32
Responsabilidade Civil

Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

Embed Size (px)

DESCRIPTION

apostila

Citation preview

Page 1: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

Responsabilidade Civil

Page 2: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

Professora conteudista: Luciana Gonçalves de Freitas Sanches Cunha

Bacharel em Ciências Humanas, Jurídicas e Sociais pela PUC-Campinas e mestre em Direito pela Unimep, é também professora de graduação e pós-graduação da UNIP (Campinas e São Paulo) nas cadeiras de Direito Civil e Direito Processual Civil. É docente orientadora do Escritório de Assistência Judiciária da UNIP Campinas, além de atuar como advogada e consultora na área cível.

© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

??? ???

????

???

????

/???

Page 3: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

Prof. Dr. João Carlos Di GenioReitor

Prof. Fábio Romeu de CarvalhoVice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças

Profa. Melânia Dalla TorreVice-Reitora de Unidades Universitárias

Prof. Dr. Yugo OkidaVice-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa

Profa. Dra. Marília Ancona-LopezVice-Reitora de Graduação

Unip Interativa – EaD

Profa. Elisabete Brihy

Prof. Marcelo Souza

Profa. Melissa Larrabure

Material Didático – EaD

Comissão editorial: Dra. Angélica L. Carlini (UNIP) Dr. Cid Santos Gesteira (UFBA) Dra. Divane Alves da Silva (UNIP) Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR) Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT) Dra. Valéria de Carvalho (UNIP)

Apoio: Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos

Projeto gráfico: Prof. Alexandre Ponzetto

Revisão: Cristina Alves Locatelli

Page 4: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1
Page 5: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

SumárioResponsabilidade Civil

APRESENTAÇÃO ......................................................................................................................................................7INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................................................7

Unidade I1 BREVE HISTÓRICO ..............................................................................................................................................9

1.1 Conceito ................................................................................................................................................... 131.2 Responsabilidade subjetiva e objetiva ......................................................................................... 13

2 PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL ................................................................................... 142.1 A conduta humana .............................................................................................................................. 162.2 Dano .......................................................................................................................................................... 16

2.2.1 Dano patrimonial .................................................................................................................................... 162.2.2 Dano moral ................................................................................................................................................ 172.2.3 Dano estético ........................................................................................................................................... 18

2.3 Nexo de causalidade ........................................................................................................................... 192.4 Critérios para a determinação da indenização ........................................................................ 202.5 Atividade de risco ................................................................................................................................. 22

3 PRESCRIÇÃO ...................................................................................................................................................... 244 EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE CIVIL ..................................................................................... 26

4.1 Estado de necessidade ....................................................................................................................... 264.2 Legítima defesa ..................................................................................................................................... 274.3 Exercício regular de direito ............................................................................................................... 284.4 Culpa exclusiva ou concorrente da vítima ................................................................................. 284.5 Culpa exclusiva ou fato de terceiro .............................................................................................. 294.6 Caso fortuito e de força maior ....................................................................................................... 304.7 A cláusula de não indenizar ............................................................................................................. 31

Unidade II5 RESPONSABILIDADE CIVIL DOS PROFISSIONAIS LIBERAIS ............................................................. 33

5.1 Do médico ............................................................................................................................................... 335.2 Do advogado .......................................................................................................................................... 38

6 RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO .................................................................................................. 417 RESPONSABILIDADE CIVIL CALCADA NA RELAÇÃO DE CONSUMO ............................................ 47

7.1 Nos contratos de transporte ............................................................................................................ 477.2 O Código de Defesa do Consumidor ............................................................................................ 55

8 RESPONSABILIDADE CIVIL DECORRENTE DO ARTIGO 932 DO CÓDIGO CIVIL ........................ 618.1 Dos pais por atos dos filhos ............................................................................................................. 61

Page 6: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1
Page 7: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

7

APRESENTAÇÃO

O presente curso de responsabilidade civil é apresentado em duas unidades, sendo que a primeira corresponde aos aspectos gerais da disciplina. São descritos apontamentos como histórico do instituto, pressupostos ou elementos da responsabilidade civil, bem como os prazos para as ações de responsabilização e suas excludentes (por vezes, o nexo causal é rompido ou ainda não há a responsabilização do agente, sempre por motivos justificados).

É evidente que são vários os casos de responsabilidade civil, porém, na unidade II, foram elencados aqueles de maior discussão no mundo jurídico, tais quais: a responsabilidade do médico, do Estado, do transporte de volumes e pessoas (especialmente este último, englobando o transporte aéreo), a responsabilidade dos pais pelos atos dos filhos menores (como um dos exemplos do rol do artigo 932 do Código Civil), bem como a responsabilidade civil do advogado.

INTRODUÇÃO

A tendência de não deixar sem ressarcimento a vítima de atos ilícitos sobrecarrega nossos tribunais de demandas acerca do tema, nas suas mais diversas espécies. O assunto é muito atual e importante, pois trata-se de tentar restaurar um equilíbrio moral e patrimonial desfeito, bem como tutelar um bem, com todas as suas utilidades, presentes e futuras, a um sujeito determinado.

O instituto da responsabilidade civil é parte integrante do direito das obrigações, pois a principal consequência da prática de um ato ilícito é o dever que seu autor tem de reparar o dano causado.

Assim, é importante dimensionar qual o tipo e os limites da responsabilidade daquele causador do dano verificado, bem como as indicações para a sua condenação, até mesmo para que não se cometam injustiças.

Na sistemática atual, o Código Civil ainda impõe à vítima, na maioria dos casos, que ela faça a prova da culpa do causador do dano, muito embora tenha inovado em prescrever em alguns artigos a responsabilidade objetiva, transferindo para o causador do dano o ônus da prova.

Deste modo, o instituto da responsabilidade civil é, nos dias atuais, de relevante preocupação e atenção tanto do legislador quanto do julgador, pois se reveste de inúmeras teorias e desdobramentos.

Page 8: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1
Page 9: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

9

Revi

são:

Cris

tina

- Di

agra

maç

ão: F

abio

- 0

8/08

/11

RESPONSABILIDADE CIVIL

Unidade I1 BREVE HISTÓRICO

Em uma época em que os homens viviam em pequenos agrupamentos, era a vingança coletiva que prevalecia. Naquele tempo, se alguém causasse dano a outrem, era punido por todos os membros da sociedade em que vivia. Por vezes, o castigo era o banimento ou até mesmo a morte do indivíduo, geralmente causada com meios brutais.

Na evolução da humanidade, iniciou-se a fase da vingança privada. Neste período, uma agressão era repelida com outra que provocasse igual dano.

Nas palavras de Dias (1997):

Forma primitiva, selvagem talvez, mas humana, de reação espontânea e natural contra o mal sofrido; solução comum a todos os povos nas suas origens, para a reparação do mal pelo mal (p. 894).

A lei que melhor traduziu esta época foi a Lei de Talião. Por força dela, cada homem reagia ao dano causado a si, levando a cabo a máxima “olho por olho, dente por dente”.

Com a aplicação deste princípio, dois danos eram verificados e nenhuma reparação. Eram duas pessoas mutiladas ou mortas. Vale destacar que a sociedade acabava por ter a capacidade de trabalho dos seus membros diminuída e várias famílias perdiam seu chefe e provedor. Cabia ao Estado intervir para declarar quando e como a vítima poderia ter o direito da retaliação.

Com base nestes direcionamentos, a responsabilidade era verdadeiramente objetiva, baseando-se na existência ou aparência do nexo de causalidade, sem a discussão ou a verificação da culpa do agente.

Lembrete

Com a evolução da sociedade e da convivência do homem em coletividade, descobriu-se que não existia nenhuma vantagem na retaliação, já que não havia compensação pelo dano causado e sim apenas novos danos. O homem começa a perceber que a vingança de nada adianta e que ter uma compensação pelo dano sofrido é muito mais vantajoso.

Page 10: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

10

Unidade I

Revi

são:

Cris

tina

- Di

agra

maç

ão: F

abio

- 0

8/08

/11

O instinto animal é controlado e a composição com o autor da ofensa torna-se mais atraente. Este reparará o dano mediante a prestação da poena1 (paga em dinheiro ou em objetos) fixada pela vítima. Como a composição voluntária vai sendo mais utilizada e acaba por se tornar comum ao legislador, sua regulamentação fez-se necessária.

Pelo fato da composição efetivar-se verdadeiramente obrigatória, a vítima não pode fazer justiça com as próprias mãos. Vedada está a vingança. A vítima do dano é compelida a aceitar a solução apontada pela autoridade.

Com o advento da Lei das XII Tábuas, a composição era imposta e as punições tarifadas. A lei trazia fixações de compensação a partir de casos concretos, sendo determinados os valores das penas a serem pagas pelos ofensores.

Além de criar uma estrutura de tarifação, o sistema da lei visava também uniformizar os delitos, enumerando taxativamente as respectivas reparações. O causador do dano pagaria uma quantia pela morte, outra pela decepagem de um membro etc.

A Lei das XII Tábuas, apesar de regular casos concretos, não possuía um princípio geral fixador da responsabilidade civil.

Foi na vigência dessa lei que a autoridade estatal percebeu que acabava sendo lesada em decorrência dos danos causados a particulares. Assim, as infrações foram divididas em delitos públicos (ofensas mais graves, de caráter perturbador da ordem) e delitos privados (aqueles que somente ocasionavam danos aos particulares).

Nos delitos públicos, a autoridade agia para reprimir as ofensas, já que o sujeito passivo atingido é a coletividade. Nos delitos privados, o Estado intervinha apenas para a fixação da composição. Em decorrência desta classificação, a pena monetária, nos primeiros, era destinada aos cofres públicos e, nos segundos, às vítimas.

A evolução para a determinação de uma lei que contivesse um princípio geral para a reparação do dano veio com a Lex Aquilia, que foi o alicerce para o desenvolvimento da atual responsabilidade civil baseada na teoria da culpa.

A Lex Aquilia dividia-se em três capítulos:

a) o primeiro tratava da regulamentação sobre casos de morte de escravos e de animais que pastam em rebanho;

b) o segundo abordava o dano causado por um credor menor ao credor principal, que conseguia a quitação de sua dívida em prejuízo do credor principal;

1 Espécie de resgate da culpa, pelo qual o ofensor adquire o direito ao perdão do ofendido.

Page 11: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

11

Revi

são:

Cris

tina

- Di

agra

maç

ão: F

abio

- 0

8/08

/11

RESPONSABILIDADE CIVIL

c) o terceiro discorria sobre o damnun injuria datum, que compreendia o dano por ferimento causado aos escravos e animais do primeiro capítulo, bem como a destruição e deterioração de coisas corpóreas.

O damnun injuria datum consistia na destruição ou deterioração da coisa alheia por fato que tivesse a atingido corpore et corpori, sem direito ou escusa legal.

Em um primeiro momento, somente o dono lesado tinha direito à reparação, porém, com o passar do tempo, possuidores diretos, indiretos e também certos detentores poderiam pleitear reparação.

Observação

Esta lei introduziu o elemento subjetivo da culpa, pois, para haver a reparação, era necessária a caracterização da intenção da pessoa em querer causar lesão à outra, excluindo-se o objetivismo de antes. A responsabilidade de um modo geral foi tratada como responsabilidade aquiliana.

É importante evidenciar que, para o Direito Romano, não havia distinção entre responsabilidade civil e responsabilidade penal, constituindo-se ambas em uma pena imposta ao causador do dano. A concepção de pena foi então, aos poucos, sendo substituída pela ideia de reparação do dano sofrido.

A teoria da culpa foi finalmente incorporada ao Código Civil Napoleônico, que acabou exercendo grande influência junto a outros diplomas legais, como o Código Civil Brasileiro de 1916 por exemplo.

O direito francês tratou de admitir como pressuposto da reparação do dano de um ato ilícito a verificação da culpa, ainda que esta fosse levíssima. Portanto, tornou-se pressuposto necessário a culpa caracterizada, independentemente da sua gravidade.

A partir de tais estudos, foi igualmente no Direito Francês que houve a criação de algumas diferenciações. Havia a responsabilidade civil, (caracterizada pelas ofensas mais leves, com a reparação do dano perante a vítima) e a responsabilidade penal (que abrangia as ofensas mais graves, de caráter perturbador da ordem), cujas reparações eram feitas perante o Estado.

Além disso, surgiu também a diferenciação entre a culpa contratual (originada das pessoas que descumprem as obrigações previstas em pactos e contratos) e a culpa extracontratual (resultante da negligência ou imprudência ocorrida extracontratualmente).

No Brasil, a evolução da história da responsabilidade civil se deu de forma lenta, sendo construída passo a passo. À época da Colônia, havia as Ordenações do Reino, sendo que não existia confusão entre reparação, pena e multa.

Com o Código Criminal, que entrou em vigor em 1830, foram trazidas previsões como a necessidade de satisfação do dano de forma mais completa possível (sendo ele avaliado em todas as suas partes e

Page 12: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

12

Unidade I

Revi

são:

Cris

tina

- Di

agra

maç

ão: F

abio

- 0

8/08

/11

consequências), a possibilidade de restituição da própria coisa ou a entrega do seu equivalente, a busca de coisa em poder de terceiro etc.

O Código Civil de 1916 - que acatou a teoria aquiliana, em nítida semelhança com o Código Francês - trazia em seu artigo 159 a responsabilidade baseada na culpa do agente, mencionando atitudes como negligência e imprudência.

Em 1966, o Supremo Tribunal Federal admitiu, pela primeira vez, a reparação de um dano moral. Porém, a jurisprudência continuou receosa até 1988, quando, por força da Constituição Federal, a reparabilidade do dano moral tornou-se incontestável, já que expressamente autorizada (CF, art. 5°, V e X).

Com efeito, a legislação civil anterior, com o art. 159, limitou-se a estabelecer que:

Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.

A verificação da culpa e a avaliação da responsabilidade regulavam-se pelo o que estava disposto nos artigos 1.518 a 1.532 e 1.537 a 1.553 do aludido Código.

O atual Código Civil Brasileiro preocupou-se e dedicou maior atenção à matéria. Na Parte Geral, tratou da responsabilidade nos artigos 186, 187 e 188, estabelecendo a regra geral da responsabilidade aquiliana e algumas excludentes. Na Parte Especial, no art. 389 e seguintes, abordou a responsabilidade contratual, dedicando-lhe ainda dois capítulos “Obrigação de indenizar” e “Indenização”, sob o título Da Responsabilidade Civil. Foi também no Código Civil atual que, no parágrafo único do art. 927, estabeleceu-se a responsabilidade objetiva por danos derivados de atividade de risco.

O art. 186 inseriu igualmente a expressa garantia de reparação do dano, já que fez a previsão ainda que exclusivamente moral. Aliás, o dano moral nos últimos anos vem tomando proporções maiores de discussão, ocasionando uma grande quantidade de demandas e a elaboração de várias teorias justificadoras.

No nosso ordenamento jurídico atual, há a previsão tanto da responsabilidade subjetiva (com a verificação da culpa), quanto da responsabilidade objetiva (independente de verificação da culpa).

A Constituição Federal de 1988 estabeleceu, por exemplo, no art. 37, § 6°, que:

As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Neste diapasão, o art. 12 do Código de Defesa do Consumidor, previu a responsabilidade objetiva, estabelecendo que:

Page 13: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

13

Revi

são:

Cris

tina

- Di

agra

maç

ão: F

abio

- 0

8/08

/11

RESPONSABILIDADE CIVIL

[...] o fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

Por derradeiro, o atual Código Civil Brasileiro consagrou a responsabilidade civil objetiva no parágrafo único do art. 927. Desta forma, o avanço foi imenso ao se prever expressamente, nestes dispositivos legais, que a verificação da culpa não é necessária.

1.1 Conceito

Toda manifestação da atitude humana pode trazer em si o problema da responsabilidade. A palavra, que vem do latim respondere, consiste na ideia de segurança ou garantia da restituição ou compensação. Diz-se, deste modo, que responsabilidade exprime o propósito de equivalência, de contraprestação e de correspondência.

Assim, assinala Diniz (2003):

Poder-se-á definir a responsabilidade civil como a aplicação de medidas que obrigue alguém a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros em razão de ato do próprio imputado, de pessoa por quem ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda (responsabilidade subjetiva), ou, ainda, de simples imposição legal (responsabilidade objetiva) (pp. 9-10).

1.2 Responsabilidade subjetiva e objetiva

O Direito Civil moderno, de modo geral, consagra a teoria da culpa como basilar da responsabilidade extracontratual, prevendo, entretanto, exceções para a responsabilidade por risco ou objetiva, determinando-se assim um sistema misto. A responsabilidade civil, conforme o seu fundamento, pode ser subjetiva ou objetiva.

Observação

É subjetiva a responsabilidade quando se baseia na culpa do agente, que deve ser comprovada, geralmente pela vítima, para gerar a obrigação de indenizar. A responsabilidade do causador do dano somente se configurará se ele agir com dolo ou culpa. Trata-se da teoria clássica, também chamada teoria da culpa ou subjetiva (lato sensu - abrangendo o dolo, bem como a culpa; stricto sensu – derivada da imprudência, negligência ou imperícia).

Page 14: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

14

Unidade I

Revi

são:

Cris

tina

- Di

agra

maç

ão: F

abio

- 0

8/08

/11

Como já foi exposto, a lei fez várias previsões de quando há a obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa. Essa teoria é a chamada objetiva ou do risco, que prescinde de comprovação da culpa para a ocorrência do dano indenizável. Para esta teoria, basta haver o dano e o nexo de causalidade para justificar a responsabilidade civil do agente. Há alguns casos, ainda, onde a culpa é presumida (responsabilidade objetiva imprópria).

Com relação à distinção entre a responsabilidade subjetiva e objetiva, Dias (1997) assevera:

No sistema da culpa, sem ela, real ou artificialmente criada, não há responsabilidade; no sistema objetivo, responde-se sem culpa, ou, melhor, esta indagação não tem lugar (p. 894).

Assim, é possível concluir que os sistemas da responsabilidade civil se moldam a partir da prova da culpa e da distribuição do ônus da prova, sendo este o centro da questão para a distinção entre a responsabilidade civil subjetiva e a responsabilidade civil objetiva.

2 PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

Assentado o princípio geral de direito de que todo aquele que causar dano a outrem é obrigado a repará-lo, necessário se faz analisar os pressupostos ou elementos básicos da responsabilidade civil.

O art. 186 do Código Civil de 2002 estabelece que:

Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Observação

Diante disso, é possível extrair-se os seguintes pressupostos da responsabilidade civil: a conduta humana (por meio da ação ou da omissão), a culpa ou dolo do agente, a relação de causalidade e o dano experimentado pela vítima.

Lembrete

Como vários dispositivos legais acabaram priorizando a ideia da responsabilidade civil sem a verificação da culpa, diversos doutrinadores afirmam que a culpa ou dolo do agente não poderiam mais ser tidos como pressupostos ou elementos essenciais da responsabilidade civil.

Page 15: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

15

Revi

são:

Cris

tina

- Di

agra

maç

ão: F

abio

- 0

8/08

/11

RESPONSABILIDADE CIVIL

Portanto, com a concepção de que a responsabilidade civil objetiva deve ser aplicada em algumas hipóteses, o que mais se verifica nos tribunais é a predominância de demandas judiciais indenizatórias fundadas na responsabilidade sem culpa.

Deste modo, para muitos doutrinadores, a ideia predominante é a de que a responsabilidade objetiva está mais para regra do que para exceção. Ou pelo menos, as hipóteses estão bem definidas na lei a respeito de cada uma das modalidades.

Asseguram Gagliano e Pamplona (2010):

A culpa, portanto, não é um elemento essencial, mas sim acidental, pelo que reiteramos nosso entendimento de que os elementos básicos ou pressupostos gerais da responsabilidade civil são apenas três: a conduta humana (positiva ou negativa), o dano ou prejuízo, e o nexo de causalidade [...] (p.13).

Para muitos, a responsabilidade civil não pode se assentar exclusivamente na culpa ou no risco, pois sempre existirão casos em que um destes critérios se revelará manifestamente insuficiente para dimensionar a responsabilização.

Aponta-se que a teoria do risco não veio substituir a teoria subjetiva. Ela veio completá-la, pois, apesar dos progressos da responsabilidade objetiva (que vêm ampliando seu campo de aplicação), esses continuam a ser exceções abertas ao postulado tradicional da responsabilidade subjetiva.

Segundo estudiosos, o parágrafo único do artigo 927 não fez desaparecer a responsabilidade com culpa em nosso sistema, até mesmo porque a responsabilidade objetiva somente pode ser aplicada quando existe lei expressa que a autorize. Portanto, na ausência de lei expressa, a responsabilidade pelo ato ilícito será subjetiva, pois esta é a regra geral no Direito brasileiro.

Em casos excepcionais, levando em conta os aspectos da nova lei, o juiz poderá decidir pela responsabilidade objetiva no caso que examina. Esta hipótese se dará quando decorrer de atividade normalmente desenvolvida por ele.

A culpa, em sentido lato, engloba o dolo e a culpa em sentido estrito. O dolo é a ação intencional, dirigida a determinado resultado ilícito ou assumindo o risco de produzir o ato ilícito. A culpa em sentido estrito é aquela derivada de:

1) negligência - desleixo, descuido, desatenção, menosprezo, indolência, omissão ou inobservância do dever em realizar determinado procedimento com as precauções necessárias;

2) imperícia - falta de técnica necessária para realização de certa atividade;

3) imprudência - falta de cautela, de cuidado; mais do que falta de atenção, é a imprevidência a cerca do mal que se deveria prever, porém, não se previu.

Page 16: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

16

Unidade I

Revi

são:

Cris

tina

- Di

agra

maç

ão: F

abio

- 0

8/08

/11

Deste modo, atualmente, os pressupostos ou elementos básicos da responsabilidade civil são: a conduta humana, o dano e o nexo de causalidade.

2.1 A conduta humana

A conduta, como pressuposto da responsabilidade civil, é o ato humano, comissivo ou omissivo, ilícito ou lícito, voluntário e objetivamente imputável, do próprio agente ou de terceiro, ou o fato de animal ou coisa inanimada, que cause dano a outrem, gerando o dever de satisfazer os direitos do lesado.

Com isso, é possível constatar que a responsabilidade decorrente de ato ilícito baseia-se na teoria de culpa, enquanto que a responsabilidade objetiva funda-se no risco. A conduta de ação ou omissão pode ser praticada:

a) pelo próprio agente causador do dano;

b) por terceiros, nos casos de danos causados pelos filhos, tutelados, curatelados (art. 932, I e II), empregados (art. 932, III), hóspedes e educandos (art. 932, IV);

c) por fato causado por animais e coisas que estejam sob a guarda do agente (art. 936).

2.2 Dano

Para que a conduta humana gere a responsabilidade civil do agente, é imprescindível a comprovação do dano dela decorrente. Sem essa prova, ninguém pode ser responsabilizado.

Observação

O dano é um dos pressupostos da responsabilidade civil, quer seja contratual, quer seja extracontratual e, portanto, sem a sua ocorrência, não existe a indenização.

Não se pode falar em indenização, nem em ressarcimento, se não existir dano. Assim, pode até haver responsabilidade sem culpa, mas não sem dano. Na responsabilidade objetiva, qualquer que seja a modalidade do risco que lhe sirva de fundamento (profissional, proveito, criado etc.), o dano constitui seu elemento preponderante. Sem a existência do dano, não haverá o que reparar, ainda que a conduta tenha sido culposa ou até dolosa. O dano é classificado como: patrimonial (material) ou extrapatrimonial (moral).

2.2.1 Dano patrimonial

O dano patrimonial (ou material) trata-se da lesão concreta aos bens da vítima, que acarreta a perda ou a deterioração, total ou parcial, do patrimônio que lhe pertence, sendo, portanto, passível de quantificação pecuniária e de indenização.

Page 17: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

17

Revi

são:

Cris

tina

- Di

agra

maç

ão: F

abio

- 0

8/08

/11

RESPONSABILIDADE CIVIL

Lembrete

O dano patrimonial abrange o dano emergente (o que efetivamente se perdeu) e os lucros cessantes (o que se deixou de ganhar em razão do evento danoso).

Nas palavras de Gonçalves (2010):

Dano emergente é o efetivo prejuízo, a diminuição patrimonial sofrida pela vítima. É, por exemplo, o que o dono do veículo danificado por outrem desembolsa para consertá-lo. Representa, pois, a diferença entre o patrimônio que a vítima tinha antes do ato ilícito e o que passou a ter depois. Lucro cessante é a frustração da expectativa de lucro. É a perda de um ganho esperado. Há casos em que a indenização já vem estimada em um contrato, como acontece quando se pactua a cláusula penal compensatória (p. 362).

2.2.2 Dano moral

O dano moral é a lesão de interesses não patrimoniais de pessoa física ou jurídica. A Constituição Federal de 1988 fortaleceu, de maneira decisiva, por meio do princípio da dignidade da pessoa humana, a determinação do dever de reparar todos os prejuízos injustamente causados a alguém.

Assim, os tribunais têm reconhecido a existência de dano moral não apenas nas ofensas à personalidade, como também naquelas sob a forma de dor, sofrimento e angústia.

Tudo ainda é muito discutido, e com isso, pode-se dizer que há situações em que a frustração, o incômodo ou o mero aborrecimento são invocados como causas suficientes para o dever de indenizar. Pelo contrário, já existem julgamentos em que estes elementos tratados como “meras” ocorrências (por meio de uma verdadeira graduação, qualificadas em menos gravosas), não foram suficientes para a condenação do ofensor.

O tema é tratado por Gonçalves (2010) da seguinte forma:

O dano moral não é propriamente a dor, a angústia, o desgosto, a aflição espiritual, a humilhação, o complexo que sofre a vítima do evento danoso, pois, esses estados de espírito constituem o conteúdo, ou melhor, a consequência do dano. A dor que experimentam os pais pela morte violenta do filho, o padecimento ou o complexo de quem suporta um dano estético, a humilhação de quem foi publicamente injuriado são estados de espírito contingentes e variáveis em cada caso, pois cada pessoa sente a seu modo (p. 377).

Page 18: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

18

Unidade I

Revi

são:

Cris

tina

- Di

agra

maç

ão: F

abio

- 0

8/08

/11

E aponta:

Para evitar excessos e abusos, só deve reputar dano moral a dor, o vexame, o sofrimento ou a humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensivamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio de seu bem-estar (p. 378).

2.2.3 Dano estético

O dano estético, relativamente novo em nossa doutrina, é conceituado como toda alteração morfológica do indivíduo que, além do aleijão, abranja as deformidades ou deformações, marcas e defeitos, ainda que mínimos, e que impliquem, sob qualquer aspecto, num afeiamento da vítima, consistindo numa simples lesão desgostante ou num permanente motivo de exposição ao ridículo ou de complexo de inferioridade, exercendo ou não influência sobre sua capacidade laborativa.

Para Diniz (2003):

A lesão estética, em regra, constitui, indubitavelmente, um dano moral que poderá ou não constituir um prejuízo patrimonial. Seguindo-se esta linha de raciocínio, o dano moral sempre abrangerá o estético ou morfológico, quando o prejuízo for extrapatrimonial, pois este último, é espécie do primeiro (p. 15).

E assim já se posicionaram os tribunais:

Se em ação de indenização houve pedido de reparação pecuniária por danos morais e estéticos decorrentes de defeitos da cirurgia e outro para pagamento de despesas com futura cirurgia corretiva, atendido este, inadmissível será o deferimento do primeiro. (TAMG, 4ª Câmara, Ap. Cível, Rel. Juiz Mercêdo Moreira, j. 21.8.1991, RT 692/149).

Segundo os participantes do IX ENTA (Encontro Nacional dos Tribunais de Alçada), realizado em agosto de 1997 em São Paulo, a resolução nº 09 foi taxativa:

O dano moral e o dano estético não se cumulam, porque ou o dano estético importa em dano material ou está compreendido no dano moral (por unanimidade).

Porém, para alguns doutrinadores há a possibilidade de indenização por danos morais e estéticos, em parcelas quantificáveis de modo autônomo.

Um caso que demonstra com clareza tal assertiva é o da modelo que necessita de seu belo rosto e corpo para poder ter o seu sustento. Imagine que essa profissional se submeta a uma cirurgia plástica e venha a sofrer lesões que lhe causem deformidades permanentes em sua morfologia

Page 19: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

19

Revi

são:

Cris

tina

- Di

agra

maç

ão: F

abio

- 0

8/08

/11

RESPONSABILIDADE CIVIL

(corpo e rosto), impedindo-a de trabalhar. Nesta hipótese, é possível verificar claramente dois tipos de prejuízos: um de ordem extrapatrimonial e outro de ordem patrimonial. Terá o juiz, então, que condenar o responsável ao ressarcimento pelo dano moral (extrapatrimonial) e pelo dano estético (patrimonial).

Porém, imagine alguém que não necessita da imagem para sobreviver, e que venha a sofrer algum dano estético. Em um primeiro momento, não haverá danos patrimoniais ligados ao prejuízo estético, salvo aquele oriundo da necessidade de cirurgias reparadoras. No entanto, os danos morais são evidentes.

Ocorre que todos aqueles que levam uma vida em sociedade necessitam estar em constante interação com os seus pares. Assim, é possível dizer que, ainda que se retire o aspecto patrimonial do prejuízo, subsistirá um dano a ser ressarcido, em relação à estética, cumulado com o dano moral. Neste sentido, vem sendo a orientação do Superior Tribunal de Justiça:

Dano moral. Dano estético. Cumulação. Quando o dano estético se distingue do dano moral, ambos devem ser indenizados separadamente. Precedentes da 3ª e da 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça. Súmula nº 83 (STJ). Agravo regimental não provido (STJ, AGA 312702/SP, 3ª Turma, Rel. Min. Ari Pargendler, DJ 06.11.2000).

Civil. Danos morais e estéticos. Cumulatividade. Permite-se a cumulação de valores autônomos, um fixado a título de dano moral e outro a título de dano estético, derivados do mesmo fato, quando forem passíveis de apuração em separado, com causas inconfundíveis. Hipótese em que do acidente decorreram sequelas psíquicas por si bastantes para reconhecer-se existente o dano moral; e a deformação sofrida em razão da mão do recorrido ter sido traumaticamente amputada, por ação corto-contundente, quando do acidente, ainda que posteriormente reimplantada, é causa bastante para reconhecimento do dano estético. Recurso não conhecido (STJ, 4ª Turma, Resp. 210351/RJ, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, DJ 25.09.2000).

A polêmica em torno da possibilidade ou não de cumulação de danos estéticos com os morais vem se tornando cada vez mais evidente, porém a corrente majoritária irá defender que a cumulação de reparação por danos morais e estéticos é possível e se aproxima de um juízo mais equânime e atento à realidade dos fatos.

2.3 Nexo de causalidade

A relação de causalidade entre a conduta humana (ação ou omissão do agente) e o dano verificado é explicitada pelo verbo causar, contido no art. 186 do Código Civil.

Page 20: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

20

Unidade I

Revi

são:

Cris

tina

- Di

agra

maç

ão: F

abio

- 0

8/08

/11

Lembrete

Sem o nexo causal, não existe a obrigação de indenizar. Não obstante, exista o dano, se a sua causa não estiver relacionada com o comportamento do agente, não haverá o que se falar em relação de causalidade e, consequentemente, em obrigação de indenizar. Nexo de causalidade é, pois, o elo existente entre a conduta do causador do dano e o dano causado.

A regra sobre o ônus da prova, em conformidade com o artigo 333 do Código de Processo Civil, diz que ao autor incumbe a prova dos fatos constitutivos do seu direito e ao réu os fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor.

Nas relações de consumo, é necessário evidenciar que a regra sofre modificações, dada a hipossuficiência do consumidor. No Código de Defesa do Consumidor é possível a inversão do ônus da prova, como direito básico do consumidor, ficando subordinada a concessão ao critério do juiz.

2.4 Critérios para a determinação da indenização

Da conduta humana, do dano e do nexo de causalidade, e inexistindo quaisquer das excludentes da responsabilidade civil, advém a obrigação indenizatória. Porém a quantificação da indenização ainda é motivo de polêmica em nosso sistema judicial. Sabe-se que a finalidade jurídica da indenização, conforme se depreende do disposto no art. 402 do Código Civil, é a recomposição integral do patrimônio daquele que sofreu o dano, devendo abranger o dano emergente, bem como os lucros cessantes.

A responsabilidade civil tem a função reparadora ou indenizatória, embora possa vir a assumir, acessoriamente, um caráter punitivo. Essa indenização pode ser:

a) específica ou in natura - fazer, efetivamente, com que as coisas voltem ao estado em que se encontravam antes de ocorrido o evento danoso;

b) por equivalência - pagamento por equivalente em dinheiro. Nesta, o juiz deve estabelecer o conteúdo do dano, considerando o dano emergente, os lucros cessantes e, às vezes, o dano moral.

O Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil, em alguns casos, estabeleceram critérios para uma espécie de tarifação da indenização, como por exemplo:

a) danos causados por demanda de dívida inexigível (artigos 939 a 941 do CC e art. 42 do CDC);

b) danos à vida e à integridade física da pessoa (artigos 948 a 951 CC);

c) danos decorrentes de usurpação e esbulho (art. 952 CC);

d) por injúria, difamação ou calúnia (art. 953 CC);

e) por ofensa à liberdade pessoal (art. 954 CC).

Page 21: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

21

Revi

são:

Cris

tina

- Di

agra

maç

ão: F

abio

- 0

8/08

/11

RESPONSABILIDADE CIVIL

No entanto, a regra básica de Direito Civil para a mensuração do quantum debeatur está expressa no art. 944:

A indenização mede-se pela extensão do dano.

Parágrafo único: Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, equitativamente, a indenização.

O caput do artigo transcrito é muito claro: se o prejuízo é de X, compreendendo o dano emergente e os lucros cessantes, a indenização terá de ser também de X.

O problema parece estar no parágrafo único do referido artigo. De que forma o juiz considerará a gravidade da culpa para fixar o valor indenizatório na hipótese, por exemplo, de responsabilidade civil objetiva, que independe de culpa?

Stoco (1999) assim expressou a sua preocupação:

Também o parágrafo único desse artigo, segundo nos parece, rompe com a teoria da restitutio integrum ao facultar ao juiz reduzir, equitativamente, a indenização se houver ”excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano”. Ao adotar e fazer retornar os critérios de graus da culpa obrou mal, pois o dano material não pode sofrer influência dessa gradação se comprovado que o agente agiu culposamente ou que há nexo de causa e efeito entre a conduta e o resultado danoso, nos casos de responsabilidade objetiva ou sem culpa. Aliás, como conciliar a contradição entre indenizar por inteiro quando se tratar de responsabilidade objetiva e impor indenização reduzida ou parcial porque o agente atuou com culpa leve, se na primeira hipótese sequer se exige culpa? (p. 34).

Assim, deduz-se que o parágrafo único do art. 944 do Código Civil somente será aplicado nos casos de responsabilidade subjetiva, nos quais a comprovação da culpa é imprescindível para gerar o dever de indenizar. Se inexistir a discussão sobre a culpa na conduta do agente causador do dano, por óbvio, não poderá haver a sua gradação no momento da fixação do valor indenizatório.

Por outro lado, no aludido artigo, deixou o legislador de prever parâmetros para disciplinar a extensão e os contornos do dano moral, sendo que acerca da sua reparabilidade, o foco principal dos debates reside, atualmente, na sua quantificação.

O Superior Tribunal de Justiça tem sustentado sistematicamente que, na fixação do quantum reparatório, devem ser considerados os seguintes critérios objetivos:

• moderação;

• proporcionalidade;

Page 22: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

22

Unidade I

Revi

são:

Cris

tina

- Di

agra

maç

ão: F

abio

- 0

8/08

/11

• grau de culpa;

• nível socioeconômico da vítima;

• porte econômico do agente ofensor.

O juiz deve, efetivamente, e não abandonando o subjetivismo, utilizar-se da lógica do razoável, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atendendo à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso.

Para fixar o valor da indenização decorrente de dano moral, portanto, deve o juiz observar os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, de modo que ela se constitua em compensação ao lesado e sirva de desestímulo ao agente causador do dano.

2.5 Atividade de risco

A necessidade de adequação do Direito Civil aos princípios fundamentais da nossa Carta Magna fez nascer a marcante tendência à objetivação da responsabilidade civil, que está explícita no dispositivo a seguir transcrito:

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (artigos 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. (itálico nosso).

No parágrafo único do artigo anterior, laborou com acerto o legislador, ao consagrar a responsabilidade civil objetiva, independentemente de culpa, porém acabou-se introduzindo na codificação o conceito aberto de atividade de risco, transferindo para os magistrados e doutrinadores a tarefa de definir o que efetivamente ela vem a ser, apta a justificar a obrigação de reparar o dano.

Lembrete

O Código Civil, não delimitando o conceito de atividade de risco, relegou ao magistrado uma discricionariedade que antes pertencia exclusivamente ao legislador. Terá o juiz a difícil missão de, por exemplo, decifrar, para reconhecer a responsabilidade civil, a que categoria de pessoas estaria o legislador se referindo, como executora de atividade de risco. A pessoa comum que utiliza o seu veículo para se locomover, ao fazê-lo, estaria exercendo atividade de risco? Havendo um acidente de veículo com danos, ficaria o motorista obrigado a repará-los mesmo sem a comprovação da sua culpa?

Page 23: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

23

Revi

são:

Cris

tina

- Di

agra

maç

ão: F

abio

- 0

8/08

/11

RESPONSABILIDADE CIVIL

São duas as circunstâncias elencadas: na primeira, a responsabilidade civil poderá ser reconhecida, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei; e na segunda, por sua vez, a responsabilidade civil poderá ser reconhecida, independentemente de culpa, quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

A primeira situação é muito clara e dispensa maiores questionamentos. A hipótese prevê a reparação do dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, como por exemplo o art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, que estabelece que:

O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

É a outra circunstância que comporta um conceito demasiadamente aberto, na verdade uma falta de conceituação do que seria a atividade de risco a que se refere à norma.

No que diz respeito à ideia central do risco, são identificadas, pelos doutrinadores, as seguintes hipóteses: a teoria do risco-proveito, do risco profissional, do risco excepcional, do risco criado e do risco integral.

a) Na teoria do risco-proveito, a responsabilidade é atribuída àquele que adquire alguma vantagem com a atividade danosa. De acordo com essa teoria, a vítima do fato lesivo teria de provar a obtenção do proveito, ou seja, do lucro pelo autor do dano.

b) A teoria do risco profissional sustenta que o dever de indenizar sempre decorre de um fato prejudicial à atividade ou profissão do lesado, a exemplo do que ocorre nos danos causados por acidente de trabalho.

c) O risco excepcional é aquele que escapa à atividade comum da vítima, ainda que estranho ao trabalho que normalmente exerça, a exemplo dos casos de acidentes com rede elétrica, exploração de energia nuclear, radioatividade etc.

d) Na teoria do risco criado, aquele que, em razão de sua atividade ou profissão, cria um perigo, está sujeito à reparação do dano que causar, salvo se houver adotado todas as medidas idôneas a evitá-lo. Diferem-se as teorias do risco-proveito e a do risco criado quando, nesta última, não se correlaciona o dano a um proveito ou vantagem do agente.

e) Por fim, a teoria do risco integral é uma modalidade extremada da doutrina do risco, uma vez que nela se dispensa até mesmo o nexo causal para justificar o dever de indenizar, que se faz presente somente em razão do dano, ainda que nos casos de culpa exclusiva da vítima.

Atividade é definida como qualquer ação ou trabalho específico, meio de vida, ocupação, profissão, exercício efetivo de função ou emprego. Risco, por sua vez, é o perigo ou a possibilidade de perigo, uma situação em que há probabilidades mais ou menos previsíveis de perda ou ganho.

Page 24: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

24

Unidade I

Revi

são:

Cris

tina

- Di

agra

maç

ão: F

abio

- 0

8/08

/11

À luz dessa conceituação, poder-se-á entender por atividade de risco, apta a justificar a obrigação indenizatória, aquela empreendida habitualmente pelo agente causador do dano com fins lucrativos, como meio de vida ou como profissão. A frequência da prática da atividade e a sua finalidade lucrativa induzem à previsibilidade, ou probabilidade, do risco para direitos de outrem.

Com o liame entre a atividade normalmente desenvolvida pelo agente com fins lucrativos - conduta humana e o dano, além do nexo de causalidade, é que se justificaria o dever de indenizar, ainda que inexistente, a ilicitude ou a culpa.

Nessa esteira de raciocínio, exclui-se prontamente a possibilidade de se responsabilizar civilmente, sem a comprovação de culpa, aquele motorista que se envolveu em acidente de trânsito, com danos, quando utilizava o veículo apenas para sua locomoção, sem fins lucrativos.

Por outro lado, poderia se dizer que todo ato danoso praticado no exercício de atividade profissional com fins lucrativos seria, portanto, indenizável. A questão não é tão simples assim.

O que dizer, por exemplo, da atividade médica? Sem sombra de dúvida, o médico, assim como o dentista, o enfermeiro, o farmacêutico etc., exerce atividade de risco. O dano decorrente do exercício de sua profissão seria indenizável, independentemente de comprovação de culpa, por ser uma atividade de risco?

O Código Civil estabelece que:

Art. 951. O disposto nos artigos 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho.

Essa disposição legal evidenciou a exclusão da responsabilidade objetiva dos profissionais da medicina, a exemplo do que já ocorria com os profissionais liberais em geral, cuja responsabilidade, a teor do que estabelece o art. 14, § 4º do Código do Consumidor, é apurada mediante a verificação da culpa.

3 PRESCRIÇÃO

Da violação de um direito, nasce, para o seu titular, uma pretensão, a qual se extingue com a prescrição, operada nos prazos dos artigos 205 e 206 do Código Civil.

O prazo prescricional começa a fluir do momento em que surge a pretensão ou ainda, imediatamente após a violação de um direito absoluto ou da obrigação de não fazer.

Page 25: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

25

Revi

são:

Cris

tina

- Di

agra

maç

ão: F

abio

- 0

8/08

/11

RESPONSABILIDADE CIVIL

Observação

Em se tratando de responsabilidade civil, o lapso prescricional flui a partir da ocorrência do evento danoso ou do conhecimento da autoria deste, sendo da natureza das ações indenizatórias a observância deste prazo.

O prazo para o ajuizamento da ação de responsabilidade civil passou de vinte para três anos, conforme dispõe o artigo 206, § 3º, inciso V.

Art. 206. Prescreve:

§ 3º Em três anos:

V - a pretensão de reparação civil.

Para a adequação da legislação, já que houve uma diminuição do lapso prescricional e para a solução do direito intertemporal, o Código Civil trouxe em seu artigo 2.028 uma regra de contagem.

Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada.

Prescrita a ação de reparação de danos, fica afastada qualquer possibilidade de recebimento da indenização. A responsabilidade do agente causador do dano se extingue nos moldes do Código Civil ou ainda do próprio Código de Defesa do Consumidor, caso a relação se desenvolva sob a égide do diploma consumerista. Se o fato também é ilícito penal, a prescrição da ação penal não influi na ação de reparação do dano, que tem próprios prazos de prescrição.

O Código de Defesa do Consumidor distingue os prazos. São decadenciais, regulados no art. 26. Para fornecimento de serviço e de produtos não duráveis, trinta dias e, para os duráveis, o prazo é de noventa dias. A contagem do prazo decadencial inicia-se a partir da efetiva entrega do produto ou do término da execução dos serviços. Sendo vício oculto, o prazo decadencial inicia-se no momento em que ficar evidenciado o defeito, embora o prazo seja idêntico tanto para os vícios aparentes quanto para os ocultos. A diferença reside somente na contagem.

O prazo prescricional, porém, é único para todos os casos de acidentes de consumo. Danos causados por fato do produto ou do serviço prescrevem em cinco anos, contando-se a partir do conhecimento do dano e de sua autoria. Respeitados os princípios consumeristas como o de proteção ao consumidor, poderá haver outro prazo, desde que esse seja favorável ao consumidor.

Page 26: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

26

Unidade I

Revi

são:

Cris

tina

- Di

agra

maç

ão: F

abio

- 0

8/08

/11

4 EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE CIVIL

Algumas circunstâncias tais como a legítima defesa, o estado de necessidade, o exercício regular de direito, a culpa exclusiva da vítima ou de terceiro, bem como o caso fortuito e a força maior são, por expressa disposição legal, consideradas excludentes do dever de indenizar.

Observação

No campo da responsabilidade extracontratual ou aquiliana, são causas de irresponsabilidade: a legítima defesa, o estado de necessidade e o exercício regular de direito; são hipóteses de excludentes de responsabilidade (por romperem o nexo de causalidade entre a conduta e o dano causado): a culpa exclusiva ou concorrente da vítima, o fato de terceiro, o caso fortuito e a força maior. Nas obrigações derivadas de contrato, é possível tomar como excludente a cláusula de não indenizar.

4.1 Estado de necessidade

A figura do estado de necessidade foi delineada no art. 188, inciso II, do Código Civil. Este dispositivo descreve atos lesivos, porém não ilícitos, que não acarretam o dever de indenizar porque a própria norma jurídica lhe subtrai a qualificação de ilícito.

O estado de necessidade consiste na situação de agressão a um direito alheio, de valor jurídico igual ou inferior àquele que se pretende proteger, para remover perigo iminente, quando as circunstâncias do fato não autorizarem outra forma de atuação (GAGLIANO; PAMPLONA, 2003, p. 112).

Ele será legítimo quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário. Não libera de quem o pratica, de reparar o prejuízo que causou. Não é possível aceitar que o prejuízo recaia sobre a vítima inocente, e que esta permaneça sem qualquer ressarcimento. Todavia, o agressor causador do perigo, se sofrer prejuízo, restará não indenizado. Desta forma, se a vítima for inocente do perigo que gerou o estado de necessidade, terá que ser ressarcida, ainda que quem esteja obrigado a reparar tenha ação regressiva contra o verdadeiro causador do perigo original. O Código Penal define o estado de necessidade e exclui a ilicitude quando, em situação de conflito ou colisão, ocorre sacrifício do bem de menor valor.

Por motivos óbvios, não pode alegar tal estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo, pois dele era exigível conduta diversa. O perigo deve ser atual, não provocado pelo agente e o sacrifício do bem deve ser o único meio capaz de afastar o perigo.

É o caso do policial que deixa de prender criminoso por saber que este possui índole perigosa.

Page 27: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

27

Revi

são:

Cris

tina

- Di

agra

maç

ão: F

abio

- 0

8/08

/11

RESPONSABILIDADE CIVIL

O estado de necessidade se justifica pela inexigibilidade de conduta adversa, de forma que, em situações jurídicas extremadas, sem que o agente a tenha provocado, para se salvar de perigo atual e efetivo, se vê obrigado a causar um dano a outrem. É o caso do alpinista que arremessa o companheiro ao abismo que se sustentam na mesma corda, pois era séria a ameaça dela romper-se com o peso dos dois.

Rodrigues (1999) pontifica que a “destruição ou deterioração de coisa alheia ordinariamente constitui ato ilícito, porque a ninguém é dado fazê-lo” (p.123).

Todavia, a lei excepcionalmente entende ser lícito o procedimento de quem deteriora ou destrói coisa alheia, o fazendo para evitar um mal maior, contanto que as circunstâncias tornem o ato absolutamente necessário e não exceda ele os limites do indispensável para remoção do perigo. Rodrigues (1999) ainda cita o exemplo do herói que, para salvar vidas humanas, lançou automóvel alheio contra veículo que, sem motorista, descia pela ladeira, praticando um ato nobilíssimo, mas não obstante deve indenizar o prejuízo causado ao dono do automóvel que assim ficou destruído.

4.2 Legítima defesa

A legítima defesa vem elencada no art. 188, inciso I e exclui a reparação de dano à vítima quando o agente revidar de imediato uma agressão atual ou iminente e injusta a um direito seu ou de outrem, usando moderadamente dos meios necessários. A agressão revidada deve ser injusta (na forma objetiva) e também restará excluída a responsabilidade criminal do agente.

A legítima defesa ou exercício regular do direito reconhecido e o próprio cumprimento do dever legal excluem a responsabilidade civil. Mas, entretanto, se ocorrer o aberratio ictus, e, uma terceira pessoa for atingida (ou algum bem) deve o agente reparar, tendo este ação regressiva contra o agressor a fim de se ressarcir da importância desembolsada.

Embora quem pratique o ato danoso em estado de necessidade seja obrigado a reparar o dano causado, o mesmo não acontece com aquele que o pratica em legítima defesa, no exercício regular de um direito e no estrito cumprimento do dever legal.

Observação

Vale evidenciar que o excesso na legítima defesa já possui caráter antijurídico e enseja a reparação.

Na esfera civil, o excesso da legítima defesa irá ser apreciado à luz do artigo 186 do Código Civil. Diversamente do que ocorre na legítima defesa real, a putativa se baseia em erro, inexistindo agressão e, sim, um equívoco do pseudoagredido. Sendo sua conduta ilícita penalmente irrelevante, posto que ausente o dolo, ingressa na órbita civil e enseja a indenização. A discussão sempre remete aos casos de desforço pessoal, nos casos de turbação e esbulho da posse, a respeito do artigo 1.210 do Código Civil.

Page 28: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

28

Unidade I

Revi

são:

Cris

tina

- Di

agra

maç

ão: F

abio

- 0

8/08

/11

Se, por exemplo, o proprietário de uma fazenda desfere tiros de arma de fogo contra invasores de seu imóvel, não haverá legítima defesa, mas excesso no exercício da defesa (ato emulativo), restando configurado o dever de indenizar, quer seja pelo abuso do direito (artigo 187) quer seja pelo ato ilícito propriamente dito (artigo 186).

4.3 Exercício regular de direito

Nos termos do já referido artigo 188, I do Código Civil, igualmente não constituem atos ilícitos os praticados no exercício regular de um direito reconhecido. O exercício regular de um direito é a utilização do direito sem invadir a esfera do direito de outrem, independentemente de causar o dano. Só exerce regularmente o seu direito aquele que não prejudica o direito do outro.

A jurisprudência tem as suas peculiaridades a respeito desta excludente e já considerou não serem atos ilícitos: a inclusão do nome de devedores em cadastros privados de inadimplentes, o protesto de títulos em casos de não pagamento no prazo estabelecido, a publicação pelo condomínio do número da unidade inadimplente na prestação de contas que circula entre os condôminos, a imputação, pelo empregador, de conduta ilícita a um empregado em razão de desconfiança de prática, por este, de furto no âmbito da empresa. Algumas condutas ainda seguem em discussão jurisprudencial como a fiscalização do e-mail corporativo pelo empregador.

4.4 Culpa exclusiva ou concorrente da vítima

Outra excludente da responsabilidade civil é a culpa exclusiva da vítima. Esta é verificada quando a vítima se expõe ao perigo concorrendo com culpa exclusiva ou concorrente para o evento danoso. Em se tratando de culpa concorrente da vítima, ou seja, agindo causador do dano e vítima, a responsabilidade do causador do dano será proporcional de acordo com a sua concorrência para o dano. Diante da culpa exclusiva da vítima, resta totalmente excluída a responsabilidade civil do agente.

No caso de culpa exclusiva da vítima, o que importa é apurar se sua atitude teve o efeito de suprimir a responsabilidade do fato pessoal do agente, afastando sua culpabilidade. Surge dificuldade quando há concorrência de culpa entre a vítima e o agente, pois leva o julgador a ter que investigar e apurar até onde a vítima propiciou o dano, para então delimitar a responsabilidade civil do agente.

Na culpa anulada, ficará prejudicada a responsabilidade civil de indenizar, devendo cada um recolher seu dano. Algumas leis, excepcionalmente, não admitem a redução da indenização em caso de culpa concorrente da vítima, obrigando o causador do dano a pagar o valor integral.

É o que estabelece, por exemplo, o Decreto 2.681/12, que trata sobre a responsabilidade civil das companhias de estrada de ferro. Tal dispositivo prescreve que a culpa concorrente da vítima não exonera o transportador da obrigação de compor os danos. Somente a culpa exclusiva poderá isentá-lo. Na hipótese de passageiro “pingente” ou daquele que permanece no estribo do vagão, as empresas de transporte devem reparar o dano consequente de desastre ocorrido com este passageiro que viaja perigosamente.

Page 29: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

29

Revi

são:

Cris

tina

- Di

agra

maç

ão: F

abio

- 0

8/08

/11

RESPONSABILIDADE CIVIL

No caso de concorrência, não desaparece o nexo causal. Ele apenas é mitigado, e a indenização devida é repartida entre os sujeitos, pois, nesses casos, o fato da vítima concorreu para a produção do dano, influenciando na indenização e assim, contribuindo para a repartição proporcional dos prejuízos.

Na culpa concorrente, a causa única e adequada ao evento parte dos próprios protagonistas do episódio que originou o dano. Assim, se houver algo a indenizar, a indenização será repartida entre os dois responsáveis, na proporção que for justa. O julgador, neste caso, impõe ao agente causador do dano o ônus de reparar por metade o prejuízo, deixando que a vítima arque com a outra metade.

4.5 Culpa exclusiva ou fato de terceiro

A culpa exclusiva de terceiro ou fato de terceiro, por dizer respeito a qualquer outra pessoa além da vítima ou do agente, afasta, da mesma forma, o nexo causal. Nessa hipótese, cabe ao agente defender-se, provando que o fato era inevitável ou imprevisível. O fato de terceiro deve equivaler à força maior. Para que seja excludente, é mister que, por sua conduta, atraia efeitos do fato prejudicial e, em consequência, não responda o agente, direta ou indiretamente, pelos efeitos do dano. A conduta do terceiro é ativa porque é seu comportamento que implica a realização do fato danoso.

Na ocorrência do dano, deve-se de imediato, traçar a relação agente ofensor/vítima para a equação seguinte: se o dano derivou-se direta e imediatamente do fato ligado ao agente, sua responsabilidade civil é inconteste. Entretanto, constatado o dano e atestando-se, em seguida, que a ocorrência se deu pela conduta do terceiro que interveio, afastando o nexo causal, a responsabilidade será atribuída exclusivamente ao terceiro e, assim, presente estará a eximente de responsabilização em favor do agente sobre o qual se imputou o dever de indenizar.

Se o ato de terceiro é a causa exclusiva do prejuízo, desaparece a relação de causalidade entre ação ou omissão do agente e o dano. Neste caso, o fato de terceiro se reveste de características similares ao caso fortuito ou de força maior. Fica marcada a inevitabilidade sem que, para tanto, intervenha a menor culpa por parte de quem sofre o impacto consubstanciado pelo fato de terceiro.

Há um aspecto a ser analisado em relação ao fato de terceiro na responsabilidade objetiva e na responsabilidade subjetiva. Quanto à primeira, destaca-se o fato de terceiro que concorre com culpa exclusiva para o dano, e mesmo assim, não exclui a responsabilidade direta do agente de reparar os danos causados à vítima, gerando o direito de regresso em face de terceiro, o real provocador do dano. O mesmo acontece em relação aos atos praticados pelos seus prepostos.

Vale destacar a Súmula 187 STF:

A responsabilidade contratual do transportador, pelo acidente com o passageiro não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva.

Page 30: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

30

Unidade I

Revi

são:

Cris

tina

- Di

agra

maç

ão: F

abio

- 0

8/08

/11

No fato de o terceiro ser o causador exclusivo do dano, desaparecida está a relação de causalidade entre o comportamento do agente e a vítima. No caso de o terceiro ser o concorrente do prejuízo, o fato de terceiro é causa parcial do evento danoso.

Nesta última hipótese, ocorrendo o dano por culpa da própria vítima, do agente indicado e do terceiro, a responsabilidade deve ser subdividida em graus de culpa, ou melhor, de causalidade, impondo-se a solidariedade nos termos do artigo 942 do Código Civil.

Dessa forma, a vítima acionará o agente ofensor ou o terceiro pela totalidade do prejuízo, remanescendo àquele que adimplir com a indenização, ação regressiva em face da pessoa que concorreu para o evento, demandando sua parte viril.

4.6 Caso fortuito e de força maior

São fatos imprevisíveis, incontroláveis pelo agente e, por isso, inevitáveis. Fortuito, em latim, quer dizer casual. É uma imprevisão, um acidente, que se mostra irrefreável ao agente e superior às suas forças.

O artigo 393 do Código Civil não faz distinção entre o caso fortuito e força maior. A principal característica é a inevitabilidade. O caso fortuito é um evento totalmente imprevisível, como os fenômenos da natureza, enquanto o caso de força maior é um evento previsível, mas inevitável (ROSSI, 2009, p. 75).

Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.

Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.

Entre os dois institutos há um denominador em comum, o da ausência de toda e qualquer culpa por parte do responsável, aliada à impossibilidade absoluta de se cumprir aquilo por que se obrigou. Para a configuração do caso fortuito ou de força maior, certos requisitos são necessários ao fato:

a) ser necessário, não determinado por culpa do devedor, pois, se há culpa, não há caso fortuito e se há caso fortuito não pode haver culpa, na medida em que um exclui o outro;

b) ser superveniente e inevitável;

c) ser irresistível, fora do alcance do poder humano.

O caso de força maior, apesar do fato ser previsível e inevitável, é mais forte que a vontade ou ação do homem, configurando-se pelo caráter do obstáculo. No caso fortuito, prevalece o caráter imprevisto. Para o legislador, não importa se o caso é fortuito ou de força maior, pois exclui-se a responsabilidade do agente de reparar os danos causados à vítima.

Page 31: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

31

Revi

são:

Cris

tina

- Di

agra

maç

ão: F

abio

- 0

8/08

/11

RESPONSABILIDADE CIVIL

Os doutrinadores ainda apontam a diferenciação entre caso fortuito interno, como o acontecimento relacionado com a pessoa do devedor ou com sua empresa e o caso fortuito externo, que se liga a um acontecimento externo, absolutamente estranho ao comportamento humano, como o que se dá com fenômenos da natureza (raios, terremotos etc.).

Se estará diante do caso fortuito quando se tratar de evento imprevisível e, por isso, inevitável. Por outro lado, força maior é quando se está diante de um evento inevitável, ainda que previsível, por se tratar de fato superior às forças do agente. Na força maior, há um elemento humano, a ação das autoridades, como a guerra, a greve etc.

Tal distinção, segundo seus defensores, permite que seja dado um tratamento diferenciado a cada um dos casos. Sustentam os doutrinadores que, em se tratando de responsabilidade contratual fundada em culpa, basta o caso fortuito para exonerar o devedor de sua responsabilidade. Todavia, se fundada na teoria do risco, apenas a força maior determinaria a exclusão da responsabilidade.

Há uma tendência doutrinária a sustentar que, se o fato determinador do dano decorreu de evento relacionado à pessoa, à coisa, ou à empresa do agente causador do dano (caso fortuito interno), deve o julgador ser mais rigoroso no reconhecimento da excludente de responsabilidade.

4.7 A cláusula de não indenizar

A cláusula de não indenizar está diretamente relacionada ao fato de ser excludente no âmbito da responsabilidade contratual e consiste na estipulação, inserida em contrato, por meio da qual uma das partes declara, com a anuência da outra parte, que não será responsável pelos prejuízos decorrentes do inadimplemento absoluto ou relativo, da obrigação ali contraída. Os riscos são transferidos para a vítima por via contratual.

Há grande controvérsia sobre sua validade. Para uns, ela deve ser nula, por ser contrária ao interesse social; para outros, ela é legítima, defendida em prol do princípio de autonomia da vontade.

Necessário se faz verificar os dispositivos do CDC, já que estas cláusulas contrariam os princípios instituídos no art. 51, I, que expressamente as consideram nulas de pleno direito.

A cláusula ou convenção de irresponsabilidade consiste na estipulação prévia por declaração unilateral (ou não), pela qual a parte que viria a obrigar-se civilmente perante outra, afasta, de acordo com esta, a aplicação da lei comum ao seu caso. Visa anular, modificar ou restringir as consequências normais de um fato da responsabilidade do beneficiário da estipulação.

Para uns, tal cláusula é imoral, vedando-se principalmente nos contratos de adesão, especialmente para que se proteja a parte mais fraca. É fato que o direito pátrio não simpatiza com tais cláusulas e a jurisprudência, de forma radical, não a admite nos contratos de transporte, editando a Súmula 161 STF, que decreta sua ostensiva inoperância neste segmento. Ela só será tolerada se for destinada à mera tutela do interesse individual. É inteiramente ineficaz a declaração unilateral do hoteleiro que não se responsabiliza pelos frutos das bagagens dos viajantes hospedados em seu hotel.

Page 32: Responsabilidade Civil_Unidade I Livro Texto 1

32

Unidade I

Revi

são:

Cris

tina

- Di

agra

maç

ão: F

abio

- 0

8/08

/11

Dois seriam os grandes requisitos de validade para a cláusula de não indenizar: a bilateralidade do consentimento e a não colisão com o preceito cogente de lei (ordem pública e os bons costumes).

São múltiplas as aplicações imagináveis da cláusula de não indenizar, como no contrato de compra e venda, com relação à não garantia em razão de falta da área, com relação à evicção e aos vícios redibitórios, nos depósitos de bagagens de hóspedes, no contrato de depósito bancário, no contrato de seguro, de mandato e de locação, além dos contratos típicos de adesão como os de leasing, os de SFH, e de utilização de cartões de crédito.

O Código de Defesa do Consumidor considera a cláusula abusiva e, portanto, nula, porque impossibilita, exonera ou atenua a responsabilidade civil do fornecedor por vícios de qualquer natureza, incluídos os acidentes de consumo e os vícios redibitórios.

Tem-se por não escrita a cláusula de não indenizar em contratos bancários de locação de cofres a clientes. No tocante da integridade da vida e da saúde, sempre se exclui a cláusula de irresponsabilidade.

Resumo

A responsabilidade civil foi em um primeiro momento exclusivamente a vingança, e somente com a evolução das leis, tornou-se uma perspectiva para a compensação. Atualmente, pode se dizer que, como pressupostos, existem a conduta humana, o nexo de causalidade e o dano, sendo este último imprescindível. Com relação ao nexo de causalidade, ele é hábil a promover o discernimento de que um tal resultado adveio de determinada conduta.

Com relação à culpa em sentido lato (dolo e culpa em sentido estrito), não há que se taxá-la mais como pressuposto ou elemento da responsabilidade civil, uma vez que, em função da existência e aumento de situações resolvidas à luz da responsabilidade objetiva (sem verificação da culpa), não se pode mais considerá-la um elemento essencial.

Para que haja a ação judicial, é necessária a observação do prazo prescricional de três anos a contar do evento danoso.

Há, entretanto, situações em que o evento com efeitos danosos ocorrerá, porém, não poderá existir a condenação do responsável. Nas excludentes de responsabilidade, o nexo de causalidade poderá ser rompido ou mesmo o tipo de ação desenvolvida será permitida por lei. Não havendo abusos ou tomando-se cuidado com a devida identificação entre o ocorrido e a hipótese prevista em lei, a excludente prevalecerá e a indenização não se verificará. O Código do Consumidor foi um instrumento importantíssimo para definir os contornos atuais da responsabilidade civil.