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A Participação Estatal no Sistema Bancário Brasileiro: uma análise do período 1996-2006 Isabela Soares de Lima Denilson Queiroz Gomes Ferreira Avaliação dos Efeitos da Lei Kandir sobre a Arrecadação de ICMS no Estado do Ceará Alejandro Leitão Guilherme Irffi Fabricio Linhares Análise do Impacto da Classificação de Risco no Mercado de Crédito Brasileiro Paulo Rogério Faustino Matos João Henrique Lemos Costa Solvência e Reação Fiscal das Administrações Públicas Municipais no Brasil Andrei Gomes Simonassi Ronaldo de Albuquerque e Arraes Francisca Lívia Souza Menezes Denise Xavier Araujo O Setor Energético Brasileiro: uma análise via indicadores de insumo-produto e o modelo híbrido para os anos de 1997 e 2002 Vinicius de Azevedo Couto Firme Fernando Salgueiro Perobelli Análise Conceitual da Política de Territórios Rurais: o desenvolvimento territorial rural no Brasil Juliano Geraldi Fluxos Totais de Comércio e Estrutura Produtiva – uma análise para o estado de Minas Gerais Marisa dos Reis A. Botelho Vanessa Petrelli Corrêa Ana Alice B. P. D. Garlipp Eficiência no Gasto Público com Educação: uma análise dos municípios do Rio Grande do Norte Jorge Luiz Mariano da Silva Júlio César Lima de Almeida Efeitos de Programas de Assistência Social sobre a Frequência Escolar nos Estados Brasileiros: uma análise baseada em dados da pesquisa de orçamentos familiares Ricardo Agostini Martini Helena Cruz Castanheira jul. dez. 2012 39

Revista Planejamento e Politicas Publicas

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Coletanea de artigos sobre Políticas Públicas e seu planejamento

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Missão do IpeaProduzir, articular e disseminar conhecimento para aperfeiçoar as políticas públicas e contribuir para o planejamento do desenvolvimento brasileiro.

A Participação Estatal no Sistema Bancário Brasileiro: uma análise do período 1996-2006Isabela Soares de LimaDenilson Queiroz Gomes Ferreira

Avaliação dos Efeitos da Lei Kandir sobre a Arrecadação de ICMS no Estado do CearáAlejandro LeitãoGuilherme IrffiFabricio Linhares

Análise do Impacto da Classificação de Risco no Mercado de Crédito BrasileiroPaulo Rogério Faustino MatosJoão Henrique Lemos Costa

Solvência e Reação Fiscal das Administrações Públicas Municipais no BrasilAndrei Gomes SimonassiRonaldo de Albuquerque e ArraesFrancisca Lívia Souza MenezesDenise Xavier Araujo

O Setor Energético Brasileiro: uma análise via indicadores de insumo-produto e o modelo híbrido para os anos de 1997 e 2002Vinicius de Azevedo Couto FirmeFernando Salgueiro Perobelli

Análise Conceitual da Política de Territórios Rurais: o desenvolvimento territorial rural no BrasilJuliano Geraldi

Fluxos Totais de Comércio e Estrutura Produtiva – uma análise para o estado de Minas GeraisMarisa dos Reis A. BotelhoVanessa Petrelli CorrêaAna Alice B. P. D. Garlipp

Eficiência no Gasto Público com Educação: uma análise dos municípios do Rio Grande do NorteJorge Luiz Mariano da SilvaJúlio César Lima de Almeida

Efeitos de Programas de Assistência Social sobre a Frequência Escolar nos Estados Brasileiros: uma análise baseada em dados da pesquisa de orçamentos familiaresRicardo Agostini MartiniHelena Cruz Castanheira

jul. dez.

2012 39

jul.-dez. | 201239

Governo FederalSecretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República

Ministro Wellington Moreira Franco

Fundação pública vinculada à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, o Ipea fornece suporte técnico e institucional às ações governamentais – possibilitando a formulação de inúmeras políticaspúblicas e programas de desenvol-vimento brasileiro – e disponibiliza, para a sociedade, pesquisas e estudos realizados por seus técnicos.

PresidenteMarcelo Côrtes Neri

Diretor de Desenvolvimento InstitucionalLuiz Cezar Loureiro de Azeredo

Diretora de Estudos e Relações Econômicas e Políticas InternacionaisLuciana Acioly da Silva

Diretor de Estudos e Políticas do Estado, das Instituições e da DemocraciaAlexandre de Ávila Gomide

Diretor de Estudos e PolíticasMacroeconômicas, SubstitutoClaudio Roberto Amitrano

Diretor de Estudos e Políticas Regionais,Urbanas e AmbientaisFrancisco de Assis Costa

Diretora de Estudos e Políticas Setoriaisde Inovação, Regulação e InfraestruturaFernanda De Negri

Diretor de Estudos e Políticas SociaisRafael Guerreiro Osorio

Chefe de GabineteSergei Suarez Dillon Soares

Assessor-chefe de Imprensa e ComunicaçãoJoão Cláudio Garcia Rodrigues Lima

Ouvidoria: http://www.ipea.gov.br/ouvidoriaURL: http://www.ipea.gov.br

PPP: PLANEJAMENTO E POLÍTICAS PÚBLICASPublicação semestral do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada cujo objetivo é promover o debate e a circulação de conhecimento em planejamento e políticas públicas, representando o esforço do instituto de disseminar pes-quisas, avaliações e proposições neste campo.E-mail: [email protected]

Corpo Editorial

Membros

Alexandre Cunha (Ipea)Axel Gosseries (Chaire Hoover/UCLouvain)Benny Schvarsberg (UnB)Gabriel Porcile (Cepal)Guilherme Delgado (Ipea – aposentado/UFU)Liana Carleial (UFPR)Maria Lúcia Werneck (UFRJ)Serguei Soares (Ipea)Wilson Suzigan (UNICAMP)

EditorBruno de Oliveira Cruz (Ipea)

CoeditorLeonardo Monasterio (Ipea)

Secretária-ExecutivaEdineide Pedreira Ramos

Apoio TécnicoFrancisco de Souza Filho

Governo FederalSecretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República

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PresidenteMarcelo Côrtes Neri

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PPP: PLANEJAMENTO E POLÍTICAS PÚBLICASPublicação semestral do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada cujo objetivo é promover o debate e a circulação de conhecimento em planejamento e políticas públicas, representando o esforço do instituto de disseminar pes-quisas, avaliações e proposições neste campo.E-mail: [email protected]

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Alexandre Cunha (Ipea)Axel Gosseries (Chaire Hoover/UCLouvain)Benny Schvarsberg (UnB)Gabriel Porcile (Cepal)Guilherme Delgado (Ipea – aposentado/UFU)Liana Carleial (UFPR)Maria Lúcia Werneck (UFRJ)Serguei Soares (Ipea)Wilson Suzigan (UNICAMP)

EditorBruno de Oliveira Cruz (Ipea)

CoeditorLeonardo Monasterio (Ipea)

Secretária-ExecutivaEdineide Pedreira Ramos

Apoio TécnicoFrancisco de Souza Filho

NORMAS AOS COLABORADORES DE PLANEJAMENTO E POLÍTICAS PÚBLICAS

1. Os artigos enviados para seleção devem ser inéditos. A remessa do artigo à revista implica autorização para a sua publicação pelo autor.

2. Os trabalhos podem ser submetidos em português, inglês, francês ou espanhol. Aceitam-se, eventualmente, artigos traduzidos já publicados em outro idioma que, pela sua relevância, mereçam divulgação em português.

3. A revista reserva-se o direito de recusar trabalhos submetidos para publicação conforme a avaliação de seus pareceristas. Todos os trabalhos submetidos serão julgados por dois pareceristas ad hoc, no processo de avaliação double-blind. Caso haja divergência entre os dois primeiros pareceristas, o artigo será encaminhado para um terceiro parecerista.

4. Os artigos selecionados para publicação deverão ser disponibilizados em formato editável (.DOC, .RTF ou .ODT). Eles podem ser enviados por e-mail <[email protected]> ou pelo site da revista (acessar a seção Publicações, subseção PPP, em <http://www.ipea.gov.br>).

5. Cada artigo deverá conter um resumo de cerca de 150 (cento e cinquenta) palavras, o qual propicie uma visão global e antecipada do assunto tratado. O resumo, bem como o título do artigo, deve ser enviado em 4 (quatro) idiomas: português, inglês, espanhol e francês. Cada resumo deve conter até 5 (cinco) palavras-chave.

6. As fórmulas matemáticas devem ser claras e estarem inseridas no próprio texto (se forem imagens, devem estar em definição mínima de 300 dpi): jamais podem dar margem a dupla interpretação. Se as deduções de fórmulas forem abreviadas, o autor deverá apresentar a derivação completa em um anexo, o qual não será publicado.

7. Diretrizes gerais para formatação dos artigos:

7.1 Antes do título, devem constar as informações sobre o autor: nome completo, instituição à qual está vinculado, endereço eletrônico e endereço para correspondência. O autor deverá informar até 5 (cinco) códigos do sistema de classificação do Journal of Economic Literature (JEL) – disponível no site <http://www.aeaweb.org/journal/jel_class_system.php>.

7.2 Os artigos não devem exceder 30 (trinta) páginas, em texto digitado em formato A4 (29,7 x 21 cm), espaço simples, letra Times New Roman, corpo 12, margens superior e esquerda com 3 cm e inferior e direita com 2 cm, justificado.

7.3 Gráficos, tabelas, quadros e figuras deverão ser entregues em formato editável (.XLS, .AI, .EPS ou .CDR) para possibilitar a manipulação eletrônica de dimensões, cores e textos. Imagens fotográficas deverão ter definição mínima de 300 dpi e estarem nos formatos .TIFF, .JPG, .BMP ou .GIF.).

7.4 As notas devem aparecer no fim da página, numeradas sequencialmente.

7.5 O artigo deve seguir as normas estabelecidas pelo Manual do Editorial do Ipea (2ª edição, 2011, disponível em: <http://www.ipea.gov.br/sites/000/2/livros/2012/livro_manual_editorialipea_2ed.pdf>) e pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), NBR-6023.

7.6 As indicações bibliográficas no texto devem obedecer, por exemplo, à forma (Barat, 1978) e, se for o caso, serem acrescidas de referência ao número da página citada: (Barat, 1978, p. 15). A referência completa deverá ser apresentada no fim do artigo, em ordem alfabética, com: no caso de livros – autor(es), título completo do livro, nome e número da série ou coleção (se houver), edição, local, editora e ano de publicação; e no caso de artigos de periódicos – autor(es), título completo do artigo, título completo do periódico, local, número e volume, número de páginas, mês e ano de publicação.

planejamento e políticas públicas ppp

número 39 | jul./dez. 2012

Brasília, 2012

© Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – ipea 2012

As opiniões emitidas nesta publicação são de exclusiva e inteira responsabilidade dos autores, não exprimindo, necessariamente, o ponto de vista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada ou da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República.

É permitida a reprodução deste texto e dos dados nele contidos, desde que citada a fonte. Reproduções para fins comerciais são proibidas.

Planejamento e políticas públicas / Instituto dePesquisa Econômica Aplicada. – n. 1 (jun.1989)- .Brasília : Ipea, 1989 -

Semestral.Editor anterior: de 1989 a março de 1990,

Instituto de Planejamento Econômico e Social.

ISSN 0103-4138

1. Economia. 2. Políticas Públicas. 3. Plane-jamento Econômico. 4. Brasil. 5. Periódicos. I.Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.

CDD 330.05

Nota dos EditorEs

A revista Planejamento e políticas públicas mantém, em seu número 39, a tra-dição da pluralidade de temas, abordagens e filiação dos autores. Este número traz nove artigos de diversos temas, desde a avaliação de políticas a discussões conceituais e apresentação de novas bases de dados e indicadores. Agrade-cemos mais uma vez a todos os autores e pareceristas da revista, que têm contribuído para um processo editorial célere, sem perder o rigor da revisão double-blind. Neste sentido, reforçamos aqui os agradecimentos à contribui-ção de inestimável valor dos pareceristas.

Este número 39 é composto por artigos que versam sobre educação, infra-estrutura, setor bancário, comércio interno e matrizes de insumo produto, tri-butação e discussões sobre territórios rurais. A variedade deve-se não apenas à relevância dos temas debatidos, mas também à sua atualidade. Assim, a revista espera contribuir com o debate nacional na grandiosa tarefa de aprimoramento das políticas públicas.

O primeiro artigo avalia a atuação dos bancos públicos desde 2003. O estudo evidencia que o papel decisivo dos bancos públicos na recuperação dos impac-tos negativos da crise de 2009 tem raízes no processo de ampliação da atuação destes bancos nos primeiros anos do século XXI. O segundo artigo discute os li-mites da compensação financeira aos estados, após perda de arrecadação de ICMS referente à desoneração das exportações, por meio da Lei Kandir, com base na experiência do estado do Ceará, que apesar de não ser grande exportador, apresen-ta perdas significativas na arrecadação. Outro artigo, que trata do setor bancário, aborda a importante questão do efeito do rating sobre a oferta de crédito no país. Os autores mostram a importância desta classificação, uma vez que a obtenção do grau de investimento, pelos resultados apresentados, tem efeito significativo sobre a concessão de crédito. Este efeito positivo sobre o setor bancário lança luz no-vamente sobre a necessidade de se debater mais profundamente a classificação de crédito e metodologias de construção dos ratings. A questão das finanças públicas municipais é o tema abordado no quarto artigo desta edição. Os autores mostram diferenças regionais no comportamento fiscal e testam a sustentabilidade destes diferentes recortes territoriais. A infraestrutura, em especial o setor elétrico, é ana-lisada no artigo seguinte. Utiliza-se a abordagem insumo-produto para verificar as ligações intersetoriais do setor elétrico. O sexto artigo trata da questão do desen-volvimento rural, debatendo a política dos chamados territórios rurais. O autor analisa e discute as bases conceituais para a elaboração destas políticas. O sétimo artigo constrói uma matriz de fluxos de comércio interno para o estado de Minas

Gerais a partir de dados fiscais. Finalmente, os dois últimos artigos deste número abordam o setor educacional, um deles pela avaliação de gastos educacionais para o Rio Grande do Norte, enquanto o outro avalia a questão da frequência escolar e o impacto dos programas de assistência social.

Desejamos a todos boa leitura.

Bruno de Oliveira Cruz Editor

Leonardo MonasterioCoeditor

sumário

a ParticiPação Estatal No sistEma BaNcário BrasilEiro: uma aNálisE do PErÍodo 1996-2006 ....................................................................................9Isabela Soares de LimaDenilson Queiroz Gomes Ferreira

AvAliAção dos efeitos dA lei KAndir sobre A ArrecAdAção de icMs no estAdo do ceArá ............................................................................................................37Alejandro LeitãoGuilherme IrffiFabricio Linhares

aNálisE do imPacto da classiFicação dE risco No mErcado dE crÉdito BrasilEiro .........................................................................................................65Paulo Rogério Faustino MatosJoão Henrique Lemos Costa

solvÊnciA e reAção fiscAl dAs AdMinistrAçÕes PÚblicAs MUniciPAis no brAsil ...........................................................................................................91Andrei Gomes Simonassi Ronaldo de Albuquerque e ArraesFrancisca Lívia Souza MenezesDenise Xavier Araujo

o sEtor ENErgÉtico BrasilEiro: uma aNálisE via iNdicadorEs dE iNsumo-Produto E o modElo hÍBrido Para os aNos dE 1997 E 2002 .........................123Vinicius de Azevedo Couto FirmeFernando Salgueiro Perobelli

Análise conceitUAl dA PolÍticA de territÓrios rUrAis: o desenvolviMento territoriAl rUrAl no brAsil ........................................................155Juliano Geraldi

flUXos totAis de coMÉrcio e estrUtUrA ProdUtivA – UMA Análise PArA o estAdo de MinAs GerAis ...............................................................187Marisa dos Reis A. BotelhoVanessa Petrelli CorrêaAna Alice B. P. D. Garlipp

EFiciÊNcia No gasto PÚBlico com Educação: uma aNálisE dos muNicÍPios do rio graNdE do NortE ..............................................219Jorge Luiz Mariano da SilvaJúlio César Lima de Almeida

efeitos de ProGrAMAs de AssistÊnciA sociAl sobre A freQUÊnciA escolAr nos estAdos brAsileiros: UMA Análise bAseAdA eM dAdos dA PesQUisA de orçAMentos fAMiliAres ..............................................................................................243Ricardo Agostini Martini Helena Cruz Castanheira

summarY

tHe stAte PArticiPAtion in tHe brAZiliAn bAnKinG sYsteM: An AnAlYsis of tHe Period 1996-2006 ..................................................................................9Isabela Soares de LimaDenilson Queiroz Gomes Ferreira

AssessinG tHe effects of KAndir lAw on ceArá’s icMs revenUe ................................37Alejandro LeitãoGuilherme IrffiFabricio Linhares

ANalYsis oF thE ratiNg imPact oN thE BraZiliaN crEdit marKEt ................................65Paulo Rogério Faustino MatosJoão Henrique Lemos Costa

solvencY And fiscAl reAction of PUblic AdMinistrAtions in brAZiliAn MUniciPAlities ................................................................................................91Andrei Gomes Simonassi Ronaldo de Albuquerque e ArraesFrancisca Lívia Souza MenezesDenise Xavier Araujo

tHe brAZiliAn enerGY sector: An AnAlYsis UsinG inPUt-oUtPUt indicAtors And tHe HYbrid Model for tHe YeArs 1997 And 2002 ..............................123Vinicius de Azevedo Couto FirmeFernando Salgueiro Perobelli

concePtUAl AnAlYsis of tHe PolicY of rUrAl territories: tHe rUrAl territoriAl develoPMent in brAZil .............................................................155Juliano Geraldi

totAl trAde flows And ProdUctive strUctUre – An AnAlYsis of tHe stAte of MinAs GerAis .....................................................................187Marisa dos Reis A. BotelhoVanessa Petrelli CorrêaAna Alice B. P. D. Garlipp

efficiencY in PUblic sPendinG on edUcAtion: An AnAlYsis of MUniciPAlities in rio GrAnde do norte ..............................................219Jorge Luiz Mariano da SilvaJúlio César Lima de Almeida

effects of welfAre ProGrAMs on scHool AttendAnce in brAZiliAn stAtes: An AnAlYsis bAsed on Pof dAtA .......................................................................................243Ricardo Agostini Martini Helena Cruz Castanheira

sumario

lA PArticiPAciÓn del estAdo en el sisteMA bAncArio brAsileÑo: Un Análisis del Periodo 1996-2006 .....................................................................................9Isabela Soares de LimaDenilson Queiroz Gomes Ferreira

evAlUAciÓn de los efectos de lA leY KAndir sobre lA recAUdAciÓn de icMs en el estAdo de ceArá .................................................................37Alejandro LeitãoGuilherme IrffiFabricio Linhares

aNálisis dE los EFEctos dE la clasiFicaciÓN dE riEsgo EN El mErcado dE crÉdito BrasilEÑo ..........................................................................................................65Paulo Rogério Faustino MatosJoão Henrique Lemos Costa

solvenciA Y reAcciÓn fiscAl de lAs AdMinistrAciones PÚblicAs en los MUniciPios brAsileÑos ...........................................................................................91Andrei Gomes Simonassi Ronaldo de Albuquerque e ArraesFrancisca Lívia Souza MenezesDenise Xavier Araujo

lA indUstriA de lA enerGÍA de brAsil: Un Análisis A trAvÉs de indicAdores de insUMo-ProdUcto Y el Modelo HÍbrido PArA los AÑos 1997 Y 2002 ....................123Vinicius de Azevedo Couto FirmeFernando Salgueiro Perobelli

el Análisis concePtUAl de lA PolÍticA de los territorios rUrAles: el desArrollo territoriAl rUrAl en brAsil ..................................................................155Juliano Geraldi

flUjos totAles de coMercio Y estrUctUrA ProdUctivA – Un Análise PArA el estAdo de MinAs GerAis .................................................................187Marisa dos Reis A. BotelhoVanessa Petrelli CorrêaAna Alice B. P. D. Garlipp

EFiciENcia EN El gasto PÚBlico EN la EducaciÓN: uN aNálisis EN los muNiciPios dE rio graNdE do NortE ............................................219Jorge Luiz Mariano da SilvaJúlio César Lima de Almeida

efectos de los ProGrAMAs sociAles en lA AsistenciA escolAr en el brAsil: Un Análisis bAsAdo en dAtos de lA encUestA de PresUPUestos fAMiliAres ...........243Ricardo Agostini Martini Helena Cruz Castanheira

sommairE

lA PArticiPAtion de l’ÉtAt dAns le sYstÈMe bAncAire bresilien: Un eXAMen de lA PÉriode 1996-2006 ...................................................................................9Isabela Soares de LimaDenilson Queiroz Gomes Ferreira

l´ÉvAlUAtion des effets de lA loi KAndir sUr le recUeil icMs dAns l´ÉtAt dU ceArá ...........................................................................................................37Alejandro LeitãoGuilherme IrffiFabricio Linhares

aNalYsE dE l’imPact dE la classiFicatioN dEs risQuEs daNs lE marchÉ du crÉdit BrÉsiliEN ..........................................................................................65Paulo Rogério Faustino MatosJoão Henrique Lemos Costa

solvAbilite et de reAction bUdGetAire des AdMinistrAtions PUbliQUes dAns les MUniciPAlites bresiliennes ............................................................91Andrei Gomes Simonassi Ronaldo de Albuquerque e ArraesFrancisca Lívia Souza MenezesDenise Xavier Araujo

l’indUstrie de l’ÉnerGie brÉsilienne: Une AnAlYse en UtilisAnt des entrÉes-sorties des indicAteUrs et le ModÈle HYbride PoUr les AnnÉes 1997 et 2002 ....................................................................................................123Vinicius de Azevedo Couto FirmeFernando Salgueiro Perobelli

l’AnAlYse concePtUelle de lA PolitiQUe des territoires rUrAles: le dÉveloPPeMent territoriAle rUrAl AU brÉsil ..........................................................155Juliano Geraldi

flUX coMMerciAUX totAUX et strUctUre ProdUctive – Une AnAlYse PoUr l’etAt de MinAs GerAis ......................................................................187Marisa dos Reis A. BotelhoVanessa Petrelli CorrêaAna Alice B. P. D. Garlipp

l’EFFicacitÉ dEs dÉPENsEs PuBliQuEs Pour l’ÉducatioN: uNE aNalYsE daNs lEs muNiciPalitÉs dE rio graNdE do NortE ..........................................219Jorge Luiz Mariano da SilvaJúlio César Lima de Almeida

effets des ProGrAMMes de bien-Être sUr lA frÉQUentAtion scolAire dAns le brÉsil: Une AnAlYse bAsÉe sUr les donnÉes de l’enQUÊte sUr les dÉPenses de consoMMAtion ............................................................................................243Ricardo Agostini Martini Helena Cruz Castanheira

a ParticiPação Estatal No sistEma BaNcário BrasilEiro: uma aNálisE do PErÍodo 1996-2006*Isabela Soares de Lima**Denilson Queiroz Gomes Ferreira***

Diante de uma nova orientação global, o governo brasileiro reestruturou seu sistema bancário em meados da década de 1990. Parte desta reforma atingiu o próprio Estado, por meio da diminuição de sua atuação neste setor. Para descrever tais mudanças, este estudo realizou uma revisão da literatura acerca da participação estatal neste mercado e da reestruturação bancária brasileira para, a partir de então, analisar seus reflexos na configuração do sistema bancário. O saldo deste processo foi a redução da atuação dos governos estaduais e o redirecionamento estratégico dos bancos públicos federais, descrito e evidenciado pela análise comparativa dos dados referentes ao período 1996-2006, disponibilizados pelo Banco Central do Brasil (BCB). Diante dos resultados encontrados, é possível concluir que a política concebida pelo Estado brasileiro para o setor bancário foi exitosa em sua implementação. Contudo, é importante ressaltar que, a partir de 2003, há uma retomada da participação dos dois principais bancos federais – Banco do Brasil S.A. (BB) e Caixa Econômica Federal (CEF) – na gestão dos ativos e das operações de crédito. Dessa forma, a participação estatal vem retomando parte do mercado bancário que outrora transferiu à iniciativa privada, ainda que este crescimento não represente um retorno aos níveis encontrados em meados da década de 1990.

Palavras-chave: sistemas bancários; Estado; bancos públicos.

thE statE ParticiPatioN iN thE BraZiliaN BaNKiNg sYstEm: aN aNalYsis oF thE PEriod 1996-2006

Facing a new global trend, Brazilian government restructured its banking system in the mid nineties. Portion of this reform reached the State itself, through the reduction of its presence in this sector. In order to describe such changes, this study carried out a literature review about state participation on this market and about Brazilian banking restructuring, and then analyze its impact on the configuration of the banking system. The result of this process was the reduction of the participation of States governments and the strategic redirection of Federal banks, described and evidenced by the comparative analysis of the data published by the Central Bank of Brazil for the period 1996-2006. Considering the results, this study concludes that the policy designed by the Brazilian government for the banking industry was successful in its implementation. However, it is important to note that, since 2003, there is a resumption of the participation of two major Federal banks – BB and CEF – in asset management and credit operations. Thus, the state role is taking on part of the banking market transferred to the private sector, although this growth does not represent a return to levels found in the mid nineties.

Keywords: banking systems; State; state-owned banks.

* Os autores agradecem o incentivo e as contribuições de Daniel Ferreira.** Aluna do Programa de Pós-graduação em Gestão da Pontifícia Universidade Católica (PUC-MG). E-mail: <[email protected]>.*** Administrador da Área de Comércio Exterior do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), e professor da Fundação de Apoio à Escola Técnica do Estado do Rio de Janeiro (FAETEC/RJ).

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 201210

la ParticiPaciÓN dEl Estado EN El sistEma BaNcario BrasilEÑo: uN aNálisis dEl PEriodo 1996-2006

Ante una nueva orientación global, el gobierno brasileño reestructuró su sistema bancario en mediados de los años noventa. Parte de esta reforma ha alcanzado el propio Estado, a través de la reducción de su presencia en este sector. Para describir estos cambios, este estudio hice una revisión de la literatura acerca de la participación del Estado en este mercado y de la reestructuración bancaria de Brasil, desde entonces analizar su impacto en la configuración del sistema bancario. El resultado de este proceso fue la reducción de la actuación de los gobiernos estaduales/provinciales y la reorientación estratégica de los bancos federales, que se describe y demuestra el análisis comparativo de los datos publicados por el Banco Central de Brasil para el período 1996-2006. Vista de los resultados, se puede concluir que la política diseñada por el gobierno brasileño para la industria bancaria ha tenido éxito en su aplicación. Sin embargo, es importante señalar que, desde 2003, hay una reanudación de la participación de los dos más grandes bancos federales – BB y CEF – en la gestión de activos y operaciones de crédito. Por lo tanto, el Estado viene retomando parte del mercado bancario que fue transferida al sector privado, aunque este crecimiento no representa un retorno a los niveles encontrados en mediados de los años noventa.

Palavras-clave: sistema bancario; Estado; bancos del estado.

la ParticiPatioN dE l’État daNs lE sYstÈmE BaNcairE BrEsiliEN: uN EXamEN dE la PÉriodE 1996-2006

Face à une nouvelle orientation globale, le gouvernement brésilien a restructuré son système bancaire dans le milieu des années nonante. Une partie de cette réforme a atteint l’état lui-même, grâce à la réduction de sa présence dans ce secteur. Pour décrire ces changements, cette étude a effectué une revue de la littérature sur les participations de l’Etat dans ce marché et sur la restructuration des banques au Brésil. Par la suite, il a été possible d’analyser l’impact sur la configuration du système bancaire. Le résultat de ce processus a été la réduction de la performance des gouvernements des états de la fédération et la réorientation stratégique des banques fédérales, décrit et mis en évidence par l’analyse comparative des données publiées par la Banque Centrale du Brésil, pour la période 1996-2006. Compte tenu des conclusions, l’étude conclut que la politique conçue par le gouvernement brésilien pour le secteur bancaire a été un succès dans sa mise en œuvre. Cependant, il est important de noter que depuis 2003 il y a une reprise de la participation de deux grandes banques fédérales – BB et CEF – dans la gestion d’actifs et opérations de crédit. Ainsi, la participation de l’État prend de suite une partie du marché bancaire qu’une fois transférés au secteur privé, bien que cette croissance ne représente pas un retour aux niveaux trouvés dans le milieu des années nonante.

mots-clés: systemes bancaires; État; banques d’état.

JEL: L33

11A Participação Estatal no Sistema Bancário Brasileiro

1 iNtrodução

Em meados da década de 1980, com a desaceleração da economia mundial e o colapso do sistema comunista, o papel do Estado como executor de ações empresariais fora bastante questionado. A partir de então, a diminuição do aparato estatal – custos, tamanho e funções – se tornou prática comum e reco-mendada. Parte das medidas saneadoras da economia mundial previa que, ao Estado, caberia a formulação e o controle de políticas públicas, transferindo sua execução a particulares.

Alinhado a essas recomendações, o governo brasileiro, a partir do mandato do presidente Fernando Collor de Mello, encampou uma agenda de desestatiza-ção da economia, cujos reflexos no sistema bancário foram mais evidentes a par-tir do governo Fernando Henrique Cardoso. Graças à estabilização monetária trazida pelo Plano Real, o Sistema Bancário Nacional passou por significativas mudanças e, entre elas, estava a diminuição da participação estatal neste setor da economia.

Vários autores envidaram esforços descrevendo como se deu o processo de reestru-turação do sistema bancário nacional (Andreatta e De Paula, 2004; Barbachan e Fonseca, 2004; Corazza, 2000; Silva e Jorge Neto, 2002 e Vidotto, 2005). Contudo, existe uma lacuna teórica na qual este estudo busca contribuir, que é demonstrar os reflexos que tal reestruturação trouxe à participação do Estado, bem como interpretar a evolução do sistema bancário brasileiro nos anos seguintes, de modo a avaliar se a política concebida pelo governo federal para o setor foi bem-sucedida. Para alcançar seu objetivo, o presente estudo propõe realizar uma avaliação de resultados, buscando julgar a efetividade da po-lítica de redução da participação do Estado no setor bancário, e utiliza-se, para tanto, de dados disponibilizados pelo Banco Central do Brasil (BCB).

O estudo está dividido em quatro capítulos. No primeiro, o tema é introduzido a partir de uma análise setorial vista sob uma orientação econômica ampla, que redefinia as atribuições do Estado. A discussão teórica existente é apre-sentada no segundo capítulo. Tal capítulo se inicia a partir de um escopo macro, no qual é apresentada a forma de participação estatal no sistema bancário de vários países. Em prosseguimento, o capítulo trata da descrição das ações reestruturadoras adotadas pelo governo federal a partir da estabilização monetária. O desdobramen-to de tais ações nos bancos estaduais e federais é descrito em seguida. A partir de então, o terceiro capítulo se inicia, no qual o objeto de estudo é desenvolvido por meio da síntese das atividades dos bancos federais em nova orientação estratégica concebida pelo governo federal e, em seguida, da realização de uma ampla análise comparativa dos dados referentes ao sistema bancário nacional durante o período 1996-2006, descrevendo as mudanças ocorridas na atuação do Estado brasileiro neste relevante setor da economia. Por fim, as considerações finais são apresentadas no decorrer do quarto capítulo.

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2 rEvisão dE litEratura

2.1 Participação do Estado no sistema bancário: visão internacional

O controle estatal de instituições bancárias é, ainda hoje, algo bastante comum nos sistemas financeiros nacionais. Hermann (2010) e La Porta, Lopez-de-Silanes e Shleifer (2002) associam a participação do Estado ao grau de desenvolvimento da economia nacional: teriam os países menos desenvolvidos maior presença no Estado no sistema bancário. Hermann (2010) ressalta, ainda, que poucos países – Alemanha, Estados Unidos e Reino Unido – puderam preterir a participação do Estado no sistema bancário para dar suporte a seu desenvolvimento econômico. Os demais países, sejam desenvolvidos ou em desenvolvimento, tiveram seu processo de industrialização no pós-guerra apoiados por um sistema baseado em créditos governamentais ou em agências de fomento em parceria com bancos privados.

Entretanto, de acordo com Freitas e Prates (2001), a partir da segunda me-tade da década de 1980, a participação dos Estados neste segmento da economia vem sofrendo importantes modificações, objetivando a diminuição e a reorien-tação estratégica de suas atividades. Este movimento de redução da participação do Estado no sistema bancário é identificado em estudos como o de La Porta, Lopez-de-Silanes e Shleifer (2002), nos quais os autores evidenciam que a parti-cipação acionária do Estado nos dez maiores bancos de 92 países foi reduzida de 59% em 1970 para 42% ao final de 1995, como demonstrado na tabela 1, que reproduz metade da amostra original.

A análise da tabela 1 permite constatar que a redução da participação do Estado no sistema bancário atingiu diferentes tipos de países: entre os oito países que mais reduziram a presença estatal, estão países desenvolvidos – Portugal e França –, antigos países socialistas – Croácia, Rússia e Hungria – e países em desenvolvimento – Chile e Equador. O Brasil figura a parte de cima da lista, en-cerrando o ano de 1995 com aproximadamente 32% das ações dos dez maiores bancos sob controle estatal, apesar da significativa redução de 39 pontos per-centuais (p.p.) em relação ao ano de 1970. Países como Estados Unidos, Reino Unido e África do Sul não tinham participação acionária do Estado nos dez maiores bancos desde 1970 e, em 1995, soma-se a este seleto grupo Canadá, Japão e Nova Zelândia.

Após 1995, o processo de redução da participação estatal no sistema bancário mundial continuou em curso, tendo Sherif, Borish e Gross (2003) evidenciado que, em 2003, a transição para o capitalismo nas antigas repúblicas da União Soviética situadas no leste europeu implicou sensível diminuição da participação estatal, em um processo que contou com o ingresso do capital estrangeiro nos mercados fi-nanceiros domésticos e, em várias experiências, com a preservação de um estreito relacionamento entre Estado e bancos privatizados.

13A Participação Estatal no Sistema Bancário Brasileiro

Adicionalmente à tendência de aumento da participação privada no contro-le de instituições bancárias, verifica-se, no âmbito organizacional, a adoção pelas remanescentes instituições públicas de modelos de gestão orientados por objetivos privados, fazendo que esta parte do setor público esteja submetida à disciplina imposta pelo mercado.

TABELA 1Participação acionária do Estado nos dez maiores bancos do país

País 1970 1995Variação

(p.p.)

Croácia 100,0 1,0 -99,0

Portugal 100,0 25,7 -74,3

Chile 91,5 19,7 -71,8

Rússia 100,0 33,0 -67,0

Hungria 100,0 36,6 -63,4

Equador 100,0 40,6 -59,4

França 74,4 17,3 -57,1

República Checa 100,0 52,0 -48,0

Nigéria 57,5 9,9 -47,6

México 82,7 35,6 -47,0

Brasil 70,8 31,7 -39,1

Bolívia 53,1 18,5 -34,7

Nova Zelândia 33,5 0,0 -33,5

Indonésia 74,9 42,9 -32,0

Coreia do Sul 56,6 25,4 -31,2

Espanha 32,6 2,0 -30,7

Islândia 100,0 71,3 -28,7

Venezuela 82,9 58,0 -24,9

Alemanha 51,9 36,4 -15,5

Índia 100,0 84,9 -15,1

Grécia 92,7 77,8 -14,9

Bélgica 39,9 27,6 -12,3

Suíça 24,9 13,4 -11,5

Argentina 71,9 60,5 -11,4

Canadá 11,0 0,0 -11,0

Noruega 54,6 43,7 -10,9

Malásia 20,0 9,9 -10,1

Austrália 20,9 12,3 -8,6

Arábia Saudita 37,6 29,1 -8,5

Japão 6,9 0,0 -6,9

Colômbia 57,7 53,9 -3,8

Israel 67,6 64,6 -2,9

Finlândia 32,1 30,7 -1,4

Dinamarca 9,8 8,9 -0,9

China 100,0 99,5 -0,5

África do Sul 0,0 0,0 0,0

(Continua)

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País 1970 1995Variação

(p.p.)

Reino Unido 0,0 0,0 0,0

Estados Unidos 0,0 0,0 0,0

Cingapura 12,9 13,5 0,7

Irlanda 3,8 4,5 0,7

Holanda 7,8 9,2 1,4

Suécia 20,8 23,2 2,4

Paquistão 73,5 86,0 12,5

Taiwan 50,4 76,5 26,1

Uruguai 42,3 68,8 26,5

Egito 53,1 88,6 35,5

Média sem ex-socialistas (oitenta países do estudo) 52,7 38,5 -14,2

Média geral (92 países do estudo) 58,9 41,6 -17,3

Fonte: La Porta, Lopez-de-Silanes e Shleifer (2002).

Em contrapartida, há exceções à regra, evidenciando que a movimentação de desestatização do sistema bancário não é homogênea. A tabela 1 demonstra, também, que a participação estatal durante o período aumentou em alguns países desenvolvidos – Irlanda, Holanda e Suécia –, tendo sido verificada, entretanto, sua maior relevância em países em desenvolvimento – Cingapura, Paquistão, Taiwan, Uruguai e Egito.

O Banco Postal no Japão, por exemplo, constitui um contraponto importante à tendência de declínio observada na região asiática. Neste caso, a presença estatal se ampliou, tendo os depósitos totais no sistema postal aumentado de US$ 1,8 trilhão em 1996 para US$ 2,2 trilhões em 2000 (Vidotto, 2005). Na Índia, a participação conjunta do State Bank of India e dos bancos nacionalizados se mantinha em 80%, em 1999, sem sofrer qualquer variação significativa em relação às décadas anterio-res. E, embora conviva com uma estrutura de custos excessiva (Arun e Turner apud Vidotto, 2005), só recentemente verificou-se a adoção de medidas de estímulo à participação privada no sistema. Na Rússia, a participação do Estado no sistema bancário cresceu desde a crise de 1998, tendo alcançado o patamar de 58% dos depósitos ao final de 2000 (Sherif, Borish e Gross, 2003). Para concluir as exceções, menciona-se a China, que preserva um sistema financeiro essencialmente estatiza-do e com diferenciações institucionais recentes, como a constituição formal de um banco central somente em 1995. Ao final de 2002, os quatro maiores bancos estatais concentravam 71% dos depósitos do sistema bancário chinês (Shih, Zang e Liu apud Vidotto, 2005).

Pode-se dizer, portanto, que a presença do Estado no sistema bancário é algo bastante comum e sua redução em âmbito global camufla a heterogeneidade das experiências dos países. E, alinhado à visão gerschenkroniana (Gerschenkron, 1962), Vidotto (2005, p. 59) conclui que:

(Continuação)

15A Participação Estatal no Sistema Bancário Brasileiro

a amplitude e duração apresentada por tal fenômeno contraindicam caracterizá-lo como uma “intervenção” externa do Estado; em vez disso, ele merece ser considera-do como próprio da maior parte das formações capitalistas em alguma das fases de seu desenvolvimento, convivendo com as particularidades apresentadas por forma-ções específicas ou padrões que agrupem várias experiências históricas.

2.2 reestruturação bancária brasileira após o Plano real

No Brasil, o processo de redução da participação estatal no sistema bancário se deu a partir da implementação do Plano Real. Anos antes, com a edição da Resolução do Banco Central no 1.524, de 21 de setembro de 1988, a configuração do Sistema Financeiro Nacional (SFN), concebida desde 1964, passaria por uma reorienta-ção estratégica importante para os rumos do sistema bancário na década seguinte. De um sistema financeiro formado por instituições especializadas, praticando uma faixa restrita de operações, guinou-se o rumo para um outro tipo, mais próximo do sistema constituído pelas denominadas “instituições universais” (BCB, 2008a). Em tal sistema, as instituições, apesar das diferenças na organização interna, apre-sentam em comum o fato de poderem oferecer todos os serviços financeiros. No Brasil, estas instituições universais seriam chamadas de “bancos múltiplos”.

Em dezembro de 1988, por exemplo, o Brasil tinha em funcionamento 104 ban-cos comerciais e cinco caixas econômicas. Do total de bancos, 49 eram bancos privados, 26 tinham controle estrangeiro – destes, dezenove filiais diretas de ban-cos estrangeiros – e 29 eram bancos públicos. Quando se analisam os ativos deste grupo de bancos, verifica-se que 57% pertenciam a bancos com controle privado nacional, 10% a bancos com controle estrangeiro e 33% pertenciam a bancos estatais (BCB, 2008a).

A inflação presente na economia brasileira desde a década de 1960 foi, paradoxal-mente, favorável ao sistema bancário, que se adaptou bem a ela durante sua exis-tência. Taxas de inflação elevadas contribuíram para aumentar a participação do setor financeiro na renda nacional. Os bancos brasileiros foram, portanto, bem-sucedidos no aproveitamento das oportunidades trazidas pela inflação alta. Isto permitiu não apenas a sobrevivência dos bancos, em um ambiente que aparente-mente seria hostil à atividade econômica, mas também acumular capital, absor-vendo parte considerável das receitas inflacionárias. Barbachan e Fonseca (2004) explicam que tais receitas eram originadas basicamente: i) de operações no overni-ght – títulos públicos com prazo de um dia e com recompra garantida; e ii) devi-do ao float bancário, sendo os ganhos da instituição bancária obtidos pelo fato de esta não corrigir os valores em conta-corrente ou oriundos do recolhimento de tri-butos, enquanto era remunerada pela aplicação destes valores em títulos públicos (De Paula e Marques, 2006).

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Com a estabilização monetária trazida pelo Plano Real, em 1994, ocorreram impactos profundos na estrutura e no funcionamento dos bancos no Brasil (Cora-zza, 2000; Silva e Jorge Neto, 2002). Os bancos tiveram de se adaptar ao fim das referidas receitas inflacionárias, readaptar sua estrutura administrativa, reduzir cus-tos, buscar eficiência e procurar novas fontes de receitas (Silva e Jorge Neto, 2002). Para ilustrar a relevância das receitas inflacionárias para os bancos brasileiros até então, Maia (2003) demonstra que, entre 1990 e 1993, tais receitas chegaram a representar cerca de 42% das receitas de intermediação financeira e 4% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro.

Soma-se à estabilização monetária, e suas consequências, o fato de o governo federal adequar o sistema financeiro nacional aos princípios básicos de contabilidade e supervisão bancária estabelecidos pelo Acordo de Basileia (Basileia I), assinado em 1988 pelos bancos centrais de países desenvolvidos reunidos no Grupo dos Dez (G10) e que estabelecia índices máximos de alavancagem. O normativo que alinhou o sistema financeiro brasileiro ao padrão internacional foi a Resolução do Conselho Monetário Nacional no 2.099, de 17 de agosto 1994.

Nesse processo de adaptação ao novo cenário macroeconômico/regulatório, além de alguns bancos grandes e médios, inúmeras pequenas instituições foram extintas, provocando redução do número de bancos e acentuada concentração do sistema bancário (Corazza, 2000). A este respeito, torna-se importante destacar que a concentração medida pelo número de bancos apresentou grandes variações ao longo da história bancária brasileira, na qual se pode observar três ondas de concentração-desconcentração. De 1950 a 1976, foi de concentração, pois o nú-mero de 413 bancos reduziu-se para apenas 106, ficando praticamente estabilizado até 1987. A segunda onda, entre 1987 e 1993, foi de desconcentração, em que o número de bancos mais que duplicou, passando de 105 para 245. A terceira onda, a partir do Plano Real, foi novamente de concentração. Graças ao Plano Real houve também uma significativa abertura do sistema bancário nacional ao capital externo, por meio do ingresso de novos bancos ou da venda de bancos nacionais a estran-geiros (Corazza, 2000).

A perda das receitas inflacionárias trazida pela estabilização monetária gerou uma crise bancária, tornando vulneráveis vários bancos, como o Econômico, o Nacional e o Bamerindus. Maia (2003) alerta, ainda, para o fato de as receitas inflacionárias terem camuflado, por anos, a má gestão empresarial de algumas instituições, algo que viria à tona com a estabilização monetária trazida pelo Plano Real. Os impactos do fim das receitas inflacionárias e a adoção do Acordo de Basileia sobre o sistema financeiro nacional eram previsíveis e reconhecidos pelas próprias autoridades governamentais. O diagnóstico da situação apontava para um número excessivo de instituições e agências, além de custos elevados,

17A Participação Estatal no Sistema Bancário Brasileiro

principalmente com pessoal. Por isso, o sistema bancário devia ser redimensionado e reorientado para novas formas de financiamento de suas atividades.

Esse processo de ajuste, contudo, não ocorreu imediatamente após o Plano Real. Apesar da perda expressiva de receita inflacionária, a rentabilidade dos bancos não se alterou significativamente. A manutenção de taxas elevadas de rentabilidade se deveu a uma combinação de fatores. A troca de receita inflacionária pela receita de serviços, que quase duplicou sua participação relativa nos anos posteriores ao Plano Real, é citada por Corazza (2000). Barbachan e Fonseca (2004), por sua vez, apontam investimentos maciços em tecnologia da informação como fórmula para ganhos de produtividade. Silva e Jorge Neto (2002) afirmam que a principal alternativa encontrada pelos bancos foi a expansão da oferta de crédito, uma vez que a estabilização monetária fez com que houvesse um substancial aumento dos depósitos bancários.

A manutenção da rentabilidade elevada, entretanto, não foi suficiente para tornar o sistema financeiro brasileiro menos vulnerável, muito em virtude do aumento dos créditos de liquidação duvidosa, fruto da adoção de critérios flexí-veis quando da concessão do crédito, este foi o principal substituto das receitas inflacionárias (Silva e Jorge Neto, 2002). Quando a economia cresceu menos em 1995 e à tal falta de crescimento se seguiu uma política restritiva de crédito e a abertura comercial, alguns setores da economia tiveram dificuldades de honrar seus compromissos, abalando o sistema bancário nacional.

O alerta de uma crise sistêmica se deu pelas crises do Banco Econômico, em agosto de 1995, e do Banco Nacional, em novembro de 1995. Crises estas que pareciam muito mais graves que todas as anteriores, devido à dimensão destes bancos, respectivamente, 4o e 3o no ranking nacional (Corazza, 2000). A percep-ção de uma iminente crise sistêmica fez com que o governo lançasse um plano de emergência, o Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional (Proer) e outras medidas saneadoras e de forta-lecimento do sistema financeiro, em novembro de 1995 (Barbachan e Fonseca, 2004). Quanto à crise do Bamerindus, por ter ocorrido em 1997, quinze meses após a criação do Proer, Corazza (2000) afirma que não representava uma ameaça tão grave para o resto do sistema.

Maia (2003) destaca que os dois princípios basilares do Proer eram a preservação da estabilidade do sistema de pagamentos e a penalização das más políticas bancárias, concebidos de modo a evitar a corrida bancária, ou seja, a quebra de confiança no sistema bancário. As políticas do Banco Central exis-tentes até então para retirar uma instituição do setor bancário se resumiam ao seu poder de intervir e liquidar tais instituições, algo que para Maia (2003) era apropriado tão somente para ser aplicado em instituições de pequeno e médio

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portes que apresentavam dificuldades. Ocorre que, nos casos dos bancos Eco-nômico e Nacional, eram instituições “grandes demais para quebrar” (“too big to fail”), e as alternativas de intervenção e/ou liquidação se mostravam insufi-cientes para conter o início de uma crise sistêmica.

Sendo assim, a alternativa encontrada para lidar com um grande banco em dificuldades foi dividi-lo em duas partes, rotuladas de “banco bom” (“good bank”) e “banco ruim” (“bad bank”). O “banco bom” se referia aos ativos bons e aos depósitos do banco em dificuldades, constituindo estes últimos uma obrigação a ser assumida pelo banco adquirente quando da venda do “banco bom”. O “banco ruim” era composto dos ativos restantes e demais obrigações do banco em dificul-dades, que entraria em processo de liquidação extrajudicial pelo Banco Central. Maia (2003) conclui que as operações do Proer tinham como finalidade cobrir o hiato patrimonial do “banco bom”, equilibrando seu balanço patrimonial e tornando-o solvente, de modo a não representar uma ameaça ao sistema, e atrati-vo a novos acionistas, distintos daqueles responsáveis pela má gestão.

Os reflexos das mudanças trazidas pela estabilidade monetária também afe-taram os bancos estatais, porém de forma distinta. Tal distinção pode ser feita por meio do tipo de controle estatal: no caso dos bancos estaduais, as discussões so-bre sua viabilidade convergiram para a decisão de transferi-los à iniciativa privada (Andreatta e De Paula, 2004). Os bancos federais tiveram outra sorte, pois a visão dominante concluía por sua necessidade, embora estes devessem se tornar eficien-tes diante da nova realidade econômica nacional. Vidotto (2005) explica os rumos distintos destes dois grupos de instituições bancárias pelo destino do financiamento concedido: enquanto os bancos federais estavam voltados para o financiamento do setor privado, os bancos estaduais serviam essencialmente ao financiamento dos seus respectivos controladores.

A decisão de manter os bancos federais sob controle estatal era um reconhe-cimento, ainda que implícito, de que os mercados financeiros brasileiros ainda ne-cessitavam da presença do Estado sob a forma empresarial. Estes bancos, contudo, deveriam assumir papéis estratégicos, como o de administradores dos fundos de poupança compulsória e o de direcionadores do crédito, por exemplo. A estratégia utilizada pelos gestores do SFN para os bancos estaduais e federais será detalhada nas duas subseções seguintes.

Pode-se afirmar, portanto, que o atual estágio de organização do sistema bancário brasileiro é:

uma consequência do processo de ajuste às condicionantes macroeconômicas após o Plano Real e do alinhamento à tendência mundial, caracterizada por fusões de empresas integrantes de diversos segmentos produtivos das modernas economias (BCB, 2008, p.1).

19A Participação Estatal no Sistema Bancário Brasileiro

2.3 Privatização dos bancos estaduais

A existência dos bancos estaduais era justificada pela necessidade de correção de distorções do mercado bancário e da possibilidade de os governos estaduais par-ticiparem dos ganhos obtidos com as receitas inflacionárias – overnight e float bancário. Com tais receitas, estes governos poderiam equilibrar seus orçamentos e atenuar os efeitos inflacionários na população por meio de uma melhor prestação de serviços. Além disso, costumava-se ressaltar em prol da atividade bancária por governos estaduais o fato de que, se deixada a cargo somente da iniciativa privada, muitos municípios menores sequer teriam agências bancárias para prestar serviços financeiros à população local (Puga, 1999).

Todavia, a realidade da grande maioria dos bancos estaduais era outra: uma gestão ineficiente aliada a um relacionamento imprudente com seu controlador e com o governo federal. Os governos estaduais conseguiam vultosos empréstimos de seus bancos, muitos destes concedidos após frágil análise de crédito e lastreados por ga-rantias de qualidade duvidosa, fazendo com que seus bancos tivessem problemas de liquidez quando não conseguiam receber de volta os recursos emprestados. A saída usualmente encontrada era a de os governadores pressionarem politicamente o governo federal, de modo a fazer com que o Banco Central socorresse os bancos estaduais em dificuldades. Para tanto, moeda era emitida, tornando ainda mais árdua a estabilização da economia e a condução da política monetária (Puga, 1999).

Desde 1983, diversos programas de apoio aos bancos estaduais foram criados com o objetivo, infrutífero, de saneá-los. Com a criação do Plano Real e o fim das receitas inflacionárias, a sustentabilidade do já frágil modelo de gestão dos bancos estaduais foi colocada em xeque. Assim sendo, a baixa confiança de investidores na carteira de crédito dos bancos estaduais precipitou uma crise cujas bases institucio-nais estavam alicerçadas antes mesmo da criação do Plano Real.

Para modificar esse panorama, a principal estratégia adotada pelo governo federal para os bancos estaduais foi a privatização. Em agosto de 1996, o gover-no federal instituiu para esta finalidade o Programa de Incentivo à Redução do Setor Público Estadual na Atividade Bancária (Proes). O objetivo primordial deste programa era reduzir a participação dos bancos estatais no sistema bancário brasileiro, como indicava seu nome, e aumentar a eficiência na gestão dos recur-sos até então por eles administrados (Puga, 1999). A redução da participação se daria, principalmente, por meio da privatização dos bancos estaduais, que, por sua vez, encontrava-se sob um guarda-chuva maior objetivando o ajuste fiscal dos estados e a reestruturação da dívida pública (De Paula e Marques, 2006).

Com o Proes, o governo federal financiou a reestruturação dos bancos estaduais, mantendo protegidos os depósitos e tendo como estratégia, após o saneamento financeiro, a transferência do controle do banco estadual à

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iniciativa privada ou seu redirecionamento estratégico, passando a atuar como um banco de fomento, impedido de captar recursos com o público. A Medida Provisória no 1.514, de 7 agosto de 1996, que instituía o Proes, previa que os recursos necessários ao saneamento dos bancos estaduais só seriam transferi-dos caso houvesse a privatização ou a transformação em banco de fomento. Caso isto não ocorresse, o governo federal participaria com metade dos recur-sos necessários, cabendo ao governo estadual arcar com os recursos restantes (Silva e Jorge Neto, 2002). O financiamento do governo federal teria 30 anos de prazo, juros de 6% ao ano mais Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna (IGP-DI) e amortizações mensais.

A partir da edição da Medida Provisória no 1.702-26, de 30 junho de 1998, o governo federal aperta ainda mais o cerco aos estados e condiciona a disponibi-lização dos recursos do Proes à transferência do controle dos bancos estaduais ao governo federal. Este, por sua vez, depois de sanear os bancos, deveria privatizá-los ou extingui-los.

A transferência do controle acionário dos governos estaduais para a iniciativa privada teve expressiva participação dos bancos nacionais, como pode ser observado na tabela 2. Este fato fez com que houvesse uma concentração bancária no Brasil.

TABELA 2 Bancos estaduais privatizados

Data da privatização Banco privatizado Banco compradorValor de compra

(R$ milhões)

26/6/1997 BANERJ Itaú 311,0

7/8/1997 Credireal BCN/Bradesco 127,3

4/12/1997 Meridional Bozano, Simonsen 265,6

14/9/1998 Bemge Itaú 583,0

17/11/1998 Bandepe ABN Amro 183,0

22/6/1999 Banebe Bradesco 260,0

17/10/2000 Banestado Itaú 1.625,0

20/11/2000 Banespa Santander 7.050,0

8/11/2001 Paraiban ABN Amro 76,5

4/12/2001 BEG Itaú 665,0

24/1/2002 BEA Bradesco 182,9

10/2/2004 BEM Bradesco 78,0

total 11.407,3

Fonte: BCB (2008b).

2.4 reestruturação dos bancos federais

Como dito, a reestruturação dos bancos federais assumiu forma distinta daquela concebida para os bancos estaduais. Enquanto a participação dos governos estaduais no sistema bancário nacional foi bastante reduzida, após ter sido responsável por um

21A Participação Estatal no Sistema Bancário Brasileiro

quinto da oferta do crédito nacional (Andreatta e De Paula, 2004), a participação dos bancos federais ainda hoje é expressiva e mantém liderança em alguns segmentos de crédito, como o habitacional, o rural e o de longo prazo.

O conjunto dos bancos federais não sofreu alterações significativas ao longo do processo de reestruturação, ao contrário dos bancos estaduais. Dos bancos con-trolados pelo governo federal, continuam no sistema bancário o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o BB, a CEF e as instituições de âmbito regional: Banco da Amazônia S.A. (Basa) e Banco do Nordeste S.A. (BNB). Entretanto, em momento anterior ao Plano Real, precisamente em 1986, as operações do Banco Nacional da Habitação (BNH) e do Banco Nacional de Crédito Cooperativo (BNCC) foram incorporadas, respectivamente, à CEF e ao BB.

Desses, o BNDES é o único que não cria moeda, pois não realiza captação de depósitos junto ao público. Quanto ao controle acionário, CEF e BNDES são empresas públicas, com a totalidade do capital aportado pelo Tesouro Nacional, enquanto BB, Basa e BNB são sociedades de economia mista, tendo o Tesouro Nacional como controlador. O BNDES está subordinado ao Ministério do Desen-volvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), enquanto os demais bancos federais se encontram na alçada do Ministério da Fazenda (MF) (Vidotto, 2005). Os três maiores bancos federais – BB, CEF e BNDES – representavam mais da metade da oferta de crédito do sistema bancário no início da década de 1990.

A reestruturação desses bancos incluía: i) redefinição da relação entre as políticas macroeconômicas e setoriais, e a atuação dos bancos; ii) redefinição de sua estrutura patrimonial e financeira; e iii) busca pela eficiência por meio da adoção de modelos de gestão característicos do setor privado.

Um exemplo da participação de tais bancos na viabilização da política macroeconômica do governo federal foi o Programa Nacional de Desestatização (PND). O BNDES se consolidou, já nos anos 1990, como gestor do programa de privatização do governo federal, exceto quanto a instituições financeiras, conduzido pelo Banco Central. Segundo Vidotto (2005, p. 62), isto o transfor-mou “no ‘banco de negócios’ ou de investimentos do governo”, uma vez que era simultaneamente financiador e gestor do processo de privatização.

A CEF e o sistema BB-Previ também desempenharam papel decisivo na via-bilização das privatizações. Em 1998, o programa de privatização enfrentava sérias incertezas (Vidotto, 2003). Foi então que o governo realizou volumosa securiti-zação de dívidas do Fundo de Compensação das Variações Salariais (FCVS), que constitui dívida do Tesouro Nacional junto às instituições financeiras, cabendo à CEF receber R$ 7 bilhões em títulos negociáveis e utilizáveis no âmbito do PND, chamados compensação das variações salariais (CVSs). O governo injetou “moe-das de privatização” no sistema bancário, podendo os bancos interessados trocar

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seus créditos imobiliários por títulos válidos nos leilões de privatização, sendo uma parte deles intermediados pela CEF.

O sistema BB-Previ, maior fundo de previdência do país e vinculado aos funcionários do BB, era na década de 1990 o maior participante da Bolsa de Valores de São Paulo. Em seguida, tornou-se um dos maiores participantes do programa de privatização ao integrar o controle de siderúrgicas, empresas do sis-tema elétrico, de mineração e de telecomunicações. Como os recursos aplicados no Previ advinham tanto dos funcionários quanto do BB, o governo federal tinha direito de nomear diretores para o fundo de previdência, controlando na prática a estratégia de investimentos do fundo, um dos motivos que explicaria sua ampla participação no processo de privatização.

Adicionalmente, a expansão da dívida mobiliária federal reforçou os fundos orçamentários com que operavam os dois bancos. O socorro oculto prestado pela CEF e pelo BB aos bancos em crise, por meio do mercado interbancário, propor-cionou bons resultados (Vidotto, 2003). A CEF ainda recorreu a linhas baratas do Proer para estatizar uma parte do estoque velho dos créditos imobiliários.

A capitalização do BB em 1996, no montante de R$ 6 bilhões aportados pelo governo federal, baseou-se essencialmente em papéis remanescentes do pro-grama de privatizações; a CEF recebeu, em 1998, uma forte injeção de liquidez, ao securitizar créditos com o FCVS, como exposto anteriormente. Tais medidas impactaram positivamente os balanços destes dois bancos, deixando-os prontos para novos desafios concebidos pelo governo federal.

A reestruturação bancária e patrimonial dos bancos federais também voltou suas atenções para a adequação do patrimônio dos bancos públicos aos preceitos do Acordo de Basileia, afetando especialmente BB e CEF. Vidotto (2003) afir-ma que o programa de saneamento financeiro subsequente retirou um volume substancial de créditos ruins dos ativos destes bancos. Tais créditos do BB fo-ram securitizados e os da CEF foram transferidos à Empresa Gestora de Ativos (Emgea), entidade responsável por sua administração e cobrança. Quando de sua criação, em junho de 2001, a Emgea recebeu da CEF contratos de financiamento imobiliário da ordem de R$ 27 bilhões. Tais contratos, em muitos casos, se en-contravam em poder da CEF embora não tenham sido originalmente concedidos por ela: referiam-se, por exemplo, às carteiras do extinto BNH, de outros órgãos públicos e bancos que trocaram parte de seu crédito imobiliário por “moedas de privatização” (Brasil, 2001b).

Sob a ótica comercial, os bancos públicos redefiniram sua relação com União, estados e municípios. Por meio da oferta de serviços específicos para o setor público, percebe-se um ambiente competitivo entre BB e CEF em segmentos como gestão de recursos e fundos de previdência. Vidotto (2003) afirma que pode ser positiva

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a concorrência, caso a ótica empresarial traga mais transparência a certos custos das esferas governamentais. Em contrapartida, a cobrança de taxas pelos repasses orçamentários para programas sociais pode trazer alguns prejuízos aos beneficiários dos programas, uma vez que menos recursos chegariam a seu destino final. O autor atribui, ainda, ao aumento da participação do setor privado na demanda por crédito a responsabilidade não apenas pelos novos critérios de gestão dos bancos federais mas também pela elevação do custo médio dos recursos e a diminuição de recursos destinados a setores tidos como estratégicos ou fragilizados.

Outra característica importante na reestruturação dos bancos federais durante a década de 1990 é a substituição de recursos orçamentários por recursos de origem privada, algo que contribuiria para que tais bancos adotassem uma “disciplina de mercado”. Como exemplos, têm-se os recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), principal origem de captação do BNDES, e os recursos oriundos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), administrados pela CEF e destinados a programas habitacionais e de saneamento básico.

A esse respeito, a “disciplina de mercado” merece destaque. Entre as iniciativas de reestruturação dos bancos federais estava a implantação de um novo modelo de gestão administrativa e operacional, cujos critérios de avaliação eram semelhantes aos adotados pelo setor privado (De Paula e Faria, 2010). Por exemplo, na gestão de ativos dos bancos públicos foram adotadas medidas de regulamentação prudencial dos bancos privados – Acordo de Basileia – e critérios eminentemente privados para a seleção de projetos, baseadas na análise risco-retorno e em metas de rentabilidade (Hermann, 2010).

Em julho de 1995, o MF emitiu a Nota Técnica MF-020, na qual Vidotto (2005) identificou um conjunto de diretrizes que deveriam nortear o novo modelo de gestão a ser adotado pelos bancos federais. Fica explícita sua missão estratégica de serem instrumentos de execução da política creditícia do governo federal e dos agentes do Tesouro Nacional. A nota também menciona que a nova condição para a existência dos bancos federais é que estes apresentem resultados e indicadores compatíveis com a atividade financeira privada.

Ratificando a necessidade dessa visão empresarial, ao lançar o Programa de Fortalecimento das Instituições Financeiras Federais (PROEF), em junho de 2001, o MF (Brasil, 2001a) afirma que o governo está determinado a impor aos bancos públicos a mesma disciplina a que estão submetidos os bancos privados, sem se esquecer de sua missão de fomento ao desenvolvimento econômico e social. Os bancos públicos deveriam, desse modo, estar preparados para a competição, com metas de rentabilidade e estratégias para a manutenção ou o aumento de participação de mercado.

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Esse novo modelo de gestão teve especial impacto no BB e na CEF, que passaram a competir com os bancos privados em segmentos como o financia-mento de bens de consumo duráveis e a gestão de recursos de terceiros por meio de fundos de investimentos, além de participar mais ativamente de captações de recursos junto ao mercado para suportar suas novas operações.

Esse movimento em direção à competição foi realizado sem que atividades inerentes às de banco público fossem ignoradas, continuando a atuar fortemente em setores cujo acesso a fundos privados é difícil, como o rural e o imobiliário, gerindo fundos e programas sociais do governo e promovendo a bancarização da população de baixa renda por meio de sua rede capilarizada de agências e corres-pondentes bancários (Hermann, 2010).

Os bancos regionais, BNB e Basa, também passaram por mudanças profundas em seus modelos de gestão. Entre as parcerias estratégicas criadas por ambos para capilarizar sua atuação e o crédito, destaca-se a introdução dos “agentes do desenvol-vimento” pelo BNB, que eram funcionários do banco que atuavam em mais de uma centena de municípios buscando alianças com lideranças empresariais, produtores, órgãos públicos e entidades privadas. Com maior acesso ao crédito, os agentes do desenvolvimento eram responsáveis por conceber ações complementares, como ca-pacitação técnica, melhorias na infraestrutura, busca de novas tecnologias e formas de adensar a cadeia produtiva local (Cintra e Prates, 2010).

Ainda no que se refere ao BNB, a mudança estratégica se deu no sentido de desvinculá-lo da imagem de executor das ações planejadas pela Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene). Para tanto, uma profunda reestru-turação interna foi concebida em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Nesta reestruturação – que visava tornar o BNB uma empresa ágil, eficiente e lucrativa –, funcionários foram realocados e capacitados, processos redesenhados, novas soluções tecnológicas adotadas, tudo com o objetivo de prover as operações de maior rapidez e estabelecer controles mais eficazes (Cardoso, 2006).

O Basa, por sua vez, fortaleceu sua posição de indutor do desenvolvimento sustentável da região, apoiando arranjos produtivos locais prioritários para cada estado da região e construindo o ambiente institucional propício para seu desen-volvimento – por meio da coordenação de ações entre órgãos públicos e entidades privadas. Também se preocupou com a melhoria dos processos internos, elegendo cinco eixos prioritários para impulsionar a expansão dos bancos: crédito, risco, atendimento, cursos e tesouraria.

A combinação entre ações que buscavam tornar BNB e Basa mais presentes nas ações de desenvolvimento regional e as que tinham como objetivo melhorar a eficiência propiciaram melhor gestão dos fundos constitucionais sob seus cuidados.

25A Participação Estatal no Sistema Bancário Brasileiro

Também se traduziram em maior número de operações contratadas, diminuição da inadimplência e aumento do patrimônio líquido. Estas ações permitiram, ainda, uma reorientação estratégica destas duas instituições, passando a atuar como articu-ladoras das cadeias produtivas locais, expandindo o crédito em busca do aumento da renda e do emprego das respectivas regiões (Cintra e Prates, 2010).

Em suma, o saldo dos anos 1990 e início dos anos 2000 para os bancos federais foi extremamente positivo, uma vez que eles se reestruturaram adminis-trativamente e recuperaram sua capacidade de ofertar crédito no sistema bancário em virtude da captação em novas fontes de recursos, capacidade esta fortemente afetada pela crise econômica vivenciada no país a partir da década de 1980 até meados da década seguinte (Vidotto, 2003).

3 dEsENvolvimENto

3.1 discussão sobre as modificações da participação estatal no sistema bancário

Após a privatização dos bancos estaduais e a reestruturação dos bancos federais, a par-ticipação estatal no sistema bancário brasileiro adquiriu um caráter mais estratégico, com seus desdobramentos operacionais sendo executados pelos bancos federais.

Atualmente, os bancos federais consolidam seu papel de agentes anticíclicos, sem que isto comprometa sua situação patrimonial, algo bastante comum no passa-do. Para De Paula e Faria (2010), este papel anticíclico parece estar relacionado com a melhoria da eficiência de crédito dos bancos federais. Exemplo deste comportamento anticíclico é demonstrado por Vidotto (2005): entre 2001 e 2003, anos de baixo crescimento econômico, a oferta de crédito das entidades privadas cresceu 15%, en-quanto a oferta dos bancos públicos elevou-se em 59%. Encerrado o ano de 2003, o crédito ofertado por bancos públicos representava cerca de 35% do volume total de crédito do sistema bancário nacional. Tal fato evidencia que o Estado brasileiro não atua apenas como regulador do sistema financeiro nacional, mas também como executor da atividade-fim, buscando estar alinhado tanto com a política macroeconô-mica quanto com os objetivos microeconômicos de eficiência operacional.

As peculiaridades de atuação de cada banco federal estão descritas em Vidotto (2005) e sintetizadas a seguir. O BNDES continua sendo, apesar da relevância cres-cente do mercado de capitais, a principal fonte interna de financiamento de longo prazo da economia brasileira, apoiado no repasse de recursos parafiscais – Programa de Integração Social (PIS)/Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Pú-blico (PASEP)-FAT – e suas reaplicações. Complementarmente, há recursos mobili-zados no mercado internacional. O sistema BNDES é composto ainda pela Agência Especial de Financiamento Industrial (Finame) e a BNDES Participações S.A.

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(BNDESPAR), por meio da qual detém participações acionárias em várias empre-sas. Isto permite ao sistema BNDES se articular com o mercado de capitais e com o restante do sistema bancário público e privado, que, ao intermediar o repasse de recursos do BNDES aos clientes, diversificam seus instrumentos de crédito e são remunerados pelo risco assumido.

O BB retomou o posto de maior banco do sistema em volume de ativos, cuja liderança absoluta foi mantida até a fusão Itaú-Unibanco, ocorrida em novembro de 2008. É o banco federal mais diversificado, presente em praticamente todos os segmentos do mercado bancário, de seguros, de capitalização e previdência. Adicionalmente, é o principal agente financeiro do Tesouro Nacional. Também é o principal agente do sistema de crédito rural, respondendo em 2007 por 58% de seus empréstimos. Além disso, é líder em empréstimos a micro e pequenas em-presas, no mercado de câmbio associado ao financiamento do comércio exterior, presente nas principais praças financeiras internacionais. Por fim, é o maior gestor de recursos de terceiros do sistema bancário nacional.

A CEF financia infraestrutura urbana, atribuição de estados e municípios, bem como o financiamento habitacional e a construção civil, estes últimos sejam públicos ou privados. Parte de seus recursos é originária do FGTS, dos depósitos judiciais de partes em litígio – sobre os quais tem monopólio constitucional – e dos recursos que mobiliza com a caderneta de poupança. Também concede crédito geral ao público e é o principal agente do governo para uma ampla variedade de programas sociais. É a operadora das loterias federais e utiliza as agências lotéricas como correspondentes bancários, sendo estas a maior rede do gênero no mercado brasileiro. A CEF tem sua atuação voltada para o mercado interno, praticamente não capta recursos externos e não opera com câmbio.

Basa e BNB são bancos regionais voltados para a Amazônia e o Nor-deste, respectivamente. Assim como o BNDES, mas com escopo muito mais reduzido, também atuam como agências de desenvolvimento e fazem papel de bancos de fomento. Parte de seus recursos é destinada ao atendimento das necessidades das micro e pequenas empresas. Atuam como bancos comerciais, ao contrário do BNDES. São administradores dos fundos constitucionais do Norte e do Nordeste, respectivamente. Somado a isto, operam linhas de re-passe internacionais.

O novo enfoque da participação estatal no sistema bancário nacional, consolidado a partir dos primeiros anos da década passada, se faz perceber por meio da análise dos dados contidos nas tabelas 3, 4 e 5, que sintetizam os reflexos da reestruturação dos bancos estatais.

27A Participação Estatal no Sistema Bancário Brasileiro

TABELA 3 Quantitativo de bancos pelo controle acionário

Bancos 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Públicos 32 27 22 19 17 15 15 15 14 14 13

Privados 198 190 182 175 175 167 152 150 150 147 146

Nacionais 131 118 105 95 91 81 76 78 82 82 81

Nacionais com participação estrangeira 26 23 18 15 14 14 11 10 10 8 9

Controle estrangeiro 25 33 43 50 57 61 56 53 49 49 48

Estrangeiros 16 16 16 15 13 11 9 9 9 8 8

total 230 217 204 194 192 182 167 165 164 161 159

Fonte: BCB (2007).

No que se refere ao controle acionário, verifica-se que, desde a introdução do Proes, em 1996, o número de bancos estatais diminui significativamente. Em 1996, o sistema bancário nacional possuía 32 bancos públicos, sendo a maioria pertencente aos estados brasileiros. Destes, apenas treze continuaram sob o con-trole estatal ao final de 2006, com os demais tendo sido privatizados ou liquidados pelo Banco Central. É evidenciado, ainda, que o período de desestatização do setor bancário se concentrou durante os anos de 1997 a 2001, quando houve uma redu-ção de 53% no número de bancos estatais. A análise destes dados permite inferir que a Medida Provisória no 1.514/1996 foi bem-sucedida, uma vez que alcançou seu objetivo: incentivar a redução da presença do setor público estadual na ativida-de financeira bancária.

Na análise mais ampla do sistema bancário nacional, os números da tabela 3 evidenciam também que o processo de concentração nas instituições bancárias não se deu apenas em bancos estatais. Os bancos privados também foram reduzidos, embora em um percentual menor que os bancos públicos. Em 2006, havia 146 bancos, contra 198 em 1996, representando uma redução de 26% durante o perí-odo analisado.

Ao diminuir o escopo de análise dos bancos privados para o tipo de controle privado, infere-se a eficácia de outra orientação governamental: a inserção de insti-tuições bancárias internacionais no sistema bancário brasileiro. Apesar da redução do número total de bancos privados no período 1996-2006, os dados demonstram um crescimento da participação de bancos controlados por instituições estrangeiras: em 1996, eram em número de 25, e ao final de 2006 somavam 48 instituições. Ou seja, um aumento de 92%, praticamente dobrando o número de bancos sob o controle estrangeiro.

Em contrapartida, o número de bancos privados controlados pelo capital nacional diminui significativamente. A redução se dá a partir de 1997 e atinge seu ápice em 2002, quando tal diminuição representa 42% sobre os números

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de 1997. Entre 2003 e 2004, esta tendência sofre alteração, passando por um aumento do número de instituições privadas nacionais, encerrando tal período com 82 bancos privados nacionais, contra 76 em 2002. A partir de 2005, há uma estabilização do número de instituições.

Outra forma de evidenciar a redução da participação estatal no sistema bancário se dá pela análise da distribuição do volume de ativos entre os bancos em operação no Brasil, como demonstrado na tabela 4. Tal análise é especial-mente importante porque a redução do número de instituições bancárias, tra-tada na tabela 3, não necessariamente implica redução do volume de recursos geridos por instituições públicas.

A título de ilustração, pode-se vislumbrar um cenário no qual o número de bancos públicos diminua, contudo, o volume de ativos dos bancos estatais rema-nescentes cresça, fazendo com que haja apenas uma concentração dos recursos nos ativos de poucos bancos com tal controle acionário. Assim sendo, para concluir que os objetivos governamentais de redução da sua participação no sistema bancário foram alcançados, torna-se necessário evidenciar que a diminuição do número de instituições públicas foi acompanhada de uma redução da participação pública na gestão dos ativos do sistema, algo que não tem correlação automática.

TABELA 4 Participação das instituições nos ativos(Em %)

Bancos 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Bancos públicos (mais caixas estaduais)

21,9 19,1 11,4 10,2 5,6 4,3 5,9 5,8 5,5 5,1 4,5

Banco do Brasil 12,5 14,4 17,4 15,8 15,6 16,8 17,1 18,4 17,4 15,4 14,5

Caixa Econômica Federal 16,5 16,6 17,0 17,1 15,4 11,0 11,7 13,0 11,5 12,1 10,7

Bancos privados nacionais 38,3 36,8 35,3 33,1 35,2 37,2 36,9 40,8 41,7 43,1 47,1

Bancos com controle estrangeiro

10,5 12,8 18,4 23,2 27,4 29,9 27,4 20,7 22,4 22,9 21,7

Cooperativas de crédito 0,3 0,4 0,5 0,7 0,8 0,9 1,0 1,3 1,4 1,5 1,5

Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

total em r$ bilhões (valores nominais)

487,1 682,5 673,4 717,8 823,8 938,1 1.103,9 1.184,0 1.283,9 1.565,9 1.961,1

Fonte: BCB (2007).

Descrita a importância da análise da tabela 4 para assegurar a eficácia da política governamental de reduzir sua participação no sistema bancário, além de estimular o ingresso de instituições estrangeiras no mercado, segue análise dos dados propriamente dita. Durante o período 1996-2006, é notória a re-dução relativa dos ativos geridos pelos bancos públicos. Em 1996, bancos es-tatais geriam 51% dos ativos do sistema bancário nacional. Esta redução se dá

29A Participação Estatal no Sistema Bancário Brasileiro

consistentemente até 2001 e encerra-se com a participação estatal em 32%. Em 2002 e 2003, a tendência de redução é interrompida, e a participação estatal encerra o período em 37%. A partir de 2004, a tendência de redução é retomada, e o período de análise 1996-2006 se encerra com 30% dos ativos geridos por bancos públicos.

Durante o período de análise, houve sensível crescimento dos ativos do sistema bancário brasileiro, ainda que expresso em valores nominais. Em 2006, os ativos totais representavam aumento de 303% em relação ao final de 1996. Desse modo, tanto a participação estatal quanto a privada aumentaram em termos absolutos, apesar da diferença relativa descrita anteriormente. Porém, enquanto o valor absoluto dos ativos geridos por bancos públicos aumentou 134%, os ativos sob administração privada cresceram 477%, demonstrando que a participação estatal está diminuindo não apenas no número de insti-tuições sob seu controle, mas também em relação aos volumes geridos pelos bancos públicos remanescentes.

A esse respeito, nota-se que tal movimento de redução não se deu de maneira uniforme em todas as instituições estatais. Enquanto os bancos estaduais reduziram expressivamente sua participação no sistema bancário, CEF e BB tiveram trajetórias diferentes entre si. Excluindo estes dois bancos federais, a participação dos demais bancos públicos na gestão dos ativos reduziu de 22% em 1996 para cerca de 5% em 2006. O mesmo movimento é percebido na gestão de ativos pela CEF, que até 1999 apresentava crescimento, para a partir de então apresentar redução, encerran-do 2006 com sua menor participação durante o período analisado: 11% dos ativos totais do sistema.

Em contrapartida, a participação relativa do BB encerra o período de análise maior que em seu início. Em 1996, 13% dos ativos totais estavam sob administra-ção do BB, percentual este que foi aumentado durante 1997 e 1998, para se reduzir novamente em 1999 e 2000. Entre 2001 e 2003, sua participação volta a aumentar, para depois seguir em queda até 2006, encerrando o período com 15% dos ativos do sistema bancário. Estes números evidenciam que, apesar da redução da atuação do Estado brasileiro no sistema bancário, sua maior instituição se encontra consolidada no mercado, fortalecida e sem indícios da existência de uma estratégia deliberada de redução de sua participação no sistema.

Na esfera privada, a maior variação na participação se deu nos bancos com controle acionário estrangeiro. Enquanto a participação dos bancos privados na-cionais na administração dos ativos totais cresceu 23% durante os onze anos da análise, a participação dos bancos privados com controle estrangeiro aumentou em 106%, evidenciando maior inserção internacional no mercado bancário, como desejado pelo governo federal. Importante ressaltar, contudo, que o crescimento da participação dos bancos com controle estrangeiro se deu pela aquisição de institui-ções nacionais, e não pela entrada e posterior crescimento orgânico. Como exem-

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plo, há aquisições do Bamerindus, Banespa e Real por, respectivamente, HSBC, Santander e ABN Amro.

Dessa forma, pode-se afirmar que as políticas adotadas pelo governo fe-deral visando à diminuição da participação estatal no sistema bancário na-cional foram bem-sucedidas, uma vez que houve redução tanto do núme-ro de bancos públicos quanto do volume de ativos geridos por aqueles que continuaram sob o controle estatal.

Por último, é realizada a análise das operações de crédito efetuadas pelo sistema bancário nacional durante o período 1996-2006. As operações de crédito são relevantes na medida em que impulsionam o consumo das famílias, das em-presas e dos governos. Desse modo, uma maior concessão de crédito estimula o crescimento econômico, condição necessária ao desenvolvimento de uma nação.

TABELA 5Participação das instituições nas operações de crédito(Em %)

Bancos 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Bancos públicos (mais caixas estaduais) 23,5 10,3 8,9 8,1 5,1 3,1 4,8 4,5 4,4 4,1 3,7

Banco do Brasil 10,6 11,0 12,1 10,6 11,0 14,5 16,2 20,4 19,4 18,5 20,0

Caixa Econômica Federal 24,0 30,9 32,3 28,7 23,0 7,1 7,6 7,9 7,5 8,0 8,1

Bancos privados nacionais 31,9 35,4 31,0 31,7 34,5 42,1 39,7 41,3 41,3 40,8 40,2

Bancos com controle estrangeiro 9,5 11,7 14,9 19,8 25,2 31,5 29,9 23,8 25,1 26,4 25,7

Cooperativas de crédito 0,5 0,7 0,9 1,1 1,2 1,6 1,8 2,1 2,3 2,3 2,3

Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

total em r$ bilhões (valores nominais)

192,1 184,7 186,6 193,7 228,3 233,2 259,2 284,6 341,7 417,2 508,3

Fonte: BCB (2007).

Durante o período sob análise, o volume de operações de crédito cresceu a uma taxa menor que o volume de ativos do sistema. Enquanto este cresceu 303%, aquele apresentou crescimento de 165%, o que pode ser consequência de condutas mais prudenciais por parte do sistema bancário, influenciado pela crise trazida pela estabilização monetária e pelo Acordo de Basileia.

Em 1996, as operações de crédito representavam 39% dos ativos totais e, no ano seguinte, sofreriam redução de 12 p.p., correspondendo a 27% dos ativos no fim de 1997. A tendência de queda relativa nas operações de crédito perdurou durante todo o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, chegando ao fim de 2002 com 23%, a menor participação sobre os ativos do período analisado. De modo contrário, a partir da gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva as operações de crédito voltam a ganhar espaço nas aplicações dos recursos captados pelo sistema bancário, em um crescimento consistente que atingiu seu ápice no

31A Participação Estatal no Sistema Bancário Brasileiro

fim de 2005, e chegando ao final do período analisado, em 2006, com sua partici-pação nos ativos totais praticamente retornando ao patamar de 1997, porém ainda bem aquém daquele observado em 1996.

Ressalte-se o fato de que a expansão do crédito é um desdobramento deliberado da política econômica do governo Lula, visando sustentar o crescimento econômico do país não apenas pelo atendimento da demanda internacional, mas também por meio do atendimento de maior demanda interna por produtos e serviços.

Tal redução da participação das operações de crédito sobre os ativos totais é verificada em cada subgrupo de bancos descritos na tabela 5, à exceção do BB. Enquanto os demais subgrupos reduziam a importância de suas operações de crédito, o BB a aumentava de 33% em 1996 para 36% em 2006, com acentu-ado crescimento durante o governo Lula. Durante o ano de 1997, as operações de crédito representariam 21% dos ativos totais do BB. Cairiam novamente em 1998 e apresentariam crescimento contínuo a partir de 2000, potencializado nos anos do governo Lula, no qual o crescimento anual médio foi de 3 p.p. Apenas em 2003, primeiro ano do governo Lula, as operações de crédito no BB aumenta-ram em 5 p.p. e encerraram com 27% dos ativos totais. Tal fato permite ratificar a conclusão de Vidotto (2005), de que os bancos federais passaram a atuar como agentes anticíclicos.

A afirmação de Vidotto (2005) encontra sustentação, no que se refere a operações de crédito, na análise dos dados do BB, contudo a mesma con-clusão não pode ser obtida ao observar a atuação da CEF. Ao contrário do BB, as operações de crédito da CEF sofreram importante redução durante o período analisado: em 1996, elas correspondiam a 57% dos ativos da CEF, enquanto em 2001 encerrariam representando apenas 16%, após uma que-da de 25 p.p. em comparação ao percentual de 2000. De modo semelhante ao BB, a partir de 2003 as operações de crédito começam a retomar sua importância relativa, crescendo em média 1 p.p. por ano, encerrando 2006 representando 20% de seus ativos.

Importante destacar, todavia, que a queda abrupta ocorrida em 2001 se deu por conta da reestruturação patrimonial pela qual passou a CEF como consequência do PROEF e da criação da Emgea, para a qual foram transferidos créditos da ordem de R$ 27 bilhões. Créditos estes que, em muitos casos, não foram origi-nalmente concedidos pela CEF: referiam-se, por exemplo, às carteiras do extinto BNH, de outros órgãos públicos e bancos que trocaram parte de seu crédito imo-biliário por “moedas de privatização” (Brasil, 2001b).

Voltando a análise para os dados agregados dos setores público e privado, percebe-se que as operações de crédito acompanharam a migração ocorrida com os ativos totais. A participação pública em 1996 era de 58% do total de

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operações de crédito ofertado no sistema bancário. Este percentual vai decrescendo até atingir 25%, em 2001, a menor participação pública nas operações de crédito verificada durante o período de análise. A partir de 2002, o crescimento relativo das operações de crédito nos bancos públicos é retomado, porém de forma descontínua ao longo dos anos seguintes, com flutuações positivas e negativas. O valor de 32% do total das operações de crédito terminaria sob a administração de bancos estatais em 2006. Enquanto os subgrupos Bancos públicos – mais caixas estaduais – e CEF reduziram sensivelmente sua participação no crédito ofertado pelo sistema, o BB dobrou sua participação relativa no período 1996-2006.

No setor privado, o crescimento ocorreu em todos os subgrupos, com destaque para o crescimento elevado apresentado pelos bancos com controle estrangeiro, que saltaram de uma participação de 10%, em 1996, para 26% do crédito ofertado em 2006, em muito explicado pelas aquisições de bancos anteriormente controlados pelo capital nacional, público ou privado.

4 coNsidEraçÕEs FiNais

Este estudo procurou demonstrar a evolução da participação estatal no sistema bancário. Inicialmente, evidenciou que a participação de Estados nacionais nos sistemas bancários é prática difundida em vários países e que sua redução, iniciada a partir da segunda metade da década de 1980, ainda se encontrava em curso até a eclosão da atual crise financeira mundial em 2008, apesar de tal movimento global omitir a heterogeneidade das experiências dos países. Além da diminuição do papel do Estado, foi abordado o fato de que mesmo as instituições públicas remanescentes sofreram mudanças: internamente, passaram a adotar formas de gestão baseada em objetivos privados, submetendo-se à disci-plina imposta pelo mercado.

Em seguida, o estudo demonstrou que, no Brasil, o processo de redu-ção da participação estatal no sistema bancário se deu a partir da implementa-ção do Plano Real, em 1994. Com o fim das receitas inflacionárias, os bancos – públicos e privados – tiveram de readaptar sua estrutura administrativa, re-duzir custos, buscar eficiência e procurar novas fontes de receitas. Quanto aos bancos estatais, a estabilização monetária os afetou de modo distinto: enquanto o governo federal optou por estimular a privatização, a reorientação estratégica ou a liquidação dos bancos estaduais. Os bancos federais sofreram ampla reestru-turação, passando a atuar com “disciplina de mercado” e voltando sua atuação a segmentos considerados estratégicos pelo governo. Em comum entre as ações reestruturadoras dos bancos federais estava a implantação de um novo modelo de gestão administrativa e operacional, que primava pela eficiência e cujos critérios de avaliação eram semelhantes aos adotados pelo setor privado.

33A Participação Estatal no Sistema Bancário Brasileiro

A análise dos números do sistema bancário disponibilizados pelo Banco Central, referentes ao período 1996-2006, permitiu concluir que as políticas de diminuição da participação estatal – iniciadas pelo governo Fernando Henrique Cardoso – foram bem-sucedidas. Tal diminuição se deu tanto no número de instituições bancárias estatais quanto na participação relativa nos ativos totais do sistema e nas operações de crédito.

Contudo, é importante ressaltar que, a partir do governo Lula, há uma retomada da participação dos dois principais bancos federais – BB e CEF – na gestão dos ativos e das operações de crédito. E, dessa forma, a participação estatal vem retomando parte do mercado bancário que outrora transferiu à iniciativa privada, ainda que este crescimento não represente um retorno aos níveis encon-trados em meados da década de 1990.

Por fim, este estudo evidenciou que, a despeito da redução agregada da atu-ação estatal no sistema bancário, o BB – maior banco público nacional – aumen-tou sua participação no mercado no período 1996-2006, tanto no que se refere à gestão de ativos quanto às operações de crédito. A análise dos dados referentes às operações de crédito administradas pelo BB comprovou, ainda, que este atua como agente anticíclico, uma vez que o banco foi o único subgrupo que aumentou a re-lação crédito/ativos totais durante o período analisado. Assim sendo, o BB encerra tal período fortalecido e sem indícios da existência de uma estratégia deliberada de diminuição de sua participação no mercado bancário. Ao contrário, desde a eclosão da atual crise financeira mundial e a perda temporária da liderança do mercado para o Itaú-Unibanco, o BB materializou a intenção do governo federal de conti-nuar participando ativamente do sistema bancário brasileiro, ao adquirir a estatal paulista Nossa Caixa e parte do Banco Votorantim.

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Originais submetidos em setembro de 2009. Última versão recebida em novembro 2011. Aprovado em janeiro de 2012.

avaliação dos EFEitos da lEi KaNdir soBrE a arrEcadação dE icms No Estado do cEará*Alejandro Leitão**Guilherme Irffi***Fabricio Linhares****

A Lei Complementar no 87/1996, conhecida como Lei Kandir, promoveu significativas mudanças no Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), entre as quais a desoneração deste tributo de competência estadual sobre as exportações de produtos primários e semielaborados. A medida de isenção fiscal, imposta pelo governo mediante esta lei, buscava dar maior competitividade ao produto brasileiro no mercado internacional. Foi oferecido aos estados um “seguro-receita” como forma de ressarcimento das possíveis perdas de arrecadação. Este estudo mostra que o estado do Ceará, apesar da pequena participação relativa na exportação total brasileira, amargou perdas de arrecadação em consequência da isenção tributária sobre as vendas para o mercado externo. Os valores estimados revelam a insuficiência dos repasses federais na compensação das perdas de arrecadação de ICMS para o Ceará.

Palavras-chave: Lei Kandir; exportações; arrecadação; ICMS; ressarcimento.

assEssiNg thE EFFEcts oF KaNdir law oN cEará’s icms rEvENuE

The Complementary Law no 87/1996, known as Kandir Law, promoted significant changes in the state goods and services tax (ICMS), the exemption of this state tax on primary products and semi-manufactured exports. This tax exemption policy, established by the government through the Law, intended to make Brazilian products more competitive in the international market. Together with the tax exemption, The Kandir Law also offered the states a sort of “revenue insurance,” as a compensation for likely losses in their revenues. This study shows that the State of Ceará, despite the relatively small share in total Brazilian exports, had a substantial decrease in its tax revenue due to the ICMS exemption on exports and that the federal transfers over 1997-2007 were not enough to compensate this government revenue loss.

Keywords: Kandir Law; exports; collection; ICMS; compensation.

EvaluaciÓN dE los EFEctos dE la lEY KaNdir soBrE la rEcaudaciÓN dE icms EN El Estado dE cEará

La ley complementar no. 87/1996 más conocida como la Ley Kandir, promovió significativos cambios en el Impuesto sobre Circulación de Mercaderías y Servicios (ICMS), entre éstas la exoneración de este tributo de competencia estatal sobre las exportaciones de productos primarios y semi-elaborados. La medida de exención fiscal, impuesta por el gobierno, por la ley, procuraba dar mayor competitividad

* Os autores agradecem os comentários dos participantes do XIV Encontro Regional de Economia do Nordeste e de pareceristas anônimos. Ressaltando que erros e omissões são de nossa inteira responsabilidade. E-mail para correspondência: <[email protected]>.** Auditor Fiscal da Receita Estadual do Ceará (Sefaz-CE). E-mail: <[email protected]>.*** Professor do Departamento de Economia Aplicada da Universidade Federal do Ceará (DEA/UFC). E-mail: [email protected]**** Professor do Curso de Pós-Graduação em Economia (CAEN) da UFC. E-mail: <[email protected]>.

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al producto brasilero en el mercado internacional. Fue ofrecido a los estados un “seguro-ingresos” como forma de resarcimiento de las posibles pérdidas de recaudación. Ese estudio muestra que el Estado de Ceará, a pesar de la pequeña participación relativa en la exportación brasilera, pagó pérdidas de recaudación como consecuencia de la exención tributaria sobre las ventas para el mercado externo. Los valores estimados revelan la insuficiencia de los repases federales en la compensación de las pérdidas de recaudación del ICMS para Ceará.

Palavras-clave: Lei Kandir; exportaciones; recaudación; ICMS; resarcimiento.

l´ÉvaluatioN dEs EFFEts dE la loi KaNdir sur lE rEcuEil *icms* daNs l´État du cEará

La Loi Complémentaire no 87/1996, aussi connue tout simplesment *Loi Kandir*, a mis en evidence des changements significatifs dans l´ICMS (un impôt) parmi lesquels la décharge fiscale à l´égard de l´État sur les exportations de produits primaires et semi-manufacturés. Cette mesure d’allégement fiscal imposée par le gouvernement à travers la   loi avait l´intention de rendre le produit brésilien plus compétitif aux yeux du marché international. Alors, il s´agissait d´offrir aux États un *revenu protégé* de sorte qu´ils soient récompensés. Cette étude montre que l’État du Ceará, en ce qui concerne sa faible presence par rapport au total des exportations brésiliennes, a eu des pertes dans son revenu en raison de l’exonération fiscale des ventes aux marchés étrangers. Au même temps les valeurs estimées révelent l’insuffisance des fonds du Gouvernement Fédéral de compenser la perte d´ICMS.

mots-clés: Loi Kandir; des exportations; recueil – ICMS; remboursement.

JEL: C22; E62.

1 iNtrodução

Em uma conjuntura em que a palavra de ordem do governo é aumentar a arreca-dação e conter a despesa do setor público, a Lei Complementar no 87/1996, mais conhecida como Lei Kandir, que disciplina o funcionamento do ICMS,1 implantou significativas alterações na tributação de operações e prestações de exportação.

Entre as medidas adotadas pela lei, destacam-se a desoneração do ICMS sobre as exportações de bens e serviços primários e semielaborados e o aprovei-tamento de crédito para aquisição tanto de ativo imobilizado de uso quanto de energia elétrica.

Pode-se afirmar, no entanto, que o objetivo da Lei Kandir não foi regulamentar o ICMS, mas uma tentativa de minorar os efeitos negativos da política de estabiliza-ção econômica provocados pelas âncoras cambial – valorização do real – e monetária – elevação da taxa de juros – que afetavam respectivamente os resultados da balança comercial e o volume dos investimentos produtivos da economia.

1. ICMS é o acrograma do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação.

39Avaliação dos Efeitos da Lei Kandir sobre a Arrecadação de ICMS no Estado do Ceará

Dessa forma, pode-se depreender que essa lei teve como mote estimular os setores produtivos voltados à exportação de forma a favorecer o saldo da balança comercial, em função da desoneração fiscal, que poderia ser contabilizada como redução nos custos de produção destes setores; ou seja, uma medida para tornar os bens e serviços comercializados mais competitivos no mercado internacional. Não obstante, segundo Kume e Piani (1997), a desoneração do ICMS das ex-portações de produtos primários e semielaborados tende a dirimir uma série de distorções resultantes da tributação sobre segmentos produtivos.

A referida lei foi aprovada, à época, com uma estratégia imediata, a qual quebrou as resistências dos estados, ao oferecer-lhes um “seguro-receita” que previa repasses automáticos em caso de queda da arrecadação, criando, desta forma, um complexo mecanismo de compensação para garantir a manuten-ção da receita dos estados, minimizando, naquele momento, o conflito pela repartição de recursos.

Cabe ressaltar que a renúncia fiscal correspondente à parcela de receita oriunda do ICMS sobre as exportações foi aceita e apoiada pelos estados, Distrito Federal e municípios, em virtude do aumento das transferências da União em favor deles, principalmente via Fundo de Participação dos Estados (FPE) e Fundo de Participação dos Municípios (FPM), a partir de 1998, bem como pela promes-sa do governo federal de ressarcimento das perdas originadas pela Lei Kandir por meio do seguro-receita, mecanismo instituído pela própria lei.

Ante o exposto, o objetivo deste trabalho é quantificar o impacto da desoneração do ICMS nas exportações dos produtos definidos no Art. 32 da Lei Complementar no 87/1996 sobre a arrecadação total deste tributo no estado do Ceará, confrontando as estimativas das perdas de receita causadas pela aplicação da lei com os valores efetivamente repassados ao estado pelo governo federal, como forma de ressarcimento ou compensação. Para tal, diferente dos estudos anteriores, emprega-se uma abordagem baseada em modelos de séries temporais e dados agregados de arrecadação do ICMS e de outras variáveis econômicas no período de 1991 a 2007. A ideia central da análise é estimar os efeitos desta lei por meio de técnicas econométricas simples, cujas propriedades já são bastante conhecidas.

Este estudo conta com mais outras quatro seções. A seção seguinte aborda al-guns aspectos relativos à Lei Kandir, procurando estabelecer um paralelo em relação às mudanças ocorridas no ICMS, além de uma abordagem da sistemática de com-pensação das perdas de estados, Distrito Federal e municípios pela União mediante a transferência de recursos financeiros. A terceira seção se reserva à apresentação de evidências empíricas baseada na literatura de estudos que enfocam o assunto.

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Na quarta seção, exibe-se a origem da base de dados utilizada para a análise, a espe-cificação dos modelos econométricos estimados e utilizados para avaliar os efeitos da lei sobre a arrecadação de ICMS no Ceará, bem como seus resultados e sua discussão, além da metodologia empregada na estimação. Por último, nas conside-rações finais, são comentados os resultados e as conclusões observadas.

2 lEi KaNdir: BrEvE histÓrico

2.1 objetivos, características e efeitos

A Lei Complementar no 87/1996, aprovada em setembro de 1996, após longo período de negociações entre o governo federal e os estados. Sua discussão suce-deu em um ambiente em que se debatiam vários outros aspectos relacionados às finanças estaduais, municipais e distritais, principalmente os embates relacionados às dívidas públicas – mais especificamente as mobiliárias – que visam ao chamado “ajuste fiscal”.

Para o governo federal, a aprovação dessa lei era de fundamental importância para se criar mecanismos de incentivos às exportações via subtração dos impostos de produtos brasileiros destinados ao exterior. Sob a óptica do governo, a retirada deste imposto aumentaria a competitividade dos produtos primários e semielaborados nacionais no mercado mundial, aumentando as exportações, com efeitos positivos sobre a balança comercial do país.

Ainda de acordo com a visão do governo central, seria importante também nesse processo que houvesse desonerações do ICMS sobre os ativos permanentes, com o objetivo de incentivar a produção interna, a qual, no curto prazo, geraria aumentos de receitas para os estados e, consequentemente, para os municípios, em função dos novos investimentos que seriam feitos na economia. Além disso, as empresas passariam a aproveitar o crédito dos pagamentos do ICMS no consumo de energia elétrica. Ficou também definido na Lei Complementar no 87/1996 que haveria a possibilidade de aproveitamento do crédito do ICMS para todas as empresas em função de seus gastos com material de uso ou consumo.

A Lei Kandir foi, então, dividida em duas etapas. Na primeira, iniciada em setembro/outubro de 1996, foram desoneradas as exportações de produ-tos primários e semielaborados, possibilitando o aproveitamento do crédito do ICMS pago nas aquisições de máquinas e equipamentos do ativo permanente. Na segunda etapa, a partir de janeiro de 1997, passaria também a ser aproveita-do como crédito o ICMS pago nas aquisições dos materiais de uso e consumo das empresas, sistemática esta que não chegou a ser adotada pelos estados, haja vista os mecanismos de prorrogação do benefício utilizados por eles.

41Avaliação dos Efeitos da Lei Kandir sobre a Arrecadação de ICMS no Estado do Ceará

2.2 o icms antes e depois da lei Kandir

A reforma tributária de 1988 veio complementar um ciclo de questionamento ao cen-tralismo político e fortalecimento da União, realizados a partir da reforma de 1966, em detrimento da Federação. Não por acaso, a reforma de 1988 teve como eixo central a questão federativa, sendo sua orientação básica fortalecer os estados e municípios.

O Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICM), principal imposto sobre o valor agregado do país, teve papel crucial na reorganização tributária. Sua base de arrecadação foi ampliada pelo ICMS, ao incorporar a base de incidência dos antigos impostos únicos e especiais cobrados pela União sobre combustíveis e lubrificantes, energia elétrica, comunicações e serviços de transporte interestadual.2

A importância da ampliação da base de arrecadação do ICMS pode ser apreen-dida pelos seguintes dados: em 1988, antes da entrada em vigor da reforma tributá-ria, 79,6% do total do imposto arrecadado provinha da indústria de transformação, enquanto 18,7% derivava do setor terciário. Em 1997, os percentuais mudaram, respectivamente, para 52,4% e 45,4% (Prado e Cavalcanti, 1988).

Dados mais recentes mostram, no caso do Ceará, que a participação do se-tor industrial na arrecadação do ICMS em 2005 e 2006 ficou na faixa dos 53%, enquanto o setor de serviços participou com quase 47% na geração da receita tributária deste imposto.

A extinção dos impostos únicos e especiais teve forte impacto sobre a base de cálculo à qual o ICMS está inserido, dado que as aquisições de energia elétrica, combustíveis e minerais, como insumos do processo produtivo, passaram a ocasionar crédito tributário para o comprador, situação radicalmente diferente da anterior a 1988, quando os impostos únicos e especiais se agregavam aos custos dos insumos.

De acordo com informações do Ministério da Fazenda (1997), o ICMS representou 6,9% do produto interno bruto (PIB), ou 24% da carga tributária global, mencionando ainda que a arrecadação direta dos estados em 1997 atingiu 8,2% do PIB. Já em 2005, o ICMS chegou a 27,53% da carga tributária global, representando aproximadamente 84% da arrecadação própria dos estados.

A Constituição de 1988 (CF/1988) ainda traria outras alterações relacionadas à tributação indireta no país. Um dos principais aspectos foi a ampliação do chamado regime de compensação. A regulamentação do ICMS ficou a cargo da lei ordinária dos diversos estados. As alíquotas internas aos estados, desde que superiores às in-terestaduais, passaram a ser definidas por eles mesmos mediante o Regulamento do ICMS (RICMS).

2. O ICMS foi criado pela Constituição Federal de 1988 (CF-1988) para substituir o ICM, principal tributo de competência estadual, estando previsto no Art. 155, inciso II da CF-1988.

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Quanto à sistemática de arrecadação, como regra geral, o imposto é cobrado em várias – ou todas – etapas do ciclo de produção e comercialização, com dedução da parte paga na etapa precedente para apuração do imposto a pagar em cada parte do referido ciclo – princípio da não cumulatividade do ICMS. A competência para cobrança do ICMS é do estado de origem da operação objeto do imposto. A própria CF/1988, reconhecendo alguns dos problemas decorrentes da adoção do princípio da origem, estabeleceu alíquotas mais baixas nas transações entre estados mais ricos e mais pobres.

Pelo texto constitucional original, a isenção do ICMS nas exportações era estabelecida apenas para produtos industrializados, ficando a desoneração de pro-dutos semielaborados a cargo de lei complementar. Esta lacuna foi preenchida com a Lei Complementar no 65, de 15 de abril de 1991, que definiu como produ-tos semielaborados, sujeitos ao pagamento do imposto nas exportações, aqueles: i) que resultassem de matéria-prima de origem animal, vegetal ou mineral quando exportada in natura; ii) cuja matéria-prima de origem animal, vegetal ou mine-ral não tenha sofrido qualquer processo que implicasse modificação da natureza química originária; iii) cujo custo da matéria-prima de origem animal, vegetal ou mineral representasse mais de 60% do custo total do produto.

A referida lei complementar conferiu ao Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) a atribuição de definir a lista dos semielaborados. Desse modo, a lista dos produtos semielaborados tributáveis organizada pelo conselho favoreceu os fiscos estaduais, o que ensejou conflitos com as empresas, haja vista a abrangência de bens alcançados pelo ICMS nas exportações, além de todos os produtos primários, o que, na visão de estudiosos da questão fiscal, diminuiria a competitividade dos produtos nacionais.

Em 1994, com o Plano Real, ao mesmo tempo, a balança comercial brasi-leira passou de um superávit de US$ 10,4 bilhões para déficits de US$ 3,4 bi e US$ 5,6 bi em 1995 e 1996, respectivamente. Neste momento, o deputado An-tônio Kandir, então ministro do Planejamento do governo Fernando Henrique Cardoso, consegue a aprovação no Congresso Nacional do Projeto de Lei Parla-mentar no 95/1996, de sua autoria, que passa a ser conhecido como Lei Kandir (Lei Complementar no 87, de 13 de setembro de 1996), estabelecendo as princi-pais regras de cobrança do ICMS, em substituição ao Decreto-Lei no 406, de 31 de dezembro de 1968.

A aprovação da lei trouxe significativas alterações na legislação do tributo, bem como enorme perspectiva de perda de arrecadação pelos estados, haja vista a total desoneração das operações com mercadorias destinadas ao exterior, além da garantia de aproveitamento integral dos créditos relativos aos insumos utilizados pelos exportadores nas mercadorias com destino ao mercado externo.

43Avaliação dos Efeitos da Lei Kandir sobre a Arrecadação de ICMS no Estado do Ceará

Apesar da não incidência tributária definida na Lei Kandir, as empresas ex-portadoras podem manter o crédito fiscal do ICMS referente às aquisições dos in-sumos utilizados na produção a ser negociada com o mercado externo. A regra geral determina o estorno do crédito fiscal do ICMS quando a operação subsequente não for tributada, conforme preceitua o Art. 66, § 2o do Decreto no 24.569/1997 (RICMS do Ceará).

No caso das exportações, a Lei Complementar no 87/1996 introduz uma exceção a essa norma, fundamentada no princípio da não cumulatividade, previsto no Art. 57 do mesmo decreto, em que se compensa o que for devido em cada ope-ração relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação com o montante cobrado nas anteriores por este ou por outro estado.

Vale salientar que esse crédito pode ser transferido a outros estabelecimentos para a utilização no abatimento do imposto a ser pago nas saídas internas ou inte-restaduais, fazendo surgir, desse modo, um mercado paralelo de compra e venda de crédito de ICMS. Neste mercado, a compradora recebe o crédito do ICMS e paga por ele com certo deságio, aumentando ainda mais o montante da perda de arrecadação dos estados e introduzindo no ambiente econômico uma perda social (peso morto) e uma consequente redução do bem-estar da comunidade, haja vista que uma parcela desta receita, que seria usada pelo governo para a satisfação das demandas coletivas, se transforma em excedente para o setor privado.

2.3 as transferências compensatórias

Tendo em vista a amenização das perdas de arrecadação previstas com a nova sistemática tributária de desoneração do ICMS sobre as exportações, além da via-bilização política do projeto, o governo instituiu na própria Lei Complementar no 87/1996, um mecanismo de compensação via transferências de recursos para estados e municípios, fazendo nascer o chamado seguro-receita, tendo autorizado, já em outubro do mesmo ano, o adiantamento de R$ 500 milhões.

Na verdade, tal mecanismo foi introduzido na lei não propriamente com o objetivo de ressarcir os estados pelas perdas de arrecadação do ICMS sobre as vendas externas, mas para garantir a manutenção do nível médio de receita deste imposto no período de julho de 1995 a junho de 1996, devidamente corrigida pelo Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna (IGP-DI) e ampliada por um fator de crescimento – 3% em 1996-1997, 2% em 1998 e 2% em 1999 –, conforme estabelecido no dispositivo legal e posteriores alterações. Dessa forma, haveria ressarcimento quando a arrecadação posterior fosse inferior à observada no período-base definido na lei, sendo os recursos limitados ao montante das perdas iniciais estimadas, funcionando apenas como garantia de preservação da arrecadação real do ICMS para cada estado.

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Dessa forma, pela sistemática adotada, os estados que conseguissem, com es-forço próprio, superar os limites iniciais de arrecadação estabelecidos não receberiam o ressarcimento, apesar de terem perdido receitas referentes às vendas destinadas ao exterior. Por sua vez, fatores alheios ao mercado externo, como sonegação, proble-mas financeiros de empresas e concessão de benefícios em razão do acirramento da “guerra fiscal” entre os entes federados, resultariam em premiação via transferências de recursos do seguro-receita para os estados com arrecadação insatisfatória.

A partir de 2000, as regras de compensação previstas na Lei Kandir foram alteradas. Inicialmente, foi editada a Lei Complementar no 102, de 11 de julho de 2000, e, posteriormente, a Lei Complementar no 115, de 26 de dezembro de 2002, que deu à Lei Kandir sua versão atual. Em substituição ao seguro-receita, foi criado um fundo orçamentário com recursos da União, cujos aportes eram feitos aos estados com base em coeficientes fixos, expressos nesta lei e definidos em negociações entre entes federados e governo central.

De acordo com a Lei Complementar no 115, a partir de 2004, os montantes transferidos passaram a ser decididos no Congresso Nacional, quando da tramita-ção do orçamento geral da União. Outra novidade foi a revogação da determinação contida na Lei Complementar no 102, a qual definia 2006 como o período final da vigência da compensação, subordinando o repasse à existência de disponibilidade orçamentária consignada a esta finalidade.

Também em 2004, foi criado um auxílio financeiro da União, cujo intuito exclu-sivo era compensar a desoneração das exportações de bens primários e semielaborados ou de, pelo menos, amenizar o ânimo dos governantes insatisfeitos com o montante da perda de receita tributária. Para o governo federal, o auxílio financeiro aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios seria um prêmio pela cooperação dos entes federados no esforço de obter resultados superavitários no comércio exterior. Os valores são dis-tribuídos aos estados de acordo com coeficientes autorizados anualmente, por meio de previsão orçamentária e mediante edição de medidas provisórias.

Os primeiros repasses foram autorizados pela Lei no 10.966/2004 e, pos-teriormente, pela Lei no 11.131/2005, aprovando, em ambos os casos, o repasse do montante de R$ 900 milhões na razão de um doze avos a cada mês, e, ainda, por intermédio da Medida Provisória (MP) no 271, de dezembro de 2005, a qual aprovou crédito adicional no mesmo valor em duas parcelas – dezembro de 2005 e janeiro de 2006 –, condicionando a liberação dos recursos ao envio, pelos estados, de informações sobre a efetiva manutenção e aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações e prestações anteriores, conforme previsto no Art. 155, § 2o, inciso X, alínea “a” da CF/1988.

45Avaliação dos Efeitos da Lei Kandir sobre a Arrecadação de ICMS no Estado do Ceará

3 EvidÊNcias EmPÍricas

A desoneração do ICMS nas exportações de produtos primários e semielaborados instituída pela Lei Kandir objetivou aumentar a competitividade das exportações brasileiras e, por conseguinte, elevar o patamar do crescimento do PIB do país. De acordo com a justificativa da lei, com a desoneração fiscal, esperava-se um efeito econômico positivo suficientemente grande, capaz de gerar receita tributária interna adicional para compensar – ou mais do que compensar – as perdas de arrecadação tributária sofridas pelos estados.

O impacto das mudanças na tributação das exportações sobre as receitas estaduais desde a vigência da Lei Kandir despertou o interesse não somente dos governantes e elaboradores de políticas públicas, mas também de acadêmicos e estudiosos das finanças públicas. Neste sentido, diversos estudos foram desenvol-vidos na área. A maioria desta literatura, utilizando metodologias distintas, sugere perdas de arrecadação de ICMS para os estados e que as compensações financeiras transferidas pelo governo federal não têm sido suficientes para compensá-las.

Kume e Piani (1997) apresentaram uma estimativa da receita do ICMS sobre as exportações de 1994 e procuraram avaliar o impacto da redução da carga fiscal imposta aos estados pela desoneração do tributo incidente sobre as vendas externas. Os autores concordam que a desoneração do ICMS sobre as exportações de produtos primários e semielaborados eliminaram significativas distorções do sistema tributário brasileiro no que diz respeito à tributação de setores produti-vos de vanguarda, possibilitando o aumento de competitividade dos produtos brasileiros no mercado internacional. Eles não deixam, entretanto, de salientar que a isenção do ICMS sobre as exportações culminou com uma perda de receita bastante sensível, principalmente para os estados menos desenvolvidos.

As prováveis perdas tributárias que a desoneração do ICMS sobre os produtos exportáveis poderá trazer para a economia paraense são discutidas por Carvalho (2000). Segundo o autor, a situação é mais grave em função de a arrecadação do governo esta-dual ser estabelecida nas empresas exportadoras de produtos semielaborados, intensivo no uso de energia e matérias-primas de fontes de recursos naturais não renováveis. Diante disso, ele defendeu que a União compensasse de maneira integral as perdas do estado nos dois primeiros anos e que, a partir de 2002, fosse reduzida de maneira pro-porcional a compensação financeira decorrente do prejuízo da receita fiscal.

A partir de uma abordagem analítica, por meio do método indutivo-compa-rativo, Silva (2006) calculou as exonerações das exportações usando as alíquotas vigentes à época, por produto, considerando as respectivas reduções de base de cálculo e constatou que o estado do Pará sofreu perdas de R$ 3,4 bilhões em sua receita tributária, considerando o período de 1996 até 2004. Além disso, ele ressalta que as perdas não foram ressarcidas pela União proporcionalmente ao tamanho do impacto na arrecadação.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 201246

Analisando o estado de Minas Gerais, Riani e Albuquerque (2000) fizeram um balanço de perdas e ganhos e apresentaram uma proposta de mudança em relação à Lei Kandir. Seguindo a mesma linha, Oliveira, Amaral, e Rezende (2004) estudaram os efeitos da desoneração do ICMS nas exportações sobre a arrecada-ção no estado da Bahia, analisando a correlação dos incrementos ou reduções das exportações com as variações na arrecadação nos cinco anos anteriores e cinco anos subsequentes à vigência da Lei Complementar no 87/1996. Os dois traba-lhos concluíram que ambos os estados perderam recursos e que o ressarcimento via seguro-receita previsto na lei, além de não compensar as perdas, penaliza os estados que conseguem alavancar sua arrecadação mediante esforço próprio.

No caso de Minas Gerais, a apuração das perdas levou em consideração os produtos primários e semielaborados, créditos de aquisição de ativos e crédito de energia elétrica. A perda líquida do estado, desde a promulgação da lei até dezembro de 1999, foi de R$ 1,689 milhões.

Em relação à Bahia, os autores não chegam a quantificar as perdas, mas citam que os governantes se queixaram de perdas na ordem de R$ 914 milhões entre setembro de 1997 e março de 2003. Os autores acrescentam ainda que as alterações positivas na pauta das exportações dos estados decorreram mais de fa-tores externos que da própria desoneração.

Na análise comparativa entre as exportações do estado da Bahia nos cinco anos anteriores à vigência da lei e os cinco anos subsequentes à sua implantação, Oliveira, Amaral e Fonseca (2004) buscaram uma correlação entre os possíveis incrementos ou diminuições das exportações e as consequentes variações da ar-recadação do estado. A partir de informações da Secretaria da Fazenda, então, os autores advogam que o governo do estado perdeu R$ 1,258 milhões, a preços de janeiro de 2004, entre setembro de 1997 e março de 2003.

No caso do Rio Grande do Sul, segundo Bósio (1999), perdas com a Lei Kandir para o estado são superiores a R$ 600 milhões para os anos de 1997 e 1998, com base nos valores de ICMS apurados em 1995. Enquanto isso, a União ressarciu o estado em apenas R$ 359,4 milhões, ou seja, ele perdeu R$ 240,4 milhões. Na análise de Frizzo (2008), considerando o período entre 1998 e 2005, as perdas do estado foram de R$ 4,877 milhões.

Albuquerque (2009) se utiliza de estatísticas descritivas e de modelo economé-trico para quantificar e analisar as perdas da arrecadação tributária incorridas no Cea-rá no período de 1991 a 2007, verificando se o seguro-receita, o fundo orçamentário e o auxílio financeiro foram suficientes para compensar satisfatoriamente o decréscimo da arrecadação. A partir dos resultados, ele constatou que houve uma evolução nas exportações, principalmente nos produtos manufaturados, mas argumenta que a Lei Kandir não impactou o setor na dimensão esperada. A arrecadação, no entanto, foi afetada negativamente por esta desoneração, já que as perdas de receita não foram

47Avaliação dos Efeitos da Lei Kandir sobre a Arrecadação de ICMS no Estado do Ceará

compensadas pelas transferências constitucionais previstas. Sendo assim, ele conclui que a Lei Kandir produziu efeitos contrários ao esperado sobre a arrecadação do ICMS, sem ensejar uma nova dinâmica na pauta de exportação cearense.

Pellegrini (2006) analisou os dez anos de compensação da União aos esta-dos, decorrente da desoneração do ICMS sobre as exportações contidas nessa lei. Para o autor, a desoneração do ICMS afetou tanto a cumulatividade como a efe-tividade das exportações, em virtude da acirrada disputa entre os entes federados pela partilha das receitas públicas, implicando considerável retrocesso no alcance da desoneração de imposto pretendida.

A partir de uma análise com modelos em dados em painel, Avellar (2008) analisou os efeitos dessa lei sobre as exportações e no resultado fiscal dos estados. A autora aponta crescimento das exportações, especialmente para os produtos básicos, os quais, em 2005, junto com os produtos semimanufaturados, concen-traram-se nos estados de São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná e Rio de Janeiro. No tocante ao crescimento da arrecadação de ICMS, constatou-se que este foi menor que o registrado no período que precede a lei supracitada. Mais do que isto, ao comparar com a redução na taxa de crescimento encontrada nas exportações, observou-se que esta foi superior para o ICMS, evidenciando-se que, com a lei, os estados tiveram um decréscimo na arrecadação.

Para Dall’Acqua (2001), no entanto, o estado de São Paulo teoricamente seria, por um lado, o grande beneficiado pela desoneração dos bens de capital e, por outro, aquele que sofreria as maiores perdas tributárias. Segundo o autor, em 1997, o estado de São Paulo teve perda de arrecadação de ICMS de R$ 1,365 bilhões, sendo R$ 1,024 (75%) correspondentes à quota-parte estadual.

Cabe ressaltar que a linha de pesquisa seguida nos trabalhos que procuraram analisar os impactos da Lei Kandir sobre a arrecadação dos estados priorizou a uti-lização de estatísticas descritivas e análises comparativas, exceto as desenvolvidas por Avellar (2008) e Albuquerque (2009), que utilizaram modelo com dados em painel e série temporal, respectivamente. Sendo assim, pode-se dizer que esta investigação con-centrará esforços com vistas a direcionar o tema para uma abordagem quantitativa que possa oferecer uma avaliação baseada em estimativas econométricas de série temporal.

4 EsPEciFicação do modElo, BasE dE dados E aNálisE dos rEsultados

4.1 modelo econométrico

Esta seção apresenta a metodologia empregada para estimar o impacto da Lei Kandir na arrecadação de ICMS pela Secretaria da Fazenda do Estado do Ceará (Sefaz-CE), bem como os resultados dos testes de especificação – raiz unitária, correlação serial e estabilidade – e a discussão acerca dos modelos.

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A ideia básica da metodologia é estimar um modelo econométrico para o comportamento da arrecadação de ICMS, que seria função desta variável no pas-sado e indicadores econômicos do Ceará, e aplicá-lo na simulação da arrecadação de ICMS em um cenário em que a Lei Kandir não estivesse em vigor. Deste modo, é possível estimar a perda de arrecadação deste tributo, comparando seus valores simulados com os reais. Esta estimativa serve para avaliar se os repasses compensatórios do governo federal foram suficientes para cobrir as perdas de receita tributária provenientes desta lei.

Com o intuito de enriquecer a análise e aprimorar a estimativa dessa perda de receita, optou-se por empregar dois modelos econométricos.3 A diferença é que o primeiro traz o ICMS como função de indicadores econômicos do estado, enquanto o segundo emprega a própria arrecadação de ICMS no passado – de-fasada – como indicador do comportamento corrente desta variável. O primeiro modelo tem a seguinte especificação:

t

k

iitmim

k

iiti

k

iitit PPXI ξδδϕδ +++++= ∑∑∑

=−

=−

=−

0,,

0,1,1

00 ... (1)

Em que tI representa a arrecadação do ICMS; tX são as exportações cearenses;

1,tP , ..., ,m tP são outros m indicadores da economia cearense; ,j iδ ’s e iϕ ’s são parâ-metros do modelo; k é o número de defasagens de cada variável incluída no modelo; e tξ é um termo de erro. Entre os indicadores econômicos disponíveis para o estado do Ceará, além do volume de exportações, tem-se o índice de produção industrial, a taxa de desemprego, o fundo de participação estadual, os índices de preços de bens e serviços, o consumo de energia elétrica etc.

O segundo modelo substitui os efeitos dos indicadores econômicos 1,tP , ...,

,m tP pela influência da própria arrecadação do ICMS, em períodos passados, em seus valores atuais. Dessa forma, assume-se que o comportamento histórico da arrecadação de ICMS contém informação suficiente sobre seu comportamento corrente e futuro. Nestes termos, o modelo é descrito por:

3. Optou-se por avaliar o efeito da Lei Kandir a partir de métodos mais tradicionais e simples e, ainda, de fácil entendimento. Apesar de ser mais provável que as relações entre variáveis econômicas ocorram de forma não linear, como muitos apontam na literatura, a maioria dos modelos econométricos aplicados a séries ainda são lineares. Vale destacar que, em muitos modelos teóricos, quando se procura soluções analíticas, o pesquisador geralmente evita o uso de relações não lineares. Entretanto, seria muito importante para o tema investigado no estudo empregar em um trabalho futuro diferentes modelos econométricos, inclusive não lineares e de espaço estado, para comparar os resultados. Além disso, bem como analisado em Ferreira (2009), a arrecadação de ICMS é influenciada pelos ciclos econômicos. Dessa forma, seria interessante averiguar a estimativa destas perdas em modelos de séries temporais não lineares similares ao utilizado no trabalho, por exemplo, a equação (1) modificada para mudança de regime de Markov e/ou efeito limiar (threshold).

49Avaliação dos Efeitos da Lei Kandir sobre a Arrecadação de ICMS no Estado do Ceará

t

k

iiti

k

iitit IXI υρϕρ +++= ∑∑

=−

=−

000

(2)

Em que tI representa a arrecadação do ICMS; tX são as exportações cea-renses; iρ ’s e iϕ ’s são parâmetros do modelo; k é o número de defasagens; e tυ é um termo de erro.

Observe que, na apresentação do segundo modelo, a variável exportação apa-rece em destaque em relação aos outros indicadores econômicos na equação (1) e, apesar de o ICMS ser modelado como função de seu comportamento passado, permanece presente na equação (2). Isto porque a Lei Kandir afeta diretamente a arrecadação de ICMS sobre esta variável, tornando seus respectivos coeficientes, nas duas equações, peças-chave na simulação das perdas de receita tributária oca-sionadas pela referida lei.

O ICMS incide diretamente sobre o valor das exportações, por isso, e tam-bém por esta variável estar relacionada ao nível de atividade econômica do estado, os coeficientes iϕ ’s, nos dois modelos, mensuram os efeitos direto e indireto das exportações sobre a arrecadação de ICMS.4 Haja vista a Lei Kandir ter suspendi-do a aplicação do imposto sobre as exportações, esperava-se que, a partir de 1996, apenas o efeito indireto, como indicador da atividade econômica, permanecesse. Neste contexto, as perdas de receita poderiam, então, ser estimadas caso se iden-tificassem os efeitos direto e indireto das exportações no ICMS, presentes nos

iϕ ’s, controlando para outros fatores que afetassem sua arrecadação. Uma vez identificados, bastaria simular a arrecadação de ICMS para o período após 1996, como se o efeito direto ainda estivesse prevalecendo; ou seja, como se a lei não estivesse em vigor.

A identificação dos efeitos nos modelos anteriores se torna possível por meio da estimação da mudança nos coeficientes iϕ ’s após a vigência da lei, na qual as ex-portações afetariam a arrecadação de ICMS apenas indiretamente, pela correlação com a dinâmica econômica do estado. Inicialmente, no entanto, é necessário

4. O efeito direto é mensurado pela arrecadação de ICMS oriunda da tributação gerada pela aplicação da alíquota vigente sobre as vendas para os mercados internacionais. O efeito indireto, por seu turno, depende da influência do setor exportador na dinâmica da economia estadual. A abertura às exportações gera economias de escala, pois amplia o mercado de trabalho e aumenta a competitividade interna, fazendo crescer a produtividade da economia e melho-rando o nível geral de renda. Esta melhoria impulsionada pelo crescimento das exportações produz efeitos de multi-plicação e aceleração sobre o setor de mercado interno, não exportador. Tais efeitos são originados pelo efeito renda e pelos efeitos de encadeamento do processo produtivo para trás e para frente, que instituem demanda por serviços e insumos, além de atividades secundárias de processamento, impactando na demanda final em função do crescimento da renda e do emprego. A elevação do nível de renda, por sua vez, provoca o crescimento das importações de insumos, máquinas e bens de consumo. Acompanhando este incremento no produto, o alargamento da base tributária gerada pelos setores internos não exportadores e pelo setor importador aflora o efeito indireto exercido pelas exportações no crescimento da arrecadação de impostos, entre os quais o ICMS.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 201250

verificar se, estatisticamente, a Lei Kandir alterou os coeficientes nas equações (1) e (2), por meio de testes de estabilidade de seus parâmetros – uma alteração nestes parâmetros sugere que a resposta da arrecadação do ICMS em relação às variáveis explicativas mudou. Neste estudo, a estabilidade dos parâmetros é tes-tada por meio do teste de Chow (1960),5 assumindo que a mudança ocorreu no segundo semestre de 1996.

Caso a mudança nos parâmetros seja detectada, adota-se como estratégia de identificação dos efeitos direto e indireto uma extensão dos modelos ante-riores, com a utilização de uma variável qualitativa capaz de captar mudanças em seus parâmetros decorrentes da Lei Kandir. Tal variável assume valores de 0 e 1, de acordo com o período, antes e depois da implementação da lei, e tem a seguinte característica:

Em que o período T* marca o início da Lei Kandir. Esta variável é incluída nos modelos, respectivamente, da seguinte forma:

( ) ( ) t

m

j

k

iitjtij

m

j

k

iitij

k

iitti

k

iititt PDPXDXDI υgδφϕgδ +⋅++⋅+++= ∑∑∑∑∑∑

= =−

= =−

=−

=−

1 0,,

1 0,

0000 (3)

( ) ( ) t

k

jitti

k

jiti

k

iitti

k

iititt IDIXDXDI υqρφϕqρ +⋅++⋅+++= ∑∑∑∑

=−

=−

=−

=−

110000 (4)

Nessa especificação, os coeficientes iϕ ’s e iφ ’s são utilizados para identificar os efeitos diferenciados das exportações sobre a arrecadação do ICMS nos dois períodos, divididos pela vigência da lei. Antes da lei, têm-se apenas os coeficien-tes iϕ ’s, que, como já discutido, medem os efeitos direto e indireto de X sobre I. Após a lei, o efeito de X sobre I é mensurado pelas somas dos coeficientes ( )i iϕ φ+ . Como não existe mais o efeito direto neste período, estas somas men-suram apenas o efeito indireto de X sobre I. Dessa forma, pode-se simular como a arrecadação de ICMS evoluiria após a Lei Kandir e computar a quantia perdida

de arrecadação baseando-se nas estimativas de iφ− ( )i i iϕ ϕ φ = − + , referente ao efeito direto das exportações na arrecadação.

No processo de estimação das equações (3) e (4), é preciso determinar o

5. Tal teste tem como hipótese auxiliar o fato de que os resíduos das regressões estimadas, antes e após a mudança estrutural, sejam distribuídos de forma independente, com média zero e variância 2σ .

51Avaliação dos Efeitos da Lei Kandir sobre a Arrecadação de ICMS no Estado do Ceará

número de defasagens utilizadas para cada variável explicativa (k), quais destas variáveis são estatisticamente significantes, bem como a quantidade de interações entre a variável binária e as demais variáveis explicativas. O número de defasagens é determinado pela minimização do Critério de Informação de Schwarz (SIC), a partir de um número máximo de quatro defasagens. A significância estatística dos coeficientes das variáveis explicativas e suas respectivas interações com a variável binária tD é determinada por meio de testes t e F.

Vale ressaltar que o ponto inicial para estimar os modelos ora apresentados con-siste em testar se todas as variáveis são estacionárias. Para isto, será empregado o teste de raiz unitária desenvolvido por Dickey e Fuller (1979), conhecido como Dickey-Fuller Aumentado (ADF). O número de defasagens utilizadas na equação de regressão do teste é determinado pelo SIC, a partir de um máximo de doze defasagens, e seus termos determinísticos – tendência e constante – são selecionados por meio do teste t.

4.2 Base de dados

O banco de dados utilizado nesta investigação abrange o período de 1991 a 2007, com periodicidade semestral.6 Em relação ao ICMS, trabalhou-se com a série histó-rica fornecida pela Coordenadoria de Administração Tributária (Catri) em conjunto com a Coordenadoria de Pesquisa e Análise Fiscal (CEPAF) da Sefaz-CE, enquanto o valor das exportações do estado do Ceará, em dólares dos Estados Unidos, foi obtido do sistema AliceWeb,7 sendo utilizada a taxa de câmbio efetiva real para conversão das moedas. A produção física industrial do Ceará, obtida da Pesquisa Industrial Mensal – Produção Física (PIM-PF) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), levou em consideração o índice de base física mensal sem ajuste sazonal. Para efeito comparativo, os valores obtidos nos modelos, os repasses compensatórios do governo federal e os créditos autorizados pelo fisco estadual foram transformados pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) do IBGE com base em ja-neiro de 2007.8

Os gráficos A.1 a A.3, no apêndice, reportam a evolução temporal das variáveis econômicas contempladas no modelo econométrico. Como pode ser observado nestes gráficos, é possível que as séries apresentem quebras estruturais

6. Dada a natureza do trabalho, de quantificar o impacto de uma política no médio/longo prazo, dados de baixa frequência talvez sejam mais adequados. O emprego de dados com frequência alta pode afetar as estimativas, devido aos frequentes ruídos neles presentes. Neste sentido, modelar dados de frequência mais alta tende a demandar metodologias mais complexas, como modelos não lineares e modelos de estado-espaço. A proposta do artigo, no entanto, é avaliar o efeito da Lei Kandir por meio de métodos mais tradicionais e simples e, ainda, de fácil entendimento.7. Disponível em: <http://aliceweb.desenvolvimento.gov.br>.8. Além da base efetivamente utilizada na formulação do modelo econométrico, destacam-se ainda dados quantitativos e qualitativos levantados nos sítios de órgãos específicos como o Ipea, o Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (Ipece),o Banco Central do Brasil (Bacen), o Receita Federal, o Ministério da Fazenda, o IBGE, a Sefaz-CE, entre outros.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 201252

e sazonalidade.9 A incidência de sazonalidade talvez seja menos provável, uma vez que as séries têm frequência semestral. De qualquer forma, quebras estrutu-rais e sazonalidade tornam o resultado dos testes geralmente tendenciosos a não rejeição da hipótese nula, o que reforçaria a conclusão de estacionariedade no teste ADF tradicional.

4.3 análise e discussão dos resultados10

Primeiramente, a análise dos modelos descritos pelas equações (1) e (2) requer a verificação da ordem de integração das séries, para se certificar de que os resultados não sejam espúrios e tenham tratamento estatístico adequado. Sendo assim, para testar a estacionariedade das séries, emprega-se o teste ADF, o qual tem como hi-pótese nula de que a variável não é estacionária. Os resultados indicam que, para todas as variáveis em análise, rejeita-se a hipótese nula de raiz unitária ao nível de 5% de significância.

TABELA 1resultados do teste de raiz unitária adF

Variáveis Estatística tβ Valor p

I -5,76 0,0004

P -3,58 0,0468

X -4,78 0,0053

Elaboração dos autores.Obs.: a estatística tβ refere-se aos modelos com intercepto e tendência linear, respectivamente. Utiliza-se do Critério de Informação de Akaike modificado (MAIC) para a escolha de defasagem para cada variável testada.

A seguir, foram estimados dois modelos, representados pelas equações (1) e (2); por meio de testes de significância individual e global dos coeficientes, são selecionadas tanto as variáveis explicativas quanto o número de defasagens inclu-ídas na equação de regressão. No modelo (1), a única variável estatisticamente relevante para explicar a arrecadação de ICMS, além do volume de exportações do estado, é o índice de produção industrial.11

Os modelos estimados são, então, empregados para testar se houve alguma mudança em suas estruturas a partir da introdução da Lei Kandir. O teste aplicado

9. Na série de arrecadação de ICMS mensal no Ceará, por exemplo, é comum ter picos sazonais de tamanhos similares, aproximadamente, em janeiro-fevereiro e agosto-setembro. Esta sazonalidade, no entanto, desaparece quando se considera a frequência semestral da arrecadação. Isto justifica a escolha pela série com periodicidade semestral em detrimento da mensal. Todavia, também foram estimados modelos considerando os dados de frequência mais alta, e os resultados coincidem com os apresentados ao longo do texto.10. Vale mencionar que estimativas dos mesmos tipos de modelos para dados trimestrais, omitidos no trabalho, apresentaram resultados bastante similares.11. A correlação entre P e X é 0,78. É relativamente alta, mas esperada por tratar-se de variáveis que mensuram o nível de atividade econômica e, possivelmente, seguem algum tipo de tendência/ciclo comum. Vale observar, entretanto, que esta correlação afeta o tamanho dos erros padrão dos estimadores de MQO, mas a propriedade de não serem tendenciosos ainda é preservada – isto é, os iϕ ’s permanecem não tendenciosos.

53Avaliação dos Efeitos da Lei Kandir sobre a Arrecadação de ICMS no Estado do Ceará

nesta etapa, teste de Chow (1960), tem por princípio contrastar a hipótese nula de que a estrutura do modelo econométrico permanece a mesma contra a hipótese alternativa de que sua estrutura mudou.

A partir das estatísticas do teste de Chow, apresentadas na tabela 2, pode-se in-ferir que, para cada modelo estimado, a hipótese nula de que sua estrutura permanece a mesma após a Lei Kandir é rejeitada ao nível de 10% de significância. Diante disso, conclui-se que a Lei Kandir contribuiu para modificar a estrutura da arrecadação de ICMS no Ceará, pois há quebra estrutural influenciada provavelmente pelas alterações tributárias impostas pela referida lei; logo, os resultados para avaliar os efeitos da Lei Kandir na arrecadação de ICMS pela Sefaz-CE serão obtidos mediante a estimação das equações (3) e (4).

TABELA 2resultados do teste de chow

Modelos Estatística da razão de máxima verossimilhança Valor p

Modelo 1 25.2843 0.00

Modelo 2 7.0670 0.07

Elaboração dos autores.

Diante desses resultados, para estimar o modelo descrito pela equação (3), denominado Modelo 1 – M1, a quantidade de defasagens sugerida pela mini-mização do SIC apontou zero defasagem, enquanto o teste F sugere somente a iteração da Lei Kandir com as exportações; ou seja, a arrecadação de ICMS (I) é função dos termos correntes (período t) e assume a seguinte forma:

ttttttt PXDXDI υδφϕgδ +++++= 11100 * (5)

Por sua vez, de maneira análoga, a equação (6) descreverá o modelo M2, que, após a minimização do SIC e a realização do teste F, adota a se-guinte especificação:

ttttttt IXDXDI υρφϕqρ +++++= −111100 * (6)

Como discutido anteriormente, os coeficientes 1ϕ e 1φ são utilizados para identificar os efeitos diferenciados das exportações sobre a arrecadação do ICMS antes e depois da Lei Kandir. O coeficiente 1ϕ mede o efeito direto e indireto de X sobre I, enquanto a soma ( 1ϕ + 1φ ) mede apenas o efeito indireto. Dessa forma, estimativas destes parâmetros são peças-chave na simulação das perdas de receita de ICMS provenientes do novo regimento tributário imposto pela Lei Kandir.

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As estimativas para os dois modelos são apresentadas na tabela 3. Inicialmen-te, pode-se destacar que todos os coeficientes são estatisticamente significantes ao nível de 5%; a única exceção é o intercepto no modelo M1. De acordo com o ajustamento dos modelos, 2R , ambos estão bem ajustados: os modelos M1 e M2 explicam, aproximadamente, 91% e 93% da variação na arrecadação semestral de ICMS no estado, respectivamente.

Segundo a estrutura dos modelos, a variável Dt*Xt foi utilizada para captar o efeito da Lei Kandir na arrecadação de ICMS. Estimativas do coeficiente correspondente a esta variável sugerem um efeito negativo da referida lei sobre a arrecadação de imposto, como era esperado. Quantitativamente, no modelo M1, pode-se inferir que, antes da Lei Kandir, a elasticidade da arrecadação em resposta às exportações era de 1,15 e, após a lei entrar em vigor, esta passou para 0,15 (modelo M1).12 Nestes termos, conclui-se que, antes da Lei Kandir, um aumento de 1% nas exportações cearenses aumentava a arrecadação de ICMS em 1,15% – efeito direto e indireto –, e, após a lei, um crescimento de 1% nas exportações enseja aumento na arrecadação de 0,15% – apenas o efeito indireto.

TABELA 3modelos estimados

Variável dependente: arrecadação de ICMS semestral

Variáveis explicativasModelo M1 – equação (5) Modelo M2 – equação (6)

Coeficiente Erro padrão Coeficiente Erro padrão

Intercepto -8.1223 8.2203 -0,20651 0.0738

Dt 19.84791 8.6458 8.06491 2.4039

Pt 1.32141 0.4331 - -

Xt 1.15531 0.4469 0.55471 0.1491

Dt*Xt -0.99551 0.4402 -0.40571 0.1197

It-1 - - 0.47461 0.1420

Testes de especificação

2R 0.9088 0.9285

SIC -0.4494 -1.2054

Estatística – F (valor p) 55.7727 0.0000 0.0000

Elaboração dos autores.Nota: 1 Denota a significância ao nível de 5%.Obs.: o teste de correlação serial de Breusch e Godfrey (BG) indicou a ausência de autocorrelação de 1ª e 2a ordens no modelo

M2, enquanto que no modelo M1 verificou-se a existência de autocorrelação serial de primeira ordem, tendo este sido corrigido e, ainda, a não existência de autocorrelação de segunda ordem.

12. Para extrair esse resultado, somou-se os coeficientes das variáveis Xt e Dt*Xt, respectivamente 1,15 + (-0,995), o que perfaz um total de 0,15 aproximadamente.

55Avaliação dos Efeitos da Lei Kandir sobre a Arrecadação de ICMS no Estado do Ceará

No modelo M2, esse cálculo deve também levar em consideração a esti-mativa do coeficiente da variável It-1. Em modelos dinâmicos, como o M2,13

o impacto de uma variável explicativa se gradua ao longo do tempo, aumentando ou diminuindo a intensidade.

No caso da equação (6), o efeito de longo prazo de uma mudança em Xt sobre It é dado por )1( 11 ρϕ − . Então, pelas estimativas do modelo M2, a elasticidade das exportações sobre a arrecadação de ICMS antes da lei é 1,05; após a lei, a elasti-cidade passou para 0,28. Convém destacar que, independentemente da metodologia econométrica empregada, as estimativas sugerem reduções no efeito das exportações sobre a arrecadação de ICMS do estado do Ceará – resultado esperado devido às imposições da lei.

Em relação às demais variáveis do modelo M1, pode-se dizer que o pro-duto industrial cearense (P) apresenta efeito positivo sobre a arrecadação de ICMS, como esperado, uma vez que a produção industrial é utilizada como proxy da atividade econômica no estado; sendo assim, se a produção industrial aumentar 1%, a arrecadação de ICMS cresce 1,32% por semestre. Vê-se que, neste caso, o efeito na arrecadação é elástico em relação à produção. Deve-se ressaltar, entretanto, que estes valores, aparentemente elevados, são resultados da forma reduzida do modelo.

O modelo M2, por sua vez, utilizou a arrecadação de ICMS defasada em um período, It-1 – esta variável é utilizada para captar a dinâmica da economia cearense, uma vez que a arrecadação no semestre t é influenciada pela arrecadação no semestre t-1; desse modo, é possível inferir que a elasticidade da arrecadação de ICMS no período t-1 enseja um efeito dinâmico capaz de perpetuar um semes-tre. Em outras palavras, como o ICMS é um imposto indireto capaz de produzir efeitos em diversos pontos no tempo, isto é, a arrecadação no período corrente – t é influenciada pelas arrecadações passadas em pelo menos um período. E como esta pesquisa faz uso de observações semestrais, assume-se que a arrecadação no semestre t (corrente) é influenciada pela arrecadação do semestre anterior (t-1).

Em conformidade com a estimação, modelo M2, diz-se que a arrecadação em t-1 exerce um impacto positivo na arrecadação de ICMS corrente. Sendo assim, um aumento de 1% na arrecadação de ICMS em t-1 gera um impacto de aproximadamente 0,47% na arrecadação no semestre corrente.

4.3.1 Cálculo das perdas

De maneira geral, vale dizer que o exercício empírico realizado por esta pesquisa confirmou a hipótese de que a Lei Kandir produziu um ônus para o estado do Ceará,

13. Entende-se por modelos dinâmicos aqueles em que a variável dependente no período anterior é uma variável explicativa.

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em termos de arrecadação de ICMS sobre o setor exportador, pois a Lei Comple-mentar no 87/1996 desonera o ICMS sobre operações que destinem mercadorias ao exterior, inclusive produtos primários e industrializados semielaborados.

Para calcular a perda de arrecadação de ICMS com a desoneração das expor-tações, empregou-se o modelo sem mudanças para o período após a Lei Kandir, estimando, dessa forma, qual seria a arrecadação de ICMS caso não existisse a lei. Em seguida, para o mesmo período – 1997 a 2007 –, calculou-se a diferença entre o ICMS previsto (que corresponde à estimativa de arrecadação sem a lei – e o ICMS real – observado no interstício de tempo considerado. Desse modo, a perda total é dada pela diferença entre o somatório do ICMS previsto menos o ICMS real e o ressarcimento feito pelo governo federal.

Em termos quantitativos, os resultados dos dois modelos guardaram certa proximidade, observada a diferença em torno de 16%. O primeiro modelo esti-mou a perda de arrecadação do ICMS do estado do Ceará em valores próximos a R$ 1,55 bilhão, contra R$ 1,8 bilhão do segundo modelo, considerando o período de janeiro de 1997 a dezembro de 2007.14

Os valores recebidos pelo estado em forma de ressarcimento e auxílio financeiro do governo federal, a preços de janeiro de 2007, alcançaram o montante de R$ 0,51 bilhão. A diferença entre os valores estimados e os repasses recebidos representa a perda total acumulada de ICMS pelo estado do Ceará com a Lei Kandir; ou seja, R$ 1,04 bilhão, pelo modelo M1, e R$ 1,29 bilhão pelo M2.15 Nesta perda, destacam-se as transferências de créditos das empresas exportadoras autorizados pela Sefaz-CE entre 2002 e 2006, quantificados em valores próximos a R$ 0,18 bilhão.16

Portanto, identificada a perda de receitas de ICMS auferidas pela economia cearense em virtude da vigência da Lei Kandir, cabe ao governo estadual arcar com este ônus, haja vista que a contrapartida do governo federal em forma de ressar-cimento não se mostrou suficiente para compensar este prejuízo de arrecadação.

5 coNsidEraçÕEs FiNais

Há muitos anos, o sistema tributário nacional carece de uma reforma profunda e clara que vise simplificar tanto a cobrança como a regulamentação dos tribu-tos. A CF/1988 reformou amplamente o papel do estado, criando um sistema de financiamento de recursos insuficiente para o seu tamanho definido, prin-cipalmente pela incompatibilidade produzida entre a repartição de receitas e a

14. Valores corrigidos pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) do IBGE, com base em janeiro de 2007.15. Nos resultados apresentados por Albuquerque (2009), que seguem a mesma linha metodológica desta pesquisa, o estado do Ceará apurou perdas da ordem de R$ 878 milhões e R$ 919 milhões; ou seja, segundo o autor, seus valores são inferiores apenas 15,58% e 28,76%, respectivamente. 16. Preços de janeiro de 2007 calculados pelo índice médio anual – INPC/IBGE.

57Avaliação dos Efeitos da Lei Kandir sobre a Arrecadação de ICMS no Estado do Ceará

atribuição de competências delegadas aos entes federados. Desse modo, o go-verno federal, pós-Constituição de 1988, deparando-se com a incapacidade de recursos para financiar a máquina e as demandas sociais, recorreu à criação de tributos, principalmente em forma de contribuições (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL ou CSSL; Imposto Provisório sobre a Movimentação ou a Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira – IPMF; Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira – CPMF), jus-tamente para não ter de dividir o fruto da arrecadação com as demais unidades da Federação.

Os estados e municípios que haviam conseguido aparente independência fi-nanceira com o aumento das transferências de receitas da União, depois de 1988, por meio do FPE e do FPM, passaram a sofrer, posteriormente, certa deterioração de suas receitas, ao mesmo tempo em que assumiram mais responsabilidades, como nos casos das estadualizações ou municipalizações de atividades básicas como saúde e educação.

Nesse contexto, em 1996, os estados sofreram um duro golpe, com a implan-tação da Lei Kandir e a iminente perda de arrecadação de ICMS sobre as exporta-ções. Somando-se a estes fatores, observa-se, em âmbito nacional, o acirramento da competição tributária, mais conhecida como “guerra fiscal”, fazendo que os estados entrassem em uma verdadeira batalha para manter o nível de receitas, ou mesmo aumentar seus recursos, com a atração de novos investimentos, aflorando ainda mais o conflito federativo.

Em relação à Lei Kandir, o Ceará, apesar da discreta participação no mon-tante exportado pelo Brasil, também amargou perdas na arrecadação do ICMS. Pelos resultados apurados nesta pesquisa empírica, pode-se concluir que a perda de arrecadação de ICMS deste estado com a não incidência do imposto sobre as exportações foi estimada entre 3 e 3,5 vezes os valores transferidos pelo governo federal a título de ressarcimento e de auxílio financeiro como forma de com-pensação; ou seja, para que o estado não tivesse sua receita deteriorada, a União deveria ter repassado de 2 a 2,5 vezes os valores efetivamente reembolsados – isto quando se compara a perda de receita estadual estimada com as transferências e os auxílios financeiros federais, excluídas as deduções destinadas ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF) e ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Edu-cação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB).

Convém ainda ressaltar que, a partir de 1998, houve mudança na estrutura da pauta de produtos exportados pelo Ceará, quando as exportações de produtos industrializados superaram a participação dos básicos. Em 1996, os produtos bási-cos participavam de 52% das exportações cearenses, enquanto os industrializados correspondiam a 46%. Em 1998, houve inversão, e os percentuais passaram para

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45% e 54%, respectivamente17. Desde então, a participação dos industrializados foi crescendo, chegando a 68% em 2006, contra 30% dos básicos18.

Ante o exposto, não se pode desprezar o efeito positivo da isenção fiscal no setor exportador como indutor da atividade econômica. Destacando tanto o ganho de competitividade relacionado aos preços, quanto à possibilidade de melhoria do parque industrial, com o incentivo às aquisições de bens de capital, dada a desoneração dos investimentos com o aproveitamento de créditos fiscais na aquisição de ativo imobilizado.

Ante os resultados aqui demonstrados, entretanto, observa-se que os meca-nismos de compensações utilizados pelo governo federal se revelaram insuficientes para equilibrar as perdas na arrecadação do ICMS sofridas pelo estado do Ceará, além de ineficientes quando se propõem apenas a complementar o nível de arreca-dação vigente à época da lei, desestimulando, de certo modo, o esforço próprio pelo aumento das receitas oriundas deste imposto. Por seu turno, a manutenção dos créditos nas compras das empresas exportadoras e a transferência destes para outros contribuintes do imposto abre margem para o surgimento de alocações ineficientes de recursos no mercado.

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17. Seria interessante analisar se essa alteração na pauta, devido ao surgimento de um segmento industrial mais forte, teria se dado em detrimento do crescimento dos setores exportadores tradicionais ou em virtude da própria deterioração dos valores de trocas no mercado internacional e/ou do esgotamento de certas culturas, mas isto não é objeto deste estudo. Sendo assim, fica como sugestão para futuros trabalhos.18. Boletim da Conjuntura Econômica do Ceará – 2006, disponibilizado pelo Ipece.

59Avaliação dos Efeitos da Lei Kandir sobre a Arrecadação de ICMS no Estado do Ceará

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Originais submetidos em outubro de 2009. Última versão recebida em janeiro de 2011. Aprovado em fevereiro de 2012.

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aPÊNdicE

aPÊNdicE a

GRÁFICO A.1arrecadação de icms – 1o semestre (1991-2007)

22,00

21,00

20,00

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Fonte: a partir das informações da Sefaz-CE.Elaboração dos autores.

GRÁFICO A.2Produção física industrial do ceará – 1o semestre (1991-2007)

4,90

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4,70

4,60

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4,30

4,20

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2005

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2007

Fonte: a partir das informações da Pesquisa Industrial Mensal – Produção Física (PIM-PF) do IBGE.Elaboração dos autores.

63Avaliação dos Efeitos da Lei Kandir sobre a Arrecadação de ICMS no Estado do Ceará

GRÁFICO A.3Exportações cearenses – 1o semestre (1991-2007)

21,50

21,00

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20,00

19,00

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1991

1992

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2004

2005

2006

2007

Fonte: a partir das informações do sistema AliceWeb.Elaboração dos autores.

aNálisE do imPacto da classiFicação dE risco No mErcado dE crÉdito BrasilEiroPaulo Rogério Faustino Matos*João Henrique Lemos Costa**

Este artigo analisa o impacto das classificações de risco (rating) no mercado de crédito e as relações de longo prazo entre produto interno bruto (PIB), depósitos à vista e oferta de crédito para o mais relevante agente no mercado financeiro brasileiro, sob arcabouço monetário estrutural desenvolvido por Bernanke e Blinder (1988), em que a oferta de crédito depende de variáveis idiossincráticas e macroeconômicas. Os resultados obtidos por meio do método de correção de erros a la Engle e Ganger (1987) permitem evidenciar a relevância do canal de crédito como instrumento de transmissão da política monetária, enfatizando a importância de acompanhar as rubricas bancárias. É possível mensurar o efeito significativamente positivo da obtenção do grau de investimento (IG) de acordo com a agência Moody´s no crédito, enquanto mudanças intermediárias na avaliação de risco não parecem ser tão relevantes. Há também evidências do efeito insignificante dos juros no crescimento do PIB.

Palavras-chave: relação de equilíbrio de longo prazo; canal de transmissão de política monetária; grau de investimento; mercado de crédito.

aNalYsis oF thE ratiNg imPact oN thE BraZiliaN crEdit marKEt

In this article, we analyze the rating impact on credit market and the long-run equilibrium relationship between Gross Domestic Product (GDP), bank deposits and credit offering for the most relevant player in Brazilian financial system, under the monetary structural framework developed by Bernanke and Blinder (1988). In this approach, credit depends on some idiosyncratic and macroeconomic variables. The results using an error-correction Engle and Ganger (1987) approach enables us to evidence the credit channel relevance as a monetary policy transmission instrument, emphasizing the relevance in observing the bank assets rubric. It is possible to measure the positive and significant impact of the investment grade, according to Moody´s agency, while intermediary rating changes do not seem to be so relevant. We also have evidences about the insignificant impact of interest rate changes on GDP growth rate.

Keywords: long-run equilibrium relationship; monetary policy transmission channel; investment grade; credit market.

* Pós-Graduação em Economia da Universidade Federal do Ceará (CAEN). E-mail: <[email protected]>.** Banco do Brasil. E-mail: <[email protected]>.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 201266

aNálisis dE los EFEctos dE la clasiFicaciÓN dE riEsgo EN El mErcado dE crÉdito BrasilEÑo

Este artículo analiza el impacto de las clasificaciones de riesgo de mercado de crédito y las relaciones de largo plazo entre el Producto Bruto Interno (PBI), los depósitos del día y la oferta de crédito para el más relevante agente en el mercado financiero brasileño, sobre un modelo monetario estructural desarrollado por Bernanke e Blinder (1988) en que la oferta de crédito depende de variables idiosincráticas y macroeconómicas. Los resultados obtenidos a través del Método de Corrección de Errores a la Engle e Granger (1987) permiten evidenciar la relevancia del canal de crédito como instrumento de transmisión de la política monetaria, enfatizando la importancia de se acompañar las líneas bancarias. Es posible medir el efecto significativamente positivo de la obtención del grado de inversión de acuerdo con la agencia Moody´s en el crédito, mientras cambios intermedios en la evaluación del riesgo no parecen ser tan relevantes. Hay también evidencias del efecto insignificante de la tasa de interés en el crecimiento del PBI.

Palavras-clave: relación de equilibrio de largo plazo; canal de transmisión de la política monetaria; grado de inversión; mercado de crédito.

aNalYsE dE l’imPact dE la classiFicatioN dEs risQuEs daNs lE marchÉ du crÉdit BrÉsiliEN

Cet article analyse l’impact des notations de crédit dans le marché du crédit et les relations à long terme entre le produit intérieur brut (PIB), les dépôts à vue et de l’offre de crédit à l’agent le plus important dans le marché financier brésilien, de l’argent dans un cadre structurel mis au point par Bernanke et Blinder (1988) dans lequel l’offre de crédit dépend de variables macroéconomiques et idiosyncrasiques. Les résultats obtenus par la méthode de correction d’erreur une Engle et de la Ganger (1987) fournissent des preuves de la pertinence du canal du crédit comme un instrument de transmission de la politique monétaire, en soulignant l’importance de la surveillance des lignes bancaires. Il est possible de mesurer l’effet positif significatif sur l’obtention de grade d’investissement en fonction de crédit Moody`s, tandis que les changements intermédiaires dans l’évaluation des risques ne semble pas si pertinent. Il ya aussi des preuves de l’effet négligeable de paiements d’intérêts dans la croissance du PIB.

mots-clés: valeur à long terme de l’équilibre; canal de transmission de la politique monétaire; le grade d’investissement; le marché du crédit.

JEL: E51, G21

1 iNtrodução

Na literatura sobre o sistema financeiro, pesquisadores parecem consentir que as oportunidades oriundas do mercado de crédito para as pessoas físicas e ju-rídicas consistiriam em fator relevante não somente na condução de política monetária, no desenvolvimento econômico, mas também como instrumento de política social capaz de reduzir pobreza e redistribuir renda, como defendem Alesina e Perotti (1996).1

1. Sobre o papel desempenhado pelo sistema financeiro, tem-se extensa literatura iniciada possivelmente por Schum-peter (1911) e revista empiricamente em Goldsmith (1969) e Shaw (1973), entre outros autores.

67Análise do Impacto da Classificação de Risco no Mercado de Crédito Brasileiro

Uma particularidade desse mercado consiste na contrapartida da oferta de crédito por parte do sistema bancário, que ocorre por meio de depósitos bancários realizados pelos agentes econômicos superavitários. Assim, uma das principais discussões de política monetária analisa a existência de canal de crédito complementar ao tradicional canal da taxa de juros, relevante, mas insuficiente ao acomodar evidências empíricas.

Na última década, foi possível observar trajetória de melhoria das avaliações de risco das principais instituições privadas brasileiras, processo este acompanhado tam-bém pelo governo quando da emissão de seus títulos ao mercado, sinalizando não somente maior confiança mas também permitindo a alocação de capitais externos para o Brasil, principalmente de fundos de pensão e seguradoras, antes impedidas por lei.

Nesse contexto, este estudo se propõe inicialmente a evidenciar e mensu-rar o impacto em razão da conquista do grau de investimento (IG) no volume ofertado de crédito do Banco do Brasil (BB), que pode ser considerado como instituição financeira representativa, responsável por quase 30% do volume total do mercado de crédito brasileiro. Para tal, utiliza-se o arcabouço estrutural de teoria monetária desenvolvido por Bernanke e Blinder (1988), utilizado em Farinha e Marques (2002) para a economia portuguesa.

De acordo com os resultados, esse arcabouço monetário se encontra bem especificado para o caso brasileiro, sendo possível evidenciar a existência do canal de crédito. Visando atentar aspectos econométricos intrínsecos a modelagens que possuam variáveis não estacionárias, as análises das relações de equilíbrio de longo prazo são realizadas via modelagem linear e por intermédio da respectiva modelagem de correção de erros, sendo os resultados robustos e intuitivos, segundo os quais mudanças intermediárias da classificação de risco de crédito (rating) não parecem ser significativas. No entanto, a obtenção do grau de investimento é significativamente relevante no mercado de crédito brasileiro. Em suma, uma mudança em classificação deste tipo – associada à obtenção da chancela de IG por instituições financeiras no Brasil – parece ser capaz de alterar significativamente a captação de recursos e, consequentemente, a oferta de crédito.

Ressalte-se, com base nessa evidência, a relevância da manutenção da austeri-dade fiscal e do equilíbrio na condução do regime monetário nesse ambiente de crise financeira, com o intuito de manter esta chancela. Os resultados sobre os impactos oriundos de choques em taxas de juros reais são contraditórios, não sendo possível afirmar a eficiência da política monetária conduzida no regime de metas inflacionárias no estímulo ao mercado de crédito ou no crescimento do produto interno bruto (PIB).

Este trabalho se encontra organizado da seguinte forma. Na seção 2, tem-se um breve histórico do mercado de crédito brasileiro, sendo abordados aspectos sobre classificação de risco de crédito na sequência. Na seção 4, é realizada a re-visão da literatura relacionada. As seções seguintes, 5 e 6, descrevem a modelagem teórica e o exercício empírico com a discussão dos resultados, respectivamente. Na seção 7, apresentam-se as conclusões.

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2 o mErcado dE crÉdito No Brasil

Segundo Galor e Zeira (1993), o processo de desenvolvimento econômico pode ser caracterizado pela complementaridade entre o capital físico e o humano, sen-do a restrição de crédito muito prejudicial para os mais desassistidos e pobres, por terem menos acesso ao crédito com fins educativos e de treinamento, ou na gera-ção de negócios. Assim, o acesso ao crédito seria relevante, estando presente nas contas de consumo e investimento de todo um sistema econômico, permitindo agilidade nas transações e expansão deste sistema.

Segundo Brigham, Gapenski e Ehrhardt (2001), a oferta de crédito por par-te de empresas e instituições financeiras é importante impulsionador da atividade econômica, por disponibilizar recursos financeiros às pessoas e às empresas para que possam financiar suas necessidades permanentes e eventuais, propiciando a possibili-dade de, em caso de necessidade de antecipação de consumo ou de assegurar-se diante de incertezas, suavizar o consumo ao longo do tempo e entre os estados da natureza.

A relevância desse mercado pode ser vista quando da evidência de que con-siderável parte do PIB, em quase todas as economias, é financiada por instituições de crédito, conforme se observa no gráfico 1. Comparado à participação do crédito no PIB nos demais países, o nível de 36% evidenciado em janeiro de 2008 para o Brasil é superior aos níveis de várias economias da América Latina e inferior aos níveis dos países componentes do BRICS (bloco econômico formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), exceto a Rússia.

GRÁFICO 1crédito doméstico ao setor privado por país em 2008(Em % do PIB)

0

25

50

75

100

125

150

175

200

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Fonte: Banco Mundial.

69Análise do Impacto da Classificação de Risco no Mercado de Crédito Brasileiro

Apesar do baixo nível evidenciado, o país parece estar experimentando taxas de crescimento do crédito real total per capita bem mais elevadas que as do PIB, ain-da que de maneira heterogênea entre os estados e as regiões. Enquanto o Nordeste evidencia taxas de crescimento do crédito da ordem de 1,36% ao mês, o Sudeste evolui a uma taxa mensal de 1,06%, valores superiores a 4,06% e 3,82%, taxas anuais de crescimento do PIB destas duas regiões, respectivamente. Estes valores compreendem o período 2004-2009, segundo Matos, Vasconcelos e Penna (2011).

No gráfico 2, é possível evidenciar a evolução da composição no destino do crédito, com destaque para a pessoa física, principalmente em estados das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, em que se observa até 60% de todo o crédito sendo destinado a pessoas físicas.

GRÁFICO 2Evolução do crédito por componentes (2005-2008)(Em % do PIB)

0,02,55,07,5

10,012,515,017,520,022,525,027,530,032,535,037,5

jan./2005 jan./2006 jan./2007 jan./2008

RuralSetor público

Comércio

Indústria

Outros serviços

Habitação

Pessoa física

Fonte: Banco Central do Brasil (BCB).

Essa é uma evidência da possibilidade e da necessidade de evolução nesse mercado, sobretudo quando da obtenção do IG de conceituadas agências de clas-sificação de risco pelo governo brasileiro e de algumas de suas principais empresas. Neste cenário, atém-se, neste estudo, à análise de impacto não de ratings sobera-nas, mas sim corporativas, sendo escolhido o BB por ser a maior, mais antiga e tradicional instituição no mercado financeiro brasileiro, tendo sido fundada em 12 de outubro de 1808, até mesmo antes de o Brasil tornar-se independente.

Pioneiro e monopolista em diversas linhas de crédito, com a proclamação da República, em 1889, atuou decisivamente para equilibrar os impactos financeiros causados no fim da Monarquia. Dois séculos depois, o market share dessa insti-tuição permanece com crescimentos sucessivos tanto nas linhas de crédito para pessoa física como jurídica, como revela a tabela 1 com o market share em 2008 em termos de operações de crédito.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 201270

TABELA 1Market share em operações de crédito (dezembro de 2008)

Instituições financeiras Operações de crédito (Saldo em R$ bilhões)Participação no volume

total do sistema (%)

Banco do Brasil 176,09 27,39

Bradesco 100,51 15,63

Caixa Econômica Federal 73,16 11,38

ABN 51,95 8,08

Itaú 42,43 6,60

Santander 42,00 6,53

Unibanco 41,42 6,44

HSBC 28,97 4,51

Itaú BBA 24,43 3,80

Finasa 18,53 2,88

Votoratim 17,15 2,67

Safra 14,31 2,23

Nossa Caixa 11,97 1,86

Total da amostra 642,91 100

Fonte: BCB.

No gráfico 3, é possível observar a evolução do montante de crédito do BB de 1999 a 2008.

GRÁFICO 3Evolução do volume de crédito do BB (1999-2008)(Em R$ bilhões)

jan./1999 jan./2000 jan./2001 jan./2002 jan./2003 jan./2004 jan./2005 jan./2006 jan./2007 jan./2008

0

25

50

75

100

125

150

175

Fonte: BCB.

71Análise do Impacto da Classificação de Risco no Mercado de Crédito Brasileiro

3 o grau dE iNvEstimENto

A partir da década de 1980, as acentuadas transformações na economia mundial foram marcadas pela intensificação da globalização, tanto do ponto de vista finan-ceiro como do comercial-produtivo. Segundo Lacerda,

(...) As inovações financeiras, como os mercados de hedge e derivativos, por exem-plo, aliadas aos recursos de telemática, combinação das telecomunicações com a informática, que ampliaram significativamente a velocidade das transações, fizeram com que este aumentasse o processo de inflação de ativos nos mercados, assim como riscos inerentes ao processo (Lacerda, 2004, p. 4-5).

Essa financeirização e a maior presença de capital internacional na forma de títulos negociáveis fizeram com que os investidores institucionais sentissem a necessidade da existência de algum termômetro que pudesse mensurar o risco associado à emissão de títulos de renda fixa, levando à disseminação de medidas de classificação de risco de crédito, conforme Ferreira e Dupita (2006).

O IG seria, então, condição de baixo risco de crédito que denota adequadas garantias e reduzida vulnerabilidade a fatores de perturbação externos a uma emis-são ou a um conjunto de obrigações de emissor. Trata-se, assim, de classificação dada por agências de risco quando as condições que representam solidez de ga-rantias e obrigações são oferecidas por um país ou uma empresa aos investidores.

Essa classificação tem como objetivo oferecer ao mercado indicador de risco para investimentos, de forma que o IG representa o conjunto de avaliações de menor grau de risco, de acordo com os critérios estabelecidos pelas agências.

A globalização exigiu grandes mudanças, e as crises recorrentes implicavam a necessidade de aprimorar a avaliação de riscos. As agências de classificação de risco que anteriormente se dedicavam principalmente à análise de risco corporativo, desenvolveram uma análise de risco de crédito (default) ou – no caso de títulos emitidos pelos governos – risco soberano.2

Dessa forma, a rating é sempre aplicada a títulos de dívida de algum emissor. Se uma empresa quer captar recursos no mercado e oferece papéis que rendem juros a investidores, a agência analisa a rating destes títulos para que os potenciais compradores avaliem os riscos.

As empresas de classificação de risco alegam que, até mesmo sob encomenda, a rating é uma avaliação independente, em razão da credibilidade da própria agência, sen-do as mais conhecidas e com maior credibilidade: Moody’s, Standard & Poor’s e Fitch.

2. É importante notar que o risco soberano de cada país se diferencia do risco de outros emissores, como empresas privadas ou estatais. Este se associa a operações de crédito concedido a Estados soberanos, que, por sua vez, adquirem certas características que diferem daquelas presentes nos casos de crédito para firmas. Para mais detalhes, ver Canuto e Santos (2003).

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Estas agências, as quais exercem papel fundamental nos mercados financeiro e econômico mundiais, possuem características distintas no que se refere às nomen-claturas e aos processos para a definição da rating.3

As agências de rating classificam as instituições em três principais categorias: investment grade, speculative grade e default. As categorias mais elevadas, que vão de AAA até BBB-, ou de Aaa até Baa3 (no caso da Moody´s), são conferidas às institui-ções que apresentam risco quase nulo e, portanto, menor risco para receber fluxos de investimento. Abaixo desta categoria, as instituições são consideradas de caráter especulativo, o que significa que apresentam algum grau de risco de inadimplência. Aquelas abaixo de Ca, SD e DDD (default), além de especulativas, são classifica-das em categoria em que a situação de risco é máxima. Esta situação-limite ocorre quando um país anuncia sua moratória – por exemplo, ao não honrar com seus compromissos e suas dívidas internacionais.

Observe na tabela 2 a classificação das ratings adotadas pela Moody’s e pela Standard & Poor’s.

TABELA 2Ratings adotadas por moody’s e standard & Poor’s

Moody's S & P

Investment Grade Ratings

Aaa AAA

Aa AA

A A

Baa BBB

Below Investment Grade ("Junk Bond")

Ba BB

B B

Caa CCC

Ca CC

C C

In Default D

Fonte: BCB.

No caso específico da instituição em questão, o BB atingiu o IG pela agência Moody’s no terceiro trimestre de 2006 (Baa3), mantendo este grau atualmente. Com relação ao governo brasileiro, pela agência Standard & Poor’s, esta chancela veio no final de abril de 2008.

3.“In fact you could almost say that we live again in a two-super-power world. There is the US and there is Moody’s. The US can destroy a country be leveling it with bombs. Moody’s can destroy a country by downgrading its bonds” (Thomas Friedman, 1995).

73Análise do Impacto da Classificação de Risco no Mercado de Crédito Brasileiro

4 litEratura rElacioNada

A maior parte da literatura sobre análise das ratings dedica-se aos determinantes das classificações de risco, principalmente no que se refere às ratings soberanas, como em Canuto e Santos (2003). Uma quantidade ainda reduzida de trabalhos é direcionada a analisar o impacto das ratings corporativas sobre o tomador, e praticamente inexistem trabalhos que avaliam o impacto que estas, as quais men-suram a capacidade de pagamento de empresas emitentes de dívida, geram sobre as empresas (ratings corporativas) e seus produtos ou serviços.

Na literatura, é evidente que os investidores preferem as dívidas pertencentes ao IG como forma de melhor se proteger do risco de default. Um exemplo consiste em um estudo recente, realizado por Bone e Ribeiro (2005), que analisa a relação entre ratings corporativas e as ações e os títulos emitidos pela Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobras) e pela Repsol-YPF, da Argentina. De acordo com os resultados, a análise do efeito de mudanças de ratings sobre os retornos das ações de uma empresa parte do fato de que ratings estão associadas ao risco de uma empresa não honrar seus compromissos.

Mais recentemente, visando analisar esse canal de crédito e os aspectos relacio-nados à taxa de câmbio, Dionísio, Salles e Wu (2006) conseguem acomodar evidên-cias empíricas sobre os efeitos prolongados de crises cambiais sobre o crescimento.

Muitos dos modelos que lidam com a oferta de crédito encontrados na lite-ratura têm o objetivo de analisar o canal de crédito como um dos mecanismos de transmissão da política monetária. Originalmente, os estudos realizavam-se sob ótica macroeconômica, na qual se avaliavam os efeitos de variáveis agregadas e de política econômica sobre o volume de crédito ofertado.

Nas análises baseadas na teoria do canal de crédito, a equação de oferta é obtida a partir de modelo investment saving/liquidity preference money supply (IS/LM), em que se inclui o mercado de crédito bancário aos mercados de bens e mo-netário, tal como em Bernanke e Blinder (1988). Ao incluir o mercado de crédito, os bancos passam a ser vistos não apenas como agentes capazes de “criar” moeda mas também assumem o importante papel de ofertar crédito.

Em recente aplicação dessa literatura para o Brasil, Bonomo e Graminho (2002) analisam a existência e a relevância do canal de empréstimos bancários no Brasil, utilizando dados de balancetes de instituições financeiras. A hipótese deste trabalho é a de que o Banco Central do Brasil (BCB) deve ser capaz de alterar a oferta de crédito dos bancos, por meio da política monetária. Assim, estimaram-se modelos que avaliassem a sensibilidade do volume de empréstimos em relação a um índice de liquidez dos bancos e, posteriormente, testou-se o impacto da política monetária sobre esta sensibilidade. Os autores também calcularam um painel com o objetivo de avaliar a influência direta de um choque de política monetária sobre a oferta de crédito bancário.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 201274

Outro trabalho nessa vertente consiste em Farinha e Marques (2002). Estes autores estimam um modelo de oferta de moeda para a economia por-tuguesa, visando evidenciar e mensurar a importância relativa do tradicional canal da taxa de juros e do canal de crédito. De acordo com os resultados, a política monetária, ao afetar os depósitos bancários, poderá deslocar a função de oferta de empréstimos bancários.

Dessa forma, como extensão com viés financista de Bonomo e Graminho (2002) e Farinha e Marques (2002), este artigo pretende analisar o impacto das mudanças de classificação de risco de crédito e da obtenção do IG por uma insti-tuição financeira representativa no mercado brasileiro em suas operações de cré-dito, sob arcabouço de Bernanke e Blinder (1988).

5 modElagEm tEÓrica

5.1 arcabouço original

Farinha e Marques (2002) apresentam uma abordagem econométrica alternativa, partindo de um modelo IS/LM simples incluindo os mercados monetário e de crédito, tal como em Bernanke e Blinder (1988). Este modelo, segundo os auto-res, permite melhor compreensão das restrições de identificação que estão subja-centes nas equações de forma reduzida. O modelo utilizado por eles é formulado a partir da equação especificada a seguir, a qual compõe um sistema em painel a ser estimado, dispondo-se de amostra com instituições financeiras:

(1)

Nesse modelo, a variável dependente, representa o volume de crédi-to ofertado para cada banco i no período t, significa os depósitos à vista neste banco, assim como representa o capital do banco i no período t, todas estas em logaritmo. A variável é a taxa de juros dos empréstimos de longo prazo, it consiste no nível das obrigações do banco, é a taxa de juros dos emprés-timos de curto prazo do mercado monetário e , a taxa de inflação.

A maior parte da literatura estima os modelos de crédito em sua forma re-duzida e em diferenças. Farinha e Marques (2002), no entanto, estimam modelo estrutural de dados em painel por intermédio de métodos de cointegração. Estes autores sugerem um modelo estrutural, utilizando variáveis em nível. Eles argu-mentam que a abordagem de forma reduzida requer fortes restrições de identifi-cação e não permite a estimação dos parâmetros relevantes.

Visando mensurar o impacto das classificações de risco em instituições do mercado de crédito, um dos objetivos deste artigo consiste em evidenciar se, de fato, a melhor qualidade na captação de recursos torna factível ao banco expan-são na oferta de crédito. Assim, adota-se o arcabouço de oferta por crédito a la

75Análise do Impacto da Classificação de Risco no Mercado de Crédito Brasileiro

Farinha e Marques (2002), a partir da equação (1), considerando-se, no entanto, o contexto da proposta deste estudo, utilizando-se assim não mais um painel, mas apenas séries temporais para a instituição tida como mais representativa no mercado brasileiro, o que basicamente limita a análise, não permitindo que se realizem inferências sobre interrelações entre as instituições bancárias.

Mais especificamente, neste artigo, pretende-se utilizar esse arcabouço, atendo-se primeiramente às limitações dos dados disponíveis para as instituições financeiras brasileiras, sendo neste sentido necessário adequar a modelagem ben-chmark. Em uma segunda etapa, as regressões serão revistas sob arcabouço de correção de erros proposta por Engle e Granger (1987), sendo este refinamento econométrico necessário, tendo-se em vista que há variáveis não estacionárias, tornando o uso de regressões lineares inadequado, em razão da não validade plena das estatísticas clássicas, as quais partem do pressuposto da estacionariedade.

5.2 Especificação dos modelos utilizados

Em Farinha e Marques (2002), são propostas algumas versões da relação (1), sen-do adotada inicialmente neste artigo a seguinte modelagem:

(2)

Em que é o retorno real da taxa de juros, a taxa Sistema Especial de Li-quidação e de Custódia (SELIC) é a proxy e consiste no log do PIB real da economia brasileira.4

Com relação aos modelos encontrados na literatura, a primeira contribuição deste estudo está na incorporação da rating de crédito como variável explicativa no modelo, tendo-se em vista captar o efeito da medida de risco dada pelo IG sobre as operações de crédito da própria instituição, por meio da inserção da variável dummy, que capta a classificação da dívida de longo prazo em moeda estrangeira captada pelo BB, de acordo com a Moody’s. A primeira extensão proposta é a seguinte:

(3)

Outra especificação que será estimada visa incorporar as mudanças qualitativas nas ratings ao longo do período analisado. Estas mudanças de rating que foram clas-sificadas pela Moody’s ao BB são tais que, do quarto trimestre de 2002 ao segundo trimestre de 2004, tem-se Ba3; do terceiro trimestre de 2004 ao segundo trimestre de 2005, Ba2; e do terceiro trimestre de 2005 ao segundo trimestre de 2006, Ba1.

4. Na modelagem utilizada em Farinha e Marques (2002), utilizam-se variáveis reais e nominais, tendo sido este pro-cedimento evitado neste artigo. A inflação, por exemplo, é empregada como variável explicativa, sendo a intuição de que esta funcione como proxy da estabilidade do cenário macroeconômico, de forma que aumentos na taxa de inflação poderiam estar refletindo alguma instabilidade na economia.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 201276

A partir do terceiro trimestre de 2006 aos dias atuais é que o BB conseguiu seu IG com a classificação Baa3. Atribuindo-se variáveis dummy para cada alteração na classificação, tem-se a segunda extensão proposta:

(4)

Em que rat1t, rat2t e rat3t representam, respectivamente, as variáveis dummy que captem as classificações Ba2, Ba1 e Baa3, sendo esta última su-ficiente para a obtenção do investment grade. Optou-se por “desconsiderar”, sem perda de generalidade, a dummy para o período do quarto trimestre de 2002 ao segundo trimestre de 2004, associada à classificação Ba3, em razão do uso de intercepto no modelo.

6 EXErcÍcio EmPÍrico

6.1 Base de dados

O exercício empírico realizado neste estudo é composto por séries das variáveis no período compreendido entre janeiro de 1999 e novembro de 2008; as principais fontes de dados financeiros utilizadas foram o BCB e a Federação Brasileira de Ban-cos (Febraban), enquanto os dados macroeconômicos foram obtidos no Ipeadata.

A variável dependente consiste no volume de operações de crédito, que cor-responde ao estoque das carteiras do BB, incluindo-se todas as modalidades, em milhares de reais deflacionados pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de janeiro de 1999. As variáveis explicativas especificadas procu-ram captar aspectos da estratégia do banco (depósitos à vista), da política econô-mica (taxa SELIC) e do ambiente macroeconômico (PIB e inflação).5

A taxa de juros SELIC foi incorporada ao modelo com o intuito de captar o “efeito preço” do próprio crédito e de outras aplicações, dado que esta guia a direção das taxas de juros dos empréstimos, podendo-se observar os impactos da política mo-netária sobre a oferta de crédito do banco, esperando-se intuitivamente que o efeito preço seja positivo – ou seja, um sinal satisfatório para o coeficiente da taxa de juros.

A variável que procura captar o efeito da demanda por crédito é o PIB – em milhões de reais – deflacionado pelo IPCA, tendo como mês-base janeiro de 1999. Este indicador é utilizado no modelo como proxy do nível de atividade econômica. O montante de depósitos à vista foi incluído por representar im-portante fonte de captação para o banco. Assim, o objetivo é captar a impor-tância desta fonte de recursos para expansão do crédito. O volume de depósitos

5. Foi empregada a conta Operações de Crédito (1.6.0.00.00.1), de acordo com o Plano Contábil das Instituições do Sistema Financeiro Nacional (COSIF), apurada e disponibilizada pelo BCB.

77Análise do Impacto da Classificação de Risco no Mercado de Crédito Brasileiro

à vista – em milhares de reais – foi deflacionado pelo IPCA, com mês-base em janeiro de 1999. No gráfico 4, é possível visualizar as principais variáveis da modelagem: volume de crédito e depósitos à vista do BB, do PIB e da SELIC dos últimos dez anos, todas com tendências crescentes, exceto a taxa de juros (SELIC). Na tabela 3, encontram-se as respectivas estatísticas descritivas.

GRÁFICO 4séries reais de crédito, depósitos à vista, PiB real e sElic real (1999-2008)(Em log e % ao mês)

jan./1999 jan./2000 jan./2001 jan./2002 jan./2003 jan./2004 jan./2005 jan./2006 jan./2007 jan./2008

4,0

4,5

5,0

5,5

6,0

6,5

7,0

7,5

8,0

-2,0%

-1,5%

-1,0%

-0,5%

0,0%

0,5%

1,0%

1,5%

2,0%

2,5%

PIB (ln) Crédito (ln) Depósito (ln) SELIC (%)

Fonte: BCB, Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e Ipeadata.

TABELA 3Estatísticas descritivas das principais variáveis nominais do modelo

EstatísticaCrédito BB(bilhões R$)

Depósito à Vista BB(bilhões R$)

PIB Mensal(bilhões R$)

SELIC(% a.m.)

Média 63,56 22,42 155,03 1,37

Desvio padrão 40,75 9,68 50,49 0,36

Mínimo 18,78 8,55 78,52 0,8

Máximo 173,22 48,14 267,56 3,33

Elaboração dos autores.

6.2 discussão dos resultados

Visando-se obter modelo bem especificado para o caso brasileiro, capaz de propor-cionar evidências sobre a magnitude e o sinal do impacto da mudança de classifi-cação de risco de crédito e da obtenção do IG no volume de crédito, estima-se cada uma das três especificações propostas por intermédio do método de mínimos qua-drados ordinários (MQOs), atendo-se para a correção da matriz de variância-co-variância proposta por Newey e West (1987), em razão da robustez dos resultados

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 201278

à presença de autocorrelação ou heterocedasticidade. Os resultados das estimações das relações (2), (3) e (4) encontram-se, respectivamente, nas tabelas 4, 5 e 6.

Em primeiro lugar, é importante analisar os sinais e a significância dos coeficientes quando da modelagem benchmark proposta na tabela 4, tendo-se em vista que a má especificação desta poderia comprometer as demais infe-rências. É possível observar que, exceto pelo intercepto, cujo valor parece ser sempre negativamente significativo e com ordem de grandeza entre -10 e -5, as demais variáveis explicativas possuem impacto também significativo, mas com sinal positivo, ressaltando-se a magnitude do impacto do volume de depósitos bancários e do PIB real, sugerindo-se que variação de 1% no volume de depó-sito implicaria 1% de aumento na oferta de crédito, em média, e que, no caso de aumento no PIB em 1%, se teria também aumento no crédito na ordem de 1,6%. O impacto de aumentos na SELIC – em 1%, por exemplo – seria bem menor, da ordem de 0,10% na oferta de crédito, tendo-se em vista que o canal pode ser caracterizado pela indexação das alternativas de crédito por esta taxa.6

TABELA 4Estimação da modelagem benchmark

Parâmetro Erro padrão P-valor

-9,941 1,23 0,00

0,961 0,11 0,00

0,101 0,02 0,00

1,591 0,24 0,00

R2 ajustado: 0,95

Teste de raiz unitária dos resíduos

Augmented Dickey-Fuller(com intercepto)

Estatística t ajustada-5,862

P-valor0,00

Fonte: Newey e West (1987).Notas:1 Parâmetros significativos a 5%.

2 Rejeita-se a hipótese nula de não estacionariedade a 5%.Obs.: estimação obtida pelo método dos mínimos quadrados ordinários (MQOs), com erro padrão robusto à heterocedastici-

dade e à autocorrelação no período de 1999-2008.

Observando-se a extensão da modelagem descrita pela relação (3), na tabela 5, é possível inferir que a obtenção do IG pela instituição em questão teve impacto signifi-cativamente positivo, da ordem de 0,14, o que corrobora o argumento tão difundido por aqueles que defenderam a relevância desta conquista pelos títulos públicos brasilei-ros, até mesmo em período de desconfiança quanto ao grau de idoneidade das agências de risco, de que, com esta chancela, oficialmente seriam rompidos empecilhos legais à entrada de recursos suntuosos de fundos de investimento estrangeiros no país.

6. Foram testadas outras extensões do modelo com a inclusão de variáveis explicativas reais, como a taxa de câmbio real efetiva, as quais se revelaram todas insignificantes.

79Análise do Impacto da Classificação de Risco no Mercado de Crédito Brasileiro

TABELA 5Estimação da modelagem para avaliação do impacto do investment grade

Parâmetro Erro padrão P-valor

-7,341 1,28 0,00

0,991 0,10 0,00

0,111 0,02 0,00

1,191 0,24 0,00

0,141 0,04 0,00

R2 ajustado: 0,95

Teste de raiz unitária dos resíduos

Augmented Dickey-Fuller(com intercepto)

Estatística t ajustada-5,912

P-valor0,00

Fonte: Newey e West (1987).Notas:1 Parâmetros significativos a 5%.

2 Rejeita-se a hipótese nula de não estacionariedade a 5%.Obs.: estimação obtida pelo método dos (MQOs), com erro padrão robusto à heterocedasticidade e à autocorrelação no

período de 1999-2008.

Por fim, a partir dos resultados da estimação da modelagem que capta toda al-teração de avaliação de risco, apresentados na tabela 6, percebe-se que as melhorias das avaliações são bem recebidas por credores e pelo mercado, mas possivelmente não o suficiente para que estes impactos sejam significativos no volume, sendo este impacto apenas significativo quando da real obtenção do IG.

Atendo-se aos valores dos coeficientes e a seus respectivos p-valores, tem-se a impressão de que o mercado estaria antecipando a obtenção da qualificação, prevendo-se a conquista deste, mas ainda sem impactos significativos. Tal conclu-são é ainda mais clara quando do teste de Wald, em que se observa a não rejeição da hipótese de que ambas as variáveis dummy que captam as mudanças interme-diárias de ratings sejam conjuntamente não significativas.

TABELA 6Estimação da modelagem para avaliação do impacto das ratings

Parâmetro Erro padrão P-valor

-6,01 1,73 0,00

0,961 0,11 0,00

0,091 0,02 0,00

1,011 0,30 0,00

0,04 0,04 0,00

0,08 0,05 0,12

0,211 0,07 0,00

(Continua)

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 201280

R2 ajustado: 0,95

Teste de raiz unitária dos resíduos

Augmented Dickey-Fuller(com intercepto)

Estatística t ajustada-5,472

P-valor0,00

Fonte: Newey e West (1987).Notas: 1 Parâmetros significativos a 5%.

2 Rejeita-se a hipótese nula de não estacionariedade a 5%.Obs.: estimação obtida pelo método dos (MQOs), com erro padrão robusto à heterocedasticidade e à autocorrelação no

período de 1999-2008.

Em resumo, pode-se inferir, com base no arcabouço utilizado, que a clas-sificação de IG dada aos títulos de dívida do BB exerce impacto positivo sobre a oferta de crédito desta instituição, uma vez que a maior qualidade na classificação reduziria os custos de captação de recursos por parte do banco. Observando-se os coeficientes quando comparados os resultados em todas as tabelas, percebe-se robustez desejável tanto na ordem de grandeza destes, quanto no sinal e na signi-ficância, ressaltando a boa especificação do modelo padrão. Pode ser visto ainda que, em todas as estimações, o valor do coeficiente de determinação que indica explicação por parte das variáveis explicativas é bastante elevado, assumindo va-lores acima de 0,95.

Um último aspecto a ser ressaltado seriam os testes de raiz unitária nos resí-duos de cada modelo. Em todas as especificações, com base no teste Augmented Dickey-Fuller (ADF), esclarece-se que os resíduos são estacionários, característi-ca desejável, uma vez que esta seria condição necessária para correta especificação da modelagem.

Uma diferença evidente entre este trabalho e o desenvolvido por Farinha e Marques (2002) estaria no fato de que, neste último – até mesmo no caso da presença de variáveis de ordem de integração I(1), como a oferta de crédito e os depósitos –, o problema de identificação desta modelagem completa composta pelas duas equações estruturais seria o de conseguir distinguir a equação da ofer-ta da equação da demanda de crédito. Assim, no âmbito da cointegração, este modelo de duas equações corresponderia às relações de equilíbrio de longo prazo entre as variáveis endógenas de modelo de vetores autorregressivos (VAR) que cointegra duas equações com regressores exógenos. Ainda segundo estes autores, seria preciso pressupor, então, a existência de dois vetores simples de cointegração e que os regressores exógenos fossem não cointegrados.

Por fim, as técnicas de painel utilizadas eram robustas a problemas de viés oriundos de não estacionariedade das variáveis em questão.

No caso brasileiro, hipóteses como as de que os depósitos bancários sejam exógenos em nível do banco em questão e que estes possuam variáveis explicativas diferentes das utilizadas no volume de crédito parecem ser satisfeitas. Porém, a

(Continuação)

81Análise do Impacto da Classificação de Risco no Mercado de Crédito Brasileiro

estimação pelo método MQO não é robusta à presença de caso de variáveis esta-cionárias, sendo possível que haja resultados espúrios.

Assim, visando-se obter resultados confiáveis e robustos – uma vez que o arcabouço em nível proposto é comumente marcado pela existência de variáveis não estacionárias – na obtenção dos próximos resultados reportados nas tabelas 11, 12 e 13, o artigo segue metodologicamente Engle e Granger (1987), ao incor-porar o fato de que as variáveis do modelo possam ser integradas de ordem I(1), além de determinar a relação de equilíbrio de longo prazo entre estas.7

6.3 análise de estacionariedade das séries

Inicialmente, são utilizados os tradicionais testes de raízes unitárias por Dickey e Fuller (1979; 1981) e Phillips e Perron (1988), os quais têm como hipótese nula a existência de raiz unitária em relação às variáveis econômicas – isto é, estas vari-áveis são integradas de ordem I(1).8

As ordens de integração das variáveis do arcabouço padrão listadas na tabela 7 permitem evidenciar a estacionariedade apenas da taxa real de juros, sendo as demais séries de ordem de integração I(1).

TABELA 7análise de estacionariedade das variáveis do modelo

Teste ADF de raiz unitária das séries

Variável Estatística t P-valor

ln(C/P) 1,67 1,00

ln(D/P) -0,78 0,91

R -5,211 0,00

ln(PIB) 0,99 1,00

Elaboração dos autores.Nota:1 Rejeita-se a hipótese nula de não estacionariedade a 5%.Obs.: no período de 1999-2008.

Para que essas séries sejam cointegradas, é necessário que todas possuam a mesma ordem de integração; condição atendida, uma vez que os testes para raiz unitária das variáveis volume de crédito, depósito bancário e PIB real em primeira diferença sinalizaram estacionariedade destas séries.9

7. Para mais detalhes, ver Enders (2004).8. A ordem de integração de uma variável refere-se ao número de vezes que esta variável deve ser diferenciada até que se torne estacionária. Se uma variável é integrada de ordem 1, isto significa que é necessária a aplicação do operador em diferença de ordem 1 para torná-la estacionária, e esta variável é denominada de diferença estacionária ou DS. Quando uma variável é estacionária ou integrada de ordem 0 (I(0)), sua média e sua variância são constantes ao longo do tempo e,consequentemente, valem os pressupostos dos testes t e os respectivos resultados obtidos para cada coeficiente de determinação (também denominado de R2), os quais são amplamente utilizados nos modelos de regressão.9. Esses resultados não foram reportados, mas encontram-se disponíveis com os autores.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 201282

Caso todas fossem estacionárias, não seria necessário realizar nenhuma mu-dança na técnica de estimação, sendo os resultados listados nas tabelas 4, 5 e 6 oriundos de modelagem bem especificada e corretamente estimada.

Assim, o segundo passo consiste em determinar a relação de longo prazo entre essas variáveis I(1), na forma dada pela seguinte relação:

(5)

Caso essas variáveis sejam cointegradas, uma estimação via MQO gera co-eficientes superconsistentes, os quais, segundo Stock (1987), convergiriam mais rapidamente que em estimação linear com variáveis estacionárias. Para determi-nar se as variáveis em questão são de fato cointegradas de ordem C(1,1), utilizou-se o teste padrão de cointegração proposto por Johansen, cujos resultados estão na tabela 8.

Com base nessa tabela, pode-se rejeitar a hipótese de não existência de coin-tegração a um nível de 1%, enquanto não se pode rejeitar a cointegração C(1,1) a 5% para as variáveis não estacionárias duas a duas.

TABELA 8teste de cointegração de Johansen

H0: Nenhuma cointegração

Variáveis Estatística Traço P-valor

ln(C/P) e ln(D/P) 19,431 0,01

ln(C/P) e ln(PIB) 24,431 0,00

ln(D/P) e ln(PIB) 18,091 0,02

H0: Uma cointegração

Variáveis Estatística Traço P-valor

ln(C/P) e ln(D/P) 0,72 0,39

ln(C/P) e ln(PIB) 3,73 0,05

ln(D/P) e ln(PIB) 0,08 0,78

Fonte: MacKinnon-Haug Michelis (1999).Nota:1 Rejeita-se a hipótese nula de não estacionariedade a 5%.Obs.: para p-valores, no período de 1999-2008.

Visando-se reforçar tal resultado relevante e necessário para a implementa-ção do modelo de correção de erros, utiliza-se também o teste descrito em Enders (2004), em que, para assegurar tal cointegração, o resíduo precisa ser estacioná-rio. Os resultados da relação de longo prazo estão reportados na tabela 9.

83Análise do Impacto da Classificação de Risco no Mercado de Crédito Brasileiro

TABELA 9Estimação da relação de equilíbrio de longo prazo

Parâmetro Erro padrão P-valor

-10,451 1,21 0,00

0,801 0,12 0,00

22 1,791 0,24 0,00

R2 ajustado: 0,95

Fonte: Newey e West (1987).Nota: 1 Parâmetros significativos a 5%.Obs.: estimação obtida pelo método dos MQOs, com erro padrão robusto à heterocedasticidade e à autocorrelação no período de 1999-2008.

A partir da série temporal do resíduo , utilizou-se o teste ADF, o qual pode não ser o mais adequado em razão de ser esta uma série de resíduos estimados e não propriamente o erro, e os testes de autorregressão até dois lags de defasagem.

Segundo esse último procedimento, caso o coeficiente da autorregressão realizada para N defasagens seja tal que não se possa rejeitar a hipótese nula deste ser nulo, então as variáveis não serão cointegradas.

(6)

Seria preciso, então, para dar continuidade ao procedimento de Engle e Granger (1987), que se rejeitasse a nulidade desse coeficiente, resultado observa-do em todos os testes realizados, de acordo com a tabela 10.

Tanto por via do teste de ADF como por via do procedimento descrito em Enders (2004), evidencia-se que o resíduo é estacionário, resultado este corro-borado até mesmo quando da estimação da regressão (6) sem lags da variação residual, ou, ainda, com um lag. Ressalte-se a robustez desta cointegração, com o do uso de diferentes técnicas.

TABELA 10revisitando o teste de cointegração

Teste de raiz unitária do resíduo

Resíduo Estatística t P-valor

4,852 0,00

Procedimento alternativo

Parâmetro Erro padrão P-valor

-0,371 -2,82 0,01

(Continua)

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 201284

Parâmetro Erro padrão P-valor

0,15 1,00 0,32

-0,09 -0,85 0,40

R2 ajustado: 0,20

Fonte: Newey e West (1987).Notas: 1 Parâmetros significativos a 5%.

2 Rejeita-se a hipótese nula de não estacionariedade a 5%.Obs.: estimação obtida pelo método dos MQOs, com erro padrão robusto à heterocedasticidade e à autocorrelação no período

de 1999-2008.

6.4 revisitando a especificação do modelo econométrico

Sendo as variáveis e cointegradas de ordem I(1), os resíduos obtidos podem ser utilizados na estimação do próprio mecanismo de correção de erros, segundo as seguintes relações:10

(7)

Observe-se que esse sistema, o qual corresponde ao modelo benchmark a la correção de erros, consiste em um VAR em diferenças, exceto pelos termos relacionados à taxa de juros real e de correção do erro. Portanto, esta metodolo-gia, utilizada comumente na estimação dos VARs, pode ser replicada para este sistema. É importante frisar que, sendo todas as variáveis estacionárias, diferen-temente do próprio termo do erro e da taxa de juros real, então as estatísticas empregadas tradicionalmente na análise destes modelos são apropriadas quando da estimação e da inferência dos resultados deste sistema.

Por fim, as extensões propostas neste artigo, que visam analisar o impacto do IG e das mudanças de classificação de risco de crédito no volume de crédito, serão revistas agora sob esta nova metodologia de correção de erros, sendo para tal necessário apenas acrescer ao sistema já referido termos referentes às variáveis dummy que captam tais mudanças. Os resultados da modelagem benchmak e suas extensões estão reportados nas tabelas 11, 12 e 13.

10. Esse sistema já incorpora a solução para o problema de cross-equation proposta por Engle e Granger (1987).

(Continuação)

85Análise do Impacto da Classificação de Risco no Mercado de Crédito Brasileiro

TABELA 11Estimação da modelagem benchmark à la correção de erros

Parâmetro Erro padrão Parâmetro Erro padrão Parâmetro Erro padrão

0,011 0,01 -0,00 0,01 0,01 0,01

-0,04 0,04 0,141 0,08 0,161 0,04

0,211 0,09 -0,00 0,22 0,16 0,10

-0,171 0,09 0,20 0,22 -0,16 0,10

-0,05 0,05 -0,591 0,11 0,111 0,05

-0,00 0,04 -0,381 0,10 -0,101 0,05

0,03 0,08 0,501 0,18 0,03 0,08

-0,161 0,08 0,421 0,18 -0,08 0,08

-0,00 0,01 0,01 0,01 -0,00 0,01

Elaboração dos autoresNota:1Parâmetros significativos a 5%.Obs.: refere-se ao período de 1999-2008.

De acordo com os resultados tabelados, percebe-se robustez para a maioria dos coeficientes estimados, mantendo-se em geral a significância e a ordem de grandeza, até mesmo quando da inclusão de variáveis dummy que captem o IG ou as mudanças de ratings.

É importante ressaltar que, em todas as extensões testadas, para todas as variáveis endógenas, o coeficiente associado ao termo de erro é significativo; evi-dência necessária neste tipo de modelagem. Exceto para a modelagem benchmark, tal erro parece significativo na explicação de todas as variáveis dependentes.

Para todos os casos testados neste estudo, a taxa de juros real, que na mode-lagem linear parecia ser significativa, passa a não possuir mais esta propriedade, ainda que os sinais corroborem a intuição para a maioria dos casos. De forma intuitiva e corroborando os resultados preliminares obtidos na modelagem linear, ainda que mal especificada, apenas a obtenção IG impacta positivamente e de forma significativa o volume de crédito, sendo as mudanças intermediárias de avaliação de risco insignificantes.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 201286

TABELA 12Estimação da modelagem para avaliação do impacto do ig à la correção de erros

Parâmetro Erro padrão Parâmetro Erro padrão Parâmetro Erro padrão

0,011 0,01 -0,01 0,02 0,01 0,01

-0,081 0,04 -0,161 0,09 0,181 0,04

0,191 0,09 -0,01 0,22 0,181 0,10

-0,201 0,09 0,18 0,22 -0,14 0,11

-0,081 0,05 -0,611 0,11 0,121 0,05

-0,03 0,04 -0,401 0,10 -0,081 0,05

0,01 0,07 0,481 0,18 0,04 0,08

-0,171 0,07 0,411 0,18 -0,08 0,08

0,00 0,01 0,01 0,02 -0,01 0,01

0,021 0,01 0,01 0,02 -0,01 0,01

Elaboração dos autoresNota:1Parâmetros significativos a 5%.Obs.: refere-se ao período de 1999-2008.

Variações passadas no volume de crédito parecem ser relevantes apenas em movimentos futuros deste volume, enquanto variações nos depósitos bancários impactam significativamente em todas as variáveis dependentes. Por fim, varia-ções no PIB devem gerar alterações futuras significativas apenas nos depósitos bancários, resultados intuitivos estes que podem ser mais bem visualizados com o auxílio gráfico dos impulsos-resposta apresentados no gráfico 5.

De acordo com os gráficos, os choques todos se dissipam sem gerar efeitos permanentes, característica necessária para que a modelagem de correção de erros seja adequadamente especificada e estimada. Corroborando as análises realizadas a partir dos resultados tabelados, impactos no PIB parecem afetar apenas os de-pósitos bancários, o choque é dissipado em cerca de sete meses e os choques nos depósitos bancários são capazes de impactar em até cinco meses depois o volume de crédito.

87Análise do Impacto da Classificação de Risco no Mercado de Crédito Brasileiro

TABELA 13Estimação da modelagem para avaliação do impacto das ratings à la correção de erros

Parâmetro Erro padrão Parâmetro Erro padrão Parâmetro Erro padrão

0,011 0,01 -0,01 0,02 0,01 0,01

-0,081 0,04 -0,171 0,09 0,181 0,04

0,191 0,09 -0,02 0,22 0,18 0,10

-0,201 0,09 0,18 0,22 -0,14 0,10

-0,081 0,05 -0,611 0,11 0,121 0,05

-0,03 0,04 -0,401 0,10 -0,081 0,05

0,011 0,07 0,481 0,18 0,04 0,09

-0,171 0,07 0,401 0,17 -0,08 0,08

0,00 0,01 0,01 0,02 -0,01 0,01

0,02 0,01 -0,01 0,02 -0,00 0,01

0,02 0,01 -0,00 0,02 -0,00 0,01

0,021 0,01 0,01 0,02 -0,01 0,01

Elaboração dos autoresNota:1Parâmetros significativos a 5%.Obs.: refere-se ao período de 1999-2008.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 201288

GRÁFICO 5impulso-resposta do modelo de correção de erros (cholesky)

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

-1,5-1,0-0,50,00,51,01,52,02,53,03,5

-2,0-1,5-1,0-0,50,00,51,01,52,02,5

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

-1,5

-1,0

-0,5

0,0

0,5

1,0

1,5

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

-7,0

-5,0

-3,0

-1,0

1,0

3,0

5,0

7,0

9,0

-2,0

-1,5

-1,0

-0,5

0,0

0,5

1,0

1,5

2,0

-1,5

-1,0

-0,5

0,0

0,5

1,0

-1,5

-1,0

-0,5

0,0

0,5

1,0

-2,0

-1,0

0,0

1,0

2,0

3,0

-1,0-0,50,00,51,01,52,02,53,03,54,0

PIB → PIB

PIB → Depósito

PIB → CréditoDepósito → Crédito

Depósito → Depósito

Depósito → PIBCrédito → PIB

Crédito → Depósito

Crédito → Crédito

Elaboração dos autores.

7 coNclusÕEs

Um dos principais tópicos de estudo na literatura de sistema financeiro e desen-volvimento sob arcabouços de política monetária consiste em analisar relações entre variáveis, como riqueza, taxa de juros e políticas no mercado de crédito, assim como mudanças de classificação de risco de crédito e incentivos a depósitos bancários. Neste contexto, evidenciaram-se a significância e o sinal positivo do impacto da obtenção do IG no volume de crédito da principal instituição de cré-dito no Brasil, sob arcabouço de transmissão de política monetária.

Visando-se atentar aspectos econométricos intrínsecos a modelagens que possuam variáveis não estacionárias, as análises das relações de equilíbrio são re-alizadas via modelagem linear e por intermédio da respectiva modelagem de cor-reção de erros, sendo possível obter resultados robustos e intuitivos, segundo os quais mudanças intermediárias da classificação de risco de crédito não parecem ser significativas; apenas a obtenção do IG é, de fato, relevante neste mercado de crédito. Os resultados sobre os impactos oriundos de choques em taxas de juros reais são contraditórios, não sendo possível afirmar a eficiência da política monetária conduzida no regime de metas inflacionárias no estímulo ao mercado de crédito ou no crescimento do PIB, resultados já obtidos em estudos anteriores realizados pelo Tesouro Nacional.

89Análise do Impacto da Classificação de Risco no Mercado de Crédito Brasileiro

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Originais submetidos em setembro de 2010. Última versão recebida em janeiro de 2012. Aprovado em fevereiro de 2012

solvÊNcia E rEação Fiscal das admiNistraçÕEs PÚBlicas muNiciPais No BrasilAndrei Gomes Simonassi*Ronaldo de Albuquerque e Arraes**Francisca Lívia Souza Menezes***Denise Xavier Araujo****

O artigo centra-se na aplicação de duas metodologias mundialmente aceitas em sustentabilidade da política fiscal, conduzidas em grupos regionais de municípios brasileiros, bem como em subamostra temporal pós-2002. As verificações empíricas são realizadas para cinco regiões brasileiras e seis mesorregiões. Muito embora seja constatado o atendimento às restrições orçamentárias intertemporais, os resultados para as funções de reação estimadas indicam, com robustas evidências estatísticas, que: i) no período 2000-2008, as prefeituras das regiões Nordeste e Sudeste não praticam políticas fiscais ativas de geração de superávit primário ao aumento da dívida pública; ii) distinguem-se efeitos diferenciados entre mesorregiões quando se incluem as capitais: a situação de insolvência no Nordeste advém das mesorregiões que incluem suas capitais; e iii) a adequação das prefeituras à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), o crescimento econômico nacional e a mudança político-ideológica da esfera federal pós-2002 surgem como fatores explicativos às mudanças nas condições de solvência para a subamostra investigada.

Palavras-chave: restrição orçamentária intertemporal; reação fiscal; municípios brasileiros.

solvENcY aNd Fiscal rEactioN oF PuBlic admiNistratioNs iN BraZiliaN muNiciPalitiEs

The article focuses on the application of two worldwide adopted methodologies on fiscal policy to regional groups of municipalities in Brazil, as well as in a post-2002 sample. The empirical tests are performed for five regions and six mesoregions. Although the temporal budget constraints are accomplished, the results for the estimated reaction functions indicate, with robust statistical evidence, that: i) in the period 2000-2008 municipality administrations in the Northeast and Southeast regions do not adopt active fiscal policies to generate primary surplus as public debt increase, ii) there are distinguished effects among mesoregions as the state capitals are included in the analysis; in this regard, the status of insolvency in the Northeast is due to the mesoregions that include a state capital; and iii) the adequacy of local governments to the Law of Fiscal Responsibility (LRF), the national economic growth and political-ideological change in federal government post-2002 emerge as explanatory factors to the occurrence of solvency fiscal situation in the Brazilian municipalities.

Keywords: temporal budget constraint; fiscal reaction; Brazilian municipalities.

* Professor da Pós-Graduação em Economia da Universidade Federal do Ceará (CAEN/UFC). Endereço eletrônico: <[email protected]>.** Professor do CAEN/UFC. Endereço eletrônico: <[email protected]>.*** Mestranda em economia pelo CAEN/UFC. Endereço eletrônico: <[email protected]>.**** Mestranda em economia pelo CAEN/UFC. Endereço eletrônico: <[email protected]>.

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solvENcia Y rEacciÓN Fiscal dE las admiNistracioNEs PÚBlicas EN los muNiciPios BrasilEÑos

El artículo se centra en la aplicación de dos metodologías en todo el mundo adoptaron en la política fiscal a los grupos regionales de los municipios de Brasil, así como en una muestra post-2002. Las pruebas empíricas se llevan a cabo en cinco regiones y seis meso regiones. A pesar de las limitaciones presupuestarias temporales se llevan a cabo, los resultados de las funciones de reacción estimados indican, con evidencia estadística sólida, que: i) en las administraciones municipio período 2000-2008 en las regiones noreste y sudeste de no adoptar políticas fiscales activas para generar superávit primario como el aumento de la deuda pública, ii) hay efectos distinguido entre meso regiones como las capitales estatales están incluidos en el análisis, en este sentido, el estado de insolvencia en el noreste se debe a la meso regiones que incluyen la capital del estado, y iii) la adecuación de los gobiernos locales para Ley de Responsabilidad Fiscal (LRF), el crecimiento económico nacional y el cambio político-ideológica en el gobierno federal después de 2002 surgen como factores explicativos de la ocurrencia de la situación de solvencia fiscal de los municipios brasileños.

Palavras-clave: restricción presupuestaria temporal; reacción fiscal, municipios brasileños.

solvaBilitE Et dE rEactioN BudgEtairE dEs admiNistratioNs PuBliQuEs daNs lEs muNiciPalitEs BrEsiliENNEs

L’article se concentre sur l’application de deux méthodologies adoptées dans le monde entier sur la politique budgétaire aux groupes régionaux de municipalités au Brésil, ainsi que dans un échantillon prélevé après-2002. Les tests empiriques sont effectuées pour cinq régions et six mes régions. Bien que les contraintes budgétaires temporelles sont accomplis, les résultats pour les fonctions de réaction estimées montrent, avec les preuves statistiques solides, que: i) dans les administrations de la période 2000-2008 municipalité dans le Nord et les régions du Sud de ne pas adopter des politiques fiscales dynamiques pour générer un excédent primaire que l’augmentation de la dette publique, ii) il ya des effets distingué parmi mes régions comme les capitales d’Etat sont inclus dans l’analyse; à cet égard, le statut de l’insolvabilité dans le nord-est due à la mes régions qui incluent une capitale de l’Etat; et iii) l’adéquation des les gouvernements locaux à Loi de Responsabilité Budgétaire (LRF), la croissance économique nationale et politico-idéologiques changement de gouvernement fédéral après-2002 émergent comme facteurs explicatifs de la survenance de la situation de solvabilité budgétaire dans les municipalités brésiliennes.

mots-clés: contrainte budgétaire temporelle; réaction budgétaire; municipalités brésiliennes.

JEL: H72; C23.

1 iNtrodução

A consolidação da estabilidade econômica, assegurada após as crises cambiais do fim da década de 1990, quando se iniciou um período de mais intenso cres-cimento da economia brasileira, tornou mais factível o aumento das receitas próprias das administrações públicas municipais, viabilizando a consecução de sua autonomia financeira.

93Solvência e Reação Fiscal das Administrações Públicas Municipais no Brasil

Mesmo no caso dos estados economicamente menores, em que a solvência das finanças municipais depende fundamentalmente de transferências da União e do estado, se a gestão dos prefeitos não comprometer um eventual crescimento da arrecadação ou do montante transferido, a dependência fiscal das prefeituras é reduzida com a evolução da economia nacional. Neste caso, a questão da sol-vência perde espaço na agenda dos formuladores de política, e a consequência imediata é a viabilidade de execução de um conjunto de estratégias que permitam o desenvolvimento municipal.

Talvez estimulado pelo desempenho econômico da última década e pelo respectivo aumento das receitas municipais, o persistente debate acerca da criação de novos municípios se acirra. Mais de oitocentas localidades se mostraram candi-datas à emancipação nas diversas assembleias legislativas do país, e em uma região menos desenvolvida como a nordestina, por exemplo, tais pedidos já somam mais de trezentos. Isto certamente pode ser um fator gerador de crise financeira para muitos municípios, pois a reduzida participação da receita tributária na receita total, consequentemente, faz com que haja pouca ou nenhuma capacidade de geração de renda via meios fiscais por parte das prefeituras.

Diante deste quadro, é primordial analisar a situação fiscal local como pré-requisito para eventuais concretizações de emancipação, uma vez que o efeito marginal gerado por cada novo município induz um redutor progressivo na par-cela de recursos destinada aos demais e, possivelmente, em um aumento da fragi-lidade do equilíbrio financeiro municipal.

O primeiro obstáculo à realização de uma análise acurada acerca da solvên-cia das prefeituras é a heterogeneidade econômico-financeira entre os municípios brasileiros. Considerando os avanços recentes nos métodos de estimação em pai-nel, pretende-se contribuir com o debate sobre este tema analisando a solvência das administrações municipais do Brasil a partir de duas abordagens consolida-das na literatura nacional e internacional de finanças públicas: i) o atendimen-to à restrição orçamentária intertemporal; e ii) a resposta da entidade pública, em termos de geração de superávit primário, aos eventuais aumentos da dívida. Mais especificamente, o estudo almeja contribuir com subsídios a, pelo menos, três questionamentos: i) em relação ao que pode ser dito acerca da solvência das prefeituras no Brasil; ii) se existem diferenças regionais entre as políticas fiscais seguidas pelos administradores públicos municipais; e iii) se houve mudança de perfil no desempenho financeiro municipal após a mudança político-ideológica no Brasil do período FHC para o período Lula.

Além da desagregação ao nível de macro e mesorregiões, a metodologia em-pregada neste estudo amplia propostas anteriores, ao executar as duas abordagens empíricas propostas seguindo a literatura tradicional de sustentabilidade da dívida

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 201294

pública. Inova, ainda, com a abordagem econométrica citada anteriormente, e de-monstrando que, muito embora a solvência das administrações municipais não esteja comprometida, a capacidade de geração de superávit primário a eventuais elevações na dívida pública é um fator preocupante em algumas regiões.

Nesse sentido, os modelos tradicionais a efeitos fixos e aleatórios e os avan-ços em técnicas de raiz unitária propostos por Levin, Lin e Chu (2002) e Im, Pesaran e Shin (2003) deram suporte à execução do presente estudo, o qual se di-vide em cinco seções além desta introdução. Na seção dois, discute-se a literatura associada ao tema; na seção três são apresentadas as duas metodologias a serem aplicadas nos exercícios empíricos explicitados na seção quatro, cujos resultados são discutidos na seção cinco. Em seguida, conclui-se com a seção seis.

2 sustENtaBilidadE da PolÍtica Fiscal Na litEratura

O artigo seminal de Hamilton e Flavin (1986) representa o marco na literatura relacionada à solvência das administrações públicas. Considerando a restrição or-çamentária intertemporal (ROI) de cada economia, o conceito de sustentabilida-de da política fiscal está relacionado à estacionariedade da série de déficit público. Em outras palavras, a rejeição da hipótese nula de raiz unitária sobre a referida série implicaria que o déficit seria consistente com a ROI do governo.

Os avanços da econometria em testes de raiz unitária e a possibilidade de execução destes em uma estrutura de dados em painel motivam o primeiro exercí-cio empírico deste artigo, apresentado na seção quatro, no sentido de investigar a solvência das administrações públicas municipais brasileiras. Para tanto, estende-se a proposta de Hamilton e Flavin (1986) para esta disposição dos dados amostrais.

Em nível nacional, Rocha (1997) conduz uma análise baseada em técnicas de cointegração e aplica a proposta de Bohn (1991) aos dados do Brasil no perí-odo 1980-1993. O pressuposto para a sustentabilidade da política fiscal estaria associado à cointegração entre as variáveis gasto e receita pública. O estudo de Rocha conclui que gastos e receitas cointegram, de modo que o déficit orçamen-tário é estacionário.

Em nova abordagem, Bohn (1998) propõe um novo teste para a solvên-cia de uma economia, que tem a vantagem de ser independente de qualquer hipótese sobre o comportamento da taxa de juros. Seguindo esta metodologia, para que a restrição orçamentária intertemporal do governo seja satisfeita, é suficiente que o superávit primário aumente quando a razão entre a dívida e o produto interno bruto (PIB) se eleva. Ou seja, se o superávit primário reage positivamente a aumentos desta razão, entende-se que a administração pública pratica uma política fiscal ativa e, portanto, não haverá razões para crer que esta economia venha a ser insolvente.

95Solvência e Reação Fiscal das Administrações Públicas Municipais no Brasil

Essa nova proposta, que também será considerada neste trabalho, corrobora a ideia de Goldfajn (2002), segundo o qual o principal problema, em termos de endividamento no Brasil, não é a relação dívida/PIB per se, mas, sim, a evolução recente deste indicador. O ponto central é, então, verificar se existe uma política ativa de geração de superávit primário ao aumento da dívida pública. E a partir disto, a ideia do segundo exercício, apresentado na seção quatro, será fundamen-tada na resposta do governo em termos desta geração de superávit primário para estabilizar a relação dívida/PIB municipal.

Garcia e Rigobon (2004) estudam a dinâmica futura da dívida brasileira a partir da perspectiva de gerenciamento de risco (risk management). Seguindo o comentário de Goldfajn (2004), o gerenciamento de risco considera que a equa-ção de acumulação de dívida, por parte de qualquer país, envolve variáveis que estariam estocasticamente influenciando umas às outras. O procedimento formal é especificar um modelo autorregressivo vetorial (VAR) para estimar o padrão das correlações entre as variáveis macroeconômicas e utilizar a matriz de correlações para a condução de simulações de Monte Carlo. Deste modo, é possível calcular a probabilidade de que a simulação da relação dívida/PIB ultrapasse um determi-nado valor (por exemplo, 75%) e, posteriormente, comparar esta probabilidade com a percepção de risco do mercado que, no caso do artigo supracitado, é dada pelo índice para os títulos de países emergentes (Emerging Markets Bond Index – Embi). Constata-se, por fim, que, apesar de a dívida ser sustentável em média – e em um ambiente sem risco –, existem diversas trajetórias nas quais a política fiscal não seria sustentável.

Ademais, ressalte-se que a maioria dos estudos desenvolvidos no Brasil es-taria sujeita à imprecisão das modelagens desenvolvidas a partir da utilização do histórico de gastos e receitas públicas no Brasil, visto que, quanto mais longas são as séries históricas sobre as rubricas de finanças públicas, mais imprecisas são as informações.

Investigando a sustentabilidade da política fiscal brasileira no período 1966-1996, Luporini (2000) constata mudanças estruturais no comportamento do indicador dívida/PIB advindas dos efeitos do choque do petróleo em 1979 sobre as contas nacionais. O procedimento adotado para contornar o proble-ma consiste em dividir a amostra em dois subperíodos delimitados pelo ano de 1980. Seus resultados sugerem que, para o período amostral completo e na subamostra 1966-1980, a dívida pública seguiu uma trajetória sustentável, não verificada na análise pós-1980.

Outro obstáculo à condução desse tipo de investigação, igualmente asso-ciado ao uso de séries temporais para as rubricas de receita e despesa no Brasil, reside na não incorporação dos denominados “esqueletos da dívida pública” e/ou

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investimentos de empresas estatais no cômputo gasto público. Goldfajn (2002), utilizando dados a partir de 1998, ressalta esta proposição e realiza simulações com diferentes cenários econômicos de longo prazo para a economia brasileira, para inferir sobre a sustentabilidade da razão dívida/PIB na década seguinte. Mesmo para cenários conservadores quanto à taxa de crescimento do PIB e do superávit fiscal, a conclusão é favorável à sustentabilidade da dívida.

Nesse sentido, o segundo exercício empírico proposto será fundamentado na abordagem mais recente de Bohn (2006), que apresenta uma crítica formal às técnicas tradicionais de testes de estacionariedade e cointegração. Mostra-se que a solvência do governo é obtida mesmo que a dívida seja estacionária a partir de qualquer número finito de diferenciações; ou seja, a ROI continua satisfeita se receitas e gastos são estacionários em diferenças para qualquer ordem arbitrária e sem qualquer pré-requisito de cointegração. Deste modo, tem-se uma ampla classe de processos estocásticos que violam as condições de estacionariedade e cointegração tradicionais para testes de sustentabilidade da política fiscal, mas continuam satisfazendo a ROI. A implicação testável deste argumento é que a prática comum de julgar se determinado governo é ou não solvente a partir de testes de raiz unitária e cointegração é falha.

O estudo de Bohn (2006) sustenta ainda que as abordagens que analisam sustentabilidade via estimação da função de reação do governo são mais promisso-ras no entendimento do comportamento dos déficits e, por isto, será considerado como a segunda metodologia, apresentada na seção quatro. Adicionalmente, para maior homogeneidade e acurácia dos dados relacionados às rubricas de finanças públicas, o exercício será conduzido a partir de uma estrutura de dados em painel, em que são considerados os municípios brasileiros, no período 2000-2008 e em subperíodos, conforme descrito nas seções seguintes.

3 EvidÊNcia EmPÍrica

As principais variáveis utilizadas nas duas abordagens empíricas deste estudo são o passivo real, o resultado orçamentário e o resultado primário das prefeituras brasileiras no período 2000-2008.

O passivo real compreende a soma do passivo financeiro – compromissos cujo pagamento independe de autorização orçamentária – com o não financei-ro obrigações que dependem de autorização orçamentária para suas liquidações ou pagamentos representados por dívidas de longo prazo. Na ausência de uma rubrica específica para o estoque da dívida pública das administrações munici-pais, toma-se esta como proxy1 para viabilizar o segundo exercício empírico a ser

1. Com exceção de um deslocamento em nível, o passivo real incorpora todos os fatores que determinam o montante da dívida pública municipal. Dado um estoque inicial, acredita-se que as oscilações deste indicador serão, portanto, captadas por esta variável.

97Solvência e Reação Fiscal das Administrações Públicas Municipais no Brasil

descrito na próxima seção. Da forma tradicional, os resultados orçamentários e primários representam as diferenças entre receitas e despesas governamentais, em que o último difere do primeiro por excluir os pagamentos com juros sobre a dívida pública preexistente.

A condição de sustentabilidade da dívida de uma economia depende do comportamento do resultado fiscal e da dívida pública. A ideia mais recen-te defendida na literatura baseia-se no comportamento do resultado primário em relação ao estoque da dívida.2 Como o fluxo (resultado) negativo favorece o incremento do estoque de dívida, tendências descendentes dos resultados orça-mentários e primários associadas ao aumento do passivo real sinalizam para uma condição de insolvência das prefeituras.

O gráfico 1 mostra a trajetória das variáveis de interesse para os municípios brasileiros no período de 2000 a 2008. O eixo da esquerda mostra os valores referentes ao passivo real, enquanto o da direita apresenta os valores relativos ao resultado primário. De acordo com a média para 3.939 municípios incluídos na amostra final,3 ocorrem dois períodos distintos de certa estabilidade do passivo real como proporção do PIB municipal, intercalados por um período de pico em 2005, quando esta relação atinge 6,36%.

GRÁFICO 1Passivo real e resultado primário como proporções do PiB municipal no Brasil (2000-2008)

0

0,01

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2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008

Resultado primário PIB Passivo real PIB

Fonte: Brasil (2009). Elaboração dos autores.

2. Com um exercício fiscal de defasagem.3. A amostra final foi obtida após processo de filtragem descrito na seção quatro, visando à exclusão de municípios com informações discrepantes.

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Em relação ao comportamento do resultado primário como proporção do PIB, são constatados quatro períodos distintos: i) entre 2001 e 2003, uma tendência descendente do indicador, condizente com uma situação que levaria à insolvência; ii) uma resposta positiva do resultado primário de 2003 a 2005; iii) novo agravamento da situação fiscal média das prefeituras entre 2005 e 2006; e iv) uma tendência ascendente a partir de 2006, evidenciando um novo comportamento positivo por parte dos administradores públicos locais, haja vista que, mesmo controlado pelo crescimento econômico verificado no perí-odo, o indicador, que era 0,15% em 2006, passa a representar 0,62% do PIB em 2008. Este resultado, associado à estabilidade da relação passivo real/PIB em torno de 5,1%, confirma a evolução fiscal média das prefeituras brasileiras a partir de 2006.

Vale ainda destacar o possível efeito dos ciclos políticos determinando o movimento oscilatório do resultado primário municipal. Note-se que o período de análise engloba três anos de eleições municipais: 2000, 2004 e 2008. Muito embora tais períodos sejam marcados por superávits, a limitação dos gastos em períodos eleitorais prevista na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) pode im-plicar antecipações de despesas por parte dos gestores e, assim sendo, resultados negativos nos anos “pré-eleitorais” não surpreenderiam. Em 2003, observa-se um expressivo déficit, mas, em 2007, este resultado não se repete, levando a crer que, se este ciclo existe, não há sincronia. Registre-se, todavia, que a investigação acerca da existência de ciclos políticos no orçamento municipal não é objeto de interesse nesta análise.

Tendo em vista a grande quantidade e a heterogeneidade dos municípios brasileiros, uma análise que envolva agregação pode induzir a conclusões dis-torcidas da realidade para muitos deles. Assim, optou-se por conduzir os dois exercícios apresentados na próxima seção de forma desagregada para regiões geo-gráficas, macro e mesorregiões, e em subperíodos.

A primeira desagregação leva em consideração as cinco regiões brasileiras definidas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e a segunda, para o período pós-2002, visando eliminar eventuais influências de mudanças ideológicas da União sobre os orçamentos municipais.4 Para explicitar os possíveis impactos regionais sobre o equilíbrio fiscal dos municípios, o gráfico 2 adiante apresenta a evolução do PIB municipal por região no Brasil de 2000 a 2007.5

4. Conforme se discute na literatura de ciência política, não é negligenciável o efeito do alinhamento político entre as esferas de governo sobre as transferências de recursos. Assim sendo, esta desagregação visa eliminar os impactos da mudança de governo do período FHC para o período Lula. 5. Última informação disponível.

99Solvência e Reação Fiscal das Administrações Públicas Municipais no Brasil

GRÁFICO 2 Evolução do PiB municipal (preços constantes de 2000) por regiões brasileiras (2000-2008)

0

200

400

600

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1000

Norte Centro-Oeste Nordeste Sul Sudeste

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008

Fonte: Ipeadata. Disponível em: <http://www.ipeadata.gov.br/>.Elaboração dos autores.

A região Sudeste, como a mais rica, apresentou em 2007 uma participação de 56,4% no PIB municipal do país, contrastando com os 5,0% da região Nor-te. Além disso, enquanto a tendência acentuada de crescimento dos municípios do Sudeste reflete o crescimento econômico do país neste período, a evolução do PIB municipal nas regiões economicamente menores, como Norte e Centro-Oeste, é bastante modesta. Este fenômeno implica menor margem para elevação dos gastos nas prefeituras destas regiões.

A região Nordeste, por outro lado, cujo crescimento é geralmente afetado por contingências em decorrência principalmente de aspectos naturais, apre-sentou, no período 2000-2007, um crescimento econômico médio municipal superior (38,0%) ao dos municípios do Sul-Sudeste (35,0%). Não obstante, a participação do PIB dos municípios nordestinos ao longo deste período perma-nece estável em torno de 13,0%, enquanto, no Sul-Sudeste, esta parcela é de aproximadamente 73,0%.

Esse cenário de dimensão econômica denota claramente as disparidades existentes entre as regiões, o que comprova a escolha metodológica por conduzir a análise de maneira descentralizada.

Após analisar a evolução do perfil econômico municipal por regiões bra-sileiras, é de extrema relevância a verificação do equilíbrio fiscal a partir dos demonstrativos financeiros destas. A exemplo do gráfico 1, o gráfico 3 ilustra

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o comportamento da proxy de dívida utilizada em relação ao déficit primário em cada região no período analisado, nas mesmas bases de desagregação do gráfico 2.

GRÁFICO 3Passivo real e resultado primário por região como proporções do PiB municipal

3A – Centro-Oeste

3C – Norte

3E – Sul

3B – Nordeste

3D – Sudeste

Resultado primário PIB Passivo real PIB

Méd

ia

Fonte: Brasil (2009).Elaboração dos autores.

101Solvência e Reação Fiscal das Administrações Públicas Municipais no Brasil

O comportamento cíclico do indicador de resultado primário verifica-do em todas as regiões pode ser causado por oscilações nas transferências de recursos aos municípios em cada ano ou por diferenças de crescimento eco-nômico.6 O primeiro fator é tão mais forte quanto mais pobre é a economia, como nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, onde as prefeituras têm a rubrica de transferências correntes como meio para consecução do equilíbrio fiscal. Nas regiões mais desenvolvidas, por sua vez, há maior capacidade para geração de superávit. Destaca-se o comportamento médio do indicador para as prefeituras da região Sul, que, no período em análise, não apresentou situ-ação de déficit.

À exceção da região Centro-Oeste, a média do indicador proxy para a razão dívida/PIB municipal apresenta uma tendência ascendente em todas as regiões, no período 2000-2008, com uma inflexão que sinaliza a redução do estoque no ano de 2004. Nos municípios do Centro-Oeste, Sudeste e Sul, as datas para os “picos e vales” são inclusive similares. Ademais, reconhecen-do que, mesmo em nível regional, a heterogeneidade persiste, a investigação proposta especializa ainda mais ao promover uma desagregação em nível de mesorregiões brasileiras.

O IBGE agrupa os municípios das cinco regiões brasileiras em 137 me-sorregiões, mas muitas delas possuem um número muito reduzido de unidades, enquanto em outras vários municípios apresentam informações conflitantes, principalmente no Norte e no Centro-Oeste. Visando à execução de um exercício empírico detalhado e, ao mesmo tempo, factível, propõe-se uma análise das me-sorregiões segundo dois critérios: i) a análise compreende apenas os municípios das três regiões economicamente maiores; e ii) para cada uma das três regiões restantes – Nordeste, Sudeste e Sul –, as mesorregiões foram divididas em dois grupos, o primeiro com aquelas nas quais se inserem as capitais estaduais, e o segundo, com as demais mesorregiões.

Dessa forma, o agrupamento das mesorregiões resulta em um total de seis grupos, que serão doravante assim denominados: Capitais Nordeste (NE), Demais Nordeste (NE), Capitais Sudeste (SE), Demais Sudeste (SE), Capitais Sul (S) e De-mais Sul (S).7 Tomando como exemplo a região Sul, tem-se que o grupo de mesor-região denominado Capitais Sul engloba as seguintes mesorregiões: Metropolitana de Curitiba, Grande Florianópolis e Metropolitana de Porto Alegre. Por sua vez, o grupo de mesorregião denominado Demais Sul engloba todas as mesorregiões da região Sul, exceto as três mencionadas. A figura 1 resume a desagregação proposta.

6. E seus efeitos sobre as receitas tributárias municipais.7. A lista de mesorregiões referentes às capitais encontra-se no anexo A.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012102

FIGURA 1grupo de mesorregiões

Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).Elaboração dos autores.

As estatísticas descritivas para o superávit primário e passivo real são apresentadas na tabela 1 para os seis grupos de mesorregiões propostos no período de 2000 a 2008. Não obstante, conforme citado anteriormente, visando expurgar quaisquer influências da mudança político-ideológica da União sobre o desempenho fiscal municipal, uma nova especialização tam-bém adequada aos exercícios empíricos apresentados nas seções seguintes requer a apresentação destas medidas para a subamostra de 2003 a 2008. Note-se que, em vários casos, as diferenças entre as médias dos indicadores são expressivas.

103Solvência e Reação Fiscal das Administrações Públicas Municipais no Brasil

TABELA 1superávit primário e passivo real como proporção do PiB(Em %)

Mesorregiões2000-2008 2003-2008

Superávit primário Passivo real Superávit primário Passivo real

Capitais Nordeste 0,28 9,38 0,29 12,15

Demais Nordeste 0,12 6,83 0,12 7,32

Capitais Sudeste 0,18 5,17 0,28 5,21

Demais Sudeste 0,27 4,40 0,31 4,46

Capitais Sul 0,69 3,95 0,75 4,17

Demais Sul 0,57 3,06 0,59 2,95

Brasil 0,31 4,76 0,34 4,98

Fonte: Brasil (2009).Elaboração dos autores.

Verifica-se que os grupos de mesorregiões que mantêm a maior e a me-nor média de superávit primário nos dois períodos amostrais são Capitais Sul e Demais Nordeste, respectivamente. Tais resultados permanecem no período pós-2002.

Em relação ao passivo real, a maior média nos dois períodos é verificada na mesorregião que compreende as capitais nordestinas, com uma participação superior ao triplo da verificada na mesorregião Demais Sul, que detém a menor média de participação desta proxy para a relação dívida/PIB.

Comparando com a média nacional, para ambos os períodos amostrais, os dois grupos de mesorregiões da região Nordeste apresentam médias inferiores em termos de superávit primário e superiores em termos de passivo real. Nos dois grupos de municípios para região Sul, verifica-se uma situação inversa destas duas rubricas. Finalmente, as mesorregiões do Sudeste apresentam comportamentos médios intermediários para os indicadores analisados.

A fim de explicitar a evolução desses principais indicadores para fluxo e estoque de recursos municipais, a tabela 2 apresenta a taxa de crescimento entre da média do superávit primário e do passivo real para os grupos de mesor regiões estudados entre 2000 e 2008. Percebe-se que, apenas nos grupos de mesorregiões da região Nordeste, a taxa de crescimento da média do superávit primário foi inferior à taxa de crescimento do passivo real.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012104

TABELA 2taxa de crescimento do superávit primário e passivo real(Em %)

MesorregiõesTaxa de crescimento

Superávit primário Passivo real

Capitais Nordeste 2,72 29,48

Demais Nordeste -4,14 7,08

Capitais Sudeste 49,93 0,90

Demais Sudeste 18,03 1,26

Capitais Sul 8,43 5,61

Demais Sul 3,23 -3,55

Brasil 10,03 4,54

Fonte: Brasil (2009).Elaboração dos autores.

Os resultados dispostos nas tabelas 1 e 2 reforçam a opção metodológica de conduzir os exercícios empíricos especializando a análise em subgrupos regionais e subamostras.

4 asPEctos mEtodolÓgicos: duas aBordagENs Em sustENtaBilidadE da PolÍtica Fiscal

Conforme dito nas seções anteriores, este estudo se fundamenta em duas aborda-gens empíricas complementares seguindo a literatura tradicional em sustentabili-dade da política fiscal. A partir dos avanços relacionados à econometria de dados em painel, a primeira verificação empírica baseia-se no atendimento à restrição orçamentária intertemporal (ROI) das prefeituras brasileiras, enquanto a segunda investiga se há uma política fiscal ativa por parte das prefeituras em termos de geração de superávit primário a eventuais aumentos da dívida pública.

As duas abordagens metodológicas serão utilizadas considerando os muni-cípios brasileiros em sua totalidade e de forma desagregada, sendo esta realizada tanto para as regiões, quanto para as mesorregiões, de acordo com a divisão de-talhada na seção anterior. Adicionalmente, cada exercício é conduzido em dois períodos: i) a partir da implementação da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), de 2000 a 2008; e ii) no período de 2003 a 2008.

Embora, como já frisado, a questão da influência política sobre o desempe-nho fiscal não seja foco deste estudo, a condução do exercício em subamostras, notadamente o segundo período, justifica um período pós-adequação das admi-nistrações públicas municipais à LRF em face da plausível hipótese de haver um período de ajuste para sua implementação permanente. Além disto, este período é marcado por um mesmo regime político-ideológico na administração federal.

105Solvência e Reação Fiscal das Administrações Públicas Municipais no Brasil

4.1 Base de dados

Informações sobre a situação contábil dos municípios foram obtidas, em frequên-cia anual, no período de 2000 a 2008, por meio da Secretaria do Tesouro Nacio-nal (Brasil, 2009). Com duas metodologias econométricas adequadas à teoria já consolidadas para painéis balanceados, adotou-se, como critério de seleção amos-tral, que as prefeituras que não disponibilizassem os demonstrativos em algum período seriam excluídas da análise.8

Além deste “filtro”, para expurgar da amostra dados inconsistentes, foram utilizados alguns “critérios de filtragem”, que consistem na exclusão dos muni-cípios que apresentaram alguma característica considerada discrepante entre as relacionadas a seguir.

• relação receita orçamentária/PIB ou despesa orçamentária/PIB maior que 1;

• dados referentes à receita orçamentária ou despesa orçamentária, em valor absoluto, iguais a zero;

• relação despesa com pessoal/PIB maior que 0,9; e

• informações referentes ao passivo real menores ou iguais a zero.

Desse modo, a amostra final compreendeu 3.939 dos 5.0509 municípios brasileiros.10 Em ambas as metodologias, as variáveis foram analisadas como pro-porção do PIB municipal, sendo esta informação provida pelo Ipeadata.11

4.2 a condição de solvência a partir do atendimento à roi

Seguindo a abordagem de Hamilton e Flavin (1986), neste primeiro exercício, estende-se a análise da restrição orçamentária intertemporal do setor público para todos os municípios brasileiros, para cada região e para os seis grupos de mesor-regiões definidos na seção três da seguinte forma, para o total dos municípios e para as subdivisões utilizadas:

(1)

8. Muito embora seja possível argumentar acerca de possível problema de viés de seleção, a amostra final, que engloba cerca de 78% do total de municípios no Brasil, é bastante representativa, principalmente nas três principais regiões do país analisadas de forma desagregada.9. Dado referente ao ano de 2008.10. A amostra final é a mesma utilizada para elaboração dos gráficos e cálculos das estatísticas apresentadas na seção 3. 11. Disponível em: <http://www.ipeadata.gov.br/>.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012106

Onde:

i = 1, ..., I indexa os municípios incluídos na amostra, e t = 2000, ..., 2008, o período para composição do painel de dados;

valor da dívida da administração pública municipal i no período t;

valor da taxa de juros da economia em cada período (que deve ser a mesma para todas as prefeituras);

gastos da administração pública municipal i no período t;

receitas da administração i no período t; e

I representa o total de municípios analisados no agregado ou em cada região.

A equação (1) mostra que, para haver um equilíbrio nas contas municipais, os gastos com bens e serviços e pagamento de juros sobre o estoque passado da dívida pública devem ser financiados via arrecadação de tributos ou contraindo/elevando a dívida pública. Resolvendo a expressão (2) olhando para frente,12 tem-se que:

(2)

Assumindo que o governo não adota um esquema do tipo Ponzi, ou seja, não sendo possível uma política fiscal baseada em refinanciamentos infinitos, em (3) deve ser válido que:

(3)

Assim, a equação (2) se reduz a:

(4)

Dessa forma, para que a política fiscal do governo seja sustentável, é necessário que o estoque da dívida global de cada grupo de administrações municipais em determinada data seja igual ao valor presente da soma dos superávits esperados para o futuro nestes grupos. Estendendo novamente o argumento proposto na análise de Hamilton e Flavin (1986), tem-se que se o déficit orçamentário das prefeituras brasileiras, de suas regiões ou grupo de mesorregiões segue um processo estacionário, a dívida também será estacio-nária e as prefeituras serão consideradas solventes. Na prática, esta solvência será investigada através de um teste de raiz unitária em painel sobre a série de déficit público.13

12. Em inglês: forward-looking.13. Para este exercício será utilizado o déficit nominal como proporção do PIB municipal.

107Solvência e Reação Fiscal das Administrações Públicas Municipais no Brasil

4.3 raiz unitária

Quando comparados a uma estrutura de séries temporais, os dados em painel permitem a realização de testes de raiz unitária com maior potência, haja vista que a utilização das duas dimensões eleva o tamanho da amostra. Existem vários testes de raiz unitária para dados em painel, mas é possível agregá-los em dois grupos: um reúne os que supõem a existência de um processo de raiz unitária comum entre os cross-sections e outro corresponde aos que admitem que este processo seja individual.

Neste primeiro exercício empírico, são realizados dois testes de raiz unitária em painel: o primeiro seguindo a proposta de Levin, Lin e Chu (2002) – dora-vante LLC (2002) –, que integra o primeiro grupo, e o segundo, de acordo com Im, Pesaran e Shin (2003) – doravante IPS (2003) – inserido no segundo grupo citado acima. A principal limitação destes testes é que eles supõem que os cross-sections são independentes, quando a literatura fornece evidências contrárias a esta hipótese. Entretanto, acredita-se que a dependência do equilíbrio financeiro municipal se dá muito mais em relação às esferas maiores de governo14 e, deste modo, tal limitação não afeta os resultados deste estudo, ao se levar em conside-ração que as contas de um município não influenciam, pelo menos diretamente, as contas de outro.15

4.4 Função de resposta fiscal

De acordo com Bohn (1998; 2006), a metodologia que se baseia no resultado da ROI do governo em valor presente e impõe como condição de solvência a não exis-tência de um esquema de Ponzi é, muitas vezes, inconsistente, por tender a não rejeitar a hipótese nula de uma raiz unitária na série de déficit público. Isto ocorreria principalmente em pequenas amostras ou na presença de quebras estruturais (Lopes, 2007). Há ainda uma variedade de processos estocásticos que fazem com que a con-dição de estacionariedade não seja satisfeita e, ainda assim, a ROI seja atendida, isto é, há séries integradas de uma ordem finita que atendem à ROI.

Embora tendo como referencial teórico comum a ROI, um enfoque alter-nativo para verificar a sustentabilidade da dívida pública, robusto aos problemas apresentados nos testes de raiz unitária, baseia-se na verificação de uma relação positiva entre o aumento da dívida pública e a geração de superávit primário por parte da administração pública no período subsequente. Esta metodologia tem ainda a vantagem de incorporar propriedades dinâmicas da dívida, em contraste com a abordagem anterior, fundamentada em propriedades estáticas.

14. As transferências intergovernamentais das esferas maiores são determinantes do equilíbrio municipal.15. Ver apêndice B para mais detalhes sobre os testes de raiz unitária realizados.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012108

Empiricamente, a partir do modelo de suavização de impostos de Bar-ro (1979) e considerando uma extensão da proposta de Bohn (1998) para uma estrutura em painel, o segundo exercício consiste na estimação de uma função de reação fiscal aplicada no conjunto dos 3.939 municípios brasi-leiros, das cinco regiões geográficas. No caso das regiões Nordeste, Sudeste e Sul, a aplicação distinguirá o grupo das mesorregiões que englobam as capitais dos estados, bem como o grupo das demais mesorregiões. Mui-to embora as heterogeneidades inter-regionais possam ser expurgadas por meio de variáveis dummies, visando atestar a robustez das estimativas em subamostras, é proposta a estimação da seguinte função de reação para cada nível de desagregação:

(5)

Em que sit representa o superávit primário, bit-1 representa a proxy para o estoque da dívida pública16 com uma defasagem, e representam os desvios de receita e gasto em relação a seus níveis naturais.17 Todas as variáveis são medi-das como proporção do PIB municipal, e os subscritos i e t estão associados aos municípios e ao período, respectivamente. Novamente, a ideia é analisar como o superávit primário reage aos aumentos da dívida pública, controlando por ou-tros fatores que afetam o resultado primário além do estoque passado da dívida. Os sinais esperados dos coeficientes são e , e, em conformidade com os argumentos anteriores, a condição de sustentabilidade é satisfeita quando .

Como é usual em dados de painel, serão estimadas regressões a efeitos fixos e aleatórios e será realizado o teste de Hausman para a escolha do modelo mais apropriado. Entretanto, em pequenas amostras, o teste de Hausman pode tornar-se inconclusivo e, neste caso, a metodologia do teste será diferenciada, utilizando-se a matriz de covariância estimada.18

Vale ainda ressaltar que, assim como no primeiro exercício, a função de resposta fiscal será ainda estimada em dois períodos distintos, 2000-2008 e 2003-2008, tanto para garantir a robustez das estimativas obtidas e do processo de inferência, como para permitir captar alguma evolução da situação fiscal das prefeituras brasileiras no período recente.

16 Conforme dito anteriormente, o passivo real é a proxy mais adequada para esta variável.17. Como nível natural, foi utilizada a média global dos cross-sections no tempo, das receitas e das despesas orça-mentárias como proporção do PIB. Desta forma, se um município apresenta uma relação despesa orçamentária/PIB menor que a média global, significa que ele tem uma margem que lhe permite aumentar seus gastos. Vale ressaltar que, em séries temporais, geralmente se utiliza como medida de correção a diferença em relação ao valor filtrado via Hodrick-Prescott.18. Esse procedimento também será adotado para o caso em que a estatística do teste for negativa.

109Solvência e Reação Fiscal das Administrações Públicas Municipais no Brasil

5 rEsultados

5.1 abordagem via roi – testes de raiz unitária

As tabelas 3 e 4 apresentam, respectivamente, os resultados dos testes de raiz unitária realizados nas séries de déficit orçamentário como proporção do PIB municipal nos dois períodos em análise para os 3.939 municípios e de acordo com as desa-gregações regionais definidas anteriormente.

Para tanto, as duas abordagens – LLC (2002) e IPS (2003) – foram consi-deradas com as estatísticas e os p-valores correspondentes dispostos nas colunas de cada tabela.

TABELA 3testes de raiz unitária (2000-2008)

Levin, Lin e Chu (LLC) Im, Pesaran e Shin (IPS)

Variável Estatística Valor p Estatística Valor p

Brasil -170,086 0,0000 -76,3286 0,0000

Centro-Oeste -33,3363 0,0000 -10,3548 0,0000

Nordeste -87,3652 0,0000 -39,1554 0,0000

Norte -21,3564 0,0000 -9,87433 0,0000

Sudeste -92,7564 0,0000 -40,4506 0,0000

Sul -87,4935 0,0000 -40,9888 0,0000

Capitais Nordeste -19,9305 0,0000 -7,53684 0,0000

Demais Nordeste -36,5915 0,0000 -15,0497 0,0000

Capitais Sudeste -22,7811 0,0000 -7,75886 0,0000

Demais Sudeste -88,4234 0,0000 -38,4848 0,0000

Capitais Sul -25,5582 0,0000 -7,51944 0,0000

Demais Sul -61,5057 0,0000 -19,8258 0,0000

Fonte: STN. Elaboração dos autores.Obs.: LLC = hipótese nula: raiz unitária (processo de raiz unitária comum); IPS = hipótese nula: raiz unitária (processo de raiz

unitária individual); as probabilidades foram computadas supondo-se normalidade assintótica; e utilizou-se o critério de Hannan-Quinn para definir o número ótimo de defasagens.

TABELA 4 testes de raiz unitária (2003-2008)

Levin, Lin & Chu (LLC) Im, Pesaran and Shin (IPS)

Variável Estatística Valor p Estatística Valor p

Brasil -195,872 0,0000 -41,921 0,0000

Centro-Oeste -106,301 0,0000 -33,9363 0,0000

Nordeste -132,804 0,0000 -24,4923 0,0000

Norte -53,1663 0,0000 -31,5314 0,0000

Sudeste -100,624 0,0000 -21,6329 0,0000

(Continua)

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012110

Levin, Lin & Chu (LLC) Im, Pesaran and Shin (IPS)

Variável Estatística Valor p Estatística Valor p

Sul -80,7699 0,0000 -20,6048 0,0000

Capitais Nordeste -212,17 0,0000 -83,4052 0,0000

Demais Nordeste -784,977 0,0000 -320,471 0,0000

Capitais Sudeste -277,665 0,0000 -72,8127 0,0000

Demais Sudeste -97,3517 0,0000 -20,7633 0,0000

Capitais Sul -53,2255 0,0000 -37,9249 0,0000

Demais Sul -60,174 0,0000 -89,5504 0,0000

Fonte: STN. Elaboração dos autores.Obs.: LLC = hipótese nula: raiz unitária (processo de raiz unitária comum); IPS = hipótese nula: raiz unitária (processo de raiz

unitária individual); as probabilidades foram computadas supondo-se normalidade assintótica; e utilizou-se o critério de Hannan-Quinn para definir o número ótimo de defasagens.

Constata-se, pelos resultados das tabelas 3 e 4, o atendimento à ROI das administrações públicas municipais brasileiras tanto em conjunto como para as regiões e grupos de mesorregiões nos dois períodos. Entretanto, cabe ainda inves-tigar se existe uma política fiscal ativa nas prefeituras, haja vista que esta primeira abordagem sofre críticas na literatura, conforme apresentado nas seções anteriores. Os resultados para a função de resposta completam o exercício empírico deste estudo.

5.2 Função de reação fiscal

5.2.1 Resultados para o período 2000-2008

A tabela 5 dispõe as estimativas para a função de reação fiscal para o total dos 3.939 municípios brasileiros e para as cinco regiões, de acordo com o método de estimação em painel sugerido pelo teste de Hausman.19 Muito embora fosse possível captar a heterogeneidade inter-regional por meio de variáveis dummies, optou-se por estimar os modelos para as diferentes subamostras como forma de atestar a consistência das estimativas nos diversos estratos.20 A tabela 6, por conse-guinte, explicita, nas mesmas bases de comparação, os resultados desta estimação nos seis grupos de mesorregiões definidos.

Inicialmente, percebe-se que, em todos os modelos, os sinais dos coeficientes das demais variáveis que afetam o resultado primário – e – condizem com os esperados; por sua vez, a condição de sustentabilidade ( > 0) é satisfeita apenas nas prefeituras das regiões Centro-Oeste, Norte e Sul, ou seja, apenas nestas regiões existe a prática de uma política fiscal ativa de geração de superávit ao aumento da dívida passada.21

19. A rejeição da hipótese nula do teste sugere uma estimação a efeitos fixos.20. Exercícios preliminares com dummies multiplicativas foram realizados e verificou-se inexistirem ganhos de eficiência para as estimativas obtidas. Por sua vez, as estimações em subamostras reforçam a escolha da função de reação definida com base na proposta de Bohn (1998).21. Sempre mensurada pelo passivo real municipal.

(Continuação)

111Solvência e Reação Fiscal das Administrações Públicas Municipais no Brasil

TABELA 5Estimação da função de resposta fiscal do Brasil e das regiões geográficas (2000-2008)

Modelosexplicativos

Brasil Centro-Oeste Nordeste Norte Sudeste Sul

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

bit-1 0,000011 0,00380 0,000011 0,00250 -0,000051 0,00630

  (0,0001) (0,0009) (0,0002) (0,0006) (0,0003) (0,0009)

0,5833 0,9986 0,4679 1,0044 0,9999 0,9998

  (0,0028) (0,0024) (0,0063) (0,0011) (0,0007) (0,0018)

-0,5773 -0,9982 -0,3754 -1,0015 -0,9990 -0,9950

  (0,0028) (0,0024) (0,0056) (0,0011) (0,0007) (0,0019)

0,0031 0,0028 0,0009 0,0013 0,0026 0,0056

  (0,0001) (0,0001) (0,0001) (0,00002) (0,00002) (0,00003)

Método EF EA EF EF EF EF

Número de observações

31.512 2.656 8.240 1.544 10.832 8.240

Cross-sections 3.939 332 1.030 193 1.354 1.030

R2 0,592 0,986 0,439 0,999 0,995 0,977

Fonte: STN. Elaboração dos autores.Nota: 1 Não significante a 5%.Obs.: EF = efeito fixo; EA = efeito aleatório; desvio padrão entre parênteses.

TABELA 6Estimação da função de resposta fiscal das mesorregiões (2000-2008)

Modelosexplicativos

Capitais NE Demais NE Capitais SE Demais SE Capitais S Demais S

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

bit-1 -0,000011 0,0118 -0,00051 0,000011 0,00081 0,0074

  (0,0001) (0,0035) (0,0007) (0,0003) (0,0005) (0,0010)

0,9197 0,4216 0,9986 1,0000 0,9994 0,9998

  (0,0080) (0,0070) (0,0021) (0,0008) (0,0013) (0,0021)

-0,8979 -0,3309 -0,9966 -0,9993 -0,9956 -0,9949

  (0,0085) (0,0059) (0,0022) (0,0008) (0,0013) (0,0022)

0,0027 -0,00021 0,0019 0,0026 0,0069 0,0054

  (0,0002) (0,0003) (0,00004) (0,00002) (0,00002) (0,00004)

Método EF EF EF2 EF EF EF

Número de observações

1.424 6.816 1.312 9.520 1.088 7.152

Cross-sections 178 852 164 1190 135 894(Continua)

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012112

Modelosexplicativos

Capitais NE Demais NE Capitais SE Demais SE Capitais S Demais S

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

R2 0,915 0,392 0,995 0,995 0,999 0,974

Fonte: STN. Elaboração dos autores.Nota: 1 Não significante a 5%.

2 Teste de Hausman utilizando a matriz de covariância estimada.Obs.: EF = efeito fixo; EA = efeito aleatório; desvio padrão entre parênteses.

Em relação à análise desagregada, nas mesorregiões Demais Sul e Demais Nordeste, constata-se a referida condição de solvência. O controle da heteroge-neidade pode ter sido o motivo da reversão do resultado antes não significante para o total dos municípios do Nordeste.22

Contrastando com os resultados obtidos no primeiro exercício, seja no total dos municípios brasileiros, nas regiões Sudeste e Nordeste, ou na mesorregião composta pelas regiões metropolitanas das capitais do Sul, o atendimento à ROI não implica a prática de uma política fiscal ativa.

A combinação dos resultados das tabelas 6 e 7 permite ainda inferir que a possível insolvência das prefeituras nordestinas predomina nas regiões metropoli-tanas que englobam as capitais, bem como a solvência nos municípios do Sul do país é promovida pelas demais mesorregiões que não as das capitais. Entre 2000 e 2008, não há uma prática de política fiscal ativa no Sudeste.

5.2.2 Resultados para o período 2003-2008

Os resultados da tabela 7 para o subperíodo 2003-2008 sugerem que apenas as prefeituras das regiões Norte e Sul adotam a prática de geração de superávit primário aos aumentos da dívida pública. Para os municípios do Centro-Oeste, verifica-se uma perda da capacidade de reação fiscal quando considerado apenas o período pós-2002. Novamente, no Nordeste e Sudeste, a capacidade de geração de superávit primário das administrações municipais se mostrou inócua.

Especializando ainda mais a análise ao nível de mesorregiões nessa subamostra, constata-se, pela tabela 8, que a mesorregião Demais Sul é determinante do resultado favorável para os municípios da região.

22. Vale lembrar que as regiões Norte e Centro-Oeste não foram trabalhadas de forma desagregada.

(Continuação)

113Solvência e Reação Fiscal das Administrações Públicas Municipais no Brasil

TABELA 7Estimação da função de resposta fiscal do brasil e das regiões geográficas (2003-2008)

Modelosexplicativos

Brasil Centro Oeste Nordeste Norte Sudeste Sul

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

bit-1 -0,000011 0,00051 -0,000031 0,0028 0,000071 0,0082

  (0,0001) (0,0005) (0,0002) (0,0009) (0,0004) (0,0009)

0,5751 1,0010 0,4204 1,0066 0,9987 0,9973

  (0,0044) (0,0008) (0,0091) (0,0017) (0,0010) (0,0027)

-0,4879 -1,0002 -0,3036 -1,0018 -0,9984 -0,9944

  (0,0040) (0,0008) (0,0072) (0,0016) (0,0010) (0,0028)

0,0035 0,0038 0,0016 0,0013 0,0031 0,0058

  (0,0001) (0,00002) (0,0002) (0,00003) (0,00002) (0,00005)

Método EF EA EF EF EF EF

Número de observações

19.695 1.660 5.150 965 6.770 5.150

Cross-sections 3.939 332 1.030 193 1.354 1.030

R2 0,523 0,999 0,349 0,998 0,995 0,963

Fonte: STN. Elaboração dos autores.Nota: 1 Não significante a 5%.Obs.: EF = efeito fixo; EA = efeito aleatório; desvio padrão entre parênteses.

TABELA 8Estimação da função de resposta fiscal das mesorregiões (2003-2008)

Modelosexplicativos

Capitais NE Demais NE Capitais SE Demais SE Capitais S Demais S

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

bit-1 0,00000011 -0,00171 -0,0013 0,00031 0,00051 0,0100

  (0,0001) (0,0052) (0,0006) (0,0004) (0,0006) (0,0011)

0,9080 0,3648 0,9982 0,9987 1,0017 0,9975

  (0,0116) (0,0102) (0,0019) (0,0010) (0,0015) (0,0031)

-0,8742 -0,2561 -0,9963 -0,9987 -0,9968 -0,9945

  (0,0124) (0,0076) (0,0019) (0,0011) (0,0015) (0,0032)

0,0027 0,0016 0,0028 0,0031 0,0075 0,0056

(Continua)

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012114

Modelosexplicativos

Capitais NE Demais NE Capitais SE Demais SE Capitais S Demais S

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

  (0,0002) (0,0004) (0,0000) (0,00002) (0,00003) (0,0001)

Método EF EA EF EF EF EF

Número de observações

890 4.260 820 5.950 680 4.470

Cross-sections 178 852 164 1.190 136 894

R2 0,897 0,286 0,998 0,995 0,999 0,959

Fonte: STN. Elaboração dos autores.Nota: 1 Não significante a 5%.

2 Teste de Hausman utilizando a matriz de covariância estimada.Obs.: EF = efeito fixo; EA = efeito aleatório; desvio padrão entre parênteses.

Ademais, enquanto a mesorregião Demais Nordeste perde capacidade de resposta na geração de superávit primário, no Sudeste, os municípios da mesorre-gião composta por regiões metropolitanas das capitais apresentam um avanço fis-cal, representado pela significância da estimativa do coeficiente associado à dívida defasada . Uma vez que as variáveis são mensuradas como proporção do PIB, este resultado pode advir do maior crescimento econômico verificado na região Sudeste, conforme apresentado no gráfico 2.

Do exposto, percebe-se que apenas nos municípios das regiões Norte e Sul e, em especial, no grupo das mesorregiões Demais Sul as duas condições de sol-vência propostas nos exercícios empíricos são satisfeitas, seja na amostra completa ou na subamostra 2003-2008.

Finalmente, a maior robustez da segunda abordagem seguida permite suge-rir que a consecução do equilíbrio financeiro nas administrações públicas muni-cipais brasileiras independe de tamanho econômico, haja vista que, em duas das três regiões economicamente maiores, a capacidade de resposta fiscal das prefeitu-ras é inócua no período completo ou na subamostra utilizada.

6 coNclusão

A partir de duas metodologias tradicionais em sustentabilidade da política fiscal, analisa-se a solvência das administrações municipais brasileiras entre 2000 e 2008 in-corporando às duas propostas os avanços da econometria com estrutura de dados em painel e desagregando as análises em grupos regionais. Adicionalmente, os exercícios são repetidos para um subperíodo amostral pós-2002, visando não apenas atestar a adequação das prefeituras à LRF, mas também como forma de expurgar influências da mudança político-ideológica da União sobre o desempenho fiscal na esfera municipal.

Em conformidade com as duas propostas teóricas, duas verificações empí-ricas foram implementadas. A primeira fundamenta-se no atendimento à ROI das prefeituras e envolve dois testes de raiz unitária em painel, de acordo com

(Continuação)

115Solvência e Reação Fiscal das Administrações Públicas Municipais no Brasil

as propostas de Levin, Lin e Chu (2002) e Im, Pesaran e Shin (2003), enquan-to a segunda é baseada na proposta de Bohn (1998) e incorpora a importância do comportamento intertemporal da administração pública para consecução do equilíbrio fiscal. Esta consiste na estimação de funções de reação fiscal com dados em painel para as administrações públicas municipais. Nos dois períodos, ambas as verificações são especializadas segundo cinco regiões brasileiras e, para as três regiões economicamente maiores, aplicadas a seis mesorregiões, de acordo com a inclusão das regiões metropolitanas de suas capitais.

Os resultados dos testes de raiz unitária corroboram o atendimento à ROI das prefeituras tanto para o total dos 3.939 municípios analisados, como em to-das as desagregações definidas e nos dois períodos amostrais predefinidos.

Os resultados para as funções de reação estimadas sugerem que: i) no perío-do 2000-2008, apenas as prefeituras das regiões Norte, Centro-Oeste e Sul prati-caram uma política fiscal ativa de geração de superávit primário como resposta ao aumento da dívida pública; ii) no mesmo período, na região Sul, a mesorregião que não inclui as regiões metropolitanas das capitais (Demais Sul) determina a solvência regional; iii) há que se levar em consideração os efeitos diferenciados entre mesorregiões quando se inserem na amostra os municípios das capitais: a situação de insolvência no Nordeste advém das mesorregiões que incluem suas capitais; iv) para o subperíodo 2003-2008, as administrações públicas municipais das regiões Norte e Sul atendem à condição de solvência desta segunda aborda-gem; e v) entre as mesorregiões, no período de 2003 a 2008, novamente, as que não compreendem as capitais do Sul e a das capitais do Sudeste apresentam uma política fiscal ativa.

O acentuado crescimento econômico do período recente mostra-se como o responsável pela evolução fiscal das prefeituras das regiões metropolitanas na região Sudeste. A combinação dos resultados obtidos sugere, ainda, que a condi-ção de sustentabilidade fiscal não está atrelada ao tamanho econômico dos mu-nicípios, haja vista que as regiões e mesorregiões que satisfizeram as condições de solvência, nos dois casos, são compostas por municípios de médio e pequeno porte (Norte e Demais Sul). Isto não implica que a criação de novos municí-pios inseridos nestas regiões lhes assegure uma condição ex ante de equilíbrio nas contas públicas. Além disso, a inserção deles cria um novo cenário para aqueles preexistentes, requerendo um reexame a posteriori.

Partindo do pressuposto de que a credibilidade de uma política fiscal deter-mina a capacidade de endividamento do governo, bem como depende das expec-tativas dos agentes acerca da sustentabilidade da política fiscal adotada, parece im-perativo a adoção de políticas fiscais ativas por parte dos administradores públicos para a consecução e manutenção do equilíbrio fiscal municipal e, muito embora a questão da influência político-ideológica de União e estados não tenha sido objeto central de discussão, cabe destacar como objeto de estudos futuros a necessidade de controlar o impacto de variáveis políticas sobre o equilíbrio financeiro municipal.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012116

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119Solvência e Reação Fiscal das Administrações Públicas Municipais no Brasil

aPÊNdicE a

tEstE dE hausmaN

TABELA A.1teste de hausman (2000-2008)

Região Coeficiente Valor-p

Brasil 1.793,81 0,00

Centro-Oeste 5,58 0,13

Nordeste 675,86 0,00

Norte 41,45 0,00

Sudeste 89,33 0,00

Sul 22,56 0,00

Capitais Nordeste 43,26 0,00

Demais Nordeste 526,57 0,00

Capitais Sudeste 54,96 0,001

Demais Sudeste 44,98 0,00

Capitais Sul 22,75 0,00

Demais Sul 20,73 0,00

Elaboração dos autores. Nota: 1 Teste realizado com a matriz de covariância estimada.

TABELA A.2teste de hausman (2003-2009)

Região Coeficiente Valor-p

Brasil 1.605,61 0,00

Centro-Oeste 10,60 0,01

Nordeste 477,38 0,00

Norte 39,99 0,00

Sudeste 35,50 0,00

Sul 5,73 0,13

Capitais Nordeste 52,18 0,00

Demais Nordeste 301,13 0,00

Capitais Sudeste 58,77 0,00

Demais Sudeste 11,78 0,01

Capitais Sul 17,08 0,00

Demais Sul 6,02 0,11

Elaboração dos autores.

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aPÊNdicE B

Os testes de raiz unitária utilizados no estudo são baseados em uma regressão do tipo Dickey-Fuller:

(1)

Onde, indexa o município; o período e é iid .

A hipótese nula comum refere-se à existência de raiz unitária em cada série analisada. Utilizou-se para escolha do “lag ótimo” o critério de Hannan-Quinn. Vale ressaltar que, como hipótese alternativa, o teste LLC (2002) supõe que cada série é estacionária, enquanto o de IPS (2003) considera que pelo menos uma das séries não possui raiz unitária.

O teste de LLC (2002) permite captar a presença de efeitos individuais determinísticos constantes e/ou com tendência linear ao longo do tempo, bem como a estrutura de autocorrelação por meio de um modelo autoregressivo de primeira ordem. Por sua vez, o de IPS (2003) é mais flexível. É robusta, por exem-plo, à correlação serial dos resíduos, heterogeneidade no tempo e não constância da variância do erro entre grupos. Assim sendo, para condução do processo de inferência realizado na seção cinco, serão considerados os resultados dos testes segundo IPS (2003).

121Solvência e Reação Fiscal das Administrações Públicas Municipais no Brasil

aPÊNdicE c

TABELA C.1Funções de resposta fiscal com a opção por dummies regionais

2000-2008 2003-2008

ExplicativasResultado primário

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

Resultado primário

bit-1 0,0001 0,000051 0,00011 0,0001 -0,0000091 0,00011

(0,0000) (0,0001) (0,0001) (0,0001) (0,0001) (0,0001)

0,5745 0,6313 0,5856 0,4671 0,5751 0,4851

(0,0195) (0,0031) (0,0028) (0,0203) (0,0044) (0,0036)

-0,5638 -0,5673 -0,5704 -0,4509 -0,4879 -0,4648

(0,0196) (0,0030) (0,0028) (0,0205) (0,0040) (0,0036)

d2 -0,0044(dropped)

-0,0049 -0,0056(dropped)

-0,0061

(0,0002) (0,0003) (0,0003) (0,0004)

d3 -0,0012(dropped)

-0,0013 -0,0018(dropped)

-0,0018

(0,0002) (0,0004) (0,0003) (0,0005)

d4 -0,00031

(dropped)-0,00031 -0,00041

(dropped)-0,00051

(0,0001) (0,0003) (0,0002) (0,0004)

d5 0,0017(dropped)

0,0017 0,0017(dropped)

0,0017

(0,0001) (0,0003) (0,0002) (0,0004)

0,0039 0,0030 0,0040 0,0051 0,0035 0,0052

  (0,0001) (0,0000) (0,0002) (0,0002) (0,0001) (0,0003)

Método MQOA EF EA MQOA EF EA

Número de observações

31.512 31.512 31.512 19.695 19.695 19.695

Cross-sections   3.939 3.939 3.939 3.939

R2 0,580 0,611 0,5974 0,469 0,523 0,5003

Teste de Hausman Estimativa: 1.416,59 Valor-p 0.00 Estimativa: 1.286,27 Valor-p 0.00

Elaboração dos autores.Nota: 1 Não significante a 5%.Obs.: MQOA = mínimos quadrados ordinários agrupados; EF = efeito fixo; EA = efeito aleatório.

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aNEXo a

mEsorrEgiÕEs rEFErENtEs a caPitais23

Mesorregiões integrantes do grupo Capitais Nordeste:

• Norte Maranhense

• Centro-Norte Piauiense

• Metropolitana de Fortaleza

• Leste Potiguar

• Mata Paraibana

• Metropolitana do Recife

• Leste Alagoano

• Leste Sergipano

• Metropolitana de Salvador

Mesorregiões integrantes do grupo Capitais Sudeste:

• Metropolitana de Belo Horizonte

• Central Espírito-Santense

• Metropolitana do Rio de Janeiro

• Metropolitana de São Paulo

Mesorregiões integrantes do grupo Capitais Sul:

• Metropolitana de Curitiba

• Grande Florianópolis

• Metropolitana de Porto Alegre

23. Fonte: IBGE.

o sEtor ENErgÉtico BrasilEiro: uma aNálisE via iNdicadorEs dE iNsumo-Produto E o modElo hÍBrido Para os aNos dE 1997 E 2002*Vinicius de Azevedo Couto Firme**Fernando Salgueiro Perobelli***

Este trabalho analisa as mudanças estruturais ocorridas no setor energético brasileiro nos anos de 1997 e 2002. Para tanto, utiliza as matrizes de insumo-produto estimadas por Guilhoto e Sesso (2005) para ambos os anos. Cabe ressaltar que, devido à necessidade de compatibilização dos dados de energia (fluxos físicos) constantes no Balanço Energético Nacional (BEN) e a matriz de insumo-produto para o Brasil, este artigo apresentará resultados para quatorze setores produtivos. A análise setorial se baseará em duas partes. A primeira será composta por uma análise exploratória do setor, mediante utilização dos indicadores clássicos de insumo-produto (isto é, setor-chave, análise dos multiplicados de emprego, renda e produção). Na segunda seção, a análise tomará por base o modelo híbrido de insumo-produto. O modelo híbrido permitirá verificar quais os requerimentos diretos, indiretos e totais do setor de energia. Os resultados deste artigo permitirão um melhor entendimento do setor de energia no Brasil.

Palavras-chave: insumo-produto; setor energético; modelos híbridos.

thE BraZiliaN ENErgY sEctor: aN aNalYsis usiNg iNPut-outPut iNdicators aNd thE hYBrid modEl For thE YEars 1997 aNd 2002

This paper analyzes the structural changes into the Brazilian energy sector for the years of 1997 and 2002. In order to reach this aim, we used the Guilhoto and Sesso (2005) estimated input-output matrices for both years. In order to make the National Energy Balance and the Input-output matrix compatible we used an input-output matrix for 14 sectors. The sectoral analysis will be divided in two parts. The first will be composed by an exploratory analysis of energy sector. We will use the classical indicators (e.g. key-sector, employment multiplier, income and production multiplier). At the second part, we will make a requirement analysis (total, direct and indirect) for the energy sector. The results will help the policy makers to better understand the energy sector in Brazil.

Keywords: input-output; energetic sector; hybrid models.

* Pesquisador do Programa de Pós-graduação em Economia Aplicada da Faculdade de Economia da Universidade Federal de Juiz de Fora.** Professor do Programa de Pós-graduação em Economia da Faculdade de Economia da Universidade Federal de Juiz de Fora; pesquisador em produtividade do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).*** Os autores agradecem a participação de Joaquim J. M. Guilhoto pela disponibilização das matrizes de insumo-produto para a realização deste trabalho.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012124

la iNdustria dE la ENErgÍa dE Brasil: uN aNálisis a travÉs dE iNdicadorEs dE iNsumo-Producto Y El modElo hÍBrido Para los aÑos 1997 Y 2002

Este artículo analiza los cambios estructurales en el sector energético brasileño en los años 1997 y 2002. Para ello, hacer uso de matrices de insumo-producto estimado por Guilhoto y Sesso (2005) para ambos años. Cabe señalar que debido a la necesidad de conciliar los datos de la energía (flujos físicos) que figura en el Balance Energético Nacional (BEN) y la matriz de insumo-producto para Brasil, en este documento se presentan los resultados para 14 sectores industriales. Un análisis sectorial se basará en dos partes. La primera consistirá en un análisis exploratorio de la industria a través del uso de los indicadores clásicos de la entrada-salida (el sector es clave, el análisis del empleo se multiplicaron, los ingresos y la producción). En la segunda sección el análisis se basará en el híbrido de insumo-producto. El modelo híbrido, que verificará los requisitos directa del sector, el consumo indirecto y total. Los resultados de este artículo ayudará a entender mejor el sector de la energía en Brasil.

Palavras-clave: de entrada-salida; sector de la energía; los modelos híbridos.

l’iNdustriE dE l’ÉNErgiE BrÉsiliENNE: uNE aNalYsE EN utilisaNt dEs ENtrÉEs-sortiEs dEs iNdicatEurs Et lE modÈlE hYBridE Pour lEs aNNÉEs 1997 Et 2002

Cet article analyse les changements structurels dans le secteur énergétique brésilien dans les années 1997 et 2002. Pour ce faire, utiliser des matrices entrées-sorties estimée par Guilhoto et Sesso (2005) pour deux ans. Il est à noter qu’en raison de la nécessité de concilier les données de l’énergie (flux physiques) contenues dans le bilan énergétique national (BEN) et la matrice d’entrée-sortie pour le Brésil, ce document présente les résultats pour 14 secteurs industriels. Une analyse sectorielle sera basé en deux parties. La première consistera en une analyse exploratoire de l’industrie grâce à l’utilisation des indicateurs classiques d’entrées-sorties (ie secteur clé, l’analyse de l’emploi, des revenus multipliés et production). Dans la deuxième section de l’analyse sera fondée sur les hybrides d’entrée-sortie. Le modèle hybride qui permettra de vérifier les exigences directes, indirectes et secteur de l’énergie totale. Les résultats de cet article sera de mieux comprendre le secteur de l’énergie au Brésil.

mots-clés: entrées-sorties; secteur de l’énergie; des modèles hybrides.

JEL: C67; D57; Q40.

1 iNtrodução

A energia é um insumo de uso generalizado na economia. Em decorrência disto, sua indisponibilidade pode produzir efeitos econômicos adversos de curto e de longo prazo. Esta carência relativa à disponibilidade de energia pode ser pro-veniente da falta de planejamento e investimento direcionados ao setor e, mais a longo prazo, da dificuldade em obter novas fontes renováveis de energia.1

1. A possibilidade de investimentos em novas fontes de energia não será tratada neste trabalho.

125O Setor Energético Brasileiro

No âmbito brasileiro, considerando o período de 1996 a 2002, pode-se concluir que, em média, mais de 48% dos recursos energéticos do país são oriundos de fontes não renováveis. Isto equivale a mais de 500 milhões de toneladas de equi-valentes de petróleo (TEP)2 produzidas no período. Pode-se destacar o petróleo, produto que responde, em média, por mais de 38% da energia primária do país. No caso das fontes renováveis, pode-se destacar a participação da energia hidráuli-ca, que manteve uma média de quase 17% da produção total de energia primária do país. Lenha e produtos da cana-de-açúcar somados representaram quase um terço da energia total produzida no período (tabela 1).

TABELA 1Produção e percentual por fonte de energia primária (1996-2002)

Energia não renovável

Petróleo Gás natural Carvão vaporCarvão

metalúrgicoUrânio (U3O8)

Total não renová-vel (a)

Ano Produção % Produção % Produção % Produção % Produção % Produção %

1996 40,52 33,00 9,09 7,40 1,79 1,46 0,09 0,07 0,00 0,00 51,49 41,93

1997 43,59 33,43 9,75 7,48 2,11 1,62 0,06 0,04 0,00 0,00 55,51 42,58

1998 50,51 36,54 10,71 7,75 2,07 1,49 0,01 0,01 0,02 0,02 63,32 45,81

1999 56,61 38,67 11,81 8,07 2,11 1,44 0,02 0,01 0,00 0,00 70,55 48,19

2000 63,85 41,64 13,18 8,60 2,60 1,70 0,01 0,01 0,13 0,09 79,78 52,03

2001 66,74 42,68 13,89 8,88 2,17 1,39 0,01 0,01 0,67 0,43 83,49 53,39

2002 75,12 43,11 15,45 8,87 1,94 1,11 0,06 0,04 3,34 1,91 95,91 55,03

soma e média 396,95 38,85 83,89 8,21 14,79 1,45 0,26 0,03 4,16 0,41 500,05 48,94

Energia renovável

Energia hidráulica

LenhaProdutos da

cana-de-açúcarOutras

Total renovável (b)

Energia total(a+b)

Ano Produção % Produção % Produção % Produção % Produção % Produção %

1996 22,85 18,61 21,97 17,89 23,40 19,05 3,09 2,51 71,30 58,07 122,79 100

1997 23,98 18,39 21,66 16,62 25,94 19,90 3,28 2,52 74,87 57,42 130,38 100

1998 25,06 18,12 21,26 15,38 25,16 18,20 3,45 2,49 74,92 54,19 138,24 100

1999 25,19 17,20 22,13 15,11 24,58 16,79 3,97 2,71 75,86 51,81 146,41 100

2000 26,17 17,07 23,05 15,04 19,89 12,97 4,44 2,89 73,56 47,97 153,33 100

2001 23,03 14,73 22,44 14,35 22,80 14,58 4,63 2,96 72,90 46,61 156,39 100

2002 24,59 14,11 23,54 13,51 25,27 14,50 4,95 2,84 78,36 44,97 174,27 100

soma e média 170,86 16,72 156,05 15,27 167,03 16,35 27,81 2,72 521,76 51,06 1.021,81 100

Elaboração dos autores.Fonte: Brasil (2008).Obs: 1. A produção está cotada em milhões de toneladas equivalentes de petróleo.

2. A participação relaciona o total produzido por uma determinada fonte de energia em um ano com a produção total obtida neste mesmo ano (fontes não renováveis mais renováveis).

3. A célula denominada Soma e média revela a produção acumulada entre 1996 e 2002 por fonte de energia e a parti-cipação média de cada uma destas fontes no mesmo período.

2. A tonelada equivalente de petróleo (TEP) é a unidade comum na qual se convertem as unidades de medida das diferen-tes formas de energia utilizadas no Balanço Energético Nacional (BEN). Os fatores de conversão são calculados com base no poder calorífico superior de cada energético em relação ao do petróleo, de 10.800 kcal/kg (Patusco, 2011).

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012126

Alguns autores argumentam que as matrizes de insumo-produto, convertidas em unidades híbridas, estariam entre as opções mais consistentes para analisar os encadeamentos do setor energético com os demais setores da economia (Bullard e Herendeen, 1975; Casler e Blair, 1997; Miller e Blair, 2009). Já existe certo avanço no que se refere ao uso deste método: alguns artigos utilizam matrizes inter-regio-nais para analisar o setor energético. Desta forma seria possível verificar as inter-dependências energéticas entre setores de regiões distintas. Perobelli et al. (2007) utilizaram um modelo híbrido inter-regional de insumo-produto com incorporação de um setor de energia visando analisar as interações energéticas entre o estado de Minas Gerais e o restante do Brasil.

Além disso, existem outras formas de se utilizarem modelos de insumo-pro-duto híbridos para o setor energético. Carvalho e Perobelli (2008) quantificaram as emissões de CO2 decorrentes do consumo de combustíveis energéticos, consi-derando um modelo de insumo-produto inter-regional híbrido para São Paulo e o restante do Brasil utilizando a matriz de 1996. Note-se que tal método poderia ser aplicado para diferentes finalidades: Machado (2002) avaliou os impactos do comércio exterior sobre o uso de energia e as emissões de CO2 por parte da eco-nomia brasileira utilizando um modelo de insumo-produto híbrido, em formato produto por atividade, aplicado aos anos de 1985, 1990 e 1995. Lenzen (1998) calculou as necessidades primárias diretas e indiretas de energia e os gases do efeito estufa (GEE) incorporados no consumo final da Austrália utilizando um modelo de insumo-produto em unidades monetárias e um modelo em unidades híbridas para o período de 1992-1993. Guilhoto e Hilgemberg (2006) aplicaram esta meto-dologia para estudar a emissão de CO2 no Brasil para 1999 utilizando uma matriz inter-regional com desagregação para diversas regiões do Brasil.

Existe também outro método que possibilita a estimação e previsão de de-manda de energia desagregada por setor. Tal procedimento une as ferramentas dos modelos de insumo-produto e econometria. Mattos et al. (2008) utilizam um modelo do tipo econométrico mais insumo-produto para realizar previsões de longo prazo do consumo de energia por setor de atividade no Brasil. São feitas previsões anuais para 2005-2010. A metodologia integra modelos econométricos de séries temporais com modelos de insumo-produto. Souza (2008) consegue mensurar os impactos setoriais, regionais e totais do consumo de energia elétrica, resultantes da variação do componente exportação da demanda final de Minas Gerais e do restante do Brasil, por meio da integração de modelos econométricos de séries temporais com modelos de insumo-produto.

Este trabalho tem por finalidade analisar a evolução do setor energético em 1997 e 2002 utilizando os instrumentos dos modelos de insumo-produto, visando fornecer informações sobre este setor para os agentes econômicos. Para tanto, serão utilizadas ferramentas que permitam obter resultados acerca do impacto deste setor

127O Setor Energético Brasileiro

sobre o produto nacional, o emprego e a renda. Além disto, será verificada a ligação deste setor com os demais setores produtivos da economia brasileira, no que diz respeito à oferta e à demanda intersetoriais, pois, segundo Hirschman (1961), um setor que demanda e é demandado pelos demais setores acima da média apresenta características de um “setor-chave” ao crescimento de uma economia. Por último, serão verificados os requerimentos de energia dos setores produtivos brasileiros. Esta última análise permitirá que crescimentos em setores específicos da economia, que apresentem poder de pressão sobre o setor energético, venham acompanhados de maiores investimentos na geração de energia.

2 sEtor ENErgÉtico E o cENário EcoNÔmico BrasilEiro3

Observando a conjuntura econômica brasileira, desde o período que antecedeu os anos analisados, até 2002, pode-se verificar que de 1993 a 1997, com a estabiliza-ção da economia, estabeleceu-se um novo ciclo de desenvolvimento, o qual elevou os índices de expansão da economia e do consumo de energia. Neste período, o produto interno bruto (PIB) cresceu a 3,9% ao ano (a.a.) e a oferta interna de energia (OIE) cresceu a 4,8% a.a., com os derivados de petróleo apresentando taxa média de crescimento de 7% a.a.; a eletricidade, de 5,1% a.a.; e a biomassa, de 2% a.a.; correspondendo, respectivamente, a elasticidades de 1,79, 1,31 e 0,52 em relação ao PIB. As taxas de crescimento do consumo da eletricidade residencial e comercial foram de, respectivamente, 8,4% a.a. e 8,6% a.a.; da gasolina automoti-va, de 13,8% a.a.; e do querosene de aviação, de 9,4% a.a. Estes foram os grandes indutores das altas taxas de consumo de energia, por conta da melhor distribuição de renda proporcionada pelo Plano Real. Neste período, as exportações de produ-tos intensivos em energia estagnaram ou regrediram.

Em 1998 e 1999, em razão de sucessivas crises externas, principalmente a crise cambial nos países asiáticos, que acabou contaminando a economia nacio-nal, o governo brasileiro foi obrigado a tomar medidas que levaram a uma forte retração no crescimento econômico, tendo o PIB apresentado um crescimento de apenas 0,13% em 1998 e de 0,81% em 1999. O baixo desempenho da economia teve reflexos no consumo de energia de 1999, notadamente quanto às energias associadas ao uso individual, como o álcool hidratado, com queda de -8,6% no consumo; a gasolina automotiva, com queda de -6,3%; o querosene de aviação, com queda de -6,3%; e a energia elétrica residencial, com apenas 2,4% de cresci-mento. Neste mesmo ano, a OIE cresceu 2%.

Em 2000, após a desvalorização da moeda, ocorrida no ano anterior, a economia demonstrou sinais de recuperação, com o crescimento do PIB de

3. Esta seção foi baseada nos dados do Balanço Energético Nacional (BEN) do Ministério de Minas e Energia – MME (Brasil, 2006, p. 26-27).

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012128

4,36%, alavancado por desempenhos expressivos dos setores de comunicação (15,6%), extrativa mineral (11,5%) e indústria de transformação (4,8%). Em termos de consumo de energia, este ano mostrou-se atípico, tendo a OIE crescido apenas 0,7%, em razão do fraco desempenho de setores industriais intensivos em energia e também da continuidade do baixo consumo da ener-gia associada ao uso individual da população.

Em 2001, mais uma vez, a economia brasileira se retraiu, resultado do desaquecimento da economia americana, agravado pelos atentados terroristas, o qual contaminou as principais economias mundiais, e também pela crise de abastecimento de eletricidade que se estabeleceu no país. O PIB cresceu 1,42% e a OIE apresentou desempenho um pouco melhor que o anterior, de 1,7%. O consumo de energia elétrica do país decresceu -6,6%, em decor-rência do contingenciamento de carga com os setores intensivos em energia, como aço, alumínio e ferroligas, sendo bastante afetados. O setor residencial também apresentou significativa retração no consumo, de -11,8%. O ano de 2001 encerrou com um consumo de derivados de petróleo igual ao do ano anterior e com consumo de álcool retraído em -7,9%.

Em 2002, a economia brasileira cresceu 1,52%, um resultado semelhante ao de 2001, tendo no setor agropecuário a melhor performance (5,3%). Em consequência da alta do câmbio e do término do contingenciamento da eletricidade, os setores exportadores voltaram a crescer, tendo reflexos na OIE, que apresentou crescimento de 2,5%, mesmo estando influenciada por desempenhos negativos dos derivados de petróleo, que retraíram -2,7%, e da eletricidade residencial, que regrediu 1,4%.

Um resumo das questões aqui tratadas pode ser observado no gráfico 1, no qual se pode notar que a taxa de variação do consumo final de energia diminui após 1997. Neste ano, o crescimento registrado foi de mais de 6%, caindo para pouco mais de 2% em 1998, 1,2% em 1999, 0,86% em 2000 e apenas 0,14% em 2001. Este decréscimo acentuado tem forte correlação com a diminuição de consumo observada no setor elétrico. Após 2001, o consumo apresenta uma pequena retomada no crescimento. A OIE acompanhou a taxa de variação do consumo final de energia até 1996. Em 1997, o consumo de energia superou a oferta interna, no entanto, ambas obtiveram um nível elevado de crescimento. Após 1997, esta passou a crescer a taxas decrescentes até 2000. Isto se deveu, em parte, ao baixo crescimento verificado no PIB brasileiro. Desde 1996, o PIB vinha crescendo a taxas inferiores ao consumo final de energia e à oferta interna, atin-gindo valores críticos de crescimento em 1998 e 1999, fato este que pressionou para baixo tanto o consumo quanto a oferta interna de energia. Em 2002, tanto o PIB quanto a OIE e o consumo interno apresentaram um pequeno crescimento em relação ao ano anterior.

129O Setor Energético Brasileiro

GRÁFICO 1taxa de variação anual do produto interno bruto (PiB), oferta interna de energia e consumo final de energia (1993-2003)

0

0,01

0,02

0,03

0,04

0,05

0,06

0,07

1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003

Consumo final energia – TEP(mil) – variação anual

OIE – variação anual

PIB – variação real anual

Fonte: Brasil (2006; 2008); Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – Sistema de Contas Nacionais (SCN).Obs.: o consumo final de energia foi obtido em Brasil (2008); a oferta interna de energia (OIE), em Brasil (2006); e o produto

interno bruto (PIB), no SCN/IBGE.

3 mEtodologia4

Segundo Bullard e Herendeen (1975), Casler e Blair (1997) e Miller e Blair (2009), o modelo de insumo-produto em unidades híbridas é a formulação mais consisten-te para a aplicação de modelos de insumo-produto de natureza físico-econômica envolvendo uso de energia. Hawdon e Pearson (1995) e Zhang e Folmer (1998) apontam algumas vantagens no uso da estrutura de insumo-produto para analisar questões relativas ao setor energético: i) permite uma desagregação setorial maior que os modelos de otimização dinâmica e os modelos macroeconômicos; ii) permi-te a incorporação de fluxos de energia intersetoriais tanto em termos físicos quanto monetários; e iii) possibilita implementar análises de impacto. Entretanto, estes modelos também apresentam algumas limitações, quais sejam: i) coeficientes fixos de insumo-produto; ii) retornos constantes de escala; e iii) demanda final determi-nada exogenamente. É importante salientar que tais limitações não invalidam os resultados do modelo.

4. Todos os índices relacionados aos multiplicadores de emprego, produto e renda, de linkages para frente e para trás e de requerimentos do setor energético foram obtidos com base na matriz híbrida.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012130

3.1 modelo híbrido de insumo-produto

O modelo de insumo-produto híbrido apresentado nesta subseção é proveniente das abordagens utilizadas por autores como Hilgemberg (2004) e Miller e Blair (2009). O modelo de energia em unidades híbridas baseia-se em um conjunto de matri-zes análogo ao do modelo convencional, isto é: matriz de transações ou fluxo de energia (medida em unidades físicas), matriz de requerimentos diretos de energia e matriz de requerimentos totais de energia (Miller e Blair, 2009). O procedi-mento consiste em substituir, na matriz de transações interindustriais (Z), a linhaque representa os fluxos de energia em unidades monetárias pelo vetor coluna, que representa os fluxos físicos de energia (E), obtido a partir da matriz do balanço energético nacional. Ou seja, após esta substituição, tem-se uma nova matriz de fluxos interindustriais (Z*), a qual representa os fluxos interindustriais de energia em unidades físicas e os demais fluxos em unidades monetárias.

Considere-se um modelo regional com quatro setores, em que um setor é, por hipótese, um setor de energia primária, cujos fluxos de produção para os de-mais setores são medidos em TEP (tonelada equivalente de petróleo). Neste caso, é possível expressar o modelo como:

=

$$$$$$$$$$$$$$$$

Z [ ]TEPTEPTEPTEPE =

(1)

Portanto, as matrizes em unidades híbridas serão representadas por um asterisco sobrescrito, como se segue:

=

$$$$$$$$$$$$*

T E PT E PT E PT E P

Z

(2)

O mesmo procedimento deve ser utilizado para a produção total (X) e de-manda final (Y) por setor:

=

$$$*

TEP

X

=

$$$*

TEP

Y (3)

131O Setor Energético Brasileiro

A matriz de coeficientes técnicos tradicional (A) pode ser representada como:

1)ˆ( −= XZA (4)

Os elementos de (A*) representam os coeficientes técnicos (ou coeficientes de requerimentos diretos) por unidade (física ou monetária). Em outras palavras, (A*) é a matriz híbrida de coeficientes técnicos.

== −

$$

$$

$$$

$$

$$

$$$

$$

$$

$$$

$$$

)( 1^

***

TEP

TEP

TEP

TEPTEPTEPTEPTEP

XZA (5)

A matriz inversa de Leontief, B* = (I – A*)-1, apresentará a mesma estrutura da matriz A* e será utilizada nos cálculos dos multiplicadores, linkages e requerimentos a seguir.

3.1.1 Multiplicadores5

Nesta subseção serão apresentados os cálculos para o multiplicador de produção, o multiplicador simples de emprego, o multiplicador de emprego do tipo 1 e o multiplicador de renda.

a) O multiplicador de produção para o setor j é o valor total da produção em todos os setores da economia necessário para satisfazer uma unidade mo-netária adicional da demanda final pela produção do setor j. Formalmente este multiplicador é o somatório dos efeitos direto, indireto e inicial.

( )

( ) ( )

=∆

=∆

∆−=∆ −

10

2 ; 01

1

1

YY

YAIX

(6)

Em que:

( )1Y∆ indica uma mudança somente no valor da demanda final para o produto do setor 1.

5. Todos os multiplicadores estão explicitados em Miller e Blair (1985).

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012132

( )2Y∆ indica uma mudança somente no valor da demanda final para o produto do setor 2.

Logo, pode-se concluir que:

( ) ( ) ( )

( ) ( ) ( )

∑=

=

=∆−=∆

=∆−=∆

n

iijjO

YAIX

YAIX

1

22

211

21

111

22

11

α

αα

αα

(7)

Portanto, em termos formais, o multiplicador de produto simples para o setor j, Oj dado na equação (7), é o somatório dos elementos da coluna da matriz inversa de Leontief. Este coeficiente mensura o impacto para todos os setores da economia de um valor adicional na demanda final do produto de um setor.

b) O multiplicador de emprego capta o número de empregos criados no setor j devido a um aumento de uma unidade na produção do mesmo setor decorrente de uma variação de uma unidade, em valor, da deman-da final.

Primeiramente, deve-se estimar a relação entre o valor bruto da produção (VBP) de um determinado setor e o emprego gerado neste setor. Em termos for-mais, tem-se:

(8)

Logo, o multiplicador simples de emprego será dado da seguinte maneira:

(9)

133O Setor Energético Brasileiro

b.1) Há também o multiplicador de emprego do tipo 1, segundo o qual, para cada emprego criado no setor j, há um total de Wj empregos criados na economia como um todo. Formalmente:

j

jj e

= (10)

c) O multiplicador de renda é calculado de forma análoga ao de emprego simples.6 Ele busca determinar quais os impactos de variações nos gastos com demanda final sobre a renda recebida pelas famílias (oferta de tra-balho) em vez de calcular o impacto sobre a produção setorial.

Primeiramente, deve-se estimar a relação entre o valor da produção de um determinado setor e a renda (salário) gerada neste setor. Em termos formais, tem-se:

(11)

Logo, o multiplicador da renda será dado da seguinte maneira:

(12)

3.1.2 Linkages para frente e para trás

Segundo Hirschman (1961), o desenvolvimento significa a transformação de um determinado estágio da economia em outro mais evoluído. O autor afirma que o desenvolvimento econômico se manifesta segundo a lógica de um desenvolvimento não equilibrado, em que ocorrem avanços desiguais entre os diversos setores da economia. Em outras palavras, quando um setor tem um avanço, os demais buscam alcançá-lo. Este processo, em que um desequilíbrio gerado em um determinado setor desencadeia alterações nos demais setores, é que gera desenvolvimento econô-mico. Segundo ele, alguns setores da economia têm a capacidade de induzir novos investimentos, devido à sua forte ligação com os demais setores da economia.

6. Apresentado no tópico (b).

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012134

Essas ligações, ou linkages, podem gerar efeitos para frente ou para trás. Segundo Toyoshima e Ferreira (2002), investimentos realizados sobre um setor que apresenta elevados linkages para frente geram efeitos positivos sobre os demais setores compradores, ou seja, trata-se de um setor que é muito demandado na economia. Já no caso daqueles que apresentam linkages para trás, os efeitos posi-tivos se dariam sobre os vendedores, logo, trata-se de um setor com alto poder de demanda sobre os demais. Para tanto, é necessário calcular os índices de ligação para frente (forward linkage effects) e para trás (backward linkage effects), propostos por Rasmussen (1956) e Hirschman (1961), como se segue.

• Linkages para trás (poder de dispersão) – Uj: determina o quanto um setor demanda dos demais setores da economia.

• Linkages para frente (sensibilidade da dispersão) – Ui: determina o quanto este setor é demandado pelos demais setores da economia.

Denotando (B) como a matriz inversa de Leontief, tem-se:

a) bij – elemento típico da matriz inversa de Leontief;

b) b.j – soma das linhas de B;

c) bi. – soma das colunas de B;

d) b.. – soma total da matriz B; e

e) B * – valor médio de todos os elementos de B, ou seja:

2

..*nbB =

(13)

Logo, os índices de ligação para frente e para trás são respectivamente (14) e (15):

*

.

Bn

bU

i

i = índice de ligação para frente (14)

*

.

Bn

bU

j

j = índice de ligação para trás (15)

Em que:

a) n – é o número de setores;

b) n

bi. – é o valor médio dos elementos na coluna j; e

135O Setor Energético Brasileiro

c)

nb j. – é o valor médio dos elementos na linha i.

3.1.3 Setor-chave

Hirschman (1961) afirma que os setores que apresentam elevado grau de encadeamento na cadeia produtiva – propagando, assim, efeitos para frente e para trás acima da média – são considerados setores-chave para o crescimento. Os setores-chave são considerados, de acordo com a literatura, como os prio-ritários na promoção do crescimento econômico regional. Estes setores são encontrados da seguinte forma:

• se Uj > 1, então, uma mudança unitária na demanda final do setor j cria um aumento acima da média na economia, ou seja, o setor j gera uma resposta dos outros setores acima da média;

• se Ui > 1, então, uma mudança unitária na demanda final de todos os setores cria um aumento acima da média no setor i – o setor i tem uma dependência acima da média da produção dos outros setores; e

• se Uj e Ui >1 – setor-chave.

3.1.4 Requerimentos de energia do setor energético7

Para se obterem os requerimentos de energia, é necessário subtrair B* da matriz identidade, da seguinte forma:

R *=B *-I * (16)

Em que R é uma matriz de coeficientes de requerimento líquido total. A matriz de coeficientes de requerimento indireto será dada por:

Q* = R* - A* (17)

As matrizes A *, R * e Q * proveem informações numéricas sobre o grau de dependência direta, total e indireta das atividades produtivas entre os setores. Os coeficientes da matriz A* de requerimentos diretos de energia proveem infor-mações sobre os efeitos imediatos, dada uma variação da demanda final, enquanto a matriz Q* de requerimentos indiretos de energia capta os efeitos secundários de uma mudança da demanda final.

O interesse é extrair tanto da matriz A* como da matriz R* apenas as infor-mações de requerimento relativas ao setor de energia. A matriz de requerimentos diretos de energia e a matriz de requerimentos totais de energia são obtidas

7. A metodologia para requerimentos de energia apresentada neste trabalho foi uma adaptação, para o contexto regional, do modelo inter-regional utilizado por Hilgemberg (2004).

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012136

extraindo-se, respectivamente, as linhas dos fluxos de energia de A* e (I – A*)-1. Torna-se necessário criar uma matriz F* com dimensão n x n, na qual seus ele-mentos que representam fluxos de energia (em TEP) são alocados ao longo da diagonal principal e os demais elementos são zeros.

=

000000000000000

*

TEP

F

(18)

Fazendo 1^

** )( −XF , obtém-se um vetor de zeros e números 1, no qual os números 1 denotam a localização do setor de energia. Pós-multiplicando as matri-zes de requerimentos diretos e de requerimentos totais de energia por 1

^** )( −XF ,

recuperam-se apenas os coeficientes de energia, ou seja, a intensidade de energia.

Logo, δ representa os requerimentos diretos e α os requerimentos totais:

1*1^

**

*1^

**

)()(

)(

−−

−=

=

AIXF

AXF

α

δ (19)

(20)

Os requerimentos indiretos de energia, g, são obtidos através da diferença entre os requerimentos totais (B*) e os requerimentos diretos (5):

])[()( *1*1

^** AAIXF −−= −−g (21)

3.2 Base de dados

A base de dados utilizada neste artigo pode ser dividida em duas partes. Primei-ramente, utilizaram as matrizes de insumo-produto estimadas por Guilhoto e Sesso (2005) referentes a 1997 e 2002. Tais matrizes apresentavam uma desagre-gação setorial para 42 setores produtivos e oitenta produtos (42 x 80). Destes, três setores passaram a compor o “setor energético” (petróleo e gás; refino do petróleo; e serviço industrial de utilidade pública – SIUP) e dez produtos passa-ram a constituir o “produto energia” (petróleo e gás; carvão e outros; álcool de cana e cereais; gasolina pura; óleos combustíveis; produtos do refino; produtos petroquímicos básicos; resinas; gasolina – álcool; e SIUP). A agregação destes setores e produtos gerou novas matrizes (40 x 71), que possibilitaram a obtenção das matrizes de consumo intermediário por setor (40 x 40) para 1997 e 2002.

137O Setor Energético Brasileiro

O segundo passo foi utilizar os dados do Balanço Energético Nacional (BEN) referentes a 1997 e 2002 para obter os valores não monetários (cotados em TEP) que iriam compor o modelo híbrido. No entanto, o BEN apresentava uma de-sagregação setorial diferente das matrizes de consumo intersetoriais (40 x 40). Logo, surgiu a necessidade de compatibilização entre as duas bases, o que gerou uma matriz final com desagregação para quatorze setores produtivos (mais deta-lhes sobre a agregação e compatibilização dos dados no apêndice A).

4 aNálisE dE rEsultados

A análise dos resultados obtidos seguirá o mesmo ordenamento da seção 3.

4.1 multiplicadores

A seguir serão apresentadas as análises dos resultados obtidos para os multiplicadores produção, emprego, emprego tipo 1 e renda.

a) Produção

O setor energético não apresenta um grande multiplicador de produção em relação aos demais setores da economia. Em 1997, a média deste índice, consi-derando todos os quatorze setores analisados, foi de 2,09. Este resultado deveu-se, principalmente, ao setor siderúrgico, que apresentou o maior multiplicador (3,51), seguido de transporte (2,86) e metais não ferrosos e outras metalurgias (2,54). Enquanto isto, o setor energético obteve um índice abaixo da média, apenas 1,38. Em 2002, a média brasileira destes setores caiu para 2,00. O setor energético, embora ainda permaneça abaixo da média, obteve elevação em seu multiplicador quando comparado a 1997. Passou de 1,38 em 1997 para 1,78 em 2002. No entanto, esta elevação não se refletiu em crescimento da média global para 2002, pois setores importantes como siderurgia e transportes apre-sentaram uma queda acentuada em seus coeficientes, assumindo valores de 2,81 e 2,51, respectivamente.

No entanto, existem outras formas de medir a importância de um setor para a economia. Através de instrumentos de insumo-produto pode-se captar o impacto que os setores geram sobre o emprego e a renda. Portanto, procurar-se-á, agora, analisar os impactos gerados no emprego, por setor, diante de uma variação exógena, de uma unidade de demanda final ocorrida em cada setor.8

8. Para melhor entendimento do impacto no emprego, o coeficiente multiplicador de emprego apresentado estará multiplicado por mil unidades monetárias e apresentará apenas duas casas decimais.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012138

b) Emprego

Em 1997, a média do multiplicador de emprego simples para os quatorze setores da economia foi de 64,56. Isto quer dizer que, em média, quando são investi-das mil unidades monetárias na economia, são gerados pouco mais de 64 novos postos de trabalho. Entre os setores que mais geram empregos, pode-se citar a agropecuária (160,36) e o de têxtil e vestuário (105,17). O setor energético, em 1997, apresentou o pior índice entre os setores analisados, com apenas 14,67, ou seja, se fossem investidas mil unidades monetárias no setor, seriam geradas pouco mais de quatorze vagas de trabalho na economia. Em 2002, a média de empregos criados, a cada mil unidades monetárias investidas por setor, diminuiu para 39,91, em parte devido à diminuição do multiplicador dos setores agrícola e de têxtil e vestuário, com índices de 78,12 e 70,31, respectivamente. O setor de alimentos e bebidas também apresentou intensa diminuição em seu multiplica-dor de emprego no período, passando de 94,44 em 1997 para 51,90 em 2002. O setor energético foi o único a obter crescimento do índice no período analisado, fechando 2002 com 22,96.

A mecanização do processo produtivo dos principais setores da economia, as-sociada aos efeitos nocivos produzidos pelo “apagão”, pode ter sido responsável pela diminuição observada no multiplicador de emprego neste período. A elevação do índice apenas no setor energético pode estar correlacionada com os investimentos realizados no setor de energia elétrica, visando evitar futuros racionamentos.

Os resultados encontrados pelo multiplicador de emprego simples consi-deram o impacto gerado no emprego devido a uma variação na demanda final. Outra abordagem com relação a este tema pode ser adotada através da mensu-ração do impacto no emprego total da economia gerado pela criação de 1 nova 1 unidade de emprego no setor j. Este método é chamado de multiplicador de emprego do tipo 1.

b.1) Emprego tipo 1

Neste caso, em 1997, o setor energético configura-se como um dos mais importantes setores geradores de emprego, com um índice de 5,25, valor superior à média nacio-nal (4,09), perdendo apenas para o setor siderúrgico (16,78), de alimentos e bebidas (7,82) e indústria química (7,15). Isto implica que se fosse criada uma unidade de emprego no setor energético, por exemplo, resultaria em mais de cinco unidades de trabalho no restante da economia (lembrando que 5,25 pode ser subdividido em: 1 unidade criada no próprio setor energético e 4,25 geradas nos demais setores). Em 2002, o índice do multiplicador de emprego tipo 1 sobe na economia brasileira, atingindo uma média de 4,56. Este resultado decorreu, em parte, da elevação ocor-rida no índice do setor energético, que passou do quarto melhor índice em 1997 ao segundo em 2002, com 8,14, ultrapassando os setores de alimentos e bebidas (7,93)

139O Setor Energético Brasileiro

e químico (7,62). O setor siderúrgico também apresentou crescimento no período, mantendo o maior índice de multiplicador de emprego tipo 1, com 18,78.

c) Renda9

Analisando o multiplicador de renda para os quatorze setores entre 1997 e 2002, foi possível perceber uma diminuição média no período analisado, de 232,28 em 1997 para 187,39 em 2002. Portanto, pode-se constatar que novos investimentos realizados em 2002 iriam gerar menor impacto sobre a renda dos trabalhadores que aqueles realizados em 1997. O setor energético apresentou um multiplicador de renda inferior à média nacional em 1997. Porém, em 2002, o crescimento verificado para este setor fez seu índice ultrapassar a média dos demais. O setor energético foi o único que apresentou índices crescentes no período.10 Passou de 124,11 em 1997 para 188,73 em 2002. Os setores que apresentaram maiores índices foram serviços públicos e transportes, com 480,57 e 377,11 em 1997 e 439,54 e 295,08 em 2002, respectivamente.

4.2 Linkages para frente e para trás

Verifica-se, através da matriz de insumo-produto de 1997 e 2002, com agregação em quatorze setores produtivos, que o setor energético nacional, em 1997, apre-sentava o maior índice de ligações para frente (2,36), seguido pelo setor de trans-portes (1,79). Logo, se tratava de um setor fortemente demandado pelos demais setores. Em outras palavras, uma mudança unitária na demanda final de todos os setores cria um aumento acima da média no setor energético. Já em 2002, a importância do setor energético, no que se refere aos efeitos para frente, diminui em relação a 1997, ficando em 1,59, sendo ultrapassado pelo setor de transportes, com 1,91. Este resultado decrescente pode ter tido influência do efeito “apagão” ocorrido no setor elétrico11 entre junho de 2001 e fevereiro de 2002 (gráfico 2).

Nesse período, tanto o consumo quanto a produção de energia decresceram devido às medidas adotadas pelo governo para restringir o consumo, visando evitar um possível blecaute nacional. Segundo Bardelin (2004), a oferta de energia não seria suficiente para suprir o consumo. No entanto, esta visão simplória pode es-conder outras questões importantes relacionadas à crise do setor. Entre elas, pode-se citar a elevada dependência dos recursos hídricos12 na geração de energia elétrica no Brasil, fator que deixa o país dependente da sazonalidade das chuvas para suprir seus reservatórios. O racionamento de energia gerou uma diminuição do consumo

9. Os índices obtidos foram multiplicados por mil.10. Fato que pode estar relacionado com a reestruturação do setor no período que se seguiu ao racionamento de energia.11. Lembrando que o setor de energia elétrica é apenas um dos componentes do setor energético analisado neste trabalho. Detalhes sobre os demais componentes estão dispostos no apêndice A.12. Mais de 90% da matriz energética, entre 1997 e 2002, segundo dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS).

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012140

por parte dos demais setores da economia. Esta diminuição pode ter influenciado o resultado obtido no índice de ligações para frente do setor energético entre 1997 e 2002, visto que demandar mais deste setor se tornou mais oneroso.

GRÁFICO 2Evolução histórica anual do consumo e produção de energia elétrica (1952 e 2006)(Em gigawats-hora – GWh)

0

50.000

100.000

150.000

200.000

250.000

300.000

350.000

400.000

450.000

1952

1954

1956

1958

1960

1962

1964

1966

1968

1970

1972

1974

1976

1978

1980

1982

1984

1986

1988

1990

1992

1994

1996

1998

2000

2002

2004

2006

Produção Consumo

Fonte: Eletrobrás.

Com relação ao índice de ligações para trás, o setor energético não é um dos mais importantes na economia brasileira, ficando abaixo da média nacional entre os setores (média = 1), tanto em 1997 (0,66) quanto em 2002 (0,89). Portanto, não é um dos setores que mais demandam dos demais setores (apesar de ter apre-sentado forte crescimento no período analisado, aproximadamente 35%).13 Em outras palavras, o aumento do nível de atividade do setor energético gera uma elevação na demanda por insumos de outros setores abaixo da média.

4.3 setor-chave

Os resultados obtidos para os linkages do setor energético (subseção 4.2) suge-rem que este setor não apresenta características de um setor-chave para a eco-nomia, mas isto não implica que ele não seja importante para o crescimento. A importância de um setor, baseada apenas pela ótica do método de setor-chave,

13. O crescimento verificado no índice de ligações para trás, entre 1997 e 2002, pode estar correlacionado com as realizações efetuadas pelo governo federal durante o “apagão”. Segundo Bardelin (2004), o racionamento de energia elétrica trouxe uma nova realidade ao setor, uma vez que foram criadas medidas e efetuados investimentos que visavam combater futuras crises de abastecimento. Entre estas medidas está o Comitê de Revitalização do Modelo do Setor Elétrico, criado pela Resolução GCE no 18, em junho de 2001, com o objetivo de revitalizar o setor energético brasileiro. Mais detalhes, ver Bardelin (2004).

141O Setor Energético Brasileiro

pode esconder aspectos importantes de cada setor. Nesta análise, apenas o setor siderúrgico apresentou características de um setor-chave, tanto em 1997 quanto em 2002.14 Em outras palavras, somente um dos quatorze setores analisados con-seguiu manter um coeficiente superior à unidade no que se refere aos linkages para frente e para trás neste período. No entanto, como mencionado, o setor energético é um dos setores com maior índice de ligações para frente (embora apresente uma fraca ligação para trás) e de elevada importância para o crescimento. Analisando a média dos índices de ligações para frente e para trás15 dos quatorze setores, em 1997 e 2002, nota-se que o setor energético é importante para a economia.16 Em 1997, sua média superou a de todos os demais setores, obtendo um índice de 1,51, seguido por siderurgia (1,39) e transportes (1,20). Já em 2002, devido à diminui-ção verificada em seu índice de ligações para frente, o setor energético apresentou uma queda na média de linkages, passando para 1,24, índice este inferior ao do setor de transportes (1,31) e da siderurgia (1,27).

Os resultados obtidos neste trabalho, considerando os linkages dos setores, corroboram as expectativas de Myrdal (1972) para infraestrutura, ou seja, aque-les setores necessários para garantir o crescimento continuado. Segundo ele, os planejadores de políticas públicas deveriam priorizar investimentos em setores como: energia, transportes e agropecuária.17 De acordo com Toyoshima e Ferreira (2002), a importância em infraestrutura mínima já é reconhecida como uma pre-condição ao desenvolvimento. Torres e Puga (2006) ressaltam a importância da expansão e melhoria da infraestrutura para o crescimento econômico. Além de ser um fator de atração de investimentos externos, a infraestrutura exerce resultados diretos no desenvolvimento humano, pois tem efeitos permanentes sobre a deter-minação de renda per capita e sobre a produtividade de um país. Pêgo Filho et al. (1999) afirmam que uma melhoria na infraestrutura pode ser decisiva na inserção de um país no mundo globalizado.

4.4 requerimentos de energia do setor energético

Nesta subseção será analisada a evolução, entre 1997 e 2002, dos requerimen-tos totais de energia provenientes do setor energético, sendo estes subdivididos em diretos e indiretos. A utilização do modelo híbrido de insumo-produto gera resultados em unidades físicas (TEP), com desagregação para quatorze setores produtivos. Isto permitirá a mensuração, em unidades físicas, da pressão exercida

14. Em 1997, o setor siderúrgico obteve índice de ligações para frente de 1,09 e 1,68 para trás. Em 2002, estes valores foram 1,14 e 1,41 respectivamente. 15. Índices para 1997 e 2002, nesta ordem. 16. Note que a utilização da média dos linkages difere da análise de setor-chave padrão definida por Hirschman (1961) – subseção 3.1.3. No entanto, foi utilizada neste trabalho para destacar a importância do setor energético.17. Cabe salientar que o setor agropecuário obteve índices de ligações para frente acima da média em 1997 (1,08) e em 2002 (1,14).

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012142

pelos quatorze setores da economia sobre o setor energético e sua evolução durante o período analisado. Observando a tabela 2, pode-se perceber que a média de requerimentos totais de energia, proveniente do setor energético, diminuiu de 1997 (0,28) para 2002 (0,156). Isto quer dizer que, em média, os quatorze setores produtivos analisados estão demandando menos energia do setor energé-tico em 2002 que demandavam em 1997. O mesmo comportamento pode ser verificado na média dos requerimentos diretos e indiretos, que passaram de apro-ximadamente 0,15 em 1997 para 0,08 em 2002; e 0,13 em 1997 para 0,07 em 2002, respectivamente.

TABELA 2 Evolução de requerimentos totais (rt), diretos (rd) e indiretos (ri) de energia do setor energético (1997-2002)

RT 1997 RT 2002 RD 1997 RD 2002 RI 1997 RI 2002

Agropecuária 0,114 0,066 0,051 0,027 0,062 0,039

Extrativa mineral 0,292 0,166 0,163 0,106 0,129 0,060

Setor energético 0,089 0,093 0,004 0,004 0,085 0,089

Mineral não metálico 0,319 0,189 0,175 0,107 0,145 0,082

Siderurgia 0,939 0,429 0,458 0,221 0,481 0,208

Metais não ferrosos e outras metalurgias 0,373 0,208 0,097 0,056 0,276 0,152

Outras indústrias 0,100 0,062 0,011 0,007 0,089 0,055

Papel e celulose 0,140 0,074 0,057 0,031 0,083 0,043

Química 0,227 0,118 0,122 0,065 0,105 0,053

Têxtil e vestuário 0,084 0,050 0,024 0,012 0,060 0,038

Alimentos e bebidas 0,115 0,070 0,019 0,011 0,096 0,058

Comércio e serviços 0,041 0,029 0,009 0,007 0,032 0,022

Transportes 1,050 0,599 0,852 0,488 0,198 0,111

Administração pública 0,042 0,027 0,015 0,010 0,028 0,017

média 0,280 0,156 0,147 0,082 0,134 0,073

Elaboração dos autores.

O gráfico 3 apresenta a evolução dos requerimentos totais de energia do setor energético que cada setor obteve em 1997 e 2002. Por meio deste gráfico, pode-se concluir que o setor siderúrgico e o de transportes apresentam os maiores índices de requerimento total: 0,94 em 1997 e 0,43 em 2002; e 1,05 em 1997 e 0,6 em 2002, respectivamente. A partir desta análise, conclui-se que são os setores com maior poder de pressionar o setor energético, apesar de apresentarem subs-tancial diminuição no período analisado. Portanto, um crescimento na siderurgia ou no setor de transportes pode demandar investimentos em energia.

143O Setor Energético Brasileiro

GRÁFICO 3Evolução dos requerimentos totais de energia do setor energético (1997-2002)

0

0,2

0,4

0,6

0,8

1

1,2

Ag

rop

ecu

ária

Extr

ativ

a m

iner

al

Seto

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erg

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o

Min

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beb

idas

Co

mér

cio

e s

ervi

ços

Tran

spo

rtes

Ad

min

istr

ação

blic

a

1997 2002

Elaboração dos autores.

No entanto, somente a análise da composição dos requerimentos (diretos e indiretos) fornecerá o verdadeiro indício da capacidade de pressão que estes seto-res podem exercer sobre o setor energético. Cabe salientar também que o único setor que obteve índice de requerimentos totais crescente, no período analisado, foi justamente o setor energético (gráfico 3). Isto significa que este setor passou a consumir mais energia em 2002 que em 1997. Uma hipótese pode ser a de que os investimentos realizados no setor elétrico no período do “apagão” tenham gerado efeitos positivos no que diz respeito à demanda deste setor por energia.

Ao analisar os requerimentos diretos de energia do setor energético, gráfico 4, nota-se que, com exceção do setor energético, que se manteve constante, todos os demais setores apresentaram diminuição em seus índices. Mais uma vez, a side-rurgia e o setor de transportes despontaram como os setores com maiores reque-rimentos diretos, com 0,46 em 1997 e 0,22 em 2002; e 0,85 em 1997 e 0,49 em 2002, respectivamente. Outros setores apresentaram índices intermediários de requerimentos diretos, são eles: minerais não metálicos (0,17) e (0,11);18 extrativo mineral (0,16) e (0,11); químico (0,12) e (0,06); e metais não ferrosos e outras

18. Índices para 1997 e 2002, nesta ordem.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012144

metalurgias (0,10) e (0,06), os quais também têm capacidade de gerar efeitos diretos sobre o setor energético, porém com menos intensidade. O setor energé-tico praticamente não apresentou requerimentos diretos de energia. Seus reque-rimentos diretos não respondem nem por 5%, tanto em 1997 quanto em 2002, dos requerimentos totais de energia apresentados por este setor.

GRÁFICO 4Evolução dos requerimentos diretos de energia do setor energético (1997-2002)

0

0,1

0,2

0,3

0,4

0,5

0,6

0,7

0,8

0,9

Ag

rop

ecu

ária

Extr

ativ

a m

iner

al

Seto

r en

erg

étic

o

Min

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met

álic

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Met

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Pap

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Qu

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Têxt

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ento

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Co

mér

cio

e s

ervi

ços

Tran

spo

rtes

Ad

min

istr

ação

blic

a1997 2002

Elaboração dos autores.

O elevado índice de requerimentos diretos de energia obtidos pelo setor de transporte e siderúrgico está condizente com os dados apresentados pelo BEN. O setor de transportes é um grande consumidor de óleo diesel, gasolina e álcool etílico, enquanto a siderurgia demanda elevadas quantidades de carvão mineral, carvão vegetal e lenha.19

Analisando os requerimentos indiretos (gráfico 5), percebe-se uma mudança no ordenamento dos setores. Mais uma vez, a siderurgia se destacou, apresentando um elevado índice de requerimentos indiretos: 0,48 em 1997 e 0,21 em 2002. O setor de transportes, no entanto, que apresentou o maior índice de requerimentos totais e dire-tos, não apresenta importância tão elevada quando se trata de requerimentos indiretos. O setor obteve 0,2 em 1997 e 0,11 em 2002, ficando atrás do setor de metais não

19. Cabe ressaltar que todos estes produtos são componentes do setor energético. Ver agregação no apêndice A.

145O Setor Energético Brasileiro

ferrosos e outras metalurgias, com 0,28 em 1997 e 0,15 em 2002. Pode-se observar que a maioria dos demais setores exerce uma pressão intermediária sobre os requerimentos indiretos do setor energético. Novamente, o setor energético obteve crescimento em seu índice de requerimentos. Desta vez, o requerimento indireto do setor de energia passou de 0,85 em 1997 para 0,89 em 2002.

GRÁFICO 5Evolução dos requerimentos indiretos de energia do setor energético (1997-2002)

1997 2002

0

0,1

0,2

0,3

0,4

0,5

0,6

Ag

rop

ecu

ária

Extr

ativ

a m

iner

al

Seto

r en

erg

étic

o

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Sid

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Met

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Co

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Tran

spo

rtes

Ad

min

istr

ação

blic

a

Elaboração dos autores.

Segundo Perobelli et al. (2007): quanto menor a relação requerimentos diretos versus indiretos, maior o poder de multiplicação que a atividade de um dado setor exerce sobre o consumo de energia dentro de uma região. Setores com alto peso na demanda de energia da região e que, ao mesmo tempo, apresentam uma baixa relação requerimentos diretos versus indire-tos tendem a produzir as mais fortes pressões de demanda sobre o setor de energia da região. Em outro extremo, estariam setores com baixo peso na demanda de energia da região e com alta relação requerimentos diretos ver-sus indiretos, que, neste caso, produziriam pequenas pressões sobre o setor de energia da região. Entre ambos os extremos, configuram-se setores com graus variados, intermediários, de importância na pressão que exercem.

O gráfico 6 fornece a relação percentual de requerimentos diretos e indiretos de cada setor em 1997 e 2002. Pode-se perceber que o setor energético apresenta

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012146

a menor relação requerimento direto versus indireto entre os demais setores. Em am-bos os períodos analisados, os requerimentos indiretos do setor ficaram acima de 95%. Isto significa que este setor possui elevado poder de multiplicação sobre o consumo de energia. Voltando ao gráfico 3, no entanto, nota-se que, apesar de o setor energético possuir elevado poder multiplicador, seus requerimentos totais de energia são modes-tos quando comparados com os de outros setores. Um setor que apresente alto nível de requerimentos totais e baixa relação entre requerimentos diretos versus indiretos reúne as condições necessárias para impor uma forte pressão de demanda sobre o setor energético. Setores como: outras indústrias, alimentos e bebidas, comércio e serviços, têxtil e vestuário, e metais não ferrosos e outras metalurgias apresentam requerimen-tos indiretos superiores a 60% do total de requerimentos. Detêm, portanto, elevado poder multiplicador. O único entre os citados, porém, capaz de gerar uma pressão moderada sobre a demanda de energia seria o setor de metais não ferrosos e outras metalurgias, por apresentar um total de requerimentos acima da média dos setores.

GRÁFICO 6Participação setorial de requerimentos diretos (rd) e indiretos (ri) nos requerimen-tos totais de energia do setor energético (1997 e 2002)

(Em %)

0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100

Administração pública (2002)Administração pública (1997)

Transportes (2002)Transportes (1997)

Comércio e serviços (2002)Comércio e serviços (1997)

Alimentos e bebidas (2002)Alimentos e bebidas (1997)

Têxtil e vestuário (2002)Têxtil e vestuário (1997)

Química (2002)Química (1997)

Papel e celulose (2002)Papel e celulose (1997)

Outras indústrias (2002)Outras indústrias (1997)

Metais não ferrosos e outras metalurgias (2002)Metais não ferrosos e outras metalurgias (1997)

Siderurgia (2002)Siderurgia (1997)

Mineral não metálico (2002)Mineral não metálico (1997)

Setor energético (2002)Setor energético (1997)Extrativa mineral (2002)Extrativa mineral (1997)

Agropecuária (2002)Agropecuária (1997)

RD RI

Elaboração dos autores com base nos resultados obtidos.

147O Setor Energético Brasileiro

Cabe ressaltar, ainda, por meio do gráfico 6, que dois casos interessantes ocorrem com os seguintes setores: siderúrgico e de transportes. O setor de trans-portes apresentou o maior nível de requerimentos totais, tanto em 1997 quanto em 2002. Porém, 81,13% deste total correspondia a requerimentos diretos em 1997. Este valor ainda obteve pequeno crescimento em 2002, atingindo 81,41%. Este setor, portanto, demanda muita energia do setor energético, mas apresenta um baixo poder multiplicador. Já o setor siderúrgico mostrou-se um dos mais propícios a pressionar a demanda de energia. Isto é explicado pelo elevado índice de requerimentos totais (tabela 1) e por sua relação entre requerimentos diretos e indiretos (ambas próximas de 50%). Em 1997, seu requerimento indireto era de 51,23%, diminuindo em 2002 para 48,50%. A redução verificada entre 1997 e 2002 para a siderurgia diminuiu seu multiplicador, mas não a ponto de o setor perder sua importância com relação à capacidade de pressionar a demanda de energia do setor energético.

5 coNclusão

Este trabalho utilizou as matrizes de insumo-produto brasileira, agregadas em quatorze setores produtivos, utilizando unidades híbridas (TEP), para os anos de 1997 e 2002, no intuito de comparar as variações ocorridas no setor energético.

Verificou-se que, mesmo havendo uma diminuição global nos multi-plicadores de produção, renda e emprego no período analisado, o setor ener-gético apresentou crescimento nos índices de todos os seus multiplicadores. O único multiplicador que apresentou um crescimento médio no período foi o de emprego tipo 1. Também neste, o setor energético se sobressaiu. Uma hipótese levantada foi a de que os investimentos realizados no setor visando evitar novos racionamentos de energia elétrica tenham contribuído para tais resultados neste setor. A elevação dos multiplicadores de produto e emprego no setor energético, no entanto, não foi suficiente para que este atingisse índices superiores à média nacional. Somente no caso do multiplicador de renda este fato foi constatado. Em 1997, o setor energético apresentava um multiplicador inferior à média nacional e em 2002 seu índice ultrapassou a média dos demais setores. O índice relacio-nado ao emprego tipo 1 para o setor energético era superior à média em 1997 e cresceu ainda mais em 2002.

Com relação aos linkages do setor energético, os resultados apresentados fornecem indícios de que o setor apresentava um forte índice de ligações para frente em 1997. Logo, tratava-se de um setor demasiadamente demandado pelos demais setores. Este resultado corrobora a ideia de que a energia é um insumo básico à economia. Em 2002, este índice diminuiu (provavelmente devido às políticas de racionamento energético adotadas pelo governo) e o

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setor energético foi ultrapassado pelo setor de transportes, no que se refere aos linkages para frente. Já o índice de ligações para trás do setor energético apresentou-se abaixo da média nacional em ambos os anos analisados. Não se configura, portanto, como um setor que proporciona elevada demanda sobre os demais. Cabe destacar, no entanto, que o setor energético apresentou cres-cimento em seu índice de ligações para trás de 1997 para 2002. Mais uma vez, acredita-se que os investimentos realizados sobre o setor energético tenham ele-vado a pressão de demanda do setor energético sobre os demais. Outra questão importante está relacionada ao critério dos setores-chave. Analisando somente pela ótica proposta por Hirschman (1961), não se percebe a relevância do setor energético nos anos analisados. Analisando a média de linkages para frente e para trás para os quatorze setores desagregados, no entanto, constatou-se que em 1997 o setor energético apresentou a maior média entre os demais, obtendo o terceiro maior índice em 2002, ficando atrás do setor de transportes e side-rurgia respectivamente.

Os resultados dos requerimentos de energia do setor energético apon-taram para uma diminuição generalizada dos requerimentos totais de uma ordem de mais de 44% de 1997 para 2002. O único setor que aumentou seus requerimentos foi justamente o setor energético. Setores como siderurgia e transportes obtiveram quedas acentuadas em seus requerimentos totais, quan-do relacionados com os demais setores no período. Ainda são, no entanto, os setores que mais requerem energia. Como destacaram Perobelli et al. (2007), esta análise deve ser aprofundada em requerimentos diretos e indiretos para que se possa traçar um perfil dos setores que realmente têm grande poder de pressão sobre o setor energético. Em primeira análise, pode-se acreditar que o setor de transportes é o grande responsável por tal pressão sobre o setor ener-gético, seguido pela siderurgia. Análise mais detalhada, porém, indica que, nos períodos em questão, mais de 80% do total de requerimentos do setor de transportes são oriundos de requerimentos diretos. Sendo assim, trata-se de um setor com baixo poder multiplicador – lembrando que quanto maior a relação requerimentos diretos versus indiretos, menor o poder de multiplicação que a atividade de um dado setor exerce sobre o consumo de energia dentro de uma região. Na outra ponta está o setor de metais não ferrosos e outras meta-lurgias, o qual apresentou mais de 70% de seus requerimentos compostos por requerimentos indiretos e, portanto, apresenta elevado poder multiplicador. Entretanto, porque seus requerimentos totais são apenas medianos, seu poder multiplicador não é convertido em grande escala para a economia. O setor siderúrgico apresenta elevado índice de requerimentos totais, sendo estes bem divididos em diretos e indiretos, tornando-o, portanto, um dos setores que

149O Setor Energético Brasileiro

apresentam maior poder de pressão sobre o setor energético. Investimentos realizados na siderurgia devem ser efetuados de forma planejada, visando mi-nimizar ou conter possíveis pressões de demanda de energia.

Como foi verificado, os três setores com maior, poder de pressão de de-manda sobre o setor energético são: transportes, siderurgia e metais não ferro-sos e outras metalurgias, respectivamente. Observando o problema dos reque-rimentos de energia dos setores analisados neste artigo pela ótica da pressão de demanda exercida sobre recursos energéticos não renováveis, porém, nota-se a relevância do setor de transportes, uma vez que, além de ser o setor que mais requer energia, também está entre os que mais utilizam fontes não renováveis. Segundo os dados do BEN (Brasil, 2008), em 1997, 47% da demanda deste setor por energia era oriunda de óleo diesel; em 2002, este percentual subiu para 52,5%. Além disso, a gasolina, embora tenha diminuído sua participa-ção como fonte de energia no período analisado, ainda foi responsável por 25% do consumo total deste setor. O setor siderúrgico também está entre os principais consumidores de fontes não renováveis. Mais de 40% da energia necessária para produzir ferro gusa e aço (elementos básicos do setor) provêm do coque de carvão mineral. Já o setor de metais não ferrosos e outras meta-lurgias esconde seu verdadeiro poder de pressão sobre as fontes não renováveis de energia. Uma análise superficial sobre o setor poderia indicar que ele não é um problema substancial, uma vez que aproximadamente 60% da energia consumida por este é oriunda de eletricidade,20 a qual, no Brasil, é produzida, em sua maioria, por hidrelétricas. Conforme mencionado neste trabalho, no entanto, o crescimento do setor de metais não ferrosos e outras metalurgias gera uma demanda direta de energia relativamente modesta, embora seu im-pacto indireto seja elevado.

Este estudo não engloba todas as alternativas metodológicas possíveis para se analisar o setor energético. Além disso, o IBGE já disponibilizou as matrizes de insumo-produto referentes a 2000 e 2005. Existem ainda, portanto, algumas possibilidades de trabalhos futuros, entre as quais a atualização deste artigo utili-zando as novas matrizes do IBGE, que permitem a atualização ou mesmo elabora-ção de matrizes inter-regionais, o que possibilitaria a obtenção de resultados com maior desagregação regional que o obtido neste artigo. Por fim, tem-se a opção de unir estas matrizes com modelos econométricos.

20. Esse valor corresponde à média entre 1997 e 2002. Mais detalhes no BEM 2008 (Brasil, 2008).

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Originais submetidos em de março de 2011. Última versão recebida em janeiro de 2012. Aprovado em janeiro de 2012.

aPÊNdicE a

TABELA A.1compatibilização dos setores do BEN com as matrizes de insumo produto

Agregação das matrizes de insumo-produto (40 x 401 → 14 x 14)

Agregação das matrizes(14 x 14) com o BEN

1 agropecuária 9 Química 1 agropecuária

Agropecuária Elementos químicos Agropecuário

2 mineração e pelotização Químicos diversos 2 mineração e pelotização

Extrativa mineral 10 têxtil e vestuário Mineração e pelotização

3 setor energético Indústria têxtil 3 setor energético

Setor energético Artigos do vestuário Setor energético

4 minerais não metálicos Fabricação de calçados 4 minerais não metálicos

Mineral não metálico 11 alimentos e bebidas Não ferrosos e outras metalurgias

5 Ferro e aço Indústria do café 5 Ferro e aço

Siderurgia Beneficiamentos de produtos vegetais

Ferro gusa e aço

6metais não ferrosos e outras metalurgias

Abate de animais Ferro ligas

Metais não ferrosos Indústria de laticínios 6 metais não ferrosos e outras metalurgias

Outros metalúrgicos Fabricação de açúcar Cimento

7 outras indústrias Fabricação de óleos vegetais Cerâmica

Máquinas e equipamentos Outros produtos alimentícios 7 outras indústrias

Material elétrico 12 comércio e serviços Outras indústrias

Equipamentos eletrônicos Comércio 8 Papel e celulose

Automóveis/caminhões/ônibus Instituições financeiras Papel e celulose

Peças e outros veículos Serviços prestados à família 9 Química

Madeira e mobiliário Serviços prestados à empresa Química

Farmacêutica e veterinária Aluguel de imóveis 10 têxtil e vestuário

Artigos plásticos Serviços privados não mercantis Têxtil

Indústrias diversas 13 transporte 11 alimentos e bebidas

Construção civil Transportes Alimentos e bebidas

Comunicações 14 serviços públicos 12 comércio e serviços

8 Papel e celulose Administração pública Comercial

Celulose, papel e gráfica 13 transporte

Indústria da borracha Rodoviário

Ferroviário

Aéreo

Hidroviário

14 serviços públicos

Público

(Continua)

153O Setor Energético Brasileiro

Agregação das matrizes de insumo-produto (40 x 401 → 14 x 14)

Agregação das matrizes(14 x 14) com o BEN

demanda final

Residencial

Consumo não identificado

Elaboração dos autores.

Nota: 1 Ambas as matrizes de insumo-produto para o Brasil, em 1997 e 2002, estão desagregadas em 42 setores produtivos.No entanto, para compor o setor energético, utilizou-se a agregação a seguir. Os setores: 1) petróleo e gás, 2) refino do petróleo e 3) SIUP da matriz de produção (42 setores X 80 produtos) e da matriz de usos e recursos (80 produtos X 42 setores) para os respectivos anos passaram a compor o setor energético. Da mesma forma, os produtos: 1) petróleo e gás, 2) carvão e outros, 3) álcool de cana e cereais, 4) gasolina pura, 5) óleos combustíveis, 6) produtos do refino, 7) produtos petroquímicos básicos, 8) resinas, 9) gasolina – álcool e 10) serviços de utilidade pública (SIUP) passaram a constituir o produto energia.O resultado obtido destas agregações são matrizes de produção e usos e recursos, para 1997 e 2002, com desagregação para quarenta setores e 71 produtos. Através destas, pode-se obter a matriz de consumo intermediário por setor, para ambos os anos, com abertura para quarenta setores produtivos.

(Continuação)

aNálisE coNcEitual da PolÍtica dE tErritÓrios rurais: o dEsENvolvimENto tErritorial rural No BrasilJuliano Geraldi*

O artigo apresenta uma análise sobre a estratégia de intervenção do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais do Ministério do Desenvolvimento Agrário com o objetivo de entender como a política territorial brasileira operacionaliza o discurso transnacional do desenvolvimento territorial rural (DTR). A partir de uma abordagem do pós-desenvolvimento, o artigo demonstra como o governo federal brasileiro se apoiou em instituições internacionais para implantar no país, entre continuidades e descontinuidades, o discurso do DTR durante os governos FHC (1995-2002) e Lula (2003-2010). Analisa, então, as bases teóricas do programa ministerial por meio de seus documentos de referência, dando ênfase aos seus conceitos fundamentais a partir dos entendimentos realizados na primeira parte. Por fim, o artigo conclui sobre a estratégia de intervenção e o entendimento conceitual desta estratégia, os critérios utilizados para a delimitação socioespacial da intervenção e o nível de governo estabelecido pelas relações federativas.

Palavras-chave: políticas públicas no meio rural; pós-desenvolvimento; desenvolvimento territorial rural (DTR); Programa de Apoio ao Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais (Ministério do Desenvolvimento Agrário – Brasil).

coNcEPtual aNalYsis oF thE PolicY oF rural tErritoriEs: thE rural tErritorial dEvEloPmENt iN BraZil

The paper presents an analysis of the intervention strategy of the Programme of Support for Sustainable Development of Rural Territories of the Ministry of Agrarian Development in order to understand how the Brazilian territorial policy operates the transnational discourse on rural territorial development – RTD. By a post-development approach, the paper demonstrates how the Brazilian federal government relied on international institutions to deploy in the country, between continuity and discontinuity, the discourse of RTD during the government of FHC (1995-2002) and Lula (2003-2010). Analyzes, then, the theoretical basis of the program through the ministerial reference documents with emphasis on its fundamental concepts from the understandings achieved in the first part. Finally, the paper concludes on the intervention strategy and conceptual understanding of this strategy, the criteria used for defining socio-spatial intervention and the level of government established by federal relations.

Keywords: public policies in rural areas; post-development; rural territorial development (RTD); Program of Support for Sustainable Development of Rural Territories (Ministry of Agrarian Development – Brazil).

* Doutorando do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. Endereço eletrônico: <[email protected]>.

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El aNálisis coNcEPtual dE la PolÍtica dE los tErritorios ruralEs: El dEsarrollo tErritorial rural EN Brasil

El artículo presenta un análisis de la estrategia de intervención del Programa de Apoyo para el Desarrollo Sostenible en los Territorios Rurales del Ministerio de Desarrollo Agrario con el fin de entender cómo la política territorial brasileña opera el discurso transnacional de desarrollo territorial rural – DTR. Desde un enfoque post-desarrollo, el artículo muestra cómo el gobierno federal de Brasil se basó en las instituciones internacionales para desplegar en el país, entre la continuidad y la discontinuidad, el discurso de la DTR durante los gobiernos FHC (1995-2002) y Lula (2003-2010). Analiza, entonces, la base teórica del programa ministerial a través de sus documentos de referencia con énfasis en los conceptos fundamentales de los entendimientos alcanzados en la primera parte. Por último, el artículo concluye con la estrategia de intervención y la comprensión conceptual de esta estrategia, los criterios utilizados para definir la intervención socio-espacial y el nivel de gobierno establecido por las relaciones federales.

Palavras-clave: politicas publicas en zonas rurales; postdesarrollo; desarrollo territorial rural (DTR); Programa de Apoyo para el Desarrollo Sostenible en los Territorios Rurales (Ministerio de Desarrollo Agrario – Brasil).

l’aNalYsE coNcEPtuEllE dE la PolitiQuE dEs tErritoirEs ruralEs: lE dÉvEloPPEmENt tErritorialE rural au BrÉsil

Le article présente une analyse de la stratégie d’intervention du Programme d’Appui au Développement Durable des Territoires Rurales du Ministère du Développement Agraire, afin de comprendre comment la politique territoriale brésilienne fonctionne le discours transnationale sur le développement territoriale rural – DTR. Partir d’une approche post-développement, l’article montre comment le gouvernement fédéral brésilien s’est appuyé sur des institutions internationales à déployer dans le pays, entre continuité et discontinuité, le discours de la DTR au cours de les gouvernements FHC (1995-2002) et Lula (2003-2010). Analyse, puis, la base théorique du programme ministériel par le biais de leurs documents de référence avec l’accent sur les concepts fondamentaux de l’accord convenu dans la première partie. Enfin, l’article conclut sur la stratégie d’intervention et de la compréhension conceptuelle de cette stratégie, les critères utilisés pour la definition socio-spatiale de la intervention et le niveau de gouvernement établi par les relations fédérales.

mots-clés: politiques publiques dans la zone rural; post-développement; développement territoriale rural (DTR); Programme d’Appui pour le Développement Durable des Territoires Rurales (Ministère du Développement Agraire – Brésil).

JEL: R58.

1 iNtrodução

Este artigo propõe uma análise da política de territórios rurais do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) com o objetivo de entender como a política territorial brasileira opera uma de suas estratégias de intervenção no âmbito rural a partir de um discurso desenvolvimentista. Ao se analisar a política ministerial, procura-se elucidar os princípios, as práticas e os conceitos dos quais se utiliza.

157Análise Conceitual da Política de Territórios Rurais

De forma inicial, o autor baseia sua argumentação em Montenegro Gómez (2006, p. 32), que, depois de identificar o duplo rural nos discursos das políticas de de-senvolvimento – o rural do atraso e o rural da possibilidade –,1 afirma que:

Em ambos os casos, o termo de comparação é um desenvolvimento baseado tanto na colonização do social pelo econômico, universalizando comportamentos ocidentais alicerçados na lógica de mercado e na reprodução e acumulação do capital, como na implementação de estratégias de controle que permitam um governo do social capaz de garantir a reprodução do sistema socioeconômico vigente.

Acredita-se que o alicerce desse posicionamento – no momento em que criti-ca o regime vigente de reprodução social – está na compreensão da necessidade que tem o desenvolvimento em cientificar a reprodução social (Santos e Silveira, 2003) com o intuito de facilitar a integração de novos territórios à dinâmica capitalista de reprodução do espaço. O pano de fundo deste artigo é que a territorialização do controle e da normatização, realizada por meio das políticas de desenvolvimento territorial, é uma forma de institucionalizar certas relações de poder que sustentam uma determinada forma de territorialização da tecnicidade e cientificidade.

O que se quer mostrar que a política de territórios rurais é uma técnica apropriada pelo MDA para despolitizar o desenvolvimento, transformando-o no movimento racional do simples progresso espaço-temporal do mundo. Conforme argumenta Santos (2000, p. 63), a seguir.

A vida assim realizada por meio dessas técnicas é, pois, cada vez menos subordinada ao aleatório e cada vez mais exige dos homens comportamentos previsíveis. Essa previsibilidade de comportamento assegura, de alguma maneira, uma visão mais racional do mundo e também dos lugares e conduz a uma organização sociotécnica do trabalho, do território e do fenômeno do poder.

As políticas territoriais tentam definir, dessa forma, uma posição de apoio ao planejamento enquanto uma tecnicidade do agir – como colocaria Escobar (2000), um planejamento que ressalta a condição de disciplinar o cidadão, nor-matizar e padronizar a realidade, inserindo as pessoas em uma realidade que pode ser controlada pelo Estado. Este movimento é resultado da utilização de instru-mentos de planejamento econômico, como é o caso das políticas de desenvolvi-mento territorial, que ao tentar alocar os meios de produção no território, o faz de forma tecnicista e racionalista, porém, diferente do que faz parecer, nunca de forma apolítica.

1. O rural do atraso é a concepção de que o meio rural é o parente pobre do meio urbano, possui baixo padrão de vida e condições restritas de produção – o termo de comparação seria o meio urbano dos países desenvolvidos, com alta capacidade de consumo e acumulação de riqueza. O rural da possibilidade é a concepção de que o meio rural possui potencialidades para se desenvolver, visto a qualidade de vida, vantagens comparativas para a instalação de novos em-preendimentos e produção intensa – em que o termo de comparação seria a concepção de que desenvolvimento não seria apenas industrialização, que laços de solidariedade, confiança e o empreendedorismo dos pequenos empresários podem se converter em um padrão de alta produção e remuneração.

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O desenvolvimento deixaria de ser uma opção para se tornar uma obrigatoriedade e, consequentemente, um instituto inquestionável. Ao des-politizar o desenvolvimento, consegue-se impor políticas com o objetivo de auxiliar a territorialização do controle e da normatização da sociedade. Estas políticas tornam-se, então, técnicas de planejamento e intervenção social que, tendo sido despolitizadas, acabam sendo consideradas como a única opção possível.

Para se entender melhor esse movimento, o artigo apresenta inicialmente o discurso transnacional no qual se apoia o programa ministerial, o desenvolvi-mento territorial rural (DTR), estabelecendo uma crítica à própria concepção de desenvolvimento a partir das concepções teóricas do pós-desenvolvimento. Neste contexto, será apresentado como o governo brasileiro traduziu os cânones do DTR no período Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) e Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010), ao mesmo tempo em que acessou agentes transnacionais na definição de políticas de desenvolvimento rural. Em um segundo momento, será analisada a política territorial do MDA por meio da análise dos documentos que servem de referência ao programa ministerial (Brasil, 2005a; 2005b; 2005c; 2006), debatendo seus conceitos fundadores e sua metodologia de intervenção a partir dos entendimentos construídos na primeira parte.

Com isso, será possível concluir sobre a política de territórios rurais enquanto técnica de planejamento ao se discorrer sobre a estratégia de intervenção e o enten-dimento conceitual desta estratégia, os critérios utilizados para a delimitação socio-espacial da intervenção e o nível de governo estabelecido pelas relações federativas.

2 dEsENvolvimENto tErritorial rural: aNálisE crÍtica a Partir do PÓs-dEsENvolvimENto E imPlicaçÕEs tEÓricas Para as PolÍticas dE dEsENvolvimENto rural No Brasil

Primeiramente, o autor fará uma análise dos pressupostos que o DTR utiliza como ponto de partida para elaborar seus princípios e suas práticas para trazer sua conceituação por meio de seus principais formuladores: Schejtman e Berdegué. Paralelo a isto, proceder-se-á a uma análise crítica destes pressupostos e princípios a partir de autores do pós-desenvolvimento, como Esteva, Montenegro Gómez, Fernández, Amin e Vigil.

Esteva (2000, p. 60) é taxativo ao declarar que, desde a década de 1940, desenvolvimento “passou a significar pelo menos uma coisa: escapar da condição indigna chamada subdesenvolvimento”. Para o autor,

a palavra sempre tem um sentido de mudança favorável, de um passo do simples para o complexo, do inferior para o superior, do pior para o melhor. Indica que esta-mos progredindo porque estamos avançando segundo uma lei universal e inevitável, e na direção de uma meta desejável (Esteva, 2000, p. 64).

159Análise Conceitual da Política de Territórios Rurais

A progressão é entendida por Esteva pelos princípios de “unicidade, homogeneidade e linearidade da evolução do mundo” (op. cit., p. 66). Esta catego-rização contribuiu para que a história moderna fosse restrita à classificação dos estágios de desenvolvimento (Rostow, 1978 apud Esteva, 2000) – a separação entre países desenvolvidos, em desenvolvimento e subdesenvolvidos – no mo-mento que esta concepção de progresso do mundo através do espaço e do tempo responde à unidade das técnicas e das ações (Santos, 2000).

O que se quer argumentar é que essa concepção espaço-tempo é marcada pela existência de um regime de tecnicidade e cientificidade na reprodução social (Santos e Silveira, 2003), o qual facilita o estabelecimento de uma determinada garantia de estabilidade das trocas e da produção, entre elas o dinheiro (Santos, 2007). Para que isto aconteça, o Estado necessita territorializar o mercado, ou seja, regular as relações mercantis que ocorrem dentro do território nacional, ga-rantindo sua reprodução adequada (Andrade, 1987). Interessa-nos saber, aqui, como este processo de territorialização do mercado opera nas políticas de desen-volvimento rural. Para Schejtman e Berdegué (2004), a regulação do mercado deve ganhar uma abordagem territorial porque:

um dos obstáculos que enfrenta o desenvolvimento rural é a ausência ou imper-feição de mercados-chaves para que os sistemas de preços cumpram a sua função esperada. A necessidade de aperfeiçoar o funcionamento dos mercados rurais tem uma alta prioridade, pois as opções de emprego rural, em geral, e as atividades dos pequenos produtores, em particular, se caracterizam por funcionar em um âmbito em que o comportamento dos mercados de crédito e seguros, tecnologia, infor-mação, trabalho, terras e outros, estão muito longe do modelo que postula que os preços de equilíbrio determinados por estes mercados se aplicam por igual a todos os participantes (Schejtman e Berdegué, 2004, p. 12, tradução nossa).

Ao fazerem entender que o mundo rural deve funcionar tão somente de forma a constituir um mercado para a definição de preços dos produtos pro-duzidos, o quadro referencial definido pelos autores opera uma concepção pro-cedimental da inclusão do indivíduo nas relações sociais que ganha relevância social apenas na sua dimensão mercantil. Esta priorização da economia na vida social condiciona a construção de um núcleo social formado apenas pela cate-goria do trabalho no momento em que internaliza o desenvolvimento do mer-cado como algo natural da reprodução social. Como forma de consolidar este quadro – e, por conseguinte, consolidar a economização da vida –, as políticas de desenvolvimento rural estabelecerão mecanismos de integração dos indiví-duos ao mercado como única solução para os problemas sociais.

É possível identificar esses mecanismos na definição que Schejtman e Berdegué (2004) dão à versão rural do atual paradigma de desenvolvimento: desenvolvimento territorial rural. Para os autores, o DTR é “um processo

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de transformação produtiva e institucional de um espaço rural determinado, cujo fim é reduzir a pobreza rural” (Schejtman e Berdegué, 2004, p. 30, tra-dução nossa). E prosseguem afirmando que:

a transformação produtiva tem o propósito de articular competitiva e sustentavel-mente a economia do território com mercados dinâmicos, o que supõe mudanças nos padrões de emprego e produção de um espaço rural determinado. O desenvol-vimento institucional tem como objetivo estimular a concertação dos atores locais entre si e deles com os agentes externos relevantes, assim como modificar as regras formais e informais que reproduzem a exclusão dos pobres dos processos e benefícios da transformação produtiva (op. cit., p. 30, tradução nossa).

Observa-se que a transformação produtiva tem como objetivo a integração do território à dinâmica de mercado, com o intuito de adensar as relações mer-cantis e, com isto, responder ao desenvolvimento enquanto acumulação do capi-tal através do espaço e do tempo. Para isto, o desenvolvimento institucional cate-goriza a parcela da sociedade que deve ser responsabilizada pelo desenvolvimento – os agricultores familiares pobres, os quais devem ser incluídos na constituição do mercado. Além disso, o enunciado concentra nos processos econômicos todos os esforços para modificar as regras formais e informais que reproduzem a exclusão dos pobres, sem atentar ao fato de que esta exclusão não tem origem somente eco-nômica. Este movimento de transformação produtiva se daria, por sua vez, pelo ordenamento territorial, de forma que a localização das atividades econômicas no território possa resultar no arranjo necessário para a maximização da produção e do consumo.

Para Montenegro Gómez (2006), a forma como o DTR relaciona-se com os cânones tradicionais do desenvolvimento acabou por consolidá-lo como a perma-nência do núcleo duro de uma determinada política de desenvolvimento: “maior e melhor integração no mercado, apoiada num arranjo entre instituições e legitimada por uma participação reificada e limitada ao papel decorativo de ratificar o que se apresenta como possível e necessário” (Montenegro e Gómez, 2006, p. 207).

Outra relação importante apresentada por Montenegro Gómez é aquela de-finidora de uma escala de poder na qual o DTR sustenta-se transnacionalmente por meio de instituições conservadoras – listadas a seguir – na forma como ope-racionalizam o desenvolvimento.

1) Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (Fida).

2) Banco Mundial.

3) Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).

4) Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO).

5) Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA).

161Análise Conceitual da Política de Territórios Rurais

6) Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal).

7) Instituto Latino-americano e do Caribe de Planificação Econômica e Social (Ilpes).

8) Agência Alemã de Cooperação Técnica (GTZ).

Essas instituições internacionais, entre outras, também são apresentadas por Fernández, Amin e Vigil (2008) como as principais influências na formulação de políticas de desenvolvimento subnacional na América Latina. Os autores ar-gumentam que a forma como essas instituições internalizaram o discurso trans-nacional do desenvolvimento nos países latino-americanos se deu por meio da:

influência de um corpo teórico majoritariamente germinado e primeiramente intro-duzido nos países centrais e, posteriormente, assimilado com pouca capacidade crítica tanto pelos organismos supranacionais que operam a região, como pelas instituições nacionais e subnacionais (Fernandez, Amin e Vigil, 2008, p. 50, tradução nossa).

O que é possível observar é que a assimilação do discurso do DTR se utiliza de uma condição colonialista na forma como se articulam as instituições listadas e os países latino-americanos (explicitada na pouca capacidade crítica). A partir do contexto apresentado, interessa ao autor saber como este processo se deu no Brasil, o qual culminou com a definição da política de territórios rurais do MDA. Para tal, deve-se partir de duas acepções: a primeira, reconhecer a escala nacional como a escala formuladora das políticas, mas que, com a descentralização admi-nistrativa pós-Constituição de 1988, é necessário reconhecer a escala local como gestora destas políticas nacionais; em segundo, visto que a implantação destas políticas pode ser considerada parte de dois governos nacionais distintos – Fer-nando Henrique Cardoso (FHC), de 1995 a 2002, e Lula, de 2003 a 2010 –, faz-se necessário compreender as permanências e mudanças na forma como os dois governos instrumentalizaram o DTR durante os dezesseis anos de seus mandatos.

Para a preponderância da escala nacional ser entendida, é necessário reco-nhecer que são os entendimentos e iniciativas levadas a cabo na escala nacional que deram e dão o tom à política em análise. É sobre este debate que o autor manterá o foco.

As transformações do rural brasileiro na década de 1980 acabam por conso-lidar alguns pressupostos – muitas vezes entendidos como um diagnóstico líquido e certo – que influenciaram as políticas de desenvolvimento rural nas últimas décadas (Ortega, 2008):

• grandes déficits de pobreza concentram-se nos ambientes rurais;

• o rural é tomado como um espaço e diferencia-se da abordagem que o identifica com o setor agropecuário;

• o processo de desenvolvimento deve ocorrer com a inserção em merca-dos dinâmicos (regionais, nacionais e internacionais);

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• a introdução de inovações tecnológicas produtivas e organizacionais, com a criação de novas estruturas de governança local; e

• essa nova governança deve ser sustentada por uma concertação social, cujo resultado é um pacto territorial que tem como meta o desenvolvi-mento endógeno.

Essa influência resulta, antes de tudo, de o rural ser mais que apenas um setor agropecuário (Ortega, 2008). Esta concepção do rural brasileiro – não mais entendido apenas como setor econômico e em dicotomia com o urbano – foi reforçada pela cons-tatação de que, apesar do que a herança marxista tenta revelar, não existiria mais no país uma questão agrária nacional, mas sim diversas questões agrárias nacionais, devido à grande heterogeneidade do rural brasileiro: este seria, para Navarro (2001), o principal limite para um projeto de desenvolvimento rural no Brasil. Este posicionamento tem sido utilizado para argumentar a necessidade de trabalhar as questões rurais em um número crescente de regionalizações (leia-se os mais de cem territórios rurais definidos hoje no país) como forma de pactuar o consenso necessário para o desenvolvimento em vez de se discutir, por exemplo, uma ampla reforma agrária nacional.

Para Beduschi Filho e Abramovay (2004, p. 36), a mudança de visão do rural como setor para o rural enquanto espaço está articulada com a mudança com a qual o planejamento governamental brasileiro se deparou no início da década de 1990: “de uma lógica de repartição setorial de recursos e de demanda de balcão para uma lógica territorial e de projetos”. Para Beduschi Filho e Abramovay (2004), este novo arcabouço interventor é delimitado por três questões principais: a atuação governamental por meio de programas; o fortalecimento das organizações locais; e novos recortes do território nacional – observados por meio dos eixos nacionais de integração e desenvolvimento, do Programa de Desenvolvimento Integrado e Sus-tentável de Mesorregiões Diferenciadas e do Zoneamento Econômico Ecológico.

Partindo-se do princípio que essa atuação teria como objetivo a mudança de um “padrão econômico e sistema político que sustentam a sociedade brasileira” (Navarro, 2001, p. 94), Navarro argumenta ser imprescindível a presença cons-tante do Estado e seus níveis subnacionais enquanto propositores das políticas públicas, haja vista o Estado “ser a única esfera da sociedade com legitimidade política assegurada para propor (e impor) mecanismos amplos e deliberados no sentido da mudança social” (op. cit., p. 88).

Argumenta-se que, conjugado com processos de descentralização em cur-so na América Latina – e que no Brasil repercutirá novas responsabilidades aos municípios –, a crescente importância do nível local (mesmo que menos política que se preconiza) na orientação das políticas de desenvolvimento significará a categorização da sociedade no espaço municipal como campo no qual o Estado obriga-se a intervir diretamente – lembrando o que foi exposto por Navarro sobre

163Análise Conceitual da Política de Territórios Rurais

a legitimidade absoluta do Estado. Isto permite ao Estado dar vazão às demandas reprimidas por políticas públicas no meio rural, visto que a demanda reprimida por desenvolvimento estaria concentrada nesta categoria (agricultor familiar).

Para Montenegro Gómez (2006, p. 63), a ideia de concentrar as políticas públicas rurais na agricultura familiar está relacionada a uma política – defendida pelo Banco Mundial2 e assumida pelo governo brasileiro a partir do primeiro mandato de FHC – de combate à pobreza rural, porém, baseado “na promoção de uma agricultura familiar empresarial integrada no mercado”. Para Montenegro Gómez (2006, p. 67), a concepção economicista da agricultura familiar comple-menta a “orientação econômico-mercantil que substancia a proposta de política pública para o meio rural”.

Sob a égide do desenvolvimento, troca-se a conflituosa questão agrária pela consensual questão do desenvolvimento – defendida por Navarro (2001, p. 94) com a denominação de “aliança do desenvolvimento rural” –, baseada na inter-venção estatal, com o intuito de proteger e promover o capital por meio da:

diversificação produtiva, pluriatividade, transformação do pequeno produtor em empresário rural, capacitando-o para contribuir melhor com a acumulação do ca-pital, implementação de políticas de desenvolvimento baseadas em mecanismos de mercado, busca de consensos entre classes sociais, participação popular e substitui-ção de enfoques setoriais por outros territoriais (Montenegro Gómez, 2006, p. 73).

Para além da categorização do social pela égide da agricultura familiar – por meio de uma concepção de fundo econômico – como ponto de continuidade entre as políticas de FHC e Lula, outro ponto que precisa ser mais bem analisa-do é aquele da descentralização, a qual teria supostamente levado o controle das dinâmicas de desenvolvimento da escala nacional para a escala local. A partir da forma como ocorreu a descentralização no Brasil, a territorialização das políticas de desenvolvimento rural tornou-se, na verdade, a municipalização da atuação da escala nacional, consolidando, na escala local, uma competição entre as munici-palidades por investimentos públicos e privados. Isto consolida um ordenamento do território operado desde o topo, em que a escala local se responsabiliza pela implantação dos projetos na medida em que se enquadra nos critérios definidos pela escala nacional – como é o caso da prerrogativa da existência de instituições territoriais para a política territorial do MDA.

Para Melo (1996), os defensores da proposta de descentralização ar-gumentam que a competição entre os entes federativos estimula a geração de inovações no sistema público, enquanto que os que se posicionam como

2. O Banco Mundial publicou em 1994 – três meses antes da eleição presidencial no Brasil – um relatório intitulado Brazil: the management of agriculture, rural development and natural resources, no qual analisava os convênios que possuía com o Brasil e realizava diagnósticos para uma mudança na sua posição diante do desenvolvimento rural.

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críticos da descentralização argumentam que a guerra fiscal como forma de inserção competitiva representa uma ausência de estratégia nacional de desen-volvimento. Melo (1996) defende que a forma com a qual a descentralização foi estabelecida no Brasil – realizada a priori da estabilização fiscal, caracteri-zada por um discurso pós-autoritarismo burocrático devido às duas décadas de regime ditatorial, e sem criar condições favoráveis às municipalidades do exercício de suas responsabilidades, fazendo-as altamente dependentes do po-der central para a implantação de políticas – criou uma guerra fiscal, a qual chama de hobbesianismo municipal, na qual o objetivo das municipalidades brasileiras tornou-se a inserir-se competitivamente em uma economia de mer-cado por meio da busca por investimentos.

Dessa forma, a descentralização, que deveria dar suporte à promoção da de-mocracia e das identidades territoriais, acabou por “converte[r] todas as questões relativas à desigualdade e concentração de renda em questões ilegítimas: elas pas-sam a ser vistas como obstáculos ao progresso” (Melo, 1996, p. 15). Apesar de partir de outra abordagem, na qual reconhece em certo grau a eficiência municipal nas decisões políticas e administrativas que lhe concernem, Abramovay (2001) também questiona se o recorte municipal é mesmo o mais apropriado para os processos de desenvolvimento ao afirmar que “local” não deve ser confundido com “municipal”. Esta constatação, realizada também em outros estudos (Abramovay, 1998; 1999; Beduschi Filho e Abramovay, 2004; Brasil, 2005a; 2006; Schneider e Tartaruga, 2004; Veiga, 2001), será uma das bases para o debate de territorializa-ção das políticas de desenvolvimento rural.3 O resultado deste movimento de des-centralização – muito mais administrativa que política – é a tentativa dos muni-cípios de se enquadrarem aos critérios definidos pelas políticas nacionais para que possam receber os recursos oriundos do âmbito federal, ou seja, de se organizarem de forma subalterna aos interesses do governo federal.

Outra acepção sobre as continuidades e rupturas dos dois governos nacio-nais em análise diz respeito ao fato de que esses dezesseis anos detiveram-se a dar o arcabouço político-institucional necessário para a elaboração e a implantação dessas políticas. Compreender as continuidades e rupturas é compreender a di-nâmica pela qual a política opera e, com isto, reconhecer a estrutura na qual o Estado a institucionaliza.

Para Montenegro Gómez (2006), a política de desenvolvimento rural do go-verno de FHC teria sido influenciada pelo entendimento do Banco Mundial para o meio rural. Segundo Montenegro Gómez (2006, p. 61), o banco entendia ser

3. O entendimento de que o deslocamento das políticas públicas da esfera municipal para a intermunicipal é a trans-posição do local para o territorial é o entendimento de um discurso pelo qual o desenvolvimento seria definido em uma escala apenas (ou na local, ou na territorial), o que acaba por escamotear um controle social estado-centrista que consolida relações multiescalares de poder que sustentam uma dinâmica capitalista de reprodução do espaço.

165Análise Conceitual da Política de Territórios Rurais

necessária “uma mudança no enfoque, colocando num primeiro plano o mercado e o senso empresarial como elementos diretores da nova dinâmica e reduzindo o papel do Estado”. O Estado brasileiro deveria, assim, elaborar políticas que promovam “relações capitalistas (...) sem considerar a pobreza existente nem a pobreza futura que mais mercado e mais concorrência provocam” (Montenegro e Gómez, 2006, p. 69).

Defendendo a concepção governista, Ortega e Mendonça (2007, p. 107) concluem que as políticas de desenvolvimento rural de FHC tinham o objetivo comum de um “enfrentamento da pobreza e da exclusão social com base em um novo referencial de atuação do Estado no campo social”. Com o pressuposto de maior eficiência dos gastos públicos, a atuação do Estado seria fortalecer as ca-pacidades locais para resolverem problemas por meio de iniciativas de desenvol-vimento local. Caberia ao governo federal e seus ministério, tão somente, “criar ambientes legais e institucionais favoráveis que incentivem o surgimento de tais iniciativas” (Franco, 2002 apud Ortega e Mendonça, 2007, p. 109). Estas inicia-tivas seriam a base do desenvolvimento local, em que a participação dos atores na esfera pública seria suficiente para gerar densidade de capital humano e social, elementos condicionais para o desenvolvimento (Ortega e Mendonça, 2007).

Dessa forma, entendendo que o agricultor familiar será o ator privilegiado na formulação das políticas públicas no meio rural, torna-se possível compreender como a política limita a ação coletiva com o intuito de modificar (ou não) uma determinada realidade. Na análise feita por Montenegro Gómez (2006, p. 70) do documento O novo mundo rural, lançado em 1999 (como proposta do segundo mandato do governo de FHC) para tratar da reformulação da política agrária no país, os objetivos definidos pelo documento reforçam “a ideia de que resolver a pobreza dentro do mercado seria possível e compatível com uma estratégia que eleva a agricultura familiar ao papel de protagonista (...) o agricultor familiar vira factótum para resolver todos os entraves do meio rural”.

Tem-se, assim, a definição do agricultor familiar como o grande segmento de intervenção para as políticas de combate à pobreza rural. Em um contexto de municipalização das políticas públicas, geradas desde a promulgação da Consti-tuição de 1988, o debate local do desenvolvimento limitou a esfera municipal como o espaço de organização social dos agricultores rurais, com o intuito de condicionar a sua ação de inclusão nos processos de produção por meio de meca-nismos de mercado. O estabelecimento de políticas como o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) vinculado aos conselhos municipais de desenvolvimento rurais (CMDRs) é exemplo da forma de atuação das políticas de desenvolvimento rural: “através de melhoras nas infraestruturas dos municípios com forte presença do agrário” objetiva “converter o pequeno produtor em pequeno empresário” (Montenegro Gómez, 2006, p. 69).

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Já o governo Lula se caracteriza, primeiramente, pelo paradoxo de “compatibilizar as prioridades de combate à pobreza e às desigualdades sociais com o crescente do-mínio das políticas econômicas liberalizantes” (Ortega e Mendonça, 2007, p. 111). Dando continuidade a certas lógicas da política anterior, o governo Lula insiste em relacionar pobreza e mercado para solucionar a inclusão social de grupos tradicional-mente excluídos. Comparando o documento base do governo de FHC, O novo mundo rural, com o documento de referência da Secretaria de Desenvolvimento Territorial do governo de Lula, Montenegro Gómez (2006) reconhece que, inserido nos discursos de valorização do territorial e da importância à participação social defendidos pelo gover-no Lula, as estratégias de implantação das políticas de desenvolvimento convergiam para os pressupostos preconizados pelo governo de FHC. E o autor continua:

podemos concluir que há mais continuidades do que rupturas, nas propostas de po-líticas públicas para o meio rural, nos últimos 10 anos. (...) observamos que o mo-delo de desenvolvimento em que se baseiam essas propostas não difere, no essencial, das sugestões que o Banco Mundial fez ao governo brasileiro, no início da década de 1990, para modificar a política agrária (Montenegro Gómez, 2006, p. 84).

As rupturas às quais o autor se refere podem ser mais bem exemplificadas por Ortega (2008), ao estabelecer três pontos de diferença que merecem sua transcrição e análise.

1) “Ainda que seja possível identificar a intenção de promover um desen-volvimento endógeno nos territórios, fica patente a tentativa de combi-nação das estratégias de buttom-up e top-down de intervenção” (op. cit., p. 173, grifo nosso). Porém, na constituição de instituições territoriais (agências de desenvolvimento, conselhos do território etc.) é evidente o papel dos níveis estatais supramunicipais (MDA e secretarias estaduais de Agricultura) no fomento e na constituição destes espaços.

2) “Ampliação do foco de alcance dessas políticas: de municipalista e agra-rista para intermunicipalista e de superação da dicotomia rural-urbano” (op. cit., p. 174). Porém, os projetos continuam sendo destinados, em grande parte, ao meio rural e consolidando, também, uma concepção uniescalar de atuação – apesar de passar de municipal para intermunici-pal, a abordagem territorial da política consolida uma relação federativa baseada na municipalização da ação do governo federal, mais que na descentralização política do poder decisório, ao manter as entidades do território em uma única escala de atuação.

3) “Há um maior empenho em superar a fragmentação de políticas e a visão setorial agropecuária presente nos governos anteriores” (idem, ibi-dem). Isto pode ser observado na diferença entre os agentes incluídos

167Análise Conceitual da Política de Territórios Rurais

nos CMDRs e nos conselhos gestores dos territórios,4 este último com a participação de entidades governamentais que não são diretamente ligadas à questão agrária, como secretarias de Educação e Saúde. Porém, as decisões do colegiado possuem respaldo apenas dentro dos programas do MDA, não havendo espaço para uma verdadeira integração e parti-cipação de outros setores.

Apesar das continuidades e rupturas, a centralidade do MDA e da escala na-cional na definição do ambiente programático das políticas de desenvolvimento rural – baseada sempre no discurso transnacional de maior eficiência do mercado – em nenhum momento é posto à prova, mesmo com todo o discurso de fortaleci-mento das comunidades locais. Para compreender melhor o estabelecimento de políticas que se apoiam no DTR, será analisado, a seguir, o Programa de Apoio ao Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais, instituído pelo MDA em 2003, visto ser a política responsável pela operacionalização do DTR pelo minis-tério – e, consequentemente, pelo governo brasileiro – nos últimos anos.

3 o Programa dE aPoio ao dEsENvolvimENto sustENtávEl dE tErritÓrios rurais do miNistÉrio do dEsENvolvimENto agrário: Estrutura dE iNtErvENção E aNálisE dos sEus coNcEitos FuNdamENtais

Para a análise do programa, primeiramente será apresentada como está estru-turada a atuação ministerial. Em um segundo momento, será feita uma análise crítica dos conceitos fundamentais desta estrutura por meio das críticas que Hadijmichalis faz às políticas territoriais, mantendo a perspectiva teórica do pós-desenvolvimento deste estudo, para que se possa subsidiar as conclusões fi-nais sobre a forma de intervenção social proposta pela política, o entendimento sobre a concepção de controle social utilizado, os critérios de regionalização para a intervenção e de definição do público-alvo, e o nível de governo estabelecido pelas relações federativas.

A definição de uma política específica que tem como objeto de intervenção a concepção de território rural inicia-se em 2003 com a criação da Secretaria de Desenvolvimento Territorial (SDT) no âmbito do MDA. No mesmo ano, o Con-selho Nacional de Desenvolvimento Rural e Agricultura Familiar (CONDRAF) publicou um texto de discussão5 que balizou a formulação de um programa de desenvolvimento sustentável de territórios rurais, incluído no Plano Plurianual 2004-2007. A formulação deste texto teve o auxílio do IIca, instituição defensora do paradigma de desenvolvimento baseado no DTR (Montenegro Gómez, 2006).

4. O Conselho Gestor do Território é o colegiado decisório recorrente na implantação das políticas de DTR e que pode-ria ser caracterizado como um conselho regional de desenvolvimento rural.5. Texto para Discussão n. 4 do Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural (NEAD) do Ministério do De-senvolvimento Agrário (MDA), publicado em outubro de 2003. O texto foi revisado e republicado pela Secretaria de Desenvolvimento Territorial (SDT) do MDA, em março de 2005 (Brasil, 2005b).

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Justificada pela constatação de que as políticas de promoção do desenvolvimento rural no Brasil das últimas décadas foram “insuficientes” – evidenciado pelo “aumento da pobreza e persistência das desigualdades regionais, setoriais, sociais e econômicas” (Brasil, 2005b, p. 9) –, a política de apoio ao desenvolvimento sustentável de terri-tórios rurais tem por objetivo “promover e apoiar iniciativas das institucionalidades representativas dos territórios rurais que objetivem o incremento sustentável dos níveis de qualidade de vida da população rural” (Brasil, 2005a, p. 7).

O programa define quatro dificuldades principais a serem equacionadas para auxiliar o processo de desenvolvimento rural pela perspectiva territorial (Brasil, 2005b).

1) Capital humano, capital social e capital natural: apoiado na ideia de que o “enfoque territorial implica no desenvolvimento endógeno e na au-togestão” (Brasil, 2005b, p. 14), a SDT compreende que os territórios rurais estão entre as áreas mais pobres do país, e que esta condição acaba por definir um ambiente desfavorável à construção da cidadania e de difícil apropriação pelos indivíduos dos recursos naturais.

2) Estrutura fundiária e acesso à terra: por meio da constatação da grande concentração fundiária existente no Brasil atualmente, o programa en-tende que a desconcentração de terra poderia, também, desconcentrar as condições de desenvolvimento para os agricultores familiares.

3) Desenvolvimento territorial ou setorial? A pergunta é feita no intuito de estabelecer uma visão de desenvolvimento que não é expressa pela “soma do crescimento de diversos setores econômicos ou sociais” (op. cit., p. 15), entendendo, dessa forma, que o enfoque territorial cria melhores condi-ções para a gestão democrática e a construção de capacidades “tanto para o trabalho quanto para a participação e para a cidadania” (idem, ibidem).

4) Recursos financeiros para investimentos públicos: as questões estrutu-rais que entravam o desenvolvimento das regiões rurais só seriam equa-cionadas quando fossem resolvidas as suas causas, o que significaria redirecionar o investimento público que somente após a sua “matura-ção”, poderia ser suplantado “por investimentos privados, por iniciati-vas autônomas, por competências locais, pela dinâmica dos mercados, pelos conhecimentos acumulados e pelas oportunidades dos negócios” (op. cit., p. 16).

A identificação dessas dificuldades parece ter o intuito de estabelecer uma visão da problemática rural brasileira que relaciona pobreza rural e agricultura familiar como condições de subdesenvolvimento destas áreas. A partir desta cons-tatação, o programa estabelece diretrizes que podem ser resumidas em seis pontos (Brasil, 2005a).

169Análise Conceitual da Política de Territórios Rurais

1) A noção de território enquanto limite e potencial para a promoção do desenvolvimento rural sustentável.

2) Desenvolvimento sustentável enquanto articulação integrada de diversas dimensões.

3) Enfoque na participação e gestão social das políticas públicas.

4) Atuação em sinergia com entidades, organizações e vários níveis de governo.

5) Foco na redução das desigualdades econômicas e sociais.

6) Dinamização econômica dos territórios.

A estratégia de implantação da política também sustenta essa forma es-pecífica de intervenção ao eleger como eixos estruturantes da sua implantação (Brasil, 2005a):

1) articulação: que se dá em institucionalidades territoriais que fazem a gestão social por meio do estabelecimento de um plano de desenvolvi-mento (a própria figura do território rural);

2) órgãos colegiados: como oportunidade para a prática democrática, en-tendida por sua forma cooperada (os conselhos gestores dos territórios);

3) planejamento e gestão participativos: que por meio de três fases – mo-bilização, elaboração de um plano e implantação do plano – deve ter como resultado a afirmação da identidade e da representatividade ter-ritorial (os planos territoriais de desenvolvimento rural sustentável); e

4) o desenvolvimento de competências: por meio da capacitação dos agen-tes locais com cursos de formação.

O argumento central na crítica que se quer estabelecer é de que a forma como está estruturada a intervenção da política resulta no estabelecimento de um sistema de governo territorial que identifica uma população exclusivamente como a delimitação de um campo de intervenção.

1) A articulação em outros espaços de poder que extrapolam o território é realizada ou diretamente pela SDT, ou por espaços definidos pela SDT – como o CONDRAF, por exemplo –, além de a articulação se dar muito mais por entidades que diretamente pelos agricultores familiares, estes últimos vistos apenas como o público-alvo da política.

2) Os órgãos colegiados naturalizam o embate político entre os interesses diversos, visto que se apoiam em uma concepção consensual de partici-pação em vez de politizar os conflitos sociais.

3) planejamento e gestão podem resultar em uma identidade territo-rial reificada que corrobora formas específicas da organização política

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regional sem as questionar, e que reforça a centralidade das instituições criadas para operarem a própria política pública – resultado, também, da concepção consensual da participação em detrimento de uma con-cepção conflituosa.

4) o desenvolvimento de competências serve tão apenas para formar e in-cluir uma parcela da população de forma acrítica no estabelecimento de políticas públicas.

Visto que se apresenta aqui uma crítica de base ao programa ministe-rial, acredita-se ser necessário apresentar de forma detalhada o que o MDA chama de “conceitos fundamentais” (Brasil, 2005a): território, abordagem territorial, capital social, gestão social, empoderamento e institucionalida-de. Far-se-á esta análise mais adiante. Por hora, apresentar-se-ão os critérios de seleção dos territórios, os resultados esperados e os instrumentos de pla-nejamento e gestão.

A seleção das áreas que são incluídas no programa iniciou com a identifica-ção – a partir da base de dados do Instituto Brasileiro de Estatística e Geografia (IBGE) referente a municípios e microrregiões – de territórios urbanos, inter-mediários e rurais. Estes últimos definidos como “microrregiões geográficas que apresentam densidade demográfica menor que 80 habitantes/km2 e população média por município de até 50 mil habitantes”, sendo identificados 450 aglome-rados municipais (Brasil, 2005a, p. 16).

A priorização de atendimento foi estabelecida de forma a convergir com os interesses do MDA, ou seja, “concentração de agricultores familiares; con-centração de famílias assentadas por programas de reforma agrária; concentra-ção de famílias de trabalhadores rurais sem terra, mobilizados ou não” (op. cit., p. 17). A estes critérios foram incluídos outros, estabelecidos em contato com os conselhos estaduais de desenvolvimento rural sustentável, sendo eles:

densidade e atividade de capital social existente nos territórios rurais; a conver-gência de interesses institucionais e de participação da sociedade civil e governos estaduais; existência de áreas prioritárias de ação do governo federal nos estados; incidência de programas, projetos e planos de desenvolvimento de caráter regional (op. cit., p. 17).

No lançamento do programa, em 2003, quarenta territórios foram aprova-dos em vinte estados. Apesar de uma meta de 190 territórios que deveriam ser apoiados até 2007, em 2012, 164 territórios estavam incluídos no sistema de informações territoriais (SIT) da SDT, distribuídos conforme o mapa 1.

171Análise Conceitual da Política de Territórios Rurais

MAPA 1territórios rurais apoiados pela sdt/mda No Brasil

Fonte: SIT e IBGE. Obs.: imagem reproduzida em baixa resolução em virtude das condições técnicas dos originais disponibilizados pelos autores

para publicação (nota do Editorial).

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Em uma breve caracterização desses territórios (tabela 1), é possível ob-servar que, apesar de possuir 28,81% da população brasileira, os territórios representam 55,17% da população rural do país, 58,45% dos agricultores familiares e 73,27% das famílias assentadas pela reforma agrária ocupando 58,49% do território brasileiro, convergindo com os critérios de definição dos territórios ao se configurarem como as áreas do país com maior incidência das categorias de interesse do MDA.

TABELA 1comparação entre Brasil e territórios rurais

Variável Brasil Territórios

População 190.724.655 54.957.103

População rural 29.846.599 16.465.649

Estabelecimentos de agricultura familiar 4.363.034 2.550.151

Famílias assentadas 880.655 645.288

Área (km2) 8.626.768,60 5.046.045,50

Fonte: SIT e IBGE.Elaboração do autor.

De acordo com a visão governamental (Brasil, 2005a), existem quatro resul-tados que se almeja alcançar com a política ministerial: o fortalecimento da gestão social, o fortalecimento das redes sociais de cooperação, a dinamização econômi-ca dos territórios e a articulação das políticas públicas. Com a análise da estrutura que conforma estes resultados, é possível estabelecer a forma de intervenção da política nos territórios.

O fortalecimento da gestão social é entendido, para o programa, como a possibilidade de determinar as ações individuais, o que deve ser feito por meio da formalização de espaços de concertação social.

Isso [a convergência dos interesses individuais] terá maior êxito à medida que esses espaços evoluam da participação pontual ou formal para uma verdadeira institucio-nalidade capaz de deliberar e construir pactos que orientem a ação desses agentes individuais, (...) [e] conduzir o processo de construção e consolidação de uma insti-tucionalidade mais estável e melhor formalizada (op. cit., p. 19).

A formalização de todo um arcabouço de determinação das ações individu-ais será construída, assim, pela existência de:

institucionalidades territoriais, planos territoriais, projetos específicos e arranjos institucionais (...) cuja capacidade real de repercutir sobre o futuro do território tem que ser dada, de um lado, por sua consistência e coerência lógica, e de outro, pelo efetivo envolvimento e aderência dos atores locais através da prática permanente da gestão social (idem, ibidem).

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Ora, a formalização de instituições que possuam a prerrogativa de determinar as ações individuais nada mais é que a legitimação de um governo do social, e não pode ser confundido como inclusão política dos indivíduos nos centros de decisão. Outra observação possível é que a gestão social é construída somente de forma descendente – em última análise, do ministério em direção ao agricultor. Porém, ela não tem o objetivo de discutir a política em si, mas tão somente de determinar a atuação dos atores locais por meio do controle social.

Um exemplo dessa dinâmica é a troca do nome do CMDR do município de Teixeira Soares (estado do Paraná) para Conselho Municipal de Desenvolvi-mento Rural Sustentável, em 2006. Tendo sido apresentada a proposta para que o conselho tivesse a mesma denominação do conselho estadual (o qual já havia incluído o vocábulo sustentável em sua definição nominal), a proposta foi aprova-da com o argumento de um dos representantes das associações de produtores: ao afirmar que não sabia o que era sustentabilidade, o agricultor tinha como única preocupação que o município pudesse perder recursos provenientes das esferas es-tadual e nacional, caso não possuísse a palavra sustentabilidade no nome (op. cit.).O objetivo não era discutir a sustentabilidade da ação pública, mas garantir o seu reconhecimento por parte das outras escalas de poder.

Outra constatação se dá no momento em que não é o impulso a novas redes nem a ampliação das existentes – aumentando assim a densidade das relações sociais – a medida utilizada para estabelecer o fortalecimento das redes sociais, mas a apropriação das redes já existentes pelos canais formais delimitados pelas institucionalidades territoriais, justificado pelo fato de que, se não estão institu-cionalizadas, as redes estariam residindo “nos subterrâneos da vida social local”, ou então, “bloqueadas por formas de exclusão e conflitos” (op. cit., p. 20).

Existe aqui a construção de um discurso dicotômico no qual relações so-ciais que não estejam formalmente institucionalizadas dentro do projeto político de desenvolvimento estabelecido pelo território, estariam, na verdade, servindo como entraves para o desenvolvimento. Ora, relacionado ao resultado anterior (fortalecimento da gestão social), é possível concluir que a institucionalização das relações sociais existentes teria como objetivo o seu controle por parte do colegia-do territorial, e não a sua expansão e seu fortalecimento.

A dinamização econômica dos territórios é entendida, para o programa, como “a consequência do investimento público e privado em formas de organização da produção e da distribuição capazes de favorecer a redução das diferenças entre as taxas de retorno privadas e sociais” (op. cit., p. 21). A importância dada à economia no enfoque territorial do programa é alusiva à importância que “renda e remune-ração digna do trabalho assumem o papel de apoiar a inclusão social, possibilitan-do o acesso a bens e serviços, bem como atribuir à inclusão econômica a função de resgatar a dimensão produtiva do indivíduo e cidadão” (Geraldi, 2006, p. 21).

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Dessa forma, é explícito o processo pelo qual o indivíduo se torna cidadão – no momento em que a inclusão social é medida pela capacidade de acesso a bens e serviços –, dado pela sua inclusão no sistema produtivo e de consumo. Observa-se a consolidação de um entendimento de sociedade no qual a importância do indivíduo enquanto cidadão se dá pela importância da sua produção econômica e capacidade de consumo.

Para o programa, a articulação de políticas públicas é responsável pela cria-ção de um “ambiente inovador para o desenvolvimento sustentável dos territórios rurais, através do acesso a serviços e recursos que possam materializar os resulta-dos do trabalho” (idem, ibidem), com o intuito de consolidar um “contexto de fomento às iniciativas empreendedoras, por meio da cooperação e da articulação interinstitucional” (GERALDI, 2006, p. 22). A forma como integração vertical e integração horizontal são descritas nas bases do programa tenta consolidar o terri-tório como única realidade política dos atores locais – leia-se, atores incluídos nas institucionalidades territoriais. Destarte, o território deve se tornar o único objeto de intervenção pública, visto que políticas públicas de desenvolvimento que não estejam referendadas no Plano Territorial de Desenvolvimento Rural Sustentável (PTDRS) não teriam a potencialidade de se concretizarem como “iniciativas de promoção de desenvolvimento dos territórios rurais” (Geraldi, 2006, p. 22).

Por último, o programa define três instrumentos de planejamento e gestão para que seja possível a concretização dos seus objetivos, são eles: o já mencionado PTDRS, os projetos específicos e o monitoramento e a avaliação das iniciativas. O PTDRS deve se caracterizar “como um conjunto organizado de proposições e de decisões que conformam um acordo territorial que tem a participação da maioria dos atores sociais” (idem, ibidem), Assim, este acordo tenta ter legitimi-dade e representatividade suficientes para representar a “reflexão crítica sobre os problemas e potencialidades” por meio da delimitação de uma “visão de futuro concertada” (idem, ibidem). Uma vez definida esta visão, devido ao suposto grau de legitimidade e representatividade emanado, o PTDRS tornar-se-ia a visão de todos os atores inseridos nos processos territoriais.

No segundo instrumento, os projetos específicos exemplificam qual é o real objeto de investimento público por parte do MDA e seus parceiros estratégicos. Estes projetos devem estar incluídos no PTDRS e devem se en-quadrar nas seguintes ações: infraestrutura e serviços territoriais; capacitação; apoio às entidades associativas e cooperadas; apoio às iniciativas de comér-cio e desenvolvimento de negócios; e cooperação horizontal e institucional. A vinculação dos projetos com o PTDRS e a sistemática de escolha dos pro-jetos acaba por eximir o MDA da suposta responsabilidade de estabelecer a priorização dos projetos – apenas supostamente, pois acaba por fazê-lo no

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momento em que define o próprio programa e as linhas de financiamento que poderão ser acessadas pelo território –, visto que já os recebe em acordo com as ações orçamentárias que pode executar.

Outra observação possível é que, em razão de a legislação brasileira res-tringir o repasse de recursos para investimento aos órgãos estatais, devido à falta de um ordenamento jurídico mais claro sobre as organizações sociais, os projetos acabam tendo como proponentes as prefeituras municipais. Desta for-ma, as entidades dependem em grande medida de prefeituras para a assinatura dos contratos e da liberação de contrapartida, relegando às outras entidades o papel de parceiras no projeto, consolidando a centralidade dos órgãos estatais na intervenção do território e dando base para o debate já realizado sobre a municipalização da ação governamental.

O terceiro instrumento, monitoramento e avaliação, é implantado por meio de quatro mecanismos principais, que devem centralizar a informação e o pro-gresso das ações desenvolvidas:

• sistema de informações gerenciais (registro das informações sobre a gestão das ações);

• sistema de monitoramento e avaliação (monitoração do avanço dos indicadores relacionados com os resultados esperados);

• SIT (site eletrônico que disponibiliza indicadores sobre os territórios apoiados); e

• Projeto Demonstrativo da Gestão Territorial (análise qualitativa realizada em uma parte dos territórios apoiados por meio de convênios com insti-tuições acadêmicas).

A existência de um sistema de monitoramento e avaliação assaz comple-xo denota a necessidade de que conceitos como desenvolvimento e qualidade de vida podem (e devem) ser cientificamente medidos, visto que estariam incluídos em uma lógica temporal evolucionista, na qual existe uma situação posterior que sempre deve representar uma melhoria da situação anterior, na-turalizando o desenvolvimento como metáfora da evolução humana. Porém, é explícita a inexistência de monitoramento e avaliação pelos próprios terri-tórios – o movimento é sempre aquele em que o MDA monitora a execução dos projetos nos territórios.

Passar-se-á, agora, à análise dos conceitos fundamentais do programa minis-terial para que se possam encaminhar as considerações finais.

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3.1 território e abordagem territorial

Base do referencial teórico da política, a abordagem territorial é responsável por:

uma proposta centrada nas pessoas, que leva em consideração os pontos de interação entre os sistemas socioculturais e os sistemas ambientais e que contempla a integração produtiva e o aproveitamento competitivo desses recursos como meios que possi-bilitam a cooperação e corresponsabilidade ampla de diversos atores sociais (Brasil, 2005a, p. 8, grifo nosso).

A definição das pessoas como campo de intervenção facilitaria a capacida-de da abordagem territorial em integrar os territórios à economia nacional por meio de uma revitalização e reestruturação progressivas (Brasil, 2005b). Para tal, apresenta dois pressupostos superiores do campo de intervenção definido: coesão social – “expressão de sociedades nas quais prevaleça a equidade, o respeito à diversidade, à solidariedade, à justiça social, o sentimento de pertencimento e inclusão” (op. cit., p. 21) – e coesão territorial – “expressão de espaços, recursos, sociedades e instituições imersas em regiões, nações ou espaços supranacionais, que os definem como entidades cultural, política e socialmente integradas” (idem, ibidem). Por meio destes pressupostos, seria possível controlar as múltiplas di-mensões do processo de desenvolvimento no território: econômica, sociocultural, político-institucional e ambiental.

A centralidade do conceito de território nas políticas atuais, para Hadjimi-chalis (2008), caracteriza a redução de espaço a território, ao confundir enraiza-mento social com relações sociais localmente delimitadas. Apesar de definir múl-tiplas dimensões, elas só se operacionalizariam por meio de um regime uniescalar. No entendimento do MDA, a uniescalaridade do território é importante para a sua integração ao território nacional.

Para tanto, nada melhor do que o ordenamento das políticas nacionais estabele-cer diretrizes que permitam a sua aplicação nos diversos contextos regionais e ins-trumentos que se ajustem às demandas sociais provenientes dos territórios. Neste contexto, evidencia-se a importância de redefinir o papel do Estado, especialmente quanto à provisão de bens públicos, direção e regulação da economia, construção da democracia e da institucionalidade rural (Brasil, 2005b, p. 24).

É implícito aqui o regime de dividir o território nacional para melhor contro-lá-lo, garantindo a territorialização do Estado, facilitando o controle dos bens pú-blicos, da economia, da democracia e da institucionalidade. Baseado em argumen-tos integralistas, a política estabelece um conceito de território no qual tudo cabe:

um espaço físico, geograficamente definido, geralmente contínuo, compreendendo a cidade e o campo, caracterizado por critérios multidimensionais – tais como o ambien-te, a economia, a sociedade, a cultura, a política e as instituições – e uma população com grupos sociais relativamente distintos, que se relacionam interna e externamente por meio de processos específicos, onde se pode distinguir um ou mais elementos que indicam identidade e coesão social, cultural e territorial (Brasil, 2005a, p. 7-8).

177Análise Conceitual da Política de Territórios Rurais

A forma como todos esses elementos devem se territorializar no espaço, a fim de se unificarem no território, cria uma relação de maior controle sobre os critérios que sustentam o estabelecimento do próprio território – realizando um movimento tautológico de sustentação dos tais critérios multidimensionais. Se for entendido que a abordagem territorial do controle intervém sobre o orde-namento da sociedade estabelecendo outras dinâmicas que mais lhe convêm, e que este processo de articulação tem o objetivo de integrar o território à dinâmica econômica nacional, pode-se concluir que o objetivo da política é estabelecer uma determinada tipologia de organização social que tenha como resultado uma ação pública direcionada à reprodução do capital.

3.2 capital social e empoderamento

A organização social a qual objetiva a política é definida, pelo MDA, a partir do conceito de capital social.

Entendido como o conjunto de relações (pessoais, sociais, institucionais) que po-dem ser mobilizadas pelas pessoas, organizações e movimentos, visando a um de-terminado fim, o capital social tem na sua raiz processos que são, a um só tempo, baseados e geradores de confiança, reciprocidade e cooperação (Brasil, 2005a, p. 9).

O que está definido aqui é a qualidade das relações que sustentam uma determinada organização social. Para o ministério, o capital social é fundamental para a conformação da identidade territorial, pois é:

elemento aglutinador capaz de sustentar a mobilização e organização dos agentes e dos fatores locais, seu engajamento em modalidades de gestão social das iniciativas desenhadas, até se alcançar a desejada melhoria da qualidade de vida dos seus habi-tantes (op. cit., p. 10).

A formação do capital social enquanto processo de organização social, se-gundo o MDA (Brasil, 2006), refere-se à capacidade dos agentes de:

• perceber-se enquanto grupo, com identidade própria;

• compreender a sua realidade e a sua interação com os outros; e

• agir eficientemente e eficazmente sobre a realidade por meio da nego-ciação dos diversos interesses a partir do diálogo e da construção de entendimentos e acordos.

Dessa forma, o ministério conclui que a organização social derivada desse ca-pital “é um tipo de formação social concreta que viabiliza a ação de um grupo” (op. cit., p. 17). Porém, retomando Hadjimichalis (2008), argumenta-se que a junção entre os vocábulos capital e social “simplesmente assume o vínculo causal entre a

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participação em organizações voluntárias e o desenvolvimento econômico dinâmico juntamente com as instituições democráticas melhoradas” (Hadjimichalis, 2008, p. 252, tradução nossa). Para Hadjimichalis, a falta de interesse em entender como se estabelecem estas relações hierarquizadas e patriarcais para manter as estruturas de produção local eficazes, flexíveis e dinâmicas, tornou o conceito uma visão ro-mântica sobre a cooperação econômica humana.

Visto que o enfoque territorial implicaria “no desenvolvimento endógeno e na autogestão” (Brasil, 2005b, p. 13), para que a política do MDA tives-se resultado, os agentes sociais teriam que formar uma organização social que expressasse uma determinada densidade do capital social, a qual daria base ao desenvolvimento. Para tal, o MDA faz uso da ideia de empoderamento para que os agentes sociais tenham capacidade e habilidade de manter a organização social. O empoderamento:

deve contribuir para que as novas institucionalidades sejam capazes de expressar formas mais avançadas e democráticas de governança e de governabilidade demo-crática, aperfeiçoando as relações vigentes entre o Estado e a sociedade, o que im-plica uma revisão dos deveres e das obrigações, papéis e atribuições, formalmente instituídas, enfatizando as convergências de interesses que conduzam à articulação de ações (Brasil, 2005a, p. 11).

Esse empoderamento – muito mais direcionado para as instituições territo-riais criadas pela própria política pública que para os agricultores familiares – de-veria ter como resultado uma organização social mais densa. Porém, se a organiza-ção a qual empodera é marcada por relações de poder desiguais, em vez de servir como base para a emancipação social dos agentes, o empoderamento irá servir para consolidar as instituições que territorializam o controle social, visto que o empo-deramento objetiva o fortalecimento da gestão social das múltiplas dimensões do desenvolvimento por meio da estratégia integracionista da abordagem territorial.

Por fim, o empoderamento tem como resultado a consolidação de um sis-tema de governo (instituições que são empoderadas) desvinculado da população (indivíduos não mobilizados), que passa a ser vista como simples público-alvo de políticas públicas. Em vez da autogestão, o resultado seria capacitar organizações locais para levarem a cabo as diretrizes definidas pelo MDA.

3.3 gestão social e institucionalidade

A gestão social é entendida, pelo MDA, como:

o processo através do qual o conjunto dos atores sociais de um território se envolve não só nos espaços de deliberação e consulta das políticas para o desenvolvimento, mas sim, e mais amplamente, no conjunto de iniciativas que vão desde a mobilização desses agentes e fatores locais até à implementação e avaliação das ações planejadas,

179Análise Conceitual da Política de Territórios Rurais

passando pelas etapas de diagnóstico, de elaboração de planos, de negociação de políticas e projetos. Gestão social implica, assim, um constante compartilhamento da responsabilidade pelos destinos do território (Brasil, 2005a, p. 10).

É patente a necessidade, em acordo com o MDA, de que essa gestão social se apoie “no capital social dos territórios, nos laços de identidade, de confiança e de colaboração que há entre as forças locais” (idem, ibidem, p. 10). Para tal, seria preciso a criação de espaços e condições para pôr em convergência o isolamento e a fragmentação; desta forma, seria possível formar o capital social necessário (idem, ibidem). Estes espaços seriam dados pelas instituições territoriais que:

são espaços (fóruns, conselhos, comissões, comitês, consórcios, articulações e arran-jos institucionais diversos) de expressão, discussão, deliberação e gestão, que con-gregam a diversidade de atores sociais e cuja atenção é voltada à gestão social das políticas e dos processos de desenvolvimento (op. cit., p. 11).

A importância das instituições na definição da operacionalização da política é construída a partir da constatação de que as instituições:

(com seus valores e concepções embutidos) influenciam na construção das identi-dades de indivíduos e de grupos, refletindo assim a maneira pela qual eles percebem as suas realidades, dão significado às suas experiências e formam suas organizações. Sendo assim, as instituições influenciam os valores que alicerçam as estruturas de alianças sustentando os sistemas de poder dentro de uma organização ou fora dela na sociedade local (Brasil, 2006, p. 16, grifo nosso).

Compreendendo que o momento em que as instituições se formam e se ter-ritorializam é o momento em que são construídos os acordos sobre a implemen-tação dos programas e projetos pactuados e de interesse do território, é possível concluir que a institucionalidade territorial é a base da formação daquilo que o ministério entende por capital social. Assim o é, pois a instituição carrega no seu objetivo um processo de gestão social. Fortalecer a gestão social é consolidar as instituições e sua intervenção sobre os rumos do desenvolvimento (Brasil, 2005c).

Porém, a construção da gestão social – que, para o programa, só pode ocorrer dentro das instituições territoriais – baseada no conceito de capital social acaba por despolitizar a política. Uma vez que a relação entre os agentes é considerada, no plano teórico, a concepção abstrata da confiança e da reciprocidade, o que ocorre é a percepção das relações sociais como algo que se transforma magicamente em territórios pacíficos e colaborativos (Hadjimichalis, 2008). Além de obrigarem os diferentes grupos sociais a referendarem uma identidade única (capacidade de se reconhecerem como um grupo que na realidade pode não existir), que se sustenta em uma única territorialidade, negando a constatação de que diferentes grupos terão diferentes percepções sobre a sua identidade. O que se vive, no momento da institucionalização da gestão social, é a construção de uma população que deve ser governada: garante-se às entidades-membros dos colegiados a prerrogativa de

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intervirem no território por meio dos projetos, mas não se procede da mesma forma com os agricultores, que continuam sendo considerados como público-alvo de políticas públicas.

4 coNsidEraçÕEs FiNais: Por uma tEsE soBrE o dEsENvolvimENto tErritorial rural

A importância que as políticas de DTR dão a conceitos como território, contro-le social, combate à pobreza e agricultor familiar clarificam bem a delimitação da estratégia governamental brasileira presente no programa do MDA analisado neste artigo. Não obstante, a forma como estes conceitos se relacionam demons-tra, também, a abordagem específica que traduz os cânones transnacionais das políticas de desenvolvimento. Como qualquer outra política pública, as políticas de desenvolvimento são uma forma de intervenção nas dinâmicas sociais, e, para tal, faz-se necessário que se possa trazer à tona a forma como esta intervenção é estruturada pelo Estado.

As análises elaboradas no artigo dão subsídios para concluir sobre três pon-tos que ajudam a entender os princípios, as práticas e os conceitos utilizados pela política: a estratégia de intervenção e o entendimento conceitual desta estratégia, os critérios utilizados para a delimitação socioespacial da intervenção e o nível de governo estabelecido pelas relações federativas.

4.1 a estratégia de intervenção e seu entendimento conceitual

A estratégia de intervenção é um dos principais pontos de análise de uma política pública. É por meio da intervenção nas dinâmicas sociais que as políticas garantem o ordenamento da sociedade para que a mudança proposta possa acontecer. Na política aqui apresentada é explícito o controle social como principal estratégia de interven-ção. O programa institui uma relação direta entre o controle da forma como os atores se relacionam e o sucesso do projeto de desenvolvimento. Quanto maior o controle sobre a dinâmica social, maior a previsibilidade da ação e, por conseguinte, maior a possibilidade de adequar a própria dinâmica às necessidades imperativas do projeto. Dessa forma, a institucionalização da participação e a garantia de que todas as deci-sões afetas ao projeto tenham o controle do coletivo – coletivo entendido enquanto institucionalidades territoriais – garantiriam, por sua vez, o ambiente favorável às iniciativas de desenvolvimento territorial.

Ao definirem o controle social como forma de intervenção, cria-se um es-paço em detrimento das relações sociais que não estão (ou que não podem ser) institucionalizadas. Como as próprias bases do programa definem, estas relações estão no subterrâneo da vida social e configurar-se-iam, por sua vez, entraves ao projeto de desenvolvimento, visto que não estão sob o julgo do controle social.

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Outro problema afeto é a própria forma como se desenvolve este controle. A implantação de organismos de controle social sem a devida precaução em compreender as relações sociopolíticas anteriores à institucionalização leva à naturalização dos conflitos e à consolidação de relações hierárquicas preesta-belecidas, o que não garante o fim dos conflitos locais e da exclusão de grupos que já o eram desde o princípio.

O controle social proposto é direcionado apenas a uma porção da área que compõe o país. Esta porção é definida sob a égide conceitual do território – con-ceito este definido pelas bases do programa de forma que tudo vale e tudo se encaixa: tudo é território. É preciso compreender o que está por trás da afirmativa governamental. Ao estabelecer qualquer coisa como território, o que se compre-ende como o seu fator fundamental é a existência de relações de poder que já estão estabelecidas. A figura do território apenas corrobora relações excludentes no mo-mento em que as naturaliza. Ao configurar um território onde tudo vale, o que se quer é configurar um controle sobre todos os aspectos da vida social. Por isto que no conceito de território do MDA é possível encaixar cultura, meio ambiente, economia, políticas sociais e toda uma ampla gama de aspectos da vida social.

Mas qual o intuito do controle sobre dinâmicas tão díspares inclusive nos seus desdobramentos territoriais? Este intuito se deve ao fato de os territórios definidos pelo MDA serem regiões nas quais a reprodução do capital mercantil não se dá na sua forma mais plena. Precisa-se, então, intervir no ordenamento da sociedade (e isto pode significar todas as dinâmicas sociais) para regulamentar o mercado de forma a maximizar a relação entre produção e consumo. Utiliza-se um conceito assaz subjetivo como o conceito de território para que se possa ga-rantir a intervenção em qualquer aspecto que assim se faça necessário. Apesar de a política não conseguir realizar esta intervenção, o discurso em torno do conceito referenda ainda as institucionalidades territoriais como única forma de atuação política das entidades participantes, visto que todas as dimensões possíveis da rea-lidade poderiam estar ali incluídas. O que se tem como resultado é a convergência dos desdobramentos territoriais das várias dinâmicas sociais e, não obstante, o seu maior controle. O território é, de forma pragmática, reconhecido como região-problema, em que é preciso a solução dos entraves para o desenvolvimento.

4.2 os critérios utilizados para a delimitação socioespacial da intervenção

Apesar de o programa ser desenvolvido para áreas de caráter rural, não é apenas este o critério de definição dos territórios que será contemplada. Existe um fator preeminente a ponto de estabelecer inclusive o objetivo maior da política, que é er-radicação da pobreza. A forma como a política governamental entrelaça pobreza e ruralidade, dá a entender não só que este é um problema passível de ser isolado dos aspectos gerais da sociedade – como se a pobreza fosse um elemento à parte, e não o resultado da exclusão gerada pela própria reprodução desigual do capital – como

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também o seu isolamento seria a única forma de combatê-lo. Ao fazê-lo, a política responsabiliza o pobre pela sua pobreza e, principalmente, pela sua solução.

A pobreza é definida, então, como a existência de uma população que não produz e que não consome – atividades que são pilares da sustentação da econo-mia. Ao estabelecer a erradicação da pobreza rural como objetivo da política e, consequentemente, a própria pobreza rural como critério de prioridade na implan-tação da sua política de desenvolvimento, o MDA consegue identificar quais são as áreas que não produzem e que não consomem o suficiente para que a engrenagem da economia nacional possa funcionar em sua plenitude. A pobreza é um entrave ao desenvolvimento, e não a sua consequência. A única solução é garantir – nas áreas onde a pobreza rural se manifesta – o controle necessário para que a própria população destes locais (os tais territórios) criem ambientes favoráveis à produção e ao consumo.

A política define, ainda, um público-alvo específico das suas ações. A catego-ria que utiliza para fazê-lo é assim entendida pois é ela própria considerada a solu-ção para a pobreza rural. A política transforma o indivíduo que mora em regiões rurais em agricultores familiares, no sentido de que, para se desenvolverem, a única solução que possuem é produzir e consumir – isto porque o próprio conceito de agricultor familiar é construído de forma a naturalizar uma relação entre homem e natureza que teria como único objetivo trabalhar a terra para que esta produ-za na sua plenitude. Qualquer outra forma de categorização social significaria o reconhecimento de outras dinâmicas sociais que não apenas aquelas atreladas à produção e ao consumo de bens.

A política parte da hipótese de que o capital mercantil precisa se reproduzir por meio da renda da terra (o que, no âmbito rural, ainda é um resquício do rural enquanto setor agrícola, uma prova dos equívocos conceituais do programa), e isto só é possível com a construção de uma concepção social centrada no trabalho. E o trabalho no meio rural só pode ser realizado em sua plenitude se os indivíduos que lá estiverem forem considerados agricultores. O resultado é uma inclusão social por via procedimental por meio do reconhecimento do indivíduo pela sua importância econômica, ou seja, pelo que ele produz e consome ou deixa de pro-duzir e consumir. Mesmo outras formas de reconhecimento (por exemplo, a de comunidades tradicionais) só são consideradas se puderem se encaixar na ideia de produção e consumo. Ou seja, questões culturais só são importantes se puderem basear políticas de turismo para a geração de renda. Qualquer outra forma de reconhecimento é considerada um entrave para o desenvolvimento.

4.3 o nível de governo estabelecido pelas relações

O último comentário deste trabalho diz respeito ao nível de governo. Entende-se que o reconhecimento dos territórios e o seu controle social relacionam-se ao

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nível de governo estabelecido – notadamente o supramunicipal – na medida em que facilitam o desdobramento territorial do governo federal sobre dinâmicas que se encontravam demasiado afastadas dos centros de decisão. A facilitação pode ocorrer de formas diversas: a escolha dos projetos a serem financiados é feita pelo colegiado territorial, porém deve se adequar ao preestabelecido pelo MDA, ou seja, apesar de aparentemente possuir o poder de decisão, o colegiado deve respeitar as linhas que já foram estabelecidas pelo ministério na definição do pro-grama; na mesma linha, o ministério tem seu trabalho de priorização de projetos facilitado pela aprovação prévia feita por estes mesmos colegiados. Ainda como resultado deste movimento, o ministério acaba tendo um maior controle sobre as institucionalidades territoriais que se possuísse um processo de articulação muni-cípio por município, visto que troca o contato com mais de 5 mil municípios pelo contato com pouco mais de 160 territórios.

Como a organização do nível de governo supramunicipal é feito dentro da égide conceitual do território – visto que não existe no ordenamento do Estado federativo brasileiro um quarto nível de poder – o governo federal possui maior capacidade de intervir junto aos atores que participam deste espaço – por isto a importância de institucionalizar todas as redes sociais possíveis sob o controle social dos colegiados territoriais. A maior capilaridade adquirida pelo contato direto com um número maior de atores – afinal, com 164 territórios os escri-tórios estaduais do MDA podem fazer parte de todos os colegiados e conselhos territoriais, o que era impossível com os CMDRs – acaba tendo por resultado um sucesso maior em adequar as dinâmicas político-sociais aos preceitos do programa e, consequentemente, um controle maior sobre as áreas que se apresentam como entraves para o desenvolvimento.

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Originais submetidos em de março de 2011. Última versão recebida em março de 2012. Aprovado em abril de 2012.

FluXos totais dE comÉrcio E Estrutura Produtiva – uma aNálisE Para o Estado dE miNas gErais*Marisa dos Reis A. Botelho**Vanessa Petrelli Corrêa***Ana Alice B. P. D. Garlipp****

O objetivo deste trabalho é caracterizar a estrutura produtiva do estado de Minas Gerais por meio dos fluxos de comércio. Diferentemente de outros trabalhos que abordaram esta temática, analisa-se o conjunto dos fluxos de comércio – intraestaduais, interestaduais e internacionais – referentes a 2006. São analisados os valores de saída (vendas) e os valores de entrada (compras), por origem e destino, das grandes regiões e dos estados, considerando as atividades segundo a intensidade dos fatores de produção (classificação da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE) e a natureza das atividades econômicas. Mediante a consideração de todos os fluxos de comércio, assim como da análise desagregada, segundo diferentes classificações, encontra-se uma estrutura produtiva, com elevado grau de diversificação e complexidade, distinta da caracterização obtida apenas pelos fluxos de comércio internacionais, em que predomina o comércio de matérias-primas e produtos agrícolas.

Palavras-chave: economia regional; Minas Gerais; fluxos de comércio; estrutura produtiva.

total tradE Flows aNd ProductivE structurE – aN aNalYsis oF thE statE oF miNas gErais

The aim of this paper is to characterize the productive structure of the state of Minas Gerais through trade flows. In a different way of others works in this theme, the paper analyses the combined trade flows – inside the state, between states and international ones – for the year of 2006. It is considering the values of sales and purchases for the macro regions and states, analyzing the activities in accordance with the nature of economic activity and means of production’ intensity (OECD classification). Through the analysis of combined trade flows, as to the disaggregate analysis according different classifications, is possible to found a productive structure with high degrees of diversification and complexity. This result is different of traditional characterization that is obtained considering only international trade flows, with predominance of agricultural products and material raw.

Keywords: regional economy; Minas Gerais; trade flows; productive structure.

*Este trabalho foi desenvolvido a partir da pesquisa Análise do mapeamento e das políticas para arranjos produtivos locais nas regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste, Nordeste e Norte do Brasil, financiada pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). As autoras agradecem o apoio do BNDES, bem como as contribuições dos pareceristas, isentando-os de qualquer responsabilidade quanto ao conteúdo apresentado. **Professora Associada do Instituto de Economia e do Programa de Pós-Graduação em Economia da Universidade Federal de Uberlândia. E-mail: <[email protected]>.***Professora Associada do Instituto de Economia e do Programa de Pós-Graduação em Economia da Universidade Federal de Uberlândia. E-mail: <[email protected]>.****Economista do Centro de Pesquisas Socioeconômicas (Cepes) do Instituto de Economia da Universidade Federal de Uberlândia. E-mail: <[email protected]>.

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FluJos totalEs dE comErcio Y Estructura Productiva – uN aNálisis Para El Estado dE miNas gErais

El objetivo del trabajo es lo de caracterizar la estructura productiva del estado de Minas Gerais a través de los flujos de comercio. Diferentemente de otros trabajos que han tratado este tema, se analiza el conjunto de los flujos de comercio – los intraestaduales, los interestaduales e los internacionales – para el año de 2006. Son analizados los valores de salida (ventas) y los de entradas (compras) por el origen y destino de las grandes regiones y provincias, considerando las actividades según la intensidad de los factores de producción (clasificación OECD) y por la naturaleza de las actividades económicas. Con la consideración de todos los flujos de comercio, así como del análisis desagregada según distintas clasificaciones, se descubre una estructura productiva con elevados grados de diversificación y complejidad, distinta de la caracterización obtenida apenas por los flujos de comercio internacionales, en que predomina el comercio de materias primas y productos agrícolas.

Palavras-clave: economía regional; Minas Gerais; flujos comerciales; estructura productiva.

FluX commErciauX totauX Et structurE ProductivE – uNE aNalYsE Pour l’Etat dE miNas gErais

L’objectif de cette étude est de caractériser la structure productive de l’État de Minas Gerais à travers les flux commerciaux. Contrairement aux autres études qui ont abordé cette question, nous analysons l’ensemble des échanges – intra-étatiques, interétatiques et internationaux – pour l’année 2006. Nous avons analysé les valeurs de sortie (ventes) et les valeurs d’entrée (achats) par origine et destination des grandes régions et États. De plus, nous avons tenu compte des activités en fonction de l’intensité des facteurs de production (classification de l’OCDE) et de la nature des activités économiques. Grâce à l’examen de tous les flux commerciaux classés selon les précédents critères, nous avons mis en évidence une structure de production avec un haut degré de diversification. Les caractéristiques de cette structure sont différentes de celles de la structure obtenue lorsque seuls les flux commerciaux internationaux sont analysés,   dans lesquelles le commerce prédominant est celui des matières premières et produits agricoles.

mots-clés: économie régionale; Minas Gerais; les flux commerciaux ; l’activités de production.

JEL: R11; F19.

1 iNtrodução

É bastante comum, na literatura especializada, análises que tomam por referên-cia a participação de regiões, estados ou países no comércio internacional para tecer considerações sobre suas estruturas produtivas. Este trabalho indica que estas análises são insuficientes, uma vez que consideram apenas um dos fluxos de comércio, o internacional. Ao considerarem-se os demais fluxos, o intraes-tadual e o interestadual, é possível realizar avaliações mais aprofundadas sobre a estrutura produtiva, dado que não necessariamente se verifica o mesmo padrão de comércio. Particularmente, quando se trata de regiões ou países com áreas e populações significativas, somadas a estruturas produtivas diversificadas, o padrão de comércio interno (intra e interestadual) pode diferir do padrão de comércio internacional, de acordo com Krugman (1991).

189Fluxos Totais de Comércio e Estrutura Produtiva

Com o objetivo de analisar o conjunto dos fluxos de comércio, utiliza-se, neste trabalho, uma base de dados ampliada, contendo os fluxos de comércio intraestaduais, interestaduais e internacionais do estado de Minas Gerais para 2006. Esta base de dados, quanto aos fluxos interestaduais, foi construída a partir da definição, em 1996, da Guia de Informações – Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (GI-ICMS) e de um esquema de processamento acorda-do entre os estados, permitindo uma maior visualização dos fluxos de comércio interestaduais. Uma vez que passou a haver uniformidade das informações e que os contribuintes estão obrigados a fornecer informações acerca das transações in-terestaduais por eles efetuadas em um determinado ano, a guia passou a ser uma fonte de dados utilizada para construir os fluxos de comércio interestaduais.

Este trabalho utiliza essa base de dados para o estado de Minas Gerais, acrescida dos fluxos de comércio intraestaduais e internacionais. A partir desta base de dados ampliada, analisam-se, para 2006, os fluxos de comércio intra-estaduais, interestaduais e internacionais deste estado, a partir de dados da Secretaria de Estado de Fazenda de Minas Gerais (SEF-MG). São analisados os valores de saída (faturamento e vendas) e os valores de entrada (compras) por origem e destino das grandes regiões, segundo a intensidade dos fatores de produção (classificação da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE) e, ainda, pela natureza das atividades econômicas.

A seção 2 descreve a metodologia do trabalho. Na seção 3, apresenta-se a balança comercial estadual, mediante a análise de fluxos interestaduais e interna-cionais. A seção 4 contém a apresentação e a análise dos dados desagregados se-gundo a intensidade dos fatores de produção – utilizando a classificação proposta pela OCDE – e a natureza da atividade econômica. Na seção 5, os resultados encontrados são analisados à luz de outras pesquisas que abordaram este tema, notadamente aquelas que se dedicam às análises dos fluxos interestaduais. A últi-ma seção é dedicada às considerações finais.

2 mEtodologia

Quando se efetua a balança comercial de uma determinada localidade, esta con-tabiliza, em fim de período, as relações de entrada e saída de bens e serviços co-mercializados entre residentes e não residentes.

Nesse sentido, metodologicamente, pode-se construir a balança comercial de um país, de um estado da Federação ou de um município. Já foram efetuados estudos no intuito de construir a balança comercial dos estados brasileiros.1 Os estudos envol-veram o levantamento de fluxos de comércio interestaduais e fluxos de comércio dos

1. Esse breve retrospecto é feito a partir de Vasconcelos (2001).

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estados com o exterior. Em um primeiro momento, as informações sobre o comércio interestadual foram levantadas por meio das notas fiscais interestaduais (processados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE – nos anos 1960 e 1970). Depois disto, foram geradas estatísticas a partir da apuração do Imposto sobre Circu-lação de Mercadorias e Serviços (ICMS) anual. Em 1987, a Secretaria de Economia e Finanças do Ministério da Fazenda promoveu o Seminário de avaliação da balança comercial interestadual. Em 1992, por iniciativa da Escola Brasileira de Administra-ção Pública e de Empresas da Fundação Getulio Vargas (Ebape/FGV), foi efetuada uma estimativa da balança comercial de cada um dos estados brasileiros para 1991, com a participação de vários membros da Comissão Técnica Permanente do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Servi-ços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (Cotepe/ICMS). Em 1996, foi definido o documento GI-ICMS, utilizado neste trabalho em conjunto com as informações referentes aos fluxos de comércio intraestaduais e internacionais.

No que se refere a trabalhos acadêmicos que avançaram na construção dos fluxos de compras e vendas para os estados brasileiros, destacam-se os de Vascon-celos (2001) e Vasconcelos e Oliveira (2006). Nestes dois estudos, a fonte dos dados são as declarações efetuadas pelos contribuintes a partir do documento GI-ICMS. No primeiro estudo, além da apresentação dos fluxos interestaduais, foi construída uma balança comercial para cada estado, sendo os fluxos realizados entre cada um dos estados brasileiros e o exterior levantados a partir do banco de dados da Secretaria de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Secex/MDIC).

No segundo estudo, cujo foco eram os fluxos de comércio interestaduais, o intuito foi produzir estimativas do comércio interestadual por setores de atividade econômica, uma vez que os dados apresentados até então diziam respeito a fluxos totais de comércio, sem um maior nível de desagregação. Para tanto, foram utili-zados os dados da GI-ICMS referentes a valores contábeis totais de saída. Destes dados, foram deduzidos os valores informados pelo Regime da Substituição Tri-butária do ICMS (ICMS-ST).2

Neste trabalho, os dados foram gerados a partir das informações prestadas pelos contribuintes para o documento GI-ICMS (valores contábeis totais),3 infor-mados pela SEF-MG. Ademais destes dados, também se solicitaram à secretaria

2. O Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços Substituição Tributária (ICMS-ST) corresponde a um tributo arrecadado no estado de origem da mercadoria, repassado para o estado consumidor, mas que deveria ser cobrado no estado de destino do produto. “Dessa forma o ICMS-ST não faz parte do valor das transações interestaduais, apesar de estar contido nos valores contábeis. Objetivando gerar uma proxy para as transações interestaduais foi retirado dos va-lores contábeis o ICMS-ST, a fim de se obter o conceito líquido dos valores contábeis” (Vasconcelos e Oliveira, 2006.2).3. Neste trabalho foram utilizados os valores contábeis totais, sem excluir o ICMS-ST.

191Fluxos Totais de Comércio e Estrutura Produtiva

os valores contábeis totais de entradas e saídas para o exterior4 a partir de informa-ções prestadas pelos contribuintes. Estes dados foram utilizados para a construção da balança comercial considerando diferentes formas de apresentação. Haja vista que o objetivo do trabalho é também o de levantar os fluxos de comércio reali-zados pelos municípios mineiros, solicitaram-se a esta secretaria, ainda, os dados de valor contábil total, declarados pelos contribuintes, referentes a entradas e saídas de comércio dos municípios para dentro do próprio estado. Coletaram-se os dados classificados pela Classificação Nacional de Atividades Econômicas 2.0 (CNAE 2.0, do IBGE), cinco dígitos, por município.

3 BalaNça comErcial: aNálisE dE FluXos iNtErEstaduais E iNtErNacioNais5

O gráfico 1 mostra as entradas e as saídas do estado de Minas Gerais em sua re-lação com o resto dos estados (interestadual) e com o exterior. O conjunto destes fluxos somou R$ 180.965 bilhões para um produto interno bruto (PIB) estadual de R$ 214.754 bilhões em 2006 (valores correntes). Destes R$ 180.965 bilhões, cerca de 23% corresponde às vendas externas e 77% às realizadas com outros estados da Federação.

O resultado do saldo total desses fluxos equivale ao resultado da balança comercial do estado, sendo considerados aqui os fluxos de saída como “exporta-ções”, dado que representam fluxos para fora do estado. Paralelamente, as entra-das representam as “importações” de outros estados e do exterior.

O saldo total da balança comercial de Minas Gerais é positivo (R$ 41,9 bilhões), haja vista que o estado apresenta uma relação superavitária com todas as macrorregiões brasileiras e também em sua relação com o exterior. Grande parte deste saldo deve-se à relação superavitária do estado com o exte-rior (R$ 21 bilhões, que representa 50,06% do superávit do estado), conside-rando-se a diferença entre as vendas externas (R$ 42,7 bilhões) e as compras (R$ 21,7 bilhões).6

4. Os valores de fluxos de entrada e saída de comércio do estado de Minas Gerais para o exterior e do exterior para este apresentados foram construídos a partir de dados fornecidos pela Secretaria de Fazenda do Estado de Minas Gerais (SEF-MG), referentes a declarações dos contribuintes. Não foram gerados a partir das informações fornecidas pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), que seria uma das alternativas possíveis e que foi utilizada por Vasconcelos (2001).5. Os dados apresentados na sequência deste trabalho encontram-se em valores correntes de 2006. 6. De acordo com os dados do MDIC, o saldo comercial em 2006 foi de US$ 10.780 milhões aproximadamente. Considerando-se a taxa média de câmbio de 2006 de R$ 2,138/1 US$, o valor do saldo apurado na base do MDIC alcança R$ 23,048 milhões, valor superior ao apurado na base de dados da SEF-MG. Segundo esclarecimentos desta, esta diferença deve estar relacionada ao fato de a base não contemplar todas as empresas e pessoas físicas que ex-portam e que são obrigadas a declarar a esta instituição. Como a diferença não é muito grande, optou-se por utilizar esta base de dados para todos os fluxos de comércio.

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GRÁFICO 1saldo da balança comercial de minas gerais (2006) (Em R$ bilhões)

0,00

5,00

10,00

15,00

20,00

25,00

Sul Sudeste Centro-Oeste Norte Nordeste Exterior

Fonte: Secretaria de Fazenda do Estado de Minas Gerais (2006).Elaboração dos autores.

GRÁFICO 2Balança comercial de minas gerais: compras do estado (importações) segundo macrorregiões e exterior do país (2006) (Em %)

8,31

64,17

4,93

2,37

4,60

15,62

Sul Sudeste Centro-Oeste Norte Nordeste Exterior

Fonte: Secretaria de Fazenda do Estado de Minas Gerais (2006).Elaboração dos autores.

193Fluxos Totais de Comércio e Estrutura Produtiva

GRÁFICO 3Balança comercial de minas gerais: destino das vendas do estado (exportações) segundo macrorregiões e exterior do país (2006)(Em %)

7,79

52,79

6,12

2,32

7,38

23,59

Sul Sudeste Centro-Oeste Norte Nordeste Exterior

Fonte: Secretaria de Fazenda do Estado de Minas Gerais (2006).Elaboração dos autores.

Ainda que esse seja o resultado dos saldos, é importante observar que o fluxo de comércio com o exterior (R$ 64.405 bilhões, ou 20,12% do fluxo de comércio total do estado) é menor que o efetuado com a região Sudeste, sendo este de R$ 184.789 bilhões, o que representa 57,8% do fluxo de comércio total do estado. Note-se, de acordo com os gráficos 2 e 3, que 64% dos fluxos de importação para o estado vêm da região Sudeste e que, paralelamente, 52,79% das exportações realizadas pelo estado (saídas) se dirigem à mesma região. Ou seja, este é o principal parceiro do estado de Minas Gerais. O segundo grande fluxo de entrada (15,62%) e de saída (23,59%) é o estabelecido com o exterior do país. O terceiro fluxo em importância, tanto de entrada (8,31%) quanto de saída (7,79%), é o estabelecido com a região Sul, cuja magnitude da participa-ção é substancialmente menor.

No que se refere ao detalhamento da balança comercial interestadual, Minas Gerais apresenta relação superavitária com todos os estados brasileiros, exceto com São Paulo e Amazonas. Os principais superávits são os estabelecidos com Rio de Janeiro e Espírito Santo (gráfico 4).

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012194

GRÁFICO 4Balança comercial de minas gerais: saldo por estado da Federação (2006) (Em R$ bilhões)

-4,00

-3,00

-2,00

-1,00

0,00

1,00

2,00

3,00

4,00

5,00

6,00

Esp

írit

o S

anto

Rio

de

Jan

eiro

Dis

trit

o F

eder

al

Bah

ia

Pará

Pern

amb

uco

Go

iás

Cea

San

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ina

Para

Mar

anh

ão

Rio

Gra

nd

e d

o S

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Mat

o G

ross

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Rio

Gra

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o N

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e

Piau

í

Toca

nti

ns

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go

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Ro

nd

ôn

ia

Serg

ipe

Para

íba

Mat

o G

ross

o S

ul

Am

apá

Acr

e

Ro

raim

a

São

Pau

lo

Am

azo

nas

Fonte: Secretaria de Fazenda do Estado de Minas Gerais (2006).Elaboração dos autores.

Na verdade, quando da análise dos fluxos de comércio, observa-se que as principais relações comerciais se estabelecem com o estado de São Paulo, segui-das por aquelas que se realizam com o Rio de Janeiro e o Espírito Santo, estados da região Sudeste próximos a Minas Gerais. Esta é responsável por 76% das en-tradas e por 69% das saídas de comércio, destacando-se que 46% das vendas in-terestaduais de Minas se dirigem a São Paulo. Ainda que em menor magnitude, destacam-se também os fluxos com Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Goiás e Bahia (gráfico 5).

195Fluxos Totais de Comércio e Estrutura Produtiva

GRÁFICO 5 Fluxos de comércio entre minas gerais e os demais estados da Federação (2006)(Em R$ bilhões)

0,00

20,00

40,00

60,00

80,00

100,00

120,00

140,00

São

Pau

lo

Rio

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Jan

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Esp

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ão

Para

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Piau

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Toca

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Ro

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Am

apá

Acr

e

Ro

raim

a

Fonte: Secretaria de Fazenda do Estado de Minas Gerais (2006).Elaboração dos autores.

4 BalaNça comErcial sEguNdo a iNtENsidadE dE FatorEs E a NaturEZa da atividadE EcoNÔmica

Com o objetivo de detalhar os principais fluxos de comércio do estado de Minas Gerais, procede-se, na sequência, à análise segundo a intensidade dos fatores de produção e segundo a natureza das atividades econômicas.

4.1 Balança comercial de minas gerais segundo a intensidade de fatores de produção

A classificação das atividades econômicas, segundo a intensidade de fato-res de produção e/ou definidores da competição, é uma classificação utilizada pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).7 As atividades são organizadas segundo a forma de inserção no mercado, podendo esclarecer questões relativas ao padrão de competição dos diferentes mercados.

7. Utilizaram-se as classificações: i) intensivas em recursos naturais – códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) 01, 02, 03, 05, 06, 07, 08, 09, 10, 11, 12, 19, 462 e 463; ii) intensivas em trabalho – códigos da CNAE 13, 14, 15, 16, 31, 41, 42, 43, 52, 55, 56, 84, 85, 96 e 97; iii) intensivas em economia de escala – códigos da CNAE 17, 18, 20, 22, 23, 24, 25, 27, 35 e 51; iv) intensivas em especialização – códigos da CNAE 28, 29, 45, 64, 65 e 466; v) intensivas em conhecimento – códigos da CNAE 21, 26, 58, 59, 60, 61, 62, 63, 69, 70, 71 e 72; e vi) Demais atividades – códigos da CNAE 32, 33, 36, 37, 38, 39, 47, 49, 50, 53, 66, 68, 73, 74, 75, 77, 78, 79, 80, 81, 82, 86, 87, 88, 90, 91, 92, 93, 94, 95, 99, 461, 464, 465, 467, 468 e 469.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012196

Ainda que ela apresente limitações,8 permite analisar os benefícios alocativos e as características do comércio estadual.

Quanto ao aspecto das trocas intraestaduais, pode-se observar que, tanto no caso das entradas quanto no caso das saídas, os fluxos entre municípios do próprio estado são os mais importantes em todas as agregações de intensidade dos fatores de produção, exceto no caso das entradas intensivas em conhecimento. Neste caso, as principais entradas vêm de outros estados (gráfico 6).

GRÁFICO 6 Fluxo de entrada de comércio (compras) dos municípios mineiros, segundo intensidade dos fatores de produção (2006)(Em %)

63,05

75,57

56,25 57,14

40,74

67,33

0,00

10,00

20,00

30,00

40,00

50,00

60,00

70,00

80,00

Intensivos em recursos naturais

Intensivos em trabalho

Intensivos em economia

de escala

Intensivos em especialização

Intensivos em conhecimento

Demais

Dentro do estado Outros estados Outros países

Fonte: Secretaria de Fazenda do Estado de Minas Gerais (2006).Elaboração dos autores.

Considerando-se as informações do gráfico 7, no tocante aos valores de entrada de comércio (compras) segundo intensidade dos fatores de produ-ção para os municípios do estado de Minas Gerais, observa-se que o maior peso está em demais (28,67%), que agrega várias atividades não considera-das nas outras agregações. Em seguida, estão os intensivos em recursos naturais (25,56%), seguidos pelos intensivos em economias de escala e pelos intensivos em especialização. As atividades econômicas classificadas como intensivas em

8. Vasconcelos e Oliveira (2006) citam: i) o grau de agregação pode levar à comparação de produtos diferentes; ii) em estudos comparados não se consegue superar o fato de que cada estado apresenta estágios de desenvol-vimento diferentes, dificultando a análise; e iii) há dificuldades envolvidas na definição fechada de alguns grupos de atividade, por conta da sobreposição de características. Além destas limitações, deve-se salientar que a referida classificação não reflete estritamente o grau de intensidade tecnológica da indústria brasileira, dado que foi cons-truída tendo como referência os países desenvolvidos. Assim, é possível que um segmento apresente um padrão de competição baseado em inovações, mas suas filiais em outros países não tenham o mesmo comportamento (caso da indústria farmacêutica, por exemplo). A despeito destas dificuldades, este tipo de agregação das atividades econômicas apresenta vantagens e tem sido bastante utilizada internacionalmente e, mais recentemente, no Brasil.

197Fluxos Totais de Comércio e Estrutura Produtiva

especialização (15,44%) e intensivas em trabalho (7,29%) apresentam baixa participação, como também, e principalmente, as intensivas em conhecimento (2,36%). Esta dinâmica é determinada pelas compras efetuadas por municí-pios mineiros tanto de outros estados quanto de dentro do próprio estado. Já entre as compras efetuadas de outros países, aquelas que se destacam são as atividades intensivas em economias de escala, seguidas das intensivas em especia-lização e intensivas em recursos naturais.

Quando se analisa apenas a balança comercial do estado, excluindo-se as compras intraestaduais, observa-se que os produtos relacionados a atividades in-tensivas em conhecimento e intensivas em trabalho pesam pouco na pauta de im-portações, haja vista que também o peso das atividades intensivas em especialização não é alto (gráfico 7). Isto explicita, por um lado, o grau de avanço e sofisticação da economia mineira, mas, por outro lado, mostra o peso da grande disponibili-dade de mão de obra no estado, não tornando necessária uma forte importação de produtos relacionados às atividades intensivas em trabalho.

GRÁFICO 7Balança comercial de minas gerais: compras segundo intensidade dos fatores de produção (2006)(Em %)

25,56

7,29

20,69 15,44

2,36

28,67

Intensivos em recursos naturais Intensivos em trabalho

Intensivos em economia de escala Intensivos em especialização

Intensivos em conhecimento Demais

Fonte: Secretaria de Fazenda do Estado de Minas Gerais (2006).Elaboração dos autores.

Para um detalhamento desses dados, no que se refere às entradas de comér-cio para Minas Gerais, aquelas que mais se destacam na classificação de produtos e serviços intensivos em recursos naturais são as atividades de comércio atacadista

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de café em grão (equivalente a 18% das entradas) e extração de minério de ferro (15,6% das entradas). Em seguida, com valores bem menores, estão a fabricação de produtos de refino de petróleo (que representa 8,4% das entradas) e a fabrica-ção de laticínios (6,4% das entradas de comércio em Minas Gerais).

Quanto às atividades intensivas em trabalho, destacam-se as entradas rela-cionadas ao pagamento de serviços por atividades de armazenamento (39,7% do total). Nas posições seguintes estão confecção de peças do vestuário, exceto rou-pas íntimas (6,1%), fabricação de artefatos têxteis para uso doméstico e tecelagem de fios de algodão, com valores de, respectivamente, 5,7% e 4,4% das entradas.

No que se refere às compras relacionadas às atividades Intensivas em especiali-zação, destaca-se a fabricação de automóveis, camionetas e utilitários, que somam 37,66% do total. A seguir vêm os relativos a comércio a varejo e por atacado de veículos automotores (18,21%) e fabricação de peças e acessórios para veículos automotores não especificados anteriormente (15,75%).

Quanto às entradas de produtos intensivos em economia de escala, os princi-pais são a produção de laminados longos de aço e a produção de laminados planos de aço, que representam 14,66% e 13,52% do total, respectivamente. A fabrica-ção de adubos e fertilizantes e a produção de relaminados, trefilados e perfilados de aço são as atividades que assumem as terceira e quarta colocações.

Nas entradas relacionadas a produtos e serviços intensivos em conhecimento, destacam-se como principais os de telecomunicações sem fio (25,9% do total); te-lecomunicações por fio (17,9%); e a fabricação de periféricos para equipamentos de informática (que representa 12,5% do total das entradas).

Por fim, na categoria demais, se destacam o comércio atacadista de combus-tíveis sólidos, líquidos e gasosos, exceto gás natural e gás liquefeito de petróleo – GLP (19,0%); comércio varejista de combustíveis para veículos automotores (11,3%); e comércio varejista de mercadorias em geral, com predominância de produtos alimentícios – hipermercados e supermercados (9,6%).

Em relação às saídas de comércio, de forma semelhante, inicia-se a apresen-tação com os fluxos totais de saídas dos municípios mineiros e, a seguir, observa-se a dinâmica das vendas expressas na balança comercial de Minas Gerais, a qual não contempla os fluxos intraestaduais.

Os dados do gráfico 8 mostram que a dinâmica de vendas para os mu-nicípios do próprio estado dominam os resultados, e isto ocorre para cada uma das agregações dos fatores de produção. No que se refere ao perfil da pauta de saídas dos municípios, pode-se observar, no mesmo gráfico, que as principais vendas são as que se estabelecem para a classificação demais,

199Fluxos Totais de Comércio e Estrutura Produtiva

seguidas das vendas de atividades intensivas em recursos naturais, das inten-sivas em economias de escala e das intensivas em especialização. As vendas re-lacionadas às atividades intensivas em trabalho e intensivas em conhecimento são as menos importantes (gráfico 8).9

GRÁFICO 8Fluxo de saída de comércio (vendas) dos municípios mineiros segundo intensidade dos fatores de produção em (2006)

(Em %)

Intensivosem recursos

naturais

Intensivosem trabalho

Intensivosem economia

de escala

Intensivosem

especialização

Intensivosem

conhecimento

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58,20

71,52

46,84

58,57

74,45

81,62

0,00

10,00

20,00

30,00

40,00

50,00

60,00

70,00

80,00

90,00

Dentro do estado Outros estados Outros países

Fonte: Secretaria de Fazenda do Estado de Minas Gerais (2006).Elaboração dos autores.

Considerando-se o valor das saídas de comércio para outros estados e ou-tros países, que constituem os valores de saída da balança comercial de Minas Gerais, observa-se um resultado um pouco diferente, pois, neste caso, vê-se que as principais vendas de Minas Gerais a não residentes são as das atividades intensivas em economias de escala, seguidas das intensivas em recursos naturais e

9. Sobre o baixo peso das atividades intensivas em conhecimento nos fluxos de comércio estaduais, deve-se destacar que tais atividades, a despeito de sua importância no atual paradigma tecnológico-produtivo, não apresentam par-ticipações elevadas nas estruturas produtivas. A título de exemplo, Hirsch-Kreinsen et al. (2003) mostram que estas atividades participaram com menos de 10% do total das atividades manufatureiras em países europeus selecionados. O estudo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi, 2007) indica uma participação de aproxima-damente 30% no total das atividades industriais brasileiras em 2004, sendo a metade deste total referente ao refino de petróleo. Excluída esta atividade, as demais apresentam percentuais de participação bastante baixos. A par destas referências, a qualificação destas atividades como “menos importantes”, no âmbito deste trabalho, deve ser inter-pretada como uma avaliação de sua participação em relação às demais classificações, não como uma avaliação de que tais atividades deveriam apresentar níveis mais elevados, segundo alguma referência preestabelecida. Note-se, ainda, que neste trabalho os percentuais encontrados para estas atividades referem-se ao total de atividades produtivas e não somente às atividades da indústria de transformação.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012200

das intensivas em especialização (gráfico 9). As menos importantes continuam sendo as Intensivas em conhecimento e as intensivas em trabalho.

GRÁFICO 9Balança comercial de minas gerais: vendas segundo intensidade dos fatores de pro-dução (2006)

(Em %)

29,60

4,89

33,38

16,36

2,52

13,24

Intensivos em recursos naturais Intensivos em trabalho

Intensivos em economia de escala Intensivos em especialização

Intensivos em conhecimento Demais

Fonte: Secretaria de Fazenda do Estado de Minas Gerais (2006).Elaboração dos autores.

Também no caso das saídas de produtos e serviços de Minas Gerais, segundo a intensidade dos fatores de produção, é interessante destacar quais as CNAEs mais importantes.

No que se refere aos intensivos em recursos naturais, os mais importantes são: extração de minério de ferro (que representa 5,5% das vendas nesta classificação); fabricação de produtos de refino de petróleo (5,2%); e comércio atacadista de café em grão (5,1% do total).

No caso dos intensivos em trabalho, o destaque é a atividade de serviços de armazenamento (36,2% das vendas). Com valores bem mais baixos, seguem as vendas relacionadas a: confecção de peças do vestuário, exceto roupas íntimas (6,7%); fabricação de artefatos têxteis para uso doméstico (4,8%); e tecelagem de fios de algodão (4,6%).

201Fluxos Totais de Comércio e Estrutura Produtiva

Quanto às vendas das atividades intensivas em economias de escala, destacam-se a produção de laminados longos de aço e a produção de laminados planos de aço, cujos percentuais são de 14,60% e 13,10% do total das vendas desta atividade. São seguidos pelos serviços de distribuição de energia elétrica (8,30% das vendas) e pela fabricação de adubos e fertilizantes.

Para os produtos e serviços intensivos em especialização, as saídas mais impor-tantes referem-se às relacionadas à fabricação de automóveis, camionetas e utilitá-rios (valor equivalente a 37,3% das vendas); ao comércio a varejo e por atacado de veículos automotores (19,9%); e à fabricação de peças e acessórios para veículos automotores não especificados anteriormente (14,4%).

Nas vendas da produção classificada como intensiva em conhecimento os itens mais importantes são os serviços de telecomunicação sem fio (32,6%) e os de telecomunicação por fio (30,0% das vendas).

No caso dos produtos classificados como demais, as vendas mais importan-tes referem-se a atividades relativas a: comércio atacadista de combustíveis sóli-dos, líquidos e gasosos, exceto gás natural e GLP (16,13% das vendas); comércio varejista de combustíveis para veículos automotores (11,22%); e comércio vare-jista de mercadorias em geral, com predominância de produtos alimentícios – hi-permercados e supermercados (8,98%).

A relação dos principais produtos e serviços comercializados por Minas Gerais, classificados segundo a intensidade dos fatores de produção, mostra que as principais entradas e saídas são, em grande medida, coincidentes em um nível de desagregação de cinco dígitos. Ou seja, grande parte de produtos e serviços que se destacam como saídas/vendas, também aparecem entre os principais valores de entradas/compras pelo estado. Ademais, o estado apre-senta participações significativas em praticamente todas as classificações com referência na intensidade dos fatores de produção. Estes aspectos dos fluxos de comércio mineiros parecem estar relacionados a um grau de complexidade elevado de sua estrutura produtiva, mais visível nos fluxos de comércio intra e interestaduais que naqueles estabelecidos com o exterior do país – estes últi-mos mais fortemente vinculados às exportações de commodities e semimanufa-turados (Xavier e Silva, 2004).

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012202

GRÁFICO 10saldo balança comercial segundo intensidade dos fatores de produção (2006)(Em R$ bilhões)

-15,00

-10,00

-5,00

0,00

5,00

10,00

15,00

20,00

25,00

30,00

Intensivos emrecursos naturais

Intensivos em trabalho

Intensivo emeconomia de escala

Intensivos emespecialização

Intensivos emconhecimento

Demais

Fonte: Secretaria de Fazenda do Estado de Minas Gerais (2006).Elaboração dos autores.

Por fim, no que se refere ao saldo da balança comercial segundo a intensidade dos fatores, o gráfico 10 mostra a ocorrência de déficit apenas em produtos intensivos em conhecimento e nos classificados como demais. No caso dos primeiros, deve-se, no entanto, observar que o saldo negativo é pequeno. Ademais, os próprios fluxos de entrada e saída relativos a esta rubrica apresentam valores substancialmente menores que os demais, indicando que o estado é praticamente autossuficiente nesta rubrica, não podendo ser considerado que Minas Gerais tenha delegado ao exterior (do esta-do) esta atividade. Nas demais rubricas, o estado é superavitário, com destaque para os produtos intensivos em economias de escala e intensivos em recursos naturais.

4.2 Balança comercial de minas gerais segundo a natureza da atividade econômica

Considerando-se a natureza da atividade econômica, é possível mostrar que os maiores fluxos totais de entrada e saída referem-se às trocas industriais. O segun-do fluxo é o de serviços, seguido pelo de produtos agrícolas e agroindustriais. Observe-se que todos os saldos são superavitários (gráfico 11).

Tomando-se a balança comercial de Minas Gerais, o saldo de serviços e de-mais são deficitários na troca com outros estados. No que se refere às trocas com o exterior do país, destacam-se os superávits industriais e em produtos agrícolas e agroindustriais, sendo o saldo apresentado pelo setor serviços deficitário – ainda que a magnitude dos valores transacionados com o exterior do país seja muito pequena.

203Fluxos Totais de Comércio e Estrutura Produtiva

GRÁFICO 11Balança comercial: fluxos de saídas e entradas de comércio, segundo natureza da atividade econômica (2006)

(Em R$ bilhões)

0,00

50,00

100,00

150,00

200,00

250,00

300,00

350,00

400,00

450,00

500,00

Agrícolas eagroindustriais

Industriais Serviços Demais Total

Saídas Entradas

Fonte: Secretaria de Fazenda do Estado de Minas Gerais (2006).Elaboração dos autores.

A fim de obter-se um maior detalhamento desses dados, referentes aos fluxos segundo a natureza de atividade econômica, efetuou-se seu desmembramento e classificação segundo códigos da CNAE. Entende-se que o fluxo de vendas tem a capacidade de mostrar o perfil produtivo de Minas Gerais.

Na sequência, tomando os principais códigos da CNAE selecionados, apre-sentam-se os valores de saídas e entradas de comércio entre Minas Gerais, os demais estados da Federação e o exterior, além dos saldos de tais operações para cada grupo de atividades.

No que concerne às atividades agrícolas e agroindustriais, as principais saídas (interestaduais e para o exterior) realizadas por Minas Gerais referem-se a: comércio atacadista especializado em transportar produtos agrícolas e agroindustriais (462 e 463); vendas de produtos derivados do petróleo; laticínios; açúcar e refinados do mesmo; papel e celulose; produtos alimen-tícios; óleos e gorduras vegetais e animais; café moído e torrado; ração; biocombustíveis; e cigarros.

O gráfico 12 apresenta as treze principais atividades, para uma melhor visualização.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012204

GRÁFICO 12comércio entre minas gerais e o exterior do estado (interestaduais e exterior do país): principais cNaEs1 relativas a atividades agrícolas e agroindustriais (2006)

(Em R$ bilhões)

0,00

1,00

2,00

3,00

4,00

5,00

6,00

7,00

8,00

9,00La

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Códigoda

CNAE 462 192 105 101 107 463 171 109 104 108 106 193 122

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Fonte: Secretaria de Fazenda do Estado de Minas Gerais (2006).Elaboração dos autores.Nota: 1Classificação por vendas (interestaduais mais exterior do país).

Analisando-se as primeiras treze atividades, observa-se que a maior parte delas apresenta saldo positivo. Destas atividades, apenas quatro apresentam saldo negativo, a saber: fabricação de produtos derivados do petróleo; comércio ata-cadista especializado em produtos alimentícios, bebidas e fumo; fabricação de outros produtos alimentícios; e moagem e fabricação de produtos amiláceos e de alimentos para animais. Em quase todos estes casos observa-se um saldo negativo interestadual e com o exterior do país.

Em relação às atividades industriais, as principais classificadas pelas vendas realizadas pelo estado de Minas Gerais para os outros estados e o exterior do país são as relativas a: siderurgia; fabricação de automóveis, camionetas e utilitários; e

205Fluxos Totais de Comércio e Estrutura Produtiva

extração de minério de ferro. Em um segundo nível de vendas, apresentam-se as atividades de produção de ferro-gusa e de ferroligas; fabricação de peças e aces-sórios para veículos automotores; comércio atacadista de produtos de consumo não alimentar; e metalurgia dos metais não ferrosos. Destacam-se também, em um terceiro patamar, as vendas relativas a: fabricação de produtos químicos inor-gânicos; fundição; fabricação de artefatos têxteis, exceto vestuário; fabricação de equipamentos para distribuição e controle de energia elétrica; extração de mine-rais metálicos não ferrosos; e fabricação de produtos cerâmicos.

O gráfico 13 apresenta as treze principais CNAEs classificadas por vendas para o exterior do estado.

GRÁFICO 13comércio entre minas gerais e o exterior do estado (interestaduais e ao exterior do país): principais cNaEs1 relativas a atividades industriais (2006)

(Em R$ bilhões)

0,00

5,00

10,00

15,00

20,00

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Códigoda

CNAE

Fonte: Secretaria de Fazenda do Estado de Minas Gerais (2006).Elaboração dos autores. Nota: 1Classificação por vendas ao exterior do estado (interestaduais mais exterior do país).

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012206

Da mesma forma que para as atividades agrícolas e agroindustriais, quase todas apresentam saldo total positivo na relação de comércio entre Minas Gerais e seu exterior. Apenas o comércio atacadista de produtos de consumo não ali-mentar apresenta saldo negativo. Esta mesma dinâmica se apresenta ao se analisar apenas o saldo entre Minas e os demais estados. No que se refere ao saldo com o exterior, várias atividades apresentam saldo negativo; mas como os volumes não são muito altos, eles acabam não afetando o resultado final relativo ao saldo total da relação intercomercial analisada.

Quanto às atividades de serviços, as saídas de comércio que mais se destacam são as relativas a: transporte rodoviário de carga; transporte metro-ferroviário; e comércio de veículos automotores. Em um patamar de vendas bem abaixo, vêm as relacionadas a: geração, transmissão e distribuição de energia elétrica; transporte de passageiros; e comércio varejista. No mesmo patamar de vendas se encontram ainda aquelas atividades relacionadas a: serviços de armazenamento, carga e descarga; edição e impressão de jornais, revistas e livros; e comércio de peças e acessórios para veículos automotores (gráfico 14).

No caso das quinze principais atividades selecionadas, várias apresen-tam um saldo negativo em sua relação com o exterior do estado. É o caso das atividades relativas a: comércio de veículos automotores; comércio varejista (475, 478, 473); serviços de armazenamento, carga e descarga; comércio de peças e acessórios para veículos automotores; serviços de telecomunicações (612 e 611); e transporte rodoviário de passageiros. O destaque é que na maioria destes casos o saldo é negativo, tanto na relação interestadual quanto na relação com o exterior do país.

207Fluxos Totais de Comércio e Estrutura Produtiva

GRÁFICO 14comércio entre minas gerais e o exterior do estado (interestaduais e exterior do país): principais cNaEs1 relativas a atividades de serviços em 2006

(Em R$ bilhões)

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Códigoda

CNAE

Fonte: Secretaria de Fazenda do Estado de Minas Gerais (2006).Elaboração dos autores.Nota: 1Classificação por vendas (interestaduais mais exterior do país).

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012208

Em suma, da análise do balanço das relações de comércio de Minas Gerais, considerando-se os três grupos de atividades (agrícolas e agroindustriais, indus-triais e de serviços), pode-se mostrar que: i) o volume de vendas das principais atividades industriais selecionadas (treze) foi muito superior ao observado nos demais setores, sendo os saldos destas, na quase totalidade (doze), positivo; ii) em segundo lugar, vêm as atividades agrícolas e agroindustriais selecionadas (treze), com a maioria (nove) também apresentando saldo comercial positivo com o ex-terior do estado; e iii) as atividades de serviço selecionadas (quinze) apresentam patamares de comércio menores em termos de valor e um maior número de ati-vidades (oito) apresentou saldo de comércio negativo.

A fim de concluir a análise a ser realizada nesta seção, relativa à balança comercial de Minas Gerais, elaborou-se uma síntese dos resultados através dos dados de valor das saídas (vendas a outros estados e exterior do país), emprego formal e o cálculo do Indicador de Densidade Fiscal (IDF), calculado pelo valor das saídas/vendas sobre o emprego formal, a partir da base da Relação Anual de Informações Sociais 2006 (Rais 2006). O indicador demonstra o volume de vendas gerado a partir de um registro de emprego formal. Quanto maior o indicador, maior a capacidade de o emprego formal gerar riqueza para a estrutura em análise.10

Considerando as principais atividades relativas ao comércio realizado entre Minas Gerais e seu exterior, a fabricação de produtos derivados do petróleo (192) é aquela que apresenta o maior IDF.

O gráfico 15 toma as CNAEs selecionadas e apresenta as quinze mais im-portantes, segundo o IDF. Em ordem decrescente de importância estão: comércio atacadista de matérias-primas agrícolas e animais vivos; fabricação de automóveis, camionetas e utilitários; fabricação de óleos e gorduras vegetais e animais; fabri-cação de celulose e outras pastas para a fabricação de papel; siderurgia; extração de minério de ferro; metalurgia dos metais não ferrosos; fabricação de produtos químicos inorgânicos.

10. Esse indicador foi construído no âmbito da pesquisa citada, a qual originou este trabalho. Na maior parte dos tra-balhos sobre esta temática, a geração de riqueza é normalmente associada ao cálculo do valor adicionado. Entretanto, não foi possível realizar este cálculo, dado que requereria informações do estoque inicial de bens e serviços produzidos em 2006, informações estas que não foram disponibilizadas pela SEF-MG.

209Fluxos Totais de Comércio e Estrutura Produtiva

GRÁFICO 15indicador de densidade Fiscal das principais atividades econômicas do comércio de minas gerais com o resto do país e o exterior (2006)

0,00

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Códigoda

CNAE

Fonte: Secretaria de Fazenda do Estado de Minas Gerais (2006).Elaboração dos autores.

Considerando as principais atividades do comércio de Minas Gerais com o exterior do estado, as que se destacam na geração de emprego estão relacionadas no gráfico 16. As mais importantes são as atividades: comércio varejista de pro-dutos novos não especificados anteriormente e de produtos usados, com 114.915 empregos; transporte rodoviário de passageiros, com 76.159 empregos gerados; comércio varejista de equipamentos de informática e comunicação, equipamen-tos e artigos, geradora de 62.529 empregos; e de transporte rodoviário de carga, que gerou 62.014 empregos.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012210

GRÁFICO 16Principais atividades do comércio de minas gerais com o exterior (geração de emprego) (2006)

(Em unidades)

0

20.000

40.000

60.000

80.000

100.000

120.000

140.000

Co

mér

cio

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Códigoda

CNAE

Fonte: Relação Anual de Informações Sociais (Rais, 2006).Elaboração dos autores.

A análise do indicador de densidade fiscal e da geração de empregos for-mais não mostra nenhuma interface entre as atividades, à exceção da atividade de siderurgia (242), entre as mais tradicionais e importantes do estado de Minas Gerais. Do ponto de vista do indicador de densidade fiscal, destacam-se ativi-dades localizadas primordialmente na indústria de transformação, enquanto a geração de empregos ocorre de forma mais concentrada em setores de serviços.

211Fluxos Totais de Comércio e Estrutura Produtiva

5 aNálisE comParada dos rEsultados

Os resultados encontrados na análise dos fluxos de comércio do estado de Minas Gerais podem ser analisados à luz de estudos anteriores acerca desta temática.

Em âmbito internacional, o estudo de Davies e Weinstein (1999) anali-sa o comércio intrarregional no Japão a fim de testar as hipóteses do modelo Hecksher-Ohlin com as da denominada nova geografia econômica. Embora o objetivo do artigo seja o de estabelecer comparações com trabalho an-terior dos autores, no qual os dois modelos são testados para o comércio internacional, pode-se dizer que o resultado principal vai ao encontro do obtido neste trabalho, qual seja, o de que o comércio intrarregional difere sobremaneira do comércio internacional. Tanto o resultado obtido em Da-vies e Weinstein (1999) como o obtido no presente trabalho corroboram a afirmação de Krugman (1991) de que, para países de grandes dimensões, a distribuição da produção entre as regiões é um tema tão importante quanto o do comércio internacional.

Para o Brasil, os mais recentes estudos realizados sobre este tema dedicam-se principalmente à análise do comércio interestadual.

O estudo de Perobelli e Haddad (2006) verificou os padrões de comér-cio interestadual e o grau de integração do mercado nacional, entre os anos de 1985 e 1997, através de uma análise espacial. Por sua vez, Vasconcelos e Oliveira (2006) realizaram uma análise da pauta de exportações (vias inter-nas) por atividade econômica, em 1999, para cada um dos estados brasileiros. Conforme já comentado, a metodologia aqui desenvolvida partiu basicamente deste último trabalho.

No que se refere à dinâmica do comércio inter-regional, as principais conclusões de ambos os estudos foi a de que as regiões que apresentam grandes fluxos de comércio estão localizadas próximas às regiões que tam-bém apresentam comércio elevado. O estado de São Paulo se destaca como grande comprador de praticamente todos os estados brasileiros, ainda que a maior parte das compras venha basicamente da região Sudeste. Quando os estudos envolveram as macrorregiões brasileiras, verificou-se uma forte concentração do comércio na porção Centro-Sul do país, ao passo que a Norte concentrou os estados que comercializam abaixo da média nacional. Em relação aos estados do Nordeste, percebeu-se uma majoritária predomi-nância do comércio intrarregional.

Especialmente o estudo de Perobelli e Haddad (2006), que efetuou uma avaliação intertemporal, mostrou que este padrão é histórico e tem se mantido, destacando-se que tem crescido o comércio inter-regional.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012212

O estudo de Domingues et al. (2002) corrobora basicamente os mesmos resultados. Eles examinam as mudanças na estrutura do comércio inter-regio-nal brasileiro, a partir de dados agregados para os estados, entre 1985 e 1997, e concluíram que a renda (PIB) dos estados é fator central na explicação do comércio interestadual. Estados com renda mais alta tendem a comercializar mais com outros de renda mais alta e vice-versa. A única exceção é o estado de São Paulo, que, conforme comentado, é o que mais compra de todos os demais. Outra conclusão de Domingues et al. (2002) foi a de que determi-nantes espaciais também têm influência, mostrando que distância importa no comércio bilateral, e, portanto, estados vizinhos tendem a comercializar maiores volumes.

Outro aspecto a considerar é o de que, ainda que as exportações sejam um importante passo para o desenvolvimento de regiões jovens, é preciso que estas gerem efeitos intersetoriais e que gerem distribuição de renda para que efetiva-mente haja encadeamentos positivos, em termos do desenvolvimento pensado de uma forma mais ampla. Partindo desta perspectiva e destacando que ela levanta importantes elementos no que se refere à dinâmica do desenvolvimento regional, Magalhães e Domingues (2008) efetuam um estudo econométrico para analisar os condicionantes do comércio interestadual.

Partem do trabalho de Vasconcelos e Oliveira (2006) e aplicam o “modelo gravitacional” para sistematizar os condicionantes e as diferenças nas relações de comércio interestaduais setorialmente. O modelo foi aplicado a cada uma das atividades econômicas.

O intuito foi o de levantar os principais determinantes do comércio inte-restadual para cada classe de atividade. Também buscaram identificar quão mais forte é o efeito da renda, da distância e da adjacência nos fluxos de comércio.

Examinando as elasticidades encontradas, os autores destacaram as con-clusões a seguir.

1) Os efeitos de atividade do vendedor e do comprador (PIBi e PIBj) têm o sinal positivo. Ademais, os coeficientes do PIB do vendedor são, em geral, maiores que os do comprador. Neste sentido, os maiores coefi-cientes para o PIBi (do vendedor) foram encontrados, principalmente, na indústria de transformação, especialmente peças e outros veículos, equipamentos eletrônicos, materiais elétricos e metalurgia básica. Parale-lamente, os maiores coeficientes pelo lado do comprador (PIBj) estão em Serviços, especialmente para comunicações e serviços prestados à família.

2) A variável distância gerou sempre efeitos negativos, ainda que na ativi-dade extrativa mineral e em equipamentos eletrônicos (provavelmente

213Fluxos Totais de Comércio e Estrutura Produtiva

devido ao efeito da Zona Franca de Manaus) tal resultado não tenha sido verificado.

3) Considerando a variável adjacência, observou-se que, em apenas um caso, a elasticidade foi negativa (fabricação de calçados). Nos demais, o coeficiente é positivo ou não significativo (refino de petróleo e álcool, extrativa mineral e petróleo). Ou seja, o coeficiente positivo mostrou que o fato de dois estados serem vizinhos afeta positivamente as relações comerciais entre eles.

Conforme se constata, as conclusões vão na mesma direção dos resulta-dos encontrados pelos trabalhos anteriormente citados, e o destaque são os resultados relativos às relações entre PIBs setoriais e a dinâmica de compras e vendas interestaduais.

A par desses resultados, pode-se tecer alguns comentários sobre a análise aqui empreendida para a balança comercial de Minas Gerais.

Conforme se pode observar, os estudos citados concentraram a análise basi-camente em termos da dinâmica do comércio inter-regional, sem estudar a balan-ça comercial do estado como um todo, uma vez que não analisaram em conjunto os fluxos de comércio dos estados com o exterior do país.

Nesse sentido, retomam-se, inicialmente, alguns dados referentes ao comér-cio inter-regional de Minas Gerais, comentando alguns dos resultados encontra-dos para 2006 em comparação com os dados apresentados por Vasconcellos e Oliveira (2006) para 1999.

No que se refere aos estados compradores dos bens e serviços produzi-dos em Minas Gerais, em 1999, São Paulo ocupava o primeiro lugar, bem adiante dos demais, sendo responsável pela absorção de 50,4% do total. A seguir, vinham Rio de Janeiro e Espírito Santo, todos eles vizinhos a Mi-nas. Destacavam-se ainda Goiás, Paraná, Bahia, Rio Grande do Sul e Distrito Federal (gráfico 17).

Em 2006, não houve uma profunda mudança nessa dinâmica. Destacam-se algumas poucas modificações. São Paulo perde parte de sua participação, mas ainda é responsável por 45,51% das compras. Os estados mais importantes em absorção permanecem basicamente os mesmos, tendo aumentado um pouco a sua participação, em virtude da perda de São Paulo. Outro destaque vai para o fato de que Santa Catarina passa a constar como um dos estados mais importantes a comprar de Minas Gerais, com uma participação superior (2,72%) à do Distri-to Federal (gráfico 18).

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GRÁFICO 17saídas interestaduais – principais estados (1999)

(Em %)

3,7

2,5

5,2

5,5

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3,3

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0 10 20 30 40 50 60

BA

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Fonte: Vasconcelos e Oliveira (2006).

GRÁFICO 18saídas interestaduais – principais estados (2006)

(Em %)

3,95

2,15

4,05

8,19

15,19

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2,72

3,08

4,40

0 10 20 30 40 50

BA

DF

GO

ES

RJ

SP

SC

RS

PR

Fonte: Secretaria de Fazenda do Estado de Minas Gerais (2006).Elaboração dos autores.

215Fluxos Totais de Comércio e Estrutura Produtiva

Em termos da distribuição regional das vendas de Minas Gerais, não houve praticamente modificação (gráfico 19). As regiões Sul e Norte au-mentam um pouco sua participação, enquanto a Centro-Oeste e a Nordeste perdem. No entanto, o fato central é o de que a região Sudeste continua responsável por comprar mais de 68% dos produtos e serviços de Minas Ge-rais. Permanece, portanto, a mesma dinâmica, que corrobora os resultados levantados pelos estudos citados.

GRÁFICO 19vendas de minas gerais às macrorregiões brasileiras (1999 e 2006)

(Em %)

0,00

10,00

20,00

30,00

40,00

50,00

60,00

70,00

Sul Sudeste Centro-Oeste Norte Nordeste

1999 2006

Fonte: Secretaria de Fazenda do Estado de Minas Gerais (2006) e Vasconcelos e Oliveira (2006).Elaboração dos autores.

Se é verdade que não houve modificação substancial no destino das exportações mineiras a outros estados da Federação, o mesmo não se pode dizer quanto aos montantes, que praticamente triplicaram. Enquanto em 1999 São Paulo comprara R$ 23,81 bilhões de Minas, em 2006 passou a comprar R$ 63,2 bilhões. Os estados do Rio de Janeiro e do Espírito Santo, que compraram, respectivamente, R$ 6,07 bilhões e R$ 2,6 bilhões, passa-ram a comprar R$ 21 bilhões e R$ 11,3 bilhões cada um. Ou seja, houve uma significativa expansão, lembrando-se que, especialmente entre 2003 e 2006, ocorre um período de grande liquidez internacional e interna, maior estabilidade, e grandes superávits da balança comercial brasileira, explicando o próprio comportamento vigoroso das exportações no período considerado.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012216

No que se refere à análise do perfil das principais saídas de Minas Gerais, em 1999, para outros estados, de acordo com a classificação baseada na natureza da atividade econômica, apresentaram a seguinte composição (CNAE-Fiscal):11 produtos industriais, com R$ 27,45 bilhões, com destaque para: fabricação e montagem de veículos automotores, reboques e carrocerias; metalurgia bási-ca; e fabricação de produtos químicos. As atividades agrícolas e agroindustriais ocuparam a segunda posição, com R$ 12,20 bilhões, cabendo destaque para a fabricação de produtos alimentícios e bebidas; comércio atacadista de produtos agropecuários in natura; produtos alimentícios para animais; e fabricação de produtos têxteis. Por fim, vêm as atividades de serviços, com R$ 3,52 bilhões, com destaque para os transportes terrestres (Vasconcelos e Oliveira, 2006).

Em 2006, os dados apresentados neste trabalho demonstram que as ativi-dades industriais continuam em primeiro lugar nas vendas interestaduais, com R$ 50,265 bilhões. Destacam-se as vendas que apresentam alto valor agregado, como as vinculadas à siderurgia e à fabricação de automóveis, camionetas e uti-litários. Depois destas atividades, pode-se notar que o valor das saídas das de-mais atividades apresentam magnitudes substancialmente menores. Destaca-se a extração de minério de ferro e a fabricação de peças e acessórios para veículos automotores. Em segundo lugar, vêm as atividades agrícolas, com R$ 27,919 bilhões, sendo os principais produtos e serviços relacionados à fabricação de pro-dutos derivados do petróleo, de laticínios, e ao abate e fabricação de produtos de carne. Em terceiro lugar, estão as atividades de serviços, com R$ 26,755 bilhões, com destaque para o transporte de cargas rodoviário, ferroviário e metroviário e o comércio de veículos automotores.12

Ou seja, Minas Gerais está entre os estados que concentram parte impor-tante de suas vendas a outros estados em produtos industriais, comercializan-do principalmente com São Paulo e seus estados vizinhos. Considerando-se a balança comercial como um todo, destaca-se que 29% das vendas estão rela-cionadas a produtos intensivos em recursos naturais e 33% àqueles intensivos em economias de escala, enquanto apenas 5% são vinculadas a produtos e serviços intensivos em trabalho.

No que se refere ainda às vendas, as estabelecidas com o exterior do país representam apenas 23% do total, enquanto as que se dirigem para São Paulo são responsáveis por 54%. Esta dinâmica se apresenta também do lado das compras,

11. A Classificação Nacional de Atividades Econômicas-Fiscal (CNAE-Fiscal), é um instrumento de identificação eco-nômica das unidades produtivas do país nos cadastros e registros das três esferas da administração pública brasileira, uniformizado nacionalmente, seguindo padrões internacionais definidos no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU). Esta classificação surgiu da necessidade de padronização das tabelas de códigos de atividades econômicas utilizadas nas três esferas de governo. Trata-se de um desdobramento adicional, criando mais dois dígitos a serem incorporados às classes da CNAE (cinco dígitos), que era a classificação utilizada até 1998 pelos órgãos federais. 12. Note-se que na classificação utilizada neste trabalho tem-se, ainda, o item demais, com R$ 12,420 bilhões.

217Fluxos Totais de Comércio e Estrutura Produtiva

o que mostra que a dinâmica de comércio de Minas Gerais não pode ser analisada apenas pela pauta e pelo resultado do comércio exterior.

O que se observa é que o estado, além de figurar entre os maiores PIBs do país, apresenta forte diversificação produtiva, expressa nos fluxos de comércio intraestaduais e interestaduais. Ademais, o padrão de comércio verificado para os fluxos com o exterior, fortemente baseados em commodities e produtos se-mimanufaturados, não se apresenta nos fluxos interestaduais. Nestes, verifica-se grande semelhança entre os principais produtos comprados e vendidos, indicação de uma estrutura produtiva diversificada e complexa.

Destaque-se ainda que, embora nem todos os trabalhos citados nesta seção tenham como referência teórica explícita os trabalhos da nova geo-grafia econômica (Krugman, 1991), seus resultados principais reforçam os argumentos deste enfoque teórico, ao concluir pela concentração do comér-cio interestadual na região Centro-Sul do país – onde estão presentes os segmentos produtivos mais complexos e há preponderância de economias de escala – e ao mostrar que a proximidade importa nos fluxos de comércio, em função dos custos de transportes.

6 coNsidEraçÕEs FiNais

A análise dos fluxos de comércio intraestaduais, interestaduais e internacionais de Minas Gerais realizada neste trabalho permite mostrar que a estrutura produtiva do estado apresenta graus elevados de diversificação e complexidade, conclusão que diverge daquela obtida a partir da análise apenas dos fluxos de comércio internacionais. A tradicional imagem do estado como exportador de matérias-primas e produtos agrícolas com baixo grau de elaboração modifica-se a partir da consideração dos fluxos de comércio internos.

Quando se considera a classificação da OCDE de atividades produtivas, verifica-se que o estado apresenta vendas em todos os itens, sendo mais rele-vantes as atividades intensivas em economias de escala, seguidas das intensivas em recursos naturais e das intensivas em especialização. A análise de destino destes fluxos mostra que o principal parceiro comercial de Minas Gerais é o estado de São Paulo, em que a relação de comércio deficitária é mais que compensada por superávits expressivos, sobretudo, com os estados do Espí-rito Santo e Rio de Janeiro. A predominância de fluxos de comércio com os estados mais próximos, localizados na região Sudeste, corrobora pesquisas anteriores que encontram forte relação entre PIBs elevados e vizinhança com os fluxos de comércio.

Outro resultado importante do trabalho é encontrado na contraposição das atividades que apresentam maiores índices de densidade fiscal (valor das vendas

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012218

sobre emprego) com as atividades que mais empregam no estado. Há uma clara divergência entre estas atividades, com a única exceção da atividade de siderurgia. Este resultado tem importantes desdobramentos em termos de políticas públicas, dado que as atividades responsáveis pelos maiores fluxos de comércio, notada-mente as industriais, não são as que mais empregam, estando estas localizadas prioritariamente no setor de serviços.

rEFErÊNcias

DAVIES, D.; WEINSTEIN, D. Economic geography and regional production structure: an empirical investigation. European Economic Review, v. 43, n. 2, 1999.

DOMINGUES, E. P. et al. Structural changes in the Brazilian inter-regional eco-nomic system, 1985-1997: holistic matrix interpretation. Australasian Journal of Regional Studies, v. 8, n. 1, p. 21-44, 2002.

IEDI – INSTITUTO DE ESTUDOS DE DESENVOLVIMENTO INDUS-TRIAL. Desindustrialização e os dilemas do crescimento econômico recente. São Paulo: Iedi, 2007.

HIRSCH-KREINSEN, H. et al. Low-tech industries and the knowledge eco-nomy: State of the art and research challenges. Europe: PILOT, 2003. (European Commission/Step Report).

KRUGMAN, P. R. Geography and trade. Cambridge: MIT Press, 1991.

MAGALHÃES, A. S.; DOMINGUES, E. P. Relações interestaduais e interseto-riais de comércio no Brasil: uma análise gravitacional e regional. Revista Brasi-leira de Estudos Regionais e Urbanos, v. 2, n. 1, 2008.

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VASCONCELOS, J. R. Matriz do fluxo de comércio interestadual de bens e ser-viços no Brasil – 1998. Rio de Janeiro: Ipea, 2001. (Texto para Discussão, n. 783).

VASCONCELOS, J. R.; OLIVEIRA, A. M. Análise da matriz por atividade econômica do comércio interestadual no Brasil – 1999. Rio de Janeiro: Ipea, 2006. (Texto para Discussão, n. 1.159).

XAVIER, C. L.; SILVA, K. A. O. Padrão de especialização e competitividade das exportações de Minas Gerais no período 1995-2004. Revista Econômica do Nordeste, v. 38, n. 4, 2007.

Originais submetidos em julho de 2011. Última versão recebida em janeiro de 2012. Aprovado em fevereiro de 2012.

EFiciÊNcia No gasto PÚBlico com Educação: uma aNálisE dos muNicÍPios do rio graNdE do NortEJorge Luiz Mariano da Silva*Júlio César Lima de Almeida**

O objetivo principal deste trabalho é mensurar a eficiência dos municípios do Rio Grande do Norte na utilização do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental (Fundef) e relacionar esta eficiência com os indicadores da avaliação educacional de 2005. Para esta mensuração foram estimadas duas fronteiras de produção na educação, por meio dos métodos de envoltória de dados da Data Envelopment Analysis (DEA) e do FDH (Free Disposal Hull). Entre outros resultados, constatou-se uma baixa eficiência do gasto público na educação municipal. Na análise realizada por meio do DEA, observou-se que quinze municípios foram eficientes e que a redução do nível de reprovação poderia ser alcançada com o aumento da eficiência do gasto na educação. O município mais ineficiente, embora recebesse mais recursos do FUNDEF, apresentou menor número de escolas, de salas de aulas, de alunos matriculados e de professores contratados que o mais eficiente. Notou-se ainda que o município mais ineficiente apresentou os mais altos níveis de reprovação e abandono de alunos.

Palavras-chave: educação; eficiência; municípios.

EFFiciENcY iN PuBlic sPENdiNg oN EducatioN: aN aNalYsis oF muNiciPalitiEs iN rio graNdE do NortE

The main objective of this study is to measure the efficiency of municipalities in the State of Rio Grande do Norte in the use of the Maintenance and Development Fund for Elementary Education (FUNDEF) and relate this efficiency to evaluation indicators in 2005. To measure the efficiency of municipalities public spending in education two frontier of production in education were estimated, using the data envelopment method, Data Envelopment Analysis (DEA) and Free Disposal Hull (FDH). Among other results found, a low efficiency rate was identified in municipality public spending. It was observed that only fifteen municipalities were considered efficient by DEA analysis. It was verified that, reductions in rates of students held back could be reached with increased efficiency of spending in education. The most inefficient municipality, even though it receives the most resources from FUNDEF, has a fewer number of schools, classrooms, registered students and contracted teachers than the municipality that is the most efficient in public spending on education. Notably, the most inefficient municipality showed the highest levels of students being held back or dropping out.

Keywords: education; efficiency; municipalities.

* Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Endereço eletrônico: <[email protected]>.** Economista da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Endereço eletrônico: <[email protected]>.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012220

EFiciENcia EN El gasto PÚBlico EN la EducaciÓN: uN aNálisis EN los muNiciPios dE rio graNdE do NortE

El objetivo principal de este trabajo es medir la eficiencia de los municipios del estado de Rio Grande do Norte en el uso del Fondo para el Mantenimiento y Desarrollo de la Enseñanza Primaria (FUNDEF) y relacionar esa eficiencia con los indicadores de evaluación educativa de 2005. Para medir la eficiencia de los municipios, fueron estimadas fronteras de producción en la educación mediante el método de envoltura de datos de Data Envelopment Analysis (DEA) y el Free Disposal Hull (FDH). Entre otros resultados, se constató una baja tasa de eficiencia del gasto público municipal. Se observó que sólo quince municipios fueron eficientes según el análisis del DEA. Se descubrió que la reducción en la tasa de reprobación puede lograrse mediante el aumento de la eficiencia del gasto en educación. El municipio más ineficiente, aunque poseía más recursos del FUNDEF, tenía menor número de escuelas, aulas, estudiantes matriculados y profesores empleados que el municipio más eficiente con el gasto público en educación. Se constató que el municipio más ineficiente tuvo las más altas tasas de reprobación y abandono escolar de los estudiantes.

Palavras-clave: educación; eficiencia; municipios.

l’EFFicacitÉ dEs dÉPENsEs PuBliQuEs Pour l’ÉducatioN: uNE aNalYsE daNs lEs muNiciPalitÉs dE rio graNdE do NortE

L’objectif principal de ce travail est de mesurer l’éfficacité des municipalités de Rio Grande do Norte dans l’utilisation des fonds pour la manutention et le développement de l’enseignement fondamental (FUNDEF) et relationer, cette éfficacité, avec les indicateurs d’évaluation éducationnel de 2005. Pour mesurer l’éfficacité a été estimé deux frontières de production dans l’éducation, utilisant les métodes de regroupements des donnés, Data Envelopment Analysis (DEA) et Free Disposal Hull (FDH).Parmi les autres résultats, nous constatons une baisse de la taxe d’efficacité de dépense publique Municipal. Nous observont que seulement quinze Municipalité ont été efficace dans l’analyse de DEA. Il a été constaté que la réduction du niveau des élèves reprouvés pourrait être obtenue en augmentant l’éfficacité des dépenses de l’éducation. En outre, la ville la plus inefficace qui possédait plus des resources FUNDEF, a montré une diminution du nombre d’écoles, des salles de classe, d’étudiants inscrits et des professeurs sous contrats que la ville plus efficace. Nous notons, que la Municipalité la plus inéfficace dans les les dépenses publiques de l’éducation, présentent les plus hauts niveaux de réprobation et abandon des étudiants.

mots-clés: éducation; efficacité; municipalités.

JEL: I20; I21; I22.

1 iNtrodução

Estudos do Banco Mundial e da Unesco revelam que nenhum país conseguiu um desenvolvimento sustentável sem investir substancialmente em educação e em saú-de. A Europa, o Oriente Médio, os Estados Unidos e outros países industrializados investem mais em educação pública que os países da América Latina, da África e da Ásia central. Em 1999, por exemplo, o Brasil gastou apenas 5% do PIB na educa-ção pública, desempenho inferior aos 6,9% do Zimbábue, (Banco Mundial, 2006). Estes estudos ainda revelam que os países em desenvolvimento vêm investindo mais recursos públicos na educação. Na década de 1990, mais de 3/4 das crianças em

221Eficiência no Gasto Público com Educação

idade escolar dos países em desenvolvimento estavam matriculadas nas escolas, e as taxas de analfabetismo caíram de 39% para 30%, entre de 1985 e 1995.

No Brasil, nos últimos anos, o governo federal vem ampliando os recursos destinados à educação nos municípios. Em 1996, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei no 9.394/1996) estabeleceu as porcentagens mínimos de investimentos que a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios deveriam destinar à manutenção e ao desenvolvimento do ensino público. Esta lei criou o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF). Sua criação foi considerada uma verdadeira revolução no ensino fundamental.

Com o FUNDEF, estados e municípios recebiam o equivalente ao nú-mero de alunos matriculados em sua rede pública do ensino fundamental e, além disso, era estipulado um valor mínimo nacional por aluno/ano, de acor-do com os dados constantes do censo escolar do ano anterior. O FUNDEF era composto por 15% dos recursos oriundos do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), do Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal (FPE), do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), do Imposto sobre Produtos Industrializados, proporcional às exporta-ções (IPI-EXP), além daqueles recursos de que trata a lei complementar no 87/1996 (Lei Kandir), e de complementação da União, quando necessário. O FUNDEF tinha basicamente dois objetivos: o primeiro era a universalização do ensino, isto é, colocar todas as crianças a partir de 7 anos de idade nas escolas, e o segundo era a valorização do professor, por meio de melhorias em sua remuneração e em sua capacitação.

Em janeiro de 2007, o FUNDEF foi substituído pelo Fundo de Manuten-ção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). Entretanto, o princípio do Fundeb é basicamente o mesmo do FUNDEF, destacando-se o aumento, para 20%, dos recursos oriundos dos im-postos.

Entretanto, apesar da criação do FUNDEF, os resultados das avaliações dos alunos não acompanharam proporcionalmente os investimentos recebidos. O estado do Rio Grande do Norte tem apresentado um dos piores indicadores de qualidade da educação brasileira, avaliada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Edu-cacionais Anísio Teixeira (Inep). Em 2005, 95% dos municípios não alcançaram a média brasileira de aprovação de alunos da 4a série, e 49,1% não alcançaram a média brasileira de aprovação de alunos da 8a série.

Os resultados também são preocupantes quando se analisam os municípios que apresentaram um índice de reprovação de alunos acima da média brasileira. Do total dos municípios, 86,6% apresentaram resultados de reprovação de alunos da 4a série

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012222

acima da média nacional, e 11,4% apresentaram estes resultados de alunos da 8a série. Péssimos indicadores são verificados quando se observam os índices de abandono. Dos 167 municípios do estado, 70,7% e 68,9%, nas referidas séries, respectivamente, apresentaram índices de evasão escolar acima da média brasileira.

Os gestores municipais procuram justificar o fraco desempenho dos indicadores educacionais relacionando-os com a limitação dos recursos recebidos. Em compensação, os pesquisadores argumentam que o fraco desempenho do ensino público municipal deve-se à ineficiência na aplica-ção dos recursos. Considerando-se o aumento dos gastos na educação, per-gunta-se, então, por que o Rio Grande do Norte não apresentou melhorias na qualidade da educação básica.

Este estudo tem por objetivo avaliar a eficiência do gasto público com o ensino fundamental nos 167 municípios que compõem o estado do Rio Grande do Norte. A intenção é verificar se os municípios alocaram de forma eficiente os recursos do FUNDEF no ensino fundamental, em 2005. Os níveis de eficiência serão comparados com os indicadores educacionais obtidos na avaliação da Prova Brasil de cada município no mesmo ano.

É importante destacar que o presente estudo não pretende ser uma análise de política educacional; o foco está na avaliação dos municípios e em sua eficácia na utilização dos recursos da educação para o ensino fundamental. Buscando alcan-çar este objetivo, serão utilizados os métodos não paramétricos Data envelopment Analysis (DEA) e Free Disposal Hull (FDH) para estimar duas fronteiras de pro-dução educacional dos municípios. Estes métodos consistem em procedimentos matemáticos que permitem avaliar, individualmente, os municípios selecionados, em relação àqueles que apresentaram a melhor prática, isto é, as melhores gestões do gasto público na educação. O presente estudo pretende, ainda, analisar os fatores que explicam a ineficiência dos municípios na alocação de recursos na educação.

O trabalho está organizado em seis seções, incluindo esta introdução. A segunda apresenta, de forma breve, alguns estudos sobre a eficiência na educa-ção. Na terceira, apresenta-se a metodologia utilizada para se obter a eficiência do gasto público municipal. Na quarta, analisam-se os resultados obtidos nos mode-los DEA e FDH. Na quinta, estima-se uma função ineficiência dos municípios na aplicação dos recursos da educação. E, na última, destacam-se as principais conclusões do estudo.

2 EFiciÊNcia Na Educação: um BrEvE rElato dE Estudos aPlicados

A questão da eficiência na educação tem despertado interesse de gestores e pesquisadores que se dedicam à problemática da relação entre financiamento

223Eficiência no Gasto Público com Educação

e desempenho das escolas públicas. Há vários estudos nas literaturas internacional e nacional, os quais consideram a possibilidade da existência de ineficiência técni-ca na gestão das escolas públicas. Estes estudos ajudam a identificar as escolas que se destacam com os mais altos níveis de desempenho, isto é, aquelas que estão na fronteira da eficiência, e também contribuem para a formulação de políticas para as escolas com mais baixos resultados educacionais.

Entre os métodos utilizados para identificar as escolas na fronteira da efici-ência, destaca-se a programação matemática do modelo DEA. MacCarty e Yai-sarwarng (1993) afirmam que a maioria dos estudos sobre a eficiência técnica nas escolas públicas usa o modelo DEA. Por exemplo, Kirjavainen e Loikkanen (1998) usaram este modelo para estudar a eficiência das escolas públicas do en-sino secundário na Finlândia, e observaram que elas foram mais eficientes que as escolas particulares. Waldo (2006), utilizando a abordagem DEA para deter-minar a eficiência das escolas públicas de municípios da Suécia, observou que a eficiência das escolas públicas é afetada pela competição com as escolas privadas. Levin (1997) encontrou diversas causas que levariam à ineficiência das escolas. Entre outras, o autor destacou a falta de conhecimento administrativo dos gesto-res das escolas públicas e a ausência de um mercado ambientalmente competitivo. Destacam-se, ainda: os trabalhos de Grosskopf e Moutray (2001) e de Primont e Domazlicky (2006), que analisaram, respectivamente, o desempenho das escolas de Chicago e de Missouri, nos Estados Unidos, o estudo de Portela e Thanas-suoulis (2001), que investigaram os níveis de eficiência educacional analisando o desempenho dos alunos e das escolas, o estudo de Bifulco e Bretschneider (2001), que compararam os resultados do DEA e da fronteira estocástica para identificar o conjunto de variáveis que interferem no processo de produção educacional, e o trabalho de Bradley et al. (2010), que mensuraram as mudanças de produtividade do setor educacional na Inglaterra.

No Brasil, há vários estudos sobre essa temática, destacando-se o trabalho de Delgado e Machado (2007), que estimou fronteiras de eficiência das escolas públicas estaduais de Minas Gerais, nos níveis de ensino fundamental e médio. Entre outros resultados, os autores constataram que as escolas localizadas onde há mais abundância de recursos educacionais tendem a ser mais eficientes. Machado Júnior et al. (2011), na busca de encontrar a eficiência do gasto municipal em educação, saúde e assistência social nos municípios do Ceará, constataram baixos níveis da eficiência média do gasto público municipal em todos as áreas, princi-palmente na educação. Sampaio e Guimarães (2009), com o objetivo de analisar a eficiência no ensino básico, nas escolas públicas e nas privadas, observaram que as escolas particulares foram mais eficientes que as públicas. Zoghbi et al. (2011), com objetivo de avaliar a eficiência dos municípios paulistas, no gasto em educa-

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012224

ção fundamental, usaram o modelo FDH para estimar a fronteira de eficiência. Entre os resultados, os autores perceberam que o grupo de municípios com mais de cem mil habitantes foi mais eficiente, e que a municipalização da rede de ensino favorece o desempenho dos alunos.

3 mEtodologia

Os modelos DEA são elaborados admitindo-se as suposições da teoria microeco-nômica de acordo com a qual a análise é desenvolvida. Isto é, podem-se admitir as hipóteses de retornos constantes ou a de variáveis de escala.

De acordo com Simar e Wilson (2002), na forma de função distância, a medida da eficiência, com a suposição de retornos constantes e produto orientado, pode ser obtida por:

( )[ ] }{ nCRSn XxYyyxD +

−ℜ∈≥≤= lllqq ,,max,ˆ 1

(1)

em que Y = [ ],....1 nyy X = [ ]nxx ...1 são matrizes de insumos e produtos,

respectivamente, e l = [ ]'1 ,..., nll é uma matriz de variáveis de intensidade.

A medida de eficiência com a suposição de retornos variáveis de escala é representada por:

( )[ ] }{ nVRSn XxYyyxD +

−ℜ∈=≥≤= lτlllqq ,1,,max,ˆ 1

(2)

O modelo com retornos constantes de escala é conhecido como DEA-C; com a suposição de retornos variáveis de escala, o modelo é denominado DEA-V. Neste estudo, utilizou-se o teste de Kolmogorov-Smirnov (K-S), sugerido por Banker (1996), para a seleção do modelo DEA. A estatística deste teste é dada por:

(3)

Nessa estatística, ( )( ) 1,ˆ −

iiCRS yxDF e ( )( ) 1

,ˆ −

iiVRS yxDF representam,

respectivamente, as distribuições de ineficiência acumuladas dos modelos DEA com retornos constantes e com variáveis de escala. No procedimen-to do teste, o valor desta estatística (0,473) comparado com o valor crítico ( ) permitiu aceitar-se a hipótese de retornos variáveis de escala.

3.1 o modelo dEa com retornos variáveis de escala (dEa-v)

De acordo com Primont e Domazlicky (2006), o modelo DEA-V com orientação produto pode ser representado pela seguinte estrutura de programação matemática:

225Eficiência no Gasto Público com Educação

Maximizar qi

Sujeito a Xl ≤ Xk,

qYi -Yl ≤ 0

∑ =n

Jj 1l

(4)

Assume-se que existem n municípios, com k recursos para a educação, os quais conseguem obter m produtos (alunos matriculados, número de professores, número de escolas, número de salas de aula). Para o iésimo município, Xk representa os recur-sos do FUNDEF destinados para a educação municipal, e os Yi representam o resul-tado desta despesa, isto é, o número de alunos matriculados, professores, escolas e sa-las de aula. As matrizes Y e X representam, respectivamente, as informações sobre os produtos e sobre os recursos do FUNDEF para a educação dos demais mu-nicípios. Neste estudo, mensurou-se a eficiência do gasto público na educação de todos os municípios do estado, ou seja, n = 167, sendo m = 4, o número de produtos, e k = 1, o número de insumos. O parâmetro l é um vetor de pesos e q é um escalar. A última restrição permite que o iésimo município alcance, no máximo, a fronteira de produção.

Os escores de eficiência de cada município na provisão do gasto público na educação são obtidos invertendo-se o valor de q, isto é: eficiência do gasto em educação = 1/q. Este valor indica a eficiência do município em atingir um maior resultado na educação do ensino fundamental com os recursos do FUNDEF. Os escores de eficiência variam no intervalo entre zero e um. Quando o escore de eficiência é igual a um, isto significa que o município está sobre a fronteira, por-tanto, ele é considerado eficiente. Quanto mais próximo a zero, mais ineficiente será o município no gasto público na educação.

3.2 o modelo Fdh

O modelo de fronteira FDH utiliza o conceito de dominância (Tulkens, 1993). Um município é considerado dominante em relação a outro se al-cança, na educação, um nível de indicadores (outputs) maior que o outro município alcançou, com os mesmos recursos financeiros, ou se atingir, com uma menor quantidade de recursos, o mesmo nível de resultados na educa-ção. Os municípios eficientes e dominantes são aqueles que têm eficiência e superam um ou mais municípios nos resultados da educação. Os eficientes não dominantes, também chamados “eficientes por default”, são aqueles que não podem ser comparados com nenhum outro município. Eles são conside-rados eficientes devido à ausência de municípios com indicadores que sejam semelhantes aos seus. Este modelo segue a estrutura de programação do

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012226

modelo DEA-V, com a introdução de uma restrição que relaxa a suposição de convexidade, ou seja, li ∈ {0,1}.

As representações gráficas das fronteiras DEA e FDH podem ser observadas na figura 1. Nesta ilustração, o contorno das fronteiras é formado pelos municí-pios eficientes, YC e YB, com base nos indicadores do número de alunos matricu-lados e de professores contratados. A medida de eficiência técnica é obtida pela distância radial em relação às fronteiras eficientes. Por exemplo: o município YA, por apresentar folgas nos indicadores de alunos e nos de professores é considerado ineficiente na avaliação das duas fronteiras.

FIGURA 1 representação das fronteiras dEa e Fdh

Y2

Y1

Número de alunos

matriculados

Número de professores contratados

DEA (FRONTEIRA)FDH(FRONTEIRA)

YC

YB

YA

θAYA

3.3 o modelo e o processo de estimação da função ineficiência municipal no gasto com educação

Diversos estudos têm procurado analisar os fatores que explicam a ineficiência das escolas públicas e privadas, estaduais e municipais, nos resultados referentes à educação. Entre eles, os trabalhos de McCarty e Yaisawarng (1993), Kirjavainen e Loikkanen (1998) e Waldo (2006). Este último utilizou a competição entre as escolas, a composição partidária, a arrecadação de impostos, a população e o perfil do município quanto à localização urbana ou rural como variáveis explicativas da função ineficiência dos municípios na Suécia.

Com o objetivo de investigar alguns dos fatores associados à ineficiência dos municípios do Rio Grande do Norte no gasto público com educação, estimou-se uma

227Eficiência no Gasto Público com Educação

função de ineficiência deste gasto, em 2005, que segue a especificação do modelo de regressão Tobit, aplicado nos trabalhos de Kirjavainen e Loikkanen (1998), McCarty e Yaisawarng (1993) e Waldo (2006). A formulação deste modelo é a seguinte:

,1

*i

n

ikiki XY εβα ++= ∑

=

Y=0 se Yi* ≤ 0, Yi=Yi* se Yi

*> 0 (5)

Os efeitos marginais para uma variável dependente contínua, no modelo Tobit, são obtidos por,

(6)

Essa equação permite comparações aproximadas entre as estimativas de mínimos quadrados ordinários e as de Tobit. Os efeitos marginais para variá-veis explicativas binárias são obtidos substituindo-se Xi = 1 e, depois, Xi = 0 na equação do valor esperado de Yi condicional a Xi.

1

[ ] ( )( )

Φ

+

Φ=

σβσβφ

σβσ

β/'/'

''

i

ii

iii X

XX

XXYE

(7)

A função ineficiência no gasto com educação municipal terá a seguinte formulação:

Y*i = α + ß1 (Idade) + ß2(Escolaridade) + ß3(Coligação) +ß4(Conselhos) +

ß5(Arrecadação) +ß6 (Localização) + ß7 (densidade) +ß8(PIB) + ξi (8)

A variável dependente censurada representa os escores de ineficiência dos municípios, *

iY . Os escores de eficiência dos municípios obtidos na esti-mação da fronteira DEA-V foram transformados em escores de ineficiência, isto é, q/11* −=iY ; e os Xi representam as variáveis explicativas associadas à ineficiência no gasto com educação.

Essas variáveis foram agregadas em dois grupos: o primeiro traz algumas características do prefeito do município (a idade, a escolaridade), uma vari-ável política (a dummy coligação do seu partido com o partido do governo estadual), e uma variável dummy que caracteriza a presença de conselhos municipais de educação.

1. Mais detalhes da aplicação do modelo Tobit, no segundo estágio da análise da eficiência nos modelos DEA, podem ser encontrados em Mcdonald (2009).

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012228

De modo geral, espera-se que a idade do prefeito reflita no acúmulo de experiência, com reflexos positivos sobre o grau de eficiência do gasto público. De forma semelhante, o maior grau de instrução do prefeito pode contribuir para a melhoria do desempenho administrativo, em particular para sua expecta-tiva sobre o quanto é importante uma maior eficiência dos gastos na educação.

Embora não haja uma argumentação teórica a priori, a variável dummy coligação tenta captar se há uma coesão entre a política educacional dos mu-nicípios e a política educacional estadual, considerando o relacionamento partidário entre ambas.

Os conselhos municipais em educação, que têm a participação da comunidade na gestão do ensino, podem estabelecer metas e diretrizes para a política educacional do município. Espera-se que a participação dos conselhos reflita um maior controle e fiscalização dos recursos aplicados, gerando efeitos positivos sobre a eficiência no gasto com educação.

O segundo grupo de variáveis explicativas refere-se às características do município nos aspectos econômico (arrecadação de impostos e PIB) e geográfi-co (localização e densidade da população). Espera-se que o crescimento do PIB municipal e a melhoria no desenvolvimento local permitam um maior empe-nho dos prefeitos na provisão do gasto em educação. Com o aumento da base da arrecadação municipal, as prefeituras poderiam empenhar-se mais na aplica-ção dos recursos, com efeitos positivos sobre a eficiência do gasto na educação.

Por seu turno, com a maior oferta de bens públicos e de serviços nos municípios urbanos, espera-se que seus gestores encontrem maiores facilidades na gestão dos recursos com a educação que os municípios com predomínio de características rurais.

Por fim, o aumento populacional dos municípios representa um aumento da demanda na educação, que, de certa forma, pressiona os custos da educação das pe-quenas cidades. Os municípios que sofrem com o crescimento populacional podem ter dificuldade na gestão dos recursos públicos, em especial aqueles destinados à educação.

3.4 a descrição e a obtenção das informações utilizadas

As informações relacionadas ao FUNDEF foram obtidas no site da Secretaria do Tesouro Nacional. As demais, relativas à quantidade de alunos matricu-lados, ao número de salas de aula, ao número de professores e de estabeleci-mentos escolares, foram obtidas no sítio do Ministério da Educação (MEC) e no do Ministério da Cultura. Em relação às informações sobre o desempenho educacional na “Prova Brasil”, foram selecionados os indicadores de aprovação, reprovação e abandono de alunos da quarta e da oitava séries. Estes dados fo-ram obtidos na página do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacio-

229Eficiência no Gasto Público com Educação

nais Anísio Teixeira (Inep). As informações sobre os municípios foram obtidas no site do Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão, no link: Perfil dos Municípios Brasileiros, gestão pública de 2005.

Na tabela 1, resumem-se as estatísticas descritivas das variáveis utilizadas na estimação das fronteiras de eficiência do gasto com educação e na função ineficiência deste gasto.

TABELA 1Estatísticas descritivas das variáveis utilizadas nos modelos dEa, Fdh e na função ineficiência do gasto com educação

Variáveis Média Desvio padrão Mínimo Máximo

DEA e FDH

FUNDEF (R$) 2.012.565 3.565.053 154.396 39.500.000

Número de professores 133,50 214,08 22 2.295

Número de salas de aulas 64,96 88,40 7 884

Alunos matriculados 1982,92 3602,90 169 39.910

Número de escolas 18,03 16,43 1 122

Função ineficiência

Idade 47,08 11,14 20 75

Escolaridade (dummy) 0,83 0,37 0 1

Coligação (dummy) 0,49 0,50 0 1

Conselhos (dummy) 0,17 0,38 0 1

Urbano (dummy) 0,66 0,47 0 1

Densidade populacional (pop/Km2) 94,27 257,45 1,14 2.542,19

Arrecadação (em R$ mil)

PIB (em R$ mil) 107.003,10 541.397,3 6.515,20 6.643.983,00

Fonte: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, Ministério da Educação e da Cultura, Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão.

4 aNalisaNdo os rEsultados da EFiciÊNcia muNiciPal No gasto com a Educação

A tabela 2 mostra a distribuição dos municípios do Rio Grande do Norte por re-cursos do FUNDEF. Nota-se que a maioria deles recebeu menos de R$ 5 milhões e que a eficiência média tende a crescer com o aumento dos recursos. Destaca-se, ainda, que, entre os municípios eficientes, o maior percentual está com aqueles que receberam até R$ 500 mil.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012230

TABELA 2distribuição dos municípios por classe de recursos do FuNdEF e eficiência média obtida dos resultados do modelo dEa

Classe de recursos do FUNDEFNúmero de municípios Eficientes Eficiência média

% %

Até 500 mil reais 20 12.0 5 33.3 0.83

Acima de 500 mil a menos de 1 milhão 47 28.1 1 6.7 0.76

De 1 milhão a menos de 2 milhões 58 34.7 1 6.7 0.81

De 2 milhões a menos de 5 milhões 32 19.2 4 26.7 0.90

De 5 milhões a menos de 10 milhões 5 3.0 1 6.7 0.92

De 10 milhões a menos de 30 milhões 4 2.4 2 13.3 0.96

De 30 milhões a menos de 40 milhões 1 0.6 1 6.7 1.0

total 167 100.0 15 100.0

Fonte: resultado da pesquisa.

A tabela 3 mostra a distribuição dos municípios por classe de eficiência, de acordo com os resultados do modelo DEA. Do total dos municípios do estado, apenas quinze apresentaram escore máximo de eficiência no gasto com educação. Outros municípios chegaram próximos à eficiência, pois apresentaram escores acima de 0,95.

TABELA 3 distribuição dos municípios por classe da eficiência do gasto público com educação – rio grande do Norte (2005)

Classe de eficiência

Número de municípios

Municípios

0 ├─ 0,5 1 Olho-d’Água do Borges.

0,5 ├─ 0,65 2 Caiçara do Norte, Monte das Gameleiras.

0,65 ├─ 0,7 12Cruzeta, Fernando Pedroza, Galinhos, Itaú, Janduis, Martins, Ouro Branco, Passagem, Pilões, São João do Sabugi, Serrinha dos Pintos, Viçosa.

0,7 ├─ 0,75 23

Angicos, Barcelona, Bodo, Carnaúba dos Dantas, Lagoa de Pedras, Lajes Pintadas, Major Sales, Pau dos Ferros, Pedra Grande, Pedra Preta, Portalegre, Riacho da Cruz, Riacho de Santana, Ruy Barbosa, São Fernando, São Francisco do Oeste, São Vicente, Serra de São Bento, Serra Negra do Norte, Taboleiro Grande, Tenente Laurentino Cruz, Triunfo Potiguar, Várzea.

0,75 ├─ 0,8 35

Baia Formosa, Coronel Ezequiel, Coronel João Pessoa, Encanto, Equador, Espirito Santo, Felipe Guer-ra, Florania, Itajá, Jaçanã, Japi, Jardim do Serido, João Dias, José da Penha, Jundiá, Lucrécia, Messias Targino, Paraú, Parazinho, Patu, Pedro Avelino, Riachuelo, Rodolfo Fernandes, São Bento do Norte, São Bento do Trairi, São José do Seridó, São Pedro, São Rafael, Senador Eloi de Souza, Sen Georgino Avelino, Severiano Melo, Tenente Ananias, Timbaúba dos Batistas, Umarizal, Vera Cruz.

0,8├─ 0,85 36

Afonso Bezerra, Bento Fernandes, Bom Jesus, Brejinho, Campo Redondo, Canguaretama, Carnau-bais, Cerro-Cora, Frutuoso Gomes, Ielmo Marinho, Jandaíra, Januário Cicco, Jardim de Piranhas, Lagoa D’anta, Lagoa De Velhos, Lagoa Nova, Lagoa Salgada, Lajes, Marcelino Vieira, Montanhas, Nisia Floresta, Parelhas, Passa e Fica, Poço Branco, Porto do Mangue, Presidente Juscelino, Pureza, Rafael Godeiro, Rio do Fogo, Santa Maria, São Miguel de Touros, São Paulo do Potengi, São Tomé, Sitio Novo, Tibau do Sul, Vila Flor.

0,85 ├─ 0,9 24

Acari, Alto do Rodrigues, Ares, Augusto Severo, Baraúna, Doutor Severiano, Goianinha, Grossos, Jardim de Angicos, Luis Gomes, Maxaranguape, Monte Alegre, Pedro Velho, Pendências, Rafael Fernandes, Santa Cruz, Santo Antonio, São Jose de Mipibu, São José do Campestre, Taipu, Tangara, Tibau, Upanema, Venha-Ver.

(Continua)

231Eficiência no Gasto Público com Educação

Classe de eficiência

Número de municípios

Municípios

0,9 ├─ 0,95 13Almino Afonso, Areia Branca, Caraúbas, Ceará-Mirim, Currais Novos, Extremoz, Francisco Dantas, Gov. Dix-Sept Rosado, Guamaré, Nova Cruz, São Gonçalo do Amarante, Serrinha, Touros.

0,95 ├─ 1,0 6 Açu, Caicó, Ipanguaçu, João Câmara, Jucurutu, São Miguel.

1,0 15Água Nova, Alexandria, Antonio Martins, Apodi, Caiçara do Rio do Vento, Ipueira, Macaiba, Macau, Mossoró, Natal, Paraná, Parnamirim, Santana do Mato, Santana do Seridó, Serra do Mel.

Fonte: resultados do modelo DEA-V.

Observa-se, no gráfico 1, que a maioria dos municípios (70,7%) apresentou escores de eficiência, pelo modelo DEA, entre 0,7 e 0,9. O município com es-core mais baixo de eficiência foi Olho-d’Água do Borges. É importante destacar que este município também apresentou o maior valor da razão entre os recursos do FUNDEF e o número de alunos matriculados (gráfico 2). Os municípios de Água Nova, Caiçara do Rio do Vento, Paraná e Serra do Mel, além de terem apresentado os mais baixos valores do FUNDEF por aluno matriculado, foram classificados, pelo modelo DEA, como eficientes no gasto público com educação.

GRÁFICO 1distribuição dos municípios por escores de eficiência no gasto público com o ensino fundamental

Olho-d'Água do Borges; 0,49

0.00

0.20

0.40

0.60

0.80

1.00

1.20

0 20 40 60 80 100 120 140 160 180

Municípios

Efici

ênci

a, D

EA-V

Fonte: resultado da pesquisa.

(Continuação)

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012232

GRÁFICO 2distribuição dos municípios de acordo com os recursos do FuNdEF, por aluno

Água Nova;R$ 730,00

Caiçara do Rio doVento; R$ 727,00

Serra do Mel;R$ 761,00

Paraná;R$ 689,00 por aluno

Olho-d'Áágua do Borges;R$1.625,00 por aluno

0

200

400

600

800

1000

1200

1400

1600

1800

0 20 40 60 80 100 120 140 160 180

Municípios

Fun

def

/mat

rícu

las

R$/

alu

no

s

Fonte: resultado da pesquisa.

Com os resultados do modelo DEA, podem-se comparar os indicadores do município ineficiente com os de um município virtual que foi formado com base nas informações dos municípios de referência (benchmarks). Veja-se, por exemplo, na tabela 4, que o município de Olho-d’Água do Borges foi ineficiente quando comparado com um município virtual construído com indicadores de Serra do Mel e Parnamirim. Este município virtual teria recebido, hipotetica-mente, o mesmo valor do FUNDEF, porém alcançaria melhores indicadores educacionais, isto é, apresentaria maior número de escolas, de salas de aulas, de alunos matriculados e de docentes. Com os mesmos recursos deste município virtual, Olho-d’Água do Borges deveria ter construído mais dezesseis escolas, ter absorvido 655 alunos e contratado mais 82 professores, além de ter amplia-do algumas escolas, com a construção de mais salas de aulas.

233Eficiência no Gasto Público com Educação

TABELA 4indicadores educacionais do município ineficiente e do município de referência: resultados do modelo dEa

Indicadores

Municípios

Município virtualMetas para Olho d’Água do Borges

Ineficiente Eficientes (Benchmarks)

Olho-d’Água do Borges Serra do Mel Parnamirim

Eficiência 0.49 1 1

l (pesos) 0.98 0.02

Número de escolas 7 23 47 23 16

Número de matrículas 622 1049 14904 1277 655

Número de salas de aula 22 79 290 82 60

Número de docentes 46 118 748 128 82

Transferências (FUNDEF) 2005 1.010.448,00 798.657,00 13.671.410 1.010.448,00 -

Fonte: resultado da pesquisa.

A tabela 5 mostra os resultados da distribuição dos municípios ineficientes no gasto com o ensino fundamental pelo modelo FDH. Do total dos municípios do Rio Grande do Norte, 56 foram ineficientes. A diferença em relação ao nú-mero obtido pelo modelo DEA deve-se à restrição de convexidade deste modelo.

TABELA 5distribuição da eficiência por classe de recursos do FuNdEF (modelo Fdh)

Classe de recursos do FUNDEF Número de municípios Eficientes Eficiência média

% %

Até 500 mil reais 20 12.0 15 75.0 0,97

Acima de 500 mil a menos de 1 milhão 47 28.1 23 48.9 0,92

De 1 milhão a menos de 2 milhões 58 34.7 39 67.2 0,97

De 2 milhões a menos de 5 milhões 32 19.2 24 75.0 0,99

De 5 milhões a menos de 10 milhões 5 3.0 5 100.0 1,00

De 10 milhões a menos de 30 milhões 4 2.4 4 100.0 1,00

De 30 milhões a menos de 40 milhões 1 0.6 1 100.0 1,00

total 167 100.0 111

Fonte: resultado da pesquisa.

Os resultados obtidos pelo modelo FDH também mostram que o município de Olho-d’Água do Borges foi o mais ineficiente (gráfico 3). Poder-se-ia extrair des-ta análise que os municípios que receberam menores recursos do FUNDEF foram mais ineficientes. É importante observar que os mais baixos valores do FUNDEF estão, normalmente, associados aos menores municípios, os quais se localizam em regiões mais distantes da capital, têm os mais baixos níveis de desenvolvimento na educação, e neles a conscientização e a cobrança da sociedade por uma melhoria da qualidade do ensino geralmente são menores que nos maiores municípios.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012234

GRÁFICO 3distribuição dos municípios ineficientes, por escores de ineficiência no gasto público com o ensino fundamental (modelo Fdh)

Itau; 0.71

Olho-d´Àgua do Borges; 0,57

0.00

0.20

0.40

0.60

0.80

1.00

1.20

0 10 20 30 40 50 60

Municípios

Efici

ênci

a, m

od

elo

FD

H

Fonte: resultado da pesquisa.

Com base nos resultados obtidos no modelo FDH, é possível comparar um município eficiente com um ineficiente. A tabela 6 apresenta os indicadores educacionais do município de Olho-d’Água, que foi classificado como inefi-ciente e superado pelo município de Pedra Preta, classificado como eficiente e dominante. Este último, com uma menor quantidade de recursos do FUNDEF, apresentou resultados melhores no gasto com a educação do que Olho-d’Água. Por exemplo: com uma menor quantidade de recursos do FUNDEF, Pedra Preta apresentou um maior número de escolas, de salas de aulas, de alunos matriculados e de professores contratados que Olho-d’Água do Borges.

235Eficiência no Gasto Público com Educação

TABELA 6indicadores do gasto público na educação do município ineficiente (dominado) e do eficiente (dominante) na fronteira Fdh

Municípios

Pedra Preta Olho-d’Água do Borges

Eficiente dominante Ineficiente

Eficiência 1,00 0,57

Fundef (R$) 724.748,27 1.010.448,47

Escolas 10 7

Matrículas 720 622

Salas 25 22

Docentes 60 46

Fonte: resultado da pesquisa.

A tabela 7 traz indicadores da avaliação do ensino fundamental realizada pelo MEC, em 2005. Esta tabela foi elaborada para expor os resultados desta avaliação que dizem respeito ao Brasil, ao estado do Rio Grande do Norte e aos municípios Pedra Preta e Olho-d’Água do Borges. Estes dois municípios foram classificados, pelo modelo FDH, respectivamente, como eficiente dominante e ineficiente dominado. A tabela não apresenta os resultados da avaliação referentes aos alunos da quarta série do município de Pedra Preta, entretanto, os indicadores dos alunos da oitava série deste município foram melhores que os dos alunos da oitava série de Olho-d’Água do Borges. No entanto, comparando-se, ainda, os resultados deste último município com os do Brasil e os do Rio Grande do Norte, percebe-se que Olho-d’Água do Borges apresentou um menor índice de aprova-ção de alunos da quarta e da oitava séries e um maior índice de abandono escolar.

TABELA 7indicadores educacionais dos alunos da quarta e da oitava séries do ensino fundamental (Brasil, rio grande do Norte e dos municípios eficiente e ineficiente na fronteira Fdh)

Pedra Preta Olho-d’Água do Borges

Brasil EstadoEficiente (dominante)

Ineficiente (dominado)

Índice 4a série 8a série 4a série 8a série 4a série 8a série 4a série 8a série

Aprovação – 83,1 74,1 66,3 84,4 76,8 67,9 78,1

Reprovação – 0,0 13,5 0,0 11,2 12,0 24,4 6,3

Abandono – 16,9 12,4 33,7 4,4 11,2 7,9 15,6

Fonte: resultado da pesquisa.

Com o objetivo de verificar a relação entre a eficiência do município no gasto público da educação e os indicadores educacionais (índices de aprovação, de reprovação e de abandono da escola na quarta e na oitava séries), será utilizado

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012236

o coeficiente de correlação de Pearson. A intenção é observar se a eficiência está negativamente correlacionada com o índice de reprovação e com o índice de abandono. E, para verificar a relação entre a eficiência dos municípios no gasto público da educação e os recursos do Fundef, será utilizado o coeficiente de correlação de postos de Spearman. A intenção é comparar a classificação dos municípios por seus escores de eficiência com a classificação dos municípios por montante de recursos do Fundef.

A tabela 8 apresenta as correlações entre os escores de eficiência no gasto público com a educação municipal e os índices de reprovação, abandono e apro-vação dos alunos da quarta série do ensino fundamental. Considerando-se que alguns municípios não foram avaliados na prova do Inep, preferiu-se descartá-los desta análise. A amostra resultante foi de 149 municípios. No modelo FDH, o coeficiente de correlação entre a eficiência e o índice de reprovação foi negativo e estatisticamente significativo no nível de 5%. Este resultado significa que acrés-cimos da eficiência dos gastos em educação dos municípios estão associados com a queda do índice de reprovação dos alunos da quarta série. Os coeficientes de correlação entre os índices de eficiência e os índices de abandono e de aprovação não foram estatisticamente significantes.

TABELA 8correlações entre a eficiência no gasto público com educação e os índices de reprovação, abandono e aprovação dos alunos da quarta série do ensino fundamental

Eficiência DEA Eficiência FDHÍndice

ReprovaçãoÍndice Abandono Índice Aprovação

Eficiência DEA 1

Eficiência FDH0.5541

(0,0000)1

Índice reprovação-0.0193(0.8151)

-0.1663(0.0426)

1

Índice abandono-0.0731(0.3759)

0.0211(0.7986)

-0.0154(0.8525)

1

Índice aprovação0.0206

(0.8027)0.0635

(0.4419)-0.4900(0,0000)

-0.4648(0,0000)

1

Fonte: resultado da pesquisa. Obs.: em parênteses o nível de significância.

A tabela 9 mostra os resultados do coeficiente de correlação entre os escores de eficiência dos municípios na educação e os índices de reprovação, de aprovação e de abandono da escola na oitava série do ensino fundamental. As correlações foram significativas, no nível de 1%, entre os escores de eficiência do DEA e do FDH (0,57), entre os índices de reprovação e de aprovação (-0,67), e entre os índices de abandono e de aprovação (-0,81); e significativas, no nível de 10%, entre o índice de abandono e o de reprovação (0,14). Entretanto, nenhum dos coeficientes de correlação entre a eficiência e os índices do ensino fundamental

237Eficiência no Gasto Público com Educação

apresentou-se estatisticamente significativo. Estes resultados parecem estar de acordo como o esperado numa avaliação educacional; ou seja, na medida em que cresce o índice de reprovação, espera-se uma queda na taxa de aprovação. Espera-se também que um acréscimo no índice de abandono diminua a taxa de aprovação dos alunos e que um aumento nas taxas de reprovação possa estar associado a um aumento do abandono da escola.

TABELA 9correlação entre a eficiência no gasto público com educação e os índices de reprovação, de abandono e de aprovação dos alunos na oitava série do ensino fundamental

Eficiência DEA Eficiência FDH Índice reprovação Índice abandono Índice aprovação

Eficiência DEA 1

Eficiência FDH0.5669

(0,0000)1

Índice reprovação0.0433

(0.6038)0.0287

(0.7309)1

Índice abandono-0.0192(0.8177)

-0.0374(0.6539)

0.1433(0.0844)

1

Índice aprovação-0.0351(0.6743)

0.0037(0.9647)

-0.6676(0,0000)

-0.8155(0,0000)

1

Fonte: resultado da pesquisa.Obs.: em parênteses o nível de significância.

A tabela 10 mostra os resultados das correlações entre as classificações dos municípios por escores de eficiência e por montantes de recursos do Fundef.

TABELA 10correlação entre as classificações dos municípios por escores de eficiência e os recursos do Fundef

Classificação por escores de eficiência Classificação por recursos recebidos

DEA FDH Fundef

DEA 1

FDH0.537

(0,000)1

Fundef0.519

(0,000)0.220

(0.004)1

Fonte: resultado da pesquisa. Obs.: em parênteses o nível de significância.

As estimativas das correlações entre as classificações dos municípios quanto à eficiência e quanto aos recursos do Fundef foram positivas e estatisticamente sig-nificativas no nível de 1%, em ambos os modelos estimados. Isto significa que os municípios que receberam mais recursos tiveram melhor classificação de eficiência. Entretanto, esta associação, embora direta, é baixa, principalmente quando se observa a estimativa do coeficiente de Spearman entre a classificação da

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012238

eficiência dos municípios pelo modelo FDH e a classificação por recursos recebidos do Fundef, (0,22). Nem sempre se pode esperar que os municípios que receberam mais recursos do Fundef venham a apresentar os melhores indicadores da aplicação destes recursos.

5 rEsultados da Estimação da FuNção iNEFiciÊNcia No gasto muNiciPal com Educação

De acordo com Greene (2000), um dos problemas com a estimação do modelo Tobit é a presença de heterocedasticidade. Este autor ressalta que o estimador de máxima verossimilhança é inconsistente diante deste problema; ou seja, se Plim

kk ββ >ˆ . Uma provável especificação, para Green (1997) e Maddala (1983), é admitir que )'exp(2

ii zασ = .

Nesse estudo, após a realização da primeira estimação e a detecção da presença de heterocestasticidade pelo teste de Breusch-Pagan, realizou-se sua correção admitindo-se a especificação: 22 )( ii zαgσ += , em que g e α são parâmetros e Zi é o vetor de variáveis explicativas.

Os resultados da estimação da função ineficiência do gasto municipal na educação estão expostos na tabela 11. As variáveis que apresentaram coeficientes estatistica-mente significantes foram: escolaridade, coligação, conselho de educação, localização, densidade populacional e PIB municipal.

A variável escolaridade apresentou uma relação negativa com a ineficiência do gasto com a educação, indicando que os municípios que elegem prefeitos com maior formação educacional podem atingir maior nível de eficiência.

O coeficiente da variável coligação apresentou uma relação direta com a ineficiência do gasto com educação. Deduz-se, assim, que a coligação dos pre-feitos com o partido do governo estadual pode resultar na ineficiência de sua gestão na aplicação dos recursos na educação. Mas o que explicaria tal asso-ciação? Há diversas respostas, entretanto, uma é certa: coligação partidária não garante qualidade da administração pública. Os prefeitos devem seguir diretrizes para a educação que estejam em consonância com as determinações do MEC e dos conselhos de educação dos respectivos municípios.

Os resultados mostraram que os municípios que formam seus conselhos educacionais podem reduzir a ineficiência no gasto com educação, constatação que reflete a importância dos conselhos no planejamento e na fiscalização da aplicação dos recursos destinados à educação municipal.

Notou-se também o efeito inverso da urbanização do município sobre a ineficiência no gasto com educação. Isto é, as melhores condições de serviços e de bens públicos, presentes nas áreas urbanas, podem ajudar a conseguir uma melhor alocação dos recursos municipais para a educação.

239Eficiência no Gasto Público com Educação

Por seu turno, o aumento da densidade demográfica poderá causar um efeito direto sobre a ineficiência na alocação dos recursos para a educação. Ou seja, os municípios densamente povoados podem apresentar maiores cus-tos e dificuldades para atender o crescimento na demanda por bens e serviços públicos, principalmente no que diz respeito à educação. Porém, é impor-tante destacar que esta relação não é a única possível. Uma maior densidade populacional pode representar maior demanda por educação; por exemplo, um aumento do número de alunos matriculados sem que haja necessidade de maior alocação de recursos. Nesse sentido, o município alcançaria maior nível de eficiência no gasto público com educação.

O aumento da renda dos municípios, representado pelo acréscimo no PIB, mostrou uma relação negativa com a ineficiência no gasto municipal com educa-ção. Admitindo-se que o crescimento da renda municipal possa refletir em me-lhorias nas condições de vida da população local, esta, certamente, demandaria novas ações dos gestores municipais quanto à qualidade da educação.

TABELA 11resultado da estimação da função ineficiência do gasto público municipal com educação – regressão tobit

Variável dependente ineficiência = 1 - (1/ q)

Coeficientes z-Statistic P-Value Efeitos marginais

Parâmetros

Constante 0.1979301 38.76831 0.000

Idade (anos) -0.0000149 -0.1670 0.8673 -0.00000823

Escolaridade (dummy) -0.0125151 -7.6217 0.0000 -0.00691342

Coligação (dummy) 0.0048161 4.4617 0.0000 0.00266041

Conselhos municipais (dummy) -0.0265501 -19.436 0.0000 -0.01466651

Arrecadação de impostos (R$) 0.00000064 1.3560 0.1751 0.00000035

Localização (urbano/rural) (dummy) -0.0122321 -10.242 0.0000 -0.00675709

Densidade populacional (pop/Km2) 0.0001311 27.562 0.0000 0.00007237

PIB municipal (R$) -0.0000002011 -2.8496 0.0044 -0.00000011

Log likelihood -764.33

Fonte: resultado da estimação do modelo Tobit. Nota: 1 Significativa a 1%.

6 coNsidEraçÕEs FiNais

A maioria dos economistas concorda que o investimento em educação é o meio mais importante para se alcançar o crescimento econômico. Na visão deles, não se pode pensar em uma trajetória para o crescimento econômico de um país sem incluir, na agenda das discussões, a educação como princípio básico do investimento em capital

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012240

humano. Assim, é indispensável a ampliação de recursos para a educação básica e do ensino fundamental. Com a política de descentralização fiscal, a transferência dos recursos e a responsabilização no desenvolvimento local, os municípios passaram a ser o principal foco de análise dos economistas e analistas em políticas públicas. Cabe aos municípios a missão de mudar o quadro perverso dos indicadores educa-cionais brasileiros. Obviamente, não se podem isolar desta responsabilidade os go-vernos federal e estadual, nem a sociedade civil como um todo. Parcerias com as ini-ciativas privadas devem ser estimuladas a fim de que, em um futuro bem próximo, as empresas e os governos, em todos os níveis, possam desfrutar deste investimento na educação das crianças e dos adolescentes.

A ineficiência do gasto público municipal é uma questão de gestão de recursos da responsabilidade dos prefeitos. Este estudo permite a seguinte reflexão: os municípios pequenos, que dispõem de menos recursos, em geral, foram mais ineficientes que aqueles que captaram uma maior fatia do Fundef. Entretanto, este resultado não é válido de forma geral: alguns municípios que apresentaram as maiores quantidades de recursos por aluno foram também os mais ineficientes. De um gestor municipal, exige-se compromisso, dedicação e empenho no aten-dimento das demandas sociais, principalmente no compromisso com a educação de seu município. Maturidade (experiência) e nível educacional são alguns dos requisitos para uma boa gestão pública, refletindo um melhor desempenho na gestão dos recursos, particularmente em relação àqueles aplicados na educação.

A avaliação dos indicadores na educação não é uma tarefa trivial. Os economistas têm procurado responder às questões por meio de mensurações de eficiência na qua-lidade e na aplicação dos recursos através da estimação de fronteiras de produção e de custo da educação. Entre as técnicas mais utilizadas, está a não paramétrica de envoltória de dados, com destaque para os métodos DEA e FDH. Mas, certamente deve-se ter cautela ao se interpretar os resultados encontrados neste estudo: incluem-se entre as limitações as restrições dos modelos estimados e as informações utilizadas. Por exemplo: não foi incluída na análise aqui realizada a aplicação do Fundef na qualificação dos docentes, que, seguramente, poderia influenciar na melhoria da qualidade do ensino. Além disso, o número de municípios eficientes varia com a escolha e as restrições de cada modelo.

Entretanto, apesar dessas e de outras limitações, o estudo permite outras considerações: melhoria na alocação dos recursos do Fundef e, desta forma, me-lhor eficiência de sua utilização, o que pode contribuir para a redução da taxa de reprovação e de abandono da escola pelas crianças, no ensino público. Progra-mas de qualificação dos corpos docente e administrativo são, sem dúvida, veto-res para se alcançarem melhorias nestes indicadores, principalmente no caso dos pequenos municípios com baixo nível de desenvolvimento educacional. Todavia, ainda há uma série de ações que poderiam ajudar a melhorar estes resultados. Algumas são tradicionais, como por exemplo, o melhoramento das merendas

241Eficiência no Gasto Público com Educação

escolares, do acervo e da qualidade das bibliotecas, o estímulo aos esportes e ou-tros programas culturais que possam ser desenvolvidos nas escolas. Outras são inovadoras, como, por exemplo, um programa de bolsa de estudo, com acom-panhamento de um educador. Entretanto, nenhuma destas ações logrará êxito se não for complementada com a participação da sociedade civil na cobrança e na fiscalização, para uma educação universal e de qualidade.

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EFEitos dE Programas dE assistÊNcia social soBrE a FrEQuÊNcia Escolar Nos Estados BrasilEiros: uma aNálisE BasEada Em dados da PEsQuisa dE orçamENtos FamiliarEs*

Ricardo Agostini Martini**Helena Cruz Castanheira***

Este trabalho procura analisar empiricamente como uma série de políticas sociais identificadas como, auxílios ou transferências monetárias, afetam os indicadores de frequência à escola por parte dos filhos das famílias beneficiadas no Brasil. Para isso, o trabalho utilizou dados de 25.392 crianças de 7 a 14 anos a partir de informações da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) de 2002 a 2003, elaborada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Para controlar os possíveis efeitos da descentralização do gasto social no Brasil, variáveis referentes às características dos estados brasileiros foram incluídas nos modelos de estimação, entre elas o volume de gastos por parte do governo estadual com assistência social. As variáveis de nível individual-familiar e de nível estadual foram incluídas em modelos probit e hierárquicos, os quais buscam diferenciar os efeitos individuais dos efeitos de grupo – no caso, os estados – sobre as estimativas de coeficientes e de variâncias nas regressões. Conclui-se que os programas assistenciais contribuem positivamente para a frequência à escola, e que este fenômeno ocorre de maneira homogênea em todo o país, sem significativas diferenças em relação às características de cada estado.

Palavras-chave: educação; políticas sociais; modelos hierárquicos.

EFFEcts oF wElFarE Programs oN school attENdaNcE iN BraZiliaN statEs: aN aNalYsis BasEd oN PoF data

This paper intends to analyze empirically how a series of welfare policies identified as aids, or monetary transferences, affects school attendance by the children of benefited families. For this, the study used data from 25,392 children aged 7 to 14 from the Consumer Expenditure Survey (POF) 2002-2003, prepared by IBGE. In order to control for the effects of decentralization of welfare policy in Brazil, variables referring to the characteristics of Brazilian states were included in estimation models, just like the extent of expenditures of state’s government with welfare. Variables of both individual-familiar and state levels were estimated with probit and hierarchical models, those ones aiming to differentiate individuals and collective effects over the estimates of coefficients and variances in the regressions. The paper concludes that welfare policy contributes positively over school attendance, and this phenomenon happens homogeneously all over the country, without significant differences related to each state’s characteristics.

Keywords: education; welfare policy; hierarchical models.

* Os autores agradecem a colaboração da professora dra. Ana Maria Hermeto de Oliveira, do Centro de Desenvol-vimento e Planejamento Regional da  Universidade Federal de Minas Gerais (Cedeplar-UFMG) para a elaboração deste trabalho. ** Economista do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). E-mail: <[email protected]>.*** Doutoranda em Demografia no Population Studies Center (PSC), University of Pennsylvania. E-mail: <[email protected]>.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012244

EFEctos dE los Programas socialEs EN la asistENcia Escolar EN El Brasil: uN aNálisis Basado EN datos dE la ENcuEsta dE PrEsuPuEstos FamiliarEs

Este trabajo analiza empíricamente como una serie de políticas sociales identificadas como ayudas, o transferencias de efectivo, afectan a los indicadores de asistencia escolar de los hijos de las familias beneficiarias en Brasil. Para ello, el estudio utilizó datos de 25.392 niños de 7 a 14 años de información de la Encuesta de Presupuestos Familiares (POF) de 2002-2003, elaborado por el IBGE. Para controlar los posibles efectos de la descentralización del gasto social en Brasil, se incluyeron en los modelos de estimación de variables sobre las características de los estados brasileños, entre ellos el volumen de gasto por el gobierno estatal con la asistencia social. Las variables a nivel individual de nivel de familia y el Estado se incluyeron en los modelos probit y jerárquicas, que tratan de diferenciar los efectos individuales de los efectos de cohorte, en este caso, los estados - en las estimaciones de los coeficientes y la varianza en las regresiones. Se concluye que los programas de asistencia contribuyen positivamente a la asistencia a la escuela, y que este fenómeno se produce de manera uniforme en todo el país, sin diferencias significativas con respecto a las características de cada Estado.

Palavras-clave: educación; políticas sociales; modelos jerárquicos.

EFFEts dEs ProgrammEs dE BiEN-ÊtrE sur la FrÉQuENtatioN scolairE daNs lE BrÉsil: uNE aNalYsE BasÉE sur lEs doNNÉEs dE l’ENQuÊtE sur lEs dÉPENsEs dE coNsommatioN

Ce document analyse de façon empirique comme une série de politiques sociales identifiées comme des aides, ou des transferts en espèces, une incidence sur les indicateurs de fréquentation scolaire par les enfants des familles bénéficiaires au Brésil. Pour ce faire, l’étude a utilisé les données de 25,392 enfants âgés de 7 à 14 ans de données de l’Enquête sur le budget des ménages (POF) à partir de 2002-2003, compilé par l’IBGE. Pour contrôler les effets possibles de la décentralisation des dépenses sociales au Brésil, ont été inclus dans les modèles d’estimation des variables concernant les caractéristiques des états brésiliens, parmi lesquels le volume des dépenses par le gouvernement de l’État avec l’aide sociale. Les variables de niveau individuel de niveau de la famille et de l’État ont été inclus dans les modèles probit et hiérarchiques, qui visent à différencier les effets individuels des effets de cohorte – dans ce cas, les États – sur les estimations des coefficients et la variance dans les régressions. Il est conclu que les programmes d’assistance contribuer positivement à la fréquentation scolaire, et que ce phénomène se produit régulièrement dans tout le pays, sans différence significative concernant les caractéristiques de chaque État.

mots-clés: éducation; les politiques sociales; modèles hiérarchiques.

JEL: C19; H52; I28.

1 iNtrodução

Uma importante controvérsia na economia do bem-estar social refere-se aos efeitos das políticas de assistência social sobre a pobreza intergeracional, isto é, se elas têm efeitos de longo prazo sobre as condições de vida da população beneficiada, além de reduzir sua situação de privação de renda no curto prazo.

245Efeitos de Programas de Assistência Social sobre a Frequência Escolar nos Estados Brasileiros

Uma maneira pela qual as famílias pobres que participam de programas sociais podem melhorar suas condições de vida, em um tempo futuro, é pela acumu-lação de capital humano, ao retirar seus filhos do mercado de trabalho precoce para frequentarem a escola, e assim se qualificarem para ter acesso a empregos de melhor remuneração no futuro. Portanto, para avaliar o impacto das polí-ticas sociais sobre a redução da pobreza intergeracional das famílias no Brasil, este artigo tem o objetivo de investigar o efeito da participação em programas sociais sobre a frequência dos filhos à escola.

A relação entre renda familiar, riqueza e demanda por escolaridade foi de-senvolvida por Becker (1991; 1993), em sua teoria sobre capital humano e tam-bém teoria econômica da família. Segundo o autor, as unidades decisórias de cada família – os pais – decidem alocar seus recursos em consumo ou em inves-timentos, por exemplo, na qualificação de seus filhos. Esta escolha depende de fatores como o seu nível de renda, o número de filhos, o custo de oportunidade do consumo e os salários no mercado de trabalho infantil. Neste caso, políticas assistenciais podem exercer um efeito-renda positivo no orçamento familiar, de modo que os pais escolhem alocar maior quantidade de recursos na educação das crianças. Para se obter um efeito mais puro do efeito da assistência social sobre os investimentos em capital humano, é necessário controlar as estimativas por outras variáveis, relacionadas à vulnerabilidade da criança diante do abandono à escola, como sexo, idade e nível de instrução de seus pais.

É importante destacar que, a partir da década de 1990, os gastos sociais no Brasil tiveram uma mudança bastante significativa de natureza. Ao contrário do que era feito anteriormente, a execução dos programas vem sendo feita de forma cada vez mais descentralizada, por meio das unidades subnacionais de governo. Por isso, espera-se que as famílias residentes nas Unidades da Federação (UF) que apresentam maior volume de políticas assistenciais ou melhor infraestrutura educacional sejam mais propensas a incentivar a frequência escolar de seus filhos, ainda que sejam carentes.

Após essas discussões, esta pesquisa procurará desenvolver modelos para esti-mar o efeito da participação, ou não, das famílias em uma lista de políticas assisten-ciais sobre a frequência de seus filhos à escola. Para isso, controlar-se á não apenas as características individuais das crianças observadas mas também as características dos estados em que habitam, como forma de se mensurar a descentralização dos programas assistenciais e as diferenças estaduais de acessibilidade ao estudo. A aná-lise, com este objetivo, será realizada pelo uso de modelos hierárquicos, os quais são construídos com o objetivo de se separar os efeitos de ordem individual e cole-tiva para a variabilidade dos dados observados. Os dados utilizados foram obtidos a partir da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) de 2002 a 2003, elabora-da pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), do Ministério da

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Fazenda e do Ministério da Educação. Chega-se à conclusão de que a participação em programas assistenciais contribui positivamente para a probabilidade de as fa-mílias encaminharem seus filhos para a escola, e esta tendência ocorre em âmbito nacional, sem significativas variações entre os estados brasileiros.

2 tEoria EcoNÔmica da FamÍlia, caPital humaNo E iNvEstimENtos Em Educação

2.1 referencial teórico

Na literatura da economia do bem-estar social, muitos estudos associam as condi-ções de vida de indivíduos e de famílias aos seus níveis de escolaridade e qualifica-ção. Assim, a pobreza é vista como a responsável pelos baixos níveis de instrução, os quais impedem os indivíduos carentes deterem acesso a postos de trabalho com melhores rendimentos, pois não estão qualificados suficientemente para li-dar com as exigências crescentes de aptidão requeridas pelo acelerado desenvolvi-mento tecnológico no processo produtivo.

Os estudos que correlacionam os investimentos na escolaridade dos indiví-duos e a diminuição dos seus níveis de pobreza são, em grande parte, influencia-dos pela Teoria do Capital Humano (Becker, 1993), a qual busca explicar tanto os retornos da educação sobre os índices de bem-estar dos indivíduos e das famílias, quanto os fundamentos dos gastos familiares em educação. Nesta teoria, o capital humano é definido como fator de produção que é acumulado por meio de in-vestimentos em atividades que podem elevar a produtividade das pessoas – por exemplo, a educação, o treinamento no emprego e os cuidados com a saúde –, de modo a proporcionar ganhos de renda no futuro.

Considerando-se que, pelo menos no Brasil, o capital humano acumulado por um indivíduo depende mais de sua escolaridade que de qualquer outra coisa, é im-portante identificar os determinantes da educação formal dos agentes econômicos. Em termos mais formais, o desempenho educacional de um indivíduo pode ser en-tendido como uma função de três grupos de fatores distintos (Soares, 2002):

P = f (S, C, I) (1)

Nessa equação, denominada de função de produção educacional, P repre-senta qualquer indicador de escolaridade de interesse, seja de quantidade seja de qualidade do ensino. A variável S representa as características socioeconômicas do aluno, isto é, um vetor de variáveis relativas à família e ao próprio aluno. O con-texto socioeconômico da escola, como a sua localidade e as características médias de seus alunos, é representado pelo termo C. O termo I, por sua vez, refere-se às características específicas da escola, como a qualidade de sua infraestrutura, as práticas pedagógicas adotadas, as características dos professores etc.

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Em relação ao papel das características da família, destaca-se o trabalho de Becker (1991), que formulou a Teoria Econômica da Família. Segundo esta te-oria, as famílias não se comportam como unidades autônomas, de preferências exógenas, mas sim como compostas por indivíduos. Assim, as preferências dos membros que compõem as famílias podem ser diferentes, o que pode levar ao sur-gimento de relações de cooperação ou de competição entre eles, o que, em suma, influencia diretamente o processo de tomada de decisões em âmbito familiar.

Assim, relacionando a Teoria do Capital Humano com a Teoria Econô-mica da Família, Becker (1991; 1993) formulou um modelo microeconômico no qual os pais tomam as decisões em âmbito familiar maximizando suas fun-ções de utilidade individuais. Tais funções revelam preferências sobre o nível de consumo presente, o número de filhos e as características de cada filho, principalmente no que diz respeito às expectativas de qualidade de vida, sucesso profissional e padrão de riqueza no futuro. Assim, os pais tomam decisões em um trade-off entre o seu nível de consumo presente e o investimento no capital humano de seus filhos, como forma de elevar sua renda futura. Neste trade-off, estão envolvidos os custos diretos destes investimentos nos filhos – representa-dos pelos gastos com educação –, assim como o custo de oportunidade de não consumir a sua renda presente. Neste modelo, o ponto de escolha ótima em relação à alocação dos recursos dos pais será o ponto em que as taxas marginais de retorno do consumo e do investimento se igualam.1

Como forma de melhor compreender o papel da família na educação in-fantil, Silva e Hasenbalg (2002) propõem que os recursos familiares aplicados no acúmulo de capital humano de seus filhos podem ser divididos em três dimen-sões. Em primeiro lugar, o capital econômico, entendido como a renda e a riqueza familiar. Em segundo lugar, o capital cultural, que representa a distribuição da educação entre os membros adultos na família, assim como a infraestrutura edu-cacional do domicílio, tal como a presença de livros. Terceiro, por fim, o capital social, que inclui as relações pessoais entre os membros da família, assim como a sua composição. Em outras palavras, o capital social depende da presença dos adultos na família e da sua atenção dedicada aos filhos.

Em uma economia com mercado de crédito imperfeito, os investimentos em capital humano serão financiados com recursos da própria família (Barros et al., 2001). Assim, as famílias com menor estoque de capital econômico investirão me-nos em capital humano que as demais. Por sua vez, como a pobreza costuma estar correlacionada com baixos índices de educação, a limitação de capital econômico provocará a transmissão intergeracional da pobreza. Segundo este mecanismo, os

1. Os pressupostos básicos do modelo, assim como sua representação formal, seguem os princípios fundamentais da teoria microeconômica.

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indivíduos com menores índices de escolaridade tendem a ter maior probabilida-de de serem pobres. Desta forma, como os nascidos em famílias pobres tendem a receber menor escolarização, acabam sendo os pobres de amanhã. Neste sentido, a renda familiar per capita é um determinante da frequência escolar.

Outro trade-off enfrentado pelas famílias em suas decisões de investir na educação de seus filhos é apresentado por Hanushek (1992). Segundo o autor, como os pais têm recursos limitados para investir na qualidade do capital humano de seus filhos, quanto maior o número de crianças na família, menor deverá ser o montante de recursos investido em cada uma delas, e menor será a qualidade de sua educação. Por isso, o número de crianças na família também é uma variável importante para a determinação da demanda por educação.

Outra variável importante para explicar a frequência escolar é o nível de escolaridade dos pais. Segundo autores como Rocha (2003), a educação dos pais exerce uma transmissão intergeracional de níveis de rendimento, servindo como um elemento fundamental contrário à perpetuação da pobreza na família. Pais mais educados, além de estarem associados a maiores dotações de recursos, ten-dem a apresentar melhores informações sobre a importância da educação sobre os rendimentos individuais, de modo que dão mais valor aos recursos gastos na educação de seus filhos (Corseuil, Santos e Foguel, 2001).

O nível de escolaridade dos pais também capta outros determinantes da renda e das dotações familiares além daquelas provenientes da educação, como origem da família, características socioeconômicas e rede de contatos e influências sociais. Além disso, a escolaridade dos pais está relacionada à renda permanente da família, a qual é o determinante mais importante para o volume de recursos aplicados nos investi-mentos em capital humano que a renda corrente, a qual é mais vulnerável a flutu-ações transitórias (Barros et al., 2001). Por fim, pais mais instruídos preferem que os filhos tenham o mesmo grau de instrução, de modo que, aos investimentos em capital humano, nestas famílias, se soma um componente de consumo de educação.

Barros et al. (2001) destacam a importância dos recursos comunitários – o fator I em (1) – na acumulação de capital humano pelas famílias. As comunida-des com mais recursos têm mais vantagens que as demais em prover educação de qualidade para seus integrantes pelo fato de que o custo marginal de educar uma pessoa a mais é decrescente no que se refere à utilização de recursos da comunida-de, como a infraestrutura escolar. Além disso, nestas comunidades os estudantes podem receber auxílio dos membros adultos, já escolarizados, e têm acesso a me-lhores alternativas de empregos intensivos em mão de obra qualificada.

Programas de transferência de renda, nesse sentido, assim como políticas de incentivo à educação, voltadas às famílias mais pobres, ajudam a contrabalancear as desvantagens familiares traduzidas principalmente pelo baixo nível de capital

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econômico, elevando o fator S em (1). Ou seja, programas de transferência de renda, assim como os assistenciais, por elevarem a renda presente dos pais, e dos chefes de família em geral, elevam as suas dotações de recursos, podendo levar tanto a um aumento do nível de consumo, o que eleva o bem-estar familiar pre-sente, quanto permitir elevação de investimento na escolaridade dos seus filhos, traduzido empiricamente pelos aumentos nos índices de matrículas em institui-ções de ensino e frequência à escola. Nesse sentido, os principais benefícios das políticas sociais de transferências monetárias estão relacionados à promoção, ao mesmo tempo, de assistência às famílias mais pobres no curto prazo – combaten-do a pobreza corrente – e de investimento, por parte das mesmas famílias, em ca-pital humano, o que acaba levando a efeitos de longo prazo, reduzindo a pobreza no futuro e promovendo a inclusão social (Resende e Oliveira, 2008). Além disso, o aumento da atual renda familiar, por meio de benefícios de programas condi-cionados de assistência social, pode elevar os índices de escolaridade pela compen-sação, para a família, do possível salário de cada filho, caso eles trabalhassem, ou então pela instituição de uma obrigação moral da família em relação aos órgãos fiscalizadores da comunidade de se comprometer a levar seus filhos à escola, como forma de não perder seus benefícios assistenciais (Schwartzman, 2004).

A literatura estudada destaca a mudança do foco dos gastos sociais no Brasil a partir da década de 1990. No que diz respeito às políticas sociais, a partir deste período, houve maior ênfase na focalização e na descentralização das responsabi-lidades sociais do setor público.

Em relação ao novo direcionamento das políticas sociais, tradicionalmente o gasto social no Brasil tinha o caráter de políticas concretas de habitação, urbanismo e saneamento básico para a população, isto é, consistiam em políticas de investi-mentos em infraestrutura social (Lavinas, 2004). Devido ao aspecto universal destas políticas, pode-se afirmar que consistiam em medidas de combate à desigualdade no país, uma vez que visavam à melhoria das condições de vida da população como um todo. Para seus defensores, estas políticas significavam a concessão de direitos de cidadania e bem-estar social à população pobre, o que proporcionaria maior acesso desta faixa da população a melhores oportunidades de emprego e condições de vida.

Durante o período de estabilização econômica – década de 1990 –, seja por motivos de restrição orçamentária governamental, seja por motivos meramente técnicos, as diretrizes do gasto social no Brasil2 passaram a dar ênfase direta à popu-lação mais necessitada.3 O mecanismo de ação das novas políticas implementadas

2. Tal fenômeno não ocorreu apenas no país, mas também em nível internacional, com destaque para os países da América Latina.3. Destaca-se que essa mudança de foco das políticas sociais no país não implicou eliminação de todas as políticas universais adotadas até então, mas sim se concentrou no desenho dos novos programas implementados.

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consiste na realização de transferências monetárias diretas à população beneficiá-ria, cujas vantagens estão sintetizadas pelo trabalho de Resende e Oliveira (2008). Ou seja, visivelmente o objetivo destas novas políticas passou a ser o combate à pobreza material, por meio da redistribuição de renda.

A partir desse período, também houve maior ênfase na descentralização das responsabilidades sociais do setor público. Winkler e Gershberg (2000) apresen-tam os fundamentos que motivaram esta tendência em âmbito internacional. Segundo os autores, a descentralização de atribuições fiscais entre as esferas gover-namentais dos países está baseada em ganhos de eficiência social e técnica.

De acordo com Winkler e Gershberg (2000), a descentralização dos com-promissos sociais dos governos federais para as unidades federativas de níveis sub-nacional e local proporciona maior eficiência social ao gasto público por elevar a participação dos agentes locais nas decisões sobre os serviços públicos – como políticas sociais – que irão receber. Por este mecanismo, os agentes revelam suas preferências, reduzindo a assimetria de informação do implementador das políti-cas, o que amplia o seu retorno sobre o bem-estar das famílias beneficiárias.

Além da eficiência social, a descentralização leva a maior eficiência técnica dos gastos públicos e sociais por três diferentes mecanismos. Em primeiro lugar, como as autoridades políticas locais têm mais informação sobre as questões orçamentárias dos programas adotados em seus territórios, elas podem minimizar os seus custos com mais eficácia. Em segundo lugar, no caso de políticas condicionadas, a ca-pacidade de monitoramento e fiscalização dos programas das autoridades locais é muito melhor do que a da burocracia federal. Por fim, a descentralização estimula a promoção de maior variedade de provedores e programas de política social, propi-ciando condições para inovações técnicas de elaboração e implementação.

Por sua vez, a evasão escolar é um problema recorrente sobre as políticas so-ciais – principalmente as relacionadas à educação – realizadas na América Latina segundo o Programa de Promoção de Reformas Educativas na América Latina e no Caribe (Preal, 2003). Isto ocorre quando crianças e adolescentes abandonam a escola antes de acumular o capital humano necessário para se tornarem compe-titivos nos mercados de trabalho locais, podendo contribuir assim para perpetuar a situação de pobreza.

O relatório aponta cinco possíveis motivos para o abandono à escola. Em primeiro lugar, as razões econômicas, relacionadas com a necessidade de tra-balhar, por parte do aluno,4 e com a falta de recursos, por parte de seus pais, para suprir os custos diretos da educação. Em segundo lugar, a falta de oferta de

4. Tal motivo predomina em relação ao abandono à escola por parte de alunos recém-adolescentes – a partir dos 14 anos.

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escolas e professores, o que é mais comum nas regiões rurais e naquelas povoadas por população de baixa renda. Terceiro, as razões familiares, que decorrem, so-bretudo, das ocorrências de gravidez e casamentos5 entre adolescentes. Por fim, o abandono da escola pode ser provocado por problemas de desempenho escolar dos alunos, pois as sucessivas reprovações podem acabar desanimando os alunos em relação ao seu futuro educativo.

Além desses motivos, Schwartzman (2004) aponta que a má qualidade do ensino pode ser um fator que provoca o abandono do ensino. Segundo o autor, os alunos podem abandonar as escolas simplesmente porque não conseguem apren-der. Assim, a acumulação de capital humano nestas condições é nula, e o retorno esperado do trabalho no tempo presente, para o aluno, é maior.

2.2 Evidências empíricas para o Brasil

No Brasil, foi realizada uma série de estudos empíricos sobre os determinantes econômicos da frequência escolar e da probabilidade de abandono. Neste sentido, destaca-se o trabalho de Kassouf (2001). Utilizando dados da Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílio (PNAD)6 de 1995, a autora utilizou um modelo pro-bit para estimar a probabilidade de crianças estudarem e trabalharem. O estudo concluiu que os fatores mais correlacionados com a frequência escolar são: altos níveis de escolaridade dos pais; baixo número de irmãos; baixa idade das crianças; elevados salários dos pais; e baixos salários das crianças no mercado de trabalho.

Corseuil, Santos e Foguel (2001) realizaram um estudo empírico para as de-cisões dos jovens entre estudo e trabalho, para quatro países da América Latina –Brasil, Chile, Honduras e Peru. Foi concluído que a educação dos pais é a variável mais importante para a probabilidade de os filhos frequentarem escolas, em todos os países da amostra. Outros fatores importantes, como grau de urbanização do país, tamanho das famílias e presença de idosos nos domicílios, variam de país para país, tanto em termos de magnitude quanto em termos de sinal.

Barros et al. (2001) procuraram estimar os determinantes do desempenho educacional, definindo como o número de séries concluídas pelo indivíduo, a partir de dados da PNAD7 e da Pesquisa sobre Padrões de Vida (PDV). Os autores reali-zaram uma análise empírica sobre variáveis de interesse agrupadas em quatro eixos: i) recursos da família; ii) recursos da comunidade em que a família vive; iii) carac-terísticas do mercado de trabalho da comunidade; e iv) características dos serviços educacionais presentes na comunidade. O principal resultado do trabalho foi que a variável mais robusta para explicar o desempenho educacional dos indivíduos é a

5. Tal motivo predomina em relação ao abandono à escola por parte de alunos do sexo feminino.6. Realizada periodicamente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).7. Divulgada pelo IBGE.

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escolaridade dos pais. Os autores chegaram a estimar que o impacto de um ano a mais de escolaridade dos pais equivale ao impacto de três anos a mais de escolari-dade dos professores na determinação do número de séries concluídas pelos alunos.

Silva e Hasenbalg (2002) utilizaram um modelo logístico ordenado para avaliar os determinantes da progressão escolar no Brasil da primeira série até a oitava série do ensino fundamental, a partir de dados da PNAD. Os autores che-garam ao resultado de que os determinantes variam ao longo das transições esco-lares. Assim, no início da vida escolar, o fator mais importante para a progressão dos alunos é o nível de escolaridade do chefe do domicílio ao qual a criança pertence. Fatores como a localização – rural ou urbana, assim como a qual região do Brasil pertence – e a estrutura do domicílio são mais importantes no meio do ciclo escolar. Por fim, a renda familiar e a cor do estudante são fatores mais im-portantes no final do ensino básico, isto é, são fatores que têm efeitos crescentes sobre o desempenho escolar ao longo da trajetória das crianças, prejudicando os mais pobres e os pardos e negros.

3 mEtodologia

A metodologia de modelos hierárquicos consiste, basicamente, no desenvolvi-mento de modelos de regressão que assumem que a variável dependente estudada é afetada por variáveis independentes de níveis distintos, isto é, tanto por aquelas específicas ao indivíduo estudado, quanto por aquelas específicas ao grupo ou ao ambiente ao qual o indivíduo se insere. Esta correlação provoca um viés negativo nas estimativas dos erros padrão dos modelos estimados diretamente pelo método dos mínimos quadrados ordinários (MQOs). Além disso, em cada nível pode ha-ver um componente residual, não explicado pelas variáveis explicativas adotadas no modelo. Nestas condições, o uso de modelos hierárquicos pode oferecer três vantagens ao estudo (Queiróz e César, 2000). Em primeiro lugar, a metodologia permite obter melhores estimativas para os parâmetros abordados no modelo, pelo controle das características do grupo mais numeroso sobre as inferências realizadas para a população total observada. Em segundo lugar, permite avaliar os efeitos entre as variáveis de diferentes níveis, disponibilizando a realização de testes de hipóteses sobre as relações entre o indivíduo e o seu respectivo grupo. Por fim, permite separar os componentes das variâncias das estimativas de acordo com o nível de cada variável independente, o que faz com que as estimativas de erro padrão sejam mais conservadoras quando a estimação é realizada por mode-los hierárquicos que quando é realizada diretamente por MQOs em um modelo linear. Além disso, a separação das variáveis explicativas em diferentes níveis faz com que a metodologia de modelos hierárquicos possibilite melhor compreensão dos problemas no processo modelado (Ferrão et al., 2002).

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Em termos mais formais,8 um modelo hierárquico baseia-se, no primeiro nível (individual), no estudo da relação entre uma variável dependente Yij – por exemplo, a frequência à escola; –, para um indivíduo i pertencente a um grupo j –, por exemplo, o estado brasileiro em que habita –, e uma variável explicativa Xij para cada indivíduo – como a participação, ou não, em programas de assistência social:

Yij = β0j + β1jXij + rij (2)

Porém, como os grupos podem exercer efeitos que influenciam o compor-tamento dos indivíduos neles integrados, pode-se controlar estes efeitos por uma variável explicativa Wj, por exemplo, o número de escolas existentes em cada esta-do da Federação. Neste caso, as equações do segundo nível (grupos) são:

β0j = γ00 + γ01Wj + u0j (3)

β1j = γ10 (4)

Observa-se que, nesse caso, como o número de escolas existentes no estado é independente da participação, ou não, por parte do indivíduo em programas assistenciais, apenas o termo de intercepto da equação do primeiro nível pode ser afetada pela variável explicativa Wj. Substituindo (3) e (4) na equação (2):

Yij = γ00 + γ01Wj + γ10Xij + u0j + rij (5)

Nesse modelo, supõe-se que os termos u0j e rij são erros aleatórios, indepen-dentes, de média zero e seguem uma distribuição normal. Sendo σ2 a variância de rij (variância entre indivíduos), e τ0

2 a variância de u0j (variância entre grupos), a correlação intragrupos será:

ρ(Yij, Yi’j) = τ02/(τ0

2 + σ2) (6)

Intuitivamente, a correlação intragrupos significa a correlação entre os valo-res da variável Yij (frequência à escola) referentes às observações de dois indivíduos escolhidos aleatoriamente em um certo grupo. A composição da variância pode definir se o modelo hierárquico é mais apropriado para a estimação que o modelo linear. Na hipótese de a maior parte da variância entre grupos, opta-se pelo mo-delo hierárquico. Sendo a maior parte da variância ser entre indivíduos, opta-se pelo modelo linear.

A estimação do modelo, tanto dos parâmetros fixos γnm quanto das variâncias e covariâncias, pode ser realizada por três alternativas distintas, de acordo com Raudenbush e Bryk (1992). Em primeiro lugar, mais utilizado na literatura, pelo método da máxima verossimilhança, no qual se escolhe os estimadores para γ e τ de modo que a probabilidade de se observar estes valores nos dados de Y máxima.

8. Essa formalização está baseada no artigo de Diaz (2007) e no livro de Raudenbush e Bryk (2002).

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Este método apresenta estimadores consistentes, eficientes e de distribuição convergente para uma normal. Em segundo lugar, pelo método da máxima veros-similhança restrita, o qual ajusta os estimadores de máxima verossimilhança de τ para os efeitos fixos nas amostras. Por fim, pelo método bayesiano, o qual controla possíveis erros de estimação de variâncias e covariâncias pela realização de inferên-cias sobre γ a partir apenas dos dados, isto é, não condicionais em τ.

Este artigo utiliza o método da máxima verossimilhança para estimar seus mo-delos, pois como se trabalha com uma grande amostra, supõe-se que os estimadores convirjam para uma distribuição normal e não haja erros de mensuração.

Depois de escolhido o método de estimação, adota-se como método de com-putação deste referido estimador os mínimos quadrados generalizados iterativos (MQGIs). Em resumo, este método consiste na definição de uma regra particular de reestimação dos parâmetros de interesse, até que haja uma convergência para o valor de maior verossimilhança. No caso dos modelos hierárquicos, este processo inicia-se pela estimativa dos parâmetros fixos, γnm, pelo metodo dos MQOs. A partir dos resultados obtidos, obtêm-se estimativas dos resíduos, as quais são uti-lizadas para estimar a matriz de variâncias e covariâncias do modelo – σ2, τn

2 e τnm. Assim, realiza-se uma reestimação dos parâmetros fixos, pela aplicação do método de MQGIs. Estes novos parâmetros, por sua vez, serão utilizados para uma rees-timação da matriz de variâncias e covariâncias, de modo que estas etapas irão se sucedendo até se verificar uma convergência dos resultados obtidos (Diaz, 2007).9

No Brasil, os trabalhos empíricos que utilizaram a metodologia de mode-los hierárquicos para estimar uma função de produção educacional em geral se valeram de dados do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB) e focaram a qualidade do ensino como variável explicada, mensurada pelo de-sempenho do aluno no exame. Exemplos destes trabalhos são os realizados por Fletcher (1998), Ferrão et al. (2001) e Barbosa e Fernandes (2001).

Nessa mesma linha, César e Soares (2001) utilizaram a metodologia de mo-delos hierárquicos para avaliar o efeito do nível socioeconômico das turmas sobre a qualidade do ensino individual. O nível socioeconômico foi mensurado pelas médias de diversos indicadores sociais em cada turma de cada escola incluída na amostra. Os dados utilizados foram os resultados da prova de matemática da oita-va série elaborada pelo SAEB em 1999. Para distinguir as diferentes dimensões de variáveis que explicam o desempenho individual do aluno no exame, os autores utilizaram um modelo hierárquico de três níveis, isto é, os próprios alunos (nível individual), as escolas, incluindo a média do perfil socioeconômico de suas tur-mas, e o estado brasileiro em que se localiza a escola.

9. Mais detalhes sobre o método dos mínimos quadrados generalizados iterativos (MQGIs) podem ser encontrados em Cameron e Triverdi (2005).

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Os resultados encontrados pelo trabalho indicam que a variabilidade das notas no exame deve-se 7,4% às variáveis estaduais, 35,1% ao perfil das escolas e 57,5% às características dos alunos. Os autores chegaram à conclusão de que o nível socioeconômico prejudica os alunos mais pobres por três diferentes meca-nismos. Em primeiro lugar, devido ao efeito de seu próprio perfil. Em segundo lugar, pelo fato de que indivíduos mais pobres tendem a frequentar as piores esco-las. Terceiro, devido à interação entre o nível socioeconômico do aluno e o meio em que vive, de modo que o aluno de pior desempenho também é prejudicado por não conviver com colegas de nível mais elevado.

Outra estimação de uma função de produção educacional para o ensino fun-damental brasileiro foi elaborada por Albernaz, Ferreira e Franco (2002). Os auto-res utilizaram os dados do SAEB de 1999 para a oitava série, de acordo com as no-tas das provas de ciências, geografia, história, português e matemática, e estimaram um modelo hierárquico de dois níveis, isto é, buscando diferenciar os efeitos do perfil socioeconômico do aluno e as características da escola. Os resultados encon-trados pelos autores, semelhantes aos do estudo de César e Soares (2001), apontam que 80% da variância do desempenho escolar deve-se às características dos alunos. Além disso, foi verificado que os alunos negros têm pior desempenho nas provas, mesmo em estimações que controlem pelo seu perfil socioeconômico. Também foi verificado que as variáveis de nível escolar contribuem para o aprendizado dos alunos, mas fatores como a escolaridade do professor também influenciam de ma-neira crescente, de acordo com o nível socioeconômico do aluno. Por fim, mesmo controlando todos estes fatores, os autores verificaram que os alunos de escolas particulares têm melhor desempenho que os de escolas públicas.

Estudos empíricos mais recentes passaram a utilizar outras bases de dados além do SAEB, e focalizaram como variável de interesse outros fatores além do desempenho dos alunos nas provas, por exemplo, o atraso educacional do aluno, a evasão escolar e a frequência à escola.

Um importante trabalho nesse sentido foi o elaborado por Rios-Neto, César e Riani (2002), que utilizaram um modelo de dois níveis para estimar a probabili-dade de progressão escolar na primeira e na quinta séries do ensino fundamental, a partir de dados de doze PNADs das décadas de 1980 e 1990. Os dois níveis das variáveis incluídas no modelo são as características das famílias a que pertencem as crianças em idade escolar e as características da escola e da comunidade em que a família vive, classificada de acordo com a interação entre a UF em que a família reside e a localidade de seu domicílio – rural, urbano ou metropolitano. Os autores chegaram ao resultado de que o background familiar é significante nas duas progressões, mas seu efeito é mais forte sobre a progressão na primeira série. Além disso, verificou-se uma relação de substitutibilidade entre os efeitos

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da escolaridade da mãe e a do professor nesta progressão, de modo que melhores professores podem compensar as desvantagens dos alunos de pior base e assim reduzir a desigualdade educacional no país.

Um trabalho envolvendo fatores relacionados à oferta e à demanda por educação e seu impacto sobre a qualidade e a quantidade do ensino em Mi-nas Gerais foi elaborado por Riani e Rios-Neto (2004). Para isso, os autores utilizaram a metodologia de modelos hierárquicos, em que as características individuais das crianças – como nível socioeconômico e background familiar –, relacionadas com a demanda por educação, foram complementadas por carac-terísticas dos municípios mineiros nos quais vivem – como as características das escolas e os recursos destinados à educação –, relacionadas com a oferta de ensino. O estudo concluiu que ambos os fatores contribuem positivamente para o percentual de crianças matriculadas nas escolas e para a seriação correta, de acordo com sua idade.

Riani e Rios-Neto (2008) também realizaram uma estimação da função de produção educacional por modelos hierárquicos procurando diferenciar os efeitos do background familiar e da estrutura escolar dos municípios brasileiros. O resultado educacional escolhido como parâmetro de interesse pelos autores é a probabilidade de um aluno cursar a série na escola na idade correta. O traba-lho utilizou dados de alunos dos ensinos fundamental e médio, de 7 a 17 anos, coletados no Censo Demográfico de 2000, para as observações de indivíduos e famílias, e do Censo Escolar de 2000, para as observações das escolas e dos mu-nicípios. As regressões realizadas pelos autores evidenciaram a grande importância da educação materna para a escolaridade dos filhos, resultado da estratificação educacional no Brasil e da elevada influência do perfil socioeconômico da família. Além disso, verificou-se que a qualidade da infraestrutura educacional municipal e dos recursos humanos melhoram os indicadores de eficiência no ensino, havendo inclusive efeito de substitutibilidade entre os efeitos do background familiar e da infraestrutura escolar municipal, de modo semelhante ao resultado encontrado por Rios-Neto, César e Riani (2002).

Como visto, a maior parte dos trabalhos que procuraram estimar uma função de produção educacional por meio de modelos hierárquicos utiliza-ram como unidades de segundo nível a escola, a comunidade e o município onde o indivíduo reside. São escassos os estudos que tentam controlar o resultado educacional individual por indicadores de infraestrutura escolar dos estados da Federação, como o número de instituições de ensino, cuja participação na responsabilidade social do setor público brasileiro é crescen-te desde a década de 1990.

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4 dados E variávEis

A principal fonte de dados utilizada para a análise empírica deste trabalho é a Pes-quisa sobre Orçamentos Familiares (POF) 2002-2003. Ela é realizada pelo IBGE e inclui dados de domicílios particulares permanentes,10 abrangendo todo o território nacional, inclusive regiões rurais e urbanas de todos os estados da Federação.

A POF consiste em um levantamento de informações sobre os gastos e os rendimentos das famílias brasileiras, entendidas como unidades de consumo, co-letadas por meio de entrevistas pessoais com seus membros, como os chefes de família e as donas de casa, e transcritas para formulários formais de pesquisa. O objetivo original desta pesquisa é definir as cestas de consumo padrão das fa-mílias brasileiras de modo a permitir a construção de um sistema de ponderações para a construção de índices de preço ao consumidor. Contudo, devido à riqueza de suas observações e dimensões, esta fonte vem sendo cada vez mais utilizada como banco de microdados para os mais variados estudos sociais. A POF 2002-2003 apresenta uma amostra de 48.171 unidades de consumo.

Este trabalho utiliza três bancos de dados integrantes da POF: i) informações sobre moradores,11 rendimentos e deduções – do trabalho –12 e outros rendimentos.13 Destes bancos de dados, foram extraídas informações sobre os moradores do do-micílio, os rendimentos da família e os benefícios sociais recebidos. Para obter a amostra final de 25.392 crianças de 7 a 14 anos, com informações sobre suas famí-lias – rendimentos e benefícios –, após linearizados os bancos, os três bancos foram agregados pelas variáveis de identificação da família e do indivíduo. Assim, foram obtidas as variáveis explicativas de nível individual para os modelos estimados.

Todas as variáveis explicativas de nível 1, isto é, nível individual das crianças, dos modelos foram construídas a partir das variáveis presentes na POF 2002-2003, sendo que algumas delas foram diretamente incluídas para a estimação, e outras obtidas por meio de proxies.

No estudo, a proxy considerada mais crítica foi o uso de uma dummy que ob-serva se o indivíduo recebe ou não remuneração por seu fator trabalho como for-ma de mensurar a incidência do trabalho infantil. Isto se justifica por dois pontos. Em primeiro lugar, por um fator técnico, pelo fato de que a POF não pergunta di-retamente às unidades de consumo se os seus membros trabalham ou não, mas sim se representam fontes de orçamento familiar. Em segundo lugar, por um fator mais intuitivo, de que o trabalho infantojuvenil não remunerado no Brasil tem uma

10. Isso é, observações referentes a militares, pacientes internados em instituições de saúde e hóspedes em domicílios coletivos ficam excluídas da pesquisa.11. Banco POF1, registro 2.12. Banco POF5, registro 12.13. Banco POF5, registro 13.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012258

característica fundamentalmente intrafamiliar, como é o caso dos jovens habitantes das áreas rurais da região Sul, que estudam em um turno do dia e ajudam seus pais no trabalho em outro, o que não prejudica a sua frequência à escola, ao contrário dos jovens que cedo ingressam no mercado de trabalho (Schwartzman, 2004).

Os dados das variáveis de nível 2, referentes às UFs brasileiras, por sua vez, têm fontes distintas. Os valores dos gastos estaduais com assistência social em 2002 foram coletados em uma planilha com os exercícios orçamentários dos esta-dos, disponíbilizados pela Coordenação-Geral das Relações e Análise Financeira de Estados e Municípios (Corem), instituição vinculada à Secretaria do Tesouro Nacional (STN), Ministério da Fazenda. Esta variável tem o objetivo de mensurar o efeito da descentralização do gasto assistencial no Brasil sobre a variável endóge-na dos modelos. O número de instituições de ensino básico em cada estado, em 2002, incluindo os ensinos fundamental e médio, para escolas públicas, privadas e estatais, foi obtido na Estatística da Educação Básica (2002), do Instituto Na-cional de Estudos e Pesquisa (INEP), vinculado ao Ministério da Educação.

QUADRO 1variável dependente

Variável [Descrição] [Observações]

freq Frequência à escola.Dummy com valor igual a 1 se a criança frequenta alguma escola, pública ou privada, e zero caso contrário.

Fonte: Pesquisa sobre Orçamentos Familiares – POF (IBGE, 2004).Elaboração dos autores.

QUADRO 2variáveis independentes de nível 1

Variável [Descrição] [Observações]

lrenda Logaritmo da renda per capita da família.Logaritmo da renda real deflacionada da família, presente na POF, dividido pelo número de pessoas em cada família.

idade_fi Idade das crianças. Idade dos filhos de cada família, de 7 a 14 anos.

menino Sexo das crianças.Dummy com valor igual a 1 para os homens, e zero para as mulheres.

negro Raça, ou cor, das crianças.Dummy com valor igual a 1 para as crianças pretas, pardas ou indígenas, e zero caso contrário.

progas Participação em programas assistenciais.Dummy com valor igual a 1 se a família da criança participa de pelo menos um programa assistencial dos selecionados para a amostra, e zero caso contrário.

nivel_instr_ch Nível de instrução do chefe da família.Número de anos de estudo do chefe da família, em valores obtidos diretamente da POF.

urbano Área em que a criança vive.Dummy com valor igual a 1 se a criança vive em área urbana, e zero se vive em área rural.

numpess Número de pessoas na família.Valores obtidos diretamente da POF, descontados os pensionistas e os empregados domésticos.

trabalha Se a criança integra o mercado de trabalho ou não.Dummy com valor igual a 1 se a criança recebe algum rendimento pelo seu fator trabalho, e zero caso contrário.

Fonte: POF (IBGE, 2004).Elaboração dos autores.

259Efeitos de Programas de Assistência Social sobre a Frequência Escolar nos Estados Brasileiros

QUADRO 3 variáveis independentes de nível 2 (2002)

Variável [Descrição] [Observações]

escolas_eb Número de escolas presentes em cada estado brasileiro. Dados coletados no INEP, Ministério da Educação.

gastos_as Gastos estaduais com assistência social. Dados coletados na STN, Ministério da Fazenda.

Fonte: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas (INEP) e Secretaria do Tesouro Nacional (STN).Elaboração dos autores.

QUADRO 4Programas assistenciais selecionados para a análise

Programas

Renda Mínima Auxílio-Estiagem

Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PET) Auxílio-Comunicação

Cesta Básica Auxílio-Desemprego

Auxílio-Leite Auxílio-Maternidade

Bolsa-Renda Auxílio-Saúde

Bolsa Escola Auxílio-Educação

Agente Jovem – programa para jovens desempregados Auxílio-Creche

Auxílio-Gás Salário-Educação

Auxílio a Portadores de Deficiência Física Auxílio-Escola

Auxílio à Energia Elétrica Auxílio-Mãe Guardiã

Salário-Família Auxílio-Funeral

Auxílio-Atividade Auxílio-Velhice

Auxílio-Fardamento

Fonte: POF (IBGE, 2004).Elaboração dos autores.

A diferença de perfil socioeconômico das crianças que frequentam e das que não frequentam a escola está de acordo com o esperado, a partir da abordagem teórica sobre os fundamentos da escolaridade. Em geral, as crianças que frequen-tam a escola, além de serem a maioria da amostra, possuem maior renda familiar per capita, menor idade, pais mais escolarizados, moram em domicílios urbanos, não trabalham e residem nos estados da Federação com mais escolas e gastos as-sistenciais. A variável com maior discrepância entre os dois perfis é a escolaridade dos pais, como identificado em trabalhos anteriores (Corseuil, Santos e Foguel, 2001 e Riani e Rios-Neto, 2008). No entanto, a tabela 1 também mostra que a proporção de crianças que frequentam a escola é muito elevada, isto é, o ensino fundamental beira a universalização.

TABELA 1Estatísticas descritivas das variáveis de níveis 1 e 2

  Frequenta escola Não frequenta escola

Variável Média DP Mínimo Máximo Média DP Mínimo Máximo

lrenda 6,904 1,329 0,300 13,344 6,371 1,301 1,078 11,174

idade_fi 10,533 2,291 7 14 10,884 2,564 7 14

menino 0,510 0,500 0 1 0,561 0,496 0 1

(Continua)

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012260

  Frequenta escola Não frequenta escola

Variável Média DP Mínimo Máximo Média DP Mínimo Máximo

negro 0,394 0,489 0 1 0,331 0,471 0 1

progas 0,374 0,484 0 1 0,282 0,450 0 1

nivel_inst_ch 5,330 3,128 0 16 3,806 2,881 0 16

urbano 0,739 0,439 0 1 0,616 0,487 0 1

numpess 5,286 1,966 2 20 5,974 2,309 2 20

trabalha 0,063 0,243 0 1 0,140 0,347 0 1

escolas_eb 9.021 6.853 716 26.339 8.317 6.799 716 26.339

gastos_as1 73.300 78.100 3.917 378.000 63.000 71.200 3.917 378.000

Número de observações2 24.471       921      

Fonte: POF 2002-2003 (IBGE, 2004) e Execução Orçamentária dos Estados (1995-2011) – Corem/STN. Disponível em: <http://www.tesouro.fazenda.gov.br/estados_municipios/>.

Elaboração dos autores.Notas: 1 Em milhares de reais.

2 Número total de observações: 25.392.

TABELA 2 Número de instituições de ensino básico e gastos com assistência social por unidade da Federação (2002)

EstadoNúmero de insti-tuições de ensino

básico

Gastos com assistência social (R$)

EstadoNúmero de

instituições de ensino básico

Gastos com assistência social (R$)

Acre 1.687 9.113.645,54 Paraíba 7.550 44.964.532,96

Alagoas 3.879 13.381.352,15 Paraná 9.424 66.894.592,10

Amapá 756 13.477.738,03 Pernambuco 11.773 70.669.557,85

Amazonas 4.952 30.575.110,94 Piauí 8.425 75.838.848,18

Bahia 26.339 96.005.220,41Rio Grande do Norte

4.856 111.059.795,84

Ceará 13.246 108.507.575,00Rio Grande do Sul

11.062 114.107.208,38

Distrito Federal 1.009 92.478.035,54 Rio de Janeiro 10.416 109.785.865,42

Espírito Santo 4.326 10.928.154,96 Rondônia 2.643 3.916.768,49

Goiás 4.960 247.792.769,67 Roraima 716 17.767.449,00

Maranhão 14.353 26.962.396,87 Santa Catarina 7.128 21.533.096,13

Mato Grosso 2.973 25.537.020,01 São Paulo 23.418 378.033.606,54

Mato Grosso do Sul 1.525 124.510.548,59 Sergipe 2.629 22.806.587,43

Minas Gerais 18.112 43.055.461,83 Tocantins 2.457 34.328.305,14

Pará 13.574 41.392.066,58      

Fonte: INEP e STN.

A tabela 3 destaca a focalização dos programas assistenciais escolhidos para o estudo. A correlação negativa entre a participação em programas de assistência social e o nível de renda das famílias ultrapassa os 25%. Além dis-so, é possível perceber o perfil do background familiar relacionado às famílias

(Continuação)

261Efeitos de Programas de Assistência Social sobre a Frequência Escolar nos Estados Brasileiros

pobres. As famílias de menor renda são mais numerosas, apresentam maior número de filhos jovens, têm mais membros negros, são mais comuns no meio rural que as famílias de maior renda.

TABELA 3 correlações entre as variáveis independentes(Em %)

  lrendaida-de_fi

menino negro progasnivel_

instr_churbano

num-pess

trabalhaesco-

las_ebgas-

tos_as

lrenda 100,00                    

idade_fi 32,00 100,00                  

menino 0,18 0,16 100,00                

negro 25,66 -1,31 -1,75 100,00              

progas -25,52 2,48 0,49 -11,03 100,00            

nivel_instr_ch 51,31 -2,63 -0,80 20,81 -19,44 100,00          

urbano 25,39 1,10 -0,18 5,90 -9,31 24,91 100,00        

numpess -37,14 3,91 0,99 -17,64 16,11 -27,91 -20,24 100,00      

trabalha -7,62 24,71 5,30 -2,80 12,93 -9,43 -12,53 7,41 100,00    

escolas_eb -4,85 1,79 -0,39 1,44 11,54 -4,58 -18,72 4,26 6,77 100,00  

gastos_as 11,01 -0,96 -1,27 10,99 0,40 5,65 -3,69 -8,61 -2,54 36,08 100,00

Elaboração dos autores.

5 modElos E rEsultados

5.1 modelo 1: probit linear

O primeiro modelo estimado no trabalho é um modelo linear simples, não hie-rárquico, que pode ser escrito pela seguinte equação:

Yij = β0j + β1jlrendaij + β2jidade_fiij + β3jmeninoij + β4jnegroij + β5jprograsij + β6jnivel_instr_chij + β7jurbanoij + β8jnumpessij + β9jtrabalhaij + β10jescolas_ebij + β11jgastos_asij + εi (7)

Como a variável dependente, frequência à escola, é uma variável dicotômica (dummy), foi utilizado para a sua estimação o modelo probit, o qual se baseia em uma função de distribuição normal acumulada.14 Seus resultados podem ser conferidos na tabela 4.

14. Mais detalhes sobre as características do modelo probit e da função de distribuição normal acumulada podem ser encontrados em Gujarati (2004).

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012262

5.2 modelo 2: Anova com efeitos aleatórios

O segundo modelo abordado pelo trabalho, o modelo Anova com efeitos aleatórios,15 é o modelo hierárquico mais simples existente, uma vez que não apresenta variáveis independentes. O objetivo dele é simplesmente permitir a di-visão da variabilidade nos dados entre os termos de resíduo individual e de grupo. A variável dependente é explicada por um termo de intercepto β mais um erro aleatório r, normalmente distribuído com média zero e variância constante σ2. O intercepto de cada observação individual é afetada por um efeito fixo de grupo, igualmente definido por um termo de intercepto γ e por um erro aleatório u:

Yij = β0j + rij (8)

β0j = γ00 + u0j (9)

O modelo completo é definido substituindo-se (9) em (8):

Yij = γ00 + u0j + rij (10)

A estimação revela que a variância total do modelo (Var(u0j + rij)) é igual a 0.035, sendo que aproximadamente 99,38% devem-se a diferenças entre os indivíduos (crianças), e 0,62% devem-se a diferenças entre os gru-pos (estados). Ou seja, o modelo revelou que o peso dos fatores estaduais influenciando os indicadores de frequência à escola, quando não controlados os efeitos individuais dos alunos, é muito pequeno. Isto pode fazer com que a estimação por modelos hierárquicos seja menos apropriada que a por modelos lineares – como o probit, da subseção anterior – para se estudar os efeitos aqui apresentados.

5.3 modelo 3: incluindo as características das crianças segundo modelo Ancova

O terceiro modelo analisado é um modelo Ancova, em que as características indi-viduais das crianças estão incluídas, mas apenas o termo de intercepto varia entre os estados. Ou seja, os modelos de níveis 1 e 2 são:

Yij = β0j + β1jlrendaij + β2jidade_fiij + β3jmeninoij + β4jnegroij + β5jprograsij + β6jnivel_instr_chij + β7jurbanoij + β8jnumpessij + β9jtrabalhaij (11)

βnj = γn0, n >0 (12)

Substituindo as equações em (11), tem-se:

Yi = γ00 + γ10lrendaij + γ20idade_fiij + γ30meninoij + γ40negroij + γ50prograsij + γ60nivel_instr_chij + γ70urbanoij + γ80numpessij + γ90trabalhaij + u0j + rij (13)

A inclusão de variáveis de controle para as características individuais das

15. Mais informações sobre esse modelo são obtidas em Raudenbush e Bryk (2002) e Queiróz e César (2000).

263Efeitos de Programas de Assistência Social sobre a Frequência Escolar nos Estados Brasileiros

crianças reduziu a variância total do modelo em cerca de 1,87%, que se distri-buiu em uma redução de 33,26% na variância entre os estados, e de 1,67% entre os alunos. Contudo, a distribuição da variância entre os dois níveis não se alte-rou significativamente: 99,58% da variância se dá entre os indivíduos, e apenas 0,42% se dá entre os grupos – estados brasileiros.

5.4 modelo 4: incluindo as características dos estados segundo modelo Ancova

O próximo modelo inclui as variáveis explicativas de nível 2, referentes às carac-terísticas dos estados brasileiros, e como elas podem afetar a frequência à escola. Em um modelo de interceptos aleatórios, a equação de nível 1 é dada por (11), e os termos de inclinação são dados por (12). O termo de intercepto é dado por:

β0j = γ00 + γ01escolas_ebj + γ02gastos_asj + u0j (14)

Substituindo-se as equações em (11) tem-se:

Yi = γ00 + γ01escolas_eb + γ02gastos_as + γ10lrendaij + γ20idade_fiij + γ30meninoij + γ40negroij + γ50prograsij + γ60nivel_instr_chij + γ70urbanoij + γ80numpessij + γ90trabalhaij + u0j + rij (15)

A inclusão das variáveis explicativas de nível 2 reduziu a variância do modelo em cerca de 0,76%, sendo que a variância entre os estados reduziu-se em 18,12%, e a variância entre os indivíduos aumentou 0,76%. Contudo, a participação da variância entre grupos caiu para 0,34% da variância total. Fora isto, a inclusão das duas variáveis independentes de nível 2 pouco afetou os coeficientes e as signifi-câncias das demais variáveis independentes do modelo.

Por sua vez, considerando-se que o volume de gastos estaduais com assistên-cia social pode influenciar outras variáveis explicativas de nível 1 –, como a renda per capita das famílias –, o trabalho infantil, ou então a participação das famílias em programas sociais –, pode-se rodar o mesmo modelo com a variável gastos_as como um termo de inclinação aleatória. Neste caso, as equações de nível 2 têm a forma (14) para o intercepto, e, para as inclinações:

βnj = γn0 + γn1gastos_asj + unj, n >0 (16)

Supondo-se que X é um vetor de variáveis explicativas de nível 1, definidas em (11), então:

Yij = β0j + β1jXij + rij (17)

Substituindo-se (14) e (16) em (17) obtém-se:

Yi = γ00 + γ01escolas_ebj + γ02gastos_asj + γn0Xij + γn1Xijgastos_asj + u0j + unjXij + rij (18)

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012264

5.5 resultados das estimações

A tabela 4 sintetiza os resultados das estimações dos modelos de 1 a 4, sendo este último estimado tanto pelo método dos interceptos aleatórios, quanto pelo mé-todo das inclinações aleatórias.

TABELA 4 resultados das estimativas dos modelos de 1 a 4

Variável [Modelo 1] [Modelo 2] [Modelo 3] [Modelo 4 – Interceptos aleatórios] [Modelo 4 – Interceptos aleatórios]

Cownstante 1,1833 0,9633 0,9243 0,9183 0,9173

  (0,130) (0,003) (0,010) (0,011) (0,011)

lrenda 0,0763   0,0053 0,0053 0,0053

  (0,014)   (0,001) (0,001) (0,001)

idade_fi -0,0183   -0,0013 -0,0013 -0,0013

  (0,007)   (0,001) (0,001) (0,001)

menino -0,0813   -0,0063 -0,0063 -0,0063

  (0,031)   (0,002) (0,002) (0,002)

negro -0,0153   -0,001 -0,001 -0,001

  (0,033)   (0,003) (0,003) (0,003)

progas 0,3383   0,0253 0,0253 0,0253

  (0,034)   (0,003) (0,003) (0,003)

nivel_inst_ch 0,0583   0,0043 0,0043 0,0043

  (0,006)   (4,43E-04) (4,43E-04) (4,43E-04)

urbano 0,1203   0,0103 0,0103 0,0103

  (0,034)   (0,003) (0,003) (0,003)

numpess -0,0323   -0,0033 -0,0033 -0,0033

  (0,008)   (0,001) (0,001) (0,001)

trabalha -0,3383   -0,0393 -0,0393 -0,0393

  (0,053)   (0,005) (0,005) (0,005)

escolas_eb 9,68E-063   7,12E-071 9,02E-072

  (2,53E-06)     (4,00E-07) (3,96E-07)

gastos_as 9,87E-11   5,81E-12

  (2,34E-10)     (3,38E-11)  

var(gastos_as)       2,77E-21

var(_cons) 2,16E-04 1,44E-04 1,18E-04 1,09E-04

var(Residual)   0,035 0,034 0,034 0,034

pseudo R2 0,0592        

Número de observações

25.392 25.392 25.392 25.392 25.392

Elaboração dos autores.Notas: 1 Variável significativa a 10%.

2 Variável significativa a 5%.3 Variável significativa a 1%.

265Efeitos de Programas de Assistência Social sobre a Frequência Escolar nos Estados Brasileiros

5.6 modelo 5: centralizando a renda das famílias pela média dos estados

Centralizar a variável renda por suas médias também pode trazer informações relevantes para a abordagem de modelos hierárquicos. Assim, quando se cen-traliza a variável por sua média geral, significa integrar os efeitos individuais dos contextuais em relação aos dados observados. Porém, quando se centraliza pela média dos grupos, isto é, pela renda per capita média de cada estado, se dá maior ênfase no estudo sobre os efeitos individuais das variáveis de nível 1. Sendo mg_lrenda a renda per capita média geral da amostra, e med_lrenda a renda per capita média por estados, as equações de ambos os modelos cen-tralizados16 são:

Yi = γ00 + γ01escolas_eb + γ02gastos_as + γ10(lrenda – mg_lrenda) + γ20idade_fi + γ30sexo1 + γ40cor2 + γ50progras + γ60nivel_instr_ch + γ70urbano + γ80numpess + γ90trabalha + u0j + rij (19)

Yi = γ00 + γ01escolas_eb + γ02gastos_as + γ10(lrenda – med_lrenda) + γ20idade_fi + γ30sexo1 + γ40cor2 + γ50progras + γ60nivel_instr_ch + γ70urbano + γ80numpess + γ90trabalha + u0j + rij (20)

Os resultados da estimação podem ser conferidos na tabela 5.

TABELA 5resultados do modelo 4 centralizados pela média geral e pela média de grupo

Variável Média geral Média de grupo

Constante 0,9553 0,9223

  (0,008) (0,042)

lrenda_geral 0,0053

  (0,001)  

med_lrenda   0,005

    (0,006)

lrenda_grupo   0,0053

    (0,001)

idade_fi -0,0013 -0,0013

  (0,001) (0,001)

menino -0,0063 -0,0063

  (0,002) (0,002)

negro -0,001 -0,001

  (0,003) (0,003)

progas 0,0253 0,0253

16. Considerando-se a mesma estrutura do modelo 4 com interceptos aleatórios.

(Continua)

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012266

Variável Média geral Média de grupo

  (0,003) (0,003)

nivel_inst_ch 0,0043 0,0043

  (0,000) (0,000)

urbano 0,0103 0,0103

  (0,003) (0,003)

numpess -0,0033 -0,0033

  (0,001) (0,001)

trabalha -0,0393 -0,0393

  (0,005) (0,005)

escolas_eb 7,12E-072 7,03E-07 1

  (4,00E-07) (4,16E-07)

gastos_as 5,81E-12 7,10E-12

  (0,955) (3,71E-11)

var(_cons) 0,000 0,000

var(Residual) 0,034 0,034

Número de observações 25.392 25.392

Elaboração dos autores.Notas: 1 Variável significativa a 10%.

2 Variável significativa a 5%. 3 Variável significativa a 1%.

Como se pode observar, a centralização pela média da renda, em ambos os casos, não afetou consideravelmente os coeficientes e as significâncias do modelo 4 com interceptos aleatórios. O que mudou foram os coeficientes e o nível de significância da constante.

5.7 comentários sobre os resultados das estimações

De acordo com os resultados obtidos, em todos os modelos, o comportamento da maior parte das variáveis explicativas está de acordo com o esperado pela bibliografia estudada (Kassouf, 2001; Courseuil, Santos e Foguel, 2001; Silva e Hasenbalg, 2002).

A frequência à escola é mais comum para crianças de maior renda, menor idade, cor branca – significante apenas no modelo probit –, que recebem benefícios de programas de assistência social, de residência nas regiões urbanas, com poucas pessoas na família, que não trabalham remuneradamente e com maior oferta de ins-tituições de ensino em seu estado. Por sua vez, a frequência tende a ser menor entre crianças de maior idade – 13 ou 14 anos –, entre homens, crianças não brancas, filhos de famílias muito numerosas e crianças que exercem trabalho remunerado.

A relação entre a renda familiar e a frequência à escola por parte dos filhos é explicada pela teoria do Capital Humano de Becker (1991; 1993), conforme já

(Continuação)

267Efeitos de Programas de Assistência Social sobre a Frequência Escolar nos Estados Brasileiros

referida. Ou seja, quanto maior é a renda da família, maior é o montante de recur-sos que os pais podem investir na qualidade do capital humano – no caso, gastos com educação – de seus filhos. E ainda, aumentos no nível de renda, mantendo constantes os custos do consumo presente e da educação dos filhos, permitem que a família possa escolher cestas de consumo de utilidade cada vez mais elevada, o que contribui para a acumulação de capital humano.

O efeito positivo da participação em programas sociais por parte das famílias para a frequência de seus filhos à escola, o ponto central deste trabalho, também pode ser explicado pela teoria de Becker. Os programas de assistência social elevam diretamente a renda das famílias, permitindo que possam alocar seus recursos em ní-veis mais altos de consumo e acumulação de capital humano. Tal observação empíri-ca contrasta com a noção segundo a qual os gastos assistenciais fazem com que as fa-mílias beneficiárias simplesmente aumentem seu nível de consumo sem se preocupar com a poupança e a educação dos filhos, ou mesmo que os benefícios desincentivem o trabalho dos pais, de modo que a situação dos filhos – de trabalhar para obter renda presente, em vez de frequentar a escola para investir em renda futura – não se altere.

Crianças pertencentes a famílias de chefe com mais anos de estudo apre-sentam níveis de frequência escolar superiores aos das demais. Os resultados do trabalho corroboraram as conclusões dos artigos de Corseuil, Santos e Foguel, (2001) e Riani e Rios-Neto (2008). Contudo, como neste trabalho o indicador de interesse foi simplesmente a frequência à escola, o valor deste parâmetro foi inferior ao dos estudos anteriores, que focalizaram aspectos referentes à qualidade da educação e ao atraso serial.

Crianças residentes em áreas urbanas apresentam níveis superiores de frequência à escola em relação às que residem em áreas rurais, devido à melhor oferta de instituições de ensino daquelas.

O relatório do Preal (2003) aponta como fatores que determinam os proble-mas de abandono à escola os relacionados à péssima oferta de estabelecimentos de ensino, não apenas a simples inexistência deles mas também a dificuldade de acesso por parte dos alunos; e também a ausência de professores. Todos estes problemas são mais comuns nas áreas rurais que nas urbanas. Além disso, há uma considerável correlação entre a residência em regiões rurais e os baixos níveis de renda familiar, com menores níveis de instrução dos pais e elevado número de pessoas integrantes.

Crianças de mais idade – na amostra, os jovens de 13 a 14 anos – têm mais probabilidade de abandonar a escola para ingressar no mercado de trabalho. Além disso, existe um fator cumulativo de abandono aos estudos, uma vez que poucas crianças que abandonaram a escola voltam a estudar no futuro. A relação inversa entre idade da criança e frequência à escola está representada nos gráficos 1 e 2, que representam simulações baseadas na probabilidade de a criança frequentar a escola,

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012268

dada sua idade, e variáveis como sexo, educação dos pais, região de residência e se trabalha. Estas simulações foram realizadas a partir dos parâmetros do modelo 1 (probit), pois os parâmetros estimados foram muito próximos aos dos modelos hierárquicos, e a sua computação é mais simples.

GRÁFICO 1impacto da localização do domicílio, do trabalho infantil e da participação em pro-gramas assistenciais sobre a probabilidade de frequentar a escola

0,5

0,7

0,9

1,1

1,3

1,5

1,7

1,9

2,1

2,3

1A

1B

7 8 9 10 11 12 13 14

Pro

bab

ilid

ade

de

freq

uen

tar

a es

cola

Idade da criançaRural e não participa Rural e participaUrbano e não participa Urbano e participa

0,5

0,7

0,9

1,1

1,3

1,5

1,7

1,9

2,1

2,3

7 8 9 10 11 12 13 14

Pro

bab

ilid

ade

de

freq

uen

tar

a es

cola

Idade da criança

Não trabalha e não participa Não trabalha e participa

Trabalha e não participa Trabalha e participa

0,5

0,7

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1,1

1,3

1,5

1,7

1,9

2,1

2,3

1A

1B

7 8 9 10 11 12 13 14

Pro

bab

ilid

ade

de

freq

uen

tar

a es

cola

Idade da criançaRural e não participa Rural e participaUrbano e não participa Urbano e participa

0,5

0,7

0,9

1,1

1,3

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1,7

1,9

2,1

2,3

7 8 9 10 11 12 13 14

Pro

bab

ilid

ade

de

freq

uen

tar

a es

cola

Idade da criança

Não trabalha e não participa Não trabalha e participa

Trabalha e não participa Trabalha e participa

Elaboração dos autores.

269Efeitos de Programas de Assistência Social sobre a Frequência Escolar nos Estados Brasileiros

GRÁFICO 2impacto do sexo da criança, da educação do chefe do domicílio e da participação em programas assistenciais sobre a probabilidade de frequentar a escola

2A

2B

0,5

0,7

0,9

1,1

1,3

1,5

1,7

1,9

2,1

2,3

7 8 9 10 11 12 13 14

Pro

bab

ilid

ade

de

freq

uen

tar

a es

cola

Idade da criança

Mulher e não participa Mulher e participaHomem e não participa Homem e participa

0,5

1

1,5

2

2,5

3

7 8 9 10 11 12 13 14

Pro

bab

ilid

ade

de

freq

uen

tar

a es

cola

Idade da criança

Até 4 anos e não participa Até 4 anos e participa

A partir de 11 anos e participa A partir de 11 anos e não participa

2A

2B

0,5

0,7

0,9

1,1

1,3

1,5

1,7

1,9

2,1

2,3

7 8 9 10 11 12 13 14

Pro

bab

ilid

ade

de

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tar

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Idade da criança

Mulher e não participa Mulher e participaHomem e não participa Homem e participa

0,5

1

1,5

2

2,5

3

7 8 9 10 11 12 13 14

Pro

bab

ilid

ade

de

freq

uen

tar

a es

cola

Idade da criança

Até 4 anos e não participa Até 4 anos e participa

A partir de 11 anos e participa A partir de 11 anos e não participa

Elaboração dos autores.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012270

Os alunos do sexo masculino abandonam os estudos com mais frequência que as mulheres para ingressarem cedo no mercado de trabalho. E, além disso, como a amostra inclui somente jovens de até 14 anos, são menos comuns os fa-tores gravidez e casamento, que afetam negativamente os estudos das meninas.

Em relação aos aspectos relacionados ao número de pessoas na família, observa-se que o impacto negativo deste fator sobre a frequência à escola é moti-vado, sobretudo, pela correlação negativa desta variável com a renda da família. Ou seja, as famílias mais pobres, por motivos diversos, como menor acesso a métodos anticonceptivos, ou mesmo a necessidade de ampliar a oferta de mão de obra familiar, tendem a ter famílias mais numerosas.

Sobre a baixa significância da cor das crianças em todos os modelos esti-mados, pode-se relacionar este resultado ao fato de que, no Brasil, a exclusão social e a discriminação têm uma natureza mais de nível social e educacional que racial. Desse modo, os indicadores socioeconômicos de cada criança po-dem ser controlados, nos modelos de estimação de frequência à escola, princi-palmente pelo nível de renda per capita de sua família e pelo grau de instrução de seus pais, sendo a questão racial, na qual as famílias brancas apresentam níveis de frequência mais elevados, uma consequência da correlação entre cor do aluno, renda de sua família (25,66% para famílias brancas) e nível de ins-trução de seus pais (20,81% para as mesmas famílias). Outro possível fator que poderia explicar a baixa significância da cor das crianças é o efeito da frequência à escola por parte dos alunos mestiços, os quais, mesmo incluídos em igual posição dos negros na composição desta variável dummy, apresentam indicadores de frequência superiores aos deste grupo.

O uso de uma dummy que mensura o fato de a criança ser uma unidade de fonte de rendimentos para a família teve significância muito favorável para as estimações. Conforme sugerido por Schwartzman (2004), o uso desta dummy controlou o trabalho infantil não remunerado, que, por ter característica informal e intrafamiliar, sobretudo de ajuda aos pais na realização de tarefas domésticas ou agropecuárias na sua própria propriedade, teria um impacto menor sobre os estudos dos filhos.

Destaca-se a baixa significância das variáveis de nível 2 para a estimação dos modelos. O número de escolas por estado não afetou os indicadores de frequência das crianças, provavelmente pelo fato da quase universalização do en-sino básico no país. A universalização do acesso ao ensino básico no Brasil tam-bém explica o alto nível de significância e do valor dos coeficientes para o termo de intercepto de cada modelo estudado neste artigo, como mostra o gráfico 3.

271Efeitos de Programas de Assistência Social sobre a Frequência Escolar nos Estados Brasileiros

GRÁFICO 3diagrama de dispersão dos resíduos

1

.8

.6

.4

.2

-.02 -.01 .01 .020

0

BLUP r.e. for uf:_cons

Fitted values freq1

Elaboração dos autores.

Nota-se, sendo a variável endógena uma dummy, que os resíduos concen-tram-se nas regiões do gráfico associadas com o valor zero e um dos eixos das or-denadas. Como se pode ver, a reta ajustada dos parâmetros do modelo é bastante elástica e corta o eixo das ordenadas em um ponto acima do 0,9. Isto significa que, independentemente das variáveis explicativas escolhidas para os modelos, o nível de frequência à escola no Brasil é muito elevado.

A baixa significância dos gastos assistenciais de nível estadual nos modelos estimados pode ser facilmente relacionada à predominante federalização dos pro-gramas sociais de transferência de renda no país.

Por fim, observa-se como o componente da variância relacionado aos efeitos de nível 2, referentes às características estaduais, é muito baixo, cerca de 0,5% da variância total, mesmo no modelo Anova. Sem nenhum controle por variáveis in-dependentes, a estimação por modelos hierárquicos não se faz necessária, sendo o modelo 1, o probit linear, suficiente para se tirar as conclusões empíricas referentes aos problemas abordados pelo trabalho.

planejamento e políticas públicas | ppp | n. 39 | jul./dez. 2012272

6 coNsidEraçÕEs FiNais

A principal conclusão deste estudo é o impacto positivo que a participação das famílias em programas assistenciais apresenta sobre a frequência de seus filhos à escola. Ou seja, apesar de todas as críticas que a assistência social recebe, geral-mente realizadas mais sob o ponto de vista moral e político que propriamente econômico e social, as famílias beneficiadas pelos programas, de fato, utilizam parte do montante recebido para investir em capital humano, e isto pode ajudar a combater a pobreza no longo prazo, pelo efeito da escolaridade sobre a produ-tividade destas crianças no mercado de trabalho, no futuro.

Além disso, neste trabalho, devido à pequena parcela da variância total dos modelos, explicada pelas diferenças entre os estados da Federação, o uso de modelos lineares de um único nível torna-se mais apropriado – principalmente o modelo probit, pois a variável dependente é dicotômica. Isto se deve ao fato de o ensino bá-sico no Brasil, atualmente, ser praticamente universalizado e da quase inexistência de dificuldades de acessibilidade a instituições de ensino entre as regiões geográficas.

As dificuldades de acesso às escolas podem afetar negativamente a frequên-cia à escola de maneira comum nos âmbitos municipal e microrregional, sobre-tudo nas localidades mais pobres e mais distantes dos grandes centros urbanos, como identificado pelo estudo de Riani e Rios-Neto (2004), mas não na esfera estadual. Contudo, a questão de se a universalização do ensino fundamental, alcançada a partir do final da década de 1990, foi obtida primeiramente devido aos programas de transferência de renda ou às políticas específicas de oferta de escolas – principalmente pela instituição do Fundo de Manutenção e Desenvol-vimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF) – é um tema de pesquisa futura, que vai além do propósito deste trabalho.

A baixa significância dos gastos estaduais com assistência social para explicar a frequência à escola revela o caráter federal dos gastos assistenciais no Brasil. Ou seja, ao contrário do que vem acontecendo com a política fiscal em geral, as funções assistenciais e redistributivas do Estado ainda são centralizadas no país.

Por fim, ressalta-se que a análise foi elaborada a partir de dados de 2002-2003. Reconhece-se que uma década é período consideravelmente longo para a discussão sobre impactos, efeitos e desafios dos programas sociais no Brasil. Além disso, existem outros trabalhos empíricos, como os levantados nas referências bibliográficas, que trataram de problemas semelhantes utilizando dados menos defasados. Contudo, considera-se que este problema pode ser minimizado por meio de duas formas, as quais favorecem a contribuição deste trabalho para o debate. Em primeiro lugar, os trabalhos mais recentes não encontraram mudan-ças significativas nas relações aqui estimadas. Em segundo lugar, ao contrário dos anteriores, este trabalho utilizou como banco de dados a POF, cuja periodicidade

273Efeitos de Programas de Assistência Social sobre a Frequência Escolar nos Estados Brasileiros

é menor que a das bases mais comuns neste tipo de estudo, como a PNAD e o SAEB, e cuja riqueza de informações faz com que seja utilizada em uma diversi-dade cada vez maior de estudos sociais.

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275Efeitos de Programas de Assistência Social sobre a Frequência Escolar nos Estados Brasileiros

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Originais submetidos em janeiro de 2012. Última versão recebida em maio de 2012. Aprovado em maio de 2012.

colaBoradorEs

Para os dois números da PPP, em 2012, a editoria da revista contou com a colabo-ração de conjunto importante de pareceristas de diferentes instituições e regiões brasileiras. Agradecemos a cada um da listagem a seguir, pois desta colaboração generosa dependem a melhoria contínua da qualidade e a pontualidade da PPP.

Acir dos Santos Almeida (Ipea)  

Adriana Moreira Amado (UnB)

Adriano Sarquiz Bezerra Menezes (IPCE)

Alexandre dos Santos Cunha (Ipea)

Alexandre Manoel Angelo da Silva (Ipea)

Alexandre Marinho (Ipea)

Alexis Maka (Ipea)

Almir de Oliveira Júnior (Ipea)

Álvaro Barrantes Hidalgo (UFPE)

Ana Cleusa Serra Mesquita (Ipea)

Anderson Antonio Denardin (UFPel)

Andre Carraro (UFPel)

Andre Rego Viana (Ipea)

Andrei Gomes Simonassi (UFC)

Antenor Lopes de Jesus Filho (Ipea)

Antonio Teixeira Lima Junior (Ipea)

Aurélio Guimarães Cruvinel e Palos (Câmara dos Deputados)

Benjamin Miranda Tabak (BACEN)

Bernard F. Couttolenc (USP)

Bernardo Mueller (UnB)

Bernardo Trindade (Ipea)

Bruno Cesar Pino Oliveira de Araujo (Ipea)

Bruno de Oliveira Cruz (Ipea)

Caio Piza (Universidade de Sussex)

Carla Bronzo Ladeira (FJP)

Carlos Alberto Ramos (ECO/UnB)

Carlos Eduardo Ferreira Carvalho (PUC)

Carlos Eduardo Flores de Araujo (ABDI)

Carlos Eduardo Gasparini (UFPB)

Carlos Eduardo Lobo e Silva (PUC/RS)  

Carlos Guilherme Adalberto Mielitz Netto (UFRGS)

Carlos Henrique Fialho Mussi (Ipea)

Carlos Henrique Ribeiro de Carvalho (Ipea)

Carolina Pescatori (FAU/UnB)

César Nunes de Castro (Ipea)

Claudio Djissey Shikida (IBMEC)

Cleandro Henrique Krause (Ipea)

Daniel Nojima (Ipardes)

Daniela Carla Decaro Schettini (USP)

Daniel Ricardo de Castro Cerqueira (Ipea)

Denis Alcides Rezende (PUC/PR)

Denise Medeiros Ribeiro Salles (UFF)

Diego de Faveri Pereira Lima (FGV)

Edson Paulo Domingos (UFMG)

Elisabetta Recine (UnB)

Elson Pires (UNESP)

Erik Alencar Figueiredo (UFPB)

Erly Cardoso Teixeira (UFV)

Ernesto Pereira Galindo (Ipea)

Fabiana Rocha (USP)

Fabio Alves (Ipea)

Fábio Veras Soares (Ipea) 

Fernanda Filgueiras Sauerbronn (UFRJ)

Fernanda Mendes Bezerra (Unioeste)

Fernando Antônio Ribeiro Soares (MF)

Fernando Antonio Slaibe Postali (USP)

Fernando Boarato Meneguin (Senado Federal)

Fernando Perobelli (UFJF)

Filipe Lage de Souza (BNDES)

Flávio de Oliveira Gonçalves (UFPR)

Francisco Marcos Figueiredo (BACEN)

Frederico Flósculo Pinheiro Barreto (UnB)

Frederico Holanda (UNB) 

Gabriel Caldas Montes (UFF)

Gabriel Coelho Squeff (Ipea)

Gervásio Ferreira dos Santos (UFBA)

Gilson Riham Karkotli (Centro Universitário Municipal de São José)

Guilherme Mendes Resende (Ipea)

Gustavo Inácio de Moraes (PUC/RS)

Joanilho Teixeira (UnB)

João Cunha da Silva (UFC)

João Francisco Alves Veloso (GDF)

João Policarpo Rodrigues Lima (UFPE)

José Angelo (UCB)

José Eustáquio Diniz Alves (IBGE)

Jose Eustáquio Ribeiro Vieira Filho (Ipea)

José Oswaldo Cândido Junior (Ipea/Senado Federal)

Juliana Aquino (UFMG)

Júnia Cristina Peres R. da Conceição (Ipea)

Junior Macambira (IDT)

Leonardo Monteiro Monastério (Ipea)

Leonardo Xavier da Silva (UFRGS) 

Liana Maria da Frota Carleal (UFPR)

Liderau dos Santos Marques (UNIRITTER)

Lucas Ferreira Mation (Ipea)

Luiz Dias Bahia (Ipea)

Luiz Honorato da Silva Júnior (UnB)

Manoel Leonardo Santos (UFMG)

Marcelo Abi-Ramia Caetano (Ipea)

Marcelo Medeiros Coelho de Souza (Ipea)

Marcelo Nonnenberg (Ipea)

Marcio Bruno Ribeiro (Ipea)

Marcio Cruz (UFPR)

Márcio Salvato (Unimontes)

Marco Aurélio Costa (Ipea)

Marco Tulio Aniceto França (UFPR)

Marcos Mendes (Senado Federal)

Maria Bernadete Gomes Pereira Sarmiento Gutierrez (Ipea)

Maria Cristina Cacciamali (USP)

Maria da Piedade Morais (Ipea)

Mauricio Benegas (UFC)

Maurício de Paula Pinto (UnB)

Maurício Mota Saboya Pinheiro (Ipea)

Max B. Ferraz (IBEST)

Miguel Matteo (Ipea)

Milko Matijoscic (Ipea)

Mirela de Carvalho Pereira da Silva (Ipea)

Monica Andrade (Cedeplar)

Nelson Fernando Zackseski  (Ipea)

Nicolino Trompieri (Ipece)

Oliveira Alves Pereira (MPOG)

Patricia Alessandra Morita (Ipea)

Paulo Augusto Meyer M. Nascimento (Ipea)

Paulo Delgado (Ipardes)

Paulo Jannuzzi (Seade)

Paulo Justiniano (UFRR)

Paulo Mol Junior (CNI)

Paulo Roberto Scalco (UFG)

Pedro Henrique Zuchi da Conceição (UnB)

Pedro Herculano G. Ferreira de Souza (Ipea)

Priscilla Albuquerque Tavares (FGV)

Rafael Henrique Moraes Pereira (Ipea)

Reisoli Bender Filho (UFSM) 

Renato Calistet (USP)

Renato Garcia (USP)

Renato S. Maluf (UFRJ)

Ricardo Bielschowsky (Cepal)

Roberta da Silva Vieira (Ipea)

Roberto Henrique Sieczkowski Gonzalez (Ipea)

Rodrigo Faria (UnB)

Rodrigo Valente Serra (ANP)

Rogerio Boueri de Miranda (Ipea)

Ronaldo Seroa Motta (Ipea)  

Rute Imanishi Rodrigues (Ipea)

Sabino Porto Jr. (UFRGS)

Salvador Teixeira Werneck Vianna (Ipea)

Sandra Silva Paulsen (Ipea)

Sandro Sacchet de Carvalho (Ipea)

Sergei Suarez Dillon Soares (Ipea)

Shirley Pereira de Mesquita (UFP)

Sonaly Rezende (UFMG)

Sueli Moro (UFMG)

Thiago Francisco Neves Gobbo (ITESP)

Tiago Toledo Ferreira (USP)

Tito Belchior S. Moreira (UCB)

Tufi Machado Soares (UFJF)

Valdemar Ferreira de Araújo Filho (UFBA)

Vander Lucas (UnB) 

Vanessa Petrelli Corrêa (UFU)

Viviane Luporini (UFRJ)

Werber Sutti (MINC)

ipea – instituto de Pesquisa Econômica aplicada

Editorial

coordenaçãoCláudio Passos de Oliveira

supervisãoEverson da Silva MouraMarco Aurélio Dias Pires

revisãoAndressa Vieira BuenoClícia Silveira RodriguesHebert Rocha de JesusIdalina Barbara de CastroLaeticia Jensen EbleLeonardo Moreira de SouzaLuciana DiasOlavo Mesquita de CarvalhoReginaldo da Silva DomingosCelma Tavares de Oliveira (estagiária)Patrícia Firmina de Oliveira Figueiredo (estagiária)

EditoraçãoAline Rodrigues LimaAndrey TomimatsuBernar José VieiraDaniella Silva NogueiraDanilo Leite de Macedo TavaresJeovah Herculano Szervinsk JuniorLeonardo Hideki Higa

livrariaSBS – Quadra 1 − Bloco J − Ed. BNDES, Térreo 70076-900 − Brasília – DFTel.: (61) 3315 5336Correio eletrônico: [email protected]

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NORMAS AOS COLABORADORES DE PLANEJAMENTO E POLÍTICAS PÚBLICAS

1. Os artigos enviados para seleção devem ser inéditos. A remessa do artigo à revista implica autorização para a sua publicação pelo autor.

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4. Os artigos selecionados para publicação deverão ser disponibilizados em formato editável (.DOC, .RTF ou .ODT). Eles podem ser enviados por e-mail <[email protected]> ou pelo site da revista (acessar a seção Publicações, subseção PPP, em <http://www.ipea.gov.br>).

5. Cada artigo deverá conter um resumo de cerca de 150 (cento e cinquenta) palavras, o qual propicie uma visão global e antecipada do assunto tratado. O resumo, bem como o título do artigo, deve ser enviado em 4 (quatro) idiomas: português, inglês, espanhol e francês. Cada resumo deve conter até 5 (cinco) palavras-chave.

6. As fórmulas matemáticas devem ser claras e estarem inseridas no próprio texto (se forem imagens, devem estar em definição mínima de 300 dpi): jamais podem dar margem a dupla interpretação. Se as deduções de fórmulas forem abreviadas, o autor deverá apresentar a derivação completa em um anexo, o qual não será publicado.

7. Diretrizes gerais para formatação dos artigos:

7.1 Antes do título, devem constar as informações sobre o autor: nome completo, instituição à qual está vinculado, endereço eletrônico e endereço para correspondência. O autor deverá informar até 5 (cinco) códigos do sistema de classificação do Journal of Economic Literature (JEL) – disponível no site <http://www.aeaweb.org/journal/jel_class_system.php>.

7.2 Os artigos não devem exceder 30 (trinta) páginas, em texto digitado em formato A4 (29,7 x 21 cm), espaço simples, letra Times New Roman, corpo 12, margens superior e esquerda com 3 cm e inferior e direita com 2 cm, justificado.

7.3 Gráficos, tabelas, quadros e figuras deverão ser entregues em formato editável (.XLS, .AI, .EPS ou .CDR) para possibilitar a manipulação eletrônica de dimensões, cores e textos. Imagens fotográficas deverão ter definição mínima de 300 dpi e estarem nos formatos .TIFF, .JPG, .BMP ou .GIF.).

7.4 As notas devem aparecer no fim da página, numeradas sequencialmente.

7.5 O artigo deve seguir as normas estabelecidas pelo Manual do Editorial do Ipea (2ª edição, 2011, disponível em: <http://www.ipea.gov.br/sites/000/2/livros/2012/livro_manual_editorialipea_2ed.pdf>) e pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), NBR-6023.

7.6 As indicações bibliográficas no texto devem obedecer, por exemplo, à forma (Barat, 1978) e, se for o caso, serem acrescidas de referência ao número da página citada: (Barat, 1978, p. 15). A referência completa deverá ser apresentada no fim do artigo, em ordem alfabética, com: no caso de livros – autor(es), título completo do livro, nome e número da série ou coleção (se houver), edição, local, editora e ano de publicação; e no caso de artigos de periódicos – autor(es), título completo do artigo, título completo do periódico, local, número e volume, número de páginas, mês e ano de publicação.

Missão do IpeaProduzir, articular e disseminar conhecimento para aperfeiçoar as políticas públicas e contribuir para o planejamento do desenvolvimento brasileiro.

A Participação Estatal no Sistema Bancário Brasileiro: uma análise do período 1996-2006Isabela Soares de LimaDenilson Queiroz Gomes Ferreira

Avaliação dos Efeitos da Lei Kandir sobre a Arrecadação de ICMS no Estado do CearáAlejandro LeitãoGuilherme IrffiFabricio Linhares

Análise do Impacto da Classificação de Risco no Mercado de Crédito BrasileiroPaulo Rogério Faustino MatosJoão Henrique Lemos Costa

Solvência e Reação Fiscal das Administrações Públicas Municipais no BrasilAndrei Gomes SimonassiRonaldo de Albuquerque e ArraesFrancisca Lívia Souza MenezesDenise Xavier Araujo

O Setor Energético Brasileiro: uma análise via indicadores de insumo-produto e o modelo híbrido para os anos de 1997 e 2002Vinicius de Azevedo Couto FirmeFernando Salgueiro Perobelli

Análise Conceitual da Política de Territórios Rurais: o desenvolvimento territorial rural no BrasilJuliano Geraldi

Fluxos Totais de Comércio e Estrutura Produtiva – uma análise para o estado de Minas GeraisMarisa dos Reis A. BotelhoVanessa Petrelli CorrêaAna Alice B. P. D. Garlipp

Eficiência no Gasto Público com Educação: uma análise dos municípios do Rio Grande do NorteJorge Luiz Mariano da SilvaJúlio César Lima de Almeida

Efeitos de Programas de Assistência Social sobre a Frequência Escolar nos Estados Brasileiros: uma análise baseada em dados da pesquisa de orçamentos familiaresRicardo Agostini MartiniHelena Cruz Castanheira

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