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REVISTA UNIVAP Universidade do Vale do Paraíba Universidade do Vale do Paraíba

Revista Univap 23jac

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Page 1: Revista Univap 23jac

REVISTA UNIVAP

Universidade do Vale do ParaíbaUniversidade do Vale do Paraíba

Page 2: Revista Univap 23jac

A REVISTA UniVap tem por objetivo divulgar conhecimentos, idéias e resultados, frutos detrabalhos desenvolvidos na UNIVAP - Universidade do Vale do Paraíba, ou que tiveramparticipação de seus professores, pesquisadores e técnicos e da comunidade científica.Os artigos assinados são de responsabilidade exclusiva de seus autores. A publicação totalou parcial dos artigos desta revista é permitida, desde que seja feita referência completa àfonte.

CORRESPONDÊNCIAUNIVAP - Av. Shishima Hifumi, 2.911 - UrbanovaCEP: 12244-000 – São José dos Campos - SP - BrasilTel.: (12) 3947-1036 / Fax: (12) 3947-1211E-mail: [email protected]

Supervisão Gráfica: Profa. Maria da Fátima Ramia Manfredini - Pró-Reitoria de Cultura e Divulgação - Univap / Revisão: Profa. GlóriaCardozo Bertti - (12) 3922-1168 / Editoração Eletrônica: Glaucia Fernanda Barbosa Gomes - Univap (12) 3947-1036 / Impressão: Jac Gráficae Editora - (12) 3928-1555 / Publicação: Univap/2006

Campus Centro:

Campus Urbanova:

Campus Urbanova/Jacareí:

Campus Villa Branca:

Campus Aquarius:

Campus Platanus:

Campus Caçapava:

Av. Shishima Hifumi, 2911 - UrbanovaCEP: 12244-000 - São José dos Campos - SP

Fone: (12) 3947-1000 - www.univap.br

Universidade do Vale do ParaíbaUniversidade do Vale do Paraíba

Universidade do Vale do ParaíbaFicha Catalográfica

Revista UniVap - Ciência - Tecnologia - Humanismo. V.1, n.1 (1993)- .São José dos Campos: UniVap, 1993-

v. : il. ; 30cm

Semestral com suplemento.ISSN 1517-3275

1 - Universidade do Vale do Paraíba

Praça Cândido Dias Castejón, 116 - Centro São José dos Campos - SP - CEP: 12245-720 - Tel.: (12) 3928-9800 Rua Paraibuna, 75 - Centro

São José dos Campos - SP - CEP: 12245-020 - Tel.: (12) 3928-9800

Avenida Shishima Hifumi, 2911 - Urbanova São José dos Campos - SP - CEP: 12244-000 - Tel.: (12) 3947-1000

acesso pela Avenida Shishima Hifumi, 2911 - Urbanova São José dos Campos - SP - CEP: 12244-000 - Tel.: (12) 3947-1000

Estrada Municipal do Limoeiro, 250 - Jd. Dora Jacareí - SP - CEP: 12300-000 - Tel.: (12) 3958-4000

Rua Dr. Tertuliano Delphim Junior, 181 - Jardim Aquarius São José dos Campos - SP - CEP: 12246-080 - Tel.: (12) 3923-9090

Avenida Frei Orestes Girardi, 3 - Bairro Fracalanza Campos do Jordão - SP - CEP: 12460-000 - Tel.: (12) 3664-5388 / 3662-4667

Estrada Municipal Borda da Mata, 2020 Caçapava - SP - CEP: 12284-820 - Tel.: (12) 3655-4646

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S U M Á R I O

v. 13 n. 23 ago. 06 ISSN 1517-3275

PALAVRA DO REITOR. ..................................................................................... 5

EDITORIAL. .......................................................................................................... 7

A FUNDAÇÃO VALEPARAIBANA DE ENSINO (FVE) E AUNIVERSIDADE DO VALE DO PARAÍBA (UNIVAP) ............................... 9

PERSPECTIVAS VALORATIVAS NA PREDIÇÃO DO RENDIMENTOESCOLAR: UM ESTUDO A PARTIR DOS VALORES HUMANOS

Nilton Soares Formiga ........................................................................................ 13

A ESPECIALIZAÇÃO DE PROFESSORES A DISTÂNCIA: ANÁLISEDE UMA EXPERIÊNCIA

Sonia Sirolli, Maria Tereza Dejuste de Paula .................................................... 21

CIÊNCIA, FILOSOFIA E RELIGIÃO DIANTE DA QUESTÃO DAORIGEM DO UNIVERSO

Mituo Uehara ...................................................................................................... 29

FUNÇÕES CARDÍACAS PARA DIFERENTES CONDIÇÕES DEEXERCÍCIO FÍSICO

Mituo Uehara, Kumiko K. Sakane, Simone A. Bertolotti ............................. 42

CÉLULAS-TRONCO: REVISÃO SOBRE OS CONCEITOS BÁSICOS

Karina Teixeira Naves, Newton Soares da Silva, Cristina Pacheco Soares .. 48

EFEITO DA IRRADIAÇÃO LASER DE BAIXA POTÊNCIA ARSIANETODE GÁLIO ALUMÍNIO (ASGAAL) DE 785NM SOBRE ACICATRIZAÇÃO DE LESÃO MUSCULAR: ESTUDO EXPERIMENTAL

Getúlio A. de Freitas Filho, Maria de Fátima Rodrigues da Silva, Marcelo E.Belleti, Evandro dos Reis Machado, Newton Soares da Silva ........................ 53

INFLAMAÇÃO PULMONAR INDUZIDA PORLIPOPOLISSACARÍDEOS (LPS) E SUA CONTRIBUIÇÃO COMOINSTRUMENTO DE PESQUISAS

Daniel de Souza Ramos, Newton Soares da Silva, Wellington Ribeiro ......... 61

A CRISE AMBIENTAL E A ECOTOXICOLOGIA: UMA FERRAMENTANA CONSERVAÇÃO DA DIVERSIDADE BIOLÓGICA

Isabel Cristina Fracasso Póvoa, Newton Soares da Silva, Maria Regina deAquino Silva ........................................................................................................ 65

O MEIO AMBIENTE E O AMBIENTE DA VIDA: A HISTÓRIAECOLÓGICA NO APERFEIÇOAMENTO E FORMAÇÃO DEPROFESSORES EM PROJETOS INTERDISCIPLINARES

Celenrozi Zaroni dos Santos, Valéria Zanetti de Almeida .............................. 73

PLANEJAMENTO URBANO, CONTROLE SOCIAL E PRIVILÉGIOS

Luciane de Menezes Siqueira, Emmanuel Antonio dos Santos ...................... 84

O NOVO RURAL EM SÃO FRANCISCO XAVIER

Luciane de Menezes Siqueira, Ely Pimenta Guimarães .................................. 93

NORMAS GERAIS PARA A PUBLICAÇÃO DE TRABALHOS NAREVISTA UNIVAP ........................................................................................... 101

Baptista Gargione FilhoReitor

Antonio de Souza Teixeira JúniorVice-Reitor e Pró-Reitor de Integração Universidade -Sociedade

Ana Maria C. B. BarsottiPró-Reitora de Assuntos Estudantis

Ailton TeixeiraPró-Reitor de Administração e Finanças

Elizabeth Moraes LiberatoPró-Reitora de Avaliação

Élcio NogueiraPró-Reitor de Graduação

Fabiola Imaculada de OliveiraPró-Reitora de Educação Continuada

Luiz Antônio GargionePró-Reitor de Planejamento

Maria Cristina Goulart Pupio SilvaPró-Reitora de Assuntos Jurídicos

Maria da Fátima Ramia ManfrediniPró-Reitora de Cultura e Divulgação

João Luiz Teixeira PintoDiretor Geral do Campus Villa Branca - Jacareí

Luiz Carlos Andrade de AquinoDiretor da Faculdade de Direito do Vale do Paraíba

Francisco Pinto BarbosaDiretor da Faculdade de Engenharia, Arquitetura eUrbanismo

Frederico Lencioni NetoDiretor da Faculdade de Educação

Marcio MaginiDiretor da Faculdade de Ciência da Computação

Renato Amaro ZângaroDiretor da Faculdade de Ciências da Saúde

Samuel Roberto Ximenes CostaDiretor da Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas

Vera Maria Almeida Rodrigues CostaDiretora da Faculdade de Comunicação e Artes

Marcos Tadeu Tavares PachecoDiretor do Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento

Maria Valdelis Nunes PereiraDiretora do Instituto Superior de Educação

COORDENAÇÃO GERALAntonio de Souza Teixeira Júnior

REVISÃO DE TEXTOGlória Cardozo Bertti

DIGITAÇÃO E FORMATAÇÃOGlaucia Fernanda Barbosa Gomes

CONSELHO EDITORIALAlexandro Oto HanefeldAmilton Maciel MonteiroAntonio de Souza Teixeira JúniorAntônio dos Santos LopesCláudio Roland SonnenburgÉlcio NogueiraElizabeth Moraes LiberatoFrancisco José de Castro PimentelFrancisco Pinto BarbosaFrederico Lencioni NetoHeitor Gurgulino de SouzaJair Cândido de MeloLuiz Carlos Scavarda do CarmoMarcos Tadeu Tavares PachecoMaria da Fátima Ramia ManfrediniMaria Tereza Dejuste de PaulaPaulo Alexandre Monteiro de FigueiredoRosângela TarangerSamuel Roberto Ximenes CostaVera Maria Almeida Rodrigues Costa

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PALAVRA DO REITOR

A nossa função, com a publicação desta Revista, é possibilitar o exercício de análisede problemas, de alguma forma ligados ao ensino e à pesquisa, no âmbito do ensinouniversitário, a nossos docentes e, em alguns casos, a discentes.

Os temas são livres, dentro das normas de proporcionar a comunicação de temasligados às atividades universitárias, estando abertas as possibilidades de contribuidoresexternos apresentarem sua criatividade.

Dentro do trinômio Ensino – Pesquisa – Extensão, há muito o que abordar. E asuniversidades, cada vez mais, alargam sua missão de atender aos anseios de sua comunidademais próxima, quer adequando seus cursos de modo a atender as demandas de profissionaisnecessários, quer direcionando as pesquisas aplicadas para proporcionar melhor qualidadede vida à população e, via extensão, praticar a inclusão social, indo até onde as carências sãomaiores, mediante carretas-oficinas, com todo equipamento necessário.

Repete-se o adágio de ir à montanha, sem esperar que ela, não vindo até nós, tenhamosa desculpa para o não atendimento da população distante.

E esta missão é cada vez mais amplificada, como agora, ao sermos instados aproporcionar atendimento jurídico, não só como até agora, praticada no prédio da Faculdadede Direito, mas indo às periferias pobres da cidade, aos bolsões de exclusão social, paraatender aos anseios de assistência jurídica da população mais desassistida.

Baptista Gargione Filho, Prof. Dr.Reitor da Univap

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EDITORIAL

Somos seres sociais. É sempre importante que nos reunamos, expressemos o quesentimos, ajudemos os nossos semelhantes e sejamos por eles assistidos.

A comunicação escrita, proporcionada pela Revista Univap revela, muitas vezes,aspectos insuspeitados de pessoas fisicamente tão próximas.

E, muitas vezes, somos obrigados a extrapolar o limite imposto às discussões de umaRevista que se pretende baseada em princípios, leis e conceitos duramente conquistados naáspera luta pelo melhor entendimento do universo constituído por matéria, espaço e tempo eextrapolar para discussões filosóficas ou religiosas. Pode-se argumentar que todas estasdiscussões são frutos de criaturas sujeitas às leis da natureza e que seus neurônios, nofundo, obedecem a forças e energias e, portanto, as leis de Newton e de Maxwell estão presentese que o pensamento e as abstrações provêm sempre de algo concreto, formulando modelosque têm a ver com a ciência.

Seja como for, o importante é que cada um seja livre para interpretar. E interpretar é aforma mais clara de ultrapassar os limites do simples conhecimento e tentar penetrar em umnovo e prodigioso universo, o do entendimento.

Aos autores, portanto, dos artigos contidos neste número da Revista, os nossosagradecimentos pelo esforço de externarem o que internalizaram, proporcionando a muitosnovas oportunidades de entender este mundo que pode ser maravilhoso, se entendido.

Antonio de Souza Teixeira Júnior, Prof. Dr.Pró-Reitor de Integração Universidade - Sociedade

e Vice-reitor da UNIVAP

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A FUNDAÇÃO VALEPARAIBANA DE ENSINO (FVE) E AUNIVERSIDADE DO VALE DO PARAÍBA (UNIVAP)

A Fundação Valeparaibana de Ensino (FVE), com sede àPraça Cândido Dias Castejón, 116, Centro, na cidade deSão José dos Campos, Estado de São Paulo, inscrita noMinistério da Fazenda sob o nº 60.191.244/0001-20, Ins-crição Estadual 645.070.494-112, é uma instituição filan-trópica e comunitária, que não possui sócios de qual-quer natureza, com seus recursos destinados integral-mente à educação, instituída por escritura pública de 24de agosto de 1963, lavrada nas Notas do Cartório do 1ºOfício da Comarca de São José dos Campos, às folhas93 vº/96 vº, do livro 275.

A Universidade do Vale do Paraíba (UNIVAP), mantidapela FVE, tem como área de atuação prioritária o DistritoGeoeducacional, DGE-31. Sua missão é a promoção daeducação para o desenvolvimento da Região do Vale doParaíba e Litoral Norte (DGE-31).

Até o presente, a UNIVAP possui os seguintes Campi:

a) Campus Centro, em São José dos Campos, situado àPraça Cândido Dias Castejón, 116, e à Rua Paraibuna,75.

b) Campus Urbanova, situado à Av. Shishima Hifumi, 2911.c) Campus Urbanova/Jacareí, com acesso pela Av.

Shishima Hifumi, 2911.d) Campus Aquarius, em São José dos Campos, situado

à Rua Dr. Tertuliano Delphim Júnior, 181.e) Campus Villa Branca, localizado em Jacareí, na Estrada

Municipal do Limoeiro, 250.f) Campus Platanus, localizado em Campos do Jordão,

na Av. Frei Orestes Girardi, 3.g) Unidade Caçapava,na Estrada Municipal Borda da

Mata, 2020.

A Educação Superior, objetivo da UNIVAP, abrange oscursos e programas a seguir descritos:

1) Graduação, abertos a candidatos que tenham con-cluído o ensino médio ou equivalente e que tenhamsido classificados em processo seletivo.

2) Pós-graduação, compreendendo programas deMestrado, Doutorado, Especialização e outros,abertos a candidatos diplomados em cursos de gra-duação e que atendam aos requisitos da UNIVAP.

3) Extensão, abertos a candidatos que atendam aosrequisitos estabelecidos pela UNIVAP.

4) Educação a distância, com uso de novas tecnologiasde comunicação.

5) Formação tecnológica, com formação de tecnólogosem nível de 3º grau.

A FVE é também mantenedora, tendo em vista a educa-ção integral dos futuros alunos da UNIVAP, de cursos deEducação Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Médio eainda de Formação Profissional e Técnica.

A UNIVAP, em seu Projeto Institucional, centra-se:

1) numa função política, capaz de colocar a educaçãocomo fator de inovação e mudanças na Região doVale do Paraíba e Litoral Norte - o DGE-31;

2) numa função ética, de forma que, ao desenvolver asua missão, observe e dissemine os valores positi-vos que dignificam o homem e a sua vida em socie-dade;

3) numa proposta de transformação social, voltadapara a Região do Vale do Paraíba e Litoral Norte;

4) no comprometimento da comunidade acadêmica como desenvolvimento sustentável do País e, emespecial, com a Região do Vale do Paraíba e LitoralNorte, sua principal área de atuação.

A UNIVAP está em permanente interação com agentessociais e culturais que com ela se identificam. Como de-corrência da demanda de seus cursos ou dos serviçosque presta, estabelece convênios com instituiçõespúblicas e privadas, no Brasil e no Exterior. Estesconvênios resultam na cooperação técnica e científica,na qualificação de seus recursos humanos e tecnoló-gicos, na viabilização de estágios acadêmicos e naprestação de serviços. A história da UNIVAP, enraizadana trajetória da Região do Vale do Paraíba e Litoral Norte,traz consigo a marca da participação comunitária, a partirdo compromisso que tem com a sociedade regional,alicerçado na tradição, na busca da excelência acadêmica,na qualidade de seu ensino, no diálogo com a comunidadee no exercício da tríplice função constitucional deassegurar a indissociabilidade da pesquisa institucional,ensino e extensão.

Como atividades de extensão, destacam-se, na UNIVAP,aquelas relativas à Comunidade Solidária, que têm porobjetivo mobilizar ações que contribuam para a alfabeti-zação e melhoria da qualidade de vida de populaçõescarentes. Dentro deste Programa, foram realizadasatividades nas áreas de Saúde, Higiene, Cidadania, Edu-cação e Lazer, em Santa Bárbara (BA), Beruri (AM),Teotônio Vilela (AL), Nova Olinda (CE), Coreaú (CE),Carnaubal (CE), São Benedito (CE), Groaíras (CE), Atalaiado Norte (AM), Pão de Açúcar (AL) e, no Vale do Paraíba,nas cidades de Monteiro Lobato, São Bento do Sapucaí,Paraibuna, São Francisco Xavier e São José dos Campos.

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Todas as pesquisas institucionais da Universidade es-tão centradas em seu Instituto de Pesquisa e Desenvol-vimento (IP&D), o qual executa programas e projetos econgrega pesquisadores de todas as áreas da UNIVAP,envolvidos em atividades de pesquisa, desenvolvimen-to e extensão. Em seus oito núcleos de pesquisa, nasáreas sócio-econômica, genômica, instrumentaçãobiomédica, espectroscopia biomolecular, estudos e de-senvolvimentos educacionais, ciências ambientais etecnologias espaciais, computação avançada, biomé-dicas, atrai e dá condições de trabalho a pesquisadoresde grande experiência, do País e do exterior. Os alunostêm condições de participar, com os professores, depesquisas, executando tarefas criativas, motivadoras, quepropiciam a formulação de modelos e de simulações,trabalhando com equipamentos de primeira linha, e istofaz a diferença entre a memorização e a compreensão.Bolsas de estudo vêm sendo oferecidas a alunos e

pesquisadores, quer pela UNIVAP, quer por instituiçõescomo CAPES, CNPq, FINEP e FAPESP.

O esforço da UNIVAP em construir, no CampusUrbanova, uma Universidade com instalações especiaispara cada área de atuação, com atenção especial aos la-boratórios, tem por objetivo um ensino de qualidade,compatível com as exigências da sociedade atual.

A UNIVAP, para o ano letivo de 2006, fiel ao lema de que“o saber amplia a visão do homem e torna o seu caminharmais seguro”, oferece à comunidade da Região do Valedo Paraíba e Litoral Norte o seguinte Programa, de seusdiversos cursos, que vão desde a Educação Infantil àPós-Graduação, passando inclusive pelo Colégio Técni-co Industrial e pela Faculdade da Terceira Idade.

- Administração de Empresas e Negócios- Arquitetura e Urbanismo- Biomedicina- Ciência da Computação- Ciências Biológicas- Ciências Contábeis- Ciências Econômicas- Ciências Sociais- Direito- Educação Física- Enfermagem- Engenharia Aeroespacial- Engenharia Ambiental- Engenharia Biomédica- Engenharia Civil- Engenharia da Computação- Engenharia de Materiais- Engenharia Elétrica

- Farmácia- Fisioterapia- Geografia- História- Jornalismo- Letras- Matemática- Normal Superior- Nutrição- Odontologia- Pedagogia- Publicidade e Propaganda- Rádio e TV- Secretariado Executivo- Serviço Social- Terapia Ocupacional- Turismo

- Doutorado

- Engenharia Biomédica

- Mestrado

- Bioengenharia- Ciências Biológicas- Engenharia Biomédica- Planejamento Urbano e Regional

- Especialização - Lato-Sensu

- Administração e Planejamento da Educação- Computação Aplicada- Comunicação Empresarial- Dentística Restauradora- Direito Processual- Gestão Ambiental- Gestão Empresarial- Neurologia Funcional- Odontopediatria- Psicopedagogia- Saúde da Família- Terapia Familiar

CURSOS DE GRADUAÇÃO

CURSOS DE PÓS-GRADUAÇÃO

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São José dos Campos

Com cerca de 600.000 habitantes, São José dos Camposé o município com maior população na sua região, sendoque seu grande desenvolvimento começou realmente coma construção da Rodovia Presidente Dutra e do CentroTécnico Aeroespacial (CTA). Além disso, a localizaçãoestratégica e privilegiada entre São Paulo e Rio de Janei-ro e a topografia apropriada para a construção de grandesindústrias possibilitaram que a cidade crescesse vertigi-nosamente na década de 70, passando a ser uma dasáreas mais dinâmicas do Estado e a terceira maior taxa decrescimento da década de 80. De 1993 para cá, a cidadepassou por grandes transformações, alcançando avan-ços na área da saúde, desenvolvimento econômico, edu-cação, criança e adolescente, saneamento básico e obras.

O comércio de São José dos Campos é bastante desen-volvido e vive um período de extensão, com vários cen-tros de compras e grandes supermercados e ShoppingCenters. Com mais de 800 indústrias, 4.000 estabeleci-mentos comerciais e superando 7.000 prestadores deserviço, o perfil industrial de São José dos Campos temdois lados distintos: o centralizado nas áreas aeroespaciale aeronáutica, como a Embraer, e outro diversificado, comindústrias, como a General Motors, Johnson & Johnson,Petrobras, Rhodia, Monsanto, Kodak, Panasonic, Hitachi,Bundy, Ericsson, Eaton e outras. É o quarto municípiodo Estado de São Paulo em arrecadação e ICMS, atrásapenas da capital, Santo André e Campinas.

São José dos Campos possui, como resultado da atuaçãode suas indústrias, dos estabelecimentos comerciais e

dos organismos que desenvolvem tecnologias de ponta,mão-de-obra de altíssimo nível. Entre esses órgãos des-tacam-se o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais(INPE), o Centro Técnico Aeroespacial (CTA), com seusInstitutos: ITA - Instituto Tecnológico de Aeronáutica,IAE - Instituto de Atividades Espaciais, IFI - Instituto deFomento e Coordenação Industrial e o IEAv - Institutode Estudos Avançados.

Com uma vida cultural bastante intensa, o município contacom uma Fundação Cultural e vários espaços culturais,como o Museu Municipal, galerias de arte, centros deexposição, casas de cultura, Teatro municipal, Cine-Tea-tro Benedito Alves da Silva, Cine-Teatro Santana e oTeatro Univap Prof. Moacyr Benedicto de Souza,cinemas, emissoras de rádio FM e AM, Central Regionalda TV Globo, jornais diários com circulação regional,além dos da capital, e várias Bibliotecas Escolares,Universitárias e de Pesquisa, como a da UNIVAP, a doINPE e a do ITA.

A UNIVAP constitui, além do CTA e do INPE, o maiorcentro de ensino e pesquisa do município. Da Pré-Escolaà Universidade, além de Cursos de Pós-Graduação e daTerceira Idade, a UNIVAP mantém o IP&D - Instituto dePesquisa e Desenvolvimento, que garante a incorpora-ção da pesquisa na comunidade acadêmica da UNIVAP,permitindo a indissociabilidade entre o ensino e a pes-quisa. A UNIVAP tem estado aberta à interação com em-presas e instituições do município, notadamente as deensino e pesquisa, entre elas o INPE e o CTA-ITA, deonde são provenientes o reitor, pró-reitores e vários pro-fessores.

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Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 13

Perspectivas Valorativas na Predição do RendimentoEscolar: um estudo a partir dos valores humanos

Nilton Soares Formiga *

Resumo: Os valores humanos têm sido um dos construtos mais estudados nas ciências humanas esociais. Na educação, tal tema vem tomando força a cada momento, seja por parte dos especialistasou por leigos, pois parte do pressuposto de que os valores são guias do comportamento humano,sendo capazes de indicar a melhor conduta para viver em sociedade ou grupos. Foi observado quea função psicossocial e o critério de orientação, salientado no modelo teórico dos valores humanosbásicos, foram capazes de predizer alguns indicadores do rendimento escolar (autoconceito doestudante e horas dedicadas ao estudo). Assim, considerando tanto a estrutura teórica quanto aaplicação dos valores aqui abordados, é possível que o rendimento escolar dos alunos apresentemuma melhoria, bem como o desenvolvimento interpessoal entre os jovens frente ao êxito e qualifica-ção escolar.

Palavras-chave: Rendimento acadêmico, valores humanos, predição de comportamento.

Abstract: Human values have been one of the most studied constructs in the human and socialsciences. In the area of education, this theme has been steadily gaining force, among both specialistsand non-specialists, since it presupposes that values are guides for human behavior and thereforecapable of indicating the best conduct for group and social life. It has been observed that psychosocialfunction and the criterion of orientation, emphasized in the theoretical model of basic humanvalues, have been capable of predicting some indicators of school achievement (the student´s self-concept and hours dedicated to study). Thus, while considering theoretical structure or theapplication of the values studied here, it is possible that student´s scholastic achievement presentsan improvement as does also the interpersonal development among the young in relation to schoolqualification and success.

Key words: Academic achievement, human values, behavior of prediction.

* Mestre em Psicologia Social pela Universidade Fede-ral da Paraíba.

E-mail: [email protected]

1. INTRODUÇÃO

Dos vários temas de pesquisa em que os valoreshumanos têm sido estudados, a educação tem merecidodestaque, haja vista o seu insistente aparecimento namídia e as diversas discussões geradoras da qualifica-ção do ensino e formação cultural entre os jovens. NosPCNs (1998) este construto é considerado um tema trans-versal, podendo-se inseri-lo sem nenhum problema tan-to no plano pedagógico e prática de ensino quanto ematividades extra-escolares propiciadas pela escola, apon-tando, assim, em direção da conjunção das díades basesdo êxito escolar: ensino-aprendizagem, professor-alunoe escola-sociedade; não mais partindo de uma diretrizlinear e unilateral (INOUE; MIGLIORI; D´AMBRÓSIO,1999), mas da sua multidisciplinariedade. Para isso, a pers-

pectiva dos valores é capaz de orientar os comportamen-tos dos estudantes (FORMIGA; GOUVEIA; QUEIROGA;LISLE JÚNIOR; CUNHA, 2001), principalmente, quandorelacionado aos construtos de orientação normativa, porexemplo, a educação cooperativa (NIQUINI, 1999), naqual o sujeito acontece nas relações e não no vazio e demaneira individual e isolada.

Quanto aos valores humanos, muitos são osenfoques apresentados sobre este tema, da sua função àestrutura, considerando sua relatividade ou universali-dade (GOUVEIA, 1998). No Brasil, educadores e pesqui-sadores que abordam e investem na implementação ereflexão sobre esse construto têm enfatizado uma linhafilosófica; é possível encontrar, no trabalho de Aparecidae Silva (1986), Inoue, Migliori e D’Ambrosio (1999) umabusca na operacionalização dos valores, porém,permeando dimensões filosóficas e abstratas quanto àmanipulação desse construto e sua aplicação à condutasócio-escolar. Desta forma, poucos estudos são encon-trados no País que abordem valores e rendimento esco-

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lar (INDEX PSI, 2003) empiricamente, seja na compreen-são de relação ou predição de variáveis.

Vale destacar que numa recente pesquisa de tipocorrelacional, Formiga, Queiroga e Gouveia (2001) avali-aram a relação dos indicadores do rendimento escolar(por exemplo, horas dedicadas ao estudo e autoconceitodo estudante) e os valores humanos, encontrando osseguintes resultados: as funções psicossocais dos valo-res (normativa, suprapessoal e interacional, as quais ca-racterizam uma dimensão coletivista) se relacionaram di-retamente com o autoconceito do estudante e as horasdedicadas ao estudo; já as funções (existência, experi-mentação e realização, representando o individualismo)apresentaram relações baixas, neutras e negativas. Comisso, observou-se que os valores que visam a inter-rela-ção, o grupo e o cumprimento das normas sociais de-monstram uma maior probabilidade em concretizar algunsindicadores do êxito escolar, bem como a formação cultu-ral e humana. Porém, apesar de esses resultados permiti-rem uma compreensão explicativa entre essas variáveis,neles existe apenas a relação de causa e efeito propostapelo cálculo de correlação de Pearson e não umaprevisibilidade funcional, a fim de avaliar um poderpreditivo entre as variáveis independentes e dependen-tes. Ao fazer referência à predição de variáveis, a partirde indicadores psicométricos através do cálculo da aná-lise de regressão, busca-se a elaboração de modelo teó-rico sobre o fenômeno estudado (BABBIE, 2001; BAR-BOSA, 1997).

Sendo assim, de modo geral os valores humanostêm sido definidos como critérios que guiam o comporta-mento, desenvolvimento e manutenção das atitudes emrelação às pessoas, eventos etc. (TAMAYO, 1988). Talconstruto é destacado pelos teóricos como uma das di-mensões de grande importância na predição do compor-tamento humano. Lima (1993) considera os valores comouma dimensão explícita de preferências e até de avalia-ção cognitiva. Rokeach (1981) acredita que a formaçãodos valores está sustentada em conteúdos cognitivos eafetivos, podendo, assim, determinar o comportamentodo sujeito ou grupo. Já para Schwartz (1992; SCHWARTZ;BILSKY, 1987; TAMAYO; SCHWARTZ, 1993) eles sãoexpressos através de tipos motivacionais, que, por suavez, são universais. Sabendo da diversidade de teoriassobre os valores (GOUVEIA, 1998), pretende-se adotaruma perspectiva alternativa, a qual parte da seguintedefinição: os Valores Humanos são como categorias deorientação consideradas como desejáveis, baseados nasnecessidades humanas e nas pré-condições parasatisfazê-las, adotadas por atores sociais, podendo va-riar quanto à sua magnitude e aos elementos que adefinem (GOUVEIA, 1998, p. 293).

Para considerar tal definição, é necessário tomar

como referência a teoria das necessidades de Maslow(1954 / 1970), as quais têm os seguintes fundamentos: (1)as necessidades humanas são relativamente universais;(2) são neutras ou positivas; (3) obedecem a uma hierar-quia; (4) o homem caminha em direção à auto-realização;e (5) a pessoa é um todo integrado e organizado. Emfunção dessa teoria, identificaram-se 24 valores básicos,que são terminais por natureza e expressam princípios-guia, sendo vistos como substantivos (ROHAN, 2000;ROKEACH, 1973). Estes servem de categorias transcen-dentes que guiam as atitudes, as crenças e os comporta-mentos em situações específicas. Estes 24 valores dãoorigem a um sistema de valor, apresentando três critériosde orientação, que contemplam cada um duas funçõespsicossociais, descritas a seguir:

Valores Pessoais. As pessoas que normalmenteassumem estes valores mantêm relações pessoaiscontratuais, geralmente procurando obter vantagens / lu-cros. A pessoa prioriza seus próprios interesses e concedebenefícios sem ter em conta uma referência particular (pa-pel ou estado). Para Rokeach (1973) estes valores são vis-tos como tendo um foco intrapessoal. Em Schwartz (1994)tais valores atendem a interesses individuais. Conside-rando a sua função psicossocial, estes podem ser dividi-dos em: (1) Valores de Experimentação: descobrir e apre-ciar estímulos novos, enfrentar situações arriscadas e pro-curar satisfação sexual são aspectos centrais destes valo-res (emoção, estimulação, prazer e sexo); e (2) Valores deRealização: além da experimentação de novos estímulos,faz parte do universo desejável dos seres o autocumpri-mento, o sentimento de ser importante e poderoso, seruma pessoa com identidade e espaço próprios(autodireção, êxito, poder, prestígio e privacidade).

Valores Centrais. A expressão “valores centrais”é usada para indicar o caráter central ou adjacente destesvalores; eles figuram entre e são compatíveis com os valo-res pessoais e sociais, estes tratados a seguir. Em termosda tipologia de Schwartz (1990, 1994), tais valores servema interesses mistos (individuais e coletivos). Consideran-do a sua função psicossocial, os valores centrais podemser divididos em dois grupos: (1) Valores de Existência:interessa garantir a própria existência orgânica (estabili-dade pessoal, sobrevivência e saúde). A ênfase não estána individualidade pessoal, mas na existência do indiví-duo. Assim, valores de existência não são incompatíveiscom valores pessoais e sociais. Eles são importantes parapessoas, principalmente em ambientes de escassez eco-nômica, mas sem colocar em risco a harmonia social; e (2)Valores Suprapessoais. Pessoas que assumem estes va-lores tentam atingir seus objetivos independentemente dogrupo ou condição social. Tais valores descrevem alguémque é maduro, com preocupações menos materiais, nãosendo limitado a características descritivas ou específicaspara iniciar uma relação ou promover benefícios (beleza,

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justiça social, maturidade e sabedoria). Estes valoresenfatizam a importância de todas as pessoas, não exclusi-vamente dos indivíduos que compõem o in-group. Por-tanto, são compatíveis com valores pessoais e sociais.Embora Rokeach (1979) use a expressão valores supra-individuais, ele não se refere ao mesmo conteúdo aquiabordado. Espera-se que os tipos motivacionais seguran-ça e universalismo, propostos por Schwartz (1992),correlacionem-se com as funções psicossociais existên-cia e suprapessoal, respectivamente.

Valores Sociais. As pessoas que assumem estesvalores estão direcionadas para estarem com os outros.No estudo de Rokeach (1973), correspondem a valoresde foco interpersonal, e em Schwartz (1994) estão incluí-dos entre os valores relacionados com os interesses co-letivos. Tais valores são assumidos por indivíduos quese comportam como alguém que gosta de ser considera-do; que deseja ser aceito e integrado no in-group, ouque pretende manter um nível essencial de harmonia en-tre atores sociais num contexto específico. Consideran-do sua função psicossocial, estes podem ser divididosem: (1) Valores Normativos: enfatizam a vida social, aestabilidade do grupo e o respeito para com os símbolose padrões culturais que prevaleceram durante anos. Aordem é apreciada mais que tudo (obediência, ordemsocial, religiosidade e tradição); e (2) Valores deInteração: estes focalizam o destino comum e a compla-cência. Especificamente, a pessoa que os assume teminteresse em ser amada e ter uma amizade verdadeira,assim como tende a apreciar uma vida. Com isso, nestetrabalho pretende-se avaliar o poder predito das funçõespsicossociais e os critérios de orientação valorativa frenteaos indicadores do rendimento escolar (horas dedicadasao estudo e autoconceito do estudante).

2. METODOLOGIA

AmostraParticiparam desta pesquisa 530 alunos distribuí-

dos entre o ensino fundamental e médio, sendo a maioriado sexo feminino (55%) e com uma média de idade de 15,21anos. A amostra foi não-probabilística, podendo ser defi-nida como intencional, pois foram consideradas as pesso-as que, consultadas, dispuseram-se a colaborar, respon-dendo o questionário que era apresentado.

InstrumentoOs participantes responderam a um questionário

constando de duas partes: Questionário dos valores bá-sicos e indicadors do rendimento escolar.

Para a caracterização Sócio-Demográfica, uma fo-lha separada foi anexada ao instrumento prévio, ondeeram solicitadas informações de caráter sócio-demográfico (por exemplo, idade, sexo etc.).

Questionário dos Valores Básicos – QVB. Umaversão inicial foi proposta em Espanhol e Português,compreendendo então 66 itens, três por cada um dos valo-res básicos que avaliava (GOUVEIA, 1998). Utilizou-se umaversão modificada, cuja comprovação, a partir de uma aná-lise fatorial confirmatória, apresentou parâmetrospsicométricos aceitáveis na população estudada, tendoos seguintes indicadores de bondade de ajuste: χ2/gl =3,02, GFI = 0,91, AGFI = 0,89 e RMSR = 0,07 (MAIA, 2000).Formado por 24 itens-valores, com etiquetas que ajudam aentender o seu conteúdo (por exemplo, Tradição– seguiras normas sociais do seu país; respeitar as tradições dasua sociedade; Êxito – obter o que se propõe; ser eficien-te em tudo que faz; Justiça Social – lutar por menor dife-rença entre pobres e ricos; permitir que cada indivíduoseja tratado como alguém valioso); para respondê-los, apessoa deveria avaliar o seu grau de importância como umprincípio-guia na sua vida e indicar sua resposta numaescala de sete pontos, com extremos 1 = Nada Importantea 7 = Muito Importante.No final precisava indicar o valormenos e o mais importante de todos, os quais receberiampontuações 0 e 8, respectivamente.

Indicadores do rendimento escolar: foi compostopelas seguintes questões: a) quntas horas dedicadas aoestudo quando fora do colégio; o sujeito deveria indicar,em um espaço pontilhado no final da pergunta, quantashoras se dedica ao estudo quando não estava no colégio;b) a sua autopercepção de como ele é como estudante.Nesta, o sujeito deveria responder o quanto ele se consi-derava como estudante, adotando uma escala que variavade 0 = Péssimo a 5 = Excelente.

ProcedimentoProcurou-se definir um mesmo procedimento pa-

drão o qual consistia em aplicar o questionário de valo-res básicos e os indicadores do rendimento escolar cole-tivamente em sala de aula. Um único pesquisador ficouresponsável pela coleta dos dados; após conseguir aautorização da diretoria do colégio e, posteriormente, doprofessor responsável pelas aulas, o pesquisador se apre-sentava como interessado em conhecer as opiniões e oscomportamentos das pessoas no dia a dia, solicitando acolaboração voluntária dos estudantes no sentido deresponderem um questionário breve. Dizia-lhes que nãohavia respostas certas ou erradas, e que respondessemindividualmente, como também assegurando o anonima-to das suas respostas, que seriam tratadas em seu con-junto. Apesar de o questionário ser auto-aplicável, con-tando com as instruções necessárias para que possamser respondidos, o pesquisador esteve presente durantetoda a aplicação para retirar eventuais dúvidas ou reali-zar esclarecimentos que se fizessem indispensáveis. Umtempo médio de 20 minutos foram suficientes para con-cluir essa atividade.

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Tal estudo pretende contribuir com as perspecti-vas teóricas sobre valores e educação; isto não invalidaa reflexão filosófica e epistemológica desse fenômeno; oque se buscou aqui foi propor um modelo teórico visan-do facilitar o trabalho de professores e pesquisadores naárea. Merece, também, ser destacado que esses resulta-dos corroboram os estudos de Formiga et al. (2002), emrelação ao tipo de orientação cultural e rendimento esco-lar e de Niquini (1999; OVEJERO; MORAL; PASTOR,2000), sobre interdependência social e aprendizagem co-operativa; esses autores defendem a importância de umadinâmica mais participativa e de cooperação, porém nãoinibindo as dimensões individuais do sujeito educacio-nal, limitando, assim, seu isolamento e egocentrismo in-telectual aguçado, por exemplo, na busca de êxito e com-petição comparativa desenfreada.

O fato está em tornar capaz uma formação ética esocial entre rendimento escolar e jovem estudante; poisa contribuição de alunos com melhor desempenho nãosomente daria um desenvolvimento e maturidade da ma-nutenção e instrumentalidade das relações sociais e per-cepção dos limites culturais e intelectuais entre eles, comotambém contribuiria na auto-valorização deste ensinantee no seu aperfeiçoamento de estudo e relações sociais.Parece ser que essa condição dissolveria a imagem-este-reótipo de que o inteligente e ‘gênio’ seria aquele sozi-nho, na primeira cadeira da sala e na frente do (a) profes-sor (a), discutindo sobre tudo, ou isolado completamen-te, melancólico e sem contato grupal.

Mesmo visando uma perspectiva de educaçãopsicossocial, isso não permite a eliminação do indivíduodo seu contexto, passando a cair mais uma vez no debate:que vem primeiro, o indivíduo ou a sociedade, a educaçãoou o aluno, a prova ou o êxito etc. Considerar uma educa-ção que forme e seja formada é algo essencial para a dinâ-mica entre escola e sociedade, já que tais realidades nãoacontecem no vácuo, mas, nas relações (CHARLOT, 2000;NIQUINI, 1999; CAMINO, 1996) e complexidade da forma-ção social e de comportamento político-educacional. Nocontexto ensino-aprendizadem, tudo pode acontecer, o serconhecido, conhecer e reconstruir, podendo garantir queno saber humano falta apenas uma orientação e esta pode-ria ser definida pelos valores humanos.

Apesar das dificuldades que a educação vem en-frentando, tanto na sua qualidade quanto no mau empregoda quantidade especializada, uma das soluções para os pro-blemas educacionais tão clássicos, considerando este es-tudo, estaria na aplicação dos valores humanos como inter-venção para o rendimento escolar, bem como a extinção darepetência e do analfabetismo cultural-científico, buscan-do, antes de tudo, uma formação ética e interdisciplinar(DISKIN et al., 1998).

Os estudos sobre valores oferecem consideradaimportância em relação ao rendimento escolar, uma vezque foi possível observar o poder preditivo para as horasdedicadas ao estudo e o autoconceito do estudante frenteaos critérios valorativos que prezam pela normatização,disciplina e relações interpessoais. Definir qual o melhorcaminho na solução desse problema educacional permitereflexões aprofundadas: desde políticas educacionais esuas verbas, individualidade de cada aluno (inteligência,motivação etc.) à instrumentalidade do ensino.

Por fim, a aplicação deste construto na área edu-cacional contribuiria na formação de questões, além dasaqui tratadas, outras propostas pelos PCNs, bem comoconhecer tanto sua relação com o rendimento e outrostemas, quanto sua hierarquia visando a construção dadinâmica do processo ensino-aprendizagem vivido naescola (FORMIGA; QUEIROGA; GOUVEIA, 2001). Des-ta maneira, além de corroborar os resultados encontra-dos em outros estudos desenvolvidos por Formiga et al.(op. cit; FORMIGA, 2002; FORMIGA, 2004), um estudoposterior que se centra-se trata-se do confronto dos va-lores humanos para mudança de comportamento escolar(CEIS, 1998; GRACIA, 1987; ROS et al., 1996) seria muitosignificativo; pois, para esses autores, o objetivo nosseus trabalhos consiste em incentivar a intervenção emalguns valores, salientando os que, teoricamente, pro-movessem disciplina e afetassem, positivamente, o ren-dimento dos alunos, já que consideramos que todos te-mos valores, e que o problema estaria entre as priorida-des valorativas que cada um de nós apresentamos; pois,considerando o contexto, não somente se exige, comotambém, é exigido que certos valores se mantenham. Pa-ralelamente a este processo, busca-se melhorar as rela-ções família-aluno-professor, fator que também é decisi-vo para manutenção e estabilidade atitudinal ecomportamental do estudante com base na sua formaçãovalorativa.

4. NOTAS

(1) A utilização desse método se deve à existênciade razões teóricas que possibilitam elaborar hipótesesque contribuam na predição dos valores em relação aofenômeno questionado (os indicadores do rendimentoescolar).

(2) Este critério concebe um indivíduo maduro eque atende tanto aos seus interesses individuais quantoaos do coletivo, sem prejudicar excessivamente a ambos.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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A Especialização de Professores a Distância: análise deuma experiência

Sonia Sirolli *Maria Tereza Dejuste de Paula *

Resumo: A disponibilidade de novos recursos tecnológicos de informação e comunicação tem provo-cado o desenvolvimento de novas estratégias de ensino e de formação. A educação/aprendizagem àdistância tem sido utilizada desde a década de 30 no Brasil e na atualidade reveste-se de importânciapara as questões educacionais, entre elas, a de formação dos professores. O presente estudo tem porobjetivo descrever, na perspectiva de duas participantes, um curso de especialização em Avaliação,oferecido a distância, dirigido a professores universitários e realizado pela Universidade de Brasíliaem parceria com a UNESCO. Os participantes do curso eram professores de instituições públicas eprivadas de ensino superior distribuídas geograficamente por todo o território nacional e com perfileducacional que variou de graduação a doutorado. O curso foi realizado através de módulos comestudos de casos e utilizou o correio e o contato telefônico como meio de alcance dos alunos e para oenvio de materiais impressos e vídeos. A avaliação e as orientações tutoriais foram feitas através deencontros presenciais regionais. Os resultados mostraram que dos 868 alunos que iniciaram o curso,a metade evadiu e 434 apresentaram a monografia final.

Palavras-chave: ensino a distância, formação de professores.

Abstract: The availability of new technologies of information and communication has been leadingto the development of new teaching and education strategies. In Brazil, the remote or distanceeducation has been used since the 1930s and today has acquired great relevance to educationquestions, among them there is the teacher’s education. This study aims to describe, from the pointof view of two former students, one graduate course on Evaluation, planned and offered at distanceto university teachers by the Universidade de Brasília in partnership with UNESCO. This coursestudents were university teachers working at public and private universities dispersed by all thecountry whose degrees varied from Bachelor to Doctorate. The course was developed throughmodules based on case studies. The printed material and videos were distributed to the students bymail. There were also telephonic contacts linking the students and the course staff. The learningevaluation and tutorial orientation took place by means of regional and presential meetings. Theresults showed that half of the 868 students enrolled in the course dropped out and 434 had the finalpaper approved.

Key words: distance education, teacher education.

* Professora da UNIVAP.

1. INTRODUÇÃO

A escola tem sido solicitada a mudar para atenderàs novas necessidades da sociedade da informação. Re-quisitos como a educação ao longo da vida, a permanen-te formação profissional e a universalização das oportu-nidades de formação, entre outros, têm provocado a buscade modalidades educacionais capazes de dar conta des-sa nova realidade. A disponibilidade de novas tecnologiasde informação e de comunicação tem oferecido à educa-

ção recursos até então não existentes e que possibilitamo desenvolvimento de novas estratégias capazes de aten-der a essas novas necessidades da tarefa educativa. Aeducação a distância tem sido uma escolha para atenderàs novas demandas do ensino e da formação.

Educar à distância não é um conceito novo. ParaNunes (1993) esse tipo de ensino tem uma longa históriade experimentações, fracassos e sucessos, tendo suaorigem recente nas experiências de educação por corres-pondência iniciadas no final do século XVIII e com largodesenvolvimento a partir de meados do século XIX .

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No Brasil, desde a década de 30, foram desenvol-vidas experiências de ensino a distância com uso dorádio e, alguns anos depois, ocorreram várias outras como uso da correspondência como meio para o ensino, taiscomo a do Instituto Universal Brasileiro e a do Senac. Nofinal da década de 80 e durante a década de 90, houveexpansão da educação a distância no Brasil, principal-mente com uso de fitas e vídeos (ALVES, 2004).

Não sendo um conceito novo, a definição de edu-cação a distância tem passado por mudanças. Os termos,educação a distância, ensino a distância e aprendizagema distância, têm sido usados como sinônimos em algunscontextos, mas, para alguns especialistas, envolvem di-ferentes características e significados.

Para Moran (1994), por exemplo,

educação à distância é o processo de en-sino-aprendizagem, mediado portecnologias, onde professores e alunosestão separados espacial e/ou temporal-mente . É ensino/aprendizagem onde pro-fessores e alunos não estão normalmentejuntos, fisicamente, mas podem estarconectados, interligados por tecnologias,principalmente as telemáticas, como aInternet. Mas também podem ser utiliza-dos o correio, o rádio, a televisão, ovídeo, o CD-ROM, o telefone, o fax etecnologias semelhantes.

O termo ensino a distância é inadequado, paraMoran, já que enfatiza o papel do professor, enquanto otermo educação a distância é mais apropriado, por sermais abrangente.

Outros, como Chaves (1999), argumentam que asexpressões educação a distância e aprendizagem a dis-tância não são adequadas porque tanto a educação comoa aprendizagem ocorrem dentro do indivíduo e, portanto,não podem ser realizadas à distância. Nesse caso, a ex-pressão ensino a distância é mais adequada porque quemestá ensinando está espacialmente distante.

Preti (apud SILVA, 2002) prefere, no lugar de umadefinição de educação a distância, apontar suas caracte-rísticas básicas: educadores e educandos se encontramseparados pelo tempo e/ou espaço, há canaistecnológicos e humanos que individualizam a interaçãoe processos mediatizados, há uma estrutura complexa aserviço dos educandos aliada a subsistemas integradosde comunicação e tutoria, há ainda produção de materi-ais didáticos que buscam promover uma aprendizagemindependente, individualizada e flexível.

Rurato, Gouveia e Gouveia (2004) assinalam algu-mas características importantes da educação a distância,tais como a abertura (diversidade e amplitude de ofertade cursos com eliminação de barreiras e requisitos deacesso, atendendo a uma população numerosa e disper-sa com níveis e estilos de aprendizagem diferenciados);a flexibilidade (de espaço e de tempo, de ritmos de apren-dizagem e diferentes combinações de estudo/trabalho/família); a eficácia (o aluno é motivado a se tornar sujeitoe responsável pela sua própria aprendizagem, a se avali-ar, a aplicar o que aprende); a formação permanente(aquisição de novos conhecimentos, interesses, atitu-des e valores) e a economia (evita deslocamentos eausência total do trabalho).

Para Fonseca (1999), a educação a distância tembase nas práticas pedagógicas avançadas doconstrutivismo, atribuindo importância à autonomia e àindependência do aluno, aspectos que, na sociedade dainformação, têm grande relevo não só do ponto de vistada cidadania como também do trabalho.

No Brasil, a Lei de Diretrizes e Bases da EducaçãoNº 9394, de 1996, no seu artigo 80, reconhece a importân-cia de programas de ensino a distância, ao assinalar queo Poder Público incentivará os esforços para que essesprogramas se intensifiquem em todos os níveis e modali-dades de ensino do Brasil.

Segundo Moran (2004), a educação a distânciano Brasil, em um primeiro momento, foi identificada como ensino por correspondência. Em um segundo momen-to, na década de 80, seu uso foi baseado em sistemas dedistribuição de informação por televisão e vídeo casse-te, usados principalmente para telecursosprofissionalizantes e formadores de estudantes do ensi-no médio e fundamental. Foi a fase que, na visão de Fon-seca (1999), pode ser caracterizada como analógica. Nofinal da década de 90, iniciou-se uma revolução com ouso da Internet. Fonseca (1999) define essa fase como afase digital, caracterizada pelo uso de tecnologias deeducação bidirecionais.

Entre as várias experiências de educação a dis-tância já realizadas e em realização, as de formação conti-nuada de profissionais para as instituições de ensinosuperior são importantes porque podem contribuir paraa qualidade do trabalho educativo dessas instituições.

É objetivo deste trabalho descrever uma experiênciarecente de formação a distância em nível de especialização,representada pelo curso oferecido pela Cátedra UNESCO/Universidade de Brasília sobre avaliação educacional. Oestudo foi desenvolvido a partir da análise da experiênciadas autoras, que foram alunas do curso e fizeram parte deum grupo de 5 profissionais da mesma instituição de ensino

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superior que concluíram o referido programa.

2. DESCRIÇÃO GERAL DO CURSO

Com o objetivo de atualizar profissionais docen-tes e técnico-administrativos de Instituições de EnsinoSuperior brasileiro, foi oferecido, em 1997, pela Universi-dade de Brasília, através da Cátedra UNESCO de Educa-ção a Distância, um curso de especialização em avalia-ção, na modalidade à distância, visando capacitar, em 24meses, cerca de 800 professores e pessoal técnico-admi-nistrativo de instituições privadas e públicas do ensinosuperior. A iniciativa foi uma parceria entre a Universida-de de Brasília, o Ministério da Educação e do Desporto(MEC), o Ministério da Ciência e Tecnologia, a Associa-ção Nacional das Universidades Particulares (ANUP) e aAssociação Brasileira das Mantenedoras do Ensino Su-perior (ABM).

Participaram do curso, como docentes, especialis-tas de universidades brasileiras e de universidades estran-geiras como as de Michigan (E.U.A.) e Kassel (Alemanha).

O curso foi dado em seis módulos ou disciplinas,totalizando trinta e dois créditos. Para completar o curso,o aluno deveria ser aprovado nas disciplinas através deavaliação presencial e elaborar uma monografia sob ori-entação de um dos professores da Cátedra.

As instituições de ensino superior escolheramseus participantes do curso, tendo sido recomendadoque a seleção observasse nos escolhidos motivação, per-sistência e condições de trabalhar com autonomia e in-dependência, características consideradas necessáriaspara um bom desempenho no curso.

O tamanho da clientela atendida pelo curso caracte-rizou uma das vantagens do uso de educação a distânciaque é o elevado número de pessoas que pode atender. Par-ticiparam do curso como alunos, docentes e funcionáriosde instituições de ensino superior públicas e privadas, detodas as regiões do país. O perfil de formação dessa cliente-la incluiu desde a graduação até o doutorado.

Os alunos do curso, que eram, como já menciona-do, também docentes e funcionários das instituições deensino superior participantes, possuíam característicasimportantes a serem consideradas para o aprendizado,tais como o tempo limitado disponível para estudo e ho-rários variados de trabalho, dificultando deslocamentoem horários fixos. A flexibilidade e autonomia oferecidapela estrutura do curso no que se referiu a horário deestudos e de realização das atividades solicitadas aten-deu às características dessa clientela adulta.

O programa do curso abrangeu conteúdos neces-

sários à formação de competências em avaliação na es-cola. Foram abordadas as seguintes temáticas organiza-das em forma de disciplinas: Técnicas e Instrumentos deAvaliação; Avaliação de Disciplina; Avaliação de Currí-culo e de Programas; Acompanhamento e Avaliação doAluno; Avaliação de Docentes e do Ensino e Avaliaçãoem Instituições de Ensino Superior.

3. RECURSOS PEDAGÓGICOS PARA O PROCESSODE ENSINO-APRENDIZAGEM

O curso em tela enquadra-se na modalidade a dis-tância, pois, entre outras características, foi realizado coma mediação de materiais escritos enviados pelo correio,vídeos gravados e a realização de encontros presenciaiscom os tutores. Foi também utilizado o contato telefônicoe o voice mail. O uso desses sistemas convencionais deensino a distância tem a vantagem de atingir clientelas quenão têm acesso a tecnologias eletrônicas mais avançadas,como é o caso do computador e Internet. O curso foiimplementado a partir de 1997 e, seu desenvolvimentoocorreu exatamente no momento anterior à expansão daInternet no Brasil, que se intensificou a partir de 1998.

O curso iniciou-se com seminários presenciaisregionais que tiveram o propósito de apresentar o currí-culo e as estratégias de ensino a serem utilizadas. Osseminários propiciaram aos participantes o conhecimen-to do grupo, o contato com a equipe organizadora docurso e com as instruções relativas ao papel do aluno.

A estrutura do curso foi modular, sendo que oaluno podia contar com textos, fitas de vídeo e ajuda dotutor. Para cada módulo, o aluno recebia, para seu estudoindividual, o material escrito composto de um texto bási-co, um volume de mapas de informação do módulo, umvolume de leituras complementares e um vídeo.

Os textos básicos eram de autoria dos professo-res e produzidos especialmente para o curso. Cada textobásico continha uma introdução em que eram apresenta-dos os objetivos do módulo a que ele se referia, os obje-tivos do texto básico e os textos para leitura. Sua leituraera obrigatória e havia, no final de cada capítulo, suges-tões de leituras facultativas para o aprofundamento dacompreensão do assunto.

Os textos básicos continham também, ao final decada um dos seus capítulos, atividades que deviam serdesenvolvidas pelos alunos. Tais atividades eram com-postas de situações e problemas a serem resolvidos peloaluno através da leitura do material do módulo, da refle-xão e da discussão com o tutor ou com outros alunos.Incluíam também questões de múltipla escolha sobre oconteúdo desenvolvido no módulo.

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Todas as atividades tinham um referencial de res-postas no final do texto para a auto-avaliação do aluno. Nocaso de algumas atividades de resposta aberta havia su-gestões e para outras havia a recomendação de se consul-tar o tutor a respeito da resposta. Este último caso ocorreu,por exemplo, no módulo 4, referente ao Acompanhamento eAvaliação de Alunos, no qual foi solicitado ao aluno queplanejasse um programa de avaliação do discente. No casodesta atividade, foi sugerido que tal plano fosse discutidocom os tutores do curso (HURTADO; SOUZA, 1997).

Em outros casos, as respostas às atividades soli-citadas nos textos básicos deviam ser discutidas com oscolegas. Foi o caso do módulo 6, referente à Avaliação deInstituições de Ensino Superior. Na atividade, solicitava-se ao aluno que discutisse as implicações das funçõespropostas por Cláudio de Moura Castro, para o ensinosuperior, para a avaliação das instituições desse nível deensino (STARK; SOUZA; SOUZA, 1998). Neste caso,havia claramente o objetivo de aprendizagem cooperati-va e co-avaliação. No caso das autoras do presente tra-balho houve discussão a respeito da atividade.

Os textos complementares apresentavam uma li-teratura relevante para a temática de cada módulo. Essaliteratura compunha-se de estudos e pesquisas nacio-nais e estrangeiras, traduzidos, que abordavam eaprofundavam aspectos relacionados ao conteúdo domódulo. Os textos complementares ofereciam também umabibliografia atualizada sobre os conteúdos desenvolvi-dos, o que possibilitava ao aluno buscá-la e ampliar oseu conhecimento.

Como já mencionado, além dos textos básicos edos complementares, o aluno recebia também mapas deinformação. Os mapas de informação são unidades de apre-sentação de informação restritas a um assunto bem defini-do, contém todas as informações que interessam a quemestude o referido assunto, sendo as informações organi-zadas em blocos. Cada bloco contém um aspecto especí-fico com definição, exemplo, ilustração, procedimento etc.Os textos têm as características de hipertexto e contêmsistemas de organização e índices que permitem ao usuá-rio encontrar com rapidez as informações relevantes (DI-CIONÁRIO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA, 2004).

Os mapas de informação foram enviados aos alu-nos em forma de fichas contendo informações sobre obje-tivos, conceitos, metodologias, procedimentos, esquemasteóricos e operacionais, instrumental de coleta e outroselementos teórico-práticos do processo de avaliação edu-cacional, organizados em unidades e tendo em vista sub-sidiar a análise dos casos apresentados nos vídeos.

Cada mapa atendia, assim, a diferentes objeti-vos, apresentando definições, características, comentá-

rios e exemplos de conceitos, como, por exemplo, avalia-ção quantitativa e qualitativa, questionário, planejamen-to e plano de ensino e outros.

O uso dos mapas de informação não somente re-presentou uma mediação entre o aluno e os objetivos aserem alcançados, possibilitando a este a construção doconhecimento a partir da resolução dos casos, como tam-bém uma inovação como estratégia de ensino.

Como também já mencionado, o aluno recebia tam-bém vídeos. Estes representaram uma modalidade dematerial audiovisual cujo objetivo era desencadear o pro-cesso de aprendizagem do módulo através da análise decasos apresentados. Cada caso descrevia uma situaçãode avaliação e solicitava uma análise por parte do alunoque, para ser realizada, demandava estudo dos mapas deinformação, do texto básico e dos complementares. Oscasos funcionavam, assim, como uma motivação para odiálogo do aluno com o conteúdo do módulo, levando-oa realizar uma aprendizagem significativa.

Cada vídeo apresentava a dramatização de 3 situ-ações ou casos que incluíam problemas que deviam serobjeto de reflexão e análise pelo aluno a partir do conteú-do do módulo a que se referiam. Para analisar os proble-mas do caso o aluno deveria recorrer aos mapas de infor-mação, aos textos nele indicados e também aos textossugeridos pela própria análise do problema. Ele poderiatambém realizar uma aprendizagem cooperativa com ogrupo de alunos parceiros do mesmo curso na sua insti-tuição, caso que ocorreu com as autoras do presentetrabalho que se reuniam com os colegas para assistir edebater os casos dos vídeos.

As situações dramatizadas nos vídeos eram seme-lhantes às da vida real e sempre aplicadas ao ensino supe-rior, que era o objetivo de formação do curso. A análise decada caso possibilitava a aplicação de conceitos desen-volvidos em mais de um módulo. Os casos do vídeo cons-tituíam também uma preparação para a avaliação presencialpois, nesta, a partir de casos, o aluno devia relacionar eaplicar os conceitos do módulo em avaliação.

Os vídeos e o material escrito se complementavam,portanto, para a aprendizagem do aluno. Os vídeos grava-dos tiveram também um papel importante na interação entrealunos e a coordenadora do curso pelo fato de que cada umdeles sempre iniciava por uma mensagem dela informandosobre fatos relevantes do curso em desenvolvimento.

4. OS TUTORES

O papel do tutor foi o de ficar acessível ao alunopara orientar, quando necessário, a compreensão dosmateriais dos módulos, o desenvolvimento das ativida-

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des propostas nos textos, a análise dos casos e amonografia. Recorrer ao tutor era uma opção do aluno,não havendo nenhum contato obrigatório. Entretanto,os tutores convidavam os alunos para reuniões coleti-vas realizadas no centro mais próximo, como, por exem-plo, na cidade de São Paulo para os alunos paulistas.Nessas reuniões, dúvidas dos alunos eram superadasatravés de discussões coletivas. Para cada região foramindicados dois tutores para a orientação dos alunos.

A disponibilidade de tutores que podiam seracessados por telefone ou nos encontros presenciaisintroduziu no curso o componente dialógico com o do-cente como parte do processo de construção dos conhe-cimentos pelos alunos.

5. A AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM DO ALUNO

A avaliação da aprendizagem do aluno, do pontode vista somativo, foi realizada através de provaspresenciais que ocorreram nos centros de cada Estado,em intervalos bimestrais e com datas previamenteestabelecidas, invariavelmente aos sábados para aten-der às necessidades da clientela do curso que, como jáfoi salientado, trabalhava.

A realização das provas efetivou-se de maneiraformal e individual em um período de duração de 4 horas.Um fiscal designado pelos organizadores do curso acom-panhava a realização das provas em cada sala.

As provas avaliavam a aprendizagem do alunoatravés de questões centradas em casos semelhantesaos dos vídeos. Os alunos deveriam analisar os casos,apresentando argumentos relacionados ao módulo emavaliação. As provas eram unificadas para todos os alu-nos do curso.

A correção era feita posteriormente pela equipede organizadores do curso e o relatório de resultados eraenviado pelo correio aos alunos após o período médiode um mês.

Os critérios de correção das provas e seus pesos,segundo os relatórios de desempenho enviados ao alu-no, eram:

a)Coerência interna: a justificativa da prescriçãorepresenta claramente uma visão crítica da descrição apre-sentada da situação. Peso 15%.

b) Coerência entre os vários aspectos da prescri-ção – na prescrição feita pelo aluno os vários aspectosda avaliação (objetivo, metodologia e outros) têm rela-ção adequada entre si. Peso: 20%.

c) Aplicação dos conhecimentos construídos aolongo dos estudos no módulo – as respostas e suasjustificativas têm relação direta com o caso relatado eexplicitam conhecimentos a partir dos conteúdos dosmódulos estudados. Peso: 20%.

d) Riqueza de argumentação – as respostas e suasjustificativas têm relação direta com o caso relatado eincluem idéias que traduzem uma perspectiva crítica evariedade de pontos de vista. Peso: 20%.

e) Abrangência da argumentação – as respostasàs perguntas escolhidas pelo aluno têm relação diretacom o caso relatado e incluem tudo o que deveria ter sidodito, nada importante sendo deixado fora. Peso: 20%.

f) Concisão- todo o registro de idéias foi feito comum mínimo de termos, sem repetições ou redundâncias.Peso: 5%.

O resultado da avaliação da prova a partir doscritérios acima, para cada módulo, era dado em forma deconceitos a partir de uma escala de 5 pontos. Os concei-tos utilizados eram: superior, médio superior, médio, mé-dio inferior e insuficiente.

O aluno somente podia passar para o estudo domódulo seguinte se recebesse conceito no mínimo mé-dio na prova do módulo em avaliação. Alunos que rece-bessem conceitos médio inferior ou insuficiente deveri-am fazer uma prova de segunda chamada. Reprovaçãona prova da segunda chamada redundaria em afastamen-to do aluno do curso.

Avaliações formativas ou de processo foram rea-lizadas pelo próprio aluno através da análise do seu pró-prio desempenho nas atividades solicitadas no texto bá-sico, através do confronto das suas respostas com assugeridas, e da auto-avaliação dos resultados do seudesempenho nas provas de cada módulo a partir dosrelatórios recebidos.

6. ALGUNS RESULTADOS DO CURSO

Inscreveram-se no curso 868 alunos. Em termosde evasão, antes do final da primeira disciplina, 19% (165)abandonaram o curso. Do total de inscritos, 519 (59.7%)chegaram até a última disciplina e 51,3% (446) concluírama monografia (PETERSON; SOUZA, 1999). Esses resul-tados indicam que aproximadamente a metade dos alu-nos desistiu do curso até a sua conclusão.

Como parte dos requisitos do curso, além da apro-vação nos módulos, os alunos deviam apresentar umamonografia com o desenvolvimento de um tema relacio-nado ao curso. Nessa etapa, segundo Peterson e Souza

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(1999) 446 alunos apresentaram a monografia. Desses,apenas 1% teve o trabalho reprovado.

Partindo-se do pressuposto de que é importantea análise das áreas escolhidas pelos alunos para a reali-zação das monografias (porque pode-se, através dela,ilustrar as direções dos esforços dos alunos na aplica-ção dos conceitos desenvolvidos no curso e indicar pro-váveis melhorias ou aumento do conhecimento da reali-

dade das suas instituições de origem como decorrênciado curso), foi também desenvolvida neste trabalho umaanálise dos temas das monografias.

Dados apresentados na web (IESB, 2005) sobreas monografias e seus temas foram analisados, mostran-do um total de 434 títulos distribuídos em 8 áreas. Asáreas escolhidas pelos alunos que desenvolveram amonografia são apresentadas na tabela abaixo.

Tabela 1 - Áreas das monografias apresentadas ao final do curso

Área da monografia Nº de

Monografias %

avaliação institucional 103 24,0 avaliação de currículos e de programas 93 21,3 avaliação de docentes e/ou ensino 86 20.0 acompanhamento e avaliação do aluno 80 18,3 avaliação de disciplinas 27 6,2 técnicas e instrumentos de avaliação 26 6,0 Avaliação de políticas públicas ou de políticas em educação 8 4,0 avaliação de egressos 1 0,2 Total 434 100,0

Fonte: IESB, 2005.

A Tabela 1 mostra que, aproximadamente, 83%dos alunos concentraram suas escolhas em temáticasligadas à avaliação no nível da instituição, dos cursos,dos docentes e dos alunos. As temáticas de avaliaçãode disciplinas e de instrumentos de avaliação tiveram ummenor apelo para os alunos. Avaliação de políticas públi-cas e de egressos foram as menos escolhidas.

Os resultados das escolhas centradas na institui-ção, nos programas, nos docentes e nos alunos podemser explicados, em parte, pelo fato de a realização do cur-so de avaliação em análise ocorrer em um período em quea universidade já era vista sob a ótica da avaliação e daprestação de contas para a sociedade. Programas comoo Programa de Avaliação Institucional das Universida-des Brasileiras (PAIUB), conduzido pelo Ministério daEducação, já estavam em ação no país e sinalizavam paraas instituições a necessidade da universidade se subme-ter ao processo de avaliação externa e interna. Muitas jáestavam construindo e submetendo ao referido progra-ma seus planos de avaliação institucional. Havia, por-tanto, necessidade de preparar recursos humanos para atarefa de avaliação institucional.

Muitas das escolhas de monografia deram-se comodecorrência de os alunos já estarem envolvidos em tarefasreferentes a algum tipo de avaliação. Muitos alunos jáfaziam parte, nas suas instituições de origem, das Comis-sões Permanentes de Avaliação, responsáveis, na época,pela avaliação nas Instituições de Ensino Superior

(PETERSON; SOUZA, 1999).

O depoimento abaixo transcrito, de uma aluna docurso, ilustra como as temáticas desenvolvidas no cursose aproximaram da vivência de alunos nas suas institui-ções de origem:

“...gostaria de registrar que a participa-ção nesse Curso de Especialização emAvaliação representou a possibilidade deadquirir, sistematizar conhecimentos e,utilizando esse instrumental teórico, re-fletir sobre um tema que faz parte do meucotidiano em termos profissionais. Os co-nhecimentos adquiridos abriram e ampli-aram meu campo de visão, apontando,para mim, novas perspectivas de análisedas questões de educação” (PETERSON;SOUZA, 1999, p. 11).

7. CONCLUSÃO

Alguns pontos merecem ser destacados na expe-riência do curso em análise:

- A discussão, reflexão, problematização e abor-dagem científica das questões da avaliação no ensinosuperior, tanto de aspectos institucionais como de apren-dizagem, representou uma contribuição significativa paraa formação de docentes e funcionários, tendo em vista a

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qualidade do processo educativo das instituições deensino superior.

- A abordagem utilizada no curso, com o uso daanálise de casos no processo de ensino, caracterizouuma concepção construtivista de aprendizagem. Alémde ser uma inovação, a análise de casos favoreceu umaaprendizagem do conteúdo como um meio para a resolu-ção de problemas e não como um fim em si mesmo, tor-nando-a significativa para o aluno. Muitas vezes, o merouso de tecnologia não caracteriza um avanço no proces-so de ensino, pois pode estar a serviço de uma aborda-gem tradicional na qual o conteúdo é o centro e cabe aoaluno apropriar-se dele através de memorização ou ativi-dades repetitivas. No caso do curso em tela, houve apreocupação com a compreensão do material através daabordagem de estudo de casos. As avaliações tambémforam realizadas através da análise de casos, o que sina-lizava para o aluno a necessidade de compreensão e departicipação ativa no curso.

- A introdução de conceitos inovadores da áreade avaliação na educação, como, por exemplo, o deportfólio como um instrumento de avaliação do aluno eda escola, representou também uma contribuição para oavanço do conhecimento dos alunos na área. O portfólio,como instrumento de avaliação, era pouco conhecidoentre os docentes das instituições de ensino.

- O uso de materiais especialmente produzidospara os objetivos do curso foi uma característica da pre-ocupação com a qualidade do curso que não se limitou asomente selecionar e reproduzir materiais já existentes.Foi o caso dos mapas de informação, dos textos básicose dos vídeos. Os textos complementares foram reprodu-ções de materiais já disponíveis, mas selecionados pelasua alta importância para a complementação da aprendi-zagem dos alunos. Textos dispersos na literatura foramconvenientemente reunidos e oferecidos para os alunos.

- O fato de grupos de pessoas da mesma institui-ção poderem estar no mesmo curso favoreceu a aprendi-zagem colaborativa. No caso da Instituição de EnsinoSuperior de origem das autoras do presente estudo, ha-via um grupo de cinco pessoas no curso, o que possibi-litou uma interação aluno-aluno em vários momentos,quando então eram discutidos os casos e outras ques-tões do curso. Considera-se esse um ponto positivo docurso em análise, pois contrariou o que Azevedo (2000)denominou como uma das maiores dificuldades do ensi-no a distância convencional, que é o isolamento do alu-no que não pode contar com o apoio de um grupo depessoas que estão na mesma situação que ele e não pode,assim, contar com as vantagens de uma aprendizagemcolaborativa.

- A vivência de um curso a distância, como o aquianalisado, com uma abordagem que favoreceu uma apren-dizagem significativa e fez uso dos recursos como umamediação para a construção do conhecimento do aluno enão para a mera absorção de informações, representouuma experiência positiva para alunos que, como as auto-ras do presente trabalho, pela primeira vez tiveram aoportunidade de serem alunas de um curso a distância.

- No caso das autoras do presente trabalho jáhavia em curso um esforço, na sua instituição de origem,de levar avante um trabalho de avaliação da universida-de e dentro dele, de avaliação do trabalho docente, o quefoi favorecido com a aprendizagem realizada no curso. Ocurso favoreceu o desenvolvimento posterior da auto-avaliação da instituição.

Alguns pontos na experiência do curso em análi-se poderiam ser melhorados no caso de sua extensão aoutros contextos:

- A auto-avaliação poderia ser utilizada com maisênfase para a autonomia da aprendizagem do aluno. Oscritérios das correções das provas, por exemplo, poderi-am ter sido mais bem esclarecidos para os alunos. A aná-lise dos relatórios das provas poderia ter sido um instru-mento de melhor favorecimento da aprendizagem do alu-no se acompanhada de uma cópia da prova. Por estardistante no tempo, o aluno não se lembrava de tudo queescrevera na prova ao receber o relatório com a sua ava-liação.

- Os canais de comunicação e de feedback pode-riam ter favorecido mais a aprendizagem dos alunos sefossem mais rápidos. O contato com os tutores era ape-nas telefônico ou no dia da reunião presencial, o que nãoatendia ao perfil dos que trabalhavam e não podiam com-parecer às reuniões coletivas.

8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Ciência, Filosofia e Religião Diante da Questão da Origemdo Universo

Mituo Uehara *

Resumo: Apresenta-se uma introdução ao estudo das questões filosóficas: 1. Por que o universoexiste? 2. Por que há ordem no universo? 3. Por que as leis da natureza podem ser expressasmatematicamente? Mostra-se a necessidade de buscar as respostas na filosofia e na religião.

Palavras-chave: Ciência, filosofia, religião, origem do universo.

Abstract: It is presented an introduction to the study of the philosophical questions: 1. Why does theuniverse exist? 2. Why there is order in the universe? 3. Why the laws of nature can be expressedmathematically? It is argued that the answers are given by philosophy and religion.

Key words: Science, philosophy, religion, origin of the universe.

* Professor da Univap.

1. INTRODUÇÃO

Werner Heisenberg, Prêmio Nobel de Física, narraum fato ocorrido em 1927, durante o Congresso Solvay,em que se discutiram questões epistemológicas relacio-nadas com as teorias quânticas. Certa noite, alguns jo-vens físicos, entre eles Werner Heisenberg e WolfgangPauli, conversavam no saguão do hotel onde estavamhospedados. Alguém comentou o fato de Einstein falarfreqüentemente de Deus, nas discussões sobre filosofiada Física. Outro acrescentou que também Max Plancknão via nenhuma contradição entre ciência e religião. Aconversa girava em torno do tema religião e ciência, quan-do Paul Dirac juntou-se ao grupo. Inesperadamente, Dirac,exaltado, disse que não entendia por que estavam falan-do sobre religião, e fez um discurso apaixonado em defe-sa do ateísmo, chegando a dizer que a religião era umaespécie de ópio. Heisenberg apresentou objeções às idéi-as de Dirac. Enquanto a discussão prosseguia, percebe-ram que Wolfgang Pauli, que antes da chegada de Dirac,havia opinado sobre o tema, permanecia calado, às vezesmostrando uma fisionomia de desagrado, e às vezes comum sorriso enigmático. Quando perguntaram o que elepensava, Pauli respondeu: “Ja, ja, unser Freund Dirachat eine Religion; und der Leitsatz dieser Religionlautet: ‘Es gibt keine Gott, und Dirac ist sein Prophet’”(Sim, sim, nosso amigo Dirac tem uma religião e o princí-pio guia dessa religião afirma: “Deus não existe e Dirac éseu profeta”). Então todos riram, inclusive Dirac, e assimterminou a conversa naquela noite, no saguão do hotel(HEISENBERG, 1973).

O fato narrado ilustra o perigo, quando se con-versa sobre religião, de se deixar dominar por preconcei-tos e agir movido mais pelas paixões do que pela razão.As pessoas envolvidas no fato narrado não eram nem delonge pouco instruídas ou pouco inteligentes, pelo con-trário, eram todos físicos brilhantes, sendo que os cita-dos nominalmente, Heisenberg, Pauli, Dirac, Einstein ePlanck , receberam o Prêmio Nobel de Física. Naquelaépoca Dirac tinha vinte e cinco anos de idade. No decor-rer dos anos sua atitude em relação à religião mudou,como veremos na parte em que tratamos dos métodos daFísica Matemática na investigação das leis da natureza.

A atitude do jovem físico Dirac revela que ele sedeixou influenciar por filosofias anticristãs do século XIX,século em que a má filosofia, baseada em falsos princí-pios, atacou a fé cristã em nome da razão (CORRIGAN,1946; RUSSEL, 1991). Essas filosofias anticristãs estãoentre as principais causas do bolchevismo e do nazismo,monstruosidades que marcaram o conturbado século XX.

No século XX ocorreu um fenômeno curioso, quese acentuou nos últimos cinqüenta anos e, mais ainda,nos últimos vinte e cinco anos: cientistas eminentes, prin-cipalmente físicos, começaram a falar de Deus em seusescritos filosóficos (MARGENAU, 1992). Entre outrasrazões, o fato está relacionado com o avanço impressio-nante da Ciência, especialmente da Física, no século XX.Físicos eminentes manifestaram suas perplexidades di-ante do notável sucesso da Física Matemática. Eles per-ceberam claramente que a Ciência não era capaz de expli-car as razões mais profundas de tal sucesso. Por exem-plo, Eugene P. Wigner, Prêmio Nobel de Física, cunhadode Dirac, escreveu um ensaio intitulado “The unreasonable

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effectiveness of mathematics in the natural sciences” (Aincompreensível eficácia da Matemática nas Ciências Na-turais) em que ele afirma que a enorme utilidade da Mate-mática nas Ciências Naturais é algo que toca o misteriosoe que não tem uma explicação racional (WIGNER, 1960).Outros Físicos, entre eles Einstein e Dirac, também mani-festaram a mesma perplexidade (DIRAC, 1939).

A Ciência não é capaz de responder muitas ques-tões fundamentais a respeito do universo, como, por exem-plo, as seguintes:

1.Por que existe algo e não o nada? Qual a origemdo universo?

2.Por que há ordem no universo e não o completocaos? Por que há leis da natureza?

3.Por que as leis da natureza podem ser expressasmatematicamente?

4.Qual a origem da capacidade humana de desco-brir leis da natureza?

A Filosofia e a Religião têm algo a dizer sobresessas questões. Através da Filosofia pode-se chegar aoconhecimento de certezas que se impõem por si ou po-dem ser deduzidas pela razão. Não é fácil definir o que éo conhecimento, mas certamente no conceito de conhe-cimento está implícito o conceito de verdade, que é aadequação da inteligência à realidade. Um conhecimentopara ser verdadeiro conhecimento deve ser adequado àrealidade (Santo Tomás de Aquino, 1999). Esta concep-ção de verdade é a única compatível com a Ciência, com-pletamente inviável sem esse pressuposto. Como nãopode haver contradição entre duas verdades, o conheci-mento científico não contradiz o verdadeiro conhecimentofilosófico, nem o verdadeiro conhecimento religioso.

Neste trabalho falamos, inicialmente, da Matemáti-ca, dando alguns exemplos de conceitos matemáticos, paraenfatizar a criatividade dos matemáticos e da liberdadeque há na criação dos conceitos matemáticos. Em segui-da, damos exemplos de teorias físicas que mostram o su-cesso notável da Física Matemática. Na seqüência, fala-mos das respostas que a Filosofia e a Religião podem daràs quatro questões acima, não respondidas pela Ciência.O objetivo não é apresentar uma discussão aprofundadadas questões tratadas, mas apenas despertar o interessepor elas.

2. MATEMÁTICA E FÍSICA

Para ajudar a compreender a perplexidade dosfísicos teóricos, quanto à eficácia da Matemática na Físi-ca, vamos falar um pouco sobre o que é Matemática e o

que é Física Matemática.

A Matemática não trata apenas de como fazer cál-culos, mas é muito mais do que isso, é uma linguagem deinigualável concisão, riqueza e precisão. Wigner disseque alguém definiu a Filosofia como o mau uso de umaterminologia que foi inventada só para esse propósito.No mesmo estilo, ele define a Matemática como a Ciênciadas operações inteligentes com conceitos e regras in-ventadas só para esse propósito. A principal ênfase é nainvenção dos conceitos (WIGNER, 1960). Um grande ma-temático, Georg Cantor se não me engano, disse queMatemática é liberdade. Liberdade de criação de concei-tos e de operações matemáticas.

Como exemplo de um conceito criado pelos mate-máticos citamos o número imaginário i = √ - 1 , a raizquadrada de menos 1. Não existe nenhum número realque elevado ao quadrado dê como resultado um númeronegativo. Os matemáticos criaram o conceito de númerocomplexo c = a + ib, em que a e b são números reais, eformularam regras para fazer operações matemáticas comnúmeros complexos. Por exemplo, a raiz quadrada de i é√i = ± (1 + i)/√2. Observando a natureza, nada vemosque sugira os números complexos inventados pelos ma-temáticos.

Outro exemplo da criatividade dos matemáticos éo número e definido pelo matemático suiço LeonhardEuler, um dos maiores matemáticos da história da Mate-mática e que viveu no século XVIII. Euler definiu a fun-ção exponencial ex como o limite de uma série infinita:

ex = limite da série (1+ x/n)n quando n tende parao infinito.

Tomando x = 1 resulta

e = limite da série (1+ 1/n)n quando n tende parao infinito,

sendo o número e o primeiro a ser definido como o limitede uma série infinita.

O número e tem o valor e = 2,71828..., em que ospontos indicam infinitos algarismos.

Derivada de uma função é outro conceito mate-mático de extrema importância tanto na Matemática puracomo na Física. A derivada da função exponencial dácomo resultado a própria função exponencial. É a únicafunção matemática cuja derivada é ela mesma, sendo,portanto, uma função especialíssima. Apesar de ser umafunção especialíssima, surpreendentemente, muitos fe-nômenos físicos obedecem a uma lei exponencial, como,por exemplo, a absorção de raios X por um meio material

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como o corpo humano.

Um outro número importante na Matemática é onúmero p, que aparece em muitas áreas da Matemática.Por exemplo, na Geometria, onde aprendemos que a rela-ção entre o comprimento L e o diâmetro D de uma circun-ferência é igual a L/D = π = 3,141592....

Os três números i, e e π satisfazem uma relaçãomatemática notável descoberta por Euler. A funçãoexponencial foi estendida por Euler para expoentes ima-ginários, o que o levou a descobrir a relação

eix = cosx + isenx.

Tomando x = π resulta

eiπ + 1 = 0,

que é certamente uma das mais belas fórmulas em toda aMatemática. Podemos escrever o valor de e na formadecimal apenas aproximadamente: e ≅ 2, 71828. Tam-bém π ≅ 3,141592. Porém, a fórmula acima é exata! Elarelaciona as cinco constantes mais importantes da Mate-mática, que simbolizam os quatro grandes campos daMatemática clássica: Aritmética, representada por 0 e 1;Álgebra, por i; Geometria, por π; e Análise, por e. O ma-temático Eli Maor cita Edward Kasser e James Newman,que narram um episódio no livro Mathematics and theImagination :

“To Benjamim Peirce, one of Harvard´sleading mathematicians in the nineteenthcentury, Euler´s formula eiπ = - 1 came assomething of a revelation. Havingdiscovered it one day, he turned to hisstudents and said: ‘Gentlemen, that issurely true, it is absolutely paradoxical;we cannot understand it, and we don´tknow what it means. But we have provedit, and therefore we know it must be thetruth’ ” (Para Benjamim Peirce, um dos prin-cipais matemáticos de Harvard no séculodezenove, a fórmula de Euler eiπ = - 1 veiocomo uma revelação. Tendo-a descobertocerto dia, virou-se para seus alunos e dis-se: ‘Cavalheiros, isto é seguramente ver-dadeiro, é absolutamente paradoxal, nósnão podemos entendê-la, e não sabemoso que ela significa. Mas, nós a demonstra-mos e, portanto, nós sabemos que ela deveser a verdade.’ ”) (MAOR, 1994).

Euler aplicou o conceito de números complexospara funções transcendentais e obteve resultados ines-perados. Ele mostrou que potências imaginárias de um

número imaginário pode ser real. Por exemplo, ele de-monstrou que a expressão ii é igual a

ii = e-(π/2 + 2kπ), onde k = 0, ± 1, ±2, …

Para cada valor de k tem-se um resultado, de modoque se têm infinitos valores, todos eles reais. Maor co-menta admirado: “Num sentido muito literal, Euler fez oimaginário tornar-se real!” (MAOR, 1994).

No século XIX a Matemática se enriqueceu com odesenvolvimento de três grandes áreas: a teoria de fun-ções de variável complexa, a Álgebra abstrata e a Geome-tria não-euclideana. Euler, por volta de 1750, foi o desbra-vador; Cauchy, Bolzano, Riemann, Weierstrass e muitosoutros, no século XIX, deram a essas áreas a importânciaque hoje ela tem, não apenas para a Matemática, mastambém para a Física.

Comenta Wigner que se alguém perguntasse a ummatemático por que ele se interessa por números comple-xos, ele mencionaria, um pouco indignado com a pergun-ta, os numerosos e belos teoremas da teoria das funçõesanalíticas, que tiveram origem na introdução do conceitode números complexos. Wigner cita um comentário de M.Polanyi (Personal Knowledge, University of ChicagoPress, 1958) em que ele afirma que a Matemática não podeser definida sem mencionar sua característica mais óbvia:o fato de que ela é interessante (WIGNER, 1960).

Procuramos mostrar com os exemplos acima, acriatividade dos matemáticos na definição de novos con-ceitos e desenvolvimento de novas teorias matemáticas.Na Matemática somos livres para definir um novo objetodo modo como quisermos, desde que a definição não con-tradiga nenhuma das definições já aceitas ou resultados jáprovados. A criatividade e o senso estético para reconhe-cer a beleza formal matemática desempenham papel impor-tante na definição de novos objetos matemáticos. GeorgCantor tinha razão, a Matemática é liberdade.

Não seria motivo de perplexidade se essa matemá-tica, criada com tanta liberdade, tivesse utilidade na expli-cação de fenômenos naturais? Pois é exatamente o queacontece na Física Matemática. Certamente para alguémque não é matemático, comenta Wigner, os números com-plexos estão longe de serem naturais ou simples, e elesnão podem ser sugeridos por observações físicas. No en-tanto, a utilização dos números complexos é quase umanecessidade na formulação das leis da teoria quântica emque os estados dos sistemas físicos são vetores num es-paço de Hilbert, um espaço complexo. Não apenas os nú-meros complexos, mas também as funções analíticas com-plexas desempenham um papel decisivo na formulação deteorias quânticas. O sucesso da Física Matemática mostraque a Matemática é a linguagem adequada para a formula-

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ção das leis da Física (WIGNER, 1960).

Freeman Dyson, físico britânico que emigrou paraos Estados Unidos, diz que na Física Matemática busca-se conhecer as leis da natureza seguindo o estilo e ométodo rigorosos da Matemática pura. O objetivo dosfísicos matemáticos, afirma Dyson, “não é calcular osfenômenos quantitativamente, e sim entendê-los quali-tativamente. Eles trabalham com teoremas e demons-trações matemáticas, não com números e computado-res. Seu objetivo é esclarecer com precisão matemáticao significado dos conceitos sobre os quais a teoria físi-ca é construída.” (DYSON, 1992).

Dyson cita uma palestra dada na universidade deMiami, em Coral Gables, por Paul Adrien Maurice Dirac,quando ele estava com setenta anos de idade e era oúltimo sobrevivente do grupo de jovens físicos que, de1925 a 1928, criaram a teoria quântica. O título da palestraera “Crenças básicas e pesquisa fundamental”. Falan-do sobre os métodos utilizados pelos físicos na investi-gação dos fenômenos da natureza, Dirac, a certa alturada palestra afirma:

“O físico teórico também pode trabalharde outra forma, mais lenta e tranqüila,capaz de conduzir a resultados mais pro-fundos. Essa forma não depende muito detrabalho experimental. Consiste em ter al-gumas crenças básicas e tentarincorporá-las numa teoria. Por que al-guém deve ter crenças básicas? Não seise posso explicar isso. Simplesmente sen-timos que a natureza é construída de umadeterminada forma e nos agarramos aessa idéia da mesma forma como nos agar-ramos a crenças religiosas. Sentimos queas coisas simplesmente precisam estarnessas linhas e precisamos imaginar umateoria matemática que incorpore a cren-ça básica.” (DYSON, 1992).

De passagem observamos que a atitude de Diracem relação à religião mudou, pois ele se inclui entre aspessoas que se agarram a crenças religiosas, tendo aban-donado o ateísmo fanático que ele manifestara aos vintee cinco anos, na conversa com Heisenberg, Pauli e ou-tros jovens físicos. Margenau inclui Dirac entre os físi-cos que falam de Deus em seus ensaios filosóficos(MARGENAU, 1992).

Dirac fala da importância do critério estético naformulação da teoria. Citemos suas palavras:

“Meu trabalho inicial foi muito influen-ciado pelas órbitas de Bohr, e tive a cren-

ça básica de que as órbitas de Bohr for-neceriam a chave para a compreensãodos eventos atômicos. Era uma crençaerrada ... Descobri que minha crença bá-sica estava errada e tive de passar parauma linha de pensamento bem outra. Pre-cisei buscar uma base mais geral parameu trabalho, e a única base confiávelna qual pude pensar, a única base geralo suficiente para evitar que eu voltasse acometer o mesmo erro era construir umprincípio de beleza matemática: dizer quena verdade não sabemos o que são asequações básicas da Física, mas que elastêm de ter uma grande beleza matemáti-ca. Precisamos insistir nisso, e esse é oúnico aspecto das equações no qual po-demos confiar e insistir ... Como se podefazer da beleza um teste fundamental paraa correção de uma teoria física? Bem, ébastante evidente que a beleza dependeefetivamente da cultura e da educaçãopara certos tipos de beleza: pintura, lite-ratura, poesia e assim por diante ... Con-tudo, a beleza matemática é de um tipobem diferente. Talvez eu devesse dizer queela é de um tipo bem diferente e transcen-de esses fatores pessoais. É a mesma emtodos os países e em todos os períodos detempo ... Bem, essa é a essência do que euqueria dizer. Na verdade é possível teruma opinião tão forte sobres essas coisasque quando um resultado de experiêncianão está de acordo com nossas crençasprovavelmente iremos prever que o resul-tado da experiência está errado e que ospesquisadores experimentais irão corri-gi-los em pouco tempo. Claro que não sepode ser obstinado demais quanto a es-ses assunto, mas ainda assim é precisoousar.” (DYSON, 1992).

Agora passamos ao comentário de Dyson:

“Dirac era ousado. A confiança que eletinha em seu próprio instinto para a be-leza matemática levou-o sucessivamentea três descobertas fundamentais: primei-ro, a formulação abstrata da MecânicaQuântica; segundo, a descrição quânticacorreta dos processo de radiação eletro-magnética; e terceiro, a equação de Diracpara o elétron. Em cada caso ele foi con-duzido não meramente a uma nova leiFísica, mas a um novo estilo de descriçãomatemática da natureza. E em cada caso

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as experiências demonstraram que eleestava certo, embora, como ele sugere naconferência de Coral Gables, tenham sur-gido inicialmente alguns resultados ex-perimentais contrários, que ele foi sufici-entemente ousado para ignorar.A crença fundamental de Dirac, a de queo critério básico para escolher uma teo-ria científica deva ser estético, demons-trou-se fantasticamente bem-sucedida emsuas mãos. A natureza concordou com seucritério. E essa concordância entre asnoções de beleza da natureza e de Diracnos presenteia com um novo exemplo deum velho enigma filosófico. Por que anatureza deve se importar com nossasopiniões sobre a beleza? Por que o elé-tron iria preferir uma bela equação a umaequação feia? Por que o universo iriadançar de acordo com a música deDirac? A essas perguntas misteriosas nemos cientistas nem os filósofos sabem res-ponder. Dirac, com seu estilo de desco-berta, propôs essas questões de modomais preciso que os outros. Mais aindaque Newton e Einstein, ele utilizou cons-ciente e diretamente o critério da belezacomo meio de descobrir a verdade.”(DYSON, 1992).

Albert Einstein, o maior físico do século XX, de-dicou aproximadamente dez anos de sua vida na formula-ção de sua teoria da gravitação, mais comumente conhe-cida com o nome de Teoria da Relatividade Geral, motiva-do não por alguma necessidade observacional, mas porrazões de caráter filosófico e estético. Sua teoria é essen-cialmente uma teoria geométrica, riemanniana, do espa-ço-tempo quadridimensional. É uma teoria de extraordi-nária beleza matemática.

Uma teoria verdadeiramente científica não devese restringir a explicar fatos já observados, mas devefazer previsões teóricas de fenômenos ainda não obser-vados. No caso da teoria de Einstein são citados, geral-mente, as três verificações observacionais: 1. o desviode um raio luminoso ao passar próximo do Sol; 2. o avan-ço do periélio do Mercúrio; 3. o atraso do relógio numcampo potencial gravitacional. Os resultadosobservacionais confirmaram as previsões teóricas deEinstein nos três casos.

A explicação dada pela teoria de Einstein para odesvio de um raio luminoso ao passar próximo de umagrande massa tornou-se ferramenta de trabalho na As-tronomia observacional. Por exemplo, a massa de umagaláxia, que se interpõe entre um quasar distante e a

Terra, pode ser estimada pelo grau de deformação daimagem do quasar, pelo efeito de lente gravitacional re-sultante do desvio do raio luminoso ao passar próximoda galáxia.

A verificação mais espetacular ainda estava porvir. O conceito de ondas gravitacionais é um conceitointeiramente novo introduzido pela Teoria da Relativida-de Geral.Sir Roger Penrose, físico matemático inglês, pro-fessor da Universidade de Oxford, em seu livro “TheLarge, the Small and the Human Mind” faz um relato daverificação indireta da existência de ondas gravitacionais.Em 1993, Hulse e Taylor ganharam o Prêmio Nobel pelaextraordinária série de observações, realizadas num perí-odo de vinte anos. Eles observaram o pulsar binárioconhecido como PSR 1913 + 16, que é constituído porum par de estrelas de neutrons, cada uma com massaaproximadamente igual à massa do Sol, concentrada numvolume de apenas alguns quilômetros de diâmetro. Asestrelas de neutrons orbitam em torno do centro de gra-vidade comum, em órbitas altamente elípticas. Uma delastem um campo magnético muito intenso e as partículasque se movem nesse campo emitem uma radiação inten-sa que pode ser detectada na Terra. Segundo a teoria deEinstein, os pulsares binários radiam energia na forma deondas gravitacionais. Essas ondas tiram energia do sis-tema numa taxa que pode ser calculada com grande pre-cisão pela teoria de Einstein. A taxa de perda de energiado sistema binário de estrelas de neutrons foi medidacom grande precisão no período de vinte anos. Os resul-tados mostram que a teoria de Einstein é correta com aprecisão de uma parte em 1014, o que faz da Teoria daRelatividade Geral a teoria física de maior precisão(PENROSE, 1997).

A teoria de Einstein tem sido utilizada para a ela-boração de vários modelos de universo, sendo que omodelo que melhor descreve os fatos observacionais éum modelo de universo em expansão, que aponta parauma situação no passado em que a temperatura eraaltíssima e toda a matéria concentrava-se praticamentenum ponto, daí alguém ter falado num Big Bang inicialque estaria na origem do universo. Steve Weinberg, físi-co matemático americano, Prêmio Nobel, em seu livro “TheFirst Three Minutes”(WEINBERG, 1977) descreve o uni-verso em seu estágio inicial, na medida em que a Físicaatual pode fazê-la. Ele mostra que a teoria de Einsteinleva à previsão de uma radiação eletromagnética de cor-po negro distribuída de modo aproximadamente unifor-me no universo. Essa radiação foi observada pelosastrofísicos americanos Penzias e Wilson, em 1965. Utili-zando a teoria de Einstein para interpretá-la, essa radia-ção nos conta algo do passado do universo, e o que elanos diz é que o Big Bang aconteceu há ~ 13,7 bilhões deanos.

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O astrofísico indiano, T. Padmanabhan, em seulivro “After the First Three Minutes – The Story of OurUniverse” relata que medidas mais precisas foram reali-zadas, em 1992, com o satélite da NASA chamado COBE(Cosmic Background Explorer), especificamente projeta-do para detectar desvios de temperatura na radiação cós-mica de microonda. Os resultados mostraram variaçõesde temperatura, no campo de radiação, com a ordem degrandeza esperada, mostrando conclusivamente que osmodelos teóricos a respeito da formação das galáxias eoutras estruturas no Universo estão basicamente corre-tas (PADMANABHAN, 1998).

A relação entre a Matemática e a Física é maisprofunda e misteriosa do que pode parecer numa análisesuperficial. Einstein nos conta que em 1907 ele se per-guntava como se poderia modificar a Teoria Newtonianada Gravitação de modo a torná-la compatível com o prin-cípio de relatividade, quando então lhe ocorreu uma idéiaque ele considerou ser a idéia mais feliz de sua vida.Entretanto, a formulação da teoria demorou quase dezanos porque Einstein não conhecia a Matemática ade-quada para exprimir suas idéias. Ele precisava de umateoria matemática dos invariantes associados ao elemen-to diferencial de linha ds2 = gµνdxµdxν. Em 1912, seu ami-go Marcel Grossman, matemático, disse-lhe que a teoriamatemática que ele procurava era a Geometria deRiemann, criada por Bernhard Riemann, um dos maioresmatemáticos do século XIX. Somente depois da informa-ção dada por Grossman é que Einstein começou a formu-lar sua famosa teoria.

Penrose comenta que o modo como Einstein de-senvolveu sua teoria da gravitação e sua convincenteverificação experimental mostram que Einstein reveloualgo da estrutura matemática da natureza. O que Einsteindescobriu não foi algo de importância secundária na Fí-sica, mas a coisa mais fundamental que há na natureza,a natureza do espaço e tempo (PENROSE, 1997).

O impressionante sucesso da Física Matemática,exemplificado pelas teorias quânticas e pela Teoria daRelatividade Geral, mostra que muita Física pode resultarde um pouco de boa Filosofia, de senso estético, da teo-ria matemática adequada, e de um insight inspirado. Emcontrapartida, muitas conjecturas filosóficas foram ins-piradas pelo sucesso da Física Matemática, o que mostraque a boa Ciência e a boa filosofia não só são compatí-veis, mas elas se beneficiam em suas mútuas interações.Assim, também a boa Ciência pode se beneficiar da boaTeologia (há boa e má teologia assim como há boa e máCiência) e vice-versa.

Sobre a interação entre Ciência, Religião e Filoso-fia, comenta o astrofísico e filósofo William Stoeger: “Areligião, a teologia e a espiritualidade proporcionaram,

em grande parte, a motivação e as condições para aciência desenvolver-se na cultura ocidental, como é agorabem reconhecido. Historicamente, alguns cientistas en-contraram inspiração e intuição para suas pesquisascientíficas nas suas crenças religiosas e insights espiri-tuais. As perspectivas filosóficas da cultura ocidentaltambém exerceram e continuam a exercer forte influên-cia no desenvolvimento do pensamento científico.”(STOEGER, 2002).

3. CONHECIMENTO FILOSÓFICO E CONHECIMEN-TO RELIGIOSO

A Ciência não é capaz de responder a questão arespeito da origem do universo porque os métodos cien-tíficos se aplicam a realidades materiais existentes e, con-seqüentemente, não têm nada a dizer sobre a situaçãohipotética da inexistência do universo. As equações daFísica não se aplicam ao nada.

Gottfried Wilhelm Leibniz, matemático e filósofoalemão, contemporâneo de Isaac Newton, formulou apergunta: “Por que existe alguma coisa e não o nada?”,que é a pergunta que a Filosofia deve responder paraexplicar a existência do universo.

Stoeger (1992) escrevendo sobre a origem do uni-verso, chama a atenção para o significado do termo “cri-ação”, que em Ciência é utilizado de modo não rigoroso.Fala-se, por exemplo, em criação de partículas na interaçãode outras partículas, ou por polarização do vácuo. Fala-se em proteínas criadas a partir de aminoácidos. Em to-dos os casos tratados pela Ciência, não há verdadeiracriação, mas sim transformação de matéria preexistente.

Filosoficamente, o significado do termo “criação”é muito mais estreito e mais específico. O termo significacreatio ex nihilo, criação a partir de absolutamente nada.A criação com a qual estamos familiarizados na Ciêncianão é creatio ex nihilo, mas sim transformação da matériapreviamente existente. Por exemplo, um fóton pode darorigem a um elétron e a um pósitron num processo físicochamado criação de um par elétron-pósitron. O elétron e opósitron não contêm em si a explicação de sua própriaexistência. A existência deles depende de alguma outracoisa, neste caso, do fóton que deu origem a eles, junta-mente com toda a cadeia causal da qual depende o fóton.

Analisando a realidade material chega-se à con-clusão de que nenhum ente físico explica a si mesmo ousua própria existência. Eles podem existir como podemnão existir, como vimos no exemplo do par elétron-pósitron que não existia e passou a existir. Na interaçãoentre uma partícula e sua antipartícula, as duas partícu-las desaparecem dando origem à radiação eletromagnéti-ca. A busca pelas causas da existência de algo deve ter-

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minar numa causa não causada. É forçoso admitir um serpor si mesmo necessário, que não tem fora de si a causada sua necessidade, antes, sendo a causa da necessida-de dos outros; e a tal ser todos chamam Deus. Aqui cita-mos Santo Tomás de Aquino, Suma Teológica, I q. 2 a.3:

“Ergo necesse est ponere aliquid quod estper se necessarium, non habens causamnecessitatis aliunde, sed quod est causanecessitatis aliis: quod omnes dicunt Deum.”(SANTO TOMÁS DE AQUINO, 1934).

Convém observar que o nada não é o vácuo daFísica. O nada não existe, não contém nenhumapotencialidade, nenhuma lei física, enquanto o vácuoexiste, é rico em potencialidades e está sujeito a leis físi-cas. Por exemplo, o vácuo tem propriedades elétricas emagnéticas que determinam a velocidade da luz atravésdele. Um par elétron-pósitron pode surgir da polarizaçãodo vácuo.

É interessante notar que a creatio ex nihilo nãoimplica necessariamente ou exige um começo no tempo,nem um começo do tempo. A hipótese de que o Universosempre existiu não elimina o problema de explicar suaexistência, pois o Universo não se explica por si mesmo.Tal hipótese não pode ser comprovada cientificamentenem provada filosoficamente. A revelação cristã fala deum começo temporal. Mas, isso não é essencial, sob oponto de vista filosófico, como explica Santo Tomás deAquino na Summa Theologica I q. 46 a.2 (SANTO TO-MÁS DE AQUINO, 1959). O problema da origem do Uni-verso é o problema da explicação de sua existência, e nãoum problema de uma origem temporal. A Ciência não écapaz de explicar a transição da não-existência para aexistência.

O princípio da creatio ex nihilo é uma conclusãofilosófica, o resultado de uma análise filosófica da reali-dade como a conhecemos e não um princípio religiosoou teológico. Ele não é incompatível com a Ciência, poisdeixa a Ciência inteiramente livre para investigar as leisque regem os fenômenos naturais.

Perguntado sobre a existência de Deus, Laplaceteria respondido: “Je n´ai pas besoin de cette hypothèse”(Eu não tenho necessidade desta hipótese). Sua respos-ta mostra que ele não entendeu a necessidade de se ex-plicar a origem das leis da natureza.

Há vários caminhos para se demonstrar racional-mente a realidade de Deus. Recentemente, meu colega eamigo Fernando de Mello Gomide, físico teórico e filóso-fo, publicou uma solução para o problema da provaontológica da realidade de Deus (GOMIDE, 1998).

Gomide alertou-me quanto ao erro comum de apli-car o termo “existência” a Deus:

“O Pe. Cornélio Fabro, eminente tomistaitaliano, mostra que a existência é a emer-gência do ente a partir de suas causas: épois idéia de extrinseceidade. Portantosó às criaturas se aplica o termo existên-cia: só elas existem porque são causadas.Ora, Deus não é causado, por isso Deusnão existe, mas Deus É. Proposições como“provas da existência de Deus”, “Deusexiste” são incorretas.” (GOMIDE, comu-nicação particular).

A Filosofia, além de demonstrar racionalmente arealidade de Deus, demonstra também vários atributosde Deus, como sua natureza puramente espiritual, suaeternidade, sua inteligência infinita etc. Esta demonstra-ção racional da realidade de Deus e de seus atributos éconhecida como Teodicéia, termo criado por Leibniz.

Demonstrada racionalmente a realidade de Deus,as origens da ordem do universo e das leis da naturezapodem ser atribuídas a Deus. Assim, a boa filosofia doser responde às perguntas sobre as origens do universo,da ordem nele observada, das leis naturais, perguntasque a Ciência não é capaz de responder. Grande parte daFilosofia moderna nada contribui para esclarecer essasquestões, porque não é Filosofia do ser. Diz o Papa JoãoPaulo II que a Filosofia moderna concentrou sua atençãosobre o homem e

“parece ter-se esquecido de que este (ohomem) é sempre chamado a voltar-setambém para uma realidade que o trans-cende. [...] A filosofia moderna, esquecen-do-se de orientar a sua pesquisa para oser, concentrou a própria investigação noconhecimento humano. Em vez de se apoi-ar sobre a capacidade que o homem temde conhecer a verdade, preferiu sublinharas suas limitações e condicionalismos.”(JOÃO PAULO II, 2005).

Por outro lado, afirma o Papa que a Filosofia deSanto Tomás de Aquino é verdadeiramente uma Filoso-fia do ser, e não do simples aparecer.

Gomide observa que a Filosofia do ser de SantoTomás de Aquino constitui uma inovação filosófica quetornou possível a formulação precisa dos dados teológi-cos da Revelação. Em seu livro Diálogo entre a Filoso-fia e Ciência, ele diz:

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“A obra-prima de Santo Tomás deAquino se encontra no seu pensamentoontológico. No Doutor Angélico, a opo-sição metafísica Platão-Aristóteles étranscendida mediante sua síntese dadoutrina do ato e da potência emAristóteles com a teoria platônica da par-ticipação, consubstanciada na sua dis-tinção real entre o ente, o ser e a essên-cia30-31. A distinção real entre o ente, oser e a essência é pensamento totalmentenovo na história da filosofia. A filosofiado ser de Santo Tomás é um resultado su-perlativo da influência da Revelação so-bre a razão natural do homem. Santo To-más quando criança se tinha feito a per-gunta: que é Deus? Sua filosofia do ser éa resposta à pergunta e permite perfeita-mente iluminar a definição que Moisésrecebeu de Javé: “Eu sou aquele que é”(Ex III, 14). A filosofia de originalidadecristã 32-33 encontrou em Santo Tomás umde seus ápices. O menino Tomás formu-lando essa pergunta que o Espírito San-to lhe inspirou, deu início à maior inova-ção filosófica da história, tornando pos-sível à inteligência cristã a mais perfeitasíntese dos dados teológicos da Revela-ção com a ordem especulativaontológica. Foi muito simbólica disso,que, no Concílio de Trento, os PadresConciliares colocaram sobre o mesmoaltar a Sagrada Escritura, os DecretosPontifícios e a Suma Teológica do Dou-tor Angélico.” (GOMIDE, 1990).

A religião cristã incorpora a doutrina filosófica dacreatio ex nihilo, acrescentando-lhe a idéia da origemtemporal do Universo. Lemos no Gênesis: “No princí-pio Deus criou o céu e a terra”(Gn 1, 1). O céu e a terrasignificam o Universo ordenado. No princípio significao início do tempo, isto é, o tempo foi criado simultanea-mente com o Universo. O segundo livro dos Macabeusfaz referência explícita à criação ex nihilo, do nada: “Eute suplico, meu filho, contempla o céu e a terra e obser-va tudo o que neles existe. Reconhece que não foi decoisas existentes que Deus os fez, e que também o gêne-ro humano surgiu da mesma forma” (2MC 7, 28).

O prólogo do Evangelho de São João também falada criação do Universo: “No princípio era o Verbo e oVerbo estava com Deus e o Verbo era Deus. No princí-pio, ele estava com Deus. Tudo foi feito por meio dele esem ele nada foi feito” (JO 1, 1-3).

Alguém perguntou a Galileu Galilei se acreditava

que o sol fosse eterno. Ele respondeu: “eterno nò, maben antico” (LEIBNIZ, 2004). A resposta dada por Galileoveio da sua fé, não da Ciência, que naquela época nadasabia sobre a teoria da formação e evolução estelar queviria a ser formulada apenas no século XX.

Gomide, dentre as questões que ele analisa emseus ensaios filosóficos sobre a relação entre Filosofia eCiência (GOMIDE, 1986; 1987; 1990; 1996; 1998; 2003),trata também da questão do sucesso da Física Matemáti-ca. Ele mostra que a Filosofia do ser de Santo Tomás deAquino e os conceitos tomistas de intensidade de for-ma, magnitude transcendental e número transcendentaljustificam perfeitamente a formalização matemática danatureza. Neste trabalho eu me limitarei a citar algunstrechos da Sagrada Escritura que se relacionam com oassunto, acrescentando alguns comentários.

No livro da Sabedoria lemos: “Mas tudodispusestes com medida, número e peso” (Sb 11, 20),que é a afirmação de que Deus criou o Universo sujeito aleis que podem ser expressas matematicamente. Deus nãocriou um Universo caótico mas ordenado, com medida,número e peso. Depois de discutir o conceito de número,segundo os conceitos tomistas, Gomide afirma:

“Assim, pois, o número surge idealmentenão só no terreno do ser-classe, mas tam-bém no domínio do ser e suas relações. NaFísica, a formalização matemática envolvenão só a de número de objetos, como nú-mero de átomos, número de partículas etc.,mas também duas instâncias dematematização que são as seguintes:

a) Atribuição de valores numéricos a qua-lidades atualizadas: as grandezas físicasconstantes e as funções dessas variáveis;

b) Equações diferenciais, que represen-tam a formalização matemática no terrenodas relações, como, por exemplo, asinterações. A 2a. lei de Newton é um casoparticular.

As três ordens de matematização estão re-tratadas no Livro da Sabedoria e eis o signi-ficado daquele versículo considerado:

a) Medida: matematização de relação.

b) Número: matematização do ser-conjunto.

c) Peso: matematização da potência ati-va, ou seja, qualidade.” (GOMIDE, 1986).

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A respeito dos números diz Santo Agostinho, emseu livro O Livre Arbítrio (Livro II cap 8, 24):

“Por essas provas e muitas outras seme-lhantes, todos aqueles que raciocinam ea quem Deus concedeu o espírito, masigualmente a quem a teimosia não envol-veu nas trevas, são forçados a reconhe-cer que a lei e a verdade dos númerosescapam ao domínio dos sentidos corpo-rais, e que essas leis são invariáveis epuras, oferecendo-se universalmente aosolhos de todos aqueles que são capazesde raciocínio”.

Santo Agostinho mostra que o conhecimento dosnúmeros e de suas leis, puramente intelectual, certo, ob-jetivo e indiscutível, é possuído por todo espírito real-mente sadio. O que é percebido pelos sentidos corporaisestá sujeito à corrupção e não sabemos por quanto tem-po durará. Ao passo que os teoremas da Matemática,que são percebidos só pela inteligência, são válidos nãoapenas hoje, mas sempre, e são um patrimônio comum detodos os que são capazes de raciocínio. Essas verdadespermanecem imutáveis em nossa mente mutável. Sãoconstantes do espírito e evidenciam a realidade do co-nhecimento. Mais adiante ele diz que a sabedoria regulapelos números a harmoniosa evolução do universo (Li-vre Arbítrio, Livro II, cap. 16, 42):

“Contempla o céu, a terra, o mar e todosos seres neles contidos [...] Todos possu-em beleza, porque têm seus números. Su-prima-os e eles nada mais serão. Logo, deonde vêm eles, a não ser daquele de ondeprocede todo número?”

O Livro da Sabedoria diz: “pois a grandeza e abeleza das criaturas fazem, por analogia, contemplarseu Autor”. Lemos também na carta de São Paulo aosRomanos:

“Porque o que se pode conhecer de Deusé manifesto entre eles, pois Deus lho reve-lou. Sua realidade invisível - seu eternopoder e sua divindade - tornou-se inteli-gível, desde a criação do mundo, atravésdas criaturas, de sorte que não têm des-culpa.” (RM 1, 19-20).

João Paulo II comenta as palavras de São Paulo,dizendo:

“Desenvolvendo com linguagem popularuma argumentação filosófica, o Apóstoloexprime uma verdade profunda: por meio

da criação, os ‘olhos da mente’ podemchegar ao conhecimento de Deus. [...] ra-ciocinando a partir dos sentidos, podechegar também à causa que está na ori-gem de toda a realidade sensível. Em ter-minologia filosófica, podemos dizer que,neste significativo texto Paulino, está afir-mada a capacidade metafísica do ho-mem.” (JOÃO PAULO II, 2005).

Heisenberg, falando sobre uso da Matemática naFísica diz:

“Antes de examinar se este método conti-nua válido ou não para a ciência atual,deveríamos perguntar-nos em que se fun-damentava a confiança que guiouCopérnico, Galileo e Kepler por esse novocaminho. Fiel à tese de von Weizsäcker,creio que se pode afirmar que esse funda-mento era mais de índole teológica.Galileo dizia que a natureza, o segundolivro de Deus (o primeiro sendo a Bíblia),estava escrita em letras matemáticas e quese teria de aprender esse alfabeto parapoder lê-la. Kepler, em sua obra sobre aharmonia do mundo, é ainda mais claro.Ele diz: Deus criou o mundo segundo suasidéias da criação. Estas idéias são as for-mas arquetípicas puras que Platão cha-mava idéias, e para o homem são inteligí-veis na qualidade de relações matemáti-cas. E são compreensíveis porque o ho-mem foi criado à semelhança espiritualde Deus. A física é o reflexo das idéiascriativas de Deus; donde a física é um ser-viço divino.” (HEISENBERG, 1979).

A Ciência pressupõe a ordem do universo, masnão explica sua origem. Como resposta racional para aquestão da origem das leis da natureza, Margenau, físico efilósofo, diz que elas foram criadas por Deus(MARGENAU, 1992).

Outra perplexidade dos físicos matemáticos é acapacidade do homem de descobrir leis da natureza. Areligião tem a resposta para essa questão. Lemos noGênesis (GN 1, 26-28):

Deus disse: “Façamos o homem à nossaimagem, como nossa semelhança, e queeles dominem sobre os peixes do mar, asaves do céu, os animais domésticos, to-das as feras e todos os répteis que raste-jam sobre a terra”.

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Deus criou o homem à sua imagem, à ima-gem de Deus ele os criou, homem e mu-lher ele os criou.

Deus os abençoou e lhes disse: “Sede fe-cundos, multiplicai-vos, enchei a terra esubmetei-a; dominai sobre os peixes domar, as aves do céu e todos os animaisque rastejam sobre a terra.”

Deus, ao criar o homem, dotou-o de inteligência,que torna a criatura uma semelhança do Criador. Com ainteligência, o homem deverá investigar as leis que re-gem os fenômenos da natureza, pois o conhecimentodessas leis significa o cumprimento da ordem dada porDeus, ao homem, de submeter a terra, o mar e o ar. Portan-to, desde sua criação o homem deveria cumprir a tarefade buscar entender a natureza, de descobrir suas leis.Sempre que Deus dá uma ordem, dá também os meiospara sua realização. Compete ao homem utilizar sabia-mente os meios que Deus lhe concede.

4. INTERAÇÃO ENTRE CIÊNCIA, FILOSOFIA E RE-LIGIÃO

No diálogo entre Ciência e Religião, mediada pelaFilosofia, as três se enriquecem, conhecem melhor seuspróprios limites e até mesmo entendem melhor o objetodo conhecimento que lhes é próprio. Estamos falando daboa Ciência, da boa Religião e da boa Filosofia.

No século XIX, o Papa Leão XIII, na carta encíclicaAeterni Patris, retomou e desenvolveu a doutrina doConcílio Vaticano I sobre a relação entre fé e razão, mos-trando como o pensamento filosófico é um contributofundamental para a fé e para a Teologia. O Papa JoãoPaulo II retomou o assunto na carta encíclica Fides etRatio, cujo capítulo VI trata da interação da Teologiacom a Filosofia. Ele diz (JOÃO PAULO II, 2005):

“Espera-se, pois, que teólogos e filósofosse deixem guiar unicamente pela autori-dade da verdade, para que seja elabora-da uma Filosofia de harmonia com a pa-lavra de Deus. Essa filosofia será o terre-no de encontro entre as culturas e a fécristã, o espaço de entendimento entre fi-éis e não fiéis. Ajudará os fiéis a conven-cerem-se mais intimamente de que a pro-fundidade e a autenticidade da fé saemfavorecidas quando esta se une ao pen-samento e não renuncia a ele.”

Em seguida, ele cita Santo Agostinho (Depraedestinatione Sanctorum 2, 5: PL 44, 963):

“Crer, nada mais é senão pensar consen-tindo [...]. Todo o que crê, pensa; crendopensa, e pensando crê [.... A fé se não forpensada, nada é”.

Lembramos também que Santo Agostinho dizia(RUBIO, 1995): “Crê para entender e entende para crer”.In Joan. 29,6.

Quanto à Ciência, ela não leva ao ateísmo, cujascausas estão menos na inteligência e mais na vontade.Max Jammer, físico e filósofo, em seu livro “Einstein e aReligião”, que discute a filosofia einsteiniana, ilustra,com o exemplo de Einstein, a interação entre a Física e aReligião, mediada pela Filosofia. Ele conta que, a alguémque perguntou a Einstein se ele era um homem profunda-mente religioso, Einstein, calmamente e com toda a digni-dade, respondeu:

“Sim, o senhor poderia dizer isso. Tentepenetrar, com seus recursos limitados, nossegredos da natureza, e o senhor desco-brirá que, por trás de todas asconcatenações discerníveis, resta algosutil, intangível e inexplicável. A venera-ção dessa força, que está além de tudo oque podemos compreender, é minha reli-gião. Nessa medida, sou realmente reli-gioso.” (JAMMER, 2000).

O sentimento do mistério não desaparece com adescoberta científica, mas esta revela um mistério aindamais profundo.

Em sentido inverso, a Teologia pode motivar e darcondições para a pesquisa científica, como mostra estu-dos sobre a origem da Ciência na cristandade ocidental.Jeffrey B. Russel fala do trabalho pioneiro de PierreDuhem, físico e grande estudioso da história da Ciência,autor da monumental obra Système du Monde, em dezvolumes, publicados em Paris de 1913 a 1959. Duhemmostra que a Igreja medieval apoiava e sustentava a Filo-sofia natural, tendo a Teologia cristã desempenhado umpapel fundamental para a formação do espírito científico,espírito indagativo e racional, que busca os porquês dosfenômenos naturais (RUSSEL, 1991). Ao trabalho deDuhem seguiram-se outros, que acrescentaram mais da-dos históricos em favor de sua tese (STARK, 2005;WOODS JR., 2005; LINDBERG, 1992).

Desde os primeiros tempos do cristianismo, a ra-zão desempenhou um papel essencial no desenvolvimen-to da Teologia cristã, através do raciocínio dedutivo.São conhecidos como Padres da Igreja autores cristãosdos primeiros séculos, responsáveis pelo desenvolvi-mento racional da Teologia, do qual resultou a definição

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de dogmas fundamentais do cristianismo.

Santo Agostinho, um dos Padres da Igreja,enfatizava o papel da razão nas considerações das verda-des da fé. Ele dizia que nós nem poderíamos crer se nãotivéssemos almas racionais (STARK, 2005). Santo Agosti-nho louvava o uso da razão não apenas em assuntos deTeologia, mas também, de modo geral, se admirava com asrealizações da inteligência humana nas Artes, nas coisaspráticas, na Matemática etc., frutos de um “inexprimíveldom” de Deus, que dotou sua criatura de uma naturezaracional (SANTO AGOSTINHO, 2000). Em seu livro Sobrea Potencialidade da Alma (De Quantitate Animae) ele serefere à invenção da escrita, à música, à variedade de idio-mas, à precisão da arte de calcular, “tudo produzido pelahumana potência de raciocínio e imaginação” (SANTOAGOSTINHO, 1997). Ele teve grande influência sobre acristandade medieval, que assimilou seus ensinamentos arespeito da capacidade da razão humana.

Em seu livro De Genesi ad Litteram (sobre o sen-tido literal do Gênesis), Santo Agostinho observa que aBíblia não contém nenhuma descrição clara da forma oudo tamanho da Terra ou do Universo. Por isso, ele alertaos cristãos para não se fazerem de tolos, citando textosisolados das Escrituras como argumento contra os filó-sofos pagãos. Loucos são os que atribuem à Bíblia suaspróprias idiotices, fazendo com que os pagãos despre-zem os cristãos e suas Escrituras. Como a Bíblia nada diza respeito da forma da Terra, ela é irrelevante para nossasalvação, e é inútil discuti-la. Contudo, é assunto para ainvestigação natural. Assim, continua Agostinho, preci-samente porque a Bíblia não responde a questão, deverí-amos ter a mente aberta à evidência apresentada pelosfilósofos. Ele estava refutando, particularmente, os cris-tãos que citavam salmos, trechos do profeta Isaías, dolivro de Jó, ou do profeta Amós, como argumentos con-tra a esfericidade da terra (RUSSEL, 1991). A religião tratada fé e da moral, que interessam à nossa salvação. Emassuntos puramente científicos, em que não entram ne-nhum aspecto da fé ou da moral, a Religião deixa para aCiência inteira liberdade de realizar suas investigaçõesdos fenômenos naturais.

A crença em Deus Criador, que criou o universoordenado, com uma estrutura racional, com leis naturais,e a confiança na capacidade humana de descobrir essasleis é que tornaram possível o nascimento da Ciência.Alfred North Whitehead, matemático e lógico, co-autorcom Bertrand Russel do famoso Principia Mathematica,afirmou que a Ciência nasceu na Europa em conseqüên-cia da generalizada “fé na possibilidade da Ciência ...originária da Teologia medieval”. Whitehead explica:

“A maior contribuição do medievalismopara a formação do movimento científico

foi a inabalável crença de que ... haviaum segredo, um segredo que podia serdesvelado. Como essa convicção foi tãovividamente implantada na mente euro-péia? ... Ele deve ter vindo da insistênciamedieval na racionalidade de Deus, con-cebida como a energia pessoal de Iahwehe com a racionalidade de um filósofo gre-go. Todos os detalhes estavam supervisi-onados: a busca na natureza somentepoderia resultar na reivindicação da féna racionalidade.” (STARK, 2005).

5. CONCLUSÃO

É próprio do espírito humano buscar a unidadedo conhecimento, englobando o conhecimento científi-co, o conhecimento filosófico e o conhecimento religio-so num todo coerente e harmônico. O princípio unificadoré o conceito de Deus, transcendente, criador do Univer-so e da ordem nele observada.

O livro Cosmos, Bios, Theos, editado por HenryMargenau e Roy Abraham Varghese, traz a opinião de maisde sessenta eminentes cientistas (dentre os quais mais devinte ganhadores do Prêmio Nobel) a respeito de Ciência eReligião. Citamos a seguir algumas dessas opiniões.

Arthur L. Schawlow, Prêmio Nobel de Física: Di-ante das maravilhas da vida e do universo, nós deve-mos perguntar por que e não apenas como. As únicasrespostas possíveis são religiosas. Eu sinto a necessi-dade de Deus no universo e na minha própria vida.

Wolfgang Smith, matemático, cujos estudos teó-ricos sobre a Aerodinâmica de campos de difusão pro-porcionaram a chave teórica para a solução do problemada reentrada em vôos espaciais: Para mim pessoalmen-te, nada é mais evidente, mais certo do que a existênciade Deus.

Walter Thirring, professor de Física da Universi-dade de Viena: Eu penso que cientistas que dedicamsuas vidas a investigar a harmonia mundi não podemdeixar de ver nessa harmonia algum plano divino. Quan-to às batalhas entre cientistas e teólogos elas aconte-cem devido à pretensão de alguns de seus representan-tes que acreditam entender mais do que realmente en-tendem. Deve-se ter humildade vis-à-vis aos grandesmistérios do cosmos.

Charles Townes, Prêmio Nobel de Física: A ques-tão da origem do Universo não pode ser respondidapela ciência. Eu creio na existência de Deus.

Eugene P. Wigner, Prêmio Nobel de Física: O con-

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ceito de Deus é maravilhoso – ele nos ajuda a tomardecisões na direção correta. O problema da origem doUniverso é um mistério para a Ciência.

Werner Arber, biofísico, Prêmio Nobel de Fisiolo-gia/Medicina: Eu aceito o conceito de Deus sem tentardefini-lo com precisão. Eu sei que o conceito de Deusajudou-me a controlar muitas questões na vida; ele meguia em situações críticas, e eu o vejo confirmado emmuitos profundos insights, na beleza do funcionamentodo mundo vivo.

D. H. R. Barton, Prêmio Nobel de Química: Deus éa Verdade. Não existe incompatibilidade entre Ciênciae Religião. Ambas buscam a verdade.

Steven L. Bernasek, professor de Química da Uni-versidade de Princeton: Eu acredito na existência de Deus.Sua existência é para mim aparente em tudo ao meu re-dor, especialmente em meu trabalho como cientista.

Sir John Eccles, Prêmio Nobel de Fisiologia/Me-dicina: A consciência não é, de nenhum modo, um resul-tado de uma evolução darwiniana. Eu acho que ela éuma criação divina. Eu acredito em Deus.

Ragnar Granit, Prêmio Nobel de Fisiologia/Medi-cina: Ciente das limitações da Ciência, eu tenho umaatitude religiosa em relação ao desconhecido.

6. AGRADECIMENTO

Agradeço ao Prof. Fernando de Mello Gomide poresclarecimentos a respeito de conceitos metafísicos daFilosofia do ser de Santo Tomás de Aquino.

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Revista UniVap, v.13, n.23, 200642

Funções Cardíacas para Diferentes Condições de ExercícioFísico

Mituo Uehara *Kumiko K. Sakane *

Simone A. Bertolotti **

Resumo: A avaliação clínica da capacidade de bombeamento do coração é mais bem realizadacom base na função cardíaca, que relaciona o volume de sangue bombeado pelo coração em cadacontração sistólica com o volume diastólico no final da fase diastólica e com outros parâmetroshemodinâmicos. A realização de exercício físico causa alteração na função cardíaca. Neste traba-lho utilizamos dados experimentais publicados na literatura para determinar, na aproximaçãolinear, funções cardíacas para diferentes níveis de exercício físico.

Palavras-chave: Funções cardíacas, exercício físico, contratilidade miocárdica.

Abstract: Clinical evaluation of the heart pumping capacity is better performed considering thecardiac function curve, which relates the blood volume pumped by the heart at each systoliccontraction to the diastolic volume at the end of the diastolic phase and to other hemodynamicparameters. Physical exercises change the cardiac function curve. In this paper, we used experimen-tal data published in the literature to determine, in the linear approximation, cardiac functioncurves for different intensity levels of physical exercises.

Key words: Cardiac function curve, exercising, myocardial contractility.

* Professor(a) da Univap.** Graduada em Engenharia Biomédica pela Univap.

1. INTRODUÇÃO

Otto Frank (1895) observou em experimento comcoração de rã que quanto maior o volume de sangueacumulado no ventrículo, no final de uma fase diastólica,maior é o volume de sangue ejetado pelo ventrículo nasístole seguinte. A mesma relação foi confirmada porErnest Starling e colaboradores (PATTERSON et al.,1914), em experimentos com preparações coração-pul-mão caninas. Essas observações podem ser expressasmatematicamente pela função S = S(vD), em que S é ovolume de ejeção (volume de sangue bombeado em cadacontração ventricular) e vD é o volume de sangue noventrículo no final de uma fase diastólica (fase em que oventrículo se enche de sangue). A função é conhecidacomo relação de Frank-Starling (KATZ, 1977).

No caso do sistema cardiovascular intacto, i.e., invivo, é preciso considerar o fato de que o ventrículo bom-beia o sangue para o sistema vascular que já contémsangue à pressão não-nula (pressão arterial na aorta), oque representa uma resistência a ser vencida pelo fluxosangüíneo. Matematicamente esse fato pode ser expres-

so escrevendo-se a relação S = S(vD; pa), que diz depen-der o volume de ejeção não apenas do volume diastólicofinal vD, conhecido como pré-carga (preload), mas tam-bém da pressão arterial pa, que aqui representa a pós-carga (afterload).

Há ainda outros fatores que podem alterar o volu-me de ejeção, como substâncias que alteram acontratilidade do músculo cardíaco. Tais substâncias sãochamadas substâncias inotrópicas (KATZ, 1977;MILNOR, 1990). A influência dessas substâncias pode-ria ser descrita matematicamente, escrevendo-se S =S(vD; pa: i), em que i representaria o estado inotrópicodo músculo cardíaco. Chamaremos a função S = S(vD;pa: i) de função cardíaca ou função ventricular, reser-vando o termo “relação de Frank-Starling” para a funçãoS = S(vD), que descreve a dependência do volume deejeção S apenas em relação ao volume diastólico final vD.

A realização de exercícios físicos impõe ao siste-ma cardiovascular uma sobrecarga decorrente de um au-mento das necessidades metabólicas dos músculos queexercem uma atividade mais intensa, ao mesmo tempoque deve ser mantido o atendimento de outros órgãos. Osistema responde a essas exigências por um aumento daventilação pulmonar, um aumento do débito cardíaco, emaumento da pressão arterial e uma redistribuição do fluxo

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de sangue, com um aumento do fluxo em direção aosmúsculos mais ativos. O aumento do débito cardíaco podese conseguido com o aumento da pulsação cardíaca ouaumento da contratilidade do músculo cardíaco, ou doaumento de ambos os fatores. Esse aumento do débitocardíaco significa portanto que as funções cardíacas sãoalteradas pela realização de exercícios físicos.

A investigação da alteração da função cardíacaem conseqüência da realização de exercícios físicos exi-ge uma formulação matemática do problema, pois a fun-ção cardíaca depende de vários fatores, o que torna difí-cil seu estudo sem um modelamento matemático, enquan-to que, matematicamente, ela pode ser mais bem estuda-da como uma função de várias variáveis. A importânciada análise matemática do problema da resposta cardiovas-cular a exercícios físicos está: 1. nas conclusões quanti-tativas e qualitativas que se podem inferir de dados ex-perimentais; 2. nas sugestões para o planejamento de

experimentos.

Neste trabalho utilizamos dados experimentais dePoliner et al. (1980) para determinar as funções cardíacascorrespondentes a diferentes níveis de exercícios físi-cos, e, através de uma análise matemática, discutimos aquestão da alteração da contratilidade miocárdica decor-rente da realização de exercícios.

2. DADOS EXPERIMENTAIS DE POLINER ET AL. (1980)

Poliner et al. (1980) realizaram experimentos comsete pessoas normais (seis homens e uma mulher), comidade média de 26 anos, que se submeteram a exercíciosfísicos de diferentes níveis de intensidade. Os exercíciosforam realizados nas posturas supina (deitada) e senta-da, em bicicletas ergométricas. A Tabela 1 contém algunsdados obtidos por aqueles autores.

Tabela 1 - Dados de Poliner et al. (1980)

EDV é o volume diastólico final; ESV o volume sistólico final; S o volume de ejeção; HR a freqüênciacardíaca; BP as pressões sistólica e diastólica; CO é o débito cardíaco.

3. DETERMINAÇÃO DA FUNÇÃO CARDÍACA

3.1 Volume médio de sangue no ventrículo

Os dados acima não são suficientes para se deter-minar a função cardíaca completa S = S(vD; pa: i), maspodemos determinar aproximadamente a dependência deS com a vD supondo uma relação linear entre as duasvariáveis. Por razões teóricas é mais interessante escre-ver a função cardíaca na forma S = S(v), em que v desig-na o volume médio de sangue no ventrículo dado por

T

dttvv

Tt

t i∫+

=)(

(1),

sendo vi(t) o volume de sangue no ventrículo no instan-te t e T o período cardíaco.

Segundo os dados experimentais de Little &Downer (1990), a maior parte do aumento do volume desangue no ventrículo ocorre no primeiro terço da diástole.Considerando ainda que a duração da diástole é aproxi-madamente o dobro da duração da sístole, o resultado daintegral na Equação (1) é aproximadamente

v 3)ESVEDV2( +

≅ (2),

sendo EDV (end diastolic volume) o volume diastólicofinal e ESV (end sistolic volume) o volume sistólico final.

Utilizando a Equação (2) e os dados da Tabela 1,obtemos os valores de v que estão na Tabela 2.

Condição Repouso Exercício 1 Exercício 2 Exercício máximo Postura Sentada supina Sentada supina Sentada supina Sentada supina

EDV (ml) 85 107 113 123 117 137 116 135 ESV (ml) 32 34 28 31 24 32 19 29

S (ml) 55 76 85 92 92 105 99 106 HR (beats/min) 89 71 124 100 165 133 182 172

BP (mmHg) 125/84 125/76 161/86 152/81 190/89 169/91 204/91 206/96 CO (l/min) 4.8 5.4 10.4 9.1 15.1 13.8 18.0 18.3

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3.2 Pressão arterial média

A pressão arterial média, num período cardíaco, édada por

T

dttpp

Tt

t aia∫

+

=)(

(3),

em que pai(t) é a pressão arterial no instante t.

Para a condição de estado estacionário a Equa-ção (3) dá aproximadamente o resultado

32 SD

app

p+

≅ (4),

sendo pD a pressão diastólica e pS a pressão sistólica.

A Equação (4) e os dados da Tabela 1 dão, para apressão arterial média pa, os resultados que estão na Tabela 2.

3.3 Relação entre o volume diastólico final (EDV)e o volume sistólico final (ESV)

A razão EDV/ESV pode ser útil na busca de umparâmetro que indique a contratilidade do miocárdio. Comos dados da Tabela 1 obtemos os valores da razão EDV/ESV que estão na Tabela 2. Indicamos por <EDV/ESV> amédia dos valores de EDV/ESV para as posturas sentadae supina, correspondentes a cada condição de exercíciofísico.

Definamos o parâmetro u por

0ESV/EDVESV/EDVu

⟩⟨⟩⟨

= (5),

em que <EDV/ESV>0 é o valor da razão <EDV/ESV> cor-respondente ao repouso. O parâmetro u indica a intensi-dade relativa do nível de exercício, em relação à condiçãode repouso.

Tabela 2 - Volume médio de sangue v; pressão arterial média pa; razão <EDV/ESV>; parâmetro u

<EDV/ESV> é a média dos valores de EDV/ESV para as posturas sentada e supina, correspondentesa cada condição de exercício físico; u = <EDV/ESV>/<EDV/ESV>0, sendo <EDV/ESV>0 o valor da razão<EDV/ESV> correspondente ao repouso. O parâmetro u indica a intensidade relativa do nível deexercício, em relação à condição de repouso.

3.4 Funções cardíacas

Suponhamos a relação linear

S = a + bv (6),

sendo a e b constantes a serem determinadas.

Dos valores de S que se encontram na Tabela 1 edos valores de v na Tabela 2, obtemos para a e b osresultados que estão na Tabela 3.

Condição Repouso Exercício 1 Exercício 2 Exercício

máximo Postura Sentada/supina Sentada/supina Sentada/supina Sentada/supina v (ml) 67 83 85 92 86 102 84 100

pa (mmHg) 98 92 136 128 156 143 166 169 EDV/ESV 2.7 3.1 4.0 4.0 4.9 4.3 6.1 4.7

<EDV/ESV> 2.9 4.0 4.6 5.4 u 1 1.4 1.6 1.9

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Tabela 3 - Constantes a e b da função linear (6)

Condição Repouso Exercício 1 Exercício 2 Exea (ml) − 32 0.0 23

.b 1.3 1.0 0.8 x (ml) 0.0 32 55

y 0.0 − 0.3 − 0.5

Vamos indicar por

S0 = a0 + b0v (7),

a função cardíaca correspondente à condição de repou-so. Para uma condição de exercício escrevemos

S = a + bv = a0 + b0v + x + yv (8),

em que x = a - a0 e y = b - b0 , sendo que os valores dex e y estão na Tabela 3.

Com os resultados da Tabela 3, escrevemos paraas funções cardíacas

S0 = a0 + b0v = - 32ml + 1.3v (9),

S1 = a1 + b1v = 1.0v (10),

S2 = a2 + b2v = 23ml + 0.8v (11),

Sm = am + bmv = 66ml + 0.4v (12),

respectivamente, para as condições de repouso, nível 1 deexercício, nível 2 de exercício e nível máximo de exercício.

Definir um índice de contratilidade é ainda um pro-blema aberto. Muitos índices têm sido propostos, porémnenhum é inteiramente satisfatório (Milnor, 1990). Comouma tentativa de definir um índice que seja empiricamenteútil, consideremos a relação EDV/ESV (volume diastólicofinal/volume sistólico final) que deve aumentar com oaumento da capacidade de contração do miocárdio.

Os resultados apresentados na Tabela 2 mostramque o parâmetro u =<EDV/ESV>/<EDV/ESV>0 aumentacom o aumento do nível de exercício.

Das Equações (7) e (8) obtemos

S = S0 + ∆S (13),

em que

∆S = x + yv (14),

representa a variação do volume de ejeção em

conseqüência dos exercícios.

Podemos determinar a relação entre ∆S e u na apro-ximação linear. Com os valores de x , da Tabelas 2, e com osvalores de u da Tabela 3, indicamos num gráfico cartesianoos pontos experimentais (u;x), como mostra a Fig. 1. Naaproximação linear, a relação entre x e u é dada por

x ≅ 100(u - 1) (15).

Fig. 1 - x em função de u. A reta representa a Equação (15).

Analogamente, indicamos num gráfico cartesianoos pontos experimentais (u;y), como mostra a Fig. 2. Naaproximação linear a relação entre y e u é dada por

y ≅ 0.9(1 - u) (16).

Fig. 2 - y em função de u. A reta representa a Equação (16)

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Das Equações (13) – (16) resulta

S = S0 + 100(u- 1) + 0.9(1 - u)v (17).

A Equação (17) mostra que S = S0 quando u = 1.

Pela Tabela 2 temos a0 ≅ -32ml e b0 ≅ 1.3, de modoque as Equações (7) e (17) dão

S = -32ml + 1.3v + 100(u - 1)ml + 0.9(1 u)v (18).

As funções cardíacas S0, S1, S2 e Sm, dadas, res-

pectivamente, pelas Equações (9)-(12), podem ser obti-das, aproximadamente, da Equação (18) tomando-se osvalores adequados de u.

A Fig. 3 mostra as funções cardíacas S = S(v; u),para os diferentes níveis de exercício, como uma família decurvas parametrizada em u. Segundo os dados da Tabela 2,o volume médio de sangue, v, no coração, variou de 67ml a102ml. Para esta faixa de valores de v, a Figura 3 mostra quea reta que representa S0 , dada pela Equação (18), tomando-se u = 1, situa-se abaixo das retas que representam as fun-ções cardíacas em diferentes níveis de exercício.

Fig. 3 - Funções cardíacas parametrizadas em u.

4. DISCUSSÃO E CONCLUSÃO

A análise matemática do problema da respostacardiovascular a exercícios físicos mostrou a importân-cia de se determinar a função cardíaca basal, correspon-dente à condição de repouso, pois é em relação a ela quese pode analisar as variações causadas pela realizaçãode exercícios. Para uma determinação mais completa dasfunções cardíacas são necessários mais dados experi-mentais do que os apresentados por Poliner et al. (1980).Por exemplo, para se determinar a influência da pressãoarterial sistêmica sobre a função cardíaca, seria necessá-rio fazer mais medidas correspondentes a cada nível deexercício, com a inclusão de outros valores dos volumesde sangue além daqueles apresentados para as posturassupina e sentada. Tais medidas podem ser feitas utilizan-do-se camas de inclinação variável, que possibilitem va-riar a pré-carga (volume diastólico final).

O aumento do volume de ejeção com o aumentodo nível de exercício pode resultar do aumento dacontratilidade do músculo cardíaco e/ou diminuição daresistência ao fluxo sangüíneo, de modo que o parâmetro

u pode incluir a influência dos dois fatores. Por essarazão não identificamos u com o índice inotrópico i queindica o estado de contratilidade do músculo cardíaco.Com os dados de Poliner et al. (1980) não é possívelcalcular a importância relativa de cada um dos dois fato-res no aumento do volume de ejeção. Seria interessantedeterminar a função cardíaca, na condição de repouso,após a administração de uma substância inotrópica, ecomparar os resultados com as funções cardíacas paradiferentes níveis de exercício. Talvez a comparação dasfunções cardíacas ajudasse na estimativa da importânciarelativa de cada fator no aumento do volume de ejeção.

As Equações (14) - (12), assim como a Fig. 3, mos-tram que o aumento do volume de ejeção, ∆S, com oaumento do nível de exercício depende do volume médiode sangue no coração (pré-carga). Essa dependênciapode significar que a contratilidade miocárdica dependeda pré-carga, o que nos faz lembrar a afirmação de Milnor(1990) de que talvez não seja possível definir um índicede contratilidade miocárdica independente da pré-carga.

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5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Células-tronco: revisão sobre os conceitos básicos

Karina Teixeira Naves *Newton Soares da Silva **

Cristina Pacheco Soares **

Resumo: Uma das mais fascinantes áreas da Biologia hoje é sem dúvida a que estuda as células-tronco. Este tipo celular é objetivo de grande interesse devido às suas propriedades biológicas eseu importante potencial médico. No entanto, assim como muitos outros campos em expansão, apesquisa em células-tronco tem levantado questões do mesmo modo como tem gerado novas desco-bertas. Para que se inicie uma pesquisa com células-tronco, seja qual for seu objetivo, é necessáriohaver uma compreensão dos fundamentos básicos conhecidos sobre o assunto. Com isto em mente,esta revisão tem por objetivo fundamentar conceitos que envolvam os diferentes tipos conhecidosde células-tronco, bem como suas propriedades principais, o que inclui os aspectos de origem,produção, capacidade de auto-renovação e diferenciação com ênfase mais especificamente nascélulas-tronco hematopoiéticas.

Palavras-chave: Célula-tronco, medula óssea, diferenciação.

Abstract: Undoubtedly one of the most fascinating areas of biology today is the one that studiesstem cells. This kind of cell has been object of great interest due to their biological properties andits important medical potential. Nevertheless, as many others expansion areas, stem cell researchhas arisen questions as well as generated new discoveries. Therefore it is important to have acomprehension concerning the stem cells basic concepts before starting a research about thistheme. Considering that, this review aims to substantiate concepts involving known different kindsof stem cells, their major properties, which include aspects of origin, production, self-renewal capacityand differentiation. This review will focus more specifically on hematopoietic stem cells.

Key words: Stem cell, bone marrow, differentiation.

* Mestranda em Ciências Biológicas - UNIVAP, 2006.** Professor(a) da UNIVAP.

1. INTRODUÇÃO

As células-tronco são geralmente definidas comocélulas clonogênicas capazes de se auto-renovar e de sediferenciar em diferentes tipos celulares (METCALF;MOORE, 1971). São primariamente divididas em células-tronco embrionárias e células-tronco adultas. Ambos ostipos são capazes de se auto-renovarem e de se diferenci-arem (KAMMINGA; HAAN, 2006). Através do processode uma única divisão celular, uma célula-tronco pode darorigem a uma nova célula-tronco como também a um pro-genitor mais diferenciado (HO, 2005). O papel normal deuma célula-tronco no organismo animal é prover os dife-rentes tipos celulares que, durante o desenvolvimento,irão formar os diversos tecidos e órgãos (MARTIN, 1980).Além das propriedades de auto-renovação e de capacida-de de diferenciação, há ainda outras propriedades queestas células apresentam, como, por exemplo, a habilidade

de sofrer divisão celular assimétrica, exibir uma incrívelcapacidade de auto-regeneração, existir em uma forma dequiescência mitótica e, através de clonagem, regenerartodos os diferentes tipos celulares que constituem o teci-do em que estão (HALL; WATT, 1989; POTTEN;LOEFFLER, 1990). A possibilidade de uma célula-troncohematopoeiética de um mamífero adulto ser capaz de setransdiferenciar em tecidos diferentes daquele em que estáinserida deu origem ao conceito de plasticidade das célu-las-tronco, o que tem causado grande euforia na comuni-dade científica em vista da possibilidade de essas célulaspoderem ser empregadas na prática de regeneração de te-cidos e órgãos (ORLIC et al., 2003; WAGERS et al., 2002).Nesta revisão, serão abordados temas para a compreen-são deste campo. Será, portanto, mais focada no entendi-mento das células-tronco hematopoiéticas.

2. REVISÃO

2.1 O que são células-tronco e onde podem ser encontradas

Há muito as células-tronco têm sido descritas comocélulas indiferenciadas com capacidade de se proliferar, se

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auto-renovar, de gerar uma grande progênie diferenciada ede regenerar tecidos (BLAU et al., 2001; SUDA et al., 2005).

Segundo Whittaker (2004), as células-tronco po-dem ser classificadas de acordo com seu potencial dediferenciação. A este respeito podem ser:

a) Pluripotentes, as quais podem se diferenciarpara produzir células de qualquer tipo encontradas nocorpo humano;

b) Multipotentes, as quais podem se diferenciarem diversos (mas não todos) tipos celulares encontra-dos no corpo humano;

c) Unipotentes, as quais têm a capacidade de sediferenciar somente em um tipo celular específico.

Entretanto, uma classificação mais completa dascélulas-tronco é dada por Chapman e colaboradores (1999):

Células-tronco Totipotentes: são as que têm acapacidade de dar origem a um organismo inteiramentefuncional assim como originar todos os tipos celularesdo corpo. Segundo Rippon e Bishop (2004) as células-tronco totipotentes são de extrema importância para oorganismo, pois fornecem a matéria-prima para o desen-volvimento de tecidos e órgãos do embrião.

Células-tronco Pluripotentes: também chamadasembriogênicas, são as capazes de dar origem a teorica-mente todos os tipos celulares, mas não a um organismofuncional;

Células-tronco Multipotentes: trata-se de célu-las em um estágio mais avançado de diferenciação, istoé, originam um número limitado de tecidos.

As células-tronco adultas são célulasmultipotentes indiferenciadas que residem em um tecidoadulto e que ainda mantêm a capacidade de se auto-re-novar e de gerar células diferenciadas (XI et al., 2005).Por residirem em um tecido adulto, estas células são tam-bém chamadas tecido-específicas e estão depositadasem vários nichos ao longo do corpo, como, por exemplo,na medula óssea, no cérebro, no fígado, na pele, comoparte do mecanismo de manutenção do tecido, cresci-mento e reparo (LAVKER;SUN, 2000; UCHIDA et al., 2000;VESSEY; de la HALL, 2001; WAGERS et al., 2002).Whittaker (2005) em seu trabalho descreveu que osblastocistos de embriões são uma fonte de células-tron-co pluripotentes, enquanto que o tecido fetal dá origem acélulas-tronco pluripotentes e multipotentes. Outra fon-te é o cordão umbilical, que origina células multipotentes.

2.2 Propriedades das células-tronco

Um grande número de propriedades, além da auto-renovação, capacidade de regeneração de tecidos e dopotencial de diferenciação, é freqüentemente atribuídoàs células-tronco. Estas propriedades incluem habilida-de de se dividir de modo assimétrico e existir em umaforma mitótica quiescente (HALL; WATT, 1989; POTTEN;LOEFFLER, 1990).

Divisão simétrica versus divisão assimétrica

Acredita-se que as células-tronco sofram uma divi-são celular assimétrica determinada intrinsecamente, quedá origem a uma filha (progenitor) diferenciada e a uma ou-tra filha que ainda mantém as características de célula-tron-co. Entretanto, mesmo que haja claros exemplos deste tipode divisão em Hirudo medicinalis, Drosophilamelanogaster e em Caenohabditis elegans, existem fortesevidências de que, em mamíferos, a divisão ocorre de ma-neira simétrica. A divisão simétrica permite que o tamanhodo “pool” de células-tronco seja regulado por fatores quecontrolam a quantidade de divisão com fins de diferencia-ção e de divisão para auto-renovação (MORRISON et al.,1997; POTTEN; LOEFFLER, 1990).

Quiescência mitótica

Outra propriedade compartilhada por algumas, masnem todas, células-tronco é a de se dividir lentamente oude forma rara. Acredita-se que isto seja verdadeiro paracélulas-tronco da pele (LAVKER et al., 1993) e da medulaóssea (MORRISON; WEISSMAN, 1994). Porém, outrostipos de células se dividem mais rapidamente. Portanto, demodo geral, pode ser verdadeiro afirmar que células-tron-co de tecidos adultos são mais propensas a um ciclo lento,entretanto esta quiescência não é uma propriedade obri-gatória das células-tronco (MORRISON et al., 1997).

2.3 Medula óssea e célula-tronco hematopoiética

A medula óssea é o tecido compreendido no centrodos ossos longos do corpo. É o lugar onde novas célulassangüíneas são produzidas. A medula óssea contém doistipos de células-tronco: a hematopoiética e as células doestroma (ou mesenquimais). As células-troncohematopoiéticas normalmente se diferenciam em células dosangue, enquanto as células do estroma produzem célulasde origem mesodérmica, como, por exemplo, osteócitos,condrócitos, adipócitos e miócitos (MAGAKI et al., 2005).

Historicamente, as células-tronco hematopoiéticas(HSC - hematopoietic stem cell) têm sido as células maisextensivamente estudadas na biologia das células-tron-co adultas. Isso se deve, em grande parte, à relativa faci-lidade de se isolar uma medula óssea (HÜTTMANN;

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DÜHRSEN, 2003). Devido às suas propriedades biológi-cas e utilidade terapêutica, tem havido verdadeiros es-forços para que seja feita a sua caracterização fenotípicae a identificação dos mecanismos moleculares envolvi-dos no controle das suas funções (BALAZS et al., 2006).

Plasticidade

Sendo uma célula adulta, a HSC tem a capacidade dedar origem a um número não tão abrangente de células.Sendo assim, a possibilidade de uma célula-troncohematopoeiética de um mamífero adulto ser capaz de setransdiferenciar em tecidos diferentes daquele em que estáinserida deu origem ao conceito de plasticidade das células-tronco, o que tem causado grande euforia na comunidadecientífica em vista da possibilidade de essas células pode-rem ser empregadas na prática de regeneração de tecidos eórgãos (ORLIC et al., 2003; WAGES et al., 2002).

Como postulado, transdiferenciação ou plasticidadedas células-tronco diz respeito à conversão de uma célula-tronco de determinado tecido em uma célula tronco de umalinhagem inteiramente distinta. Este processo implica em umaperda concomitante dos marcadores celulares específicos eda função da célula original e aquisição de marcadores efunção do tipo celular transdiferenciado (KUCIA et al., 2005).

Regulação do número de células-troncohematopoiéticas

Em ratos jovens, a freqüência de HSCs em tecidoshematopoiéticos é relativamente constante. Alguns mo-delos propuseram que as HSCs permanecem fora do ci-clo celular durante muito tempo da vida do animal. Então,uma ou poucas células hematopoiéticas de cada vez sãorecrutadas para a hematopoiese e, quando elas atingemo fim da sua vida reprodutiva, uma célula ou poucas cé-lulas as repõem (WEISSMAN, 2000). Isso iria exigir ummecanismo de regulação extremamente eficiente e ummecanismo de “feedback” quase que mágico para con-trolar a entrada de apenas uma ou poucas células decada vez na hematopoiese. Contrário a esta hipótese,experimentos subseqüentes mostraram que em ratos jo-vens cerca de 8 a 10% das HSCs entram, ao acaso, nociclo celular por dia e que, ao fim de 1 a 3 meses, todas ascélulas hematopoiéticas entraram no ciclo celular(BRADFORD et al., 1997).

O número ou a freqüência de muitos tipos celula-res é regulado, em parte, pela morte celular programada(ou apoptose). As HSCs não são exceção. Estudos queutilizavam HSCs transgênicas que superexpressavam aproteína anti-apoptótica Bcl-2 mostraram que houve umaumento gradual na quantidade de HSCs, o que sugereque o número de HSCs é, em parte, regulado pelaapoptose (DOMEM et al., 2000).

Fig. 1 - Modelo dos destinos alternativos das células-troncohematopoiéticas.

Fonte: WEISSMAN, 2000.

Fig. 2 - Rota das células-tronco.Fonte: BLAU; BRAZELTON; WEIMANN, 2001.

Células-tronco hematopoiéticas em outros teci-dos e órgãos em mamíferos

As investigações dos últimos anos têm apoiado acapacidade das células-tronco hematopoiéticas de se dife-renciarem em outro tecidos tanto in vivo como in vitro(COLINO, 2003). A Fig. 2 mostra um esquema deste conceito:

A progênie resultante da divisão de HSCs pode seauto-renovar, se diferenciar (gerando um progenitor maisdiferenciado), entrar no processo de morte celular progra-mada ou se mobilizar pela corrente sanguínea (Fig. 1).

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A Fig. 2 ilustra as características das células-tron-co adultas, que incluem plasticidade, diversidade de ori-gem e multiplicidade de tecidos em que pode se diferen-ciar. As células-tronco são capazes de interagir com di-versos tecidos partindo da corrente sanguínea (a “rodo-via”) para gerar tipos celulares apropriados em respostaa sinais do tecido em que se encontram ou de fatores decrescimento, aqui ilustrados pelo “outdoors”. (Extraídode BLAU et al., 2001).

Algumas células-tronco podem transitar pela cir-culação e ter acesso a outros órgãos do corpo. Células-tronco derivadas da medula óssea entram em diferentesórgãos, alguns bem documentados experimentalmentecomo o coração, o cérebro, o músculo esquelético ou ofígado (BITTNER et al., 1999; BRAZELTON et al., 2000;JACKSON et al., 1999; LAGASSE et al., 2000; MEZEY etal., 2000). Sinais emitidos pelo tecido (“homing signals”)podem ser resultantes de dano local, o que irá influenciara migração de células-tronco até sítios específicos(BUTCHER, 1991). Fatores de crescimento induzem ascélulas-tronco a participarem da função do órgão com oqual interagem. Portanto, o microambiente (o contato comcélulas vizinhas, com a matriz extracelular ou com o meiolocal), assim como fatores de diferenciação, desempenhaum papel-chave na determinação das funções de umacélula tronco. Sabe-se que dentro de órgãos como o cé-rebro, o fígado e o músculo esquelético, existem popula-ções de células-tronco exclusivas para o reparo do teci-do em que residem. Acredita-se que as células-troncopossam entrar nestes tecidos para tanto contribuir com apopulação já existente ali, como também para gerar célu-las diferenciadas (BLAU et al., 2001).

3. CONCLUSÃO

Os avanços nas pesquisas com células-tronco têmsido vistos por todo o mundo. Muitos esforços têm sebaseado na caracterização destes tipos celulares paraque sejam mais bem conhecidos e assim aplicados a finsclínicos e terapêuticos. Ainda existem muitas questões aserem respondidas e muitos estudos a serem realizados,mas certamente este é um campo muito promissor queainda gerará muitos benefícios para a ciência médica.

4. AGRADECIMENTOS

Este trabalho contou com o apoio da CAPES –Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de NívelSuperior.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Efeito da Irradiação Laser de Baixa Potência Arsianeto deGálio Alumínio (ASGAAL) de 785nm sobre a Cicatrização

de Lesão Muscular: estudo experimental

Getúlio Antonio de Freitas Filho *Maria de Fátima Rodrigues da Silva *

Marcelo Emílio Belleti **Evandro dos Reis Machado **Newton Soares da Silva ***

Resumo: Uma das intervenções fisioterapêuticas para lesões musculares é a irradiação laser debaixa potência. Neste trabalho, foi utilizado o laser de baixa potência de 785nm e densidade deenergia de 4 J/cm2 com o objetivo de avaliar seus efeitos sobre o processo inflamatório e fibrascolágenas do músculo esquelético de ratos após trauma mecânico. Foram utilizados 48 ratos dalinhagem Wistar divididos aleatoriamente em três grupos: Grupo Controle Normal (GCN), GrupoControle Lesionado (GCL) e Grupo Lesionado e Tratado (GLT), todos contendo 16 animais, subdi-vididos em subgrupos de 8 animais para análises no oitavo e décimo quinto dias após a lesão.Foram feitas lesões no músculo gastrocnêmio, por impacto de um pino de 320g solto sobre omúsculo a 21cm de altura. A terapia laser foi iniciada com uma aplicação duas horas após a lesãoe mais três aplicações em dias alternados. O grupo controle foi submetido a um tratamento seme-lhante com o aparelho laser desligado. Os músculos foram fixados em formol e processados emparafina. Foram feitas colorações com hematoxilina-eosina, vermelho picrossírius e fast green. Asanálises histomorfométrica indicaram que a terapia laser estimulou significativamente a deposi-ção do colágeno nos músculos tratados em comparação aos músculos não tratados, tanto após oitodias quanto quinze dias após a lesão. A comparação da quantidade de colágeno nos músculosentre o oitavo e décimo quinto dias indicou também o aumento em sua produção na fase mais tardiada lesão. A análise histológica mostrou que não houve alterações no processo inflamatório, quantoao número de fibroblastos, macrófagos e monócitos em relação aos grupos tratados e gruposcontroles. Portanto, concluiu-se que doses de 4/cm2 de Al-Ga-As do laser de 785 nm não promove-ram mudanças quanto ao número de células do processo inflamatório e neovascularização, masaumentaram a deposição de fibras colágenas entre as fibras musculares, sugerindo que a terapialaser estimula a síntese de colágeno.

Palavras-chave: Lesão muscular, colágeno, laser 785 nm.

Abstract: One of the physical therapeutic interventions for the injured muscles is the low potencylaser irradiation. In this work, low potency laser of 785nm and energy density of 4 J/cm2 was usedto test its effects on the inflammatory process and collagen’s fibers of skeletal muscles of rats aftermechanical trauma. Forty-eight rats of Wistar lineage were used and randomly divided in threegroups: Normal Control Group (NCG), Injured Control Group (ICG) and Injured and TreatedGroup (ITG), each one containing 16 animals, subdivided in 8 subgroups for analyses on the eighthand fifteenth days after the injury. Injuries were made in the gastrocnemius muscle, by the impact ofa pin with 320g released on the muscle at 21 cm in height. The laser therapy application started 2hours after the injury with three other applications in alternated days. The control group wassubmitted to a similar treatment with the laser equipment turned off. The muscles were stuck in

* FESURV-Universidade de Rio Verde - GO.** UFU - Universidade Federal de Uberlândia.*** Professor da UNIVAP.

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formol and processed in paraffin. Colorations were done with hematoxilyn-eosin, picrosirius redand fast green. The histomorphometric analysis indicates that the laser therapy stimulatedsignificantly the collagens deposition in the treated muscles in comparison with non-treated muscleseither after eight or fifteen days of the injury. The comparison of the collagen quantity in the musclesbetween the eighth and fifteenth days indicated the increase in their production at the injury’s laterstage too. The histology analysis showed that there were not any alterations in the inflammatoryprocess, in the number of fibroblasts, macrophages and monocytes in relation to the treated groupsand control groups. Therefore, it was concluded that the 4J/cm2 of Al-Ga-As laser doses, didn’tprovoke changes in the numbers of cells in the inflammatory process and neovascularization, butincreased the collagen‘s fibers deposition between the muscles fibers, suggesting that the lasertherapy stimulates the collagen synthesis.

Key words: Muscle injure, collagen, laser 785 nm.

1. INTRODUÇÃO

A perspectiva para a utilização do laser de baixapotência como forma terapêutica tem sido investigadadesde a década de 60. Estes estudos mostram que estaforma de radiação pode estimular processos biológicos,em especial os processos de reparo tecidual (MESTER;KORENVI-BOTH; SPIRY; TISZA, 1975).

Dentre os tecidos biológicos o músculo é o maisplástico, isto é, capaz de se remodelar frente a estímuloscomo atividade física, condições de nutrição, inervação,eletroestimulação, imobilização e alterações de condiçãohormonais (ROSE; ROTHSTEIN, 1982). O músculoesquelético é também um dos mais afetados por atividadesesportivas e traumas decorrentes de atividades de vida diá-ria. A rápida recuperação deste tecido mantendo suas pro-priedades mecânicas e desempenho é importante para oindivíduo lesionado em especial para atletas que necessi-tam de sua máxima eficiência durante as competições.

Estas lesões muitas vezes exigem longo tempo deimobilização e uso de antiinflamatórios que podem pro-vocar o aumento no número de fibras colágenas, bemcomo alterações em sua orientação espacial e diminuiçãoda quantidade de fibras musculares. Estas alteraçõescontribuem para mudanças nas funções e propriedadesbiomecânicas do músculo (TABARY et al., 1972;WILLIAN; GOLDSPINK, 1984; YAMAMOTO et al.;1996; JARVINEN et al., 2002; MEDRADO; PUGLIESE;REIS; ANDRADE, 2003).

O principal constituinte do tecido muscular sãoproteínas contráteis que por sua vez são envolvidas pelotecido conjuntivo constituído por colágeno e elastina,as quais formam o endomísio, epimísio e perimísio. Estesenvoltórios do tecido muscular dão ao músculo elastici-dade e flexibilidade, além de ligar o músculo aos ossos edistribuir as forças da contração muscular. Após umainjúria, o músculo passa por um processo de regenera-ção das fibras musculares danificadas e a produção de

um tecido conjuntivo de cicatrização. Este tecidocicatricial em excesso pode ser uma barreira mecânicapara inibir a regeneração muscular (FISHER et al., 2000;BODINER-FOWLER, 1994).

A terapia laser de baixa potência apresenta efeitofotobiológico, estimulando a síntese de ATP, de colágeno,proliferação celular dentre outros eventos celulares. Des-sa forma, podem ocorrer efeitos analgésicos,antiinflamatórios e reparadores. Porém, estes efeitos de-pendem de fatores como comprimento de onda do laser,dose e tempo de aplicação (KARU; PYATIBRAT;KALENDO, 1995; PEREIRA et al., 2002;BOURGUIGNON-FILHO et al., 2005).

Estudos utilizando os lasers 904 e 632,8 nm sobreregeneração do músculo esquelético mostraram que o laserde 904nm não influenciou a regeneração muscular em mús-culo lesionado por miotoxina em camundongo (OLIVEIRAet al., 1999). Por outro lado, o ensaio utilizando laser de632,8 nm, com capacidade menor de penetração, nas mes-mas condições, influenciou a regeneração de modo dosedependente (AMARAL et al., 2001). Assim, é importantedeterminar o efeito da terapia laser sob diferentes condi-ções de aplicação em lesões musculares.

O presente trabalho avaliou o efeito da terapiautilizando densidade de energia de 4 J/cm2 do laser Al-Ga-As de 785nm sobre células do processo inflamatórioe o colágeno do músculo gastrocnêmio de rato lesionadopor impacto.

2. METODOLOGIA

2.1. Animais

Neste trabalho foram aplicados os princípios éti-cos da experimentação animal de acordo com o COBEA(Colégio Brasileiro de Experimentação Animal), tendo sidoaprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Univap,protocolo n° L098/2005/CEP.

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Foram utilizados 48 ratos (Rattus norvergicus),machos da linhagem WISTAR, de mesma idade (70 dias),sexo e massa corporal. Os ratos foram mantidos dentrodas condições ideais para sua espécie, ou seja, tempera-tura a 25°C, umidade 40% e luminosidade dia/noite de 12horas e ventilação adequada e ração sólida e água adlibitum enquanto durou o estudo.

2.2. Grupos experimentais

Os animais foram divididos em três grupos, sendo16 não lesionados, 16 lesionados não-tratados e 16lesionados e tratados. Os grupos por sua vez foram subdi-vididos em dois subgrupos com 8 ratos. Cada subgrupofoi sacrificado no 8º e 15º dias após o início do experimento.

2.3. Mecanismo de lesão

Os animais foram anestesiados com quetamina a5% e xilasina a 2% na proporção de 1:4 em dose de 0,10 a0,15 mL/100g de massa corporal, sendo feito em seguidaa tricotomia delimitando a área a ser contundida. Na re-gião caudal da perna direita.

Optou-se por utilizar uma forma de produção delesão que se assemelhasse ao que ocorre na prática deesportes, bem como em atividades de vida diária. Assim,foi utilizado o aparelho promotor de lesa o qual possibi-lita a realização de lesões por meio de impacto (Fig. 1).

O equipamento promotor de trauma mecânico(PTM) em sua estrutura geral é formado por uma basefixa, um trilho fixo, um suporte móvel e um pino de impac-to como descrito a seguir:

• Base fixa: Tem por finalidade a sustentação detodo o aparelho, bem como servir de base para coloca-ção dos animais em disposição previamente calculadapara que a lesão fosse implantada de conformidade como objetivo inicial;

• Trilho fixo: Parafusado na base fixa, tem por fimservir de trilho por onde irá correr o suporte móvel. Tra-ta-se de uma estrutura quadrangular, o que impede quese altere a trajetória da haste e que esta atinja necessari-amente o ponto determinado, funcionando assim como ocorredor por onde se deslocará a peça móvel;

• Suporte móvel: Em uma de suas extremidadescombina-se com o trilho fixo, onde realiza movimento dedeslocamento vertical, motivado pela ação da aceleraçãogravitacional. Por outra extremidade liga-se ao pino deimpacto, possuindo a capacidade de ser regulada, masque no momento da indução da lesão permanece ajusta-da em altura previamente estabelecida;

• Pino de impacto: Tem por função fazer contatocom o local do animal a ser lesionado, com massa de 320g. O pino foi posicionado sobre o músculo gastrocnêmiodo rato e solto, causando um impacto que provocou le-são muscular.

Fig. 1 - Equipamento promotor de trauma mecânico (PTM).

2.4. Terapia com Laser As-Ga-Al 785 nm

O equipamento utilizado foi o Laser PhysioluxDual (Bioset Brasil) com freqüência de trabalho de 2000Hertz e comprimento de onda de 785 nm – Arseneto deGálio e Alumínio – infravermelho, e LASER em emissãocontínua, com densidade de energia de 4J/cm2, potênciade pico de 70 mW, área do feixe de 0,08cm2 e regime deemissão contínua.

A aplicação da radiação laser Al-Ga-As foi iniciadano primeiro dia, duas horas após a lesão, pelo métodotranscutâneo pontual em apenas um ponto, com dose de4J/cm2. Os animais foram posicionados sobre uma plata-forma, em decúbito ventral com hiperextensão do membroinferior direito. A terapia laser foi realizada no 1º, 3º, 5º e 7ºdia após a lesão. A incidência da irradição foi realizadadiretamente sobre a pele da região lesionada, com o conta-to direto da caneta sobre esta região em ângulo de 90º. Osanimais controle também receberam o mesmo tipo de mani-pulação, porém com o equipamento laser desligado.

2.5. Análise histomorfométrica do colágeno

Ao final de cada fase experimental, os animaisforam sacrificados com dose excessiva de anestésico viaintraperitoneal. Em seguida, os músculos gastrocnêmiosforam retirados por meio de equipamentos cirúrgicos.

Os músculos foram fixados em formol 12% e colo-cados em parafina. Foram feitos cortes transversais de 9mm e processados para coloração hematoxilina-eosina(HE), vermelho picrossírius e fast green.

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A coloração por vermelho picrossírius permite iden-tificar fibras colágenas pela cor vermelha. A coloração docolágeno foi executada usando uma modificação dos mé-todos combinados descritos por Sweat et al (1964) e Dolbere Spach (1987). Inicialmente as lâminas foram imersas por2 minutos em cubeta contendo solução de ácido vermelhopicrossírius, (sirius red e solução saturada de ácido pícrico)por 90 minutos. As amostras foram enxaguadas por 2 mi-nutos em solução 0,01 NHCl, seguido pelo enxágüe por 1minuto em etanol 70%, etanol 100% e xilol.

A coloração por fast green evidencia as fibrasmusculares em verde, permitindo o contraste com as fi-bras colágenas em vermelho para a realização da análisemorfométrica dos tecidos conjuntivos.

As imagens dos cortes histológicos foram obti-das em microscópio Olympus Triocular BX40 acoplado àcâmera Olympus-200, ligada a um computador PC atra-vés de placa digitalizadora Data Translation 3153 comobjetivas de 10X e 40X.

As quantificações morfométricas do colágenoforam feitas a partir da binarização da imagem no progra-ma HLimage. Neste, o colágeno em vermelho se tornapreto em contraste com a coloração verde do músculo,

que se torna branca. O programa calcula a área em preto,resultando na porcentagem de colágeno.

2.6. Análise estatística

Todas as variáveis aferidas no estudo foram ana-lisadas com o auxílio do programa SPSS 12.0 paraWindows. A expressão dos valores está demonstrada emmédia aritmética e desvio-padrão, submetido ao testeestatístico Wilcox ANOVA e t-Student. O nível designificância estabelecido foi de 5 %(p<0,05).

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1. Aspectos da lesão e do processo inflamatóriodo músculo gastrocnêmio em recuperação

Ao exame in vivo, 24 horas após a lesão, foi ob-servado aumento na espessura do músculo, caracteri-zando edema, movimento de retirada do membro àpalpação e hiperemia local. À luz da microscopia ópticaobservou-se que o mecanismo de lesão utilizado nesteestudo promoveu separação das fibras musculares sem,no entanto, apresentar características de injúria muscu-lar como split fibres e núcleos centralizados (Fig. 2).

Fig. 2 - Corte transversal do músculo gastrocnêmio corado com HE, 24 horas após a lesão. Seta: fibra muscular;seta pontilhada: fibroblasto; seta ondulada: células gigantes. Barra: A- 100 µm e B- 25 µm.

Oito dias após a lesão por impacto todos os mús-culos gastrocnêmios lesionados tanto do grupo irradia-do quanto não-irradiado mostraram a presença de célu-las do processo inflamatório como: células gigantes,mononucleados (macrófagos, monócitos) e fibroblastos.Foi observado também que a neovascularização ocorreuem ambos os grupos, porém não há diferença estatistica-mente significante entre a quantidade de células e devasos neoformados quando comparados os grupos tra-tados e não tratados.

Após 15 dias de lesão, observa-se ainda a pre-sença de células relacionadas ao processo inflamatório eneovascularização, tanto no grupo de animais lesionadosquanto no grupo de animais lesionados e tratados, po-

rém, sem diferença estatística entre os grupos.

A comparação entre os grupos tratados oito equinze dias após a lesão também não mostrou diferençaestatística significativa entre número de células inflama-tórias e neovascularização, sugerindo que a terapia lasernão influenciou a evolução do processo inflamatório.

A terapia laser é um dos recursos utilizados em trata-mentos fisioterapêuticos aplicados desde a superfície doorganismo como em casos de cicatrização da pele, ao trata-mento de lesões em tecidos profundos, como o osso(BOURGUIGNON-FILHO et al., 2005). Neste trabalho foiutilizada a terapia laser de baixa potência no comprimentode onda de 785nm. Esta escolha baseou-se em estudos rea-

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lizados por Karu (2003), os quais mostram que os compri-mentos de onda com maior potencial para penetração capa-zes de atravessar o tecido epitelial estão entre 750 a 800 nmestando, portanto, o comprimento de 785nm, dentro da faixaindicada como capaz de atingir a camada muscular.

A literatura traz que a aplicação da radiação laserdurante a fase aguda diminui o processo inflamatório(STAINKI et al., 1998; SCHINDL et al., 2000); baseadonestas informações foi decidido iniciar o protocolo deaplicação logo após a lesão, seguida de três aplicaçõesem dias alternados.

Neste trabalho foi observado que não houve alte-rações no número de células relacionadas ao processoinflamatório. Vários trabalhos utilizando o laser As-Gatanto em lesão muscular por miotoxina quanto em culturade células também demonstram o mesmo efeito (BOUMAet al.., 1996; OLIVEIRA et al., 1999).

Vários trabalhos sugerem a eficácia da terapia laserde baixa potência e baixa intensidade de energia parapromover a diminuição do processo inflamatório como a

diminuição do edema. Porém, poucos trabalhos foramrealizados a fim de verificar o efeito da terapia laser sobrea migração de células para locais de inflamação.

3.2. Análise histomorfométrica do colágeno nomúsculo lesionado

No oitavo dia após a lesão, observou-se que ogrupo irradiado apresentou as fibras colágenas distribu-ídas entre as fibras musculares (Fig. 3). A quantificaçãodo colágeno mostrou que ela é maior no grupo irradiado,sugerindo que a terapia laser estimulou sua produção(p = 0,000) (Fig. 4).

Após quinze dias da lesão, observou-se ainda amaior quantidade de colágeno no grupo irradiado comdiferença estatisticamente significante (p=0,001) (Fig. 4).

A comparação da quantidade de colágeno entre ooitavo e décimo quinto dias nos grupos irradiados mos-trou também maior quantidade de colágeno no décimoquinto dia (p= 0,003) sugerindo que o estímulo à produ-ção de colágeno continuou (Fig. 4).

Fig. 3 - Análise histológica do tecido muscular com 8 das após lesão: A – grupo lesionado não-tratado (GCL); B –grupo controle lesionado e tratado (GLT); C – grupo controle normal (GCN). Análise histológica do tecido

muscular com 15 dias após lesão: D – Grupo lesionado e tratado (GLT); E – grupo controle lesionado não-tratado(GCL); F – grupo lesionado e tratado (GCN). Picrosirius e fastgreen (barra = 100 µm).

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Fig. 4 - Gráfico da porcentagem de colágeno do músculo gastrocnêmio lesionado após a irradiação de 4J/cm2 de laser785 nm. GCN – grupo controle normal, GCL – grupo controle lesionado, GLT - grupo lesionado e tratado (8 e 15 dias).

O músculo é também constituído por tecido con-juntivo, o qual é composto principalmente de fibrascolágenas, produzidas por fibroblastos que formam estru-turas que envolvem o tecido muscular, sendo importantespara distribuir forças geradas pelas fibras musculares e nafixação dos músculos aos ossos. Após uma lesão, ocolágeno pode atuar no processo de cicatrização com oaumento de sua produção. Esta cicatrização por sua vezpode ser desvantajosa quando contribui para diminuir acapacidade funcional do tecido. Dessa forma, é importan-te compreender o efeito da terapia laser sobre o colágenoque envolve o tecido muscular. A terapia laser é um méto-do muito usado dentro dos mais variados protocolos em-pregados, e o que se tem visto é que a terapia laser, apesarde muito estudada, ainda gera controvérsias e dúvidassobre seu efeito na cicatrização do tecido muscular.

De acordo com Letho et al. (1985), a produção decolágeno em músculo lesionado inicia-se dois dias apósa lesão e é mais intensa entre os 5º e 21º dias e diminuilogo após. No presente estudo observou-se que no 8º e15º dia ainda havia produção de colágeno. Como não foiobservada a proliferação de fibroblastos sugere-se que airradiação laser estimulou a síntese de colágeno.

A utilização de terapia laser 904 nm na dose de 4 J/cm2 promoveu a deposição de colágeno em tendões de ra-tos submetidos à tenotomia do tendão calcâneo tanto nafase inicial quanto tardia da lesão (TAVARES et al., 2005).

Estudos realizados por Reddy et al. (1998) mos-tram que a terapia laser estimula a produção de colágenoem tendão lesionado por cirurgia. Análises bioquímicas

revelaram que a quantidade de ligações cruzadas entreas fibras colágenas do grupo tratado era semelhante aogrupo controle indicando que a terapia laser atua de ma-neira a acelerar a renovação do colágeno.

Quando uma terapia laser é aplicada podem-seobter efeitos tanto estimulatórios quanto inibitórios so-bre a proliferação celular ou ativação de seu metabolis-mo. A lei de Arndt-Schultz indica que existem densidadesque não alteram a resposta biológica, doses que estimu-lam e doses que inibem a resposta (SOMMER et al., 2001).Estudos in vitro utilizando laser de 904 nm mostraramque a irradiação de 3 a 4 J/cm2 promove o aumento donúmero de fibroblastos e que a dose de 5 J/cm2 nãosurtiu efeitos sobre o crescimento celular (PEREIRA etal., 2002). Já Schindl et al. (2000) encontraram que emcultura de fibroblastos doses acima de 10 J/cm2 inibem aprodução de colágeno. A dose de 4 J/cm² escolhida nes-te estudo foi utilizada na expectativa de abordar sua efi-ciência no rearranjo do colágeno e eficácia quanto aoparâmetro biomodulador sobre fibras colágenas.

Skinmer et al. (1996) encontraram que a radiaçãolaser de 904 nm em cultura de fibroblastos aumentou asíntese de colágeno e não alterou o número de células,resultado também demonstrado em nosso experimentocom o laser de 785nm. Eles encontraram também que asíntese de colágeno foi maior quando foram feitas aplica-ções por mais de quatro dias. Pogrel et al. (1997), aoutilizarem radiação laser de 830 nm, com diferentes dosese tempos de aplicação, em cultura de fibroblastos, en-contraram que não houve estímulo à proliferação, migra-ção e adesão de fibroblastos. Outros trabalhos, utilizan-

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do o mesmo comprimento de onda, mostraram que esteatua sobre o processo de cicatrização acelerando suasfases, abreviando a fase de exudação e acelerando a fasede reparação, e, ainda, diminuindo o edema, melhorandoo tecido de granulação nas lesões, estimulando a prolife-ração de fibroblastos e miofibrosblastos e, deste modo,aumentando a deposição organizada de colágeno, alémde estimular a formação de retículo endoplasmático, demitocôndrias e de miofibrilas (MEDRADO et al., 2003;PUGLIESE et al., 2003).

Outro trabalho utilizando comprimentos de ondade 635 nm e 780 nm, próximos ao utilizado neste trabalho,mostrou não haver efeito sobre o crescimento do colágeno.E ainda o laser a 3-4 J/cm² tem intenso efeito sobre ocrescimento do colágeno (PEREIRA et al., 2002).

A recuperação muscular pode ocorrer também peloreparo do tecido muscular por meio do preenchimento daárea de lesão por células miogênicas, as quais irão recu-perar a fibra lesionada ou pela formação de nova fibramuscular a partir de células mio-precursoras (ROTH;ORUN, 1985). Neste trabalho não foram observadas alte-rações no tamanho da fibra, na posição do núcleo quepudessem indicar a regeneração muscular tanto no gru-po tratado quanto no controle. Oliveira et al. (1999), emseus estudos sobre o efeito do laser AsGa (904 nm) comdoses de 3 e 10 J/cm2 na regeneração de músculoesquelético lesionado com miotoxina, observaram tam-bém que ambas as doses não promoviam efeitos sobre oprocesso de regeneração muscular.

Amaral et al., (2001) avaliaram o efeito do laserHeNe com comprimento de onda de 632,8 nm e potênciade 2,6 mW, com doses 2.6, 8,4 e 25 J/cm2 aplicados du-rante cinco dias consecutivos, sobre a pele do músculotibial anterior lesionado, e constataram que somente adose de 2.6 J/cm2 proporcionou aumento da fibra muscu-lar e densidade mitocondrial.

A organização do colágeno no músculo sadio oulesionado é de suma importância para a funcionalidademuscular, podendo o excesso aliado à desorganizaçãocausar barreiras mecânicas que inibem a função e/ou re-generação muscular. No campo da fisioterapia, a reabili-tação com sucesso depende do retorno da funcionalida-de do músculo acometido; vários protocolos de trata-mentos são empregados com o objetivo de promoveruma restauração tecidual rápida, mas sem alteração nasatividades normais.

Este trabalho permite concluir que a aplicação de4J/cm2 da irradiação laser de 785 nm pode promover asíntese de colágeno. Porém, este efeito pode não ser fa-vorável à funcionalidade do músculo por ser um tecidode cicatrização.

4. AGRADECIMENTOS

Agradecemos à Empresa Bioset Indústria deTecnologia Eletrônica Ltda à cessão da caneta 785nm deAs-Ga-Al, à Universidade Federal de Uberlândia pela dis-ponibilidade para utilização do Biotério e Laboratório deBioquímica (LABIBI) e Laboratório de Morfologia.

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Inflamação Pulmonar Induzida por Lipopolissacarídeos(LPS) e sua Contribuição como Instrumento de Pesquisas

Daniel de Souza Ramos *Newton Soares da Silva **

Wellington Ribeiro **

Resumo: O sistema imunológico é responsável pela defesa do organismo contra infecções. Pormuito tempo o homem vem buscando formas de reproduzir os quadros dessas doenças, com o obje-tivo de desenvolver tratamentos eficazes e seguros. Os lipopolissacarídeos (LPS) têm sido umaferramenta muito importante para o conhecimento da ação tóxica das bactérias gram-negativas epara o entendimento de como o sistema imune combate tais invasores. Faz-se aqui uma breverevisão sobre as pesquisas, quais as novas descobertas e quais os novos caminhos que estão sendotraçados nessa área de estudos.

Palavras-chave: Inflamação pulmonar, LPS.

Abstract: The immune system is responsible for the defense of the organism against infections. For along time man has been searching forms to reproduce the pictures of these illnesses, with theobjective to develop efficient and safe treatments. The lipopolysaccharide (LPS) has been a veryimportant tool for the knowledge of the toxic action of the gram-negative bacteria and for theunderstanding of how the immune system combats such invaders. This paper does a brief reviewabout the researches, the new discoveries, and the ways being traced in this area.

Key words: Lung inflammation, LPS.

* Mestrando em Ciências Biológicas - UNIVAP, 2006.** Professor da UNIVAP.

1. INTRODUÇÃO

O organismo humano está em constantesuscetibilidade a infecções por microorganismos e bacté-rias, que, dependendo de seu componente de toxicidade,podem vir a causar quadros infecciosos letais. Contudo, oprocesso de evolução da espécie nos qualificou com acapacidade imunológica, que pode se apresentar na formaadquirida, o que nos torna capazes de criar defesas fisioló-gicas contra as agressões, e na forma inata, que envolveprocessos gerais, como a fagocitose (BRODER et al., 1994;COLVIN et al., 1994; GRANSTEIN, 1994).

Com as constantes alterações climáticas, alimenta-res e de hábitos de vida, é cada vez maior a incidência denovas doenças ligadas ao sistema respiratório (SR) (ABBEYet al., 1993; BOBAK, 2000; BRAGA et al., 1999;COMMITTEE OF THE ENVIRONMENTAL ANDOCCUPATIONAL HEALTH, 1996; DOMINICI et al., 2002).Posto isto, as pneumonias permanecem em um patamar dedestaque, alardeando o mundo com ocorrências mais pre-coces e letais entre as populações. Segundo a Organização

Mundial de Saúde, as doenças respiratórias agudas (DRA)em crianças não somente ocorrem, com maior freqüência,como também são mais letais.(BERMAN et al.,1990; SHANN,1986; MCINTOSH, 2002; HEMMING, 1994).

Em 1985 pela primeira vez, a Chlamydiapneumoniae foi reconhecida como agente etiológico deinfecção respiratória no ser humano (SAIKKU et al., 1985).Atualmente é identificada como um agente de pneumo-nia atípica e infecção respiratória alta (GRAYSTON et al.,1986; GRAYSTON et al., 1990; GRAYSTON, 1994), esti-mando-se que 5 a 15% de todos os casos de pneumoniase associem a Chlamydia pneumoniae (PRINCIPI et al.,2001; KUO et al., 1995).O único sorotipo identificado atéa data denomina-se TWAR (SAIKKU et al., 1985;GRAYSTON et al., 1986), A Chlamydia pneumoniae éuma bactéria intracelular obrigatória, com um ciclo devida bifásico, uma forma extracelular infecciosa e umaforma intracelular metabolicamente ativa. Dois a três diasdepois da invasão ocorre infecção de novas células hos-pedeiras. A bactéria multiplica-se nos macrófagosalveolares, células do músculo-liso e células endoteliais,induzindo alterações nos cílios do epitélio pulmonar(KAUPPINEN; SAIKKU, 1995). A Chlamydiapneumoniae transmite-se pelo trato respiratório, ocor-rendo primariamente em crianças dos cinco aos quinze

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anos de idade, as reincidências de infecções são freqüen-tes, mas estima-se que 50% dos adultos tenhamanticorpos para este agente (GRAYSTON et al., 1990;NIKI; KISHIMOTO, 1996; BLASI et al., 1998).

Embora nosso sistema imunológico produzaanticorpos e a medicina conte, hoje, com uma gama varia-da de vacinas para o combate a infecções, existem bactéri-as que liberam substâncias, como os lipopolissacarídeos(LPS), que são os componentes tóxicos das bactérias gram-negativas (BA, 1998), cujo grau de toxicidade em um qua-dro avançado da infecção acarreta um processo inflama-tório degenerativo danoso ao tecido, conhecido comosíndrome da disfunção múltipla dos órgãos (MDOS)(BEAL; CERRA, 1994), pois, na tentativa de conter a infla-mação, nosso organismo lança mão de suas células dedefesa como macrófagos e neutrófilos que se deslocamaté o local onde o agente invasor está agredindo o orga-nismo. Estes, por sua vez, liberam uma variada quantidadede sinalizadores que desencadeiam novas cascatas, ati-vando outros mecanismos de defesa e citocinas, como ofator de necrose tumoral (TNF), a interleucina-1 (IL-1) einterleucina-6 (IL-6) que trabalham degradando o agenteinvasor (CAVAILLON et al., 1990). Vários estudos relata-ram associações da imunidade inata a variações nos genesque codificam proteínas especificas, como as TLRs, TNF-a, CD14, e proteína crescente bactericidal/permeabilidade(COHEN, 2002; ARCAROLI et al., 2005). Hoje, a Medicinatem procurado soluções eficazes e que tragam menos con-seqüências posteriores ao organismo afetado. Algumaslinhas de pesquisas têm encontrado substâncias que, alémde possuírem funções bem definidas no organismo, po-dem contribuir para o desenvolvimento de novos trata-mentos. Um bom exemplo são as lipoproteínas dos HDL(EMANCIPATOR et al., 1992).

A partir do contexto exposto buscaremos definirum panorama dos métodos mais utilizados e das desco-bertas que surgem nas variadas linhas de pesquisas afins.Essa revisão apenas objetiva demonstrar o papel dos mé-todos que reproduzem quadros infecciosos, utilizandocomo ferramenta lipopolissacarídeos. E com isso, de umamaneira geral, demonstrar como estão sendo traçados oscaminhos, para que, quem sabe num futuro próximo, oorganismo humano não esteja desprovido de defesa con-tra as inflamações e, por outro lado, deixar um horizonte deopções de linhas de estudo para que novos pesquisado-res possam vir a dar suas contribuições, para o desenvol-vimento de novas vacinas e tratamentos contra invasõesbacterianas e para a compreensão da capacidade de adap-tação dos mecanismos de defesa do organismo humano.

2. DISCUSSÃO

Sendo as inflamações pulmonares motivo de gran-de parte das mortes registradas, muitos estudos procu-

ram reproduzir as condições infecciosas da ação dos LPSsem camundongos (BERMAN et al., 1990; SHANN, 1986;MCINTOSH, 2002; HEMMING, 1994; TATE; REPINE,1983; WEILAND et al., 1986; WOTHERN et al., 1987;NEWMAN, 1985 ). Esse processo se dá a partir da admi-nistração intraperitonial ou através da instilação nasaldos LPSs (TATE; REPINE, 1983; WEILAND et al., 1986;WOTHERN et al., 1987; NEWMAN, 1985 ). Podemosfacilmente através desse modelo dosar o grau de toxicidadedesejado e determinar um estudo dirigido a uma infecçãoaguda ou crônica.

Durante os quadros inflamatórios percebe-se quea resposta imune inata possui um leque de opções paraproteger o organismo do agente invasor, contudo nãopodemos esquecer que alguns dos mecanismos de defesautilizados podem reverter suas função de proteção, tor-nando-se desencadeadores de ferimentos que comprome-tem o tecido afetado. Estudos recentes buscam encontrarrespostas para a ação de vários reguladores do processoinflamatório. Os Nrf2 e a família dos receptores TLR pare-cem ter um papel importante na organização da defesaimunológica inata (BEUTLER et al., 2003; MEDZHITOV;JANEWAY JR, 2000). O receptor TLR4 é capaz de detectarvários LPSs diferentes (CHOW et al., 1999), mas muitosartigos apresentam diferentes resultados com relação aospapéis desse receptor (CHAPES et al., 2001; CHEN et al.,2004; FAURE et al., 2004; HART et al., 2003; LETTINGAet al., 2002; MANN et al., 2004; SCHURR et al., 2005;SING et al., 2003). Higgins e outros descreveram umaaplicabilidade diferente para TLR4 durante a infecção comparapertussis do B. Em seu modelo, o TLR4 parece sermais importante para desenvolver a imunidade adaptável,atuando nas respostas reguladoras (HIGGINS et al., 2003).Vários modelos caracterizam-se pelo aumento dapermeabilidade vascular, acúmulo e ativação de neutrófilose macrófagos, levando-os a liberarem inúmeras citocinas,enzimas proteolíticas, espécies reativas de oxigênio e ni-trogênio e metabólitos do ácido araquidônico (GOODMANet al., 1996; ROSSEAU et al., 2000; FREVERT et al., 1995;KOPYDLOWSKI et al., 1999). Inúmeros desses produtosatuam como sinalizadores para as células que constituemas vias aéreas (músculo liso e células epiteliais principal-mente) e o parênquima pulmonar (pneumócitos tipo II),levando-as a liberarem citocinas e fatores de crescimento,contribuindo para a perpetuação da inflamação, o que cro-nicamente leva a um remodelamento das vias aéreas eparênquima pulmonar, causando alterações estruturaisfuncionais dos pulmões (NAGASE; WOESSNER, 1999;MURPHY; DOCHERTY, 1992).

3. CONCLUSÕES

Diante do volume de experimentos que fazem usodos lipopolissacarídeos conclui-se que sua utilização jáé consolidada no meio científico.

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Nota-se que as células do sistema imunológicoexercem funções variadas e determinadas pelo fator in-feccioso.

Estudos recentes têm encontrado novas citocinase receptores, deixando claro que ainda não estão total-mente definidos os mecanismos específicos de ação dosistema imune.

4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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A Crise Ambiental e a Ecotoxicologia: uma ferramenta naconservação da diversidade biológica

Isabel Cristina Fracasso Póvoa *Newton Soares da Silva **

Maria Regina de Aquino Silva **

Resumo: É relevante destacar a utilização dos recursos naturais como fonte de energia durante aRevolução Industrial o que levou a crise ambiental. Para combater as pragas agrícolas, foramintroduzidos, no início do século XX, os pesticidas, os quais abrangem os inseticidas, os herbicidase os fungicidas, denominados xenobióticos. Outra classe de contaminantes são os metais pesados,os quais são conseqüência da produção comercial. O ciclo antropogênico global resultou napresença de metais pesados e os efeitos de acumulação ao longo da cadeia trófica podem serobservados tanto em ambientes terrestres como aquáticos, afetando a biodiversidade. O Brasil éconsiderado o país da megadiversidade, com 15 a 20% do número total de espécies do planeta;conta com a mais diversa flora do mundo, número superior a 55 mil espécies descritas. Diante danecessidade de preservação surgiram movimentos que deram origem ao conceito de desenvolvi-mento sustentável, como o Clube de Roma, em 1968, 1ª Conferência Sobre o Meio Ambiente, emEstocolmo, 1972, e o relatório de Brundtland proposto pela ‘Comissão Mundial do Desenvolvi-mento e Meio Ambiente’, e, mais recente, em março de 2006, a COP8, “Oitava Conferência dasPartes da Convenção sobre Diversidade Biológica”, realizada no Brasil. E como ferramenta paraa preservação da biodiversidade surge a ecotoxicologia, a qual desenvolve pesquisas que focali-zam degradação ambiental, saúde pública e preservação de recursos naturais. A ecotoxicologiarealiza a importante tarefa da avaliação do risco ambiental, sendo os estudos ecotoxicológicosfundamentais para a sociedade desenvolver planos de recuperação de ecossistemas degradados econservação da biodiversidade.

Palavras-chave: Desenvolvimento sustentável, organoclorados, metais pesados, ecotoxicologia.

Abstract: It is relevant to highlight the natural resources utilization as source of energy during theIndustrial Revolution, which led to an environmental crisis. Pesticides, such as insecticides,herbicides and fungicides, denominated xenobiotics were introduced in the beginning of the 20thcentury to combat agricultural plagues. Another pollutant class is the heavy metals, which areconsequence of the commercial scale production. The anthropogenic global cycle resulted in thepresence of heavy metals and the accumulating effects through the trophic chain can be observedeither in the terrestrial or in the aquatic environment affecting biodiversity. Brazil is considered oneof the countries with great diversity. The country holds 15 to 20% of the total number of species ofthe planet and has the largest diversified flora of the world, a number higher than 55 thousanddescribed species. Due to the need for preservation, movements were created with the concept ofsustainable development for example the Club of Rome, in 1968, The 1st Stockholm Conference onEnvironment, in 1972, the Brundtland report proposed by the ‘World Commission for Developmentand Environment and more recently, in March 2006, the COP8 “Eighth Conference of the Parties inthe Biological Diversity Convention”, held in Brazil. Ecotoxicology emerges in this scenery as atool for the preservation of the biodiversity, and develops research that focus on the environmentaldegradation, public health and natural resources preservation. Ecotoxicology performs the importanttask of evaluating the environmental risk, where ecotoxicolgy studies are fundamental for thesociety to develop plans to recover degraded ecosystems and the conservation of the biodiversity.

Key words: Sustainable development, organochlorines, heavy metals, ecotoxicology.

* Mestranda em Ciências Biológicas - UNIVAP, 2006.** Professor(a) da UNIVAP.

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1. INTRODUÇÃO

Desde os primórdios da humanidade, a natureza,a grande fonte de inspiração dos filósofos gregos, erareferência fundamental para existência humana e o ho-mem era visto como parte integrante desse conjunto defenômenos. Todavia, na Idade Média, o homem come-çou a se afastar da natureza e, com o advento do cristia-nismo, a forma de ver a natureza passou a refletir interes-ses das classes dominantes, sendo pensada e interpreta-da através das Sagradas Escrituras.

Nos séculos XV e XVI o Renascimento trouxe areformulação da idéia sobre a natureza “divina” e o rom-pimento entre a ordem divina e ordem humana. Estasnovas linhas de pensamento, segundo Rocha (2005), le-varam a um carácter antropocêntrico de domínio da natu-reza e o anseio de controlá-la.

Já no século XVII a tese de Galileu Galilei (1564 –1642) derruba a visão clássica do mundo - o Geocêntrismo,adotada pelo cristianismo na perspectiva de São Tomásde Aquino (1224 – 1274) e então a ciência revela o carácterobscuro da natureza utilizando a experimentação e a ma-temática. Assim, a ciência no século XVIII estabeleceu arazão como essência e idealizou a natureza como umrecurso infinito a ser explorado e juntamente a descober-tas e desenvolvimentos tecnológicos culminou a Revo-lução Industrial, que, durante sua primeira fase, levou aoaparecimento das classes rurais e urbanas, implementouum sistema baseado no capital e trabalho assalariado, ocapitalismo (ROCHA, 2005).

É importante destacar a importância dos recursosnaturais como fonte de energia nesse novo sistema. Naprimeira fase da revolução industrial – de 1780 a 1860,revolução do carvão e do ferro – levou a mecanização daindústria e da agricultura. Na segunda fase de revoluçãoindustrial – de 1860 a 1914, revolução do aço e da eletri-cidade – surgiram os primeiros automóveis na Alemanhae Estados Unidos, e novas e revolucionárias formas deorganização de negócios foram implementadas, em de-corrência da acumulação de capital, tais como: forma-ções de cartéis e fusões empresariais.

À medida que os países se industrializavamincrementava-se a produção de alimentos e a melhoranas condições sócio-econômicas e sanitárias e conse-qüentemente a redução da taxa bruta de mortalidade econseqüente aumento da taxa de crescimentopopulacional.

A partir desse novo contexto sócio-econômico, omeio ambiente começou a receber de forma crescente osresíduos industriais e domésticos, impactando-o e con-seqüentemente os recursos naturais. Estes novos pa-

drões de geração de resíduos surgiram em quantidadesmaiores que a capacidade de absorção da natureza, dan-do origem a problemas ambientais, como carência de re-cursos e perda da biodiversidade.

Mediante toda a problemática ambiental, surgemas grandes reuniões ambientais a partir da década de 60e grandes tratados visando a proteção do meio ambien-te. Dentro de todo esse debate, o meio científico vembuscando conhecimentos para sustentar as previsõesdesastrosas do descuido com o meio ambiente e trilhan-do caminhos para seu uso sustentável, preservando abiodiversidade do nosso planeta.

A ecotoxicologia surge nesse momento comogrande ferramenta para validar estudos, pelos quais osdecisores podem se basear nessa grande tarefa da pre-servação.

2. BIODIVERSIDADE

“Diversidade biológica” significa a variabilidadede organismos vivos de todas as origens, compreenden-do, dentre outros, os ecossistemas terrestres, marinhose outros ecossistemas aquáticos e os complexos ecoló-gicos de que fazem parte; compreendendo ainda a diver-sidade dentro de espécies, entre espécies e deecossistemas. (Artigo 2 da Convenção sobre Diversida-de Biológica)

Ninguém conhece, ainda, o número total de espé-cies existentes na Terra, todavia, aproximadamente,1.500.000 espécies de plantas e animais em todo mundoforam descritas. Alguns especialistas estimaram que acontagem final possa atingir entre 10 e 30 milhões, porémestudos realizados recentemente em florestas tropicaissugerem que pode haver 30 milhões de espécies apenasde insetos (WILSON, 1997).

A atividade antrópica vem ocasinando constanteimpacto em populações de espécies e uma quantidadesignificativa está sendo sistematicamente destruída. Pre-sentemente especialistas têm voltado sua maior atençãoàs florestas tropicais, porque embora cubram apenas 7%da superfície terrestre, elas contêm mais da metade dasespécies da biota mundial e estão sendo destruídas eexploradas de maneira agressiva muito rapidamente. Atu-almente, menos de 5% das florestas estão protegidas emforma de parques e reservas e estão vulneráveis a pres-sões políticas e econômicas. De acordo com Wilson(1997), persistindo os atuais níveis de remoção das flo-restas, dentro de um século haverá perda de 12% de 704espécies de aves na bacia amazônica, e de 15% de 92000espécies de plantas nas Américas Central e do Sul.

É importante salientar que a biodiversidade é a

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fonte mais importante de recursos naturais na Terra, de-pendem dela a agricultura, a medicina e a indústria, sen-do sua conservação dependente da amplitude de cadaespécie, de procriação múltipla que apresentam comple-xos padrões de variabilidade genética. Desta maneira,mesmo que uma espécie em perigo seja salva da extinção,dependendo do número de indivíduos, ela provavelmen-te terá perdido muito da sua diversidade genética.

O Brasil é considerado o país da megadiversidade,com 15 a 20% do número total de espécies do planeta;conta com a mais diversa flora do mundo, número superiora 55 mil espécies descritas. A Amazônia, a Mata Atlânticae o Cerrado são exemplos de ecossistemas mais ricos doplaneta e estão localizados em delimitacões brasileiras.

Levando em consideração estas informações te-mos muito clara a importância do Brasil nesse atual con-ceito de recursos naturais e riqueza genética, assim comoo valor de se estabelecerem diretrizes políticas e educaci-onais para sua conservação.

3. CONTAMINANTES NO ECOSSISTEMA

3.1 Organoclorados

Os denominados xenobióticos (inseticidas,herbicidas e fungicidas), compostos orgânicos estranhos,são continuamente descartados no ambiente por comu-nidades urbanas e industriais. No século passado, mui-tos milhares de substâncias orgânicas, como bifenilaspolicloradas (PCBs), praguicidas organoclorados,dibenzofuranos policlorados e dibenzo-p-dioxinas foramproduzidos e uma considerável parcela liberada no meioambiente.

Em 1940, Paul Müeller observou que o DDT(diclorodifeniltricloroetano) era um potente inseticida e seuuso rapidamente se implementou. Durante a Segunda Guer-ra Mundial, na Itália, o DDT em pó foi pulverizado na peleda população para prevenir epidemias de tifo transmitidapor vetores. Müeller recebeu prêmio nobel de medicinaem 1948, pelas milhões de vidas salvas pelo DDT.

O poder residual do DDT, considerado como qua-lidade positiva, começou a ser encarado como sério in-conveniente. Tardiamente se constatou que resíduoshaviam contaminado praticamente todos ecossistemas,e, na década de 60, se intensificaram pesquisas relativasao assunto e começou-se a implantar medidas legaisrestringindo o seu uso. Apesar da restrição, o problemada contaminação tem se agravado e adquirido propor-ções dramáticas, atualmente pode-se encontrar DDT nasregiões polares (D’AMATO et al.,2002).

As PCBs (bifenilas policloradas) são um tipo de

composto organoclorado que foi sintetizado inicialmen-te em 1800 na Alemanha. Estas podem apresentar diver-sas substituições possíveis em relação à quantidade deátomos de cloro, as quais variam de 1 a 10 átomos, po-dendo ser obtidos até 209 estruturas diferentes denomi-nadas congêneres.

A produção industrial das PCBs iniciou em 1920,mas somente depois de mais de 40 anos, em 1966, foireconhecido como contaminante ambiental . Em 1970 teveseu auge na produção com 50.000 toneladas, sendo aindústria eletro-eletrônica a maior consumidora (PENTE-ADO e VAZ, 2001). As PCBs foram muito difundida devi-do principalmente as suas propriedades físico-químicas,como são a alta constante dielétrica e a elevada estabili-dade térmica. Segundo Penteado e Vaz (2001), devido aesse grande emprego, o acúmulo mundial dessa subs-tância foi aproximadamente de 1.200.000 toneladas, e destetotal cerca de 60% foi utilizado em transformadores ecapacitores, 15% para fluídos de transferência de calor e25% como aditivos na formulação de plastificantes, tin-tas, adesivos e pesticidas. Cerca de 40% ou 300.000 to-neladas entrou no ambiente e grande parte do restanteestá em uso em equipamentos eletro-eletrônicos antigos.

No Brasil as restrições foram implementadas em1981; até então o produto era importado principalmentedos Estados Unidos e Alemanha. No entanto, permite-seque equipamentos já instalados continuem em funciona-mento até sua substituição integral.

O BHC (hexaclorobenzeno) é outro exemplo deorganoclorado, que consiste de uma mistura de uma sé-rie de isômeros em diferentes porcentagens e dentre es-tes o mais conhecido é o isômero ã (Lindano) com propri-edades inseticidas.

A legislação brasileira proibiu seu uso em 1985,ficando restrito às campanhas de saúde pública, mas in-felizmente existem áreas muito contaminadas, como noMunicípio de Duque de Caxias, RJ, onde existia uma fá-brica de BHC que foi abandonada em 1965 juntamentecom parte de sua produção, cerca de 300 a 400 toneladas(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2003).

Outros contaminantes a destacar são as dioxinase furanos, os quais são duas classes de compostos aro-máticos tricíclicos, que possuem propriedades físicas equímicas semelhantes. São formados como subprodutonão intencional de vários processos envolvendo o clo-ro, produção de diversos produtos químicos (pesticidas),branqueamento de papel e celulose, incineração de resí-duos, incêndios, incineração de lixo urbano e hospitalar,incineração de resíduos industriais, veículos automotorese outros (ASSUNÇÃO; PESQUERO,1999).

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A seqüência de reações para a formação de furanose dioxinas ainda não é bem conhecida, mas sim suas fontes,que são os PCBs e os processos de combustão respectiva-mente. Estudos em cobaias, como coelhos, macacos e gado,demonstraram que o sistema imune e reprodutivo é atingidopor estas substâncias. A meia-vida da dioxina em seres hu-manos tem sido estimada em 5 a 11 anos, sabe-se, porém,que aumenta com a idade, provavelmente devido ao au-mento de tecido adiposo e à diminuição do metabolismobasal (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2003).

Muitos pontos em relação às dioxinas e furanosainda não estão completamente entendidos, por exemploas tranformações que sofrem na atmosfera na fase vapore os efeitos sinergéticos dessas substâncias no meioambiente (ASSUNÇÃO; PESQUERO, 1999).

Em relação à atmosfera sabemos que a volatizaçãode material organoclorado pode chegar até mesmo em áreasremotas, como o continente Antártico e Ártico, e podeestar distribuídos entre fase gasosa e material particulado.Esta distribuição é influenciada principalmente pela tem-peratura e pressão (PENTEADO; VAZ, 2001).

Com relação a seres humanos, pode-se ressaltarque a persistência ambiental desses compostos pode tra-zer vários efeitos, dentre estes o caso de mulheres emperíodo de lactação que podem mobilizar resíduos deorganoclorados presentes em depósitos corporais (gor-dura), sendo oferecidos aos bebês; contaminantes quepodem estar incorporados na alimentação (MELLO-DA-SILVA; FRUCHTENGARTEN, 2005). Recentes estudosfeitos em salsichas (BOGUSZ et al., 2004) e queijos (SAN-TOS et al., 2006) detetaram a presença de organoclorados,que, apesar de atenderem os limites máximos permitidospela legislação, chamam a atenção, alertando sobre a ne-cessidade de continuar estudos e rever a legislação, le-vando em conta o poder cancerígeno dessas substâncias.

Durante uma reunião do Programa das NaçõesUnidas para o Ambiente, em maio de 2001, em Estocolmo,representantes de 90 países, incluindo o Brasil, assina-ram a Convenção sobre Poluentes Orgânicos Persisten-tes, que visa proibir a produção e o uso de 12 substân-cias tóxicas, atendendo a um apelo da comunidade inter-nacional (NASS; FRANCISCO, 2002).

3.2 Metais Pesados

Os metais pesados talvez sejam os agentes tóxi-cos mais conhecidos pelo homem; há aproximadamente2000 anos a.C. grandes quantidades de chumbo eramobtidas como subproduto da fusão da prata, dando iní-cio à sua utilização.

Embora amplamente utilizado, o termo metal pesa-

do não possui definição única, variando de acordo como ramo da ciência que o aborda, entretanto podemos de-finir que são elementos com a massa atômica maior que ado cálcio.

A emissão de metais pesados no ambiente é con-seqüência da produção comercial específica, mas poroutro lado há emissões não intencionais decorrentes daqueima do carvão, do petróleo, acúmulo de lodos e entu-lhos, e produção de cimento e vidro.

O ciclo antropogênico global implementou a presen-ça de metais pesados, e considerando também os processosda biofera, podemos citar estudos recentes, que descreverama presença de altas concentrações de mercúrio nos PirineosFranceses, região montanhosa que teoricamente não possuifontes de contaminação (BLAIS et al., 2005).

Os efeitos de acumulação ao longo da cadeia tróficapodem ser observados tanto em ambientes terrestres comoaquáticos. Outro aspecto importante a ser considerado é ainteração entre diversos metais e não metais, que podemresultar numa potencialização ou diminuição dos seus efei-tos deletérios, além da interação com substâncias húmicas,que acabam complexando alguns metais.

A seguir apresentam-se alguns metais pesados:

Cádmio (Cd) – É uma descoberta relativamenterecente, foi descrito em 1817. Não possui função biológi-ca e é altamente tóxico a plantas e animais; os níveisnaturais de Cd encontrados normalmente não causamtoxicidade aguda.

É utilizado em galvanoplastia, fabricação de ligas,baterias de Ni-Cd, tubos de TV, pigmentos, esmaltes e tin-turas têxteis, fotografia, lasers, entre outros. Na agricultu-ra, a fonte de contaminação são os fertilizantes fosfatados,os quais interferem no pH do solo, aumentando sua dis-ponibilidade (PIERANGELI et al.,2004) e conseqüentemen-te a concentração do metal nos produtos agrícolas.

Cobre (Cu) – Considerado um dos elementosessenciais mais importantes para as plantas e animais.Os usos principais são na produção de fios e de suasligas, bronze e latão. As minas para extração de cobreproduzem um grande impacto ambiental, disponibilizandooutros metais pesados como manganês e arsênico, osquais possuem potencial carcinogênico (BIDONE et al.,2001). Estudos recentes com peixes demonstram que seuacúmulo nas brânquias leva a alterações na atividade deproteínas responsáveis por trocas iônicas e em altera-ções em fatores bioquímicos modificando o funciona-mento deste organismo (MONTEIRO et al., 2005).

Chumbo (Pb) – O liberado no ambiente possui

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maior tempo de residência comparado com a maioria dospoluentes; tende a se acumular nos solos e sedimentos.O chumbo pode se encontrar em dois estados de oxida-ção, Pb (II) e Pb (IV), que são estáveis, mas no ambienteo elemento predominante é o chumbo bivalente.

Cromo (Cr) – Pode ser introduzido no ambienteatravés de deposições de origem industrial, comocurtumes e siderurgia. Na natureza, o cromo ocorre tantona forma trivalente como na forma hexavalente. Por sermais solúvel , o cromo hexavalente apresenta maiortoxicidade do que na forma trivalente. Diversos estudosevidenciam seus efeitos tóxicos em organismos e plan-tas. Na soja, sua ação reduz absorção de nutrientes efixação de nitrogênio por bactérias aderidas a suas raízes.(CASTILHOS et al., 2001)

Mercúrio (Hg) – O emprego de compostosmercuriais durante décadas na agricultura e seu uso parafins industriais resultaram no aumento significativo dacontaminação ambiental. Grande parte desse mercúrioentra no ambiente como Hg (II) ou elemental Hg (0); apartir desse estado pode ser metilado por caminhosbióticos e abióticos, formando metilmercúrio, a qual ésua forma mais tóxica e acumulativa.

4. DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Sabemos que os processos ecológicos susten-tam a função dos ecosssistemas e que os aspectos maisimportantes são o direcionamento da energia e reciclagemcontínua de materiais.

Quando os processos naturais são rompidos, osecossistemas podem não ser mais capazes de se manterema si próprios. Sendo assim, manter uma biosfera sustentá-vel requer que conservemos os processos ecológicos;contudo, o que ocorreu no último século foi uma vastainterferência nesses sistemas onde, segundo Ricklefs(2003), as habilidades tecnológicas avançaram muito rapi-damente para que a natureza se mantivesse em equilíbrio.

Esses níveis de degradação começaram a causarimpactos negativos significantes, comprometendo proces-sos industriais pela escassez de recursos naturais e a saúdehumana devido à contaminação do solo, do ar e da água.

A partir desses eventos surgiram movimentos quederam origem ao conceito de desenvolvimento susten-tável. Em 1968 surge uma organização informal, o Clubede Roma, formado por cientistas, educadores, economis-tas, humanistas, industriais e funcionários públicos dedez países, o qual tinha em mente obter uma visão maisclara dos limites do sistema mundial e seu comportamen-to a longo prazo. O primeiro documento que formalizouestas discussões foi então o estudo dos “Limites do Cres-

cimento”, publicado em 1972 e posteriormente apresen-tado na 1ª Conferência Sobre o Meio Ambiente, em Esto-colmo, também em 1972, a qual foi organizada diante deuma série de denúncias referentes ao uso indiscriminadodos recursos naturais.

Em 1973 surge o conceito de ecodesenvolvimento,o qual considerava potencialidades locais, a diversidadede situações e diferentes caminhos para o desenvolvi-mento de base sustentada, entretanto necessariamenteatrelado a políticas de redistribuição de renda e de avali-ação dos impactos das políticas de países desenvolvi-dos nos países em desenvolvimento (SACHS, 1986).

O termo desenvolvimento sustentável foi usadopela primeira vez em 1987 quando a ONU publica o relató-rio de Brundtland, proposto pela ‘Comissão Mundial doDesenvolvimento e Meio Ambiente’. Essa comissão foiformada em 1984, tendo como coordenadora a primeira-ministra da Noruega, Gro Halem Brundtland. A comissãodefiniu em seu relatório final o conceito de desenvolvi-mento sustentável: “Atender às necessidades da gera-ção presente sem comprometer a habilidade das gera-ções futuras de atenderem suas próprias necessidades.”

Mediante as primeiras discussões ambientais e aclara necessidade de se atrelar economia, política, socie-dade e meio ambiente, seguiram-se várias conferênciasmundiais. Entre elas destaca-se a ECO 92, no Rio de Ja-neiro, tendo como principal resultado a Agenda 21 quepropõe que os diversos países do mundo tomem medi-das para garantir a sustentabilidade das atividades hu-manas. Trata de transformações culturais e de valores,estimulando a adoção de padrões de consumo e produ-ção, visando a proteção do meio ambiente e ainda pro-põe soluções e estima custos de investimento.

Em 1997 foi realizado o Rio + 5, evento que tinhacomo objetivo fazer um balanço dos cinco anos decor-rentes do Rio 92, infelizmente se evidenciou que poucohavia sido feito de fato para colocar em prática as resolu-ções da última conferência pela maioria dos países parti-cipantes, entre eles o Brasil.

Posteriormente foi realizada em Johannesburgo aRio + 10, em 2002, na qual foram detalhados objetivosdentro dos princípios já conhecidos. Destaca-se pelaprimeira vez os problemas associados à globalização, poisos benefícios e os custos a ela associados estão distri-buídos desigualmente com o risco de a pobreza gerardesconfiança nos sistemas democráticos, o que poderiaprovocar o surgimento de sistemas ditatoriais.

Um aspecto relevante é que a democratização detodos estes debates envolve a contraposição de interes-ses de diferentes países e de distintas camadas da soci-

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edade, sendo interessante salientar que o estudos levama um plano político mundial, talvez impraticável, a serdesenvolvido pela ONU.

O Brasil, que efetivamente participou das confe-rências mundiais, agora é sede para várias discussões,as quais abordam as definições sobre desenvolvimentosustentável descrito pelos orgãos da ONU com certa de-saprovação. Segundo Diegues (1992): “ se baseiam nanecessidade de se atingir o grau de desenvolvimentoatingido pelas sociedades industrializadas e está cadavez mais claro que o estilo de desenvolvimento dessassociedades, baseado num concurso exorbitante de ener-gia, artificialmente barata e intensiva em recursos na-turais (...) é igualmente insustentável a médio e longoprazo.”

Mais recentemente, em março de 2006, foi realiza-da no Brasil a COP8, “Oitava Conferência das Partes daConvenção sobre Diversidade Biológica”, sendo o ór-gão supremo decisório no âmbito da Convenção sobreDiversidade Biológica (CDB).

Um dos resultados dos debates, que duraram duassemanas, foi a definição de uma data limite, até 2010, paraa criação de regras internacionais para repartição doslucros oriundos dos recursos genéticos e de conheci-mento de populações tradicionais, tema muito polêmicojá que implica que os países ricos paguem pelo que jáestão usufruindo.

A CDB parte do pressuposto de que abiodiversidade deve ser uma preocupação comum dahumanidade, entretanto se observa que existe uma certacautela nos tratados sobre meio ambiente em relação aofato de países do primeiro mundo assumirem sua parcelade responsabilidade no subdesenvolvimento de algunspaíses mais pobres, os que foram outrora explorados paraatender suas necessidades, permitindo que assumissemo status atual de primeiro mundo.

Já no Brasil estão sendo trilhados caminhos parao conhecimento da sua biodiversidade com a elaboraçãode inventários, quando será possível atingir os objeti-vos da CDB, tarefa a qual é de grande urgência, tendo emvista a velocidade da degração do nosso ambiente.

5. ECOTOXICOLOGIA

Como ferramenta para a preservação dabiodiversidade surge a ecotoxicologia. Em 1969, o pro-fessor francês René Truhaut institui o termoEcotoxicologia, do grego oîkos (domicílio, habitat, meioambiente: ecologia) e a palavra toxicologia (ciência dosagentes tóxicos, dos venenos ), para definir a ciência quetrata dos efeitos deletérios promovidos por substâncias

químicas (xenobióticos) de origem antrópica e como agemsobre os ecossistemas, sua biota e suas inter-relações(AZEVEDO; CHASIN, 2003).

A ecotoxicologia desenvolve pesquisas que fo-calizam degradação ambiental, saúde pública e preserva-ção de recursos naturais; o meio científico tem buscadoprogressivamente maior conhecimento de sistemas na-turais, dos seus constituíntes, mecanismos de funciona-mento e comportamento diante de inúmeroscontaminanates, oferecendo recursos para estabelecerestratégias de proteção e gestão ambiental

A expressão da ecotoxicidade de uma substânciaquímica depende das características da exposição e deseu comportamento nos sistemas biológicos. Além daspropriedades físico-químicas das substâncias, deve-seconsiderar a magnitude, a duração, as vias de introduçãoe a suscetibilidade dos organismos, estando esta últimadiretamente interligada aos processos toxicocinéticos etoxicodinâmicos.

Dentro da ecotoxicologia, tanto o ecossitema aquá-tico quanto os sedimentos são os compartimentos dedestaque nas análises ambientais. Os ecossistemas aquá-ticos são possivelmente os sistemas naturais que maisreceberam a descarga das atividades antrópicas nas últi-mas décadas, e os sedimentos têm papel importante tan-to na acumulação como na liberação de substâncias tóxi-cas para o meio aquático.

A deposição de sedimentos depende de uma sériede fatores ambientais que influenciam a composição quí-mica dos sedimentos, com reflexo no teor de nutrientes e,conseqüentemente, na biota, levando em conta que háintensas trocas entre sedimentos e coluna d’água. Os com-postos indicadores de contaminação ambiental encontra-dos no sedimento podem ser orgânicos, como inseticidase herbicidas, ou inorgânicos, como metais pesados.

Estudos recentes na bacia do Médio Tietê Supe-rior resaltam a importância da relação água-sedimento nacontaminação do meio, levando em consideração, nãosomente as substâncias dissolvidas, mas a presença decontaminantes biodisponíveis no sedimento, uma vez queeste pode representar o verdadeiro potencial tóxico dosistema (ESPÍNDOLA et al.,2000). Outros significativosestudos que têm como protagonista o sedimento pode-rão classificar ambientes de acordo com seu nível de con-taminação e biodisponibilidade de metais pesados, comoo mercúrio, metal nocivo que sofre biomagnificação den-tro da cadeia trófica (SIQUEIRA et al., 2005), e aindacomo indicadores de atividades antrópicas irresponsá-veis, como exemplo a detecção de mercúrio na regiãoamazônica do Brasil (MASCARENHAS et al., 2004), poração do garimpo.

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Para o monitoramento e avaliação de impactosambientais em ecossistema aquáticos são realizadas me-dições de alterações nas variavéis físicas e químicas, jun-tamente com variáveis microbiológicas, os coliformestotais e fecais. São ferramentas de indiscutível valor naclassificação e enquadramento de rios e córregos em clas-ses de qualidade de água, mas que fornecem parâmetrosmomentâneos de uma situação que é dinâmica(WHITFIELD, 2001), além disso o monitoramento físicoe químico não é muito eficiente na determinação de alte-rações nas comunidades biológicas.

Atualmente, um dos desafios da ecotoxicologia édeterminar organismos representativos do ecossistemacomo indicadores de contaminação. Os bioindicadoressão definidos como organismos ou comunidades querespondem à poluição ambiental, alterando suas funçõesvitais ou acumulando toxinas, eventos que modificam adinâmica das populações.

No entanto, as populações em um sistema naturalrefletem a integridade ecológica total dos ecossistemas,integrando efeitos dos diferentes agentes impactantes,em que cada tipo de organismo apresenta seu limite detolerância a contaminantes, sendo a perda de espéciessensíveis e crescimento da população tolerante uma in-dicação de contaminação.

Principais organismos comumente utilizados naavaliação de contaminação em ecossistemas aquáticossão os macroinvertebrados bentônicos, peixes e comu-nidade perifítica (GOURLART; CALLISTO,2003); a utili-zação de macrovertebrados bentônicos em estudo deimpacto ambiental ainda é incipiente no Brasil, entretan-to é amplamente utilizado em outros países da Europa enos Estados Unidos.

A ecotoxicologia realiza uma importante tarefa, aavaliação do risco ambiental, o qual é uma união entre aciência do ambiente e a administração do risco, esta deveprover suficiente informação para decisões que venhama proporcionar a proteção do meio ambiente.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O desenvolvimento sustentável pode serententido como melhoria das condições de existência dospovos, com a utilização consciente de recursos naturais.Sendo assim, o monitoramento ambiental, a diminuiçãode descarga de xenobióticos no ambiente e os estudosecotoxicológicos funcionam como uma ferramenta fun-damental da sociedade para desenvolver planos de recu-peração de ecossistemas degradados e a conservaçãoda biodiversidade.

Deve-se em primeiro lugar refletir sobre nosso

verdadeiro lugar dentro dos sistemas naturais, pois faze-mos parte deles e do seu funcionamento. Historicamen-te, avaliações de impacto ambiental têm se concentradonos efeitos na saúde humana, entretanto podem causarriscos severos às demais comunidades biológicas.

7. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

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O Meio Ambiente e o Ambiente da Vida: a históriaecológica no aperfeiçoamento e formação de professores

em projetos interdisciplinares

Celenrozi Zaroni dos Santos *Valéria Zanetti de Almeida **

Resumo: A interdisciplinaridade na escola tem motivado novas propostas de ensino e de currículo,baseada na inter-relação entre os diversos ramos do conhecimento. Os novos parâmetros curricularesincluem o assunto meio ambiente como forma de expressar conceitos e valores fundamentais àdemocracia e à cidadania. Esse tema, assim como Ética, Saúde, Pluralidade cultural e Orientaçãosexual, corresponde a questões importantes e urgentes para a sociedade brasileira de hoje, presen-tes sob várias formas na vida cotidiana. Através do estudo do meio ambiente, o aluno conseguecompreender as noções básicas sobre o tema, perceber relações que condicionam a vida paraposicionar-se de forma crítica diante do mundo, dominar métodos de manejo e conservaçãoambiental. Lançando mão da micro e macrorrelações, propõe-se discutir a história ecológica,relatando a ação do homem no meio ambiente a partir dos primeiros habitantes da América, dacolonização européia e dos períodos econômicos do Brasil – cana-de-açúcar, extração de ouro,café, chegando aos principais produtos agrícolas da atualidade. Este é um trabalho que deverácaber, especialmente, aos educadores que querem fazer a diferença na educação do Brasil. O temafoi trabalhado com 83 professores da rede pública e com 46 alunos de graduação de CiênciasBiológicas e Matemática.

Palavras-chave: Educação, história, meio ambiente.

Abstract: Interdisciplinarity at school has motivated new conceptions of teaching and curriculumbased on the interrelation among several fields of knowledge. The new curriculum parametersinclude environment subject to express fundamental concepts and values to democracy andcitizenship. This theme, as well as ethics, health, cultural plurality and sexual orientation, correspondsto important and urgent questions to the contemporary Brazilian society which are present in dailylife under various forms. Studying the environment, the student understands its basic notions, perceivelife relations so as to position himself before the world in a critical way, master managing methodsand environmental conservation. Considering the micro and macro relations, it is proposed todiscuss the ecology history, describing the anthropic action on the environment from the America’sfirst inhabitants, through European colonization and over the Brazilian economic cycles – sugarcane, gold exploration, coffee, getting to the main modern agricultural products. This paper issuitable especially for teachers who want to make a difference on educational fields in Brazil. Thetheme was discussed with 83 teachers from public schools and 46 undergraduate students fromBiology and Mathematic courses.

Key words: Education, history, environment.

* Mestranda em Planejamento Urbano e Regional -PLUR, UNIVAP, 2006.

** Professora da UNIVAP.

1. INTRODUÇÃO

O Brasil, além de ser um dos maiores países domundo em extensão, possui inúmeros recursos naturais

de fundamental importância para todo o planeta. Suasflorestas tropicais, seu pantanal, seu cerrado, seus man-gues e suas restingas representam importantesecossistemas. Possui uma grande parte da água docedisponível para o consumo humano e é detentor de umadas maiores biodiversidades do mundo.

Como forma de entender a natureza e a forma comoo homem se apropria dela, é preciso compreender a evo-

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lução do pensamento humano. O trabalho tem por obje-tivo expor a necessidade de estudarmos a históriaambiental do Brasil, buscando compreender a origem e aevolução de algumas dinâmicas predatórias que vêm mar-cando a economia brasileira desde os seus primórdios.Conhecê-las em profundidade é importante para termosesperança de transformá-las.

A história ecológica é uma abordagem nova deconteúdo sugerida pelos Parâmetros Curriculares Nacio-nais (PCN). São ainda tímidas as investidas dos profes-sores das diferentes áreas com o tema em sala de aula. Aatuação como docente no Programa de Capacitação deProfessores da rede Estadual deu-nos possibilidade derelacionar o tema Meio Ambiente com as outras áreas doconhecimento, elaborando um projeto interdisciplinar. Aproposta foi trabalhada com os professores de História,Geografia, Matemática e Biologia na “Teia do Saber” daRede Pública do Estado de São Paulo e com os alunos dagraduação dos cursos de Ciências Biológicas, Geogra-fia, História e Matemática na Faculdade de Educação daUniversidade do Vale do Paraíba.

O projeto tentou dar ao professor uma base histó-rica para conscientizar os alunos dos problemas ambientaise dicas para trabalhar o tema nas escolas de ensino funda-mental e médio, de forma interdisciplinar. Visando atransversalidade, pretendia-se romper com a idéia que oestudo do Meio ambiente deveria ser responsabilidadeúnica e exclusiva do professor de Ciências ou Biologia.

Segundo Caldeira (2001), existem poucos traba-lhos no campo da Educação Matemática discutindo ques-tões de ordem educacional prática ou teórica, em que seenvolvam trabalhos quantificando fenômenos relaciona-dos ao meio ambiente e que sirva como um referencialpara a formação do professor da área.

O professor, importante agente da transformaçãosocial, conhecendo os problemas ambientais de formahistórica e atual, contribuirá, sobremaneira, para as pe-quenas ações, a partir da própria escola, do bairro e até,quem sabe, num plano mais abrangente e eficaz, o pensargloba/agir local proposto na Agenda 21.

2. MEIO AMBIENTE E A TRANSVERSALIDADE DOTEMA

A interdisciplinaridade refere-se a uma nova con-cepção de ensino e de currículo baseada nainterdependência entre os diversos ramos do conheci-mento. A proposta interdisciplinar busca um novoparadigma, mais dinâmico e compatível com o avançoacelerado da Ciência e da Tecnologia.

Segundo Andrade (2005), essa proposta, definida

como construtivista, vem ao encontro da necessidadede reformulação curricular nas escolas. De acordo com ateoria construtivista, o ser humano nasce com potencialpara aprender. E este potencial - esta capacidade - só sedesenvolverá na interação com o mundo, na experimen-tação com o objeto de conhecimento, na reflexão sobre aação. A aprendizagem conforme metodologiaconstrutivista, se organiza, se estrutura num processodialético de interlocução.

Andrade (2005)ainda afirma que a qualidade daeducação, grande preocupação atual dos administrado-res escolares, será alcançada via gestão participativa,criação de trabalho de equipe (parceria, cooperação) eadaptação para currículo interdisciplinar, mecanismos quesuperam o modelo individualista, fragmentado ecentralizador de administração e de produção do saber.Um dos caminhos à operacionalização do currículointerdisciplinar é, pois, a administração e metodologiaparticipativas.

Uma prática escolar interdisciplinar tem algumascaracterísticas que podem ser apontadas como funda-mentais para uma transformação curricular e que exigemmudanças de atitude, procedimento e postura por partedos educadores. Os Parâmetros Curriculares Educacio-nais preconizam que a nova ação pedagógica deverá,segundo Andrade (2005):

- perceber-se interdisciplinar, sentir-se “parte douniverso e um universo à parte” (resgatar sua própriainteireza, sua unidade);

- historicizar e contextualizar os conteúdos (res-gatar a memória dos acontecimentos, interessando-se porsuas origens, causas, conseqüências e significações;aprender a ler jornal e a discutir as notícias);

- valorizar o trabalho em parceria, em equipeinterdisciplinar, integrada (tanto o corpo docente como ocorpo discente), estabelecendo pontos de contato entreas diversas disciplinas e atividades do currículo;

- desenvolver atitude de busca, de pesquisa, detransformação, construção, investigação e descoberta;

- definir uma base teórica única como eixo norteadorde todo o trabalho escolar, seja ideológica (que tipo de ho-mem queremos formar?), psicopedagógica (que teoria deaprendizagem fundamenta o projeto escolar?), ou relacional(como são as relações interpessoais, a questão do poder, daautonomia e da centralização decisória na escola?);

- resgatar o sentido do humano, o mais profundo esignificativo eixo da interdisciplinaridade, perguntando-se a todo momento: - “o que há de profundamente huma-

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no neste novo conteúdo?” ou - “em que este conteúdocontribui para que os alunos se tornem mais humanos?”.

- trabalhar com a pedagogia de projetos, que eli-mina a artificialidade da escola, aproximando-a da vidareal e estimula a iniciativa, a criatividade, a cooperação ea co-responsabilidade.

Desenvolver projetos interdisciplinares na esco-la é, seguramente, a melhor maneira de garantir aintegração de conteúdos pretendida pelas novas pro-postas curriculares. Um projeto surge de uma situação,de uma necessidade sentida pela própria turma e constade um conjunto de tarefas planejadas e empreendidasespontaneamente pelo grupo, em torno de um objetivocomum (ANDRADE, 2005).

Para Jolibert (1994), “a pedagogia de projetos per-mite viver numa escola alicerçada no real, aberta a múlti-plas relações com o exterior: nela a criança trabalha “pravaler” e dispõe dos meios para afirmar-se como agentede seus aprendizados, produzindo algo que tem sentidoe unidade.” Realiza-se, assim, a proposta dainterdisciplinaridade de buscar o sentido e a unidade doconhecimento e do ser.

A transversalidade do tema meio ambiente, segun-do os Parâmetros em Ação (2001), tem dois significados.De um lado, deve ser algo externo ao universo escolar,com um recorte próprio, sem se circunscrever a uma áreaespecífica de saber, contribuindo assim com abordagensnovas de conteúdos – como, por exemplo, uma visão maiscomplexa do meio ambiente. Ao mesmo tempo, deve estarpresente nos conteúdos das disciplinas e nos procedi-mentos e atitudes do convívio escolar. A idéia-chave dostemas transversais é re-significar o que se ensina, aproxi-mando da realidade. Essa constatação é fundamental paraintegrar a questão ambiental no universo escolar.

Os modelos e a linguagem da Matemática, porexemplo, auxiliam a compreender a realidade em seus di-versos aspectos, assim como boa parte das formas domeio ambiente e de seu funcionamento. Seus instrumen-tos permitem que sejam revelados e identificados padrõese dinâmicas universais, conhecimentos essenciais paraorientar nossas intervenções no meio ambiente. Podemser desenvolvidos pelos alunos trabalhos matemáticossobre a dinâmica das florestas e das águas, a multiplica-ção e desaparição de espécies e da biodiversidade, asformas da natureza, e trabalhos analisando a expansãourbana e as áreas desmatadas (PCN EM AÇÃO, 2001).

Segundo Caldeira (2001), quantificar os fenôme-nos ambientais deixa a Matemática aquém daquilo queela deve ser, mas aprender Matemática usando como“pano de fundo as questões ambientais faz muito mais

do que fornecer aos estudantes instrumentos e ferra-mentas para a compreensão do fenômeno. Aprender ausar a Matemática no seu cotidiano faz com que o estu-dante perceba, entre outras coisas, seu verdadeiro papelcomo cidadão e transformador social”.

A história ecológica aparece como ferramenta im-portante do professor para a qualificação, não só dosfenômenos da natureza, mas também da natureza do ho-mem frente aos problemas ambientais enfrentados hoje,no ambiente da escola ou fora dela.

3. HISTÓRIA ECOLÓGICA GLOBAL

Antes de conhecer a história ecológica do Brasile os fatos que foram marcantes para o meio ambientedesde a colonização, temos de conhecer um pouco dahistória ecológica global e o espaço geográfico das so-ciedades indígenas que ocuparam o território da Américano período pré-colombiano e que já interagiam com anatureza no Brasil.

A rica biodiversidade da ecologia tropical do Bra-sil e suas paisagens foram alteradas muito mais recente-mente e muito menos do que as dos biomas do “velhomundo”. Nesse sentido, o território brasileiro é mais “rús-tico”, mais “selvagem”, exibindo marcas humanas muitomais leves. Ou seja, ele ainda está por sofrer interven-ções humanas de profundidade e duração comparáveisàs que ocorreram no “velho mundo”, visto que o Brasil éconsiderado um país em desenvolvimento, onde o pro-cesso de urbanização e do consumo de matérias primasestão em franco crescimento (DRUMMOND, 2002).

A ocupação do território brasileiro se deu sob osregimes de comunidades de caçadores-coletores nôma-des ou de pequenas aldeias semipermanentes depolicultores tropicais. Isso contrasta com o regime decivilizações complexas (com agricultura intensiva, ani-mais domesticados, divisão social do trabalho, classessociais especializadas, cidades permanentes, estado cen-tralizado, religiões organizadas etc.). Embora no conti-nente americano existissem também civilizações asseme-lhadas a essas sediados nos territórios atuais do Méxicoe do Peru ou em partes da Amazônia, esse regime nãopredominou no conjunto do território brasileiro.

Uma boa parte dos povos remanescentes de ca-çadores-coletores e policultores que praticam ou aindasão influenciados pelos estilos de vida “tradicionais”,de baixo impacto sobre o mundo natural, vivem ou vive-ram no Brasil. Não se trata da natureza brasileira ser“intocada”, mas sim de ela ser “tocada” há menos tempo,e de forma mais “leve” (DRUMMOND, 2002).

Segundo Drummond (2002), a ocupação do terri-

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tório do Brasil começou com migrantes vindos da Ásia eda Oceania há cerca de 12 mil anos (trabalhos mais recen-tes data a ocupação do território nacional em torno de 16mil anos) e encontraram um continente vasto, ecologica-mente diversificado e cujos processos biológicos vinhamevoluindo sem intervenção humana. A natureza, antesdesse período, estava longe de ser estática. Haviainteração entre as plantas e animais. Ecossistemas e pai-sagens mudaram ao sabor de mudanças climáticas, extin-guiram-se algumas espécies e surgiram novas”.

Os primeiros habitantes da América eram descen-dentes dos caçadores-coletores. Após um certo período,começaram a ser formadas as primeiras aldeias agrícolas.Na América do Norte, elas evoluíram a estados agrícolas.Como exemplo, podemos citar a civilização Maia naGuatemala. No Brasil, os indígenas formaram várias al-deias agrícolas e assim viveram até a chegada dos portu-gueses (DRUMMOND, 2002).

Estamos, portanto, em um outro momento históri-co. Momento em que o pensamento moderno, com basena observação das conseqüências históricas da devas-tação ambiental, nos dá o direito de questionar milêniosde cultura humana dominante e afirmar, subversivamen-te que tomar as florestas como uma sombra a ser destruídaé o caminho do colapso. O caminho da sobrevivência, aocontrário, deve ser o de considerar as florestas comonossas vizinhas e supridoras. Em outras palavras, ao in-vés de vê-las como uma franja de escuridão ao nossoredor, aprender a reconhecê-las como nosso colchãobenéfico e imprescindível de inspiração, sustento e ga-rantia de vida (PÁDUA, 2005).

4. HISTÓRIA ECOLÓGICA DO BRASIL E OS 500ANOS DE DESTRUIÇÃO

A descrição do Brasil feita por Pero Vaz de Cami-nha, em 1500, comprova uma paisagem diferenciada da-quela da conquista da terra. Os 500 anos da história doBrasil foram marcados pela destruição. No campoambiental, a área desmatada dos três maiores biomas,Amazônia, Mata Atlântica e Cerrado, soma, no total, 2,7milhões de km2, ou seja, 31,7% do território nacional e 62vezes a superfície do Estado do Rio. Imagine a bandeirabrasileira sem um terço de seu verde (PÁDUA, 2004).

A convivência com a Mata Atlântica, sem dúvida,marcou a formação da economia e da sociedade coloniaisdesde os seus primeiros momentos. No começo do séculoXVI, quando os europeus chegaram pela primeira vez aonosso território, o tamanho da massa verde que cobria olitoral do nordeste ao sul do país, podendo penetrar decem a quinhentos quilômetros no interior, devia estar emtorno de 130 milhões de hectares (PÁDUA, 2004).

A agricultura é um dos principais responsáveispelo desmatamento. O problema está na forma que seexerce a agricultura. Os mitos da época da colonizaçãoainda persistem. São eles: “Nessa terra, em se plantandotudo dá”, “a natureza é inesgotável, e não é preciso adap-tar tecnologia à natureza” (PÁDUA, 2004).

Segundo Feijão Teixeira (2001), o processo deocupação territorial e a incorporação de novas áreas aoprocesso produtivo agrícola no Brasil, ao longo dos anos,foram feitos sem preocupação ambiental. A expansão dafronteira agrícola caracterizou-se pela redução dabiodiversidade e por outros impactos sobre os recursosambientais, principalmente sobre o solo e a água.

Os períodos econômicos do Brasil Colônia são exem-plos da exploração predatória dos recursos naturais. Gran-des extensões de Mata Atlântica foram destruídas paraabrir espaço para os canaviais. Calcula-se que, para cadaquilo de açúcar produzido no Brasil, queimou-se cerca de15 quilos de lenha. A atividade econômica do século XVIIIfoi dominada pela mineração do ouro e dos diamantes, deforma também predatória. Encostas foram desmatadas, riosforam dragados e seus cursos desviados. Pelo menos 100toneladas de mercúrio foram utilizadas na extração do ouroem Minas Gerais (PÁDUA, 2005).

Para Pádua (2004), a idéia de que a Mata Atlânticaera vista como um estorvo vinha da imagem difundidaem 1711 pelo jesuíta André João Antonil, em Cultura eopulência do Brasil por suas drogas e minas. Na obrade Antonil, a floresta surge de forma indireta como umgrande obstáculo: “feita a escolha da melhor terra para acana, roça-se, queima-se, limpa-se, tirando-lhe tudo o quepodia servir de obstáculo”. Segundo Dean (1996) a la-voura, vista pelos nativos como complemento de umadieta alimentar, significava, para os jesuítas, “a identifi-cação com o cristianismo” pois eliminava a floresta e, emconjunto, qualquer vestígio cultural da política dos pa-jés e feiticeiros.

De todos os produtos coloniais, isto é, aqueles plan-tados para render um excelente exportável para a metrópole– o mais valioso e viável era a cana-de-açúcar. Cultivada háséculos na Índia e plantada em todo o Mediterrâneo, foi umimportante produto de exportação dos portugueses para osmercados do norte da Europa (DEAN, 1996).

Em suas colônias dos Açores e Madeira, Portugaljá possuía uma pequena produção de açúcar, embora lu-crativa que, no entanto, não atendia mais um mercado con-sumidor em franco crescimento. As condições propíciaspara efetivar o plantio na terra dos brasis possibilitaram aexploração sistemática do solo, dando início à monoculturaem larga escala. Embora a cana tivesse de ser adubada naMadeira e Açores e São Tomé, isso era desnecessário no

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Brasil, onde, em certos lugares, a cana podia ser cortadaano após ano sem replantio (ASSUNÇÃO, 2000).

Josué de Castro (apud DEAN, 1996) em Geografiada Fome, traça o retrato violento da cana-de-açúcar: “Jáafirmou alguém, com muita razão, que o cultivo da cana-de-açúcar se processa em regime de autofagia: a cana de-vorando tudo em torno de si, engolindo terras e mais ter-ras, dissolvendo o húmus do solo, aniquilando as peque-nas culturas indefesas e o próprio capital humano, do quala sua cultura tira toda a vida”. A conservação dos recur-sos naturais iria mostrar-se irrelevante em uma sociedadena qual a conservação da vida humana era irrelevante.

O ouro e o diamante brasileiros, no século XVIII,foram as mais importantes riquezas do novo mundo co-lonial. De 1700 a 1800, 1 milhão de quilos de ouro foramoficialmente registrados a caminho da Metrópole e tal-vez outro milhão tenha escapado ao fisco real. Cerca de2,4 milhões de quilates de diamantes foram extraídos.Segundo registros oficiais, uma quantia adicional desco-nhecida e incalculável foi contrabandeada (DEAN, 1996).

O efeito desse tipo de mineração foi o de substi-tuir a floresta por terras com pântanos esburacados. Obotânico francês Auguste de Saint-Hilaire, quando atra-vessou a estrada ao norte de Ouro Preto, na segundadécada do século XIX, relatava que “por todos os lados,tínhamos sob os olhos os vestígios aflitivos das lava-gens, vastas extensões de terra revolvida e montes decascalho.” (DEAN, 1996).

O desnudamento das encostas provocou erosão decamadas de terra, gerando gigantescos sulcos chamadosvoçorocas, assoreamento de leitos de riachos e enchentesque ainda ocorrem na região de forma generalizada que pa-recem características naturais da paisagem (DEAN, 1996).

O volume total de ouro obtido durante o séculoXVIII teria revirado 4 mil km2 da região de Mata Atlântica.Isso sugere a destruição de cerca de 20% da faixa auríferaque se estendia por 450 quilômetros entre Diamantina eLavras. O crescimento da floresta secundária nas áreasde garimpo e de queimada tendia a enfraquecer.

Segundo Dean (1996), a modificação e a remoçãoexploratória, hidráulica e manual da superfície dos solosdas florestas sugerem que o empreendimento mineradordo século XVIII exigiu muito mais da Mata Atlântica queos primeiros dois séculos de lavoura de subsistência comas plantações de trigo e cana-de-açúcar. A degradaçãode grande parte do solo das áreas derrubadas estavaocorrendo a tal ponto que a vegetação que renascia ca-recia de muitas das espécies que teriam reconstituído, naausência de interferência humana.

Surgiram críticas à agricultura de corte e queima,técnicas fáceis e baratas de avançar na agricultura; taistécnicas são utilizadas até hoje. Rodrigo de SouzaCoutinho, ministro da Marinha e do Ultramar, entre 1796e 1801, compartilhou a tese de que era preciso evitar adevastação das florestas brasileiras. Neste período, SousaCoutinho teve a iniciativa de enviar cartas régias para osgovernadores de algumas capitanias brasileiras estabe-lecendo normas para o uso das florestas litorâneas. Oalvo principal das cartas, assinadas pela rainha, era “aindiscreta e desordenada ambição dos habitantes que,com pretexto das suas lavouras, têm assolado e destruídopreciosas matas a ferro e fogo” (PÁDUA, 2004).

A partir de então, todas as matas e árvores locali-zados ao longo da costa marítima, ou nas margens dosrios navegáveis que desembocassem no mar, eram pro-priedade exclusiva da Coroa.

Segundo Pádua (2002), a história da defesa daMata Atlântica no Brasil colônia não terminou neste epi-sódio. Outras vozes tentaram defender nossas matas comoa de Baltasar da Silva Lisboa e José Bonifácio que che-gou a propor um modelo de desenvolvimento sustentá-vel moderno até para os dias de hoje, com base na refor-ma agrária, beneficiando os índios e os negros libertos.José Bonifácio com uma mirada visionária de historiadorambiental percebeu claramente que a decadênciacivilizatória do antigamente poderoso Oriente Médio nãopodia ser divorciada da degradação de suas condiçõesambientais. Afirmou, em um texto de 1815 que: “todos osque conhecem por estudo a grande influência dos bos-ques e arvoredos na economia geral da natureza sabemque os países que perderam suas matas estão quase detodo estéreis e sem gente. Assim sucedeu à Síria, Fenícia,Palestina, Chipre, e outras terras, e vai sucedendo aonosso Portugal”. A destruição florestal ameaçava trans-formar o nosso território, segundo Bonifácio, em algosemelhante aos “páramos e desertos áridos da Líbia”(PÁDUA, 2004).

Depois da emancipação política em 7 de setembrode 1822, nossa situação econômica parecia complicadapela dívida externa. Foi-se o ouro...Muitas vilasmineradoras entraram em decadência, e seus moradoresvoltaram à floresta para reassumir a lavoura da derruba-da e queimada. Nas primeiras décadas do império, surgeuma nova cultura que se tornaria a base da economiaexportadora do Rio de Janeiro – o café, até então despre-zado pelos funcionários da coroa, mas que já agradavaaos paladares dos europeus.

Tal como o século XVIII havia sido, para o Brasil,o século do ouro, o século XIX seria o século do café.Para a Mata Atlântica, entretanto, a introdução dessaplanta exótica significaria uma ameaça mais intensa que

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qualquer outro evento dos trezentos anos anteriores. Emcontrapartida, a erva foi a salvação da aristocracia colo-nial e da corte imperial que cambaleava. (DEAN, 1996).

O café foi inicialmente plantado no litoral do Rio deJaneiro. No entanto, os ventos salinos acabaram empur-rando as plantações de café para o planalto um poucomais fresco e depois para o Vale do Paraíba. O cultivo docafé exige solos que não sejam encharcados nem secos;dessa forma, o plantio deveria ser feito em encostas íngre-mes. Àquela época, acreditava-se que o café deveria serplantado em solo coberto por floresta “virgem”. As anti-gas zonas cafeeiras não eram replantadas e novas faixasde floresta primária eram então constantemente limpas paramanter a produção. O café avançou pelas terras altas, degeração em geração, nada deixando em seu rastro além demontanhas desnudadas (DEAN, 1996).

Lacerda Werneck, um dos maiores plantadores decafé do Rio de Janeiro, criou um manual dos agricultoresapresentando reflexões sobre a prática dos fazendeirosmais representativos. Nesse manual, aconselhava-seobservar as encostas dos montes na primavera, quandomuitas árvores da floresta estão em flor. Onde se visse oJacarandatã e outras dezesseis espécies determinadas(encontradas somente na floresta primária), a terra era deboa qualidade (DEAN, 1996).

Novamente o fogo foi usado como forma de limparo terreno para o plantio do café. Os incêndios de muitasclareiras elevavam imensas nuvens cinzentas de fumaça.Dean (1996) comenta que o Vale do Paraíba deve ter pare-cido infernal ao final das estações secas, com centenas defogos espalhados por todos os lados. Segundo o autor, afumaça era tanta que uma nuvem amarela pairava sobre aprovíncia durante esses meses, obscurecendo o sol de diae apagando as estrela à noite. Muitas espécies podem tervirado cinzas antes mesmo de serem estudadas e sua im-portância reconhecida (DEAN, 1996).

Auguste de Saint-Hilaire, que viajou pelas partescentrais e meridionais do Brasil, achava que a zona oci-dental do Vale do Paraíba abrigava a vegetação maisdiversificada que ele vira em todas as suas viagens pelaMata Atlântica. Esses primeiros investigadores não dis-punham do tempo nem de recursos para um completoestudo das formas de vida que habitavam a Mata nasregiões destruídas pelo desmatamento. Quase todos semantiveram nas mesmas trilhas de mulas; na maioria, evi-tavam florestas altas.

Entre os botânicos, o brasileiro Francisco Freire Ale-mão, em ocasião da destruição da floresta, corria de umaderrubada a outra, para examinar as gigantes abatidas. Infe-lizmente, segundo consta, mal dava conta de estudar todasas árvores, quanto mais epífitas e parasitas (DEAN, 1996).

No início do século XX, o comércio de café entrouem crise e muitos fazendeiros abandonaram as plantações,deixando o Vale do Paraíba empobrecido juntamente comsua vegetação natural. Um século depois da introdução docafé, Augusto Ruschi, o grande naturalista e ambientalistado Espírito Santo, lamentava o resultado do cultivodepredatório: “jamais restabeleceremos o clima e as condi-ções bióticas do solo que possuíamos” (DEAN, 1996).

Reclamava o biólogo que, ainda que fosse do café“que a vida de nossa gente depende; dele depende umbom ou mau governo”. Ruschi chamava as característi-cas da sociedade pós-colonial como intruso indesejável.A atrasada forma de tratar a terra, assim como a produçãomonocultora, visando lucro imediato, e a ineficiência ad-ministrativa do governo brasileiro deram fundamentospara que Ruschi comentasse que “o feito está consuma-do e nenhum traço da floresta restou sobre os morrossecos e amarelados do Vale do Paraíba” (DEAN, 1996).

A queimada da floresta para produção cafeeira foia principal causa, mas não a única, do desflorestamentono século XIX. É sabido que o comércio do café induziuo crescimento demográfico, a urbanização, a industriali-zação e a implantação de ferrovias.

A política de crescimento industrial no período daditadura foi questionada na primeira Conferência das Na-ções Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento,realizada em Estocolmo em 1972. José Sarney contra-argu-mentava dizendo: “que venha a poluição, desde que asfábricas venham com ela”.Um representante do governona conferência apresentou uma desculpa populista e dis-simulada para o problema ambiental. Para ele, “a pior formade poluição é a pobreza”, como se um ambiente preserva-do e saudável fosse sinal de pobreza (DEAN, 1996).

As riquezas do meio ambiente não são vistascomo um produto de crescimento. Na colonização, a flo-resta era vista como um obstáculo. Hoje, depois de qui-nhentos anos, a visão dos políticos e agricultores pode-rosos não mudou muito. Tem-se a idéia de que as flores-tas são improdutivas, têm baixo valor e pouco contribu-em para o desenvolvimento do País.

Estudos recentes mostram que a expansão agríco-la e a agropecuária não trazem crescimento econômico àspopulações mais pobres como se acreditava. O mito deque políticas ambientais impedem ou prejudicam o cresci-mento econômico é um equívoco. Estudos mostram queas ações que protejam o meio ambiente tendem a melhorara qualidade de vida da população (YOUNG, 2004).

Na exploração do novo mundo, a principal vítima,além dos seus primitivos habitantes, foi a Mata Atlânti-ca. Do período colonial até hoje, a área perdeu 93% de

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suas florestas que originalmente cobriam 1,3 milhões dekm2 ao longo do litoral. Em áreas como as florestas dearaucária no Sul do País, há apenas 2% da coberturaoriginal. O Cerrado perdeu 50% ou um milhão de km2, desua cobertura original, desde o início de sua ocupaçãona década de 1950 (DEAN, 1996).

A Amazônia, nos últimos 25 anos, teve 15% da flo-resta ou 551.000 km2 destruídos. Com as matas, foram embo-ra também os animais que nelas habitavam. A árvore que foio símbolo do País e que lhe deu o nome, o Pau-brasil, é umaespécie em via de extinção, e, quinhentos anos depois, só éencontrada em jardins botânicos (PÁDUA, 2005).

Para cada hectare que se pretendia abrir para alavoura, de cinco a dez eram destruídos pelo fogo des-controlado. Já no século XX, começaram a ser destruídoso Cerrado e a Amazônia. O Cerrado, como aconteceu coma Mata Atlântica, está sendo visto como um embaraçoque deve ser superado. A expansão da fronteira agrícola,destinada à produção de grãos para a exportação, vemdizimando este bioma (SUERTEGARAY, 2004).

Segundo Nobre (2004), dos anos 1950 para cá omercúrio continua sendo usado nos garimpos. A frontei-ra agrícola continua em expansão. Existem 30 mil focosde queimadas por mês no País durante a época da seca eos desmatamentos nas encostas ainda provocam erosãoe enchentes. As queimadas contribuem em muito para oaumento do efeito estufa causado pela emissão de ga-ses, principalmente o CO2, produzidos pela queima decombustíveis fósseis.

Segundo Suertegaray (2004), estudos indicamque, na Amazônia, a soja e a pecuária induzem as queima-das e o desmatamento, que marca o início de uma desas-trosa transformação ambiental. Inclui-se, entre outrosefeitos, processos de exposição do solo, da lavagem su-perficial com perda de solo, do assoreamento dos rios e,ainda, dos processos de arenização que podem fazer daAmazônia um grande deserto.

A expansão do agronegócio (atividade agrícolaem que a produção destina-se basicamente ao mercadoexterno), que até os anos 80 concentravam-se nos Esta-dos do Sul, agora se expande às regiões centro-oeste,oeste da Bahia, sul do Maranhão e Piauí. O cerrado, quepermaneceu por longos anos área de “reserva” para aexpansão agrícola, devido à infertilidade do solo e à es-cassez de água, pelos efeitos da tecnologia, se tornouum obstáculo superado (YOUNG; STEFFEN, 2005).

Vários são os problemas ambientais indicadoscomo associados ao agronegócio. Entre eles:desmatamentos, perda da biodiversidade, erosão hídrica(ravinas e voçorocas), formação de areais, assoreamento

dos cursos d’água, contaminação do lençol freático,salinização, perda e envenenamento do solo, esgotamentopotencial dos recursos hídricos (comprometimento dosmananciais). O elevado investimento degrada, não só oambiente, mas também expropria a população de seuhábitat tradicional, destruindo seus ritos, cultura, repre-sentações e formas de produção aliadas à conservação(SUERTEGARAY, 2004).

A destruição continuou, as lições não foram apren-didas e chegamos, ao século XX, novamente vitimandoas comunidades indígenas com moto-serras e tratores.Dos 3,5 milhões de índíos que existiam nessas terras res-ta apenas o equivalente à metade da população de umbairro como Copacabana. Os Pataxós, que viram Cabralchegar com suas caravelas em Porto Seguro, há quinhen-tos anos, até hoje apanham da polícia do homem brancoe arriscam ser queimados vivos quando protestam porsuas terras (PÁDUA, 2005).

Poucos produtores conhecem ou dão valor aoconhecimento do ambiente específico em que atuam. Istojá ocorria no século XVI quando os colonizadores nãoconheciam a biodiversidade brasileira e introduziram es-pécies nativas da Europa, menosprezando o conhecimen-to dos índios Tupi. Segundo Dean (1996), a destruiçãode florestas tropicais é irreversível no âmbito de qual-quer escala temporal humana. Quando a floresta tropicalé destruída, a perda em danos de diversidade, complexi-dade e originalidade não é apenas maior que a de outroecossistema: é incalculável. É uma tragédia cujas propor-ções ultrapassam a compreensão ou concepções huma-nas. As intervenções humanas quase nunca realizam asexpectativas, os resultado são campos empobrecidos,pastos magros, cidades sem água, homens e animais semcasa nem comida.

Quais as ações que podemos adotar para reverteressa situação? Com certeza, investimentos na agricultu-ra familiar, novas tecnologias para uso da água e investi-mentos que ajudem as populações ribeirinhas e que vi-vem nas florestas. Yong e Steffen (2005) citam políticasno Amazonas que aumentaram a renda da populaçãocompatíveis com a sobrevivência da floresta, valorizan-do financeiramente o uso sustentável da floresta. Issoincluiu o licenciamento de planos de manejo florestal depequena escala e incentivos à extração de produtos não-madeireiros, como borracha, óleo de andiroba, copaíba eoutras essências, mel, açaí, enfim, uma enorme diversida-de de produtos que a floresta proporciona.

Aumentando a renda média dos produtos flores-tais fica bem mais fácil conter o processo de conversãopara atividades alternativas. Por outro lado, foi feito umesforço de regularização fundiária, para impedir odesmatamento como “produtor” de direitos de proprie-

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dade. Junto com outras políticas que encaram que pre-servação florestal não se faz apenas com coerção, comessas ações a área desmatada caiu de 1.734 km2 para1.054km2. (YONG; STEFFEN, 2005).

O conhecimento das leis ambientais é um elemen-to indispensável para a avaliação de diagnósticosambientais. Conforme ressaltam os PCNs de Meio Ambi-ente, “a compreensão da organização administrativa dopoder público (ministérios, secretarias, diretorias, depar-tamentos) também auxilia os alunos a se posicionaremcomo cidadãos participativos. Afinal, apesar de o Brasilpossuir um dos mais elaborados sistemas de leis de pre-servação ambiental, nossa realidade é extremamente pro-blemática, pois essas leis não são cumpridas, pelo des-conhecimento da população, por descaso ou por diver-sos outros fatores” (PCN EM AÇÃO, 2000)

5. METODOLOGIA

A necessidade de ampliar os estudos na áreaambiental nas escolas levou-nos a elaborar a presenteproposta. Ressalta-se a importância de trabalharmos asquestões ambientais durante a formação do docente,assim como nos cursos de aperfeiçoamento.

O tema Meio Ambiente foi trabalhado com 83 pro-fessores da rede pública inscritos no programa de forma-ção continuada do Estado de São Paulo oferecido pelaUniversidade do Vale do Paraíba (UNIVAP) nos municí-pios de Jacareí, São José dos Campos e Taubaté.

A Secretaria de Educação do Estado de São Paulo,visando à capacitação de professores do ciclo II do Ensi-no Fundamental e do Ensino Médio, que atuam em sala deaula nas escolas estaduais jurisdicionadas à Diretoria deEnsino criou, no ano de 2003, o Programa de FormaçãoContinuada de Professores denominado Teia do Saber.

Segundo o Projeto Básico do Programa de Forma-ção Continuada “Teia do Saber” (2004), esse programatem como objetivo oferecer à população uma escola pú-blica de qualidade, favorecendo o acesso à cultura, àarte, à ciência, ao mundo do trabalho, educando para oconvívio social e solidário, para o comportamento ético,para o desenvolvimento do sentido da justiça, o aprimo-ramento pessoal e a valorização da vida. O êxito desseempreendimento requer o preparo intelectual, emocionale afetivo dos profissionais nele envolvidos. Por essa ra-zão, prioriza-se, entre suas ações, a formação dos educa-dores que atuam nas escolas.

O projeto da Secretaria de Educação prevê a par-ticipação de instituições de ensino superior contratadaspara realização de cursos de capacitação e aprimoramen-to dos professores da rede pública estadual. A UNIVAP,

através da Faculdade de Educação, assumiu a responsa-bilidade de oferecer, no ano de 2004, conforme contrato,os cursos solicitados pelas Diretorias de Ensino dos mu-nicípios de Jacareí, São José dos Campos e Taubaté.

O presente trabalho surgiu da necessidade de ofe-recer aos professores que atuam na rede pública estadu-al um curso que contemple os conteúdos específicos daárea de atuação com aplicação de temas interdisciplinarescomo, por exemplo, o tema transversal meio ambiente.

Por determinação da Secretaria da Educação, nofinal de cada encontro (1) seria realizada uma avaliaçãoatravés de um questionário. Este material serviu de basepara compor os resultados deste estudo, uma vez que aopinião dos professores/alunos sobre o tema foi de sumaimportância para a nossa fundamentação. Após a aplica-ção da presente proposta no curso Teia do Saber, o pro-jeto da História Ecológica, além dos cursos de História eGeografia, foi aplicado também para os cursos de Gradu-ação: Licenciaturas em História, Geografia, Matemática eCiências Biológicas, o que foi realizado no ano de 2005.

Em forma de explanação, realização de atividadesem sala de aula e prática de campo, buscou-seinstrumentalizar os professores para a sua prática peda-gógica. Uma das estratégias utilizadas foi, através daanálise da paisagem, fazer com que os docentes perce-bessem a ação antrópica no ambiente, relacionando osfatos históricos aos impactos das plantações de café noVale do Paraíba.

Ao término da aula, os professores responderamum questionário de avaliação relativo à sua aprendiza-gem e à viabilização do tema em sala de aula.

A aplicação do tema no curso de graduação deMatemática e Ciências Biológicas da UNIVAP se deusob a forma de palestra dentro das disciplinas Seminári-os de Matemática e prática de Formação de Professores.O questionamento sobre a aplicação do conhecimentoda História Ecológica nos projetos de meio ambiente fo-ram respondidos pelos alunos através do questionárioinvestigativo.

6. RESULTADOS E DISCUSSÕES

Os resultados obtidos através da aplicação dequestionários (Tabelas 1 a 3) revelaram a importância dosconhecimentos históricos para reflexão de atitudes. Opresente trabalho sugeriu uma abordagem interdisciplinardas questões ambientais, reforçando a importância domeio ambiente com os fatos históricos na tentativa deproporcionar ao educador conhecimentos e habilidadesnecessárias para trabalhar com projetos de EducaçãoAmbiental nas escolas.

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Um aluno, além de considerar importante os co-nhecimentos históricos no estudo da ecologia e diag-nóstico dos problemas ambientais, ressaltou que o temaserve como parâmetro para mudança de atitudes. Umoutro destacou a importância do conhecimento históricona interpretação da realidade. A maioria dos alunos res-ponderam que a História Ecológica é uma ferramenta im-portante nos projetos de meio ambiente nas escolas.

Araújo (2002) realizou um trabalho investigativotambém com questionários aplicados a professores darede pública de PortoVelho–RO. Como resultado, obtevevárias respostas de como a educação ambiental é vistapelos professores. O resultado foi relatado com as se-guintes afirmações dos alunos-professores: “o profes-sor de Ciências e Geografia é que deve tratar o assunto.Afinal, eles estudam isso na faculdade”; “sei que tenhoresponsabilidade para com o meio ambiente, as drogas, osexo entre meus alunos, mas não me sinto preparadopara lidar com nenhum desses pontos. Não tive nadadisso na minha formação”.

A ressonância desses discursos na escola levou-nos à elaboração da presente proposta, como forma deressaltar a importância de trabalhar as questõesambientais já na formação do docente na graduação etambém nos cursos de aperfeiçoamento dos professoresda rede pública como foi comprovado através do traba-lho de Araújo (2002).

Professores ressaltaram não terem sido prepara-dos na graduação para lidar com os temas transversais.A História Ecológica é uma ferramenta importante na for-mação do educador. Preparado, o docente poderá abor-dar o assunto com mais propriedade nas salas de aulascontribuindo significativamente nos projetos da escola,independentemente de sua área de formação.

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A História Ecológica é uma ferramenta importantepara conscientização dos problemas ambientais enfren-tados na atualidade. Diante dos fatos históricos, tenta-mos aprender com os erros. Segundo Leonardo Boff(2003), apesar de sermos reféns de um modelo civilizatóriodepredador e consumista, surge a urgência daespiritualidade que nos leva a cuidar da vida em todas assuas formas porque vivemos nelas excelência e valor etudo que existe merece viver.

Quando se fala em preservação dos recursos natu-rais, toda forma de conhecimento deve ser considerada,seja através da Filosofia, da História, da Ecologia e daespiritualidade. Há várias formas de abordagem das ques-tões ambientais e a histórica é apenas uma delas que foiressaltada neste trabalho. O educador deve se apropriar de

todo esse conhecimento para conscientização de uma gera-ção que não conta mais com vastas matas, rios que parecemnão ter fim e solos em que “se plantando tudo dá”.

Infelizmente, o brasileiro tem um rico vocabuláriopara exprimir sua opinião sobre o assunto: “pois é”, “nãotem jeito não”, “tá cada vez pior”, “o povo aqui é assimmesmo”, “a culpa é do governo”, “deixa pra lá”, “nãoadianta” “o problema não é meu”, são algumas das ex-pressões mais ouvidas. O resultado dessa mentalidadefoi a destruição. Não devemos simplesmente lamentar adestruição, mas aprender com o passado e fazer diferen-te, adotando medidas preventivas e salvando o que ain-da pode ser salvo. Cabe ao educador mudar essa menta-lidade, colocando em suas aulas a importância da preser-vação do meio ambiente e da biodiversidade, seja eleprofessor de Biologia, História, Geografia, Matemática.

Somente desta forma é que a sustentabilidade deixade ser um plano que consta somente no papel, e passa aser um instinto, dentro de cada um. Uma condição quedeve preponderar na educação é a capacidade de produ-zir conhecimento para que seus povos possam promo-ver seu desenvolvimento humano de forma racional esustentável. Este é um trabalho que deverá caber, espe-cialmente, aos educadores que querem fazer a diferençana educação do Brasil.

8. NOTA

(1) As aulas realizam-se aos sábados, nos campida instituição, com uma carga horária total de 80 horas.

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Planejamento Urbano, Controle Social e Privilégios

Luciane de Menezes Siqueira *Emmanuel Antonio dos Santos **

Resumo: O planejamento urbano no Brasil tem tradição de utilizar-se de modelos já desenvolvidos empaíses europeus. Visando conhecer estes modelos de planejamento, o presente estudo faz uma aborda-gem teórica e identifica como estes foram, e são, utilizados no país. A abordagem teórica abrange umperíodo histórico que vai do final do século XIX ao início do século XXI.

Palavras-chave: Capitalismo, planejamento urbano, Estado, controle social.

Abstract: Urban planning models already developed by some European countries are traditionallyadopted in Brazil. With the objective of knowing these urban planning models, this paper studies thetheoretical approach about the urban planning models and identifies how they were and are beingused in Brazil. The theoretical approach covers the period from the beginning of the 19th century upto the 21st century.

Key words: Capitalism, urban planning, State, social control.

* Mestranda em Planejamento Urbano e Regional -PLUR, UNIVAP, 2006.

** Professor da UNIVAP.

1. INTRODUÇÃO

Ao final do século XIX o Brasil já é uma Repúbli-ca, não conta mais com mão-de-obra escrava, as terras jáhaviam sido reforçadas como propriedade privada, atra-vés da Lei de Terras, e as primeiras atividades industri-ais, como base econômica, começam a se desenvolvernas cidades. O país apresentava, portanto, condiçõespropícias para inserir-se no modo capitalista de acumula-ção, e para tanto passa a desenvolver planos urbanísti-cos como forma de tornar as cidades atraentes ao capitalinternacional e mostrar ao mundo sua nova condição, ouseja, a condição de modernidade.

Para tanto, o Estado brasileiro, e sua elite dirigente,passam a utilizar-se de planos urbanos, seguindo os mo-delos já desenvolvidos em países europeus e nos EstadosUnidos, modelos estes “distantes da nossa realidade”,(MARICATO, 2000). Estes modelos de planos urbanosserviam aos interesses da elite dirigente e escamoteavamos conflitos sociais, que se refletiam sobre o espaço urba-no, derivados da mudança do modo de vida que passou aocorrer nas cidades desde o final do século XIX.

Segundo Maricato (1997, p. 30), este urbanismoque se inaugurava no país seria o urbanismo que iria se

consolidar durante todo o século XX no Brasil: a moder-nização excludente, ou seja, o investimento nas áreasque constituem o cenário da cidade hegemônica ou ofici-al, com a conseqüente segregação e diferenciação acen-tuada na ocupação do solo e na distribuição dos equipa-mentos urbanos.

Com base nesses pressupostos este artigo pre-tende caracterizar os modelos de planejamento urbanodesenvolvidos na Europa e nos Estados Unidos, e indi-car como foram utilizados no Brasil.

2. A ORIGEM DO PLANEJAMENTO URBANO

O planejamento urbano, de modo formal, tem ori-gem na Europa do século XIX, quando as cidades, alémde serem sede do aparato produtivo - da indústria - pas-saram a ser sede do alojamento da mão-de-obra. As cida-des não tinham infra-estrutura que permitisse alojar ade-quadamente o contingente populacional que migrava àscidades, levando conseqüentemente a um adensamentodessa população em cortiços nas áreas centrais das ci-dades.

As péssimas condições físicas das cidades, as-sociadas às péssimas condições de vida dos trabalhado-res urbanos - que já se organizavam em sindicatos ereinvidicavam melhores condições de vida e trabalho -passaram a ser foco de ação planejadora do Estado in-glês, quando teve fim o regime liberal, no final da primeirametade do século XIX.

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As cidades que se industrializavam tinham de seadequar à nova ordem capitalista vigente e passam a seutilizar do urbanismo – “que pertence de fato e direito,essencialmente, ao saber arquitetônico” (SOUSA, 2004)- como forma de organizar e ordenar as cidades.

Cidade saneada, remodelada, significava repro-dução saudável das forças de produção, conseqüente-mente significaria maior produtividade. Cidade saneadasignificaria manutenção e reprodução do capital. As ci-dades tinham de se tornar eficientes ao capital e ade-quar-se a este.

As intervenções urbanas foram sendo realizadas,objetivando que as cidades passassem a ter eficiência,tornando-se mais propícias à ordem capitalista, dandopor embico as primeiras formas de planejamento urbano.

Conforme Souza (2004, p. 158) as intervençõesurbanísticas estavam mais preocupadas com a funciona-lidade, a estética e a “ordem” que com a justiça social(ou, fantasiosamente imaginando que uma remodelaçãoespacial trará, por si só, “harmonia social”), não obstanteela conter uma óbvia e essencial dimensão espacial.

A ação planejadora sobre as cidades em deterio-ração, e implicitamente sobre a sociedade, visava, sobre-tudo, torná-las aptas ao desenvolvimento capitalista,adaptando-as a este em cada uma de suas etapas de trans-formação a partir de então.

A ação planejadora passou a ser objeto de obten-ção de controle no, e sobre, o espaço urbano, visando amanutenção, e conseqüente domínio, do status quo dasforças capitalistas. Controle sobre a cidade, sobre seuordenamento, significa, implicitamente, ter controle so-bre a sociedade que nela vive. Sociedade controlada,manipulada, facilitada fica a dominação.

Desde o final do século XIX até o século presente,várias linhas de pensamento se juntam a linhas de ação,formando, portanto, um modelo, para melhor tentar adap-tar as cidades às transformações ocorridas com o sistemacapitalista. Todos os modelos propostos são aqui consi-derados como planejamento urbano, mesmo aqueles queexarcebavam a preocupação com o urbanismo, julgandoque a resolução dos “problemas urbanos” estaria vincula-da a uma melhoria das formas espaciais urbanas.

É bom deixar claro que se sabe que no presentemomento histórico, o “planejamento urbano inclui o Ur-banismo (ou desenho urbano); o último é um subconjuntodo primeiro” (SOUZA, 2004, p. 56). Mas até o começodos anos 1940, o urbanismo foi considerado como plane-jamento urbano, por isso se torna importante fazer consi-derações sobre seus modelos, especialmente porque es-

tes, além dos demais posteriores, foram seguidos porvários países no mundo, incluindo aí o Brasil.

3. MODELOS DE PLANEJAMENTO URBANOEUROPEUS

Segundo Campos Filho (1992) a primeira linha deurbanismo, pós-Revolução Industrial, foi o urbanismosanitarista. Este tinha por preocupação básica as condi-ções dos bairros e habitações, visando a melhoria dascondições sanitárias do ambiente urbano. Encarava osproblemas urbanos com racionalidade e julgava quemelhorias técnicas no ambiente construído resolveriamos problemas sociais - como se estes fossem somenteuma questão de formatação espacial.

A questão do saneamento deu origem à legisla-ção urbanística que estabelecia normas para a ocupaçãourbana, visando evitar adensamentos populacionais emdeterminadas áreas. De acordo com Campos Filho (1992,p.6) “Estas normas se constituíram, aos poucos, em có-digos de regulamentos urbanísticos quanto às edificaçõese ao uso, à ocupação e ao parcelamento do solo para finsurbanos e as políticas de transporte correspondentes.Esses equivalem aos atuais códigos de zoneamento”.

Cullingworth, citado por Souza (2004, pp.251-252),argumenta que o espírito que acompanha o zoneamentodesde seus primórdios, como os propósitos de promovera saúde e o bem-estar geral, prevenir o superadensamentoetc, omite aquele que é, de longe, o mais importante: aexclusão de pessoas ou usos indesejáveis, e por via deconseqüência a preservação do status quo.

Verifica-se que o zoneamento passa a ser utilizadocomo instrumento regulamentador da segregação sócio-espacial que é desejada por uma elite dominante objetivandomanter seu controle no e sobre o espaço urbano.

Em seguida, e muitas vezes simultâneamente aourbanismo sanitarista, começou a surgir o urbanismoestético viário, que tem em Paris o seu maior expoente, obarão Haussmann e a Ètoile (estrela) de avenidas, tendoao centro o Arco do Triunfo, sua maior expressão (CAM-POS FILHO, 1992).

Souza & Soares (2000) informam que a reformaurbano-sanitária promovida por Hausmann implicou ademolição da parte antiga da cidade devastando quartei-rões então superpovoados, igrejas e antigas constru-ções, abrindo sobre os escombros grandes avenidas, queintegravam um novo traçado viário para a cidade.

Segundo Spósito (1999) muitas construções anti-gas foram derrubadas em nome do melhor aproveitamen-to dos espaços e da uniformidade da arquitetura.As

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áreas residenciais ricas afastaram-se do centro à procurade ares mais limpos. Em nome do melhor aproveitamentodo espaço, mas, no fundo, objetivando maiores lucrosforam planejados imensos bairros operários, marcadospor alta densidade e uniformidade.

O urbanismo de Haussmann, como consideradopor Campos Filho (1999), usa a monumentalidade comoexpressão da força da classe burguesa dominante, retrata-da numa preocupação da ordenação do espaço urbano.

Este modelo de ordenação do espaço urbano,como proposto por Haussmann, acabou transformando-se em modelo de intervenção urbanística em vários paí-ses que se inseriam no modo capitalista industrial deprodução e que precisavam adequar-se à nova estruturaeconômica vigente.

O urbanismo sanitarista e o urbanismo estético-viário prepararam a base para a adaptação da sociedadeao sistema produtivo industrial, levando as cidades auma modernização subseqüente. Mas, conforme citaSouza (2004, p.125), o urbanismo modernista terá o ápicedo apriorismo do planejamento urbano com as proposi-ções de Le Corbusier.

Conforme cita Campos Filho (1999), Le Corbusierpropunha uma arquitetura e urbanismo dos grandes cen-tros urbanos e do industrialismo, em que procurava com-binar áreas verdes e edificações verticais, visando umaalta densidade urbana, redutora dos custos de urbaniza-ção, pela menor extensão de infra-estrutura e equipamen-tos urbanos. Comparava a cidade a uma máquina de mo-rar. A cidade deveria funcionar como um instrumento,como uma máquina, deveria ter eficiência.

A estética corbusiana caracterizava-se pelodespojamento e pelo primado da função, e diferentemen-te da cidade pós-liberal, que privilegiava as funções pro-dutivas, entre elas as terciárias, privilegiará as funçõesurbanas na seguinte ordem: habitar, trabalhar, cultivar ocorpo e o espírito, circular (BENÉVOLO, 1999, p. 630).

As idéias de zoneamento, ou de diferentes usosdo solo, surgidas na Alemanha do século XIX, ganharamforça com as proposições de Le Corbusier. Segundo Souza(2004, p.253), “as idéias de Le Corbusier preconizavamque os diferentes usos da terra, sobretudo as diversasfunções básicas do viver urbano, produzir, circular, mo-rar e recrear-se, deveriam ser objeto de uma separaçãorígida”. Estas idéias encontram seu ponto culminante em1933, na quarta edição dos Congressos Internacionaisde Arquitetura Moderna - CIAM-, do qual derivou a Car-ta de Atenas.

Conforme Bologna (2000), a Carta de Atenas foi

um manifesto, gerado pelos urbanistas presentes noCIAM de 1933, o qual indicava um modelo de cidade,analisando as necessidades humanas universais, no qua-dro das quatro grandes funções propostas por LeCorbusier. A separação funcional era a chave mestra do“ordenamento” da cidade e de sua modernização.

Esta proposta de plano de cidade será adotadaem vários países, como França, Japão, Estados Unidos eÁfrica do Norte. No Brasil, nos anos 1950, Lúcio Costa eOscar Niemeyer idealizam Brasília.

Percebe-se, que o zoneamento urbano foi o ins-trumental encontrado e utilizado para tornar as cidades,e implicitamente a sociedade, eficientes e domesticadas.

Segundo Bridley et al. (apud SOUZA, 2004), ogrande boom populacional verificado no pós-guerra e anova fase em que se encontra o capitalismo, no caso emsua fase monopolista em um período político de GuerraFria, induzem o Estado a um maior controle sobre o terri-tório e suas cidades, e implicitamente sobre a sociedade.Neste contexto, grandes sistemas de planejamento co-meçaram a se estabelecer e o Estado passa a fazer uso deseus poderes de controle e disciplinamento da expansãourbana e de uso da terra. É o período do planejamentoregulatório.

Castellls (apud SPÓSITO, 1998, p. 67) afirma queo “capitalismo precisa de uma concentração do poderpolítico, e cria condições para a formação de umatecnocracia, apoiada na competência dos especialistas,que em nível das cidades produz uma planificação urba-na sem particularismos através de programas nacionais”.

Nos anos 1960, o planejamento físico territorialcomeça a sofrer algumas intervenções derivado da novamaneira de enxergar as cidades, apoiadas na evolução dametodologia adotada pela teoria geral dos sistemas, de-senvolvida para fins militares durante a Segunda GuerraMundial.

Segundo Souza (2004) o que na prática aconteceué que o planejamento urbano começou a absorver ele-mentos do enfoque sistêmico, tendo o seu vocabulário eo seu instrumental enriquecidos e sofisticados sem quea essência fosse muito modificada.[...]. A racionalidadeinstrumental se volta exclusivamente para a adequaçãodos meios a fins preestabelecidos, permanecendo estesúltimos inquestionáveis.

Todo o aparato regulatório que foi absorvido peloplanejamento urbano encontrou respaldo nas proposi-ções do modelo keynesianista/fordista. Este perdura doinício do século XX até a década de 1970, quando a crisemundial do petróleo, associada ao avanço da tecnologia,

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implicará desemprego e transporá uma nova adequaçãomundial ao sistema capitalista, levando conseqüentemen-te ao enfraquecimento dos Estados nacionais. O enfra-quecimento dos Estados nacionais implicará o retornodo liberalismo em nova formatação: o neoliberalismo.

O neoliberalismo e o avanço da tecnologia impli-carão, a partir dos anos 1980, uma globalização da eco-nomia e esta levará o capital a ser volátil em razão de suabusca incessante por mercados consumidores. O capitalvolátil implicará uma competição, ou em uma guerra, en-tre os lugares na intenção de atraí-lo. A partir de então oslugares, ou melhor, as cidades, têm de se adaptar à novaordem e passam a se utilizar de modelos e estratégiasempresariais para planejar a nova forma de organizar, eordenar, a cidade, ou, entenda-se, a nova maneira dedirecionar investimentos públicos para atender às de-mandas do capital.

Segundo Compans (1999, p. 108) a competiçãoentre as cidades refletirá a competição das empresas, quena busca por incrementos de produtividade procuram sesituar naquelas localidades que mais oferecem condiçõespara tanto.

Para Souza (2004, p. 30) o planejamento baseadoem estratégias empresariais rompe com o espíritoregulatório dos anos 70, “na medida em que deixa detentar domesticar ou disciplinar o capital para, pelo con-trário, melhor se ajustarem aos seus interesses, inclusiveimediatos”.

O mais conhecido, e divulgado, modelo de plane-jamento estratégico é o da cidade de Barcelona -Espanha,mas a utilização de técnicas empresariais para gerir ascidades em crise encontra sua origem na Baltimore - USA- dos anos 1960.

O Plano Estratégico de Barcelona propõe obrasde revitalização urbana, valorizando alguns locais, bemcomo valorizará a imagem de novos monumentos, comoforma de mostrar ao mundo sua nova inserção na pós-modernidade, fazendo uso, para tanto, do city marketing.

Para Vainer (2000, p. 77), o planejamento estratégicotraz consigo “um discurso que se estrutura sobre a articula-ção de três analogias constitutivas: a cidade é uma merca-doria; a cidade é uma empresa; a cidade é uma pátria”.

Para Compans (1999, p. 108),

“A lógica simbiótica da cidade-empresa éambivalente à da cidade-mercadoria, quedeve promover sua imagem no exterior comvistas a exercer atração de investidores, eao mesmo tempo facilitar suas ‘exportações

de bens, serviços e profissionais. Ambasatribuem aos governos locais uma espéciede papel de capitalista coletivo, na medidaem que’ a mercado tecnia da cidade, ven-der a cidade, converteu-se, portanto, emuma das funções básicas dos governoslocais e em um dos principais campos denegociação público-privada”. (BORJA;FORN, 1996, p. 33)

A estratégia utilizada para legitimar a cidade-em-presa, e manipular a grande massa trabalhadora para acei-tar a nova condição da cidade, encontra respaldo na cri-se econômica.

Conforme argumenta Vainer (2000), a sensação decrise induz a população ao consenso da urgência de res-postas urbanas para uma reativação econômica, e doemprego, nas cidades. Este consenso se transforma emum consistente e durável patriotismo de cidade, que será,ao mesmo tempo, resultado e condição do sucesso doplanejamento estratégico.

Este patriotismo será ainda mais exacerbado, emanipulado, quando os governos locais começam a uti-lizar a estratégia de realização de obras monumentais.Estas serão utilizadas como uma marca da cidade queidentifica seus usuários e lhes proporciona amor cívico

Ressalve-se que estas obras, aí incluindo obras dearte em espaços públicos e prédios de arquitetura arroja-da, com perfil de pós-modernidade, localizam-se em áreaspré-selecionadas, em áreas nobres da cidade. Mas, a de-manda insolvável da população não se importará com es-ses investimentos, em áreas nobres, porque enxergam queestes lhes garantirão o retorno do emprego, sendo assim,consentem na gentrificação. Mais uma vez a população émanipulada segundo os interesses capitais.

Percebe-se que a busca de consensos é uma téc-nica de obtenção de controle social.

O que se verifica é que, de acordo com asespecificidades apresentadas pelo desenvolvimento docapitalismo, particularmente em se falando no períodocompreendido entre meados do século XIX e começo doséculo XXI, várias atividades de planejamento urbano,contendo propostas urbanísticas, vêm sendo criadascomo forma de “organizar” as cidades e torná-las atraen-te ao capital e sua reprodução.

4. O PLANEJAMENTO URBANO NO BRASIL

No Brasil, somente a partir dos anos de 1870, como início de uma sociedade urbano-industrial favorecidapela atividade cafeeira, começará a haver uma preocupa-

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ção em tornar as cidades “atraentes” ao capital internaci-onal. Para que isso ocorresse, o país, e sua elite agráriadirigente, passa a utilizar-se de planos urbanos - enten-didos como atividades de planejamento urbano que in-corporam discurso e ação concreta do Estado sobre ourbano - seguindo os modelos já desenvolvidos em paí-ses europeus e nos Estados Unidos.

Quando, já na década de 1870, as cidades brasilei-ras começaram a expressar um desconforto ambiental,com proliferação de cortiços e doenças, devido ao êxodoem sua direção, começa a haver uma preocupação daelite agrária, que nas cidades tinham residências, quantoà salubridade e quanto ao seu afastamento desta popu-lação desprovida.

Sousa & Soares (2002, p. 21) relatam que no Rio deJaneiro a situação apresentava-se caótica, “a imagem decidade doente consolidava-se, tornando necessário umprojeto de reforma urbana. As casas insalubres, as ruasestreitas, a sujeira e a pobreza envergonhavam as autori-dades diante da presença de visitantes estrangeiros, com-prometendo e afugentando interesses comerciais”.

Em 1875 o Rio de Janeiro, representado por suaelite dirigente, na Comissão de Melhoramentos da Cida-de do Rio de Janeiro, criada em 1874, apresentará o pri-meiro documento com propostas de melhoramentos paraa cidade, o Plano de Melhoramentos, conhecido tambémcomo o “Plano de Engenheiros”, o qual credita Villaça(1999, p. 193), ser o marco referencial do nascimento doplanejamento urbano no Brasil, porque pela primeira vezse utilizará os conceitos de “plano” e “global” associa-dos ao espaço urbano.

Mas, somente após a Proclamação da Repúblicaas propostas de melhoramento ganharão vulto.

Conforme cita Nestor Goulart (apud SOUSA; SO-ARES, 2002, p. 25), as primeiras administrações republica-nas tiveram como um de seus objetivos fundamentais amodernização das principais cidades, sobretudo da capi-tal federal, para estabelecer o contraste com os feitos damonarquia, cujo vínculo principal era com a escravidão.

Os planos de renovação urbana se inspiraram nareforma de Paris, executada pelo prefeito Haussmann noperíodo de 1853-1870. A renovação das cidades se deunas áreas centrais e em novos bairros destinados ao usodas classes dominantes e às faixas de renda média. Oscentros passaram por reformas amplas e programas derenovação.

Villaça (1999), considera que o ápice dos planos deembelezamento no país, e de sua efetivação, e que foi mode-lo para as demais capitais do país, está no plano de reformas

para a cidade do Rio de Janeiro, elaborado por Pereira Pas-sos, governador nomeado do Rio de Janeiro em 1903.

Oliveira Reis (apud VILLAÇA, 1999), chega a ar-gumentar que foi impressionante a coincidência, para nãodizer a exatidão, entre a obra efetivamente executada e oplano elaborado por Pereira Passos. Mas, como alertaVillaça (1999) “isso nunca mais viria a acontecer”, mesmoque os Planos Agache, para o Rio de Janeiro, em 1926, ede Prestes Maia, em 1945, para São Paulo, tivessem sidorazoavelmente cumpridos. Estes dois últimos, pela novi-dade de seus conteúdos, marcaram uma nova etapa nahistória do planejamento urbano no Brasil, e foram mo-delo de planejamento para as demais cidades do país, noperíodo que perdura entre o final dos anos 1920, quandoocorreu a grande crise mundial e o país começou a seindustrializar, até o início dos anos 1950.

Os Planos Agache e Prestes Maia, apesar de se-rem planos globalizantes, deram ênfase à circulação eprivilegiaram de investimentos as áreas centrais. Entre-tanto, a ênfase dada à circulação indica que esses planosserviam aos interesses relativos ao início da sociedadeurbano-industrial, verificado no período de 1930 a 1950,em que a cidade da produção tinha que ser eficiente, porisso especial atenção ao aspecto da circulação em detri-mento aos problemas urbanos que se avolumavam. Con-forme Villaça (apud MARICATO, 1999, p. 125) “o planodiscurso cumpre um papel ideológico e ajuda a encobriro motor que comanda os investimentos urbanos”.

De acordo com Bologna (2000), a partir da décadade 1950, intensificou-se, nos países latino-americanos,em particular no Brasil, a intervenção do Estado na defi-nição da política econômica e em outros setores. Foi en-tão que passaram a atuar a Comissão Mista Brasil - EUA(1951-1953) e o Grupo Misto BNDE/CEPAL (1953-1955).Esses grupos pretendiam implantar no Brasil um proces-so de industrialização, como forma de alcançar a inde-pendência econômica do país.

A referida autora, identifica que no Brasil essa foia época da ideologia desenvolvimentista que caracteri-zou o governo do Presidente Juscelino Kubitscheck(1955-1960). Durante este período, o Estado passou aadotar o planejamento econômico como única forma ca-paz de possibilitar a superação do atraso da economia eda miséria da população.

Como cita Maricato (1997, p. 37) o desenvolvi-mento dos anos 1950 que sustentou o processo de acu-mulação no Brasil, teve por base a indústria de bens du-ráveis (automóveis, máquinas, eletrodomésticos) quecombinava tecnologia importada, e avançada para ospadrões brasileiros, com baixos salários.

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Foi nos anos 1950, que “o encarecimento do pre-ço da força de trabalho e da produção de certas mercado-rias nos países centrais, induziram esses países a ummovimento de industrialização no sentido da periferia”(OLIVEIRA 1982, p. 48), e que o processo de industriali-zação nacional passou a ter significativo e crescente con-trole do capital internacional.

Neste contexto as atividades de planejamento ur-bano passaram a atender às exigências do capitalismointernacional em expansão, que intensificava a busca porvantagens geográficas na instalação de suas unidadesde produção, e tem início os superplanos de caráter ur-bano e regional.

Através do Plano de Metas, no governo de Jus-celino Kubitscheck, entre os anos 1955 e 1960, e dosPNDs (Planos Nacionais de Desenvolvimento) nos go-vernos militares, que ocorreram entre os anos 1964 a 1980,são lançadas as bases para a introdução dessa industri-alização, ou do capitalismo monopolista, através da in-tensificação de uma rede de transportes rodoviários e decomunicações, objetivando uma maior integraçãoterritorial, visando a formação de um mercado de consu-mo que pudesse dar sustentação ao desenvolvimentodas forças produtivas capitalistas internacionais no país.

No governo de Kubitscheck, a construção deBrasília no planalto central, um velho sonho desde o Im-

pério, teve um destaque primordial na nova aparência dopaís (BECKER, 1998, p. 86).

Considerada como “metassíntese do Plano deMetas” (BOLOGNA, 2000, p. 24), a construção de Brasília,baseada nas proposições de Le Corbusier e nas referên-cias da Carta de Atenas teve, de acordo com Becker (1998,p. 86), um significado simbólico de que o país estaria sedesenvolvendo. O desenho da cidade se confunde como de uma nova sociedade: racional, ordenada e eficiente.

Mas como se sabe, o ideal de cidade justa, infeliz-mente, não foi alcançado.

Conforme relata Maricato (1997, p. 39), “o ideáriomodernista, a utopia construída pelos arquitetos de orga-nizar a cidade separando as diferentes funções, passou aser incorporado ao urbanismo brasileiro por intermédio deleis de zoneamento e planos diretores, consolidando nasdécadas seguintes um conjunto de idéias fora do lugar”.

Em seu projeto de modernização, o Brasil cresceueconomicamente, mas fez aprofundar as disparidadessociais nas cidades que se industrializavam. Em decor-rência da migração campo-cidade, é provocada uma cres-cente urbanização nas cidades que se industrializavam.Na Tabela 1 pode ser verificado o crescimento da urbani-zação no país neste período.

A partir dos anos 1950, o país se torna predomi-nantemente urbano. A crescente urbanização levou aconurbação entre as cidades, dando origem a grandesmetrópoles e grandes problemas, especialmente os dehabitação e infra-estrutura.

Como a industrialização brasileira é caracterizadapor baixos salários, o acesso à habitação fica restrito àsfaixas de maior renda, e as faixas menos providas acabamse direcionando as áreas periféricas das cidades, muitasvezes com deficiência de infra-estrutura, ou então ocu-pam o solo ilegalmente.

Conforme cita Bologna (2000, p. 24), “o Estadonão havia formulado uma política urbana consistente eabrangente à altura do acelerado processo brasileiro de

urbanização”.

Há de ser lembrado, como referenciado por Olivei-ra (1982, p. 50), que “quando as indústrias começaram a seinstalar no país, trouxeram dentro de si uma complexa divi-são social do trabalho, onde se destacava a enormegravitação do trabalho improdutivo, de gerentes e executi-vos, o que deu origem a grande classe média do Brasil”.

Por representarem os interesses do capitalismomonopolista no país, o Estado, voltado ao aspecto dourbano enquanto localização, passou a “atender deman-das da classe média, dando por contraste o desatendimentoda forma mais absurda possível das demandas das clas-ses mais baixas na estrutura de classes da sociedade, dasdemandas do operariado, das demandas das classes po-

1960 1970 1980 POPULAÇÃO URBANA 31.303.034 52.084.984 80.436.409

POPULAÇÃO RURAL 38.767.423 41.054.053 38.566.297Tabela 1 - População urbana e rural - 1960-1996

Fonte: Censos demográficos de 1960 a 1991 e contagem da população de 1996.

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pulares em geral” (OLIVEIRA, 1982, p.51).

Quando a população brasileira começa a se con-trapor a esse sistema perverso de exclusão, ou contra-por-se à “modernidade da pobreza”, como diz Becker(1999, p. 169), e ter apoio do então Presidente da Repúbli-ca, João Goulart, acontece o golpe militar.

Ao capturar o poder político, que implicitamenterecapturava os interesses do capitalismo, já que o mo-mento é de Guerra Fria, as forças armadas introduzem noplanejamento, não só sua burocracia de base técnica,que requer planos para sobreviver, mas também o seuestilo autoritário-tecnocrata. O Estado Nacional se utili-zará do planejamento regulatório.

Bologna (2000, p. 24), cita que do ponto de vistado planejamento urbano, o ano de 1964 marca o momen-to a partir do qual se inicia uma política voltada para aquestão urbana, e que o Estado abre duas frentes deplanejamento relacionadas com a cidade:

“Uma, aquela do Banco Nacional da Habi-tação (BNH), e outra, a do Serviço Federalde Habitação e Urbanismo (SERFAU), emque um dos objetivos seria estabelecer cri-térios, de âmbito nacional, para a execu-ção dos programas habitacionais. No casodo BNH, os seus objetivos proclamados,de voltar-se para a chamada habitação deinteresse social, logo se mostraram com-prometidos em função da especulação imo-biliária e do capital financeiro (baixalucratividade em função do crescente pre-ço da terra urbana). O SERFAU esgotou-se precocemente na elaboração, ou no fi-nanciamento a particulares, de Planos Pre-liminares de Desenvolvimento Local Inte-grado, com os quais as Prefeituras se ca-pacitavam aos financiamentos governa-mentais para a construção de conjuntoshabitacionais” (SANTOS apudBOLOGNA, 2000, p. 24).

Nos anos em que resistiu o regime militar “umaquantidade inédita de Planos Diretores foi elaborada noperíodo. [...] Álibi ou convicção positivista, o planeja-mento foi tomado como solução para o caos urbano e ocrescimento descontrolado. Essas idéias dissimulavamos conflitos e os reais motores desse caos” (MARICATO,1999, p. 139).

Há de ser referido que neste período foram elabora-dos Planos Nacionais de Desenvolvimento (PND), que, emtermos de planejamento regional, priorizaram investimentosmaciços em redes de integração espacial, estradas, aeropor-

tos, portos e telecomunicações. Desta forma o país conti-nuava a perseguir os ideais de integração nacional e conse-qüentemente beneficiava a circulação do capital.

Mas, todo o aparato desenvolvimentista, empre-endido desde os anos 1955, teve como base de recursosempréstimos internacionais e estes levaram, nos anos 1970,com a crise do petróleo e o esgotamento do sistema finan-ceiro dos países centrais, a uma fragilização do Estadonacional, o que gerou uma situação de crise interna. Estaúltima associada ao avanço da globalização, que provo-cou uma reestruturação econômica mundial, levou a umafuga de capitais do país, conseqüentemente levando auma situação de desindustrialização e desemprego. O de-semprego acentuou a desigualdade refletida sobre o es-paço urbano, sendo que cada vez tornava-se mais difícil àgrande massa trabalhadora fazer parte da cidade legal.

Em resposta à situação de crise econômica, de umEstado interventor e regulador, aliado à dificuldade daelite nacional se sobrepor às reinvidicações popularespor reformas urbanas, vem a tona no país, nos anos 1990,via eleição direta, o Estado neoliberal. Este último trans-porá para os estados e municípios a necessidade de se-rem competitivos, o que implicará em autonomia destesquanto às suas políticas de desenvolvimento local. Nes-te contexto tem início a fase, que ainda perdura, de umplanejamento urbano baseado em técnicas empresariaisque apoiam-se, sobretudo nas proposições do Plano deBarcelona.

Há de ser considerado que a mudança no Estadonacional, conforme apontado por Maricato (2001), foiresultado das diretrizes propostas pelo Consenso deWashington que preconizava uma agenda inquestionávelpara dirigir os destinos dos países emergentes e apre-sentava como princípio norteador à soberania absolutado mercado, interna e externa dos países, acompanhadodos corolários de diminuição do Estado e de erosão doconceito de nação. Desta maneira, para a referida autora,os planos estratégicos combinaram bem com as diretri-zes do Consenso de Washington.

A cidade do Rio de Janeiro tem o mais conhecidoexemplo de planejamento estratégico no país, e contoupara sua elaboração com um grupo de consultorescatalães. Mas, como cita Compans,

“O Plano Estratégico da Cidade do Rio deJaneiro provocou a inversão privilegiadade recursos públicos no atendimento dasexigências do setor privado. As propostasconsideradas prioritárias foram aquelas re-lacionadas diretamente aos objetivos es-tratégicos de melhoria da infra-estruturaurbana (acessibilidade, transporte e tele-

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comunicações), de criação de áreas empre-sariais e de atratividade de atividades eco-nômicas, em detrimento daquelas que tra-tavam do emprego, da qualidade de vida, edemocratização da Administração Pública”.

Estas observações vão ao encontro às observa-ções de Maricato (2000) quando esta considera que asestratégias de desenvolvimento local utilizadas no pla-nejamento estratégico aumentam as disparidades, a se-gregação espacial, ao passo que privilegiam algumasáreas em detrimento a outras.

Mais uma vez percebe-se que o planejamento ur-bano, no Brasil, apresenta um discurso, que é neste perí-odo amplamente divulgado pelo marketing, e dissimula adireção tomada pelos investimentos públicos. Não seobserva uma proposição de plano urbano que vise a re-produção saudável da grande massa trabalhadora do país.O que se percebe é que o planejamento estratégico vemsendo utilizado como técnica de controle social,objetivando a manutenção do status quo capitalista.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

No transcorrer deste artigo pôde ser percebidoque, tanto para a Europa e Estados Unidos, quanto parao Brasil, o planejamento urbano está vinculado à ordemeconômica vigente e é instrumental de uso fundamentalpara o grande capital e suas forças hegemônicas pode-rem se reproduzir e manter seu controle sobre a socieda-de que no e sobre o espaço vive.

Como visto, o Brasil tem uma herança de fazer usode modelos de planejamento urbano importados. Estesmodelos, como indicado por Maricato (2000), sempre fo-ram “distantes de nossa realidade” mas sempre serviramaos interesses de nossa elite dirigente.

Segundo Villaça (1999) diferentemente da Europae dos Estados Unidos onde o planejamento urbanocorresponde, em parte, às ações concretas do Estado, noBrasil o planejamento urbano é usado como uma fachadaideológica, não legitimando a ação concreta do Estado,mas, ao contrário, procura ocultá-la.

Esta afirmação pode ser observada neste textoquando se verifica que as obras realizadas através deplanos urbanos privilegiam algumas áreas em detrimentoa outras. As áreas privilegiadas são aquelas ocupadas edestinadas à população solvente e que possibilitam acirculação e reprodução saudável do capital. Já nasáreas ocupadas por população insolvente os investimen-tos são mínimos porque mínimos também serão os cus-tos de sua reprodução.

Para tentar reverter esse quadro, que implica se-gregação sócio-espacial, considera-se que o grande de-safio a ser enfrentado pelas próximas gestões urbanas éo de tornar equânime, através do planejamento urbano, adistribuição das vantagens dos investimentos públicosque possibilitem a reprodução satisfatória de “toda” aforça de trabalho do país.

Em relação a esse desafio, alguns municípios brasi-leiros, especialmente de gestão de esquerda, dentre os quaispode-se citar Porto Alegre (RS), Belém (PA) e Santo André(SP), vêm, desde o início dos anos 1990, avançando nestaquestão, pondo em prática o planejamento participativocomo meio de democratizar o governo municipal.

Um dos instrumentos, dentre outros, posto emprática neste tipo de planejamento é o orçamentoparticipativo o qual se resume em um processo de elabo-ração da proposta orçamentária municipal com delibera-ção da comunidade, propiciando controle e poder de de-cisão da sociedade sobre os gastos públicos.

Ao verificar a aplicação do orçamento participativoem Belém, Martins (2001) cita que no primeiro ano (1997)houve predomínio de ações locais e vitais e já no terceiroano houve uma ampliação dos horizontes à medida queas emergências iam sendo atendidas. A autora constatouque as necessidades foram passando a expressar, não sódemandas hoje necessárias, mas desejos para o futuro.

Constata-se, portanto, que existe possibilidadepara tornar equânime a distribuição dos investimentospúblicos para a reprodução satisfatória de toda a forcade trabalho, resta, entretanto que o Estado, em todos osníveis, desprenda-se das amarras de seu clientelismo.

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O Novo Rural em São Francisco Xavier

Luciane de Menezes Siqueira *Ely Pimenta Guimarães *

Resumo: Trata-se de um estudo que objetiva identificar quais as determinantes que têm induzidonovos usos não agropecuários do solo em São Francisco Xavier, Distrito do município de São Josédos Campos - SP. Estes novos usos têm sido responsáveis pela manutenção da população local, bemcomo pelo retorno de outras que do local migraram em face à crise da pecuária leiteira na décadade 1980.

Palavras-chave: Rural, meio de vida, investimentos, legislação, APAs.

Abstract: This study aims to identify the causes that have been inducing new land uses other thannon-agricultural and cattle raising in São Francisco Xavier, District in São José dos Campos – SP.These new land uses have contributed to keep the local population and to the return of those whohad migrated due to the milk cattle raising crises in the 1980’s.

Key words: Rural, living way, investments, legislation, APAs.

* Mestranda em Planejamento Urbano e Regional -PLUR, UNIVAP, 2006.

1. INTRODUÇÃO

O meio rural brasileiro, hoje, já não apresenta asmesmas características de espaço isolado e autônomoque prevaleceu até a década de 1920, quando o país ti-nha sua economia baseada na agroexportação.

A expansão do meio técnico, nas décadas seguin-tes, em direção às áreas rurais passou a mostrar cada vezmais tênue a dicotomia entre urbano e rural. O meio ruralvem deixando de ser sinônimo de um espaço tipicamenteagropecuário.

Entretanto, a expansão do meio técnico contem-porâneo acirrou a competitividade entre grandes produ-tores latifundiários e pequenos produtores. Dentre estesúltimos, alguns ainda resistentes, tiveram de encontraralternativas para se manter no campo em face da agressi-va concorrência.

Com a ampliação e difusão do pensamento ecoló-gico e com as novas necessidades de lazer do homemurbano moderno vem à tona o resgate da cultura ruralque acaba por induzir e propiciar novos usos não exclu-sivamente agropecuários no meio rural.

Graziano da Silva (1996, p. 60) cita que entre essesnovos usos encontram-se atividades voltadas ao turis-

mo, a expansão do número chácaras de lazer, pousadas,pesque-pague, restaurantes, bem como novas ativida-des produtivas, como a criação de abelhas, aves, plantasornamentais e flores, que acabam por se tornar novosnichos de mercado. Desta maneira, o autor verifica queas atividades agropecuárias tradicionais já não conse-guem explicar por si só a dinâmica do emprego e da po-pulação no rural do Estado de São Paulo.

Conforme dados expostos pelo referido autor(1997, p. 51), no Brasil, a proporção de trabalhadores ru-rais em atividades não-agrícolas passou, entre 1992 e1995, de 20,8% para 22,8%. Em São Paulo, o percentualde trabalhadores rurais ocupados em atividades não-agrí-colas era, em 1992, de 35,5%, passando para 44,2% em1995. Verifica-se, portanto, que vem ocorrendo um au-mento no número de pessoas ocupadas no meio rural ematividades não-agrícolas.

Veiga (apud MIRANDA, 2005) cita que adinamização econômica de diversas regiões rurais estásendo determinada pela captação de rendas urbanas, e,entende-se em Carneiro (apud MIRANDA, 2005), queessa captação de renda urbana está relacionada com osnovos usos rurais, que tendem a substituir, em grau deinteresse e rendimento a unidade de produção agrícolaque ali antes funcionava.

A partir de observações empíricas, percebe-se queo distrito de São Francisco Xavier, localizado na árearural do município de São José dos Campos, vem pas-sando por alterações semelhantes às que os autores aci-

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ma citados se referiram, ou seja, o meio rural do distrito jánão mais se caracteriza somente por uso agropecuário.

Com base nesses pressupostos este trabalho pro-curara identificar as determinantes que induziram aosnovos usos não-agrícolas e pecuários em São FranciscoXavier, bem como suas conseqüências.

2. CARACTERIZAÇÃO DO DISTRITO DE SÃO FRAN-CISCO XAVIER

São Francisco Xavier é um dos distritos do muni-cípio de São José dos Campos. Oficialmente, o municípioé constituído por três distritos: São José dos Campos(sede), Eugênio de Melo e São Francisco Xavier (Fig. 1).

Fig. 1 - Mapa do Município de São José dos Campos edivisas distritais.

Fonte: São José em dados - 2004.

No município de São José dos Campos, o distritosede, São José dos Campos, e o distrito de Eugênio deMelo desenvolvem atividades econômicas voltadas àindustrialização, onde há a caracterização de um parqueaeronáutico e aeroespacial. Entretanto, o distrito de SãoFrancisco Xavier, afastado cerca de 60km da sede muni-cipal, com sua localização na Serra da Mantiqueira, com-pondo um relevo harmonioso de montanhas e vales, pos-sui características rurais e tem sua economia baseada na

pecuária leiteira e produção de derivados de leite, segui-da do plantio de culturas temporárias para subsistência,feijão, milho e mandioca, e a criação de animais domésti-cos (PMSJC, 2004). O setor de serviços ligado ao turismotambém está em crescimento, com a implantação de pou-sadas e produção de artesanato, o que vem caracterizan-do um novo meio e modo de vida rural.

Conforme o Censo Demográfico de 2002 o distritode São Francisco Xavier tem uma população total de 2867habitantes, sendo 64% (1831) deste total de populaçãorural e 36% de população urbana (1036). Segundo infor-mações do administrador do distrito, Antônio Fernandesda Silva, o número total de habitantes chega a ter um acrés-cimo de 1200 pessoas se for considerado que a cidade élocal de segunda residência para um número significativode paulistanos e joseenses que têm, no distrito, chácarasde lazer e pousadas. Aos finais de semana e feriados acres-centa-se uma média de 2000 pessoas visitando o distritopara atividades de lazer e descanso.

Através de estimativa da Associação de TurismoSustentável - ATUS - verificou-se que o distrito possuitrinta e cinco (35) propriedades com pousadas que de-senvolvem atividades de turismo rural, que vêm se cons-tituindo, junto à atividade agropecuária, a base econômi-ca do distrito. Destas 35 pousadas, 20 são registradas noCNPJ; três (3) propriedades onde se desenvolve ativida-de de piscicultura, sendo que uma delas desenvolve ati-vidade de pesque-pague que é responsável por um nú-mero considerável de visitantes ao distrito nos finais desemana; uma (1) propriedade desenvolve ranário; seis(6) desenvolvem atividade de apicultura; quatro (4) de-senvolvem o cultivo de shitake (cogumelo). Em relação àprodução de shitake, duas das quatro propriedades queo cultivam, a Fazenda Guirra e a Fazenda Essência, alémde destinarem parte de sua produção para o Estado deSão Paulo, exportam para os Estados Unidos e Europa.As outras duas produtoras de shitake direcionam suaprodução para o mercado de consumo da Grande SãoPaulo e de São José dos Campos. Aliás, toda a produçãode peixes, rãs, mel e queijo é destinada ao mercado deconsumo de São Paulo e São José dos Campos.

A atividade industrial tem característica decomplementação de renda, em que a produção está voltadaquase na totalidade a atividades artesanais, com grandeparte das atividades voltadas à informalidade, totalizando19 empresas, segundo o Cadastro Industrial de São Josédos Campos. Dentre essas atividades cita-se: aparelhamen-to de madeiras, produção de lingüiça, produção de violas,móveis rústicos, geléias, manteigas, queijos, pães, cachaça.

No distrito há um total de dez (10) lojas; um ban-co; uma Unidade Básica de Saúde, a qual responde pelaassistência médica e odontológica local; uma escola

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municipal, uma escola estadual e 12 restaurantes.

A população economicamente ativa é de cerca de45%, segundo informações da subprefeitura. Deste totalpercentual 21,9% se dedicam à agropecuária, 12,2% aocomércio, 20% à prestação de serviços, 7,3% à construçãocivil e 2,4% ao setor de transportes, e há predominância detrabalhadores empregados no Poder Público Municipal,que conta com cerca de 29,3%, sendo a maioria constituí-da por mão-de-obra não-especializada. A mesma fonte re-lata que a explicação para parte da grande parcela de po-pulação que não trabalha, 55%, está no fato de haver, nodistrito, um grande número de habitantes em idade esco-lar, perfazendo um total de 791 pessoas, segundo levanta-mento dos dados censitários de 2000.

Observa-se através destes últimos dados que aeconomia do distrito está voltada às atividades deagropecuária e turismo. Mas, conforme relata a ATUS, asatividades ligadas ao turismo e à diversificação das ativi-dades agropecuárias ganharam maior expressividade,como fonte de renda local, a partir dos anos 1990, quan-do o distrito passa a ser amparado por lei municipal comoárea de preservação ambiental, sendo uma série de nor-malizações e diretrizes destinadas ao distrito numa tenta-tiva de preservar as áreas de nascentes, fauna e vegeta-ção atlântica remanescente, além de promover o desen-volvimento sustentável para a população local, visandomantê-la na área rural do município

Conforme relatos da PMSJC (1985) - PrefeituraMunicipal de São José dos Campos, o distrito de SãoFrancisco Xavier, inicialmente era ocupado por proprie-dades rurais relacionadas às práticas agropecuárias, es-pecialmente voltadas à produção leiteira. Nos anos 1980,o baixo preço, pago pelo mercado ao produto, leva aatividade à estagnação, e o homem do campo com seusrecursos reduzidos não vê alternativa para se manter. Aopção encontrada se volta para o arrendamento de parteda propriedade, bem como o parcelamento e venda paraterceiros. Os proprietários vão se desfazendo de parte desuas propriedades até que o remanescente mal dá para acriação e plantio caseiro. Desfizerem-se do gado porquejá não há pasto suficiente. O parcelamento das proprie-dades incentiva o surgimento de chácaras de lazer paraturistas de fim de semana.

Outro fato observado em São Francisco Xavier serefere ao fato de que, quando os novos proprietáriosrurais compraram terras com a finalidade de montar chá-caras de veraneio, montando hortas, pomares e peque-nas criações, empregaram os ex-proprietários ou os fi-lhos destes.

Entre os novos proprietários rurais, há fazendei-ros, empreendedores, que encontraram condições climá-

ticas para desenvolver na região novos negócios, comoé o caso de criação de animais de raça e do turismo. Osbenefícios que se seguiram foram relativos, pois à medi-da que as novas atividades geraram condições para queo antigo proprietário se fixasse na região pelo trabalhoassalariado, promoveu rompimento com seus laços daterra. O antigo trabalhador rural estava expulso de suasantigas tradições em suas terras, quando plantava para aprópria subsistência. O fato de estar empregado não sig-nificava que sua condição econômica tivesse melhora-do. Significava apenas uma transformação no seu modode vida (PMSJC, 1985).

Observa-se então que grande parte dos antigos pro-prietários rurais perde o domínio da terra e neste momentopassa a ser empregado dos novos donos das terras.

Muitos dos ex-proprietários rurais relutam em de-satar os laços com a terra, tentando permanecer próximoem outros trabalhos e/ou atividades, empregando-secomo caseiros e pedreiros na construção civil. Outrosfabricam doces, queijos e comercializam como meio desubsistência. É uma tentativa de reforçar a identidade, depertencer a um lugar, como uma âncora de segurança. Irde encontro à modernidade sem perder sua origem.(PMSJC, 1985).

Percebe-se que o antigo proprietário rural perdesuas características, seu referencial. O pequeno agricul-tor/pecuarista perde suas perspectivas de trabalho agrá-rio. E a partir desse momento fica estabelecida uma novaatividade econômica no distrito: o turismo.

Em diagnóstico realizado em uma proposta de Pla-no Diretor para o distrito de São Francisco Xavier, elabo-rado pela Secretaria de Planejamento e Informática daPrefeitura Municipal de São José dos Campos, no ano de1985, há referências de que a paisagem pouco a pouco setransforma, ocorrendo transformação local, com invasãode construções que exprimem o conceito e as necessida-des do homem urbano. Esse processo violenta o sistemasimples e primitivo do homem do campo, cortando suasraízes mais profundas, de trabalhador rural, impondo umanova condição de vida que é irreversível.

Alternativas deveriam ser tomadas para que nãoocorresse esse impacto sócio-econômico, evitando comisso o êxodo de parte da população, bem como a degra-dação ambiental do distrito, visto que inúmeras chácarase atividades de reflorestamento estavam expandindo-separa as áreas de remanescentes. “O processo de degra-dação que passou a ocorrer em inúmeros locais do distri-to, justificou a criação da APAs pelos órgãos públicosatravés da regulamentação e ampliação de mecanismosde conservação do patrimônio natural”, segundo indicaMartin et al. (apud MEDEIROS, 2005).

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3. AS APAS DE SÃO FRANCISCO XAVIER E O FO-MENTO DA PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO JOSÉDOS CAMPOS PARA ESTÍMULO DAS NOVAS ATI-VIDADES RURAIS

De acordo com Moreli e Fantin (2001) a criação deAPAs - Área de Proteção Ambiental - pela União, Esta-dos, ou Municípios, encontram respaldo na Política Na-cional do Meio Ambiente, de 1981, que editou a Lei 6.902(de 27/4/1981), em que foram criadas as Estações Ecoló-gicas (áreas representativas de ecossistemas brasileiros,sendo que 90% delas deveriam permanecer intocadas e10% poderiam sofrer alterações para fins científicos) e asÁreas de Proteção Ambiental, onde poderiam permane-cer as propriedades privadas, mas o poder público pode-ria limitar as atividades econômicas para fins de proteçãoambiental.

A criação de uma APA objetiva proteger e asse-gurar a sustentabilidade do uso de recursos naturais comdestaque especial para a biodiversidade (conjunto deespécies e ecossistemas de uma região), através da dis-ciplina do processo de ocupação do solo.

Em 1982, conforme Decreto Federal nº 87.561/82,de 13 de setembro de 1982, é criada a APA da BaciaHidrográfica do Paraíba do Sul com área total de 37,88Km, incidente no município de São José dos Campos.

Em São José dos Campos, conforme indicam Morelie Fantin (2001), a legislação referente aos aspectosambientais teve início na década de 1970, juntamente coma consolidação do parque industrial do município. Com oadvento da Constituição de 1988 que dedicou um capítuloespecial para o meio ambiente, o legislador municipal sen-tiu a necessidade de criar instrumentos legais para a prote-ção do meio ambiente, consolidando a legislação ambientalatual do município de São José dos Campos.

Seguindo as tendências das Constituições Fede-ral e do Estado de São Paulo, a Lei Orgânica do municípiode São José dos Campos, de 5 de abril de 1990, reservouum capítulo específico para tratar das questões referen-tes ao meio ambiente.

No TÍTULO VI, Capítulo I, Do Meio Ambiente, oArtigo 241 define que os rios Paraíba do Sul, Buquira e doPeixe, a Reserva Florestal Augusto Ruschi (Fazenda BoaVista), a área ocupada pelo antigo Sanatório Vicentina Ara-nha, o Banhado e o Distrito de São Francisco Xavier sãoespaços territoriais especialmente protegidos e sua utili-zação far-se-á na forma da lei, dentro de condições queassegurem a preservação do meio ambiente (PMSJC, 2005).

Em 1992, a Lei Municipal nº 4.212/92 declara área deproteção ambiental - APA, o trecho da Serra da Mantiqueira

no município (próximo a São Francisco Xavier).

Em 4 de abril de 1995 a Lei complementar 165/95dispõe sobre a política territorial e urbana do municípiode São José dos Campos e institui o Plano Diretor deDesenvolvimento Integrado, o qual, entre outras dispo-sições, define as características e o perímetro das Áreasde Proteção Ambiental, perfazendo um total de quatro,sendo uma delas, a APA IV, criada dentro do perímetrourbano. As APAs I e II estão inseridas no Distrito de SãoFrancisco Xavier (PMSJC, 2004).

Conforme relatam Monteiro e Silva (2001), a APAI, Área de Proteção Ambiental da Serra da Mantiqueira, écaracterizada pelos maciços remanescentes do Comple-xo da Mata Atlântica e pela nascente do Rio do Peixe ecompreende a margem esquerda do rio citado; a APA IIcompreende a margem direita do Rio do Peixe e é caracte-rizada por inúmeros recursos hídricos da Bacia do Rio doPeixe.

Na referida lei, ainda se observa - na seção II, DasDiretrizes Específicas de Desenvolvimento EconômicoRural - na Subseção I, Artigo 7°, nos Incisos VII, X, XI,XII e XIV, respectivamente - disposições sobre:

- estimular o potencial econômico das áreas pro-tegidas “APAS”, através do desenvolvimento de ativi-dades turísticas, manifestações de cultura local, e domanejo sustentado dos recursos naturais existentes;

- apoiar os Conselhos distritais de São FranciscoXavier e Eugênio de Melo;

- dotar a administração Distrital de São FranciscoXavier de corpo técnico adequado ao desenvolvimentoe a orientação de programas e projetos da AdministraçãoMunicipal junto à comunidade;

- fomentar e apoiar iniciativas privadas para a do-tação de infra-estrutura turística, tais como: meios de hos-pedagem e atividades comerciais;

- criar uma central turística equipada com bancode dados referentes aos eventos e outros potenciais deestruturação do setor, objetivando a sua divulgação edos serviços oferecidos.

Em 1997, a Lei complementar 165/97, de 15 de De-zembro dispõe sobre uso e ocupação do solo no municí-pio e estabelece, em seu Capítulo VI, Artigo 134, incisos1° e 2°, o tipo de uso permitido para as APAs, e dispõe,respectivamente que:

- na Área de Proteção Ambiental da Serra daMantiqueira (APA I) são permitidos os usos destinados

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ao ecoturismo e atividades florestais com espécies nati-vas, admitindo-se as atividades agrícola e pecuária medi-ante a adoção de métodos e técnicas conservacionistasdo solo e das águas, serviços de hospedagem e o usoagroindustrial;

- na Área de Proteção Ambiental do Rio do Peixe(APA II), são permitidos os usos agrícolas, florestais,pecuários e o ecoturismo mediante a prática de métodose técnicas conservacionistas do solo e das águas, servi-ços de hospedagem e o uso agroindustrial.

Em 8 de novembro de 2002, foi aprovada a lei esta-dual n° 11262, criando a APA São Francisco Xavier, queainda está em processo de regulamentação. O perímetrodesta APA corresponde ao perímetro da APA Municipalda Serra da Mantiqueira. Conforme dispõe a referida lei,

em seu artigo 2°, a implantação desta APA será coordena-da pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente - CONSEMA- em colaboração com os órgãos da administração Direta,Indireta e Fundacional do Estado, vinculados à preserva-ção do meio ambiente. Dispõe ainda que o Estado, pormeio de seus órgãos competentes, fica autorizado a firmarconvênios ou contratos públicos, com órgãos e poderesmunicipais ou com entidades da comunidade local neces-sários para a implantação da APA. Para que esta APA sejaregulamentada, é necessário que se estabeleça seu Planode Manejo, mediante o qual, com fundamento nos objeti-vos gerais de uma unidade de conservação, se estabeleceo seu zoneamento e as normas que devem presidir o usoda área e o manejo dos recursos naturais. Na Fig. 2 podeser observada a localização das APAs do distrito de SãoFrancisco Xavier, lembrando que a APA estadual coincidecom a APA municipal da Serra da Mantiqueira.

Fig. 2 - APAs de São Francisco Xavier.Fonte: Medeiros, 2005.

Como o distrito passa a ser considerado uma APA,e, como em uma APA podem se desenvolver atividadeseconômicas sustentáveis, a PMSJC passa a direcionarinvestimentos públicos, bem como incentiva os investi-mentos privados, visando alternativas que possam man-ter o homem no meio rural, evitando assim o êxodo rural.

Um adendo: por ser uma APA, as atividades eco-

nômicas e a implantação de qualquer tipo de construçãodevem passar por regularizações junto aos órgãos com-petentes, Polícia Florestal, DEPRN- Departamento Esta-dual de Proteção de Recursos Naturais, Secretaria de Pla-nejamento Urbano da PMSJC. Entretanto, conforme rela-tos da Secretaria de Planejamento Urbano (2005), obser-va-se que há resistência de alguns proprietários ruraisem seguir as determinações devidas quanto ao uso do

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solo, sendo que estas vão contra seus interesses de usoe rentabilidade. Este é um conflito que vem demonstran-do que o “coronelismo” ainda é vigente na estrutura domeio rural, mesmo considerando novas formas de uso.

Seguindo as determinações propostas na lei 165/95, a Prefeitura Municipal de São José dos Campos veminvestindo no distrito junto aos representantes da socie-dade civil local - Associação do Turismo Sustentável, Clu-be dos Tropeiros e Violeiros, Sindicato dos TrabalhadoresRurais de SJC, Instituto Muriqui (ONG), Paróquia de SFX,Sociedade de Amigos de SFX, Grupo de Mulheres de SFX,Grupo de voluntários da Bacia do rio do Peixe - desenvol-vendo cursos de capacitação para a população local, comatividades voltadas ao comércio, turismo e agropecuária,contando, com parcerias, entre outras, junto ao SEBRAE eSESI. A capacitação da comunidade local objetiva diversi-ficar o trabalho da mão-de-obra local, incentivar a ativida-de turística e elevar a faixa salarial média local que, segun-do dados do Censo (2000), é de R$300,00.

É importante ressaltar que as organizações dasociedade civil estão em constante vigilância aos acon-tecimentos locais e visam representar os interesses dosdiferentes segmentos da sociedade, o que muitas vezesgera conflitos quando se buscam consensos para deter-minadas realizações em SFX.

Para estimular a manutenção do homem no cam-po, vem sendo desenvolvido o estudo da formação de

uma cooperativa de laticínios local, bem como propostapara uma cooperativa de apicultores e uma cooperativade artesanato que contaria, esta última, específicamente,com o trabalho das mulheres de SFX.

As atividades voltadas ao turismo também vêmrecebendo incentivos da PMSJC que criou, em 1997, oCOMTUR - Conselho Municipal de Turismo de São Josédos Campos, como parte do Programa Nacional deMunicipalização do Turismo, da Embratur.

Os investimentos privados das pousadas rurais tam-bém têm sido um motivador para a manutenção da populaçãolocal no campo, as quais se tornaram fontes de emprego.

A PMSJC vem estimulando, junto a parcerias pri-vadas, uma diversificação de eventos no distrito, alémdas festas tradicionais de origem religiosa, como formade manter o giro dos turistas no distrito e manter aquecidaa sua economia, estimulando, conseqüentemente, a ma-nutenção da população local.

De acordo com informações da ATUS e da Admi-nistração Distrital, vem sendo observado o retorno demoradores locais que haviam migrado para outras cida-des, bem como vem ocorrendo, em direção ao distrito, umamigração de população de áreas diversas do país e atémesmo de estrangeiros, visando investimentos em pousa-das, restaurantes, spas, em função do novo modo de usoda terra no local. Este fato pode ser observado na Tabela 1.

Tabela 1 - Crescimento populacional das áreas urbana e rural

Fonte: IBGE 2002. Adaptado de Medeiros, 2005.

Observa-se que durante quatro décadas, de 1950a 1980, a população rural do município, moradora do dis-trito de São Francisco Xavier, apresentou um crescimen-to populacional negativo. A partir de 1990 este quadropassa a se alterar, chegando a 2000 com um númeropopulacional equivalente ao de 1970. Este fato está as-sociado ao incremento das novas atividades rurais que

possibilitaram a recolocação do antigo morador rural.

Na Tabela 2 pode ser observado o crescimento donúmero de moradias na área urbana e na área rural, em que sepode inferir que as atividades de lazer estão direcionadas aomeio rural local, sendo que houve um acréscimo considerávelno número total de moradias de segunda residência.

Tabela 2 - Tabela de distribuição dos domicílios por situação e tipo de uso

Fonte: Ruschman, 2004.

POPULAÇÃO 1950 1960 1970 1980 199URBANA 250 358 503 722 99RURAL 3.744 3.023 2.365 1.768 1.70TOTAL 3.994 3.381 2.868 2.490 2.69

Período Distrito Domicílios ocAno Total Urbana Rural Total Urbana1980 662 122 540 563 89 2000 1.230 339 981 815 288

Crescimento relativo 85% 177% 65% 44,7% 223%

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Visando divulgar permanentemente as atividadesvoltadas ao turismo, a ATUS se uniu ao COMTUR e aEventos SJC (setor da PMSJC que lida com a divulgaçãode eventos do município).

Visando estimular as atividades turísticas, aPMSJC empreendeu obras de revitalização no distrito deSão Francisco Xavier, estabelecendo, portanto, um pla-nejamento estratégico que visa à manutenção, e amplia-ção, da economia local.

Finalizando: observa-se que os investimentos nodistrito visam à manutenção, e ampliação, da economialocal, bem como mostra o novo modo de vida da popula-ção rural, atrelado ao novo uso da terra, sendo que seestabeleceram novas opções de emprego, fonte de ren-da, já que a propriedade da terra passou por significati-vas mudanças que alteraram as suas características na-turais, as características da posse e, conseqüentemente,as características do trabalho rural.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

São Francisco Xavier é distrito de um municípiocuja vocação principal, na atualidade, está voltada àsatividades aeronáuticas e aeroespaciais. Entretanto, suadistância da sede municipal, aliada às condições físicas,pode ter sido um dos fatores que o manteve com caracte-rísticas distintas do restante do município.

Até o início dos anos 1980 prevaleceram, no dis-trito, atividades agropecuárias, indicando uma dicotomiaentre a área urbana do município, dotada de meios técni-cos, e a área rural, vista sob muitos aspectos de formanegativa porque não era dotada dos meios técnicos ur-banos. Esse caráter negativo, conforme aponta Grazianoda Silva (apud MIRANDA, 2005), está associado à árearural desde o século XVII, quando o urbano passou a seridentificado com o novo, com o progresso capitalistadas fábricas; e o rural - ou a classe dos proprietáriosrurais, com o velho, ou seja, a velha ordem social vigen-te, e com o atraso, no sentido de que procuravam impediro progresso das forças sociais.

Conforme Otavio Valentim Balsadi (apudMIRANDA, 2005), um dos pontos fundamentais relacio-nados com as profundas transformações pelas quais vempassando o meio rural, está relacionado à clara e fortetendência de queda das ocupações agrícolas. Em SãoFrancisco Xavier, as transformações que se observamno meio rural são decorrentes da nova forma de apropri-ação do uso do solo, especialmente em atividades volta-das ao turismo, desde que a produção pecuária leiteiradeclinou em virtude de uma instável política leiteira, as-sociada a inexpressivo plantel de animais e falta de orien-tação técnica. O antigo produtor rural passa a dispor de

suas propriedades, parcelando-as e propiciando sua ocu-pação por chácaras de recreio para turistas paulistas.Estes últimos, implicitamente, foram aos poucosdescaracterizando o modo de vida rural local, bem comoo uso do solo.

A PMSJC já havia observado, desde os anos 1980,a introdução de novos valores urbanos na comunidadelocal, o que aumentava o grau de exigência quanto aosserviços urbanos e criava novas necessidades à medidaque os novos habitantes interagiam com a comunidade edemonstrava o crescimento das atividades nãoagropecuárias no meio rural local. Observa-se, em SãoFrancisco Xavier, uma crescente urbanização do meiorural com moradias de alto padrão, turismo rural, lazer.Observam-se também novas atividades no meio rural -com dedicação à criação de abelhas, peixes, produção deflores e plantas ornamentais, atividades de recreação,pesque-pague, restaurantes, spas- todas dotadas de va-lor comercial considerável.

Verifica-se, no distrito de São Francisco Xavier, omesmo fato já constatado por Veiga (apud MIRANDA,2005), em estudos sobre o novo rural paulista de que a“dinamização econômica de diversas regiões rurais estásendo muito mais pela captação de rendas urbanas, sen-do que há uma procura crescente de formas de lazer as-sociadas ao meio rural, intensificado pela divulgação dopensamento ecológico” que se tornou praxe a partir dosanos 80.

Entretanto, a expansão do número de proprieda-des voltadas ao turismo e veraneio provocaram degrada-ção ambiental, sendo que avançaram para áreas de rema-nescentes. Estas alterações do meio físico justificaram,como se refere Martin (apud MIRANDA, 2005), a criaçãodas APAs pelos órgãos públicos, através da regulamen-tação e ampliação de mecanismos de conservação dopatrimônio natural. A partir da regulamentação das APAs,o uso do solo passou a ser sistematizado e fiscalizado.As atividades turísticas, consideradas como a nova vo-cação do distrito, passaram a ser orientadas como umnovo meio de vida para a população local. A subprefeiturado município investe em cursos de capacitação voltadosàs atividades ligadas ao turismo, como forma de evitar oêxodo e de ampliar a renda média local.

A exemplo de fato observado por Carneiro (apudMIRANDA, 2005) para outras áreas do interior do Esta-do de São Paulo, as atividades voltadas ao turismo emSão Francisco Xavier vêm propiciando oportunidade detrabalho para o conjunto da mão-de-obra familiar, contri-buindo para o aumento de sua renda e para uma visívelmelhoria das condições de parte da população rural que,ao ter garantida uma renda fixa e razoavelmente estávelem sua própria localidade de origem, abandona o projeto

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de migração em busca de emprego e salário na cidade.

Finalizando, observa-se que o meio rural de SãoFrancisco Xavier já não é mais caracterizado somentecomo um meio agropecuário, pois se tornou um novomeio rural, sendo que incorporou valores e usos urba-nos no desenvolvimento de pluriatividades rurais, quevêm estimulando a permanência da população local.

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- Autor(es). Logo abaixo do título, apresentar nome(s)do(s) autor(es) por extenso, sem abreviaturas. Comasterisco, colocado logo após o nome completo do autorou autores, remeter a uma nota de rodapé relativa às

informações referentes às instituições a que pertence(m)e às qualificações, títulos, cargos ou outros atributos.

- Resumo. Com no máximo 250 palavras, o resumo deveapresentar o que foi feito e estudado, seu objetivo, comofoi feito (metodologia), apresentando os resultados,conclusões ou reflexões sobre o tema, de modo que oleitor possa avaliar o conteúdo do texto. NBR6028.

- Abstract. Versão do resumo para a língua Inglesa.Caso o trabalho seja escrito em Inglês, o Abstract deveser traduzido para o Português (Resumo).

- Palavras-chave (Key words). Apresentar de duas acinco palavras-chave sobre o tema.

- Texto. Corpo do artigo estruturado em introdução,desenvolvimento e conclusão. No caso de divisão deseções, sua ordenação deve seguir o sistema denumeração progressiva (NBr6024), com subtítulos decaráter informativo.

- Citações dentro do texto. As citações com mais de 3linhas devem ser destacadas com recuo da margemesquerda 4 cm, com letra menor que a do texto utilizadoe sem aspas.Ex.: Na criança, bons hábitos posturais são

importantes para evitar sobrecargasanormais em ossos em crescimento ealterações adaptativas em músculos etecido mole. (KISNER; COLBY, 1998).

Nas citações são utilizadas sobrenome e data,apresentadas em maiúsculas dentro do parênteses eem minúsculas fora do parênteses.Ex.: 1. Segundo Spector (2003), “A discussão dosresultados é a parte mais livre da tese, onde o autortem maior latitude para demonstrar o seu domínio dotema e o valor do estudo.”Ex.: 2. A discussão dos resultados é a parte mais livreda tese, onde o autor tem maior latitude parademonstrar o seu domínio do tema e o valor do estudo(SPECTOR, 2003).

- Referências Bibliográficas: devem ser apresentadasno final do trabalho, em ordem alfabética de sobrenomedo(s) autor(es), como nos seguintes exemplos:

a) Livro: SOBRENOME, Nome. Título da obra. Localde publicação: Editora, data. Exemplo: PÉCORA,Alcir. Problemas de redação. 4.ed. São Paulo: MartinsFontes, 1992.

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Revista UniVap, v.13, n.23, 2006102

b) Capítulo de livro: SOBRENOME, Nome. Título docapítulo. In: SOBRENOME, Nome (org.). Título dolivro. Local de publicação: Editora, data. Páginainicial-final. Exemplo: LACOSTE, Yves. Liquidar ageografia... liquidar a idéia nacional? In: VESENTIN,José William (org.). Geografia e ensino: textos críticos.Campinas: Papirus, 1989. p.31-82.

c) Artigo de periódico: SOBRENOME, Nome. Títulodo artigo. Título do periódico, local de publicação,volume do periódico, número do fascículo, páginainicial-página final, mês(es). Ano. Exemplo:ALMEIDA JÚNIOR, M. A economia brasileira.Revista Brasileira de Economia, São Paulo, v. 11, n.1, p. 26-28, jan./fev. 1995.

d) Dissertações, Teses e Trabalhos Acadêmicos:SOBRENOME, Nome. Título da dissertação (ou tese).Local. Número de páginas (Categoria, grau e área deconcentração). Instituição em que foi defendida. data.Exemplo: BRAZ, A. L. Efeito da luz na faixa espectraldo visível em adultos sadios. 2002. 1 disco laser.Dissertação (Mestrado em Bioengenharia) - Institutode Pesquisa e Desenvolvimento, Universidade doVale do Paraíba, São José dos Campos, 2002.

e) Outros casos: Consultar as Normas da ABNT paraReferências Bibliográficas (NBR6023). Ou acessar osite: http://www.univap.br/cultura/abnt.htm

4. As figuras (desenhos, gráficos, ilustrações, fotos) etabelas devem apresentar boa qualidade e seremacompanhados de legendas breves e claras. Indicar noverso das ilustrações, escritos a lápis, o sentido da figura,o nome do autor e o título abreviado do trabalho. Asfiguras devem ser numeradas seqüencialmente comnúmeros arábicos e iniciadas pelo termo Fig., devendoficar na parte inferior da figura. Exemplo: Fig. 4 - Gráficode controle de custo. (fonte 10). As tabelas tambémdevem ser numeradas seqüencialmente, com númerosarábicos, e colocadas na parte superior da tabela.Exemplo: Tabela 5 - Cronograma da Pesquisa. As figurase tabelas devem ser impressas juntamente com o originale quando geradas no computador deverão estar gravadasno mesmo arquivo do texto original. Fotografias,desenho artístico, mapas etc., devem ser de boaqualidade e em preto e branco.

5. O encaminhamento do original para publicação deveser feito acompanhado do disquete ou CD-ROM e com aindicação do software e versão usada.

6. O Corpo Editorial avaliará sobre a conveniência ounão da publicação do trabalho enviado, bem comopoderá indicar correções ou sugerir modificações. Acada edição, o Corpo Editorial selecionará, dentre ostrabalhos considerados favoráveis para publicação,aqueles que serão publicados imediatamente. Os nãoselecionados serão novamente apreciados na ocasiãodas edições seguintes.

7. Os conteúdos e os pontos de vista expressos nos textossão de responsabilidade de seus autores e nãoapresentam necessariamente as posições do CorpoEditorial da Revista UniVap.

8. Originais. A Revista não devolverá os originais dostrabalhos e remeterá, gratuitamente, a seus autores, trêsexemplares do número em que forem publicados.

9. O Corpo Editorial se reserva o direito de introduziralterações nos originais, com o objetivo de manter ahomogeneidade e a qualidade da publicação,respeitando, porém, o estilo e a opinião dos autores.

10. Endereços. Deverá ser enviado o endereço completode um dos autores para correspondência. Os trabalhosdeverão ser enviados para:

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