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1 DIREITO COMUNITÁRIO Introdução – AS ORIGENS DA IDEIA EUROPEIA 1. Noção de Europa É frequente situar em épocas recuadas da história o momento em que, pela primeira vez, se terá pressentido a existência de elementos que, contribuindo para definir um particular espaço físico e para individualuzar os povos da Europa, permitiram a estes arrogar-se a qualidade de membros de uma distinta família humana. A tomada de consciência da realidade europeia exigiu, porém, a superação de poderosos factores de dissociação de populações que, à partida, se achavam profundamente separadas pelas diferenças de origem, pela língua, pela cultura, pelo grau de civilização. Em primeiro lugar,a própria irregularidade do contorno geográfico e a duvidosa autonomia da Europa não se prestam a uma caracterização geográfica muito precisa, havendo quem apresente a Europa como um simples promontório da Ásia, enquanto outros a vêm estreitamente ligada à África. Ora, esta noção de elasticidade geográfica, com todos os elementos de diversificação de condições de vida que daí naturalmete decorrem, não podia favorecer uma satisfatória definição territorial da Europa. Analogamente, quando nos detemos a examinar a diversidade étnica e o antagonismo de interesses dos diversos povos que ao longo dos sucessivos

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DIREITO COMUNITÁRIO

Introdução – AS ORIGENS DA IDEIA EUROPEIA

1. Noção de Europa

É frequente situar em épocas recuadas da história o momento em que, pela primeira vez, se terá pressentido a existência de elementos que, contribuindo para definir um particular espaço físico e para individualuzar os povos da Europa, permitiram a estes arrogar-se a qualidade de membros de uma distinta família humana.

A tomada de consciência da realidade europeia exigiu, porém, a superação de poderosos factores de dissociação de populações que, à partida, se achavam profundamente separadas pelas diferenças de origem, pela língua, pela cultura, pelo grau de civilização.

Em primeiro lugar,a própria irregularidade do contorno geográfico e a duvidosa autonomia da Europa não se prestam a uma caracterização geográfica muito precisa, havendo quem apresente a Europa como um simples promontório da Ásia, enquanto outros a vêm estreitamente ligada à África. Ora, esta noção de elasticidade geográfica, com todos os elementos de diversificação de condições de vida que daí naturalmete decorrem, não podia favorecer uma satisfatória definição territorial da Europa.

Analogamente, quando nos detemos a examinar a diversidade étnica e o antagonismo de interesses dos diversos povos que ao longo dos sucessivos períodos históricos se foram fixando no continente europeu, não deparamos com qualquer factor de unidade (salvo, a partir de certa época histórica, a comunhão de crença religiosa) cuja presença tivesse podido desempenhar, à semelhança do que ocorreu noutros espaços territoriais, uma acção catalisadora de múltiplos factores de desagregação.

É bem conhecida como tal acção catalisadora foi no séc. XIX desempenhada no continente americano, tal como no séc. XX em África, pelo desejo comum da libertação do domínio ou da simples ingerência europeia – traduzido, pelo que toca ao Novo Mundo, pela doutrina Monroviana da «América para os americanos» e no Continente Negro por um vasto movimento

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2. Uma comunidade de civilização

A comunidade de cultura e de civilização e a unidade espiritual em que a Europa viria a exprimir-se, superando a falta de unidade geográfica e a diversidade dos povos que ao longo dos tempos nela se instalaram, é, porém, antes de mais e fundamentalmente, obra de Roma.

É certo que a tradição europeia deve o essencial do seu conteúdo tanto às instituições jurídicas e sociais romanas como ao espólio helénico e ao ideário judaico-cristão; mas Roma, não se limitando a justapor essas diversas contribuições, soube realizar a síntese dos seus elementos fundamentrais, transmitindo-a depois aos povos que submetera ao seu domínio e conquistara para a sua civilização.

A ulterior incursão no Império, centrado sobre o Mediterrâneo e já então periclitante (que corria risco, perigo), de elementos culturais de origem germânica, viria a influenciar fortemente a definição do que mais tarde se convenciou denominar civilização europeia – uma civilização cuja essência é o resultado da amálgama da tradição cultural da antiguidade greco-romana e do cristianismo, do mundo mediterrânico e dos povos germânicos.

3. A Europa sob o domínio da Roma Imperial

A adesão de toda a Europa – desde a Lusitânia, sobre o Atlântico, até aos povos acantonados a leste do Elba, desde a Grécia à Britânia – ao modelo romano de cultura e de civilização, permitiu que num vasto espaço geográfico, sensivelmente coincidente com a Europa Ocidental e Central dos nossos diais, se desenvolvessem sociedades humanas que embora etnicamente distintas, se subordinaram a leis e instituições comuns. Surge, assim, uma primeira noção

É bem conhecida como tal acção catalisadora foi no séc. XIX desempenhada no continente americano, tal como no séc. XX em África, pelo desejo comum da libertação do domínio ou da simples ingerência europeia – traduzido, pelo que toca ao Novo Mundo, pela doutrina Monroviana da «América para os americanos» e no Continente Negro por um vasto movimento

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política de Europa: uma Europa conquistada, mas tornada una, depois de submetida pelas legiões romanas, por virtude da superior civilização do conquistador e sobretudo da ordem jurídica com vocação unificadora de que este era portador.

A unidade europeia sob o domínio de Roma não haveria, porém, de resistir muito tempo aos factores de desagregação interna e ao assalto de sucessivas vagas de bárbaros que, desencadeadas nas periferias, rapidamente convergiram para o coração do Império.

4. A Europa sob a égide da Roma papal

Mas, ultrapassada a fase de profundas convulsões que acompanharam e se seguiram à derrocada do império Romano, é ainda sob a égide de Roma – apoiada agora não na força das legiões mas, antes, no prestígio e autoridade que o Papado romano conseguira salvaguardar e impor – que a Europa vai ser organizada e a sua unidade de civilização preservada.

A difusão do cristianismo implicou a aceitação pelos diversos povos da Europa de concepções muito próximas sobre o mundo e avida, sobre o destino último do homem e o modo de o alcançar – tudo traduzido no respeito de valores e na observância de regras de comportamento resultantes dos princípios de uma comum religião de matriz judaico-cristã e de uma vasta interpenetração de culturas em que o sistema jurídico e social de Roma, amoldado a novas formas de existência no contacto com as instituições dos povos bárbaros, marca uma presença inconfundível.

Numa Europa assim submetida à religião cristã, a Igreja de Roma exerce uma influência e consegue mesmo um acatamento tão generalizado no domínio temporal que conseguiu impor à Europa uma unidade espiritual e formas de unidade política que ficaram a marcar para sempre a sua história.

O império de Carlos Magno surge, neste especial ambiente da Europa medieval, como uma magnífica representação da «Civitas Dei» na concepção de Santo

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Agostinho, assente como esteve mum vasto território europeu submetido a uma autoridade dual – política e religiosa – mas que no topo da hierarquia, na pessoa, reencontrara transitoriamente uma certa forma de unidade.

De igual modo, o Sacro Império Romano-Germânico conforma-se ainda com o modelo político de uma Europa unificada sob o signo da Igreja de Cristo.

Neste contexto político-religioso, o movimento das Cruzadas – dominante num longo período histórico em que eram ainda bem frouxis os conceitos de soberania nacional – apresenta-se como expressão inequívoca de uma Europa una que, mobilizando as energias colectivas, surge perante os infiéis a defender ideias e objectivos comuns a povos e príncipes submetidos todos, espiritual e temporalmente, à autoridade voluntariamente acatada dos Papas de Roma.

5. A desvalorização do papel político da Igreja

Não obstante a vitória alcançada sobre os Imperadores alemães, que permitira reafirmar a soberania temporal da Igreja, esta saiu consideravelmente enfraquecida das lutas que do séc. X ao séc. XIII os Papas se viram obrigados a sustentar.

A partir do século XIV é com os Reis de França que se reacende a longa batalha entre o poder de Roma e o poder de Príncipes que, arrogando-se a qualidade de representantes directos de Deus na Terra, pretendiam eximir-se a qualquer ingerência do Papado no domínio temporal.

A Igreja é agora, porém, nesta segunda fase da luta, a grande vencida – com enorme prejuízo do seu anterior poder político e mesmo da sua influência epsiritual que até então exercera.

A transferência dos Papas para Avinhão (1309), o Cisma do Ocidente (1378-1429) e, sobretudo, a Reforma protestante (1517), represntaram os momentos culminantes da decadência do prestígio e da autoridade de Roma sobre a Europa Cristã.

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6. O despertar das modernas soberanias europeias e a quebra da unidade política e religiosa da Europa

Entretanto, e não obstante o espírito de cristandade que domina as nações da Europa vinculando-as e solidarizando-as sobretudo na luta contra os inimigos da fé e permitindo-lhes resistir a graves ameaças asiáticas e islâmicas, as relações entre os diversos Estados europeus são dominadas por um clima de rivalidade permanente a exprimir-se frequentemente em luta armada.

À medida que no quadro das diversas nações europeias se robustece o poder central e se afirma o princípio da unidade nacional, acentua-se o risco de confrontos directos – que o Papado deixara de ter autoridade para arbitrar – entre Estados que emergem, cada vez mais coesos, fortes e senhores dos seus destinos, de complexos processos de integração macional e de afirmação do poder absoluto dos respectivos soberanos.

As guerras religiosas – que representam um momento crucial do processo de afirmação da independência nacional em face do Papado e de elaboração de um novo mapa político da Europa – dando ocasião a prolongadas e esgotantes provas de força, marcam também a época histórica em que se inicia um esforço sistemático na busca de fórmulas de equilíbrio das potências europeias, independentes e soberanas dentro dos limites territoriais do Estado.

A comunidade da civilização mantém-se, certamente, mas a unidade religiosa e política da Europa, que o Papado preservara durante um milénio, essa parecia definitivamente perdida.

7. O «Balance of Power» e o «Concerto Europeu»

A tentativa napoleónica de unificação do espaço europeu, fruto de um imperialismo apoiado na força de exércitos em movimento através do continente, só por um curto espaço de tempo interrompeu a aplicação, que desde

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o século XVI vinha a ser ensaiada, dos princípios e regras do «Balance of Power» baseado num sistema de alianças entre potências europeias, cujo eixo podia oscilar por razões conjunturais mas sem alteração profunda do peso das coligações em presença.

A Santa Aliança – que emerge do Congresso de Viena em que se procedera à liquidação por via diplomática da aventura imperial da França – e a política do «Concerto Europeu» que se lhe seguiu, exprimem o pleno triunfo das soberanias nacionais em que o continente se achava retalhado; soberanias que, forçadas a coexistir num estreito quadro geográfico, buscam fórmulas de convivência possível, moderam as irrupções de agressividade ocorridas aqui e além, arbitram autoritariamente, se necessário pela força das armas, os conflitos pontuais a nível interno ou internacional e retocam paulatinamente, atentas ao princípio das nacionalidades, o mapa político da Europa.

8. A paz fundada na cooperação e no respeito pelo direito internacional (1815-1914)

Valorizando e utilizando no interesse geral uma comunidade de civilização que o contacto cada vez mais fácil e estreito permitia reforçar, dia a dia, a Europa soube construir ao longo do séc. XX, por sobre as fronteiras erguidas no decurso de um milénio e através de frequentes congressos políticos e conferências técnicas, um espírito de entendimento, de cooperação efectiva e de enriquecimento mútuo que proporcionou ao Velho Continente um século de paz e de enorme desenvolvimento económico, técnico e cultural.

A evolução técnica, sobretudo na segunda metade do séc. XIX – designadamente no domínio dos transportes e das comunicações – dá lugar a um notável florescimento de organizações de cooperação internacional cuja iniciativa surge normalmente no quadro europeu, ainda então o verdadeiro centro do mundo civilizado.

Em 1865 é instituída a União Telegráfica Internacional; em 1874 é criada uma União Postal Internacional que em 1878 adopta a designação de União Postal Universal (UPU); na Conferência de Berlim de 1906 é criada a União Rádio-Telegráfica Internacional; em 1875 surge a União para o Sistema Métrico; em 1883 a União para a Protecção da Propriedade Industrial; em 1886 a União para a Protecção da Propriedade Literária e Artístrica; em 1890 a União dos

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A guerra franco-prussina, de cruta duração, pareceu não ser mais, neste particular contexto, que um conflito episódico e circunscrito.

Em breve a Europa, retomada a calma, se lançava de novo na busca do progresso através da cooperação e na consolidação da paz através do apelo ao Direito, de que as Conferências de Haia e as importantes convenções aí concluídas são a justa expressão.

A guerra de 1914-1918 viria, tragicamente, impor uma interrupção brutal e sangrenta nos esforços, até aí bem sucedidos, no sentido do estreitamento da cooperação europeia.

Porém, mal o conflito chega ao seu termo, logo diversas vozes – e das mais autorizadas – se erguem a proclamar a necessidade não apenas de retomar o interrompido esforço de cooperação mas, bem mais do que isso, de o ultrapassar mediante a recriação da perdida unidade da Europa.

A evolução técnica, sobretudo na segunda metade do séc. XIX – designadamente no domínio dos transportes e das comunicações – dá lugar a um notável florescimento de organizações de cooperação internacional cuja iniciativa surge normalmente no quadro europeu, ainda então o verdadeiro centro do mundo civilizado.

Em 1865 é instituída a União Telegráfica Internacional; em 1874 é criada uma União Postal Internacional que em 1878 adopta a designação de União Postal Universal (UPU); na Conferência de Berlim de 1906 é criada a União Rádio-Telegráfica Internacional; em 1875 surge a União para o Sistema Métrico; em 1883 a União para a Protecção da Propriedade Industrial; em 1886 a União para a Protecção da Propriedade Literária e Artístrica; em 1890 a União dos

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Capítulo I – O ANSEIO DE UNIDADE EUROPEIA

Secção 1.ª – Os Percursores

9. Uma ideia mítica

A recriação da unidade europeia constituíra sempre, ao longo dos séculos, um anseio comum a homens «invulgares»: alguns, como Napoleão e Hitler, tentaram-no pela força das armas; mas o desfecho das suas aventuras sangrentas comprovou que a Europa só se uniria pela força de vontades livres.

Foi, porém, no período entre as duas guerras mundiais, em pleno século XX, que se assitiu à criação de um clima particularmente favorável à divulgação do velho sonho de unidade política; e a tragédia europeia de 1939-1945 viria a permitir a reposição, em novas bases, de projectos concretos de integração da Europa.

O período entre as duas grandes guerras

10. Uma ideia mobilizadora

Logo após a primeira grande guerra, Luigi EINAUDI, que viria a ser o Presidente da República Italiana, publicava uma primeira mensagem em que expunha a necessidade de congregar os povos europeus que acabavam de sair de uma luta prolongada e cruel e de os solidarizar na construção de uma Europa unida, capaz de desempenhar no mundo o tradicional e eminente papel que historicamente fora e deveria continuar a ser o seu.

Apesar de esta ser uma ideia muito compartilhada entre muitos euorpeus de vulto, os conflitos de interesses desencadeados na altura de assinatura do Tratado de Versalhes contribuíram largamente para exacervar os nacionalistas reinantes, pouco propícios à aceitação imediata do pensamento de EINAUDI e daqueles que o

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retomaram, como foi o caso do Conde COUDENHOVE-KALERGI, de HERRIOT, de LOUCHEUR.

11. A acção de COUDENHOVE-KALERGI

Porém, pouco tempo volvido, surge um novo apelo à união dos povos da Europa, a que estava reservado bem mais amplo acolhimento.

O Conde COUDENHOVE-KALERGI, jovem aristicrata austro-húngaro, tornou-se o apóstolo da unificação da Europa, tarefa à qual iria consagrar a sua vida.

Os seus esforços alcançaram resultados encorajadores, sobretudo no que respeita à formação de uma opinião pública mais aberta ao anseio de uma Europa unida.

Em consonância com a sua luta, o então ministro dos negícios estrangeiros de França, HERRIOT, lançou em 1925, no Parlamento Francês, um primeiro apelo oficial à união da Europa.

Logo em 1926, diversos economistas e homens de negócios exprimiram a sua adesão à ideia de criação de uma «União Económica e Aduaneira Europeia» cuja designação exprime um objectivo ainda hoje perfeitamente actual na medida em que se considere que uma sólida união económica constitui a base necessária da desejada união política.

Em 1927, o ministro francês LOUCHEUR propunha, por seu tirno, criação de cartéis europeus do carvão, do aço e dos cereais, «organizados pelos Governos no interesse geral e não apenas para satisfação do egoísmo dos produtores».

Desta forma, no curto espaço de cinco anos haviam sido lançadas as ideias, propostas de actuação e medids fundamentais de um projecto coerente de integração europeia: acção sobre a opinião pública, especialmente sobre a opinião parlamentar; e utilização da integração económica – ainda que incialmente restringida a sectores bem delimitados – como instrumento da integração política.

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12. O Manifesto de Viena

Por inciativa do referido Conde realizou-se em Viena de Áustria, em 1927, o Congresso Pan-Europeu. Num ambiente entusiasta, os apóstolos da Nova Europa fizeram a sua profissão de fé nos destinos de uma Europa unificada, a partir de uma tribuna decorada sobre as doutrinas dos grandes precursores: KANT e VITOR HUGO, SULLY e o Abade SAINT-PIERRE.

O manifesto saído do Congresso exprimia um veemente apelo à unidade europeia.

13. A acção de Aristides BRIAND

A acção do referido conde e, sobretudo, o manifesto de Viena causaram uma profunda impressão no ministro dos NE de França, Aristides BRIANDA, que decide tomar uma iniciativa oficial de carácter concreto que fosse o eco, ao nível dos governos da Europa, dos anseios expressos por tantos ilustres europeus.

Após ter sondado vários dos seus colegas europeus sem ter deparado com reservas sérias senão do lado da Grã-Bretanha; após ter conseguido a aprovação da sua iniciativa pelo Parlamento francês na altura do voto sobre a sua declaração de investidura como Presidente do Conselho; e de ter anunciado as suas intenções em conferência de imprensa, BRIAND decide finalmente, em 5 de Setembro de 1929, submeter à Assembleia da SDN o seu projecto de União Europeia:

«(…) Eu julgo que entre os povos que estão geograficamente agrupados, como os povos da Europa,

deve existir uma espécie de laço federal. É este o laço que eu desejaria esforçar-me por estabelecer. Evidentemente

que a associação terá sobretudo lugar no domínio económico. É esta a questão mais premente e eu creio que é possível alcançar êxito. Mas estou igualmente seguro de que, do ponto de vista político, assim como do ponto de vista social, o laço federal, sem afectar a soberania de

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nenhuma das Nações que possam vir a participar em tal associação, pode ser benéfico».

A proposta de BRAIND era, sem dúvida, bastante equívoca, na medida em que não é fácil ver como um laço federal entre Estados Europeus poderia ser compatibilizado com o total respeito da soberania dos Estados-membros da organização a constituir.

Mas, não obstante esta formulação prudente, tão vaga que esvaziava a ideia original de muito do seu conteúdo útil,as suas propostas foram acolhidas, após um primeiro movimento de simpatia, com grandes reservas, manifestadas obretudo por parte da Grã-Bretanha.

14. O fracasso da iniciativa de BRIAND

De qualquer modo, a sua proposta não surgiu no melhor momento.

Apanhada na lenta e entorpecedora engrenagem da SDN, só em Setembro de 1930 veio a ser designada uma «Comissão para o Estudo da União Europeia» presidida pelo próprio BRIAND que nela trabalhou aceveradamente durante dois anos.

Mas, em fins de 1932 BRIAND morre; no ano imediato, HITLER conquista o poder na Alemanha, consolidando assim o triunfo de um ideário inspirado num nacionalismo exacerbado e agressivo, oposto a qualquer porjecto de unidade europeia assente na livre expressão da vontade dos diversos povos da Europa.

Mesmo aos mais optimistas a iniciativa de BRIAND aparecia como uma ideia morte, sobretudo quando começram a manifestar-se no quadro europeu iniciativas alemãs que eram o claro prenúncio de uma nova guerra.

Secção 2.ª – O Ressurgimento da Ideia Europeia no Pós-Guerra

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A situação na Europa no termo da II Guerra Mundial

15. A situação económica

Quando a guerra chega ao seu termo, após seis anos de luta devastadora e sangrenta, a Europa não é mais do que um vasto campo de ruínas: exausta espiritualmente, dividia por ódios indizíveis, profundamente endividada e economicamente detsroçada, defronta-se com a necessidade imediata de um ingente esforço de recuperação da sua capacidade de produção, destinado antes de mais a alojar, vestir e alimentar populações carecidas de meios para satisfazer necessidades elementares.

Mas o aparelho europeu de produção, que durante seis anos foram em larga escala posto ao serviço do esforço da guerra ou detsruído no decurso das hostilidades, não dispunha de equipamentos, nem de capital, nem de matérias-primas que lhe pemritissem retomar a actividade normal.

16. A situação política

A par disso, o desfecho da guerra determinara a ocupação, pelos exércitos soviéticos, não só de uma vasta parcela de território alemão, como igualmente dos países da Europa de Leste e da Europa Balcânica. Submetidos a apertado controlo, que permitiu a subida ao poder de governos constituídos por elementos favoráveis aos desígnios soviéticos, esses Estados viram-se forçados a modelar a sua vida política, económica e social, bem como as suas próprias relações exteriores, na conformidade da vontade e da própria imagem do ocupante; e a assumir rapidamente, tanto no plano interno como na cena internacional, a fisionomia e o comportamento de estados satélites de Moscovo.

Mas os propósitos expansionistas da União Sociética parecia não se limitarem ao espaço europeu que a sorte das operações militares colocara directamente sobre o seu domínio. Durante a guerra, haviam emergido dos quadros

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da resistência ao ocupante nazi, nos países do Ocidente Europeu, fortes e bem organizados partidos comunistas que, após o termo do conflito, tentaram apossar-se do poder pela força (como sucedeu na Grécia, onde só com o auxílio exterior foi possível ao governo legal dominar, após prolongada luta, a rebelião armada) ou pelo menos participar no seu exército (como se verificou na França, onde o Partido Comunista cedo veio a revelar-se como o mais forte, disciplinado e combativo dos partidos franceses). Também na Itália, o predomínio eleitoral da democracia cristã não impedia que o Partido Comunista, numeroso e bem estruturado, representasse uma ameaça permanente para as instituições democráticas.

Cada um dos Estados do Ocidente Europeu sentia-se politicamente minado e ameçado, no interior das suas próprias fronteiras, por uma«quinta coluna» soviética.

17. A situação militar

Por outro lado, as tropas soviéticas achavam-se a poucas horas d emarcha das fronteiras francesas, e a Europa Ocidental sabia-se militarmente indefesa: os E.U.A. haviam retirado, logo após o fim da guerra, mantendo no Continente europeu forças pouco mais que simbólicas a afirmar o seu direito de ocupação da Alemanha; a Grã-Bretanha, única potência europeia a dispor, no termo do conflito, de forças armadas eficazes, desmobilizara-as rapidamente. O resto da Europa do Ocidente não representava, militarmente, mais do que uma soma de fraqueza.

Os desíngios hegemónicos da União Soviética – bem expressos no domínio total (militar, político e económico) a que sujeitara os países de Leste – faziam deste modo pesar sobre a Europa Ocidental uma ameaça permanente. A concretização dessa ameaça poderia depender apenas de uma oportunidade favorável, a fomentar do exterior, ou que resultaria naturalmente da conjugação de uma situação interna económica e socialmente difícil, propícia à aceitação popular de transformações profundas dos sistemas económico, político

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e social, com as iniciativas golpistas dos partidos comunistas bem estruturados, bem apoiados do exterior e dotados da capacidade comprovada para explorar, em proveito da causa internacionalista a que se haviam devotado, as múltiplas fissuras da armadura democrática dos Estados do Ocidente Europeu.

A palavra de ordem: «Construir a Europa»

18. A conjugação de condições favoráveis à unidade europeia

Nestas condições, os europeus mais lúcidos sentem que a Europa só poderá fazer face à ameaça que sobre ela impende se conseguir organizar-se e fortalecer-se na unidade.

«Construir a Europa» passa a ser palavra de ordem.As condições necessárias estão para tal reunidas: a

pendência de uma ameaça exterior, afectando todos os países do Ocidente; a existência de problemas comuns a todos os Estados – problemas políticos, económicos, sociais e de defesa – que só em conjugação de esforços poderiam ser eficazmente enfrentados. Por outro lado, o caminho para a unidade europeia parecia aplanado na medida em que ao nível dos respinsáveis políticos dos países do Ocidente se forjara durante a guerra a convicção generalizafa de uma acção solidária na construção de um futuro comum.

A sujeição dos povos da Europa ao domínio alemão dera com efeito origem a contactos e favorecera a aproximação, no exílio, de dirigentes dos países subjugados, criado-se entre eles um estado de espírito que muito contribuiu para a aceitação, após o termo das hostilidades, de novos arranjos políticos e económicos. Ganahra-se consciência de que os pequenos países, isolados, eram particularmente vulneráveis à agressão; e que as dificuldades que iriam veirificar-se no após-guerra, sobretudo no campo económico e social, exigiam soluções inovadoras de que todos pudessem tirar porveito.

Foi assim que o projecto da criação do BENELUX, união aduaneira entre a Bélgica, a Holanda e o Luxemburgo,

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nasceu em Londres, durante a guerra, dos contactos entre os dirigentes exilados destes países.

19. A acção de CHURCHILL

CHURCHILL tem perfeita consciência da ameaça que provém do Leste; sente que é urgente antecipar-se a novas manifestações dos nacionalismos europeus, exacerbanos pela tentaiva hitleriana de criação da Europa Germânica; e está seguro, por outro lado, de que a unidade europeia, não podendo basear-se em qualquer projecto hegemónico, está dependente da reconciliação franco-alemã.

CHURCHILL decide envolver-se activamente nos movimentos de opinião tendentes a divulgar e a fazer avançar o projecto de integração da Europa.

Depois de apontar a necessidade da organização do Ocidente Europeu, face à Europa de Leste que se fechara sobre si mesma («Uma cortina de ferro» - acaba de tombar sobre a Europa), CHURCHILL faz um apelo à união dos povos europeus, considerando que tal união comportava a prévia reconciliação entre a França e a Alemanha e implicava a constituição entre os dois países de uma confederação capaz de garantir uma comunhão de destinos.

O terreno estava já preparado para que a exortação de CHURCHILL -«É preciso criar os Estados Unidos da Europa!» - recolhesse um eco favorável no seio dos múltiplos movimentos internacionais que entretanto haviam surgido para divulgar o ideário da construção europeia.

20. A querela da supranacionalidade

A atmosfera de exaltada fé europeia em que o CONGRESSO DA HAIA decorreu não consegiu mascarar a realidade de que pelo menos duas tendências bem mascaradas dividiam os partidários da «ideia europeia»:

uma corrente federalista que reclamaba a instituição imediata de uma autêntica federação política, ou seja, a criação dos Estados Unidos da Europa;

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uma corrente pragmática, aparentemente mais realista ou mais prudente, agrupava os que, hostis aos abandonos de soberania por parte dos Estados, parecia acreditarem, sobretudo, nas vantagens dos contactos intergovernamentais e insistiam em que o objectivo último da unificação da Europa deveria ser alcançado progressivamente, através de uma cooperação cada vez mais estretita entre os Estados soberanos.

A oposição entre as duas correntes era fundamental e à divergência de opiniões estava subjacente uma dificuldade inerente, que assim pode enunciar-se:

Como conciliar o objectivo de unificação da Europa que necessariamente implicaria a aceitação de instituições dotadas de poderes supranacionais efectivos – com a permanência e intangibilidade da soberania dos Estados, por definição avessos a todas as formas de ingerência externa nos assuntos de cada um?

21. A moção final do Congresso da Haia

Dado que a dificuldade não é puramente doutrinal, ela irá estar presente ao longo de todo o processo de integração e será a responsável pelas dificuldades, pelas crises e mesmo pelos impasses por que haveria de passar o projecto de união europeia no quadro comunitário.

Mas, unidos por um compartilhado apego a uma ideia-mito e animados do mesmo empenho em fazer avançar o porcesso, os congressistas de Haia souberam habilmente camuflar as suas divergências doutrinais e chegar a uma moção final que seria votada por unanimidade e que, uma vez aprecuada pelos responsáveis políticos dos Estados da Europa, permitiria a estes avançar numa das possíveis direcções.

A par da aprovação desta moção os congressitas decidiram a criação de um Comité para a Europa Unida, sob cuja égide a maior parte dos movimentos pró-europeus acabaria, em 1948, por se federar no seio do MOVIMENTO EUROPEU.

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A opinião pública europeia estava já perfeitamente alertada e preparada para os esforços concretos, no sentido de edificação da Europa, que iriam desenvolver-se em duas frentes: a da cooperação – no pleno respeito pela soberania dos Estados europeus; e a da integração – que acabaria por se impor – tendente à instituição entre os Estados participantes de um embrião de laço federal vocacionado para congregar um dia, no quadro dos Estados Unidos da Europa, um grupo de paises que ao longo dos séculos se haviam periodicamente enfrentado nos campos de batalha.

Capítulo II - DA COOPERAÇÃO À INTEGRAÇÃO

Secção 1.ª – A fase da cooperação

Não obstante a dramática situação económica em que a Europa se encontrava no imediato após-guerra, os primeiros esforços de cooperação institucionalizada no quadro europeu ocorreram no plano da defesa, conduzindo à criação da União da Europa Ocidental (UEO); mas foram particularmente relevantes no âmbito económico e no domínio político.

A cooperação económica

22. A Organização Europeia de Cooperação Económica (OECE)

Se a colaboração estreita no plano da defesa era um imperativo de sobrevivência do Ocidente Europeu face à voracidade soviética, a cooperação no domínio económico surgia como uma necessidade pungente numa Europa devastada pela guerra e por isso carecida de auxílio exterior pronto e eficaz para se recompor dos golpes sofridos e para furtar as populações esmorecidas à propaganda comunista.

23. O Plano Marshall

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Os responsáveis norte-americanos aperceberam-se rapidamente dos riscos políticos decorrentes da situação de ruína económica e da consequente debilidade do tecido social com que a Europa emergira de uma longa e terrível guerra.

Em 5 de Junho de 1947, p General MARSHALL declarava que os Estados Unidos estavam prontos a apoiar o esforço de reconstrução europeia, desde que os países da Europa conseguissem entender-se quanto à forma de repartir e utilizar eficazmente o auxílio económico-financeiro norte-americano, na conformidade de um sistema de cooperação mútua a instituir entre eles.Esta mesma ideia viria a ser formalmente consagrada na lei norte-americana de 2 de Abril de 1948 que aprovou o «European Recovery Program» em que o Plano Marshall se convertera.

24. A Convenção de Paris de 16 de Abril de 1948 que instituiu a OECE

Imediatamente a seguir, em 16 de Julho de 1947, uma conferência de 16 países europeus (entre os quais Portugal) reunia-se em Paris para apreciar os termos da oferta norte-americana e decidir sobre a forma de lhe dar adequado seguimento.

Tendo chegado a completo acordo, os Estados participantes assinaram, em 16 de Abril de 1948, a Convenção de Paris que criou a Organização Europeia de Cooperação Económica (OECE), cujos objectivos no domínio da cooperação económica foram largamente alcançados. Os países europeus membros da organização conseguiram, nos dez anos que se seguiram à sua criação, atingir e mesmo ultrapassar os níveis de desenvolvimento económico anteriores à guerra.

25. A Organização de Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE)

Um novo contexto económico

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Realizada assim com êxito a missão que lhe fora cometida e modificado profundamente o contexto económico que presidira à sua criação, a OECE pôde encarar, à luz de circunstâncias qualitativamente diferentes, a redefinição dos seus objectivos. Doravante, ultrapassando o quadro europeu, a acção da Organização deveria passar a interessar a um mais bloco de países industrializados do mundo – nomeadamente aos E.U.A. e ao Canadá, que eram já membros associados da OECE – ligados, no âmbito de um sistema de economia de mercado, por relações económicas intensas e todos empenhados num esforço de liberalização das trocas, de desenvolvimento da economia e do comércio internacionais e mesmo de ajuda, mais equitativamente repartida, aos países subdesenvolvidos ou em vias de desenvolvimento económico.

A criação da OCDE

Nesta conformidade, pela Convenção que assinaram em Paris em 14 de Dezembro de 1960, os 18 estados Europeus membros da OECE, os E.U.A. e o Canadá decidiram converter a OECE numa Organização de Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), com objectivos diferentes – mais amplos e mais genéricos.

O art. 1.º da Convenção enuncia-os nos seguintes termos:

«A OCDE tem por objectivo promover políticas visando:

a) Realizar a mais ampla expansão possível da economia e do emprego e a melhoria do nível de vida nos países mebros, sem prejuízo da estabilidade financeira e contribuir assim para o desenvolvimento da economia mundial;

b) Contribuir para uma expansão económica sã, tanto nos países membros como não membros em vias de desenvolvimento económico;

c) Contribuir para a expansão do comércio mundial numa base multilateral e não discriminatória, na conformidade das obrigações internacionais».

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A OCDE surge assim como uma organização renovada quanto aos seus objectivos e alargada quanto ao número de países que nela participam aos quais viriam ulteriormente a juntar-se o Japão, a Austrália e a Nova Zelândia.

O papel actual da OCDE

A OECE e a OCDE constituíram ao longo das últimas décadas um fórum privilegiado em que os países do Ocidente Europei mais tarde acompanhados pelos E.U.A, pelo Canadá e por outros países industrializados do mundo (Japão, Austrália e Nova Zelândia), puderam expor e discutir os respectivos pontos de vista sobre as melhores vias para promover a cooperação económica europeia e internacional e para prestar ajuda a terceiros países.

Mas, uma vez alcançado o objectivo inicial e fundamental da recuperação económica da Europa e do funcionamento normal das relações de comércio internacional, apareceu como evidente que a OECE e depois a OCDE haviam esgotado o essencial da sua finalidade de promoção da cooperação económica no quadro regional europeu; e isto sobretudo porque a emergência de novas Organizações – as Comunidades Europeias, a Associação Europeia de Comércio Livre (EFTA) e a Organização Mundial do Comércio (OMC) – haviam feito transitar para outros centros de concertação e decisão problemas maiores da economia e do comércio intra-europeu e mesmo mundial.

Esta situação tornou-se ainda mais evidente depois que a Grã-Bretanha, tendo aderido às Comunidades Europeias, deixou de tentar utilizar a OCDE como ponte de contacto entre a EFTA e o Mercado Comum Europeu.

Parece legítimo admitir que, tendo cumprido brilhantemente a sua missão, a OCDE desempenha actualmente um papel marginal no que respeita à resolução dos grandes problemas económicos com que o mundo – e a Europa em particular – se estão a defrontar.

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Num plano equiparável se pode situar outra organização – esta especificamente europeia – que, criada com objectivos marcadamente políticos, esteve sempre aquém das esperanças que nela se depositaram: tarta-se do CONSELHO DA EUROPA, instituído no quadro da cooperação política.

A cooperação política: o Conselho da Europa

26. As origens, os membros, os objectivos e os meios de acção do Conselho da Europa

i. As origens

No Congresso da Haia, realizado de 7 a 10 de Maio de 1947, conseguiu chegar-se a acordo quanto ao teor de uma moção final que, não obstante as divergências de princípio entre os países participantes sobre a forma de «fazer a Europa», exprimia um vibrante apelo comum aos responsáveis dos Estados.

No seguimento da moção, os governos francês e belga decidiram, em Agosto de 1948, patrocinar as conclusões do Congresso da Haia e propor a criação de uma Assembleia Parlamentar Europeia.

A proposta franco-belga defrontou-se, porém, com a habitual reserva britânica a iniciativas portadoras do selo da supranacionalidade – e tudo quanto se consegiu obter dos ingleses foi uma contraproposta baseada num sistema de cooperação intergovernamental de tipo clássico com base num Conselho de Ministros habilitado a decidir, como no âmbito da OECE, por acordo mútuo de todos os membros.

Finalmente, no seio do Conselho da União da Europa Ocidental (UEO) conseguiu chegar-se, em Janeiro de 1949, a um dúbio (ambíguo) compromisso:

A organização europeia a criar comportaria um COMITÉ DE MINISTROS cujas decisões estariam sujeitas à regra da unanimidade; mas,

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seria instituída no quadro da nova organização uma ASSEMBLEIA CONSTITUTIVA, formada por representantes de cada Estado-membro, eleitos pelo respectivo Parlamento ou designados por outra forma definida a nível nacional.

Foi com base neste compromisso que os cinco Estados-membros da União da Europa Ocidental (França, Grã-Bretanha, Bélgica, Holanda e Luxemburgo – BENELUX), acompanhados de mais cinco Estados democráticos do Ocidente Europeu (Irlanda, Itália, Dinamarca, Suécia e Noruega) assinaram em Londres, em 5 de Maio de 1949, a Convenção que criava o CONSELHO DA EUROPA, com sede em Estrasburgo.

ii. Os membros do Conselho da Europa

27. O Conselho da Europa é actualmente constituído por 46 países. O processo de admissão está definido no art. 4.º:

«Qualquer Estado europeu considerado como dotado da capacidade e de vontade de se conformar às disposições do art. 3.º pode ser convidado pelo Comité de Ministros a tornar-se membro do Conselho da Europa».

É um órgão político – o Comité de Ministros – que, aprecdiando livremente cada caso concreto, decide se um Estado europeu pode, ou não, ser convidado a fazer parte da Organização.

No entanto, em virtude de uma resolução que adoptou em 1951, o Comité de Ministros aceitou que a Assembleia Consultiva fosse ouvida sobre o convite a dirigir a um Estado europeu para se tornar membro do Conselho da Europa.

A retirada de um membro do CE é possível nos termos enunciados no art. 7.º do Estatuto.

A exclusão está prevista no art. 8.º, para o caso de um Estado infringir as disposições do art. 3.º: o Estado em causa é, primeiro, suspenso do seu direito de representação na Assembleia Consultiva e no Comité de Ministros e convidado a retirar-se do Conselho da Europa; se não se

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retirar voluntariamente, o Comité de Minsitros pode decidir excluí-lo.

A simples suspensão do direito de representação pode igualmente ser decidida «se um membro não cumprir as suas obrigações financeiras» (art.9.º).

iii. Os objectivos da Conselho da Europa

28. Estão definidos no art. 1.º da Convenção de Londres de 5 de Maio de 1949:

«A finalidade do Conselho da Europa é a de realizar uma união mais estreita entre os seus membros a fim de salvaguardar e promover os ideiais e os princípios que são seu património comum, e de favorecer o respectivo progresso económico e social».

Com efetio, essa finalidade genérica não exprime qualquer intenção dos signatários da Convenção de Londres (que contém o Estatuto do Conselho da Europa) de promover a integração política dos Estados; e nenhuma referência é aí feita ao propósito dos Estados de pôr em comum os seus direitos soberanos.

O Conselho da Europa, tanto pelos objectivos que visa como pelos meios de os realizar surge, nitidamente, como mera organização de cooperação internacional, afeiçoada às tradicionais reservas e concepções britânicas.

No quadro desta Organização, os Estados-membros pretendem apenas «salvaguardar e promover os ideais e princípios que são seu património comum»; objectivo que comporta o respeito dos três princípios «sobre que se funda a verdadeira democracia», ou seja:

«liberdade individual» « liberdade política» e «preeminência do direito».

Os Estados europeus ocidentais entenderam assim reafirmar a sua vinculação aos princípios tradicionais da democracia liberal e fazem mesmo da sua aceitação uma condição essencial da adesão ao Conselho da Europa.

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Para além dessa «União mais estreita» dos Estados-membros, o art. 1.º da Convenção de Londres aponta ainda, como objectivo do Conselho da Europa, «favorecer o progresso económico e social».

iv. Os meios de acção do Conselho da Europa

29. A união mais estreita entre os membros do Conselho da Europa, capaz de conduzir à realização dos apontados objectivos comuns, será prosseguida pelos órgãos do Conselho através do exame das questões de interesse comum, da conclusão de acordos e da adopção de uma acção comum nos domínios económico, social, cultural, científico, jurídico e administrativo, assim como mediante a salvaguarda e o desenvolvimento dos direitos do Homem e das liberdades fundamentais (art.1.º, al.b), do Estatuto).

Os meios de acção indicados assemelham-se aos utilizados por qualquer outra Organização internacional de cooperação: são manifestamente limitados e não põem de modo algum em causa a intangibilidade das soberanias nacionais.

O que se instituiu no seio do Conselho da Europa foi uma simples cooperação intergovernamental, manifestamente alheada das fórmulas federalistas defendidas no Congresso da Haia e subjacentes à vibrante moção que esteve na origem dessa Organização europeia.

No entanto, coném sublinhar que se o Conselho da Europa dispõe de limitados meios de acção, em contrapartida são muito vastos, quase ilimitados, os domínios em que pode exercê-los: só foram expressamente excluídas da sua competência as«questões relativas à defesa nacional» ou que sejam «da competência de outras organizações internacionais» (cfr. o art. 1.º, al.b) e c)).

Organização e funcionamento do Conselho da Europa

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São três os órgãos essenciais do Conselho da Europa: o Comité de Ministros, a Assembleia Consultiva e o Secretariado.

i. O Comité de Ministros

30. O Comité de Ministros é o órgão intergovernamental representativo dos Estados-membros do Conselho da Europa.

Estatutariamente, cada um dos membros do Conselho tem um representante no Comité de Ministros (que é, em princípio, o Ministro dos Negócios Estrangeiros ou o seu suplente) e dispõe aí de um voto.

O Comité de Ministros funciona na conformidade do regulamento interno, cuja aprovação é da sua competência.

As suas reuniões realizam-se a dois níveis: ao nível dos MNE, pelo menos duas vezes por

ano e uma normalmente por ocasião da abertura da sessão ordinária da Assembleia Consultiva, decorrendo as sessões na conformidade do regulamento interno do Comité, não sendo públicas;

ao nível dos delegados as reuniões são bimensais (mas, na prática, cerca de 10 vezes por ano).

A Presidência do Comité de Ministros é rotativa, segundo a ordem alfabética dos respectivos países.

Os trabalhos decorrem de acordo com a ordem do dia previamente elaborada em que figuram normalmente os problemas de administração interna, o exame de recomendações formuladas pela Assembleia, a discussão das propostas apresentadas pelos membrps d Comité e o estudo das recomendações a dirigir aos governos dos países membros do Conselho.

As decisões, em questões importantes, são tomadas por unanimidade, não obstante as regras d evoto, menos rígidas, previstas no Estatuto (art. 20.º), o Comité acabou por consagrar a regra da unanimidade, embora admitindo que a abstenção de um membro não impede a adopção,

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pelos restantes, das decisões para as quais o Estatuto exija unanimidade.

Os poderes do Comité são aparentemente vastos: nos termos do art. 13.º, «o Comité de Ministros é o órgão competente para agir em nome do Conselho da Europa, em cumprimento dos arts. 15.º e 16.º».

Enquanto o art. 16.º atribui ao Comité competência em relação a todas as questões de organização interna do Conselho da Europa, o art. 15.º confia-lhe uma vasta missão europeia – a de «examinar as medidas apropriadas à realização da finalidade do Conselho da Europa, incluindo a conclusão de convenções e acordos e a adopção pelos Governos de uma política comum em relação a questões determinadas».

Compete ainda ao Comité aprovar o orçamento do Conselho, convidar qualquer estado a tornar-se membro da Organização e pronunciar a sua suspensão ou exclusão.

ii. A Assembleia Parlamentar

31. A Assembleia do Conselho da Europa não corresponde, manifestamente, aos anseios dos que no Congresso da Haia reclamaram a criação de um órgão verdadeiramente representativo dos povos da Europa e dotado das competências necessárias para impulsionar, no plano político e jurídico-constitucional, o projecto de unificação europeia.

Na realidade, a Assembleia está longe de poder considerar-se uma autêntica instituição parlamentar. A semelhança entre essa instituição e qualquer parlamento nacional reside apenas na circunstância de que os seus membros são parlamentares dos países membros da Organização, assistindo-lhes o direito de exprimir com toda a liberdade as suas opiniões pessoais e de votar, por simples maioria, os pareceres ou recomendações que a Assembleia tem competência para adoptar; e em que, por outro lado, a Assemblei se organizou e funciona como um verdadeiro parlamento.

A Assembleia Consultiva não dispõe de poder de legislar, nem sequer pode tomar decisões em matéria de finanças directamente relacionadas com

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o seu funcionamento; e muito menos dispõe de qualquer poder político efectivo em relação ao Comité de Ministros.

O papel da Assembleia é o de exprimir a opinião pública europeia, mais concretamente o de sugeriri, aconselhar, encorajar; frequentemente, o de criticar – nunca o de decidir.

a)Composição e funcionamento da Assembleia

32. A Assembleia conta actualmente com 313 membros efectivos e outros tantos suplentes.

Cada país tem o direito de designar um número de representantes efectivos – e outros tantos suplentes – que é função do respectivo peso demográfico, entre o limite máximo de 18 (Alemanha, França, Itália e Inglaterra) e mínimo de 2 (Liechtenstein).

Entre os limites de 18 e 2 encontram-se: Espanha com 14; Turquia com 10; Bélgica, Holanda, Portugal e Grécia com 7; Suécia, Áustria e Suiça com 6; Dinamarca e Noruega com 5; Irlanda com 4; Islândia, Luxemburdo, Chipre e Malta com 3.

O Estatuto do Conselho da Europa previu que a Assembleia tivesse em cada ano uma sessão cuja duração não deve, em princípio, exceder um mês; actualmente, a Assembleuia realiza três sessões públicas por ano, com duração de uma semana e dez dias (Primavera, Outono e Inverno), em Estrasburgo-

A Assembleia Consultiva pode igualmente reunir-se em sessão extraordinária – mas para tal é necessária a concordância do Comité de Ministros.

b)Os poderes da Assembleia

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33. Nos termos do art. 23.º do Estatuto,

«A Assembleia Consultiva pode deliberar e formular recomendações sobre qualquer questão que corresponde à finalidade do Conselho e se inclua na sua competência».

Como a competência do Conselho da Europa é muito ampla, escapando-lhe apenas as questões ligadas à defesa nacional, dir-se-ia que um vasto campo de reflexão e acção estaria aberto à Assembleia, o que permitiria supor a existência de extensos poderes.

Na realidade, tais poderes são muito reduzidos, podendo a Assembleia discutir praticamente tudo, mas decide sobre pouquíssima coisa.

É-lhe facultado emitir pareceres, adoptar resoluções e fazer recomendações.

Entre os seus poderes contam-se o de aprovar o seu regimento, o de eleger a sua Mesa, fixar a ordem do dia das sessões, constituir Comissões e, em particular, o de eleger juízes do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.

O Secretário-Geral

34. O Secretariado, organizado em conformidade com os arts. 36.º e 37.º dos Estatutos, constitui o aparelho administrativo do Conselho da EUROPA, CABENDO-LHE, em particular, prestar à Assembleia o apoio de que esta carece.

À frente do Secretariado está um Secretário-Geral, coadjuvado por um Secretário-Geral Adjunto (ambos nomeados pela Assembleia sob recomendação do Comité), e pelo pessoal necessário.

iii. A acção do Conselho da Europa

35. Que balanço fazer da obra realizada pelo Conselho da Europa em mais de 50 anos de existência?

Os resultados da sua acção são sem dúvida modestos – sobretudo se confrontados com as expectativas geradas

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pela iniciativa que esteve na sua origem e com os ambiciosos objectivos dos seus promotores.

O Conselho tem funcionado como um importante e prestigiado fórum europeu, ponto de encontro e de convívio das diversas correntes de opinião europeias e centro de debate de todas as questões com interesse para a Europa.

Alguns problemas concretos , em vários domínios – político, económico, social, cultural – têm encontrado aí uma via de solução. Inúmeras convenções (nos domínios político, jurídico, téncico, segurança social, cultura e ensino, da livre circulação das pessoas e ideias) foram negociadas e concluídas no seio do Conselho da Europa.

A acção do Conselho da Europa atingiu resultados particularmente notáveis no que respeita à definição e defesa dos Direitos do Homem assentes nos princípios e regras jurídicas enunciados na Convenção Europeia dos Direitos do Homem, assinada em Roma, em 4 de Novembro de 1950 pelos representantes dos Estados-membros do Conselho Da Europa. Este documento não s elimitou, como acontece com a Declaração dos Direitos do Homem da ONU, a definir certos direitos fundamentrais do Homem no seio de uma sociedade civilizada, pois organiza também um adequado processo de salvaguarda, a nível europeu e no âmbito de instituições especializadas, dos direitos ameaçados de violação.

Secção 2.ª – A Fase de Integração

Subsecção 1.ª – Da Declaração Schuman aos Tratados de Paris e de Roma

A criação da Comunidade Europeia do Carvão e do Aço

i. A questão alemã

36. Vencida em 1945, a Alemanha, destroçada, dividida, privada de instituições representativas do Estado, não tivera qualquer intervenção nos esforços de construção europeia nem fora admitida a participar nos diversos

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acordos que haviam permitido dar-lhe expressão jurídica.

A evolução da situação política da Europa e no mundo, que já obrigara os países europeus vencedores da II Guerra Mundial a refazer o seu sistema de alianças miliatres, ia por+em aconselhá-los a ter em conta a existência da Alemanha Ocidental, subtraída ao domínio russo e que graças ao generoso auxílio americano iniciara uma fase de prodigiosa recuperação económica que em breve levaria o mundo surpreendido a falar do «milagre aleão».

O ano de 1949 marca uma viragem decisiva na luta do povo alemão pelo seu ressurgimento económico e político. Em 7 de Setembro, com efeito, era proclamada a República Federal Alemã e o termo do regime de tutela a que desde o fim da guerra a Alemanha Ocidental, ocupada por três potências aliadas – E.U.A., Inglaterra e França – estava submetida.

Situada no coração da Europa, da qual sempre constituiu uma parcela essencial, a Alemanha não podia mais ser ignorada nem excluída das grandes correntes do movimento europeu, sob pena de s criar uma situação anómala e cheia de riscos para uma Europa que nunca poderia considerar-se verdadeiramente integrada enquanto dela estivesse ausente a grande nação germânica.

ii. Uma iniciativa ousada: a Declaração SCHUMAN

37. Em Maio de 1950, o Governo francês, através do seu MNE, Robert SCHUMAN, tomou sobre o problema das relações franco-germânicas, uma iniciativa da maior importância histórica ao expor publicamente a solução que, por sugestão de Jean MONNET, fora encontrada para um sério problema económico que estava na origem de muitas das tradicionais dificuldades entre a França e a Alemanha.

Tal solução, que teria por efeito imediato permitir o controlo bilateral da produção de matérias-primas fundamentais para o desenvolvimento de qualquer futuro esforço de guerra ou prossecução de objectivos de domínio económico, consistia em «colocar o conjunto da produção franco-alemã do carvão e do aço sob o

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controlo de uma autoridade comum, numa organização aberta à participação de outros países da Europa».

Para além disso, as propostas contidas na Declaração SCHUMAN coorespondiam com grande oportunidade e clarividência a três acutilantes questões com que a Europa se defrontava no início dos anos 50:

questão eonómica – resultante da necessidade urgente de reorganizar a siderurgia europeia e, em geral, as indústrias de base;

questão política – vital para apaz da Europa, como CHURCHILL, lucidamente pusera em relevo – que consistia na necessidade imepriosa d eregular em novas bases, adequadas a eliminar as causas de novos conflitos sangrentos, as relações franco-alemãs; e

questão mais ampla da unificação europeia, que exigia a superação de fórmulas tradicionais de simples cooperação, manifestamente incapazes de promover a integração da Europa Ocidental.

iii. A adesão à proposta francesa

38. A proposta do governo francês teve imediato e favorável eco nas capitais europeias. Desde logo pelo chanceler alemão Konrad ADENAEUR, pois pressentiu as fundas implicações futuras do projecto concebido por R. SHUMAN – quer no tocante à reinserção da Alemanha no mundo ocidental quer, em prticular, no respeitante às relações franco-alemãs.

O acolhimento do Governo italiano e dos três países do BENELUX foi igualmente positivo – pelo que em 20 de Junho se iniciaram entre os seis países as negociações que haveriam de conduzir, em 18 de Abril de 1951, à instituição da Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA).

No entanto, a Inglaterra pura e simplesmente recusou-se a participar.

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iv. O Tratado de Paris de 18 de Abril de 1951

39. O Tratado que instituiu a COMUNIDADE EUROPEIA DO CARVÃO E DO AÇO foi assinado em Paris em 18 de Abril de 1951. Ratificado pelos Estados participantes – França, República Federal da Alemanha, Itália, Bélgica, Holanda e Luxemburgo – entrou em vigor em 25 de Julho de 1952.1

O Tratado de Paris consagra não só as soluções como o rpóprio espítio da declaração SCHUMAN:

os aspectos característicos de uma organização «parafederal» estão com efeito claramente marcados no Tratado: transferência de determinadas competências estatais para uma Alta Autoridade comunitária dotada de amplos poderes para agir tanto sobre os Estados-membros como sobre as empresas nacionais dos sectores do carvão e do aço; produção legislativa autónoma e consequente sobreposição de ordens jurídicas; possibilidades abertas às instituições comunitárias de procederem elas mesmas a revisões do Tratado; submissão dos Estados-membros à legislação de origem comunitária e a rigoroso controlo jurisdicional do exacto cumprimento das obrigações por eles assumidas no âmbito da CECA;

a par disso, o Tratado, retomando no seu preâmbulo as fórmulas essenciais da declaração SCHUMAN, proclamava o seu objectivo último de «criar, mediante a instauração de uma comunidade económica, os primeiros fundamentos de uma comunidade mais larga e mais profunda … e lançar assim as bases de instituições capazes de orientar um destino doravamte partilhado».

Apesar de tudo isto ser muito significativo, se tivermos em conta os grandes anseios anteriormente expressos pelos diversos movimetnos europeus, uma integração

1 A CECA foi constituída por um Tratado que deveria vigorar durante 50 anos. Nesta conformidade, a organização extingiu-se em 2002, sendo as suas competências, direitos, património e obrigações assumidos pela Comunidade Europeia e, agora, pela União Europeia.

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europeia limitada aos sectores do carvão e do aço constituía um projecto e uma realização assaz modestos.

Só que a criação da CECA como que desbloqueou uma situação de impasse, pondo em movimento uma engrenagem que pelo simples jogo dos fenómenos económicos e políticos a que daria lugar, acababria por ultrapassar o quadro apertado de uma organização sectorial.

O passo seguinte seria a criação da Comunidade Económica Europeia e da Comunidade Europeia da Energia Atómica.

A criação da CEE e da CEEA (EURATOM)

i. A assinatura dos Tratados de Roma

Em 25 de Março de 1957, dois tratados, instituindo a Comunidade Económica Europeia (CEE) e a Comunidade Europeia da Energia Atómica (CEEA ou EURATOM), foram assinados em Roma para entrarem em vigor em 14 de Janeiro de 1958, data histórica que marca um momento decisivo do esforço da unificação da Europa Ocidental.

A partir de então, três Comunidades – três distintas organizações internacionais – passaram a responder pelo processo de integração europeia.

ii. O Mercado Comum em marcha

O Mercado Comum Europeu arranca em 14 de Janeiro de 1958, numa época francamente favorável – a dos golden sixties – para a economia mundial em geral e para a europeia em particular.

Os números respeitantes à produção e às trocas intercomunitárias internacionais melhoram de forma acentuada; a nova entidade económica europeia toma rapidamente forma; e em face de um acolhimento popular franbcamente favorável, o «facto europeu» começa a impor-se no interior e no exterior da Comunidade.

Subsecção 2.ª – O Alargamento e Aprofundamento das Comunidades Europeias

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Os sucessivos alargamentos

40. Segundo o art. 49.º do Tratado da União Europeia, na redacção actual, resultante do Tratado de Lisboa,

«Qualquer Estado europeu que respeite os valores referidos no art. 2.º e esteja empenhado em promovê-los pode pedir para se tornar membro da União (…)»

Ao abrigo do correspondente art .237.º do Tratado da CEE, então em vigor:

o Reino Unido, a Dinamarca e a Irlanda solicitaram em 1973 a sua adesão às Comunidades Europeias;

em 1980 ocorreu a desão da Grécia; também, por força dos Tratados de Adesão

assinados em Lisboa e em Madrid em 12 de Junho de 1985, os dois Estados ibéricos tornaram-se, em 1 de Janeiro de 1986, membros de pleno direito da Comunidade;

A adesão da Áustria, da Finlândia e da Suécia teve lugar em 1 de Janeiro de 1995;

em 1 de Maio de 2004 ocorreu a adesão de 10 outros Estados mediterrânicos e do Leste da Europa, nomeadamente: República Checa, Chipre, Eslováquia, Eslovénia, Estónia, Hungria, Letónia, Lituânia, Malta e Polónia;

a este Comunidade de 25 membros juntaram-se depois a Bulgária e a Roménia, estando pendentes negociações para a adesão de novos membros.

O aprofundamento do projecto comunitário

i. O Acto Único Europeu

41. O projecto de integração europeia, previsto no Tratado de Roma de 1958 que instituiu a CEE, deveria ser realizado faseadamente, na conformidade da política de

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pequenos passos que fora preconizada por R. SCHUMAN:

A liberalização das trocas, no quadro da União Aduaneira, deveria ocorrer ao longo de um período transitório de 12 anos, dividido em três fases (arts. 7.º, 12.º. e segs, do Tratado da CE);

As «Quatro Liberdades» - liberdade de circulação dos trabalhadores, direito de estabelecimento, liberdade de prestação de serviços e livre circulação dos capitais – previstas no Tratado – seriam concretizadas à medida que a autorudade comunitária (i.e., o duo Comissão-Conselho) fosse adoptamdo os necessários regulamentos, directivas, decisões e outros actos normativos da competência das Instituições da Comunidade;

A definição e aplicação das políticas comuns necessárias à realização e ao bom funcionamento do mercado comum europeu – quer as políticas previstas no Tratado quer outras que a prática comunitária iria mostrar serem indespensáveis – exigiam igualmente um árdio e complexo esforço normativo que iria constituir um trabalho de décadas;

Ao longo dos anos 60, o processo de integração europeia avançou consideravelmente, mas o grande esforço então realizado não teve o desejado seguimento na década de 70 e no primeiro lustro dos anos 80;

Os sucessivos alargamentos da Comunidade revelavam cada vez mais ostensivamente a crescente inadequação dos processos comunitários de decisão ao funcionamento de uma Comunidade que perdera homogeneidade ao aumentar para doze, em 1986, o número dos seus membros.

Formara-se, assim, a consciência generalizada – a que os governos dos Estados-membros não podiam ser indiferentes – de que a Comunidade carecia de novos impulsos, na perspectiva de criação da ão falada União

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Europeia, e de que tais impulsos não dispensavam a adaptação do sistema institucional comunitário.

Tal foi o objectivo do Acto Único Europeu que, assinado em 1986, entrou em vigor em 1987.

ii. O Tratado de Maastricht, o Tratado de Amesterdão e o Tratado de Nice

42. O Tratado de Maastricht representou um novo e importante avanço no processo de integração europeia, natural consequência da aplicação do Acto Único Europeu.

Na verdade, a plena realização do mercado interno e a eficaz aplicação das novas políticas comuns instituídas pelo Acto Único aconselhava – se não exigiam mesmo – o estabelecimento no quadro comunitário de uma união económica e monetária, servida por uma moeda única;

A existência desta união ampliava a projecção da unidade comunitária na cena internacional e exigia o reforço e o aperfeiçoamento dos mecanismos preexistentes de definição e execução de uma política externa da Comunidade;

Também no seio de uma união cada vez mais estreita dos Estados Europeus, a posição dos cidadãos não podia ser menosprezada, convindo por isso assegurar-lhes um estatuto mais consistente de cidadãos de uma Comunidade de Estados, com o indispensável reforço da salvaguarda dos seus direitos fundamentais;

Em suma: impunha-se, cerca de 40 anos após a criação das Comunidades Europeias, redifinir – alargando-os e aprofundando-os – os objectivos do projecto inicial de integração; e, consequentemente, reconsiderar os instrumentos ou meios de acção a utilizar, no seio de uma União Europeia, para realizar tais objectivos – quer os meios de carácter económico, social, monetário e outros, quer os instrumentos de natureza jurídica e institucional adequados a dotar a União de maior capacidade de resposta pronta e

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eficaz aos desafios com que haveria de ver-se confrontada tanto no quadro interno como na ordem institucional.

O Tratado de Maastricht foi assinado em 7 de Fevereiro de 1992 e após vicissitudes várias – relacionadas com dificuldades na sua aprovação em alguns Estados, que obrigaram a revisões das constituições respectivas e mesmo a referendos nacionais – entrou em vigor em 1 de Novembro de 1993.

Também na perspectiva de futuros alargamentos e do aperfeiçoamento e aprofundamento do processo de integração europeia, em 2 de Outubro de 1997 viria a ser assinado o Tratado de Amesterdão que corresponde a um novo impulso dado à construção de uma Europa mais unida, anda que muito timidamente.

De igual modo, na perspectiva do alargamento da UE a um vasto conjunto de países europeus cujas candidaturas foram aceites e estavam pendentes; para obviar a dificuldades de ordem institucional que uma União mais ampla iria suscitar na ausência de disposições adequadas; e para introduzir nos Tratados comuntários alguns aprofundamentos e aperfeiçoamentos que se tornaram necessários – foi assinado, em 26 de Fevereiro de 2001 o Tratado de Nice que entrou em vigor em Fevereiro de 2003.

iii. O Tratado de Lisboa

43. A União Europeia estava em vias de abarcar todo o espaço europeu – e era geral a consciência da necessidade e bem assim da disponibilidade dos respectivos políticos dos Estados-membros para enquadrar institucionalmente, de forma adequada, a integração económica, social e política da Europa.

Uma Comissão liderada pelo ex-Presidente da França, Valery Giscard d’Estaings, prestigiado campeão da integração europeia, redigiu com notável celeridade um projecto de Tratado que estabelecia uma «Constituição para a Europa» que viria a ser assinado em Roma em 29 de

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Outubro de 2004 por 25 Estados-membros com o acordo dos 3 Estados que tinham então pendentes candidaturas de adesão (Bulgária, Roménia e Turquia).

No entanto, o Projecto de Constituição não logrou triunfar das resistências opostas por importantes sectores da população europeia; em referendo convocado para votar o projecto, o eleitorado francês, tal como o holandês, exprimiu a sua rejeição – pelo que o projectado Tratado Constitucional não pôde ter seguimento.

Apesar do enorme desânimo que se abateu sobre as hostes mais europeísticas, porque se mantinha premente a necessidade de um novo enquadramento jurídico do projecto de integração – que, agora alargado a 27 Estados-membros e em breve a mais, se revelava dia a dia incompatível com a visão de uma integração mais ampla e mais profunda da Europa e com o espartilh institucional concebido nos anos 50 – os Estados-membros decidiram reconverter a malograda «Constituição para a Europa» num novo Tratado que, embora de perfil mais modesto, pudesse salvaguardar o essencial.

Surgiu assim o Tratado de Lisboa, assinado no Mosteiro dos Jerónimos em 13 de Dezembro de 2007 e que, após vicissitudes várias no tocante à sua ratificação pelos Estados-membros (o povo irlandês só em segundo referendo lhe deu a sua aprovação), viria a entrar em vigor em 1 de Dezembro de 2009.

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II Parte - A natureza específica da União Europeia

Título I – Os objectivos da U.E. e os instrumentos da sua realização

44. A definição dos objectivos, finalidades ou missões de uma organização internacional reveste-se de fundamental importância jurídica na medida em que permite delimitar com o necessário rigor a sua esfera de competências e apurar com maior segurança o sentido e alcance dos textos que a refem – interpretação teleológica a que o Tribunal de Justiça da União Europeia faz constantemente apelo no cumprimento da sua missão de interpretar e aplicar o direito comunitário – art. 19.º TUE.

Tal definição de objectivos serve também para melhor avaliar da adequação dos meios ou instrumentos de acção de que a Organização e causa dispõe para o cumprimento das missões que a respectiva carta constitutiva pôs a seu cargo; e para lhe facultar o recurso a competências não expressamente previstas mas necessárias à prossecução dos objectivos estatutariamente fixados – competências implícitas.

Ao concluir os Tratados Comunitários – quer os Tratados originários quer outros, ulteriormente negociados para operar a revisão dos anteriores – os Estados-membros pretenderam prosseguir objectivos de natureza diferentes:

Objectivos reais ou imediatos, traduzidos na realização da integração económica;

Um objectivo virtual ou potencial, de carácter político, a concretizar a longo prazo, que acabaria por ser identificado e explicitado sob a designação de U.E.. Note-se, porém, que o Tratado de Lisboa, ao conferir à União personalidade jurídica (art. 47.º TUE) e ao aprofundar consideravelmente a integração europeia empreendida nos anos 50, assinala apenas «uma nova etapa nos processos de

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criação de uma união cada vez mais estreita entre os povos da Europa» (art. 1.º do TUE).

i. O objectivo político da União Europeia

45. O objectivo polítco para cuja realização deveriam concorrer as Comunidades Europeias e que por efeito de arrastamento – i.e., por força da dinâmica da engrenagem instituída pelos Tratados – seria o resultado previsível ou inevitável da integração dos diversos espaços económicos nacionais, consistia na associação dos Estados-membros numa União Europeia de estiço confederal ou mesmo federal.

Este objectivo foi, ao longo das últimas décadas, repetidamente afirmado e viria a ser confirmado quer pelo Tratado de Maastricht em 1992 que instituiu a União Europeia, quer nos subsequentes Tratados de Amesterdão e de Nice. O projecto da «Constituição Europeia», se tivesse vingado, implicaria um largo passo na direcção apontada. Não vingou, mas o Tratado de Lisboa, embora menos ambicioso, representou um passo significativo no processo de unificação europeia.

ii. Os objectivos reais ou imediatos da União Europeia

46. Estes objectivos – de carácter marcadamente político, económico e social – estão enunciados no art. 3.º do TUE e, mais explicitamente ainda, no TFUE.

Tais objectivos deverão ser prosseguidos mediante o aprofundamento do processo de integração no âmbito da União Económica e Monetária instituída no quadro da U.E.

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Capítulo I

O objectivo da unidade política subjacente ao Projecto de Integração Europeia

47. Os Tratados de Paris (CECA) e de Roma (CEE e CEEA) que criaram as Comunidades Europeias exprimem frouxamente a intenção política subjacente ao projecto de integração europeia; mas tal intenção nunca deixou de ser proclamada, com maior ou menor vigor e convicção, quer no âmbito das instâncias comunitárias quer no quadro intergovernamental.

Secção 1.ª – A expressão dada aos Tratados de Paris e de Roma ao objectivo da unidade política

48. Recorde-se que a CECA (extinta em 2002) e, no seguimento desta, a CE e a CEEA têm na sua origem a DECLARAÇÃO SCHUMAN, feita em nome do Governo francês no dia 9 de Maio de 1950.

Numa passagem essencial dessa Declaração afirmava-se que mediante a criação da CECA «será realizada simples e rapidamente a fusão de interesses indispensável ao estabelecimento de uma Comunidade económica e introduzido o fermento de uma Comunidade mais vasta e mais profunda entre países durante muito tempo opostos por divisões sangrentas (…) Esta proposta estabelecerá as primeiras bases concretas de uma federação europeia indispensável à preservação da paz».

A proposta SCHUMAN era dominada por três ideias-força que lhe estavam na origem:

a necessidade de pôr termo à rivalidade franco-alemã;

a necessidade de proporcionar aos países europeus um quadro favorável a uma «economia de grandes espaços»;

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a necessidade de unificar a Europa para lhe restituir o lugar que lhe coubera no passado e poderia vir ainda a ser o seu no mundo dos nossos dias.

49. Na conformidade do pensamento expresso na declaração SCHUMAN e dos claros propósitos de unidade política que animavam vastos e influentes círculos europeus no após-guerra, afirmava-se no preâmbulo do Tratado de Paris que instituiu a CECA, que os Estados-membros:

«Conscientes de que a Europa só se construirá por meio de realizações concretas que criem uma solidariedade efctiva (…)

Resolvidos a substituir rivalidades seculares por uma fusão dos seus interesses essenciais; a assentar, pela instituição de uma comunidade económica, os primeiros alicerces de uma comunidade mais ampla e mais profunda entre povos há muito divididos po conflitos sangrentos e a lançar as bases de instituições capazes de orientar um destino doravamte compartilhado (…)»

50. Esta mesma ideia viria a ser retomada e confirmada – embora em termos mais vagos – pelos seis Estados fundadores da CE que no preâmbulo do Tratado de Roma se declararam «determinados a estabelecer os fundamentos de uma união cada vez mais esTreita entre os povos europeus».

Desde então, os responsáveis políticos, tanto a nível nacional como no quadro comunitário, jamais cessaram afirmar que as Comunidades ditas económicas implicavam e simultaneamente preparavam a emergência de uma Comunidade política.

Secção 2.ª – A proclamação pelas instâncias nacionais e comunitárias do objectivo da unidade política da Europa

51. O objectivo da unidade política da Europa, cuja realização só a longo prazo se antolhava possível,

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esteve sempre presente, com mais ou menos clareza, nas sucessivas declarações, relatórios, projectos d etratados e documentos oficiais emanados tanto dos mais altos representantes dos Estados-membros como das Instituições Comunitárias. Em 1984, o Parlamento Europeu decidiu ele próprio fazer avançar o processo de integração política, aprovando um projecto de tratado elaborado no seu seio, que visava instituir a «União Europeia» e cuja conclusão propôs aos Estados-membros.

Porém, os Estados não deram seguimento a esta iniciativa, limiatndo-se a assinar o Acto único Europeu que viria de algum modo explicitar as suas concepções mais reservadas sobre a evolução do processo de construção política da Europa.

No entanto, de forma repetida, ao longo dos últimos 25 anos, os Estados-membros têm proclamado, em solenes declarações dos seus mais altos representantes, a intenção política subjacente ao projecto de integração europeia.

Embora em termos ambíguos, o objectivo final contido nessas declarações era o de instituir um «União Europeia» - de natureza não definida mas que aparecia sempre ligada a um ideário de liberdade e democracia comum a todos os Estados-membros e que, por consenso inequívoco, se entendia dever caracterizar tal projecto.

A intenção mais clara de vontade dos Estados a prosseguir pela via do aprofundamento da U.E. viria a ser expressa quer no Tratado de Maastricht de 1992, que a instituiu, quer no Tratado de Amesterdão de 1998, quer no Tratado de Nice de 2001 – quer, finalmente, no Tratado de Lisboa.

O significado do Tratado de Lisboa

52. O TUE, com a formulação resultante do Tratado de Lisboa, retoma e amplia as proclamações de princípios constantes dos tratados anteriores.

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Logo no Preâmbulo, os Estados-membros da U.E. declaram-se decididos « a assinalar uma nova fase do processo de integração europeia iniciado com a instituição das Comunidades Europeias» e, inspirados «no património cultural, religioso e humanista da Europa»; recordam «a importânica histórica do fim da divisão do continente europeu e a necessidade da criação de bases sólidas para a construção da futura Europa», vocacionada para abarcar todos os países europeus que satisfaçam as exigências da adesão à U.E. e respeitem os valores identificados no art. 2.º do Tratado que a instituiu;

Mais se declaram resolvidos a «instituir uma cidadania comum aos nacionais dos Estados-membros»;

e a «executar uma política externa e de segurança» que possa evoluir no sentido de uma defesa comum;

Igualmente se afirmam resolvidos a «continuar o processo de criação de uma União cada vez mais estreita entre os povos da Europa» assente nos princípios da igualdade, liberdade, democracia, respeito pelos direitos do Homem e liberdades fundamentais e do Estado de Direito, e bem assim na solidariedade entre os povos da Europa e no progresso económico e social.

Finalmente, os Estados-membros, não considerando a U.E., na sua fase actual, como o desfecho ou termo do processo de integração já iniciado nos anos 50 – i.e., como obra acabada e definitiva – desde já encaram «a perspectiva das etapas ulteriores a transpor para fazer progredir a U.E.».

Capítulo II

Os objectivos imediatos da União Europeia

Tais objectivos, evocados no Preâmbulo do TUE, foram explicitados no seu articulado. Trata-se de objectivos de natureza marcadamente política ou de carácter económico e social.

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Secção 1.ª – Objectivos de natureza política

Objectivos na ordem internacional

53. Na ordem externa a U.E. tem por objectivo promover a paz (art. 3.º/1 TUE). E, ao promovê-la, tem presentes os valores em que se afunda e de que entende não dever alhear-se nas relações com os outros países:

respeito pela dignidade humana; respeito da liberdade, democracia, igualdade,

do Estado de Direito e pelos direitos do homem, incluindo os direitos das pessoas pertencentes a minorias.

Estes valores são comuns aos Estados-membros, numa sociedade caracterizada pelo pluralismo, a não discriminação, a tolerância, a justiça, a solidariedade e a igualdade entre homens e mulheres (cfr. art. 2.º TUE).

Para isso, nas suas relações com o resto do mundo, a União afirma e promove os seus valores e interesses e contribui para a protecção dos seus cidadãos. Contribui para a paz, segurança, desenvolvimento sustentável do planeta, a solidariedade e o respeito mútuo entre os povos, comércio livre e equitativo, erradicação da pobreza e a protecção dos direitos do Homem, em especial os da criança, bem como para a rigorosa observância e o desenvolvimento do direito internacioanl incluindo o respeito dos princípios da CNU (cfr. art. 3.º/1/5).

Em particular, a União desenvolve relações privilegiadas com os países vizinhos, a fim de criar um espaço de prosperidade e boa vizinhança, fundado nos valores da União e caracterizado por relações etsreitas e pacíficas, baseadas na cooperação, podendo para o efeito concluir acordos específicos com os países interessados (cfr. art. 8.º).

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Objectivos na ordem interna

i. Nas relações com os Estados-membros

54. Tendo em vista o reforço da unidade entre os países europeus que a constituem, a União promove a coesão económica, social e territorial e bem assim a solidariedade entre os Estados-membros respeitanto a riqueza da sua diversidade cultural e linguística, velando pela salvaguarda e pelo desenvolvimento do património cultural europeu (art. 3.º/3 TUE).

Igualmente, a União respeita a igualdade dos Estados-membros, perante os Tratados bem como a respectiva identidade nacional, reflectida nas estruturas políticas e constitucionais fundamentais de cada um deles, incluindo no que se refere à autonomia local e regional.

A União respeita as funções essenciais do Estado, nomeadamente as que se destinam a garantir a integridade territorial, a manter a ordem pública e a salvaguardar a segurança nacional continua a ser da exclusiva responsabilidade de cada Estado-membro (art. 4.º/1).

Na verdade, a delimitação das competências da União rege-se pelo princípio da atribuição (art. 5.º) pelo que «as comeptências que não sejam atribuídas à União pertencem aos Estados-membros» (art. 4.º) – e mesmo no que respeita às competências da União, o seu exercício rege-se pelos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade (art. 5.º).

De qualquer forma, com base no princípio da cooperação leal que domina as relações entre os Estados-membros e entre estes e a União de que fazem parte, uma e outros respeitam-se e assistem-se mutuamente no cumprimento das missões decorrentes dos Tratados – cumprindo à União velar por que os seus Membros tomem todas as medidas gerais ou específicas adequadas para garantir a correcta execução quer das obrigações resultantes dos Tratados quer das impostas pelos actos das Instituições da União. Entre tais obrigações conta-se a de os Estados-membros facilitarem à União e colaborarem com ela no cumprimento da sua missão, na ordem interna e na

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ordem internacional, abstendo_se de qualquer medida que possa pôr em risco a realização dos seus objectivos (art. 4.º/3).

ii. Nas relações com os cidadãos da União

55. O princípio fundamental está explicitado no art. 3.º do TUE: «A União tem por objectivo promover a paz, os seus valores e o bem-estar dos seus povos» (art. 3.º/1).

Tendo em vista a concretização deste objectivo, a União procurou através da criação do mercado interno e, em termos mais amplos, da realização da União Económica Monetária, proporciona aos cidadãos da União um elevado nível de vida assente num crescimento económico equilibrado e na estabilidade dos preços, numa economia social de mercado altamente competitiva que tenha como meta o pleno emprego e o progresso social, e num elevado nível de protecção e de melhoramento da qualidade do ambiente (art. 3.º/1).

Mas, convindo que a um alto nível de bem estar material correspondesse também um adequado quadro de vida, a União proprociona também aos seus cidadãos um espaço de liberdade,segurança e justiça sem fronteiras internas, em que seja assegurada a livre circulação de pessoas, em conjugação com medidas adequadas em matéria de controlos na fronteira externa, de asilo e emigração, bem como de prevenção da criminalidade (art. 3.º/2).

A par disso, a União combate e exclusão social e as discriminações e promove a justiça e a protecção sociais, a igualdade entre os homens e mulheres, a solidariedade entre gerações e a protecção dos direitos da criança – tudo na conformidade das disposições dos tratados em particular no respeito dos direitos, liberdades e princípios enunciados na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia que tem o memso valor jurídico que os Tratados (art. 6.º/2).

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Secção 2.ª – Objectivos económicos e sociais da União Europeia

56. Tais objectivos estão enunciados no art. 3.º do TUE e explicitados ao longo do TFUE. Por força dos n.ºs 3 e 4 do art. 3.º, a União:

«estabelece um mercado interno», e »uma união económica e monetária cuja moeda é o euro»;

Empenha-se no desenvolvimento sustentável da Europa, assente num crescimento económico equilibrado e na estabilidade dos preços, numa economia social de mercado altamente competitiva que tenha como meta o pleno emprego e o rpogresso social, e num elevado nível de protecção e de mlehoramento da qualidade do ambiente;

promove a coesão económica, social e territorial, e a solidariedade entre os Estados-membros;

combate a exclusão social e as discriminações e promobe a justiça e a protecção sociais, a igualdade entre homens e mulheres, a solidariedade entre as gerações e a protecção dos direitos da criança;

respeita a riqueza da sua diversidade cultural e linguística e vela pela salvaguarda e pelo desenvolvimento do património cultural europeu.

Capítulo III – Os isntrumentos da realização dos objectivos da União Europeia

Os Tratados procuram dotar a União de meios adequados à prossecução dos seus objectivos quer de natureza política quer de natureza económica.

Secção 1.ª – Os instrumentos da realização dos objectivos políticos

Em primeiro lugar, foi conferida à U.E. personalidade jurídica (art. 47.º TUE) que lhe permite agir

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autonomamente, em seu próprio nome, quer na ordem interna, quer na ordem internacional.

Por outro lado, a União foi dotada de um aparelho institucional poderoso, dotado de atribuição e poderes adequados a desempenhar com eficácia o seu papel no plano interno e na cena internacional.

O aparelho institucional

i. O papel das Instituições da União

57. Composto pelos mais altos representantes dos Estados da União (chefes de Estado ou de governo), o Conseho Europeu «dá à União os impulsos necessários ao seu desenvolvimento, e nomeadamente, à sua projecção na cena internacional» (art. 15.º/1 TUE). Mais concretamente: com base nos princípios e objectivos enunciados no art. 21.º, o Conselho Europeu identifica os interesses e objectivos estratégicos da União e fixa as linhas esratégicas que deverão nortear o Conselho na elaboração da acção externa da União (arts. 16.º/6, 21.º, 22.º e 26.º TUE). E o Presidente do Conselho Europeu assegura, ao nível e nessa qualidade «a representação externa da União nas matérias do âmbito da política externa e de segurança comum» (art. 15.º/6 TUE).

Por seu turno, o Conselho reunido em Conselhos Gerais, sob a Presidência do Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e Políticos de Segurança, «elabora a política externa e de segurança comum da Unição, adopta as decisões necessárias à definição e execução dessa política com base nas orientações gerais e linhas estratégicas definidas pelo Conselho Europeu» (arts. 26.º/2 e 27.º). E é da sua competência autorizar a abertura de negociações para a conclusão de acordos internacionais e definir as directrizes de negociação, designar o negociador ou chefe de equipa de negociação, autorizar a assinatura do acordo negociado e decidir da sua conclusão (arts. 207.º, 216.º a 218.º TFUE).

Cabe ao Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros executar a política externa e de segurança comum, utilizando os meios da União e também dos Estados-membros (arts. 26.º/3 e 27.º TUE).

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A Comissão, por seu lado, desempenha um importante papel na cena internacional: o Alto Representante da União é Vice-Presidente da Comissão; por outro lado, cabe à Comissão, através de iniciativas que toma, desencadear o processo de contratação interncional, nomeadamente no domínio da política comercial comum, mediante recomendações que apresenta ao Conselho; conduz as negociações assegurando-se de que os acordos negociados são compatíveis com as políticas e normas internas da União (art. 207.º TFUE). Cabe ainda à Comissão (quando não caiba ao Alto Representante da União no exercício das suas competências), dar execução aos compromissos internacionais assumidos pela União.

Finalmente, compete ao Parlamento Europeu, em certos casos, conceder ou não a sua aprovação a acordos negociados em diversos domínios e dar parecer (não vinculativo) sobre outros acordos (art. 218.º/6, al.a)).

A acção externa da União

58. A acção da U.E. no domínio das relações externas tem fundamentalmente em vista a afirmação da identidade da U.E. na cena internacional, nomeadamente através da execução de uma política externa e de segurança comum que inclua a definição gradual de uma política de defesa comum que poderá conduzir a uma defesa comum (art. 24.º TUE).

A definição e aplicação de tais políticas sem um prévio esforço de adequada concertação poderia implicar consequências graves quer para a União quer para os Estados que dela fazem parte.

A política comercial adoptada pela União em relação a determinados países ou ao resto do mundo; a posição dos Estados-membros em face do mundo árabe em geral e do conflito israelo-árabe em particular; a ajuda a países do Terceiro Mundo e as relações especiais com os países ACP (África, Caraíbas e Pacífico) organizadas no âmbito de sucessivas Convenções que a U.E. com eles celebrou; a posição dos Estados-membros relativamente às guerras internacionais ou civis e outros conflitos que ocorram no

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mundo; as questões relativas ao abastecimento em energia ou à preservação do ambiente – tudo são matérias que implicam sérias opções políticas a nível nacional, no quadro intergovernamental dos Estados-membros e no âmbito da União. Ora, para que tais opções sejam as mais convenientes simultaneamente do ponto de vista da U.E. e dos estados que a constituem, é indispensável que as decisões a tomar quer pelas Instituições da União quer pelos governos nacionais surjam como o resultado de um prévio esforço de compatibilização dos objectivos e interesses gerais da União com os interesses e objectivos particulares dos seus membros, e que as posições acordadas num quadro apropriado tenham depois adequada expressão prática no âmbito da acção da União e da política externa dos Estados-membros.

i. Princípios fundamentais da acção externa da União

59. A acção da União na cena internacional assenta nos princípios que presidiram à sua criação, desenvolvimento e alargamento, e que é seu objectivo promover em todo o mundo: democracia, Estado de direito, universalidade e indivisibilidade dos direitos do Homem e das liberdades fundamentais, respeito pela dignidade humana, princípios de igualdade e de solidariedade e respeito pelos princípios da CNU e do direito internacional.

A União procura desenvolver relações e constituir parcerias com os países terceiros e com as organziações internacionais, regionais ou mundiais que partilhem dos princípios enunciados (art. 21.º/1 TUE).

ii. Objectivos da acção externa da União

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60. A União define e prossegue políticas e acções comuns e diligencia no sentido de assegurar um elevado grau de cooperação em todos os domínios das relações internacionais, a fim de:

a) Salvaguardar os seus valores, interesses fundamentais, segurança, independência e integridade;

b) Consolidar e apoiar a democracia, o Estado de direito, os direitos do Homem e os princípios do direito internacional;

c) Preservar a paz, prevenir conflitos e reforçar a segurança internacional, em conformidade com os objectivos e os princípios da CNU, com os princípios da Acta Final de HelsÍnquia e com os objectivos da Carta de Paris, inlcuindo os respeitantes às fronteiras externas;

d) Apoiar o desenvolvimento sustentável nos planos económico, social e ambiental dos países em desenvolvimento, tendo como principal objectivo erradicar a pobreza;

e) Incentivar a integração de todos os países na economia mundial, inclusivamente através da eliminação progressiva dos obstáculos ao comércio internacional;

f) Contribuir para o desenvolvimento de medidas internacionais para preservar e melhorar a qualidaDe do ambiente e a gestão sustentável dos recursos naturais à escala mundial, a fim de assegurar um desenvolvimento sustentável;

g) Prestar assistência a populações, países e regiões confrontados com catástrofes naturais ou de origem humana; e

h) Promover um sistema internacional baseado numa cooperação multilateral reforçada e uma boa governação ao nível mundial (art. 21.º/2 TUE).

A competência da União em matéria de política externa e de segurança comum abrange todos os domínios da política externa, bem como todas as questões relativas à segurança da União, incluindo a definição gradual de uma

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política comum de defesa que poderá conduzir uma defesa comum (cfr. art. 24.º TUE).

Com base nos referidos princípios e objectivos, o Conselho Europeu, mediante recomendação do Conselho, identifica os interesses e objectivos estratégicos da União.

E o Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros, no domínio da política externa e de segurança comum, e a Comissão, nos restantes domínios da acção externa, podem apresentar propostas conjuntas ao Conselho (art. 22.º TUE).

iii. O papel dos Estados-membros

61. Qualquer Estado-membro tal como o Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política Segurança (ou o Alto Representante com o apoio da Comissão) podem submeter ao Conselho todas as questões do âmbito da política externa e de segurança comum e apresentar-lhe, respectivamente, iniciativas ou propostas (art. 30.º TUE).

Nos casos em que exijam uma decisão rápida, o Alto Representante convoca, por iniciativa própria ou a pedido de um Estado-membro, uma reunião extraordinária do Conselho, no prazo de quarenta e oito horas ou, em caso de absoluta necessidade, num prazo mais curto (art. 30.º TUE).

Também, por força do art. 32.º, os Estados-membros devem concertar-se no âmbito do Conselho Europeu e do Conselho sobre todas as questões de política externa e de segurança que revistam de interesse geral, de modo a definir uma abordagem comum. Antes de empreender qualquer acção no plano internacional ou de assumir qualquer compromisso que possa afectar os interesses da União, cada Estado-membro consulta os outros no Conselho Europeu ou no Conselho. Os Estados-membros asseguram, através da convergência das suas acções, que a União possa defender os seus interesses e os seus valores no plano internacional.

Logo que o Conselho Europeu, ou o Conselho, tenha definido uma abordagem comum da União, o Alto

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Representante da União para os Negócios Estrangeiros e os Ministros dos Negócios Estrangeiros dos Estados-membros coordenam as suas actividades no Conselho (art. 32.º TUE).

Também as missões diplomáticas dos Estados-membros e as delegações da União nos países terceiros e junto das organizações internacionais cooperam entre si e contribuem para a formulação e execução da abordagem comum.

A par disso, os Estados-membros coordenam a sua acção no âmbito das organizações internacionais e em conferências internacionais. Nessas instâncias defendem as posições da União (arts. 32.º e 34.º TUE).

Os Estados-membros que sejam igualmente membros do Conselho de Segurança das Nações Unidas concertam-se e mantêm os outros Estados-membros, bem como o Alto Representante, plenamente informados. Os Estados-membros que são membros do CSNU defendem, no exercício das suas funções, as posições e os interesses da União, sem prejuízo das responsabilidades que lhes incumbem por força da CNU.

Sempre que a União tenha definido uma posição sobre um tema que conste da ordem de trabalhos do CSNU, os Estados-membros que nele têm assento solicitam que o Alto Representante seja convidado a apresentar a posição da União (art. 34.º TUE).

Por outro lado, consoante o disposto no art. 35.º do TUE, as missões diplomáticas e consulares dos Estados-membros e as delegações da União nos países terceiros e nas conferências internacionais, bem como as respectivas representações junto das organizações internacionais concertam-se no sentido de assegurar a observância e a execução das decisões que definem as posições e acções da União.

As referidas missões, delegações e representações intensificam a sua cooperação através do intercâmbio de informações, procedendo a avaliações comuns.

Em especial, as referidas missões e delegações contribuem para a execução do direito de protecção dos cidadãos da União no território de países terceiros.

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As decisões em matéria de política externa são tomadas pelo Conselho Europeu e pelo Conselho, deliberando por unanimidade que não é prejudicada pela eventual abstenção de qualquer Estado-membro – o qual não ficando por força da sua abstenção obrigado a aplicar a decisão adoptada, deve abster-se de actuações susceptíveis de colidir com a acção da União (art. 31.º TUE).

A política comum de segurança e defesa

62. Segundo o art. 42.º/1/2 do TUE, a política comum de segurança e defesa faz parte integrante da política externa e de segurança comum. A política comum de segurança e defesa garante à União uma capacidade operacional apoiada em meios civis e militares. A União pode empregá-los em missões no exterior a fim de assegurar a manutenção da paz, a prevenção de conflitos e o reforço da segurança internacional, de acordo com os princípios da CNU. A execução destas tarefas assenta nas capacidades fornecidas pelos Estados-membros.

A política comum de segurança e defesa inclui a definição gradual de uma política de defesa comum da União. Esta conduzirá a uma defesa comum logo que o Conselho Europeu, deliberando por unanimidade, assim decida e os Estados-membros assim o aceitem na conformidade das respectivas normas constitucionais (art. 42.º TUE).

Com vista à execução da política comum de segurança e defesa, os Estados-membros colocam à disposição da União capacidades civis e militares de modo a contribuir para os objectivos definidos pelo Conselho. Os Estados-membros que constituam entre si forças multinacionais podem também colocá-las à disposição da política comum de segurança e defesa (art. 42.º/3 TUE).

As missões nas quais a União pode utilizar meios civis e militares, incluem as acções conjuntas em matéria de desarmamento, missões humanitárias e de evacuação,

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missões de aconselhamento e assistência em matéria militar, missões de prevenção de conflitos e de manutenção da paz, missões de forças de combate para a gestão de crises, incluindo as missões de restabelecimento da paz e as operações de estabilizção em termos de conflitos. Todas essas missões podem contribuir para a luta contra o terrorismo, inclusive mediante o apoio prestado a países terceiros para combater o terrorismo no respectivo território.

Por outro lado, a Política Comum de Segurança e Defesa comporta um sistema de auxílio e assistência mútuos: no caso de um Estado-membro ser alvo de agressão armada no seu território: os outros Estados-membros devem prestar-lhe auxílio por todos os meios ao seu alcance (art. 42.º/7 TUE).

As decisões relativas à política comum de segurança e defesa, incluindo as que respeitam ao lançamento de uma missão referida no art. 42.º, são adoptadas pelo Conselho, deliberando por unanimidade, sob proposta do Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança ou por iniciativa de um Estado-membro (art. 42.º/4 TUE).

Secção 2.ª – Os instrumentos da realização dos objectivos de natureza económica e social

63. Relembre-se os objectivos económicos e sociais explicitados no art. 30.º TUE:

A União «empenha-se no desenvolvimento sustentável da Europa, assente num crescimento económico equilibrado e na estabilidade de preços, numa economia social de mercado altamente competitiva que tenha como meta o pleno emprego e o progresso social, e num elevado nível de protecção e de melhoramento da qualidad edo ambiente. Fomenta o progresso científico e tecnológico».

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«Combate a exclusão social e as discriminações e promove a justiça e a protecção sociais, a igualdade entre homens e mulheres, a solidariedade entre as gerações e a protecção dos direitos da criança».

«Promove a coesão económica, social e territorial, e a solidariedade entre os Estados-membros.»

Para alcançar estes objectivos, a União- estabelece um mercado interno; e- uma união económica e monetária cuja moeda é o

Euro.

O mercado interno

64. O mercado interno compreende um espaço sem fronteiras internas no qual a livre circulação das mercadorias, pessoas, serviços e capitais, é assegurada de acordo comas disposições dos Tratados (art. 26.º/2 TUE).

i. Livre circulação das mercadorias

65. A livre circulação tem lugar no quadro de uma união aduaneira que abrange a totalidade do comércio de mercadorias (originárias ou não dos Estados-membros) e implica a proibição entre os Estados-membros de direitos aduaneiros de importação e exportação e de quaisquer outros encargos de natureza equivalente – e bem assim de restrições quantitativas à importação e exportação ou de medidas de efeito equivalente (arts. 28.º e segs. designadamente 30.º, 34.º e 35.º).

ii. A livre circulação das pessoas

66. A realização do mercado interno também implica a livre circulação das pessoas em geral, e em particular dos trabalhadores assalariados (arts.

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45.º a 48.º), dos empresários que pretendam estabelecer em qualquer sector de actividade (agricultura, indústria, serviços) a título individual ou mediante a constituição de sociedades, dos profissionais independentes cuja actividade consista na prestação de serviços e das pessoas em geral ao deslocar-se no espaço da União, mesmo na qualidade de simples turistas, beneficiam da prestação de serviços diversos.

iii. Liberdade de estabelecimento e de prestação de serviços

67. Nesta conformidade, os Tratados proíbem as restrições ao direito de estabelecimento dos nacionais de um Estado-membro no território de outro Estado-membro, pelo que estes gozam da liberdade de criar, em qualquer parte do espaço da União, empresas ou sociedades novas, de participar em sociedades já existentes ou de criar agências, sucursais ou filiais de empresas ou sociedades já constituídas no respectivo país de origem. Igualmente são proibidas as restrições à livre prestação de serviços, no território da União, pelos nacionais dos Estados-membros (arts. 49.º e 62.º TFUE).

iv. A livre circulação dos capitais

68. A União proíbe todas as restrições aos movimentos de capitais e aos pagamentos entre Estados-membros e entre estes e países terceiros (art. 63.º TFUE).

Regras comuns e concorrência

69. Para que a economia da União se tornasse «altamente competitiva» (art. 3.º/3 TUE), os Tratados

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estabeleceram um conjunto de regras de concorrência aplicáveis aos operadores económicos da União que proíbem e sancionaram práticas anticoncorrenciais entre as empresas (privadas e públicas) e auxílios estatais lesivos de uma concorrência leal (arts. 101.º a 109.º TFUE).

A União Económica e Monetária

70. O projecto europeu não se limitava apenas à realização do mercado interno que, por força da engrenagem instituída e da sua dinâmica própria deveria evoluir no sentido da criação de uma união económica e monetária. Este passo foi sendo dado paulatinamente, até ser formalmente consagrado no n.º 4 do art. 3.º do TUE, graças à definição e aplicação gradual de um conjunto de políticas comuns nos domínios económico e social, conducentes a um desenvolvimento sustentável assente no crescimento económico equilibrado, na estabilidade dos preços (que cabe ao BCE assegurar), no pleno emprego e no progresso social, no progresso científico e tecnológico e no elevado nível de protecção do ambiente.

Tais políticas, contempladas no TFUE são, entre outras, as seguintes:

política agrícola e de pescas (arts. 38.º a 44.º TFUE);

política conducente à criação na União de um espaço de liberdade, segurança e justiça (arts. 67.º a 89º);

política de transportes (arts. 90.º a 100.º e 170.º a 172.º TFUE);

políticas nos domínios económico e monetário consiantes com a criação da União Económica e Monetária (arts. 119.º a 144.º TFUE);

política social (arts. 151.º a 164.º); políticas de educação e formação profisisonal e

de juventude e desporto (arts. 165.º e 160.º); política de cultura (art. 167.º);

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de saúde pública (art. 168.º); de defesa dos consumidores (art. 169.º); política industrial (art. 173.º); política de investigação de desenvolvimento

tecnológico (art. 179.º); política de protecção do ambiente (arts. 191.º -

193.º); política de protecção civil (art. 196.º) – tudo

orientado no sentido de promover um desenvolvimetno harmonioso do conjunto da União e reforçar assim a sua coesão económica, social e territorial (arts. 174º - 178.º) e de criar, no quadro da U.E., uma sólida União Económica e Monetária servida por uma moeda única.

O reforço da defesa dos direitos e dos interesses dos nacionais dos Estados-membros

71. O TUE reforça também os direitos e interesses dos nacionais dos seus Estados-membros mediante:

instituição de uma cidadania da União; proclamação solene do respeito pelos direitos e

liberdades fundamentais.

i. A cidadania da União Europeia

72. A expressão «cidadãos comunitários» pretende dirigir-se aos cidadãos dos Estados-membros que eram sujeitos de direito comunitário. O TUE instituiu, nos seus arts. 9.º e 10.º, a cidadania da União, expressão cuja natureza e alcance foram estabelecidos nos arts. 20.º a 24.º do TFUE, que tratam do reconhecimento da cidadania da União e dos direitos inerentes a esse reconhecimento.

«É cidadão da União qualquer pessoa que tenha a nacionalidade de um Estado-membro» (art. 9.º TUE).

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Nestas condições, cada um dos Estados-membros da União mantém completa liberdade para, de acordo com os seus próprios critérios, atribuir a sua nacionalidade.

Consequentemente, todo aquele que pelo direito interno de um Estado for considerado como seu nacional beneficia, ipso facto, da cidadania da União. E como cidadão da União goza dos direitos e fica sujeito aos deveres decorrentes do direito comunitário.

ii. Os direitos inerentes à qualidade de cidadão da U.E.

1. Direito de livre circulação e permanência

73. Segundo o art. 20.º/2/al.a) e 21.º do TFUE, «qualquer cidadão da União goza do direito de circular e permanecer livremente no território dos Estados-membros».

Esta disposição estende a qualquer pessoa o direito de livre circulação de que na redacção das anteriores disposições do Tratado, conjugadas com as do direito derivado e com a jurisprudência do Tribunal, apenas beneficiava o «homo economicus», participante no mercado interno.

A esse direito de livre circulação acresce o de permanecer livremente no território dos Estados-membros – direito de que inicialmente apenas usufruíam os trabalhadores assalariados, os empresários e os trabalhadores indepententes beneficiários da liberdade de estabelecimento e de prestação de serviços.

O acordo de Schengen de 14 de Junho de 1985 relativo à eliminação dos controlos nas fronteiras internas da Comunidade Europeia, complementado por uma Convenção de Aplicação (1990) e outros actos que alargaram o seu domínio de aplicação a quase todo o espaço da EU permitiu facilitar o direito de livre circulação dos cidadãos europeus.

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2. Direitos políticos

74. Estes direitos abarcam:

a) O direito de qualquer cidadão da EU residente num Estado-membro que não seja o da sua nacionalidade eleger e ser eleito nas eleições municipais do Estado-membro de residência, nas mesmas condições que os nacionais desse Estado (art. 20.º/2/al. b) e 22.º TFUE).

b) O direito de eleger e de ser eleito nas eleições para o Parlamento Europeu no Estado-membro de residência, nas mesmas condições que os nacionais de esse Estado (art. 20.º/2/al. b e 22.º TFUE).2

3. Direito à protecção diplomática

75. Qualquer cidadão da U.E. beneficia, no território de países terceiros em que o Estado-membro de que é nacional não se encontre representado, de protecção por parte das autoridades diplomáticas e consulares de qualquer Estado-membro, ao qual incumbr prestá-la nas mesmas condições em que a presta aos seus próprios nacionais (art. 20.º/2/al. c) e 23.º TUE).

4. Direito de petição ao Parlamento Europeu

76. Qualquer cidadão da U.E., bem como qualquer outra pessoa singular ou colectiva com residência ou sede estatutária num Estado-membro) tem o direito de apresentar, a título individual ou em associação com outros cidadãos ou pessoas, petições ao Parlamento

2 CFR. Directiva n.º 93/101/CE – regula o exercício do direito de voto e a elegibilidade nas eleições para o Parlamento Europeu por parte dos cidadãos da U.E. residentes num Estado-membro de que não tenham a nacionalidade – Lei n.º 4/94, de 9 de Março (transposição para a ordem interna portuguesa).

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Europeu sobre qualquer questão que se integre nos domínios da actividade da União e que lhe diga directamente respeito (arts. 20.º/2/al. d), 24.º e 227.º TFUE).

5. Direito de queixa ao Provedor de Justiça

77. Qualquer cidadão da União – ou qualquer pessoa singular ou colectiva com residência ou sede estatutária num Estado-membro – pode dirigir-se ao Provedor de Justiça para apresentar queixas respeitantes a casos d emá administração na actuação das Instituições ou organismos da União – com excepção do Tribunal de Justiça quando este tenha agido no exercício das respectivas funções jurisdicionais (arts. 20.º/2/al. d), 24.º e 228.º TFUE).

Cabe igualmente aos cidadãos da U.E. o direito de se dirigir às Instituições e aos órgãos consultivos da União numa das línguas dos Tratados de obter uma resposta na mesma língua (art. 20.º/2/al. d)).

6. Respeito dos direitos fundamentais dos cidadãos da União

78. Por fim, o TUE garante aos seus cidadãos o respeito pelos seus direitos fundamentais nos termos decorrentes do art. 6.º TUE.

Título II – A Natureza Jurídica da União Europeia

79. A conclusão dos Tratados implicou para os Estados-membros que neles participaram ou a eles aderiram mais tarde, não apenas uma autolimitação da soberania nacional mas, mais do que isso, a transferência para a U.E. do exercício de poderes soberanos do Estado.

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Ao assumirem o estatuto de membros da União, os Estados renunciaram – como o exigia o estabelecimento de uma união aduaneira e a integração dos mercados internos – a uma considerável parcela das suas competências tradicionais; mas, para além disso, conferiram às Instituições da União, com vista à criação da União Económica e Monetária, o exercício, em seu lugar, de competências e poderes muito vastos, tanto de carácter legislativo e executivo como de natureza jurisdicional e até política – com exclusão, nos domínios submetidos a uma gestão comum, do exercicio pelos Estados-membros de poderes paralelos ou concorrentes.

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Capítulo I – Uma Organização Internacional «SUI GENERIS»

Introdução

80. Ainda é do fórum a questão da natureza da U.E. cujos caracteres distintivos não permitem incluí-la em nenhuma das categorias preestabelecidas – situada a meio caminho entre as organizações de simples cooperação e os sistemas federais.

Organização do tipo federal?

81. Numa síntese dos aspectos ou caracteres de estilo federal que uma análise levada a cabo com espírio federalista permitia atribuir às Comunidades Europeias reconhece que:

Os Tratados de Roma, à semelhança de uma «Carta Federal». foram concluídos por tempo ilimitado e não previram em nenhum caso o direito de secessão3;

Tais tratados estabelecem, tal como as cartas federais, a transferência de competências dos Estados-membros para as Instituições Comunitárias;

O sistema institucional das Comunidades comporta elaborados processos de decisão por maioria;

A revisão dos Tratados deve ser levada a cabo não através de instrumentos de carácter intergovernamental negociados no âmbito de conferências diplomáticas do tipo clássico mas, antes, segundo um processo que, se exige a intervenção dos Estados-membros, comporta também a participação das próprias Instituições da U.E.;

À semelhança do que sucede num sistema federal as Instituições dispõem de um verdadeiro poder legislativo que lhes permite adoptar regras gerais e abstractas, directa e imediatamente aplicáveis na ordem jurídica interna dos Estados-membros

3 Actualmente isto não é excato. O art. 50.º do TUE dispôs que: «Qualquer Estado-membro pode decidir (…) retirar-se da União».

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independentemente de qualquer processo de recepção;

Os Tratados organizam a subordinação dos Estados-membros à regra do direito comum, atribuido ao Tribunal de Justiça competências que lhe permitem impor um certo federalismo jurídico, traduzido não só na aplicabilidade directa do direito comunitário como também na sua primazia sobre o direito interno dos Estados-membros e na sua sujeição a mecanismos destinados a assegurar-lhe uma interpretação e aplicação uniformes;

Os Tratados e mais ainda o direito deles derivado e que é uma criação das próprias Comunidades comportam uma espécie de fiscalização federal no âmbito de um sistema de recursos próprios;

E foi instituída, ainda, no âmbito da U.E. uma União Económica e Monetária servida por uma moeda única.

Assim, depara-se com um «tal conunto de caracteres inerentes ao regime federal que é legítimno concluir que os nossos Tratados consagram um certo federalismo funcional e pretender, por conseguinte, interpretá-los com referência aos princípios fundamentais do federalismo» (Prof. TEITGEN)

Organizações de integração

82. Outros autores, dos quais sobressai o papel de Pièrre PESCATORE, considerando a originalidade e as finalidades, simultaneamente económicas e políticas, do processo de integração europeia de que os tratados comunitários foram o elemento motor, entenderam possível qualificar as Comunidades Europeias como organizações de integração e o direito que as reGe como direito de integração – por oposição ao direito internacional clássico da coexistência ou da simples cooperação intergovernamental. Mas esta conclusão em nada prejudica a tese de TEITGEN.

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Organizações supranacionais

83. Também a natureza e a extensão das atribuições e poderes das Comunidades Europeias, exercidos no espaço territorial dos Estados-membros (por vezes em relação aos próprios nacionais destes) e que, em domínios determinados, excluem o exercício das correspondnetes competências dos Estados, têm permitido encará-las como organizações supranacionais.

Em suma: as concepções qualificações referidas não são muito úteis: antes de mais, estão demasiado ligadas à concepção ideológica a que se adira sobre os objectivos das Comunidades (U.E.) e até a juízo que se faça sobre as intenções que teriam presidido à sua criação; por outro lado, impõe-se reconhecer que nenhuma é aceite pelo conjunto da doutrina jurídica; finalmente, as qualificações possíveis não contribuem de modo algum para facilitar a apreensão do sistema complexo de relações e particularmente de partilha de competências entre a Comunidade (U.E.) e os seus Estados-membros.

Em todo o caso, porque é ideia corrente que a adesão às Comunidades Europeias implicou a alienação da soberania nacional, impõe-s-enos examinar se é possível considerar as Comunidades Europeias (agora U.E.) como entidades soberanas, partindo do princípio de que uma transferência de soberania estadual não é concebível senão a favor de um sujeito de direito internacional titular de soberania que, por força de tal transferência, se torna soberano.

O prosseguimento da nossa análise vai levar-nos a concluir que as Comunidades Europeias (agora U.E.) a ser consideradas como simples organizações interestaduais do tipo novo, instituídas para gerir em comum interesses de um conjunto de Estados-membros, cuja criação não implicou para os Estados-

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membros a renúncia à soberania nacional; implicou, apenas, a transferência do exercício de certas competências estatais.

Secção 1.ª – A pretensa soberania da União Europeia

84. Para chegar a um porto seguro sobre a verdadeira natureza da U.E. seria oportuno analisar a natureza jurídica das suas atribuições, a extensão e o conteúdo dos seus poderes – em relação aos Estados-membros e aos respectivos súbditos – o grau de dependência ou de autonomia do seu sistema de tomada de decisões, as relações de superioridade ou de subordinação entre a ordem jurídica da União e as ordens jurídicas nacionais, etc.

Apesar de haverem já sido feitas profundamente, estas análises não têm permitido chegar a conclusões seguras no tocante à questão de saber se os tratados que instituíram as Comunidades Europeias e agora a União Europeia deram origem a uma entidade «supranacional» habilitada a beneficiar da transferência de uma parcela de soberania dos Estados-membros.

O TJUE tem-se furtado a empregar expressões sumárias ultrapassadas como a de «supranacionalidade», tendo antes recorrido a fórmulas sibilinas, como a de «nova ordem jurídica» e tomando decisões ousadas que lhe permitiram pavimentar a via de um certo federalismo jurídico europeu. Por seu turno, certos tribunais nacionais não têm hesitado em ir mais longe, proclamando a emergência de um verdadeira soberania comunitária.

A questão da supranacionalidade

85. O primeiro autor a empregar a expressão «supranacional» no contexto da unificação europeia foi Arthur SALTER.

No entanto, a responsabilidade pela introdução deste vocábulo no léxico oficial cabe a R. SCHUMAN, ao expor perante a Assembleia Nacional Francesa, em nome do

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Governo, os traços gerais do projecto CECA; depois, ao favorecer a introdução da expressão no próprio dispositivo do Tratado de Paris (cfr. art. 9.º do Tratado CECA).

Mais tarde, SCHUMAN esforçou-se por precisar quais seriam o sentido e alcance da supranacionalidade europeia.

Para R. SCHUMAN, a supranacionalidade situa-se a meio caminho entre, por um lado, o individualismo internacional (que considera intangível a soberania nacional e só aceita as limitações desta soberania que resultem de obrigações consensuais, ocasionais e revogáveis); e, por outro lado, a federação de Estados subordinados a um superestado dotado de soberania territorial e política próprias.

Segundo ele, se uma instituição supranacional como a Comunidade, não possui as características de um Estado, é um afcto que ela detém e exerce certos poderes soberanos:

é independente dos Governos dos Estados-membros, nos limites definidos pelo Tratado;

esta independência é irrevogável, bem como a transferência de competências de que beneficiou;

o Tratado confere à Comunidade uma missão e funções próprias que não são exercidas a Título de simples delegação de poderes dos Estados-membros.

Esra noção de supranacionalidade estaria destinada, uma vez lançada sob a autoridade desse homem de Estado e europeu convicto, a manifestar todas as suas virtualidades como ideia-força da integração europeia: utilizada en 1952 no art. 9.º do Tratado CECA, a expressão «supranacionalidade» viria a ser retomada no projecto de tratado respeitante à Comunidade Política Europeia – o que permitiu a SCHUMAN avançar a previsão de que este vocábulo não mais seria excluído do léxico jurídico, e manifestar a sua firme convicção de que um novo grau na hierarquia dos poderes estaria assim definitivamente consagrado para o futuro.

Embora os Tratados CEE e CEEA, assinados em 1956 não tenham utilizado esta expressão, a doutrina jurídica adoptou-a para caracterizar as Comunidades Europeias face a outras organizações

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internacionais, pondo em relevo o que há de específico no fenómeno comunitário e que permitiria falar de «supranacionalidade».

86. Para REUTER – primeiro autor que tentou dar conteúdo jurídico preciso à nova noção – o que autorizaria a utilizá-la no quadro europeu seria a independência das instituições comunitárias em relação aos Governos nacionais, a transferência de competências estatais para as Comunidades e as relações imediatas entre os órgãos comunitários e os particulares (pessoas singulares e colectivas) nacionais dos Estados-membros.

Também COLIN entendeu que a origem da supranacionalidade reside numa transferência de competências estaduais.

Segundo outros autores, podri acrescentar-se aos elementos relevados por REUTER o facto de que as competências atribuídas às Comunidades são relativamente extensas.

VISSCHER, por seu lado, considera que o carácter distintivo da supranacionalidade consiste no imediatismo do direito comunitário, ou seja, na possibilidade da sua aplicação directa aos particulares, independentemente de qualquer intervenção dos Estados.

Para WILDAU, a expressão em causa supõe uma ordem de subordinação, ao contrário do vocábulo «internacional»m que está essencialmente relacionado com a ideia de coordenação de soberanias; esta ordem de subordinação implica a independência do órgão supranacional face aos Estados e o carácter obrigatório das suas decisões.

Em suma: pela nossa parte, mesmo aceitando que o Tratado de Lisboa, ao criar a U.E., veio sublinhar a natureza supranacional da U.E., admitimos que uma análise cuidada dos diversos aspectos que os autores referidos puseram em destaque permitiria detectar situações similares em organizações intergovernamentais tradicionais.A tomada de decisões por maioria, o carácter obrigatório de tais decisões na ordem interna dos Estados, a

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independência dos resoectivos órgãos e dos seus membros são características comuns a diversas organizações internacionais.Impõe-se, todavia, reconhecer que a intervenção sistemática e permanente das Comunidades e agora da U.E. em vastos domínios que anteriormente dependiam da competência exclusiva dos Estados e cujas fronteiras são mal definidas (o que permitiu uma inflação constante de competências comunitárias), é uma realidade que tem pouco que ver com a intervenção esporádica das organizações internacionais clássicas em domínios restritos e rigorosamente definidos da actividade e da competência próprias dos Estados.

Não obstante, parece que os critérios que melhor podem exprimir a supranacionalidade de uma OI são essencialmente dois: a autonomia dos seus órgãos em face dos Estados-membros e os imediatismo dos poderes exercidos – imediatismo que se manifesta quando a norma ou injunção concreta (decisão) emanada desses órgãos autónomos é directamente aplicável e plenamente eficaz na ordem jurídica interna dos Estados, independentemente de qualquer acto nacional destinado a operar a sua recpção ou prejudicar a sua eficácia.

Uma nova ordem jurídica

87. Tanto o TJ como certos tribunais nacionais tiveram já ocasião de se pronunciar sobre a natureza jurídica das Comunidades Europeias, exprimindo as suas concepções.

No acórdão proferido no caso Costa/ENEL, o TJ precisou que o Tratado CE, diversamente dos tratados internacionais tradicionais, instituiu:

«Uma ordem jurídica própria, uma Comunidade de duração ilimitada, dotada de atribuições próprias, de personalidade, capacidade jurídica, capacidade de

representação internacional e, mais precisamente, de poderes reais decorrentes de uma limitação de

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competências ou de uma transferência de atribuições dos Estados à Comunidade (…)»

Os Estados limitaram pois, «ainda que em domínios restritos, os seus direitos soberanos e criaram assim um

corpo de direito aplicável aos seus súbditos e a si próprios… A transferência operada pelos Estados, da sua ordem

jurídica interna a favor da ordem jurídica comunitária, dos direitos e obrigações correspondentes às disposições dos tratados implica, pois, uma limitação definitiva dos seus

direitos soberanos contra a qual não poderá prevalecer um acto unilateral ulterior incompatível com a noção de

Comunidade».

No Ac. de 14 de Dezembro de 1971, o Tribunal declara, porém, em termos mais moderados, que os «Estados-membros acordaram em instituir uma Comunidade de duração ilimitada, dotada de instituições permanentes, investida de poderes reais decorrentes de uma limitação de competências ou de uma transferência de atribuições dos Estados a esta Comunidade».

Mas no Ac. de 13 de Julho de 1972, o TJ reafirma esta ideia de «limitação definitiva dos direitos soberanos dos Estados, contra a qual não poderá prevalecer a invocação de disposições do direito interno, seja qual for a sua natureza».

88. Verifica-se que o TJ evita meticulosamente qualificar as Comunidades como entidades soberanas. Mas, ao procurar isolá-las de qualquer impureza de carácter metajurídico, encarando-as como um sistema normativo autónomo que, graças aos princípios de aplicabilidade directa e do primado da norma comunitária, age como um instrumento de unificação do direito; e, ao apresentá-las, depuradas de qualquer componente política ou ideológica, como um «ordenamento jurídico» próprio e autónomo, não se terá poreventura o Alto Tribunal inspirado numa concepção kelsiana que precisamnete identifica a entidade soberana que é o Estado com um sistema de normas jurídicas?

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O direito comunitário seria, na concepção do TJUE, um ordenamento autónomo não somente por ser distinto tanto da ordem jurídica interna como da ordem jurídica internacional e por não ser tributário das ordens jurídicas dos Estados-membros, mas ainda porque as suas relações com tais ordens jurídicas são definidas segundo critérios póoprios de direito comunitário – que, ao proclamar o princípio da primazia da ordem jurídica da U.E. instituiu uma relação de subordinação em que o ordenamento jurídico dos Estados-membros é forçado a vergar-se perante a ordem jurídica reconhecida como superior.

Não constituirá a ordem jurídica da U.E. – autónoma e distinta da dos Estados-membros – a expressão, no plano normativo, de uma sonberania própria em face dos Estados que a constituem?

i. As concepções de alguns tribunais nacionais

89. Certos tribunais nacionais entenderam poder dar esse passo, reconhecendo formalmente às Comunidades, e agora à U.E., a soberanoa que o TJ não havia ousado proclamar abertamente.

O TC italiano, na sua decisão de 27 de Dezembro de 1973, depois de ter qualificado a CEE como «uma nova organização interestadual, de tipo supranacional, de carácter permanente, dotada de personalidade jurídica e de capacidade de representação internacional», acrescenta que «ao criar a Comunidade como uma instituição caracterizada por uma ordem jurídica autónoma e independente, a Itália e os outros Estados-membros conferiram e reconheceram poderes soberanos determinados à Comunidade Económica concebida como instrumento de integração dos Estados participantes (…)».

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Também o TC da República Federal Alemã qualificou a CE como uma «potência pública de natureza particular», «supranacional», «nitidamente distinta da potência pública dos Estados-membros (…) potência pública autónoma e independente em face da potência pública de cada um dos Estados-membros», criada por um tratado que«representa de certo modo a Constituição desta Comunidade», para a qual os Estados-membros «transferiram certos direitos de soberania» e cujas Instituições exercem «direitos soberanos» de que os Estados-membros se despojaram em porveito da Comunidade por eles criada. «Resulta da natureza jurídica da Comunidade que os actos adoptados soberanamente pelas suas Instituições no quadro da sua competência (…)»

Este mesmo tribunal já tinha igualmente declarado em 1968 que «ao concluir o Tratado CEE, os Estados fundadores criaram um sujeito novo e autónomo, de poder soberano no interior de um domínio limitado de competência; o direito dele emanado encontra o fundamento da sua validade interna no facto de os Estados-membros terem submetido o respectivo território a essa potência soberana».

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Secção 2.ª – As Comunidades: Organizações Interestaduais não soberanas

90. A afirmação do primado absoluto da ordem jurídica comunitária correspondia a proclamar, embora sem usar a palavra, a natureza supranacional e soberana das Comunidades Europeias.

Com efeito, o carácter autónomo da ordem jurídica comunitária, a sua supremacia dita absoluta e o seu domínio crescente sobre o conjunto da ordem jurídica nacional (inclusive sobre a ordem constitucional) não poderiam ser entendidos senão como implicando o esvaziamento progressivo da própria essência da soberania do Etado face à constante e irreprimível expansão de uma ordem jurídica superior.

Que subsistiria, em tais circunstâncias, dos atributos fundamentais da soberania do Estado – a ausência de qualquer forma de subordinação no plano orgânico (tendo como corolário a exclusão da ingerência externa nos assuntos internos e o exclusivismo das competências – designadamente das competências normativa e jurisdiconal – que o direito internacional reconhece aos Estados?

O próprio princípio da submissão imediata ao direito internacional – que segundo um critério puramente jurídico é a marca distintiva da soberania – e bem assim o princípio da autonomia constitucional que é, em todo o caso, um atributo essencial da independência nacional, estaria irremediavelmente prejudicados pelo princípio da primazia absoluta do Direito Comunitário. Ora, como se impõe admitir que quando uma soberania se esvazia uma outra se lhe substitui, a soberania das Comunidades Europeias apareceria, a esta luz, como dificilmente contestável.

No entanto, parece que não chegamos ainda a esse ponto se aceitarmos que a U.E. não deve ser considerada como entidade soberana – antes como mera organização interestadual em proveito da qual os Estados operaram não a transferência (irreversível)

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de uma parcela de soberania nacional mas, mais singelamente, uma simples delegação do exercício de competências estaduais, limitada a certos domínios específicos; delegação esta que a todo o tempo pode ser retirada, embora com o alto custo que representaria, para um Estado-membro, a sua inevitável separação da União – como aliás lhe é facultada pelo art. 50.º do TUE.

Capítulo II – Os Princípios Constitucionais da União Europeia

91. A apreensão da natureza da U.E. não permite prescindir do apuramento de alguns princípios fundamentais que a caracterizam e cuja identificação contribuirá para esclarecer o verdadeiro carácter peculiar desta Organização.

Quais são esses princípios fundamentais que pela sua particular importância poderão ser considerados princípios constitucionais da U.E.?

Organiza–lo-emos em torno de dois grandes eixos de reflexão que correspondem a outros tantos princípios dominantes da ordem jurídico-económica e social da U.E.: o princípio democrático e o princípio da liberdade económica.

Estes dois princípios apresentam um carácter essencial que não comportam, em caso algum, a possibilidade de derrogação na ordem jurídica interna dos Estados-membros, já que tal derrogação constituiria um atentado inaceitável contra o espírito da U.E., na medida em que poria irremediavelmente em causa a homogeneidade e a coesão do bloco de países que dela fazem parte.

Mas, a par destes princípios os Tratados consagram outros que muito contribuem para conferir à U.E. uma entidade própria.

Secção 1.ª – O princípio democrático

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92. Embora não haja sido explicitamente enunciado nos Tratados de Roma, este princípio podia ser considerado como verdadeiramente basilar e estruturante da empresa comunitária. O TUE viria, porém, a fazer-lhe referência expressa. Por isso mesmo, importa precisar o seu conteúdo e verificar até que ponto os Estados da União estão vinculados à sua observância na respectiva ordem interna.

O princípio democrático na base da União Europeia

93. A determinação do conteúdo do princípio democrático como elemento essencial da ordem jurídico-política instituída no âmbito da U.E. não dispensa a evocação dos objectivos virtuais da empresa de integração europeia e da base democrática em que os Estados-membros pretenderam fazê-la assentar.

i. Os objectivos virtuais dos Tratados Comunitários originários

94. O objectivo virtual dos Tratados Europeus consiste na instituição, a longo prazo, de uma União Económica e de uma União Política da Comunidade, assente numa base federal.

No entanto, esse objectivo da fundação de uma união económica e política dos povos da Europa nunca foi dissociado do princípio democrático a que deveria conformar-se. É de notar o texto da «Carta da Identidade Europeia», da «Declaração sobre a Democracia», do Preâmbulo do Acto único e do texto do Tratado da U.E.

ii. O Tratado da União Europeia

95. O TUE viria ulteriormente, no preâmbulo e no próprio articulado, reafirmar o fundamento democrático da U.E.

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No seu preâmbulo, os Estados-membros confirmam «o seu apego aos princípios da liberdade, democracia, respeito pelos direitos do Homem e liberdades fundamenrais e do Estado de direito», tal como manifestam o seu desejo de «reforçar o carácter democrático e a eficácia do funcionamento das Instituições» da União.

Explicitando este propósito, o art. 2.º do TUE dispõe que a União «funda-se nos valores do respeito pela dignidade humana, da liberdade, da democracia, da igualdade, do Estado de direito e do respeito pelos direitos do Homem, incluindo os direitos das pessoas pertencentes a minorias. Estes valores são comuns aos Estados-membros, numa sociedade caracterizada pelo pluralismo, a não discriminação, a tolerância, a justiça, a solidariedade e a igualdade entre homens e mulheres».

Procurando prevenir qualquer desvio a tais princípios, o art. 7.º autoriza o Conselho, nas condições aí previstas, a «verificar a existência de um risco manifesto de violação dos valores» referidos e a «suspender alguns dos direitos decorrentes da aplicação do presente Tratado ao Estado-membro em causa», incluindo o direito de voto no Conselho.

O conteúdo do princípio democrático

96. Ao reler a Carta ou «Declaração sobre a Identidade Europeia», a «Declaração sobre a Democracia» e, sobretudo, o Preâmbulo e o articulado do TUE, verificamos que o princípio democrático aí firmado se exprime em dois planos distintos:

por uma lado, o princípio identifica-se com uma determinada concepção sobre a legitimidade, organização e exercício do poder político e encontra a sua expressão – no quadro da União como nas Constituições dos Estados-membros – no sistema da democracia representativa e pluralista. Por força do

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art. 10.º/1 do TUE, «o funcionamento da União baseia-se na democracia representativa».

paralelamente, como expressão de uma exigência irrecusável nos planos ético, social e político, o princípio democrático implica o respeito dos direitos fundamenrais tal como estes são enunciados e salvaguardados não só em algumas disposições dos Tratados mas, também, nas Constituições dos Estados-membros e nos instrumentos internacionais a que os mesmos Estados aderiram, que a ordem jurídica comunitária pôde assimilar em virtude do trabalho de elaboração jurisprudencial levado a cabo nos últimos 30 anos pelo Tribunal das Comunidades – tudo hoje vertido no art. 6.º TUE.

Secção 2.ª – Os Princípios Constitucionais de Ordem Económica

O princípio da liberdade económica

i. A fisionomia geral da Comunidade

97. Os Tratados de Paris e de Roma, e hoje o TUE, ligaram entre si, no quadro de uma organização «sui generis» que aspira a ser mais do que um simples instrumento de integração económica, diversos Estados europeus portadores de uma civilização milenária, vinculados a uma concepção comum sobre o valor intrínseco da democracia (considerada como fundamento da legitimidade, organização e exercício do poder político), imbuídos de um comum respeito pelos valores do humanismo e identificados pela sua adesão geral a um sistema de economia social de mercado assente na propriedade privada dos meios de produção, na livre concorrência e noutros princípios e regras de disciplina económica e social que desses decorrem.

ii. O conteúdo do princípio: as liberdades instituídas

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98. A consagração na ordem económica da U.E. da disciplina inerente a uma economia de mercado resulta dos princípios e disposições jurídicas que organizam e regem o funcionamento do mercado interno e que dão expressão concreta a «cinco liberdades» - e outras que os Tratados reconhecem: livre circulação das mercadorias , favorecida pela

instituição, no quadro de uma união aduaneira, da pauta exterior comum;

livre circulação de pessoas; livre prestação de serviços ; direito de estabelecimento ; livre circulação dos capitais no quadro de uma

união económica e monetária.

99. Estas liberdades individualizam o mercado interno da U.E. em relação aos mercados de direcção administrativa, tal como o distinguem de uma zona de trocas livres ou de uma simples união aduaneira.

A exacta caracterização do mercado interno resulta do real conteúdo de tais liberdades, consideradas a tal ponto específicas e essenciais que o Tratados de Roma as qualificava como fundamentos da Comunidade.

O princípio constitucional da liberdade económica reflecte a realidade de que o mercado interno é expressão de uma economia de mercado, de inspiração neoliberal – o que explica a grande importância que os tratados atribuem ao princípio da livre concorrência.

Tal princípio comporta a propriedade privada dos meios de produção, constitucionalmente garantida na ordem jurídica interna dos Estados-membros quer no quadro da União – art. 61.º CRP; comporta também a liberdade de empreender e de agir no domínio económico (livre iniciativa).

A liberdade económica implica ainda o direito reconhecido aos operadores ou agentes económicos do mercado interno de circular livremente no espaço da União para aí se dedicarem a um trabalho assalariado ou independente (actividade artesanal ou profissão liberal), para se estabelecerem como comerciantes ou produtores

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em qualquer domínio da vida económica e para prestarem livremente os serviços correspondentes ao seu ramo de actividade.

Tudo isto no quadro de um estado de direito democrático que salvaguarda eficazmente os direitos que dão conteúdo real ao princípio da liberdade económica.

Porém, é de notar que esta liberdade económica não é absoluta, já que os Estados se reservaram o direito de restringor o acesso dos operadores do mercado interno à propriedade e ao uso de certos meios de produção e a determinadas actividades profissionais.

Nos termos do seu art. 345.º, o Tratado (TFUE) «em nada prejudica o regime de propriedade nos Estados-membros».

Cada Estado é pois livre não somente de manter, mas igualmente de alargar, em detrimento da propriedade privada, o sector público da economia – e isto através da criação de novas empresas, quer mediante a socialização de empresas peexistentes (por nacionalização, expropriação, tomada de posição accionista, etc.) – art. 83.º da CRP.

Mas se o Tratado não interfere com o regime de propriedade dos meios de produção, tem muito a ver com o uso que deles é feito: as empresas do sector público estão, com efeito, no exercício da respectiva actividade, sujeitas às regras comuns de concorrência e os Estados obrigados a respeitar o princípio da não discriminação – cfr. arts. 101.º e 106.º TFUE).

iii. As implicações do princípio da liberdade económica

O completo apuramento do conteúdo e alcance do princípio da liberdade económica exige uma referência a outros princípios a nível constitucional que, para além das «cinco liberdades» referidas, conferem plena expressão à livre iniciativa de que usufruem os operadores económicos do mercado interno da U.E.

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O princípio da concorrência leal

100. A ordem jurídica comunitária comporta um regime capaz de assegurar que a concorrência não é falseada no mercado interno. Tal regime ficou estabelecido nos arts. 37.º e 101.º a 109.º do TFUE.

Os negociadores dos Tratados consideraram, a justo título, que o princípio da concorrência era essencial para o funcionamento correcto do mercado que se pretendia instituir – pois só a liberdade de concorrência poderia assegurar a protecção das empresas e dos consumidores e impedir que barreiras criadas pelo «dirigismo» dos cartéis e monopólios se substituíssem às fronteiras de direito público que os Estados quiseram abater.

A filosofia que presidiu ao sistema instituído foi a de que se impunha criar um mercado aberto, à escala da U.E., capaz de proporcionar aos nacionais dos Estados-membros – produtores, comerciantes e consumidores – as vantagens decorrentes de um vasto espaço economicamente integrado.

O princípio da não discriminação em razão da nacionalidade

101. Este princípio encontra-se consagrado no art. 18.º do TFUE, tendo a sua expressão concreta noutras disposições, como sejam os arts. 34.º e 35.º, 37.º/1/2, 45.º/2/3, 49.º, 54.º, 57.º, 92.º, etc.

O princípio proíbe todas as formas de discrimiançaõ em razão da nacionalidade, opondo assim um limite intransponível ao exercício, pelos Estados-membros, de qualquer competência que tenha por efeito estabelecer não só discriminações istentivas e evidentes com base na nacionalidade como, igualmente, formas dissimuladas de discriminação que por aplicação de outros critérios possam conduzir ao mesmo resultado.

Trata-se de um princípio verdadeiramente fundamental na medida em que de facto ou de direito

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penetra e rege toda a construção europeia, de tal modo que, sem ele, o direito da União, o mercado interno e o seu funcionamento seriam inconcebíveis.

O princípio da igualdade

102. O princípio da igualdade, na sua dupla vertente da igualdade dos Estados e da igualdade dos agentes económicos privados, acha-se estreitamente ligado ao princípio da não discriminação, de que pode mesmo considerar-se a outra face.

a)A igualdade dos Estados

A União respeita a igualdade dos Estados-membros perante os Tratados, bem como a respectiva identidade nacional, reflectida nas estruturas políticas e constitucionais fundamentais de cada um deles, incluindo no que se refere à autonomia local e regional. A União respeita as funções essenciais do Estado, nomeadamente as que se destinam a garantir a integridade territorial, a manter a ordem pública e a salvaguardar a segurança nacionaL. Em especial, a segurança nacional continua a ser da exclusiva responsabilidade de cada Estado-membro (art. 4.º/2 do TUE).

A igualdade dos Estados-membros implica que nenhum deles pode reivindicar uma situação de privilégio em face dos seus parceiros fora dos casos, estreitamente limitados, em que os Tratados a admitem:

1.º Durante o período de transição que se segue à sua adesão à União, um Estado poderá beneficiar da possibilidade de se furtar (mas nas precisas condições resultantes da negociação) ao cumprimento de algumas obrigações inerentes à qualidade de Estado-membro; mas esta concessão poderá implicar contrapartidas diversas a favor dos seus parceiros;

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2.º No caso de sérias perturbações da situação económica ou social de um Estado-membro, a União pode, a solicitação do Estado afectado, autorizá-lo a adoptar medidas de excepção (cláusulas de salvaguarda) – mas limitadas no tempo e aplicadas em condições rigorosamente definidas.

O princípio da igualdade dos Estados implica que situações comparáveis não devem ser tratadas de maneira diferente, a menos que uma diferenciação seja objectivamente justificada.

b)A igualdade dos agentes económicos privados

Implica que o direito da União atribui em condição de perfeita igualdade, aos nacionais de qualquer Estado-membro (pessoas físicas ou morais), enquanto agentes económicos da União, os direitos e obrigações decorrentes dos Tratados ou dos actos adoptados na sua conformidade.

Todos, sem qualquer discriminação entre eles, adquirem, pelo simples facto de serem nacionais de um Estado-membro, agindo no quadro do mercado interno, um estatuto de inteira igualdade. Consequentemente, qualquer tartamento de favor, qualquer privilégio que não encontre fundamento numa qualquer disposição, é contrário à ordem jurídica por que a União se rege.

Os princípios da coesão económica e social, da solidariedade e da cooperação leal

103. Trata-se de princípios intimamente relacionados: a prática da solidariedade nas relações entre os Estados-membros torna-se mais fácil e menos custosa à medida que se fortalece a coesão económica e social do conjunto; mas a coesão dos Estados-membros supõe, dados os diferentes estádios de desenvolvimento em que ainda se encontram, uma solidariedade efectiva entre eles; a concretização desta solidariedade implica uma cooperação leal quer entre os

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Estados-membros quer entre estes e as Instituições da União e também a prática do princípio da preferência comunitária que encontra expressão no domínio da política agrícola da União.

i. O princípio da coesão económica e social

104. O objectivo da coesão económica já estava de algum modo implícito no primitivo texto do Tratado de Roma em que se proclamava como «missão» comunitária a realização de «um desenvolvimento harmonioso» no conjunto da Comunidade.

O TUE reforçou a relevância do princípio ao inscrevê-lo no seu art. 3.º entre os objectivos da U.E.: «A União promove a coesão económica, social e territorial, e a solidariedade entre os Estados-membros».

Dando aplicação ao citado art. 3.º CE, o art. 174.º do TFUE dispõe:

«A fim de promover um desenvolvimento harmonioso do conjunto da União, esta desenvolve e prossegue a sua acção no sentido de reforçar a sua coesão económica, social e territorial.

Em especial, a União procura reduzir a disparidade entre os níveis de desenvolvimento das diversas regiões e o atraso das regiões menos favorecidas».

Nesta conformidade, cumpre aos Estados conduzir e coordenar as suas políticas tendo em vista alcançar os referidos objectivos; e cumpre à União, na formulação e concretização das suas políticas e acções e na realização do mercado interno, ter em conta esses mesmos objectivos e contribuir para que sejam alcançados; cumpre mais à União apoiar a prossecução desses objectivos mediante a acção por ela desenvolvida através de fundos com finalidade estrutural:

(Fundo Europeu de Orientação e Garantia Agríciola (FEOGA) – Secção Orientação;

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Fundo Social Europeu; Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional

(FEDER); Fundo de Coesão, Banco Europeu de

Investimento (BEI) e demais instrumentos financeiros existentes (cfr. art. 175.º TFUE).

ii. O princípio da solidariedade

105. Os tratados associaram os Estados-membros da União Europeia num quadro jurídico, económico e social que constantemente faz apelo à prática da solidariedade.

O princípio tem consagração constitucional no n.º 3 do art. 3.º do TUE que confia à União a missão de promover «a coesão económica e social e a solidariedade entre os Estados-membros».

Este princípio tem plena aplicação em diversos domínios e circunstâncias – e designadamente no âmbito do sistema de financiamento das despesas da União – na medida em que as receitas do orçamento (ditos recursos próprios) são geradas no quadro das actividades de produção e consumo que se desenvolvem nos territórios dos Estados-membros que assim contribuem em conjunto para suportar o custo das acções da União, independentemente dos benefícios que delas possam retirar.

O princípio da cooperação leal nas relações entre a Comunidade e os seus Estados-membros

106. O princípio da cooperação está contemplado no Tratado CE – em particular no art.4.º/3:

«3. Em virtude do princípio da cooperação leal, a União e os Estados-membros respeitam-se e assistem-se mutuamente no cumprimento das missões decorrentes dos Tratados».

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«Os Estados-membros tomam as medidas gerais ou específicas adequadas para garantir a execução das obrigações decorrentes dos Tratdos ou resultantes dos actos das instituições da União.

Os Estados-membros facilitam à União o cumprimento da sua missão e abstêm-se de qualquer medida susceptível de pôr em perigo a realização de objectivos da União».

Note-se que se este princípio obriga os Estados-membros a tomar todas as medidas adequadas a garantir o alcance e eficácia do direito da União, igualmente impõe às Instituições deveres recíprocos de cooperação leal entre si e nas relações com os Estados-mmebros (cfr. art. 13.º/2 TUE).

Secção 3.ª – Os Princípios da especialidade, da subsidiariedade e da proporcionalidade

Trata-se de dois princípios fundamentias norteadores das relações entre a União e os seus Estados-membros.

O princípio da especialidade ou da atribuição

107. A União não dispõe de competência geral. Goza, apenas das competências que pelos Tratados lhe foram atribuídas, ou seja, é titular de uma competência de atribuição.

Este princípio da especialidade, que rege a generalidade das organizações internacionais, está consagrado no art. 5.º/1/2:

«1. A delimitação das competências da União rege-se pelo princípio da atribuição (…)

2. Em virtude do princípio da atribuição, a União actua unicamente dentro dos limites das competências que os Estados-membros lhe tenham atribuido nos tratados para alcançar os objectivos fixados por estes últimos. As

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competências que não sejam atribuídas à União nos Trtados pertencem aos Estados-membros.»

Por seu turno, o art. 13.º/2, após identificar as Instituições da União, acrescenta:

«2. Cada instituição actua dentro dos limites das atribuições que lhe são conferidas pelos Tratados, de acordo com os procedimentos, condições e finalidades que estes estabeleceram (…)»

Mas o Tratado não delimita com absoluto rigor, por âmbitos materiais ou de funções, as competências conferidas à União e as reservadas para os Estados-membros e isto não obstante o disposto nos arts. 2.º e segs. do TFUE.

Por isso mesmo, as competências comunitárias têm, ao longo das últimas décadas, beneficiado de constante expansão – graças, por um lado, à utilização que tem sido feita do art. 352.º do TFUE; e, por outro lado, da aplicação encorajada pelo Tribunal de Justiça, do princípio das competências implícitas, válido no quadro da União como no de outras organizações internacionais.

Esta ambiguidade na definição rigorosa das competências, propiciadora da ingerência da União em domínios que os Estados consideravam seus, está na origem do princípio da subsidiariedade destinado precisamente a acautelar o risco da crescente redução da esfera de competências estatais.

O princípio da subsidiariedade

i. A proclamação do princípio

108. Trata-se de um princípio fundamental no quadro de uma organização deferal que por definição supõe um adequado sistema de repartição de competências entre os órgãos centrais da federação e os estados federados (estados, repúblicas, províncias…)

A forma por que esta repartição se opera pode diferir de Federação para Federação.

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A U.E. é uma associação de Estados independentes que nos Tratados constitutivos apenas conferiram às suas Instituições as atribuições e poderes que quiseram confiar-lhes.

O sistema de repartição de competências que foi adoptado enferma, no entanto, de inevitável imprecisão – o que permitiu quer ao Tribunal de Justiça (que tal como o STFederal dos Estados Unidos se tem largamente socorrido da teoria das competências implícitas) quer à própria União (explorando as potencialidades do art. 352.º do TFUE) quer aos próprios Estados-membros agindo por via dos tratados formais, alargar constantemente o quadro das competências da União, com o correspondente esvaziamento das competências estatais.

A retracção constante no domínio das competências reservadas dos Estados-membros, registada ao longo dos últimos 30 anos, acelerou-se fortemente por força do TUE e, em particular, em resultado da instituição da União Económica e Monetária.

Compreende-se, portanto, a inquietção dos responsáveis dos Estados-membros e dos cidadãos em geral perante a dilatação constante, aparentemente imparável, do poder de intervenção da União em domínios que tradicionalmente eram objecto do exercício de competências exclusivas dos órgãos nacionais.

Essa inquietação generalizada levou os Estados-membros a tentar lmitar os poderes de ingerência das Instituições da U.E.. E a fórmua encontrada para concretizar a intenção, proclamada no preâmbulo do TUE, de criar «uma União cada vez mais estreita entre os povos da Europa, em que as decisões sejam tomadas ao nível mais próximo dos cidadãos», consistiu na adopção do princípio da subsidiariedade, consagrado no seu art. 6.º/3 TUE:

«Em virtude do princípio da subsidiariedade, nos domínios que não sejam sua competência exclusiva a União intervém apenas se e na medida em que os objectivos da acção considerada não possam ser suficientemente alcançados pelos Estados-mmebros, tanto ao nível central como ao nível regional e local, podendo, contudo, devido às dimensões ou aos efeitos da acção considerada, ser mais bem alcançados ao nível da União».

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O princípio da subsidiariedade surge como essencial para estabelecer o critério de repartição de competências entre os diferentes níveis de poder na União Europeia. Mas a aplicação do princípio suscita dificuldades quer no tocante à sua explicitação quer quanto à repartição das atribuições e correspondentes responsabilidades.

ii. A aplicação do princípio da subsidiariedade

109. Atento às dificuldades de aplicação deste princípio, o Conselho Europeu reunido em Edimburgo, em 11 de Dezembro de 1992, procedeu a uma abordagem global do novo princípio estabelecido no art. 5.º do Tratado, definindo «os princípios básicos, as orientações e os procedimentos e políticas a adoptar» para o aplicar correctamente e, portanto, para obviar a dificuldades nas relações interinstitucioanis e nas relações entre a União e os seus Estados-membros.

Actualmente, um Protocolo relativo à aplicação dos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidde, anexo ao Tratado de Lisboa, fixa as condições de aplicação desses princípios e institui um sistema de controlo dessa aplicação, em que avulta o papel dos Parlamentos nacionais e a fiscalização jurisdicIonal, a cargo do TJUE (arts. 8.º do Protocolo e 263.º do TFUE).

O princípio da proporcionalidade

110. Em virtude do princípio da proporcionalidade, o conteúdo e a forma da acção da União não devem exceder o necessário para alcançar os objectivos dos Tratados (arts. 5.º/4 TUE e 296.º TFUE).

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As instituições da União aplicam o princípio da proporcionalidade em conformidade com o Protocolo relativo à aplicação dos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade anexo, ao Tratado de Lisboa.

Este princípio é frequentemente objecto da atenção do TJUE que, ao exercer o controlo da legalidade dos actos das Instituições, tem procurado precisar o seu exacto sentido. Pe.ex., no Ac. FROMANÇAIS de 23.02.1985, entendeu que:

«A fim de determinar se uma disposição do direito comunitário está em conformidade com o princípio da proporcionalidade, é necessário determinar, em primeiro lugar, se os meios que emprega para alcançar o objectivo correspondem à importância desse objectivo e, em segundo lugar, se são necessários para a sua realização».

Secção 4.ª – Os princípios fundamentais da Ordem Jurídica e da ordem institucional

O princípio da liberdade económica acha-se salvaguardado, no quadro de um verdadeiro estado de direito, por um sólido e coerente conjunto de princípios de natureza constitucional: o princípio da legalidade, o princípio de equilíbrio institucional e, em estreita concexão com estes, os princípios da primazia, da aplicabilidade directa e da uniformidade de interpretação do direito da União.

O princípio da legalidade

111. O funcionamento da U.E. está, todo ele, submetido ao princípio da legalidade: a organização e as actividades das Instituições e as relações interinstitucionais; a definição das competências da União e de cada um dos seus órgãos; as relações dos Estados-membros e destes com a União; a posição dos particulares em face dos Estados, da União e dos parceiros económicos privados – na medida em que as suas relações mútuas se situem no âmbito

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da ordem jurídico-económica relativa à União Económica e Monetária (cfr. o art. 2.º TUE).

Consequentemente, todas as relações jurídicas estabelecidas no quadro da União ficam sob o controlo de órgãos jurisdicionais independentes – quer o TJUE, do Tribunal Geral e dos tribunais especializados, nos limites da competência que lhes é reconhecida pelos Tratados, quer das jurisdições nacionais que são os tribunais de direito comum da ordem jurídica da União.

Tais jurisdições estão habilitadas, no âmbito das competências respectivas, a aplicar o direito da União em condições de desejável uniformidade – assegurada pelo jogo combinado dos princípios fundamentais da aplicabilidade directa, da primazia e da uniformidade de interpretação e de apreciação da validade da regra comum.

Tendo-se presente que a União obedece ao «princípio democrático» e que conseguiu instituir um sistema que reconhece e salvaguarda os direitos fundamentais dos seus cidadãos, pode com toda a segurança afirmar-se que a Comunidade apresenta a fisionomia de um verdadeiro «Estado de direito».

O princípio do equilíbrio institucional

112. É permitido ver «no equilíbrio de poderes característicos da estrutura institucional da Comunidade uma garantia fundamental concedida pelo Tratado, nomeadamente, às empresas e associações de empresas a que se aplica» e não só às empresas, como igualmente aos Estados-membros, aos particulares e às próprias Instituições.

Este princípio, posto em relevo pelo TJUE, está baseado na ideia de que a repartição de poderes no quadro da U.E. deve ser rigorosamente respeitada por cada Instituição; e dele decorre que:

no exercício dos poderes que lhe foram reconhecidos pelos Tratados, cada instituição

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deve respeitar o lugar e o papel que lhe cabem segundo o sistema neles estabelecido;

e atmbém, uma Instituição não pode ser privada do exercício de um poder que lhe caiba em proveito quer de outra Instituição, quer de um organismo não previsto pelos Tratados, mesmo quando a criação de tal organismo não seja em si mesma ilegal.

O princípio do equilíbrio institucional constitui, no quadro da União, uma apreciável contrapartida ao princípio clássico da divisão de poderes cuja falta de rigor no seio da União traduz um défice democrático e uma falha no sistema de garantias do cidadão europeu.

Assim, o princípio do equilíbrio institucional está estreitamente ligado ao princípio da legalidade, contribuindo fortemente para caracterizar a União como «Estado de direito».

Os princípios respeitantes às relações entre a ordem jurídica da União e as ordens jurídicas dos Estados-membros

113. A ordem jurídico-constitucional instituída pelos Tratados está profundamente marcada pelos princípios da autonomia, da aplicabilidade directa, da primazia e da interpretação uniforme do direito da União.

Trata-se de princípios que, regendo as relações da ordem jurídica da União com a ordem jurídica interna dos Estados-membros e com o Direito Internacional, são da mesma natureza dos que, na ordem constitucional destes últimos, respeitam às relações do ordenamento interno com a ordem jurídica da União e com o direito internacional.

Trata-se, por outro lado, de princípios que estão longe de ser indiferentes à ordem económica da União; bem pelo contrário, a sua elaboração e imposição foram levadas a cabo pelo TJUE no quadro de uma salvaguarda sistemática dos fundamentos económicos da U.E.: a livre circulação das

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mercadorias, o direito de estabelecimento, a liberdade de criculação e de prestação de seviços, a política agrícola, a política de transportes, a política comercial exterior comum, etc,

Trata-se, por fim, de princípios fundamentais da ordem jurídica da União.