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1 ANÁLISE COMPARATIVA DA ESTRUTURA DE TRABALHO SCRUM COM OS REQUISITOS DA NORMA ISO9001 Autoria: Carlos Santos da Silva, Marco Polo Corrêa Mafra, Max Fortunato Cohen RESUMO Empresas de tecnologia, que desenvolvem produtos, executam projetos seguindo um processo padronizado com objetivo de estarem aptas ao padrão de qualidade gerido pela norma ISO9001. O diferencial em ter um bom processo, e seguir uma metodologia de desenvolvimento de produto, permitirá que uma empresa lance no mercado produtos no menor tempo e com maior qualidade. Esse tipo de empresa gerencia os projetos de acordo com abordagens recomendadas por órgãos responsáveis pela manutenção dos processos, ou arcabouços, a fim de que haja uma padronização na forma de desenvolver os produtos. Tradicionalmente, as empresas orientadas a projetos utilizam técnicas recomendadas pela abordagem em cascata: analisar, projetar, implementar e testar. Com o advento de novas tecnologias, necessidade de implementação e lançamento mais rápido no mercado, outras frentes de melhorias de processos criaram abordagens diferenciadas para desenvolvimento, como é o caso da abordagem ágil, especificamente a forma de trabalho Scrum. O Scrum é desburocratizado e preza pelo empiricismo conseguindo a simpatia de muitos desenvolvedores que correm contra o tempo na etapa de desenvolvimento de produto. Surge então a necessidade de investigar até que nível de compatibilidade com requisitos da norma de qualidade o Scrum poderá atender para poder seguir como ferramenta adotada por equipes de desenvolvimento dentro das organizações de projetos. O presente artigo tem como objetivo analisar a compatibilidade do Scrum com a norma de qualidade ISO9001. A pesquisa realizada abordou um levantamento bibliográfico sobre a norma ISO9001 e sobre a fundamentação teórica do arcabouço Scrum. Foi realizada uma pesquisa documental em sites oficiais que tratam sobre o tema, na Internet. Em seguida foi feita uma análise comparativa, confrontando itens do Scrum com requisitos da norma de qualidade, com o intuito de avaliar a compatibilidade entre os mesmos. A pesquisa foi ainda do tipo descritiva, onde foram descritos os elementos que compõem os dois objetos do estudo: a ISO9001 e o Scrum. Pode- se concluir que é possível compatibilizar um projeto que utiliza Scrum, visando atender às exigências da norma de qualidade ISO9001. O Scrum não é uma metodologia, nem cobre totalmente todas as etapas de gerenciamento de projetos. Porém é uma forma de trabalho que possibilita a eficácia do projeto. Como o Scrum não exige uso de ferramentas eletrônicas, todo o trabalho pode ser executado de forma cadenciada e rotineira a fim de que com poucos controles manuais. A adaptação do Scrum à ISO9001 pode criar um processo ágil e manter o funcionamento do arcabouço sem modificação, possibilitando a manutenção da certificação de qualidade pelo órgão certificador internacional e evitando a distorção da forma de trabalhar original pregada pelos evangelizadores do Scrum mundo a fora.

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ANÁLISE COMPARATIVA DA ESTRUTURA DE TRABALHO SCRUM COM OS REQUISITOS DA NORMA ISO9001

Autoria: Carlos Santos da Silva, Marco Polo Corrêa Mafra, Max Fortunato Cohen

RESUMO

Empresas de tecnologia, que desenvolvem produtos, executam projetos seguindo um processo padronizado com objetivo de estarem aptas ao padrão de qualidade gerido pela norma ISO9001. O diferencial em ter um bom processo, e seguir uma metodologia de desenvolvimento de produto, permitirá que uma empresa lance no mercado produtos no menor tempo e com maior qualidade. Esse tipo de empresa gerencia os projetos de acordo com abordagens recomendadas por órgãos responsáveis pela manutenção dos processos, ou arcabouços, a fim de que haja uma padronização na forma de desenvolver os produtos. Tradicionalmente, as empresas orientadas a projetos utilizam técnicas recomendadas pela abordagem em cascata: analisar, projetar, implementar e testar. Com o advento de novas tecnologias, necessidade de implementação e lançamento mais rápido no mercado, outras frentes de melhorias de processos criaram abordagens diferenciadas para desenvolvimento, como é o caso da abordagem ágil, especificamente a forma de trabalho Scrum. O Scrum é desburocratizado e preza pelo empiricismo conseguindo a simpatia de muitos desenvolvedores que correm contra o tempo na etapa de desenvolvimento de produto. Surge então a necessidade de investigar até que nível de compatibilidade com requisitos da norma de qualidade o Scrum poderá atender para poder seguir como ferramenta adotada por equipes de desenvolvimento dentro das organizações de projetos. O presente artigo tem como objetivo analisar a compatibilidade do Scrum com a norma de qualidade ISO9001. A pesquisa realizada abordou um levantamento bibliográfico sobre a norma ISO9001 e sobre a fundamentação teórica do arcabouço Scrum. Foi realizada uma pesquisa documental em sites oficiais que tratam sobre o tema, na Internet. Em seguida foi feita uma análise comparativa, confrontando itens do Scrum com requisitos da norma de qualidade, com o intuito de avaliar a compatibilidade entre os mesmos. A pesquisa foi ainda do tipo descritiva, onde foram descritos os elementos que compõem os dois objetos do estudo: a ISO9001 e o Scrum. Pode-se concluir que é possível compatibilizar um projeto que utiliza Scrum, visando atender às exigências da norma de qualidade ISO9001. O Scrum não é uma metodologia, nem cobre totalmente todas as etapas de gerenciamento de projetos. Porém é uma forma de trabalho que possibilita a eficácia do projeto. Como o Scrum não exige uso de ferramentas eletrônicas, todo o trabalho pode ser executado de forma cadenciada e rotineira a fim de que com poucos controles manuais. A adaptação do Scrum à ISO9001 pode criar um processo ágil e manter o funcionamento do arcabouço sem modificação, possibilitando a manutenção da certificação de qualidade pelo órgão certificador internacional e evitando a distorção da forma de trabalhar original pregada pelos evangelizadores do Scrum mundo a fora.

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1. Introdução Uma das variáveis de grande importância para as organizações é a qualidade em seus processos, projetos ou produtos. Com o aumento global da concorrência, tornou-se fundamental para a competitividade, e bom funcionamento das organizações, a implementação de Sistemas de Gestão da Qualidade. Nas indústrias de manufatura a norma de qualidade aplicável é a NBR ISO 9002, com foco em atividades de suporte e produção. Na área de projetos de produtos, a norma de qualidade aplicável é a NBR ISO 9001, com foco em atividades de desenvolvimento de produtos.

Um Instituto de Pesquisa & Desenvolvimento, ou Engenharia de Desenvolvimento de Produto, normalmente trabalha de forma “projetizada” e deve atender às normas de qualidade. Para tanto, utiliza-se da aplicação suas metodologias e processos com respectiva documentação técnica. Busca-se evidenciar todas as fases do processo e seguimento do ciclo de planejamento, desenvolvimento, controle e ações de melhorias.

Áreas de desenvolvimento de produtos, em institutos de pesquisa ou empresas industriais, utilizam diferentes abordagens de gerenciamento de projetos para fazer seus produtos. Abordagens mais tradicionais seguem uma metodologia alinhada com exigências da norma de qualidade. Porém, muitas falhas podem ocorrer na gestão desses projetos que deixam abertura para diferentes interpretações do atendimento aos requisitos. Abordagens de desenvolvimento de produtos mais atuais, que prezam pelo empírico, são preferidas por equipes jovens de desenvolvimento, mas não constituem uma metodologia completa de gerenciamento de projetos compatível com a norma.

Oliveira (2005) ressalta que não é possível alcançar todos os potenciais benefícios no processo do projeto se o sistema de gestão das empresas responsáveis pela sua produção for deixado em segundo plano. O principal benefício de se implantar um Sistema de Gestão da Qualidade – SGQ (certificado ou não) é que este auxilia na organização e administração de todos os processos de uma Empresa. Um sistema documentado contribui para assegurar que as pessoas na organização não estejam apenas “fazendo o seu trabalho”, mas que estejam fazendo o trabalho do jeito que a organização deseja que o trabalho seja feito (SALGADO, 2006).

De acordo com Boehm (2006), a partir de 2000 estamos vivendo uma tendência para o desenvolvimento ágil de aplicações devido a um ritmo acelerado de mudanças e inovações na tecnologia da informação, em organizações e no ambiente de negócios. Seguindo tal pensamento, deve-se buscar encontrar formas mais eficientes de se gerenciar projetos. Uma abordagem alternativa é o arcabouço Ágil – o Scrum. Mas, é possível aliar os requisitos da norma ISO com o Scrum?

Diante de tal questionamento, tem-se o objetivo deste artigo com sendo o de analisar comparativamente a estrutura de trabalho Scrum com os requisitos da norma ISO9001. Buscou-se realizar uma pesquisa do tipo bibliográfica, comparativa, documental e descritiva.

Primeiramente foi feito um levantamento bibliográfico sobre a norma ISO9001 e sobre a fundamentação teórica do arcabouço Scrum, através da leitura de livros e artigos científicos. Foi realizada uma pesquisa documental em sites oficiais que tratam sobre o tema, na Internet. Em seguida foi feita uma análise comparativa, confrontando itens do Scrum com requisitos da norma de qualidade, com o intuito de avaliar a compatibilidade entre os mesmos. Por fim, pode-se afirmar que esta é também uma pesquisa descritiva, tendo em vista que foram descritas os elementos que compõem os dois objetos do estudo – a ISO e o Scrum.

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Este trabalho está organizado da seguinte maneira: a Seção 2 descreve as principais características da norma ISO9001; a Seção 3 descreve os principais elementos do arcabouço Scrum; na Seção 4 é feita uma análise comparativa entre o Scrum e os requisitos da ISO9001; Finalmente, a Seção 5 apresenta as conclusões deste trabalho.

2. A norma ISO 9001 A Organização Internacional de Normalização, popularmente conhecida como ISO, é o maior desenvolvedor de normas internacionais, atualmente englobando instituições padronizadoras de 175 países. Sua sede é em Genebra, na Suíça. Foi criada em 1947 com o objetivo de facilitar a coordenação internacional e a unificação de padrões técnicos, tendo publicado seu primeiro padrão em 1951. Atualmente está ligada também à normalização de padrões de gestão.

Zacharias (2001) descreve que a primeira norma relativa à Sistema da Qualidade foi a Mil-Q-9858 editada em 1963 pelo Departamento de Defesa dos EUA. Em 1970 foi emitido o documento 10 CFK 50-B pela comissão de Energia Atômica Americana, que fundamentou o conceito de Sistema de Garantia da Qualidade. Em 1987 surgiu uma nova família de normas, a ISO 9000, um conjunto de normas e diretrizes internacionais para sistemas de gestão da qualidade, que ganhou rapidamente a atenção de uma audiência muito maior que suas predecessoras porque se referia a toda a comunidade empresarial, e não só aos engenheiros.

Cada país membro da ISO possui uma entidade nacional como sua representante junto aos comitês da ISO, sendo representada no Brasil pela ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas).

O INMETRO (Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial) é a entidade responsável para determinar as diretrizes que os OCCs (Organismos Credenciados de Certificação) seguem ao emitir certificados ISO para entidades corporativas. Os OCCs são encarregados da responsabilidade para interpretar a norma ISO 9001, avaliar sua aplicação às situações de negócio da companhia e determinar se o sistema de qualidade da empresa está em conformidade com a norma, para posterior certificação.

Até o final de dezembro de 2007, pelo menos 951.486 certificados ISO 9001:2000 haviam sido emitidos em 175 países e economias.

A NBR ISO 9001:2008 faz parte da nova família de normas da série 9000 publicada no Brasil em dezembro de 2008, que é composta por três normas, com objetivos e propósitos distintos, conforme apresentado a seguir:

NBR ISO 9000: Sistemas de Gestão da Qualidade – Fundamentos e vocabulário: Define os principais conceitos utilizados nas normas da série NBR ISO 9000;

NBR ISO 9001: Sistemas de Gestão da Qualidade – Requisitos: Define os requisitos básicos para a implantação de um sistema de gestão da qualidade. Essa é a norma de certificação;

NBR ISO 9004: Sistemas de Gestão da Qualidade – Diretrizes para Melhoria de Desempenho: Fornece diretrizes para a melhoria do desempenho de um sistema de gestão da qualidade e determina a extensão de cada um de seus elementos. Juntamente com a NBR ISO 9001 forma o par consistente.

Cada uma das normas, como pode ser observado, possui objetivos específicos e tem sido utilizada pelas organizações para apoiar a implantação de sistemas de gestão da qualidade ou

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somente para fornecer a base conceitual para a implantação de melhores práticas relacionadas à melhoria da qualidade.

Apesar da série ISO referir-se a Gestão da Qualidade, todos os que a implantaram e utilizaram, conseguiram melhorias significativas em suas empresas, na produtividade, custos e mesmo no clima organizacional com responsabilidades e tarefas melhor definidas e controladas (FERREIRA, 2001).

A NBR ISO 9001:2005 possui oito princípios que podem ser utilizados pela alta direção para conduzir a organização à melhoria do seu desempenho. A seguir, esses princípios são apresentados, tendo sido extraídos na íntegra da NBR ISO 9000 publicada em dezembro de 2005 (ABNT, 2005):

Foco no cliente: Organizações dependem de seus clientes, portanto é recomendável que atendam às necessidades atuais e futuras do cliente, os seus requisitos e procurem exceder as suas expectativas.

Liderança: Líderes estabelecem a unidade de propósito e o rumo da organização. Convém que se crie e mantenha um ambiente interno, no qual as pessoas possam estar totalmente envolvidas no propósito de atingir os objetivos da organização.

Envolvimento de pessoas: Pessoas de todos os níveis são a essência de uma organização, e seu total envolvimento possibilita que as suas habilidades sejam usadas para o benefício da organização.

Abordagem de processo: Um resultado desejado é alcançado mais eficientemente quando as atividades e os recursos relacionados são gerenciados como um processo.

Abordagem sistêmica para a gestão: Identificar, entender e gerenciar os processos inter-relacionados como um sistema contribui para a eficácia e eficiência da organização no sentido de esta atingir os seus objetivos.

Melhoria contínua: Convém que a melhoria contínua do desempenho global da organização seja seu objetivo permanente.

Abordagem factual para tomada de decisão: Decisões eficazes são baseadas na análise de dados e informações.

Benefícios mútuos nas relações com os fornecedores: Uma organização e seus fornecedores são interdependentes, e uma relação de benefícios mútuos aumenta a capacidade de ambos de agregar valor.

3. O arcabouço Scrum A Gestão de Projetos Ágil surgiu a partir do Manifesto para Desenvolvimento Ágil de Softwares (HIGHSMITH, 2004), lançado em 2001. A essência dessa linha de desenvolvimento é a busca por métodos e técnicas de Gerenciamento de Projetos mais simples, que ofereçam maior flexibilidade com relação às alterações e maior foco no cliente. A meta é alcançar maior velocidade na tomada de decisões, tornando-se ideal em ambientes inovadores, uma vez que permite adaptar o processo, absorver mudanças em requisitos e escopo do produto (ANGIONI, 2006).

Boehm (2006) cita que no final dos anos 90 surgiram vários métodos ágeis, entre eles: Adaptive Software Development, Crystal, Dynamic Systems Development, eXtreme Programming (XP), Feature Driven Development (FDD) e Scrum. Todos esses métodos

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empregam princípios ágeis, tais como ciclos iterativos, entrega rápida de software funcionando e simplicidade, como definido no Manifesto para Desenvolvimento Ágil (BECK et al., 2001). A essência desse movimento é a definição de novo enfoque de desenvolvimento de software, calcado na agilidade, na flexibilidade, nas habilidades de comunicação e na capacidade de oferecer novos produtos e serviços de valor ao mercado, em curtos períodos de tempo (HIGHSMITH, 2004).

O Scrum é uma abordagem enxuta de desenvolvimento de produtos. Este arcabouço foi desenvolvido por Jeff Sutherland em 1993, baseado num artigo de Takeuchi & Nonaka (1986) sobre as vantagens dos pequenos times no desenvolvimento de produtos. Originalmente, seu foco era somente o desenvolvimento de software, embora hoje seja aplicado ao desenvolvimento de produtos de maneira geral. Apesar de ser uma abordagem nova, a utilização do Scrum tem aumentado bastante nos últimos anos, impulsionados pelas recentes pesquisas que mostram que seu uso aumenta a satisfação dos clientes e diminui o atraso em projetos em relação aos métodos tradicionais (MANN & MAURER, 2005).

O arcabouço, no jargão técnico “framework”, Scrum é uma prática Ágil que pode ser aplicada a qualquer tipo de desenvolvimento, onde haja no mínimo possibilidade de formar equipes de sete pessoas, com variação de mais ou menos duas pessoas. O Scrum vem do termo em inglês atribuído ao time de rúgbi onde todos juntos trabalham em prol de um mesmo objetivo.

Enquanto as metodologias tradicionais de desenvolvimento mantêm o foco na geração de documentação sobre o projeto e no cumprimento rígido de processos, a proposta ágil é concentrar as atenções no desenvolvimento em si e nas relações entre os participantes (MUNDIN et al., 2002). A fase de planejamento inicial é reduzida para que os desenvolvedores possam se concentrar em cada iteração em vez de traçar diretrizes para o projeto como um todo.

O Scrum é composto por cerimônias, papéis e artefatos. Deve obedecer a uma seqüência de execução para que proporcione sucesso ao projeto. O framework é baseado em iterações compostas por períodos conhecidos como Sprints que variam entre duas a seis semanas. A palavra Sprint vem do termo em inglês que significa corrida ou tomada de tempo, denotando exatamente que em cada período iterativo a equipe deve fazer o melhor de si para entregar o máximo possível do que foi comprometido.

A seguir é feita uma breve explanação dos itens que compõem o Scrum, conforme determina a Scrum Alliance, organização que rege o Scrum mundialmente, bem como certifica pessoas que se especializam na execução de projetos utilizando tal abordagem.

3.1 Papéis

Os membros que utilizam o arcabouço precisam atuar conforme os papéis designados durante a etapa de desenvolvimento. Os papéis podem ser:

– Scrum Master (SM) é o líder de pessoas, responsável por fazer o arcabouço funcionar. Resolve os impedimentos levantados pela equipe, que possam atrapalhar a entrega do Sprint.

– Product Owner (PO) é o líder técnico do produto a ser entregue. É a pessoa que representa o cliente ou pode ser o próprio cliente, que sabe o que deseja receber e avalia as entregas parciais e entrega final do projeto. O PO é o responsável por manter a lista de funcionalidades (Product Backlog) atualizada e priorizada, calcular e acompanhar o Retorno de Investimento do projeto.

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– Scrum Team (ST) é a equipe auto-gerenciável e responsável por planejar, desenvolver e entregar as partes do produto de acordo com as prioridades estabelecidas pelo Product Owner, apontando os problemas ou impedimentos em maior escala que não consigam ser resolvidos para que o Scrum Master possa remover.

3.2 Artefatos

Os artefatos do Scrum são essenciais para manter a compatibilidade com a qualidade e compromisso de entregas. São artefatos:

– Product Backlog é uma lista de funcionalidades do produto priorizada por valor de negócio e estimada pela equipe em forma de pontos. Essa lista é mantida pelo Product Owner.

– Sprint Backlog é um painel contendo as funcionalidades selecionadas para entrega num determinado Sprint com respectivas tarefas planejadas em forma de adesivos do tipo post-it.

– Burndown Chart é um gráfico que mostra a evolução do produto ao longo do projeto ou de suas funcionalidades durante o sprint.

– Impediment Backlog é uma lista ou painel contendo os impedimentos levantados pela equipe nas reuniões diárias, com acompanhamento de progresso e solução. Essa lista é mantida pelo Scrum Master.

3.3 Cerimônias As cerimônias executadas no Scrum são muito importantes para que possa ocorrer o ciclo PDCA (Planejar, Executar, Controlar e Agir). São as seguintes:

– Sprint Planning1: primeiro planejamento da iteração. Nessa reunião a equipe planeja “o que” se comprometerá a fazer em um período iterativo juntamente ao cliente, representado pelo PO. São selecionados da lista de funcionalidades, os itens que serão trabalhados e entregues no final do sprint.

– Sprint Planning2: segundo planejamento da iteração. Nessa reunião a equipe planeja “como” farão as tarefas de cada funcionalidade no período do sprint.

– Sprint Review: revisão da iteração. Nessa reunião a equipe demonstra para o PO e convidados externos as funcionalidades executadas durante o Sprint.

– Sprint Retrospective: retrospectiva da iteração. Nessa reunião a equipe analisa criticamente o processo que foi executado durante o Sprint e sugere melhorias para as futuras iterações.

– Daily Scrum Meeting: reunião diária da iteração. Nessa reunião, com duração máxima recomendada de quinze minutos, a equipe se comunica mutuamente informando o que fez no período de um dia, o que fará no período de um dia e o que poderá atrapalhar o desempenho de seu trabalho para entregar a funcionalidade.

– Estimation Meeting: reunião de estimativa. Nessa reunião a equipe estima o tamanho (em pontos) de cada funcionalidade que será trabalhada ao longo do projeto. A cada final de iteração refina-se a pontuação a lista, pois a equipe vai se conscientizando melhor da complexidade das funcionalidades e tarefas planejadas. Essa pontuação da

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estimativa fica registrada no Product Backlog e mantida pelo Product Owner. As reuniões de estimativa podem ocorrer mais de uma vez durante o Sprint, sempre que houver necessidade de mensurar em pontos ou refinar a lista de funcionalidades.

Cada uma das cerimônias tem um responsável. A condução da reunião de estimativa é feita pelo Product Owner, a primeira reunião de planejamento é conduzida pelo Product Owner, a segunda reunião de planejamento é conduzida pelo Scrum Master, a reunião de revisão é conduzida pelo Product Owner, a reunião de retrospectiva é conduzida pelo Scrum Master e as reuniões diárias são conduzidas pela própria equipe auto-gerenciável.

Na figura 1 é mostrada a estrutura do Scrum, onde em uma iteração deve ocorrer no mínimo uma reunião de estimativa (EM), primeira reunião de planejamento (SP1), segunda reunião de planejamento (SP2), execução dos trabalhos (WIP), reunião de revisão (SRV) e reunião de retrospectiva (SRT).

SP1SP1

SP2SP2

WIPWIP

SRVSRV

SRTSRT

EM

EM EM...

SP1SP1

SP2SP2

WIPWIP

SRVSRV

SRTSRT

EM

EM EM...

Figura 1 – Cerimônias do Sprint

Fonte: Próprio autor.

4. Análise Comparativa ISO 9001 x Scrum O projeto é um esforço temporário e único para o fornecimento de um produto ou serviço. Este esforço é temporário, pois possui ao menos uma data de início e uma data de término bem definidos. É único, porque representa o fornecimento de um produto ou serviço nunca feito antes e que nunca mais será fornecido de forma idêntica (PMBoK, 2004).

O gerenciamento de projetos é o ramo da administração utilizado para desenvolver um projeto, dentro do seu ciclo de vida (PRADO, 1998). Processo de gerenciamento de projetos na organização precisa ser padronizado, pois a norma de qualidade requer evidências de execução das etapas e domínio sobre ações a serem tomadas visando garantir a qualidade do produto.

Como o Scrum é bem aceito pelos desenvolvedores de software, por passar a impressão de desburocratização, foi visto como oportunidade para adaptá-lo no arcabouço de gerenciamento de projetos, aproveitando todos os atributos positivos que vão de encontro ao que é mais requerido na norma ISO 9001, ou seja, atender ao ciclo PDCA.

O Ciclo PDCA consiste em uma metodologia que tem com função auxiliar no diagnóstico, analisar e fornecer o prognóstico de problemas de uma organização, sendo muito útil na solução de problemas. Poucas ferramentas se mostram tão efetivas na busca da melhoria contínua quanto o Ciclo PDCA, já que este conduz a ações sistemáticas agilizando a obtenção de melhores resultados visando garantir a sobrevivência e crescimento das empresas (QUINQUIOLO, 2002). Como a utilização do Ciclo PDCA está ligada ao conceito de

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processo. É importante que todos, os envolvidos em sua implementação, entendam a visão processual como a identificação dos insumos, clientes e saídas destes, além dos relacionamentos internos existentes na organização.

O Scrum é executado na camada de gerenciamento de projetos, especificamente mais concentrado nas etapas de Planejamento e Execução.

Na figura 2 é possível observar que podem ocorrer diversas iterações em um projeto com abordagem ágil, começando na fase de planejamento e se estendendo por toda a fase de execução. Em cada iteração, ou Sprint, acontece um planejamento, execução e teste. Enquanto não for possível entregar parcialmente um produto demonstrável ao cliente serão executadas iterações.

SP1SP1

SP2SP2

WIPWIP

SRVSRV

SRTSRT

EM

EM

EM

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SP1SP1

SP2SP2

WIPWIP

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Sprint # 1 Sprint # 2 Sprint # 3 Sprint # N

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EM

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SRVSRV

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EM

EM

EM

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EM

EM

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EM

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SP1SP1

SP2SP2

WIPWIP

SRVSRV

SRTSRT

EM

EM

EM

.

.

.

Sprint # 1 Sprint # 2 Sprint # 3 Sprint # N

Conceito Plano Execução Suporte

Figura 2 – As iterações nas fases do projeto

Fonte: Próprio autor.

Ao ser observadas as atividades dentro do ciclo iterativo do Scrum, é possível verificar que para cada período ocorre o planejamento, execução, controle e ações de melhoria, o que é o núcleo da ISO9001: o PDCA, conforme pode ser visualizado na figura 3. Cada cerimônia está compatível com o que é exigido pela ISO em termos que fechamento do ciclo de melhoria contínua em projetos.

PP

PPDD

CC

AA

PP

PPDD

CC

AA

Figura 3 – Ciclo PDCA presente em cada iteração (Sprint) no arcabouço Scrum

Fonte: Próprio autor

Ao acompanhar um processo baseado em Scrum, poderá ser observado que o PCDA não ocorre somente no período do Sprint, mas ocorre também diariamente. Isso é decorrente do acontecimento de cada reunião diária (Daily Scrum) de 15 minutos a equipe presta conta do

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que executou, planeja o que executará, controla os problemas evitando atrasos de entregas e sugere ações para que não aconteça repetição de problemas, melhorando assim o processo. Portanto, significa que na parte “D” do Sprint ocorre outro PDCA.

Pode-se associar o sistema de qualidade aplicado a uma empresa projetizada conforme camadas hierárquicas que descrevem a compatibilidade entre o Scrum e a ISO9001.

Figura 4 – Compatibilidade do Scrum com a ISO9001

Fonte: Próprio autor.

Analisando a figura 4, a ISO9001 é o principal objetivo de compatibilidade e padronização entre os diversos processos de uma empresa. Cada área escreve seus procedimentos explicando como ocorre o mapeamento de processo, documentos, instruções de trabalho e rotas de aprovações. Na camada de instrução de trabalho, temos o Scrum no mesmo nível. Os registros do framework são documentados através das minutas das cerimônias e artefatos. Dessa forma ficam sincronizados os passos necessários para compatibilidade com a norma de qualidade e a abordagem utilizada durante o desenvolvimento do produto.

No Quadro 1 buscou-se dispor os requisitos da norma ISO com as cerimônias e artefatos em cada fase de projeto. Observa-se, então, que o alinhamento de tais elementos é possível.

Requisito da norma ISO Conceito Planejamento Execução

7.1. Planejamento da realização do produto

Processo de planejamento da realização do produto

Processo de desenvolvimento da realização do produto

Plano de Projeto

7.2. Processos relacionados a clientes

7.2.1. Determinação de requisitos relacionados ao produto 7.2.2. Análise crítica dos requisitos relacionados ao produto

7.2.3. Comunicação com o cliente sobre os requisitos do produto

Project Charter

7.2. Processos relacionados a clientes

7.2.2. Análise crítica dos requisitos Product

Backlog

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relacionados ao produto

7.2. Processos relacionados a clientes

7.2.3. Comunicação com o cliente sobre os requisitos do produto

Sprint Review

7.3. Controle de desenvolvimento do produto

7.3.1.planejamento, projeto e desenvolvimento Plano de

Projeto

7.3. Controle de desenvolvimento do produto

7.3.2. Definição das entradas de projeto e desenvolvimento

Plano de Projeto

Sprint Planning1

7.3. Controle de desenvolvimento do produto

7.3.3. Geração das saídas do projeto e desenvolvimento

Sprint

Planning1

Sprint Review

7.3. Controle de desenvolvimento do produto

7.3.4. Revisão da realização projeto e desenvolvimento

Sprint Review

Sprint Retrospective

7.3. Controle de desenvolvimento do produto

7.3.5. Realizar verificação do projeto e desenvolvimento

Sprint Review

7.3. Controle de desenvolvimento do produto

7.3.6. Conduzir a validação do projeto e desenvolvimento

Sprint Review

7.3. Controle de desenvolvimento do produto

7.3.7. Gerenciamento das mudanças no projeto e desenvolvimento

Product Backlog

Quadro 1 – Cerimônias e artefatos do Scrum alinhados aos requisitos da norma ISO9001

Fonte: Próprio autor.

Podemos observar na figura 5 as quatro fases do gerenciamento de projetos com abordagem ágil implementada num instituto de pesquisa: Proposta, Planejamento, Execução e Encerramento. Para cada uma das fases foram destacados os principais documentos do arcabouço Scrum e do processo de gerenciamento de projetos, relacionados com os itens de requisitos da norma.

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Figura 5 – Fases do projeto com Scrum atendendo à ISO9001

Fonte: Próprio autor.

Na camada de gerenciamento de projetos, o conteúdo dos documentos Project Charter (na fase Proposta) e Plano de Projeto (na fase Planejamento) atendem aos requisitos:

1. Processos relacionados a clientes,

2. Planejamento da realização do produto, e

3. Controle de desenvolvimento do produto.

Na fase Execução, o arcabouço Scrum atende aos subitens dos requisitos:

1. Análise crítica dos requisitos relacionados ao produto e gerenciamento das mudanças no projeto e desenvolvimento,

2. Definição das entradas de projeto e desenvolvimento e geração das saídas do projeto e desenvolvimento,

3. Revisão da realização projeto e desenvolvimento,

4. Realização da verificação do projeto e desenvolvimento,

5. Condução da validação do projeto e desenvolvimento, e

6. Comunicação com o cliente sobre os requisitos do produto.

Na fase Encerramento a norma é atendida pelo requisito condução da validação do projeto e desenvolvimento. Dessa forma, o arcabouço sincroniza com os requisitos 7.x da norma ISO9001, que se refere ao desenvolvimento de produto. Para cada coluna de requisito da norma (Quadro 1) há um documento correspondente do Scrum na camada de gerenciamento

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de projeto que permite compatibilizar assim o ciclo PDCA do Scrum com o da norma de qualidade.

5. Considerações Finais Este artigo teve como objetivo analisar comparativamente a estrutura de trabalho Scrum com os requisitos da norma ISO9001. Buscou-se, através de uma pesquisa bibliográfica, comparativa, documental e descritiva, atingir tal objetivo. Feita uma análise comparativa dos dois objetos estudados pode-se concluir que é possível compatibilizar um projeto que utiliza Scrum, visando atender às exigências da norma de qualidade ISO9001.

O Scrum não é uma metodologia, nem cobre totalmente todas as etapas de gerenciamento de projetos. Porém é uma forma de trabalho que possibilita a eficácia do projeto através da entrega parcial do produto antevendo os problemas, antecipando a satisfação do cliente, agindo preventivamente ou corretivamente no processo e fechando o ciclo PDCA, permitindo a compatibilização com a norma de qualidade relacionada a fazer produtos.

Como o Scrum não exige uso de ferramentas eletrônicas, todo o trabalho pode ser executado de forma cadenciada e rotineira a fim de que com poucos controles manuais. Atua sem interferir burocraticamente no trabalho operacional da equipe, de modo que possa ser documentado, controlado, melhorado e planejado durante todo o ciclo do projeto. Isso é o que a norma de qualidade ISO9001 pede, ou seja, nada precisa ser criado para se adequar à norma. A norma pode ser atendida apenas com o PDCA executando o arcabouço da forma que foi concebido, com poucas formalizações de artefatos e cerimônias.

Quando da aplicação do Scrum, os documentos gerados nas cerimônias em forma de minutas e artefatos devem ser padronizados, de forma a atender os requisitos da norma. Todo o conteúdo dos documentos das fases de gerenciamento de projeto (proposta, planejamento, execução e encerramento) devem ser analisados minuciosamente e readequados de forma a responder às perguntas do auditor relacionadas com o ciclo PDCA. Na fase de execução, os documentos do Scrum (minutas e artefatos) servem como evidências de planejamento, desenvolvimento, controle e ações de melhorias com repetidos períodos durante todo o ciclo do projeto, permitindo assim ajustar o processo no decorrer do desenvolvimento e garantir a entrega do produto no tempo e com qualidade.

Esta proposta de adaptação do Scrum à ISO9001 pode criar um processo ágil e manter o funcionamento do arcabouço sem modificação, possibilitando a manutenção da certificação de qualidade pelo órgão certificador internacional e evitando a distorção da forma de trabalhar original pregada pelos evangelizadores do Scrum mundo a fora.

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