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Adoecimento do Tempo (parte 1)
Eduardo Laborne Ferreira
Saúde Mentale Espiritual
Fazer escolhas sobre a própria vida pede tempo e um
processo. Tempo, um dos maiores complicadores da nossa
existência. Surge uma ideia de futuro, daquilo que só poderá
ser mais à frente. Como temos a habilidade de sentir que algo
falta, que não existe no presente, sem a capacidade clara de
precisar o quê?
Na ansiedade que acompanha essa busca sentimos a
presença de uma ausência. Qual a certeza? Temos garantias?
A angústia patrocinadora deste caminho comunica que nem
poderia ser diferente, já que, se me sinto angustiado, tenho
uma escolha a ser feita e existe a possibilidade de ser diferente
de dizer sim e não para algo. Se não, tudo estaria decidido, tudo
certo, nada mais o que se fazer sobre.
Na excessiva valorização do presente, cada vez mais o futuro
fica ameaçado. Quando centro a minha vida no presente,
ignoro o passado e fico sem a perspectiva de futuro. Esperança
é uma virtude ativa, esperar também é buscar. A esperança é
um sinal da alma que anseia por algo melhor, e de que existe
essa possibilidade. A vida leva tempo. 60 minutos são sempre
60 minutos? Tempo adoece?
Não existem roteiros que superem o ineditismo da vida.
Entristecimento é diferente de depressão. Prazer é de diferente
de felicidade.
Felicidade é uma vibração intensa, que você sente uma
vitalidade exuberante, mas ela não é um estado permanente de
vida, até porque, se assim fosse, como saberíamos que somos
felizes? Felicidade são instantes, episódios, em que você sente
a vida naquilo que de melhor ela tem a oferecer, na sua
plenitude, preenchedora dos vazios da alma. A vida feliz não é
ausência de tristezas, de solidão e ausência de perdas. Apesar
dos momentos tristes, ou até por causa deles, aqui e ali temos
momentos de felicidade. Euforia não é felicidade. Posso ter
momentos de prazer intenso, quase instantâneos, imediatos,
mas profundamente promotores de infelicidade.
Felicidade vem também daquilo que é essencial, essência é
indispensável. Quanto trabalho árduo para a retirada das
máscaras, das camadas de verniz social que colocamos, para
adequarmos ao que o ambiente pede? “Alegria do rebanho é
quando o lobo come a ovelha do lado”. Às vezes pensamos que
essencial e fundamental são correlatos. Dinheiro é
fundamental, mas não é essencial. Sem ele eu tenho
problemas, mas ele, em si, não me felicita. Daí a perplexidade
que sentimos quando atingimos objetivos de uma vida, e não
sentimos equivalência em felicidade. Atingir metas são
movimentos permeados de risco. E agora, que preencho todos
os requisitos que me foram ditos como o de uma pessoa feliz, o
que fazer?
“Caminhante não é caminho, caminho se faz ao andar”. Aqui
e agora podem ser o passo desse caminho, mas para onde?
Como dar direção ao passo se o incômodo seria a
incapacidade de nomear isto que sinto, mas que me trouxe até
aqui? Quantos, em nossa experiência no Hospital Espírita
André Luiz, foram se reencontrar em uma internação? “minha
vida perdeu o sentido”, ou, “não era isso, hoje eu vejo e acho
que é tarde demais para mudar...” Talvez alguma forma de
traduzir e simbolizar corretamente essa busca seja com a
sensação de ter se perdido. “Se perder também é caminho”.
Psicólogo formado pelo Unicentro Newton Paiva, especialista em dependência química pela UNIAD-UNIFESP e em Psicologia Existencial Gestalt, pela FEAD. Formação na Abordagem Centrada na Pessoa, pelo Centro de Psicologia Humanista. Psicólogo de família do CETAS-Centro de Terapias e Assistência Social (HEAL).