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UNIVERSIDADE LUSÍADA DE LISBOA Instituto Superior de Serviço Social de Lisboa Mestrado em Serviço Social Respostas sociais para o envelhecimento do indivíduo portador de deficiência mental Volume 1 Vera Cláudia Pires Bento Lisboa 2008

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U N I V E R S I D A D E L U S Í A D A D E L I S B O A

Instituto Superior de Serviço Social de Lisboa

Mest rado em Serv iço Soc ia l

Respostas sociais para o envelhecimento do indivíduo portador de deficiência mental

Volume 1

Vera Cláudia Pires Bento

Lisboa

2008

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Vera Cláudia Pires Bento

Respostas sociais para o envelhecimento do indivíduo portador de deficiência mental

Dissertação apresentada ao Instituto Superior de Serviço Social da Universidade Lusíada de Lisboa, para obtenção do grau de Mestre em Serviço Social. Orientador: Prof.ª Doutora Adelaide Fernandes Pires Malainho

Lisboa

2008

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Mediateca da Universidade Lusíada de Lisboa - Catalogação na Publicação BENTO, Vera Cláudia Pires, 1980- Respostas sociais para o envelhecimento do indivíduo portador de deficiência mental / Vera Cláudia Pires Bento ; orientado por Adelaide Fernandes Pires Malainho. - Lisboa : [s.n.], 2008. - Dissertação de Mestrado em Serviço Social, Instituto Superior de Serviço Social da Universidade Lusíada de Lisboa. I – MALAINHO, Adelaide Fernandes Pires, 1957- LCSH 1. Deficientes Mentais - Aspectos Sociais - Portugal 2. Deficientes Mentais - Assistência em Instituições - Portugal 3. Deficientes Mentais - Serviços para - Portugal 4. Deficientes Mentais - Estudo de Casos 5. Envelhecimento - Aspectos Sociais - Portugal 6. Serviço Social com Deficientes Mentais - Portugal 7. Universidade Lusíada de Lisboa. Instituto Superior de Serviço Social - Dissertações e Teses 8. Dissertações e Teses Académicas – Portugal - Lisboa 1. People with Mental Disabilities - Social Aspects - Portugal 2. People with Mental Disabilities - Institutional Care - Portugal 3. People with Mental Disabilities - Services for - Portugal 4. People with Mental Disabilities - Case Studies 5. Aging - Social Aspects - Portugal 6. Social Work with People with Mental Disabilities - Portugal 7. Universidade Lusíada de Lisboa. Instituto Superior de Serviço Social - Dissertations 8. Dissertations, Academic – Portugal - Lisbon LCC - HV3006.P8 B46 2008

Ficha Técnica

Autora Vera Cláudia Pires Bento

Orientadora Prof.ª Doutora Adelaide Fernandes Pires Malainho

Título Respostas sociais para o envelhecimento do indivíduo portador de deficiência mental

Local Lisboa

Ano 2008

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Agradecimentos

A elaboração de uma Dissertação de Mestrado reúne, na maioria das vezes, grandes e preciosos

contributos de várias pessoas, nesta secção tenho a oportunidade de lhes fazer um pequeno

agradecimento por escrito, demonstrando assim um pouco do sentimento de gratidão que nutro por

elas.

À Professora Doutora Adelaide Malainho, orientadora da dissertação, agradeço o apoio, a partilha do

saber e as valiosas contribuições para o trabalho. Acima de tudo, obrigada por me continuar a

acompanhar nesta jornada e por estimular o meu interesse pelo conhecimento e pela vida académica.

Um especial obrigado aos utentes da Associação em estudo e às suas famílias pelo carinho com que

me acolheram e por toda a sinceridade que me confiaram.

Ao Dr. António Martins, por ter autorizado a realização desta investigação na Associação e a toda a

sua equipa de profissionais que prescindiram de algum do seu precioso tempo no acompanhamento a

esta investigação, em especial ao Dr. Ricardo e à Dr.ª Gabriela pelo enorme interesse e disposição

em colaborar sempre que solicitada a sua ajuda.

À minha grande amiga Elsa, que apesar da sua distância, partilha comigo o ‘amor’ pela causa das

pessoas portadoras de deficiência mental, um grande obrigado por todos os seus contributos e

reflexões.

À minha irmã Andreia, pelas suas palavras de coragem e incentivo sempre presentes e aos restantes

familiares pela compreensão, apoio e estímulo, que contribuiu de forma indiscutível para o final

desta longa e árdua etapa.

Ao meu grande amor... Gonçalo, tu foste a motivação e a força para acabar esta tese quando as perdi;

tu foste o porto que me abrigou nos dias de tempestade e o vento que me levou ao fim do percurso

nos dias de sol; tu foste tudo e muito mais. Jamais terei palavras para te agradecer.

O meu profundo e sentido agradecimento a todas as pessoas que contribuíram para a concretização

desta dissertação, estimulando-me intelectual e emocionalmente.

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"Consegues imaginar-nos daqui a uns anos, partilhando tranquilamente um banco de jardim?

É tão estranho ter setenta anos..."

("Old Friends", Simon and Garfunkel)

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APRESENTAÇÃO

Título: Respostas sociais para o envelhecimento do indivíduo portador de deficiência mental

Resumo: A presente dissertação é uma pesquisa qualitativa que pretende reflectir sobre as questões relacionadas com o envelhecimento do indivíduo portador de deficiência mental e o seu bem-estar nesse processo evolutivo, promovido pelas repostas sociais existentes. Procurámos perceber qual ou quais as respostas sociais promotoras de bem-estar para o envelhecimento das pessoas portadoras de deficiência mental. Realizámos um Estudo de Caso exploratório e descritivo, de casos múltiplos, numa Associação geograficamente situada em Lisboa que dá resposta a pessoas portadoras de deficiência mental jovens e adultas. Os instrumentos utilizados para alcançar os objectivos delineados foram a observação participante do campo empírico, entrevistas exploratórias a testemunhas privilegiadas e entrevistas semi-directivas às pessoas portadoras de deficiência mental moderada com idade superior a 45 anos, aos seus familiares e aos profissionais que trabalham na Associação. Para a construção do referencial teórico sobre a problemática do envelhecimento da pessoa portadora de deficiência mental, recorremos aos contributos de autores consagrados como: Maria Albuquerque, Pedro Morato, Domingos Rosa, Nancy Breitenbach, Matthew Janicki, Marcelo Medeiros e Debora Diniz, Gert-Jan Vreeke e Robert Shalock, bem como os contributos de Marilda Iamamoto, Sara Banks, Veras Baptista, Queirós & Henríquez, Jean Weisshaupt, Vicente P. Faleiros, Alcina Martins, Idilia Fernandes e Josefina – Mc Donough, se revelaram importantes para o aprofundamento da importância do Serviço Social na planificação e implementação de políticas sociais mais ajustadas às necessidades individuais destas pessoas. Concluímos que o envelhecimento ainda não é totalmente percepcionado pelo indivíduo portador de deficiência em processo de envelhecimento, mas já começam a aparecer alguns sinais físicos e psicológicos. O planeamento de novas respostas visando as pessoas mais velhas com deficiência mental, deve contemplar outro problema subjacente que é o do envelhecimento dos seus principais cuidadores que também já se encontram na fase da 3.ª idade. Percepcionámos que as vontades dos pais e dos profissionais enquadram-se num quadro típico de respostas possíveis planificadas pela instituição em estudo, no entanto a pessoa portadora de deficiência mental considera que para envelhecer com qualidade e bem-estar o desenho das respostas deve basear-se nas vontades individuais de cada um, permitindo a sua independência, estas pessoas revelaram gostar de envelhecer activos e com saúde, mantendo os laços familiares e de amizade.

Palavras-chave: 1. Deficientes Mentais - Aspectos Sociais - Portugal 2. Deficientes Mentais - Assistência em Instituições - Portugal 3. Deficientes Mentais - Serviços para - Portugal 4. Deficientes Mentais - Estudo de Casos 5. Envelhecimento - Aspectos Sociais - Portugal 6. Serviço Social com Deficientes Mentais - Portugal 7. Universidade Lusíada de Lisboa. Instituto Superior de Serviço Social - Dissertações e Teses 8. Dissertações e Teses Académicas – Portugal - Lisboa

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PRESENTATION

Title: Social Responses to the aging of the Individual bearer of Mental Disabilities

Abstract: This dissertation is a qualitative research that aims to reflect on issues related to the aging of the individual bearer of mental disabilities and its well-being in this evolutionary process, promoted by the existing social responses. We tried to understand which are the social answers to promote well-being to the aging of people with Mental Disabilities. We performed an exploratory and descriptive case Study, of multiple cases in an Association geographically situated in Lisbon which gives a support to young and adult people with Mental Disabilities. The instruments used to achieve the objectives outlined were the participant observation of the empirical field, exploratory interviews with distinct witnesses and semi-directive interviews with people, aged over 45 years, bearing moderate mental disabilities, their families and professionals working in the Association. For the construction of theoretical referential system about the aging problem of people with Mental Disabilities, we appealed for contributions from authors such as: Maria Albuquerque, Pedro Morato, Sunday Rosa, Nancy Breitenbach, Matthew Janicki, Marcelo Medeiros and Debora Diniz, Gert-Jan Vreeke and Robert Shalock, as well as the contributions of Marilda Iamamoto, Sara Banks, Veras Baptista, Queiroz & Henríquez, Jean Weisshaupt, Vincent P. Faleiros, Alcina Martins, Idilia Fernandes and Josefina - Mc Donough, who revealed to be important for the deepening of the importance of Social Service in the planning and implementation of social policies more suitable for the individual needs of these people. We conclude that the aging is not yet fully perceived by the individual bearer of mental disabilities in the ageing process, but have begun to show some physical and psychological signs. The planning of new responses aimed at older people with mental disabilities should provide another underlying problem which is the ageing of their main carers who are already at the 3rd age stage. We perceived that the wishes of parents and professionals fall into a typical table of possible answers planned by the institution under study, however the person bearer of mental disabilities believes that to grow old with quality and well-being the design of answers should be based on each individual wishes, allowing its independence. These people have shown that they like to age lively and with health, maintaining family bonding and friendships.

Keywords: 1. People with Mental Disabilities - Social Aspects - Portugal 2. People with Mental Disabilities - Institutional Care - Portugal 3. People with Mental Disabilities - Services for - Portugal 4. People with Mental Disabilities - Case Studies 5. Aging - Social Aspects - Portugal 6. Social Work with People with Mental Disabilities - Portugal 7. Universidade Lusíada de Lisboa. Instituto Superior de Serviço Social - Dissertations 8. Dissertations, Academic – Portugal - Lisbon

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Sumário INTRODUÇÃO 14 CAPITULO I 18 1. ENVELHECIMENTO E DEFICIÊNCIA MENTAL 18

1.1 - A Sociedade e a problemática do Envelhecimento 18 1.1.1 - Transformações gerais no processo de Envelhecimento 20

1.2 - A Sociedade e a problemática da Deficiência Mental 21 1.2.1 - Mudança de paradigma no domínio da Deficiência Mental 21

1.3 - Envelhecimento e Deficiência Mental 26 1.3.1 - Uma questão de números 30

1.3.2 - Envelhecimento e Deficiência na Modernidade 31

2. SOCIEDADE DE RISCO PARA O INDIVÍDUO PORTADOR DE DEFICIÊNCIA MENTAL EM PROCESSO DE ENVELHECIMENTO 34 2.1 - Dupla discriminação 35

2.2 - Imagem do corpo 38

2.3 – Mundo do trabalho 39

2.4 - Reforma 40

2.5 – Envelhecimento das famílias 41

2.6 – Interdição / Inabilitação 44

3. RESPOSTAS SOCIAIS PARA O INDIVÍDUO PORTADOR DE DEFICIÊNCIA MENTAL EM PROCESSO DE ENVELHECIMENTO 46

3.1 - Respostas Sociais para pessoas idosas 49

3.2 - Respostas Sociais para pessoas adultas portadoras de deficiência 52

3.3 - Necessidades específicas de respostas sociais para o envelhecimento

do indivíduo portador de deficiência mental 55

4. BEM-ESTAR DO INDIVÍDUO PORTADOR DE DEFICIÊNCIA MENTAL NO SEU PROCESSO DE ENVELHECIMENTO 60

4.1- Aspecto individual do bem-estar 61

4.2 - Vertente Social do bem-estar 62 4.3 - Factores que contribuem para o bem-estar 66

5. O PAPEL DO SERVIÇO SOCIAL NAS INSTITUIÇÕES DE RESPOSTA AO ENVELHECIMENTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA MENTAL 71

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CAPITULO II - ESTRUTURAÇÃO DA INVESTIGAÇÃO EMPÍRICA 81

1. Fundamentos, justificação e estratégia metodológica 82 2. Técnicas de Investigação 93

CAPITULO III – ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTAD OS 100 1. Análise das entrevistas realizadas aos familiares: visão dos pais sobre o envelhecimento dos filhos portadores de deficiência mental 100

1.1 - Breve caracterização dos familiares 100 1.2 - A Deficiência Mental 103 1.2.1 - Nascimento de um filho com deficiência mental 103

1.2.2 - Existência de outros filhos 103

1.2.3 - Existência de outros familiares portadores de deficiência mental 104

1.2.4 - Causa da deficiência mental 104

1.2.5 - Percurso escolar da pessoa portadora de deficiência mental 105

1.2.6 - Ter um filho portador de deficiência mental 105

1.2.7 - Principal cuidador da pessoa com deficiência mental 107

1.2.8 - Processo de Interdição / Tutoria 107

1.3 – O Envelhecimento 110

1.3.1 - Envelhecimento de um filho 110

1.3.2 - Sinais de envelhecimento 111

1.3.3 - Preocupações dos pais relativamente ao envelhecimento dos filhos 112

1.3.4 - Necessidades dos pais 114

1.4 - Respostas para o envelhecimento das pessoas portadoras de Deficiência Mental 115

1.4.1 - Melhor resposta para o futuro 115

1.4.1.1 - Actividades promotoras de bem-estar no envelhecimento

da pessoa portadora de deficiência mental 117

2 - Análise das entrevistas aos Profissionais: A visão dos profissionais sobre o envelhecimento dos utentes portadores de Deficiência Mental 120

2.1 - Caracterização sumária dos Profissionais 120 2.2 - A Associação 123

2.2.1 - Objectivos da Associação 123

2.3 – Ser profissional na Associação 124

2.3.1 - Motivações para trabalhar com pessoas portadoras de deficiência mental 124

2.3.2 - Constrangimentos ao vir trabalhar para a Associação 125

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2.3.3 – Vantagens de vir trabalhar para a Associação 126

2.3.4 – Funções dos profissionais na Associação 127

2.3.4.1 - O papel da Assistente Social 128

2.3.5 - Avaliação do trabalho que desenvolvem na Associação 130

2.4 - Ética e os Profissionais 130

2.4.1 – Valores Éticos dos profissionais 130

2.4.2 – Valores Éticos da Assistente Social 132

2.5 - A problemática da Deficiência Mental 133

2.5.1 – Definição de pessoa portadora de deficiência mental 133

2.6 – Problemática do Envelhecimento 135

2.6.1 - Processo de envelhecimento da pessoa portadora de

deficiência mental 135

2.6.2 - Necessidades das pessoas portadoras de deficiência mental

em processo de envelhecimento 138

2.6.3 - Sentimentos das pessoas portadoras de deficiência mental

em processo de envelhecimento 140

2.7 - A família e a problemática do envelhecimento da pessoa portadora de Deficiência Mental 141

2.7.1 - Problemas dos pais 141

2.7.2 - Processo de atribuição de tutor 142

2.7.3 - Avaliação das famílias sobre o trabalho desenvolvido na Associação 143

2.8 – Respostas Sociais 144

2.8.1 – Melhor resposta para o envelhecimento da pessoa portadora de

deficiência mental 144

2.8.1.1 - Actividades promotoras de bem-estar no envelhecimento

da pessoa portadora de deficiência mental 147

3 - Análise das entrevistas aos indivíduos portadores de Deficiência Mental: “ Um olhar sobre o amanhã” 151 3.1 – Caracterização sumária dos utentes 151

3.2 - Problemática da deficiência mental 154 3.2.1 - A minha identidade 154

3.3 – Associação 155

3.3.1 - Entrada na Associação 155

3.3.2 - Razão pela qual estão na Associação 157

3.3.3 - Avaliação da sua permanência na Associação 158

3.4 - Problemática do Envelhecimento 158 3.4.1 - Noção da idade 158

3.4.2 - Definição de envelhecimento 160

3.4.3 - Sinais de envelhecimento 161

3.5 – Família 162

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3.5.1 - Envelhecimento dos pais 162

3.5.2 - Morte dos pais 164

3.6 - Respostas para o envelhecimento 165 3.6.1 - Um olhar sobre o amanhã 165

3.6.2 - As suas vontades … 167

3.6.3 - Que actividades… 172

3.6.4 - O que é que os faz felizes… 173

4 – Análise Global: interligação dos resultados 174 CONCLUSÃO 186 BIBLIOGRAFIA 187 VOLUME 2 ÍNDICE DE APÊNDICES

Apêndice 1: Diários de Campo 197

Apêndice 2: Guião de entrevistas exploratórias 234

Apêndice 3: Entrevistas exploratórias 236

Apêndice 4: Guião de entrevista aos familiares 257

Apêndice 5: Guião de entrevista aos profissionais da Associação 259

Apêndice 6: Guião de entrevista às pessoas portadoras de deficiência mental 264

Apêndice 7: Pré-teste dos guiões de entrevista 266

Apêndice 8: Transcrição das entrevistas realizadas aos familiares 281

Apêndice 9: Transcrição das entrevistas realizadas aos profissionais

da Associação 310

Apêndice 10: Planificação e transcrição da dinâmica de grupo 343

Apêndice 11: Transcrição das entrevistas realizadas às pessoas portadoras de

deficiência mental 359

Apêndice 12: Análise de conteúdo das entrevistas aos familiares 396 Apêndice 13: Análise de conteúdo das entrevistas aos profissionais 404

Apêndice 14: Análise de conteúdo das entrevistas às pessoas portadoras de

deficiência mental 417

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES Lista de quadros referentes à caracterização da Associação:

Quadro 1 - Distribuição dos utentes por idade, género e resposta institucional Lista de quadros referentes à análise das entrevistas aos familiares:

Quadro 2 - Sistematização da análise das entrevistas aos familiares 102

Quadro 3- Nascimento de um filho com deficiência 103

Quadro 4 - Existência de outros filhos 103

Quadro 5 - Causa da deficiência mental 104

Quadro 6 - Percurso escolar da pessoa portadora de deficiência mental 105

Quadro 7 - Ter um filho portador de deficiência mental 106

Quadro 8 - Principal cuidador da pessoa com deficiência mental 107

Quadro 9 - Processo de Interdição / Tutoria das pessoas com deficiência mental 107

Quadro 10 - Envelhecimento de um filho 110

Quadro 11 - Sinais de envelhecimento 111

Quadro 12 - Preocupações dos pais 112

Quadro 13 - Necessidades dos pais 114

Quadro 14 - Melhor resposta para o futuro 115

Quadro 15 - Actividades promotoras de bem-estar no envelhecimento da

pessoa portadora de deficiência mental 118

Lista de quadros referentes à análise das entrevistas aos profissionais:

Quadro 16 - Caracterização dos profissionais 120

Quadro 17 - Sistematização da análise das entrevistas aos profissionais 122

Quadro 18 - Objectivos da Associação 123

Quadro 19 - Motivação para trabalhar com pessoas portadoras de

deficiência mental 124

Quadro 20 - Constrangimentos ao vir trabalhar para a Associação 125

Quadro 21 - As vantagens de vir trabalhar para a Associação 126

Quadro 22 - Avaliação do trabalho que desenvolvem na Associação 130

Quadro 23 - Definição de pessoa portadora de deficiência mental 133

Quadro 24 - Processo de envelhecimento da pessoa portadora de deficiência mental 135

Quadro 25 - Necessidades das pessoas portadoras de deficiência mental em

processo de envelhecimento 138

Quadro 26 - Sentimentos das pessoas portadoras de deficiência mental em

processo de envelhecimento 140

Quadro 27 - Problemas dos pais 141

Quadro 28 - Processo de atribuição de tutor da pessoa portadora de

deficiência mental 142

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Quadro 29 - Resposta para o envelhecimento da pessoa portadora de

deficiência mental 144

Quadro 30 - Actividades promotoras de bem-estar no envelhecimento

da pessoa portadora de deficiência mental 147

Lista de quadros referentes à análise das entrevistas aos utentes:

Quadro 31 - Caracterização dos utentes da Associação 151

Quadro 32 - Sistematização da análise das entrevistas realizadas às

pessoas portadoras de deficiência mental 153 Quadro 33 - Quadro interpretativo do tema “a minha identidade” 154

Quadro 34 - Razões pelas quais estão na Associação 157

Quadro 35 - Noção da idade 158

Quadro 36 - Definição de envelhecimento 161

Quadro 37 - Sinais de envelhecimento 169

Quadro 38 - Excerto da dinâmica de grupo sobre o tema do envelhecimento 166

Quadro 39 - Resposta para o envelhecimento 167

Quadro 40 - Actividades promotoras de bem-estar no envelhecimento 171

Quadro 41 - Razões porque são felizes 173

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico n.º 1 – Género dos utentes 84

Gráfico n.º 2 – Idade dos utentes 84

Gráfico n.º 3 – Grau de deficiência mental 84

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 14

INTRODUÇÃO

A presente dissertação insere-se no âmbito do V Mestrado em Serviço Social, no Instituto

Superior de Serviço Social de Lisboa - Universidade Lusíada e está subordinada ao tema:

“Respostas Sociais para o envelhecimento do indivíduo portador de deficiência mental”.

O problema subjacente a este trabalho prende-se com os seguintes vectores de análise: as

questões relacionadas com o envelhecimento do indivíduo portador de deficiência mental e

o seu bem-estar nesse processo evolutivo, promovido pelas respostas sociais existentes.

Na população com deficiência mental (DM), a preocupação com o processo de

envelhecimento resulta, entre outros factores, do aumento da sua esperança de vida, que

neste último século duplicou (Rosa1, 2004: 8).

Este facto levantará grandes questões futuras à sociedade, aos políticos, às instituições e às

famílias, caso não se invista na prevenção com planos e estratégias de resposta (António,

2003: 170).

Citando Rosa, pode afirmar-se que o tema do envelhecimento da pessoa com deficiência

mental constitui uma matéria pouco estudada. “ (…) o tema do envelhecimento da pessoa

com deficiência deveria ser obrigatoriamente introduzido em estudos e investigações a

realizar pelas universidades. Tem-se estudado exaustivamente as crianças, os jovens e os

adultos, mas esta nova “realidade emergente” ainda está a dar os seus primeiros passos

ao nível da investigação” (2004: 9).

A forte motivação pessoal surge da curiosidade e interesse pelo futuro incerto e pouco

pensado para estas pessoas. O apelido de “jovens” parece ser eterno, como conclui

Maffezoli (2004) na sua tese de Mestrado, destaca a infantilização e a dependência

excessiva imposta pelo grupo social à pessoa com deficiência mental, vista como eterna

criança. Deste modo, surgiram-nos sérias questões relativamente ao seu futuro, pois ao

observarmos a terminologia das instituições existentes, repara-se que a sua maioria destina-

se a jovens e adultos, onde as respostas institucionais foram pensadas e implementadas

1 Domingos Rosa é Presidente da Direcção da AFID – Associação Nacional de Famílias para a Integração da Pessoa Deficiente

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para essa faixa etária, contudo alguns dos seus utentes estão a entrar numa idade mais

avançada e é aquela casa que reconhecem como sua.

Pretendemos perceber o que é que as pessoas com deficiência mental que se encontram em

processo de envelhecimento, entendem como condições necessárias para o seu bem-estar e

melhoria da sua qualidade de vida. Por outro lado, interessou-nos entender quais as

respostas sociais que existem para atender esta população e quais destas podem ser as mais

eficazes na promoção de bem-estar e nas respostas às necessidades específicas do

indivíduo portador de deficiência mental.

Compreender este fenómeno, contribui não só para o aprofundamento do conhecimento

sobre o processo de envelhecimento do indivíduo adulto portador de deficiência mental,

mas também permitiu entender as suas necessidades específicas e conhecer a percepção de

bem-estar, que o próprio indivíduo tem relativamente ao seu processo de envelhecimento,

bem como conhecer quais as respostas sociais que respondem às necessidades do indivíduo

adulto portador de deficiência mental no seu processo de envelhecimento.

Considera-se que a partir deste conhecimento será possível repensar as respostas

existentes, adaptá-las às novas exigências, responder a incertezas dos profissionais e

familiares, tal como planear de forma adequada o futuro desta população.

Acreditamos que o aprofundamento desta temática seja de grande importância para o

Serviço Social, na construção de conhecimento teórico sobre o assunto em questão; na

construção de instrumentos e práticas sociais para os Assistentes Sociais, de forma a que o

exercício profissional destes, seja orientado para a satisfação de necessidades humanas

específicas, garantia dos direitos humanos e efectivação da protecção social, trabalhando

para melhorar o bem-estar e qualidade de vida da pessoa com deficiência e contribuir para

uma melhor análise, estudo, planificação e possível concepção de políticas sociais mais

ajustadas às suas necessidades.

Para a concretização deste estudo contamos com a participação de uma Associação2 de

resposta a pessoas portadoras de deficiência mental. Esta Associação é uma Instituição

Particular de Solidariedade Social, situada geograficamente em Lisboa, que tem como

2 Com o intuito de preservarmos a identidade dos participantes optámos por não revelar o nome da Associação

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objectivo promover a integração das pessoas com deficiência mental na idade jovem e

adulta, vocacionada ao apoio nos vectores da formação, emprego, apoio ocupacional e

apoio residencial. Onde concretizámos um Estudo de Caso dirigido aos seus utentes com

idade igual ou superior a 45 anos, portadores de deficiência mental moderada, alguns dos

seus familiares e aos profissionais da mesma.

Realizámos uma pesquisa qualitativa, para através dela, percebermos de que forma é que

se pode proporcionar respostas sociais com qualidade e adequadas às necessidades desta

população na sua etapa mais avançada.

Tendo por base o tema em estudo construiu-se a seguinte pergunta de partida: “Em que

medida as respostas sociais e/ou familiares promovem o bem-estar da pessoa portadora de

deficiência mental em processo de envelhecimento?”

De forma a orientar a nossa pesquisa, constituíram-se outras perguntas; Quais são os

problemas que o indivíduo portador de deficiência mental com idade avançada enfrenta

actualmente? Que tipos de apoio carece? Quais as suas necessidades? Em que consiste o

sistema de prestação de serviços vigente para responder às necessidades destas pessoas?

Devem estabelecer-se respostas sociais específicas para a população portadora de

deficiência mental em processo de envelhecimento ou devem incluir-se em repostas

existentes que atendam as pessoas portadoras de deficiência mental de todas as idades?

Que tipo de programas se devem desenvolver para ajudar o indivíduo deficiente mental

adulto a fazer frente ao processo de envelhecimento e a resolver os problemas que podem

surgir durante esse processo?

Para alcançar os pressupostos da presente investigação foram definidos os seguintes

objectivos:

- Perceber quais as respostas sociais promotoras de bem-estar mais adequadas às

necessidades especificas no processo de envelhecimento do indivíduo portador

de deficiência mental.

- Contribuir para uma planificação e melhoria dos serviços / respostas destinadas

ao adulto portador de deficiência mental no seu processo de envelhecimento.

- Responder a questões colocadas pelos profissionais e familiares do indivíduo

adulto portador de deficiência mental no seu processo de envelhecimento.

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- Contribuir para uma diminuição dos mitos e preconceitos existentes sobre esta

problemática.

Do ponto de vista estrutural este documento está dividido em três partes fundamentais que

se encontram interligadas entre si.

A primeira parte é constituída pelo enquadramento teórico, em que se pretende aprofundar

e relacionar os conceitos mais importantes referentes ao processo de envelhecimento dos

indivíduos portadores de deficiência mental, dando consistência teórica ao estudo que se

pretende descrever.

Na segunda parte descreve-se a abordagem metodológica e identificam-se os paradigmas,

métodos e técnicas que utilizámos na realização desta investigação.

A terceira e última parte, destina-se à apresentação e análise dos dados recolhidos na fase

empírica, sistematiza-se os principais resultados que estiveram presentes nesta investigação

e apresentamos uma reflexão da problemática com base na triangulação dos diferentes

pontos de vista dos participantes, bem como a relevância do papel do Assistente Social nas

instituições de apoio a pessoas portadoras de deficiência mental.

Concluímos este trabalho, com o desenho de novas respostas para o processo de

envelhecimento deste novo grupo e com uma avaliação da forma como este processo foi

desenvolvido.

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CAPITULO I

Para uma melhor compreensão da problemática do envelhecimento da pessoa com

deficiência mental, apresentaremos primeiro um enquadramento das questões inerentes ao

envelhecimento e em seguida focamos a deficiência mental, para depois nos debruçarmos

sobre ambas.

Esta opção advém do facto da temática ainda não ter sido muito explorada. Tem-se

registado investigações aprofundadas sobre estes temas em separado contudo, por esta ser

uma nova realidade, são escassos os estudos nesta área.

1 – ENVELHECIMENTO E DEFICIÊNCIA

1.1 - Sociedade e a problemática do Envelhecimento

O homem sempre se preocupou com o envelhecimento caracterizando-o normalmente

como sendo um período de maior vulnerabilidade e dependência da pessoa, por perda

gradual das suas capacidades. (Rosa, 2004: 8).

No Ocidente, o termo idoso é usado para caracterizar as pessoas de idade igual ou superior

a 65 anos. A Organização das Nações Unidas prefere utilizar o termo Terceira Idade para

se referir a este período da vida. A União Europeia optou pela expressão sénior para

mencionar a população com mais de 50 anos, contudo, para muitos autores o termo idoso é

visto como o que melhor identifica a pessoa no seu estado de velhice, etapa em que é

acumulado no indivíduo diversas desvantagens sociais, físicas e psicológicas (Bize e

Vallier, 1995, in Jacob3, 2001).

A civilização oriental valoriza-a exactamente pelo facto de lhe atribuir as características do

bom senso, da serenidade, do equilíbrio, da sabedoria e do conhecimento. Os velhos são

um exemplo na sociedade e as suas intervenções sociais são muito consideradas e

importantes para o desenvolvimento da mesma. A civilização ocidental infelizmente não

3 Luís Jacob, Presidente da Direcção da Associação Rede de Universidades da Terceira Idade - RUTIS; Fundador e director da Universidade Sénior de Almeirim, desde 2001...

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valoriza tanto esta fase da vida, o que coloca sérios problemas ao nível do seu

acompanhamento e apoio, designadamente na resolução de problemas como a solidão, o

isolamento, a carência afectiva e económica a que muitas destas pessoas estão votadas,

(Rosa, 2004: 8).

Fernandes (1997) na obra “Velhice e Sociedade”, afirma que “ (...) o surgimento da

terceira idade, categorização segundo a qual se é considerado velho, resulta de um

processo de construção de representação da velhice encarada como problema social que

passou a mobilizar gente, meios e esforços. Ser velho representa ser diminuído,

carenciado, alguém que precisa de solidariedade e ajuda” 4. (Fernandes, 1997: 13)

A mesma autora menciona que a problemática do envelhecimento é indissociável das

mudanças ocorridas nas sociedades contemporâneas, quer a nível económico, social e

cultural, sendo também condicionada por vários factores, podendo-se destacar a

diminuição das taxas de fecundidade e de natalidade, bem como das taxas de mortalidade e

o consequente aumento da esperança média de vida.

O envelhecimento demográfico das populações é um dos fenómenos irreversíveis das

sociedades modernas (Fernandes, 2001: 39). Ao longo das últimas décadas, a pirâmide de

idades da população residente em Portugal tem vindo a sofrer um estreitamento na base e

um alargamento no topo, verificando-se efectivamente que a própria população idosa está a

aumentar. Relativamente ao futuro, e tendo em conta as projecções assentes numa certa

estabilidade da fecundidade, aumento da esperança média de vida e ainda um saldo

migratório positivo, espera-se que a população idosa em Portugal continue a aumentar,

passando os idosos a representar 18,1% da população em 2020 (Wall et al, 2002: 6). Esta

"involução demográfica"5 enquadra-se na tendência dominante da dinâmica das

populações dos países desenvolvidos e, a seu tempo, da população mundial. (Fernandes,

2001: 40)

Os avanços da ciência e da medicina aumentaram a esperança e a qualidade de vida

possibilitando a alteração da representação social tradicional que se possuiu do idoso, uma

4 A autora refere que à velhice, está vulgarmente associada a ideia de pobreza, escassez de meios materiais, de solidão, de doença e de alguma forma de segregação social. 5 Este processo representou uma verdadeira revolução demográfica, sendo que há a tendência para um desequilíbrio considerável entre as gerações, ou seja, o aumento dos mais velhos é relativamente empolado pela redução dos mais novos, contribuindo, desse modo, para o agravamento do desequilíbrio intergeracional.

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vez que este é cada vez mais uma pessoa capaz, activa, empenhada em participar na vida

familiar e na comunidade, ocupando um lugar que lhe compete (Fernandes, 1997: 33).

No entanto, Moragas (1997), refere que os velhos configuram-se como uma categoria

independente do resto da sociedade, como um grupo com características próprias, que

supõe maior separação do resto da sociedade do que outros grupos como as crianças,

adultos e operários. Pois a velhice suscita reacções negativas, não somente variáveis

descritivas da condição pessoal da pessoa, como a aparência física, o estado de saúde e o

sexo.

A velhice é, na verdade, uma fase da vida vulnerável em que à decadência física e

intelectual se acrescenta muitas vezes a exclusão social (Fernandes, 1997: 155).

Do ponto de vista da velhice, como objectividade social e para que o conceito represente a

totalidade e não somente aquela dimensão que impressione o observador, o enfoque

objectivo da velhice levará em conta a idade cronológica, as condições psíquicas,

económicas e sociais da pessoa. Uma condição pessoal a mais que proporcione informação

sobre a pessoa, deve ser considerada objectivamente como quaisquer outras variáveis sobre

as quais o indivíduo não exerce influência como: sexo, raça, nacionalidade, família de

origem etc., que a sociologia denomina de atribuídas ou originárias (Moragas, 1997).

Actualmente o ser humano envelhece de uma forma diferente, espelho de um meio

ambiente em constante mudança, que leva em consideração as condições contemporâneas

da relação organismo-meio ambiente, diferentes das de qualquer outra época histórica. A

maior parte dos idosos possui competência funcional (Moragas, 1997).

1.1.1 – Transformações gerais no processo de envelhecimento

Envelhecer é um processo inerente a todo o ser humano (Moragas, 1997). O

envelhecimento pode considerar-se como sendo um processo fisiológico, psicológico e

social (Fernandes, 2000: 26).

Segundo Jacob (2001), o envelhecimento é um processo biológico progressivo e natural,

caracterizado pelo declínio das funções celulares e pela diminuição da capacidade

funcional, que é vivido de forma variável consoante o contexto social de cada indivíduo.

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O documento “População Idosa, Análise e Perspectivas a Problemática dos Cuidados

Intrafamiliares” (1996: 30) elaborado pelo Núcleo de Documentos Técnica e Divulgação, a

população idosa devido a condicionalismos de várias ordens apresenta, na sua grande

maioria, estados de saúde precários caracterizados pela existência de situações patológicas

em particular doenças cérebro-vasculares; tumores malignos; doenças cardiovasculares e

acidentes que originam fracturas dos ossos. Estas situações limitam frequentemente as

capacidades funcionais dos indivíduos idosos, tendo repercussões ao nível da execução das

tarefas da vida quotidiana e da sua independência. As perturbações psíquicas, também são

frequentes com o avanço da idade, sobretudo os estudos de demência por arteriosclerose ou

outras situações, onde se destaca a doença de Alzheimer.

Os idosos são alvo de uma forte “rejeição social”, pois o facto das suas faculdades

intelectuais e físicas de adaptação sofrerem uma certa decadência é desvalorizado pelas

sociedades pós-industriais em que vivemos actualmente. (Moragas, 1997)

A depressão é a característica mais comum do envelhecimento, devido às situações

concretas a que os idosos estão sujeitos, tais como diminuição da força e das capacidades

físicas; situação de reforma; a perda da capacidade produtiva; mudança no estatuto social e

isolamento. A desorientação, perda de memória e apatia são sintomas da depressão, que se

caracterizam, geralmente, por uma alteração dos aspectos cognitivos, emocionais e

motores dos indivíduos idosos. Para evitar a depressão é necessário estimular e permitir a

participação dos idosos em actividades sociais, o que os conduz a manterem o interesse

pela vida. (Moragas, 1997)

1.2 - Sociedade e a problemática da Deficiência Mental

O conceito de “Sociedade” é ambíguo e refere-se simultaneamente num sentido genérico a

“relacionamento social”, e a um sistema particular de relações sociais. Durkheim, trata a

sociedade de uma forma mística, como “uma espécie de “super-entidade” perante a qual

os membros individuais mostrariam, muito apropriadamente, uma atitude de reverência “

(Guiddens, 1992: 10).

1.2.1 - Mudança de Paradigma no domínio da Deficiência Mental

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Uma das considerações teóricas fundamentais no domínio da deficiência mental é a sua

conceptualização. Têm-se procurado elaborar critérios de definição claros e não ambíguos,

mas esta tarefa tem-se revelado particularmente difícil (Albuquerque, 2000: 15).

Na realidade, como refere Albuquerque (2000: 15), a heterogeneidade da população

habitualmente designada como deficiente mental, em termos de etiologias, características

comportamentais, necessidades educativas, entre outros aspectos, revela que se trata de um

problema prático (e teórico) complexo, não redutível a uma definição unívoca.

A definição da deficiência mental permanece controversa, não obstante os progressos

notáveis nos conhecimentos teóricos e nas práticas reabilitativas verificados nas últimas

décadas. Assim, as definições de deficiência mental são geralmente formais, dada a

dificuldade em definir de forma precisa a diversidade que a constitui. Por outro lado, a

evolução histórica deste conceito demonstra que as suas definições foram

consideravelmente influenciadas por exigências sociais, culturais, políticas e

administrativas (Albuquerque, 2000: 15).

Segundo Maria Albuquerque (2000), são essencialmente quatro as conceptualizações da

deficiência mental dominantes no século XX. Ou seja, deficiência mental como défice

Intelectual; défice intelectual e adaptativo; défice cognitivo e constructo social:

- Défice Intelectual: A definição psicométrica da deficiência mental surgiu com a

obrigatoriedade escolar, que a equacionou a um atraso do desenvolvimento intelectual,

constatável e mensurável a partir da criação por Binet e Simon da Escala Métrica de

Inteligência. O aparecimento das noções de idade mental e de quociente intelectual (QI), a

divulgação e o êxito da prática psicométrica geraram uma série de suposições e práticas

que conduziram à assimilação da deficiência mental ao resultado obtido num teste de

inteligência. A partir de um modelo de avaliação normativo, estabeleceu-se um processo

tautológico em que um desempenho que se suspeitava ser inferior era confirmado e

explicado pelo quociente intelectual. Assumindo um poder interpretativo do desempenho e

das diferenças individuais que não possuía, o comportamento dos deficientes mentais era

atribuído ao seu baixo QI (Haywood e Wachs, 1981, in Albuquerque, 2000: 16). Esta

perspectiva de classificação da deficiência mental, pode considerar-se clássica. (Morato,

1995: 14)

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Segundo esta corrente, “é deficiente mental, todo o indivíduo que apresenta um défice ou

diminuição das suas capacidades intelectuais.” (Bautista & Valência, 1997: 210)

Segundo afirma Zazzo (1979), a deficiência mental confundiu-se com os limiares de QI,

cuja origem social e arbitrariedade não foram tidas em conta, e que revestiram um valor

absoluto e universal que nunca poderiam ou pretenderam ter.

- Défice Intelectual e Adaptativo: a este título, considera-se indispensável mencionar duas

definições apresentadas pela organização internacional “American Association on Mental

Retardation” (AAMR), que viriam a ser adoptadas por outras instituições de renome.

De acordo com a primeira definição, que se manteve em vigor entre 1972 e 1992, a

“deficiência mental refere-se a um funcionamento intelectual significativamente inferior à

média, acompanhado de défices no comportamento adaptativo, manifestado durante o

período de desenvolvimento” (Grossman, 1983 in Bautista & Valência, 1997: 210). Para

além destes três critérios essenciais, especifica-se que o termo deficiência mental, descreve

o comportamento actual, e não implica um prognóstico. O critério “funcionamento

intelectual significativamente inferior à média” foi operacionalizado como correspondendo

a um QI igual ou inferior a 70 num ou mais testes estandardizados de inteligência. Um QI

de 70 foi, no entanto, considerado como uma linha directriz, uma aproximação sujeita a

uma avaliação clínica e não como um valor fixo (Albuquerque, 2000: 19).

A classificação dos diferentes níveis de deficiência intelectual, passa a efectuar-se também

por proposta da AAMR (1992, in Claudino, 1997: 35) em função do estabelecimento de

níveis de correspondência entre o critério psicométrico e o do comportamento adaptativo,

colocando-se indivíduos muito heterogéneos numa de quatro categorias: ligeira,

moderada, severa e profunda. Assim, a deficiência mental ligeira corresponde a um QI de

50-55 a aproximadamente 70. Este sistema nominal de classificação é minimamente útil

para os profissionais e investigadores, desde que não se percam de vista algumas

considerações. Os deficientes mentais agrupados homogeneamente em função do QI

exibem uma significativa variabilidade intra e inter-individual (Baumeister, 1968 in

Albuquerque, 2000: 19). A multiplicidade das etiologias, a diversidade das manifestações

cognitivas, comportamentais e educacionais, as respostas diferenciais à reabilitação, numa

mesma categoria, aconselham a maior prudência na aplicação deste sistema classificativo.

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Apesar da delimitação do conceito de comportamento adaptativo se ter revelado difícil

(Robinson & Robinson, 1976 in Albuquerque, 2000: 20), acordou-se que diz respeito à

“capacidade de adaptação às exigências naturais e sociais do meio” (Magerotte, 1978: 7),

isto é, visa “a eficácia dos indivíduos na satisfação das normas de independência pessoal e

de responsabilidade social estabelecidas para a sua idade e o seu grupo cultural” (Grosman,

1983 in Albuquerque, 2000: 20).

Atendendo a que as normas e expectativas sociais diferem consideravelmente com a idade,

com os contextos de vida (lar, escola, local de trabalho, etc.) e com o grupo cultural a que o

indivíduo pertence, o comportamento adaptativo deverá ser avaliado de forma diferencial,

de acordo com esses factores. Deste modo, o conceito de comportamento adaptativo é,

fundamentalmente, um conceito relativo às situações sociais e ao nível de desenvolvimento

individual. Em complemento, um pressuposto implícito na definição de comportamento

adaptativo é o que diz respeito a desempenhos observáveis, a comportamentos manifestos

e não às capacidades ou aptidões que lhe possam estar subjacentes. Por outras palavras,

reporta-se ao que as pessoas fazem habitualmente e não ao que elas podem ou são capazes

de virem a fazer (Grossman, 1983, in Albuquerque, 2000: 21).

A segunda definição enuncia que “deficiência mental refere-se a limitações substanciais

no funcionamento actual. Caracteriza-se por um funcionamento intelectual

significativamente inferior à média, que coexiste com limitações em duas ou mais das

seguintes áreas de competências adaptativas: comunicação, cuidados pessoais, autonomia

em casa, competências sociais, utilização de recursos comunitários, iniciativa e

responsabilidade, saúde e segurança, aptidões académicas funcionais, lazer e trabalho. A

deficiência mental manifesta-se antes dos 18 anos” (AAMR, 1992: 1 cit por Claudino,

1997: 27).

A leitura desta definição permite verificar que os três critérios fundamentais de diagnóstico

da deficiência mental se mantêm e pode, mesmo, levar-nos a pensar que comporta simples

alterações de pormenor em relação à definição precedente. Assim, no que respeita ao

critério de funcionamento intelectual, o limiar superior da deficiência mental corresponde,

agora, a um QI de aproximadamente 70 a 75. Nenhum valor de QI pode ser entendido de

forma rígida e inflexível, mas antes como uma estimativa imprecisa e complementar com

diversos outros elementos do processo de avaliação psicológica (MacMillan , Gresham &

Siperstein, 1993 in Albuquerque, 2000: 21).

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A modificação mais radical subjacente à nova definição diz respeito ao facto de se

recomendar que o sistema de classificação baseado no QI seja substituído por outro

completamente distinto, que se centra na intensidade dos apoios que as pessoas com

deficiência mental poderão necessitar.

Os proponentes e defensores da modificação do sistema de classificação (Luckasson et al.,

1992; Reiss, 1994 in Albuquerque, 2000: 22) sustentam que ela configura uma mudança

de paradigma no domínio da deficiência mental, similar à que se tem vindo a verificar

em relação à generalidade das deficiências e incapacidades. Assim, por um lado, a

deficiência mental deveria deixar de ser entendida como um défice de natureza individual,

para passar a ser considerada com a expressão da interacção entre o sujeito e o meio em

que se insere. Por outro lado, a deficiência mental deveria deixar de ser perspectivada em

termos de défices, para passar a ser analisada em termos dos apoios necessários ao

exercício de diferentes papéis sociais. Em consequência, a ênfase ao nível da classificação

teria de deslocar-se das características individuais para as características e suportes

ambientais susceptíveis de facilitarem o crescimento, desenvolvimento, bem-estar e

satisfação pessoais.

- Défice cognitivo: Uma das áreas mais extensivamente estudadas no domínio da

deficiência mental, tem sido a do desenvolvimento e funcionamento cognitivo. Na verdade,

as manifestações principais da deficiência mental, situam-se na menor eficiência em

situações de aprendizagem de aquisição de aptidões e de resoluções de problemas (Clarke

& Clarke, 1985 in Albuquerque, 2000: 25). São muitos os conceitos propostos para

explicar os aspectos cognitivos da deficiência mental e são várias as controvérsias teóricas

que têm assinalado os últimos anos. De entre estas, a mais pertinente e persistente no que

respeita à deficiência mental ligeira é a que se refere à conceptualização do seu

desenvolvimento cognitivo. De facto, dois modelos teóricos opostos têm caracterizado a

deficiência mental ou como um simples atraso no desenvolvimento (modelo

desenvolvimentista), ou como a expressão de défices qualitativos específicos (modelo

deficitário ou da diferença).

- Constructo Social: Esta corrente defende que o deficiente mental é aquele que apresenta,

em maior ou menor medida, dificuldade para se adaptar ao meio social em que vive e para

levar a cabo uma vida autónoma (Bautista & Valência, 1997: 210). Ou seja, a deficiência

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mental comporta uma dimensão social e, por isso, não pode ser entendida sem referência a

variáveis socioculturais. A investigação reforça a noção de que a identificação dos

deficientes mentais apoia-se em critérios socioculturais particulares (Barnett, 1986 in

Albuquerque, 2000: 29).

A radicalização dos factos assinalados levou Mercer (1973, in Albuquerque, 2000: 29) a

propôr uma “perspectiva de sistema social” na definição da deficiência mental. De acordo

com esta abordagem, exclusivamente sociológica, a deficiência mental ligeira não é uma

característica, fenómeno ou condição individual, mas antes um estatuto e um papel

desempenhados por um indivíduo num ou nalguns sistemas sociais específicos e não

necessariamente em todos. Esta perspectiva é, no entanto, demasiado extrema, e reúne

maior aceitação numa perspectiva mais moderada, em que a identificação da deficiência

mental ligeira emerge da interacção entre os vários contextos ecológicos e as

características individuais.

Em conclusão poderá dizer-se que as definições de deficiência mental utilizam como

principais critérios os resultados obtidos pelos indivíduos nas provas de inteligência e/ou

sua capacidade de adaptação e integração na sociedade. Os sistemas de classificação por

seu lado, fundamentam-se nos desvios dos resultados obtidos nos testes de inteligência

relativamente à média e/ou adaptação social (Claudino, 1997: 37).

1.3 - Envelhecimento e Deficiência Mental Envelhecer é um processo contínuo que se inicia com a concepção do indivíduo e se

encerra com a sua morte (Fortuna, 2004: 3)6. Velhice e terceira idade, são termos que

caracterizam um período natural da vida das pessoas a requerer atenção redobrada, quer ao

nível da mudança de atitudes, quer ao nível da intervenção social, no acompanhamento e

apoio social, na manutenção física e cuidados de saúde da pessoa com idade avançada.

Tratando-se de pessoas com deficiência, esta realidade exige ainda mais atenção, tal como

acontece em outras fases da vida deste tipo de população (Rosa, 2004: 8), pois alia-se ao

envelhecimento o preconceito e o desespero técnico e social (Rosa, 2004: 3).

6 Artigo do Jornal da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Entrevista a Dr.ª Sónia Fortuna – psicóloga, mestre e doutoranda em Gerontologia pela Unicamp, Brasil).

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Quando se fala em deficiências, em âmbitos científicos ou institucionais, relaciona-se de

imediato este termo com outros como a prevenção, intervenção precoce, integração

educativa, profissional, acessibilidade, reabilitação, entre outros, sempre evocando a

infância, a juventude e a idade adulta, relacionando-se poucas as vezes a deficiência ao

envelhecimento. Isto porque até há poucos anos, a esperança média de vida dos deficientes

era bastante inferior à da população em geral, não chegando sequer à velhice (Rodríguez,

2002: 20).

Algumas décadas atrás, os deficientes mentais viviam 30 anos no máximo, acreditava-se

que o deficiente morria em decorrência da sua própria deficiência. Hoje sabe-se que

morriam devido a doenças que ocorriam com mais frequência. (Perri, 2004)

Contudo, e apesar dos avanços técnicos e científicos que a era moderna nos tem prendado

principalmente os avanços na medicina que traduzem o aumento da esperança de vida, o

certo é que este desenvolvimento não tem tido idêntica correspondência no respeito pelos

direitos cívicos e garantias das pessoas com idade avançada em todas as áreas, incluindo as

pessoas com deficiência (Rosa, 2004: 8).

Isto porque, como consequência, esta população apresenta um conjunto de novas

necessidades, derivadas do seu processo de envelhecimento, que vêem modificar a sua

condição anterior, (Rodríguez, 2002: 20).

Como reflexo destas transformações societárias, esta geração pioneira, enfrenta o novo

desafio do envelhecimento (Perri, 2004: 1). Pode dizer-se que nos últimos 20 anos, as

pessoas com deficiência mental viram a sua esperança média de vida aumentada, em

proporções finalmente consideráveis, quase para o dobro (Coquebert, 2004: 10).

Depois de enfrentarem uma infância e a juventude marcadas pela discriminação e falta de

oportunidades, as pessoas com deficiência que chegam à terceira idade, têm de enfrentar

agora mais uma exclusão social: a velhice (Perri, 2004: 1; Fortuna, 2004: 3), com os

mesmos anseios de todos: uma vida activa, com lazer, saúde e qualidade de vida.

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Estamos perante uma nova realidade social, que constitui uma emergência silenciosa7,

sobretudo porque ainda não há conhecimento suficiente sobre os programas, recursos e

serviços que são mais apropriados para responder às necessidades que apresenta esta

população (Rodríguez, 2002: 20). Por outro lado, à medida que as pessoas com deficiência

vão envelhecendo, envelhecem paralelamente as suas famílias, que são quem geralmente

cuida deles e não estão preparados para esta nova problemática. (Rosa, 2004: 8).

Apesar da questão do envelhecimento ser bem familiar para os especialistas que trabalham

com idosos, é um terreno misterioso para os profissionais que trabalham com deficientes

mentais (Breitenbach, 1999: 23). Ou seja, há um grande desencontro entre os diferentes

agentes que trabalham no âmbito da gerontologia ou em torno da deficiência. Ao actuarem

em pólos separados, existe um grande desconhecimento tanto teórico como prático nos

estudos produzidos por ambos (Rodríguez, 2002: 21).

É neste sentido que, o envelhecimento das pessoas com deficiência, deverá ser uma das

prioridades das políticas sociais dos próximos anos8 (Cuesta, 2002: 18).

Para as pessoas com deficiência mental, o envelhecimento apresenta-se principalmente em

três formas (Breitenbach, 1999: 24-25):

Envelhecimento clássico: este tipo de envelhecimento é relativo às diminuições e

disfuncionamentos progressivos associados à idade: modificação de aspecto, problemas

visuais, fragilidade óssea, entre outros. Estes sinais do tempo que vai passando não têm

nada de excepcionais. A maioria das pessoas que apresentam uma deficiência mental

manifestará, os mesmos sintomas da idade que aqueles que se caracterizam como “idosos

válidos”. A sua esperança de vida aproximar-se-á da população em geral e os seus

problemas de saúde serão semelhantes. No entanto, a presença de uma deficiência

intelectual pode comprometer o seu reconhecimento e, por conseguinte, o

acompanhamento adequado destas transformações comuns.

Envelhecimento individual: o envelhecimento individual, reflecte as condições de vida, das

pessoas que apresentam uma deficiência mental, que dependem da etiologia da deficiência

e do modo como é conduzido todo o processo de desenvolvimento pessoal e social destas

7 Denominado pelo Comité de Reabilitação e Integração das pessoas com deficiência do conselho da Europa. 8 Referiu Manuel Sancho, subdirector geral do plano de acção e programas para pessoas com deficiências de IMSERSO, durante o acto de inauguração do Congresso Internacional celebrado em Oviedo, sobre deficiência e envelhecimento

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pessoas. Esse envelhecimento individual que caracteriza todos os seres humanos, na pessoa

portadora de deficiência mental, toma outra dimensão na medida em que durante a sua vida

pode ter tido atitudes que a longo prazo, podem levar a um envelhecimento individual mais

acentuado, nomeadamente: no uso de medicamentos específicos; quedas devido a crises de

epilepsia; condições de trabalho nos centros de emprego protegido; uma alimentação

desequilibrada; uma actividade física insuficiente ou mesmo a necessitar de cuidados

paliativos.

Envelhecimento patológico: as patologias associadas à idade, que golpeiam muito

especialmente esta população, têm sido exploradas sem se ter em conta o seu verdadeiro

alcance, e as divergências de opinião dos especialistas têm vindo a diminuir.

Contudo, para além destes três conceitos de envelhecimento, este autor também refere que,

ainda hoje, os dados científicos são divergentes e paradoxos. Por exemplo, logo que uns

confirmem o aumento da esperança de vida dos deficientes mentais, outros debruçam-se

sobre o seu envelhecimento precoce. Este debate sobre o envelhecimento precoce nos

deficientes mentais, vai mais adiante que as perguntas de morbidade e de mortalidade.

Trata-se de um olhar muito relativo sobre as pessoas, e de um julgamento adiantado sobre

a sua (in) utilidade social. Levantando-se questões como: Se uma pessoa é velha a partir

dos 60 anos, em que idade estas pessoas começam a ser "velhas"?; Em que momento se

pode qualificar este envelhecimento de "prematuro"?

Não é evidente que o handicap por si só, seja factor de um envelhecimento precoce. Porém

é evidente que os diferentes problemas de saúde e os diferentes graus da deficiência podem

ser factores a ter em conta (Coquebert, 2004: 10).

Dentro deste campo, os estudos indicam que, em muitos casos, os efeitos biológicos,

psicológicos e sociais do envelhecimento podem aparecer antes da idade, provocando

assim uma disparidade entre os critérios de admissão dos serviços para idosos e as

necessidades individuais desta população (Janicki, 1987: 36).

Surge assim, uma definição puramente ambivalente e cronológica, para definir as

pessoas com deficiência mental idosas. Não obstante, na maioria das pessoas com

deficiência mental, parece que os 45 anos marcam um período no desenvolvimento da vida

em que se manifesta a diminuição de algumas reservas físicas e o aparecimento do ajuste

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psicológico à velhice. Posto isto, muitos profissionais, reconhecem esta idade como a

época em que se deve prestar consideração a um ajuste das actividades vitais que reflectem

condutas, interesses e capacidades físicas próprias da idade. Contudo, alguns estudos

demonstraram que só aos 75 anos é que começa a ocorrer uma importante degradação das

funções (Janicki, 1987: 37).

O uso de uma definição que combine a presença da deficiência mental com o facto de

encontrar-se no último período da própria vida, pode ajudar a definir que tipos de serviços

são necessários (Janicki, 1987: 64).

Pode observar-se alguns sinais relacionados ao envelhecimento, comum a todas as pessoas,

nomeadamente: comprometimento da saúde; diminuição da capacidade física; lentidão de

movimentos, fala e pensamento; sonolência, cansaço não associada a medicação;

irritabilidade; maior inflexibilidade; discurso repetitivo; restrição de vocabulário;

desorganização do discurso; comprometimento da memória; interesses e contactos

diminuídos; descuido da aparência e higiene pessoal; perda de iniciativa; quadro

depressivo; quadro demencial. (Janicki, 1987: 65)

Como revisto anteriormente, no caso do deficiente mental, é comum estes sinais

aparecerem mais cedo, devido ao uso prolongado de medicamentos, a dificuldade em

relatar queixas, sedentarismo, obesidade, comportamento sexual de risco, abusos de fumo,

álcool e drogas, infantilização e vida social menos estruturada (Arantes, 2004: 4)9.

Ao tomar-se consciência desta problemática, devem unir-se esforços no sentido de

melhorar o mais possível a qualidade de vida desta população e consequentemente da sua

família, o que pode passar pela adequação e melhoria da rede de serviços disponíveis para

esta população.

1.3.1 - Uma questão de números

A perspectiva científica da demografia sobre o envelhecimento das populações, é um ponto

de partida essencial para a formulação problemática da velhice na actualidade (Fernandes,

2001: 40). Isto porque apesar de os números não serem consensuais, constata-se que no

9 Artigo Técnico sobre Envelhecimento e Deficiência Mental, no Jornal da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais – APAE de Jundiai. Maria Arantes é psicóloga do centro de tratamento profissionalizante da Apae de Jundiai.

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início do século XX, a esperança de vida das pessoas era em geral, de cerca de 40/50 anos

e das pessoas com deficiência de 20/30 anos. Na década de 60/70, viram-se estes

indicadores subir para 50/60 anos na população em geral e nas pessoas com deficiência

para 30/40 anos (Rosa, 2004: 8).

A mesma autora, refere que hoje, as expectativas cifram-se numa esperança de vida para a

população em geral entre os 70/80anos e para as pessoas com deficiência mental para

60/70 anos. O que traduz um aumento maior do que o verificado para a população em

geral.

Esta nova realidade, começa a chamar a atenção da sociedade, na medida em que surgiu

com a emergência das grandes mudanças ao nível das políticas sociais destinadas aos mais

desfavorecidos. Acredita-se que a melhoria das respostas sociais destinadas a todas as

faixas etárias e a especial atenção dos técnicos que acompanharam o seu crescimento e

promoveram a sua integração e bem-estar, sejam também factores importantes para o

aumento da esperança de vida desta população.

Segundo os Censos 2001, relativamente à análise da população com deficiência em

Portugal, a população com deficiência mental representa 0,7% da população (0,8 % na

população masculina e 0,6% na população feminina). Entre a população com deficiência o

índice de envelhecimento é cerca de 5,5 vezes superior ao da população total, registando-se

um índice de envelhecimento da população com deficiência mais elevado nas regiões mais

envelhecidas10 (INE, 2002: 4).

A taxa de incidência da deficiência mental no grupo etário dos 25-54 anos é de

aproximadamente 0,8% da população. No conjunto da população com 55-64 anos a taxa de

incidência atingiu cerca de 0,9% e no grupo de pessoas com mais de 65 anos estima-se que

represente 0,8%. É entre a população idosa que incidem as maiores taxas de deficiência

(INE, 2002: 6).

1.3.2 - Envelhecimento e Deficiência na Modernidade

O termo “Modernidade” segundo Anthony Guiddens, refere-se a modos de vida e de

organização social que emergiram na Europa por volta do século XVII e que adquiriram

10 Destaque do INE de 4 de Fevereiro de 2002, p.1-11 – Informação à Comunicação Social. www.ine.pt

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uma influência mais ou menos universal. Estamos a entrar num momento em que as

consequências da modernidade se tornam mais radicalizadas e universalizadas do que antes

(1992).

A modernidade, ao estar associada ao desenvolvimento do capitalismo, da ciência e

tecnologia e ao nascimento do Estado Moderno, acarreta um maior interesse em regular e

disciplinar a vida das pessoas, quer por meio do desenvolvimento das ciências humanas ou

do corpo. A preocupação central na modernidade é institucionalizar as transições das

pessoas, através de uma lógica fundamentada na uniformização e universalização das

transições, levando a uma maior segregação de grupos sociais (Bassit, 2000: 222 in Prado,

2002: 3).

O debate sobre o envelhecimento e a deficiência tem ocupado cada vez mais espaço nas

políticas públicas. Isso ocorre, por um lado, como resultado do envelhecimento

populacional, que força o reconhecimento de que a experiência da deficiência não pertence

apenas ao universo do inesperado e, sim, é algo que faz parte da vida de uma grande

quantidade de pessoas. Por outro lado, resulta de mudanças no que se define por

deficiência e na forma de entender, como é que a sociedade é responsável por ela. A

combinação destes factores tem implicações directas na determinação do conteúdo das

políticas e do seu público-alvo (Medeiros & Diniz, 2004: 1).

A definição de deficiência é necessária para as políticas sociais voltadas aos deficientes. A

busca de critérios essencialmente técnicos e neutros para determinar o que é deficiência,

não só é ingénua, como, geralmente oculta, sob uma fachada neutra de valores altamente

prescritivos quanto à função e objectivos das políticas sociais. O mesmo pode ser dito em

relação aos idosos, em que discussões sobre idade compõem o cerne dos debates (Medeiros

& Diniz, 2004: 1).

Os mesmos autores, apresentam dois modelos explicativos da deficiência, nomeadamente o

Modelo Social e o Modelo Médico.

O Modelo Social da deficiência é uma corrente política e teórica iniciada no Reino Unidos

nos anos 1960, como reacção às abordagens biomédicas. Provocou uma reviravolta nos

modelos tradicionais de compreensão da deficiência ao retirar do indivíduo a origem da

desigualdade e devolvê-la ao social. É uma discussão extensa sobre políticas de bem-estar

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e de justiça, em que a explicação médica para a desigualdade não é mais considerada

suficiente.11 No cruzamento entre deficientes e idosos, as perspectivas teóricas e políticas

do modelo social da deficiência são uma fonte rica de diálogo e inspiração para políticas de

bem-estar para idosos. A ideia básica deste modelo é de que a deficiência não deve ser

entendida como um problema individual, mas como uma questão eminentemente social,

transferindo a responsabilidade pelas desvantagens dos deficientes das limitações corporais

do indivíduo para a incapacidade da sociedade em prever e ajustar-se à diversidade (Oliver,

1990, in Medeiros & Diniz, 2004: 1). Deficiência seria o resultado da opressão e da

discriminação sofrida pelas pessoas em função de uma sociedade que se organiza de uma

maneira que não permite incluí-la na vida quotidiana.

Para o Modelo Médico, a lesão levava à deficiência, contudo para o modelo social são os

sistemas sociais excludentes que levavam pessoas com lesões à experiência da deficiência.

Em síntese, o modelo médico identifica a pessoa deficiente como uma pessoa com algum

tipo de inadequação para a sociedade; o modelo social por sua vez inverte o argumento e

identifica a deficiência na inadequação da sociedade para incluir todos, sem excepção.

A combinação da existência de uma condição de saúde bem abaixo de um padrão abstracto

de normalidade e a persistência dessa condição no tempo permite ao modelo médico

diferenciar doença de deficiência. O modelo social não reconhece esta distinção porque,

entende que os ajustes requeridos da sociedade para que ela contemple a diversidade da

deficiência são independentes de quanto tempo uma condição corporal se irá manter12

(Abberley, 1987 in Medeiros & Diniz, 2004: 2). O modelo médico ao não reconhecer que

os doentes também experimentam a deficiência, exclui da atenção das políticas públicas

uma grande parcela da população que necessita delas, problema que pode afectar uma

grande parte da população idosa. Para evitar este tipo de exclusão o modelo social não usa

da mesma maneira a distinção entre doença e deficiência.

“Todos os deficientes experimentam a deficiência como uma restrição social, não

importando se estas restrições ocorrem em consequência de ambientes inacessíveis, de

noções questionáveis de inteligência e competência social, (...) ou se pelas atitudes

11 É uma discussão extensa sobre políticas de bem-estar e de justiça social, em que a explicação médica para a exclusão não é mais considerada suficiente 12 Por exemplo: uma pessoa que usa cadeira de rodas para se recuperar de fracturas nas pernas, necessita dos mesmos ajustes no sistema de transportes que uma pessoa permanentemente incapacitada de andar.

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públicas hostis das pessoas que não têm lesões visíveis” (Oliver, 1990, cit por Medeiros &

Diniz, 2004: 2).

No final da década de 1990, alguns argumentos do modelo social passam a ser revisados.

As feministas mostraram que as políticas públicas não devem apenas debruçar-se na

independência dos deficientes, mas devem também criar condições favoráveis para que o

cuidado seja exercido. E que para a experiência da deficiência convergiam outras

desigualdades, tais como a raça, género, orientação sexual ou idade (Medeiros & Diniz,

2004: 3).

A argumentação do modelo social encontrou nos idosos um caso paradigmático: um

ambiente hostil pode fazer com que a acumulação de limitações leves na funcionalidade

corporal se torne causa de grandes deficiências entre os idosos. Inúmeros casos

demonstram que a deficiência não é uma experiência limitada a uma minoria reduzida, mas

um facto ordinário e previsível no curso de vida das pessoas, assim como o

envelhecimento (Medeiros & Diniz, 2004: 3).

Em 2001, a Organização Mundial da Saúde revisou o catálogo internacional de

classificação da deficiência para adequar-se a esta perspectiva (OMS-ICF, 2001).

Associar o envelhecimento à deficiência na sociedade moderna é algo que encontra alguma

resistência devido ao estigma associado ao termo “deficiente”, mas dentro da interpretação

do modelo social faz sentido argumentar que muitos idosos são excluídos de uma parte

importante da vida social, em proporção muito maior do que aquela que poderia ser

atribuída às suas eventuais limitações, portanto, experimentam não só a deficiência como a

discriminação baseada em preconceitos relativos às suas capacidades corporais, (Medeiros

& Diniz, 2004: 4).

2 - SOCIEDADE DE RISCO PARA O INDIVÍDUO PORTADOR DE

DEFICIÊNCIA MENTAL EM PROCESSO DE ENVELHECIMENTO

Este tema constitui um desafio à imaginação em torno dos modelos de sociedade que

formam uma dicotomia entre Modernidade vs Vulnerabilidade na sobrevivência de grupos

vulneráveis face às exigências da modernidade. Para compreender melhor a problemática

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do envelhecimento na deficiência, é importante procurar identificar-se o modo como as

sociedades dos nossos dias, que alguns têm designado de sociedade de risco, se estruturam

em torno de dinâmicas e requisitos que tornam mais difícil a participação dos grupos

vulneráveis e degradam as condições de vida daqueles que devido às suas características

pessoais estão menos dotados para competir num mundo cada vez mais selectivo,

ameaçador e exigente (Capucha, 2003/4: 19).

A aparição da Sociedade de Risco é uma outra cara do envelhecimento industrial. Este

conceito descreve uma fase de desenvolvimento da sociedade moderna em que os perigos

sociais, políticos, ecológicos e individuais criados pelo impulso da inovação aludem cada

vez mais ao controlo e às instituições protectoras da sociedade industrial. O conceito de

sociedade de risco, descreve um estádio da modernidade em que se tornam predominantes

alguns perigos produzidos no desenrolar da sociedade industrial. Este conceito articula a

transformação sistémica e da época em três áreas (Beck, 2002: 116):

1 – Relação da sociedade industrial moderna com os recursos da natureza e da cultura.

Isto é válido no que respeita à natureza externa dos seres humanos e às culturas humanas

como o respeito a todas as formas de vida cultural.

2 – Relação da sociedade com os perigos e problemas que produziu, que por sua vez se

desdobra nas bases do conceito de segurança social.

3 – A dissolução e desencantamento das fontes de significado e especificidades dos

grupos, “processo de individualização”.

No caminhar para o fim da vida, surgem alguns “domínios” geralmente associados à ideia

de risco acrescido na modernidade (Capucha, 2003/4: 19), que podem ser mais bem

caracterizados como os “desafios da transição”. Estes problemas da transição colocam

algumas mudanças na manutenção do estilo de vida e reflectem-se nos interesses de bem-

estar e qualidade de vida para a fase mais avançada do indivíduo portador de deficiência

mental (Janicki, 1997: 110).

2.1 - Dupla Discriminação

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Apesar dos enormes avanços científicos, tecnológicos, políticos e culturais, que as nossas

sociedades alcançaram, o imaginário colectivo acerca da velhice ainda está carregado de

preconceitos, mitos ou ideias erróneas acerca desta última etapa do desenvolvimento

humano (António, 2003: 75), tal com temos vindo a demonstrar ao longo deste trabalho.

“A pessoa idosa dobra-se ao ideal convencional que lhe é proposto. Teme o escândalo ou

simplesmente o ridículo. Torna-se escrava “do que vão dizer”. Interioriza as obrigações

de decência e de castidade impostas pela sociedade. Os seus próprios desejos a

envergonham e ela os nega...” (Simone de Beauvoir, in António, 2003: 75).

Nas sociedades pré-modernas os idosos gozavam de prestígio e eram respeitados pelos

demais em sua autoridade e sabedoria: uma "idade de ouro da velhice" ou uma

"gerontocracia" derivada da posição de patriarcas em extensas famílias onde os velhos

detinham conhecimento e poder. Com o processo de modernização, a industrialização

traria o afastamento dos velhos do mundo produtivo, a urbanização resultaria na redução

do tamanho da família esgotando o poder patriarcal do idoso, cujo saber não seria mais

adequado às necessidades dos jovens escolarizados e mais valorizados e, por fim, a

marginalização e a solidão constituiriam, em conjunto, as mazelas de uma nova forma de

discriminação social: o "etarismo" (Groisman e Debert, 1997, in Prado, 2002: 4).

É necessário considerar a idade avançada como um importante aspecto da vida. Um dos

aspectos que estão por detrás das facetas da definição de qualidade de vida para os idosos é

o modo como a sociedade define esta população e que status aspira para este grupo. Sendo

de facto importante considerar que os idosos com deficiência mental têm de afirmar-se

com o duplo problema da maneira como a sociedade vê a pessoa idosa e para além disso

também deficiente. Na verdade, a sociedade está embutida em propensões negativas

relativamente à idade avançada, e para suplementar a nossa sociedade continua a exibir

influências negativas contra o ser deficiente (Janicki, 1997: 107).

Consequentemente, os factores culturais constroem as nossas atitudes contra as pessoas

portadoras de deficiência mental com idade avançada. Reconhece-se que as atitudes da

sociedade relativamente à idade e à deficiência mental interagem para afectar a natureza da

integração desta população no seio da estrutura da sociedade (Janicki, 1997: 108).

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A sociedade aspira valores positivos para a juventude e valores negativos para o

envelhecimento. O termo “ageism”, manifesta-se num vasto fenómeno de estereótipos e

mythos; absoluto desdenho, desgostar ou simplesmente um súbito evitar do contacto;

práticas discriminatórias em casa, no emprego, em todo o tipo de serviços, tal como nos

desenhos animados e anedotas. “Ageism” representa uma atitude negativa da sociedade. O

preconceito contra as pessoas idosas é demonstrado através da ênfase que a sociedade dá à

juventude e à beleza, a antítese da percepção estereotipada da idade madura. Paralelamente

existe um conjunto de atitudes negativas em relação às pessoas portadoras de handicaps. O

termo “Handicapism” surgiu para caracterizar essa atitude, e é também repercussão da

cultura e geração. Muitas atitudes negativas contra o handicap sobre as pessoas velhas

parecem ser devido ao medo de que eles próprios podem vir a ficar incapacitados (Janicki,

1997: 109).

As pessoas têm tendência para ver as incapacidades partindo da noção básica de

“normalidade”, olhando os outros em consequência das suas habilidades para confrontar o

padrão maioritário de qualidade, para o emprego, produtividade e outros valores que

prevalecem (Janicki, 1997: 110).

Em suma, continuam a existir muitos mitos relativamente à pessoa idosa e à pessoa com

deficiência, que nem sempre se comprovam com os factos (Moragas, 1997). Segundo a

OMS, alguns dos mitos ou preconceitos acerca da deficiência mental e do processo de

envelhecimento nas pessoas com deficiência mental, são: “As deficiências são resultado de

comportamentos errados ou negligentes por parte dos pais”; “os adultos com deficiência

mental apenas podem ser cuidados e acompanhados em instituições”; “os adultos com

deficiência mental são incapazes de aprender tarefas do dia-a-dia, de ser educados ou de

trabalhar” (OMS, 2000: 4 in António, 2003: 171-172).

Esta manifestação externa da discriminação, comum nas sociedades contemporâneas,

ocorre, quando à descriminação por idade se alia as desigualdades de sexo, nível

económico, etnia, de falta de saúde, de falta de relações sociais. Esta situação, ocorre nas

sociedades contemporâneas avançadas, devido ao grande número de mudanças sociais que

arrasam estruturas psíquicas, económicas e sociais estabelecidas sem proporcionar

mecanismos substitutivos integradores (Moragas, 1997).

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Contudo, estes, não são mais do que grandes mitos errados, que advém da primeira ideia de

que quando nascia uma criança com deficiência era um castigo divino, sendo muitas vezes

escondidos de toda a sociedade. Contudo actualmente muitas pessoas com deficiência

mental participam activamente na comunidade, vindo assim contrariar a maioria dos mitos

existentes sem fundamento.

2.2 - Imagem do corpo

A longevidade trouxe atitudes diferentes e encara-se o envelhecimento de uma forma

diferente da que se encarava ontem. Nos dias de hoje, deseja-se ser jovem durante mais

tempo e para isso recorre-se a todo o tipo de estratégias que possam atrasar qualquer marca

de envelhecimento. Estas preocupações, existentes a princípio na mulher, estenderam-se

posteriormente ao homem (Bayle, 2004: 621).

Contudo, apesar da permanência desta imagem negativa, as mudanças que ocorreram no

séc. XX trouxeram novas relações em relação aos freaks (pessoas com graves deformações

corporais), e em simultâneo, surgem novos corpos desviantes e novas práticas de

intervenção nos corpos, que vão utilizar a estética do bizarro por oposição à norma

(Tucherman, 1999, in Lourenço, 2001: 137).

A mesma autora, refere que se trata de procurar no “monstro” o que poderíamos ser e não o

que somos, na intensa procura de responder às questões: até que grau de deformação

permaneceremos humanos? (Tucherman, 1999, in Lourenço, 2001: 138).

Surge como norma social a beleza juvenil. Através dos rótulos, a totalidade das pessoas

idosas enquadra-se como fisicamente limitada, visualmente pouco agradáveis e

funcionalmente dependentes. De acordo com os meios de comunicação, são características

da velhice como as rugas, os cabelos brancos e a postura encurvada que se opõem às da

juventude. Contudo nem sempre assim foi, há menos de dois séculos, nos países

actualmente industrializados, valorizavam-se e respeitavam-se estas características, que

hoje são evitadas com uma grande quantidade de artificiosos cosméticos (Moragas, 1997).

Esta rotulagem estética negativa dos idosos constitui um processo semelhante ao que

experimentam outros grupos diferentes, tais como os deficientes que também se viram

marginalizados porque não se encaixam no ideal estético promovido pela sociedade de

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massas, que não passa de um padrão de beleza que somente caracteriza somente uma

pequena parte dos cidadãos (Moragas, 1997).

Torna-se necessário mudar o estereótipo da beleza juvenil, sendo da competência dos

líderes da moda descobrir uma nova imagem para as diferentes idades da vida (Moragas,

1997). Assim, o indivíduo portador de deficiência que atinge uma idade avançada é

sobrecarregado com uma dupla rotulagem negativa, por ser deficiente e idoso.

2.3 - Mundo do trabalho

O significado moderno de trabalho industrial é considerado incompatível com a velhice: o

trabalho é coisa de adultos e de jovens. Na sociedade Industrial Trabalho e Velhice são

considerados realidades opostas, dificilmente compatíveis, evocando papéis contraditórios

(Moragas, 1997): Trabalho (papel activo): produtivo; gerador de renda; exigências físicas,

psíquicas e sociais; ritmo intenso; obrigação, carga, responsabilidade; Velhice (papel

passivo): não produtiva; recebedora de pensão; pouca aptidão física; ritmo vital lento;

isenção de obrigações e responsabilidades.

Com o surgimento das novas tecnologias, concorre a problemática da relação destas com o

trabalho e as suas repercussões na vida social, que se deve ao facto das sociedades situarem

no centro do processo produtivo o trabalho e fazerem convergir a figura do trabalhador

com a figura do cidadão de pleno direito. Por outro, a actividade produtiva passou a ter um

carácter estruturador na construção do carácter individual (Amaro, 2005: 5).

O trabalho é a esfera fundamental para a autonomia das pessoas, para a aquisição de um

estatuto social, condição de acesso a um conjunto de direitos, suporte para a construção de

projectos de futuro (Capucha, 2003/4: 19). É fonte de dignidade pessoal, capacidade de

intervenção e concessão do direito a ser social dos sujeitos (Amaro, 2005). Hoje, o mundo

do trabalho é, quase sempre vivido como mundo instável e de risco, mesmo para os mais

preparados, e como um mundo de que são excluídos, ou acantonados nas zonas de menor

qualidade, os mais desfavorecidos. Tais dinâmicas na esfera do trabalho escapam ao

controlo dos aparelhos políticos do Estado, que se deixam dominar pelos interesses da

economia especulativa, recuando nas suas funções reguladoras e prestadoras de serviços e

transferindo para os privados algumas das funções sociais fundamentais que asseguravam e

dos serviços que prestavam, instaurando na vida social o risco que é apanágio do mercado.

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A privatização das funções sociais é outra face da individualização da resposta aos riscos

(Capucha, 2003/4: 19).

Assim os mais vulneráveis, que viam na intervenção do estado a única esperança de

reequilíbrio da relação de forças e de apoio à inserção social e profissional, confrontam-se

com o risco acrescido de redução de meios disponíveis para o investimento na elevação das

suas capacidades (Capucha, 2003/4: 20).

A velhice define-se como um período de ausência de trabalho, e esta atitude reflecte-se na

quantidade de termos aplicáveis aos idosos: classes passivas, aposentados pensionistas e

incute-se na mentalidade popular a relação velhice – ausência de trabalho – reforma

(Moragas, 1997).

2.4 - Reforma

“As pessoas idosas, ou seja os cidadãos mais velhos, são cidadãos de corpo inteiro, aos

quais deve ser garantido o acesso aos direitos económicos e sociais comuns a todos os

cidadãos.” (Quaresma, 1999: p.103)

O grupo de pessoas idosas emerge e é socialmente construído a partir da conquista de um

direito – o direito à reforma e a prestações de velhice. Em Portugal este direito surge após

1974 (Quaresma, 1999: 104). Enquanto trabalha tem um estatuto. Porém, a partir do

momento que entra na reforma, pode perder a sua identidade social e se não se transforma

a perda do trabalho noutras actividades positivas, a saúde física e psicológica pode

degradar-se (Bayle, 2004: 621).

A nível social, o idoso passa da actividade (trabalho) à inactividade (reforma), o que

implica necessariamente um olhar diferente em relação a si e aos outros, como a

“utilidade” social com o seu leque de papéis, funções e estatutos. (Bayle, 2004: 622)

A passagem para a reforma, apresenta de imediato uma mudança no estilo de vida da

pessoa, e em termos máximos pode alterar uma situação da vida, nos suportes de saúde,

sociais e financeiros e até mesmo na manutenção das relações interpessoais. Relativamente

às pessoas com incapacidades, os benefícios materiais associados ao trabalho, são

normalmente substituídos pelos benefícios da Segurança Social ou através de uma pensão.

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Por outro lado, muitos pensionistas, quando são forçados a deixar o trabalho pensam no

que podem fazer para substituir o trabalho, e em todos os benefícios sociais e psicológicos

que a ele estão associados, como também as amizades, um sítio para ir todos os dias e a sua

própria identidade pessoal. Isto nem sempre é o caso dos indivíduos portadores deficiência

mental que atingem a idade de reforma (Janicki, 1997: 112).

A mudança de estilo de vida, nestas situações, é associada à falha em adquirir alternativas

associadas à idade avançada. Pois as alternativas disponíveis podem não compensar a

perca dos benefícios financeiros e sociais (Janicki, 1997: 112).

Por outro lado, no que diz respeito à etapa da reforma nas pessoas com deficiência mental

que fizeram um percurso pela vida activa, em que estiveram parte da sua vida integrados

em centros de emprego protegidos ou mesmo no mercado normal de trabalho, cada caso

terá sempre de ser avaliado individualmente nas seguintes dimensões: o estado de saúde

física e psicológica; o enquadramento sócio-familiar; o suporte habitacional e os recursos

económicos; a capacidade de autonomia e de auto-determinação; a capacidade de inserção

social e de ocupação em actividades de lazer e tempos livres (António, 2003: 205).

2.5 - Envelhecimento das Famílias

Não é tão remoto assim o tempo em que grande parte da população se dedicava à

agricultura ou ao artesanato; a pessoa nascia numa família, trabalhava na propriedade ou

oficina da família e, conforme ia envelhecendo as actividades iam sendo adaptadas para

que o idoso se mantivesse uma ajuda útil dentro do grupo familiar. Dentro desta teia

relacional, o idoso terminava os seus dias num ambiente de segurança e confiança,

mantendo uma segurança estável e desproblematizada. “Mas eis que a vida moderna vem

romper com o passado, fazendo imperar um paradigma da racionalidade que quebra a

unidade tradicional e a deixa sem respostas para as questões existenciais, fazendo emergir

uma ansiedade ladeada pela liberdade humana.” (Quaresma, 1999: 105)

Na sequência das transformações económicas, sociais e culturais que estão também

subjacentes ao processo de envelhecimento das nossas sociedades, fez com que a família

tenha mudado. Essas transformações, interagiram nas estruturas demográficas e sócio-

familiares bem como na constituição do próprio tecido social, e estão na base das

mudanças aceleradas ao nível das formas e tipos de família, das relações entre a família e a

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sociedade, bem como da concepção e repartição dos papéis e funções dos diferentes

membros da família. A nuclearização da família, a actividade profissional da mulher e o

trabalho profissional como eixo da organização familiar, são sinais das mudanças em

curso, sendo também significativos do sentido das mesmas, (Quaresma, 1999: 105).

Actualmente a definição de família remete-nos para um modelo característico das

sociedades industriais – família nuclear, conjugal e monoparental, que se baseia na

separação física e económica.

Como consequência das referidas alterações da estrutura familiar surge o fenómeno da

desfamiliarização. Que segundo Remi Lenoir (1985 in Fernandes, 1997: 61) caracteriza

como sendo um processo de desmoronamento das bases sociais em que assenta o

“familismo” tradicional resultando em parte, do declínio das categorias em que a família

era fundada. Ou seja, em torno de um património que é simultaneamente um meio de

produção e existência material e simbólica de grupo. A população idosa devido ao seu

estado de saúde mais vulnerável, é afectada ao nível da sua independência. Tornando-se

importante a existência de uma estrutura familiar que faculte alguma assistência o que,

devido ao fenómeno da desfamiliarização, é muitas vezes afectada e consequentemente

diminuída na sua eficiência e alcance.

O risco não se encontra, apenas, na maneira como as pessoas decidem organizar as suas

famílias. O risco é o de se registarem recuos nos apoios e serviços que permitam às

famílias combinar esforços com o Estado, a Sociedade Civil e as Empresas, para fazer com

que os seus membros mais vulneráveis aprendam a deixar de sê-lo (Capucha, 2003/4: 21).

Tal sucede ainda, pela excessiva subordinação às exigências do mercado de trabalho, que

diminuem muitos direitos de cidadania como sejam o da assistência ao idoso.

A família é um espaço privilegiado para o contacto entre gerações. Nela, os idosos deverão

sentir-se apoiados, mesmo quando de todo não seja possível partilharem o mesmo tecto. Os

laços afectivos são muito mais importantes do que a partilha do espaço físico. Porém,

verifica-se que a família assegura, ainda, aos idosos a prestação de cuidados informais

adequados à satisfação das suas necessidades, mesmo que em muitos casos o faça com

dificuldades de vária ordem e com maior ou menor grau de eficácia. Esta situação exige ser

sustentada por serviços médico-sociais e de formação adequada às necessidades dos

idosos, de forma a completar eficazmente as capacidades das famílias (Quaresma, 1999).

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Para além das mudanças na estrutura familiar, ocorreram também mudanças a outros

níveis, designadamente mudanças resultantes das alterações demográficas, dos

movimentos migratórios, que devido à distância física e cultural que se criou levou à

existência de percursos de vida diferentes entre gerações, cavando-se assim um fosso

geracional. Segundo Quaresma (1999), “estes fenómenos interagindo sobre os modos de

vida das famílias, repercutem-se ao nível do sistema de relações e de apoios inter

familiares, bem como da dimensão e estrutura do núcleo familiar que o coabita, com

consequente aumento do número de pessoas idosas, designadamente as mulheres muito

idosas.” (Quaresma, 1999: 104)

No que se refere, aos indivíduos adultos portadores de deficiência mental, Janicki (1997)

explica que “older adults with mental retardation generally do not have children or a

spouse on whom they can depend for aid and support”13 (Janicki, 1997: 111). Em alguns

casos, vivem com os pais, também já com idade avançada que continuam a cuidar dos

apoios e suportes necessários do seu dia-a-dia, sendo esta situação considerada como “duas

gerações de idosos”. Contudo, devido ao avançar da idade, esta situação deteorizada pode

levar a várias preocupações relativamente ao bem-estar de ambos, principalmente quando é

da responsabilidade do familiar, já envelhecido, cuidar do seu filho portador de deficiência

mental, durante seu processo de envelhecimento. No entanto, ainda pode surgir a situação

de que é outro filho não deficiente que com o envelhecer dos próprios pais fica responsável

quer por estes quer pelo irmão. Na inexistência de familiares próximos, também pode ser o

próprio adulto com deficiência mental o cuidador dos seus pais envelhecidos. Isto coloca

um dilema: Será que o adulto deficiente mental, com essa responsabilidade como cuidador

sentirá a necessita de ser independente, e talvez adoptar um novo estilo de vida? (Janicki,

1997: 111)

Consequentemente, outro dos grandes problemas que as pessoas com deficiência mental se

deparam, é o envelhecimento e a morte dos seus pais. Esta é por sua vez um destino da

vida, nem sempre fácil de assimilar, verificando-se nestas famílias que habitualmente a

ideia de preparação do futuro é evitada ou não tem prioridade face às exigências do dia-a-

13 Tradução: “(...) frequentemente não têm filhos ou esposa de que possam depender mais tarde para cuidados e suporte.” Esta situação que cada vez mais se vai alterando com a defesa dos direitos dos deficientes mentais relativamente à sua sexualidade.”

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dia (Dowling & Hollins, 2003 in António, 2003: 187). Geralmente não dizem à pessoa com

deficiência mental que alguém morreu, por vezes uma realidade alternativa é inventada

para esconder a verdade da morte. Da mesma forma, não comparecem, na sua maioria, em

funerais, sendo tratados à semelhança das crianças (Fernandes, 2003: 14).

As consideráveis mudanças culturais e sociais do séc. XX, contribuíram para a dissipação

dos tabus que rodeiam a ideia de morte e finitude humana. É agora altura, de favorecer a

importância da vivência do processo de luto e de todos os rituais associados, nas pessoas

portadoras de deficiência mental (Dowling & Hollins, 2003 in António, 2003: 191).

Sem um planeamento do futuro, quer os indivíduos portadores de deficiência mental, quer

os seus pais e familiares, também já envelhecidos tendem a olhar para o futuro com receio

e ameaça (Dowling & Hollins, 2003 in António, 2003: 187). Sendo assim fundamental, a

elaboração de planos para uma vida mais autónoma e independente, perante a inevitável

morte da sua família.

2.6 – Interdição e atribuição de Tutor

A globalização, é feita por todos nós. Todos nós que vivemos estes tempos de mudança

constante, em que se avança a uma velocidade desigual, lutando para tornar igual o que é

naturalmente diferente.

Promover a inclusão social das pessoas com deficiência, é sem dúvida um dos grandes

objectivos que tem acompanhado o trajecto das Instituições em Portugal. Desta forma, só

teremos uma sociedade mais solidária, quando todos os cidadãos com deficiência tiverem

lugar à participação plena do exercício dos seus direitos e dos seus deveres, ou seja, ao

exercício pleno de cidadania.

Rodrigues (2004: 7), refere que nesta perspectiva é importante lançar o debate a todos os

pais, técnicos e familiares de modo geral, o tema dos regimes Tutelares – Interdição ou

Inabilitação, como forma de salvaguardar dos direitos e defesa dos interesses dos jovens

/adultos com deficiência.

A legislação portuguesa protege as pessoas portadoras de deficiência através de inúmeros

Decretos Lei (DL). Desta forma os Regimes da Interdição e Inabilitação da Tutela

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(Código Civil: artigos 138º e ss, artigos 1927º e ss e Código de Processo Civil: artigos 944º

e ss) definem que: “a interdição consiste na coarctação do exercício de direitos de

determinadas pessoas que demonstrem incapacidade para poder governar a sua pessoa e

os seus bens enquanto que a inabilitação traduz-se apenas na incapacidade de uma pessoa

reger o seu património, podendo ser interditos todas as pessoas que possuam uma

anomalia psíquica, surdez-mudez ou cegueira.”

Quando se atinge a maioridade, com todos os direitos, deveres e obrigações a que estão

implicados todos os indivíduos, independentemente de serem ou não portadores de

deficiência mental, terão sempre que ser responsabilizados pelos seus actos (art.º 130º do

Código Civil). Desta forma, qualquer acto ilícito e/ou punível por lei, será imputável à

pessoa deficiente, caso não tenha sido dado encaminhamento aos referidos processos de

Interdição ou Inabilitação.

Procede-se à Interdição da pessoa em caso de deficiência mental profunda/grave, a fim de

prevenir que, após a ausência do suporte familiar (idade avançada, morte dos progenitores,

etc.) esteja assegurado um Tutor e um Conselho de Família. Contudo, não é aconselhável a

Interdição em casos de deficiência mental ligeira e/ou com capacidade para o trabalho (em

meio normal ou protegido), na medida em que inviabiliza a celebração de contrato de

trabalho, indo contra a filosofia da auto-representação. Os factos que fundamentam a

interdição, caracterizam-se pela actualidade, incapacitação natural e permanência. Podem

ser declarados interditos do exercício dos seus direitos, todos aqueles que se mostrem

incapazes de governar a sua pessoa e bens. (SNRPD: 2002)

A pessoa Interdita, não pode casar, perfilhar, fazer testamento, está inibido do poder

paternal, não pode ser tutor ou vogal, nem administrador de bens. Depois da sentença, os

negócios jurídicos celebrados são sempre anulados.

É aconselhável a inabilitação, nos casos de deficiência mental não muito grave, mas que

impossibilite a gestão do património, isto é, em pessoas com autonomia própria mas que

não sejam capazes de gerir o seu dinheiro e os seus bens. (SNRPD: 2002)

Na interdição, o Conselho de Família deverá ser composto por três elementos, um Tutor,

um Protutor e um Vogal. Estes cargos poderão ser ocupados pelos pais, irmãos, familiares,

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amigos, ou outras pessoas idóneas que possam assumir a responsabilidade de zelar pelos

interesses e salvaguarda dos direitos de um cidadão portador de deficiência.

O Tutor , será a pessoa de referência, tendo como função cuidar do bem-estar, saúde,

educação do interdito, assumindo os direitos e obrigações dos pais. No entanto, só pode

utilizar os rendimentos do interdito no sustento da educação/reabilitação do mesmo, bem

como na administração dos seus bens, isto é, sempre em prol da pessoa deficiente. O

Curador , assiste ao inabilitado na administração do seu património. (SNRPD: 2002)

Deverá a família tomar a responsabilidade de dar início a este processo.

O papel dos técnicos / instituições consiste em informar, divulgar e acompanhar as famílias

durante todo o processo, através de documentação, apoio social, psicológico e jurídico;

potencializar a capacidade das famílias, através da sua participação activa e criar grupos de

Auto-Ajuda. (Rodrigues, 2004: 11).

É neste contexto que urge perspectivar algumas mudanças e reformulações, como por

exemplo, na própria lei aqui apresentada, pelo facto de esta se basear quase exclusivamente

em aspectos patrimoniais e sucessórios, revelando-se inadequada e desajustada à realidade

das pessoas com deficiência e suas famílias. Seria pois fundamental, simplificar o processo

legal, flexibilizar os mecanismos e a respectiva celeridade no decurso da acção. Não menos

importante, e à luz daquilo que é já realizado noutros países da Europa, seria também

benéfico a criação de Fundações Tutelares, com o apoio de tutores profissionais e um

investimento na qualificação dos representantes legais.

A necessidade do debate e reflexão dos profissionais, famílias, organizações e sociedade

civil em geral, acerca deste tema, torna-se pertinente, num momento em que planear,

perspectivar e assegurar o futuro das pessoas com deficiência é uma prioridade, para a

inclusão plena das pessoas com deficiência, naquilo a que se chama hoje, sociedade

moderna (Rodrigues, 2004).

3 - RESPOSTAS SOCIAIS PARA O INDIVÍDUO PORTADOR DE DEFICIÊNCIA

MENTAL EM PROCESSO DE ENVELHECIMENTO

As transformações verificadas na sociedade, especialmente de índole demográfica e

familiar, com o progressivo envelhecimento da população, a diversidade interna desse

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envelhecimento, o aumento da esperança média de vida, os indicadores referentes à

exclusão social, as mudanças na estrutura e nos modelos de família e a extensão crescente

dos direitos de cidadania, tornaram imperativa a concepção de novas formas de

intervenção e o ajustamento das respostas sociais já existentes, de modo a que privilegiem

a flexibilidade necessária para atender à mutação constante e à crescente complexidade da

realidade social (Chichorro et al, 2006: 5).

Neste sentido, o debate gerado em torno do envelhecimento e das respostas sociais de

apoio aos cidadãos idosos, tem adquirido nos últimos anos e particularmente nas

sociedades ocidentais crescente actualidade e relevância. A notoriedade desta questão,

encontra-se na centralidade que o tema tem tido no discurso político e social e na

proliferação de iniciativas mais ou menos visíveis e mediáticas que têm como preocupação

central questões ligadas à velhice e ao apoio social. (Martins14, 2005: 128)

Decorrente do processo de legitimação do problema social da velhice, agora também

extenso às pessoas com deficiência, constitui-se um campo de produção e gestão de bens

especificamente orientados para estes grupos-alvo e que tendem a generalizar-se e a

oferecer produtos diversificados. (Martins, 2005: 127)

A forma como a sociedade encara a pessoa com deficiência tem variado no tempo e, hoje o

princípio da igualdade de oportunidades é um princípio essencial da política social relativa

às pessoas com deficiência (Pereira, 2003/04: 29). Dentro do quadro normativo da

Reabilitação, com base na Lei 38/2004, o princípio da igualdade de oportunidades

pressupõe o respeito pelo princípio da singularidade de cada caso e das medidas

especificamente a ela apropriadas (DGEEP/MTSS, 2006: 17).

Dentro deste princípio poder-se-á contemplar a nova realidade do envelhecimento das

pessoas com deficiência mental, sendo que esta problemática pode vir a exigir novas

respostas e medidas específicas.

No âmbito da segurança social, a organização das respostas sociais dirigidas às pessoas

com deficiência e suas famílias foram absorvendo as transformações da sociedade, sendo

que à medida que o paradigma da deficiência se foi alterando a intervenção junto da pessoa

com deficiência foi ganhando novas dimensões. Por um lado, de uma perspectiva médica,

14 Professora Coordenadora da Escola Superior de Saúde do Instituto Superior Politécnico de Viseu

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centrada em preocupações clínicas evolui para uma abordagem social, iniciada com o

regresso à comunidade, a procura de respostas no ambiente natural e o progressivo

reconhecimento dos seus direitos, sobretudo o direito à diferença. (Pereira, 2003/04: 29)

No caso das respostas sociais na área da reabilitação e integração das pessoas com

deficiência em Portugal, existem domínios de intervenção institucional cuja visibilidade é

menor do que a importância efectiva que possuem. (DGEEP/MTSS, 2006: 1)

Uma das metas do Plano Nacional de Acção para a Inclusão, refere a importância de uma

rede de serviços a nível nacional que contemple todas as áreas de intervenção que as

pessoas com deficiência carecem, incluindo a criação de uma rede de centros de apoio a

pessoas com deficiência, para responder às necessidades de informação, encaminhamento e

acompanhamento das pessoas com deficiência, nas áreas da saúde, educação, segurança

social, emprego, habitação, transportes tempos livros e outros sectores de administração

pública. (DGEEP/MTSS, 2006: 17)

A intervenção da segurança social acompanha todas as fases do ciclo de vida das pessoas

com deficiência e suas famílias, embora com maior incidência no apoio e

acompanhamento durante a idade adulta. (Pereira, 2003/04: 30)

No âmbito do Sistema da Acção Social gerido pelo Instituto da Segurança Social, o

exercício do apoio social pode ser desenvolvido por serviços e equipamentos sociais de

apoio às pessoas e às famílias, envolvendo a participação de diferentes entidades,

nomeadamente, os estabelecimentos integrados, as Instituições Particulares de

Solidariedade Social (IPSS) e outras instituições públicas ou privadas. (Claro, 2006: 6)

O incentivo à expansão e qualificação da rede de serviços e equipamentos sociais, dirigidos

aos diversos grupos de população, é uma das vertentes onde a Acção Social tem tido maior

intervenção. Apostando-se na diversidade, a ênfase tem sido colocada no reforço do papel

da família, na conciliação do trabalho familiar com a vida profissional, no

desenvolvimento do apoio domiciliário, na dinamização de estruturas de convívio e de

combate ao isolamento e insegurança e numa maior e melhor prevenção e cobertura das

situações de dependência. (Chichorro et al, 2006: 5)

Outra das dimensões essenciais relaciona-se com a multiplicidade de actores que intervêm

no apoio prestado aos indivíduos e famílias. Nesta perspectiva tem confluído a acção de

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vários organismos públicos, privados e da sociedade civil, contribuindo para a concertação

da acção social, numa lógica de parceria, complementaridade e participação, contribuindo

para o mainstreaming da Inclusão Social. (Chichorro et al, 2006: 6).

A Carta Social (2007)15 faz a caracterização geral da rede de serviços e equipamentos,

com base nas entidades proprietárias dos equipamentos, nos próprios equipamentos,

segundo a sua natureza jurídica e ainda com base nas respostas sociais por área de

intervenção. As entidades proprietárias podem ser entidades lucrativas ou não lucrativas.

As entidades não lucrativas compreendem as Instituições Particulares de Solidariedade

Social, Fundações de Solidariedade Social, Centros Sociais e Paroquiais, Irmandades das

Misericórdias, Cooperativas de Solidariedade Social, Organizações Particulares de

Solidariedade Social, Santa Casa da Misericórdia, Entidades Públicas a nível central e

local, entre outras (GEP/MTSS, 2007: 10). Por equipamento social entende-se: “toda a

estrutura física onde se desenvolvem as diferentes respostas sociais ou estão instalados os

serviços de enquadramento a determinadas respostas junto dos utentes”. (GEP/MTSS,

2007: 11)

Desta forma, o documento “Nomenclaturas / Conceitos - Respostas Sociais” (Chichorro et

al, 2006), apresenta uma descrição das respostas sociais existentes por área de intervenção.

Por não ser contemplada especificamente a problemática do envelhecimento do indivíduo

portador de Deficiência Mental, debruçamo-nos sobre as respostas destinadas à população

idosa e à população com deficiência em separado. Contudo, é de salientar que existem

determinadas respostas que se destinam a ambas áreas de intervenção.

3.1 - Respostas sociais para pessoas idosas

Serviço De Apoio Domiciliário (SAD)16 - Resposta social, desenvolvida a partir de um

equipamento, que consiste na prestação de cuidados individualizados e personalizados no

domicílio a indivíduos e famílias quando, por motivo de doença, deficiência ou outro

impedimento, não possam assegurar temporária ou permanentemente, a satisfação das

necessidades básicas e/ou as actividades da vida diária. Os Destinatários são

15 GEP/MTSS (2007). Rede de Serviços e Equipamentos Sociais – relatório 2006 16 Decreto-Lei n.º141/89, de 28 de Abril; Despacho Normativo n.º 62/99, de 12 de Novembro, Guião Técnico aprovado por despacho do SEIS de 29/11/1996. Obs.: Resposta comum à prevista para a população adulta com deficiência.

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prioritariamente indivíduos e famílias, pessoas idosas, pessoas com deficiência, pessoas em

situação de dependência. Tem como objectivos: contribuir para a melhoria da qualidade de

vida dos indivíduos e famílias; garantir a prestação de cuidados de ordem física e apoio

psicossocial aos utentes e famílias, de modo a contribuir para seu equilíbrio e bem-estar;

apoiar os indivíduos e famílias na satisfação das necessidades e actividades da vida diária;

criar condições que permitam preservar e incentivar as relações inter-familiares; colaborar

e/ou assegurar o acesso à prestação de cuidados de saúde; Contribuir para retardar ou evitar

a institucionalização; Prevenir situações de dependência e promover a autonomia.

(Chichorro et al, 2006: 33)

Centro de Convívio - Resposta social, desenvolvida em equipamento, de apoio a

actividades sócio-recreativas e culturais, organizadas e dinamizadas com participação

activa das pessoas idosas de uma comunidade. Os Destinatários deste serviço são Pessoas

residentes numa determinada comunidade, prioritariamente com 65 e mais anos. Tem

como objectivos: prevenir a solidão e a exclusão social; contribuir para a estabilização ou

retardamento das consequências nefastas do envelhecimento; incentivar a participação e

potenciar a inclusão social; fomentar as relações interpessoais e intergeracionais; contribuir

para retardar ou evitar a institucionalização e prevenir situações de dependência e

promover a autonomia. (Chichorro et al, 2006: 34)

Centro de Dia17 - Resposta social, desenvolvida em equipamento, que consiste na

prestação de um conjunto de serviços que contribuem para a manutenção das pessoas

idosas no seu meio sócio-familiar. Os Destinatários são pessoas que necessitem dos

serviços prestados pelo Centro de Dia, prioritariamente pessoas com 65 e mais anos. Tem

como objectivos: proporcionar serviços adequados à satisfação das necessidades dos

utentes; contribuir para a estabilização ou retardamento das consequências nefastas do

envelhecimento; prestar apoio psicossocial; fomentar relações interpessoais e

intergeracionais e potenciar a inclusão social; favorecer a permanência da pessoa idosa no

seu meio habitual de vida; contribuir para retardar ou evitar a institucionalização; prevenir

situações de dependência e promover a autonomia. (Chichorro et al, 2006: 35)

17 Guião Técnico aprovado por Despacho do SEIS em 29/11/1996, Despacho do MESS de 03/08/1993.

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Centro de Noite18 - Resposta social, desenvolvida em equipamento, que tem por

finalidade o acolhimento nocturno, prioritariamente para pessoas idosas com autonomia

que, por vivenciarem situações de solidão, isolamento ou insegurança necessitam de

suporte de acompanhamento durante a noite. Os Destinatários deste serviço são

prioritariamente pessoas de 65 e mais anos com autonomia ou, em condições excepcionais,

com idade inferior, a considerar caso a caso. Tem como objectivos: acolher durante a noite,

pessoas idosas com autonomia; assegurar bem-estar e segurança; favorecer a permanência

no seu meio habitual de vida; evitar ou retardar a institucionalização. (Chichorro et al,

2006: 36)

Acolhimento Familiar para Pessoas Idosas19 - Resposta social que consiste em integrar,

temporária ou permanentemente, em famílias consideradas idóneas, pessoas idosas quando,

por ausência ou falta de condições de familiares e / ou inexistência ou insuficiência de

respostas sociais, não possam permanecer no seu domicílio. Os Destinatários deste serviço

são pessoas com 65 e mais anos. Tem como objectivos: acolher pessoas idosas (no máximo

de três), que se encontrem em situação de dependência ou de perda de autonomia, vivam

isoladas e sem apoio de natureza sócio-familiar e/ou em situação de insegurança; garantir à

pessoa acolhida um ambiente sócio-familiar e afectivo propício à satisfação das suas

necessidades e ao respeito pela sua identidade, personalidade e privacidade; evitar ou

retardar o recurso à institucionalização. (Chichorro et al, 2006: 37)

Residência - Resposta social, desenvolvida em equipamento, constituída por um conjunto

de apartamentos com espaços e/ou serviços de utilização comum, para pessoas idosas, ou

outras, com autonomia total ou parcial. Os Destinatários são pessoas de 65 e mais anos ou

de idade inferior em condições excepcionais, a considerar caso a caso. Tem como

objectivos: proporcionar alojamento (temporário ou permanente); garantir à pessoa idosa

uma vida confortável e um ambiente calmo e humanizado; proporcionar serviços

adequados à problemática biopsicossocial das pessoas idosas; contribuir para a

estabilização ou retardamento das consequências nefastas do envelhecimento; criar

condições que permitam preservar e incentivar a relação inter-familiar. (Chichorro et al,

2006: 38)

18 Orientação Técnica, Circular n.º12, de 25.06.2004 - Guião técnico, aprovado por Despacho de 19 de Maio de 2004 do Ministro da Segurança Social e do Trabalho. 19 Decreto-Lei n.º 391/91, de 10 de Outubro; Despacho Conjunto n.º 727/99, de 23 de Agosto; Despacho 15 032/2004, de 27 de Julho Obs.: Resposta comum à prevista para a população adulta com deficiência.

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Lar de Idosos20 - Resposta social, desenvolvida em equipamento, destinada a alojamento

colectivo, de utilização temporária ou permanente, para pessoas idosas ou outras em

situação de maior risco de perda de independência e/ou de autonomia. Os Destinatários

deste serviço são pessoas de 65 e mais anos ou de idade inferior em condições

excepcionais, a considerar caso a caso. Tem como objectivos: Acolher pessoas idosas, ou

outras, cuja situação social, familiar, económica e /ou de saúde, não lhes permite

permanecer no seu meio habitual de vida; assegurar a prestação dos cuidados adequados à

satisfação das necessidades, tendo em vista a manutenção da autonomia e independência;

proporcionar alojamento temporário, como forma de apoio à família; criar condições que

permitam preservar e incentivar a relação inter-familiar; potenciar a inclusão social;

encaminhar e acompanhar as pessoas idosas para soluções adequadas à sua situação.

(Chichorro et al, 2006: 39)

3.2- Respostas Sociais para pessoas adultas portadoras de deficiência

Centro de Atendimento/Acompanhamento e Animação para Pessoas com Deficiência

- Resposta social, desenvolvida em equipamento, organizada em espaço polivalente,

destinado a informar, orientar e apoiar as pessoas com deficiência, promovendo o

desenvolvimento das competências necessárias à resolução dos seus próprios problemas,

bem como actividades de animação sócio-cultural. Os Destinatários são pessoas com

deficiência e famílias. Tem como objectivos: informar, apoiar e orientar as pessoas com

deficiência e suas famílias na resolução dos seus problemas; contribuir para que seja

reconhecido às pessoas com deficiência o direito à participação no processo de tomada de

decisões; promover o convívio entre as pessoas através de actividades sócio-culturais,

recreativas e de lazer, a fim de reforçar a auto-estima e a motivação, favorecendo a

inclusão social; informar/sensibilizar a comunidade em geral para as problemáticas da

deficiência, promovendo uma mudança de atitude. (Chichorro et al, 2006: 41)

Centro de Actividades Ocupacionais (CAO)21 - Resposta social, desenvolvida em

equipamento, destinada a desenvolver actividades para jovens e adultos com deficiência 20 Despacho Normativo n.º 12/98, de 25 de Fevereiro; Despacho n.º 9400/2001 do SESSS, de 11 Abril de 2001; Despacho n.º 7837/2002, de 16 de Abril; Despacho do MESS de 03/08/1993, Guião Técnico aprovado por Despacho do SEIS em 29/11/1996; Orientação Técnica, Circular n.º11, de 24.06.2004. 21 Decreto-Lei n.º 18/89, de 11 de Janeiro e Despacho n.º 52/SESS/90, de 16 de Julho.

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grave. Os Destinatários deste serviço são pessoas com deficiência grave, com idade igual

ou superior a 16 anos, cujas capacidades não permitam, temporária ou permanentemente, o

exercício de uma actividade produtiva; pessoas com deficiência cuja situação não se

enquadre no âmbito do regime de emprego protegido, nos termos da respectiva legislação e

careçam de apoios específicos. Tem como objectivos: estimular e facilitar o

desenvolvimento das capacidades; promover estratégias de reforço de auto-estima e de

autonomia pessoal e social; privilegiar a inter-acção com a família e com a comunidade, no

sentido da integração social das pessoas com deficiência; promover o encaminhamento,

sempre que possível, para programas adequados de integração sócio-profissional

(Chichorro et al, 2006: 43). Os CAO, destinam-se a promover a ocupação das pessoas com

deficiência mental em uma fase da vida paralela e equiparada ao que representa para as

pessoas ditas normais o período em que se encontram em actividade produtiva.

Acolhimento Familiar para Pessoas Adultas com Deficiência22 - Resposta social, que

consiste em integrar, temporária ou permanentemente, em famílias consideradas idóneas,

pessoas com deficiência, a partir da idade adulta. Os Destinatários deste serviço são

pessoas com deficiência, a partir da idade adulta, em situação de dependência e sem apoio

sócio-familiar. Tem como objectivos: acolher pessoas com deficiência; garantir à pessoa

acolhida um ambiente sócio-familiar e afectivo propício à satisfação das suas necessidades

básicas e ao respeito pela sua identidade, personalidade e privacidade; facilitar a interacção

com a comunidade, no sentido da integração social das pessoas com deficiência; promover

estratégias de reforço de auto-estima e de autonomia pessoal e social; evitar ou retardar a

institucionalização.

Lar Residencial - Resposta social, desenvolvida em equipamento, destinada a alojar

jovens e adultos com deficiência, que se encontrem impedidos temporária ou

definitivamente de residir no seu meio familiar. Os Destinatários deste serviço são pessoas

com deficiência com idade igual ou superior a 16 anos; pessoas com deficiência, com

idades inferiores a 16 anos cuja situação sócio-familiar o aconselhe e se tenham esgotado

as possibilidades de encaminhamento para outras respostas sociais mais adequadas. Tem

como objectivos: disponibilizar apoio residencial permanente ou temporário a jovens e

22 Decreto-Lei n.º 391/91, de 10 de Outubro; Despacho Conjunto n.º 727/99, de 23 de Agosto – Estabelece as condições de formação para as famílias de acolhimento para pessoas idosas e adultas com deficiência. Obs.: Resposta comum à prevista para as pessoas idosas.

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adultos com deficiência; garantir condições de bem-estar e qualidade de vida ajustadas às

necessidades dos utentes; promover estratégias de reforço da auto-estima, autonomia

pessoal e social dos utentes; privilegiar a interacção com a família e com a comunidade, no

sentido da integração social dos utentes. (Chichorro et al, 2006: 45)

Transporte de Pessoas com Deficiência - Resposta social, desenvolvida através de um

serviço, de natureza colectiva de apoio a crianças, jovens e adultos com deficiência, que

assegura o transporte e acompanhamento personalizado. Os Destinatários deste serviço são

crianças, jovens e adultos com deficiência. Tem como objectivos: facilitar a mobilidade em

ordem à prossecução dos objectivos gerais de reabilitação e integração da pessoa com

deficiência.

O conjunto de serviços e equipamentos que cada sociedade oferece aos seus idosos, tem

como objectivo melhorar as condições de vida. (Martins, 2005: 137)

Relativamente à distribuição espacial das respostas sociais, esta não é uniforme por todo o

território continental, acompanha geralmente a densidade populacional de cada área

geográfica. Em 2006, cerca de metade da totalidade das respostas sociais (46,4%) elegem

como público-alvo a população idosa, facto que por si só reflecte o significativo peso desta

área no investimento social. As repostas dirigidas à Reabilitação e Integração de Pessoas

com Deficiência também apresentam um grande ritmo de crescimento (43,4%)

(GEP/MTSS, 2007: 15).

Como se pode verificar, apenas o Serviço de Apoio Domiciliário e o Acolhimento Familiar

são as respostas sociais previstas para ambas as problemáticas, da pessoa idosa e da pessoa

com deficiência.

As sociedades Europeias e o nosso País em particular, perante o aparecimento deste novo

desafio na área social, devem implementar respostas concretas e inovadoras, com vista à

eliminação da discriminação contra as pessoas com deficiência, à promoção da igualdade

de oportunidades e à melhoria da qualidade de vida. (Rosa, 2005: 8)

Com o aumento da esperança média de vida das pessoas portadoras de deficiência mental,

as instituições destinadas a acompanhar esta população, tendem a investir neste tipo de

respostas para responder às necessidades dos seus utentes que iniciam o seu processo de

envelhecimento. A promoção de bem-estar no processo de envelhecimento do indivíduo

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portador de deficiência mental é uma tarefa da responsabilidade de todos os que estão à sua

volta, partindo da responsabilidade da instituição que muitas vezes conhecem desde a

infância e que se faz representar pela sua equipa técnica, ao apoio familiar e à política

social instituída.

3.3 - Necessidades específicas de Respostas Sociais para o Envelhecimento do

Indivíduo portador de Deficiência Mental

Consideram-se organizações prestadoras de Serviços Sociais, todas as entidades públicas

e/ou privadas, lucrativas ou não lucrativas, que desenvolvem ou prestam serviços aos

cidadãos para resolver os problemas sociais e dar resposta às necessidades tanto

individuais como colectivas. A sua função social é dirigida à melhoria das condições de

vida e ao desenvolvimento de potencialidades individuais, de grupo e colectivas que

possibilitem o pleno desenvolvimento humano e reduzam as desigualdades (Sánchez &

Bellido, 2002: 74).

“Los Servicios Sociales, en definitiva se trata de satisfacer lo que reside de más

permanente en el ser humano” 23 (Resa, 2002: 108). A mesma autora adverte para a

necessária sensibilidade que se tem que exercitar nos Serviços Sociais para não violentar

os sentimentos mais profundos dos “usuários”24.

O modo mais convencional de se medir a satisfação dos usuários, consiste em relacionar as

necessidades dos mesmos com os níveis de satisfação conseguidos em função dos meios

utilizados. As necessidades movem a acção. Os serviços em alguns casos, podem satisfazer

plenamente algumas das necessidades dos usuários, noutros casos tem que se criar metas

para a sua resolução, isto porque existem vários tipos de necessidades, que vão desde as

mais elementares, como as fisiológicas (fome, sede), as que garantem a sobrevivência dos

usuários (pensões alimentares), às mais sofisticadas de auto-realização ou de valorização.

(Resa, 2002: 108)

A satisfação das necessidades por parte dos serviços sociais, é o que permite falar de níveis

de satisfação. São os usuários como «consumidores» de serviços os que estarão mais

motivados para se aproximar deles.

23 “Os serviços Sociais, em definitivo, tratam de satisfazer o que reside de mais permanente no ser humano.” 24 Usuário provém do latin “usus” que significa usar, fazer uso de, servir-se de, utilizar

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Uma das análises mais conhecidas de necessidades humanas é o modelo psicológico de

Abraham Maslow, que partindo da base e chegando ao topo identifica desde as

necessidades mais elementares até às mais complexas: (Resa, 2002: 109)

1- Necessidades fisiológicas (relacionadas com a sobrevivência da pessoa, como

fome e sede)

2- Necessidades de Segurança e Protecção (relacionadas com a protecção física

das pessoas, saúde e segurança)

3- Necessidades Sociais (sentir-se amado por familiares e amigos, sentido de

pertença e amor...)

4- Necessidades de estimação (como sentir-se valorizado e estimado por os outro,

reconhecimento, estatuto, prestigio)

5- Necessidades de auto-realização e desenvolvimento pessoal (chegar a realizar o

conjunto de valores com que cada sujeito se identifica e tem como referência)

Na análise das necessidades humanas Potyara Pereira (2002) classifica as necessidades

humanas básicas como aquelas cuja natureza mais profunda é a universalidade e

objectividade, o que significa dizer que todos os seres humanos, em todos os lugares e em

todas as culturas, têm necessidades básicas comuns. Logo, ao não serem satisfeitas, geram

sérios prejuízos à vida das pessoas. Sérios prejuízos são impactos negativos cruciais que

impedem ou põe em sério risco a possibilidade objectiva dos seres humanos de viver, física

e socialmente, em condições de poder expressar a sua capacidade de participação activa e

crítica (Pereira, 2002: 69).

As necessidades mostram duas faces, nomeadamente uma como carência e privação e

outra de complemento, não obstante têm um complemento de satisfação contextual, sócio-

cultural e histórico.

As necessidades de respostas sociais que têm as pessoas adultas portadoras de deficiência

mental são, em muitos aspectos, similares aos das outras pessoas adultas. Os idosos têm

muitas necessidades que não são específicas da sua idade, tais como as referidas

anteriormente e todos os elementos físicos e sociais que contribuem para a manutenção do

bem-estar e de uma boa qualidade de vida. Alguns estudos mostram que existem

necessidades de serviços comuns entre a população portadora de deficiência mental em

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processo de envelhecimento e a população sem deficiência, contudo há provas empíricas

que demonstram que as pessoas portadoras de deficiência mental em certas condições

envelhecem mais cedo. Assim o desenho dos serviços deve ter em conta que algumas

pessoas adultas com deficiência mental começam a mostrar sinais de envelhecimento 10

anos antes da população em geral. (Janicki, 1987: 64)

Há algumas necessidades especiais próprias da população portadora de deficiência mental

com idade avançada. Por exemplo, muitas pessoas vivem com a sua família e parentes, e à

medida que os pais e os tutores vão envelhecendo, converter-se-ão numa família de duas

gerações de idosos, e a capacidade para manter o membro com deficiência mental no seu

lugar familiar, diminuirá potencialmente; muitas pessoas vivem em ambientes de grande

atenção colectiva, à medida que envelhecem em casa desenvolvem condições médicas

crónicas ou problemas funcionais que exigirão serviços de apoio a longo prazo; muitas

destas pessoas, mais frágeis, permanecem em instituições para pessoas com deficiência

mental e em hospitais e ao envelhecerem necessitam de mais serviços médicos e de

enfermagem, não só pelos problemas físicos associados à sua incapacidade, mas também

pelos problemas derivados do envelhecimento (Janicki, 1987: 66).

Segundo Calenti et al (2002: 161), as pessoas portadoras de deficiência mental que

envelhecem, irão ver aumentadas as suas necessidades devido à incapacidade que

possuem. Ao chegar a esta etapa do ciclo vital este grupo apresenta as seguintes

necessidades:

- Necessidades Familiares: As pessoas portadoras de deficiência mental, vivem a sua

maior parte do tempo no domicílio familiar. É a família e em concreto os pais,

encarregados de cobrir as suas necessidades vitais e de lhes dar apoio ao longo da sua vida.

A maioria pergunta-se: O que é que vai acontecer quando nós não estivermos cá? Esta

pergunta era fácil de responder há uns anos atrás, visto que em muitos casos os indivíduos

morriam antes de chegarem à velhice, contudo na actualidade atingem idades mais

avançadas juntamente com o envelhecimento precoce destes sujeitos, sobrevivendo aos

seus pais e em muitos casos encontrando-se ao mesmo tempo os pais já envelhecidos a

cuidar dos seus filhos também já envelhecidos.

- Necessidades Sanitárias: Com o aumentar dos anos de vida, surge um aumento das

enfermidades e a necessidade de prestar uma maior atenção à saúde, que podem ir

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provocando deficiências no funcionamento normal dos indivíduos para a sua idade e

capacidade prévia, com a conseguinte necessidade de ajudas técnicas para facilitar a

realização de actividades da vida diária. A atenção deve ser orientada por uma equipa

multidisciplinar, com capacidade de resposta não só às patologias que vão aparecendo mas

também aos problemas de carácter social e psicológico que caracterizam esta etapa da vida.

Assim, é importante avançar-se com o desenho de programas de coordenação sócio-

sanitária que garantam as prestações sanitárias nas mesmas condições que às pessoas sem

deficiência. Também será importante o desenvolvimento de programas de promoção de

saúde dirigidos às pessoas com deficiência mental e aos seus cuidadores.

- Necessidades de Integração social e psicológica: Ao longo da vida todas as pessoas

devem ter condutas sociais aceitáveis. Devem ser promovidas desde a sua infância

actividades e entretenimento para que possam assumir os papéis próprios da sua idade em

cada etapa da sua vida. Ao chegar à última etapa da vida, quando se fala de apoios e da

permanência no seu meio, esta pode tornar-se impossível, surgindo a necessidade de um

novo recurso - a residência. Aí deve atender-se psicologicamente todos os aspectos

relacionados com a morte das pessoas chegadas e do próprio indivíduo, instruindo o

cuidador nas condutas e atitudes mais adequadas para fazer frente às questões do

envelhecimento do indivíduo portador de deficiência mental.

- Necessidades de Habitação: O melhor para cada pessoa é envelhecer na sua própria casa,

dentro da sua comunidade, cobrindo as suas necessidades para realizar as actividades

diárias com a ajuda ao domicílio. Contudo, às vezes o aumento da dependência é tão alto,

que as ajudas habituais que se prestam são insuficientes para compensar as carências,

sendo necessário pensar noutra alternativa como ingresso numa residência. Esta mudança

deve ser realizada com muita cautela, tentando que se produzam as mínimas consequências

negativas, sobretudo a nível mental. Cada caso deve ser analisado individualmente,

surgindo também como outra solução, a criação de residências em que podem viver as

pessoas portadoras de deficiência mental que envelheceram precocemente e os seus pais.

- Necessidades económicas e legais: Existe uma percentagem muito reduzida de pessoas

com deficiência mental que encontram um trabalho integrado durante a sua vida activa. Ao

perder o emprego devido à idade ou à perca de capacidades, produz-se uma diminuição

considerável dos rendimentos, principalmente durante o envelhecimento vão aumentar as

suas necessidades. Por esta razão deve-se incrementar ajudas económicas, por serem o

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único meio que promove a sua independência por mais tempo. Estes apoios devem ser

proporcionados sem pressionar a pessoa a deixar a sua fonte de rendimentos e tendo

sempre em conta a individualidade de cada um.

Por o envelhecimento ser uma fase da vida das pessoas, de maior dependência e

vulnerabilidade, implica a criação de estruturas de apoio, em articulação com os Serviços

Públicos, nomeadamente os serviços de saúde. Estamos a falar de pessoas com idade

avançada, na sua maioria sem pais, apenas com irmãos e alguns familiares de 2.º e 3.º grau,

sem vidas interligadas que permitam um fácil desenvolvimento de laços familiares e do

apoio que é necessário, quer ao nível de resposta de enquadramento, quer a nível afectivo.

Deste modo, é imprescindível repensar as respostas existentes, adaptando-as a esta nova

realidade e dotando-as de meios e recursos ajustáveis à nova realidade e às novas

exigências, referindo que é urgente repensar o Apoio Domiciliário enquanto modelo de

intervenção e de apoio, como um serviço imprescindível para um número significativo de

pessoas nesta fase da vida. A articulação entre as áreas sociais de apoio e de saúde deverá

ser melhorada e extensiva a outras intervenções especializadas com as inerentes

consequências financeiras. (Rosa, 2005: 8)

Segundo o Presidente da Direcção da AFID, Domingos Rosa (2005) as respostas mais

ajustadas para este tipo de população são estruturas integradas que permitam vários tipos

de intervenção – social, saúde, ocupação entre outras, devidamente inseridas nas

comunidades locais. Tendo em conta os elevados índices de dependência desta população

refere ainda que deveriam ser multiplicadas as respostas residenciais e repensados os seus

modelos de intervenção. Deverão ainda ser pensadas e implementadas repostas inovadoras

do tipo hospitais de retaguarda, que atendam pessoas com idade avançada acamadas, em

estado terminal, que permitam uma intervenção mais ajustada à sua situação de saúde e de

deficiência.

Em muitos casos, as necessidades dos indivíduos portadores de deficiência mental em

processo de envelhecimento podem ser atendidas pelos serviços proporcionados dentro do

esquema de serviços sociais de uma localidade. Noutros casos, a rede genérica de serviços

pode ser insuficiente para atender a essas necessidades especiais. Nestas ocasiões, os

organismos encarregados dos serviços para as pessoas portadoras de deficiência mental

devem desenvolver e atender essas necessidades dentro das suas próprias estruturas

(Janicki, 1987: 67).

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Nestes cenários, o ideal seria que as pessoas idosas e suas famílias pudessem exercer uma

escolha livre e esclarecida dos apoios e equipamentos que necessitam. No entanto, o que

tem acontecido é que o factor “escolha” toma, para algumas situações, foros de privilégio,

quando o aceso a respostas diversificadas e capacitadas para atender adequadamente as

pessoas que delas necessitam deveria ser um direito (Cadete, 2001, in Martins, 2005: 139)

A organização e gestão das políticas sociais devem ser efectuadas no sentido da atender as

múltiplas especificidades postas a cada área/sector (saúde, habitação, assistência social,

trabalho, etc.). Porém, mesmo que uma rede de política social atenda à “completude” das

especificidades que lhe são devidas, mesmo que tenha um trabalho articulado e

complementar entre entidades, serviços, programas e projectos, a mesma não dá conta do

atendimento pleno, integral das necessidades da população (Pereira, 2002).

Com base no exposto, é possível afirmar que as várias redes de políticas sociais,

articuladas entre si, formando a rede sócio-assistencial, podem objectivar o atendimento às

necessidades humanas básicas na perspectiva da garantia dos direitos sociais dos usuários

das organizações. O estabelecimento desta rede permite instituir formas de integralidade da

assistência aos vários grupos sociais.

Garantir aos cidadãos o acesso a serviços de qualidade adequados à satisfação das suas

necessidades e expectativas é um desafio que implicará o envolvimento e empenho de

todas as partes interessadas. (Claro, 2006: 6).

4 – BEM-ESTAR DO INDIVÍDUO PORTADOR DE DEFICIÊNCIA MENT AL NO

SEU PROCESSO DE ENVELHECIMENTO

Os termos bem-estar e bem-estar social, têm estado muito na moda nos últimos tempos. A

sua efectiva introdução, no nosso vocabulário, operou-se na sombra da enorme e universal

expansão dos conceitos ingleses de “welfare” e “social welfare”.

O significado da palavra welfare deriva da sua originária acepção etimológica que deriva

de um termo alemão. Num sentido mais rígido significa “ter boa viagem”, implicando a

idéia de viajar comodamente pelo caminho da vida. O Webste’s New International

Dictionary , define o vocábulo welfare como estado ou condição relativa ao Bem-estar,

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especialmente condições de saúde, felicidade, prosperidade ou condições semelhantes. Por

outro lado o Shorter Oxford English Dictionary, atribui-lhe uma significação análoga:

condição de sentir-se bem; boa sorte, felicidade ou bem-estar de uma pessoa, comunidade

ou coisa, (Martínez, 1986).

Esping-Andersen in Adão e Silva (2002) definiu o conceito de “modelo de welfare”, como

um instrumento de compreensão, de como as políticas sociais influenciam o

funcionamento do mercado de trabalho, as estruturas sociais mais amplas, e como, neste

processo uma série de factores, se interligam.

O bem-estar, com os seus diversos elementos constitutivos, representa as condições

essenciais, realmente indispensáveis, para o que Aristóteles chamava de “uma vida boa”.

4.1 - Aspecto individual do bem-estar

As notas de objectividade, carácter externo e minimidade iluminam plenamente a sua

vertente individual e nela se exemplificam (Martínez, 1986). Para o autor é evidente que o

bem-estar de uma pessoa, não depende tanto do que ela sente ou acredite, mas da afluência

de determinados eixos objectivos, por outras palavras, não é uma questão de estados

subjectivos de consciência, mas sim de condições e circunstâncias objectivas, tais como o

bem-estar físico, o afecto o seu equilíbrio mental e emocional, a sua prosperidade material.

Estes podem inclusivamente ser conhecidos melhor por outros do que pelo próprio

interessado, pois o interesse e a preocupação são coisas distintas de conhecimento ou

informação. Assim não há ninguém que sinta maior preocupação pelo seu bem-estar do

que o próprio interessado.

As condições objectivas geralmente consideram-se como os requisitos básicos para a

concretização da felicidade. Daí que seja mensurável, mediante critérios objectivos tais

como os Indicadores Sociais e os Aspectos exteriores isto é, científicos.

O conceito welfare, no seu aspecto individual, faz referência aos requisitos básicos

necessários para o bem-estar do homem em geral, incluindo principalmente os elementos

relativos às condições mínimas de saúde e de propriedade económica indispensáveis para

aquele (Martínez, 1986).

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A alusão ao carácter básico, revela-se como uma componente negativa na relação do

welfare com o bem-estar humano em geral, por essa noção fazer referência a esse bem-

estar não na sua totalidade global, mas sim apenas em seus requisitos primordiais, em

fundamentos indispensáveis. O welfare aponta assim para a ideia de que existe um mínimo

determinado para o nível de vida. Os elementos chave do bem-estar individual, são a saúde

física, os recursos económicos e a saúde mental e psicológica (Martínez, 1986).

A felicidade não se identifica com o bem-estar, nem constituiu um dos seus elementos,

contudo é sim o objectivo final do bem-estar. Por outras palavras, um homem que foi

presenteado com bem-estar, há-de estar próximo da felicidade, por ter a posse dos

elementos considerados essenciais para uma vida feliz. Contudo, o vasto e complexo

mundo das relações interpessoais, as relações pessoais estritas ou íntimas como as relações

familiares profissionais, de amizade ou de outro tipo, também constituem aspectos chave

para o bem-estar pessoal, porque a relação social também é importante para a satisfação

das necessidades (Martínez, 1986).

Não devemos esquecer, por último de que o homem normalmente não pode alcançar o seu

bem-estar com absoluta independência do bem-estar dos outros, visto que, como animal

social que é, o seu próprio bem-estar está ligado ao bem-estar daqueles que estão próximos

e que constituem as pessoas do percurso da sua vida, pessoas do seu círculo mais íntimo

(Martínez, 1986).

4.2 - Vertente social do bem-estar

O bem-estar não se esgota apenas no seu aspecto individual, tem claramente uma

componente social, e por isso fala-se de bem-estar social (Martínez, 1986).

Para a obtenção de felicidade o homem precisa, para além das necessidades individuais,

necessidades sociais relativamente ao estabelecimento de uma ordem social que conduza à

consecução daqueles supostos requisitos básicos para a felicidade que são comuns a todos

os cidadãos. Assim o bem-estar social refere-se, por um lado, de forma geral, à ordem

social como instrumento para promover a satisfação das necessidades de bem-estar

individual que são comuns, partilhadas e experimentadas em conjunto pelos diversos

membros da sociedade, e por outro, mais particular à ordem social como promotor

daqueles aspectos de bem-estar pessoal, em diversos campos, desde a criação de recursos

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públicos desfrutados em comum, aos sítios de relação social com os amigos ou

companheiros, ou seja todos aqueles sectores em que há partilha de situações de interacção

social (Martínez, 1986).

Daí que o bem-estar social não pode ser identificado simplesmente como uma componente

social do bem-estar individual, sobretudo porque pressupõe e implica inter-relações

sistemáticas que só podem produzir-se através da interacção dos indivíduos, (Martínez,

1986).

Para Ezequiel Ander-Egg (1995), o conceito de bem-estar social aparece como um

“conjunto de leis, programas, benefícios e serviços que se estabelecem para assegurar o

robustecer da previsão de tudo aquilo que se considera como necessidades básicas para o

bem-estar humano e melhoria social” (Ezequiel Ander-Egg, 1995: 48).

Nos actuais pontos de vista sobre bem-estar social, predominam duas concepções deste

conceito: a residual e a desenvolvimentista (Martínez, 1986):

Concepção “residual” em que o bem-estar social é entendido como uma função residual, a

de controlar os indivíduos “desviados ou dependentes” e/ou aliviar a sua penosa situação

de algum modo mínimo, como acto de caridade pública ou privada. Esta foi a forma

tradicional como a sociedade tem tratado de assistir os necessitados: a comunidade

intervém com meios públicos ou privados para assegurar um nível mínimo de bem-estar

pessoal e de funcionamento social, tendo como destinatários, os pobres, as crianças a cargo

de outros, os idosos e os deficientes. A concepção residual pressupõe que os seus

programas existem para fazer frente às necessidades mais precárias dos indivíduos que são

incapazes de dar resposta às suas necessidades, por meio das instituições normais de

família e mercado. Ou seja, defende que as instituições de bem-estar social deveriam entrar

em jogo só quando as estruturas normais da família e mercado falham, baseando-se na

noção de que há dois canais naturais que satisfazem as necessidades do indivíduo, a família

e a economia de mercado, e só quando esta não funciona, como por exemplo na velhice ou

doença é que entra em acção uma terceira estrutura que é a estrutura do bem-estar social

(Martínez, 1986).

Na concepção “Desenvolvimentista” ou “Institucional” o conceito de bem-estar social

oferece um carácter positivo, e estende-se muito mais além da assistência facilitada aos

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necessitados, partindo da base de que numa sociedade industrial todos os cidadãos podem

requerer diversos serviços sociais, para poderem desenvolver a sua capacidade produtiva e

alcançar e manter um nível de bem-estar desejável (Martínez, 1986). É um ponto de vista

muito mais prometedor, pois contempla os serviços de bem-estar como funções normais de

vanguarda, da sociedade moderna industrial, que consiste em ajudar os indivíduos a

alcançar a sua auto-realização. Não implica nenhum estigma, nenhuma emergência,

nenhuma anormalidade.

Constata-se que não existe unanimidade na definição de bem-estar social, existindo

definições que reflectem a concepção residual, e outras (cada vez mais) tendem a basear-se

em moldes mais amplos para acolher em suas fórmulas a concepção institucional ou

desenvolvimentista (Martínez, 1986).

Outro conceito actual associado ao bem-estar é o conceito de Qualidade de Vida (QV).

Torna-se necessário reflectir sobre ele na medida em que este contempla na sua definição e

composição os vários tipos de bem-estar. Por outro lado, é através deste conceito, que os

autores, que se debruçam sobre a problemática do envelhecimento do indivíduo portador

de deficiência mental, abordam as questões do bem-estar para este grupo.

Neste novo século, uma das maiores preocupações das pessoas tem sido a busca por

melhor qualidade de vida e bem-estar querendo dizer “promover a saúde” (Arantes, 2004:

4).

O conceito de Qualidade de Vida (QV), é um conceito complexo, pois actualmente não

existe um acordo total relativamente à sua definição. Constata-se a presença de uma

diversidade de modelos teóricos desenvolvidos ao longo da sua história, que se agruparam

em torno de quatro grandes perspectivas seguindo o esquema proposto por Borthwick-

Duffy (1992) (in Arostegi, 1999: 406). Os primeiros enfoques situaram-se numa medida

unidimensional do conceito, desde parâmetros objectivos, condições de vida e bem-estar

social, a enfoques subjectivos como a satisfação pessoal. Com os avanços na investigação,

surge o estudo multidimensional da QV, que se baseia quer nas condições objectivas de

vida quer na satisfação pessoal do indivíduo (Arostegi, 1999: 407).

Felce (1997), define qualidade de vida como um “bem-estar geral que comporta

descritores objectivos e avaliações subjectivas de bem-estar físico, material, social,

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produtivo, emocional e cívico, todos medidos por um conjunto de valores pessoais” (Felce

(1997: 127). Esta definição é considerada, não apenas para a deficiência mental, mas

também é utilizada noutros grupos desde a população em geral a subgrupos sociais.

O conceito ideológico de QV no âmbito da deficiência mental, nasce como uma extensão

lógica do conceito de normalidade (Arostegi, 1999: 407) e que avança acentuando a

importância do bem-estar individual. Tradicionalmente, a qualidade de vida das pessoas

com deficiência mental foi definida através de critérios objectivos das suas circunstâncias

de vida. Na última década, esta concepção revelou-se reducionista ao limitar-se às

condições de vida. A mudança na conceptualização de deficiente mental, a importância do

poder de decisão em torno da sua própria vida, fez repensar uma medida de QV que

reconheça as preferências individuais das pessoas com deficiência mental. O bem-estar

pessoal, está determinado por uma ampla variedade de variáveis que certamente incluem

condições de vida, mas também incluem a percepção pessoal das particularidades da vida,

que geralmente, são consideradas como o bem-estar subjectivo da qualidade de vida

subjectiva (Arostegi, 1999: 407). Ou seja, é uma mistura de componentes objectivas e

subjectivas (Vreeke et al, 1997: 290).

As questões em torno da qualidade de vida e do bem-estar, foram a preocupação dos

Ministros responsáveis pelas Políticas de Intervenção para as Pessoas com deficiência,

reunidos na Segunda Conferência Europeia, em Málaga, em Maio de 2003, na qual

produziram uma Declaração Política, subordinada ao tema “Melhorar a qualidade de vida

das Pessoas com deficiência: prosseguir uma política coerente para e através de uma plena

participação”. Esta Declaração Política consagra a necessidade de alterar o quadro de apoio

desta população em todas as áreas, incluindo o envelhecimento, e sugere que os estados da

União Europeia elaborem planos de acção que consubstanciem políticas que façam evoluir

para a plena participação das pessoas com deficiência e suas famílias no desenvolvimento

dos seus projectos de vida, na melhoria da qualidade de vida, na igualdade de

oportunidades, na garantia e respeito pelos direitos e liberdades fundamentais da pessoa

(Rosa, 2004: 9).

A mesma autora, considera, a aprovação pela Assembleia da República Portuguesa da Lei

n.º 38/2004, de 18/08, que define as Bases Gerais do Regime Jurídico da Prevenção,

Habilitação, Reabilitação e Participação da Pessoa com Deficiência, ser um passo

importante neste sentido.

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A qualidade de vida emergiu, como uma potencialidade para definir as metas dos serviços

e para induzir o seu impacto na condição das pessoas no seu dia-a-dia. (Felce, 1997: 126).

De acordo com Nahas (2001)25, QV pode ser considerada como a condição humana

resultante de um conjunto de parâmetros individuais, socioculturais e ambientais, que

determinam como vive o ser humano.

As dificuldades inerentes à definição dos factores associados ao bem-estar do idoso

deficiente mental são idênticas, às dificuldades em definir os factores para outros grupos

que são apenas idosos, ou aqueles que viveram toda a vida com uma deficiência. Os

factores relacionados aos idosos com deficiência mental não têm que ser necessariamente

diferentes daqueles que afectam outros idosos (Janicki, 1997: 105).

4.3 – Factores que contribuem para o bem-estar

Na sociedade ocidental «clássica» não fazia qualquer sentido falar de bem-estar e

qualidade de vida para esta população, dado que não existiam conhecimentos científicos

suficientes e bases éticas marcantes, capazes de orientar essa sociedade no respeito pela

dignidade e subjectividade da pessoa diferente.

“ (...) a velhice não é uma variável fixa, que podemos analisar antes e depois da

modernização, mas uma realidade culturalmente construída, inclusive pelas disciplinas

científicas que a tomaram como alvo” (Groisman, 1999: 48 in Prado, 2002: 4). Desta

forma, o bem-estar desta população, não pode ser entendido à margem e com

independência, da sociedade em que se desenvolve, dos seus recursos materiais, científicos

e humanos, do seu sistema de valores e da sua estrutura de poder (Martínez, 1986).

Segundo a Organização Mundial de Saúde, existem muitos mitos ou preconceitos acerca

da deficiência mental e do processo de envelhecimento nas pessoas com deficiência

mental. O reconhecimento do valor humano, em termos sociais das pessoas com

deficiência é variável de nação para nação e ainda muito dependente dos ideais culturais

vigentes. Nestas circunstâncias, as pessoas com deficiência mental acabam por

experienciar um acesso reduzido às necessidades básicas da vida humana, ingredientes

25 In: R. Bras. Ci. e Mov. Brasília, v.11 (2), 55-61, Junho 2003, p.56.

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chave associados a um envelhecimento saudável e com qualidade (OMS, 2000d in

António, 2003: 172).

Na nossa cultura damos muito valor à possibilidade de podermos tomar as nossas escolhas

de forma independente. O nosso rendimento define as nossas opções na maneira como

vivemos, as nossas experiências e oportunidades definem o que podemos fazer e o nosso

emprego define a nossa vida social. Pessoas que viveram muitos anos com uma deficiência

e que estão “velhas”, podem ter diminuídas as suas opções sociais e financeiras, o que vai

influenciar as suas decisões e escolhas (Janicki, 1997: 106).

Tem sido debatido, pelos gerontologistas, os aspectos qualitativos da idade avançada.

Reconhecendo-se quer para a população em geral, quer para a população com deficiência

mental, que os apoios sociais e financeiros, nesta fase da vida são muito importantes.

Contudo continuam a existir diferenças gerais no estilo de vida e na disponibilidade dos

serviços (Janicki, 1997: 106).

A dignidade pessoal, liberdade de escolha e a determinação pessoal, são contributos

importantes para o bem-estar das pessoas idosas que são cuidadas há muito tempo em

instituições. No entanto, essas forças institucionais e familiares estão entre o trabalhar para

essa autonomia e os factores pessoais de “empowerment” que contribuem para uma

crescente qualidade de vida (Shalock, 1996).

Por outro lado, são enumeradas seis dimensões de bem-estar consideradas necessárias e

fundamentais para a qualidade de vida no processo de envelhecimento da pessoa portadora

de deficiência mental, baseadas (Bluden, 1988 in Shalock, 1996; Felce, 1997):

Bem-estar Físico - é a habilidade para usar um corpo o mais eficazmente possível. Para as

pessoas idosas com deficiência mental, é importante estarem libertos dos efeitos

debilitativos da doença ou deficiência. As limitações da idade avançada ou de uma vida

longa com deficiência física pode reduzir a independência do indivíduo e levar a grandes

impedimentos no estilo de vida. Pois, na verdade alguns estudiosos denotaram que o valor

pessoal da saúde e da actividade social está associado a valores muito elevados de

satisfação de vida (Janicki, 1997: 106). O bem-estar físico está relacionado com, saúde,

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nutrição, fitness, mobilidade e segurança pessoal26. O fitness e a mobilidade são dois

aspectos relacionados com a habilidade física, e talvez a sua definição mais correcta seja,

como capacidades funcionais relativamente a actividades específicas. Estes aspectos

interligam-se com a consideração do desenvolvimento e actividade (Felce, 1997: 130).

Bem-estar Material - é a habilidade para ganhar e usar o rendimento de acordo com a

prudência disponível, viver com qualidade física aceitável e ter bens materiais a uma

quantidade e qualidade desejável. A relação entre estes factores ambientais serve para

compreender a qualidade de vida (Janicki, 1997: 106). Está relacionado com a riqueza ou

rendimento, com vários aspectos da qualidade do meio ambiente em que se vive,

nomeadamente, o transporte, segurança e ocupação. Qualidade da casa, o nível de

mobiliário, equipamentos, comida, bens pessoais e o carácter do bairro. Tudo isto são

aspectos relevantes da qualidade do alojamento (Felce, 1997: 130).

Bem-estar Social – esta dimensão, tal como abordado anteriormente, oferece um elemento

vital para a vida da maioria das pessoas. Os ingredientes mais importantes do bem-estar

social são: fazer parte da comunidade, ter amizades, ser capaz de fazer escolhas, estar

competente no funcionamento (ao nível da comunicação, mobilidade, auto-ajuda e

habilidade social e de lazer), e ser objecto de respeito. De facto, a diferença de classes pode

afectar o envolvimento social e consequentemente afectar o bem-estar subjectivo. No

entanto, no indicador de “satisfação da vida”, o poder de escolha é um factor que está

condicionado pelo status económico e social, fazendo com que as opções de escolha sejam

delimitadas (Janicki, 1997: 107). Para Schalock (1996 in Felce, 1997: 131) bem-estar

social inclui duas dimensões: (1) a qualidade e dimensão das relações interpessoais –

intimidade e afeição recíproca com a vida familiar, com a família, parentes, amigos ou

pessoas conhecidas; (2) envolvimento na comunidade ou inclusão social –

comprometimento nas actividades comunitárias e o nível de aceitação ou suporte dado pela

comunidade. Ambas as dimensões podem ser assumidas como status social ou papel social.

Bem-estar Cognitivo - esta dimensão envolve uma percepção pessoal de qualidade de vida

e de “life satisfaction”. Muitas pesquisas demonstraram que a percepção pessoal de bem-

estar, está fortemente relacionada com factores socio-económicos, com o grau de interação

26 A segurança pessoal também pode ser considerada como um aspecto do bem-estar emocional, como classificou Schalock (1996 in Felce, 1997, p.130), ou como um direito cívico.

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social e aspectos da situação de vida. Novamente, o poder de escolha, aparentemente está

amplamente ligado ao bem-estar cognitivo e à “life satisfaction”. Não obstante, as

referências societárias são contributos importantes para a construção da percepção pessoal,

isto porque o rótulo negativo em relação aos idosos, pode funcionar para diminuir a auto-

estima, o que pode levar a restringir a autonomia e as oportunidades de vida (Janicki, 1997:

107).

Bem-estar Emocional - está relacionado com a felicidade, não possuir stress, estado

mental, auto-estima, crenças espirituais ou religiosas, sexualidade e contentamento

(satisfação). O grau de stress reflecte as condições sob, as quais, as actividades sociais e

funcionais são induzidas e pode afectar o grau de divertimento destas actividades. A auto-

estima e a satisfação com o status pessoal, crenças religiosas e sexualidade pessoal, são

outros factores que influenciam o estado psicológico ou emocional do indivíduo (Felce,

1997: 131).

Bem-estar Cívico - está relacionado com a privacidade, protecção sob a lei, direito de

votar, responsabilidades cívicas (Schalock, 1996 in Felce, 1997: 132).

Ao longo dos tempos, os seres humanos têm aspirado e lutado para realizar as suas

necessidades da melhor forma possível, criando estruturas de relações que lhes sejam úteis

na busca da satisfação. A preocupação com o bem-estar não é de hoje, pois o desejo de

manter uma vida melhor e mais saudável é tão antigo como a civilização (Setién, 1993:

56). Na sua instintiva luta pela vida, o ser humano adapta-se e modifica-se, procurando

outros valores a cada limitação que lhe é apresentada. Isto acontece a todas as pessoas

independentemente das suas limitações.

Não obstante, a relação entre a idade e a deficiência ainda associa outras variáveis

contextuais, das quais se elaboram três premissas, sobre as quais reflectimos anteriormente,

nomeadamente: (A) a atitude da sociedade afecta a qualidade de vida e o bem-estar no

envelhecimento do indivíduo portador deficiência mental, (B) os factores associados à QV

dos idosos com deficiência mental são qualitativamente idênticos àqueles associados a

outros idosos, (C) as transições ocorridas no processo de envelhecimento, apresentam

mudanças que afectam o estilo de vida dos deficientes mentais com idade avançada,

nomeadamente o envelhecimento da própria família, o seu próprio envelhecimento, a

mudança de casa e a reforma.

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“En Europa, (...) se considera que la prevención y el retraso del envejecimiento deben

constituir acciones prioritarias si se pretende conseguir una mayor calidad de vida de los

ciudadanos.”27 (Gaspar Casado, do Comité para a Reabilitação e Integração das pessoas

com deficiência do conselho da Europa in Cuesta, 2002: 19). Ou seja, para se conseguir

proporcionar uma velhice com melhor qualidade, começa com um melhor funcionamento

dos mecanismos de prevenção, desde os primeiros períodos de vida da pessoa com

deficiência (Rosa, 2004: 9). Neste sentido, é importante preparar a família para as questões

do envelhecimento do deficiente e isto deve começar quando ele nasce. Neste processo

também se deve mentalizar a família para o seu próprio envelhecimento (Gaia, 2004)28,

ressaltando de imediato a necessidade de participação das famílias em todo o processo de

desenvolvimento da pessoa (Rosa, 2004: 9).

A participação activa da família é um elemento facilitador na intervenção,

acompanhamento e apoio aos seus filhos e simultaneamente um contributo para a

manutenção da qualidade de vida da pessoa com deficiência, ao longo de toda a sua vida e

em especial no período da velhice. Prevenir e intervir o mais precocemente possível, cria

condições para uma melhor qualidade de vida no futuro e, consequentemente na velhice

(Rosa, 2004: 9). É fundamental que no processo de envelhecimento desta população a sua

família mantenha uma postura de relutância face ao futuro, que possa ser entendida e

elaborada quer pelos pais, quer pelos filhos, como algo que requer tempo e sensibilidade.

A família deve ser capaz de pensar sobre o futuro e apoiar o seu filho(a) na elaboração de

planos e projectos para uma vida mais autónoma e independente (António, 2003: 187).

As questões relacionadas com a deficiência, tratam-se essencialmente de direitos humanos

e da consequente dignidade da pessoa humana. As políticas públicas devem ter subjacente

a necessidade de encarar a solidariedade como um valor e não como uma técnica ou

instrumento (António, 2003: 187).

Ignorar esses direitos, traduzir-se-ia em actos irreflectidos e desumanos que conduziriam a

marcas prejudiciais e indeléveis na personalidade e bem-estar integral da pessoa portadora

de deficiência mental e na própria identidade de uma sociedade que se assume como

27 Na Europa, considera-se que a prevenção e o retardar do envelhecimento devem constituir acções prioritárias para se conseguir uma maior qualidade de vida dos cidadãos. 28 Seminário organizado pela Associação Nacional de Famílias para a Integração da pessoa deficiente (AFID). Suporte audiovisual do seminário, fornecido pela própria Associação.

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democrática, humana e defensora dos princípios e práticas inerentes à inclusão e

normalização.

Tornando-se assim responsabilidade do Estado, uma adequada modernização das políticas

sociais vigentes, com a integração dos novos conhecimentos científicos na área da saúde e

do envelhecimento humano, promoção da integração das pessoas com deficiência e

desenvolvimento de novas infra-estruturas que contemplem estas medidas. Urge informar e

formar o público em geral sobre esta problemática, tal como, criar centros de investigação

e documentação especializada onde os familiares, clínicos e cuidadores possam encontrar

informações, esclarecer dúvidas, receber treino específico e realizar troca de experiências.

Por fim deve promover formação específica dos profissionais que trabalham directamente

com esta população (OMS, 2000d in António, 2003: 172).

Face às especificidades das pessoas com deficiência mental, as instituições deverão

adaptar-se às necessidades emergentes que decorrem do processo de envelhecimento de

cada um dos seus utentes providenciando, serviços médicos, actividades de prevenção,

adequação das actividades propostas e incrementar a formação adequada do pessoal

técnico e auxiliar para as especificidades do envelhecimento destas pessoas (António,

2003: 173).

Relativamente às respostas sociais, promotoras de bem-estar, para as pessoas com

deficiência mental que envelhecem, Miguel Ángel Verdugo professor do departamento de

Personalidade da Universidade de Salamanca, afirma que: “estas pessoas devem ter acesso

às infra-estruturas de saúde da população em geral, favorecendo assim a sua inclusão de

forma natural. A finalidade é que os serviços e apoios se ajustem a cada indivíduo”

(Cuesta, 2002: 19).

5 – O PAPEL DO SERVIÇO SOCIAL NAS INSTITUIÇÕES DE RESPOSTA AO

ENVELHECIMENTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA MENTAL

Pode afirmar-se que em Portugal, estas duas últimas décadas têm sido as mais ricas da

história do Serviço Social Português pelo percurso desenvolvido e pelas suas conquistas.

Na explicação deste percurso, deve ter-se em conta, para além do quadro da formação

académica ou no campo da profissão, a análise e compreensão do processo histórico e

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sócio-político no qual o próprio Serviço Social está inserido. (Negreiros, 1999) A

abordagem dos contextos sócio-históricos em que o Serviço Social se desenvolveu e a

forma como os profissionais foram respondendo às questões e aos desafios que se foram

estabelecendo na sociedade, nas várias conjunturas históricas reflectem como a profissão

se foi construindo socialmente.

Ao longo dos últimos 20 anos, o Serviço Social em Portugal, vem desenvolvendo

arrebatadas movimentações quer de âmbito interno quer na sua articulação com diversas

estruturas sociais. As transformações mais significativas no campo interno prendem-se

com a formação académica e sua estrutura curricular, com a investigação e a construção do

conhecimento em Serviço Social. (Martins, 2003)

No contexto da trajectória do Serviço Social Português, privilegia-se a sua génese, a sua

emergência e a institucionalização da profissão. O prestígio do estatuto académico, abriu as

portas para o reconhecimento do valor da profissão e possibilitou que a investigação

passasse a ser parte integrante da identidade da profissão, que marcou um salto qualitativo

no reconhecimento académico desta área. (Martins, 2003)

O Serviço Social está, “ (...) situado no jogo e na malha das relações sociais, está sujeito

às influências e determinações que se exercem no campo de estruturação dessas mesmas

relações. Bem como, através das articulações que estabelece, da mobilização e luta que

desenvolve nesse mesmo campo, e da construção e análise que elabora através da

explicitação dos saberes e das práticas, vai como categoria social que é, tornar-se também

“sujeito” da sua própria trajectória.” (Negreiros, 1999: 31-32).

A Federação Internacional de Assistentes Sociais (FIAS) e a Associação Internacional de

Escolas de Serviço Social (AIESS) definem o Serviço Social como “uma profissão que

promove a mudança social, a resolução de problemas nas relações humanas e o reforço

da emancipação das pessoas para promoção do bem-estar. Ao utilizar teorias do

comportamento humano e dos sistemas sociais, o Serviço Social intervém nas situações em

que as pessoas interagem com o seu meio. Os princípios dos direitos humanos e da justiça

social são fundamentais para o Serviço Social”29.

29 Disponível na internet em: www.apross.pt/etica.php

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 73

Esta definição sublinha os princípios dos direitos humanos e justiça social, base

fundamental da profissão, na medida em que permitem desenvolver a liberdade individual

da acção e dos recursos dos indivíduos na sociedade. Faz referência às várias declarações e

convenções sobre direitos humanos que são relevantes para o Serviço Social, seguidas de

uma declaração de princípios éticos gerais assentes nos dois princípios de direitos

humanos: dignidade e justiça social. E introduz ainda uma orientação básica da conduta

ética no Serviço Social.

Entende-se por ética, o estudo da moral (normas de comportamento que as pessoas seguem

como referência do que é correcto ou incorrecto, bom ou mal). O termo de ética pode usar-

se de maneira equivalente a “moral”, para referir-se a regras/normas de conduta no que

concerne ao que é correcto/incorrecto e bom/mau, (Banks, 1997).

Não obstante, considera-se esta definição de Serviço Social importante, na medida em que

faz referência a aspectos relevantes para a profissão dos Assistentes Sociais explicitando as

finalidades da profissão, a sua relação com a mudança social e empowerment, fazendo

menção de que o Serviço Social não se encontra unicamente direccionado para ajudar as

pessoas a ajustarem-se ao seu meio, mas também a instruir e habilitar as mesmas a serem

autónomas, responsáveis, adquirindo competências e habilidades indispensáveis para a sua

autonomia.

Para a autora Marília Andrade (2001) “Serviço Social é uma área de conhecimento no

domínio do social que fornece contributos para a compreensão das realidades e

necessidades societárias e para a concepção e compreensão de políticas sociais. Constrói

propostas efectivas de intervenção, no âmbito do social, considerando-as inscritas em

projectos societários mais amplos nem sempre coincidentes.” (Andrade, 2001: 165)

Cabe salientar os desafios postos à profissão na actualidade, tomando por referência

Iamamoto (2000) o Serviço Social requer olhos abertos para o mundo contemporâneo para

decifrá-lo e participar da sua criação, desenvolvendo um trabalho pautado no zelo pela

qualidade dos serviços prestados, na defesa da universalidade dos serviços públicos, na

actualização do compromisso ético-político com interesses colectivos da população

usuária.

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 74

Dessa forma, o exercício da profissão prevê competências teórico-práticas, ético-políticas,

técnico-operativas para defender o seu campo de trabalho, suas qualificações e funções

profissionais. É ir além das rotinas institucionais e apreender o movimento da realidade

para detectar tendências e possibilidades nela presentes, passíveis de serem executadas.

Neste sentido, a prática profissional quotidiana, exprime não apenas a capacidade técnico-

operativa de quem a realiza, mas também, a sua posição existencial, política, ideológica

face às relações da sociedade em que vive. É essa posição que particulariza a intervenção

profissional, dando-lhe uma qualidade e imprimindo-lhe uma direcção. (Baptista, 2001:

17)

A FIAS e a AIESS acreditam que um maior conhecimento e compreensão da temática dos

Direitos Humanos contribuirão para o aperfeiçoamento da acção e intervenção dos

profissionais de Serviço Social em benefício daqueles que necessitam dos seus serviços.

“O Serviço Social tem sido, desde a sua criação, uma actividade de defesa dos Direitos

Humanos, tendo por princípio base o valor intrínseco de cada ser humano e como um dos

seus principais objectivos a promoção de estruturas sociais equitativas, capazes de

oferecer às pessoas segurança e desenvolvimento, ao mesmo tempo que defendem a sua

dignidade” (ONU, 1999: 19). Graça André (2002) considera o conceito Direitos Humanos,

directamente ligado à satisfação de necessidades, ou seja, são a resposta local e global às

necessidades básicas.

As origens do Serviço Social radicam em ideais humanitários e democráticos. A prática do

Serviço Social tem estado centrada, desde o seu início, na satisfação de necessidades e no

desenvolvimento do potencial e recursos humanos. (ONU, 1999: 20)

No exercício profissional, as nossas intervenções devem ser orientadas para a satisfação de

necessidades humanas específicas e para a garantia dos direitos humanos e efectivação da

protecção social, trabalhando para o bem-estar e realização pessoal dos seres humanos,

exigindo uma consciência ética vinculada a um corpo de valores comuns à profissão,

enquanto conjunto de valores a ter em conta com os cidadãos/utentes (Serafim, 2004).

Os assistentes sociais participam no planeamento, orçamentação, execução, avaliação e

alteração das políticas e serviços sociais de carácter preventivo destinados a diferentes

grupos e comunidades. Intervêm em numerosos sectores funcionais, utilizando diversas

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 75

abordagens metodológicas, trabalhando no âmbito de um quadro organizacional amplo e

prestando serviços sociais a diversos sectores da população. Trabalham com os utentes a

diversos níveis: ao nível do indivíduo e da família (nível micro); ao nível da comunidade

(nível meso); e ao nível da sociedade – nacional e internacional (nível macro).

O Serviço Social desenvolve-se em cinco contextos diferentes, os quais, apesar de poderem

ser analisados separadamente, constituem partes de um todo. Esses contextos são de

carácter geográfico, político, sócio-económico, cultural e espiritual: (a) Geográfico: toda a

actividade se desenvolve dentro de determinadas fronteiras: organismo, nação, Estado,

região. (b) Político: Cada país tem um determinado sistema político. Este define o contexto

dentro do qual a actividade se desenvolve, quer o sistema seja liberal ou repressivo,

socialista, social-democrata ou capitalista. (c) Socio-económico: um modo de vida

adequado, trabalho, saúde e serviços médicos apropriados, educação e, se possível, acesso

à segurança social e a serviços sociais são aspirações humanas elementares. A coesão

social de qualquer grupo ou nação depende, em larga medida, de uma distribuição

equitativa dos recursos disponíveis. (d) Cultural: os usos, crenças, aspirações e cultura dos

indivíduos, das famílias, dos grupos, das comunidades e das nações têm de ser respeitadas,

embora sem prejuízo da evolução de determinadas práticas e crenças. Doutro modo,

ocorrerão actos discriminatórios, destrutivos para a sociedade. (e) Espiritual: nenhuma

sociedade no seio da qual se desenvolve Serviço Social é destituída de valores. É de

importância central, quer para o desenvolvimento do Serviço Social, quer para

desempenho humano, que seja prestada atenção ao espírito, valores, filosofias e ética, bem

como às esperanças e ideais daqueles com quem os profissionais de Serviço Social

trabalham e, ao mesmo tempo, aos valores dos próprios assistentes sociais. (ONU, 1999:

21)

Paulo Pedroso30, nomeia que os Assistentes Sociais são pedagogos, mediadores,

activadores e agentes de desenvolvimento. Pedagogos porque o objectivo do trabalho

social é uma efectiva relação de transformação, com uma lógica de ética de emancipação,

no sentido de ajudar as pessoas a encontrarem a sua própria autonomia. Mediadores entre a

linguagem da burocracia e o quotidiano dos cidadãos, como tradutores do estado de direito

para os cidadãos, mas também mediadores entre as necessidades e as disponibilidades. É

30 Deputado da Assembleia da Republica

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um trabalho de activação dos beneficiários, das instituições e por último são agentes de

desenvolvimento local (Pedroso, 2002: 152-157).

Os espaços privilegiados de actuação profissional, são as instituições sociais que estão

organizadas para responder a problemas específicos colocados por utentes individuais. Ao

dar respostas parcelares a problemas particulares, classificando e categorizando os

problemas, oferecem respostas fragmentadas, operando, deste modo, a separação das

pessoas dos seus grupos sociais de pertença e da sua classe. O serviço social, actuando no

contexto institucional, pode romper ou reforçar esta separação, conforme a estratégia

profissional adoptada (Queirós & Henríquez, 1994).

Nas instituições prestadoras de serviço sem fins lucrativos o cliente do Serviço social

também é cliente em relação à instituição, neste caso, a relação assistente social/cliente

identifica-se sob todos os aspectos com a situação que será descrita nas empresas. O que

precisa de ser ressaltado é que a organização institucional presta um único serviço

específico, e que esse serviço determinado é determinante de tudo e de todos que se

relacionam com este serviço no espaço interno da organização institucional. (Weisshaupt,

1988: 57)

As instituições, como instrumento de políticas sociais, estruturam-se em função de

categorias especiais de clientela, que variam segundo o contexto económico, social e

político. Essas clientelas formam-se segundo o problema que apresentem para as classes

dominantes num determinado momento.

Na sua função de controlo social, as instituições realizam formas de recuperação e de

distensão social por intermédio da divisão dos clientes e dos problemas, do adiamento de

soluções, do oferecimento de respostas simbólicas e parciais. (Faleiros, 1991: 35)

Esse controlo sobre os problemas, objectivam a diminuição das tensões e conflitos sociais.

Talvez seja este também o objectivo do Serviço Social: pela escuta, pela paciência, pelo

estudo, pela comunicação pessoal, o problema é diminuído e uma solução dentro da ordem

pode ser visualizada e a desagregação social é evitada. (Faleiros, 1991: 36)

As instituições tornam-se assim veículos para mediatizar a “igualdade de oportunidades”,

pela integração ao modo industrial – urbano - consumidor das populações consideradas

desfavorecidas. (Faleiros, 1991: 40)

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 77

Constata-se que o Serviço Social é uma instituição, que tem consequentemente um objecto,

um âmbito e agentes determinados; e desenvolve a sua prática no quadro organizacional

das mais diversas instituições que por sua vez, têm objecto, âmbito e agentes próprios. Os

objectivos profissionais articulam-se com os objectivos dessas organizações, fazendo com

que o Assistente Social expresse os objectivos da prática num duplo quadro de referência:

o discurso profissional e o discurso da organização institucional onde trabalha

(Weisshaupt, 1988: 31).

Várias pesquisas mostram que os assistentes sociais, na prática, confundem objectivos

profissionais e objectivos institucionais. Assim os objectivos profissionais são definidos

como melhoria das condições de vida, promoção humana, administração de recursos

humanos, planeamento, bem-estar social, sem distinguir a proposta profissional da

proposta institucional. (Faleiros, 1991: 18).

Nesta perspectiva, o papel dos profissionais comprometidos com os interesses dos utentes,

consistirá na adopção de uma estratégia que vise a alteração da correlação de forças

institucionais, estratégia essa que implica o estabelecimento de uma aliança entre os

profissionais e o grupo dos utilizadores, ou potenciais utilizadores, da instituição. O

desafio do profissional consiste justamente na reorientação do seu quotidiano de acordo

com a correlação de forças existente, para facilitar acesso da população ao saber sobre elas

mesmas, aos recursos disponíveis e ao poder de decisão. (Faleiros, 1991: 55)

Sendo uma actividade de mediação interpessoal, o Serviço Social exige consciência dos

valores e sólidos conhecimentos de base, nomeadamente na área dos Direitos Humanos,

que lhe possam servir de orientação nas múltiplas situações de conflito que surgem na

prática. Se, por um lado, os assistentes sociais podem, através da sua actividade, reforçar

os direitos dos respectivos utentes, por outro uma análise deficiente pode levá-los a pôr

esses direitos em risco. A visão do respectivo trabalho a partir de uma perspectiva global

de Direitos Humanos auxilia os profissionais, conferindo-lhes um sentido de unidade e

solidariedade, sem perder de vista as perspectivas, condições e necessidades locais, que

constituem o quadro de actuação destes profissionais. (ONU, 1999: 22)

“O objecto da prática do Serviço Social é a carência institucional, o perigo de

desinstitucionalização, o risco de institucionalização indevida do qual o cliente, enfim, os

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cidadãos são portadores” (Weisshaupt, 1988: 70). Assim, as práticas profissionais que

aparecem como evidentes, são na verdade complexas e pouco claras, na medida em que

são uma expressão da diversidade e dinâmica das relações sociais mais amplas e

determinadas no quadro normativo das políticas institucionais.

Nas instituições, desenvolvem-se actividades que são de natureza técnica e burocrática e

que vão desde a formulação de políticas ao nível das estruturas sociais constituídas, à dos

microacontecimentos, da operacionalização das políticas, das relações face a face. Aqui, o

utente aparece como ser concreto, não genérico, com problemas muito específicos, face

aos quais é necessário analisar o que acontece, estabelecer uma crítica, tomar uma posição

e decidir um tipo de intervenção. (Baptista, 2001)

Como bem esclarece Iamamoto (2000) o nosso objectivo de intervenção profissional é a

questão social. Entender as Deficiências na perspectiva da questão social é superar a visão

restrita que centra na pessoa a patologia e, a intervenção estará voltada para o ser social,

tendo em vista os problemas que estão na produção social e não apenas nas limitações

humanas (Fernandes, 2005).

Nas instituições que objectivam um alvo populacional o Assistente Social apresenta-se

como agente privilegiado, pois uma das suas funções consiste em conhecer a realidade

subjectiva e objectiva do cliente bem como na adequação das demandas sociais e das

ofertas institucionais. O conhecimento da realidade subjectiva da clientela permite o

controlo de suas interpretações, maneiras de pensar, expressar e querer, dos conteúdos das

representações e das expectativas sobre os problemas e as possíveis soluções. Ao tomar

conhecimento dos critérios institucionais, o assistente social se habilita a avaliá-los em

função da demanda e a realizar um controle de qualidade da instituição (Weisshaupt,

1988).

“A questão é que, para dotar o cliente de uma organização social capaz de resolver os

seus problemas, o assistente social precisa estabelecer fluxos de conhecimentos não

apenas no sentido de tornar o cliente e sua situação conhecidos na instituição, mas

também no sentido de fazer a instituição conhecida na comunidade, em particular pelo

cliente” (Weisshaupt, 1988: 123).

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A metodologia do Serviço Social, é pois uma construção do conhecimento que reflecte

sobre ele mesmo, sobre os passos, falhas, processos, objectivos e fundamentalmente sobre

o objecto desse conhecimento. Utiliza procedimentos de diagnóstico, elaboração de

programas e projectos, controle de actividades e avaliação por resultados. Situa-se numa

determinada correlação de forças que objectiva a racionalização de recursos em função

daquilo que os próprios tecnocratas chamam de ‘necessidades’.

Do ponto de vista metodológico, o processo de construção de saber divide-se em dois

grandes paradigmas que de maneira geral, orientam a prática profissional: o paradigma

funcionalista - tecnocrático e o paradigma dialéctico político. (Faleiros, 1991: 107)

A metodologia da regulação consiste no estudo de certas situações problema e na busca de

uma compensação, a nível de recursos para esta situação. A regulação combina a relação

problema-recurso de acordo com certas normas institucionais preestabelecidas, tomando os

problemas como desregulagens que podem ser reparados através de mecanismos

institucionais. Esta metodologia busca definir e mostrar para a população o seu problema,

mas na perspectiva da instituição, com os mecanismos de dilatação da questão e com

justificativas de falta de recursos, na busca de fazer aceitar alternativas diferentes das

propostas pela população, fazendo-a acreditar que a questão que a aflige e a preocupa

poderá ser dimensionada. (Faleiros, 1991: 107)

Outro paradigma do trabalho social, é a metodologia da articulação, voltada para um

processo político de articulação de forças para a solução dos problemas e não de

isolamento do problema para desmobilização de forças. Esta metodologia surge em

oposição à metodologia da regulação em que considera as relações sociais contraditórias

para pensar-se um processo de articulação do trabalho social nesse contexto. A contradição

é movimento, luta, negação, superação numa totalidade complexa mediatizada por relações

complexas, a consideração das classes fundamentais dessa sociedade e mais ainda as

relações entre essas classes, relações de exploração e dominação, e as relações com outras

classes existentes numa formação social. Assim, um problema, uma questão apresentada

pela população, por um indivíduo, são expressões das relações sociais e não resultado

estático de uma falha individual. Os problemas vividos pelo Assistente Social são o

resultado de relações complexas e é na articulação dessas relações que pode ser visualizado

o encaminhamento da superação de um problema e não de sua solução através de um

recurso institucional. (Faleiros, 1991: 111)

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Na metodologia da articulação a apresentação de um problema é apenas um dos pontos de

partida para a relação do particular com o geral, que se faz, ao mesmo tempo, através de

uma relação política entre o assistente social e a população. O processo de articulação

consiste na formação de vínculos políticos para fortalecer a autonomia, a independência

ideológica da população e a sua organização. É a vinculação entre o assistente social e a

população através da mútua independência e reconhecimento da autonomia do profissional

e da autonomia da população que deve decidir a melhor alternativa para a superação de um

problema de acordo com a força existente. A análise das alternativas e consequências de

uma ajuda implica pois um esclarecimento de como ela é vista pela própria instituição e

pela própria população. O levantamento das divergências de perspectiva sobre a questão é

fundamental no processo metodológico da articulação. Assim, o trabalhador social

esclarece sua perspectiva, a da instituição, a do Estado, conjuntamente com a população

que se vê esclarecida pelas perspectivas anteriores.

Assim a prestação de determinados recursos dos quais dispõe a instituição pode variar de

formas, de acordo com a perspectiva pela qual a população encara a questão. (Faleiros,

1991: 115)

O papel do Assistente Social, na resposta institucional ao envelhecimento da pessoa com

deficiência mental, poderá ser fundamental para diminuir o impacto negativo da

desvantagem social da pessoa idosa portadora de deficiência mental, contribuindo para a

diminuição do stress e reforçando as capacidades individuais e familiares de lidar e cuidar;

favorecer a comunicação entre os vários elementos implicados com o fim e o efeito de

identificar e enquadrar a complexidade da situação; ajudar a pessoa idosa portadora de

deficiência mental e a sua família a reconhecer as suas próprias potencialidades e

dificuldades e proceder ao mapeamento e prospecção dos recursos institucionais e

comunitários favorecendo um trabalho em rede e assessorando na resolução conjunta das

situações; e, por fim, efectuar as medidas adequadas dentro do seu campo de actuação para

proporcionar bem-estar ao idoso através da adequação dos serviços prestados e das

medidas políticas definidas ou a definir.

“Os profissionais devem ser capazes de ordenar os recursos, elaborar meios eficazes,

alcançar os objectivos propostos pelas instituições” (Faleiros, 1991: 42).

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CAPITULO II – ESTRUTURAÇÃO DA INVESTIGAÇÃO EMPÍRICA A investigação é um estudo sistemático em busca de conhecimentos e respostas em relação

a um determinado objecto com o fim de incorporá-lo, de maneira comunicável e

comprovável, a um corpo de conhecimento que se dispõe em uma dada área de reflexão,

esse estudo sistemático expressa uma concepção determinada do que seja essa área: do

sentido e do lugar que ela ocupa no contexto amplo dos conhecimentos. (Baptista, 2001:

32).

Ao investigador é então exigido um conjunto de procedimentos rigorosos para que, no

estudo das dimensões analíticas internas e externas, apreenda a complexidade e o carácter

contraditório das relações, as visões do mundo dos grupos em interacção e a forma como

estas geram e impulsionam as acções profissionais. Neste processo tem de enfrentar as

dificuldades e os desafios que se colocam quando tem de decidir, primeiro, quais os

materiais empíricos que vai trabalhar e segundo, como trabalhá-los (Baptista, 2001).

A partir de um estudo amplo das condições objectivas, pode-se construir um instrumento

de pesquisa que configure a visão do mundo de um determinado grupo social, a qual deve

permitir estabelecer os marcos de coerência entre os diferentes elementos das suas acções.

(Baptista, 2001).

No Serviço Social, assumido como profissão interventiva, o conhecimento a ser construído

pela investigação tem como horizonte não apenas a compreensão e explicação do real, mas

a operacionalização de um determinado tipo de acção sobre esse real. (Baptista, 2001: 42).

No que diz respeito à legitimidade das investigações sobre a prática profissional, a autora

Myrian Veras Baptista (2001) diz que a investigação científica voltada para a acção sobre a

realidade tem as suas exigências próprias ao nível da lógica, da epistemologia e das

técnicas, pois assumir como postulado para a intervenção a associação fundamental entre

teoria e prática, implica a construção de um caminho científico para a investigação da sua

acção, no quadro da intervenção. Exige a dialéctica intrínseca entre o processo cognitivo e

a acção.

Investigar a prática profissional tendo a intervenção como horizonte, isto é, “quando a

relação cognitiva não é a relação predominante” (Baptista, 2001: 39), confere à

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 82

investigação um carácter instrumental. Na forma particular do conhecimento de uma

disciplina de intervenção, emerge uma maneira particular de pôr problemas e construir

soluções lançando mão do desenvolvimento teórico e de aplicações tecnológicas.

A sugestão expressa pela autora é que o profissional desenvolva uma reflexão num sentido

histórico, social, político e técnico, de questionamento dos saberes instituídos, a fim de

produzir um saber e uma prática consequentes. A prática tem condições de ser fonte de

teoria, de ser espaço de elaboração científica, desde que problematizada e apreendida na

sua concretização, de uma perspectiva crítica, proporcionada por uma teoria social. O

pensamento ganha conteúdo através da sua interlocução com o real. Isto exige que a

relação entre conhecimento e acção se desenvolva num triplo movimento: crítica,

construção de um conhecimento novo e síntese no plano do conhecimento e da acção.

(Baptista, 200: 21)

A partir dos objectivos principais desta pesquisa, que passam por perceber e caracterizar

quais as respostas para o envelhecimento da pessoa portadora de Deficiência Mental,

foram aprofundados no Capitulo I desta investigação os temas principais que enquadram

teoricamente esta pesquisa. Em virtude desta problemática ser considerada pouco

aprofundada, foi necessário delinear estratégias metodológicas exequíveis e viáveis que

permitissem a sua análise.

1. Fundamentos, justificação e estratégia metodológica

Este ponto do documento tem como objectivo apresentar e justificar a opção metodológica

que se considera viável para analisar a problemática em estudo, sendo também definido o

problema em estudo, a estratégia da investigação adoptada, o universo e objecto empírico,

os métodos e técnicas usadas para a concretização deste trabalho.

Neste sentido, o problema subjacente a este trabalho prende-se com os seguintes vectores

de análise: as questões relacionadas com o envelhecimento do indivíduo portador de

deficiência mental e o seu bem-estar nesse processo evolutivo, promovido pelas repostas

sociais existentes.

Devido ao aumento da esperança de vida no geral e em especial nas pessoas com

deficiência, as pessoas com deficiência mental vivem agora muitos mais anos, do que há

alguns anos atrás. Esta nova situação, vem proporcionar a esta população a passagem por

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muitas situações de transição que também colocam novos desafios aos técnicos e

familiares que os rodeiam, na procura de novas respostas.

Considerámos nesta pesquisa, que é necessário unir os conhecimentos da gerontologia e da

área da deficiência, e dar primazia à voz das próprias pessoas, para se perceber o que é que

lhes pode proporcionar um envelhecimento com qualidade de vida, com o objectivo de se

repensar as respostas existentes, adaptá-las às novas exigências, responder a incertezas dos

profissionais e familiares, tal como planear de forma adequada o futuro desta população.

Para a concretização deste estudo, tendo em atenção a pergunta de partida: “Em que

medida as respostas sociais e/ou familiares promovem o bem-estar da pessoa portadora de

deficiência mental em processo de envelhecimento?”, realizámos um Estudo de Caso de

casos múltiplos numa Associação de resposta a pessoas portadoras de deficiência mental.

Esta Associação é uma Instituição Particular de Solidariedade Social, situada

geograficamente em Lisboa, e tem como objectivo promover a integração das pessoas com

deficiência mental na idade jovem e adulta, vocacionada ao apoio nos vectores da

formação, emprego, apoio ocupacional e apoio residencial.

Caracterização do campo empírico:

Um pouco de história: A Associação foi fundada por um grupo de pais e alguns

técnicos a 24 de Outubro de 1983, que decidiram unir esforços em torno de um projecto

que procurava responder às ansiedades e incógnitas em relação ao futuro dos seus filhos

com deficiência mental. A dinâmica deste grupo inicial rapidamente se estendeu a outros

pais que vivenciavam o mesmo problema e à sociedade civil em geral, que solidariamente,

deram um impulso decisivo para que o projecto se tornasse realidade. Após a cedência do

terreno para instalação por parte da câmara Municipal de Lisboa, o projecto de construção

das estruturas desenvolveu-se entre 1989 e 1996, com os apoios financeiros do Centro

Regional de Segurança Social de Lisboa e Vale do Tejo, do Instituto do Emprego e

Formação profissional e tantos outros organismos e entidades colectivas e particulares.

Assim conseguiram edificar um conjunto de estruturas onde actualmente são apoiadas 80

pessoas, com deficiência de nível ligeiro, moderado, severo e profundo, através das

seguintes repostas institucionais: Programas de Formação e Emprego (proporcionar

condições de trabalho), Actividades Ocupacionais (promover o desenvolvimento pessoal

e social) e Apoio Residencial (apoiar as famílias através de apoio residencial

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Idades

05

10152025303540

20-24 25-29 30-34 35-39 40-44 45-49 50-54

Escalão etário

n.º u

tente

s

Género

64%

36%Masculino

Feminino

individualizado). Contextualizando no tempo, em 1990, iniciou o funcionamento do Centro

de Actividades Ocupacionais; em 1991, deu início à laboração do Centro de Emprego

Protegido e em 1992, arrancou com o apoio na valência Residencial.

É uma Instituição Particular de Solidariedade Social, situada geograficamente em Lisboa e

tem como objectivo promover a integração das pessoas com deficiência mental na idade

jovem e adulta, vocacionada ao apoio nos vectores da formação, emprego, apoio

ocupacional e apoio residencial.

Caracterização dos utentes: Actualmente dá resposta a 103 utentes portadores de

Deficiência Mental que se encontram distribuídos pelas diversas actividades.

- Género e Idade: Os utentes são maioritariamente do género masculino, num total

de 66 homens e 37 mulheres, como se pode verificar no gráfico n.º 1. Apresentam idades

compreendidas entre os 20 – 54 anos, com maior predominância entre os 30 e 44 anos.

Gráfico n.º 1 – Género dos utentes Gráfico n.º 2 – Idade dos utentes

Fonte: Dados fornecidos pela Assistente Social da Associação

Quadro 1 - Distribuição dos utentes por idade, género e resposta institucional

Escalão Etário Resposta Institucional Género

<15 15-19 20-24 25-29 30-34 35-39 40-44 45-49 50-54 Total

M 5 9 7 1 22 CEP F 2 5 7

M 4 2 5 14 10 6 3 44 CAO F 3 3 4 6 7 5 2 30

M Apoio Residencial31

F 90

M 4 2 10 23 17 6 4 66 Total F 3 3 6 11 7 5 2 37

Fonte: Dados fornecidos pela Assistente Social da Associação

31 Todos os utentes têm direito a beneficiar de apoio residencial. Apenas 90 famílias recebem este apoio por

opção da família, tendo sempre em conta o projecto de vida de cada utente.

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Grau de Deficiência Mental

64%19%

17%

Ligeira

Moderada

Profunda / Severa

- Habilitações Literárias: Devido à sua deficiência intelectual, uma grande parte

dos utentes não têm habilitações literárias. Existe uma grande percentagem de utentes que

nem sequer sabe assinar o seu nome num total aproximado de 44 utentes. Os que

estudaram, muitos não completaram o ensino primário, tiveram um percurso escolar

apoiado e adquiriram fracas competências para a leitura. Apenas um utente estudou até ao

2.º ciclo e outro até ao 3.º ciclo. Habitualmente os utentes do Centro de Actividades

Ocupacionais possuem habilitações mais baixas e os trabalhadores do Centro de Emprego

Protegido na sua generalidade sabem assinar e escrever.

- Tipo e grau de Deficiência Mental: Revelou-se muito difícil caracterizar o grau de

deficiência mental dos utentes com rigor, porque as definições existentes por si só também

não são completamente lineares, pois de acordo com a definição estabelecida pela

AAMR 32, pode-se classificar as pessoas com deficiência mental dentro dos seguintes

níveis, Ligeiro, Moderado e Profundo, baseados no QI e considerando o comportamento

adaptativo dos indivíduos.

Gráfico n.º 3 – Grau de Deficiência Mental

Fonte: Dados fornecidos pela Assistente Social da Associação

Tendo por base esta classificação, concluiu-se que a maioria dos utentes possui uma

deficiência mental de grau ligeiro (64%), 19% dos utentes apresentam uma deficiência

mental moderada e 17% têm deficiência mental profunda, como se pode verificar no

gráfico n.º 3. Para além da deficiência mental alguns dos utentes apresentam outros

problemas associados como Doença Mental, Paralisia Cerebral, Trissomia 21, Síndrome de

Ruben Stine entre outras.

Caracterização dos Serviços:

Serviço de Apoio Residencial: Com base no Projecto de Vida elaborado para

cada uma das pessoas a que a Instituição apoia, nas quais participam a família, os técnicos

32 Associação Americana de Deficiência Mental

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e o próprio cliente, sempre que possível, procura-se proporcionar a cada um as respostas

sequenciais que nesse projecto foram definidas. Sendo o sistema familiar a “pedra basilar”

em todo o projecto do Associação, mas ao mesmo tempo caracterizado por fragilidades

várias que se vão acentuando com o avançar da idade e o inexorável desaparecimento dos

pais. A valência de Apoio Residencial surge, assim, como um serviço de apoio às pessoas

com deficiência e suas famílias, com uma função supletiva e não substitutiva, em ordem à

sua maior autonomia afectiva, pessoal e social e como um elemento reequilibrador do

sistema familiar tantas vezes já abalado na vertente física e psicológica. Este serviço

integra três tipos de respostas: (A) Apoio Residencial de natureza mais assistencial para os

indivíduos com maior nível de dependência; (B) as Residências de Transição, com

objectivos de formação para a autonomia e vida independente; (C) os Apartamentos

supervisionados e autónomos, no exterior, para aqueles que ascendam a um nível de

autonomia que permita a sua integração mais ou menos independente no exterior. Mais

recentemente, a Instituição estendeu a possibilidade de vir a apoiar os pais dos utentes da

Associação, quando, por motivo de idade e de saúde, venham a necessitar de apoio dos

serviços de Centro de Dia, Apoio Domiciliário e Lazer. Assim, a Instituição possui quatro

unidades residenciais (três delas com dez camas e uma com cinco) nas quais é possível

responder em regime rotativo, às necessidades de apoio de cerca de noventa beneficiários

da Instituição. Anualmente, para cada um, é estabelecido um programa de utilização do

serviço de Apoio Residencial em função da necessidade e interesse do beneficiário e da

família bem como do cumprimento dos objectivos de desenvolvimento de competências

pessoais e sociais para a autonomia e vida independente.

Este modelo de apoio assenta num patamar básico em que a família nunca é dispensada do

seu papel fundamental na vida das pessoas com deficiência, desde que exista e funcione

minimamente.

Formação e Emprego:

Departamento de Formação: A Associação é uma entidade acreditada pelo INOFOR, tem

promovido acções de formação para pessoas com deficiência, visando a sua inserção

profissional em mercado aberto de trabalho. A par destas, desde 1989 promove formação

profissional de activos em resposta às necessidades de formação interna e externa

identificadas no Associação e na generalidade das IPSS. O seu Departamento de Formação

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responde a necessidades de instituições e/ou de profissionais individuais das áreas de

pedagogia e reabilitação, com vista ao seu aperfeiçoamento profissional.

Centro de Emprego Protegido (CEP): Ciente das dificuldades inerentes à inserção

profissional das pessoas com deficiência mental em meio aberto de trabalho, o Associação

tem em funcionamento, desde 1991, um Centro de Emprego Protegido (CEP), onde estão

integrados profissionalmente 29 pessoas com deficiência distribuídos por vários sectores

de actividade. O CEP é constituído por um conjunto de unidades de prestação de serviços à

comunidade e tem por objectivo assegurar as condições que permitam às pessoas com

deficiência que não têm oportunidade de integração no mercado aberto de trabalho o

desempenho de uma actividade produtiva e, sempre que possível, a transição para o

mercado de emprego normal. Posiciona-se no contexto de mercado aberto, estando este

sector sujeito às leis do mercado e os seus trabalhadores em regime de Emprego Protegido

gozam das mesmas regalias e estão sujeitos às mesmas regras que outro trabalhador.

Os serviços prestados são coordenados por profissionais competentes em cada uma das

áreas e distribuem-se pela: lavandaria industrial; estofamento e decoração; jardinagem e

outros serviços como embalagem de talheres, selecção e embalamento de auscultadores

para uma empresa de catering de aviões, bem como o serviço de acompanhamento às

viaturas do Departamento da Acção Social da C.M.L, através dos Ajudantes de Carrinha.

Centro de Actividades Ocupacionais (CAO): É uma valência da Instituição de

apoio terapêutico, pedagógico e assistencial às pessoas com deficiência que não possuam

capacidade de execução de um trabalho com carácter produtivo. Tem como filosofia a

valorização pessoal e a integração social das pessoas com deficiência mental moderada,

grave e profunda, no sentido do desenvolvimento e maximização das suas competências e

capacidades residuais. Proporciona-se aos utentes a integração num conjunto de

actividades de natureza útil e lúdico – recreativo, que visam a melhoria do bem-estar e

qualidade de vida dos utentes e são uma forma de mantê-los activos e interessados. Nesta

valência são apoiados 74 beneficiários em três estruturas semi-autónomas: o Centro de

Actividades Estritamente Ocupacionais, o Centro de Actividades Ocupacionais Úteis e a

área Terapêutico – Pedagógica.

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O Centro de Actividades Estritamente Ocupacionais, de natureza lúdica e recreativa,

está vocacionado para as pessoas com nível de deficiência mental severa e profunda, onde

procura promover a independência pessoal, comunicação e a socialização de cada um.

O Centro de Actividades Ocupacionais Úteis, é uma estrutura na qual são desenvolvidas

actividades social e economicamente úteis para as pessoas com nível de deficiência mental

moderada, que não reúnem as condições necessárias ao exercício de uma actividade

profissional em regime de emprego protegido. Das actividades actualmente em curso é

possível destacar: Montagem e embalagem de produtos metálicos – Metalúrgica Luso-

Alemã; Embalagem de cabos para computadores – Frenesim, Lda.; Embalagem de talheres

e dobragem de guardanapos – Cateringpor; Montagem de bucins eléctricos – J. Santos;

Embalagem expedição de frascos – B.P.; Actividades hortícolas, jardinagem e pecuária.

Estas actividades pretendem ser adaptadas e ajustadas às capacidades e aos interesses de

cada cliente, sendo que o trabalho com cada um é orientado, em cada momento, por um

plano terapêutico e pedagógico individual que contempla a intervenção das diferentes

áreas, com uma incidência maior dumas em relação às outras, que é ditada pelas

necessidades e características individuais e os objectivos a alcançar com cada um. As

Áreas Terapêuticas e Pedagógicas, são transversais a todos os clientes do CAO e têm

como finalidade o desenvolvimento máximo de cada um e a recuperação de capacidades

nos domínios cognitivo, motor, emocional e social.

Neste sentido assumem especial importância as actividades culturais, gimnodesportivas e

recreativas, disponíveis para todos os clientes do CAO. Estas pretendem ser diversificadas

numa perspectiva pluridisciplinar, sendo estas: Educação Física: ginástica, actividades

desportivas, natação, remo adaptado; Hipoterapia: Estimulação/relaxação (Snoezelen);

Animação Musical; Actividades Expressivas; Fisioterapia; Hidromassagem / Jacuzzi;

Desenvolvimento Pessoal e Social; Artesanato; Confeitaria de doces tradicionais, pão

quente e pão com chouriço. Para além destas actividades de carácter regular, ainda dispõe

de uma série de actividades pontuais de cariz cultural e/ou desportivo, nomeadamente um

protocolo com a Escola Secundária Eça de Queirós (onde alguns clientes estão integrados

nas aulas de educação física), saídas a nível dos encontros inter-centros e, ainda, vários

passeios/visitas e excursões ao longo do ano.

A formação global destes indivíduos e a resposta às suas necessidades específicas no

domínio terapêutico obrigam a uma intervenção de uma equipa multidisciplinar em todas

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estas áreas. Complementarmente, usufruem de apoios especializados nas áreas do Serviço

Social e Psicologia. O Serviço Social tem como objectivo geral mobilizar recursos internos

e externos, designadamente no seio da família e da sociedade em geral, de forma a alcançar

a melhor adaptação social de cada um. Por sua vez, o Serviço de Psicologia preconiza

estratégias e técnicas de intervenção para cada um dos jovens, intervindo directamente

através de técnicas específicas, designadamente na avaliação dos jovens, na sua orientação

vocacional na utilização de técnicas psicoterapêuticas, no sentido de preservar o equilíbrio

e melhorar o seu comportamento adaptativo.

Condições de Admissão / Critérios de selecção: Para poder ser admitido na

Associação, a pessoa tem que ser portadora de Deficiência Mental, ter idade igual ou

superior a 18 anos, residir na Zona de Lisboa e dois dos seus familiares directos têm que se

fazer sócios efectivos do Associação. Os critérios de selecção dependem um pouco da

disponibilidade existente nas salas em determinado momento, no entanto a data de

inscrição é importante e existe também preferência de inserção pelos utentes provenientes

da comunidade mais próxima. Todos os utentes passam por um período de experiência,

com a duração de aproximadamente 1 mês no CAO da Instituição, com o objectivo de se

perceber se existe uma adaptação ao grupo e à própria dinâmica institucional e conhecer

qual será a resposta mais adequada às suas necessidades.

Equipa Técnica: No global, o bom funcionamento do Associação conta com o

apoio de 50 funcionários. Possui uma equipa pluridisciplinar composta por 12 auxiliares e

7 técnicos que, em todas as medidas pretende primar pela qualidade dos serviços e pelo

bem-estar das pessoas apoiadas. Em regime de trabalho a tempo inteiro tem um Director

Técnico, um Psicólogo, uma Assistente Social e uma Psicopedagoga, em regime parcial

colaboram com a Associação uma Fisioterapeuta, um Professor de Natação e um Professor

de Educação Física.

A Direcção da Associação é composta por Pais ou Sócios efectivos e são efectuadas novas

eleições de 3 em três anos. O suporte financeiro da instituição advém da cota paga pelos

sócios efectivos e sócios contribuintes, como também do apoio e contributo de muitas

entidades da comunidade.

O horário de funcionamento institucional é das 9h às 17horas de segunda a sexta-feira.

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Estratégia metodológica: Dada a quase inexistência em Portugal de trabalhos de investigação nesta área, pareceu-nos

que a metodologia de cariz essencialmente qualitativo é a que mais se adequa ao presente

estudo. Assim, realizámos um Estudo de Caso exploratório e descritivo, de casos

múltiplos, em que os dados recolhidos foram essencialmente de natureza qualitativa.

Yin (1988) in Carmo & Ferreira (1998: 216) define Estudo de Caso, como: “uma

abordagem empírica que investiga um fenómeno actual no seu contexto real; quando, os

limites entre determinados fenómenos e o seu contexto não são claramente evidentes; e no

qual são utilizadas muitas fontes de dados.”

Quer isto dizer que foi desenvolvido numa metodologia própria dos estudos exploratórios e

que estava longe do nosso propósito a recolha de dados estatísticos, de carácter oficial.

Um primeiro aspecto que caracteriza as metodologias qualitativas é o objectivo de captar e

reconstruir significados, utilizando uma linguagem mais descritiva. Num segundo aspecto

poder-se-á evidenciar o modo como a informação é “capturada” e num terceiro aspecto a

forma para adquirir informação numa metodologia qualitativa é flexível, sendo o seu

objectivo compreender os significados que cada actor social faz da sua realidade.

O Universo do presente trabalho de investigação é constituído por 3 grupos de pessoas,

nomeadamente: Utentes portadores de deficiência mental; Familiares pertencentes ao

agregado dos utentes em questão e Profissionais da Associação que acompanham o

processo destes.

Esta escolha surgiu após um contacto inicial com o Director da Associação, seguido de um

pedido oficial solicitando autorização para realizarmos o nosso trabalho de investigação

naquela Associação, o qual foi bem aceite. Em seguida, foi-nos apresentada a instituição,

os utentes, as suas actividades e os seus colaboradores, onde tivemos oportunidade de

perceber o seu funcionamento, apresentarmos o nosso projecto e expormos os objectivos

do nosso trabalho de forma geral. Nesta primeira aproximação à instituição, fomos muito

bem recebidos quer pelos técnicos quer pelos utentes.

As nossas preocupações com o envelhecimento das pessoas com deficiência mental

revelaram-se pertinentes na medida em que a própria instituição tem vindo a reflectir sobre

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elas como um tema de prioridade eminente. O director demonstrou bastante interesse em

poder colaborar neste projecto, referindo que o processo de reabilitação e elaboração do

projecto individual dos seus utentes, integra as questões do envelhecimento, deste e da sua

família, sendo importante abordar este assunto sempre do ponto de vista pessoal, familiar e

técnico.

Neste sentido, tendo em conta a necessidade de abranger este universo, foi constituída uma

amostra não probabilística, utilizando-se a técnica de amostragem de conveniência.

As amostras não probabilísticas “podem ser seleccionadas tendo como base critérios de

escolha intencional sistematicamente utilizados com a finalidade de determinar as

unidades da população que fazem parte da amostra.” (Carmo & Ferreira, 1998: 197).

Na amostra intencional, os informantes podem ser seleccionados para o estudo de acordo

com um certo número de critérios estabelecidos pelo investigador, tais como a idade, o

grau de deficiência, o seu percurso de vida, o grau de parentesco etc.

A fundamentação desta escolha parte do princípio de que: “se utiliza um grupo de

indivíduos que esteja disponível (...). Poderá tratar-se de um estudo exploratório cujos

resultados obviamente não podem ser generalizados à população à qual pertence o grupo

de conveniência.” (Carmo & Ferreira, 1998: 197).

Assim, para a selecção dos participantes, tivemos em conta as variáveis idade, grau de

deficiência e capacidades comunicacionais. Os restantes participantes têm uma ligação

directa familiar e profissional com os utentes seleccionados. Desta forma a amostra é

constituída por: 4 Utentes da Associação, portadores de deficiência mental moderada, com

idade superior a 45 anos que frequentam o Centro de Actividades Ocupacionais; 4

Familiares pertencentes ao agregado das pessoas com deficiência mental em questão (três

Mães e um Pai) e 4 Profissionais da Associação, nomeadamente 1 Assistente Social, 1

Psicólogo, 1 Auxiliar de Acção Educativa e 1 Ajudante de Lar. De forma a preservar o

sigilo e confidencialidade dos participantes não serão revelados os seus nomes.

A escolha deste objecto empírico, incidiu no facto de se considerar que os profissionais, a

família e a própria pessoa com deficiência mental, são os principais intervenientes directos

de todo o processo de desenvolvimento e envelhecimento do indivíduo.

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Os profissionais da Associação, são quem acompanha o processo de manutenção de

competências dos utentes, mantendo um conhecimento teórico e prático da problemática da

deficiência mental. Em especial, o profissional de Serviço Social por ser na maioria das

vezes o primeiro a receber o utente na instituição, por acompanhar o desenvolvimento do

projecto de vida do utente e por fazer a ponte entre este, a instituição e a família,

desempenha um papel primordial e imprescindível quer na definição das novas políticas

sociais quer na implementação de novas respostas para esta população, na medida em que

conhece a sua realidade bem de perto, partindo de diferentes pontos de vista.

A Família, por sua vez é fundamental no processo de envelhecimento desta população

mantendo uma postura de relutância face ao futuro, pensando e apoiando o seu familiar na

elaboração de planos e projectos para uma vida mais independente e autónoma.

Por fim, consideramos que a planificação e futura implementação de futuras respostas

sociais, não poderão ter sucesso se a voz dos seus futuros utentes não for activa

A partir do discurso da pessoa com deficiência mental, dos seus familiares e profissionais

que consigo trabalham todo o dia, estudámos as suas percepções e expectativas acerca do

processo de envelhecimento da pessoa com deficiência mental, bem como compreendemos

quais as respostas sociais e institucionais, que melhor se adequam às suas necessidades

para poderem envelhecer com qualidade.

A estratégia de pesquisa pela qual se optou é a estratégia indutiva, própria dos estudos

qualitativos. Esta tem essencialmente um carácter exploratório e descritivo.

Na estratégia indutiva, “Os investigadores tendem a analisar a informação de uma forma

indutiva. Desenvolvem conceitos e chegam à compreensão dos fenómenos a partir de

padrões provenientes da recolha de dados. Não procuram a informação para verificar

hipóteses.” (Carmo & Ferreira, 1998: 179). Tem como ponto de partida uma pesquisa

exploratória, ou seja uma, “... Fase aberta na qual o investigador se situa como um

verdadeiro explorador, se familiariza com a situação ou um fenómeno e tenta descrevê-los

e analisá-los” (Albarello, 1997: 97).

Segundo alguns autores, a estratégia indutiva consiste em quatro principais etapas, as quais

foram tomadas em consideração neste estudo, nomeadamente: (1) Todos os factos são

observados e registados sem qualquer selecção ou conjecturas acerca da sua importância

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relativa. (2) Estes factos são analisados, comparados e classificados, sem usar hipóteses.

(3) Desta análise, retiram-se indutivamente as generalizações respeitantes às relações entre

os factos. (4) Estas generalizações são testadas.

A estratégia indutiva aplica-se a todos os sujeitos do objecto empírico, na medida em que

se procurará, através dos mesmos, informações passíveis para produzir generalizações

sobre os padrões ou regularidades que existem nos dados obtidos.

Através de entrevistas, recolhemos contributos das percepções das pessoas com deficiência

mental que se encontram no seu processo de envelhecimento, da sua família e dos

profissionais que acompanham o seu processo, para se perceber de que forma é que se

pode proporcionar respostas sociais com qualidade e adequadas às necessidades desta

população na sua etapa mais avançada.

2 - Técnicas de Investigação

Para a realização desta investigação recorreu-se ao uso de diferentes estratégias e técnicas

de investigação.

O instrumento mais adequado, deve permitir conhecer a opinião que as pessoas com

deficiência mental têm relativamente à sua vida e também as suas condições de vida

objectivas (Arostegi, 1999: 408).

Assim tendo em conta as características individuais das pessoas com deficiência mental,

foram utilizadas as seguintes técnicas:

Pesquisa Bibliográfica: através de uma aprofundada pesquisa bibliográfica construímos o

enquadramento teórico, estimulando novas perspectivas relativamente às dimensões que

pretendemos estudar e ao desenvolvimento da investigação, contribuído para o

aprofundamento do conhecimento em Serviço Social.

Observação – Participante: através da observação participante, é o próprio investigador o

instrumento principal de observação. Isto significa que, o investigador pode compreender o

mundo social do interior, pois partilha a condição humana dos indivíduos que observa.

Tem por objectivo recolher os dados (sobre acções, opiniões ou perspectivas) aos quais o

observador exterior não teria acesso. A observação participante é portanto uma técnica de

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investigação qualitativa adequada ao investigador que deseja compreender um meio social

que à partida, lhe é estranho ou exterior e que lhe vai permitir integrar-se progressivamente

nas actividades das pessoas que nele vivem. (Boutin, 1990: 155)

Com o objectivo de conhecermos de perto a realidade da população em estudo,

observámos e participámos no campo empírico através do acompanhamento de algumas

actividades existentes na Associação, durante 5 meses.

Esta estratégia revelou-se fundamental pois permitiu-nos criar alguma relação de

proximidade e confiança com os profissionais e os utentes, sendo assim mais fácil a

colaboração de todos os intervenientes neste projecto.

Após o período de observação registaram-se todos os dados recolhidos, resultando daí um

conjunto de diários de campo33 que se basearam na metodologia defendida por Biklen e

Bogdan (1994) sobre a construção e elaboração dos diários de campo.

Entrevistas Exploratórias: realizámos três entrevistas semi-directivas de carácter

exploratório34 a testemunhas privilegiadas, com o objectivo de aproximar a realidade das

práticas profissionais ao conteúdo teórico explorado e também como base para a

construção das entrevistas a aplicar aos participantes. Assim aplicámos entrevistas

exploratórias35 a dois directores de duas instituições que dão resposta a jovens / adultos

com deficiência mental e a uma Psiquiatra que trabalha no Hospital Júlio de Matos.

Inquérito por entrevista: realizámos entrevistas semi-directivas a todos os participantes.

Considera-se que o inquérito por entrevista foi o instrumento mais adequado devido à sua

“flexibilidade quanto ao tempo de duração, adaptação a novas situações e a diversos tipos

de entrevistados; profundidade (permite observar o entrevistado e colher informações

intimas ou do tipo confidencial) ” (Carmo & Ferreira, 1998: 130).

Neste sentido, partindo do contributo das entrevistas exploratórias e de algum período de

observação participação, elaborámos um guião de entrevista para os familiares36, um guião

33 Vide Apêndice n.º 1 (Volume 2) – Diários de Campo 34 Vide Apêndice n.º 2 (Volume 2) - Guião da Entrevista Exploratória 35 Vide Apêndice n.º 3 (Volume 2) – Entrevistas Exploratórias 36 Vide Apêndice n.º 4 (Volume 2) – Guião de entrevista aos familiares

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de entrevista para cada profissional37 consoante a sua área de actividade no Associação e

um guião de entrevista para os utentes38.

Registe-se que as entrevistas dirigidas às pessoas com deficiência mental, devido às suas

características individuais, ao nível da compreensão e capacidade de desenvolvimento mais

restrito de resposta, impelem que a escolha do método seja flexível, mas não demasiado

amplo, neste sentido sentimos necessidade de recorrer na maioria a perguntas fechadas.

Com o objectivo de conhecer e avaliar qual a melhor resposta promotora de bem-estar no

processo de envelhecimento do indivíduo portador de deficiência mental, aplicaram-se

entrevistas semi-directivas aos familiares, aos profissionais e aos utentes. Esta variante da

entrevista “é semi-directiva no sentido em que não é inteiramente aberta nem

encaminhada por um grande número de perguntas precisas” (Quivy, 1998: 192).

Todas entrevistas foram realizadas na Associação com o objectivo de aproximação do

investigador ao contexto real dos participantes, gravadas e posteriormente transcritas na

íntegra.

Através de uma entrevista orientada, a partir de um referencial de perguntas-guia, o

entrevistado desenvolveu um discurso em torno dos temas propostos, livremente,

exprimindo-se com abertura, expondo as interpretações, sentimentos, percepções sobre o

tema proposto. Tendo em conta as características da população com deficiência mental,

esta técnica por não ser totalmente rígida, parece-nos ser a mais adequada para observar o

contexto de vida e as opiniões dos entrevistados.

Os temas propostos nas entrevistas, incidiram nas questões consideradas mais importantes

a abordar tendo em vista a resposta às questões de investigação, debruçámo-nos por isso

em três grandes temas, nomeadamente a problemática da deficiência mental, a

problemática do envelhecimento e as respostas sociais adequadas ao envelhecimento das

pessoas portadoras de deficiência mental.

Neste sentido, todas entrevistas tiveram início com um conjunto de perguntas

identificativas do entrevistado que nos permitiram proceder à caracterização pessoal de

37 Vide Apêndice n.º 5 (Volume 2) - Guião de entrevista aos profissionais 38 Vide Apêndice n.º 6 (Volume 2) - Guião de entrevista às pessoas portadoras de deficiência mental

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cada um. Esta caracterização teve como objectivo a possibilidade de interpretação dos

dados partindo da contextualização histórica, social e cultural de cada participante.

Em virtude da complexidade do tema desta investigação, a aplicação do guião de entrevista

aos familiares e aos profissionais foi submetido a um pré-teste39 que teve como objectivo

testar e confirmar a coerência das questões, bem como a sua pertinência.

As entrevistas aos familiares40 contemplaram questões referentes à problemática da

deficiência mental, com o intuito de percebermos a realidade familiar dos pais que têm um

filho portador de deficiência mental, bem como a sua percepção sobre o que é a deficiência

mental, as suas causas e as implicações que este filho apresenta na organização da vida

destas famílias. Um segundo tema explorado foi a problemática do envelhecimento, com o

objectivo de compreendermos a percepção dos pais sobre o envelhecimento dos filhos, as

suas preocupações e necessidades neste processo evolutivo, tendo em conta que os

próprios pais são os seus principais cuidadores e encontram-se na faixa etária da 3.ª idade.

Por fim questionámos os familiares sobre as suas vontades relativamente ao futuro dos

seus filhos, ou seja qual a melhor resposta social e conjunto de actividades promotoras de

bem-estar no envelhecimento dos seus filhos.

As entrevistas realizadas aos profissionais41, tiveram como objectivo a obtenção de um

ponto de vista técnico baseado na prática e conhecimento profissional dos entrevistados.

Inicialmente considerámos importante elaborarmos um enquadramento destes profissionais

na Associação em que trabalham, tendo sido colocadas perguntas relativas aos objectivos

da Instituição, como é que foram trabalhar para lá, quais as suas motivações e

constrangimentos e as funções que cada profissional desempenha. Aos profissionais de

Serviço Social e Psicologia colocaram-se questões relativamente aos princípios e valores

éticos em que baseiam a sua acção, tendo em vista a sua posição relativamente à

Declaração dos Direitos Humanos para a pessoa com deficiência. No conjunto de

perguntas referentes à problemática da deficiência mental e do envelhecimento,

procurámos obter um conhecimento sobre ambas as problemáticas acreditando que os

profissionais têm condições para basear as suas respostas nas teorias existentes e na sua

prática profissional confirmando ou infirmando as teorias já existentes. A entrevista

39 Vide Apêndice n.º 7 (Volume 2) – Pré-teste dos guiões de entrevista 40 Vide Apêndice n.º 8 (Volume 2) – Transcrição das entrevistas realizadas aos familiares 41 Vide Apêndice n.º 9 (Volume 2) – Transcrição das entrevistas realizadas aos profissionais

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contemplou ainda um conjunto de perguntas referentes à situação das famílias que se

deparam com o problema do envelhecimento de um filho portador de deficiência mental,

perguntando-lhes qual a sua opinião relativamente aos problemas e necessidades dos pais,

bem como sobre o processo de atribuição de tutores e sobre a avaliação que os pais fazem

dos serviços que a Associação presta. Por fim abordámos o tema das respostas sociais

questionando os profissionais sobre qual o desenho da melhor resposta para o

envelhecimento das pessoas portadoras de deficiência mental.

Antes de aplicarmos o guião de entrevista às pessoas portadoras de deficiência mental,

fomos introduzindo a temática durante o período de observação participante, pois

apercebemo-nos de que apesar deste tema ter sido já explorado pela Associação, para

alguns utentes quando falávamos do envelhecimento das pessoas no geral e

especificamente no caso deles em concreto, associaram automaticamente o tema à morte

dos pais. Sentimos por isso que os utentes não estavam a entender o propósito do nosso

estudo e neste sentido, inicialmente realizou-se uma Dinâmica de Grupo42sobre o tema do

Envelhecimento, dirigida aos 4 utentes em estudo, com o objectivo de introduzir,

sensibilizar e informar o tema em causa, onde contámos com a colaboração do Psicólogo

da Associação, que na sua actividade profissional já desenvolve com os utentes actividades

que procuram o treino do controlo emocional, revelando-se por isso o seu apoio

fundamental neste processo. As entrevistas semi-directivas foram realizadas nos dias

seguintes.

As entrevistas aos utentes43 tiveram como objectivo ouvir na primeira pessoa a opinião

sobre as questões que temos vindo a aprofundar. Constitui-se essencialmente por um

conjunto de perguntas directas e fechadas que abordaram as questões da identidade da

pessoa com deficiência mental, na tentativa de posicionarmos os entrevistados num

contexto pessoal, levando-os a falar sobre eles mesmos. Após as perguntas sobre a sua

família pedimos para falarem sobre eles esperando que abordassem os temas que

consideram mais importantes na vida deles e a partir daí fomos colocando questões sobre a

vinda deles para a Associação, tentando sempre situar a pessoa no espaço e no tempo.

Introduzimos, deste modo, o tema do envelhecimento com perguntas referentes à sua idade

e sobre a noção que têm relativamente à idade dos pais e suas dificuldades inerentes ao

avançar da idade, para posteriormente entendermos se os participantes sentem os sinais de 42 Vide Apêndice n.º 10 (Volume 2) – Planificação e transcrição da dinâmica de grupo 43 Vide Apêndice n.º 11 (Volume 2) – Transcrição das entrevistas realizadas às pessoas portadoras de DM

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envelhecimento e qual a sua opinião acerca do seu futuro, onde e com quem querem viver

e que actividades querem desenvolver.

Análise de Conteúdo: posteriormente, realizou-se análise de conteúdo às entrevistas

realizadas, onde tivemos por base as temáticas consideradas essenciais para a interpretação

dos dados recolhidos. “A análise de conteúdo é um conjunto de técnicas de análise das

comunicações” (Bardin, 1979: 31).

A técnica de tratamento de dados, análise de conteúdo, foi fulcral para a interpretação da

informação recolhida, porque é “(...) uma técnica para fazer inferências pela identificação

sistemática e objectiva das características específicas de uma mensagem” (Holst in

Ghiglione e Matalon, 1992: 184). Esta técnica permitiu descobrir categorias e construir a

análise das relações da informação recolhida.

Há que ter em conta que a mensagem não vem escrita apenas nas letras ou palavras, mas

sim que se faz também anunciar por um vasto recurso de comunicados simbólicos

(terminologias; vocabulários, códigos de linguagem próprios e por outras formas de

comunicação não verbal), indispensáveis para uma compreensão da mensagem.

Esta técnica tem “a vantagem de em muitos casos funcionar como uma técnica «não-

obstrutiva»” (Vala, 1986: 106), ou seja, não implica constrangimentos entre entrevistador

e entrevistado, dado que é aplicado a posteriori sobre o material empírico recolhido.

Segundo Bardin (1979: 95), esta técnica passa por algumas etapas no seu processo de

tratamento de dados, as quais foram tomadas em conta. A primeira fase, consistiu numa

pré-análise, “é a fase de organização propriamente dita”. Na segunda fase procedemos a

uma exploração do material, “(...) não é mais do que a administração sistemática das

decisões tomadas.” Esta “consiste essencialmente em operações de descodificação,

desconto ou enumeração, em função de regras previamente formuladas.” Neste sentido a

análise de conteúdo realizada seguiu a organização sugerida por Yin (1984) in Boutin

(1990: 173) em que a análise foi dividida por três grupos nomeadamente os familiares, os

profissionais e os utentes, construindo-se para isso um quadro de análise para cada grupo

de entrevistas, baseado em categorias temáticas e dimensões a analisar.

Numa terceira etapa procedemos ao tratamento dos resultados obtidos e sua interpretação,

“os resultados brutos são tratados de maneira a serem significativos e válidos (…) o

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 99

analista, tendo à sua disposição resultados significativos e fiéis, pode então propor

inferências e adiantar interpretações a propósito dos objectivos previstos.” Bardin (1979:

95)

Por fim procedemos a uma triangulação dos dados obtidos, e apresentamos as conclusões

apreendidas.

Importa referir que os dados recolhidos foram tratados com os necessários cuidados éticos

e respeitada a confidencialidade dos participantes que aceitaram participar neste estudo.

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CAPITULO III – ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTAD OS

1 - Análise das entrevistas realizadas aos familiares: visão dos pais sobre o

envelhecimento dos filhos portadores de deficiência Mental

Neste ponto apresentamos a análise dos dados recolhidos ao longo do processo de

investigação que resultam das entrevistas realizadas aos familiares (três mães e um pai) dos

utentes da Associação, que participaram nesta investigação. Com o propósito de

conhecermos de forma aprofundada a sua opinião sobre o assunto em causa, submetemos a

informação recolhida a uma análise de conteúdo44 que permitiu a organização e

sistematização dos dados recolhidos.

Tendo em conta o tema em estudo, e procurando conhecer a visão dos pais sobre o

envelhecimento dos seus filhos portadores de deficiência mental, numa primeira parte da

entrevista procurámos conhecer melhor os pais através de questões gerais de identificação

que nos permitiu realizar a caracterização deste grupo de entrevistados. Numa segunda

parte aprofundámos questões relativas à situação da deficiência mental e todas as suas

implicações ao nível familiar. Numa terceira parte colocámos questões referentes ao

envelhecimento dos seus filhos onde procurámos percepcionar qual a opinião dos pais

sobre o processo de envelhecimento destes, as suas preocupações e necessidades nesta

etapa da vida. Por fim questionámos os pais sobre as suas vontades relativamente ao futuro

dos seus filhos dirigindo as nossas questões para o tema das respostas sociais. Neste

sentido, esta análise debruça-se sobre três grandes temas, nomeadamente: a problemática

da deficiência mental, a problemática do envelhecimento e respostas sociais.

1.1. - Breve caracterização dos Familiares entrevistados

Familiar 1 – Mãe, tem 72 anos está viúva há 4 anos, vive com a filha e uma terceira

pessoa já considerada da família, tem o 4.º ano de escolaridade e trabalhou como

empregada auxiliar na APPACDM em Lisboa. Actualmente está reformada.

Familiar 2 – Mãe, tem 76 anos, é casada, vive com o marido e o filho portador de

Deficiência Mental, é Licenciada em Engenharia Química, exerceu apenas por duas vezes

a sua profissão e devido à criação dos filhos acabou por trabalhar como explicadora de

44 Vide Apêndice n.º 12 (Volume 2) – Análise de conteúdo das entrevistas aos familiares

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matemática e físico-química dando explicações em casa, tem feito parte de todos os órgãos

sociais do Associação e no último mandato foi presidente da Direcção. Actualmente está

reformada.

Familiar 3 – Mãe, tem 71 anos, está viúva há dois anos, Vive sozinha com a filha

portadora de Deficiência Mental, tem o 8.º ano de escolaridade, durante a maior parte da

sua vida foi dona de casa à excepção de um pequeno período da sua vida que foi

mediadora de seguros. Actualmente está reformada.

Familiar 4 – Pai, tem 80 anos, é casado, vive com a esposa e o filho portador de

deficiência mental, tem o 4.º ano de escolaridade, trabalhou inicialmente no campo e

depois foi trabalhar para a Fundação Calouste Gulbenkian como auxiliar administrativo.

Actualmente está reformado.

Como podemos verificar entrevistámos três mães e um pai. Considerámos importante

perceber também qual a opinião do pai sobre o envelhecimento do seu filho, pois se

tivermos em conta que a média de idades dos pais é de 70-80 anos e os contextualizarmos

na época social em que criaram e educaram os seus filhos, a figura do pai era vista como o

chefe de família responsável pela manutenção económica familiar.

Neste sentido pareceu-nos interessante a possibilidade de se poder confrontar a visão das

mães que na sua globalidade dedicaram grande parte da sua vida aos cuidados dos filhos e

a visão de um pai que sempre trabalhou fora de casa.

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Sistematização da análise das entrevistas aos familiares Quadro 2 – Sistematização da análise das entrevistas aos familiares

Fonte: Entrevistas realizadas aos familiares, 2007

Temas Categorias Sub-categorias

Nascimento de um filho com DM

Dúvidas e incertezas; desconhecimento do problema; choque

Existência de outros filhos

Têm outros filhos sem deficiência; atenuou a dor; bom relacionamento entre irmãos

Existência de outros familiares portadores de

DM

Não existem outros familiares portadores de deficiência

Causa da DM Má assistência durante o parto; deficiência num cromossoma; infecção doença;

prematuridade

Percurso escolar da pessoa portadora de DM

Procura da escola mais ajustada às necessidades; existência de poucas escolas

especiais; necessidade de mudança de residência; passaram por muitas escolas;

escolas desadequadas às necessidades de adultos

Ter um filho portador de DM

É uma pessoa especial; não é uma pessoa normal; pessoa inocente; problema

monstruoso; pessoa que nos limita; é difícil viver com ele; caminho muito difícil;

preocupação, deixamos de ser donos de nós mesmos; pessoa que precisa de carinho e

compreensão

Principal cuidador da pessoa com DM

É a mãe, apenas uma família referiu ser o pai e a mãe

Deficiência

Mental

(DM)

Processo de Interdição / Tutoria

Processo demorado; retira a autoridade da pessoa; desconhecimento do processo de

interdição; necessidade de esclarecimentos por parte da Associação; processo

concluído; o tutor deve ser um familiar próximo; na inexistência de familiares deverá

ser a instituição a responsável pelos seus filhos; o Tutor é uma garantia para o futuro

dos filhos

Envelhecimento de um filho com DM

Problemática recente; não pensa muito sobre isso; envelhecimento precoce;

preocupação

Sinais de envelhecimento

Está mais calma; envelhecimento a nível físico; esquecimentos; perca de autonomia;

problemas visuais; menos energia; confuso; instabilidade emocional; problemas de

saúde

Preocupações dos pais relativamente ao

envelhecimento dos filhos

O seu envelhecimento; o seu estado de saúde; vislumbrar a própria morte; futuro dos

filhos; duplo envelhecimento; tutor dos filhos

Envelheci

mento

Necessidades dos pais Apoio aos filhos; apoio aos pais

Melhor resposta para o futuro

A associação; existência de uma pessoa que cuide do filho; manutenção dos laços

familiares; lar para pais e filhos

Respostas

Sociais Actividades promotoras

de bem-estar no envelhecimento da

pessoa portadora DM

Adaptação das actividades existentes; pretendem que o filho se mantenha activo; não

sabem quais as actividades indicadas; actividades físicas; actividades de relaxamento;

actividades que mantenham as capacidades dos filhos

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1.2 - A Deficiência Mental:

1.2.1 - Nascimento de um filho com deficiência mental

O nascimento de um filho é sempre um momento muito esperado na maioria das famílias.

Durante o período de gestação os pais criam imagens de como será o seu filho. Através das

entrevistas realizadas tentámos entender os sentimentos dos pais e perceber o que muda na

vida de uma família com o nascimento de uma criança portadora de deficiência, para

percepcionarmos de forma mais adequada todo o percurso de vida destes e dos seus filhos

e entendermos de forma mais realista as suas vontades.

Quadro 3 – Nascimento de um filho com deficiência45

Fonte: Entrevistas realizadas aos familiares, 2007

Para estes pais o nascimento do seu filho veio acompanhado de muitas dúvidas e incertezas

“quando a menina nasceu eu não soube logo que ela era deficiente, só passado uns dias é

que eu comecei a ver que havia alguma coisa de diferente” (F1).

Há 40 anos atrás as questões relativas à deficiência mental ainda não tinham sido

exploradas com profundidade, o que fez com que estes pais demorassem anos para

saberem qual o real problema do seu filho. “ (…) os médicos disseram sempre que o …

não tinha nada. O pediatra (…) tinha dito aos meus pais que realmente era possível que

houvesse ali realmente uma deficiência mas isto ao fim de 6 anos.” (F2)

Quando se apercebem que algo está errado, surge o momento de difícil adaptação àquela

nova realidade, chamado por alguns autores a fase do luto, “bem a princípio foi um choque

muito grande (…) foi mesmo difícil para mim e para o meu marido (F1)

1.2.2 - Existência de outros filhos

Quadro 4 - Existência de outros filhos

Respostas F1 F2 F3 F4 Têm outros filhos s/ deficiência Atenuou a dor Bom relacionamento entre irmãos

Fonte: Entrevistas realizadas aos familiares, 2007

45 Legenda para todos os quadros apresentados: Resposta dada pelo entrevistado

Respostas F1 F2 F3 F4 Dúvidas e incertezas Desconhecimento do problema Choque

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A existência de outros filhos sem deficiência ajudou a atenuar a dor destes pais, que a certo

momento da sua vida revelam um grande cansaço emocional, “em certas alturas da vida

precisei de sair um pouco de casa até por causa da …” (F3) promovido pela procura

constante de respostas adequadas às necessidades dos seus filhos. (…) o … deu muito

trabalho e cansou-me muito, “(…) sem grandes apoios de ninguém porque os médicos não

acreditavam” (…F2); “ (…) quando eu tive o outro filho então já se atenuou um bocado a

dor” (…F1) Os pais referiram que existe um bom relacionamento entre os irmãos.

1.2.3 - Existência de outros familiares portadores de deficiência mental

Nenhuma família entrevistada possuía familiares próximos que possuíssem qualquer tipo

de deficiência, excluindo por isso a hipótese da causa da deficiência dos seus filhos ser

hereditária.

1.2.4 - Causa da deficiência mental

Quadro 5 - Causa da deficiência mental

Respostas F1 F2 F3 F4

Má assistência durante o parto Deficiência num cromossoma Infecção doença Prematuridade

Fonte: Entrevistas realizadas aos familiares, 2007

Na maioria dos casos de deficiência mental (DM), especialmente os níveis de leve e

moderado não se pode identificar as causas, ficando aí uma discussão acirrada entre

autores, “não foi diagnosticado ao … nenhuma doença” (F2)

Como se pode perceber pelo quadro anterior cada um destes pais apresenta uma causa

diferente, como razão para o seu filho ser portador de deficiência mental. No entanto as

principais causas apontadas pelos pais prendem-se com causas Peri-Natais que incidiram

desde o inicio do trabalho de parto até ao 30º dia de vida do bebé, tais como má assistência

e trauma de parto, “ela foi tirada a forcep a ferros e deram-lhe cabo da cabecita” (F1) e

prematuridade “quase que tenho a certeza que foi devido ao parto, prematuro, muito

fraquinho (…F4) e causas Pós-Natais que incidiram do 30º dia de vida até o final da

adolescência, tais como infecções ou outras doenças, “nasceu normal teve foi uma

meningite mingocócita aos 17 meses e foi a desgraça dela ficou sem andar sem ver e

devagarinho lá foi recuperando” (F3), “uma deficiência num cromossoma que é mais

pequeno que os outros que é o Syndrome de Williams”. (F2)

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1.2.5 - Percurso escolar da pessoa portadora de deficiência mental

Quadro 6 - Percurso escolar da pessoa portadora de deficiência mental

Respostas F1 F2 F3 F4 Procura da escola mais ajustada às necessidades Existência de poucas escolas especiais Necessidade de mudança de residência Passaram por muitas escolas Desadequados às necessidades de adultos

Fonte: Entrevistas realizadas aos familiares, 2007

Passada a fase de luto, revelam toda uma vida de luta, como podemos perceber pelas

palavras destas mães que tiveram que procurar professores especiais e escolas também

especiais numa procura constante do que era melhor para os seus filhos. “Eu andava

sempre a procurar coisas não é mas não havia grandes recursos” (F3); “ (…) há 40 e tais

anos não havia nada absolutamente nada” (F1). Nessa procura, viram-se forçadas a

reorganizar a vida, como por exemplo mudar de local de residência46 “comecei outra vez

com a luta, vim para Lisboa por causa da …” (F1). Os pais que na época viviam fora de

Portugal, viveram divididos com a dúvida se cá existiriam mais respostas, tendo mesmo

um deles, enviado a filha para ser internada num colégio cá em Portugal. “ (…) Em Lisboa

há colégios tão bons para ela (…) não havia nada de especial, mas (…) não descansei

enquanto ela não veio”. (F3)

Todos eles explicaram que os seus filhos passaram por vários colégios como o Clapared ou

a CERCI de Lisboa, mas que ao atingirem uma idade adulta esses locais deixaram de ser

adequados para as suas necessidades e aí surge a integração dos seus filhos na Associação.

“na altura era fraquinho tudo (…) porque foi comigo que ele aprendeu”. (F2)

1.2.6 - Ter um filho portador de deficiência mental Quadro 7 – Ter um filho portador de deficiência mental

Respostas F1 F2 F3 F4

É uma pessoa especial Não é uma pessoa normal Pessoa inocente Problema monstruoso Pessoa que nos limita É difícil viver com ele Caminho muito difícil Preocupação Deixamos de ser donos de nós mesmos Pessoa que precisa de carinho e compreensão

Fonte: Entrevistas realizadas aos familiares, 2007

46 Vide Diário de campo de 13 de Abril 2007

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Como revelam estes pais, ser pai ou mãe de uma pessoa portadora de deficiência mental,

pode revelar-se uma tarefa difícil, principalmente porque os filhos não têm uma

perspectiva de percurso de vida idêntico à generalidade das pessoas. “ (…) É especial (…),

não é uma pessoa normal, que tenha um futuro risonho, que pudesse vir a constituir um

lar, (…) não dá bem para descrever bem a monstruosidade do problema.” (F4)

O facto de a pessoa com deficiência mental necessitar de acompanhamento diário nas suas

tarefas conduz a uma responsabilidade máxima por parte dos pais que dura toda a vida.

“ (…) Nunca somos muito, donos de nós mesmos (…) há toda uma série de coisas que nós

deixamos de fazer não numa perspectiva de os esconder (…) houve um bocadinho de nós

que morreu e sobretudo o futuro (…) é sempre uma pessoa que nos limita em muita coisa”

(…F2)

Esse destino “pesado” que a vida lhes reservou, “ (…) acho que não é bênção para

ninguém (…F2); “(…) é um bocado complicado viver com ele” (F4), é superado pelo

sentimento de amor entre pais e filhos. Apesar do desgaste diário ao nível físico e

emocional que estes pais descrevem nas suas palavras, a pessoa com deficiência mental é

geralmente uma pessoa afectiva. “Uma pessoa com deficiência mental é uma pessoa

especial.” (F3) Os pais descrevem que ao longo da vida foram aprendendo estratégias de

como lidar com as características dos próprios filhos, tentando na medida do possível

exigir-lhes as mesmas regras de comportamento generalizadas na sociedade.

“É um caminho muito difícil mas a gente aprende a viver com isso, o melhor possível e até

a ter momentos de alegria porque são sempre inocentes.” (F3)

“Acho que é uma pessoa, (…) devemos ter tanto ou mais carinho e mais compreensão do

que por uma pessoa que não tenha problemas, não é!” (F1)

“Eu lido com ela como nada fosse (…) às vezes eu é que já não tenho paciência” (…F3)

Contudo podemos concluir que ter um filho portador de deficiência mental é sobretudo

“uma preocupação essencialmente do dia e do amanhã.” (F2)

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1.2.7 - Principal cuidador da pessoa com deficiência mental

Quadro 8 - Principal cuidador da pessoa com deficiência mental

Entrevistas Familiares F1 F2 F3 F4

Mãe Pai Mãe e Pai

Fonte: Entrevistas realizadas aos familiares, 2007

Os entrevistados foram essencialmente mulheres e mães. Duas delas neste momento

encontram-se viúvas sendo por isso as principais cuidadoras da pessoa com deficiência,

mesmo apresentando já bastante idade “Sou eu.” (F3). Os filhos não casaram nem

constituíram família e por isso também nunca saíram de casa. Outra das mães revela que

apesar da existência do pai, é ela que é a principal cuidadora, sacrificando o seu

crescimento profissional em prole da educação e acompanhamento dos filhos. “Sou eu a

principal cuidadora. (…) porque o meu marido não estava em casa.” (F2) A quarta família

entrevistada referiu que ambos cuidavam do filho, a mãe e o pai.

Todos estes pais contam ainda com o apoio da Associação para cuidar dos seus filhos

adultos e portadores de deficiência intelectual. “Sou só eu, e o … (…) foi a melhor coisa

que me apareceu na vida foi o … e toda esta família (…) sinto muito apoio aqui” (…F1)

1.2.8 - Processo de Interdição / Tutoria

Quadro 9 - Processo de Interdição / Tutoria das pessoas com deficiência mental

Respostas F1 F2 F3 F4 Processo demorado Retira a autoridade da pessoa Desconhecimento do processo de interdição Necessidade de esclarecimentos por parte da Associação Processo concluído O tutor deve ser um familiar próximo Na inexistência de familiares deverá ser a Associação o responsável pelos seus filhos O Tutor é uma garantia para o futuro dos filhos

Fonte: Entrevistas realizadas aos familiares, 2007

Segundo o Regime da Interdição e Inabilitação e da Tutela (Código Civil: artigos 138º e ss,

artigos 1927º e ss e Código de Processo Civil: artigos 944º e ss) em Portugal todos os

cidadãos que atinjam a maioridade, podem garantir a total gestão dos seus próprios bens/

actos, desde que capazes para tal. O processo de interdição e inabilitação aparece como um

instrumento jurídico destinado a impedir essa mesma gestão, tendo em consideração um

determinado grau de incapacidade da pessoa com deficiência para o fazer. Uma vez

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decretada a inabilitação, a gestão passará a ser exercida por terceiros, nos termos da

decisão proferida em tribunal. “A … não tem autoridade.” (F1)

Este é um processo habitualmente demorado e confuso, “ (…) já comecei a tratar dos

papéis há bastante tempo” (…F1); “foi um processo que no caso do … decorreu com

relativa celeridade eu sei que houve ai casos muito demorados para se resolver.” (F2)

A maioria dos familiares, apresentam um discurso um pouco controverso revelando algum

desconhecimento relativamente ao processo de interdição e às suas implicações na sua

própria vida e na vida dos seus próprios filhos. “Eu também não sei bem (…) tendo esses

papéis (…) venho aqui falar com a associação para ver o que é preciso mais.” (F1); “ele

já está praticamente (…) interditado, eu sinceramente nem sei bem.” (F4)

Com o objectivo de esclarecer os pais sobre este processo, foi realizada na Associação uma

sessão de esclarecimento, “nós tivemos aqui no … um esclarecimento muito valioso com

um advogado, (…) e ele disse que apesar de eu ser mãe se não tivesse nomeado a tutora,

oficialmente não tinha direito de decidir certas coisas sobre a vida dela” (F3) que teve

como resultado a iniciação do processo de interdição de alguns utentes com o apoio

efectivo da Associação. Destes quatro pais apenas uma família já tinha esse processo

concluído, “o … já está interditado” (F2), os outros pais apesar de se considerarem

responsáveis pelos actos dos seus filhos ainda não concluíram o processo de interdição e

atribuição de um tutor legal para os seus filhos, “ (…) por enquanto sou mãe, ainda não

sou responsável legal” (…F1); “já tenho tudo encaminhado da interdição dela, foi um

bocadinho mais tarde do que devia ser (…), mas de qualquer forma a responsável pela …

sou eu” (F3); “eu nunca entrei com os papéis para ser nomeado um tutor” (…F4)

Todos os pais encontram-se recentemente preocupados com a protecção dos seus filhos

que não conseguem responder pelos seus próprios actos, isto porque, por um lado eles

próprios já começam a apresentar bastante idade e por outro a nomeação de um tutor para

além de ser uma forma de salvaguardar os bens dos seus filhos é também uma forma de

prevenir a ausência dos principais cuidadores, “agora é que comecei a pensar porque a

idade já começa a pesar um bocadinho e de um momento para outro posso ir-me embora e

ela ficar.” (F1)

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Demonstram que foi muito difícil enquanto pais assumirem que o próprio filho não tem

capacidades suficientes para gerir a própria vida, mas conseguiram controlar essas

emoções por considerarem que estavam a protegê-lo.

“Indiscutivelmente é um choque (…) mas o perigo que seria o … não estar interditado é de

longe muito maior do que qualquer sentimento pessoal de frustração (…) a falha maior de

todas do …, a mais pronunciada uma ausência completa da noção de quantidades” (…F2)

“Por exemplo a … vai às compras mas não sabe fazer um troco (…) na higiene na roupa,

(…) eu é que tenho que tratar de tudo (…) ela ainda nem sabe, e eu ainda não sei como é

que lhe hei-de dizer, porque ela vai ficar!” (…F1)

Nesse momento, encontravam-se a realizar as diligências necessárias para serem nomeados

tutores dos próprios filhos contudo, pensam que na sua ausência o responsável legal mais

adequado para o seu filho deve ser em primeira instância um familiar próximo.

“Deveria ser o meu filho mas se ele não estiver cá! (…) tem primas, não sei se um dia se

elas estarão dispostas a vir visitá-la ou a levá-la para casa” (…F1)

“Possivelmente o meu filho mais novo (…) acredito que (…) os irmãos o acompanharão

sempre” (F2)

“Eu pedi à Dona … para ficar responsável pelo … pelo facto do irmão ter muitos

problemas e não ser a pessoa mais indicada”. “nós gostávamos que ela fosse uma

garantia para o futuro dele. (…) Ela e a Associação” (…F4)

No caso dessa impossibilidade, “é um problema, vamos ter grandes dificuldades em

arranjar ou nomear um novo tutor (…) na família não temos ninguém” (F4), acreditam

que a Associação saberá como tomar conta do seu filho e gerir juntamente com um pro-

tutor os bens deste.

“Acho que a ideia do … é criar um grupo de colaboradores que vão ocupar-se só disso

porque eu ainda tenho mais filhos mas há muitos casos aqui que são filhos únicos” (F3)

“Falta-me fazer é no notário, fazer uma declaração de que por minha morte a tutoria dela

fica entregue à Associação (…) acho que a justiça é entregar a parte da minha filha ao …

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uma vez que ela esteja aqui e embora o protutor possa sempre ver se as coisas estão bem

geridas porque isso é exigência do tribunal.” (F3)

1.3 – O Envelhecimento

1.3.1 - Envelhecimento de um filho com deficiência mental

Quadro 10 – Envelhecimento de um filho

Fonte: Entrevistas realizadas aos familiares, 2007

Ver um filho portador de deficiência mental envelhecer é uma situação que se verifica há

poucos anos devido ao aumento da esperança média de vida transposto também a esta

população, promovido pelos avanços médicos e científicos que se têm observado, como

revela a mãe de um dos utentes da Associação, “ (…) eles antes morriam todos antes dos

pais, era muito raro passarem antes dos 20, 21, claro que hoje o meu filho já vai fazer

quase 50” (F2).

Neste sentido, o envelhecimento da pessoa portadora de deficiência mental é um problema

na vida dos pais relativamente recente, sendo por isso pouco aprofundado, “tem graça

nunca aprofundei isso nunca... quer dizer não sei, vou vivendo o dia-a-dia (…) agora

talvez tenha pensado mais desde que o meu marido faleceu, quando éramos os dois, não é

dividíamos a carga pelos dois, agora sozinha tenho pensado mais” (…F1)

Os pais têm-se deparado com esta nova situação verificando que demoram mais tempo a

aparecer os sinais de envelhecimento mas que apesar disso os seus filhos têm envelhecido

precocemente. “Eles demoram muito mais tempo a envelhecer (…) mas também quando

começam caiem um bocadinho mais depressa.” (…F3);“ (…) Isso se aproxima cada vez

mais rápido (…) está a envelhecer precocemente.” (F4); “ (…) É uma preocupação (…)

eles envelhecem muito mais cedo.” (F2)

Os pais demonstram grande preocupação com este novo futuro dos filhos, tão pouco

estudado e aprofundado, é um problema sem solução, nós vamos embora e o que será a

partir daí? (F4), e por isso eles próprios no dia-a-dia deparam-se com pequenas alterações

Respostas F1 F2 F3 F4

Problemática recente Não pensa muito sobre isso Envelhecimento precoce Preocupação

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significativas reveladoras do aumento da idade. “ (…) Faz sempre impressão olhar para os

nossos filhos e pensar neles como velhos” (F2).

Apesar da inquietação surgem sempre palavras optimistas no discurso dos pais, “eu estou

mais do que preparada não é, nós também não melhoramos com a idade e eles muito

menos.” (F3)

1.3.2 - Sinais de envelhecimento

Quadro 11 – Sinais de envelhecimento

Fonte: Entrevistas realizadas aos familiares, 2007

Com o passar dos anos os pais consideram que os seus filhos amadureceram e que a

Associação em estudo, tem sido um grande contributo na aquisição e manutenção das

aprendizagens e comportamentos. “Há para melhor (…) ela está mais calma” (F1)

Relativamente à visibilidade dos sinais de envelhecimento os pais são unânimes quanto à

opinião que os filhos já apresentam algumas diferenças quer a nível físico quer a nível

intelectual, contudo consideram os filhos saudáveis.

“Ao nível físico, ela de facto tem dificuldades, coitada, nas pernas e também tem má

circulação (…) está muito pesada. Às vezes fala: ‘ai as minhas pernas já é o peso da

idade!’” (…F1).

“ (…) Embora não se note grandes regressões em muitas coisas, há coisas que o … já não

dá a mesma resposta, embora nunca fosse uma resposta brilhante, essa resposta já

começa a apresentar algumas falhas (…) há mais vezes em que se esquece” (…F2)

“Até há poucos anos ela vinha e ia sozinha para o … só que depois ai há uns 5 anos mais

ou menos começou a cair com facilidade, tropeçava (…) noto no andar dela (…) mexia-se

bastante mais (…) rabugenta às vezes, (…) há usa óculos.” (F3)

Respostas F1 F2 F3 F4

Está mais calma A nível físico Esquecimentos Perca de autonomia Problemas visuais Menos energia Confuso Instabilidade emocional Problemas de saúde

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Outro sinal de envelhecimento apontado pelos pais é a falta de energia, “ (…) ela quer é

estar sossegadinha” (F3), começam a demorar mais tempo a realizar as mesmas tarefas,

sentem as pernas cansadas e por vezes esquecem-se de pequenas coisas. “ (…) Está cada

vez mais lento, pergunta tudo (…) muito confuso, começa a fazer uma coisa e não a

termina (…) é muito instável. (F4)

Este ponto tem que ser analisado, tendo em conta a heterogeneidade das pessoas com

deficiência mental e principalmente, é importante não nos esquecermos, que estas pessoas

atingiram patamares mais baixos de aprendizagem e daí não ser tão notável as percas de

capacidades. Os problemas associados à deficiência que foram identificados, na sua

globalidade são idênticos a qualquer outra pessoa e não específicos das pessoas com

deficiência mental, como por exemplo diabetes e problemas no estômago, “a deterioração

há-de ser mais rápida (…) a diabetes também não ajuda é um factor negativo” (…F2)

“ (…) Ele (…) para além da deficiência mental que tem, carece de outros problemas de

saúde, tais como um problema hemorroidal (…) e problemas no estômago” (…F4)

1.3.3 - Preocupações dos pais relativamente ao envelhecimento dos filhos

Quadro 12 – Preocupações dos pais

Fonte: Entrevistas realizadas aos familiares, 2007

Relativamente às preocupações dos pais, estas têm surgido ao logo da análise das

categorias apresentadas anteriormente, contudo referem expressamente que se encontram

muito preocupados essencialmente com o futuro dos filhos e com o seu próprio futuro,

receando a velhice, a diminuição de saúde e a morte. “As maiores preocupações seja talvez

a minha velhice (…) por enquanto eu vou resolvendo as coisas, até quando não sei!” (F1)

“ (…) Pessoalmente o que mais me afecta e preocupa é o futuro (…) porque começamos a

perder a saúde, começam a aparecer problemas e no … vão com certeza começar a

aparecer mais cedo e isso é uma preocupação” (F2)

Respostas F1 F2 F3 F4

O seu envelhecimento O seu estado de saúde Vislumbrar a própria morte Futuro dos filhos Duplo envelhecimento Tutor dos filhos

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“Preocupa-me um bocadinho com a minha saúde, (…) porque se fosse só por mim eu

morria já hoje (…) não posso falhar por causa dela, não tem mais ninguém para tomar

conta dela” (F3)

“ (…) nós vamos embora e o que será a partir daí? Mesmo a nível da permanência dele

aqui no … o que é que pode acontecer? Eu morro deixa de haver rendimentos (…) as

finanças vão apanhar tudo, como é que é! Vai viver na rua! (…) É eu ir para o outro lado,

e como é que eu vou, e deixo-o cá?” (F4)

A preocupação relativa ao futuro prende-se particularmente com a mudança que se vai

fazer sentir na vida dos filhos, pois sendo estes os principais cuidadores na sua ausência a

pessoa com deficiência terá que ficar a cargo de alguém, “(…) é sempre um peso que fica a

alguém, ainda que fique aqui, os irmãos têm que o vir buscar ou têm que se ocupar dele ou

preocupar com ele, é uma preocupação muito grande essa.” (F2); “era um grande fardo

que tiravam das costas do irmão, se o … desaparecesse da vida dele.” (F4)

Essa preocupação com o futuro revelou-se tão intensa ao ponto de existirem pais que

“estavam num pessimismo uma coisa, ai queriam que os filhos morressem à frente deles!”

(F3). Os pais entrevistados abordam esta ideia contudo não partilham da mesma vontade.

“ (…) mas não penso nada assim.” (F3)

Apesar de demonstrarem as suas preocupações, esclarecem novamente que se sentem

muito confiantes no apoio que a Associação irá prestar quando for necessário, expressando

por isso que não têm o direito de se sentirem preocupados eu também não sou das pessoas

que muito me preocupo, porque eu sou crente e confio muito em Deus (…F1)

“ (…) Mas dizer que me preocupa muito o que será a vida dele não me preocupa (…)

resolvi pensar sobre isso e conclui que não tenho o direito sequer de sentir angústia.” (F2)

“Tenho uma grande confiança no … e nas pessoas que cá estão (…) sinceramente neste

momento não tenho grande preocupação.” (F3)

Sintetizando, evidenciam sinais de preocupação com o problema do duplo envelhecimento

e com todas as consequências que podem advir dessa situação. “Só nós, eu e a minha

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mulher, sabemos o quanto temos pensado no envelhecimento e o quanto é importante

haver alguém que se preocupe com isso!” (F4)

1.3.4 - Necessidades dos pais

Quadro 13 – Necessidades dos pais

Fonte: Entrevistas realizadas aos familiares, 2007

Os pais apresentam essencialmente sinais de cansaço e uma saúde um pouco frágil devido

ao avançar da idade. “Tenho três hérnias discais” (F1); “ (…) vou dizer a verdade eu

muitos dias com ela sempre ao pé de mim também não fico muito bem, começo a fazer a

minha vida normal com dificuldades, fico com a minha saúde mental afectada!” (F3)

Neste sentido referem que sentem necessidades de apoio ao nível dos cuidados pessoais

diários quer para o seu filho quer para eles mesmos, porque se eles estão a envelhecer e

consequentemente a perder capacidades em breve irão deixar de conseguir cuidar

permanentemente dos seus filhos que por sua vez também começam a necessitar de

cuidados mais alargados. Assim mantém o apoio máximo aos filhos enquanto conseguirem

com o objectivo de reservarem o lugar do filho na Associação quando falecerem.

“ (…) Às vezes é muito difícil estar sempre a vir buscá-la e trazê-la porque ainda é longe,

mas temos que fazer um bocadinho de sacrifício porque não quero perder o lugar dela

aqui no … para quando eu falecer ela ter quem lhe dê apoio” (F3)

“As minhas necessidades, era ter alguém que tomasse conta de mim, do … e da minha

mulher e do filho. (…) porque (…) não temos ninguém” (…F4)

A única família que considera não ter necessidades de apoio, refere que apesar da idade é

bastante saudável e que tem outro tipo de apoios que ajudam nas tarefas diárias “por

enquanto estou bem (…), não tenho grande necessidade de apoios. Tenho uma mulher-a-

dias (...) que é uma ajuda preciosa, tenho saúde, sou bastante saudável” (…F2).

Assim podemos concluir que as condições de saúde e as condições económicas podem

condicionar o grau de necessidades e tipo de apoios considerados necessários pelos pais.

Respostas F1 F2 F3 F4

Apoio aos filhos Apoio aos pais Não tem necessidades

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1.4 - Respostas para o envelhecimento das pessoas portadoras de Deficiência Mental

1.4.1 - Melhor resposta para o futuro

Quadro 14 – Melhor resposta para o Futuro

Fonte: Entrevistas realizadas aos familiares, 2007

“Há 40 e tais anos não havia nada absolutamente nada” (F1); “Tanto que eu lutei muito

para arranjar assim uma coisa onde ela pudesse ficar depois de eu partir!” (F3)

Percebe-se que a procura de uma resposta para o futuro, tem sido a busca diária destes pais

desde o momento que perceberam que os seus filhos se tinham tornado adultos e que eles

próprios se encontram a envelhecer. Explicam que essa procura por uma resposta social e

institucional que satisfaça as necessidades actuais e futuras dos seus filhos não foi fácil.

“O futuro é este, é ela ficar aqui! (…) estou mesmo já a tratar de certas coisas para ver se

ela fica cá mesmo.” (F1)

“ (…) Embora não seja o ideal ter os nossos filhos numa instituição a tempo inteiro (…) o

nosso fim será num lar e ele acabará aqui possivelmente. Eu estou convencida que ele

aqui no … será acompanhado e acarinhado que terá aqui tanto quanto é possível fora de

casa uma casa.” (F2)

“O que penso fazer é quando eu falecer ela ficar aqui, e o meu marido antes de falecer já

estava a par. Se não fosse aqui aonde é que ela devia ficar?!” (F3)

“A Associação (…) alguém se responsabilizasse por ele, queria que alguém tomasse conta

dele até aos últimos anos dele, que ele fosse uma pessoa cuidada por alguém e estimado

enquanto fosse vivo.” (F4)

Percebemos desta forma que todos os pais acreditam que a melhor resposta para o futuro

dos filhos, é a instituição que frequentam actualmente. Reafirmam novamente a grande

confiança que depositam na Associação e nos seus colaboradores, crendo que estes já se

Respostas F1 F2 F3 F4

A Associação Existência de uma pessoa que cuide do filho Manutenção dos laços familiares Lar para pais e filhos

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encontram a estudar uma nova forma reorganização de modo a adaptar-se ao problema do

envelhecimento de alguns dos seus utentes. “O … porque tem o Dr. … que já anda a

algum tempo preocupado com o problema do envelhecimento.” (F2)

Assim, para os pais, o modelo desta instituição apresenta-se como uma resposta ao

envelhecimento dos seus filhos por ser específica e adaptada à realidade da problemática

da deficiência mental à semelhança da resposta social tipo Lar de Idosos existente para a

população em geral. Analisamos pelas suas palavras que não pretendem que os seus filhos

integrem nenhuma resposta tipificada para a problemática do envelhecimento, preferindo

uma resposta destinada à população portadora de deficiência mental mesmo que esta ainda

não tenha sido testada e implementada para as pessoas com deficiência mental que

envelhecem. “Acho que é realmente o melhor para ela, estar aqui com pessoas que são

especializadas, estão preparadas para lidar com eles e que a tratam bem e ela é feliz.”

(F3)

Em relação à participação da família nuclear na continuação e manutenção do apoio dado à

pessoa com deficiência mental, estes pais em unanimidade referem que preferem que seja a

Associação a casa do seu filho, com o objectivo de não sobrecarregar os outros filhos com

encargos referentes a este. No entanto, não excluem a importância da manutenção dos

laços familiares através de apoios pontuais dos irmãos ou família chegada. “ (…) Ela fica

melhor cá do que com a família. (…) o irmão é rapaz ele gosta imenso dela (…) mas não

tem paciência” (…F1); “não é viável ela ir viver com os irmãos, podem eventualmente vir

buscá-la ao fim de semana dar um passeio” (…F3); “para o … seria um alívio enorme

libertar-se completamente do irmão.” (F4)

No que concerne à qualidade de vida e bem-estar no envelhecimento das pessoas com

deficiência mental, pensam que os seus filhos não são exigentes, revelando que com

pequenos apoios familiares e bens pessoais podem envelhecer felizes. “Eu acho que se ele

tiver um quarto só dele aqui assim em que os irmãos lhe dêem algum apoio, para ele não

se sentir abandonado, acho que o … não terá um fim que seja para me preocupar.” (F2)

No entanto, admitem que têm começado a introduzir, com alguma prudência, aos seus

filhos este assunto do duplo envelhecimento e sobre qual será o melhor lugar para viverem

quando falecerem, iniciando o processo de adaptação e integração nas residências da

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Associação. “Ela já fica cá todos os meses pelo menos uma semana por mês, para

adaptação. (F1);

“E tenho preparado a … devagarinho brincando com humor, sem dramas (…) e digo-lhe,

olha já sabes que quando eu for para o céu, ficas no …, e ela está farta de saber isso que é

a casa dela.” (F3)

Na opinião dos pais, os filhos já têm consciência do que irá acontecer após o falecimento

destes e aceitam com relativa naturalidade essa nova casa.

“Ela tem a noção que um dia vai ficar aqui, tem… mesmo ela às vezes diz: viver com (…)

não antes quero ficar no …. (…) quer dizer quando vem não! Diz sempre não é lá a minha

casa, aqui é que eu tenho o meu quartinho… mas quando está cá está satisfeita.” (F1; F3)

Surge ainda outro tipo de resposta apontada por um dos pais que consideramos inovadora

por identificar-se como resposta para o problema de duplo envelhecimento, pois apresenta

um carácter de resposta dupla, podendo satisfazer as necessidades quer dos pais quer dos

filhos, que destaca a manutenção dos laços de proximidade entre as duas gerações até ao

final da vida dos pais. “O ideal seria um lar onde pudéssemos estar os três” (…F4)

É importante ressalvar que actualmente o conjunto de respostas sociais promovidas pela

política social existente em Portugal destinadas às pessoas adultas portadoras de

deficiência e à população idosa, não contempla nenhuma resposta que contemple o

atendimento a pais e filhos. Por outro lado, de momento não temos conhecimento da

existência de nenhuma instituição deste género que responda às especificidades da

população portadora de deficiência mental e às especificidades do seu cuidador

1.4.1.1 - Actividades promotoras de bem-estar no envelhecimento da

pessoa portadora de Deficiência Mental

Quadro 15 - Actividades promotoras de bem-estar no envelhecimento da pessoa portadora de deficiência mental

Fonte: Entrevistas realizadas aos familiares, 2007

Respostas F1 F2 F3 F4

Adaptação das actividades existentes Pretendem que o filho se mantenha activo Não sabe quais as actividades indicadas Actividades físicas Actividades de relaxamento Actividades que mantenham as capacidades dos filhos

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As actividades desenvolvidas na Associação pelas pessoas portadoras de deficiência

mental, segundo os familiares constituem-se como um emprego para estas pessoas, em que

existem regras e funções definidas que têm que ser cumpridas a fim de receberem no final

do mês um reforço positivo pelas tarefas realizadas, visto para os utentes como um

ordenado. (…) o principal trabalho dela e que ela gosta muito de fazer (…) é a profissão

dela” (F1). “Ele diz sempre às pessoas que de manhã vem para o trabalho” (F2).

Os pais durante o seu discurso demonstram que estão satisfeitos com as actividades que

são propostas pela Associação, “têm aqui muitas actividades, tem ginástica tem remo (…)

tem artesanato” (…F1), “sei que faz umas coisas manuais” (F4), no entanto ressalvam

que devido ao envelhecimento dos seus filhos existe uma necessidade absoluta de

reformular e reorganizar as actividades propostas pela Associação devido às

transformações físicas que as pessoas possam vir a sofrer, tendo em atenção que vão

começar a surgir diferenças entre as necessidades de actividades dos utentes mais jovens e

dos utentes mais velhos.

“Há coisas que os nossos filhos já não podem fazer dentro de três quatro anos (…)

Teremos que fazer aqui dentro uma adaptação, que eu não sei qual é (…) seguramente

uma evolução que será parcial, porque temos jovens que não podem ser sacrificados pelo

envelhecimento de alguns, mas temos também que perceber que esses mais velhos não

podem continuar a acompanhar as mesmas valências que fazem os mais novos. É uma

necessidade absoluta (…) quereria que eles continuassem a ter actividades mas acho que

essas actividades vão ter que ser estudadas e adaptadas em função da idade que eles têm.

Quais são? Não me peça!” (F2)

A maioria dos pais refere que gostaria que o seu filho se mantivesse activo, mas não

souberam enumerar em concreto quais as actividades que consideram necessárias, Apesar

disso, de acordo com os pais entrevistados, a actividade física é muito importante para a

sustentação do bem-estar psicológico e físico das pessoas com deficiência mental que

envelhecem, de forma a prevenir o envelhecimento precoce. “ (…) Enquanto ela puder

movimentar-se (…) é muito bom para ela porque senão ela acomoda-se” (…F1)

“Penso que é importante, actividades que mantenham as suas capacidades.” (F4)

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“Espero que continuem sempre a ter um apoio de ginástica de fisioterapia (…) que

continuem com o seu jacuzzi têm lá em cima a sala de relaxe (…) usufruírem mais desse

tipo de apoios para que o seu organismo não se vá deteriorando tão rapidamente” (…F2)

Síntese Conclusiva

Por fim, podemos concluir que os pais gostariam que o seu filho quando envelhecer

usufrua de uma resposta social, que promova a sua qualidade de vida principalmente ao

nível do bem-estar físico, psicológico, emocional e social.

“Porque eu julgo horrível o sistema dos lares em que as pessoas estão em muitos deles

(…) à espera que o dia chegue (…) queria que eles tivessem alguma qualidade de vida e

não se sentissem uns trapos uns monos que estão ali à espera que acabe o dia.” (F2)

Uma resposta que tenha uma equipa de profissionais atenta às mudanças e necessidades

dos seus utentes, com actividades adequadas às características individuais de cada pessoa

com deficiência mental.

Pelo facto de conhecerem a Associação em estudo, todos os pais acreditam que esta

instituição, é essa resposta que eles tanto procuraram para suprir o anseio e o medo da

morte e do envelhecimento e principalmente o desconhecimento de um futuro ainda

incerto. “Tem cá quem a vá avaliando enquanto ela puder” (…F1)

Assim, expõem nas suas palavras a extrema confiança que depositam na Associação e em

toda a sua equipa de profissionais. “Penso que o … (…) está desde já a estruturar (acho

eu) a resposta para os nossos filhos mais velhos” (…F2).

Neste sentido, percepcionamos, que os pais ambicionam para o envelhecimento dos seus

filhos um modelo de resposta formal, como a associação que frequentam actualmente.

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2 - Análise das entrevistas aos Profissionais: A visão dos profissionais sobre o

envelhecimento dos utentes portadores de deficiência mental

Neste ponto apresentamos a análise dos dados recolhidos ao longo do processo de

investigação que resultam das entrevistas realizadas a quatro profissionais que trabalham

directamente com os utentes da Associação. Com o propósito de conhecermos de forma

aprofundada a sua opinião sobre o assunto em causa, submetemos a informação recolhida a

uma análise de conteúdo temática47.

Os profissionais trabalham em departamentos distintos da Instituição, possuindo por isso

características profissionais diversas. Considerou-se que era a maneira mais concreta de

conseguirmos obter informação diversificada sobre cada uma das respostas que a

Associação proporciona aos seus utentes. Por esta razão, questionámos os profissionais

tendo em conta as funções que desempenham, o que nos levou a criar entrevistas distintas

para cada um deles.

Neste sentido, procedemos a uma breve caracterização dos mesmos, para em seguida nos

debruçarmos sobre a descrição dos dados obtidos.

2.1 - Caracterização sumária dos Profissionais

Quadro 16 – Breve caracterização dos profissionais

Profissionais Idade Hab.

Literárias Representante do

Serviço

Tempo de trabalho com DM

Assistente Social 42 Licenciatura Serviço Social 15 anos

Psicólogo 27 Licenciatura Serviço de Psicologia 3 anos e

meio Auxiliar de Acção Educativa 55 8.º ano Sala de CAO 18 anos

Ajudante de Lar 42 9.º ano Residência 3 anos Fonte: Entrevistas realizadas aos profissionais da Associação, 2007

Profissional 1 (P1): Assistente Social, tem 42 anos é licenciada em Serviço Social é

responsável pelo departamento de Serviço Social na Associação e trabalha com pessoas

portadoras de deficiência mental há 15 anos, na Associação.

Profissional 2 (P2): Psicólogo, tem 27 anos é Licenciado em Psicologia Organizacional, é

responsável pelo departamento de Psicologia da Associação e trabalha com pessoas

portadoras de deficiência mental há três anos e meio, na Associação. 47 Vide Apêndice n.º 13 (volume 2) – Análise de conteúdo das entrevistas aos profissionais

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Profissional 3 (P3): Auxiliar de Acção Educativa, tem 55 anos, possui o 8.º ano de

escolaridade, é responsável por uma Sala de Actividades Ocupacionais dirigida a pessoas

portadoras de deficiência mental moderada e trabalha com pessoas portadoras de

deficiência mental há 18 anos, na Associação.

Profissional 4 (P4): Ajudante de Lar, tem 42 anos, possui o 9.º ano de escolaridade,

representa o Departamento Residencial da Associação e trabalha com pessoas portadoras

de deficiência mental há 3 anos, na Associação.

Sistematização da análise das entrevistas realizadas aos profissionais

Quadro 17 - Sistematização da análise das entrevistas realizadas aos profissionais

Temas Categorias Sub – categorias

A Associação Objectivos da Associação Dar apoio à pessoa com DM; responsabilizar a família; aconselhamento à família; promoção da não institucionalização; integração do jovem adulto com DM; maior qualidade de vida para os utentes

Motivações para trabalhar com pessoas portadoras de

DM

2.ª escolha profissional; desemprego / oportunidade de emprego; gosto pela reabilitação; área atractiva; aprofundar os conhecimentos na área da deficiência

Constrangimentos ao vir trabalhar para a Associação

Desconhecimento da DM; falta de experiência; 1.º impacto: medos / receios; não houve grandes constrangimentos

As vantagens de vir trabalhar para a Associação

Instituição em si; instalações / infra-estruturas; organização; equipa técnica; população calorosa / afectuosa; enriquecimento pessoal; enriquecimento profissional; ensinar e aprender

Desempenham diferentes funções mediante o seu sector de actividade na Associação.

Funções dos profissionais na Associação

- O papel da Assistente Social

Interligação da Associação com o exterior; apoio ao utente e seus familiares; coordenadora das Residências; participa em projectos Europeus

Ser profissional na Associação

Avaliação do trabalho que desenvolvem na Associação

Gostam do trabalho que realizam; corresponde às necessidades dos utentes; sentem-se apoiados pela direcção

Valores Éticos dos profissionais

Respeito pela diferença; respeito pelos direitos e deveres; igualdade de tratamento; dignidade humana; respeito pelos utentes

Ética

e os Profissionais Valores Éticos da Assistente

Social Respeito e honestidade para com os utentes e colegas de trabalho; igualdade de tratamento

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Deficiência Mental

(DM)

Definição de Pessoa portadora de DM

Fragilidades: � Pessoa com limitações � Tem um défice no funcionamento

da inteligência � Maior dificuldade de adaptação ao

meio � Maior dependência � Precisa de apoio mais personalizado � Podem ter vários níveis de

deficiência

Potencialidades: � Pessoa válida � Conhecedora dos seus

direitos e deveres � Sensível � Carinhoso / afectuoso � Amigo � Verdadeiro � Trabalhador � Responsável

Processo de envelhecimento da pessoa portadora de DM

Nova problemática; quanto mais capacidades têm mais notório é o envelhecimento; processo de envelhecimento similar aos ditos normais; perca de capacidades adquiridas, físicas e intelectuais; processo de envelhecimento a nível físico mais acentuado; menor autonomia; realiza as tarefas mais devagar; envelhecimento precoce; mais experiência da vida; mais sabedoria que os mais novos; maior auto-controlo

Necessidades das pessoas portadoras de DM em

processo de envelhecimento

Acompanhamento personalizado; similares a qualquer outra pessoa; estimulação a vários níveis; integração social; preparação para o futuro; descansar; apoio para os pais

Envelhecimento

Sentimentos das pessoas portadoras de DM em

processo de envelhecimento

Sentem-se satisfeitos por estarem na Associação; sentem que a Associação é a casa deles; estão satisfeitos com as actividades propostas; sentem-se bem; não se sentem velhos; são felizes; não se preocupam com o envelhecimento; gostam de estar na moradia

Problemas dos pais Preocupação com o futuro dos filhos; preocupação com o próprio envelhecimento; perca de capacidades para cuidar dos filhos; preocupação com a própria morte

Processo de atribuição de tutor da pessoa portadora de

DM

Consiste em retirar a capacidade de decisão à pessoa DM; salvaguarda dos bens; a Associação dá orientação às famílias; os pais devem escolher o tutor; o tutor deve ser um familiar; a instituição não deve ser tutora; na inexistência de familiares o tutor deve ser um voluntário; o tutor deve zelar pelo bem-estar da pessoa

A família e a problemática do envelhecimento

da pessoa portadora de

DM

Avaliação das famílias

sobre o trabalho desenvolvido na Associação

As famílias estão satisfeitas com o trabalho que a Associação desenvolve

Melhor Resposta para o envelhecimento da pessoa

portadora de DM

Lar para as famílias; lugar onde sejam satisfeitas as necessidades básicas; resposta residencial; resposta promotora de bem-estar e qualidade de vida; não internato; resposta com apoio médico e de enfermagem; resposta sem barreiras arquitectónicas; nova valência com pessoas de diferentes idades; resposta tipo lar para pessoas idosas; resposta promotora de laços familiares Respostas

Sociais Actividades promotoras de

bem-estar no envelhecimento da pessoa

portadora de DM

Actividades ocupacionais; físicas (Fisioterapia; Remo; Natação; ginástica; de animação; de relaxamento (jacuzzi); rotatividade de actividades; adaptação das actividades; actividades em conjunto com pessoas de várias faixas etárias

Fonte: Entrevistas realizadas aos profissionais da Associação, 2007

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2.2 - A Associação

2.2.1 - Objectivos da Associação

Quadro 18 – Objectivos da Associação

Respostas P1 P2 P3 P4

Dar apoio à pessoa com DM

Responsabilizar a família

Aconselhamento à família

Promoção da não institucionalização

Integração do jovem adulto com DM

Maior qualidade de vida para os utentes

Não deixar parar os utentes

Fonte: Entrevistas realizadas aos profissionais da Associação, 2007

“O objectivo da instituição é nunca os deixar parar” (P3)

A Associação foi fundada por um grupo de pais que se encontravam preocupados com o

futuro dos seus filhos e de acordo com os profissionais de serviço social e psicologia o

grande objectivo geral desde o seu início é o apoio e a integração da pessoa com

deficiência mental jovem e adulta. “O grande objectivo dos pais foi criar uma Instituição

que desse apoio aos seus filhos.” (P1); “a Associação tem como objectivo geral o apoio e

a integração da pessoa com deficiência mental jovem e adulta” (P2)

Como objectivos específicos a Associação trabalha no sentido de conseguir maior

qualidade de vida para os utentes baseando-se nas dimensões da qualidade de vida de

Robert Shalock descritas no Capitulo I ponto 3.3.3 deste trabalho. “temos objectivos mais

específicos que assentam (…) nas oito dimensões da qualidade de vida” (P2).

Por outro lado assumem-se também como objectivos específicos da Associação: o apoio

social e psicológico às famílias, a manutenção da responsabilização das famílias pelo seu

familiar, a promoção de sessões de aconselhamento às famílias sobre o processo de

inabilitação e tutoria, com o grande objectivo de dar aos pais poder de decisão sobre a vida

dos seus filhos e principalmente promover e incentivar a não institucionalização destas

pessoas.

“Nunca deixarmos de responsabilizar a família (…) o aconselhamento às famílias sobre as

tutorias e o futuro dos seus filhos para em vida os pais poderem escolher quem é que se

vai responsabilizar pelos seus filhos após a sua morte (…) o objectivo é que sejam

institucionalizados o menor número possível de pessoas.” (P1)

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2.3 – Ser profissional na Associação

2.3.1 - Motivações para trabalhar com pessoas portadoras de Deficiência Mental

Quadro 19 – Motivação para trabalhar com pessoas portadoras de DM

Fonte: Entrevistas realizadas aos profissionais da Associação, 2007

Trabalhar com pessoas e para pessoas nem sempre é uma tarefa fácil. As características

individuais da pessoa portadora de deficiência mental exigem de qualquer profissional

atenção e compreensão e principalmente respeito pela diferença através de uma postura

ética assente nos direitos humanos e de cidadania.

Ao observarmos as respostas dadas pelos profissionais sobre as motivações que os levaram

a vir trabalhar para a Associação, percebemos que, para todos eles trabalhar com pessoas

com deficiência mental, não foi a escolha inicial, mas foi sim uma forma de saírem do

desemprego tendo na Associação uma oportunidade. “Não foi a minha escolha inicial”

(P1); “pensar na possibilidade de integração profissional” (P2); “as motivações, eu vou

ser muito sincera (…) na altura vim porque não tinha trabalho.” (P3; P4)

Apesar da sinceridade dos profissionais ao revelarem que trabalhavam noutra área e que a

principal motivação foi a aquisição de um emprego novo, sendo que estavam

desempregados ou queriam mudar de emprego, todos na sua globalidade revelaram que já

conheciam a Associação e o trabalho que desenvolvia, sendo este um elemento facilitador

de integração. “Já conhecia a Instituição” (P1); “conhecia, num contacto esporádico com

pessoas com deficiência mental” (P2); “eu vinha cá muitas vezes às galas, e portanto já

tinha assim um certo contacto com os utentes.” (P4)

O trabalho diário com pessoas portadoras de deficiência mental pode acarretar um grande

desgaste emocional, contudo devido ao facto de geralmente serem pessoas muito

afectuosas rapidamente conquistaram estes profissionais, fazendo desta 2.ª escolha uma

escolha para a vida inteira. Sendo este outro factor importante para adaptação destes

profissionais.

Respostas P1 P2 P3 P4

2.ª escolha profissional

Desemprego / Oportunidade de emprego

Gosto pela reabilitação

Área atractiva

Aprofundar os conhecimentos na área da deficiência

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“ (…) Primeiro vim porque não tinha emprego mas depois gostei, comecei a interessar-me

por tudo o que diz respeito a estas pessoas e a viver cada vez mais esta realidade.” (P3)

2.3.2 - Constrangimentos ao vir trabalhar para a Associação

Quadro 20 - Constrangimentos ao vir trabalhar para a Associação

Fonte: Entrevistas realizadas aos profissionais da Associação, 2007

Vir trabalhar para a Associação significava trabalhar com pessoas portadoras de

deficiência mental. Tendo em conta que estes profissionais não tinham um conhecimento

aprofundado desta problemática e que a sociedade em geral tem ao longo de vários anos

deixado sobreviver alguns mitos e preconceitos negativos relativamente às pessoas com

deficiência, tentámos perceber o que é que os profissionais sentiram ao vir trabalhar com

esta população.

Os profissionais revelaram que na sua generalidade não houve constrangimentos de

relevância. “Nunca tive grandes constrangimentos” (P1). Apenas demonstraram que a

falta de experiência, “relativamente a constrangimentos necessariamente a falta de

experiência na área” (P2) e o desconhecimento da problemática da deficiência mental

criou alguma ansiedade inicial que podemos traduzir em medos e receios provavelmente

fundamentados pelos estereótipos existentes à cerca desta população.

“Eu no meu tempo, não havia pessoas com deficiência, ou eu não me apercebia delas mas

o facto é que eu não estava nem eu nem a generalidade das pessoas estava habituada a

contactar com pessoas com deficiência (…) Eu sou sincera o primeiro impacto tive-o! Foi

mau, foi os medos os receios mas isto tudo passa depois é uma questão de hábito.” (P1)

Respostas P1 P2 P3 P4

Desconhecimento da DM

Falta de experiência

1.º impacto: medos / receios

Não houve grandes constrangimentos

Não respondeu

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2.3.3 – As vantagens de vir trabalhar para a Associação

Quadro 21 – As vantagens de vir trabalhar para a Associação

Fonte: Entrevistas realizadas aos profissionais da Associação, 2007

Quando perguntámos aos profissionais quais foram as mais-valias na sua vida por terem

vindo trabalhar para a Associação, surgiram de imediato os elogios à própria Instituição, a

forma como se organiza, como tem melhorado as suas infra-estruturas, como dinamiza as

actividades para os seus utentes, a qualidade da equipa técnica. “A instituição em si, acho

que essa é a maior potencialidade” (P1)

“Tem óptimas instalações (…) é uma instituição muito bem organizada (…) tem uma

grande qualidade a nível de competências técnicas.” (P2)

Não podemos analisar este ponto sem nos debruçarmos sobre algumas circunstâncias como

o facto de dois destes profissionais trabalharem na Associação desde a sua abertura e

portanto têm sido também um pouco imagem do trabalho que ali se desenvolve. Por outro

lado os outros dois profissionais antes de irem trabalhar para a Associação mantinham uma

ligação familiar de forma directa ou indirecta com alguém ligado ao Associação. Podendo

assim parecer que as observações apresentadas foram condicionadas por estas

circunstâncias, a verdade é que durante a observação participante pudemos observar que

estes profissionais sentem a Associação como uma obra que também lhes pertence

parecendo uma “grande família”, tornando-se um local de trabalho de eleição para estes

profissionais principalmente pelas características dos utentes e da própria instituição. “se

hoje houvesse oportunidade de ir trabalhar com outra problemática eu por minha vontade

não escolhia outra ficava na deficiência” (P1)

“Criam-se amizades a sério entre eles e entre nós e nós (…) ninguém consegue, pelo

menos eu não consigo dissociar a minha vida em relação a esta população.” (P3)

Respostas P1 P2 P3 P4

Instituição em si Instalações / infra-estruturas

Organização Equipa técnica População calorosa / afectuosa

Enriquecimento pessoal Enriquecimento profissional

Ensinar Aprender

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Implicitamente os profissionais confessam que ensinaram muito mas que também

aprenderam muito com os utentes desde que vieram trabalhar para a Associação, o que

promoveu o seu enriquecimento a nível pessoal e profissional. “ (…) Acima de tudo houve

um enriquecimento seja profissional seja pessoal na minha vida” (P2); “podia ter

ensinado e ensinei mas também aprendi muito! O que é muito gratificante, eu nunca

pensei.” (…P3)

2.3.4 – Funções dos profissionais na Associação

A Associação possui uma equipa de profissionais multidisciplinar que trabalham em

conjunto na obtenção dos seus objectivos. Cada um dos profissionais acima descritos

desempenha funções distintas na associação como podemos observar pela descrição feita

por cada profissional apresentada no quadro seguinte.

Ao profissional de Psicologia compete essencialmente a gestão dos recursos humanos; zelo

pela qualidade dos serviços prestados na Associação, responsável pelo departamento de

formação e pelo departamento de estofamento do Centro de Emprego Protegido. No

âmbito da sua formação profissional dá apoio psicológico aos utentes e aos pais,

desenvolve acções de psicoterapia. Para além destas funções ainda desenvolve actividades

respeitantes aos projectos Europeus em que a Associação participa. A médio prazo

perspectiva melhorar as suas competências, ” na área da qualidade (…) da economia

social (…) um doutoramento (…) estabilização da minha vida profissional.” (P2)

A Auxiliar de Acção Educativa, é responsável por uma sala do Centro de Actividades

Ocupacionais e tem como principal função trabalhar as capacidades cognitivas e físicas,

com vista à manutenção ou mudança de comportamentos dos utentes.

A Ajudante de Lar está afecta a todo o trabalho existente nas residências da Associação,

sendo que é responsável pelo bem-estar dos utentes quando estão na residência. As suas

funções reportam-se à satisfação das necessidades básicas dos utentes nomeadamente ao

tratamento da alimentação e higiene.

Apresentamos em seguida uma exposição aprofundada das funções da profissional de

Serviço Social, que por ser a nossa profissão e a área profissional em que incide este

trabalho, mereceu uma maior atenção da nossa parte.

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2.3.4.1 - O papel da Assistente Social

Ao nível institucional a Assistente Social é em primeiro lugar responsável pela interligação

da Associação com o exterior, nomeadamente no contacto e apresentação do projecto

desenvolvido pela Associação, com outras instituições e principalmente no contacto com a

família. É a Assistente Social quem faz a ‘ponte’ entre a Instituição e a família,

desenvolvendo uma relação de confiança entre aquilo que é o seu papel na instituição e o

apoio ao utente e seus familiares. Desenvolve um trabalho de apoio às famílias na

resolução dos seus problemas incentivando-os a um papel activo junto da instituição.

Por outro lado também mantém um papel activo junto dos utentes no seu apoio directo,

para que eles adquiram comportamentos sociais adequados e uma maior integração e

adaptação ao meio, realizando para isso acções pontuais que facilitem a inserção dos

utentes no seu ambiente familiar e institucional.

Segundo a Assistente Social, acumula as funções de Serviço Social com as funções de

Coordenadora das Residências sendo também sua responsabilidade zelar pelo

cumprimento dos planos terapêuticos, pedagógicos e assistenciais das moradias, tendo

como função gerir os recursos humanos, a permanência dos utentes e tudo que seja

inerente àquele sector.

Participa ainda em alguns projectos Europeus que a Instituição se encontra a desenvolver.

Neste sentido, quando questionámos a Assistente Social sobre os objectivos do Serviço

Social, a profissional não se distanciou do papel que desempenha na Instituição referindo

que os objectivos do seu trabalho são distintos do trabalho dos colegas, havendo para isso

uma definição de objectivos para cada um, que é respeitada por todos. “Eu apoio as

famílias inicialmente e apoio individualmente”. (P1)

Relativamente às referências teórico metodológicas que orientam a sua acção, a Assistente

Social referiu que o trabalho diário na instituição absorve a totalidade do seu tempo não

restando espaço para continuar a aprofundar os seus conhecimentos como desejaria.

“Já estudei faz tanto tempo! (…) estou tão absorvida que às vezes falta-me tempo para

poder fazer outro tipo de trabalho. (…) Eu trabalho no directo, numa equipa

pluridisciplinar com o utente com a família e com a comunidade”. (P1)

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Partindo do discurso da Assistente Social percebemos que as suas acções têm por base uma

perspectiva sistémica, em que não vê o utente como uma pessoa individual mas sim como

alguém no centro de um sistema, sistema esse familiar a instituição e a comunidade em que

está inserido.

Consideramos que é de todos os profissionais entrevistados o elemento na equipa

multidisciplinar que melhor conhece as quatro realidades envolvidas na vida de um utente.

Destacamos assim que a Assistente Social é o profissional que mantém uma proximidade

constante com o utente, a família o seu meio ambiente e a instituição onde desenvolve a

sua prática profissional. A Assistente Social torna-se assim uma profissional privilegiada,

por conhecer as diferentes realidades permitindo-lhe deste modo avaliar as necessidades

dos utentes e dos seus familiares de uma forma mais real, sendo da sua responsabilidade a

adequação dos serviços prestados pela instituição.

Neste jogo de poderes, como explica Vicente Paula Faleiros (1991: 42) o Assistente Social

deverá ser capaz “de ordenar os recursos, elaborar meios eficazes, alcançar os objectivos

propostos pelas instituições” sem nunca esquecer dos objectivos também a atingir com os

usuários. Constatamos que a Assistente Social entrevistada, conhece nitidamente quais os

objectivos do Serviço Social, pois apesar de não enunciar claramente os objectivos

referentes à sua profissão, coloca em prática os conhecimentos teóricos aprendidos na

formação apesar de não apresentar uma consciência de que os pratica, traduzindo-se essa

expressão na sua dificuldade em responder quais os objectivos de intervenção e qual o

quadro teórico em que baseia a sua acção. Contudo, pratica uma actividade de mediação

interpessoal entre os vários elementos envolvidos no processo de envelhecimento da

pessoa portadora de deficiência mental, trabalhando para além do ajustamento desta

população ao seu meio mas também, procura intervir numa mudança social dotando as

pessoas de “empowerment” no sentido de as dotar de competências e habilidades sociais

indispensáveis para a sua autonomia. Por outro lado, acompanha a sua prática profissional

de valores sólidos na área dos Direitos Humanos que funcionam como orientação das suas

acções.

Neste sentido, acreditamos que o profissional de Serviço Social pode ter um papel

preponderante no desenho de novas respostas para o envelhecimento da pessoa portadora

de deficiência mental.

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2.3.5 - Avaliação do trabalho que desenvolvem na Associação

Quadro 22 - Avaliação do trabalho que desenvolvem na Associação

Respostas P1 P2 P3 P4

Gostam do trabalho que realizam

Corresponde às necessidades dos utentes

Sentem-se apoiados pela direcção

Fonte: Entrevistas realizadas aos profissionais da Associação, 2007

Os profissionais fazem uma avaliação positiva do trabalho que desenvolvem na Associação

com os utentes. Sendo que revelam que gostam de trabalhar com os utentes e por isso têm-

se dedicado ao cumprimento dos objectivos propostos pela instituição para cada um dos

utentes. Explicam que isso só é possível porque têm todo o apoio e acompanhamento dos

colegas e da direcção. “É um trabalho muito positivo, em que eu gosto muito de trabalhar

com eles” (P1; P2)

“Faço uma avaliação positiva, porque penso que fiz tudo o que estava ao meu alcance,

tenho vivido experiências que nunca pensei vir a viver, mas também tenho tido sempre o

acompanhamento dos meus chefes de toda a direcção” (P3)

“Acho que é um trabalho bom, pelo menos eu tenho dado o meu melhor e a minha entrega

em relação aos utentes” (P4).

Por fim a Auxiliar de Acção Educativa explana a sua satisfação referindo que “estes 17

anos tornaram-me mais mulher, um ser humano mais elevado, mais alto e vejo o resultado

e sinto-me feliz!” (P3)

2.4 - Ética e os Profissionais 2.4.1 – Valores Éticos dos profissionais Entende-se por ética, o estudo da moral (normas de comportamento que as pessoas seguem

como referência do que é correcto ou incorrecto, bom ou mal). O termo de ética pode usar-

se de maneira equivalente a “moral”, para referir-se a regras/normas de conduta no que

concerne ao que é correcto/incorrecto e bom/mau, (Banks, 1997).

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As questões sobre ética e valores profissionais apenas foram questionados aos profissionais

de Serviço Social e Psicologia, contudo podemos perceber que os direitos das pessoas

portadoras de deficiência estão presentes no quotidiano dos trabalhadores da Associação.

Por essa razão, vamos apenas debruçar-nos numa análise global destes valores presentes no

discurso do profissional de psicologia e iremos proceder a uma análise mais aprofundada

dos valores éticos da profissional de Serviço Social, tendo em atenção a importância do

papel do Assistente Social na concepção e desenvolvimento de respostas sociais

promotoras de bem-estar no processo de envelhecimento das pessoas portadoras de

deficiência mental.

Os valores éticos dos profissionais questionados, estão presentes durante todo o seu

discurso, sem excepção de nenhum deles. Mantém uma postura de respeito pela diferença,

demonstrando que estão diariamente atentos às vontades e decisões dos utentes, tendo

sempre como meta de trabalho a melhoria das condições de vida da pessoa portadora de

deficiência mental. “Temos que ter em atenção a auto determinação de cada um deles o

direito de poder escolher e se eles não se sentirem capazes de fazer ginástica naturalmente

que deve ser respeitado.” (P2)

Este facto pode ter a ver com a existência de um código de ética criado pela Associação

que tem como objectivo orientar as acções dos profissionais. “Nós próprios aqui no …

temos um código ético e nesse código também temos identificado os valores que devem

nortear as acções dos profissionais do ….” (P2)

“Temos um código de ética que vai pelo respeito pelos direitos e deveres e a partir daí

criámos um manual de utilização de CAO, e moradias.” (P1)

O Psicólogo, considera que enquanto profissional que trabalha com pessoas portadoras de

deficiência, deve estar consciente dos seguintes valores: igualdade de tratamento;

dignidade humana, respeito pelos utentes bem como pelos direitos e deveres destas

pessoas. Apontando que estes são os principais princípios éticos essenciais no

desenvolvimento de actividades com um maior rigor ético possível.

“O valor da igualdade (…) a todos os níveis igualdade de tratamento (…) o valor da

dignidade da pessoa (…) tratarmos como seres humanos toda e qualquer pessoa, sendo

conscientes dos direitos e deveres que lhes assistem (…) o valor do respeito” (…P2)

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2.4.2 – Valores Éticos da Assistente Social

“O Serviço Social tem sido, desde a sua criação, uma actividade de defesa dos Direitos

Humanos” (ONU, 1999). Podemos perceber pelo discurso da Assistente Social que a

defesa pelos direitos humanos, também tem sido a sua preocupação, baseando o seu

exercício profissional no respeito e honestidade para com os utentes e colegas de trabalho,

mantendo um papel activo na mudança de comportamentos destes profissionais com base

na defesa pelos Direitos Humanos das pessoas que usam os serviços da Associação.

“É o respeito pelas pessoas com quem trabalho. Honestidade, sou sincera com as pessoas

(…) respeito as funções das pessoas (…) exijo que me respeitem a mim. Em relação aos

utentes, tenho muito carinho por eles e respeito-os nas suas exigências (…) junto da

equipa exijo que exista esse respeito.” (P1)

A Assistente Social, confessou que se tem debatido pelo cumprimento desses princípios

éticos por parte de todos os profissionais, que tem sido uma grande luta mas que já vai

havendo resultados positivos. “Tem sido uma luta que temos levado a cabo há alguns

anos, que é fazer com que a generalidade dos trabalhadores os respeitem.” (P1)

Reportando-se ao desempenho dos profissionais auxiliares, explica que se mantém muito

atenta aos aspectos dos direitos dos utentes e à forma como aqueles profissionais colocam

em prática a sua acção

“Estou sempre muito atenta a este aspecto e se nós os tratarmos com o devido respeito

(…) e com carinho (…) não devemos deixar que esta situação passe estes limites, porque

elas aqui têm o trabalhos delas com estes utentes e não devem estreitar muito as ligações,

não deixar que deixe de ser profissional, porque depois começa-se a confundir tudo (…)

exijo que elas os tratem com igualdade. Exijo que elas respeitem os “miúdos”. (P1)

Refere que, independentemente do surgimento de grandes amizades entre profissionais e

utentes, e de existirem preferências, naturais do ser humano, não deve ser nunca esquecido

o valor da igualdade de tratamento sendo que aquele é o local de trabalho daqueles

profissionais. “Temos amizade (…) mas temos que saber distinguir que estamos no nosso

local de trabalho.” (P1)

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A consciência ética é uma componente fundamental da prática dos Assistentes Sociais. A

sua capacidade e empenho em agir eticamente é um aspecto essencial da qualidade do

serviço que prestam aos clientes.

“Nós (…) temos que lhes prestar um serviço com uma maior qualidade, temos que fazer

avaliações do serviço para melhorarmos as nossas respostas de outra maneira não vamos

conseguir fazer melhoramentos e modificações.” (P1)

2.5 - A problemática da Deficiência Mental

2.5.1 – Definição de pessoa portadora de deficiência mental

Quadro 23 - Definição de Pessoa portadora de deficiência mental

Respostas P1 P2 P3 P4

Fragilidades

Pessoa com limitações

Tem um défice no funcionamento da inteligência

Maior dificuldade de adaptação ao meio

Maior dependência

Precisa de apoio mais personalizado

Podem ter vários níveis de deficiência

Potencialidades

Pessoa válida

Conhecedora dos seus direitos e deveres

Sensível

Carinhoso / afectuoso

Amigo

Verdadeiro

Trabalhador

Responsável Fonte: Entrevistas realizadas aos profissionais da Associação, 2007

Os profissionais ao definirem a pessoa portadora de deficiência mental, segundo a sua

experiência prática, inicialmente centraram-se na definição exposta no Capitulo 1,

confirmando que é uma pessoa com limitações do foro cognitivo e intelectual, “em termos

técnicos, é uma pessoa que em termos do funcionamento da inteligência tem um défice

pelo menos a nível de duas competências adaptativas” (P2); “todos eles têm mais

problemas cognitivos que são quanto a mim o que define a deficiência mental” (P3); “é

uma pessoa com algumas limitações” (P1), “é uma pessoa com menos capacidades que

precisa de mais auxílio” que se traduzem na sua dificuldade de adaptação ao meio,

necessitando assim de um apoio personalizado na concretização de algumas tarefas do

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quotidiano. “Traduz-se em termos de adaptação ao meio (…) precisa de um apoio mais

personalizado (P2)

“ (…) Podem ser autónomos no comer, no vestir, no calçar, no andar, em apanharem

transportes mas têm que ter sempre um acompanhamento.” (P4)

Por outro lado, estes profissionais no seu discurso passaram a barreira da definição

preconcebida para esta população e explicaram que cada pessoa é uma pessoa diferente

com características distintas e necessidades individuais, ressalvando também as

potencialidades desta população. Assim, apontaram outras características, descrevendo que

são habitualmente pessoas sensíveis, carinhosas, amigas e verdadeiras, sendo por isso

gratificante trabalhar com esta população. “Acho uma população bastante calorosa,

bastante afectuosa” (P2); “são pessoas sensíveis, amigos, muito verdadeiros, são

extremamente verdadeiros (…) não são hipócritas.” (P3)

Apresentaram também outras características reveladoras do trabalho desenvolvido pela

Instituição, que fazem destas pessoas cidadãos conhecedores dos seus direitos e deveres,

responsáveis trabalhadores e válidos. Pois como se pode confirmar através dos diários de

campo, as salas de CAO estavam enfeitadas com placares relativos aos direitos e deveres

do cidadão portador de deficiência mental, sendo que em alguns momentos a auxiliar de

acção educativa recorreu ao uso das regras com o objectivo de chamar a atenção do grupo

para as mesmas.

“Eles sabem que têm deveres e direitos, sabem perfeitamente que têm o dever de ser e

trabalhar para o futuro e programar e fazer o seu projecto de vida e pensar e exigir que

sejam dadas todas as condições (…) são trabalhadores, são responsáveis” (…P3)

Esta classificação de deficiência mental tem importantes implicações para o sistema de

prestação de serviços para essas pessoas, tendo em conta o facto de que muitas pessoas

com deficiência mental não apresentam limitações em todas as áreas das habilidades

adaptativas e, portanto, não precisam de apoios nessas áreas não afectadas, “alguns têm

limitações mais acentuadas que outros” (P1) exigindo-se assim uma concepção de

prestação de serviços que respondam às necessidades individuais de cada um.

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2.6 – Problemática do Envelhecimento

2.6.1 - Processo de envelhecimento da pessoa portadora de deficiência mental

Quadro 24 – Processo de envelhecimento da pessoa portadora de deficiência mental

Respostas P1 P2 P3 P4 Nova problemática

Quanto mais capacidades têm mais notório é o envelhecimento

Processo de envelhecimento similar aos ditos normais

Perca de capacidades adquiridas, físicas e intelectuais

Processo de envelhecimento a nível físico mais acentuado

Menor autonomia

Realiza as tarefas mais devagar

Envelhecimento precoce

Mais experiência da vida

Mais sabedoria que os mais novos

Maior auto-controlo Fonte: Entrevistas realizadas aos profissionais da Associação, 2007

“Apesar da questão do envelhecimento ser bem familiar para os especialistas que

trabalham com idosos, é um terreno misterioso para os profissionais que trabalham com

deficientes mentais”. (Breitenbach, 1999: 23)

Ao abordarmos as questões do envelhecimento das pessoas portadoras de deficiência

mental, os profissionais demonstraram contentamento por esta ser uma temática que eles

consideram nova e pouco estudada, revelando que os pais, os profissionais e a própria

instituição ainda se encontra a aprender e a tentar aprofundar o seu conhecimento nesta

matéria, e por isso a melhor forma para a percepcionarem será através dos próprios utentes.

“Estamos a aprender com eles” (P1), “eu aqui há uns anos tinha a noção de que eles

morriam novos, mas hoje chegamos à conclusão que não, os pais estão todos a morrer,

concluo que eles terão quase a mesma vida que nós temos.” (P3)

Actualmente a pessoa mais velha da instituição tem 54 anos, o que não pode ser

considerada idosa se nos regermos pelas definições impostas pela sociedade no geral. “Os

mais velhos que eu tenho aqui têm 54, 55 anos não são assim propriamente idosas não é!”

(P1) “tenho na minha sala a mulher mais velha da instituição com 53 anos” (P3), contudo

segundo a pesquisa bibliográfica referenciada no Capitulo 1, ponto 3, “na maioria das

pessoas com deficiência mental, parece que os 45 anos marcam um período no

desenvolvimento da vida em que se manifesta a diminuição de algumas reservas físicas e o

aparecimento do ajuste psicológico à velhice (…) os estudos indicam que, em muitos

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casos, os efeitos biológicos, psicológicos e sociais do envelhecimento podem aparecer

antes da idade (Janicki, 1987).

Partindo da observação participante, pudemos constatar que se há alguns anos os utentes

eram muito jovens, actualmente já se verifica que a maioria dos utentes tem idades

compreendidas entre os 30 – 50 anos, “são todos já com por volta dos trintas e muitos

quarentas, pronto a nossa população já tem toda estas idades” (P3), contudo no olhar dos

profissionais mantém-se a tendência de se olhar para a pessoa portadora de deficiência

mental alguém que não envelhece. “ (…) Alguns já têm 50 e tal anos, pois está bem mas

nós vemo-los sempre jovens” (P3)

Tendo como referência a observação do campo empírico e os relatos dos profissionais

podemos afirmar que se verifica a existência de um envelhecimento precoce nos utentes da

Associação, “eles envelhecem mais cedo do que os ditos normais, eu acho que haverá

alguns que sim os outros não” (P3), “devido às medicações e todos os problemas que

levam a envelhecer mais precocemente”. Apesar dos sinais de envelhecimento ainda não

serem totalmente notórios “ou somos nós com os nossos olhos que não queremos ver ou

não sei, mas acho que ainda não se nota muito” (P3), os profissionais referem que esses

sinais são mais visíveis nas pessoas portadoras de deficiência leve ou moderada porque

também adquiriram ao longo da vida mas capacidades, “quanto mais capacidades têm

mais notório é o envelhecimento” (P1)

Alguns utentes já revelam alguma perca de capacidades principalmente ao nível físico,

nomeadamente ao nível da autonomia e da locomoção, realizando as tarefas que lhe são

propostas mais devagar, o que faz com que necessitem de maior apoio por parte dos

profissionais, da instituição e da família.

“Eu noto já algumas diferenças (…) porque eles vão perdendo certas capacidades (…) ou

seja a autonomia, (…) todas as coisas que eles aprenderam e que até tinham uma certa

potencialidade para fazer, com a idade vão desaprendendo” (…P4)

“Nós vamos notando que todas as aprendizagens que eles fizeram (…) já se nota que

chegaram ali e quase que estagnaram (…) pronto já faz as coisas mais devagar.” (P3)

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“Obviamente que o processo de envelhecimento a nível físico é mais acentuado do que em

termos intelectuais (…) se traduz em termos de menor autonomia (…) locomoção (…)

própria medicação” (…P2)

Por outro lado nota-se também a perca de algumas capacidades intelectuais adquiridas, tais

como a capacidade de leitura e escrita, “estão a perder a capacidade da leitura, estão a

perder a capacidade da escrita, aqueles que adquiriram.” (P1)

Estes sinais de envelhecimento são transpostos pelos profissionais na voz dos utentes

quando fazem referência que os utentes já falam sobre as suas dificuldades inerentes da

idade, “a da minha sala diz: ‘ai já estou velha e cansada’, outra que diz: ‘já estou cansada

estou a precisar de ir para a reforma.” (P3)

Por outro lado referem também que a idade avançada trouxe a estes utentes a sabedoria

tantas vezes associada aos idosos, isto é, estão mais maduros e conhecedores das regras da

instituição.

“O factor idade permite-lhes ter uma maior experiência a todos os níveis (…) procuram

dar conselhos (…) e isso até nos ajuda.” (P2)

“ (…) Têm muito mais experiência a tudo, (…) como é que isto funciona, já têm a noção

da avaliação, já sabem às vezes controlar-se mais.” (P4)

À excepção de algumas problemáticas específicas, podemos considerar que a perca de

capacidades enumeradas pelos profissionais são semelhantes a qualquer outra pessoa que

não possui deficiência mental, com a diferença que estes sinais aparecem mais cedo nas

pessoas portadoras de deficiência mental.

“A mim parece-me que em termos de evolução de uma pessoa dita normal e de uma

pessoa com deficiência mental o processo de envelhecimento parece-me ser bastante

similar exceptuando casos como o Syndrome de Down, o Syndrome de Ruben Stain ou o

Syndrome de Williams.” (P2)

Para que o processo de envelhecimento se atenue o máximo possível a instituição

proporciona aos seus utentes um conjunto de actividades com o objectivo de prevenir esse

envelhecimento.

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“ (…) Eles têm um conjunto de actividades que uma pessoa dita normal não tinha, esta

instituição possibilita-lhes uma mais fácil preparação do futuro e do envelhecimento” (P2)

2.6.2 - Necessidades das pessoas portadoras de deficiência mental em processo de

envelhecimento

Quadro 25 – Necessidades das pessoas portadoras de deficiência mental em

processo de envelhecimento

Respostas P1 P2 P3 P4

Acompanhamento personalizado

Similares a qualquer outra pessoa

Estimulação a vários níveis

Integração social

Preparação para o futuro

Descansar

Apoio para os pais

Fonte: Entrevistas realizadas aos profissionais da Associação, 2007

Os profissionais expressaram que a Associação tem a preocupação de desenvolver as suas

actividades com os utentes tendo por base o levantamento das necessidades individuais de

cada um, elaborando para isso um plano de intervenção mensal48 e anual que tem como

objectivo a elaboração de um projecto de vida a longo prazo para cada utente onde se tenta

prever as necessidades que cada um irá ter daí a uns anos. “Quando fazemos um plano de

intervenção individual, temos em conta as necessidades individuais de cada um (…)

procuramos olhar para essas questões do envelhecimento e ver que respostas ele

necessitará no futuro a médio e a longo prazo” (P2)

Os profissionais acham que as necessidades dos utentes mais velhos são similares às

necessidades de qualquer pessoa que inicie esta nova fase da vida, tendo em atenção todas

as transformações inerentes ao envelhecimento como as mudanças físicas, a reforma a

diminuição de capacidades de locomoção e autonomia entre outras. “ São muito similares

a uma pessoa dita normal” (P2); “as necessidades que qualquer pessoa tem quando deixa

de trabalhar e que deixa de fazer as coisas que fazia.” (P3)

Assim consideram que as principais necessidades das pessoas com deficiência mental em

processo de envelhecimento são acima de tudo o acompanhamento personalizado por parte

dos profissionais, estimulação física, sensorial e intelectual, apoio na preparação para as

48 Ver diário de campo de 22 de Maio de 2007, p.231

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mudanças do futuro, tais como um novo tutor, uma nova casa etc. e a promoção da

integração social destas pessoas.

“Neste momento começam a precisar de um acompanhamento mais personalizado por

parte das monitoras (…) dentro e fora da instituição.” (P1)

“Teremos que trabalhar acima de tudo o máximo a estimulação a todos os níveis, (…)

integração social e prepará-los para um futuro enquanto pessoas mais envelhecidas na

questão da tutoria e depois uma preocupação essencial ao nível do bem-estar físico.” (P2)

“Apoio a todos os níveis, igual ao que os ditos normais vão precisar quando chegam à

velhice, isto pode ter a certeza!” (P3).

Surge ainda a questão da necessidade de descansarem mais devido à idade. A Ajudante de

Lar refere que já nota que alguns utentes mais velhos já solicitam mais silêncio e espaço

para descansar quando saem do CAO e vão ficar na residência. “Terem o seu canto

também para poderem descansar mais um bocadinho” (…P4)

Emerge uma necessidade que claramente não pode ser comparada com a realidade da

população em geral. Pelo facto da pessoa portadora de deficiência mental não possuir

condições para cuidar de si na totalidade, dificilmente vai conseguir dar resposta às

necessidades dos pais que também estão envelhecidos. Verificando-se a existência de duas

gerações envelhecidas, surge a necessidade de acompanhamento para ambos, tendo em

conta que todos os utentes questionados neste estudo vivem com os seus pais e que estes já

têm entre 70-80 anos.

“Aqueles que já têm pais que têm quase 80 anos já estamos quase a falar duma 3.ª e 4.ª

idade em que ambos necessitam de ser acompanhados pelos técnicos (…) nalguns casos já

estamos a colocar monitoras a acompanhar os utentes aos médicos a fazerem exames

clínicos para apoiarem as famílias” (…P1)

“Na maior parte deles daqui a uns anos não têm família, tirando aqueles que têm irmãos e

que muitas vezes os irmãos não são as pessoas que mais os acompanham.” (P4)

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2.6.3 - Sentimentos das pessoas portadoras de deficiência mental

em processo de envelhecimento

Quadro 26 – Sentimentos das pessoas portadoras de DM em processo de envelhecimento

Fonte: Entrevistas realizadas aos profissionais da Associação, 2007

Ao questionarmos os profissionais sobre como se sentem os utentes mais velhos da

Associação, a maioria dos profissionais orientou a sua resposta para o grau de satisfação

dos utentes em relação à Associação, afirmando que os utentes sentem-se bem, gostam de

estar na Associação, das actividades que lhe são propostas, da residência, sendo que a

avaliação do grau de satisfação dos utentes é bastante positivo, podendo mesmo, para

alguns ser considerada a sua 2.ª casa. “Eles sentem que (…) é a casa deles (…) que este é o

meu segundo quarto” (P1); “satisfeitos por fazerem um conjunto de actividades” (P2);

“acho que eles sentem-se bem” (P3; P4); “excepções de alguns que não gostam, não é o

não gostar é estão sempre a reclamar.” (P4)

Na Associação, realiza-se com frequência avaliação da satisfação dos utentes, pois

considera-se de extrema importância que as pessoas se sintam bem num sítio que pode vir

a ser a sua futura casa. Esta satisfação pode verificar-se nas descrições dos diários de

campo, no discurso das entrevistas realizadas aos utentes e nas entrevistas realizadas aos

seus familiares, pois só assim será possível uma confiança tão grande nas respostas de

apoio que a Associação prevê para os seus utentes. “Fazemos uma avaliação da satisfação

dos nossos clientes (…) quer seja através da observação directa (…) parece-me que são

pessoas bastante satisfeitas por estarem nesta instituição.” (P2)

No que diz respeito ao tema em causa, os profissionais consideram que os utentes não se

sentem velhos, ainda não se preocupam com os problemas do envelhecimento, sentindo-se

por isso felizes. Referem também que eles não têm a noção do que é ser velho neste país.

Respostas P1 P2 P3 P4

Sentem-se satisfeitos por estarem na Associação

Sentem que a Associação é a casa deles

Estão satisfeitos com as actividades da Associação

Sentem-se bem

Não se sentem velhos

São felizes

Não se preocupam com o envelhecimento

Gostam de estar na moradia

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“Eles ainda não se sentem velhos (…) ainda vivem tão felizes que ainda não se preocupam

com isso.” (P3)

2.7 - A família e a problemática do envelhecimento da pessoa portadora de DM

2.7.1 - Problemas dos pais

Quadro 27 – Problemas dos pais

Respostas P1 P2 P3 P4 Preocupação com o futuro dos filhos

Próprio envelhecimento

Perca de capacidades para cuidar dos filhos

Preocupação com a própria morte Fonte: Entrevistas realizadas aos profissionais da Associação, 2007 Os principais problemas dos pais, referidos pelos profissionais, são essencialmente o seu

próprio envelhecimento e as consequências que daí advêm, “ (…) é uma angústia para a

grande maioria dos pais pensarem que eles vão e ficam cá os filhos.” (P1)

“ (…) Há uma grande dificuldade e grande preocupação em obter o máximo de resposta

possível para o futuro dos filhos, ter alguém que os trate condignamente” (…P2)

“Cada vez mais os utentes ficam cá, (…) os pais cada vez mais precisam de ter um

bocadinho de descanso, porque já são muitos anos.” (P4)

Sentem-se preocupados e angustiados com o futuro, numa procura constante de um lugar e

de alguém que cuide com carinho e amor do seu filho. Neste processo de envelhecimento

dos pais, desponta a preocupação de morrerem antes dos seus filhos e o medo da

incapacidade para cuidarem deste de forma autónoma. “Já começam os dois a ter

necessidades (…) conforme a família vai necessitando do apoio nós vamos dando.” (P1)

“Nós temos por exemplo uma mãe que pelo facto de já ter 80 anos, problemas de coração

e mesmo as condições sócio económicas não são as desejáveis nós já estamos a dar

resposta ao filho quase a tempo inteiro” (…P2)

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2.7.2 - Processo de atribuição de tutor da pessoa portadora de deficiência mental

Quadro 28 - Processo de atribuição de tutor da pessoa portadora de DM

Fonte: Entrevistas realizadas aos profissionais da Associação, 2007

Como podemos observar anteriormente, um dos objectivos da Associação é o

aconselhamento, esclarecimento e apoio aos pais no processo de interdição dos seus filhos.

“A instituição tem trabalhado nesse sentido há muito tempo, temos feito sensibilização às

famílias, temos orientado as famílias muito no processo de interdição.” (P1)

No Capítulo I ponto 2.6, sobre o processo de inabilitação e interdição das pessoas com

deficiência, percebemos que “a interdição consiste na coarctação do exercício de direitos

de determinadas pessoas que demonstrem incapacidade para poder governar a sua pessoa

e os seus bens” (Código Civil: artigos 138º e ss, artigos 1927º e ss e Código de Processo

Civil: artigos 944º e ss), “é retirar a capacidade que qualquer pessoa tem como cidadão a

partir dos 18 anos.” (P1)

A Assistente Social explica-nos que este apoio revela-se extremamente importante nas

escolhas para o futuro das pessoas portadoras de deficiência mental no sentido de

consciencializar os pais para os perigos que estas pessoas podem enfrentar se não tiverem

quem responda por elas. Este processo deve ser solicitado pelos pais, cônjuge ou outro

parente sucessível aquando a inexistência dos anteriores familiares, a partir da idade adulta

da pessoa com deficiência e tem como principal objectivo, salvaguardar os direitos e bens

das pessoas com deficiência mental.

“ (…) Eles não têm capacidade para ter o seu cuidado pessoal, gerir os seus dinheiros,

gerir os seus bens, (…) e por isso têm que ter alguém a representá-los (…) salvaguarda

também os bens que lhe pertencem” (…P1)

Respostas P1 P2

Consiste em retirar a capacidade de decisão à pessoa DM

Salvaguarda dos bens

A Associação dá orientação às famílias

Os pais devem escolher o tutor

O tutor deve ser um familiar

A instituição não deve ser tutora

Na inexistência de familiares o tutor deve ser um voluntário

O tutor deve zelar pelo bem-estar da pessoa

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Estes profissionais consideram que é importante que sejam os pais a escolher o tutor do seu

filho, “estamos a orientar os pais para o processo de tutoria para eles em vida poderem

escolher o tutor do seu filho” (P1) que eles aconselham que seja sempre um familiar

próximo e de preferência jovem para poder continuar a dar apoio à pessoa. “(…)

Percebermos se há ou não há a resposta em termos dos tutores no âmbito familiar” (P2);

“aconselhamos sempre que sejam pessoas mais novas para poderem continuar o apoio

aquela pessoa.” (P1)

Procuram ser cuidadosos nesse aconselhamento com o intuito dos pais escolherem a pessoa

mais indicada, pensando no bem-estar emocional e integração social desta pessoa, “deve

ser feito com muita consciência do que se está a fazer.” (P1)

“Procurar (…) em termos dos tutores (…) responsabilidades (…) de lhes prestar o maior

nível de afecto possível e nível de integração possível” (P2)

Concluem que no caso de não existir nenhum familiar que possa assegurar o compromisso

de ser tutor da pessoa com deficiência, o desejável é que não seja a Instituição a Tutora,

mas sim tentar-se encontrar alguém independente e externo à instituição, como por

exemplo tutores voluntários, para que avaliação dos serviços seja sempre a mais justa

possível.

“Baseando-nos na boa experiência já existente em Espanha relativamente às delegações

tutelares, procurarmos uma resposta através de tutores voluntários para aqueles que não

tenham nenhuma resposta ao nível familiar” (…P2)

2.7.3 - Avaliação das famílias sobre o trabalho desenvolvido na Associação

Partindo da auscultação às famílias sobre a satisfação dos serviços que a Associação presta

aos seus filhos, os profissionais de Serviço Social e Psicologia sentem-se confiantes ao

afirmarem que os pais fazem uma avaliação positiva dos diferentes serviços que a

instituição presta aos seus filhos. Novamente a Instituição revela preocupação em manter

serviços de qualidade que respondam às necessidades dos utentes e dos seus familiares.

“Temos pedido às famílias que façam uma avaliação dos diversos serviços que nós

prestamos aqui aos seus filhos e tem sido uma avaliação sempre positiva” (P1; P2).

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2.8 – Respostas Sociais

2.8.1 – Melhor Resposta para o envelhecimento da pessoa portadora

de deficiência mental

Quadro 29 - Resposta para o envelhecimento da pessoa portadora de deficiência mental

Respostas P1 P2 P3 P4

Lar para as famílias

Lugar onde sejam satisfeitas as necessidades básicas

Resposta residencial

Resposta promotora de bem-estar e qualidade de vida

Não internato

Resposta com apoio médico e de enfermagem

Resposta sem barreiras arquitectónicas

Nova valência com pessoas de diferentes idades

Resposta tipo lar para pessoas idosas

Resposta promotora de laços familiares Fonte: Entrevistas realizadas aos profissionais da Associação, 2007

No que concerne à questão sobre o desenho da melhor resposta social para o

envelhecimento da pessoa portadora de deficiência mental, os profissionais debruçaram-se

numa reflexão sobre os projectos de reorganização da Associação, “temos o projecto de um

lar para famílias” (P1) onde deixaram transparecer a sua opinião sobre o assunto tendo em

conta o seu conhecimento aprofundado da problemática da deficiência mental e da sua

família. “ (…) Quando a nossa população chegar aos 60 e tais (…) vamos ter que

obrigatoriamente reformular as nossas respostas (…) isto está presente nas nossas

preocupações. “ (P1)

Todos os profissionais deixaram transparecer nas suas palavras que este tema é assunto em

debate nas reuniões da equipa técnica, sendo o envelhecimento dos seus utentes também

uma grande preocupação para a instituição, pela inexistência de respostas. “ (…) Ou a

instituição ou o Estado tem que criar (…) para as pessoas de idade com deficiência, que

não há, nós aqui também não temos” (…P3)

Devido ao envelhecimento dos pais e dos filhos a Associação não mantém um olhar

reducionista sobre esta problemática e na voz dos profissionais percebemos que há uma

grande preocupação em satisfazer as necessidades dos pais dos utentes. Assim, configura-

se como necessária uma resposta que abarque necessidades distintas dos pais e dos filhos.

Nesse sentido os profissionais perspectivam que a solução de futuro irá passar por uma

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resposta residencial. Contudo, não se verificou unanimidade no desenho dessa resposta,

sendo que a maioria dos profissionais defende que a resposta ideal será aquela que

promove a manutenção dos laços familiares. Desta forma, surgem quatro tipos de resposta

para o envelhecimento da pessoa portadora de deficiência mental e sua família:

(A) - Resposta residencial diferenciada da resposta dos pais, “Isto com um objectivo de

não fazermos uma separação entre os nossos utentes e as famílias (…) quando eles

necessitarem (…) serem integrados na mesma instituição e conviverem também, cada um

no seu sector (…) dar atendimento aos pais num lar, e os filhos têm que ter outro

atendimento com outras funcionárias e juntá-los em espaços comuns para estarem mais

próximos” (P1)

(B) - O utente mantém-se no seio da família (tutor), vem passar o dia à instituição e

resposta tipo Lar para os pais, “gostaríamos de manter uma filosofia de não internato na

instituição (…) sobre o nosso ponto de vista é fundamental que haja o afecto familiar (…)

se traduz ao nível do bem-estar emocional (…) outra preocupação são os pais destas

pessoas (…) para isso estamos a pensar fazer aqui um lar (…) no sentido de termos como

prioridade os próprios pais para que eles estejam mais próximos possíveis e que não haja

uma perda de laços.” (P2)

(C) - Nova valência com pessoas de diferentes idades e actividades adaptadas, “ se

calhar Lar não seria nome indicado, mas sim uma nova valência (…) durante o dia

enquanto poderem, junto com os mais jovens e não estivessem segregados (…) mas com

actividades dentro das possibilidades de cada um” (P3)

(D) - Resposta tipo Lar 3.ª Idade, tipificada para pessoas portadoras de deficiência

envelhecidas, “a melhor resposta era fazer género de uma divisão tipo lar (…) porque já

todos tinham as mesmas actividades, dentro das capacidades deles, porque eram todos

mais ou menos da mesma idade” (…P4)

Apesar da diferenciação da tipologia das respostas sugeridas, todos os profissionais deixam

subentender que o mais importante é a promoção do bem-estar e qualidade de vida destas

pessoas, “respostas que procuram acima de tudo dar o maior bem-estar e qualidade de

vida possível a estas pessoas” (P2) e que para isso é fundamental a proximidade com a

família, “um sítio assim sem haver à mesma o corte com a família como agora existe. Aos

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fins-de-semana virem buscá-los, levar, virem visitar” (…P4) e o desenvolvimento de

actividades físicas e sociais para a manutenção das capacidades adquiridas por estas

pessoas.

Ressalta novamente a ideia de que a pessoa portadora de deficiência mental não é muito

exigente, necessitando apenas de um lugar onde o tratem com respeito e dignidade e onde

lhe sejam satisfeitas as suas necessidades básicas. “Desde que sejam satisfeitas as

necessidades básicas deles e dos seus interesses eles vivem felizes, eles não são muito

exigentes.” (P1)

O profissional de psicologia salienta que a Associação no futuro pretende reforçar os

cuidados médicos e de enfermagem, pois considera que esta será uma necessidade dos

utentes mais velhos, bem como eliminarem as barreiras arquitectónicas que possam existir,

no sentido de adaptar o melhor possível os serviços prestados à nova condição dos utentes.

“Reforçar os cuidados de enfermagem (…), porque (…) já identificámos como sendo algo

importante e a rever são as questões do apoio médico e de enfermagem (…) temos que

rever as nossas condições em termos das acessibilidades.” (P2)

Concluímos assim que a maioria dos profissionais não gostaria que a Associação se torna-

se um Lar de 3.ª idade, pelas suas características segregadoras e pela ideia estereotipada em

que a pessoa permanece lá inactiva à espera que o tempo passe. “Não vamos fazer igual

aos lares da 3.ª idade” (…P3)

Exemplo de resposta social realizada pela Associação

Apesar das necessidades e preocupações relativas ao envelhecimento das pessoas

portadoras de deficiência mental, ainda não estão estruturadas as respostas para esta

problemática, pois como podemos observar pelas respostas dos profissionais e até dos pais,

a Associação está ainda a pensar na melhor forma de se organizar para o futuro. No

entanto, apesar de rara, já surgiu a necessidade de apoio por parte de uma família, apoio

esse que a Associação respondeu de forma pontual.

“Nós até já temos uma família que está a ser acompanhada, totalmente, pela instituição,

em que o apartamento foi cedido pela câmara (…) vêem à instituição quando querem e

sempre que podem, fazem a visita ao filho, o filho (…) também vai com a nossa

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empregada, à hora do almoço, visitá-los (…) dois em dois dias, de três em três dias. Ele

reside aqui, é um dos utentes que já cá vive, permanentemente (…) quando fechamos a

instituição vêem aqui para dentro da instituição (…) ficam cá com o guarda e ficam mais

apoiadas.” (P1)

Através desta explicação dada pela Assistente Social podemos perceber que, o apoio dado

a esta família poderá necessitar de alguns ajustes. Importa reflectir sobre, a capacidade da

instituição promover o mesmo tipo de resposta, em larga escala. No entanto, já é um

princípio positivo de actuação que pode servir como modelo a reflectir e reformular para

outros pais que venham a necessitar desse apoio, dirigido às duas gerações de pais e filhos.

Este modelo de apoio tenta dar resposta quer às necessidades da pessoa portadora de

deficiência mental, quer à sua família que, por ser carenciada e possuir outros membros do

agregado também com outras problemáticas tenta dar apoio a cada um, de forma separada

e em locais separados, privilegiando a proximidade desses locais de forma a manter uma

relação familiar de proximidade. Aqui observamos, essencialmente, dois tipos de respostas

sociais, nomeadamente o apoio domiciliário e residencial à família e um apoio residencial

à pessoa com deficiência. Assim, concluímos que emerge a necessidade de interligação

entre as várias respostas existentes de forma a responder, também, aos diferentes tipos de

necessidades.

2.8.1.1 - Actividades promotoras de bem-estar no envelhecimento da

pessoa portadora de deficiência mental

Quadro 30 – Actividades promotoras de bem-estar no envelhecimento da pessoa portadora de DM

Respostas P1 P2 P3 P4 Actividades ocupacionais

Actividades físicas (Fisioterapia; Remo; Natação; ginástica

Actividades de animação

Actividades de relaxamento (jacuzzi)

Rotatividade de actividades

Adaptação das actividades

Actividades em conjunto com pessoas de várias faixas etárias

Fonte: Entrevistas realizadas aos profissionais da Associação, 2007

Actualmente, as actividades que os utentes, contemplados neste estudo, desenvolvem na

Associação têm o carácter de emprego para estes, na medida em que incutem nas

actividades desenvolvidas um grau elevado de responsabilidade, no cumprimento dos

objectivos e horários estabelecidos. “Eles pensam que vêem para o seu trabalho e é

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verdade, este é o trabalho deles em que também têm uma gratificação no final do mês”

(P1).

“Eles não vêem para a escola, vêem para o trabalho eles sabem que são adultos

trabalhadores, uns dizem-se electricistas outros dizem-se sei lá (…) eles têm capacidade

de ver que já não são crianças” (P3)

Os profissionais referem que na resposta ao envelhecimento das pessoas portadoras de

deficiência mental pensam manter uma grande parte das actividades que a instituição já

desenvolve, procurando que exista uma rotatividade e uma adaptação às mesmas, de forma

a proporcionarem bem-estar e qualidade de vida a estas pessoas. Consideram que algumas

delas adaptam-se também às pessoas mais velhas.

“ Iremos procurar acima de tudo manter as actividades que são desenvolvidas por todos

(…) e adaptá-las (…) termos o cuidado obviamente através de indicações médicas, da

própria família, de prepararmos as pessoas um pouco mais envelhecidas (…) no sentido

de melhorar e dar a maior qualidade de vida possível.” (P2)

“ (…) Eu não sei se estas actividades ocupacionais que eles elaboram aqui, em sala, não

se adaptam a uma terceira idade, se calhar até se adaptam! ” (P1)

“Acho que enquanto eles puderem e tiverem capacidades nem que sejam as mínimas,

faziam 50 peças agora fazem 20 ou 10, corriam um ginásio inteiro, correm metade do

ginásio, mas correm, ainda trabalham.” (P3)

Neste sentido, e procurando não fazer uma diferenciação entre os utentes mais jovens e os

mais velhos, o profissional de Psicologia considera que a melhor filosofia será a existência

de pessoas de diferentes idades na mesma sala de actividades com o objectivo de estimular

a partilha de aprendizagens e experiências.

“Uma das filosofias que nós temos e que me parece que iremos manter é procurar que não

haja uma diferenciação de tratamento entre as pessoas com diferentes idades (…) até é

desejável que haja numa mesma sala, pessoas com diferentes faixas etárias no sentido de

que haja uma estimulação mútua e uma aprendizagem contínua.” (P1)

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Através da observação participante podemos confirmar que, os utentes estão distribuídos

pelas salas, independentemente da sua idade e que desenvolvem actividades específicas

consoante as necessidades estabelecidas no plano individual do utente. Na dinâmica em

sala de actividades ocupacionais observámos a existência de inter-ajuda entre alguns

utentes.

Não obstante, o objectivo dos profissionais é não deixarem os utentes parar nem caírem

num comodismo, “nós iremos procurar o máximo possível não ter pessoas envelhecidas

estagnadas, sentadas à espera que o dia passe (…) porque parar é morrer” (P2);

“enquanto puderem vão sempre trabalhar e nós estamos cá precisamente para não os

deixar parar.” (P3)

Assim, apontam como actividades promotoras de bem-estar no processo de

envelhecimento, as actividades ocupacionais, físicas, de relaxamento e de animação.

“Todos os tipos de actividades, desportivas, de animação musical, de trabalho, de

passeios, fisioterapias, tudo aquilo que for possível.” (P1)

“Actividades, no sentido de procurarmos que estejam mais aptas possível ao nível físico,

fazer mais fisioterapia (…) um pouco mais de remo, de natação, jacuzzi, ginástica, no

sentido (…) que o bem-estar físico seja um bem maior possível.” (P2)

Síntese conclusiva

Reflectindo sobre, as respostas apresentadas para o envelhecimento da pessoa com

deficiência mental e as necessidades eminentes da sua família, também ela já envelhecida,

parece-nos que as propostas A e B são as que mais se adequam às necessidades dos utentes

e dos pais, promovendo o máximo de bem-estar a ambos. Neste sentido apresentamos uma

reflexão sobre estas propostas, beneficiando dos contributos dados pelos restantes

profissionais.

Em primeiro lugar verifica-se que, os profissionais não contemplam a hipótese da pessoa

com deficiência mental ingressar numa resposta já existente destinada a pessoas idosas.

Por sua vez, implicitamente demonstram que as respostas já existentes destinadas a pessoas

portadoras de deficiência mental deverão sofrer uma reestruturação e uma possível

adequação a esta nova problemática.

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Pensamos que, esta ocorrência se deve ao facto de estes profissionais conhecerem as

especificidades das pessoas portadoras de deficiência mental e para eles, estas prevalecem

sobre as características do envelhecimento, isto porque através do levantamento das

necessidades dos utentes a instituição poderá sempre reformular o seu plano de actuação,

enquanto que, na generalidade dos Lares para idosos, nem sempre a equipa de profissionais

possui conhecimentos específicos na área da deficiência, bem como estes profissionais

também não têm experiência no trabalho com pessoas idosas. No entanto conhecem muito

bem a problemática da deficiência mental o que lhes dá confiança para continuarem a dar o

apoio necessário a esta população.

“Eles que são pessoas que não sabem escolher e não sabe exigir, mas nós sabemos o que

lhes pode dar qualidade de vida e a nossa função é essa, contribuir para que estas pessoas

tenham uma qualidade de vida.” (P1)

A primeira proposta surgirá no caso de não existir outro familiar que passe a ser o cuidador

da pessoa com deficiência, sendo por essas razões forçada a institucionalização. Contudo,

propõe-se o desenvolvimento de mecanismos que permitam a manutenção dos laços

familiares, e actividades de ocupação, reabilitação e integração, fomentando o apoio

intergeracional.

A segunda proposta centrada na perspectiva do apoio familiar, quando este existe, na nossa

perspectiva pode vir a ser a “melhor resposta” pois permite ao utente manter o seu estilo de

vida, facilitando a proximidade com os pais, despreocupando-o da tarefa de cuidarem

deles, fomentado deste modo a integração na comunidade e numa resposta social já

existente nessa comunidade. Através de actividades de ocupação, reabilitação e integração,

conjuntas com outros utentes de diferentes idades, perspectiva-se que se desenvolva um

trabalho de inter-ajuda e partilha de experiências. Logicamente que nesta resposta devem

estar também contemplados os apoios médicos geralmente necessários na terceira idade,

bem como uma adequação das actividades propostas às capacidades e necessidades destes

utentes mais velhos.

Independentemente do tipo de estrutura organizacional “têm que ser criadas condições,

como se criaram para os ditos normais, porque vão ter as mesmas necessidades e os

mesmos direitos que qualquer pessoa tem.” (P3)

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3 - Análise das entrevistas aos indivíduos portadores de Deficiência Mental: “um

olhar sobre o amanhã”

Neste capítulo apresentamos a análise dos dados recolhidos ao longo do processo de

investigação que resultam da dinâmica de grupo e das entrevistas realizadas aos quatro

utentes da Associação participantes nesta investigação. Com o propósito de conhecermos

de forma aprofundada os seus anseios e as suas vontades sobre o seu próprio

envelhecimento, submetemos a informação recolhida a uma análise de conteúdo49.

Os utentes possuem deficiência mental moderada e frequentam o Centro de Actividades

Ocupacionais, onde realizam actividades consideradas socialmente úteis. Tentámos

constituir um grupo de pessoas que apesar da sua deficiência, tenham capacidades para

reflectir sobre o tema exposto de forma mais real possível, contudo devido à deficiência

que possuem, todos os participantes apresentam características adaptativas diferentes,

sendo por isso necessário um olhar especial sobre esta análise na medida em que algumas

vezes foi necessário colocar as questões várias vezes e de diferentes formas para se

conseguir obter uma resposta mais próxima da realidade destes utentes, não é por isso

possível proceder-se a generalizações.

Neste sentido, procedemos a uma breve caracterização dos utentes da Associação

participantes neste estudo. No intuito dessa caracterização reflectir o percurso individual de

vida de cada utente, para além da informação recolhida a partir da entrevista consultámos

também o processo individual de cada um.

3.1 - Caracterização sumária dos utentes

Quadro 31 – Caracterização dos utentes da Associação

Pessoa portadora

de DM

Familiar entrevistado Idade Causa da deficiência Associação Sector

Utente 1 Familiar 1 49 Encefalite 1990 CAO Utente 2 Familiar 2 51 Febre asiática durante a gravidez 1990 CAO Utente 3 Familiar 3 50 Meningite 1990 CAO Utente 4 Familiar 4 50 Anóxia 1990 CAO

Fonte: Entrevistas realizadas aos utentes da Associação, 2007

49 Vide Apêndice n.º 14 (volume 2) – Análise de conteúdo das entrevistas realizadas às pessoas portadoras de deficiência mental

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Utente 1 (U1): Filha da família 1, género feminino, nasceu a 19 de Junho de 1959,

actualmente têm 49 anos, tem um irmão. Vive em Lisboa com a mãe e uma hóspede.

Causa da deficiência: Período neo-natal (fórceps – anóxia), encefalite aos 22 dias de vida.

Doença crónica: Epilepsia. Antecedentes escolares: 7 anos no ensino integrado onde

atingiu o 3.º ano e 14 anos numa CERCI onde fez o 4.º ano. Veio para a Associação em

1990. Frequenta o centro de actividades ocupacionais.

Utente 2 (U2): Filho da família 2, género masculino, nasceu a 1 de Novembro de 1957,

actualmente tem 51 anos, tem uma irmã e um irmão. Vive em Lisboa com a mãe e o pai.

Causa da Deficiência: Não existem certezas mas coloca-se a hipótese de Febre asiática

durante a gravidez ou Spina Bífida. Doença Crónica: Diabetes. Antecedentes escolares: 1

ano na pré-primária no Colégio Moderno, 7 anos na primária (grau de iniciação),

nomeadamente 4 anos no colégio Clapared, 2 anos num colégio em Luanda, 1 ano no

Declony, realizou o 4.º ano no colégio Descobertas em Lisboa e 7 anos na CERCI. Veio

para a Associação em 1990. Frequenta o centro de actividades ocupacionais.

Utente 3 (U3): Filho da família 3, género feminino, nasceu em Luanda a 10 de Junho de

1956, actualmente tem 50 anos, onde viveu até aos 20 anos, tem 4 irmãos (dois irmãos e

duas irmãs). Durante a semana vive na residência do Associação e ao fim de semana vai a

casa onde fica sozinha com a mãe. Causa da Deficiência: Factores peri-natais, meningite

aos 8 meses que causou atrasos no desenvolvimento psico-motor e cognitivo. Antecedentes

escolares: andou na escola em Luanda e fez o 4.º ano na CERCI em Lisboa. Veio para a

Associação em 1990. Frequenta o centro de actividades ocupacionais.

Utente 4 (U4): Filho da família 4, género masculino, nasceu a 12 de Dezembro de 1958,

actualmente tem 50 anos, tem um irmão. Vive em Lisboa com a mãe e o pai. Causa da

Deficiência: anóxia com 3 semanas de vida. Antecedentes escolares: não atingiu nenhum

nível de escolaridade apesar de ter estado 7 anos num colégio no Areeiro, até vir para a

Associação, esteve 14 anos em casa. Veio para a Associação em 1990. Frequenta o centro

de actividades ocupacionais.

Não obstante, conscientes da dificuldade em aprofundar este tema a partir das respostas

dadas pelas pessoas portadoras de deficiência mental, considerámos que por serem os

actores principais do processo que envolve o envelhecimento desta população, seria uma

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mais-valia a tentativa de compreensão da problemática partindo do seu ponto de vista,

mesmo que este muitas vezes possa parecer uma utopia.

Assim, introduzimos esta análise com um excerto de uma das entrevistas, que reflecte o

direito à liberdade de escolha e expressão que assiste a todos os seres humanos.

“Eu tenho que falar, tenho que desabafar, tenho que pôr a conversa em dia! Nós os

deficientes temos que nos apresentar tal e qual como nós somos, nós temos que mostrar ao

mundo o que somos e o que é que estamos aqui a fazer neste mundo! Porque muitas

pessoas não nos conhecem porque têm medo de nós, têm medo que a gente sejamos

tímidos e não é assim! Nós temos que dizer tudo o que vai dentro da alma, tudo o que vai

dentro do nosso coração, o que é que está mal e o que é que está certo e o que é que está

errado, a gente tem que dizer que a gente existe! Nós temos que dizer o que é que a gente

está cá a fazer, temos que dizer o que é que a gente faz!” (U1)

Sistematização da análise das entrevistas às pessoas portadoras de deficiência mental

Quadro 32 - Sistematização da análise das entrevistas realizadas às pessoas portadoras de deficiência mental

Temas Categorias Sub-categorias

Problemática da Deficiência

Mental A minha identidade Características pessoais, idade, percurso escolar, família e

problemas de saúde.

Entrada na Associação Mudança positiva; entraram na instituição há 14 anos a quando a sua abertura

Razão pelo qual estão na Associação Necessidade de um acompanhamento personalizado; conhecia o director, a mãe já não consegue tomar conta dela

Instituição Associação

Avaliação da sua permanência na Associação Estão satisfeitos por estarem na associação

Noção da idade 3 utentes sabem que estão mais velhos apenas 1 considera que está mais novo desde que veio para a instituição

Definição de envelhecimento Associam o envelhecimento a características físicas Problemática do Envelhecimento

Sinais de envelhecimento Cansaço; problemas de saúde; mudanças físicas

Envelhecimento dos pais Acham que os pais ainda não estão velhos Família

Morte dos pais Não participam das cerimónias sociais, sabem que os pais irão morrer antes deles

Um olhar sobre o amanhã As suas vontades …

Viver com o namorado fora da Associação; não viver na Associação; viver com um familiar; viver com amigos fora do Associação; viver num lar

Que actividades… Actividades físicas; psicológicas; sociais; actividades da vida diária e todas as actividades que já desenvolvem

Respostas para o envelhecimento

O que é que os faz felizes… Sentir-se útil e ocupada; ter saúde; ser alegre e conversar com os colegas e a família

Fonte: Entrevistas realizadas aos utentes da Associação, 2007

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3.2 – A problemática da deficiência mental

3.2.1 - A minha identidade

Quadro 33 – Quadro interpretativo do tema “a minha identidade”

Respostas U1 U2 U2 U4 Características pessoais positivas Idade Percurso escolar Família Doenças

Fonte: Entrevistas realizadas aos utentes da Associação, 2007

A entrevista aplicada aos utentes, teve início com uma pergunta aberta em que pedimos à

pessoa para falar um pouco sobre ela mesma, que teve como principal objectivo

descontrair a pessoa fazendo-a esquecer que estava numa entrevista e introduzir as

questões sobre a sua identidade pessoal, levando-os a abordar os assuntos considerados por

eles mais importantes e para percebermos como é que a pessoa portadora de deficiência

mental se vê a si própria e como vê a sua família. Devido às características específicas de

cada um dos entrevistados, durante esta análise não podemos descuidar de que cada caso

deve ser analisado de forma individual.

Eu: (…), hoje em vez de falarmos no global vamos falar um bocadinho sobre ti, queres começar por onde? Utente 1: Evidentemente, então cada caso é um caso! (U1)

Os entrevistados mostraram inicialmente dificuldade em falar sobre eles próprios sem a

existência de orientação.

Eu: Tens dificuldade em falar sobre ti? Utente 3: ééé” (U3)

Contudo, abordaram essencialmente questões referentes às suas características pessoais,

idade, percurso escolar, família e ainda alguns problemas de saúde.

“Eu sou uma jóia de pessoa, ai sou sou! (…) Estou quase com 50 anos e já andei em

vários colégios, não é brincadeira nenhuma” (…) Eu fiz a minha 4.ª classe tinha 15 anos

(…)Escovo sempre os dentes antes de deitar e levei a vacina a BCG.” (U1)

“Eu sou o …, sou um rapaz com 49 anos, vou para os 50, sou um rapaz com uma certa,

como é que hei-de dizer, com uma certa vontade de falar com as pessoas, consigo por

exemplo (…) Sou do signo escorpião, nasci em Novembro de 1957 no dia de Todos os

Santos. Tenho dois irmãos, um irmão divorciado e uma irmã casada. O meu irmão tem um

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filho e eu sou tio do filho dele, gosto muito dele é muito simpático (…) Eu disse à minha

mãe que eu queria ser tio dele e a minha mãe disse que eu podia ser tio dele. (…) Tenho

diabetes como sabe (…) Foi horrível, nunca pensei vir a ter diabetes nunca pensei nisso,

uma situação que eu não estava à espera que acontecesse.” (U2)

“Eu sou uma menina que tenho 50 anos, vou fazer 51 para a semana (…) Eu quando

estava em Angola, uma vez fui para a escola que era lá ao pé de casa e fui atropelada foi

um tio meu que estava lá a trabalhar e que foi comigo para o hospital, levei pontos aqui

quer ver.

“Eu sou um rapaz, jovem e bom rapaz. Tenho 48 anos, 49” (U4)

Como podemos observar no quadro n.º 33, os utentes um e dois foram mais comunicativos.

Ao pedirmos para se apresentarem, estes foram os temas que sobressaíram do seu discurso.

Neste sentido consideramos que estes são as principais temáticas que envolvem a vida

destes participantes. Assim partindo destes temas introduzidos pelos utentes, elaborámos a

sua caracterização, já realizada anteriormente e aprofundámos estas questões com vista à

exploração das suas vontades relativamente ao seu próprio envelhecimento.

3.3 – A Associação

3.3.1 - Entrada na Associação

A vinda destas pessoas para a Associação revelou-se uma mudança positiva nas suas vidas

e na vida dos seus pais, como já aprofundámos anteriormente na análise das entrevistas aos

familiares e na caracterização do percurso escolar destes utentes, na medida em que

durante anos tiveram que mudar constantemente de escola na procura da escola adequada

às suas necessidades.

Todos estes utentes vieram para a Associação, quando já adultos e no momento do início

da sua actividade. Os entrevistados têm a noção que já estão naquela instituição desde essa

data, contudo nem todos conseguem percepcionar há quantos anos estão na Associação.

“Vim quando fiz a minha 4.ª classe, tinha 17 anos”. (U1); “Desde que isto abriu (…) devia

ter para ai uns 20 ou 20 e pouco. Ainda nem existia isto aqui nem nada. Não existia o

ginásio nem isto aqui.” (U2)

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A terceira entrevistada revelou que apesar de saber que veio para a Associação quando a

sua abertura, não tem a noção de há quanto tempo lá está, pois na realidade foi para o

Associação há 14 anos e pensa que está lá há apenas 4 anos, como se pode observar no

excerto da entrevista apresentada em seguida.

Eu: lembras-te com quantos anos vieste para o …? Utente 3: Há, há, foi quando isto abriu, foi quando o … abriu. Eu: Lembras-te quantos anos é que tinhas? Utente 3: Era novinha ainda não tinha 50 Eu: Eras novinha? Utente 3: Era Eu: Então e quantos anos tens agora? Utente 3: 50 Eu: Então e há quantos anos é que cá estás? Pensa lá comigo, se ainda não tinhas 50, 50 tens agora… Utente 3: é, é Eu: se já vieste há muitos anos atrás, tinhas que ter menos de 50 anos. Então quantos anos tinhas, assim mais ou menos, pensa lá? Utente 3: 48 ou 49 Eu: Há então estás cá ai há três anos? Utente 3: Há 4 anos Eu: Então, mas o … não abriu há 4 anos! O … abriu há 15 anos mais ou menos. Utente 3: Eu vim logo, assim que fiz os testes com o Dr…., até eu e a minha mãe fomos a Almada fazer os testes e depois passei e depois fiquei logo, vim logo quando isto abriu, vim logo. Eu: Eras nova? Utente 3: Era Eu: Já foi há muitos anos? Utente 3: Foi Eu: Então não tinhas quase 50, eras mais nova Utente 3: Era Eu: Bem me parecia (risos)

Apesar da tentativa de localizar a utente 3 no tempo, esta não conseguiu percepcionar o

número de anos em que está na Associação, ao contrário do utente 4 que inicialmente

sugeriu que questionássemos a mãe sobre a sua vinda porque ele não sabia responder, mas

com uma pequena ajuda rapidamente conclui que está na Associação há 14 anos, no

entanto pensa ter vindo em 1993 e a ficha individual do utente refere que entrou em 1990.

Utente 4: Eu vim para aqui em 93. Eu: E lembras-te quantos anos é que tinhas quando vieste para cá? Utente 4: Haaaa! Isso pode perguntar à minha mãe. Eu: Assim mais ou menos, já foi há muitos anos? Utente 4: Não, não foi há muitos anos, que eu estou cá desde 93 portanto! Ai (suspirou) 93… Eu: De 1993 até 2007 já passaram alguns anos, já cá estás há quantos anos? Utente 4: Já cá estou há 14 anos Eu: Exactamente. Utente 4: 2 de Fevereiro é o dia que eu entrei aqui.

A dificuldade em percepcionarem a noção do tempo, pode também condicionar a sua

noção de envelhecimento. Pois envelhecer significa um somatório de anos vividos e à

excepção da utente 1, os entrevistados não apresentaram um paralelismo entre a sua idade

e o número de anos que frequentam a Associação. Neste sentido, recorremos a algumas

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estratégias com o objectivo de percebermos se apesar da sua dificuldade em contabilizar o

tempo sabiam as razões porque estão numa instituição e se sentem mais velhos ou mais

novos desde a sua entrada.

3.3.2 - Razão pelo qual estão na Associação

Quadro 34 – Razões pelas quais estão na Associação

Respostas U1 U2 U2 U4 Necessidade de um acompanhamento personalizado Conhecia o Director

A mãe já não consegue tomar conta dela Não respondeu

Fonte: Entrevistas realizadas aos utentes da Associação, 2007

Apenas três dos quatro entrevistados explicaram as razões pelas quais se encontram numa

instituição com as características da Associação em estudo. Como podemos observar pelo

quadro 33, todos os utentes acreditam que estão naquela Associação por razões diferentes.

Contudo parece-nos que a utente 1 é a que mais se aproxima das razões reais que explicam

a sua permanência na instituição, sendo que tem a perfeita noção de que ela tem um

problema que não lhe permite gerir a sua própria vida de forma independente, pois

necessita sempre de apoio.

Eu: E porque é que achas que estás no …? Utente 1: Porque eu não conseguia orientar-me sozinha. Não não conseguia. Eu: O que é que isso significa? (…) Utente 1: Então pois não, nem eu nem ninguém! Nós precisamos de alguém que ajude a gente a organizar-se. Que o nosso futuro seja se casar ou outra coisa, nós temos que ter alguém que nos oriente na vida, porque a nossa vida não é brincadeira.

A utente 3, associa o envelhecimento da mãe à sua estadia na Associação, isto porque ela

começou por vir para a instituição apenas durante o dia, e neste momento, já fica toda a

semana na residência, por ter começado a perder autonomia e por forma da instituição

apoiar a sua família que também já se encontra envelhecida. Apesar desta não ter sido a

razão que fez com que a utente 3 fosse para uma instituição com as características desta

Associação, a verdade é que já começa a ser um dos motivos que levam à sua permanência.

Contudo, ela não identifica que está numa instituição devido às suas próprias

características e necessidades mas sim devido às necessidades da sua família.

Eu: E sabes porque é que estás no …? Pensa lá um bocadinho! Eu acho que tu sabes! Utente 3: Sei! Eu: Então será porquê? Utente 3: Porque a minha mãe já está com muita… Eu: O que é que tem a tua mãe! Já tem muita idade é isso! Utente 3: Já!

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Eu: E mais? Utente 3: E já não me pode aturar!

O utente 2, desconhece a razão pela qual veio e permanece na Associação, sendo que

acredita que está lá porque conheceu o Director, não explicitando as verdadeiras razões

pelas quais está numa instituição. Por outro lado, associa a Associação ao seu local de

trabalho, revelando que não tem consciência da sua real problemática.

Eu: Sabes porque é que estás no …? Utente 2: Eu estou cá por uma simples razão, por causa do Dr., eu conheço o Dr. há uma data de anos Estou cá para aprender coisas novas, para ter um futuro melhor, uma vida melhor, para ter um trabalho qualquer, se o Dr. me desse essa oportunidade eu até gostava imenso, gostava imenso de ir trabalhar lá para fora. Eu: Porque é que achas que nunca foste trabalhar para fora do …? Utente 2: Porque nunca me chamaram para ir lá para fora trabalhar.

Concluímos assim que, apenas um dos três utentes que manifestaram a razão porque estão

na Associação, conhece a verdadeira razão pela qual permanece no seu dia-a-dia numa

Instituição.

3.3.3 – Avaliação da sua permanência na Associação

Não obstante, demonstram satisfação por estarem num lugar como aquela Associação,

chegando mesmo a preferir estar lá do que em casa. É importante referir que estes utentes

associam a sua vinda para a Instituição como quem vem para o trabalho todos os dias, e

desse modo quando questionámos se gostam de estar na Associação, a sua resposta refere-

se essencialmente às actividades que ali desenvolvem e aos colegas. “ Gosto, gosto não é

uma seca” (U2); “Eu adoro, gosto mais de estar no … do que em casa. Em casa aborrece-

me, não tenho colegas lá nem nada, aborrece-me” (U3); “Eu prefiro estar aqui do que em

casa.” (U4)

3.4 – A problemática do Envelhecimento

3.4.1 - Noção da idade

Quadro 35 – Noção da idade

Respostas U1 U2 U2 U4 Estou mais novo Estou mais velho

Fonte: Entrevistas realizadas aos utentes da Associação, 2007

Numa primeira fase, abordámos a questão da idade na dinâmica de grupo, através do

recurso a imagens reveladoras do processo de envelhecimento, na tentativa de que os

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utentes se identificassem com uma das etapas da vida reconstituída nas imagens50. Ao

apresentarmos uma imagem com quatro fotos da mesma pessoa nas diferentes fases do seu

desenvolvimento, em que a 1.ª era uma criança e a última já era idosa. Todos os

entrevistados se reviram na 4.ª imagem revelando que já se sentem a envelhecer. Quando

confrontados com esta escolha, explicaram que apesar de ainda não apresentarem todos os

sinais do envelhecimento, tais como rugas ou o uso de bengala, sentem-se mais próximos

desta etapa da vida do que da etapa anterior relativa aos 40-50 anos. Este resultado,

surpreendeu-nos na medida em que todos os utentes encontram-se na fase anterior à

seleccionada.

Após a introdução do tema, posteriormente na entrevista individual, para percebermos se

os utentes tinham a noção da idade e todas as características que daí advém, criámos uma

relação entre a idade que tinham quando entraram para a Associação e a que têm agora,

neste sentido, questionámos se eles achavam que estavam mais novos ou mais velhos

desde que ingressaram na Associação.

A maioria dos utentes sabem que todos os anos comemoram um aniversário e por isso

estão mais velhos, apesar de anteriormente na sua globalidade não terem revelado saber há

quantos anos estão na Associação. “Então estou mais velhinha. Então pois estou, faço

anos todos os anos e vou crescendo mais depressa vou ficando mais velhinha” (U1),

“mais velha! (…) olha, porque tenho mais idade”. (U3).

Eu: Já passaram alguns anos! E agora sentes-te mais novo ou mais velho do que quando entras-te para o …? Utente 4: Sentia-me mais novo! Eu: Quando vieste para cá sentias-te mais novo! Significa que agora sentes-te mais velho? Utente 4: Pois a idade não perdoa? (U4)

Curiosamente o utente 2, anteriormente, revelou saber que estava na Associação há 14

anos mas quando questionado, revelou não ter noção dessa passagem, achando que está

mais novo.

Eu: Achas que estás mais novo do que quando vieste para o …? Utente 2: Acho! Acho que estou um bocadinho mais novo, mas a vida é a vida, aos 50 é que eu não sei como é que vai ser porque já só falta um ano. (U2)

Na tentativa de entendermos o raciocínio do utente, colocámos a pergunta de outra forma,

e este associou os cabelos brancos como uma característica do envelhecimento, à sua

50 Vide Apêndice n.º 11 (volume2) – análise da 1ª imagem

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realidade física de momento, percebendo que nem sempre possuiu cabelos brancos. Desta

forma, conseguimos que o utente 2 percebesse que está mais velho.

Eu: Então e tu achas que estás mais novo do que quando tinhas 20 anos? Utente 2: Não sei, talvez, mas ainda não tinha cabelos brancos! Eu: Então? E os cabelos brancos podem ser reflexo de quê? Utente 2: Velhice. Eu: Hum, então se calhar não estás mais novo! Utente 2: Pois não, estou a ficar um bocadinho mais velho.

Outra estratégia adoptada para compreendermos se os utentes sabem distinguir as

diferenças de idades através das características individuais de cada um, foi o recurso à

comparação entre o entrevistado e o entrevistador. Aí, claramente todos os entrevistados

revelaram perceber as diferenças físicas entre uma pessoa mais nova e outra mais velha.

3.4.2 - Definição de envelhecimento

Segundo Jacob (2001), o envelhecimento é um processo biológico progressivo e natural,

caracterizado pelo declínio das funções celulares e pela diminuição da capacidade

funcional, que é vivido de forma variável consoante o contexto social de cada indivíduo.

Ao questionarmos o que é o envelhecimento para a pessoa com deficiência mental,

podemos constatar, que para os utentes, envelhecer, significa o aparecimento de diferentes

problemas de saúde. Consideram também que o corpo sofre várias mudanças físicas e

psicológicas que levam a uma perca de capacidades acentuada “Uma pessoa velha! É ter

cabelos brancos (…) e andar de bengala e tudo” (U3)

“É uma pessoa que já tem muita idade para se mexer porque lhe custa muito a andar (…)

muitos que andam com bengala outros com cadeirinhas de rodas há outros que andam

também com andarilhos e há ai muita gente com esses problemas, eu até já tenho visto

muita gente a cegar por causa disso.” (U2)

Associam principalmente o envelhecimento a características negativas e muitas vezes à

morte, “esta é uma preocupação de todos nós!” (U1), chegando mesmo a expressar um

sentimento de angústia relativamente a esta etapa, “não havia de haver velhice! possa! Eu

detesto a velhice, eu detesto!” (U3) apresentando dificuldade em apontar características

positivas. Revelam algum receio por essa nova fase da vida baseado no desconhecimento

do que pode vir a acontecer, no entanto esperam atingir bastante idade.

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Quadro 36 – Definição de envelhecimento

3.4.3 - Sinais de envelhecimento

Quadro 37 – Sinais de envelhecimento

Respostas U1 U2 U2 U4 Cansaço Problemas de saúde Mudanças físicas

Fonte: Entrevistas realizadas aos utentes da Associação, 2007

As características associadas ao envelhecimento já se vão começando a notar nesta

população de meia-idade. Eles próprios, demonstram que já se sentem um pouco

envelhecidos “porque começamos a sentirmo-nos velhos e tudo!” (U3); “porque a gente

estamos a ficar mais velhos, os anos vão passando por nós, mas nós temos que andar para

frente” (U4); apesar de explicarem que esses sinais ainda não são totalmente

percepcionados por eles, pois não sentem ainda grandes mudanças na sua vida. “Só se

possa ter havido uma pequena diferença, não sei, mas…não sinto essa diferença” (U2);

“Eu sinto-me bem, não tenho nada, estou para durar e tudo” (U3)

Deste modo, são mais visíveis as mudanças físicas do que as mudanças psicológicas,

nomeadamente no aparecimento de cabelos brancos, pequenas rugas e dificuldades em

realizar as tarefas com a mesma rapidez de anteriormente.

A utente 1 refere que se sente cansada da vida agitada e rotineira que leva, revelando que

sente necessidade de ajustar os hábitos e tarefas do dia-a-dia à sua condição actual.

Eu: O que é para vocês o envelhecimento? O que é ser velho? Utente 2: É também ter problemas de saúde, problemas também no corpo, problemas vários. Utente 1: É uma tristeza uma pessoa chegar a velha, é uma tristeza pá! Eu: E porquê? explica lá! Utente 1: Então, porque a gente já não tem as mesmas energias, vai-nos desaparecendo as energias e as capacidades intelectuais e muito mais. A gente não pode esperar ter as mesmas energias quando tiver 80, 90 nem 100 anos! Psicólogo: Vocês associam muito o envelhecimento a coisas negativas, mas será que no envelhecimento também não há coisas positivas! O que é que vocês acham? Utente 3: Há! Utente 4: Há pois! Psicólogo: Que coisas positivas é que acham que há? Utente 4: Há muitas. Psicólogo: Como por exemplo? Utente 4: Isso já não sei. Psicólogo: Estou a ver que não conseguem! Eunice: Não conseguimos porque a gente tem medo! Psicólogo: Medo de quê? Utente 1: De envelhecer! Utente 3: Pois! Fonte: Dinâmica de Grupo, 2007

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Os principais sinais de envelhecimento físicos apontados pelas pessoas portadoras de

deficiência mental entrevistadas foram essencialmente o aparecimento de cabelos brancos,

“porque já estou a ficar com cabelos brancos e já começo a dizer, já estou velho” (U2);

“os meus são brancos e os seus são pintados” (U3; U4), rugas “eu estou com rugas e a …

não” (U4); cansaço e diminuição da capacidade física “então é canseira (…) é esta vida

rotineira, não é não gostar mas quanto mais ando a correr mais me doem os ossos” (U1);

“as pernas a falharem-me e tudo… e e e eu dantes ia sozinha para casa e agora é a minha

mãe que tem que me vir buscar, porque dei uma queda” (U3); “vou daqui do trabalho vou

descansar um pouco” (U4) e problemas de saúde vários, “no aspecto exterior está bem, o

problema é as pernas, as minhas perninhas, é varizes e as cãibras aqui na anca. E tenho

alergias também, ao pólen. (…) dantes não tinha nada disto! Quando a gente vai para

velha é que nos aparece isto tudo! É verdade! (U1); “e os diabetes que é a coisa mais

triste” (U2); “eu dantes não usava óculos, só há pouco tempo é que comecei a usar” (U3);

“a saúde é que interessa (…) tenho lá uma carta bem escrita, por um médico que me quer

operar (…) Tenho outros também, na coluna” (U4).

Em função dos problemas apresentados pelos utentes com idades compreendidas entre os

49-50 anos, podemos concluir que pouco diferem dos problemas manifestados por uma

pessoa dita normal, da mesma idade.

Contudo se nos focarmos na realidade da pessoa com deficiência mental, em que o seu

percurso e as transições por que passou são totalmente díspares de qualquer outra pessoa

que não possui uma deficiência, necessitando toda a sua vida de diferentes apoios, estes

problemas adquirem uma dimensão superior na medida em que, se podem tornar mais

intensos, fazendo com que estas pessoas necessitem de respostas adequadas às suas

necessidades independentemente da sua idade. Assim, partindo deste ponto de vista

podemos dizer que os utentes falam de um envelhecimento precoce.

3.5 – Família

3.5.1 - Envelhecimento dos pais

O envelhecimento dos seus pais, é um assunto muito delicado, pois ao abordarmos esta

questão, surgem muitas outras relativas às preocupações sobre o seu futuro. Os pais são

para estes adultos o seu grande “porto de abrigo”, são eles que cuidam, alimentam, dão

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carinho e responsabilizam-se pelos seus filhos portadores de deficiência mental. São, sem

dúvida as pessoas em quem mais confiam.

Arriscamo-nos a comparar que mantém uma relação de pais em idade activa e filhos

crianças em idade escolar. Pois por muito que esta comparação pareça anti-ética, afinal

estamos a falar de pessoas adultas a entrar numa fase de envelhecimento, a realidade

observada foi essa a ideia que nos transmitiu. A total dependência económica, habitacional

e até de certo modo física dos pais, faz-nos entender esta situação como algo lógico.

Assim, a pessoa portadora de deficiência mental, apesar de no seu discurso revelar que

entende que os seus pais também estão a envelhecer, quando questionados directamente

sobre essa situação, identificam a idade avançada dos pais mas recusam-se a perceber que

os seus pais também se encontram a perder capacidades, isto porque, visualizam que as

cuidadoras, neste caso as mães, ainda mantém as mesmas tarefas em casa e para com eles.

Eu: E as pessoas com quem vives, achas que já estão velhas? Utente 2: “Estão assim um bocadinho, o meu pai já está, ele agora custa-lhe a andar um bocado, já tem a ver com a idade (…) não, acho que ela (a mãe) ainda está nova. Ainda faz o jantar o almoço e essas coisas”. Utente 3: Não! Ainda está nova! A minha mãe tem 70 e ainda é nova! Faz a comida, faz a cama dela, lava a loiça passa a ferro, faz tudo em casa.

Para a utente 3, apesar da abordagem inicial sobre o envelhecimento, considera que uma

pessoa só é velha aos 100 anos, logo a sua mãe ainda não é velha.

O utente 4 associa o envelhecimento apenas à idade e por isso considerando que a mãe e o

pai já têm muita idade considera-os um pouco envelhecidos. Apesar de não saber enunciar

o que é que nota de diferente nos pais nos últimos anos, constata que a mãe tem vários

problemas de saúde e tal como os outros utentes considera que a mãe apesar disso não

perdeu capacidades físicas pois realiza as mesmas tarefas em casa.

Eu: E o que é uma pessoa idosa? Utente 4: Tem muitos anos de vida. Como o meu pai pronto, que vai fazer 79 anos. Eu: Tu achas que o teu pai já está velho? Utente 4: Ele não está assim muito velho. (…) Utente 4: A minha mãe com a idade que ela tem! O que é que se espera! Eu: Quais são as diferenças que tu tens notado neles há uns anos para cá? Utente 4: Muita coisa, mas o que é que se há-de fazer, eu nem sei a metade! Eu: Achas que a tua mãe faz as mesmas tarefas como dantes? Utente 4: Faz! Eu: E achas que ela se cansa mais ou menos? Utente 4: Cansaço, não, nunca vi! Eu: E ela tem alguma doença? Utente 4: Hó tem bem poucas!

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Em excepção, surge novamente a utente 1 que expressou a sua preocupação com o

envelhecimento da sua mãe, associando-lhe os problemas inerentes ao envelhecimento

humano.

Eu: ... andas preocupada, porquê? A tua mãe, achas que já está velha? Utente 1: Evidentemente! Está cansada, é uma pessoa muito doente, tem problemas de asma, tem

joanetes.” (U1)

3.5.2 - Morte dos pais

A morte é um tema difícil de abordar para qualquer pessoa, pois é associada à tristeza e à

dor. Este é por sua vez um destino da vida, nem sempre fácil de assimilar, verificando-se

nas famílias que habitualmente a ideia de preparação do futuro é evitada ou não tem

prioridade face às exigências do dia-a-dia (Dowling & Hollins, 2003 in António, 2003:

187). Geralmente não dizem à pessoa com deficiência mental que alguém morreu, por

vezes uma realidade alternativa é inventada para esconder a verdade da morte. Da mesma

forma, não comparecem, na sua maioria, em funerais, sendo tratados à semelhança das

crianças (Fernandes, 2003: 14). Em consonância com o que estes autores defendem, todos

estes utentes referem já ter vivido uma situação de morte por parte de alguém conhecido.

Contudo apenas dois deles perderam um familiar directo, neste caso o pai. “O meu pai

morreu há quatro anos! Mulher não me fales do meu pai! (…) Vai fazer 5 anos para o ano

que ele vive no cemitério de Benfica!” (U1)

“Quando ele morreu eu estava aqui, eu não soube que ele tinha morrido. Quando o Dr.

me disse que ele tinha morrido eu chorei, chorei, chorei tanto, fartei-me de chorar, era

meu pai e eu fartei-me de chorar. Fiquei com pena de não ir ao funeral dele.” (U3)

Estas utentes, mostraram-se muito impacientes e nervosas ao falarem sobre a morte dos

pais, ambas estavam na Associação no momento e só tiveram conhecimento mais tarde,

não lhes tendo sido dada oportunidade de ir ao funeral. Apesar de demonstrarem tristeza

por não terem participado no funeral, explicam que foi-lhes explicado que a situação podia

não lhes fazer bem devido ao problema que têm e por isso aceitaram que seria melhor para

elas.

Todos os utentes percebem que com o envelhecimento pode vir a morte, e dependendo da

sua situação individual vivenciam essa angustia e temor de forma diferente. No caso destas

duas utentes, actualmente já só têm mãe e o medo de perderem esse “porto de abrigo” já

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existe. “E quando os pais fecharem os olhos? Quando os pais deixarem de existir, pois é

essa é que é a minha preocupação, é por isso é que eu não durmo de noite!” (U1)

“Ela outro dia disse-me; eu quero é morrer, quero é morrer. E eu disse a ela: nem pense,

tu nem penses nisso, ainda há-de viver muitos anos cá!” (U3)

Deste modo, confirmam, já pensar sobre a possibilidade dos pais morrerem antes deles,

contudo têm consciência que são mais novos e não querem morrer ao mesmo tempo que os

pais. “Vou para o céu, mas não vou agora!” (U4)

3.6 - Respostas para o envelhecimento

3.6.1 - Um olhar sobre o amanhã As questões relativas ao envelhecimento apresentaram-se para estes utentes como algo

ambivalente e até um pouco confusas. Como temos observado no decurso desta análise a

noção de envelhecimento para eles próprios é diferente da noção que possuem do

envelhecimento dos pais. Também se sentem a envelhecer, identificam-se com a imagem

de uma pessoa idosa, mas em seguida consideram que uma pessoa velha possui muitos

mais anos que eles. Por este motivo e porque foi frequente a associação do envelhecimento

à morte, optámos por apresentar o nosso trabalho a estes utentes como “um olhar sobre o

amanhã”, para assim conseguirmos perceber quais as suas vontades relativamente ao seu

futuro.

Eu: Já pensaste no teu dia de amanhã? Utente 1: Então é ir como a minha mãe vai e como foi o meu pai! É o único caminho de Deus! Não conheço mais nenhum!

Com o contacto estabelecido com a utente 1 percebemos que as questões relativas ao seu

futuro são uma das suas grandes preocupações. Sempre que se tentou abordar esta temática

a utente ficou muito instável, pois sente que devido aos seus problemas a família não a

deixa tomar o rumo que ela tanto ambiciona. No entanto, partilhou com muita facilidade

que se sente uma mulher adulta e gostava de casar e ter filhos, mesmo tendo consciência

das suas limitações.

“Pois é só que o tempo vai passando (...) E eu quero-me casar! Queria ter um futuro e

aqui não tenho futuro! (…) Eu começo a estar muito cansada desta vida. Sou uma mulher!

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Então! Se uma pessoa já está cansada deseja de ir para um sítio mais calmo, mais

tranquilo, não é! Mas eu gostava de falar sobre o futuro. O que é que o futuro nos

reserva?” (U1)

Apesar de já demonstrarem que sentem mudanças na sua vida e na vida da sua família, os

outros utentes expressaram que ainda não pensaram sobre o futuro. “Sei lá o que é que vai

ser daqui a uns anos. Não sei, eu não sei, hó! Dr.ª não sei o que me pode acontecer não

faço ideia não tenho assim ideia nenhuma” (U2); “Não… e o que é que o hei-de fazer?”

(U4)

Este facto advém dos pais na sua maioria não terem abordado o tema do envelhecimento e

as suas consequências com os filhos, de forma espontânea e aberta de forma a permitirem

que estes participem na construção do seu projecto de vida. No decorrer da dinâmica de

grupo os utentes afirmaram que os pais se preocupam com o seu envelhecimento, mas

apenas um utente confirmou que o pai já tinha conversado com ele sobre o seu futuro,

como podemos observar no quadro seguinte.

Quadro 38 – Excerto da dinâmica de grupo sobre o tema do envelhecimento

Fonte: Dinâmica de Grupo

Psicólogo: Então e acham que os vossos pais se preocupam com o vosso futuro? Utente 4: Exactamente! Utente 3: A minha mãe preocupa-se com o meu futuro. Utente 2: A minha mãe também! Eu: E como é que ela demonstra essa preocupação? Já falou convosco sobre isso, já teve uma conversa convosco a explicar que irá envelhecer e se já tem previsto o que irá acontecer com vocês? Ou nunca falaram sobre este tema do envelhecimento ou já? Utente 3: Ela não nunca falou. Psicólogo: E o pai do Sr….? O Sr. …, já falou? Utente 4: Já. Psicólogo: E o que é que disse? Utente 4: Que qualquer dia ele ia para o Céu. Psicólogo: E a …, a Dona … nunca falou contigo sobre o tema do envelhecimento? Utente 1: (abanou a cabeça indicando que não) Psicólogo: Não nunca disse nada. Eu: E o …? Utente 2: A minha mãe também nunca me falou nisso. Psicólogo: Mas vocês acham que eles se preocupam? Utente 1: Eles preocupam-se porque nos amam. Não há maior amor no mundo que o amor de pai e de mãe.

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3.6.2 - As suas vontades …

Quadro 39 – Resposta para o envelhecimento

Respostas U1 U2 U2 U4 Viver com o namorado fora da Associação Não viver na Associação Viver com um familiar Viver com amigos fora da Associação Viver num Lar

Fonte: Entrevistas realizadas aos utentes da Associação, 2007 Olhar para o dia de amanhã, implica pensarem o que pretendem para o próprio futuro.

Durante toda a vida estes utentes foram apoiados por terceiros, como a família e a

Associação, no percurso da sua vida. Ou seja, devido à problemática da deficiência mental,

nunca possuíram autonomia nem independência na tomada de decisões.

Não obstante, lhes ter sido transmitido pela Associação, que são pessoas com direitos e

deveres, e sempre que necessário responsabilizados pelas suas acções. Porque, apesar de

não lhes ser conferida a capacidade de gestão da sua própria vida, são acima de tudo

pessoas com vontades próprias e mesmo que essas vontades não possam ser concretizáveis

nesta sociedade, não lhes pode ser retirado o direito de ‘Sonhar’.

Acreditamos que a melhor resposta para o envelhecimento da pessoa com deficiência

mental ou para qualquer outra pessoa, deve principalmente contemplar a vontade

individual de cada um. Diminuindo assim, as respostas homogéneas destinadas a grupos

distintos, para se valorizar as respostas com um carácter mais individualizado indo ao

encontro dos desejos e necessidades das pessoas.

Para a pessoa com deficiência mental, não existiram limites na expressão das suas

vontades. Na tentativa de entendermos os sonhos e desejos destas pessoas a quando os seus

pais deixarem de poder cuidar deles, e considerando as características individuais de cada,

passamos a expor qual a melhor resposta para o envelhecimento partindo do ponto de vista

das mesmas.

Utente 1:

A utente 1 revela algum cansaço em passar os seus dias na Associação. Eu queria que

fosse alternado, não vir sempre para o …!. Sempre que falámos no envelhecimento e sobre

o seu futuro, demonstrou uma grande revolta por não poder levar uma vida considerada

‘normal’.

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Como referido anteriormente, a sensação de estar a envelhecer começa a preocupá-la pois

sente-se uma mulher adulta consciente das suas limitações e para o seu futuro deseja casar

com o namorado “então queria casar com o …”, ir viver sozinha com ele, “eu

sinceramente eu acho que era vivermos sozinhos, sem ninguém nos chatear”, ter filhos e

trabalhar na Associação com o namorado até se reformarem, “trabalhamos aqui no …

enquanto pudéssemos. Eu ainda me falta uns aninhos para me reformar é só aos 65”

Explicou-nos que este sonho só é possível de se realizar se tiverem apoio nas suas tarefas

domésticas por parte da Associação.

“Pois evidentemente que preciso de alguém que me oriente, eu e todos! Porque se a gente

não tiver isso, é que é mesmo impossível que a gente faça alguma coisa desta vida! (…)

Então mas eu falava com o chefe e o chefe arranjava alguém para me lá ir apoiar em

casa, está a perceber”.

“A gente não tem a culpa de cá estar neste mundo, meu amor! Nem eu nem ele! Então!”

Na sua perspectiva, tudo seria muito simples se a Associação e ambas as famílias o

permitissem, pois sempre que a confrontámos com alguns obstáculos ela revelou ser

conhecedora dos seus direitos, defendendo assim as suas ideias sobre o assunto.

“Então vou à Assembleia da República e exponho o meu caso! (…) Que remédio têm eles,

então eles têm dinheiro para os almoços e para os jantares e não têm dinheiro para ajudar

os deficientes, porquê? Os deficientes não são mais importantes que os almoços e os

jantares! Os deficientes deviam vir em primeiro lugar, então! Tem que ser assim, não

devemos ser marginalizados eles têm que ajudar, então!”

Partindo do exposto, percebemos que a utente 1 não conseguiu pensar sobre o seu

envelhecimento, pois necessita da oportunidade de experimentar o que é ser uma mulher

adulta e dona de si. Esta situação bloqueia o seu pensamento, não permitindo a projecção

de mais expectativas futuras.

No entanto, quando a questionámos sobre a sua permanência na Associação um dia mais

tarde, a utente não duvidou ao responder que não quer ficar na Associação “eu não quero

cá ficar já disse ao Dr.” Pressupomos assim, que a sua vontade é envelhecer em casa

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própria com o seu namorado, recebendo apoio institucional na realização das suas tarefas

diárias e na resposta às necessidades pessoais que possam surgir com o envelhecimento.

Utente 2:

Ao questionarmos o utente 2 sobre o que queria para o seu futuro, afirmou que queria ter

“um futuro bom e um futuro agradável”. Na ausência dos pais gostaria de viver fora da

Associação, numa casa com outros colegas, com recurso ao apoio que necessita nas tarefas

da vida diária. “Talvez numa casa lá fora. Aqui não gostava, por exemplo. Ter pessoas que

me dessem uma ajuda”.

O utente 2 tem consciência de que não conseguiria viver sozinho, mas não deixa de sonhar

com essa possibilidade. Para fazer face às suas necessidades, considera que necessita de ser

apoiado, “para me dar um certo apoio (…) em várias coisas como arranjar-me como

lavar-me como vestir-me.”

Na tentativa de explorarmos outras alternativas, verificámos que o utente 2 entende que

talvez seja difícil concretizar a sua vontade, pois se calhar isso era um bocado difícil,

contudo quando lhe perguntámos se ele gostaria de vir viver para a Associação, apesar de

anteriormente já ter referido que não gostava, voltou novamente a demonstrar desagrado

por essa resposta. De forma indirecta e através de alguma agitação evidenciou que não

considerava ser a melhor resposta para o seu futuro, como podemos ver no excerto da

entrevista seguinte.

Eu: Imagina que tu tinhas que viver aqui no…, como é que gostavas de viver aqui? Jorge: Ai é que… Eu: Gostavas de viver aqui n…? Jorge: Eu gostava, mas é muito é muita coisa muita gente e depois é uma confusão. Pronto é isso!

Utente 3:

Ao perguntarmos à utente 3, se já tinha pensado sobre o seu futuro quando a sua mãe já

não pudesse cuidar dela, referiu que sim já tinha pensado sobre isso e que gostava de ir

viver com o namorado fora da Associação. “Já! Eu já lhe disse, quando ela não estiver por

perto sabe o que é que eu vou fazer? Sabe onde é que eu vou ficar? Em casa do, do, do…,

pois vou para lá! (…) Aliás adorava ir viver com ele e deixar o ….”

Durante a nossa conversa, constatamos que a utente 3 não tem noção das suas verdadeiras

dificuldades de autonomia, pois considera que não necessita de apoio e que podia trabalhar

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para fazer face às suas necessidades económicas. “Não! Eu, eu não, não preciso! A gente

trabalhava.”

Em seguida referiu que se isso não pudesse vir a acontecer gostava de ir viver com a irmã

para outro país, no entanto rapidamente percebeu que isso iria trazer uma grande mudança

na vida dela e acabou por nos explicar que não pode sair da Associação porque é lá que

tem os seus amigos e se sente bem. “Ia viver para ao pé da minha irmã. Para a Suiça. (…)

Era, era isso que eu queria. Mas não posso deixar o …, porque tenho cá os meus colegas,

tenho cá a minha vida o que é que eu ia fazer para lá?”

A utente 3 tem quatro irmãos e apesar de sentir que seria difícil ir viver com os irmãos

porque ou vivem noutro país ou não existe um entendimento do seu problema, ou

simplesmente não têm disponibilidade total para atender às suas necessidades específicas,

continuou a nomear cada um deles como a melhor resposta para o seu futuro. Ou ia para

Macau para ao pé do meu irmão (…) eu gostava já de ir, sabe para onde para ao pé do

meu irmão ….

Após algum tempo de reflexão sobre o assunto a utente 3 referiu que gosta mais de estar no

Associação do que em casa, “eu gosto, eu gosto do meu quarto aqui no …, adoro mais

viver aqui do que em casa, pois aí tem colegas e actividades que ocupam o seu tempo,

aceitando que esta poderá ser a resposta para o seu futuro.

Eu: E um dia se tivesses que viver aqui, o que é que tu achavas? Margarida: Eu achava bem! Eu achava! Os meu irmão … não tem paciência para mim, nãããão, nem o meu irmão …, mais paciência tem o meu irmão … e a minha irmã …. Ela já disse, disse-me assim: porque é que não vens cá para casa uns dias comigo. (…) Gostava de lá ir passar uns dias, uns dias só! Só uns dias!

Utente 4

O utente 4 gostava de ter uma vida calma e sossegada, com saúde. “Quero muita saúde e

paz e sossego!” Acha que só é possível obter uma vida sossegada na sua casa onde se

identifica com o espaço, onde tem os seus objectos pessoais e os seus pais. “Em casa! Que

é onde eu posso ter tudo. Quem me tira o meu quarto tira-me tudo, com certeza que sim.”

Na inexistência dos seus pais, em primeiro lugar disse que gostava de viver com a vizinha,

pessoa sua amiga em quem deposita confiança para cuidar dele. “Posso ficar com a minha

vizinha que é muito minha amiga.”

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Quando o questionámos sobre a hipótese em viver na Associação, inicialmente respondeu

que era o seu local de trabalho e por isso não queria viver lá. “No … só para trabalhar.

Não venham cá mandar-me areia para os olhos que isto para mim não me serve.”

No entanto, quando ficar velhinho sabe que vai ter que ir para um lar, “ir para um lar (…)

hó, como há muitos, há muitos lares mas custam muito dinheiro.” Por fim, apesar de

demonstrar que vir para a Associação não é a sua escolha preferencial, revelou que se esse

lar fosse na Associação, poderia existir vantagens, pois seria mais barato e poderia obter

ajuda por parte dos profissionais. “Pronto se for aqui no…, ainda assim, em vez de estar a

pagar por exemplo 650 € lá fora, o … ajudava-me.”

Pela descrição dos utentes, constatamos que vir para a Associação quando envelhecerem é

a última hipótese de todos os entrevistados. O sonho de uma vida independente é bem

evidente nas suas palavras, mesmo que para isso tenham que continuar a ter apoio por parte

da Associação. Em seguida percebemos que a família foi em segunda instância

privilegiada como uma solução para o seu futuro. Por fim, apenas dois dos utentes

aceitaram a hipótese de virem viver para a Associação, apenas na impossibilidade de

concretizar as suas vontades iniciais.

A forte vontade de viverem sozinhos e a proximidade com a família foram elementos

bastante presentes durante o trabalho de campo, sendo que, estas conclusões não nos foram

totalmente alheias. Os utentes reconhecem o trabalho que a instituição desenvolve com

eles, manifestam satisfação por estar na Associação, mas para o seu futuro gostavam de

poder encontrar outra resposta que possa de certo modo não trazer grandes mudanças à

dinâmica diária que mantém, isto é, ficarem em casa e virem passar o dia para a

Associação.

Na verdade se olharmos estes resultado de forma aprofundada, verificamos que nenhum

utente quer cortar o elo de ligação com a instituição, logo suscita-nos algumas dúvidas se

as suas respostas reflectem a fase do envelhecimento ou se apenas se referem a uma vida

que eles gostariam de poder ter, mas que devido à sua condição foi-lhes negada.

No entanto, como pessoas que vivem numa sociedade de direitos, temos que respeitar as

suas ideias e vontades.

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3.6.3 – Que actividades…

Quadro 40 - Actividades promotoras de bem-estar no envelhecimento

Respostas U1 U2 U2 U4 Actividades Físicas Actividades Psicológicas Actividades Sociais Actividades da vida diária São todas as actividades que já desenvolvem

Fonte: Entrevistas realizadas aos utentes da Associação, 2007 Consideramos que a manutenção de actividades adequadas às mudanças individuais das

pessoas com deficiência mental podem vir a prevenir o aparecimento precoce dos sinais de

envelhecimento.

Os utentes entrevistados encontram-se satisfeitos com as diversas actividades que

desenvolvem actualmente “não tenho nenhuma que eu não goste eu gosto de todas” (U1).

Consideram que é importante para o seu bem-estar manterem-se activos e por isso acham

que todas as actividades que já desenvolvem são também importantes para a manutenção

da sua saúde.

As actividades que gostam mais de desenvolver são o remo, a ginástica, a piscina, o

artesanato, as actividades da vida diária, aulas de competências pessoais e sociais e

informática. “Gosto mais do remo (…) é a ginástica também. Gosto do que estou a fazer

aqui, levar o lixo, pôr os pratos, faz-me bem para eu me sentir mais independente (…)

também gosto do artesanato” (U2); “para mim, as mais importantes é ir à piscina (…) ir

para o computador” (U3).

Não obstante, quando envelhecerem gostavam de desenvolver actividades diferentes que

lhes tragam alguma actividade mas que tenham em conta as suas dificuldades inerentes do

envelhecimento e lhes proporcionem uma vida mais calma, “eu gostava de fazer outras

actividades (…) mas eu gostava de ter uma vida mais calma” (U1); “é que é sempre a

mesma coisa, são sempre as mesmas tarefas, devíamos fazer outras.” (U2; U3; U4)

Apesar dessa vontade de mudança, os utentes não conseguem nomear com precisão quais

as actividades que promovem bem-estar no seu envelhecimento, fazendo referência apenas

ao global, dizendo que “são quase todas” (U4) importantes. Assim, apenas dois utentes

fazem referência a actividades que de momento não têm mas que já tiveram, tais como

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hipoterapia, cozinhar e passear. “Andar de cavalo que é o que eu gosto, gostava de poder

sair de casa e isso assim” (U2), “hum, hum, ir para a cozinha” (U3).

Deste modo, concluímos que os utentes para o seu envelhecimento consideram importante

manterem actividades físicas, desde que, adaptadas às suas condições no momento, tais

como natação, ginástica e remo, actividades psicológicas como o treino do computador o

treino das suas competências pessoais e actividades de carácter social que mantenham o

contacto com a sua comunidade e lhes proporcionem momentos de lazer.

3.6.4 - O que é que os faz felizes…

Quadro 41 – Razões porque são felizes

Respostas U1 U2 U2 U4 Não sou uma pessoa feliz Sentir-se útil e ocupada Ter saúde Ser alegre Conversar com os colegas e a família

Fonte: Entrevistas realizadas aos utentes da Associação, 2007

Os entrevistados na sua maioria consideram que são pessoas felizes à excepção do utente 4

referindo que devido aos seus problemas de saúde não se sente feliz. “Eu não posso ser

feliz, (…) nunca, porque o que eu tenho é tão grave tão grave” (U4).

Cada um deles sente-se feliz por razões diferentes. A utente 1 diz que desenvolver uma

actividade diária e sentir-se útil é o que a faz ser uma pessoa feliz. “Oh mulher é caminhar

todos os dias para aqui! Faz-me bem, porque me sinto ocupada, gosto de me sentir útil e

ocupada, evidentemente” (U1). O utente 2 sente-se bem a conversar com os colegas e

familiares. “Se calhar é eu conversar com os meus colegas, estar com os meus irmãos os

meus pais o meu sobrinho” (U2) e a utente 3 ressalva que é uma pessoa alegre e que para

ela o mais importante é ter saúde. “A primeira coisa é ter saúde (…) e ser alegre” (U3)

Há pequenas coisas que podem trazer uma grande felicidade. Como podemos observar a

pessoa com deficiência mental confere às coisas mais simples da vida a causa para a sua

felicidade.

Síntese conclusiva

Partindo da análise do discurso dos utentes, concluímos que o desenho das respostas para o

envelhecimento da pessoa com deficiência mental, devem fundamentalmente basear-se nas

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vontades individuais de cada um. Para os entrevistados essa resposta deve promover a sua

independência, incluindo actividades físicas e sociais por forma a prevenir os sinais do

envelhecimento e permitir a manutenção das suas competências sociais e pessoais.

A pessoa com deficiência mental gostaria, através das actividades que já desenvolve e

através de novas actividades que respondam às suas necessidades, envelhecer com

actividade e saúde, mantendo os laços familiares e de amizade.

4 – Análise Global: interligação dos resultados obtidos

Com o intuito de respondermos à nossa pergunta de partida: “Em que medida as respostas

sociais e/ou familiares promovem o bem-estar da pessoa portadora de deficiência mental

em processo de envelhecimento?”, partindo da análise do discurso dos intervenientes

directos deste processo, apresentamos uma reflexão sobre alguns elementos desta

problemática, de forma a respondermos a esta e a outras perguntas iniciais que serviram de

orientação para a nossa pesquisa.

A pessoa portadora de Deficiência Mental

Segundo a Associação Americana de Deficiência Mental (AAMR), por deficiência mental

entende-se “o estado de redução notável do funcionamento intelectual significativamente

inferior à média, associado a limitações pelo menos em dois aspectos do funcionamento

adaptativo: comunicação, cuidados pessoais, competências domésticas, habilidades

sociais, utilização dos recursos comunitários, autonomia, saúde e segurança, aptidões

escolares, lazer e trabalho”. (AAMR, 1992: 1 cit. por Claudino, 1997: 27).

Esta definição revela-se bastante reducionista perante a apresentação da problemática da

deficiência mental descrita pelos profissionais e familiares entrevistados. Os profissionais

acrescentam a esta definição, características pessoais, que normalmente não podem ser

generalizadas, mas que nesta análise constatamos que os profissionais identificam a pessoa

portadora de deficiência mental como alguém que para além das suas limitações possui

várias potencialidades ao nível do seu carácter e personalidade. Assim, definem que a

pessoa portadora de deficiência mental é habitualmente sensível, carinhosa, amiga,

verdadeira, conhecedora dos seus direitos e deveres, responsável, trabalhadora e válida.

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Os familiares apresentaram a problemática da deficiência mental do seu ponto de vista

emocional, ressaltando essencialmente as dificuldades que têm sentido em responder às

necessidades do seu filho. Com o nascimento de um filho portador de deficiência mental a

sua família sofreu constantes reestruturações na busca das melhores respostas para aquele

filho. Afirmam que são pessoas especiais, inocentes, que precisam de carinho e

compreensão. Devido aos problemas vivenciados por estas pessoas, as mesmas explicam

que ter um filho portador de deficiência mental é uma preocupação para toda a vida.

Da análise do discurso da pessoa com deficiência mental, percebemos que estes na sua

maioria reconhecem que têm limitações ao nível intelectual que se reflectem na diminuição

da sua autonomia em determinadas áreas do seu quotidiano, que são diferentes em cada um

dos utentes entrevistados, dependendo da capacidade individual de adaptação ao meio de

cada um.

Envelhecimento da pessoa portadora de Deficiência Mental

Ao debruçarmos a nossa atenção sobre os problemas que o indivíduo portador de

deficiência mental com idade avançada enfrenta actualmente emerge a necessidade de

percebermos como se processa o envelhecimento da pessoa portadora de deficiência

mental.

Na maioria das pessoas com deficiência mental, parece que os 45 anos marcam um

período no desenvolvimento da vida em que se manifesta a diminuição de algumas

reservas físicas e o aparecimento do ajuste psicológico à velhice” (Janicki, 1987: 37). Esta

definição apresenta-se como ambivalente e apenas cronológica não sendo consensual para

todos os autores que estudam esta matéria.

Durante o período de observação pudemos constatar que houve um salto qualitativo e

quantitativo do ponto de vista da longevidade destas pessoas e a sua esperança média de

vida continua a aumentar.

O mesmo autor refere que muitos profissionais, reconhecem esta idade como a época em

que se deve ter em consideração um ajuste das actividades vitais que reflectem condutas,

interesses e capacidades físicas próprias da idade. Os profissionais da Associação em

estudo, também referem que alguns utentes já revelam alguma diminuição de capacidades

principalmente ao nível físico, nomeadamente ao nível da autonomia e da locomoção,

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realizando as tarefas que lhe são propostas mais devagar, notando-se também a redução de

algumas capacidades intelectuais adquiridas, tais como a capacidade de leitura e escrita o

que faz com que necessitem de maior apoio por parte dos profissionais, da instituição e da

família. No entanto, consideram que o envelhecimento das pessoas portadoras de

deficiência mental apresenta um quadro bastante idêntico do ponto de vista físico a

qualquer outra pessoa à excepção das pessoas que apresentam outras patologias devido a

malformações congénitas.

A família partilha da mesma opinião que os profissionais, referindo que os sinais de

envelhecimento dos seus filhos, ainda não são totalmente visíveis, no entanto dizem que

estes apresentam apenas pequenas diferenças a nível físico e a nível intelectual. Porém,

consideram na sua maioria que os filhos estão a envelhecer precocemente.

Os profissionais e a família atribuem algumas potencialidades ao processo de

envelhecimento da pessoa com deficiência mental, na medida em que com o avançar da

idade tornaram-se pessoas mais maduras, com mais sabedoria e um maior auto-controlo.

A pessoa com deficiência mental, sente-se envelhecida e identifica-se com as pessoas mais

velhas. No entanto apenas associaram o envelhecimento às suas mudanças físicas,

revelando que se sentem mais cansados, com problemas de saúde que não tinham

anteriormente e com sinais físicos identificativos do avançar da idade como cabelos

brancos e rugas. Contudo, não demonstraram ter esta percepção acerca do envelhecimento

dos seus progenitores, pois para a maioria dos utentes entrevistados, os seus pais ainda não

estão “velhos”, pois ainda realizam as mesmas tarefas quotidianas

Pelo descrito, estamos perante uma forma de envelhecimento clássico. Como explica

Breitenbach (1999), remete-se “às diminuições e disfuncionamentos progressivos

associados à idade: modificação de aspecto, problemas visuais, fragilidade óssea etc. A

maioria das pessoas que apresentam uma deficiência mental manifestará, os mesmos

sintomas da idade que aqueles que se caracterizam como “idosos válidos”. A sua

esperança de vida aproximar-se-á da população em geral e os seus problemas de saúde

serão semelhantes”. (Breitenbach, 1999: 24-25)

Partindo dos testemunhos dos profissionais, da família e da própria pessoa portadora de

deficiência mental podemos concluir que, esta apresenta o mesmo processo de regressão

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física como qualquer outra pessoa na sua generalidade, à excepção daquelas pessoas que

apresentam outros síndromes associados, contudo os sinais de envelhecimento e a

diminuição de autonomia parecem surgir nesta população mais cedo do que na população

em geral.

Do ponto de vista psicológico, intelectual, mental e social estas pessoas pelas

contingências a elas associadas, não desempenharam e/ou não conseguiram ascender aos

mesmos papéis e estatutos que outras pessoas não portadoras de deficiência mental, daí que

as perdas são menos percebidas por si e pelos outros.

Assim segundo Breitenbach (1999) o processo de envelhecimento da pessoa portadora de

deficiência mental pode ser considerado como um envelhecimento individual, na medida

em que reflecte as condições de vida, das pessoas que apresentam uma deficiência mental,

que dependem da etiologia da deficiência e do modo como é conduzido todo o processo de

desenvolvimento pessoal e social destas pessoas.

Algo que caracteriza esta população é o facto de não terem a noção tão acentuada de que

estão a perder capacidades como a população de um modo geral possui. No entanto

apresentam outros handicaps provenientes da sua dependência durante parte da sua vida,

pois com o avançar da idade essa dependência começa a acentuar-se à medida que vão

perdendo as suas faculdades físicas e mentais.

Ao longo da vida estas pessoas tiveram suporte de terceiras pessoas, como a família e as

instituições, no final da vida existem maiores constrangimentos motivados pela

fragilização progressiva das estruturas familiares.

Os familiares entrevistados, já se apresentam na fase da terceira idade e demonstram

elevada preocupação com a sua própria morte e com o seu próprio envelhecimento,

transmitindo receio por não saberem se o seu estado de saúde irá permitir cuidar dos seus

filhos, por muitos anos, de forma autónoma. Consequentemente, preocupam-se com o

facto de o seu filho também estar a envelhecer e com a planificação das respostas para o

envelhecimento destes, com o objectivo de em vida conseguirem um lugar e alguém que

cuide com carinho e amor o seu filho.

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 178

Colocam-se aqui também questões do ponto vista legal, do ponto de vista da

representatividade, do suporte social destas pessoas após os pilares fundamentais que são

as figuras familiares, existindo outras especificidades em torno desta população

comparativamente com a generalidade da população. A pessoa portadora de deficiência

mental moderada, devido às suas limitações específicas não é considerada apta para gerir

autonomamente a sua vida e os seus bens. A lei prevê que após atingirem a maioridade

sejam sempre representados, por terceiras pessoas, seja numa interdição total seja através

da figura de inabilitação em áreas específicas.

Segundo os profissionais entrevistados, um dos objectivos da Associação é o

aconselhamento, esclarecimento e apoio aos pais no processo de interdição dos seus filhos.

Aconselham que o Tutor, da pessoa portadora de deficiência mental, deve ser sempre um

familiar próximo, e que mesmo nessa impossibilidade não é desejável que uma instituição

assuma esse papel, prevenindo-se assim que os valores institucionais se sobreponham às

necessidades apresentadas por estas pessoas. Por sua vez, a família vê o Tutor como uma

garantia para o futuro do seu filho, partilha da ideia de que deve ser em primeiro lugar um

familiar próximo, mas ao contrário da posição apresentada pelos profissionais, gostaria, na

inexistência de outro familiar, que assuma essa responsabilidade, que seja a instituição a

responsável legal do seu filho.

As pessoas portadoras de deficiência mental entrevistadas revelaram desconhecimento

sobre este processo, sabendo apenas que neste momento são os pais que detêm o poder de

decisão sobre o seu projecto de vida.

Assim, muitas destas pessoas com o processo de envelhecimento irão apresentar como

principais necessidades, o acompanhamento personalizado por parte dos profissionais,

estimulação física, sensorial e intelectual, maiores níveis de cuidados de medicina e de

enfermagem, apoio na preparação para as mudanças do futuro, tais como um novo tutor e

uma nova casa, bem como a continuação da promoção da integração social destas pessoas.

Respostas Sociais para o indivíduo portador de deficiência mental em processo

de envelhecimento Ao longo dos últimos anos o delinear das respostas sociais destinadas à população

portadora de deficiência mental têm sofrido grandes alterações acompanhando os

princípios de igualdade de direitos e de dignidade humana tão vincados na nossa época.

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 179

Partindo da caracterização geral da rede de serviços e equipamentos realizada na Carta

Social (2007) da responsabilidade da Segurança Social, exposta no Capitulo I ponto 3,

constatamos que actualmente as respostas sociais existentes dividem-se por áreas de

intervenção. Assim, surge logo à partida uma separação entre as duas grandes

problemáticas que associamos neste trabalho, existindo respostas específicas para a

problemática do envelhecimento em geral, onde não é contemplada a realidade específica

da população portadora de deficiência e por outro lado as respostas existentes para a

população portadora de deficiência mental também não integram esta área de intervenção.

A esta situação, junta-se o facto de muitos equipamentos de resposta a pessoas idosas,

colocarem limitações de acesso a pessoas portadoras de deficiência e o facto de a maioria

das respostas existentes para a população com deficiência se dirigirem a crianças, jovens

ou adultos, tendo um programa de actividades delineado para a inserção na vida activa.

Esta realidade, leva-nos a pensar que este grupo fica à mercê da ‘boa vontade’ das

Instituições de resposta a pessoas idosas ou vai permanecendo em Instituições que não

estão ainda adaptadas às suas necessidades inerentes ao processo de envelhecimento, pois

apesar desta realidade ainda não ser vivenciada em larga escala, já começam a surgir

necessidades de respostas por parte das famílias destas pessoas.

Reflectindo sobre a questão, se devem estabelecer-se respostas sociais específicas para a

população portadora de deficiência mental em processo de envelhecimento ou se estes se

devem incluir em repostas existentes que atendam os deficientes mentais de todas as idade.

Pais e profissionais defendem que a especificidade da população com deficiência mental,

em muitas situações, não se compadece com uma inserção ou inclusão em repostas

normalizadas e tradicionais para as pessoas idosas em geral.

Na sua opinião as características específicas das pessoas portadoras de deficiência mental

prevalecem sobre as características do envelhecimento, sendo que os pais confiam nos

profissionais e estes por sua vez referem que conhecem muito bem a problemática da

deficiência sendo apenas necessário atenção às mudanças que podem ocorrer nestas

pessoas e uma reestruturação dos serviços existentes.

A associação em estudo, encontra-se por isso a trabalhar no desenvolvimento de programas

e recursos que respondam às necessidades das pessoas com deficiência em processo de

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envelhecimento, procurando encorajar a população, desde a mais tenra idade, a adoptar

hábitos e formas de vida saudáveis que permitam um envelhecimento activo, nas melhores

condições possíveis de saúde física e mental.

Os apoios de que carecem as pessoas portadoras de deficiência mental em processo de envelhecimento

Na perspectiva dos pais, a resposta social que melhor atenderia o seu filho nesta fase mais

avançada da idade, seria aquela que contemplasse a promoção da qualidade de vida destas

pessoas principalmente ao nível do bem-estar físico, psicológico, emocional e social.

Precisariam sempre de um suporte formal, equipado de profissionais qualificados na área

da deficiência mental, e que promovesse a manutenção dos laços familiares dos utentes.

Deste modo, em unanimidade, referem que preferem que seja a Associação a casa do seu

filho, com o objectivo de não sobrecarregar os outros filhos, no entanto consideram muito

importante que se continue a incentivar a ligação à família.

Os pais referem ainda que, os seus filhos estão conscientes e preparados, para mudarem da

residência familiar para a institucional após o falecimento dos mesmos. Um dos pais,

preocupado com o duplo envelhecimento, sugere que o ideal seria uma resposta residencial

que atendesse às necessidades de pais e filhos.

A Associação analisada, também demonstrou estar atenta à problemática do

envelhecimento dos seus utentes e respectivos cuidadores que neste caso são os seus

progenitores e na voz dos profissionais percebemos que há uma grande preocupação

também em satisfazer as necessidades dos pais dos utentes. Neste sentido, os profissionais

debruçaram-se numa reflexão sobre os projectos de reorganização da Associação,

perspectivando que a solução de futuro irá passar por uma resposta residencial. Não se

verificou unanimidade no desenho dessa resposta, sendo que a maioria dos profissionais, e

dos progenitores dos utentes, defendem que a resposta ideal é aquela que promover a

manutenção dos laços familiares.

No entanto nesta pesquisa, foram sugeridas por parte dos entrevistados dois tipos de

resposta para atender a pessoa portadora de deficiência mental e sua família que merecem a

nossa reflexão:

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(A) - Resposta residencial diferenciada da resposta dos pais. Esta proposta surge como resposta às famílias que não têm outro familiar que cuide do seu

filho na sua ausência. Por estas razões é forçada a institucionalização. Contudo, propõe-se

o desenvolvimento de mecanismos que permitam a manutenção dos laços familiares, e

actividades de ocupação, reabilitação e integração, fomentando o apoio intergeracional.

(B) - A pessoa portadora de deficiência mental em processo de envelhecimento,

mantém-se no seio da família (tutor), vem passar o dia à instituição e resposta

tipo Lar para os pais

De todas as propostas apresentadas pelos familiares e profissionais, a proposta B é a única

proposta que permite à pessoa portadora de deficiência mental manter o seu estilo de vida,

facilitando a proximidade com os pais, despreocupando-o da tarefa de cuidarem deles,

fomentado deste modo a integração na comunidade da área de residência e numa resposta

social já existente nessa mesma comunidade.

Coloca-se em evidência o desenvolvimento do trabalho de inter-ajuda e partilha de

experiências através de actividades de ocupação, reabilitação e integração, conjuntas com

outros utentes de diferentes idades. Bem como, uma adequação das actividades propostas

às capacidades e necessidades destes utentes mais velhos.

Por outro lado, nesta resposta devem ser reforçados os apoios médicos e de enfermagem

habitualmente fundamentais na terceira idade.

E o que pensa a pessoa portadora de deficiência mental?

Como podemos observar, a família e os profissionais apresentam uma delineação do

projecto de vida destas pessoas que passa por residirem num futuro próximo na instituição

que frequentam actualmente. Não obstante, a pessoa portadora de deficiência mental referir

por ordem de preferência as seguintes vontades:

1. Viver sozinho, mas apoiado no seu quotidiano por um suporte social formal;

2. Viver com um familiar

3. Viver numa Instituição

Assim, constatamos que viver numa instituição quando envelhecerem é a última hipótese

sugerida pelos quatro entrevistados. Em que dois dos utentes, rejeitam passar o resto dos

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seus dias numa instituição e os outros dois entrevistados apenas consideram a hipótese da

institucionalização na impossibilidade de concretização das suas vontades.

A pessoa portadora de deficiência mental evidenciou que para o seu envelhecimento

gostaria de viver fora da instituição com um companheiro (a) ou com amigos,

reconhecendo na sua generalidade que têm limitações e que por isso necessitam sempre do

apoio social formal. Manifestam satisfação por frequentar a instituição e não gostariam de

romper esse elo de ligação.

Consideram que essa resposta deve promover a sua independência, incluindo actividades

físicas e sociais com o objectivo de prevenir os sinais do envelhecimento e permitir a

manutenção das suas competências sociais e pessoais. Através das actividades que já

desenvolvem e através de novas actividades que respondam às suas necessidades,

gostariam de envelhecer com actividade e saúde, mantendo os laços familiares e de

amizade.

A problemática do envelhecimento da pessoa portadora de deficiência mental têm um

carácter duplo que não pode ser esquecido, assim, a importância de se pensar em respostas

para pais e filhos é eminente, logo concluímos que a proposta apresentada pelos

profissionais em que, a pessoa portadora de deficiência mental em processo de

envelhecimento, mantém-se no seio da família, vem passar o dia à instituição e

implementação de uma resposta tipo Lar para os pais, é a que mais se aproxima da

vontade de todos os intervenientes deste processo.

Partindo da análise do discurso dos utentes, concluímos que o desenho das respostas para o

envelhecimento da pessoa com deficiência mental, deve ser a mais personalizada possível

e basear-se fundamentalmente nas vontades individuais de cada um.

Se pretendemos que estas pessoas tenham um envelhecimento com qualidade de vida é

fundamental criar-se infra-estruturas que promovam o seu bem-estar físico, no entanto não

devemos esquecer do seu bem-estar cognitivo que como refere Janicki (1997) envolve a

percepção pessoal de qualidade de vida e está fortemente ligado ao direito da liberdade de

escolha.

Partindo dos contributos dos pais, dos profissionais e dos próprios utentes propomos que se

repense o Apoio Domiciliário como modelo de intervenção, enquanto estas pessoas

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 183

tiverem condições para poderem viver na sua casa, respondendo de forma individualizada

às dificuldades de cada um. Este apoio domiciliário deve ir além de suprir as suas

necessidades básicas e enfrentar as exigências de afecto, carinho e compreensão que estas,

bem como todas as pessoas merecem obter nesta fase vulnerável do seu percurso de vida.

No Seminário “Novas idades Velhas – Envelhecimento das pessoas com deficiência”

(2007), pudemos conhecer as respostas já existentes noutros países da Europa para o

envelhecimento das pessoas com deficiência. À semelhança do que já acontece na

Inglaterra, Escócia e Suécia, a existência de Fundações Tutelares e “Assistentes

Pessoais”51, propostos por instituições do Estado, partindo do delineamento do projecto de

vida da pessoa com deficiência realizado pela instituição, a família e a pessoa portadora de

deficiência, poderia ser uma solução para responder aos anseios desta população. Os

assistentes pessoais, têm como função acompanhar a pessoa com deficiência na

concretização da sua independência diária e na concretização das suas vontades.

A criação de estruturas residências específicas para esta população, semelhantes aos lares

para idosos, incentivam respostas uniformes, que os distanciam do seu meio ambiente e

facilitam a desresponsabilização da família, contudo em situações de duplo

envelhecimento e de grande dependência poderá vir a ser uma solução de futuro desde que

se tenham os devidos cuidados em tornar essa residência o mais próxima possível de uma

‘casa’. Os seus profissionais não devem esquecer as vontades individuais de cada um dos

seus clientes e a família deve ser incentivada a participar nas actividades dessa residência.

Na nossa perspectiva, as respostas sociais e familiares promotoras de bem-estar no

envelhecimento da pessoa portadora de deficiência mental são estruturas que integram

vários tipos de intervenção ao nível social, de saúde e de ocupação, inseridas na

comunidade que respondem às especificidades dos pais e dos filhos.

Acima de tudo esta resposta deve ajudar, em todos os sentidos, estas pessoas a realizarem o

seu sonho de viverem de forma independente e contribuir para um mundo mais justo.

51 Testemunho da Dra. Kathleen Donnely (Capability Scotland), Dra. Caroline Glendinning (Inglaterra) e Dra. Charlotte Holmberg e Per Holmberg (Suécia) durante a sua intervenção no seminário internacional “Novas idades Velhas – Envelhecimento das pessoas com deficiência”, 12 e 13 de Outubro de 2007, organizado pela Associação do Porto de Paralisia Cerebral (APPC)

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 184

Papel do Assistente Social…

Como observado na análise das entrevistas dos profissionais, de todos os entrevistados, a

Assistente Social é a que se posiciona de forma privilegiada perante o problema subjacente

do envelhecimento das pessoas portadoras de deficiência mental. É a Assistente Social

quem faz a ‘ponte’ entre a instituição e a família, desenvolvendo uma relação de confiança

entre aquilo que é o seu papel na instituição e o apoio ao utente e seus familiares. Conhece

por isso, a realidade subjectiva e objectiva dos utentes, bem como as ofertas institucionais.

Segundo Weisshaupt (1988) os objectivos dos profissionais articulam-se com os objectivos

das organizações onde trabalham, fazendo com que o Assistente Social expresse os

objectivos da prática num duplo quadro de referência: o discurso profissional e o discurso

da organização institucional onde trabalha.

Pela análise do discurso da Assistente Social percebemos que, apesar de ter presente nas

suas acções uma conduta ética profissional, vincada por valores de respeito pelos direitos

da pessoa com deficiência, quando confrontada com a questão da melhor resposta para o

envelhecimento da pessoa portadora de deficiência mental, adoptou uma postura

institucional reveladora dos projectos institucionais, procurando uma solução para o

problema na perspectiva da instituição, ao invés de mediar o ponto de vista das pessoas

portadoras de deficiência, da instituição e propor vínculos políticos para fortalecer a

autonomia dos próprios utentes e da instituição52. Este facto, faz-nos percepcionar que a

Assistente Social orienta a sua prática segundo o paradigma da regulação proposto por

Vicente Paula Faleiros (1991)

Assim, consideramos que a prática profissional deve orientar-se segundo a metodologia da

articulação, com o objectivo de dotar a pessoa portadora de deficiência mental de

empowerment e poder de decisão sobre o seu percurso de vida.

O Assistente Social, neste momento, em que a instituição se encontra à procura de novas

respostas para esta problemática, tem uma grande responsabilidade na articulação das

relações entre todos os intervenientes neste processo, cabendo a este profissional, partindo

do conhecimento que possui da realidade empírica, formular propostas que melhor

52 Este facto também foi percepcionado no discurso dos outros profissionais.

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respondam às situações estudadas, ainda que essas propostas impliquem a alteração das

medidas de políticas públicas e institucionais.

Como explica Josefina Mc-Donough (1999: 103) a presença do serviço social ao nível do

desenvolvimento das políticas e da liderança de programas sociais, quase não existe, o que

subordina o exercício da profissão a propósitos e regulações que não são moldadas nem

consistentes com os objectivos e os valores do Serviço Social. Esta ausência dos assistentes

sociais nas práticas de políticas sociais não só põe em perigo a identidade da profissão mas

também os interesses dos clientes que deveriam respeitar e defender.

Historicamente o Assistente Social tem sido o grande executor de políticas sociais mas

actualmente não se deve limitar apenas a executar as medidas de política social, pode

inclusive, se assim o entender, propor medidas que melhor se ajustem às situações que o

profissional muito bem conhece. E se possível participar na concepção dessas mesmas

políticas.

O papel dos Assistentes Sociais na intervenção política tem como compromisso os

interesses dos carenciados, a sua preocupação é apoiarem políticas que promovam os

direitos sociais dos clientes e oporem-se a políticas que diminuam mais esses direitos. (Mc-

Donough, 1999: 104)

O objectivo do profissional político é ajudar não apenas um caso individual, mas toda uma

classe de indivíduos. A estratégia de análise política pode conduzir o profissional ao

elemento específico da política que precisa de reformulação através do uso de critérios de

suficiência, adequação, autodeterminação e eficiência. Tal análise, torna-se a base para a

advocacia legislativa ou simplesmente para a reforma organizacional no processo de

implementação da política. (Mc-Donough, 1999: 116)

A realidade das pessoas portadoras de deficiência mental está a mudar, com o aumento da

esperança de vida, também as respostas têm que mudar. O Assistente Social necessita de

identificar e compreender estas novas condições para assumirem papéis dinâmicos e

inovadores na promoção da justiça social.

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Conclusão

No final da presente tese permanece em nós a vontade de continuar a aprofundar esta

problemática, encerrando este trabalho com a esperança de ter contribuído para o avançar

de novas respostas na área do envelhecimento da pessoa com deficiência e na expectativa

que esta reflexão venha ajudar a Associação em estudo a reformular as suas respostas, com

um conhecimento mais aprofundado das necessidades reais dos seus utentes.

Não nos foi possível ficarmos indiferentes, às características afectivas das pessoas

portadoras de deficiência mental que contribuíram, para que, o desenvolvimento desta tese

se traduzisse em preciosos momentos de prazer. Sentimos por isso que crescemos a nível

pessoal, profissional e humano, sabendo no entanto, que muito ficou por aprofundar.

Neste sentido, apontamos como principal característica deste estudo o facto de ser um

Estudo de Caso. Assim os resultados obtidos revelam apenas a realidade institucional do

nosso campo empírico, não permitindo a generalização dos resultados.

Sugere-se assim um estudo mais aprofundado sobre esta problemática, privilegiando a

função do profissional de Serviço Social. Ou seja, partindo do conhecimento deste

profissional, recolher-se informações sobre o tema em estudo, em várias instituições, de

resposta a pessoas portadoras de deficiência mental, em Portugal. Desta forma seria

possível, perceber se os resultados da nossa investigação são idênticos à realidade da

problemática no país.

O diagnóstico realizado sobre a problemática do envelhecimento da pessoa portadora de

deficiência mental, leva-nos a concluir que face às especificidades destas pessoas, as

instituições deverão adaptar-se às necessidades emergentes que decorrem do processo de

envelhecimento de cada um dos seus utentes, providenciando serviços médicos,

actividades de prevenção, adequação das actividades existentes e incrementar a formação

adequada do pessoal técnico e auxiliar para as especificidades do envelhecimento destas

pessoas, tendo sempre como base das suas acções os desejos e vontades dos seus utentes.

Pois, podemos perceber, que apesar dos profissionais e familiares demonstrarem que lutam

pela obtenção da melhor resposta para a população em estudo, na verdade, a mesma, foi

construída para um destinatário que é a pessoa portadora de deficiência mental, sem que o

mesmo fosse ouvido e implicado nesse processo.

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Apêndices

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Apêndice 1 Titulo: Diários de Campo

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DIÁRIOS DE CAMPO Desde Setembro de 2005 que mantenho contacto com a Associação e em Especial

com o Director. Nesse momento solicitei autorização para realizar a minha parte empírica na instituição que desde logo foi abem aceite.

Durante o processo de construção e mudança de tema e objectivos, afastei-me um pouco da Instituição mantendo apenas contacto telefónico.

Em Outubro de 2006 voltei a fazer um pedido formal pois o meu tema tinha mudado. Só em finais de Dezembro é que obtive resposta positiva. Com as comemorações do natal combinámos em Janeiro eu iniciar a minha aproximação à instituição e aos utentes.

Assim, desde Janeiro 2007, tenho mantido contacto regular e de forma presencial com o director e com a Assistente Social, na caracterização institucional. Em Fevereiro terminei a caracterização e iniciei uma fase exploratória sobre o tema. Em Março iniciei a minha observação - participação na Associação.

Desde sempre que o meu projecto tem sido muito bem recebido com todo apoio e atenção necessária.

Pretende-se através da observação – participação na Associação, atingir os seguintes objectivos:

- Conhecer a dinâmica institucional - Integrar as actividades desenvolvidas - Estabelecer aproximação com os utentes do Centro de Actividades

Ocupacionais - Definir o objecto de estudo - Estabelecer uma relação de proximidade com o objecto de estudo - Conhecer as actividades desenvolvidas pelo objecto de estudo - Conhecer as ideias que o objecto de estudo tem relativamente à própria família.

De forma a respeitar a confidencialidade e o anonimato de todos os profissionais e utentes os nomes apresentados são irreais.

Associação… 22 de Março de 2007

14h às17h

VISITA GUIADA À INSTITUIÇÃO Hoje foi o meu primeiro dia de observação na Associação. A Assistente Social, apresentou-me as instalações, os utentes, os funcionários e

técnicos que por nós foram passando. À medida que a visita foi decorrendo, foi-me explicando o modo de funcionamento

da Associação. Comecei por conhecer o Centro de Actividades Ocupacionais que é composto por

várias salas. A primeira sala que conheci foi a sala com os deficientes profundos. Dois dos utentes aproximaram-se para me conhecer, os outros apenas me observaram.

Um rapaz precisou de ser acompanhado à casa de banho e a monitora quando saiu da sala, ao mesmo tempo que nós, “trancou a porta”.

C.O.: Esta sala tem um carácter emocional muito elevado, o ambiente é até um pouco tenso. As pessoas permanecem ali, sentadas a andar…naquele preciso momento senti-me impotente perante uma realidade tão difícil de aceitar.

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Continuámos a nossa visita com normalidade. O meu silêncio fez a Assistente Social referir que naquela sala muitos tentam fugir e que em primeiro lugar está a segurança dos utentes, explicou-me também, que devido ao elevado desgaste psicológico dos monitores, 3 em 3 anos, estes são redistribuídos por outras salas, fazendo que todos mudem para não permanecerem muitos anos sempre com os mesmos utentes e com as mesmas problemáticas.

Continuando para a sala seguinte, foi-me apresentado o Psicólogo, que se mostrou disponível para colaborar com o meu trabalho, elogiando o tema proposto e desejou-me boa sorte.

Na segunda sala de CAO que visitei, as pessoas estavam a trabalhar, consoante o seu grau de capacidade, umas estavam a agrupar conjuntos de 6 talheres enquanto outros os colocavam dentro de uma saco, para depois serem enviados para outra empresa competente que se encarregará de esterilizá-los e outros estavam a dobrar guardanapos. Estas tarefas consideradas socialmente úteis são muitas vezes realizadas de forma lenta com recurso a uma régua de contar para as pessoas que ainda não conseguiram aprender.

Noutra sala encontrei pessoas a embalar cabos USB, em que a tarefa consiste em colocar o cabo correctamente dentro da embalagem e fechar a embalagem. Nem todas as pessoas conseguem ter destreza manual para esta actividade.

Na sala seguinte os utentes estavam a montar bucins também para enviar para uma empresa. Uns separavam as peças outros enroscavam-nas. Ainda noutra sala, estavam a retirar as esponjas dos auscultadores e a separá-las.

Em seguida conheci o Centro de Emprego Protegido (CEP), onde com a supervisão de uma monitora, os trabalhadores dividem tarefas e têm uma linha de montagem dos pacotes de talheres que encontramos nos aviões da TAP. Ou seja, os outros utentes no CAO preparam e organizam o material necessário, para aqui poder ser organizados os pacotes. Outras actividades do CEP são a carpintaria, a restauração e o estofamento, este espaço está aberto contudo o seu funcionamento é muito reduzido pois actualmente não é muito solicitado. Ali ao lado existe um pequeno espaço onde alguns funcionários do CEP se encontram a cravar as embalagens com os cabos USB que vêm do CAO.

Na Lavandaria também tive oportunidade de observar as pessoas a trabalhar. Este serviço é bastante procurado pela comunidade, mas novamente nesta actividade existe uma encarregada responsável pelo trabalho das pessoas com deficiência mental.

Sucessivamente conheci as três residências da Associação, em que a Assistente Social me explicou como organiza a permanência alternada dos utentes pelas residências. Todos têm direito a este apoio que tem como objectivo apoiar os pais. Por outro lado permite o treino da autonomia pessoal e das actividades da vida diária, como também uma adaptação ao espaço para o caso de um dia mais tarde necessitarem de ficar a viver na Associação.

Por fim conheci o ginásio onde desenvolvem actividades físicas e outras como o teatro e a sala de convívio onde se realiza um baile à sexta-feira à tarde.

A Associação é uma instituição bastante grande e por isso só às 18h terminámos a visita. Os monitores, técnicos e utentes que conheci, ficaram a saber qual o meu propósito para a minha presença na Associação e foi-lhes pedido que colaborassem no que no que fosse necessário.

C.O.: Pareceu-me que para a maioria dos monitores, aquela população era a sua vida e por isso penso

que irão ser colaborantes. Esta tarde foi preenchida de emoções e talvez os meus pensamentos de admiração pelo esforço

daqueles utentes e o sorriso estampado na minha cara não tenha permitido perceber bem se as salas eram de CAO 1 ou 2 e quais as diferenças.

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Associação… 13 de Abril de 2007

14h:30m às16:30h Sexta-feira ACTIVIDADE MUSICAL Cheguei à Associação às 14:30. Encontrei-me com a Assistente Social que me

acompanhou a um salão onde habitualmente os utentes se juntam à sexta-feira à tarde para a realização de um baile.

Ela voltou a apresentar-me pela 2.ª vez a algumas técnicas que já se encontravam no baile e ausentou-se. Eu ali fiquei um bocado embaraçada, sem saber muito bem como me aproximar e integrar.

O grupo que estava a tocar era composto por dois elementos (1 utente que toca pandeireta e um vocalista a tocar guitarra), fazem parte do grupo “Panteras Negras”53.

Na sala encontravam-se os utentes do CAO 1 e CAO 2 e as suas respectivas técnicas (3). Estavam muito animados, uns dançavam aos pares e outros faziam uma roda dançando de mãos dadas.

Aproximei-me de uma técnica, questionei-a sobre o grupo e em específico sobre a idade de uma utente que me parecia mais velha. Foi a minha oportunidade para iniciar uma conversa e colocar a técnica à vontade para me questionar.

A utente em questão, “Odete”, apesar de aparentar mais idade tem apenas 42 anos. O grupo de utentes tinha entre 18 e 52 anos, sendo na sua maioria de 30/40 e

poucos anos, na generalidade fisicamente pareceram-me mais velhos, pela pele já enrugada e até alguns cabelos brancos.

Mantive-me em observação, sorridente para quem me aborda-se esperando que alguém com a curiosidade e novidade da minha presença se aproxima-se … e assim foi, rapidamente alguns utentes à medida em que iam dando pela minha presença aproximaram-se e cumprimentaram-me, outros optaram por me sorrir.

Uma das utentes, a Erica estava a dançar muito animada com o seu par mas a curiosidade de saber quem eu era foi superior e logo na 1.ª oportunidade dirigiu-se a mim, olhou-me, eu sorri e ela sorriu também, assim aproximou-se. Perguntou o meu nome, quem eu era e o que é que estava ali a fazer. Fui estabelecendo um diálogo com ela, expliquei que era Assistente Social…. E ela olhou-me com um olhar de desconfiança…. E eu perguntei-lhe se ela tinha algum problema com isso… ela respondeu-se prontamente que não até achava bem…. E expliquei-lhe que estava a fazer um estudo ali na Associação e que por isso ia passar lá algum tempo e ela sorriu.

Sentou-se próxima de mim, e elogiou o meu colar, dizendo que ainda mo podiam roubar. Disse-lhe que ela não ficava rica, comentário que ela achou muita graça fazendo com que ela se senti-se mais à vontade comigo.

Queria perguntar-lhe a idade pois a Erica não me pareceu nada jovem, mas não sabia como o fazer. Ela é uma senhora baixa, de estrutura forte, com o cabelo rebelde, usa óculos e é muito extrovertida.

Ela voltou a ir dançar e outro utente com uma deficiência motora associada que estava sentado ao meu lado direito teve oportunidade de conversar comigo, perguntou-me o meu nome e logo começou a fazer-me confidências familiares algo confusas. Pelo

53 É o grupo musical da Associação que tem já no seu curriculum inúmeras actuações em Portugal e 2 em Espanha e a edição de um CD de temas de música Portuguesa

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barulho e a sua dificuldade em expressar-se verbalmente não consegui perceber tudo o que me quis transmitir.

Outros vieram e apresentaram-se e quiseram saber como é que eu me chamava, contudo outros apenas continuavam a dançar e a olhar-me.

O Márcio aproximou-se e apresentou-se, como não tinha comunicação verbal tive muita dificuldade em entender os seus gestos, mas ele ao perceber a minha dificuldade chamou a monitora para a tradução. Apesar das suas grandes limitações físicas ele apresenta uma deficiência mental ligeira. Transmite com um grande sorriso e um olhar esbugalhado uma grande felicidade. Disse que o meu nome era muito bonito e perguntou-me se eu era nova monitora.

A Erica voltou, quis saber de onde é que eu era, e eu disse-lhe que sou de Torres Novas e ela disse-me que era de Leiria, que era perto e sentou-se ao pé de mim a descansar. A música estava animada e ela puxou-me para dançar e aí tivemos oportunidade para conversar mais calmamente.

Ela comentou que eu era muito bonita e perguntou-me quantos anos eu tinha e aí eu questionei quantos ela tinha. Com o desenvolvimento da nossa conversa informal, fiquei a saber que a Erica vai fazer 48 anos daqui a dois meses, que nasceu em Leiria, porque os pais viviam nas Caldas da Rainha e que veio viver para Lisboa quando era pequena porque lá não havia instituições para o problema dela. Actualmente vive com os pais num andar perto do marquês de pombal, mas o seu sonho é ir viver para as Caldas da Rainha. Desde a infância que anda em instituições que dão apoio a pessoas com deficiência mental, referindo que já estava na Associação há muitos anos.

Voltou a perguntar-me o que é que eu estava ali a fazer? Voltei a explicar-lhe que estava a estudar o envelhecimento, fez um ar de surpreendida e eu perguntei-lhe se ela achava mal e ela disse-me NÂO, até acho magnifico, estudarem muitas coisas. E disse-me: “mas os deficientes não envelhecem, porque têm um espírito muito jovem” e rimos.

À nossa volta, o baile decorria com normalidade, as monitoras mostraram-se satisfeitas por eu estar a dançar com a Erica e sorriram com tantas perguntas.

Enquanto dancei, pude observar que as monitoras estabelecem uma relação muito afectiva com os utentes, mas têm que estar com permanente atenção para qualquer acontecimento, pois podem tentar fugir ou criar alguma confusão.

Durante o baile um utente fugiu para o exterior e enquanto a monitora o foi buscar, outros me diziam que ele era “mau”. Noutro momento um utente tentou baixar as calças no meu da pista de dança, foi imediatamente repreendido por uma monitora e os colegas começaram a fazer gestos de que ele era maluco, pronunciando mesmo esse comentário.

C.O.: De facto é uma realidade à margem de tudo o que podemos considerar normalizado e o mais

curioso é que entre eles também fazem distinções de quem é mais coerente no seu comportamento, apesar de todos possuírem uma deficiência que muitas vezes os rotula de “malucos”.54

54 Goffman (1988), ao discutir questões relacionadas ao estigma, aponta que a característica que estigmatiza alguém é o que pode confirmar a “normalidade de outrem”. O estigma não existe, sumariamente, a partir de características como a cor da pele, um defeito físico, etc., mas sim num sistema de relações. O que importa é o fato de não ser o esperado por um grupo social. Para o autor, há alguns atributos, como a deficiência mental, que em quase toda a sociedade ocidental levam ao descrédito.

Argumenta que o estigma não se realiza por dois grupos estanques de indivíduos, os “normais” e os “estigmatizados”, mas sim por um processo social de dois papéis, dos quais cada um pode participar, em algum momento de sua vida ou em alguma situação. Por isso, aquele que é estigmatizado em uma circunstância determinada, exibe todos os preconceitos em relação a outros estigmatizados em outros aspectos. Isso pode ser observado entre os próprios jovens com deficiência mental que, algumas vezes, também discriminam seus pares ou outras pessoas com diferentes características estigmatizantes.

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Porque o espaço não é muito grande, o baile tem início às 14h:30m e dura até às

17h, mas os grupos não vão todos ao mesmo tempo, vão entrando e saindo para não se concentrarem todos na mesma sala. Por volta das 15h:45m estes grupos voltam para as suas salas e começam a arranjar-se para irem para casa e outros grupos iniciam o baile.

Quando foram embora a Erica despediu-se e perguntou quando é que eu voltava. O último grupo foi muito pouco interventivo e a monitora precisou de indicar-lhes

como é que deviam organiza-se para dançar uns com os outros.

C.O.: Pareceu-me que a monitora estava muito saturada do baile e impunha que todos dançassem uns com os outros o que nem sempre era muito bem aceite.

Apresentei-me à monitora explicando qual era o objectivo da minha presença,

demonstrei disponibilidade para ajudar no que fosse preciso, contudo ela não se mostrou muito comunicativa, ignorando a minha presença. Este grupo era composto por pessoas mais jovens que na sua maioria também ignoraram a minha presença.

Apesar de me estar a sentir um pouco desconfortável, entrou outro novo grupo que vinha do teatro, e eles sim vinham cheios de energia, que contagiou os outros. Rapidamente me perguntaram se eu sabia dançar e aí começou de novo a animação do baile. O rapaz estava radiante por ter encontrado um novo par.

Após a dança outra jovem portadora de Síndrome de Down aproximou-se e abraçou-me como se fossemos amigas.

C.O.: Senti-me lisonjeada por o gesto carinhoso da jovem.

Por volta das 16:30 despedi-me e retirei-me do baile. Por fim dirigi-me à sala da Assistente social e partilhei com ela que a tarde tinha

sido muito agradável. Pedi-lhe informação sobre quais os utentes com mais de 45 anos, portadores de deficiência mental ligeira ou moderada, passíveis a fazer parte do meu objecto de estudo, para futuramente a minha observação ser mais dirigida.

Chegámos assim à seguinte lista: - Carlos Braga (CEP) – 57 anos - Carlos Luís Zuqued – 49 anos - Maria – 49 anos - Renato Teixeira – (49 anos – 1958) - Duarte – 46 anos - Erica – 47 anos - Francisco L. – 47(8) anos

Associação… 17 de Abril de 2007

14h às 16h

CENTRO DE ACTIVIDADES OCUPACIONAIS 1 (CAO1) SALA 3 Dirigi-me ao gabinete da Assistente Social para, como tem sido hábito, ela me

indicar qual seria a melhor sala para observar tendo em conta que já decidimos o meu objecto de estudo.

Referiu que hoje a dinâmica institucional estava um pouco alterada, na medida em que algumas monitoras trocaram de sala, porque durante a tarde irá decorrer na Associação

GOFFMAN, E. (1988). Estigma: Notas sobre a Manipulação da Identidade Deteriorada. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan S.A.

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uma sessão de formação dirigida às auxiliares e a alguns monitores, sobre métodos de observação e avaliação leccionada pela Assistente Social. Por isso disse-me que: “as monitoras das salas e os próprios grupos de utentes estão redistribuídos de forma diferente da habitual”.

Acompanhou-me à sala 3 de CAO 1. No caminho questionei o objectivo da formação, respondeu-me que tinha como objectivo transmitir às monitoras e auxiliares diferentes formas de observação dos acontecimentos em sala ou na residência que permita uma melhor avaliação dos utentes e dotá-las de mecanismos adequados para um melhor desempenho profissional.

Quando cheguei, cumprimentei a monitora e o grupo no geral. A Erica e outro utente manifestaram satisfação em ver-me de novo, os restantes colegas observaram-me mostrando indiferença.

O grupo estava composto por 7 utentes, 5 raparigas e dois rapazes com graus de deficiência mental diferentes, maioritariamente jovens à excepção da Erica e da Odete. Erica que tem 47 anos e que será uma participante do nosso estudo pois apresenta todas as características necessárias e a Odete com 42 anos que apesar da idade apresenta uma deficiência mental moderada e um conjunto de outras dificuldades associadas que não permitem a sua participação neste estudo. A Odete irá fazer anos esta semana e quando a interpelei sobre a sua idade ela respondeu-me que iria fazer 4 anos, continuei a brincar com ela sobre esse assunto com alguma ajuda dos colegas para ver se ela se lembrava da sua verdadeira idade mas ela insistiu que ia fazer apenas 4 anos. Foram os colegas que me disseram a idade real da Odete.

O ambiente na sala estava calmo, todos estavam a ler revistas e a fazer recortes do que mais gostavam à excepção da Erica que estava equipada com uma bata branca e um chapéu branco na cabeça, a dobrar guardanapos.

Perguntei à monitora presente que actividades costumam desenvolver naquela sala. Referiu que pertence a outra sala e estava ali apenas a substituir uma colega, mesmo assim, explicou-me que habitualmente os utentes costumam a realizar actividades como enroscar bocins (as tampas vêm soltas e são eles quem as enroscam), contudo há algum tempo para cá as empresas têm enviado cada vez menos trabalho e tem sido difícil arranjar ocupação socialmente útil para os utentes.

Aproximei-me do grupo, eles estavam dispostos em U, e sentei-me na mesa com eles, entre a monitora e a Erica. Naquele lugar, conseguia observar todos os utentes e conversar com a monitora e a Erica, que naquele grupo em especifico é com quem eu pretendo ganhar confiança e criar proximidade.

Segundo a monitora “ela” estava cheia de vontade de trabalhar, ao contrário do que manifestou com a minha presença. Pois quando me sentei próximo dela começou a referir que hoje estava cansada, a monitora perguntou-lhe onde é que estava a motivação anterior. Eu colaborei com a monitora e perguntei-lhe o porquê do desânimo, ela não me soube responder apenas sorriu. Ela estava mais interessada na minha presença e em conversar comigo do que em continuar a trabalhar. Elogiei o trabalho dela, e perguntei-lhe para que é que serviam aqueles guardanapos, ela explicou-me que estava a dobrar guardanapos para colocar nos saquinhos com os talheres que no Centro de Emprego Protegido fazem para os aviões. Incentivei-a a continuar o trabalho e ela mudou a sua postura curva e como que orgulhosa continuou a sua tarefa. Pouco depois, partilhou comigo que aquele trabalho é muito mal pago e que cada vez mais têm menos trabalho.

Esta ideia já me tinha sido transmitida na apresentação da instituição, ideia essa que a Erica conhece claramente. Pois ela recebe apenas um reforço monetário mínimo e sabe que a TAP paga pouco à instituição por aquele serviço, ela apenas mantém uma actividade ocupacional considerada útil.

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Mudando de assunto radicalmente, contou-me que tinha um namorado e que estava a pensar em casar. Perguntei-lhe como se chamava disse-me que era o David, perguntei-lhe onde estava e ela disse-me que estava noutro pavilhão e que lá dentro da instituição não era permitido grandes namoros, mas que estavam a pensar em casar porque ainda ia a tempo.

Ao conversar com a Erica percebi que ela é bastante consciente das regras da Instituição bem como realista com a sua vida pessoal, pois ela gostava de casar mas até à data isso ainda não foi possível, ela também sabe que isso se deve aos problemas que ela tem. Contudo considera-se uma jovem e por isso ainda tem muito tempo.

A sala estava toda enfeitada com placares relativos aos deveres e direitos que o cidadão com deficiência mental tem, existia no fundo da sala dois computadores que alguns utentes usam quando a monitora os acompanha e existiam alguns mapas de actividades diárias bem como o calendário dos aniversários e o mapa da avaliação pessoal. Estes quadros revelam-se muito importantes na organização diária de cada utente, usando as imagens e as fotografias de forma a simplificar o entendimento de cada um.

Em alguns momentos a monitora recorreu ao uso das regras, apontando para a parede onde determinada regra especifica estava fixada, com o objectivo de chamar a atenção do grupo para a mesma.

Durante a minha presença nesta sala, ouvi o Psicólogo a aproximar-se com outro grupo de utentes para a sala ao lado, sala de relaxamento e estimulação (Snoezelen). Questionei a monitora sobre qual a actividade que ele ia desenvolver e se haveria possibilidade de eu participar. Ela prontamente levantou-se e dirigiu-se para a porta onde já estava o psicólogo e um grupo de formandos portadores de deficiência mental grave. Acompanhei-a, voltei a apresentar-me e questionei qual seria a hipótese de observar ou participar na actividade. O meu pedido foi muito bem aceite quer pelo psicólogo quer pelos utentes. Pediu-me para me descalçar e entrar.

A sala de Snoezelen, é um espaço cheio de magia e calma…

C.O.:A palavra Snoezelen provem do holandês e foi criada nos anos 60 por Hulseggee e Verheul, para designar certas actividades desenvolvidas no trabalho com indivíduos sofrendo de deficiência mental profunda. Com o Snoezelen pretende-se “tocar” os indivíduos através da estimulação dos cinco sentidos e das emoções que desperta. Requer a criação de um ambiente agradável e isolado das atracções exteriores, bem como de uma relação empática e securizante entre o utente e o técnico que o acompanha. A duração e qualidade do estímulo varia de indivíduo para indivíduo e tem de ser permanentemente monitorizada. Neste ambiente é possível verificar que o indivíduo com demência se acalma, demonstrando menos receios em relação ao que o rodeia. Tal como em todas as actividades desenvolvidas com pessoas com demência, a história de cada um, os seus interesses, o seu percurso, são extremamente importantes, não só para a relação terapêutica que se estabelece, mas também para a selecção dos estímulos adequados ao longo de cada sessão. Deste modo podemos definir Snoezelen como uma metodologia de trabalho que se destina a providenciar um ambiente multisensorialmente estimulante, onde os utentes podem relaxar, interagir uns com os outros, passar algum tempo isolados, experimentar sensações e objectos, no seu ritmo, consoante a sua vontade e curiosidade.

A sala de Snoezelen da Associação é composta por duas camas de água, colchões em pele que preenchem toda a sala, uma coluna de água, uma cortina de fitas brilhantes e uma bola de espelhos no tecto. Predomina a cor branca, pouca claridade reflectindo-se as bolas brancas por toda a sala e a música pode variar consoante o objectivo do exercício.

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Sala de Snoezelen

O Psicólogo pediu para se sentarem à volta da mesa, e eu pensei mas não existe

nenhuma mesa, rapidamente percebi que todos sabiam o que era. No meio dos colchões está desenhado um círculo que faz de mesa. Como se eu fosse parte do grupo segui as mesmas instruções. A primeira actividade consistiu em mandar a bola ao melhor amigo e explicar para o grupo o porquê da escolha. Um utente começou a perguntar se eu também jogava e foi tão insistente que não deu oportunidade para dizer que não. Eu disse ao grupo que ninguém sabia quem eu era à excepção do Márcio que já me tinha conhecido no Baile de sexta-feira e por isso não me podiam escolher. Assim o Psicólogo disse que sim que nós (eu e ele) também participávamos, isto porque o grupo era composto por 8 pessoas e só comigo o número de participantes ia ficar impar. Introduziu também outra componente ao jogo para que este também permiti-se conhecermo-nos, então pediu-lhes que à medida que iam jogando aproveitassem para se apresentarem. E assim foi, começaram a mandar a bola uns para os outros e a explicar porque é que são amigos e cada um disse o seu nome.

Este grupo apresenta muitas dificuldades comunicativas e um grau de deficiência grave, tendo sido necessária a ajuda do psicólogo para entender o que eles me queriam dizer.

Quando me passaram a bola, apresentei-me e expliquei o que estava ali a fazer. Alguém apressou-se a perguntar-me a idade, o que levou o Psicólogo a pedir a todos que também me dissessem a idade para percebermos se podiam participar no meu estudo. A pessoa mais velha era a Dora que tem 54 anos contudo ela apresenta uma deficiência mental profunda não sendo por isso possível aplicar-lhe uma entrevista. Ela fisicamente já apresenta algumas rugas e o seu cabelo já está todo branco. Os outros eram todos mais jovens tinham idades entre os 25-40 anos.

Apesar da Dora ser mais velha que os seus colegas de grupo, podendo mesmo já ser considerada por alguns autores que já é idosa. As actividades desenvolvidas foram iguais para todos, e não foram desajustadas à necessidade da Dora, isto porque o objectivo desta actividade é promover uma relação de proximidade entre todos, controlo visual e controlo dos movimentos bem como promover o desenvolvimento da oralidade. Necessidades que apesar da idade a Dora continua a ter.

Após conhecer a idade de todos, percebi que nenhum deles poderia fazer parte do meu objecto de estudo, contudo a experiência estava a ser tão enriquecedora, tão forte emocionalmente que já não importava as idades, embrenhei-me no grupo e esperei para ver o que é que eu podia aprender mais com eles.

Em seguida foi a minha vez de lançar a bola, lancei ao Márcio, porque ele é mesmo especial, não fala e tem muitas limitações nos membros inferiores e superiores, mas em compensação tem um sorriso esbugalhado e um olhar forte que consegue transmitir muita felicidade em pequenas coisas.

C.O.: Quando o conheci no baile, tive um certo receio dele, porque abraçou-me e eu não sabia nada

sobre ele, agora depois de o conhecer já me sinto mais segura.

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Ao entrarmos para a sala ele reconheceu-me imediatamente e cumprimentou-me com um beijinho e por isso achei que ele era o único ali no grupo que naquele momento eu podia seleccionar para ser meu amigo e disse: “porque desde que me conheceu sempre foi muito simpático” e ele demonstrou uma felicidade interior na sua expressão corporal, facial e no seu olhar. Ele precisou que o Psicólogo traduzi-se a sua resposta. “Obrigado, tu também és muito simpática”.

Na actividade seguinte o psicólogo solicitou a minha ajuda no apoio ao exercício. Este consistiu em inspirar e expirar com o objectivo de treinar o controlo da respiração. Assim, deitaram-se de barriga para cima espalhados pela sala e foi-lhes pedido que em silêncio e de olhos fechados, inspirassem pelo nariz até sentirem o peito cheio de ar e em seguida expirassem pela boca até sentirem a barriga a esvaziar. Eu acompanhei o exercício de alguns utentes de forma a verificar se estavam a realizá-lo de forma correcta. Quando eu e o Psicólogo terminámos de verificar se todos estavam a fazer correctamente, passámos para a actividade seguinte que consistiu em bater as palmas à velocidade comandada pelo Psicólogo e parar quando for dada a ordem. Esta actividade tem como objectivo o controlo dos movimentos e o treino da audição e visão. Desta forma, voltaram a sentar-se à volta da mesa e o Psicólogo comandou o exercício, ele começava por bater palmas devagar ia intensificando a velocidade e de repente parava. A ideia era que os utentes o acompanhassem. Das primeiras vezes não correu muito bem, havia sempre alguém que continuava a bater as palmas, mas após algumas tentativas notou-se uma melhoria significativa.

Subsequentemente passou-se à actividade da dança. Foi-lhes pedido que fizessem pares e em alguns minutos treinarem uma pequena dança, com o objectivo de controlo dos movimentos corporais e principalmente o incentivo ao trabalho em equipa. Curiosamente as raparigas queriam fazer par com outra rapariga, ao que o Psicólogo disse que não podia ser porque havia quatro rapazes e quatro raparigas e por isso deviam aproveitar para fazer pares mistos. Perguntaram se nós também participávamos e nós referimos que fazíamos parte do júri para o desempate. Foi-lhes pedido para tomarem atenção à dança dos colegas porque depois iam votar no que mais gostaram.

Ao som da música cada grupo foi apresentando a sua dança. Todos estiveram muito bem, conseguiram trabalhar em grupo e coordenar movimentos, apenas um par dançou com uma velocidade muito superior ao ritmo musical.

Na fase das votações, cada par tinha que chegar a um acordo e votar noutro par. O Psicólogo percebeu que eu tive preferência por um par e era o que no final estava a ser menos votado e então disse ao grupo que eu e ele ainda não tínhamos votado e perguntou-me qual é que eu escolheria, eu disse-lhe que era o par do Márcio e “” e ele disse que concordava e por isso o nosso voto ia para eles. A minha escolha incidiu no facto de ambos serem quem tinham maior dificuldades físicas e terem sido os mais comunicativos, demonstrando movimentos lentos ao ritmo da música, usando o toque da face e dos braços como controlo de movimentos e transmissão de carinho.

Simplesmente adorei, chegando mesmo os meus olhos a brilhar. Por fim, exploraram os recursos da sala, dividiu-se o grupo em dois e eu fui com

um grupo para os colchões de água com o objectivo de relaxamento corporal enquanto o Psicólogo foi para a colona de água com os restantes. Esta coluna tem a água sempre em movimento e as bolhas sobem pela coluna. A água tem um efeito relaxante e ao colarem o ouvido à coluna podem sentir o som relaxante do mar.

Em seguida os grupos trocam, no meu grupo a Dora quis ficar mais tempo do que os outros a escutar a coluna de água. Por fim todos passam pela cortina de fitas, sentam-se lá dentro e pelo fascínio do brilhante das fitas, dá a ideia que estão isolados.

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Para finalizar as actividades na sala de Snoezelen porque já eram 16h, hora de se despacharem para ir embora para casa, todos se deitaram no chão em silêncio e de olhos fechados a escutar a música durante 5 minutos, para relaxarem de todas as emoções anteriores.

C.O.: Através da prática da actividade lúdica, é possível exercitar as aptidões que são necessárias na vida futura, proporcionando um espaço para o auto-controle e desenvolvimento relacional.55

À saída a maioria despediu-se de mim, perguntou se eu estava lá no dia seguinte.

Como tinham deixado os sapatos à entrada eu e o Psicólogo demos uma ajuda a quem não conseguia calçar-se e vestir a bata sozinho.

O Psicólogo agradeceu a minha ajuda e fomos conversando até à sala ao lado onde eu tinha deixado as minhas coisas. Ainda lá estavam alguns utentes a recortar bocados de revistas e a Erica muito preocupada porque era hora da avaliação e a monitora nunca mais vinha e ela tinha que sair para ir a uma consulta.

Perguntei-lhe se estava doente e quem é que ia com ela, e ela disse-me que ia só fazer umas análises e que logicamente ia sozinha, “evidentemente que vou sozinha! Então uma mulher que está a pensar em casar não precisava de ninguém para ir com ela” explanou a Erica. Eu sem saber o que lhe dizer relativamente à minha pergunta desapropriada à realidade dela, disse-lhe “claro Erica que pergunta a minha!” Ela estava muito ansiosa apesar de ainda faltarem 3 horas.

O Psicólogo conversou um pouco com aquele grupo, perguntou-lhes com correu o dia e foi organizando a sala para a avaliação. Neste sentido sentou todos os utentes à volta da secretária da monitora, enquanto esperavam por esta fomos todos conversando. Naquele momento consegui aproximar-me de alguns utentes que estavam mais distantes, apesar da Erica tentar captar a minha atenção ao máximo.

Explicou-me que eles fazem uma avaliação diária do seu comportamento e desenvolvimento nas tarefas diárias e que todos têm um plano para cumprir tendo-se estabelecido objectivos individuais. Existe um placar na sala onde se coloca a avaliação de cada um. Quando acontece algum incidente podem ter que ir conversar com o psicólogo a fim de melhorarem o seu comportamento.

Existe também uma caderneta que serve como meio de comunicação entre a família e o Elo, onde sempre que se considere relevante, o monitor ou o familiar deixa uma mensagem.

Como a monitora não teve oportunidade de aparecer e estava na hora de irem apanhar a carrinha para irem para casa, o Psicólogo deu as cadernetas a cada um e disse que hoje excepcionalmente não tinha havido avaliação mas que amanhã a fariam com a monitora.

C.O.: Pareceu-me que este método serve como reforço positivo ou negativo e que os utentes daquela

sala o consideravam muito importante.

Despedimo-nos e o Psicólogo apresentou a sua disponibilidade para colaborar no que for necessário.

Dirigi-me ao gabinete da Assistente Social, e combinámos a minha vinda novamente na próxima sexta-feira.

55 VIEIRA e CALHEIROS (1999). (Des)dramatizar na Doença Mental – Psicodrama e Psicopatologia: como lidar em drama com indivíduos com deficiência mental. Cap.11.

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Associação… 20 de Abril de 2007

14h:30m às 16h:30m Sexta-feira ACTIVIDADE MUSICAL (Sala de Convívio) Quando cheguei à Associação dirigi-me à sala da Assistente Social, para a

cumprimentar e dizer que ia novamente participar no baile. Solicitei a sua ajuda para reconhecer os utentes com mais de 45 anos que nós já tínhamos identificado. Ela acompanhou-me à sala de convívio e apresentou-me o Francisco L., que estava sentado à entrada da porta. Não se mostrou muito receptivo tendo apenas acenado com a cabeça cumprimentou-me e afastou-se.

Em seguida apresentou-me a Maria e o Renato que estavam a dançar juntos. E retirou-se dizendo que naquele momento não estava lá mais ninguém e solicitou às monitoras que me dessem um apoio no que fosse necessário.

Fiquei ao pé da Maria e devido ao barulho ela voltou a apresentar-se e apresentou-me o Renato como o namorado dela. Ele reafirmou somos namorados, continuaram a dançar e foram falando comigo. Perguntaram-me se eu era nova monitora e eu disse que não e expliquei que estava lá a estudar o envelhecimento e que ia passar lá algum tempo com eles e ia precisar de conversar um pouco. Perguntei-lhes o que achavam e eles disseram-me que está bem que se for preciso conversar, por eles estava tudo bem. Formam um par encantador, ambos com idades próximas dos 50 anos.

Entretanto chegou a Erica, cumprimentou-me e convidou-me para dançar, aceitei, mas perguntei-lhe porque é que ela não dançava com o namorado e ela disse-me que era um rapaz que estava no fundo da sala mas que ele não lhe apetecia dançar.

Surgiu um incidente durante o baile e daí a presença do Psicólogo. Uma rapariga começou aos pontapés a outro par que estava a dançar. Foi chamada à atenção para não o fazer mais mas ela repetiu o comportamento e por isso foi de castigo sentar-se num banco à entrada da sala. O Psicólogo esteve a conversar com ela. Voltou para a sala e continuou a dançar com outros utentes.

A Maria e o Renato sentaram-se e eu sentei-me junto deles, disseram-me que a rapariga era má e estavam muito indignados com a atitude dela. Voltaram a ir dançar e eu já não consegui estabelecer diálogo com eles. Demonstraram satisfação com a minha presença sorrindo para mim sempre que os olhares se cruzavam.

Tive várias solicitações para dançar, de vários utentes que insistentemente me faziam dispersar a minha atenção no meu objecto de estudo.

Quando consegui uma pausa, dirigi-me à entrada e sentei-me ao lado do Francisco. Ele ignorou a minha presença, perguntei-lhe se ele não gostava do baile, ele respondeu-me que estava farto e continuou a ler o jornal. Perguntei-lhe se ele já ia ao baile há muito tempo e ele disse-me que sim à muito tempo, mas nunca desviou o olhar do jornal. Abordou-me mudando o assunto para a temática do jornal, contudo a sua dificuldade com a oralidade e a música alta não permitiram um diálogo muito fluente. Contudo rapidamente ele se levantou e começou a andar às voltas como que se mostrando incomodado com a minha presença. Disse-lhe até já e voltei para o baile. Aí ingressei numa roda com alguns utentes da actividade de Snoezelen da passada terça feira, pois estes estavam próximos da Erica e senti que com a minha atenção dividida ela estava um pouco sentida. O grupo ficou contente com a minha presença, fui movimentando a roda e como a Erica estava sentada ali perto perguntei-lhe: “Erica não dança?” E ela com uma expressão triste disse-me que agora não lhe apetecia. Continuei na brincadeira com ela e com o grupo.

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Afastei-me e voltei para a entrada da porta para conversar um pouco com uma monitora. Perguntei-lhe se aquele baile já existia há muito tempo, e ela respondeu-me “eu já participo há 15 anos, todas as sextas-feiras”. E eu apontei para o facto de serem quase sempre os mesmos utentes. Ela referiu: “eles são muito especiais, é um mundo à parte e para trabalhar com esta população é também preciso ser-se um pouco maluco”.

Posteriormente foram embora para as suas salas. A Maria e o Renato, vieram prontamente despedir-se de mim e perguntaram quando é que eu ia à sala deles e eu respondi-lhes que um dia destes aparecia por lá.

A Erica ia-se embora sem me dizer nada mas eu chamei-a e disse-lhe adeus, ela esboçou um pequeno sorriso e deu-me um abraço.

Permaneci por ali, até o Francisco voltar dentro do salão para comentar comigo uma notícia que estava no jornal. Senti progressos na nossa aproximação contudo percebi que ele tem um perfil muito especial e independente, tem muitas dificuldades na oralidade o que compromete a participação dele no estudo.

Quando ele foi embora, já não permaneci no baile por muito mais tempo, pois o grupo seguinte novamente ignorou a minha presença ali, a monitora voltou a ter que organizar os pares para dançarem e quase todos ainda são muito jovens.

Por fim, fui despedir-me da Assistente Social, referi que tinha tido alguma dificuldade em interagir com o Francisco, ela disse-me que ele era um pouco complicado e que já estava à espera disso. Combinámos que eu viria novamente na terça-feira seguinte e que iria para a sala da Maria e do Renato.

Com o objectivo de me aproximar do Carlos, que por ser trabalhador do CEP e trabalhar no exterior, combinámos observá-lo na semana que ele vai ficar na residência.

Associação… 24 de Abril de 2007

14h:30m Dirigi-me à Associação como combinado, contudo quando cheguei as actividades

tinham sido suspensas devido ao falecimento de um familiar próximo do Director.

Associação… 3 de Maio de 2007

14h:30m às 16h:45m

CENTRO DE ACTIVIDADES OCUPACIONAIS 1 (CAO1) SALA 1 E 2 Hoje cheguei à Associação às 14h:30m, dirigi-me para a recepção e pedi para ser

anunciada à Assistente Social. O telefonista esboçou um sorriso e já não perguntou como é que eu me chamava. E disse: “Dona Vera pode subir”.

Ele é funcionário da Associação, é um rapaz que aparenta ter vinte e poucos anos e é portador de deficiência mental ligeira. Já me conhece devido aos meus telefonemas e porque sempre que eu chego tenho que passar ali pela recepção.

Inicialmente eu e a Assistente Social elaborámos o ponto de situação da minha presença ali na Associação, referi que estava a correr tudo bem e disse-lhe que tinha visto na página deles na Internet que neste mês de Abril iriam realizar uma actividade. Ela respondeu-me que sim, que no dia 10 de Maio iriam decorrer os Jogos da Primavera, que era uma festa com muitas instituições e que por isso estava tudo num alvoroço. E

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convidou-me a participar, referiu que era um dia diferente em que eu ia ter possibilidade de observar vários contextos.

As pessoas estavam todas atarefadas com o planeamento da festa e isso sentia-se por todo o lado, o parque de estacionamento estava cheio, a entrada também tinha várias pessoas à espera e via-se as pessoas a andarem de um lado para ou outro.

Disse-lhe que não queria incomodar e sugeri que hoje gostava de colaborar com as actividades da sala onde se encontra a Maria, ela disse-me que não era possível porque a Maria estava a faltar esta semana. Sugeriu que eu fosse para a sala 1 do CAO 1 com o objectivo de conhecer o Duarte e o Renato.

Acompanhou-me à sala e disse à monitora que eu iria passar a tarde com eles. A sala é idêntica à sala 3, composta por mesas dispostas em U, as paredes estão

cobertas com cartazes com as normas de cidadania, na parede do fundo existe um placar com o mapa da avaliação, um cartaz com a fotografia dos utentes da sala e a data do seu aniversário, um mapa de actividades diário, novamente com recurso à fotografia e à colagem de símbolos referentes a cada actividade. Ao fundo da sala existe também uma secretária da monitora e duas mesas de apoio com jogos e material didáctico. Ainda na parede do lado direito podemos encontrar dois posters da equipa portuguesa de futebol. Existe uma janela que acompanha toda a parede do lado esquerdo e que dá visibilidade para um pequeno jardim e espaço de actividades exteriores. Pode também ver-se dali as três residências que ficam situadas do outro lado da estrada.

Por toda a sala haviam grandes caixas de cartão cheias de caixas de plástico para embalar cabos USB e sacos de plástico pretos cheios de tampas de plástico cor de laranja.

Na sala os utentes estavam dispostos em U nos seus lugares a trabalhar. Estavam presentes 6 utentes. Todos tinham à frente dois cestos, um com peças de plástico cor de laranja abertas e outro onde colocavam as mesmas peças já fechadas. Essas peças são tampas de garrafas de lixívia ou de outros detergentes que chegam a Associação abertas e o objectivo é serem devolvidas ao fabricante prontas para serem colocadas na garrafa. Para o desenvolvimento desta tarefa todos os utentes usam um bloco de madeira como apoio, martelam com o bloco na tampa para que esta fique selada.

Hoje já não foram necessárias apresentações. Naquele momento alguns utentes destabilizaram com a nossa presença, requerendo

a minha atenção e a da Assistente Social. O utente mais novo da sala, disse à Assistente Social que queria ficar uma semana inteira no Lar. Ele teve que recorrer aos gestos e à escrita para manifestar o seu interesse, porque para além da deficiência mental também é portador de deficiência auditiva. Ela respondeu-lhe com uma pergunta: Há! Agora já queres! Já gostas de ficar no lar. E da comida gostas? Ele disse que sim e com muita dificuldade explicou que comeu bacalhau no forno e que gostou muito. Disse também que agora gosta de tudo.

A Assistente Social e a monitora (Lina) explicaram-me que aquele utente quando veio para a Associação, só comia carne com batatas fritas e foi uma grande luta para ele mudar esses hábitos bem como convencê-lo a ficar no lar. Agora gostou de tal maneira da estadia cá na Associação que está sempre a pedir para ficar mais vezes.

Em seguida a Assistente Social apresentou-me o Renato, disse-lhe: Renato esta senhora é a Dr.ª Vera. Ele olhou para mim como se já me tivesse visto em algum sítio.

Eu dirigi-me a ele e disse: Olá Renato não se recorda de mim? Ele respondeu: Parece-me que sim. E eu disse-lhe pois conhecemo-nos no outro dia, até estava com a Maria. Ele disse: Há parece-me que já estou a ver!

Naquele momento, penso que o Renato não estava bem a ver quem eu era mas entretanto a Assistente Social referiu: “Parece-me que aqui o João também já tem mais de 40 anos”. Perguntou-lhe a idade, ele disse que tinha ali o bilhete de identidade. Tirou do

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bolso uma miniatura do bilhete e deu à Assistente Social, que verificou que ele nasceu em 1960 e por isso tem… e pensou em voz alta, fazendo com que o Renato se adianta-se e disse-se: tem 47 anos o João. E eu disse: “isso é que foi uma rapidez, já vi que o Renato é bom a matemática. Olhou para mim com um olhar simpático.

A Assistente Social expressou que pensava que o João fosse mais novo, mas que sendo assim ele tem as características indicadas para ser integrado no estudo. Perguntou à monitora pelo Duarte. Ela explicou que ele está na sala 2 ao lado daquela sala.

Perguntou-me se eu queria ir lá conhecê-lo, eu respondi que sim. Os utentes na sua generalidade observavam-me e dois ou três tentavam chamar a

minha atenção. O Márcio (daquela sala) levantou-se e tentou ganhar a minha atenção conversando comigo sobre a sua preocupação do momento, no entanto ele tem muitas dificuldades na linguagem oral e foi muito difícil eu entendê-lo. A monitora mandou que ele se sentasse imediatamente e ele desistiu.

Eu trazia um caderno pequeno na mão, perguntei se podia lá deixar o caderno, pois pretendia voltar, a monitora referiu que sim sem problema. Dirigi-me ao grupo e disse: “Vou deixar aqui as minhas coisas mas ainda não vou embora, vou só aqui conhecer os colegas da sala ao lado, volto já”. E alguns disseram, até já.

Desloquei-me com a Assistente Social à sala ao lado para conhecer o Duarte. SALA 2 (15h:00m às 15:30m) Observei que a sala mantinha a mesma disposição e o mesmo tipo de material

espalhado pelas paredes que a sala anterior. Tinha também pendurado na parede um cartaz sobre alimentação saudável e outro sobre as regras de higiene, estava também disposto alguns diplomas da natação e de participação em actividades de alguns utentes da sala. A disposição era igual, em U com a secretária da monitora ao fundo da sala. Existe uma janela que acompanha toda a parede do lado direito da sala que dá visibilidade para um pequeno jardim da parte traseira da Associação.

Quando entrámos na sala estavam presentes 8 utentes também sentados em U e a trabalharem em grupos de dois, há excepção de uma utente que estava apenas em actividade estritamente ocupacional. Quatro utentes (divididos aos pares) estavam a fechar as tampas de plástico cor de laranja, tinham dois cestos à frente de cada par, um com as peças abertas e outro onde colocavam as peças já fechadas, e 1 par estava a separar umas fichas de identificação em plástico cor-de-rosa que vinham agrupadas em forma de árvore. Tinham à sua frente três cestos, um com as peças em bruto e outros dois onde colocavam já as peças separadas.

Quatro dos utentes cumprimentaram-me quando eu cheguei. A Assistente Social apresentou-me o Duarte que olhou para mim de forma tímida e continuou a trabalhar. A Assistente Social explicou-me que o Duarte tinha uma esquizofrenia associada à deficiência mental e que por isso nem sempre é fácil conversar com ele.

Entretanto a monitora entra na sala. Ela pediu desculpa pela ausência mas teve que ir com uma utente à casa de banho. A utente esboçou um ligeiro sorriso. Ela é paraplégica e tem graves limitações nos membros superiores.

A Assistente Social retirou-se e eu fiquei na sala a conversar com a monitora. Ela referiu que ainda bem que eu tinha conseguido ir noutro dia para além da sexta-feira e que todos os dias de manhã costumam ter um colaborador voluntário lá na sala. Alguns utentes começam a requerer a minha atenção, a Carina começa a chamar-me para eu ver o trabalho dela, chama-me mãe e não desistiu enquanto não me aproximei. Ao chegar ao pé dela mostrou-me o trabalho que estava a fazer, no momento não percebi que a Carina estava apenas a treinar e disse-lhe que ainda faltavam algumas peças que lhe tinham escapado e ela continuou a trabalhar muito contente.

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A monitora confidenciou-me que a Carina tinha vindo de um colégio privado de apoio a pessoas com deficiência, mas que quando chegou à Associação não trazia nenhum trabalho de reabilitação feito e que só agora é que ela tem aprendido pequenas coisas, contudo é uma jovem dos seus 18 anos que só agora está a aprender algumas regras. Ela desenvolve apenas um trabalho estritamente ocupacional, que lhe dá a ideia de igualdade, pois ela tenta realizar a mesma tarefa que os colegas. Pela expressão dos restantes utentes percebi que eles sabiam que ela não tinha que cumprir os mesmos objectivos que eles, mas isso não lhes importava porque cada um ali dentro trabalha ao seu ritmo.

Elogiei o bom trabalho que estavam a desenvolver em voz alta, um utente e o seu par solicitaram a minha atenção, chamando-me: Dr.ª Vera! Hó! Dr.ª Vera! Aproximei-me e eles explicaram-me que as tampas eram para colocar nas garrafas de plástico de lixívia ou detergentes que depois se vendem nos supermercados, e perguntaram: nunca viu? Eu respondi-lhes: “Nunca reparei nas tampas das garrafas, mas a partir deste momento vou tomar mais atenção e de certeza que quando as vir me vou lembrar de vocês.

O barulho instaurou-se os outros colegas também quiseram reforçar a ideia sobre o trabalho que estavam a desempenhar.

C.O.: Hoje senti-me muito bem pois percebi que já me conheciam

Elogiei também o trabalho do Duarte que estava a separar as peças cor-de-rosa. Ele estava a trabalhar em silêncio e muito concentrado, sendo-lhe um pouco indiferente o barulho ou confusão da sala. Perguntei-lhe se gostava de fazer aquele trabalho? Ele mostrou-se afável, e respondeu: “Sim, é um trabalho muito importante!” Explicou-me que aquelas chapas servem para colocar o nome e pôr num porta-chaves.

Todas as peças eram cor-de-rosas, e por isso explanei que era giro se as peças tivessem muitas cores ao mesmo tempo que mexi num dos cestos, que me parecia não estar certo, pois tinha os paus que prendiam as peças e algumas peças. Foi nesse momento que o Duarte me mostrou que aquelas peças eram as que tinham defeito e que o trabalho dele era separar as peças boas das com defeito. Este é de facto um trabalho minucioso pois é necessário ter muita atenção para se perceber os pequenos defeitos das peças. Este trabalho estava a ser desenvolvido pelo Duarte e por uma colega que nunca levantou a cabeça para integrar a nossa conversa. Também estava a ajudar outra utente, contudo ela apenas separava as peças, devido às suas dificuldades motoras.

Fui passeando pela sala e conversando com todos. A monitora, voltou a perguntar-me qual era o meu objectivo. Eu expliquei que

estava a fazer um estudo sobre o envelhecimento lá na Associação. Ela demonstrou interesse através de um olhar entusiástico. Perguntei-lhe quantos anos tem o Duarte, ela respondeu que isso era simples, dirigimo-nos ao placar dos aniversários e verificou que ele nasceu em 1962, e contou-me que ele talvez conseguisse falar comigo neste momento, porque ele passou o último mês internado no Hospital Júlio de Matos na Unidade de Isolados, devido ao facto de possuir esquizofrenia e que de tempos em tempos ele descompensa e fica descontrolado.

O tempo estava a passar, já eram 15:30 e eu ainda tinha prometido ir à sala 1. Perguntei a que horas saíam. A monitora disse-me que a partir das 16h começavam a organizar-se para a avaliação e para irem apanhar as carrinhas.

Foi nesse momento que me despedi de todos para ir à sala 1. Perguntaram se eu voltava no dia seguinte. Eu respondi que talvez não, mas voltava na semana seguinte. Nesse momento entrou o Psicólogo, cumprimentou-me de fugida. Perguntou se estava a correr tudo bem. Vinha trazer informações sobre uma festa que ia acontecer na semana seguinte. Eu referi que já tinha tido conhecimento e que ia tentar estar presente, mostrando

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disponibilidade para ajudar no que fosse preciso. Respondeu-me que toda a ajuda era necessária, pois tinham sido convidadas à volta de 30 instituições num total de aproximadamente 300 pessoas.

Veio também informar a monitora que iam lá umas raparigas à sala. Explicou que elas estão a fazer uma prospecção de mercado sobre o emprego para as pessoas com deficiência e pediu à monitora para responder às perguntas que lhe forem colocadas. A monitora disse ao Psicólogo que não sabia nada sobre os custos do trabalho, sobre quanto é que as empresas pagam por aquele trabalho desenvolvido ali na Associação.

O Psicólogo retirou-se despedindo-se dizendo que estava à espera de me ver nos Jogos da Primavera.

SALA 1 (15h:35m) Dirigi-me para a sala 1. Quando voltei a entrar na sala todos permaneciam nos

mesmos lugares a trabalhar e a monitora estava a fazer uns trabalhos manuais para a festa. Eram umas medalhas para entregar a todos os participantes. Perguntei-lhe se me podia sentar junto dela e se precisava de ajuda. Ela referiu que estava a cortar o papel em forma de medalha que já estava colado numa tábua redonda com os rebordos pintados de branco e que só faltava fazer trezentos. Num dos lados da medalha estava o símbolo da festa, o desenho de crianças de mãos dadas a azul por cima da imagem do mundo e escrito Jogos da Primavera, 10 de Maio de 2007, Jogos Pró-Igualdade (ver imagem), e no outro lado estava a identificação da Associação através do seu símbolo e nome. Naquele momento sentei-me e peguei numa tesoura e comecei a cortar as medalhas.

Capa do Programa da Festa

Aquele lugar era perfeito, pois sentados à minha frente estava o João e o Renato e

por isso podia ir conversando com eles e observando a sala à medida em que ia dando uma ajuda.

O Renato disse-me que o ano passado tinham ganho um prémio. O João observava-me mas manteve-se em silêncio a trabalhar. Alguns dos restantes utentes, tentavam interagir comigo chamando a minha

atenção. Na sala existem duas pessoas portadoras de deficiência auditiva e por isso a monitora e eles utilizam uma linguagem com gestos.

O Renato o João e o Márcio, saíram para ir buscar mais peças a outra sala. O Renato disse-me: Até já! Não vai já embora pois não! Eu respondi-lhe que ainda ficava mais um pouco.

Entretanto entrou na sala o Director da Associação que veio dar a informação sobre as raparigas que iam lá passar para o estudo de prospecção de mercado. Cumprimentou-me, eu transmiti-lhe os meus sentimentos pela morte de sua mãe. Quando estava para se retirar, perguntou-me se estava a correr tudo bem, e disponibilizou-se para apoiar o meu trabalho no que fosse preciso. Explanou também: “Há já sabe da festa quinta-feira, vejo que está a ajudar!” Respondi-lhe que sim, que a Assistente Social me tinha convidado, e que eu iria fazer os possíveis para estar presente. Respondeu: “Teremos todo o gosto em vê-la por cá”. Em seguida apresentei a minha disponibilidade para ajudar no que fosse preciso.

O Director retirou-se da sala e eu continuei a recortar as medalhas e observando tudo o que se ia passando à minha volta.

Entretanto entrou na sala a monitora da sala 2 com a Carina e pediu à monitora da sala se podia deixá-la lá um pouco porque tinha que se ausentar da sala por um instante.

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Assim a monitora da sala 2 saiu e a Carina ficou sentada ao lado da monitora daquela sala a construir um puzzle.

Um utente que estava sentado ao fundo da sala, portador de deficiência mental e motora começou a conversar com o Renato. Pela agressividade percebi que a conversa não era amigável. Esse rapaz ao tentar sair do lugar caiu no chão. A monitora e outro colega que estava ao lado correram para o ajudar. A monitora perguntou-lhe onde é que ele ia? Os colegas disseram que ele queria ir meter-se com o Renato. A monitora disse, “há! Então se ias fazer maldades, foi por isso é que caíste!” O João e o Márcio olharam para mim e disseram: “ele às vezes é mau”. Esse rapaz, disse à monitora que queria ir à casa de banho. A monitora ajudou-o a sentar-se na cadeira de rodas e ele saiu da sala. Neste momento o Renato olha para mim e diz-me: “ele que cá venha que eu sei defender-me ou ele pensa que só ele é que sabe bater! Eu não tenho medo dele!”

A monitora aproximou-se e referiu baixinho: “é preciso ter alguma atenção com este utente porque se permitirmos até a nós nos bate!” E em seguida tentou acalmar os ânimos e disse ao Renato: “vamos continuar a trabalhar!”

Na tentativa de mudança de assunto, perguntei ao Renato se gostava do trabalho que estava a fazer. Ele respondeu-me que sim, mas que têm tido pouco trabalho. Referiu que agora estavam a fechar as tampas para as garrafas que se vendem nos supermercados mas que já tem feito outros trabalhos para a Tap e apontou para os sacos que estavam espalhados pela sala.

Perguntei ao João se ele também gostava do que estava a fazer. Olhou para mim acenou com a cabeça que sim e sorriu.

O Renato solicitou a minha atenção, perguntando: “Mora lá na minha Rua?” Respondi: “Não Renato! Não está recordado de mim? Conhecemo-nos na sexta

feira na música, estava a dançar com a Maria”. “Há!” Respondeu ele, “já me estou a lembrar, está cá para nos conhecer. É que

pareceu-me uma moça que vive lá ao pé de mim, é parecida com ela, e eu estava a fazer confusão. E está cá na Associação a fazer o quê?” Eu expliquei que estava a estudar o envelhecimento lá na Associação. Ele disse-me, “o meu pai já está muito velho, já tem 79 anos e a minha mãe vai fazer 76 em Julho. Mas já têm muitas doenças”. Perguntei-lhe “que doenças é que tem?”. Disse-me: “as doenças da idade, é que ela não perdoa. E eu já tenho 49 anos”. Disse-lhe, então ainda é um homem novo, e ele abanou a cabeça e encolheu os ombros.

Perguntei-lhe se vivia com os pais. Respondeu-me “sim a minha casa é aqui perto, vou e venho a pé todos os dias”, começando a explicar-me onde ficava em concreto. Perguntei: “E os seus pais costumam vir buscá-lo?” O Renato respondeu: “Não! Eu vou sozinho! Mas quer falar com a minha mãe? Ela vem cá para a semana buscar-me à residência”.

O João disse, “eu também vivo para esses lados”. Argumentei, “sim João! E também vive com os seus pais”. Ele respondeu: “Sim e também vou a pé sozinho”.

O Renato disse: “a minha mãe está sempre a dizer que eu sou um bebé grande”. Questionei: “E tu o que pensas disso?” Ele respondeu: “É por causa dos problemas

que eu tenho, sabe como é”. O João interrompeu dizendo que também vivia com os pais. Exclamei: “Sim,

João!” E ele disse: “moro aqui perto!” O Renato disse: “Nunca mais é hora de ir embora para casa”. Perguntei: “Então

porquê Renato, não gosta de estar aqui?” Ele respondeu: “Gosto, mas já cá estou desde as 9h da manhã”.

Por volta das 16h a monitora pediu para começarem a organizar-se para a avaliação. Começaram todos a arrumar as suas coisas.

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Eu tinha deixado o meu caderno na secretária da monitora e ela agarrou no caderno e deu-mo. Um utente mais jovem veio na minha direcção e tentava comunicar comigo por gestos, eu estava a perceber que ele queria saber o que é que eu escrevia naquele caderno. A monitora na tentativa de tradução do que ele estava a tentar falar comigo, brincou com a situação e disse-lhe: “ela esteve a ver se vocês se portaram bem e agora vai escrever no caderno para dar ao chefe”. O utente não acreditou e perguntou-me se era verdade. A monitora riu-se e eu disse-lhe: “não! Fique descansado que eu não vou fazer queixinhas ao chefe”. Naquele momento os colegas de turma estavam a tomar atenção ao nosso diálogo e foi uma risada geral.

A monitora pediu para todos voltarem aos seus lugares porque ela ia começar a fazer a avaliação. Sentou-se na mesma mesa com os utentes e realizou a avaliação de cada um individualmente. As componentes que constituíram a avaliação foram: “rendimento no trabalho”, “assiduidade e pontualidade”, “higiene e arranjo pessoal” e “comportamento relacional”. A monitora questionou em grupo cada utente sobre cada um destes parâmetros. Cada um deles fez a sua auto-avaliação, quando a monitora e os colegas não concordavam com a auto-avaliação, conversavam até chegarem a um entendimento. A situação de falta de concordância ocorreu, contudo rapidamente o utente diminui a sua pontuação aceitando a avaliação proposta.

Terminada a avaliação, a monitora deu a caderneta individual a cada um. Disse a um utente: “Há dois dias que a tua mãe não vê a caderneta, tens que mostrar-lhe porque ela anda muito distraída”.

A monitora explicou-me que a caderneta é o meio de comunicação entre a Associação e os pais. Lá escrevem todas as mensagens que o monitor quer transmitir aos pais bem como as mensagens que os pais querem transmitir ao monitor, e desta forma mantém um contacto permanente.

Os utentes começaram a sair e eu acompanhei-os. O Renato perguntou se eu voltava amanhã. Respondi-lhe que talvez não fosse possível, mas que ia tentar estar presente na festa. Ele disse, “boa vai gostar, o ano passado ganhámos um prémio”.

A seguir dirigi-me ao gabinete da Assistente Social. Conversámos sobre a minha experiência daquela tarde. Comentei que ainda me sentia baralhada com o nome das salas devido à grande dimensão da instituição e que tinha conseguido estabelecer uma boa relação de proximidade com o Renato, mas com o Duarte e o João ainda necessito de mais tempo. Concluímos que o João também pode fazer parte do objecto empírico desta investigação.

Ao falarmos sobre os utentes mais velhos que frequentam a Associação, a Assistente Social revelou que neste momento não têm vagas, e que mesmo assim as pessoas mais jovens têm prioridade de entrada para que “o centro de actividades ocupacionais não se transforme num centro de dia”56.

Combinámos a minha vinda no dia 10 de Maio, para a “Festa da Primavera”. Questionei sobre as instituições que iriam estar presentes, a Assistente Social explicou-me que a festa já se realiza há muitos anos e têm participado várias instituições da comunidade local entre outras que foram convidadas e aceitaram o convite, desde Centros de Dia a Infantários a IPSS ou mesmo escolas secundárias. Referiu: “O objectivo principal é o convívio, é sempre um momento muito agradável e divertido, vai ver que vai gostar!”

Quando ia a sair da Associação, encontrei a Erica à espera para atravessar a estrada, parei e apitei dizendo adeus e dando-lhe passagem, ela ficou contente por me ver, atravessou a estrada sempre a dizer-me adeus e a rir-se de contente.

56 Em todas as salas observadas, verifica-se uma maioria de pessoas adultas com idades compreendidas entre os 30-50 anos. Parece-me que esta é uma forma de prevenir a existência de salas ocupacionais apenas com pessoas mais velhas.

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Associação… 10 de Maio de 2007

10h:00m às 17h:00m JOGOS DA PRIMAVERA Cheguei à Associação por volta das 10h da manhã. Já tinham chegado algumas

instituições que se agrupavam dispersas pelo pátio. Procurei a Assistente Social, que me disse que os utentes da Associação ainda estavam todos dentro das suas salas até que cheguem a maioria das instituições, pois o movimento era muito grande. Verifiquei a existência de Escolas Secundárias, Infantários e várias instituições na área da deficiência mental e motora. A Dr.ª acompanhou-me às salas de CAO1. Dirigi-me à sala 2, quando entrei os formandos fizeram uma grande festa, estavam muito excitados com a festa. Estava presente um rapaz que eu ainda não tinha conhecido. Os utentes cumprimentaram-me, por isso ele apercebeu-se que eles me conheciam, dirigi-me a ele e perguntei: “Deve ser o estagiário que costuma cá estar de manhã?” Ele respondeu que sim. Apresentei-me, conversámos um pouco e ele disse: “eles estão muito irrequietos, não sei o que é que estamos à espera para ir para a rua”. O Duarte veio cumprimentar-me e perguntou: “È a minha psicóloga?” Eu sorri e disse-lhe: “Não Duarte é a Vera, estive cá na sala a semana passada”. Ele disse: “Há já me lembro, vem cá falar connosco, já sei!” E sorriu.

Retirei-me, quando vinha a sair da sala encontrei a monitora que me disse: “Boa conseguiu vir!” Desloquei-me até à sala 1. Quando entrei na sala, cumprimentei todos e a Maria apressou-se a cumprimentar-me com dois beijinhos. E disse: “Olá veio, à nossa festa!”. Respondi: “sim! Estive cá a semana passada mas a Maria fez ronha e não veio!” Ela riu e disse, “estive em casa. Mas já cá estou para a festa”. “Hum! E o Renato ainda não veio?” Ela disse: “Pois estou a estranhar já devia cá estar”.

A monitora ofereceu-me um queque da Dan Cake57, pois estavam todos a comer, recusei e outra utente que não se recordava de mim começou a fazer-me perguntas. Ela tem mais ou menos 40 e tal anos e é portadora de deficiência mental grave, por esse motivo continuava a questionar o meu nome e apesar de eu lhe responder passado um minuto voltava a questionar-me.

A maioria dos utentes estava debruçado na janela a ver chegar os convidados. A Maria disse: “Ai a tua camisola é tão linda! Tu vens tão bonita, vens mesmo

bonita! É nova?” Eu agradeci o elogio e disse: “Tu é que estás bonita, tens uma ti-shirt igual a todos58”. Perguntou-me: “A sua mãe e o seu pai também vieram?” Eu tive que explicar que eles viviam em Torres Novas e estavam a trabalhar. Ela disse-me “pois a minha mãe também não pode vir, porque... e o meu pai que, Deus o tenha, já morreu!”

Vim até ao exterior, pude observar uma multidão de pessoas todas com a ti-shirt igual e a identificação da Instituição a que pertencem nas costas. As instituições juntavam-se por grupos ao longo do recinto. Em frente do CAO1, podia ver-se os preparativos para os jogos e duas carrinhas com o equipamento de som. Muita música e movimento. Ao fundo pude avistar por cima da porta do ginásio um placar que dizia “Igualdade de Oportunidades”, e outro a indicar a exposição. Questionei uma monitora, se a exposição já estava aberta, ela disse que sim que se eu quisesse podia ir visitar.

Ao movimentar-me por entre os diferentes grupos pude verificar o grande número de instituições presentes e principalmente a diversidade de problemáticas, desde os mais pequenos até aos seniores todos apresentavam uma grande boa disposição.

57 Um dos patrocinadores dos Jogos da Primavera 58 Todas as pessoas tinham vestido uma camisola de manga curta branca com o símbolo da festa da parte da frente.

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 217

Dirigi-me à exposição, esta era composta por trabalhos identificativos de cada uma das instituições participantes. Os trabalhos retratavam o tema da “Igualdade de oportunidades” sob o ponto de vista de cada instituição, retratando também a sua população alvo. Os trabalhos demonstravam muita criatividade e empenho, todos realizados de forma artesanal.

Estavam várias pessoas das diferentes instituições também a visitar a exposição. À saída encontrei-me com o Psicólogo que me explicou que em consonância com o

Ano Europeu sobre a “Igualdade de Oportunidades para todos”, esta era a 15ª edição dos Jogos da Primavera que foi dedicada a este tema e por isso denominaram-nos de “Jogos Pró-Igualdade”. Referiu também que com esta iniciativa, querem mais uma vez chamar a atenção para a opinião pública para o tratamento ainda tão desigual dado à população com deficiência. Trazer à participação nestes jogos outros públicos também desfavorecidos e assinalar igualmente as evidências do seu tratamento desigual. Promover a integração social entre todos os grupos em presença, salientado as suas diferenças e riqueza individual. Que também pretendem proporcionar a todos os participantes um dia cheio de animação, boa disposição, alegria e vivências enriquecedoras. “Divirta-se Dr.ª Vera!”.

Regressei para a entrada do CAO1. Os utentes e as monitoras estavam todos ali à entrada a observar as movimentações das instituições presentes. A formadora da sala 1 ofereceu-me uma ti-shirt e disse: “Vá lá para não se sentir diferente!” Vesti a camisola e de facto senti-me parte integrante do grupo.

Entretanto chegou o Francisco e perguntou, “está boa?” Perguntei: “sim e o Francisco? Respondeu sem olhar para mim, “sim, sim, sim, estou bom, estou bom!”

A Maria que estava sentada num banco à entrada da porta, chamou-me e disse-me esta é a mãe do Francisco e apresentou-me uma senhora que aparentava ter mais ou menos 68 anos. Cumprimentei-a, perguntou-me se eu era nova monitora, respondi que não que estava a fazer um estudo lá na Associação. O Francisco aproximou-se e eu brinquei com ele: “Então Francisco nem me apresentava a sua mãe”, mas ele afastou-se.

Estava previsto o desfile das instituições para as 10:45, mas com tantas pessoas era impossível cumprir horários. Por volta das 11h foi pedido ao microfone que as instituições se dispusessem em fila por grupos, sem uma ordem definida. Conseguiu-se criar um comboio gigante de pessoas todas de várias idades, raças, com e sem deficiências. A Associação era a última instituição a juntar-se por isso tivemos que esperar um pouco pela nossa vez. À medida que as diferentes salas se foram juntando ao comboio, vi a Erica. Cumprimentei-a, estava muito extrovertida por causa da festa agarrou-se a mim e deu-me dois beijos na cara e seguiu no desfile.

Ao som da música as instituições desfilaram pelo pátio da Associação até a um jardim onde estava montado um palco e um centro preparado para a realização de actividades. Ao longo do desfile estavam várias pessoas a assistir, pareceu-me técnicos e alguns familiares.

Na chegada ao jardim as instituições foram cada uma ocupando um lugar à volta do centro do Jardim. Os mais idosos e os utentes da Associação (por serem um número mais elevado quer de utentes quer de familiares) sentaram-se numas cadeiras debaixo de uma tenda.

Ás 11:30 deu-se início à cerimónia de Abertura. No palco uma senhora agradeceu aos patrocinadores, revelando que sem eles a festa não se poderia concretizar, em seguida agradeceu a todos os participantes, explicou que há 15 anos que aquela festa se realiza e introduziu o que iria acontecer durante aquele dia.

Em seguida, encontravam-se dispostos no centro do jardim alguns utentes da Associação preparados para dar início à primeira apresentação de abertura dos Jogos. Acompanhados com música, alguns utentes iniciaram uma dança. Quatro rapazes vestidos

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de fato e gravata estavam em cima de uma roda que simbolizava o mundo. Estes retratavam o mundo dos políticos, surge alguém vestido de branco que, um a um os empurra para fora do mundo, retirando o poder aos políticos e devolvendo o poder a toda a população, entretanto entra em cena um conjunto de pessoas mascaradas que representam várias culturas, vários países várias religiões e várias problemáticas, deambulando pelo mundo. Essa pessoa de branco (penso que retracta um ser superior) vem juntando um a um, fazendo com que dêem as mãos e circulem num círculo de mãos dadas, em seguida percorrem o mundo espalhando a “igualdade na diversidade”, por fim levantaram um cartaz com o tema da Igualdade de Oportunidades.

C.O.: Esta coreografia foi muito bem realizada para a temática em questão.

Chegou a ser comovente o carisma da diversidade tão presente quer na peça que em tudo o que rodeava aquela cerimónia. Os actores encararam a actividade com muita responsabilidade.

Seguiu-se o início dos jogos, os participantes do 1.º jogo deslocaram-se para a área

já preparada para o efeito. O jogo chamava-se “Bingo das Oportunidades”, o seu objectivo era preencher o cartão Bingo da sua equipa, com bolas numeradas, no menor tempo possível. Consistia em três equipas constituídas por 5 elementos (4 utentes + 1 técnico), que jogaram em simultâneo.

Os 5 jogadores colocaram-se na posição inicial indicada no esquema. O primeiro elemento (A) simula ser invisual colocando uma venda nos olhos (caso não fosse cego) e acompanhado com um guia (B) que pode ser técnico ou colega. Outro jogador simula ser portador de deficiência motora (C) e encontra-se em cadeira de rodas, tendo junto de si um condutor (D). O 5º elemento da equipa (E) é um jogador sem dificuldades de mobilidade.

A um sinal sonoro, o jogador que “simula ser portador de cegueira” retira de uma caixa junto de si, uma bola numerada que deverá entregar ao jogador que simula ser “portador de deficiência motora”, que apoiado pelo guia deverá seguir o percurso assinalado no chão. O jogador C recebe a bola e deverá ir entregá-la ao jogador sem dificuldades (E), sendo conduzido por D. Imediatamente estes 4 jogadores devem regressar às suas posições iniciais para repetir a tarefa até terminar as bolas. O jogador E ao receber cada bola deve correr até ao seu cartão Bingo, subi-lo e ai colocar a bola na casa do mesmo número, regressando à posição inicial para recolher mais uma.

As três equipas tinham um percurso distinto e ganhava quem conseguisse preencher o cartão bingo em primeiro lugar. O jogo repetiu-se pelo número de vezes das instituições participantes, pois todas participaram com três elementos. Durante o jogo, existia uma pessoa que estava a relatar os acontecimentos outra a cronometrar o tempo e ainda um grupo de rapazes e raparigas com idades entre os 12-16 anos da escola secundária da comunidade local que foram denominados de “Juízes dos Jogos”, estavam identificados com uma faixa cor de laranja no braço e tinham a função de regular e apoiar o decorrer dos jogos.

No decorrer do jogo aproximei-me da equipa da Associação, em que participava o Carlos. Ainda não tínhamos tido oportunidade de nos conhecermos, mas mesmo assim ele cumprimentou-me e eu desejei-lhe boa sorte para o jogo. Permaneci durante algum tempo a observar a dinâmica estabelecida e percebi que as pessoas se estavam a divertir imenso e que naquele momento as diferenças entre todos diluíam-se pois independentemente da problemática associada, todos participaram num jogo em comum.

C.O.: Considero de extrema importância a integração nestas actividades de jovens sem deficiência, pois permitiu-lhes conhecer realidades diferentes incentivando para um futuro vazio de exclusões.

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Em seguida fui para o outro espaço onde ficaram os restantes dos participantes. O recinto já estava organizado para o 2.º jogo que se chamou “Igual Acesso”. Eu aproximei-me do grupo de utentes da Associação. Alguns utentes ainda estavam a acabar de almoçar bem como alguns grupos de visitantes (cada instituição trouxe o seu almoço). Uma monitora pediu-me se eu tomava conta da Carina enquanto ela ia apoiar outra utente que ainda não tinha terminado de almoçar, porque estava uma grande confusão e a Carina podia desaparecer. Fiquei então a observar a Carina e o restante grupo que estava sentado numas cadeiras para verem o decorrer do jogo. A verdade é que daqueles lugares não dava para ver muito bem e por isso não consegui observar a totalidade da sua dinâmica. Contudo por todo o recinto estavam cartazes que identificavam alguns serviços da sociedade como o ensino, a saúde etc. e o objectivo era chamar a atenção para o direito ao igual acesso a todos os serviços públicos. Novamente participaram todas as instituições colaborando com 4 elementos de cada.

Estavam 4 equipas a jogar em simultâneo. Existiam quatro áreas – Educação, Saúde, Trabalho e Cultura, devendo no início do jogo, cada uma ser ocupada por uma das 4 equipas. A um sinal sonoro os jogadores iniciaram a realização das tarefas inerentes à sua área, devendo depois rodar para a área que se segue no sentido indicado.

Entre as 4 áreas existiam obstáculos que tinham que ser transpostos pelos jogadores: Ponte móvel, Escada, Túnel e Pneus.

Cada equipa terminou na área onde começou, colocando então uma placa com o respectivo nome de área, concluindo assim o jogo.

Em seguida, decorreu a entrega dos prémios aos vencedores dos jogos. Em que as instituições vencedoras receberam um azulejo com o símbolo da Associação e todos os participantes receberam uma medalha de participação.

Seguiu-se o momento da animação musical, que contou com a colaboração em primeiro lugar do cantor Bonga. Quando ele entrou no recinto os utentes das várias instituições entraram numa grande euforia, assobiando e chamando por ele. Ele subiu ao palco e as pessoas invadiram a relva e começaram a dançar. Parecia uma discoteca em plena tarde, não importava a idade ou a deficiência porque a maioria gostava do cantor. Ele cantou duas músicas, chamou uma criança ao palco de origem africana para dançar com ele e depois desceu para a relva para o meio do público e dançou juntamente com todos. Seguiram-se mais alguns cantores como a Mónica Sintra e outros cantores de música tradicional portuguesa menos conhecidos. Todos eles interagiram com o público.

Durante o momento musical a monitora deixou de ver a Carina, perguntou-me muito preocupada se eu a tinha visto, disse-lhe que não e fui ajudar a procurá-la. No meio daquela multidão de gente avistei a Carina num canto a sentada a brincar com duas senhoras que parecia monitoras de alguma instituição. Chamei a monitora, e fomos ter com ela. As monitoras que estavam com ela explicaram que forma monitoras da Carina noutro colégio durante 18 anos e por isso ela estava ali tão confortável parecendo estar no seu ambiente natural.

Apesar da grande energia geral, houve um grupo de idosos provenientes do Centro Comunitário de Reformados e Pensionistas de Camarate que a sua maioria permaneceu todo o tempo do momento musical sentado, apenas rindo e batendo palmas.59

O Renato veio cumprimentar-me, eu perguntei-lhe: “então Renato por onde tem andado que eu ainda não o tinha visto?” Ele respondeu: “Não me viu a mim, mas eu via a si?” Perguntei: “Aonde?” Ele respondeu: “Nem me conheceu porque eu estava de fato! Eu era o Político e via-a muito bem”. Eu: “Ai Renato, estava bem disfarçado e representou muito bem!”. 59 Talvez devido ao piso ser um pouco instável, este grupo de pessoas mais idosas não se sentiram seguras para dançar em cima da relva.

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Ele retirou-se e foi dar o seu casaco a uma senhora dos seus 70 e poucos anos que estava sentada na última fila, talvez seja a sua mãe.

Por volta das 15h:30m procedeu-se à entrega do prémio do “Melhor Placard”, e o vencedor foi mesmo a Instituição organizadora, isto é a Associação.

A partir das 16h as instituições começaram a despedir-se e ir embora. Tendo sido dados por encerrados os jogos por volta das 17h.

Associação…

15 de Maio de 2007 17h:30m às 21h

VISITA À RESIDÊNCIA 2 Cheguei à Associação e encontrei-me com o Psicólogo no pátio. Hoje foi ele a fazer

a minha integração na residência porque a Assistente Social me tinha dito que não podia estar presente porque ia haver uma acção de formação para alguns funcionários e ela teria que participar não tendo disponibilidade para me acompanhar.

O psicólogo acompanhou-me à Residência 2, explicou-me que devido à ausência de alguns monitores (por causa de uma acção de formação interna) alguns utentes das outras residências tinham actividade musical. Assim quando chegámos à residência apresentou-me a duas ajudantes de lar, explicando os objectivos da minha presença e pediu a colaboração delas no que eu precisasse. A Maria estava a limpar o pó na sala e quando me viu veio espontaneamente cumprimentar-me e perguntou se eu ia lá ficar na residência. O psicólogo disse para eu o acompanhar à sala da música para me apresentar os restantes utentes das outras residências. No caminho para a sala de música, eu estava a explicar ao Dr. que o meu objecto de estudo são as pessoas com mais de 45 anos e que com as visitas tenho conseguido conhecer melhor as pessoas que vão participar no estudo, à excepção do Fernando com quem não consegui estabelecer uma relação de proximidade, entretanto o Fernando vinha a sair da sala e disse-nos alguma coisa, que eu não consegui entender, mas nem para nós dirigiu o olhar. O Dr. referiu: “sim o Fernando tem uma personalidade complexa ele não consegue olhar para as pessoas quando fala com elas, não reparou?”

Chegámos à sala onde se costuma realizar o baile à sexta-feira à tarde. A música era da autoria de uma parte do grupo dos “Panteras Negras”, todos os utentes e as monitoras estavam dispostos em U à volta da pista de dança. O Dr. apresentou-me e disse que eu ia lá estar um bocado a observar e a conviver com os utentes. Eu disse olá e retirei-me com o psicólogo referindo que era provável que voltasse. Fui até à residência 2, quando entrei a Maria continuava a limpar o pó. As Ajudantes de Lar estavam a começar a fazer o jantar.

A sala é grande tem duas janelas que deixam entrar a claridade e está decorada com todo o conforto de uma casa onde vive uma família. Tinha ao centro uma mesa de jantar comprida e rectangular e uma mesa mais pequena redonda, um aparador, um móvel com uma televisão e uma aparelhagem, e vários quadros nas paredes, bem como diversos objectos decorativos por cima da mesa e dos móveis. Ao fundo da sala via-se uma pequena cozinha e uma entrada que dava para um pequeno hall com três quartos e uma casa de banho. Ao lado dessa entrada existe umas escadas que dão acesso ao primeiro andar da residência. Numa das paredes da cozinha existe um placar com o registo das actividades semanais de cada utente da residência.

Uma das monitoras explicou-me que no início de cada semana fazem uma reunião com os utentes onde cada um se compromete a cumprir determinadas tarefas domésticas. Referiu que há alguma flexibilidade na execução de tarefas que gostam mais, mas que o objectivo é que aprendam a ser independentes nas suas actividades de vida diária, bem como aprendam a viver em grupo partilhando o espaço, aprendendo a gerir as suas regras e

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os seus direitos. Disse também que nessa reunião os utentes podem sugerir uma refeição à sua escolha, novamente tendo que entrar em acordo na decisão do grupo. Após a divisão de tarefas é afixado no placar uma tabela com os dias e as funções de cada um, que serve para os utentes se organizarem diariamente.

Entretanto a Maria já tinha regressado e veio rapidamente mostrar-me a avaliação diária dela, mostrou que teve sempre 10, o que corresponde à soma da nota máxima diária.

O Renato dirige-se à cozinha com o balde da água na mão dizendo que já tinha terminado de lavar a casa de banho. Entretanto entram na sala da residência o Fábio e o Carlos. As monitoras apresentaram-nos, o Carlos disse que já me conhecia. Expliquei-lhes que estava lá para os conhecer porque estava a estudar o envelhecimento. Disse-me “eu ajudo no que for preciso e respondo às perguntas que quiser”. O Carlos mostrou um olhar cansado e talvez um pouco de indiferença pela minha presença.

A monitora indicou ao Carlos as tarefas que ele tinha que realizar. Ele agarrou no balde com o detergente e o esfregão e convidou-me a acompanhá-lo para conversarmos.

Subimos ao 1.º andar, acompanhou-me ao seu quarto e disse que aquela era a sua cama e a outra era de outro colega. Perguntou-me: “o que é que queria perguntar-me? Pode perguntar que eu respondo!” Respondi-lhe: “Hoje apenas quero conversar um pouco consigo e conhecê-lo melhor e depois de nos conhecermos melhor, combinamos um outro dia, pode ser?” Ele respondeu: “Pode, quando quiser? E se quiser conhecer a minha mãe ela vem buscar-me na sexta-feira. Disse-me que trabalhava em quê?” Respondi: “Sou Assistente Social e trabalho com pessoas cegas”. Ele: “A minha mãe é professora de química dos alunos do Instituto Superior Técnico e o meu pai é oftalmologista. É colega da Assistente Social, da Drª…?” Respondi: “Sim, mais ou menos!” Ele: “Ás vezes começo a pensar o que é isso do social umas vezes sei outras fico confuso”. Eu ia para começar a tentar explicar de uma forma simplificada a minha noção de social, mas o Carlos disse: “foi o veneno da cobra que os fez ficar cegos?” Ele regrediu na nossa conversa e pensava que as pessoas ficavam cegas porque foram mordidas por uma cobra. Expliquei-lhe que isso não era verdade e que as pessoas cegas eram um grupo de pessoas que não vêem e que têm características parecidas como eles lá na Associação. Carlos: “Há estou a ver!” E disse-lhe: “Eu não quero atrapalhar as suas tarefas, o melhor é ir depois quando terminar continuamos a conversar”. Entretanto chega o Francisco e pediu um esfregão e detergente ao Carlos, dirigiu-se à casa de banho do Hall do 1º andar e começou a lavá-la. O Carlos começou a limpar a casa de banho do próprio quarto.

No primeiro andar existem três quartos, uma casa de banho e uma pequena sala. Desci para o rés-do-chão, o Fábio estava a lanchar. Olhou para mim e sorriu. Eu

aproximei-me e perguntei se estava tudo bem com ele, ele respondeu-me que colaborava no fosse preciso, apesar de eu não lhe ter perguntado. Os sinais físicos do envelhecimento são bastante visíveis no Carlos, já tem cabelos brancos, muitas rugas e não tem a dentição completa. Tem um olhar um pouco triste e com reflexo de cansado. Segundo informação fornecida pela a Assistente Social o Fábio é o utente/trabalhador mais velho do Elo, ou seja, ele está a trabalhar no centro de emprego protegido mas continua a ser utente da residência pois já não tem pais. Devido à sua idade também já avançada e devido à sua deficiência mental o Fábio reside na residência da Associação e vai alguns fins-de-semana a casa de um irmão.

A Maria continuava a limpar o pó e o Renato chegou e convidou-me para jogar às Damas com ele. Eu aceitei mas disse-lhe que não sabia jogar muito bem, ele disse que não fazia mal porque ele explicava-me. Foi buscar o jogo e sentámo-nos numa mesa redonda na sala. Quando começámos a jogar, a Maria veio conversar comigo impedindo que o jogo se desenvolvesse. Debruçou-se sobre a mesa e começou a fazer perguntas sobre mim. Se a minha mãe e o meu pai estavam bons, se eu tinha irmãos, onde é que eu morava se eu era

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casada, se eu tinha fotografias na carteira para lhe mostrar... Um rol de perguntas sem fim. Fui tentado responder-lhe, com a pressão do Renato a querer que eu joga-se. Disse-lhe que os meus pais estavam em Torres Novas e que eu só lá ia ao fim de semana. O Renato não queria acreditar pois disse que o pai dele também é de Torres Novas, mas já vivem em Lisboa há muitos anos. A Maria disse, “sim, é como eu também só vou a casa ao fim de semana, mas o meu pai já morreu coitadinho”. Perguntei-lhe porque é que ficava lá na residência sempre, ela respondeu que morava longe, em Miratejo e que está na Associação desde a sua abertura. Disse também que a mãe já tem 70 anos e que tem outros irmãos e sobrinhos, um que já está casado.

O Renato voltou a contar-me que a mãe tem 76 anos e o pai tem 79, mas já têm muitos problemas.

Perguntaram-me quantos anos têm os meus pais. Disse-lhes que tinham 50 e poucos anos, e que ainda eram novos. O Renato franziu os olhos e abanou a cabeça, dizendo que ele também fazia 50 anos. Perguntei-lhe, que cara tinha sido aquela. Ele disse-me: eu também tenho quase 50 mas já vou durar pouco”. Perguntei-lhe: porque é que pensa isso”, disse-me: “eu estou muito doente, já nada é como era dantes”. Em determinado momento confessou-me que tinha problemas no ânus e que o médico não faz nada, que o que eles querem é que ele vá pagar para ir a outro médico privado. Contou-me que tinha dois irmãos, porque um morreu. Esse irmão tinha problemas crónicos, esteve internado no Júlio de Matos, ele referiu que gostava muito dele mas que tinha medo dele porque ele batia ao pai. Perguntei-lhe quais foram as causas da morte, disse-me que foi da doença.

Entretanto o Carlos sentou-se na mesa. Perguntei-lhe se já tinha realizado todas as tarefas, respondeu-me que por hoje já estava e que estava à espera de vez para ir tomar banho. O Renato disse: “já tomei banho de manhã”. E o Carlos disse-lhe: “mas não é de manhã é antes do jantar que se toma banho”. Permaneceu ali entretido a lançar uns dados pertencentes a outro jogo e a contar os números.

O Carlos é um rapaz baixo, moreno e muito magro. Usa uns óculos de sol desportivos com lentes espelhadas. Tem uma atitude formal e educada.

C.O: Todas as vezes que vi o Carlos ele trazia os óculos postos. Em determinado momento ouvi

alguém a comentar que eram novos e ele a mostrar os óculos com muito orgulho. Usar óculos de sol pode ser uma forma de se esconder, por outro lado o facto dos óculos serem futuristas podem fazê-lo sentir-se mais jovem.

A Maria sentou-se ao meu lado e entre nós ficou a minha mala entreaberta. Ela demonstrou uma grande curiosidade com as minhas coisas e voltou a pedir para

ver a fotografia do meu namorado. Mostrei-lha e ela referiu: “há fazem um lindo par, é tão bonito o seu namorado!” Ela viu o meu caderno dentro da mala e quis ver. Retirei o caderno da mala, abri numa página em branco e pedi-lhe para me dizer os nomes das pessoas que estavam naquele dia na residência. Ela o Renato e o Carlos ajudaram dizendo: “Então escreva aí, os nossos nomes, Carlos, Renato, Maria, Francisco, Fábio, e falta cá os que estão na música que são o Bruno, a Maria João, a Cláudia e o Pedro. Depois de escrita a lista a Maria puxou o caderno para ela e começou a ler. Brinquei com ela e disse-lhe: “Sabe ler muito bem!” O Renato retorquiu: “eu também sei ler tenho o 6.º ano”.

C.O: Naquele momento a Maria também me disse o grau de escolaridade que ela tinha, mas não me

recordo ao certo. Tentar saber na próxima visita à Associação. Ela tem uma maneira própria de falar. Fala com uma entoação forte no final das frases e muitas vezes fala como se estivesse a cantar, sempre que tento reproduzir as suas falas quase que consigo ouvi-la a pronunciá-las. Manteve uma relação de proximidade imediata comigo, está sempre a tentar tocar nos meus cabelos e na minha roupa. Observa muito bem o que trago vestido e quase sempre tenho recebido elogios da parte dela. Se por um lado foi positivo essa aproximação e relação de empatia, em alguns momentos ela exige em demasia a minha atenção permanente.

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Perguntei para o grupo se gostavam mais de falar ou de escrever. O Renato e a

Maria disseram que sabiam escrever mas gostavam mais de falar. O Carlos retirou-se dizendo que se ia preparar para o jantar. O Renato perguntou: “Então nunca mais faz as perguntas?” A Maria: “Sim! Faça que nós respondemos e depois pode escrever aqui no seu caderno.” Expliquei-lhes que ainda não ia fazer as perguntas naquele dia. O Renato, com uma expressão de espanto perguntou: “ Então está à espera para quando? Quando eu me for embora? Olhe que eu vou sexta-feira! Pode perguntar o que quiser que agente responde, não há problema.” Expliquei que ia voltar mais vezes a Associação e que depois podíamos combinar um dia para conversarmos e perguntei: “O que é que acham?” “Está bem a Vera é que sabe”, disse o Renato. A Maria acenou com a cabeça que sim.

O Renato disse: “é a sua vez de jogar”. Eu não sabia muito bem como poderia jogar sem que ele avança-se casas no tabuleiro das damas, mas arrisquei. O Renato riu-se e disse: “você é atrevida, assim vou ganhar duas peças, o que quer dizer que (silêncio) olhou para mim e exclamou: “Dhaaa!!!! jogou mal”, acenando com a mão em frente aos olhos para cima e para baixo. Em seguida sugeriu que eu retira-se a jogada, para me explicar. O Renato tem um olhar meigo, mas cansado, não tem cabelos brancos e tem os lábios revirados para fora e algumas rugas na cara.

C.O: Demonstrou que era mais importante ensinar-me do que ganhar. Penso que o fez sentir-se numa

posição superior.

Durante o tempo anteriormente descrito o Francisco, deambulou pela sala, fazendo comentários ao tempo que estava a anunciar na televisão.

Por volta das 19:30, a ajudante de lar chamou a Maria para ir tomar banho. Ela agarrou-me na mão e disse: “Prometa que não se vai embora, eu volto já”. Eu prometi-lhe que não ia embora sem me despedir dela. A ajudante de lar disse para a Maria: “Vai andando que eu já lá vou ter contigo”e voltou-se para mim e disse-me: “A Maria não é autónoma no banho, precisa de ajuda, se não formos lá esquece-se que o banho tem fim”.

Continuei a tentar terminar o jogo com o Renato. Apesar de tudo empatámos, devido à grande ajuda que ele me deu.

Passado algum tempo uma das ajudantes de lar aproximou-se da mesa e disse “Renato é a tua vez”, ele disse que já tinha tomado banho de manhã, mas a monitora explicou-lhe que o banho era todas as Terças e Quintas-feiras antes do jantar e por isso tinha que tomar banho novamente. Ele mostrou-se muito zangado, contrapondo a ordem da monitora. Eu e a monitora explicámos a importância do banho e dissemos que não fazia mal tomar banho novamente, e disse-lhe: “Vá lá que eu espero-o aqui!” Mesmo assim ele não estava muito convencido, até que a monitora lhe perguntou: “que dia da semana é hoje” ele pensou um pouco e depois respondeu: “é quarta-feira” e ela disse: “não, estás enganado é terça-feira dia de banho.” O Renato demonstrando algum esforço lá foi tomar banho.

C.O: Penso que ele estava confundido com o dia e talvez por isso estivesse a dizer que tinha tomado

banho de manhã. Ou então queria escapar-se desse cuidado de higiene pessoal, o que não me pareceu pois ele costuma aparecer sempre limpo e com a roupa lavada.

Levantei-me e fui até à cozinha, uma das ajudantes de lar estava a fazer o jantar e explicou-me que o primeiro grupo a tomar banho é o das raparigas e que depois vão os rapazes, o último a tomar banho tem que arrumar a casa de banho. As restantes tarefas da casa são distribuídas por todos e em cada dia têm uma avaliação. Dirigiu-se para um quarto no rés-do-chão onde havia um armário onde guardam um dossier com a ficha diária de cada utente. Mostrou-me a ficha de avaliação diária, que era igual à do CAO e explicou-me

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que cada um dos factores de avaliação (descritos num dos diários anteriores) tem uma escala de avaliação compreendida entre 0-2 à excepção do factor rendimento no trabalho que vai de 1-4. A Maria entrou no quarto. Vestia um fato de treino e um robe. Apressou-se a buscar a sua ficha de avaliação para me mostrar que tinha tido sempre 10 na sua avaliação diária, o que corresponde à avaliação máxima em todos os itens da avaliação. Referiu que queria ganhar o prémio. Questionei: “Qual é o prémio?” Disse: “o prémio de bom comportamento, se ganhar mais pontos ganho mais dinheiro”. A monitora interviu dizendo que a avaliação é efectuada diariamente mas no final de cada mês, é efectuado um balanço da avaliação, como forma de contabilização para o rendimento mensal de cada utente.

C.O.: O dinheiro que recebem é simbólico, mas funciona como reforço positivo no incentivo à aquisição de regras comportamentais. Tendo em conta que a avaliação do grau de deficiência mental contempla a forte interacção entre o sujeito e o ambiente é importante que os sujeitos aprendam as regras da sociedade em que estão inseridos e consigam ser o mais autónomos possível. Percebi que estes sujeitos necessitam de um acompanhamento constante na manutenção competências sociais, sendo que algumas das pessoas estão na instituição há muitos anos e ainda necessitam de supervisão.

Reconstrução da Ficha de Avaliação

Voltámos para a sala. Os utentes foram chegando com o aproximar da hora de jantar. Chegou um utente, jovem, que trazia na mão um papel. Abordou-me e disse: “ Podias dizer à minha mãe que eu antes quero ir para Albufeira” e mostrou-me o papel. O papel era o pedido de autorização aos pais para irem à colónia de férias. Havia dois sítios possíveis, Sines e Albufeira. A duração é de duas semanas no mês de Junho para Albufeira e uma semana para Sines em Julho.

Em seguida a Maria vem com o papel dela para me mostrar, e disse: “Eu também quero ir para Albufeira”. A monitora disse: “Muitos querem ir para Albufeira por causa da cozinheira”.

Perguntou em voz alta: “Quem é a pôr a mesa, está na hora?” O Francisco e o Fábio que entretanto já estavam na sala a ver televisão começaram a pôr a mesa sem alarido.

FICHA DE AVALIAÇÃO DIÁRIA

Nome: Dia: Moradia: Mês: Faltas:

Dias

Factores

Pontuação

1 2 3 4 5 6 7 8 9 19 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31

Rendimento no Trabalho 1 - 4

Assiduidade e Pontualidade 0 - 2

Higiene e Arranjo Pessoal 0 - 2

Comportamento Relacional 0 - 2

TOTAL

Observações:____________________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________________________________________

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Permaneci um pouco em pé a observar a dinâmica. A Maria aproximou-se e perguntou: “a sua mãe e o seu pai estão bons?” Respondi: “Sim! E os seus?” Maria: “Hó! (silêncio e olhar pensativo) a minha mãe já tem 70 anos, e o meu pai morreu também quando tinha 70 anos, no ano passado”. Ia para começar a falar, mas ela iniciou um discurso individual e ofegante, demonstrando muita ansiedade. Disse: “Ele já estava muito mal, tinha uma doença ruim. A mim ninguém me diz que não foi o tabaco, foi de certeza o tabaco que o matou. Ele já estava muito magrinho!” Na tentativa de lhe transmitir alguma calma e situá-la no espaço e no tempo, interrompi o discurso e disse: “Mas já foi a algum tempo não foi Maria?” Ela continuou: “Sim, eu estava cá na Associação quando ele morreu”, e no seu discurso seguinte continuou a insistir que nessa data estava na Associação. “Quando ligaram para cá a dizer, quando eu soube! Fui para o gabinete do director e chorei muito, muito, muito, porque era o meu pai! Eu nem ao funeral fui, porque estava cá e ninguém me podia vir buscar e assim conversei com o director e achámos melhor assim. Mas a minha mãe realizou o pedido do meu pai, ele sempre disse que queria ser cremado.”

C.O.: Não consegui entrar em diálogo, porque naquele momento ela começou a contar-me como

tinha sido e não foi possível perceber se ela associava a idade da morte do pai com a idade da mãe e se isso de algum modo a preocupa.

Na sequência do discurso ofegante da Maria presença de todos os outros utentes,

uma das ajudantes de lar disse: “Pronto Maria, vamos acalmar que todos já conhecemos essa história, podias ajudá-los a pôr a mesa.” Ela aceitou o conselho e foi ajudar a pôr a mesa.

Entrou o Carlos, vinha despedir-se pois ia jantar à residência n.º 3. Aproximou-se e despediu-se de mim com dois beijinhos na cara e disse: “quando quiser conversar eu estou às suas ordens”. E retirou-se.

As monitoras começaram a colocar os tachos com a comida numa mesa de apoio e os utentes começaram a sentar-se. Pelo que pude perceber os lugares não eram marcados pois uma monitora disse para a Maria: “há! hoje ficas aí de frente para a televisão!” Curiosamente ficaram dispostos em separado, os rapazes sentaram-se na mesa redonda e as raparigas e as monitoras sentaram-se na mesa rectangular. Ao todo estavam a jantar 4 rapazes, 5 raparigas e duas monitoras. Eu permaneci sentada no sofá a fazer companhia durante o jantar, porque apesar de me terem convidado para jantar eu sabia que não estavam a fazer conta com mais uma pessoa.

Serviram os pratos de cada utente. O jantar foi peixe cozido com batata e legumes. Uma utente do CAO3 com 27 anos, demonstrou o seu desagrado relativamente à ementa do dia. As ajudantes de lar, conversaram com ela e explicaram a todos a importância do peixe e dos legumes e como ela tem colesterol negociaram com ela que se comece um bocado de cenoura e couve, podia comer metade de um ovo. Ela dividiu o ovo com outra colega. Aparentemente tiveram algum cuidado a elaborar os pratos tendo em conta os gostos de cada um.

O jantar decorreu na normalidade, sem incidentes, parecia um jantar em família, onde conversavam calmamente uns com os outros. Quando começou a dar o telejornal, as ajudantes pediram silêncio e todos acataram tomando atenção às notícias. Durante o jantar entrou outro utente, que tinha jantado na residência 3. Começou a deambular à volta da mesa e destabilizou o ambiente. As ajudantes de lar chamaram a atenção desse utente para o seu comportamento. Ele sentou-se ao meu lado de forma desajeitada, todo deitado no sofá com as pernas abertas. Uma ajudante de lar apressou-se a chamá-lo a atenção fazendo referência à avaliação diária e dizendo: “Isso são modos quando temos visitas em casa! Achas que a tua mãe vai ficar contente quando souber do teu comportamento?”. Ele

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respondeu: “Não”. Levantou-se e foi sentar-se ao pé da mesa dos rapazes. Perguntou ao Francisco: “A tua mãe?” Francisco: “Está em casa”. Outro utente: “E está bem de saúde?”. Francisco: “Está, está!”. Ele não estabeleceu contacto visual com o colega, começando a levantar a mesa como forma de terminar a conversa.

C.O.: Acho que vai ser muito difícil conversar com o Francisco de forma formal, pois ele não

estabelece contacto visual com ninguém, não olha as pessoas nos olhos e normalmente foge ao diálogo.

O Francisco e a Maria levantaram a mesa. O Francisco lavou parte da louça e

deixou uma poça de água no chão da cozinha. A Maria foi a última a acabar a refeição, a ajudante de lar disse que por isso era ela amanhã a levantar a mesa. Hoje foi dia de bolo de chocolate à sobremesa. Estavam todos muito contentes, ofereceram-me bolo e aí tive que aceitar. Comi um bocado de bolo e por volta das 21h despedi-me. A Maria e o Renato não queriam que eu fosse embora e perguntaram quando é que eu voltava. O Renato disse: “Venha para nós jogarmos outra vez”. Prometi que voltava quando pudesse e agradeci a companhia de todos, vieram comigo até à porta dizer adeus.

C.O.: Foi muito importante sentir que o ambiente na residência era muito calmo, que as monitoras transmitiam muito carinho aos utentes. Foi também uma experiência interessante verificar como as tarefas da vida diária fazem parte da organização da casa e da vida de todos os utentes. Penso que a Maria identifica-se com o espaço, bem como o Carlos se identifica com o quarto. O Renato aceita com normalidade que tem que ficar na residência de vez em quando.

Associação… 22 de Maio de 2007

14h:30m às 15h:15m

CENTRO DE ACTIVIDADES OCUPACIONAIS 1 (CAO 1)

Grupo 5

Cheguei à Associação e como de costume dirigi-me ao gabinete da Assistente Social, pois tínhamos combinado que hoje eu ia conhecer a sala de CAO 3. Ela não estava. O Bruno que é o telefonista / recepcionista disse-me que ela teve que sair. Assim, optei por ir às duas salas que já conheço, com o objectivo de cumprimentar e conversar com alguns utentes.

Na sala de CAO 1, estavam sentados cinco utentes numa mesa disposta em U, três raparigas e 2 rapazes. Três deles estavam a ler revistas e a fazer recortes de imagens ou texto. Outro estava a jogar no computador e a Erica estava equipada com touca e bata branca a dobrar guardanapos. Em cima da mesa à sua frente estavam três grupos de guardanapos já dobrados.

Quando entrei na sala a Erica mostrou uma grande excitação por me ver, levantou-se e veio dar-me dois beijos, agarrou-me na mão e puxando a cadeira ao lado da dela disse-me: “senta-te aqui”. Ela disse-me que para o mês que vem vai de férias para Albufeira, mas que o namorado (e olhou para o rapaz que estava sentado no computador e disse: “o meu namorado não gosta de praia e antes quer ir para Sines.” “Ai sim! Mas olhe que Sines

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também tem praia” disse eu. Ela: “Evidentemente, que não é a mesma coisa! A Associação tem lá em Albufeira uma casa, muito boa, nunca foi lá?” Respondi, “não ainda não tive oportunidade”. Ela: “Hó mulher peça ao Dr. Martins ou ao sobrinho, o Dr. Ricardo, ou à Assistente Social se preferir e venha com agente”. Respondi: “E depois quem é que ficava lá no meu trabalho?” Ela riu-se e perguntou: “Quando é que me leva a conhecer o seu trabalho? Tem que pedir à Assistente Social que ela leva-nos lá no carro!” Disse-lhe que quando quisesse lá ir seria bem vinda. Erica: “Quando? Olhe que tem que ser antes de eu ir de férias! E eu vou para Albufeira e depois em Agosto vou para a Costa da Caparica com a minha mãe e as pessoas da junta da freguesia.”

C.O.: Mais tarde percebi que a casa que a Erica se refere não é outro pólo da Associação, mas sim a

colónia de férias para onde vão com os profissionais e monitores todos os anos. Ela tem a clara noção de hierarquia e sabe que não pode ausentar-se da Associação sem

autorização. A Erica monopolizou a minha atenção.

Eu: “Já percebi que gosta muito de passear, e da festa da primavera, gostou?” Erica:

“Eu gostei muito, foi uma grande festa, a minha mãe não pode vir não sabe o que perdeu!” Perguntei: “Porquê, estava a trabalhar?” Erica: “Não (olhou para mim com espanto) a minha mãe já não trabalha há muitos anos por causa da idade e porque já não pode por causa das doenças.” Eu: “Ela tem quantos anos?” Erica: “Já tem 74 anos, mas já não pode trabalhar por causa da saúde”. Eu: “E o seu pai?” Erica: “Então não sabe! O meu pai vive no cemitério de Benfica, morreu há uns anos por causa da doença do Alzeimer. E eu não posso ir lá vê-lo à casa dele.” Eu: “Então e porquê?” Erica: “Por causa da Epilepsia, evidentemente, se não ainda tinha lá um ataque! Quando isso aconteceu (quando o pai morreu), eu e o director achámos melhor assim.”

Continuou a dobrar guardanapos e abanando a cabeça, referiu: “com este trabalho ganha-se muito mal, nem dá para comprar um par de sapatos. A minha mãe tem que ter 3 hóspedes lá em casa para vivermos melhor, para ganharmos dinheirinho (fez o gesto de dinheiro com a mão)”. A monitora riu-se e disse: “Ai a Erica é tão pobrezinha coitadinha, está sempre a chorar-se! E piscou-me o olho. A Erica olhou para ela, sorriu e disse: “pois a vida está muito difícil”.

Mudando de assunto perguntei: “E o casamento quando é?” Ela irritada disse: “Ainda não é porque a minha mãe não me deixa casar, mas eu um dia ainda fujo!”

A certo momento queixou-se de uma dor por baixo do peito esquerdo referindo que tinha muitas vezes “cãibras” naquele sítio.

Entretanto entraram na sala duas utentes. Uma rapariga jovem, morena, baixa e forte sentou-se ao meu lado, equipou-se com a bata e touca branca na cabeça e começou a dobrar guardanapos. A outra sentou-se a ler uma revista.

Despedi-me de todos, explicando que ia até à sala ao lado cumprimentar outros colegas.

Ao sair da sala sentei-me um pouco num banco que existe no hall, para tirar algumas notas. Abri o meu caderno e comecei a escrever, quando de repente aparece a Erica. Pergunta: “O que está aqui a fazer? Está a escrever no seu caderno?” Respondi atrapalhada: “sim estou a tirar umas notas sobre algumas coisas importantes para não me esquecer”. Erica: “Posso ver?” Respondi: “Sim claro que podes!”. Ela sentou-se ao meu lado para poder olhar para a folha do meu caderno, e eu perguntei: “Então o que é que estás a fazer aqui fora?” Ela levantou-se e dirigindo-se para a casa de banho disse: “vim à casa de banho, porque estava a dar-me novamente uma cãibra” aproximou-se novamente e sussurrou ao meu ouvido: “sabes como é! É o PDI! Dantes quando era mais nova não tinha nada disto.” Riu-se à gargalhada e saiu.

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Continuei a tirar as minhas notas. Á minha frente estava um placar com vários documentos institucionais, como o regulamento, o horário de funcionamento a distribuição dos monitores por sala, um cronograma do Centro de Actividades ocupacionais e o Plano de Intervenção de cada utente para o mês de Maio.

C.O.: Actualmente os grupos não estão a desenvolver todas as actividades

dispostas no organigrama, devido ao pouco trabalho que tem sido entregue pelas empresas parceiras. Como se pode observar a actividade a decorrer na sala 5 não corresponde a este mapeamento.

Após um olhar atento para o Plano de Intervenção Transversal, relativo às competências Adaptativas – Competências Sociais do mês de Maio afixado no placar do hall do CAO 1, pude verificar que para todos os utentes existe um objectivo que eles deverão tentar cumprir durante aquele mês. Atentamente observei os objectivos para os utentes com mais de 45 anos e portadores de deficiência mental ligeira ou moderada.

Assim pude registar que o Plano dizia: Objectivo: Será capaz de… Duarte: exprimir correctamente os seus sentimentos. Erica60: Manter distanciamento necessário com as pessoas estranhas e manter-se em

silêncio no autocarro. Francisco: manter-se em silêncio quando necessário e falar quando deve. João: melhorar o seu relacionamento, diminuindo a sua inibição. Carlos61: Conviver e Interagir com todos os colegas da Associação. Maria62: Manter uma distância social mais correcta com as pessoas conhecidas e

desconhecidas. Renato Teixeira63: Manter a distância social com as pessoas desconhecidas e acabar

com o hábito de pedir. Em seguida dirigi-me à sala 2 de CAO 1, que é no edifício ao lado deste.

60 Utente 1 61 Utente 2 62 Utente 3 63 Utente 4

CAO

CAO 1 Centro de Actividades

Ocupacionais úteis

CAO 2 Centro de Actividades

Estritamente Ocupacionais

Área Pedagógica / Terapêutica

Grupo 1 Emb. cabos computador / montagem componentes

Eléctricos

Grupo 2 Emb. De talheres /

cabos de computadores

Grupo 1 Serviço Psicológico Fisioterapia / Hidromassagem

Grupo 3 Montagem de componentes

Eléctricos BP

Grupo 5 Horticultura e Jardinagem

Grupo 4 Dobragem de guardanapos /

Montagem de comp. Eléctricos

Grupo 6 Dobragem de guardanapos /

Escolha de talheres

Grupo 2 Serviço Social

Desenvolvimento pessoal e social

Expressões

Snoozelen

Animação Musical

Educação Natação / Remo adaptado

Artesanato

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Associação… 22 de Maio de 2007

15h:15m às 16h

CENTRO DE ACTIVIDADES OCUPACIONAIS 1 (CAO 1)

Grupo 2

Já estava no final do dia, a sala estava num reboliço. Quando entrei na sala, o Renato Teixeira e um colega estavam a jogar ao computador, a Maria estava a fazer um puzzle em que através da introdução de pinos de várias cores ia construir um desenho. Perguntei à monitora pelos outros colegas, ela disse-me que dois deles tinham ido para o Artesanato e que outros, o Psicólogo tinha ido buscar para a realização de uma actividade, mas que não sabia ao certo do que se tratava.

Cumprimentei a Maria, veio prontamente dar-me dois beijinhos e disse: “Vem tão bonita, a Vera, vem sempre tão bonita”. “A sua mãe e o seu paizinho estão bons?” Respondi que sim que estavam em Torres Novas. Ela: “Eu também fui a casa no fim-de-semana”. Eu: “Sim! E correu bem o fim-de-semana?” Maria: “Sim correu bem, foi bom. Quem me dera morar aqui perto!” Eu: “Então porquê?” Maria: “Para poder ir a casa todos os dias”.

Aproximei-me do computador e perguntei que é que estavam a jogar, o colega do Renato disse: “É a tua amiga!” O Renato perguntou: “sim é minha amiga, mas também é tua amiga”. Ele disse: “mas é mais tua amiga”. A monitora interviu e perguntou-lhe porque é que estava a dizer aquilo. Ele respondeu que era porque eu falava mais vezes com o Renato. Eu interrompi o diálogo e expliquei-lhe: “Sim é verdade eu tenho conversado com o Renato porque tem calhado assim, mas sou amiga dos dois”. A monitora disse: “vamos lá deixar os ciúmes de lado a Vera é amiga de todos”.

A Maria chamou-me para eu ver o puzzle que ela tinha concluído. Dirigi-me a ela e elogiei o seu esforço e disse a todos que já voltava que ia só ver a actividade de artesanato ali ao lado.

Quando entrei na sala de artesanato estava uma monitora a ensinar dois utentes, o João e outro utente mais jovem portador de deficiência mental e auditiva. A monitora estava a ensinar-lhe a fazer um laço, recorrendo à demonstração e acompanhamento do movimento manual efectuado pelo utente. Ele estava a apresentar muitas dificuldades, tendo sido necessário repetir várias vezes a explicação. A monitora sentiu necessidade de explicar, “às vezes é mais importante batalharmos nestas pequenas coisas do que fazerem trabalhos muito bonitos”.

C.O.: A importância de saber fazer um laço está relacionado com o controlo da destreza

manual e com o treino do movimento manual. É também importante na autonomia de uma pessoa, pois saber atar os sapatos é uma das competências pessoais que se adquire em criança.

O João estava a observar o colega, a monitora referiu: “o João já fez o seu trabalho

é aquele que ali está exposto”. Perguntei: “Posso ver a exposição dos trabalhos realizados?” Monitora: “sim claro!”

Percorri a sala do artesanato, observando alguns dos trabalhos expostos. Usam pasta de papel, papel, gesso entre outros materiais com recurso à pintura na realização dos trabalhos. Por toda a sala estavam espalhados desenhos e trabalhos manuais realizados pelos utentes.

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Na sala ao lado ouvia-se o psicólogo a realizar uma sessão de grupo com alguns utentes. Pareceu-me que o tema era sobre a sexualidade, pois conversavam sobre o facto de terem namorado(a) e porque é que uns tinham namorado(a) e outros não.

Precisava de conversar com o psicólogo, quando senti que estava a terminar a sua sessão, agradeci à monitora a sua atenção, despedi-me dos dois utentes e ausentei-me da sala. Quando cheguei ao corredor já não consegui encontrar o psicólogo e por isso regressei à sala de CAO1 para ir me despedir. A Maria e o Renato perguntaram quando é que eu voltava.

Quando vinha a sair do CAO 1 encontrei no pátio o Francisco e o Duarte, que vinham de uma sala de formação que existe ao fundo do jardim. Aproximaram-se, e o Fernando cumprimentou-me com dois beijos na cara e disse: “ Olha a minha amiga!” Dei-lhe um aperto de mão e perguntei: “Está tudo bem contigo? Respondeu: “Sim, venho ali de uma actividade.” E continuou o seu caminho.

Seguiu-se o Diamantino, sorriu e deu-me um aperto de mão. Perguntei em que actividade estiveram, respondeu: Estivemos nas “competências emocionais”. Perguntei: “e gostaram?” Fez sinal que sim com a cabeça ao mesmo tempo que encolheu os ombros e dirigiu-se à sala de CAO.

Ao caminhar para o carro encontro o Fábio que estava a cuidar do jardim. Ao avistar-me ao longe identificou-me de imediato e sorriu-me. Aproximei-me para o cumprimentar, perguntou-me se estava boa, disse-lhe que sim e retribui a pergunta, ao fazer-lhe a mesma pergunta, apresentou-me um sorriso pouco expressivo encolheu os ombros e disse: “ Vai-se andando”. Elogiei a Buganvília que estava no jardim e perguntei se era ele quem cuidava dela, disse-me que sim e que se eu quisesse ele pedia ao superior dele e dava-me um pezinho para eu plantar no jardim.

C.O.: Apenas tinha estado uma vez com o Fábio, na residência. Nesse momento senti alguma

indiferença da parte dele em relação à minha presença. Hoje foi bom sentir o contrário na simpatia transmitida por ele.

Associação… 30 de Maio de 2007

15h:00m às 16h REUNIÃO COM O PSICÓLOGO Desde o inicio da minha permanência aqui na Associação que tenho mantido um

contacto informal com a maioria dos profissionais. Reuni-me com o psicólogo com o objectivo de lhe propor e pedir a sua colaboração

numa actividade que considero importante no desenvolvimento do meu trabalho. Outro pressuposto desta reunião foi indagar qual o grau de familiaridade que os utentes mantém com as questões do envelhecimento e como é que reagem a temas como a morte, por forma a poder preparar-me no confronto directo da entrevista.

Propus a realização de uma actividade de grupo com o tema do Envelhecimento que tivesse como principal objectivo introduzir o tema aos utentes.

Pedi a sua ajuda e colaboração na realização dessa actividade pois é ele que trabalha as emoções com os utentes e por isso penso que os utentes se vão sentir mais confortáveis com a presença do psicólogo.

O Psicólogo demonstrou agrado na minha proposta. Em primeiro lugar definimos quem serão os utentes que farão parte do meu objecto de estudo. Concluímos que iriam participar 4 utentes, a Erica, a Maria, o Renato e o Carlos. Na tomada de decisão tivemos em conta a idade, o grau de deficiência mental, as características comunicacionais e o grau

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de aproximação que eu consegui estabelecer com todos os possíveis intervenientes. Estes foram os que mais interagiram comigo durante o meu período de observação participação. Assim este grupo de utentes constituiu-se como o meu objecto de estudo, em que todos têm mais de 45 anos, possuem deficiência mental moderada, frequentam o centro de actividades ocupacionais com actividades consideradas socialmente úteis e apresentam uma capacidade de comunicação considerada razoável para o objectivo que pretendemos atingir.

Acordámos que eu irei planificar a Dinâmica de Grupo mediante os objectivos do trabalho de investigação. Marquei apresentar ao psicólogo a minha proposta por escrito no dia 6 de Junho.

A Dinâmica de grupo ficou agendada para o dia 26 de Junho porque os utentes nas semanas anteriores vão para Albufeira para a colónia de Férias.

Associação…

1 de Junho de 2007 14h:00m às 15h

REUNIÃO COM O DIRECTOR O encontro com o director teve como objectivo, dar a conhecer o teor das

entrevistas; pedir a sua opinião sobre as mesmas e solicitar a sua colaboração na aproximação às famílias.

Apresentei ao director as minhas entrevistas e referi o grupo de utentes escolhidos para participar no meu estudo. Ele referiu que tinha sido uma boa escolha e que as entrevistas estavam muito bem. Referi que seriam bem aceites sugestões de reformulação mas ele não achou necessidade de reformular nenhuma questão. Combinámos quais dos profissionais da Associação iriam ser os participantes e combinámos uma estratégia de participação dos pais. Mostrei a minha disponibilidade para me deslocar a casa dos familiares a fim de realizar a entrevista, mas o Director achou que após a aceitação dos pais na participação neste trabalho, seria mais indicado solicitar aos pais para se deslocarem a Associação.

Durante a nossa conversa, entrou na sala a Presidente da Associação, que é mãe de um utente. O Director apresentou-me e eu apresentei o trabalho que me encontro a desenvolver. O director referiu que eu poderia realizar o pré-teste da entrevista à Presidente porque ela é mãe e funcionária, contudo reflectiu e achou que ela por desempenhar dois papeis, a de mãe e a de funcionária, poderia não conseguir colocar-se de forma neutra na entrevista.

A Presidente foi muito simpática comigo, e revelou-me verbalmente a sua disponibilidade para colaborar comigo.

Em seguida entrou a mãe do utente Carlos. O director apresentou-nos, explicou que ela pertence à direcção e que vai muitas vezes a Associação, pedindo assim a sua colaboração. Ela disponibilizou-se de imediato, contudo referiu não poder adiantar com uma data porque andava com alguns problemas de saúde.

Sentia-me um pouco a atrapalhar o trabalho, por isso tendo já resolvido os meus assuntos despedi-me e retirei-me.

Quando vinha a sair da sala do Director estava a Maria e a sua mãe à saída, aproximei-me e a mãe da Maria dirigiu-se para a sala do director. Cumprimentei a Maria, perguntei-lhe se ia para casa, ela disse: “sim, sexta, sábado e domingo, perguntei, vejo que vai fazer fim-de-semana grande!” Mas ela não me estava a dar muita atenção.

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Associação… 1 de Junho de 2007

15h:00m às 16h CENTRO DE ACTIVIDADES OCUPACIONAIS 1 O Victor estava à entrada, disse que ia ao dentista. Entrei na sala, disse boa tarde e vi vários montes de guardanapos dobrados em cima

da mesa e disse, “trabalharam muito hoje!” A Erica respondeu: Eu é que trabalhei! Disse-lhe: Sim Erica! Ela tinha um cartão rosa-choc na mão. Perguntei: que cartão é esse? A Erica puxou

a cadeira ao lado dela e pediu-me para me sentar, dizendo: “é o meu bilhete de identidade! Tenho que andar sempre com ele.” Pedi-lhe para me explicar o seu significado, pois era um cartão com vários desenhos correspondentes aos dados pessoais da Eriça, com o registo do nome idade e afins por baixo dos desenhos.

C.O.: Este cartão é um substituto do B.I., aparentemente foi realizado manualmente e serve para

prevenir uma eventual perca do verdadeiro. Apresenta uma versão simplificada com recurso ao desenho. Apesar da sua simplicidade serve como identificação da pessoa caso necessário.

Disse-me que daqui a uns dias ia de férias para Albufeira. Perguntei quando ao certo e se ainda podíamos conversar antes de ela ir de férias? Ela respondeu: “Hó mulher! È que eu vou já dia 18!, vou no dia antes dos meus anos, faço anos a 19”. Abraçou-se a mim e disse: “Gostava tanto que me telefonasse nesse dia.” Respondi-lhe: “Mesmo que eu não te telefone, prometo que me vou lembrar de ti”. Ela continuou a agarrar na minha mão e a colocá-la na sua cabeça para eu lhe dar carinho. Perguntei: “O que se passa Erica, estás muito triste hoje, queres contar-me?” Ela: “Evidentemente, estou aqui fechada à uma semana!” Eu: “O que quer dizer com isso?” Ela: “Hó mulher tive na moradia, já viu 5 dias na Associação de dia e de noite”. Eu: “Então a quase todos gostam de ficar na moradia e tu não gostas porquê? É por causa das tarefas?” Ela: “Ninguém pode gostar, Isto é de uma mulher dar em louca!” “Não, é que me sinto sufocada uma semana inteira sem ir passear”. Eu: “Hum estou a ver! Quando estás em casa costumas ir passear depois do jantar?” Ela: “Evidentemente, quase todos os dias vou dar uma volta, para arejar!

Ao mesmo tempo que íamos conversando ela continuava a solicitar o contacto físico entre nós. Pegava-me na mão e dava-me festas, abraçava-me, solicitava que eu a abraça-se e ao mesmo tempo ia pegando no cartão que tinha à sua frente.

E disse: “O pior é o que eu tenho para fazer depois das férias!” Perguntei porquê. Mostrou-se pensativa, e disse: “vou dar uma palestra!” Eu: “Sobre o quê?” “Sobre a Eternidade, ali na minha Igreja!” Perguntei-lhe o que é que ela ia falar em concreto? Mas ela não me quis dizer porque era surpresa e disse: “ Depois vê a cassete”. “Aiiiii, custa-me muito falar sobre estas coisas!” A verdade é que é a nossa última morada, todos lá vamos parar!”

C.O.: A Erica associa a Eternidade à morte e principalmente associa o tema à morte do pai, disse-lhe

que queria falar com ela sobre o envelhecimento ela rapidamente associou-o à morte e referiu que não gostava de falar sobre isso!

Ela estava emocionalmente triste, constantemente a pedir-me carinho, a agarrar-me

na mão, a colocar o meu braço por cima dos ombros dela e a tentar abraçar-me. Quando quis vir-me embora, não queria que eu viesse, disse que queria que eu volta-se na segunda-feira.

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Entretanto entrou na sala outro utente que possuía uma deficiência profunda. O seu pai veio buscá-lo, pude observar que já aparentava uma idade bastante avançada. Em seguida chegou o pai do Victor também vinha buscá-lo. Igualmente ao outro pai, os sinais visíveis do envelhecimento já se faziam notar.

Despedi-me e desejei boas férias a todos.

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Apêndice 2 Titulo: Guião de Entrevista Exploratória

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Guião da entrevista exploratória

Tendo em conta a pergunta de partida “Quais são as respostas sociais e/ou familiares que promovem bem-estar no processo de envelhecimento da pessoa com deficiência mental?” responda às seguintes perguntas:

� Qual a noção que tem de pessoa portadora de Deficiência Mental?

� Qual a noção que tem de pessoa idosa?

� O que é para si um indivíduo com Deficiência Mental e já com idade avançada?

� Na sua perspectiva quais são os problemas que o indivíduo portador de Deficiência Mental com idade avançada enfrenta actualmente?

� Que tipos de apoio carecem estas pessoas?

� E quais são as principais necessidades destes indivíduos?

� Tem uma ideia de quais são os motivos que levam a família ou a pessoa com deficiência mental a procurar apoio nas instituições?

� Que medidas de política social existem para apoiar estas pessoas?

� Será que essas medidas de política social atendem o indivíduo portador de deficiência mental que envelhece? (análise critica dessas medidas)

� Sabe quais são as respostas sociais que existem destinadas a esta população, mesmo ao nível residencial e de acompanhamento?

� Quais lhe parecem ser os objectivos das instituições que apoiam esta franja populacional?

� Qual será o destino da população que está na instituição? (perguntar a quem for pertinente)

� Qual o referencial teórico que orienta a sua prática?

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Apêndice 3 Titulo: Transcrição das Entrevistas Exploratórias

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Entrevista exploratória 1 (Director de instituição de apoio a pessoas com deficiência mental)64

Eu: Antes de mais nada, como o Dr. António Martins já conhece, o meu trabalho insere-se no âmbito do Mestrado em Serviço Social, sobre o tema “Respostas Sociais para o bem-estar do indivíduo adulto portador de Deficiência Mental no seu processo de envelhecimento”. Os objectivos principais deste trabalho vão de encontro a um aprofundamento sobre esta temática e preferencialmente conhecer quais são as respostas sociais mais eficazes para a promoção de bem-estar e na resposta específica às suas necessidades também específicas, sempre com um objectivo principal que é planificar e melhorar a qualidade das respostas destinadas a este grupo populacional. Tendo em conta o tema e uma pergunta de partida, sob a qual eu me estou a basear, que é “Quais são as respostas sociais, institucionais e/ou familiares que promovem bem-estar no processo de envelhecimento da pessoa com deficiência mental?” pedia-lhe que reflectisse um pouco comigo sobre estas temáticas, começando talvez por lhe perguntar o que é que é para si, ou o que é que acha que é uma pessoa com deficiência mental? Dr. António Martins: Ora muito bem dito, o que é uma pessoa com deficiência mental, vamos lá ver para mim uma pessoa com deficiência mental trata-se de um ser humano como qualquer outro que tem algumas dificuldades no âmbito do seu comportamento adaptativo e que advêm das dificuldades intelectuais que obviamente tem a ver com aspectos ideológicos dos mais diversos que acontecem no período de desenvolvimento normalmente pois para como patamar o período de desenvolvimento dos 18 anos, mas do ponto de vista visível e funcional aquilo que é mais visível é que têm dificuldades no seu comportamento adaptativo, ao nível social, ao nível da sua vida pessoal, ao nível da sua vida familiar, ao nível da integração profissional, do ponto de vista cognitivo ou aos mais diferentes níveis de desenvolvimento a que estas pessoas estão sujeitas para cumprimento do que são expectativas da sociedade ao longo de toda a sua vida. Tanto que eu sublinho muito este aspecto funcional e do comportamento adaptativo que segundo aquilo que é a orientação e ali mais digamos actual que advém da Associação Americana para o Estudo da Deficiência Mental, tendo em conta sempre também que esse comportamento adaptativo e as dificuldades que daí advêm têm muito a ver com os contextos, os meios em que as pessoas se integram, maior ou menor em função da capacidade do meio também se adaptar à deficiência destas pessoas. Eu: Tendo em conta que este trabalho vai ligar a pessoa com deficiência e a pessoa idosa, perguntava-lhe agora o que é que é para si uma pessoa idosa, visto que já me deu a sua opinião sobre a pessoa com deficiência mental? Dr. António Martins: A pessoa idosa tem elementos que são inexoráveis e que estão presentes que têm a ver com a idade, obviamente o nível etário, mas depois a sua tradução do ponto de vista sintomatológico ao nível físico psicológico, mental, obviamente, mais geral e …pronto, e depois tudo aquilo que são também a sua tradução do ponto de vista social, as características sociais, perdas dos seus papeis dos seus estatutos que desempenhou ao longo da vida e portanto que pouco a pouco perde. Há o processo evolutivo e o involutivo e portanto o processo de envelhecimento é algo que ocorre ao

64 Psicólogo, Director da Associação em estudo. Participou em conferências e encontros sobre a temática. Autor de artigos apresentados na Revista da Associação, sobre o tema do envelhecimento da pessoa deficiente mental.

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longo do desenvolvimento mas que é mais notório, e naturalmente, associado a esse processo de involução da curva descendente e portanto têm depois todas essas traduções físicas psicológicas, sociais, mentais etc. que nós todos conhecemos. Eu: E então se juntarmos as características da pessoa com deficiência mental e as características relativas ao envelhecimento de uma “pessoa qualquer”, como é que poderia ser uma pessoa com deficiência mental em processo de envelhecimento, ou com uma idade já avançada? Dr. António Martins: Trata-se de um quadro bastante idêntico do ponto de vista físico, eu direi logo que a nível físico não há grandes diferenças a não ser em algumas patologias que ocorrem designadamente no Síndrome de Down devido às malformações congénitas que determinam logo à partida uma esperança de vida pelo menos tradicionalmente menor, apesar de neste momento ter havido um salto qualitativo e quantitativo do ponto de vista da longevidade destas pessoas e a esperança de vida continua a ter repercussões do ponto de vista da esperança de vida. Portanto a nível físico eu diria que as pessoas com deficiência mental em geral com excepção de alguns síndromes têm do ponto de vista físico um desenvolvimento dito normalizado, isto é dentro daquilo que são as bitolas da nossa sociedade, desenvolve e crescem do ponto de vista biológico e físico e têm o mesmo processo de involução de regressão do ponto de vista físico como qualquer outra pessoa na generalidade. Depois já não acontece a mesma coisa do ponto de vista psicológico e mental, das faculdades mentais, portanto não há duvida nenhuma que estas pessoas pelas contingências a eles associadas e devido às dificuldades que têm do ponto de vista intelectual, cresceram menos, digamos assim do ponto de vista mental, a nível psicológico, também a nível social não desempenharam os papéis que, ou muitos deles não conseguiram ascender aos mesmos papeis aos mesmos estatutos que outras pessoas têm, daí que digamos que as perdas são menos notórias, perdas do ponto de vista visível e social também percebidas por si e pelos outros, porquê? Porque quanto mais se sobe maior é a queda e portanto eles subiram muito pouco e a queda é muito pequenina, temos aqui pessoas que têm 50, 54(5) anos em que não há e não verifico qualquer perda do ponto de vista mental, porquê, porque eles tiveram num patamar tão baixo do ponto de vista do seu desenvolvimento que permaneceram pelo nível sensório motor, por exemplo casos de deficiência profunda, portanto isto não é notório nestas pessoas, manter-se-ão os meninos que foram toda a vida até à morte. Noutros já é mais notório no caso das deficiências ligeiras, por exemplo, que actualmente temos ao nível do nosso Centro de Emprego Protegido ou integrados profissionalmente no mercado aberto de trabalho, aí começam a repercutir-se de forma mais visível, por exemplo, as suas percas do ponto de vista das suas faculdades intelectuais, elas já não eram muito altas mas começa a verificar-se que começam a perder faculdades, a capacidade por exemplo ao nível da atenção, de memória, também neles são notórios essas perdas como na população em geral, não tão notórios porque eles também não foram muito dotados digamos assim do ponto de vista destas faculdades. Do ponto de vista social, a mesma coisa, porquê? Porque grande parte deles, os estatutos que eles tiveram, ao nível por exemplo do nosso Centro de Actividades Ocupacionais que caracteriza a maior parte da nossa população, esses aí por exemplo, nunca desempenharam uma função profissional, portanto a perda de estatuto que advém das reformas, etc... também não são visíveis para eles nem para os outros, nem é percepcionado por eles, portanto, digamos que são privilegiados. Esta população é privilegiada porque de facto não há tantos custos nem tantas perdas, tantos lutos sociais e a outros níveis de faculdades e a noção de que estão a perder capacidades como na população em geral, ou seja é algo que caracteriza positivamente esta população. Têm

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outros problemas, outros handicaps, eles que durante parte da vida foram pessoas dependentes, continuarão ou acentuar-se-ão essa dependência à medida que vão perdendo as suas faculdades, nomeadamente do ponto de vista físico, que muitos deles conseguiram ter uma certa autonomia, locomoverem-se, ganharem a sua autonomia social, autonomamente, é evidente que as dependências que até ali houve por motivações, em relação das suas dificuldades intelectuais, agora também se acentuam no domínio da autonomia a estes níveis. Portanto as limitações são visíveis e as dependências são maiores de terceiros. Se ao longo da vida se tratou de uma grande parte deles terem uma vida suportada por terceiras pessoas, a família em primeiro lugar, instituições, depois em suporte à família e a ele próprio, no final da vida maiores fragilidades existem, motivado por fragilização progressiva das estruturas familiares, os pais que partem porque envelhecem, como a lei natural da vida, estas pessoas ficam mais desprotegidas, por outro lado colocam-se aqui questões do ponto vista legal, do ponto de vista da representatividade, do suporte das pessoas após os pilares fundamentais que são as figuras familiares, portanto outras especificidades existem em torno desta população comparativamente com a generalidade da população, que em alguns casos também atingem níveis de incapacitação que obriga que haja de facto depois um apoio maior e até terceiras pessoas para os representarem porque ficam em quadros psicológicos e demenciais que por exemplo não são capazes de ter uma auto-representação, sendo que à partida, e aliás o que prevê a lei é que após atingirem a maioridade sejam sempre representados, a maioria, representados por terceiras pessoas seja numa interdição total seja através da figura de inabilitação em áreas especificas. Eu: O que é que lhe parece, que tipo de apoios é que estas pessoas quando chegarem a uma idade mais avançada vão necessitar, quer dizer, quando eu digo isto, digo todo o tipo de apoios, fazendo um paralelismo entre as suas necessidades e o apoio que poderão requerer para responder a todas estas necessidades? Dr. António Martins: Em meu entender a especificidade da população com Deficiência Mental, em muitas situações, não se compadece com uma inserção ou inclusão em repostas normalizadas e tradicionais para as pessoas idosas em geral. Digo sobretudo os casos com deficiência grave e profunda de maneira nenhuma em meu entender as nossas estruturas de suporte sejam lares residenciais em geral, naturalmente, lares residenciais, serviços de apoio domiciliário seja também os centros de dia ou outro tipo de respostas ou valências nesse âmbito, não têm capacidade de responder à especificidade das necessidades desta população mais dependentes, estou a falar das pessoas com nível de deficiência grave e profunda. Os níveis de deficiência moderado e ligeiro aí, do meu ponto de vista, havia que progressivamente fazer todo um trabalho junto da segurança social se calhar em primeiro lugar a passar depois pelas diferentes instituições e entidades que têm respostas a este domínio no sentido de as sensibilizar para também a este nível e no final da vida, poderem incluir estas pessoas com necessidades especificas, é certo, mas são tão graves como outros casos de nível de deficiência mais receptual, e que depois exige todo um trabalho em torno das pessoas idosas em geral para que haja uma aceitação destas diferenças também, porque também eles nessa altura serão e continuaram a ser diferentes digamos na tradução dos seus comportamentos etc. relativamente às outras pessoas. E portanto a aceitação passa bastante por isso, passa pela segurança social, passa pelas entidades que têm as suas respostas, passa pela população que irá conviver, eventualmente, com estas pessoas incluídas, no meu ponto de vista, na medida do possível devíamos trabalhar no sentido da inclusão também neste final de vida.

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Agora esta realidade não existe e portanto, qual é a realidade actual? e nos termos mais próximos sem duvida nenhuma, são as instituições vocacionadas já ao longo da vida para apoiar estas pessoas, na idade jovem adulta através dos centros de actividades ocupacionais, centro de emprego protegido e outras respostas que também no final da vida, e estão neste momento já a preparar-se para responder às especificidades que advém nesta população do seu processo de envelhecimento, e portanto estou convencido, e a Associação em concreto está a preparar-se para responder às necessidades das pessoas com deficiência grave e profunda das pessoas com nível de deficiência moderado e também aqueles que têm nível de deficiência mais ligeira. Será a resposta ideal? Eu diria que não, o desejável era também que partíssemos para o trabalho de inclusão na reposta mais normalizada possível. A família, dizia eu à pouco, é um elemento para nós imprescindível, que continue a ter o papel de apoio a estas pessoas até ao final da vida, seja os pais se existirem, muitos na maior parte dos casos já não existem nos processo de envelhecimento do seus filhos, já não assistem a essa fase, mas sobretudo através dos tutores, e portanto os tutores do nosso ponto de vista não devem de maneira nenhuma demitirem-se do papel de suporte social, afectivo presencial, directo não devem ser meras figuras de gestão patrimonial daquilo que são os bens do seu tutelado, mas devem ser figuras presentes efectivas no apoio a estas pessoas tuteladas por eles, e portanto a nossa filosofia, à semelhança com daquilo que acontece actualmente com as famílias, vai no sentido de continuar a valorizar imenso o seu papel (...) A motivação dos pais, das famílias tem muito a ver com a preocupação com o futuro e com o envelhecimento dos filhos, com o seu próprio envelhecimento dos pais que é um processo também para eles extremamente doloroso do ponto de vista psicológico verem-se progressivamente a ficar sem capacidade de uma resposta e a terem obrigatoriamente de .... pois a instituição vir a substitui-los em vida ainda e isso sem dúvida nenhuma que é uma das preocupações. Nós assistimos em muitas situações ao envelhecimento dos pais e ao envelhecimento dos filhos em simultâneo, aliás como sabe há um processo de envelhecimento mais precoce da parte da maioria destas pessoas sobretudo em alguns síndromes, nesse sentido pois as próprias famílias muitas vezes, para além de serem os filhos precisarem de apoio também elas próprias pedem muito apoio. Nós por exemplo, uma das preocupações da instituição actualmente é criar uma resposta também para o apoio às famílias aos pais designadamente que vão ficando progressivamente incapacitados e que a grande preocupação é “o que será de mim quando ficar se eventualmente ficar completamente incapacitado em vida, eventualmente ir para um lar não sei aonde e o meu filho ficar aqui na Associação e em vida ver esta roptura, e nesse sentido a Associação, por exemplo está a preparar uma resposta de lar residencial também para a terceira idade, no sentido de que em vida não haja este sofrimento, mais um sofrimento destes pais e mantê-los o mais possível próximos uns dos outros. Eu: Eu vou pedir-lhe imensa desculpa para me fazer um resumo muito breve, para eu não perder tudo, eu penso que a parte que se perdeu foi relativa às principais necessidades e principais respostas que uma instituição poderá dar a uma pessoa com deficiência mental que envelhece. Dr. António Martins: Pronto, não há duvida nenhuma que nos parece que muitas destas pessoas com o processo de envelhecimento vão ter uma necessidade muito maior e de maior suporte da parte da instituição do ponto de vista físico, no sentido de preservar o seu bem-estar físico portanto maiores níveis de cuidados da medicina e da enfermagem haverá

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seguramente também uma maior necessidade da parte da instituição de um apoio em muitas as situações dadas as fragilidades que existem da parte das famílias também de se substituir à família no sentido de muitas vezes também desempenhar a função de tutor e daí responsabilizar-se pela gestão patrimonial e por aquilo que é o papel actual das famílias no apoio social na sua inserção social, etc... nós por exemplo temos previsto haja respostas diferenciadas para aqueles que têm tutores a quem incumbe ainda a responsabilidade desse suporte pois de gestão patrimonial mas também de suporte social afectivo familiar etc. e aqueles que fiquem directamente tutelados pela instituição temos previsto que tenham também algo parecido no sentido de que eles não tenham uma vida exclusivamente institucional, nós por exemplo o que prevemos criar em torno destas pessoas que ficarem directamente tuteladas pela instituição é uma direcção de tutorias ou uma direcção de tutelas em que iremos procurar agregar a ela uma figura que por exemplo já em Espanha existe e está em torno das fundações tutelares que é o Delegado tutelar, o Delegado tutelar é um voluntário que se interessa por determinada pessoa que está diariamente tutelada pela fundação ou pela instituição neste caso e que desempenhará o papel de suporte familiar afectivo que a instituição pelos recursos que têm não terá capacidades de o fazer, e portanto levá-lo-á a passear e ao cinema como qualquer outra pessoa familiar ou tutor que possa a vir a desempenhar essa função, levá-lo-á eventualmente nas férias se houver uma relação afectiva, e também se houver da parte da instituição confiança para o efeito porque a responsabilidade será sempre da instituição, não há dúvida nenhuma que depois de lhe ser confiada a tutela levá-lo-á por exemplo nos anos no natal etc... é sempre importante para que as pessoas não vivam única e exclusivamente na instituição. Entendemos que a família tutor que fica como ainda que tenha uma certa autonomia mas que fica como reserva e substituição dos pais que partem, nunca terão a mesma capacidade de resposta que a família original e portanto a instituição nessa altura terá um papel muito mais forte do que actualmente o têm os pais mas quereríamos sempre preservar que haja este duplo recurso de apoio a estas pessoas, a família tutor no exterior e a instituição. Eu: Quais são as principais medidas políticas para dar a esta população. Será que existem ou será que ainda não existem. Quer dizer de conhecimento pessoal, eu sei que existem para a pessoa com deficiência e para a pessoa idosa em separado, mas será que alguma contempla uma abertura? Dr. António Martins: Eu falei-lhe um bocadinho nessa dupla resposta aos idosos e às pessoas com deficiência, a necessidade de haver algum entrosamento numa filosofia de política inclusiva de respostas que me parece que seriam desejável para determinado tipo de população com deficiência que tenham uma capacidade também de inserção e inclusão quase acontece actualmente na educação, na vida profissional etc.. e portanto também na terceira idade será desejável apostar nisto. Agora as políticas a este nível, o que é que acontece? Pois continua ainda a haver uma separação muito grande entre aquilo que são repostas da área da deficiência, terceira idade, deficiência e os idosos separado de uma forma ainda muito dicotómica e em separado. Portanto e aquilo que acontece na área da deficiência em particular pois as instituições estão neste momento a dotar-se de recursos e de estruturas que possam responder a essa fase do envelhecimento e designadamente das respostas residenciais. Temos de em conjunto com a segurança social e com o poder político procurar que evoluam, as repostas, ou pelo menos os desenho das respostas conforme estão neste momento estruturados no âmbito da Segurança Social, eu digo isso e não me canso de dizer à Segurança Social que há uma rigidez, digamos assim, da parte da Segurança Social em ajustar na lei e do ponto de vista político as experiências que estão no terreno e se actualmente existem centros de

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actividade ocupacionais que têm uma determinada filosofia, vamos chamar a mesma coisa para aqueles que estão na terceira idade? Centros de actividades Ocupacionais, qual é e conforme está consignado na lei, qual a essência das actividades ocupacionais, é a ocupação! Nessa altura que as pessoas já estão mais dependentes faz sentido falar nisso? Não fará mais sentido falar num centro de dia, à semelhança daquilo que acontece, em que basicamente as actividades que são desenvolvidas são de origem lúdicas recreativas, de algumas actividades culturais etc... portanto a ocupação deixa de ser, digamos assim, o cerne dessa resposta, ou que deveria ser, dessa fase de envelhecimento. A área residencial tal e qual neste momento também está, haveria que do meu ponto de vista, evoluir porque continua a estar a figura do lar residencial enquanto resposta política e legislada ainda algo também muito fechado, com uma reposta digamos quase de dormitório, e ali estão durante o dia, porque tudo aquilo que está previsto em torno da residência é que haja serviços médicos e de enfermagem, que haja cuidados de higiene saúde e mais nada... e estas pessoas por ali ficam e mais nada a vegetar digamos assim.... Isto é aquilo que terão muitos deles, necessidade e terão necessidade de continuar a ter estímulos sociais culturais sensoriais a todos os níveis depois não está previsto que o lar residencial possa ser dotado de recursos que possa desenvolver este tipo de actividades tão importantes a esta população enquanto vivem. Portanto há que modificar essas respostas, mas actualmente politicamente e legislativamente, não há dúvida nenhuma que o que está mais consignado para estas pessoas em fase de envelhecimento é a resposta lar residencial. Eu: Já existe algum que seja especificamente destinado? Dr. António Martins: Só para pessoas idosas com deficiência mental não conheço, e do meu ponto de vista seria uma má prática se começássemos a segregar níveis etários também na área da deficiência, isto é quando falamos de lares residenciais deve do meu ponto de vista incluir todos os níveis etários e não apenas as pessoas idosas, eu vi por acaso uma experiência que me arrepiou em Sevilha que tinham apenas idosos era uma câmara da morte, pessoas altamente dependentes, que já o eram, mas depois com o processo de envelhecimento muito mais dependentes, por ali vegetavam velhinhos deambulando de um lado para o outro sem estímulos sem nada, e aquelas figuras exclusivamente daquela idade era algo que arrepiava. Eu: Portanto considera que a pessoa com deficiência mental a esse nível terá algumas diferenças da pessoa idosa? ou à semelhança das respostas que existem segregadas só para uma determinada idade? Dr. António Martins: Eu entendo que há toda a vantagem, isto é que não sejam as respostas de lar residencial criadas do ponto de vista da inserção só com pessoas pelo motivo de terem um nível etário já bastante avançado, conforme acontece na população em geral. Como a resposta residencial na área da deficiência por razões várias sobretudo e basicamente é esta a primeira razão, não terem uma estrutura familiar de suporte adequada e portanto, falta do pai e da mãe, estão desprotegidos há que criar uma resposta residencial sejam crianças, nós por acaso não estamos vocacionados para crianças, mas jovens por exemplo 17, 18 anos etc que começam a ter contingências várias da vida familiar que não tem um suporte adequado e portanto essas pessoas necessitam de um apoio residencial adequado, gente de 18, 19 anos devem conviver com pessoas de 50, 60, 70 anos. Eu: No fundo, parece-me que já me respondeu a quase a tudo aquilo que eu precisava saber, mas talvez ainda vá um bocadinho mais fundo, perguntando-lhe, qual será o destino

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destas pessoas que estão aqui agora, quer dizer temos algumas pessoas bastante jovens mas também há outras que já estão a atingir uma idade que para nós talvez seja o topo de uma carreira profissional, digamos sociedade no geral, mas se calhar para eles talvez já seja o caminhar para o fim de uma carreira profissional. Dr. António Martins: Agora temos, como sabe, umas pessoas que estão inseridas profissionalmente no mercado aberto de trabalho cujo as famílias e também elas aspiram a uma resposta na fase do envelhecimento de apoio residencial, havemos de ver se temos essa capacidade de resposta ou pelo menos se não a tivermos procuraremos depois apoiá-los no sentido de encontrarem uma resposta inclusiva, que é o que é desejável se eles forem capazes e tiverem características isto é se estiverem fisicamente e psicologicamente capazes para isso, temos outros que estão em emprego protegido em que neste momento interrogamos se também devemos apostar numa resposta inclusiva, e se calhar alguns vão nesse sentido, aliás algumas famílias que sabendo que a Associação tem neste momento e está a preparar o futuro desta população, na fase de pós-reforma, entenderam por bem nem se interessarem grandemente até ao momento, dado o sector residencial, porque entendem que o futuro do seu filho e o processo de envelhecimento pode passar por uma resposta inclusiva como qualquer outra, ou por o suporte familiar etc, portanto há alguns que a família por opção decidiram que “não se viver, vai para o centro de dia” “se tiver necessidade vai para um lar” em geral etc. Há outros que pelo contrário, também tem a ver com o percurso de vida que a pessoa teve, claro com certeza, de certa forma têm uma rede quer familiar quer de vizinhança, exactamente, e o nível de capacidades que eles têm actualmente, não havendo assim perdas adultas, faz prever que também o processo de envelhecimento não seja tão complicado como aqueles que têm um grau de dependência maior, portanto e nesse sentido, também não é tão problemático digamos assim, temos outros que ao nível de emprego protegido mesmo e alguns do centro de actividades ocupacionais que têm melhores competências que por exemplo aquilo que se aposta vai no sentido de virmos a criar estruturas residenciais disseminadas aqui pela comunidade o mais próximo possível onde possam exercer a sua autonomia e vida independente, e portanto, seja ainda durante o período activo da sua vida profissional em emprego protegido, ou até algum que esteja inserido no exterior, seja alguns do centro de actividades ocupacionais que também desenvolvam competências de autonomia e vida independente pretendemos vir a criar esses núcleos familiares inseridos na comunidade e mantê-los e geri-los sempre com supervisão da instituição naturalmente, mas com a maior autonomia e de forma mais integrada possível. Há aqueles que terão uma maior dependência e mesmo estes que estando inseridos já em estruturas residenciais na comunidade que venhamos a constatar o processo involutivo forte pois nós reservamos para esses as respostas residenciais que temos aqui no interior da instituição, e portanto constam actualmente 35 lugares onde digamos ficaram os casos com maior dependência e aqui serão assistidos do ponto de vista médico de enfermagem e de outros cuidados que careçam. Eu: Obrigado pela sua disponibilidade e informação!

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Entrevista exploratória 2 (Directora de lar residencial para pessoas com deficiência mental)65

Eu: Irmã Maria João, tendo em conta o tema e os objectivos do meu trabalho, baseio-me na seguinte pergunta de partida: Quais são as respostas sociais, institucionais e/ou familiares que promovem bem-estar no processo de envelhecimento da pessoa com deficiência mental?” Partindo de todo este contexto esta entrevista exploratória tem como objectivo pensar sobre estas questões, começando por lhe perguntar em primeiro lugar o que é para si uma pessoa com deficiência mental? Irmã MJ: Perguntou-me em primeiro lugar o que é que eu pensava o que era a deficiência mental? Para já eu considero que a deficiência é intelectual, não é portanto, porque para mim é o que é verdadeiramente a deficiência mental. Novamente devido às circunstâncias de vida das pessoas, que mais tarde juntamente com a deficiência mental vêm associar-se qualquer problemática da doença mental, dependendo da altura em que ela começa a revelar-se. Aquilo que me pedia, portanto para o bem – estar da pessoa com deficiência mental, eu quase que lhe digo que é necessário aquilo que é também necessário a qualquer pessoa dita normal sem qualquer deficiência, em relação ao envelhecimento ou em relação à vida adulta ou de criança, ou seja recriar de qualquer forma um ambiente o mais familiar possível e um ambiente familiar que tenha em conta não só ter de facto uma vida familiar boa e com atenção mas simultaneamente uma vida com o exterior portanto de relação com a sociedade normal, de contacto com juntas de freguesia diferentes associações, com a paróquia no caso das pessoas quererem integrarem-se, é um pouco isso que nós fazemos actualmente, com quase todas as pessoas, que é estarem integradas no seu trabalho e aí têm uma actividade laboral ou ainda estão em formação de acordo com a sua idade, após o trabalho nós fazemos com eles que têm esse défice intelectual, um apoio escolar, até aqui temos tido um ensino recorrente agora o ensino recorrente sofreu uma reforma o que vai ser uma exigência para nós portanto dado que aquilo que hoje se faz como substituto do ensino recorrente é bastante lento daquilo que se vê nesta hora, hora e meia duas horas conforme, porque eles só a partir das cinco seis é que começam a chegar a casa, às sete jantam, portanto o tempo é muito limitado, e começam a sair de casa às 6horas o que eu acho que de facto na formação é uma violência muito grande em relação às pessoas com deficiência intelectual. Portanto eu penso que há que dar em relação à pessoa com deficiência promover aquilo que me diz o melhor bem-estar, e o bem-estar passa de acordo com a faixa etária em que se encontra dar-lhe o mais semelhante ao que numa família a pessoa naquela fase etária tem. Sabendo que, uma grande parte deles, já não têm família, já não têm pais, os irmãos não se podem ocupar deles, outros foram retirados à família por alguma razão pelo tribunal, logo há que criar outro tipo de situações. Aqui nós tentamos, como lhe dizia criar uma situação de formação escolar pré profissional ou profissional em que simultaneamente tentamos encontrar outras actividades, ou em tempo de férias ou fins-de-semana prolongados, em que eles possam como toda a gente participar noutro tipo de actividades como por exemplo na praia no campo, no estrangeiro até com intercâmbios internacionais e simultaneamente ir acompanhando no campo da saúde através de apoios vindos da sociedade, cada um têm o seu médico de família que irá indicando o que é que aquela pessoa precisa para estar

65 Irmã Maria João Vieira Neves, da Congregação das Irmãs de Santa Doroteia, fundadora e directora da Associação “A Casa de Betânia” (IPSS de utilidade Pública e Superior Interesse Social, cuja finalidade é a integração familiar, social e profissional de jovens e adultos com deficiência intelectual).

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melhor na vida, portanto eu penso que é uma situação tão semelhante à de qualquer pessoa normal, que eu creio que é assim que se cresce na vida. O problema da deficiência mental na terceira idade ou já na velhice, é um problema que se começa a pôr a todas as instituições inclusivamente a nós temos por exemplo um caso de 54 anos, dois de 44, portanto são só três, à partida ainda não são casos de terceira idade, mas que nos quais nós notamos já um decréscimo das suas capacidades para isso nós preparámos, embora ainda não esteja em funcionamento, uma residência diferente com outro tipo de condições em que existam elevadores, dado que aqui as nossa pessoas têm uma mobilidade como qualquer outra não é, portanto o problema situa-se na sua mente e não no resto do seu corpo, ou no resto do seu corpo como qualquer pessoa normal, eles também têm essas problemáticas. Para promover do ponto de vista familiar daqueles… nós aqui somos residências não temos muito o problema de uma grande ligação à família para que lhes dêem resposta, eles já estão aqui porque a família não há-de dar resposta, então cabe-nos a nós criar essas condições, e para criar essas condições eu não vejo outra forma do que a mesma instituição criar residências próprias, que exijam outro tipo de actividades ocupacionais de saídas como se faz num lar de terceira idade se ele de facto estiver bem organizado. Só que devemos saber que aquelas pessoas de terceira idade têm deficiência mental, portanto irão com certeza desenvolver outro tipo de problemas para os quais nós que já os conhecemos desde o inicio devemos estar mais preparados do que se eles entrarem num lar de terceira idade normal, portanto eu penso que onde igualmente pessoas sem deficiência vivem e estão com eles, que é esse o nosso objectivo, não apenas pessoas que vêm cá trabalhar há de facto técnicos e pessoas que os acompanham dentro da instituição, (de forma a criar um ambiente) mas pessoas que vivem e que dormem com eles que estão não rotativamente com eles mas que vivem e os conhecem desde o princípio. Esta é de facto uma dificuldade que temos mas que nós temos tentado superar, se vamos conseguir superá-la ou se tem que entrar noutra via é reposta à qual não lhe posso dar. Estamos a tentar superá-la, tínhamos um projecto para o Algueirão, portanto que era a construção de raiz de uma residência, não para muita gente, mas para 12 / 14 pessoas no máximo e tendo simultaneamente uma área para actividades ocupacionais, onde estariam os residentes e mais, portanto poderiam ser cerca de 30 que poderiam estar nessas actividades ocupacionais ou mesmo preparatórias para entrarem numa actividade de formação posteriormente, podendo depois serem integrados se forem daquela zona numa outra residência nossa no caso da família não se situar na zona e ser um ambiente mais jovem. Eu: Queria perguntar-lhe, por me ter falado ainda à pouco que já têm dois utentes que talvez ainda não tivessem entrado na idade mais avançada dita envelhecimento, há alguns autores que defendem que a partir dos 50 anos algumas pessoas com deficiência mental já poderiam ser consideradas idosas, o que é que pensa sobre isso? Irmã MJ: O que eu penso sobre isso, isso é muito variável, portanto não há pelo menos, da experiência que temos aqui de facto aquele que tem 54 anos é uma rapaz com uma grande capacidade de mobilidade que ia a Lisboa ia ao trabalho pintava, eu penso que a partir de facto dos 50 anos ele largou a sua pintura deixou de ira até ao Alentejo onde ia sozinho e agora situa-se mais aqui em Queijas e volta e meia vai a casa do irmão que também neste momento vive em Queijas até à data não, mas foi por causa dele que tentou encontrar aqui um apartamento e gerimos as duas coisas, não é, os outros eu de facto noto um decréscimo nas suas capacidades, mas naturalmente qualquer um deles se falar com eles não vêem outra hipótese senão continuar aqui, penso eu, mas isso falando com eles poderá ver isso porque nunca lhes fiz essa pergunta. Até porque as nossas residências são

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para dar resposta a partir dos 16 anos até aos 40 anos, idade de entrada, mas para depois permanecerem aqui, a não ser que alguma coisa aconteça, mas não há a questão de que aos 60 têm que sair. Nós queremos é de facto encontrar outro espaço onde com acompanhamento de enfermagem médico mais continuado e tudo isso como essas pessoas precisam e onde é difícil viverem pessoas de 60 anos juntamente com as de 20 penso que ter um é como ter um avozinho mas ter vários já é diferente, portanto, eu tenho experiência de uma instituição em Barcelona onde estive durante um tempo onde haviam utentes já com 70 e tal anos e que estava bastante debilitado e ele era querido entre todos e todos colaboravam com ele, eu penso que se não forem muitos que isso é possível estarem no mesmo local mas se forem muitos já não, não penso que é benéfico nem para eles nem portanto aqui no nosso caso as condições das próprias casas não é porque aquele andava em cadeira de rodas e as nossas casas de facto não têm condições para isso. Eu: Ia perguntar-lhe, apesar de já me ter referido que actualmente ainda não têm residentes de facto com características já de envelhecimento, o que é que possam ser as características de uma pessoa com deficiência mental e já com idade avançada, e quais serão os principais problemas que eles possam enfrentar. Irmã Mj: Neste momento quer dizer pela experiência que tenho eu penso que é a mesma coisa que acontece na sociedade, uma pessoa com deficiência mental, intelectual mas que entra numa fase de envelhecimento com Alzaimer, Parkinson, tem que ter um tratamento adequado a essa doença, normalmente é o que deve acontecer, qualquer pessoa muito idosa, como há tantos com 80 anos e que são uns bons avozinhos com quem os outros todos gostam de estar, portanto terão um tratamento. Portanto eu acho que a mesma coisa que se põe quando eles têm 18 ou 19 anos em que o tratamento é tão individualizado porque cada um têm a mesma problemática, justo a mesma coisa vai acontecer quando eles tirem uma idade mais avançada e portanto como se habituaram é como uma pessoa de terceira idade, no fundo ela não deveria ser retirada da família e eles quer estejam nesta residência quer estejam em qualquer outra das nossas residências eles não sentem que estão em residências diferentes podem escolher ou podemos ser nós a escolher um local diferente por causa do grupo que não se entende tão bem, nesta idade, não é, mas não por outra razão qualquer, eu espero que estas pessoas, até porque muitos deles, temos agora o caso da Inês que será uma que poderá até entrar, porque ela está a trabalhar num lar com irmãs de terceira idade, umas em cadeiras de rodas outras não, mas portanto ela está lá feliz, portanto como é que nós podemos preparar estas pessoas para um dia mais tarde quando um envelhece e a gente vê isso que eles têm um bom acolhimento se forem orientados, em relação aqueles que já são como eles dizem um pouco mais chatinhos, porque já têm os 40 anos, e que dizem sempre a mesma coisa e perguntam a mesma coisa muitas vezes. Eu: Penso que também talvez já tenha respondido a esta pergunta, um pouco aqui e ali, mas assim nomeando, podendo dizer que se tivesse que nomear, que tipo de apoios considera serem mais necessários na fase avançada da pessoa com deficiência mental? Irmã Mj: Cada um pode precisar de uma apoio diferente, mas em primeiro lugar temos que ter condições para que se a pessoa já não consiga cuidar da sua higiene, se é preciso tratar-se portanto tudo isto obriga a uma modificação das condições da casa ou levá-la para uma outra casa que pertença à mesma instituição, eu não penso que isso seja ir colocá-la num lar de terceira idade, a não ser que a pessoa tenha uma doença em que já não tem consciência da sua problemática então o que importa é que seja bem tratada e então poderá

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entrar num lar de terceira idade q2ue trata daquele tipo de doença, porque eu acho que é um tratamento como para qualquer outra pessoa, na nossa perspectiva é esse, embora tentamos que deixam de ter a mesma mobilidade, portanto se é uma casa para subir escadas, com certeza temos que encontrar uma casa onde isso não aconteça, aliás nós temos a residência de Carnaxide que dá para 5 pessoas e que é nos rés do chão portanto onde não há de facto falta de acessibilidade, a não ser também em cadeira de rodas já não é acessível, mas quer dizer, para poder tratar de uma pessoa com mais idade é uma casa indicada para isso. Outra, de futuro, eu penso que nós temos muito que preparar esse futuro! Eu acho que é uma casa para pessoas, como temos estas quatro que nasceram e as pessoas que estavam aqui foram para outra, quer dizer como é que podemos progressivamente começar a pôr num local pessoas que até pode ter também mais jovens, mas onde têm os demais idade, onde tem um acompanhamento de enfermagem diferente. Eu: A casa de Betânia é essencialmente uma casa que dá apoio a pessoas com deficiência mental em várias idades e gostava de saber qual o seu parecer, ou o que é que pensa que leva a pessoa com deficiência ou a sua família a procurar uma instituição deste género? Já me disse à pouco que por vezes podem ser retirados às famílias pelo tribunal, mas fora esses casos em que de certa forma são obrigados a ser institucionalizados, que outro tipo de causas podem levar uma família a entregar o seu filho a uma instituição? Irmã MJ: Só temos um caso que eu veja, agora de repente, de alguém que tenha pais, pais muito idosos e que portanto os irmãos não podendo tomar conta dessa jovem, procuraram que ela estivesse aqui, mas ela continua a ir aos fins-de-semana ver os pais, mas os pais já não têm condições para estar a tomar conta dela. Temos uma outra que também tem mãe, mas a mãe está num lar de terceira idade, portanto os familiares já a puseram aqui desde que ela deixou a mãe, portanto os familiares recorrem à casa de Betânia precisamente quando já não podem dar resposta eles, precisamente porque nós atendendemos as pessoas 24 horas por dia e 365 dias por ano, a maioria dos lares residenciais para pessoas com deficiência fecham durante um mês, não quer dizer que, temos alguns que fecham durante o ano, mas há outros que somos nós que nos ocupamos, a estrutura da Casa de Betânia é sobretudo para pessoas que não têm família que os possa apoiar ou que já não exista família ou que tenham sido retirados à família. Mas a maior parte, a excepção que existe é apenas uma porque a outra nem se pode considerar dado que a mãe está num lar de terceira idade, e a sobrinha é que é responsável dela, é uma sobrinha que é responsável porque não podia ficar com ela de nenhuma maneira e lá soube da nossa existência. O outro caso que é de facto uma jovem sem pai e mãe que está uma senhora completamente diferente desde que cá está, porque já nem tem capacidades nem domina porque ela em casa é que mandava em todos, ela precisava de facto de um local em que cuidassem dela. Eu: Perguntava-lhe agora, ao nível das políticas sociais que existem, se tem conhecimento de que políticas sociais existem ou se existem algumas políticas específicas relativamente à questão do envelhecimento das pessoas com deficiência? Irmã MJ: Não conheço nada, acho que o nosso país, não está preparado para isso e penso também que são as próprias instituições que estão a pensar nisso, não é a política. Relativamente à política acabou de sair recentemente, em Maio passado o documento que faz a legislação relativamente aos Lares para as pessoas com deficiência, portanto até aqui não existia, só desde Maio 2006, existe uma legislação, que nem sequer contempla os diferentes tipos de deficiência, que são muito diferentes uns dos outros, a pessoa com deficiência mental é muito diferente por exemplo de uma pessoa em cadeira de rodas, a

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legislação é para qualquer tipo de deficiência, eu acho que aí à que adaptar ou dar condições para que a segurança social verifique se as residências estão adaptadas às pessoas e às suas realidades concretas, claro! com distinções do tipo de deficiência. Eu: Eu fiz uma procura, tendo em conta as respostas que a sociedade têm para a pessoa com deficiência, e tive muita dificuldade em encontrar qualquer reposta especifica para a pessoa deficiente envelhecida, encontrei sempre separadamente, ou seja para a pessoa idosa no global, mesmo que essa população, algumas delas tenham adquirido deficiências entretanto, ou então para a população com deficiência no global também, verificando que as respostas existentes, quase nunca contemplam a questão do envelhecimento, no que diz respeito às pessoas com deficiência, quase sempre são centros de actividades ocupacionais dirigidos normalmente a jovens dos 16 aos 40, portanto …. Daí a minha questão! Irmã MJ: Eu por um lado compreendo essa atitude, porque acho que uma pessoa com deficiência intelectual mas que está na sua família e se aos 50 e tal anos começa a ter marcas que precisa de apoio de um lar para pessoas de terceira idade, eu acho que ele estará melhor, porque nunca viveu em instituição, num lar de terceira idade onde se encontra com outras pessoas não é tão grande o choque para ele. Portanto eu penso que isso é possível, mas há casos em que isso não é possível, eu penso que esse problema se começa a por nas instituições, portanto pessoas que sempre viveram em instituições para pessoas com deficiência mental, temos que pensar neles porque eles podem viver mais do que nós, como é que nós vamos fazer, porque eles de facto não têm família, e aqueles que hoje têm amanhã podem não ter, portanto temos que pensar também nisso. Conto-lhe o caso de uma jovem que aqui temos, com Trissomia 21 e tem a mãe num lar de terceira idade, mas a mãe já não podia fazer nada por ela, por isso é necessário encontrar uma resposta. Eu acho que as respostas têm que ser muito viradas para as situações, nós devíamos ter a nível da nossa política social uma organização que tenta-se nas pessoas em concreto perceber quais são as instituições adaptadas a estas pessoas? Muitas das vezes o que importa é arranjar um lugar e não ver se o lugar se adopta aquela pessoa, nós temos tido várias dificuldades na integração de alguns jovens porque eles não têm características dos jovens com deficiência intelectual, tiveram foi dificuldades a na sua vida, uma família disfuncional, jovens com problemas de outro tipo por isso é que não estudaram e não sabem ler, não porque não tiveram capacidade mas porque andaram…. Não se integram nestes lares não é porque não são adequadas às situações das pessoas que a sociedade vai criando, no fundo, porque dantes nós não tínhamos determinados problemas… Eu: A verdade é que as condições de saúde melhoraram muito, e uma das principais causas que encontrei na pesquisa bibliográfica que tenho feito, foi mesmo isso, que é pelo facto de haver uma maior preocupação com a saúde das pessoas com deficiência intelectual, também essas vivem mais tempo, porque se tem muito mais cuidado com isso (claro), talvez se há 50 anos atrás também se tivesse cuidado com isso talvez se calhar já hoje em dia tínhamos muitas pessoas com 90 anos (sim), acontece que há 50 anos atrás ninguém se preocupava muito com isso, as pessoas não iam tanto ao médico como vão agora. Irmã MJ: Nós próprios morríamos mais cedo. E com as pessoas com deficiência mental está a acontecer o mesmo eles vão chegar perfeitamente aos 60 anos ou mais.

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Eu: Sabe se existe ou conhece alguma resposta ou seja que já um lar, especificamente ou uma resposta residencial ou qualquer outro tipo de resposta já instituída em Portugal com essas características? Eu sei que existe em França, sei que existe noutros países, mas em Portugal! Irmã MJ: Eu também desconheço completamente, mas gostava que de conhecer e gostava de saber que existe. Eu acho que aí cabe ao estado ajudar as organizações que têm pessoas com deficiência intelectual criarem uma resposta para essas suas pessoas, a segurança social, também tem lá as suas respostas…. Eu: Eu penso que já me respondeu a muitas curiosidades que eu tinha sobre o tema, no fundo, e por fim, ia pedir-lhe que me deixa-se uma reflexão sua sobre o destino desta população, ou seja qual poderá ser o destino destas pessoas que estão aqui a viver e se calhar nunca pensaram que vão chegar a “velhos” (porque de facto nos também nunca pensamos sobre isso)! Irmã MJ: Em primeiro lugar aqueles que são mais velhos que já têm 40 e tal anos e manifestam algumas marcas de um maior envelhecimento, esses não pensam que estão velhos, eles são sempre jovens, os números não contam muito para eles, eles ficam de facto muito espantados quando se diz, eles a mim dizem que eu não estou velha e eu já tenho 54 anos, e de facto eu já estou a entrar no que se chama a terceira idade apesar de já estar aposentada da escola. Mas portanto eles têm uma visão diferente, eu penso que cabe-nos a nós também termos essa visão diferente, que nós enquanto vivemos de facto somos seres vivos, temos sempre capacidades, aliás é a ideia que nós lhes incutimos desde o principio, que de facto não têm muitas capacidades intelectuais, por vezes não têm tantas, mas têm outras que por vezes as pessoas não têm como por exemplo, eles faltarem ao trabalho para eles é uma dor, é um sofrimento, nós gostamos de vez em quando faltar um dia ao trabalho, para eles é um castigo portanto nós temos que ir descobrindo, vamos aprendendo com eles … outra realidade, que nós podemos ser úteis que podemos sempre fazer alguma coisa pelos outros, eu acho que quando eles chegarem a uma idade que já não podem estar integrados no meio laboral, têm que estar integrados nas residências mas com actividades ocupacionais, estas duas residências vão-nos permitir naturalmente criar alguma coisa para essas pessoas que necessitam apoio e portanto eu penso que se eles fizerem pequenos trabalhinhos, eu penso que eles irão encontrar e continuar com uma vida feliz como tiveram até agora, agora compete-nos a nós como o coração juntar as duas coisas para darmos as respostas que eles necessitam. Eu: Vou só terminar, fazendo-lhe uma pergunta um pouco mais pessoal, que é: enquanto profissional e também familiar, qual é a sua preocupação máxima, tendo em conta que estão ambos a caminhar para o envelhecimento? Irmã MJ: Sim, a minha preocupação com ele é praticamente a mesma da com os outros, daí que de facto foi ao criar juntamente com outras pessoas a Casa de Betânia, penso que a razão fundamental foi a existência do meu Manel, se o Manel não existisse naturalmente nunca me tinha passado pela cabeça qualquer coisa destas, eu penso que nós por vezes passamos por pequenas dificuldades, para sermos criativos nas respostas, a minha preocupação com ele pois penso que eu posso ir primeiro que ele, mas acredito que a associação e todas as pessoas que aqui trabalham, com mais capacidade até do que eu porque ele não gosta de se dar com a irmã, portanto lhe dar a resposta que ele necessita, até morrer. Eu: Obrigado irmã, pela sua atenção!

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Entrevista exploratória 3 (Médica psiquiatra do hospital Júlio de Matos)66

Entrevista realizada no Hospital de Dia do Hospital psiquiátrico Júlio de Matos, no dia 11 de Abril pelas 10h da manhã. Na sala estavam presentes três pessoas, eu, o Dr. Marco Gonçalves (médico psiquiatra) e a Dra. Paula Nunes a quem foi dirigida esta entrevista. Pela presença do Dr. Marco, considerou-se que a sua opinião sobre o assunto também poderia ser importante, sendo a determinado momento convidado a participar. Inicialmente explicou-se de forma breve o tema, os objectivos do trabalho, as motivações e dúvidas pessoais, apresentámos também a pergunta de partida que deverá ser orientadora desta entrevista. Eu: Em primeiro lugar, peço-lhe para reflectir um pouco sobre as questões que existem à volta do envelhecimento da pessoa com deficiência mental, e talvez, o que é para si, uma pessoa com deficiência mental. Dra. Paula Nunes: Uma pessoa com deficiência mental, pode ser de várias origens, quer cognitiva quer meramente afectiva, eu conheço pessoas com deficiência mental que são débeis funcionais, que não são débeis cognitivos, mas que de facto não conseguem ter uma vida dentro dos parâmetros normais e com autonomia que é exigida a cada idade e a pergunta era… estou a dizer que há vários tipos de deficiências mentais. Há algumas que são mesmo apenas funcionais. Eu: A pergunta era: o que é para si uma pessoa com deficiência mental? Dra. Paula Nunes: No fundo, é basicamente uma pessoa que não é capaz de cumprir as normas estabelecidas para a sua idade e para a sua cultura. É isso que é uma pessoa com deficiência mental. Eu: E, pensando agora na diferença entre o que é uma pessoa com deficiência mental e uma pessoa idosa? Dra. Paula Nunes: Uma pessoa idosa, sem deficiência mental consegue cumprir o papel que lhe está atribuída na sua cultura e dentro do seu grupo etário. Os avós são avós, e os avôs são avôs, conseguem ir buscar os netos à escola, conseguem apesar de tudo manter a sua autonomia, não vejo o paralelo aí, não. Entre o idoso e o deficiente mental não vejo o paralelo. O idoso tem o seu lugar e mantém, desde que saudável, mantém capacidade de cumprir o seu papel segundo as normas vigentes. Claro que, na Polinésia, se calhar é diferente. Não estou a dizer o contrário. Estou a dizer, em cada sítio… portanto, não é para mim sobreponível. Eu: E se pensarmos então, numa pessoa com deficiência mental, como a que me estava a descrever, mas já com um idade avançada? Os autores divergem, há quem diga que a pessoa com deficiência mental pode ser considerada já envelhecida a partir dos seus 50 anos, e há quem diga que não, que esse envelhecimento precoce não existe nas pessoas com deficiência mental.

66 Médica Psiquiatra e Psicanalista do Hospital Júlio de Matos, com larga experiência nas problemáticas das pessoas portadoras de deficiência mental em contexto hospitalar.

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Dra. Paula Nunes: Varia com a deficiência mental. Há deficiência mental, nomeadamente as de cariz genético, que inclusivamente têm um risco muito maior de Alzheimer que o resto da população, portanto, eu penso que a etiologia da deficiência mental aí é importante. Uma deficiência mental ligeira, já tenho visto aguentar-se sem grandes alterações até idades muito avançadas. Agora, de facto, há certos tipos de deficiência mental (o mongolóidismo é típico) em que de facto começa a haver doenças de pessoas idosas muito mais precocemente. É habitual isso. O que penso é que a etiologia da deficiência é importante. Outras não. Outras pessoas com outras etiologias mantém-se relativamente iguais a elas próprias a vida toda. Eu: O que é que pensa que serão os principais problemas de uma pessoa com deficiência mental que atinge já uma idade já avançada. A todos os níveis. Dra. Paula Nunes: Eu penso, pelo que sei, que acaba por ser cumulativo: são as dificuldades da deficiência mental, acumulado com a incapacidade de abotoar o botão da camisa, que não vem da deficiência mental, vem da idade. Portanto, o que eu tenho visto, e conheço muitos casos, um deficiente mental idoso é um deficiente mental, pode desenvolver patologias de envelhecimento, imaginemos que não, e depois acumula dificuldades de uma pessoa idosa: anda menos bem, começa a ter reumatismo… mesmo sem evolução da deterioração psíquica, precisa de mais apoio, a nível logístico, que um deficiente mental jovem, que pode manter mais autonomia, e mantém. Portanto, eu penso que é cumulativo. Não penso que haja um contínuo, nem nada disso. Conheço pessoas com deficiência mental que funcionam muito bem até determinada etapa, chega uma determinada idade e, sei lá, já não têm agilidade para vestir as calças sozinhos. Precisam que os ajudem a vestir e esse tipo de coisas. Que não vêm da deficiência mental, vêm da idade. Até aí vestiam-se sozinhos, mas chega uma altura e precisam de mais, de quê? De cuidados apropriados a idosos. Mais do que outra coisa qualquer. Estamos a falar de pessoas de debilidade mentais ligeiras, e não de debilidades mentais profundas, que são agitados. Eu: As suas principais necessidades são específicas da idade? Dra. Paula Nunes: São específicas à idade, por exemplo, eu trabalho num pavilhão de doentes crónicos, tenho cerca de 40 doentes, uns são débeis mais ligeiros, que colaboram nas tarefas da enfermaria, põem as mesas, ajudam a limpar o chão, ajudam a vestir outros doentes, fazem coisas simples, não estou a dizer que fazem coisas complicadas, mas pronto, chega a uma altura, as pessoas viveram lá a vida toda, quando têm 70 anos já não se podem pôr a lavar o chão nem a fazer as camas. Já não podem, por causa da idade, não é por causa da deficiência mental. A deficiência mental muitas vezes está lá estabilizada desde o início. Conheço vários casos assim. Eu: E, vocês aqui no hospital, também dão algum apoio à família, ou normalmente os casos de deficiência mental que têm apoiado ao longo da vida são casos que vêm através das instituições ou por eles próprios. Dra. Paula Nunes: Não, não… nós tentamos sempre dar apoio à família. Sempre que possível. Os casos mais antigos que cá estão já não têm família. Já nem sequer há qualquer contacto com a família, não se sabe o paradeiro nem se existe família. Sempre que existe, sim. Tenta-se fazer um trabalho com a família. Tenho aqui no pavilhão uma doente que

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tem uma deficiência mental ligeira, ainda é jovem, é a Francelina. Tentamos trabalhar com a mãe, com a família. Eu: Para mim, a questão da família é um pouco importante porque uma das principais realidades interligadas com o envelhecimento é que, tal e qual como nos acontece a nós, os nossos pais vão envelhecendo há medida que nós também vamos envelhecendo, e se nós duramos mais anos, os nossos pais vão durar certamente menos. E no caso da pessoa com deficiência mental, que muitas vezes possa ter sido apoiada toda uma vida, pela família, exaustivamente, quando a família deixa de existir, o que é que vai acontecer? Dra. Paula Nunes: O que vai acontecer é que a pessoa vai ser institucionalizada. É o que vai acontecer. Eu: E parece-lhe que essa seja a resposta mais adequada? Ou, ao nível das políticas sociais, o nosso país esteja preparado para responder às necessidades destas pessoas? Dra. Paula Nunes: É mesmo essa a única resposta que há. Poderia haver outras, penso eu. Poderia haver por ex., para debilidades ligeiras, residências protegidas, ou residências vigiadas, podia haver outro tipo de resposta para essas situações. Para já, cá, o que há é a institucionalização. Não há mais nada a funcionar cá. Não é que isso seja o mais adequado, as pessoas ficam separadas completamente do mundo, mas para doentes mentais começa agora a haver umas tentativas de residências integradas na comunidade, mas para debilidades mentais, por enquanto, não conheço outras medidas políticas. (A Dr.ª Paula refere-se ao seu conhecimento da realidade hospitalar) Eu: Pela pesquisa bibliográfica que eu fiz, as respostas actuais que existem actualmente dividem-se pelas pessoas idosas e pelas pessoas adultas portadoras de deficiência. No global, não falando só especificamente nas pessoas com deficiência mental. O que acontece é que segrega-se, e mesmo as instituições para pessoas com deficiência mental só agora é que estão a começar a pensar que pode existir o envelhecimento e que pode existir outra etapa e outro tipo de respostas. Dra. Paula Nunes: Eu não conheço respostas específicas para débeis idosos. O que conheço são algumas instituições, nomeadamente, as ordens religiosas que aceitam um débil idoso, aceitando a debilidade e as consequências da idade em simultâneo. Onde é que vê essa segregação? Eu: Eu referi-me relativamente às instituições que existem, por ex., da segurança social ou apoiadas por ela, em que, eles próprios quando fazem uma listagem das respostas que existem, por ex, dos hospitais, IPSS, dividem-nas automaticamente por respostas a pessoas idosas, no global, e a pessoas com deficiência, também no global. Dra. Paula Nunes: Sim, isso sim. E há outra coisa, de origem na sociedade civil implantada no terreno. As CERCI, a APPACDM, que fazem um excelente trabalho para crianças e adultos. Agora, o Ministério só apoia (risos…) Na prática, o que eu vejo, e apoiam, até certo ponto, até poderem… porque depois chega uma altura que não podem. E aí, a resposta continua a ser a mesma, que não conheço outra, é a institucionalização. Ou a tentativa de institucionalização. E se a segurança social sabe de outra olhe eu não dei por nada! (risos)

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Eu: E existem instituições para pessoas idosas, os lares de idosos os centros de dia (…) que nos seus estatutos têm uma cláusula dizendo que não aceitam pessoas com determinadas incapacidades! Dra. Paula Nunes: Muitas vezes isso acontece. Eu: Logo aí existe um factor de exclusão. Relativamente às respostas que já existem para pessoas adultas, na minha perspectiva, e gostava de saber a sua, não sei se terão as respostas mais indicadas para depois, a posteriori, porque se a pessoa passou 10 anos num centro de actividades ocupacionais ou num centro de emprego protegido, esse emprego vai terminar e chegando aos 55 ou que seja aos 65 anos, e a pessoa conseguir manter as suas capacidades de trabalho mais ou menos estáveis, vai chegar a uma fase em que vai ter que terminar aquela realidade, e que mudar. Se a própria instituição mantém a pessoa no mesmo local ou se deve criar novas respostas? Dra. Paula Nunes: Sim. Eu também conheço um sítio onde há isso, que são as ordens religiosas, que têm de facto também emprego protegido, a esse nível. Como esses doentes vivem lá, a questão não se põe. Quando eles deixam de trabalhar, continuam lá, não têm problemas. A Associação não sei como é que faz? Eu: Na Associação é diferente. As pessoas todas residem em casa, com a família, faz um trabalho permanente de apoio à família, dão o apoio por exemplo uma vez por mês, para a pessoa ficar no Elo e para a família poder descansar, mas é a família quem é responsável pelo utente e eles simplesmente passam o dia na instituição. Quer seja a trabalhar, quer seja no sector de actividades ocupacionais. Dra. Paula Nunes: E quando a família desaparecer! Eu: E quando a família desaparecer! Pela sua experiência, gostava que reflectisse um pouco sobre isso. Dra. Paula Nunes: Eu não acho que eles devessem ser institucionalizados: acho que deviam manter a socialização possível. O que eu digo é que eu não conheço onde isso aconteça. Não acho a institucionalização uma boa solução, mas não conheço outra, para já. Penso que deveria haver residências protegidas, residências vigiadas, onde as pessoas pudessem estar integradas num ambiente comunitário. Para já, não tenho é visto outra coisa. E é muito frequente ver-se isso. Eu: Eu penso que actualmente, as instituições estão, algumas delas, as IPSS estão de certa forma preocupadas com isso, e a tentar criar alguma resposta dirigida a essas pessoas, nem que seja de encaminhamento para a comunidade local, onde aquela pessoa reside, isto porque a realidade hospitalar é um pouco diferente, tendo em conta que foi a primeira resposta de apoio às pessoas com deficiência mental. Dra. Paula Nunes: Mas ainda não a criaram. Sabe o que é que a Misericórdia faz? Tenta institucionalizar os doentes. A Misericórdia, quando as pessoas começam a dar muitos problemas, estão velhotes, precisam de ser algaliados, colostomias, etc., têm as coisas da idade, não é nada mais do que qualquer um de nós pode vir a ter, tentam institucionalizar. Não tentam minimamente qualquer coisa nenhuma. E isto é a Misericórdia, que tem séculos de experiência. Portanto, as IPSSs espero que surjam com soluções mais criativas.

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Porque o que há agora, tem sido isto. E mesmo, em determinadas situações, pessoas que estão integradas em CERCIs, ou em IPSSs, por acaso da Associação nunca apanhei, a determinada altura, quando consideram que a pessoa ultrapassa a capacidade de resposta deles, tentam institucionalizá-los. Também vês isso nos bancos de urgência psiquiátrica (dirigindo-se ao Dr. Marco, também presente). Dr. Marco: Sim. Eu: E tentam institucionalizá-los em que instituições? Dra. Paula Nunes: Hospitais, como primeira escolha. Mas os hospitais não têm capacidade para isso. A primeira tentativa é no hospital. Mesmo a família. Tem um débil em casa, já está velhote, incontinente urinário, dirige-se com frequência à urgência do hospital. Mas isto quando começam a aparecer problemas que têm a ver com a idade, e não com a debilidade. É infelizmente a realidade que nós vimos. Eu: E falando, utopicamente, do que é que poderia ser uma instituição com respostas adequadas para estas pessoas, duma experiência diferente daquela que eu trago, porque nós temos um trabalho diário diferente da psiquiatria, e por isso eu considero importante conhecer o seu ponto de vista Dra. Paula Nunes: E como vê, temos experiências muito diferentes. Eu: O que lhe parece que poderiam ser as valências ou as actividades a desenvolver com essa população? Dra. Paula Nunes: Esta população habitualmente dá-se bem com actividades relativamente simples e repetitivas. Com supervisão e com tolerância para a falta de frustração que habitualmente têm e para a falta de controlo de instintos que habitualmente têm também. Portanto, nós aqui temos boas experiências em lavandaria, em cozinha, com supervisão, temos conseguido boa aceitação em vários débeis jovens como ajudantes de cozinha, penso que há uma série de coisas que é possível (jardinagem, mas para jovens) Eu: E já têm muita população envelhecida, com deficiência mental? Dra. Paula Nunes: Muita, muita, muita! Vá ali ao pavilhão 21, ou ao pavilhão 30, e tem ali uma secção asilar, em que as pessoas eram internadas aos 10 ou aos 11 anos e ficaram lá o resto da vida. O tempo vai passando, e agora têm 70. E porque também não têm razão para morrer antes. Tivemos aqui um débil, até ligeiro, internado em 1956. Portanto, estava internado há 50 anos. E estava bem. Morreu de velho. Eu: Isso era caso para dizer que se o tirassem do internamento seria mais prejudicial para ele. Dra. Paula Nunes: Num caso destes, seria muito difícil. Eu não sei o que seria dele se não estivesse lá. E esta tem sido a resposta tradicional. Esta não é boa, espero que apareçam outras. Eu: Ia pedir-lhe só para reflectir em voz alta quais as respostas que possam promover bem-estar no envelhecimento da pessoa com deficiência mental

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Dra. Paula Nunes: Ocupação protegida, não necessariamente trabalho, porque isso permite organizar o dia, levantar de manhã, deitar à noite, permite às pessoas não andarem completamente perdidas, azamboadas, sem saberem se é terça ou quarta. Ocupação, com fins-de-semana, uma estrutura temporal através da ocupação. E depois penso que residências devidamente vigiadas, na comunidade. Devidamente vigiadas, conforme a necessidade, naturalmente. Acho a ocupação muito importante, porque as pessoas sem ocupação perdem-se às quantas andas. Para todas as pessoas, e para os débeis mais ainda, porque já têm alguma dificuldade em de facto organizar-se. Eu: Dr. Marco, tem estado a assistir à nossa conversa, quer debruçar-se sobre algum assunto discutido? Convidava-o também a reflectir sobre esta questão. (O Dr. Marco optou por colocar uma questão à Dra. Paula sobre o tema) Dr. Marco: Não vê a possibilidade de um portador de deficiência mental que viveu com a família desde a infância, e que agora os pais faleceram e que ele possa continuar na sua casa, com essa tal ocupação? Dra. Paula Nunes: Vejo, sim. Desde que haja apoio domiciliário. Só que não costuma haver. Mas, sozinho, à noite!? Era preferível procurar uma solução mais protectora. Tem que se investir bastante na reabilitação funcional dos débeis. É possível e fazem grandes trabalhos, para que eles possam de facto gerir o mais autonomamente possível a sua vida. Eu: Qual é a vossa opinião sobre a integração de uma pessoa débil, já com uma idade avançada, numa resposta destinada a pessoas idosas, até que ponto consideram que aquelas equipas estão preparadas para as receber? Dra. Paula Nunes: Não estão. As equipas não estão. Não estão preparadas para dar medicação, para assegurar um seguimento psiquiátrico regular, não estão preparadas para fazer nada disso. A ideia é logo “ele está maluco, institucionaliza-se”. É a primeira ideia que lhes vem à cabeça. Quer seja débil, quer seja demente. Não estão preparados. Eu: Ia pergunta-vos o que pensam sobre este estudo? (risos…) Dra. Paula Nunes: Acho interessante, porque é preciso criar novas respostas, vai sempre haver débeis, não vai sempre haver hospitais psiquiátricos com funções asilares, isso é um dado adquirido, e os débeis vão precisar de respostas à mesma. No entanto, foi assim que as coisas começarem, com a institucionalização muito precoce dos débeis, especialmente dos profundos. Mas não tão profundos também. Internados aos 8, aos 9, aos 10… Não foi há tanto tempo assim. A resposta hospitalar está fora de causa, a médio prazo. Mais para o curto do que para o médio. Portanto, é bom que comecem surgir novas respostas noutros sítios. Nós próprios, hoje em dia, já não internamos um débil assim de qualquer maneira. Dr. Marco: Eu partilho da tua ideia. Dra. Paula Nunes: Esperamos que entretanto surjam respostas que consigam conter, dar resposta, a estas situações, que não vão desaparecer. Pelo contrário: dantes, os débeis morriam cedo. Agora já não morrem assim tão cedo. Tenho um internado com 83 anos. E está tão débil hoje como estava débil, seguramente, há 60 anos, quando foi internado. As

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observações são exactamente sobreponíveis. Não há uma diferença. Mutismo, estereotipias… Mas, são expectativas de vida longas. Não devemos fazer confusão entre as etiologias das debilidades: os mongolóides têm uma esperança de vida menor que a população em geral, devido às doenças associadas. E, portanto, para avaliar esperanças de vida, a etiologia parece-me importante. Têm que aparecer respostas muito inovadoras e muito diferentes, porque as que há não são satisfatórias nem vão ser suficientes. Eu: Muito Obrigado pela vossa colaboração.

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Apêndice 4

Titulo: Guião de entrevista aos familiares

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GIÃO DE ENTREVISTA AO FAMILIAR

1. Como se chama? 2. Qual a sua data de nascimento? 3. Qual o seu estado civil? 4. Quais são as suas habilitações literárias? 5. Qual a sua profissão? 6. Qual a sua situação actual face ao emprego? 7. Qual a sua relação de parentesco com o utente? 8. Quem é o principal cuidador da pessoa com deficiência mental? E porquê? 9. Quantas pessoas moram regularmente em casa? 10. Qual o grau de parentesco de cada um com a pessoa portadora de deficiência

mental? 11. Existe mais algum familiar portador de deficiência mental? Pode falar-me um

pouco sobre ele? 12. O que é para si ter um filho portador de deficiência mental? 13. Como se processa o quotidiano do seu filho? 14. O que significa para si vê-lo envelhecer? 15. À medida que o seu filho vai envelhecendo que alterações tem observado? 16. Quais as suas preocupações em relação ao futuro do seu filho? 17. Enquanto mãe, quais as suas necessidades? 18. Quem é o responsável legal do seu filho? 19. Na sua ausência, quem pensa vir a ser o responsável legal mais adequado para o seu

filho? 20. E, qual pensa ser o melhor lugar para responder às necessidades do seu filho no

futuro?

Obrigado pelo seu contributo!

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Apêndice 5

Titulo: Guião de entrevista aos profissionais da Associação

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GUIÃO DE ENTREVISTA À ASSISTENTE SOCIAL

1. Como se chama?

2. Qual a sua data de nascimento?

3. Quais são as suas habilitações literárias?

4. Há quanto tempo exerce a profissão de assistente social?

5. Em que áreas já exerceu a sua actividade profissional?

6. E há quanto tempo trabalha com pessoas portadoras de deficiência mental?

7. Há quanto tempo trabalha na Associação?

8. Quais os motivos que a conduziram a vir trabalhar com pessoas portadoras de deficiência mental?

9. O que é que sentiu quando veio trabalhar para esta instituição?

10. Quais foram os constrangimentos e as potencialidade com que se debateu quando veio trabalhar para esta Instituição?

11. Quais são os objectivos desta Instituição?

12. Quais são as funções que desempenha na Associação? (especificidade do assistente social)

13. Concretamente, em que é que consiste o seu trabalho?

14. No seu entender quais são os objectivos do Serviço Social?

15. Quais são os valores que norteiam as suas acções? (quais são os princípios que o acompanham enquanto profissional)

16. Quais as referências teórico metodológicas que orientam a sua acção? (em que teorias e metodologias baseia a sua acção)

17. O que é para si uma pessoa portadora de deficiência mental?

18. Qual a noção que tem de pessoa portadora de deficiência mental em processo de envelhecimento?

19. Em que é que consiste o quotidiano dos utentes mais velhos que frequentam esta instituição?

20. Quais são as necessidades dos utentes mais velhos da Associação?

21. E quais são as suas potencialidades?

22. Na sua perspectiva quais são os problemas que os familiares dos utentes mais velhos enfrentam neste processo?

23. Qual lhe parece ser a melhor resposta para estas pessoas que se encontram em processo de envelhecimento?

24. No seu entender, como é que se sentem os utentes mais velhos aqui?

25. Qual lhe parece ser a avaliação que as famílias fazem do trabalho que aqui desenvolvem?

26. E qual a avaliação que faz do seu trabalho?

Obrigado pela sua colaboração!

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GUIÃO DE ENTREVISTA AO PSICÓLOGO

1. Como se chama?

2. Qual a sua data de nascimento?

3. Quais são as suas habilitações literárias?

4. Há quanto tempo exerce a profissão de Psicólogo?

5. Em que áreas já exerceu a sua actividade profissional?

6. Há quanto tempo trabalha com pessoas portadoras de deficiência mental?

7. E há quanto tempo trabalha na Associação?

8. Quais os motivos que o conduziram a vir trabalhar com pessoas portadoras de deficiência mental?

9. O que é que sentiu quando veio trabalhar para esta instituição?

10. Quais foram os constrangimentos e as potencialidade com que se debateu quando veio trabalhar para esta Instituição?

11. Quais são os objectivos desta Instituição?

12. Quais são as funções que desempenha na Associação?

13. Concretamente, em que é que consiste o seu trabalho?

14. Quais são os seus objectivos enquanto profissional?

15. Quais são os valores que norteiam as suas acções? (quais são os princípios que o acompanham enquanto profissional)

16. O que é para si uma pessoa portadora de deficiência mental?

17. Qual a noção que tem de pessoa portadora de deficiência mental em processo de envelhecimento?

18. Em que é que consiste o quotidiano dos utentes mais velhos que frequentam esta instituição?

19. Quais são as necessidades dos utentes mais velhos da Associação?

20. E quais são as suas potencialidades?

21. Na sua perspectiva quais são os problemas que os familiares dos utentes mais velhos enfrentam neste processo?

22. Qual lhe parece ser a melhor resposta para estas pessoas que se encontram em processo de envelhecimento?

23. No seu entender, como é que se sentem os utentes mais velhos aqui?

24. Qual lhe parece ser a avaliação que as famílias fazem do trabalho que aqui desenvolvem?

25. E qual a avaliação que faz do seu trabalho?

Obrigado pela sua colaboração!

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GUIÃO DE ENTREVISTA À AUXILIAR DE ACÇÃO EDUCATIVA

1. Como se chama?

2. Qual a sua data de nascimento?

3. Quais são as suas habilitações literárias?

4. Há quanto tempo exerce a profissão de ----?

5. Quais são as funções que desempenha na Associação?

6. Concretamente, em que é que consiste o seu trabalho?

7. Quais os motivos que a conduziram a vir trabalhar com pessoas portadoras de deficiência mental?

8. Há quanto tempo trabalha na Associação?

9. E há quanto tempo trabalha com pessoas portadoras de deficiência mental?

10. O que é para si uma pessoa portadora de deficiência mental?

11. Qual a noção que tem de pessoa portadora de deficiência mental em processo de envelhecimento?

12. Em que é que consiste o quotidiano dos utentes mais velhos que frequentam esta

instituição?

13. Quais são as necessidades dos utentes mais velhos da Associação?

14. E quais são as suas potencialidades?

15. Qual lhe parece ser a melhor resposta para estas pessoas quando envelhecerem?

16. No seu entender, como é que se sentem os utentes mais velhos na Associação?

17. Qual a avaliação que faz do trabalho que aqui desenvolve?

Obrigado pela sua colaboração!

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GUIÃO DE ENTREVISTA À AJUDANTE DE LAR

1. Como se chama?

2. Qual a sua data de nascimento?

3. Quais são as suas habilitações literárias?

4. Há quanto tempo exerce a profissão de ----?

5. Quais são as funções que desempenha na Associação?

6. Concretamente, em que é que consiste o seu trabalho?

7. Quais os motivos que a conduziram a vir trabalhar com pessoas portadoras de deficiência mental?

8. Há quanto tempo trabalha na Associação?

9. E há quanto tempo trabalha com pessoas portadoras de deficiência mental?

10. O que é para si uma pessoa portadora de deficiência mental?

11. Qual a noção que tem de pessoa portadora de deficiência mental em processo de envelhecimento?

12. Em que é que consiste o quotidiano dos utentes mais velhos que frequentam esta

instituição?

13. Quais são as necessidades dos utentes mais velhos da Associação?

14. E quais são as suas potencialidades?

15. Qual lhe parece ser a melhor resposta para estas pessoas quando envelhecerem?

16. No seu entender, como é que se sentem os utentes mais velhos na Associação?

17. Qual a avaliação que faz do trabalho que aqui desenvolve?

Obrigado pela sua colaboração!

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Apêndice 6

Titulo: Guião de entrevista às pessoas portadoras de Deficiência Mental

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GUIÃO DE ENTREVISTA AO UTENTE

Hoje vamos falar um bocadinho sobre ti, queres começar por onde?

� Quem é que tu pensas que és? Quem és tu? Como é que tu achas que és? Fala-me sobre ti?

� Quantos anos tens?

� Onde vives? E sempre viveste aí?

� Com quem vives?

� Tens irmãos?

� Sabes quantos anos têm os teus pais? (as pessoas com quem tu vives)

� Lembras-te quantos anos tinhas quando vieste para a Associação?

� E porque é que achas que estás cá na Associação?

� E agora sentes-te mais novo ou mais velho? (porquê, quais as razões)

� Então vamos lá falar sobre isso. Olha para ti e para mim, quem é que tu achas que é mais velho sou eu ou és tu? (trabalhar a imagem do corpo)

� E o que é que tu achas que é uma pessoa velha? O que é para ti a velhice?

� As pessoas com quem vives, achas que já estão velhas? E porquê?

� E o que é que tu achas que acontece às pessoas bem velhas? Às pessoas idosas àquelas que são muito mais velhas do que tu?

� E quando a tua “mãe” não estiver por perto? Já pensaste sobre isso? O que é que achas que vai acontecer? Já pensaste que ela pode morrer e um dia ir-se embora?

� Já faleceu alguém que tu gostavas muito, ou alguém que tu conhecias?

� E agora pensando em ti, já pensaste no teu dia de amanhã?

� O que é que queres para o teu futuro? Fala-me sobre isso?

� Aonde é que gostavas de viver? (com quem e onde)

� E na Associação, gostas de estar na Associação?

� Gostas dos trabalhos que fazes?

� Quais é que são os trabalhos que tu gostas mais de fazer?

� E quais é que tu achas que são os mais importantes para ti?

� E imagina daqui a uns anos, gostavas de continuar a fazer o mesmo ou gostavas de fazer outras coisas?

� De tudo o que falámos aqui hoje neste bocadinho, achas que te sentes uma pessoa feliz? E quais são as coisas que te fazem feliz?

Obrigado!

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Apêndice 7

Título: Pré-teste dos guiões de entrevista:

(Pré-teste aplicado a um Familiar e a um Profissional)

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PRÉ-TESTE ENTREVISTA AO FAMILIAR

Entrevista semi-directiva realizada na Associação, na sala de psicopedagogia curativa, a uma mãe de um utente com mais de 45 anos, no dia 16 de Junho de 2007 às 15horas. Teve a duração de 45 minutos. Ao explicar os objectivos do trabalho, a Dona … ainda antes de ligar o gravador, disse-me o que para ela é ter um filho com deficiência mental, dizendo que antes de mais nada considera que o filho é uma pessoa, uma pessoa adulta com algumas dificuldades mas que ela sempre o trata como qualquer pessoa adulta, com alguns cuidados porque ele precisa, mas tenta sempre explicar-lhe tudo e conversa com ele. Disse que teve muita sorte com o filho porque ele é muito bom para ela. (O que é para si ter um filho portador de deficiência mental?) Eu: Como se chama? Familiar: … Eu: Qual a sua data de nascimento? Familiar: 5-05-1930, tenho 77 anos. Eu: Dona …, qual é o seu estado civil? Familiar: É doméstica. Eu: Quando falo de estado civil, pergunto-lhe se é casada, solteira…? Familiar: Há! Viúva. Eu: Há quantos anos? Familiar: Já fez 14 em Abril. Já foi há alguns anos. O meu filho foi como um milagre para mim porque diziam na Associação e dizia eu, como é que eu havia de conseguir dominar o Fernando porque ele era só o pai, era só o pai, se eu dizia alguma coisa mandava-me calar que eu não sabia o que dizia. E o pai apoiava-o e pronto o pai faleceu e o Fernando mudou por completo. Ele era só o pai, eu não contava para nada, claro que eu sempre pensei um dia que o pai morra como é que eu vou conseguir dominá-lo, e foi muito fácil, foi muito fácil dominar o Fernando, ele quando o pai faleceu ele foi para casa da minha cunhada e depois passado sete dias houve a missa e ele veio, não quis ir à missa que foi na portela e ficou em casa e depois quando viemos fiz o jantar, e digo eu, Fernando anda filho anda jantar, fui lá ao quarto ele estava deitado em cima da cama a chorar. Eu disse-lhe, o filho quer chorar, o filho chora, faz bem chorar, anda filho vamos jantar. Então lá fomos, fomos jantar e eu disse-lhe, olha lá filho tu estás triste, mas olha que o paizinho não quer que tu estejas triste, o paizinho está além sentado na cadeira, tu estás aí, a mãe está aqui e o paizinho está ali, nós é que não vimos porque agora ele está no céu. Ele ficou muito sério a olhar para mim, e porque se o filho está triste o pai também está e o filho não quer que o pai esteja triste, muito bem. Eu estive sempre assim, bem disposta sempre sorridente como se nada tivesse acontecido, na presença dele. Por vezes até tirava a blusa preta, e pronto, porque ele um dia quando me viu sem a blusa preta até me disse, hó mãe o que é isso já não andas como andavas? È assim, a mãezinha gosta e vestiu-se assim! Se a mãe gosta, disse ele. Então tudo muito bem, quando era para tomar banho era preciso sempre o pai mandá-lo porque se zangava e estava sempre à espera que o pai lhe disse-se, vá Fernando vai tomar banho, para ele explodir logo, não tomo, não tomo e não tomo. O pai faleceu e

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eu disse e agora como é que vai ser, e eu disse-lhe assim, hó filho tu sabes o que é que tens que fazer hoje, não sabes, depois de jantar antes de ires para a cama, hó filho tu sabes o que é que tens que fazer, tens que tomar banhinho. Pois, muito bem não disse mais nada, nem ele abriu a boca ficou assim a olhar para mim, e disse eu vou tomar banho. Foi tomar banho, tudo muito bem, no outro dia, isto na segunda ou na terça, eu tinha lavado a toalha e não tinha toalha na casa de banho, e diz-me ele assim, hó mãe a minha toalha? Disse, hó filho a mãe lavou vai ao gavetão e tira uma. Qual é mãe? A que o filho quiser! Lá foi, lá tirou a toalha e disse-me ou mãe é esta, e eu disse-lhe é a que o filho quiser, a que o filho gostar mais, essa é que é. Lá foi todo contente para a casa de banho. E daí a diante foi aos poucos, quando falava do pai era como se o pai tivesse ido ali e já viesse. Quando vem o dia dos anos do pai, diz-me sempre, hó mãe o pai fazia hoje anos, e eu assim, fazia e faz filho, não é, é ao pé de nós, está lá no céu ao pé de Nosso Senhor. Aceitou, foi uma coisa que eu até fiquei…, para mim foi um milagre. Sempre bem, sempre bem disposto com a mãe, adora a mãe, só que quando o meu marido faleceu, ele tem que estar sempre no supermercado, e ele nessa altura de cinco em cinco minutos ía a casa, ia a casa ver como é que eu estava. Ligava-me televisão, e eu assim que ele saía desligava-a logo, via-me e ia logo para o supermercado. Eu: E quais são as suas habilitações literárias? Familiar: Eu só tenho a 4.ª classe Eu: Alguma vez trabalhou? Familiar: Não, fui sempre doméstica, eu fazia tudo em minha casa, eu fazia costura, malha, renda, eu fazia tudo. Eu: Então nunca fez descontos? Familiar: Não. Tenho uma pensão do meu marido, que está dividida por mim e pelo Fernando. Eu: A Dona … é mãe do Fernando e quem é o principal cuidador do Fernando? Familiar: Sou eu, em casa sou eu claro, sou eu enquanto eu estiver. Eu tenho uma cunhada que é mais que uma irmã e claro, quando é preciso qualquer coisa, … eu fui operada às varizes ela esteve lá em casa, com ele. Fui operada à vista no dia 25, volto a ser agora operada no dia 20 deste mês e é ela que vem, é ela que está com ele, que ele entende-se às mil maravilhas com a tia e com as primas, que tem três filhas. Entende-se muito bem com elas, e são elas é que vai ser a Tutora, uma das filhas dela, uma que é mesmo da idade dele. Eu: Neste momento quem é o responsável legal do seu filho? Familiar: Neste momento sou eu, quando eu faltar fica a prima. Eu: É a pessoa que na sua ausência gostava que viesse a ser tutora dele? Familiar: Pois sim, já falei nisso e já está tudo falado, já está tudo acordado entre eles. Mas posso dizer-lhe que mesmo que não fossem eles os tutores, eu tenho a certeza que eles faziam esse papel, mesmo não sendo, são de facto, gostam muito dele e claro o Fernando é tudo com as primas e com as primas e com a tia a tia adora-o. Tive sorte neste ponto de vista com a minha cunhada. Eu digo se não fosse ela, eu já cá não estava, tive uma depressão que tive de facto muito mal, teve dois meses na minha casa, deixou a casa dela e foi para a minha tratar de mim. Se não a tenho a ela eu não tinha saído daquela depressão. Ela tem menos um ano do que eu, mas parece que tem menos 20 anos que eu, cheia de vida e genica e enquanto eu já não tenho nada disso.

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Eu: E diga-me uma coisa Dona …, quantas pessoas moram regularmente em casa? Familiar: Só moramos os dois. Éramos três, agora somos dois. Eu: Tem mais algum familiar portador de deficiência mental? Familiar: Sim, tenho uma irmã que também teve um filho deficiente e na parte do meu marido também. Eu: Com a mesma deficiência que o Fernando ou outra? Pode falar-me um pouco sobre eles? Familiar: Não, o da minha irmã era mais ou menos mas era muito pior, esse era profundo, deficiente profundo. O da parte do meu cunhado seria como o Fernando, também pior um bocadinho. Isto já veio certamente de família, da parte do meu marido e da minha, os dois tínhamos. A avó do meu marido enlouqueceu, desorientou-se, sem a família. Eu: Já me disse ainda há pouco que o Fernando tem que fazer umas tarefas lá em casa, como faz aqui na Associação… pode contar-me como é o quotidiano do Fernando? Familiar: O quotidiano do Fernando é ir para o supermercado. Eu: Ele gosta de ir ao supermercado? Familiar: Oi, então ele vai daqui e vai para o supermercado, vem à hora do jantar, janta, vai fechar o supermercado. Eu: E consegue contar-me por exemplo um dia do Fernando? Familiar: Um dia, mas em que … Eu: Por exemplo desde de manhã, o que é que ele faz, como é que ele vem para o Elo… Familiar: Isso levanta-se não é preciso chamá-lo, o Fernando nunca foi preciso chamá-lo para ele vir para a Associação às vezes ele é que me acorda a mim, de manhã. E levanta-se e lava-se, barbeia-se, faz tudo e se for preciso faz o pequeno-almoço e come sozinho. Não há problema com o Fernando nesse ponto de vista, veste-se, barbeia-se, faz as coisas que é preciso, isso não incomoda nada o Fernando, o Fernando não dá trabalho nenhum. Eu: E depois… Familiar: Depois vem passar o dia a Associação, chega cá à tarde e está ali um bocadinho e diz à mãe o que é que se passou, o que é que comeu, eu gosto sempre de perguntar o que é que comeu (risos), que é para saber o que é que lhe dou ao jantar, se comeu carne à noite come peixe, ao contrário, e então diz e pronto lá vai ele ao supermercado. Adora o supermercado, ele adora ir ao supermercado, o supermercado é o segundo emprego, a Associação é o primeiro. Eu: E o que é que ele vai fazer ao supermercado? Familiar: Ai, no supermercado estão todos lá, então conversa claro, portanto com as empregadas do supermercado como das casas de papelarias e tudo o que lá está aberto, ele é que mete o totobola àquela gente toda, faz os recados que seja preciso aviar o Fernando é que vai, ele dá-lhes lá um jeitão. Os carros lá do supermercado ele é que arruma se estão desarrumados, as senhoras que não sabem onde estão as coisas, dizem hó Fernando eu não sei onde é que está isto, lá vai com as senhoras para dizer onde é que estão, é assim… é um segundo emprego dele! Eu: E é um supermercado lá perto de casa?

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Familiar: É um supermercado grande é em frente da nossa casa. É só atravessar a rua, aquilo foi a melhor coisa que podia ali ter aparecido, foi o supermercado. E o Fernando por exemplo ao sábado à tarde vai para o parque das Nações, não pode faltar, vai para o Parque das Nações todos os sábados e diz-me mãe queres alguma coisa lá do continente? Se eu quiser alguma coisa lá lhe digo. Pois vai sempre ao continente se eu preciso de alguma coisa trás, se não preciso vai à mesma. Esse é o passeio dele. Até as primas, uma das primas tinha lá um café, quando foi da Expo, e ele claro todos os sábados ele ia ver as primas, agora as primas já lá não estão e ele vai ao continente, ele tem que ir lá todos os sábados e às vezes se se destina outra coisa no sábado ele já não está contente porque o sábado é para ir ao continente, não pode mudar, é assim e é assim que tem que ser. Eu: O que significa para si vê-lo envelhecer? Familiar: É muito triste, muito triste, eu peço a Deus que tenha pena dele! Muito triste porque o meu filho está muito agarrado à mãe, e um dia se eu falto, vai ser muito triste para ele (momento de silêncio) … muito triste para ele! (momento de silêncio, colocou a cabeça baixa e voltou a repetir, muito triste para ele!). Eu: À medida que o seu filho vai envelhecendo que alterações tem observado? Familiar: Mais calmo, mais compreensível, quer dizer mais parado, claro, são os anos. Dantes não podia estar sossegado estava sempre a mexer agora não está mais parado, já são os 47 que estão a pesar, é natural. Deste ponto de vista está melhor, mais compreensível das coisas, mas quando ele não quer não quer mesmo nada, pois e eu procuro sempre arranjar uma maneira com que ele não se enerve, agora descobri uma! Quando se zanga, porque quando se zanga o Fernando é um caso sério dá murros na mesa e faz trinta por uma linha e se eu falo ainda é pior, ele já faz aquilo para que eu me revolte. E então o que eu faço, choro, choro, ele assim que me vê com as lágrimas nos olhos, pronto o Fernando não está cá. Cala-se logo, não diz nem mais uma nada, olha que rico truque que eu arranjei! (risos) Eu: E ele? Acha que ele também se preocupa e repara no seu próprio envelhecimento? Familiar: Acho que não, não… a mãe é a mãe, e ele esteja como estiver nunca está doente nunca lhe dói nada e a mãe para ele é a mesma coisa, eu só lhe digo tens que ajudar a mãe a mãe já está velhinha não pode. Eu acho que ele não gosta de ouvir que eu lhe diga…, para ele a mãe está sempre boa, nunca está doente, como ele. Ia ser um problema com ele. Ele caiu, andava aqui a descarregar umas caixas da camioneta e torceu um pé, o tornozelo era uma coisa enorme, fez uns exames e depois deram-lhe uma pomada, foi pôr a pomada fez-lhe uma alergia, chegou a ter a perna mas toda era um tambor e toda em ferida, nunca disse ai, nunca disse nada, eu não tenho nada, não me dói nada, de maneira nenhuma, chegou a ter urticária por todo o corpo, tinha o corpo cheio isso é uma coisa que afronta, lá foi à médica, lá tratou veio para casa e corou-se mas da perna nunca mais se curou. Aqui à dias fui ao hospital com ele mas nunca mais curou porque ele no princípio nunca mais lhe deu o que a perna precisava de descanso, ele não compreende isso que tinha que estar com a perna no ar e não andar, não compreende isso, ele tem que fazer doer, doa ou não doa ele tem que fazer tudo como fazia, tenha o que tiver. Eu às vezes digo-lhe, estás a ver filho, o Sr. doutor disse que tinhas que estar sentado com a perninha no ar, mas não tu tinhas que ir para a Associação, e tu tinhas que ir para o supermercado e depois no supermercado está lá sempre em pé, lá tanto tempo. Claro, aquilo não melhorou, e de vez em quando lá lhe incha a perna, aquilo deve doer-lhe com certeza mas lá queixar-se ele não se queixa está tudo bem.

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Eu: E quer contar-me um bocadinho quais são as suas preocupações em relação ao futuro do seu filho? Familiar: Eu nem sei o que pensar, eu nem quero pensar sequer que lhe diga, eu não quero pensar (silêncio). Eu estou esperançada que eu ainda hei-de chorar pelo meu filho essa é a esperança que me dá forças. Que hei-de ser eu a chorar por ele não há-de ser ele a chorar por mim. Eu: Compreende que essa não é a lei natural da vida? Familiar: Pois não, esta não é a lei natural mas, quer dizer eu parece que se não fosse esta esperança minha eu já tinha, que eu já não tinha aguentado, (baixinho e com a lágrima nos olhos) eu já não tinha aguentado. Isto é uma esperança minha que me ajuda muito, pois claro se calhar não poderá ser é óbvio, poder ser pode! Não há muito, anda cá uma que tão novinha faleceu aqui na Associação. Mas essa é a minha única esperança. Eu: E porque é que tem essa esperança, o Fernando tem mais algum problema físico para além da deficiência mental? Familiar: Não, não, o que é que o Fernando pode morrer de ataque e ninguém sabe o que é que ele tem, é preciso, lidar com ele de facto uma pessoa que esteja sempre atenta aos problemas dele e esteja sempre sobre ele, porque o Fernando se lhe picas qualquer mosca ou mosquito ele arranha até fazer uma ferida. E nunca tem nada! Esconde procura esconder, anda sempre com feridas, essas feridas não, e se eu não estiver todos os dias atenta com o Fernando é um problema, é que ele esconde, de facto tem que ser uma pessoa só para ele a bem dizer, uma pessoa só para ele para estar sempre sobre ele. Toma banho ou assim, lá vou eu ver se ele não tem nenhuma feridazita, às vezes vejo nas toalhas se há sangue ou assim, ele esconde, e eu digo ou filho… agora tem uma aqui no braço diz que no outro dia já está curado, se ponho o penso de manhã á noite já vai sem ele, tenho impressão que lhe dá comichão ou qualquer coisa. Ele tira. Outra coisa é as unhas trá-las sempre rentinhas porque eu todos os sábados lhe corto as unhas, mesmo rentinhas, está a ver põe-se assim a esgravatar, enquanto não fizer sangue não deixa de esgravatar, faz feridas, dá impressão que não lhe dói as feridas a ele, e é um problema, e ele e ele e a mãe ele pela mãe, eu acho que não está certo que seja assim, não está certo que seja assim já chega (silêncio) quer dizer o meu filho devia ter ficado com o pai, que ele não ficava melhor com o pai ficava melhor com a mãe, mas o pai aceitava melhor que eu, eu não, mas sou uma revoltada com a vida, acho que não está certo porque infeliz desses que percam o pai e a mãe. Uma vida triste. Eu tenho fé, é o que eu digo é a minha sorte, é a minha sorte eu ter fé, porque o meu filho não vai sofrer o desgosto de ter perdido o pai e sofrer o de perder a mãe, eu tenho fé grande, e deus não ma leve porque senão é um problema, mas então agente não sabe, mas de facto não está certo que seja assim, ficarem sem o pai e mãe porque é quem têm é o pai e a mãe, claro a família e todos eles, mas não são pai nem são mãe, principalmente mãe, e não pode ser mesmo, felizes daqueles que aceitam. Eu: Enquanto mãe, quais as suas necessidades? Familiar: Há pois, já lá vou para os 77, quer dizer, porque ele a mim não me dá guerra nenhuma, a mim não me dá preocupações nenhuma o Fernando, ele de manhã levanta-se vai para o colégio vai se embora janta lá fica, eu vou deitar-me quando quero, lá fica a ver televisão deita-se também quando quer, não há problema nenhum. Eu: Não sente necessidades? Familiar: Foi pena não terem pensado aqui no Lar mais cedo e não estar o Lar já pronto, pois pensou-se fazer aqui um lar, fazer, ainda andam a ver se dão um terreno para ele!

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Eu: Um lar para quem? Familiar: Para eles e para nós, para eles e para os pais quando eles não poderem fazer nada. Eu: Isso seria uma boa resposta? Familiar: Ai então não era! Isso era o ideal, eu já cá estava se ele já estivesse feito. Eu: E, qual pensa ser o melhor lugar para responder às necessidades do seu filho no futuro? Não vamos pensar que vai falecer primeiro que ele, vamos pensar que os dois estão a perder capacidades e que estão juntos e pensar qual será a melhor resposta para essa situação? Familiar: è isso mesmo, é o que todas a s mães desejavam, não é! Quando agente pensa em ir para qualquer outro e ele viva aqui, isso então para o Fernando, eu ir para um lar e ele vir para aqui isso seria o fim para o Fernando agora um sítio onde estejam os dois isso sim encantados da vida, estamos os dois no mesmo sitio, isso era muito bom, mas já não é do meu tempo, para o meu tempo já não é, vamos lá ver. Eu estou em baixo, estou cansada, cansada da vida, estou só bem a dormir, por qualquer coisa me canso isso é mesmo que eu estou de dia para ano acho uma diferença enorme, de ano para ano, não pelo meu filho porque ele não me dá trabalho nenhum, não me dá trabalho nenhum acata tudo o que eu digo faz tudo o que eu disser, tudo bem tem lá os deveres dele… Eu: Às vezes é importante conversarmos sobre estas coisas, e saber o que é que a família acha que é melhor para ela. Familiar: Para nós o importante é estamos ao pé deles! Enquanto nós podermos ir estando ao pé deles ele tem alguém que está a viver só para ele, não pelo que faça, mas está ali e para ele é muito bom Eu: Quer contar-me mais alguma coisa, acrescentar algo? Familiar: Não sei, creio que não, o meu Fernando de facto o defeito que noto nele é que lhe podem bater, podem fazer o que quiserem que ele nunca diz foi este ou aquele, podem fazer-lhe perguntas sobre qualquer coisa que ele não responde, não responde i isto é mau é muito mau para ele. È um problema, e também a minha esperança é que a minha irmã o filho morreu primeiro que ela, o meu marido tinha um primo que também tinha um que também morreu primeiro que os pais, e eu digo ou meus deus e o meu filho não há-de ter também essa sorte, ao fim ao cabo é uma sorte, agente tem que morrer um dia, porque é que temos que sofrer, isso é que eu não acho certo. Eu: E acha que como ele tentou superar a morte do pai, talvez com o apoio da família também… Familiar: Não supera a da mãe, a mãe não é a mesma coisa, a mãe estava sempre ali presente, e o Fernando é muito comunicativo ele fala, claro mas ele gosta muito que conversem com ele e que falem, eu tive um sobrinho meu um ano lá na minha casa, o Fernando melhorou tanto que nem queira saber porque quando saíam, claro eles iam sempre dar uma volta lá com os amigos do primo, ele era mais um no grupo deles ele melhorou na fala e em tudo, quer dizer ao Fernando faz-lhe falta companhia, mas companhia que tenha alguma coisa para lhe ensinar a ele, não é ele precisar de ensinar aos outros, porque o Fernando adora a Associação e os colegas e assim mas não dá confiança, porque ele mesmo aqui, com os monitores e professores é com eles que ele conversa, porque se vierem os colegas e é vai vai vai! Gosta, e se apanha as pessoas conhecidas, fala, fala e gosta que lhe façam perguntas, isso fica todo contente, toda a gente adora o Fernando e ele conhece toda a gente, vá para o hospital vá para qualquer lado há sempre

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gente conhecida que fala ao Fernando, ai meu deus e pergunto-lhe quem, ele diz é lá do bairro, pronto conhece tudo, tudo, tudo, porque ele é comunicativo e gosta de falar e as pessoas gostam dele, ele de facto é uma pessoa extraordinária, ele gosta muito de pode falar. O vizinho mora por baixo no rés-do-chão estava lá fora ele tem cães, e ele foi daqui do elo e disse-lhe então senhor … e ele não respondeu, não lhe ligou e ele vem a subir as escadas e diz ele é burro não fala, é burro não fala, e eu disse então filho o que é que vens a dizer, há o Sr. Carlos não fala! E se as pessoas são as primeiras a dirigirem-se a ele fica tonto fica doido de contente. E ele agora já não sabe falar está sempre gago, mas tenho a impressão que também é aqui o ambiente da Associação, como vê os outros a não saberem falar a maior parte deles, aquilo está a comunicar com ele, está a interferir com ele porque eu vi quando foi disto do primo ele tinha os outros rapazes conversava, ia para a cama passava ele e o primo no mesmo quarto a conversar até ás tantas da noite, coisas sem importância mas que ele gostava. Eu penso que ele há-de sentir-se muito só não terem alguém com quem ir a qualquer lado ou assim, mas cá com a gente da Associação não! Não vai! Já quando ele estava na outra Associação, tinha lá uns melhorzitos que até se empregaram depois cá fora, e aos domingos ou assim, iam lá a casa para irem dar uma volta, para irem todos dar uma volta, não senhor, foi uma vez e nunca mais, quando eles tocavam a campainha e ele via quem eram, dizia logo: “não estou cá, eu não estou cá, eu não quero ir.” Quer e ía se fossem outros, mas daqui não, não gosta… Eu: Muito obrigado Dona … pela sua disponibilidade e contributo, foi gratificante para mim poder conversar consigo e conhecer um pouco melhor o Fernando. Familiar: Ora essa, de nada, quando for preciso alguma coisa é só dizer! Pois o Fernando é preciso calma, deixá-lo falar e não o contrariar porque o que ele diz não se escreve, porque se escreve-se ele logo se calava, porque ele sente prazer em fazer arreliar as pessoas, eu noto isso nele que ele às vezes faz coisas para eu me zangar, pois eu em vez de me zangar eu rio-me, e ele fica assim… como quem diz não era isto que eu esperava! Fica assim a olhar para mim. Quer saber eu acertei com ele. Estou sempre do lado dele, não o quero contrariar, já com a tia, que eles se adoram estão sempre pegados, ela diz uma coisa, pois ele diz uma coisa, pois ela contraria-o, pois estão ali os dois a teimar. Eu na frente dela não lhe digo nada mas por trás olha lá tanto faz o que ele diz seja pau ou seja pedra! Não interessa nada estares a teimar, porque o que ele diz não se escreve! Larga-o porque se estás a teimar ele vai acabar por fazer trinta por uma linha é preciso é largá-lo da mão, o que ele diz é que está bem, pronto! Nós agora podíamos ir para a praia porque temos casa na Costa, mas qual quê não vai, só no mês de Agosto porque é só no mês de Agosto que tem férias, isso vir para a Associação é um compromisso uma responsabilidade para ele, o trabalho! E quando não há trabalho? Não há trabalho vai todo preocupado porque não há trabalho, isto é o trabalho dele é uma responsabilidade, bem como o supermercado. Quando é Inverno as pequenas que fecham o supermercado, pedem para ele ir com elas até à camioneta, e ele vai, é outro encargo que ele tem, ele vai acompanhá-las, pensam que estão muito bem acompanhadas com o Fernando mas isto é só figura, se vier alguém que queira fazer mal faz à mesma. Mas pronto ele lá vai muito contente e enquanto elas não entrarem o autocarro ele não vai para casa. Às vezes fica até mais tarde porque o autocarro atrasou, lá vou eu ver dele então mas o supermercado já fechou e ele não aparece! Pronto ainda lá estava porque o autocarro atrasou-se, e pronto. Eu: Novamente um grande obrigado Dona…!

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PRÉ-TESTE ENTREVISTA AO PROFISSIONAL

Entrevista realizada no dia 12 de Junho às 12:00, no gabinete da entrevistada, na Associação. Teve a duração de 45 minutos. Antes do inicio da entrevista foram explicados os objectivos e propósitos do trabalho, bem como explicitado que todos os dados serão tratados com confidencialidade e rigor ético. Eu: Como se chama? Profissional: … Eu: …, qual a sua data de nascimento? Profissional: Nasci a 12 de Setembro do ano de 1977 Eu: Quais são as suas habilitações literárias? Profissional: Sou Licenciada em Psicodedagogia Curativa Eu: Há quanto tempo exerce a profissão de Psicopedagoga? Profissional: Há cerca de 8 anos. Eu: Em que áreas já exerceu a sua actividade profissional? Profissional: Só na área da Reabilitação Eu: Em que Instituições? Profissional: Só na Associação Eu: E portanto, há quanto tempo trabalha com pessoas portadoras de deficiência mental? Profissional: Há 8 anos (risos)… Eu: Quais foram os motivos que a conduziram a vir trabalhar para a Associação e com pessoas portadoras de deficiência mental? Profissional: É o seguinte o meu curso foi de quatro anos e ao longo do curso fizemos estágios, todos os anos fizemos um ano de estágio. No primeiro ano fiz na área dos idosos, o segundo ano na área da doença mental e no quarto ano, aliás só começámos a estagiar no segundo ano, o segundo ano na área dos idosos, o terceiro na área da doença mental e o quarto na Associação. Fiz aqui o estágio e depois a partir dessa data nunca mais consegui desligar-me da Associação. Eu: Quando diz, que não se conseguiu desligar, pode contar-me um pouco quais foram os constrangimentos e as potencialidades com que se debateu quando veio trabalhar para a Associação? Profissional: O primeiro impacto? É o que pretende saber! O primeiro impacto, não tive assim nenhuma reacção negativa, pelo contrário, quando entrei na Associação, senti logo (pensativa), senti um vinculo muito forte a esta instituição, desde logo do inicio, de maneira que depois não fui capaz de me desligar quando acabei o estágio, quando acabei o curso, pois acabei por fazer voluntariado e acabei por ficar, apresentei um projecto de intervenção na área do DPS, e depois acabei por ficar. O que é que quer dizer com DPS? Desenvolvimento Pessoal e Social e Desenvolvimento Cultural que é essa a minha área, que me compete.

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Eu: São essas as suas funções? Profissional: Sim, sim, sou técnica de Psicopedagogia e sou responsável por essas duas áreas: DPS e Desenvolvimento Cultural, são duas áreas distintas. Eu: E quais foram as potencialidades da sua vinda para esta instituição? Profissional: Eu ganhei tudo e mais alguma coisa, ganhei novos amigos, ganhei…sei lá o que é que eu ganhei! Eu não me vejo a trabalhar noutra área, que não seja na área da reabilitação, adoro aquilo que faço… Eu: Refere-se ao trabalho com a população portadora de deficiência mental ou também com outro tipo de população? Profissional: Sinto que estou mesmo vocacionada para a área da deficiência mental, é mesmo. Eu: Quais são os objectivos da Associação? Profissional: Os objectivos da Associação, promover a qualidade de vida dos nossos clientes, essencialmente é isso. Eu: Estava há pouco a dizer-me que desenvolve duas actividades. Concretamente em que é que consiste o seu trabalho? Profissional: É assim, o meu trabalho consiste em trabalhar dificuldades de Aprendizagem. Na área do Desenvolvimento cultural tento trabalhar, portanto competências que eles (gaguejou e disse: ai desculpe) têm na área das dificuldades de aprendizagem que são muito comuns neste tipo de população, trabalho essencialmente a parte de competências ao nível da leitura, da escrita, introduzi agora uma nova área da informática que é uma área que eles estão muito motivados, aprendem imensas coisas através do computador, pronto essencialmente é manter algumas competências que eles têm, ou os que não têm, adquirir algumas noções como aprender a escrever o nome, introduzir os dados pessoais deles no computador, para eles é gratificante. O DPS é mais trabalhar ao nível de competências como saber estar, saber fazer, trabalho muito as dinâmicas de grupo, essencialmente é nisto que consiste o meu trabalho. Eu: Quais são os seus objectivos enquanto profissional? Profissional: Melhorar cada vez mais, e fazer com que eles atinjam os objectivos da minha área, ou seja, que aprendam, que tirem o maior proveito na área do DPS e Desenvolvimento Cultural. (eu espero que isto esteja a correr bem, porque eu não estou…) Eu: Não faz mal, sinta-se à vontade para parar e reflectir o tempo que precisar. Eu não pretendo que este momento se torne num inquérito mas sim numa conversa de partilha de ideias. Profissional: É a primeira vez que me fazem uma entrevista…mas está tudo bem, eu agora é que fiquei um bocadinho baralhada, o que é que me estava a perguntar? Eu: Estava a perguntar-lhe quais os seus objectivos enquanto profissional? Profissional: Essencialmente é melhorar cada vez mais, de forma a que eles aprendam e consigam atingir os objectivos que eu traço ao inicio do ano para eles. Eu: Existe um plano? Profissional: Existe um plano de intervenção, em que vários técnicos das diferentes áreas traçam objectivos gerais e específicos, e depois a partir desses objectivos é fazer um trabalho ao longo do ano, fazer com que funcionem. Adquirir hábitos de leitura, escrita, essencialmente é esse o meu trabalho, voltando um bocadinho atrás.

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Eu: Pensando na questão do envelhecimento de alguns utentes, os objectivos individuais têm sido alterados? Profissional: Não tenho pensado muito nisso, de facto! É assim eles são adultos, não é, e eu continuo a chamar, é um lapso meu sem dúvida, meu e de muitos profissionais que aqui trabalham, os nossos jovens! Eles já não são, temos aqui muitos adultos a caminhar, não digo para a terceira idade, mas para lá irão caminhar. Mas eu ainda acho que os trato muito com alguma infantilidade. Os objectivos não são os mesmos, mas de facto não tenho pensado muito nisso, por isso é que eu estava a justificar, que ainda acho que eles são os meus meninos, os meus jovens, mas se calhar, acho que é um aspecto que eu tenho que ponderar para o próximo ano quando tiver que fazer novamente os objectivos. Agora há alguns objectivos que tenho andado a trabalhá-los ao longo destes anos. Eu: Quais são os valores que norteiam as suas acções? Profissional: Para que as coisas funcionem, acreditar que eles são capazes de atingir os objectivos…aaa…. Assertividade… Não estou a perceber a questão desculpe! Eu: Refiro-me aos princípios em que cada profissão se baseia. Quais são os princípios que a acompanham enquanto profissional? Profissional: O meu trabalho é feito no espaço de uma sala, quando entro na sala distribuo trabalho pelos diferentes utentes, diferentes grupos e é assim, a partir daí eles têm que fazer um trabalho, agora não sei muito bem o que é que hei-de responder nesta questão! Eu: Quais os princípios éticos em que baseia a sua acção quando desenvolve essas actividades de grupo, por exemplo? Profissional: Princípios éticos, … deixe-me pensar um bocadinho……. Confidencialidade, sem dúvida, mas são questões … é assim, eu sei quais são os meus princípios de ética profissional, mas eu não faço trabalho individualizado, é mais trabalho grupal…. Eu: E pensando nesses princípios que considera que mantém, eles são transpostos para o grupo, portanto que princípios são esses? Profissional: Meu Deus, deu-me uma branca! Eu: Não faz mal…. Profissional: Sem dúvida que as minhas acções se regem pela igualdade, o saber escutar nesta área é muito importante, porque é uma população que gosta muito de se fazer ouvir, são pessoas muito comunicativas, às vezes costumam falar todos ao mesmo tempo, na sala de formação, e de facto o meu trabalho que acaba por seu grupal, mas tento na medida do possível saber escutá-los, tento muitas vezes colocar-me no lugar deles, acho que isso é muito importante para um profissional, é um dos valores importantes sabermos colocar-nos no lugar deles, e pronto dar oportunidade que todos participem de uma forma activa, … essencialmente acho que é isso Vera. Eu: Já falámos um pouco sobre o sua experiência profissional ao longo destes oito anos a trabalhar com esta população e por isso pergunto-lhe: O que é para si uma pessoa portadora de deficiência mental? Profissional: É uma pessoa. É uma pessoa, com dificuldades, mas nós também temos dificuldades e é a tal coisa que eu estava a dizer à Vera no inicio, eu trato-os como pessoas, apesar de às vezes eu sei, não sei se devia estar a dizer isto, mas tenho noção que às vezes eu acho que os trato com alguma infantilidade, mas tento na medida do possível falar com

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eles como pessoas, de pessoas para pessoas, essencialmente é esse o objectivo do meu trabalho. Eu: Mas olhando para todos os utentes, na sua perspectiva, como define uma pessoa com deficiência mental? Profissional: Uma pessoa com deficiência mental, é uma pessoa que tem limitações a nível físico como a nível cognitivo. Quer uma definição mais elaborada? Eu: Não. É aquilo que a Patrícia sente como o que é uma pessoa portadora de deficiência mental, baseando-se na sua experiência. Profissional: Sim, sem dúvida, a experiência, apesar do meu percurso profissional aqui na Associação, estou cá há oito anos, fiz o meu último ano de estágio, só um pequeno parênteses, comecei como estagiária, depois como voluntária e depois passei a parte time e só desde o ano passado é que estou mesmo a contrato. Pronto, tive muitos, é assim não estou cá à oito anos a tempo inteiro tive algumas interrupções, foi a minha vida profissional que não se organizou logo de inicio. Mas dá para ter uma ideia do que é uma pessoa com deficiência mental. Acho que ainda não lhe respondi por concreto. É uma pessoa com alguns handicaps em diferentes áreas, ao nível cognitivo, aliás todos eles têm muitas dificuldades ao nível cognitivo e outros mais a nível físico. Espero que tenha respondido à sua questão. Eu: E qual é a noção que tem de uma pessoa portadora de deficiência mental em processo de envelhecimento? Profissional: Eu noto ao longo destes últimos oito anos que muitos deles têm, aliás os objectivos que eu tratei de inicio não são bem os mesmos, porque noto que tem havido muita deteorização ao nível mental, estão mais apáticos, sinto que já não têm aquela dinâmica que tinham aqui há uns anos, estão a caminhar para velhos! E nós também (risos) Eu: Em que é que consiste o quotidiano dos utentes mais velhos que frequentam esta instituição? Profissional: Temos aí alguns casos, mas tentamos na medida do possível que tenham o mesmo ritmo, o mesmo dia a dia que tinham há uns anos atrás. Havendo respeito de facto com as limitações que em alguns casos já estão evidentes, mas tentar de forma que tenham um dia a dia normal, continuam a ter as mesmas actividades de educação física, DPS, todas as actividades que temos aqui na Associação, nós tentamos… o factor idade ainda não é um factor, que determine, está a caminhar para velho se calhar é melhor não ter este tipo de actividades. Porque é assim se estão a caminhar para velhos convém haver movimento e movimentarem-se de forma a que eles não entrem numa inércia total. Eu: Quando me diz que frequentam as mesmas actividades, por exemplo como é um dia de um utente? Profissional: É assim, estou a tentar lembrar-me de algum caso, com mais de 45 anos, a Vera tem essa indicação? Eu: Sim, a Eunice, o Rui, a Margarida… Profissional: exactamente estão perto dos 50…o dia a dia! Todos têm actividades que fazem parte do plano técnico. Estou a lembrar-me, de manhã se estiverem na moradia, levantam-se de manhã, fazem as tarefas que estão estabelecidas pela nossa Assistente Social, depois de terem a moradia mais ou menos organizada, vão para a sala, depois dependendo dos dias, imaginemos que é dia da natação, vão para a natação, vêm da

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natação, vão almoçar, da parte da tarde também têm algumas actividades, depois é hora do lanche e depois vão para casa. Se estiverem na moradia, vão para a moradia e aí continuam com as actividades até à hora do jantar. (Queria que eu fosse mais específica?) Eu: Não, não, mais ou menos era este o objectivo. E o que pensa sobre… quais são as necessidades dos utentes mais velhos da Associação? Profissional: As necessidades... está a colocar-me questões que de facto eu nunca tinha pensado, é verdade, as necessidades (pensativa) haver mais actividades, porque eu noto que a falta de trabalho nas aulas é um factor relevante, noto muita inércia, há uma inércia da parte dos nossos jovens, por exemplo há dias da parte da tarde que eles não têm actividades nem sequer têm trabalho nas salas, se calhar se houvesse mais actividades só para que eles se mexessem mais e houvesse mais movimento, talvez isso fosse benéfico para eles. Eu: Está a falar-me ao nível da ocupação, e a outros níveis? Profissional: relativamente à minha área, a nível social é importante apostarmos nas saídas para o exterior, porque eu acho que eles estando parados criam uma acomodação e se calhar para o envelhecimento... é assim nós temos que travar, tem que haver energia de forma aqueles não entrem na inércia, lá estou eu a usar a mesma palavra, mas de facto é importante eles saírem mais, contactarem mais, com a família contactam porque aqui nesta instituição, quando eles ficam na moradia, a moradia não serve de depósito para ninguém, e acho que é importante eles manterem as relações com as famílias e manterem o trabalhinho aqui na Associação e as saídas para o exterior, muitas actividades, eu acho que isto é importante para o desenvolvimento deles, para a continuação de um bom desenvolvimento. Eu: E quais são as potencialidades que têm as pessoas mais velhas? Profissional: Claro que não pode ser tudo mau no envelhecimento. Têm muitas potencialidades, nesta área é um bocado complicado estar a falar nisso, porque as pessoas mais velhas de que estamos a falar, são pessoas que têm muitas dificuldades a nível cognitivo, mas porque é engraçado eles nem sequer vão buscar coisas, nós falamos dos velhos que têm muita sabedoria que têm muitas histórias de vida, aqui é um bocadinho mais complicado estar a falar sobre isso, porque por exemplo o caso de uma Eunice, ela vai buscar coisas engraçadas, de facto, não sei se devia falar de casos pontuais, mas... Estava eu a dizer que os idosos têm tendência a ir buscar coisas antigas, aqui nesta área nem sempre conseguem. Eles têm muitas coisas para nos dar, é um aspecto que eu nunca tinha reflectido e estou a sentir-me um pouco constrangida por nunca ter pensado nisto... Eu: Se for mais fácil para si, pensar num caso individual... Profissional: Estou a pensar no caso da Eunice, que tem perto de 50 anos, é uma pessoa que tem muita sabedoria, é a mãezinha aqui de todos (risos), ainda é uma jovem mas se calhar quando for mais idosa vai ser a nossa avozinha (risos), porque já agora é nossa mãe, ela é uma pessoa que de facto sabe muito gosta muito de cuidar dos outros é muito protectora dos jovens que aqui trabalham na Associação. Estava a lembrar-me das potencialidades, ela é uma fala-barato, tem histórias de vida fantásticas para nos dar e que nos conta. Eu: E pensando um pouco na família...na sua perspectiva quais são os problemas que os familiares dos utentes mais velhos enfrentam neste processo?

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Profissional: As dificuldades, sentidas da parte dos pais é a morte dos pais, tem a ver com, portanto ficarem com a aquela sensação de não saberem... tendo a Associação como um espaço que de certeza vai tratar dos filhos com todo o respeito que eles merecem, mas de facto eu penso que a maior preocupação é com a morte que se aproxima, principalmente. Eu: Qual lhe parece ser a melhor resposta para responder às necessidades das pessoas que aqui se encontram e estão a ficar envelhecidas? Profissional: Qual o tipo de intervenção que poderíamos ter? Se calhar vou repetir-me um bocadinho, eu acho que devemos tentar fazer com que eles continuem a manter os mesmos hábitos, as mesmas rotinas, apostar mais em actividades para que eles não fiquem com uma vida sedentária. É isso que me preocupa que eles se acomodem ao factor idade e é isso tentar apostar nas diferentes actividades que já têm e se calhar acrescentar mais algumas, é isso. Eu: No seu entender, como é que se sentem os utentes mais velhos aqui? Profissional: Eu acho que a idade passa por eles e eles não se apercebem disso. Pensando um bocadinho no grupo de pessoas mais velhas, pronto eu acho que há muitas alterações em termos de sua capacidade de resposta desde à oito anos atrás é diferente, mas eu acho que eles não dão pelo tempo a passar. Mas sim penso que se sentem bem. Eu: Qual lhe parece ser a avaliação que as famílias fazem do trabalho que aqui desenvolvem? Profissional: Eu acho que as famílias estão satisfeitas com o trabalho que eles desenvolvem, e sentem-se felizes com isso, os filhos está bem eles também está bem de certeza. Eu: Isso é demonstrado de alguma maneira? Profissional: É no dia-a-dia, muitos deles interessam-se por os filhos, e vê-se nas reuniões de pais porque colocam uma série de questões, estão satisfeitos de certeza absoluta é notório. Não sei se a Vera sabe, mas temos uma metodologia de uns caderninhos, (interrupção) estava eu a dizer há um “cadernozinho”, que acaba por ser um meio de comunicação entre os pais e a instituição e esse caderno serve para os pais terem conhecimento dos objectivos que estão a ser trabalhados durante os diferentes meses porque temos em cada mês, não sei se já lhe falaram sobre isso, competências adaptativas, mais ou menos, portanto este mês estamos a trabalhar ao nível da comunidade. Pronto há interesse em parte dos pais, mandam e escrevem nas agendas isto demonstra que estão satisfeitos e há preocupação a esse nível. Eu: E qual a avaliação que faz do seu trabalho? Profissional: (Risos) Tem escala!? Estou satisfeita, é lógico que estou, gosto muito do que faço adoro trabalhar com este tipo de população, estes são os meus meninos que vou tentar... daqui a uns aninhos os meus velhinhos, as calhar. Estou muito satisfeita com o trabalho que tenho desenvolvido aqui na Associação. Eu: A Dr.ª … quer acrescentar mais algum contributo a este trabalho. Profissional: Quero dizer-lhe que de facto vou reflectir acerca disto, sinceramente acerca desta temática que é tão pouco trabalhada, discutida e se calhar tentar promover algumas acções de formação nesta área, porque para aqui para os técnicos também era importante pensar á cerca disso. Tem curso de formação de formadores? Quem sabe depois de tirar o Mestrado não vem cá fazer uma acção. Eu acho importante de facto, penso que como eu

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outros técnicos também vão partilhar desta opinião que não estão sensibilizados, vemos os nossos jovens como os nossos meninos e de facto temos que pensar neles como pessoas que estão a envelhecer e que, há bocado estávamos a falar dos valores, têm que ser respeitados por isso. Eu: Muito obrigado pela sua colaboração e contributo! Profissional: Obrigado eu Vera, espero ter ajudado. Observação: Antes de iniciar a entrevista apresentei-me e expus o tema do trabalho e os seus objectivos. Comprometi-me a tratar os dados com confidencialidade e rigor ético. A entrevista com a Dr.ª …, decorreu dentro da normalidade, contudo ela mostrou-se muito nervosa desde o inicio, senti que ela se estava a sentir avaliada com o conjunto de perguntas que eu lhe estava a fazer sobre o seu trabalho, o que veio a dificultar o decorrer da entrevista e principalmente demonstrou ter dificuldade em responder às questões sobre o envelhecimento, não conseguindo pensar no global dos utentes, tendo sido por isso necessário nomear alguns utentes com mais de 45 anos. Na maioria das questões não aprofundou o tema solicitado e não conseguiu responder à questão “Quais são os valores que norteiam as suas acções”, referindo que não estava a entender a pergunta, tentei questionar sobre os seus princípios éticos enquanto profissional mas também não conseguiu responder. Apesar de eu ter tentado desconstruir a pergunta (talvez eu não o tenha feito da melhor maneira) ela não estava a entender o fundamento da questão. Confesso que me surpreendeu, pois numa conversa informal com o Psicólogo este disse que na Associação está a tentar construir um Referencial de Ética para as IPSS que irá ser submetido à avaliação da Segurança Social como instrumento a ser usado por todas as IPSS. Ainda acrescentou que a própria Associação tem um quadro de referência ético para os funcionários e para os utentes. Este estado nervoso da entrevistada pode ter sido por ser a primeira vez que foi entrevistada ou devido ao seu vinculo precário com a instituição. A Dr.ª … só teve conhecimento dos objectivos do trabalho no inicio da entrevista e referiu no final da mesma que não estava preparada, pois era importante reflectir sobre algumas questões antes da entrevista. Sugeriu que futuramente era importante o entrevistado conhecer o teor das perguntas. No dia seguinte, desculpou-se perguntando se eu queria repetir a entrevista, admitiu que se sentiu intimidada com as perguntas sobre o seu trabalho, mas que achou a entrevista bem estruturada e de fácil compreensão.

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Apêndice 8

Título: Transcrição das entrevistas realizadas aos familiares

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FAMILIAR 1 Associação…

18 de Junho de 2007, 9h Eu: Como se chama? Mãe: Dona … Eu: Qual a sua data de nascimento? Mãe: 8-01-1935, tenho 72 anos Eu: Qual o seu estado civil? Mãe: Viúva Eu: Há muitos anos? Mãe: Há 4 anos Eu: Dona …, quais são as suas habilitações literárias? Mãe: 4.ª classe, acho que agora mudaram é o 4.º ano, mas cá para mim é a 4.ª classe Eu: Alguma vez trabalhou? Qual a sua profissão? Mãe: A minha profissão era empregada auxiliar, acho que era isso, na APPACDM, nos deficientes Mentais Mongolóides. Eu: Em Lisboa? Mãe: Sim, sim, sim. Era costureira, mas trabalhava só em casa e depois surgiu aquela oportunidade de me empregar, em casa não descontava, não tinha descontos não era uma coisa certa e então aproveitei, o que foi muito bom. Eu: Trabalhou lá quantos anos? Mãe: 15 anos Eu: E neste momento, qual a sua situação face ao emprego? Mãe: Estou reformada, até me reformei bastante cedo por invalidez. Eu: E quais foram os motivos que a levaram a pedir a reforma por invalidez? Mãe: Tenho três hérnias discais, por isso é que não posso carregar com grandes sacos e grandes pesos. Eu: Qual a sua relação de parentesco com o utente? Mãe: Eu sou mãe da Eunice Eu: Quem é o principal cuidador da pessoa com deficiência mental? E porquê? Mãe: Sou só eu…. Eu e a Associação (risos) Eu: É uma grande ajuda? Mãe: Imensa, nem calcula, foi a melhor coisa que me apareceu na vida foi a Associação e toda esta família, o Dr.… a Dr.ª …, a Dona … nem sei não quero deixar ninguém de fora porque são todos extraordinários. Eu: E explique-me um pouco porque é que é a principal cuidadora e a ajuda que a

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Associação lhe presta. Mãe: Sim porque ajudam imenso, até quando foi a morte do meu marido me ajudaram muito, tiveram cá a Eunice ainda uma semana ou duas salvo erro, e naquela altura agente fica nem sei e ajudaram-na muito porque ela era muito ligada ao pai. É assim, é muito difícil, tivemos casados quase 45 anos é muito difícil (lágrimas - silêncio). Como me estava a perguntar, eu sinto muito apoio aqui na Associação até se eu tiver algum problema até… eu não sou muito de depressões mas também somos humanos não é, vimos falar com o Dr. … e ele dá-me imenso apoio, eu vou muito mais calma muito mais tranquila porque eu sei que se me acontecer qualquer coisa a Eunice está entregue. É esse o meu motivo… Eu: Quantas pessoas moram regularmente em casa? Mãe: Moram, moram, tenho duas hospedas. Eu: Familiares? Mãe: Não, não, mas há lá uma que é praticamente da família já está lá há 14 ou 15 anos que ela lá está, já é considerada como família. Eu: Existe mais algum familiar portador de deficiência mental? Mãe: Não que eu conhece-se não. A causa da deficiência da Eunice não é genética ela foi tirada a forcep a ferros e deram-lhe cabo da cabecita, apertaram-lhe nas meninges quando ela tinha onze dias teve uma encefalite, teve três meses internada em Coimbra porque isto foi em Leiria nós morávamos em Leiria, nessa altura teve três meses internada em Coimbra entre a vida e a morte, mas Deus entendeu que ela devia cá ficar, e graças a Deus por isso é a minha companhia agora, só tenho mais um filho mas ela gora até está em Inglaterra, ainda não está a viver propriamente dito, ainda cá tem a mulher e os filhos mas está com ideia de ir para lá. A vida cá está muito complicada! Eu: O que é para si ter uma filha portadora de deficiência mental? Mãe: Bem a principio foi um choque muito grande, não é, porque eu estava há dez meses e dois dias casadas e quando a menina nasceu eu não soube logo que ela era deficiente só passado uns dias é que eu comecei a ver que havia alguma coisa de diferente porque não pegava no peito e só gemia gemia gemia, eu vi que havia qualquer coisa de diferente, mas que havia muito pouca assistência no hospital de Leiria, foi uma coisa tremenda, pouca assistência porque fizeram tanto disparate na Enunice, arrancaram-lhe um ombro, fizeram-lhe um buraco na cabeça e depois com os focos da infecção apareceu-lhe outro buraco na cintura e outro na perna tanto que ela tem a perna torta e tudo. E então não queriam que eu saísse do hospital, queriam que ela morresse lá para não verem as aneiras que fizeram. O meu marido teve que assinar um termo de responsabilidade para eu sair porque não me queriam deixar sair, em geral quando eram tiradas as ferros ao fim de onze dias saiam e não me deixaram sair, tive lá uns quinze dias salvo erro e a miúda só gemia, isto não podia continuar, depois então fomos para Coimbra com ela, mas o médico tinha lá amigos à espera onde ele tinha estudado e veio-nos recomendar que fossemos para Lisboa, para que se nós quiséssemos não irmos para Coimbra, para ninguém ver o que ele andou a fazer, mas foi precisamente para aí que nós fomos e calhou logo nas mãos de um médico que ele conhecia, e disse-nos como é que o meu colega fez um disparate tão grande, ele já morreu também coitado, que Deus o perdoe! Nós ficámos com este problema a vida inteira e eles ficam sempre limpos sempre bem! A princípio foi um grande choque, depois até aos seis anos foi mesmo difícil para mim, foi mesmo muito difícil para mim e para o meu marido coitadinho, porque… só que depois ela já tinha seis anos e meio quando eu tive o outro filho então já se atenuou um bocado a dor

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já pronto eu também estava com ele, a princípio era só com a Eunice, era só a Eunice, a Eunice, pois já tinha outra responsabilidade já me passou mais. Mas depois comecei outra vez com a luta, vim para Lisboa por causa da Eunice, nessa altura eu morava nas Caldas da Rainha porque foi onde eu fui sempre criada desde pequenina foi nas Caldas, depois casei fui para Leiria e depois voltei para as Caldas para tomar conta de quem me criou que eu não fui criada com os meus pais fui criada com uns padrinhos e a minha madrinha já tinha 80 e tal anos e sozinha e eu pedi ao meu marido para virmos porque ela criou-me e a minha obrigação era tomar conta dela dada a idade que ela tinha não é! Então lá conseguimos, vimos para as Caldas. Chegámos mas não tive facilidades nenhumas porque não havia uma escola especial, não havia nada nessa altura, há 40 e tais anos não havia nada absolutamente nada. E então vim para Lisboa por causa dela para conseguir alguma coisa mas também foi muito difícil só depois do 25 de Abril, bem quer dizer ela já estava na escola ela teve na escola normal mas com classe especial, de manhã estava na classe especial e à tarde estava com os normais, era uma associação nem sei bem como é que se chamava, e então aquilo naquela altura ainda havia o Instituto Aurélio da Costa Ferreira onde nós a íamos inscrever e eu consegui, acho que isso já não existe… Eu: Sim eu penso que ainda existe, é um colégio de ensino especial não é? Mãe: Tinha vários departamentos ela estava no campo de Santana. Depois lá consegui metê-la aí mas com muitas dificuldades. Tive que escrever ao Ministro da Educação, isto ainda antes do 25 de Abril, a expor a minha situação que deixei a minha casa e onde tinha muito mais facilidades porque foi sempre onde vivi, que tinha deixado a minha casa e não conseguia arranjar escola para a miúda, e nessa altura ele mandou-me logo uma carta passados uns dias para eu ir ter à direcção escolar e lá consegui. Se é preciso temos que lutar… Depois quando foi o 25 de Abril, começaram reuniões porque eu já a tinha inscrito na Segurança Social, de maneira que nessa altura ainda não havia nada para assim para darem subsídios para colégios nem nada. E então depois do 25 de Abril é que começaram as reuniões para a CERCI, portanto ela ainda esteve na CERCI, ainda esteve uns anitos na CERCI, até que o Dr. …, a Dona … e não me recordo agora mais quem era que esteja aqui dentro, começaram a pensar em organizar esta associação, portanto lá se conseguiu, e ela veio para cá desde o principio ela é o n.º 6, tem graça que já na CERCI foi das primeiras estive à espera até que abrisse em Chelas para ela ir para lá e depois aqui também foi das primeiras, eu também pertenço à comissão instaladora. Eu: Voltando à questão que lhe coloquei, o que é para si ter uma filha portadora de deficiência mental? Mãe: Acho que é uma pessoa, acho que é tão importante e devemos ter tanto ou mais carinho e mais compreensão do que por uma pessoa que não tenha problemas, não é! Eu: E se associarmos a uma pessoa com deficiência mental ao envelhecimento o que é que pensa que poderá ser uma pessoa com deficiência mental já envelhecida? Mãe: Pela minha Eunice penso que será o mesmo que ela tem sido toda a vida a mesma coisa sempre ela que … desde que a tratem bem e lhe dêem carinho, ela gosta (risos) Eu: E o que significa para si vê-la envelhecer? Mãe: Tem graça nunca aprofundei isso nunca... quer dizer não sei, vou vivendo o dia-a-dia porque tem que ser mesmo assim, agora talvez tenha pensado mais desde que o meu marido faleceu, quando éramos os dois, não é dividíamos a carga pelos dois, não é agora

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sozinha tenho pensado mais, mas também estou descansada porque eu seu que um dia que me vá embora, que Deus me leve ela fica cá na Associação, estou mesmo já a tratar de certas coisas para ver se ela fica cá mesmo, porque isto… eu não sei se o irmão ficará em Inglaterra ou não ficará se virá para cá novamente, não sei, mas de qualquer das maneiras ela fica melhor cá do que com a família. Porque a família, o irmão é rapaz ele gosta imenso dela e … a cunhada também gosta dela mas não tem paciência, não, não tem paciência e eu sei e eu compreendo até compreendo porque isto não é, quer dizer, não é pêra doce, não é difícil mas é muito teimosa… se soubermos levá-la não é difícil mas quem não está habituada a lidar com ela é um bocado complicado, porque, como já deve ter tido oportunidade de apreciar, ela em certas coisas parece suma pessoa normal, não é! Ela conversa, mantém uma conversa como uma pessoa normal e depois à uma coisa a minha nora não compreende e não aceita muitas coisas de que a Eunice faça porque se ela tem esperteza para uma coisa também ter para a outra é o que ela diz! Por isso é muito mais difícil ela ficar lá, para ela seria muito pior porque aquilo a vida é um grande choque e então eu prefiro que ela fique cá na Associação. Eu: À medida que a Eunice vai envelhecendo que alterações tem observado? Mãe: Há para melhor, começamos logo por dizer que talvez não se nota, ela está mais calma, muito melhor, então desde que está aqui na Associação então não tem comparação! Eu: E que outras alterações tem notado? Mãe: Ao nível físico ela de facto tem dificuldades coitada, nas pernas e também tem má circulação, tem um bocado de dificuldade e também está muito pesada, mas mental está melhor e até desde que o meu marido faleceu ela está muito mais meiga mais carinhosa, é só meu amor minha querida, a nossa eu não falo assim porque não quero estar a falar, mas penso que ela pensa agora só tenho a minha mãe o meu pai já não está e o que ela deve pensar, e então às vezes qualquer coisa que ela se irrite e que me deixe triste ela diz logo, pronto mãe não é nada já passou, já passou! Revela que ela se preocupa imenso imenso imenso, preocupa-se muito comigo! Eu: E acha que ela tem notado que também está a envelhecer? Mãe: Às vezes diz, às vezes fala ai isto já é o peso da idade (risos), ai as minhas pernas já é o peso da idade! Eu: Dona … pode contar-me como se processa o quotidiano da Eunice? Mãe: Durante a semana levanta-se às 7 da manhã, toma o seu banho, faz a sua higiene ela é toda muito asseada nisso, toma o seu banhinho depois dou-lhe um toque no cabelo porque ela gosta, arranjo-lhe o pequeno-almoço enquanto ela se veste e vem para a Associação e depois tem aqui várias actividades. Eu: Ela vem sozinha para a Associação? Mãe: Sempre sozinha, a principio eu comecei a trazê-la depois pronto ela começou a vir sozinha, ela sabe ler muito bem ela não se atrapalha se for preciso mudar de autocarro ela muda de autocarro ela conhece tudo (risos), e depois à tarde regressa, tem alturas que vai para a fisioterapia, faz fisioterapia pela segurança social lá perto né, e quando às vezes vem cansada lá põe a mesa e depois vê um bocadito televisão e daí a um bocado vai se deitar nove e meia dez horas. Agora aos sábados é que ela faz mais qualquer coisita, mas também já pouco faz, já fez mais qualquer coisita, às vezes passava uma roupita a ferro agora tem sempre as pernas cansadas, mas gosta imenso de ir fazer compras, isso então como nós temos o mini preço ali perto eu faço-lhe a lista e ela vai lá fazer as compras, já é uma ajuda porque também há várias coisas que eu não posso trazer porque não posso carregar grandes pesos, e depois tenho um contra, isto não há bela sem senão moro no quinto andar sem

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elevador (risos), já não é para a minha idade e para quem tem asma ainda mais difícil! Eu: Quais as suas preocupações em relação ao futuro da sua filha? E do seu próprio futuro? Mãe: As maiores preocupações seja talvez a minha velhice, como é que eu hei-de subir a escada e fazer a limpeza à casa que é grande, e os recursos financeiros são muito poucos porque estas pensões são uma desgraça, mas olhe eu também não sou das pessoas que muito me preocupo, porque eu sou crente e confio muito em Deus e sei que Deus não nos vai desamparar, por isso entrego nas mãos de Deus todas as coisas e sei que ele vai resolver o problema aquilo que eu não poder fazer ele faz! Eu não sou católica sou crente evangélica sou da igreja Baptista, e então creio em Deus e sei que ele nunca me vai desamparar! (silêncio) Eu: E em relação ao futuro da Eunice quais são as suas preocupações? Mãe: O futuro é este é ela ficar aqui! Enquanto eu puder ela está comigo, enquanto eu puder sempre tenho tentado suprir as principais necessidades dela, mas no futuro é a Associação. Eu: E quando diz que o futuro dela é a Associação… quem é no momento o responsável legal da sua filha? Mãe: Sou eu a tutora e o meu filho é o pró-tutor. Eu: Independentemente de a Eunice vir para a Associação, na sua ausência, quem pensa vir a ser o responsável legal mais adequado para o seu filho? Mãe: Deveria ser o meu filho mas se ele não estiver cá! Ele está para o norte de Inglaterra! É difícil, ela tem primas, não sei se um dia se elas estarão dispostas a vir visitá-la ou a levá-la para casa isso não sei, porque cada uma está nas suas casas são casadas cada uma tem os seus filhos algumas até já têm netos. E também tenho aqui uma irmã muito próximo, mas, nunca, como eu nunca fui criada com ela, com eles, não fui criada com os meus irmãos agora já não tenho mais nenhum a não ser a minha irmã, já morreram 4 irmãos, a mas a minha irmã não liga muito, gosta da sobrinha se lá for mas não é pessoa que venha, não sei se eu faltar se ela tinha a lucidez de vir visitar a sobrinha, não sei! Eu: Enquanto mãe, quais as suas necessidades? Mãe: Por enquanto eu vou resolvendo as coisas, quer dizer por enquanto, até quando não sei! Até quando é uma incógnita não sei, não sei! Mas também nós não podemos estar ansiosos por isso porque senão então ficamos paranóicos, não pode ser, temos que ter a lucidez vivendo um dia de cada vez. E não estar com uma grande ansiedade porque senão adoecemos e enlouquecemos e é muito pior não é! Eu: Mas ainda há pouco disse-me que já anda a tratar do que é necessário… Mãe: Há! Sim já ando a tratar da interditação dela, já, por acaso até era para ir com ela hoje ao tribunal, ela ainda nem sabe, e eu ainda não sei como é que lhe hei-de dizer, porque ela vai ficar…mas era para ir hoje com ela mas tenho que ir lá pedir, porque até me mandaram um postal para me apresentar lá hoje com ela, já comecei a tratar dos papéis há bastante tempo, já há uns dois ou três meses, mas fui lá pedir para adiarem, e segunda-feira se calhar vou lá com ela, tenho que telefonar para lá a ver se têm oportunidade de a atenderem. Eu: E para além do que já tratou, que outras coisas vão ser necessárias no processo de interditação? Mãe: Eu também não sei bem, porque ainda não chegou a essa altura mas bem tendo esses

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papéis na mão estando tudo arranjado, pois venho aqui falar com a Associação para ver o que é preciso mais. Eu: E que tipo de resposta poderá dar a Associação? Mãe: É ela ficar cá se for necessário, por isso é que têm as moradias. Ela já fica cá todos os meses pelo menos uma semana por mês fica cá para adaptação. Eu: E ela mostra satisfação em ficar cá na moradia? Mãe: Quer dizer quando vem não! Diz sempre não é lá a minha casa aqui é que é a minha casa, aqui é que eu tenho o meu quartinho… mas quando está cá está satisfeita, está porque eu telefono para cá e ela está na galhofa com os outros e tudo não tem problema é só na altura em que vem. Eu: Quando fala na interditação o que é que isso implica? Mãe: A Eunice não tem autoridade, porque por exemplo a Eunice vai às compras mas se a enganarem nos trocos ela fica enganada porque não sabe fazer um troco, ela conhece as notas conhece mas não sabe perceber que se levar 20 e gastar 15 não sabe quanto tem que trazer de troco, não sabe e outras coisas mais que ela… por exemplo na higiene na roupa, não sabe tratar dessas coisas eu é que tenho que tratar de tudo, eu é que tenho que pôr tudo a jeito, porque ela não sabe, não tem aquela noção por exemplo é capaz de vestir no verão uma saia toda florida com uma blusa toda florida, não é não tem a noção do que fica bem ou fica mal. Eu: e o que é que isso implica? Eu ainda não sou tutora por enquanto sou mãe, ainda não sou responsável legal e depois é que fica tudo esclarecido em como sou até viver. Enquanto o meu marido foi vivo eu nunca pensei nisso, éramos os dois e pronto e agora é que comecei a pensar porque a idade já começa a pesar um bocadinho e de um momento para outro posso ir-me embora e ela ficar, ela não ficava desamparada porque com certeza que o irmão não a ia deixar desamparada mas pronto. Eu: E, qual pensa ser o melhor lugar para responder às necessidades da Eunice no futuro? Mãe: Eu acho que enquanto ela puder movimentar-se e andar nestes trabalhos e nestas coisas é muito bom para ela porque senão ela acomoda-se, porque estas moças assim acomodam-se muito e se ela não tiver estas actividades fica catética. Eu acho que é muito bom enquanto ela puder tem cá quem a vá avaliando enquanto ela puder, ela tem aqui muitas actividades tem ginástica tem remo tem várias coisas, tem artesanato tem muita coisa e o principal trabalho dela e que ela gosta muito de fazer é dobrar guardanapos, é a profissão dela (risos). Eu: Quer acrescentar mais alguma coisa sobre o que estivemos a conversar? Mãe: Acho que não, não tenho. Eu: Quero agradecer-lhe a sua disponibilidade, este é uma situação com que me preocupo em especial e é importante para mim conhecer o que pensão os pais e os filhos… Mãe: Ela tem a noção que um dia vai ficar aqui, tem… mesmo ela às vezes diz viver com a minha cunhada, não antes quero ficar na Associação. Mas ainda bem que ela tem essa noção porque a cunhada não a compreende muito bem ia haver um grande choque e assim seria muito melhor ficar aqui! Eu: Obrigada pela sua colaboração!

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FAMILIAR 2 Associação…

Julho de 2007, 14h:30m Em primeiro lugar vou explicar-lhe, apesar de saber que de certa forma já o fizeram, mas quero eu fazê-lo como forma de entendimento e introdução à nossa conversa. Expliquei o tema, objectivos …. Os procedimentos…. Mãe: A esperança média de vida das pessoas com deficiência aumentou muito e no outro dia eu estava a falar com a Dr.ª … que tem estado aqui, aquela advogada que tem estado aqui a trabalhar, não sei se já a encontrou… ela estava a dizer-me em relação às tutelas, não sei há tão pouca força não há isto é um problema que não existia dantes, e eu disse-lhe pois não porque eles antes, não se punha o problema porque eles antes morriam todos antes dos pais, morriam todos muito cedo era muito raro passarem antes dos 20, 21, claro que hoje o meu filho já vai fazer quase 50… Eu: Estamos a conversar à um pouco e ainda não sei como se chama? Eu: Qual a sua data de nascimento? Mãe: 7 de Novembro de 1932 Eu: Qual o seu estado civil? Mãe: Casada Eu: Quais são as suas habilitações literárias? Mãe: Sou Licenciada em Engenharia Química Eu: Qual a sua profissão? Mãe: sou Engenheira Química, há 52 anos, faz agora anos na véspera de São Pedro que me reformei. Eu: Qual a sua situação actual face ao emprego? Mãe: Nunca estive empregada à excepção de duas vezes em Luanda. A minha ideia era realmente ter uma vida profissional quando fiz o curso e quando o escolhi só que o meu marido era oficial do exército na altura e depois entretanto foi fazer o curso de medicina e acabou por tem feito só medicina e até que se reformou agora há uns quatro anos, mas é oficial de exército e estivemos por duas vezes em Angola em 61 a 63 e em 71, 73 mas eu realmente desde que o … nasceu que deu problemas começa por os olhos colarem, não era normal já naquela época mesmo uma criança nascer e não abrir os olhos não sei se era de tempo ou não era de tempo quando engravidei do … ainda estava a alimentar a minha filha mais velha de maneira que não sei se é tempo se não é o médico diz que sim ou diz que não e eu digo que sim, já nem sei bem como é que foi e realmente acaba por o … prolongar os meses ciáticos, os médicos diziam que era mania minha, porque a … é que era precoce que estava mal habituada mas infelizmente a verdade estava comigo, pois entretanto veio a seguir logo outro portanto tive três filhos assim de seguida, na altura não dava muito para estar empregada naquelas condições e depois fomos parar a Angola, os meninos eram pequeninos ainda eles ficaram em casa dos meus pais e foi em 61 não se sabia bem o que é que ia acontecer em Luanda e estive lá a trabalhar realmente estive num laboratório de geologia e minas, e aí estive a trabalhar fora de casa e depois em 71 voltei a

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Luanda e fui visitar as pessoas com quem tinha trabalhado e perguntaram-me se eu não queria voltar porque havia um trabalho que se calhar seria a pessoa indicada para fazer e voltei a trabalhar nessa altura já com os meus filhos lá, de resto tenho dado sempre explicações de matemática e físico-química e mais ou menos o que fiz na minha vida profissional foi isso mais do que outra coisa. Eu: Eu tive conhecimento que também tem tido um papel activo aqui na Associação… Mãe: Tenho feito parte de todos os órgãos sociais, sempre, excepto o primeiro e agora de resto tenho sempre feito parte dos órgãos sociais, cuidava disto, cuidava daquilo, fui secretária da direcção, acho que fui secretária do conselho fiscal, presidente do conselho fiscal e no último mandato tive como presidente da Direcção porque a dona … não queria fazer outro mandato a seguir e como tínhamos feito uma alteração de funcionamento pensámos que seria bom haver uma transição embora eu não gostasse de mandar, porque não gosto, eu gosto mais de trabalhar não à frente mas num papel de apoio, estar presente quando é preciso mas não gosto de dar a cara por tudo, não tenho assim uma facilidade, como é que hei-de dizer não tenho desejo de estar em público e falar e a comunicar e ser realmente a pessoa que a parece, não é realmente a minha maneira de ser, foi mais uma questão de voluntariado, de boa vontade de querer ajudar uma transição e pronto quando foram agora estas eleições eu achei que era altura de parar, eu estou com 74 anos faço este ano 75 um mandato são três anos e ia acabar a quase com 78 eu acho que nesta posição é preciso uma pessoa com vontade de trabalhar, com ideias e com vontade de ir para a frente que aos 74 anos não se tem. Eu: Mas está muito bem conservada! (risos) Mãe: Eu sinto que ainda tenho capacidade e sei que seria capaz, mas acho que já não estou com idade para continuar, eu sei que em qualquer idade pode acontecer mas na minha idade mais facilmente a pessoa tem fragilidades, o meu marido está com 82 anos, portanto também me custa não estar com ele mais tempo. Por outro lado em relação à idade, nestes três anos que eu estive à frente da Instituição eu acho que é sempre tudo muito relativo havendo uma dona … que esteve toda uma vida inteira à frente desta casa e o Dr. …, a pessoa ainda que não queira prefere dar o valor de oportunidade de decidir porque eles estão mais, estão cá o dia inteiro e eu estava cá aos bocadinhos e nesta casa a pessoa que está à frente tem que estar aqui porque todos os dias tem que se decidir algo. Eu: Como é que foi o processo de integração do … aqui na Associação? Mãe: O … estava na CERCI, na formação profissional e o Dr. … falou-me que ia iniciar esta instituição se eu estaria interessada. Eu achei que sim até porque o … na altura já estava com quase com 20 e poucos anos e ele na CERCI já não estava a fazer nada porque a CERCI estava naquela altura essencialmente ligada para a parte escolar, o … já não estava a aprender nada como a maioria dos que vieram para aqui, portanto não só não estavam a aproveitar como estavam a roubar espaços àqueles que precisam de ir para lá e que iriam aproveitar tanto essa possibilidade, por isso é que eu achei a ideia óptima, tenho muita pena não sou sócia fundadora gostaria muito de ser mas já não cheguei tão cedo mas assim que foi possível juntei-me ao grupo que estava a trabalhar e foi quando o … passou da CERCI para aqui. Na CERCI foi onde realmente o … teve algum avanço, ele tinha andado no Clapared no Declory, nas Descobertas, em Luanda teve na única escola que havia, foi melhor que nada pelo menos estava integrado, porque eu trabalhava 6 horas seguidas. E depois dessas experiências todas na CERCI foi onde ele realmente começou a desembaraçar-se, aprendeu a ler e a escrever ainda que mal, mas enfim, no Clapared e essencialmente comigo não vale a pena estar a dizer de outra maneira porque foi comigo que ele aprendeu, números, contas nem a brincar é a falha maior de todas do …, a mais pronunciada uma ausência completa da noção de quantidades, mas para o … se eu lhe

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disser que 9 e 5 são 18 para ele é a mesma coisa, eu costumo a dizer que a única vez que o … se apercebeu da diferença e por causa de cores ou contas não me recordo porque os médicos disseram sempre que o … não tinha nada, já quando o … veio onde Luanda em 63 portanto no ano em que o … fez 6 anos e nessa altura que o médico que o acompanhava pediatra que o acompanhava nessa altura tinha dito aos meus pais que realmente era possível que houvesse ali realmente uma deficiência mas isto ao fim de 6 anos, e pronto de facto nessa altura ele foi a médicos e etc. e confirmou-se embora não se sabendo ao certo o que era e o … portanto como o médico dizia que era mania e que era preguiça eu insistia e exigia. Eu: Podia ter sido logo apoiado. Mãe: Era a mesma coisa, a diferença não seria muita mas de qualquer maneira. E num último dia já de cabeça perdida, porque de facto ele não consegue ter a noção de quantidade, e disse: mas oh … tu queres! Queres dois estalos ou queres quatro? Filho: Não quero nenhum! (risos) Foi de facto a única vez que ele desenvolveu assim um raciocínio de quantidade lógica, foi dessa vez. Porque para ele dois quatro e um, a ordem dos números ou o valor das coisas não existe, está completamente… uma facilidade de expressão relativamente grande uma linguagem rica, tem um vocabulário rico o … pode-se dizer consegue falar com as pessoas tem realmente muito mais, não sei a quem é que lhe sai nem a mim nem ao meu marido somos assim pessoas com grandes facilidades de relacionamento. Eu: O … de uma primeira vez falou para mim muito educado, e a segunda vez penso que foi a Dra. … que lhe deve ter dito que eu gostava de conversar com ele um dia e ele prontamente chamou-me apresentou-me o quarto dele ali na residência e disse-me e o que é que queria falar comigo, (risos) e eu disse-lhe não … não é hoje hoje só vim conhecê-lo, depois de nos conhecermos um bocadinho melhor depois conversamos e ele disse mas pode perguntar, pode perguntar! (risos) D. Manuela: Nos colégios não sei como é que está agora, mas na altura era fraquinho tudo, o Clapared talvez mesmo a assim tenha sido o melhor, mas o … já não tinha vaga no Clapared, quando fui para Africa já me tinham dito que ele não podia entrar no ano seguinte, pois foi-se mantendo por ali, quando viemos ou nas Descobertas ou em África, as Descobertas foi um caos completo de facto foi um desastre, mas na Cerci de facto, o Dr. … era quem lá estava já lá na altura e foi quem o orientou e o habituou até foi lá que o habituaram andar sozinho no autocarro o … anda sozinho daqui para casa vai e vem sozinho, apanha dois ou três autocarros conforme o caminho que resolve fazer o que a mim me dá uma certa preocupação não saber o caminho que ele está fazer, mas eu também não o posso manter com a rédea curta completamente, já com os outros a ansiedade é sempre a mesma não se justifica também… Eu: Quem é o principal cuidador do seu filho? Mãe: Sou eu a principal cuidadora. Eu: E porquê? Mãe: Porque o meu marido não estava em casa praticamente e eu tive os filhos quase todos seguidos. O … faz um anos e meio, não chega 14 meses de diferença da irmã e depois o João José faz diferença 25 meses de diferença do …, graças a deus que foi um bocadinho mais afastado porque o … deu muito trabalho e cansou-me muito, era permanente sem grandes apoios de ninguém porque os médicos não acreditavam e então aquilo era assim um desbravar de terreno, o meu marido na altura era oficial de exército, já no fim de casado fez o curso de estado maior… e portanto tinha trabalho todo o dia e para além do trabalho do exército tinha mais alguma coisa por fazer, porque trabalhava em electrónica porque tinha um amigo que tinha duas firmas e ele trabalhava umas horas, ele

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praticamente não estava em casa e eu tive sempre em casa, porque o... que é uma pessoa que se relaciona extremamente bem com todos ele com o pessoal de casa nem brincando, na altura ainda tínhamos criadas, na altura eram criadas que se chamavam criadas internas, portanto eu tinha uma criada e uma mulher-a-dias, mas o … e elas nunca se entenderam, nunca, nunca, nunca, portanto não era muito fácil nas horas que ele não estivesse na escolas ele estar entregue a criadas e suponho que isso talvez tivesse agravado se ele estivesse estado entregue a pessoal doméstico chamemos-lhe assim são sempre pessoas com pouca preparação, tem menos capacidade em ultrapassar certas dificuldades. Naturalmente fui sempre eu que fui tomando conta do.... Eu: E como é a relação que ele estabelece com os irmãos? Mãe: Boa Eu: Actualmente quantas pessoas moram regularmente em casa? Mãe: Eu, ele e o pai, os outros já casaram já saíram de casa. Eu: Existe mais algum familiar portador de deficiência mental? Pode falar-me um pouco sobre ele? Mãe: Não, não foi diagnosticado ao... nenhuma doença digamos assim com um nome há uns anos surgiu ou detectaram uma deficiência num cromossoma que é mais pequeno que os outros que é o Syndrome de Williams, não fizemos nenhuma despistagem, não fizemos. As características, até foi o meu filho mais novo que me levou um artigo do Cientific American, que possivelmente terá sido, aliás até o trouxe para o Dr. … sobre o Syndrome de Williams, e que ele me disse à mãe olhe para este artigo veja lá se não é o..., o facto destes problemas desde sempre, problemas actuais parecia, as qualidades e os defeitos digamos assim, parecia um retrato do... se é ou não é, é como lhe digo nunca fiz a verificação, se tivesse remédio para isso, talvez o faria. Eu: O... é o mais velho? Mãe: É o do meio, como sempre os problemas surgem no segundo, não sei porque, mas com muita frequência, não sei não faço ideia às vezes nós só vemos o que queremos ver, muitos também são filhos únicos e portanto foi logo no primeiro mas muitos deles também foi acidente de parto. Do... não porque nem sei se tive três horas à espera do..., foi assim, senti contracções às 9 da noite e ele nasceu antes da meia-noite (risos) ele era pequenino não tinha problema nenhum tinha dois quilos e 800g. Eu: Numa perspectiva de mãe, o que é para si ter um filho portador de deficiência mental? Mãe: Uma preocupação essencialmente do dia e do amanhã, o dia a dia vive-se com mais ou com menos satisfação. Quando me dizem que é uma bênção ter um filho deficiente, acho que não é bênção para ninguém, deu-me a possibilidade de conhecer pessoas excepcionais que não teria conhecido de outra maneira, deu-me possibilidade de tomar conhecimento e contacto com problemas que de outro lado ignoraria mas que se calhar vivia feliz sem os conhecer, pessoalmente o que mais me afecta e preocupa é o futuro, o dia-a-dia dá-se resposta com mais paciência nuns dias com menos noutros às vezes com algum cansaço porque nunca somos muito donos de nós mesmos quando temos um filho com deficiência, à toda uma série de coisas que nós deixamos de fazer não numa perspectiva de os esconder ou de … mas perdemos um bocado a vontade de fazer as coisas houve um bocadinho de nós que morreu e sobretudo o futuro, muito embora a Associação é uma bênção isso sim, é uma resposta que a maioria dos pais com filhos com deficiência não terão disponível, os meus outros filhos, quer a minha filha quer o meu filho darão seguramente apoio ao... no dia que nós faltarmos mas é uma carga que eu lhes deixo é uma

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herança pesada é isso essencialmente aquilo que e depois o... ainda tem mais um agravo coitado, o... gostava tanto de comer doces dessas coisas, está com diabetes já faz dez anos, portanto aquele único prazer que ele tinha deixou de ter muito embora hoje em dia já haja alguns alimentos preparados para eles mas nunca pode ser à vontade porque mas mesmo aqueles que são ditos para diabéticos têm sempre uma parte de açúcar. Portanto tem que haver cuidado, portanto o... é sempre uma pessoa que nos limita em muita coisa. Evidentemente que os outros meus filhos têm a sua vida organizada tem a sua casa têm a possibilidade de ganhar a sua vida têm a sua vida toda estruturada, tanto quanto hoje em dia alguém tem a sua vida estruturada, o... não, o... é sempre um peso que fica a alguém ainda que fique aqui, os irmãos têm que o vir buscar ou têm que se ocupar dele ou preocupar com ele, é uma preocupação muito grande essa. Eu: O que significa para si vê-lo envelhecer? Mãe: O Envelhecer do... é uma preocupação também na medida em que eles envelhecem muito mais cedo, embora não se note grandes regressões em muitas coisas, há coisas que o... já não dá a mesma resposta, embora nunca fosse uma resposta brilhante essa resposta já começa a apresentar algumas falhas, e portanto a deterioração há-de ser mais rápida até porque a diabetes também não ajuda é um factor negativo, portanto, e um envelhecer dele como o envelhecer dos irmãos faz sempre impressão olhar para os nossos filhos e pensar neles como velhos e hoje em dia em que a esperança de vida é muito maior todos nós acabamos por ter filhos velhos, a minha mãe tem 98 anos para ela deve fazer imensa confusão ver-me com 74 quase com 75, mas de certo modo faz impressão são mais preocupações que se apresentam porque começamos a perder a saúde, começam a aparecer problemas e no... vão com certeza começar a aparecer mais cedo e isso é uma preocupação, voltamos sempre à mesma a diabetes é uma doença insidiosa, doença que ataca a vista ataca toda a parte cerebral ataca todos os órgãos, tenho pavor à ideia de ele poder começar a ter feridas nos pés, a começar a ter que ser operado, acontece a muitos diabéticos é o que acontecem, todos esses são factores que a cada dia estão presentes, portanto se a preocupação com os outros é grande com este é muito maior, é sempre potenciado. Eu: À medida que o seu filho vai envelhecendo que alterações tem observado? Mãe: O... em casa faz muita coisa, desde sempre eu e o meu marido somos uns pais muito exigentes, fomos sempre e os outros filhos talvez tenham sofrido um bocadinho do muito que eu tinha que exigir ao... para conseguir um bocadinho e claro se exigia a um exigia a todos, eles às vezes queixam-se a mãe exigiu tanto que nós somos pessoas extremamente exigentes no nosso trabalho queixam-se que somos exigentes, lamento muito não saber educar de outra maneira, portanto o... foi habituado a não ser o coitadinho mas sim mais uma pessoa da casa e portanto tem as suas obrigações, ele faz a sua cama, põe a roupa a lavar, arruma a roupa dele quando se pões no quarto dele ele é que a arruma nas gavetas melhor ou pior de vez em quando temos as nossas discussões pessoais (risos) porque as gavetas quando lá vou nem sempre estão bem, mas melhor ou pior fica feito, o... é que põe a mesa é que tira a louça da máquina e arruma-a toda nos armários, põe a mesa e sabe perfeitamente o que é o almoço hoje se é peixe se é carne o que é a fruta, ele é que trata disso tudo dos talheres dos guardanapos de lavar a fruta ele é que faz isso tudo, quando está em casa ele faz isso tudo, essas coisas começam a falhar há mais vezes em que se esquece do pão ou há mais vezes em que os talheres não estão propriamente como deve ser, são coisinhas pequeninas que nós vamos sentindo que já não é bem da mesma maneira, há esquecimentos mais que não havia, são coisinhas pequeninas do dia-a-dia não é nada estritamente.

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Eu: Quais as suas preocupações em relação ao futuro do seu filho? Mãe: Eu estou convencida que ele aqui na Associação será acompanhado e acarinhado que terá aqui tanto quanto é possível fora de casa uma casa. Julgo creio e acredito que os meus filhos não o vão largar, que os irmãos o acompanharão sempre e portanto que ele embora não seja o ideal ter os nossos filhos numa instituição a tempo inteiro, tem tido a sua vida toda em casa portanto um dia será como qualquer um de nós porque também não vale a pena estarmos a enganarmos o nosso fim hoje em dia será num lar e ele acabará aqui possivelmente, mas dizer que me preocupa muito o que será a vida dele não me preocupa, desde que ele tenha um quarto tenha os seus livros porque o... lê tudo adora ter livros de automóveis de aviões de barcos, desde que ele possa ter isso e os discos que ele gosta de ouvir música, eu acho que se ele tiver um quarto só dele aqui assim em que os irmãos lhe dêem algum apoio para ele não se sentir abandonado acho que o... não terá um fim que seja para me preocupar. Resolvi pensar sobre isso e conclui que não tenho o direito sequer de sentir angústia em relação a isso. Os nossos filhos aqui têm uma coisa muito boa, que é não terem a noção do problema quer dos deles quer dos pais, para eles não existe, alguma coisa boa haviam de ter, para eles não há preocupações, vivem o dia-a-dia e pronto. Eu: Falando do dia-a-dia, como se processa o quotidiano do seu filho? Mãe: O... levanta-se cedo porque nós moramos ao pé do estádio do Benfica, por isso levanta-se lá para as sete horas esteja eu ou não ao pé tem despertador às 7 horas o despertador toca ele levanta-se faz a injecção de insulina toma o pequeno-almoço arranja-se e vem para a Associação sozinho, quase sempre já estou a pé mas às vezes não estou pelo menos quando ele sai já estou, mas já não tenho necessidade de me levantar às 7 da manhã nem eu nem o meu marido já não estamos a trabalhar eu este ano ainda dei uma explicação ou duas mas para o ano já não vou dar. De maneira que às vezes nem vejo o... de manhã. Depois vem para aqui faz aqui a sua vida almoça e ao fim da tarde volta para casa, quando chega a casa toma banho, para não ter que se levantar tão cedo de manhã, porque anda todo o dia fora de casa e é muito mais agradável para ele tomar banho àquela hora e arranjar-se depois faz aquelas coisas de que tem obrigação, põe a mesa e aquelas coisas, vê televisão ouve discos, vai à janela um bocado está entretido com os livros dele, passa muito tempo com legos a fazer coisitas de legos sobretudo ventoinhas todas muito simétricas não há uma peça fora do sítio o que é muito estranho para quem não tem a noção de quantidade mas de facto é que é completamente simétrico, impecáveis, extraordinário porque não dá para entender grandes compridas largas, está muito tempo com aquilo. Às vezes, o meu marido gostou sempre de trabalhar fazer trabalhos de mãos, carpintaria marcenaria electrónica aquilo que lhe apetecia ele fazia, uma pessoa extremamente habilidosa de mãos, tanto que na marquise tem uma banca que tem coisas e o... tem as suas ferramentas não faz nada de jeito mas ocupa-se por ali assim a martelar a pregar ou limas e a dessoldar, às vezes o pai dá-lhe peças e ele está ali entretido com uma coisa daquelas que é de dessoldar uma coisa dessas ligada à corrente e ele aprendeu com o pai a fazer e vai tendo os cuidados necessários. Televisão não vê assim muito, praticamente vê desporto de resto não se interessa grandemente pela televisão, musica, ouve muito quer discos cds quer telefonia. Aos fins-de-semana levanta-se à mesma às 7 horas e depois normalmente volta para a cama até às dez da manhã para tomar o pequeno-almoço e volta para a cama e dorme até à hora que ele quiser porque também não vale a pena levantar-se muito cedo. Aos sábados e domingos de manhã vai religiosamente ao Fonte Nova (risos) conhece as pessoas todas do centro e todas as pessoas o conhecem, fora os vizinhos todos desde casa até lá e nas imediações, à tarde vai ao continente ao Colombo, de maneira que sábados domingos e feriados de manhã é no fonte nova à tarde é no Colombo, sempre a conta relógio que é para não andar muito tempo fora e não dar tempo

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para fazer grandes asneiras. Cumpre rigorosamente os horários não há uma falha aquela hora está a tocar-me à porta mas também sabe que se não tiver na próxima vez não vai, mas é a única maneira de eu conseguir ter algum controlo e exigir também aqui, de maneira que de manhã sai pelas dez horas ao meio dia vai a casa e almoçar à tarde saia pelas 13:30m e às 15 está em casa. E é a vida dele! Na praia quando estamos lá em baixo no Algarve, temos casa em Ferragudo, sai cedo eu já estou sempre a pé mas ele sai cedo, faz uns caminhos compridos para ir até à praia, percorre meio mundo para ir à praia de Ferragudo, vai visitando as pessoas todas ele foi para ali desde que nasceu e a família do meu marido é de lá portanto toda a gente o conhece e depois eu vou à praia a quase todas as manhas anda por ali fala com as pessoas toma banho vagamente, ele nada bem mas não gosta muito de água fria e vem almoçar depois de almoço está um bocadito deitado, sai vai fazer as visitas todas que lhe interessa até às seis, hora do lanche vem lanchar e vai para a praia, depois a fim da tarde toma banho e janta e depois vai novamente à rua ver os amigos um bocadito até às 10h e volta a casa, tem uma certa independência! No Algarve tem imensos amigos estrangeiros casais ingleses sobretudo ingleses. Há um casal que tem casa lá durante o tempo que está em Inglaterra escrevem e mandam emails manda revistas de automóveis, são amigos dele. Eu tenho a sorte que o... tem alguma capacidade e sentido de orientação formidável e claro o que é também importante para eu o poder largar um bocadinho e nunca se agarra muito tempo às pessoas portanto eu sei que ele está com muitas pessoas mas nunca se pega a uma pessoa de maneira a incomodá-la durante muito tempo e ele está ali diz duas ou três coisas e segue, mata muita gente mas poucochinho de cada vez (risos). No Algarve tem a vantagem como à muita gente conhecida eu sei sempre por onde é que ele foi e por onde é que ele passou de maneira que está sempre vigiado. E se ele for a algum sítio que não deve eu depois falo com ele, de maneira que ele tem o cuidado de não sair dos parâmetros estabelecidos. Eu: Voltando um pouco atrás às actividades aqui na Associação ele demonstra satisfação? Mãe: O... desde que esteja a trabalhar não gosta, ele não gosta de trabalhar, também não sei a quem sai porque tanto eu como o meu marido gostámos sempre muito de trabalhar, tivemos sempre uma vida de bastante trabalho bastante preenchida, mas o... não gosta de trabalhar de maneira que faz o que tem que fazer mas não é que seja uma alegria para ele. A única coisa que lhe dá verdadeiramente alegria é a bateria, ele faz parte do grupo Panteras Negras, e quem não gosta detesta, faz tudo o que lhe mandem fazer ele sabe que o que lhe dizem para fazer ele tem que fazer isso sempre foi uma regra lá em casa para todos, mas agora dizer que ele gosta muito de dobrar guardanapos ou não sei o quê faz porque é aquilo que tem que fazer e pronto sabe que é assim. E as pessoas quando têm um emprego também não têm de trabalhar! O teu é o teu tu não dizes que vais para o teu trabalho, então é o teu trabalho tens que ir trabalhar. Ele diz sempre às pessoas que de manhã vem para o trabalho. E aqui à tempo aquele casal inglês enviou um email e eu respondi, porque o... fala inglês quase perfeitamente mas não é capaz de escrever, português e mal, portanto quando respondi demorei e disse que tinha demorado a responder porque ele não esteve em casa porque não sei se sabe o... está numa instituição e assim portanto todos os meses está lá uns dias e ele respondeu que o... nunca fala da sua pessoa que ia para o trabalho e não dizia mais nada e ele também não perguntava e que inclusivamente que eu aqui à tempo dei-lhe uma revista humorística ele disse-me qual era eu até sei mas eu não me recordo é um med qualquer coisa assim, e o... até percebeu e começou a fazer-me perguntas e de maneira que eu agora nem sei muito de certas coisas de automóveis e aviões e o... está-me sempre a perguntar. O senhor nem sabia que ele estava numa instituição, dificilmente…

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quem está com ele todos os dias ou todas as manhãs na praia não se apercebe disso, mas nem sabia como era a vida do ..., vai todos os dias para o trabalho. Eu: Enquanto mãe, quais as suas necessidades? Mãe: Por enquanto estou bem, fui operada porque cai, fora isso estou bem, não tenho grande necessidade de apoios. Tenho uma mulher-a-dias muito boa que é uma ajuda preciosa, tenho saúde, sou bastante saudável e habituei-me a estar muito tempo em casa entretenho-me com os livros, as explicações é que me vão fazer muita falta à minha cabeça porque eu gostava muito, mas … Eu: Quem é o responsável legal do seu filho? Mãe: Sou eu, o... já está interditado, sou eu a tutora. Eu: Pode explicar-me a questão da interdição? Mãe: A interdição foi feita através de uma advogado, o Dr. … fez uma avaliação, o... foi a uma junta médica em que foi atribuído determinado quociente de deficiência, aliás realizado antes do processo de interdição, depois o Dr. tratou de tudo e fomos ao tribunal, eu o meu marido, o meu cunhado e uma tia minha que são o conselho de família, que por acaso tenho que mudar a minha tia vive no Brasil não dá muito jeito para conselho de família, o processo decorreu através do Dr. depois fomos chamados todos com o juiz e o... o juiz fez umas perguntas ao... o Dr. orientou-as para o lado que achava mais conveniente porque se fossem falar de automóveis ao... ele não era dado por interdito porque o... Sabe de automóveis o que eu imagino que não há para saber, o Dr. levou aquilo para os números para as horas e não foi de forma alguma enganar, mas sim chamar a atenção para os pontos necessários e que estavam em causa essencialmente, portanto foi-nos dada a interdição, isso já está no papel isso já está averbado na custódia eu estou nomeada como tutora e a minha tia e o meu cunhado como conselho de família, depois é dado conhecimento, e aqui assim há uma cópia do processo de interdição. Foi um processo que no caso do... decorreu com relativa celeridade eu sei que houve ai casos muito demorados para se resolver, não foi o caso do... correu muito bem, mas é um choque, indiscutivelmente é um choque mas também a pessoa não pode fazer como a avestruz, o facto de nós ignorarmos os problemas não os resolve nem os faz desaparecer, portanto o perigo que seria o... não estar interditado é de longe muito maior do que qualquer sentimento pessoal de frustração de dizer assim pusemos o carimbo final no assunto, porque é. Para mim foi pior, quando fui com ele à junta para darem o quociente de deficiência digamos assim foi pior do que a interdição, até porque tive um azar desgraçado com os médios, porque foram umas pessoas muito pouco correctos na maneira de lidar, e isso devia ser uma coisa que devia ser tratada com muita delicadeza e com muita atenção e não foi, foram muito pouco correctos e depois foi portanto um choque talvez maior, primeiro foi logo o 1.º passo não reconhecer oficialmente que havia um problema que eu conheci desde os oito dias do... mas enfim, uma coisa é nós dizermos que sim outra coisa é dizerem-nos que sim e foi talvez mais chocante para mim do que a interdição, porque como lhe digo foi um processo que decorreu pior para as pessoas envolvidas. Eu: Na sua ausência, quem pensa vir a ser o responsável legal mais adequado para o seu filho? Mãe: Possivelmente o meu filho mais novo, ele já é assim aqui sócio efectivo, ele vem muito aqui ao Elo, aliás neste momento faz parte do conselho fiscal e já o foi nos últimos órgãos sociais. Tem uma disponibilidade de tempo maior que a minha filha, a minha filha é médica, não guia porque tem uma deficiência de visão portanto o guiar seria sempre um risco e como médica tem o tempo muito mais ocupado e com menos possibilidade de ser

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ela a dizer o que quer porque ela é médica em São José não faz clínica particular, com menos possibilidade de alteração de horários. O João José é informático tem uma horário livre e portanto uma possibilidade maior de jogar com o seu tempo embora tendo uma situação, a sua vida não é tão bem arrumada como a da irmã, casou-se, divorciou-se, ficou com um filho voltou a juntar-se com outra é assim uma vida moderna, mas por ter menos prisões e ser dono de si próprio tem mais possibilidade de certo modo de se deslocar e estar mais presente. O... dá-se lindamente com a... e o cunhado mas realmente eles têm uma vida desgastada. Eu: E, qual pensa ser o melhor lugar para responder às necessidades do seu filho no futuro? Mãe: A Associação porque tem o Dr. … que já anda a algum tempo preocupado com o problema do envelhecimento que é o problema que para mim está presente há muito tempo, já tenho falado sobre ele com o Dr. … aliás já temos falado nisso muitas vezes, eu sei que há muitos pais que não querem falar sobre isso, não sei se não se apercebem se estão também a não querer aperceber-se da necessidade de se ir alterando dentro da instituição alguma coisa, há coisas que os nosso filhos já não podem fazer dentro de três quatro anos, mas eu penso que a Associação, o Dr. … já está a orientar as coisas de maneira a dar resposta àqueles que estão a ficar mais velhos porque eles aos poucos vão deixar de poder fazer uma série de coisas que fazem hoje não há possibilidade. A minha confiança na Associação é na Associação porque tem por trás um Dr. … porque está desde já a estruturar (acho eu) a resposta que os nossos filhos mais velhos… agora temos aí alguns mais novinhos, mas terá de haver uma evolução pelo menos parcial para essa resposta aos nossos filhos mais velhos. Eu acho que isso vai ser uma resposta que vai existir, em que eu colaborarei no que for necessário porque estou disponível para esta casa enquanto for viva, mas acho que vai haver essa resposta! Eu: E que coisas são essas que têm que mudar? D. Manuela: Eu não sou muito imaginativa, está bem, fora dos números não imagino muito, mas acho importante que tenham algumas actividades, porque eu julgo horrível o sistema dos lares em que as pessoas estão em muitos deles com certeza, já visitou lares, na altura também visitei alguns porque nem foi para a minha mãe, mas para a irmã dela que já tem 100 anos (risos) e na altura em que a minha prima começou a procurar uma resposta para a mãe, porque já estava a ter uns AVCs estava quase incapacitada e portanto a minha prima da minha idade também não tinha possibilidades de cuidar de uma pessoa que estava acamada, agora não está mas na altura estava e pediu-me para ir com ela ver alguns lares e é uma sensação chegar a um lar e ver uma data de cadeiras à roda e tudo ali à roda à espera que o dia chegue, a maioria dos lares é assim, aquele em que a minha mãe está as pessoas têm o seu quarto e portanto muitas delas, é um andar muito bom na António Augusto Aguiar, mas está ali assim nos maples com a televisão a trabalhar mas conversam umas com as outras. Quer dizer não é dos piores que eu tenho visto, têm as pessoas separadas as mais incapacitadas para um lado e as menos para outro com as vantagens e desvantagens que isso tem obviamente… é horrível… portanto não quereria que fosse uma casa assim é onde eu queria chegar, quereria que eles continuassem a ter actividades mas acho que essas actividades vão ter que ser estudadas e adaptadas em função da idade que eles têm. Quais são? Não me peça! O que é que eu gostaria não lhe sei dizer! Queria que ele e os outros porque nós na nesta casa não podemos pensar só no nosso filho, queria que eles tivessem alguma qualidade de vida e não se sentissem uns trapos uns monos que estão ali à espera que acabe o dia. Não sei se é possível, até porque se já é difícil para as pessoas chamadas normais bem mais difícil há-de ser para pessoas com deficiência.

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Teremos que fazer aqui dentro uma adaptação, que eu não sei qual é, espero que continuem sempre a ter um apoio de ginástica de fisioterapia para que não fiquem com as juntas todas perras, que continuem com o seu jacuzzi têm lá em cima a sala de relaxe, possivelmente terão que se virar mais para estas actividades mesmo aqueles que hoje não fazem uso destas valências, possivelmente terão que alterar a sua vida no sentido de usufruírem mais desse tipo de apoios para que o seu organismo não se vá deteriorando tão rapidamente, mas temos que pôr de parte outras coisas, não podemos estar a pensar que eles vão continuar a manter o mesmo numero de exercícios que fazem hoje, mesmo o ir àqueles encontros inter-centros tudo isso, aos poucos com certeza vão deixar de ir, porque nós temos aqui os centros de terceira idade para os jogos, qualquer dia são os nossos que são da terceira idade aqui dentro (risos). Tem que haver seguramente uma evolução que será parcial, porque temos jovens que não podem ser sacrificados pelo envelhecimento de alguns, mas temos também que perceber que esses mais velhos não podem continuar a acompanhar as mesmas valências que fazem os mais novos. Como é que isso se resolve? Há eu isso não sou capaz de lhe responder! Acho que tem que se resolver, acho que é uma necessidade absoluta, mas não lhe sei dizer… Já tenho falado com o Dr. … se calhar os nossos CAOS têm que ser alterados de maneira a eles terem outras actividades que sejam mais adequadas a pessoas com maiores dificuldades que estes já têm… Eu: Obrigado pelo seu contributo! Não sei se quer acrescentar alguma coisa! Mãe: Estarei sempre disponível se necessitar de mais alguma coisa, conta comigo e obrigada eu.

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FAMILIAR 3 Associação…

7 de Julho de 2007, 15h Eu: Como se chama? Mãe Eu: Posso tratá-la por dona … Mãe: Não, Não já sou velhota mas chega só …! (risos) Eu: Qual a sua data de nascimento? Mãe: 29-11-1936 faço 71 este ano já. Portanto andamos sempre certas, foi sempre certo 71, 51 e 41, a minha filha, tenho uma filha mais nova. Tive a … com 20 anos e da outra tinha 30, de maneira que foi sempre assim com diferenças de 10 anos. Eu: Qual o seu estado civil? Mãe: Viúva, faz em Maio dois anos Eu: Quais são as suas habilitações literárias? Mãe: Tenho o 4.º ano de acesso, acho que se traduz ao 8.º ano agora. Eu: Qual a sua profissão? Mãe: Olhe sinceramente fui dona de casa quase sempre, mas em certas alturas da vida precisei de sair um pouco de casa até por causa da …, para sair e tal um bocadinho do ambiente de casa, é que eu tenho mais três rapazes, tenho 5 filhos. A... é a segunda e depois outro rapaz e outro rapaz e depois. Fiz um curso de mediadora de seguras na década de 90 tinha já quase 50 anos e gosto daquela adrenalina dos exames e daquelas coisas, e vendi numa empresa de telefones, eu tinha uma pessoa que gostava de mim e dos meus filhos, nós viemos de Angola, fomos ficando em Angola, acabei por casar em Luanda e os meus filhos todos também nasceram lá, e então tinha uma senhora que foi para a minha casa ainda o terceiro era pequenino e que me ajudava muito e era de muita confiança era como família, e então eles já eram crescidinhos e eu senti necessidade de fazer alguma coisa e então respondi aos anúncios tive nessa empresa de vendas por telefones e depois respondi ao anúncio para mediadora, fiz exame fiquei mas o meu marido era uma coisa não queria que eu trabalha-se e de maneira que eu acabei por ficar em casa. Depois o meu marido ainda chegou a fazer uma sociedade comigo porque ele era vendedor auto, para contornar um bocadinho os impostos mas aquilo também deu despesa e descontávamos para a caixa e os descontos que ele fazia depois tive direito a qualquer coisa depois de ele falecer. Eu: Neste caso actualmente a sua situação face ao emprego… Mãe: Neste momento estou reformada. Eu: A Mãe é mãe do … correcto? Mãe: Sim, sou mãe da... Rosa Eu: Quantas pessoas moram regularmente em casa? Mãe: Neste momento sou só eu e ela, os outros já estão todos casados ou vivem já fora de casa. Tenho 5 filhos a... é a segunda mais velha.

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Eu: Quem é o principal cuidador da sua filha? Mãe: Sou eu. Eu: Existe mais algum familiar portador de deficiência mental? Mãe: Graças a Deus não, a... também nasceu normal teve foi uma meningite mingocócita aos 17 meses e foi a desgraça dela ficou sem andar sem ver e devagarinho lá foi recuperando porque ela tinha um quociente de inteligência alto que já foi feito mais velhinha 12 15 anos. Eu andava sempre a procurar coisas não é mas não havia grandes recursos, ela teve uma professora especial que eu não sei como é que descobri ela tinha o curso de ensino especial era professora era numa escola normal. Mas acho que pôs um anúncio e por acaso até morava perto de mim e eu pu-la lá logo. Depois teve noutra também e as coisas foram andando devagarinho as coisas foram abrindo, depois teve internada um ano no Clapared, não sei se conhece, porque o meu marido naquela altura andava metido no vinho e eu vim cá através de uns amigos que era sócio do meu marido, tive também em casa de uma prima do meu marido que também me foram ajudar e acompanhar, fiz-lhe o enxoval e aquela coisa toda mas depois ela ia realmente um bocadinho diferente, uma mulher com muitos bons modos e tudo, porque ela às vezes era assim um bocadinho coisa e tal, mas coitadinha não sei porquê quando foi entregue às hospedeiras no avião, depois quando eu cheguei a casa vi que ela estava suja, a despesa que era realmente grande, e uma colega de liceu que nos foi visitar disse-me: ai Mãe em Lisboa há colégios tão bons para ela e tal, vais lá, não havia nada de especial, mas aquilo enfiou-se me na cabeça e eu não descansei enquanto ela não veio, mas acho que foi só um ano lectivo que ela cá esteve porque entretanto as coisas lá também evoluíram um bocadinho e eu achei que era melhor ela estar no ambiente de família, ir à escola durante o dia e então na escola andou sempre lá, e depois aqui na CERCI já fez a 4.ª classe. Quando voltámos para Portugal em 79 ela já era adulta. Eu: Como descreve o relacionamento que a … mantém com os irmãos? Mãe: É bom, às vezes são um bocadinho exigentes mas normalmente é bom. Em miúdos implicavam um bocadinho havia pouca paciência, mas nada de anormal, tanto que eu lutei muito para arranjar assim uma coisa onde ela pudesse ficar depois de eu partir! Não é porque é a preocupação de todos os pais que têm filhos assim! Até que um dia, respondia procurava pesquisava ainda não havia nada disto dos computadores mas através dos jornais e falava com as pessoas depois ouvi falar ainda não era o ELO era uma CERCI telefonei, marcaram-me uma entrevista, fui lá com ela fizeram muitas perguntas. Ela vinha sozinha, até há poucos anos ela vinha e ia sozinha mesmo aqui para o Elo só que depois ai à uns 5 anos mais ou menos começou a cair com facilidade, tropeçava não tem aquele instinto de ir com as mãos ou qualquer coisa vai logo com a cara ao chão de maneira que a Dr.ª … disse que estava a ficar perigoso a... vir sozinha, na rua e o movimento e tudo, então era o meu marido que a trazia agora há dois anos é que sou eu. Este fim-de-semana ela ficou cá, descansou um bocadinho não é, às vezes é muito difícil estar sempre a vir buscá-la e trazê-la porque ainda é longe, mas temos que fazer um bocadinho de sacrifício porque não quero perder o lugar dela aqui na Associação para quando eu falecer ela ter quem lhe dê apoio, não é. Já tenho tudo encaminhado da interdição dela, foi um bocadinho mais tarde do que devia ser, mas como é que se diz mais vale tarde do que nunca. Nós tivemos aqui na Associação um esclarecimento muito valioso com um advogado, foi uma sessão aberta a todos os pais, e ele disse que apesar de eu ser mãe se não tivesse nomeado a tutora oficialmente não tinha direito de decidir certas coisas sobre a vida dela. Ela andava sozinha e chega a uma determinada idade que chega o desassossego e sentem a sexualidade, porque é igual a nós e o nosso ginecologista

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aconselhou-me, mas isto depois se se tira sente-se muita falta e graças a Deus é o que me vale. (Silêncio, momento de tensão e a dona Mãe começou a chorar) Mas depois realmente eu achei que era o melhor para ela, houve um médico que me disse em certa altura que ela podia ter filhos perfeitamente normal e a senhora o criar e eu fiquei assim a olhar para ele. Eu achei que aquele traumatismo de parto ia ser horrível para ela, ela não tem muita paciência as crianças gostam muito de brincar com ela mas ela não tem paciência e eu achei que ela era completamente incapaz de criar um filho e mesmo com o meu marido isso eram coisas que não se punham, de maneira que acabei por tomar a decisão e depois vim a saber que podia ser presa por isso. Eu não lhe expliquei tim tim por tim tim o que ia fazer. Mas o processo de interdição já está em andamento, mas de qualquer forma a responsável pela... sou eu. Eu: Na sua ausência, quem pensa vir a ser o responsável legal mais adequado para o seu filho? Mãe: Este meu filho que vive cá é o protutor e uma sobrinha minha do lado do meu marido que se ofereceu que já está aposentada, ai meu deus agora não me lembro quem é a outra pessoa. MAS havia ideia, isso por acaso falta-me fazer é no notário fazer uma declaração de que por minha morte a tutoria dela fica entregue a Associação, porque por exemplo o protutor o que faz é levá-lo ao médico e acompanhá-la e se ela tem uma doença vai para casa e o meu filho é bancário e tem muita responsabilidade lá no banco não tinha tempo para fazer isso só se ele já tivesse uma certa idade e já estivesse aposentado mas ele ainda tem 40 anos e de maneira acho que a ideia do elo é criar um grupo de colaboradores que vão ocupar-se só disso porque eu ainda tenho mais filhos mas há muitos casos aqui que são filhos únicos. Quer dizer já têm deixado a Associação. De maneira que eu o que penso fazer é quando eu falecer ela ficar aqui, e o meu marido antes de falecer já estava a par e foi ele que coitado que… Mesmo eu já disse aos meus filhos e a quem quisesse ouvir que acho que a justiça é entregar a parte da minha filha a Associação uma vez que ela esteja aqui e embora o protutor possa sempre seguir as coisas e ver se as coisas estão bem geridas porque isso é exigência do tribunal embora da minha parte já fiz só falta isso, mas dizem: não tem pressa nenhuma Dona Mãe porque também não vai morrer já e eu digo há não sei às vezes sou tão distraída a atravessar a estrada agora já estou um bocadinho mais atenta depois dos sustos que já apanhei, estou um bocado mais atenta, agora tenho um bocadinho de mais cuidado com a minha saúde porque não posso falhar por causa dela não é, não tem mais ninguém agora para tomar conta dela. Eu: O que é para si ter um filho portador de deficiência mental? Mãe: (silêncio) é um caminho muito difícil mas agente aprende a viver com isso, o melhor possível e até a ter momentos de alegria porque são sempre inocentes. Agora no outro dia achei uma graça, ai sei lá para ai até aos 15 anos ou mais, e para mim a ... nunca fazia nada nunca era culpada de nada, porque ela é muito alegre muito faladora muito generosa, e também tem o seu mau génio às vezes e da outra vez o Dr. … disse-me olhe que a ... não é boa cachopa (risos) porque ele claro como psicólogo e porque está aqui toda a semana conhece-os às vezes um bocadinho melhor que os próprios pais, mas é assim agora somos só as duas. Mas ela gosta muito de ir para as amigas pelo menos três amigas que são um bocadinho mais velhas do que ela, uma não é da mesma idade ou mais nova até, tem um talho ela adora ir para lá, ela dá-lhe uma bata e ela faz os hambúrgueres e tudo isso, a melhor coisa que lhe podem dar é ir ao sábado à Mariete, depois ela convida-a para almoçar e fica lá e depois como tem carro vai levá-la a casa à tardinha lá para a noite é o melhor que lhe podem fazer ao fim de semana e tem outras amigas, outra que coitadinha vive lá sozinha mas está um bocadinho mais longe, teve umas tromboses e já não trabalha

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coitada e às vezes vai lá visitá-la lá a casa mas ela não gosta muito de a ver assim e eu digo-lhe que está assim mas precisa de ti, sempre foi uma grande amizade entre as duas mas como ela agora não sai está ali em casa. Mas é engraçado quando vai diz ai a Preciosa estava tão contente ajudei-a a fazer a cama ou a passar a ferro ou qualquer coisa assim, ela passa muito bem a ferro. Nós tínhamos uma lavadeira africana e ela gostava imenso de ir para a garagem ao fundo do jardim e ela então adorava porque os africanos têm um carinho muito especial pelos deficientes e então adorava lá estar ao pé dela sentava-se lá numa cadeirinha e aprendeu de tanto ver passar que passa uma camisa de homem muito bem. E depois aqui na Associação fez a 4.º classe, logo ao princípio aqui na Associação ainda era ali um barracão era o Dr. … já nessa altura e outro professor e ele disse a ... fez a 4.ª classe mas sem favor, porque há muitos normais que fazem pior figura do que ela, gosta de ler e tal é um bocadinho preguiçosa para escrever, gosta de ler revistas porque o livro depois perde o interesse, a televisão é que ela gosta. Uma pessoa com deficiência mental é uma pessoa especial. Normalmente eu ligo como ela como nada fosse, mas ela em casa é tramada para fazer qualquer coisa, diz que faz e ajuda e tal mas depois e eu às vezes se eu mandar ela faz mas claro eu é que tenho que ir fazendo as coisas devagarinho às vezes eu é que já não tenho paciência para estar sempre a dizer-lhe para fazer alguma coisa. Mas ela gosta de cozinhar e assim, eu é que agora já vou almoçar à associação dos reformados e a reforma também não é muito grande mas também não pago assim nada por ali além, de maneira que tenho assim a vida um bocadinho mais livre e orientada. Eu: Como se processa o quotidiano da sua filha? Mãe: Ela está cá durante a semana, mas levanta-se relativamente cedo toma banho, isso a higiene pessoal é o que ela me dá mais trabalho, tenho que andar sempre de volta dela. Agora quando foi para a praia mandei-lhe uns pensos mas elas não ligaram e depois estava para ir buscá-la e a minha nora ofereceu-se para vir cá comigo, a ... tinha uns calções brancos e eu perguntei-lhe se ela tinha feito xixi, ela despachou-me e claro disse sim já fiz. No caminho ora com o calor veio o cheiro, quando chegámos fui com ela à casa de banho: e disse-lhe! hó ... parece impossível então tu entras-te para o carro assim, os calções dela estavam todos molhados claro eu nem perguntei à minha nora ela que é toda cuidadosa com o carro! E a outra tal amiga a Mariete no outro dia foi levá-la a casa, ela distrai-se, aguenta muitas horas mas não é o dia todo, tem que ir e quando ela está em casa antes de comer mando-a sempre fazer xixi, e aqui se ela fizer antes do lanche e antes de deitar isto não acontece, mas de vez enquanto acontece. Graças a Deus aos anos que na cama não faz, às vezes se está excitada numa festa numa alegria mas de resto não acontece. Por isso é que quando temos alguma coisa eu não lhe digo com muita antecedência. Ela faz a higiene pessoal dela mas claro se quero que fique bem (disse em baixinho) tenho que ser eu a lavá-la porque ela aldraba um bocadinho. E é isso o que me dá um bocadinho de mais trabalho desde ir buscá-la e trazer. Mas para mim uma pessoa deficiente pronto é um caminho para o céu, o que não quer dizer que eu muitas vezes não me impaciente com ela infelizmente às vezes isso ainda acontece mesmo com esta idade. Quando ela faz assim umas coisas, outra coisa que me custa é ela estragar-me coisas em casa e mexe em tudo, uma coisa que ela não pode ver é um produto qualquer, por exemplo os desodorizantes, tem um papelinho com a marca, e ela tira o papel para mascar e eu desde que descobri que ela engolia as chiclets nunca mais lhe dei, é para engolir, ela adora fita-cola tudo o que é de fita-cola rasga para mascar e acho que os papéis aquilo tem cola não sei, seja do que for seja um creme não interessa, tudo o que foi para o Algarve veio sem papel. Isso, eu já estou habituada…

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Eu: O que significa para a Sr.ª ver a sua filha envelhecer? Mãe: Olhe isso eu estou mais do que preparada não é, nós também não melhoramos com a idade e eles muito menos, eles demoram muito mais tempo a envelhecer é engraçado que ela até aqui à uns anos ninguém lhe dava a idade que tinha, ficavam admirados quando ela dizia que tinha 40 ou 45, mas também quando começam caiem um bocadinho mais depressa foi isso que o Dr. … me disse porque noto no andar dela que ela está muito não sei, também é de não andar à vontade porque ela antes deste problema de não vir sozinha adorava fazer recados, às vezes saia asneira, escrevia-lhe num papelinho mas se ela resolve-se fazer pela sua cabeça e não ligar ao papel claro que … mas normalmente fazia bem trazia o troco, e adorava fazer recados às pessoas amigas, claro mexia-se bastante mais. Aqui na Associação, agora acho que já a deixam andar sozinha, mas ela caiu dois dias seguidos, a primeira vez abriu o queixo e a Dr.ª … telefonou-me a dizer Dona … onde é que está, estou a apanhar o autocarro para aí, ela disse não venha porque a menina está aí no hospital. A segunda vez foi o nariz, por acaso não partiu porque já uma vez aqui bateu numa porta e partiu, mas estava tão inchado com duas pancadas dois dia seguidos, que o Dr. … disse não isto é demais não pode ser esta menina não anda mais sozinha quando sair da sala alguém a leva pela mão, se não tropeça basta uma pedrazinha mais saída. Até foi num sítio onde ela estava farta de passar ali à saída da sala, não sei como é que ia, ia a enfiar o casaco não sei, assustaram-se imenso todos por ela porque pensavam que ela tinha partido braço. E depois dois dias seguidos, eu nem queria acreditar quando a Dr.ª … me disse então mas disseram que ela não se tinha magoado ontem! O que foi? Não não foi o de ontem magoou-se hoje outra vez! De maneira que, mesmo quando ando com ela na rua nunca vai sozinha vai sempre com o braço dado ou com a mão bem presa, já uma vez caímos as duas (risos) ela caiu e eu também, ai minha nossa senhora, porque ela é pesada e eu não ia atenta se calhar e não aguentei cai atrás dela, mas foi só uma vez também, mas mesmo assim ultimamente não tem tropeçado muito, eu estou sempre a dizer para ela levantar bem o pé… Eu: À medida que a sua filha vai envelhecendo que alterações tem observado? Mãe: Está um bocadinho rabugenta às vezes e tal, e ela saúde realmente é saudável ela nem teve as doenças que os irmão tiveram em pequeninos como o sarampo por exemplo. O que eu noto mais é o andar, eles até têm cá fisioterapia e ela deixou de ir à natação porque uma vez cortou lá um pé e como estávamos a quase no fim do ano… não disse nada, mas agora para o ano vou ver se ela continua ir à natação porque lhe faz bem, mas ela não se importa ela quer é estar sossegadinha e às vezes é assim um bocadinho impaciente aqui com os colegas por aquilo que eu sei, havia ai um então que tiveram que ser separados, eles são todos doentes agente não pode dar razão nem a um nem a outro. De maneira que o que eu noto mais nela é o andar assim um bocadinho inclinada para a frente, e eu digo-lhe: hó ... endireita as costas! De resto falar fala bem, há usa óculos, foi no ano passado em Agosto, não sei que é que ela se queixou, teve dificuldade em ler qualquer coisa, e disse-lhe mas então tu não consegues ler as coisas, e tu não dizes nada, às vezes é aquela coisa de eles não dizerem nada do que sentem, e agente nem sempre estamos as ver as coisas, de maneira que agora usa óculos, já há um ano, numa das quedas ficaram todos tortos, mas adaptou-se lindamente, eu quando tive que me adaptar a estas lentes progressivas sai e voltei para trás a chorar porque o chão parecia um buraco, ela foram logo progressivos e não teve o mais pequenino problema. Eu: Quais as suas preocupações em relação ao futuro da sua filha? Mãe: Eu já desde o início, é engraçado mas agora já há muito tempo ainda o meu Marido era vivo, que os pais estavam num pessimismo uma coisa, ai queriam que os filhos

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morressem à frente deles! Eu não sou capaz dizia eu, porque ela é muito alegre e gosta de viver e pronto é feliz com pouco eu também sei isso. Desde que tenha pessoas que a estimem a levem à Mariete que ela adora e a Preciosa e a uma outra senhora que é nossa vizinha que se chama Dona Ermelinda. Em casa aguenta-se assim um dia, mas agora em Agosto já sei que ela não vai parar em casa e eu também vou dizer a verdade eu muitos dias com ela sempre ao pé de mim também não fico muito bem, começo a fazer a minha vida normal com dificuldades, fico com a minha saúde mental afectada! Sempre lutei muito por ela, mas sinto que quando ela faz sempre as mesmas coisas as mesmas tolices e principalmente eu como já estou muito escaldada que ela está longe de mim eu não estou a ver, não é que a casa seja muito grande… Mas não penso nada assim como outros pais acho que ela ainda pode viver muitos e anos e como tenho uma grande confiança na Associação e nas pessoas que cá estão e as que também vão ser escolhidas futuramente, porque o meu filho também é sócio efectivo, na minha falta é ele que a vem buscar e essas coisas todas, quando é preciso vem às reuniões quase sempre não é, e isso também me foi logo dito pela Associação, não havia mais nenhum sócio efectivo porque há muitos sócios, uns são só sócios outros são sócios efectivos que têm obrigação de vir às reuniões para tomar as decisões e votar. E portanto nós temos que confiar, de maneira que todos têm mesmo que confiar. E tenho preparado a ... devagarinho brincando com humor, sem dramas e coisas e digo-lhe olha já sabes que quando eu for para o céu ficas na Associação, e ela está farta de saber isso que é a casa dela, de maneira que sinceramente neste momento não tenho grande preocupação, isso sim tive essa preocupação quando sei lá há uns 20 anos ou 20 e tal já ela tinha uns trinta anos, viemos de Angola em 1975 e depois fomos para a aquela casa em 1979, e andava à procura de qualquer coisa até que foi construído a Associação, acho que já conhece o Dr. … isto para ele é um sacerdócio, ele é aplicado a eles de corpo e alma, e agora tem o sobrinho que é exactamente a mesma figura dele, é mais novo mas também é uma óptima pessoa e de maneira que não vivo preocupada com isso, preocupa-me um bocadinho com a minha saúde, tenho os meus cuidados porque a ... precisa de mim, porque se fosse só por mim eu morria já hoje (momento de grande tensão, a dona … começou a chorar abruptamente, perguntei se ela queria fazer uma pausa, desliguei o gravador e respeitei o seu sofrimento) Mas era um gesto inconsciente, por ela claro, porque se eu ficasse sem andar ou assim ela tinha que ficar cá na Associação sempre. Aqui há um anos, dois anos, foi logo a seguir ao meu marido falecer, dei uma queda tremenda foi distracção havia um degrau e eu pensei que era a direito e fiquei estendida no chão, e fiquei um bocado atrapalhada da coluna andei em médico e tal até que vi que tinha que recorrer a outra coisa para me curar por causa dela e claro tinha recebido o dinheiro da segurança social que é um bom dinheirinho mas de que me serve o dinheiro se não tiver saúde para cuidar da minha filha. Durante dois meses era o meu filho que vinha cá, era o protutor que a vinha trazer e levar, eu não podia custava-me andar. E perdi o amor ao dinheiro e gastei e fui a um médico muito bom que eu recomendo, fazia fisioterapia e depois voltava ao mesmo, ou eu ficava inutilizada ou então não sei. Eu: E o que diz a sua filha sobre ficar cá na Associação? Mãe: Há não se importa ela gosta de vir, ainda por exemplo em Maio teve duas semanas em casa e em Junho também teve, porque quando há um feriado à quarta-feira eu não posso vir pô-la à segunda para vir buscá-la à terça, também tem que se poupar um bocadinho e ela já estava com saudades de vir para a Associação. Eu: Enquanto mãe, quais as suas necessidades?

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Mãe: A saúde, o pão nosso de cada dia, não peço mais do que isso e a graça de Deus acima de tudo porque ela depende só de mim, agora a saúde também depende de nós mas nem sempre controlamos o que possa aparecer, faço análises todos os anos, tenho um bocadinho de cuidado continuo a ir uma vez por mês ao médico da coluna. Eu: E, qual pensa ser o melhor lugar para responder às necessidades da sua filha no futuro? Mãe: Se não fosse aqui aonde é que ela devia ficar, ao fim de semana acredito que os irmãos a venham buscar, este que vive mais perto porque o outro vive em Setúbal e os outros estão no estrangeiro e o único que vive cá é aquele que é pró-tutor dela, de maneira que não é viável ela ir viver com os irmãos, podem eventualmente vir buscá-la ao fim de semana dar um passeio, acho que é realmente o melhor para ela estar aqui com pessoas que são especializadas e estão preparadas para lidar com eles e que a tratam bem e ela é feliz, passeia também, ela conhece melhor Lisboa do que eu saiem ao fim de semana, saem menos mas mesmo assim antigamente saiam todos os domingos. Eu: Obrigado pelo seu contributo dona …! Mãe: Desculpe ter falado tanto… Eu: Ora essa só tenho a agradecer….

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FAMILIAR 4 Associação…

21 de Junho de 2007, 15h:20m

Pai: Posso só fazer-lhe uma pergunta! Esta Investigação que a Dr.ª está a fazer foi pedida por quem? Eu: Expliquei o contexto e os objectivos do trabalho… Pai: Vamos ter aqui uma óptima colaboradora! Tem objectivos bem fundamentados, porque só explorando este assunto é que se pode obter bons resultados. Eu: Introduzi a entrevista. Eu: Como se chama? … sou pai do … Eu: Qual a sua data de nascimento Sr. …? Pai: 24 de Maio de 1928 Eu: Qual o seu estado civil? Pai: Casado Eu: Quais são as suas habilitações literárias? Pai: 4.ª Classe Eu: Qual a sua profissão? Pai: Eu trabalhei no campo a partir de determinada data, naquela altura os filhos dos pobres eram o braço dos pais e tinham que ir trabalhar e trabalhei no campo como servente e mais tarde entrei na Fundação Gulbenkian como auxiliar administrativo e a partir daí pronto já sou reformado. Eu: O Sr. … é pai do …, como já me tinha dito, e quem é o principal cuidador do seu filho? Pai: Eu e a minha mulher. Nós tínhamos outro filho que morreu e o outro nosso filho tem um menino mas há certas características nas pessoas e eu pedi à Dona … para ficar responsável pelo … pelo facto do irmão Pedro ter muitos problemas e não ser a pessoa mais indicada. (o Sr. … emocionou-se e o facto de ter algum problema na voz, o gravador não conseguiu captar a totalidade do discurso, …) Eu: As questões relacionadas com a legalidade e com quem gostaria que o … ficasse, era uma pergunta que eu preparei mais para o fim mas já que está a falar sobre isso, quando diz que a Dona …. é a outra pessoa que ficou também responsável isso significa que vai ser na vossa ausência tutora do …? Pai: Eu nunca entrei com os papéis para ser nomeado um tutor, para isso tenho que ir ao tribunal para que isso aconteça, de facto nós gostávamos que ela fosse responsável pelo ... e quer dizer que fosse uma garantia para o futuro dele, não lhe sei responder sinceramente, isto está tudo em stand by, mas em todo o caso ele já foi ele já está praticamente quer dizer interditado, está interditado já desde, eu sinceramente nem sei bem. Ela e a Associação, vamos supor, alguém que se possa responsabilizar pelo futuro do …, porque é o problema

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de todos os pais, o meu filho quando eu morrer…o que é que há-de ser do meu filho quando eu morrer, eu morro eu sei que vou morrer e depois vou ter imensas dificuldades, eu não mas quem cá fica. É um problema vamos ter grandes dificuldades em arranjar ou nomear um novo tutor. Não temos ninguém na família não temos ninguém e isso vai criar problemas penso que nos próprios pais. Eu: Quantas pessoas moram regularmente em casa? Pai: Somos três, ele o pai e a mãe. Eu: Ainda há pouco falou-me que o … tem um irmão com alguns problemas, mas existe mais algum familiar portador de deficiência mental? Pai: Não, havia uma pessoa com deficiência na família mas já há muitos anos que morreu, era irmã do meu pai… Eu: Pode falar-me um pouco sobre ela? Pai: Era assim fugia de noite e ia para os campos sozinha, um sapato aqui acolá, tentavam encontrá-la mas depois voltava sempre à mesma situação. Mas mais recente não, nem os meus pais nem irmãos. Da parte da minha mulher também não me consta que tenha havido alguém! Eu: E qual pensa ser a causa da deficiência do seu filho? Pai: O … já nasceu assim, creio ou quase que tenho a certeza que foi devido ao parto, prematuro, muito fraquinho e tudo isso deve ter contribuído para essa situação. Eu: O que é para si ter um filho portador de deficiência mental? Pai: Isso é um grande mal, eterno, sofre-se muito. E é especial ao mesmo tempo, não é uma pessoa normal que tenha um futuro risonho que pudesse vir a constituir um lar, enfim isto é tão complicado se calhar não dá bem para descrever bem a monstruosidade do problema. (silêncio) Eu: O que significa para si vê-lo envelhecer? Pai: Vamos bater no mesmo, o que eu vejo é que isso se aproxima cada vez mais rápido e que se evolui constantemente. É que nós mesmos temos dado por isso vê-se que o ... está a envelhecer precocemente, ele nunca foi assim muito despachado e agora dá-me a sensação que está cada vez mais lento, pergunta tudo, eu já nem falo do acumular de problemas é um problema no seu todo é um problema que abrange tantas coisas que enfim… que incomodar não é termo não é uma questão de incomodar é uma situação, é um problema sem solução e como é um problema sem solução nós vamos embora e o que será, o que será a partir daí? Mesmo a nível da permanência dele aqui na Associação o que é que pode acontecer? Eu nunca coloquei esta questão à Dona … ou ao Dr. …, mas é assim, como disse aqui há pouco vivo exclusivamente dos meus rendimentos da reforma, mas eu morro deixa de haver rendimentos, não há quem pague a contribuição da casa e não há quem pague outras coisas, o que é que vai acontecer, isto é o que eu prevejo e vai as finanças vão apanhar tudo por falta de cumprimento de pagamento das coisas, como é que é! Vai viver na rua! Eu prevejo porque isto vai acontecer, porque não há rendimentos para suportar os encargos e depois isto é super complicado é como é que isto quando a Dr. me falou como é que eu vejo o envelhecimento do …, eu já estou a tornar-me repetitivo mas acabo por voltar a dizer-lhe que está a envelhecer precocemente. Eu: À medida que o seu filho vai envelhecendo que alterações tem observado?

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Pai: O … é um bocado complicado viver com ele porque ele é difícil as características da doença dele são muito difíceis, nós pais tentamos sempre levar a água ao moinho da melhor maneira, mas por vezes acabamos por nos calar, ou fazê-lo sentir um bocadinho por nós, não achas …? mas quem é que trata de ti não é o pai e a mãe, temos carinho e… depois ele reconhece que … mas por sistema ele é um bocado refilão, não é fácil haver um bom entendimento se não houver boa compreensão da parte dos pais e isso é que faz diminuir a água na fervura. Parece-me que ele está a ser mais, para ser franco, a demorar mais tempo a fazer as coisas que fazia já em certo tempo, muito confuso, começa a fazer uma coisa e não a termina, se limpar o quintal deixa ficar o lixo deixa ficar aquilo assim, quando dantes não. Pois outra coisa agente tem que insistir para ele o ir tirar ou então… é muito instável, muito instável. Ele sempre foi assim instável desde pequenino que a mãe se via em trabalhos com ele, porque ele carece de muitos cuidados para além da deficiência mental que tem carece de outros problemas de saúde tais como um problema hemorroidal bastante agravado e problemas no estômago, de maneira que… se eu tivesse feito um apanhado das perguntas que me iam ser feitas podia realmente ter feito uma reflexão mais profunda e ser mais esclarecedor! Eu: Eu vou tomar em consideração a sua proposta, e se o Sr. … achar que quer reflectir um pouco sobre o que estamos a conversar e voltar noutra ocasião para conversarmos melhor, sinta-se à vontade para isso. Pai: Mas a Dr.ª não tem dificuldade em perceber o problema que existe eu sei que não tem dificuldade por isso quero responder-lhe que não vale a pena eu ir para casa e pensar falta-me dizer isto ou aquilo, porque eu penso, penso não! tenho a certeza absoluta que a Dr.ª está a aperceber-se de todo este problema e será fácil chegar a uma conclusão, por isso penso que podemos continuar. Eu: Então vamos continuar… Sr. … como se processa o quotidiano do seu filho? Pai: É assim ele é muito cuidadoso com a sua higiene, eu digo-lhe tomas banho à noite e ficas logo despachado e ele diz-me não porque de manhã vou mais fresco, e tem razão. Então de manhã levanta-se e barbeia-se, toma banho e ele só precisa e ajuda para lavar as costas de resto é muito cuidadoso, porque ele levanta-se vai à sanita mas senta-se logo no bidé. Isto já começando portanto a responder à sua pergunta, tudo a tempo suficiente, embora às vezes impulsionado por nós pais para desenvolver o que está a fazer e então ai pelas 8 e 15 isto já no fim de estar vestido vai para a Associação sozinho, eu acompanho-o à distância. Eu: E ele sabe que o vigia? Pai: Sabe claro que sabe, nós moramos aqui ao pé é só atravessar aqui a avenida para o outro lado. Ele sai de casa, quer estabelecer diálogo seja com quem for com plena irresponsabilidade, ele não fala mal a ninguém, não trata mal ninguém é muito curioso, desculpe a expressão é um “pega massa” (risos), adora conversar. Pronto mas eu mantenho a distância e ele topa-me sempre. Entra para a Associação e eu fico sossegado. À vinda eu mais ou menos também estou aqui nas proximidades a observar o ambiente a ver se ele entra aqui na ponte. Chega a casa faz aquelas sopinhas de letras, adora fazer isso e quando sente mais dificuldade pede ajuda, isto é depois de ele sair daqui da Associação. Fica por aqui, vê televisão, vai para o quarto ouve música tem lá as coisinhas dele, brinca como uma criança, qualquer coisa serve para brincar, entretanto janta e vê televisão e vai dormir. Eu: Como é que se processou a vinda do … para a Associação? Pai: Olhe ele andou num colégio de reeducação pedagógica no Areeiro, teve lá alguns anos acho que foi dos 11 aos 15. Destabilizava o ambiente dos outros, embora houvesse lá

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outros com o mesmo problema dele, mas pronto. E então tive que o tirar de lá. Entretanto trouxe-o para casa e pronto pois veio para aqui. A segurança social exigia 25 utentes para dar inicio ao Elo, e havia ai uma senhora que é sogra da Paula … aqui da secretaria que acaba por me dizer que tinha uma menina em casa numa cadeira de rodas e essa senhora como fazia a cobrança das cotas da Associação, e o … já estava inscrito, e essa senhora disse ai não me diga que o … não vai entrar, depois houve pessoas que me influenciaram para pedir a alguém da junta que pudesse influenciar, bem conclusão Ele foi chamado! Um dia tive coragem de perguntar ao Dr. … se alguém da junta tinha influenciado a vinda do … para aqui. O Dr. … disse-me abertamente que não, era só para saber se devia agradecer a alguém, o Dr. … disse que não, então devo-o à Sr.ª dona Carlota e à tal menina Paula e ao Dr. …. Ele veio para cá, não me recordo bem se ele veio, é porque houve alguns que foram transferidos da CERCI para aqui, mas agora não sei bem se ele veio logo, a minha mulher sabe de certeza ela lá nisso é fantástica, se ele veio logo para aqui no inicio quando abriram a Associação ou se foi logo um pouco depois, ele está cá desde 1991, mais ou menos. Eu: Quais as suas preocupações em relação ao futuro do seu filho? Pai: As minhas preocupações, peço desculpa eu já manifestei sinceramente não sei o que mais dizer sobre isso. É o eu ir para o outro lado e como é que eu vou e deixo-o cá? Eu: Enquanto pai, quais as suas necessidades? E as da sua esposa? Pai: As minhas necessidades, era ter alguém que tomasse conta de mim do … e da minha mulher e do filho. Mas é assim porque eu a minha mulher e o ... não temos ninguém, porque o Pedro de que já lhe falei, é um rapaz, custa-me imenso dizer isto porque eu gosto imenso dele, eu gosto imenso dele, amanhã se Deus quiser vou vê-lo porque nós vamos vê-lo todos os fins de semana, mas como no sábado tenho que estar aqui na Associação para receber o ... que vem da praia, já não posso lá ir como é hábito então vou antecipar e vou amanhã para a Aroeira, amanhã que é sexta-feira e no sábado de manhã vou receber o .... Gosto imenso dele e custa-me muito dizer, mas é um homem que tem 35 anos, olhe sou péssimo para datas, nasceu em 1971. Ele actualmente está a trabalhar, mas o que me custa dizer e não vou dizer mas é um homenzinho com quem não posso contar, porquê! As pessoas que são apanhadas na teia se têm algum carácter vão perdê-lo, toda a vida, eu não posso contar com ele. Eu: Esses problemas interferem na relação que ele mantém com o …? Pai: Não, não não, vamos lá ver eles dão-se bem, mas para o Pedro seria um alivio enorme libertar-se completamente do irmão. Se o … pede alguma coisa ao irmão, ele às vezes diz deixa-me estar sossegado. Não tem muita paciência, mas não são agressivos não têm nenhum problema. Têm uma relação boa, mas distante. Era um grande fardo que tiravam das costas do irmão, se o … desaparecesse da vida dele. Eu: E, qual pensa ser o melhor lugar para responder às necessidades do seu filho no futuro? Pai: é uma pergunta muito difícil, não é fácil responder! Eu queria para o …porque já se sabe que ele não tem capacidade para se orientar. O que é que eu desejava para ele, que alguém se responsabilizasse por ele, mas queria que alguém tomasse conta dele até aos últimos anos dele, que ele fosse uma pessoa cuidada por alguém e estimado enquanto fosse vivo. O ideal seria um lar onde pudéssemos estar os três, pois como já lhe disse não temos mais ninguém.

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Eu: Que tipo de actividades podem fazer o … feliz? Pai: Eu não lhe sei responder a essa pergunta em concreto, não sei responder a isso, acho que não há nada mais que vá fazer o … melhorar as suas capacidades. Se quer que lhe diga nem sei bem que actividades o … faz cá na Associação, sei que faz umas coisas manuais mas o grande problema é a falta de trabalho. Mas penso que é importante, actividades que mantenham as suas capacidades. Eu: Sr. … quer acrescentar algum contributo sobre este tema? Pai: Só nós, eu e a minha mulher, sabemos o quanto temos pensado no envelhecimento e o quanto é importante haver alguém que se preocupe com isso! Eu não vou deixar de dizer à minha mulher o tema da nossa conversa que me agradou muito, gostei muito de falar consigo, senti-me muito acarinhado por si! (o Sr. … não conseguiu conter as lágrimas). É gratificante para os dois, espero que tenha muito sucesso porque isso é importante para si e para nós! Eu: Muito obrigado por tudo Sr. …. À saída expliquei que ia falar com o … na próxima semana e ele disse: Pai: Espero que tenha sorte porque é um bocadinho difícil, e um bocadinho mentiroso! (risos)

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Apêndice 9

Título: Transcrição das entrevistas aos profissionais da Associação

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PROFISSIONAL 1 - ENTREVISTA À ASSISTENTE SOCIAL

Associação… 1.ª - 5 de Julho de 2007, 17h

2.ª – 9 de Julho de 2007 – 14h Observação: A entrevista foi dividida em duas sessões por impossibilidade da Assistente Social em concluir a mesma. Por outro lado a entrevistada revelou algum nervosismo com a presença do gravador e em determinado momento sugeriu repetir algumas questões noutro momento. Sendo assim, numa segunda vez voltámos a abordar algumas questões já efectuadas. De forma a distinguir o contributo dado num segundo momento, destacamos a negrito as perguntas elaboradas pela 2.ª vez. Eu: Como se chama? A.S.: … Eu: Qual a sua data de nascimento? A.S.: Eu sou do ano de 1965, tenho 42 anos. Eu: Quais são as suas habilitações literárias? A.S.: Tenho uma licenciatura em Serviço Social. Eu: Há quanto tempo exerce a profissão de assistente social? A.S.: Há 15 anos, acabei o curso em Julho e entrei na Associação em Setembro vim logo de imediato trabalhar para a Associação, aliás eu até fui admitida a 31 de Julho. Eu: E há quanto tempo trabalha com pessoas portadoras de deficiência mental? A.S.: Há 15 anos, nunca trabalhei com outra população sempre me mantive aqui. O que para mim tem sido positivo, gostei gosto e mantenho-me cá. Eu: Quais os motivos que a conduziram a vir trabalhar com pessoas portadoras de deficiência mental? A.S.: (risos) Foi o próprio emprego, eu sou sincera estava acabar a formação vi um anúncio que a Associação precisava de uma técnica de Serviço Social, calhou estar afixado no placar da escola que foram lá afixar à espera de encontrarem alguém recém-licenciado. Tirei a licenciatura no Instituto, concorri e cá fiquei. Eu: O que é que sentiu quando veio trabalhar para esta instituição? A.S.: É assim para mim não era novidade a Associação, eu já conhecia a Instituição até porque eu já tinha feito estágio na área da deficiência, já me sentia um pouco mais à vontade na área da deficiência que não foi a minha escolha inicial. Estagiei no Centro São Vicente Paulo porque o Centro queria iniciar uma valência de CAO para dar resposta a pessoas com deficiência ali do bairro da Serafina e da Liberdade e nós agarrámos esse projecto e foi o nosso estágio. Foi fazer um levantamento das pessoas com deficiência desses bairros, não sei se conhece a zona, mas dá resposta aos idosos já dava na altura às crianças até ao Atl e faltava a área da deficiência, tinham aberto à pouco tempo um lar terminal para pessoas já em fase terminal faltava dar resposta às pessoas com deficiência e nessa altura a promotora do apoio domiciliário, deu-nos essa oportunidade que foi muito boa porque foi um estágio muito rico porque tivemos também algumas facilidades a nível

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da instituição para obtermos o levantamento que já estava a ser feito pela técnica de serviço social para abrir um CAO. Eu: Quais foram os constrangimentos e as potencialidade com que se debateu quando veio trabalhar para esta Instituição? A.S.: Pois já não foi o primeiro impacto com pessoas com deficiência, porque sejamos realistas. Agora já há mais pessoas com deficiência nas escolas não é até porque já há mais facilidade no transporte e a evolução desde há alguns anos para cá tem sido muito positiva. Eu no meu tempo não havia, não havia pessoas com deficiência, ou eu não me apercebia delas mas o facto é que eu não estava nem eu nem a generalidade das pessoas estava habituada a contactar com pessoas com deficiência. Estava lá uma pessoa que tinha paralisia cerebral e estudava durante o dia e realmente porque sei e conheci várias instituições de apoio com deficiência e aí sim é que comecei a aperceber-me da realidade não é, que estas pessoas existem! A Associação tinha acabado de começar a funcionar, porque eu ainda antes de vir para a Associação fui à CERCI e lá disseram-nos que havia uma instituição para pessoas com deficiência e eu vim conhecer a Associação que só tinha um pavilhão ali em cima que era o que havia na altura, longe de mim pensar que viria para aqui trabalhar. Nunca tive grandes constrangimentos e depois é assim eu nunca encarei as pessoas com deficiência como pessoas menos válidas, são iguais a mim só que têm algumas limitações por isso há que chegar até elas ultrapassando essas limitações só isso. Nunca contacto com eles tento sempre fazer-me entender, agora não gosto de usar diminutivos não gosto de os minimizar falo com eles como falo consigo como falo com outra pessoa. Se não me consigo fazer entender então tenho que reformular, utilizo alguns termos que eles também utilizam se calhar também para chegar até eles, dependendo dos casos é a minha estratégia. Mas é assim contacto com eles como contactos com as outras pessoas não tenho nenhum constrangimento em relação a isso, além disso eu também já vinha um pouco preparada, eu sou sincera o primeiro impacto tive-o! Até porque andava grávida, o meu primeiro estágio foi assim um bocado complicado porque estava grávida na altura e depois vi-me confrontada a ir para a associação de Oeiras de Paralisia Cerebral e essa foi a que me marcou mais! Foi mau, foi os medos os receios mas isto tudo passa depois é uma questão de hábito. Eu: E não falando apenas das coisas más, quais foram as potencialidades com que se debateu quando veio trabalhar para a Associação? A.S.: (risos) A instituição em si, acho que essa é a maior potencialidade. E se hoje houvesse oportunidade de ir trabalhar com outra problemática eu por minha vontade não escolhia outra ficava na deficiência porque quando andava no estágio e tive que escolher a área em que ia estagiar eu gostava muito de ter estagiado com crianças, por ser mais fácil o estágio não ter tanta burocracia e de mais fácil acesso até à própria instituição e depois fiz aquele estágio onde ganhei um traquejo muito grande e depois vim para aqui porque completamente diferente porque eu vejo agora estagiárias que não têm o à vontade que eu tinha lá dentro da instituição, mas eu gostava muito de trabalhar com crianças e depois acabei por ter essa oportunidade mas como na altura era um contrato temporário para substituição de uma licença de parto para a Casa de Apoio de Carcavelos, eu confrontei aqui a instituição, fui lá a uma entrevista depois ligaram-me logo de seguida a dizer que tinha sido admitida, mas depois dessa entrevista eu esclareci logo a minha situação e acabei por deixar para trás aquela grande opção que eu queria que era trabalhar com crianças e crianças desprotegidas, porque realmente queria logo no inicio e acabei por escolher trabalhar com as pessoas com deficiência.

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Eu: Quais são os objectivos desta Instituição? A.S.: Os objectivos da instituição desde o seu início, é dar apoio à pessoa com deficiência. O grande objectivo dos pais foi criar uma instituição que desse apoio aos seus filhos, esse é o grande objectivo desta casa. Tem havido algumas modificações ao longo destes anos, com as quais eu partilho, que é realmente nunca deixarmos de responsabilizar a família. As famílias querem entregar-nos os seus filhos e a instituição que resolva todos os problemas. As estadias cá prolongadas quase o ano inteiro idas a casa apenas pontualmente, então a instituição tem sido muito muito muito persistente em gerir este apoio residencial e eu estou desde o inicio no apoio residencial. É uma batalha que nós vamos travando ao longo destes anos. Vamos também conseguindo ao longo destes anos modificar as atitudes dos pais, mas nós temos que ter presente que estes utentes que ficam à responsabilidade da instituição, temos andado a tentar modificar isto e responsabilizar a família. Promovemos também o aconselhamento às famílias sobre as tutórias e o futuro dos seus filhos para em vida os pais poderem escolher quem é que se vai responsabilizar pelos seus filhos após a sua morte. E já temos aqui algumas que de facto já deixaram algum familiar como tutor e não estão a utilizar a instituição. O objectivo é que sejam institucionalizados o menor número possível de pessoas. Eu: Tenho conhecimento que é coordenadora das Residências mas concretamente quais são as funções que desempenha? A.S.: Á minha responsabilidade está tudo o que seja relacionado com o contacto com as famílias. Em relação ao meu trabalho é assim, as famílias também não há uma rotatividade nas famílias porque como sabe, utentes que não transitam para outras instituições não há entradas e saídas conforme acaba o ano, não é! São utentes fixos na instituição, o que me ajuda muito porque também vamos tendo uma relação com as famílias muito mais próxima, já nos vamos conhecendo. É o contacto com as famílias, é o apoio aos utentes sempre que seja necessário, na área da saúde sou eu quem faz o contacto com o médico da nossa instituição na articulação médico família e instituição, faço a articulação entre a família e a monitora se necessário. Também sou eu quem mantém o contacto com algumas instituições no exterior, na solicitação de apoios diversos e por diversos motivos. Nos projectos, eu faço parte de alguns projectos, eu faço parte de alguns projectos aqui na Instituição mas isso a coordenação dos projectos é do Director Técnico. 2.ª Entrevista: Eu: Quais são as funções que desempenha actualmente na Associação? A.S.: Tem a ver com a articulação entre instituições, incentivar a ligação entre a instituição e as famílias, apoiar directamente os utentes na aquisição de comportamentos sociais adequados e uma melhor adaptação ao meio através de acções pontuais. Assim o Serviço Social integra-se num plano geral de trabalho a nível do CAO e Moradias, consiste na interiorização dos jovens de determinados comportamentos adequados que permite uma maior aceitação e educação social respeitando sempre a sua diferença no fundo é aquilo que eu já tinha falado. Apoiar as famílias e resolver os seus problemas através dos seus próprios meios, procurar que as famílias assumam um papel activo e consumando com os objectivos e estão a ser prosseguidos, dar a conhecer a outras instituições o projecto do Associação e fazer a articulação com vista a um futuro projecto integrado de resposta a esta população. Esta é a base e são os objectivos gerais das minhas funções aqui na Instituição. Depois paralelamente tenho as funções de coordenadora da residência, que é zelar pelo cumprimento dos planos terapêuticos, pedagógicos e assistenciais das moradias. Cada

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utente tem um plano de trabalho, são definidos semestralmente, seis em seis meses os objectivos de trabalho para cada utente. Muitos desses objectivos ficam durante um ano e até mais do que um ano, mas de seis em seis meses é feita uma avaliação dos objectivos para aquele utente. E delineamos se continuamos ou não esses objectivos. Todos os utentes têm objectivos de trabalho devido também porque muitas pessoas só transitam pela residência mais ou menos 44 dias por ano, o que dificulta mantermos um trabalho continuo com eles, dai muitos deles termos um objectivo quase que anual. Tenho como responsabilidade elaborar e coordenar a definição de actividades para as diferentes áreas de intervenção de cada utente individualmente, isto especificamente só na residência, tenho como responsabilidade também coordenar a definição dos planos individuais de trabalho, os tais objectivos de trabalho que é feito com cada utente em cada semestre. Responsabilidade pelo acompanhamento e avaliação dos programas de trabalho da residência, sou em quem tem que providenciar os meios necessários para o desenvolvimento das actividades programadas, coordenar e liderar a equipa do pessoal das moradias, participar na direcção técnica do centro e participar nas reuniões do concelho executivo, sempre convocada para o efeito. Acrescido às funções de Técnica de Serviço Social tenho estas funções, é assim têm a ver com o Serviço Social mas também são muito inerentes à coordenação, à chefia de um sector. Eu: Pode falar-me um pouco dos projectos que está envolvida? A.S.: Os projectos neste momento estamos a acabar o EQUAL, tivemos um projecto que foi o RPQ, em que eu estive integrada no projecto RPQ – CAO que são referências de boas práticas a aplicar em CAOS isto para se mudar um pouco atitudes ao nível das instituições poderem fazer uma avaliação do seu funcionamento, é um documento muito interessante. Eu não tenho aqui o documento senão mostrava-lhe. (fomos interrompidas por um utente) A.S.: Onde é que nós íamos? Eu: Estava a contar-me sobre o projecto RPQ. Qual era o seu papel nesse projecto? A.S.: Era redefinirmos o documento, nós tínhamos que reformular e adaptar, o Dr. … já inicialmente há uns anos atrás, já o tínhamos traduzido e aplicado aqui no nosso CAO e agora foi elaborá-lo revê-lo cortar e adicionar alguns itens novos considerados importantes em várias vertentes. É um documento orientador que nos orienta, não nos faz esquecer de nenhum item, como os cuidados pessoais, vamos trabalhando muitos itens para nos fazer lembrar que se temos que melhorar e responder à pergunta se estamos bem para depois podermos melhorar o funcionamento do CAO. Eu: Tem estado a contar-me um pouco quais são as suas funções, mas concretamente, em que é que consiste o seu trabalho? A.S.: É assim eu sou responsável, é assim tudo o que são assuntos relacionados com as famílias é a mim que vêm ter e sou eu que sou responsável sou eu que falo com as famílias. Quem mantém o contacto com as famílias sou eu, muitas vezes para eles sou eu quem sou responsável e esquecem que há assuntos que me ultrapassam e que deve ser já tratado ou a situação complica-se e deve ser tratado a nível da direcção. Eu: No seu entender quais são os objectivos do Serviço Social? A.S.: Eu realmente a nível de serviço social, eu estou tão absorvida que às vezes falta-me tempo para poder fazer outro tipo de trabalho, vou aproveitando e vou juntando as duas

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coisas, junto tudo, muitas vezes falo como coordenadora com as famílias e estou a falar como técnica de serviço social e junta-se aqui um pouco as coisas. Muitas pessoas até acham que eu sou só coordenadora da residência e nem sou técnica de serviço social, e faço parte da residência, como todos os utentes passam pela residência eles acham que aqui a técnica de serviço social aqui fica assim um bocadinho parece que sou mais, como é que eu vou explicar eu sou mais conhecida como coordenadora das residências (risos). Eu: Quais são as suas funções enquanto coordenadora das residências? A.S.: Pôr aquele sector em funcionamento. Tudo, desde os horários, desde fazer o levantamento das necessidades, já modifiquei muitas vezes muita coisa. Cada vez que abre um sector há modificações cada vez que abre uma moradia modifico os turnos e faço outros turnos e etc. Já fiz muitos turnos, a maneira como está a funcionar sou eu quem faz a gestão daquele sector, ao nível do dinheiro, requisições e pedidos que dizem respeito àquele sector bem como toda a sua organização. Eu: Desculpe por ter modificado o rumo da nossa conversa, mas estávamos a falar sobre o que é que no seu entender são os objectivos do Serviço Social? A.S.: No meu trabalho aqui está claro, até porque cada profissional tem as suas tarefas e eu tenho o meu papel e normalmente os meus colegas também não se metem nos meus assuntos. Há uma definição de objectivos que até está um pouco desactualizado mas que tem a ver com o apoio às famílias. Eu apoio as famílias inicialmente e apoio individualmente. Eu: Quais são os valores que norteiam as suas acções? (quais são os princípios que o acompanham enquanto profissional) A.S.: É fazer com que e isto tem sido uma luta que temos levado a cabo há alguns anos que é fazer com que a generalidade dos trabalhadores os respeitem. Normalmente as pessoas se calhar porque não têm autoridade sob as pessoas com deficiência então uma das maneira de manterem a autoridade é a afirmação. Temos um código de ética que vai pelo respeito pelos direitos e deveres e a partir daí criámos um manual de utilização de CAO, manual de utilização também das moradias. Aqui foi traduzida para um caderninho do cliente. Os nossos direitos e os nossos deveres. Este caderno é da residência mas temos assim um semelhante para o CAO. Esta caderneta do utente serve de ponte entre a instituição e a família. Eu: Após o recapitular das suas funções, quais são os princípios que a acompanham enquanto profissional? A.S.: É o respeito pelas pessoas com quem trabalho. Honestidade, sou sincera com as pessoas digo o que tenho a dizer quando tenho a dizer, respeito as funções das pessoas, tanto respeito uma pessoa que está no sector da limpeza como uma encarregada e também exijo que me respeitem a mim. Em relação aos utentes, tenho muito carinho por eles e respeito-os nas suas exigências e faço que junto da equipa exijo que exista esse respeito. Um dos valores da Associação é que nós estamos aqui para lhes prestar um serviço, na óptica do cliente, eles estão aqui, pagam para lhes prestarmos um serviço por isso temos que lhes prestar um serviço com uma maior qualidade, temos que fazer avaliações do serviço para melhorarmos as nossas respostas de outra maneira não vamos conseguir fazer melhoramentos e modificações, isto para não estagnarmos porque a tendência é as pessoas ficarem quietinhas no mesmo canto e que ninguém as incomode e depois todos nós criamos vícios que temos que combate-los e às vezes umas modificações são importantes. Isto exige na óptica do cliente, elas estão aqui para prestar um serviço ao cliente que são os

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utentes, eles não são os meninos delas que podem tratar por aquele diminutivo que eu não gosto que elas os tratem pelo diminutivo, porque depois dá um ar mais familiar e estreito na ligação também o carinho se pode passar para a forma autoritária e de manipulação e isso nós tentamos, eu estou sempre muito atenta a este aspecto e se nós os tratarmos com o devido respeito dentro das capacidades deles e com carinho e não devemos deixar que esta situação que passe estes limites, porque elas aqui têm o trabalhos delas com estes utentes e não devem estreitar muito as ligações, não deixar que deixe de ser profissional porque depois começa-se a confundir tudo. Não quer dizer que não se sinta amizade, sente-se amizade sim! Temos amizade temos mais simpatia por uns do que por outros porque todos nós somos assim, mas temos que saber distinguir que estamos no nosso local de trabalho. Não nos podemos concentrar só em B ou C porque são mais simpáticos, e depois os outros são os antipáticos os que chateiam, isso não pode acontecer, estou sempre muito atenta a estes pormenores e exijo que elas os tratem com igualdade. Exijo que elas respeitem os “miúdos”, (risos) isto de dizer miúdos é incorrecto mas de facto eles para nós são miúdos, se calhar é uma forma mais carinhosa de os tratarmos. Eu: Quais as referências teórico metodológicas que orientam a sua acção? Ou seja em que teorias e metodologias baseia a sua acção? A.S.: (risos) Esta pergunta! Eu sinceramente não lhe sei responder, já estudei faz tanto tempo que não lhe sei dizer os nomes. Eu trabalho no directo numa equipa pluridisciplinar com o utente com a família e com a comunidade. Eu: Não há problema eu compreendo! Penso que desenvolve a sua acção baseando-se no modelo sistémico, em que não vê o utente como uma pessoa individual mas sim como alguém no centro de um sistema, sistema esse familiar a instituição e a comunidade em que está inserido. A.S.: Agora que fala no modelo sistémico, parece que me estou a lembrar de algumas coisas. Eu: Segundo a sua experiência, o que é para si uma pessoa portadora de deficiência mental? A.S.: É uma pessoa com algumas limitações, têm algumas limitações, alguns têm limitações mais acentuadas que outros. Todos temos limitações, a diferença é que nós conseguimos disfarçar as nossas limitações e eles não conseguem disfarçar as deles porque não têm essa capacidade! Ás vezes é assim, eles sabem que fazem mal e quando eles sabem que fizeram alguma coisa que não foi correcto são os primeiros a virem dizer mesmo sabendo que depois vou chamá-los a atenção e vou dizer-lhes exactamente aquilo que eles já sabem (risos) que não foi correcto. Mas eles vêm aqui logo dizer-me, chegam ali e dizem-me aconteceu isto e isto e isto. Eu: Qual a noção que tem de pessoa portadora de deficiência mental em processo de envelhecimento? A.S.: Estamos a aprender com eles, porque aí o objectivo é que eles consigam manter algumas aquisições que conseguiram aprender até à idade adulta, ao nível da leitura por exemplo, em inúmeras aquisições. E mesmo em relação a alguns, coisas que não aconteciam e agora... por exemplo a ... cai desamparada, o … também já tem as suas limitações, vão-se notando no envelhecimento deles, eu acho que é mais notório quanto mais capacidades eles adquiriram torna-se mais notório o envelhecimento, as pessoas com deficiência profunda não é tão notória. Se calhar conhece o Fernando Fonseca, o Fernando de há 15 anos atrás e o Fernando de hoje sinceramente não lhe noto nada de diferente. Ele

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está no CAO 2, eu não noto diferenças a não ser no aspecto físico talvez. Daí que é mais notório naqueles que conseguiram adquirir algumas capacidades pois é como se costuma dizer quanto mais alto se chega maior é a queda. E neles também, quanto mais capacidades têm mais notório é o envelhecimento. No futuro é assim, eles também já estão a cumprir um programa ocupacional em actividades ocupacionais e eles não têm capacidades para mais, eu não sei se estas actividades ocupacionais que eles elaboram aqui em sala não se adaptam a uma terceira idade, se calhar até se adaptam! Algumas adaptam-se! Algumas vão adaptando-se ao longo dos anos e quando eles tiverem idades dos 60 e tais desde que tenham essas capacidades de trabalho... Eu: Parece-lhe que os utentes mais velhos vão querer mudar de actividades ou manter as actividades que já desenvolvem? A.S.: Nós tentamos sempre que haja uma rotatividade dessas actividades e mudar as actividades de preferência só que às vezes não é fácil. Eu: Em que é que consiste o quotidiano dos utentes mais velhos que frequentam esta instituição? A.S.: É igual ao dos outros utentes. A educação física, a animação musical se houver animação musical, têm trabalho de sala que é um trabalho de base e depois dali vão para as outras áreas, desenvolvimento pessoal, representação, têm educação física natação. Às cinco horas os que ficam aqui na residência têm as actividades ali no bar que normalmente têm Karaoke ou animação musical, ou simplesmente jogar e conversar por volta das 20:30 é o jantar, entre as 20h e pouco e as 21:30/22h é tempo de lazer ou para fazerem aquilo que quiserem, verem televisão, jogarem, há aqueles que trazem as consolas e ligam à televisão e vão jogando, pronto cada um ocupa o tempo como gosta mais. Eu: Quais são as necessidades dos utentes mais velhos da Associação? A.S.: Aqueles que já têm pais que têm quase 80 anos já estamos quase a falar duma 3.ª e 4.ª idade em que ambos necessitam de ser acompanhados pelos técnicos. Nós até já temos uma família que já está a ser acompanhada totalmente pela instituição em que o apartamento foi cedido pela câmara. Esta família era muito carenciada, sem condições, vivia numa casa no centro de Lisboa com a irmã que também tem uma deficiência mental ligeira e o filho está quase permanentemente aqui na instituição. Agora a mãe está aqui no bairro ao lado, mãe e filho visitam-se e quando é preciso a mãe vem para cá para o nosso apoio residencial, já cá tem estado durante vários dias é um apoio que tem que ser dado e muitos podem vir a precisar deste apoio. Dar-lhes outras condições porque eles são nossos clientes e neste caso já são os clientes e as famílias. Já começam os dois a ter necessidades e vamos ter ai algumas famílias que vamos ter que ajudar na alimentação, no tratar no ajudar a dar o banho. Vamos fazendo aquilo que a família vai necessitando, não chegamos lá e agora vamos começar e fazer isto tudo! Não! Conforme a família vai necessitando do apoio nós vamos dando. Eu: Apesar de hoje termos voltado um pouco atrás, tínhamos terminado a nossa conversa anterior numa questão que me parece muito importante para a planificação de novas respostas que são as necessidades dos utentes. Não se importa de voltar a abordar esta questão, ou seja, quais lhe parecem ser as necessidades dos utentes mais velhos da Associação? A.S.: Neste momento começam a precisar de um acompanhamento mais personalizado por parte das monitoras também porque estão um pouco mais dependentes e necessitam de mais orientação das monitoras dentro e fora da instituição, porque se eles estão

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envelhecidos as famílias também estão envelhecidas. Nalguns casos já estamos a colocar monitoras a acompanhar os utentes aos médicos a fazerem exames clínicos para apoiarem as famílias isto também já num processo de envelhecimento das famílias. Nós também já estamos a dar apoio a uma família em centro de dia, porque vivia em condições muito degradadas e temos o projecto de um lar para famílias, que está em projecto porque ainda não conseguimos o terreno. Tínhamos um terreno aqui há uns anos foi-nos cedido mas nunca fizeram a escritura e estamos sem terreno para podermos avançar com o projecto de lar para as famílias, para os familiares dos nossos utentes. Isto com um objectivo de não fazermos uma separação entre os nossos utentes e as famílias, os pais e as mães quando eles necessitarem de ir para um lar. Serem integrados na mesma instituição e conviverem também cada um no seu sector dentro dos mesmos espaços que é o que acontece agora no centro de dia. Esta senhora aqui pertencia ao nosso apoio domiciliário. Estão numa casa que é da Associação e nós fazemos o apoio domiciliário. Quando é necessário ficam aqui internamente nas moradias. Eu: E nessa residência como é que é efectuado o apoio? A.S.: Vive lá uma mãe e uma irmã, a irmã também tem deficiência e não pode lá ter o filho. Porque o filho é um deficiente mental profundo que tem que ser acompanhado a sua hiperactividade não permite que ele esteja fechado era agredi-lo a ele ficar fechado num apartamento. Dai como ela viviam longe da instituição, vieram para mais próximo, com outras condições de habitação, vêm à instituição quando querem e sempre que podem e fazem a visita ao filho, o filho muitas vezes também vai com a nossa empregada à hora do almoço e vai visitá-las e normalmente à sempre uma ligação se não diária de dois em dois dias de três em três dias, vêem-se sempre. Ele reside aqui, é um dos utentes que já cá vive permanentemente. Exactamente por causa da idade da mãe, ao problema grave que lhe tem de hiperactividade e por causa de ser uma família muito fragilizada. Normalmente quando nós fechamos a instituição elas vêm aqui para dentro da instituição porque aqui têm espaço, andam à vontade ficam cá com o guarda e ficam mais apoiadas por nós. Eu: Qual lhe parece ser a longo prazo o modelo de apoio a estas famílias? A.S.: Este projecto de apoiar as famílias surgiu logo quando a Associação iniciou funcionamento em que a principal preocupação é as famílias e algumas famílias precisarem de apoio. Eu: E quais são as suas potencialidades dos utentes mais velhos? A.S.: Neles é muito notório. Além disso o notório é perderem capacidades. Porque estão a perder a capacidade da leitura, estão a perder a capacidade da escrita, aqueles que adquiriram, porque os que não adquiriram ficam mais ou menos no mesmo estado. Daí eu que há 15 anos que estou cá num deficiente profundo não vejo assim grande diferença se quer que lhe diga. Na deficiência moderada a perca de capacidades é mais notória, bem como nós que com a idade também vamos perdendo algumas capacidades. Não tão acentuado, porque eles também nunca tiveram grandes capacidade. Agora não posso dizer assim muito mais porque eu não conheço pessoas muito para além dos 50 anos. Os mais velhos que eu tenho aqui têm 54 55 anos não são assim propriamente idosas não é. Daí que evidentemente ainda não há coisas muito acentuadas, quando eles tiverem 70, possivelmente as minhas respostas serão diferentes. Até porque a eles também chega as doenças que a todos nós, os problemas de colesterol, AVC’s etc a eles também lhes pode acontecer.

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Eu: Falando um pouco sobre as famílias, na sua perspectiva quais são os problemas que os familiares dos utentes mais velhos enfrentam neste processo? A.S.: É a ausência deles, é a morte da parte deles, a morte dos pais, é uma angustia para a grande maioria dos pais é uma angustia pensarem que eles vão e ficam cá os filhos e a instituição surgiu exactamente para dar essa resposta é após a morte dos pais estamos a orientar os pais para os processo de tutória para eles em vida poderem escolher o tutor do seu filho após a sua morte, normalmente enquanto os pais estão vivos são os pais os seus tutores, após a morte dos pais fica um conselho de família e depois segue o conselho de família que são familiares, primos ou irmãos, são pessoas próximas que nós aconselhamos sempre que sejam pessoas mais novas para poderem continuar o apoio aquela pessoa. E aí sim a instituição tem trabalhado nesse sentido à muito tempo, temos feito sensibilização às famílias, temos orientado as famílias muito no processo de interdição e mesmo assim à muitas que por opção ainda não avançaram com o processo de interdição e temos que continuar a informar e a esclarecer as famílias porque nós falamos até já cá vieram por duas vezes a Associação advogados para esclarecer questões e esclarecimentos, para as famílias colocaremos as suas duvidas porque há muitas duvidas que devem ser colocadas e negociar o que se deve ser feito com muita consciência do que se está a fazer. Eu: Pode falar-me sobre o processo de interdição? A.S.: É retirar a capacidade que qualquer pessoa tem como cidadão a partir dos 18 anos. Nós a partir dos 18 anos somos um cidadão com deveres e responsabilidades e eles não têm capacidade de ter o seu cuidado pessoal gerir os seus dinheiros gerir os seus bens de responder perante alguma coisa que surja, não têm essa capacidade e por isso têm que ter alguém a representá-los, esse alguém são os pais porque os pais pensam que o podem fazer mesmo se os filhos não estiverem interditados, mas não podem. Porque a partir dos 18 anos é adulto e responsável por si mesmo e os pais só podem responder por eles se eles se eles tiverem interditados. Isto quer dizer o quê, vou dar-lhe um exemplo, ele tem uma casa em nome dele, a partir dos 18 anos ele pode fazer o que quiser com a casa, qualquer pessoa chega ali ele assina um papel de compra e venda assina o que é necessário e vende a casa, e pode nem se ter apercebido que vendeu a casa, pode nem ter capacidade para isso. Se ele estiver interditado isso não pode acontecer nunca, porque ele não tem validade, ele pode assinar tudo não tem é nenhuma validade e mais salvaguarda também os bens que lhe pertencem. Vou dar-lhe um exemplo, morrem os pais aquela pessoa com deficiência é interditada quem fica tutor é uma pessoa mais próxima um irmão uma prima, seja quem for não interessa, o irmão quer vender os bens que lhe pertencem não pode. Tem que requerer uma autorização do tribunal tem que justificar que aqueles bens que quer vender é para isto e mais para aquilo e em beneficio da própria pessoa, o tribunal dá autorização e tem que ter um comprovativo em como aquele dinheiro foi reinvestido em prol daquela pessoa. Isto também é uma salvaguarda das pessoas com deficiência. Por isso é que o processo de interdição deve ser feito em vida dos pais, para poderem ser os pais a decidir quem é que vai fazer parte do conselho de família que serão os futuros responsáveis por essa pessoa. Depois há também a inabilitação, que é retirar só metade, ele como cidadão pode isto no caso dos do CEP que têm um deficiência mental ligeira não se pode aplicar a interdição por completo porque isso é retirar todos os poderes de decisão à pessoa, mas a inabilitação que é retirar só a parte de gestão do dinheiro e dos seus bens. Eles representam-se a si mesmos, mas quando toca a decisões de gerir dinheiros etc eles têm um representante. Eu: Qual lhe parece ser a melhor resposta para estas pessoas que se encontram em processo de envelhecimento?

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A.S.: Desde que sejam satisfeitas as necessidades básicas deles e dos seus interesses eles vivem felizes, eles não são muito exigentes. É verdade eles não têm grandes exigências. Essa resposta de lar é mais para os pais porque para os filhos nos já temos as residências. A nossa realidade também nos mostra que quando temos aqui pais e filhos misturados no mesmo sector, na mesma casa é muito complicado, temos que separá-los em respostas mas não temos que separá-los a eles, podem estar em espaços comuns mas as suas áreas têm que ser separadas, penso eu, se não é terrível. As famílias entre elas também não é fácil e nós temos aqui várias famílias e várias situações porque entre elas não é fácil e depois o filho da outra é que incomoda o meu filho, é assim temos que separar, dar atendimento aos pais num lar, e os filhos têm que ter outro atendimento com outras funcionárias e juntá-los em espaços comuns para estarem mais próximos. Como temos que separar os deficientes profundos dos deficiente ligeiros ou moderados se queremos manter um funcionamento dentro do normal, porque não podemos deixar que um deficiente profundo esteja constantemente a incomodar outro colega que queira trabalhar e esteja sempre a ser incomodado porque queremos fazer integração! Fazemos integração em espaço adequados para estarem juntos, inter-ajuda entre eles, promovemos isso muito, agora há espaços em que têm que estar mesmo separados. Em relação à família e aos filhos também tem que ser assim, posso mudar de ideias, mas neste momento é assim que eu penso. Eu: No seu entender, como é que se sentem os utentes mais velhos aqui? A.S.: Bem! Eles sentem que a Associação é a casa deles, não sei se algum lhe expressou que quando não puderem estar em casa que podem vir aqui para as residências, alguns dizem isso e já conseguem transportar que a residência é a segunda casa deles, outros dizem que este é o meu segundo quarto, e isso é importante é importante que eles se sinta aqui bem porque para alguns poderá vir a ser a futura casa deles. Eu: Qual lhe parece ser a avaliação que as famílias fazem do trabalho que aqui desenvolvem? A.S.: Muito positiva, temos feito algumas auscultações às famílias, temos pedido às famílias que façam uma avaliação dos diversos serviços que nós prestamos aqui aos seus filhos e tem sido uma avaliação sempre positiva. Também recebemos com muito agrado algumas críticas para podermos melhorar os serviços seja eles de CAO ou residências, mas fazemos com alguma frequência uma auscultação às famílias. Eu: E qual a avaliação que faz do seu trabalho? A.S.: Acho que é um trabalho muito positivo, em que eu gosto muito de trabalhar com eles. Ajuda realmente essas pessoas a terem uma resposta a nível de actividades ocupacionais uma resposta para o seu dia-a-dia como uma pessoa normal que vai para o seu trabalho e eles pensam assim que vêm para o seu trabalho e é verdade este é o trabalho deles em que também tem uma gratificação no final do mês por isso é o contribuir para que estas pessoas tenham também a oportunidade de terem o seu trabalho e oportunidade também de terem resposta ao nível residencial e não ficarem confinados a um lar, à resposta do lar que como a segurança social quer meter é o isolamento, as pessoas ficarem aqui sossegadinhas a ver televisão o dia inteiro. Não é isso que nós queremos, queremos que eles vivam e tenham todos os tipos de actividades desportivas de animação musical de trabalho de passeios, fisioterapias, tudo aquilo que for possível e tudo aquilo que eles também têm direito e dar-lhes as melhores condições de vida e qualidade de vida que eles que são pessoas que não sabem escolher e não sabem exigir mas nós sabemos o que lhes

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pode dar qualidade de vida e a nossa função é essa contribuir para que estas pessoas tenham uma qualidade de vida. Eu: Quer acrescentar mais algum contributo? A.S.: Eu só tenho pena de não a poder ajudar muito, porque eu não tenho muita experiência com pessoas da terceira idade com deficiência, absolutamente nenhuma. Esta população é uma população que está agora numa idade adulta que vieram da CERCIS pequeninos, cada vez mais há mais pessoas adultas daí a necessidade que tiveram em criar os CAOS e também com as residências. Nós também vamos ter necessidade de mudar as nossas respostas quando tivermos uma população muito envelhecida, quando a nossa população chegar aos 60 e tais 70 e 80s aí sim, vamos ter que obrigatoriamente reformular as nossas respostas. E isto está presente nas nossas preocupações. Eu: Obrigado pela sua colaboração Dr.ª …!

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PROFISSIONAL 2 - ENTREVISTA AO PSICÓLOGO Eu: Como se chama? Psicólogo: … Eu: Qual a sua data de nascimento? Psicólogo: 8-06-1980 Eu: Quais são as suas habilitações literárias? Psicólogo: Licenciado em Psicologia com especialização na área da psicologia organizacional Eu: Há quanto tempo exerce a profissão de Psicólogo? Psicólogo: Psicólogo, há volta de três anos e meio. Eu: Em que áreas já exerceu a sua actividade profissional? Psicólogo: Inicialmente trabalhei numa empresa, numa multinacional do ramo dos automóveis, só que não gostei muito daquilo que fazia e optei por uma nova área, uma área completamente distinta daquela em que eu estava. Uma área que para mim atraiu-me imenso, eu já conhecia minimamente a realidade na área da reabilitação em virtude de já ter contactado com a população deste tipo, acho uma população bastante calorosa, bastante afectuosa e nesse sentido gostaria de experimentar ainda e deram-me essa oportunidade de experimentar, necessariamente tendo em vista alguma empregabilidade nesta área. Eu: E há quanto tempo trabalha na Associação? Psicólogo: Há três anos à volta disso. Eu: Há quanto tempo trabalha com pessoas portadoras de deficiência mental? Psicólogo: Também há três anos. Eu: Quais os motivos que o conduziram a vir trabalhar com pessoas portadoras de deficiência mental? Psicólogo: Já falei um bocadinho acerca da razão mas se calhar vou aprofundar um pouco mais. Como lhe disse, inicialmente estive numa empresa de comércio de automóveis em que tive como funções entre outras a avaliação de desempenho que levava ao despedimento das pessoas, fazia a avaliação dos trabalhadores e portanto estávamos numa fase de crise e saturação em que havia a redução de trabalhadores. Nós fazíamos a avaliação de desempenho e coube-me a mim essa tarefa em virtude de ter essa qualificação e tive que despedir famílias, marido e mulher e não é uma situação nada agradável e eu não perspectivo o psicólogo como sendo uma pessoa que destabiliza emocionalmente as pessoas mas como estabilizador emocional e nesse sentido não gostei, podia lá ter ficado mas não gostei, apresentaram-me depois uma proposta para vir aqui fazer um estágio profissional, agarrei essa oportunidade e gostei imenso e estou aqui. As motivações foram numa certa parte a vontade de conhecer mais profundamente a área da reabilitação porque só conhecia num contacto esporádico com pessoas com deficiência mental numa segunda vertente foi também pensar na possibilidade de integração profissional porque não é fácil na área dos psicólogos, e havia essa possibilidade através de inicialmente um estágio profissional e a possibilidade de fazer uma coisa diversificada, diferentes tipos de intervenções visto que já tinha uma noção mínima do que é que podia fazer aqui na

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Associação, e sei que é uma instituição que com o seu carácter pró-activo e dinâmico poderia ter vários tipos de desempenhos nesta área da reabilitação e não só. Eu: O que é que sentiu quando veio trabalhar para esta instituição? Psicólogo: Eu nunca cá tinha vindo e sinceramente fiquei extremamente bem impressionado quer ao nível das infra-estruturas necessariamente e aí a Associação tem óptimas instalações construídas de raiz e isso facilita necessariamente todo o desenvolvimento dos programas que a Associação desenvolve, como também em termos organizativos, é uma instituição muito bem organizada que em termos técnicos tem uma grande qualidade a nível de competências técnicas e nesse sentido obviamente que facilita toda a integração de um profissional como eu. Isso foi um aspecto facilitador e necessariamente fiquei muito bem impressionado. Eu: Quais foram os constrangimentos e as potencialidade com que se debateu quando veio trabalhar para esta Instituição? Psicólogo: Relativamente a constrangimentos necessariamente a falta de experiência na área, eu não tinha qualquer tipo de experiência nunca tinha feito nada nesta área apesar de na minha faculdade ter tido disciplinas extracurriculares na área da reabilitação porque eu gostaria de ter um conhecimento mais abrangente e não só na área das organizações das empresas e procurei diversificar um bocado essas disciplinas no sentido de me preparar minimamente mas necessariamente que aquilo que se aprende na teoria depois na prática é completamente diferente. Estamos a lidar com seres humanos que têm reacções completamente não previsíveis e deste modo, e eles enquanto seres humanos que têm um pouco mais de dificuldade em controlar as emoções e em gerir essas emoções devido às suas limitações cognitivas, necessariamente que temos que ter um pouco mais de cuidado a trabalhar com eles. Constrangimentos parece-me que este tenha sido o maior constrangimento para além de ter saído de uma cidade, eu moro na Guarda estudei em Coimbra e vim para uma cidade bastante maior onde os laços familiares podem se romper um pouco. Relativamente às potencialidades, acima de tudo houve um enriquecimento seja profissional seja pessoal na minha vida. A entrada aqui para a Associação em termos profissionais, nestes três anos já aprendi imensas coisas tive possibilidade de contactar com diferentes temáticas com diferentes pessoas completamente diferente daquilo que eu estava habituado a trabalhar para além disso a nível pessoal esta experiência enriquece-me porque digamos que eles são seres humanos extremamente afectuosos, carinhosos e mesmo a nível técnico também há um ambiente bastante bom e nesse sentido parece-me que podemos atingir os objectivos. Eu: Quais são os objectivos desta Instituição? Psicólogo: Nós podemos falar de um objectivo geral, a Associação tem como objectivo geral o apoio e a integração da pessoa com deficiência mental jovem e adulta depois temos objectivos mais específicos que assentam um pouco naquilo que é o nosso programa baseado nas 8 dimensões da qualidade de vida de Robert Shalock. Estas 8 dimensões de qualidade de vida tocam necessariamente os aspectos do bem-estar físico bem-estar material o bem-estar emocional os direitos, desenvolvimentos pessoal e social a inclusão social, autonomia a autodeterminação são os alicerces que a Associação trabalha no sentido de conseguir maior qualidade de vida para as pessoas que estão nesta instituição que são os nossos utentes.

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Eu: Tendo em conta estes objectivos quais são as funções que desempenha aqui na Associação? Psicólogo: Então vamos por partes, eu tenho várias funções, eu para além de ter a responsabilidade na área da qualidade visto ser psicólogo organizacional, isto ao nível do departamento de qualidade da Associação. Também tenho funções de recrutamento e selecção de pessoal, tenho funções de avaliação e desempenho dos colaboradores que depois levam gratificações ao final de cada ano. Depois tenho a responsabilidade ao nível da formação quer seja a formação interna ou externa sou formador certificado e a Associação enquanto entidade formadora que é também tem que necessariamente rentabilizar os formadores internos e eu sou um deles, para além disso também trabalho em projectos Europeus, estou neste momento a participar em dois projectos Europeus o projecto Equal - Rumo à Qualidade em que procurei construir com outros agentes do processo, instrumentos de avaliação da qualidade, também estou no projecto Leonardo da Vinci em que também estamos a trabalhar um conjunto de programas de E-learning e de Mentoring no sentido de, mais na área da deficiência mental necessariamente. Depois também tenho a responsabilidade de gestão do Estofamento na área do Centro de Emprego Protegido tenho responsabilidade ao nível das actividades de psicoterapia, sou o responsável tal como faço avaliação psicológica seja aos nossos clientes seja aos pais, também faço formação e apoio aos familiares, tenho a responsabilidade também ao nível de orientação de várias alunas no âmbito de estágios académicos e depois todas as outras actividades desde revistas. Como se pode perceber uma pessoa que vem aqui para a Associação não pode ter muitas rotinas porque senão depois conciliar tudo isto mas é preferível a não se ter nada para fazer! Procuro ter um papel activo o máximo possível. Obviamente que quando temos tantas responsabilidades algumas que temos que ter a noção de prioridade relativamente a outras. Mas parece-me mesmo assim que o meu desempenho não tem sido mau avaliado. Parece-me! Pelo menos fizemos agora recentemente a avaliação de desempenho e estão satisfeitos com o rendimento. Eu: Mas concretamente, em que é que consiste o trabalho que desenvolve com os utentes? Psicólogo: Eu tenho responsabilidade acima de tudo da gestão de emoções que passa por um contacto diário materializado um pouco na actividade que eu desenvolvo que é a psicoterapia em que procuramos trabalhar um pouco através de rolle playings e dinâmicas de grupo no sentido de analisarmos qual o estado emocional de cada um deles e procurar soluções de equilíbrio a esse nível. Para além disso também tenho a responsabilidade de orientar os grupos de auto representação que é um espaço organizado por eles próprios reivindicarem e procurarem a melhoria dos serviços da Associação e é assim um espaço em que eles dizem o que é que acham que está mal como é que nós podemos corrigir e eu não sou um elemento animador mas procuro ser o mais passível possível no sentido de eles próprios organizarem essa reunião e procuro depois ser o elemento de transferência da informação que é discutida ali para as entidades que são responsáveis para resolverem essas questões e esses problemas que ali são debatidos. Como por exemplo ao nível da alimentação que é uma questão crónica ao nível das organizações e nesse sentido eu obviamente oiço e passo a informação à responsável que gere a alimentação no sentido de melhorar alguns aspectos. Este é um exemplo como outros. Eu: Quais são os seus objectivos enquanto profissional? Psicólogo: A médio prazo gostaria de melhorar as minhas competências na área da qualidade ao nível da economia social. Estou agora a participar num curso de formação de 150 horas que é denominado como curso de gestores para a qualidade e economia social, é

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um curso que me parece que me há-de dar as bases necessárias para conseguir trabalhar melhor esta área da qualidade aqui na Associação e além disso a médio prazo perspectivo um doutoramento nesta área. Depois, outros objectivos em termos profissionais, uma estabilização da minha vida profissional mas sempre nesta área se for possível. Porque não chegam só as competências teóricas nesta área também tem que haver alguma vocação e eu sinto-me bem com eles e nesse sentido acho que esta é a minha vocação. Eu: Quais são os valores que norteiam as suas acções? (quais são os princípios que o acompanham enquanto profissional) Psicólogo: Os valores! Se for recorrer ao código deontológico da psicologia que ele existe, mas nós próprios aqui na Associação o temos um código ético e nesse código também temos identificado os valores que devem nortear as acções dos profissionais da Associação. Necessariamente quais é que são os valores que me parecem serem importantes quando estamos a trabalhar com esta população e enquanto profissionais? O valor da igualdade penso que é o valor da igualdade, a igualdade a todos os níveis igualdade de tratamento que é fundamental não diferenciarmos, a sociedade já tem estas pessoas tão estigmatizadas que se nós próprios não os tratarmos de igual forma não é nada bom para eles, o valor da dignidade da pessoa enquanto pessoa humana também me parece ser um valor fundamental tratarmos como seres humanos toda e qualquer pessoa, sendo conscientes dos direitos e deveres que lhes assistem também é importante. Um dos outros valores é o respeito o valor do respeito que eu apoio muito porque também me parece muito importante nesta área e outros valores que necessariamente eu podia aqui começar a debitar mas parece-me que estes são os essenciais são os de base para que depois sejam desenvolvidas actividades com um maior rigor ético possível. Eu: O que é para si uma pessoa portadora de deficiência mental? Psicólogo: Tecnicamente? Eu: Enquanto profissional o que é para si uma pessoa portadora de deficiência mental do ponto de vista técnico e pessoal? Psicólogo: Em termos técnicos uma pessoa com deficiência mental é uma pessoa que em termos do funcionamento da inteligência tem um défice e isso traduz-se em termos de adaptação ao meio. Obviamente que quando falamos de uma pessoa com deficiência mental tendo e segundo aquilo que são os critérios, para ser considerado portador de deficiência mental deverá pelo menos ter défice a nível de 2 competências adaptativas. Em termos daquele palavreado do dia-a-dia a mim parece-me que são pessoas que têm limitações que essas limitações se traduzem numa dependência um pouco maior do que aquelas pessoas ditas normais, que precisa de um apoio mais personalizado e nós procuramos fazer isso a nível desta instituição nós procuramos tendo em conta as limitações de cada um porque depois quando falamos de deficiência mental existem vários níveis de deficiência mental nomeadamente ligeira moderada grave e profunda, naturalmente que as pessoas com deficiência mental profunda e grave necessariamente precisam de mais apoio um apoio mais personalizado e mais directo do que as outras, mas obviamente que o facto de terem este tipo de défice em termos intelectuais não os pode condicionar a desenvolver qualquer tipo de actividade que outra pessoa dita normal poderá fazer, necessariamente terá que ter o apoio extra, especialmente as pessoas com deficiência mental ligeira e as que temos no centro de emprego protegido conseguem desenvolver um conjunto de actividades de trabalho perfeitamente que outra pessoa normal conseguirá fazer.

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Eu: Quais as diferenças entre uma pessoa com deficiência mental ligeira e uma pessoa com deficiência mental moderada? Psicólogo: Entre a ligeira e a moderada naturalmente que há diferenças, mas não são tão visíveis como uma pessoa com deficiência ligeira e profunda aí sim claramente há diferenças visíveis e por isso nós próprios temos trabalhos diferentes para cada um deles, enquanto que, as pessoas com deficiência mental profunda têm um trabalho estritamente ocupacional é um trabalho mais lúdico pedagógico as pessoas que têm deficiência ligeira têm um trabalho muito mais exigente que tem um cariz de produção e produtividade, tem essa diferença. As pessoas que têm deficiência moderada têm um trabalho ocupacional útil em que desenvolvem um conjunto de actividades mas que não são um conjunto de actividades que são obrigados a produzir com prazos com quantidades tudo isso, necessariamente tem que haver essas diferenças. Eu: Qual a noção que tem de pessoa portadora de deficiência mental em processo de envelhecimento? Psicólogo: Vejamos, eu não sou um “experte” na matéria mas por aquilo que já li e por aquilo que conheço a mim parece-me que em termos de evolução de uma pessoa dita normal e de uma pessoa com deficiência mental o processo de envelhecimento parece-me ser bastante similar exceptuando casos como o Syndrome de Down, o Syndrome de Ruben Stain ou o Syndrome de Williams parece-me que o processo será semelhante. Obviamente que segundo aquilo que é informação teórica parece-me haver uma diferenciação de dois três quatro cinco anos para as pessoas com Syndrome de Down obviamente pelo menos pelo que é informação há um processo de degeneração mais rápido e há uma mortalidade em termos de faixas etárias à volta dos 60 65 anos tenho ideia e ao nível do homem da mulher um pouco mais, e o Syndrome de Williams e o Syndrome de Ruben Stain os processos de degeneração são mais visíveis em termos físicos necessariamente. Nós temos aqui o caso da Cristina Dias enquanto Ruben Stain e um ... Zuquede em termos de Syndrome de Williams em que há uma perda um pouco mais acentuada de algumas das competências que eles desenvolvem, no Syndrome de Williams isso é visível em termos do Syndrome Ruben Stain é mais visível a nível físico. Parece-me que paralelamente a um outro processo de envelhecimento, seja paralisia cerebral seja outro tipo de deficiência é bastante similar, pelo menos foi que o que recebi enquanto informação. E eu ainda não sei porque se formos a fazer uma comparação entre um por exemplo “Pina Bastos” que anda na casa dos 35 anos e outra pessoa na casa dos 35 / 40 ainda não se vê traduzido o processo de envelhecimento, ainda não se consegue ver. Depois, eu tenho aqui alguns exemplos, por exemplo olhar para uma pessoa como Fernando Fonseca e mas aí já é profundo. Ao nível dos casos moderados temos o Carlos Braga que já é um caso ligeiro, mas uma Eunice que já caminha para os 50 anos, comparando com uma pessoa dita normal, eles têm um conjunto de actividades que uma pessoa dita normal não tinha, porque esta instituição possibilita-lhes uma mais fácil preparação do futuro e do envelhecimento, procura através de um conjunto de actividades físicas pelo menos prepará-los para isso, para esse processo de envelhecimento pelo menos para que esse processo de envelhecimento se atenue o máximo possível em termos de perda de capacidade física naturalmente. Mas parece-me que nós estamos a ver um bocado, porque uma pessoa com 50 anos ainda estará a trabalhar no processo normal de trabalho enquanto que estas pessoas institucionalizadas como estão têm um conjunto de actividades um pouco diferentes, mas apesar disso parece-me que não vejo assim uma diferença tão nítida quanto isso. É que depois não podemos generalizar o tipo de casos que aqui temos, por exemplo uma Eunice daquilo que vejo de há três anos para agora vejo uma Eunice um pouco mais acomodada um pouco mais, apesar de ela ser muito reivindicativa e nunca

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gostar de estar onde está porque é uma característica da personalidade dela obviamente que ela teve perdas. Perdas a nível físico que é um caso específico da Eunice porque há outras pessoas com 50 anos e mesmo com deficiência mental e não têm os problemas de saúde que tem a Eunice. Bem que me parece que seja um processo bem similar ao nosso. Eu: Ainda há pouco falava-me das actividades que a Associação desenvolve. Neste contexto, em que é que consiste o quotidiano dos utentes mais velhos que frequentam esta instituição? Psicólogo: Uma das filosofias que nós temos e que me parece que iremos manter é procurar que não haja uma diferenciação de tratamento entre as pessoas com diferentes idades, ou seja diferenciar as pessoas com sei lá 40 / 45 anos das pessoas com 18 anos. Até é desejável que haja numa mesma sala pessoas com diferentes faixas etárias no sentido de que haja uma estimulação mútua e uma aprendizagem contínua por parte de todos esses elementos. Nós próprios temos como filosofia procurar fazer isso porque senão se nós colocarmos pessoas com 50 anos todas numa sala necessariamente que o estimulo e as actividades são diferentes do que uma pessoa mais nova com mais capacidade com interesses diferentes e é importante conseguirmos conciliar tudo isso. E por isso nós iremos procurar acima de tudo manter as actividades que são desenvolvidas por todos eles e obviamente termos o cuidado obviamente através de indicações médicas através da própria família de prepararmos as pessoas um pouco mais envelhecidas agora denomina-se de um nome muito interessante agora em vez de idosos é como é que é há pessoas maduras. O que também é muito interessante este novo termo mas não vale a pena agora fugir ao tema, porque não convém muito. Nós iremos procurar acima de tudo é que estas pessoas com um pouco mais de idade desenvolvam um conjunto de actividades no sentido de procurarmos que estejam mais aptas possível ao nível físico, fazer mais fisioterapia procuramos que eles façam um pouco mais de remo de natação, jacuzzi ginástica, interessa fazerem trabalhos mais de cariz físico no sentido de os prepararmos pelo menos que o bem estar físico seja um bem mais e maior possível. Mas obviamente que outros com 19 / 20 anos necessitem também destas actividades mas se calhar não de uma forma tão frequente. Eu estou a lembrar-me no caso do Aníbal que devido ao facto ele ter alguns problemas ao nível motor e físico procuramos dar-lhe o máximo possível de horas em termos de actividade semanal de fisioterapia no sentido de que ele recupere e que melhore. Nós quando fazemos um plano de intervenção individual nós temos em conta as necessidades individuais de cada um, e para além do plano de intervenção que fazemos anualmente também temos o cuidado de fazer um projecto de vida. Esse projecto de vida obviamente que não é de curto prazo mas sim de médio e longo prazo e nesse projecto de vida procuramos olhar um pouco para essas questões do envelhecimento e ver que respostas ele necessitará no futuro a médio e alongo prazo e precavermos e delinearmos um projecto de vida consoante as necessidades que iram ter daqui por cinco dez anos nós temos sempre esse cuidado. Eu: Quais são as necessidades dos utentes mais velhos da Associação? Psicólogo: Eu acho que as necessidades das pessoas mais velhas na área da deficiência mental, são muito similares a uma pessoa dita normal, eu acho que teremos que trabalhar acima de tudo o máximo a estimulação, estimulação a todos os níveis, procurarmos que eles não entrem num conformismo numa acomodação é fundamental que eles não atinjam. E trabalharmos também fundamentalmente a nível da própria integração social, já por si eles são pessoas que têm este estereótipo este estigma de pessoas que não são facilmente, olhamos para uma pessoa com deficiência mental e infelizmente ainda vemos pessoas que

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viram a cara para o lado nós iremos procurar desde o primeiro dia que estão na instituição até ao ultimo dia procuramos integrá-los na sociedade que é o que é fundamental e obviamente prepará-los para um futuro, isso é feito ao nível das moradias procuramos prepará-los em termos de maior autonomia possível, e para isso fazemos essa formação, vamos procurar ter um cuidado especial em termos dos tutores em termos de responsabilidades que o tutor tem em termos de função de lhes prestar o maior nível de afecto possível ao nível de integração possível e nesse sentido necessariamente temos que trabalhar ai para com a família no sentido de percebermos se há ou não há a resposta em termos dos tutores nessa família no âmbito familiar e se não houver procuramos outro tipo de respostas que não seria desejável que passa-se pela instituição e que fosse a instituição a tutora dessa pessoa, devemos sempre ver se há alguém mais independente e externa à instituição para que pessoa mais rapidamente fazer uma avaliação independente. Parece-me que são duas ideias essenciais a integração, o preparar o futuro deles enquanto pessoa mais envelhecidas na questão da tutória e depois uma preocupação essencial ao nível do bem-estar físico necessariamente é uma preocupação que todos nós iremos ter na nossa vida e que eles também deverão ter. Eu: E quais são as suas potencialidades dessas pessoas? Psicólogo: Quando se fala em pessoas maduras, é um pouco ambíguo falar na questão das pessoas maduras, porque há pessoas que atingem a maturidade com uma determinada idade há outras que atingem a maturidade quando têm uma idade maior, não é! Nesse sentido olhando um pouco para estas pessoas, a mim parece-me que o factor idade lhes permite ter uma maior experiência a todos os níveis, porque já vivenciaram experiências que outros mais novos não vivenciaram. Para além disso e teoricamente deviam ser pessoas que em termos de gestão e controlo emocional deviam ter mais capacidade mas o acto de serem pessoas com algumas limitações não têm capacidade para gerir as emoções tão facilmente. Ma apesar disse eles tê potencialidade como, conseguem desenvolver um conjunto de actividades, já têm alguns vícios em que resolvem problemas que outros que menos experientes não conseguem fazer têm uma maior experiência e esse facto reflecte-se mesmo em termos comportamentais há pessoas que pelo facto de terem 45 / 50 anos procuram dar conselhos, aconselhar e serem os paizinhos e as mãezinhas dos colegas mais novas e isso até nos ajuda. E é uma das potencialidades e virtudes do factor idade. E eles próprios jogarem com esse factor idade e darem conselhos, nós gostamos é que esses conselhos sejam conselhos bons e não conselhos maus, que Às vezes eles procuram fazer isso e espicaçar os colegas e tudo mais. Mas normalmente também dão conselhos acertados. Que outras coisas podemos retirar do facto de serem pessoas envelhecidas em termos de potencialidade, acho que estas são as duas, três ideias essenciais. Eu: Na sua perspectiva quais são os problemas que os familiares dos utentes mais velhos enfrentam neste processo? Psicólogo: É a dificuldade de saberem o futuro por parte dos filhos. Dificuldades! Bem há dificuldades distintas dependendo das famílias, de famílias para famílias há variações, por exemplo nós temos famílias que pelo facto do filho estar a envelhecer obviamente que se traduz em termos de menor autonomia ao nível da própria locomoção e em termos da própria medicação e têm dificuldades ao nível do apoio. Porque quando nós falamos que um filho ou sobrinho ou irmão está a envelhecer naturalmente que os familiares também envelhecem e isso traduz-se também em termos de perdas do próprio familiar e a dificuldade que ele sente em dar-lhe respostas, nós temos por exemplo uma mãe que pelo facto de já ter 80 anos problemas de coração e mesmos as condições sócio económicas não são as desejáveis nós já estamos a dar resposta ao filho quase a tempo inteiro, nesse sentido

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a preocupação da mãe é que felizmente que ele tem esta instituição que lhe consegue dar este apoio, imagine que não havia uma instituição que lhe desse esse apoio porque ela já não tem capacidade para o fazer, isso também se reflecte nos outros familiares obviamente que há pessoas que tem um apoio maior por parte dos filhos dos primos mas neste caso especifico não há esse apoio e essa é uma das grandes dificuldades por parte dos pais. Obviamente que outro aspecto é a questão do futuro, há uma grande dificuldade e grande preocupação em obter o máximo de resposta possível para o futuro dos filhos, ter alguém que os trate condignamente é uma das grandes preocupações deles enquanto familiares. Eu: Qual lhe parece ser a melhor resposta para estas pessoas que se encontram em processo de envelhecimento? Psicólogo: Nós gostaríamos de manter uma filosofia de não internato na instituição porque seria importante, sobre o nosso ponto de vista é fundamental que haja o afecto familiar no sentido que o afecto se traduz ao nível do bem-estar emocional e isso nós avaliamos no dia-a-dia quando há pessoas que, obviamente que varia de pessoa para pessoa, mas quando há pessoas que estão aqui 10/15 dias sem ver a família, naturalmente que têm o destabilização em termos comportamentais que é visível, nesse sentido nós gostaríamos acima de tudo que o afecto e principalmente o afecto da família não se perdesse, mas naturalmente em que essa situação não se consegue resolver por que não existe mais nenhum familiar e nesse sentido iremos procurar manter as nossas respostas, como lhe disse respostas que procuram acima de tudo dar o maior bem-estar e qualidade de vida possível a estas pessoas. Uma outra preocupação são os pais destas pessoas e de que forma é que depois os pais, para isso estamos a pensar fazer aqui um lar, aqui mesmo próximo aqui ao lado no sentido de termos como prioridade os próprios pais para que eles estejam mais próximos possíveis e que não haja uma perda de laços. Neste sentido iremos tentar priorizar os pais dos nossos utentes e procurar que não se perca a ligação. Para além disso obviamente que iremos reforçar os cuidados de enfermagem, em termos de saúde obviamente que não iremos poder manter as respostas de saúde que temos presentemente, porque agora temos uma ida ao médico penso que duas vezes por ano e análises também duas três vezes por ano e uma das coisas que nós já identificámos como sendo algo importante e a rever é as questões do apoio médico e de enfermagem, necessitamos de ter um apoio mais presente para eles e por isso iremos procurar melhorar em termos das próprias acessibilidades das nossas residências, porque temos apenas 6 / 7 quartos no rés-do-chão, já temos 3 / 4 cadeiras de rodas mais umas ou outras dificuldades que surjam no futuro ao nível da mobilidade, necessariamente também temos que rever as nossas condições em termos das acessibilidades quer seja através da implementação de um elevador que eu acho que seria o ideal. Para além disso em termos de tradução prática do envelhecimento e de precavermos o envelhecimento depois iremos procurar acima de tudo, baseando-nos na boa experiência já existente em Espanha relativamente às delegações tutelares, procurarmos uma resposta através de tutores voluntários para aqueles que não tenham nenhuma resposta ao nível familiar, nenhum suporte familiar, iremos procurar que tutores voluntários façam um trabalho a esse nível. Nós iremos procurar o máximo possível não ter pessoas envelhecidas estagnadas, sentadas à espera que o dia passe. É uma filosofia que nós iremos procurar manter. E nós temos a possibilidade de ver alguns lares em que as pessoas estão lá sentadas sem fazer nada. Iremos procurar acima de tudo ter, claro que também depende deles, mas dentro das capacidades de cada um iremos procurar que eles não entrem num conformismo num comodismo, mas procurar desenvolver um conjunto de actividades, manter o máximo possível as actividades que estamos a desenvolver e adaptá-las mas nunca parar com nenhuma actividade, porque parar é morrer e porque para eles também não é desejável que

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fiquem parados, obviamente que o processo de envelhecimento a nível físico é mais acentuado do que em termos intelectuais e se eles já têm uma dependência e um défice tão grande a nível intelectual, nós temos uma actividade que é de desenvolvimento pessoal e social em que procuramos não só manter as competências académico funcionais como também procurar que sejam adquiridas outras e nesse sentido todas as actividades que fazemos presentemente iremos tentar manter, no sentido de melhorar e dar a maior qualidade de vida possível, logicamente que também temos que ter em atenção a auto determinação de cada um deles o direito de poder escolher e se eles não se sentirem capazes de fazer ginástica naturalmente que deve ser respeitado. Mesmo nós chegamos a uma determinada idade e se calhar já não temos paciência para estar a fazer ginástica não temos vontade de fazer natação por exemplo, naturalmente que temos que respeitar isso. Mas iremos procurar diversificar as actividades para que se não fizerem uma poderem fazer outra, mas que não fiquem estagnados, isso parece-me que é fundamental. Eu: No seu entender, como é que se sentem os utentes mais velhos aqui? Psicólogo: Os utentes mais velhos da Associação sentem-se como os utentes mais novos da Associação. Eu acho que aparentemente, pelo menos pelo que oiço! Nós também fazemos uma avaliação da satisfação dos nossos clientes e obviamente que essa avaliação traduz-se em termos quantitativos e a grande generalidade a maioria das pessoas que estão na Associação, seja através dessa resposta quer seja através da observação directa, porque nós também temos oportunidade de fazer isso, parece-me que são pessoas bastante satisfeitas por estarem nesta instituição. Naturalmente que há umas que estão um pouco mais renitentes ao nível das residências não gostam tanto mas obviamente que isso é algo que nos ultrapassa ao nível das responsabilidades os pais, e eu acho bastante importante a formação aqui nas residências, isto é muitas vezes em casa fazem-lhe as vontades todas não colaboram com as tarefas e depois aqui na residência já trabalham e fazem o dia a dia daquilo que uma pessoa dita normal fará dentro de uma casa, limpezas fazer uma cama e tudo isso, e procuramos que eles aprendam, por isso é que me parece que há aquelas pequenas coisas de irem para a residência. Para além disso no geral parecem-me bastante satisfeitos e satisfeitos por fazerem um conjunto de actividades que eles gostam muito de fazer, eles gostam muito de passear essencialmente tudo o que tenha a haver com os passeios as colónias de férias e a fins eles adoram. Eu: Qual lhe parece ser a avaliação que as famílias fazem do trabalho que aqui desenvolvem? Psicólogo: A grande maioria das famílias também faz uma avaliação bastante boa, naturalmente que há umas famílias mais exigentes que outras, há famílias que têm uma bitola completamente diferente, outras que não conhecem mais nenhuma instituição para além da Associação, não sabem o que é que acontece noutras instituições e por isso não têm um padrão de comparação para que possam ser mais ou menos exigentes e neste caso gostam de tudo o que é feito na instituição, mas a grande maioria deles parecem satisfeitos. Mas obviamente melhor que eu serão as famílias para responder a esta questão, e eu acho que já fez uma pequena análise a esse nível (risos). Eu: E agora pergunto-lhe a si, qual a avaliação que faz do seu trabalho? Psicólogo: essa é uma pergunta mais complicada, porque quando nos avaliamos a nós… MAS eu acho que melhor que nós são as outras pessoas avaliar o nosso trabalho e obviamente que à prestações e exigências completamente diferentes, há pessoas que têm um nível de exigência em termos do desempenho profissional uns mais elevados do que outros e nesse sentido acho que é muito subjectivo a avaliação que faço do meu

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desempenho. Mas obviamente que dentro do que me é pedido e exigido parece-me que tento responder ao máximo. A repercussão do meu trabalho parece-me bastante positiva, porque quando nós criamos e desenvolvemos um conjunto de actividades, essas actividades respondem àquilo que é o diagnóstico das necessidades que fazemos com os nossos clientes e famílias e um dos aspectos que foram identificados como sendo importantes para eles foi a procura de bem-estar emocional e de controlo em termos comportamentais e nesse sentido e como eu tenho essa responsabilidade parece-me bastante positivo o trabalho desenvolvido. Obviamente que de uma forma menos directa através de um conjunto de instrumentos de avaliação que nós estamos a procurar construir ao nível do projecto “Rumo à qualidade” ao nível do Centro de Actividades Ocupacionais através de uma identificação que deverão existir e não existem por exemplo e obviamente que isso depois se materializará depois na melhoria da prestação de um serviço num serviço com mais qualidade e nesse sentido parece-me que há um conjunto de actividades que nós podemos desenvolver e não o estamos a fazer, uma delas e que é muito pedida por eles é a hipoterapia. É uma actividade importante em termos de correcção postural autoconfiança em termos do próprio relaxamento através do contacto com o animal, tudo isso tem tradução também a esse nível e é uma actividade em que iremos tentar contornar as dificuldades que nos forem colocadas no sentido de voltarmos a fazê-lo. Claro que gostaríamos de desenvolver outras actividades mas também temos contingências que nem sempre são possíveis de controlar e que limitam o nosso desempenho. Eu: Por fim, quer acrescentar alguma coisa a esta temática, alguma sugestão para o desenvolvimento deste trabalho? Psicólogo: Eu acho, por aquilo que eu vi, está um trabalho muito completo é uma vertente diferente às abordagens normalmente realizadas sobre as pessoas com deficiência mental, porque não é habitual abordarem as respostas em termos institucionais e o envelhecimento da pessoa com deficiência metal e aí o trabalho acrescido que a Vera teve em termos de leitura bibliográfica e tudo mais, em termos de questões parece-me que percorreu aquilo que é o mais importante necessariamente. Não vejo assim mais nada que tenha a acrescentar, tentei dar o meu melhor nas respostas no sentido de tentar ser uma mais-valia para o seu trabalho, agora se isso se traduz numa mais-valia, obviamente que o que eu tentei fazer foi com base no meu conhecimento e baseando-me nesta instituição especificamente. Pois pode haver outras respostas outras realidades mas que eu não conheço. Eu: Obrigado pela sua colaboração!

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PROFISSIONAL 3 - ENTREVISTA À AUXILIAR DE ACÇÃO EDUCATIVA

Associação…, 5 de Julho de 2007, 15h

Eu: Olá eu sei que lhe chamam …? Aux. Acção Educativa: Eu sou mais conhecida por …, o meu nome é …, mas um utente que não fala e conseguiu dizer … para ele foi um grande acontecimento para a família para os técnicos e então fiquei a …. Eu: Qual a sua data de nascimento? Aux. Acção Educativa: Tenho 55 anos, 16-02-1952 Eu: Quais são as suas habilitações literárias? Aux. Acção Educativa: Tenho o 9.º ano e fiz o curso para trabalhar como monitora promovido pelo Elo, embora a nível de categorias profissionais a monitora não existe nós somos consideradas auxiliares de educação que não o somos. Eu: Há quanto tempo exerce a profissão de Auxiliar de Acção Educativa? Aux. Acção Educativa: Há 17 anos e meio, sempre aqui na Associação, entrei precisamente no dia em que abriu a Associação e na altura fundaram-se como instituição mas depois levou algum tempo a darem os passos todos necessários arranjar o espaço arranjar o dinheiro e entretanto um ano antes foi quando eu fiz o curso por isso há 18 anos e meio que conheço a realidade da Associação. Entretanto tive quase um ano a fazer o curso. Eu: Enquanto Auxiliar de Acção Educativa quais são as funções que desempenha aqui na Associação? Aux. Acção Educativa: As minhas funções enquanto monitora é ajudá-los em todos os aspectos, quer no aspecto cognitivo, físico, motor pronto trabalhar as capacidades e conseguir uma mudança de comportamentos e até conseguirmos, eu há 17 anos e meio não os conhecia tinha que explorar todas as potencialidades que eles podiam ter, algo que tivemos bastante jeito, considero que tivemos muito êxito com alguns, uns quase não falavam outros não tinham hábitos de trabalho não tinha hábitos com comportamentos bastante …! È bastante complicado! Mas a nossa tarefa é precisamente essa é mantê-los ocupados mas também trabalhar toda esta parte de mudança de comportamentos e essencialmente ajudá-los o mais possível a todos os níveis, agente tem que os ajudar a todos os níveis, não é estarmos numa sala com 8 ou 9 e eles estarem a olhar uns para os outros, não… dá sempre para a prender, eles aprendem mas nós também aprendemos, aprendemos junto com eles, nestes 17 anos e meio podia ter ensinado e ensinei mas também aprendi muito! O que é muito gratificante, eu nunca pensei a priori quando vim trabalhar com esta população que eles me iam ensinar alguma coisa, antes pelo contrário. Eu: Quais os motivos que a conduziram a vir trabalhar com pessoas portadoras de deficiência mental? Aux. Acção Educativa: As motivações, eu vou ser muito sincera, na altura quando me falaram deste curso porque há um casal amigo que tem uma filha portadora de deficiência, este casal meu amigo já era sócio disto e disse-me olha vai abrir este curso assim assim, eu na altura estava sem emprego e eu vim naquela de vir, estava sem emprego e muito sinceramente conhecia aquele caso na altura criança mas não tinha assim muito a haver, não conhecia muito a realidade, trabalhava noutra área que não tinha nada a ver, completamente diferente e na altura sinceramente vim porque não tinha trabalho mas depois embrenhei-me de tal maneira durante o curso, as vivências e fui conhecendo e ao

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nível do curso fomos fazendo visitas e alguns hoje clientes da Associação fizeram com que nós os conhecêssemos e às famílias e fiz um estágio de um mês e portanto foi-me cativando, primeiro vim porque não tinha emprego mas depois gostei comecei a interessar por tudo o que diz respeito a estas pessoas e a viver cada vez mais esta realidade. Eu: O que é para si uma pessoa portadora de deficiência mental? Aux. Acção Educativa: É à partida uma pessoa com dificuldades, principalmente cognitivos, podem ser físicos também mas as mais associadas são as dificuldades cognitivas e a deficiência física, que podem ter vários graus, temos os profundos os moderados e os ligeiros, temos os mais profundos que são aqueles que nem sequer conseguem reagir a estímulos como temos cá alguns, depois temos os moderados que é a maioria de CAO e temos aqueles que são mais ligeiros ao nível do CEP. Todos eles têm mais problemas cognitivos que é quanto a mim o que define a deficiência mental, mas depois há toda a outra agravante que vêm arrastadas, pode ser de nascença pode ser às vezes por problemas sociais também pode ser adquirida a deficiência mental pelo espaço onde está inserido, pela sociedade, sei lá… Temos cá vários tipos de deficiência, uns têm associado esquizofrenia também temos alguns dois ou três que não têm deficiência mental, esta tem sido uma discussão ao longo dos anos antigamente era tudo doente mental, nós se virmos aqui há uns anos eram os chamados maluquinhos e punham-nos em hospitais psiquiátricos hoje vejo que não é nada disso, hoje sabemos distinguir uma pessoa doente e uma pessoa deficiente porque eram todos rotulados da mesma maneira, felizmente começaram a haver estas instituições para haver a tal diferença entre eles, porque antigamente eram todos doentes mentais. Eu hoje, desde que trabalho com esta população vejo o que não conseguia ver aqui há uns anos atrás quando era tudo tão escondido e manipulado à maneira deles pronto porque eram todos doentes mentais metidos nos hospitais e hoje consigo ver que conheci pessoas que não eram doentes mentais a e afinal eram deficientes mentais. Eu: E para si qual é a diferença entre as pessoas portadoras de deficiência mental e portadoras de uma doença mental? Aux. Acção Educativa: A priori uma pessoa com deficiência mental não são agressivos, a agressividade tem muito mais a ver com a doença mental, as aprendizagens que retiram ao longo da vida as pessoas com deficiência enquanto que, as pessoas com doença mental chegam ali e estagnam e já não há nada a fazer porque tomam muitos medicamentos que trazem outras consequências, enquanto que a pessoa com deficiência pode também tomar medicamentos claro mas são pessoas que fazem uma aprendizagem claro se forem trabalhados desde crianças e tiverem uma continuação conseguem fazer muitas aprendizagens, é verdade que chegam a um ponto a uma etapa chega ali e pára já não se consegue mais. As causas das duas problemáticas também são diferentes mas eu também não sou grande especialista para estar a falar disto. Eu: Qual a noção que tem de pessoa portadora de deficiência mental em processo de envelhecimento? Aux. Acção Educativa: Pois eu inclusive tenho na minha sala a mulher mais velha da instituição com 53 anos. Claro que agente nota, às vezes não queremos mas, dizemos ela ainda consegue, está óptima mas nós vamos notando que todas as aprendizagens que eles fizeram ao longo destes anos que tiveram que aprender desde o ABC, já se nota que chegaram ali e quase que estagnaram, mas não quer dizer que parem porque não param! Eu mesmo assim penso às vezes surpreendem-nos porque agente pensa: ai daqui a uns anos já não fazem, “flana” já não faz metade do que fazia porque isto da idade também

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envelhecem, mas não, ou somos nós com os nossos olhos que não queremos ver ou não sei, mas acho que ainda não se nota muito, aliás se fosse uma pessoa dita normal já se notavam o peso dos anos e nota-se claro que se nota e pronto já faz as coisas mais devagar e não sê quê mas por enquanto ainda não noto aquela diferença neles apesar de terem idade e eles todos como deve saber são todos já com por volta dos trintas e muitos quarentas, pronto a nossa população já tem toda estas idades, já se vai notando diferenças é lógico que se notam algumas diferenças, mas continuam a trabalhar e a fazer tudo o que faziam até aqui enquanto eles conseguirem nós vamos tentar sempre que eles não parem… continuam a fazer tudo na mesma como fazia à 17 anos e meio, claro que vão para a educação física e vem a professora e diz: ai … fulano já não está já tem… Claro nós também temos que ver que alguns já têm 50 e tal anos, pois está bem mas nós vemo-los sempre jovens, alguns já se nota pronto já têm, a da minha sala diz: ai já estou velha e cansada, pronto já há este tipo de respostas. Pois temos aí uma outra que diz: já estou cansada estou a precisar de ir para a reforma, como ouvem falar tanto da reforma eles dizem-me isso tudo: então já viu a nossa idade estamos na idade da reforma, você também se vai reformar e nós também queremos, alguns têm essa noção! Eu: Reflectindo um pouco sobre isso, sobre o que é para eles a idade da reforma será que isso se traduz numa mudança de actividades? Aux. Acção Educativa: Temos algumas que sim, mas acho que dizem aquilo da boca para fora temos outros que enquanto puderem vão sempre trabalhar e nós estamos cá precisamente para não os deixar parar. Porque o que é que vai acontecer a esta população, se não houvesse uma instituição estavam todos metidos se calhar num lar de terceira idade, mas nem todos…Enquanto cá estiverem isso não vai acontecer a priori têm um lugar aqui a segurado, senão o que é que faziam a esta gente, lar de terceira idade nem todos é a tal cláusula que há em alguns e então o que é que as pessoa faziam a partir dos trinta e que há muitos com 40 com dificuldades e certas coisas, morriam ali parados, acho que não acho que enquanto eles puderem e tiverem capacidades nem que sejam as mínimas capacidades faziam 50 peças agora fazem 20 ou 10, corriam um ginásio inteiro correm metade do ginásio, mas correm ainda trabalham ainda levantam-se todos os dias a dizer que vêm para o trabalho é que eles não vêm para a escola, vêm para o trabalho eles sabem que são adultos trabalhadores, uns dizem-se electricistas outros dizem-se sei lá, eles sabem que vêem para o trabalho não vêm para a escola nem vêm para brincar, por isso é que isto ainda os move, eles têm capacidade de ver que já não são crianças. Nós temos que manter isto até o mais tarde possível, mesmo aqui dentro do elo há uns poucos que já não trabalham, pronto mesmo esses que já não conseguem vir a pé tem que haver uma cadeirinha de rodas e têm que vir a andar vamos supor… temos que manter a actividade deles. Pronto eles envelhecem mais cedo do que os ditos normais, eu acho que haverá alguns que sim os outros não acho que envelheçam mais depressa do que eu por exemplo, tenho lá uma utente da minha idade, não acho que ela seja mais velha do que eu claro que tem as suas dificuldades é a tal relação entre as dificuldades dela e das minhas, ela continua activa e extremamente bem disposta é daquelas que não tem capacidade de prever o futuro não sabe o que vai ser o futuro dela. É a realidade deles, claro que nós fazemos uma pergunta, dizem-nos coisas que nós sabemos a priori que não vai acontecer, mas porque é que eles não hão-de poder ter as ideias deles, só quando é que são coisas sérias é que nós temos que lhes pôr um travão não é, mas temos que os deixar acreditar, agora vamos só castrá-los logo e dizer: ai tu não podes fazer isso, nem penses, nem penses nem penses! Isso é estar a castrar as ideias, eles

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já têm tantas limitações e nós ainda vamos promover a limitação do pensamento e dos sonhos? Os profundos precisam de ajuda para tudo, não respondem a estímulos, agarrarem num dedo ficamos todas contentes, um pequeno sorriso, um apertar de mão ou de um dedo, eles têm dificuldades diferentes das pessoas portadoras de uma deficiência moderada. Alguns têm a noção das incapacidades que têm mas continuam a sonhar! Se estivermos a fazer uma sessão de pensar daqui a uns tempos, uns abrem um restaurante, outros… porque não! Agente não lhe pode dizer que é impossível, é o sonho dele é o projecto de vida que ele tem, realizável ou não depende. Eu: Em que é que consiste o quotidiano dos utentes mais velhos que frequentam esta instituição? Aux. Acção Educativa: O quotidiano! Ainda não temos ninguém que fuja do quotidiano normal da instituição. Os que vêm de casa fazem a vida normal ou vêm de transportes alguns ainda vem de transportes públicos vem nas carrinha outras são os pais que os trazem, chegam aqui têm a sala de trabalho onde se dirigem e continuam ainda a ter todas as actividades, ainda não temos nenhum de dizer assim aquele tem mais idade deixou de ir à educação física, ainda não temos isso por enquanto, os que vêm fazem a sua vida normal, normal dentro da instituição, chamada normal porque para eles esta é a sua vida normal, continuam por enquanto a fazer tudo, toda a população está activa, dentro deste contexto não temos ninguém reformado. De segunda a sexta, temos, não sei se sabe alguns estão cá de segunda a sexta só vão a casa ao fim de semana por opção dos pais ou por opção própria, depois temos os outros que vão passando pela moradia periodicamente, mas por enquanto ainda não temos ninguém que por causa da idade já não faz, já não pode ir já não pode fazer. É a tal coisa a mais velha tem 54 anos, mas eu aqui há uns anos tinha a noção de que eles morriam novos, mas hoje chegamos à conclusão que não os pais estão todos a morrer, concluo que eles terão a quase a mesma vida quase que nós temos, aqui ainda não temos ninguém que tenha ficar ali todo o dia a ver televisão ou que tenha uma vida mais moderada por causa da idade. Notamos algumas dificuldades como já lhe tinha dito anteriormente. Daqui a algum tempo poderemos vir a ter alguns problemas, como já lhe disse os pais estão morrer, a maior parte, se eles já têm 50 e tal anos os pais também já não são jovens não é. A instituição dará sempre o apoio a eles. Como é que vai ser esse apoio? Coisas como nós hoje já falamos o que é que será desta nossa população daqui a uns anos? O que é que vão fazer? Tentar isto, é a tal coisa, às vezes só se fazem as coisas quando se chega à altura, mas nós pensamos quando temos reuniões, temos que estar preparados, acho que se vai tentar manter até mais tarde possível com alguma actividade, vamos supor que eles conseguem fazer alguma coisa manualmente e não conseguem fazer ginástica, esse tipo de coisas. Eu sei que cada vez precisam mais de ajudas porque entretanto vão perdendo as coisas que tinham adquirido, o saber comer o vestir e despir que aprenderam ao longo dos anos e conseguem muitas vezes fazer autonomamente mas que se calhar daqui a alguns anos… E temos aí alguns casos que já vão regredindo já tem mais dificuldade em fazer as coisas é natural que daqui a uns anos isso tendencialmente vai acontecer, porque nós os ditos normais também passamos por essa fase, então ai vão ter que ser muito mais ajudados sempre mais acompanhados, pronto tem que se ter outro trabalho, pronto vamos recomeçar se calhar um trabalho todo novamente deles aprenderem a viver com as dificuldades que vão ter novamente. Se calhar eles próprios vão ter a noção que já não conseguem, mas o objectivo da instituição é nunca aos deixar parar. Se eles ainda puderem nem que seja ir ver a rua, ir à avenida porque não? Não vamos fazer igual aos lares da 3.ª idade! Não queremos abrir um lar de 3.ª idade aqui dentro, claro que um dia vai acontecer, mas entretanto…

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Eu: Qual lhe parece ser a melhor resposta para estas pessoas quando envelhecerem? Aux. Acção Educativa: Vamos supor que a instituição não tivesse condições físicas de abrir uma nova coisa, mas se calhar Lar não seria nome indicado, mas sim uma nova valência, porque não? Eu por exemplo aqui há uns anos fui a Sevilha e agora não sei dizer o termo espanhol da valência, mas era uma valência para pessoas já com uma certa idade, então as pessoas de idade estavam lá todas, como nós temos uma moradia lá fora, havia uma moradia para as pessoas já com uma certa idade, com deficiência mas já com uma certa idade, elas estavam ali todas juntas mas eu não gostei muito do modelo digo-lhe já não gostei, estavam ali muito segregadas ali coitadinhas todas as velhinhas ali fechadas naquela casa sem actividades, cheguei a essa conclusão. Eu acho que a Associação não vai seguir esse exemplo, espero que não siga! Mas alguma coisa tem que ser criada, não estou a vê-los a vir para um CAO, mas se calhar uma valência porque não misturá-los durante o dia enquanto puderem junto com os mais jovens que fossem entrar para o CAO e não estivessem segregados, novos para um lado velhos para outro. Pronto ali aqueles coitados têm uma reforma deixem-nos estar sossegadinhos a ver televisão ninguém lhes mexe, não acho que não, espero que não e acho que não é isso que vai acontecer. Criar uma valência que sim senhor mas com actividades dentro das possibilidades de cada um, porque nós vemos que há pessoas que estão na reforma mas ainda são válidas, estes talvez com as suas dificuldades físicas que é o que os vai deitar abaixo muito mais cedo, é o que vai fazer com que deixem de estar activos, são muitas vezes associados à deficiência mental e que vai de certeza fazê-los parar mais cedo! Porque não é o problema que tem de cabeça mas fisicamente já se nota. E é isso que não deve acontecer, não andam a pé, vêm de cadeiras de rodas não podem é parar porque se eles estiverem dentro da capacidade deles mentalmente bem é o físico que vai piorar primeiro. Eu: Quais são as necessidades dos utentes mais velhos da Associação? Aux. Acção Educativa: As necessidades que qualquer pessoa tem quando deixa de trabalhar e que deixa de fazer as coisas que fazia. Apoio a todos os níveis, igual ao que os ditos normais vão precisar quando chegam à velhice, isto pode ter a certeza! Eu: A grande diferença poderá ser o facto de que os ditos normais criaram uma estrutura, tentado criar uma independência económica! Aux. Acção Educativa: Aqui por isso mesmo é que tem que ser, ou outro serviço ou é o estado que tem que criar estruturas para esta população. Os ditos normais, criaram estruturas, aplicam o dinheiro vão não sei para onde e normalmente têm alguém para tomar conta deles, estes não! Porque ou entretanto têm um projecto de vida elaborado entre eles os pais e a instituição, porque na maior parte deles daqui a uns anos não têm família, tirando aqueles que não têm irmãos e que muitas vezes os irmão não são as pessoas que mais os acompanham. Criar uma estrutura é o que eu digo ou a instituição ou o Estado tem que criar estruturas precisamente para as pessoas de idade com deficiência que não há, nós aqui também não temos porquê porque ainda não temos essa população mas que se pensa nisso pensa e a direcção e nós muitas vezes também pensamos. Mas vai ser basicamente não os deixar parar completamente e terem o apoio como qualquer pessoa que entra na fase da velhice tem e tem direito. Porque deveriam ter os mesmos direitos que qualquer um de nós. Eu às vezes penso o que é que vai ser deles! Têm que ser criadas condições, como se criaram para os ditos normais, porque vão ter as mesmas necessidades e os mesmos direitos que qualquer pessoa tem. E eles mas cedo, porque fisicamente é mais cedo do que nós. Eu: E quais são as suas potencialidades?

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Aux. Acção Educativa: Eles também têm potencialidades, eles sabem que têm deveres e direitos, sabem perfeitamente que têm o dever de ser e trabalhar para o futuro e programar e fazer os eu projecto de vida e pensar e exigir que sejam dadas todas as condições, eles têm essa noção não são muitos os que têm mas alguns têm essa noção. E eles vão pensando que têm que preservar o que têm e que têm que cuidar e que se a instituição foi cuidada para eles próprios têm que ajudar a preservar a ajudar a construir em que tudo o que for preciso para que as coisas continuem e que melhorem se possível. As características positivas, posso dizer-lhe tanta coisa, são pessoas sensíveis, amigos, muito verdadeiros, são extremamente verdadeiros se gostam, gostam, se não gostam dizem logo que não gostam não são hipócritas e são trabalhadores, são responsáveis coisa que às vezes as pessoas não acreditam, quando falamos às vezes lá fora “fulano” assim assim chegou atrasado e está doente, há eles ligam lá a essas coisas, não eles são responsáveis eles são muito mais responsáveis e directos do que as pessoas ditas normais, então sensíveis amigos do amigo, criam-se amizades a sério entre eles e entre nós e eles coisas que nós já não conseguimos dizer pronto ali ficou o emprego e agora vamos para casa, ninguém consegue pelo menos eu não consigo dissociar a minha vida em relação a esta população. Eu: No seu entender, como é que se sentem os utentes mais velhos na Associação? Aux. Acção Educativa: Acho que eles sentem-se bem, eles ainda não se sentem velhos, ainda não atingiram essa, sim há um ou outro que diz que já está velho mas eles são felizes à maneira deles, ainda não sentem o peso ainda não sabem o que é ser velho neste país, não têm a noção do que é entrar na velhice neste pais, porque nós sabemos que às vezes é muito triste chegar-se à velhice. Se calhar nunca vão ter essa noção tirando alguns que tenham mais capacidade se calhar daqui a uns anos sentem se não forem cuidados e tratados como deve ser, mas a maioria actualmente não sente. Há uns ou outros que dizem, há se não fosse o elo não sei o que seria de mim daqui a uns anos, mas pronto claro que entendem e sabem mas ainda vivem tão felizes que ainda não se preocupam com isso. Eu: E qual a avaliação que faz do trabalho que aqui desenvolve? Aux. Acção Educativa: Avaliando-me a mim mesmo, faço uma avaliação positiva, porque penso que fiz tudo o que estava ao meu alcance, tenho vivido experiência que nunca pensei vir a viver, mas também tenho tido sempre o acompanhamento dos meus chefes de toda a direcção e acho que fiz um trabalho bem feito dentro das minhas possibilidades e dentro do contexto e acho que sim que estes 17 anos tornaram-me mais mulher, um ser humano mais elevado, mais alto e vejo o resultado e sinto-me feliz! Eu: Quer acrescentar alguma coisa que considere importante para este tema? Aux. Acção Educativa: Não, eu só lhe queria dizer que eu louvo e fico contente que ainda hajam pessoas como a Vera que faz estes trabalhos porque eu há 17 anos não via ninguém, porque este tema é importante, ao longo do tempo vão aparecendo ai pessoas umas mais assim outras, mas fico contente e fico satisfeita que à pessoas que vem ver o que é na realidade, é a tal coisa o teórico, vir à realidade e vir falar com as pessoas que realmente trabalham porque a teoria quando se chaga à realidade não tem nada a ver. È de louvar quem se interessa por este tema e eu só tenho a desejar-lhe as melhores felicidades. Só dou os parabéns à Vera porque fiquei muito contente e muito sensibilizada por me ter escolhido e espero ter ajudado no seu trabalho. E estou sempre cá, se depois da entrevista precisar de mais alguma coisa, estou sempre à disposição. Eu: Muito obrigado pela sua colaboração, eu é que tenho muito a agradecer todos os seus contributos

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PROFISSIONAL 4 - AJUDANTE DE LAR

Eu: Como é que se chama? … Eu: … qual é a sua data de nascimento? Ajudante de Lar: 9-01-1964, já são 42 anos Eu: Quais são as suas habilitações literárias? Ajudante de Lar: 8º ano unificado com frequência de 9.º ano Eu: Há quanto tempo exerce a profissão de ajudante de lar? È essa a sua profissão aqui na Associação? Ajudante de Lar: Sim sim é essa, agora é portanto ajudante de acção directa, o nome mudou chama-se auxiliar de acção directa. Sensivelmente vai fazer 3 anos aqui na Associação. Antes não tinha nada a ver com esta profissão. Trabalhava na fábrica da pólvora ali em Moscavide que fechou, trabalhei lá durante 11 anos. Eu: Quais os motivos que a conduziram a vir trabalhar com pessoas portadoras de deficiência mental? Ajudante de Lar: Porque eu tenho uma ex-cunhada que trabalha aqui e eu vinha cá muitas vezes às galas, vinha cá buscá-la e portanto já tinha assim um certo contacto com os utentes, aqueles dos talheres da lavandaria, pronto com os mais profundos não porque não ia às salas, mas pronto já tinha uma ideia disto mais ou menos e depois como fiquei desempregada surgiu a oportunidade de vir para aqui e eu vim. Eu: Quais são as funções que desempenha na Associação? Ajudante de Lar: Pronto é tratar da higiene da alimentação, do bem-estar deles aqui na residência. Que é dar os banhos. Dar-lhes o jantar tratar das roupas, deitá-los levantá-los e pronto. É assim nós durante a semana nunca fazemos manhãs, porque eles vão para o CAO e não estão na residência, portanto entramos sempre à tarde, portanto fazemos sempre o turno da tarde e da noite. Ao fim de semana é que nos calha também manhãs, mas é basicamente a mesma coisa porque quando venho fazer as manhãs, quando estou a fazer a noite antes de me ir embora também tenho que dar os banhos, portanto as funções acabam por ser sempre as mesmas. Eu: E há quanto tempo trabalha com pessoas portadoras de deficiência mental? Ajudante de Lar: Desde há três anos e qualquer coisa, nunca tinha tido outro contacto com pessoas com deficiência mental nem qualquer outra deficiência. Eu: Partindo da sua experiência enquanto profissional, o que é para si uma pessoa portadora de deficiência mental? Ajudante de Lar: É uma pessoa com menos capacidades que precisa de mais auxílio. Precisa sempre de ser auxiliada praticamente em todas as suas funções, porque até mesmo aqueles que nós consideramos autónomos são autónomos até um certo ponto, podem ser autónomos no comer no vestir no calçar no andarem aqui até apanharem transportes mas têm que ter sempre um acompanhamento porque a cabeça deles há-de ter sempre uma falhazinha e portanto precisam sempre, são pessoas que precisam sempre de uma de um auxílio uns mais do que outros, de uma ajuda.

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Eu: Qual a noção que tem de pessoa portadora de deficiência mental em processo de envelhecimento? Ajudante de Lar: Eu noto já algumas diferenças, porque nesta população até mesmo sei lá com trintas e tais neste espaço dos três anos que eu cá estou já vou notando porque eles vão perdendo certas capacidades, vão andando para trás ou seja tudo aquilo que as minhas colegas que já cá estavam lhes ensinaram e eles tinham aprendido que agora começam a andar para traz. E eu também noto isso neles que vão perdendo algumas capacidades ou seja a autonomia, aquilo que eles aprenderam não quer dizer que tenham desaprendido mas já tem mais dificuldade em pôr em prática aquilo que aprenderam e não precisam de ser muito velhos, porque isto é uma população que eu acho, na minha opinião e por aquilo que tenho visto aqui que envelhece mais cedo do que uma pessoa dita normal, digamos assim. Eu: Em que é que consiste o quotidiano dos utentes mais velhos que frequentam esta instituição? Ajudante de Lar: Vamos imaginar que estamos a começar de manhã, tomam o banho o pequeno-almoço durante a semana vão para o CAO onde têm várias actividades, os que não vão, mas mesmo os mais profundos têm várias actividades, as natações e tudo isso, e depois há aqueles que têm as actividades laborais como estar nos talheres outros estão nas salas a embalar, pronto têm o seu trabalho. Quando saem, alguns vão para casa, os que ficam na residência estamos até às sete horas ali no bar a conviver a ouvir música, ver televisão ou vídeos, e depois vêm para as moradias, eu estou a reportar-me ao geral, porque por exemplo eles na moradia 2 eles não vão para o bar porque vêm fazer as tarefas aqui, mas nas outras residências não são eles que fazem as tarefas, porque eles não têm capacidades para o fazer, a moradia 2 é onde estão os ditos autónomos. Apesar de nas outras moradias também lá está à mesma quem saiba lavar que sabe comer sozinho que faz esse tipo de coisas, mas não tem tanta autonomia como estes têm. Pronto aqui é diferente, eles saiem vêm para aqui fazer as tarefas como já viu, cada um tem uma tarefa estipulada ou lavar a casa de banho, aspirar o quarto cada um faz a sua tarefa. Nas outras moradias está lá a conviver até às sete horas que é a hora que depois vem para dentro porque o jantar é às 7 e meia e dentro das capacidades deles eles também ajudam a pôr a mesa a levantar a mesa, nas outras moradias os que têm mais capacidade também ajudam. Depois acabando o jantar é hora do lazer, vêm televisão ou jogam e depois às 10 e meia é hora de se deitarem e portanto têm este ciclo. Eu: Pode contar-me como é que fazem a gestão e a divisão de tarefas? A gestão das tarefas aqui na moradia dois, que é onde há mais tarefas, aqui na dois nós à segunda-feira quando eles entram temos uma listazinha onde nós pomos o nome do utente e perguntamos o que é que ele quer fazer, que é para também não estarem sempre a fazer o mesmo, pronto o aspirar e a casa de banho isso têm que fazer sempre porque é quase sempre a mesma coisa, mas vão rodando por exemplo o estar na cozinha a arranjar os alimentos descascar batatas cenouras pronto esse tipo de tarefas, o lavar o fogão o lava-loiça e pronto vão rodando e é praticamente as tarefas que nós temos aqui. Eu: Quais são as necessidades dos utentes mais velhos da Associação? Ajudante de Lar: Há ai uns quantos há a ... o … e outros quantos destes assim mais autónomos. Quer dizer para mim eles têm todas estas actividades mas eu acho que às vezes já se torna um pouco cansativo tanta actividade em relação a outros mais jovens, não é? Penso que eles também deviam estar mais um bocadinho no seu, estarem mais recatados, terem o seu

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canto também para poderem descansar mais um bocadinho, porque às vezes eles têm ali as tarefas e trabalham ali e depois chegam aqui e eu noto que eles coitados já dizem “ai estou tão cansado hoje”, pronto já não lhes apetecia tanto terem ainda mais outras tarefas para fazer sempre. Por exemplo ao fim de semana o levantar que é sempre praticamente à mesma hora tanto faz durante a semana como ao fim de semana, portanto eu acho que devido À idade deles já devia haver uma diferençazinha, na minha opinião, por exemplo aqui a instituição acha que… Eu: Quais são as actividades que os utentes mais velhos têm ao fim de semana? Ajudante de Lar: Aqui ao fim de semana às vezes temos passeio, vem uma carrinha e vamos passear, portanto lá está também tem a ver com o grupo que cá está, porque às vezes são grupos muito complicados e não dá muito jeito para sair mas quando são grupos que eles sejam mais autónomos vamos sair. Quando não temos carrinha e agora que vem ai o tempo bom, temos uma saída de manhã e outra à tarde, geralmente vamos ali até à Portela ou à Encarnação pronto aqui por perto. Eu: E quais são as suas potencialidades? Ajudante de Lar: Eles é assim, como eu estava a dizer, todas as coisas que eles aprenderam e que até tinham uma certa potencialidade para fazer, com a idade vão desaprendendo, porque à coisas que eles faziam bem e agora por exemplo já não fazem até mesmo ali nos alimentos, aquilo que foi mais falado, mas agora se nós não tivermos sempre ali em cima a sempre a dizer vai limpar a casa de banho, por exemplo limpavam bem a casa de banho e vão perdendo mais, nós já temos que dizer então deixas ficar isso ai em cima, agora tens que passar com o paninho e pronto há utentes que faziam aquilo e pronto agora vão ficando assim um bocadinho mais parados. As características positivas é que já têm muito mais experiência a tudo, já sabem gerir melhor um bocadinho porque já sabem mais como é que isto funciona, já tem noção da avaliação, já sabem às vezes controlar-se mais porque já sabem que depois isso interfere na avaliação, já não são assim como os utentes mais jovens que não pensam tanto assim nas coisas não é. Eu: Qual lhe parece ser a melhor resposta para estas pessoas quando envelhecerem? Ajudante de Lar: Eu para mim a melhor resposta era fazer género de uma divisão tipo lar, pronto porque já todos tinham as mesmas actividades dentro das capacidades deles porque eram todos mais ou mesmos da mesma idade, porque por exemplo aqui como ainda estão todos misturados os de 50 com os de 22 não é, acabam por os de 50 fazer os que de 22 fazem não é! E eu penso que era importante haver uma divisão, havendo um género de um lar e depois haver actividades mais apropriadas pronto, não é ficarem parados, mas terem uma vida um bocadinho mais calma, visto que eles envelhecem devido às medicações e todos os problemas que levam a envelhecer mais precocemente. Ter assim um bocadinho mais de sossego. Mas isto já se nota hoje porque alguns já é complicado, este mais jovens acabam por desestabilizar um bocadinho aqueles que já não têm tanta paciência para saltos para gritos para movimentos não é! Porque isso até acaba por acontecer com a população em geral em relação às pessoas com mais idade e os jovens que agente às vezes vê podem gostar muito às vezes de ir lá para os bailaricos dos lares dos reformados mas também gostam do seu momento de sossego e aqui penso que é a mesma coisa apesar de ser um bocadinho mais cedo. Eu: No seu entender, como é que se sentem os utentes mais velhos na Associação? Ajudante de Lar: Os utentes mais velhos, eu penso por exemplo estamos a falar do autónomos. Eu penso que eles aqui, por exemplo na moraria aqui nesta moradia onde estão

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os mais autónomos sentem-se assim às vezes que sabem mais um bocadinho até que os outros não é, e então metem-se com aqueles que não sabem fazer é assim o tipo de situações que surgem aqui. Mas em relação, porque aqui na moradia dois os que cá estão são todos praticamente das mesmas idades não difere assim muito, são todos com mais idade os mais novos são os últimos utentes que entraram com 20 e poucos anos porque todos os que já cá estavam os mais novos têm 40 e tais e depois é tudo dai para a frente. Eu: Como é que acha que se sentem os utentes aqui na moradia? Ajudante de Lar: Depende, há alguns que gostam mais de cá estar do que em casa mas temos outros que estão habituados lá está o ir daqui o ir para casa já não fazem mais nada e então como aqui ainda têm as tarefas para fazer, dizem assim nunca mais chega o dia de ir para casa. Não é porque se sintam mal, mas estão habituados a chegar a casa e depois também têm o seu quarto e a sua privacidade e aqui é um bocado complicado porque se cada trouxesse o que quisesse e o que lhe apetecesse aqui é um bocado complicado depois controlar isso. Mas eles a maioria sente-se bem gostam de cá estar, excepções de alguns que não gostam, não é o não gostar é estão sempre a reclamar eles sabem que têm que cá estar mas estão sempre a reclamar e sempre “nunca mais chega sexta-feira” quando cá estão a semana toda, “quero ir para a minha casinha”. A Eunice por exemplo não sei se foi uma das que entrevistou, mas a Eunice é do princípio ao fim, vá Eunice vai lá limpar a casa de banho e ela é logo ai não porque me dói isto porque me dói aquilo, ela faz mas está sempre sempre a reclamar, “ e nunca mais chega o dia de ir para ao pé da minha mãezinha”, pronto ma acaba por fazer e quando cá está acaba por gostar de cá estar só que tem que estar sempre a reclamar. Eu: Como é que os utentes mantém ligação com a família quando cá estão? Ajudante de Lar: É geralmente os pais que telefonam e nós quando temos alguma coisa a transmitir fora do normal falamos com os pais. Eu: Qual a avaliação que faz do trabalho que aqui desenvolve? Ajudante de Lar: Quer dizer eu na minha perspectiva eu acho que é um trabalho bom, pelo menos eu tenho dado o meu melhor e a minha entrega em relação aos utentes e sendo assim se eu vejo que dou o meu melhor e dentro do possível quando estou aqui estou a 100%. As vezes nós temos os nossos problemas mas quando estou aqui tento sempre estar a 100% por cento para eles porque quando cá estão isto acaba por ser a casa deles e por muito que nós tenhamos problemas chagamos aqui e acabamos por esquecer isso porque eles são bastante sensíveis e apercebem-se sempre quando agente está bem quando não estamos bem e acaba por haver logo ali aquela ligação do que é que tem está chateada hoje está triste não esteja assim pronto acaba sempre por haver isso assim como nós também já os conhecemos e quando chegam nós também lhes dizemos então o que é que aconteceu hoje no CAO, portaste-te mal, pronto há sempre uma grande ligação entre nós da nossa parte para com eles e eles para connosco. Eu: Quer acrescentar alguma coisa sobre o que temos estado a conversar? Ajudante de Lar: Não quer dizer, a única coisa que eu tenho a dizer em relação a isto é que muitas vezes as minhas colegas perguntam-me onde é que trabalhas e eu respondo que já conhecia a instituição pelo menos os mais autónomos mas os profundos não, mas quando comecei a lidar com os mais profundos é que eu própria comecei a ter uma ideia diferente das pessoas com deficiência, porque apesar de agente dizer há mas hoje em dia já é muito diferente de antigamente, não é bem assim, não é assim tão diferente do antigamente um deficiente é sempre um deficiente eu digo isso porque eu trabalhei 11 anos

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num sitio diferente em que as pessoas hoje me dizem ai que horror como é que tu és capaz, há e as babas e eles quando se passam há e todo esse tipo de coisas que as pessoas ainda.. não sei, o deficiente ainda continua a ser o deficiente por muito que agente lute, talvez por desconhecimento não sei! Não é que eu tivesse esse tipo de problemas porque se tivesse também não tinha vindo para cá porque há pessoas que mesmo que quisessem não se conseguem adaptar, mas eu própria reconheço que fiquei com uma ideia totalmente diferente de um deficiente mesmo do deficiente mais profundo aquele que nós vemos ali numa cadeira de rodas e que não fala que não se mexe e que nós temos a ideia de ser um ser que está ali e depois quando começamos a lidar com este tipo de população vemos que é totalmente diferente na realidade não é assim. A sugestão que eu tenho a fazer é que eu acho importantes todos os trabalhos que falam sobre a deficiência sejam eles profundos ou não seja porque deficiência, cá deficiente até é aquele que é coxo até aquele que é cego de uma vista aquele que não tem uma mão para as pessoas é sempre alguém que é diferente, fala-se de todos diferentes todos iguais, mas as pessoas vêm sempre as diferenças. Aquilo que nós sentimos é que cada vez mais os utentes ficam cá portanto aqueles que até há um tempo era raro ficarem cá ao fim de semana, os pais cada vez vão tendo mais, precisam cada vez mais de terem um bocadinho de descanso, porque já são muitos anos, por exemplo há aqui utentes que já têm 50 e tal anos e não são os filhos mais velhos portanto logo ai os pais já terão uma idade muito avançada. Eles é um caso diferente dos idosos no geral, por isso eu digo aqui por exemplo, pronto existe esta instituição, que houvessem muito mais assim em que eles tivessem a sua evolução faz de conta como um colégio que vão para lá para a pré primária da pré vão para a primária e até saírem da escola e aqui eu acho e havia de haver instituições ou a maioria devia ser assim sem eles saírem à mesma do seu ambiente das pessoas que conhecem terem aquela evolução ficaram jovens forma independentes e não saíram dali pronto têm o seu cantinho na mesma com as mesmas pessoas que conhecem com os mesmos colegas tudo sem ser assim uma mudança brusca mas terem um sitio onde ficarem! Porque de hoje para amanhã nós sabemos muitos têm irmãos mas é complicado porque nós também temos que ver o lado da família que têm os seus filhos e a sua vida e é um bocado complicado porque é o que eu digo eles há dias que agente é quase só para um, porque requerem muita atenção basta qualquer desequilibro que tenham e é um bocado difícil para a família no dia-a-dia do corre corre terem essa disponibilidade toda para com eles, e então um sitio assim sem haver à mesma o corte com a família como agora existe não é fins de semana virem buscá-los, levar virem visitar porque há pais que quando os filhos ficam cá de fim de semana vêm cá à mesma passar um bocado com eles, mas aqui é diferente estão com ele aquele bocado mas depois também têm o seu bocado para descansar. Eu: Obrigado … pela sua colaboração!

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Apêndice 10

Titulo: Planificação e transcrição da dinâmica de grupo

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Planificação da Dinâmica de Grupo

Actividade: Dinâmica de grupo Dia: 26 de Junho de 2007 Hora: 15h:00m Duração: 45m Local: Associação População alvo: 4 utentes do Centro de Actividades Ocupacionais (2 rapazes e duas raparigas) portadores de deficiência mental ligeira ou moderada com mais de 45 anos de idade. Responsáveis: Dr. Ricardo (Psicólogo) e Vera Bento

Tema: “ Um olhar sobre o amanhã” Objectivos Gerais:

� Introduzir o tema do envelhecimento � Informar e Sensibilizar para o processo de envelhecimento destes utentes

Objectivos Específicos: � Reflectir em grupo sobre as questões relativas ao envelhecimento � Identificar mudanças individuais físicas e psicológicas � Reflectir sobre a Associação e as actividades aí propostas � Consciencializar para o envelhecimento da família

Conteúdo programático: � O que é o envelhecimento � Envelhecimento físico e psicológico � Actividades promotoras de bem-estar no processo de envelhecimento � Duplo envelhecimento: Envelhecimento da pessoa com deficiência e da sua família.

Estratégia a utilizar: Sessão semi-dirigida com recurso à projecção de imagens de pessoas com diferentes idades e incentivo ao debate sobre o tema. Planificação: Hoje vamos falar sobre o “envelhecimento” É um grande palavrão:

� Sabem o que é o envelhecimento? O que é que quer dizer? O que é para vocês o envelhecimento?

� Desde que chegaram a Associação, o que é que mudou em vocês? (em termos físicos e psicológicos) – introduzir a questão com a projecção de imagens

� Quais as actividades desenvolvidas pela Associação que permitem que o vosso envelhecimento se faça o mais saudável possível?

� E a vossa família mostra preocupação com o envelhecimento? (explorar o envelhecimento de ambos)

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Transcrição da actividade: Psicólogo: Vamos fazer uma dinâmica de grupo em conjunto. Aquilo que a Vera aqui está a fazer connosco é um trabalho para o mestrado dela como vocês sabem. Ela anda a procurar melhorar as suas qualificações. Erica: Como as estagiárias que cá estiveram? Psicólogo: É um pouco diferente as estagiárias procuraram apenas saber o que é que vocês pensam sobre o envelhecimento em geral. Erica: Eu não quero falar sobre a eternidade, eu não falo! Por amor da Santa! Elas são loucas virem falar-nos disso! (estava bastante agitada e a falar em voz alta) Eu: Eunice, nós apenas queremos falar um pouco sobre o tema do envelhecimento e temos algumas perguntas estruturadas, nós não vamos falar sobre a morte vamos falar sobre o envelhecimento. Normalmente um dos erros que acontece é que vocês associam muito o envelhecimento à morte! Erica: Então pois é! Psicólogo: Mas não tem que ser assim, nós vamos falar apenas sobre o envelhecimento e o envelhecimento é um percurso normal, todos nós envelhecemos e nós estamos conscientes disso. Temos aqui algumas perguntas que a Dr.ª Vera vos vai colocar no sentido de percebermos um bocadinho melhor o que é que vocês acham e a vossa opinião sobre isso, estão a perceber. Para isso trouxemos umas imagens de apoio para que vocês percebam um bocadinho qual é que é o percurso evolutivo, a evolução que ouve. (projectámos a 1.ª imagem)

Renato: Essas pessoas são idosas? Psicólogo: É sempre a mesma pessoa, está bem. Eu: Vou só responder melhor à Erica antes de começarmos. Erica nós só falamos do que queremos falar, não somos obrigados a falar sobre nada que não queremos, está bem! E falar sobre envelhecimento, como o Dr. (..) estava a dizer não é falar sobre a morte. Erica: Mas elas fizeram! (ela referia-se às estagiárias) Eu: Está bem, mas nós hoje aqui vamos falar sobre o envelhecimento mas noutro ponto de vista. Erica: A bíblia diz que a nossa vida dos 70 aos 80 anos é enfado e canseira. E mal de nós se não chegamos lá. Se não chegamos lá então é que agente já vai para o céu. É o que a bíblia diz enfado e canseira e robustez! Porque mal de nós se agente não chegar lá! Então é porque vamos para o lar de são …, é a última morada não temos mais nenhuma. Renato: Isso são todos ninguém cá fica! Maria: Ai pois não! Eu: Vou dizer-vos o nome que eu escolhi para esta sessão para vocês verem que não tem a ver com a morte. E o nome que eu dei a esta sessão foi “um olhar sobre o amanhã”. O amanhã não significa que seja a morte, mas sim os anos futuros os anos que aí vêem. Carlos: Quer dizer “novos anos”. Eu: Sim! E a primeira questão é então o que é isso do Envelhecimento? O que é para vocês os envelhecimento? Temos aqui esta imagem que retrata quatro pessoas, como o Dr. estava a dizer e bem, quatro pessoas que certamente serão a mesma, o que é que vos parece? Carlos: É a mesma pessoa que está à frente. É a mesma pessoa que está do lado esquerdo.

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Psicólogo: O que é que vocês acham? Parece-vos a mesma pessoa ou são pessoas diferentes? Maria: É a mesma pessoa! Psicólogo: De certeza? Maria: Ééééé. Psicólogo: E como é que vocês percebem isso? Maria: Porque têm a mesma cara. Carlos: Porque são parecidas só que esta aqui já tem rugas ali na cara. Erica: Então não se vê que têm a mesma fisionomia! Psicólogo: Fisionomia! É um bocadinho discutível, porque aquela criança ali não tem a mesma fisionomia que aquela primeira senhora. Maria: Pois claro, porque é mais velha. Agente ainda não chegou lá mas quando lá chegarmos vai ver se não ficamos igual a elas. Renato: Exactamente, então qualquer um vê! Aquela está mais como nós! Carlos: Claro que uma é diferente da outra porque uma ali está mais nova e esta aqui já está mais velha. Eu: O Renato já está a ficar assim? Renato: Para lá caminho! E os outros também! Mas para lá caminho! Psicólogo: Muito bem, mais alguma questão relativamente a esta imagem? Maria: Já tenho meio século e vou fazer mais anos. Renato: Hás-de fazer, hás-de! Psicólogo: Reparem que o objectivo destas imagens é no sentido de vocês pensarem um bocadinho que também já foram crianças, não é, como aquela criança ali. Já foram jovens, adolescentes, já passaram por uma idade mais adulta até chegarmos à velhice. Eu: Em que fase da vossa vida é que vocês estão? Olhando para aquela imagem, qual das quatro pessoas é que está na mesma fase que vocês? Carlos: Estamos na fase da adolescência. Psicólogo: Na 1.ª, 2.ª, 3.ª ou 4.ª pessoa? A 1.ª é a criança e a 4.ª é esta senhora! Carlos: Na primeira. Maria: Na quarta! Carlos: Na quarta não, primeira se faz favor! Psicólogo: Achas que estás nesta ...? (apontou para a imagem da criança e começou a subir) Maria: Não! Psicólogo: e nesta? Maria: Não! Psicólogo: também não, e nesta? Maria: Não! Psicólogo: Também não, e nesta? Maria: Sim! Renato: Sim! Eu: Então se calhar o melhor é ouvirmos um de cada vez. Está bem? Para percebermos se todos vocês se encontram na mesma fase ou não. Então vamos começar pela Maria. A Maria diz que se encontra na última fase. Maria: Sim! Eu: E a Erica identifica-se com quem? Erica: Na 4.ª. Carlos: Eu também me identifico na 4.ª imagem. Eu: E o Renato? Renato: Eu também! Psicólogo: E porque é que se identificam na quarta imagem já agora? Maria: (risos) porque sim! Psicólogo: É muito fácil dizermos que nos identificamos na 4.ª fase!

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Maria: Porque nos sentimos mais velhos. Renato: Ora bem, e é verdade! Maria: É verdade! É a lei da vida! Carlos: Nós sentimo-nos mais velhos e sentimos mais problemas ao andar eeeeee…… Eu: Eu confesso que achava que vocês iam dizer que se identificavam com a 3.ª imagem! Carlos: Na 3.ª imagem? Eu: Quais são as principais diferenças que vocês reparam naquela imagem? Psicólogo: Entre a 3.ª e a 4.ª essencialmente. Maria: A 4.ª vê-se que está assim envelhecida, e a 3.ª… Renato: Tem rugas. Maria: Tem rugas e a 3.ª não! Psicólogo: Mas vocês também têm rugas? Maria: Nós não! Carlos: Eu não tenho nada ainda. Erica: Ter ainda não temos. Psicólogo: Então vejam lá qual foi a vossa escolha? Vocês escolheram como pessoas idosas, é verdade ou não? Maria: Quer dizer… Carlos: Mas eu acho que… olhe que o meu familiar, a minha avó também já está tão coisa, também já está num lar, quer dizer dantes estava em casa agora já está num lar e ela já está aa… Psicólogo: Quer dizer que associas o envelhecimento ao lar, é isso? Carlos: Ao envelhecimento também os lares, a minha avó também já está lá. Maria: Eu também tinha, a minha avó quando eu ia lá para ao pé dela, ela dava-me uma agulha, uma linha e um trapinho e eu cozia, cozia, cozia e ninguém me ouvia. A minha mãe dizia: a miúda vem para aqui ninguém a ouve! Eu: Então já falámos um pouco sobre estas etapas que estão representadas nesta imagem, e agora pergunto novamente, o que é para vocês o envelhecimento? O que é ser velho? Carlos: É também ter problemas de saúde, problemas também no corpo, problemas vários. Erica: É uma tristeza uma pessoa chegar a velha, é uma tristeza pá! Eu: E porquê explica lá? Erica: Então porque agente já não tem as mesmas energias, vai-nos desaparecendo as energias e as capacidades intelectuais e muito mais. Agente não pode esperar ter as mesmas energias quando tiver 80 90 nem 100 anos! Renato: Eu quero dizer uma coisa. O meu avô tinha 90 anos quando faleceu, é verdade. E a minha avó faleceu com 94 salvo erro. Maria: Eu lembro-me tanto da minha avó. Era gordinha, gordinha! Psicólogo: Vocês associam muito o envelhecimento a coisas negativas, mas será que no envelhecimento também não há coisas positivas! O que é que vocês acham? Maria: Há! Renato: Há pois! Psicólogo: Que coisas positivas é que acham que há? Renato: Há muitas. Psicólogo: Como por exemplo? Renato: Isso já não sei. Psicólogo: Estou a ver que não conseguem! Erica: Não conseguimos porque agente tem medo! Psicólogo: Medo de quê? Erica: De envelhecer! Maria: Pois! Erica: Há-de perguntar à dona “linda” se ela quer envelhecer? A dona “linda” não quer! À pois não!

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Renato: Há pois, está bem! Psicólogo: Mas como podemos ver por esta imagem é um percurso natural! Renato: É verdade. Erica: Evidentemente! Psicólogo: E felizmente que envelhecemos, não é? Erica: É sinal que estamos vivos! Eu: Eu também pretendo ficar bem velhinha! Maria: E eu também! Renato: Quando a idade chegar depois logo se vê! Psicólogo: Mas ainda não disseram coisas positivas sobre o envelhecimento! Então vamos mostrar a próxima imagem. (projectámos a 2.ª imagem)

Erica: Está a ver o que é ser velho, é assim ir de bengala a subir as escadas! Eu: E o que é que a outra senhora de azul vos transmite? Ela também tem uma bengala, mas a cara dela está triste ou contente? Maria: Contente! Carlos: Contente. Renato: Não. Psicólogo: Não está contente? Maria: Está contente está! Renato: Está contente assim de bengala! Maria: Está! Renato: Ela não pode estar contente assim de bengala! Erica: Porque tem dores na coluna. Eu: Tem dores de coluna! Mas mesmo assim uma pessoa pode sorrir, mesmo estando velho e com algumas limitações também consegue sorrir, não é? Maria: É! Eu: E o outro senhor? Carlos: Já está com as mãos agarradas à bengala para subir as escadas. Renato: Exactamente é isso mesmo ou Carlos! Eu: E parecem umas escadas... Carlos: Muito altas, lá de cima até cá a baixo, vai lá vai, até que as escadas abanão. Psicólogo: O que vocês dizem é que naturalmente há algumas dificuldades pelo facto de sermos mais velhos a nível físico como disseram, a nível emocional a nível intelectual, perdemos algumas capacidades… Erica: Perdemos e de que maneira! Psicólogo: E porque é que será que as perdemos? Maria: Vamos enfraquecendo e perdemos as capacidades Carlos: O enfraquecimento nas pessoas é muito grande também às vezes. Eu: E desde que vocês vieram para a Associação que mudanças é que vocês têm notado? Maria: Eu estou cá desde que a Associação abriu, desde que a Associação abriu entrei logo. Eu: Então e o que é que mudou em ti Maria, conta-me lá? Maria: Em mim? (silêncio) Eu: Lembra-te da imagem anterior e em todas as mudanças que se vêem lá e pensa em ti.

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Psicólogo: Antes de mais, por exemplo, com que idade vieram para a Associação? Já cá estão há muitos anos! Renato: Já! Eu: Há quantos anos é que já cá estão? Renato: Eu entrei em 93. Psicólogo: 93, 14 anos. Maria: Eu entrei pelo menos em 83 ou 84. Renato: Eu entrei no dia dois de Fevereiro 1993, acho que sim. Psicólogo: Então já cá estão há muito tempo! Renato: Pois já. Maria: Quando abriu, eu vim logo para cá! Psicólogo: Eu acho que cada um de vocês veio logo quando a Associação abriu, só o Renato Teixeira é que acho que não. Erica: Pois porque não havia vaga. Psicólogo: Então e desde aquela altura em que entraram até agora o que é que vocês sentiram que mudou em vocês? Não notam diferenças? Que diferenças é que notam? Renato: Eu prefiro estar aqui do que em casa. Maria: Eu também prefiro estar aqui do que em casa, em casa não tenho nada para fazer e aqui tenho. Renato: Eu tenho sempre que fazer em casa, pôr a mesa tirar a mesa… Psicólogo: Quer dizer que gosta mais de estar na instituição? Renato: Exactamente, mas de longe! Psicólogo: Mas eu gostava era de vos ouvir dizer algumas diferenças, desde que vocês entraram para cá o que é que vocês sentem de diferente em vós? Maria: Em nós? Erica: Pergunte aos nossos pais, que eles sabem! Psicólogo: Mas eu estou a perguntar é a vocês? O que é que vocês sentem de diferente? Olhem para vocês quando vieram e agora que diferenças é que há? Erica: Éramos mais novos e agora estamos mais velhitos, é óbvio! Psicólogo: E sentiram que perderam alguma coisa, alguma coisa que já não consigam fazer? Erica: Eu dantes dormia melhor do que agora. A sério! E começam a aparecer-me problemas nas artroses o que é muito chato. Renato: É chato e de que maneira! Psicólogo: E mais? Erica: Eu no outro dia fui ao pingo doce e quando cheguei tive que me deitar na cama da minha mãe e esfregar as pernas com álcool. Psicólogo: E dantes já tinhas esses problemas físicos? Erica: Eu não! Alguma vez com 20 anos tinha estes problemas! Psicólogo: Então quer dizer que com esses problemas físicos foi-se um bocadinho a baixo? Erica: Então pois foi! Renato: E de que maneira! Psicólogo: A Erica é a nível dos joelhos, e vocês é a nível de quê? Maria: Então é resultado da velhice! Psicólogo: Mas o que é que vocês sentem que mudou a nível físico? A forma como vocês trabalhavam, será que não tinham mais força à 14, 15 anos do têm agora? Renato: Sim, sim, sim. Psicólogo: E psicologicamente notam algumas diferenças? O que é isto de psicologicamente? Tem a ver com os aspectos a nível intelectual, a nossa capacidade de pensarmos de tomarmos decisões, com o passar da idade será… Carlos: Com a nossa alegria também, a nossa emoção! Psicólogo: E houve melhoras ou piorou?

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Carlos: Um bocadinho de melhoras e de pioras. A nível de idade. O meu caso é este, sou diabético já há muitos anos. Começaram a aparecer-me os diabetes e depois apareceram ao meu pai, o meu pai também tem e eu também tenho. E estas coisas, nunca me tinha acontecido isto Dr. Psicólogo: Com a idade surgiram os diabetes. Carlos: O problema é que eu tive dois meses na CUF por causa disso. Psicólogo: Mais uma expressão respeitante a uma alteração ao nível físico, no caso do Carlos ao nível da saúde. E capacidade para resolver problemas? Vocês dantes tinham mais facilidade ou não em resolver os problemas? Maria: Eu tinha. Carlos: Eu nunca me tinha acontecido nada disto, e já vou para os 50 anos. Renato: Eu vou para os 51 Psicólogo: “Cambada de velhos que eu aqui tenho!” Todos: (Risada geral) Psicólogo: Outro aspecto positivo que vocês ainda não referiram que tem a ver com as emoções e com a gestão das emoções. Carlos: o que é isso da gestão de emoções? Psicólogo: Eu explicar-vos, tem a haver com a nossa capacidade de nos controlarmos a nós próprios. Com o avançar da idade vocês acham que se controlam melhor ou pior? Em termos de comportamentos e tudo mais. Carlos: Penso que tenho um comportamento muito melhor do que aqueles que às vezes andam para aí a portar-se mal e a meterem-se uns com os outros. Psicólogo: Então no inicio vocês portavam-se melhor ou pior do que agora, por exemplo? Renato: Portava-me pior! Psicólogo: Se calhar o Renato melhorou! Renato: Muito. Psicólogo: Agora portas-te muito melhor! Mas aposto que a Maria piorou! Quando chegou a Associação era uma menina muito certinha e depois com o passar dos anos começou a piorar. Maria: (risos) Pois. Psicólogo: “Ora bolas”! É que se nós formos a ver, com o evoluir dos anos nós vamos tendo experiências novas e teoricamente devíamos controlarmo-nos mais, não é? Maria: É! Erica: Claro! Psicólogo: Porque já passamos por muito mais experiências, já sabemos como funciona a Associação e temos que ter um maior controlo sobre aquilo que fazemos, teoricamente, agora na prática parece que há diferenças, não é! E a Erica qual é que foi o percurso da Erica? Melhorou ou piorou o controlo de si própria? Erica: Melhorei! Psicólogo: Óptimo! E o Carlos? Carlos: Ao nível dos movimentos as coisas, isso para mim também às vezes me faz ficar um bocado mal também, porque eu dos movimentos muitas vezes eu exagero em certas coisas, eu não devia exagerar mas eu exagero naquilo que não devo comer e depois a minha mãe dá-me uma descasca a mim, e já fui aqui também chamado à atenção por causa disso também. Psicólogo: Falta de controlo. Carlos: Falta de controlo e por causa... Erica: Então mas o que é isso, tens que ter mais cuidado, por causa da tua saúde, então! Psicólogo: Pois é a sua saúde que está em causa. Maria: Pois é depois os diabetes sobem! Carlos: E depois no outro dia eu estava tão aflito que fui lá à sua sala falar consigo e desabafei tudo consigo o que tinha a desabafar, quando foi aquela coisa de eu ter comido uma data de chocolates seguidos uns dos outros, e a minha mãe foi lá falar com o Dr. Martins e depois tive a falar consigo por

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causa disso. Isso já foi há uns anos atrás. Psicólogo: Então pelo facto de ter o problema dos diabetes piorou em termos de controlo sobre si próprio, essencialmente ao nível da alimentação! Carlos: Agora já tenho andado a controlar melhor. Psicólogo: Óptimo! Temos que ter cuidado com a nossa saúde e a nossa alimentação. Eu: Então e digam-me lá quando é que surgiram esses cabelos brancos? Maria: Quando? Renato: E ainda não tenho nenhum (risos) Maria: Olha aqui! (apontou para o cabelo do Renato) Renato: Aonde? Eu: Temos que ir buscar um espelho! Psicólogo: Já se olhou ao espelho? Renato: Mas aonde? Maria: tens aqui, olha! Aqui! Psicólogo: Pois é verdade todos vós já têm cabelos brancos. Eu: Quando vocês vieram para a Associação tinham cabelos brancos? Maria: Eu não, nunca tive cabelos brancos. Quando vim para cá não tinha. Carlos: Eu também não. Erica: Eu já tinha! A minha mãe já tem cabelos brancos desde os 18 anos. Psicólogo: E que outras características que com o decorrer dos anos são visíveis, para além das rugas que já vimos, e além dos cabelos brancos na cabeça o que é que acontece? Renato: Envelhece-se! Eu: Mas o que é isso do envelhecer? Psicólogo: Então vamos lá dizer as características do envelhecimento? Cabelos brancos, rugas e mais? Carlos: Falta de memória também. Psicólogo: Perda de memória, boa, mais? Erica: Menopausa. Eu: Muito bem, Erica! Psicólogo: Boa, menopausas e andropausas começam a chegar, mais. Renato: Há muito para falar ainda! Psicólogo: Força Renato, então conta-nos lá mais coisas. Renato: Não há tempo para nada. Psicólogo: Não há tempo, quer dizer que nós quando envelhecemos ficamos com muito menos tempo para fazer as coisas? Renato: Ora bem! Psicólogo: Mas então o envelhecimento não se associa à idade de quê? Renato: Hum…. Psicólogo: Da reforma, não é! Maria: Agora não há! Eu: Há, há! Psicólogo: O que aconteceu foi a mudança da idade de reforma que passou para os 65 anos. Erica: Agente é que também devia ter direito a reforma! Psicólogo: E uma das coisas positivas da reforma é que temos mais tempo para nós. É verdade ou não? Maria: É. Renato: É como o meu pai também. Carlos: O meu pai já está reformado também. O meu pai era oftalmologista e já está reformado. Psicólogo: Que outra coisa acontece nos homens ao nível do cabelo para além dos cabelos brancos? Carlos: Queda de cabelo também. Psicólogo: Exactamente. Maria: E nas mulheres também.

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Psicólogo: Sim nas mulheres também mas não é tão significativo. E porque é que os homens perdem cabelo mais rapidamente do que as mulheres? Maria: Porquê? Psicólogo: Tem a haver com as hormonas. Carlos: Pois com as hormonas. Maria: Com as hormonas? Psicólogo: É os esterogéneos e a testosterona. Nós já falámos sobre isso. Maria: (risos) Psicólogo: Já falámos também que a menopausa e andropausa também está associado. Mais a nível físico e intelectual já abordámos e outras questões sobre o envelhecimento? (silêncio) Eu: Vocês acham que estão mais calmos ou não desde que vieram para cá? Maria: Eu, eu… Renato: Nós estamos mais calmos é que a idade não perdoa! Psicólogo: Já não dá para grandes aventuras, é isso? Renato: Não, não já não dá. Carlos: Não dá para grandes aventuras. Psicólogo: E que coisas é que vocês faziam antes e agora já não conseguem fazer? Renato: Ir para a praia por exemplo. Psicólogo: E agora já foram para a praia? Renato: É, para a praia para o campo. Carlos: Dantes íamos à piscina. Psicólogo: Mas isso tem a ver com a programação das actividades e com outras questões, porque como eu vos informei, a piscina não tinha a água em condições. Carlos: Estava avariada não é? Psicólogo: Havia obras e estava muito suja. Que aventuras é que vocês faziam quando vieram para cá que agora não conseguem fazer. Há alguma coisa que agora não conseguem fazer? Maria: Não! Nós conseguimos fazer tudo na mesma. Psicólogo: Tudo ao mesmo ritmo? Renato: Eu faço tudo e mais alguma coisa. Maria : E eu também faço tudo e mais alguma coisa! Eu: E a Erica? Erica: Os meus dias é a dobrar guardanapos para a TAP mulher! Maria: (Risos) Psicólogo: Já tem um grande historial de dobrar guardanapos, verdade ou não? Quantos milhares é que já passaram por essas mãos? Eu: Eu vou lembrar-me quando andar de avião. Psicólogo: Este guardanapo foi dobrado pela Erica Marques! Erica: Até já me dói isto aqui! Psicólogo: Ai está outra consequência de tanto trabalho. Erica: É é, estou mas é a ficar velha! Psicólogo: Sabem o que é uma tendinite? Carlos: É uma dor muito forte que apanha os braços e não só. Renato: E as pernas também. Psicólogo: Consequência de… muito trabalho desenvolvido ao longo dos anos. Erica: Nem sei porque é que é tanto trabalho depois agente morre e deixa cá tudo! Psicólogo: Porque é que vocês trabalham já agora? Erica: É para sobreviver, porque agente não consegue sobreviver sem dinheiro, evidentemente! Maria: É pelo dinheiro. Renato: Claro!

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Eu: Então vocês recebem assim tanto dinheiro que dê para sobreviver? Maria: Agente recebe… Erica: Aquele que nos faz falta. Psicólogo: È o suficiente? Maria: É! Renato: Para mim é! Psicólogo: E se vocês morassem sozinhos, acham que era o suficiente? Erica: Mas é que agente não pode morar sozinhos! Carlos: Tínhamos que ter a ajuda de alguém para nos ajudar. Psicólogo: Vocês precisam de apoio também ao nível do dinheiro e da ajuda dos vossos familiares para conseguirem sobreviver, verdade ou não? Renato: É. Psicólogo: O dinheiro que vocês têm não é suficiente? Maria: Não! Psicólogo: Quanto é que vocês recebem em média, normalmente? Erica: Quanto é que agente faz? 15€ mais ou menos. Psicólogo: E para que é que dará 15€? Maria: Para irmos para o Algarve. Psicólogo: É suficiente? Maria: É. Erica: Só dá para comprar um par de sapatos. Renato: Ou um par de Pantufas! Eu: E vocês pensam fazer as actividades que estão a fazer agora até quando? Erica: Até quando Deus quiser. Maria: Até quando Deus quiser. Renato: Ora bem, é isso mesmo. Eu: Sendo a idade da reforma até aos 65 anos, imaginem que vão fazer as mesmas actividades até aos 65 anos. Renato: Oh! Ainda falta. Maria: Ainda falta muito! Eu: Acham que vão conseguir fazer estas actividades até aos 65 anos? Maria: Aaaa, eu vou. Psicólogo: Que actividades é que vocês fazem que procuram que vocês fiquem assim fortes? Maria: É a ginástica. Natação. Erica: Fisioterapia. Psicólogo: São algumas que vos ajudam a ficar fortes… Renato: Exactamente. Psicólogo: …Para avançar até aos 65 anos, é isso? Maria: É. Renato: Vamos lá ver se chegamos lá! Maria: É, havemos de chegar lá. Psicólogo: Significa que estas actividades vos permitem ser ainda mais saudáveis. Renato: Exactamente: Psicólogo: Mais alguma actividade que vocês façam que … Erica: Eu gostava da Hipoterapia. Renato: Eu também. Psicólogo: É uma reclamação que vocês fazem? Mas vocês sabem porque é que deixaram de ter hipoterapia não sabem? Erica: Olha porque não há papel! Maria: Não há dinheirinho!

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Erica: Custa uma pipa de massa como diz o Daniel. Psicólogo: Nós pusemos em consideração aos vossos pais e os vossos pais disseram que não tinham condições e só um reduzido número de pais é que não se importava de pagar e como esse grupo era quatro cinco pessoas não se justificava alugarmos aquele espaço para... Erica: Mas faz-nos imensa falta. Psicólogo: Era uma ajuda que vos preparava para enfrentarem o envelhecimento. Maria: Pois! Renato: Exactamente. Psicólogo: Para que é que servem as actividades que vocês fazem aqui na Associação? Servem para vos preparar para o futuro porquê? Maria: Então para nos preparar para termos a nossa casa e vivermos... Renato: Sozinhos. Maria: e vivermos sozinhos. Psicólogo: Acham que essas actividades vos permite isso? Renato: Exactamente! Psicólogo: Acham que vos promove autonomia? É isso? Renato: Exactamente! Maria: Sim! Carlos: E essa autonomia também é para nós podermos andar na rua, também temos essa autonomia, mas se você se porta mal não tem essa autonomia! Mas se tiver essa autonomia está muito melhor. Psicólogo: As questões da autonomia têm muito que se lhe diga! Carlos: Óh! E de que maneira! Psicólogo: A autonomia não se limita apenas às questões físicas. As actividades que vocês enunciaram são actividades que trabalham essencialmente o nível físico, mas há outras actividades que nós desenvolvemos que também trabalham o cérebro, é verdade ou não? Maria: é Renato: é Carlos: é Erica: é Psicólogo: Quais é que são? Que também permitirão ter alguma autonomia! (silêncio) Psicólogo: Não estão a ver assim nenhuma actividade especial em que trabalharam mais com a “cabecinha”! Então? (Silêncio) (Imagem 3)

Psicólogo: Senhores! Estão muito fracos vocês! É da idade, já vi! Estamos aqui com este pessoal velho! Renato: Vamos ficar velhos com certeza! Eu: Todos vamos, sabem que envelhecer é um processo contínuo e por isso é que quando nós mostramos aquelas fotografias da criança e de uma pessoa já muito velhinha, é um processo contínuo, pois quer a criança quer a pessoa já muito velhinha está a envelhecer! Todos nós que aqui estamos, estamos a envelhecer, todos os dias envelhecemos. Psicólogo: É verdade nós estamos aqui a falar e o tempo está a passar! Erica: Pois o tempo não volta para trás! Maria: Temos que viver um dia de cada vez! Renato: Também acredito nisso.

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Eu: E falando gora na vossa família. Acham que a vossa família está a envelhecer? (imagem 4) Renato: O meu pai está! Psicólogo: E a tua mãe Maria? Maria: A minha mãe ….. Renato: Está sempre nova! Maria: Está a envelhecer Renato: Há bom! Pensei que era mais nova que a minha! Psicólogo: E a Dona Florinda! Como é que anda a Dona Florinda? Também já está a ficar mais velhota? Erica: É a vida! Psicólogo: Desde que a Erica entrou para cá ela envelheceu bastante é verdade ou não? Erica: (Abanou a cabeça assinalando que sim. A sua face revelou preocupação e tristeza) Eu: E vocês preocupam-se com o envelhecimento dos vossos pais? Renato: Preocupo. Maria: Eu preocupo-me. Eu: E porque é que se preocupam? Maria: Porque estão a ficar mais velhos e tudo. Eu: E que consequências é que o envelhecimento dos vossos pais traz para convosco? Psicólogo: Que consequências é que poderá ter o facto dos vossos pais estarem a envelhecer? No futuro que consequências é que poderá trazer? Renato: Eu sei uma. Eu: Diga Renato. Renato: No futuro vou vir para a Associação. Psicólogo: Ora aí está, uma das consequências que você vê com o envelhecimento dos seus pais é vir aqui para a Associação. Maria: Eu também, eu também. Psicólogo: E a Erica? Se calhar a Erica pensa um pouco diferente. É verdade ou não Erica, o que é que você pensa? Eu: Com o envelhecimento da sua mãe o que é que poderá acontecer, Erica? Erica: (silêncio) Renato: Olha que amanhã não vais conseguir ficar sozinha em casa! Erica: Eu quero ir viver com o Daniel, droga! (levantou a voz) Renato: Está calada! Psicólogo: Fica com o Daniel, pronto respeitem a opinião da Erica. Tem a possibilidade de ficar com o Daniel. Erica: Cada cabeça sua sentença! Psicólogo: E conseguiram viver os dois juntos? O Daniel… explique à Vera quem é o Daniel? Erica: É a minha alma gémea. Psicólogo: Então para si na falta da sua mãe, vai viver com o Daniel? Erica: Sim! Mas precisava de uma pessoa que me orientasse. Psicólogo: Mesmo assim precisava de uma pessoa que a orientasse? Erica: Simmmm! Então a minha mãe foi para tribunal comigo e o homem disse à minha mãe que eu não podia viver sozinha!?

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Psicólogo: Teria a haver com as questões da interdição? Erica: Evidentemente! Carlos: Eu posso …. Vera: Diga Carlos, na ausência dos seus pais o que é que acha que vai acontecer? Carlos: É vir para aqui viver. Venho para aqui também para a Associação se for caso disso. Psicólogo: Já viram o que é que é a Associação daqui por uns anos? Renato: Então! Psicólogo: Tem aqui um grupo de “velhotes”! Maria: Uma cambada de velhotes (risos)iiiiiiii! Renato: Hum… Maria: Também não vais estar novo não penses? Eu vou estar velha e tu novo? Isso é que era bom! Eu: Imaginando que não existia a Associação que outras hipóteses é que vocês encontravam? Já vimos que a Erica ia viver com o namorado, e os outros? Psicólogo: Sim a Erica quer ir viver com o futuro marido. Maria: Risos Erica: Estás a rir porquê? Psicólogo: É uma possibilidade, é uma possibilidade, desde que haja alguém que os oriente e os apoio não me parece descabida essa possibilidade. Não vejo nenhum problema! Outras possibilidades? Erica: Pois! Eu não vou com a minha mãe! E tu queres ir com a tua? Maria: Olha eu também não vou com a minha mãe! Erica: Olha! O que é que a Maria João nos disse há tempos? Eu e o Psicólogo: O que é que ela vos disse? Erica: Se agente fosse com os nossos pais (….. não se percebe) evidentemente de maneira nenhuma (…) Eu: E vocês também não queriam ir com os vossos pais ou queriam? Maria: Nãooooooo! Erica: Eu, eu não queria ir com ela! Maria: Eu, eu não queria. Olhe! Está húmido, está fria! Agora ir para lá nem pouco mais ou menos! Renato: Não não, está fria! Psicólogo: Então e acham que os vossos pais se preocupam com o vosso futuro? Renato: Exactamente! Maria: A minha mãe preocupa-se com o meu futuro. Carlos: A minha mãe também! Eu: E como é que ela demonstra essa preocupação? Já falou convosco sobre isso, já teve uma conversa convosco a explicar que irá envelhecer e se já tem previsto o que irá acontecer com vocês? Ou nunca falaram sobre este tema do envelhecimento ou já? Maria: Ela não nunca falou. Psicólogo: E o pai do Sr. Renato? O Sr. Teixeira, já falou? Renato: Já. Psicólogo: E o que é que disse? Renato: Que qualquer dia ele ia para o Céu. Psicólogo: E a Erica, a Dona Florinda nunca falou contigo sobre o tema do envelhecimento? Erica: (abanou a cabeça indicando que não) Psicólogo: Não nunca disse nada. Eu: E o Carlos? Carlos: A minha mãe também nunca me falou nisso. Psicólogo: Mas vocês acham que eles se preocupam? Erica: Eles preocupam-se porque nos amam. Não maior amor no mundo que o amor de pai e de mãe. Maria: Olhe! Pai há só um e mãe há só uma! Psicólogo: E acham que eles podem estar descansados deixando-vos aqui no Associação? Renato: Exactamente.

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Carlos: Eu acho que podem ficar descansados. Maria: Eu acho que sim. Psicólogo: Acham que podem ficar descansados. E vocês sentem-se bem aqui? Olhando para um futuro mais longínquo, quando vocês tiverem, depois dos 65 anos e estarem reformados acham que se sentiram mesmo assim aqui bem? Maria: Pois! Eu sinto-me aqui bem! Estou melhor aqui do que em casa. Eu sou sincera sinto-me melhor aqui do que em casa! Eu: E o Carlos? Carlos: Eu também me sinto bem, aqui e em casa, mas eu muitas vezes tenho que fazer em casa. Psicólogo: Preferia ficar em casa ou estar na Associação? Carlos: Em casa e na Associação, as duas coisas. Se conseguir conciliar essas duas coisas era melhor. Eu: E qual é a posição da Erica? A posição da Erica é outra bem diferente! Renato: Ora bem. Psicólogo: É casar e morar com a sua cara metade, é verdade ou não? O problema é a dona Florinda! Erica: Mas não pode! Não há nenhum pai e nenhuma mãe que possa proibir o filho de casar! Porque se não eu digo à minha mãe e a minha mãe vem falar com o Dr.º Martins não percebo onde é que está o problema e se for preciso falo com a mãe do Mário (sócia e funcionária) e a Dr.ª Gabriela (A.S.) então mas o que é isto!? Não há nenhuma mãe que possa proibir uma coisa destas! Então mas o que é isto? Eu não pedi para vir a este mundo, não tenho a culpa de ser assim então mas o que é isto!?!? Eles também não casaram!? Então mas que moral é que é esta? Não tiveram filhos? Evidentemente, então mas agente também cá está neste mundo! Maria: Agente tem culpa de cá estar neste mundo? Pois, nós não temos a culpa de cá estar neste mundo! Agente não tem a culpa! Psicólogo: Obviamente que vocês têm direitos mas também têm deveres verdade ou não? Maria: É! Erica: É claro que temos deveres, olha agora! Psicólogo: E vocês reconhecem essas limitações, não é? Erica: Então nós não sabemos! Nós precisamos de ser protegidos. Psicólogo: Porque vocês têm algumas limitações e estão nesta instituição que vos dá todo o apoio que vocês precisam. Erica: Evidentemente. Psicólogo: Acham que o apoio que a instituição vos dá é suficiente para vos preparar para o futuro? Maria: Há pois! Erica: Evidentemente, homem! Psicólogo: Que outras actividades gostavam de ter para além da hipoterapia? Carlos: Óh Dr.º Ricardo eu gostava que tivesse uma coisa com um motor mecânico como há ali em Chelas, como eu já trabalhei lá em baixo em Chelas na Zona J onde eu tive a trabalhar, onde o seu tio me pôs lá. Foi na pré profissional onde eu andei (referia-se a outra instituição anterior). Maria: Eu quando sai da fiz logo a 4.ª classe e vim logo para aqui. Psicólogo: Vocês gostavam mais de estar na CERCI ou de estar aqui? Maria: Aqui na Associação. Carlos: É muito melhor. Psicólogo: E porque é que é melhor? Carlos: Porque aqui temos mais espaço. Psicólogo: Sentem-se mais livres aqui, é? Maria: É! Muito mais! Carlos: É que lá em baixo davam porrada. Erica: Ai coitadinha de mim! Psicólogo: Isso na CERCI era? Levavam trolitadas? Erica: Pois!

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Psicólogo: Mas aqui não! Uma das coisas que vocês são conscientes é que nós temos um código de ética que diz que nunca se pode bater em nenhum utente e que vocês têm todo o direito caso isso aconteça de vir falar com as pessoas responsáveis para analisarmos a situação. Seja colega seja monitor se já quem for. Carlos: Isso não tem a haver com o tratado de Genebra? Maria: O meu pai um dia meteu-se nos copos, e bateu-me. E fiquei com o olho todo o negro. Carlos: Eu também tenho uma coisa a dizer aos meus colegas. Eu: Então diga Carlos. Carlos: Uma vez isso também me aconteceu isso, em casa o meu pai vai para bater e a minha mãe põe a mão à frente e é obvio que eu caí no chão. Eu contei isso ao seu tio e o seu tio acreditou naquilo que disse a ele. Psicólogo: Sim, não tinha porque não acreditar. Eu: Antes de terminarmos gostava que reflectissem sobre a imagem que está exposta. Carlos: Ele está a olhar para ela com um olhar muito terno. Eu: O que é que vocês acham, será mãe e filho? Carlos: É de certeza mãe e filho com aquele cabelo branco de certeza. A mãe está a olhar para o alto com um ar muito coiso a ver se o filho diz alguma coisa a ela. E ele tem o cabelo branco e a mãe também. Eu: Eles têm um ar de felizes ou infelizes? Carlos: Felizes. Famílias felizes. Maria: Sim. Erica: Tá. Eu: Obrigado pela vossa participação, os vossos contributos foram muito importantes. Psicólogo: Obrigado então pela vossa participação, sim os vossos contributos foram muito importantes

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Apêndice 11

Título: Transcrição das entrevistas às pessoas portadoras de Deficiência Mental

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ENTREVISTA AO UTENTE 1 Associação…,

28 de Junho de 2007, 15h:15m Eu: No outro dia estivemos a conversar em grupo sobre o envelhecimento, e tu ficaste um pouco nervosa porque não querias falar sobre a ETERNIDADE. Naquele momento não te expliquei mas eternidade não significa morte, mas sim o contrário. Significa que a vida é interminável, não termina. Portanto hoje vamos falar sobre o envelhecimento, mas não temos que falar sobre a morte se tu não quiseres. Utente 1: Então Eternidade é o quê? Eu: Olha para tu perceberes melhor, podemos dizer que quem é eterno vive para sempre. Utente 1: Há… porque ai já não há dor, não há guerras não há ranger de dentes não há nada, mulher! Porque aí é tudo sagrado, a bíblia sagrada é muito clara a esse ponto! Você não conhece a Bíblia Sagrada? Eu: Para te dizer a verdade não conheço muito bem. Utente 1: Oh mulher mas se você quer comungar, na bíblia sagrada está lá tudo escrito lá, nem há parto nem dor de dentes, aí é que já não há nada! Não há nada! Eu: … eu gostava que tu reflictas sobre quando tu ficares bem velhinha! E vamos deixar o assunto da morte para depois! Utente 1: Está bem! Deus queira eu e a Vera! Eu: Sim todos nós! Mas eu gostava que não estivesses a pensar só na morte, é lógico que quando ficamos bem velhinhos podemos morrer, mas eu não queria que essa fosse a tua preocupação enquanto estamos a conversar. Utente 1: Esta é uma preocupação de todos nós! Ai agente não sabe! Há quem não queira ser velhinha! Eu: Tu não queres ser velhinha? Utente 1: Não o José Vital, mulher! E a mãe queria levá-lo quando ela morresse! Veja lá se ele não está cá para as curvas mulher! Queria levá-lo para o Lar de São Cristóvão, que é o céu mulher! A mãe disse na reunião ao Dr. Martins que o queria levar para o lar de São Cristóvão e ele ainda anda aí. Eu: Olha … mas eu não quero que tu te sintas mal a conversar comigo está bem? Utente 1: Eu não! Você não veio cá para fazer mal! Eu tenho que falar tenho que desabafar tenho que pôr a conversa em dia! Nós os deficientes temos que nos apresentar tal e qual como nós somos, nós temos que mostrar ao mundo o que somos e o que é que estamos aqui a fazer neste mundo! Porque muitas pessoas não nos conhecem porque têm medo de nós, têm medo que agente seja tímidos e não é assim! Nós temos que dizer tudo o que vai dentro da alma tudo o que vai dentro do nosso coração, o que é que está mal e o que é que está certo e o que é que está errado, agente tem que dizer que agente existe! Nós temos que dizer o que é que agente está cá a fazer, temos que dizer o que é que agente faz! Eu: É verdade! Utente 1: Mas não há ninguém que nos mande falar!

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Eu: Hoje podes falar! Em vez de irmos falar em grupo, hoje em vês de falarmos no global vamos falar um bocadinho sobre ti, queres começar por onde? Utente 1: Evidentemente, então cada caso é um caso! Eu: Exactamente …! Então fala-me lá um bocadinho sobre ti? Utente 1: Quer que eu conte o quê? Eu: O que tu quiseres! Utente 1: Eu não sei do meu nascimento e a minha mãe nunca me contou! Eu: E se eu te pergunta-se assim: quem és tu? O que é que tu me dizias? Utente 1: Eu sou uma jóia de pessoa, ai sou sou! Eu: E mais! Utente 1: E não há outra como eu, não há não! Ai isso não há! (momento de silêncio) Estou quase com 50 anos e já andei em vários colégios não é brincadeira nenhuma. Gosto muito dos meus colegas… Eu: Faz de conta que nós não nos conhecemos, nunca nos vimos, e tu tinhas que te apresentar e falar um pouco sobre ti. Imagina que eu não sei nada sobre ti! Utente 1: Risos Eu: Então? Não eras capaz de me dizer nada? Ou eu tenho que desligar o gravador! Utente 1: Não não é preciso. Eu fiz a minha 4.ª classe tinha 15 anos! Eu: Sim! E sabes porquê? Utente 1: Porque não podia fazer mais cedo. Andei três anos na segunda classe. Mas na quarta classe, Meus Deus, tomara muitos fazer uma quarta classe como eu fiz. Eu: Tiveste boas notas foi? Utente 1: Fiz na escola 1 no campo de Santana é ao pé do jardim filha! Como quem vai para o hospital dos capuchos, foi ai é que eu fiz a minha quarta classe! Eu: E mais sobre ti? Utente 1: Escovo sempre os dentes antes de deitar e levei a vacina a BCG lembro-me perfeitamente da picada no braço e deram-me um torrão de açúcar. Eu: Então chamas-te …! E tens quantos anos? Utente 1: Eu, eu tenho 48, mas foram feitos este mês os meus 48 aninhos! Eu: Onde vives? Utente 1: Moro na Avenida de Angola n.º 67, 5.º esquerdo, é no Marquês de Pombal, moro em frente do Banco Santander. Eu: E sempre viveste aí? Utente 1: Morei 15 anos ao pé do hospital de Santa Marta. Eu: E mais! Utente 1: Silêncio Eu: Eu sei que moraste nas Caldas da Rainha, é verdade?

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Utente 1: Sim até aos seis anos. Então a minha mãe não lhe disse! Eu: Já nem me lembro o que é que a tua mãe me disse, tenho falado com tanta gente! Mas eu quero é que tu me digas, pode ser? Utente 1: Eu também morei em Leiria, mas eu não me lembro bem. Morei em Turquel. Eu: Já moraste em muitos sítios! Utente 1: Ai pá morei em todos esses sítios, Meu Deus, mas eu só penso quando é que eu vou voltar lá. Eu: E porquê? Utente 1: Porque foi os melhores anos da minha vida. Porque tinha mais calma e não andava nesta adrenalina como ando aqui dentro da instituição, filha. Ai não andava não, pois não, isto aqui é uma canseira da vida (risos). Fale com a Dr.ª Gabriela e fale com o Dr. Martins que ele logo lhe diz ou com o Dr. Ricardo, isto aqui é assim mulher, isto é um lixo que não presta para nada. Eu: Não presta porquê? Utente 1: Isto de viver dentro da cidade é como um viver em constante ... não presta, porquê! Não presta filha não presta viver dentro da cidade. Então não vê... Eu: Mas a … está todos os dias aqui na Associação... Utente 1: Pois é só que o tempo vai passando (...) Eu: E então? Utente 1: E eu quero me casar! Eu: Os anos vão passando e a … quer-se casar! Utente 1: Queria ter um futuro e aqui não tenho futuro! Eu: Aqui na Associação? Utente 1: Sim! Eu: E porque é que diz isso? Utente 1: Eu começo a estar muito cansada desta vida. Sou uma mulher! Então! Se uma pessoa já está cansada deseja de ir para um sitio mais calmo, mais tranquilo não é! Eu: Vamos falar um pouco sobre a tua família, tens irmãos? Utente 1: Tenho um, tenho e tenho uma cunhada que é do Seixal e as minhas sobrinhas. Uma das minhas sobrinhas fez hoje oito dias que fez 11 anos. E um Pedro Miguel que tem uma cadelinha lá. Eu: E tu gostas deles? Utente 1: Gosto à minha maneira. Eles já têm a vida deles. Eu: Com quem vives? Utente 1: Vivo com a minha mãe e mais os hóspedes que estão lá em casa. Eu: E o teu pai? Utente 1: Então o meu pai! O meu pai morreu há quatro anos! Mulher não me fales do meu pai! Não quero falar do meu pai criatura.

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Eu: Tudo bem … se não queres falar do teu pai não falamos. Utente 1: O meu pai morreu há quatro anos com um AVC de ataque e morreu no hospital do Desterro, vai fazer 5 anos para o ano que ele vive no cemitério de Benfica! O meu pai chamava-se Mário dos Santos Marques e a minha mãe chama-se Florinda. Eu nasci em Leiria e o meu irmão nasceu na maternidade Alfredo da Costa e a mulher do meu irmão nasceu em Almada. Eu: O teu irmão é mais novo ou mais velho do que tu? Utente 1: É mais novo do que eu. Eu sou a mais velhinha! Quando ele nasceu tinha eu 6 anos e meio quase 7 anos. Era muito crescidinha. Eu: Sabes quantos anos tem a tua mãe? Utente 1: Tem 72 vai fazer 73 dia 1 de Janeiro assinala o novo ano. Eu: Lembras-te quantos anos tinhas quando vieste para a Associação? Utente 1: Vim quando fiz a minha 4.ª classe, tinha 17 anos. Eu: E porque é que achas que estás na Associação? Utente 1: Porque eu não conseguia orientar-me sozinha. Não não conseguia. Eu: O que é que isso significa? Utente 1: A vida está muito difícil, muito difícil. É uma barra muito pesada. Mas eu gostava de falar sobre o futuro. Eu: Gostavas de falar sobre o teu futuro? Utente 1: O que é que o futuro nos reserva? O que é que o futuro nos reserva? É que o nosso futuro não é hoje nem amanhã nem daqui a um ano, é quando Deus estabelecer. Nós já temos um futuro já definido, uma vida definida e o nosso destino e o nosso futuro, os pontos da nossa vida, nós temos que obedecer Deus é que decide a nossa vida. Nada conseguimos fazer contra isso neste mundo. A nossa fé tem que ser como diz o … a fé sem obra é morta. Evidentemente. Eu: Ainda há pouco estavas a dizer-me que não te consegues orientar sozinha. O que é que isso quer dizer? Utente 1: Então pois não, nem eu nem ninguém! Nós precisamos de alguém que ajude agente a organizar-se. Que o nosso futuro seja se casar ou outra coisa, nós temos que ter alguém que nos oriente na vida, porque a nossa vida não é brincadeira. Eu: Então deixa ver se eu te percebi! Estavas a dizer-me que gostavas de te casar. Utente 1: Evidentemente! Eu: Mas que precisavas de apoio da Associação por exemplo. Utente 1: Pois evidentemente que preciso de alguém que me oriente, eu e todos! Não sou só eu, são todos no geral mulher! Nós precisamos de ter alguém que nos oriente na vida. Porque se agente não tiver isso nada conseguimos fazer nesta vida, é que é mesmo impossível que agente faça alguma coisa desta vida! Eu: … eu estou a fazer-te estas perguntas todas… Utente 1: Diga meu amor!

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Eu: Para tentar ajudar a Associação a perceber o que é que vocês querem para o vosso dia de amanhã. Utente 1: Evidentemente, então pois. Eu: Então conta-me uma coisa. Tu desde que vieste para a Associação achas que estás mais nova ou mais velha? Utente 1: Então estou mais velhinha. Então pois estou, faço anos todos os anos e vou crescendo mais depressa vou ficando mais velhinha. Eu: E o que é que significa ficares mais velhinha! Que diferenças é que tu tens notado? Utente 1: Canseiras! Como diz a bíblia sagrada que a nossa vida dos 60 aos 80 anos e o que é que diz lá? Quem é forte, é canseira e robustez! Eu: E é isso que tu tens sentido? Utente 1: Evidentemente eu e toda a gente! Eu: Então mas vamos pensar só em ti? O que é que tu tens notado de diferente em ti? Utente 1: Então é canseira. Eu: E mais? No teu aspecto exterior? Utente 1: No aspecto exterior está bem, o problema é as pernas, as minhas perninhas, é varizes e as quembras aqui na anca. E tenho alergias também, ao polén. Estas coisas dantes não tinha nada disto! Quando agente vai para velha é que nos aparece isto tudo! É verdade! Eu: E esses cabelos brancos? Já tens cabelos brancos desde os 18 anos? Utente 1: Não! Mas a minha mãe começou a ter cabelos brancos aos 18 anos, filha! Foi ela que mos pegou! Eu: Óh … pensa lá bem no que me estás a dizer! Como é que a tua mãe te pegou os cabelos brancos se quando ela tinha 18 anos tu ainda não eras nascida! Utente 1: (risos) é que eu já nasci com cabelos brancos! (risos) Eu: Ai que tu estás a enganar-me, tenho que ir pedir umas fotografias tuas! Utente 1: (risos) eu estava a brincar consigo mulher! Eu: Então vamos lá falar a sério. Olha para ti e para mim, quem é que tu achas que é mais velho sou eu ou és tu? Utente 1: Sou eu! Eu: E porquê? Utente 1: Porque eu nasci primeiro. Eu: Como é que sabes, não sabes quantos anos é que eu tenho! Utente 1: Então quando é que você faz anos? Eu: Primeiro tens que me dizer quais são as diferenças que reconheces em nós? Utente 1: Então, tem um tipo fino! Eu: Há eu tenho um tipo fino! Muito obrigada! E mais? Utente 1: È o que eu lhe disse, é isto (sussurrou) é esta vida rotineira, não é não gostar mas quanto mais ando a correr mais me doem os ossos.

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Eu: Então a grande diferença que tu tens notado é sentires-te cansada! Utente 1: Sim! Olha as minhas olheiras! Isto não é normal, eu qualquer dia vou tirar isto. Eu não durmo de noite, penso nisto na Associação, evidentemente. Eu: Mas porquê não gostas de vir para a Associação? Utente 1: Eu queria que fosse alternado, não vir sempre para a Associação! Eu: Então conta-me lá como é que tu querias fazer isso? Utente 1: (risos) Então queria casar com o Daniel? Sabe quem é? Eu: Claro que sei quem é o Daniel. E depois iam viver para onde? Utente 1: Então para onde ele mora. Eu: Mas se calhar ele vive com os pais, não é? Utente 1: E quando os pais fecharem os olhos? Quando os pais deixarem de existir, pois é essa é que é a minha preocupação, é por isso é que eu não durmo de noite! Eu: A pensares que a tua mãe pode deixar de existir? Utente 1: A minha mãe e a minha futura sogra e o meu futuro sogro! Eu: E depois nessa altura o que é que tu achas que era melhor para vocês os dois? Utente 1: Eu sinceramente eu acho que era vivermos sozinhos, sem ninguém nos chatear! Viver como o passarinho, filha. Eu: Mas ainda há pouco me disseste que estavas na Associação porque precisavas de apoio. Utente 1: Então mas eu falava com o chefe e o chefe arranjava alguém para me lá ir apoiar em casa, está a perceber. Eu: Então e depois estavas lá em casa sozinha sem fazer nada? Utente 1: Eu! Tinha sempre que fazer em casa! Eu: Então e ficavam lá os dois todo o dia… Utente 1: Em casa arranja-se sempre que fazer, as pessoas como eu como você arranjamos sempre que fazer. Eu: … andas preocupada porquê? A tua mãe, achas que já está velha? Utente 1: Evidentemente! Está cansada, é uma pessoa muito doente, tens problemas de asma, tem joanetes. Nós temos uma vizinha que foi operada e depois ficou numa cadeirinha de rodas, já viu a minha mãe ia tirar e depois ficava numa cadeirinha de rodas. Tem três buracos na coluna. Eu: E o que é que tu achas que acontece às pessoas bem velhas? Às pessoas idosas àquelas que são muito mais velhas do que tu? Utente 1: Vão para um Lar de São Cristóvão! Toda a gente vai!

Eu: E agora pensando em ti, já pensaste no teu dia de amanhã? Utente 1: Então é ir como a minha mãe vai e como foi o meu pai! É o único caminho de Deus! Não conheço mais nenhum!

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Eu: Claro, mas tu se calhar não vais na mesma altura que a tua mãe! UTENTE 1: Então hei-de ir na mesma altura que ela! Não eu sou mais nova! Eu: É o que eu te estou a dizer. E quando a tua “mãe” não estiver por perto? Já pensaste sobre isso? O que é que achas que vai acontecer? Utente 1: Oh mulher vou viver com o …! Vou para casa dele. Eu: E tu achas que eras capaz de viver sozinha com o …? Utente 1: Evidentemente se tivesse alguém que me orientasse. Eu: Mas vocês tinham que ter dinheiro como é que faziam isso? Utente 1: Trabalhamos aqui na Associação enquanto pudéssemos. Eu ainda me falta uns aninhos para me reformar é só aos 65. Eu: E tu achas que o dinheiro que aqui ganham chega para todas as despesas? Utente 1: Então vou à assembleia da república e exponho o meu caso! Eu: E achas que eles te davam alguma coisa! Utente 1: Que remédio têm eles, então eles têm dinheiro para os almoços e para os jantares e não têm dinheiro para ajudar os deficientes porquê? Os deficientes não são mais importantes que os almoços e os jantares! Os deficientes deviam vir em primeiro lugar, então! Tem que ser assim, não devemos ser marginalizados eles têm que ajudar, então! Eu: Então era isso que tu gostavas para o teu futuro! Utente 1: Evidentemente! Punham um monitor a apoiar-nos, na nossa casa. Eu: E no Elo, gostas de estar na Associação? Utente 1: Eu já disse ao Dr. … que queria ir viver sozinha, eu não tenho papas na língua. Eu gosto, não hei-de gostar porquê! Só quando me chateiam é que eu não gosto! Eu: E quem é que te chateia? Utente 1: Os miúdos. Mas eu não fiz mal nenhum ao Paulo Rui ou ao… Eu: Gostas dos trabalhos que fazes? Utente 1: Eu gosto de dobrar guardanapos. Gosto de todos os trabalhos. Eu: Mas quais? É que eu não conheço todos os trabalhos que vocês fazem? Utente 1: Ó filha, então faço fisioterapia, depois natação, só quando estou com o período é que não posso fazer, faço ginástica, hipoterapia, hidroginástica, eu gosto de fazer estas coisas. Eu: E quais é que tu achas que são os mais importantes para ti? Utente 1: São todas, não tenho nenhuma que eu não goste eu gosto de todas. Eu: E imagina daqui a uns anos, gostavas de continuar a fazer o mesmo ou gostavas de fazer outras coisas? Utente 1: Não há! Então o Dr. …, vê-se e deseja-se para arranjar coisas e mais coisinhas para os miúdos, não há, mesmo que quisessem não há. Isto está péssimo dona Vera Bento.

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Eu: Mas imagina que havia mais actividades, tu gostavas de fazer as mesmas ou gostavas de fazer outras? Utente 1: Eu gostava de fazer outras. Se houvesse, se não houvesse olha ficava na mesma. Eu: E que actividades é que tu achas que te iam fazer bem? Utente 1: Todas. Mas eu gostava de ter uma vida mais calma. E ter dinheiro para me poder governar, quem é que não gostava! Mas a vida não dá para isso! È uma tristeza mas é a realidade! Eu: Porque é que tu achas que a vida não deu para isso? Utente 1: Então você não vê o telejornal! Eu: Mas por ti, porque é que tu achas a vida não te deu essas oportunidades? Utente 1: A vida está cada vez mais difícil, quanto mais desemprego mais fome há! Eu: …, de tudo o que falámos aqui hoje neste bocadinho, achas que te sentes uma pessoa feliz? Utente 1: Eu sou à vista dos outros sou! Então não é? É verdade e é a realidade agente tem que se conformar perante estas situações, evidentemente. Eu: E quais são as coisas que te fazem feliz? Utente 1: Ninguém sabe o dia de amanhã. Não sei o que é que me reserva. Agente tem que viver um dia de cada vez, a bíblia sagrada diz isso. Eu: Mas ainda não me disseste quais são as coisas que te fazem feliz? Utente 1: Oh mulher é caminhar todos os dias para aqui! Faz-me bem, porque me sinto ocupada, gosto de me sentir útil e ocupada, evidentemente. Eu: Queres dizer-me mais alguma coisa? Utente 1: Já lhe disse o que é que eu queria. Quem é que não anseia por uma vida melhor quem é que não quer ter filhos. Mas agente temos que nos sentirmos bem com a nossa alma, porque nós temos um futuro e temos que viver um dia de cada vez. Não sabemos o que é que o futuro nos reserva. Eu espero se dê outras oportunidades aos colegas, porque (sussurrou) o Elo tem uma lista enorme mesmo enorme, o “”teve 13 anos em casa porque não tinha vaga para entrar aqui, então isto admite-se! Ele em casa numa cadeirinha de rodas a precisar de vir para aqui para a instituição, o Dr. … bem tentava para cá o meter mas, isto não cabe na cabeça de ninguém. Eu preciso de sair daqui porque já cá estou desde o princípio para dar lugar a outros que precisam mais, há milhares que não têm onde estar. Eu: E se não fosses viver com o Daniel? Que outra hipótese colocas? Utente 1: Mas ele quer ir viver comigo! Eu: E os pais dele o que é que dizem? Utente 1: Os pais deles que falem com o chefe, com o Dr. … e a minha mãe procure o Dr. …, isto deve ser discutido na reunião quando eles cá vierem que discutam isso na reunião, agente não tem a culpa de cá estar neste mundo, meu amor! Nem eu nem ele! Então! Eu: E porque é que tu achas que tens estes problemas?

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Utente 1: Olha então a culpa é do médico, foi a minha mãe fartou-se de se chatear com o médico e o bandido do médico virou-se para o meu pai, hó Sr. Mário dos Santos Marques e tem a coragem de dizer ao meu pai que eu não sobrevivia no hospital de Coimbra, hó Dr. Vera. Isto não são coisas que se digam! Então isto admite-se eu salve-me e estou aqui viva e activa e ainda tenho muito para dar! E tomara que muita gente fosse como eu! É verdade eu não tenho papas na língua. Uma pessoa como eu não há! A Associação nunca mais vai ter uma pessoa como eu. (risos) Eu: E se a Associação um dia tivesse uma resposta para poderes ficar cá? Utente 1: Eu não quero cá ficar já disse ao Dr. …. Eu: … já estás a olhar para o relógio, não te prendo mais (risos). Obrigado Eunice por teres conversado um bocadinho comigo! Gostei muito de conversar contigo. Utente 1: Eu gostei muito de a ouvir!

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ENTREVISTA AO UTENTE 2 Associação…,

26 de Junho de 2007, 19h

Hoje vamos falar um bocadinho sobre ti, queres começar por onde? Eu: Fala-me sobre ti? Quem é que tu pensas que és? Utente 2: Eu sou o …, sou um rapaz com 49 anos, vou para os 50, sou um rapaz com uma certa, como é que hei-de dizer, com uma certa vontade de falar com as pessoas, consigo por exemplo, porque eu é a primeira vez que estou a fazer uma entrevista consigo. E acho que é giro as pessoas estarem a conversar umas com as outras para as pessoas se entenderem uma com a outra, para falar sobre aquilo que quiser falar sobre aquilo que quiser dizer, sobre aquilo que gosta de falar. Eu: E mais, fala-me mais sobre ti. Utente 2: Sou do signo escorpião, nasci em Novembro de 1957 no dia de Todos os Santos. Tenho dois irmãos um irmão divorciado e uma irmã casada. O meu irmão tem um filho e eu sou tio do filho dele, gosto muito dele é muito simpático, ele é meu sobrinho já há uma data de anos, quis ser tio dele, eu sou tio dele, por isso é que eu me ofereci para ser tio dele. Eu disse à minha mãe que eu queria ser tio dele e a minha mãe disse que eu podia ser tio dele. Eu: Onde vives? Utente 2: Em Benfica ao pé do Estádio. Eu: E sempre viveste aí? Utente 2: Em primeiro tive a viver na 5 de Outubro ao pá da 2.ª circular depois é que vim aqui para Benfica. Eu: Com quem vives? Utente 2: Com os meus pais. Os meus irmãos já estão um para cada lado, a minha irmã vive ali ao pé de Santa Marta, a minha irmã trabalha em São José e o meu cunhado trabalha em Santa Marta. E ainda tenho os meus primos a minha madrinha ainda, tenho a minha avó tenho mais primos. Eu: E mais coisas sobre ti? Utente 2: Tenho diabetes como sabe, é apareceu-me já há uns anos eu não estava à espera que isto me aparece-se mas depois é que me apareceu. Foi horrível, nunca pensei vir a ter diabetes nunca pensei nisso, uma situação que eu não estava à espera que acontece-se. Eu: Já foi há muitos anos? Utente 2: Comecei a ficar magro, magro, tive que ir para o hospital de são José, tive que ser encaminhado para lá não podia ficar em casa tão magro como estava. Eu: Sabes quantos anos têm os teus pais? Utente 2: Não, não sei Eu: Mas achas que eles são novos ou são velhos? Utente 2: Acho que já são um bocado velhos.

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Eu: E tu, sabes há quantos anos estás cá na Associação? Utente 2: Desde que isto abriu. Eu: Lembras-te quantos anos tinhas? Utente 2: Devia ter para ai uns 20 ou 20 e pouco. Ainda nem existia isto aqui nem nada. Não existia o ginásio nem isto aqui. Eu: Sabes porque é que estás na Associação? Utente 2: Eu estou cá por uma simples razão, por causa do Dr. …, eu conheço o Dr. … há uma data de anos, e o Dr. … ainda andava lá em baixo ai na pré profissional em Chelas e daí é que eu comecei a conhecer o Dr. … porque ele foi meu vizinho, e a dona Cremilde também no estádio da luz. E daí eu sei que o Dr. … tinha sido meu vizinho vivia na outra rua abaixo e um dia ao sair de casa vejo o Dr. … a ter uma aula de instrução, já é meu amigo há muitos anos. Estou cá para aprender coisas novas, para ter um futuro melhor uma vida melhor para ter um trabalho qualquer, se o Dr. … me desse essa oportunidade eu até gostava imenso, gostava imenso de ir trabalhar lá para fora. Eu: Porque é que achas que nunca foste trabalhar para fora da Associação? Utente 2: Porque nunca me chamaram para ir lá para fora trabalhar, mas eu já tive noutros sítios, já tive a trabalhar na carpintaria, já estive nos talheres, nos estofamentos, nos quadros eléctricos e outras coisas, também fui moço de recados e eu gostava imenso. E cá estou e sinto-me aqui também à vontade, sinto-me bem com os colegas, eu não posso queixar-me dos meus amigos porque eu sou amigo deles, tenho aqui bastantes amigos e não posso perder nenhum amigo meu porque eu gosto dos meus amigos, gosto dos meus pais, gostos dos meus irmãos, gosto do meu sobrinho, gosto da minha família toda. Gosto daquelas pessoas que me amam e que gostam de mim. Que me vêem na rua que gostam também de mim, pessoas amigas. Eu: Falas com muitas pessoas na rua? Utente 2: É muitas vezes sou eu que falo, por isso é que eu vi o Dr. a ter uma aula de instrução. Também tenho os meus primos, tenho as minhas primas e todas estas coisas, eu sou assim, tenho os meus pais a minha avó os meus irmãos... Eu: …, tu já estás há alguns anos na Associação, e agora achas que estás mais novo ou mais velho? Utente 2: Eu acho que ainda estou novo. Eu: Achas que estás mais novo do que quando vieste para a Associação? Utente 2: Acho! Acho que estou um bocadinho mais novo, mas a vida é a vida, aos 50 é que eu não sei como é que vai ser porque já só falta um ano. Eu: Então e tu achas que estás mais novo do que quando tinhas 20 anos? Utente 2: Não sei, talvez, mas ainda não tinha cabelos brancos! Eu: Então? E os cabelos brancos podem ser reflexo de quê? Utente 2: Velhice. Eu: Hum, então se calhar não estás mais novo! Utente 2: Pois não, estou a ficar um bocadinho mais velho.

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Eu: E porque é que estás a ficar um bocadinho mais velho? Pensa lá que mudanças tens observado em ti? Utente 2: Quando era pequenino, ainda não era grande. Quando era pequenino ainda andava no colégio moderno depois fui para o colégio Clapared, ai as coisas pronto (silêncio e cabeça baixa)... Eu: O que é que começou? Utente 2: pois as coisas também não andavam lá muito bem, não gostei daquele sítio também, tal e qual como nas Descobertas também não gostei nada daquilo e foi uma coisa assim um bocado que eu também não estava à espera, que acontecesse, os professores também faltavam e a comida era fria, ficava fria depois se os professores faltavam não podiam dar aulas aos miúdos. Eu: Olha …, agora que acabaste de me contar o teu percurso, neste momento estás mais velho ou mais novo? Utente 2: Estou mais velho! Eu: Então conta-me lá porque é que estás mais velho? Utente 2: Porque já estou a ficar com cabelos brancos e cada vez que fico com mais já começo a dizer “já estou velho, já estou velho” Eu: Quais foram as mudanças que sentiste nos últimos anos? Utente 2: Só se possa ter havido uma pequena diferença, não sei, mas…não sinto essa diferença, agora sinto é esticões no corpo, sinto assim um esticão como se fosse uma batida forte. E no outro dia senti um esticão aqui no braço direito nunca me aconteceu estas coisas estar aqui o braço e ele levantar sozinho. E os diabetes que é a coisa mais triste, não posso comer assim tantos doces. Eu: E olhando-te ao espelho, vês outras diferenças para além dos cabelos brancos? Olha para ti e para mim, quem é que tu achas que é mais novo? Utente 2: (risos e apontou para mim) Eu: Risos, é verdade sou eu! E porque é que achas que eu sou mais nova? Utente 2: Porque se eu sou mais velho a Dr.ª Vera é mais nova. Eu: Mas o que é que te fez dizeres que eu sou mais nova? Utente 2: Porque não tem os cabelos brancos. Eu: E mais… Utente 2: Não tem rugas, não tem nada. Eu: E diz-me! O que é que tu achas que é uma pessoa velha? Utente 2: Uma pessoa que já tem muita idade para se mexer porque lhe custa muito a andar, as dores da terceira idade, esses por exemplo coitados já não se mexem quase nada, muitos que andam com bengala outros com cadeirinhas de rodas há outros que andam também com andarilhos e há ai muita gente com esses problemas eu até já tenho visto muita gente a cegar por causa disso. Eu: E as coisas positivas? Utente 2: Pois também têm muitas coisas positivas, tem que ser mais destacadas também.

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Eu: Costuma dizer-se que os mais velhos têm a sabedoria da vida! O que achas sobre isso? Utente 2: Pois é os mais velhos têm a sabedoria da vida! Eu: Achas que já aprendeste mais ao longo destes anos? Utente 2: Hum, não, para mim é difícil eu raciocinar uma coisa com a outra, mas há outros raciocínios que eu deveria ter e eu não entendo. Eu: Como por exemplo? Utente 2: Eu estou a falar com uma pessoa, com a minha mãe e o meu pai meter-se nas conversas que não lhe dizem respeito por causa de mim, pois… Eu: E que conversas são essas? Já conversaste com a tua mãe sobre o envelhecimento? Utente 2: Não. Não Eu: E as pessoas com quem vives, achas que já estão velhas? Utente 2: Estão assim um bocadinho, o meu pai já está, ele agora custa-lhe a andar um bocado, já tem a ver com a idade. Ele vai buscar pão e às vezes vai buscar coisas à minha mãe, eu às vezes também vou lá buscar coisas a eles. Eu: Costumas ajudar a tua mãe? Utente 2: Ajudo a minha mãe, porque ela pede-me para a ir ajudar. Eu: Achas que ela já está velha? Utente 2: Não, acho que ela ainda está nova. Ainda faz o jantar o almoço e essas coisas, o meu pai às vezes ainda consegue fazer isso. Eu: Mas isso não significa que ela ainda está nova? Pensa lá no que me disseste que era uma pessoa velha? Utente 2: Pois, é uma pessoa que já tem uma certa idade, que já não consegue andar no devido ritmo, que tem problemas em vários sítios que tem que os resolver e não os consegue resolver. Que pode chegar aos 100 anos. Eu: E a partir de que idade é que tu achas que uma pessoa já está velha? Utente 2: Ai aos 89 anos, para ai. Eu: Como a tua avó? Utente 2: Sim tem 90 e poucos, mas ela ainda anda, ela anda bem, ela está num lar, ela dantes não estava mas a minha mãe meteu-a num lar. Eu: E porque é que achas que ela foi para um lar? Utente 2: Não tinha ninguém com quem estar em casa coitada, já precisava de quem a ajudasse ela precisa muito de ajuda. Uma vez fui lá com a minha mãe fui lá vê-la! Eu: E tu sabes o que é que acontece às pessoas bem velhinhas? Utente 2: Podem morrer Eu: Já pensaste sobre isso? Utente 2: Acenou sim com a cabeça. Também pode um dia acontecer-me a mim! Eu: A ti a mim e a muitas pessoas…

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Utente 2: Pois a muitas pessoas Eu: Já pensaste que isso pode acontecer primeiro aos teus pais do que a ti? Utente 2: Não, não foi assim muito tempo que eu tivesse a pensar. Eu: E já faleceu alguém perto de ti, que tu gostasses muito? Utente 2: Sim Eu: E queres falar sobre isso? Utente 2: Foi o meu avô, o meu avô …, ele já estava na cama, já foi há muitos anos, mas ainda tenho a minha avó. Pois e foi assim que ele morreu numa cama. O pai do meu pai. Eu: O que é que pensas sobre a morte? Utente 2: É uma coisa muito triste, para a minha mãe para o meu pai e para nós todos, foi uma perda muito grande para o meu pai. E depois a seguir foi o meu avô o pai da minha mãe, também morreu no hospital, teve um problema de diabetes, o mesmo problema que eu tenho e de repente Traz e também morreu a minha prima …, a irmã do meu pai, morreu o meu tio …. Eu: E agora pensando em ti, já pensaste no teu dia de amanhã? Utente 2: Sei lá o que é que vai ser daqui a uns anos. Eu: O que é que achas que vai acontecer? Utente 2: Não sei, eu não sei, hó Dr.ª Vera não sei o que me pode acontecer não faço ideia não tenho assim ideia nenhuma. Eu: Tudo bem …, não sabes o que te vai acontecer, mas já pensaste o que é que queres para o teu futuro? O que é que queres para ti? Nós estamos todos a ficar mais velhinhos e como tu me disseste começamos a perder capacidades, menos força, menos memória… isto foi o que tu me disseste não foi? Utente 2: Foi Eu: Então imagina que nós vamos chegar lá e que tu também vais chegar a velhinho! Utente 2: Pois claro! Eu: Então fala-me lá um bocadinho sobre isso. O que é tu queres para o teu futuro? Utente 2: Para o meu futuro queria que, ter um futuro melhor um futuro bom um futuro agradável que se os pais dessem um bom futuro aos filhos é porque agente quer conversar imenso e dessem mais atenção aos filhos como costumam dar, pois eu muitas vezes também me metro em coisas que não me devo meter e não me posso meter em sarilhos porque senão já sei como é o meu pai e a minha mãe comigo, isso é que é agora sobre o futuro! Eu: Onde é que tu gostavas de viver no futuro, na ausência da tua mãe e do teu pai? Utente 2: Talvez numa casa lá fora. Aqui não gostava por exemplo. Ter pessoas que me dessem uma ajuda. Eu: Precisavas de alguém que te ajudasse? Utente 2: Pois. Eu: E achas que precisas de ajuda em quê?

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Utente 2: Em várias coisas como arranjar-me como lavar-me como vestir-me, para me dar um certo apoio. Eu: Isso se calhar era um bocado difícil estares a viver sozinho lá fora e teres alguém sempre para te ajudar! Utente 2: Pois se calhar isso era um bocado difícil, depende daquele sítio onde as pessoas possam vir a ter uma casa alugada por exemplo. Eu: E gostavas de viver sozinho ou com mais alguém? Utente 2: Com mais alguém! Eu: Com quem? Utente 2: Com colegas meus por exemplo Eu: E se isso não fosse possível, tens consciência que essa opção é muito difícil para ti, não tens? Utente 2: Acenou que sim com a cabeça Eu: Não havendo essa opção em que outro sitio e com quem é que gostavas de viver? Utente 2: Pois podia ser difícil. Eu: Imagina que tu tinhas que viver aqui na Associação, como é que gostavas de viver aqui? Utente 2: Ai é que. Eu: Gostavas de viver aqui na Associação? Utente 2: Eu gostava, mas é muito é muita coisa muita gente e depois é uma confusão. Pronto é isso. Eu: Olha então vamos falar sobre outro assunto. Gostas de estar cá na Associação? Utente 2: Gosto, gosto não é uma seca. Eu: E dos trabalhos que tu cá fazes quais são os que tu gostas mais? Utente 2: Hoje por exemplo tive que limpar a casa de banho. Eu: Isso é porque estás cá esta semana na residência, e durante o dia, quando vais para o CAO 3, gostas dos trabalhos que fazes? Utente 2: Gosto. Eu: E quais são os trabalhos que tu gostas mais, conta-me lá? Utente 2: Hum, (riso forçado) Eu: Não gostas muito de fazer aqueles trabalhos, é isso? Utente 2: É aqueles é! É que é sempre a mesma coisa, são sempre as mesmas tarefas, devíamos fazer outras, é sempre lavar as casa de banho, por a mesa levantar a mesa por talheres tirar talheres, levantar os pratos e pôr os pratos, lavar a loiça limpar, e essas coisas. Eu: Sim e no CAO? Utente 2: Hoje nem sequer fui para lá de manhã, tive cá a passar a semana e depois hoje tive à tarde na oficina.

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Eu: E nos outros dias, há tantos anos que cá estás que já fizeste imensas actividades até já me contaste ainda à bocado que tiveste na carpintaria, que tiveste a fazer de moço de recados, não foi? De todas as actividades que tu tens feito cá na Associação, quais é que tu gostas mais? Utente 2: É o remo. As outras é sempre a mesma coisa. Gosto mais do remo. Eu: Mas quais é que tu achas que são mais importantes para ti? Para tu te sentires bem? Utente 2: É a ginástica também. Gosto do que estou a fazer aqui, levar o lixo, pôr os pratos, faz-me bem para eu me sentir mais independente. Eu: E sem ser aqui na moradia? Utente 2: Lá fora também gosto do artesanato, gosto imenso porque o artesanato é bonito. Eu: E daqui a uns anos … Utente 2: Já estou a ficar com sono! Eu: Estamos mesmo quase a terminar, mas queres parar? Utente 2: Se calhar é melhor parar já estou um bocado cansado! Eu: Então vou fazer-te só mais duas perguntas, pode ser? Utente 2: Está bem, então pergunte lá. Eu: Daqui a uns anos, gostavas de continuar a fazer as mesmas actividades ou gostavas de fazer outras coisas? Utente 2: Eu gostava de fazer outras. Eu: Que outras actividades? Utente 2: Andar de cavalo que é o que eu gosto, gostava de poder sair de casa e isso assim. Eu: Manteres-te activo, é isso? Utente 2: Sim. Eu: De tudo o que falámos aqui hoje neste bocadinho, achas que te sentes uma pessoa feliz? Utente 2: Sou, sinto-me feliz! Eu: E quais são as coisas que te fazem feliz? Utente 2: Se calhar é eu conversar com os meus colegas, estar com os meus irmãos os meus pais o meu sobrinho. Eu: Queres contar-me mais alguma coisa? Utente 2: Não. Não quero. Eu gostei de conversar consigo (risos) Eu: Obrigado pelo teu contributo e sinceridade. Utente 2: Eu posso ouvir a gravação? Eu: Podes, claro que podes, ora vamos lá!

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ENTREVISTA AO UTENTE 3 Associação…,

26 de Junho de 2007, 18h

Eu: ainda há bocadinho falámos sobre todos e agora vamos falar um bocadinho sobre ti, queres começar por onde?

Eu: Quem é que tu pensas que és?

Utente 3: Quem eu sou?

Eu: Sim, quem és tu? Fala-me sobre ti?

Utente 3: Eu sou uma menina que tenho 50 anos, vou fazer 51 para a semana.

Eu: És uma bela jovem!

Utente 3: Sou!

Eu: Então onde é que tu vives …?

Utente 3: Em Mira Tejo do outro lado do rio

Eu: E sempre viveste em Mira Tejo?

Utente 3: Sempre! Quer dizer tinha outra casa, em Sintra, tive em Sintra muito tempo e Sintra naquela casa ao pé do autódromo do Estoril

Eu: E porque é que mudaram!

Utente 3: Porque a casa era muito cara e não havia dinheiro, a primeira casa foi nessa e o homenzinho que nos, tinha um quintal bem grande e depois a minha sobrinha a mais velha ia para lá e não conseguia dormir nem nada e nem lhe dava o sono nem nada e depois a minha mãe tinha que ficar com ela.

Eu: Então se tens sobrinhas, significa que tens irmãos! Quantos irmãos tens?

Utente 3: Cinco, tenho cinco irmãos.

Eu: Fala-me lá um bocadinho sobre eles.

Utente 3: O mais velho está em Macau, depois sou eu depois é o meu irmão Carlitos depois é o meu irmão Tó e depois é a minha irmã. Três rapazes e duas raparigas, ainda estão todos vivos.

Eu: Olha e neste momento vives com quem?

Utente 3: Com a mãe.

Eu: Só com a tua mãe?

Utente 3: Só. Às vezes o meu irmão também vai lá este que tem a filha e fica lá a dormir com ela e tudo, temos lá um sofá na sala que é sofá cama olha ele abre o sofá cama e fica lá com ela. E tem a coisa lá no campismo, ela agora está com ele foi não sei para onde com ele.

Eu: Se calhar foram de férias.

Utente 3: Foram de férias os dois. Como ela tinha férias da escola. Agora só vem sexta-feira que vem. Diz que ela estava toda feliz lá com o pai. Já tinha arranjado amigas e tudo, lá e tudo, ela é que ligou à minha mãe a contar isso.

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 377

Eu: Então e conta-me lá mais coisas sobre ti, já conheço a tua família e mais… apresenta-te…

Utente 3: Haaaaa!!!

Eu: Tens dificuldade em falar sobre ti?

Utente 3: ééé

Eu: Podes dizer-me o que tu quiseres, imagina que eu sou tua amiga e nós nos encontrávamos na rua, o que é que me contavas sobre ti?

Utente 3: Eu quando estava em Angola, uma vez fui para a escola que era lá ao pé de casa e fui atropelada foi um tio meu que estava lá a trabalhar e que foi comigo para o hospital, levei pontos aqui quer ver (levantou a calça para me mostrar a cicatriz)

Eu: Mas não me tinhas contado que tinhas vivido em Angola! Perguntei-te se sempre viveste em Mira Tejo e tu disseste me que sim, explica lá isso melhor?

Utente 3: Não, vim lá de Angola

Eu: E vieste de Angola com quantos anos, sabes?

Utente 3: Com, com, 20 anos, vim fazer cá os 20

Eu: E sabes quantos anos têm os teus pais?

Utente 3: O meu pai tinha 70 a minha mãe tem agora 70, tinha 69 e fez agora 70 a minha mãe.

Eu: Fez anos há pouco tempo a tua mãe?

Utente 3: Sim dia 29 de Novembro fez anos.

Eu: Então tu estavas-me a dizer que vieste viver para Sintra, e para a Associação lembras-te com quantos anos vieste para a Associação?

Utente 3: Há, há, foi quando isto abriu, foi quando a Associação abriu.

Eu: Lembras-te quantos anos é que tinhas?

Utente 3: Era novinha ainda não tinha 50

Eu: Eras novinha?

Utente 3: Era

Eu: Então e quantos anos tens agora?

Utente 3: 50

Eu: Então e há quantos anos é que cá estás? Pensa lá comigo, se ainda não tinhas 50, 50 tens agora…

Utente 3: é, é

Eu: se já vieste há muitos anos atrás, tinhas que ter menos de 50 anos. Então quantos anos tinhas, assim mais ou menos, pensa lá?

Utente 3: 48 ou 49

Eu: Há então estás cá ai há três anos?

Utente 3: Há 4 anos

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 378

Eu: Então, mas a Associação não abriu há 4 anos! A Associação abriu à 15 anos mais ou menos.

Utente 3: Eu vim logo, assim que fiz os testes com o Dr. Martins, até eu e a minha mãe fomos a Almada fazer os testes e depois passei e depois fiquei logo, vim logo quando isto abriu, vim logo.

Eu: Eras nova?

Utente 3: Era

Eu: Já foi há muitos anos?

Utente 3: Foi

Eu: Então não tinhas quase 50, eras mais nova

Utente 3: Era

Eu: Bem me parecia (risos)

Utente 3: Eu quando era pequenina tinha 8 meses ou 15 tive uma meningite em pequenina, parei de andar e falar, foi, foi uma meningite. Um burro de um médico, um estúpido de um médico é que lá em Angola não me quis operar e depois olha… a minha avó que Deus tenha disse sempre operem a miúda, operem a miúda porque a miúda salva-se, eles nunca quiseram, nunca, a não ser a minha mãe, nunca quiseram, deixaram-me andar deixaram-me andar e depois olha, só fiz a 4.ª classe à pouco tempo quando estava na CERCI é que fiz a 4.ª classe!

Eu: E achas que foi por causa da meningite?

Utente 3: Pois.

Eu: E o que é que a meningite te fez?

Utente 3: (suspirou)

Eu: Sabes?

Utente 3: Não sei.

Eu: E sabes porque é que estás na Associação? Pensa lá um bocadinho! Eu acho que tu sabes!

Utente 3: Sei!

Eu: Então será porquê?

Utente 3: Porque a minha mãe já está com muita…

Eu: O que é que tem a tua mãe! Já tem muita idade é isso!

Utente 3: Já!

Eu: E mais?

Utente 3: E já não me pode aturar!

Eu: Mas porquê? És assim tão difícil de aturar?

Utente 3: Não.

Eu: Então conta-me lá o que se passa.

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 379

Utente 3: E depois aqui estou sempre com, não quero ir para a sal nem para o recreio e depois a dona Ana Cristina está sempre a dizer-me: vai para o recreio, vai para o recreio, tu também tens o direito de ir… e eu estou sempre a ajudá-la e em casa eu não faço a minha cama.

Eu: Não ajudas a tua mãe?

Utente 3: Naaaaão!

Eu: Mas não ajudas porquê?

Utente 3: Porque ela é muito difícil de se fazer, é!

Eu: Então e não achas que a tua mãe precisa de ajuda!

Utente 3: Acho que precisa, mas custa-me muito a fazer, sim.

Eu: E ajudas nas outras tarefas?

Utente 3: Ajudo.

Eu: Mas se calhar a tua mãe tem que te pedir muito!

Utente 3: Eu às vezes como tenho a minha máquina e às vezes ela às vezes aquilo não quer que eu a ajude.

Eu: Olha lá! E agora achas que estás mais nova ou mais velha desde que entraste para a Associação?

Utente 3: Mais velha!

Eu: Então e porquê?

Utente 3: Olha, porque tenho mais idade.

Eu: Mais idade e mais, o que é que tu tens mais?

Utente 3: Mais cabelos brancos e com menos juízo

Eu: Tens menos juízo! Explica lá isso melhor?

Utente 3: Tenho (risos). Porque me dizem! O marido da monitora graça está sempre a dizer-me tu estás com menos juízo, onde é que tu tens o juízo, está sempre assim!

Eu: E tu concordas com ele?

Utente 3: Eu não, eu não, eu não

Eu: E é só ele que te diz isso? Se calhar está a brincar contigo!

Utente 3: É… ele no outro dia disse, tu não vias sair, já me estava a dizer que eu não ia sair com os outros, e eu a dizer-lhe vou sim senhora eu já estou ai inscrita.

Eu: Então mas tu fizeste alguma coisa?

Utente 3: Eu não, eu não fiz nada. E fui, estava inscrita e fui

Eu: Olha lá estávamos a falar sobre se tu eras mais nova ou mais velha. Já me disseste que achas que está mais velha do que quando vieste para cá!

Utente 3: É!

Eu: Então olha lá para mim e para ti, quem é que tu achas que é mais velho sou eu ou és tu?

Utente 3: Tu és mais nova!

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 380

Eu: E achas que eu tenho quantos anos?

Utente 3: Aaaa, 26

Eu: Acertas-te! Quem é que te contou?

Utente 3: (risos) tem a idade do Dr. Ricardo, tem, tem…

Eu: Como é que sabes?

Utente 3: Ele tem 26.

Eu: Já fez 27 há 15 dias.

Utente 3: Já?

Eu: Sim, esqueceste-te de lhe dar os parabéns.

Utente 3: Pois foi (risos) eu esqueci-me

Eu: Olha lá…

Utente 3: Sim

Eu: Então porque é que dizes que eu sou mais nova, quais são as nossas diferenças?

Utente 3: A sua é porque não tem o cabelo branco e eu tenho. As rugas (risos)

Eu: E mais? Sempre usas-te óculos?

Utente 3: Não! Não via bem as letras e depois a médica é que disse, eu fui à médica e o oculista disse, tu tens que usar óculos porque tu não vês bem! E não via as letras até as letrinhas pequeninas do jornal não via.

Eu: E isso foi há muitos anos?

Utente 3: Não foi há pouco tempo, há uns meses

Eu: E Achas que essa falta de visão veio com a idade?

Utente 3: Sim, é!

Eu: E o que é que veio mais com a idade? Como é que tu te sentes?

Utente 3: Eu sinto-me bem, não tenho nada, estou para durar e tudo.

Eu: E então o que é para ti uma pessoa velha?

Utente 3: Uma pessoa velha! É ter cabelos brancos e e e e e andar de bengala e tudo.

Eu: E o que é que isso significa usar uma bengala sabes?

Utente 3: Não, não sei.

Eu: Significa que a pessoa já não consegue andar sozinha sem se apoiar, por isso é que as pessoas mais velhas às vezes têm que usar uma bengala.

Utente 3: Hum, pois se não ainda caem e catrapumba.

Eu: E mais?

Utente 3: Eu dantes não usava óculos, só há pouco tempo é que comecei a usar.

Eu: E conta-me lá, achas que as pessoas com quem vives, a tua mãe, achas que já está velha?

Utente 3: Não! Ainda está nova!

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 381

Eu: E quantos anos é que ela tem?

Utente 3: Tem 70, fez há pouco tempo 70, não está velha!

Eu: Não.

Utente 3: Naaão!

Eu: E tua achas que uma pessoa é velha com que idade?

Utente 3: oiten…aaaaaa, 100 anos. Com 100 anos é que uma pessoa é velha!

Eu: Mas sabes … vivem poucas pessoas até aos 100 anos.

Utente 3: Eu conheço uma senhora, uma velhota que era minha conhecida que viveu até aos 100 ou cento e tal anos.

Eu: Mas olha que são poucas pessoas, conheces muitas mais?

Utente 3: Não, só conhecia aquela

Eu: Então e uma pessoa com 70 anos, não é velha?

Utente 3: Naaaaão, é nova! 70 anos! A minha mãe tem 70 e ainda é nova!

Eu: E porque é que tu achas que ela ainda é nova?

Utente 3: Porque é. Porque ainda é nova. Ela outro dia disse-me; eu quero é morrer, quero é morrer. E eu disse a ela: nem pense, tu nem penses nisso, ainda há-de viver muitos anos cá!

Eu: Porque é que tu achas que ela te disse que queria morrer?

Utente 3: Porque estava cansada e tudo, cansada de viver cá.

Eu: Achas que ela está cansada?

Utente 3: Está!

Eu: E o que é que a faz estar cansada?

Utente 3: Sei lá! Eu não sei.

Eu: Sabes o que é que acontece às pessoas bem velhinhas?

Utente 3: Sei.

Eu: É o quê?

Utente 3: É ficam acamadas e depois não tem força para nada.

Eu: Já pensaste que se calhar a tua mãe também já se sente velhinha?

Utente 3: Há! Velhinha! Velhinha são os trapos! Ela com 70 anos ainda não está velhinha!

Eu: Ela ainda consegue fazer muitas coisas?

Utente 3: Ainda! Faz a comida, faz a cama dela, lava a loiça passa a ferro, faz tudo em casa e tem máquina de lavar a loiça só a passa por água e mais nada e põe lá na máquina para a lavar, melhor, se ela não tivesse máquina que remédio tinha ela de lavar a loiça. Tem máquina de lavar roupa e máquina de lavar a loiça comprou-a, o que é que ela quer mais, até tem um tanque e tudo lá fora na varanda, o que é que ela quer mais!

Eu: Então olha lá, então e tu nunca pensas-te que esses sintomas que te têm aparecido a ti e às pessoas que vão envelhecendo, ficarem mais cansadas, terem os cabelos brancos

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 382

terem rugas, também se calhar a tua mãe está a ficar mais cansada e já não consegue fazer tão bem as actividades que fazia antes?

Utente 3: Não! Ela está ali para as curvas.

Eu: A tua mãe disse-te que queria morrer! E quando a tua “mãe” não estiver por perto? Já pensaste sobre isso? O que é que achas que vai acontecer?

Utente 3: Já! Eu já lhe disse, quando ela não estiver por perto sabe o que é que eu vou fazer? Sabe onde é que eu vou ficar? Em casa do, do, do…, pois vou para lá!

Eu: Então mas os pais do … também já estão a ficar velhinhos, também podem não estar por perto muito mais anos!

Utente 3: (risos) Agente entende-se, agente entende-se, eu e ele entendemo-nos, é!

Eu: Então e acham que não precisam de ajuda?

Utente 3: Não! Eu, eu não não preciso!

Eu: E gostavas de ir viver com ele e deixar a Associação?

Utente 3: Eu gostava, aliás adorava ir viver com ele e deixar a Associação. Mas ele tem sempre as as, aquelas coisas que ele tem e isso olha.

Eu: E tu sentias-te em segurança vivendo sozinha com ele?

Utente 3: Eu sentia!

Eu: Então e depois como é que vocês vivam, vocês não têm ordenado?

Utente 3: A gente trabalhávamos.

Eu: Ai era, ias trabalhar para onde?

Utente 3: A, lá para, para mulher-a-dias. Se ele não tivesse essas macacoas eu arranjava trabalho, ai isso é que eu arranjava.

Eu: Vamos ver essa situação por outro lado, como essa hipótese é um pouco difícil de acontecer, tu percebes porque é difícil não percebes?

Margarida: Pois, percebo!

Eu: Então vamos pensar na hipótese de tu não poderes ir viver com o …, porque o … também vive com os pais dele e a hipótese da tua mãe já não estar cá estar longe, qual era outra solução?

Utente 3: Ia viver para ao pé da minha irmã. Para a Suiça.

Eu: E tu já pensas-te no teu dia de amanhã?

Utente 3: Eu ia, se ela me paga-se a passagem eu ia. Deixava a Associação e ia para lá!

Eu: Era isso que tu querias?

Utente 3: Era, era isso que eu queria. Mas não posso deixar a Associação, porque tenho cá os meus colegas, tenho cá a minha vida o que é que eu ia fazer para lá?

Eu: E isso também é importante para ti, não é?

Utente 3: Pois.

Eu: Então vamos lá medir as coisas!

Utente 3: Ou ia para Macau para ao pé do meu irmão, ou então não sei.

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 383

Eu: Mas pensa lá o que é que era melhor para ti? O que é que tu gostavas mesmo mais?

Utente 3: Eu gostava já de ir, sabe para onde para ao pé do meu irmão Zeca.

Eu: Ele vive aonde?

Utente 3: Em Macau.

Eu: E ele tinha condições para ficar contigo?

Utente 3: Ele, tinha, tinha condições. Ele até é tão meiguinho para mim tão meiguinho é o irmão que eu gosto mais. Gosto gosto gosto, muito muito muito. Agora os outros, o meu irmão … até faz pouco de mim. Da outra vez que ele estava lá quando ainda não tinha arranjado casa nem emprego agora já arranjou, já saiu de casa e já foi para casa dele, já levou as coisas dele todas, a planta dele que ele deixou lá em casa está enorme.

Eu: E os outros irmãos?

Utente 3: Eles não têm paciência nem vagar nem nada. O meu irmão … está a trabalhar.

Eu: Sabes se estás interditada? Sabes o que é estar interditada?

Utente 3: Não sei.

Eu: É a tua mãe quem decide por ti?

Utente 3: Eu tenho cá o meu dinheiro e agora nunca mais levei o dinheiro para casa nem nada.

Eu: Então porquê?

Utente 3: Porque as monitoras, eu levava o dinheiro para casa e a minha mãe gastava-o logo todo, comprava coisas para casa e tudo e eu nem o via, nem o via… gastava-o todo.

Eu: E tu queres esse dinheiro para quê?

Utente 3: Para ir para o Algarve

Eu: Mas se calhar esse dinheiro não chega para ir ao Algarve, achas que chega?

Utente 3: Chegou, para eu comprar uns gelados e isso. Chegou e sobrou até.

Eu: Então significa que um dia gostavas de ir viver com o teu irmão em Macau, se não pudesses ir viver com o ….

Utente 3: É, pois se eu não pudesse ir viver com o …, gostava de ir viver para Macau.

Eu: E no Elo, gostas de estar na Associação?

Utente 3: Eu adoro, gosto mais de estar na Associação do que em casa. Em casa aborrece-me, não tenho colegas lá nem nada, aborrece-me.

Eu: E gostas das actividades que fazes aqui?

Utente 3: Eu gosto.

Eu: Gostas! Quais é que tu gostas mais?

Utente 3: Gostava de ir andar a cavalo, eu adorava.

Eu: E mais, quais é que tu gostas mais, quais é que tu achas que são mais importantes para ti?

Utente 3: Para mim, as mais importantes é ir à piscina, mas a monitora Lena Sardinha nunca me deixa.

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 384

Eu: E porquê, sabes?

Utente 3: Porque diz: o que é que ela vai para lá fazer com essas feridas.

Eu: Pois é … estás sempre a mexer nas feridas não podes mexer tens que deixar sarar para poderes ir à piscina.

Utente 3: Já estão saradas… (mudou repentinamente de assunto) Isto foi uma queda que eu dei lá na CERCI e depois ficou assim e aqui foi uma queimadela de ferro.

Eu: Porque é que fazes estas feridas, conta-me lá?

Utente 3: Quando estou mais enervada.

Eu: estás nervosa agora?

Utente 3: Não, não

Eu: Estamos só a conversar.

Utente 3: É…

Eu: Olha estavas a contar-me quais eram as actividades mais importantes para ti?

Utente 3: Eu gostava de ir andar a cavalo, agora como não há não sei quando é que vai haver, sabe quando é que vai voltar a haver?

Eu: O Dr… já te explicou ainda a bocadinho!

Utente 3: Por culpa dos pais. Agente paga. Eu adorava

Eu: E o que é que tu gostavas mais. Das coisas que tu fazes quais é que tu achas que te fazem melhor, ao teu corpo, à tua saúde ao teu bem-estar?

Utente 3: Ir para a patrícia, ir para o computador, eu adoro ir para o computador, eu acho as mais importantes.

Eu: Imagina-te daqui a uns anos, já tens 50 daqui a 10 anos já vais ter 60, achas que vais continuar a querer fazer as mesmas actividades?

Utente 3: Gostava de fazer outras.

Eu: Gostavas?

Utente 3: Gostava.

Eu: E sabes que outras coisas gostavas de fazer ou não?

Utente 3: Sabe o que eu não gostava de fazer é …. E sabe o que é que o meu pai me dizia: tu hás-de viver até aos 100 anos, se que me via dizia sempre e às vezes batia-me no rabo, eu detestava, detestava que me batesse no rabo era a coisa que eu mais detestava.

Eu: Isso era quando tu te portavas mal?

Utente 3: Eu, eu nunca me portava mal. Houve um dia, a minha mãe sabia que eu tinha ido à minha amiga ele depois estava bêbado ou qualquer coisa e bateu-me no olho e ficou o olho todo negro e depois começou a dizer-me desculpa desculpa, depois de me bater é que me pediu desculpa antes de me bater é que devia ter visto o que me ia fazer, bater dá prisão, pois dá! Bater numa pessoa deficiente dá prisão!

Eu: Davas-te bem com o teu pai?

Utente 3: Eu, eu não dava nada bem, ele quando chegava a casa nem me deixava pegar no comando da televisão. Ele só queria ver os filmes do canal holywood mais nada, eu não

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 385

podia estar em casa a ver televisão a ver as minhas novelas nem nada e depois ele tirava-me o comando e escondia-o. (começou a falar muito rápido e ofogante)

Eu: E porque é que ele era assim?

Utente 3: Quando ele morreu eu estava aqui, eu não soube que ele tinha morrido. Quando o Dr. Martins me disse que ele tinha morrido eu chorei, chorei, chorei, chorei tanto tanto, fartei-me de chorar, era meu pai e eu fartei-me de chorar. Fiquei com pena de não ir ao funeral dele. (chorosa)

Eu: O Dr. Martins falou contigo, se calhar foi melhor para ti não achas?

Utente 3: Foi…

Eu: Olha ainda à pouco, depois mudas-te de assunto e acabas-te por não me contar que coisas novas é que tu gostava de fazer? Já estás cansada destas?

Utente 3: É! Se eu tivesse dinheiro, sabe o que é que eu fazia? Eu ia à Suiça ver a minha irmã, ia, eu ia à Suiça, ia ver a minha irmã, ver a minha irmã e os meus sobrinhos que vêm cá poucas vezes. Ela mandou uma passagem para a minha mãe ir, mas a minha mãe como estava sempre comigo, sempre, sempre, sempre, anda sempre comigo, e ela disse vou-te mandar a passagem e mandou a passagem para lá, se ela tivesse cá deixado a passagem eu tinha ido, ia para lá para o pé dela, ajudar a minha irmã a tratar dos meus sobrinhos, eu conseguia, eu gosto tanto tanto dela, adoro-a, tenho tanta pena que ela esteja lá sozinha com eles. Agora só vem em Outubro ou Novembro, vem cá passar uns dias. Ela tem lá a vida dela, mas eu já disse à minha mãe quando ela vier eu não vou deixar ela ir, não vou, não vou.

Eu: Mas a tua irmã tem a vida dela! Tal como tu que vens para a Associação!

Utente 3: Eu não vou deixar ela ir, não vou, não vou, não vou, olhe eu não vou deixar ela ir… (a … exaltou-se demonstrando que esta é uma situação que a magoa) Olhe eu amarro-a à cadeira!

Eu: Coitadinha da tua irmã, não acredito que sejas assim tão má!

Utente 3: Riu à gargalhada

Eu: Voltando às actividades, disseste-me que querias fazer outras actividades aqui na Associação mas ainda não me contaste que actividades eram essas, pensa lá um pouco sobre isso?

Utente 3: Hum, Hum, ir para a cozinha…

Eu: Gostas de cozinhar?

Utente 3: Sim, olhe eu sei fazer uma sopa de legumes sozinha, sim, sei fazer uma sopa de caldo verde sozinha, sozinha. Da outra vez que estive na cozinha, aqui na residência, descasquei as batatas e fiz muitas coisas e agora não me deixam ir para a cozinha porquê? Não me deixam ir para a cozinha nem nada, eu cá queria ir para a cozinha! Nem me cortei nem nada! Eu sei fazer as camas sozinha, ponho o lençol de baixo, entalo e faço sozinha.

Eu: Aprendeste aqui na Associação?

Utente 3: Sim. E sei passar a ferro. Sei.

Eu: Também aprendeste a passar aqui na Associação?

Utente 3: Não! Foi em Angola, com a Maria lavadeira. Tinha lá a Maria, que era uma preta, e eu quando não tinha escola ia lá para a garagem, tinha um quintal bem grande e ela

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 386

lavava a roupa. A minha mãe punha um lençol grande lá de cima e depois atirava-a cá para baixo e depois o meu irmão Carlitos andava de bicicleta e sujava os lençóis todos! Malandro e depois ouve uma vez a Maria estava lá, e a minha mãe dizia sempre: Hó Maria como é que tu estás? E ela dizia sempre: assim assim minha senhora (risos).

Eu: Olha, de tudo o que nós falámos aqui hoje e daquilo que falámos na sessão de grupo anterior, tu és uma pessoa feliz?

Utente 3: Eu sou, eu sou!

Eu: Sim, sentes-te uma pessoa feliz?

Utente 3: Eu sinto-me!

Eu: E quais são as coisas que te fazem feliz?

Utente 3: A primeira coisa é ter saúde.

Eu: É! E mais?

Utente 3: E ser alegre. A minha avó que deus a tenha era tal e qual como eu, eu hei-de trazer a fotografia da minha avó para a Vera ver.

Eu: Tu achas que és alegre?

Utente 3: Eu sou! Eu …. Não há mais uma pessoa mais alegre do que eu. Eu sou uma pessoa tão alegre, tão alegre, ando sempre bem disposta, sempre. Sempre quando não me chateiam, quando me chateiam chega-me a mostarda ao nariz e ninguém me atura.

Eu: Queres contar-me mais alguma coisa sobre este tema que temos estado a falar?

Utente 3: Silêncio…

Eu: Olha ainda outra coisa, gostas do teu quarto aqui na Associação?

Utente 3: Eu gosto, eu gosto do meu quarto aqui na Associação, adoro mais viver aqui do que em casa!

Eu: E um dia se tivesses que viver aqui, o que é que tu achavas?

Utente 3: Eu achava bem! Eu achava! Os meu irmão … não tem paciência para mim, nãããão, nem o meu irmão …, mais paciência tem o meu irmão … e a minha irmã …. Ela já disse, disse-me assim: porque é que não vens cá para casa uns dias comigo. Eu se a minha mãe não mandasse a passagem para lá eu tinha ido. Gostava de lá ir passar uns dias, uns dias só! Só uns dias! Ela já me disse, que se eu for para lá vai ficar comigo a fazer uns jogos.

Eu: Hó …, muito obrigado por teres conversado um bocadinho comigo, eu gostei muito de te ouvir!

Utente 3: De nada (risos)

Utente 3: Eu dou tudo, mas quando me pisão os calos, olha é uma chatice, ficamos velhos e tudo, não havia de haver velhice!

Eu: Achas que sim! Achas que a velhice é má?

Utente 3: Éééé, não havia de haver velhice! possa! Eu detesto a velhice, eu detesto!

Eu: Mas porquê?

Utente 3: Porque começamos a sentirmo-nos velhos e tudo! E às vezes….

Eu: … já começas a sentir-te velha?

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 387

Utente 3: Eu já!

Eu: O que é que sentes?

Utente 3: As pernas a falharem-me e tudo… e e e eu dantes ia sozinha para casa e agora é a minha mãe que tem que me vir buscar, porque dei uma queda e fiquei com a cara toda esmurrada…

Eu: E achas que isso tem a ver com a idade?

Utente 3: Pois! Eu acho que sim!

Eu: Obrigado novamente!

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 388

ENTREVISTA AO UTENTE 4 Associação..,

28 de Junho de 2007, 14h

Eu: Olá, na outra vez falámos em grupo, hoje vamos falar um bocadinho sobre ti, queres começar por onde?

Eu: Fala-me um pouco sobre ti? Quem é que tu pensas que és? Quem és tu? Como é que tu achas que és?

Utente 4: Eu sou um rapaz jovem e bom rapaz. Tenho 48 anos, 49, tive 17 anos noutro sítio, depois aí por volta de uns 4 anos 5, 6, 7, não sabia o que era isto e uma vizinha nossa, sabe, tenho uma vizinha que tem cá uma filha também aqui no CAO 2, e ela convidou-me para vir ao … para ver isto como é que era, isto ainda nem era nada sequer. Havia aqui uma, vamos lá ver, uma casa de madeira coladas e não sei que mais…

Eu: E conta-me mais coisas sobre ti?

Utente 4: Eu vim para aqui em 93.

Eu: E lembras-te quantos anos é que tinhas quando vieste para cá?

Utente 4: Haaaa! Isso pode perguntar à minha mãe.

Eu: Assim mais ou menos, já foi há muitos anos?

Utente 4: Não, não foi há muitos anos, que eu estou cá desde 93 portanto! Ai (suspirou) 93…

Eu: Antes de falarmos da Associação, vamos falar só mais um bocadinho sobre ti. Com quem é que tu vives?

Utente 4: Com o meu pai e com a minha mãe.

Eu: E aonde é que vives?

Utente 4: Vivo aqui nos Olivais.

Eu: Sempre viveste nos Olivais?

Utente 4: Sim senhor. Nasci na Amadora mas vim viver para os Olivais.

Eu: E irmãos, tens irmãos?

Utente 4: Tenho só um.

Eu: Mais velhos, mais novos?

Utente 4: O mais velho já faleceu!

Eu: Há muitos anos?

Utente 4: Não foi assim há muitos anos! 1 de Janeiro. Era o mais velho. E ainda tenho um irmão mais novo. Eu sou o do meio. O meu irmão mais novo se eu lhe pedir um livro ele não se nega.

Eu: Dás-te bem com o teu irmão mais novo?

Utente 4: Dou!

Eu: Ele tem quantos anos, sabes?

Utente 4: Ele tem uns, faz anos em Dezembro no dia 5, 38 anos.

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Eu: E os teus pais, sabes quantos anos têm?

Utente 4: O meu pai tem 79, não, agora a minha mãe faz no dia 26 de Julho 77, é isso.

Eu: Então o teu pai tem 79 e a tua mãe talvez 77…é assim?

Utente 4: Sim!

Eu: Ainda há pouco estavas a dizer-me que vieste em 1993 para a Associação, certo?

Utente 4: Exactamente.

Eu: De 1993 até 2007 já passaram alguns anos, já cá estás há quantos anos?

Utente 4: Já cá estou há 14 anos

Eu: Exactamente.

Utente 4: 2 de Fevereiro é o dia que eu entrei aqui.

Eu: Já passaram alguns anos! E agora sentes-te mais novo ou mais velho do que quando entras-te para a Associação?

Utente 4: Sentia-me mais novo!

Eu: Quando vieste para cá sentias-te mais novo! Significa que agora sentes-te mais velho?

Utente 4: Pois a idade não perdoa?

Eu: Porque é que dizes que a idade não perdoa?

Utente 4: Porque agente estamos a ficar mais velhos, os anos vão passando por nós, mas nós temos que andar para frente.

Eu: Mas porque é que te sentes mais velho?

Utente 4: Silêncio

Eu: Se dizes que te sentes mais velho deves ter as tuas razões não queres contar-me?

Utente 4: Não é isso… (silêncio)

Eu: Não te consegues explicar?

Utente 4: Abanou a cabeça fazendo sinal que não consegui explicar

Eu: Então vamos fazer a pergunta de outra maneira! Olha para mim e para ti, tu achas que eu sou mais nova ou mais velha do que tu?

Utente 4: Muito mais nova!

Eu: Muito mais nova porquê? O que é que tu vês em mim que te faz pensar que eu sou mais nova?

Utente 4: Porque a idade é mais coisa do que a minha é mais nova!

Eu: Mas pensa lá porquê?

Utente 4: Ai, Ai…

Eu: Compara lá os teus cabelos com os meus?

Utente 4: Os meus são brancos e os seus são pintados.

Eu: Boa, é verdade os meus cabelos são pintados, mas ainda não tenho cabelos brancos.

Utente 4: Está calor!

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Eu: E na nossa cara que diferenças temos?

Utente 4: Eu estou com rugas e a Vera não.

Eu: Pois é! E o que é que mudou ai dentro de ti com os anos? Achas que mudou alguma coisa?

Utente 4: Se calhar! A saúde é que interessa!

Eu: Achas que tens mais problemas ou menos desde o tempo em que vieste para a Associação?

Utente 4: Está bem, está bem! Tenho lá uma carta bem escrita, por um médico que me quer operar às hemorróidas.

Eu: E tens mais algum problema?

Utente 4: Tenho outros também, na coluna, e outra coisa qualquer que está lá uma carta fechada tem que ir ver o que é.

Eu: E já tinhas esses problemas quando vieste para a Associação?

Utente 4: Já tinha.

Eu: E achas que esses problemas agora são maiores ou mais pequenos?

Utente 4: São maiores do que o que eu pensava!

Eu: Mas também tens coisas boas?

Utente 4: Sim tenho muitas coisas boas. Graças a Deus. Há momentos! Há momentos em que estou bem, outros que estou mal!

Eu: E em que momentos é que estás bem?

Utente 4: Quando estou no sofá a ver televisão ou qualquer coisa, para me distrair. Ouvir rádio um CD, ouvir o que quiser.

Eu: E pensa lá comigo, tu quando vieste para a Associação também só estavas bem era sentado a ver televisão!

Utente 4: Eu não, nessa altura nunca conseguia estar parado, fazia qualquer coisa, sempre, nunca consegui estar parado!

Eu: Então alguma coisa mudou! Achas que mudou alguma coisa?

Utente 4: Não sei!

Eu: Não sabes?

Utente 4: Não!

Eu: Então pensa lá comigo disseste-me que dantes nunca estavas parado tinhas que estar sempre a fazer alguma coisa e que agora gostas de estar sossegado a ouvir música a ver televisão!

Utente 4: Eu também posso fazer uma coisa, que a Dr.ª não vai conseguir descobrir o que é?

Eu: Podes fazer uma coisa?

Utente 4: Sim! Descubra lá?

Eu: Não sei…

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Utente 4: Mas pense um bocadinho, podem ser muitas coisas, muitas!

Eu: Pode cozinhar, fazer algumas coisas lá em casa.

Utente 4: Não cozinhar nunca cozinhei!

Eu: Tens que me contar que eu não adivinho.

Utente 4: Faço Pompons.

Eu: Pompons? E como é que os fazes?

Utente 4: Em lã, em lã mesmo e vendo aos meus clientes

Eu: Muito bem, nunca me tinhas contado. Então quer dizer que tens uma actividade extra para além da Associação?

Utente 4: Não, quer dizer quando venho para a Associação estou só na Associação. Mas se as pessoas quiserem por exemplo uns pompons eu posso fazer uma dúzia.

Eu: Explica-me lá como é que são os pompons que tu vendes?

Utente 4: Por exemplo faço faço faço daqueles grandes, uma roda grande e chata, enrolo a lã se tiver a um cartão, portanto tenho uma, duas, três rodas já feitas, são os moldes. Antigamente ainda fazia mais, mas deixei de fazer porque não havia clientes.

Eu: Isso é que é chato!

Utente 4: Mas digo-lhe uma coisa vou continuar a fazê-las até morrer. Por a caso não me arranja lã?

Eu: Não sei se lá tenho alguma coisa em casa, sabe que é daqueles materiais que nós não usamos muito porque não fazemos tricô.

Utente 4: Pois e às vezes mandam fora!

Eu: Eu vou ver o que te consigo arranjar, mas não te prometo.

Utente 4: Está bem… quando vou daqui do trabalho vou descansar um pouco. Porque agora é muito difícil arranjar lã.

Eu: Olha vamos voltar um bocadinho ao tema que estávamos a conversar, pode ser?

Utente 4: Sim.

Eu: O que é que é para ti uma pessoa velha?

Utente 4: É idosa.

Eu: E o que é uma pessoa idosa?

Utente 4: Tem muitos anos de vida. Como o meu pai pronto, que vai fazer 79 anos.

Eu: Tu achas que o teu pai já está velho?

Utente 4: Ele não está assim muito velho. Ele levanta-se logo de manhã cedo, todos os dias. Sai de casa, o que é que agente há-de fazer e depois vai às compras à minha mãe aonde? Deixa cá ver, ao Lidle, traz umas coisinhas costuma a ver o jornal do Lidle.

Eu: E o que é para ti a velhice?

Utente 4: Não sei responder.

Eu: Está bem. Então pensa lá porque é que achas que o teu pai é velho?

Utente 4: Hum (silêncio)

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Eu: Alguma vez tinhas pensado sobre isto?

Utente 4: Não.

Eu: Mas é importante pensares sobre estas coisas, não achas?

Utente 4: Pois, é que lá no colégio no Areeiro faziam tanta pergunta, tanta pergunta! Ui! E eu não gostava nada disso.

Eu: Mas não estás a gostar de conversar comigo?

Utente 4: Estou, Estou! Mas foi onde eu estive 17 anos.

Eu: Olha conta-me outra coisa, e a tua mão achas que já está velha?

Utente 4: A minha mãe com a idade que ela tem! O que é que se espera!

Eu: Quais são as diferenças que tu tens notado neles há uns anos para cá?

Utente 4: Muita coisa, mas o que é que se há-de fazer, eu nem sei a metade!

Eu: Achas que a tua mãe faz as mesmas tarefas como dantes?

Utente 4: Faz!

Eu: E achas que ela se cansa mais ou menos?

Utente 4: Cansaço, não, nunca vi!

Eu: E ela tem alguma doença?

Utente 4: Hó tem bem poucas!

Eu: Sabes o que é que acontece às pessoas bem velhinhas?

Utente 4: Sei! E o que é que agente há-de fazer? Está mesmo a dizer o que é!

Eu: Pois é todos nós vamos morrer um dia!

Utente 4: Isso toda a gente sabe. Mas eu não vou para lá!

Eu: Então vais para onde?

Utente 4: Vou para o céu, mas não vou agora!

Eu: Sim… eu estava a falar das pessoas bem velhinhas!

Utente 4: Como a minha avó, que esteve viúva 8 anos. Depois foi a vez dela e quando chagar a nossa vez…

Eu: Tu já perdeste algumas pessoas? Os teus avós e o teu irmão, não foi!

Utente 4: Sim, mas há mais. A irmã do meu pai também uma tia minha.

Eu: já pensaste que os teus pais um dia podem morrer antes de ti?

Utente 4: Hó! Eu também posso morrer antes deles, ninguém sabe.

Eu: Claro que não, ninguém sabe mas a lei natural da vida é que é suposto que os nossos pais morram antes de nós.

Utente 4: Claro!

Eu: E tu já pensaste como é que vai ser o teu dia de amanhã, quando eles não estiverem cá?

Utente 4: Não… e o que é que o hei-de fazer?

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Eu: E o que é que tu gostavas, para o teu dia de amanhã já pensas-te sobre isso?

Utente 4: Não

Eu: Não pensaste. Então pensa lá comigo! O que é que tu querias para o teu futuro?

Utente 4: Queria uma casa! Um bom carro!

Eu: Mas tu já sabes que não podes conduzir.

Utente 4: Não, mas eu tenho uma carrinha Mercedes, mas quem conduz é o meu pai, só que a carrinha está em meu nome.

Eu: Então carro já tens! Mas o que eu te estava a perguntar era: um dia se os teus pais não estiverem cá onde é que tu queres viver? O que é que tu queres para ti?

Utente 4: Quero muita saúde e paz e sossego!

Eu: E como é que podes ter sossego?

Utente 4: É ninguém me chatear a cabeça.

Eu: E onde é que tens sossego, em casa ou aqui na Associação?

Utente 4: Em casa! Que é onde eu posso ter tudo. Quem me tira o meu quarto tira-me tudo, com certeza que sim.

Eu: Então e já imaginaste chegar a casa e não estar lá os teus pais!

Utente 4: Tenho sempre gente em casa, o meu pai a minha mãe ou a minha vizinha. Posso ficar com a minha vizinha que é muito minha amiga. Sim senhor.

Eu: Achas que podias ficar com ela bem?

Utente 4: Claro! Tem um terreno lá ao pé de nós e também tenho outro casal amigo que é da Holanda. Se me pagassem a passagem eu ia lá passar umas férias.

Eu: Estavas a dizer-me que gostavas de ficar a viver em tua casa ou com a tua vizinha.

Utente 4: Sim.

Eu: E na Associação?

Utente 4: Na Associação só para trabalhar. Não venham cá mandar-me areia para os olhos que isto para mim não me serve.

Eu: Então e porquê?

Utente 4: Porque isto aqui vai tudo pelo ar.

Eu: Achas isso?

Utente 4: Hó, hó! Já é assim, já temos pouco trabalho!

Eu: Olha e gostas das actividades que desenvolves aqui na Associação?

Utente 4: Gosto.

Eu: E tu queres continuar a fazer estas actividades por muito anos, ou queres mudar de actividades?

Utente 4: Eu queria mudar de actividades, porque são sempre as mesmas.

Eu: E queres mudar de actividades porque tu também mudaste…

Utente 4: Exactamente.

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Eu: Ou porque te sentes cansado, ou simplesmente querias que fossem diferentes.

Utente 4: Queria que fossem diferentes. E depois fico velhinho e já sabe como é!

Eu: E o que é que tu pensas fazer quando fores velhinho?

Utente 4: Ir para um lar.

Eu: Ir para um lar, é isso que tu querias? E um lar como?

Utente 4: Hó, como há muitos, há muitos lares mas custam muito dinheiro.

Eu: Então e se o Lar fosse aqui na Associação, o que é que achas?

Utente 4: Pronto se for aqui na Associação, ainda assim em vez de estar a pagar por exemplo 650 € lá fora, a Associação ajudava-me.

Eu: Imaginando esse lar, o que é que tu gostavas de lá fazer?

Utente 4: Essa é uma pergunta muitooooo, é um bocadinho, fico tímido de falar sobre isso, depois logo se vê.

Eu: Então e as actividades que tu tens agora, quais é que tu gostas mais?

Utente 4: É jogar à bola.

Eu: É, ainda gostas de jogar à bola?

Utente 4: Mas já não é tanto como se fosse rapaz novo 16, 17 anos (risos). Eu ainda me lembro de uma vez ir a passar um velhote que ia por ai a fora e a bola estava longe mas eu mandei com tal força a bola que bateu na testa do homem. Eu estava com uns colegas meus e o homem ia apanhar o autocarro, depois o homem começou a ralhar e eu e os meus colegas dissemos então não fui eu, não.

Eu: Eras endiabrado!

Utente 4: Era muito.

Eu: E agora.

Utente 4: Malandreco! E continuo sempre até morrer.

Eu: Então e quais são as actividades que são melhores para o teu bem estar e saúde?

Utente 4: São quase todas.(silêncio) Estou cheio de calor.

Eu: Estamos quase a terminar, está bem!

Utente 4: Sim

Eu: De tudo o que falámos aqui hoje neste bocadinho, achas que te sentes uma pessoa feliz?

Utente 4: Eu não posso ser feliz, uma pessoa feliz não posso ser nunca, porque o que eu tenho é tão grave tão grave, o que eu tenho das hemorróidas e com estes ataques de epilepsia, epilépticos, às vezes dá-me um, tremo fico todo branco, não posso mais… já me deu dois aqui.

Eu: Achas que é por isso que não és uma pessoa feliz?

Utente 4: Claro que não, eu não posso ser feliz!

Eu: Então mas também tens momentos bons em que não tens ataques, por exemplo hoje estás a conversar muito bem comigo.

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Utente 4: Pois mas! Isto, não sei…

Eu: E o que é que poderia fazer-te feliz?

Utente 4: Sei lá!

Eu: Eu acredito que tu sabes, pensa lá um bocadinho. Nunca te fizeram esta pergunta?

Utente 4: Não.

Eu: Então estou eu a perguntar-te, podes contar-me o que é que te faria feliz?

Utente 4: Eu dou-me bem na água morna, água trepida, água pela cabeça a baixo. Amanhã pelas 7horas txuuuu (imitou o barulho como se estivesse a tomar banho).

Eu: E mais coisas…

Utente 4: Arranjar uma rapariga!

Eu: Mas eu ouvi dizer que tu és namorado da Margarida!

Utente 4: É! Mas ela não presta para nada…

Eu: Pensa lá bem no que estás a dizer!

Utente 4: Não presta, não presta, já disse que não presta, mete as mãos na boca.

Eu: Ela não deixa que lhe dê beijinhos é isso?

Utente 4: Também não fazem falta! Mesmo que ela quisesse agora não quero eu. Uma rapariga, mas não é destas daqui que são todas gordas e feias!

Eu: (expressão de espanto) Ai meu Deus!

Utente 4: Não é meu Deus, esta é que é a verdade, eu não queria nenhuma.

Eu: Se calhar chateaste-te com a Margarida mas ainda fazem as pazes!

Utente 4: Hummm, ela é que se chateia comigo. Mas eu nem sequer me chateio com isso.

Eu: Utente 4, para terminarmos a nossa conversa, queres acrescentar alguma coisa?

Utente 4: Não

Eu: Obrigado, por teres falado comigo.

Utente 4: De nada.

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Apêndice 12

Título: Análise de conteúdo das entrevistas realizadas aos familiares

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Análise de Conteúdo das entrevistas realizadas aos familiares A Deficiência Mental: Nascimento de um filho com deficiência

Familiar 1 (F1) Bem a principio foi um choque muito grande (…) depois até aos seis anos foi mesmo difícil para mim e para o meu marido coitadinho (…) só que depois ela já tinha seis anos e meio quando eu tive o outro filho então já se atenuou um bocado a dor (…F1) (…) quando a menina nasceu eu não soube logo logo que ela era deficiente só passado uns dias é que eu comecei a ver que havia alguma coisa de diferente porque não pegava no peito e só gemia gemia gemia. (F1)

Familiar 2 (F2) (…) desde que o … nasceu que deu problemas começa por os olhos colarem, não era normal já naquela época mesmo uma criança nascer e não abrir os olhos não sei. (F2) (…) os médicos disseram sempre que o … não tinha nada. O pediatra que o acompanhava nessa altura tinha dito aos meus pais que realmente era possível que houvesse ali realmente uma deficiência mas isto ao fim de 6 anos (…F2) Nos colégios não sei como é que está agora, mas na altura era fraquinho tudo, o Clapared talvez mesmo a assim tenha sido o melhor. (F2) (…) já estava com quase com 20 e poucos anos e ele na CERCI já não estava a fazer nada porque a CERCI estava naquela altura essencialmente ligada para a parte escolar (…F2) (…) na CERCI foi onde ele realmente começou a desembaraçar-se, aprendeu a ler e a escrever ainda que mal, mas enfim, no Clapared e essencialmente comigo não vale a pena estar a dizer de outra maneira porque foi comigo que ele aprendeu, números, contas nem a brincar é a falha maior de todas. (F2)

Familiar 3 (F3) (…) fui dona de casa quase sempre, mas em certas alturas da vida precisei de sair um pouco de casa até por causa da …, para sair e tal um bocadinho do ambiente de casa (F3) Eu andava sempre a procurar coisas não é mas não havia grandes recursos (F3) ai Teresa em Lisboa há colégios tão bons para ela e tal, vais lá, não havia nada de especial, mas aquilo enfiou-se me na cabeça e eu não descansei enquanto ela não veio (F3)

Familiar 4 (F4) Existência de outros familiares portadores de deficiência mental Não que eu conhece-se não. (F1) Não, (…) (F2) Graças a Deus não (…) (F3) Não, havia uma pessoa com deficiência na família mas já há muitos anos que morreu, era irmã do meu pai. (F4)

Causa da Deficiência Mental

Familiar 1 A causa (…) não é genética ela foi tirada a forcep a ferros e deram-lhe cabo da cabecita, apertaram-lhe nas meninges quando ela tinha onze dias teve uma encefalite (…) (F1)

Familiar 2 (…) não foi diagnosticado ao … nenhuma doença (…) uma deficiência num cromossoma que é mais pequeno que os outros que é o Syndrome de Williams, não fizemos nenhuma despistagem. (F2)

Familiar 3 Nasceu normal teve foi uma meningite mingocócita aos 17 meses e foi a desgraça dela ficou sem andar

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 398

sem ver e devagarinho lá foi recuperando porque ela tinha um quociente de inteligência alto que já foi feito mais velhinha 12 15 anos. (F3)

Familiar 4 (…) já nasceu assim, creio ou quase que tenho a certeza que foi devido ao parto, prematuro, muito fraquinho (…) (F4) Ter um filho portador de deficiência mental

Familiar 1 (F1) Acho que é uma pessoa, acho que é tão importante e devemos ter tanto ou mais carinho e mais compreensão do que por uma pessoa que não tenha problemas, não é! (F1)

Familiar 2 (F2) Uma preocupação essencialmente do dia e do amanhã. (F2) (…) acho que não é bênção para ninguém (…F2) (…) nunca somos muito donos de nós mesmos quando temos um filho com deficiência, à toda uma série de coisas que nós deixamos de fazer não numa perspectiva de os esconder ou de … mas perdemos um bocado a vontade de fazer as coisas houve um bocadinho de nós que morreu e sobretudo o futuro (…F2) (…) é sempre uma pessoa que nos limita em muita coisa (…F2)

Familiar 3 (F3) É um caminho muito difícil mas agente aprende a viver com isso, o melhor possível e até a ter momentos de alegria porque são sempre inocentes. (F3) Uma pessoa com deficiência mental é uma pessoa especial. Normalmente eu ligo como ela como nada fosse (F3) (…) às vezes eu é que já não tenho paciência (…F3)

Familiar 4 (F4) Isso é um grande mal, eterno, sofre-se muito. E é especial ao mesmo tempo, não é uma pessoa normal que tenha um futuro risonho que pudesse vir a constituir um lar, enfim isto é tão complicado se calhar não dá bem para descrever bem a monstruosidade do problema. (silêncio) (F4) (…) é um bocado complicado viver com ele porque ele é difícil as características da doença dele são muito difíceis. (F4) Principal cuidador da pessoa com deficiência mental

Familiar 1 (F1) Sou só eu…. Eu e a Associação (risos) (…) foi a melhor coisa que me apareceu na vida foi a Associação e toda esta família (…) (F1) Sim porque ajudam imenso, até quando foi a morte do meu marido me ajudaram muito, tiveram cá a … ainda uma semana ou duas salvo erro (…) eu sinto muito apoio aqui na Associação até se eu tiver algum problema (…) vimos falar com o Dr. … e ele dá-me imenso apoio, eu vou muito mais calma muito mais tranquila porque eu sei que se me acontecer qualquer coisa a … está entregue. É esse o meu motivo! (F1)

Familiar 2 (F2) Sou eu a principal cuidadora. (…) Porque o meu marido não estava em casa praticamente e eu tive os filhos quase todos seguidos. (F2)

Familiar 3 (F3) Sou eu. (F3)

Familiar 4 (F4) Eu e a minha mulher. (F4) Processo de Interdição / Tutoria das pessoas com deficiência mental

Familiar 1 (F1) Sou eu a tutora e o meu filho é o protutor. (F1) Deveria ser o meu filho mas se ele não estiver cá! (…) tem primas, não sei se um dia se elas estarão dispostas a vir visitá-la ou a levá-la para casa isso não sei (…F1) Sim já ando a tratar da interditação dela (…) ela ainda nem sabe, e eu ainda não sei como é que lhe hei-de dizer, porque ela vai ficar! (F1) (…) já comecei a tratar dos papéis há bastante tempo, já há uns dois ou três meses (…)

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Eu também não sei bem (…) tendo esses papéis (…) venho aqui falar com a Associação para ver o que é preciso mais. (F1) Eu ainda não sou tutora por enquanto sou mãe, ainda não sou responsável legal (…) e agora é que comecei a pensar porque a idade já começa a pesar um bocadinho e de um momento para outro posso ir-me embora e ela ficar. (F1) A … não tem autoridade, porque por exemplo a … vai às compras mas se a enganarem nos trocos ela fica enganada porque não sabe fazer um troco (…) por exemplo na higiene na roupa, não sabe tratar dessas coisas eu é que tenho que tratar de tudo, eu é que tenho que pôr tudo a jeito, porque ela não sabe, não tem aquela noção (…F1)

Familiar 2 (F2) Sou eu, o … já está interditado, sou eu a tutora. (F2) A interdição foi feita através de uma advogado (…) o Dr. (…) fez uma avaliação, o … foi a uma junta médica em que foi atribuído determinado quociente de deficiência (…) fomos ao tribunal, depois fomos chamados todos com o juiz e o …o juiz fez umas perguntas ao … o Dr. orientou-as para o lado que achava mais conveniente porque se fossem falar de automóveis ao Jorge ele não era dado por interdito porque o Jorge sabe de automóveis o que eu imagino que não há para saber, o Dr. levou aquilo para os números para as horas e não foi de forma alguma enganar, mas sim chamar a atenção para os pontos necessários e que estavam em causa essencialmente, portanto foi-nos dada a interdição. (F2) Foi um processo que no caso do … decorreu com relativa celeridade eu sei que houve ai casos muito demorados para se resolver. (F2) (…) mas é um choque, indiscutivelmente é um choque (…) mas o perigo que seria o … não estar interditado é de longe muito maior do que qualquer sentimento pessoal de frustração (F2) Possivelmente o meu filho mais novo (F2)

Familiar 3 (F3) Já tenho tudo encaminhado da interdição dela, foi um bocadinho mais tarde do que devia ser (…), mas de qualquer forma a responsável pela Margarida sou eu. (F3) Nós tivemos aqui na Associação um esclarecimento muito valioso com um advogado, foi uma sessão aberta a todos os pais, e ele disse que apesar de eu ser mãe se não tivesse nomeado a tutora oficialmente não tinha direito de decidir certas coisas sobre a vida dela (F3) Este meu filho que vive cá é o protutor (F3) (…) por acaso falta-me fazer é no notário fazer uma declaração de que por minha morte a tutoria dela fica entregue a Associação, porque por exemplo o protutor o que faz é levá-lo ao médico e acompanhá-la e se ela tem uma doença vai para casa e o meu filho é bancário (…) não tinha tempo para fazer isso (…) de maneira acho que a ideia do elo é criar um grupo de colaboradores que vão ocupar-se só disso porque eu ainda tenho mais filhos mas há muitos casos aqui que são filhos únicos. (F3) (…) acho que a justiça é entregar a parte da minha filha a Associação uma vez que ela esteja aqui e embora o protutor possa sempre seguir as coisas e ver se as coisas estão bem geridas porque isso é exigência do tribunal (F3)

Familiar 4 (F4) Eu nunca entrei com os papéis para ser nomeado um tutor, para isso tenho que ir ao tribunal para que isso aconteça, de facto nós gostávamos que ela fosse responsável pelo … e quer dizer que fosse uma garantia para o futuro dele. (…) Ela e a Associação (…) ele já foi ele já está praticamente quer dizer interditado, está interditado já desde, eu sinceramente nem sei bem. (F4) É um problema vamos ter grandes dificuldades em arranjar ou nomear um novo tutor. Não temos ninguém na família não temos ninguém. (F4) O Envelhecimento Envelhecimento de um filho

Familiar 1 (F1) Tem graça nunca aprofundei isso nunca... quer dizer não sei, vou vivendo o dia a dia porque tem que ser mesmo assim, agora talvez tenha pensado mais desde que o meu marido faleceu, quando éramos os dois, não é dividíamos a carga pelos dois, não é agora sozinha tenho pensado mais (…F1)

Familiar 2 (F2)

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(…) é uma preocupação também na medida em que eles envelhecem muito mais cedo. (F2) (…) faz sempre impressão olhar para os nossos filhos e pensar neles como velhos (F2) (…) isto é um problema que não existia dantes (…) porque eles antes morriam todos antes dos pais, morriam todos muito cedo era muito raro passarem antes dos 20, 21, claro que hoje o meu filho já vai fazer quase 50. (F2)

Familiar 3 (F3) Olhe isso eu estou mais do que preparada não é, nós também não melhoramos com a idade e eles muito menos, eles demoram muito mais tempo a envelhecer é engraçado que ela até aqui há uns anos ninguém lhe dava a idade que tinha, ficavam admirados quando ela dizia que tinha 40 ou 45, mas também quando começam caiem um bocadinho mais depressa foi isso que o Dr. … me disse (…F3)

Familiar 4 (F4) O que eu vejo é que isso se aproxima cada vez mais rápido e que se evolui constantemente. (…) como é que eu vejo o envelhecimento do … (…) que está a envelhecer precocemente. (F4) (…) eu já nem falo do acumular de problemas é um problema no seu todo é um problema que abrange tantas coisas que enfim… que incomodar não é o termo não é uma questão de incomodar é uma situação, é um problema sem solução e como é um problema sem solução nós vamos embora e o que será, o que será a partir daí? Sinais de envelhecimento

Familiar 1 (F1) Há para melhor, começamos logo por dizer que talvez não se nota, ela está mais calma, muito melhor, então desde que está aqui no … então não tem comparação! Ao nível físico ela de facto tem dificuldades coitada, nas pernas e também tem má circulação (…) está muito pesada. Mas mental está melhor e até desde que o meu marido faleceu ela está muito mais meiga mais carinhosa. (…) qualquer coisa que ela se errite e que me deixe triste ela diz logo, pronto mãe não é nada já passou, já passou! Revela que ela se preocupa imenso imenso imenso, preocupa-se muito comigo! (F1) Ás vezes fala ai isto já é o peso da idade (risos), ai as minhas pernas já é o peso da idade! (…) às vezes passava uma roupita a ferro agora tem sempre as pernas cansadas

Familiar 2 (F2) (…) embora não se note grandes regressões em muitas coisas, há coisas que o Jorge já não dá a mesma resposta, embora nunca fosse uma resposta brilhante essa resposta já começa a apresentar algumas falhas, e portanto a deterioração há-de ser mais rápida até porque a diabetes também não ajuda é um factor negativo (…) (F2) (…) foi habituado a não ser o coitadinho mas sim mais uma pessoa da casa e portanto tem as suas obrigações, (…)essas coisas começam a falhar há mais vezes em que se esquece (…)são coisinhas pequeninas que nós vamos sentindo que já não é bem da mesma maneira, há esquecimentos mais que não havia, são coisinhas pequeninas do dia a dia não é nada estritamente.

Familiar 3 (F3) Ela vinha sozinha, até há poucos anos ela vinha e ia sozinha mesmo aqui para a Associação só que depois ai à uns 5 anos mais ou menos começou a cair com facilidade, tropeçava não tem aquele instinto de ir com as mãos ou qualquer coisa vai logo com a cara ao chão (…) (…) noto no andar dela (…) mexia-se bastante mais. (…) ela caiu dois dias seguidos. (…) o Dr. … disse não isto é demais não pode ser esta menina não anda mais sozinha quando sair da sala alguém a leva pela mão, se não tropeça basta uma pedrazinha mais saída (…) (…) mesmo quando ando com ela na rua nunca vai sozinha vai sempre com o braço dado ou com a mão bem presa, já uma vez caímos as duas (risos) ela caiu e eu também. (sinal de duplo envelhecimento) Está um bocadinho rabugenta às vezes, (…) (…) ela saúde realmente é saudável(…) De maneira que o que eu noto mais nela é o andar assim um bocadinho inclinada para a frente (…) há usa óculos, foi no ano passado em Agosto (…) ela quer é estar sossegadinha

Familiar 4 (F4) É que nós mesmos temos dado por isso vê-se que o … está a envelhecer precocemente (…) agora dá-me a sensação que está cada vez mais lento, pergunta tudo

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Parece-me que ele está (…) a demorar mais tempo a fazer as coisas que fazia já em certo tempo, muito confuso, começa a fazer uma coisa e não a termina, se limpar o quintal deixa ficar o lixo deixa ficar aquilo assim, quando dantes não. (…) é muito instável (…) ele carece de muitos cuidados para além da deficiência mental que tem carece de outros problemas de saúde tais como um problema hemorroidal bastante agravado e problemas no estômago (…) Preocupações dos pais

Familiar 1 (F1) As maiores preocupações seja talvez a minha velhice, como é que eu hei-de subir a escada e fazer a limpeza à casa que é grande, e os recursos financeiros são muito poucos porque estas pensões são uma desgraça, mas olhe eu também não sou das pessoas que muito me preocupo, porque eu sou crente e confio muito em Deus (…) sei que ele nunca me vai desamparar! (silêncio) (F1) Por enquanto eu vou resolvendo as coisas, quer dizer por enquanto, até quando não sei! Até quando é uma incógnita não sei, não sei! Mas também nós não podemos estar ansiosos por isso porque senão então ficamos paranóicos, não pode ser, temos que ter a lucidez vivendo um dia de cada vez. (F1)

Familiar 2 (F2) (…) pessoalmente o que mais me afecta e preocupa é o futuro (…) (F2) (…) é sempre um peso que fica a alguém ainda que fique aqui, os irmãos têm que o vir buscar ou têm que se ocupar dele ou preocupar com ele, é uma preocupação muito grande essa. (F2) (…) são mais preocupações que se apresentam porque começamos a perder a saúde, começam a aparecer problemas e no Jorge vão com certeza começar a aparecer mais cedo e isso é uma preocupação. (F2) (…) se a preocupação com os outros é grande com este é muito maior, é sempre potenciado. (F2) acredito que (…) os irmãos o acompanharão sempre (…) mas dizer que me preocupa muito o que será a vida dele não me preocupa Resolvi pensar sobre isso e conclui que não tenho o direito sequer de sentir angústia em relação a isso.

Familiar 3 (F3) (…) já há muito tempo (…) que os pais estavam num pessimismo uma coisa, ai queriam que os filhos morressem à frente deles! Eu não sou capaz dizia eu, porque ela é muito alegre e gosta de viver e pronto é feliz com pouco eu também sei isso. Mas não penso nada assim como outros pais acho que ela ainda pode viver muitos anos e como tenho uma grande confiança na Associação e nas pessoas que cá estão e as que também vão ser escolhidas futuramente, porque o meu filho também é sócio efectivo, na minha falta é ele que a vem buscar e essas coisas todas. Sinceramente neste momento não tenho grande preocupação, isso sim tive essa preocupação quando sei lá há uns 20 anos ou 20 e tal já ela tinha uns trinta anos. Preocupa-me um bocadinho com a minha saúde, tenho os meus cuidados porque a Guida precisa de mim, porque se fosse só por mim eu morria já hoje Agora tenho um bocadinho de mais cuidado com a minha saúde porque não posso falhar por causa dela não é, não tem mais ninguém agora para tomar conta dela.

Familiar 4 (F4) (…) nós vamos embora e o que será, o que será a partir daí? (F4) Mesmo a nível da permanência dele aqui na Associação o que é que pode acontecer? (F4) eu morro deixa de haver rendimentos, não há quem pague a contribuição da casa e não há quem pague outras coisas, o que é que vai acontecer (…) as finanças vão apanhar tudo por falta de cumprimento de pagamento das coisas, como é que é! Vai viver na rua! Eu prevejo porque isto vai acontecer, porque não há rendimentos para suportar os encargos e depois isto é super complicado (F4) É o eu ir para o outro lado e como é que eu vou e deixo-o cá? Era um grande fardo que tiravam das costas do irmão, se o … desaparecesse da vida dele. Só nós, eu e a minha mulher, sabemos o quanto temos pensado no envelhecimento e o quanto é importante haver alguém que se preocupe com isso!

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Necessidades apresentadas pelos pais Familiar 1 (F1)

Tenho três hérnias discais, por isso é que não posso carregar com grandes sacos e grandes pesos. Familiar 2 (F2)

Por enquanto estou bem (…), não tenho grande necessidade de apoios. Tenho uma mulher a dias (...)que é uma ajuda preciosa, tenho saúde, sou bastante saudável (…)

Familiar 3 (F3) (…) vou dizer a verdade eu muitos dias com ela sempre ao pé de mim também não fico muito bem, começo a fazer a minha vida normal com dificuldades, fico com a minha saúde mental afectada! A saúde, o pão nosso de cada dia, não peço mais do que isso e a graça de Deus acima de tudo porque ela depende só de mim (…) (…) às vezes é muito difícil estar sempre a vir buscá-la e trazê-la porque ainda é longe, mas temos que fazer um bocadinho de sacrifício porque não quero perder o lugar dela aqui na Associação para quando eu falecer ela ter quem lhe dê apoio

Familiar 4 (F4) As minhas necessidades, era ter alguém que tomasse conta de mim do ... e da minha mulher e do filho. (…) porque (…)não temos ninguém Melhor resposta para o futuro

Familiar 1 (F1) há 40 e tais anos não havia nada absolutamente nada (F1) (…) estou descansada porque eu sei que um dia que me vá embora, que Deus me leve ela fica cá na Associação, estou mesmo já a tratar de certas coisas para ver se ela fica cá mesmo (F1) (…) ela fica melhor cá do que com a família. (…) o irmão é rapaz ele gosta imenso dela e a cunhada também gosta dela mas não tem paciência (…)eu sei e eu compreendo (…) porque isto não é pêra doce, não é difícil mas é muito teimosa (…) (F1) Por isso é muito mais difícil ela ficar lá, para ela seria muito pior porque aquilo a vida é um grande choque e então eu prefiro que ela fique cá na Associação. (F1) O futuro é este é ela ficar aqui! (…) sempre tenho tentado suprir as principais necessidades dela, mas no futuro é a Associação. Ela já fica cá todos os meses pelo menos uma semana por mês fica cá para adaptação. O que diz a Eunice? Quer dizer quando vem não! Diz sempre não é lá a minha casa aqui é que é a minha casa, aqui é que eu tenho o meu quartinho… mas quando está cá está satisfeita, está porque eu telefono para cá e ela está na galhofa com os outros e tudo não tem problema é só na altura em que vem. Ela tem a noção que um dia vai ficar aqui, tem… mesmo ela às vezes diz viver com (…) não antes quero ficar na Associação. (…) ia haver um grande choque (…) Seria muito melhor ficar aqui!

Familiar 2 (F2) (…) embora não seja o ideal ter os nossos filhos numa instituição a tempo inteiro, tem tido a sua vida toda em casa portanto um dia será como qualquer um de nós porque também não vale a pena estarmos a enganarmos o nosso fim hoje em dia será num lar e ele acabará aqui possivelmente. Eu estou convencida que ele aqui na Associação será acompanhado e acarinhado que terá aqui tanto quanto é possível fora de casa uma casa. desde que ele tenha um quarto tenha os seus livros (…) e os discos que ele gosta de ouvir música, eu acho que se ele tiver um quarto só dele aqui assim em que os irmãos lhe dêem algum apoio para ele não se sentir abandonado acho que o Jorge não terá um fim que seja para me preocupar. A Associação porque tem o Dr. … que já anda a algum tempo preocupado com o problema do envelhecimento que é o problema que para mim está presente há muito tempo

Familiar 3 (F3) tanto que eu lutei muito para arranjar assim uma coisa onde ela pudesse ficar depois de eu partir! Não é porque é a preocupação de todos os pais que têm filhos assim! (F3) E tenho preparado a Guida devagarinho brincando com humor, sem dramas e coisas e digo-lhe olha já sabes que quando eu for para o céu ficas na Associação, e ela está farta de saber isso que é a casa dela

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O que penso fazer é quando eu falecer ela ficar aqui, e o meu marido antes de falecer já estava a par Se não fosse aqui aonde é que ela devia ficar?! ao fim de semana acredito que os irmãos a venham buscar (…) não é viável ela ir viver com os irmãos, podem eventualmente vir buscá-la ao fim de semana dar um passeio, acho que é realmente o melhor para ela estar aqui com pessoas que são especializadas e estão preparadas para lidar com eles e que a tratam bem e ela é feliz, passeia também (…) O que diz a …? Há não se importa ela gosta de vir (…)

Familiar 4 (F4) É uma pergunta muito difícil, não é fácil responder! Eu queria para o ... porque já se sabe que ele não tem capacidade para se orientar. que alguém se responsabilizasse por ele, mas queria que alguém tomasse conta dele até aos últimos anos dele, que ele fosse uma pessoa cuidada por alguém e estimado enquanto fosse vivo. O ideal seria um lar onde pudéssemos estar os três (…) Actividades promotoras de bem-estar no envelhecimento da pessoa portadora de deficiência mental

Familiar 1 (F1) Eu acho que enquanto ela puder movimentar-se e andar nestes trabalhos e nestas coisas é muito bom para ela porque senão ela acomoda-se (…) se ela não tiver estas actividades fica catética. (…) tem cá quem a vá avaliando enquanto ela puder (…) tem aqui muitas actividades tem ginástica tem remo (…) tem artesanato (…)e o principal trabalho dela e que ela gosta muito de fazer (…) é a profissão dela (risos).

Familiar 2 (F2) O Jorge desde que esteja a trabalhar não gosta, ele não gosta de trabalhar, (…) de maneira que faz o que tem que fazer mas não é que seja uma alegria para ele. A única coisa que lhe dá verdadeiramente alegria é a bateria (…) faz porque é aquilo que tem que fazer e pronto sabe que é assim. Ele diz sempre às pessoas que de manhã vem para o trabalho. (…) acho importante que tenham algumas actividades, porque eu julgo horrível o sistema dos lares em (…) que as pessoas estão em muitos deles (…) à espera que o dia chegue (…) quereria que eles continuassem a ter actividades mas acho que essas actividades vão ter que ser estudadas e adaptadas em função da idade que eles têm. Quais são? Não me peça! (…) queria que eles tivessem alguma qualidade de vida e não se sentissem uns trapos uns monos que estão ali à espera que acabe o dia. Não sei se é possível, até porque se já é difícil para as pessoas chamadas normais bem mais difícil há-de ser para pessoas com deficiência. (…) espero que continuem sempre a ter um apoio de ginástica de fisioterapia para que não fiquem com as juntas todas perras, que continuem com o seu jacuzzi têm lá em cima a sala de relaxe, possivelmente terão que se virar mais para estas actividades mesmo aqueles que hoje não fazem uso destas valências, possivelmente terão que alterar a sua vida no sentido de usufruírem mais desse tipo de apoios para que o seu organismo não se vá deteriorando tão rapidamente, mas temos que pôr de parte outras coisas, não podemos estar a pensar que eles vão continuar a manter o mesmo numero de exercícios que fazem hoje, mesmo o ir àqueles encontros inter-centros tudo isso, aos poucos com certeza vão deixar de ir, porque nós temos aqui os centros de terceira idade para os jogos, qualquer dia são os nossos que são da terceira idade aqui dentro (risos).

Familiar 3 (F3)

Familiar 4 (F4) Eu não lhe sei responder a essa pergunta em concreto (…) acho que não há nada mais que vá fazer o ... melhorar as suas capacidades. Se quer que lhe diga nem sei bem que actividades o ... faz cá na Associação, sei que faz umas coisas manuais mas o grande problema é a falta de trabalho. Mas penso que é importante actividades que mantenham as suas capacidades.

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Apêndice 13

Título: Análise de conteúdo das entrevistas realizadas aos profissionais

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Análise de contudo às entrevistas realizadas aos profissionais da Associação A Associação Objectivos da Associação

Profissionais Objectivos da Associação

Assistente Social

(P1)

Os objectivos da instituição desde o seu início, é dar apoio à pessoa com deficiência. O grande objectivo dos pais foi criar uma instituição que desse apoio aos seus filhos, esse é o grande objectivo desta casa. Tem havido algumas modificações ao longo destes anos, com as quais eu partilho, que é realmente nunca deixarmos de responsabilizar a família.

Promovemos também o aconselhamento às famílias sobre as tutorias e o futuro dos seus filhos para em vida os pais poderem escolher quem é que se vai responsabilizar pelos seus filhos após a sua morte. E já temos aqui algumas que de facto já deixaram algum familiar como tutor e não estão a utilizar a instituição.

O objectivo é que sejam institucionalizados o menor número possível de pessoas.

(…) a instituição surgiu exactamente para dar essa resposta é após a morte dos pais

Psicólogo (P2)

A Associação tem como objectivo geral o apoio e a integração da pessoa com deficiência mental jovem e adulta depois temos objectivos mais específicos que assentam um pouco naquilo que é o nosso programa baseado nas 8 dimensões da qualidade de vida de Robert Shalock. Estas 8 dimensões de qualidade de vida tocam necessariamente os aspectos do bem estar físico bem estar material o bem estar emocional os direitos, desenvolvimentos pessoal e social a inclusão social, autonomia a autodeterminação são os alicerces que a Associação trabalha no sentido de conseguir maior qualidade de vida para as pessoas que estão nesta instituição que são os nossos utentes.

Auxiliar de Acção Educativa

(P3)

O objectivo da instituição é nunca aos deixar parar. Se eles ainda puderem nem que seja ir ver a rua, ir à avenida porque não?

Ajudante de Lar (P4)

Ser profissional na Associação Motivações para trabalhar com pessoas portadoras de Deficiência Mental

Profissionais Motivações para trabalhar com pessoas portadoras de Deficiência Mental

Assistente Social

(P1)

É assim para mim não era novidade a Associação, eu já conhecia a Instituição até porque eu já tinha feito estágio na área da deficiência, já me sentia um pouco mais à vontade na área da deficiência que não foi a minha escolha inicial.

(…) eu confrontei aqui a instituição, e acabei por deixar para trás aquela grande opção que eu queria que era trabalhar com crianças e crianças desprotegidas, e acabei por escolher trabalhar com as pessoas com deficiência.

Psicólogo (P2)

não gostei muito daquilo que fazia e optei por uma nova área

Uma área que para mim atraiu-me imenso (…) e nesse sentido gostaria de experimentar ainda e deram-me essa oportunidade de experimentar, necessariamente tendo em vista alguma empregabilidade nesta área.

As motivações foram numa certa parte a vontade de conhecer mais profundamente a área da reabilitação porque só conhecia num contacto esporádico com pessoas com deficiência mental numa segunda vertente foi também pensar na possibilidade de integração profissional (…)

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Auxiliar de Acção Educativa

(P3)

As motivações, eu vou ser muito sincera (…) trabalhava noutra área que não tinha nada a ver, completamente diferente e na altura sinceramente vim porque não tinha trabalho mas depois embrenhei-me de tal maneira durante o curso, as vivências e fui conhecendo e ao nível do curso fomos fazendo visitas e alguns hoje clientes da Associação fizeram com que nós os conhecêssemos e às famílias e fiz um estágio de um mês e portanto foi-me cativando, primeiro vim porque não tinha emprego mas depois gostei comecei a interessar por tudo o que diz respeito a estas pessoas e a viver cada vez mais esta realidade.

Ajudante de Lar (P4)

Porque eu tenho uma ex-cunhada que trabalha aqui e eu vinha cá muitas vezes às galas, vinha cá buscá-la e portanto já tinha assim um certo contacto com os utentes, (…) pronto com os mais profundos não porque não ia às salas, mas pronto já tinha uma ideia disto mais ou menos e depois como fiquei desempregada surgiu a oportunidade de vir para aqui e eu vim.

Constrangimentos ao vir trabalhar para a Associação

Profissionais Constrangimentos ao vir trabalhar para a Associação

Assistente Social

(P1)

Eu no meu tempo não havia, não havia pessoas com deficiência, ou eu não me apercebia delas mas o facto é que eu não estava nem eu nem a generalidade das pessoas estava habituada a contactar com pessoas com deficiência.

Nunca tive grandes constrangimentos

Mas é assim contacto com eles como contacto com as outras pessoas não tenho nenhum constrangimento em relação a isso, além disso eu também já vinha um pouco preparada, eu sou sincera o primeiro impacto tive-o! Até porque andava grávida, o meu primeiro estágio foi assim um bocado complicado porque estava grávida na altura e depois vi-me confrontada a ir para a associação de Oeiras de Paralisia Cerebral e essa foi a que me marcou mais! Foi mau, foi os medos os receios mas isto tudo passa depois é uma questão de hábito.

Psicólogo (P2)

Relativamente a constrangimentos necessariamente a falta de experiência na área.

As vantagens de vir trabalhar para a Associação

Profissionais As vantagens de vir trabalhar para a Associação

Assistente Social

(P1)

A instituição em si, acho que essa é a maior potencialidade. E se hoje houvesse oportunidade de ir trabalhar com outra problemática eu por minha vontade não escolhia outra ficava na deficiência

Psicólogo (P2)

Eu nunca cá tinha vindo e sinceramente fiquei extremamente bem impressionado quer ao nível das infra-estruturas necessariamente e ai a Associação tem óptimas instalações construídas de raiz e isso facilita necessariamente todo o desenvolvimento dos programas que a Associação desenvolve, como também em termos organizativos, é uma instituição muito bem organizada que em termos técnicos tem uma grande qualidade a nível de competências técnicas

Relativamente às potencialidades, acima de tudo houve um enriquecimento seja profissional seja pessoal na minha vida. (…) já aprendi imensas coisas tive possibilidade de contactar com diferentes temáticas com diferentes pessoas (…) nível pessoal esta experiência enriquece-me porque digamos que eles são seres humanos extremamente afectuosos, carinhosos e mesmo a nível técnico também há um ambiente bastante bom e nesse sentido parece-me que podemos atingir os objectivos.

Auxiliar de Acção Educativa

(P3)

(…) podia ter ensinado e ensinei mas também aprendi muito! O que é muito gratificante, eu nunca pensei a priori quando vim trabalhar com esta população que eles me iam ensinar alguma coisa, antes pelo contrário.

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criam-se amizades a sério entre eles e entre nós e eles coisas que nós já não conseguimos dizer pronto ali ficou o emprego e agora vamos para casa, ninguém consegue pelo menos eu não consigo dissociar a minha vida em relação a esta população.

Ajudante de Lar (P4)

Há sempre uma grande ligação entre nós da nossa parte para com eles e eles para connosco.

Funções dos profissionais na Associação

Profissionais Funções dos profissionais na Associação

Assistente Social (P1)

“a articulação entre instituições, incentivar a ligação entre a instituição e as famílias, apoiar directamente os utentes na aquisição de comportamentos sociais adequados e uma melhor adaptação ao meio através de acções pontuais”

“o Serviço Social integra-se num plano geral de trabalho a nível do CAO e Moradias”

“Apoiar as famílias e resolver os seus problemas através dos seus próprios meios, procurar que as famílias assumam um papel activo e consumando com os objectivos e estão a ser prosseguidos”

“dar a conhecer a outras instituições o projecto da Associação e fazer a articulação com vista a um futuro projecto integrado de resposta a esta população”

“funções de coordenadora da residência, que é zelar pelo cumprimento dos planos terapêuticos, pedagógicos e assistenciais das moradias”

“faço parte de alguns projectos aqui na Instituição”

Psicólogo (P2)

“responsabilidade ao nível do departamento de qualidade da Associação”

“funções de recrutamento e selecção de pessoal”

“funções de avaliação e desempenho dos colaboradores”

“responsabilidade ao nível da formação quer seja a formação interna ou externa”

“trabalho em projectos Europeus”

“responsabilidade de gestão do Estofamento na área do Centro de Emprego Protegido”

“responsabilidade ao nível das actividades de psicoterapia”

“faço avaliação psicológica seja aos nossos clientes seja aos pais”

“faço formação e apoio aos familiares”

“orientação de várias alunas no âmbito de estágios académicos”

Auxiliar de Acção Educativa

(P3)

“ajudá-los em todos os aspectos, quer no aspecto cognitivo, físico, motor, trabalhar as capacidades e conseguir uma mudança de comportamentos”

“mantê-los ocupados mas também trabalhar toda esta parte de mudança de comportamentos”

Ajudante de Lar (P4)

“tratar da higiene da alimentação, do bem-estar deles aqui na residência. É dar os banhos, dar-lhes o jantar tratar das roupas, deitá-los levantá-los e pronto”

Avaliação do trabalho que desenvolvem na Associação

Profissionais Avaliação do trabalho que desenvolvem na Associação Assistente Social

(P1) Acho que é um trabalho muito positivo, em que eu gosto muito de trabalhar com eles

Psicólogo (P2)

(…) é muito subjectivo a avaliação que faço do meu desempenho. Mas obviamente que dentro do que me é pedido e exigido parece-me que tento responder ao máximo.

A repercussão do meu trabalho parece-me bastante positiva, porque quando nós criamos e

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desenvolvemos um conjunto de actividades, essas actividades respondem àquilo que é o diagnóstico das necessidades que fazemos com os nossos clientes e famílias e um dos aspectos que foram identificados como sendo importantes para eles foi a procura de bem-estar emocional e de controlo em termos comportamentais e nesse sentido e como eu tenho essa responsabilidade parece-me bastante positivo o trabalho desenvolvido.

Auxiliar de Acção Educativa

(P3)

(…) faço uma avaliação positiva, porque penso que fiz tudo o que estava ao meu alcance, tenho vivido experiência que nunca pensei vir a viver, mas também tenho tido sempre o acompanhamento dos meus chefes de toda a direcção e acho que fiz um trabalho bem feito dentro das minhas possibilidades e dentro do contexto e acho que sim que estes 17 anos tornaram-me mais mulher, um ser humano mais elevado, mais alto e vejo o resultado e sinto-me feliz!

Ajudante de Lar (P4)

(…) eu na minha perspectiva eu acho que é um trabalho bom, pelo menos eu tenho dado o meu melhor e a minha entrega em relação aos utentes e sendo assim se eu vejo que dou o meu melhor e dentro do possível quando estou aqui estou a 100%

Ética e os Profissionais

Valores Éticos dos profissionais

Profissionais Valores Éticos dos profissionais

Assistente Social (P1)

É fazer com que e isto tem sido uma luta que temos levado a cabo há alguns anos que é fazer com que a generalidade dos trabalhadores os respeitem. Temos um código de ética que vai pelo respeito pelos direitos e deveres e a partir daí criámos um manual de utilização de CAO, manual de utilização também das moradias É o respeito pelas pessoas com quem trabalho. Honestidade, sou sincera com as pessoas digo o que tenho a dizer quando tenho a dizer, respeito as funções das pessoas, tanto respeito uma pessoa que está no sector da limpeza como uma encarregada e também exijo que me respeitem a mim. Em relação aos utentes, tenho muito carinho por eles e respeito-os nas suas exigências e faço que junto da equipa exijo que exista esse respeito. Um dos valores da Associação é que nós estamos aqui para lhes prestar um serviço, na óptica do cliente, eles estão aqui, pagam para lhes prestarmos um serviço por isso temos que lhes prestar um serviço com uma maior qualidade, temos que fazer avaliações do serviço para melhorarmos as nossas respostas de outra maneira não vamos conseguir fazer melhoramentos e modificações, estou sempre muito atenta a este aspecto e se nós os tratarmos com o devido respeito dentro das capacidades deles e com carinho e não devemos deixar que esta situação que passe estes limites, porque elas aqui têm o trabalhos delas com estes utentes e não devem estreitar muito as ligações, não deixar que deixe de ser profissional porque depois começa-se a confundir tudo. Não quer dizer que não se sinta amizade, sente-se amizade sim! Temos amizade temos mais simpatia por uns do que por outros porque todos nós somos assim, mas temos que saber distinguir que estamos no nosso local de trabalho. e exijo que elas os tratem com igualdade. Exijo que elas respeitem os “miúdos”, (risos) isto de dizer miúdos é incorrecto mas de facto eles para nós são miúdos, se calhar é uma forma mais carinhosa de os tratarmos.

Psicólogo (P2)

Se for recorrer ao código deontológico da psicologia que ele existe, mas nós próprios aqui na Associação temos um código ético e nesse código também temos identificado os valores que devem nortear as acções dos profissionais da Associação. Necessariamente quais é que são os valores que me parecem serem importantes quando estamos a trabalhar com esta população e enquanto profissionais? O valor da igualdade (…) a todos os níveis igualdade de tratamento que é fundamental não diferenciarmos, o valor da dignidade da pessoa enquanto pessoa humana também me parece ser um valor fundamental tratarmos como seres humanos toda e qualquer pessoa, sendo conscientes dos direitos e deveres que lhes assistem também é importante. Um dos outros valores é o respeito o valor do respeito que eu apoio muito porque também me parece muito importante nesta área e outros valores que necessariamente eu podia aqui começar a debitar mas parece-me que estes são os essenciais são os de base para que depois sejam desenvolvidas actividades com um maior rigor ético possível.

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A problemática da Deficiência Mental Pessoa portadora de Deficiência Mental

Profissionais Definição de pessoa portadora de deficiência mental

Assistente Social (Profissional 1)

É uma pessoa com algumas limitações (…) alguns têm limitações mais acentuadas que outros

Todos temos limitações, a diferença é que nós conseguimos disfarçar as nossas limitações e eles não conseguem disfarçar as deles porque não têm essa capacidade!

(…) eu nunca encarei as pessoas com deficiência como pessoas menos válidas

Psicólogo (Profissional 2)

Em termos técnicos uma pessoa com deficiência mental é uma pessoa que em termos do funcionamento da inteligência tem um défice e isso traduz-se em termos de adaptação ao meio. deverá pelo menos ter défice a nível de 2 competências adaptativas

Em termos daquele palavreado do dia a dia a mim parece-me que são pessoas que têm limitações que essas limitações se traduzem numa dependência um pouco maior do que aquelas pessoas ditas normais, que precisa de um apoio mais personalizado

(…) existem vários níveis de deficiência mental nomeadamente ligeira moderada grave e profunda, (…) as pessoas que têm deficiência ligeira têm um trabalho muito mais exigente que tem um cariz de produção e produtividade, tem essa diferença. As pessoas que têm deficiência moderada têm um trabalho ocupacional útil em que desenvolvem um conjunto de actividades mas que não são um conjunto de actividades que são obrigados a produzir com prazos com quantidades tudo isso, necessariamente tem que haver essas diferenças.

(…) acho uma população bastante calorosa, bastante afectuosa

Auxiliar de Acção Educativa

(Profissional 3)

É à partida uma pessoa com dificuldades, principalmente cognitivos, podem ser físicos também mas as mais associadas são as dificuldades cognitivas, que podem ter vários graus, temos os profundos os moderados e os ligeiros

(…) os mais profundos que são aqueles que nem sequer conseguem reagir a estímulos (…)os moderados que é a maioria de CAO e temos aqueles que são mais ligeiros ao nível do CEP

Todos eles têm mais problemas cognitivos que é quanto a mim o que define a deficiência mental.

Eles também têm potencialidades, eles sabem que têm deveres e direitos, sabem perfeitamente que têm o dever de ser e trabalhar para o futuro e programar e fazer o seu projecto de vida e pensar e exigir que sejam dadas todas as condições, eles têm essa noção não são muitos os que têm mas alguns têm essa noção.

As características positivas, posso dizer-lhe tanta coisa, são pessoas sensíveis, amigos, muito verdadeiros, são extremamente verdadeiros se gostam gostam se não gostam dizem logo que não gostam não são hipócritas e são trabalhadores, são responsáveis coisa que às vezes as pessoas não acreditam, quando falamos às vezes lá fora

Ajudante de Lar (Profissional 4)

É uma pessoa com menos capacidades que precisa de mais auxílio (…) praticamente em todas as suas funções, porque até mesmo aqueles que nós consideramos autónomos são autónomos até um certo ponto, podem ser autónomos no comer no vestir no calçar no andarem aqui até apanharem transportes mas têm que ter sempre um acompanhamento porque a cabeça deles há-de ter sempre uma falhazinha.

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 410

A problemática do Envelhecimento Processo de envelhecimento da pessoa portadora de deficiência mental

Profissionais Processo de envelhecimento da pessoa portadora de deficiência mental

Assistente Social

(P1)

Estamos a aprender com eles. (…) aí o objectivo é que eles consigam manter algumas aquisições que conseguiram aprender até à idade adulta

(…) vão-se notando no envelhecimento deles, eu acho que é mais notório quanto mais capacidades eles adquiriram torna-se mais notório o envelhecimento, as pessoas com deficiência profunda não é tão notória.

(…) quanto mais capacidades têm mais notório é o envelhecimento

(…) o notório é perderem capacidades. Porque estão a perder a capacidade da leitura, estão a perder a capacidade da escrita, aqueles que adquiriram, porque os que não adquiriram ficam mais ou menos no mesmo estado

(…) Na deficiência moderada a perca de capacidades é mais notória, não tão acentuado, porque eles também nunca tiveram grandes capacidades.

(…) Agora não posso dizer assim muito mais porque eu não conheço pessoas muito para além dos 50 anos. Os mais velhos que eu tenho aqui têm 54, 55 anos não são assim propriamente idosas não é. Daí que evidentemente ainda não há coisas muito acentuadas, quando eles tiverem 70, possivelmente as minhas respostas serão diferentes.

Psicólogo (P2)

(…) a mim parece-me que em termos de evolução de uma pessoa dita normal e de uma pessoa com deficiência mental o processo de envelhecimento parece-me ser bastante similar exceptuando casos como o Syndrome de Down, o Syndrome de Ruben Stain ou o Syndrome de Williams

(…) obviamente que o processo de envelhecimento a nível físico é mais acentuado do que em termos intelectuais

(…) depois não podemos generalizar o tipo de casos que aqui temos

(…) mas uma … que já caminha para os 50 anos, comparando com uma pessoa dita normal, eles têm um conjunto de actividades que uma pessoa dita normal não tinha, porque esta instituição possibilita-lhes uma mais fácil preparação do futuro e do envelhecimento, procura através de um conjunto de actividades físicas pelo menos prepará-los para isso, para esse processo de envelhecimento pelo menos para que esse processo de envelhecimento se atenue o máximo possível em termos de perda de capacidade física naturalmente

(…) se traduz em termos de menor autonomia ao nível da própria locomoção e em termos da própria medicação e têm dificuldades ao nível do apoio.

Potencialidades: o factor idade lhes permite ter uma maior experiência a todos os níveis (…) reflecte-se mesmo em termos comportamentais há pessoas que pelo facto de terem 45 / 50 anos procuram dar conselhos, aconselhar e serem os paizinhos e as mãezinhas dos colegas mais novas e isso até nos ajuda.

(…) teoricamente deviam ser pessoas que em termos de gestão e controlo emocional deviam ter mais capacidade mas o acto de serem pessoas com algumas limitações não têm capacidade para gerir as emoções tão facilmente.

Auxiliar de Acção Educativa

(P3)

(…) eu inclusive tenho na minha sala a mulher mais velha da instituição com 54 anos.

Claro que agente nota, às vezes não queremos mas, dizemos ela ainda consegue, está óptima mas nós vamos notando que todas as aprendizagens que eles fizeram ao longo destes anos que tiveram que aprender desde o ABC, já se nota que chegaram ali e quase que estagnaram,

(…) ou somos nós com os nossos olhos que não queremos ver ou não sei, mas acho que ainda não se nota muito (…) pronto já faz as coisas mais devagar

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(…) claro que vão para a educação física e vem a professora e diz: ai Bé fulano já não está já tem… Claro nós também temos que ver que alguns já têm 50 e tal anos, pois está bem mas nós vemo-los sempre jovens, alguns já se nota pronto já têm, a da minha sala diz: ai já estou velha e cansada, pronto já há este tipo de respostas.

(…) outra que diz: já estou cansada estou a precisar de ir para a reforma, como ouvem falar tanto da reforma eles dizem-me isso tudo: então já viu a nossa idade estamos na idade da reforma, você também se vai reformar e nós também queremos, alguns têm essa noção!

(…) já se vai notando diferenças é lógico que se notam algumas diferenças, mas continuam a trabalhar e a fazer tudo o que faziam até aqui

(…) Pronto eles envelhecem mais cedo do que os ditos normais, eu acho que haverá alguns que sim os outros não

(…) eu aqui há uns anos tinha a noção de que eles morriam novos, mas hoje chegamos à conclusão que não os pais estão todos a morrer, concluo que eles terão a quase a mesma vida quase que nós temos,

Ajudante de Lar (P4)

Eu noto já algumas diferenças (…) porque eles vão perdendo certas capacidades, vão andando para trás ou seja tudo aquilo que as minhas colegas que já cá estavam lhes ensinaram e eles tinham aprendido que agora começam a andar para traz.

(…) vão perdendo algumas capacidades ou seja a autonomia, aquilo que eles aprenderam não quer dizer que tenham desaprendido mas já tem mais dificuldade em pôr em prática aquilo que aprenderam e não precisam de ser muito velhos, porque isto é uma população que eu acho, na minha opinião e por aquilo que tenho visto aqui que envelhece mais cedo do que uma pessoa dita normal, digamos assim.

(…) todas as coisas que eles aprenderam e que até tinham uma certa potencialidade para fazer, com a idade vão desaprendendo, porque à coisas que eles faziam bem e agora por exemplo já não fazem

As características positivas é que já têm muito mais experiência a tudo, (…) já sabem mais como é que isto funciona, já têm a noção da avaliação, já sabem às vezes controlar-se mais

(…) estamos a falar dos autónomos (…) aqui nesta moradia (…) sentem-se assim às vezes que sabem mais um bocadinho até que os outros não é, e então metem-se com aqueles que não sabem fazer é assim o tipo de situações que surgem aqui.

(…) eles envelhecem devido às medicações e todos os problemas que levam a envelhecer mais precocemente

Necessidades das pessoas portadoras de DM envelhecidas

Profissionais Necessidades das pessoas portadoras de DM envelhecidas

Assistente Social

(P1)

Aqueles que já têm pais que têm quase 80 anos já estamos quase a falar duma 3.ª e 4.ª idade em que ambos necessitam de ser acompanhados pelos técnicos.

Já começam os dois a ter necessidades e vamos ter ai algumas famílias que vamos ter que ajudar na alimentação, no tratar no ajudar a dar o banho. Vamos fazendo aquilo que a família vai necessitando, não chegamos lá e agora vamos começar e fazer isto tudo! Não! Conforme a família vai necessitando do apoio nós vamos dando.

Neste momento começam a precisar de um acompanhamento mais personalizado por parte das monitoras também porque estão um pouco mais dependentes e necessitam de mais orientação das monitoras dentro e fora da instituição, (…) Nalguns casos já estamos a colocar monitoras a acompanhar os utentes aos médicos a fazerem exames clínicos para apoiarem as famílias, isto também já num processo de envelhecimento das famílias.

Psicólogo (P2)

Nós quando fazemos um plano de intervenção individual, nós temos em conta as necessidades individuais de cada um, e para além do plano de intervenção que fazemos anualmente também temos o cuidado de fazer um projecto de vida. Esse projecto de vida obviamente que não é de curto prazo mas sim de médio e longo prazo e nesse projecto de

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vida procuramos olhar um pouco para essas questões do envelhecimento e ver que respostas ele necessitará no futuro a médio e a longo prazo e precavermos e delinearmos um projecto de vida consoante as necessidades que iram ter daqui por cinco dez anos nós temos sempre esse cuidado.

Eu acho que as necessidades das pessoas mais velhas na área da deficiência mental, são muito similares a uma pessoas dita normal,

(…) teremos que trabalhar acima de tudo o máximo a estimulação, estimulação a todos os níveis, procurarmos que eles não entrem num conformismo numa acomodação (…) trabalharmos também fundamentalmente a nível da própria integração social e obviamente prepará-los para um futuro

(…) são duas ideias essenciais a integração, o preparar o futuro deles enquanto pessoa mais envelhecidas na questão da tutoria e depois uma preocupação essencial ao nível do bem estar físico necessariamente é uma preocupação que todos nós iremos ter na nossa vida e que eles também deverão ter.

Auxiliar de Acção Educativa

(P3)

As necessidades que qualquer pessoa tem quando deixa de trabalhar e que deixa de fazer as coisas que fazia. Apoio a todos os níveis, igual ao que os ditos normais vão precisar quando chegam à velhice, isto pode ter a certeza!

Ajudante de Lar (P4)

Penso que eles também deviam estar mais um bocadinho no seu, estarem mais recatados, terem o seu canto também para poderem descansar mais um bocadinho, eles coitados já dizem “ai estou tão cansado hoje”,

(…) na maior parte deles daqui a uns anos não têm família, tirando aqueles que não têm irmãos e que muitas vezes os irmãos não são as pessoas que mais os acompanham.

Sentimentos das pessoas portadoras de DM envelhecidas

Profissionais Sentimentos das pessoas portadoras de DM envelhecidas

Assistente Social (P1)

Eles sentem que a Associação é a casa deles (…) a residência é a segunda casa deles, outros dizem que este é o meu segundo quarto, e isso é importante é importante que eles se sintam aqui bem porque para alguns poderá vir a ser a futura casa deles.

Psicólogo (P2)

(…) fazemos uma avaliação da satisfação dos nossos clientes e obviamente que essa avaliação traduz-se em termos quantitativos e a grande generalidade a maioria das pessoas que estão na Associação, seja através dessa resposta quer seja através da observação directa, porque nós também temos oportunidade de fazer isso, parece-me que são pessoas bastante satisfeitas por estarem nesta instituição. (…) e satisfeitos por fazerem um conjunto de actividades que eles gostam muito de fazer, eles gostam muito de passear essencialmente tudo o que tenha a haver com os passeios as colónias de férias e a fins eles adoram.

Auxiliar de Acção Educativa

(P3)

Acho que eles sentem-se bem, eles ainda não se sentem velhos, ainda não atingiram essa, sim há um ou outro que diz que já está velho mas eles são felizes à maneira deles, ainda não sentem o peso ainda não sabem o que é ser velho neste país, não têm a noção do que é entrar na velhice neste pais, porque nós sabemos que às vezes é muito triste chegar-se à velhice (…) ainda vivem tão felizes que ainda não se preocupam com isso

Ajudante de Lar (P4)

(…) eles a maioria sente-se bem gostam de cá estar, excepções de alguns que não gostam, não é o não gostar é estão sempre a reclamar eles sabem que têm que cá estar mas estão sempre a reclamar e sempre “nunca mais chega sexta feira” quando cá estão a semana toda, “quero ir para a minha casinha”.

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A família e a problemática do envelhecimento da pessoa portadora de DM Problemas dos pais

Profissionais Problemas dos pais

Assistente Social (P1)

É a ausência deles, é a morte da parte deles (…) é uma angustia para a grande maioria dos pais é uma angustia pensarem que eles vão e ficam cá os filhos

Já começam os dois a ter necessidades e vamos ter ai algumas famílias que vamos ter que ajudar na alimentação, no tratar no ajudar a dar o banho. Vamos fazendo aquilo que a família vai necessitando, não chegamos lá e agora vamos começar e fazer isto tudo! Não! Conforme a família vai necessitando do apoio nós vamos dando.

Psicólogo (P2)

É a dificuldade de saberem o futuro por parte dos filhos. (…) há dificuldades distintas dependendo das famílias (…) os familiares também envelhecem e isso traduz-se também em termos de perdas do próprio familiar e a dificuldade que ele sente em dar-lhe respostas,

(…) outro aspecto é a questão do futuro, há uma grande dificuldade e grande preocupação em obter o máximo de resposta possível para o futuro dos filhos, ter alguém que os trate condignamente é uma das grandes preocupações deles enquanto familiares.

Auxiliar de Acção Educativa

(P3)

Ajudante de Lar (P4)

(…) nós também temos que ver o lado da família que têm os seus filhos e a sua vida e é um bocado complicado porque é o que eu digo eles há dias que agente é quase só para um, porque requerem muita atenção basta qualquer desequilibro que tenham e é um bocado difícil para a família no dia a dia do corre corre terem essa disponibilidade toda para com eles

(…) cada vez mais os utentes ficam cá portanto aqueles que até há um tempo era raro ficarem cá ao fim de semana, os pais cada vez vão tendo mais, precisam cada vez mais de terem um bocadinho de descanso, porque já são muitos anos, por exemplo há aqui utentes que já têm 50 e tal anos e não são os filhos mais velhos portanto logo ai os pais já terão uma idade muito avançada.

Processo de atribuição de tutor da pessoa portadora de DM

Profissionais Processo de atribuição de tutor da pessoa portadora de DM

Assistente Social (P1)

(…) estamos a orientar os pais para os processo de tutoria para eles em vida poderem escolher o tutor do seu filho após a sua morte, normalmente enquanto os pais estão vivos são os pais os seus tutores, após a morte dos pais fica um conselho de família e depois segue o conselho de família que são familiares, primos ou irmãos, são pessoas próximas que nós aconselhamos sempre que sejam pessoas mais novas para poderem continuar o apoio aquela pessoa.

A instituição tem trabalhado nesse sentido há muito tempo, temos feito sensibilização às famílias, temos orientado as famílias muito no processo de interdição e mesmo assim há muitas que por opção ainda não avançaram com o processo de interdição (…) deve ser feito com muita consciência do que se está a fazer.

É retirar a capacidade que qualquer pessoa tem como cidadão a partir dos 18 anos. Nós a partir dos 18 anos somos um cidadão com deveres e responsabilidades e eles não têm capacidade de ter o seu cuidado pessoal gerir os seus dinheiros gerir os seus bens de responder perante alguma coisa que surja, não têm essa capacidade e por isso têm que ter alguém a representá-los

(…) ele não tem validade, ele pode assinar tudo não tem é nenhuma validade e mais salvaguarda também os bens que lhe pertencem.

Psicólogo (P2)

(…) procurar ter um cuidado especial em termos dos tutores em termos de responsabilidades que o tutor tem em termos de função de lhes prestar o maior nível de afecto possível ao nível de integração possível e nesse sentido necessariamente temos que trabalhar ai para com a família no sentido de percebermos se há ou não há a resposta em

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 414

termos dos tutores nessa família no âmbito familiar e se não houver procuramos outro tipo de respostas que não seria desejável que passa-se pela instituição e que fosse a instituição a tutora dessa pessoa, devemos sempre ver se há alguém mais independente e externa à instituição para que pessoa mais rapidamente fazer uma avaliação independente.

(…) baseando-nos na boa experiência já existente em Espanha relativamente às delegações tutelares, procurarmos uma resposta através de tutores voluntários para aqueles que não tenham nenhuma resposta ao nível familiar, nenhum suporte familiar, iremos procurar que tutores voluntários façam um trabalho a esse nível.

Avaliação das famílias sobre o trabalho desenvolvido na Associação

Profissionais Avaliação das famílias sobre o trabalho desenvolvido na Associação

Assistente Social (P1)

Muito positiva, (…) temos pedido às famílias que façam uma avaliação dos diversos serviços que nós prestamos aqui aos seus filhos e tem sido uma avaliação sempre positiva (…) fazemos com alguma frequência uma auscultação às famílias

Psicólogo (P2)

A grande maioria das famílias também faz uma avaliação bastante boa, naturalmente que há umas famílias mais exigentes que outras, há famílias que têm uma bitola completamente diferente, outras que não conhecem mais nenhuma instituição para além da Associação, não sabem o que é que acontece noutras instituições e por isso não têm um padrão de comparação para que possam ser mais ou menos exigentes e neste caso gostam de tudo o que é feito na instituição, mas a grande maioria deles parecem satisfeitos.

Melhor resposta para o futuro Resposta para o envelhecimento da pessoa portadora de DM

Profissionais Resposta para o envelhecimento da pessoa portadora de DM

Assistente Social

(P1)

(…) temos o projecto de um lar para famílias, que está em projecto porque ainda não conseguimos o terreno

Isto com um objectivo de não fazermos uma separação entre os nossos utentes e as famílias, os pais e as mães quando eles necessitarem de ir para um lar. Serem integrados na mesma instituição e conviverem também cada um no seu sector dentro dos mesmos espaços que é o que acontece agora no centro de dia. (AS)

Desde que sejam satisfeitas as necessidades básicas deles e dos seus interesses eles vivem felizes, eles não são muito exigentes.

A nossa realidade também nos mostra que quando temos aqui pais e filhos misturados no mesmo sector, na mesma casa é muito complicado, temos que separá-los em respostas mas não temos que separá-los a eles, podem estar em espaços comuns mas as suas áreas têm que ser separadas, penso eu, se não é terrível

(…) dar atendimento aos pais num lar, e os filhos têm que ter outro atendimento com outras funcionárias e juntá-los em espaços comuns para estarem mais próximos.

(…) terem resposta ao nível residencial e não ficarem confinados a um lar, à resposta do lar que como a segurança social quer meter é o isolamento, as pessoas ficarem aqui sossegadinhas a ver televisão o dia inteiro. Não é isso que nós queremos

(…) eles que são pessoas que não sabem escolher e não sabem exigir mas nós sabemos o que lhes pode dar qualidade de vida e a nossa função é essa contribuir para que estas pessoas tenham uma qualidade de vida.

Psicólogo (P2)

Nós gostaríamos de manter uma filosofia de não internato na instituição (…) sobre o nosso ponto de vista é fundamental que haja o afecto familiar no sentido que o afecto se traduz ao nível do bem-estar emocional e isso nós avaliamos no dia a dia (…) quando há pessoas que estão aqui 10/15 dias sem ver a família, naturalmente que têm o destabilização em termos comportamentais que é visível, nesse sentido nós gostaríamos acima de tudo que o afecto e principalmente o afecto da família não se perdesse

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 415

(…) respostas que procuram acima de tudo dar o maior bem estar e qualidade de vida possível a estas pessoas.

(…) outra preocupação são os pais destas pessoas (…) para isso estamos a pensar fazer aqui um lar, aqui mesmo próximo aqui ao lado no sentido de termos como prioridade os próprios pais para que eles estejam mais próximos possíveis e que não haja uma perda de laços. Neste sentido iremos tentar priorizar os pais dos nossos utentes e procurar que não se perca a ligação

(…) iremos reforçar os cuidados de enfermagem, em termos de saúde obviamente que não iremos poder manter as respostas de saúde que temos presentemente, porque agora temos uma ida ao médico penso que duas vezes por ano e análises também duas três vezes por ano e uma das coisas que nós já identificámos como sendo algo importante e a rever é as questões do apoio médico e de enfermagem, necessitamos de ter um apoio mais presente para eles e por isso iremos procurar melhorar em termos das próprias acessibilidades das nossas residências, porque temos apenas 6 / 7 quartos no rés-do-chão, já temos 3 / 4 cadeiras de rodas mais umas ou outras dificuldades que surjam no futuro ao nível da mobilidade, necessariamente também temos que rever as nossas condições em termos das acessibilidades quer seja através da implementação de um elevador que eu acho que seria o ideal.

Auxiliar de Acção Educativa

(P3)

(…) se calhar Lar não seria nome indicado, mas sim uma nova valência (…) não estou a vê-los a vir para um CAO, mas se calhar uma valência porque não misturá-los durante o dia enquanto puderem junto com os mais jovens que fossem entrar para o CAO e não estivessem segregados, novos para um lado velhos para outro.

Criar uma valência que sim senhor mas com actividades dentro das possibilidades de cada um (…) com as suas dificuldades físicas que é o que os vai deitar abaixo muito mais cedo, é o que vai fazer com que deixem de estar activos, vai de certeza fazê-los parar mais cedo

Criar uma estrutura é o que eu digo ou a instituição ou o Estado tem que criar estruturas precisamente para as pessoas de idade com deficiência que não há, nós aqui também não temos porquê porque ainda não temos essa população mas que se pensa nisso pensa e a direcção e nós muitas vezes também pensamos.

Não vamos fazer igual aos lares da 3.ª idade! Não queremos abrir um lar de 3.ª idade aqui dentro, claro que um dia vai acontecer, mas entretanto…

Têm que ser criadas condições, como se criaram para os ditos normais, porque vão ter as mesmas necessidades e os mesmos direitos que qualquer pessoa tem. E eles mais cedo, porque fisicamente é mais cedo do que nós.

Ajudante de Lar (P4)

(…) a melhor resposta era fazer género de uma divisão tipo lar (…) porque já todos tinham as mesmas actividades dentro das capacidades deles porque eram todos mais ou mesmos da mesma idade (…) e depois haver actividades mais apropriadas, não é ficarem parados, mas terem uma vida um bocadinho mais calma

(…) um sitio assim sem haver à mesma o corte com a família como agora existe não é fins de semana virem buscá-los, levar virem visitar porque há pais que quando os filhos ficam cá de fim de semana vêm cá à mesma passar um bocado com eles, mas aqui é diferente estão com ele aquele bocado mas depois também têm o seu bocado para descansar.

Actividades promotoras de bem-estar no envelhecimento

Profissionais Actividades promotoras de bem-estar no envelhecimento

Assistente Social

(P1)

(…) estão a cumprir um programa ocupacional em actividades ocupacionais e eles não têm capacidades para mais, eu não sei se estas actividades ocupacionais que eles elaboram aqui em sala não se adaptam a uma terceira idade, se calhar até se adaptam! Algumas adaptam-se! Algumas vão adaptando-se ao longo dos anos e quando eles tiverem idades dos 60 e tais desde que tenham essas capacidades de trabalho...

Nós tentamos sempre que haja uma rotatividade dessas actividades e mudar as actividades de preferência só que às vezes não é fácil.

(…) eles pensam assim que vêm para o seu trabalho e é verdade este é o trabalho deles em que

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também tem uma gratificação no final do mês

(…) queremos que eles vivam e tenham todo os tipo de actividades desportivas de animação musical de trabalho de passeios, fisioterapias, tudo aquilo que for possível e tudo aquilo que eles também têm direito e dar-lhes as melhores condições de vida e qualidade de vida

Psicólogo (P2)

Uma das filosofias que nós temos e que me parece que iremos manter é procurar que não haja uma diferenciação de tratamento entre as pessoas com diferentes idades, ou seja diferenciar as pessoas com sei lá 40 / 45 anos das pessoas com 18 anos.

Até é desejável que haja numa mesma sala pessoas com diferentes faixas etárias no sentido de que haja uma estimulação mútua e uma aprendizagem contínua por parte de todos esses elementos.

(…) nós iremos procurar acima de tudo manter as actividades que são desenvolvidas por todos eles e obviamente termos o cuidado obviamente através de indicações médicas através da própria família de prepararmos as pessoas um pouco mais envelhecidas

Nós iremos procurar acima de tudo é que estas pessoas com um pouco mais de idade desenvolvam um conjunto de actividades no sentido de procurarmos que estejam mais aptas possível ao nível físico, fazer mais fisioterapia procuramos que eles façam um pouco mais de remo de natação, jacuzzi ginástica, interessa fazerem trabalhos mais de cariz físico no sentido de os prepararmos pelo menos que o bem estar físico seja um bem mais e maior possível

Nós iremos procurar o máximo possível não ter pessoas envelhecidas estagnadas, sentadas à espera que o dia passe (…)

(…) iremos procurar que eles não entrem num conformismo num comodismo, mas procurar desenvolver um conjunto de actividades, manter o máximo possível as actividades que estamos a desenvolver e adaptá-las mas nunca parar com nenhuma actividade, porque parar é morrer e porque para eles também não é desejável que fiquem parados,

(…) todas as actividades que fazemos presentemente iremos tentar manter, no sentido de melhorar e dar a maior qualidade de vida possível, logicamente que também temos que ter em atenção a auto determinação de cada um deles o direito de poder escolher e se eles não se sentirem capazes de fazer ginástica naturalmente que deve ser respeitado.

Auxiliar de Acção Educativa

(P3)

(…) enquanto eles conseguirem nós vamos tentar sempre que eles não parem…

(…) enquanto puderem vão sempre trabalhar e nós estamos cá precisamente para não os deixar parar.

(…) acho que enquanto eles puderem e tiverem capacidades nem que sejam as mínimas capacidades faziam 50 peças agora fazem 20 ou 10, corriam um ginásio inteiro correm metade do ginásio, mas correm ainda trabalham ainda levantam-se todos os dias a dizer que vêm para o trabalho é que eles não vêm para a escola, vêm para o trabalho eles sabem que são adultos trabalhadores, uns dizem-se electricistas outros dizem-se sei lá, eles sabem que vêem para o trabalho não vêm para a escola nem vêm para brincar, por isso é que isto ainda os move, eles têm capacidade de ver que já não são crianças. Nós temos que manter isto até o mais tarde possível, mesmo aqui dentro da Associação há uns poucos que já não trabalham, pronto mesmo esses que já não conseguem vir a pé tem que haver uma cadeirinha de rodas e têm que vir a andar vamos supor… temos que manter a actividade deles.

Ajudante de Lar (P4)

(…) para mim eles têm todas estas actividades mas eu acho que às vezes já se torna um pouco cansativo tanta actividade em relação a outros mais jovens, não é?

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Apêndice 14

Título: Análise de conteúdo das entrevistas realizadas às pessoas portadoras de

Deficiência Mental

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A problemática da deficiência mental A minha identidade

Utente A minha identidade

Utente 1

Eu tenho que falar tenho que desabafar tenho que pôr a conversa em dia! Nós os deficientes temos que nos apresentar tal e qual como nós somos, nós temos que mostrar ao mundo o que somos e o que é que estamos aqui a fazer neste mundo! Porque muitas pessoas não nos conhecem porque têm medo de nós, têm medo que agente seja tímidos e não é assim! Nós temos que dizer tudo o que vai dentro da alma tudo o que vai dentro do nosso coração, o que é que está mal e o que é que está certo e o que é que está errado, agente tem que dizer que agente existe! Nós temos que dizer o que é que agente está cá a fazer, temos que dizer o que é que agente faz! Eu: É verdade! Utente 1: Mas não há ninguém que nos mande falar! Eu: Hoje podes falar! Em vez de irmos falar em grupo, hoje em vez de falarmos no global vamos falar um bocadinho sobre ti, queres começar por onde? Utente 1: Evidentemente, então cada caso é um caso! Eu: Exactamente …! Então fala-me lá um bocadinho sobre ti? Utente 1: Quer que eu conte o quê? Eu: O que tu quiseres! Utente 1: Eu não sei do meu nascimento e a minha mãe nunca me contou! Eu: E se eu te pergunta-se assim: quem és tu? O que é que tu me dizias? Utente 1: Eu sou uma jóia de pessoa, ai sou sou! Eu: E mais! Utente 1: E não há outra como eu, não há não! Ai isso não há! (momento de silêncio) Estou quase com 50 anos e já andei em vários colégios não é brincadeira nenhuma. Gosto muito dos meus colegas… Eu: Faz de conta que nós não nos conhecemos, nunca nos vimos, e tu tinhas que te apresentar e falar um pouco sobre ti. Imagina que eu não sei nada sobre ti! Utente 1: Risos Eu: Então? Não eras capaz de me dizer nada? Ou eu tenho que desligar o gravador! Utente 1: Não não é preciso. Eu fiz a minha 4.ª classe tinha 15 anos! Eu: Sim! E sabes porquê? Utente 1: Porque não podia fazer mais cedo. Andei três anos na segunda classe. Mas na quarta classe, Meus Deus, tomara muitos fazer uma quarta classe como eu fiz. Eu: Tiveste boas notas foi? Utente 1: Fiz na escola 1 no campo de Santana é ao pé do jardim filha! Como quem vai para o hospital dos capuchos, foi ai é que eu fiz a minha quarta classe! Eu: E mais sobre ti? Utente 1: Escovo sempre os dentes antes de deitar e levei a vacina a BCG lembro-me perfeitamente da picada no braço e deram-me um torrão de açúcar. Eu: Então chamas-te …! E tens quantos anos? Utente 1: Eu, eu tenho 48, mas foram feitos este mês os meus 48 aninhos! Eu: Onde vives? Utente 1: Moro na Avenida de Angola n.º 67, 5.º esquerdo, é no Marquês de Pombal, moro em frente do Banco Santander. Eu: E sempre viveste aí? Utente 1: Morei 15 anos ao pé do hospital de Santa Marta. Eu: E mais! Utente 1: Silêncio Eu: Eu sei que moraste nas Caldas da Rainha, é verdade? Utente 1: Sim até aos seis anos. Então a minha mãe não lhe disse! Eu: Já nem me lembro o que é que a tua mãe me disse, tenho falado com tanta gente! Mas eu quero é que tu me digas, pode ser? Utente 1: Eu também morei em Leiria, mas eu não me lembro bem. Morei em Turquel. Eu: Já moraste em muitos sítios! Utente 1: Ai pá morei em todos esses sítios, Meu Deus, mas eu só penso quando é que eu vou voltar lá. Eu: E porquê?

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 419

Utente 1: Porque foi os melhores anos da minha vida. Porque tinha mais calma e não andava nesta adrenalina como ando aqui dentro da instituição, filha. Ai não andava não, pois não, isto aqui é uma canseira da vida (risos). Fale com a Dr.ª Gabriela e fale com o Dr. Martins que ele logo lhe diz ou com o Dr. Ricardo, isto aqui é assim mulher, isto é um lixo que não presta para nada. Eu: Não presta porquê? Utente 1: Isto de viver dentro da cidade é como um viver em constante ... não presta, porquê! Não presta filha não presta viver dentro da cidade. Então não vê...

Utente 2

Eu: Fala-me sobre ti? Quem é que tu pensas que és? Utente 2: Eu sou o …, sou um rapaz com 49 anos, vou para os 50, sou um rapaz com uma certa, como é que hei-de dizer, com uma certa vontade de falar com as pessoas, consigo por exemplo, porque eu é a primeira vez que estou a fazer uma entrevista consigo. E acho que é giro as pessoas estarem a conversar umas com as outras para as pessoas se entenderem uma com a outra, para falar sobre aquilo que quiser falar sobre aquilo que quiser dizer, sobre aquilo que gosta de falar. Eu: E mais, fala-me mais sobre ti. Utente 2: Sou do signo escorpião, nasci em Novembro de 1957 no dia de Todos os Santos. Tenho dois irmãos um irmão divorciado e uma irmã casada. O meu irmão tem um filho e eu sou tio do filho dele, gosto muito dele é muito simpático, ele é meu sobrinho já há uma data de anos, quis ser tio dele, eu sou tio dele, por isso é que eu me ofereci para ser tio dele. Eu disse à minha mãe que eu queria ser tio dele e a minha mãe disse que eu podia ser tio dele. Eu: E mais coisas sobre ti? Utente 2: Tenho diabetes como sabe, é apareceu-me já há uns anos eu não estava à espera que isto me aparece-se mas depois é que me apareceu. Foi horrível, nunca pensei vir a ter diabetes nunca pensei nisso, uma situação que eu não estava à espera que acontece-se.

Utente 3

Eu: Quem é que tu pensas que és? Utente 3: Quem eu sou? Eu: Sim, quem és tu? Fala-me sobre ti? Utente 3: Eu sou uma menina que tenho 50 anos, vou fazer 51 para a semana. (…) Eu: Então e conta-me lá mais coisas sobre ti, já conheço a tua família e mais… apresenta-te… Utente 3: Haaaaa!!! Eu: Tens dificuldade em falar sobre ti? Utente 3: ééé Eu: Podes dizer-me o que tu quiseres, imagina que eu sou tua amiga e nós nos encontrávamos na rua, o que é que me contavas sobre ti? Utente 3: Eu quando estava em Angola, uma vez fui para a escola que era lá ao pé de casa e fui atropelada foi um tio meu que estava lá a trabalhar e que foi comigo para o hospital, levei pontos aqui quer ver (levantou a calça para me mostrar a cicatriz) Eu: Mas não me tinhas contado que tinhas vivido em Angola! Perguntei-te se sempre viveste em Mira Tejo e tu disseste me que sim, explica lá isso melhor? Utente 3: Não, vim lá de Angola Eu: E vieste de Angola com quantos anos, sabes? Utente 3: Com, com, 20 anos, vim fazer cá os 20

Utente 4 Eu: Fala-me um pouco sobre ti? Quem é que tu pensas que és? Quem és tu? Como é que tu achas que és? Utente 4: Eu sou um rapaz jovem e bom rapaz. Tenho 48 anos, 49,

Eu e a minha família

Utente Eu e a minha família

Utente 1

Eu: Vamos falar um pouco sobre a tua família, tens irmãos? Utente 1: Tenho um, tenho e tenho uma cunhada que é do Seixal e as minhas sobrinhas. Uma das minhas sobrinhas fez hoje oito dias que fez 11 anos. E um Pedro Miguel que tem uma cadelinha lá. Eu: E tu gostas deles? Utente 1: Gosto à minha maneira. Eles já têm a vida deles. Eu: Com quem vives? Utente 1: Vivo com a minha mãe e mais os hóspedes que estão lá em casa. Eu: E o teu pai? Utente 1: Então o meu pai! O meu pai morreu há quatro anos! Mulher não me fales do meu pai! Não quero falar do meu pai criatura. Eu: Tudo bem … se não queres falar do teu pai não falamos.

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 420

Utente 1: O meu pai morreu há quatro anos com um AVC de ataque e morreu no hospital do Desterro, vai fazer 5 anos para o ano que ele vive no cemitério de Benfica! O meu pai chamava-se Mário dos Santos Marques e a minha mãe chama-se Florinda. Eu nasci em Leiria e o meu irmão nasceu na maternidade Alfredo da Costa e a mulher do meu irmão nasceu em Almada. Eu: O teu irmão é mais novo ou mais velho do que tu? Utente 1: É mais novo do que eu. Eu sou a mais velhinha! Quando ele nasceu tinha eu 6 anos e meio quase 7 anos. Era muito crescidinha. Eu: Sabes quantos anos tem a tua mãe? Utente 1: Tem 72 vai fazer 73 dia 1 de Janeiro assinala o novo ano.

Utente 2

Eu: Com quem vives? Utente 2: Com os meus pais. Os meus irmãos já estão um para cada lado, a minha irmã vive ali ao pé de Santa Marta, a minha irmã trabalha em São José e o meu cunhado trabalha em Santa Marta. E ainda tenho os meus primos a minha madrinha ainda, tenho a minha avó tenho mais primos. (…) gosto dos meus pais, gostos dos meus irmãos, gosto do meu sobrinho, gosto da minha família toda. Gosto daquelas pessoas que me amam e que gostam de mim (…) Também tenho os meus primos, tenho as minhas primas e todas estas coisas, eu sou assim, tenho os meus pais a minha avó os meus irmãos...

Utente 3

Eu: Então se tens sobrinhas, significa que tens irmãos! Quantos irmãos tens? Utente 3: Cinco, tenho cinco irmãos. Eu: Fala-me lá um bocadinho sobre eles. Utente 3: O mais velho está em Macau, depois sou eu depois é o meu irmão Carlitos depois é o meu irmão Tó e depois é a minha irmã. Três rapazes e duas raparigas, ainda estão todos vivos. Eu: Olha e neste momento vives com quem? Utente 3: Com a mãe. Eu: Só com a tua mãe? Utente 3: Só. Às vezes o meu irmão também vai lá Eu: E sabes quantos anos têm os teus pais? Utente 3: O meu pai tinha 70 a minha mãe tem agora 70, tinha 69 e fez agora 70 a minha mãe.

Utente 4

Eu: Antes de falarmos do Elo, vamos falar só mais um bocadinho sobre ti. Com quem é que tu vives? Utente 4: Com o meu pai e com a minha mãe. Eu: E aonde é que vives? Utente 4: Vivo aqui nos Olivais. Eu: Sempre viveste nos Olivais? Utente 4: Sim senhor. Nasci na Amadora mas vim viver para os Olivais. Eu: E irmãos, tens irmãos? Utente 4: Tenho só um. Eu: Mais velhos, mais novos? Utente 4: O mais velho já faleceu! Eu: Há muitos anos? Utente 4: Não foi assim há muitos anos! 1 de Janeiro. Era o mais velho. E ainda tenho um irmão mais novo. Eu sou o do meio. O meu irmão mais novo se eu lhe pedir um livro ele não se nega. Eu: Dás-te bem com o teu irmão mais novo? Utente 4: Dou! Eu: E os teus pais, sabes quantos anos têm? Utente 4: O meu pai tem 79, não, agora a minha mãe faz no dia 26 de Julho 77, é isso. Eu: Então o teu pai tem 79 e a tua mãe talvez 77…é assim?

A Associação Entrada na Associação Razão pelo qual estão na Associação Satisfação por estarem na Associação

Utentes

Utente 1 Eu: Lembras-te quantos anos tinhas quando vieste para a Associação?

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 421

Utente 1: Vim quando fiz a minha 4.ª classe, tinha 17 anos. Eu: E porque é que achas que estás na Associação? Utente 1: Porque eu não conseguia orientar-me sozinha. Não não conseguia. Eu: O que é que isso significa? Utente 1: A vida está muito difícil, muito difícil. É uma barra muito pesada. Mas eu gostava de falar sobre o futuro. (…) Eu: Ainda há pouco estavas a dizer-me que não te consegues orientar sozinha. O que é que isso quer dizer? Utente 1: Então pois não, nem eu nem ninguém! Nós precisamos de alguém que ajude agente a organizar-se. Que o nosso futuro seja se casar ou outra coisa, nós temos que ter alguém que nos oriente na vida, porque a nossa vida não é brincadeira.

Utente 2

Eu: E tu, sabes há quantos anos estás cá na Associação? Utente 2: Desde que isto abriu. Eu: Lembras-te quantos anos tinhas? Utente 2: Devia ter para ai uns 20 ou 20 e pouco. Ainda nem existia isto aqui nem nada. Não existia o ginásio nem isto aqui. Eu: Sabes porque é que estás na Associação? Utente 2: Eu estou cá por uma simples razão, por causa do Dr. Martins, eu conheço o Dr. Martins há uma data de anos, e o Dr. Martins ainda andava lá em baixo ai na pré profissional em Chelas e daí é que eu comecei a conhecer o Dr. Martins porque ele foi meu vizinho, e a dona Cremilde também no estádio da luz. E daí eu sei que o Dr. Martins tinha sido meu vizinho vivia na outra rua abaixo e um dia ao sair de casa vejo o Dr. Martins a ter uma aula de instrução, já é meu amigo há muitos anos. Estou cá para aprender coisas novas, para ter um futuro melhor uma vida melhor para ter um trabalho qualquer, se o Dr. Martins me desse essa oportunidade eu até gostava imenso, gostava imenso de ir trabalhar lá para fora. Eu: Porque é que achas que nunca foste trabalhar para fora da Associação? Utente 2: Porque nunca me chamaram para ir lá para fora trabalhar (…)E cá estou e sinto-me aqui também à vontade, sinto-me bem com os colegas, eu não posso queixar-me dos meus amigos porque eu sou amigo deles, tenho aqui bastantes amigos e não posso perder nenhum amigo meu porque eu gosto dos meus amigos Gostas de estar cá na Associação? Utente 2: Gosto, gosto não é uma seca.

Utente 3

e para a Associação lembras-te com quantos anos vieste para a Associação? Utente 3: Há, há, foi quando isto abriu, foi quando a Associação abriu. Eu: Lembras-te quantos anos é que tinhas? Utente 3: Era novinha ainda não tinha 50 Eu: Eras novinha? Utente 3: Era Eu: Então e quantos anos tens agora Utente 3? Utente 3: 50 Eu: Então e há quantos anos é que cá estás? Pensa lá comigo Utente 3, se ainda não tinhas 50, 50 tens agora… Utente 3: é, é Eu: se já vieste há muitos anos atrás, tinhas que ter menos de 50 anos. Então quantos anos tinhas, assim mais ou menos, pensa lá? Utente 3: 48 ou 49 Eu: Há então estás cá ai há três anos? Utente 3: Há 4 anos Eu: Então, mas a Associação não abriu há 4 anos! A Associação abriu há 15 anos mais ou menos. Utente 3: Eu vim logo, assim que fiz os testes com o Dr. Martins, até eu e a minha mãe fomos a Almada fazer os testes e depois passei e depois fiquei logo, vim logo quando isto abriu, vim logo. Eu: Eras nova? Utente 3: Era Eu: Já foi há muitos anos? Utente 3: Foi Eu: Então não tinhas quase 50, eras mais nova

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 422

Utente 3: Era Eu: Bem me parecia (risos) (…) Eu: E sabes porque é que estás na Associação? Pensa lá um bocadinho! Eu acho que tu sabes! Utente 3: Sei! Eu: Então será porquê? Utente 3: Porque a minha mãe já está com muita… Eu: O que é que tem a tua mãe! Já tem muita idade é isso! Utente 3: Já! Eu: E mais? Utente 3: E já não me pode aturar! (…) Eu: E na Associação, gostas de estar na Associação? Utente 3: Eu adoro, gosto mais de estar na Associação do que em casa. Em casa aborrece-me, não tenho colegas lá nem nada, aborrece-me.

Utente 4

Eu: E conta-me mais coisas sobre ti? Utente 4: Eu vim para aqui em 93. Eu: E lembras-te quantos anos é que tinhas quando vieste para cá? Utente 4: Haaaa! Isso pode perguntar à minha mãe. Eu: Assim mais ou menos, já foi há muitos anos? Utente 4: Não, não foi há muitos anos, que eu estou cá desde 93 portanto! Ai (suspirou) 93… Eu: De 1993 até 2007 já passaram alguns anos, já cá estás há quantos anos? Utente 4: Já cá estou há 14 anos Eu: Exactamente. Utente 4: 2 de Fevereiro é o dia que eu entrei aqui.

A problemática do Envelhecimento Noção de idade

Utente Noção da idade

Utente 1

Eu: Então conta-me uma coisa. Tu desde que vieste para o Elo achas que estás mais nova ou mais velha? Utente 1: Então estou mais velhinha. Então pois estou, faço anos todos os anos e vou crescendo mais depressa vou ficando mais velhinha. (…) Eu: Então vamos lá falar a sério. Olha para ti e para mim, quem é que tu achas que é mais velho sou eu ou és tu? Utente 1: Sou eu! Eu: E porquê? Utente 1: Porque eu nasci primeiro.

Utente 2

Eu: …, tu já estás há alguns anos na Associação, e agora achas que estás mais novo ou mais velho? Utente 2: Eu acho que ainda estou novo. Eu: Achas que estás mais novo do que quando vieste para a Associação? Utente 2: Acho! Acho que estou um bocadinho mais novo, mas a vida é a vida, aos 50 é que eu não sei como é que vai ser porque já só falta um ano. Eu: Então e tu achas que estás mais novo do que quando tinhas 20 anos? Utente 2: Não sei, talvez, mas ainda não tinha cabelos brancos! Eu: Então? E os cabelos brancos podem ser reflexo de quê? Utente 2: Velhice. Eu: Hum, então se calhar não estás mais novo! Utente 2: Pois não, estou a ficar um bocadinho mais velho.

Utente 3

Eu: Olha lá Utente 3 e agora achas que estás mais nova ou mais velha desde que entraste para a Associação? Utente 3: Mais velha! Eu: Então e porquê?

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 423

Utente 3: Olha, porque tenho mais idade. (…) Eu: Olha lá estávamos a falar sobre se tu eras mais nova ou mais velha. Já me disseste que achas que está mais velha do que quando vieste para cá! Utente 3: É! Eu: Então olha lá para mim e para ti, quem é que tu achas que é mais velho sou eu ou és tu? Utente 3: Tu és mais nova!

Utente 4

Eu: Já passaram alguns anos! E agora sentes-te mais novo ou mais velho do que quando entras-te para a Associação? Utente 4: Sentia-me mais novo! Eu: Quando vieste para cá sentias-te mais novo! Significa que agora sentes-te mais velho? Utente 4: Pois a idade não perdoa?

Envelhecimento

Utente Definição e sinais de envelhecimento

Utente 1

Eu: … eu gostava que tu reflictas sobre quando tu ficares bem velhinha! E vamos deixar o assunto da morte para depois! Utente 1: Está bem! Deus queira eu e a Vera! Eu: Sim todos nós! Mas eu gostava que não estivesses a pensar só na morte, é lógico que quando ficamos bem velhinhos podemos morrer, mas eu não queria que essa fosse a tua preocupação enquanto estamos a conversar. Utente 1: Esta é uma preocupação de todos nós! Ai agente não sabe! Há quem não queira ser velhinha! Eu: Tu não queres ser velhinha? Utente 1: Não o José Vital, mulher! E a mãe queria levá-lo quando ela morresse! Veja lá se ele não está cá para as curvas mulher! Queria levá-lo para o Lar de São Cristóvão, que é o céu mulher! A mãe disse na reunião ao Dr. Martins que o queria levar para o lar de São Cristóvão e ele ainda anda aí. (…) Eu: E o que é que significa ficares mais velhinha! Que diferenças é que tu tens notado? Utente 1: Canseiras! Como diz a bíblia sagrada que a nossa vida dos 60 aos 80 anos e o que é que diz lá? Quem é forte, é canseira e robustez! Eu: E é isso que tu tens sentido? Utente 1: Evidentemente eu e toda a gente! Eu: Então mas vamos pensar só em ti? O que é que tu tens notado de diferente em ti? Utente 1: Então é canseira. Eu: E mais? No teu aspecto exterior? Utente 1: No aspecto exterior está bem, o problema é as pernas, as minhas perninhas, é varizes e as caimbras aqui na anca. E tenho alergias também, ao polén. Estas coisas dantes não tinha nada disto! Quando agente vai para velha é que nos aparece isto tudo! É verdade! Eu: E esses cabelos brancos? Já tens cabelos brancos desde os 18 anos? Utente 1: Não! Mas a minha mãe começou a ter cabelos brancos aos 18 anos, filha! Foi ela que mos pegou! Eu: Óh … pensa lá bem no que me estás a dizer! Como é que a tua mãe te pegou os cabelos brancos se quando ela tinha 18 anos tu ainda não eras nascida! Utente 1: (risos) é que eu já nasci com cabelos brancos! (risos) Eu: Ai que tu estás a enganar-me, tenho que ir pedir umas fotografias tuas! Utente 1: (risos) eu estava a brincar consigo mulher! Utente 1: È o que eu lhe disse, é isto (sussurrou) é esta vida rotineira, não é não gostar mas quanto mais ando a correr mais me doem os ossos. Eu: Então a grande diferença que tu tens notado é sentires-te cansada! Utente 1: Sim! Olha as minhas olheiras! Isto não é normal, eu qualquer dia vou tirar isto. Eu não durmo de noite, penso nisto na Associação, evidentemente.

Utente 2

Eu: Então conta-me lá porque é que estás mais velho? Utente 2: Porque já estou a ficar com cabelos brancos e cada vez que fico com mais já começo a dizer “já estou velho, já estou velho” Eu: Quais foram as mudanças que sentiste nos últimos anos? Utente 2: Só se possa ter havido uma pequena diferença, não sei, mas…não sinto essa diferença, agora sinto é esticões no corpo, sinto assim um esticão como se fosse uma batida

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 424

forte. E no outro dia senti um esticão aqui no braço direito nunca me aconteceu estas coisas estar aqui o braço e ele levantar sozinho. E os diabetes que é a coisa mais triste, não posso comer assim tantos doces. Eu: E olhando-te ao espelho, vês outras diferenças para além dos cabelos brancos? Olha para ti e para mim, quem é que tu achas que é mais novo? Utente 2: (risos e apontou para mim) Eu: Risos, é verdade sou eu! E porque é que achas que eu sou mais nova? Utente 2: Porque se eu sou mais velho a Dr.ª Vera é mais nova. Eu: Mas o que é que te fez dizeres que eu sou mais nova? Utente 2: Porque não tem os cabelos brancos. Eu: E mais… Utente 2: Não tem rugas, não tem nada. Eu: E diz-me! O que é que tu achas que é uma pessoa velha? Utente 2: Uma pessoa que já tem muita idade para se mexer porque lhe custa muito a andar, as dores da terceira idade, esses por exemplo coitados já não se mexem quase nada, muitos que andam com bengala outros com cadeirinhas de rodas há outros que andam também com andarilhos e há ai muita gente com esses problemas eu até já tenho visto muita gente a cegar por causa disso. Eu: E as coisas positivas? Utente 2: Pois também têm muitas coisas positivas, tem que ser mais destacadas também. Eu: Costuma dizer-se que os mais velhos têm a sabedoria da vida! O que achas sobre isso? Utente 2: Pois é os mais velhos têm a sabedoria da vida! Eu: Achas que já aprendeste mais ao longo destes anos? Utente 2: Hum, não, para mim é difícil eu raciocinar uma coisa com a outra, mas há outros raciocínios que eu deveria ter e eu não entendo. Eu: E que conversas são essas? Já conversaste com a tua mãe sobre o envelhecimento? Utente 2: Não. Não

Utente 3

Eu: Mais idade e mais, o que é que tu tens mais? Utente 3: Mais cabelos brancos e com menos juízo (…) Eu: Então porque é que dizes que eu sou mais nova, quais são as nossas diferenças? Utente 3: A sua é porque não tem o cabelo branco e eu tenho. As rugas (risos) Eu: E mais? Sempre usas-te óculos? Utente 3: Não! Não via bem as letras e depois a médica é que disse, eu fui à médica e o oculista disse, tu tens que usar óculos porque tu não vês bem! E não via as letras até as letrinhas pequeninas do jornal não via. Eu: E isso foi há muitos anos? Utente 3: Não foi há pouco tempo, há uns meses Eu: E Achas que essa falta de visão veio com a idade? Utente 3: Sim, é! Eu: E o que é que veio mais com a idade? Como é que tu te sentes? Utente 3: Eu sinto-me bem, não tenho nada, estou para durar e tudo. Eu: E então o que é para ti uma pessoa velha? Utente 3: Uma pessoa velha! É ter cabelos brancos e e e e e andar de bengala e tudo (…) Eu: E mais Utente 3? Utente 3: Eu dantes não usava óculos, só há pouco tempo é que comecei a usar. (…) olha é uma chatice, ficamos velhos e tudo, não havia de haver velhice! Eu: Achas que sim! Achas que a velhice é má? Utente 3: Éééé, não havia de haver velhice! possa! Eu detesto a velhice, eu detesto! Eu: Mas porquê? Utente 3: Porque começamos a sentirmo-nos velhos e tudo! E às vezes…. Eu: Utente 3 já começas a sentir-te velha? Utente 3: Eu já! Eu: O que é que sentes? Utente 3: As pernas a falharem-me e tudo… e e e eu dantes ia sozinha para casa e agora é a minha mãe que tem que me vir buscar, porque dei uma queda e fiquei com a cara toda esmurrada… Eu: E achas que isso tem a ver com a idade?

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 425

Utente 3: Pois! Eu acho que sim!

Utente 4

Eu: Porque é que dizes que a idade não perdoa? Utente 4: Porque agente estamos a ficar mais velhos, os anos vão passando por nós, mas nós temos que andar para frente. Eu: Mas porque é que te sentes mais velho? Utente 4: Silêncio Eu: Se dizes que te sentes mais velho deves ter as tuas razões não queres contar-me? Utente 4: Não é isso… (silêncio) Eu: Não te consegues explicar? Utente 4: Abanou a cabeça fazendo sinal que não consegui explicar Eu: Então vamos fazer a pergunta de outra maneira! Olha para mim e para ti, tu achas que eu sou mais nova ou mais velha do que tu? Utente 4: Muito mais nova! Eu: Muito mais nova porquê? O que é que tu vês em mim que te faz pensar que eu sou mais nova? Utente 4: Porque a idade é mais coisa do que a minha é mais nova! Eu: Mas pensa lá porquê? Utente 4: Ai, Ai… Eu: Compara lá os teus cabelos com os meus? Utente 4: Os meus são brancos e os seus são pintados. Eu: Boa, é verdade os meus cabelos são pintados, mas ainda não tenho cabelos brancos. (…) Utente 4: Eu estou com rugas e a Vera não. Eu: Pois é! E o que é que mudou ai dentro de ti com os anos? Achas que mudou alguma coisa? Utente 4: Se calhar! A saúde é que interessa! Eu: Achas que tens mais problemas ou menos desde o tempo em que vieste para a Associação? Utente 4: Está bem, está bem! Tenho lá uma carta bem escrita, por um médico que me quer operar às hemorróidas. Eu: E tens mais algum problema? Utente 4: Tenho outros também, na coluna, e outra coisa qualquer que está lá uma carta fechada tem que ir ver o que é. Eu: E já tinhas esses problemas quando vieste para a Associação? Utente 4: Já tinha. Eu: E achas que esses problemas agora são maiores ou mais pequenos? Utente 4: São maiores do que o que eu pensava! Eu: Mas também tens coisas boas? Utente 4: Sim tenho muitas coisas boas. Graças a Deus. Há momentos! Há momentos em que estou bem, outros que estou mal! Eu: E em que momentos é que estás bem? Utente 4: Quando estou no sofá a ver televisão ou qualquer coisa, para me distrair. Ouvir rádio um CD, ouvir o que quiser. Eu: E pensa lá comigo, tu quando vieste para a Associação também só estavas bem era sentado a ver televisão! Utente 4: Eu não, nessa altura nunca conseguia estar parado, fazia qualquer coisa, sempre, nunca consegui estar parado! Eu: Então alguma coisa mudou! Achas que mudou alguma coisa? Utente 4: Não sei! (…) Utente 4: Está bem… quando vou daqui do trabalho vou descansar um pouco. Porque agora é muito difícil arranjar lã.

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 426

A família Envelhecimento dos pais

Utente Envelhecimento dos pais

Utente 1

Eu: … andas preocupada porquê? A tua mãe, achas que já está velha? Utente 1: Evidentemente! Está cansada, é uma pessoa muito doente, tens problemas de asma, tem joanetes. Nós temos uma vizinha que foi operada e depois ficou numa cadeirinha de rodas, já viu a minha mãe ia tirar e depois ficava numa cadeirinha de rodas. Tem três buracos na coluna.

Utente 2

Eu: E as pessoas com quem vives, achas que já estão velhas? Utente 2: Estão assim um bocadinho, o meu pai já está, ele agora custa-lhe a andar um bocado, já tem a ver com a idade. Ele vai buscar pão e às vezes vai buscar coisas à minha mãe, eu às vezes também vou lá buscar coisas a eles. Eu: Costumas ajudar a tua mãe? Utente 2: Ajudo a minha mãe, porque ela pede-me para a ir ajudar. Eu: Achas que ela já está velha? Utente 2: Não, acho que ela ainda está nova. Ainda faz o jantar o almoço e essas coisas, o meu pai às vezes ainda consegue fazer isso. Eu: Mas isso não significa que ela ainda está nova? Pensa lá no que me disseste que era uma pessoa velha? Utente 2: Pois, é uma pessoa que já tem uma certa idade, que já não consegue andar no devido ritmo, que tem problemas em vários sítios que tem que os resolver e não os consegue resolver. Que pode chegar aos 100 anos. Eu: E a partir de que idade é que tu achas que uma pessoa já está velha? Utente 2: Ai aos 89 anos, para ai.

Utente 3

Eu: O que é que tem a tua mãe! Já tem muita idade é isso! Utente 3: Já! Eu: E mais? Utente 3: E já não me pode aturar! (…) Eu: E conta-me lá, achas que as pessoas com quem vives, a tua mãe, achas que já está velha? Utente 3: Não! Ainda está nova! Eu: E quantos anos é que ela tem? Utente 3: Tem 70, fez há pouco tempo 70, não está velha! Eu: Não. Utente 3: Naaão! Eu: E tua achas que uma pessoa é velha com que idade? Utente 3: oiten…aaaaaa, 100 anos. Com 100 anos é que uma pessoa é velha! (…) Eu: Então e uma pessoa com 70 anos, não é velha? Utente 3: Naaaaão, é nova! 70 anos! A minha mãe tem 70 e ainda é nova! (…) Eu: Ela ainda consegue fazer muitas coisas? Utente 3: Ainda! Faz a comida, faz a cama dela, lava a loiça passa a ferro, faz tudo em casa e tem máquina de lavar a loiça só a passa por água e mais nada e põe lá na máquina para a lavar, melhor, se ela não tivesse máquina que remédio tinha ela de lavar a loiça. Tem máquina de lavar roupa e máquina de lavar a loiça comprou-a, o que é que ela quer mais, até tem um tanque e tudo lá fora na varanda, o que é que ela quer mais!

Utente 4

Eu: E o que é uma pessoa idosa? Utente 4: Tem muitos anos de vida. Como o meu pai pronto, que vai fazer 79 anos. Eu: Tu achas que o teu pai já está velho? Utente 4: Ele não está assim muito velho. (…) Eu: Está bem. Então pensa lá porque é que achas que o teu pai é velho? Utente 4: Hum (silêncio) Eu: Alguma vez tinhas pensado sobre isto? Utente 4: Não. (…)

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Eu: Olha conta-me outra coisa, e a tua mãe achas que já está velha? Utente 4: A minha mãe com a idade que ela tem! O que é que se espera! Eu: Quais são as diferenças que tu tens notado neles há uns anos para cá? Utente 4: Muita coisa, mas o que é que se há-de fazer, eu nem sei a metade! Eu: Achas que a tua mãe faz as mesmas tarefas como dantes? Utente 4: Faz! Eu: E achas que ela se cansa mais ou menos? Utente 4: Cansaço, não, nunca vi! Eu: E ela tem alguma doença? Utente 4: Hó tem bem poucas!

A morte dos pais

Utente A morte dos pais

Utente 1

Eu: Mas se calhar ele vive com os pais, não é? Utente 1: E quando os pais fecharem os olhos? Quando os pais deixarem de existir, pois é essa é que é a minha preocupação, é por isso é que eu não durmo de noite! Eu: A pensares que a tua mãe pode deixar de existir? Utente 1: A minha mãe e a minha futura sogra e o meu futuro sogro! (…) Eu: E o que é que tu achas que acontece às pessoas bem velhas? Às pessoas idosas àquelas que são muito mais velhas do que tu? Utente 1: Vão para um Lar de São Cristóvão! Toda a gente vai! (…)

Utente 2

Eu: E tu sabes o que é que acontece às pessoas bem velhinhas? Utente 2: Podem morrer Eu: Já pensaste sobre isso? Utente 2: Acenou sim com a cabeça. Também pode um dia acontecer-me a mim! Eu: A ti a mim e a muitas pessoas… Utente 2: Pois a muitas pessoas Eu: Já pensaste que isso pode acontecer primeiro aos teus pais do que a ti? Utente 2: Não, não foi assim muito tempo que eu tivesse a pensar. (…) Eu: O que é que pensas sobre a morte Utente 2? Utente 2: É uma coisa muito triste, para a minha mãe para o meu pai e para nós todos, foi uma perda muito grande para o meu pai.

Utente 3

Utente 3: Ela outro dia disse-me; eu quero é morrer, quero é morrer. E eu disse a ela: nem pense, tu nem penses nisso, ainda há-de viver muitos anos cá! Eu: Porque é que tu achas que ela te disse que queria morrer? Utente 3: Porque estava cansada e tudo, cansada de viver cá. Eu: Achas que ela está cansada? Utente 3: Está! Eu: E o que é que a faz estar cansada? Utente 3: Sei lá! Eu não sei. Eu: Sabes o que é que acontece às pessoas bem velhinhas? Utente 3: Sei. Eu: É o quê? Utente 3: É ficam acamadas e depois não tem força para nada. (…) Utente 3: Quando ele morreu eu estava aqui, eu não soube que ele tinha morrido. Quando o Dr. Martins me disse que ele tinha morrido eu chorei, chorei, chorei, chorei tanto tanto, fartei-me de chorar, era meu pai e eu fartei-me de chorar. Fiquei com pena de não ir ao funeral dele. (chorosa)

Utente 4

Eu: Sabes o que é que acontece às pessoas bem velhinhas? Utente 4: Sei! E o que é que agente há-de fazer? Está mesmo a dizer o que é! Eu: Pois é todos nós vamos morrer um dia! Utente 4: Isso toda a gente sabe. Mas eu não vou para lá! Eu: Então vais para onde? Utente 4: Vou para o céu, mas não vou agora!

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(…) Eu: já pensaste que os teus pais um dia podem morrer antes de ti? Utente 4: Hó! Eu também posso morrer antes deles, ninguém sabe. Eu: Claro que não, ninguém sabe mas a lei natural da vida é que é suposto que os nossos pais morram antes de nós. Utente 4: Claro!

Respostas para o envelhecimento Um olhar sobre o amanhã

Utente Um olhar sobre o amanhã

Utente 1

Eu: E agora pensando em ti, já pensaste no teu dia de amanhã? Utente 1: Então é ir como a minha mãe vai e como foi o meu pai! É o único caminho de Deus! Não conheço mais nenhum! (…) Eu: Mas a … está todos os dias aqui na Associação... Utente 1: Pois é só que o tempo vai passando (...) Eu: E então? Utente 1: E eu quero me casar! Eu: Os anos vão passando e a … quer-se casar! Utente 1: Queria ter um futuro e aqui não tenho futuro! Eu: Aqui na Associação? Utente 1: Sim! Eu: E porque é que diz isso? Utente 1: Eu começo a estar muito cansada desta vida. Sou uma mulher! Então! Se uma pessoa já está cansada deseja de ir para um sítio mais calmo, mais tranquilo não é! (…) Utente 1: Mas eu gostava de falar sobre o futuro. Eu: Gostavas de falar sobre o teu futuro? Utente 1: O que é que o futuro nos reserva? O que é que o futuro nos reserva? É que o nosso futuro não é hoje nem amanhã nem daqui a um ano, é quando Deus estabelecer. Nós já temos um futuro já definido, uma vida definida e o nosso destino e o nosso futuro, os pontos da nossa vida, nós temos que obedecer Deus é que decide a nossa vida. Nada conseguimos fazer contra isso neste mundo. A nossa fé tem que ser como diz o … a fé sem obra é morta. Evidentemente.

Utente 2

Eu: E agora pensando em ti, já pensaste no teu dia de amanhã? Utente 2: Sei lá o que é que vai ser daqui a uns anos. Eu: O que é que achas que vai acontecer? Utente 2: Não sei, eu não sei, hó Dr.ª Vera não sei o que me pode acontecer não faço ideia não tenho assim ideia nenhuma.

Utente 3

Utente 4

Eu: E tu já pensaste como é que vai ser o teu dia de amanhã, quando eles não estiverem cá? Utente 4: Não… e o que é que o hei-de fazer? Eu: E o que é que tu gostavas, para o teu dia de amanhã já pensas-te sobre isso? Utente 4: Não

As suas vontades …

Utente As suas vontades …

Utente 1

Eu: Mas porquê não gostas de vir para a Associação? Utente 1: Eu queria que fosse alternado, não vir sempre para a Associação! Eu: Então conta-me lá como é que tu querias fazer isso? Utente 1: (risos) Então queria casar com o …? Sabe quem é? Eu: Claro que sei quem é o Daniel. E depois iam viver para onde? Utente 1: Então para onde ele mora. (…)

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Eu: E depois nessa altura o que é que tu achas que era melhor para vocês os dois? Utente 1: Eu sinceramente eu acho que era vivermos sozinhos, sem ninguém nos chatear! Viver como o passarinho, filha. Eu: Mas ainda há pouco me disseste que estavas na Associação porque precisavas de apoio. Utente 1: Então mas eu falava com o chefe e o chefe arranjava alguém para me lá ir apoiar em casa, está a perceber. Eu: Então e depois estavas lá em casa sozinha sem fazer nada? Utente 1: Eu! Tinha sempre que fazer em casa! Eu: Então e ficavam lá os dois todo o dia… Utente 1: Em casa arranja-se sempre que fazer, as pessoas como eu como você arranjamos sempre que fazer. (…) Eu: Então deixa ver se eu te percebi! Estavas a dizer-me que gostavas de te casar. Utente 1: Evidentemente! Eu: Mas que precisavas de apoio da Associação por exemplo. Utente 1: Pois evidentemente que preciso de alguém que me oriente, eu e todos! Não sou só eu, são todos no geral mulher! Nós precisamos de ter alguém que nos oriente na vida. Porque se agente não tiver isso nada conseguimos fazer nesta vida, é que é mesmo impossível que agente faça alguma coisa desta vida! (…) Eu: É o que eu te estou a dizer. E quando a tua “mãe” não estiver por perto? Já pensaste sobre isso? O que é que achas que vai acontecer? Utente 1: Oh mulher vou viver com o …! Vou para casa dele. Eu: E tu achas que eras capaz de viver sozinha com o …? Utente 1: Evidentemente se tivesse alguém que me orientasse. Eu: Mas vocês tinham que ter dinheiro como é que faziam isso? Utente 1: Trabalhamos aqui na Associação enquanto pudéssemos. Eu ainda me falta uns aninhos para me reformar é só aos 65. Eu: E tu achas que o dinheiro que aqui ganham chega para todas as despesas? Utente 1: Então vou à assembleia da república e exponho o meu caso! Eu: E achas que eles te davam alguma coisa! Utente 1: Que remédio têm eles, então eles têm dinheiro para os almoços e para os jantares e não têm dinheiro para ajudar os deficientes porquê? Os deficientes não são mais importantes que os almoços e os jantares! Os deficientes deviam vir em primeiro lugar, então! Tem que ser assim, não devemos ser marginalizados eles têm que ajudar, então! Eu: Então era isso que tu gostavas para o teu futuro! Utente 1: Evidentemente! Punham um monitor a apoiar-nos, na nossa casa. Eu: E na Associação, gostas de estar na Associação? Utente 1: Eu já disse ao dr. Martins que queria ir viver sozinha, eu não tenho papas na língua. Eu gosto, não hei-de gostar porquê! Só quando me chateiam é que eu não gosto! (…) Eu: Queres dizer-me mais alguma coisa? Utente 1: Já lhe disse o que é que eu queria. Quem é que não anseia por uma vida melhor quem é que não quer ter filhos. Mas agente temos que nos sentirmos bem com a nossa alma, porque nós temos um futuro e temos que viver um dia de cada vez. Não sabemos o que é que o futuro nos reserva. Eu: E se não fosses viver com o Daniel? Que outra hipótese colocas? Utente 1: Mas ele quer ir viver comigo! Eu: E os pais dele o que é que dizem? Utente 1: Os pais deles que falem com o chefe, com o Dr. Martins e a minha mãe procure o Dr. Martins, isto deve ser discutido na reunião quando eles cá vierem que discutam isso na reunião, agente não tem a culpa de cá estar neste mundo, meu amor! Nem eu nem ele! Então! (…) Eu: E se a Associação um dia tivesse uma resposta para poderes ficar cá? Utente 1: Eu não quero cá ficar já disse ao Dr. ….

Utente 2

Eu: Tudo bem …, não sabes o que te vai acontecer, mas já pensaste o que é que queres para o teu futuro? O que é que queres para ti? Nós estamos todos a ficar mais velhinhos e como tu me disseste começamos a perder capacidades, menos força, menos memória… isto foi o que tu me disseste não foi? Utente 2: Foi

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Eu: Então imagina que nós vamos chegar lá e que tu também vais chegar a velhinho! Utente 2: Pois claro! Eu: Então fala-me lá um bocadinho sobre isso. O que é tu queres para o teu futuro? Utente 2: Para o meu futuro queria que, ter um futuro melhor um futuro bom um futuro agradável Eu: Onde é que tu gostavas de viver no futuro, na ausência da tua mãe e do teu pai? Utente 2: Talvez numa casa lá fora. Aqui não gostava por exemplo. Ter pessoas que me dessem uma ajuda. Eu: Precisavas de alguém que te ajudasse? Utente 2: Pois. Eu: E achas que precisas de ajuda em quê? Utente 2: Em várias coisas como arranjar-me como lavar-me como vestir-me, para me dar um certo apoio. Eu: Isso se calhar era um bocado difícil estares a viver sozinho lá fora e teres alguém sempre para te ajudar! Utente 2: Pois se calhar isso era um bocado difícil, depende daquele sítio onde as pessoas possam vir a ter uma casa alugada por exemplo. Eu: E gostavas de viver sozinho ou com mais alguém? Utente 2: Com mais alguém! Eu: Com quem? Utente 2: Com colegas meus por exemplo Eu: E se isso não fosse possível, tens consciência que essa opção é muito difícil para ti, não tens? Utente 2: Acenou que sim com a cabeça Eu: Não havendo essa opção em que outro sitio e com quem é que gostavas de viver? Utente 2: Pois podia ser difícil. Eu: Imagina que tu tinhas que viver aqui na Associação, como é que gostavas de viver aqui? Utente 2: Ai é que. Eu: Gostavas de viver aqui na Associação? Utente 2: Eu gostava, mas é muito é muita coisa muita gente e depois é uma confusão. Pronto é isso. Eu: Olha então vamos falar sobre outro assunto

Utente 3

Eu: A tua mãe disse-te que queria morrer! E quando a tua “mãe” não estiver por perto? Já pensaste sobre isso? O que é que achas que vai acontecer? Utente 3: Já! Eu já lhe disse, quando ela não estiver por perto sabe o que é que eu vou fazer? Sabe onde é que eu vou ficar? Em casa do, do, do… pois vou para lá! Eu: Então mas os pais do ... também já estão a ficar velhinhos, também podem não estar por perto muito mais anos! Utente 3: (risos) Agente entende-se, agente entende-se, eu e ele entendemo-nos, é! Eu: Então e acham que não precisam de ajuda? Utente 3: Não! Eu, eu não não preciso! Eu: E gostavas de ir viver com ele e deixar Associação? Utente 3: Eu gostava, aliás adorava ir viver com ele e deixar a Associação. Mas ele tem sempre as as, aquelas coisas que ele tem e isso olha. Eu: E tu sentias-te em segurança vivendo sozinha com ele? Utente 3: Eu sentia! Eu: Então e depois como é que vocês vivam, vocês não têm ordenado? Utente 3: Agente trabalhávamos. Eu: Ai era, ias trabalhar para onde? Utente 3: A, lá para, para mulher-a-dias. Se ele não tivesse essas macacoas eu arranjava trabalho, ai isso é que eu arranjava. Eu: Vamos ver essa situação por outro lado, como essa hipótese é um pouco difícil de acontecer, tu percebes porque é difícil não percebes Utente 3? Utente 3: Pois, percebo! Eu: Então vamos pensar na hipótese de tu não poderes ir viver com o ..., porque o ... também vive com os pais dele e a hipótese da tua mãe já não estar cá estar longe, qual era outra solução? Utente 3: Ia viver para ao pé da minha irmã. Para a Suiça. Eu: E tu já pensas-te no teu dia de amanhã? Utente 3: Eu ia, se ela me paga-se a passagem eu ia. Deixava a Associação e ia para lá!

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Eu: Era isso que tu querias? Utente 3: Era, era isso que eu queria. Mas não posso deixar a Associação, porque tenho cá os meus colegas, tenho cá a minha vida o que é que eu ia fazer para lá? Eu: E isso também é importante para ti, não é? Utente 3: Pois. Eu: Então vamos lá medir as coisas! Utente 3: Ou ia para Macau para ao pé do meu irmão, ou então não sei. Eu: Mas pensa lá o que é que era melhor para ti? O que é que tu gostavas mesmo mais? Utente 3: Eu gostava já de ir, sabe para onde para ao pé do meu irmão Zeca. Eu: Ele vive aonde? Utente 3: Em Macau. Eu: E ele tinha condições para ficar contigo? Utente 3: Ele, tinha, tinha condições. Ele até é tão meiguinho para mim tão meiguinho é o irmão que eu gosto mais. Gosto gosto gosto, muito muito muito. Agora os outros, o meu irmão Carlitos até faz pouco de mim. Da outra vez que ele estva lá quando ainda não tinha arranjado casa nem emprego agora já arranjou, já saiu de casa e já foi para casa dele, já levou as coisas dele todas, a planta dele que ele deixou lá em casa está enorme. Eu: E os outros irmãos? Utente 3: Eles não têm paciência nem vagar nem nada. O meu irmão Tó está a trabalhar. (…) Eu: Então significa que um dia gostavas de ir viver com o teu irmão em Macau, se não pudesses ir viver com o .... Utente 3: É, pois se eu não pudesse ir viver com o ..., gostava de ir viver para Macau. (…) Eu: Olha ainda outra coisa, gostas do teu quarto aqui na Associação? Utente 3: Eu gosto, eu gosto do meu quarto aqui na Associação, adoro mais viver aqui do que em casa! Eu: E um dia se tivesses que viver aqui, o que é que tu achavas? Utente 3: Eu achava bem! Eu achava! Os meu irmão … não tem paciência para mim, nãããão, nem o meu irmão …, mais paciência tem o meu irmão … e a minha irmã …. Ela já disse, disse-me assim: porque é que não vens cá para casa uns dias comigo. Eu se a minha mãe não mandasse a passagem para lá eu tinha ido. Gostava de lá ir passar uns dias, uns dias só! Só uns dias! Ela já me disse, que se eu for para lá vai ficar comigo a fazer uns jogos.

Utente 4

Eu: Não pensaste. Então pensa lá comigo! O que é que tu querias para o teu futuro? Utente 4: Queria uma casa! Um bom carro! Eu: Mas tu já sabes que não podes conduzir. Utente 4: Não, mas eu tenho uma carrinha Mercedes, mas quem conduz é o meu pai, só que a carrinha está em meu nome. Eu: Então carro já tens! Mas o que eu te estava a perguntar era: um dia se os teus pais não estiverem cá onde é que tu queres viver? O que é que tu queres para ti? Utente 4: Quero muita saúde e paz e sossego! Eu: E como é que podes ter sossego? Utente 4: É ninguém me chatear a cabeça. Eu: E onde é que tens sossego, em casa ou aqui na Associação? Utente 4: Em casa! Que é onde eu posso ter tudo. Quem me tira o meu quarto tira-me tudo, com certeza que sim. Eu: Então e já imaginaste chegar a casa e não estar lá os teus pais! Utente 4: Tenho sempre gente em casa, o meu pai a minha mãe ou a minha vizinha. Posso ficar com a minha vizinha que é muito minha amiga. Sim senhor. Eu: Estavas a dizer-me que gostavas de ficar a viver em tua casa ou com a tua vizinha. Utente 4: Sim. Eu: E na Associação? Utente 4: Na Associação só para trabalhar. Não venham cá mandar-me areia para os olhos que isto para mim não me serve. Eu: Então e porquê? Utente 4: Porque isto aqui vai tudo pelo ar. Eu: Achas isso? Utente 4: Hó, hó! Já é assim, já temos pouco trabalho! (…) Eu: E o que é que tu pensas fazer quando fores velhinho?

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 432

Utente 4: Ir para um lar. Eu: Ir para um lar, é isso que tu querias? E um lar como? Utente 4: Hó, como há muitos, há muitos lares mas custam muito dinheiro. Eu: Então e se o Lar fosse aqui na Associação, o que é que achas? Utente 4: Pronto se for aqui na Associação, ainda assim em vez de estar a pagar por exemplo 650 € lá fora, a Associação ajudava-me.

Que actividades…

Utente Actividades preventivas do envelhecimento

Utente 1

Eu: Gostas dos trabalhos que fazes? Utente 1: Eu gosto de dobrar guardanapos. Gosto de todos os trabalhos. Eu: Mas quais? É que eu não conheço todos os trabalhos que vocês fazem? Utente 1: Ó filha, então faço fisioterapia, depois natação, só quando estou com o período é que não posso fazer, faço ginástica, hipoterapia, hidroginástica, eu gosto de fazer estas coisas. Eu: E quais é que tu achas que são os mais importantes para ti? Utente 1: São todas, não tenho nenhuma que eu não goste eu gosto de todas. Eu: E imagina daqui a uns anos, gostavas de continuar a fazer o mesmo ou gostavas de fazer outras coisas? Utente 1: Não há! Então o Dr. Martins, vê-se e deseja-se para arranjar coisas e mais coisinhas para os miúdos, não há, mesmo que quisessem não há. Isto está péssimo dona Vera Bento. Eu: Mas imagina que havia mais actividades, tu gostavas de fazer as mesmas ou gostavas de fazer outras? Utente 1: Eu gostava de fazer outras. Se houvesse, se não houvesse olha ficava na mesma. Eu: E que actividades é que tu achas que te iam fazer bem? Utente 1: Todas. Mas eu gostava de ter uma vida mais calma. E ter dinheiro para me poder governar, quem é que não gostava! Mas a vida não dá para isso! È uma tristeza mas é a realidade!

Utente 2

Eu: E dos trabalhos que tu cá fazes quais são os que tu gostas mais? Utente 2: Hoje por exemplo tive que limpar a casa de banho. Eu: Isso é porque estás cá esta semana na residência, e durante o dia, quando vais para o CAO 3, gostas dos trabalhos que fazes? Utente 2: Gosto. Eu: E quais são os trabalhos que tu gostas mais, conta-me lá? Utente 2: Hum, (riso forçado) Eu: Não gostas muito de fazer aqueles trabalhos, é isso? Utente 2: É aqueles é! É que é sempre a mesma coisa, são sempre as mesmas tarefas, devíamos fazer outras, é sempre lavar as casas de banho, por a mesa levantar a mesa por talheres tirar talheres, levantar os pratos e pôr os pratos, lavar a loiça limpar, e essas coisas. Eu: Sim, e no CAO? Utente 2: Hoje nem sequer fui para lá de manhã, tive cá a passar a semana e depois hoje tive à tarde na oficina. Eu: E nos outros dias, há tantos anos que cá estás que já fizeste imensas actividades até já me contaste ainda à bocado que tiveste na carpintaria, que tiveste a fazer de moço de recados, não foi? De todas as actividades que tu tens feito cá no Elo, quais é que tu gostas mais? Utente 2: É o remo. As outras é sempre a mesma coisa. Gosto mais do remo. Eu: Mas quais é que tu achas que são mais importantes para ti? Para tu te sentires bem? Utente 2: É a ginástica também. Gosto do que estou a fazer aqui, levar o lixo, pôr os pratos, faz-me bem para eu me sentir mais independente. Eu: E sem ser aqui na moradia? Utente 2: Lá fora também gosto do artesanato, gosto imenso porque o artesanato é bonito. (…) Eu: Daqui a uns anos, gostavas de continuar a fazer as mesmas actividades ou gostavas de fazer outras coisas?

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Instituto Superior de Serviço Social - ULL 433

Utente 2: Eu gostava de fazer outras. Eu: Que outras actividades? Utente 2: Andar de cavalo que é o que eu gosto, gostava de poder sair de casa e isso assim. Eu: Manteres-te activo, é isso? Utente 2: Sim.

Utente 3

Eu: E gostas das actividades que fazes aqui? Utente 3: Eu gosto. Eu: Gostas! Quais é que tu gostas mais? Utente 3: Gostava de ir andar a cavalo, eu adorava. Eu: E mais, quais é que tu gostas mais, quais é que tu achas que são mais importantes para ti? Utente 3: Para mim, as mais importantes é ir à piscina (…) Utente 3: Eu gostava de ir andar a cavalo, agora como não há não sei quando é que vai haver, sabe quando é que vai voltar a haver? (…) Eu: E o que é que tu gostavas mais. Das coisas que tu fazes quais é que tu achas que te fazem melhor, ao teu corpo, à tua saúde ao teu bem-estar? Utente 3: Ir para a patrícia, ir para o computador, eu adoro ir para o computador, eu acho as mais importantes. Eu: Imagina-te daqui a uns anos, já tens 50 daqui a 10 anos já vais ter 60, achas que vais continuar a querer fazer as mesmas actividades? Utente 3: Gostava de fazer outras. Eu: Gostavas? Utente 3: Gostava. (…) Utente 3: Hum, Hum, ir para a cozinha…

Utente 4

Eu: Olha e gostas das actividades que desenvolves aqui na Associação? Utente 4: Gosto. Eu: E tu queres continuar a fazer estas actividades por muito anos, ou queres mudar de actividades? Utente 4: Eu queria mudar de actividades, porque são sempre as mesmas. Eu: E queres mudar de actividades porque tu também mudaste… Utente 4: Exactamente. Eu: Ou porque te sentes cansado, ou simplesmente querias que fossem diferentes. Utente 4: Queria que fossem diferentes. E depois fico velhinho e já sabe como é! (…) Eu: Imaginando esse lar, o que é que tu gostavas de lá fazer? Utente 4: Essa é uma pergunta muitooooo, é um bocadinho, fico tímido de falar sobre isso, depois logo se vê. (…) Eu: Então e quais são as actividades que são melhores para o teu bem-estar e saúde? Utente 4: São quase todas.

O que é que os faz felizes…

Utente Razões porque são felizes

Utente 1

Eu: …, de tudo o que falámos aqui hoje neste bocadinho, achas que te sentes uma pessoa feliz? Utente 1: Eu sou à vista dos outros sou! Então não é? É verdade e é a realidade agente tem que se conformar perante estas situações, evidentemente. Eu: E quais são as coisas que te fazem feliz? Utente 1: Ninguém sabe o dia de amanhã. Não sei o que é que me reserva. Agente tem que viver um dia de cada vez, a bíblia sagrada diz isso. Eu: Mas ainda não me disseste quais são as coisas que te fazem feliz? Utente 1: Oh mulher é caminhar todos os dias para aqui! Faz-me bem, porque me sinto ocupada, gosto de me sentir útil e ocupada, evidentemente.

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Utente 2

Eu: De tudo o que falámos aqui hoje neste bocadinho, achas que te sentes uma pessoa feliz? Utente 2: Sou, sinto-me feliz! Eu: E quais são as coisas que te fazem feliz? Utente 2: Se calhar é eu conversar com os meus colegas, estar com os meus irmãos os meus pais o meu sobrinho.

Utente 3

Eu: Olha Utente 3, de tudo o que nós falámos aqui hoje e daquilo que falámos na sessão de grupo anterior, tu és uma pessoa feliz? Utente 3: Eu sou, eu sou! Eu: Sim, sentes-te uma pessoa feliz? Utente 3: Eu sinto-me! Eu: E quais são as coisas que te fazem feliz? Utente 3: A primeira coisa é ter saúde. Eu: É! E mais? Utente 3: E ser alegre. A minha avó que deus a tenha era tal e qual como eu, eu hei-de trazer a fotografia da minha avó para a Vera ver. Eu: Tu achas que és alegre? Utente 3: Eu sou! Eu …. Não há mais uma pessoa mais alegre do que eu. Eu sou uma pessoa tão alegre, tão alegre, ando sempre bem disposta, sempre. Sempre quando não me chateiam, quando me chateiam chega-me a mostarda ao nariz e ninguém me atura.

Utente 4

Eu: De tudo o que falámos aqui hoje neste bocadinho, achas que te sentes uma pessoa feliz? Utente 4: Eu não posso ser feliz, uma pessoa feliz não posso ser nunca, porque o que eu tenho é tão grave tão grave, o que eu tenho das hemorróidas e com estes ataques de epilepsia, epilépticos, às vezes dá-me um, tremo tremo fico todo branco, não posso mais… já me deu dois aqui. Eu: Achas que é por isso que não és uma pessoa feliz? Utente 4: Claro que não, eu não posso ser feliz! Eu: Então mas também tens momentos bons em que não tens ataques, por exemplo hoje estás a conversar muito bem comigo. Utente 4: Pois mas! Isto, não sei… Eu: E o que é que poderia fazer-te feliz? Utente 4: Sei lá! Eu: Eu acredito que tu sabes, pensa lá um bocadinho. Nunca te fizeram esta pergunta? Utente 4: Não. Eu: Então estou eu a perguntar-te, podes contar-me o que é que te faria feliz? Utente 4: Eu dou-me bem na água morna, água tépida, água pela cabeça a baixo. Amanhã pelas 7horas txuuuu (imitou o barulho como se estivesse a tomar banho). Eu: E mais coisas… Utente 4: Arranjar uma rapariga!