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ECONOMIA & DESENVOLVIMENTO PARA OS NOVOS TEMPOS ANO 39 – Nº 278 – Novembro/Dezembro de 2014 EDITORIAL Para ler e refletir Para ler e refletir E mais Carlos Alberto dos Santos Fernando Nogueira da Costa Entrevistas e dicas de livros para pensar uma agenda nacional para o desenvolvimento Especial Carlos Alberto dos Santos Fernando Nogueira da Costa

Rumos 278

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Revista Rumos - Novembro/Dezembro 2014

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EDITORIAL

Para ler e refletirPara ler e refletir

E mais

Carlos Alberto dos SantosFernando Nogueira da Costa

Entrevistas e dicas de livros para pensar uma agenda nacional para o desenvolvimento

Especial

Carlos Alberto dos SantosFernando Nogueira da Costa

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ano de 2014 prometia muito e se superou. O Campeonato Mundial de Futebol e as recentes eleições foram intensas, com surpresas e com desdobramentos ainda não totalmen-te compreendidos. Com o intuito de trazer luz aos fatos, a Rumos conversou com quatro renomados pesquisadores,

cujos livros, recém-lançados, nos dão subsídios para entender o Brasil atual. Marco Antônio Macedo Cintra, Márcio Porchmann, Lena Lavinas e Maria Celina D’Araujo, em conversas exclusivas, nos contam que país é esse que passou por transformações modernizantes tão intensas, mas que ainda guarda traços do passado. É um convite para que, você leitor, se debruce sobre essas obras e reflita sobre o que viveu e o que presenciará no futuro. Também trazemos uma entrevista especial com o economista Fernando Nogueira da Costa, que mostra o papel fundamental da pou-pança do trabalhador no financiamento de longo prazo no país.

E, encerrando um ano tão intenso, a ABDE traz a cobertura da entrega da primeira edição do Prêmio ABDE de Monografias, que será revisto e ampliado para o próximo ano. Estão publicados, de forma reduzida, os artigos vencedores.

Ainda há mais entrevistas e colunas variadas em uma edição robusta em textos e ideias. São leituras para relaxar durante as férias ou, quem sabe, instigar debates e conversas sobre o futuro. A edição vem encerrar esse ano atípico, tão intenso e diverso, com uma lufada de ânimo sobre o Brasil que gostaríamos de ver nos próximos tempos. Boa leitura!

OAO LEITOR

Seção

RUMOS – 4 – Novembro/Dezembro 2014

MICRO E PEQUENAS

S SUMÁRIO

8

FOMENTO56

12 EXPERTISE

22

Crédito para os pequenos negócios

Apoio

Futuro

Volta ao crescimento40OPINIÃO

Especial

Convite à reflexão

REPORTAGEM CAPA

No

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UPP Empreendedor

Economia para o Social42REPORTAGEM

48ARTIGOPesquisa“Desvendando Mistérios de Genomas”: um projeto de computação intensiva

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O Brasil do futuroFernando Nogueira da Costa

16PRÊMIO ABDEReconhecimento

O dia das boas práticas

Financiando a Infraestruturada Inovação: a Desenvolve SP e o Parque Tecnológico de Sorocaba

Billy Matias e Fábio Fávero

A experiência da área de gestão de riscos do BNDESjulho 2007- julho 2014

Lavinia Barros de Castro

44ARTIGOMissão

O papel do Banco da Amazôniana redução das desigualdades regionais

Inclusão socioambiental como alternativa para o crescimento econômico

46REPORTAGEMSustentabilidade

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Nós e os outrosTroca de experiências

52PELO MUNDO

Quem precisa de bancos de desenvolvimento?

Reflexão

50 REPORTAGEMGestãoPlanejamento de longo prazo

ARTIGOSistema Nacional de Fomento

Unindo potências para financiar um grande Brasil

5

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RUMOS – 5 – Novembro/Dezembro 2014

propósito de representar os bancos de desenvolvimento. Esses bancos, com atuação em nível regional e articulados com o então Banco Nacional de Desenvolvimento Econô-mico (BNDE) na condição de executores de programas da instituição federal, foram os principais financiadores do investimento produtivo no ciclo de crescimento daquele período. As crises da dívida e fiscal dos anos 1980 marcaram, todavia, o fim de uma época de expansão continuada da eco-nomia brasileira e impuseram toda sorte de dificuldades à ABDE e a seus associados, as quais se agravaram diante das políticas de redução da presença do setor público na atividade bancária executadas nos anos 1990. Inversamente, com a criação das agências de fomento em diversos estados da federação desde os primórdios do novo século e, sobretudo, em face do papel desempenhado pelas instituições financei-ras públicas para minimizar os efeitos da crise iniciada no

AARTIGO

SISTEMA NACIONAL DE FOMENTO

Oano de 2014 foi marcado por intensos debates sobre o futuro do Brasil em meio ao processo eleitoral que levou à reeleição da presidente Dilma Rousseff. Alguns desses debates, notada-mente aqueles que versaram sobre as instituições

e o funcionamento da economia brasileira, abordaram temas diretamente associados ao cerne da atividade da Associação Brasileira de Desenvolvimento (ABDE), qual seja, o financia-mento do desenvolvimento econômico e o papel das institui-ções públicas. Neste artigo, procuro recuperar a trajetória da associação nos últimos anos a fim de sistematizar sua agenda de trabalho em prol da construção de um verdadeiro Sistema Nacional de Fomento (SNF).

Fundada em 1969 no auge do processo de industrializa-ção latino-americana do pós-guerra e que no Brasil viria a se estender até o final dos anos 1970, a ABDE nasceu com o

Carlos Henrique Horn

Unindo potências para financiar um grande Brasil

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Carlos Henrique Horn é diretor de Planejamento do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE) e presidente da ABDE. Formado em Ciências Econômicas e mestre em Economia pela UFRGS, Horn possui doutorado em Industrial Relations na London School of Economic and Political Science da Universidade de Londres e é professor associado da Universidade Federaldo Rio Grande do Sul (UFRGS).

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AARTIGO

setor bancário norte-americano em 2008, ajudando a sustentar o ritmo de crescimento da econo-mia brasileira, a ABDE reafir-mou-se como espaço privilegiado para o debate de questões sobre o financiamento do investimento e a atuação das instituições de fomento. Para tanto, concorreu igualmente a reavaliação em curso do papel dos bancos públi-cos pelas agências multilaterais. Na ABDE, o Plano de Ação de 2009 e o Planejamento Estratégi-co de 2011-12 ilustram este novo contexto, que levou à edição da Carta ABDE de 2013 em defesa da importância das instituições de fomento como parte necessária de um sistema financeiro misto e firmemente orientado para a sustentação do processo de desenvolvimento brasileiro.

Não obstante a mencionada reavaliação recente do papel das Instituições Financeiras de Desenvolvimento (IFD) pelas agências multilaterais, permanece ainda bem difundida no espectro político do país a tese da redução da presença do setor público na atividade bancária na linha elaborada ao final do século XX no Consenso de Washington ou Consenso Neoliberal. Em sua excelente síntese publicada pelo Ipea em 2010 (Uma proposta de delimitação conceitual de bancos públicos), Simone de Deos e Ana Rosa Mendonça listam as principais críticas normalmente dirigidas às IFD. Enten-dem os críticos que essas instituições possuem alta taxa de ativos que não performam e altos custos operacionais, costu-mam mascarar resultados por meio da rolagem de dívidas, são menos capitalizadas, recebem subsídios governamentais nem sempre explícitos, ocupam o espaço das instituições privadas (crowding-out), são utilizadas para maximizar objeti-vos pessoais de políticos e têm contribuição limitada para o desenvolvimento, concentrando seus empréstimos no setor público e nas grandes empresas. Como corolário, acreditam que a melhor política seria reduzir-se-lhes o tamanho ou, secundariamente, sujeitá-las ao mesmo arcabouço regula-mentar e de supervisão que os entes privados.

Os problemas de atuação das IFD elencados por seus críticos não nos parecem suficientes para negar-lhes a exis-tência, mas podem ajudar na definição de políticas e na ges-tão orientadas a melhorar seu desempenho. Nos anos de predomínio absoluto das ideias do Consenso Neoliberal,

uma das poucas vozes de dissen-so com projeção no debate público, o economista e prêmio Nobel Joseph Stiglitz, bem lembrou em palestra realizada na ABDE, no Rio de Janeiro, que é muito fácil acabar com instituições financeiras públicas, mas é bastante difícil criá-las partindo do zero. Aos que não se afiliam à doutrina de que as IFD seriam intrinsecamente negati-vas, mas reconhecem seus pro-blemas efetivos ou potenciais, cabe, portanto, entender as causas desses problemas e apli-car as medidas necessárias à sua superação.

De outro lado, os argumen-tos dos defensores das IFD mostram-se igualmente rele-vantes. Sem desconhecer os diferentes matizes observados nesses argumentos, estão bem difundidas as ideias de que as IFD preenchem falhas de mer-cado, geram externalidades positivas e reduzem o raciona-mento de crédito. Tais institui-ções podem direcionar crédito a

segmentos que proporcionam ganhos de produtividade e que não encontram recursos para financiamento no setor privado, destacando-se os projetos de infraestrutura, de pequenas e médias empresas, de inovação e de desenvolvi-mento regional. Além disso, as IFD ajudam a evitar a frus-tração de políticas anticíclicas que ocorreria em face de escassez de crédito privado, ampliam a competição, promo-vem desenvolvimento e inclusão financeira e garantem solidez e segurança ao setor financeiro. Numa versão mais abrangente da defesa dessas instituições, entende-se que elas asseguram meios de financiamento à criação de capacidade produtiva, permitindo certa autonomia financeira à nação para a implementação de políticas de desenvolvimento, ao proverem linhas de fomento para setores prioritários não atendidos pelo setor privado, definirem novos produtos financeiros ou novas condições de produtos existentes e evitarem a fragilidade financeira.

A digressão teórica anterior é útil para entender o marco mais geral de atuação da ABDE na sua condição de associa-ção de representação das IFD brasileiras. Hoje, a ABDE reúne 28 IFD dentre instituições oficiais federais, bancos de desenvolvimento controlados por estados, agências de fomento, bancos comerciais estaduais com carteira de desen-

RUMOS – 7 – Novembro/Dezembro 2014

volvimento, banco cooperativo, Finep e Sebrae. A validade teórica das IFD é a premissa estratégica que move a ABDE. Sob tal premissa, a associação vem procurando contribuir para a solução dos problemas do desenvolvimento econômi-co do Brasil, especificamente no que se refere, para utilizar uma expressão cara a Ignácio Rangel, ao comportamento do aparelho nacional de intermediação financeira. E assim defi-niu sua missão: ajudar a construir um Sistema Nacional de Fomento que apoie o desenvolvimento nacional em todas as suas dimensões – econômica, social e ambiental.

Ampliar a efetividade do SNF, por mais meritória que se mostre a missão, é tarefa que se encontra ainda longe de um bom termo. Inúmeras são as questões que se apresentam nessa construção. Em sua reflexão publicada na revista Rumos n° 275 (Antigos problemas, novos desafios), Lavinia Barros de Castro elenca vários desafios postos a um efetivo SNF: financiar inovação, compreender o significado das novas demandas sociais, atiçar o espírito empreendedor, fomentar a competitividade, satisfazer as demandas de infraestrutura urbana e saúde decorrentes do envelhecimento da popula-ção, integrar as dimensões social e ambiental à dimensão econômica, complementar políticas de desenvolvimento regional e local, ser financeiramente sustentável e atender às novas demandas regulatórias. Ao enfrentar estes e outros desafios, há que se evoluir da condição atual de um agregado de instituições que tem o fomento ao investimento dentre suas principais funções para a de um arranjo efetivamente sistêmico.

A construção do SNF está no centro da agenda de traba-lho da associação tal como consagrado na Carta ABDE de 2013. Em nosso entender, um passo extraordinário neste sentido poderá vir de uma efetiva articulação entre as insti-tuições federais especializadas no financiamento ao investi-mento e à inovação, mas sem capilaridade, e as instituições regionais em função da execução de uma política nacional de desenvolvimento regional, respeitadas as especificida-des de cada estado e suas próprias políticas de desenvolvi-mento. Pode-se contrapor que essa articulação já existe, uma vez que muitas das IFD regionais são agentes repassa-dores de recursos do BNDES e da Finep e, posto que con-troladas por estados, devem obedecer aos ditames das polí-ticas de desenvolvimento de seus controladores. Todavia, uma inspeção mais detalhada desta dupla questão da articu-lação entre os entes federais e regionais, de um lado, e da atuação das IFD como agentes de políticas de desenvolvi-mento, de outro, evidencia que há enorme espaço a ser preenchido entre a situação nominal presente e o potencial de um efetivo Sistema Nacional de Fomento. O preenchi-mento desse espaço, aproximando o mundo real da pro-messa do SNF, requer a combinação de boa técnica e deter-minação política.

Muitas das medidas para a construção de um SNF encon-tram-se inscritas na Carta ABDE. Se lhe acrescentarmos um

par de novas proposições, teremos, assim, uma agenda do Sistema Nacional de Fomento composta de sete pontos principais, a saber:

1. Institucionalizar a articulação entre IFD fede-rais e IFD regionais, orientada para a execução de programas específicos de uma política nacional de desenvolvimento regional e de políticas estaduais de desenvolvimento.

2. Ampliar as fontes de recursos das IFD regio-nais, com adoção de critérios específicos para a definição de limites operacionais por parte das IFD federais; garantia de acesso direto a fundos de poupança compulsória, orçamentários e constitu-cionais; e ampliação das possibilidades de captação em mercado.

3. Criar incentivos para o aumento da base de capital, através de políticas para que os estados capitalizem as IFD regionais; de garantias de reten-ção de resultados das IFD; e da adoção de regime tributário diferenciado.

4. associado a Reduzir o custo de observânciacontroles por vezes excessivos e meramente buro-cráticos dos órgãos supervisores.

5. Enfatizar a criação de sistemas e fundos garan-tidores de crédito, associados aos programas de financiamento direcionados a objetivos específicos das políticas de desenvolvimento (por ex., inovação em PME; apoio a atividades propulsoras em regiões de menor renda etc.).

6. Investir fortemente na capacitação das IFDpara fazer com que seus técnicos atuem como verdadeiros agentes de desenvolvimento, capazes de combinar o crédito e outras modalidades de financiamento com o conhecimento de questões igualmente relevantes ao investimento produtivo (incentivos fiscais, normas para a concessão de terrenos públicos para empreendimentos, proces-sos de licenciamento ambiental etc.).

7. Melhorar continuamente a governança das IFD, de modo que consigam cumprir sua missão institucional e, ao mesmo tempo, assegurar um adequado balanço risco-retorno.

A construção de um efetivo Sistema Nacional de Fomento pode ser vista como mais um capítulo do processo de fortalecimento institucional em curso no Brasil orienta-do para a recuperação da capacidade de planejamento e de execução de políticas de desenvolvimento. A perda dessa capacidade foi outro dos custos impostos pela crise fiscal da década de 1980 e pela orientação neoliberal que predomi-nou nos anos 1990. Sua recuperação é tarefa imprescindível para o sucesso do projeto nacional de desenvolvimento econômico e social.

RUMOS – 6 – Novembro/Dezembro 2014

As Instituições de Desenvolvimento asseguram meios de

financiamento à criação de

capacidade produtiva, permitindo certa

autonomia financeira à nação para

a implementação de políticas de

desenvolvimento.

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AARTIGO

setor bancário norte-americano em 2008, ajudando a sustentar o ritmo de crescimento da econo-mia brasileira, a ABDE reafir-mou-se como espaço privilegiado para o debate de questões sobre o financiamento do investimento e a atuação das instituições de fomento. Para tanto, concorreu igualmente a reavaliação em curso do papel dos bancos públi-cos pelas agências multilaterais. Na ABDE, o Plano de Ação de 2009 e o Planejamento Estratégi-co de 2011-12 ilustram este novo contexto, que levou à edição da Carta ABDE de 2013 em defesa da importância das instituições de fomento como parte necessária de um sistema financeiro misto e firmemente orientado para a sustentação do processo de desenvolvimento brasileiro.

Não obstante a mencionada reavaliação recente do papel das Instituições Financeiras de Desenvolvimento (IFD) pelas agências multilaterais, permanece ainda bem difundida no espectro político do país a tese da redução da presença do setor público na atividade bancária na linha elaborada ao final do século XX no Consenso de Washington ou Consenso Neoliberal. Em sua excelente síntese publicada pelo Ipea em 2010 (Uma proposta de delimitação conceitual de bancos públicos), Simone de Deos e Ana Rosa Mendonça listam as principais críticas normalmente dirigidas às IFD. Enten-dem os críticos que essas instituições possuem alta taxa de ativos que não performam e altos custos operacionais, costu-mam mascarar resultados por meio da rolagem de dívidas, são menos capitalizadas, recebem subsídios governamentais nem sempre explícitos, ocupam o espaço das instituições privadas (crowding-out), são utilizadas para maximizar objeti-vos pessoais de políticos e têm contribuição limitada para o desenvolvimento, concentrando seus empréstimos no setor público e nas grandes empresas. Como corolário, acreditam que a melhor política seria reduzir-se-lhes o tamanho ou, secundariamente, sujeitá-las ao mesmo arcabouço regula-mentar e de supervisão que os entes privados.

Os problemas de atuação das IFD elencados por seus críticos não nos parecem suficientes para negar-lhes a exis-tência, mas podem ajudar na definição de políticas e na ges-tão orientadas a melhorar seu desempenho. Nos anos de predomínio absoluto das ideias do Consenso Neoliberal,

uma das poucas vozes de dissen-so com projeção no debate público, o economista e prêmio Nobel Joseph Stiglitz, bem lembrou em palestra realizada na ABDE, no Rio de Janeiro, que é muito fácil acabar com instituições financeiras públicas, mas é bastante difícil criá-las partindo do zero. Aos que não se afiliam à doutrina de que as IFD seriam intrinsecamente negati-vas, mas reconhecem seus pro-blemas efetivos ou potenciais, cabe, portanto, entender as causas desses problemas e apli-car as medidas necessárias à sua superação.

De outro lado, os argumen-tos dos defensores das IFD mostram-se igualmente rele-vantes. Sem desconhecer os diferentes matizes observados nesses argumentos, estão bem difundidas as ideias de que as IFD preenchem falhas de mer-cado, geram externalidades positivas e reduzem o raciona-mento de crédito. Tais institui-ções podem direcionar crédito a

segmentos que proporcionam ganhos de produtividade e que não encontram recursos para financiamento no setor privado, destacando-se os projetos de infraestrutura, de pequenas e médias empresas, de inovação e de desenvolvi-mento regional. Além disso, as IFD ajudam a evitar a frus-tração de políticas anticíclicas que ocorreria em face de escassez de crédito privado, ampliam a competição, promo-vem desenvolvimento e inclusão financeira e garantem solidez e segurança ao setor financeiro. Numa versão mais abrangente da defesa dessas instituições, entende-se que elas asseguram meios de financiamento à criação de capacidade produtiva, permitindo certa autonomia financeira à nação para a implementação de políticas de desenvolvimento, ao proverem linhas de fomento para setores prioritários não atendidos pelo setor privado, definirem novos produtos financeiros ou novas condições de produtos existentes e evitarem a fragilidade financeira.

A digressão teórica anterior é útil para entender o marco mais geral de atuação da ABDE na sua condição de associa-ção de representação das IFD brasileiras. Hoje, a ABDE reúne 28 IFD dentre instituições oficiais federais, bancos de desenvolvimento controlados por estados, agências de fomento, bancos comerciais estaduais com carteira de desen-

RUMOS – 7 – Novembro/Dezembro 2014

volvimento, banco cooperativo, Finep e Sebrae. A validade teórica das IFD é a premissa estratégica que move a ABDE. Sob tal premissa, a associação vem procurando contribuir para a solução dos problemas do desenvolvimento econômi-co do Brasil, especificamente no que se refere, para utilizar uma expressão cara a Ignácio Rangel, ao comportamento do aparelho nacional de intermediação financeira. E assim defi-niu sua missão: ajudar a construir um Sistema Nacional de Fomento que apoie o desenvolvimento nacional em todas as suas dimensões – econômica, social e ambiental.

Ampliar a efetividade do SNF, por mais meritória que se mostre a missão, é tarefa que se encontra ainda longe de um bom termo. Inúmeras são as questões que se apresentam nessa construção. Em sua reflexão publicada na revista Rumos n° 275 (Antigos problemas, novos desafios), Lavinia Barros de Castro elenca vários desafios postos a um efetivo SNF: financiar inovação, compreender o significado das novas demandas sociais, atiçar o espírito empreendedor, fomentar a competitividade, satisfazer as demandas de infraestrutura urbana e saúde decorrentes do envelhecimento da popula-ção, integrar as dimensões social e ambiental à dimensão econômica, complementar políticas de desenvolvimento regional e local, ser financeiramente sustentável e atender às novas demandas regulatórias. Ao enfrentar estes e outros desafios, há que se evoluir da condição atual de um agregado de instituições que tem o fomento ao investimento dentre suas principais funções para a de um arranjo efetivamente sistêmico.

A construção do SNF está no centro da agenda de traba-lho da associação tal como consagrado na Carta ABDE de 2013. Em nosso entender, um passo extraordinário neste sentido poderá vir de uma efetiva articulação entre as insti-tuições federais especializadas no financiamento ao investi-mento e à inovação, mas sem capilaridade, e as instituições regionais em função da execução de uma política nacional de desenvolvimento regional, respeitadas as especificida-des de cada estado e suas próprias políticas de desenvolvi-mento. Pode-se contrapor que essa articulação já existe, uma vez que muitas das IFD regionais são agentes repassa-dores de recursos do BNDES e da Finep e, posto que con-troladas por estados, devem obedecer aos ditames das polí-ticas de desenvolvimento de seus controladores. Todavia, uma inspeção mais detalhada desta dupla questão da articu-lação entre os entes federais e regionais, de um lado, e da atuação das IFD como agentes de políticas de desenvolvi-mento, de outro, evidencia que há enorme espaço a ser preenchido entre a situação nominal presente e o potencial de um efetivo Sistema Nacional de Fomento. O preenchi-mento desse espaço, aproximando o mundo real da pro-messa do SNF, requer a combinação de boa técnica e deter-minação política.

Muitas das medidas para a construção de um SNF encon-tram-se inscritas na Carta ABDE. Se lhe acrescentarmos um

par de novas proposições, teremos, assim, uma agenda do Sistema Nacional de Fomento composta de sete pontos principais, a saber:

1. Institucionalizar a articulação entre IFD fede-rais e IFD regionais, orientada para a execução de programas específicos de uma política nacional de desenvolvimento regional e de políticas estaduais de desenvolvimento.

2. Ampliar as fontes de recursos das IFD regio-nais, com adoção de critérios específicos para a definição de limites operacionais por parte das IFD federais; garantia de acesso direto a fundos de poupança compulsória, orçamentários e constitu-cionais; e ampliação das possibilidades de captação em mercado.

3. Criar incentivos para o aumento da base de capital, através de políticas para que os estados capitalizem as IFD regionais; de garantias de reten-ção de resultados das IFD; e da adoção de regime tributário diferenciado.

4. associado a Reduzir o custo de observânciacontroles por vezes excessivos e meramente buro-cráticos dos órgãos supervisores.

5. Enfatizar a criação de sistemas e fundos garan-tidores de crédito, associados aos programas de financiamento direcionados a objetivos específicos das políticas de desenvolvimento (por ex., inovação em PME; apoio a atividades propulsoras em regiões de menor renda etc.).

6. Investir fortemente na capacitação das IFDpara fazer com que seus técnicos atuem como verdadeiros agentes de desenvolvimento, capazes de combinar o crédito e outras modalidades de financiamento com o conhecimento de questões igualmente relevantes ao investimento produtivo (incentivos fiscais, normas para a concessão de terrenos públicos para empreendimentos, proces-sos de licenciamento ambiental etc.).

7. Melhorar continuamente a governança das IFD, de modo que consigam cumprir sua missão institucional e, ao mesmo tempo, assegurar um adequado balanço risco-retorno.

A construção de um efetivo Sistema Nacional de Fomento pode ser vista como mais um capítulo do processo de fortalecimento institucional em curso no Brasil orienta-do para a recuperação da capacidade de planejamento e de execução de políticas de desenvolvimento. A perda dessa capacidade foi outro dos custos impostos pela crise fiscal da década de 1980 e pela orientação neoliberal que predomi-nou nos anos 1990. Sua recuperação é tarefa imprescindível para o sucesso do projeto nacional de desenvolvimento econômico e social.

RUMOS – 6 – Novembro/Dezembro 2014

As Instituições de Desenvolvimento asseguram meios de

financiamento à criação de

capacidade produtiva, permitindo certa

autonomia financeira à nação para

a implementação de políticas de

desenvolvimento.

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Acesso ao crédito e orientação para empreendedores. Com esses dois norteadores, o Sebrae tem sido o grande apoiador dos pequenos negócios no país. Nesta entrevista, o diretor-técnico da instituição, Carlos Alberto dos Santos, ressalta o impacto positivo para o Brasil de estar ao lado das micro e pequenas empresas

Por André Tennitz

RUMOS – 8 – Novembro/Dezembro 2014

umos – Um dos principais problemas das micro e pequenas empresas é o acesso a crédito, tanto para investimento quanto para capital de giro. Como tem evoluído essa questão e qual o papel do Sebrae nesse

processo?Carlos Alberto dos Santos – Pesquisas recentes que reali-zamos mostram uma evolução positiva. Mas apontam tam-bém para a necessidade de melhorias substantivas no acesso dos pequenos negócios ao Sistema Financeiro Nacional. Nós temos dois grandes desafios. O primeiro está no pró-prio processo de concessão de crédito, no momento da análise de risco. As metodologias usuais de análise de risco, que são extremamente eficazes no crédito ao consumidor, no crédito para grandes empresas estruturadas e consolida-das, falham, ou ganham enormes dificuldades num segmen-to que demanda pequenos valores por operação, e no qual as empresas apresentam informações de menor qualidade. A assimetria de informações, que é inerente a todo contrato de crédito, é maior no segmento de pequenos negócios. O agente financeiro tem muito menos informações sobre o negócio do que o tomador do crédito, e essa grande assime-tria dificulta enormemente a análise de risco e a própria precificação do crédito, expressa nos spreads. Por causa dessa insuficiência, uma grande quantidade de operações de crédi-to acaba se inviabilizando, ou então os contratos são realiza-dos com volume de recursos inferiores aos possíveis e

necessários. Isso dificulta a expansão e a consolidação das micro e pequenas empresas, e a própria expansão da cartei-ra de crédito dos bancos nesse segmento empresarial. É uma situação em que todos perdem. Perdem as empresas, per-dem os bancos. Perde o Brasil.

Além desse processo de análise de crédito, que muitas vezes não capta ou não identifica as particularidades dos pequenos negócios, sua volatilidade, seu alto grau de infor-malidade nas relações comerciais, temos um segundo grande desafio, que são as garantias. As garantias tradicionais, em especial as garantias reais, que são demandadas nos contratos de crédito, dificilmente estão disponíveis para as micro e pequenas empresas. Desse modo, mesmo que a análise de risco aponte para a viabilidade do contrato de crédito, nos valores e nas taxas propostas, as operações podem se inviabi-lizar por falta de garantias suficientes. Mais uma vez, perdem as empresas, os bancos, a sociedade brasileira.

Rumos – Qual tem sido o trabalho do Sebrae para elimi-nar ou, ao menos, minimizar esses problemas?Carlos Alberto – Não sendo uma instituição financeira, o Sebrae procura atuar numa estratégia de dois vetores: primei-ro, com informação, orientação, capacitação e consultoria de gestão para preparar os pequenos negócios e aproximá-los do Sistema Financeiro Nacional, com o objetivo de reduzir a assimetria de informações e facilitar a contratação do crédito. Essa é a grande atuação do Sebrae no dia a dia, por meio de

RUMOS – 9 – Novembro/Dezembro 2014

suas várias formas de atendimento presencial, remota, –coletiva ou individual.

O segundo vetor da estratégia visa, de forma proativa, contribuir para minimizar ao máximo possível as limitações em relação a garantias. Estamos fortemente empenhados em estabelecer ou ampliar mecanismos alternativos de garantia, seja por meio de fundos – como o Fundo de Aval de Micro e Pequenas Empresas (Fampe), operado por instituições finan-ceiras conveniadas com o Sebrae –, seja mediante sociedades de garantia de crédito, que são organizações de caráter mutua-lista, formadas pelos próprios empreendedores, com suporte de entidades de classe e do poder público.

O Sebrae tem apoiado firmemente a criação dessas socie-dades por todo país, tanto com orientação técnica e institucio-nal, quanto com suporte financeiro para a constituição dos fundos garantidores. Elas já existem hoje em diversos esta-dos, em diversas cidades. O que se busca é melhorar a relação das micro e pequenas empresas com todos os agentes finan-ceiros – bancos privados, instituições públicas, cooperativas de crédito – e aprimorar o ambiente de negócios, reduzindo a distância entre demanda e oferta de crédito no Sistema Finan-ceiro Nacional.

Rumos – O Banco Central está avaliando a regulamen-tação da atividade das sociedades de garantia. Qual a importância dessa regulamentação?Carlos Alberto – Conforme anunciado pelo Banco Central,

a regulamentação será feita a partir de um processo de con-sulta pública de 90 dias. A ideia é que as sociedades passem a ser consideradas cooperativas de garantias. São as chamadas garantias mútuas. As entidades hoje existentes estão organi-zadas na figura jurídica de organizações da sociedade civil de interesse público (Oscips), mas com a regulamentação, elas serão integradas ao sistema cooperativo, e, consequente-mente, ao Sistema Financeiro Nacional. Elas passarão a ser supervisionadas pelo Banco Central e terão que cumprir exigências de capital, de provisionamento etc. Sua carta de garantia passará a ser considerada na ponderação de risco das operações dos bancos. Isso será um grande estímulo para que os agentes financeiros operem mais frequentemen-te com essa alternativa de garantia, que é extremamente inovadora no Brasil.

Rumos – Qual a diferença entre o trabalho dos fundos de aval e das sociedades de garantia de crédito?Carlos Alberto – Ambos realizam trabalhos importantes e complementares. Os fundos de aval têm um caráter mais massivo. Temos diversos fundos no Brasil. Além do Fampe, temos o Fundo Garantidor de Operações (FGO), do Banco do Brasil, o Fundo Garantidor de Investimentos (FGI), gerido pelo BNDES, e o Funproger, que opera com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). No seu conjun-to, eles já têm uma carteira ativa de muitos bilhões de reais, o que facilita o acesso ao crédito pelos pequenos negócios. Mas

M MICRO E PEQUENAS

O diretor-técnico do Sebrae, Carlos Alberto dos Santos, é doutor em economia pela Universidade Livre de Berlim (Alemanha). Foi diretor de Administração e Finanças do Sebrae Nacional e éespecialista em sistema financeiro e desenvolvimento local. C

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Acesso ao crédito e orientação para empreendedores. Com esses dois norteadores, o Sebrae tem sido o grande apoiador dos pequenos negócios no país. Nesta entrevista, o diretor-técnico da instituição, Carlos Alberto dos Santos, ressalta o impacto positivo para o Brasil de estar ao lado das micro e pequenas empresas

Por André Tennitz

RUMOS – 8 – Novembro/Dezembro 2014

umos – Um dos principais problemas das micro e pequenas empresas é o acesso a crédito, tanto para investimento quanto para capital de giro. Como tem evoluído essa questão e qual o papel do Sebrae nesse

processo?Carlos Alberto dos Santos – Pesquisas recentes que reali-zamos mostram uma evolução positiva. Mas apontam tam-bém para a necessidade de melhorias substantivas no acesso dos pequenos negócios ao Sistema Financeiro Nacional. Nós temos dois grandes desafios. O primeiro está no pró-prio processo de concessão de crédito, no momento da análise de risco. As metodologias usuais de análise de risco, que são extremamente eficazes no crédito ao consumidor, no crédito para grandes empresas estruturadas e consolida-das, falham, ou ganham enormes dificuldades num segmen-to que demanda pequenos valores por operação, e no qual as empresas apresentam informações de menor qualidade. A assimetria de informações, que é inerente a todo contrato de crédito, é maior no segmento de pequenos negócios. O agente financeiro tem muito menos informações sobre o negócio do que o tomador do crédito, e essa grande assime-tria dificulta enormemente a análise de risco e a própria precificação do crédito, expressa nos spreads. Por causa dessa insuficiência, uma grande quantidade de operações de crédi-to acaba se inviabilizando, ou então os contratos são realiza-dos com volume de recursos inferiores aos possíveis e

necessários. Isso dificulta a expansão e a consolidação das micro e pequenas empresas, e a própria expansão da cartei-ra de crédito dos bancos nesse segmento empresarial. É uma situação em que todos perdem. Perdem as empresas, per-dem os bancos. Perde o Brasil.

Além desse processo de análise de crédito, que muitas vezes não capta ou não identifica as particularidades dos pequenos negócios, sua volatilidade, seu alto grau de infor-malidade nas relações comerciais, temos um segundo grande desafio, que são as garantias. As garantias tradicionais, em especial as garantias reais, que são demandadas nos contratos de crédito, dificilmente estão disponíveis para as micro e pequenas empresas. Desse modo, mesmo que a análise de risco aponte para a viabilidade do contrato de crédito, nos valores e nas taxas propostas, as operações podem se inviabi-lizar por falta de garantias suficientes. Mais uma vez, perdem as empresas, os bancos, a sociedade brasileira.

Rumos – Qual tem sido o trabalho do Sebrae para elimi-nar ou, ao menos, minimizar esses problemas?Carlos Alberto – Não sendo uma instituição financeira, o Sebrae procura atuar numa estratégia de dois vetores: primei-ro, com informação, orientação, capacitação e consultoria de gestão para preparar os pequenos negócios e aproximá-los do Sistema Financeiro Nacional, com o objetivo de reduzir a assimetria de informações e facilitar a contratação do crédito. Essa é a grande atuação do Sebrae no dia a dia, por meio de

RUMOS – 9 – Novembro/Dezembro 2014

suas várias formas de atendimento presencial, remota, –coletiva ou individual.

O segundo vetor da estratégia visa, de forma proativa, contribuir para minimizar ao máximo possível as limitações em relação a garantias. Estamos fortemente empenhados em estabelecer ou ampliar mecanismos alternativos de garantia, seja por meio de fundos – como o Fundo de Aval de Micro e Pequenas Empresas (Fampe), operado por instituições finan-ceiras conveniadas com o Sebrae –, seja mediante sociedades de garantia de crédito, que são organizações de caráter mutua-lista, formadas pelos próprios empreendedores, com suporte de entidades de classe e do poder público.

O Sebrae tem apoiado firmemente a criação dessas socie-dades por todo país, tanto com orientação técnica e institucio-nal, quanto com suporte financeiro para a constituição dos fundos garantidores. Elas já existem hoje em diversos esta-dos, em diversas cidades. O que se busca é melhorar a relação das micro e pequenas empresas com todos os agentes finan-ceiros – bancos privados, instituições públicas, cooperativas de crédito – e aprimorar o ambiente de negócios, reduzindo a distância entre demanda e oferta de crédito no Sistema Finan-ceiro Nacional.

Rumos – O Banco Central está avaliando a regulamen-tação da atividade das sociedades de garantia. Qual a importância dessa regulamentação?Carlos Alberto – Conforme anunciado pelo Banco Central,

a regulamentação será feita a partir de um processo de con-sulta pública de 90 dias. A ideia é que as sociedades passem a ser consideradas cooperativas de garantias. São as chamadas garantias mútuas. As entidades hoje existentes estão organi-zadas na figura jurídica de organizações da sociedade civil de interesse público (Oscips), mas com a regulamentação, elas serão integradas ao sistema cooperativo, e, consequente-mente, ao Sistema Financeiro Nacional. Elas passarão a ser supervisionadas pelo Banco Central e terão que cumprir exigências de capital, de provisionamento etc. Sua carta de garantia passará a ser considerada na ponderação de risco das operações dos bancos. Isso será um grande estímulo para que os agentes financeiros operem mais frequentemen-te com essa alternativa de garantia, que é extremamente inovadora no Brasil.

Rumos – Qual a diferença entre o trabalho dos fundos de aval e das sociedades de garantia de crédito?Carlos Alberto – Ambos realizam trabalhos importantes e complementares. Os fundos de aval têm um caráter mais massivo. Temos diversos fundos no Brasil. Além do Fampe, temos o Fundo Garantidor de Operações (FGO), do Banco do Brasil, o Fundo Garantidor de Investimentos (FGI), gerido pelo BNDES, e o Funproger, que opera com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). No seu conjun-to, eles já têm uma carteira ativa de muitos bilhões de reais, o que facilita o acesso ao crédito pelos pequenos negócios. Mas

M MICRO E PEQUENAS

O diretor-técnico do Sebrae, Carlos Alberto dos Santos, é doutor em economia pela Universidade Livre de Berlim (Alemanha). Foi diretor de Administração e Finanças do Sebrae Nacional e éespecialista em sistema financeiro e desenvolvimento local. C

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Crédito paraos pequenosnegócios

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é preciso fazer mais, porque o mercado está em crescimento e há uma enorme demanda ainda não atendida. A própria expansão do Sistema Financeiro Nacional está se dando, e cada vez mais será dessa forma, por meio da ampliação do crédito imobiliário, que ainda é relativamente pequeno no nosso país, e do crédito à pessoa jurídica de pequeno porte. Então, há um vasto mercado a ser explorado.

As Sociedades de Garantia de Crédito têm atuação mar-cadamente local e essa característica permite que elas tenham um conhecimento mais aprofundado da realidade dos empreendimentos. Seu caráter mutualista, além disso, confe-re um sentido mais forte às garantias. Regulamentadas como cooperativas de garantias, elas trabalharão muito próximas das cooperativas de crédito, como já acontece hoje, mas também se aproximarão mais dos bancos comerciais e dos bancos de fomento em todo o país. O sistema financeiro passará a ter mais segurança para trabalhar com elas. É toda uma regulamentação que visa consolidar esse mecanismo. Atualmente, as sociedades têm uma carteira de R$ 60 milhões em garantias. É um volume ainda modesto, mas é grande o potencial de crescimento e de disseminação das novas coope-rativas por todo o território nacional.

Rumos — Qual a importância de preparar as micro e pequenas empresas para trabalhar com o Sistema Financeiro, aproveitar os mecanismos de financiamen-tos existentes e gerir bem os recursos?Carlos Alberto – Essa é uma questão fundamental. Para as micro e pequenas empresas, o grande desafio é a gestão financeira. O endividamento – e crédito significa sempre endividamento – é uma decisão a ser tomada à luz das opor-tunidades do negócio. O crédito, por si só, não é uma solução. Ele é um instrumento que, se mal utilizado, aumenta as difi-culdades e pode até comprometer todo o empreendimento. Os recursos obtidos de terceiros possibilitam o aproveita-mento das oportunidades existentes no mercado, mas não criam essas oportunidades. É importante que o pequeno empreendedor tenha a consciência de que endividar-se ou não é uma decisão subordinada à estratégia do negócio.

Rumos – O custo dos financiamentos disponíveis é adequado às pequenas e microempresas?Carlos Alberto – Nos pequenos negócios, que demandam créditos de pequena monta, o custo não é apenas a taxa de juros para o tomador. Ele reflete todos os gastos, monetários ou não, na contratação e na liquidação do crédito. Os chama-dos custos de transação são relevantes, em especial o tempo que o empresário necessita para conseguir o crédito. O tempo é extremamente escasso para o pequeno empreendedor, uma vez que ele exerce múltiplas funções na empresa. Se a libera-ção do crédito demanda muitos procedimentos, muito tem-po, isso tudo tem um custo enorme. O que explica o fato de uma parte significativa dos empresários utilizar largamente cheque especial e cartão de crédito como fontes de financia-mento, duas modalidades muito caras, mas que podem ser acessadas rapidamente. Pelos levantamentos mais recentes

de que dispomos, o cheque especial é utilizado, em média, por 24% dos pequenos negócios. . O cartão de crédito, por 25%São formas de financiamento extremamente caras com rela-ção à taxa de juros, mas com custos de transação muito bai-xos, por isso se oferecem como alternativas para necessida-des momentâneas de capital de giro, por exemplo. As pesqui-sas mostram, contudo, que a grande fonte de financiamento dos pequenos negócios, com 61%, é o pagamento a prazo de fornecedores. O que novamente coloca a relevância da boa gestão financeira. Porque as vendas também são feitas a pra-zo, e um eventual descasamento entre contas a pagar e a rece-ber pode gerar necessidades de endividamento a taxas eleva-das por um problema que deriva de uma gestão ineficiente.

Rumos – As micro e pequenas empresas estão hoje mais preparadas para gerenciar a questão financeira?Carlos Alberto – Sim. Os indicadores mostram uma evolução muito positiva. Há 15 anos, 49% dos pequenos negócios não sobreviviam mais de dois anos. Em 2012, na média na-cional, chegamos a um índice de sobrevivência de 73%, o que é um número bastante significativo. A participação de jovens e de mulheres na direção dos empreendimentos tem aumentado, assim como a escolaridade dos empreendedores. Tem crescido também o empreendedorismo por oportunidade, que é outro elemento bastante relevante, sobretudo no contexto de um mercado de trabalho aquecido, e até de pleno emprego em alguns setores. Isso mostra que a opção de empreender está se

RUMOS – 10 – Novembro/Dezembro 2014 RUMOS – 11 – Novembro/Dezembro 2014

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tornando cada vez mais uma decisão consistente, mais pensa-da, mais preparada. O quadro está mudando para melhor.

Rumos – Pode-se notar evolução também no Sistema Financeiro em termos de atendimento ao segmento das micro e pequenas empresas? Carlos Alberto – Também aqui a evolução tem sido positiva, embora muito ainda se possa fazer. Há um processo de seg-mentação de carteiras, inclusive em bancos de varejo, que passam a ter estratégias de tratamento diferenciado, na con-cepção e que as empresas de pequeno porte têm diferenças qualitativas que devem ser observadas. A designação de gerências de relacionamento e a criação de agências só para pequenos negócios são parte desse processo. O esforço de renovação, de marketing, de aproximação é perceptível na publicidade. Bancos estrangeiros com larga tradição de aten-dimento de varejo a pequenas empresas em outros países já se posicionam nesse mercado.

Rumos – Como o Sistema Financeiro pode se preparar para atender melhor o segmento dos empreendimentos de pequeno porte?Carlos Alberto – O processo de expansão financeira, medido pela relação crédito/PIB, é contínuo desde 2002. Na época, o índice era de 22%; hoje é de 56%. Essa expansão reflete tam-bém a ampliação das carteiras voltadas para pessoas jurídicas. O que é importante é perceber que, num primeiro momento, os

agentes financeiros buscam alcançar aqueles clientes mais pró-ximos, mais qualificados, mais acessíveis devido a um relaciona-mento bancário já estabelecido. Na medida em que o processo se amplia, vai se tornando mais difícil. O que reforça a percep-ção de que é preciso avançar, com produtos e serviços inovado-res, mais adequados às características dos pequenos negócios. Não é só o crédito, mas também os seguros, os meios eletrôni-cos de pagamento, a previdência complementar etc. O crédito, quando é de pequena monta, traz em si um custo unitário eleva-do, o que se resolve a partir de ganhos de escala. É por isso que esse segmento de mercado é tão difícil. Ele tem questões estru-turais, que devem ser levadas em consideração, mas uma estra-tégia que efetivamente consiga avançar de uma forma consis-tente, de maneira coerente com os mecanismos de mercado, que seja sustentável, tem, necessariamente, de ser massiva.

Aqui temos um denominador comum dos interesses do Sistema Financeiro Nacional e dos pequenos negócios e, ao redor dessa relação, o Sebrae, que é um órgão de assistência técnica presente em todo o país. Esse processo de aproxima-ção, de conhecimento, de fidelização, é bom para o sistema financeiro, é bom para os pequenos negócios, mas só se tor-nará efetivo se for massivo, se for em grande quantidade. E nós trabalhamos com grandes quantidades. Em 2014, o Sistema Sebrae atendeu cerca de 2,2 milhões de pessoas jurídicas distintas, com enorme gama de produtos e serviços, num relacionamento intensivo com essas empresas. Então, para o Sistema Financeiro Nacional, esse é um mercado extremamente atrativo.

Rumos – Como o senhor avalia os resultados do traba-lho do Sebrae com os pequenos negócios?Carlos Alberto – Uma pesquisa da Serasa conseguiu estabe-lecer uma correlação clara entre a aplicação das soluções do Sebrae e o desenvolvimento das empresas. Os empreendi-mentos atendidos pelos programas de assistência técnica do Sebrae demandam mais crédito do que a média do mercado – o que significa que estão em expansão. Além disso, oferecem risco de crédito inferior à média do segmento em que atuam. Isso foi medido a partir de uma base enorme de dados, com mais de 20 mil empresas diferentes. Portanto, o resultado é bastante positivo e animador.

Rumos – Que importância o senhor confere à ABDE, a entidade que congrega e representa o Sistema Nacional de Fomento, integrado pelos bancos de desenvolvimen-to e pelas agências de fomento do país?Carlos Alberto – Para nós, a ABDE e o Sistema Nacional de Fomento têm enorme importância. Isso é simbolizado pelo fato de o Sebrae ser o único associado da ABDE que não é um agente financeiro. Num primeiro momento, isso pode até parecer estranho, mas frente a tudo o que dissemos, essa participação se coloca de uma forma muito coerente. A comu-nidade da ABDE congrega agentes financeiros voltados aos processos de desenvolvimento, que interagem com os peque-nos negócios. E esses, certamente, têm muito interesse em acessar os produtos e serviços desses agentes financeiros.

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EVOLUÇÃO DO ACESSO A CRÉDITO2010-2013 (%)

O seguimento do MEI mais que triplicou a proporção de tomadores, passando de 5% em 2010 para 17% em 20’13, mas continua sendo o seguimento em que é menor proporção de tomadores

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Fonte: Pesquisa Sebrae (1.500 respondentes).

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Microempreendedor Individual (MEI),Microempresa (ME), Empresa de Pequeno Porte (EPP)

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é preciso fazer mais, porque o mercado está em crescimento e há uma enorme demanda ainda não atendida. A própria expansão do Sistema Financeiro Nacional está se dando, e cada vez mais será dessa forma, por meio da ampliação do crédito imobiliário, que ainda é relativamente pequeno no nosso país, e do crédito à pessoa jurídica de pequeno porte. Então, há um vasto mercado a ser explorado.

As Sociedades de Garantia de Crédito têm atuação mar-cadamente local e essa característica permite que elas tenham um conhecimento mais aprofundado da realidade dos empreendimentos. Seu caráter mutualista, além disso, confe-re um sentido mais forte às garantias. Regulamentadas como cooperativas de garantias, elas trabalharão muito próximas das cooperativas de crédito, como já acontece hoje, mas também se aproximarão mais dos bancos comerciais e dos bancos de fomento em todo o país. O sistema financeiro passará a ter mais segurança para trabalhar com elas. É toda uma regulamentação que visa consolidar esse mecanismo. Atualmente, as sociedades têm uma carteira de R$ 60 milhões em garantias. É um volume ainda modesto, mas é grande o potencial de crescimento e de disseminação das novas coope-rativas por todo o território nacional.

Rumos — Qual a importância de preparar as micro e pequenas empresas para trabalhar com o Sistema Financeiro, aproveitar os mecanismos de financiamen-tos existentes e gerir bem os recursos?Carlos Alberto – Essa é uma questão fundamental. Para as micro e pequenas empresas, o grande desafio é a gestão financeira. O endividamento – e crédito significa sempre endividamento – é uma decisão a ser tomada à luz das opor-tunidades do negócio. O crédito, por si só, não é uma solução. Ele é um instrumento que, se mal utilizado, aumenta as difi-culdades e pode até comprometer todo o empreendimento. Os recursos obtidos de terceiros possibilitam o aproveita-mento das oportunidades existentes no mercado, mas não criam essas oportunidades. É importante que o pequeno empreendedor tenha a consciência de que endividar-se ou não é uma decisão subordinada à estratégia do negócio.

Rumos – O custo dos financiamentos disponíveis é adequado às pequenas e microempresas?Carlos Alberto – Nos pequenos negócios, que demandam créditos de pequena monta, o custo não é apenas a taxa de juros para o tomador. Ele reflete todos os gastos, monetários ou não, na contratação e na liquidação do crédito. Os chama-dos custos de transação são relevantes, em especial o tempo que o empresário necessita para conseguir o crédito. O tempo é extremamente escasso para o pequeno empreendedor, uma vez que ele exerce múltiplas funções na empresa. Se a libera-ção do crédito demanda muitos procedimentos, muito tem-po, isso tudo tem um custo enorme. O que explica o fato de uma parte significativa dos empresários utilizar largamente cheque especial e cartão de crédito como fontes de financia-mento, duas modalidades muito caras, mas que podem ser acessadas rapidamente. Pelos levantamentos mais recentes

de que dispomos, o cheque especial é utilizado, em média, por 24% dos pequenos negócios. . O cartão de crédito, por 25%São formas de financiamento extremamente caras com rela-ção à taxa de juros, mas com custos de transação muito bai-xos, por isso se oferecem como alternativas para necessida-des momentâneas de capital de giro, por exemplo. As pesqui-sas mostram, contudo, que a grande fonte de financiamento dos pequenos negócios, com 61%, é o pagamento a prazo de fornecedores. O que novamente coloca a relevância da boa gestão financeira. Porque as vendas também são feitas a pra-zo, e um eventual descasamento entre contas a pagar e a rece-ber pode gerar necessidades de endividamento a taxas eleva-das por um problema que deriva de uma gestão ineficiente.

Rumos – As micro e pequenas empresas estão hoje mais preparadas para gerenciar a questão financeira?Carlos Alberto – Sim. Os indicadores mostram uma evolução muito positiva. Há 15 anos, 49% dos pequenos negócios não sobreviviam mais de dois anos. Em 2012, na média na-cional, chegamos a um índice de sobrevivência de 73%, o que é um número bastante significativo. A participação de jovens e de mulheres na direção dos empreendimentos tem aumentado, assim como a escolaridade dos empreendedores. Tem crescido também o empreendedorismo por oportunidade, que é outro elemento bastante relevante, sobretudo no contexto de um mercado de trabalho aquecido, e até de pleno emprego em alguns setores. Isso mostra que a opção de empreender está se

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tornando cada vez mais uma decisão consistente, mais pensa-da, mais preparada. O quadro está mudando para melhor.

Rumos – Pode-se notar evolução também no Sistema Financeiro em termos de atendimento ao segmento das micro e pequenas empresas? Carlos Alberto – Também aqui a evolução tem sido positiva, embora muito ainda se possa fazer. Há um processo de seg-mentação de carteiras, inclusive em bancos de varejo, que passam a ter estratégias de tratamento diferenciado, na con-cepção e que as empresas de pequeno porte têm diferenças qualitativas que devem ser observadas. A designação de gerências de relacionamento e a criação de agências só para pequenos negócios são parte desse processo. O esforço de renovação, de marketing, de aproximação é perceptível na publicidade. Bancos estrangeiros com larga tradição de aten-dimento de varejo a pequenas empresas em outros países já se posicionam nesse mercado.

Rumos – Como o Sistema Financeiro pode se preparar para atender melhor o segmento dos empreendimentos de pequeno porte?Carlos Alberto – O processo de expansão financeira, medido pela relação crédito/PIB, é contínuo desde 2002. Na época, o índice era de 22%; hoje é de 56%. Essa expansão reflete tam-bém a ampliação das carteiras voltadas para pessoas jurídicas. O que é importante é perceber que, num primeiro momento, os

agentes financeiros buscam alcançar aqueles clientes mais pró-ximos, mais qualificados, mais acessíveis devido a um relaciona-mento bancário já estabelecido. Na medida em que o processo se amplia, vai se tornando mais difícil. O que reforça a percep-ção de que é preciso avançar, com produtos e serviços inovado-res, mais adequados às características dos pequenos negócios. Não é só o crédito, mas também os seguros, os meios eletrôni-cos de pagamento, a previdência complementar etc. O crédito, quando é de pequena monta, traz em si um custo unitário eleva-do, o que se resolve a partir de ganhos de escala. É por isso que esse segmento de mercado é tão difícil. Ele tem questões estru-turais, que devem ser levadas em consideração, mas uma estra-tégia que efetivamente consiga avançar de uma forma consis-tente, de maneira coerente com os mecanismos de mercado, que seja sustentável, tem, necessariamente, de ser massiva.

Aqui temos um denominador comum dos interesses do Sistema Financeiro Nacional e dos pequenos negócios e, ao redor dessa relação, o Sebrae, que é um órgão de assistência técnica presente em todo o país. Esse processo de aproxima-ção, de conhecimento, de fidelização, é bom para o sistema financeiro, é bom para os pequenos negócios, mas só se tor-nará efetivo se for massivo, se for em grande quantidade. E nós trabalhamos com grandes quantidades. Em 2014, o Sistema Sebrae atendeu cerca de 2,2 milhões de pessoas jurídicas distintas, com enorme gama de produtos e serviços, num relacionamento intensivo com essas empresas. Então, para o Sistema Financeiro Nacional, esse é um mercado extremamente atrativo.

Rumos – Como o senhor avalia os resultados do traba-lho do Sebrae com os pequenos negócios?Carlos Alberto – Uma pesquisa da Serasa conseguiu estabe-lecer uma correlação clara entre a aplicação das soluções do Sebrae e o desenvolvimento das empresas. Os empreendi-mentos atendidos pelos programas de assistência técnica do Sebrae demandam mais crédito do que a média do mercado – o que significa que estão em expansão. Além disso, oferecem risco de crédito inferior à média do segmento em que atuam. Isso foi medido a partir de uma base enorme de dados, com mais de 20 mil empresas diferentes. Portanto, o resultado é bastante positivo e animador.

Rumos – Que importância o senhor confere à ABDE, a entidade que congrega e representa o Sistema Nacional de Fomento, integrado pelos bancos de desenvolvimen-to e pelas agências de fomento do país?Carlos Alberto – Para nós, a ABDE e o Sistema Nacional de Fomento têm enorme importância. Isso é simbolizado pelo fato de o Sebrae ser o único associado da ABDE que não é um agente financeiro. Num primeiro momento, isso pode até parecer estranho, mas frente a tudo o que dissemos, essa participação se coloca de uma forma muito coerente. A comu-nidade da ABDE congrega agentes financeiros voltados aos processos de desenvolvimento, que interagem com os peque-nos negócios. E esses, certamente, têm muito interesse em acessar os produtos e serviços desses agentes financeiros.

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EVOLUÇÃO DO ACESSO A CRÉDITO2010-2013 (%)

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Fonte: Pesquisa Sebrae (1.500 respondentes).

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om grande experiência em macroeconomia, o doutor Fernando Nogueira da Costa dedicou grande parte de sua carreira ao estudo da Teoria Monetária e Financeira, tendo pesquisado os temas Sistema Financeiro, Bancos, Teoria e Política Monetária, Inflação e Finanças Com-

portamentais. Seu livro Brasil dos Bancos, editado pelo Instituto de Economia (IE) da Unicamp, recebeu o primeiro lugar no Prê-mio Brasil de Economia 2012, concedido pelo Conselho Fede-ral de Economia (Cofecon). Com a primeira edição esgotada, uma segunda impressão chegou às livrarias no final deste ano.

Recentemente, no entanto, o especialista passou a se debru-çar sobre a neuroeconomia, ou seja, à neurociência aplicada às decisões financeiras, particularmente às finanças pessoais. “Muita coisa mudou na nossa sociedade, a começar por uma longevidade maior. Hoje, se a pessoa trabalha por 30 anos, ainda restam outros 35 para viver, então será preciso gerar esta poupança, investir em previdência complementar e evitar erros financeiros durante a juventude e vida adulta para garantir uma boa velhice”, explica. A longevidade também tem gerado altos custos relativos a doenças degenerativas. “São pessoas que precisam de cuidados especiais, envolvendo recursos muito significativos. É preciso socializar este custo, criar escala, senão estaremos gerando novos problemas sociais”, avisa.

Outra dimensão abordada nos estudos de Nogueira da Costa é a Oniomani – o impulso descontrolado para consumir usando o crédito. Segundo ele, esta patologia se tornou tão comum que já existem grupos de ajuda semelhantes ao Alcóo-licos Anônimos (AA) para ajudar as pessoas a controlarem seus custos. Na Inglaterra, uma linha de pesquisadores vem pensando políticas públicas a partir da ideia da Economia da Felicidade, ou seja, levando em conta problemas contemporâ-neos que afetam a economia das pessoas. “A separação conju-gal e o desemprego são as principais causas de dor entre as pessoas. Isso desestrutura as famílias, envolve divisão de bens, nem sempre as decisões do casal impedem a queda de padrão de vida dos filhos e mesmo de um ou dos dois membros do antigo casal”, exemplifica. Estes estudiosos estão pensando em formas para auxiliar os jovens a compreender a extensão de ter filhos e possam se organizar para errar o mínimo.

O professor destaca que até recentemente a maior parte dos economistas – incluindo ele – não pensava além das finanças corporativas e da gestão das grandes fortunas. A partir dessa constatação, Fernando Nogueira da Costa passou a se dedicar a entender a finanças dos trabalhadores, das pessoas comuns. Depois da análise conceitual, ele concluiu que o sistema finan-ceiro brasileiro de hoje opera com mais recursos oriundos da poupança dos trabalhadores do que das grandes fortunas.

Mercado consumidor – Quando ocupava o cargo de vice-presidente de Finanças e Mercado de Capitais da Caixa Econô-

No mês que precedeu as eleições, ele escreveu quase um artigo por dia. O economista e doutor em Ciência Econômica pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Fernando Nogueira da Costa avaliou o processo eleitoral como “intenso e exaustivo, mas extremamente proveitoso”, por ter permitido a discussão de uma grande quantidade de assuntos e projetos. Recentemente o professor tem se dedicado aos estudos das finanças pessoais e dos trabalhadores. Em sua avaliação, a reeleição de Dilma Rousseff dá ao Brasil um cenário bastante otimista. Os resultados mais expressivos, ele avisa, só serão percebidos em 2022.

Por Ana Redig

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O Brasil do futuro

Fernando Nogueira da Costa

mica Federal (2003-2007), o economista encontrou a resposta para uma pergunta que ele vinha se fazendo há tempos: qual era o real tamanho do mercado consumidor brasileiro? Afinal, desde o início do primeiro governo do presidente Lula todas as estratégias elaboradas pela equipe econômica levaram em conta a inclusão social com entrada no mercado consumidor. “Encontrei uma pesquisa que mostrava que em 2004 o Brasil tinha o 7º mercado consumidor do mundo. Nos primeiros lugares estavam Estados Unidos e China, com 240 milhões de consumidores cada um. Depois, Japão e Índia, com 120 milhões cada. Em seguida vinha a Alemanha, com 72 milhões; a Rússia, com 62 milhões; e o Brasil com 58 milhões. Este núme-ro considera aqueles que tinham uma renda com paridade e poder de compra em torno de US$ 7 mil por ano. Ainda assim, apenas 33% da população brasileira estava inclusa neste merca-do”, informa o professor.

Observando a lista, temos três países de capitalismo madu-ro – Estados Unidos, Japão e Alemanha – e todos os outros são membros do Brics: China, Índia, Rússia, África do Sul e Brasil. A diferença positiva para o Brasil é que entre os países emergentes o percentual da população inclusa era muito pequeno. Para se ter ideia, na Rússia havia cerca de 48% de consumidores, na China apenas 19% estavam inclusos; e na Índia eram somente 12%. Os países de capitalismo maduro, entretanto, tinham 90% da população no mercado consumi-dor. “Esses dados mostravam o caminho para os países emer-gentes: era preciso incluir os consumidores em potencial. E esta inclusão precisava ser simultânea à distribuição de renda de forma a atrair capitais e investimentos, e para que tivesse um efeito multiplicador no que se refere a renda e emprego. E isso foi feito”, garante o economista.

Os dados falam por si. No final do segundo mandato do governo Lula mais de 30 milhões de brasileiros já haviam sido incluídos. A classe média nacional hoje passa dos 100 milhões de pessoas. O Brasil superou a Rússia e a Alemanha e se tornou

oo 5 maior mercado consumidor mundial. Durante a crise global, assim como os outros países emer-

gentes, o Brasil se saiu muito melhor do que os de capitalismo maduro. Fernando Nogueira destaca outro fator fundamental: a presença de bancos públicos para financiar este desenvolvi-mento. “Tanto China, como Índia e Rússia têm participação de bancos públicos no mercado de crédito ainda maiores do que no Brasil. Em 2004, a participação dos bancos públicos no mercado de crédito era de pouco mais de 40%. Hoje já repre-senta a metade”, informa o professor.

Nogueira da Costa explica que quando a crise mundial chegou no último trimestre de 2008, grandes empresas multi-nacionais – marcas que ainda não operavam no Brasil – encon-traram um mercado consumidor e a presença de bancos públi-cos garantindo o crédito. “Isso foi fundamental para a atração de investimentos internacionais”, garante.

Fernando Nogueira da Costa é economista e doutor em Ciência Econômica pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), onde é professor.

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om grande experiência em macroeconomia, o doutor Fernando Nogueira da Costa dedicou grande parte de sua carreira ao estudo da Teoria Monetária e Financeira, tendo pesquisado os temas Sistema Financeiro, Bancos, Teoria e Política Monetária, Inflação e Finanças Com-

portamentais. Seu livro Brasil dos Bancos, editado pelo Instituto de Economia (IE) da Unicamp, recebeu o primeiro lugar no Prê-mio Brasil de Economia 2012, concedido pelo Conselho Fede-ral de Economia (Cofecon). Com a primeira edição esgotada, uma segunda impressão chegou às livrarias no final deste ano.

Recentemente, no entanto, o especialista passou a se debru-çar sobre a neuroeconomia, ou seja, à neurociência aplicada às decisões financeiras, particularmente às finanças pessoais. “Muita coisa mudou na nossa sociedade, a começar por uma longevidade maior. Hoje, se a pessoa trabalha por 30 anos, ainda restam outros 35 para viver, então será preciso gerar esta poupança, investir em previdência complementar e evitar erros financeiros durante a juventude e vida adulta para garantir uma boa velhice”, explica. A longevidade também tem gerado altos custos relativos a doenças degenerativas. “São pessoas que precisam de cuidados especiais, envolvendo recursos muito significativos. É preciso socializar este custo, criar escala, senão estaremos gerando novos problemas sociais”, avisa.

Outra dimensão abordada nos estudos de Nogueira da Costa é a Oniomani – o impulso descontrolado para consumir usando o crédito. Segundo ele, esta patologia se tornou tão comum que já existem grupos de ajuda semelhantes ao Alcóo-licos Anônimos (AA) para ajudar as pessoas a controlarem seus custos. Na Inglaterra, uma linha de pesquisadores vem pensando políticas públicas a partir da ideia da Economia da Felicidade, ou seja, levando em conta problemas contemporâ-neos que afetam a economia das pessoas. “A separação conju-gal e o desemprego são as principais causas de dor entre as pessoas. Isso desestrutura as famílias, envolve divisão de bens, nem sempre as decisões do casal impedem a queda de padrão de vida dos filhos e mesmo de um ou dos dois membros do antigo casal”, exemplifica. Estes estudiosos estão pensando em formas para auxiliar os jovens a compreender a extensão de ter filhos e possam se organizar para errar o mínimo.

O professor destaca que até recentemente a maior parte dos economistas – incluindo ele – não pensava além das finanças corporativas e da gestão das grandes fortunas. A partir dessa constatação, Fernando Nogueira da Costa passou a se dedicar a entender a finanças dos trabalhadores, das pessoas comuns. Depois da análise conceitual, ele concluiu que o sistema finan-ceiro brasileiro de hoje opera com mais recursos oriundos da poupança dos trabalhadores do que das grandes fortunas.

Mercado consumidor – Quando ocupava o cargo de vice-presidente de Finanças e Mercado de Capitais da Caixa Econô-

No mês que precedeu as eleições, ele escreveu quase um artigo por dia. O economista e doutor em Ciência Econômica pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Fernando Nogueira da Costa avaliou o processo eleitoral como “intenso e exaustivo, mas extremamente proveitoso”, por ter permitido a discussão de uma grande quantidade de assuntos e projetos. Recentemente o professor tem se dedicado aos estudos das finanças pessoais e dos trabalhadores. Em sua avaliação, a reeleição de Dilma Rousseff dá ao Brasil um cenário bastante otimista. Os resultados mais expressivos, ele avisa, só serão percebidos em 2022.

Por Ana Redig

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O Brasil do futuro

Fernando Nogueira da Costa

mica Federal (2003-2007), o economista encontrou a resposta para uma pergunta que ele vinha se fazendo há tempos: qual era o real tamanho do mercado consumidor brasileiro? Afinal, desde o início do primeiro governo do presidente Lula todas as estratégias elaboradas pela equipe econômica levaram em conta a inclusão social com entrada no mercado consumidor. “Encontrei uma pesquisa que mostrava que em 2004 o Brasil tinha o 7º mercado consumidor do mundo. Nos primeiros lugares estavam Estados Unidos e China, com 240 milhões de consumidores cada um. Depois, Japão e Índia, com 120 milhões cada. Em seguida vinha a Alemanha, com 72 milhões; a Rússia, com 62 milhões; e o Brasil com 58 milhões. Este núme-ro considera aqueles que tinham uma renda com paridade e poder de compra em torno de US$ 7 mil por ano. Ainda assim, apenas 33% da população brasileira estava inclusa neste merca-do”, informa o professor.

Observando a lista, temos três países de capitalismo madu-ro – Estados Unidos, Japão e Alemanha – e todos os outros são membros do Brics: China, Índia, Rússia, África do Sul e Brasil. A diferença positiva para o Brasil é que entre os países emergentes o percentual da população inclusa era muito pequeno. Para se ter ideia, na Rússia havia cerca de 48% de consumidores, na China apenas 19% estavam inclusos; e na Índia eram somente 12%. Os países de capitalismo maduro, entretanto, tinham 90% da população no mercado consumi-dor. “Esses dados mostravam o caminho para os países emer-gentes: era preciso incluir os consumidores em potencial. E esta inclusão precisava ser simultânea à distribuição de renda de forma a atrair capitais e investimentos, e para que tivesse um efeito multiplicador no que se refere a renda e emprego. E isso foi feito”, garante o economista.

Os dados falam por si. No final do segundo mandato do governo Lula mais de 30 milhões de brasileiros já haviam sido incluídos. A classe média nacional hoje passa dos 100 milhões de pessoas. O Brasil superou a Rússia e a Alemanha e se tornou

oo 5 maior mercado consumidor mundial. Durante a crise global, assim como os outros países emer-

gentes, o Brasil se saiu muito melhor do que os de capitalismo maduro. Fernando Nogueira destaca outro fator fundamental: a presença de bancos públicos para financiar este desenvolvi-mento. “Tanto China, como Índia e Rússia têm participação de bancos públicos no mercado de crédito ainda maiores do que no Brasil. Em 2004, a participação dos bancos públicos no mercado de crédito era de pouco mais de 40%. Hoje já repre-senta a metade”, informa o professor.

Nogueira da Costa explica que quando a crise mundial chegou no último trimestre de 2008, grandes empresas multi-nacionais – marcas que ainda não operavam no Brasil – encon-traram um mercado consumidor e a presença de bancos públi-cos garantindo o crédito. “Isso foi fundamental para a atração de investimentos internacionais”, garante.

Fernando Nogueira da Costa é economista e doutor em Ciência Econômica pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), onde é professor.

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RUMOS 14 – Novembro/Dezembro 2014 – RUMOS 15– Novembro/Dezembro 2014 –

Eleições – Durante a disputa presiden-cial Fernando Nogueira da Costa anali-sou as características dos pensamentos políticos dos candidatos, e seus desdo-bramentos econômicos para escrever diversos artigos. A seu ver, as duas correntes que foram para o segundo turno mostravam visões bem opostas. “De um lado tínhamos uma linha neoli-beral e do outro uma mais social-desenvolvimentista. Basicamente, a pro-posta econômica do Partido da Social Democracia Brasileira era a tapeação de preços básicos: juros, câmbio, política fiscal para controlar a inflação. A do Partido dos Trabalhadores, ao contrá-rio, propunha o desenvolvimento a longo prazo. O que eu chamo de social

desenvolvimentismo, ou seja, um governo que dá o mesmo peso à política econômica e à política social ativa”.

Em sua opinião, os economistas que analisam o país fora do debate eleitoral, com uma visão de longo prazo, apontam para um cenário otimista para o país nas próximas décadas.

o“Nos próximos 10 anos, quando o Brasil se tornar o 6 maior país produtor de petróleo do mundo e um grande exportador, será possível estabilizar o câmbio e, assim, a inflação. Esse é um projeto estratégico com peso diferenciado para o país”, completa.

Para ele, a inclusão social no mercado consumidor é um pilar básico do crescimento sustentável de longo prazo. “Os grandes projetos de infraestrutura como o do pré-sal, que a meu ver é um projeto redentor da economia brasileira, darão sustentação ao crescimento de longo prazo com efeitos, espe-ro, magníficos sobre Educação e Saúde”, complementa. O especialista explica que o Brasil vem seguindo o modelo da Noruega, que utilizou seu Fundo de Riqueza Soberano para resolver problemas de Previdência Social. O Brasil vai usar esses recursos para resolver problemas de qualificação na área de educação e da saúde.

Portanto, se o país for analisado com foco no curto prazo, concluiremos pelo pessimismo, inflação, crise. Mas o especia-lista argumenta que o Estado não pode se guiar por expectati-vas imediatistas, pois precisa pensar e desenvolver o país para as próximas gerações. Para ele, um governante é aquele que vê além do seu mandato. “Dilma é uma estadista, mas a história só vai reconhecer seu papel chave na história brasileira no futuro. Todos os grandes investimentos que foram colocados em andamento em seu governo são resultados a serem colhi-dos a partir de 2018, porém o mais expressivo vai aparecer mesmo em 2022, ano do bicentenário da Independência do Brasil”, antevê. Fernando Nogueira da Costa acredita que ela tomou decisões corajosas em um momento de crise mundial e deslanchou o pacote de investimentos que vai dar muitos frutos. “Em 2022, o país vai finalmente proclamar sua inde-pendência financeira”, conclui.

Infraestrutura – Fernando Nogueira da Costa explica que financiamento público foi de funda-mental importância em um primeiro momento, quando a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil financiaram o consumo. A partir de 2005, a Caixa começou a criar as bases para o financiamen-to imobiliário, o Banco do Brasil focou no agrone-gócio e o BNDES manteve a diretiva de garantir recursos para a infraestrutura. Para o professor, esta política de crédito teve papel chave naquele primeiro momento. “Agora o grande desfio é investir em infraestrutura logística, e infelizmente isso não ficou claro durante a campanha eleitoral: as grandes obras estão em andamento”, destaca.

Fernando Nogueira da Costa também integra um grupo de pesquisadores – a Rede D (Desenvolvimentista) que, com recursos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), se dedicou a pesquisar o futuro do desenvolvimento no país. Em vez de se dedicar à análise de leituras de séries temporais, o economista tomou como desafio medir o potencial de financi-amento para o futuro. Assim, ele se debruçou sobre as fontes de financiamento necessárias para dar continuidade a esses investimentos de longo prazo já iniciados.

Depois da análise conceitual, ele partiu para o seguinte raciocínio: o sistema financeiro brasileiro tinha um financia-mento global bastante razoável, comparado a outros países do mundo. Os dados mostravam que até 2002 o crédito em rela-ção ao Produto Interno Bruto (PIB) caiu até 22%. Com base neste indicador, a conclusão era de que o sistema financeiro não estava cumprindo o seu papel de financiar. “Isso sempre me incomodou, então defendi uma hipótese diferente”, revela o economista.

Ao desagregar os dados do financiamento total, foi possí-vel perceber melhor os detalhes. Durante o governo do presi-dente Fernando Henrique Cardoso, a política era privatizar os bancos estaduais, que chegaram a ser os segundos maiores prestadores do Brasil, o que gerou forte reflexo no mercado. O crédito que era antes considerado público, no final de 1994 passou a ser privado, por vezes privado e estrangeiro. Passada esta fase, logo depois do Plano Real, o crédito em relação ao PIB, que era de 36%, manteve a tendência de queda até chegar aos 22%, em 2002. “Nessa época a dívida pública chegou a 62% do PIB, então somando ambos chegávamos a cerca de 88% do PIB financiado. Só que ¾ desse valor eram destinados para carregar a dívida pública. Esses recursos eram, portanto, desviados de financiar o desenvolvimento para custear a dívi-da e as diversas crises vividas no país”, esclarece.

Fernando da Costa explica que no governo Lula este per-centual chegou a 57% de um PIB extraordinariamente maior – mais de R$ 5 trilhões. Somando esses 57% de crédito junto aos 41% de dívida pública chegamos a 98% do financiamento total. Para o professor, mais do que números, a diferença é que a partir deste momento houve uma política de crédito.

O país adotou um modelo que, ao mesmo tempo que gera renda, lança produtos financeiros capazes de captar fontes de

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financiamento que serão responsáveis por lastrear o crédito. Ou seja, a renda do PIB brasileiro cresceu muito e o destino desses recursos foi transferido para o consumo das famílias. Com o consumo mais elevado, os comerciantes reinvestem em estoque, mas também fazem investimentos. Isso contraria o modelo da poupança, baseado em cortar gastos.

“Quando você faz o inverso e incentiva o consumo, cria um círculo virtuoso, gerando a renda necessária para incrementar aplicações financeiras. Se os bancos souberem lançar produtos adequados, como prazos adequados, juros compatíveis, a ten-dência é expandir o crédito, gerando esse efeito multiplicador que propicia o funding interno”, ensina o economista.

Fernando destaca que a oportunidade de financiar grandes pacotes de investimentos com funding interno é fato inédito na história brasileira. “Pela primeira vez a Caixa Econômica reali-zou financiamentos para empresas de grande porte. Os bancos públicos foram fundamentais para a exploração do pré-sal, maior pacote de investimentos em petróleo do mundo, especi-almente o BNDES, que destinou seu maior volume de investi-mentos para a Petrobras. E tudo foi feito com financiamento interno”, destaca o professor.

Fernando lembra que essa perspectiva financeira de longo prazo, com alguma autonomia, é também uma novidade histó-rica para o Brasil, pois o país sempre precisou recorrer a finan-ciamentos externos. Como consequência, qualquer crise cam-bial afetava os projetos e estancava o crescimento. Assim, o país só conseguia dar pequenos “voos de galinha”.

Capitalismo de Estado neocorporativista – Fernando Nogueira da Costa também vem estudando as características do capitalismo brasileiro contemporâneo, que ele classifica como “capitalismo de Estado neocorporativista”. O concei-to, de origem europeia, vem sendo empregado em situações em que antigas lideranças sindicais, agora à frente de partidos de origem trabalhista, chegam ao poder, investindo no Esta-do de Bem-estar Social. Ainda assim, para governar esses governantes precisam fazer coalizões e alianças. Os pesquisa-dores europeus perceberam que este tipo de transição, essa associação entre representantes tanto trabalhistas como patronais, quase é necessária para garantir uma política eco-nômica sem vetos.

Ao participar de encontros do Conselho de Desenvolvi-mento Econômico e Social, Fernando Nogueira descobriu que presenciava essa experiência em Brasília. “A meu ver essa prática é extremamente representativa desta busca de concili-ação de interesses desses vários tipos de lideranças da socie-dade, não só ligadas às atividades produtivas, empresários, trabalhadores, mas também todo um tipo de representação”, avalia.

Assim, o professor se interessou por entender o novo papel do capital de origem trabalhista, ou seja, os fundos fechados de pensão (patrocinados pelas empresas estatais) que, juntos, têm cerca de R$ 680 bilhões em ativos. Os fundos abertos de pensão, VGBL etc., aqueles que qualquer pessoa pode aplicar, somam mais de R$ 320 bilhões. “Somando os

dois, temos cerca de R$ 1 trilhão, o que significa mais de 20% do PIB brasileiro. Mas este não é todo o capital de origem trabalhista: há ainda R$ 260 bilhões do FGTS, e mesmo o FAT, atravessa uma crise atual-mente, entre outros”, revela.

Com essa informação sobre o capital proveniente do trabalho, o pesquisador decidiu medir o capital dos bilionários brasileiros, as chamadas grandes fortunas. Fernando concluiu que, comparando os dados de forma agregada, atualmente o capital de origem trabalhis-ta supera o das grandes fortunas no Brasil. Isso significa que o trabalho tem tido maior peso no financiamento do desenvol-vimento do país. “Analisando os grandes projetos encontra-mos os grandes fundos de pensão associados com grandes corporações, com o BNDESpar e até com uma minoria estrangeira”, observa o professor.

Ele brinca que o clássico tripé econômico, formado pelo capital de origem privado nacional e estrangeiro e o estatal, agora ganhou uma quarta perna, já que este capital de origem trabalhista passou a ser um player importante. Só a Previ repre-senta ¼ dos recursos de todos os fundos de pensão. Junto com Petros, Funcef e Valia somam mais de 50% da indústria dos fundos de pensão, e o restante é formado por mais de 300 pequenos fundos que não se associam a grandes projetos, só participam do mercado comprando produtos financeiros.

E de onde esse capital tomou tanta força? Daquilo que Fernando da Costa chama de capitalismo antropofágico, tropicalista e miscigenado. “Esta é uma característica muito brasileira, pegar ideias que vêm de fora e adequar ao clima”. Ele acredita que essa mestiçagem seja a originalidade brasilei-ra. “É a nossa jabuticaba, precisamos valorizar isso, pegar o que tem de melhor e tentar evitar os erros, adequando ao clima tropical”. Ele explica que quando as privatizações começaram no governo FHC, os investidores privados não se apresentaram. Como a ideia era não pulverizar as empre-sas, os grandes fundos patrocinados pelas estatais foram chamados. “Ironicamente, quando o governo de origem trabalhista chegou ao poder, esses grandes fundos de pensão tinham como lideranças sindicalistas autênticos, muitos ligados à própria CUT”.

Para o estudioso, o fundamental é que o país atravessa uma fase do capitalismo em que o capital trabalhista tem peso nos negócios estratégicos para o país, juntamente com BNDESpar, grandes bancos, grandes corporações. “Isso é distinto, uma característica nossa, e é um capitalismo de Esta-do, porque tem um projeto focado no longo prazo”, analisa.

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Eleições – Durante a disputa presiden-cial Fernando Nogueira da Costa anali-sou as características dos pensamentos políticos dos candidatos, e seus desdo-bramentos econômicos para escrever diversos artigos. A seu ver, as duas correntes que foram para o segundo turno mostravam visões bem opostas. “De um lado tínhamos uma linha neoli-beral e do outro uma mais social-desenvolvimentista. Basicamente, a pro-posta econômica do Partido da Social Democracia Brasileira era a tapeação de preços básicos: juros, câmbio, política fiscal para controlar a inflação. A do Partido dos Trabalhadores, ao contrá-rio, propunha o desenvolvimento a longo prazo. O que eu chamo de social

desenvolvimentismo, ou seja, um governo que dá o mesmo peso à política econômica e à política social ativa”.

Em sua opinião, os economistas que analisam o país fora do debate eleitoral, com uma visão de longo prazo, apontam para um cenário otimista para o país nas próximas décadas.

o“Nos próximos 10 anos, quando o Brasil se tornar o 6 maior país produtor de petróleo do mundo e um grande exportador, será possível estabilizar o câmbio e, assim, a inflação. Esse é um projeto estratégico com peso diferenciado para o país”, completa.

Para ele, a inclusão social no mercado consumidor é um pilar básico do crescimento sustentável de longo prazo. “Os grandes projetos de infraestrutura como o do pré-sal, que a meu ver é um projeto redentor da economia brasileira, darão sustentação ao crescimento de longo prazo com efeitos, espe-ro, magníficos sobre Educação e Saúde”, complementa. O especialista explica que o Brasil vem seguindo o modelo da Noruega, que utilizou seu Fundo de Riqueza Soberano para resolver problemas de Previdência Social. O Brasil vai usar esses recursos para resolver problemas de qualificação na área de educação e da saúde.

Portanto, se o país for analisado com foco no curto prazo, concluiremos pelo pessimismo, inflação, crise. Mas o especia-lista argumenta que o Estado não pode se guiar por expectati-vas imediatistas, pois precisa pensar e desenvolver o país para as próximas gerações. Para ele, um governante é aquele que vê além do seu mandato. “Dilma é uma estadista, mas a história só vai reconhecer seu papel chave na história brasileira no futuro. Todos os grandes investimentos que foram colocados em andamento em seu governo são resultados a serem colhi-dos a partir de 2018, porém o mais expressivo vai aparecer mesmo em 2022, ano do bicentenário da Independência do Brasil”, antevê. Fernando Nogueira da Costa acredita que ela tomou decisões corajosas em um momento de crise mundial e deslanchou o pacote de investimentos que vai dar muitos frutos. “Em 2022, o país vai finalmente proclamar sua inde-pendência financeira”, conclui.

Infraestrutura – Fernando Nogueira da Costa explica que financiamento público foi de funda-mental importância em um primeiro momento, quando a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil financiaram o consumo. A partir de 2005, a Caixa começou a criar as bases para o financiamen-to imobiliário, o Banco do Brasil focou no agrone-gócio e o BNDES manteve a diretiva de garantir recursos para a infraestrutura. Para o professor, esta política de crédito teve papel chave naquele primeiro momento. “Agora o grande desfio é investir em infraestrutura logística, e infelizmente isso não ficou claro durante a campanha eleitoral: as grandes obras estão em andamento”, destaca.

Fernando Nogueira da Costa também integra um grupo de pesquisadores – a Rede D (Desenvolvimentista) que, com recursos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), se dedicou a pesquisar o futuro do desenvolvimento no país. Em vez de se dedicar à análise de leituras de séries temporais, o economista tomou como desafio medir o potencial de financi-amento para o futuro. Assim, ele se debruçou sobre as fontes de financiamento necessárias para dar continuidade a esses investimentos de longo prazo já iniciados.

Depois da análise conceitual, ele partiu para o seguinte raciocínio: o sistema financeiro brasileiro tinha um financia-mento global bastante razoável, comparado a outros países do mundo. Os dados mostravam que até 2002 o crédito em rela-ção ao Produto Interno Bruto (PIB) caiu até 22%. Com base neste indicador, a conclusão era de que o sistema financeiro não estava cumprindo o seu papel de financiar. “Isso sempre me incomodou, então defendi uma hipótese diferente”, revela o economista.

Ao desagregar os dados do financiamento total, foi possí-vel perceber melhor os detalhes. Durante o governo do presi-dente Fernando Henrique Cardoso, a política era privatizar os bancos estaduais, que chegaram a ser os segundos maiores prestadores do Brasil, o que gerou forte reflexo no mercado. O crédito que era antes considerado público, no final de 1994 passou a ser privado, por vezes privado e estrangeiro. Passada esta fase, logo depois do Plano Real, o crédito em relação ao PIB, que era de 36%, manteve a tendência de queda até chegar aos 22%, em 2002. “Nessa época a dívida pública chegou a 62% do PIB, então somando ambos chegávamos a cerca de 88% do PIB financiado. Só que ¾ desse valor eram destinados para carregar a dívida pública. Esses recursos eram, portanto, desviados de financiar o desenvolvimento para custear a dívi-da e as diversas crises vividas no país”, esclarece.

Fernando da Costa explica que no governo Lula este per-centual chegou a 57% de um PIB extraordinariamente maior – mais de R$ 5 trilhões. Somando esses 57% de crédito junto aos 41% de dívida pública chegamos a 98% do financiamento total. Para o professor, mais do que números, a diferença é que a partir deste momento houve uma política de crédito.

O país adotou um modelo que, ao mesmo tempo que gera renda, lança produtos financeiros capazes de captar fontes de

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“Quando você faz o inverso e incentiva o consumo, cria um círculo virtuoso, gerando a renda necessária para incrementar aplicações financeiras. Se os bancos souberem lançar produtos adequados, como prazos adequados, juros compatíveis, a ten-dência é expandir o crédito, gerando esse efeito multiplicador que propicia o funding interno”, ensina o economista.

Fernando destaca que a oportunidade de financiar grandes pacotes de investimentos com funding interno é fato inédito na história brasileira. “Pela primeira vez a Caixa Econômica reali-zou financiamentos para empresas de grande porte. Os bancos públicos foram fundamentais para a exploração do pré-sal, maior pacote de investimentos em petróleo do mundo, especi-almente o BNDES, que destinou seu maior volume de investi-mentos para a Petrobras. E tudo foi feito com financiamento interno”, destaca o professor.

Fernando lembra que essa perspectiva financeira de longo prazo, com alguma autonomia, é também uma novidade histó-rica para o Brasil, pois o país sempre precisou recorrer a finan-ciamentos externos. Como consequência, qualquer crise cam-bial afetava os projetos e estancava o crescimento. Assim, o país só conseguia dar pequenos “voos de galinha”.

Capitalismo de Estado neocorporativista – Fernando Nogueira da Costa também vem estudando as características do capitalismo brasileiro contemporâneo, que ele classifica como “capitalismo de Estado neocorporativista”. O concei-to, de origem europeia, vem sendo empregado em situações em que antigas lideranças sindicais, agora à frente de partidos de origem trabalhista, chegam ao poder, investindo no Esta-do de Bem-estar Social. Ainda assim, para governar esses governantes precisam fazer coalizões e alianças. Os pesquisa-dores europeus perceberam que este tipo de transição, essa associação entre representantes tanto trabalhistas como patronais, quase é necessária para garantir uma política eco-nômica sem vetos.

Ao participar de encontros do Conselho de Desenvolvi-mento Econômico e Social, Fernando Nogueira descobriu que presenciava essa experiência em Brasília. “A meu ver essa prática é extremamente representativa desta busca de concili-ação de interesses desses vários tipos de lideranças da socie-dade, não só ligadas às atividades produtivas, empresários, trabalhadores, mas também todo um tipo de representação”, avalia.

Assim, o professor se interessou por entender o novo papel do capital de origem trabalhista, ou seja, os fundos fechados de pensão (patrocinados pelas empresas estatais) que, juntos, têm cerca de R$ 680 bilhões em ativos. Os fundos abertos de pensão, VGBL etc., aqueles que qualquer pessoa pode aplicar, somam mais de R$ 320 bilhões. “Somando os

dois, temos cerca de R$ 1 trilhão, o que significa mais de 20% do PIB brasileiro. Mas este não é todo o capital de origem trabalhista: há ainda R$ 260 bilhões do FGTS, e mesmo o FAT, atravessa uma crise atual-mente, entre outros”, revela.

Com essa informação sobre o capital proveniente do trabalho, o pesquisador decidiu medir o capital dos bilionários brasileiros, as chamadas grandes fortunas. Fernando concluiu que, comparando os dados de forma agregada, atualmente o capital de origem trabalhis-ta supera o das grandes fortunas no Brasil. Isso significa que o trabalho tem tido maior peso no financiamento do desenvol-vimento do país. “Analisando os grandes projetos encontra-mos os grandes fundos de pensão associados com grandes corporações, com o BNDESpar e até com uma minoria estrangeira”, observa o professor.

Ele brinca que o clássico tripé econômico, formado pelo capital de origem privado nacional e estrangeiro e o estatal, agora ganhou uma quarta perna, já que este capital de origem trabalhista passou a ser um player importante. Só a Previ repre-senta ¼ dos recursos de todos os fundos de pensão. Junto com Petros, Funcef e Valia somam mais de 50% da indústria dos fundos de pensão, e o restante é formado por mais de 300 pequenos fundos que não se associam a grandes projetos, só participam do mercado comprando produtos financeiros.

E de onde esse capital tomou tanta força? Daquilo que Fernando da Costa chama de capitalismo antropofágico, tropicalista e miscigenado. “Esta é uma característica muito brasileira, pegar ideias que vêm de fora e adequar ao clima”. Ele acredita que essa mestiçagem seja a originalidade brasilei-ra. “É a nossa jabuticaba, precisamos valorizar isso, pegar o que tem de melhor e tentar evitar os erros, adequando ao clima tropical”. Ele explica que quando as privatizações começaram no governo FHC, os investidores privados não se apresentaram. Como a ideia era não pulverizar as empre-sas, os grandes fundos patrocinados pelas estatais foram chamados. “Ironicamente, quando o governo de origem trabalhista chegou ao poder, esses grandes fundos de pensão tinham como lideranças sindicalistas autênticos, muitos ligados à própria CUT”.

Para o estudioso, o fundamental é que o país atravessa uma fase do capitalismo em que o capital trabalhista tem peso nos negócios estratégicos para o país, juntamente com BNDESpar, grandes bancos, grandes corporações. “Isso é distinto, uma característica nossa, e é um capitalismo de Esta-do, porque tem um projeto focado no longo prazo”, analisa.

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Fernando Nogueira da Costa

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Page 16: Rumos 278

Por Jader Moraes

RUMOS 16 Novembro/Dezembro 2014 � �

da agência, que também realizou parcerias com universidades, centros de pesquisa e empresas de Pesquisa e Desenvolvimento.

Para fazer o trabalho, os autores contaram que foram ao parque para ver, in loco, os resultados da operação realizada pela agência.“O financiamento à inovação é algo fundamental, mas é difícil pois não traz retorno rápido. Esse projeto, que escolhe-mos para escrever, foi além, pois investiu em estrutura física e também institucional, com a criação de um ambiente de intera-ção como o do parque, que incentiva a inovação e a pesquisa”, contaram os vencedores.

A Desenvolve SP também foi agraciada com a menção honrosa concedida ao segundo melhor trabalho da categoria – a monografia “Programa Renova SP: Financiamento para Reno-vação da Frota de Caminhões”, escrita por Paulo Roberto da Silva e Regina Bini Carrosa. O presidente da agência, Milton Luiz de Melo Santos, participou da cerimônia e recebeu um troféu em homenagem à instituição.

Na segunda categoria, Excelência em Gestão, o prêmio principal foi conferido à assessora da Área de Pesquisa Econô-mica do BNDES, Lavinia Barros de Castro. O trabalho vence-dor busca refletir, a partir da experiência da área de gestão de riscos do banco entre os anos de 2007 e 2014, sobre a imple-mentação das regras de Basileia no banco, apontando alguns importantes benefícios para o gerenciamento da instituição..

“Espero que o artigo contribua para não apenas comparti-lhar experiências, mas também para ajudar a construir uma agenda para lidarmos com os desafios comuns, para que possa-mos continuar sendo sustentáveis financeiramente, sem preju-dicar nosso dever de fomento aos desafios – mutantes – do desenvolvimento”, resumiu Lavinia.

Na mesma categoria, o trabalho “Avaliação do Planeja-mento Estratégico numa Instituição Pública a partir do Balan-ced Scorecad: o caso BRDE”, de Marcos Aurélio Cunha, do BRDE, recebeu uma menção honrosa. Além destes trabalhos, outros três artigos se destacaram e compõem o livro do Prê-mio, que foi lançado durante a cerimônia.

Nesta primeira edição, o Prêmio recebeu 27 inscrições, de autores de 11 instituições diferentes. Quinze trabalhos foram aptos para concorrer na primeira categoria, e os demais (12), no segundo tema. O concurso foi organizado pela Comissão de Estudos e Pesquisas em conjunto com a Gerência de Estu-dos Econômicos da ABDE.

O dia das boas práticas

RUMOS 17 – Novembro/Dezembro 2014 �

ito meses após seu lançamento, em abril deste ano, a primeira edição do Prêmio ABDE de Monogra-fias sobre o Sistema Nacional de Fomento (SNF) foi encerrada em grande estilo, em evento no

Centro de Convenções da Bolsa de Valores do Rio de Janeiro, no dia 05 de dezembro. A cerimônia de premiação reuniu os vencedores em cada categoria, além de técnicos e executivos das Instituições Financeiras de Desenvolvimento (IFDs), dentre outros convidados.

“Esta é uma ação que faz parte do Planejamento Estraté-gico da ABDE e foi um grande acerto termos reservado a primeira edição apenas para a inscrição de trabalhos dos técnicos das instituições associadas, pois o que emergiu foi uma realidade muito rica das instituições, de um modo que só quem vive diariamente poderia relatar.”, comentou o presi-dente da ABDE e diretor do Banco Regional de Desenvolvi-mento do Extremo Sul (BRDE), o economista Carlos Henri-que Horn.

Em participação em vídeo, o presidente do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e do Con-selho dos Associados da ABDE, Luciano Coutinho, lembrou da importância do prêmio. “É uma iniciativa que valoriza o desenvolvimento regional e abre um espaço para a reflexão e para o trabalho intelectual e de pesquisa que enriquece a prática dos profissionais nas nossas instituições financeiras”, disse.

Premiados – O Prêmio ABDE foi criado com a finalidade de estimular a elaboração de trabalhos escritos de reflexão e apre-sentação de proposições sobre o financiamento do desenvolvi-mento. Com o tema “Melhores Práticas do SNF”, buscou incentivar a divulgação de trabalhos inéditos baseados em estu-dos e constatações empíricas, em duas categorias específicas: Financiamento do Desenvolvimento e Excelência em Gestão. Os vencedores em cada categoria receberam um prêmio de R$ 5 mil, além de verem seus artigos publicados, na íntegra, em um livro e, de forma resumida, na revista Rumos (páginas 18 e 20 desta edição).

Com um relato da exitosa experiência no Parque Tecnológi-co de Sorocaba, os técnicos da Superintendência de Políticas Públicas da Agência de Desenvolvimento Paulista (Desenvolve SP), Billy Matias e Fábio Fávero, venceram a primeira categoria. Em sua implementação, o parque contou com financiamento

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RECONHECIMENTOPRÊMIO ABDE ED IÇ ÃO 2014

A cerimônia de premiação foi precedida por duas palestras, ministradas pela Gradual Investimentos e pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em que foi analisada a conjuntura econômica brasileira e mundial e a quantia necessária de investimento para o Brasil crescer de forma mais acelerada nos próximos anos.

Primeiro a falar, o técnico de Planejamento e Pesquisa do Ipea, de Lucas Ferraz Vasconcelos, apresentou o proje-to “Investimentos no Brasil: quanto é preciso e como financiá-lo?”. De acordo com ele, o investimento tem sido um foco do trabalho do órgão há algum tempo, com a realização de estudos setoriais, para análise da realidade em cada setor da economia brasileira. Com o projeto, que será realizado em parceria com a ABDE a partir do próxi-mo ano, pretende-se mapear o quanto é necessário investir e quais os instrumentos para o financiamento desses investimentos.

“A ABDE será parceira fundamental do projeto, pois nos ajudará a refinar os dados que já temos e poderemos chegar a análises mais precisas das possibilidades e dos entraves para o investimento no Brasil”, defendeu.

O economista-chefe da Gradual Investimentos, André Perfeito, ao apresentar dados sobre a evolução do salário mínimo e rendimento médio no país, dívida pública, supe-rávit primário, investimento estrangeiro direto, juros reais, entre outros índices macroeconômicos, destacou que o quadro da economia brasileira não é dramático, como alguns analistas sugerem, mas que requer atenção frente ao cenário econômico global. “O mundo mudou, as rela-ções são outras, e precisamos estar atentos a isso”, resu-miu, exemplificando com a intensificação da relação comercial com a China, ocorrida nos últimos anos.

“Vivemos atualmente o amadurecimento do Plano Real, cujo grande ganho, na minha visão, foi a redução da taxa de juros e não a vitória sobre a inflação”, frisou Perfei-to, que acrescentou ao fim da exposição: “O nosso traba-lho hoje é criar uma infraestrutura financeira no país”.

Conjuntura econômica em debate

A entrega do Prêmio ABDE de Monografias reconhece as experiências exitosas nas Instituições Financeiras de Desenvolvimento e incentiva uma reflexão sobre o futuro do investimento para o crescimento do país.

O presidente do BNDES, Luciano Coutinho, deixou sua mensagem gravada.

No palco, os autores das monografias vencedoras e os representantes do Sistema Nacional de Fomento.

O economista André Perfeito falou sobre as perspectivas econômicas para 2015.

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Por Jader Moraes

RUMOS 16 Novembro/Dezembro 2014 � �

da agência, que também realizou parcerias com universidades, centros de pesquisa e empresas de Pesquisa e Desenvolvimento.

Para fazer o trabalho, os autores contaram que foram ao parque para ver, in loco, os resultados da operação realizada pela agência.“O financiamento à inovação é algo fundamental, mas é difícil pois não traz retorno rápido. Esse projeto, que escolhe-mos para escrever, foi além, pois investiu em estrutura física e também institucional, com a criação de um ambiente de intera-ção como o do parque, que incentiva a inovação e a pesquisa”, contaram os vencedores.

A Desenvolve SP também foi agraciada com a menção honrosa concedida ao segundo melhor trabalho da categoria – a monografia “Programa Renova SP: Financiamento para Reno-vação da Frota de Caminhões”, escrita por Paulo Roberto da Silva e Regina Bini Carrosa. O presidente da agência, Milton Luiz de Melo Santos, participou da cerimônia e recebeu um troféu em homenagem à instituição.

Na segunda categoria, Excelência em Gestão, o prêmio principal foi conferido à assessora da Área de Pesquisa Econô-mica do BNDES, Lavinia Barros de Castro. O trabalho vence-dor busca refletir, a partir da experiência da área de gestão de riscos do banco entre os anos de 2007 e 2014, sobre a imple-mentação das regras de Basileia no banco, apontando alguns importantes benefícios para o gerenciamento da instituição..

“Espero que o artigo contribua para não apenas comparti-lhar experiências, mas também para ajudar a construir uma agenda para lidarmos com os desafios comuns, para que possa-mos continuar sendo sustentáveis financeiramente, sem preju-dicar nosso dever de fomento aos desafios – mutantes – do desenvolvimento”, resumiu Lavinia.

Na mesma categoria, o trabalho “Avaliação do Planeja-mento Estratégico numa Instituição Pública a partir do Balan-ced Scorecad: o caso BRDE”, de Marcos Aurélio Cunha, do BRDE, recebeu uma menção honrosa. Além destes trabalhos, outros três artigos se destacaram e compõem o livro do Prê-mio, que foi lançado durante a cerimônia.

Nesta primeira edição, o Prêmio recebeu 27 inscrições, de autores de 11 instituições diferentes. Quinze trabalhos foram aptos para concorrer na primeira categoria, e os demais (12), no segundo tema. O concurso foi organizado pela Comissão de Estudos e Pesquisas em conjunto com a Gerência de Estu-dos Econômicos da ABDE.

O dia das boas práticas

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ito meses após seu lançamento, em abril deste ano, a primeira edição do Prêmio ABDE de Monogra-fias sobre o Sistema Nacional de Fomento (SNF) foi encerrada em grande estilo, em evento no

Centro de Convenções da Bolsa de Valores do Rio de Janeiro, no dia 05 de dezembro. A cerimônia de premiação reuniu os vencedores em cada categoria, além de técnicos e executivos das Instituições Financeiras de Desenvolvimento (IFDs), dentre outros convidados.

“Esta é uma ação que faz parte do Planejamento Estraté-gico da ABDE e foi um grande acerto termos reservado a primeira edição apenas para a inscrição de trabalhos dos técnicos das instituições associadas, pois o que emergiu foi uma realidade muito rica das instituições, de um modo que só quem vive diariamente poderia relatar.”, comentou o presi-dente da ABDE e diretor do Banco Regional de Desenvolvi-mento do Extremo Sul (BRDE), o economista Carlos Henri-que Horn.

Em participação em vídeo, o presidente do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e do Con-selho dos Associados da ABDE, Luciano Coutinho, lembrou da importância do prêmio. “É uma iniciativa que valoriza o desenvolvimento regional e abre um espaço para a reflexão e para o trabalho intelectual e de pesquisa que enriquece a prática dos profissionais nas nossas instituições financeiras”, disse.

Premiados – O Prêmio ABDE foi criado com a finalidade de estimular a elaboração de trabalhos escritos de reflexão e apre-sentação de proposições sobre o financiamento do desenvolvi-mento. Com o tema “Melhores Práticas do SNF”, buscou incentivar a divulgação de trabalhos inéditos baseados em estu-dos e constatações empíricas, em duas categorias específicas: Financiamento do Desenvolvimento e Excelência em Gestão. Os vencedores em cada categoria receberam um prêmio de R$ 5 mil, além de verem seus artigos publicados, na íntegra, em um livro e, de forma resumida, na revista Rumos (páginas 18 e 20 desta edição).

Com um relato da exitosa experiência no Parque Tecnológi-co de Sorocaba, os técnicos da Superintendência de Políticas Públicas da Agência de Desenvolvimento Paulista (Desenvolve SP), Billy Matias e Fábio Fávero, venceram a primeira categoria. Em sua implementação, o parque contou com financiamento

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RECONHECIMENTOPRÊMIO ABDE ED IÇ ÃO 2014

A cerimônia de premiação foi precedida por duas palestras, ministradas pela Gradual Investimentos e pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em que foi analisada a conjuntura econômica brasileira e mundial e a quantia necessária de investimento para o Brasil crescer de forma mais acelerada nos próximos anos.

Primeiro a falar, o técnico de Planejamento e Pesquisa do Ipea, de Lucas Ferraz Vasconcelos, apresentou o proje-to “Investimentos no Brasil: quanto é preciso e como financiá-lo?”. De acordo com ele, o investimento tem sido um foco do trabalho do órgão há algum tempo, com a realização de estudos setoriais, para análise da realidade em cada setor da economia brasileira. Com o projeto, que será realizado em parceria com a ABDE a partir do próxi-mo ano, pretende-se mapear o quanto é necessário investir e quais os instrumentos para o financiamento desses investimentos.

“A ABDE será parceira fundamental do projeto, pois nos ajudará a refinar os dados que já temos e poderemos chegar a análises mais precisas das possibilidades e dos entraves para o investimento no Brasil”, defendeu.

O economista-chefe da Gradual Investimentos, André Perfeito, ao apresentar dados sobre a evolução do salário mínimo e rendimento médio no país, dívida pública, supe-rávit primário, investimento estrangeiro direto, juros reais, entre outros índices macroeconômicos, destacou que o quadro da economia brasileira não é dramático, como alguns analistas sugerem, mas que requer atenção frente ao cenário econômico global. “O mundo mudou, as rela-ções são outras, e precisamos estar atentos a isso”, resu-miu, exemplificando com a intensificação da relação comercial com a China, ocorrida nos últimos anos.

“Vivemos atualmente o amadurecimento do Plano Real, cujo grande ganho, na minha visão, foi a redução da taxa de juros e não a vitória sobre a inflação”, frisou Perfei-to, que acrescentou ao fim da exposição: “O nosso traba-lho hoje é criar uma infraestrutura financeira no país”.

Conjuntura econômica em debate

A entrega do Prêmio ABDE de Monografias reconhece as experiências exitosas nas Instituições Financeiras de Desenvolvimento e incentiva uma reflexão sobre o futuro do investimento para o crescimento do país.

O presidente do BNDES, Luciano Coutinho, deixou sua mensagem gravada.

No palco, os autores das monografias vencedoras e os representantes do Sistema Nacional de Fomento.

O economista André Perfeito falou sobre as perspectivas econômicas para 2015.

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do Parque, as instituições instaladas obtiveram dez depósitos de patentes, com outros em processo de tramitação.

Em termos de lições com alcance multiplicador, o caso de Sorocaba destaca-se pelo fato de que o projeto vinculou-se, de início, a uma proposta inovadora, na medida em que trazia em seu bojo não só criar as condições físicas para a atração de indústrias ao município, mas ao permitir que o espaço estimu-lasse a fertilidade do processo de pesquisa e desenvolvimento tecnológico, já que propôs a aproximação, em um mesmo local, das diferentes pontas do processo inovador, qual seja, universi-dades, centros de pesquisa e empresas interessadas no desenvolvimento de novos processos e produtos, incluindo eventuais startups, por meio da incubadora de empresas.

Esta infraestrutura física vinculou-se a uma preocupação em atenuar os riscos empresariais de investimento em tecnologia, por seu grau de incerteza e tempo de maturação maior, tornando estes investimentos um fator de agregação de valor aos produtos e serviços, por meio de incentivos financeiros e institucionais claros para pesquisa e inovação, o que também impacta na competitividade e no valor agregado da economia local.

Feitas estas considerações, seguem algumas recomendações pontuais derivadas da experiência deste projeto:

Criação de mecanismos para uma maior interlocução entre poder público e entidades empresariais, de maneira que os investimentos públicos dos municípios se vinculem diretamen-te a projetos que explorem o contexto econômico local;

Consolidação de conhecimento de melhores projetos voltados à infraestrutura de inovação, com a realização de eventos para a consolidação e disseminação das melhores práticas, de maneira a fomentar a articulação em rede das instituições de apoio à inovação científica e tecnológica, das empresas inovadoras e das organizações de pesquisa tecnológica;

Como os pedidos de financiamento estão sujeitos à demanda das prefeituras, disseminar junto a estas as melhores práticas de projetos, modelos de investimento voltados à inovação, e práticas voltadas à interlocução entre poder público, instituições de pesquisa e de empresas inovadoras;

Articulação entre instituições com atuação dentro da área

MONOGRAFIA

Financiando a Infraestruturada Inovação:

PRÊMIO ABDE

a Desenvolve SP e o Parque Tecnológico de Sorocaba

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nascentes que se enquadram em determinadas áreas de negócios, notadamente as áreas de maior potencial de inovação.

A importância de atenção a tal tema estratégico por parte das instituições de fomento brasileiras dá-se pela simples comparação dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento por países selecionados, em termos percentuais do seu Produto Interno Produto (PIB), em que podemos constatar, por exemplo, que o Brasil investiu, entre 2000 e 2012, em média, 1% de seu PIB nesta área, enquanto países desenvolvidos, como os EUA, investiram uma média que variou entre 2,5% a 2,8%, o Japão, com seus investimentos variando entre 3% e 3,5%, e a Alemanha, entre 2,5% e 3%, o que indica uma lacuna importan-te para a ação do Estado brasileiro.

Dentro deste horizonte, e procurando estimular um contexto institucional de inovação, é que atua a Agência de Desenvolvimento Paulista (Desenvolve SP), ao ofertar crédito de longo prazo para as pequenas e médias empresas paulistas, bem como para os municípios do estado. No caso de Sorocaba que apresentamos resumidamente adiante, a Desenvolve SP participou por meio de financiamento com recursos da Linha Distrito Industrial, voltados para a realização de investimentos de infraestrutura para a implementação de Parque Tecnológico em uma área de 1,8 milhão de m² do Distrito Industrial no norte do município.

No projeto estava prevista a construção de um edifício Núcleo do Parque Tecnológico, com espaço para a estrutura de administração, uma incubadora tecnológica, módulos para laboratórios de universidades e empresas, centro de convenções, área de convivência comum, além de lotes disponíveis no terreno para instituições com interesse em se instalarem no local.

A finalização das obras do entorno e do Edifício Núcleo deu-se em 2012, sendo que hoje o Parque Tecnológico conta com oito empresas instaladas. Quanto às Instituições de Ensino Superior (IES), o Parque dispõe de seis universidades com laboratórios próprios, além de um laboratório da Scania em conjunto com a Politécnica da Universidade de São Paulo (USP). Vale destacar que, em curto período de funcionamento

Nde inovação, como Sebrae, Anprotec, entre outras, além de agências com funding específico para pesquisa e desenvolvimen-to de inovação, como Finep, BNDES e Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), de maneira que haja uma adequação da interlocução para garantir uma infraestrutu-ra institucional para projetos voltados à inovação;

Realização de reflexão sobre linhas específicas ao setor público que envolvam projetos que desenvolvam uma infraestrutura de incentivos a instituições como Parques Tecnológicos ou incubadoras de base tecnológica.

Como reflexão final, apresentamos a lição tomada de Mario Tanigawa, diretor da empresa municipal que administra o Parque, e que afirma que ideias e necessidades existem para ocorrer a inovação, mas elas precisam de uma infraestrutura de fomento à sua existência, seja por meio da disponibilização de espaço físico, seja pela criação de um ambiente que dinamize o processo de inovação e pesquisa, assim como uma estrutura de orientação para a gestão de projetos de inovação e os seus riscos financeiros. Como ilustração de como esta necessidade existe podemos destacar a velocidade com que houve a instalação de IES, a incubadora e as empresas no local – 17 instituições em um ano e meio de funcionamento.

Neste panorama, cabe às instituições participantes do Sistema Nacional Fomento atuarem como parceiras deste processo, com financiamentos e apoios específicos para a inovação, seja no setor privado ou no público, que tragam em seus projetos de investimento uma preocupação com o estabelecimento de uma infraestrutura física e institucional voltada para a inovação e a pesquisa tecnológica.

Edição 2014

o Brasil, o Sistema Nacional de Fomento (SNF) deve sua existência à percepção do papel do Estado como indutor do desenvolvimento econômico, em oposição às teorias econômicas clássicas, que defendem o Estado mínimo como mecanismo

regulador suficiente para o bom funcionamento da economia. E tendo em vista a relação que o desenvolvimento tecnológico possui com o desenvolvimento econômico, cabe refletir a respeito da ação do Estado como indutor do processo de inovação tecnológica.

Para Olivier Blanchard (2011) os fatores que condicionam o investimento em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) são dois: fertilidade do processo de pesquisa – como os investi-mentos se transformam em ideias e produtos; e a apropriabili-dade dos resultados da pesquisa – ou seja, como as empresas se apropriam dos seus investimentos em pesquisa transforman-do o tempo e o dinheiro investidos em retorno financeiro. Para ele, a fertilidade é influenciada pela dinâmica existente entre pesquisa básica e aplicada, enquanto a apropriabilidade diz respeito ao contexto institucional e a incentivos legais para o investimento em P&D, como patentes e mecanismos de proteção da propriedade intelectual gerada por este investi-mento. Como se pode ver, ambas as variáveis são influenciadas por fatores de contexto institucional, dentro do qual a ação de fomento pode agir.

Dentro desta perspectiva, entre as ferramentas disponí-veis para o Estado fomentar o desenvolvimento tecnológico está a de incentivar a criação de Parques Tecnológicos e incubadoras de empresas. Sucintamente, Parques Tecnológi-cos são complexos de desenvolvimento tecnológico que visam fomentar mercados baseados no conhecimento, por meio da integração da pesquisa científica e tecnológica, empresas e organizações governamentais em um mesmo local físico, criando as condições para um relacionamento dinâmico entre estes grupos, desta forma interferindo diretamente nos eixos da fertilidade e da apropriabilidade da pesquisa voltada à inovação tecnológica. Já as incubadoras têm por finalidade amparar o estágio inicial de empresas

ReferênciasBLANCHARD, Olivier. Macroeconomia. São Paulo: Prentice Hall, 2011, 5ª ed.CASTRO, Bernardo Hauch Ribeiro de. Sistema Nacional de Fomento: proposta de atuação no financiamento à inovação no nível estadual. In: ABDE: Sistema Nacional de Fomento: Financiando o Desenvolvimento. Coletânea de Trabalhos. S.l.: 2014.CUNHA, André; CARVALHO, Carlos Eduardo; PRATES, Daniela. Estado atual do Sistema Nacional de Fomento e indicadores de desempenho. In: ABDE: Sistema Nacional de Fomento: financiando o desenvolvimento. Coletânea de Trabalhos. S.l.: 2014

Billy Matias é consultor de Negócios da Superintendência de Políticas Públicas da Desenvolve SP, e cursa MBA em Banking pela FGV e com graduação em Administração pela Faculdade Anchieta. E, a sua esquerda, Fábio Fávero é analista da Superintendência de Políticas Públicas da Desenvolve SP, mestre em Relações Internacionais pelo Programa San Tiago Dantas (PUC-SP, Unesp e Unicamp), com graduação na mesma área pela Universidade Estadual Paulista.

Billy MatiasFábio Fávero

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do Parque, as instituições instaladas obtiveram dez depósitos de patentes, com outros em processo de tramitação.

Em termos de lições com alcance multiplicador, o caso de Sorocaba destaca-se pelo fato de que o projeto vinculou-se, de início, a uma proposta inovadora, na medida em que trazia em seu bojo não só criar as condições físicas para a atração de indústrias ao município, mas ao permitir que o espaço estimu-lasse a fertilidade do processo de pesquisa e desenvolvimento tecnológico, já que propôs a aproximação, em um mesmo local, das diferentes pontas do processo inovador, qual seja, universi-dades, centros de pesquisa e empresas interessadas no desenvolvimento de novos processos e produtos, incluindo eventuais startups, por meio da incubadora de empresas.

Esta infraestrutura física vinculou-se a uma preocupação em atenuar os riscos empresariais de investimento em tecnologia, por seu grau de incerteza e tempo de maturação maior, tornando estes investimentos um fator de agregação de valor aos produtos e serviços, por meio de incentivos financeiros e institucionais claros para pesquisa e inovação, o que também impacta na competitividade e no valor agregado da economia local.

Feitas estas considerações, seguem algumas recomendações pontuais derivadas da experiência deste projeto:

Criação de mecanismos para uma maior interlocução entre poder público e entidades empresariais, de maneira que os investimentos públicos dos municípios se vinculem diretamen-te a projetos que explorem o contexto econômico local;

Consolidação de conhecimento de melhores projetos voltados à infraestrutura de inovação, com a realização de eventos para a consolidação e disseminação das melhores práticas, de maneira a fomentar a articulação em rede das instituições de apoio à inovação científica e tecnológica, das empresas inovadoras e das organizações de pesquisa tecnológica;

Como os pedidos de financiamento estão sujeitos à demanda das prefeituras, disseminar junto a estas as melhores práticas de projetos, modelos de investimento voltados à inovação, e práticas voltadas à interlocução entre poder público, instituições de pesquisa e de empresas inovadoras;

Articulação entre instituições com atuação dentro da área

MONOGRAFIA

Financiando a Infraestruturada Inovação:

PRÊMIO ABDE

a Desenvolve SP e o Parque Tecnológico de Sorocaba

RUMOS 19 – Novembro/Dezembro 2014 –

nascentes que se enquadram em determinadas áreas de negócios, notadamente as áreas de maior potencial de inovação.

A importância de atenção a tal tema estratégico por parte das instituições de fomento brasileiras dá-se pela simples comparação dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento por países selecionados, em termos percentuais do seu Produto Interno Produto (PIB), em que podemos constatar, por exemplo, que o Brasil investiu, entre 2000 e 2012, em média, 1% de seu PIB nesta área, enquanto países desenvolvidos, como os EUA, investiram uma média que variou entre 2,5% a 2,8%, o Japão, com seus investimentos variando entre 3% e 3,5%, e a Alemanha, entre 2,5% e 3%, o que indica uma lacuna importan-te para a ação do Estado brasileiro.

Dentro deste horizonte, e procurando estimular um contexto institucional de inovação, é que atua a Agência de Desenvolvimento Paulista (Desenvolve SP), ao ofertar crédito de longo prazo para as pequenas e médias empresas paulistas, bem como para os municípios do estado. No caso de Sorocaba que apresentamos resumidamente adiante, a Desenvolve SP participou por meio de financiamento com recursos da Linha Distrito Industrial, voltados para a realização de investimentos de infraestrutura para a implementação de Parque Tecnológico em uma área de 1,8 milhão de m² do Distrito Industrial no norte do município.

No projeto estava prevista a construção de um edifício Núcleo do Parque Tecnológico, com espaço para a estrutura de administração, uma incubadora tecnológica, módulos para laboratórios de universidades e empresas, centro de convenções, área de convivência comum, além de lotes disponíveis no terreno para instituições com interesse em se instalarem no local.

A finalização das obras do entorno e do Edifício Núcleo deu-se em 2012, sendo que hoje o Parque Tecnológico conta com oito empresas instaladas. Quanto às Instituições de Ensino Superior (IES), o Parque dispõe de seis universidades com laboratórios próprios, além de um laboratório da Scania em conjunto com a Politécnica da Universidade de São Paulo (USP). Vale destacar que, em curto período de funcionamento

Nde inovação, como Sebrae, Anprotec, entre outras, além de agências com funding específico para pesquisa e desenvolvimen-to de inovação, como Finep, BNDES e Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), de maneira que haja uma adequação da interlocução para garantir uma infraestrutu-ra institucional para projetos voltados à inovação;

Realização de reflexão sobre linhas específicas ao setor público que envolvam projetos que desenvolvam uma infraestrutura de incentivos a instituições como Parques Tecnológicos ou incubadoras de base tecnológica.

Como reflexão final, apresentamos a lição tomada de Mario Tanigawa, diretor da empresa municipal que administra o Parque, e que afirma que ideias e necessidades existem para ocorrer a inovação, mas elas precisam de uma infraestrutura de fomento à sua existência, seja por meio da disponibilização de espaço físico, seja pela criação de um ambiente que dinamize o processo de inovação e pesquisa, assim como uma estrutura de orientação para a gestão de projetos de inovação e os seus riscos financeiros. Como ilustração de como esta necessidade existe podemos destacar a velocidade com que houve a instalação de IES, a incubadora e as empresas no local – 17 instituições em um ano e meio de funcionamento.

Neste panorama, cabe às instituições participantes do Sistema Nacional Fomento atuarem como parceiras deste processo, com financiamentos e apoios específicos para a inovação, seja no setor privado ou no público, que tragam em seus projetos de investimento uma preocupação com o estabelecimento de uma infraestrutura física e institucional voltada para a inovação e a pesquisa tecnológica.

Edição 2014

o Brasil, o Sistema Nacional de Fomento (SNF) deve sua existência à percepção do papel do Estado como indutor do desenvolvimento econômico, em oposição às teorias econômicas clássicas, que defendem o Estado mínimo como mecanismo

regulador suficiente para o bom funcionamento da economia. E tendo em vista a relação que o desenvolvimento tecnológico possui com o desenvolvimento econômico, cabe refletir a respeito da ação do Estado como indutor do processo de inovação tecnológica.

Para Olivier Blanchard (2011) os fatores que condicionam o investimento em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) são dois: fertilidade do processo de pesquisa – como os investi-mentos se transformam em ideias e produtos; e a apropriabili-dade dos resultados da pesquisa – ou seja, como as empresas se apropriam dos seus investimentos em pesquisa transforman-do o tempo e o dinheiro investidos em retorno financeiro. Para ele, a fertilidade é influenciada pela dinâmica existente entre pesquisa básica e aplicada, enquanto a apropriabilidade diz respeito ao contexto institucional e a incentivos legais para o investimento em P&D, como patentes e mecanismos de proteção da propriedade intelectual gerada por este investi-mento. Como se pode ver, ambas as variáveis são influenciadas por fatores de contexto institucional, dentro do qual a ação de fomento pode agir.

Dentro desta perspectiva, entre as ferramentas disponí-veis para o Estado fomentar o desenvolvimento tecnológico está a de incentivar a criação de Parques Tecnológicos e incubadoras de empresas. Sucintamente, Parques Tecnológi-cos são complexos de desenvolvimento tecnológico que visam fomentar mercados baseados no conhecimento, por meio da integração da pesquisa científica e tecnológica, empresas e organizações governamentais em um mesmo local físico, criando as condições para um relacionamento dinâmico entre estes grupos, desta forma interferindo diretamente nos eixos da fertilidade e da apropriabilidade da pesquisa voltada à inovação tecnológica. Já as incubadoras têm por finalidade amparar o estágio inicial de empresas

ReferênciasBLANCHARD, Olivier. Macroeconomia. São Paulo: Prentice Hall, 2011, 5ª ed.CASTRO, Bernardo Hauch Ribeiro de. Sistema Nacional de Fomento: proposta de atuação no financiamento à inovação no nível estadual. In: ABDE: Sistema Nacional de Fomento: Financiando o Desenvolvimento. Coletânea de Trabalhos. S.l.: 2014.CUNHA, André; CARVALHO, Carlos Eduardo; PRATES, Daniela. Estado atual do Sistema Nacional de Fomento e indicadores de desempenho. In: ABDE: Sistema Nacional de Fomento: financiando o desenvolvimento. Coletânea de Trabalhos. S.l.: 2014

Billy Matias é consultor de Negócios da Superintendência de Políticas Públicas da Desenvolve SP, e cursa MBA em Banking pela FGV e com graduação em Administração pela Faculdade Anchieta. E, a sua esquerda, Fábio Fávero é analista da Superintendência de Políticas Públicas da Desenvolve SP, mestre em Relações Internacionais pelo Programa San Tiago Dantas (PUC-SP, Unesp e Unicamp), com graduação na mesma área pela Universidade Estadual Paulista.

Billy MatiasFábio Fávero

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RUMOS 20 Novembro/Dezembro 2014 – –

permanecer baixa e da paradoxal melhora da qualidade da carteira. De fato, houve crescimento de ativos em empresas Investment Grade em plena crise, já que essas recorreram ao banco por ter suas condições de captação a mercado deteriora-das. Se, porém, os mesmos recursos fossem alocados em títulos públicos, ao invés de empréstimos, o provisionamento de capital seria zero – o que corrobora a visão da existência de certo viés contra operações de crédito nos acordos de Basileia.

Mostramos ainda a influência do pagamento de dividendos complementares à União para a redução do IB do BNDES. Bancos públicos têm de, em momentos de baixa do ciclo, simultaneamente, contribuir mais para o superávit primário, ao mesmo tempo que aumentam seus empréstimos (papel anticíclico). O resultado é uma queda do IB – o que prejudica justamente aqueles que estão indo na direção desejada pelo regulador. A inclusão de um colchão anticíclico em Basileia III, todavia, poderá amenizar as maiores exigências de capital regulamentar, em momentos de baixa do ciclo.

O artigo traz, por fim, um fato curioso, a entrada das regras de Basileia III não teve consequências negativas para o BNDES. Na realidade, o IB aumentou. Em primeiro lugar, porque grande parte das novas exigências do marco (derivativos, risco da contraparte e colchões de liquidez) tendem a ter pouco efeito sobre BDs. Em segundo, porque a exigência de capital para “Compromissos de Crédito” (valores comprometidos, mas ainda não desembolsados) passou a ser considerada apenas no valor do primeiro ano – o que evidentemente melhora as condições daqueles que emprestam a prazos maiores. Adicional-mente, houve elevação do capital do banco, em virtude da renegociação de contratos de instrumentos híbridos – o que em princípio não é algo passível de generalização, pois depende da prévia estrutura de capital de cada instituição e do próprio processo de renegociação.

Um ponto importante do artigo é que, a despeito das dificuldades criadas pela pró-ciclicidade do IB, as regras de Basileia parecem ter trazido, ao menos no BNDES, mais benefícios do que custos: formalização de responsabilidades, criação de novos limites, melhora no tratamento dos dados,

MONOGRAFIA

A EXPERIÊNCIA DA ÁREA DE GESTÃO DE RISCOS DO BNDES

PRÊMIO ABDE

julho 2007 – julho 2014

RUMOS 21 – Novembro/Dezembro 2014 –

tendem a ser os de câmbio e os de juros da carteira bancária. Em relação a descasamentos de prazos, BDs possuem certa vantagem, na medida em que a duration do passivo seja menor do que a do ativo (apesar dos largos prazos das operações de crédito). O mesmo não pode ser dito sobre descasamentos de indexadores, que são uma fonte relevante de riscos.

Apesar dessas vantagens, há também desafios para gestão de riscos. O primeiro é a tendência à concentração da carteira de crédito, seja por cliente, setor, região ou mesmo por garantidor. Mitigar a tendência à concentração é um desafio que se impõe. Outro é como auferir o risco de mercado em instrumentos ilíquidos, cuja marcação por modelo está sujeita a erros. Há também de se questionar se o tratamento dado em Basileia ao ajuste pela maturidade em modelos internos de risco de crédito é adequado para as características dos BDs – será que o prazo onera BDs da mesma forma que os bancos privados? Ademais, existem questões de governança corporativa, sendo a maior delas a dificuldade de se definir qual o apetite ao risco da instituição. Todos esses são temas sugeridos para debate entre associados da ABDE.

Por fim, não é evidente que exista menor risco operacional em BDs. Apesar de contarem com menor número de operações – o que reduz as chances de alguns erros –, podem existir dificuldades em campos, como por exemplo, maior risco associado a sistemas de Tecnologia da Informação (TI), dada a sujeição ao orçamento da União ou a regras de licitação pública. Além disso, certas operações envolvem projetos de longo prazo que, em princípio, possuem risco operacional maior do que operações de varejo.

O artigo relata que a AGR, criada em 2007, sempre contou com o apoio da Alta Diretoria do BNDES. Apesar de corres-ponder a um requisito regulatório, já havia a preocupação na casa com um futuro no qual captações a mercado se tornassem mais relevantes e ocorresse o crescimento de operações de maior risco (inovação, infraestrutura, entre outras prioridades).

No auge da crise subprime, de 2008 a 2009, a grande variação do Índice de Basileia (IB) do BNDES deu-se no incremento das parcelas de risco de crédito, a despeito de a inadimplência

Ncriação de novas bases de eventos de riscos, reforço da impor-tância de desenvolver (ou adquirir) sistemas (TI), disseminação de uma cultura de gestão de riscos, busca por melhores mitigadores, melhoria na comunicação, criação de Plano de Continuidade de Negócios, entre outros.

No BNDES, os requerimentos de capital de Basileia foram cumpridos, em suma, sem inviabilizar a atuação da instituição como promotor do desenvolvimento. No entanto, foram fundamentais algumas adaptações ao marco, bem como um intenso diálogo com o regulador. Para o futuro, há uma agenda de temas que ainda requerem reflexão (e eventuais propostas de adaptação do marco) entre associados do Sistema Nacional de Fomento.

Não nos parece, em suma, existir grande incompatibilidade entre aderir a Basileia e atuar como instituição de fomento ao desenvolvimento. Como atestado na recente Conferência The present and the future of Development Financial Institutions: a learning dialogue, organizada pelo Minds e patrocinada pelo BNDES em 2014, o KfW (banco de desenvolvimento alemão), o China Development Bank e o Indian Small and Medium Enterprise Bank, apesar de não estarem formalmente submeti-dos a Basileia, optaram por aderir aos Acordos. Ademais, a grande maioria das instituições de fomento da América Latina seguem os mesmos critérios prudenciais dos bancos privados. O que se fazem necessárias são algumas adaptações, em linha com os princípios internacionais de gestão de riscos, em que as exigências regulatórias devem ser adequadas ao perfil de risco da instituição e proporcionais a sua importância sistêmica. No caso das Agências de Fomento e dos Bancos Cooperativos, que possuem estruturas operacionais muito pequenas, não seria adequado discutir a flexibilização de algumas exigências, talvez excessivas para a materialidade do risco?

Cabe aos gestores de riscos das instituições de fomento assegurar que a preocupação com a saúde financeira e com os limites prudenciais não prejudique o compromisso com o desenvolvimento. Riscos existem para serem geridos, e não evitados – e as instituições de fomento possuem diversos mecanismos para fazê-lo.

Edição 2014

este artigo buscamos uma reflexão sobre a gestão de risco em Bancos de Desenvolvimento (BDs), cuja relevância, no atual contexto da crise de crédito internacional, dispensa adjetivos. As perguntas que orientam o artigo são: no que se refere à gestão de

riscos, BDs diferem de bancos privados? O marco de Basileia impõe grandes limites à atuação de BDs? Buscamos uma generalização analítica, a partir de um estudo de caso explanató-rio. O intuito maior, porém, é ampliar o diálogo, compartilhar experiências e propor uma agenda comum de trabalho para desafios, que, a nosso ver, se beneficiariam de fóruns de discussão entre associados da Associação Brasileira de Desen-volvimento (ABDE) e desta com o regulador.

Refletindo sobre características gerais de BDs, por meio da experiência da Área de Gestão de Riscos do BNDES (AGR), concluímos que, ao contrário do que inicialmente se supõe, o fato de assumir operações em maiores prazos e atuar em setores de maior risco (micro, pequenas e médias empresas – MPMEs –, projetos de infraestrutura, inovações etc.) não implica, por definição, maiores problemas para a gestão de riscos. Isto porque existem diversas vantagens em relação às instituições privadas:

1) BDs possuem, em princípio, menor risco de liquidez, por conta de sua própria estrutura de funding que contam com recursos fiscais e/ou parafiscais, bem como captações junto a organismos multilaterais.

2) Maiores prazos na concessão de empréstimos não constituem impreterivelmente maiores riscos de crédito para BDs, porque as captações são também de maior prazo – o que concede aos BDs maior poder de renegociação de dívidas.

3) BDs têm vantagem no apoio à exportação para países de maior risco porque cobranças entre governos são mais fáceis de serem viabilizadas e existem mecanismos de apoio específicos – no Brasil, Fundo de Garantia a Exportação (FGE) e Convênio de Pagamentos e Créditos Recíprocos (CCR).

4) BDs possuem, em princípio, menor exposição às flutuações de mercado, com menor carteira de títulos e valores mobiliários para negociação. Os maiores riscos de mercado

Lavinia Barros de Castro é doutora em Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2009) e doutora em Ciências Sociais pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro(2006), com doutorado sanduíche na Universidade de Berkeley,Califórnia. É economista do BNDES desde 2001, onde trabalhoucomo assessora da Área de Gestão de Riscos (2007-2013) e atualmente é assessora da Área de Pesquisa Econômica.

Lavinia Barros de Castro

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RUMOS 20 Novembro/Dezembro 2014 – –

permanecer baixa e da paradoxal melhora da qualidade da carteira. De fato, houve crescimento de ativos em empresas Investment Grade em plena crise, já que essas recorreram ao banco por ter suas condições de captação a mercado deteriora-das. Se, porém, os mesmos recursos fossem alocados em títulos públicos, ao invés de empréstimos, o provisionamento de capital seria zero – o que corrobora a visão da existência de certo viés contra operações de crédito nos acordos de Basileia.

Mostramos ainda a influência do pagamento de dividendos complementares à União para a redução do IB do BNDES. Bancos públicos têm de, em momentos de baixa do ciclo, simultaneamente, contribuir mais para o superávit primário, ao mesmo tempo que aumentam seus empréstimos (papel anticíclico). O resultado é uma queda do IB – o que prejudica justamente aqueles que estão indo na direção desejada pelo regulador. A inclusão de um colchão anticíclico em Basileia III, todavia, poderá amenizar as maiores exigências de capital regulamentar, em momentos de baixa do ciclo.

O artigo traz, por fim, um fato curioso, a entrada das regras de Basileia III não teve consequências negativas para o BNDES. Na realidade, o IB aumentou. Em primeiro lugar, porque grande parte das novas exigências do marco (derivativos, risco da contraparte e colchões de liquidez) tendem a ter pouco efeito sobre BDs. Em segundo, porque a exigência de capital para “Compromissos de Crédito” (valores comprometidos, mas ainda não desembolsados) passou a ser considerada apenas no valor do primeiro ano – o que evidentemente melhora as condições daqueles que emprestam a prazos maiores. Adicional-mente, houve elevação do capital do banco, em virtude da renegociação de contratos de instrumentos híbridos – o que em princípio não é algo passível de generalização, pois depende da prévia estrutura de capital de cada instituição e do próprio processo de renegociação.

Um ponto importante do artigo é que, a despeito das dificuldades criadas pela pró-ciclicidade do IB, as regras de Basileia parecem ter trazido, ao menos no BNDES, mais benefícios do que custos: formalização de responsabilidades, criação de novos limites, melhora no tratamento dos dados,

MONOGRAFIA

A EXPERIÊNCIA DA ÁREA DE GESTÃO DE RISCOS DO BNDES

PRÊMIO ABDE

julho 2007 – julho 2014

RUMOS 21 – Novembro/Dezembro 2014 –

tendem a ser os de câmbio e os de juros da carteira bancária. Em relação a descasamentos de prazos, BDs possuem certa vantagem, na medida em que a duration do passivo seja menor do que a do ativo (apesar dos largos prazos das operações de crédito). O mesmo não pode ser dito sobre descasamentos de indexadores, que são uma fonte relevante de riscos.

Apesar dessas vantagens, há também desafios para gestão de riscos. O primeiro é a tendência à concentração da carteira de crédito, seja por cliente, setor, região ou mesmo por garantidor. Mitigar a tendência à concentração é um desafio que se impõe. Outro é como auferir o risco de mercado em instrumentos ilíquidos, cuja marcação por modelo está sujeita a erros. Há também de se questionar se o tratamento dado em Basileia ao ajuste pela maturidade em modelos internos de risco de crédito é adequado para as características dos BDs – será que o prazo onera BDs da mesma forma que os bancos privados? Ademais, existem questões de governança corporativa, sendo a maior delas a dificuldade de se definir qual o apetite ao risco da instituição. Todos esses são temas sugeridos para debate entre associados da ABDE.

Por fim, não é evidente que exista menor risco operacional em BDs. Apesar de contarem com menor número de operações – o que reduz as chances de alguns erros –, podem existir dificuldades em campos, como por exemplo, maior risco associado a sistemas de Tecnologia da Informação (TI), dada a sujeição ao orçamento da União ou a regras de licitação pública. Além disso, certas operações envolvem projetos de longo prazo que, em princípio, possuem risco operacional maior do que operações de varejo.

O artigo relata que a AGR, criada em 2007, sempre contou com o apoio da Alta Diretoria do BNDES. Apesar de corres-ponder a um requisito regulatório, já havia a preocupação na casa com um futuro no qual captações a mercado se tornassem mais relevantes e ocorresse o crescimento de operações de maior risco (inovação, infraestrutura, entre outras prioridades).

No auge da crise subprime, de 2008 a 2009, a grande variação do Índice de Basileia (IB) do BNDES deu-se no incremento das parcelas de risco de crédito, a despeito de a inadimplência

Ncriação de novas bases de eventos de riscos, reforço da impor-tância de desenvolver (ou adquirir) sistemas (TI), disseminação de uma cultura de gestão de riscos, busca por melhores mitigadores, melhoria na comunicação, criação de Plano de Continuidade de Negócios, entre outros.

No BNDES, os requerimentos de capital de Basileia foram cumpridos, em suma, sem inviabilizar a atuação da instituição como promotor do desenvolvimento. No entanto, foram fundamentais algumas adaptações ao marco, bem como um intenso diálogo com o regulador. Para o futuro, há uma agenda de temas que ainda requerem reflexão (e eventuais propostas de adaptação do marco) entre associados do Sistema Nacional de Fomento.

Não nos parece, em suma, existir grande incompatibilidade entre aderir a Basileia e atuar como instituição de fomento ao desenvolvimento. Como atestado na recente Conferência The present and the future of Development Financial Institutions: a learning dialogue, organizada pelo Minds e patrocinada pelo BNDES em 2014, o KfW (banco de desenvolvimento alemão), o China Development Bank e o Indian Small and Medium Enterprise Bank, apesar de não estarem formalmente submeti-dos a Basileia, optaram por aderir aos Acordos. Ademais, a grande maioria das instituições de fomento da América Latina seguem os mesmos critérios prudenciais dos bancos privados. O que se fazem necessárias são algumas adaptações, em linha com os princípios internacionais de gestão de riscos, em que as exigências regulatórias devem ser adequadas ao perfil de risco da instituição e proporcionais a sua importância sistêmica. No caso das Agências de Fomento e dos Bancos Cooperativos, que possuem estruturas operacionais muito pequenas, não seria adequado discutir a flexibilização de algumas exigências, talvez excessivas para a materialidade do risco?

Cabe aos gestores de riscos das instituições de fomento assegurar que a preocupação com a saúde financeira e com os limites prudenciais não prejudique o compromisso com o desenvolvimento. Riscos existem para serem geridos, e não evitados – e as instituições de fomento possuem diversos mecanismos para fazê-lo.

Edição 2014

este artigo buscamos uma reflexão sobre a gestão de risco em Bancos de Desenvolvimento (BDs), cuja relevância, no atual contexto da crise de crédito internacional, dispensa adjetivos. As perguntas que orientam o artigo são: no que se refere à gestão de

riscos, BDs diferem de bancos privados? O marco de Basileia impõe grandes limites à atuação de BDs? Buscamos uma generalização analítica, a partir de um estudo de caso explanató-rio. O intuito maior, porém, é ampliar o diálogo, compartilhar experiências e propor uma agenda comum de trabalho para desafios, que, a nosso ver, se beneficiariam de fóruns de discussão entre associados da Associação Brasileira de Desen-volvimento (ABDE) e desta com o regulador.

Refletindo sobre características gerais de BDs, por meio da experiência da Área de Gestão de Riscos do BNDES (AGR), concluímos que, ao contrário do que inicialmente se supõe, o fato de assumir operações em maiores prazos e atuar em setores de maior risco (micro, pequenas e médias empresas – MPMEs –, projetos de infraestrutura, inovações etc.) não implica, por definição, maiores problemas para a gestão de riscos. Isto porque existem diversas vantagens em relação às instituições privadas:

1) BDs possuem, em princípio, menor risco de liquidez, por conta de sua própria estrutura de funding que contam com recursos fiscais e/ou parafiscais, bem como captações junto a organismos multilaterais.

2) Maiores prazos na concessão de empréstimos não constituem impreterivelmente maiores riscos de crédito para BDs, porque as captações são também de maior prazo – o que concede aos BDs maior poder de renegociação de dívidas.

3) BDs têm vantagem no apoio à exportação para países de maior risco porque cobranças entre governos são mais fáceis de serem viabilizadas e existem mecanismos de apoio específicos – no Brasil, Fundo de Garantia a Exportação (FGE) e Convênio de Pagamentos e Créditos Recíprocos (CCR).

4) BDs possuem, em princípio, menor exposição às flutuações de mercado, com menor carteira de títulos e valores mobiliários para negociação. Os maiores riscos de mercado

Lavinia Barros de Castro é doutora em Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2009) e doutora em Ciências Sociais pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro(2006), com doutorado sanduíche na Universidade de Berkeley,Califórnia. É economista do BNDES desde 2001, onde trabalhoucomo assessora da Área de Gestão de Riscos (2007-2013) e atualmente é assessora da Área de Pesquisa Econômica.

Lavinia Barros de Castro

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RUMOS – 23 – Novembro/Dezembro 2014

Analisar a história durante seu transcurso é um desafio e tanto, pois é difícil entender todos os desdobramentos sociais enquanto são vividos, daí ver-se o grande trabalho desenvolvido pelos editores André Bojikian Calixtre, André Martins Biancarelli e Marcos Antonio Macedo Cintra ao traçar um retrato do desenvolvimento do Brasil na atualidade e orientar as perspectivas futuras. Ganham contorno a questão da (des)industrialização, a exportação apoiada em commodities e o “modelo de desenvolvimento inclusivo”. Macedo Cintra explicita que é preciso construir uma nova trajetória de crescimento, que dependerá de um amplo programa de investimentos em infraestrutura e uma forte articulação governamental.

umos – O livro apresenta o “diag-nóstico de uma época”, ao passo que também deli-

neia algumas questões cen-trais que precisam estar na pauta da agenda de desen-volvimento do país nos pró-ximos anos. Qual a contri-buição que a obra, com sua característica diversa, pode dar a esse debate?Marcos Antonio Macedo Cintra – A partir de uma pers-pectiva de economia política, o conjunto dos capítulos procura realizar um amplo panorama das principais características do desenvolvimento brasileiro contemporâneo: funcionamen-to do tripé macroeconômico, gestão da dívida pública, meca-nismos de financiamento do investimento e da produção,

dinâmica da estrutura produti-va, regressão industrial, trans-formações no mercado de trabalho e no salário mínimo, políticas de distribuição de renda etc. Dessa forma, busca explicitar elementos para fomentar o debate em torno desses inúmeros desafios ao desenvolvimento socioeconô-mico brasileiro.

Tratou-se de um esforço coletivo de reflexão, desenca-deado pela equipe do Instituto de Pesquisa Econômica Apli-cada (Ipea), sob a liderança do professor Márcio Pochmann, que contou com a participa-ção de professores de diversas un ive r s idades, da Rede Desenvolvimentista – forma-da por pesquisadores de dis-tintas universidades coorde-nados pelo Centro de Estudos de Conjuntura e Política Eco-

PASSADO, PRESENTEE FUTURO

R

ESPECIAL

RUMOS – 22 – Novembro/Dezembro 2014

reportagem especial de capa desta edição da Rumos é um convite à leitura e à reflexão sobre temas que

dizem respeito ao desenvolvimento econômico e à democracia brasileira. Quatro importantes pesquisadores, de diferentes campos de atuação, apresentam teses e discussões que figuram em seus mais recentes livros, também apresentados nas próximas páginas.

Para começar, o economista Marcos Antonio Macedo Cintra, um dos editores de Presente e futuro do desenvolvimento brasileiro, encara o desafio de analisar os desdobramentos sociais do atual modelo de desenvolvimento brasileiro, que se apoia em uma política de inclusão, e defende novas perspectivas para a reinvenção das forças e da trajetória de crescimento do país.

O professor Márcio Pochmann, por sua vez, apresenta algumas das reflexões que o levaram à formulação de um ponto de vista que o coloca em oposição ao pensamento quase consensual que se formou no país nessa última década. Para o economista, não existe uma nova classe média no Brasil, e sim uma classe trabalhadora que recompôs seus ganhos e ajudou a diminuir a histórica desigualdade. Em seu livro O mito da grande classe média e também nessa entrevista, Pochmann alerta para a “armadilha” da aceitação acrítica da tese da “medianização” da sociedade brasileira.

Na sequência, a economista Lena Lavinas aborda uma interessante pesquisa desenvolvida sob sua coordenação, e que originou o livro Percepções sobre desigualdade e pobreza, sobre

o que pensam os brasileiros acerca das políticas sociais. E o que se vê é um pensamento paradoxal, ou ainda, em suas palavras, consistentemente paradoxal. Contudo, para além de apontar para a população, o que a professora defende é que o Estado brasileiro, ao definir a amplitude do alcance da políticas social, é quem ajuda a moldar a percepção das pessoas acerca de sua importância. Para ela, falta ousadia aos governos para a implementação de políticas universais, como rege a Constituição.

E é justamente a Constituição Cidadã e todas as suas implicações políticas e sociais o foco da entrevista com a cientista social Maria Celina D’Araujo, que fecha esse especial. Organizadora do livro Redemocratização e mudança social no Brasil, ela aponta que o país ainda precisa percorrer um longo caminho para cumprir plenamente o que determina a sua Carta Magna, especialmente no tocante à participação social, aos direitos sociais e à transparência na gestão pública. Maria Celina também traça um perfil (racial e social) da elite dirigente do país, que evidencia as transformações pelas quais o Brasil ainda tem que passar e que, de certa forma, já está passando.

Economia, política, direitos sociais. Em resumo, são essas as discussões que estão postas nas próximas quinze páginas. São temas há muito presentes na agenda nacional, mas que nem por isso estão superados ou vencidos. As entrevistas mostram caminhos para a construção do país que queremos ser no futuro. Eis uma boa forma de iniciarmos as reflexões para o ano de 2015.

ESPECIAL

A Rumos conversou com quatro renomados estudiosos da Economia e das Ciências Sociais e traz um especial com entrevistas que auxiliam na discussão de temas importantes para a sociedade brasileira. As conversas revisitam as grandes questões nacionais (mobilidade social, políticas universais, desenvolvimento) que integram uma agenda de trabalho para a construção de um grande país. Confiram!

Por Jader Moraes e Thais Sena

Convite à reflexão

Marcos Antonio Macedo Cintra Passado e futuro do desenvolvimento, página 23

Márcio PochmannO mito da grande classe média, página 26

Lena Lavinas Percepções sobre a desigualdade e pobreza, página 32

Maria Celina D´AraujoRedemocratização e mudança social no Brasil, página 36

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RUMOS – 23 – Novembro/Dezembro 2014

Analisar a história durante seu transcurso é um desafio e tanto, pois é difícil entender todos os desdobramentos sociais enquanto são vividos, daí ver-se o grande trabalho desenvolvido pelos editores André Bojikian Calixtre, André Martins Biancarelli e Marcos Antonio Macedo Cintra ao traçar um retrato do desenvolvimento do Brasil na atualidade e orientar as perspectivas futuras. Ganham contorno a questão da (des)industrialização, a exportação apoiada em commodities e o “modelo de desenvolvimento inclusivo”. Macedo Cintra explicita que é preciso construir uma nova trajetória de crescimento, que dependerá de um amplo programa de investimentos em infraestrutura e uma forte articulação governamental.

umos – O livro apresenta o “diag-nóstico de uma época”, ao passo que também deli-

neia algumas questões cen-trais que precisam estar na pauta da agenda de desen-volvimento do país nos pró-ximos anos. Qual a contri-buição que a obra, com sua característica diversa, pode dar a esse debate?Marcos Antonio Macedo Cintra – A partir de uma pers-pectiva de economia política, o conjunto dos capítulos procura realizar um amplo panorama das principais características do desenvolvimento brasileiro contemporâneo: funcionamen-to do tripé macroeconômico, gestão da dívida pública, meca-nismos de financiamento do investimento e da produção,

dinâmica da estrutura produti-va, regressão industrial, trans-formações no mercado de trabalho e no salário mínimo, políticas de distribuição de renda etc. Dessa forma, busca explicitar elementos para fomentar o debate em torno desses inúmeros desafios ao desenvolvimento socioeconô-mico brasileiro.

Tratou-se de um esforço coletivo de reflexão, desenca-deado pela equipe do Instituto de Pesquisa Econômica Apli-cada (Ipea), sob a liderança do professor Márcio Pochmann, que contou com a participa-ção de professores de diversas un ive r s idades, da Rede Desenvolvimentista – forma-da por pesquisadores de dis-tintas universidades coorde-nados pelo Centro de Estudos de Conjuntura e Política Eco-

PASSADO, PRESENTEE FUTURO

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ESPECIAL

RUMOS – 22 – Novembro/Dezembro 2014

reportagem especial de capa desta edição da Rumos é um convite à leitura e à reflexão sobre temas que

dizem respeito ao desenvolvimento econômico e à democracia brasileira. Quatro importantes pesquisadores, de diferentes campos de atuação, apresentam teses e discussões que figuram em seus mais recentes livros, também apresentados nas próximas páginas.

Para começar, o economista Marcos Antonio Macedo Cintra, um dos editores de Presente e futuro do desenvolvimento brasileiro, encara o desafio de analisar os desdobramentos sociais do atual modelo de desenvolvimento brasileiro, que se apoia em uma política de inclusão, e defende novas perspectivas para a reinvenção das forças e da trajetória de crescimento do país.

O professor Márcio Pochmann, por sua vez, apresenta algumas das reflexões que o levaram à formulação de um ponto de vista que o coloca em oposição ao pensamento quase consensual que se formou no país nessa última década. Para o economista, não existe uma nova classe média no Brasil, e sim uma classe trabalhadora que recompôs seus ganhos e ajudou a diminuir a histórica desigualdade. Em seu livro O mito da grande classe média e também nessa entrevista, Pochmann alerta para a “armadilha” da aceitação acrítica da tese da “medianização” da sociedade brasileira.

Na sequência, a economista Lena Lavinas aborda uma interessante pesquisa desenvolvida sob sua coordenação, e que originou o livro Percepções sobre desigualdade e pobreza, sobre

o que pensam os brasileiros acerca das políticas sociais. E o que se vê é um pensamento paradoxal, ou ainda, em suas palavras, consistentemente paradoxal. Contudo, para além de apontar para a população, o que a professora defende é que o Estado brasileiro, ao definir a amplitude do alcance da políticas social, é quem ajuda a moldar a percepção das pessoas acerca de sua importância. Para ela, falta ousadia aos governos para a implementação de políticas universais, como rege a Constituição.

E é justamente a Constituição Cidadã e todas as suas implicações políticas e sociais o foco da entrevista com a cientista social Maria Celina D’Araujo, que fecha esse especial. Organizadora do livro Redemocratização e mudança social no Brasil, ela aponta que o país ainda precisa percorrer um longo caminho para cumprir plenamente o que determina a sua Carta Magna, especialmente no tocante à participação social, aos direitos sociais e à transparência na gestão pública. Maria Celina também traça um perfil (racial e social) da elite dirigente do país, que evidencia as transformações pelas quais o Brasil ainda tem que passar e que, de certa forma, já está passando.

Economia, política, direitos sociais. Em resumo, são essas as discussões que estão postas nas próximas quinze páginas. São temas há muito presentes na agenda nacional, mas que nem por isso estão superados ou vencidos. As entrevistas mostram caminhos para a construção do país que queremos ser no futuro. Eis uma boa forma de iniciarmos as reflexões para o ano de 2015.

ESPECIAL

A Rumos conversou com quatro renomados estudiosos da Economia e das Ciências Sociais e traz um especial com entrevistas que auxiliam na discussão de temas importantes para a sociedade brasileira. As conversas revisitam as grandes questões nacionais (mobilidade social, políticas universais, desenvolvimento) que integram uma agenda de trabalho para a construção de um grande país. Confiram!

Por Jader Moraes e Thais Sena

Convite à reflexão

Marcos Antonio Macedo Cintra Passado e futuro do desenvolvimento, página 23

Márcio PochmannO mito da grande classe média, página 26

Lena Lavinas Percepções sobre a desigualdade e pobreza, página 32

Maria Celina D´AraujoRedemocratização e mudança social no Brasil, página 36

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das políticas de distribuição de renda e de expansão dos servi-ços públicos.

A superação requer a construção de uma nova trajetória de crescimento. Essa, por sua vez, parece depender da articulação de um amplo programa de investimento em infraestrutura – transporte, energia, saneamento básico, mobilidade urbana, inclusão digital – e em expansão dos serviços públicos – saúde, educação, habitação popular – capaz de impulsionar o investi-mento do setor privado (em velhos e novos setores produti-vos) para o mercado interno e para o internacional.

Rumos – O Brasil vive um processo, há pelo menos três décadas, de perda da importância da indústria na eco-nomia. Há uma dificuldade de exportarmos produtos de maior valor agregado, por exemplo. Como reverter esse processo de desindustrialização? A inserção nas cadeias globais de valor é um caminho?Cintra – O jornalista Sérgio Leo, em uma argumentação muito pertinente, afirmou: “Não se escolhe entrar numa cadeia global de produção. Criam-se condições para ser esco-lhido pelas grandes companhias que as controlam”. Nesse sentido, o sistema tributário, os custos trabalhistas, a rede de infraestrutura e logística, o regime de comércio assumem papéis preponderantes, nos quais o país apresenta grandes dificuldades.

Todavia, as maiores multinacionais – líderes das cadeias produtivas globais – estão instaladas no país. Dificilmente, portanto, a inserção nessas redes globais de produção resulta-rá de processos automáticos ou de mercado. Vale dizer, exi-gem a coordenação de diversos instrumentos – política industrial, de comércio exterior, de inovação tecnológica, de mecanismos de financiamento de longo prazo etc. – públicos e privados. Talvez, em alguns casos, até requerem a constru-ção de empresas estatais, dados os elevados custos e riscos envolvidos.

Seria importante também promover o aprofundamento da integração brasileira na América do Sul, por meio da arti-

nômica do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas – e do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação.

Rumos – Nos últimos dez anos, o Brasil promoveu mudan-ças importantes em seu modelo de desenvolvimento, tor-nando-o mais inclusivo. Em que pesem todas as inegáveis conquistas, quais os limites que o país encontrou na imple-mentação desse modelo e como podemos superá-los?Cintra – Na primeira década do século XXI, em âmbito interna-cional, houve uma enorme mudança de preços relativos: os pre-ços das commodities subiram e os preços dos produtos industriais caíram com o acirramento da concorrência e a expansão das cadeias produtivas globais, articulando países com menores custos, inclusive salariais. Essa dinâmica favoreceu o agronegócio e a mineração brasileira, por um lado, e a reação modernizante e defensiva do setor manufatureiro, por outro, o que resultou em um vazamento crescente para o exterior, sobretudo para a Ásia, de uma parte relevante do impulso proveniente da expansão do mercado interno. Os capítulos de Ricardo Bielschowsky, Gabriel Squeff e Lucas Vasconcelos e de Marcelo Arend mostram que a indústria manufatureira brasileira foi se transformando em uma “maquiladora para dentro” – por meio da importação de peças, componentes e produtos finais, sobretudo do complexo eletroe-letrônico, automotivo, farmacêutico e químico.

Essa perda de densidade da estrutura industrial, seu atraso tecnológico, a dificuldade de geração de empregos de melhor qualidade e de melhores salários, o esgotamento da capacidade de endividamento dos assalariados, resultaram em um arrefeci-mento do dinamismo da economia. Com isso, os desequilíbrios foram se acumulando e se explicitaram os limites do “modelo de desenvolvimento inclusivo”. A taxa de inflação passa a ron-dar o limite superior da meta; as altas taxas de juros ameaçam a atividade econômica e elevam o estoque da dívida pública; o balanço de pagamento apresenta elevado déficit em transações correntes, financiado por capitais voláteis; o enrijecimento do gasto público e a queda na arrecadação dificultam a expansão

ESPECIAL

Presente e futuro do desenvolvimento brasileiroAndré Bojikian, André Martins Biancarelli, Marcos Antonio Macedo Cintra (orgs.)Ipea, 643p., 2014.

RUMOS – 25 – Novembro/Dezembro 2014

culação de cadeias produtivas regionais. Essa estratégia irá requerer o desenho de uma política regional de compras governamentais e a definição de um padrão de financiamento da integração, seja pela implementação do Banco do Sul, seja pelo fortalecimento da Corporação Andina de Fomento – agora, Banco de Desenvolvimento da América Latina.

Rumos – Como recuperar o papel do investimento para o crescimento da economia? Concretamente, considera ser possível avançarmos para um modelo em que os financiamentos de longo prazo sejam concedidos por outros atores, que não apenas os bancos públicos?Cintra – A despeito de inovações institucionais relevantes, tais como a letra financeira, as debêntures de infraestrutura, o financiamento do investimento brasileiro persiste caro, escas-so e com prazo relativamente curto. A existência de aplicação alternativa em títulos públicos federais, ativos negociáveis com vantajosa combinação de alta rentabilidade e baixíssimo risco, faz com que os investidores e os bancos não ampliem a con-cessão de dívidas e de crédito. Os bancos somente concedem financiamento de longo prazo como recursos direcionados ou com funding externo.

Neste contexto, impôs-se a necessidade de transferências do Tesouro Nacional para o Banco Nacional de Desenvolvi-mento Econômico e Social (BNDES) no montante de R$ 410,8 bilhões, entre 2008 e 2014, bem como a capitalização do Banco do Brasil (BB) e da Caixa Econômica – em torno de R$ 57,5 bilhões. Tal movimento permitiu a montagem de enge-nharias financeiras e/ou patrimoniais visando o financiamen-to de diversos projetos de infraestrutura, como mostra o capí-tulo do Fernando Costa.

Esses arranjos societários envolvem as instituições finan-ceiras públicas federais – BNDES, BB, Caixa –, as empresas estatais (Petrobras, Eletrobras, Vale etc.) e os fundos de pensão patrocinados por empresas estatais – Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil (Previ), Fundação Petrobras de Seguridade Social (Petros), Fundação dos Economiários Federais (Funcef) etc. –, cujos Conselhos de Administração são compartilhados com “voto de Minerva” da instituição patrocinadora –, e as empresas privadas (nacionais ou estran-geiras). O Tesouro Nacional, em última análise, oferece aos investidores risco soberano, para captar em longo prazo, tanto no mercado financeiro doméstico, como no internacional, e possibilita aos bancos públicos federais a realocação dos recur-sos em prazos adequados ao financiamento dos setores priori-tários para o desenvolvimento brasileiro.

São iniciativas e avanços relevantes, mas ainda de pouca monta, sem permitir o equacionamento do padrão de finan-ciamento em reais do investimento produtivo e da infraestru-tura na economia brasileira.

Rumos – No livro, é defendido que o país deve reinven-tar as forças de seu crescimento, levando-o a uma políti-

ca de conteúdo desenvolvimentista. O que seria esse novo desenvolvimentismo? Difere-se do conceito histórico de desenvolvimentismo, tal qual o conhecemos?Cintra – O capítulo do Pedro Fonseca procura exatamente delimitar o conceito de desenvolvimentismo, a partir da expe-riência histórica latino-americana. Argumenta que o emprego do termo desenvolvimentismo qualifica distintos fenômenos, do passado e do presente. Essa polissemia se converte em ambi-guidade, algumas vezes refere-se a uma política econômica executada por governos da América Latina no século XX, outras vezes centra-se no pensamento econômico da Comissão Econômica para a América Latina e Caribe.

Pedro Fonseca explorou a extensão e as possibilidades de uso do conceito, a partir de algumas experiências governamen-tais, bem como novos atributos que apareceram ou se reforça-ram como valores nas últimas décadas – tais como democra-“ ”cia, defesa do meio ambiente, estabilidade econômica etc. Conclui, então, que, “apesar das objeções que o desenvolvi-mentismo vem recebendo de diferentes segmentos, o mesmo dá sinais inequívocos de que está vivo, seja por apresentar defensores, seja pelo fato de servir como alvo para seus críti-cos; antes que superado, tudo sugere que os problemas que “ ”deram ensejo ao aparecimento do conceito – como consciên-cia do atraso , do subdesenvolvimento , da heterogenei-“ ” “ ” “dade estrutural ou da dependência – ainda se fazem presen-” “ ”tes. Assim sendo, parece improvável que ele caia em desuso e não granjeie adeptos, embora seu programa como projeto de superação do status quo exija permanente reatualização”.

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das políticas de distribuição de renda e de expansão dos servi-ços públicos.

A superação requer a construção de uma nova trajetória de crescimento. Essa, por sua vez, parece depender da articulação de um amplo programa de investimento em infraestrutura – transporte, energia, saneamento básico, mobilidade urbana, inclusão digital – e em expansão dos serviços públicos – saúde, educação, habitação popular – capaz de impulsionar o investi-mento do setor privado (em velhos e novos setores produti-vos) para o mercado interno e para o internacional.

Rumos – O Brasil vive um processo, há pelo menos três décadas, de perda da importância da indústria na eco-nomia. Há uma dificuldade de exportarmos produtos de maior valor agregado, por exemplo. Como reverter esse processo de desindustrialização? A inserção nas cadeias globais de valor é um caminho?Cintra – O jornalista Sérgio Leo, em uma argumentação muito pertinente, afirmou: “Não se escolhe entrar numa cadeia global de produção. Criam-se condições para ser esco-lhido pelas grandes companhias que as controlam”. Nesse sentido, o sistema tributário, os custos trabalhistas, a rede de infraestrutura e logística, o regime de comércio assumem papéis preponderantes, nos quais o país apresenta grandes dificuldades.

Todavia, as maiores multinacionais – líderes das cadeias produtivas globais – estão instaladas no país. Dificilmente, portanto, a inserção nessas redes globais de produção resulta-rá de processos automáticos ou de mercado. Vale dizer, exi-gem a coordenação de diversos instrumentos – política industrial, de comércio exterior, de inovação tecnológica, de mecanismos de financiamento de longo prazo etc. – públicos e privados. Talvez, em alguns casos, até requerem a constru-ção de empresas estatais, dados os elevados custos e riscos envolvidos.

Seria importante também promover o aprofundamento da integração brasileira na América do Sul, por meio da arti-

nômica do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas – e do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação.

Rumos – Nos últimos dez anos, o Brasil promoveu mudan-ças importantes em seu modelo de desenvolvimento, tor-nando-o mais inclusivo. Em que pesem todas as inegáveis conquistas, quais os limites que o país encontrou na imple-mentação desse modelo e como podemos superá-los?Cintra – Na primeira década do século XXI, em âmbito interna-cional, houve uma enorme mudança de preços relativos: os pre-ços das commodities subiram e os preços dos produtos industriais caíram com o acirramento da concorrência e a expansão das cadeias produtivas globais, articulando países com menores custos, inclusive salariais. Essa dinâmica favoreceu o agronegócio e a mineração brasileira, por um lado, e a reação modernizante e defensiva do setor manufatureiro, por outro, o que resultou em um vazamento crescente para o exterior, sobretudo para a Ásia, de uma parte relevante do impulso proveniente da expansão do mercado interno. Os capítulos de Ricardo Bielschowsky, Gabriel Squeff e Lucas Vasconcelos e de Marcelo Arend mostram que a indústria manufatureira brasileira foi se transformando em uma “maquiladora para dentro” – por meio da importação de peças, componentes e produtos finais, sobretudo do complexo eletroe-letrônico, automotivo, farmacêutico e químico.

Essa perda de densidade da estrutura industrial, seu atraso tecnológico, a dificuldade de geração de empregos de melhor qualidade e de melhores salários, o esgotamento da capacidade de endividamento dos assalariados, resultaram em um arrefeci-mento do dinamismo da economia. Com isso, os desequilíbrios foram se acumulando e se explicitaram os limites do “modelo de desenvolvimento inclusivo”. A taxa de inflação passa a ron-dar o limite superior da meta; as altas taxas de juros ameaçam a atividade econômica e elevam o estoque da dívida pública; o balanço de pagamento apresenta elevado déficit em transações correntes, financiado por capitais voláteis; o enrijecimento do gasto público e a queda na arrecadação dificultam a expansão

ESPECIAL

Presente e futuro do desenvolvimento brasileiroAndré Bojikian, André Martins Biancarelli, Marcos Antonio Macedo Cintra (orgs.)Ipea, 643p., 2014.

RUMOS – 25 – Novembro/Dezembro 2014

culação de cadeias produtivas regionais. Essa estratégia irá requerer o desenho de uma política regional de compras governamentais e a definição de um padrão de financiamento da integração, seja pela implementação do Banco do Sul, seja pelo fortalecimento da Corporação Andina de Fomento – agora, Banco de Desenvolvimento da América Latina.

Rumos – Como recuperar o papel do investimento para o crescimento da economia? Concretamente, considera ser possível avançarmos para um modelo em que os financiamentos de longo prazo sejam concedidos por outros atores, que não apenas os bancos públicos?Cintra – A despeito de inovações institucionais relevantes, tais como a letra financeira, as debêntures de infraestrutura, o financiamento do investimento brasileiro persiste caro, escas-so e com prazo relativamente curto. A existência de aplicação alternativa em títulos públicos federais, ativos negociáveis com vantajosa combinação de alta rentabilidade e baixíssimo risco, faz com que os investidores e os bancos não ampliem a con-cessão de dívidas e de crédito. Os bancos somente concedem financiamento de longo prazo como recursos direcionados ou com funding externo.

Neste contexto, impôs-se a necessidade de transferências do Tesouro Nacional para o Banco Nacional de Desenvolvi-mento Econômico e Social (BNDES) no montante de R$ 410,8 bilhões, entre 2008 e 2014, bem como a capitalização do Banco do Brasil (BB) e da Caixa Econômica – em torno de R$ 57,5 bilhões. Tal movimento permitiu a montagem de enge-nharias financeiras e/ou patrimoniais visando o financiamen-to de diversos projetos de infraestrutura, como mostra o capí-tulo do Fernando Costa.

Esses arranjos societários envolvem as instituições finan-ceiras públicas federais – BNDES, BB, Caixa –, as empresas estatais (Petrobras, Eletrobras, Vale etc.) e os fundos de pensão patrocinados por empresas estatais – Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil (Previ), Fundação Petrobras de Seguridade Social (Petros), Fundação dos Economiários Federais (Funcef) etc. –, cujos Conselhos de Administração são compartilhados com “voto de Minerva” da instituição patrocinadora –, e as empresas privadas (nacionais ou estran-geiras). O Tesouro Nacional, em última análise, oferece aos investidores risco soberano, para captar em longo prazo, tanto no mercado financeiro doméstico, como no internacional, e possibilita aos bancos públicos federais a realocação dos recur-sos em prazos adequados ao financiamento dos setores priori-tários para o desenvolvimento brasileiro.

São iniciativas e avanços relevantes, mas ainda de pouca monta, sem permitir o equacionamento do padrão de finan-ciamento em reais do investimento produtivo e da infraestru-tura na economia brasileira.

Rumos – No livro, é defendido que o país deve reinven-tar as forças de seu crescimento, levando-o a uma políti-

ca de conteúdo desenvolvimentista. O que seria esse novo desenvolvimentismo? Difere-se do conceito histórico de desenvolvimentismo, tal qual o conhecemos?Cintra – O capítulo do Pedro Fonseca procura exatamente delimitar o conceito de desenvolvimentismo, a partir da expe-riência histórica latino-americana. Argumenta que o emprego do termo desenvolvimentismo qualifica distintos fenômenos, do passado e do presente. Essa polissemia se converte em ambi-guidade, algumas vezes refere-se a uma política econômica executada por governos da América Latina no século XX, outras vezes centra-se no pensamento econômico da Comissão Econômica para a América Latina e Caribe.

Pedro Fonseca explorou a extensão e as possibilidades de uso do conceito, a partir de algumas experiências governamen-tais, bem como novos atributos que apareceram ou se reforça-ram como valores nas últimas décadas – tais como democra-“ ”cia, defesa do meio ambiente, estabilidade econômica etc. Conclui, então, que, “apesar das objeções que o desenvolvi-mentismo vem recebendo de diferentes segmentos, o mesmo dá sinais inequívocos de que está vivo, seja por apresentar defensores, seja pelo fato de servir como alvo para seus críti-cos; antes que superado, tudo sugere que os problemas que “ ”deram ensejo ao aparecimento do conceito – como consciên-cia do atraso , do subdesenvolvimento , da heterogenei-“ ” “ ” “dade estrutural ou da dependência – ainda se fazem presen-” “ ”tes. Assim sendo, parece improvável que ele caia em desuso e não granjeie adeptos, embora seu programa como projeto de superação do status quo exija permanente reatualização”.

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O economista Márcio Pochmann, professor da Unicamp e presidente do Ipea por longo mandato, navega em um mar de números, dados e análises históricas para decretar, na contracorrente do pensamento consensual que se estabeleceu no país: não temos uma nova classe média no Brasil. Pochmann não desconsidera ou minimiza a forte mobilidade social que ocorreu nos últimos anos – ao contrário, compara, guardadas as devidas proporções, ao ocorrido na Europa do pós-guerra, com a elevação da renda dos mais pobres, níveis seguros de emprego e a implementação de um estado de bem estar-social. O que ele defende é que considerar a recomposição dos ganhos da classe trabalhadora e a diminuição da desigualdade como ascensão de uma nova classe média pode ser uma armadilha para o fortalecimento de teses que advoguem a diminuição do papel do Estado na sociedade brasileira. Afinal, para que um Estado forte em um país de classe média, que não precisa do braço estatal para corrigir as assimetrias e oportunizar o acesso aos serviços básicos aos mais frágeis da pirâmide social?

umos – No livro O mito da grande classe média, o senhor defende que as mudanças

ocorridas no país na última década não forjam o nasci-mento de uma nova classe média, mas sim a recomposi-ção da classe trabalhadora em novas bases de consumo. A professora Marilena Chauí diz que sua tese está “na con-tracorrente do senso comum econômico-sociológico”. Por que essa aceitação quase consensual do conceito de “nova classe média”?Márcio Pochmann – Meu trabalho resgata o parâmetro social que vem sendo utilizado para analisar a estratificação D

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social de cada país. E é justamen-te essa abordagem já consolidada há muito tempo que me permite dizer que nós tivemos, de fato, no Brasil, na primeira década deste século, uma grande mobili-dade social, uma ampliação da classe trabalhadora pela expan-são do emprego e melhora do salário mínimo. É uma recupera-ção associada sobretudo ao emprego, foram mais de 22 milhões de empregos abertos a partir de 2003. Isso configura, na verdade, uma sociedade amplia-da do ponto de vista da presença da classe trabalhadora.

Há uma tendência de avali-ar o que ocorreu na estrutura social brasileira utilizando-se como critério de análise aquilo que tem importância do ponto

de vista mercadológico, das análises de marketing, especial-mente para as empresas que estão preocupadas em saber o que produzir, como produzir e em que quantidade. Esse instrumental, que provém da referência mais de mercado, é importante para saber que tipo de produto as empresas vão produzir e a que preço, olhando quais são os segmentos que mais crescem na pespectiva de uma escala de renda. Isso tem permitido a alguns setores identificar que no Brasil tivemos uma expansão de níveis de renda intermediários que seria equivalente a uma sociedade de classe média. Ao meu modo de ver, essa apropriação pela ciência econômica de um instrumental que anteriormente servia fundamental-mente para as empresas é um equívoco, embora reconheça que essa forma de olhar a sociedade tem sido adotada em outros países. O que foi feito aqui no Brasil, de certa manei-ra, é uma cópia do tipo de estudo que vem sendo desenvol-vido pelo próprio Banco Mundial em outros países. Então, quando se analisa essa ideia de estrutura social, utiliza-se basicamente o critério renda, que é um critério importante, mas insuficiente para caracterizar uma estrutura tão com-plexa, como é a sociedade em cada país.

Rumos – Que outros critérios o senhor acredita que deveriam ser levados em conta? Pochmann – O que, de maneira geral, tem sido uma referên-cia importante é considerar, a partir da estrutura produtiva de cada país, as consequências geradas no mercado de trabalho, na estratificação do consumo, na renda e, portanto, a própria estrutura produtiva que caracteriza melhor o tipo de socieda-de que se tem. E justamente o conceito de classe média, tal qual nós entendemos hoje, está diretamente relacionado à

sociedade urbana e industrial, porque o chamado “emprego de classe média”, como foi identificado a partir dos anos 1940 e 1950, inicialmente nos Estados Unidos, era aquele emprego do profissional da grande empresa que não estava vinculado à produção direta, mas eram os administradores, os executivos, os gerentes, o corpo mais técnico da grande empresa privada. Depois também nos empregos públicos. Logo, esse tipo de segmento que ganhou maior dimensão está vinculado ao emprego industrial. Quando se analisa o que está ocorrendo em sociedades que perdem a importância da indústria, como é o caso dos Estados Unidos e da União Europeia, percebe-se o enfraquecimento desse tipo de emprego e o que mais ganha dimensão são os empregos de serviços. Ocorre que o setor de serviços é um setor muito heterogêneo – tem empregos de maior remuneração e maior qualidade, sobretudo aqueles vin-culados aos serviços de distribuição, de produção, que são mais nobres; mas, ao mesmo tempo, também há os serviços que são portadores de empregos mais precários, como comércio e ser-viços pessoais. Temos uma transição, de uma sociedade urbana industrial para uma sociedade de serviços, e que o que mais a caracteriza é uma polarização entre empregos bons e ruins. Abrindo a perspectiva de considerar-se a estrutura social hoje diferente daquela que é herdeira da sociedade industrial, ou seja, sem indústria ou com indústria muito fraca, o tipo de estrutura social que se tem é mais polarizado.

Rumos – Alguns pesquisadores dizem que essa discussão entre “nova classe média” e “nova classe trabalhadora” é apenas uma briga conceitual. Quais as implicações políti-cas concretas dessa aceitação sobre a nova classe média, que o senhor tem apontado como um problema?

QUEBRANDO O MITO: EXISTE UMA NOVA

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O economista Márcio Pochmann, professor da Unicamp e presidente do Ipea por longo mandato, navega em um mar de números, dados e análises históricas para decretar, na contracorrente do pensamento consensual que se estabeleceu no país: não temos uma nova classe média no Brasil. Pochmann não desconsidera ou minimiza a forte mobilidade social que ocorreu nos últimos anos – ao contrário, compara, guardadas as devidas proporções, ao ocorrido na Europa do pós-guerra, com a elevação da renda dos mais pobres, níveis seguros de emprego e a implementação de um estado de bem estar-social. O que ele defende é que considerar a recomposição dos ganhos da classe trabalhadora e a diminuição da desigualdade como ascensão de uma nova classe média pode ser uma armadilha para o fortalecimento de teses que advoguem a diminuição do papel do Estado na sociedade brasileira. Afinal, para que um Estado forte em um país de classe média, que não precisa do braço estatal para corrigir as assimetrias e oportunizar o acesso aos serviços básicos aos mais frágeis da pirâmide social?

umos – No livro O mito da grande classe média, o senhor defende que as mudanças

ocorridas no país na última década não forjam o nasci-mento de uma nova classe média, mas sim a recomposi-ção da classe trabalhadora em novas bases de consumo. A professora Marilena Chauí diz que sua tese está “na con-tracorrente do senso comum econômico-sociológico”. Por que essa aceitação quase consensual do conceito de “nova classe média”?Márcio Pochmann – Meu trabalho resgata o parâmetro social que vem sendo utilizado para analisar a estratificação D

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social de cada país. E é justamen-te essa abordagem já consolidada há muito tempo que me permite dizer que nós tivemos, de fato, no Brasil, na primeira década deste século, uma grande mobili-dade social, uma ampliação da classe trabalhadora pela expan-são do emprego e melhora do salário mínimo. É uma recupera-ção associada sobretudo ao emprego, foram mais de 22 milhões de empregos abertos a partir de 2003. Isso configura, na verdade, uma sociedade amplia-da do ponto de vista da presença da classe trabalhadora.

Há uma tendência de avali-ar o que ocorreu na estrutura social brasileira utilizando-se como critério de análise aquilo que tem importância do ponto

de vista mercadológico, das análises de marketing, especial-mente para as empresas que estão preocupadas em saber o que produzir, como produzir e em que quantidade. Esse instrumental, que provém da referência mais de mercado, é importante para saber que tipo de produto as empresas vão produzir e a que preço, olhando quais são os segmentos que mais crescem na pespectiva de uma escala de renda. Isso tem permitido a alguns setores identificar que no Brasil tivemos uma expansão de níveis de renda intermediários que seria equivalente a uma sociedade de classe média. Ao meu modo de ver, essa apropriação pela ciência econômica de um instrumental que anteriormente servia fundamental-mente para as empresas é um equívoco, embora reconheça que essa forma de olhar a sociedade tem sido adotada em outros países. O que foi feito aqui no Brasil, de certa manei-ra, é uma cópia do tipo de estudo que vem sendo desenvol-vido pelo próprio Banco Mundial em outros países. Então, quando se analisa essa ideia de estrutura social, utiliza-se basicamente o critério renda, que é um critério importante, mas insuficiente para caracterizar uma estrutura tão com-plexa, como é a sociedade em cada país.

Rumos – Que outros critérios o senhor acredita que deveriam ser levados em conta? Pochmann – O que, de maneira geral, tem sido uma referên-cia importante é considerar, a partir da estrutura produtiva de cada país, as consequências geradas no mercado de trabalho, na estratificação do consumo, na renda e, portanto, a própria estrutura produtiva que caracteriza melhor o tipo de socieda-de que se tem. E justamente o conceito de classe média, tal qual nós entendemos hoje, está diretamente relacionado à

sociedade urbana e industrial, porque o chamado “emprego de classe média”, como foi identificado a partir dos anos 1940 e 1950, inicialmente nos Estados Unidos, era aquele emprego do profissional da grande empresa que não estava vinculado à produção direta, mas eram os administradores, os executivos, os gerentes, o corpo mais técnico da grande empresa privada. Depois também nos empregos públicos. Logo, esse tipo de segmento que ganhou maior dimensão está vinculado ao emprego industrial. Quando se analisa o que está ocorrendo em sociedades que perdem a importância da indústria, como é o caso dos Estados Unidos e da União Europeia, percebe-se o enfraquecimento desse tipo de emprego e o que mais ganha dimensão são os empregos de serviços. Ocorre que o setor de serviços é um setor muito heterogêneo – tem empregos de maior remuneração e maior qualidade, sobretudo aqueles vin-culados aos serviços de distribuição, de produção, que são mais nobres; mas, ao mesmo tempo, também há os serviços que são portadores de empregos mais precários, como comércio e ser-viços pessoais. Temos uma transição, de uma sociedade urbana industrial para uma sociedade de serviços, e que o que mais a caracteriza é uma polarização entre empregos bons e ruins. Abrindo a perspectiva de considerar-se a estrutura social hoje diferente daquela que é herdeira da sociedade industrial, ou seja, sem indústria ou com indústria muito fraca, o tipo de estrutura social que se tem é mais polarizado.

Rumos – Alguns pesquisadores dizem que essa discussão entre “nova classe média” e “nova classe trabalhadora” é apenas uma briga conceitual. Quais as implicações políti-cas concretas dessa aceitação sobre a nova classe média, que o senhor tem apontado como um problema?

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Pochmann – Guardada a devida proporção, tentamos imple-mentar no Brasil essa experiência exitosa do pós-guerra na Europa, ou seja, de estabelecer que concomitantemente à elevação dos ricos e da própria classe média, é necessário ele-var o padrão de vida dos pobres. A experiência do Brasil na época quando houve um crescimento econômico, isso nos anos 1970, foi de melhora de apenas uma parcela dos brasilei-ros. A classe trabalhadora ficou marginalizada do que ocorreu do ponto de vista da expansão econômica. Pela experiência democrática na primeira década do século XXI, o país conse-guiu combinar uma retomada do crescimento econômico com distribuição de renda, o que foi extremamente exitoso, especi-

almente num momento em que o mun-do, sobretudo nos países mais ricos, oferece baixo dinamismo, maior desem-prego, maior pobreza e desigualdade. O Brasil se transformou numa referência internacional reconhecida por vários organismos, inclusive das Nações Uni-das.

Rumos – Na década de 1990, o país teve um congelamento da estratifi-cação social e recentemente passou por esse processo de mobilidade social que o senhor citou. Acredita que o prognóstico daqui para a fren-te é de mais mobilidade ou de uma acomodação desse cenário? Pochmann – Acredito que uma das características principais do capitalismo brasileiro é a mobilidade social. No entanto, de maneira geral, tem sido uma mobilidade social muito heterogênea. Sempre dou o exemplo de que no Brasil, historicamente, é como se os mais ricos chegassem num prédio e tomassem imediatamente o elevador, tal qual eles subiriam rapidamente o seu nível de renda, de condições de vida. Enquanto que o conjunto da população também chegava nesse mesmo edifício, mas sem direito a elevador, ele vai ter que subir degrau por degrau. Então, ele sobe, mas

é lento, o que aumenta a desigualdade. Sendo assim, não acredito que é possível imaginar um capitalismo nos próxi-mos anos no Brasil sem que haja mobilidade. A questão a ser colocada é qual mobilidade ocorrerá: será uma mobilidade mais significativa na base da pirâmide ou uma mobilidade muito mais voltada para o topo da pirâmide social brasileira? Rumos – Em sua obra, o senhor avalia que o Brasil tem duas pautas urgentes para seu futuro: a reindustrializa-

Pochmann – Essa pergunta é boa, porque ela permite expressar que a definição conceitual não está deslocada de implicações de natureza política, especialmente olhando a realidade brasileira em que se percebe que está associada a ideia de que a chamada classe média tradicional – os professores, bancários, gerentes, adminis-tradores – é um segmento que pouco depende de políticas públi-cas. Por meio da possibilidade de se abaterem gastos com saúde privada, educação privada, assistência privada, previdência priva-da no imposto de renda, esse segmento de classe média consegue viabilizar o gasto privado através de compensações tributárias obtidas. Assim, não são segmentos que necessitam diretamente de políticas universais nas áreas de saúde, educação, habitação e transporte. Quem precisa de fato de políti-cas públicas são os trabalhadores, pois ganham pouco e não têm condições de viabilizar o gasto privado, nos serviços de saúde, educação, transporte, habitação e assim por diante. E tão pouco ganham que não conseguem fazer declaração do imposto de renda e absorver aquilo que as deduções do imposto de renda permitem determinados gastos. Portanto, necessita a presença do Estado.

Quando se diz que esse segmento que avançou e foi beneficiado pela ascensão social é de classe média, de certa maneira estamos querendo colocá-los na classe média tradicional e dizendo que não precisam de políticas públicas, que precisam na verdade de menos imposto e que por si só resolverão seus problemas de ordem educacional ou previdenciária e assim por diante. Ao definir o que está acontecendo com a população brasileira, encaminho o tipo de ação que é o papel do Estado. Então, se identifico que tivemos uma ascensão para trabalhadores, trabalhadores de renda relativamente baixa, e que para melhorar sua condição é preciso um serviço público de excelente qualidade na educação, saúde etc., pressuponho uma ação do Estado mais forte. Temos o embate entre visões do ponto de vista conceitual, mas com grande implicação nas decisões de políti-cas públicas.

Rumos – É possível fazer um paralelo entre o que aconte-ceu no Brasil nesses últimos dez anos com o ocorrido no pós-guerra, sobretudo na Europa, durante os “30 anos gloriosos”, quando os trabalhadores tiveram conquistas sociais como elevação de renda e emprego, consumo de bens duráveis. No Brasil, isso aconteceu de forma tardia?

“Quando se diz que esse segmento beneficiado pela ascensão social é de classe média, de certa maneira estamos dizendo que não precisam de políticas públicas, mas sim de menos imposto e que por si só resolverão seus problemas. Ao definir o que está acontecendo com a população brasileira, encaminho o tipo de ação que é o papel do Estado.”

“Não é possível imaginar um capitalismo nos próximos anos no Brasil sem que haja mobilidade. A questão é: qual mobilidade ocorrerá? Será mais significativa na base da pirâmide ou mais voltada para o topo da pirâmide social brasileira?”

ESPECIAL

numa transição para uma sociedade de serviços, e obviamente isso exige um repo-sicionamento em termos do Estado, por-que o Estado que temos hoje não é porta-dor desse futuro dos serviços. Quer dizer, quando se olha a divisão dentro dos gover-nos, percebemos que há uma política indus-trial que vê a indústria como um todo; uma política de agropecuária que observa o setor como um todo; mas nos serviços não há, o que existe é uma dispersão – na saúde, na educação, no transporte, no turismo, na assistência. Então, há necessidade de ter outro leque de atuação do Estado, do ponto de vista mais articulado e integrado, olhan-do o serviço da totalidade de vida. Não podemos ver apenas o indivíduo naquilo que concerne às pessoas que estão com problema de doença, ou que estão sem educação adequada, ou sem emprego, ou sem mobilidade. Temos que olhar o indiví-duo na sua totalidade e isso implicaria em uma reforma do Estado que desse conta desse desafio.

Rumos – E existem condições concre-tas para o Brasil fazer essa reforma em curto prazo e avançar nessas duas áreas apontadas? Pochmann – Não acredito que seja um problema de ordem técnica, que não saiba-mos o que fazer. Isso, no meu modo de ver, está superado. É, sim, um problema de natureza política. A reforma do Estado e outras reformas que precisariam ser reali-zadas, como a tributária e a dos meios de comunicação, dependem de uma só que é a reforma política. A mãe de todas as refor-mas é a política. O sistema político eleitoral que temos hoje é um sistema que, na verda-de, termina obstaculizando a realização das reformas que o Brasil precisa.

É bom ressaltar o fato de que tivemos um plebiscito popular que foi feito em

2014 [na semana da pátria] em torno do tema da reforma políti-ca, foram quase oito milhões de pessoas que participaram, o que é uma demonstração de que a sociedade quer outro sistema político. Então, acredito que em 2015, se houver um movimen-to nesse sentido, nós poderemos ter êxito numa reforma políti-ca e aí, sim, abriria a possibilidade de fazer as reformas que o Brasil almeja e ao mesmo tempo vão ficando em segundo plano, perdendo espaço para questões menores, sem grande comple-tude do ponto de vista dos desafios brasileiros.

ção e a reconfiguração qualitativa dos serviços públicos. Por que acredita que essas pautas devem ter a centralidade na reorientação política e econômica brasileira? Pochmann – Identifico esses dois caminhos como margeadores para o futuro do Brasil, imaginando a pers-pectiva de termos um país para todos, do ponto de vista da qualidade do emprego. Isso obviamente pressupõe um ritmo de expansão do país mais rapidamente e de melhor qualidade, e não há como pensar em uma econo-mia mais dinâmica sem o reforço industrial. Não acredito que podemos voltar à estrutura industrial que tive-mos nos anos 1970, início dos anos 1980, tão diversificada como era. Até porque o quadro internacional mudou, com o aparecimento das cadeias globais de valor, mas não há dúvida de que o Brasil possui comple-xos industriais de grande magnitude, que são fundamentais.

Hoje, todo investimento em pro-gresso técnico no mundo se concentra basicamente em três complexos importantes, que são o automobilísti-co, o farmacêutico e a tecnologia de informação e comunicação. Desses três, que respondem por 64% de todos os investimentos feitos em inovação no mundo, o Brasil tem dois setores muito fortes, que são o auto-mobilístico e o de fármacos, que vem crescendo, inclusive pela presença da empresa nacional, com os genéricos, que devem ganhar ainda mais impor-tância, inclusive no que diz respeito à pesquisa. O setor de tecnologia da informação ainda é um setor em desenvolvimento no Brasil. Portanto, temos condições concretas e objetivas e um mercado interno portentoso; temos a possibilidade de ganhar maior espaço no comércio externo, a partir desta capacidade de ampliar o valor agregado dessas cadeias pro-dutivas, assim como outras que nós já possuímos, como a indústria de defesa do Brasil e todo o setor de agronegócio, que também é uma referência de pujança. Então, o Brasil tem de fato condições para fortalecer o seu setor industrial em base mais sólida.

Ao mesmo tempo, devemos reconhecer que estamos

O Mito da Grande Classe MédiaMarcio PochmannBoitempo Editorial, 180p., 2014.

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Pochmann – Guardada a devida proporção, tentamos imple-mentar no Brasil essa experiência exitosa do pós-guerra na Europa, ou seja, de estabelecer que concomitantemente à elevação dos ricos e da própria classe média, é necessário ele-var o padrão de vida dos pobres. A experiência do Brasil na época quando houve um crescimento econômico, isso nos anos 1970, foi de melhora de apenas uma parcela dos brasilei-ros. A classe trabalhadora ficou marginalizada do que ocorreu do ponto de vista da expansão econômica. Pela experiência democrática na primeira década do século XXI, o país conse-guiu combinar uma retomada do crescimento econômico com distribuição de renda, o que foi extremamente exitoso, especi-

almente num momento em que o mun-do, sobretudo nos países mais ricos, oferece baixo dinamismo, maior desem-prego, maior pobreza e desigualdade. O Brasil se transformou numa referência internacional reconhecida por vários organismos, inclusive das Nações Uni-das.

Rumos – Na década de 1990, o país teve um congelamento da estratifi-cação social e recentemente passou por esse processo de mobilidade social que o senhor citou. Acredita que o prognóstico daqui para a fren-te é de mais mobilidade ou de uma acomodação desse cenário? Pochmann – Acredito que uma das características principais do capitalismo brasileiro é a mobilidade social. No entanto, de maneira geral, tem sido uma mobilidade social muito heterogênea. Sempre dou o exemplo de que no Brasil, historicamente, é como se os mais ricos chegassem num prédio e tomassem imediatamente o elevador, tal qual eles subiriam rapidamente o seu nível de renda, de condições de vida. Enquanto que o conjunto da população também chegava nesse mesmo edifício, mas sem direito a elevador, ele vai ter que subir degrau por degrau. Então, ele sobe, mas

é lento, o que aumenta a desigualdade. Sendo assim, não acredito que é possível imaginar um capitalismo nos próxi-mos anos no Brasil sem que haja mobilidade. A questão a ser colocada é qual mobilidade ocorrerá: será uma mobilidade mais significativa na base da pirâmide ou uma mobilidade muito mais voltada para o topo da pirâmide social brasileira? Rumos – Em sua obra, o senhor avalia que o Brasil tem duas pautas urgentes para seu futuro: a reindustrializa-

Pochmann – Essa pergunta é boa, porque ela permite expressar que a definição conceitual não está deslocada de implicações de natureza política, especialmente olhando a realidade brasileira em que se percebe que está associada a ideia de que a chamada classe média tradicional – os professores, bancários, gerentes, adminis-tradores – é um segmento que pouco depende de políticas públi-cas. Por meio da possibilidade de se abaterem gastos com saúde privada, educação privada, assistência privada, previdência priva-da no imposto de renda, esse segmento de classe média consegue viabilizar o gasto privado através de compensações tributárias obtidas. Assim, não são segmentos que necessitam diretamente de políticas universais nas áreas de saúde, educação, habitação e transporte. Quem precisa de fato de políti-cas públicas são os trabalhadores, pois ganham pouco e não têm condições de viabilizar o gasto privado, nos serviços de saúde, educação, transporte, habitação e assim por diante. E tão pouco ganham que não conseguem fazer declaração do imposto de renda e absorver aquilo que as deduções do imposto de renda permitem determinados gastos. Portanto, necessita a presença do Estado.

Quando se diz que esse segmento que avançou e foi beneficiado pela ascensão social é de classe média, de certa maneira estamos querendo colocá-los na classe média tradicional e dizendo que não precisam de políticas públicas, que precisam na verdade de menos imposto e que por si só resolverão seus problemas de ordem educacional ou previdenciária e assim por diante. Ao definir o que está acontecendo com a população brasileira, encaminho o tipo de ação que é o papel do Estado. Então, se identifico que tivemos uma ascensão para trabalhadores, trabalhadores de renda relativamente baixa, e que para melhorar sua condição é preciso um serviço público de excelente qualidade na educação, saúde etc., pressuponho uma ação do Estado mais forte. Temos o embate entre visões do ponto de vista conceitual, mas com grande implicação nas decisões de políti-cas públicas.

Rumos – É possível fazer um paralelo entre o que aconte-ceu no Brasil nesses últimos dez anos com o ocorrido no pós-guerra, sobretudo na Europa, durante os “30 anos gloriosos”, quando os trabalhadores tiveram conquistas sociais como elevação de renda e emprego, consumo de bens duráveis. No Brasil, isso aconteceu de forma tardia?

“Quando se diz que esse segmento beneficiado pela ascensão social é de classe média, de certa maneira estamos dizendo que não precisam de políticas públicas, mas sim de menos imposto e que por si só resolverão seus problemas. Ao definir o que está acontecendo com a população brasileira, encaminho o tipo de ação que é o papel do Estado.”

“Não é possível imaginar um capitalismo nos próximos anos no Brasil sem que haja mobilidade. A questão é: qual mobilidade ocorrerá? Será mais significativa na base da pirâmide ou mais voltada para o topo da pirâmide social brasileira?”

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numa transição para uma sociedade de serviços, e obviamente isso exige um repo-sicionamento em termos do Estado, por-que o Estado que temos hoje não é porta-dor desse futuro dos serviços. Quer dizer, quando se olha a divisão dentro dos gover-nos, percebemos que há uma política indus-trial que vê a indústria como um todo; uma política de agropecuária que observa o setor como um todo; mas nos serviços não há, o que existe é uma dispersão – na saúde, na educação, no transporte, no turismo, na assistência. Então, há necessidade de ter outro leque de atuação do Estado, do ponto de vista mais articulado e integrado, olhan-do o serviço da totalidade de vida. Não podemos ver apenas o indivíduo naquilo que concerne às pessoas que estão com problema de doença, ou que estão sem educação adequada, ou sem emprego, ou sem mobilidade. Temos que olhar o indiví-duo na sua totalidade e isso implicaria em uma reforma do Estado que desse conta desse desafio.

Rumos – E existem condições concre-tas para o Brasil fazer essa reforma em curto prazo e avançar nessas duas áreas apontadas? Pochmann – Não acredito que seja um problema de ordem técnica, que não saiba-mos o que fazer. Isso, no meu modo de ver, está superado. É, sim, um problema de natureza política. A reforma do Estado e outras reformas que precisariam ser reali-zadas, como a tributária e a dos meios de comunicação, dependem de uma só que é a reforma política. A mãe de todas as refor-mas é a política. O sistema político eleitoral que temos hoje é um sistema que, na verda-de, termina obstaculizando a realização das reformas que o Brasil precisa.

É bom ressaltar o fato de que tivemos um plebiscito popular que foi feito em

2014 [na semana da pátria] em torno do tema da reforma políti-ca, foram quase oito milhões de pessoas que participaram, o que é uma demonstração de que a sociedade quer outro sistema político. Então, acredito que em 2015, se houver um movimen-to nesse sentido, nós poderemos ter êxito numa reforma políti-ca e aí, sim, abriria a possibilidade de fazer as reformas que o Brasil almeja e ao mesmo tempo vão ficando em segundo plano, perdendo espaço para questões menores, sem grande comple-tude do ponto de vista dos desafios brasileiros.

ção e a reconfiguração qualitativa dos serviços públicos. Por que acredita que essas pautas devem ter a centralidade na reorientação política e econômica brasileira? Pochmann – Identifico esses dois caminhos como margeadores para o futuro do Brasil, imaginando a pers-pectiva de termos um país para todos, do ponto de vista da qualidade do emprego. Isso obviamente pressupõe um ritmo de expansão do país mais rapidamente e de melhor qualidade, e não há como pensar em uma econo-mia mais dinâmica sem o reforço industrial. Não acredito que podemos voltar à estrutura industrial que tive-mos nos anos 1970, início dos anos 1980, tão diversificada como era. Até porque o quadro internacional mudou, com o aparecimento das cadeias globais de valor, mas não há dúvida de que o Brasil possui comple-xos industriais de grande magnitude, que são fundamentais.

Hoje, todo investimento em pro-gresso técnico no mundo se concentra basicamente em três complexos importantes, que são o automobilísti-co, o farmacêutico e a tecnologia de informação e comunicação. Desses três, que respondem por 64% de todos os investimentos feitos em inovação no mundo, o Brasil tem dois setores muito fortes, que são o auto-mobilístico e o de fármacos, que vem crescendo, inclusive pela presença da empresa nacional, com os genéricos, que devem ganhar ainda mais impor-tância, inclusive no que diz respeito à pesquisa. O setor de tecnologia da informação ainda é um setor em desenvolvimento no Brasil. Portanto, temos condições concretas e objetivas e um mercado interno portentoso; temos a possibilidade de ganhar maior espaço no comércio externo, a partir desta capacidade de ampliar o valor agregado dessas cadeias pro-dutivas, assim como outras que nós já possuímos, como a indústria de defesa do Brasil e todo o setor de agronegócio, que também é uma referência de pujança. Então, o Brasil tem de fato condições para fortalecer o seu setor industrial em base mais sólida.

Ao mesmo tempo, devemos reconhecer que estamos

O Mito da Grande Classe MédiaMarcio PochmannBoitempo Editorial, 180p., 2014.

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 O pensamento do brasileiro é paradoxal em relação aos direitos sociais: de um lado, acredita que o Estado deve intervir para reduzir a pobreza; de outro, é contra a universalização de programas de transferência de renda e de garantias sociais. Nessa entrevista, a pesquisadora Lena Lavinas, coordenadora geral da pesquisa que deu origem ao livro “Percepções sobre desigualdade e pobreza: o que pensam os brasileiros da política social?”, publicado pelo Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento, busca explicar esse pensamento e compreender o que está implicado por detrás dele. Para ela, o paradoxo brasileiro é fruto de deficiências do Estado na implementação e operacionalização das políticas sociais, que não são pensadas com o caráter universalista e redistribuitivo que rege a Constituição. Ao contrário, são restritivas e condicionadas. Se o Estado fosse mais ousado no desenho de suas políticas, advoga, a população também avançaria em sua percepção social.

umos – O resulta-do da pesquisa, que indicou que os brasileiros são paradoxais quan-

do o assunto é presença do Estado e políticas universais, surpreendeu a equipe?Lena Lavinas – O que surpre-endeu foi a consistência dos paradoxos, porque não é uma ou outra dimensão que é contraditó-ria e paradoxal, são várias as dimensões contraditórias e para-doxais. Embora haja uma clara consciência de que o Estado tem um papel fundamental na pro-moção do desenvolvimento e de políticas mais igualitárias, as percepções ficam paradoxais quando se busca detalhar o grau que se espera que o Estado possa

operar. Acredito que duas coisas explicam isso.

De um lado, antes mesmo da década de 2000, o Brasil e a Amé-rica Latina em geral têm um traço muito marcante desse papel do Estado na garantia de certos padrões mínimos – o salário mínimo, por exemplo, é algo criado nas décadas de 1930 e 1940 em vários países latino-americanos e foi um mecanismo que, nessa última década, teve um papel dos mais relevantes não apenas no Brasil, mas na quase totalidade dos países latino-americanos, sobretudo na Amé-rica do Sul. Então, existe uma configuração clara para os brasi-leiros de que o Estado tem um papel motor na construção de uma institucionalidade forte,

tanto para o desenvolvimento econômico quanto para a redu-ção das desigualdades; ao mesmo tempo que a prática adotada pelo Estado de não fomentar políticas universais que dão igual acesso a todos os indivíduos mostra que a forma como o Estado brasileiro provê o acesso a essas políticas é que vai configurar também uma institucionalidade contraditória, que traz para os brasileiros uma impressão de que “já estamos dando o mínimo, o Bolsa Família, está bom”.

Na bibliografia internacional, já foi sistematizado e com-preendido que determinadas práticas e regras institucionais acabam orientando a percepção de como as ações devem se dar. Nesse sentido, sabemos que o Estado brasileiro é pouco redistributivo e extremamente regressivo na sua política fiscal e tributária. A maior parte dos mecanismos de prote-ção social que funcionam hoje, ou são contributivos, como a aposentadoria, que inclusive é reconhecida e defendida pelos brasileiros; ou são políticas assistenciais, como os programas de transferência de renda para os extremamente pobres, na condição que eles possam comprovar esse grau de destitui-ção. Mas, fora disso – políticas contributivas e assistenciais –, não existe uma compreensão de que o melhor seria que todos compartilhassem do mesmo grau e do mesmo tipo de bem-estar.

A forma como são desenhadas as políticas acaba por orientar a percepção dos indivíduos de que aquilo deve ser assim e não de outra maneira. Como no Brasil hoje a política social é essencialmente de base contributiva e assistencial, os brasileiros entendem que deve ser dessa maneira, pois é assim que funciona a institucionalidade da nossa política social, em total discordância com os marcos da Constituição de 1988, que tem uma dimensão universalista.

Rumos – Essa consistência dos paradoxos, que a senhora aponta, também aparece nos estudos realizados pelo mundo ou essa contradição é só nossa? Lena – O que se vê nos estudos internacionais é que as mulhe-res e as pessoas mais pobres tendem a ser mais favoráveis à redistribuição, e também os grupos étnicos mais desfavoreci-dos. Nesse sentido, aqui há um perfil muito convergente com o que mostram as pesquisas internacionais em termos de redistri-buição. O apoio à redistribuição tende a cair à medida que as pessoas ficam mais velhas, ele é maior entre os jovens e entre as pessoas de nível superior. Tudo isso realmente é convergente com o que se encontra em outros países. O que talvez seja sin-gular a nossa realidade é essa consistência dos paradoxos, que são muitos. Quer dizer, ao mesmo tempo que se é favorável ao Bolsa Família, não se quer melhorar a linha da pobreza, que todos reconhecem como baixa; ninguém quer elevar o benefí-cio, embora todos achem que o Bolsa Família não tire ninguém da pobreza. Então, são paradoxos. Ou seja, uma política não é eficiente para retirar da pobreza e tem uma linha de pobreza que é muito pobre e que, portanto, mantém grande parte na pobre-za, mas “bom, mas vamos deixar como está”.

Esse é o âmago do paradoxo, é o reconhecimento de que temos um nível de redistribuição que é baixo. O nosso patamar de redistribuição é muito baixo, tanto pelo perfil da política social, quanto pelo perfil das políticas tributárias que têm um papel muito relevante para promover a redistribuição. Todo mundo reconhece isso e quer progressividade, mas aparentemente, embo-ra dois terços se declarem de classe média, ninguém quer contri-buir para que isso mude. É como se fosse uma responsabilidade de outros. Existe certo pensamento de que: “isso é uma coisa que está acontecendo, mas eu não tenho nada a ver com isso”.

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 O pensamento do brasileiro é paradoxal em relação aos direitos sociais: de um lado, acredita que o Estado deve intervir para reduzir a pobreza; de outro, é contra a universalização de programas de transferência de renda e de garantias sociais. Nessa entrevista, a pesquisadora Lena Lavinas, coordenadora geral da pesquisa que deu origem ao livro “Percepções sobre desigualdade e pobreza: o que pensam os brasileiros da política social?”, publicado pelo Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento, busca explicar esse pensamento e compreender o que está implicado por detrás dele. Para ela, o paradoxo brasileiro é fruto de deficiências do Estado na implementação e operacionalização das políticas sociais, que não são pensadas com o caráter universalista e redistribuitivo que rege a Constituição. Ao contrário, são restritivas e condicionadas. Se o Estado fosse mais ousado no desenho de suas políticas, advoga, a população também avançaria em sua percepção social.

umos – O resulta-do da pesquisa, que indicou que os brasileiros são paradoxais quan-

do o assunto é presença do Estado e políticas universais, surpreendeu a equipe?Lena Lavinas – O que surpre-endeu foi a consistência dos paradoxos, porque não é uma ou outra dimensão que é contraditó-ria e paradoxal, são várias as dimensões contraditórias e para-doxais. Embora haja uma clara consciência de que o Estado tem um papel fundamental na pro-moção do desenvolvimento e de políticas mais igualitárias, as percepções ficam paradoxais quando se busca detalhar o grau que se espera que o Estado possa

operar. Acredito que duas coisas explicam isso.

De um lado, antes mesmo da década de 2000, o Brasil e a Amé-rica Latina em geral têm um traço muito marcante desse papel do Estado na garantia de certos padrões mínimos – o salário mínimo, por exemplo, é algo criado nas décadas de 1930 e 1940 em vários países latino-americanos e foi um mecanismo que, nessa última década, teve um papel dos mais relevantes não apenas no Brasil, mas na quase totalidade dos países latino-americanos, sobretudo na Amé-rica do Sul. Então, existe uma configuração clara para os brasi-leiros de que o Estado tem um papel motor na construção de uma institucionalidade forte,

tanto para o desenvolvimento econômico quanto para a redu-ção das desigualdades; ao mesmo tempo que a prática adotada pelo Estado de não fomentar políticas universais que dão igual acesso a todos os indivíduos mostra que a forma como o Estado brasileiro provê o acesso a essas políticas é que vai configurar também uma institucionalidade contraditória, que traz para os brasileiros uma impressão de que “já estamos dando o mínimo, o Bolsa Família, está bom”.

Na bibliografia internacional, já foi sistematizado e com-preendido que determinadas práticas e regras institucionais acabam orientando a percepção de como as ações devem se dar. Nesse sentido, sabemos que o Estado brasileiro é pouco redistributivo e extremamente regressivo na sua política fiscal e tributária. A maior parte dos mecanismos de prote-ção social que funcionam hoje, ou são contributivos, como a aposentadoria, que inclusive é reconhecida e defendida pelos brasileiros; ou são políticas assistenciais, como os programas de transferência de renda para os extremamente pobres, na condição que eles possam comprovar esse grau de destitui-ção. Mas, fora disso – políticas contributivas e assistenciais –, não existe uma compreensão de que o melhor seria que todos compartilhassem do mesmo grau e do mesmo tipo de bem-estar.

A forma como são desenhadas as políticas acaba por orientar a percepção dos indivíduos de que aquilo deve ser assim e não de outra maneira. Como no Brasil hoje a política social é essencialmente de base contributiva e assistencial, os brasileiros entendem que deve ser dessa maneira, pois é assim que funciona a institucionalidade da nossa política social, em total discordância com os marcos da Constituição de 1988, que tem uma dimensão universalista.

Rumos – Essa consistência dos paradoxos, que a senhora aponta, também aparece nos estudos realizados pelo mundo ou essa contradição é só nossa? Lena – O que se vê nos estudos internacionais é que as mulhe-res e as pessoas mais pobres tendem a ser mais favoráveis à redistribuição, e também os grupos étnicos mais desfavoreci-dos. Nesse sentido, aqui há um perfil muito convergente com o que mostram as pesquisas internacionais em termos de redistri-buição. O apoio à redistribuição tende a cair à medida que as pessoas ficam mais velhas, ele é maior entre os jovens e entre as pessoas de nível superior. Tudo isso realmente é convergente com o que se encontra em outros países. O que talvez seja sin-gular a nossa realidade é essa consistência dos paradoxos, que são muitos. Quer dizer, ao mesmo tempo que se é favorável ao Bolsa Família, não se quer melhorar a linha da pobreza, que todos reconhecem como baixa; ninguém quer elevar o benefí-cio, embora todos achem que o Bolsa Família não tire ninguém da pobreza. Então, são paradoxos. Ou seja, uma política não é eficiente para retirar da pobreza e tem uma linha de pobreza que é muito pobre e que, portanto, mantém grande parte na pobre-za, mas “bom, mas vamos deixar como está”.

Esse é o âmago do paradoxo, é o reconhecimento de que temos um nível de redistribuição que é baixo. O nosso patamar de redistribuição é muito baixo, tanto pelo perfil da política social, quanto pelo perfil das políticas tributárias que têm um papel muito relevante para promover a redistribuição. Todo mundo reconhece isso e quer progressividade, mas aparentemente, embo-ra dois terços se declarem de classe média, ninguém quer contri-buir para que isso mude. É como se fosse uma responsabilidade de outros. Existe certo pensamento de que: “isso é uma coisa que está acontecendo, mas eu não tenho nada a ver com isso”.

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regiões, são as áreas que eram menos desenvolvidas, e que tiveram maior taxa de crescimento no período recente – e não apenas mais programa social –, sobretudo o Nordeste, que se mostram mais favoráveis à redistribuição.

Rumos – A pesquisa também aponta que há uma quase unanimidade de que o governo deve intervir para reduzir a desigualdade. Foi uma das poucas questões com amplo apoio. De outro lado, há um mito

que se sustenta enquanto percep-ção da sociedade: a questão da geração de filhos como estratégia para aumentar a renda, embora isso não se apoie nos dados oficia-is. Existe uma assimetria na infor-mação a esse respeito?Lena – Não acredito que seja falha de comunicação, e sim justamente o fato de que as instituições não funcionam em favor da promoção da cidadania. Hoje qual é a institucionalidade mais forte que se tem em termos de política social no Brasil? Há o Instituto Nacio-nal de Seguridade Social (INSS), que é contributivo, e as pessoas entendem que é importante e acreditam no segu-ro social, mas de outro lado elas veem que qualquer outra política se não for contributiva deve ser uma política de mínimos sociais. Por quê? Porque só há essas duas alternativas. Na prática, é assim que a política social funciona no Brasil. Não existe a lógica da universa-lidade, da incondicionalidade, do aces-

so em função da cidadania. Como não operamos a política social dessa maneira, as pessoas não percebem que isso seja possível.

O que a pesquisa mostra é que a percepção dos brasilei-ros é, em grande medida, fruto da forma como são imple-mentadas e operacionalizadas as políticas. O Bolsa Famí-lia, por exemplo, possui um desenho como uma política residual, que garante um mínimo para os comprovada-mente pobres. O programa funcionou, as pessoas extre-mamente pobres estão sendo atendidas. A partir daí mui-tos pensam que isso é o suficiente, e o resto tem que ser garantido por esforço próprio; quando a nossa Constitui-ção diz outra coisa. Então o problema não é que exista a assimetria de informação ou que as pessoas desconheçam o que rege a legislação, mas sim que a institucionalidade foi debilitada.

Rumos – Outro ponto que chama a atenção é a percep-ção da população em relação à pobreza, pois há uma

Rumos – Apesar de o Brasil ser percebido como um país de grande desigualdade social, mais da metade da popu-lação mostra-se satisfeita com a sua vida. É possível entender esse indicador a partir dos paradoxos de que a senhora fala? Lena – Acredito que esse indicador reflete muito mais a mudança que ocorreu em termos de inclusão no mercado nos últimos anos no Brasil. O país se transformou numa sociedade de consumo de massa por meio do crescimento, geração de emprego e forte expansão do crédito, mas, sobretudo, essa inserção trouxe às pessoas a percepção de que a vida de fato melhorou. E se compararmos essa déca-da de 2000 com os anos 1980 e 1990, não há dúvida nenhuma. Não só o cresci-mento econômico foi superior, mas houve uma redução extraordinária da taxa de desemprego, crescimento da renda média, elevação do número de benefícios contributivos pagos à popula-ção, expansão do crédito etc. Então essa satisfação que as pessoas têm reflete uma mudança radical após um período de grande estagnação que foram os anos 1980 e 1990. A satisfação verificada na pesquisa expressa essa mudança em termos de indicadores econômicos e sociais e em termos de renda dos últimos anos.

Rumos – Esse cenário favorável influi no pensamento paradoxal do brasileiro ou é um pensamento de fundo, constituinte, que nos acom-panha desde sempre? Ou seja, a pesquisa é um retrato deste momento ou reflete algo mais profundo? Lena – Nesse momento, conseguimos captar um retrato: aplicou-se o questionário em final de 2012 e ele revelou o flap shop; quer dizer, eu tirei uma foto e o que se viu nela é que as pessoas se situam à frente de uma dinâmica de mudança, a um processo novo de mobilidade social ascendente, logo elas são otimistas. Acredito que se fosse reaplicado o questionário hoje, teríamos um quadro menos alvissareiro, pois há uma queda do ponto de vista do crescimento, praticamente zero este ano, o custo do dinheiro está aumentando, a restrição creditícia também vai aumentar, as pessoas certamente estão mais endividadas do que estavam antes. E também porque houve um momento de forte polarização social, que foram essas eleições.

O que o livro traz, e é muito convergente com a eleição, é justamente que, apesar de todos compreenderem que a desi-gualdade ainda é grande no país e de isso ser percebido por todos os indivíduos de todas as classes sociais em todas as

“Se o Estado fosse mais ousado no desenho das suas políticas sociais, talvez pudéssemos ter um apoio muito maior à política de caráter universal e a um sistema tributário mais redistributivo.”

“A instrução e os níveis crescentes de escolaridade contribuem para fortalecer a dimensão da redistribuição, dos bens públicos universais. O fator educacional pesa mais do que o corte regional”

ESPECIAL

sente em todas as regiões, pois todas elas possuem pessoas de maior e de menor renda. Não há padrões radicalmente dife-rentes, o que se vê é que, em algumas regiões, uma proporção maior de pessoas apoiam a redistribuição, uma redistribuição mais universalista e menos restritiva e con-dicionada, que é um pouco a conclusão do nosso trabalho.

A questão do Bolsa Família mostra que 42% aprovam o aumento do benefício e 42% desaprovam. Ou seja, o país está dividido. E aí não é uma questão de Norte e Sul, existe uma série de outras variáveis individuais, como idade, que vão nessa direção. A questão é menos Norte e Nor-deste, em que aparece realmente uma proporção maior de apoio a políticas mais universais, mas no geral essas clivagens se reproduzem no interior de todas as regiões. O fator educacional, de acesso ao nível superior, pesa mais do que o corte regional, por exemplo. A instrução e os níveis crescentes de escolaridade contribu-em para fortalecer a dimensão da redistri-buição, dos bens públicos universais.

Rumos – Qual a conclusão principal a que chegaram?

Lena – O estudo mostra que, na verdade, dada a baixa institucionalidade das políticas sociais de caráter mais universal e altamente redistributivas, os brasileiros em geral acabam menos sensíveis à possibilidade de mais igualdade. Os coeficientes de apoio à intervenção do Estado tendem a ser maiores nos grupos de menor renda nas regiões menos desen-volvidas, mas em todos os lugares as pessoas se posicionam frente àquilo que existe. E o que é que existe? A política social hoje no Brasil é contributiva – o INSS, que todo mundo defen-de, com as pensões e salários; ou é residual, como é o caso do Bolsa Família, e as pessoas tendem a apoiar o desenho do pro-grama justamente porque não conseguem vislumbrar se isso poderia ser diferente. Isso mostra que se o Estado fosse mais ousado no desenho das suas políticas sociais, talvez pudésse-mos ter um apoio muito maior à política de caráter universal, a um sistema tributário que também fosse mais redistributivo, pois hoje ele é bastante regressivo. E talvez o cidadão brasileiro médio, que apoia a intervenção do Estado, fosse mais compro-metido com uma provisão pública universal, que é justamente a dimensão menos evidente no resultado final da pesquisa. Ou seja, somos pouco solidários e achamos que a política social deve ser condicionada, residual ou contributiva. Acredito que isso reflete o abandono das políticas universais no país nos últimos anos, essa é a percepção dos brasileiros.

cisão: 23% creditam à falta de opor-tunidades, 24% ficaram neutros e outros 27% falam em “falta de inte-resse em correr atrás”. O que esses números revelam?Lena – Vemos que, na verdade, um quarto acha que as pessoas são pobres por falta de oportunidades, um quarto é indiferente, outro quarto acha que as pessoas não querem se esforçar, e outro quarto não pensa nada. Existe uma distribuição mais ou menos homo-gênea, não tem uma visão que predo-mine, embora sobressaia a impressão, nessa fase recente em que a economia está crescendo, de uma certa surpresa: “Ah, ainda tem gente pobre?”. A per-cepção é de que a responsabilidade é da pessoa, que não estaria se esforçando o suficiente. Rumos – E rejeitam a renda da cidadania, já garantida por lei...Lena – Porque isso nunca foi imple-mentado. A lei foi aprovada em 2004, mas ninguém sabe que ela existe, e a maioria da população brasileira é radi-calmente contra. O que mostra que é justamente o Estado, ao desenhar as políticas sociais, que consolida ou não determinadas políticas já aprovadas que fazem parte da institu-cionalidade do Brasil. A população é radicalmente contra muito mais por ignorar, pois quando o papel de tornar factível coisas novas e prover oportunidades mais igualitárias para todos não é preenchido pelo Estado, a percepção da popula-ção também retrocede. A institucionalidade da política social é muito forte para configurar a percepção que as pessoas têm das coisas. Ora, como existe uma lei de cidadania que foi vota-da, mas nunca foi implementada, então é porque ela não tem relevância, não se adapta, não era factível e deve ser descartada. Isso mostra quão importante é o Estado honrar seus próprios compromissos em termos de cidadania com a população.

Rumos – Em que medida a pesquisa ajuda a compreen-der melhor as últimas eleições? Lena – A pesquisa mostra que em todas as regiões do Brasil o apoio às medidas de caráter redistributivo foi importante. Agora, as regiões menos desenvolvidas como Norte e Nor-deste mostraram uma proporção de apoio superior àquelas que têm renda mais alta. Os brasileiros em todas as regiões reconhecem o papel do governo na questão da desigualdade, que o Estado é um ator fundamental e se quiser acabar com a pobreza, ele seria capaz de fazê-lo. Essa percepção está pre-

Percepções sobre desigualdade e pobreza: o que pensam os brasileiros da política social?Lena Lavinas (coord.), Barbara Cobo, Fabio Waltenberg, Alinne Veiga, Yasmín Salazar MendesCentro Internacional Celso Furtado, 172p., 2014.

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regiões, são as áreas que eram menos desenvolvidas, e que tiveram maior taxa de crescimento no período recente – e não apenas mais programa social –, sobretudo o Nordeste, que se mostram mais favoráveis à redistribuição.

Rumos – A pesquisa também aponta que há uma quase unanimidade de que o governo deve intervir para reduzir a desigualdade. Foi uma das poucas questões com amplo apoio. De outro lado, há um mito

que se sustenta enquanto percep-ção da sociedade: a questão da geração de filhos como estratégia para aumentar a renda, embora isso não se apoie nos dados oficia-is. Existe uma assimetria na infor-mação a esse respeito?Lena – Não acredito que seja falha de comunicação, e sim justamente o fato de que as instituições não funcionam em favor da promoção da cidadania. Hoje qual é a institucionalidade mais forte que se tem em termos de política social no Brasil? Há o Instituto Nacio-nal de Seguridade Social (INSS), que é contributivo, e as pessoas entendem que é importante e acreditam no segu-ro social, mas de outro lado elas veem que qualquer outra política se não for contributiva deve ser uma política de mínimos sociais. Por quê? Porque só há essas duas alternativas. Na prática, é assim que a política social funciona no Brasil. Não existe a lógica da universa-lidade, da incondicionalidade, do aces-

so em função da cidadania. Como não operamos a política social dessa maneira, as pessoas não percebem que isso seja possível.

O que a pesquisa mostra é que a percepção dos brasilei-ros é, em grande medida, fruto da forma como são imple-mentadas e operacionalizadas as políticas. O Bolsa Famí-lia, por exemplo, possui um desenho como uma política residual, que garante um mínimo para os comprovada-mente pobres. O programa funcionou, as pessoas extre-mamente pobres estão sendo atendidas. A partir daí mui-tos pensam que isso é o suficiente, e o resto tem que ser garantido por esforço próprio; quando a nossa Constitui-ção diz outra coisa. Então o problema não é que exista a assimetria de informação ou que as pessoas desconheçam o que rege a legislação, mas sim que a institucionalidade foi debilitada.

Rumos – Outro ponto que chama a atenção é a percep-ção da população em relação à pobreza, pois há uma

Rumos – Apesar de o Brasil ser percebido como um país de grande desigualdade social, mais da metade da popu-lação mostra-se satisfeita com a sua vida. É possível entender esse indicador a partir dos paradoxos de que a senhora fala? Lena – Acredito que esse indicador reflete muito mais a mudança que ocorreu em termos de inclusão no mercado nos últimos anos no Brasil. O país se transformou numa sociedade de consumo de massa por meio do crescimento, geração de emprego e forte expansão do crédito, mas, sobretudo, essa inserção trouxe às pessoas a percepção de que a vida de fato melhorou. E se compararmos essa déca-da de 2000 com os anos 1980 e 1990, não há dúvida nenhuma. Não só o cresci-mento econômico foi superior, mas houve uma redução extraordinária da taxa de desemprego, crescimento da renda média, elevação do número de benefícios contributivos pagos à popula-ção, expansão do crédito etc. Então essa satisfação que as pessoas têm reflete uma mudança radical após um período de grande estagnação que foram os anos 1980 e 1990. A satisfação verificada na pesquisa expressa essa mudança em termos de indicadores econômicos e sociais e em termos de renda dos últimos anos.

Rumos – Esse cenário favorável influi no pensamento paradoxal do brasileiro ou é um pensamento de fundo, constituinte, que nos acom-panha desde sempre? Ou seja, a pesquisa é um retrato deste momento ou reflete algo mais profundo? Lena – Nesse momento, conseguimos captar um retrato: aplicou-se o questionário em final de 2012 e ele revelou o flap shop; quer dizer, eu tirei uma foto e o que se viu nela é que as pessoas se situam à frente de uma dinâmica de mudança, a um processo novo de mobilidade social ascendente, logo elas são otimistas. Acredito que se fosse reaplicado o questionário hoje, teríamos um quadro menos alvissareiro, pois há uma queda do ponto de vista do crescimento, praticamente zero este ano, o custo do dinheiro está aumentando, a restrição creditícia também vai aumentar, as pessoas certamente estão mais endividadas do que estavam antes. E também porque houve um momento de forte polarização social, que foram essas eleições.

O que o livro traz, e é muito convergente com a eleição, é justamente que, apesar de todos compreenderem que a desi-gualdade ainda é grande no país e de isso ser percebido por todos os indivíduos de todas as classes sociais em todas as

“Se o Estado fosse mais ousado no desenho das suas políticas sociais, talvez pudéssemos ter um apoio muito maior à política de caráter universal e a um sistema tributário mais redistributivo.”

“A instrução e os níveis crescentes de escolaridade contribuem para fortalecer a dimensão da redistribuição, dos bens públicos universais. O fator educacional pesa mais do que o corte regional”

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sente em todas as regiões, pois todas elas possuem pessoas de maior e de menor renda. Não há padrões radicalmente dife-rentes, o que se vê é que, em algumas regiões, uma proporção maior de pessoas apoiam a redistribuição, uma redistribuição mais universalista e menos restritiva e con-dicionada, que é um pouco a conclusão do nosso trabalho.

A questão do Bolsa Família mostra que 42% aprovam o aumento do benefício e 42% desaprovam. Ou seja, o país está dividido. E aí não é uma questão de Norte e Sul, existe uma série de outras variáveis individuais, como idade, que vão nessa direção. A questão é menos Norte e Nor-deste, em que aparece realmente uma proporção maior de apoio a políticas mais universais, mas no geral essas clivagens se reproduzem no interior de todas as regiões. O fator educacional, de acesso ao nível superior, pesa mais do que o corte regional, por exemplo. A instrução e os níveis crescentes de escolaridade contribu-em para fortalecer a dimensão da redistri-buição, dos bens públicos universais.

Rumos – Qual a conclusão principal a que chegaram?

Lena – O estudo mostra que, na verdade, dada a baixa institucionalidade das políticas sociais de caráter mais universal e altamente redistributivas, os brasileiros em geral acabam menos sensíveis à possibilidade de mais igualdade. Os coeficientes de apoio à intervenção do Estado tendem a ser maiores nos grupos de menor renda nas regiões menos desen-volvidas, mas em todos os lugares as pessoas se posicionam frente àquilo que existe. E o que é que existe? A política social hoje no Brasil é contributiva – o INSS, que todo mundo defen-de, com as pensões e salários; ou é residual, como é o caso do Bolsa Família, e as pessoas tendem a apoiar o desenho do pro-grama justamente porque não conseguem vislumbrar se isso poderia ser diferente. Isso mostra que se o Estado fosse mais ousado no desenho das suas políticas sociais, talvez pudésse-mos ter um apoio muito maior à política de caráter universal, a um sistema tributário que também fosse mais redistributivo, pois hoje ele é bastante regressivo. E talvez o cidadão brasileiro médio, que apoia a intervenção do Estado, fosse mais compro-metido com uma provisão pública universal, que é justamente a dimensão menos evidente no resultado final da pesquisa. Ou seja, somos pouco solidários e achamos que a política social deve ser condicionada, residual ou contributiva. Acredito que isso reflete o abandono das políticas universais no país nos últimos anos, essa é a percepção dos brasileiros.

cisão: 23% creditam à falta de opor-tunidades, 24% ficaram neutros e outros 27% falam em “falta de inte-resse em correr atrás”. O que esses números revelam?Lena – Vemos que, na verdade, um quarto acha que as pessoas são pobres por falta de oportunidades, um quarto é indiferente, outro quarto acha que as pessoas não querem se esforçar, e outro quarto não pensa nada. Existe uma distribuição mais ou menos homo-gênea, não tem uma visão que predo-mine, embora sobressaia a impressão, nessa fase recente em que a economia está crescendo, de uma certa surpresa: “Ah, ainda tem gente pobre?”. A per-cepção é de que a responsabilidade é da pessoa, que não estaria se esforçando o suficiente. Rumos – E rejeitam a renda da cidadania, já garantida por lei...Lena – Porque isso nunca foi imple-mentado. A lei foi aprovada em 2004, mas ninguém sabe que ela existe, e a maioria da população brasileira é radi-calmente contra. O que mostra que é justamente o Estado, ao desenhar as políticas sociais, que consolida ou não determinadas políticas já aprovadas que fazem parte da institu-cionalidade do Brasil. A população é radicalmente contra muito mais por ignorar, pois quando o papel de tornar factível coisas novas e prover oportunidades mais igualitárias para todos não é preenchido pelo Estado, a percepção da popula-ção também retrocede. A institucionalidade da política social é muito forte para configurar a percepção que as pessoas têm das coisas. Ora, como existe uma lei de cidadania que foi vota-da, mas nunca foi implementada, então é porque ela não tem relevância, não se adapta, não era factível e deve ser descartada. Isso mostra quão importante é o Estado honrar seus próprios compromissos em termos de cidadania com a população.

Rumos – Em que medida a pesquisa ajuda a compreen-der melhor as últimas eleições? Lena – A pesquisa mostra que em todas as regiões do Brasil o apoio às medidas de caráter redistributivo foi importante. Agora, as regiões menos desenvolvidas como Norte e Nor-deste mostraram uma proporção de apoio superior àquelas que têm renda mais alta. Os brasileiros em todas as regiões reconhecem o papel do governo na questão da desigualdade, que o Estado é um ator fundamental e se quiser acabar com a pobreza, ele seria capaz de fazê-lo. Essa percepção está pre-

Percepções sobre desigualdade e pobreza: o que pensam os brasileiros da política social?Lena Lavinas (coord.), Barbara Cobo, Fabio Waltenberg, Alinne Veiga, Yasmín Salazar MendesCentro Internacional Celso Furtado, 172p., 2014.

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RUMOS – 36 – Novembro/Dezembro 2014 RUMOS – 37 – Novembro/Dezembro 2014

Se é fato que vivemos em um país onde “a democracia está acima de qualquer suspeita”, para a cientista política Maria Celina Soares D’Araujo o país ainda tem grandes desafios a superar no presente. Mais de 30 anos após a promulgação da chamada Constituição Cidadã, ela acredita que a Carta ainda está longe de ser implementada, especialmente no que diz respeito a alguns de seus pilares básicos: a participação social nas decisões de políticas públicas, a garantia plena dos direitos sociais e a transparência dos gastos públicos. Em recente pesquisa, exposta junto a outros oito artigos no livro “Redemocratização e Mudança Social no Brasil”, Maria Celina lembra que a elite dirigente do Executivo brasileiro (e ainda mais o Legislativo, como explica nessa entrevista) ainda se ressente de negros e mulheres em sua composição. É um sinal da intensidade da nossa democracia?

umos – Rede-mocratização e Mudança Soci-al no Brasi l é uma obra eclé-

tica, com textos sobre edu-cação, desigualdade, gêne-ro, violência, movimentos sociais, política, cidade. Qual é o tecido comum en t r e e sses a r t igos de temas tão diversos? Maria Celina D’Araujo – O que há de comum em todos esses textos é que o grupo de professores trabalha na Pontifí-cia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e que está publicando suas investiga-ções para questões da agenda social, da agenda política depois da redemocratização. É um Div

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livro que leva em conta as mudanças nas políticas socia-is, de gênero, de educação, na questão do federalismo, na questão das mulheres especifi-camente e da violência, nos movimentos sociais que ganharam as primeiras pági-nas dos jornais no ano passa-do, na questão da cidade, que tem a ver com os movimentos sociais porque as cidades estão esclerosadas.

É um livro que reúne uma série de artigos de professores que estão pensando sobre essa esclerose da democracia na atualidade, no sentido não de que ela está falhando, mas no sentido de que ela precisa ter mais respostas rápidas. O objetivo do livro é esse: fazer

um balanço do quanto a sociedade está satisfeita com as políti-cas sociais e por outro lado sobre quais são as políticas sociais que o Estado vem oferecendo. Há em comum em todo o livro a ideia de que o Brasil tem melhorado obviamente depois da ditadura, a democracia está acima de qualquer suspeita, e mos-tramos isso. Ao mesmo tempo, identificamos quais são os calcanhares de Aquiles, os problemas que ainda precisam ser enfrentados com a maior garra.

Rumos – E quais são esses problemas? Na sua avalia-ção, quais são os desafios centrais que precisam ser enfrentados nesse momento?Maria Celina – Os problemas a serem enfrentados com maior garra e fibra são os da transparência dos gastos públi-cos, especialmente dos gastos nas áreas sociais e de investi-mentos econômicos. Também a transparência nas políticas de segurança, porque há um misto, um mix em que o Exército ajuda com a Polícia Militar e ao mesmo tempo a polícia conti-nua em aliança com os traficantes, pelo menos nas grandes metrópoles, como o Rio de Janeiro. E há um problema sério, que é sobre como prestar contas. O que normalmente o governo tem feito é dizer: “Nós gastamos tanto em educação, tanto em saúde tanto em habitação”. Esse é o discurso de todos os governos, mas queremos ir além disso.

Não é quanto se gasta, é como se gasta, onde se gasta e a

qualidade desse gasto. Não adianta falar “gastamos tantos milhões em moradia popular” sem indicar o que isso significou efetivamente para o bem-estar da população. É interessante frisar que estas questões são típicas da democracia, só numa democracia somos capazes de fazer essas perguntas: se estamos gastando bem e não simplesmente quanto estamos gastando. É isso que o livro faz na área fiscal, na questão do federalismo, da educação, do Bolsa Família, dos cargos de confiança... Qual é a qualidade dos gastos nessas áreas todas? Porque o quantitativo não é mais suficiente para se explicar o sucesso de um governo: gastamos tanto, investimos tantos milhões. Estamos numa fase mais qualitativa, de entendermos quais são os ganhos efetivos para a população de cada uma dessas políticas.

Rumos – A Constituição de 1988 consolida o processo de redemocratização e apresenta dois pilares, que são a con-sagração dos direitos civis e a participação da sociedade na formulação das políticas públicas. Como é que a senhora avalia esses dois pontos específicos: o quanto nós conseguimos avançar, especialmente na participação social nos espaços de decisões políticas? Maria Celina – A Constituição de 1988 é realmente um docu-mento fundador da democracia brasileira, mas que está muito longe de ser implementada. Ela é ainda um projeto, não está sendo implementada em toda sua vitalidade, mas certamente

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ESPECIAL

A CAMINHO DA DEMOCRACIA PLENA

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Se é fato que vivemos em um país onde “a democracia está acima de qualquer suspeita”, para a cientista política Maria Celina Soares D’Araujo o país ainda tem grandes desafios a superar no presente. Mais de 30 anos após a promulgação da chamada Constituição Cidadã, ela acredita que a Carta ainda está longe de ser implementada, especialmente no que diz respeito a alguns de seus pilares básicos: a participação social nas decisões de políticas públicas, a garantia plena dos direitos sociais e a transparência dos gastos públicos. Em recente pesquisa, exposta junto a outros oito artigos no livro “Redemocratização e Mudança Social no Brasil”, Maria Celina lembra que a elite dirigente do Executivo brasileiro (e ainda mais o Legislativo, como explica nessa entrevista) ainda se ressente de negros e mulheres em sua composição. É um sinal da intensidade da nossa democracia?

umos – Rede-mocratização e Mudança Soci-al no Brasi l é uma obra eclé-

tica, com textos sobre edu-cação, desigualdade, gêne-ro, violência, movimentos sociais, política, cidade. Qual é o tecido comum en t r e e sses a r t igos de temas tão diversos? Maria Celina D’Araujo – O que há de comum em todos esses textos é que o grupo de professores trabalha na Pontifí-cia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e que está publicando suas investiga-ções para questões da agenda social, da agenda política depois da redemocratização. É um D

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livro que leva em conta as mudanças nas políticas socia-is, de gênero, de educação, na questão do federalismo, na questão das mulheres especifi-camente e da violência, nos movimentos sociais que ganharam as primeiras pági-nas dos jornais no ano passa-do, na questão da cidade, que tem a ver com os movimentos sociais porque as cidades estão esclerosadas.

É um livro que reúne uma série de artigos de professores que estão pensando sobre essa esclerose da democracia na atualidade, no sentido não de que ela está falhando, mas no sentido de que ela precisa ter mais respostas rápidas. O objetivo do livro é esse: fazer

um balanço do quanto a sociedade está satisfeita com as políti-cas sociais e por outro lado sobre quais são as políticas sociais que o Estado vem oferecendo. Há em comum em todo o livro a ideia de que o Brasil tem melhorado obviamente depois da ditadura, a democracia está acima de qualquer suspeita, e mos-tramos isso. Ao mesmo tempo, identificamos quais são os calcanhares de Aquiles, os problemas que ainda precisam ser enfrentados com a maior garra.

Rumos – E quais são esses problemas? Na sua avalia-ção, quais são os desafios centrais que precisam ser enfrentados nesse momento?Maria Celina – Os problemas a serem enfrentados com maior garra e fibra são os da transparência dos gastos públi-cos, especialmente dos gastos nas áreas sociais e de investi-mentos econômicos. Também a transparência nas políticas de segurança, porque há um misto, um mix em que o Exército ajuda com a Polícia Militar e ao mesmo tempo a polícia conti-nua em aliança com os traficantes, pelo menos nas grandes metrópoles, como o Rio de Janeiro. E há um problema sério, que é sobre como prestar contas. O que normalmente o governo tem feito é dizer: “Nós gastamos tanto em educação, tanto em saúde tanto em habitação”. Esse é o discurso de todos os governos, mas queremos ir além disso.

Não é quanto se gasta, é como se gasta, onde se gasta e a

qualidade desse gasto. Não adianta falar “gastamos tantos milhões em moradia popular” sem indicar o que isso significou efetivamente para o bem-estar da população. É interessante frisar que estas questões são típicas da democracia, só numa democracia somos capazes de fazer essas perguntas: se estamos gastando bem e não simplesmente quanto estamos gastando. É isso que o livro faz na área fiscal, na questão do federalismo, da educação, do Bolsa Família, dos cargos de confiança... Qual é a qualidade dos gastos nessas áreas todas? Porque o quantitativo não é mais suficiente para se explicar o sucesso de um governo: gastamos tanto, investimos tantos milhões. Estamos numa fase mais qualitativa, de entendermos quais são os ganhos efetivos para a população de cada uma dessas políticas.

Rumos – A Constituição de 1988 consolida o processo de redemocratização e apresenta dois pilares, que são a con-sagração dos direitos civis e a participação da sociedade na formulação das políticas públicas. Como é que a senhora avalia esses dois pontos específicos: o quanto nós conseguimos avançar, especialmente na participação social nos espaços de decisões políticas? Maria Celina – A Constituição de 1988 é realmente um docu-mento fundador da democracia brasileira, mas que está muito longe de ser implementada. Ela é ainda um projeto, não está sendo implementada em toda sua vitalidade, mas certamente

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precisamos enfrentar. Não é que estejamos numa encruzilha-da. O Brasil não está numa encruzilhada, o país está andando, mas tem que enfrentar alguns desafios para poder continuar a melhorar.

Rumos – Especificamente na sua pesquisa, que está exposta em um artigo no fim do livro, a senhora traz dados que ajudam a desfazer aquilo que o economista Luiz Carlos Bresser-Pereira chamou de “mito de Brasí-lia”, essa ideia um pouco cristalizada de que os cargos comissionados de dirigentes públicos são todos frutos de nomeação partidária e clientelista. Por que essa ideia

permanece tão forte?Maria Celina – Depois da Constitui-ção, é criada uma carreira de serviço público muito rigorosa. Todos os funcionários públicos entram por concurso e seguem uma carreira espe-cificada, que tem determinados cargos e procedimentos para galgar outras posições. Nessa situação, os cargos de confiança se tornam necessários para, por exemplo, trazer uma pessoa que estava no Ministério da Agricultura como técnico de assuntos agrícolas para ser assessor do ministro. Dar um cargo de confiança é dar um passapor-te para que a pessoa possa pular posi-ções, essa é uma forma de contornar todos os detalhamentos das carreiras do serviço público. Isso de um lado é muito positivo – o ministro que chega, ou o presidente da República, pode pinçar dentro do serviço público as pessoas que julga importante estar ao seu lado e levá-las para sua equipe. É uma forma de resolver o problema da rigidez burocrática que se tem hoje. Isso é importante nos altos escalões do governo federal, nas secretárias execu-tivas, nas assessorias dos ministérios,

para ter essa flexibilidade e trazer pessoas que estão em outro ministério ou até mesmo no mercado, pois a ideia do cargo de direção e assessoramento é justamente trazer pessoas que estejam no serviço público ou na iniciativa privada para pres-tarem o serviço para o órgão público por um determinado tempo.

A questão é que isso é importante no topo da carreira, nos cargos de dirigentes, de pessoas que executam despesas e implementam políticas públicas. Esse grupo não passa de três mil pessoas. Só que temos 23 mil cargos de confiança no país. Há cargos de confiança que não fazem muito sentido. Creio que lá no topo faz sentido, são as pessoas que o governo

coleta no serviço público e no mercado, para dizer “essas são as pessoas que eu quero ter a meu lado”. O “mito de Brasília”, que o Bresser-Pereira fala, é achar que essas pessoas chega-ram lá por favor. Não, elas chegam lá por competência, obvia-mente afinadas com o projeto político.

Só que, além dessas três mil pessoas, que precisam estar lá porque estão afinadas com o projeto político, existem mais 20 mil que não têm muita razão de ser, e é acomodação política mesmo. São pessoas que têm cargos de secretaria, chefia de motorista, coordenação de motorista, coordena-ção de folha de ponto, enfim, que não têm muito a ver. Em vários países, todos democratas, há uma margem de liberda-de para que o governo possa compor sua equipe e não fique só amarrado naquelas pessoas que foram concursadas; é importante que cada governo tenha uma margem de liberda-de para formar suas equipes. O exagero no Brasil é que não precisamos ter 23 mil pessoas. Precisamos – e vamos ser generosos – de três mil, mas o resto é acomodação de com-promisso de campanha, de alianças, enfim.

Rumos – No que a senhora classifica de “elite dirigente do Poder Executivo”, que são essas funções de con-fiança nos altos escalões, ainda existe uma baixa parti-cipação feminina e de não brancos. Isso revela algo sobre a intensidade da democracia brasileira e sobre o longo percurso que ainda temos para caminhar? Maria Celina – Se observarmos ao longo dos governos Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, vemos que está melhorando. A participa-ção de mulheres e de negros ainda é uma proporção muito pequena, uma vez que metade da população são mulheres e a outra metade são negros, mas está aumentando. Nesse extrato superior já tem 25% de mulheres e 10% de negros. Mas, certamente, esses dados são muito reveladores do quanto a sociedade brasileira é excludente. Excludente do ponto de vista étnico e de gênero.

Não podemos dizer que é um apartheid étnico, mas é um problema muito grande a situação de negros e de mulheres na política e nos cargos públicos. Só que o mais incrível é que esses dados do Poder Executivo que mostro na minha pes-

quisa são muito mais animadores do que se olharmos o Legis-lativo. Há, apenas, 3% de negros e 9% de mulheres no Con-gresso. Então, o Poder Executivo com essas nomeações para cargos de direção acaba tendo o resultado mais democrático da participação feminina e de setores étnicos diferenciáveis. Isso é uma coisa muito interessante no Brasil: se olharmos os minis-térios do governo Lula – não os do Fernando Henrique, pois era um ministério de homens brancos –, mas se olharmos o ministério do Lula, da Dilma, vamos ver que é um ministério que tem negros, tem mulheres, mas o Congresso Nacional é igual como era no Fernando Henrique: tem 9% de mulheres e 3% de negros. Por que tem mais negros no Executivo? Porque o presidente da República pode nomear. Por que tem menos negros no Congresso? Porque depende da eleição, e fazer eleição no Brasil é muito mais difícil: ser candidato, ser indica-do, ter dinheiro para fazer uma campanha, conseguir recursos. Tudo isso é mais difícil tanto para os negros quanto para as mulheres. Logo, temos uma distorção de representação muito mais forte no Legislativo, que não avança.

Em 2002, quando Lula foi eleito, a participação de mulhe-res no Congresso era a que temos até hoje. Se olharmos para o ministério, cresceu; para o Congresso, parou. Por que parou no Congresso? Porque no Congresso depende de outras políticas que não a vontade do presidente e o arbítrio do presidente dizendo “eu quero nomear a Marta Suplicy, a Benedita da Silva, o Joaquim Barbosa para o Supremo Tribunal Federal”. Quan-do depende de uma eleição, de indicação de partidos que mobi-lize a sociedade, as mulheres e os negros continuam lá nos raios do chão.

Rumos – É um retrato do que ocorre em outros setores da nossa sociedade?Maria Celina – É um retrato da inércia da nossa sociedade de tocar nos pontos-chaves. Pontos como a implementação de uma política de gênero para as mulheres na política representa-tiva, não apenas no ministério. No ministério é indicação polí-tica do presidente. É implementar uma política pública para as mulheres no poder representativo e para os negros também; não tem política nesse sentido. Aliás, os financiamentos das mulheres são menores, dos negros são menores e assim por diante. Há uma desigualdade estrutural na sociedade brasileira, especialmente quando se trata da incorporação dos mais pobres, e os mais pobres são negros, e quando se trata da incor-poração dos que têm menos poder, no caso as mulheres. Esses são problemas estruturais que precisam de políticas de Estado para serem alterados, o Estado tem que participar disso. Assim como hoje já tem a política de cotas, que é uma forma de fazer os afrodescendentes entrarem na escola, como temos uma política de cotas para as mulheres no serviço público federal, também precisamos fazer ações afirmativas para termos uma sociedade mais igualitária. Uma sociedade mais igualitária no sentido de que quando vier uma eleição todos possam concor-rer em igualdade mínima de condições.

é um marco e para se fazer qualquer mudança na Constituição temos que pensar muito, porque é efetivamente uma Carta segura. Quanto à participação popular, creio que o documen-to já estabeleceu uma série de mecanismos: a ação direta de inconstitucionalidade, o plebiscito, o referendo, a ação popu-lar. Há uma série de possibilidades para que a sociedade inter-pele e questione o poder público acerca de coisas que foram feitas ou que deixaram de ser feitas. Não creio que se precise de mais arranjos de consulta popular, precisamos é de fortale-cer o poder do Congresso, o poder da democracia representa-tiva pari passu à participação da sociedade. Esse equilíbrio tem que existir. A democracia representativa – ou seja, o Congres-so, assembleias estaduais, municipais – tem que continuar existindo porque ela não é perfeita, mas sem ela tudo será pior.

Então, em concomitância à existên-cia dessa democracia formal e repre-sentativa, temos que incentivar uma forma de democracia direta e participa-tiva, mas isso tem que ser feito de uma forma cooperativa. Não é para uma se contrapor à outra, senão entramos numa competição um pouco antropo-fágica. Ter conselhos, assembleias populares, conselhos de bairro, conse-lhos de saúde etc., é muito importante e já existem muitos. Desse ponto de vista, o Brasil tem uma renda organiza-tiva fabulosa. Isso pode ser fortalecido, mas não significa que deva se desvalori-zar o Congresso.

O meu único problema é esse, quan-do algumas pessoas dizem que para fortalecer esses grupos comunitários temos que desvalorizar o Congresso. Os dois têm que ser igualmente valoriza-dos. Se olharmos para o mundo inteiro, as democracias estáveis e os governos que respeitam os direitos políticos, sociais e econômicos das pessoas, prati-cam a democracia representativa. E isso se dá também por plebiscitos e consultas que são necessárias. Nós, no Rio de Jane-iro, por exemplo, não fomos consultados se queríamos Olim-píadas. Acho fundamental que se faça consulta sobre certos temas que implicam em a população colocar dinheiro do seu bolso para eventos que o governo quer promover.

As duas ações têm que existir: um Congresso funcionando para a rotina das questões do Estado e dos grandes projetos, mas tem que ouvir a sociedade para haver também essa chama-da democracia participativa. As duas maneiras complementares de fazer democracia – a representativa e a direta –, são impor-tantes, é sobre isso que o livro está falando. São problemas que

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“Não é quanto se gasta, é como se gasta, onde se gasta e a qualidade desse gasto. Não adianta falar 'gastamos tantos milhões em moradia popular' sem indicar o que isso significou efetivamente para o bem-estar da população.”

Redemocratização e MudançaSocial no BrasilMaria Celina D´Araujo (org.)FGV, 232p., 2014.

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RUMOS – 38 – Novembro/Dezembro 2014 RUMOS – 39 – Novembro/Dezembro 2014

precisamos enfrentar. Não é que estejamos numa encruzilha-da. O Brasil não está numa encruzilhada, o país está andando, mas tem que enfrentar alguns desafios para poder continuar a melhorar.

Rumos – Especificamente na sua pesquisa, que está exposta em um artigo no fim do livro, a senhora traz dados que ajudam a desfazer aquilo que o economista Luiz Carlos Bresser-Pereira chamou de “mito de Brasí-lia”, essa ideia um pouco cristalizada de que os cargos comissionados de dirigentes públicos são todos frutos de nomeação partidária e clientelista. Por que essa ideia

permanece tão forte?Maria Celina – Depois da Constitui-ção, é criada uma carreira de serviço público muito rigorosa. Todos os funcionários públicos entram por concurso e seguem uma carreira espe-cificada, que tem determinados cargos e procedimentos para galgar outras posições. Nessa situação, os cargos de confiança se tornam necessários para, por exemplo, trazer uma pessoa que estava no Ministério da Agricultura como técnico de assuntos agrícolas para ser assessor do ministro. Dar um cargo de confiança é dar um passapor-te para que a pessoa possa pular posi-ções, essa é uma forma de contornar todos os detalhamentos das carreiras do serviço público. Isso de um lado é muito positivo – o ministro que chega, ou o presidente da República, pode pinçar dentro do serviço público as pessoas que julga importante estar ao seu lado e levá-las para sua equipe. É uma forma de resolver o problema da rigidez burocrática que se tem hoje. Isso é importante nos altos escalões do governo federal, nas secretárias execu-tivas, nas assessorias dos ministérios,

para ter essa flexibilidade e trazer pessoas que estão em outro ministério ou até mesmo no mercado, pois a ideia do cargo de direção e assessoramento é justamente trazer pessoas que estejam no serviço público ou na iniciativa privada para pres-tarem o serviço para o órgão público por um determinado tempo.

A questão é que isso é importante no topo da carreira, nos cargos de dirigentes, de pessoas que executam despesas e implementam políticas públicas. Esse grupo não passa de três mil pessoas. Só que temos 23 mil cargos de confiança no país. Há cargos de confiança que não fazem muito sentido. Creio que lá no topo faz sentido, são as pessoas que o governo

coleta no serviço público e no mercado, para dizer “essas são as pessoas que eu quero ter a meu lado”. O “mito de Brasília”, que o Bresser-Pereira fala, é achar que essas pessoas chega-ram lá por favor. Não, elas chegam lá por competência, obvia-mente afinadas com o projeto político.

Só que, além dessas três mil pessoas, que precisam estar lá porque estão afinadas com o projeto político, existem mais 20 mil que não têm muita razão de ser, e é acomodação política mesmo. São pessoas que têm cargos de secretaria, chefia de motorista, coordenação de motorista, coordena-ção de folha de ponto, enfim, que não têm muito a ver. Em vários países, todos democratas, há uma margem de liberda-de para que o governo possa compor sua equipe e não fique só amarrado naquelas pessoas que foram concursadas; é importante que cada governo tenha uma margem de liberda-de para formar suas equipes. O exagero no Brasil é que não precisamos ter 23 mil pessoas. Precisamos – e vamos ser generosos – de três mil, mas o resto é acomodação de com-promisso de campanha, de alianças, enfim.

Rumos – No que a senhora classifica de “elite dirigente do Poder Executivo”, que são essas funções de con-fiança nos altos escalões, ainda existe uma baixa parti-cipação feminina e de não brancos. Isso revela algo sobre a intensidade da democracia brasileira e sobre o longo percurso que ainda temos para caminhar? Maria Celina – Se observarmos ao longo dos governos Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, vemos que está melhorando. A participa-ção de mulheres e de negros ainda é uma proporção muito pequena, uma vez que metade da população são mulheres e a outra metade são negros, mas está aumentando. Nesse extrato superior já tem 25% de mulheres e 10% de negros. Mas, certamente, esses dados são muito reveladores do quanto a sociedade brasileira é excludente. Excludente do ponto de vista étnico e de gênero.

Não podemos dizer que é um apartheid étnico, mas é um problema muito grande a situação de negros e de mulheres na política e nos cargos públicos. Só que o mais incrível é que esses dados do Poder Executivo que mostro na minha pes-

quisa são muito mais animadores do que se olharmos o Legis-lativo. Há, apenas, 3% de negros e 9% de mulheres no Con-gresso. Então, o Poder Executivo com essas nomeações para cargos de direção acaba tendo o resultado mais democrático da participação feminina e de setores étnicos diferenciáveis. Isso é uma coisa muito interessante no Brasil: se olharmos os minis-térios do governo Lula – não os do Fernando Henrique, pois era um ministério de homens brancos –, mas se olharmos o ministério do Lula, da Dilma, vamos ver que é um ministério que tem negros, tem mulheres, mas o Congresso Nacional é igual como era no Fernando Henrique: tem 9% de mulheres e 3% de negros. Por que tem mais negros no Executivo? Porque o presidente da República pode nomear. Por que tem menos negros no Congresso? Porque depende da eleição, e fazer eleição no Brasil é muito mais difícil: ser candidato, ser indica-do, ter dinheiro para fazer uma campanha, conseguir recursos. Tudo isso é mais difícil tanto para os negros quanto para as mulheres. Logo, temos uma distorção de representação muito mais forte no Legislativo, que não avança.

Em 2002, quando Lula foi eleito, a participação de mulhe-res no Congresso era a que temos até hoje. Se olharmos para o ministério, cresceu; para o Congresso, parou. Por que parou no Congresso? Porque no Congresso depende de outras políticas que não a vontade do presidente e o arbítrio do presidente dizendo “eu quero nomear a Marta Suplicy, a Benedita da Silva, o Joaquim Barbosa para o Supremo Tribunal Federal”. Quan-do depende de uma eleição, de indicação de partidos que mobi-lize a sociedade, as mulheres e os negros continuam lá nos raios do chão.

Rumos – É um retrato do que ocorre em outros setores da nossa sociedade?Maria Celina – É um retrato da inércia da nossa sociedade de tocar nos pontos-chaves. Pontos como a implementação de uma política de gênero para as mulheres na política representa-tiva, não apenas no ministério. No ministério é indicação polí-tica do presidente. É implementar uma política pública para as mulheres no poder representativo e para os negros também; não tem política nesse sentido. Aliás, os financiamentos das mulheres são menores, dos negros são menores e assim por diante. Há uma desigualdade estrutural na sociedade brasileira, especialmente quando se trata da incorporação dos mais pobres, e os mais pobres são negros, e quando se trata da incor-poração dos que têm menos poder, no caso as mulheres. Esses são problemas estruturais que precisam de políticas de Estado para serem alterados, o Estado tem que participar disso. Assim como hoje já tem a política de cotas, que é uma forma de fazer os afrodescendentes entrarem na escola, como temos uma política de cotas para as mulheres no serviço público federal, também precisamos fazer ações afirmativas para termos uma sociedade mais igualitária. Uma sociedade mais igualitária no sentido de que quando vier uma eleição todos possam concor-rer em igualdade mínima de condições.

é um marco e para se fazer qualquer mudança na Constituição temos que pensar muito, porque é efetivamente uma Carta segura. Quanto à participação popular, creio que o documen-to já estabeleceu uma série de mecanismos: a ação direta de inconstitucionalidade, o plebiscito, o referendo, a ação popu-lar. Há uma série de possibilidades para que a sociedade inter-pele e questione o poder público acerca de coisas que foram feitas ou que deixaram de ser feitas. Não creio que se precise de mais arranjos de consulta popular, precisamos é de fortale-cer o poder do Congresso, o poder da democracia representa-tiva pari passu à participação da sociedade. Esse equilíbrio tem que existir. A democracia representativa – ou seja, o Congres-so, assembleias estaduais, municipais – tem que continuar existindo porque ela não é perfeita, mas sem ela tudo será pior.

Então, em concomitância à existên-cia dessa democracia formal e repre-sentativa, temos que incentivar uma forma de democracia direta e participa-tiva, mas isso tem que ser feito de uma forma cooperativa. Não é para uma se contrapor à outra, senão entramos numa competição um pouco antropo-fágica. Ter conselhos, assembleias populares, conselhos de bairro, conse-lhos de saúde etc., é muito importante e já existem muitos. Desse ponto de vista, o Brasil tem uma renda organiza-tiva fabulosa. Isso pode ser fortalecido, mas não significa que deva se desvalori-zar o Congresso.

O meu único problema é esse, quan-do algumas pessoas dizem que para fortalecer esses grupos comunitários temos que desvalorizar o Congresso. Os dois têm que ser igualmente valoriza-dos. Se olharmos para o mundo inteiro, as democracias estáveis e os governos que respeitam os direitos políticos, sociais e econômicos das pessoas, prati-cam a democracia representativa. E isso se dá também por plebiscitos e consultas que são necessárias. Nós, no Rio de Jane-iro, por exemplo, não fomos consultados se queríamos Olim-píadas. Acho fundamental que se faça consulta sobre certos temas que implicam em a população colocar dinheiro do seu bolso para eventos que o governo quer promover.

As duas ações têm que existir: um Congresso funcionando para a rotina das questões do Estado e dos grandes projetos, mas tem que ouvir a sociedade para haver também essa chama-da democracia participativa. As duas maneiras complementares de fazer democracia – a representativa e a direta –, são impor-tantes, é sobre isso que o livro está falando. São problemas que

ESPECIAL

“Não é quanto se gasta, é como se gasta, onde se gasta e a qualidade desse gasto. Não adianta falar 'gastamos tantos milhões em moradia popular' sem indicar o que isso significou efetivamente para o bem-estar da população.”

Redemocratização e MudançaSocial no BrasilMaria Celina D´Araujo (org.)FGV, 232p., 2014.

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pós enfrentar uma campanha eleitoral duríssima “co-mo nunca se viu antes neste país”, Dilma Rousseff foi reeleita presidenta pelo voto de 55 milhões de brasileiros para conduzir no período 2015-2018 o

esforço coletivo de construção da sociedade expressa na Consti-tuição de 1988 que propõe uma organização, na qual: 1)os cida-dãos são livres para escolher como querem construir e usufruir suas vidas; 2) existem instituições que incentivam a geração de crescente igualdade de oportunidades, isto é, que cada vez menos a vida de cada cidadão dependa do acidente de seu nasci-mento; e 3) assiste-se aos que, por qualquer motivo, tiveram menor oportunidade e trata-se de capacitá-los para que possam viver suas vidas com dignidade. Essa organização social não se confunde com a organização econômica da sociedade. Uma boa gestão material da economia é apenas condição necessária, mas não suficiente, para a conquista da sociedade “civilizada”.

As propostas da oposição encontraram dificuldades na elei-ção por quatro motivos: 1º) porque a discussão centrou-se em temas econômicos abstratos cujas consequências estão muito distantes dos interesses imediatos dos cidadãos comuns; 2º) por-que faltou à oposição convicção e “credibilidade” ao afirmar que “continuaria a apoiar” a política de inclusão social; 3º) porque ignorou que o “pífio aumento” da renda foi sentido apenas pelos 40% dos eleitores com renda familiar superior a três salá-rios mínimos, enquanto os outros 60% beneficiaram-se de uma formidável política de transferência de renda; e, por último, 4º) porque recebeu a solidariedade de significativo contingente elei-toral que preconceituosamente considera “imoral” a bem-sucedida política de inclusão social.

Trata-se de uma assimetria deplorável e intransponível: o governo Dilma “perdeu a credibilidade” junto ao setor produti-vo com seu intervencionismo bem-intencionado, sacrificou o equilíbrio fiscal e o crescimento para manter a credibilidade da sua política de inclusão social, o que lhe deu o segundo mandato. As lideranças oposicionistas pregaram desde o início que eram “portadoras da credibilidade” do setor produtivo, mas o seu comportamento passado e a falta de convicção presente recusa-ram-lhes a “credibilidade” na inclusão social. A presidenta Dil-ma recebeu um novo voto de confiança que lhe dá a oportunida-de de voltar ao seu discurso original de 2011, “produzir mais com menos”, que é sinônimo de produtividade e aumento do crescimento e de dar continuidade à política de inclusão social apoiada na igualdade de oportunidades.

Ainda que a conjuntura externa não tenha sido particular-mente favorável durante o quatriênio, é preciso reconhecer que na área econômica os resultados de 2011-2014 deixam muito a desejar: 1) crescimento médio do Produto Interno Bruto (PIB) per capita de 0,8% ao ano; 2) taxa de inflação média anual de 6,2% e 3) a despeito do baixo crescimento, um déficit acumula-do em conta corrente de 270 bilhões de dólares. O comporta-mento do “índice de bem-estar” – que leva em conta o cresci-mento da renda média real, corrigido pelo índice de igualdade – mostra que ele atingiu uma estabilidade que, em breve, poderá mudar o humor do “andar de baixo”, que foi fundamental no resultado da eleição. Isto tornaria ainda mais difícil o quatriênio 2015-2018.

Não estamos à beira de um desastre na economia. A taxa de inflação é elevada, mas não está “fora de controle”. A política fiscal, em parte como consequência do baixo crescimento, tem tolerado déficits nominais maiores, uma deterioração do supe-rávit primário e um leve aumento da relação Dívida Bruta/PIB. A política cambial tem convivido com um déficit em conta cor-rente insustentável. Tudo isso é corrigível sem nenhuma como-ção ou “freio de arrumação” paralisante. O que o governo pre-cisa é de programas transparentes que facilitem a retomada de um diálogo absolutamente aberto com os empresários, especi-almente da indústria, cujo poder de competição foi destruído tanto nas exportações como no mercado interno graças à utili-zação do câmbio como instrumento de combate à inflação em lugar dos tradicionais mecanismos de política fiscal, monetária e salarial.

As condições de cooptação do setor privado estarão criadas na medida em que o governo mostre uma verdadeira disposição de honrar os compromissos e demonstre compreender que os empresários querem a mesma coisa que ele, a volta ao cresci-mento. E reconheça as limitações impostas pela contabilidade nacional; utilize o sistema de preços na alocação dos fatores de produção e nas escolhas dos consumidores; aceite que precisa coordenar melhor as políticas fiscal, salarial, monetária e cambi-al; e que, por último, mas não menos importante, sem uma políti-ca industrial realista o crescimento do PIB não voltará.

A presidenta sabe que não vai recuperar a confiança do setor econômico apenas na base da conversa e que sem o crescimento do PIB acabará perdendo a confiança no flanco social.

O Brasil deu seu voto de confiança à Sra. Dilma Rousseff e é obrigação de todos ajudá-la a honrá-lo.

FUTURO

Volta ao crescimento

RUMOS – 40 – Novembro/Dezembro 2014

Antonio Delfim Netto

Professor Emérito da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA-USP). Ex-ministro da Fazenda, da Agricultura e do Planejamento.

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O OPINIÃO

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o analisar os números e as marcas alcançadas pelo programa de microcrédito que tem levado novas oportunidades a milhares de empreende-dores de um conjunto de 39 favelas cariocas, o presidente da Agência Estadual de Fomento

(AgeRio), José Domingos Vargas, sentencia: “o desenvolvi-mento econômico liberta”. Ancorado em uma estratégia ampla de governo, voltada para as comunidades periféricas do estado, o programa chegou ao início do último trimestre de 2014 com mais de cinco mil operações realizadas, em um total de R$ 21 milhões liberados.

O programa de microcrédito produtivo orientado, ope-rado pela agência, teve início em 2012 e se situa em um arco estratégico do estado para as periferias, estabelecido em

Por Luciano Silva

RUMOS – 42 – Novembro/Dezembro 2014 RUMOS – 43 – Novembro/Dezembro 2014

UPP EMPREENDEDOR

Programa de microcrédito da AgeRio chega a cinco mil operações e ajuda a transformar a vida de pequenos empreendedores nas favelas do Rio de Janeiro; presidente da instituição faz um balanço e projeta superar as metas traçadas até 2018

C CENÁRIOS DO RIO

Aquatro pilares: segurança pública, infraestrutura urbana, políticas públicas e desenvolvimento econômico. O progra-ma tem como objetivo estabelecer novos níveis de trabalho e renda nas comunidades atendidas.

“Nosso foco é desenvolver as comunidades, por isso centramos nossa ação no financiamento produtivo, aquele que tem potencial de desenvolver economicamente a locali-dade. Não financiamos o consumo. Financiamos geladeira, computador? Sim, desde que sejam uma ferramenta para o empreendedorismo, estejam a serviço de um empreendimen-to”, exemplificou Vargas.

O presidente frisou que, com a implantação das Unida-des de Polícia Pacificadora (UPPs), abre-se um ambiente propício para o desenvolvimento de ações do campo econô-

mico. Assim, a agência vê aumentar, mês a mês, o volume de operações e a resposta positi-va dos empreendedores ao cha-mado da AgeRio. “Cada vez nos tornamos mais conhecidos. A maior dificuldade, para a con-cessão do crédito, é ter um bom produto e uma boa comunica-ção com o público. Estamos conseguindo isso”, avaliou.

Por meio do Fundo UPP Empreendedor, a agência con-cede financiamento em melho-res condições que as normal-mente encontradas no mercado: o empreendedor pode requerer entre R$ 300 e R$ 15 mil para seu negócio e tem até três meses de carência para quitar o emprésti-mo com juros de 0,25% ao mês (3% ao ano) e prazo de paga-mento de até 24 meses. O negó-cio não precisa ser formalizado

avaliação da operação; e agora tem um novo serviço: a unida-de móvel de atendimento.

Trata-se de unidades móveis, tecnologicamente equipa-das, com ar condicionado e espaço de atendimento. Os micro-ônibus percorrem as comunidades atendidas pelo programa e oferecem, além da consulta, capacitação para os empreendedores locais, em parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). “Nós não estabelecemos obrigatoriedade de formalização, mas, em conjunto com o Sebrae, vemos que ela acontece em função da necessidade. O empreendedor bem orientado vai se for-malizar”, opina.

Para Domingos Vargas, o sucesso do programa é fruto de uma estratégia consistente e bem articulada com as três esferas do governo. Ele defende a política de pacificação como um meio de reparação das divisões historicamente construídas entre as favelas e o conjunto da cidade. Para exemplificar, cita o aumento da frequência das crianças na escola e o aumento do fluxo entre as comunidades e os bair-ros formais, com moradores de outras regiões indo às fave-las para usufruir de serviços. “A pacificação é a chave de tudo”, define.

Por isso, ele destaca que, dentre as muitas ações desenvol-vidas pela instituição, esta talvez seja a de impacto mais direto para transformar a vida das pessoas, em curto prazo. Além de uma estratégia de desenvolvimento econômico, com impulso sobre o comércio e o setor de serviços das comunidades, o microcrédito acaba por se tornar uma ferramenta de desen-volvimento social.

“Não há confusão entre o desenvolvimento econômico e o social. Quando se entra com o fluxo de capitais, tudo melhora, as pessoas ganham autonomia e podem decidir soberanamente sobre os rumos de suas vidas. E, neste senti-do, temos recursos permanentes assegurados pelo estado para podermos continuar a investir e desaguá-los nas comu-nidades”, garante Vargas, afirmando que a meta de alcançar 20 mil operações deve ser atingida antes de 2018, prazo inici-almente estipulado pela agência. Unidades móveis de atendimento levam crédito às comunidades pacificadas.

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Economia para o Social

para o empreendedor buscar o financiamento, embora este seja um caminho natural ao longo do processo de amadure-cimento do empreendimento.

Outro facilitador é a figura do capacitador de crédito, um morador da comunidade treinado para fazer orientação finan-ceira e acompanhamento dos empreendedores que buscam o programa. Este trabalho inclui assessoria e dicas de educação financeira, entre outras ações. “Não fazemos o crédito pelo crédito. Pedimos sempre um projeto para o empreendedor, por mais simples que seja, e nos certificamos, junto a ele, que as condições do empréstimo são viáveis”, defendeu Domingos Vargas, lembrando que a taxa de inadimplência do programa é muito baixa, na casa de 1,33%. “Para a população que possui baixa renda, o CPF é o maior patrimônio, então eles não dei-xam o nome ficar com restrições cadastrais”, completou.

Móvel – A estratégia da agência para chegar até o empreen-dedor, além do capacitador de crédito local, passa também pelo site da instituição, por meio do qual o empreendedor pode simular o financiamento e até mesmo solicitar uma

Outra modalidade de microcrédito operada pela agência é feita por meio dos repasses no âmbito do programa Crescer, com recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Essa modalidade é operada a partir de uma parceria da AgeRio com prefeituras em todo o estado – atualmente são dez as beneficiadas.

Pela especificação da parceria, a agência de fomen-to assume o risco e o funding, enquanto a prefeitura cede espaço físico e empregados para operar o programa. A capacitação dos funcionários também é realizada pela agência.

Em parceria com municípios, agência faz repasse do Crescer

José Domingos Vargas,presidente da AgeRio.

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o analisar os números e as marcas alcançadas pelo programa de microcrédito que tem levado novas oportunidades a milhares de empreende-dores de um conjunto de 39 favelas cariocas, o presidente da Agência Estadual de Fomento

(AgeRio), José Domingos Vargas, sentencia: “o desenvolvi-mento econômico liberta”. Ancorado em uma estratégia ampla de governo, voltada para as comunidades periféricas do estado, o programa chegou ao início do último trimestre de 2014 com mais de cinco mil operações realizadas, em um total de R$ 21 milhões liberados.

O programa de microcrédito produtivo orientado, ope-rado pela agência, teve início em 2012 e se situa em um arco estratégico do estado para as periferias, estabelecido em

Por Luciano Silva

RUMOS – 42 – Novembro/Dezembro 2014 RUMOS – 43 – Novembro/Dezembro 2014

UPP EMPREENDEDOR

Programa de microcrédito da AgeRio chega a cinco mil operações e ajuda a transformar a vida de pequenos empreendedores nas favelas do Rio de Janeiro; presidente da instituição faz um balanço e projeta superar as metas traçadas até 2018

C CENÁRIOS DO RIO

Aquatro pilares: segurança pública, infraestrutura urbana, políticas públicas e desenvolvimento econômico. O progra-ma tem como objetivo estabelecer novos níveis de trabalho e renda nas comunidades atendidas.

“Nosso foco é desenvolver as comunidades, por isso centramos nossa ação no financiamento produtivo, aquele que tem potencial de desenvolver economicamente a locali-dade. Não financiamos o consumo. Financiamos geladeira, computador? Sim, desde que sejam uma ferramenta para o empreendedorismo, estejam a serviço de um empreendimen-to”, exemplificou Vargas.

O presidente frisou que, com a implantação das Unida-des de Polícia Pacificadora (UPPs), abre-se um ambiente propício para o desenvolvimento de ações do campo econô-

mico. Assim, a agência vê aumentar, mês a mês, o volume de operações e a resposta positi-va dos empreendedores ao cha-mado da AgeRio. “Cada vez nos tornamos mais conhecidos. A maior dificuldade, para a con-cessão do crédito, é ter um bom produto e uma boa comunica-ção com o público. Estamos conseguindo isso”, avaliou.

Por meio do Fundo UPP Empreendedor, a agência con-cede financiamento em melho-res condições que as normal-mente encontradas no mercado: o empreendedor pode requerer entre R$ 300 e R$ 15 mil para seu negócio e tem até três meses de carência para quitar o emprésti-mo com juros de 0,25% ao mês (3% ao ano) e prazo de paga-mento de até 24 meses. O negó-cio não precisa ser formalizado

avaliação da operação; e agora tem um novo serviço: a unida-de móvel de atendimento.

Trata-se de unidades móveis, tecnologicamente equipa-das, com ar condicionado e espaço de atendimento. Os micro-ônibus percorrem as comunidades atendidas pelo programa e oferecem, além da consulta, capacitação para os empreendedores locais, em parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). “Nós não estabelecemos obrigatoriedade de formalização, mas, em conjunto com o Sebrae, vemos que ela acontece em função da necessidade. O empreendedor bem orientado vai se for-malizar”, opina.

Para Domingos Vargas, o sucesso do programa é fruto de uma estratégia consistente e bem articulada com as três esferas do governo. Ele defende a política de pacificação como um meio de reparação das divisões historicamente construídas entre as favelas e o conjunto da cidade. Para exemplificar, cita o aumento da frequência das crianças na escola e o aumento do fluxo entre as comunidades e os bair-ros formais, com moradores de outras regiões indo às fave-las para usufruir de serviços. “A pacificação é a chave de tudo”, define.

Por isso, ele destaca que, dentre as muitas ações desenvol-vidas pela instituição, esta talvez seja a de impacto mais direto para transformar a vida das pessoas, em curto prazo. Além de uma estratégia de desenvolvimento econômico, com impulso sobre o comércio e o setor de serviços das comunidades, o microcrédito acaba por se tornar uma ferramenta de desen-volvimento social.

“Não há confusão entre o desenvolvimento econômico e o social. Quando se entra com o fluxo de capitais, tudo melhora, as pessoas ganham autonomia e podem decidir soberanamente sobre os rumos de suas vidas. E, neste senti-do, temos recursos permanentes assegurados pelo estado para podermos continuar a investir e desaguá-los nas comu-nidades”, garante Vargas, afirmando que a meta de alcançar 20 mil operações deve ser atingida antes de 2018, prazo inici-almente estipulado pela agência. Unidades móveis de atendimento levam crédito às comunidades pacificadas.

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Economia para o Social

para o empreendedor buscar o financiamento, embora este seja um caminho natural ao longo do processo de amadure-cimento do empreendimento.

Outro facilitador é a figura do capacitador de crédito, um morador da comunidade treinado para fazer orientação finan-ceira e acompanhamento dos empreendedores que buscam o programa. Este trabalho inclui assessoria e dicas de educação financeira, entre outras ações. “Não fazemos o crédito pelo crédito. Pedimos sempre um projeto para o empreendedor, por mais simples que seja, e nos certificamos, junto a ele, que as condições do empréstimo são viáveis”, defendeu Domingos Vargas, lembrando que a taxa de inadimplência do programa é muito baixa, na casa de 1,33%. “Para a população que possui baixa renda, o CPF é o maior patrimônio, então eles não dei-xam o nome ficar com restrições cadastrais”, completou.

Móvel – A estratégia da agência para chegar até o empreen-dedor, além do capacitador de crédito local, passa também pelo site da instituição, por meio do qual o empreendedor pode simular o financiamento e até mesmo solicitar uma

Outra modalidade de microcrédito operada pela agência é feita por meio dos repasses no âmbito do programa Crescer, com recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Essa modalidade é operada a partir de uma parceria da AgeRio com prefeituras em todo o estado – atualmente são dez as beneficiadas.

Pela especificação da parceria, a agência de fomen-to assume o risco e o funding, enquanto a prefeitura cede espaço físico e empregados para operar o programa. A capacitação dos funcionários também é realizada pela agência.

Em parceria com municípios, agência faz repasse do Crescer

José Domingos Vargas,presidente da AgeRio.

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ecentemente, o Centro de Desenvolvimento e Planeja-mento Regional (Cedplar/ UFMG) realizou estudo sobre a importância dos bancos

públicos no Brasil e destacou seu papel anticíclico e de apoio à política econômica em momentos de instabilidade financeira, garantindo recursos para investimentos que minimizam os impactos danosos à economia, como concentração de renda e outras mazelas.

Nesse contexto, o Banco da Amazô-nia, enquanto agente financeiro do gover-no federal, tem entre suas principais fun-ções sociais a de fomentar o desenvolvi-mento dos setores produtivos em condi-ções mais favoráveis e levar o acesso ao crédito às localidades e segmentos que muitas vezes os bancos privados não têm interesse em operar, auxiliando na redução das desigualdades intra e interregionais.

Um dos mecanismos utilizados pelo governo federal para diminuir as disparidades regionais é a Política Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR), que classifica todos os municípios brasileiros segundo quatro tipologias: Baixa Renda (BR); Estagnada de Média Renda (EMR); Dinâmica de Menor Renda (DMR); e Alta Renda (AR).

Com essa classificação, os diversos entes estatais podem

balizar suas políticas públicas e contribuir, cada um na sua área de atuação, para que o país alcance um patamar mais equânime nos indicadores socioeconômicos, condição para qualquer processo de desenvolvimento em bases mais sustentáveis.

Assim, o Banco da Amazônia pauta sua política de crédito nas diretrizes da PNDR, envidando esforços para que a aplicação de recursos seja direcionada para os municípios de menor renda e a região possa beneficiar-se com os efeitos positivos da redução das desigualdades intra e interregionais.

Historicamente, desde a implantação da PNDR, o banco atua de maneira a orientar a aplicação de recursos, prioritariamente, para as áreas com menor grau de desenvolvimen-to. Em 2013, seguindo essa diretriz, aproxi-madamente 66% dos recursos do Fundo Constitucional de Financiamento do Norte (FNO) foram aplicados em municípios de menor renda (BR, EMR e DMR), conforme demonstrado na tabela ao lado.

Os benefícios dessa melhor distribuição na alocação de recursos, em proveito dos municípios menos desenvolvidos economicamente, que vêm ocorrendo historicamente, foram estimados por estudo contratado pelo Banco da Amazônia e realizado pela Fundação de Apoio à Universidade Federal de Viçosa (Funarbe). Considerando o período de janeiro de 2006 a junho de 2011, a instituição aplicou R$ 10,30 bilhões

RUMOS – 45 – Novembro/Dezembro 2014 RUMOS – 44 – Novembro/Dezembro 2014

na agricultura, agroindústria, comércio, indústria, pecuária e serviço, o que corresponde a 44,3% do total de recursos aplicados na região Norte, desde setembro de 1989, quando o FNO começou sua operação.

De acordo com o estudo, na agricultura ocorreu a intro-dução de tecnologias modernas atreladas à produção de grãos, óleo vegetal, frutas e produção de alimentos, e na pecuária a implantação de novas técnicas de manejo dos rebanhos e das pastagens, com vistas a aumentar a produtivi-dade. A exploração madeireira passou a utilizar o manejo florestal sustentável e a produção de madeiras plantadas obtida dos sistemas de reflorestamento com espécies nativas e exóticas. O mais importante é que tudo isso vem ocorrendo com a agregação de valor aos produtos de base agrária por meio de agroindústrias, que estão se adequando à escala de produção, utilizando novas tecnologias, diversificando os

RFinanciamentos do Banco da Amazônia possibilitaram a introdução de tecnologias modernas para a produção de grãos, óleo vegetal, frutas e outros alimentos.

Ag

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cia

Bra

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Operações contratadas conforme a tipologia da PNDR

Exercício de 2013

Tipologia

Nº Municípios

N° Op.

%

R$ 1,00

%

BR

114

11.802

26,7%

349.865.269

7,4%

EMR 157 13.599 30,7% 1.917.457.594 40,6%

DMR

145

15.608

35,3%

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18,3%

AR

25

3.268

7,4%

1.586.555.793

33,6%

TOTAIS 441 44.277 100,0% 4.719.204.803 100,0%

Fonte: Banco da Amazônia – Sistema de Controle de Operações

AARTIGO

MISSÃO

Oduval Lobato

Gerente executivo de Gestão de Programas Governamentais do Banco da Amazônia

O papel do Banco da Amazônia na redução das desigualdades regionais

produtos e aumentando a competitividade empresarial, com vistas a ampliar suas participações nos mercados nacional e internacional.

Ainda segundo o estudo da Funarbe, os resultados per-mitem concluir que a política de crédito do FNO na Região Norte apresentou significativa contribuição para a ocupação da mão de obra, com crescimento da participação da mulher na tomada do crédito, expansão do faturamento, inserção dos produtos no mercado, aumento da margem de lucro e da produtividade do trabalho que, por sua vez, se refletiram na melhoria da qualidade de vida das pessoas.

Por fim, as análises da nossa área de estudos, a partir de simulações realizadas com base na metodologia de insumo-produto, estimam que as aplicações de crédito de fomento com recursos do FNO, no exercício de 2013, possuíam potencial para incrementar em R$ 18,5 bilhões o Produto Interno Bruto (PIB) do país, ou seja, o que corresponde que a

cada R$1,00 aplicado nos projetos financiados, ocorre o incremento de R$ 3,91 no PIB.

Esses resultados nos fazem crer que o Banco da Amazônia vem cumprindo sua missão institucional, que é “contribuir para o desenvolvimento sustentável da Amazônia, através da execução das políticas públicas e da oferta de produtos e serviços financeiros, visando à satisfação dos clientes, acionistas e sociedade” e dessa forma colaborar para que tenhamos um país com mais equidade, em suas múltiplas dimensões.

Oduval Lobato

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ecentemente, o Centro de Desenvolvimento e Planeja-mento Regional (Cedplar/ UFMG) realizou estudo sobre a importância dos bancos

públicos no Brasil e destacou seu papel anticíclico e de apoio à política econômica em momentos de instabilidade financeira, garantindo recursos para investimentos que minimizam os impactos danosos à economia, como concentração de renda e outras mazelas.

Nesse contexto, o Banco da Amazô-nia, enquanto agente financeiro do gover-no federal, tem entre suas principais fun-ções sociais a de fomentar o desenvolvi-mento dos setores produtivos em condi-ções mais favoráveis e levar o acesso ao crédito às localidades e segmentos que muitas vezes os bancos privados não têm interesse em operar, auxiliando na redução das desigualdades intra e interregionais.

Um dos mecanismos utilizados pelo governo federal para diminuir as disparidades regionais é a Política Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR), que classifica todos os municípios brasileiros segundo quatro tipologias: Baixa Renda (BR); Estagnada de Média Renda (EMR); Dinâmica de Menor Renda (DMR); e Alta Renda (AR).

Com essa classificação, os diversos entes estatais podem

balizar suas políticas públicas e contribuir, cada um na sua área de atuação, para que o país alcance um patamar mais equânime nos indicadores socioeconômicos, condição para qualquer processo de desenvolvimento em bases mais sustentáveis.

Assim, o Banco da Amazônia pauta sua política de crédito nas diretrizes da PNDR, envidando esforços para que a aplicação de recursos seja direcionada para os municípios de menor renda e a região possa beneficiar-se com os efeitos positivos da redução das desigualdades intra e interregionais.

Historicamente, desde a implantação da PNDR, o banco atua de maneira a orientar a aplicação de recursos, prioritariamente, para as áreas com menor grau de desenvolvimen-to. Em 2013, seguindo essa diretriz, aproxi-madamente 66% dos recursos do Fundo Constitucional de Financiamento do Norte (FNO) foram aplicados em municípios de menor renda (BR, EMR e DMR), conforme demonstrado na tabela ao lado.

Os benefícios dessa melhor distribuição na alocação de recursos, em proveito dos municípios menos desenvolvidos economicamente, que vêm ocorrendo historicamente, foram estimados por estudo contratado pelo Banco da Amazônia e realizado pela Fundação de Apoio à Universidade Federal de Viçosa (Funarbe). Considerando o período de janeiro de 2006 a junho de 2011, a instituição aplicou R$ 10,30 bilhões

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na agricultura, agroindústria, comércio, indústria, pecuária e serviço, o que corresponde a 44,3% do total de recursos aplicados na região Norte, desde setembro de 1989, quando o FNO começou sua operação.

De acordo com o estudo, na agricultura ocorreu a intro-dução de tecnologias modernas atreladas à produção de grãos, óleo vegetal, frutas e produção de alimentos, e na pecuária a implantação de novas técnicas de manejo dos rebanhos e das pastagens, com vistas a aumentar a produtivi-dade. A exploração madeireira passou a utilizar o manejo florestal sustentável e a produção de madeiras plantadas obtida dos sistemas de reflorestamento com espécies nativas e exóticas. O mais importante é que tudo isso vem ocorrendo com a agregação de valor aos produtos de base agrária por meio de agroindústrias, que estão se adequando à escala de produção, utilizando novas tecnologias, diversificando os

RFinanciamentos do Banco da Amazônia possibilitaram a introdução de tecnologias modernas para a produção de grãos, óleo vegetal, frutas e outros alimentos.

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Operações contratadas conforme a tipologia da PNDR

Exercício de 2013

Tipologia

Nº Municípios

N° Op.

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TOTAIS 441 44.277 100,0% 4.719.204.803 100,0%

Fonte: Banco da Amazônia – Sistema de Controle de Operações

AARTIGO

MISSÃO

Oduval Lobato

Gerente executivo de Gestão de Programas Governamentais do Banco da Amazônia

O papel do Banco da Amazônia na redução das desigualdades regionais

produtos e aumentando a competitividade empresarial, com vistas a ampliar suas participações nos mercados nacional e internacional.

Ainda segundo o estudo da Funarbe, os resultados per-mitem concluir que a política de crédito do FNO na Região Norte apresentou significativa contribuição para a ocupação da mão de obra, com crescimento da participação da mulher na tomada do crédito, expansão do faturamento, inserção dos produtos no mercado, aumento da margem de lucro e da produtividade do trabalho que, por sua vez, se refletiram na melhoria da qualidade de vida das pessoas.

Por fim, as análises da nossa área de estudos, a partir de simulações realizadas com base na metodologia de insumo-produto, estimam que as aplicações de crédito de fomento com recursos do FNO, no exercício de 2013, possuíam potencial para incrementar em R$ 18,5 bilhões o Produto Interno Bruto (PIB) do país, ou seja, o que corresponde que a

cada R$1,00 aplicado nos projetos financiados, ocorre o incremento de R$ 3,91 no PIB.

Esses resultados nos fazem crer que o Banco da Amazônia vem cumprindo sua missão institucional, que é “contribuir para o desenvolvimento sustentável da Amazônia, através da execução das políticas públicas e da oferta de produtos e serviços financeiros, visando à satisfação dos clientes, acionistas e sociedade” e dessa forma colaborar para que tenhamos um país com mais equidade, em suas múltiplas dimensões.

Oduval Lobato

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RUMOS – 47 – Novembro/Dezembro 2014

alar de crescimento econômico, sem considerar aspectos sociais e ambientais, tornou-se inviável. Ao passo que o mundo evolui, há uma percepção de que o desenvolvimento de um país depende do equilíbrio entre o aumento de riquezas,

distribuição de renda e proteção do meio ambiente. A relevância do tema atrai também a atenção das cooperativas financeiras que têm como um de seus valores a responsabilidade socioambiental. A atenção ao bem-estar da população e às limitações dos recursos naturais está na agenda de prioridades dessas instituições, que tiveram origem na Inglaterra durante a Revolução Industrial, para atender, inicialmente, as necessidades básicas de operários.

O surgimento da primeira cooperativa ocorreu no bairro de Rochdale, em Manchester (Inglaterra), no ano de 1844. Com o advento da Revolução Industrial, o aumento no núme-ro de demissões, devido à maquinofatura, gerou grandes transtornos socioeconômicos. A solução encontrada por um grupo de tecelões foi organizar uma cooperativa de consumo em que todos contribuíam com uma modesta quantia por mês para a aquisição de bens de consumo e dividiam de forma igualitária o adquirido.

A ideia vingou e se espalhou por toda a Inglaterra. Da mesma forma, ao longo do tempo, outros ramos do cooperati-vismo surgiram pelo mundo. Foram criadas cooperativas de trabalho, educacional, transporte, agropecuário, social, saúde, financeira, habitacional, produção, infraestrutura, mineral, turismo e lazer.

Desde o nascimento do primeiro movimento cooperati-

RUMOS – 46 – Novembro/Dezembro 2014

associados linhas de financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES) que contribuem para a preser-vação do meio ambiente. Uma delas é o Programa para Redu-ção da Emissão de Gases de Efeito Estufa na Agricultura (ABC), que visa, entre outras coisas, à recuperação de pasta-gens degradadas, redução do desmatamento, ampliação da área de florestas cultivadas e adequação das propriedades rurais à legislação ambiental. Para conceder o crédito o siste-ma exige a licença e o cadastro ambiental e se assegura de que o recurso financiado será investido.

O superintendente comercial do Bancoob, Luciano Ribeiro Machado, acredita que o desenvolvimento do país depende de fatores como a geração de empregos e distribui-ção de renda. Em sua opinião, as cooperativas contribuem para o crescimento socioeconômico das regiões onde se situam, promovendo a inclusão financeira.

De acordo com a Assessoria de Planejamento e Projetos Corporativos (ASPLAN) do Sicoob Confederação, o siste-ma oferece soluções financeiras para 229 municípios brasi-leiros sem atendimento bancário, que somam mais de um milhão de habitantes nessas regiões.

“O Sicoob está presente inclusive em municípios que não possuem agências bancárias. Democratizamos o acesso ao crédito e a outros serviços. Nossa atuação está focada nas pessoas, em oferecer produtos e serviços que otimizem sua gestão financeira, pois com finanças equilibradas podemos gerar o econômico e o social, não o contrário”, salientou Luciano.

O modelo cooperativista que nasceu no século XVIII, com a criação da primeira cooperativa, mostra-se capaz de promover o desenvolvimento socioeconômico sem aban-donar a responsabilidade socioambiental. Afinal, o que dá força ao movimento cooperativo, ano após ano, são os valo-res e princípios que o conduz, entre eles cooperação, respei-to, solidariedade, democracia e igualdade.

vista até os dias atuais o mundo passou por grandes transfor-mações e, superando a busca pelo desenvolvimento econô-mico, a preocupação com a inclusão social e com os recursos naturais entrou na pauta do cooperativismo financeiro.

Hoje, as cooperativas financeiras possuem os mesmos serviços oferecidos pelos bancos, o diferencial é a forma como atuam. O cooperativismo é regido por valores e por princípios, entre eles, o interesse pela comunidade.

O diretor-presidente do Banco Cooperativo do Brasil (Bancoob), Marco Aurélio Almada, explica que as cooperati-vas financeiras funcionam como um motor, que faz o dinheiro girar dentro da própria região onde está inserida. “Como são cooperativas regionais, estão naturalmente comprometidas com o projeto da localidade”, disse Almada.

Outro princípio que conduz os trabalhos de uma coopera-tiva é a participação econômica dos associados, que também são donos do empreendimento. Ao contribuir para a constitui-ção do patrimônio, os cooperados participam das decisões da instituição e recebem, ao final do período contábil, parte do resultado financeiro, chamado de sobras no cooperativismo.

O Sistema de Cooperativas de Crédito do Brasil (Sicoob) está presente em 25 estados e no Distrito Federal. Consideran-do as 10 maiores instituições financeiras do ranking de depósi-tos, o Sicoob foi o que mais cresceu entre junho de 2013 e junho de 2014. Mais de R$ 6 bilhões foram depositados, atin-gindo R$ 30 bilhões no período, o que elevou o sistema à oitava posição. Segundo Ricardo Simone Pereira, diretor financeiro do Bancoob, isso se deve à atratividade do modelo de negócio adotado.

F“Além do acesso a um portfólio absolutamente completo

de produtos e serviços, com tarifas reduzidas e atendimento personalizado, a participação cooperativa traz um benefício adicional, presente e perceptível: o sentimento de participar, de maneira solidária e efetiva, do crescimento econômico da comunidade”, explica Ricardo.

Atento às melhores práticas do mercado, o Sicoob tem investido fortemente em tecnologia. Além dos 2.235 pontos de atendimento e 2.305 caixas eletrônicos, dispõe de aplicativo Mobile Banking e está presente nas principais redes sociais. Utiliza, ainda, desde 2001, o Sistema de Informática do Sicoob (Sisbr), para integrar operacionalmente as cooperativas. Como exemplo, é feito numa mesma plataforma o controle das opera-ções de crédito, convênio, cobrança, conta-corrente e cartões.

O Sicoob foi a primeira instituição financeira no Brasil a disponibilizar o Touch ID da Apple para os associados reali-zarem pagamentos, transferências, e outros serviços por meio de um sensor biométrico.

Outra preocupação do cooperativismo é a sustentabil4-6idade ambiental. As cooperativas disponibilizam para os

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Ana Carolina Oliveira

Inclusão socioambiental como alternativa para o crescimento econômico

Cooperativas financeiras do Sicoob atuam de Norte a Sul contribuindo para o desenvolvimento das comunidades

SUSTENTABILIDADER REPORTAGEM

Luciano Ribeiro, superintendente comercial do Bancoob.

Reunião dos pioneirosdo cooperativismoem Rochdale,Manchester, Inglaterra.

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Ricardo Simone Pereira, diretor financeiro do Bancoob.

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alar de crescimento econômico, sem considerar aspectos sociais e ambientais, tornou-se inviável. Ao passo que o mundo evolui, há uma percepção de que o desenvolvimento de um país depende do equilíbrio entre o aumento de riquezas,

distribuição de renda e proteção do meio ambiente. A relevância do tema atrai também a atenção das cooperativas financeiras que têm como um de seus valores a responsabilidade socioambiental. A atenção ao bem-estar da população e às limitações dos recursos naturais está na agenda de prioridades dessas instituições, que tiveram origem na Inglaterra durante a Revolução Industrial, para atender, inicialmente, as necessidades básicas de operários.

O surgimento da primeira cooperativa ocorreu no bairro de Rochdale, em Manchester (Inglaterra), no ano de 1844. Com o advento da Revolução Industrial, o aumento no núme-ro de demissões, devido à maquinofatura, gerou grandes transtornos socioeconômicos. A solução encontrada por um grupo de tecelões foi organizar uma cooperativa de consumo em que todos contribuíam com uma modesta quantia por mês para a aquisição de bens de consumo e dividiam de forma igualitária o adquirido.

A ideia vingou e se espalhou por toda a Inglaterra. Da mesma forma, ao longo do tempo, outros ramos do cooperati-vismo surgiram pelo mundo. Foram criadas cooperativas de trabalho, educacional, transporte, agropecuário, social, saúde, financeira, habitacional, produção, infraestrutura, mineral, turismo e lazer.

Desde o nascimento do primeiro movimento cooperati-

RUMOS – 46 – Novembro/Dezembro 2014

associados linhas de financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES) que contribuem para a preser-vação do meio ambiente. Uma delas é o Programa para Redu-ção da Emissão de Gases de Efeito Estufa na Agricultura (ABC), que visa, entre outras coisas, à recuperação de pasta-gens degradadas, redução do desmatamento, ampliação da área de florestas cultivadas e adequação das propriedades rurais à legislação ambiental. Para conceder o crédito o siste-ma exige a licença e o cadastro ambiental e se assegura de que o recurso financiado será investido.

O superintendente comercial do Bancoob, Luciano Ribeiro Machado, acredita que o desenvolvimento do país depende de fatores como a geração de empregos e distribui-ção de renda. Em sua opinião, as cooperativas contribuem para o crescimento socioeconômico das regiões onde se situam, promovendo a inclusão financeira.

De acordo com a Assessoria de Planejamento e Projetos Corporativos (ASPLAN) do Sicoob Confederação, o siste-ma oferece soluções financeiras para 229 municípios brasi-leiros sem atendimento bancário, que somam mais de um milhão de habitantes nessas regiões.

“O Sicoob está presente inclusive em municípios que não possuem agências bancárias. Democratizamos o acesso ao crédito e a outros serviços. Nossa atuação está focada nas pessoas, em oferecer produtos e serviços que otimizem sua gestão financeira, pois com finanças equilibradas podemos gerar o econômico e o social, não o contrário”, salientou Luciano.

O modelo cooperativista que nasceu no século XVIII, com a criação da primeira cooperativa, mostra-se capaz de promover o desenvolvimento socioeconômico sem aban-donar a responsabilidade socioambiental. Afinal, o que dá força ao movimento cooperativo, ano após ano, são os valo-res e princípios que o conduz, entre eles cooperação, respei-to, solidariedade, democracia e igualdade.

vista até os dias atuais o mundo passou por grandes transfor-mações e, superando a busca pelo desenvolvimento econô-mico, a preocupação com a inclusão social e com os recursos naturais entrou na pauta do cooperativismo financeiro.

Hoje, as cooperativas financeiras possuem os mesmos serviços oferecidos pelos bancos, o diferencial é a forma como atuam. O cooperativismo é regido por valores e por princípios, entre eles, o interesse pela comunidade.

O diretor-presidente do Banco Cooperativo do Brasil (Bancoob), Marco Aurélio Almada, explica que as cooperati-vas financeiras funcionam como um motor, que faz o dinheiro girar dentro da própria região onde está inserida. “Como são cooperativas regionais, estão naturalmente comprometidas com o projeto da localidade”, disse Almada.

Outro princípio que conduz os trabalhos de uma coopera-tiva é a participação econômica dos associados, que também são donos do empreendimento. Ao contribuir para a constitui-ção do patrimônio, os cooperados participam das decisões da instituição e recebem, ao final do período contábil, parte do resultado financeiro, chamado de sobras no cooperativismo.

O Sistema de Cooperativas de Crédito do Brasil (Sicoob) está presente em 25 estados e no Distrito Federal. Consideran-do as 10 maiores instituições financeiras do ranking de depósi-tos, o Sicoob foi o que mais cresceu entre junho de 2013 e junho de 2014. Mais de R$ 6 bilhões foram depositados, atin-gindo R$ 30 bilhões no período, o que elevou o sistema à oitava posição. Segundo Ricardo Simone Pereira, diretor financeiro do Bancoob, isso se deve à atratividade do modelo de negócio adotado.

F“Além do acesso a um portfólio absolutamente completo

de produtos e serviços, com tarifas reduzidas e atendimento personalizado, a participação cooperativa traz um benefício adicional, presente e perceptível: o sentimento de participar, de maneira solidária e efetiva, do crescimento econômico da comunidade”, explica Ricardo.

Atento às melhores práticas do mercado, o Sicoob tem investido fortemente em tecnologia. Além dos 2.235 pontos de atendimento e 2.305 caixas eletrônicos, dispõe de aplicativo Mobile Banking e está presente nas principais redes sociais. Utiliza, ainda, desde 2001, o Sistema de Informática do Sicoob (Sisbr), para integrar operacionalmente as cooperativas. Como exemplo, é feito numa mesma plataforma o controle das opera-ções de crédito, convênio, cobrança, conta-corrente e cartões.

O Sicoob foi a primeira instituição financeira no Brasil a disponibilizar o Touch ID da Apple para os associados reali-zarem pagamentos, transferências, e outros serviços por meio de um sensor biométrico.

Outra preocupação do cooperativismo é a sustentabil4-6idade ambiental. As cooperativas disponibilizam para os

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Inclusão socioambiental como alternativa para o crescimento econômico

Cooperativas financeiras do Sicoob atuam de Norte a Sul contribuindo para o desenvolvimento das comunidades

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Luciano Ribeiro, superintendente comercial do Bancoob.

Reunião dos pioneirosdo cooperativismoem Rochdale,Manchester, Inglaterra.

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Ricardo Simone Pereira, diretor financeiro do Bancoob.

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Win Degrave

PESQUISAARTIGO

esde os anos 1970, cientistas se esforçam para determinar o código genético de organismos vivos. Após inovações em automação e em tecno-logias de sequenciamento, o genoma completo de um organismo de vida livre, Haemophilus influenzae,

foi obtido em 1995, logo seguido de muitos outros organismos modelo, como Escherichia coli (bactérias do intestino), levedura, patógenos humanos como o da tuberculose, e de parasitas como o da malária, de genomas de plantas, e em 2001 o primeiro esbo-ço de um genoma humano. Desde então, dados genômicos vêm acumulando em ritmo exponencial, e com menor custo.

Outras contribuições importantes são a análise da variação genética em populações de (micro)organismos, mapeando diferenças individuais, e o estudo de seres humanos, buscando marcadores de doenças, estabelecendo a relação entre as doen-ças hereditárias e mutações no genoma, e a farmacogenética para adaptar tratamento à genética individual, entre outros.

Metagenômica: o mundo desconhecido – Por outro lado, notou-se que o material genético total isolado de solo, de água doce ou do mar, no interior ou na superfície de organismos inclusive dos seres humanos, revela uma diversidade muito maior de organismos, na maior parte desconhecidos, em abor-dagem chamada de metagenômica. Só uma pequena fração é cultivável no laboratório. Os cientistas já sonham determinar o código genético de todas as espécies na Terra.

Limitações computacionais – Diversos entraves precisam ser resolvidos. A nossa capacidade computacional, de armazena-mento, de transmissão de dados e os algoritmos para análise de “Big Data” e visualização são insuficientes. A migração para datacenters e nuvens gigantes, e o transporte físico de discos rígi-dos, até mesmo em caminhões inteiros, não resolvem todos os problemas. Nenhum banco de dados único contém todos os dados genéticos atuais, e muitos desenvolvem novas formas de representar e interpretar a informação. Entre elementos regula-tórios e estruturais, o genoma codifica para proteínas estruturais e principalmente funcionais como enzimas catalisadoras do metabolismo das células, para transformar nutrientes em uma grande variedade de substâncias químicas, de pequenas molécu-las orgânicas a produtos intermediários e polímeros como açú-cares, ácidos nucleicos, ácidos graxos e lipídeos.

“Desvendando Mistérios de Genomas” e o WCGrid – Em 2007, conhecia-se cerca de 400 genomas completos e 3,5 milhões de sequências proteicas de cerca de 4.000 organismos.

DA Fiocruz e a World Community Grid (WCGrid) lançaram um projeto para comparar todas entre si, verificando predições computacionais de anotação funcional. O resultado foi disponi-bilizado para a comunidade científica. Agora, há cerca de 70 milhões de sequências de proteínas de mais de 54.000 espécies. Um número muito maior ainda de sequências metagenômicas precisa ser analisado, entre outros vindo de uma colaboração com o Dr. Torsten Thomas, da Universidade de South New Wales, na Austrália, que gera dados de ecossistemas marinhos. A interpretação funcional e a determinação da relação precisa entre os micro-organismos, na sua maioria desconhecidos, torna-se uma tarefa para um supercomputador, dedicando tempo muito custoso, ou então, para um sistema “grid”, com-posto de centenas de milhares de computadores como a WCGrid. Assim, mais de 200 milhões de sequências de proteí-nas serão comparadas ao longo de um ano, em vez de 40.000 anos se fossem executadas por um único computador.

Aplicações em saúde, ambiente e agricultura – Os resulta-dos dos cálculos ainda precisam ser processados e disponibiliza-dos em uma base de dados, contendo as relações entre as proteí-nas de todos os seres vivos conhecidos no momento, porém com atualização fácil e contínua. Esta permitirá desenvolver novas estratégias contra patógenos de humanos, animal, agríco-la ou do ambiente, permitindo estudar a detecção (diagnóstico), tratamento e a concepção de vacinas. Muitas outras aplicações são esperadas, baseadas na vasta variedade de proteínas e enzi-mas da biodiversidade, como bioinseticidas, novos antibióticos, enzimas que degradam e eliminam resíduos industriais ou polu-entes, como petróleo, metais pesados ou produtos químicos orgânicos. Enzimas podem auxiliar na síntese e na produção de produtos químicos (biotransformações), ou de celulose, de tecidos e de cosméticos.

Biologia sintética – Uma das principais aplicações, em curto prazo, está na biologia sintética, envolvendo a engenharia bio-química de micro-organismos para a produção de biofármacos, mas também de plásticos verdes (petróleo independente), química verde, e para os biocombustíveis, como o bioetanol e álcoois superiores, querosene e biodiesel. Para a bioengenharia de micro-organismos, é preciso ter um profundo conhecimen-to das vias bioquímicas, da sua regulação e da engenharia gené-tica. Através de projetos como o “Desvendando Mistérios de Genomas”, a grande variedade de funções enzimáticas e bioló-gicas ainda desconhecidas na natureza irá se tornar disponível para nós.

RUMOS – 48 – Novembro/Dezembro 2014

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“Desvendando Mistérios de Genomas”: um projeto de computação intensiva

Pesquisador titular do Laboratório de Genômica Funcional e Bioinformáticado Instituto Oswaldo Cruz.

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Por Carmen Nery

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A agência do Rio Grande do Sul do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE) revisou sua estratégia de atuação, envolveu toda a equipe e agora colhe os frutos de seguir à risca o planejamento estratégicoE E

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epois de ver a contratação de operações cair de R$ 650 milhões em 2009 para R$ 460 milhões em 2010, a Agência do Rio Grande do Sul (AGRS) do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE) empreendeu um amplo

esforço para a elaboração de um planejamento estratégico de longo prazo. Para o superintendente da AGRS, Paulo André Raffin, foi preciso rever a estratégia e considerar que os financiamentos e empréstimos do estado constituem uma importante fonte de recursos para os empreendedores da região. Entretanto os recursos nem sempre existem em quan-tidade suficiente e são liberados com a agilidade necessária.

Os resultados do planejamento estratégico foram imedia-tos e vêm se repetindo anualmente desde então. Em 2012, o valor das contratações da agência aumentou 60%, passando para R$ 744,3 milhões. No ano passado, o valor das contrata-ções da agência ultrapassou a meta planejada de R$ 700 milhões e atingiu R$ 1.083 bilhão, muito superior aos dos anos anteriores.

O principal objetivo do planejamento estratégico foi aumentar a participação da AGRS no mercado de crédito de longo prazo do estado do Rio Grande do Sul. Ao assumirem a representação gaúcha no BRDE em 2011, os diretores Carlos Henrique Horn e José Hermeto Hoffmann incentivaram e motivaram a superintendência e as gerências de planejamento, operacional e administrativa da AGRS para a elaboração de uma estratégia. O primeiro passo foi a realização de um work-shop intitulado “Estratégia de atuação para prospecção, libe-ração e contratação de projetos”. Em um sábado de dezembro de 2011, o encontro, sob coordenação de consultoria externa, teve o objetivo de reunir, voluntariamente, funcionários de diversos setores para refletir sobre a atuação da agência, anali-sar as forças, fraquezas, oportunidades e ameaças, além de encaminhar ações para avançar nos resultados de atuação no ano de 2012. Desse trabalho, foram apontadas 43 ações, sendo 22 ações externas à agência e 21 internas.

No início de 2012, o planejamento prosseguiu com um exercício para analistas de projetos da AGRS e da diretoria geral, utilizando-se o método GUT (Gravidade, Urgência e Tendência), a fim de hierarquizar essas ações. Como resul-tado desses dois trabalhos, foram hierarquizadas 11 diretri-zes básicas de ação e 15 projetos.

As principais diretrizes da Estratégia RS estão relacio-nadas à prospecção, à contratação de operações e à manu-tenção da carteira de clientes. Para Raffin, foi necessário ter uma visão geral do processo. “Importante este panorama para que possamos entender a estratégia e perceber como uma ação individual pode interferir no projeto como um todo”, diz o superintendente.

Graciele Dequi, gerente de operações da AGRS, explica que, para aumentar a adesão e compreensão dos colaborado-res, foi preciso incluí-los no processo. Ela defende que metas devem ser definidas por todos e não por uma ou duas pesso-as. “Metas construídas em conjunto aumentam o engajamen-to das pessoas no cumprimento e alcance, pois permitem o entendimento do porquê de cada ação”, observa.

Durante o ano de 2012, houve um acompanhamento das ações relativas às 11 diretrizes básicas e aos 15 projetos, sob a coordenação do superintendente Carlos Horn e de gerentes da agência. Para a adesão e comprometimento dos colabora-dores, foi de fundamental importância que todos compreen-dessem o processo e se comprometessem. Em outubro de 2012, Raffin realizou reuniões de sensibilização, intituladas “Compartilha BRDE”, com o objetivo de apresentar o anda-mento das ações a todos os colaboradores locais.

Foram apresentados aos colaboradores a situação dos 15 projetos, a definição de metas e os resultados das ações para qualificar e agilizar a prospecção e a contratação de cli-entes. Outros objetivos apresentados foram as necessida-des de se ampliar a capilaridade do banco por meio de con-vênios e consultores, desenvolver políticas para posiciona-mento competitivo, mapear oportunidades e incrementar a

comunicação e a gestão de Recursos Humanos (RH). Nessa reunião de sensibilização, o gerente de planeja-

mento, Alexander Leitzke, destacou a figura do Gestor de Clientes, um modelo que está sendo utilizado pelos técni-cos e que servirá para mapear o histórico e assegurar o vín-culo dos clientes com o BRDE. “Cada cliente terá um ges-tor e saberá quem é responsável pela sua conta e a quem se dirigir em caso de dúvidas. Esse processo aumenta a fideli-zação de clientes junto ao banco, pois personaliza o atendi-mento”, explica Leitzke.

O ganho com o planejamento foi tão efetivo que as equi-pes das áreas de recuperação de crédito e jurídica realizaram, em junho de 2013, um workshop similar de alinhamento das melhores práticas. Segundo José Hermeto Hoffmann, dire-tor de acompanhamento e recuperação de crédito, o objetivo foi de que a iniciativa potencializasse a ação da agência nessa área, aproveitando as experiências e os processos bem-sucedidos das áreas operacionais e de planejamento.

Em maio de 2014, dando continuidade ao trabalho de acompanhamento e controle das diretrizes, foi realizada reu-nião sobre Estratégia RS com o objetivo de discutir aspectos das diretrizes da agência relacionados às áreas de planeja-mento e operações. Com a presença de todos os gestores da agência, o encontro, dessa vez, foi mediado pelo superinten-dente e pela técnica de Recursos Humanos, que adotaram a metodologia de exposição teórica e discussões em grupo.

Alexander Leitzke diz que a meta para este ano foi man-tida em R$ 800 milhões em função da conjuntura adversa de um ano atípico com Copa do Mundo, eleições, aumento das taxas de juros e redução da atividade econômica. O número de contratações, porém, é crescente: foram 900 contratos em 2012, 1,9 mil no ano passado, e este ano deve

chegar a 2 mil contratações. “Toda a estratégia serviu para unir mais a AGRS e para que todos soubessem o que cada setor está fazendo. Mapeamos a carteira de clientes; defini-mos a figura do gestor de clientes, que passa a ter uma carte-ira com a qual mantém contato regular, atuando como um assessor; implantamos um novo escritório regional em Caxi-as do Sul e melhoramos os outros três existentes”, afirma o gerente de planejamento.

Graciele Dequi acrescenta que também foram reestru-turadas as gerências. Foi criada a gerência de convênios, que visa a dar capilaridade à agência e agilizar operações por meio de convênios com cooperativas de crédito e de produ-ção, fabricantes e revendas de máquinas e equipamentos. “Além disso, foi mantida a gerência rural, que ficou focada em crédito a produtores rurais e também à agricultura fami-liar”, explica Graciele.

Também foram ampliados os serviços da agência por meio da oferta de carta fiança, consultoria e avaliações. A rentabilidade das operações está sendo monitorada, e a bus-ca de excelência nos serviços prestados vem sendo obtida por meio de treinamentos e capacitação. A agência também vem trabalhando forte em inovação por meio das linhas Finep InovaCred e BNDES MPME Inovadora (micro, pequena e média empresas).

O planejamento também direcionou a AGRS para um novo esforço de imagem do Banco Regional de Desenvol-vimento do Extremo Sul no mercado gaúcho, associando-a a seus parceiros, o que consolidou uma nova política merca-dológica. Além disso, desenvolveu e orientou a prática de marketing na agência, criando relatórios de controle para as gerências, realizando reuniões periódicas e monitorando a movimentação da concorrência.

Planejamento de longo prazo

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Por Carmen Nery

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A agência do Rio Grande do Sul do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE) revisou sua estratégia de atuação, envolveu toda a equipe e agora colhe os frutos de seguir à risca o planejamento estratégicoE E

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esforço para a elaboração de um planejamento estratégico de longo prazo. Para o superintendente da AGRS, Paulo André Raffin, foi preciso rever a estratégia e considerar que os financiamentos e empréstimos do estado constituem uma importante fonte de recursos para os empreendedores da região. Entretanto os recursos nem sempre existem em quan-tidade suficiente e são liberados com a agilidade necessária.

Os resultados do planejamento estratégico foram imedia-tos e vêm se repetindo anualmente desde então. Em 2012, o valor das contratações da agência aumentou 60%, passando para R$ 744,3 milhões. No ano passado, o valor das contrata-ções da agência ultrapassou a meta planejada de R$ 700 milhões e atingiu R$ 1.083 bilhão, muito superior aos dos anos anteriores.

O principal objetivo do planejamento estratégico foi aumentar a participação da AGRS no mercado de crédito de longo prazo do estado do Rio Grande do Sul. Ao assumirem a representação gaúcha no BRDE em 2011, os diretores Carlos Henrique Horn e José Hermeto Hoffmann incentivaram e motivaram a superintendência e as gerências de planejamento, operacional e administrativa da AGRS para a elaboração de uma estratégia. O primeiro passo foi a realização de um work-shop intitulado “Estratégia de atuação para prospecção, libe-ração e contratação de projetos”. Em um sábado de dezembro de 2011, o encontro, sob coordenação de consultoria externa, teve o objetivo de reunir, voluntariamente, funcionários de diversos setores para refletir sobre a atuação da agência, anali-sar as forças, fraquezas, oportunidades e ameaças, além de encaminhar ações para avançar nos resultados de atuação no ano de 2012. Desse trabalho, foram apontadas 43 ações, sendo 22 ações externas à agência e 21 internas.

No início de 2012, o planejamento prosseguiu com um exercício para analistas de projetos da AGRS e da diretoria geral, utilizando-se o método GUT (Gravidade, Urgência e Tendência), a fim de hierarquizar essas ações. Como resul-tado desses dois trabalhos, foram hierarquizadas 11 diretri-zes básicas de ação e 15 projetos.

As principais diretrizes da Estratégia RS estão relacio-nadas à prospecção, à contratação de operações e à manu-tenção da carteira de clientes. Para Raffin, foi necessário ter uma visão geral do processo. “Importante este panorama para que possamos entender a estratégia e perceber como uma ação individual pode interferir no projeto como um todo”, diz o superintendente.

Graciele Dequi, gerente de operações da AGRS, explica que, para aumentar a adesão e compreensão dos colaborado-res, foi preciso incluí-los no processo. Ela defende que metas devem ser definidas por todos e não por uma ou duas pesso-as. “Metas construídas em conjunto aumentam o engajamen-to das pessoas no cumprimento e alcance, pois permitem o entendimento do porquê de cada ação”, observa.

Durante o ano de 2012, houve um acompanhamento das ações relativas às 11 diretrizes básicas e aos 15 projetos, sob a coordenação do superintendente Carlos Horn e de gerentes da agência. Para a adesão e comprometimento dos colabora-dores, foi de fundamental importância que todos compreen-dessem o processo e se comprometessem. Em outubro de 2012, Raffin realizou reuniões de sensibilização, intituladas “Compartilha BRDE”, com o objetivo de apresentar o anda-mento das ações a todos os colaboradores locais.

Foram apresentados aos colaboradores a situação dos 15 projetos, a definição de metas e os resultados das ações para qualificar e agilizar a prospecção e a contratação de cli-entes. Outros objetivos apresentados foram as necessida-des de se ampliar a capilaridade do banco por meio de con-vênios e consultores, desenvolver políticas para posiciona-mento competitivo, mapear oportunidades e incrementar a

comunicação e a gestão de Recursos Humanos (RH). Nessa reunião de sensibilização, o gerente de planeja-

mento, Alexander Leitzke, destacou a figura do Gestor de Clientes, um modelo que está sendo utilizado pelos técni-cos e que servirá para mapear o histórico e assegurar o vín-culo dos clientes com o BRDE. “Cada cliente terá um ges-tor e saberá quem é responsável pela sua conta e a quem se dirigir em caso de dúvidas. Esse processo aumenta a fideli-zação de clientes junto ao banco, pois personaliza o atendi-mento”, explica Leitzke.

O ganho com o planejamento foi tão efetivo que as equi-pes das áreas de recuperação de crédito e jurídica realizaram, em junho de 2013, um workshop similar de alinhamento das melhores práticas. Segundo José Hermeto Hoffmann, dire-tor de acompanhamento e recuperação de crédito, o objetivo foi de que a iniciativa potencializasse a ação da agência nessa área, aproveitando as experiências e os processos bem-sucedidos das áreas operacionais e de planejamento.

Em maio de 2014, dando continuidade ao trabalho de acompanhamento e controle das diretrizes, foi realizada reu-nião sobre Estratégia RS com o objetivo de discutir aspectos das diretrizes da agência relacionados às áreas de planeja-mento e operações. Com a presença de todos os gestores da agência, o encontro, dessa vez, foi mediado pelo superinten-dente e pela técnica de Recursos Humanos, que adotaram a metodologia de exposição teórica e discussões em grupo.

Alexander Leitzke diz que a meta para este ano foi man-tida em R$ 800 milhões em função da conjuntura adversa de um ano atípico com Copa do Mundo, eleições, aumento das taxas de juros e redução da atividade econômica. O número de contratações, porém, é crescente: foram 900 contratos em 2012, 1,9 mil no ano passado, e este ano deve

chegar a 2 mil contratações. “Toda a estratégia serviu para unir mais a AGRS e para que todos soubessem o que cada setor está fazendo. Mapeamos a carteira de clientes; defini-mos a figura do gestor de clientes, que passa a ter uma carte-ira com a qual mantém contato regular, atuando como um assessor; implantamos um novo escritório regional em Caxi-as do Sul e melhoramos os outros três existentes”, afirma o gerente de planejamento.

Graciele Dequi acrescenta que também foram reestru-turadas as gerências. Foi criada a gerência de convênios, que visa a dar capilaridade à agência e agilizar operações por meio de convênios com cooperativas de crédito e de produ-ção, fabricantes e revendas de máquinas e equipamentos. “Além disso, foi mantida a gerência rural, que ficou focada em crédito a produtores rurais e também à agricultura fami-liar”, explica Graciele.

Também foram ampliados os serviços da agência por meio da oferta de carta fiança, consultoria e avaliações. A rentabilidade das operações está sendo monitorada, e a bus-ca de excelência nos serviços prestados vem sendo obtida por meio de treinamentos e capacitação. A agência também vem trabalhando forte em inovação por meio das linhas Finep InovaCred e BNDES MPME Inovadora (micro, pequena e média empresas).

O planejamento também direcionou a AGRS para um novo esforço de imagem do Banco Regional de Desenvol-vimento do Extremo Sul no mercado gaúcho, associando-a a seus parceiros, o que consolidou uma nova política merca-dológica. Além disso, desenvolveu e orientou a prática de marketing na agência, criando relatórios de controle para as gerências, realizando reuniões periódicas e monitorando a movimentação da concorrência.

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intervenção do Estado no sistema financeiro, com a presença de bancos públicos, sempre foi intensamente debatida entre os pesquisadores, com argumentos contra e a favor da existência des-

sas instituições. Uma parte dessa discussão envolve os bancos de desenvolvimento (BDs), que tiveram papel fundamental na recuperação da crise de 2008/2009. Naquela ocasião, eviden-ciou-se a extrema importância de instituições financeiras públicas qualificadas em momentos de retração do crédito pri-vado, pois evitam quedas abruptas nos financiamentos aos investimentos. Situações financeiras de extrema gravidade exi-giram ações imediatas e eficientes: o sucesso da atuação dos BDs de países desenvolvidos e em desenvolvimento deveu-se ao fato de serem instituições já consolidadas e com grande experiência de atuação. Essa constatação tornou oportuna a discussão sobre o papel desses bancos na economia mundial, muitas vezes considerados seres exóticos, típicos de países em desenvolvimento e mercados financeiros incompletos.

É importante discernir a atuação de curto prazo do papel de longo prazo dos BDs. A curto prazo, destaca-se o papel anticíclico e estabilizador do mercado financeiro, garantin-do a oferta do crédito em momentos de maior incerteza e redução dos financiamentos privados. A possibilidade de fal-ta de crédito agrava-se em momentos de crises econômicas. As evidências mostram que o comportamento do sistema financeiro é pró-cíclico: em situações de crise, a oferta de cré-dito diminui mais do que se expande em fases de crescimen-to econômico. Em momentos de incertezas sobre os rumos da economia, a preferência pela liquidez aumenta de forma expressiva. Por isso, o crédito torna-se mais caro, escasso e concentrado nos momentos de maior instabilidade macroe-conômica, exatamente quando mecanismos de refinancia-mento e de apoio financeiro são mais necessários. Isso apro-funda a instabilidade e inviabiliza diversos projetos de inves-timento¹. Nesses casos, os BDs assumem importante fun-

ção anticíclica, fornecendo recursos para o financiamento dos projetos de investimento em um momento de estanca-mento do crédito privado.

O papel de longo prazo dos BDs, por sua vez, é permanente e decorre do próprio dinamismo do processo de desenvolvi-mento. As “missões” e objetivos dos BD mudam ao longo do tempo, refletindo diferentes estágios de desenvolvimento dos países. Em nações em desenvolvimento como o Brasil e a China, por exemplo, os BDs têm uma atuação mais abrangente, financi-ando projetos em diversos setores da economia. Entretanto, mes-mo em economias desenvolvidas, nas quais já houve o avanço ex-pressivo dos diversos setores produtivos, a ação dos BDs conti-nua fundamental – haja vista a importância do KfW Bankengruppe (KfW), na Alemanha (ver Rumos nº 274). O enfrentamento dos novos desafios econômicos, sociais e ambi-entais se coloca tanto para países em desenvolvimento quanto para as economias mais avançadas – e os bancos de desenvolvi-mento são instrumentos valiosos em cada um dos casos.

As evidências internacionais mostram que os BDs não des-locam instituições financeiras privadas do mercado, mas, sim, atuam de forma complementar, oferecendo o crédito necessá-rio para projetos estratégicos, mas pouco atraentes para as ins-tituições privadas. Assim, a importância dos BDs vai muito além da questão de “falha de mercado”, pela existência de sis-temas financeiros incompletos. Em razão da incerteza quanto ao futuro, dependendo das características dos novos segmen-tos que precisem ser apoiados, pode não haver instituições pri-vadas dispostas a ofertar o crédito necessário. E esse problema continua, mesmo que haja sistemas financeiros nacionais e internacionais bastante desenvolvidos. O apoio dos BDs justi-fica-se porque são segmentos altamente complexos e comu-mente dispendiosos, que exigem uma expertise sofisticada para avaliação, geram impactos positivos em toda a economia (ex-ternalidades positivas) e/ou onde prevalecem os retornos soci-ais sobre os retornos privados. Dentre os que inspiram maior

incerteza, destacam-se a infraestrutura; a inovação tecnológi-ca; o apoio às micro, pequenas e médias empresas (MPME); microcrédito e projetos econômicos ambiental e socialmente responsáveis (fontes alternativas de energia e outras iniciativas da “economia verde”).

Os BDs são essenciais para apoiar políticas e estratégias de desenvolvimento e são muito comuns em vários países, em diversos estágios de desenvolvimento. Entretanto, não há um modelo único de atuação. Os BDs podem ser diferentes quan-to a: 1) a estrutura de propriedade (total ou parcialmente públi-cos); 2) o foco de atuação (restrito ou amplo); 3) formas de financiamento (diretos ou indiretos); 4) os custos dos financia-mentos; 5) o ambiente regulatório ao qual estão subordinados; 6) a governança corporativa; e 7) o tamanho, o portfólio de empréstimos e a performance financeira².

A importância dos BD nas economias desenvolvidas e em desenvolvimento é constatada quando se observa a razão ati-vo/Produto Interno Bruto (PIB) de três grandes bancos de desenvolvimento do mundo. No caso do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), em 2013, esse indicador foi de 16,2%, em linha com o KfW (17,0%) e China Development Bank (CDB) (14,4%). De fato, muitos paí-ses não têm um único BD, mas um sistema de instituições de desenvolvimento que abrange os segmentos típicos de atuação dos BDs (infraestrutura, inovação, MPME, entre outros). Na China, por exemplo, o CDB, juntamente com o Agricultural Development Bank e o China Eximbank representam 22,32% do PIB em termo de ativos. Na Alemanha, por sua vez, além do KfW e do Retenbank, especializado no financiamento à agricultura, há 17 bancos de desenvolvimento regionais.

Quando se considera a participação das carteiras das insti-tuições no PIB, a atuação é relevante: três dos maiores BDs nacionais (CDB, KfW, e BNDES) têm uma carteira de crédito superior a 10% do PIB de seus países, com destaque para o KfW, com 14,5%, em 2013.

Podemos citar como exemplos do papel fundamental dos BDs no processo de mudança estrutural a relevância do CDB e do KfW nos investimentos em energia alternativa, do Business Development Bank of Canada (BDC) para as MPME tecnoló-gicas, e do Korea Development Bank (KDB) na política indus-trial com alto viés tecnológico e inovador da Coreia do Sul.

Além da sua relevância econômica, a expertise dessas institui-ções históricas as capacita para avaliar projetos além do finance-iro, considerando as diversas externalidades e impactos. Por isso, medir a efetividade dos seus financiamentos em atingir objetivos de promoção do desenvolvimento é necessário para

legitimar a sua atuação. Cabe ressaltar, no entanto, que as carac-terísticas dinâmicas do desenvolvimento dificultam a mensura-ção dessa efetividade e, portanto, a análise deve ser cautelosa.

A experiência histórica dos BDs mostra que as instituições que se mantêm importantes até hoje possuem um funding está-vel, sustentabilidade financeira, transparência e mandato bem definido. Portanto, a questão que se coloca não é a necessidade de um BD, mas sim como operá-lo de forma a alcançar os obje-tivos de desenvolvimento de longo prazo.

Colocando o sistema financeiro em uma perspectiva futu-ra e em um cenário com crescente financeirização da econo-mia, somente a regulação não poderá conter as perdas para a sociedade relacionadas às atividades especulativas, à excessiva alavancagem e à crescente complexidade do sistema financei-ro. Muitas vezes as instituições privadas não têm interesse em prover financiamentos, especialmente de longo prazo, para determinados segmentos, por isso é preciso um sistema finan-ceiro funcional e inovador, no qual os setores privado e públi-co atuem de forma conjunta.

Portanto, os BDs continuarão fundamentais para ofertar o financiamento de longo prazo para os setores produtivos, em detrimento de atividades especulativas ou de curto prazo. Isto pode ser facilitado pela implantação de inovações financeiras pelos BDs que possam ser compartilhadas pelo setor privado. Com as transformações recentes e futuras do sistema financei-ro, como meios de pagamento digitais, clubes de empréstimo, entre outros, que poderão tornar os passivos privados cada vez mais de curto prazo, os BDs terão papel ainda mais relevante em prover financiamento de longo prazo a fim de fazer frente aos novos desafios colocados pelo processo de desenvolvi-mento econômico, social e ambiental.

RUMOS – 52 – Novembro/Dezembro 2014

Ana Cláudia Além e Rodrigo Madeira

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Quem precisa de bancos de desenvolvimento?

O sexto artigo desta série trata da importância da atuação das Instituições Financeiras de Desenvolvimento (IFD) para o bom desempenho da economia, principalmente, mas não exclusivamente, em momentos de crise. O artigo traz ainda exemplos de diversos lugares do mundo e apresenta os vários modelos de atuação que cada IFD pode ter.

1.Ver Kregel (1997), Margins of safety and weight of the argument in generating financial instability. Journal of Economic Issues, v. 31, n. 2; Minsky (1982), Can '’IT' happen again? Essays on instability and finance. New York: M. E. Sharpe; Minsky (1986) Stabilizing an unstable economy. New Haven: Yale University Press; Crotty (2011), The realism of assumptions does matter: why Keynes-Minsky theory must replace efficient market theory as the guide to financial regulation policy, Working Paper 5, University of Massachusetts; e Findley e Williams (1985), A post keynesian view of modern financial economics: in search of alternative paradigms. Journal of Business and Finance, v. 12, n. 1, abr.-jun.2.Ver “A contribuição dos bancos de desenvolvimento para o financiamento de longo prazo”, de Ana Cláudia Além e Rodrigo Madeira, publicado na Revista do BNDES 40, dezembro de 2013.

Ana Claúdia é chefe do Departamento e Rodrigo é gerente, ambos da Área de Pesquisa e Acompanhamento Econômico do BNDES.

Page 53: Rumos 278

REFLEXÃO

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RUMOS – 53 – Novembro/Dezembro 2014

intervenção do Estado no sistema financeiro, com a presença de bancos públicos, sempre foi intensamente debatida entre os pesquisadores, com argumentos contra e a favor da existência des-

sas instituições. Uma parte dessa discussão envolve os bancos de desenvolvimento (BDs), que tiveram papel fundamental na recuperação da crise de 2008/2009. Naquela ocasião, eviden-ciou-se a extrema importância de instituições financeiras públicas qualificadas em momentos de retração do crédito pri-vado, pois evitam quedas abruptas nos financiamentos aos investimentos. Situações financeiras de extrema gravidade exi-giram ações imediatas e eficientes: o sucesso da atuação dos BDs de países desenvolvidos e em desenvolvimento deveu-se ao fato de serem instituições já consolidadas e com grande experiência de atuação. Essa constatação tornou oportuna a discussão sobre o papel desses bancos na economia mundial, muitas vezes considerados seres exóticos, típicos de países em desenvolvimento e mercados financeiros incompletos.

É importante discernir a atuação de curto prazo do papel de longo prazo dos BDs. A curto prazo, destaca-se o papel anticíclico e estabilizador do mercado financeiro, garantin-do a oferta do crédito em momentos de maior incerteza e redução dos financiamentos privados. A possibilidade de fal-ta de crédito agrava-se em momentos de crises econômicas. As evidências mostram que o comportamento do sistema financeiro é pró-cíclico: em situações de crise, a oferta de cré-dito diminui mais do que se expande em fases de crescimen-to econômico. Em momentos de incertezas sobre os rumos da economia, a preferência pela liquidez aumenta de forma expressiva. Por isso, o crédito torna-se mais caro, escasso e concentrado nos momentos de maior instabilidade macroe-conômica, exatamente quando mecanismos de refinancia-mento e de apoio financeiro são mais necessários. Isso apro-funda a instabilidade e inviabiliza diversos projetos de inves-timento¹. Nesses casos, os BDs assumem importante fun-

ção anticíclica, fornecendo recursos para o financiamento dos projetos de investimento em um momento de estanca-mento do crédito privado.

O papel de longo prazo dos BDs, por sua vez, é permanente e decorre do próprio dinamismo do processo de desenvolvi-mento. As “missões” e objetivos dos BD mudam ao longo do tempo, refletindo diferentes estágios de desenvolvimento dos países. Em nações em desenvolvimento como o Brasil e a China, por exemplo, os BDs têm uma atuação mais abrangente, financi-ando projetos em diversos setores da economia. Entretanto, mes-mo em economias desenvolvidas, nas quais já houve o avanço ex-pressivo dos diversos setores produtivos, a ação dos BDs conti-nua fundamental – haja vista a importância do KfW Bankengruppe (KfW), na Alemanha (ver Rumos nº 274). O enfrentamento dos novos desafios econômicos, sociais e ambi-entais se coloca tanto para países em desenvolvimento quanto para as economias mais avançadas – e os bancos de desenvolvi-mento são instrumentos valiosos em cada um dos casos.

As evidências internacionais mostram que os BDs não des-locam instituições financeiras privadas do mercado, mas, sim, atuam de forma complementar, oferecendo o crédito necessá-rio para projetos estratégicos, mas pouco atraentes para as ins-tituições privadas. Assim, a importância dos BDs vai muito além da questão de “falha de mercado”, pela existência de sis-temas financeiros incompletos. Em razão da incerteza quanto ao futuro, dependendo das características dos novos segmen-tos que precisem ser apoiados, pode não haver instituições pri-vadas dispostas a ofertar o crédito necessário. E esse problema continua, mesmo que haja sistemas financeiros nacionais e internacionais bastante desenvolvidos. O apoio dos BDs justi-fica-se porque são segmentos altamente complexos e comu-mente dispendiosos, que exigem uma expertise sofisticada para avaliação, geram impactos positivos em toda a economia (ex-ternalidades positivas) e/ou onde prevalecem os retornos soci-ais sobre os retornos privados. Dentre os que inspiram maior

incerteza, destacam-se a infraestrutura; a inovação tecnológi-ca; o apoio às micro, pequenas e médias empresas (MPME); microcrédito e projetos econômicos ambiental e socialmente responsáveis (fontes alternativas de energia e outras iniciativas da “economia verde”).

Os BDs são essenciais para apoiar políticas e estratégias de desenvolvimento e são muito comuns em vários países, em diversos estágios de desenvolvimento. Entretanto, não há um modelo único de atuação. Os BDs podem ser diferentes quan-to a: 1) a estrutura de propriedade (total ou parcialmente públi-cos); 2) o foco de atuação (restrito ou amplo); 3) formas de financiamento (diretos ou indiretos); 4) os custos dos financia-mentos; 5) o ambiente regulatório ao qual estão subordinados; 6) a governança corporativa; e 7) o tamanho, o portfólio de empréstimos e a performance financeira².

A importância dos BD nas economias desenvolvidas e em desenvolvimento é constatada quando se observa a razão ati-vo/Produto Interno Bruto (PIB) de três grandes bancos de desenvolvimento do mundo. No caso do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), em 2013, esse indicador foi de 16,2%, em linha com o KfW (17,0%) e China Development Bank (CDB) (14,4%). De fato, muitos paí-ses não têm um único BD, mas um sistema de instituições de desenvolvimento que abrange os segmentos típicos de atuação dos BDs (infraestrutura, inovação, MPME, entre outros). Na China, por exemplo, o CDB, juntamente com o Agricultural Development Bank e o China Eximbank representam 22,32% do PIB em termo de ativos. Na Alemanha, por sua vez, além do KfW e do Retenbank, especializado no financiamento à agricultura, há 17 bancos de desenvolvimento regionais.

Quando se considera a participação das carteiras das insti-tuições no PIB, a atuação é relevante: três dos maiores BDs nacionais (CDB, KfW, e BNDES) têm uma carteira de crédito superior a 10% do PIB de seus países, com destaque para o KfW, com 14,5%, em 2013.

Podemos citar como exemplos do papel fundamental dos BDs no processo de mudança estrutural a relevância do CDB e do KfW nos investimentos em energia alternativa, do Business Development Bank of Canada (BDC) para as MPME tecnoló-gicas, e do Korea Development Bank (KDB) na política indus-trial com alto viés tecnológico e inovador da Coreia do Sul.

Além da sua relevância econômica, a expertise dessas institui-ções históricas as capacita para avaliar projetos além do finance-iro, considerando as diversas externalidades e impactos. Por isso, medir a efetividade dos seus financiamentos em atingir objetivos de promoção do desenvolvimento é necessário para

legitimar a sua atuação. Cabe ressaltar, no entanto, que as carac-terísticas dinâmicas do desenvolvimento dificultam a mensura-ção dessa efetividade e, portanto, a análise deve ser cautelosa.

A experiência histórica dos BDs mostra que as instituições que se mantêm importantes até hoje possuem um funding está-vel, sustentabilidade financeira, transparência e mandato bem definido. Portanto, a questão que se coloca não é a necessidade de um BD, mas sim como operá-lo de forma a alcançar os obje-tivos de desenvolvimento de longo prazo.

Colocando o sistema financeiro em uma perspectiva futu-ra e em um cenário com crescente financeirização da econo-mia, somente a regulação não poderá conter as perdas para a sociedade relacionadas às atividades especulativas, à excessiva alavancagem e à crescente complexidade do sistema financei-ro. Muitas vezes as instituições privadas não têm interesse em prover financiamentos, especialmente de longo prazo, para determinados segmentos, por isso é preciso um sistema finan-ceiro funcional e inovador, no qual os setores privado e públi-co atuem de forma conjunta.

Portanto, os BDs continuarão fundamentais para ofertar o financiamento de longo prazo para os setores produtivos, em detrimento de atividades especulativas ou de curto prazo. Isto pode ser facilitado pela implantação de inovações financeiras pelos BDs que possam ser compartilhadas pelo setor privado. Com as transformações recentes e futuras do sistema financei-ro, como meios de pagamento digitais, clubes de empréstimo, entre outros, que poderão tornar os passivos privados cada vez mais de curto prazo, os BDs terão papel ainda mais relevante em prover financiamento de longo prazo a fim de fazer frente aos novos desafios colocados pelo processo de desenvolvi-mento econômico, social e ambiental.

RUMOS – 52 – Novembro/Dezembro 2014

Ana Cláudia Além e Rodrigo Madeira

Div

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Quem precisa de bancos de desenvolvimento?

O sexto artigo desta série trata da importância da atuação das Instituições Financeiras de Desenvolvimento (IFD) para o bom desempenho da economia, principalmente, mas não exclusivamente, em momentos de crise. O artigo traz ainda exemplos de diversos lugares do mundo e apresenta os vários modelos de atuação que cada IFD pode ter.

1.Ver Kregel (1997), Margins of safety and weight of the argument in generating financial instability. Journal of Economic Issues, v. 31, n. 2; Minsky (1982), Can '’IT' happen again? Essays on instability and finance. New York: M. E. Sharpe; Minsky (1986) Stabilizing an unstable economy. New Haven: Yale University Press; Crotty (2011), The realism of assumptions does matter: why Keynes-Minsky theory must replace efficient market theory as the guide to financial regulation policy, Working Paper 5, University of Massachusetts; e Findley e Williams (1985), A post keynesian view of modern financial economics: in search of alternative paradigms. Journal of Business and Finance, v. 12, n. 1, abr.-jun.2.Ver “A contribuição dos bancos de desenvolvimento para o financiamento de longo prazo”, de Ana Cláudia Além e Rodrigo Madeira, publicado na Revista do BNDES 40, dezembro de 2013.

Ana Claúdia é chefe do Departamento e Rodrigo é gerente, ambos da Área de Pesquisa e Acompanhamento Econômico do BNDES.

Page 54: Rumos 278

TROCA DE EXPERIÊNCIAS

PPELO MUNDO

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Sistema Nacional de Fomento (SNF) – composto por bancos públicos federais, bancos de desenvol-vimento controlados por estados da federação, bancos cooperativos, bancos públicos comerciais estaduais com carteira de desenvolvimento, agên-

cias de fomento, a Finep e o Sebrae – é constituído por institui-ções que são direta ou indiretamente afetadas pelas políticas públicas e ações do Estado. Esse conjunto de instituições que formam o SNF corresponde a um complexo e variado grupo que juntos são responsáveis por algo em torno de 54% do total do Saldo de Operações de Crédito do Sistema Financeiro Naci-onal, 48% dos Ativos e 30% do Patrimônio Líquido (segundo dados divulgados pelo Banco Central de junho de 2014).

A ABDE, como Associação que representa as instituições que formam o SNF, entende que a defesa desse Sistema é uma tarefa complexa e deve ser feita firmemente. Entende, tam-bém, que essa defesa deve ser cumprida com base nas teorias existentes e em experiências bem-sucedidas. Foi exatamente essa a ideia que originou esta coluna, intitulada “Pelo Mundo”, que conta as práticas de instituições financeiras de desenvolvi-mento em diferentes países do mundo. A comparação com experiências internacionais e sua inserção nos seus respectivos sistemas financeiros permite que entendamos a importância dessas Instituições Financeiras de Desenvolvimento para as economias locais. Pretendemos mostrar, com isso, que o Brasil não atua de forma isolada. Economias com sistemas nacionais de fomento forte estão menos suscetíveis às flutuações natura-is dos ciclos econômicos.

As teorias acerca da eficiência sobre esse Sistema variam enormemente. Por um longo período, muito em função dos descompassos patrimoniais das Instituições Financeiras de Desenvolvimento, mas principalmente fruto da onda liberali-zante que dominou a teoria econômica a partir dos anos 1980, tais instituições passaram por um processo de encolhimento (em termos de operações de crédito, ativos, quantidade e, prin-cipalmente, em importância). Essa tendência se reverteu consi-deravelmente a partir da crise econômica mundial que se iniciou em 2007/2008. Desde então, a atividade das instituições que formam o SNF tem se intensificado e seus agentes foram essen-

ciais para impedir o represamento da liquidez – não somente no Brasil, mas também naqueles países que contam com sistemas nacionais de fomento fortes. A atuação não apenas como ins-trumentos de políticas contracíclicas (a mais disseminada de todas as funções dos agentes do SNF), mas como entes minimi-zadores das incompletudes do mercado, vem se intensificando. Essa retomada de importância veio acompanhada pelo aumen-to das discussões acerca de sua funcionalidade e importância.

Com a presente edição, a coluna completa um ano. Foram seis artigos que de forma esclarecedora mostraram como funci-onam instituições de fomento em diversos países. O primeiro exemplo foi da Inglaterra e o Green Investment Bank (GIB) – um banco de desenvolvimento destinado apenas a projetos de inovação e eficiência ambiental. O banco foi constituído para colaborar com o atendimento dos objetivos do Protocolo de Kyoto e regulamentos do Estado. O segundo artigo tratou do sistema financeiro da Alemanha, enfatizando o KfW Banken-gruppe, um dos mais importantes bancos de desenvolvimento do mundo e um dos dez maiores bancos da Alemanha. O terceiro trouxe a experiência chinesa com seu banco de desen-volvimento – o gigante China Development Bank Corporation, e sua atuação como instrumento de políticas públicas, contribu-indo para o desenvolvimento daquele país. Na sequência, foi a vez do Overseas Private Investment Corporation, banco esta-dunidense que atua na promoção de negócios de empresas nacionais em economias emergentes. O quinto artigo tratou do Bpifrance – o banco de investimento público francês, de propri-edade dividida entre o Estado e a Caixa de Depósitos. Final-mente, essa edição trouxe uma defesa generalizada dos bancos públicos, mostrando exemplos e a importância de suas ações nas economias.

Continuaremos, ao longo de 2015, a publicar esta coluna, pois acreditamos que há, ainda, muitos exemplos a serem divul-gados. Sendo assim, estimulamos o debate apresentando mais experiências dos países que contam com instituições de fomen-to. Deveremos, também, incluir o papel das cooperativas de crédito para o desenvolvimento e fortalecimento dos sistemas nacionais de fomento. Esperamos que continuem nos acompa-nhando nesta série e que a mesma seja útil para reflexão.

RUMOS – 54 – Novembro/Dezembro 2014

Fernanda Feil

Formada em economia pela Universidade de São Paulo (USP) e mestre na mesma área pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Gerente de Estudos Econômicos da ABDE.

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Nós e os outros

Page 55: Rumos 278

AFAP – Agência de Fomento do Estado do Amapá S/APresidente: Sávio Pereswww.afap.ap.gov.br

AFEAM – Agência de Fomento do Estado do Amazonas S/A Presidente: Evandor Geber Filhowww.afeam.am.gov.br

AFERR – Agência de Fomento do Estado de Roraima S/A Presidente: Murilo Gomes Pereirawww.aferr.rr.gov.br

AGEFEPE – Agência de Fomento do Estado de Pernambuco S/A Presidente: Agnaldo Nunes de Souzawww.agefepe.pe.gov.br

AGERIO – Agência de Fomento do Estado do Rio de Janeiro S/A Presidente: José Domingos Vargaswww.agerio.com.br

AGN – Agência de Fomento do Rio Grande do Norte S/A Presidente: João Augusto da Cunha Melowww.agnrn.com.br

BADESC – Agência de Fomento do Estado de Santa Catarina S/A Presidente: Wellington Roberto Bieleckiwww.badesc.gov.br

BADESUL – Badesul Desenvolvimento S/A – Agência de Fomento RS Presidente: Marcelo de Carvalho Lopes www.badesul.com.br

BANCO DA AMAZÔNIA –Banco da Amazônia S/A Presidente: Valmir Pedro Rossiwww.bancoamazonia.com.br

BANCOOB – Banco Cooperativo do Brasil S/A Presidente: Marco Aurélio B. de Almada Abreuwww.bancoob.com.br

BANDES – Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo S/A Presidente: Guilherme Henrique Pereirawww.bandes.com.br

BANPARÁ – Banco do Estado do Pará S/A Presidente: Augusto Sergio Amorim Costawww.banparanet.com.br

BB – Banco do Brasil S/APresidente: Aldemir Bendinewww.bb.com.br

BDMG – Banco de Desenvolvimento do Estado de Minas Gerais S/A Presidente: Júlio Onofre Mendes www.bdmg.mg.gov.br

BNB – Banco do Nordeste S/A Presidente: Nelson Antônio de Souzawww.bnb.gov.br

BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social Presidente: Luciano Coutinhowww.bndes.gov.br

BRB – Banco de Brasília Presidente: Alair José Martins Vargaswww.brb.com.br

BRDE – Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul Presidente: Jorge Gomes Rosa Filhowww.brde.com.br

CAIXA – Caixa Econômica Federal Presidente: Jorge Fontes Heredawww.caixa.gov.br

DESENBAHIA – Agência de Fomento do Estado da Bahia S/A Presidente: Vitor Lopeswww.desenbahia.ba.gov.br

DESENVOLVE – Agência de Fomento do Estado de Alagoas S/A Presidente: Antonio Carlos Quintilianowww.desenvolve-al.com.brDESENVOLVE SP – Agência de

Desenvolvimento Paulista Presidente: Milton Luiz de Melo Santoswww.desenvolvesp.com.br

FINEP – Inovação e Pesquisa Presidente: Glauco Arbixwww.finep.gov.br

FOMENTO PARANÁ – Agência de Fomento do Paraná S/A Presidente: Juraci Barbosa Sobrinhowww.fomento.pr.gov.br

GOIÁSFOMENTO – Agência de Fomento do Estado de Goiás S/A Presidente: Humberto Tannús Júniorwww.fomento.goias.com.br

MT FOMENTO – Agência de Fomento do Estado de Mato Grosso S/A Presidente: Mário Milton Verlangieri Ferreira Mendeswww.mtfomento.mt.gov.br

PIAUÍ FOMENTO – Agência de Fomento e Desenvolvimento do Estado do Piauí S/A Presidente: Lucrecina Pereira da Silva (interina)www.fomento.pi.gov.br

SEBRAE – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas Presidente: Luiz Eduardo Barretto Filho www.sebrae.com.br

SISTEMA NACIONAL DE FOMENTO

Page 56: Rumos 278

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econô-mico e Social (BNDES) aprovou a concessão de apoio não reembolsável de R$ 41,8 milhões ao municí-pio de São Paulo, para ampliar o nível de reaprovei-tamento dos resíduos sóli-dos urbanos, com inclusão socioprodutiva dos catado-res de materiais recicláveis. Os recursos, originários do BNDES Fundo Social, representam 23% do total a ser investido no projeto, que é parte do Sistema Integrado de Gestão de Resíduos Sólidos Domiciliares, desenvolvido pela Autoridade Municipal de Limpeza Urbana (AMLURB).

A meta é universalizar a coleta seletiva domiciliar e elevar o aproveitamento dos resíduos sólidos dos níveis atuais de 1,6% para 10%, o que deverá gerar uma quantidade de resíduos muito superior à capacidade das cooperativas de triá-los. A AMLURB aprimorará a relação com as cooperativas, que formalizarão contratos de prestação de serviços e passarão a receber o pagamento pelos serviços ambientais urbanos. Ao final do projeto, cerca 1.500 catadores devem ser beneficiados.

RUMOS – 56 – Novembro/Dezembro 2014 RUMOS – 57 – Novembro/Dezembro 2014

A Agência de Fomento do Amapá (Afap) desem-penha papel fundamental na democratização do crédito, trazendo para o sistema de crédito local sobretudo empreendedo-res populares, a quem o acesso a bancos comerciais e de investimentos tradicionais eram negados, ou pelo exces-so de burocracia ou por eles não se enquadrarem nos perfis de clientes dessas instituições financeiras.

De maio de 2011 a outubro deste ano foram realizadas 6.692 operações de crédito, que somam o montante de R$ 37.589.593,29 de financiamentos. Desse total, R$ 31.289.241,97 foram com recursos próprios da Afap e R$ 6.300.351,32 por meio do Fundo de Desenvolvimento Rural do Amapá (Frap) e Fundo de Apoio ao Microempreendedor e ao Desenvolvimento do Artesanato do Amapá (Fundmicro). Segundo o presidente da Afap, Sávio Peres, a meta de 30 milhões até o fim de 2014 já foi atingida, superando assim as expectativas da instituição.

F FOMENTO

Com um ativo total de R$ 13,3 bilhões até outubro, a Finep (Pesquisa e Inovação) deve fechar 2014 com R$ 14 bilhões em volume de ativos, um crescimento de 23% em relação ao que foi apresentado no ano passado (R$ 11,4 bilhões). “O resultado é excelente se levarmos em conta que a Finep atua exclusivamente com financiamento à inovação”, afirma o diretor Financeiro e de Controladoria da agência, Cláudio Guimarães.

Desde 2010, quando tinha ativos totais de R$ 4,3 bilhões, houve um crescimento de mais de 300%. O aumento expressivo de operações de crédito foi o grande responsável pelo salto. Nesse segmento, a agência já movimentou cerca de R$ 7 bilhões até outubro deste ano, frente a R$ 1,5 bilhão em 2011.

O especialista do setor de Oportunidades para a Maioria (OMJ) do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Johnny Jirón, esteve em Ribeirão das Neves, em Minas Gerais, para conhecer a mercearia e açougue Esquinão da Carne, cliente do Banco de Desenvolvimen-to de Minas Gerais (BDMG) por meio da linha BDMG Acredita. O representante do BID foi

recebido pelos gerentes Estefano Winter e Thia-go Magalhães. A visita teve por objetivo conhecer

in loco como a empresa aplicou os recursos e os resultados obtidos. Duran-te a visita, o sócio Ronie Azevedo contou que “no início, tínhamos a expecta-tiva de dobrar o cresci-mento em seis meses. Com o apoio do BDMG, nós não apenas alcançamos esse resultado como o superamos. O nosso obje-tivo agora é continuar crescendo”. Lançado em abril deste ano, o BDMG Acredita liberou, até novembro, R$ 10,4 milhões para 726 empresas nascentes.

De janeiro a setembro de 2014, o lucro da Caixa foi de R$ 5,3 bilhões, alta de 5,6% em relação aos nove primeiros meses do ano passado. No ter-ceiro trimestre, o lucro líquido alcançou R$ 1,9 bilhão, cresci-mento de 1,0% em relação ao trimestre anterior e de 1,7% sobre o mesmo trimestre de

2013. O retorno sobre o patrimônio líquido médio nos últimos doze meses foi de 17,8%. O banco alcançou no trimestre saldo de R$ 1,0 trilhão em ativos próprios, 5,8% maior que o apre-sentado no segundo trimestre deste ano e 18,6% superior ao registrado no terceiro trimestre de 2013. “Esses números mar-cam a trajetória da Caixa e confirmam a sua relevância, fortale-cendo-a como um banco público de excelência”, comentou o presidente da instituição, Jorge Hereda.

Em nove meses, a Caixa injetou R$ 501,1 bilhões na eco-nomia brasileira por meio de contratações de crédito, paga-mento de benefícios sociais, investimentos em infraestrutura própria, remuneração de pessoal, e destinação social das lote-rias, dentre outros.

A Agência de Desenvolvi-mento Paulista (Desenvolve SP) acaba de atingir a marca de R$ 100 milhões em financiamentos con-cedidos pela Linha Economia Ver-de para projetos sustentáveis de pequenas e médias empresas pau-listas. Os recursos foram investi-dos em iniciativas que reduzem a emissão de gases causadores do efeito estufa e o impacto das ativi-dades produtivas no meio ambi-ente. O setor da indústria foi res-

ponsável por mais da metade do valor emprestado pela insti-tuição, R$ 52 milhões. O restante foi investido pelo setor do comércio e pelas empresas prestadoras de serviços. Ainda de acordo com o levantamento, os negócios de pequeno e médio porte representaram 43% e 57% na participação dos desem-bolsos, respectivamente. “Investir em um negócio ambiental-mente correto já não é apenas um diferencial no mercado, mas condição obrigatória para o sucesso das empresas”, diz Mil-ton Luiz de Melo Santos, presidente da instituição.

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GoiásFomento libera linha de crédito específica para contabilistas goianos

Desenvolve SP chega a R$ 100 milhões em financiamentos para Economia Verde

Afap supera a meta de R$ 30 milhões em financiamentos

BID visita empresa atendida pela linha BDMG Acredita

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Caixa supera marca de R$ 1 trilhãoem ativos próprios

BNDES apoia projeto de coleta

seletiva de catadores em SP

A partir do mês de novem-bro, os contabilistas de Goiás poderão contar com uma linha de crédito específica para a categoria por meio da Agência de Fomento do Esta-do, a GoiásFomento. O limite para capital de giro será de R$ 2 milhões, e para investimento R$ 4 milhões. A assinatura do protocolo de intenções foi feita entre a GoiásFomento, o Conselho Regional de Conta-bilidade (CRC), Sindicato dos Contabilistas no estado de Goiás e Sindicato de Contabi-listas de Anápolis. O objetivo é que todos os profissionais dessa categoria tenham acesso a essa linha de crédito.

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Finep deve fechar 2014 com R$ 14 bilhões em ativos

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O C o n s e l h o R e g i o n a l d e Economia do Rio G r a n d e d o S u l ( C o r e c o n / R S ) premiou, em dezem-bro, profissionais da área e jornalistas de-dicados ao segmento que se destacaram durante 2014. O prê-

mio máximo da entidade, Economista do Ano de 2014, foi concedido ao presidente da ABDE e diretor de Planejamento do BRDE, Carlos Henrique Horn. “É uma grande honra ser escolhido um dos destaques da profissão por uma comissão julgadora composta por colegas em atuação nos setores público e privado”, disse Horn, salientando a capacidade da academia gaúcha em promover uma formação ampla, que permite o contato com todas as teorias econômicas. A iniciativa do Corecon/RS reconhece os profissionais que atuam nos mais diferentes campos, engajados em atividades dos setores privado ou público, academia ou autônomos. A distinção é entregue àqueles que tenham se destacado por sua contribuição no fortalecimento do desenvolvimento econômico regional ou nacional.

Diretor do BRDE e presidente da

ABDE recebe prêmio Economista

do Ano 2014

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O Banco Nacional de Desenvolvimento Econô-mico e Social (BNDES) aprovou a concessão de apoio não reembolsável de R$ 41,8 milhões ao municí-pio de São Paulo, para ampliar o nível de reaprovei-tamento dos resíduos sóli-dos urbanos, com inclusão socioprodutiva dos catado-res de materiais recicláveis. Os recursos, originários do BNDES Fundo Social, representam 23% do total a ser investido no projeto, que é parte do Sistema Integrado de Gestão de Resíduos Sólidos Domiciliares, desenvolvido pela Autoridade Municipal de Limpeza Urbana (AMLURB).

A meta é universalizar a coleta seletiva domiciliar e elevar o aproveitamento dos resíduos sólidos dos níveis atuais de 1,6% para 10%, o que deverá gerar uma quantidade de resíduos muito superior à capacidade das cooperativas de triá-los. A AMLURB aprimorará a relação com as cooperativas, que formalizarão contratos de prestação de serviços e passarão a receber o pagamento pelos serviços ambientais urbanos. Ao final do projeto, cerca 1.500 catadores devem ser beneficiados.

RUMOS – 56 – Novembro/Dezembro 2014 RUMOS – 57 – Novembro/Dezembro 2014

A Agência de Fomento do Amapá (Afap) desem-penha papel fundamental na democratização do crédito, trazendo para o sistema de crédito local sobretudo empreendedo-res populares, a quem o acesso a bancos comerciais e de investimentos tradicionais eram negados, ou pelo exces-so de burocracia ou por eles não se enquadrarem nos perfis de clientes dessas instituições financeiras.

De maio de 2011 a outubro deste ano foram realizadas 6.692 operações de crédito, que somam o montante de R$ 37.589.593,29 de financiamentos. Desse total, R$ 31.289.241,97 foram com recursos próprios da Afap e R$ 6.300.351,32 por meio do Fundo de Desenvolvimento Rural do Amapá (Frap) e Fundo de Apoio ao Microempreendedor e ao Desenvolvimento do Artesanato do Amapá (Fundmicro). Segundo o presidente da Afap, Sávio Peres, a meta de 30 milhões até o fim de 2014 já foi atingida, superando assim as expectativas da instituição.

F FOMENTO

Com um ativo total de R$ 13,3 bilhões até outubro, a Finep (Pesquisa e Inovação) deve fechar 2014 com R$ 14 bilhões em volume de ativos, um crescimento de 23% em relação ao que foi apresentado no ano passado (R$ 11,4 bilhões). “O resultado é excelente se levarmos em conta que a Finep atua exclusivamente com financiamento à inovação”, afirma o diretor Financeiro e de Controladoria da agência, Cláudio Guimarães.

Desde 2010, quando tinha ativos totais de R$ 4,3 bilhões, houve um crescimento de mais de 300%. O aumento expressivo de operações de crédito foi o grande responsável pelo salto. Nesse segmento, a agência já movimentou cerca de R$ 7 bilhões até outubro deste ano, frente a R$ 1,5 bilhão em 2011.

O especialista do setor de Oportunidades para a Maioria (OMJ) do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Johnny Jirón, esteve em Ribeirão das Neves, em Minas Gerais, para conhecer a mercearia e açougue Esquinão da Carne, cliente do Banco de Desenvolvimen-to de Minas Gerais (BDMG) por meio da linha BDMG Acredita. O representante do BID foi

recebido pelos gerentes Estefano Winter e Thia-go Magalhães. A visita teve por objetivo conhecer

in loco como a empresa aplicou os recursos e os resultados obtidos. Duran-te a visita, o sócio Ronie Azevedo contou que “no início, tínhamos a expecta-tiva de dobrar o cresci-mento em seis meses. Com o apoio do BDMG, nós não apenas alcançamos esse resultado como o superamos. O nosso obje-tivo agora é continuar crescendo”. Lançado em abril deste ano, o BDMG Acredita liberou, até novembro, R$ 10,4 milhões para 726 empresas nascentes.

De janeiro a setembro de 2014, o lucro da Caixa foi de R$ 5,3 bilhões, alta de 5,6% em relação aos nove primeiros meses do ano passado. No ter-ceiro trimestre, o lucro líquido alcançou R$ 1,9 bilhão, cresci-mento de 1,0% em relação ao trimestre anterior e de 1,7% sobre o mesmo trimestre de

2013. O retorno sobre o patrimônio líquido médio nos últimos doze meses foi de 17,8%. O banco alcançou no trimestre saldo de R$ 1,0 trilhão em ativos próprios, 5,8% maior que o apre-sentado no segundo trimestre deste ano e 18,6% superior ao registrado no terceiro trimestre de 2013. “Esses números mar-cam a trajetória da Caixa e confirmam a sua relevância, fortale-cendo-a como um banco público de excelência”, comentou o presidente da instituição, Jorge Hereda.

Em nove meses, a Caixa injetou R$ 501,1 bilhões na eco-nomia brasileira por meio de contratações de crédito, paga-mento de benefícios sociais, investimentos em infraestrutura própria, remuneração de pessoal, e destinação social das lote-rias, dentre outros.

A Agência de Desenvolvi-mento Paulista (Desenvolve SP) acaba de atingir a marca de R$ 100 milhões em financiamentos con-cedidos pela Linha Economia Ver-de para projetos sustentáveis de pequenas e médias empresas pau-listas. Os recursos foram investi-dos em iniciativas que reduzem a emissão de gases causadores do efeito estufa e o impacto das ativi-dades produtivas no meio ambi-ente. O setor da indústria foi res-

ponsável por mais da metade do valor emprestado pela insti-tuição, R$ 52 milhões. O restante foi investido pelo setor do comércio e pelas empresas prestadoras de serviços. Ainda de acordo com o levantamento, os negócios de pequeno e médio porte representaram 43% e 57% na participação dos desem-bolsos, respectivamente. “Investir em um negócio ambiental-mente correto já não é apenas um diferencial no mercado, mas condição obrigatória para o sucesso das empresas”, diz Mil-ton Luiz de Melo Santos, presidente da instituição.

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GoiásFomento libera linha de crédito específica para contabilistas goianos

Desenvolve SP chega a R$ 100 milhões em financiamentos para Economia Verde

Afap supera a meta de R$ 30 milhões em financiamentos

BID visita empresa atendida pela linha BDMG Acredita

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Caixa supera marca de R$ 1 trilhãoem ativos próprios

BNDES apoia projeto de coleta

seletiva de catadores em SP

A partir do mês de novem-bro, os contabilistas de Goiás poderão contar com uma linha de crédito específica para a categoria por meio da Agência de Fomento do Esta-do, a GoiásFomento. O limite para capital de giro será de R$ 2 milhões, e para investimento R$ 4 milhões. A assinatura do protocolo de intenções foi feita entre a GoiásFomento, o Conselho Regional de Conta-bilidade (CRC), Sindicato dos Contabilistas no estado de Goiás e Sindicato de Contabi-listas de Anápolis. O objetivo é que todos os profissionais dessa categoria tenham acesso a essa linha de crédito.

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mio máximo da entidade, Economista do Ano de 2014, foi concedido ao presidente da ABDE e diretor de Planejamento do BRDE, Carlos Henrique Horn. “É uma grande honra ser escolhido um dos destaques da profissão por uma comissão julgadora composta por colegas em atuação nos setores público e privado”, disse Horn, salientando a capacidade da academia gaúcha em promover uma formação ampla, que permite o contato com todas as teorias econômicas. A iniciativa do Corecon/RS reconhece os profissionais que atuam nos mais diferentes campos, engajados em atividades dos setores privado ou público, academia ou autônomos. A distinção é entregue àqueles que tenham se destacado por sua contribuição no fortalecimento do desenvolvimento econômico regional ou nacional.

Diretor do BRDE e presidente da

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CARTAS DO LEITOR

Redação e AdministraçãoAvenida Nilo Peçanha, 50, 11º andar Grupo 1109 Rio de Janeiro - RJ - CEP: 20020-906Telefone (21) 2109.6041Fax (21) 2109.6004

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EquipeJader MoraesLivia Marques PimentelNoel Joaquim Faiad

Revisão Renato R. Carvalho

E C O N O M I A & D E S E N V O L V I M E N T O P A R A O S N O V O S T E M P O S

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CONSELHO DOS ASSOCIADOSPresidente: Luciano Coutinho

DIRETORIAPresidente: Carlos Henrique Horn

1º Vice-Presidente: Vitor César Ribeiro Lopes

Vice-Presidentes: Antonio Carlos Sampaio Quintiliano, Carlos Alberto dos Santos, Guilherme Narciso Lacerda, Milton Luiz de Melo Santos, , Rogério de Paulo Roberto Evangelista de LimaPaula Tavares, Rubens Rodrigues Filho, Valmir Pedro Rossi.

Superintendente-Executivo: Marco Antonio A. de Araujo Lima.

Publicação bimestralISSN 1415-4722

Instituições Associadas à ABDE

AFAP – Agência de Fomento do Estado do Amapá S.A.AFEAM – Agência de Fomento do Estado do Amazonas S.A.AFERR – Agência de Fomento do Estado de Roraima S.A.AGEFEPE – Agência de Fomento do Estado de Pernambuco S.A.AGN – Agência de Fomento do Rio Grande do Norte S.A.AGERIO – Agência Estadual de FomentoBADESC – Agência de Fomento do Estado de Santa Catarina S.A.BADESUL Badesul Desenvolvimento S.A. Agência de Fomento – – BANCO DA AMAZÔNIA – Banco da Amazônia S.A.BANCOOB – Banco Cooperativo do Brasil S.A.BANDES – Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo S.A.BANPARÁ – Banco do Estado do Pará S.A.BB – Banco do Brasil S.A.BDMG – Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais S.A.BNB – Banco do Nordeste S.A.BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e SocialBRDE – Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo SulBRB – Banco de BrasíliaCAIXA – Caixa Econômica FederalDESENBAHIA – Agência de Fomento do Estado da Bahia S.A.DESENVOLVE – Agência de Fomento de Alagoas S.A.DESENVOLVE SP – Agência de Desenvolvimento PaulistaFINEP – Inovação e PesquisaFOMENTO PARANÁ – Agência de Fomento do Paraná S.A.GOIÁSFOMENTO – Agência de Fomento de Goiás S.A.MT FOMENTO – Agência de Fomento do Estado de Mato Grosso S.A.PIAUÍ FOMENTO – Agência de Fomento e Desenvolvimento do Estado do Piauí S.A.SEBRAE – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas

Capa Noel Joaquim Faiad

Impressão e CTP J. Sholna Reproduções Gráficas

Distribuição SVD/Sistemas de Venda Direta

Conselho EditorialCarlos Alberto dos Santos, Carlos Henrique Horn, João Paulo dos Reis Velloso, Maurício Borges Lemos e Thais Sena Schettino.

As matérias assinadas são de responsabilidade de seus autores, não refletindo, necessariamente, a opinião da ABDE. Sua reprodução é livre em qualquer outro veículo de comunicação, desde que citada a fonte.

RUMOS – – Novembro/Dezembro 2014 58

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Ano 39 – Nº 278 Novembro/Dezembro 2014

EmpreendedoraSou uma jovem empreendedora manauara na cidade de Manaus (AM). Tenho muito interesse em receber em forma de cortesia a revista Rumos na minha residência. Tal fato se prende a que sou pes-quisadora e tenho vários projetos empresariais a serem implementa-dos nas regiões Norte e Nordeste e a revista aponta vários caminhos para o Desenvolvimento. Conheci a revista Rumos no Sebrae Amazo-nas, pois participo de uma série de treinamentos e eventos empresa-riais. Desde já agradeço a atenção. Elayne Meirelles, empreende-dora. Manaus (AM).

Diretor AdministrativoAgradeço a remessa do exemplar da revista Rumos, Ano 39, número 277, setembro/outubro de 2014 e felicito-lhe pela qualidade da publi-cação. Cordialmente. Orpheu Santos Salles, diretor administrativo Associação Brasileira de Imprensa (ABI). Rio de Janeiro (RJ).

Técnica BancáriaGostaria de voltar a receber a revista Rumos, que é muito importante para o meu crescimento profissional. Cleonice Teodósia Braga Fer-reira, técnica bancária. Belém (PA).

FuncionárioSou funcionário do BNDES e costumava receber regularmente a revista Rumos. Gostaria de voltar a receber o periódico. Ariel Doctorovich, funcionário. Rio de Janeiro (RJ).

Nota da Redação: Diferente do que foi publicado na edição 277, página 22, o economista Nelson Barbosa ao falar em 2,5%, se refe-ria ao resultado primário necessário para manter a dívida pública estável em relação ao PIB.

Acesse: www.abde.org.br

Leia a revista e consulte as edições passadas.

DIGITALE C O N O M I A & D E S E N V O LV I M E N T O P A R A O S N O V O S T E M P O S

Entrevistas

Vitor Lopes

Carlos Antonio Costa Ribeiro

Banco do Brics:

nasce um gigante

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EDITORIAL

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