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Ano VI – nº 7 – Dezembro/09 ENTREVISTA João Emanuel Evangelista Ler o Brasil sob o Olhar da Ética CULTURA O ovo, o galo e a galinha na cultura popular

Revista Cei Cultural VII

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Revista CEI CULTURAL

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Page 1: Revista Cei Cultural VII

Ano VI – nº 7 – Dezembro/09

ENTREVISTAJoão Emanuel

Evangelista

Ler o Brasil sob o Olhar da Ética

CULTURAO ovo, o galo e a galinha na cultura popular

Page 2: Revista Cei Cultural VII

Revista Ceia CulturalISSN 1808-7302

DiretoraMaria Lúcia Andrade de Azevedo

Conselho EditorialProfª. Ana Cristina Dias

Profª. Áurea FrazãoProfª. Celina BezerraProf. Nilton Xavier

RedaçãoTh ales Lago – DRT/RN 1.037

RevisãoAna Cristina Dias

Tiragem3.000 exemplaresProjeto Gráfi coInfi nitaimagem

Fone: (84) 3231-3795 / 8805-1004infi nitaimagem@infi nitaimagem.com.br

EdiçãoVerbo Comunicação & Eventos

Telefax: (84) [email protected]

Jornalista ResponsávelSylvia Serejo – DRT/RN 916

InformaçõesCEI – Centro de Educação Integrada

Fone: (84) 4006-0550www.ceinet.com.br

[email protected]

Os artigos assinados por colaboradores não necessariamente refl etem a opinião

do Conselho de Direção do CEI.

Capa: Ilustração vencedora do con-curso Capa Ceia Cultural, de autoria das alunas Mariana Araújo e Kamila

Marques, do 8º ano “B” - Ensino Fundamental/CEI.

LITERATURA

Editorial

Cultura, literatura, fi losofi a, uma pitada de bom humor e uma porção generosa de criatividade. Esses foram os principais ingredientes da sétima Ceia Cultural, edição que marca os seis anos de existência da nossa revista.

Em 2009, o colégio CEI adotou o tema integrador “Ler o Brasil sob o olhar da ética”. Os trabalhos desenvolvidos na escola sobre o tema inspiraram alguns textos presentes neste exemplar, entre eles, “Do Ethos à Vida”, produzido pelo professor Marco Jordão. A entrevista desta edição, com o cientista social João Emanuel Evangelista, também traz observações importantes para refl etirmos acerca da discussão que praticamos sobre a ética em nosso país.

A Ceia Cultural ainda traz textos prazerosos, como “O ovo, o galo e a galinha na cultura popular”, dos professores Nilton Xavier e Antonio Carlos Galvão, e crônicas criativas produzidas por nossos alunos. Destaque para “A guerra do sal-gado”, de Lucas Menezes, uma descrição descontraída sobre a “batalha” diária para conquistar o lanche na hora do intervalo. Resenhas, poesias e outros artigos valorosos completam esta edição.

Boa Ceia para todos!

3 LiteraturaA arte literária em função da ética

4 CulturaO ovo, o galo e a galinha na cultura popular

6 ProjetoQualidade de vida

7 CrônicaHoje sou um grão de areia

8 CrônicaE foi naquela ruazinha

9 ResenhasRomance, A menina que roubava livros, O cava-leiro inexistente

10 ArtigoVivendo hoje o amanhã

11 ArtigoOs dois lados da mesma moeda

12 EntrevistaJoão Emanuel Evangelista

14 Educação InfantilPor uma sociedade ética

15 CrônicaA guerra do salgado

16 Caderno de Poesia18 EducaçãoA aula integrada

19 CrônicaOs brincos de ouro

20 ÉticaDo Ethos à vida

22 Palavra de PaisEducação em tempos de telemática

Índice

NESTA EDIÇÃO

Ao contemplarmos a literatura, percebemos que ela se instaura

como algo dinâmico, que faz parte da vida da gente e concerne a uma orga-nização particular de linguagem capaz de tornar estranho e alienar a fala co-mum, causando uma desconformidade, como diriam os linguistas, entre os sig-nifi cantes e os signifi cados. Além disso, ela apropria-se dessa mesma linguagem para difundir, através do trabalho in-cessante com as palavras, ideias e emo-ções do ser humano.

Ao lermos um texto “literário”, não imaginamos o quanto poderá ser importante para nossa constituição quanto indivíduo e como será útil às nossas ações em sociedade. Mas, por intermédio de autores como Ana Ma-ria Machado e Mario Quintana, per-cebemos que é possível sermos agentes e não apenas pacientes das atitudes co-tidianas em busca do desenvolvimento pessoal, através da emoção despertada pela palavra.

Em conformidade com o pensamento so-bre esse poder transformador da lingua-gem e sua função social, Ana Maria Ma-chado é aclamada como expoente na arte de instruir pela magia da palavra a partir de contextos distintos e gêneros variados, os quais perpassam a fase infantil, juve-nil e adulta de nossas vidas, sem deixar perder-se a essência poética característica, desde os seus primeiros escritos. Não fo-ram à-toa as premiações recebidas por ela: o prêmio Christian Andersen (2000) e o Machado de Assis (2002). Este, pelo conjunto da obra.

O público infantil tende obter dessa autora sensibilidade, amor e compre-ensão, a partir da série Mico Maneco (1983-1988) na qual ela direciona seus conhecimentos pedagógicos, e de mãe, para tratar do uso das letras, oferecendo

recursos diferenciadores para os fone-mas às crianças das séries iniciais, bem como a proposta de outros títulos como Uma Gota de Mágica, em que a desco-berta de elementos da realidade (a bola de gude encontrada no mato) e da fanta-sia (o momento em que a menina que a encontrou, a vê brilhando pela presença de um vaga-lume dentro da mesma) são conferidos a cada palavra decifrada, imagem constituída e página lida. Além desses, o Bisa Bia, Bisa Bel (1982), que parece referir-se a um traço presente em toda a obra dessa autora, tanto pela con-cepção de criação literária pela lingua-gem como pela solidária humanização do leitor, porque, a partir das imagens, as quais, segundo Benjamin, fazem com que a criança “mergulhe sonhando em si mesma” e as compreenda para que a palavra seja despertada em si, é que Ana Maria instaura seu propósito “criador-educador” imanente a sua obra.

Assim, como poeta e amante das letras, Mario Quintana também sugere, como alguém que nunca achou ter escrito nada a sua altura: poesia “é insatisfação”. Nessa perspectiva, ele conseguiu produ-zir, dando síntese e plurissignifi cância àquilo que poderia representar longui-dão, igualando-se a Carlos Drummond de Andrade, Alberto de Oliveira e Érico Veríssimo, que transmitiram suas ideias de forma clara, sem delongas, procu-rando a palavra certa para o pensamento incerto, fazendo os apreciadores de suas obras contemplarem em prosa, ou em versos, alumbramentos capazes de des-pertarem reminiscências e trazerem atonalidades poéticas, pondo em xeque, por vezes, a própria existência humana, além de ratifi car o “inventar é estar mais próximo da realidade”.

Nesse invencionismo literário, Ana Maria Machado e Mario Quintana procuram

A arte literária em função da ética

Professor de Língua Portuguesa e Especialista em Literatura

traduzir ideias e desejos no leitor (alguns suplantados há muito tempo no íntimo de cada um, outros latentes e ávidos pela descoberta daquilo que é sugerido pelo trabalho desses autores com as palavras), suscitando-lhe, nessa tradução, a neces-sidade de visitar suas obras e delas fazer uso, no cotidiano, como se tivesse con-sultado um manual de instruções para uma vida emblematizada com a ética.

Jonas Bezerra de Araújo

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PATRIMÔNIO CULTURAL

De modo frequente, a represen-tação da galinha aparece no

artesanato brasileiro em número ex-pressivo quando comparada com a fi -gura de outros animais domésticos. O que justifi caria essa preferência?

Introduzida em nosso país pelos coloni-zadores portugueses, a galinha adaptou-se de imediato às condições climáticas e desenvolveu-se rapidamente através do sistema de criatório caseiro, acompa-nhando a progressão do cultivo de grãos. Fornecendo ovos e carne, abasteceu a po-pulação como fonte de proteína acessível.

A convivência entre o homem e a gali-nha resultou na criação de práticas cul-turais muito diversifi cadas, associadas à criação e uso das aves, abrangendo aí, além da própria galinha, o galo cantor que marca as horas e anuncia o dia, as ninhadas de pintos e os ovos, a constru-ção do galinheiro, dos ninhos, dos po-leiros, de seu uso até mesmo como ani-mal de guarda, exemplo da guiné ou ga- A

galin

ha e

o g

alo

na t

radi

ção

popu

lar Ela veio de muito longe

Lá das terras do além-marTrazida de Portugal e da ÁfricaFazia parte da dieta alimentarJuntamente com o portuguêsFez a grande navegaçãoCruzou mares e oceanosAté desembarcar neste chãoAo chegar ao Novo MundoLogo se adaptouAo sistema de criatórioQue a colônia adotouNele a ave era deitadaCom o fi m da reproduçãoPreparava-se o ninhoPara não haver invasãoA galinha muito arrediaChoca os pintos que vão nascerE depois serão criadosAté o abate acontecerMas não é apenas esse o papelQue à galinha foi reservadoEla povoa o universo da crençaDo profano e do sagradoÉ presença relevanteNo mundo da superstiçãoSão histórias de arrepiarE outras de fascinaçãoGalinha choca é perigoFaz até mulher abortarAssim, fi que longe delaSe não quiser malograrDizem até que ela espalhouAs palhas do presépio do SenhorPor isso é também agourentaNão merece crédito ou valorMas uma canja de galinhaQuem vai então recusarE se a mulher amamentaFaz o leite transbordarSe alguém está em festaOvo de galinha é atiradoOu então se é protestoO ovo é de longe jogadoQuando fi nda a Sexta da PaixãoE o sábado já vai chegarAs galinhas são guardadasPara que não as venham roubarNo domingo todos festejamO fi m da missa matinalE então se sentam à mesaEsperando o prato principalDe sua família também é o galoSímbolo de beleza e fi dalguiaQue com o seu cocoricóEspalha no ar a melodiaApressa-se em ser o primeiroA aurora anunciar

Lembrando a quem trabalhaQue é hora de levantarÀs vezes está encimadoNa torre de uma igrejinhaMajestoso guarda a cidadeMas não canta a ladainhaTem esporas e não é cavaleiroSabe bem a hora de cantarTem serra e não é carpinteiroCava o chão que vai ciscarLá na Antiga GréciaO galo presente estavaPara alegria da plateiaQue uma rinha apreciavaTinha a rinha suas regrasDisciplina não faltavaE o galo vencedorCom medalha se louvavaDa Europa veio para AméricaO evento se popularizouE até o mestre CascudoAo estudo se dedicouO galo em PortugalÉ um símbolo popularPintado com muitas coresRemete à história do lugarAssim galo e galinhaSe tornaram popularNo Brasil e em todo mundoSão presença singularA galinha com toda a famíliaConquistou o paladarSeja caipira ou torradaÉ garantia de agradarEla que saiu do terreiroNa cozinha tem lugarDa mesa deu mais um saltoFoi parar lá no altarJá faz parte da memóriaNa cultura tem lugarVejam a galinha d’AngolaMais famosa não háNos rituais de magiaPresente ela estáComo parte da oferendaPara o santo agradarPintadinha de brancoSe destaca no terreiroE na canção de ViniciusBagunça todo o galinheiroAssim por todo ladoGalinha e galo presentes estãoComo parte da históriaE de toda a tradiçãoOvo, galo e galinhaSe discute quem primeiro chegouE a ciência se apressa e diz:Foi do ovo que tudo começou.

linha de angola, que alardeia seu carac-terístico “tô fraco” ante à aproximação de qualquer estranho. Simbolicamente, desdobrou-se nas interpretações artísti-cas de sua imagem em objetos decora-tivos e utilitários, na oralidade popular através de ditos, provérbios, insultos e superstições, nas religiões de origem africana nas quais desponta como mito e oferenda nos rituais, na lúdica infantil e na alimentação, baseada não somente nos pratos em que aparece como ingre-diente principal, mas também no pre-paro que antecede o seu abate.

Compondo há séculos o cenário rural dos quintais e terreiros nacionais, evocados inclusive por sua simples imagem, talvez essa proximidade explique a presença marcante da galinha nas manifestações populares, ampliando nesse caso o inte-resse estético para além de sua aparência simultaneamente ingênua e graciosa.

Tal observação motivou a organização da exposição “O ovo, o galo e a galinha

na cultura popular”, realizada no CEI durante o XVII Festival de Folclore e Cultura Popular, em 2009, baseada num estudo sobre a presença desse animal em produções da cultura popular. A expo-sição foi composta por trabalhos artísti-cos realizados por escultores, ceramistas, pintores, poetas, fotógrafos, bordadeiras, além de outros registros que traduzem uma diversidade de saberes e fazeres co-tidianos presentes também na oralidade, na gastronomia e em práticas diretamente relacionadas à avicultura doméstica.

Tradição oral - Historicamente, o homem não surgiu no mundo com a habilidade de falar. Todavia, desde o advento da expressão humana por meio da fala — com todo o seu simbolismo e ideologia —, o ser humano utiliza-se dessa “ferramenta” de tal forma que, apesar de ser essencialmente social, pa-rece ser “objeto” do natural.

As marcas deixadas pela tradição oral, diferentemente das marcas pictóricas,

Profª Clícia Maria e Barros

fi gurativas e/ou escritas, deveriam ter tempo defi nido de duração, devido ao seu caráter efêmero — falou-se, não se escreveu ou se gravou, perdeu-se, pelo menos em parte. Mas, muitas vezes, não é exatamente assim que ocorre.

Quando há algo marcante na cultura de determinada comunidade humana, esse algo pode ser registrado de inúmeras ma-neiras (desenho, pintura, escrita,...), mas, ao meu ver, nenhum teria status maior do que aquele que sobreviveu por meio da oralidade, uma vez que, em tese, não devia durar, como foi dito anteriormente.

E é nesse contexto que se encontram al-guns gêneros textuais – orais – que con-cretizam a importância da galinha (e seus correlatos: o galo e o ovo) no nosso folclore e, de maneira geral, na cultura mundial. Anedotas, parlendas, trava-línguas, piadas, provérbios, fábulas, adivinhas, ditos, insultos, superstições, entre tantos, que foram passados de ge-ração em geração via oralidade, susten-tam a representação expressiva da fi gura da galinha nos costumes do povo.

Alimento do corpo e, por que não, ali-mento da alma, por meio do riso, da refl exão, da fantasia, de ensinamentos, essas formas de expressão oral estão tão vivas hoje quanto outrora: “Gorou o ovo! Gorou o ovo!”; “Você sabe por que a galinha atravessa a rua? Para chegar ao outro lado!”; “Deus me defenda de eu ter uma fi lha galinha!”; “Tá achando isso difícil? Então põe um ovo para ver uma coisa!”; “Come isso logo menino! Para de ciscar a comida como se fosse uma galinha!”; “Vou te contar a história da Galinha dos ovos de ouro!”; “Que me-nino inquieto! Vai pôr um ovo, é?”; “Fu-lano de tal está pisando em ovos, depois daquela situação!”; “Brinque não, viu! De grão em grão é que a galinha enche o papo”; “Eita! Que alegria! Até parece pinto no lixo!”; “Você conhece a histó-ria do Galo de Barcelos?”; “Não se pode ter dó da galinha quando ela está sendo morta, então ela demora a morrer!”.

Conhecer e reconhecer as formas da tradição oral da fi gura galinácea em nossa cultura é também perceber que algo aparentemente simples pode, sim, provocar marcas indeléveis, que atravessam o tempo, apesar das mu-danças impostas por ele.

Nilton Xavier e Antonio Carlos Galvão

O ovo, o galo e a galinha na cultura popular

Professora de História

Professor de Artes, mestre em antropologia

Professor de Língua Portuguesa, mestre

em educação

Foto: Carla Régia

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“Sou uma gota de água, sou um grão de areia...” já

dizia Renato e sua legião. Bom, pesso-almente, eu não cheguei a conhecê-los, mas gostei da homenagem. Ser compa-rado a um cantor famoso do porte de Renato Russo é uma honra e tanto! Mas eu acho que estou mais para “eu nasci há dez mil anos atrás’’, de Raul Seixas, do que ‘‘pais e fi lhos”.

Minha jornada começa com a aterris-sagem na terra em um meteoro alguns bilhões de anos atrás. Eu e meus colegas rochosos estávamos super empolgados com as novas possibilidades, podería-mos fazer parte de rios de lava, das mais imponentes, fortes e rígidas montanhas, dos mais profundos e misteriosos vales absais do Pacífi co...

Eu escolhi participar de um rio de lava. 1500 °C todo dia, o batuque da placas tectônicas se chocando embaixo de mim... Era farra todo dia. Depois de muito calor e pressão e algumas reações, tornei-me um belo diamante. Este foi o meu auge, bonito, forte, au-toconfi ante! Poderia ser o que eu qui-sesse. Então, num determinado dia, um corajoso e inteligente caçador humano me pegou para servi-lhe de arma. Era uns dos primeiros da sua espécie a uti-lizar ferramentas. O hominídeo era meio curvado, peludo e fazia uns ruí-dos engraçados; vivemos boas aventu-ras juntos... Voltávamos sempre fartos depois da caça e nenhum predador era páreo para nós. Até que algo maior lhe

Hoje sou um grão de areia,

mas ontem já fui um diamante...

CRÔNICAPROJETO

Qualidade de vida : para além dos muros da escola

Acreditamos que a escola é o espaço, por excelência, para me-diar o processo de formação de cidadãos éticos e

ativos na sociedade, bem como o lugar de relações socioafetivas entre educandos e educadores e de socialização e reconstrução do conhecimento construído historica-mente. Essas relações devem acontecer a partir de refl exões e ações sobre o mundo que nos cerca, a fi m de que os educandos sejam capazes de agir com criticidade, responsabilidade e ética.

Zabala postula que as inovações educativas costumam ser produzidas, entre outras razões, por uma pressão exterior ou pela vontade ou desejo de mudança de um grupo ou de uma instituição. Diante disso, uma escola que pretende inovar e am-pliar a sua prática educativa oportuniza aos educandos espaços para discutir sobre a sua realidade, a fi m de avaliá-la, transformá-la e ressignifi cá-la.

Com esse intuito, propusemos aos educandos do quinto ano do Ensino Funda-mental a vivência com um projeto de trabalho que discute a sua qualidade de

vida e a do cidadão natalense. Nesse trabalho, eles puderam investigar o que é necessário para ter-se qualidade de vida, quais são os direitos validados na Constituição Brasileira quanto à temática e à preservação deles no con-texto atual, assim como que ações de reivindicação e defesa da conquista da cidadania em sua plenitude é possível adotar.

Para tanto, pudemos “ultrapassar os muros da escola”, como propõe o mestre Paulo Freire, ao discorrer que a escola só tem sentido quando está atrelada à realidade, relacionando as aprendiza-gens à vida, assegurando a construção de conhecimentos que servirão para interagir no meio social no qual está inserido. Nesse sentido, desenvolvemos um projeto intitulado “Por uma melhor qualidade de vida”, ao longo de quatro anos consecutivos, o qual oportunizou o estudo in-loco na Escola Municipal Almerinda Bezerra Furtado, Creche Tia Deusa, Lar do Ancião Evangélico, Abrigo Juvino Barreto e na Comuni-dade Beira Rio, localizados em nossa cidade.

Nessas instituições, os educandos pude-ram conhecer como é a qualidade de vida de outras pessoas, estabelecer relações com os conhecimentos discutidos em sala de aula sobre os aspectos socio-his-tóricos e políticos que contribuíram para a atual conjuntura social na qual estamos inseridos e pensar em formas de possibili-tar a garantia dos direitos preservados aos cidadãos na Constituição Brasileira.

A posteriori, eles puderam desenvolver ações de cidadania nas instituições e na comunidade ribeirinha, através de momentos de formação com ofi cinas educativas, mediadas pelas crianças, no tocante aos cuidados com a saúde bu-cal, higiene pessoal, brincadeiras e jo-gos educativos, alimentação alternativa, contação de histórias, danças, atividades físicas, direitos e deveres do cidadão.

Essa prática foi orientada através do nosso projeto de Formação Ético-social, visando formar pessoas preparadas para agir e intervir em nossa sociedade com respeito, responsabilidade e compro-misso social, a partir de uma postura ética. Parafraseando Freire, queremos uma escola para a vida, preocupada em cumprir com sua função educativa de forma integral.

Diante da validação por parte das nos-sas crianças a respeito dessa experiên-cia, e pelos educadores do 5º ano en-volvidos no processo de ensino e apren-dizagem, acreditamos que a inclusão da realidade no currículo escolar, a partir dos temas transversais, promove a aprendizagem, haja vista que “o apren-der a aprender prazeroso” acontece quando o conhecimento ganha um sig-nifi cado para o sujeito, tornando assim relevante investir tempo, disposição e prazer no ato de aprender.

Marcilene Paulino da Silva

chamou atenção. Nenhuma presa era mais atraente do que tinha em mente, nenhum tesouro ou aventura valia mais do que o que tirava o sono do meu dono. O nobre caçador se tornara a presa de uma paixão pré-histórica, o nome dela era Luzia. Ela era um espécime inte-ressante: quadril largo, cabelos longos, emanava feromônio no ar, transparecia fertilidade e possuía um poder especial sobre o meu, este hominídeo apaixo-nado. Eles formaram um belo casal. Ele deixou os dias de aventura de lado, ela passou a cuidar de seus fi lhos e fui à busca de novas experiências.

Passados os dias de aventura e mais alguns séculos de refl exão, resolvi en-trar de vez na nova moda burguesa romântica. Servi de presente para as mais lindas mulheres da alta burgue-sia europeia. Escutei juras de amor em formas de poesia desmetrifi cada e pude até sentir o último suspiro dos amantes não correspondidos em busca da paz profana e eterna. Nessa onda cheguei até ao Palácio de Versalhes onde fui presente do rei Luís XVI a Maria Anto-nieta, minha última e mais nobre dona. Por ironia do destino e infelicidade mi-nha, um descuido da rainha francesa deixou que eu me chocasse com outro diamante, foi o sufi ciente para me tirar da vida luxuosa de Versalhes e entrar no realismo nu e cru dos proletariados franceses em revolução. Por sorte, fui logo encontrado por um militar inglês, que me tomou como seu e me fez de abotoador para seu uniforme. Este e

seus outros colegas militares estavam a caminho das 13 colônias para apartar uma possível revolução separatista. A guerra foi horrível, mas esse novo povo que nascia lutou com honra e coragem por sua independência. Estabeleci-me e acompanhei todo o processo evolutivo dessa nova nação em ascensão.

Depois de um bom tempo, percebi que era hora de trabalhar e encontrar um lugar para me fi xar. Descobri, então, um complexo que estava em constru-ção, seriam as maiores torres gêmeas do mundo, um polo corporativo que abri-garia escritórios e se localizaria no cen-tro de Manhattan. Fiz parte deste obe-lisco comercial de cento e um andares e por trinta e um anos me estabilizei. Até o décimo primeiro dia de setem-bro de 2001... Foi nesse dia que minha estabilidade se esfarelou junto com ou-tras toneladas de concreto e 3.278 seres humanos na colisão dos aviões contra o World Trade Center. A nuvem de po-eira dos destroços encobriu o sol, dei-xando o ambiente tão frio e sombrio quanto o coração das vítimas. Eu, no meio da nebulosa de poeira, fui emba-lado pelas correntes de ar até chegar ao Brasil, país que atualmente me serve de morada. Vivo em Natal, me aposentei da vida de aventuras, romances e tragé-dias. Sou apenas um pedaço de matéria inorgânica que vive em uma duna em constante mutação de acordo com o vento... Nada me diferencia dos outros corpos minerais a minha volta, além de minhas experiências e histórias.

Matheus Selim

Orientadora Pedagógica

Aluno do 2° Ano - Ensino Médio/CEI

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O cavaleiro inexistente ainda existe A obra “O Cavaleiro Inexistente”, de Ítalo Calvino, faz parte de uma trilogia chamada “Os Nossos Antepassa-dos”, que mostra a origem do homem contemporâneo, vazio e alienado.

Neste livro, o autor nos apresenta à seguinte situação: uma freira tem como penitência escrever sobre Agilulfo Emo Bertran-dino dos Guildiverni e dos Altri de Corbentraz e Sura, um cavaleiro bastante diferente, a começar por sua armadura, impeca-velmente branca e sempre polida, e pelo fato de que, dentro da armadura, não existir nada. Ítalo Calvino inova em seu texto, pois, ao mostrar somente a armadura, nos dá a ideia da morte da antiga sociedade cavaleiresca medieval, a sobrevivência somente das armas, códigos e armaduras, a mudança da sociedade que esqueceu o amor cortês e toda a regra de sociedade.

Essa obra nos leva às origens do homem atual, aquele que foca somente o exterior, perdendo sua vida, esquecendo dos seus desejos e vontades para seguir um padrão sistemático, com medo do julgamento dos outros. Como disse Calvino: “Agilulfo, o guerreiro que não existe, tomou os traços psicológicos de um tipo humano muito difuso nos ambientes de nossa sociedade (...) protótipos de Agilulfo se encontram por toda parte (...)”.

Carlos Alex Cabral, Herbeti Chagas, Pedro Augusto Fragoso e Yuri SouzaAlunos do 1º Ano - Ensino Médio/CEI

E foi naquela ruazinha

CRÔNICA RESENHAS

É a mesma ruazinha sossegada, onde brinquei e aprendi as lições que não são ensinadas na escola. Lembro-me

das nossas brincadeiras e dos nossos momentos em que des-cobríamos nosso corpo e fazíamos fl orescer a adolescência.

Vi-me a falar sozinho quando passei pelo velho cartaz anun-ciando: Alegrias – Risos, do circo que há muito fora em-bora. Esse circo, que representava a fuga da vida, para um momento de alegria, em que as pessoas se juntavam, e, por mais diferentes que fossem, se encontravam em busca de um mesmo sentimento.

Ali, naquela mesma ruazinha, vi tristezas e, pela primeira vez, meu coração abriu as portas para o amor, amor infan-til esse meu de acreditar que todo amor é para sempre. No batente da ruazinha, eu estava sentado, a olhar um grupo de meninas a brincar. Até que uma delas sentou-se ao meu lado, conversando, até nossos pais nos chamarem. Foi assim que iniciou uma série de encontros com beijos apaixonados. Ela, dois anos mais que eu, já conhecia os segredos mais íntimos do amor e, com uma ingenuidade tremenda, eu os aprendia, mas fui tolo em acreditar que aquela brincadeiri-nha se tornaria eterna. Parece mentira, mas onde vi o amor começar, vi-o acabar com minha paixão nos braços de outro alguém.

Mas desse modo a vida continua, e os cartazes da alegria foram substituídos a cada nova chegada do palco de palha-ços. Foi numa noite de brincadeiras que, de forma grotesca, a rua abriu-me os olhos para a realidade, tirando de mim o meu pai e, aos dezesseis anos, eu sentia o peso do mundo em minhas costas.

E foi assim, naquela ruazinha, que aprendi que amigos são para sempre, paixões marcam corações e na memória aque-les que amamos estarão sempre ao nosso lado. E foi assim, naquela ruazinha, que me encontrei sozinho e abandonado, numa simples noite de terça-feira, com o circo não mais ali.

Rodrigo Bezerra e Luiz Filipe Alunos do 9º Ano - Ensino Fundamental/CEI

A menina que roubava livros

A mãe e dois irmãos numa viagem de trem em companhia da morte, em direção a um destino desconhecido. Du-rante a viagem, o corpo inerte do irmão foi a imagem que a menina manteve, por muito tempo, congelada em sua mente. A morte acolheu a alma da criança e pensou : “alma fria feito sorvete”. Após o enterro dele e ainda sem consciência desta triste separação, a neve dá um presente à menina: um livro de letras prateadas que ela guardou na sua mala. Aquela menina estava sendo conduzida pela sua mãe, num gesto de desespero e proteção, para adoção. Na chegada à estação fi nal, outra separação. Agora, separada de sua mãe, deixou para trás, sob protesto, o cheiro e a lembrança do casaco cheio de sulcos aconchegantes e aquecedores, usado por ela , no momento em que a entregou para autoridades.

O casal de poucas posses que a adotaria e ao seu irmão, se o mesmo tivesse resistido àquela gelada viagem, aguardava-os ansiosamente.

Apesar do estranhamento, em poucos dias, com a ajuda do livro de letras prateadas, já existiam sinais de uma relação paterna entre eles. A menina que passou a viver em busca da sobrevivência material e psicológica , naquela cidade alemã, entre brin-cadeiras e trabalhos realizados para a mãe adotiva, sempre arranjava um jeito de roubar livros.

A leitura desse exemplo literário, além de confrontar o leitor com aspectos obscuros de uma época, de um país em guerra e suas consequências, leva-o a refl etir de maneira inédita sobre a função e o valor das palavras usadas para salvar vidas e como atitudes de solidariedade humana confrontam-se com atitudes dantescas de humanos que, “escondidos nas nuvens” trazem o sofrimento e a morte para milhares de pessoas.

Áurea Frazão - Coordenadora de Eventos

Romance Romance é um sucesso do cinema brasileiro que intertextualiza a obra clássica “Tristão e Isolda”, interpretados no teatro pelos personagens Ana (Letícia Sabatella) e Pedro (Wagner Moura). Durante os meses em que a peça permanece em cartaz, o casal se apaixona. O amor de ambos é registrado pela bela produção de arte do fi lme(há cenas tanto no Rio de Janeiro quanto no sertão paraibano), além de um roteiro poético e dinâmico, provocando reviravoltas dignas de histórias clássicas.

Dirigido por Guel Arraes e produzido por Paula Lavigne, a essência deste drama é representar o cotidiano de dois profi ssio-nais cujo ofício impõe barreiras à continuidade de uma intensa relação que marcou a vida deles. Ao tentarem superar a aver-são dele a trabalhar na televisão e a realizarem o desejo dela de atuar em telenovelas, Ana e Pedro se unem profi ssionalmente para fazer uma releitura de “Tristão e Isolda”, no interior nordestino.

A comicidade presente em Romance fi ca por conta do elenco composto por estrelas como Marco Nanini, Andréa Beltrão, Vladimir Brichta e José Wilker. O fi lme recebeu quatro indicações ao Grande Prêmio Cinema Brasil, nas categorias de Melhor Ator (Wagner Moura), Melhor Atriz Coadjuvante (Andréa Beltrão), Melhor Figurino e Melhor Maquiagem. Vale a pena envolver-se neste Romance.

Ana Márcia - Aluna do 1º Ano - Ensino Médio/CEI

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ARTIGO

Vivendo hoje o amanhãMariana A. Rodrigues

ARTIGO

Aluna do 8º Ano - Ensino Fundamental/CEI

Um ano novo vem chegando, e, com ele, novas ideias, novos pensamentos, novas amizades, muita coisa nova. Muitas vezes deixamos o ano pas-

sar sem valorizar o tempo. Mas acho que deveríamos dar um tempo na correria do dia-a-dia e parar para refl etir, pensar um pouco no que estamos fa-zendo. Será que estamos vivendo tudo no seu tempo, e aprovei-tando o tempo ao máximo como deveríamos? Por que esperar o amanhã sem aproveitar o presente, se aquilo que queremos deixar para depois pode ser feito agora? Pare um pouco e refl ita. Se você é estudante, pense bem, você está aprovei-tando o tempo que tem para estudar o que precisa, sem acumular dúvidas e sem acumular matéria? Desse modo teríamos o fi m de semana livre para fazermos o que quiser.

Podemos comparar o tempo com a água. Temos à nossa frente todos os dias, mas não damos o seu devido valor porque “amanhã” ainda teremos. Mas uma hora a água irá se acabar. Assim como o tempo se acaba, passa rápido, todo dia termina, e o “amanhã” chega com um novo dia, inteiro para ser aproveitado. Mas e se o amanhã não chegar? E se amanhã você não tiver tempo sufi ciente? Faça de hoje o seu “amanhã”, não deixe para amanhã o que se pode fazer hoje, não deixe para depois o que pode ser feito agora.

Faça hoje o que se tem para fazer, aproveite seu precioso tempo. Se está muito ocupado para visitar sua família, passar um tempo com seu fi lho, pense como se fosse seu último dia com ele, e com certeza você irá arranjar um tempo. Se você está esperando uma ocasião para usar certo perfume, saiba que essa oca-sião é o presente. A vida é uma dádiva, que deve ser valorizada.

Se fi zer hoje tudo que se tem para fazer, amanhã você estará mais tranquilo. Viva como se deve viver, aproveite cada segundo do dia, todos os dias do mês, todos os meses do ano, to-dos os anos de sua vida. Aproveite todo o tempo que puder aprovei-tar, seja feliz, isso é o que importa, e, com certeza, desse modo você fará outras pessoas felizes.

Na sociedade em que vivemos, a prática do individualismo

é unânime. Entretanto, há dois tipos de individualismo: o sadio e o com-petitivo. O primeiro consiste em viver sua própria vida, sem interferir na vida alheia; já o segundo prega que devemos viver privando o próximo desse direito.

Muitas pessoas relacionam a ideia do individualismo competitivo com a re-alização pessoal e a profi ssional, isto é, apenas com a prática dele será possível “subir na vida”, ser bem-sucedido. Isso, porém, é algo imposto pela sociedade e, principalmente, pela mídia. É como

diria o fi lósofo Jean-Jacques Rousseau: “O homem nasce bom; a sociedade é que o corrompe”.

Já os defensores do individualismo sadio formam a parcela da população que não é infl uenciada pelo que mostra a televisão. Para eles, não é preciso “passar por cima” de outras pessoas para alcançar seus obje-tivos, isto é, seu direito de liberdade ter-mina onde começa o do próximo.

O fato é que a frequente prática do mau individualismo gerou uma séria crise moral. Essa crise é caracterizada, principalmente, pela falta de con-fi ança entre as pessoas. Imaginemos,

Os dois lados da mesma moeda

Os dois lados da mesma moeda

Carolina TavaresAluna do 2º ano – Ensino Médio/CEI

por exemplo, uma pessoa no super-mercado. Já na hora de pagar, entrega o dinheiro ao caixa e este último, desconfi ado, confere se as notas são verdadeiras; o cliente, por sua vez, ao receber o troco, confere igualmente se as notas são verdadeiras.

A cada dia que se passa, mais e mais pes-soas se adaptam ao mau individualismo. Todavia, quanto mais pessoas se torna-rem praticantes dele, maior será a crise moral já mencionada. Precisamos parar e pensar se mais vale uma sociedade rica e egoísta ou uma sociedade de paz, inde-pendente de qualquer outra coisa.

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E n t r e v i s t a

ENTREVISTAconjugada com um conjunto de políticas governamentais que implica exatamente numa alteração desse quadro.

Dentro desta perspectiva, em que es-tado encontra-se o país?

Pela primeira vez na história republi-cana brasileira, estamos vivendo a expe-riência de ter algum índice de redução das desigualdades sociais, porque o Go-verno Federal começa a ter nos pobres o foco das suas políticas sociais. Isso, que para alguns segmentos sociais, so-bretudo da classe média, é visto sempre com um certo preconceito, particular-mente programas como o Bolsa Famí-lia, deveria se tornar uma política mais ambiciosa e permanente, para que nós pudéssemos ter uma política de inclu-são em termos de política de estado e não apenas política de governo. Essa é, a meu ver, a base inicial para que tivés-semos a recuperação da capacidade fi -nanceira dos governos municipal, esta-dual e federal, em desenvolver políticas públicas que assegurem uma cidada-nia ampliada para todos. Isso signifi ca romper com um cânone que é muito veiculado hoje pelos principais meios de comunicação de que o Estado deve gastar pouco e o mercado deve resolver os problemas da sociedade.

Qual a importância da discussão so-bre a ética em nossa sociedade?

Discutir ética é sempre algo muito posi-tivo. No entanto, essa discussão requer alguns cuidados. Quando nós vemos a discussão sobre a ética na sociedade brasileira, particularmente através dos meios de comunicação de massa, ela produz uma distorção sobre o enten-dimento das possibilidades do que é a ética em nosso país. Em primeiro lugar, o Brasil não é a sociedade onde há o

maior índice de corrupção no mundo. A corrupção é um fenômeno universal nos países desenvolvidos, subdesenvolvi-dos e em desenvolvimento. A diferença é que algumas sociedades têm mecanis-mos, particularmente de justiça, para coibir os desvios de conduta na área de apropriação privada de recursos públi-cos, como as práticas de corrupção. Ou-tra coisa curiosa é que no Brasil, quando se faz uma discussão sobre ética, há uma tendência em concentrar todos os males nos representantes políticos. Isso é um outro equívoco. Se há corrupção entre os políticos é porque há corruptores. E es-tes, em geral, são empresários que estão na iniciativa privada. Só que isso nunca é dito. Então, para se combater efetiva-mente a corrupção na política, é neces-sário que seja publicizado os dois lados do processo: quem corrompe e quem é corrompido. Eu costumo dizer que, se existem desvios e problemas éticos por aqui, eles são a expressão da sociedade brasileira. A política exprime aquilo que o cidadão na sua vida cotidiana faz. Por que nós temos que condenar apenas os políticos por essas práticas, quando eles são a expressão mais legítima daquilo que nós cidadãos fazemos? Então, nós aceitamos os nosso desvios na vida co-tidiana e condenamos aquilo que supos-tamente é um desvio absurdo, circuns-crito ao mundo da política

O brasileiro é um povo ético?

Quando fazemos essa discussão sobre ética, há um diagnóstico pressuposto que a gente precisa deixar claro. Primeiro, essa ideia que existem sociedades de-senvolvidas em que a ética é absoluta. É falso dizer que, nas sociedades capitalis-tas desenvolvidas, tem-se uma separação absoluta entre a esfera privada e a esfera pública, e que a esfera pública está, por-tanto, isenta das perversões e desvios da

corrupção. Isso também é um equívoco de conhecimento histórico dessas socie-dades. Existe corrupção na sociedade americana, francesa, alemã, inglesa, japonesa, etc. Ou seja, todo e qualquer cidadão segue a ética da sua cultura, por isso é preciso ter um componente de re-lativização sócio-histórica. Isso não sig-nifi ca dizer que a gente tem que justifi car as condutas que são reprováveis do ponto de vista de apropriação de recursos pú-blicos por grupos privados. É importante que essa discussão sobre ética seja feita nas escolas, para que haja consciência dos cidadãos sobre a necessidade de que nós devemos ter mecanismos de controle público sobre o uso de recursos feito pelos governantes, e que haja mecanis-mos de responsabilização social dessas pessoas frente à sociedade. Isso só é feito através da criação de uma cultura em que os cidadãos sintam-se responsáveis pelo destino da vida coletiva.

Há um certo comodismo do cida-dão brasileiro em relação aos escân-dalos de corrupção?

Eu não penso dessa forma. Acho que esse é o ponto de vista mais forte entre os jor-nalistas. Eles tendem, pela cobertura que fazem desse fenômeno da ética e dos pro-blemas de corrupção na política, a atribu-írem que os cidadãos só se orientam nas suas decisões políticas por esse critério. A rigor, nenhum cidadão, nem mesmo os jornalistas, fazem suas escolhas políticas tomando por base apenas uma dimensão. Sempre quando qualquer cidadão, seja ele pobre ou rico, que more em São Paulo ou no Nordeste, vai fazer suas escolhas eleitorais, ele nunca escolhe apenas a di-mensão da ética. Mesmo esses jornalistas, que se pretendem os arautos da ética, não fazem suas escolhas tomando apenas esse elemento como fator primordial das suas escolhas políticas. Por isso que não con-cordo com a ideia de que o povo brasileiro faz uma escolha política desconsiderando ou minimizando a dimensão ética. Na verdade, todo e qualquer cidadão, mesmo que não tenha uma escolaridade maior, ao fazer suas escolhas, mobiliza um con-junto de variáveis para avaliar as propos-tas e os candidatos que são submetidos nos processos eleitorais.

A ética e os problemas sociopolíticos brasileiros são os prin-cipais temas abordados nesta entrevista com o cientista

social João Emanuel Evangelista. Mestre em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e doutor em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo (USP), o professor João Evangelista emite suas opiniões e nos apresenta seus pontos de vista acerca de questões relevantes da realidade brasileira, como a desigualdade social e a discussão sobre a ética em nossa sociedade.

O Brasil é um dos países com maior índice de desigualdade social. Por que chegamos a essa triste realidade?

A desigualdade social no Brasil só pode ser entendida quando relacionamos esse fenômeno complexo com a história da formação da sociedade brasileira. So-mos uma sociedade criada na periferia do mundo concomitantemente com o desenvolvimento da modernidade nos países metropolitanos. No Brasil da-quele tempo, no momento de seu des-cobrimento, da sua colonização, houve uma reinvenção de formas atrasadas de relação de trabalho e relação de produ-ção que reintroduziu o escravismo na produção de mercadorias para abastecer o mercado mundial. A marca do escra-vismo é a matriz que explica as desigual-dades sociais e as profundas assimetrias na possibilidade do exercício da cidada-nia entre os brasileiros, de modo que a desigualdade social se expressa na forma de subcidadania para a maioria e de uma cidadania plena para muito poucos.

A educação é a chave principal para a diminuição desse abismo social?

Eu diria que a educação é um dos meca-nismos, mas não é o único. Nós só pode-mos pensar numa sociedade mais iguali-tária e mais democrática quando, através de políticas públicas básicas, assegurar-mos os direitos elementares de cidada-nia para todos. Precisamos dar escola e saúde de qualidade, trabalho digno e assegurar segurança, lazer e cultura para todos. Ou seja, a educação precisa estar

João Emanuel Evangelista

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CRÔNICA

9h40. Contagem regressiva: faltam 5 minutos para o

toque do intervalo. Tic-tac, tic-tac, tic-tac. Olhando nervoso para o relógio, o aluno permanece em posição de largada em sua cadeira. Dessa vez dera sorte: sentou-se no lugar da frente e, com cer-teza, seria o primeiro a sair pela porta da sala e chegar à cantina, assim que o Toque Divino soasse.

9h43. Ele já não presta atenção no que a professora de Matemática diz. Suas per-nas tremem, o suor escorre em sua testa.

9h44. Já não se controla. Será que con-seguiria seu pastel de frango? Todo dia era a mesma coisa: 20 dos 25 minutos do intervalo eram sacrifi cados na fi la do lanche. Ele estava revoltado com aquilo, não queria mais perder o único momento de descanso que tinha na sua exaustiva manhã de aulas.

9h45. O aluno escuta a música de MPB, que era como um tiro de largada para a Corrida do Salgado. Imediatamente, sai em disparada na direção da porta, e começa a correr pelos corredores, que parecem nunca mais ter fi m.

Finalmente, consegue sair do labirinto e avista a cantina. Apenas três pessoas. Mesmo sem entender como aqueles três conseguiram chegar ali antes dele, o aluno pega o 4º lugar da fi la. “4º lugar, até que não é tão mau. Pelo menos não vou de-morar pra pegar meu lanche”, pensa ele.

Vindos não sei de onde, surge ao longe um monte de outros alunos brigando e gritando, como um rebanho de vacas loucas que fugiram do pasto.

- Droga! – ele se revolta – Lá vêm aqueles trogloditas esfomeados do 9º ano de novo!

E assim, quando os mais velhos che-gam, é dado início à Guerra do Sal-gado. Empurrão aqui, chute ali, gritos para todo lado.

- Roubaram minha fi cha!

- Meu cachorro-quente é sem batata!

- Tão me empurrando!

- Cadê o meu folheado??!

- Ei, furou a fi la!

- Tem alguém me apalpando aqui!

- Moça, eu quero minha pizza!

Todos os tipos de comentário são ouvi-dos naquele momento.

Os menos persistentes desistem de comprar o lanche e vão embora. Os “playboys” fortões saem se gabando por terem conseguido seu salgado primeiro. E ainda tem aquele pobre coitado que tem sua calça abaixada em público.

Mas o nosso herói permanece em pé na fi la, fi rme e forte. Se é que aquilo ainda pode ser chamado de fi la. Não era nada mais do que uma bagunça. Se alguém fosse distribuir comida de graça na África, os africanos seriam mais educados.

No meio daquele caos, o aluno perde sua fi cha depois de um empurrão. Aga-cha e começa a procurá-la no chão. Avista-a, estica o braço e consegue pegá-la, mesmo depois de pelo menos três pessoas pisarem na sua mão.

O aluno levanta, e menos de três segun-dos depois disso, leva uma bofetada na cara, e vai novamente ao chão. Ele não

viu quem foi e nem demonstra interesse em saber. Apenas levanta e não desiste.

Mais alguns instantes e ele tem a sen-sação de ser puxado para cima. Era alguém puxando seu cabelo. Então ele dá um tapinha na mão daquela pessoa, para que ela soltasse seus cabelos.

Um pouco depois, leva uma cotovelada na barriga, sabe-se lá de quem, e solta um berro de dor, berro esse que não foi escutado por ninguém, em consequên-cia do enorme barulho do ambiente.

Mesmo um pouco desequilibrado, ele permanece em pé.

A ponto de explodir, o aluno pensa: “Céus! Isso é a fi la para o lanche ou um campo de tortura?!”. Mas tem seu pensamento interrompido por alguma coisa gelada e amarela que cai na sua barriga. Alguém havia derramado suco de maracujá em sua camisa.

Se antes estava a ponto de explodir, agora explodiu de vez. Aquilo foi simplesmente a gota d’água. Enfurecido e com ódio no olhar, o aluno solta um novo berro, dessa vez de ataque. Tonto, com dor de cabeça e barriga, com a mão esmagada, desca-belado e molhado, ele corre em direção à multidão e sai atropelando todos, como num jogo de futebol americano.

E depois de tudo, ele chega ao balcão. Orgulhoso, feliz e com esperança nos olhos, ergue no braço sua fi cha, puxa ar e dirigi-se à atendente da cantina:

- Moça, me vê um pastel de frango, por favor.

- O salgado acabou, meu fi lho.

Por uma sociedade ética

A guerra do salgadoLucas Menezes

Aluno do 8º Ano - Ensino Fundamental/CEI

Uma palavra pequena em tamanho, porém com

um signifi cado imenso, extremamente necessário de ser praticado no mundo contemporâneo, onde a valorização do “ter” sobrepuja a consciência do “ser”, numa realidade que vivemos, na qual a falta de uma tomada de posição ética traz resultados alarmantes.

Nesse contexto, com o entendimento de que, desde a mais tenra idade, pode-se e devem-se trabalhar os valo-res, os direitos e as atitudes em prol da formação de um indivíduo e em consequência de uma sociedade di-versa, mas humana, no Estágio III Matutino foi desenvolvido, este ano, o projeto: Brincando e aprendendo so-bre valores com Ruth Rocha.

Com esse trabalho, objetivou-se a construção, bem como a atuação do conceito da ética na vida das crianças, de forma lúdica e integrada ao traba-lho literário. Tendo em vista a faixa etária do grupo (4 anos de idade), bus-camos, por meio de leituras comparti-lhadas, registros gráfi cos, listagem de conhecimentos, dramatizações e nas próprias situações da rotina diária, vi-venciar a ética.

Na primeira etapa do projeto, foi lan-çado o questionamento para o grupo sobre o que as crianças sabiam refe-rente à ética. Foi interessante observar

o espanto de algumas que desconheciam a palavra, outras já tinham ouvido falar, mas não sabiam dizer o que realmente signifi cava. Desse modo, sugerimos à turma que esse conceito seria compar-tilhado posteriormente em grupo, após a leitura de algumas histórias e as ex-periências de determinadas situações. Daí, então, voltaríamos a discutir sobre o assunto.

Com o combinado acertado em grupo, passamos para fase seguinte: expor, por meio de dois livros de Ruth Rocha, ética e suas relações. Contudo, é válido colocar que, durante a contação de his-tórias, a professora não interveio para focalizar o teor ético que havia nelas.

A primeira história lida foi “O dono da bola” (Ruth Rocha)1. Após a contação da história, o grupo registrou suas im-pressões individuais por meio do dese-nho e da oralidade. Algumas crianças citaram que era legal a atitude de Ca-loca (personagem central da história) em querer tudo da forma dele, mas a maioria da turma registrou o momento em que o menino percebe a importân-cia do desapego material e a valorização das opiniões diversas às suas.

Dado a partida em nossa jornada ética, combinamos, em grupo, de retornar al-gumas atividades importantes de convi-

1 http://www2.uol.com.br/ruthrocha/livros.htm. Acessado em 01/07/2009.

vência e que acontecem diariamente em nossa rotina. Listamos e, em seguida, dramatizamos a formação da nossa roda de conversas diária, esperando a vez de falar, ouvindo e valorizando as falas de cada um, a procura em auxiliar a pro-fessora e os demais colegas no que estes necessitam, bem como a preservação do material de uso coletivo e individual.

Outro momento expressivo no desenvol-vimento do trabalho foi a leitura da De-claração Universal dos Direitos Huma-nos, escrita por Ruth Rocha (1995). Esse texto alavancou inúmeras observações do grupo sobre o que são os direitos de todos e quais os deveres que cada um possui com o coletivo. As crianças fi zeram rela-ção com uma infi nidade de vivências que experimentam no seu cotidiano.

Corroborando nesta linha propomos a turma uma situação hipotética no ob-jetivo de propiciar a refl exão crítica, a tomada de postura, como também a formulação de ideias referentes, mesmo que de maneira implícita, ao conceito de ética. Questionamos ao grupo o que eles fariam se vissem uma criança trabalhando. As respostas vieram sob a forma de desenhos e verbalizações, as quais retratavam uma compreensão concreta do que é um bem comum mo-ral: o direito à escola, resposta presente em quase todos os trabalhos.

Diante das proposições executadas, se-guimos para o momento da troca de ideias na roda de conversa, na qual foi retomada a problematização inicial do projeto: O que é ética? Nesse momento, listamos, em grupo, variados conceitos sobre a ética e sua atuação na nossa vida.

Com essa listagem, encontramos res-postas como: “Ter ética é não bater no colega”; “É não mentir!”; “É saber esperar sua vez e dividir com o amigo as coisas”, entre outras. Respostas es-sas que nos motivam a explorar com mais frequência temas relacionados à moral, às posturas e atitudes, que nos alertam que muito ainda há de ser feito, ao passo que nos revigoram pela certeza da contribuição no encalço de uma sociedade ética.

Leide Dayana P. de FreitasProfessora da Educação Infantil - Estágio III

EDUCAÇÃO INFANTIL

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Aos que desistiram...de sonhar...Oferecemos este poema para você, que ainda não sabia que a Terra era redonda e que acreditava que, muito longe, iria existir uma tabuleta qualquer onde estaria escrito, em letras rústicas: FIM DO MUNDO.

Mas não desanime diante da rea-lidade... afaste a confusão... esta-beleça você... “uma porção de fi ns mundo”. E siga sonhando...

Daniela FernandesLetícia Oliveira

Luisa Paula Vítor Navarro

Alunos do 8º AnoEnsino Fundamental/CEI

BailarinasAs bailarinas solitárias,dedicamos a vocês,com todas as suas solidões,este poema.

Para quando estiveremdançando e rodopiandosobre suas belas sapatilhassozinhas...

Para quando estiverem no palco,prestes a fazer o movimentomais difícil e mais solitário,pensar nele...

Para quando estiveremcom a “mão ainda erguida”sentir que as suas solidõeslibertam-se pelos suavese delicados dedos...

Amanda BatistaHeloísa Guz

Vinícius FonsecaElaine Oliveira

Alunos do 8º AnoEnsino Fundamental/CEI

Câmara Cascudo: vida em versosCascudo nasceuNa cidade do NatalSeu primeiro trabalhoUm artigo de jornalMantendo sua coluna jornalísticaUma leitura sensacional

Cascudo, um patrimônio de NatalDistribuía sabedoriaComo um artigo de valorCada livro uma sinfoniaLendo para o povoCada estrofe uma melodia

Cada dia de sua vidaUm conto para contarCom cada livro e versoSoube a todos encantarUm amigo companheiroQue sabia amar

Cascudo já se foiCada dia de sua vida nos marcouTantos livros e contosQue nos contouSozinhos no BrasilEle nos deixou

Clara PorpinoHugo Valentim

Alunos do 6º AnoEnsino Fundamental/CEI

Câmara Cascudo: vida em versos IILuís da Câmara CascudoEra um estudiosoDa nossa terra NatalUm homem graciosoPara o BrasilEra muito precioso

Do livro Lendas BrasileirasNão há do que reclamarPois o livro é de CascudoOuçam o que vou falar...As lendas são ótimasPodem observar

Para CascudoO “carro” nunca “caiu”“A Iara” nunca cantouE “A Gralha Azul” nunca no céu expandiu“O Zumbi nunca morreu”Mas o “corpo santo” sempre existiu

Esse aluno inteligenteNo Atheneu Norte-Rio-Grandense foi a estudarFormou-se em 1928Teve motivos para comemorarSeus pais bem orgulhosos fi caramPois em Direito chegou a se formar

Com a fi ta azul no braçoCascudo um aluno exemplarEra um príncipeDe as bochechas apertar Seus pais eram orgulhososAté o fi lho se louvar.

Maria Clara DantasRebeca Cordeiro

Alunas do 6º AnoEnsino Fundamental/CEI

A você, menina dos cabelos longos...Lamentamos pela tua solidão, mastambém alegramo-nos com a tua paixão, tão profunda, um amor imensamente profundo, que aos olhos faz mal. Mas não te enganes, fujas destes olhos que com censura te perseguem, não te enga-nes sobre caminhos... que abrirão novas paixões

Com sinceridade,

Brenda BorgesBrenda Rodrigues

Dandara MarinhoJosé Américo

Alunos do 8º AnoEnsino Fundamental/CEI

Uma pedra para nadaUma pedra para chutar Uma pedra para extravasarUma pedra para matar Uma pedra para pisar

Uma pedra no seu relacionamentoUma pedra no seu amorUma pedra no seu caminhoUma pedra na sua amizade

Uma pedra entre sua família Uma pedra entre homens e mulheres Uma pedra entre ricos e pobresUma pedra entre rosas

Uma pedra em cima dos seus direitos Uma pedra para apedrejarUma pedra para cada coisa

Uma pedra para TudoUma pedra entrementes morta.

Lucas CabralAluno do 2° Ano

Ensino Médio/CEI

De produtora à escritoraVamos falar sobre Ana MariaBastante inteligenteNasceu no Rio de JaneiroE escrevia livros frequentementeTudo o que escreviaSaía de sua mente.

Ana Maria deve ser admiradaSua primeira obra foi especialE desde sua infânciaTinha um ótimo astralSeus verões passava na praiaE quando voltava ia para o colegial.

Sempre foi uma boa alunaPois gostava de estudarTirava notas boasE em Geografi a pôde se formarMas resolveu desistirPara Artes poder cursar.

Ganhava muitos prêmiosPelas suas obrasPois nas livrariasSeus livros nunca têm sobraQuando não tinha ideiasInventava uma manobra.

Em sua vida teve sucessoSendo uma produtoraE sempre mandava ideiasPara a sua editoraPublicando seus livrosSe tornou uma escritora.

Helena MunayMarina GabrielleAlunas do 6º Ano

Ensino Fundamental/CEI

POESIAS

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Page 10: Revista Cei Cultural VII

EDUCAÇÃO

Os brincos de ouro

Conta a lenda que o sonho de um turista era

conhecer a Floresta Amazônica. Certo dia, seu sonho foi realizado e, ao che-gar nesse paraíso, fi cou encantado com a beleza de uma índia da tribo Kayapó.

Emerson, como era chamado, fez de tudo para se aproximar da índia Aimé, conquistando-a com presentes feitos da própria natureza. A moça fi cava encan-tada com tantos presentes que recebia, mas não sabia que o seu pretendente destruía tanto os seres vegetais como os animais para conseguir o material ne-cessário na fabricação desses presentes.

O moço conquistou toda a tribo com sua simpatia e seu amor por Aimé e logo marcou a data do casamento. A tribo aguardava ansiosa por esse dia, pois, como era tradição, algum pretendente que não fosse da sua tribo teria que dar

Alessandro Viola, Luis Felipe,

Luiz Eduardo, Marcela Nelson, Maria Beatriz e Pedro Henrique

Alunos do 5º Ano - Ensino Fundamental/CEI.

como “dote” de casamento muito ouro. Sabendo disso, Emerson foi à procura de ouro, pois além desse “dote”, queria dar para sua querida Aimé um par de brincos, mas, como o ouro era coisa rara naquela região, não o encontrou. Porém, ele sabia da existência de ouro na tenda do pajé e fi cou planejando um jeito de pegá-lo.

Numa noite, como de costume, toda a tribo estava reunida contemplando o luar para ouvir os conselhos dos mais velhos. Nesse momento, aproveitando que todos estavam entretidos, Emerson mais que depressa entrou na cabana do pajé e roubou todo seu ouro. Ele não sabia que o pajé tinha poderes mágicos e havia colocado um feitiço para quem recebesse o seu ouro. O rapaz, mal in-tencionado, correu e foi à cidade enco-mendar a joia que imaginara presentear sua amada no dia de seu casamento.

E assim chegou o dia tão esperado e eis que surge a noiva acompanhada pelos rituais da tribo. O noivo, ao recebê-la, entregou todo orgulhoso a joia acom-panhada de outra caixa com o restante do ouro. Nesse momento, Aimé se transformou numa estátua de ouro. O pajé logo percebeu o feitiço e condenou o moço até o fi m de sua vida a prestar serviços de conscientização para aque-las pessoas que tinham o mau costume de pegar no que não era seu, ou seja, roubar algo de alguém, pois assim, de-pois de um certo tempo, Aimé voltaria à condição de humana.

Diz a lenda que quem visita a Floresta Amazônica encontra sempre um guia turístico em frente a uma estátua de ouro, aconselhando as pessoas a não destruir a natureza, como também a não mexer em nada, praticando a vir-tude da honestidade.

CRÔNICA

O diálogo entre vários especia-listas pode provocar uma mu-

dança de atitude em relação às suas práticas educativas, pois os desloca do lugar de destaque (onde, segundo a Análise de Discurso Francesa, o dis-curso pedagógico os coloca). Isso faz de seus conhecimentos específi cos apenas uma possibilidade dentre os outros co-nhecimentos acadêmicos e cotidianos que estão, ou deveriam estar, sendo usados como ferramentas para a cons-trução de sujeitos sociais e críticos, que são capazes de se incluírem no contexto socioambiental e se verem como trans-formadores da realidade, sendo assim sujeitos autônomos. Além disso, pode permitir a ocorrência da emancipação dos sujeitos envolvidos (professores) no momento em que, enquanto dialogam sobre o tema ambiente, ocorre uma abertura ou ampliação em relação aos outros conhecimentos, até mesmo os não formais, evitando assim que ocorra uma limitação de seus saberes dentro de sua disciplina ou área. Na interdis-ciplinaridade, proposta pela prática das aulas integradas, os participantes são igualmente sujeitos e atores, uma vez que contribuem em alguns momentos e em outros atuam como modifi cadores das decisões e das relações de domínio no grupo de estudo.

Essa participação na elaboração de prá-tica educativa interdisciplinar possibi-lita aos sujeitos ganhos do ponto de vista pessoal e coletivo, uma vez que atuam e sofrem a atuação de outros atores para a construção de um novo conhecimento

que será usado na formação de profi s-sionais capazes de se incluírem no con-texto sociocultural e se verem como transformadores da realidade.

Segundo Fazenda (2005), a interdisci-plinaridade é um encontro entre pes-soas para desenvolver um determinado fazer. É uma troca de ideias e de expe-riências que surge a partir do querer se envolver. Tomando como base esse conceito de interdisciplinaridade, per-cebemos que ele se coaduna com a aula integrada, uma vez que esta permite um diálogo do professor com sua prática pedagógica e com os demais profi ssio-nais docentes, os quais se reúnem para trocar ideias e experiências e elaborar estratégias viáveis que possam auxiliá-los na prática em sala de aula.

A aula integrada é compreendida como uma experiência dialógica entre profi s-sionais especialistas cuja interação per-mite uma ampliação de seus saberes. Esta é gerada pelas várias reuniões de estudos que objetivam preparar as au-las de maneira coletiva, o que provoca troca de conhecimentos e experiências e, assim,uma melhoria em sua organi-zação teórico-pedagógica.

A formação do grupo interdisciplinar para formação continuada, utilizando como estratégia a aula integrada, per-mite a necessidade de um espaço de re-lações pedagógicas como ambiente de cooperação, ampliação, produção, hu-mildade, realização, refl exão e autono-mia. Isso porque os professores trocam ideias, dialogam de forma a contribuir

com os demais colegas, dando suges-tões, criticando positivamente e refl e-tindo sobre o que pode ser melhorado em sua prática de sala de aula. Há um refl etir “antes”, “durante” e “depois” de sua prática escolar.

Nesse sentido, temos percebido que o agir pedagógico do professor que as-sume a prática da aula integrada acaba por revelar um profi ssional competente nos domínios teóricos e práticos de sua disciplina, que refl ete sempre sobre a necessidade de ultrapassar ou superar as fronteiras disciplinares, para então ter segurança ao dialogar com as outras áreas de conhecimento. Esse profi ssio-nal se torna capaz de se apropriar de avanços e inovações pedagógicas, busca estabelecer relação entre os conheci-mentos pedagógicos e científi cos, além de desenvolver a capacidade de elabo-rar projetos interdisciplinares, a partir de situações-problema, com temas ou tarefas que garantam a articulação das contribuições oriundas das diversas disciplinas.

ReferênciasFAZENDA, Ivani (org). Práticas Interdisciplinares na Escola. 10ª Ed. São Paulo: Cortez. 2005.FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005.GIL, Antônio Carlos. Métodos e técnicas da pes-quisa social. 5ª ed – São Paulo: Atlas, 2007.JANTSCH, Ari Paulo & BIANCHETTI, Lucídio. Interdisciplinaridade: para além da fi losofi a do su-jeito. Petrópolis, RJ: Vozes, 1995.TRIVIÑOS, Augusto N. Silva. Introdução à pesquisa em ciências sociais. 1 ed – São Paulo: Atlas, 2007.SANTOMÉ, Jurjo Torres. Globalização e Interdisci-plinaridade: o currículo integrado. 1998.

A aula integrada como estratégia para integrar áreas de conhecimento do ensino médio

Maria da Glória AlbinoProfessora de Biologia

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Page 11: Revista Cei Cultural VII

lógica é εθος). Todavia esse conceito é bastante geral e não chegaremos a gran-des conclusões a partir dele, mas ele es-tabelece um caminho a ser seguido que nos leva a outra conceituação que nos dará algumas pistas sobre a importân-cia da ética, já anteriormente postulada. Numa frase, Ética constitui a parte do conhecimento e do agir humano que se ocupa com as refl exões sobre as noções e os princípios que fundamentam a vida moral. Sendo assim, a ética vem contes-tar ou atestar as condutas postas pela moral e suas consequências.

À vista disso, façamos uma refl exão so-bre o tema integrador proposto pelo Co-légio CEI neste ano. É mister analisá-lo de forma mais detalhada, vejamos: pe-guemos três palavras dessa frase: Ler o Brasil sob o olhar da Ética, quais sejam, Ler, Brasil e Ética.

Ler – Segundo Paul Ricoeur, fi lósofo francês contemporâneo, o ser humano, em sua estrutura fundamental, ou seja, em sua essência, forma-se a partir das suas leituras, isso ele chama de forma-ção do sujeito. No entanto, essas leitu-ras das quais ele fala não são “leituras do mundo” ou “experiências do ho-mem no mundo” como dizem por aí, mas sim a leitura que fazemos no nosso dia-a-dia, são as leituras de romances, fi losofi a, história, ciências, jornais etc. Isso é que forma o sujeito, isso é que dá a humanidade ao humano. Mas, daí já se pode fazer uma refl exão ética: Como um país como o nosso, cuja caracterís-tica marcante é não levar a sério a edu-cação, as artes e a cultura, pode formar sujeitos? O que esperar desses sujeitos

Se entrarmos no túnel do tempo e nos depararmos com a gênesis

do pensamento ético-político, pode-se dizer que ele emergiu a partir da cons-tituição da polis como um esforço para confrontar o agir dos cidadãos, e suas instituições, com as exigências univer-sais da razão. Como estamos tratando dos desafi os contemporâneos, a fi losofi a política e a ética, hoje, brotam da con-sideração das questões desafi adoras que marcam nossa vida coletiva. Daí por-que, hodiernamente, a primeira tarefa da fi losofi a política e do pensamento ético é levar em consideração a análise da situação do mundo contemporâneo. Segundo alguns fi lósofos, essa aná-lise deve partir de uma constatação, a saber: se fi zermos um diagnóstico das situações as quais estamos enfrentando agora (como humanidade), perceber-se-á que estamos vivendo num momento de crise Ética. Mais do que lugar co-mum, essa frase retrata um problema sério, com os quais pensadores con-temporâneos se debruçam com afi nco. É por esse motivo que o debate sobre a ética nunca se esgotará, pois, se os seres humanos do mundo contemporâneo, começando desde cedo na escola, não retomarem e entenderem o sentido ini-cial da ética, os problemas se tornarão irreversíveis e nos restará apenas o la-mento das gerações futuras.

Para entendermos o conceito de ética comecemos por sua defi nição geral: Ética vem do grego Éthos, cujo sig-nifi cado é não só Morada, Habitat, Habitação (donde a raiz etimológica é ηθος), como também hábito, conduta e comportamento (donde a raiz etimo-Do

Etho

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D o E t h o s à V i d aMarco Aurélio de M. Jordão

que são formados pela mídia, que tem como principal função alienar e nos transformar em consumidores e não em cidadãos? Então esse ler que o CEI nos convida a fazer é uma leitura crítica, é a leitura que o fi lósofo acima mencio-nado sonhou ao pensar num mundo mais justo e igual.

Brasil – Pensar o Brasil sob o olhar do tema integrador é pensá-lo de maneira crítica, é pensá-lo sob seu aspecto social e político. E isso pode ser feito a partir de um conceito que já é bastante tra-balhado e bastante lembrado, mas que infelizmente essa lembrança fi ca apenas nas discussões em sala de aula ou nos debates acadêmicos, a saber, Cidadania. O sociólogo Wanderlei Guilherme dos Santos, ao analisar os direitos civis e po-líticos num período da nossa história, denominou a nossa cidadania de “cida-dania regulada”, ou seja, apesar de uma evolução de direitos, o Brasil sempre se caracterizou por uma cidadania res-trita. No nosso país os direitos são para todos e os deveres para poucos. Então o que falta? Leitura! Para que possamos nos tornar indivíduos críticos, logo ci-dadãos exigentes e conscientes, para sermos um povo ético, justo e feliz.

Ética – Para fi nalizar, falaremos de ética. Todos nós sempre usamos essa palavra, ou para repreender alguém ou para elogiar. Ultimamente estamos mais repreendendo do que elogiando. Jaeger, numa referência a Aristóteles ao falar de ética, pede para imaginarmos como seria o convívio em um barco, por exemplo. Como seria Conviver (vi-ver–com) em um ambiente pequeno?

Teríamos que respeitar o espaço do outro e cuidar do nosso, teríamos que vigiar os nossos costumes e os nossos hábitos para que não interferíssimos na vida do outro. Isso seria recíproco, e sem essa organização o barco não se-ria habitável. Dessa mesma maneira é com a nossa cidade, é com o nosso país e com o mundo. Se nós não tivermos um costume saudável, e isso é pensar no outro, o nosso habitat será caótico. Se pensarmos apenas nos problemas que nos atingem diretamente, o nosso éthos fi cará sem uma organização, abrindo espaço para jogos de interesses, corrup-ção, violência, destruição da natureza etc. Por isso a ética, como uma refl exão acerca dos princípios morais, é de suma importância para que façamos uma ci-dade digna dos seus cidadãos.

Finalmente, que esse pequeno texto traga algumas refl exões. Essas três pala-vras, que estarão presentes durante toda nossa vida, sejam pensadas com mais cuidado por todos que fazem o CEI. Se transformarmos a leitura em educação, o Brasil em uma nação justa e a ética em algo corriqueiro em nossas vidas, cami-nharemos à eudaimonia, ou seja, o con-ceito grego de felicidade, em que o cida-dão ético constrói sua cidade sob a égide da justiça e ensina que o conhecimento é um processo dual, que, para conquistá-lo, é necessário disciplina e sofrimento, mas que, ao alcançá-lo, o prazer é in-descritível. Finalizaremos, assim, com o poeta Antônio Machado: “Caminhante, não há caminho; faz-se caminho ao andar”. Andemos, portanto, juntos, de maneira ética, para assim conquistar e reafi rmar a Vida, sempre.

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III Recital de Música Sacra – CEI, participações: soprano Alzeny Nelo, regente Fábio Presgrave, violoncelista Saulo Oliveira

(Aluno CEI) e Orquestra de Câmara. – Abril/2009 –

Quanta força e beleza residem na missão de EDUCAR!

Quantos desafi os a superar, mas, principal-mente, quanto a aprender. Paciência, dedicação, conhecimento, autocontrole e poder de obser-vação são ferramentas fundamentais na arte de educar. Tempo e amor; molhos indispensáveis.

Quando Milton nasceu, minha forma de ver o mundo mudou. Já não era mais dono do meu destino e haveria de me responsabilizar por ele o resto da minha vida. Um desafi o e tanto. Fas-cinante! Mágico! Aí, pensei: “como erros e acertos são companheiros constantes no caminhar de quem se propõe a educar, o mais importante é se prepa-rar e nunca desistir de tentar fazer o melhor”.

Hoje, muito se fala que o mundo está cada vez mais louco, violento, imprevisível e que a televi-são e a internet são obstáculos à boa educação. Será? Por esses “motivos”, há mesmo quem ache melhor não ter fi lhos. Ou serão desculpas?

Respeito que assim pensa, mas acredito que o mundo está cada vez melhor e que esse é um mo-mento sublime para se viver e educar. Se as in-formações correm na velocidade da telemática, é melhor estarmos preparados para enfrentá-las. Se o mundo é outro, é outro tanto para o mal quanto para o bem. Por isso, precisamos perma-nentemente nos aperfeiçoar. Não dá para deixar nossos fi lhos “colados” ao computador horas a fi o, sem ter a menor ideia do que estão fazendo, apenas para que fi quem quietos e “nos deixem em paz”. Não dá para fazer uma assinatura de televisão fechada e deixar que nossos fi lhos “jul-guem” os conteúdos que podem absorver. Pre-

cisamos participar e, principalmente, dar a eles parâmetros para que sejam capazes de fazer o melhor uso dessas “inovações”.

Ora, mas também é fato que muitos de nós têm menos afi nidade que nossos fi lhos com inter-net, smartphones, ipods, orkut, twitter, msn e um sem número de outras “novidades”. É verdade e, embora acompanhá-los seja quase impossível, é necessário que busquemos um mínimo de co-nhecimento nessa área, pois, do contrário, per-deremos totalmente o controle sobre aquilo que nossos fi lhos estão fazendo e sobre o quê estão se dedicando.

Quanto à internet, um bom começo é acessar as cartilhas disponíveis nos sítios da SaferNet Bra-sil, do Centro de Estudos, Resposta e Trata-mento de Incidentes de Segurança no Brasil e do Comitê para Democratização da Informá-tica, cujos endereços informamos ao fi nal, nos quais é possível encontrar informações preciosas quanto ao uso seguro dessa ferramenta.

Embora o mundo tenha mudado muito, ale-gria, respeito, amor e diálogo permanente são ainda as formas mais adequadas de ajudarmos nossos fi lhos a trilharem o melhor caminho e, para isso, precisamos estar “antenados” com aquilo que os motiva e seduz, pois não é possível dialogar se não falarmos a mesma linguagem.

Caros pais, o desafi o é grande, mas o resultado é infi nitamente compensador.

http://www.safernet.org.br/site/prevencao/cartilha/safer-dicashttp://cartilha.cert.brhttp://www.cdipr.org.br/cartilha/

Educação em tempos de telemát ica

Eudes Albuquerque de AndradeEngenheiro Eletricista e Bacharel em Direito

PALAVRA DE PAIS

Fotos: Carla Régia

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