medidas políticas. Identificamos
então duas abordagens contrárias em coexistência
Abordagem pedagógica Assenta na ideia de que uma parte significativa das situações de violência tem a sua
origem no insucesso da escola em conseguir atingir os objectivos educativos que lhe são
determinados. O argumento central é o de que o sistema educativo português teve, nas
últimas décadas, um razoável sucesso na implementação de mecanismos que
promoveram o crescente acesso de todos à educação escolar, mas falhou na criação de
oportunidades para democratizar o sucesso escolar. A permanência de elevadas taxas de
insucesso e abandono escolar (particularmente no ciclo final da escolaridade
obrigatória) constituem problemas ainda longe de estarem solucionados, facto que
condiciona e orienta uma parte significativa das medidas políticas e pedagógicas
tomadas nos últimos anos. A procura de soluções é concebida dentro de um quadro
político e pedagógico com o objectivo final de obter a democratização do sucesso
escolar (compreendendo este não apenas as aprendizagens cognitivas, mas também
sociais e culturais). Genericamente, os defensores deste ponto de vista (um misto de
noções sóciopsicopedagógicas) consideram que é dentro do campo pedagógico que a
violência pode ser resolvida, ou pelo menos prevenida, dando importância reduzida a
medidas baseadas no uso do policiamento dentro dos limites da escola (somente
admitido em situações muito específicas). A estratégia defendida é centrada na
promoção das competências sociais e na formação cívica e educativa dos alunos. As
situações violentas resultam da frustração dos alunos e traduzemse em actos violentos
26
por estes não serem capazes de lidar com o insucesso e sentiremse agredidos durante o
seu percurso escolar.
Esta perspectiva sublinha assim, essencialmente, a necessidade de medidas do tipo
organizacional e pedagógico. As primeiras são compostas por legislação sobre gestão
escolar descentralizada e pelos os territórios educativos de intervenção prioritária. 6 As
segundas compreendem medidas como a gestão flexível do currículo (particularmente a
sua adaptação local); a possibilidade de promover “currículos alternativos” para alunos
com dificuldades de aprendizagem; a mudança de processos de avaliação dos alunos
procurando reduzir a exclusão prematura; o “estudo acompanhado”, que procura
promover competências individuais e hábitos de estudo nos alunos; o “Regulamento dos
direitos e deveres do aluno”, fornecendo a orientação para promoção de competências
sociais.
Durante a última década e meia podem igualmente ser identificadas algumas medidas
que, apesar de não serem especificamente dirigidas para a resolução do problema da
violência na escola, tomavam em conta algumas das suas dimensões.
A tentativa de implementação de programas de formação social e pessoal, na sequência
da aprovação da Lei de Bases do Sistema Educativo, traduziuse, em 1989, 7 na
aprovação dos planos curriculares para o ensino básico e secundário que consideravam
na sua estrutura um espaço disciplinar com uma hora semanal designado por
“desenvolvimento pessoal e social”. Com a mudança de orientação política governativa
operada em meados da década de 90, podemos encontrar um conjunto de orientações
curriculares que procuram romper com este modelo. A “educação para a cidadania”
retoma, em parte, os princípios e objectivos da “formação pessoal e social”, embora
procure consagrar uma perspectiva transversal e de complementaridade curricular, para
que, em todos os ciclos, as actividades de instrução e de educação para a cidadania
sejam combinadas de modo consistente e permanente (DL 6/2001).
6 Os Territórios Educativos de Intervenção Prioritária”(TEIP) foram criados, a título experimental, no ano de 1996/97 pelo Despacho nº 147B/ME/96 e pelo Despacho Conjunto nº 73/96 dos secretários de estado da educação e inovação e da administração educativa. Foram então definidos 34 territórios, distribuídos pelas 5 direcções regionais de educação. Os territórios foram concebidos como espaços comunitários de intersecção entre as estruturas do sistema escolar dos 3 ciclos do ensino básico e da educação préescolar e as estruturas comunitárias de educação extraescolar para o desenvolvimento de populações social e economicamente desfavorecidas. A filosofia subjacente ao modelo de criação dos TEIP em Portugal aproximase das ZEP francesas (Zones d’Éducation Prioritaires) e das EAZ inglesas (Education Action Zones). Para conhecer o quadro comparativo das medidas políticas centrais, assentes numa lógica de territorialização e de autonomia das escolas, em diversos países europeus, ver Barroso (org.), 1999; AA.VV., 2000; e Canário e outros, 2001. 7 DL 286/89, que só virá a ser regulamentado em 1991 (Despacho 65/ME/91) dandose início a um período experimental apenas em 1993 com a aprovação do Despacho 171/ME/93, marcado por sucessivas dificuldades e controvérsias, que bloquearam qualquer eficácia.
27
Abordagem policial Esta segunda linha de argumentação sobre as situações de violência na escola reenvia,
no essencial, a responsabilidade de tais actos para aqueles que ocupam posições
desfavorecidas no espaço social. Tal concepção sustenta que:
a violência aumenta, em particular nas escolas situadas junto de zonas da periferia
degradada, marginal ou de bairros sociais;
a violência preexiste à escola, élhe exterior, existe uma inevitabilidade na
reprodução da violência contextual em violência escolar;
são os alunos de insucesso escolar os mais violentos, e, em particular os
provenientes de minorias étnicas.
Tais asserções partem do pressuposto de que as situações de violência na escola
resultam de uma “agressão” à comunidade escolar por elementos marginais,
provenientes desses bairros, razão pela qual aquela deve ser defendida. O “programa
escola segura” constitui a mais emblemática das medidas políticas decorrente desta
abordagem.
A primeira medida política, especificamente tomada para controlar o crescimento das
situações de violência dentro das escolas, é de 1992, e baseouse num protocolo entre o
Ministério da Educação e o Ministério da Administração Interna. 8 Criado com o
objectivo de coordenar esforços das autoridades escolares e forças policiais, este
protocolo era bastante sumário e excluía qualquer dimensão pedagógica. Dele resultou o
“programa escola segura”, coordenado pelo Gabinete de Segurança do Ministério da
Educação (criado em 1984), e implementado num número progressivamente maior de
escolas, durante os anos seguintes. A partir de 1995, o governo, de centro esquerda,
manteve na sua essência, as medidas políticas tomadas pelo anterior executivo,
nomeadamente este último programa.
Representando um significativo esforço financeiro por parte do estado e mobilizando
um número significativo de recursos policiais e guardas do gabinete de segurança do
ME, na sua forma actual, representa a defesa do modelo centralista de gestão do sistema
8 Politicamente a sua origem e implementação foi realizada por um governo de centro direita o que explica, em parte, a prevalência que a administração interna tem tido no seu desenvolvimento. Explicará também algumas das dificuldades sentidas na sua transformação de um programa de vigilância policial para um programa de educação cívica comunitária.
28
educativo. A mobilização dos diferentes agentes educativos existentes na comunidade, a
implementação de programas de educação cívica, a diversificação dos espaços
educativos escolares e extraescolares, simplesmente, não são contemplados,
privilegiandose antes uma abordagem policial. É interessante verificar, que o discurso
da segurança parece manter as diversas forças políticas “atadas” à “inevitabilidade” da
necessidade do seu crescimento, mesmo aquelas que preconizam visões alternativas do
sistema educativo. Tratase da aprendizagem, nos espaços escolares, da cidadania
policiada.
A concepção centralista assim traduzse, aliás, pela dificuldade da instituição em aceitar
a diversidade sociocultural como um bem, pressupondo que aquela dificulta os
processos de socialização de massas. Uma posição que se mantém mesmo quando
formalmente as directivas políticas e os quadros normativos parecem promover o
respeito pela diversidade. A escola defendese da comunidade com gradeamentos,
guardas e cartões de identificação, ensinando, assim, aos alunos os princípios da
cidadania desconfiada. O encerramento da escola parece ser, para alguns, a condição da
sua sobrevivência.
Alguma evolução legislativa foi entretanto efectuada, nomeadamente a publicação do
Decreto Lei nº 16/2001 combate à insegurança e violência em meio escolar , que
mantém o Programa Escola Segura sob a tutela do Ministério da Educação, em
coordenação com os da Administração Interna, da Cultura, Saúde, do Trabalho e
Solidariedade e da Juventude e Desporto; com a estrutura de acompanhamento ao
Programa Escola Segura agora integrada no Observatório do Ensino Básico e
Secundário.
Para além da investigação, está prevista ainda a elaboração de um guia sobre as medidas
contra a violência nas escolas, um acréscimo de qualificação das equipas especializadas
de apoio sociopedagógico; a consolidação da autoridade do pessoal docente; o
acompanhamento e responsabilização das famílias de alunos com comportamentos
violentos; ao mesmo tempo que se prevêem acções de apoio para os alunos vítimas de
violência escolar. O Decreto Lei nº 16/2001 recomenda ainda a concepção e integração
de módulos sobre violência e indisciplina na escola nos cursos de formação inicial e
contínua de professores.
Apesar do significativo avanço que tal programa representaria face à actual situação, é
de salientar que, mais uma vez, se procurava uma solução longe das comunidades
29
educativas. Sobre a situação actual pouco se sabe, já que o actual governo não se
pronunciou até ao momento sobre a sua visão para o problema.
A violência nos documentos oficiais Para identificar o uso de terminologia sobre violência, foram analisados diferentes tipos
de documentos e estatísticas. Primeiro, um grupo de documentos oficiais produzidos
durante a concepção e execução do “programa escola segura” (protocolos inter
ministeriais, regulamentos dos guardas escolares, questionários utilizados para registar
situações marginais e estatísticas). Segundo, a análise das regras nacionais para a
definição dos direitos e deveres dos alunos nos Regulamentos internos de escola e no
Regulamento disciplinar do aluno.
Os documentos oficiais caracterizamse pela ausência de uma definição de violência ou
pela não utilização do termo. Os documentos do “programa escola segura” utilizam,
sistematicamente, os termos (in)segurança ou marginalidade para descrever todas as
situações consideradas desviantes da norma escolar. Dentro da mesma categoria geral,
são considerados acontecimentos tão diferentes como alarmes de bomba, tráfico de
drogas ou roubos e assaltos. Esta situação é corrente nos questionários utilizados pelo
gabinete de segurança para relatar situações marginais, desde 1986. A revisão destes
questionários realizouse, com a progressiva compreensão, pelas autoridades, de que a
maioria das situações registadas eram perpetradas dentro da escola, por alunos, e não
eram resultados de acções de estranhos, vindos de bairros problemáticos da vizinhança.
Termos como bullying ou violência aparecem, pela primeira vez, como categorias independentes, em finais dos anos 90, mas ainda misturados com indisciplina, racismo
ou abuso sexual, e dentro da categoria mais geral de acções contra pessoas.
As regras nacionais para a definição dos direitos e deveres dos alunos nos regulamentos
internos de escola e no regulamento disciplinar do aluno, que constituem documentos
centrais para a produção de regulamentos locais, também nunca mencionam o termo
violência. A sua estratégia é centrada na promoção de competências sociais e na
formação cívica e educativa dos alunos, em vez de procurar categorizar os seus
comportamentos.
Em síntese, podemos afirmar que a presença de situações violentas nas escolas
portuguesas levou, durante a última década e meia, a um conjunto de medidas políticas
caracterizadas pelas diferentes compreensões das suas causas e filosofias de
intervenção. Cada uma das duas perspectivas tem os seus defensores e tornase difícil
30
afirmar que trabalhem em conjunto, sendo as diferentes medidas geralmente pouco
coordenadas e apresentando um elevado potencial de desperdício de recursos; expresso
na “confusão” terminológica evidenciada nos documentos oficiais.
3.2 – O Programa Escola Segura: alguns resultados da sua implementação
3.2.1 – Origem e pressupostos do programa
É a partir de meados dos anos 80 que a questão da segurança nas escolas começa
lentamente a transformarse numa questão que merece a atenção das autoridades
educativas. De facto, após um crescendo “invisível” de actos violentos (assaltos,
agressões, destruição de propriedade, etc), e da pressão resultante das reclamações das
escolas, associações de pais e sindicatos, o poder político toma as primeiras medidas
tendentes a minimizar o problema 9 . São momentos centrais desse processo a criação do
Gabinete de Segurança do Ministério da Educação em 1984; a colaboração não
sistemática para garantir segurança às escolas durante os anos 80 entre o Ministério da
Educação e o Ministério da Administração Interna, seguido pela assinatura de um
protocolo em 1992 que estruturou a cooperação, reafirmado em 1996 sob a designação
de Programa Escola Segura. Os objectivos deste protocolo consistiam na promoção de condições de segurança nas escolas para que a liberdade de aprender e ensinar pudesse
ser efectivamente possível. Os promotores do Programa Escola Segura consideraram
que a violência escolar era provocada por jovens marginais provenientes de bairros
problemáticos da vizinhança dos estabelecimentos escolares, sendo necessário evitar o
que consideravam como verdadeiras agressões às comunidades escolares. Inicialmente
os responsáveis do programa entendiam que a metodologia adequada para lidar com a
situação seria centrar a sua atenção em sensibilizar escolas, famílias e comunidades para
este problema. Simultaneamente com estas medidas três linhas de intervenção foram
definidas:
em primeiro lugar, a presença regular de polícias no exterior da escola,
em segundo, a criação de um corpo de guardas escolares dependente
directamente do Gabinete de Segurança do Ministério da Educação;
9 De salientar que apesar da relativa frequência de casos estes nunca obtiveram uma mediatização significativa, o que contribuiu para os manter numa relativa penumbra.
31
por último a tentativa para treinar os funcionários das escolas para lidar com
ameaças vindas do exterior.
Até meados dos anos 90 o Programa Escola Segura constituiu a única política para lidar
com as situações de violência, e, no essencial, acabou por se basear numa perspectiva
preventiva de base policial. A sua implementação ficou a cargo do Gabinete de
Segurança do Ministério da Educação (GSME) em cooperação com o Ministério da
Administração Interna (Forças Policiais e Governadores de Distrito).
Âmbito de actuação e estrutura organizacional do programa Todas as escolas públicas do país do ensino nãosuperior, geridas directamente pelo
Ministério da Educação (2º e 3º ciclos do Ensino Básico, Ensino Secundário). Apesar de
as escolas do 1º ciclo do Ensino Básico não serem da responsabilidade directa do
Ministério da Educação existem escolas com programas de segurança negociados com
as respectivas Câmaras Municipais.
O conjunto das escolas encontrase classificado em quatro níveis de segurança,
conforme o tipo e extensão dos problemas detectados. Os níveis de segurança
organizamse da seguinte forma:
escolas com problemas no interior e exterior;
escolas com problemas só no interior;
escolas em observação inicial;
todas as outras escolas.
Estrutura organizacional O Programa Escola Segura possui duas vertentes articuladas entre si, embora independentes. A primeira é coordenada pelo Gabinete de Segurança do Ministério da
Educação e apoiase numa estrutura de delegados de segurança existentes em todas as
escolas do país, assim como nas Direcções Regionais de Educação e nos Centros de
Área Educativa. O Gabinete de Segurança possui ainda na sua dependência hierárquica
directa um corpo de agentes de segurança através do qual desenvolve o essencial da sua
actuação dentro dos espaços escolares. Enquanto presentes nas escolas, os agentes
dependem também operacionalmente do Conselho Directo das mesmas.
A selecção e recrutamento dos agentes de segurança é feita essencialmente entre ex
agentes da polícia que se encontram na situação de reforma. A sua selecção realizase
32
através de análise curricular, de informações sobre o seu desempenho enquanto se
encontravam na polícia e das avaliações regularmente fornecidas pelas direcções das
escolas sobre o seu desempenho, integração e sensibilidade para as funções. Ao
iniciarem funções élhes fornecida formação sobre os objectivos prioritários de
actuação, estratégias de intervenção e procedimentos em situações de risco. A formação
sobre princípios e regras de segurança foi também já possibilitada aos auxiliares de
acção educativa em algumas regiões do país e a algumas associações de pais e de
estudantes.
O objectivo principal da actuação dos agentes de segurança é a prevenção das situações
de violência e delinquência dentro dos espaços escolares. Para isso a recolha de
informações sobre potenciais situações de risco, o estabelecimento de boas relações com
a comunidade educativa (em particular com os alunos), as famílias e a restante
comunidade exterior à escola, constitui um elemento fundamental. Cada agente deve
pois possuir uma visão clara das situações de risco existentes na escola e no seu
contexto exterior, a qual é prioritariamente transmitida ao Conselho Directivo da
respectiva escola.
A actuação destes agentes não se confunde com a actuação disciplinar própria da escola,
não podendo encontrarse em conflito com esta, sendo a intervenção apenas possível a
pedido expresso do Conselho Directo. Os agentes apenas intervêm quando se deparam
com situações inesperadas de violência entre alunos, destruição de bens/vandalismo,
assaltos, utilização de armas, ataques de carácter sexual. O essencial da sua actividade
procura prevenir o aparecimento desse tipo de situações, procurando identificar e
dialogar com os eventuais líderes de grupos, ganhando a sua confiança, ou afastando
elementos exteriores às escolas considerados perturbadores. Em qualquer dos casos a
sua actuação deve ser discutida com o Conselho Directo da escola. Os agentes de
segurança pública dependentes do GSME coordenam também a sua actividade com as
forças de segurança da área (PSP ou GNR) e os guardas nocturnos, não se substituindo
a estes, pois não possuem o mesmo estatuto legal.
A segunda dimensão diz respeito à actuação das forças de segurança. A actividade das
forças policiais diz respeito ao patrulhamento do espaço envolvente das escolas e dos
percursos casaescola. Existe ainda um conjunto de viaturas (cerca de 200) fornecidas
33
pelos governos civis que estão identificadas com o logotipo do programa e que circulam
junto às escolas com os piquetes de segurança, possuindo um efeito essencialmente
dissuasor.
É de assinalar o elevado e crescente número de recursos humanos e materiais afectos ao
programa, como podemos constatar pela leitura dos quadros seguinte.
Quadro nº1 Recursos Humanos e Materiais afectos em exclusividade ao Programa
Escola Segura 2000
PSP GNR GS/ME Total Recur sos Humanos 295 411 706 Recursos Mater iais Viaturas 167 187 7 361 Recursos Mater iais Ciclomotores 116 116 Recursos Mater iais Telemóveis 70 38 11 119
Fonte: Ministério da Educação, 1999
Para o ano de 2003, e tomando como referência a PSP, no âmbito do Programa,
encontramos a seguintes distribuição de Recursos.
Quadro nº2 Recursos da PSP afectos em exclusividade ao Programa Escola
Segura para o ano de 2003
Recursos Total Número de agentes do Programa Escola Segura 310 Número de viaturas 114 + 16 carros patrulha Motociclos 39 Scooters 48 Fonte: Relatório PSP 2002/03
34
3.2.2 – A informação produzida no âmbito do programa
A informação produzida pelo Gabinete de Segurança do Ministério da Educação
constitui o único exemplo institucional de recolha extensiva de informação relativa à
violência em meio escolar, sendo constituída pelas comunicações de ocorrências
realizadas pelas escolas a nível nacional nos anos entre 1995 e 2000. Esta informação
possui um alcance e fiabilidade limitadas na medida em que as informações disponíveis
resultam apenas das ocorrências declaradas e não das efectivamente ocorridas, facto que
se pode atribuir, essencialmente, a motivos de carácter organizacional.
O desconhecimento da obrigatoriedade dos Conselhos Executivos de procederem à
comunicação da totalidade dos incidentes à Direcção Regional de Educação (DRE), ao
Centro de Área educativa (CAE) e ao Gabinete de Segurança do Ministério da
Educação (GSME), a burocratização dos processos de comunicação; a adopção de
estratégias de ocultação de situações de violência que possam contribuir para a
degradação da imagem da escola, e para a prática de actos retaliatórios contra os
queixosos; a tentativa de limitar o efeito de difusão do fenómeno por imitação,
encontramse entre as causas que levam à prática generalizada de não comunicação das
ocorrências.
Outro factor que condiciona a fiabilidade dos dados resulta da dificuldade em encontrar
uma definição de violência (ou acto violento) comum a todos os intervenientes. Assim a
subjectividade inerente à avaliação individual de cada situação e a banalização da
utilização desta noção no quotidiano escolar (em que, por excesso, tudo é violento, ou,
tudo é relativizado) contribui igualmente para o baixo empenhamento de algumas
escolas na recolha da informação, reforçando assim para o enviesamento dos dados
disponíveis.
Os instrumentos de recolha constituem igualmente uma fonte importante de problemas
no que respeita à fiabilidade dos dados recolhidos. A sua estrutura; as categorias
utilizadas, que muitas vezes se recobrem ou são totalmente subjectivas; a utilização de
terminologias que remetem para diferentes leituras (bullying, por exemplo.), tornaas
frequentemente desadequadas.
35
Apesar destas insuficiências, consideramos que na ausência de outra informação de
nível nacional, se justifica a sua utilização, mesmo que a sua leitura não possa fornecer
mais que algumas indicações pouco fiáveis.
As ocorrências registadas O Gabinete de Segurança do Ministério da Educação registou 433 ocorrências para o
ano de 1995, 914 em 1996, 949 em 1997, e em 1998 foram registados 816 casos. Para o
ano 2000 o Gabinete de Segurança registou 1873. Relativamente aos anos de 1999 e
2000 o Gabinete de Segurança introduziu alterações nos instrumentos de recolha,
nomeadamente com a inclusão de novas categorias como gangs e grupos, drogas lícitas. Para os anos escolares posteriores a 2000 destacase a organização dos dados a
partir dos registos efectuados pelas forças policiais como a PSP e GNR.
Há, portanto, ou uma contabilização deficiente das ocorrências, ou os fenómenos
designados por violência tem uma representação reduzida no universo escolar, mesmo
considerando que este tipo de estatísticas subavalia sempre as situações efectivamente
ocorridas. Contudo, pela leitura dos registos existentes podemos concluir que há uma
tendência de aumento das ocorrências registadas 10 , e algumas variações interessantes.
Em primeiro lugar constatamse as diferenças significativas na distribuição regional das
ocorrências (Quadro nº1), com incidência especial nas áreas abrangidas pelas Direcções
Regionais de Educação de Lisboa e do Norte, que apresentam sempre os valores mais
elevados para todos os anos referidos.
Quadro nº3 Número de ocorrências de situações de violência em meio escolar,
segundo a sua distribuição regional (19951998)
Direcções Regionais Educação
1995 1996 1997 1998
Lisboa 198 (45,73%)
557 (60,94%)
548 (57,74%)
488 (59,80%)
Nor te 147 (33,95%)
192 (21,01%)
236 (24,87%)
185 (22,67%)
Centro 32(7,39%)
96(10,50%)
76(8,01%)
61(7,48%)
10 À qual não será alheia a tentativa do GSME para melhorar a recolha de informação, podendo apenas representar um aumento de eficácia no seu registo.
36
Algarve 48(11,09%)
45(4,92%)
58(6,11%)
48(7,11%)
Alentejo 8 (1,85%)
24(2,63%)
31(3,27%)
24(2,94%)
Total 433 914 949 816 Fonte: Ministério da Educação, 1999
Face à sobrerepresentação nestas duas Direcções Regionais de Educação, que em parte
coincidem com as Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto, poderseão levantar
algumas hipóteses: em primeiro lugar a própria dimensão da população escolar e dos
estabelecimentos aí existentes; em segundo a maior diversidade de públicos, com o
consequente aumento da conflitualidade, à existência de situações graves de exclusão e
conflitualidade social; e, finalmente a uma maior ocorrência de situações de
marginalidade infantil e juvenil. Na situação oposta encontrase a Direcção Regional de
Educação do Alentejo onde se encontra o maior número de escolas rurais isoladas do
país, correspondente a uma área marcada pela profunda desertificação, em particular em
toda a sua faixa interior. Seria contudo fundamental compreender melhor as dinâmicas
internas particulares das diferentes regiões e estabelecimentos escolares, através de uma
necessária desagregação da informação, já que de outra forma poderemos incorrer em
análises pouco esclarecedoras.
Para além da distribuição das ocorrências no território nacional os relatórios do GSME
consideram também na sua análise o tipo de situação violentas, informação apenas
disponível para os anos de 1995 a 1998 (Quadro nº2).
Quadro nº4 Número de ocorrências por tipo de situação de violência em meio escolar
19951998
Tipos/Situações de violência 1995 1996 1997 1998 Roubo e vandalismo 248
65,59% 408 44,64%
376 39,62%
258 31,74%
Violência no inter ior da escola 5713,16%
586,35%
117 12,33%
161 19,73%
Violência nos acessos à escola 368,31%
475,14%
925,14%
161 19,73%
Droga 276,24%
616,67%
808,43%
435,27%
Disparos 1 5,56%
9 0,98%
5 0,53%
192,33%
Ameaça de bomba 184,16%
312 34,14%
238 25,08%
819 93%
Assédio sexual 5 1,15%
101,09%
262,47%
435,27%
Fogo posto 4 2 1 5
37
0,92% 0,22% 0,22% 0,61% Alcoolismo 1
0,23% 20
21%
Racismo 1 0,11%
1 0,11%
3 0,37%
Outros 6 0,66%
111,16%
415,02%
Fonte: Ministério da Educação, 1999
No que diz respeito ao tipo de ocorrências registadas verificase uma lenta
transformação das suas características. A categoria que recolhe maior número de
registos, Roubo e Vandalismo, vem de forma mais ou menos rápida a registar uma
redução significativa. Esta resultará provavelmente do facto de as escolas terem vindo a
desenvolver maior atenção à guarda do material escolar, à colocação de guardas
nocturnos, assim como da implementação do Programa Escola Segura que garante a
vigilância das escolas pelas forças policiais e por guardas escolares.
Paralela à perca de importância da categoria atrás referida há a registar o aumento
significativo das situações de violência (agressão física, assaltos, ...), sendo que a categoria agressão mantém em geral um valor mais expressivo, com excepção da
Direcção da Região do Norte. Os relatórios referem que as estações de Outono e
Inverno são a época de maior incidência de ocorrências nos acessos às escolas,
facilitadas pela redução da luminosidade no final do dia.
Cerca de 80% das ocorrências de Ameaças de Bomba dãose nos períodos lectivos, coincidindo com o início do ano lectivo, as épocas de avaliação e com o Carnaval. É de
referir que apesar de inúmeras ameaças de bomba nunca se registou qualquer incidente
deste tipo.
Para os anos de 1999 e 2000 contamos com as informações produzidas pelo Programa
Escola Segura que reúne os registos de ocorrências da PSP e GNR e do Gabinete de
Segurança do Ministério da Educação. O relatório final de avaliação do Programa
sublinha a inexistência de uma metodologia uniforme na recolha e tratamento dos dados
seja das diferentes forças policiais, seja do próprio Ministério da Educação. Por este
motivo não há possibilidade de se proceder a uma análise comparativa, seja a nível
nacional ou local, o que obriga ainda à apresentação dos dados separados por força
policial.
38
Quadro nº 5 Ocorrências da PSP – Todos os estabelecimentos de ensino
Tipo de Ocor rências 98/99 99/00
Ameaça de bomba 76 111
Posse/uso de armas 16 18
Ofensas corporais 126 282
Danos 129 135
Posse/ Consumo de estupefacientes 12 44
Fur to 523 666
Ameaça/injúr ia 47 108
Rapto/ sequestro 3
Roubo 49 178
Ofensa sexual 3 42
Vandalismo 31 116
Outro 48 30
Total 1060 1733
Fonte: Relatório Final Programa Escola Segura, MAI/ME, 2000
Os quadros nº 4 e nº 5 resultam do registo de ocorrências da PSP, sendo que o primeiro
se refere à totalidade das escolas, e o segundo apresenta os valores encontrados apenas
para as escolas abrangidas pelo Protocolo MAI/ME. Contudo, não é possível a
comparação das escolas do Protocolo face à totalidade de escolas, na medida em que as
categorias são diferentes apesar de as directrizes de actuação provirem do mesmo
organismo. Por exemplo, se para a PSP contamos com posse e consumo de
estupefacientes, ofensa sexual e ameaça de bomba, já nos formulários de registo de ocorrências do Programa da Escola Segura estas categorias estão ausentes. Ainda, como
distinguir entre furto e roubo? Como diferenciar danos de vandalismo? Por fim, como interpretar a categoria posse/consumo de estupefacientes, na perspectiva da violência na escola (violência autoinflingida?).
Se no quadro nº 4 a categoria cuja frequência mais elevada é relativa aos furtos, tanto para 98/99 com 523, e para 99/00 com 600, destacandose significativamente dos
restantes, já no quadro nº 5 encontramos a mesma categoria modal mas já não tão
distanciada, sendo que, a que mais se aproxima é a relativa a outros.
39
Quadro nº 6 – Ocorrências registadas pela PSP nas Escolas do Protocolo
MAI/ME 1996/99
Tipo de Ocor rências 96/07 97/98 98/99
Danos 6 8 7
Vandalismo 1 1 3
Fur tos 24 36 29
Roubos 4 4 9
Injúr ias/ameaças 7 10 7
Ofensas corporais 14 33 17
Outros 53 47 35
Total 109 139 107
Fonte: Relatório Final Programa Escola Segura, MAI/ME, 2000
A GNR, tal como a PSP, é responsável pelo registo de ocorrências, porém, esta força
policial apresenta uma modalidade distinta de registo. Assim, e como se pode ler no
quadro seguinte, distingue entre Acções Contra Pessoas e Acções Contra Bens, contudo
a presença de categorias tais como greve de alunos, drogas lícitas ou acidentes, e ainda pequena violência levantamnos algumas reservas e interrogações.
Quadro nº 7 – Ocorrências registadas pela GNR em 2000
Acções sobre bens
Roubo e furto sobre instalações e equipamentos 129
Vandalismo sobre instalações e equipamentos 48
Fogo posto 2
Acções sobre as pessoas
Extorsão 4
Ameaça 4
Chantagem 1
Pequena violência 38
Violência sobre os professores 1
Violência sobre os funcionários 3
Violência sobre os alunos 41
Indisciplina sobre os professores 8
Indisciplina sobre os funcionários 5
Violação 3
Assédio 2
Aliciamento 7
Grupos/gangs de alunos 2
40
Grupos/ gangs de estranhos 2
Tráfego/ consumo de droga 3
Ameaça de bomba 13
Armas brancas detectadas 23
Armas de fogo 1
Greves de alunos 22
Acidentes 5
Outros 10
Fonte: Relatório Final Programa Escola Segura, MAI/ME, 2000
Para o ano de 2000 o Gabinete de Segurança do Ministério da Educação introduziu
alterações significativas na recolha e tratamento da informação relativa à violência
escolar passando a distinguir entre Acções Contra Bens e Acções Contra Pessoas, e, pela primeira vez, são diferenciadas as acções contra funcionários, professores e alunos.
Quadro nº 8 – Ocorrências registadas pelo GSME, 2000
Acções sobre bens
Roubo e furto sobre instalações e equipamentos 269
Vandalismo sobre instalações e equipamentos 158
Fogo posto 17
Disparos 8
Sobre bens de professores 24
Sobre bens de funcionários 10
Sobre bens de alunos 87
Total 573
Acções sobre as pessoas
Bullying 179
Violência na escola 336
Violência no exterior da escola 238
Assédio/abuso sexual sobre discentes 20
Grupos/gangs 77
Droga ilícita 232
Droga lícita 42
Atitudes racistas 9
Ameaça de bomba 105
Armas brancas detectadas 56
Armas de fogo detectadas 6
Total 1300
41
Fonte: Relatório Final Programa Escola Segura, MAI/ME, 2000
No que diz respeito às Acções contra pessoas (quadro nº 7), tal como para os anos escolares anteriores, destacamse de forma significativa a DRE de Lisboa e Vale do
Tejo e a DRE Norte.
Quadro nº 9 Acções contra as pessoas por DRE (Direcção Regional de Educação), 2000
Região Frequência Percentagem
Nor te 1195 37,7%
Centro 213 6,7%
Lisboa 1596 50,4%
Alentejo 34 1,1%
Algarve 129 4,1%
Fonte: Gabinete de Segurança do Ministério da Educação, 2001
Os dados integrados sob a designação genérica Acções contra pessoas (Quadro nº 8) exemplificam bem as dificuldades em analisar a informação disponível. Misturamse
aqui categorias relativas a acções violentas, sem que estas sejam devidamente
explicitadas, com categorias respeitantes aos locais onde essas acções foram cometidas.
Quadro nº 10 – Acções contra pessoas por tipo de ocorrência, em percentagem, 2000
Acções contra pessoas Percentagem
Acções de bullying 19,2%
Acções contra pessoas no interior da escola 28,6%
Acções contra pessoas no exter ior da escola 23,7%
Outras acções contra pessoas 28,4%
Fonte: Gabinete de Segurança do Ministério da Educação, 2001
A desagregação da categoria Acções contra pessoas no interior da escola, ao distinguir entre professores, funcionários e alunos, permite realizar algumas observações
interessantes. Podemos encontrar variações significativas que mostram discrepâncias
importantes entre regiões. É em Lisboa que as acções contra professores e funcionários
são mais significativas, sendo as acções contra os alunos mais frequentes na região
Norte.
42
Quadro nº 11 Acções contra pessoas dentro da escola, em percentagem,
por regiões, 2000
Regiões Professores Funcionár ios Alunos
Nor te 30,9% 23,5% 49,5%
Centro 4,3% 1,2% 4,5%
Lisboa 61,2% 70,5% 39,4%
Alentejo 3,6% 1,2% 0,3%
Algarve 3,6% 6,3%
Fonte: Gabinete de Segurança do Ministério da Educação, 2001
As ocorrências registadas para o exterior da escola mostram uma inversão em relação ao
interior da escola, é na região Norte que professores e funcionários são mais agredidos,
e em Lisboa os alunos.
Quadro nº 12 Acções contra pessoas no exterior da escola, em percentagem,
por regiões, 2000
Regiões Professores Funcionár ios Alunos
Nor te 72,0% 80,6% 29,4%
Centro 3,5%
Lisboa 20,0% 12,9% 65,9%
Alentejo 3,2% 0,1%
Algarve 8,0% 3,2% 1,2%
Fonte: Gabinete de Segurança do Ministério da Educação, 2001
As situações mais frequentes no que diz respeito às Acções contra bens são globalmente
as relativas a Roubo/furto e Vandalismo sobre instalações e equipamentos. De destacar que na região de Lisboa, apesar dessa tendência também se afirmar, assume particular
importância o Roubo/furto e vandalismo sobre bens de alunos.
Quadro nº 13 – Acções contra bens, por Direcção Regional de Educação,
em percentagem, 2000
Acções contra bens Nor te Centro Lisboa Alentejo Algarve Roubo/fur to sobre instalações e equipamentos
11,2% 3,4% 14,8% 1,2% 2,7%
Vandalismo sobre instalações e equipamentos
13,9% 3,6% 9,2% 0,6% 2,0%
Roubo/fur to e vandalismo sobre bens de professores
1,3% 1,7%
Roubo/fur to e vandalismo sobre bens de funcionár ios
0,7% 0,1% 1,2% 0,2% 0,1%
Roubo/fur to e vandalismo 11,7% 18,0% 0,2% 1,7%
43
sobre bens de alunos Total 38,8% 7,2%% 44,9% 2,2% 6,8% Fonte: Gabinete de Segurança do Ministério da Educação, 2001
A informação relativa ao Programa para os anos lectivos a partir de 2000/01 encontrase
disponibilizada por cada uma das forças policiais. Assim, embora digam respeito ao
mesmo âmbito apresentamolos segundo as fontes.
Relativamente à PSP é considerada, no âmbito do Programa, como área da sua
responsabilidade um total de 832.082 alunos encontrandose distribuindose da seguinte
forma:
Quadro nº 14 – Âmbito de actuação da PSP tipo e número de estabelecimentos por número de
alunos e grau de ensino, no ano lectivo 2002/03
N.º de Estabelecimentos de Ensino Público Pr ivado
Nº de Alunos
Básico (1.º Ciclo) 1.245 266 173.056 Básico (2.º Ciclo) 334 131 113.825 Básico (3.º Ciclo) 371 124 131.405 Secundár io 289 117 200.404 Super ior 125 73 213.392 TOTAL 2.101 599 832.082 Fonte: Relatório PSP 2002/03
O registo de ocorrências acompanhadas pela PSP são, desde o ano lectivo de 2000/01,
reunidas por esta força segundo o mesmo instrumento. O quadro seguinte apresenta a
evolução das ocorrências nas áreas escolares de intervenção desta força, até ao ano
lectivo passado.
Quadro nº 15 – Registo de ocorrências da PSP em valores absolutos por ano lectivo, 2000/03
Tipo de ocor rência 2000/01 2001/02 2002/03 Total Ameaça de bomba 79 103 49 875 Fur to 777 797 868 4773 Roubo 466 662 654 2082 Posse/uso de arma 45 48 39 183 Vandalismo/danos 272 310 262 1606 Injúr ias/ameaças 182 169 199 774 Ofensas integr idade física 411 467 519 2002 Posse/Consumo de estupefacientes 60 98 76 308 Ofensas sexuais 77 105 73 321 Outro Tipo 65 59 58 353
Total 2434 2818 2797 13277 Fonte: Relatório PSP 2002/03
44
Em termos territoriais a distribuição geográfica de ocorrências no ano lectivo 2002/2003
não se distancia significativamente dos valores anteriormente discutidos, mantendose o
destaque para as zonas mais urbanizadas.
Quadro nº 16 – Registo de ocorrências pela PSP por distrito, no ano lectivo 2002/03
Distr ito Total de ocor rências Percentagem Aveiro 136 4,9% Beja 22 0,8% Braga 172 6,1% Bragança 49 1,8% Castelo Branco 18 0,6% Coimbra 40 1,4% Évora 28 1,0% Faro 112 4,0% Guarda 3 0,1% Leir ia 56 2,0% Lisboa 1056 37,8% Por talegre 8 0,3% Por to 707 25,3% Santarém 35 1,3% Setúbal 168 6,0% Viana do Castelo 5 0,2% Vila Real 3 0,1% Viseu 11 0,4% Madeira 99 3,5% Ponta Delgada 32 1,1% Angra Heroísmo 32 1,1% Hor ta 5 0,2%
TOTAL 2797 Fonte: Relatório PSP 2002/03
Ainda no ano lectivo 2002/2003, a PSP realizou cerca de 371 detenções de suspeitos,
relativas a ocorrências em áreas escolares. O tratamento de informação deste tipo, assim
como a sua disponibilização evidenciam a preocupação das forças policiais com a
apresentação de informação relativa à sua intervenção.
Quadro nº 17 – Número de detenções efectuadas pela PSP em áreas escolares por tipo de ocorrência no ano lectivo 2002/03 Tipo de ocor rência Número de detenções Fur to 81 Roubo 33 Ofensas à integr idade física 110 Injúr ias/Ameaças 57 Tráfico de Estupefacientes 8 Posse/Uso de arma 13 Vandalismo/Danos 26 Ameaça de Bomba 7 Ofensas Sexuais 18
45
Outro tipo 18 TOTAL 371 Fonte: Relatório PSP 2002/03
Por fim, a informação reunida e tratada pela GNR no mesmo âmbito para os anos de
2001 a 2003. Esta força policial utiliza um conjunto de categorias distinto da anterior,
embora, ao contrário da PSP, não tenha conseguido ainda estabilizar as categorias dos
instrumentos de recolha.
Quadro nº 18 – Registo de ocorrências do Programa Escola Segura pela GNR, 2001 Tipo de ocor rências Número de ocor rências
Acções sobre bens Instalações e equipamentos Fur to 235 Vandalismo 78 Fogo posto 2 Disparos 10
TOTAL 325 Bens da Comunidade Educativa Professores 15 Funcionár ios 5 Alunos 63 Escola 215
TOTAL 298 TOTAL 623
Acções sobre pessoas Extorção 5 Humilhação 7 Ameaça 6 Pequena Violência 14 Indisciplina sobre: Professores 3 Indisciplina sobre: Funcionár ios 1 Assédio/abuso sexual: Violação 1 Assédio/abuso sexual: Assédio 9 Assédio/abuso sexual: Aliciamento 1 Tráfico/consumo droga 5 Ameaças de bomba 13 Armas Brancas 2 Armas fogo 3 Diver sos 6
TOTAL 76 TOTAL 699
Fonte: GNR, Relatório Programa Escola Segura 2001
Quadro nº 19 – Registo de ocorrências do Programa Escola Segura pela GNR, 2002 Tipo de ocor rências Número de ocor rências
Acções Sobre os Bens Furto/Roubo 422 Vandalismo 27 Fogo Posto 75
TOTAL 528 Acções Sobre as Pessoas Ameaça 17
46
Pequena Violência 57 Actividades Pertubadoras Acção Escolar 13 Acidentes Viação Alunos 4 Ofensa Sexual 14 Assédio 11 Violação 3 Tráfico/consumo droga 6 Ameaças de bomba 25 Armas Brancas/Fogo 7 Diversos 64
TOTAL 221 TOTAL 749
Fonte: GNR, Relatório Programa Escola Segura 2002
Quadro nº 20 – Registo de ocorrências do Programa Escola Segura pela GNR, 2003
Tipo de ocor rências Número de ocor rências Acções Sobre os Bens Furto 346 Roubo 28 Vandalismo 77 Fogo Posto 1
TOTAL 452 Acções Sobre as Pessoas Ofensa Corporal 22 Ofensa Sexual 3 Assédio 1 Violação 1 Injúrias/Ameaças 16 Tráfico/consumo droga 4 Ameaças de bomba 14 Armas Brancas/Fogo 3 Acidentes Viação Alunos 2 Outras acções não criminais 19 Outras acções criminais 22
TOTAL 107 TOTAL 559
Fonte: GNR, Relatório Programa Escola Segura 2003
Podemos concluir afirmando que as diferenças e problemas metodológicos respeitantes
à recolha de informação pelas diferentes forças policiais, GNR e PSP, ou pelo Gabinete
de Segurança do Ministério da Educação, não nos permitem proceder com rigor a uma
análise comparativa esclarecedora.
Apesar de a maioria das pesquisas sublinhar a importância de estruturar redes locais
para apoiar a intervenção articulada dos agentes educativos e uma gestão integrada dos
recursos para atingir o sucesso escolar, há uma forte resistência de diferentes agentes
47
educativos à descentralização nos diferentes níveis do sistema educativo, resultante dos
modelos de organizacionais e pedagógicos profundamente arreigados.
48
4 – Encontros e desencontros: a violência no quotidiano escolar 11
4.1 Nota introdutória
A ocorrência de situações de violência nas escolas tem dado origem a variados
discursos mediáticos e políticos que se traduzem numa orientação selectiva da opinião
pública para estabelecimentos e contextos socialmente desfavorecidos, ocultando ou
ignorando as raízes e extensão do problema. A importância destes discursos é tal que se
constitui num obstáculo à própria progressão da pesquisa 12 e intervenção social.
A associação frequente entre violência na escola e contextos socialmente desfavorecidos
levounos a orientar a nossa pesquisa para meios escolares que à partida não se
encontrassem estigmatizados por este tipo de concepções. Por esta razão optámos pela
realização de um estudo de caso numa escola que não se situasse na proximidades de
bairros degradados e onde a multiculturalidade não constituísse um traço distintivo, pois
os fenómenos de violência são correntemente associados, nos discursos mediáticos e de
senso comum, a estas características. circunstâncias a que os já referidos discursos
associam os fenómenos de violência. A selecção uma escola do 2º e 3º ciclos ensino
básico, situada no centro urbano de Lisboa, justificase ainda, pelas indicações teóricas
e empíricas 13 disponíveis, que apontam estes ciclos de ensino como aqueles em que as
situações violência são mais frequentes.
4.2 Caracterização do estabelecimento escolar
O estabelecimento escolar localizase em plena baixa de Lisboa, numa freguesia
marcada pelo reduzido número de residentes (apenas 1168 recenseados) e uma
população flutuante muito significativa ligada ao comércio tradicional ou de lazer.
Inicialmente ligada à Escola Francisco Arruda, funcionou como secção desta no
Conservatório Nacional e posteriormente no Palácio Cabral. Autonomizouse em 1976,
sediandose então na Rua das Chagas, no palacete anteriormente ocupado pelo Instituto
11 Este capítulo resulta de um projecto de investigação financiado pelo Instituto Inovação Educacional, no âmbito da Medida 2, do Programa SIQE, com o título “A produção da violência na escola”, realizado por João Sebastião, Mariana Gaio Alves, Patrícia Amaral. 12 Charlot e Émin (1997) 13 Pereira, Mendonça, Neto, Almeida, Valente (1996); Gabinete de segurança do Ministério da Educação (1999).
49
Comercial de Lisboa. No ano lectivo de 1997/98, passou a Escola do Ensino Básico dos
2º e 3º ciclos, assim se mantendo até hoje. A escola integrase num território educativo
de intervenção prioritária (TEIP) desde 1997/98, do qual também fazem parte 3 escolas
básicas do 1º ciclo e um jardim de infância.
Os alunos No ano lectivo de 1999/2000, a escola era frequentada por 434 alunos do 2º e 3º ciclos,
com um total de 22 turmas. Houve uma redução acentuada do número de alunos
comparativamente ao ano de 1998/99, em que se encontravam 650 alunos inscritos.
Quadro nº 21 Número de alunos por anos de escolaridade (1999/2000)
Anos de Escolaridade Número de Turmas Número de alunos
5º ano 6 126 6º ano 8 160 7º ano 2 38 8º ano 3 55 9º ano 3 55
Total 22 434
A escola integra essencialmente alunos provenientes de freguesias do centro de
Lisboa 14 , contudo, o facto de se situar numa zona comercial central, leva a que muitos
alunos sejam provenientes da periferia, acompanhando os seus pais quotidianamente
nos movimentos pendulares casaemprego.
Serviço de Acção Social Escolar
O facto de mais de metade dos alunos da escola serem apoiados pelo SASE (Serviço de
Acção Social Escolar) constitui um indicador através do qual se pode inferir da sua
origem socioeconómica e evidencia uma população escolar com carências materiais.
Com efeito, no ano lectivo de 1999/00 foram apoiados 69,6% dos alunos do 2º ciclo
(escalão A e B), percentagem que se reduz ligeiramente no 3º ciclo para 62,9%
14 Freguesias de Santa Catarina, Mercês, Sacramento, São Paulo, São José, Mártires, Santa Justa, Encarnação, Coração de Jesus, Madalena, Santiago, Santo Estevão, SantosoVelho, São Nicolau, S. Mamede, São Cristovão, São Lourenço, Socorro e Sé.
50
Gráfico nº 1 – Nº de alunos abrangidos pela A.S.E Ano lectivo de 1999/00)
0 20 40 60 80 100 120 140 160 180
5º ano 6º ano 7º ano 8º ano 9º ano
Anos de escolaridade
Nº d
e alun
os
Nº alunos ASE
Os Professores O corpo docente da escola é constituído por 62 professores, encontramse destacados
noutras escolas e serviços 6 professores do 2º ciclo e 5 professores do 3º ciclo.
Salientase que o corpo docente em funções na escola é em grande parte constituído por
41 professores do quadro de nomeação definitiva, seguindose os contratados com um
total de 12 professores de ambos os ciclos. Apenas 8 professores estão destacados nesta
escola e somente 1 é professor de quadro de zona pedagógica.
Esta situação confirma o panorama de estabilidade relativa dos quadros de docentes das
escolas das zonas urbanas centrais, estabelecimentos mais desejados pela sua
acessibilidade, prestígio e eventual inexistência de problemas com as populações
escolares.
Quadro nº 22 Número de professores por ciclo em função das suas categorias
profissionais
Categorias 2º Ciclo 3º Ciclo Total
Professores do Quadro Nomeação Definitiva 27 14 41 Professores Destacados 5 3 8 Professores Contratados 9 3 12 Professores de Quadro de Zona Pedagógica 1 1 Total 41 21 62
51
Pessoal não docente Consideramos relevante o facto de a escola contar com o apoio de duas Psicólogas, uma
Técnica Superior de Serviço Social, um Professor de Apoio Educativo e uma Técnica
do SASE, todos pertencentes ao quadro, facto que em escolas de maior dimensão muitas
vezes não será fácil encontrar.
Além do pessoal não docente com funções educativas a escola conta ainda com um
elemento do Pessoal da Limpeza, dois Guardas Nocturnos e seis Auxiliares de Acção
Educativa.
Quadro nº 23 Número de funcionários em função da sua situação profissional
Categor ias Do Quadro Contratados Total
Psicólogas 2 2 Técnica Superior do Serviço Social 1 ∗ 1 Professor do Apoio Educativo 1 1 Técnica do ASE 1 1 Pessoal de Administração Escolar 8 8 Auxiliares de Acção Educativa 13 6 19 Técnicos de Laboratório 1 1 Pessoal de Limpeza 1 1 Guarda Nocturno 2 2 Total 27 9 36
∗ A Técnica Superior do Serviço Social, pertence ao SPO (Serviço de Psicologia e Orientação) da Escola Secundária David Mourão Ferreira, prestando parcialmente apoio a esta escola. Dos treze auxiliares de acção educativa do quadro, dois funcionários encontravamse de licença prolongada.
As instalações O edifício, com três pisos, é um antigo palacete bastante degradado, possuindo a
particularidade de alojar uma inquilina no 2º andar, que, para entrar em casa, tem
forçosamente de utilizar a entrada da escola.
No rés do chão funciona a reprografia, secretaria, sala de convívio para alunos, sala de
convívio para pessoal não docente, refeitório, gabinete de apoio educativo, gabinete do
Serviço de Psicologia e Orientação, gabinete da Acção Social Escolar e o pátio. Existem
ainda salas de aula e o bar.
No primeiro andar existem as salas do Conselho Executivo, dos professores, dos
directores de turma, material didáctico, audiovisuais, a biblioteca e uma sala de
computadores. Funcionam neste andar outras salas de aula.
52
No segundo andar situase a Ludoteca, as salas de estudo, sala de projecção e a sala de
Educação Musical.
No projecto educativo que a escola disponibilizou, constava uma lista de problemas
com que a escola se depara no seu quotidiano, dos quais destacamos:
salas de aula de pequena dimensão;
o acesso feito por escadas estreitas e sem a devida protecção.
As varandas do 1º andar encontramse degradadas e sem protecção.
Necessidade de urgente intervenção no pátio, na sala de convívio de alunos,
cantina, corredores e salas de aula.
Em termos de segurança o projecto educativo da escola indica que: “O edifício não tem
qualquer sistema de alarme de incêndio e extintores em número suficiente e
devidamente vistoriados. A boca de incêndio no r/c e o carretel do 2º andar não estão
em condições de funcionamento. Não dispõe de escada de emergência e no seu interior
não existe nenhum marco de incêndio” 15 .
Frequência de actos violentos registados Segundo dados recolhidos na escola, no ano lectivo de 1999/ 2000, o número de
participações feitas ao conselho executivo no 2º período por motivo de comportamento
violento a colegas resultou num total de 67 participações, distribuídas pelos vários anos
de escolaridade, com excepção do 8º ano, no qual não foi registada qualquer ocorrência.
Salientase que o 2º ciclo é claramente o que revela dados mais preocupantes em relação
às participações, pois é neste ciclo de ensino que se registam 85% dos casos, uma
diferença significativa comparativamente ao 3º ciclo que regista apenas 5% das
participações.
Esta constatação pode ser um indício de que o 2º Ciclo constitui um momento crítico já
que os alunos têm que se adaptar a um funcionamento escolar diferente daquele que
conheciam no 1º Ciclo, em aspectos da vida escolar como a divisão do tempo lectivo, a
sua distribuição por várias salas, os saberes compartimentados com professores
diferentes para cada área. A análise dos casos de abandono escolar revela que este
fenómenos é particularmente significativo no 2º Ciclo. Durante o ano lectivo de
1999/2000 foi registado um abandono escolar de 4,4% do total de alunos. Contudo este
15 Projecto Educativo, 1999/2002
53
abandono é mais frequente no 2º ciclo, já que aí se verifica uma percentagem de 5,2%
de casos de abandono, facto que no 3º ciclo se reduz para 2,7%.
Gráfico nº 2 – Número de participações por ano de escolaridade
( 2º período) ano lectivo de 1999/00)
4.3– Escolarização, norma e violência
Um pressuposto importante desta pesquisa dizia respeito à existência e disseminação de
situações caracterizadas como violentas nas escolas. Longe de partilharmos visões
psicologistas que assentam a compreensão dos comportamentos violentos em distúrbios
e desequilíbrios internos ao indivíduo (sem negar contudo que em algumas situações o
seu poder explicativo possa ser relevante), pensamos que estes não podem ser
entendidos fora da rede de interacções em que se produziram. Considerar tais
comportamentos isolados levaria a desprezar a importância que os factores contextuais
assumem (a leitura que os diferentes intervenientes fazem de uma determinada situação
de interacção a partir do lugar ocupado por cada um na rede de relações sociais) ou
estruturais (como os resultantes da posição que ocupam na estrutura social, dos quadros
culturais e de valores de que são portadores). Procurámos assim, embora que ainda de
0
5
1 0
1 5
2 0
2 5
3 0
3 5
4 0
Nº d
e participações
5 º a n o 6 º a n o 7 º a n o 9 º a n o
54
forma exploratória, realizar uma primeira avaliação da importância relativa das
diferentes dimensões envolvidas na sua génese.
4.3.1 Os alunos alvo de processos disciplinares
Tendo com base a consulta dos processos disciplinares relativos ao ano lectivo de
1999/2000, procurámos obter informação mais alargada sobre o clima disciplinar da
escola. É verdade que este indicador não é exaustivo, pois uma parte significativa dos
conflitos não chega a conselho disciplinar. A grande maioria são resolvidos
informalmente pelos docentes/directores de turma ou directamente, entre alunos,
chegando apenas a conselho disciplinar os considerados mais graves.
Porém considerámos que a consulta dos processos disciplinares poderia fornecer
informações interessantes.
Recolhemos informação sobre os alunos alvo de processos, tendo sido possível na
generalidade dos casos obtêla segundo o género, idade, escolaridade, número de
processos de cada aluno e local de residência. Analisámos ainda, através das fichas
individuais dos alunos, a inserção profissional e o grau de parentesco dos encarregados
de educação dos alunos.
Dos 23 alunos que foram objecto de processos disciplinares, 20 eram do sexo masculino
e apenas 3 do sexo feminino. Um total desses 18 alunos teve de cumprir 1 pena
disciplinar durante o ano lectivo, dos quais 5 acumularam mais do que 1 processo
disciplinar.
Quadro nº 24 Número de processos disciplinares por aluno segundo o número
de reprovações
Nº de alunos Nº de r eprovações
Nº de processos por aluno
Nº de processos
8 0 1 8 2 0 2 4 1 0 3 3 1 1 1 1 4 2 1 4 3 3 1 3 1 3 2 2 1 4 2 2 1 5 1 1 1 4 1 1
55
Total 23 Total 29
Analisando os 29 processos disciplinares que decorreram no ano lectivo de 1999/00
constatamos que 11 alunos nunca reprovaram, 1 aluno reprovou 1 vez, 4 reprovaram 2
vezes, 7 reprovaram mais de 2 vezes.
Contudo, dos alunos que nunca reprovaram 3 foram alvo de 2 ou mais processos
disciplinares neste ano lectivo, o mesmo número de processos que registam os alunos
que reprovaram 3 vezes e outro que reprovou 4 16 .
As idades dos alunos variam entre os 10 e os 17 anos, mas é na faixa etária entre os 10 e
os 14 anos que mais alunos foram penalizados disciplinarmente e se encontram alunos
com mais de 1 processo.
Quadro nº 25 Número de alunos objecto de processos disciplinares no ano lectivo de 1999/00
Ano de escolaridade Nº de processos disciplinares 5º ano 6 6º ano 10 7º ano 5 8º ano 2 9º ano 0 Total 23
É no 2º ciclo que se verifica um maior número de processos disciplinares (16) e apenas
(7) no 3º ciclo. Convém salientar que no 3º ciclo não se registaram processos
disciplinares no 9º ano de escolaridade.
Isto significa que 10,5% do total dos alunos do 2º ciclo foram penalizados com
processos disciplinares, enquanto que a percentagem no 3º ciclo se reduz para 2,4%.
Os encarregados de educação destes alunos são na sua maioria o pai ou a mãe do aluno,
tendo apenas 3 alunos como seu encarregado outras pessoas da família ou não
familiares. Assim, 11 alunos têm como encarregado de educação a mãe, 9 têm como
16 Este facto por si só mereceria uma avaliação extensiva, já que questiona um dos estereótipos mais fortes sobre as situações de indisciplina e violência, que os considera como o resultado quase linear das situações de insucesso escolar.
56
encarregado o pai, 1 tem a avó e 2 alunos têm como encarregado uma pessoa não
familiar.
Relativamente à situação perante o trabalho dos encarregados de educação dos 23
alunos objecto de processos disciplinares, verificámos que 5 encarregados de educação
não exercem actividade profissional (3 empregados e 3 desempregados), sendo que o
grupo profissional mais representado é o pessoal dos serviços e vendedores que regista
7 indivíduos, existindo ainda 4 trabalhadores não qualificados. Os restantes distribuem
se por outros grupos profissionais.
Nas fichas individuais dos alunos apenas 1 encarregado não tinha qualquer informação
relativa à sua situação perante o trabalho, razão que se prende com o facto do
encarregado não ser da família do aluno.
Quadro nº 26 Grupos profissionais dos encarregados de educação dos alunos
objecto de processos disciplinares no ano lectivo 99/00
Em síntese, verificamos que é sobre os rapazes, sobretudo os mais novos que
frequentam o 2º ciclo que recaem mais penalizações disciplinares.
Existe uma sobrerepresentação das mães entre os encarregados de educação dos alunos,
contudo a análise dos processos disciplinares não contempla a informação detalhada da
Grupos profissionais Nº de encarregados
educação em situação
profissional
1 Quadros superiores da administração pública, dirigentes e
quadros superiores de empresas
1
2 Especialistas das profissões intelectuais e científicas
3 Técnicos e profissionais de nível intermédio
4 Pessoal administrativo e similares 1
5 Pessoal dos serviços e vendedores 7
6 Agricultores e trabalhadores qualificados
da agricultura e pescas
7 Operários, Artífices e trabalhadores similares 1
8 Operadores de instalações e máquinas e trabalhadores da
montagem
1
9 Trabalhadores nãoqualificados 4
Total 15
57
participação dos encarregados de educação da escola e em particular nos conselhos
disciplinares. O registo das presenças nos conselhos disciplinares indica que a maioria
dos encarregados de educação esteve presente.
Existem também semelhanças relativamente à situação perante o trabalho dos
encarregados de educação dos alunos entrevistados e dos encarregados dos alunos
objecto de processos disciplinares, ambos apresentam valores mais elevados no grupo
profissional do pessoal dos serviços e vendedores e dos trabalhadores nãoqualificados.
4.3.2 Relação com escolaridade
Uma das concepções mais vulgares no universo pedagógico considera que um dos
factores que mais contribuem para o despoletar de comportamentos agressivos em
contexto escolar é o designado “malestar escolar” dos estudantes, produto directo da
massificação, da degradação das condições materiais e pedagógicas das escolas e do
insucesso escolar. A situação de indisciplina grave e violência resultaria da presença
crescente em níveis cada vez mais elevados do sistema educativo de grupos de crianças
originárias das camadas populares, tradicionalmente dele afastados e a sua consequente
desadequação aos quadros normativos, culturais e de valores maioritariamente vistos
como desejáveis na escola.
Este “malestar”, esta desadequação, constituem um elemento central das
representações e expectativas dos docentes face às crianças originárias de meios
populares e traduzse frequentemente em práticas organizacionais e pedagógicas
discriminatórias. Convém realçar que uma parte dessas representações é ela própria
partilhada pelas próprias camadas populares, constrangidas pela falta de recursos
(materiais, culturais e simbólicos) que permitam resolver a contradição resultante do
desejo de ver os filhos atingir escolaridades mais elevadas e qualificantes e a resignação
face ao veredicto escolar, confirmador de percursos e posições sociais dominadas.
Procurámos então aferir que tipo de relação possuíam estes alunos com a escola e os
saberes, que papel assumia a escola no seu universo quotidiano, quais as expectativas
face ao futuro. Nesta análise procurámos sempre que possível, confrontar os discursos
de agressores, agredidos e outros não participantes (alunos, professores e auxiliares de
58
educação). Tentámos ainda compreender a forma como professores e auxiliares
caracterizavam a relação da escola com as famílias e restante comunidade.
A relação dos alunos com a escola No respeitante à relação dos alunos com a escola é interessante referir a diferença de
opiniões entre agressores e agredidos. Os primeiros entendem a escola essencialmente
como um espaço de sociabilidade, onde brincam e se encontram com os amigos, sem
que a escola pareça assumir um papel significativo nos seus interesses e projectos
futuros.
“Gostar gosto, assim em termos de amigos e isso gosto, agora em termos de aulas não (...) Sou malandro
(...) Comecei a ter mais amigos e a começarme a desviarme mais das aulas (...) Pronto ia com os meus
colegas para alguns lados fumar e isso. Não íamos ás aulas”. (Aluno, agressor)
“Se for pela escola não, das aulas também não gosto muito, mas estar na escola mais por causa dos
colegas, apesar de ter boas notas”. (Aluno, agressor)
Os agredidos, ao falarem da escola, referem sobretudo o desconforto e desânimo de
quem tem que frequentar um espaço desagradável, seja pelo seu estado de conservação,
seja pelas situações de que são vítimas. Ressalta a sua visão crítica da escola em que
andam, destacando o seu ambiente, o facto das casas de banho estarem degradadas, de
sentirem dificuldades em certas disciplinas, receio de serem mal tratados e insultados.
“Isso são os testes e ter de estudar todos os dias. Se quer que lhe diga sinceramente, não tenho assim
nenhum gosto nesta escola, esta escola é muito má, não gosto nada aqui nesta escola. Acho que está assim
um bocado velha”. (Aluno, não participante)
“Não gosto de algumas pessoas. Umas que pedem dinheiro, nós não lhes damos e depois começam a
revistarnos. Tiramnos o que nós temos”. (Aluno, agredido)
“…se calhar é o ambiente, às vezes formase um mau ambiente aqui na escola, é um ambiente de racismo,
mais ou menos”. (Aluno, agredido)
Relativamente às expectativas quanto ao futuro dos onze alunos entrevistados apenas
um revelou que gostaria de fazer um curso superior, o aluno mais velho que frequenta o
9º ano de escolaridade. Quatro querem terminar os seus estudos no 9º ano, um no 10º
59
ano, três querem seguir até ao 12º ano, um não sabe e outro pretende desistir no final do
ano lectivo, frequentando actualmente o 5º ano de escolaridade.
Quanto às expectativas dos pais face à escolaridade dos seus filhos, quatro alunos
disseramnos que os pais gostavam que tirassem um curso superior, três que
completassem o 12º ano e dois que acabassem o 9º ano. Dois alunos disseram que não
sabem até que ano os pais gostavam que estudassem.
“Superior, de Jornalismo, Comunicação Social”.(Aluno, não participante)
“Não, não se importa, ao menos quer é que eu tire o 9º ano” (Aluno, agressor)
“Acho que os meus pais gostavam que eu estudasse até ao 12ºano e gostavam que eu fosse até à
Universidade, mas a área que eu quero acho que não dá”. (Aluno, não participante)
Devido ao reduzido número de entrevistas realizadas não é possível estabelecer
associações entre os percursos escolares e comportamentos violentos, contudo nos casos
analisados era visível que os agressores tinham percursos mais complicados (dois deles
tinham reprovado três e quatro vezes, respectivamente), as suas expectativas quanto ao
prosseguimento da escolaridade eram aparentemente menores e as conversas com os
pais menos explícitas que nas outras duas categorias. É contudo óbvio que se torna
necessário aprofundar estas relações e alargar a análise a um número significativo de
casos.
Relação escolafamílias Procurámos conhecer, na perspectiva dos docentes, a forma como as famílias destes
jovens se relacionavam com a escola e se esta desenvolve actividades conjuntas com a
comunidade a que pertence.
Para além da opinião dos professores sobre as famílias não ser particularmente positiva,
a informação acerca das mesmas é reduzida. Os professores declaram que as famílias
colaboram pouco com a escola, que os pais dos alunos que criam mais problemas não
comparecem nas reuniões, impossibilitando a solução conjunta dessas questões. A
informação também não parece ser muita, uma das professoras entrevistadas
desconhecia a existência da associação de pais.
“Que não existe, que não presta, que os pais acham que a escola… uma mentalidade à moda antiga, têm
60
de pedir licença e faz favor e desculpe senhor professor, isto de um modo geral, porque também há
aqueles …que talvez porque como têm essa mentalidade, sentemse forçados e então revoltamse e então
põem processos em cima dos professores e porque “ o professor não pense que é o maior! E o professor
não pense que manda no meu filho! E o que ele diz é que está certo e eles é que têm o poder!”
(Professora)
“Pouca, pouca relação com os pais de maneira geral (...) um problema que é difícil nos pais, revêm o
problema na escola com aquilo que acontece com os seus filhos e não vêm os outros problemas mais
globais e a presente associação de pais tem essa visão...” (Membro do Conselho Executivo)
“Pessoalmente eu acho que os pais não estão devidamente educados para, para…para já não há
associação de pais aqui, ou se há é muito pouco representada, isto pelo que me consta, depois e mesmo se
houvesse, eu não, e se calhar por isso é que eles não se entusiasmam muito bem qual é que seria o tipo de
conversa, porque facilmente se comenta e dificilmente se constrói, tá a perceber?”. (Professora)
Colaboração Escola/ Comunidade Relativamente à relação entre a escola e a comunidade dos sete professores apenas dois
se lhe referiram e a apreciação não é particularmente positiva.
“Tem havido projectos em colaboração com a Câmara, este ano não houve assim nada de muito
específico mas há dois anos “Viver o verde”, em que se fez acções de sensibilização para aspectos da
poluição e acções de combate à poluição... este ano não tenho ideia nenhuma que tenha havido uma
colaboração estreita entre a comunidade e a escola”. (Professora)
“Isso temos sempre como eu digo professores teimosos que mantêm apesar das condições físicas não
agradáveis, têm feito projectos, vários projectos, áreas de estudo, projectos com a Câmara Municipal de
Lisboa, mesmo parcerias que temos tido com a ESE em relação à formação de professores na disciplina
de Ciências e Matemática, já há vários anos que temos essa parceria, jornal da escola, oficina de
humanidades”. (Membro do Conselho Executivo)
A perspectiva do pessoal auxiliar Para o pessoal auxiliar, a relação entre a escola e os encarregados de educação é
“basicamente boa”, referindo que são os pais dos alunos do 5º e 6º ano que participam
mais nas reuniões. No entanto, há ainda quem pense que na escola decidem os
professores e em casa os pais.
“Muito, preocupamse bastante. Sim e a escola procura os pais, por acaso tenho notado bastante”.
61
(Pessoal auxiliar)
“Os pais não era na escola que deviam participar, era em casa. Porque na escola estamos cá a gente e os
professores, os pais estão a trabalhar, não podem participar nada. Nas reuniões voulhe dizer uma coisa é
raro cá estar, mas o que me consta é que vêm cá mais os pais do alunos do 5º e 6º anos do que do 7º, 8º ou
9º anos...” (Pessoal auxiliar)
Em síntese, a escola em estudo parece caracterizarse pela existência de ténues relações
quer com as famílias quer com a comunidade envolvente, o que provavelmente não
contraria tendências mais globais a nível do sistema educativo. É importante notar,
porém, a relevância para os alunos (em especial para os agressores) da escola enquanto
espaço de sociabilidade, muito embora as aspirações no sentido do prosseguimento de
estudos não sejam muito elevadas. O discurso dos alunos parece revelar em alguns
casos alguma descoincidência entre as expectativas de pais e filhos quanto ao
prolongamento do percurso escolar, esperando os pais que os filhos atinjam níveis de
escolaridade mais elevados. A esta descoincidência não deverá ser alheia a importância
que crescentemente assumem os contextos de socialização não familiares pelos quais os
jovens circulam, veiculando frequentemente valores alternativos e mesmo opostos aos
transmitidos pela socialização familiar.
62
4.4.3 Representações de indisciplina e violência
Tratandose de uma investigação com um carácter exploratório sobre a violência na
escola, o presente estudo tem como um dos seus objectivos a delimitação dos conceitos
de violência e de indisciplina. Para tal, consideramos importante analisar as
representações dos actores da comunidade escolar sobre as definições de indisciplina e
violência.
A análise das entrevistas realizadas, permite perceber que, para os professores e para o
pessoal auxiliar, indisciplina e violência são fenómenos distintos. De um modo geral, a
indisciplina é considerada como sendo menos grave do que a violência, sendo que a
primeira se traduz num comportamento considerado incorrecto e a segunda implica
agressividade física ou verbal.
“Eu acho que nunca tive alunos violentos, mas já ouvi casos em... violentos para mim
conduz um pouco à agressão, não apenas verbal mas também física. Os indisciplinados
é mais aquela coisa do interromper a aula, o dizer qualquer coisa que não vem a
propósito”(Professor)
“um aluno violento é desde logo o confronto físico, agressão física, se bem que agressão
verbal também os há” (Professor )
“um aluno indisciplinado é o aluno que está irrequieto na cadeira, que não consegue
concentrarse e ouvir o professor, ou põese a falar para trás e para a frente, não está ali
com o mínimo de atenção. O aluno violento é aquele aluno que chega á aula, puxa pela
cadeira, põe as cadeiras para o ar e atira as cadeiras pela janela, sei lá...” (Professor)
Parece ser consensual entre a maior parte dos professores, e é também referido por 2 dos
3 membros do pessoal auxiliar entrevistados, que a indisciplina se circunscreve ao
espaço da sala de aula. Na maior parte dos casos, a indisciplina tem a ver com
perturbações ao funcionamento das aulas e traduzse em actos como “estar irrequieto
nas aulas”, “bichanar com os colegas” , “mandar bocas”, e “não aceitar regras”. Quando
interrogados sobre o que é um aluno indisciplinado, dizem os professores e o pessoal
auxiliar:
63
“É um aluno que se recusa a participar nas actividades lectivas, mostra desrespeito pelos
colegas, perturba o normal funcionamento da aula” (Professor)
“Será aquele aluno que está constantemente irrequieto na aula, é portanto uma coisa
constante, não é uma coisa pontual” (Professor)
“Um aluno que intervem sem estar na sua vez, um aluno que não pára de falar
constantemente, não se autodomina nas suas intervenções, está sempre na brincadeira
na sala de aula” (Professor)
“O aluno indisciplinado é aquele que trata mal o professor e não tem comportamento,
não sabe estar nas aulas e que perturba as aulas” (Pessoal auxiliar )
“É aquele que entra dentro da sala de aula e não se senta correctamente, não ouve o que
o professor diz” (Pessoal auxiliar)
É interessante notar que a maior parte dos alunos (8) afirmam que os professores têm a
mesma definição de indisciplina do que eles próprios. No entanto, é notório que, para os
alunos ao contrário do que se verifica entre os professores, a indisciplina não se
circunscreve ao espaço da sala de aula, mas tem também em conta o espaço da escola
em geral. Ou seja, os actos de indisciplina têm a ver com a relação com o professor (é
indisciplina “gritar com o professor” ou “gozar com o professor”) mas têm também a
ver com o comportamento na escola para além do espaço da sala de aula (é também
indisciplina “faltar às aulas” e “dizer asneiras”). Sobre o que fazem os alunos
indisciplinados, dizem os alunos:
“Faltam às aulas, alguns vão fumar para a casa de banho, saem da escola sem os
porteiros verem, é isso...” (Aluno, não participante)
“Refilam com as professoras, saem por trás da escola” (Aluno, não participante)
64
“Chamamnos nomes, gozam connosco, há certas coisas que eles dizem que nós não
fazemos. Por exemplo, eles é que tiram uma coisa e depois dizem que fomos nós que tirámos.” (Aluno, agredido)
É curioso notar também que os alunos em geral se referem aos indisciplinados como
“eles”, ou seja, como um grupo a que não pertencem. Mas 2 dos 3 alunos agressores
entrevistados assumemse claramente como alunos indisciplinados, dando como
exemplos de actos de indisciplina as suas próprias acções:
“A mesma coisa que eu, às vezes. Faço distúrbios nas aulas, faço coisas nas aulas,
gritar, uma vez gritei aos ouvidos da professora, ela não estava a ouvir, fui ao pé dela e
gritei. Porque farteime de chamála, ela não estava com atenção, estava a olhar para um
livro e não sei quê, eu fui lá e griteilhe aos ouvidos. O “Canelas” mandava a professora
para um certo sítio. A professora estava sempre a chatearlhe a cabeça, ele estava quieto
sem fazer nada, ela estava sempre a dizer: “Ricardo escreve!” e ele: “Está bem, já
escrevo.” E ela: “Ricardo escreve!” e ele: “Professora vá...”, depois mandouo para a
rua.” (Aluno, agressor)
“É assim, os que são indisciplinados, a maior parte andam todos em grupo, eu assim sou
indisciplinado e ando sempre num grupo. Somos um grupo de quatro e somos todos
indisciplinados.” (Aluno, agressor)
Reacções perante a indisciplina Do ponto de vista dos professores e pessoal auxiliar, as formas de resolver as situações
de indisciplina parecem obedecer a um procedimento geral e comum à maioria. Os
docentes procuram, em primeiro lugar, resolver a situação através do diálogo com o(s)
aluno(s), tanto no espaço da aula como fora dela. Caso a conversa não resulte optam
pelo contacto com o Director de Turma ou Encarregado de Educação e, em casos
considerados insustentáveis pela sua gravidade ou persistência, enviam os alunos para o
GAF 17 .
17 Gabinete de Acompanhamento e Formação, tem como função receber alunos que por motivos de comportamento são colocados fora da sala de aula. O aluno é recebido por um professor, preenche uma ficha na qual explica o motivo de saída da aula e realiza exercícios determinados pelo seu professor.
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“Tento primeiro chamar a atenção do aluno, posso também fazer algum recado para o
encarregado de educação ou algum director de turma para chamar a atenção do aluno, e
se ele continuar, pronto tenho de o mandar para o GAF” (Professor)
No caso dos auxiliares de educação, quando o diálogo não resulta, acabam por recorrer
à realização de uma participação do(s) aluno(s) em causa.
“Chamolhes a atenção, falo com eles a bem. Temos que fazer a participação, mas
primeiro a pessoa fala com o menino, fazlhes ver as coisas para que entenda e se porte
melhor, mas quando eles ainda depois insistem a pessoa tem de fazer participação
deles.” (Pessoal auxiliar )
No entanto, todos os professores concordam em que as estratégias e “limites” perante
situações de indisciplina não são idênticos e, de um modo geral, os alunos constatam as
diferentes reacções dos professores perante situações de indisciplina semelhantes 18 .
“Há pessoas mais tolerantes, há pessoas que sabem muito bem lidar com situações de
indisciplina, não perdem a calma, há pessoas que se exaltam muito mais por tudo e por
nada mandam um aluno para o GAF, há outras pessoas que sabem lidar com pequenas
situações na aula e o aluno não tem de ir para o GAF, não se justifica sair da sala de
aula” (Professor)
“Há professores que gritam muito mais e nem ponho a hipótese, por que não posso
gritar, ficava sem voz. Há professores que não fazem nada e que aguentam para não
terem de ouvir... não terem de aparecer nos top ten dos que mandam muitos para o
GAF.” (Professor)
“Eles têm reacções diferentes.” (Aluno, não participante)
“A stôra de Inglês é assim, qualquer coisinha que nós fazemos vamos logo para o GAF
e a stôra de Português ainda dá outra oportunidade.” (Aluno, não participante)
18 Só para um aluno – um agressor – todos os professores reagem da mesma forma e enviam de imediato para o GAF.
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“Ou mandam para a rua ou não fazem nada. A directora de turma não faz nada, deixaos
estar. Mas a professora de Ciências, ela está a falar, se nós dizemos qualquer coisa, ela
mandanos logo para a rua..” (Aluno, agredido)
“Há professores que parecem que têm medo dos alunos e eles até podem fazer o que
quiserem nas aulas que os professores não ligam, só mandam parar quietos e nãodizem
mais nada, e aí eles começam a fazer mais e mais que é para ver se conseguem
enfurecer o professor, mas de um certo modo eu acho que o professor faz de propósito,
que é para ver se o aluno pára quieto, mas há professores que parecem que têm mesmo
medo dos alunos.” (Aluno, agredido)
O factor idade e experiência profissional dos professores aparece referenciado em
diversas entrevistas de alunos e professores como sendo explicativo de diferentes
reacções perante situações de indisciplina. Na visão dos professores, são aqueles que
têm maior experiência que melhor lidam com estas situações.
“Eu acho que os professores com mais tarimba, com mais experiência de escola e que
não estão ligados a estes casos excepcionais de falta de controle de uma turma, acho que
lidam melhor com estas situações, comportamentos complicados, ou falando com eles
ou chamando a atenção ou falando de uma certa maneira, utilizando a tal ironia no
sentido de humor se pode conseguir leválos a bom porto.” (Professor)
“temos professoras novas aqui muito problemáticas” (Membro do Conselho Executivo)
Porém, na visão dos alunos a questão não se coloca da mesma forma. O que mais
apreciam são sobretudo os professores que conversam com eles e que não resolvem o
assunto recorrendo de imediato à participação ou à falta disciplinar, e, entre os
professores mais novos identificam esses dois tipos de atitudes contrastantes.
“Eu acho que os mais novos são mais severos (...) Não é severos, severos, mas pronto
têm mais tendência a marcar falta por comportamento mau.” (Aluno, não participante)
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“Depende da mentalidade do professor (...) por exemplo o aluno é indisciplinado, para
já não se preocupam muito, já não quero conversas contigo, já não interessa, faz o que
quiseres, faço participações, marco faltas disciplinares, telefonemas para casa, pronto, é
assim que agem! E os professores com uma mentalidade mais nova tentam resolver as
coisas de outra maneira, falando com o aluno.” (Aluno, não participante)
Razões da Indisciplina Relativamente às razões que conduzem a situações de indisciplina, é geral entre alunos,
professores e pessoal auxiliar, a tendência para atribuir as causas a factores exteriores à
escola. A indisciplina é nesse discurso maioritário entre a população escolar, no
essencial trazida de fora da escola e geralmente resultante do ambiente e educação
familiar. A adopção por alunos desse discurso mais não é do que uma entre outras
formas de inculcação ideológica, legitimadoras das desigualdades escolares e com o
efeito prático de obscurecer e/ou diminuir as responsabilidades da escola enquanto
produtora de comportamentos desviantes.
“Isso eu penso que há questões de base e em relação às regras de base da própria
família, os miúdos se não têm essa referência dos pais, não há hipótese, referências,
regras básicas de funcionamento, os pais chegam a casa cansados, não estão para se
maçar” (Professor )
“Tem a ver com a formação, com os princípios que eles têm, a educação, o ambiente em
que foram criados ou por situações da vida, por vezes também o ambiente dentro da
própria casa, os pais” (Pessoal auxiliar)
“Por causa das famílias, principalmente os pais não se importam muito com os filhos e
deixam os filhos à vontade sem manter a rédea curta como se costuma dizer, e eles vão
abusando, abusando e ás tantas já ninguém se preocupa, os pais também não se
importam se telefonam lá para casa” (Aluno, não participante)
“Porque não lhes dão educação. Os pais.” (Aluno, agressor)
Entre os professores, a maior parte dos entrevistados apontam causas ligadas à família,
ao clima em casa e à educação familiar, mas há outros que referem também aspectos
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relativos à relação entre professor e aluno e à importância de uma relação negativa com
a escola e a escolaridade.
“Fundamentalmente clareza na transmissão de regras á partida, aulas bem preparadas e
uma relação de empatia com os alunos podem fazer com que estes elementos
conjugados funcionem bem numa aula, construir um ambiente saudável. A base familiar
é a sustentação, muitos são oriundos de famílias em que o pai ou a mãe estão separados
e as coisas estão muito articuladas e eles não têm suporte, não é?” (Professor)
“Bem, tem as próprias razões temperamentais e tem a educação em sentido lato, que
têm desde que nasceram... é fundamental a educação que têm, o saber estar que
deveriam já trazer quando chegam a uma escola do 2º ciclo, deviam ter aprendido já no
jardim de infância, há coisas que...“ (Professor)
Entre o pessoal auxiliar, todos eles referem a educação familiar e o ambiente em casa
como razão da indisciplina e um deles salienta, para além disso, a importância da
personalidade como factor a ter também em conta.
“Acho que é uma questão de personalidade, de educação, de factores exteriores que os
influenciam, portanto os pais, a família, a parte humana e a parte material, eles são
influenciados por tudo isso, vaise repercutir na vida deles no futuro e no presente”
(Pessoal auxiliar)
Entre os alunos, a maior parte aponta o factor falta de atenção dos pais como razão de
indisciplina, alguns referem a necessidade de serem autoritários e de se afirmarem e 1
deles refere que se trata de uma questão de solidariedade de grupo (tratase de um
agressor).
“Talvez porque queiram ser conhecidos ou talvez porque queiram armarse em bons”
(Aluno, não participante)
“Queremse tornar mais autoritários, se calhar.” (Aluno, não participante)
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“Agora se houver porrada assim do género, entre algum do nosso grupo, o resto do
grupo metese” (Aluno, agressor)
Em síntese, as representações dos professores e pessoal auxiliar quanto à definição de
indisciplina e violência são semelhantes, isto é, para ambos a indisciplina é considerada
menos grave do que a violência. A primeira prendese com a perturbação do normal
funcionamento da aula, atitudes de incorrecção e a segunda implica agressividade física
e verbal.
Contrariamente à opinião de professores e pessoal auxiliar, para os alunos a indisciplina
não se circunscreve à sala de aula, mas acontece também fora do seu espaço.
Perante situações de indisciplina professores e auxiliares de acção educativa afirmam
que procuram em primeiro conversar com os alunos, mas no caso de esta ser
insuficiente o pessoal auxiliar participa do aluno, sendo que os professores optam por
contactar a Directora de Turma ou Encarregado de educação, enviando os alunos para o
G.A.F. apenas quando a situação é insustentável.
As explicações avançadas pelos três grupos de entrevistados para a ocorrência de
situações de indisciplina são sobretudo as variáveis ligadas ao ambiente e educação
familiar que são consideradas mais importantes, tendo um destaque menor as relativas à
relação com a escola e com os professores (estas são referidas de forma secundária por
alguns professores) e as variáveis referentes à personalidade dos alunos.
A este propósito procurámos compreender como é que nas famílias dos alunos
entrevistados se resolvem os conflitos e que estratégias adoptam os pais em situações
nas quais não concordem com os comportamentos e atitudes dos filhos. Constatámos
que a maioria refere a aplicação de castigos, que os proibem de jogar à bola, consola, de
ver televisão e de se ocuparem com actividades com as quais habitualmente se ocupam.
4.4.4 A violência e a agressividade no quotidiano
Um dos objectivos desta pesquisa consistia na compreensão das concepções e
percepções dos vários elementos que compõem a comunidade educativa sobre as
situações de violência e indisciplina nas escolas.
Das entrevistas realizadas, junto dos professores constatámos que a maioria é da opinião
de que as situações de indisciplina/ violência nas escolas têm vindo a agravarse. É
70
contudo de realçar que essa “constatação” resulta não de uma vivência na escola desse
tipo de situações mas de uma sensação difusa de insegurança que se traduz num
sentimento de malestar.
“Aumentaram! A escola é um reflexo da sociedade e eu penso que a sociedade está mais
violenta, não há dúvida nenhuma, portanto temos mais casos...” (Professora)
“Eu acho que têm vindo a aumentar desde que estou a trabalhar há vinte e sete anos,
sempre foi assim, sempre houve violência. Mas noto que nestes últimos anos há um
crescendo bastante acentuado”. (Professora)
“Nas escolas no geral, têm vindo a aumentar, aquilo que nós vimos nos jornais é que em
média por semana, um professor é violentado ou agredido fisicamente, não sei se isto é
correcto, mas é no mínimo frustrante”. (Professora)
Também para o pessoal auxiliar de acção educativa a indisciplina e a violência nas
escolas em geral tem vindo a agravarse, contudo associam mais estas situações a
escolas localizadas na proximidade de bairros degradados.
“Ah! Em geral não, têmse agravado, segundo eu ouço dizer ao nível de outras escolas,
para a Damaia, para aqueles bairros mais degradados dizem que é uma coisa horrível, os
roubos, droga, salvo seja, deus nos livre disso tudo”. (Pessoal auxiliar)
“Têm, mas depende dos bairros em que as escolas estão localizadas. Houve um caso ali
em Chelas, um aluno bateu no professor, foi uma situação mesmo muito feia. Eu acho
que em todas as escolas há casos de violência, em todas, uns casos mais sérios numas
do que noutras, mesmo na altura que eu andava na escola havia violência, mesmo entre
colegas, entre alunos e professores...”. (Pessoal auxiliar)
Quando questionámos a situação nesta escola em especial, as opiniões dividemse, por
um lado os professores que desconhecem casos concretos de violência, por outro os
professores que afirmam que a situação nunca esteve tão preocupante como agora.
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“Olhe comparando com aquilo que eu leio, que se passa noutras escolas de violência
urbanizada, eu penso que esta até não é muito significativa, não tem pareceme, pelo
menos é o que eu oiço dos meus colegas, não tem essas características, ainda não
tem”.(Professora)
“Pelo que eu ouço dizer é que isto está horrível, está muito pior mesmo este ano. Várias
professoras, dizem que este ano foi o pior e que nunca viram coisas assim”. (Professora)
“... desde o primeiro ano até este terceiro ano as coisas têm melhorado, tem vindo a
fazerse um esforço da parte de funcionários e professores, tentar controlar melhor as
coisas, agora os casos pontuais de indisciplina que me têm chegado aos ouvidos, de
alunos de 5º e 6º ano, que eu acho que são muito graves, nomeadamente relatos de aulas
que eu vejo, que é uma coisa impensável com obscenidades claras para o professor,
coisas que eu nunca pensaria que se passam e que efectivamente se passam e o
professor faz de conta que não ouve, etc”. (Professora)
Para o pessoal auxiliar de acção educativa as situações de indisciplina e violência nesta
escola mantêmse ou melhoraram comparativamente a anos anteriores.
“Não, não aumentou, mantémse. Não vamos só falar da situação que se deu, está muito
melhor, nem pensar. Noutros tempos que eu já vi nesta escola. A droga, por exemplo”.
(Pessoal auxiliar)
“Melhorou. Porque saíram alunos mais velhinhos que se aproveitavam de qualquer
coisa, como grande parte desses alunos já cá não estão a coisa melhorou”. (Pessoal
auxiliar)
Agressão / Conflitualidade / Intimidação Procurámos também perceber se ocorriam situações de agressividade no quotidiano
escolar. A esse respeito indagámos sobre a ocorrência de agressões, assaltos e
intimidação entre os alunos ou por terceiros.
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Dos 11 alunos entrevistados, 6 afirmaram já terem estado envolvidos em situações de
pancadaria e agressões com os seus colegas, motivadas por insultos, provocações ou
questões de namoros às quais não se atribuem grande importância.
(Aluno, não participante)
“Eu já andei à porrada por causa da bola, já houve um que começouse a armar em
esperto e levou. Estava a tirarme a bola, nós estávamos a jogar e ele chegou lá e disse:
“Quero jogar!” e eu disse: “agora esperas, fazes equipa a seguir” e ele disse: “ Não, não
faço” e eu disse: “ Deves ter a mania, tu!”, depois ele veio de lá a armar em esperto e
levou porrada. Deilhe porrada, metio no chão e comecei a darlhe pontapés na boca.
Então armase em esperto, pensa que passa todos!” (Aluno, não participante)
“Uma vez estava um colega meu… com a minha namorada. A minha namorada pôsme
os palitos. Lá fora deilhe três socos na boca. “Ah Carlos porque é que fizeste isso?”, e
eu: “Eu explicote, estavas a namorar com a minha gaja, não estavas?”, “Ah é mentira”
e eu Pumba, toma outro.” (Aluno, agressor)
Poucos professores que dizem ter conhecimento de casos de agressão, por parte dos
alunos. Contudo, uma professora referiu ter sido vítima de agressão à entrada da escola.
Também estas situações de agressão não são consideradas frequentes nem preocupantes.
A maioria das situações relatadas assumem contornos pouco claros, pois a maioria
afirma não terem a certeza porque também ouviram de outras pessoas, isto é, não
presenciaram.
“Eu acho que havia aí uma colega minha que teve um problema nos pulsos aqui há uns
tempos atrás. Acho que ela ia fazer não sei o quê, o aluno agarroulhe e depois puxou
lhe o braço para trás e ela não teve uma boa reacção e depois torceu o braço. (...) Olhe,
no princípio, eu ia lá nesse sítio, ia de costas e acho que me amandaram com fruta ou o
que é que foi. Lá fora. Agora cá dentro, não. Cá dentro, não.(...) Não, foi logo no
“Andei à porrada com um aluno, mas foi no 2º período e ele partiume a cabeça. Estava
na fila no bar, então ele começou a empurrarme, eu empurreio, ele deume um soco e
eu bati com a cabeça na parede. Levou quatro dias de suspensão.”
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princípio, eles não gostaram da maneira… e resolveram atirar qualquer coisa à
professora.” (Professor)
“Eu conhecimento não tive, tive zumzuns de que houve, agora não tenho informação
formal e precisa, nem em que circunstâncias foi, nem como é que foi.” (Professor)
“Assaltado, não tenho conhecimento nenhum. Agredido fisicamente? Verbalmente
penso que sim.” (Professor)
Não obstante, uma auxiliar de acção educativa partilhou connosco a experiência
negativa de que foi alvo por parte de um aluno que a agrediu.
“ele vai com uma mão, atira contra mão a esquerda, este dedo que ainda está cheio de
artrose, olhe tenho alturas em que ele se verga todo para baixo e dá dores horríveis, de
ele ter feito assim e deume um pontapé no braço esquerdo, são dores horríveis”
(Pessoal auxiliar)
“A Dona Ivone que lhe falei há pouco, a Dona Albertina mas já foi há mais tempo que
já se reformou, também foi agredida aqui na escola, mas são poucos os casos.” (Pessoal
auxiliar)
Por conseguinte e no que diz respeito a agressões de professores sobre alunos,
verificámos que para os segundos não existem situações preocupantes de agressão, mas
sim as designadas “palmadinhas”, “carolos”, “tostas” e “caldinhos”. Aliás, é comum a
referência de acontecimentos ocorridos em anos lectivos anteriores de professores que
agrediram alunos. Estas práticas são consideradas normais e de certa forma élhes
atribuída pouca importância pelos dois grupos.
“Por acaso já houve uma história, mas contaramme, não sei se é verdade, o ano passado
um dava uns caldinhos e umas chapadinhas a um aluno, mas não sei se é verdade, não
tenho certezas, mas contaramme que esse professor foi apanhado lá fora e também
levou uma surrazita e pronto, de amigos do aluno”.
(Aluno, não participante)
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“Ah! Eles só dão assim chapadinhas, não dói nada” (Aluno, Agredido)
“O meu professor de Educação Visual e Tecnológica dá tostas aos miúdos. Começam a
falar um com o outro, depois o outro dá uma chapada no outro e depois o professor vai
lá e dá uma tosta em cada um.” (Aluno, agressor)
“Há muitos professores assim como o professor de Educação Física…há miúdos que
fazem qualquer coisa mal, miúdos pequeninos e dálhes com o apito na cabeça dos
miúdos. Isso aconteceu com um miúdo (...)Foi assim provas a correr, estafetas. Ele fez
qualquer coisa mal e o professor deulhe com o apito, eu já avisei a mim é que ele não
fazia isso. “ (Aluno, agressor)
“À não ser aquele professor de Educação Física que andava a bater nos alunos com um
apito. Quando os alunos se portavam mal ele dava com o apito. Não, foi o ano passado.
Doíalhes, era um apito de metal, tinha um de plástico, mas como partiu na cabeça de
um, comprou um de metal.” (Aluno, não participante)
“Uma vez no quarto ano... uma vez a professora bateu no meu colega. Porque ele não
conseguia ler. Deulhe um estalo.” (Aluno, não participante)
Para os professores também é natural a utilização de procedimentos como a
“chapadinha”, “estalada” e o “tabefe”. No entanto, todos desconhecem que os seus
colegas batam ou utilizem formas mais agressivas de controlar a indisciplina na sala de
aula.
“Bater como? É que há bater e bater. É chegar assim por trás e darlhe assim (palmada
no pescoço) para se acalmar, aí isso eu sei, eu faço, faço e dá um resultadão”
(Professor)
“Não vi, mas ouço dizer, assim uma palmada ou um puxão de orelhas. Sim, dar uma
estalada ou uma palmada nas costas ou no ombro, isso ouço os alunos dizerem e ouço
vários alunos a dizer.” (Professor)
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“Conhecer situações em que batam, não. Mas é assim, é no contexto em que as coisas
são efectivamente feitas, tipo ou presta mais atenção e dáse uma “festinha” na cabeça
do aluno, mas bater penso que não.” (Professor)
“Também acontece, eu não lhe chamaria bater, chamaria perder o controle, mas chegam
a agarrar, pelo menos agarram, bater não. Temos tido aí umas queixas bastante fortes.”
(Professor)
No que se refere ainda à relação entre alunos, foinos dito que é prática corrente as
situações de intimidação. Geralmente dos mais velhos sobre os mais novos.
“...um puto chamoume filho da… amandeilhe um soco. Eu deilhe um empurrão sem
querer à saída da casa de banho e ele disse: “Filho da…” e eu deilhe um “pêssego” na
boca. Partiu um dente. Foi ao conselho directivo fazer queixa de mim. E depois eu fui lá
e disse que ele tinhame chamado o tal nome e ele é que foi suspenso.”(Aluno, agressor)
“São os mais velhos nos mais novos, porque os mais velhos pensam que são
assim…alguns como andam hà mais tempo aqui, pensam que são as vedetas da escola
entre aspas, porque como que já são maiores e isso podem bater nos outros, porque os
outros não me vão bater, mas às vezes até se enganam.” (Aluno, vítima)
Verificámos que para além da intimidação frequente dos alunos entre pares é vulgar
pedirem para intervir em diversas circunstâncias pessoas exteriores à escola, por
exemplo, irmãos, primos e grupos amigos do bairro, no sentido de agredirem os colegas
da escola com os quais existem conflitos.
“No outro dia esse colega meu que chamoume nomes, chamou outro colega dele o Rui
para me vir “dar na boca” hoje, às 18:30 h. Se vierem estão lixados também, eu conheço
malta de Chelas, Zona J, da Amadora, do Miratejo, Pontinha. A jogar à bola às vezes dá
soco, dá pau, dá cacetada.” (Aluno, agressor)
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“..Um dia bateramme ai, fui chamar o meu irmão, o meu irmão deulhe, depois o gajo
ainda começou a ameaçarme, fui chamar o meu irmão e o meu primo Vasco que você
fez a entrevista no outro dia e ele deulhe.” (Aluno, não participante)
“Porque às vezes há alunos que os maiores vão influenciar para andar à porrada, mas há
uns que chamam os irmão, chamam os pais, os irmãos e isso, depois acontece um
bocado de… pancada.” (Aluno, vítima)
A maioria dos alunos, professores e pessoal auxiliar afirmam que não ocorrem assaltos
na escola, no entanto, são habituais os pequenos roubos, nomeadamente o
desaparecimento de material escolar, jogos e outros objectos de baixo valor. Estas
situações são frequentes, mas encaradas como normais.
“Muitas coisas, walkmans, telemóveis, dinheiro, já o ano passado havia muitos roubos,
era mais as mochilas, depois ficam com as canetas, agora livros mandam todos para o
lixo. Desaparecem mais é malas.”(Aluno, agressor)
“Mas às vezes aqui é mais roubar canetas, dinheiro e isso, mas não são grandes
coisas.(...) Ah! É por causa de roubarem as canetas e as borrachas, correctores e isso,
eles batem. Há porque alguns metemse com as namoradas dos outros e começam a as
apalpar e a fazerse a elas, eles não gostam e batem, mas eles também arranjam sempre
um motivo para andarem à porrada.” (Aluno, vítima)
“...mas há poucos dias um colega meu perdeu uma mochila, acho que lhe roubaram.
Não sei, ele esteve a dizerme que ficou sem a mochila e não sei quê…e eu perguntei
lhe: “Mas roubaramte?”, ele não responde nada, mas deve ter sido roubada.” (Aluno,
não participante)
“A carteira. Pediramme dinheiro, eu disse assim, queres ver e tudo? E eles disseram:
“Então deixa cá ver!”, ele tiroume a carteira e tudo o que tinha lá dentro. Não, ele
disse: “Se vais fazer participação estás lixado”. (Aluno, vítima)
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“Que desapareça um ou outro material, uma caneta, não sei quantos, ás vezes nem se
sabe muito bem se foi o aluno que o perdeu ou se roubaram. Mas assaltos, mesmo
assaltos, não.” (Professor )
Já fui roubada por um aluno, mas também foi descuido meu, tenho que dizer a realidade
não é? Não fechei a gaveta da escrivaninha e eles espreitaram, fui meter lá a carteira e
roubaramna.” (Pessoal auxiliar)
Sentimento de segurança Relativamente à segurança da escola, quisemos saber se alunos, professores e pessoal
auxiliar sentiam medo ou receio de estar na sua escola. É interessante verificar que a
principal preocupação relativa à segurança não diz respeito a ameaças provenientes de
terceiros vistas como pontuais, mas está principalmente relacionada com o espaço físico
da escola, resultado da degradação em que se encontra o edifício.
Alguns professores afirmam que não têm medo, mas já passaram por situações mais
complicadas.
“Quanto muito tenho medo que alguma coisa me caía em cima. Atenção, eu estou
sempre a bater na mesma tecla, tenho algum receio, mas isso, não é (…) tenho algum
receio de algum pontapé, alguma cotovelada indevida, como tinha uma colega minha
que há uns tempos atrás estava grávida e tinha muito receio em descer as escadas,
porque é muito estreita e os alunos sobem e descem de uma maneira muito desordenada
e pode haver sempre qualquer coisa que…”. (Professora)
“Não, tinha cuidado. Já me chamaram nomes na rua e eu tinha um certo cuidado porque
(…) por causa do grupo chamarme nomes e mostrar que até é mesmo capaz de bater e
não sei o quê. Mas quando está sozinho, eu sei que ele não é capaz de fazer”.
(Professora)
“Já me pintaram o carro, também se estragarem não estragam grande coisa, este ano já
ameaçaram “Ah o seu carrito!” e eu disse: “está bem vocês estragam e eu vou atrás de
vocês, eu sei quem é que vocês são”.
(Membro do Conselho Executivo)
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Dos alunos entrevistados, somente uma aluna revelou sentir medo no primeiro dia de
aulas, os restantes disseramnos que não sentem medo, nem receio de estar na sua
escola. As justificações prendemse com a proximidade do quartel da GNR e com o
facto de terem amigos mais velhos que os protegem.
O pessoal auxiliar tal como os alunos também não sentem medo nem receio de estar na
escola.
“Medo, não. (...) Porque conheço os mais velhos (...) Por exemplo, se alguém me quiser
bater eu depois chamoos”. (aluno, não participante)
“Medo? Não (...) eu tenho amigos. Antes de vir para esta escola já os conhecia da
primária e isso”.
(aluno, não participante)
“Já, um bocadinho só. Foi no primeiro dia, porque eu tenho medo. Há miúdos maiores
que eu que obrigamnos a fumar, como há miúdas daqui que obrigam a fumar. Eu já vi
uma miúda a ir para a casa de banho, que convidaram ela a entrar e obrigaramna a
fumar”. (aluno,agredido)
“Houve uma altura que eu tive, mas não do tempo desta escola. Agora não, não tenho
medo, posso ficar aí sozinha que não tenho receio”. (Pessoal auxiliar)
Ainda em relação à segurança, os professores dizem que em termos de relações
interpessoais não existem problemas, a insegurança mais uma vez prendese com as
condições do edifício. Dos sete professores entrevistados, apenas uma professora
manifestou receio face às atitudes dos alunos.
“Pois ao nível dos comportamentos é como lhe digo, eu estou aqui descansada a dar
aulas, os alunos decidem o que quiserem fazer e se a professora tiver alguma reacção,
cailhe tudo em cima, é o que lhe digo”. (Professora)
“Sim, segura pelo facto de não sermos atacadas e não levarmos com uma faca? Sim,
acho que sim. Onde não é segura é porque a tábua pode cair em cima de nós. Isso acho
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que não é segura, porque como o corredor é apertado e como há muitos alunos, posso
levar um pontapé como já levei, pontapés e cotoveladas, mas é sem querer, porque eu
vou ao bar e toda a gente me aconselha para não ir ao bar e a caminho do bar levo com a
bola, pontapé, cotovelada”. (Professora)
Para o pessoal auxiliar a escola é segura, no entanto os alunos na sua maioria não
partilham da mesma opinião. Para uns a insegurança está relacionada com o aspecto
físico da escola, para outros com a facilidade com que se saí dos portões da escola.
Dos onze alunos entrevistados, só três nos disseram claramente que achavam a escola
segura, os restantes responderam que não ou mais ou menos.
“Mais ou menos. Dá para entrar na escola com facilidade e sair”. (Aluno, não
participante)
“Mais ou menos. Aquele portão de saída, alguns que enganam e deviam de mostrar o
cartão. Por exemplo, tínhamos aulas e eu não queria ir para as aulas, eu saio porque digo
que não tenho aulas e eles deixamme ir”. (Aluno do 5º ano, não participante em actos
de agressão)
“...depois a escola está no estado em que está, pode cair o tecto ou não, não podemos ir
às varandas, as varandas podem cair e depois os mais novos não se sentem muito
seguros, havendo o problemas dos que vão lá e os ameaçam, que lhes pedem dinheiro e
lhes batem”. (Aluno do 9º ano, não participante em actos de agressão)
Deste modo, quisemos saber como eram as relações entre colegas no contexto da escola,
se existem situações de agressividade e/ou perseguição (colegas que andam sempre a
embirrar com eles ou com outros). A maioria dos alunos respondeu que não, opinião
que já não é partilhada pelos alunos vítimas de agressão, os quais afirmam ser
regularmente vítimas de intimidação.
“Comigo não, com os outros colegas às vezes. São outros, os repetentes”. (Aluno, não
participante)
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“Os mais novos é que têm a mania de intimidarem os outros mais velhos, porque eles
sabem muito bem que a gente não lhes vai bater, não é? São pequenos, não lhes vamos
fazer mal nenhum, só que eles às vezes gostam de empurrar as pessoas e chamar nomes,
mas nada de especial”. (Aluno, não participante)
“Há um da minha turma que embirra sempre comigo, está sempre a chamarme nomes, ‘Dentolas’ e manda a minha mãe para uns certos sítios” . (Aluno, vítima de actos de agressão)
“Começam a chamarme preta e mais… só que eu não ligo e digolhes ‘Olha sou preta
com muito gosto!’, não ligo ao que eles dizem, eu tenho a minha cor e eles têm a deles”.
(Aluno, vítima de actos de agressão)
Em síntese, embora os professores e o pessoal auxiliar considerem que as situações de
indisciplina e violência têm vindo a agravarse nas escolas e sociedade em geral, tal
tendência não é unanimemente aceite para descrever a situação na escola em que
trabalham. Todos os grupos entrevistados referiram que já foram confrontados e
estiveram envolvidos em situações de violência e agressividade na escola, no entanto,
este fenómeno é encarado como normal, isto é, não suscita grandes preocupações, no
sentido em que nunca ameaçou o modo de funcionamento da instituição, não questiona
a sua existência, hierarquias e objectivos.
Naturalizados foram também os pequenos roubos de mochilas, canetas, correctores e de
pequenas quantias de dinheiro que habitualmente desaparecem.
É prática corrente entre alunos a intimidação, perseguição e ameaça, geralmente de
alunos mais velhos sobre os mais novos, dos mais fortes sobre os mais fracos,
(bullying).
Assim, relativamente à escola são desvalorizadas e consideradas insignificantes as
situações de assaltos e agressões, sendo que para todos o sentimento de insegurança
prendese sobretudo com as degradadas instalações da escola e as péssimas condições
físicas e espaciais.
81
4.4.5. Relação com as normas
Como se entendem as normas A forma como o quadro normativo é entendido pelos diferentes sujeitos varia, no nosso
entender, em função da posição ocupada por cada um no espaço de relações sociais que
designamos por comunidade educativa.
Para os professores as regras mais valorizadas são aquelas que promovem o
conhecimento e a interiorização dos direitos e deveres associados à posição ocupada por
cada indivíduo nesse espaço. Para eles o conhecimento destas regras orienta tanto o
pessoal docente como não docente na forma de agir dentro e fora da sala de aula, nos
corredores e no pátio da escola, diminuindo assim a incerteza.
Na perspectiva dos alunos está associado à possibilidade de enfrentar uma pena que se
terá de cumprir caso se verifique o incumprimento das regras da escola. Esse aviso parte
dos professores, mas também dos pais dos alunos, cujas recomendações aos filhos
realçam as possíveis sanções.
“«Ah agora vais para a escola lá para baixo tens de te portar bem senão eles metemte
dispensa». Aqui nesta escola se eu me portar mal fico suspenso.” (Aluno, envolvido em
actos de agressão)
“Sim, a minha mãe disse que eu tinha que me portar bem senão ia para a rua e se eu
fizesse muitas coisas podia ser suspenso.” (Aluno, não participante)
“Se infringíssemos, ainda tínhamos uma falta disciplinar ou conselho disciplinar”.
(Aluno, vítima de actos de agressão)
Conhecer as normas Todos os alunos, professores e pessoal da acção educativa revelaram conhecer a
existência de um regulamento interno da escola. Contudo quando questionados a
propósito das regras mais importantes desse regulamento os professores referiram
exemplos tão gerais como o “cumprimento dos deveres”, “conhecer os direitos e os
deveres” e “fala sobre as regras em relação aos alunos”. Dos 7 professores
entrevistados, dois disseram não se lembrar do regulamento, um porque não o tinha e
82
outro porque a última vez que o lera já tinha sido há algum tempo. Pelo contrário, os
alunos referiram inúmeros exemplos das regras apresentadas no regulamento interno.
Tanto os alunos como professores coincidiam no acto de não o terem voltado a ler
depois de este lhes ser entregue.
“Sim, deramme o regulamento da escola e todos os anos mesmo que estejamos aqui
nesta escola há muito tempo, lemos sempre o regulamento da escola. Foi a nossa
directora de turma. Leu e explicou como é que nos devíamos de comportar e que
devíamos respeitar as regras”. (Aluno, não participante)
“Eu por acaso tive o azar do meu regulamento estar incompleto e ainda não fui buscar
outro sinceramente...deixeme pensar...sinceramente não tenho assim nenhuma opinião
formada”. (Professora)
“Eu penso que as mais importantes são o cumprimento dos deveres dos alunos, dos
professores e do pessoal auxiliar”. (Professora)
No início do ano lectivo os directores de turma entregam o regulamento interno e falam
acerca do mesmo com os alunos, no entanto, só alguns professores de outras disciplinas
abordaram esta questão nas suas aulas. Foram poucos os que o fizeram no decorrer do
ano lectivo.
“Só a directora de turma é que disse, os outros professores não disseram nada.” (Aluno,
vítima de actos de agressão)
“Deramme uns folhetos, peguei neles e foram directamente para o caixote do lixo.”
(Aluno, envolvido em actos de agressão)
No que diz respeito aos professores a falta de homogeneidade na forma como encaram
as regras foi patente quando questionados sobre os modos de aplicação do regulamento
interno. As razões estão associadas, no entender dos entrevistados aos anos de serviço e
situações de eventual saturação, bem como a facilitação por parte dos professores no
que respeita ao cumprimento das regras ao longo do ano lectivo, que resulta num
aumento dos casos de indisciplina.
83
“Não isso não posso dizer, até porque, sei até por experiência própria que cada pessoa
tem a sua maneira de actuar.” (Professora)
“Não dão a mesma importância e depois também há uns que chegam à sala e os alunos
já entraram, há outros que só quando os alunos estão bem comportados cá fora é que
começam a deixar entrar os alunos, há outros que entram ao mesmo tempo que os
alunos, não há assim muita coerência, mas era importante que houvesse, não porque um
tivesse uma opinião mais eficaz ou mais correcta do que os outros, mas por causa dos
miúdos é importante haver uma certa coerência, eles depois modificamse quando vão
de sala para sala, sabem com que professor é que vão estar e sabem que com este posso
fazer barulho com o estojo e com o outro não podem fazer barulho com o estojo e que
este se eles disserem que a mesa tem um risco vai logo chamar o funcionário e o outro
vai dizer está bem, está bem!” (Professora)
“Não decididamente não. Por exemplo uma regra que é não deixar os alunos saírem
durante as aulas… às vezes passam imensos miúdos que vêm de salas de aula, que os
professores deixaram os miúdos ir, isto repetese e não é uma vez. Se fosse uma vez
para irem à casa de banho, tudo bem, agora quando as coisas começam a ser muito
frequentes é um bocado complicado, começam a ganhar essa mania e depois é a
continuação”. (Professora)
“...isso depende dos professores, mas de uma maneira geral não é má, temos é quatro ou
cinco professores que estão bastante fragilizados, quer por muitos anos de serviço, quer
pela sua idade, quer pelas duas coisas, quer pelas suas facetas idiossincráticas que a
relação tornase difícil e há problemas a nível disciplinar”. (Membro do Conselho
Executivo)
“No princípio do ano quando toda a gente está a cumprir as regras estabelecidas, as
coisas são muito calmas ai até Novembro e depois quando… não sei se falta…ou os
professores acham que está tudo feito, começam a facilitar e começa a desabrochar a
indisciplina, pronto e depois há um crescendo…vai num crescendo que só pára no fim
do ano”. (Professora)
84
Atitudes face à norma Procurámos saber junto dos professores e pessoal auxiliar se os alunos partilham
aceitam e compreendem das normas do regulamento interno ou se pelo contrário
desenvolvem comportamentos que no seu critério indiciam resistência e/ou rejeição.
No entender da maioria dos professores este aceitam genericamente as normas,
havendo, contudo, casos em que a indisciplina surge como resultado da gestão das
regras efectuada pelos docentes.
“Não senti isso, não, antes pelo contrário, eles aderem, o que é necessário é que haja de
facto por parte dos professores essa…quer dizer, essa situação sempre presente, para
que os chamar à responsabilidade e a fazerem sempre cumprir”. (Professora)
“...eles são juizes acutilantes e não lhes passa nada, portanto, eles podem aceitar neste
momento qualquer observação que lhes seja feita, mas numa situação parecida ou que
eles achem que é parecida se não for aplicado o mesmo, eles sentem e o processo de
indisciplina começa”. (Professora)
Já o pessoal de acção educativa, cuja posição subordinada na estrutura hierárquica do
estabelecimento escolar lhes proporciona menor poder e margens limitadas de gestão do
quadro normativo, tem uma opinião contrária aos professores. Todos os entrevistados
consideram que os alunos manifestam resistência em relação ao cumprimento da norma.
“Pelo contrário, alguns não seguem as regras, por exemplo, na questão de entrarem para
uma sala com pouco comportamento, atiram com as portas, estragam, tentam tirar
fechos, tentam danificar, uma pessoa está a limpar dão um pontapé no balde e a água vai
por fora, enfim!” (Pessoal auxiliar)
“Em relação aos bonés, às vezes os professores têm de os mandar tirar, as pastilhas, mas
também não ligam a mínima se entram ou não com pastilhas, a única coisa que eles
sabem fazer é quando toca vão logo para o bar para poderem ficar no corredor a comer,
para entrar mais tarde na sala de aula, temos que os mandar embrulhar a comida e
mandálos entrar...”. (Pessoal Auxiliar)
85
Interessavanos saber, ainda em relação às normas, se existe alguma regra na escola
com a qual os alunos, os professores e o pessoal auxiliar não concordassem. Existe da
parte da maioria dos alunos entrevistados uma aceitação genérica das regras da escola,
referindo a importância dessas para o normal funcionamento da escola. Contudo,
algumas regras são alvo de críticas, por considerarem que possuem um carácter
arbitrário. Nomeadamente:
“Entrar com bonés para o pátio, isso eu não concordo, porque é que não se pode entrar
com bonés para a escola? Menos para as aulas, para as aulas tirase”. (aluno, envolvido
em actos de agressão)
“Não concordo com o dizerem que não podemos andar aqui nos corredores, porque de
Inverno se está a chover não podemos ir lá para fora e acho que devíamos de poder estar
nos corredores, porque não há espaço nenhum lá fora e se estivermos nos corredores nós
estamos calmos a conversar...” (Aluno, não participante)
A maioria dos professores entrevistados concorda igualmente com a generalidade das
regras do regulamento interno. Quanto à proposta de alguma regra que não esteja
definida presentemente na escola, apresentaram sugestões:
“... poderá haver um toque a seguir…no primeiro tempo, uma tolerância maior, isso
acontece na generalidade das escolas (...) tanto para professores como para alunos”.
(professora)
“Olhe, por exemplo, a proibição de usar telemóvel pelos alunos e pelos professores
dentro da sala de aula, eu nunca vi, mas ouço dizer que há quem atenda o telefone
dentro da sala de aula, eu penso que a postura do professor em relação aos alunos é
fundamental”. (Professora)
“... não concordo coma as medidas educativas disciplinares, com as suspensões, etc,
mas vejome obrigada a fazer. Porque não servem para nada, só servem para os tirar de
cá e para termos uma vida mais descansada, vejome obrigada a concordar com isso,
mas não concordo, eu na minha direcção de turma tive um aluno com três suspensões
neste ano e eu sei que a suspensão não servia para nada”. (Professora)
86
Para além da aplicação destas regras ser muitas vezes diferente de professor para
professor, verificase que as regras informais são transmitidas e comunicadas em sala de
aula nem sempre coincidem com as normas formais e não formais.
Segundo, Ivo Domingues existem três tipos de normas: as regras formais (provenientes
do Ministério de Educação) que circulam em forma de decretos, portarias e despachos.
As regras não formais (elaboradas pelos órgãos da escola) que visam solucionar os
problemas que surgem no estabelecimento de ensino e as regras informais, comunicadas
verbalmente na sala de aula ou no pátio da escola. “Estas últimas, confundemse com as
regras sociais. São estabelecidas por quem detém poderes para as formular, impor e
defender” (Domingues, 1995:16).
Quando perguntámos aos professores quais as diferenças entre eles nos modos de
aplicação das normas do regulamento, as respostas variam. Para alguns tem a ver com a
idade, para outros tem a ver com a experiência, habilidade, para outros ainda com o
rigor.
“Aqui nesta escola, ao contrário da minha experiência que os professores mais novos
eram mais permissivos, tenho certas reservas, penso que há professores aqui, porque
estão mais desgastados ou porque não têm condições no momento e no contexto em que
estão de ter mão nos miúdos, isso também se verifica em certos casos e são pessoas já
de uma certa idade, mas muita experiência de ensino, não são exactamente o pessoal
jovem”.(Professora)
“Isso a idade aí, alguns como estão fragilizados não se lembram disso, não têm
capacidade por mais que queiram, as pessoas querem, mas não são capazes de
defenderem o que ali está, os mais novos também por falta de experiência não
conseguem controlar uma turma e leválos a trabalhar...” (Membro do Conselho
Executivo)
“Existe, existe. As que valorizo mais é a relação das pessoas, das relações humanas,
entre pessoal, alunos e professores. Não faltar ao respeito, ser correcto com toda a gente,
isso são regras tanto dos empregados como dos alunos”. (Pessoal auxiliar)
87
Quanto à eventual contribuição dos alunos na definição das regras da escola, a resposta
dos professores é muito positiva. Todos partilham a ideia de que os alunos devem ter
palavra sobre um assunto que lhes diz directamente respeito. Esta opinião é também
partilhada pelo pessoal de acção educativa.
“Ah sim! devem com certeza. A participação deles é muito importante e eles são muito
mais rigorosos nas regras de funcionamento até do que propriamente os professores,
porque eu faço isso na minha disciplina e há coisas que eu não poria e eles põem,
portanto eles têm noção do que é que devem e não devem fazer, e essa participação
ajuda com certeza a eles interiorizarem esses valores e a responsabilizálos
simultaneamente pelo cumprimento das mesmas”. (Professora)
“Sim. Porque foram eles que decidiram, conheciam as regras e fixavam melhor as
regras, depois interiorizavam mais, como sendo uma coisa deles e levavam aquilo mais
a sério quando alguém fizesse batota, como eles costumam dizer”. (Professora)
“Sim. Porque eles também têm regras como nós temos. Terem um bom comportamento,
respeitaremnos, nós temos que os respeitar para sermos respeitadas, não é?” (Pessoal
auxiliar)
Em síntese, alunos, professores e pessoal auxiliar sabem que existe um regulamento
interno da escola e qual a sua finalidade. Quanto à sua aceitação por parte dos alunos,
professores e pessoal auxiliar têm uma opinião diferente. Para os professores, os alunos
aceitam na generalidade as regras no contexto da sala de aula, excepto situações em que
percebem as fragilidades dos professores e nas quais apresentam comportamentos de
indisciplina e de resistência. Na opinião do pessoal auxiliar, os alunos não aceitam o
cumprimento das regras e os professores têm constantemente de lhes lembrar o
regulamento.
Os alunos concordam com a existência de regras na escola e são eles que referem mais
espontaneamente as regras que consideram mais importantes no regulamento. Apesar
dessa concordância genérica mencionaram algumas que consideram arbitrárias,
nomeadamente, entrar com bonés para a escola e não poderem circular nos corredores
durante os intervalos.
88
Os professores concordam com o regulamento, mas alguns sugerem outras regras que
deveriam ser tidas em conta, por exemplo, proibição do uso do telemóvel nas salas de
aula e a existência de um segundo toque de tolerância.
As diferentes formas dos professores realizarem o controlo dos comportamentos na sala
de aula traduz a diversidade do próprio corpo docente na percepção e aplicação das
regras no quotidiano.
A participação dos alunos na definição das regras da escola é uma opinião partilhada
pelos professores e pelo pessoal auxiliar, no sentido de se familiarizarem mais com as
regras e interiorizarem determinados valores vistos como desejáveis .
4.5 – Nota final
A realização deste estudo de caso procurava, antes de mais, compreender qual a
incidência das situações de violência no quotidiano de uma escola, procurando
aprofundar o conhecimento sobre os contextos concretos que resultam na produção
desse tipo de situações.
A participação no quotidiano de uma Escola Básica 2/3 do centro de Lisboa foi a este
propósito profundamente interessante. Após primeiros contactos pareceunos que a
escola confirmava os pressupostos que tinham levado à sua escolha, ou seja, não estar à
partida referenciada (em particular não ser socialmente designada) como registando
problemas graves de indisciplina e violência. Este era aliás um pressuposto importante,
pois não nos encontrávamos à procura de um estabelecimento em que a ocorrência de
situações de violência se enquadrasse no tipo de situações que regularmente vemos
serem ultramediatizadas. A razão de ser dessa opção radica na ideia de que o essencial
das situações violentas na escola não são constituídas por situações de grande violência
cometidas por grupos de jovens marginais, mas antes se traduzem em situações de
pequena violência quotidiana entre alunos (pequenos roubos e agressões, intimidação
quotidiana).
Se é verdade que a primeira imagem que construímos da escola se manteve ao longo do
tempo, a permanência mais prolongada no terreno veio possibilitar uma visão mais
aprofundada sobre o seu quotidiano.
A análise realizada durante o ano lectivo de 1999/00, traduziuse na ideia de nos
encontrarmos perante uma escola organizada, que não “enferma” da maioria dos males
frequentemente atribuídos à escola portuguesa: instabilidade directiva, elevada rotação
89
dos docentes, fraca cooperação entre docentes, inexistência de serviços de apoio. Já no
que diz respeito às instalações as queixas sobre a sua degradação e desadaptação eram
frequentes e comuns a toda a comunidade escolar.
É de referir que a escola conta com uma assinalável estabilidade do corpo docente (no
essencial efectivo), possui diferentes serviços de apoio, nomeadamente um gabinete de
acompanhamento e formação, gabinete de serviço de psicologia e orientação e o
gabinete de acção social escolar com recursos superiores a muitas escolas de maior
dimensão. Existe um regulamento de escola que é discutido com os alunos, o projecto
educativo parece ser partilhado pela comunidade educativa.
Este panorama positivo, de uma escola que funciona, poderia levar à partida a pensar
que as situações de agressividade e violência seriam reduzidas ou mesmo inexistentes.
Esta concepção seria ainda mais forte se tomarmos em conta as asserções pedagógicas
que consideram estar na origem dessas situações o chamado “malestar escolar”,
resultante das situações de desorganização da escola e de percursos escolares marcados
pelo insucesso, que quando resolvidos, levariam ao seu desaparecimento. Muitas destas
concepções vão de par com a ideia de que existe uma relação de causalidade entre as
situações de indisciplina e violência e a proveniência dos alunos de zonas marcadas por
situações de carência económica e cultural. A melhoria destes indicadores traduzirseia
quase automaticamente na mudança ou desaparecimento desses comportamentos 19 .
A discussão teórica e a avaliação empírica destas concepções levará, necessariamente, à
percepção do grau de autonomia que o fenómeno possui um face a essas dimensões e
até que ponto implica programas próprios para a sua redução.
Do trabalho desenvolvido ressaltam algumas conclusões:
Em primeiro lugar diz respeito à amplitude da disseminação das situações violentas.
Com efeito, através das entrevistas realizadas percebemos que a violência é recorrente,
quotidiana e atinge toda a população escolar. São situações de conflitualidade que
poderemos designar globalmente como de reduzida gravidade e de um modo geral de
baixa intensidade Os “empurrões”, “pontapés”, “tostas” e pequenos roubos são
considerados habituais, o que leva a que se verifique uma certa naturalização das
situações de violência. Estas não são geralmente objecto de grande preocupação e não
19 Concepções semelhantes podem ser encontradas nos discursos relativos à evolução da delinquência infantojuvenil, analisados em Sebastião, João (2000) “A infância em Portugal: alguns equívocos e interrogações” in Forum Sociológico nº3/4, Lisboa, IEDS/UNL.
90
lhes é atribuída grande relevância nem qualquer programa particular por parte da escola.
Apenas em situações de maior gravidade é convocado um conselho disciplinar. Esta
circunstância poderá deverse ao facto de a instituição considerar que estas situações
não põem em causa nem os seus objectivos nem as hierarquias nela existentes.
Em segundo lugar parecenos que o espaço pequeno e degradado do edifício da escola é
um elemento facilitador do aparecimento destas situações de conflitualidade. Os
constrangimentos físicos são evidentes quando entramos na escola e percebemos o
estado de degradação do edifício antigo, as más condições de acesso pelas estreitas
escadas e corredores sem as devidas protecções e o reduzido espaço do pátio, local de
recreio dos alunos. É notória ainda a deterioração das salas de aula e da sala de
convívio, bem como a inexistência de saídas de emergência, condição essencial de
segurança.
Em terceiro lugar será importante questionar algumas concepções correntes entre a
comunidade escolar. As explicações avançadas pelos três grupos de entrevistados para a
ocorrência de situações de indisciplina grave e violência são sobretudo relacionadas
com o ambiente e educação familiar dos alunos. Este facto, em particular entre os
alunos, parece constituir a incorporação do discurso de professores e funcionários sobre
as famílias (ou pelo menos sobre uma parte delas). Contudo, verificamos através das
entrevistas aos alunos que os pais não recorrem correntemente ao uso das punições
físicas, e que, em caso de conflito, optam por aplicarlhes castigos que se prendem
com a proibição de realizar as actividades de tempos livres mais apreciadas pelos
jovens. Assim sendo, parecenos que outras razões explicativas para a ocorrência de
situações de indisciplina e violência a que é conferido menor destaque nos três grupos
de actores entrevistados, como a relação desses alunos com a escolaridade; as relações
interpessoais com os professores e colegas; outras causas ligadas à própria
personalidade dos alunos deveriam ser objecto de uma maior atenção e reflexão por
parte da escola.
91
Em quarto lugar, seria importante ter em atenção a sobrerepresentação de situações
violentas no 2º ciclo, a qual origina a necessidade de a escola (re)pensar a recepção e
acompanhamento dos alunos na transição do 1º para o 2º ciclo do ensino básico 20 .
Em quinto lugar, as entrevistas realizadas tornaram notório que alunos, professores e
pessoal auxiliar sabem que existe um regulamento interno da escola e qual a sua
finalidade. Porém, a inexistência de um consenso sobre este regulamento e de um
critério comum quanto às normas de comportamento, faz com que os vários
professores tenham regras próprias e interpretações pessoais do regulamento da
escola. Tal facto traduzse na dissolução da norma, na necessidade de os alunos criarem
uma lista das exigências particulares de cada docente, na indefinição que leva à perca de
relevância dos quadros normativos na gestão das relações entre os diferentes membros
da comunidade escolar.
Em sexto lugar, devido ao reduzido número de entrevistas realizadas não é possível
estabelecer associações entre os percursos escolares e comportamentos violentos,
contudo nos casos analisados era visível que os agressores tinham percursos mais
complicados (dois deles tinham reprovado três e quatro vezes, respectivamente), as
suas expectativas quanto ao prosseguimento da escolaridade eram aparentemente
menores e as conversas com os pais menos explícitas que entre os agredidos e os não
participantes em situações de violência.
Em sétimo e último lugar, com a realização do projecto, ficanos a convicção da
necessidade de aprofundar a análise destes fenómenos de violência e indisciplina,
alargando a análise a um número significativo de casos. Tornase claro que a violência
não constitui uma situação esporádica, antes é recorrente e necessita medidas
específicas. Por outro lado as limitações desta pesquisa impediram que fossem
abordados em conjunto com os diferentes agentes educativos existentes na comunidade
(associações de pais, autarquias, associações comunitárias dos mais variados tipos,
polícia, etc..) as medidas que, dentro dos seus âmbitos particulares de actuação,
poderiam ser realizadas em articulação. Estas constituem linhas de investigação e
20 Já em outros momentos este aspecto foi alvo de análise e realçada a sua importância. Ver a propósito Benavente, Ana, Campiche, Jean, Seabra, Teresa e Sebastião, João (1994), Renunciar à Escola o abandono escolar no Ensino Básico, Fim de Século, Lisboa.
92
intervenção que pensamos constituirão no futuro aspecto incontornáveis da vida das
escolas e comunidades respectivas.
93
5. Conclusão
A gradual visibilidade sobre as situações de violência na escola adquiriu
progressivamente na última década uma importância social crescente, traduzida na
ocorrência de alguns debates públicos sobre o tema e em numerosas referências nos
meios de comunicação social. O trabalho de que se dá conta nesta publicação, resultante
de uma linha de investigação desenvolvida pelo Centro de Investigação e Estudos de
Sociologia, permitiu o confronto com algumas das prénoções socialmente
disseminadas sobre os fenómenos de violência na escola, contribuindo esse esforço, a
nosso ver, para uma visão mais aproximada da real situação existente. Neste desejo de
objectivação pudemos ainda verificar dois obstáculos de monta a esse objectivo: em
primeiro lugar a dificuldade para a agenda da investigação incorporar a problemática;
em segundo, a quase inexistência de informação extensiva 21 , facto ainda mais agravado
pela fraca qualidade da disponível a nível nacional.
O percurso de investigação realizado levounos, num primeiro momento, a analisar a
investigação realizada no campo da educação em Portugal (parte 2); depois a questionar
as políticas públicas (parte 3), e, finalmente, à realização de um estudo de caso numa
escola do centro de Lisboa (parte 4). Como afirma Marie DuruBellat (2000: 26) “se
admitirmos que a especificidade da aproximação científica se situa na tomada em conta
de dados empíricos permitindo controlar a prazo as construções teóricas, logo a questão
da validação/refutação externa das construções teóricas é central. Procurámos, por isso,
com este percurso, confrontar os desenvolvimentos teóricoconceptuais e a investigação
empírica realizada em Portugal, tentando ressaltar o que, em nosso entender, poderiam
ser consideradas as suas virtualidades e insuficiências.
A investigação sobre violência em Portugal
Relativamente ao campo da investigação em torno da violência na escola pudemos
constatar que este se caracteriza pela oscilação entre dois pólos opostos. Num dos
extremos registase alguma tendência para o isolacionismo teórico, evidenciado pela
utilização de um número limitado e fechado de referências conceptuais. Por vezes esta
tendência traduzse na reprodução, para a realidade nacional, de conceptualizações
21 Facto que em termos educativos não se reduz apenas a este aspecto, mas que se estende a quase toda a informação básica sobre o sistema educativo
94
produzidas por autores estrangeiros com a tentação da sua utilização em quase regime
de exclusividade.
No outro extremo constatase a utilização indiferenciada e não justificada de conceitos
provenientes de quadros teóricos pouco relacionáveis 22 . Consideramos que a
diversidade teórica e metodológica em torno da violência em meio escolar pode resultar
num profícuo e estimulante espaço de pluralidade e discussão científicas, e pode mesmo
ser considerada como desejável no sentido em que pode resultar uma visão mais
completa do fenómeno violência na escola, bem como tem um potencial efeito de
confronto entre resultados, de todo desejável. A constatação, por diversas pesquisas, da
multidimensionalidade do fenómeno aconselha abordagens sensíveis a diferentes
posturas teóricas e metodológicas, possibilitando, assim, em nosso entender, o cruzar de
olhares que permitem analisar as diferentes configurações que este assume. Contudo,
no caso português, a prática dominante no campo da investigação em educação no
sentido de evitar o confronto e o questionamento dos resultados de pesquisas, leva a que
os diferentes autores raramente refiram os resultados de outras pesquisas, anulando,
assim, o que de positivo se poderia encontrar na diversidade de abordagens.
A superação desta polarização até agora característica deste campo de investigação em
Portugal é, em nosso entender, decisiva para a construção de indicadores estáveis
necessários ao desenvolvimento de análises longitudinais e comparativas do fenómeno
em estudo, a qual é uma lacuna central da pesquisa que tem sido desenvolvida sobre o
tema no nosso país.
Noções equívocas sobre a ocorrência de situações de violência
A pesquisa realizada permitiu ainda questionar algumas noções habitualmente
associadas a este fenómeno:
Em primeiro lugar, embora o fenómeno da violência na escola seja objecto de discursos
alarmistas nos meios de comunicação e na comunidade educativa que lhe atribuem uma
expressividade crescente e assustadora, os dados de que dispomos não permitem
suportar estes discursos. Na verdade, não encontramos dados nem indícios de que as
situações de violência em meio escolar tenham assumido nos últimos anos uma
22 Esta situação de imprecisão teórica surgiu de forma exemplar num número significativo de comunicações apresentadas ao XI colóquio da AFIRSE “Violência e indisciplina na Escola” realizado em Lisboa em Novembro de 2001.
95
dimensão que possa ser considerada como correndo o risco de se encontrar fora de
controlo 23 . Os dados oficiais, apesar das suas deficiências, dão conta de um número
reduzido de situações violentas nas escolas do país. No mesmo sentido, o estudo de caso
realizado revelou que as situações de violência grave são raras, embora revelando a
existência de situações que poderíamos designar globalmente como violência de
reduzida gravidade e de baixa intensidade. Este tipo de violência é recorrente e
quotidiana, atingindo toda a população escolar. É contudo interessante constatar que não
lhe é atribuída grande importância pela própria escola, verificandose uma certa
“naturalização” das situações de violência pelos diferentes actores presentes no espaço
educativo. Aqui sim, impõese a tomada de medidas orientadas para a sua resolução, já
que esta se traduz para uma parte dos alunos na diminuição efectiva dos seus direitos de
acesso à educação.
Em segundo lugar, os dados de que dispomos não nos permitem associar, de forma clara
e inequívoca, a ocorrência de situações de violência na escola a indivíduos com
percursos escolares marcados pelo insucesso escolar. Isto, embora no estudo de caso
surjam indícios de que os agressores entrevistados era protagonistas de percursos
escolares com algumas reprovações e portadores de projectos de futuro em que a escola
não tem um papel central. O estudo de caso indica, para além disso, que outras variáveis
como o género 24 , a idade e o nível de escolaridade 25 , poderão estar associados à maior
ou menor ocorrência de situações de violência.
Em terceiro lugar, existe alguma contaminação da investigação por noções ideológicas e
de senso comum, respeitantes nomeadamente à origem da violência. É comum a
aceitação, sem questionamento, da ideia segundo a qual a violência na escola é um
fenómeno recente e desviante, cuja origem se encontra mais ou menos directamente nos
contextos sociais em que as escolas se integram, designadamente contextos socialmente
desvalorizados e excluídos. A violência decorre, deste ponto de vista, de causas
“sociais” exteriores à escola, normalmente de condições materiais de vida deficientes da
socialização familiar resultante dos modelos culturais dessas famílias, ou, então, a
características individuais, definidas como “natureza selvagem” de algumas crianças.
23 Facto que confirma tendências igualmente sublinhadas por diversas pesquisas a nível europeu. 24 Tanto entre os agresssores como entre as vítimas de situações violentas encontramos um número de rapazes superior ao de raparigas. 25 Verificase um maior número de situações violentas no 2º ciclo, o que poderá estar relacionado com a mudança em termos de regime e quotidiano escolar dos alunos.
96
Tais concepções, que fundamentam a existência de medidas políticas como o programa
Escola Segura obscurecem a investigação e bloqueiam a intervenção, resultando delas,
frequentemente, a ideia de que a escola não é capaz de alterar o rumo das coisas. O
estudo de caso mostrou claramente que as situações de violência não existem apenas
nestes contextos. Ao contrário caracterizamse pela sua transversalidade a diversos
contextos sociais, em resultado, não apenas, de conflitos interpessoais, mais ou menos
pontuais, mas também, de causas relacionadas com a qualidade dos espaços escolares e
com os modelos organizacionais e pedagógicos seguidos pela escola.
Não ter em consideração estes aspectos, sobrevalorizando ou tomando apenas em conta
o que resulta de alguns particularismos próprios de certas camadas sociais, obscurece as
diversas experiências positivas e programas de carácter não policial que se têm
desenvolvido a nível nacional e internacional, os quais constituem, sem dúvida, uma
alternativa eficaz na prevenção do desenvolvimento de comportamentos violentos nas
escolas.
De salientar, também, a transversalidade que a violência possui nos discursos dos
diferentes actores presentes no espaço educativo. Todos se referem a acontecimentos
que podemos classificar como violência (agressões físicas voluntárias, ou não, roubos,
agressão psicológica, etc). Contudo, raramente assume para os intervenientes contornos
de algo intolerável, antes, sendo alvo de um processo de naturalização, quer na sua
dimensão quer nas suas consequências (facto que tem que ser matizado, já que os alunos
vítimas de agressão encaram o assunto de forma um pouco diferente).
Deste conjunto de aspectos resultam hipóteses interrelacionadas que necessitam, no
nosso entender, de ser exploradas em futuros estudos de forma a esclarecer a relação e
peso relativo das diferentes variáveis. A este propósito, é de salientar que a
complementaridade de estudos extensivos e intensivos permitiria uma compreensão
mais apurada da forma como se entrecruzam, nas situações de violência na escola, a
actuação de elementos estruturais, respeitantes aos quadros de vida dos indivíduos e à
actividade socializadora da instituição escola, com a acção de quadros culturais e
interaccionais particulares.
Políticas e estratégias de combate à violência
Na dimensão de análise respeitante aos programas e iniciativas oficiais que procuram
intervir sobre a violência em meio escolar, concluímos que as mesmas estão centradas
97
em duas linhas de intervenção (de carácter pedagógico e policial), verificandose que as
diferentes medidas são geralmente pouco ou nada coordenadas e apresentam um
elevado potencial de desperdício de recursos. Em particular importa chamar a atenção
para o progressivo desenvolvimento do Programa Escola Segura pelo relativo relevo em
termos de políticas públicas que lhe é atribuído, em particular nos recursos
disponibilizados. Representando o essencial do esforço de intervenção por parte do
Estado nesta área e mobilizando um número significativo de recursos materiais e
humanos, do seu desenvolvimento têm resultado tendências contraditórias. Contudo
esse relevo não é acompanhado de uma estrutura organizativa que corresponda a esse
esforço, continuando o Gabinete de Segurança do Ministério da Educação reduzido a
uma estrutura artesanal.
Um aspecto mais importante tem ainda marcado negativamente o seu desenvolvimento.
A preponderância da Administração Interna no protocolo estabelecido com a Educação
tem imposto uma perspectiva marcadamente policial que, no nosso entender, não se
adapta ao tipo de instituições em que desenvolve a sua actividade nem às situações
ocorridas. A ideia de que as situações violentas resultam da actividade de grupos
marginais exteriores à escola é profundamente desadaptada e raramente fundamentada.
Este tipo de medidas políticas resulta em boa parte da ignorância da realidade educativa
demonstrada por uma parte significativa da classe política, que, sempre que confrontada
com a questão, resvala para o discurso da extensão da presença policial. O discurso
conservador e autoritário da “segurança” parece manter as diversas forças políticas
“atadas” à “inevitabilidade” da necessidade do seu crescimento, mesmo aquelas que
preconizam visões alternativas do desenvolvimento do sistema educativo. Tratase da
aprendizagem, nos espaços escolares, da cidadania policiada. A preponderância deste tipo de concepções parece aliás reforçar as tendências de
fechamento dos espaços escolares à comunidade, solução essa vista por muitos como
garantia da sobrevivência face a uma iminente ameaça de dissolução das regras do seu
funcionamento. Assim, a solução tem sido a escola defenderse da comunidade com
gradeamentos, guardas e cartões de identificação. Ensinase, assim, aos alunos os
princípios da cidadania desconfiada 26 .
26 A este respeito é de realçar o programa Abrir a escola ao fim de semana, levado a cabo pela EB 2+3 de Armação de Pêra, em que esta se encontra aberta durante o fim de semana à utilização pela comunidade sem que nela se encontrem presentes quaisquer tipo de vigilantes, num exercício de educação e participação cívica a todos os títulos notável.
98
Esta concepção traduzse na dificuldade da instituição em aceitar a diversidade
sociocultural como um bem, já que parte do pressuposto de que esta dificulta os
processos de socialização de massas, posição que se mantém mesmo quando
formalmente as directivas políticas e os quadros normativos parecem promover o
respeito pela diversidade.
Alguma evolução legislativa foi entretanto efectuada, nomeadamente a tentativa de
coordenação entre iniciativas de ministérios diferentes 27 , contudo nunca implementado.
De salientar que mais uma vez se procurava uma solução longe das comunidades
educativas, sendo antes privilegiada a articulação de serviços centrais.
Daqui decorre a necessidade de sublinhar que, para além da importância de programas
de âmbito nacional como o Escola Segura que é objecto de análise neste trabalho, existe
um amplo espaço de intervenção possível a nível de cada escola nas suas dimensões
pedagógica e organizacional que, em nosso entender, podem permitir de forma eficaz o
combate à ocorrência de situações de violência. A coordenação da actividade
desenvolvida pelos programas de carácter nacional com a mobilização dos diferentes
agentes educativos existentes na comunidade, a implementação de programas de
educação cívica, a diversificação dos espaços educativos escolares e extraescolares
constituem alternativas que necessitam de ser apoiadas para que possam construir os
seus próprios espaços de legitimidade. A afectação de recursos para os diferentes tipos
de iniciativas pressupõe igualmente a reorientação do Programa Escola Segura,
reduzindo a sua preponderância policial e fornecendolhe um carácter eminentemente
civil, aberto à participação das comunidades locais. Só assim se poderá promover a
cidadania democrática, de forma a que os diferentes participantes do processo educativo
se sintam responsabilizados e parte activa de processos educativos abertos e integrantes
do desenvolvimento das respectivas comunidades.
Pistas para o desenvolvimento da investigação
O que diferencia então um empurrão (mesmo que violento) durante uma brincadeira de
um empurrão intencional para agredir um colega? Como separar a agressividade
recorrente na infância e adolescência de situações reiteradas de agressividade e coacção
sobre determinados indivíduos ou grupos? A discussão (principalmente a nível
27 Decreto Lei nº 16/2001 Combate à Insegurança e Violência em Meio Escolar
99
internacional) surge eivada de considerações ideológicas e morais que contaminam o
debate, deslizando, frequentemente, da análise para a tentativa de produzir modelos de
intervenção, nos quais esses pressupostos assumem peso crescente. Apesar das
tentativas realizadas por alguns autores para definir o que designamos por violência na
escola, não nos parece de todo fácil encontrar uma norma universal para classificar os
comportamentos violentos, já que a classificação de determinados comportamentos
varia com os quadros culturais dos diferentes grupos assim como com os contextos e
momentos em que se produz. 28 A rejeição da centração exclusiva da pesquisa no ponto
de vista unilateral das vítimas, pela subjectividade que introduz na análise, deverá
constituir uma precaução prévia.
A este respeito, e utilizando em parte a proposta que Peter Aggleton realizou para
ultrapassar o fechamento dos debates realizados na sociologia sobre as concepções de
desvio (Aggleton, 1991), seria de interesse delinear um programa de pesquisa que
procure ultrapassar, para o caso português, as limitações anteriormente referidas, o qual
tomasse em conta:
os determinismos estruturais da violência na escola, entendidos de forma ampla,
nos quais incluiríamos, particularmente, os quadros de vida das crianças, os
modelos de socialização escolar e as condições de acesso à escolaridade;
o processo de reacção societal à violência, ressaltando aqui a forma como as
escolas e comunidades lidam com este tipo de situações;
a psicologia social do envolvimento na violência, que nos possibilite compreender
que processos levam a que algumas crianças se transformem em agressores ou em
vítimas.
28 Sobre os quadros culturais dos diferentes grupos, vejase, por exemplo, os frequentes conflitos das crianças ciganas com os modelos comportamentais que a escola se esforça por impor.
100
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107
7. Anexos
Anexo A Metodologia do Estudo de Caso
Tendo em conta o reduzido número de pesquisas disponíveis sobre o caso português e
os fracos recursos disponíveis, optámos por realizar um estudo de caso com carácter
exploratório, privilegiando a análise mais intensiva, de forma a possibilitar o
desenvolvimento de perspectivas analíticas inovadoras na abordagem das diferentes
dimensões do fenómeno de violência na escola.
A estratégia metodológica seguida apoiouse na articulação de diferentes técnicas de
forma a maximizar os reduzidos recursos disponíveis. Assim foram utilizadas:
entrevistas semiestruturadas, a alunos (agressores e agredidos), docentes e
funcionários;
conversas informais com os vários elementos da escola, inclusive o conselho
executivo que forneceu os dados e o material de suporte à investigação;
análise documental, tendo sido analisados o projecto educativo; os processos
disciplinares do qual constavam as participações feitas por vários
intervenientes da escola dos alunos; os processos individuais e os
regulamentos internos da escola.
Foram realizadas 21 entrevistas, sendo 11 a alunos, 6 a professores e 3 a pessoal
auxiliar de acção educativa. A escolha destes três grupos de entrevistados explicase
pelo facto de interagirem quotidianamente no espaço da escola, por terem participado
directamente nas situações de violência, por serem informantes privilegiados
relativamente à realidade da escola.
As entrevistas foram realizadas segundo os seguintes critérios:
Docente membro do Conselho Executivo da escola. Informante privilegiado pelo
profundo conhecimento que resulta de uma ligação com mais de vinte anos a esta
escola, exercendo funções no Conselho Executivo.
Professores que leccionam a diferentes anos de escolaridade ( 3 entrevistas).
108
Directores de turma, por contactarem mais com os alunos, os pais e professores e
terem acesso a mais elementos sobre estes ( 3 entrevistas).
Alunos de vários anos de escolaridade, segundo os quais diferenciámos, os agressores
(3 entrevistas), vítimas (4 entrevistas) e 4 alunos não participantes em situações de
violência. A escolha foi feita com base na consulta prévia dos processos disciplinares,
assim como das fichas de aluno dos directores de turma.
Pessoal auxiliar, porque contactam diariamente com os alunos, tendo 2 deles sido
vítimas de actos violentos fornecendo pistas e dados interessantes para a pesquisa.
Na medida do possível entrevistámos os alunos agressores e aqueles que foram suas
vítimas, procurando desta forma ter acesso aos dois lados dos incidentes.
Neste estudo não foi possível falar com as famílias dos alunos entrevistados, dado os
recursos disponíveis (materiais, temporais e humanos). No entanto, tal seria importante
pois através dessa informação poderíamos compreender melhor a relação da família
com a escola e as suas representações sobre os actos violentos e os modos que estas
consideram aceitáveis na solução de conflitos.
Caracterização da amostra
Os alunos Realizámos 11 entrevistas a alunos com idades compreendidas entre os 10 e os 14 anos
de idade, sendo 8 deles do sexo masculino. A maioria destes jovens vivem em bairros
populares de Lisboa, como o Bairro Alto (4), Bica (2), e outras freguesias próximas,
como por exemplo São Bento e Campo de Santana.
Quanto ao percurso escolar, salientase que dos 11 entrevistados, quatro alunos
reprovaram, três deles mais de uma vez.
A inserção socioprofissional das famílias destes jovens entrevistados distribuise pelo
pessoal de serviços e vendedores (7), dos trabalhadores não qualificados (4) e do
pessoal administrativo e similares (3). Os restantes distribuemse por outros grupos
socioprofissionais como por exemplo artífices e trabalhadores similares (2), quadros
superiores da administração pública e operários (1),.
109
Quadro nº 27 Grupos socioprofissionais dos pais dos alunos entrevistados
Entrevistados Ent. 1 Ent. 2 Ent. 3 Ent. 4 Ent. 5 Ent. 6 Ent. 7 Ent. 8 Ent. 9 Ent. 10 Ent. 11
P M P M P M P M P M P M P M P M P M P M P M
1.Quadros superiores da administração pública, dirigentes e quadros
1
2.Espcialistas das profissões intelectuais e científicas 3. Técnicos e profissionais de nível intermédio 4. Pessoal administrativo e similares
1 1 1
5. Pessoal dos serviços e vendedores
1 1 1 1 1 1 1
6. Agricultores e trabalhadores qualificados da agricultura
1
7. Operários, artífices e trabalhadores similares
1
8. Operadores de instalações e máquinas e trabalhadores de montagem 9. Trabalhadores não qualificados
1 1 1 1
Relativamente às qualificações escolares dos pais dos alunos, o nível de escolaridade
mais elevado é o 12º ano, com apenas 1 caso, situandose os restantes entre a 2º classe e
o 9º ano de escolaridade.
No entanto um dado significativo a assinalar é o facto de alguns destes jovens não
saberem o nível de instrução e a profissão dos seus pais, circunstância que se prende
com o facto de não terem contacto com estes ou por terem falecido. Esta ausência de
respostas verificase nas crianças que pertencem a famílias monoparentais femininas e
naquelas que vivem com outros elementos da família, como por exemplo, tios, avós,
etc.
Os professores Em relação aos 6 professores entrevistados, a idade varia entre os 27 e os 52 anos.
Realizámos 3 entrevistas a professoras do 2º e 3º ciclo e 3 entrevistas a directoras de
turma, o único professor entrevistado é membro do Conselho Executivo da escola. Do
conjunto dos professores entrevistados (7), a maioria pertence ao quadro de nomeação
definitiva desta escola (4), uma outra ao quadro de zona pedagógica (1). Das
entrevistadas não pertencentes ao quadro (2), encontrandose uma a leccionar por
miniconcurso (1) e outra professora destacada pertencente ao quadro de outra escola (1).
Dos entrevistados dois participam em órgãos de gestão da escola, um como membro do
Conselho Executivo e outra como membro da Assembleia de Escola.
110
Relativamente aos anos de serviço na totalidade, verificamos que 3 têm mais do que 20
anos de serviço, enquanto que os outros 4 entrevistados têm entre 2 a 9 anos de serviço.
No entanto, os dados recolhidos em relação aos anos de serviço nesta escola em
particular indicam que apenas 2 entrevistados se encontram ao serviço desta escola há
mais de 18 anos e que os outros 5 entrevistados leccionam nesta escola há 5 ou mais
anos.
Para melhor caracterizar os professores entrevistados, recolhemos informação
relacionada com a formação que os mesmos têm para a docência e verificámos que a
maioria dos professores tem a profissionalização, apenas um professor tem só a
licenciatura sem habilitações pedagógicas.
Pessoal Auxiliar Para este estudo entrevistámos 3 auxiliares de acção educativa, 2 do sexo feminino e 1
do sexo masculino com 32 anos.
Uma das auxiliares entrevistada tem 13 anos de serviço, os outros têm menos de 3 anos
de serviço. Nenhum tem mais de 3 anos de serviço nesta escola. Tendo os mais novos o
12º ano escolaridade enquanto a auxiliar com mais tempo de serviço possui a 4º classe.
111
Anexo B Caracterização dos alunos objecto de processos disciplinares
Aluno Ano Idade Número de processos
Grau de parentesco do encar regado de educação.
Profissão do encar regado de educação
Bruno 6º 11 1 Mãe Ajudante de cabeleireira Marco 6º 14 1 Mãe Reformada
Luís 6º 10 3 Pai Empregada de balcão
Daniel 5º 10 1 Mãe Doméstica Paulo 6º 13 1 Pai Serralheiro
Hugo 6º 14 2 Pai Agente da PSP
Abdul 5º 10 2 Avó Reformada
Victor 5º 14 2 Pai Assessor de Presidente da Câmara
Eder 6º 11 2 Não familiar Nuno 7º 17 1 Pai Des
José 6º 15 1 Pai Manobrador de máquinas
Feliciana 8º 15 1 Freira do Instituto de internato de menores
Educadora religiosa
Ricardo 6º 14 1 Mãe Cozinheira
Ricardo 6º 13 1 Pai Desempregado
112
Aluno Ano Idade Número de processos
Grau de parentesco do encarregado de
educação
Profissão do encarregado de educação
Luís 7º 11 1 Mãe Cozinheira
Mário 7º 12 1 Mãe Empregada de Balcão
Miguel 7º 11 1 Pai Vigilante
Soraia 7º 12 1 Mãe Auxiliar de Infantário
Luís 5º 13 1 Mãe Empregada de Limpe
Frederico 5º 10 1 Mãe Empregada Hospitalar
António 6º 13 1 Mãe Doméstica
Sadjo 5º 10 1 Pai Desempregado
Mónica 8º 14 1 Mãe Empregada de Escritório
113
Anexo C – Tipo de ocorrências objecto de processos disciplinares
Tipo de ocorrência 5ª ano 6º ano 7º ano “...insultou o colega agredindoo fisicamente...deslocando e arremessando pelo ar algumas cadeiras pela
sala com as quais pretendia atingir o colega”. (R.I.) x
“...envolvese numa troca de insultos e agressões físicas com outro colega, demostrando dificuldade em
controlar a sua agressividade face a eventuais provocações. (R.I.) x
“...o aluno agrediu com um murro, partindo um dente, deixandolhe um olho negro e o nariz inchado e
negro, rompeu a mala da aluna” (D.T.)
“...agredia verbalmente a prof. de Inglês., Matemática e Educação Musical e fisicamente a de Ciências da
Natureza. Empurrandoa quando esta tentava controlar uma situação de perturbação à entrada da sala de
aula”. (R.I.)
É agressivo verbalmente quando confrontado com eventuais contrariedades e repreensões, inclusivamente
ameaçou agredir fisicamente de matemática que é a sua Directora de Turma. Partiu um extintor da escola
propositadamente. Agrediu um colega, provocandolhe um traumatismo craniano ao ser responsável pela sua
queda nas escadas. ( R.I.)
x
“...desobedeceu aos auxiliares que o acompanhavam ao G.A.F., tendo fugido e chegado mesmo a agredir
com pontapés um auxiliar, com a agravante de ter seguido a referida auxiliar, insultandoa e agredindo
novamente com um pontapé”. (R.I) x
“É insolente e provocador com professores e auxiliares, utilizando muitas vezes, uma linguagem verbal pouco adequada. Muitas vezes está na escola, mas falta às aulas curriculares”. (R.I)
x “...falta de respeito pelos colegas de turma e da escola, ou agredindoos verbalmente e fisicamente. É ainda
um aluno pouco pontual, o que agrava o seu comportamento desestabilizador”. (R.I)
“O aluno não cumpriu as normas, manifesta total desrespeito para com os professores, colegas, funcionários
revelando um comportamento agressivo, perturbador do regular funcionamento das actividades escolares”.
(R.I)
x
“O aluno perturbou a aula, agredindo uma colega e saindo da sala sem autorização.” entrou para as aulas gritando e recusandose a trabalhar, foi agressivo com o professor e deu... pontapés nas
cadeiras nas aulas de Português”
“Agrediu a colega Maria na aula de História... voltou a agredir esta colega no bar quando esta se preparava
para adquirir a senha de almoço, deulhe pontapés e puxoulhe os cabelos. Nesse dia voltou a agredir a
colega no bar . (R.I)
x
114
Tipo de ocorrência 5ª ano 6º ano 7º ano “O aluno demonstrou também uma certa dificuldade em controlar a sua agressividade face a eventuais
contrariedades e repreensões. Conforme consta do auto do inquirido ele acaba por aceitar que deu o pontapé
na funcionária e que tal procedimento foi muito incorrecto”. (R.I) x
“... em situação de aula desobedeceu aos professores, comportouse de modo a que as aulas não podiam
funcionar normalmente, com a sua presença gritando e usando linguagem imprópria”. (R.I) x
“o arguido, no pátio da escola encheu uma garrafa com urina e água. Deitando de seguida a garrafa com o
líquido para cima da colega”.
“o arguido nas escadas do refeitório da escola lançou uma pedra que atingiu na cabeça a aluna que teve de
ser transportada ao hospital” . (R.I)
x
“... o arguido provocou a vítima dandolhe calduços e quando este reagiu empurrandoo, agrediua com
violência provocandolhe um traumatismo na cabeça”.
“...empurrou a cabeça do aluno Marco contra a parede provocandolhe também um traumatismo”. (R.I) x
“...atitude inadequada à hora de entrada na sala 9 tenho como consequência que um aluno se magoou”. “...atitude inconsciente quando provocada pela colega, lançou a mochila pela janela da referida sala”. (R.I)
“...apresenta um comportamento incorrecto, recusandose a participar nos trabalhos proposto e por consequência desestabilizado a desenrolar da aula e da turma”. “estes serviamse do caixote do lixo para transportar o aluno em questão e uma outra aluna enquanto os restantes empurravam o caixote de uma das portas do pátio até ao centro do mesmo”. (R.I)
x
“o aluno agrediu uma colega dandolhe um pontapé e espetandolhe um lápis na perna...este saltou a rede da
escola e saiu”.
“o aluno forçou a entrada na Ludoteca e tendo sido impedido foi mal educado com a funcionária, recusando se a descer e tendo danificado um pedaço da parede e do pavimento.”
x
“provocando e ofendendo verbalmente um colega de turma. Fora da sala de aula continuou a sua provocação
e atitude imprópria, como consta das participações.” (R.I) x
“...começou a provocar o colega Luís, tendo este respondido às provocações. No seguimento dos actos o
aluno Mário deu um estalo ao aluno Luís. As confrontações terminaram após repreensão por parte da
professora. Já no pátio, as confrontações foram reatadas, tendo o Mário e o Luís entrado em confrontação
física violenta. Segundo as testemunhas, os confrontos físicos no pátio foram iniciados pelo Mário, tendo o
Luis respondido às agressões. (R.I)
x
115
Tipo de ocorrência 5ª ano 6º ano 7º ano “...proferindo palavrões em voz alta e quando advertido prosseguiu, acumulou 6 participações disciplinares
associadas a atitudes de incorrecção e insolência. Estas atitudes têm maior incidência na aula de
Inglês...considerada de um comportamento de carácter grave, em que o aluno, ao ter sido enviado ao GAF,
decidiu sair da escola sem autorização.” (R.I)
x
“A aluna recusouse a seguir as orientações da prof. de Inglês na sala de aula...não zelou pela conservação e
asseio da escola, no pátio. No corredor, agrediu a Ana Filipa de forma violenta e gratuita. Adoptou atitudes
muito incorrectas na aula de Inglês. No mesmo dia adoptou um comportamento de risco, ao brincar no muro
do pátio for escola da protecção da rede.” (R.I)
x
“...o aluno esteve sentado em cima das casas de banho, cuspindo todos os colegas que por ali passavam.... o aluno teve uma ordem de saída da sala de aula, por estar a perturbar a aula, quando advertido pela prof. de matemática, replica agressivamente e quando esta lhe solicita a caderneta , ele atiraa para o chão, quando recebe ordem de saída , saí batendo com a porta.” (R.I)
x
“...provocou de uma maneira impressionante o colega Ricardo, chegando ao ponto do agredir (...) recusouse a sentar no lugar, respondendo muito mal ao prof. , não acatou nada do que este lhe pedia( ...) numa aula o aluno passou o tempo todo a falar, a rir alto, a provocar os colegas e a fazer “palhaçadas”. (...) entra na sala de aula aos saltos, dá a volta à sala, recusase a sentar e vai conversando com os colegas. Dá arrotos propositadamente e responde com maus modos à prof..(...) Deu arrotos alto e quando o prof. o mandou ir para o GAF, provocoua dizendo: “ Está armada em boa!” (R.I)
x
Atitude inadequada e fez gestos impróprios na sala de aula de Português (...) atitudes que prejudicam o
normal funcionamento da aula, recusandose a cumprir a ordem da prof. em ir para o GAF. (...) destruiu por
completo um fio de electricidade que já estava um pouco solto na sala de Ed. Musical. (R.I) x
“Agressões físicas (pontapés, estalos, murros, socos, agressões com elástico) a oito colegas.” “Agressões verbais a dois professores e um auxiliar.” “Recusa de trabalhos na aula. Destruição de objectos pertencentes a colegas.” (R.I) x
“...o prof. de matemática, ao corrigir o teste da aluna, deparouse com um texto redigido na folha de teste
que a aluna deveria utilizar para a resolução do mesmo.”(R.I)
116
Anexo D Guiões de entrevista
Guião de entrevista para alunos
1. Gostas de andar na escola?
2. O que é que gostas mais aqui na tua escola?
3. O que é que gostas menos aqui na tua escola?
4. Já alguma vez reprovaste?
5. Quantas vezes? Em que anos?
6. Até que ano pensas estudar?
7. Os teus pais gostariam que estudasses até que ano?
8. Quando vieste para esta escola, alguém te explicou como deverias comportarte?
Quem disse (pais/professores)? O que disseram?
9. Sabes se existe algum regulamento interno na escola? Já o lêste?
Já falaste dele com os professores?
Lembraste de alguma coisa? De quê?
10. Existe alguma regra na escola com a qual tu não concordas? Qual? Porquê?
11. Há colegas teus que tu consideras indisciplinados?
O que fazem? Dá exemplos.
12. Porque achas que se comportam assim?
117
13. E os teus professores pensam da mesma maneira? Também acham que eles são
indisciplinados?
Pensam todos assim ou só alguns?
O que fazem quando isso acontece?
14. Já alguma vez tiveste medo/receio de estar na tua escola? Porquê?
15. Achas que a tua escola é segura? Porquê?
16. Costuma haver assaltos e/ou pancada entre alunos?
Já foste assaltado? Já te bateram?
Porquê? Por quem?
17. Há colegas teus que costumam bater nos outros? Porquê?
18. Há colegas teus que andam sempre a embirrar contigo ou com outros colegas?
Quem são? (mais velhos/ grupos/ outros)
19. Já viste os funcionários e os professores bater nalgum aluno? Porquê?
20. Quando fazes alguma coisa que os teus pais não gostam o que é que eles fazem
normalmente?
(pai/mãe)
(bater/ ralhar/ castigar – como?)
21. Quando os teus amigos se zangam como é que resolvem a situação?
(Bater/ discutir/ etc)
22. Quando acabas as aulas, fica ainda algum tempo na escola, vais logo para casa,
como é?
23. Como costumas ocupar habitualmente os teus tempos livres?
118
Caracterização do aluno:
Idade
Género
Profissão de pai e mãe
Nível de instrução de pai e mãe
Dimensão do agregado familiar
Local de residência
Ano de escolaridade que frequentas
119
Guião de entrevistas para professores
1. Há quanto tempo lecciona nesta escola?
2. Quais são os aspectos que considera mais positivos e mais negativos nesta escola?
(Espaço físico, equipamentos, ambiente entre alunos/ professores; escola/
comunidade/ pais)
3. Do seu conhecimento sobre o regulamento interno da escola, quais as regras que
considera mais importantes?
4. Acha que esses aspectos são os mais valorizados pelo resto da escola? Ou são
outros? Porquê?
5. Acha que todos os professores aplicam as normas do regulamento interno da mesma
forma? Quais as diferenças? Quem aplica como?
6. Existe alguma regra na escola com a qual não concorde? (Qual? Porquê?)
7. Gostaria de propor alguma regra que não esteja definida presentemente na escola?
8. Acha que os alunos também devem contribuir para a definição das regras da escola?
Porquê?
9. Parecelhe que os alunos compreendem, partilham e aceitam as normas do
regulamento interno, ou pelo contrário encontra algumas resistências por parte dos
mesmos?
10. Na sua opinião, o que é um aluno indisciplinado? Dê exemplos.
11. Quando está em sala de aula como é que normalmente reage perante estas situações?
120
12. Todos os professores agem da mesma maneira perante situações de indisciplina?
Quais as diferenças? Quem age como?
13. No seu entender, porque razão os alunos são dis/indisciplinados?
14. Acha que as alterações no processo de avaliação/ regime de progressão de alunos
tiveram consequências nos seus comportamentos na escola?
15. O aluno indisciplinado é diferente ou igual a um aluno violento? Porquê?
16. Na sua opinião, as situações de indisciplina/ violência nas escolas em geral têm
vindo a agravarse ou pelo contrário? Quais? (aumentaram, diminuíram ou
mantiveramse)
17. E nesta escola em especial como descreveria a situação?
18. Sabe se algum professor foi agredido e/ou assaltado na escola? O que faz a escola
nesta situação?
19. Conhece situações em que os professores batam nos alunos?
20. Costuma haver agressões entre alunos? E assaltos? O que faz a escola nesta
situação?
21. Que ideia tem da relação entre os alunos e o pessoal auxiliar? Acha que é uma
relação pacífica ou não?
22. Existe alguns alunos a que associe mais frequentemente situações de violência e
indisciplina? Quais?
23. Existem grupos organizados na escola? Quais? Como os reconhece?
24. Alguma vez sentiu medo/receio de estar na escola? Em que situação?
121
25. Acha que esta escola é segura? Explique. Diga em que sentido afirma isso.
26. Quais os recursos que a escola tem para fazer face a situações de violência e
indisciplina grave? São eficazes? Porquê?
27. Acha que devia haver outros mecanismos? Quais?
28. Quem poderia colaborar com a escola na sua resolução de situações de violência e
indisciplina grave?
Caracterização do professor:
Idade
Género
Anos de serviço
Anos de serviço nesta escola
Formação específica para a docência ou não? (profissionalização ou curso via de
ensino)
Professor do quadro ou não/situação profissional
Participou em órgãos de gestão nesta escola? E noutra?
122
Guião de entrevistas para Pessoal Auxiliar
1. Há quanto tempo trabalha nesta escola?
2. Quais são os aspectos que considera mais positivos e mais negativos nesta escola?
(Espaço físico, equipamentos, ambiente entre alunos/ professores, escola/
comunidade/ pais)
3. Sabe se existe um regulamento interno da escola? Já o leu?
Quais as regras que considera mais importantes?
Existe alguma regra com a qual não concorde?
4. Gostaria de propor alguma regra que não esteja definida presentemente a escola?
5. Acha que os alunos também devem contribuir para a definição das regras da escola?
Porquê?
6. Parecelhe que os alunos, compreendem, partilham e aceitam as normas do
regulamento interno, ou pelo contrário encontra algumas resistências por parte dos
mesmos?
7. Na sua opinião, o que é um aluno indisciplinado? Dê exemplos.
8. Como é que normalmente reage perante estas situações quando ocorrem fora das
salas de aula? Todos os seus colegas agem da mesma maneira perante situações de
indisciplina? Quais as diferenças? Quem age como?
9. No seu entender, porque razão os alunos são dis/indisciplinados?
10. O aluno indisciplinado é diferente ou igual a um aluno violento? Porquê?
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11. Na sua opinião, as situações de indisciplina ou violência nas escolas em geral têm
vindo a agravarse ou pelo contrário? Quais (aumentaram, diminuíram ou
mantiveramse)?
12. E nesta escola em especial como descreveria a situação?
13. Alguma vez foi agredido e/ou assaltado na escola?
14. Sabe se algum colega seu foi agredido/ou assaltado na escola? O que faz a escola
nesta situação?
15. Existem alguns alunos a que associe mais frequentemente situações de violência e
indisciplina ? Quais?
16. Existem grupos organizados na escola? Quais? Como os reconhece?
17. Alguma vez sentiu medo/receio de estar na escola? Em que situação? Porquê?
18. Acha que esta escola é segura? Explique. Diga em que sentido afirma isso.
19. Acha que os mecanismos de que a escola dispõe são suficientes e adequados para
fazer face a situações de indisciplina e violência? Porquê?
Que outros mecanismos poderiam existir?
Caracterização do funcionário:
Idade
Género
Anos de serviço
Anos de serviço nesta escola
Ano de escolaridade mais elevado que concluiu