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Sally Mackenzie - Nobres Apaixonados 02 - Marques Apaixonado

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Page 1: Sally Mackenzie - Nobres Apaixonados 02 - Marques Apaixonado
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MARQUÊS APAIXONADO The Naked Marquis

Sally Mackenzie

JULIA HISTÓRICO 1513

IInnggllaatteerrrraa,, 11881155 CCoommoo ddiizzeerr ""eeuu ttee aammoo??""......

Ao fazer o pedido de casamento Charles Draysmith foi tão romântico quanto um juiz dando uma sentença. Tudo bem que Emma Peterson é apenas a filha do vigário, e ele o novo marquês de Knightsdale, e talvez prefira se casar com ela do que enfrentar a horda de moças solteiras e suas mães casamenteiras... Mas quando ele sugere que está tão somente interessado no ato de "encomendar" um herdeiro... Ah, isso já é demais para uma dama de verdade...

Deve haver algo de estranho com uma mulher que atira um bibelô em um homem que demonstra seus interesses. Talvez o modo como Charles fez o pedido não tenha sido dos mais românticos, mas parecia a solução perfeita. Ele conseguiria uma esposa, Emma conquistaria uma posição na sociedade... Tudo muito simples e prático. Só que as coisas não tão simples como parecem... pois para convencer Emma a se casar, Charles terá de fazer algo muito difícil: confessar que está perdidamente apaixonado...

DDiiggiittaalliizzaaççããoo:: NNééiiaa

RReevviissããoo:: SSaavvooyy

SSaallllyy MMaaccKKeennzziiee ffooii pprrooffeessssoorraa aassssiisstteennttee ddaa UUnniivveerrssiiddaaddee ddee NNoottrree DDaammee,, ee ccoommeeççoouu aa ccaarrrreeiirraa ddee eessccrriittoorraa rreeddiiggiinnddoo lleeiiss ffeeddeerraaiiss,, jjoorrnnaaiiss eessccoollaarreess,, pprrooggrraammaass ddee aauuddiittóórriioo,, ppeeççaass ddee tteeaattrroo,, gguuiiaass ddee nnaattaaççããoo ee rreellaattóórriiooss..

MMaarrqquuêêss AAppaaiixxoonnaaddoo éé oo sseegguunnddoo lliivvrroo ddee ssuuaa sséérriiee ""NNoobbrreess AAppaaiixxoonnaaddooss""..

Page 3: Sally Mackenzie - Nobres Apaixonados 02 - Marques Apaixonado

""CCoomm uumm eelleennccoo ddee ppeerrssoonnaaggeennss eennccaannttaaddoorreess,, oo sseegguunnddoo lliivvrroo ddaa sséérriiee NNoobbrreess AAppaaiixxoonnaaddooss,, ddee SSaallllyy MMaaccKKeennzziiee,, éé uummaa hhiissttóórriiaa ddeelliicciioossaa,, bbeemm--hhuummoorraaddaa ee mmuuiittoo rroommâânnttiiccaa!!"" Romantic Times

""MMaarrqquuêêss AAppaaiixxoonnaaddoo éé,, eemm rroommaannccee,, oo eeqquuiivvaalleennttee aa uumm bboolloo ddee cchhooccoollaattee...... ccaaddaa ppáággiinnaa éé uumm ddeelleeiittee iirrrreessiissttíívveell!!"" Lisa Kleypas

Opiniões de Leitoras: "Eu simplesmente adorei este livro, da primeira à última página! E um romance maravilhoso, com uma trama interessante, personagens encantadores, um lindo cenário, muita intriga, paixão, vingança, tensão sensual e um senso de humor extraordinário!"

"Sally MacKenzie dá continuidade à série que começou com Duque Apaixonado, agora com a história de Charles. A combinação da autora de humor, sensualidade e um toque de suspense é genial. Marquês Apaixonado é um romance que eu recomendo!"

"Que gracinha de romance! Divertido, sensual, a leitura perfeita para uma tarde de verão..."

"Um romance de época fabuloso! Os diálogos são engraçados, e os personagens são adoráveis!"

"Eu estou adorando a série Nobres Apaixonados! As histórias são muito divertidas e muito românticas!"

Querida leitora, Se você leu Sabrina 1499 - Duque Apaixonado - você vai adorar conhecer agora a história de um

marquês apaixonado, uma história tão divertida e romântica quanto a primeira. Se você não leu, vai adorar ler este livro do mesmo jeito! Charles e Emma se apaixonam praticamente à primeira vista, quando ele volta para casa para assumir o título, após a morte do irmão e da cunhada, e encontra Emma encarregada de cuidar de suas sobrinhas. Muitas peripécias e um mistério intrigante esperam por você neste romance encantador!

Leonice Pomponio Editora

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Sally MacKenzie - MARQUÊS APAIXONADO - TRADUÇÃO Silvia M. Caldiron Rezende

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Copyright © 2006 by Sally MacKenzie Originalmente publicado em 2006 pela Kensington Publishing Corp.

PUBLICADO SOB ACORDO COM KENSINGTON PUBLISHING CORP. NY, NY - USA Todos os direitos reservados.

Todos os personagens desta obra são fictícios. Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas terá sido mera coincidência. Proibida a reprodução, total ou parcial, desta publicação, seja qual for o

meio, eletrônico ou mecânico, sem a permissão expressa da Editora Nova Cultural Ltda.

TÍTULO ORIGINAL: The Naked Marquis EDITORA: Leonice Pomponio

ASSISTENTES EDITORIAIS: Patrícia Chaves e Paula Rotta Silvia Moreira EDIÇÃO/TEXTO Tradução: Silvia M. Caldiron Rezende Revisão: Waldir Moraes

ARTE: Mônica Maldonado ILUSTRAÇÃO: Thomas Schluck

MARKETING/COMERCIAL: Andrea Riccelli PRODUÇÃO GRÁFICA: Sônia Sassi PAGINAÇÃO: Dany Editora Ltda.

© 2008 Editora Nova Cultural Ltda. Rua Paes Leme, 524 - 10° andar - CEP 05424-010 - São Paulo - SP

www.novacultural.com.br. Premedia, impressão e acabamento: RR Donnelley

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“Por que Paul tinha de morrer”? O major Charles Draysmith estava parado diante da imponente construção de pedra, as gotas de chuva escorrendo por seu rosto enquanto ele fitava a imponente fachada de pedra. Não queria entrar.

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Tinha adiado sua vinda, permanecendo em Londres o máximo que pudera, encontrando-se com o advogado e com os banqueiros que cuidavam das finanças de Paul, providenciando todos os detalhes da sucessão... e odiando cada minuto. Cada "Pois não, milorde" era como se outro pedaço de sua vida lhe fosse roubado.

Graças a um ladrão italiano anônimo, ele era agora o marquês de Knightsdale. Não podia continuar parado ali, indefinidamente. Logo tia Bea chegaria para preparar a festa, com suas carruagens cheias de criados e sua gata peluda e enjoada. No dia seguinte, uma horda de moças solteiras aristocráticas e suas mães invadiriam Knightsdale. O medo rasgou-lhe as entranhas, e suas mãos começaram a suar, como sempre acontecia antes de cada batalha que ele tivera de enfrentar na Espanha. Queria dar meia-volta e sair correndo. Mas bateu na porta.

— Bom dia, milorde.

— Será mesmo um bom dia, Lambert?

Charles permitiu que o mordomo o ajudasse com o sobretudo encharcado. Já fazia dez anos que ele não via o homem. Desde o casamento de Paul.

Charles tinha acabado de sair da universidade na última vez que estivera em casa. Agora estava com trinta anos, porém envelhecido pela tragédia da guerra.

— Poderia mandar alguém cuidar do meu cavalo, por favor?

— Certamente, milorde. Lady Beatrice veio com o senhor?

— Não, eu vim na frente. Eu... Que barulho foi esse?—Charles jurou ter ouvido o que parecia ser um estrondo distante de artilharia.

— Creio que seja a Srta. Peterson, milorde ,com lady Isabelle e lady Claire.

— O que elas estão fazendo? — Charles seguiu em direção à escadaria. O barulho vinha do andar superior.

— Creio que estão jogando boliche, milorde. Na galeria principal.

Ele arqueou as sobrancelhas ao ouvir outro estrondo, um grito agudo e um latido. Alguém estaria ferido? Charles disparou, subindo dois degraus de cada vez. A galeria principal, se ainda lembrava-se bem, tinha vários bustos de mármore muito pesados dos antepassados dos Draysmith. Se algum tivesse caído sobre uma das meninas... E aquele latido? Havia um cachorro, também?

O que a tal da Srta. Peterson estava pensando? Seria ela a governanta? Peterson era o sobrenome do reverendo, o que o levou a concluir que as sobrinhas estavam em boas mãos.

Charles chegou ao corredor bem a tempo de ver um pequeno ierrier malhado trombando com o pedestal do busto do tio-avô Randall.

Emma Peterson deu um salto para amparar a estátua no exato momento em que um homem berrou da escadaria. A surpresa ao ouvir uma voz masculina foi tanta que ela quase caiu sobre a escultura. Seria possível que o Sr. Lambert tivesse permitido que um maluco entrasse na casa?

— O que acha que está fazendo, permitindo que esse animal corra solto dessa maneira? Uma das meninas poderia ter sido esmagada pela estátua de mármore!

Emma enrijeceu. Quem era aquele homem para entrar de repente, esbravejando e repreendendo? Ela ajeitou os óculos sobre o nariz. Seria alguém conhecido? A voz parecia levemente familiar. Se ao menos pudesse vê-lo mais de perto...

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Os ombros largos e a fisionomia autoritária indicaram que se tratava de alguém acostumado a dar ordens. E se ele se mostrasse ameaçador? Se gritasse, será que alguém viria socorrê-la?

— Prinny não pretendia machucar ninguém, senhor. — Atrás de Emma, a valente Isabelle encarou o intruso.

— É claro que ele não tinha intenção de ferir ninguém. — A pequena Claire abraçou o cão.—Você é um cachorro bonzinho, não é, Prinny?

O cão latiu e lambeu o rosto da menina.

— Prinny pode ser um cachorro bonzinho — disse Charles —, mas dentro de casa não é lugar para ele ficar correndo.

— Senhor! — Emma sentiu alívio ao perceber que sua voz soara firme. — Senhor, tenho de pedir que se retire imediatamente.

— E eu peço que seja a senhorita a se retirar agora mesmo. — Emma engoliu em seco. Céus, o homem estava se aproximando!

— Isabelle, Claire, venham para cá. — Charles parou.

— Isabelle e Claire?

— Sim. — Emma ergueu o queixo com altivez.

Agora ele se encontrava próximo o suficiente para que ela pudesse vê-lo melhor. Seu rosto era bronzeado, os cabelos castanho-claros cacheados, bem curtos. Mais velho, mais forte e mais seguro do que o rapaz que Emma vira de longe no casamento do falecido marquês. Mesmo assim o reconheceu. Nunca teria se esquecido daqueles olhos: azul-claros como dois lagos cristalinos.

Charles Draysmith, o jovem que ela idolatrara e por quem suspirara, estava de volta a Knightsdale.

— Estas são as minhas sobrinhas? — Charles olhava para as meninas. A mais velha, Isabelle, estava perto de completar nove anos. Era miúda e tinha cabelos lisos e loiros e os mesmos olhos verdes de Paul. A outra, Claire, ainda tinha as formas arredondadas de um bebê e os mesmos cabelos cacheados do tio.

Claire pôs as mãozinhas nos quadris.

— O senhor é um homem mau?

— Claire! — Emma a admoestou. — Este é seu tio Charles, o novo marquês de Knightsdale.

Charles observou a governanta. Com ela sabia quem ele era? Bem, os criados deviam estar esperando por sua chegada. Tinha enviado uma carta, informando que estava a caminho com tia Bea, portanto, não era preciso ser um gênio para descobrir sua identidade. A princípio, porém, não sabia de quem se tratava, ou não teria pedido que se retirasse.

Emma se manteve firme, tomando o partido das meninas. Muitos soldados empalideciam diante de uma ordem do major Draysmith, mas não a Srta. Peterson.

Charles avaliou melhor o rosto da moça. A Srta. Peterson era pouco mais alta que Isabelle e tinha cabelos castanho-escuros ainda mais cacheados do que os seus, algumas sardas no rosto e olhos castanhos, emoldurados por longos cílios.

—Tampinha?—Charles conteve o riso ao reconhecer Emma Peterson, a filha do reverendo, a magricela chorona que não saía do seu encalço como se fosse um cãozinho perdido. Os outros garotos caçoavam de Charles por isso, mas ele nunca tivera coragem de mandá-la embora. — Queira me desculpar, Emma. Você não é a governanta das crianças, então?

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— Não, milorde. A governanta, a Srta. Hodgekiss, foi chamada de repente para cuidar da mãe, que adoeceu. Estou apenas substituindo-a durante a ausência dela.

Um delicado rubor surgiu nas faces de Emma. Seus olhos nem ousaram se erguer. Já os de Charles eram penetrantes. E ele gostou de imaginar que ainda pudesse existir uma sombra da idolatria que Emma nutrira por seu herói de infância.

Ela havia se tornado uma moça atraente. Talvez fosse a solução para o seu problema. E se ele a pedisse em casamento? Pior do que estava, sua situação não ficaria. Se tivesse uma resposta antes da maldita festa, não seria obrigado a passar os próximos dias fugindo das casamenteiras.

Charles sentiu Claire puxando a manga de seu paletó.

—A Srta. Hodgekiss tem medo que a mãe dela morra.—Um par de olhinhos castanhos olhava fixamente para ele. — Minha mãe morreu em uma montanha na Itália.

— Itália. Sua mãe e seu pai morreram em uma montanha na Itália.

Charles teve de dar uma tossidela para disfarçar o riso. Nunca simpatizara muito com Cecília, a esposa de Paul. Considerava-a bonita e superficial, como a maioria das damas da sociedade. Ele deslizou os dedos entre os cachos de Claire e olhou para Isabelle. As meninas não pareciam tão tristes para quem perdera os pais recentemente. O que não era de surpreender. Pelo que seus amigos, o duque de Alvord e o conde de Westbrooke, haviam lhe contado, Paul e Cecília não eram pais muito afetuosos. O casal costumava passar a maior parte do tempo em Londres ou viajando ao redor do mundo.

— O senhor é o nosso pai agora?

— Claire, não seja boba! — Isabelle ralhou. — Tio Charles não vai querer ficar conosco. Ele quer ter a própria família.

Charles ouviu Emma suspirar. Ele também sentiu como se tivesse sido golpeado no estômago. Era verdade que nunca pensara muito nas meninas, mas isso não era o mesmo que não querer ficar com elas.

— Eu sou seu tio, Isabelle. Irmão de seu pai. Portanto, vocês duas são a minha família, e esta é a sua casa. Claire está certa, agora sou como um pai para vocês.

Ele sorriu. Com certeza, podia ser um pai para as sobrinhas, tanto quanto Paul fora.

— Conte-me sobre Prinny. Foi você que lhe deu esse nome? — Tudo o que Charles podia ver do cãozinho branco e preto era o rabinho agitado e as patinhas traseiras. O restante estava escondido entre o pedestal da estátua do tio-avô Randall e a parede. — Ei, garoto, saia daí!

Prinny parou de se esfregar na base da pilastra, espirrou e saiu para investigar as botas de Charles.

— Prinny é da Srta. Emma, papai.

— Claire, querida, lorde Knightsdale é seu tio, não seu pai. — Claire fez beicinho.

— Mas eu não quero um tio. Eu quero um pai!

Charles se ajoelhou para que seu rosto ficasse no mesmo nível do da sobrinha.

— Algumas pessoas podem ficar confusas se ouvirem você me chamar de papai, Claire. E seria injusto esquecer do seu verdadeiro pai, não seria?

O lábio inferior de Claire tremeu, e os bracinhos se cruzaram apertados contra o peito.

— Eu quero um pai. Por que o senhor não pode ser meu pai? E a Srta. Emma minha mãe?

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Charles se sentiu como à beira de um precipício. Um passo em falso, e Claire poderia se desmanchar em lágrimas.

— E se você me chamar de tio Charles na frente dos outros, e de papai quando estivermos em família?

— Em família?

— Quando estivermos somente eu, você, Isabelle e a Srta. Peterson. Você concorda?

Claire abraçou Charles pelo pescoço. A pele da menina era macia como a de um bebê. Os cachinhos roçaram o queixo de Charles, que sentiu uma estranha sensação de derretimento no peito.

— Concordo, sim, papai Charles — Claire respondeu, antes de soltá-lo para, em seguida, abraçar Prinny.

Charles olhou para Isabelle.

— Você também pode me chamar de papai, Isabelle, se quiser.

— Eu tenho nove anos, tio. Não sou mais um bebê.

— Não é mesmo... Você se incomodaria se eu pegasse a Srta. Peterson emprestada só um pouquinho? Preciso conversar com ela sobre alguns assuntos.

— É claro que não — Isabelle respondeu. Emma pareceu esconder um sorriso.

— Isabelle, você poderia levar Claire de volta à sala de brinquedos?

— Sim, Srta. Emma.

— Podemos levar Prinny conosco, mamãe Emma? — Charles mordeu o lábio para não rir da expressão de Emma.

Ela ficou claramente constrangida com o novo título que Claire lhe conferiu, mas não disse nada para não ferir os sentimentos da menina.

— Está bem, podem levá-lo, contanto que ele não incomode Nanny.

— Prinny não cômoda Nanny.

O cão deu dois latidos e lambeu o rostinho de Claire.

— Nanny gosta de Prinny, Srta. Emma — Isabelle afirmou. — Ela só finge estar incomodada.

A voz de Claire ecoou no corredor enquanto as irmãs se distanciavam:

—Acho que papai Charles será um ótimo pai, você não acha, Isabelle? Ele tem olhos bonitos e os cabelos iguais aos meus. — Charles sorriu, olhando para Emma, que estava ruborizada.

— Peço desculpas, milorde. Claire ainda é muito pequena. Tenho certeza de que seus modos vão melhorar.

— Oh, não estou ofendido. Meu cabelo é mesmo cacheado. Igual ao seu. — Seus olhos passearam pelos cachos de Emma. Ela ficou ainda mais corada, e de uma maneira muito atraente. — Quanto aos olhos bonitos, não tenho nada a dizer. Você acha os meus olhos bonitos?

— Milorde! — O rubor mudou de rosa para vermelho forte. Charles sorriu, oferecendo o braço.

— Vamos até a biblioteca? Eu gostaria que você me contasse um pouco sobre as minhas sobrinhas. Como pôde perceber, não sei muito sobre elas.

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Emma desceu a escadaria de braços dados com Charles, rumo à biblioteca. Suas emoções eram confusas. Havia se assustado quando ele gritara na escada, mas, ao reconhecê-lo... bem, não sabia mais o que sentia.

Deveria estar brava ainda. Afinal, se sentira profundamente magoada durante os últimos quatro meses, tempo em que Charles nem se dera ao trabalho de se deslocar de Londres para fazer uma visita às sobrinhas, que haviam ficado órfãs. Não que as meninas tivessem sentido falta, já que estavam acostumadas a ser negligenciadas pelos próprios pais. Mesmo assim, Emma admitiu para si mesma, enquanto desciam os degraus da longa escadaria, que se decepcionara, e muito, com a atitude dele.

Sim, Charles tinha vindo mostrar seu pesar durante o velório. Havia sido por apenas algumas horas, pois assim que o marquês e a marquesa foram enterrados no mausoléu da família, ele partira. E desde então nunca mais voltara. Por quê? O que tinha acontecido com Charles? Será que a guerra o transformara tão drasticamente? Com certeza o menino que ela conhecera não teria ignorado as sobrinhas daquela maneira.

Emma se lembrava do dia exato em que o conhecera. E guardava a recordação como um tesouro que desenterrava todas as vezes que se sentia solitária, triste ou desanimada.

Tinha seis anos, na época. Seu pai acabara de assumir a paróquia de Knightsdale, e ela sentia saudade da velha casa, dos amigos, de tudo que lhe era familiar. Emma havia encontrado um bom galho de árvore para se sentar, próximo ao riacho que corria perto do vicariato, e ali ficou chorando até não ter mais lágrimas.

E então Charles invadira seu mundo assobiando. Ela o ouvira antes de vê-lo. Ele parara à sua frente e apoiara as mãos nos quadris, olhando-a.

Charles era apenas quatro anos mais velho que Emma, um menino magrelo de cabelos castanhos cacheados, mas, naquele momento, aos seus olhos parecera um ser encantado da floresta. Charles fizera ares de complacência e então tirara um lenço amarrotado do bolso e o estendera.

— Pare com isso — dissera, enquanto enxugava as lágrimas de seu rosto. — Pare de chorar. Você não quer que pensem que é um bebê, quer? Venha me ajudar a encontrar uma salamandra.

Naquele momento, Emma se apaixonara por ele, e nunca mais o esquecera.

Emma olhou para a própria mão, apoiada no braço dele. O calor que emanava do tecido da manga afetou sua respiração de uma maneira estranha. De repente, ela sentiu vontade de entrelaçar os dedos com os dele.

Mas Charles estava fora de seu alcance, e Emma sabia disso. Sempre soubera, desde os tempos em que o perseguia pela floresta, vinte anos antes. Charles era filho de um marquês, e ela, filha de um clérigo. Mesmo assim o perseguira nos tempos de infância, feliz por receber um pouco de atenção. Quando ele havia partido para estudar fora, ela chorara novamente, e mais uma vez as lágrimas não ajudaram a conter a dor.

Em seguida, sua mãe havia morrido, e Emma precisava cuidar da irmã, Meg, e do pai. E não tinha mais tempo para sonhos românticos e tolos.

Quando chegaram ao vestíbulo, ela observou pelo canto dos olhos o perfil de Charles. Embora não tivesse tempo, continuara sonhando, mesmo assim.

Emma tinha dezesseis anos quando Charles esteve em Knightsdale pela última vez. Ainda era jovem demais para ser convidada para o baile em comemoração ao casamento do novo marquês, o irmão mais velho de Charles. Mas não tão jovem para não querer muito ir e, quem sabe, dançar com Charles.

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Foi então que fizera a coisa mais ousada de toda sua vida. Pulara a janela de seu quarto, que dava para o bosque, e se escondera nas sombras das árvores, observando os homens em seus trajes de gala e as mulheres cobertas de jóias e vestidos coloridos.

Passado algum tempo, Emma vira Charles saindo ao terraço acompanhado de uma dama de Londres. O vestido que ela usava realçava cada curva do corpo bem-feito, e o decote proporcionava uma generosa visão dos seios fartos. Era uma moça muito bonita. E, então, Charles a abraçara e a beijara, enquanto deslizava as mãos livremente por aquele corpo que se contorcia nos braços dele.

Aquilo fizera Emma se sentir ofegante e desconfortável. Envergonhada, fraca e acalorada. Ela voltara correndo para casa, com se o demônio em pessoa estivesse em seu encalço.

Emma revira aquele beijo em seus sonhos um milhão de vezes depois. Mas, nos sonhos, ela era a mulher nos braços de Charles.

Bem, já deveria estar curada daquela afeição infantil. Por isso, afastou a mão do braço de Charles quando eles entraram na biblioteca.

— Emma, sinto muito se a assustei há pouco. — Charles indicou a poltrona ao lado da lareira, para que ela se sentasse, mas Emma preferiu permanecer em pé, forçando-o a fazer o mesmo.

—Milorde, já faz quatro meses que seu irmão e sua cunhada faleceram, deixando órfãs as suas sobrinhas. Por que demorou tanto a vir para casa?

Charles deu de ombros.

— Casa? — Ele baixou o olhar para a escrivaninha. Quando olhou para cima, seu rosto estava inexpressivo. — As meninas estavam em boas mãos. Falei com seu pai no funeral. Por que elas iriam querer ver um tio que não passava de um estranho? E realmente pensei que ainda fossem bebês de colo.

— Como pôde pensar isso? Isabelle tem nove anos, e Claire, quatro.

— Eu tinha apenas vinte e um anos quando Paul teve a primeira filha. Só pensava em me divertir nas noites de Londres. Também fiquei desapontado por ele não ter conseguido um herdeiro varão. Confesso que não pensei muito no assunto. E então fui para a guerra. Claire nem tinha nascido quando parti para a Espanha.

— E pretende abandoná-las novamente, agora que as viu? — Emma podia ver, pela expressão de Charles, que era exatamente isso que ele estava planejando.

— O senhor não pode fazer isso, milorde! As meninas já viveram muito tempo aos cuidados dos criados. Elas precisam de um parente na casa. O senhor viu quanto Claire deseja ter um pai! E Isabelle também, apesar de ser mais reservada.

— E quanto a uma mãe, Emma? Tem certeza de que as meninas não precisam de uma mãe talvez até mais do que um pai?

—Bem, é claro que elas precisam de uma mãe, mas não existe nenhuma à disposição no momento.

— Não? — Charles sorriu. — Que tal você?

Emma sentiu como se o ar tivesse sido sugado de seus pulmões. Charles se esforçava para conter o riso. Emma estava boquiaberta.

—Seria a solução perfeita. As meninas precisam de uma mãe, elas a conhecem e a apreciam, e você mora aqui perto. Sendo assim, teria o conforto da sua família sempre à mão.

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E eu acho por demais deliciosa a possibilidade de ir para a cama com você! Charles sorriu, tentando imaginar como Emma reagiria se soubesse o que ele estava pensando. Fazia anos que não pensava nela, mas, ao vê-la agora...

Essa seria a solução perfeita para os seus problemas. Afinal, Charles não pretendia passar muito tempo ao lado da esposa, uma vez que não planejava permanecer em Knightsdale. Já tinha encontrado algo útil para fazer em Londres e viria de vez em quando ao campo para cuidar de suas responsabilidades de herdeiro.

Sim, viria para se deitar com a esposa. Para tirar aquele vestido sem graça que encobria o belo corpo. Para enterrar o rosto nos seios macios. Para...

— Você tem um namorado, ou pretendente?

— Bem, não, mas...

— E me desculpe por eu dizer isto, mas você já passou um pouco da idade de se casar, não é mesmo? Já deve estar com vinte e seis, se não me engano.

— Sim...

Charles fitou-a, percebendo o rubor e os seios arfantes. Então ergueu o olhar e seus olhos se encontraram. Talvez não devesse ter comentado sobre o fato de ela ser uma solteirona, mas isso com certeza seria um fator importante na hora de Emma tomar uma decisão.

—Não pretendo ficar no seu caminho. Passarei a maior parte do tempo em Londres. Você só terá de me tolerar durante minhas visitas ocasionais.

— Por que se dar ao trabalho de fazer as visitas, afinal? O senhor se manteve afastado durante todos estes anos de Knightsdale.

Será que Emma não tinha percebido o óbvio? Como ele não tinha notado antes o quanto ela era desejável? Ou o quanto aqueles lábios eram sedutores, mesmo apertados como estavam agora...

— E há a questão do herdeiro — disse Charles.

— O que o senhor quer dizer, exatamente?

— Precisarei de um herdeiro, agora que sou o marquês. E não poderei ter um se minha esposa estiver morando em Kent e eu em Londres, poderei?

Charles se abaixou quando um cachorrinho de porcelana passou voando sobre sua cabeça e se espatifou contra a porta.

— Estou interrompendo alguma coisa?

Nesse momento, três plumas cor de laranja surgiram pela porta entreaberta, seguida por cachinhos grisalhos e um rosto muito redondo com os mesmos olhos azuis de Charles.

— De forma alguma, tia Bea — respondeu ele. — Por favor, entre.

Emma ajeitou os óculos, seu ataque de ira substituído pela surpresa ao ver a silhueta arredondada de tia Beatrice, trajando um vestido vermelho com listras cor de laranja.

A mulher entrou, evitando os cacos espalhados no carpete.

—Não vai me apresentar à moça, Charles?—Beatrice ergueu o pince-nez.

— É claro, tia. Esta é a Srta. Emma Peterson, filha do reverendo Peterson. Srta. Peterson, minha tia, lady Beatrice.

— Lady Beatrice. — Emma fez uma mesura. — Prazer em conhe... Oh!

Emma engasgou e saltou para o lado. Algo tinha roçado seu tornozelo. Beatrice riu.

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— Não se assuste, minha querida. É apenas Bess.

Uma enorme gata alaranjada subiu com um salto na cadeira ao lado de Emma e se acomodou sobre o assento. Charles riu.

— Acho que Prinny não irá aprovar Bess, tia.

— Não me diga que você convidou aquele idiota gordo, Charles. Ele certamente não estava na minha lista de convidados.

— Nem na minha. Estou me referindo ao cachorro da Srta. Peterson.

— Você tem um cachorro chamado Prinny? Que gracinha!

— Na verdade ele pertence à minha irmã, Meg.

—Ah. Bem, então, mal posso esperar para conhecer sua irmã. —Beatrice avançou pela sala.—Existe algum motivo específico para estarmos em pé, Charles?

— Eu estava esperando que Emma se sentasse, mas ela não se mostrou... propensa.

— Oh, bem, eu estou propensa, apesar de ter vindo sentada de Londres até aqui. Agora que você é o marquês, Charles, terá de providenciar uma carruagem melhor. Juro que senti cada pedra do caminho.

Beatrice se sentou com graciosidade, o que era uma proeza, Emma pensou, para alguém de formas tão avantajadas.

— Venha, Emma, sente-se. Bess lhe cederá a cadeira, não é mesmo, Bess?

A gata, porém, não parecia disposta a se mover.

— Com licença. — O braço de Charles roçou o de Emma quando ele se inclinou para pegar a gata. Ela sentiu o contato acidental como se um raio tivesse passado entre ambos. Observou as mãos grandes e gentis apanhando a gata, e esperou que Charles não tivesse ouvido seu suspiro profundo ou notado o modo como ela enrijecera.

Quando olhou de novo, Charles já estava colocando Bess no colo da tia, que analisava Emma detalhadamente.

— Obrigada, Charles. Meu sobrinho é um verdadeiro herói, não é mesmo, Emma?

Emma sorriu sem jeito e caminhou em direção à cadeira, agora desocupada. Antes de se sentar, tentou limpar discretamente os pêlos alaranjados da gata. Deu uma olhada para Charles, que se inclinou e sorriu.

— Faço o possível, tia, para salvar as donzelas ameaçadas por dragões e por todos os tipos de gatos.

— Hum. — Beatrice acariciava a gata e estudava o sobrinho. Emma nem se mexia enquanto os olhos da mulher a examinavam. — Esta donzela precisa ser salva de algo em particular, Charles?

— Não que eu saiba, tia. — Ele se recostou na cornija da lareira. — Por que pergunta?

— Porque tive a impressão de ouvir alguma coisa sendo atirada contra a porta e se quebrando, logo antes de entrar aqui.

Emma esperava era que seu rosto não estivesse tão vermelho quanto ela sentia.

— Creio que eu disse algo que desagradou a Srta. Peterson.

— É mesmo? Bem, qualquer um se perguntaria, então, o que seria tão desagradável a ponto de levar uma moça bem-educada a jogar um bibelô e quebrá-lo.

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Emma concluiu que já era hora de se retirar.

— Acho melhor eu voltar para as meninas, milorde, lady Beatrice. Elas já devem estar cansando a pobre Nanny.

— Não vá, Emma — lady Beatrice falou. — Nem tivemos tempo de conversar para nos conhecermos melhor.

Emma voltou a se sentar.

— Não há nada de muito interessante a saber sobre a minha pessoa, lady Beatrice.

Beatrice ergueu uma sobrancelha.

— E exatamente isso que estou tentando descobrir.

— Tia, pare com isso. Emma está apenas fazendo a gentileza de substituir a Srta. Hodgekiss, a governanta das meninas, que foi cuidar da mãe doente.

— Entendi. E ela está hospedada em Knightsdale? — Os olhos azuis de Beatrice examinavam Emma dos pés à cabeça.

— Que... conveniente.

— A Srta. Peterson e eu estávamos justamente retomando a velha amizade de infância quando a senhora chegou, tia.

— Retomando, Charles? Então você e Emma já foram... amigos ou algo assim?

— Não. — Emma se levantou, prestes a deixar a sala sem se importar com o que Charles e a tia pudessem pensar. — Lady Beatrice, posso lhe assegurar que...

— Por favor, não precisa, minha criança. Sente-se. Peço desculpas se a ofendi.

Emma se sentou, mas na beira da cadeira, pronta para sair ao primeiro insulto.

— Não estou acostumada a esse tipo de tratamento, lady Beatrice. Espero que não se repita.

Beatrice riu.

— Você não tem papas na língua, não é mesmo? Isso é bom. Então me conte por que atirou aquele bibelô na porta.

Emma corou.

— Era um cachorro de porcelana, lady Beatrice.

—Ah, é mesmo!—A mulher esfregou as orelhinhas da gata.

— Bess provavelmente a apoiaria. Ela não gosta muito de cães. Emma olhou para Charles em busca de socorro. O safado estava com a mão sobre a boca, encobrindo uma risada.

— Não era minha intenção quebrar o bibelô.

— Não? Então, qual era a sua intenção?

— Eu queria acertar a cabeça de lorde Knightsdale.

—É claro. E o que você fez para merecer tal castigo, Charles?

— Eu apenas pedi a Srta. Peterson em casamento. Mas, pelo visto, ela recusou.

Beatrice demonstrou surpresa.

— Sei. Mas um simples "não" não seria suficiente?

— Aparentemente, não — respondeu Charles.

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— Lady Beatrice, peço desculpas — disse Emma. — Não tenho como explicar minha reação.

— Então é melhor nem tentar, querida. Algumas coisas são inexplicáveis e outras se esclarecem com o tempo. Só nos resta esperar para ver em qual categoria o episódio de hoje irá se enquadrar. Você disse que vocês já se conheciam? — Charles sorriu.

— Emma e eu somos amigos de infância, tia. Quando a senhora chegou, estávamos nos reencontrando, depois de anos sem nos ver.

— Anos, Charles? Quantos anos? — Ele encolheu os ombros.

— Talvez mais de vinte.— Beatrice fitou o sobrinho.

— Você não vê esta moça desde que eram crianças e mesmo assim acabou de pedi-la em casamento?

— Sim.

Beatrice meneou a cabeça.

— Emma, minhas desculpas. Eu compreendo perfeitamente a sua reação. Da próxima vez atire um objeto mais pesado e mais de perto.

Charles observava a conversa das damas. Lambert tinha trazido chá e bolo e um pires de leite para Bess.

— Você disse que tem dormido aqui na casa, não foi, Emma? — Beatrice se serviu de uma fatia de bolo.

— Sim. A Srta. Hodgekiss teve de se ausentar de repente na última semana, e achei melhor me mudar para cá para ajudar Nanny. Ela está com muita idade.

— E verdade. E sua família pode se ajeitar sem você? — Emma fez uma pausa, e Charles se inclinou para a frente.

Havia uma sombra naqueles olhos encantadores, escondidos atrás da armação dos óculos?

— Oh, sim. Minha irmã já tem dezesseis anos, por isso não precisa mais dos meus cuidados. E ela nem quer minha supervisão diária.

— Hum. E creio que sua mãe tenha falecido há muitos anos, não foi?

— Pouco tempo depois que Meg nasceu. — Emma sorriu, mas Charles viu de novo a sombra em seu olhar. — Eu criei Meg e cuidei da casa, mas as coisas mudaram. O fato é que posso cuidar das meninas sem problema durante a ausência da Srta. Hodgekiss.

Charles viu Emma mordiscar um pedaço de bolo. Ela tinha uma boca bonita, lábios carnudos... beijáveis. Ele olhou a pontinha da língua rosada saindo para capturar uma migalha errante, e sentiu um calor surgindo em uma parte específica de sua anatomia ao imaginar as coisas deliciosas que aquela língua seria capaz de fazer.

— Você não concorda, Charles?

— O quê? — Ele desviou sua atenção dos lábios de Emma para encontrar o olhar fixo da tia. — Desculpe, tia. Mas acho que estava divagando.

— É assim que vocês chamam aquilo, agora? — lady Beatrice zombou. — No meu tempo...

Charles deu uma olhada para a fisionomia assustada de Emma.

— Tia, a senhora poderia nos poupar de mais um embaraço e apenas repetir a pergunta?

— Tudo bem. Eu estava tentando convencer Emma a participar dos festejos que faremos para comemorar seu novo título, Charles.

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— Uma excelente idéia! — Ele deu um sorriso radiante.

— Mas, milorde, eu não posso simplesmente me juntar aos convidados — argumentou Emma.

— Por que não?

— Eu sou a governanta.

— Governanta temporária. — Beatrice ofereceu um pedacinho de bolo à gata. — Seu berço é impecável. Seu pai é filho de um nobre, se me lembro bem.

— A quarta geração — Emma corrigiu.

— Não importa. Tem sangue azul suficiente. — Emma bateu a xícara sobre o pires.

— Suficiente para quê?

— Para a sociedade, Emma. — Beatrice colocou na boca um pedaço de bolo. — Não me lembro de vê-la nos salões de baile de Londres. Você não debutou?

— Não. Quando eu tinha dezessete anos, Meg ainda era criança. Eu não quis sair de perto de minha irmãzinha, e acho que meu pai não queria muito que eu fosse a Londres. Creio que até poderia ter pedido a uma das minhas tias que me acompanhasse, mas achei que não valeria a pena.— Beatrice assentiu.

— Sim, agora me lembro de suas tias, lady Gromwell, a condessa, e lady Fanning, a baronesa. Perfeitamente aceitável. — Ela se serviu de outra fatia de bolo. — Você disse que sua irmã tem dezesseis anos? Ela também recusou a viagem a Londres?

— Sim. Papai até lhe ofereceu uma oportunidade. Lady Elizabeth, irmã do duque de Alvord, estava debutando, e Meg poderia ter ido com ela a Londres. — Emma suspirou. — Acho que Meg não se interessa muito por vestidos e babados. Ela gosta mesmo é de caminhar no campo em busca de plantas para a sua coleção.

Emma fez uma pausa, olhando para a xícara de chá. Charles percebeu mais uma vez uma sombra na doce fisionomia.

— E as coisas estavam um pouco... incertas lá em casa.

O que estaria incomodando Emma? Ele queria ver apenas alegria naqueles olhos, ou o brilho da paixão, e não tristeza.

—Parece-me que sua irmã está precisando de um polimento, Emma — disse Beatrice. — Sugiro incluirmos o nome dela na lista de convidados, Charles. Será a oportunidade perfeita para introduzir a moça na sociedade.

— Ótima idéia, tia. E Emma estará aqui para acompanhar a irmã.

— Lady Beatrice, não sei...

— Nós insistimos. Não é mesmo, Charles?

— Sem dúvida. Eu a acompanharei à sua casa hoje, Emma. Para entregar o convite pessoalmente.

— Mas...

— Tenho certeza de que seu pai não irá se opor — Beatrice insistiu. — Ele ficará contente em ver que a filha, ou melhor, as filhas terão uma oportunidade de alcançar uma boa posição social.

Emma abandonou a xícara de chá e se recostou, seus olhos parecendo soltar faíscas.

— Lady Beatrice...

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A outra ergueu a mão.

— Não seja teimosa. O que você tem contra um pouco de divertimento? Uns joguinhos de cartas, um ou dois piqueniques, um baile?

— Preciso cuidar das meninas.

— É claro, mas não o dia todo. Tenho certeza de que Nanny pode ficar de olho nas duas um pouco, não pode? — Beatrice olhou para Charles.

—Certamente. — Ele sorriu.—Na verdade, ela está cuidando das meninas agora. E as duas já não são mais bebezinhos. Isabelle me pareceu muito responsável.

— De fato, ela é — Emma concordou. — Mas precisa se dedicar aos estudos.

-— Tenho certeza de que Isabelle o fará. — Charles vislumbrou a sorte a seu favor. — Farei uma visita à sala de estudos e ajudarei, contanto que você não me peça para ensinar a pintar com aquarela. Não sei pintar, nem desenhar, nem qualquer coisa do tipo.

— Hum...

— Então, está decidido. — Beatrice pegou a última fatia de bolo. — Vá apanhar seu chapéu, Emma, e Charles a acompanhará até sua casa agora mesmo.

— Mas...

Beatrice gesticulou. Emma olhou para Charles, que riu da mistura de ira, frustração e resignação que havia em seu rosto. E esperança? Haveria mesmo uma pontinha de esperança? Ele suspeitava que já fazia muito tempo desde a última vez que aquela moça se permitira um pouquinho de diversão.

Charles estava determinado a mudar isso. E achou que adoraria dar a Emma um pouco de prazer; prazer glorioso, quente, doce; tarde da noite e de manhãzinha. Ele observou o movimento gracioso dos quadris se movendo em direção à saída da sala.

— Decidiu-se por ela, não é?

Charles encolheu os ombros, voltando-se para a tia.

— Desde a morte de Paul a senhora vem insistindo que eu tenho de me casar. Emma Peterson servirá muito bem.

— Você pode escolher entre as muitas damas que virão para os festejos.

— Já conheço todas.

—Ah, mas elas estão muito mais interessadas agora que você é o marquês de Knightsdale.

Charles sentiu um nó no estômago. Aquela era justamente uma das coisas que ele mais abominava em sua situação atual: a bajulação. Pessoas que nunca tinham se importado com o major Draysmith agora se acotovelavam para cumprimentar lorde Knightsdale.

— Esse é o charme de Emma, tia. Acho que ela não liga nem um pouco para o meu título.

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Emma fez o que pôde para descer a escadaria com a maior calma. Pois ainda estava enfurecida. Que ousadia a de Charles! Depois de todos aqueles anos, pedi-la em casamento. E era capaz de jurar que Charles nem a tinha reconhecido quando a vira.

Tudo que ele queria era alguém para procriar. Ela certamente não iria se oferecer para dar continuidade à dinastia dos Knightsdale. Naquele momento, o que mais desejava era pôr um fim à linhagem, isso sim. E com as próprias mãos, se possível!

Emma fez uma pausa no segundo andar, segurando o corrimão com tanta força que seus dedos ficaram esbranquiçados. Respirou fundo. Estava aborrecida consigo mesma. Por que Charles não era feio ou vesgo ou corcunda ou manco? E por que tinha de ser o homem que assombrava seus sonhos?

Levou as mãos às faces ruborizadas. Charles assombrara mais do que seus sonhos. Mesmo acordada, ela sonhava com ele, com o beijo que havia presenciado naquela noite.

Agora ele a pedira em casamento. Seria a oportunidade perfeita para descobrir exatamente como seria provar aqueles lábios; como seria sentir aquelas mão acariciando-a... Mas não podia se casar com um homem apenas para aplacar a curiosidade. Claro que não. Tal pensamento era ridículo. Emma terminou de descer a escada.

— Emma. Que rápida. Esplêndido.

Charles estava parado no vestíbulo, sorrindo para ela.

— Não demora muito para colocar um chapéu, milorde.

—Não? Serei obrigado a acreditar em você, pois nunca tentei o desafio.

— Não duvido que você deve ter bem mais experiência em tirar um chapéu!

Emma mordeu o lábio inferior. De onde tinha vindo aquilo? Nunca fora de dizer as coisas sem pensar. Só lhe restou olhar para a frente à medida que caminhavam rumo à saída, mas Charles veio rindo logo atrás.

— Ah, Emma Peterson, será que detectei algum subentendido?

— Não tenho idéia do que está dizendo, milorde.

— Então você não insinuou que eu já tirei o chapéu de bem mais que uma dama?

Emma sentiu um calor subindo pelo rosto. Só então teve a exata noção do alcance de suas palavras.

— E claro que não, milorde. — Ele deu uma risada estrondosa.

— Oh, Emma, acho que vamos nos divertir muito. E, por favor, me chame de Charles.

Ela prendeu a respiração ao sentir as mãos grandes e quentes ao redor da sua cintura, erguendo-a para sentá-la no coche de duas rodas. Em seguida, ele deu a volta para ocupar o outro lado do assento e sorriu, tocando na ponta do queixo de Emma com o dedo indicador.

Charles respirou fundo o ar fresco do campo, deliciando-se com o aroma da relva nova. Sorriu. Fazia anos que não se sentia tão leve, certamente não desde que voltara da Espanha, ou desde que soubera da morte do irmão. Talvez não se sentisse assim desde a infância, quando tinha o dia todo para pescar, correr e brincar de Robin Hood ou de Cavaleiro da Távola Redonda, sempre com a menina em seu encalço. Ele riu. Quem imaginaria que viria a sentir algo mais pela pequena de cabelos cacheados a quem apelidara de Magrela...

— O que é tão engraçado, milorde?

Então Emma pretendia continuar com o tratamento cerimonioso? Charles olhou para ela.

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— Você sabia que os outros garotos a chamavam de Sombra?

— Do que o senhor está falando?

— De quando éramos crianças. Os outros garotos a chamavam de Sombra, porque você vivia me seguindo.

— Oh! — Emma olhava para a paisagem agora, com o rosto muito corado.

— Eu não a chamava assim. Não me importava que me seguisse.

— O senhor me chamava de Magrela.

— Bem, você era pequena e magrinha. Ainda não é muito alta, apesar de algumas partes do seu corpo... — os olhos de Charles desceram na altura do busto arredondado — ...terem crescido consideravelmente.

— Milorde! — As faces de Emma estavam pegando fogo agora.

Charles se encolheu de medo de levar uma bofetada.

— As suas mãos, por exemplo — ele disse, rindo. — Tenho certeza de que estão maiores. Os seus pés também. O seu lindo...

Emma respirou fundo, fazendo com que as partes protuberantes de seu corpo arfassem.

— ...o seu queixo cresceu desde que você era criança.

— Milorde, o senhor é muito... escorregadio.

— Como? Não entendi o que você quis dizer.

— Entendeu, sim! O senhor é escorregadio como um peixe.

— Querida — Charles disse —, seja lá qual for a parte do meu corpo que quiser agarrar, por favor, não se acanhe.

Emma dirigiu-lhe um olhar confuso, mas cauteloso.

— O senhor está fazendo novamente.

— O que estou fazendo?

— Não banque o inocente. O senhor insinuou algo.

— Não.

— Sim, insinuou. — Ele sorriu.

— Talvez.

— Então me diga o que foi.

— Oh, não, Emma, meu amor. Não direi mesmo. Mostrarei, mas somente depois de casados.

Charles riu e olhou adiante para a conhecida construção de pedra onde passara tantas horas aprendendo grego e latim com o reverendo Peterson.

— Seu pai está em casa?

— Creio que sim.

Charles notou o leve tremor na voz de Emma.

— E sua irmã?

Ela deu de ombros.

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— Meg deve estar fazendo peraltices por aí. Trepando em árvores para colher folhas de todos os tipos. Se papai e a...

Emma se calou, e Charles percebeu que ela estava tensa.

— E quem? — encorajou, puxando as rédeas.

De queixo erguido e com a postura ereta, Emma parecia um soldado pronto para a batalha. Todos os pensamentos insinuantes abandonaram a mente de Charles. Ele tinha certeza de que estava prestes a descobrir o motivo da sombra que rondava o olhar de Emma.

—E a Sra. Graham—ela respondeu.—A Sra. Harriet Graham é uma viúva que ajuda na igreja, cuidando das flores... e coisas do tipo.

— E?

— E o quê, milorde?

— Por que a simples menção do nome da Sra. Harriet Graham, a viúva, a fez enrijecer como se tivesse acabado de engolir um espeto quente?

— Não sei do que o senhor está falando.

— Não pode ser apenas pelo simples fato de essa senhora ajudar na igreja, pode? — Charles observou Emma. — Você disse que seu pai e a Sra. Graham, o problema está no "e", não é? A Sra. Graham é uma mulher inescrupulosa ou algo assim?

Emma meneou a cabeça.

— É claro que não. A Sra. Graham é uma boa ovelha da congregação.

— Mas talvez não seja uma ovelha tão boa para fazer parte da sua família. É isso?

— O senhor vai me ajudar a descer daqui ou terei de pular?

— Eu a ajudarei.

Charles deu a volta e segurou-a pela cintura. Não deslizou o corpo delgado junto ao seu como desejava, mas apreciou e muito a curva da cintura sob suas mãos.

Para sua surpresa, Emma não se esquivou assim que tocou os pés no chão. Ficou parada, olhando para baixo, os olhos ocultos pelo chapéu.

— Emma, você está bem?

— Sim... claro. — Ela recuou um passo, e Charles a soltou. — Sinto muito. Venha por aqui, milorde.

Ele a acompanhou. O cheiro o atingiu de imediato: o odor do aprendizado, dos livros velhos, de capa de couro, de papel e tinta. Sentira aquele cheiro tantas vezes quando era criança, enquanto lutava para decorar as declinações do latim. Havia sentido o mesmo cheiro na universidade, mas este era melhor. Este era de casa. O pai de Emma tinha sido um mestre gentil. Rígido, autoritário, porém sempre encorajador. Charles estudara muito para satisfazê-lo.

E se sentia culpado por ter desejado que o reverendo Peterson fosse seu pai. Talvez por isso tolerasse Emma. Ele a considerava como uma irmã. Mas tinha mudado de idéia quanto a isso. Emma parou à porta do escritório do pai e bateu.

— Temos visita, papai.

— Podem entrar, por favor.

Ela abriu a porta, e Charles parou no batente. Logicamente, o reverendo Peterson havia envelhecido nos últimos vinte anos. Os cabelos estavam grisalhos; as faces, levemente emaciadas, os

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ossos faciais, mais evidentes. Charles sabia disso, pois se encontrara com o reverendo quatro meses antes, no funeral de Paul.

— Milorde — Peterson disse ao se levantar. — É muito bom vê-lo de novo. Estamos muito felizes que o senhor tenha vindo para Knightsdale.

Charles sorriu.

— O senhor quer dizer "finalmente". Mas obrigado.

O sorriso do reverendo Peterson ainda era o mesmo. Os olhos ainda tinham o mesmo brilho, atrás das lentes dos óculos.

— Não era minha intenção criticar um marquês.

— Pare com isso.

O velho mestre e amigo sorriu ainda mais.

— Estava apenas ansioso para vê-lo de volta, milorde. — Ele se voltou para uma senhora miúda sentada ao lado da escrivaninha. — Gostaria de lhe apresentar a Sra. Harriet Graham. A Sra. Graham é relativamente nova aqui, mas tem sido um membro ativo da nossa comunidade.

— Sra. Graham. — Charles tomou a mão da mulher e teve certeza de ouvir um suspiro áspero de Emma, que ainda se encontrava junto à porta.

—Milorde.— A Sra. Graham cumprimentou-o com um belo sorriso, e ele gostou dela de imediato. A mulher tinha feições agradáveis, com olhos castanhos e cabelos que um dia foram castanhos também, mas que agora possuíam algumas mechas grisalhas.

— Reverendo, vim entregar um convite às suas filhas. — Emma observou Charles apertando a mão da Sra. Graham.

Não se surpreendeu ao encontrá-la no escritório do pai. Afinal, ela praticamente vivia por ali.

— Várias damas, da mesma idade da Srta. Margaret, estarão presentes. Minha tia, lady Beatrice, achou que seria uma excelente oportunidade para sua filha caçula ser apresentada à sociedade, ao lado de pessoas conhecidas e da irmã como acompanhante.

— E quem acompanhará minha filha mais velha?

— Papai, não sou nenhuma desmiolada. Sei me cuidar sozinha.

Emma viu Charles arquear as sobrancelhas e corou. Talvez o tom tivesse sido muito áspero.

— Eu não quis dizer isso, Emma, mas você também nunca esteve em Londres.

— Já participei de bailes locais.

— Sim, eu sei, mas...

— Não se preocupe, senhor. — Havia um leve tom de humor no tom de Charles.

Emma se virou para fitá-lo, mas Charles a ignorou.

— Minha tia estará presente, e não será uma comemoração muito extravagante. Somente alguns piqueniques e um baile. Nada demais. Creio que o duque de Alvord virá com a esposa e a irmã, assim como o conde de Westbrooke, para que as damas encontrem rostos conhecidos. O reverendo assentiu.

— A irmã do duque, lady Elizabeth, é muito amiga de Meg. Não tenho nenhuma objeção. Você tem, Harriet?

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Emma cerrou os dentes quando a Sra. Graham murmurou que não.

— Os convidados devem chegar amanhã — Charles prosseguiu. — Sendo assim, enviarei uma carruagem para apanhar a Srta. Margaret pela manhã, pode ser?

— Ótimo, milorde. — O vigário olhou para a filha. — Emma deverá preparar algo para levar. Afinal, ela não planejava participar dos festejos quando foi substituir a Srta. Hodgekiss.

— Não, e não estou planejando comparecer a nenhuma atividade social. Passarei a maior parte do tempo com as meninas.

— Não o tempo todo — Charles interveio. — Por que não vai arrumar suas coisas agora?

Emma não queria arrumar nada. Cruzou os braços, pronta para informar isso a todos, mas captou o olhar de Charles antes de dizer qualquer coisa. Havia algo na fisionomia do marquês que a alertou de que aquele não era o momento para infantilidades. Já tinha vinte e seis anos e deveria se comportar como tal.

— Não me demoro.

— Precisa de ajuda?

—Não, Sra. Graham. Já posso me arranjar sozinha. — Emma olhou de relance para o pai e viu a expressão de reprovação. — Mas... obrigada pelo oferecimento. Eu volto logo.

Não demorou para que ela arrumasse suas coisas. Não possuía muitos vestidos e a maioria já estava em Knightsdale.

Charles colocou a pequena valise de Emma na carruagem enquanto ela se despedia do pai.

— Minhas orelhas deveriam estar ardendo? — Emma perguntou pouco depois, quando Charles a ajudou a ocupar o assento.

— Seu pai não falaria sobre você comigo e a Sra. Graham.

— Tenho certeza de que ele fala com a Sra. Graham sobre mim.—Emma esperou que Charles fosse defender a mulher, mas ele não disse nada. Ela também não deveria dizer nada, porém as palavras estavam presas na garganta, pedindo para sair.

Emma não tinha com quem desabafar. Não podia falar com Meg. Até tentara uma vez, mas a irmã, por ser muito jovem, não havia entendido. E as outras mulheres que conhecia eram muito velhas.

Emma olhou para Charles, que indagou:

— Qual é o problema?

— Que problema? Do que o senhor está falando?

—Você está sentada aí, resmungando e cerrando os punhos. Parece que vai explodir a qualquer momento.

— Eu não estava resmungando. Que absurdo!

— Estava, sim.

— Nem sei resmungar.

— Você gostaria de me contar o que a está preocupando?

— Não. — Emma comprimiu os lábios. — Não tenho problema nenhum.

Charles suspirou.

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— Acho que deve ser alguma coisa relacionada com a Sra. Graham, mas, francamente, não consigo imaginar o que seja. Pareceu-me uma senhora de respeito e muito simpática.

— Mas não é! — Emma agarrou o braço de Charles. — Ela é uma descarada sem-vergonha!

— A Sra. Graham?

— Sim.

Eles continuaram em silêncio durante alguns minutos. Emma tentou recuperar o controle. Estava trêmula.

— Tudo bem, Emma, eu desisto. Não consigo imaginar como a Sra. Graham possa ser uma descarada sem-vergonha. Sei que é um assunto delicado, mas vou perguntar mesmo assim. O que ela fez?

— Eu a surpreendi aos beijos com meu pai no escritório. — Emma se lembrava perfeitamente da cena, como se tivesse acabado de acontecer, apesar de já se terem passado dois meses.

— E?

Emma olhou para Charles.

— Como assim?

— E o que mais? Você viu a Sra. Graham beijando seu pai. E o que mais?

— Como, o que mais? Isso não é o suficiente? E estava mais do que claro que era ela quem estava beijando meu pai, e não o contrário. Tinha os cabelos despenteados, e os botões do vestido abertos, expondo o pescoço.

—Entendi. Então eles estavam trocando carícias. Já faz quanto tempo que sua mãe morreu, Emma?

— Isso não vem ao caso.

— A Sra. Graham estava possuída por algum espírito maligno?

— Claro que não. Meu pai é um homem de Deus.

— Precisamente. Então, talvez ele esteja pronto para se casar novamente e goste da Sra. Graham.

— Meu pai é muito velho para se casar. — Emma enterrou os dedos no braço de Charles.

— Querida — ele disse, segurando as rédeas com uma mão e, com a outra, gentilmente soltando os dedinhos que o comprimiam —, seu pai não deve ter mais que cinqüenta anos. Não é tão velho assim.

— Mas eu não quero uma mãe.

—Tenho certeza de que a Sra. Graham deve saber disso, nem acredito que ela queira ser sua mãe. Você já tem vinte e seis anos, e Meg, dezesseis. Irão se casar em breve. Seu pai ficará sozinho. Você deveria ficar feliz que ele tenha encontrado a Sra. Graham.

Emma soltou o braço de Charles. Já deveria ter imaginado que ele não entenderia. Como poderia? Era homem, afinal.

— Eu não vou me casar.

Charles sorriu, voltando a atenção para os cavalos.

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—Talvez não. A escolha é sua. Mas permita que seu pai tenha a mesma liberdade de decisão.

— Mas o senhor não entende. Ele é meu pai. Tem deveres para com a família.

— Ele é um homem também, querida.— Emma olhou para as próprias mãos.

— Pensei que meu pai amasse a mim e a Meg. Por que ele precisa dela?

— É um tipo de amor diferente, Emma. Você não entende as necessidades de um homem?

Ela meneou a cabeça. O que poderia ser mais importante para um homem do que as próprias filhas?

— Não. Não sei e não entendo.

— Então, meu amor, permita que eu lhe mostre. — Quando Emma se deu conta, os lábios de Charles estavam colados aos seus e, com a língua, ele a fez entreabrir a boca.

Quem imaginaria tal coisa? Emma certamente nunca. Eram tantas sensações... A maciez da língua dentro de sua boca. O leve sugar. A suave pressão dos lábios. O cheiro de creme de barbear e da pele.

Céus, seu corpo agora latejava em partes que causam rubor só de pensar. O coração estava disparado. Quando Charles, por fim, a soltou, Emma estremeceu e olhou para ele, surpresa. Aqueles lábios mágicos estavam sorrindo, mas havia uma fúria, uma chama azul nos olhos que parecia queimar como fogo a parte de seu corpo que Charles olhava fixamente.

— O que o senhor acabou de fazer comigo?

— Não muito mais do que eu realmente gostaria de ter feito, querida.

Emma se sentia deliciosamente estonteada. Se os cavalos não tivessem parado sozinhos, Charles não saberia dizer até onde ele e Emma teriam ido. E, a bem da verdade, uma carruagem aberta em uma estrada pública não era o local ideal para iniciar uma virgem nas delícias do amor.

—Querida, da próxima vez que fizermos isso, não será numa carruagem.

— Próxima vez? Haverá uma próxima vez?

— Ah, com certeza. Assim que for possível.

— Milorde! — Finalmente o cérebro de Emma pareceu sair do transe. Uma onda de calor coloriu suas faces, e ela ajeitou os óculos. — Estou certa de que o que fizemos é impróprio.

— Muito impróprio. — Charles sorriu. — Mas muito bom.

— Creio que devemos seguir para Knightsdale. — Ele agitou as rédeas.

— Você não acha que deveria me chamar de Charles, meu amor? Milorde me parece um tanto impessoal. E acabamos de compartilhar um momento muito íntimo.

— Eu não penso dessa forma.

— Não? Então, como você classificaria o que aconteceu? Eu coloquei a minha língua dentro da...

— Milorde!

—Se não quiser que eu descreva em detalhes o que acabamos de fazer, convém me chamar de Charles.

— Milorde, por favor!

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— Quer que eu continue? Adorarei. Na verdade, acho que descreverei o que faremos na próxima vez em que eu tiver o prazer de colocar a minha língua...

— Charles! — Emma gritou, agarrando-lhe o braço.

— Viu? Não foi difícil, foi? — Ela contraiu os lábios.

— Acho que prefiro terminar esta viagem em silêncio.

— Esplêndido. Vou me distrair imaginando as coisas maravilhosas que poderemos fazer na próxima oportunidade que tivermos.

— Srta. Peterson!

O chamado veio de um homem que estava logo à frente. Charles estudou o sujeito que se aproximava.

— É um amigo seu? — perguntou.

— Um conhecido, o sr. Albert Stockley. Ele alugou as terras do Sr. Atworthy, que está morando na cidade. — Emma acenou e sorriu para o homem, que parou a seu lado. — Bom dia, Sr. Stockley.

— Srta. Peterson. — O cavalheiro se inclinou de leve.

— Sr. Stockley, o senhor conhece lorde Knightsdale?

— Não. — Ele se inclinou para Charles. — Muito prazer, milorde.

— Stockley. — Charles meneou a cabeça.

— Srta. Peterson — disse Stockley — eu estava indo para Knightsdale justamente para falar com a senhorita, mas agora que o lorde está em casa, creio que a senhorita deve ter regressado ao vicariato.

— Bem, na verdade...

— A Srta. Peterson se ofereceu para ficar e me ajudar com os cuidados de minhas sobrinhas na ausência de nossa governanta — informou Charles.

Stockley franziu o cenho.

— É mesmo? Mas isso não é inadequado, milorde? Não que eu esteja criticando, mas a Srta. Peterson é solteira. Precisa de uma acompanhante para resguardar sua reputação.

Charles sentiu o desconforto de Emma.

— O senhor não precisa se preocupar — ele respondeu. — Minha tia, lady Beatrice, está em casa. Ela cuidará para que meus instintos selvagens fiquem sob controle.

— Milorde, eu não quis insinuar...

— Desculpe-me, mas caso os cavalheiros não tenham percebido, eu ainda estou sentada aqui.

Charles sorriu.

— Sr. Stockley — ela prosseguiu —, agradeço sua preocupação, mas pode ficar tranqüilo. Não corro perigo de me expor aos instintos selvagens do lorde.

— Não, é claro que não. Eu não quis dizer isso... Eu sei que sua virtude é intocável... Bem, só queria perguntar se a senhorita gostaria de dar um passeio amanhã, depois do almoço.

— Seria ótimo, mas...

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— Mas a Srta. Peterson estará ocupada amanhã. Darei uma festa em minha casa, e ela concordou em tomar parte, quando os deveres de governanta permitirem, é claro. Meus convidados devem chegar amanhã. O senhor será bem-vindo... se quiser comparecer.

Stockley sorriu.

— Eu adoraria, milorde. — Ele se inclinou novamente. — Mal posso esperar para vê-los amanhã.

Charles, por sua vez, queria mesmo era ver o sujeito pelas costas.

— Aceita mais ervilhas?

— Não, obrigada, milorde.

Charles tinha ido ao quarto de estudos para convidar Emma para o jantar. Ela tentara se esquivar, mas Isabelle a havia incentivado a aceitar.

— Há muito tempo eu não comia algo tão bom — disse Beatrice, olhando para o prato.

— Coma mais um pouco, tia, vai lhe fazer bem.

— Não quero ficar estufada. Gostaria apenas de um pouco mais de vinho, Charles.

— Acho que a senhora já tomou o suficiente por hoje, tia.

—Quando os seus convidados vão chegar, lady Beatrice? — perguntou Emma.

—Os convidados de Charles, você quer dizer. Este é o ponto. Sabe, Charles precisa arranjar uma esposa. Ele precisa de um herdeiro, pois não quer que o título passe para o primo Aubrey. Aquele idiota provavelmente iria berrar se encontrasse uma mulher em sua cama... — Beatrice se inclinou para a frente. — Sabe o que eu acho?

— Tia Bea! Tenho certeza de que não queremos saber o que a senhora acha — interveio Charles.

Beatrice espetou um pedaço do robalo e olhou para Emma.

—Você poderia nos poupar de todo esse trabalho se aceitasse o pedido de casamento de Charles.

— Tia!

— Lady Beatrice! — Beatrice provou o peixe.

— Credo! Está horrível! — O garfo tilintou sobre o prato. Ela se inclinou para falar novamente com Emma e apontou para Charles.—Limpe esses seus óculos, mocinha, e olhe para aquele homem. Não é o primo Aubrey que está sentado ali. Tenho certeza de que Charles é capaz de providenciar um herdeiro bem depressa. Não estou certa, querido?

Charles temia que seu rosto estivesse tão vermelho quanto o de Emma.

— Se me derem licença — Emma disse, levantando-se. — Estou me sentindo... estranha...

— Está quente? — Beatrice perguntou. — Deve estar se sentindo quente, moça. Pense nos ombros deste homem. Nas pernas. Nas coxas. No...

— Tia Bea!

Beatrice parou e olhou para Charles.

—Não precisa gritar. Pensei que estivesse acostumado a falar abertamente, mas juro que você está mais corado do que Emma.

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Charles desfez o laço da gravata. Finalmente tinha conseguido convencer a tia a ir para a cama. E agora estava em seu quarto. Precisava descansar da longa jornada e do dia emocionante que tivera.

— Pode se recolher, Henderson. Não vou mais precisar de você por hoje.

— Boa noite, milorde.

Ele viu a porta se fechar atrás do criado. Queria ficar sozinho. Precisava assumir as rédeas de sua nova condição. Olhou ao redor do quarto para os quadros escurecidos pelo tempo, para a mobília pesada, para a enorme cama. Deus! Aquele não era o seu lugar. Era o quarto de seu pai. O quarto de Paul.

O pobre Paul se mudara para aquele quarto quando tinha apenas catorze anos. O pai morrera, deixando a responsabilidade do título para o filho mais velho.

Mas, pelo menos, o rapaz estava preparado para isso. Bem, não tão preparado. Afinal, quem estaria pronto para assumir tantos deveres na mais tenra adolescência? Paul, no entanto, tinha sido criado para a função; sabia desde o berço que seria um marquês. Era o seu destino. Não o de Charles.

Ele caminhou pelo quarto.

Lembrou-se daquela tarde no White's como se tivesse acontecido no dia anterior. Estava sentado com Robbie, o conde de Westbrooke. Os dois celebravam a pequena participação que ajudara a aproximar James, o duque de Alvord, e a esposa, Sarah. Charles tinha acabado de tomar um gole de vinho quando um mensageiro os encontrara.

— Major Charles Draysmith?

Um calafrio perpassara seu corpo. Pela fisionomia séria e solene do rapaz, ele adivinhou que sua vida estava prestes a mudar drasticamente.

— Sim, sou o major Draysmith.

— Lamento informar, major, que o marquês de Knightsdale e a marquesa sofreram um trágico acidente.

Maldição, maldição, maldição! Charles pulou da cama e olhou através da janela para a profunda escuridão que encobria Knightsdale. Não havia luar; as nuvens estavam tão escuras quanto seu coração.

Naquele momento, quando o mensageiro dera a notícia de que Paul estava morto, Charles deixara de ser ele mesmo. Seus planos, seu futuro, sua identidade... tudo lhe foi arrancado. Havia se tornado o marquês de Knightsdale.

Fechou as cortinas com violência. Tirou as meias, a calça e a ceroula. Queria mesmo era poder arrancar a própria pele. Escapar daquele quarto, do título, de todas as responsabilidades. Mas não podia. Knightsdale era parte de seu dever agora. Do nada, a lembrança de Claire invadiu sua mente; o som do riso, os bracinhos ao redor de seu pescoço e a voz da menina chamando-o de "papai". Bem, talvez fosse mais do que um dever.

E então foi a vez da imagem de Emma Peterson tomar conta de seus pensamentos. Deitar-se com ela com certeza seria mais do que um dever. Charles a imaginou nua sobre os lençóis. Sim, definitivamente ela tornaria aquele quarto, aquela cama, um local bem mais aconchegante.

Precisava conversar com ela pela manhã, antes de os convidados chegarem. Emma era uma mulher inteligente. Acabaria enxergando a vantagem do casamento. Estava claro que ela gostava

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muito de Isabelle e Claire. O casamento traria benefícios a Emma também. Olhando para o dossel da cama, ele sorriu.

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Charles acordou no meio de um sonho muito bom. Emma estava em sua cama. Os cabelos estavam espalhados sobre o travesseiro, e as mãos dele espalmadas nos seios macios. Ela lhe acariciava o braço com os dedos delicados. Hum... Outra parte de seu corpo queria muito receber a mesma atenção. Ela deu um tapa em seu ombro, e Charles parou. Nunca tinha brincado disso antes...

— Papai Charles, acorde!

Ele abriu os olhos e deparou com o rostinho de Claire a alguns centímetros de seu nariz.

Charles sabia que estava totalmente nu sob os lençóis. Teria de começar trancar a porta do quarto todas as noites.

— O que foi, Claire? Aconteceu alguma coisa?

— O senhor precisa vir rápido, papai Charles. Tem um fantasma na casa.

— Você deve ter tido um pesadelo, querida. Já chamou Nanny?

A menina balançou os cachinhos.

— Ela está gritando muito alto.

Ao longe, eles ouviram alguém dizendo:

— Calma, Nanny! Isso é bobagem...

— Por que ela está gritando? Claire revirou os olhos.

— Nanny disse que viu um fantasma. Mamãe Emma pediu para eu vir chamá-lo. Vamos logo, papai Charles. O senhor precisa pegar o fantasma.

— Está bem.

Claire não parava de puxar o braço do tio. Charles se enrolou no lençol e se levantou. Pegou um alfinete de gravata e prendeu o lençol como se fosse uma toga romana, enquanto a sobrinha o puxava para fora do quarto.

Encontraram Beatrice no vestíbulo, usando uma camisola castanho-avermelhada com borlas douradas, uma touca de dormir vermelha e com o rosto pálido. Bess também parecia transtornada, balançando o rabo aos pés da dona.

— Que confusão é essa? Ninguém pode me deixar morrer em paz?

— Aparentemente ninguém está descansando em paz esta noite, tia. E se a senhora não tivesse bebido tanto conhaque e vinho, não estaria se sentindo à beira da morte agora.

Claire puxou o braço do tio.

— Vamos logo, papai Charles. O fantasma vai escapar. — Charles acompanhou a garotinha. Beatrice e Bess vieram logo atrás.

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— Do que Claire o chamou?

— Deixe para lá, tia.

— Que traje estranho você está usando.

Charles resmungou. Estava difícil andar depressa com as pernas se enroscando no lençol.

— Como as mulheres conseguem andar de saia? — ele perguntou depois de tropeçar pela quarta vez.

— Melhor do que você, obviamente. Oh, saia do caminho e me deixe passar.

— E se houver mesmo um fantasma?

—Tenho certeza de que ele já deve ter corrido de medo, com toda essa gritaria. Daqui posso ouvir os berros de Nanny.

Eles finalmente chegaram ao quarto das crianças. Emma, usando uma camisola longa branca fechada até o queixo, que deixou Charles desapontado, tentava acalmar Nanny. Isabelle estava ao lado, segurando Prinny.

— Eu trouxe papai Charles, mamãe Emma! — anunciou Claire.

Nanny olhou para Charles e gritou. Bess olhou para Prinny e se eriçou. Prinny olhou para a gata e rosnou. Beatrice olhou para a cena e levou as mãos à cabeça.

— Meu Deus! Alguém me diga que isso é uma alucinação, por favor!

Prinny latia como um louco, perseguindo Bess, que estava com os pêlos arrepiados e tentava escalar a "toga" de Charles. Este, tentando se portar como um cavalheiro o tempo todo, segurava o lençol como podia e continha os palavrões que lhe vinham à mente enquanto a gata lhe arranhava as pernas. Mas, pelos olhos arregalados de Claire, ele não conseguiu se conter por muito tempo.

— Oh, mamãe Emma, papai Charles disse uma palavra feia.

Emma já estava mergulhando para segurar Prinny pelas patinhas quando teve a oportunidade de ver de relance os tornozelos bem-feitos de Charles, antes de ele ouvir o som agourento de um rasgo e sentir um ventinho roçando suas pernas.

— Tia, venha pegar sua maldita gata!

— Eu sabia que você tinha pernas bonitas, Charles. Viu, Emma? Que pernas, hein?

Charles não sabia definir se o calor que sentia era de raiva ou de vergonha.

— Tia, por favor, pegue essa gata maluca!

— Francamente, Charles, não estamos em um campo de batalha. Bem, talvez estejamos um pouquinho, mas você poderia baixar a voz. Está assustando Bess.

— Farei mais do que assustar essa peste...

— Charles! Lembre-se, você é um cavalheiro. — Beatrice pegou Bess do chão e a segurou junto ao rosto. — Calma, calma, amorzinho... O homem mau não tinha intenção de assustar você.

— Tinha, sim! — Charles resmungou.

Suas pernas estavam expostas, arranhadas e sangrando. O essencial, no entanto, encontrava-se coberto. Mas Emma não tirava os olhos do belo par de pernas masculinas.

— Oh, milorde, suas pobres pernas. Vou buscar água para lavá-las. Posso?

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A idéia de Emma lavar suas pernas fez que a saia da "toga", agora bem mais curta, se erguesse de um modo estranho. Charles percebeu que a tia tinha aberto a boca para comentar.

Ele se virou para Nanny:

— Alguém pode me dizer o que está acontecendo?

— Oh, milorde, nunca fiquei tão assustada em toda a minha vida! Pensei ter ouvido um barulho, por isso me levantei para ir verificar se estava tudo bem com as minhas crianças, e foi então que vi algo logo ali. Eu gritei, e a coisa flutuou e desapareceu no ar. — A senhora apontava um ponto exato, acima das estantes de livros das meninas. — Ouvi o ruído de correntes se arrastando e tudo o mais.

— Entendi. — Uma vez que Beatrice continuava segurando Bess, Emma soltou Prinny, que foi farejar o local indicado por Nanny. — Então, a senhora disse que viu um fantasma desaparecer justamente onde Prinny está agora?

— Milorde... — Nanny parecia confusa.

—Ali—Charles insistiu.—Onde está Prinny, o cachorrinho de Emma.

— O cachorro de Emma? Oh! Desculpe-me, milorde. — Nanny desapareceu dentro de seu quarto e voltou em seguida usando óculos. — Ah, assim está melhor. Sim, acho que foi exatamente onde o cachorro está agora.

Charles encarava a mulher.

— Nanny, por que você gritou quando eu entrei, então?

—Porque pensei que o senhor fosse o fantasma que estivesse voltando, milorde. Está usando uma roupa estranha. Isso é uma fantasia de antigo romano?

— Não, Nanny. — Ele olhou para Emma, que estava com os olhos voltados para o chão, segurando o riso. — Você também viu a aparição?

— Não, milorde. — Ela tentava se conter como podia. — Quando cheguei aqui, a coisa já tinha desaparecido. — Em seguida, Emma se virou para o lado e caiu na gargalhada.

— Estou feliz que tenha achado a situação tão engraçada, Emma.

Ela acenou com a mão, obviamente não conseguindo falar. As lágrimas escorriam pelas faces de tanto que ela ria.

— Você está muito engraçado, Charles — disse Beatrice —, apesar de achar a reação de Emma um tanto exagerada.

— Perdoe-me, lady Beatrice.

Emma recuperou a compostura. Isabelle e Claire estavam rindo também. Charles concluiu que o tal fantasma não passava de fruto da imaginação de Nanny. Mesmo assim, ele não podia ignorar o fato de Emma e as meninas estarem se divertido muito.

— Se as damas acharem que podem terminar a noite aqui — ele disse —, amanhã poderemos providenciar acomodações em outro andar para vocês. Está bem assim?

Emma finalmente conseguiu se controlar.

— Certamente, milorde. Estaremos bem.

— Então, tenham uma boa noite.

Charles puxou a ponta rasgada do lençol, gesticulou para a tia, e saiu. Assim que deixou o quarto de brinquedos, ele ouviu a voz de Nanny:

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— Desculpe, Emma, mas o lorde tem belas pernas.

Emma terminou de guardar o último traje no armário. Seu vestido de baile. Parecia bobagem ter trazido, mas mesmo assim...

Nunca deveria ter comprado o vestido, pensou. Fora uma extravagância, mas ela ficara encantada quando vira o cetim azul na loja do sr. Ashford. Bem, até mesmo Meg gostara da cor, dizendo que lembrava o azul do céu ao entardecer no início do outono. Isso tinha sido quatro anos antes.

Bem, talvez comprar o tecido fosse um ato compreensível, mas permitir que a Sra. Croft, a costureira da vila, confeccionasse o vestido fora uma loucura. O que ela estava pensando? O que a Sra. Croft estava pensando? O traje era muito escandaloso para a filha de um pároco, especialmente para uma solteirona. O decote mal cobria o busto e revelava algo mais sempre que ela se mexia, o que a deixara chocada.

Às vezes Emma dava uma olhadinha no vestido, sonhadora, mas nunca o usaria. Nunca.

Até aquele dia.

Ela deu uma última olhada no traje antes de fechar o armário. Iria usá-lo no baile. Já estava um pouco ultrapassado e, sem dúvida, pareceria simples demais perto dos luxuosos vestidos vindos de Londres, mas não havia nada a fazer quanto a isso.

Emma sentou-se próximo à janela, sentindo o sol da manhã aquecer-lhe as costas. Seu novo quarto não era muito maior do que o outro que ela ocupara no andar de cima, perto dos aposentos das meninas, mas era decorado com mais luxo. Nanny e as meninas estavam em um quarto maior do outro lado do corredor.

Emma fechou os olhos. Não tinha dormido bem na noite anterior por causa daquele incidente ridículo do fantasma. Por que não percebera antes que Nanny estava sem os óculos? Mas, na hora, pensara que havia um intruso na casa, e não poderia pôr a segurança das meninas em risco. Por isso mandara Claire chamar Charles.

Ela sorriu, lembrando-se do traje do marquês. Engraçado e incrivelmente atraente. Nanny e lady Beatrice estavam certas: Charles tinha pernas muito bonitas. Maravilhosas. Não que ela já tivesse visto um par de pernas masculinas antes, claro.

E não foram apenas as pernas que se revelaram muito interessantes. Os braços, o pescoço, os ombros, parte do peito. Ele parecia uma estátua grega, com a diferença de que estava vivo. Quente. De carne e osso.

De repente, os raios de sol que penetravam através da janela se tornaram quentes demais. Emma moveu a cadeira de lugar. O que estava acontecendo com ela? Tinha sonhado a noite toda com Charles. Bem, já sonhara com ele antes, mas agora os sonhos eram bem mais detalhados. Muito mais, mas ainda não o suficiente.

Emma corou. Que atrevida! Tinha vontade de tocá-lo, de ser tocada por ele. De sentir os braços em torno de seu corpo, de acariciar aqueles músculos, os pêlos do peito. Seriam macios ou ásperos? E aquela pele maravilhosa... como seria senti-la sob os dedos?

Emma se abanou com as mãos. Seu corpo todo estava reagindo de uma maneira estranha àqueles pensamentos. Na verdade, uma parte específica parecia latejar. Talvez já fosse tempo de se casar. Nunca havia considerado a idéia antes, mas, como Charles dissera, Meg já estava com dezesseis anos. Logo seu pai não iria mais precisar de sua ajuda. Ele tinha a Sra. Graham, e Emma estava convencida de que os dois ficariam felizes se ela se mudasse. E a única maneira de fazer isso seria se casando.

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Talvez o casamento pudesse ser a solução para a sua vida, afinal.

Ela voltou para perto da janela. Seu novo quarto dava vista para toda a frente da casa, que estava vazia agora, mas em poucas horas se encheria de carruagens, trazendo várias damas. Certamente, um grande número de homens solteiros também viria. Charles poderia escolher uma moça, porém restariam vários cavalheiros disponíveis.

Talvez um deles pudesse se interessar por ela, pela sua pessoa, e não por ser uma procriadora em potencial. De qualquer maneira, isso seria o mais próximo que Emma chegaria do mercado casamenteiro de Londres. Mas ela aproveitaria a oportunidade para fazer uma "comprinha".

—Meg!—Emma vira a irmã chegando e correu escada abaixo para recebê-la.

Meg estava de cara feia.

— Você é muito malvada, Emma.

— Por que está dizendo isso?

De fato, Emma não esperava que Meg pudesse se entusiasmar com o convite para a festa, mas não deixava de ser uma ótima oportunidade para a irmã adquirir algum traquejo social.

— Foi você que pôs na cabeça do papai que eu deveria vir para esta festa ridícula, não foi?

Emma riu.

— Na verdade, foi lorde Knightsdale quem estendeu o convite a você. E a festa não será ridícula. Você poderá circular um pouquinho em sociedade, o que não lhe fará mal algum.

— Não tente encobrir a sua culpa, pois eu sei que você também esteve lá para entregar o convite. E não quero me misturar com a sociedade. Essa gente não passa de um bando de almofadinhas e mocinhas fúteis e mimadas. Encontrei um caminho muito interessante ao norte das terras do sr. Beggley e é para lá que quero ir... Céus, o que é aquilo?

Emma se virou para ver Beatrice se aproximando. A senhora trajava um vestido cor de vinho com bolinhas verdes, com um arranjo de penas de avestruz balançando sobre os cachos grisalhos.

Meg ficou espantada. Arregalou os olhos e fitou a irmã. Emma franziu o cenho, rezando para que Meg se contivesse e não fizesse nenhum comentário a respeito da roupa extravagante da anfitriã.

—Lady Beatrice, gostaria de lhe apresentar minha irmã, Meg.

Meg fez uma mesura.

— Obrigada por me convidar, lady Beatrice.

— Seja bem-vinda, querida. — Beatrice se voltou para Lambert: — Por favor, peça para George levar as coisas de Margaret para o quarto amarelo.

— Certamente, milady. — Beatrice sorriu.

— Tenho ótimos planos para vocês duas. — Emma enrijeceu.

— Tem mesmo? — Meg deu um sorriso malicioso. Obviamente, percebera o desconforto da irmã.— E quais seriam esses planos?

Emma rezou para que o chão se abrisse sob seus pés e a engolisse, porém, por milagre, Beatrice se conteve.

— Ainda é muito cedo para dizer.

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— Mas isso envolve...

Emma decidiu interromper Meg:

— Lady Beatrice, a senhora dormiu bem?

— Na verdade, não. Só consegui cochilar, depois daquele episódio do fantasma. E, para completar, minha cabeça parecia que ia explodir. Não beba muito conhaque, Meg. Pelo menos, não em excesso.

— Conhaque? Fantasma? — Meg murmurou enquanto Beatrice esfregava a testa. — Talvez a estada não vá ser tão monótona, afinal.

— Shh — Emma sinalizou para a irmã.

— O que você disse, querida? Acho que eu não estava prestando atenção.

— Nada, lady Beatrice. Estou feliz que o incidente de ontem à noite tenha acabado bem.

Emma percebeu os olhos curiosos de Meg, mas felizmente Charles apareceu naquele exato momento, impedindo Beatrice de contar em detalhes tudo o que se passara no quarto de brinquedos das meninas, incluindo o incidente com a "toga" de Charles e as pernas e...

— Bom dia, ladies. Ouvi mesmo você dizer que esta é sua irmã, Emma?

— Sim, milorde.

Ele segurou a mão de Meg.

— Prazer em revê-la, Margaret. Da última vez em que nos encontramos, você mal andava.

Ela sorriu.

— Por favor, lorde Knightsdale, pode me chamar de Meg. Ninguém de chama de Margaret.

— Meg, então. Acho que o seu cachorro está no quarto de brinquedo com as minhas sobrinhas.

— Meu cachorro?

— Prinny — explicou Emma. — O seu cachorro.

— Não acredito que você ainda insista em dizer que Prinny é meu, Emma. Posso ter colocado o nome nele quando era filhote, mas Prinny se considera seu. Provavelmente porque você é quem se lembra de alimentá-lo.

Essa era uma discussão familiar. Emma respirou fundo e tentou responder com calma:

— Você sabe que arrumamos Prinny para lhe fazer companhia durante as longas caminhadas que você insiste em fazer. Ele serve para protegê-la quando está sozinha no campo.

—Você avisou isso a Prinny? Na poucas ocasiões em que ele foi comigo, tudo que fez foi perseguir coelhos. Não o quero comigo. Ele pisa nos espécimes.

— Espécimes? — Charles indagou.

— Eu me interesso por plantas, milorde.

— Milady, o Sr. Stockley acaba de chegar — Lambert informou.

— Ah, o apaixonado. — Meg sorriu para a irmã. — Vai ser difícil evitar o rapaz, não acha, Emma?

— O apaixonado? — Charles perguntou enquanto Beatrice se afastava para receber o convidado.

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Emma estrangularia a irmã ali mesmo se pudesse.

— Não é nada disso, milorde. Meg só está brincando. — Lançou um olhar de alerta para evitar que a irmã prosseguisse. Mas Meg ignorou a advertência.

— Com freqüência, ou melhor, constantemente, o Sr. Stockley visita o vicariato desde que se mudou para a casa do Sr. Atworthy. E desde que Emma veio para cá, percebi que as visitas dele escassearam.

— Entendi — disse Charles. — Nesse caso, fico feliz por termos nos encontrado com o Sr. Stockley ontem e convidado para se juntar aos festejos.

—Sim, foi muita sorte. Não foi? Vamos, Meg, eu vou ajudá-la a se instalar em seu quarto.

Emma agarrou o braço da irmã e subiu a escadaria.

Então Stockley estava interessado em Emma. Pela primeira vez Charles se sentiu feliz por ter um título para jogar na cara do sujeitinho. Observou o homem colocando óculos para examinar melhor uma enorme urna que ficava ao lado da porta, atrevendo-se a ponto de levantar a tampa e espiar dentro.

— Está procurando algo, Stockley?

O rapaz levou um susto, fazendo a peça oscilar sobre o pedestal. Charles a amparou.

— Milorde, o senhor me assustou. Eu estava apenas admirando esta belíssima peça de arte. É da dinastia Ming, o senhor sabia?

— Não fazia idéia. O senhor se interessa por louça?

— Por arte, milorde. Arte. Sim, me interesso por todas as coisas de valor: estátuas, pinturas, jóias.

— É mesmo?

Charles pensou se não seria melhor mandar trancar a prataria. Onde o pai de Emma estava com a cabeça quando permitira que o salafrário entrasse no vicariato? E onde ele, Charles, estava com a cabeça quando o convidara para vir a Knightsdale? Agora teria de ficar de olho em Emma. Bem de perto. Era sua obrigação como anfitrião.

— Charles, as convidadas chegaram.

— Certo. Já estou indo, tia. — Ele se voltou para Stockley. — Espero que aprecie sua estada em Knightsdale. Precisa de ajuda para encontrar seu quarto?

— Oh, não, milorde. Posso encontrar o caminho. — Charles observou o sujeitinho subir a escadaria.

— Tia, a senhora não colocou Stockley em um quarto perto de Emma, colocou?

— É claro que não, Charles. Você acha que sou tola? Troquei o quarto dele pelo da Srta. Russell esta manhã, quando mudamos Emma para o mesmo andar. O Sr. Stockley ficará no final do corredor, para que não entre por engano no quarto de Emma durante a noite.

— Ótimo.

Charles estava parado junto à janela da biblioteca, admirando o jardim e o lago. Todos os convidados já tinham chegado. Tratava-se de uma estranha mistura. Bem, as mães caçadoras de maridos e suas filhas e todos os tipos de cavalheiros disponíveis não eram algo assim tão incomum. Foram as moças da família Peterson que tornaram a lista de convidados bem mais interessante.

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— Charles, você viu as gêmeas Farthington no corredor? — Ele sorriu quando Robbie Hamilton, o conde de Westbrooke, entrou na biblioteca.

— Você, pelo jeito, viu.

— Preciso de um conhaque. Onde você guarda a bebida?

— Sobre o aparador da esquerda. Só não permita que as gêmeas captem o cheiro.

Robbie parou com a mão sobre a tampa da garrafa.

— As gêmeas Farthington gostam de conhaque? — Charles riu.

— De cálices cheios.

Os dois riram enquanto Robbie enchia dois cálices e, em seguida, estendeu um ao anfitrião.

— Como vão às coisas, meu amigo?

— Bem, eu creio. — Charles tomou um gole do conhaque. — Parece-me que Paul investiu com sabedoria, até onde pude ver em Londres.

— Isso é um alívio. E a propriedade, como está? — Charles encolheu os ombros.

— Coles, o administrador, me parece competente. Cheguei ontem e tive um assunto para tratar. Mas hoje cedo conversei com ele e aparentemente as coisas vão bem.

Charles sentiu a mão de Robbie em seu ombro.

— Você sabe que pode contar comigo, se precisar.

— Eu sei, Robbie. — Deu um tapinha na mão do amigo. — Eu sei.

Robbie sorriu.

— Tenho um pouco mais de experiência nesse negócio de nobreza. E administro uma propriedade, é claro.

— É claro.

— Coles tinha algo mais a dizer?

— Somente que Paul se tornou um lorde muito ausente depois de se casar com Cecília. Coles não escondeu a esperança de que eu seja mais presente.

— Cecília gostava de Londres.

— E aparentemente de qualquer outro lugar que não fosse Knightsdale.

Robbie sentou-se em uma poltrona próxima à lareira.

— Ela gostava da atenção da sociedade.

— E por conta disso deixava as próprias filhas de lado.

— De fato. Mas muitas crianças crescem sob os cuidados de criados. Eu confesso que só via meus pais umas cinco ou seis vezes durante o ano, e suponho que você também não tenha passado muito tempo com os seus, não é?

— Não. — Charles se juntou a Robbie perto do fogo. — Na verdade, eu nem queria ver meu pai. Você se lembra do temperamento dele.

Robbie assentiu.

— E quanto à sua mãe? — Charles suspirou.

— Não era muito diferente de Cecília.

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— E você se importava?

— Não que eu me lembre. Mas as minhas sobrinhas... — Tomou outro gole. — A menor está me chamando de "papai Charles".

— Como assim? — Um homem indagou da porta. — Você já é pai, Charles? Meus parabéns, mas conseguiu o feito tão rápido, antes mesmo de arranjar uma esposa?

—James!—Charles se levantou para cumprimentar o duque de Alvord. — Como está Sarah?

— Muito bem, obrigado.

— Ouvi dizer que estão esperando o novo duque — Robbie comentou.

James sorriu.

— Talvez.

— É mesmo? — Charles ofereceu um conhaque a James. — Isso requer um brinde.

— Certifique-se apenas se fechou bem a porta da biblioteca, James. Charles disse que as gêmeas Farthington gostam muito de conhaque.

— E mesmo? Eu não sabia. E aquela que estava admirando as estátuas na galeria principal era a Srta. Russell?

— Deve ser — Charles respondeu. — Estava acompanhada de um homem baixote?

James ergueu as sobrancelhas.

— Não sabia que a Srta. Russell tinha um admirador. — Robbie gargalhou.

— Pelo visto, esta festa será muito interessante. — James riu.

—Mas quem é o baixinho que está cortejando a Srta. Russell?

— É o Sr. Albert Stockley, e ele não está cortejando a Srta. Russell. Eu o encontrei examinando um vaso no vestíbulo e pensei que ele tivesse se juntado à Srta. Russell no passeio para ver as peças de arte de Knightsdale.

— Está desconfiado de que o tal do Sr. Stockley tem dedos leves? — James perguntou.

Charles encolheu os ombros.

— Talvez. Não fui com a cara do homem.

— Então por que o convidou? — Robbie indagou. — Ele não é o almofadinha que está alugando a casa de Atworthy?

— Sim, o próprio. Você sabe algo sobre ele?

— Não. E você, James?

— Não. — James sorriu. — Estou preocupado com outros assuntos.

— Aposto que sim. — Robbie revirou os olhos. — As damas de Alvord viajaram para Brighton para lhe dar, digamos, oportunidade de se concentrar nas suas obrigações.

— Tenho de cumprir com meu dever, afinal de contas, e arrumar um sucessor. E você ficará feliz em saber que tia Gladys, lady Amanda e Lizzie estão de volta. Lizzie se juntará a nós amanhã.

— Então a pequena Lizzie se unirá ao bando de donzelas interessadas no nosso novo marquês?

— Não creio que Lizzie esteja interessada em Charles, Robbie.

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— E eu não estou interessado em nenhuma moça. — Charles interveio.

— Não está? Então por que vai promover um baile para tantas moçoilas? Se você não é o melhor partido disponível, então quem é? — Robbie ergueu a mão. — Eu é que não sou.

— Bem, muito menos eu — James disse. — E se Charles diz que não está interessado...

— Não. Eu ainda sou muito jovem para me prender. — declarou Robbie.

— Haverá outros homens solteiros na festa — Charles falou.

— Portanto, não precisa ficar com medo, Robbie.

— Claro que não. Com um marquês disponível, as moças não irão se interessar por um simples conde. Pedirei ao meu pajem que verifique todas as noites, antes de eu ir me deitar, se não há nenhuma escondida no meu quarto. E tomarei o cuidado de evitar todas as áreas mais reclusas de sua bela propriedade.

— Robbie tomou outro gole de conhaque. Talvez eu grude em sua tia Bea. Pois, pelo que me lembro, ela não terá nenhum problema em afastar qualquer mocinha mais atrevida.

— Ótima idéia, Robbie — James disse. — Mas ainda não entendo por que você convidou todas essas pessoas, Charles, se não está interessado em arranjar uma noiva. Tenho quase certeza de que a adorável lady Dunlee e a encantadora Sra. Oldston não trouxeram suas lindas filhas para Knightsdale apenas por causa da bonita paisagem. A menos que, é claro, a paisagem inclua você colocando um anel de noivado no dedo de uma das beldades.

— Sim, entendo o que quer dizer. Pensei que estava no mercado, mas já encontrei uma pretendente.

— Oh? E quem é a felizarda? — James perguntou.

— A Srta. Emma Peterson.

— A filha do vigário?

—Não é apenas a filha do vigário, James — Robbie interveio, rindo. — É a Sombra.

— Sombra? Que sombra? Ah, sim, agora me lembro! A menina que costumava seguir os passos de Charles quando éramos crianças.

— E caso não tenha notado — Robbie sorriu —, e é claro que não notou, sendo um homem casado, a Srta. Peterson não é mais uma menininha.

— Comporte-se, Robbie. — Charles se surpreendeu com o próprio e inusitado ciúme ao ouvir o tom zombeteiro do amigo. — Não permitirei que desrespeite a Srta. Peterson.

— Oh, eu sempre respeitei os mais velhos.

— Mais velhos? Emma só tem vinte e seis anos.

— Assim como eu, meu amigo. Você é o idoso por aqui, o único de nós que já entrou na casa dos trinta. Pensando melhor, não creio que a Srta. Peterson seja dois meses mais velha; acho até que tivemos uma discussão uma vez sobre isso quando eu completei dez anos.

—Cavalheiros, não vamos relembrar o que já está esquecido. —James ergueu o cálice.—O momento é de comemorar. Quando você pretende anunciar o noivado, Charles?

— Logo.

— No baile? — Robbie indagou. — Seria o momento certo. Talvez você possa deixar as outras senhoritas curiosas até lá, assim elas me deixarão em paz.

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— Sim, no baile. — Charles se lembrou do som do cachorrinho de porcelana se espatifando contra a porta da biblioteca. — Eu espero. Tenho alguns problemas a resolver antes.

—Se a temporada de Londres é parecida com isto, estou feliz por não ter ido a nenhuma.

— Meg, fale baixo. — Emma puxou a irmã discretamente para os fundos da sala de visitas.

Um mar de vozes as engolfava. Damas elegantes de Londres em seus vestidos na última moda conversavam com cavalheiros que usavam gravatas com os mais elaborados laços e paletós bem-talhados. Emma se sentiu mais do que um pouco fora de moda. Buscava por um rosto conhecido e viu Beatrice, resplandecente num vestido carmesim com laços de fita verde, rindo muito com a Sra. Begley. Seus cálices pareciam cheios de conhaque.

Emma avistou as gêmeas Farthington no outro extremo da sala, examinando um quadro enorme de uma mulher nua ao lado de um homem nu da cintura para cima, cercados por um bando de querubins gorduchos. A Srta. Esther apontou para o homem com os ombros expostos e cutucou a irmã na altura das costelas. Pelo menos nenhuma das duas estava bebendo.

— Dê só uma olhada no bando de gansas barulhentas. — Meg apontou para um grupo de jovens que se acotovelavam em torno de Charles. — Ainda bem que lorde Knightsdale usa o cabelo bem curto, ou seus adoráveis cachos iriam se enroscar em todas aquelas pestanas batendo ao redor.

Emma concordou. As mocinhas estavam bajulando Charles da forma mais indiscreta possível. Aquilo certamente não seria nada bom para alguém que já tinha uma auto-estima tão alta quanto ele. Não que não fosse bonito. Era muito mais do que lindo, usando aquele traje de noite.

Charles olhou para cima. Os olhos azuis encontraram os de Emma do outro lado da sala, e ele sorriu. Ela sentiu um calor estranho irradiando-se do estômago.

— Lá vem o seu admirador especial, Emma.

— Meu o quê?

O Sr. Stockley serpenteava na direção das duas. Emma nunca o imaginara parecido com uma serpente antes, mas naquela noite ele se assemelhava muito a uma cobra.

— Parece que a qualquer momento vai sair uma língua bifurcada da boca do sujeito — Meg murmurou.— Acho que vou me juntar à Srta. Russell.

Emma resistiu à tentação de segurar a irmã pelo braço.

— Srta. Peterson, estou feliz em ver que lorde Knightsdale permitiu que a senhorita se juntasse aos festejos. Quem está cuidando de lady Isabelle e lady Claire?

Emma cerrou os dentes.

— Nanny está com as meninas, Sr. Stockley.

— Ah, Nanny. Uma senhora madura e confiável. Suponho que a senhorita tenha um quarto próximo ao de Nanny e das meninas.

O homem estava supondo coisas demais.

— Não imagino por que o senhor queira saber onde fica o meu quarto, Sr. Stockley.

O sujeitinho sorriu de modo malicioso.

— Não quis ser desrespeitoso, Srta. Peterson. Tenho certeza de que uma moça madura com a senhorita sabe guardar muito bem a sua reputação. É apenas que... bem... não ficaria bem para a

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senhorita ocupar o mesmo andar que nosso anfitrião. As pessoas têm mente pequena. Podem comentar...

Emma podia dar o nome de uma pessoa de mente pequena naquele exato momento.

— Senhor, não vejo como minha reputação possa estar em perigo. Lady Beatrice está hospedada na casa, afinal, e, para completar, temos os outros hóspedes. O senhor acha que lorde Knightsdale seria capaz de arrombar o meu quarto e se atirar na minha cama?

— Estou ainda mais surpreso, Westbrooke, em ver como conhecemos pouco o nosso amigo. Quem iria imaginar que Knightsdale teria coragem de sair deflorando virgens?

Emma corou e se virou para dar de cara com o duque de Alvord e o conde de Westbrooke.

— Vossa Graça, eu não quis...

— E claro que a senhorita não quis dizer nada, Srta. Peterson. — O duque sorriu para ela, mas sua expressão mudou ao olhar para Stockley.— No entanto, eu me pergunto o que o cavalheiro a seu lado insinuou.

— Sou Albert Stockley, Vossa Graça, e não tive a intenção de ofender. Estava apenas alertando a Srta. Peterson de um modo geral, como amigo.

— Como amigo. Sei. — O duque olhou para o conde de Westbrooke. — Corrija-me se eu estiver errado, Westbrooke, mas creio que a Srta. Peterson é amiga de infância de Knightsdale, não é? Sendo assim, qualquer um iria imaginar que ele tomaria como responsabilidade o bem-estar da antiga amiga sob seu teto.

— Qualquer um imaginaria — Westbrooke concordou. Emma já tinha ouvido o suficiente.

— Parem com isso. — Ela de fato se ofendera com a insinuação do sr. Stockley, mas não precisava que ninguém a defendesse. — Tenho certeza de que o Sr. Stockley estava apenas tentando ser cavalheiro. — Emma se voltou para o seu vizinho: — Sr. Stockley, como o senhor já deve ter concluído, conheci Sua Graça e lorde Westbrooke quando éramos todos crianças, apesar de eles mal notarem a minha presença naquela época.

— E claro que nós a ignorávamos, Srta. Peterson — disse o duque. — A senhorita era uma menina, e não nos interessávamos pelas meninas naquela época.

— Pode agradecer a mim por eles a tolerarem — Charles interveio. Ele tinha acabado de escapar do seu "harém".—Estes aqui a teriam expulsado de todas as brincadeiras se não fosse por mim.

Definitivamente, Stockley havia sido excluído do grupo. O duque e lorde Westbrooke deram um passo para o lado, fechando o círculo, e Stockley ficou invisível, escondido atrás dos homens muito mais altos do que ele. Então virou-se e se afastou sem graça.

—Onde está sua esposa, Vossa Graça?—Emma perguntou.

— Descansando. — O sorriso do duque foi tão largo que ele pareceu um garoto novamente. — Ela tem andado muito cansada ultimamente.

— Alvord se considera tão esperto que pensa ter descoberto como...

— Robbie! — Charles apontou para Emma, interrompendo o amigo.

Westbrooke olhou para ela e se rendeu.

— Tenho certeza de que você já deve ter deduzido, Emma — Charles disse —, que o duque e a duquesa estão esperando o primeiro herdeiro.

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— Que notícia maravilhosa, Vossa Graça! — Emma foi contagiada pela alegria do duque. — Espero me encontrar com a duquesa amanhã.

— Charles.—Beatrice surgiu atrás do sobrinho, acompanhada de um senhor corcunda. —Já está na hora do jantar. Duque, o senhor é o nobre de título mais elevado, por isso deve acompanhar lady Augusta.

— Será um prazer. — Westbrooke torceu o nariz.

— Duvido que seja tão prazeroso, James. Lady Augusta o deixará de queixo caído antes que você tenha terminado a sua sopa de tartaruga.

Beatrice apontou os dedos cheios de anéis para Westbrooke.

— E o senhor, milorde, irá acompanhar lady Barworth.

— Lady Barworth, não! — Westbrooke ergueu as mãos, enquanto o duque e Charles tentavam em vão conter o riso. — Tenha pena, por favor. Sou muito jovem para ter de ouvir os detalhes sobre uma crise de gota ou de uma indigestão.

— Milorde, tenho certeza de que não será tão ruim assim.

— A senhora tem razão, tia — Charles disse. — Lady Barworth gosta de falar sobre as doenças dos netinhos também.

— E ouvir dizer que o mais novo está se recuperando de sarampo — completou o duque de Alvord.

Beatrice encarou Robbie.

— Espero que se comporte, milorde.

— E claro. Prometo tentar não adormecer durante o relato médico de lady Barworth, e, se cair nos braços de Morfeu durante o jantar, prometo não roncar. — Robbie sorriu. — Pelo menos, não muito alto.

Beatrice resmungou e se voltou para Emma.

— Aqui está o seu acompanhante, minha querida. — A lady apanhou o braço do senhor que esteve o tempo todo parado ao lado e gritou no ouvido dele: — Esta é a Srta. Peterson, Sr. Maxwell! O senhor a acompanhará durante o jantar!

— Se tenho paladar? — Maxwell era tão corcunda que seu nariz ficava quase na altura do busto de Emma. — Sacrilégio! Não atire uma onça em mim, minha querida.

Emma recuou dois passos antes que uma gota de baba do velhinho atingisse seus seios.

— Maxwell, o senhor perdeu a cabeça.—O olhar de Charles parecia uma nuvem de tempestade.

Maxwell ergueu a cabeça para poder olhá-lo.

— O quê? Não precisa ficar irritado, milorde. Não sabia que você estava de olho na mocinha. — Maxwell chiou no que pareceu ser um riso. — Um homem pode olhar, não pode, sem ofender?

— Vamos, Charles — Beatrice chamou. — Acompanhe-me ao jantar. Emma estará segura. O pobre Sr. Maxwell não pode fazer muito além de olhar para ela.

Maxwell não deu sinais de que ouvira o comentário, mas Emma tinha certeza de que seu rosto estava mais vermelho do que o vestido de Beatrice.

— Vamos passar para a sala de jantar? — Maxwell perguntou.

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— Acho que não temos outra opção, temos? — Emma disse, afastando a mão atrevida do homem.

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— Acho que ainda não vi um vestido como o seu nesta temporada, Srta. Peterson. Quem é a sua modista? —Os olhos proeminentes de lady Oldston brilhavam com malícia.

Emma forçou um sorriso.

— É a Sra. Croft, uma senhora da nossa comunidade.

— Sei.

— Que originalidade a sua usar um... talento local. Nunca tentei isso. Talvez se torne uma tendência. — Lady Dunlee deu um sorriso leve, tendo o cuidado para não vincar o queixo proeminente.

— Não me lembro de ter visto a senhorita em Londres. — A terceira mulher repulsiva, a Sra. Pelham, bocejou. — A senhorita já deve ter debutado... — ela fez uma pausa estudada — ...há alguns anos.

— Com certeza não vi sua irmã — lady Oldston comentou. — Teria notado, pois ela deve ser da mesma idade da minha querida Amanda.

A querida Amanda parecia com um cruzamento de cavalo com sapo. Tinha olhos esbugalhados e era dentuça como a mãe.

— E de lady Caroline também. — Lady Dunlee pronunciou com ênfase o título da filha.

Lady Oldston corou, pois não passava de uma simples esposa de barão, enquanto lady Dunlee era uma condessa. E Caroline era mais redonda do que a mãe. Estava cochichando com a Srta. Oldston, ambas próximas à janela que dava para o jardim.

— Acho que foi muita generosidade da parte de lorde Knightsdale convidar os vizinhos — comentou a Sra. Pelham. —Não concorda, Srta. Peterson? Deve estar sendo muito divertido para a senhorita.

Emma murmurou algo educadamente. Mas as ilustres senhoras não pareciam mesmo esperar por uma reposta mais coerente de uma moça tão provinciana quanto ela. Se tivesse a metade da esperteza e da ousadia da irmã, Emma teria escapado logo após o jantar, como Meg fizera na passagem entre a sala de jantar e a sala de visitas. Teria sido fácil. Se alguém perguntasse, ela poderia alegar que ia dar uma olhada nas meninas.

Emma sorriu e acenou vagamente para a outra dose de veneno verbal que a Sra. Pelham acabara de soltar. Não tinha como mentir para si mesma. Acompanhara as damas até a sala na esperança de ver Charles novamente. Como era tola!

Muito tola, concluiu, sentindo o coração disparar no instante em que ele cruzou o umbral e seus olhos se encontraram. Lady Oldston suspirou.

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— Não foi romântico como lorde Knightsdale olhou para a minha querida Amanda quando entrou na sala? Ele conversou muito com ela nesta última temporada, em Londres. Não fiquei surpresa ao receber o convite para os festejos.

A Sra. Pelham riu.

— Oh, lady Oldston, que estranho! É claro que todos sabem que o marquês está interessado na minha Lucinda. Não que Amanda não seja uma moça fina, mas Lucinda... Bem, meu marido já teve de negar o pedido de um conde e de um visconde. — A senhora suspirou. — Achamos que Lucinda ainda é jovem para se casar, mas meu marido pode mudar de idéia em se tratando de um cavalheiro sério e distinto como lorde Knightsdale.

—É uma pena as meninas terem ficado órfãs — lady Dunlee comentou. — Tão inconveniente. A mulher que se casar com Knightsdale terá de criar as sobrinhas.

—Ah, mas é para isso que servem as governantas, não é mesmo, Srta. Peterson? — A Sra. Pelham sorriu de modo malicioso.

— Tenho certeza de que lorde Knightsdale espera que a esposa trate as sobrinhas com carinho e consideração — disse Emma.

— Não deixe que a honra de poder permanecer na casa dele sirva para criar falsas esperanças, querida — lady Oldston declarou. — Mas escute o que vou lhe dizer: marqueses não se casam com governantas.

—Não mesmo — concordou a Sra. Pelham. — Se a senhorita está esperando um pedido, bem...

— Receberá, sim. — Lady Dunlee riu. — Uma carícia nos ombros.

— Um colar, pulseiras e anéis, mas nunca uma aliança de casamento — lady Oldston completou.

— Concentre seus esforços em alguém mais à sua altura, querida — a Sra. Pelham alfinetou. — Alguém como o Sr. Stockley, talvez.

Emma olhou para a frente. Beatrice estava junto à bandeja de chá, segurando uma xícara.

— A senhorita faria a gentileza de nos servir?

— É claro. — Emma poderia até colher as folhas de chá só para se ver livre daquelas megeras. — Com sua licença?

— Onde a senhorita estava com a cabeça para ir se sentar com aquele grupinho? — Beatrice murmurou quando Emma se aproximou.

— Foram elas que se sentaram comigo. Eu não tinha idéia do quanto eram desagradáveis.

— Desagradáveis? — Beatrice zombou. — Se elas são desagradáveis, Satã não passa de um malvadinho. Não creio que tenham dado a devida importância ao fato de Charles ter dirigido sua atenção exclusivamente a você antes do jantar; ele e os amigos, Alvord e Westbrooke.

Ela sorriu e se inclinou para sussurrar no ouvido de Emma: — Pode deixar que eu levarei o chá para elas. Estou um tanto desastrada hoje. Talvez um banho de chá quente sirva para derreter o gelo daqueles coraçõezinhos malvados. — Emma sorriu em resposta.

— Tenha cuidado, lady Beatrice.

— Gostaria que eu desse um banho em mais alguém?

— Não consigo pensar em ninguém em especial.

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—Não? Eu, sim. Nunca gostei do tom de amarelo que Victoria Pelham está usando. Ela parece uma imensa torta de limão siciliano. Eu estaria lhe fazendo um favor se tingisse o vestido com chá.

Emma sorriu. Não esperava que lady Beatrice fosse mesmo colocar o plano perverso em ação, mas minutos depois ouviu a Sra. Pelham emitir um grito agudo.

—Acho que minha tia não gostou de alguma coisa que a Sra. Pelham disse — Charles comentou enquanto servia uma xícara de chá para Emma.

— Creio que tenha sido a cor do vestido.

Eles olharam para as damas. Beatrice tinha dado um jeito de espirrar chá sobre lady Oldston e lady Dunlee, enquanto as duas tentavam enxugar a frente do vestido da Sra. Pelham.

— Minha tia tem razão. Amarelo não é a cor certa para a Sra. Pelham.

Emma riu.

—Lorde Knightsdale.—A Srta. Haverford sorriu para Charles. — O senhor poderia virar as páginas da partitura para mim?

— Seria um prazer, Srta. Haverford. Estarei com a senhorita ao piano em um momento.

— A Srta. Haverford parece ser uma boa moça. — Emma tentou engolir o ciúme. A Srta. Haverford tinha dezessete aninhos, lindos cachinhos dourados e encantadores olhos azuis. Era também a filha de um visconde.

— É uma jovem muito boazinha. Assim como Meg. — Emma sorriu.

— Não estou certa se alguém poderia descrever Meg como uma jovem boazinha. Não que ela não seja boa, é claro, mas essa não é a primeira palavra que me vem à mente quando penso em minha irmã.

— Não? E que palavra seria?

— Não sei... — Emma hesitou. — Inteligente. Determinada. Teimosa.

Charles riu.

— Fala como uma irmã mais velha. — Ele baixou o tom da voz. — Preciso falar em particular com você, Emma. Encontre-me no jardim-de-inverno depois que as senhoras se retirarem. Pode ser?

— Parece inapropriado.

— Mas não é. Não se preocupe. Quero falar sobre Isabelle e Claire.

— E isso não pode esperar até amanhã? — Emma viu a Srta. Haverford sentada ao piano e acenando na direção deles. — Acho que a Srta. Haverford está perdendo a paciência.

Charles acenou em resposta.

— O assunto não pode esperar até amanhã. Promete que irá? — Emma suspirou.

— Está bem.

Emma esperou nas sombras do jardim-de-inverno. A espessa vegetação abafava o som, dando a impressão de privacidade. Aquilo era loucura. Ouviu passos entrando no jardim. E se alguém a visse ali? Como iria explicar o que estava fazendo?

— Emma?

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A voz de Charles soou baixa na penumbra.

— Sim?

— Ah. — Ele segurou a mão dela e a puxou para os fundos do jardim.

— Milorde, nós vamos conversar sobre suas sobrinhas?

—Shh. Já vamos, em um momento. Não quero que nenhuma das mães casamenteiras me encontre aqui.

Emma baixou o tom da voz ao mesmo volume do de Charles.

— Pensei que todas já tivessem se recolhido.

— Deveriam, mas um homem deve ser sempre cauteloso. — Ele caminhou até parar sob a copa frondosa de uma árvore. — Aqui está bom.

Charles ainda segurava a mão de Emma. Ela a puxou de leve, mas ele segurou com mais força, trazendo-a para mais perto. Parecia tão íntimo ficar parada ali com Charles ao luar, ocultos pelas folhagens.

Sua mente a alertou de que deveria se afastar, mas o corpo não queria obedecer.

— O que o senhor precisa falar comigo, milorde?

— Charles.

— Milorde.

Os lábios sedutores e másculos estavam a apenas alguns centímetros dos seus.

—Se você continuar insistindo nesse "milorde", Emma, terei de persuadi-la novamente a usar meu nome de batismo. Você se lembra do método que usei na carruagem?

Será que ela poderia se esquecer? Todo o seu corpo, das pontas dos cabelos aos dedos dos pés, ardia à lembrança de seus lábios se encontrando.

— Está bem, Charles. Você queria conversar comigo sobre Isabelle e Claire.

— Hum.

Charles deslizou a ponta do dedo indicador sobre os lábios dela, e Emma sentiu um calor se espalhar por seu corpo.

— Lorde Knightsdale, o senhor queria falar sobre suas sobrinhas?

Ele sorriu.

— Bem, sim, mas também quero beijar você, Emma. Gostei do beijo de ontem. Você, não?

Definitivamente, Emma não iria responder a tal pergunta.

— O que queria me dizer sobre suas sobrinhas? — Charles suspirou.

— Só queria perguntar o que você acha de irmos pescar com elas amanhã de manhã. Poderemos sair bem cedo e voltar antes de os hóspedes acordarem. Acho que Isabelle e Claire vão gostar, e eu poderia passar algum tempo com elas antes de sair com o administrador da propriedade e, em seguida, brincar de anfitrião.

— Isso seria maravilhoso. — Emma sorriu. Se Charles passasse algum tempo com as meninas, conhecesse as duas melhor, acabaria se apegando a elas, e assim não teria coragem de abandoná-las. — Tenho certeza de que as duas vão adorar. Duvido que já tenham pescado alguma vez.

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— Eu também.

— A que horas devemos estar prontas?

— Baterei na porta de seu quarto. Não me olhe assim, ninguém estará acordado para me ver, por isso não causaremos nenhum escândalo.

— E os criados?

— Não entrarei no seu quarto, Emma. Falarei com você através da porta.

— Muito bem. — Certamente não havia nada de impróprio no plano. Ela era a governanta temporária das meninas, e uma solteirona de vinte e seis anos. — Então, acho melhor eu me recolher, milorde, uma vez que vamos acordar cedo.

Emma percebeu o brilho dos dentes muito brancos na escuridão.

— Você ainda tem medo de aranhas, Emma?

— O que quer dizer com isso?

— Um dos problemas de se expor à natureza é ter de lidar com os intrusos que se escondem entre os arbustos. Se me permite...

Charles apanhou uma aranha preta que descia pelo decote de Emma. Ela saltou quando a viu. Sua reação não teve nada a ver com os dedos de Charles, que roçaram de leve os seios arfantes. Por sorte o decote do vestido era alto. Não havia nenhuma chance de a aranha ou os dedos penetrarem mais profundamente. Charles segurou o inseto apavorante na altura dos olhos de Emma.

— Devo colocar isto nas suas costas? — perguntou, rindo. — Ainda me lembro de como você gritou na ocasião em que Robbie colocou uma aranha nas suas costas, quando éramos crianças.

— Livre-se disso, por favor! — Emma virou o rosto.

— É claro, querida. — Charles jogou a aranha nas plantas e lançou os braços em torno da cintura de Emma, puxando-a para tão perto que ela sentiu o calor da respiração dele em seu pescoço. — Devo passar a mão pelo seu corpo para me certificar de que nenhuma outra criatura peçonhenta decidiu pousar na sua pessoa?

— Só tenho medo de aranhas.

Emma mal conseguia falar. A mão direita de Charles se movia por sua saia. Seus joelhos estavam bambos, mas ele a amparava com o braço esquerdo.

Ela mal conseguia respirar com aquela mão deslizando por seu corpo. A palma agora parara sobre o seio; os dedos traçando as curvas. Seus mamilos estavam enrijecidos e ardentes. Emma tinha certeza de que se sentiria mortificada se um dia imaginasse uma mão masculina sobre seu vestido. Mas o calor que subia e descia por seu corpo não tinha nada de ruim. Era mais um chocante desejo... uma necessidade de sentir aquela mão tocando sua pele nua. Ela gemeu.

Charles a virou de frente para ele, e Emma se soltou, erguendo as mãos para abraçá-lo. Havia uma estranha saliência roçando o ventre de Emma, e ela se esfregou contra aquilo.

— Emma...

Charles espalmou as mãos sobre o traseiro arredondado e a pressionou ainda mais contra seu corpo. Então, segurou o queixo delicado com uma das mãos, os dedos roçando a parte sensível logo atrás da orelha enquanto o polegar tocava o lábio inferior. Emma suspirou, seus lábios se entreabriram e ela os umedeceu com a ponta da língua. Eles ansiavam por serem beijados.

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E foi o que aconteceu. A boca de Charles os capturou, sugando, lambendo. Era uma loucura. Mas Emma precisava de mais prazer, de mais carícias... de algo mais. O discreto pedido e o desejo que ela não sabia explicar foram atendidos. A língua de Charles encheu sua boca, como ele tinha feito no dia anterior. Trouxe-a para mais perto, suas mãos a enlaçaram pela cintura e deslizaram pelas costas, antes de se enterrarem nos cabelos.

Emma precisava tocá-lo também. Mas o colete estava atrapalhando. Seus dedos leves deslizaram pelas costas largas até tocar com satisfação o tecido macio da calça. Ela explorou cada curva dos músculos de Charles.

— Querida — ele sussurrou, a voz trêmula —, isto é muito bom, mas acho que devemos parar. O chão do jardim não é uma cama muito confortável.

— O quê? — Emma não estava raciocinando bem. Tudo que queria era sentir. De repente, parou como se tivesse queimado as mãos. O que estava acontecendo? Emma empurrou Charles com as duas mãos.

— Eu...

— Shh... — Ele pôs um dedo sobre os lábios rosados.

—Mas as minhas mãos estavam sobre... Eu estava tocando... — Emma respirou fundo. — Peço desculpas, milorde. — Charles riu.

— Não peça desculpas, Emma. Adorei sentir o toque das suas mãos...

Emma gemeu, embaraçada.

— E você deve se lembrar que eu estava com as mãos no seu adorável...

— Não diga! — Ele riu.

— Está bem, não direi. Mas adorei cada minuto do nosso encontro. E espero repetir a experiência, porém sem a presença irritante das roupas e em um local mais confortável, como no meu quarto, por exemplo.

— Lorde Knightsdale!

— Charles. Por favor, Emma. Todas as vezes que você me chama de Knightsdale, parece que vou me virar e ver meu irmão. O que é uma sensação estranha depois do nosso encontro tão íntimo.

— Entendi.

Emma só conseguia pensar em sua própria imagem, nua, na cama de Charles. E nele, completamente nu também. Mas sua imaginação não era capaz de completar todos os detalhes da cena. Era melhor nem imaginar. Ela engoliu em seco e recuperou a compostura, tentando prestar atenção ao que Charles dizia.

— Lembra que eu sugeri que nos casássemos? Mas você recusou, pelo menos foi isso que entendi quando atirou o cachorrinho de porcelana contra mim. O que acha de reconsiderar a proposta agora?

— Não. — Emma não estava em condições de considerar nada. Todo seu corpo desejava ansiosamente e... bem, ela não estava racionando com clareza. — Não. E acho melhor eu me recolher. No meu quarto. Sozinha.

Charles pousou a mão de Emma sobre seu braço e a acompanhou no mais profundo silêncio até a porta do quarto.

— Boa noite, lorde Knightsdale — ela murmurou.

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Mas Charles estava pensando seriamente em beijá-la de novo, e assim permaneceu imóvel, com um sorriso nos lábios que dizia tudo.

— Milorde?

— Hum?

Conseguiria convencê-la a aceitar seu pedido agora? A porta do quarto de Emma estava logo atrás. O que seria mais conveniente? Eles poderiam ficar noivos na cama, onde ele passaria o restante da noite naqueles braços...

— Milorde...

Charles ergueu o braço para tocar a face delicada, mas Emma o afastou.

— Lorde Knightsdale, preste atenção. Não está sentindo cheiro de fumaça?

Charles inalou. O odor acre de linho queimado trouxe sua mente de volta à realidade. Algo mais além dele estava em chamas!

Charles se sentou na cama, olhando para a porta que ligava seu quarto ao da marquesa. Ou, nesse caso, ao quarto de Emma. Eles tiveram muita sorte na noite anterior. Uma das criadas devia ter esquecido uma vela acesa no quarto de Emma, que acabara caindo sobre a cama, dando início a um pequeno incêndio. O fogo não se espalhou e foi possível apagá-lo apenas com a água do jarro do lavatório. Nem foi preciso chamar os criados. Mesmo assim, o quarto ficou inabitável, por isso Charles achara melhor trazer Emma para o único cômodo vago. O da marquesa.

Como aquela vela fora esquecida acesa? Ele iria pedir ao Sr. Lambert que falasse com as criadas. Tamanha falta de cuidado poderia ser perigoso. Mas o que mais o preocupava não era o possível descuido de alguma criada, e sim a possibilidade de alguém ter invadido o quarto de Emma e esbarrado na vela, que caíra sobre a cama. Bastariam apenas alguns minutos para as chamas se espalharem da cama para o tapete e as cortinas. Deus! Enquanto ele estava no corredor cobiçando o corpo de Emma, alguém se encontrava dentro do quarto e, ao ouvi-los, derrubara a vela na pressa de sair.

Mas como o intruso tinha conseguido escapar, já que havia apenas uma porta no aposento? Charles se vestiu. Havia muitas dúvidas: quem, por que, como. Mas pelo menos Emma estava ao seu alcance agora. Se ela gritasse, ele poderia acudi-la em questão de segundos. Charles bateu na porta do quarto ao lado.

— Emma? Nada de resposta.

Ele hesitou durante uns cinco minutos antes de abrir a porta. Caminhou no escuro até a cama. Emma estava deitada, os cabelos um emaranhado de cachos espalhados sobre o travesseiro, o cobertor puxado até o pescoço. Ela sorria como se estivesse no meio de um sonho bom. Charles não gostava de acordar as pessoas, mas a pescaria iria se atrasar, e ele tinha os hóspedes esperando para mais tarde.

Deveria dar-lhe um beijo para despertá-la? Não, se fizesse isso, nunca iriam para a pescaria...

— Emma?

Ela resmungou e se virou.

— Emma, querida, já é hora de levantar. — Tocou no ombro dela com gentileza.

— O quê? — Ela abriu os olhos e, em seguida, puxou o cobertor sobre a cabeça.

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Charles a descobriu até a altura do queixo.

— Temos uma pescaria, sua dorminhoca, com Isabelle e Claire, lembra?

— Mas é tão cedo... E o senhor não deveria estar no meu quarto.

— Sei que é cedo, mas está ficando tarde se quisermos apanhar algum peixe. Você precisa se levantar. Vista-se e vá chamar as meninas. Eu vou pegar as varas de pescar e nos encontraremos nos fundos da casa, está bem?

Emma resmungou.

— Se eu sair, você vai dormir novamente? — Charles sorriu. — Devo puxar as cobertas e fazer cócegas nos seus pés?

— Não, não. Já estou acordada. Pode ir.

— Tem certeza? Se me deixar plantado do lado de fora, no frio da manhã, trarei um balde de água gelada do lago e despejarei sobre você.

— Estou acordada. Pode ir.

Emma lavou o rosto com água fria para espantar o sono. Em seguida, colocou o vestido mais velho que possuía e prendeu os cabelos para trás. Uma peliça descorada e um chapéu completaram o traje.

Saiu no corredor e seguiu para o quarto das meninas. Deveria simplesmente se recusar a pensar em Charles, lorde Knightsdale, não fosse como seu patrão temporário. Definitivamente, não deveria se permitir levar em consideração uma posição mais permanente na casa. Ele não a amava. Estava apenas interessado em seus serviços de governanta e em uma fêmea que pudesse procriar e ficar esquecida na propriedade de campo pelo restante do ano. Bem, embora ela já tivesse vinte e seis anos, não estava desesperada. Muito menos almejava um título. As mocinhas de Londres que se digladiassem para conquistar a atenção do marquês.

— Papai Charles, eu nunca pesquei na vida!

Claire correu ao encontro de Charles, que se abaixou para abraçar a garotinha. Emma sentiu um aperto no peito. Claire queria desesperadamente um pai; não apenas alguém para chamar de pai, mas um homem que fizesse parte da sua vida. Será que Charles poderia fazer isso?

Não, se ele planejava viver em Londres, vindo de vez em quando ao campo só para marcar presença. Emma corou com a estranha sensação que o pensamento lhe causou. Não sabia exatamente como as crianças nasciam, mas tinha quase certeza de que o procedimento estava ligado às atividades que ela e Charles haviam experimentando no jardim-de-inverno.

Prinny pulou para saudar Charles e quase deslocou o ombro de Emma, que o segurava pela coleira.

— Permita que eu leve o cachorro — disse Charles. — Meninas, vocês poderiam carregar as varinhas de pescar para que eu possa ajudar Emma com Prinny?

— É claro, tio Charles.

— Sim, sim, papai Charles. Eu nunca carreguei uma vara de pescar antes.

— Bem, então agora pode carregar. — Ele distribuiu as varinhas e assumiu Prinny, levando a cesta para os peixes na mão esquerda. — Sabem, meninas, Emma e eu costumávamos pescar quando éramos crianças. Eu era um pouco mais velho do que você, Isabelle, e Emma tinha seis anos quando fomos pescar juntos pela primeira vez.

Claire se aproximou do tio.

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— É mesmo? E o senhor pescou algum peixe?

— Sim, mas Emma só pegou gripe. — Ele riu. — Ela caiu na água, e eu tive de resgatá-la.

— Na verdade, eu fui empurrada, milorde.

—Bem, nunca tivemos certeza disso, tivemos? Robbie insiste que você tropeçou.

— Com a ajuda do pé que ele colocou na minha frente!

Eles andaram por entre as árvores, seguindo por um caminho estreito. O ar estava frio e úmido. Uma leve neblina encobria o céu. Emma inalou o cheiro forte dos pinheiros e o perfume suave das folhas secas. Passara tantos momentos de sua infância entre aquelas árvores, correndo atrás do homem que agora ria de algo que Claire dissera. Até mesmo Isabelle estava mais próxima do tio.

Naquela época, Charles Draysmith era apenas o segundo filho, carregava com cortesia o título, mas tinha mais charme do que o pai e o irmão juntos. Todo mundo gostava dele: os trabalhadores da fazenda, os jardineiros, as crianças da vila. Inclusive ela própria.

—Aqui é um ótimo local, o que você acha, Claire?—Charles colocou a cesta no chão, e Claire correu para a beira da água.

— Não estou vendo nenhum peixe, papai Charles.

— E claro que não! Os peixes são animais ariscos. Eles não gostam de ser apanhados.

— Porque sabem que vão virar comida! — Claire bateu palmas e pulou. — Podemos comer peixe no café da manhã?

— Se apanharmos um. — Charles se voltou para a outra sobrinha: — Você gostaria que eu arrumasse a linha de pesca para você, Isabelle?

— Sim, por favor, tio.

Claire se encostou em Charles para observar o trabalho.

— Credo! — A pequena torceu o nariz. — Uma minhoca!

— Quer ver mais de perto?

Charles segurou a minhoca na altura dos olhos de Claire. Ela recuou, encolhendo-se e rindo.

— Não! As minhocas são nojentas...

— Então, você não quer preparar a sua vara de pescar? Eu posso lhe ensinar.

— O senhor pode me ensinar, tio Charles — Isabelle falou. — Eu não sou um bebê.

— Eu também não sou um bebê. — Claire colocou as mãozinhas sobre os quadris e mostrou a língua para a irmã. — Pode me ensinar, papai Charles.

— Claire, comporte-se, por favor! — ele recomendou, num tom risonho. — O que a sua governanta tem lhe ensinado?

— Não culpe a Srta. Emma, tio Charles — Isabelle interveio. — Não é culpa dela que Claire seja uma menina má.

— Eu não sou má. — Claire fez beicinho. — Mamãe Emma, eu sou má? Minha mãe costumava dizer isso, mas eu não sou.

Emma se aproximou e abraçou a menina.

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— É claro que você não é má, querida. E tenho certeza de que sua mãe não quis dizer isso. Às vezes os adultos ficam um pouco irritados e dizem coisas sem pensar.

— Não, Srta. Emma. — Isabelle parecia muito séria. — Mamãe... bem, ela disse... que queria um menino, sabe, para que não precisasse mais ter outro bebê.

Claire concordou.

— Se ela tivesse um menino, teria cumprido com o dever.

— Papai precisava de um herdeiro, Srta. Emma, e Claire e eu não podemos ser herdeiras.

Emma olhou para Charles, que parecia tão pasmo quanto ela.

— Bem, eu sou o pai de vocês agora, Isabelle. E gosto das duas exatamente como são. — Ele tocou no queixo de Claire e olhou bem nos olhos da garotinha.—E você não é uma menina má, Claire. Mas precisa aprender a se comportar. Você imagina o que as pessoas iriam dizer se a Srta. Emma mostrasse a língua para minha tia?

Claire gargalhou.

— Mamãe Emma nunca faria uma coisa assim!

— Exatamente. Por isso você precisa aprender a se comportar, pelo menos em sociedade. — Charles sorriu para as sobrinhas. — Agora me deixem mostrar como se faz para apanhar peixes.

Emma tirou um cobertor da cesta e o abriu na sombra de uma árvore. Prinny já tinha gastado energia suficiente e estava descansando ao lado. Ela se sentou sobre o cobertor e observou Charles com as meninas. E concluiu que ele daria um ótimo pai se pretendesse permanecer em Knightsdale.

Pouco depois, Charles tirou o paletó e se sentou ao lado de Emma, olhando para as meninas.

— Acho que meu irmão e minha cunhada não eram os melhores pais do mundo.

Emma suspirou.

— Bem, acredito que não eram muito diferentes dos outros pais da alta sociedade, mas as filhas certamente queriam ficar mais com eles.

— Talvez tivesse sido pior. Deus, não posso acreditar que Cecília tenha dito às meninas que queria um filho.

—Não temos certeza se ela realmente disse isso, milorde. As crianças costumam entender errado. Escutam as coisas por partes e juntam de uma maneira que faz sentido para elas.

Não que Emma acreditasse que Cecília não tivesse dito exatamente aquilo que Isabelle contara. A mulher era muito vaidosa e egocêntrica. Completamente insensível.

— Seja lá o que for que Cecília tenha dito, o fato é que agora as meninas precisam de um pai e de uma mãe.

— Sim. — Emma hesitou. Com certeza Charles estava começando a enxergar a necessidade de permanecer em Knightsdale. — Quando o senhor se casar, milorde...

—Você quer dizer quando nos casarmos, Emma. As meninas gostam de você. Elas... — Ele franziu o cenho. —Onde arranjou esse chapéu horroroso?

Então, só agora havia notado como ela estava vestida?

— Não é horroroso. É um chapéu muito bom, especialmente para uma pescaria de manhã bem cedo.

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— Só se pretende guardar os peixes no chapéu. Você deveria se livrar dele. Na verdade, eu ficarei feliz em tirá-lo da sua cabeça. — Charles esticou o braço em direção à fita, mas Emma se afastou, protegendo-se com as duas mãos.

— Afaste suas mãos, lorde Knightsdale. — Um brilho surgiu nos olhos dele.

— É que eu gostei muito de não manter as mãos afastadas na noite passada.

— Comporte-se, senhor!

— Mas...

— Papai Charles, papai Charlai Eu peguei um... — O restante da frase se perdeu num splash.

— Tio Charles! — Isabelle gritou. — Claire caiu na água... e ela não sabe nadar!

Emma ficou em pé no mesmo instante, mas Charles foi mais rápido do que ela. Já havia pulado no lago e segurava Claire.

— Claire, querida — ele disse — São os peixes que saem da água, e não as meninas que pulam para apanhá-los.

A menina soluçou e tossiu.

— O peixe escapou... — choramingou ela.

— Pegaremos outro em outra oportunidade. E eu ensinarei você e Isabelle a nadar. Você gostaria?

— Sim!

Emma havia chegado à beira de, lago. Parou ao lado de Isabelle e olhou para os dois, que ainda se encontravam na água. Era para Claire estar muito assustada, mas ela sorria e abraçava Charles, que, ensopado, tinha a camisa e a calça grudadas no corpo.

Estava maravilhoso. O desejo da noite anterior retornou com força total, e Emma até pensou em pular na agua com eles, pois precisava esfriar a excitação. Charles carregou Claire sobre os ombros de volta para Knightsdale. Ela seguiu sentada sobre os ombros do tio, rindo e falando, enquanto Isabelle caminhava ao lado, participando, feliz.

De alguma maneira Emma precisava persuadir Charles a não ir embora de Knightsdale. As meninas precisavam do tio. Precisavam de um pai. Ele tinha de ficar, pois havia levado riso e alegria à vida das sobrinhas. Elas não sentiam sua falta antes porque não o conheciam. Mas, agora, se Charles resolvesse passar a maior parte do ano em Londres, iria deixar para trás corações partidos. O dela com certeza ficaria. Apesar de Emma se recusar a admitir isso até para si mesma. Assim que chegaram à soleira, da porta, Charles anunciou:

— Acho que Claire e eu precisamos de um bom banho.

A menina franziu a testa e fez biquinho. Charles riu.

— Nada de birra, Claire. Acompanhe a Srta. Emma, e ela e Nanny a deixarão limpinha.

— Você gostaria de usar um pouco da minha lavanda? — Emma perguntou.

Foi como se uma nuvem tivesse saído da frente do sol.

— Sim! Então ficarei com o seu cheiro, não é mesmo? — Emma riu.

— Sim, você ficará com o meu cheiro.

— O senhor não acha que mamãe Emma tem um cheiro gostoso, papai Charles?

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Os lábios de Charles se abriram num belo sorriso.

— Oh, sim. Ela tem um cheiro muito gostoso. — Emma podia jurar que estava corada dos pés à cabeça.

— Bem, então vamos, Claire. Venha, Prinny! — Ela se abaixou para colocar a coleira no cachorro. Era melhor não correr o risco com tantos hóspedes na casa.

Charles ainda estava sorrindo ao acompanhá-las escada acima.

— Emma, nos veremos mais tarde.

— E nós, papai Charles? Vamos nos encontrar mais tarde também?

Charles fez uma carícia nos cabelos de Claire.

— Passarei na sala de brinquedos logo mais. Tenho um encontro marcado com o Sr. Coles, o administrador, e depois terei de dar atenção aos hóspedes. Foi por isso que fomos pescar bem cedo, para que eu pudesse ficar com vocês antes dos deveres.

— Por favor! O senhor precisa ver se estou cheirando igual à mamãe Emma!

Charles sorriu.

— Não perderei isso por nada. Talvez antes do jantar. Agora vá tomar um banho.

Emma passou pelo seu quarto para pegar o frasco de lavanda. Em seguida, quando estavam chegando aos aposentos das crianças, duas jovens risonhas saíram de outro cômodo. Eram a Srta. Amanda Oldston e lady Caroline Dunlee, que soltou um grito ao deparar com elas.

— Não precisa ter medo — Claire tranqüilizou-a. — Prinny é mansinho.

Caroline enrijeceu, as bochechas redondas inflaram ainda mais, e o nariz de batata se torceu com desdém.

— Não estou com medo. Só não gosto de cachorros. Eles são sujos e nojentos.

Os lábios de Amanda se abriram como os de um cavalo, expondo os dentes enormes, e ela deixou escapar uma risada que mais parecia um relincho.

— Sorte que não é um gato, Caroline. Pois se fosse, você já estaria inchada e se coçando inteira.

Caroline dirigiu seu desdém contra Amanda:

— Você precisa se controlar, Amanda. Está parecendo um cavalo.

— Melhor do que parecer com uma porca. Se quiser conquistar Knightsdale, é melhor comer menos bolos e doces.

— Bem, ele certamente não vai escolher uma égua magrela como você.

— Papai Charles vai escolher mamãe Peterson!

O súbito silêncio que se seguiu às palavras ingênuas de Claire foi profundo o suficiente para sufocar qualquer um. Certamente sufocou Emma. Caroline engasgou; Amanda já estava com os olhos esbugalhados de sempre. Emma fechou os olhos por um segundo, desejando que um buraco se abrisse sob seus pés e a engolisse.

— Papai Charles? — Os olhinhos de lady Carolina examinavam Emma.

— Claire, tio Charles disse que você só poderia chamá-lo de papai em particular! — a irmã a admoestou.

A garotinha deu de ombros.

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— Eu precisava dizer a elas, Isabelle. — Claire olhou diretamente para Caroline e Amanda. — Minha mãe e meu pai morreram na Itú... — ela fez uma pausa, claramente para acertar a palavra — ...na Itália. Tio Charles é meu pai agora. E ele vai se casar com a Srta. Emma.

—É mesmo?—Caroline observou o vestido velho de Emma, a peliça descorada e o chapéu gasto. — Estranho, mas acho que perdi o anúncio. Você ouviu algo, Amanda?

—Lady Caroline, Srta. Amanda—Emma interveio —, Claire tem apenas quatro anos. É uma menina muito imaginativa.

— Mamãe Emma, eu não imaginei que papai Charles estava sentado com a senhora no cobertor.

— No cobertor? — estranhou Caroline.

—Nós fomos pescar hoje cedo—Emma esclareceu.—Lorde Knightsdale quer dar atenção às sobrinhas para se aproximar delas, pois agora é o tutor das duas. E eu estou substituindo a governanta, que precisou sair de licença. — Emma sabia que estava falando demais, pois não devia nenhuma satisfação a Caroline ou a quem quer que fosse, mas não suportaria ser o alvo de conversas e comentários.

—Quanta gentileza de lorde Knightsdale se interessar pelas sobrinhas órfãs! Você não acha, Amanda?

— Sim, Caroline, muita gentileza.

— Mas eu acho que isso irá mudar depois que ele se casar — Caroline declarou com um sorriso maldoso.

— Tenho certeza que não — rebateu Emma.

Como aquela moça mimada podia dizer tal coisa na frente de Isabelle e Claire? Ela desejava que Prinny fosse de fato um cão feroz. Adoraria vê-lo morder o traseiro gordo de Caroline.

— Oh, Srta. Peterson. — Caroline meneou a cabeça, gargalhando. — Se conhecesse a sociedade, saberia como as coisas funcionam.

— Posso não entender muito bem como funcionam as coisas na alta sociedade, mas conheço lorde Knightsdale desde que éramos crianças. Ele nunca abandonaria as sobrinhas.—Talvez as abandonasse fisicamente por Londres, mas jamais emocionalmente.

—Então, a senhorita... conhece... muito bem lorde Knightsdale?

— É claro que não, lady Caroline. Eu só quis dizer...

— Não importa o que quis dizer, Srta. Peterson. Parece que esqueceu algo crucial: lorde Knightsdale terá uma esposa. Duvido que qualquer dama da sociedade irá assumir as sobrinhas impertinentes.

— A senhora é muito malvada! — disse Claire.

Emma ouviu o tom choroso no fundo da voz. Isabelle estava pálida como um fantasma.

— E você é uma menina muito atrevida! — Caroline ralhou. — Convém melhorar seu comportamento se não quiser acabar num asilo de loucos.

Emma já tinha ouvido o suficiente. Soltou a coleira de Prinny. Livre, o cão correu para bater as patinhas enlameadas no vestido branco de Caroline.

Emma sorriu. Caroline só gritava.

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— Precisamos fazer alguma coisa, Claire.

Isabelle se sentou na cama da irmãzinha. Emma havia descido para se juntar aos hóspedes; Nanny estava tirando um cochilo.

— Não podemos deixar tio Charles se casar com uma das damas de Londres.

Claire se sentou, apertando a ponta macia do travesseiro.

— Papai Charles vai se casar com mamãe Emma.

— Espero que sim, mas não podemos ter certeza. Acho melhor fazermos algo a respeito.

Prinny pulou na cama de Claire.

— O que podemos fazer, Isabelle?

Essa era a pergunta à qual Isabelle vinha tentando responder desde que Emma levara as meninas para o quarto. Ela ainda estava tão aborrecida que mal havia trocado algumas palavras com as duas, durante o banho de Claire.

— Precisamos fazer que a Srta. Emma e tio Charles fiquem juntos a maior parte do tempo.

— Podemos ir pescar amanhã outra vez. Eu gostei muito.

— Não, acho que eles têm que ficar sozinhos. Só os dois.

— Por quê?

Isabelle encolheu os ombros.

— Não sei direito. A Sra. Lambert estava conversando com Nanny na semana passada sobre a Srta. Wendle, que mora na casa onde a irmã da Sra. Lambert trabalha. A Srta. Wendle ficou sozinha com lorde não-sei-o-quê, e eles tiveram de se casar longo em seguida. Acho que a Sra. Lambert ia contar mais alguma coisa para Nanny, mas então ela me viu e parou de falar.

Claire pôs o queixo sobre os joelhos.

— Mamãe Emma está dormindo no quarto que era da mamãe. Só tem uma porta entre ela e o quarto de papai Charles.

Isabelle assentiu.

— Se a gente colocar alguma coisa no quarto do tio Charles, que a Srta. Emma precise, como a escova de cabelos, ela terá de entrar para procurar.

— E vamos nos livrar do chapéu feio que ela usou hoje. — Isabelle suspirou.

— Sim. Eu gostaria de encontrar um jeito de comprar vestidos novos para a Srta. Emma. Mamãe sempre usava um vestido novo.

— Está bem. Mas podemos fazer isso assim que eu acordar do meu soninho? Nanny disse que os convidados vão sair para um passeio em volta do lago, então mamãe e papai não estarão nos seus quartos.

Isabelle concordou, mas ainda via alguns problemas. Gostaria que as roupas de Emma fossem mais bonitas, mas não havia nada que ela e Claire pudessem fazer a respeito. Talvez algo que deixasse as moças de Londres menos atraentes.

— Vamos fazer que aquelas horrorosas fiquem ainda mais feias, principalmente lady Caroline.

— Mas como, se ela já parece uma porca? — Claire perguntou.

— Sim, mas uma porca bem-arrumada.

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— Não tão bem-arrumada depois que Prinny bateu as patas no vestido dela.—Claire acariciou o cãozinho. — Bom menino.

Prinny lambeu a mãozinha fofa.

— Sim, mas lembra quando a lady cara-de-cavalo disse para lady Caroline que era uma sorte que Prinny não era um gato?

— Ela falou que a lady porquinha poderia ficar vermelha e se coçando toda.

— E inchada, apesar de eu não conseguir imaginar como ela pode ficar ainda mais inchada do que já é.

Claire riu.

— Bess é uma gata.

—É mesmo!—Isabelle deu um sorriso malicioso. — E aposto que ela adoraria dar uma voltinha no quarto de lady Caroline.

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Emma ainda estava furiosa quando se juntou aos outros para o passeio ao redor do lago. E procurou ficar o mais distante possível de Caroline e de Amanda, o que significava afastar-se de Charles, pois as jovens o cercavam como abelhas em torno de um doce.

Ele, por sua vez, não sentia nenhuma vontade de participar do tal passeio. Queria mesmo era poder passar um pouco mais de tempo com Emma. A sós. Para convencê-la a aceitar seu pedido de casamento.

Na primeira oportunidade que teve, Charles pousou a mão de Emma sobre o próprio braço. Ele a queria junto de si, e não de braço dado com o tal Stockley, que não tinha desgrudado um só segundo, fazendo perguntas a ela sobre detalhes da casa, da decoração e coisas do tipo.

Alvord e Westbrooke arranjaram uma desculpa para escapar do passeio. Charles teria uma conversinha com os dois assim que chegasse em casa. Além de Stockley, os únicos homens que o estavam ajudando a acompanhar as moças eram três patetas bem vestidos: o Sr. William Dunlee, um jovem conhecido como Carpa, que era o segundo filho do conde de Dunlee; o espinhento Sr. Frampton, apelidado de Bolha, filho mais velho de um barão; e o ilustre Sr. Oldston, cujo apelido era Sapo em honra à semelhança que toda a família tinha com o anfíbio. Todos estudavam na mesma universidade e haviam conseguido escapar ilesos ao aprendizado, até onde se podia perceber.

— Vamos caminhar mais à frente, Emma? — pediu Charles.

— Seria ótimo.

— Você precisa me salvar daquele bando de idiotas — ele disse, assim que se encontravam a uma certa distância.

— Eles são apenas um pouco infantis.

— Um pouco? Eu tinha sob o meu comando, na Espanha, jovens muito mais novos que eles. Alguns estavam em fase de crescimento ainda, e mesmo assim eram bravos soldados.

— Posso imaginar como uma guerra pode amadurecer uma pessoa — declarou Emma.

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— Sim, você tem razão quanto a isso. — Charles lembrou-se da última vez que percorrera aquele mesmo caminho. Devia ser um pouco mais jovem do que os três bufões. Será que não era tão fútil quanto eles?

Fechou os olhos por um momento, puxando pela memória. Talvez fosse. Na época da universidade, ele também vagara sem rumo e com raiva da vida. Precisava fazer algo, e esse algo era sempre beber, jogar e farrear.

Quando a esposa de James, Sarah, uma americana e republicana convicta, havia questionado o sistema inglês de primogenitura, Charles argumentara, alegando que nem todos os herdeiros eram tão maus quanto Richard, o primo de James, sempre pronto para matar em nome da herança. E afirmara que não invejava o irmão.

E tinha falado com toda a sinceridade.

Mas no fundo sabia que mentira.

Charles ajudou Emma a pular sobre um tronco caído.

Ele jamais tinha ambicionado o título, porém invejara Paul. O irmão nunca vagara sem rumo e sem direção pela vida. Sempre tivera um propósito. Sempre soube que seria um marquês. Enquanto Charles só foi descobrir seu rumo aos vinte anos, quando resolveu seguir James no exército.

— Se eu não tivesse seguido James no exército, não sei o que teria sido da minha vida. Provavelmente teria virado um malandro farrista.

— Bobagem. Tenho certeza de que o senhor teria se saído muito bem em qualquer carreira que tivesse escolhido.

Charles fitou Emma. Ela falara com tanta convicção, como se não tivesse dúvida de que ele poderia de fato se sair bem em tudo que tentasse.

— Você realmente acredita nisso, não é?

— É claro.

Seus olhos sinceros e brilhantes o fitavam por trás dos óculos. Charles se lembrou de que Emma o olhava daquela mesma maneira quando eram crianças. Naquela época, tudo não passava de idealização infantil, mas agora era o olhar de uma mulher adulta que acreditava nele.

— Case-se comigo, Emma. Por favor. O nosso casamento resolveria tantos problemas... Poderíamos nos livrar desses idiotas de Londres. Minhas sobrinhas ganhariam um pai e uma mãe, e você teria sua própria casa. — Ele sorriu, aproximando-se. — E eu teria uma oportunidade das mais adoráveis de produzir um herdeiro. O que me diz?

A bofetada de Emma foi eloqüente o bastante.

— Coloque o peixe no travesseiro, Claire. Acho que assim vai funcionar melhor.

Isabelle estava no quarto de Caroline com Bess nos braços. A gata acompanhara a dupla de bom grado ao ver a truta na mão de Claire.

— Esfregue bem no travesseiro, Claire. Mas não muito, para não ficar com cheiro forte de peixe. Isso, bem aí onde ela vai pôr a cabeça.

Isabelle colocou Bess sobre a cama. A gata cheirava o travesseiro como uma maluca, esfregando em busca do peixe. Ela cheirou aqui e ali e, como não encontrou nada, lambeu as patinhas, bocejou, pulou da cama e deixou o quarto.

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Emma estava tão brava que seguiu cegamente pelo caminho. Ouviu Charles chamando-a, mas o ignorou. Tudo o que queria era ter outro cachorrinho de porcelana para atirar nele, ali mesmo. Casar-se apenas para resolver os problemas do marquês? Para que ele pudesse arranjar um herdeiro e depois voltar para a vida de aventuras em Londres?

Deveria era ir para casa. Mas Isabelle e Claire precisavam dela. Emma não poderia abandoná-las nas mãos das moças maldosas de Londres. E se Charles se casasse com uma delas? O que aconteceria a Isabelle e Claire? Mas ela não podia se casar com Charles apenas para proteger as meninas, podia?

— Encontrei o chapéu, Isabelle.

— Ótimo. Você viu a escova de cabelos da Srta. Emma? — Claire deu uma olhada na penteadeira de Emma.

— Achei.

— Ela vai precisar da escova hoje à noite. Vamos colocá-la no quarto do tio Charles.

Isabelle abriu a porta que ligava os dois aposentos e viu Henderson, o pajem de Charles, dobrando algumas gravatas. Recuou rapidamente, pisando no pé de Claire.

— Ai!

Henderson olhou para a porta.

— Em que posso ajudá-la, lady Isabelle?

— Estamos procurando tio Charles.

— É mesmo? E o que lady Claire está fazendo com o chapéu da Srta. Peterson na mão?

— Ele não é muito bonito — Claire disse, e o colocou na cabeça. — O senhor não acha que se parece com um balde?

O rosto de Henderson se contorceu com se estivesse sentindo cheiro de coisa ruim.

— Não cabe a mim comentar a respeito das roupas da Srta. Peterson.

— Mas o senhor acha que este chapéu está na moda? — Isabelle insistiu.

O pobre Henderson parecia lutar contra si mesmo. Ele suspirou, vencido.

— Não, não posso dizer que esteja na moda.

— Eu acho que a Srta. Emma ficaria mais bonita sem ele, o senhor não acha?

— Lady Isabelle...

— Nós só não queremos que ela faça feio perto daquelas moças de Londres, Sr. Henderson — Claire explicou.

— Eu entendo...

— Àquelas moças são malvadas.

Isabelle puxou Claire de volta para o quarto de Emma. —Bem, uma vez que tio Charles não está aqui, nós já vamos. Adeus, Sr. Henderson.

Ela fechou a porta e suspirou.

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—Que pena que o Sr. Henderson esteja no quarto do tio Charles. — Claire encolheu os ombros.

— Escondi a escova de cabelos de mamãe Emma embaixo dos papéis do papai Charles enquanto você conversava.

Isabelle sorriu.

— Bom trabalho, Claire.

Claire saiu pela porta que dava para o corredor, balançando o chapéu pelas fitas.

— Aposto que a Srta. Russell adoraria isto para colocar no espantalho do jardim.

Emma viu a Sra. Graham assim que retornou do lago. A mulher estava parada no vestíbulo da entrada de Knightsdale, rindo ao lado do reverendo. Um nó se formou em seu estômago. Então lady Caroline não era a única megera transitando na propriedade.

— Obrigada pelo passeio, milorde — Caroline disse logo atrás.

Emma se virou para ver a moça olhando encantada para Charles. A ousada estava com uma mão sobre os seios fartos e com a outra no braço de Charles.

— Estou cansada da longa caminhada. Acho que vou descansar um pouco antes do jantar.

Será que ela esperava que Charles lhe fizesse companhia?

— Vamos, Caroline — Amanda chamou com impaciência.

— Nós nos veremos mais tarde, milorde. — Caroline esbarrou em Emma ao passar, e seguiu a amiga.

Emma cerrou os punhos e respirou fundo. Estava sendo infantil. Não era de seu feitio se sentir assim. Olhou para a Sra. Graham e seu mau humor voltou. A mulher tivera a audácia de sorrir para ela, como se tivesse tomado suas dores com a atitude de Caroline. Mas Emma não compartilhava nada com a Sra. Harriet Graham. Nada. Exceto o pai. Ele sorriu para a Sra. Graham, e o estômago de Emma se contorceu. Não. Ele estava apenas sendo educado. Não iria trazer aquela mulherzinha para o seio de sua família. Não podia.

— Sra. Graham... Reverendo Peterson... Sejam bem-vindos a Knightsdale — Charles os saudou. — Espero que a senhora não se importe que eu roube o seu acompanhante por um momento. Tenho um assunto para discutir com o reverendo.

— É claro que não, milorde. — A Sra. Graham sorriu.

— Esplêndido. Lambert — Charles chamou o mordomo —, poderia encaminhar a Sra. Graham à sala azul? — Ele sorriu de volta para a mulher. — Prometo não demorar, senhora.

— Por favor, não se incomode com isso, milorde. Não estou com pressa. — A Sra. Graham olhou para Emma, que rangeu os dentes. — Você me acompanharia, Emma?

— Não.

Emma viu Charles enrijecer. Seu pai franziu o cenho. Talvez ela tivesse sido um pouco ríspida.

— Não, obrigada. Estou cansada. — Decidiu usar a mesma desculpa de Caroline? Céus, ela não podia ter descido tanto. — Quero dizer...

—Tudo bem, querida—a Sra. Graham respondeu.—Ficarei bem.

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— Lady Beatrice se encontra na sala azul em companhia de outras damas, senhora — Lambert informou.

Charles ergueu as sobrancelhas.

—Outras damas, Lambert? Espero que você tenha escondido o conhaque.

Emma fitou o pai, que lhe dirigiu um olhar de reprovação. Ela lutou contra a própria consciência.

— Acho que poderei fazer companhia à Sra. Graham. Se o senhor me der licença, papai.

Emma recebeu um sorriso agradecido do pai quando seguiu a Sra. Graham até a sala azul.

— Posso lhe oferecer um cálice de conhaque, reverendo? — Charles indicou o caminho da biblioteca ao pai de Emma.

— Aceito, obrigado.

Charles estendeu um cálice ao reverendo Peterson e apontou uma poltrona. Ele preferiu permanecer em pé ao lado da lareira.

— Senhor, a razão pela qual o chamei... Bem, eu gostaria de... — Charles deu uma tossidela e recomeçou: — Eu gostaria de ter a sua permissão para...

— Sim? Apenas diga. Não pode ser tão ruim assim.

— Eu gostaria de me casar com sua filha, senhor.

O reverendo Peterson se endireitou no assento, havia uma expressão de espanto em seu rosto.

— Com Emma?

— É claro, com Emma. Meg é muito jovem.

— Bem, nem tanto, mas eu concordo, Emma é uma escolha melhor para o senhor. Meg não se interessou por nenhum homem até onde sei. Emma, sim, se ela for capaz de admitir para si mesma.

— Então, tenho permissão para lhe fazer a corte?

— Sim. Apesar de a palavra final ser de minha filha, é claro.

— É claro. Isso é o que mais me assusta.

— Está com medo de que Emma recuse o seu pedido? — Charles riu.

— Bem, para dizer a verdade, ela já recusou, mas, com o tempo, acho que conseguirei convencê-la.

O reverendo assentiu.

— Minha filha o idolatrou durante anos.

—Sim, eu sabia. No momento, porém, não está agindo dessa forma.

O reverendo suspirou.

— Emma não tem andado muito feliz, lorde Knightsdale, e acho que é por minha culpa.

— O que o senhor quer dizer?

Dessa vez foi o vigário que ficou desconfortável. Tomou um bom gole de conhaque.

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— O senhor sabe que minha esposa morreu quando Meg tinha um ano. Foi um parto difícil, e Catherine nunca se recuperou por completo. Fiquei arrasado, assim como Emma, é claro. Ela estava com apenas nove anos, mas assumiu tudo como se fosse mais velha. Tomou conta de Meg e da casa. Eu não deveria ter permitido, porém na época me pareceu bom. Aquilo deu um propósito para Emma. E eu...

O reverendo fechou os olhos, os lábios comprimidos como se ele tivesse sido tomado por um espasmo de dor.

— O senhor não precisa...

—Não, milorde, eu preciso.—Ele suspirou e pousou o cálice na mesa. — Nunca quis me casar novamente. Emma cuidava de tudo enquanto eu me dedicava à igreja e aos meus alunos. Eu estava feliz, pensei. E achei que Emma e Meg também estivessem.

— Tenho certeza que sim.

— Talvez. Mas a vida continua. As coisas mudam. Harriet se mudou para a vila depois que o marido faleceu. Ela herdou uma casinha aqui, e, quando a vi depois do culto pela primeira vez... Bem, sentimentos que eu imaginei estarem mortos ressurgiram. Harriet se ofereceu para ajudar na igreja; não para se insinuar ou algo assim, o senhor entende, mas porque ela realmente gosta de cuidar das flores e de arrumar o altar. Era ativa na antiga igreja que freqüentava e encontrou consolo na nova atividade. Nós nos tornamos amigos, e então nossa amizade se aprofundou.

— Eu compreendo. O senhor não precisa entrar em detalhes. — O vigário riu, corando.

—Oh, não tema, eu não entrarei em detalhes. — Ele meneou a cabeça. — O fato é que, com o passar do tempo, as coisas têm se tornado mais difíceis.

Charles sorriu.

— Eu imagino.

— Então o senhor não acha que estou muito velho para... Não, deixe para lá. O ponto é que eu quero me casar com Harriet, e ela quer se casar comigo. Mas sei que Emma não gosta da idéia.

— Bem, eu não diria que ela adora a Sra. Graham.

— Harriet e eu já discutimos isso, e realmente entendemos a reação de Emma. Harriet tem certeza de que nunca fez nada que pudesse ofendê-la. Na verdade, elas eram amigas... até meu interesse se tornar aparente.

— E o que Meg acha? Ela sabe que o senhor quer se casar?

— Oh, sim. Ela é muito diferente de Emma. Bem, não teve de assumir todas as responsabilidades que Emma teve. Acho que Meg não se importa, contanto que o nosso casamento não afete a sua vida. Ela é apaixonada por plantas.

O reverendo Peterson enrijeceu no assento.

— Sempre pensei... Quero dizer, acho... Bem... — Olhou direta mente para Charles. — Agora, não me entenda mal, meu Jovem. Não estou dando permissão para que tome qualquer tipo de liberdade com minha filha. Mas acho que se Emma descobrir como é o amor entre um homem e uma mulher, compreenderá melhor meus sentimentos. Se ela soubesse como é sentir uma... atração... por um homem, talvez entenderia que um casamento é mais do que... Bem, talvez entenderia algo sobre casamento e amor. Que o amor que Harriet e eu temos um pelo outro não ameaça aquele que sinto pelas minhas filhas. E também que não estou traindo minha falecida esposa, que sempre terá um lugar no meu coração.

Charles se sentou de frente para o vigário.

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— Emma nunca teve um pretendente, então?

—Não menti quando disse que ela o idolatrou. Olhando para o passado, eu deveria ter insistido que Emma fosse para Londres. Tenho certeza de que minhas irmãs a acompanhariam com todo o prazer. Mas ela não quis deixar Meg, e eu não quis mudar minha rotina. — Um amargor tomou conta da voz do pároco. — Agora, estou pagando um preço pelo meu egoísmo.

—- Basta desculpas, por favor. Creio que Emma e eu formamos um bom par.—Charles sorriu. — Só preciso convencê-la disso.

Estranho! Emma ergueu a cabeça do travesseiro para ouvir melhor. Que barulho era aquele?

— Aiiiiiil Mamãe! Aiiiiii!

Caroline saiu correndo do quarto gritando e chorando. Mais pessoas foram abrindo as portas dos cômodos para ver o que estava acontecendo. Emma viu Meg e caminhou até o aposento da irmã.

— O que está acontecendo, Emma?

Nesse momento, elas viram Caroline batendo na porta do quarto da mãe.

— Não faço idéia.

A criada de lady Dunlee finalmente atendeu às batidas. —Pois não, milady? Oh! Oh, minha nossa!—A criada levou o avental ao rosto e começou a se lamentar.

— Oh, pelo amor de Deus, Mary! — a voz aguda de lady Dunlee ecoou. — O que é toda essa comoção? Será que não se pode descansar sossegada... — Lady Dunlee apareceu à porta e ficou boquiaberta, arregalou os olhos e então começou a se coçar.

Beatrice passou por Emma, Bess seguindo-a pomposa.

—Lady Dunlee, por favor, acalme-se. O que está acontecendo?

Emma e os outros convidados observavam atentos. Os olhos de Caroline estavam inchados e ainda menores; o rosto todo coberto por bolinhas vermelhas; e seu nariz escorria. Ela fungava, espirrava e se coçava.

—Acho que já entendi—disse Beatrice ao olhar para o estado deplorável de Caroline. — Sinto muito pela sua indisposição, lady Caroline.

— Indisposição? Eu chamo isso que aconteceu à minha filha de desastre!

—Bem, certamente é uma complicação. Ela se sentirá melhor se descansar um pouco.

Lady Caroline gritou e escondeu o rosto no ombro da mãe.

—Qual é o problema precisamente, lady Dunlee?—indagou lady Beatrice.

— Aquilo! — Lady Dunlee apontou para Bess, que decidira se sentar ao lado de Beatrice e estava lambendo as patinhas. — Aquela criatura felina é o problema!

-— Lady Dunlee, não fale assim da minha gata.—Lady Beatrice se moveu para proteger Bess.—Ela não pretendia incomodar sua filha.

— Ah! Pois eu gostaria de informar que a minha Caroline tem alergia a gatos.

—Aquilo passou no meu travesseiro, mamãe. Tenho certeza. Eu estava bem quando me deitei para descansar. — Lady Dunlee endireitou os ombros com altivez.

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— O que sua gata estava fazendo no quarto de minha filha?

— Não faço a menor idéia. Bess não gosta de porcos. — Lady Dunlee bufou.

— Lady Beatrice, a senhora está comparando minha filha a uma... porca?

— Creio que ela lembra bastante uma.

Caroline soluçou alto quando os espectadores caíram na risada.

— Por favor, diga para meu marido e meu filho se aprontarem, e mande preparar a nossa carruagem — lady Dunlee ordenou à criada. — Estamos de partida.

Beatrice sorriu.

— Façam uma ótima viagem.

Charles olhava para a pilha de papéis sobre a escrivaninha. Ele precisava de uma secretária. Não, precisava de uma esposa. De Emma. Alguém bateu à porta.

— Pode entrar.

Lambert surgiu, segurando um grande número de cartas.

— A correspondência, milorde.

— Pode colocar na mesa, Lambert.

—Milorde, acredito que já saiba que lorde Dunlee e a família partiram.

— É mesmo? Mas assim, tão de repente? Ele disse por quê?

— Creio que tenha sido por insistência de lady Dunlee, milorde.

—Da lady Dunlee? Mas por que ela iria querer partir? Parecia muito interessada nas festividades. — Lambert deu uma tossidela.

— Parece que lady Beatice ofendeu lady Caroline. Charles estranhou o fato.

— Mas tia Bea não costuma fazer isso com as pessoas.

— Creio que lady Caroline havia insultado Bess. Acontece que lady Caroline tem alergia a gatos. Bess entrou no quarto dela, e ela ficou toda cheia de bolhas e com o rosto inchado.

— Entendi. Obrigado por me informar, Lambert.

Ótimo, uma moça a menos para evitar, pensou Charles assim que Lambert saiu. Pena que tia Beatrice não tivesse ofendido lady Caroline antes. O que ele precisava agora era se concentrar em um plano para a sua campanha. Emma tinha lhe dado um tapa sem nenhuma explicação. Ele nem a beijara, só a pedira em casamento. Charles afundou na cadeira, lembrando-se do calor do corpo de Emma, de como ela havia se entregado em seus braços, naquela noite no jardim-de-inverno. Como tinha sido bom beijá-la!

Ele adoraria fazer muito mais do que beijá-la. Adoraria provar muito mais do corpo de Emma, cada centímetro, cada curva, cada ponto secreto...

— Ocupado, Charles?

Ele se livrou do inusitado desejo que se apoderara de sua mente.

— Nem tanto. Entre, Robbie.

Robbie deu uma olhada na mesa ao se aproximar.

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— Parece que deveria estar ocupado.

— Eu sei. Tenho mil coisas para fazer, mas não sei por onde começar. — Charles olhou para as pilhas de papéis.

— Você precisa de uma secretária.

— Preciso de um monte de coisas desde que meu irmão morreu e eu herdei este maldito título. Não estou conseguindo dar conta de tudo.

— Parece que você esta precisando beber algo, também. — Robbie serviu uma dose de conhaque.

— Obrigado. — Charles aceitou o cálice. — Você fez falta no passeio de hoje à tarde. Fiquei de babá de um bando de mocinhas e rapazotes desmiolados e donzelas casadoiras.

Robbie riu, jogando-se sobre a cadeira que ficava de frente para a escrivaninha.

— Por que você acha que me ofereci tão rapidamente para fazer companhia à irmã de Alvord?

— Pensei que quisesse passar um tempo ao lado da resplandecente Lizzie.

—Lizzie? Resplandecente? — Robbie riu.—A pequena Lizzie é como uma irmã para mim, Charles. Você sabe disso. Adorável, encantadora, mas... resplandecente? Ela mal acabou de sair das fraldas.

— Não exatamente, Robbie. Lizzie tem dezessete anos e já se apresentou oficialmente à sociedade. Alvord deve ter recebido muitos pedidos à mão da irmã.

Robbie franziu o cenho.

— Não. Lizzie não está pronta para se casar. Tenho certeza disso. James não a forçaria. O que foi isso?

Charles também ouvira um baque surdo.

— Não sei.

Robbie se levantou e espiou para o corredor.

— Não tem ninguém. Será que foi lá fora?

— Não creio. — Mesmo assim Charles olhou pela janela. Nada. — Parece que alguma coisa pesada caiu.

— Talvez você tenha ratos bem gordos correndo pela casa. — Charles olhou desconfiado para a antiga estante de livros.

— Espero que não.

Após o jantar, Emma estava sentada ao lado de Sarah, a duquesa de Alvord, na sala de estar. Ela simpatizara à primeira vista com a americana ruiva. Calculou que as duas deviam ter mais ou menos a mesma idade.

— Meu marido disse que vocês eram amigos de infância, Srta. Peterson.

— Sim, Vossa Graça. Na verdade, mais que uma amiga, eu era um empecilho no meio dos meninos. Lorde Knightsdale contou que o duque e lorde Westbrooke me chamavam de Sombra?

A duquesa riu.

— Sua irmã e Lizzie têm a mesma idade, não é? E são muito amigas.

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— Sim. — Emma olhou ao redor à procura de Meg, que pela primeira vez não tinha se recolhido mais cedo. Ela estava sentada com Lizzie, e as duas riam de alguma coisa. — Lizzie convidou Meg para ir a Londres na próxima temporada, mas minha irmã não se interessa muito por bailes e festas.

— Não?

— Meg prefere caminhar no campo em busca de novos espécimes de plantas.

— Fico feliz que ela tenha uma paixão. No entanto, mais cedo ou mais tarde irá se interessar pelos rapazes. É natural. — A duquesa riu. — Eu dava aulas em uma escola para moças, na Filadélfia, por isso passei um bom tempo observando as jovens.

Emma assentiu. Meg tinha dito naquela tarde que pretendia se casar um dia, o que já era um começo. Mas o fato era que não havia muitos candidatos decentes à disposição no momento. O Carpa, não que fosse um grande partido, fora embora com a família; o Bolha e o Sapo ainda tinham muito tempo pela frente antes de estarem prontos para o casamento; lorde Westbrooke era um bom partido, mas Lizzie sempre o amara, embora o conde não demonstrasse nenhum sinal de reciprocidade.

Meg precisava ir para Londres, isso sim. Bem, se ela, Emma se casasse com Charles... Não, pensando melhor, essa não era uma boa hipótese.

— E como lorde Knightsdale está se saindo, Srta. Peterson?

— O quê? — Emma olhou para a duquesa. — Como assim?

— A senhorita sabe como Charles está se saindo? Da última vez que conversamos em Londres, tive a impressão de que ele não tinha nenhuma vontade de herdar o título. É claro que naquela época não havia motivos para suspeitar que isso pudesse acontecer. Charles está se adaptando à vida de marquês?

— Vossa Graça... — Charles não queria ser o marquês? Ele nunca comentara a esse respeito com ela. Devia ser por isso que estava tão ansioso para se casar, para cumprir com seu dever e então seguir em frente com sua vida. — Realmente não sei. Lorde Knightsdale não me faz confidências.

— Não? Estou certa de que James me disse... — A duquesa franziu a testa, então meneou a cabeça. — Acho que me confundi. Peço desculpas. — Em seguida, corou. — Tenho andado estranha ultimamente.

Emma sorriu.

— Vossa Graça não precisa se desculpar. Como está se sentindo?

— Bem. Só um pouco cansada, mas me disseram que passa logo.—A duquesa sorriu.—A senhorita já deve estar sabendo da novidade.

— Sim. Acho que já não é mais segredo.

— Nada é segredo na sociedade, não é mesmo?—A duquesa riu. — Não que eu quisesse esconder sobre o meu estado. Só estou habituada com uma vida mais privativa. Casar com um duque britânico é algo que leva tempo para a gente se acostumar.

— Sim, a vida aqui deve ser muito diferente.—Emma tentou se imaginar deixando sua família para cruzar o Atlântico. — A senhora sente muita saudade do seu país?

— Não. — A duquesa ajeitou a saia. — Às vezes, mas não tenho mais um lar nos Estados Unidos. Minha mãe morreu quando eu era criança. Meu pai morreu no ano passado, e foi por isso que vim para a Inglaterra.

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Ela olhou para cima e sorriu para alguém que estava atrás de Emma. Esta se virou e viu o duque de Alvord conduzindo os homens que haviam acabado de tomar o vinho do Porto após o jantar.

— Meu lar agora é na Inglaterra — concluiu a duquesa.

Os olhos do duque se encontraram com os da esposa, e um sorriso largo surgiu em seu rosto. Era evidente que era muito apaixonado por ela, Emma concluiu ao cumprimentá-lo. E cedeu o lugar para que ele pudesse se sentar ao lado da esposa. Durante o jantar, ela observara o casal. A expressão do duque era sempre agradável, porém reservada quando conversava com todos; mas quando ele olhava para a esposa, sua fisionomia se transformava e os olhos se iluminavam com um brilho especial.

Emma adoraria ter um homem olhando para ela daquela maneira. Charles o faria? A Srta. Russell interrompeu seus pensamentos para comentar sobre as aventuras daquela tarde. Ela sorriu e fingiu prestar atenção. Charles só queria alguém para dar à luz seu herdeiro e para cuidar das sobrinhas. Emma olhou para ele, que estava conversando com sir Thomas e com lorde Haverford. Charles percebeu o olhar e sorriu.

Emma olhou para as próprias mãos, esperando que seu coração não estivesse tão disparado a ponto de alguém notar. Ela adoraria ter um filho. Adoraria ter um bebê... com os mesmos olhos azuis de Charles.

Em seguida, Emma percebeu o Sr. Stockley olhando ao redor da sala. Talvez, se arranjasse uma cadeira em um cantinho distante, conseguisse evitar o inconveniente. Ficou imaginando se Charles ficaria tão feliz e protetor se ela estivesse grávida, assim como o duque estava para com a duquesa? Não. Ele iria para Londres, depois que tivesse certeza de que sua semente estava plantada. Talvez nem estivesse presente no dia do nascimento. Por que viria? Melhor ficar em Londres, bebendo e se divertindo.

Emma alisou a saia. Ela provavelmente não o veria de novo até que chegasse o momento de "providenciar" o próximo Draysmith.

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Charles já tinha acabado de se vestir para dormir quando ouviu uma batidinha na porta que separava seu quarto do da marquesa. Ele caminhou até a porta, fazendo sinal para seu criado pessoal, Henderson, se retirar.

— Boa noite, Henderson — ele murmurou. O valete se inclinou e foi embora.

— Emma! — Charles exclamou ao abrir a porta.

Queria ter dito mais, mas aquela visão de camisola, com os cabelos cacheados descendo sobre os ombros, o deixou sem fôlego e sem reação.

Emma ergueu os braços e afastou os cabelos para trás, fazendo que a camisola realçasse os seios. Charles fechou os olhos e rezou para se controlar.

— Meu chapéu sumiu, milorde, e a escova de cabelos também. Já procurei por toda parte e não consigo encontrar.

A voz dela soou distante. Ele abriu os olhos e viu que Emma caminhava em direção à lareira. Que Deus lhe desse forças. O tecido fino da camisola mostrava as formas perfeitas e

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arredondadas. O fogo da lareira refletiu sobre os seios maravilhosos, revelando a sombra dos mamilos escuros. A cintura fina, os quadris, as coxas, uma sombra escura cobrindo...

Um cavalheiro teria estendido um xale à dama.

— Qual é o problema com o senhor? — Emma sussurrou com aspereza, as mãos sobre os quadris, esticando o tecido da camisola, oferecendo uma visão ainda melhor do belo corpo. — Está aí parado sem dizer nada.

— Desculpe-me. — Charles desviou o olhar das lindas formas. — O que aconteceu mesmo?

— Alguém roubou meu chapéu. — Emma parou diante do guarda-roupa aberto e apontou.

— Tem certeza? — Feliz por ter algo mais em que pensar além da atração que estava sentindo, Charles se moveu para examinar o guarda-roupa. — Aqui está — ele disse, segurando o chapéu que ela usara no passeio naquela tarde.

— Não é esse. Estou falando do outro.

— Que outro?

— O que usei na pescaria. — Charles se espantou.

— Emma, nenhum ladrão de respeito iria querer roubar aquele chapéu.

— Bem, mas ele não está aqui.

—Talvez alguma criada tenha pensado por engano que você não o quisesse mais.

— Por que alguém iria imaginar isso?

— Porque você já deveria ter jogado fora aquele chapéu há muito tempo. Acho que nem a mendiga mais pobre de Londres gostaria de usar aquilo.

— Bem, se é tudo que...

— Emma, você gostava mesmo daquele chapéu?

Ela corou. Charles percebeu a luta de Emma entre o desejo de dizer a verdade e de dar uma resposta à altura.

— Não — ela disse finalmente —, mas isso não significa que eu goste de saber que alguém mexeu nas minhas coisas.

— Tem razão. — Charles tentou pensar, mas estava inebriado pelo perfume de Emma. — Você disse que algo mais tinha sumido?

— Minha escova de cabelos.

— Era de valor?

— Não.

— Será que não a guardou em outro lugar?

— Onde? — Emma apontou para a penteadeira, que estava completamente vazia.

— Será que não caiu no chão?

Charles se ajoelhou para olhar embaixo do móvel. Emma se aproximou para espiar, e ele sentiu a camisola roçar seu braço. E se virou.

Oh... Deus! Charles estava olhando diretamente para o belo, adorável, inacreditável ponto entre as pernas arredondadas. Havia apenas um tecido fino entre ele e os pêlos sedosos os quais ansiava tanto por tocar e...

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Charles engoliu em seco. Tentou se lembrar de que precisava respirar.

— O que o senhor está vendo?

— O que... — Ele se esticou e acabou batendo a cabeça no móvel. Então Emma se abaixou, e Charles deparou com o belo par de seios bem diante de seus olhos.

— Onde o senhor bateu a cabeça? Deixe-me dar uma olhada.

Emma o puxou para mais perto. Se ele fingisse perder o equilíbrio agora, poderia cair de boca entre as duas elevações tentadoras.

— Estou bem — Charles murmurou, esquivando-se. E se certificou de que seu camisolão estava bem fechado antes de se levantar.

— O senhor tem certeza de que está bem? Parece um pouco... estranho.

— Não, não. — Ele tossiu baixinho. — Estou bem. Realmente. Só bati a cabeça.

— Parece que está doendo. — Emma se esticou para tocá-lo de novo. Charles recuou os quadris para não cutucá-la com algo que estava muito enrijecido.

— Viu, o senhor está sentindo tanta dor que está até transpirando.

Ele a segurou pelos ombros e virou-a a fim de levá-la para o quarto. Era preciso se afastar da cama antes que a atacasse como um animal no cio.

— Estou bem, Emma. Não poderia me sentir melhor.

— O que o senhor está fazendo?

— Você precisa de uma escova de cabelos. Eu posso lhe emprestar uma. Na verdade, vou pentear os seus cabelos.

Charles se comportava de um modo muito estranho. Por que levá-la para o quarto dele? Será que estava com más intenções? Ela deveria sair correndo, isso sim. Mas não conseguia. Não estava com medo de Charles, e sim curiosa. Queria ver como era o quarto dele, sua privacidade.

Emma parou na soleira da porta. Os móveis escuros e pesados e as cortinas azuis e douradas deviam ter sido escolhidas pelo pai e pelo irmão. Mesmo assim, havia outros detalhes que só podiam ser de Charles, como os alfinetes de gravata cuidadosamente arrumados sobre a cômoda, a desordem de papéis na escrivaninha, a...

—Olhe!—Emma se aproximou dos papéis e puxou a escova. — Como ela veio parar aqui?

— Não sei. — Charles pegou a escova e a examinou. — Perdoe-me por dizer, mas isto não parece algo que pudesse despertar a cobiça de um ladrão.

—Não, mas como veio parar no seu quarto? Será que alguém estava mexendo nos seus papéis?

— E escovando os cabelos ao mesmo tempo? Duvido. — Charles mexeu nos objetos sobre a escrivaninha. — Está tudo em ordem.

— Em ordem? — Ele riu.

— Quero dizer, está tudo aqui.

— Ótimo. Então vou pegar a minha escova e voltar para o quarto.

Charles ergueu a escova para o alto.

— Acho que não. Eu me ofereci para brincar de criada, e estou determinado a levar isso adiante.

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O coração de Emma disparou.

— Isso é ridículo. Posso escovar meus cabelos sozinha.

— Tenho certeza que sim. — Ele a colocou sentada na banqueta de frente para seu espelho e deslizou as mãos nos cabelos sedosos. — Mas esta noite eu vou escovar os seus cabelos. É o preço que terá de pagar por ter perturbado meu descanso.

— Não foi minha intenção...

Charles começou a escovar-lhe os cabelos. Emma fechou os olhos para apreciar melhor a sensação. Enquanto, segurando a escova com uma mão, ele massageava o couro cabeludo e descia pelos cabelos, com a outra mão acariciava-lhe a testa, a face, o pescoço. Ela sentiu então os lábios tocando-a, e abriu os olhos.

— Confie em mim — ele murmurou.

Os lábios desceram da testa para as têmporas e passearam pela face. Emma soltou um leve gemido e, por instinto, inclinou a cabeça para trás. Charles sorriu e tocou no ponto sensível entre a orelha e o pescoço. Ela respirou fundo, com uma sensação estranha nos seios. Parecia que os mamilos iam saltar...

— Milorde...

— Shh... Não tenha medo. Só estamos brincando. Prometo que manterei meus lábios acima do seu ombro e minhas mãos acima da cintura, certo?

— Não sei...

A sanidade a abandonou quando a mão de Charles tocou seus seios.

— Milorde...

— Relaxe. Não é gostoso?

Emma certamente não tinha como negar que aquilo era muito bom. Pecaminosamente bom. Charles estava lhe acariciando os seios. Em seguida, ele os segurou por baixo, enquanto seus lábios traçavam uma linha pelo pescoço.

— Abra os olhos, meu amor. Olhe no espelho.

— Não... — Mas Emma os abriu. E o que viu foi chocante e a fez corar. Charles olhava para ela, os olhos azuis brilhando de desejo e cobiça.

Ele a puxou para mais perto, pressionando os seios contra o peito musculoso e amplo, enquanto as mãos seguravam o queixo de Emma. Em seguida, abriu-lhe os lábios sedutores com a língua, que penetrou livremente. Ela teve de se segurar nos ombros fortes para não cair.

Mãos grandes deslizaram então por suas costas, porém pararam na altura da cintura, conforme o prometido. A boca passeou pelo pescoço, mas parou no ombro. Emma ansiava para que as mãos descessem mais e que os lábios tocassem seus seios. Será que ela perdera a cabeça? Emma o empurrou.

— O que está fazendo comigo?

— O que você está fazendo comigo, eu é que pergunto...

— O senhor me responda. Afinal, é o experiente aqui.

— Não exatamente. — Charles respirou fundo e sorriu. — Estamos nos seduzindo, querida. Eu adoraria carregá-la para aquela cama, onde poderíamos continuar com a brincadeira. O que você acha?

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— Não.

— Mentirosa.—Ele deu-lhe um rápido beijinho e se afastou. — Mas você tem razão. É melhor ir para o seu quarto, sozinha. — Emma quase correu para a porta.

— Não confia em mim, querida? Ou é em você mesma que não confia?

— Boa noite — ela disse, fechando a porta para a risada de Charles.

— Durma bem — ele sussurrou através da madeira que os separava.

Emma tocou na porta, então se dirigiu para a cama vazia. Sabia que não conseguiria dormir.

Charles olhou para o dossel e suspirou. Já era quase alvorada. Rolara na cama a noite toda, sem conseguir relaxar. Bem, havia dormido um pouco, pois tivera sonhos maravilhosos. Poderia haver algo mais especial do que sentir os seios fartos de Emma em suas mãos? Talvez a sensação dos mamilos. Ela havia estremecido de uma tal maneira quando ele os tocara, horas antes... Gritaria de prazer se ele os sugasse?

Charles fechou os olhos, sorrindo. Daria tudo para acariciar aqueles seios novamente e enterrar o rosto entre eles. Poder passar as mãos pelos tornozelos, subir pelas pernas roliças, alisar as coxas alvas até tocar nos pêlos escuros que o tentaram tanto na noite anterior. E beijar então...

Se ao menos não fosse um cavalheiro, poderia ter trazido Emma para a sua cama. Teria sido fácil. Alguns beijinhos. Umas carícias. E se ela permitisse que suas mãos e lábios descessem um pouco mais...

Charles fechou os olhos, imaginando a maciez, o gosto de Emma. Não agüentando mais tanta excitação, Charles decidiu ir dar um mergulho no lago para esfriar os pensamentos.

Emma escovou os cabelos e se lembrou das mãos de Charles... Não sabia definir o que havia acontecido. A sensação das mãos fortes tocando seus cabelos com delicadeza. Dos dedos sobre os seios, nos mamilos... Era melhor nem pensar.

Pelo menos ele não tinha tocado diretamente na pele. Pelo menos ela estava de camisola.

E se não estivesse? Como seria a sensação de sentir aquelas mãos tocando diretamente sua pele?

Emma respirou fundo. Havia passado a noite em claro. Não conseguira se aquietar na cama. Seu corpo estava muito... sensível. Ela queria que aquela porta se abrisse e Charles entrasse para terminar o que começara. Fosse lá o que fosse.

Jogou a escova de cabelos sobre a penteadeira. Estava tão confusa! Precisava clarear a mente. Um passeio com Prinny ao redor do lago seria uma ótima opção. Emma se vestiu, apanhou o chapéu e saiu quietinha pelo corredor. Lá estava o cachorrinho, na cama de Claire.

— Prinny! — Emma sussurrou, e as orelhinhas do cão se ergueram de imediato. — Vamos passear.

As patinhas pularam no chão, mas Claire nem se mexeu. Emma colocou a coleira em Prinny. Assim que o soltou, distante o suficiente da casa para que ele pudesse extravasar suas energias, o cãozinho saiu correndo na frente.

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Meg já estaria fazendo suas caminhadas matinais, em busca de novos espécimes? Emma parou num amplo gramado e olhou para a casa. O sol refletia sobre a fachada, que brilhava intensamente. Se casasse com Charles, poderia ser a senhora de Knightsdale.

Seguiu em direção ao lago. Ela gostava da Sra. Lambert, a arrumadeira. As duas se dariam muito bem. E amava Isabelle e Claire. Poderia continuar perto de Meg e do pai. O que estava pensando? A casa, as meninas... nada disso importava de fato. O que mais importava era Charles. Ele a amava de verdade? Ou ela era apenas uma solução simples para os seus problemas? E quanto a ela, suportaria um casamento por conveniência?

Os latidos do cãozinho chamaram sua atenção.

— Prinny!

Os ladrados ficaram ainda mais altos. Será que ele tinha encontrado Meg? Talvez a irmã estivesse precisando de ajuda. Emma levantou a barra da saia e correu em direção ao lago. Podia ouvir Prinny, mas não conseguia vê-lo.

— Pri...

— Bom dia, Emma.

Ela fechou os olhos e os abriu em seguida. A visão não tinha desaparecido. O marquês de Knightsdale estava parado sob uma árvore à beira do lago, nu como viera ao mundo. Bem, não tão nu assim. Tinha uma toalha enrolada em torno da cintura, uma tolha que Prinny tentava remover.

Foi então que o cachorrinho deu mais um puxão e a tolha deslizou.

— Você poderia chamar o seu cachorro, querida? A menos que queira olhar mais um pouco para mim. Não que eu me importe, é claro. Estou sempre pronto para satisfazer o desejo de uma dama. Se quiser, posso deixar que ele fique com a toalha.

— Não!

Emma correu e segurou Prinny, tentando convencê-lo a soltar a toalha. Lutava para manter os olhos fixos no cão, e não nas pernas de Charles. Nos pés descalços. Nos dedos.

— Cachorro peralta! — ela disse. A voz soou fraca.—Prinny, solte!

O cão rosnou. Não estava nem um pouco interessado em cooperar.

— Sinto muito, milorde — Emma falou, olhando para cima. — Parece que... Oh! — Ela olhou de volta para a toalha. Havia uma enorme protuberância apontando do corpo de Charles. — O senhor deslocou algo?

— Como assim?

Emma se aproximou do membro supostamente deslocado.

— Não toque!

Ela recuou rapidamente.

— Não precisa gritar. Está doendo muito?

— Sim. Está doendo muito. Acho que vou morrer em cinco minutos se você não se virar de costas e fechar os olhos por um momento. — A voz de Charles saiu rouca.

— Posso ajudá-lo em alguma coisa?

— Sim, pode. Tenho certeza de que você pode me curar, mas não agora. Agora, você vai se virar e tapar os olhos com as mãos até eu dizer que pode tirar. Não vale espiar. Entendeu?

Emma se virou. Mas, se tapasse os olhos, teria de soltar Prinny.

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— Oh! — Ela sentiu um solavanco, e então viu Prinny correndo em direção ao lago com a toalha de Charles na boca.

Tapou os olhos novamente. Charles tentava vestir a calça, olhando para o lago. Estava precisando era de outro mergulho, depois de ver Emma examinando-o em todos os detalhes... Tinha sido uma lenta tortura! E Emma nem fazia idéia do que estava fazendo com ele... para o que estava olhando. Charles adoraria mostrar tudo a ela. Se ao menos pudesse levá-la para a cama naquele instante, aliviaria sua tensão. Se não se casasse logo com Emma, iria enlouquecer.

— O senhor não deveria estar aqui sem roupa.

—Está falando como uma governanta, Emma.—Finalmente conseguiu abotoar a calça. — Você está espiando?

— Não! Mas o senhor não deveria nadar assim. Qualquer um poderia ter visto.

Charles vestiu a camisa.

— Pode olhar agora. Estou vestido.

Emma se virou. O olhar desceu imediatamente para um determinado lugar da calça.

— Tem certeza de que está bem? — Ela se aproximou, como que para tocá-lo, mas parou e recuou a mão.—O senhor parece melhor. Havia algo errado com... com... — Emma corou. — Sei que não deveria abordar um assunto tão íntimo, mas parecia doer muito. O senhor já mostrou aquilo para um médico?

— Não há nada de anormal comigo, e ficarei muito feliz em lhe mostrar depois que nos casarmos. — Charles estendeu a mão para que ela se levantasse. — Talvez eu possa lhe mostrar antes, se continuar me torturando assim.

— Milorde!

Charles já estava cansado de olhar e falar. Já estava na hora de tocar... Aliás, passara da hora. Emma se debateu por um momento e então se deixou levar. Sua boca se abriu quando os lábios de Charles se aproximaram. Ela estava aprendendo.

Ele a saboreou lentamente. Não havia por que ter pressa, i estavam protegidos pelas árvores e era pouco provável que um convidado saísse para um passeio tão cedo. E se alguém aparecesse e a reputação de Emma Peterson ficasse comprometida? Bem, a intenção dele era das melhores.

Emma se sentia derreter. Os braços e pernas pareciam pesados, e os joelhos estavam bambos. Havia um vazio profundo em seu ventre e uma umidade estranha entre as pernas. Estaria doente, com febre? Precisava se afastar de Charles, mas era incapaz de fazer qualquer movimento.

Então, os dedos hábeis tocaram seus mamilos, e Emma não conseguiu mais pensar. Apenas sentia. Os lábios de Charles desceram pelo contorno de seu rosto. Emma se virou um pouco, inclinando a cabeça para trás e recostando-se no braço forte que a amparava, dando espaço para que a boca masculina deslizasse livremente.

Ela se sentia tão quente... Os seios pareciam inchados. Precisava que ele os tocasse. Precisava sentir as mãos em seu corpo como sentira na noite anterior. E Charles a fez sentir. Uma mão segurava o rosto delicado, acariciando o pescoço, enquanto a outra descia. Uma perna dele estava entre as de Emma, pressionando de uma maneira tentadora.

— Isto é amor, Emma. Doce amor.

Ele desamarrou o decote do vestido e deslizou a mão para dentro sem cerimônia, tocando-lhe a pele. A sensação de Emma foi chocante. Ou teria sido, se ela estivesse com o mínimo de

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capacidade de se chocar com algo. Capacidade que ela parecia ter perdido havia muito tempo. Seus sentidos estavam concentrados demais na nova e estranha necessidade febril que a consumia dia e noite.

E então sentiu os lábios tocando-lhe os seios. Emma passou as mãos pelos cabelos de Charles, puxando-o para mais perto. A língua executava movimentos circulares ao redor do mamilo, a boca sugava. Ele apertava as nádegas arredondadas, aproximando-a ainda mais do membro enrijecido.

Algo estava acontecendo.

— Charles — a voz de Emma soou como um sopro fraco.

— Shh, Emma. Está tudo bem. Vamos, querida. Você consegue fazer isso. Está tudo bem. Agora que tenho você, não a soltarei.

Emma se sentiu selvagem. Ousada. Maluca. Desesperada.

Charles sugava um seio e então o outro. Ela sentiu o ar frio e o sol sobre os mamilos úmidos. Estava exposta ao mundo, para Charles ver. Mas não se importava. Parecia possuída. Aproximou-se ainda mais dele, que a amparou com as duas mãos, guiando-a, ajudando-a a se ajustar.

Mas não foi o suficiente. Não ainda. Parecia que faltava algo mais.

Uma mão de Charles desceu e tocou entre as coxas de Emma de uma maneira ousada e inusitada; e então os dedos estimularam um ponto pequeno e sensível...

Ela se abalou. Mas a boca de Charles capturou os altos gemidos que Emma emitiu quando algo desconhecido, extremamente intenso e maravilhoso invadiu seu corpo. E então ela se largou nos braços másculos. Estava lânguida, não conseguia nem erguer a cabeça, e se encostou no peito de Charles até que o coração voltasse a bater normalmente.

—Foi lindo, Emma—Charles sussurrou, acariciando-lhe os cachos indomáveis.

Ela continuava agarrada a ele. Pequenos tremores ainda percorriam seu corpo. Emma fechou os olhos; tudo o que queria era permanecer ali para sempre. Na beira do lago, nos braços do marquês de Knightsdale, com o vestido erguido até a cintura, à vista de qualquer um que por ali passasse.

Então, de repente, ela soltou um gritinho, empurrou Charles e saiu correndo em direção à casa. Charles bateu na porta do quarto.

— Emma?

— Vá embora!

Ele olhou ao longo do corredor. A Srta. Farthington observava, curiosa. Charles a cumprimentou e se dirigiu ao seu quarto. Em seguida, bateu na porta que separava os dois cômodos.

— Emma?

— Não!

— Precisamos conversar, querida.—Ele tentou abrir a porta, mas não conseguiu.—Você colocou algo atrás da porta, Emma?

— Sim — a voz saiu entre soluços, como se ela estivesse chorando.

— Querida, não precisa ter medo de mim. Deixe-me entrar. Prometo que só vamos conversar. Não tocarei em você.

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O silêncio foi à única resposta. Charles tomou isso como um bom sinal.

— Emma, você deve estar cheia de dúvidas. Tem noção do que aconteceu na beira do lago?

— Não! — A resposta veio alta e clara como um trovão, seguida por um soluço.

Charles experimentou uma sensação estranha, como se seu coração tivesse virado dentro do peito.

— Deixe-me entrar, Emma. Para que possamos conversar direito. Você não quer que ninguém ouça a nossa conversa, quer?

— Não! — Dessa vez havia um toque de pânico também. Ele ouviu o som de passos se aproximando e de algo sendo arrastado. Então, Emma abriu a porta. Seus olhos estavam inchados de tanto chorar.

— Emma... — Charles quebrou a promessa e a abraçou no mesmo instante. — Emma, querida, sinto muito se a aborreci. Não era minha intenção assustá-la.

Ela soluçou e se entregou ao abraço.

— Vamos. — Ele a conduziu até a poltrona perto da lareira e a colocou sentada em seu colo, mantendo-a abraçada e protegida.

Charles adorava sentir o peso do corpo relaxado de Emma sobre o seu. E era estranho que não se sentisse tomado pelo desejo, naquele instante. Sim, havia desejo, mas era como uma orquestra tocando no salão de baile e sendo ouvida por alguém que se encontrava no terraço. Maravilhoso, mágico, porém não passava de pano de fundo.

—O que você fez comigo?—Emma sussurrou contra o peito dele.

Como ele poderia responder àquela pergunta?

— Eu fiz amor com você, querida. — Ele a sentiu ficar tensa.

— Então, eu estou... estou... grávida?

A situação poderia ser engraçada se não fosse tão desastrosa.

— Não, Emma, você não está grávida.

— Tem certeza?

— Certeza absoluta, querida.

— Mas algo muito... estranho aconteceu comigo.

Ela falava tão baixinho que Charles teve de prender a respiração para conseguir ouvi-la.

—Eu me senti... selvagem. Queria muito... Não sei explicar... — Ele respirou fundo.

— Mas você gostou do que sentiu, querida?

Emma permaneceu em silêncio por alguns instantes, e Charles pensou que seu coração fosse parar.

— Sim — ela disse finalmente. — Gostei. — Ele suspirou aliviado e a abraçou.

— Fico feliz.

— Mas como você sabe que não estou grávida?

— Porque... Porque algo mais precisa acontecer, para uma mulher ficar grávida, querida. E isso não aconteceu hoje.

— Oh. — Ela o fitou. — E você ficou triste por causa disso? — Charles encolheu os ombros.

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— Um pouco, porque é algo muito bom. Mas eu sabia que não era a hora certa.

Emma baixou a cabeça antes que ele pudesse provar de novo um pouco do sabor de seus lábios.

— Você já fez bebês antes?

— Não! — Pelo menos Charles tinha quase certeza de não ter nenhum filho perdido no mundo.

— Então, como sabe que é bom?

— Apenas sei, Emma. Você tem de acreditar em mim. É algo que todos os homens sabem.

— Isso não está fazendo muito sentido para mim.

— Mas faz sentido, pode crer. E, então, você me perdoa pelo que aconteceu?

Ela assentiu.

— Acho que sim. Mas tenho mais uma pergunta.

— Sim?

Charles sentiu um vazio no estômago quando Emma olhou para as próprias mãos. Por que será que ele tinha certeza de que aquela seria a pergunta mais difícil de todas?

— Você disse que fez amor comigo.

— Sim.

— Isso significa que você me ama?

Parecia que Charles tinha levado um soco no estômago. Emma ficou assustada e embaraçada. Embaraçada quando pensou em como havia se comportado no lago; assustada quando pensou que poderia estar grávida. Ela era solteira. Como poderia ter um filho? Onde iria morar? A vergonha se apossou de seu ser. O que seu pai iria dizer? E Meg?

Trancou a porta que dava para o corredor e arrastou a cômoda para a frente da que ligava seu quarto ao de Charles. Depois levou as mãos ao peito. Oh, Deus! Ele tinha visto seus seios! Colocara a boca neles... Emma cruzou os braços num gesto protetor. Charles havia tocado todo seu corpo. E ela se entregara a ele como se fosse uma, uma... Nem sabia direito o que pensar. Tudo que acontecera era muito novo e inesperado.

A questão era que havia estado com Charles. O menino a quem idolatrara quando criança, que havia secado suas lágrimas quando ela chorava sozinha. O rapaz que preenchera seus sonhos de adolescente. O primeiro homem que a tinha beijado, o único homem que a tocara.

Mas ele não dissera que a amava.

— Acho que o nosso plano não funcionou, Isabelle. Mamãe Emma e papai Charles parecem estar bravos um com o outro.

Isabelle concordou. Ela e Claire estavam sentadas no gramado, vendo o grupo de hóspedes saindo para um piquenique. Charles tinha tentado se aproximar de Emma, mas ela se esquivara todas as vezes.

— Temos que pensar em algo, Claire. — Isabelle franziu as sobrancelhas.—Será que tem alguma outra coisa da Srta. Emma que possamos colocar no quarto do tio Charles?

— Que tal a camisola? Vamos esconder lá! — Isabelle assentiu.

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—Com certeza ela vai precisar da camisola. Acho que só tem uma.

— Bem, se tiver mais, escondemos as outras também. — Claire se levantou assim que o último convidado passou. — Vamos. Vamos esconder direitinho, para mamãe Emma e papai Charles terem de procurar a noite toda.

Emma subiu para o quarto das meninas. Ela havia saído com a maioria dos hóspedes para um piquenique, mas começara a chover, e ela já estava cansada das conversas fúteis, e resolveu voltar mais cedo para casa.

— Nanny, onde estão as meninas? — Ao ouvir a voz de Emma, Prinny saiu correndo do quarto de Claire, latindo como um maluco. — Shh! Você está fazendo muito barulho.

— Elas foram fazer uma visitinha a Cook.

Emma franziu o cenho. Quando fora a última vez que Isabelle e Claire tinham feito o dever de casa? Ela estava sendo negligente para com seus deveres de governanta. No dia seguinte, a primeira coisa que iria fazer seria levar as meninas para a sala de estudos.

— Muito bem. Vou levar Prinny para correr um pouco lá embaixo. Todos os hóspedes foram para o piquenique.

Mas quando Emma entrou na galeria principal, percebeu que se enganara. Stockley encontrava-se lá, admirando a longa linhagem dos ancestrais de Knightsdale em quadros e esculturas alinhados ao longo das paredes. Ela parou e se abaixou para prender a coleira em Prinny, e estava pronta para sair de mansinho quando algo chamou sua atenção.

Stockley estava examinando atrás dos quadros. O que estaria procurando? Prinny também não gostou do comportamento do cavalheiro e começou a latir. Stockley teve um sobressalto e quase derrubou o busto de um dos ilustres antepassados.

— Srta. Peterson. Pensei que todos tivessem ido ao piquenique.

Emma soltou a cordinha da coleira, e o cachorro correu para cheirar as botas do homenzinho.

— A senhorita poderia chamar o seu cãozinho, por favor?

— Prinny é mansinho.

— Talvez. O fato é que não sou muito afeito a animais.

— Sei. — Ela se abaixou para prender a coleira do cachorrinho, mas este se esquivou.

— Venha aqui, Prinny!

O cão latiu e, de repente, perdeu o interesse por Stockley e saiu para farejar atrás do pedestal do busto do tio-avô Randall, que quase tinha ido ao chão pouco antes.

— Eu diria que a senhorita não tem muito controle sobre o seu animal.

— Prinny, na verdade, pertence à minha irmã.

Stockley deu um sorriso malicioso e foi se aproximando de Emma de uma maneira estranha e ousada.

— Não fuja, Srta. Peterson. Eu gostaria de lhe mostrar uma coisa no meu quarto.

— Sr. Stockley!

Mas ele não parava de avançar, até deixá-la quase encurralada.

— Pare com isso, Srta. Peterson, ou melhor, Emma. Você já não é mais uma menininha. Não me venha com esses falsos protestos.

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— Não são falsos! Eu gostaria que o senhor tirasse as mãos de cima de mim!

— Quer que eu as coloque embaixo da sua saia? Eu adoraria.

— Tente fazer isso e eu... eu gritarei feito uma louca!

— Oh, e quem irá ouvi-la? O seu cachorrinho? Ele vai me desafiar para um duelo? Estou morrendo de medo. — Stockley se inclinou para frente, com um brilho sórdido nos olhos. — Mas obrigado por me alertar. Tomarei o cuidado de cobrir a boca do cachorro antes de cobrir a sua...

Emma não esperou pelo resto. Gritou o mais alto que pôde, mas o sujeito foi rápido. Sua boca abafou o outro grito antes que Emma tivesse tempo de encher os pulmões. Nesse instante, Stockley a soltou e gritou mais alto do que ela podia imaginar que alguém fosse capaz. Prinny, seu salvador, rosnou.

— Seu maldito...

O cãozinho estava com os dentes à mostra, obviamente preparado para arrancar outro pedaço do tornozelo de Stockley. Mas o homem não esperou e saiu correndo, gritando ameaças contra Emma e Prinny. Emma estava furiosa. Charles havia tomado liberdades com ela... e não tinha certeza se a amava?

Estava furiosa consigo mesma, pois pensara que todo aquele contato físico havia significado algo mais para ele. Como pudera ser tão ingênua?

— Bom dia, Srta. Peterson.

— Onde está o seu pretendente?

Emma ergueu os olhos do livro e deparou com as gêmeas Farthington.

— Pois não?

— Elas estão falando do papai Charles, mamãe Emma. — Emma olhou séria para Claire.

— Volte para as suas letras, mocinha. — As gêmeas riram.

— Papai Charles? — disse Esther. Rachel sorriu.

— Aposto que lorde Knightsdale daria um ótimo pai.

— E o título caiu muito bem nele, se entende o que quero dizer — Esther sussurrou, cutucando a costela da irmã.

As duas riram mais alto ainda.

— Ah, sim, aqueles ombros largos...

— Aquelas pernas...

— Senhoritas, por favor! — Emma sentiu as faces corando e olhou para Claire. As meninas estavam observando as gêmeas com muito interesse. — As senhoritas subiram até aqui por algum motivo específico?

— Oh, não.

— Só estávamos de passagem.

Ninguém subia até o último andar da casa "só de passagem".

— Diremos ao marquês onde a senhorita se encontra.

— Não é preciso.

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Emma observou as duas amigas de lady Beatrice se retirando e não entendeu qual o propósito da estranha visita.

— Acabei de ver lorde Knightsdale na biblioteca.

Emma centralizou o vaso vermelho de rosas que ela estava arrumando na sala de estar.

— Obrigada por me alertar, Srta. Russell.

— Não estou alertando, estou avisando. Ele está sozinho.

— É mesmo?

A dama sacudiu a cabeça com veemência.

— Seria o momento perfeito para... a senhorita sabe. — Emma ajeitou os óculos.

— Não, eu não sei.

— Não sabe? — A Srta. Russell franziu a testa. — Lavinia disse que a viu voltando do lago com o vestido caindo...

— Bem, obrigada, Srta. Russell, por me avisar sobre o paradeiro de lorde Knightsdale.

A Srta. Russell fez uma mesura.

—Eu sabia que iria gostar de saber. Pode deixar que cuidarei das rosas para a senhorita.

Desconfiada, Emma caminhou pelo jardim. Se visse outra amiga de lady Beatrice, sairia correndo e aos gritos. Nesse momento, avistou de longe a tia de Charles vindo em sua direção. Felizmente a senhora não teve tempo de vê-la. Emma fez meia-volta e seguiu para o lado oposto.

— Srta. Peterson.

Ela se virou, porém não reconheceu a voz feminina.

— Aqui, Srta. Peterson.

A duquesa de Alvord estava sentada em um banco sob uma árvore. Sorriu quando Emma se aproximou.

— De quem a senhorita está se escondendo? — Emma sorriu sem jeito.

— De lady Beatrice.

— Sente-se aqui ao meu lado. Vamos conversar. Se ela vier na nossa direção, tenho certeza de que não irá nos interromper.

Emma não tinha tanta certeza assim, mas, para seu alívio, Beatrice mudou de rumo.

— Por que estava fugindo de lady Beatrice, Srta. Peterson?

— De medo que ela viesse falar comigo a respeito do sobrinho. — Emma corou. — Parece que está havendo uma campanha entre as amigas de lady Beatrice para que eu me case com lorde Knightsdale, e tenho quase certeza de que lady Beatrice é a responsável.

— Interessante. E a senhorita não quer se casar com Charles? — Emma fitou a duquesa, uma jovem senhora que certamente a compreenderia. Era óbvio que ela estava completamente apaixonada pelo marido, e vice-versa.

— Lorde Knightsdale não me ama.

A outra pareceu surpresa.

— Ele lhe disse isso?

— Não, mas parece claro, não parece?

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— Não para mim. Na verdade, James me contou que Charles está muito interessado na senhorita. — Emma meneou a cabeça.

— Oh, ele quer apenas uma esposa. Precisa de uma, agora que é marquês. E eu sou conveniente. É só isso.

— Tem certeza? Tenho observado o modo como ele olha para a senhorita.

Emma corou e seu coração disparou de repente.

— Com certeza a senhora está imaginando coisas.

— Não creio. — A duquesa sorriu. — Ele já mostrou algum tipo de interesse em especial? Os dois já se encontraram em particular? Já se beijaram? — Ela riu. — Não pense que precisa responder a todas essas perguntas. Não sou tão ousada a ponto de tentar vasculhar sua vida pessoal.

Emma alisou o vestido. Bem, Charles a pedira em casamento. A situação era mais do que embaraçosa, mas ela precisava de algumas respostas e não tinha a quem recorrer.

— Lorde Knightsdale tem demonstrado certo interesse, tanto que eu, eu... — Como poderia dizer aquilo? A duquesa ouvia com atenção, e Emma se lembrou de que precisava de um conselho. — Eu... eu lhe perguntei se me ama, e ele...

— E Charles disse que não? — A duquesa pareceu surpresa novamente.

— Não! Sim. Quero dizer, não sei. Ele não disse exatamente que não me ama, apenas permaneceu sentado, olhando para mim, boquiaberto.—Emma enrijeceu ao sentir as lágrimas descendo por seu rosto. Enxugou-as com as costas da mão e mordeu o lábio, mas um soluço escapou mesmo assim.

Queria cobrir o rosto e chorar. Estava se sentindo como uma menininha perdida.

— Lorde Knightsdale disse que gosta muito de mim, que é claro que se importa comigo. E prosseguiu com coisas assim. Acho que ele apenas... sente desejo por mim. — As últimas palavras foram sussurradas.

— Srta. Peterson. Creio que posso chamá-la de Emma, não posso? — A duquesa bateu no joelho de Emma. — Por favor, isso não é tão ruim. Na verdade, acho que é muito bom. Tome, enxugue os olhos.

Emma apanhou o lencinho que a duquesa ofereceu.

— Onde aconteceu essa conversa? — Emma ruborizou.

— No meu quarto.

— No seu quarto?

— Sim. Sei que é chocante, mas...

— Não estou chocada. Está tudo bem. — A duquesa sorriu. — Conheci meu marido na cama de um quarto em uma estalagem. Na cama e nu.

Emma engasgou. A duquesa era americana. Talvez... não, ela não podia imaginar que os costumes dos americanos pudessem ser tão diferentes. A duquesa riu.

— Foi quase uma comédia de erros que nos colocou naquela situação, e levou algum tempo para as coisas se esclarecerem. Mas creio que... Bem, fico feliz em dizer que James sentiu desejo por mim desde a primeira vez que me viu. E eu por ele. Um pouco de desejo, ou muito, é algo bom, contanto que conduza ao casamento, é claro.

— Desejo é bom? — Emma nunca ouvira o pai falar sobre isso em seus sermões.

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— Claro que sim, pois o desejo indica uma forte atração física. E casamento é uma relação física.

Emma não se lembrava mais de como era o casamento de seus pais, pois era muito jovem quando a mãe morrera. Mas seu encontro com Charles na margem do lago certamente tinha sido algo muito físico.

— Sem o contato físico não existiriam bebês. — A duquesa sabia como falar. — O que você não pode esquecer, Emma, é que os homens não têm muito jeito com as palavras. Eles sabem agir melhor.

— Não estou entendendo.

— O que eu quero dizer é que homens e mulheres são diferentes. Não que eu seja uma especialista no assunto, mas tenho pensando muito sobre isso ultimamente.

— Entendi. — Emma engoliu o desapontamento. Esperava encontrar respostas, mas só estava encontrando mais dúvidas.

A duquesa se inclinou.

— Os homens não pensam como nós. Quando perguntou a Charles se ele a ama, Emma, pediu a ele que analisasse o que sente por você. E Charles, provavelmente, não sabia a resposta porque nunca deve ter se perguntado isso. Ele apenas sabe que a deseja. — Mais um sorriso gentil. — Tenho certeza de que vocês não estavam sentados em poltronas separadas durante aquela conversa no seu quarto.

Emma ruborizou ainda mais.

— Bem, não... Mas então como poderei saber se é amor ou desejo que um homem sente por mim?

— Emma, provavelmente isso não deve fazer muita diferença na cabeça de Charles agora, e de nenhum outro homem. Depois que ele tiver satisfeito um pouco desse desejo, então será capaz de saber se a ama. Agora, Charles não está raciocinando com a cabeça... — Foi a vez de a duquesa corar.

— Sarah.

A duquesa se virou, e um sorriso largo iluminou seu rosto.

— Aqui, James.

Emma viu o duque se aproximando. Ele, também, estava sorrindo, e seu rosto tinha uma fisionomia terna que o duque adquiria apenas quando olhava para a esposa. Mas dessa vez Emma notou algo mais. Os olhos do duque tinham um brilho familiar. Era o mesmo que Emma via nos olhos de Charles quando ele olhava para ela.

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Charles estava sentando à escrivaninha, cercado de uma pilha de papéis. Definitivamente, precisava de uma secretária. Podia jurar que o volume de papéis tinha dobrado desde a última vez que se sentara ali. Estariam se procriando?

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Procriando. Ele recostou-se na cadeira com as mãos cruzadas atrás da cabeça. Como adoraria estar ocupado na reprodução de um pequeno Draysmith com Emma! Daria tudo para tocá-la sem todas aquelas camadas de roupas. Para sentir o contato de pele na pele.

Por que ela tivera que falar sobre amor? Mas agora não se tratava de um jogo sexual como aqueles com os quais ele costumava se envolver na adolescência. Agora se tratava de casamento. Família. Filhos. Tudo por causa de Emma.

Se aquele ladrão não tivesse atirado em Paul e Cecília nos Alpes italianos, mandando a carruagem montanha abaixo, ele não teria retornado para Knightsdale e reencontrado Emma Peterson. Se não tivesse descoberto que aquele tesouro precioso ainda vivia em Kent, isso sim, teria sido a tragédia de sua vida. Se o irmão surgisse naquele instante, ele ficaria imensamente feliz em vê-lo. Livrar-se-ia de todas aquelas obrigações e iria embora, mas levaria Emma consigo, se pudesse.

Charles sorriu. Sim, ele a amava. Diria isso a ela, e então lhe daria o anel de noivado dos Knightsdale. Iria pegá-lo naquele instante. Estava guardado em um cofre na biblioteca. O ladrão não o roubara; estava no dedo de Cecília quando o corpo retornou à Inglaterra.

Charles franziu o cenho. O investigador não tinha conseguido descobrir o que fora roubado, apesar de insistir que o ladrão havia sido o causador das mortes de Paul, Cecília e dos criados que os acompanhavam. Não houvera nenhuma testemunha. Somente a cena do crime, com toda a bagagem revirada, como se o ladrão estivesse em busca de algo. Até mesmo os assentos da carruagem tinham sido rasgados e vasculhados. Charles abriu o cofre. Todas as jóias da família estavam ali. Pegou o anel e o guardou no bolso do colete.

Todas as vezes que Emma olhou para Charles durante o jantar, ele estava olhando para ela, o que era extremamente desconfortável. Assim como tudo que se passava ao seu redor parecia desagradá-la naquela noite. Emma se esgueirou para o quarto na primeira oportunidade que se apresentou. Não demorou muito, e Charles também subiu, com a desculpa de que precisava pôr a correspondência em dia.

Para completar a noite dos desconfortos, Emma não conseguia encontrar a camisola. Deu mais uma olhada no guarda-roupa, e nada. Ela não tinha tantas roupas assim para que a camisola pudesse se perder entre elas. Definitivamente, não estava no armário.

Bem, não iria dormir de vestido, então, iria se deitar sem roupa nenhuma.

Pelo menos a escova de cabelos não tinha desaparecido de novo. Emma se sentou diante da penteadeira e olhou através do espelho a porta que separava seu quarto do de Charles. Como a sua escova de cabelos fora parar entre os papéis dele? Será que a camisola também estava lá?

O pensamento lhe causou arrepios e um súbito calor. Ela não iria precisar da camisola para se esquentar durante a noite. Até mesmo o vestido estava muito quente naquele momento.

Assim, tirou a roupa e foi para a cama. Estava mais do que quente. Tanto que demorou a encontrar uma posição, e, quando cochilou, seu sono leve foi invadido por sonhos com Charles tocando as partes mais íntimas de seu corpo, à beira do lago. Depois de ter despertado pela décima quinta vez, Emma desistiu. Talvez se vestisse alguma coisa conseguisse dormir sossegada e sem sonhos eróticos para atormentá-la.

Estava alcançando os óculos quando ouviu o estalo e então o ruído de algo raspando. Sentou-se na cama, puxando as cobertas até o pescoço. Algo se movia do outro lado do quarto. Algo branco estava emergindo da parede...

Emma gritou o mais alto que pôde. Então mergulhou sob as cobertas e começou a rezar.

Charles colocou o livro de lado. Já tinha lido a mesma página mais de vinte vezes e finalmente reconheceu que a leitura não faria sentido naquela noite. Olhou de novo para a porta que

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o separava de Emma. Daria tudo para fazer amor com ela naquele momento. Precisava vê-la... falar com ela, abraçá-la... precisava...

Charles se endireitou na poltrona. Precisava mesmo era dar um mergulho no lago para aplacar os ânimos, pois nunca conseguiria dormir naquele estado de excitação em que se encontrava. Droga, não tinha certeza nem mesmo se conseguiria abotoar a calça!

De repente, ele ouviu um barulho estranho que o deixou paralisado. Durante a guerra tinha ouvido os mesmos sons perturbadores, de mulheres apavoradas gritando em desespero. Charles correu e pegou um candelabro em vez da calça. Precisava ver o inimigo; o pesado objeto poderia servir como uma arma para bater na cabeça do intruso.

Abriu a porta que dava para o quarto de Emma, segurando a vela no alto. Não havia nada de anormal. Olhou ao redor e não viu ninguém. Nem mesmo Emma. Aproximou-se então da cama. Havia algo no centro, sob os lençóis. Cauteloso, levantou uma ponta do lençol e puxou-o rapidamente com um único movimento.

Ali estava Emma, encolhida em posição fetal, a cabeça entre as mãos, os cabelos esparramados ao redor e a pele branca e macia exposta ao ar.

Ela se virou e olhou para Charles. Ele permaneceu imóvel. Mal conseguia raciocinar. Muito menos respirar. Apenas observava os seios fartos se movendo com todo o corpo, enquanto sua boca secava e outra parte de seu corpo crescia, enrijecida.

Charles já tinha visto aqueles seios no lago, mas agora era muito melhor. Seus olhos traçaram a linha do pescoço, dos ombros delicados, da pele alva dos seios e das costelas.

— Emma? — Ele gemeu.

— Charles? — Ela apanhou os óculos. — Você está nu.

— Você também, querida.

Os olhos ingênuos desceram então do rosto para as partes baixas do corpo másculo e completamente nu.

— Era isso que estava sob a toalha, hoje cedo?

— Sim. — Charles deixou um riso nervoso escapar. — Costumo carregar sempre comigo.

— Mas como isso cabe na sua calça?

— Ele encolhe para guardar. — Colocou o candelabro sobre a mesa ao lado. — Você quer tocar?

Emma hesitou, apesar de mostrar claramente sua enorme curiosidade.

— Posso?

— Por favor.

Com todo o cuidado, ela estendeu a mão. Charles observou os dedos delicados se aproximando e fechou os olhos por um momento ao sentir o toque suave. Podia jurar que a qualquer momento iria cair sobre a cama e tomar Emma em seus braços para fazer amor até o dia amanhecer. Mas, antes, precisava pegar algo em seu quarto.

— Emma, fique exatamente onde está. Não se mova. Jure que não vai se mover.

— Bem... — Ela corou e puxou o lençol.

Instantes depois, Emma viu Charles voltando pela porta. E, bem, aquela parte específica do corpo dele ainda continuava incrivelmente enrijecida, e ela estava ansiosa para tocar um pouco mais.

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— Você ainda está sem roupa — Emma murmurou.

— Estou. Não vejo necessidade de me vestir. Na verdade, espero continuar assim por muito tempo.

Emma sentiu a mão forte descer por sua espinha até a base da coluna numa carícia sensual. O colchão se mexeu quando Charles se sentou a seu lado. Agora ele tocava os lados de seu corpo, passando pelos seios, descendo para as coxas, até Emma abrir as pernas, rendendo-se.

Então, de repente, Charles parou.

— Emma, por que você gritou? Não estou vendo nada de ameaçador por aqui.

Ela ergueu a cabeça, olhou em volta e foi obrigada a admitir que, de fato, não havia nada de estanho no quarto. Naquele momento, pelo menos.

— Vi alguma coisa logo ali. — Emma indicou com o queixo. — Um vulto branco, saindo da parede.

— Saindo da parede? Você não poderia ser um pouco mais específica?

— Eu estava sem óculos.

— Outro fantasma como o de Nanny?

— Não. Bem, eu vi algo... — Ela estava quase certa, mas o que teria sido?

Charles se levantou, foi até a parede e tateou.

— Não vejo nenhum sinal do seu fantasma, querida. É melhor eu passar a noite aqui. Para protegê-la. Você não acha?

O olhar de Emma foi lentamente da virilha até encontrar o sorriso belo e sedutor de Charles. Quando os olhos de ambos se encontraram, ele ficou extasiado de ver todo aquele brilho inocente.

— Sim... — Ela mal conseguia falar. — Acho que é uma boa idéia.

— Acredite, querida, é uma ótima idéia. — Charles se sentou na cama. — Acho que estou pensando em algo que podemos fazer para nos esquecermos do tal fantasma.

— É mesmo? E o que seria?

Ele se aproximou lentamente e tocou nos seios arfantes. Emma soltou um leve gemido de prazer.

— Como você é perfeita, meu amor!

— Eu estou... estou... tão... quente — ela disse. — Por favor. Preciso de você. Preciso que você me... toque. Em todo o meu corpo.

— Você não pode imaginar como fico feliz em ouvir isso, minha querida. E ficarei ainda mais feliz em poder satisfazer o seu pedido. Mas daqui a pouco.

— Eu quero agora.

— Quanta ansiedade! Pelo jeito, estou condenado a ser seu escravo; função que exercerei com todo o prazer, mas com uma condição.

— O quê?

— Que você se case comigo. — Charles pegou o anel dos Knightsdale que havia colocado sobre o criado-mudo. — Não encostarei um dedo e nenhuma outra parte do meu corpo em você, até que aceite o meu pedido.

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— Está bem. — Emma fez menção de pegar o anel, mas Charles o segurou.

— Não, minha querida impaciente. Pense bem. Uma vez que eu colocar este anel no seu dedo, você estará comprometida para sempre. Será minha esposa, mãe dos meus filhos.

A safira no anel de família refletia a luz da vela. Dá-lo a Emma significava outro laço atado com Knightsdale. Ele tinha certeza do que estava fazendo. Sentia-se feliz.

— Diga sim, Emma. Eu preciso de você. — Ela olhou para o anel e então para Charles.

— Mas você me ama? — Ele sorriu.

— Sim, querida. Eu te amo. Sei que estou sentindo algo que nunca tinha experimentado antes. Vamos, Emma, diga sim.

Ela sorriu.

— Eu aceito.

Charles previu que a noite seria ótima. A sensação provocada pelas mãos de Charles era maravilhosa. Emma arqueou o corpo quando ele lhe afagou os seios e depois tomou um mamilo na boca, sugando-o demoradamente. Ela enterrou as mãos nos cabelos dele, puxando-o para si, encorajando-o. Não queria que aquele prazer terminasse, nunca mais.

Sem parar de sugar-lhe o seio, Charles deslizou a mão pelo abdômen de Emma e foi descendo, até alcançar a região úmida entre as pernas dela. Ela se retesou ao senti-lo pressionar e forçar um dedo para dentro de seu corpo, mas logo em seguida relaxou os músculos, permitindo que ele aprofundasse o toque.

Charles então passou a sugar o outro mamilo, enquanto, com a outra mão, acariciava o primeiro, fazendo os quadris de Emma se arquearem e se contorcerem junto a seu corpo.

Emma sentiu a própria umidade aumentando, e embora não soubesse explicar o que estava acontecendo consigo mesma, não se preocupou, entregue que estava às sensações novas e indescritíveis que Charles lhe proporcionava.

Ela se sentia numa espécie de transe, enquanto Charles se movia e se encaixava entre suas pernas, lentamente substituindo o dedo por aquela parte de seu corpo que ela vira pouco antes.

Em algum canto de seu cérebro, perpassou o pensamento de que seria impossível aquilo caber no mesmo espaço que o dedo dele ocupava até um segundo atrás, mas Emma não protestou, decidindo confiar em Charles. Ele devia saber o que estava fazendo, refletiu vagamente.

Emma se retesou ao sentir uma forte agulhada no baixo-ventre, e Charles percebeu, tanto que parou de se mover no mesmo instante.

— Está tudo bem — ele sussurrou no ouvido de Emma. — Já vai passar...

E voltou a se mover sobre ela, devagar a princípio, e depois aumentando o ritmo gradativamente. Emma o abraçou e, instintivamente, o enlaçou pela cintura com as pernas, acompanhando os movimentos dele.

— É assim que se fazem os bebês... — Charles ergueu o corpo e se apoiou nos cotovelos, movendo freneticamente os quadris para frente e para trás, fitando Emma nos olhos. — Eu derramo... a minha semente... dentro... de você...

De repente Charles ficou imóvel, e Emma sentiu alguma coisa quente se espalhar dentro dela. A respiração dele estava ofegante, e Emma enterrou os dedos nos cabelos macios, sentindo um estranho turbilhão de sensações e emoções. Sua respiração também estava difícil, e ela não estava conseguindo pensar direito; sentia uma dor não muito forte, apenas um pouco incômoda, entre as

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pernas; sentia o peso do corpo de Charles, abandonado sobre o seu; e sentia uma espécie de plenitude, física e espiritual, completa.

Aquela união entre ela e Charles transcendera em muito o plano físico; Emma não sabia ao certo explicar o que fora, nem como, nem por que, mas tinha certeza de que um vínculo muito especial acabara de se criar entre eles, uma conexão que ela não compreendia, mas que sabia que acontecera. Ela se sentia, verdadeiramente, uma mulher casada.

Charles sonhou que a mão de uma mulher estava tocando uma parte muito íntima de seu corpo. Mas não parecia o toque de uma prostituta experiente. Não, era hesitante. Não tenha medo. Por favor, continue. Ele abriu as pernas, dando espaço suficiente para que os dedos mágicos continuassem o trabalho.

O suor escorria por seu peito. Charles estava ardendo e gemia. Por favor, mais!

— Estou machucando você?

Charles abriu os olhos. Não era um sonho.

—Nem um pouco— ele murmurou. — Continue, por favor.

Emma sorriu e prosseguiu com a atividade. E eles fizeram amor mais uma vez, com os primeiros raios de sol penetrando através das cortinas da janela do quarto da marquesa.

Charles adorou provar um pouco mais de Emma. Sentir os seios contra seu tórax. Tocar todo o corpo perfeito sem receios. Fazer amor como nunca havia imaginado fazer um dia.

Passados alguns minutos, ele recobrou a lucidez.

—Adorei despertar assim.—Beijou-a e a abraçou com ardor. — Você vai me acordar assim todas as manhãs?

Emma sorriu.

— Talvez. — Emma cobriu o rosto com o lençol, tentando esconder o rubor.

—- Não se preocupe. O casamento calará a todos.—Ele pegou a mão direita de sua futura esposa. — Nós apenas antecipamos a lua-de-mel, querida. E acho que anteciparemos mais algumas vezes antes que os proclamas sejam publicados. Logo estaremos casados.

Charles a beijou. Se não se esforçasse para sair da cama imediatamente, logo estariam se amando outra vez. Ele não se importava com o que os outros iriam dizer, mas não queria que Emma sofresse com os olhares de reprovação.

— Vamos lá, vamos nos vestir.

— Precisamos contar para as meninas — disse Emma, se levantando e procurando alguma coisa para vestir.

Charles assentiu.

— E depois para tia Bea e Meg, é claro. Seu pai virá ao baile hoje à noite, e então farei o pedido oficial a ele.

Charles foi para seu quarto e se vestiu, sem se preocupar em fechar a porta de comunicação. Quando voltou, Emma já colocara um vestido, e estava escovando os cabelos. Antes que ele dissesse qualquer coisa, notou um objeto brilhando no chão à luz do sol, e se abaixou para observar.

Era bem no local onde Emma dissera ter visto o "vulto branco" na noite anterior.

— O que é isso? — Emma se ajoelhou na cama para ver o que ele estava apanhando no chão.

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— Um relógio. — Charles abriu o relógio de bolso sobre a palma da mão. — É uma peça espanhola. Parece sólido demais para pertencer a um fantasma.

Emma olhou para o relógio dourado que estava sobre a mão espalmada.

— Você consegue se lembrar de algum detalhe sobre a tal coisa que viu? — Ele alisou o tapete, mas não achou nenhuma outra pista.

— Bem, eu estava sem os óculos, por isso não pude ver com muita clareza. Ouvi um estalo e um rangido, como se fosse de uma porta se abrindo. E então uma coisa branca saiu da parede. Eu só gritei e me enfiei debaixo das cobertas.

Charles olhou para a parede.

— E você acha que o fantasma apareceu aqui?

— Acho que sim.

Ele tateou novamente a superfície da parede.

— Quando eu era criança, meu tio-avô Randall nos visitou num verão; foi antes de você se mudar para Knightsdale. — Seus dedos continuaram alisando a parede em busca de alguma protuberância ou depressão. — Tio Randall era a ovelha negra da família. Meu pai não gostava quando ele vinha. Ficou muito aborrecido quando meu tio disse que iria ficar por todo o verão e, para piorar, que pagaria para um escultor local imortalizar sua imagem nada atraente em mármore.

— Eu vi o busto na galeria principal — disse Emma.

— Ele não era o mais bonito dos Draysmith.

— Não, comparado ao marquês atual. — Charles sorriu.

— Tio Randall passou a maior parte daquele verão bebendo o conhaque de meu pai e dormindo de pura embriaguez. Paul e eu pensamos que ele era um pirata, pois contou uma ou duas histórias sobre o mar. Mas como estava sempre bêbado, não levamos muito a sério. Mesmo assim, buscar tesouros enterrados foi uma atividade bastante divertida naquele verão, até para Paul, que normalmente não gostava da minha companhia.

— Paul não gostava das pessoas em geral — declarou Emma. Charles encolheu os ombros.

— Você mal o conheceu. Não deve ter sido fácil para ele assumir o fardo do título tão cedo. Tinha apenas catorze anos quando papai faleceu.

— Acho que você tem razão.

Charles examinou a parede. Poderia dar um chute, mas não seria o melhor procedimento.

— Além de nos contar as histórias sobre piratas, tio Randall nos revelou que existia um labirinto de passagens secretas atrás das paredes de Knightsdale. Procuramos num dia chuvoso, mas, como não encontramos nada, concluímos que se tratava de outra lorota contada pelo nosso tio, sempre embriagado. Agora começo a pensar de maneira diferente.

O fantasma que Nanny dissera ter visto, o princípio de incêndio no quarto de Emma, a aparição da noite anterior. Alguém estava se movendo às escondidas por Knightsdale, e Charles não estava nada propenso a imaginar que se tratava de um espírito. Mas onde estaria a maldita porta da passagem?

Enquanto isso, Emma examinava atrás de um quadro que se encontrava um pouco mais à frente.

— Achou alguma coisa?

— Parece que encontrei um desnível aqui. Mas não estou conseguindo...

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— Deixe-me ver. — Charles se aproximou.

— Está logo aqui.

Ele seguiu os dedos de Emma. O quadro era muito pesado e grande para ser removido da parede, mas eles conseguiram afastá-lo o suficiente para pôr as mãos atrás. Sim, Charles sentiu a elevação. Não estava muito longe da moldura, mas ele não conseguia mover a mão para além daquele limite.

— Será que é para baixo? — Emma tentava espiar atrás do quadro.

— Acho que sim. — Charles puxou algo, e eles ouviram um estalo.

— Olhe! — Emma recuou. Parte da parede estava aberta. O quadro, na verdade, era uma porta que dava para uma passagem secreta.

— Coloque alguma coisa para impedir que a abertura se feche quando eu soltar a alavanca.

— Está bem. — Emma olhou ao redor e pegou a escova de cabelos. — Pronto.

— O que você está fazendo? — Charles segurou o braço delicado. — Saia. Está parecendo Prinny farejando confusão.

— Está muito escuro aqui. Vou pegar uma vela. — Pouco depois, Emma voltou.

— Não pense que vai me impedir de dar ao menos uma olhadinha.

— Será que não? — Charles acendeu a vela e entrou, espremendo-se pela passagem estreita.

— Lembre-se de que, se não fosse por mim, você nunca descobriria como abrir a passagem secreta — alegou Emma.

— Oh, eu acabaria descobrindo.

— Charles! Eu não vou me embrenhar pelas entranhas de Knightsdale. Só quero entrar aí com você.

— Não tem muito espaço. — A passagem era apertada, e Charles mal conseguia se mover de lado. — E está muito empoeirado.

— Não me importo com um pouco de pó. Você não vai conseguir fazer que eu desista, por isso pare de tentar impedir, e me dê espaço.

— Está bem. Pelo menos prenda os cabelos dentro de uma touca. Você não vai querer que as aranhas se enrosquem nos seus cachos.

Emma ficou paralisada.

— Tem aranhas aí?

— Sim, muitas. Aranhas gordas e pretas, magras e com pernas compridas...

— Tem certeza de que são aranhas?

Charles deu de ombros. Deveria ter se lembrado antes que Emma tinha pavor de aranhas.

— E tem muitas teias também. Você sabe como isso gruda no corpo da gente.

— Talvez seja melhor eu não entrar. Assim, caso você fique preso aí, poderei sair em busca de socorro.

Charles sorriu.

— Ótima idéia.

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—O que você pretende fazer, Charles? Não pode entrar nessa passagem sem saber aonde vai dar.

Emma tinha razão, ele precisava de um plano. Charles voltou para o quarto.

— Espero que essa não seja a sua melhor camisa. — Ele riu.

— Com certeza não é.

— Talvez fosse melhor jogar fora depois da sua exploração. Acho que não vai querer que o Sr. Henderson tenha um ataque.

— Talvez.—Charles tentou inutilmente remover um pouco da poeira.

— Agora, me diga aonde você acha que essa passagem vai dar. Acredita que pode haver uma saída em cada um dos cômodos da casa?

— Duvido. Isso deve ir do quarto do lorde até alguma saída secreta para fora da casa.

— E quanto ao fantasma que Nanny viu na sala de brinquedos?

— Sim. E ainda teve o princípio de incêndio no seu quarto. Parece-me que devem existir outras saídas — Charles comentou. — Acho que a única maneira de descobrir a resposta é fazendo uma exploração.

— Tem certeza de que quer entrar ali novamente?

— Vou examinar a alavanca para ver como funciona.

Ele abriu a porta, e Emma olhou de relance para a passagem escura e infestada de aranhas.

—Acho que descobri — disse Charles.—Tem uma alavanca do lado de dentro. Quando a porta se fecha, a alavanca trava, e quem está do lado de fora não consegue perceber que há uma passagem.

Ele ergueu a vela para iluminar o ambiente. Qualquer um que tivesse aberto a porta não podia ser mais alto do que ele nem mais corpulento.

— Feche a porta e deixe-me ver se consigo abrir daqui de dentro.

— Claro que não vou fazer isso — declarou Emma.

— Como poderei descobrir o mecanismo?

— Não sei. Só sei que esta porta ficará aberta. Se eu a fechar e você não conseguir abrir... Não, não posso nem imaginar isso.

— Então, o que você sugere?

— Sugiro dar uma olhada no quarto de brinquedos. Deve haver uma porta lá, pois foi onde Nanny viu o fantasma. Vou subir e chamar Isabelle, Claire e Prinny para fazerem bastante barulho e nos ajudarem a localizar a passagem. Enquanto isso, esta porta permanecerá aberta. Na verdade, mandaremos o sr. Henderson ficar vigiando, para não haver o risco de ser fechada novamente.

— Quem entraria aqui, meu amor? — Emma cruzou os braços.

— Algo muito estranho está acontecendo, e não sabemos quem é o responsável por tudo isso, Charles.

— Não sabemos? Aposto que Stockley é o culpado. Na verdade, vou colocar um criado para segui-lo. Não gostei do sujeito desde a primeira vez que o vi.

— Mas o Sr. Stockley é novo na vizinhança. Como ele pode saber sobre as passagens secretas?

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— Essa é uma boa pergunta. Agora, se me der licença... — Emma o segurou pelo braço.

— Chame o Sr. Henderson primeiro.

— Emma.

— Chame o Sr. Henderson primeiro ou eu grito e saio correndo pelo corredor.

Charles sorriu. Não conseguia imaginá-la tendo um ataque de birra, mas ela parecia estar falando sério.

— Vá chamar o Sr. Henderson, Charles.

— Esta bem, se insiste tanto.

Emma viu Charles desaparecer pela abertura na parede.

— Você cuidará para que ninguém feche a porta, não é mesmo? — ela perguntou novamente.

— Sim, pode deixar.

Emma verificou a área em busca de aranhas, então colocou a cabeça para dentro da passagem escura. Charles não tinha feito muito progresso ainda.

— Tome cuidado.

Ele olhou para trás e sorriu.

— Tomarei. E tão estreito aqui que mal posso me mover.

— Cuidado para não entalar!

—Você virá me salvar se isso acontecer, não virá? Enfrentará as aranhas?

— Com certeza mandarei alguém atrás de você. — Emma não queria nem imaginar Charles preso entre as paredes de Knightsdale. — Tente bater na parede.

— Por quê?

— Faça o que estou dizendo.

— Muito bem. Mas não tem muito espaço aqui para bater. — Charles bateu.

— Isso foi o suficiente. Deu para ouvir. Se ficar preso ou perdido, bata, e nós o encontraremos. Enviarei os homens à sua procura, se for preciso.

— Não sei se vai funcionar, Emma. Knightsdale tem centenas de anos. Não estou certo de que conseguiremos quebrar uma parede destas.

— Pare de reclamar e avance quanto puder. O Sr. Henderson ficará de guarda aqui, e eu esperarei você na sala de brinquedos. Não se perca.

— Está bem. Farei o possível.

Emma saiu da passagem limpando-se, com receio de alguma aranha.

— Cuide para que ninguém feche a porta, Sr. Henderson.

— Sim, Srta. Peterson. Não precisa se preocupar. Ninguém fechará a porta.

— Coisas estranhas têm acontecido, Sr. Henderson. Não podemos nos descuidar.

— Srta. Peterson, por favor. Não permitirei que aconteça qualquer coisa a milorde.

— Estou apenas um pouco nervosa. Não é todo dia que se encontra uma passagem secreta em um quarto.

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O Sr. Henderson sorriu.

— A senhorita tem razão. Agora, se me permite, sugiro que suba até a sala de brinquedos para se encontrar com milorde.

— Sim. Estou a caminho.

—E, por favor, faça que ele retorne imediatamente ao quarto — o Sr. Henderson disse quando Emma já ia sair. — Creio que ele precisará mudar de roupa.

Emma saiu em disparada pelo corredor. Até onde Charles já tinha chegado? Estaria perdido, preso? Não, claro que não. Era uma tola em se preocupar tanto. Fosse quem fosse que estivesse usando as passagens, não ficara entalado em nenhuma parte, portanto não havia razão para imaginar que Charles poderia ficar.

Prinny a recebeu na sala de brinquedos com seu latido agudo.

— Já o levei para passear esta manhã, Srta. Emma.

— Obrigada, Isabelle. Sinto muito que os cuidados com Prinny tenham sobrado para você. Foi falta minha.

— Não faz mal. Eu gosto de passear com ele.

Emma percebeu que Isabelle e Claire a fitavam com um interesse incomum.

— Dormiu bem, mamãe Emma?

Isabelle deu uma cotovelada em Claire. Emma corou. Talvez as meninas soubessem algo a respeito de suas atividades noturnas? Bem, ela não poderia responder a essa pergunta inocente sem parecer culpada, por isso resolveu ignorar.

—Meninas, vocês se lembram onde exatamente Nanny disse ter visto o fantasma?

— Logo ali, mamãe Emma. Tenho certeza de que foi perto da estante de livros.

— Acho que você tem razão, Claire. — Emma bateu contra a parede e não ouviu nada.

— O que está fazendo, Srta. Emma?

— Seu tio descobriu uma passagem secreta entre as paredes, Isabelle. Ele está explorando. Achamos que aqui tem uma saída.

— Passagem secreta! — Claire pulava, excitada, batendo palmas.

— A mocinha não irá pôr nem sequer um dedo lá dentro, lady Claire — Emma avisou. — Lá é escuro, sujo e cheio de aranhas.

— Eu gosto de aranhas. — Emma ficou boquiaberta.

— Gosta?

Claire assentiu, entusiasmada.

— Sim, eu... Oh, olhe para Prinny.

O cão estava farejando no rodapé. De repente, ele começou a latir e arranhar a parede com as patinhas dianteiras.

—O que foi, Prinny?—Emma se abaixou.—Charles! — Ela batia com força contra a parede.—Charles, você está aí? Quieto, Prinny! Não consigo ouvir nada. Charles!

— Srta. Emma — Isabelle disse —, se tio Charles quiser sair, é melhor nos afastarmos para dar espaço.

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— Sim. Você tem razão. — Emma recuou. — Claire, você poderia trazer Prinny também?

Agora havia espaço suficiente para a porta se abrir. Emma esperou. Nada. Prinny latiu e tentava escapar, mas Claire o segurava.

—Vocês não acham que ele já deveria ter chegado?—Emma perguntou como para si mesma.

— Não passou muito tempo ainda, mamãe Emma. — Mas, para Emma, parecia uma eternidade.

— Bem, segure Prinny direitinho. Quando a porta se abrir, ele pode sair correndo e, se entrar na passagem secreta, talvez nunca mais o encontremos.

— Tem toda razão — uma voz masculina respondeu.

— Charles!—Uma parte da parede se abriu e Charles surgiu sorrindo, espalhando poeira e com o rosto e os cabelos cobertos de teias de aranha. Ele estava maravilhoso. Emma queria se atirar em seus braços.

Charles abriu os braços.

— Que tal um beijinho, Emma? Você vai permitir que um pouco de sujeira a impeça?

— Charles! Quero dizer... milorde. — Ela apontou para Isabelle e Claire, cujos olhinhos estavam atentos.

— O senhor vai beijar a Srta. Emma, titio?

— Vou!

— Não vai, não!

— Mas a senhorita queria beijar papai Charles, não queria, mamãe Emma?

Emma abriu a boca, porém não poderia mentir. Sentiu o rubor subindo pelas faces.

— Funcionou! — Claire saltitava, soltando Prinny.—Isabelle, funcionou!

— Prinny! — Emma gritou com o cachorro, mas Charles o apanhou antes que ele desaparecesse através da parede.

—Acho melhor fecharmos a passagem.—Ele fechou a porta.

— Agora conte o que funcionou, Claire.

— Claire — Isabelle a reprimiu —, talvez seja melhor você não...

Mas a menina não poderia ser detida. Ela dançava de alegria.

— Isabelle é muito esperta. Ela disse que precisávamos dar um jeito de colocar vocês dois sozinhos, por isso escondemos a escova de cabelos de mamãe Emma no quarto de papai Charles. Mas isso não funcionou, então escondemos a camisola dela também. E aí funcionou! Vocês vão se casar agora?

— Claire, só porque tio Charles queria dar um beijo na Srta. Emma, não quer dizer que eles vão se casar.

—Bem, Isabelle — Charles interveio —, espero que você não saia beijando um homem com quem não pretenda se casar.

— Não, mas...—Isabelle arrumou os cabelos atrás das orelhas. — Então o senhor vai mesmo se casar com a Srta. Emma, tio?

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— Sim, eu vou. E você e Claire vão morar conosco e vão ser nossas filhas mais velhas. O que você acha disso?

Isabelle assentiu. Mordeu o lábio inferior, piscou, então abriu os braços e pulou no pescoço de Charles.

— Sim — ela soluçava. — Sim, papai, eu adoraria muito!

Charles fez as meninas prometerem guardar segredo sobre o noivado com Emma até à hora do baile. Não queria que todos ficassem sabendo antes de poder contar a tia Bea e ao pai de Emma. Eles fariam o anúncio formal no baile, logo mais, à noite.

— Demorou uma eternidade para você sair da parede — Emma disse quando voltavam para o quarto de Charles. — Acho que você já estava tentando abrir fazia algum tempo, porque Prinny começou a latir como um louco.

— Sim, eu ouvi. Levei alguns minutos para descobrir como funcionava o mecanismo da trava. Depois que descobri, percebi como era fácil.

— Notei que a porta não rangeu como a do meu quarto, ao abrir — disse Emma.

— Sim. Acho que o visitante misterioso deve estar usando tranqüilamente essa passagem depois que Nanny, você e as meninas se mudaram para o andar de baixo.

— Quantas portas você acha que podem existir?

— Não faço idéia. Por via das dúvidas, vou colocar um criado no encalço de Stockley.

— Mas, e se ele não for o culpado? E se for, o que pode estar querendo?

— Não sei. Pelo menos não teremos muito mais com que nos preocupar depois de anunciarmos o nosso noivado, pois a maioria dos convidados irá arrumar as malas e sair em busca de outro nobre disponível. Além do mais, uma coisa é certa: a raposa aqui já foi capturada.

— Bom dia, Charles, Emma.—Beatrice escolheu o exato momento em que os dois passavam para sair de seu quarto. — O que você estava dizendo sobre raposa capturada?

Charles viu o olhar da tia pousando na mão direita de Emma. Ele podia apostar que Beatrice era capaz de enxergar o anel de noivado dos Knightsdale a quilômetros de distância.

— Tia, eu estava justamente querendo falar com a senhora.

— Por favor, entrem e sentem-se.

A saleta de estar que antecedia o quarto de Beatrice era decorada com agradáveis tons de verde que contrastavam com a enorme gata alaranjada deitada no parapeito da janela. Bess miou, espreguiçou-se e, em seguida, retomou o cochilo como se nada tivesse acontecido. Beatrice olhou de novo para a mão de Emma.

—Como a senhora já deve ter notado, tia, Emma está usando o anel de noivado dos Knightsdale.

— Sim, eu percebi. E adorei. — Ela abraçou Emma e em seguida o sobrinho.

—Quando faremos o anúncio?—perguntou.—Será no baile de logo mais?

— Sim. O reverendo Peterson virá para o jantar. Eu já tinha a permissão dele para fazer a corte a Emma, é claro.

—Maravilhoso! E vocês se casarão no ano que vem na Igreja de St. George, na praça Hanover. — Beatrice deu um leve saltinho que lembrou de longe a sobrinha Claire. — Será o maior evento da temporada!

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— Sinto muito desapontá-la, tia, mas isso não será possível. Nós nos casaremos em Knightsdale assim que correrem os proclamas.

Beatrice voltou-se para Emma.

— Você tem certeza de que não quer um belo casamento em Londres?

— Na verdade, lady Beatrice, eu ficaria muito mais feliz com um casamento celebrado por meu pai aqui em Knightsdale. Nunca estive em Londres. Acho que ficaria intimidada.

— Bem, se pensa assim... Mas casar com tanta pressa...

— Já tenho vinte e seis anos. Não há motivos para adiar essa união.

— Sim. — Beatrice lançou um olhar de reprovação para Charles. Ele ergueu uma sobrancelha e levou as mãos para trás. Ela hesitou, mas então prosseguiu: — Emma, sei que não tem uma mãe para aconselhá-la, por isso não deve entender a repercussão que um casamento apressado pode ter. O ponto é que, se casar-se com tanta pressa, as pessoas vão comentar.

Emma ficou vermelha como o vestido que Beatrice usava.

— Bem, nesse caso... Creio que podemos esperar até o mês que vem para nos casarmos.

Charles sorriu.

— Acho que será melhor. — Ele se moveu, distanciando-se da porta. — Mudando de assunto, tia... Acontecimentos estranhos têm ocorrido aqui e eu desconfio que o Sr. Stockley pode estar envolvido.

Beatrice meneou a cabeça.

— Confesso que tenho andado preocupada com outro assunto e não percebi nada. — Ela abriu um sorriso largo. — Assunto que já foi resolvido, para minha grande satisfação. Quanto ao Sr. Stockley, acho que ele deve ter alguma ligação com seu tio-avô Randall. Há dias que venho tentando me lembrar, mas não consigo.

— Tio Randall?—Charles se inclinou para frente. Ele nunca tinha falado sobre o tio, exceto com Paul, quando os dois brincavam de pirata. Havia até tentado uma vez, mas a reação abrupta do pai à simples pergunta o desencorajara a prosseguir no assunto. — É verdade que Randall era um pirata, tia?

— Acho que ele preferia ser chamado de "corsário", Charles. Mas, sim, eu acho que era. Randall saiu para o mar quando era ainda um menino.

— Da última vez que tio Randall nos visitou eu estava com sete anos — disse Charles. — Ele morreu pouco tempo depois. Bebeu muito numa noite ruim e saiu andando, sem perceber que estava no fim da plataforma do cais.

Beatrice zombou.

— Essa é a versão de seu pai.

— E qual é a outra? Eu nunca ouvi.

— Nem eu. — A tia encolheu os ombros. — Apenas jamais acreditei nessa. Randall bebia, é claro. Às vezes passava do limite. Mas agüentava. Não acredito que estivesse tão bêbado a ponto de não saber para onde estava indo. Eu acho que ele teve uma ajudazinha lá no cais.

— Acredita que tio Randall foi assassinado? — Charles não conseguiu esconder o espanto na voz. — A senhora contou a meu pai sobre essa sua suspeita?

— É claro que sim. Mas George riu de mim. Ele ficou feliz em se ver livre de Randall. — Beatrice voltou-se para Emma: — Meu irmão e meu tio nunca se deram bem. Nós crescemos todos

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juntos. Randall tinha a mesma idade de George. Meu pai morreu quando eu tinha dois anos e George quatro, e fomos criados por nosso avô. Minha mãe não ficou muito feliz com o arranjo. A segunda esposa de meu avô, a mãe de Randall, era um ou dois anos mais nova do que minha mãe. Criou-se uma situação desconfortável para todos.

Bess pulou no colo de Beatrice, que a acariciou.

— Randall insistia que George o chamasse de tio Randall, acho que justamente porque George não gostava. Randall era muito brincalhão, e minha mãe não tinha senso de humor. Quando George herdou o título, tudo piorou. Randall não demonstrava o devido respeito. Eu o adorava, mas confesso que foi um alívio ele ter saído para o mar.

— Percebi que meu pai não ficou muito feliz quando tio Randall veio nos visitar—Charles comentou —, mas não sabia sobre nada disso. Meu pai nunca foi de demonstrar afeto.

— Exato. George era seco como um galho velho — a tia completou. — Eu sempre desejei que Randall, e não George, fosse meu irmão.

— Mesmo assim, não posso acreditar que meu pai tenha ficado feliz em saber que o tio havia sido assassinado.

— É verdade. George teria mandado investigar se tivesse imaginado a possibilidade de um assassinato, pois não seria um fim adequado para um Draysmith. Mas um acidente trágico pode acontecer com qualquer um, e por isso George aceitou a fatalidade.

— Mas a senhora não — concluiu Emma.

— Não. — Beatrice balançou a cabeça com veemência. — Não mesmo.

Ela acariciou a gata em silêncio durante alguns instantes, para então acrescentar:

— Randall estava preocupado na última vez que esteve aqui, tenho certeza. Ele estava bebendo muito.

—Vivia bêbado a maior parte do tempo — Charles completou.

— É verdade. E aquilo não era comum. Havia alguma coisa o incomodando. Ele até brincou sobre morrer. Bem, eu pensei que fosse brincadeira, mas então Randall chamou aquele escultor esquisito para fazer o seu busto. Disse que não iria viver para sempre e que queria ter certeza de que o seu lugar estava garantido na linhagem dos Draysmith.

A voz de Beatrice de repente estremeceu.

— Tia, não precisa continuar, se isso lhe traz recordações ruins.

Beatrice secou os olhos com um lencinho. Pela primeira vez ela aparentou seus sessenta anos.

— Não, eu quero contar, Charles. Não penso muito em Randall, mas quando me lembro dele fico triste. É a incerteza que me incomoda. Sinto que uma injustiça aconteceu, que a alma de Randall não descansa em paz.

— A senhora não acha que o fantasma de tio Randall tem rondado Knightsdale?

Charles ficou satisfeito que Emma tivesse feito a pergunta. Ele esperava que a tia não acreditasse que Knightsdale fosse de fato assombrada.

— É claro que não, querida. Eu estava falando de maneira figurativa. — Ela sorriu e meneou a cabeça. — Se tem algum espírito vagando em Knightsdale, só pode ser o de George. Bem, ele odiava aquele busto de Randall. Na opinião de George, meu tio deveria ter mandado chamar um artista de Londres, e não um desconhecido local. Mas perdeu a batalha; sempre perdia quando discutia com Randall.

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Charles decidiu que já era tempo de trazer a conversa de volta ao ponto central.

— Mas... e quanto a Stockley, tia?

— Tenho quase certeza de que Randall comentou algo a respeito desse homem, a última vez que esteve aqui. Mas não consigo me lembrar o que foi.

— Mas, lady Beatrice, o Sr. Stockley não tem idade suficiente para ter algo a ver com a morte de lorde Randall — argumentou Emma.

— É claro que não. Eu não quis dizer que seja este Sr. Stockley. Acho que pode ser o pai, ou outro parente dele.

— Não creio que o Sr. Stockley tenha comentado que a família teve algum negócio com barcos — Emma disse.—Talvez lorde Randall tenha trabalhado em um dos barcos da família Stockley.

— Duvido que a família de Stockley tenha possuído um barco. Ele não tem cara de que vem de família rica.

— E eu tenho certeza de que nunca vi Stockley antes. — Charles meneou a cabeça, concordando com a tia.

Beatrice franziu a testa e parou de acariciar Bess.

— Eu gostaria de me lembrar de algo mais.

— Eu gostaria de chutar Stockley da minha casa. — Charles não queria que um sujeito de caráter suspeito permanecesse sob seu teto. Além disso, havia ainda a possibilidade de ele ter entrado no quarto de Emma.

— Tia Bea, a senhora sabe aonde a passagem secreta de Knightsdale vai dar?

— Passagem secreta? Pensei que George a tivesse mandado fechar depois que herdou o título.

— Então a senhora sabia sobre isso?

— É claro, Charles. As passagens entre as paredes não eram segredo para ninguém. Nós as usávamos para fugir dos estudos.

— Eu nunca soube de nada. Pensei que fosse apenas outra lorota de bêbado de tio Randall.

Beatrice riu.

— Como eu disse, pensei que George tivesse mandado fechar, pois elas não combinavam com a noção de decência de seu pai. Mas por que você pergunta?

— Porque alguém está usando as passagens novamente.

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Alguém estava usando as passagens secretas? Emma ponderou a questão enquanto Betty, a criada de lady Elizabeth, arrumava seu cabelo para o baile. Charles tinha certeza de que era o Sr. Stockley, mas ele não gostava do homem. Bem, ela também não gostava do sujeito, porém isso não significava que Stockley estivesse xeretando pelas paredes de Knightsdale. Na verdade, seu

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comportamento era estranho, sempre curioso e fazendo muitas perguntas sobre os objetos de arte da casa. Parecia até que estava à procura de algo específico. Mas o quê?

Se ao menos lady Beatrice pudesse se lembrar do que lorde Randall tinha dito anos antes... Emma suspirou.

— A senhorita não gostou do penteado?

— Oh, não, Betty. Está bom. — Emma se olhou no espelho e ficou surpresa com o resultado. — Oh, ficou maravilhoso!

— Obrigada. Bem, agora eu preciso ir, senhorita. Ainda tenho de arrumar a Srta. Margaret e lady Elizabeth.

— Pode ir, Betty. Você conseguiu fazer mágica nos meus cabelos. Obrigada.

Emma continuou se admirando depois que Betty saiu. Estava mais bonita do que jamais poderia esperar. Betty domara os cachos de modo que ficassem elegantes e... sedutores. Como se tivessem sido presos no alto da cabeça casualmente, apenas esperando por um homem para puxar alguns grampos e soltá-los sobre os seios.

Emma corou só de pensar no homem que ela queria que fizesse isso. E embora o vestido de baile de cetim azul já tivesse quatro anos, parecia melhor do que ela imaginara. Charles iria gostar dele? Ficaria tentado para ver o que estava saltando do decote ousado?

Emma fechou os olhos e esperou que sim. Adoraria sentir as mãos grandes e fortes tocando sua pele, seus seios. E imaginou os dedos deslizando, os lábios seguindo-os, traçando uma linha que descia para... Seus mamilos enrijeceram e todo seu corpo parecia arder.

— Que modo adorável de me saudar, querida!

Emma sentiu o hálito de Charles em seu pescoço e os dedos mergulhando no decote para tocar os mamilos. Mas o que ela queria mesmo era que os lábios descessem. Inclinou a cabeça para trás para olhar. A calça de Charles estava bem na altura do seu rosto... a calça apertada e reveladora. Emma sorriu e o tocou.

Charles inspirou e recuou um passo.

— Que ousada, meu amor!

— Me desculpe...

— Nada disso, querida. Adoro a sua ousadia. Mas, infelizmente, neste exato momento não podemos ver até onde ela vai nos levar. Temos de ir ao baile e precisamos estar apresentáveis quando descermos. Sem marcas de amassado ou manchas suspeitas. — Ele sorriu. — Mas depois do baile, sinta-se à vontade para liberar toda a sua ousadia. Adorarei dar algumas sugestões.

Charles mordiscou-lhe o lóbulo da orelha.

— Você irá para o meu quarto esta noite, Emma? Para fazer amor comigo na cama dos ancestrais dos Draysmith?

— Ah, sim. — Novamente ela foi tomada pelo desejo, o que dificultou seu raciocínio. — Por que temos de ir ao baile?

— Porque é o nosso baile de noivado. Porque as pessoas ficarão escandalizadas se eu, o anfitrião, não aparecer. E porque preciso contar a seu pai que vamos nos casar. Acho que ele gostaria de saber.

— Sim. — Emma respirou fundo, tentando pensar em algo que não fosse Charles e a parte mágica do corpo que ele escondia sob a calça.

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— Emma.

— Hum? — Ela percebeu o tom sério.

— A Sra. Graham também estará presente.

— Oh. — Emma esperou até que a mistura de emoções se desfizesse ao ouvir o nome da Sra. Graham.

Aparentemente a luxúria tinha sido substituída por outros sentimentos.

— Seu pai iria gostar muito se você conseguisse receber bem a Sra. Graham. Na verdade, acho que adoraria receber a sua bênção, querida. Ou pelo menos a sua compreensão, no casamento deles.

— Está bem. — Emma se perguntava se toda a antiga mágoa não poderia voltar quando se encontrasse cara a cara com a Sra. Graham.

Charles certamente preferiria tirar o belo vestido de Emma, deitar-se com ela na cama e penetrar nas delícias que aquele corpo tinha a oferecer. Poderia ter feito isso se não soubesse do imenso escândalo que iria causar. E tudo que ele queria era falar com o reverendo Peterson e publicar os proclamas quanto antes. Seu anel de noivado no dedo de Emma parecia ser o suficiente para permitir que as atividades no quarto continuassem, mas era melhor colocar a aliança de casamento antes que seu herdeiro começasse a crescer no ventre de Emma. Isso se fosse possível, pois não tinha certeza se conseguiria continuar se segurando por muito tempo mais.

Emma estava maravilhosa! Quando Charles entrou no quarto e a viu de olhos fechados, a cabeça inclinada para trás, os seios empinados, os adoráveis mamilos saltados contra o cetim... E então a mão delicada o tocou.

Foi difícil resistir ao desejo de levá-la para a cama. Aquele vestido azul era obsceno, capaz de instigar a imaginação de um homem. Charles desviou os pensamentos dos lençóis e da pele alva e macia.

— Emma, na verdade eu vim aqui com um propósito. — Ele levou a mão ao bolso do paletó e tirou um colar. — Isto combina com o seu anel. Tem também uma pulseira e uma tiara, mas acho que hoje não se faz necessário.

Colocou as safiras em torno do pescoço de Emma e prendeu o fecho.

— Oh, Charles! É lindo, mas eu não posso aceitar.

— É claro que pode. Você será minha esposa, a marquesa. — Se alguém tivesse dito em Londres que um dia ele iria dizer "minha esposa" e "marquesa" sem blasfemar, chamaria o sujeito de maluco. Era espantoso como as coisas podiam mudar em tão pouco tempo. — Se servir de consolo, não estou dando a você de fato. Estas jóias pertencem ao título. Um dia você terá de entregá-las à esposa do nosso filho.

Emma olhava encantada para Charles.

— O que você disse despertou idéias tentadoras.

— É melhor deixar essas idéias para mais tarde. Agora, apenas sorria e use o colar.—Ele a abraçou, tomando cuidado para não amassar o vestido, e seus lábios se encontraram num simples roçar. — Vamos ver se seu pai já chegou.

Emma descobriu que nela havia lugar para outros sentimentos além de desejo. Parou do lado de fora da biblioteca e segurou com firmeza o braço de Charles. Euforia, preocupação, embaraço, arrependimento e amor... tudo se misturava em seu coração.

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— Obrigada por trazer papai à biblioteca. Eu não poderia ter essa conversa na frente de outras pessoas.

— A Sra. Graham deve estar com ele. Você quer que eu peça para ela sair?

— Sim. Não. Oh, não sei! — Emma contraiu os lábios. — Já não sei mais nada...

— Não? Bem, sugiro então que entremos.

Charles abriu a porta e Emma entrou junto com ele. Seu pai se encontrava sozinho, parado ao lado da escrivaninha. Parecia... solitário e um pouco triste. Mais velho, os ombros caídos. Ela notou que os cabelos estavam mais grisalhos.

Ele se virou e sorriu.

— Emma. Lorde Knightsdale.

—Por favor, me chame de Charles. O senhor será meu sogro. Não posso permitir que continue me chamando de milorde o tempo todo.

Emma percebeu que o rosto do pai se iluminou quando olhou para ela.

— Emma? Você vai se casar com Charles?

— Sim, papai, eu vou. — Se seus pés não estivessem grudados ao chão, ela poderia voar no pescoço do pai. Ele certamente esperava por isso. — Onde está a Sra. Graham?

— Esperando em outra sala. Ela pensou... bem, ela não faz parte da família.

— Mas deveria fazer, papai.

A fisionomia do reverendo se transformou.

— O quê?

— A Sra. Graham deveria fazer parte da família, papai, se o senhor a ama. O senhor a ama?

— Bem. — O reverendo respirou fundo. — Sim, eu a amo, mas nenhum de nós queria... Você é minha filha, Emma. Devo ser leal a você antes de tudo.

— Não.—Emma mal podia acreditar no que estava dizendo. Não estava apenas proferindo palavras vazias para libertar o pai. — Não, eu acho que o senhor deve ser leal consigo mesmo antes de tudo, papai. Pelo menos neste caso. E quanto à Sra. Graham, Harriet... Meg acha que o senhor deveria se casar com Harriet. Ela percebeu isso primeiro, que o senhor está mais sorridente, mais feliz.

— Emma...

— Que o senhor está interessado em algo mais que não sejam seus livros. E acho que está certo. Eu deveria ter visto isso antes, também, mas fui por demais egoísta e sinto muito por isso. Não era minha intenção impedi-lo de seguir com sua vida.

As lágrimas desciam pelo rosto de Emma. O nó no estômago se desfez quando seu pai abriu os braços. Finalmente seus pés se moveram e ela correu para ele e o abraçou com ternura. E quando ergueu o olhar, percebeu que o pai também chorava.

— Que... notícia maravilhosa, Srta. Peterson!—Lady Oldston engasgou com as palavras.

— É mesmo — a Sra. Pelham ecoou. — Eu nunca imaginaria... Mas, então, vocês são amigos de infância?

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— A antiga amizade dever trazer um certo conforto à relação, suponho.—Lady Oldston sorriu ao enfatizar a palavra "antiga".

As duas senhoras se entreolharam. Pelo menos as damas da vizinhança estavam felizes com o noivado de Charles.

—Muito bem—disse a Sra. Begley. — Estou feliz pelo casal.

— Estamos esperando por um herdeiro em nove meses — comentou Rachel Farthington.

— Ou antes! — Esther deu uma cotovelada em Rachel, e as gêmeas riram em cumplicidade.

— Comportem-se, damas, por favor — a Sra. Begley avisou. Elas olharam para Charles e sorriram. As sobrancelhas do lorde se ergueram, mas ele sorriu de volta.

— Boa noite, senhoras. Se puderem dar licença a Emma... Nós precisamos abrir o baile.

— Certamente.

— Vá, querida.

— Ele fica tão bem com essa calça! — O comentário de Esther quase foi abafado pelas primeiras notas tocadas pela orquestra.

— Acho que estou ruborizado — Charles confessou, conduzindo Emma à pista de dança.

— Está mesmo. — Ela também corou ao se lembrar da maravilha que aquela calça encerrava.

— Hum... Você está com um adorável tom de rosa no rosto, querida. Vai me contar o motivo do rubor?

— Não. Não posso.

— Mas eu vou lhe dizer o que estou pensando. — Charles girou com Emma em seus braços.—Estou pensando em quanto você está linda nesse vestido... e em como ficará ainda melhor quando estiver sem ele.

— Charles!

— Estou imaginando você deitada nua na minha cama hoje à noite.

— Charles! — Emma deve ter exclamado alto, pois o duque de Alvord olhou para ela, e a duquesa sorriu.

— Sua pele clara sobre os meus lençóis, seus belos cabelos esparramados no meu travesseiro...

Emma olhou ao redor e lhe pareceu que ninguém tinha escutado as palavras escandalosas de Charles.

— ...seus seios macios, com os mamilos enrijecidos, implorando pela minha boca...

Emma sentiu os joelhos fraquejarem e um calor espalhar-se por todo seu corpo.

— ...a sua cintura, seus quadris, aquele ninho aconchegante de pêlos que você tem entre as coxas. Ah, aquelas belas pernas brancas e macias abertas, convidando, provocando...

— Charles... — Emma sussurrou, mal conseguindo falar. Era muito tentador ouvi-lo dizer tais coisas bem no meio do salão de baile, onde qualquer um poderia escutar.

— Quero enterrar meu rosto entre as suas coxas, para provar a sua...

— Charles, se você não parar agora mesmo, eu... eu... Bem, não sei o que farei, mas isso me parece muito embaraçoso.

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— É mesmo? Então soa promissor.

— Charles...

— Está certo. Prometo me comportar até mais tarde, quando tiver você na minha cama. — Quando a música terminou, ele aproximou os lábios da orelha de Emma.—Então, prometa que irá perder toda a compostura quando estivermos a sós no meu quarto.

— Oh! — Ela esperava que seu rosto não estivesse tão vermelho quanto o sentia.

Emma dançou com o conde de Westbrooke e com o duque de Alvord. Então Stockley a encontrou.

— Parabéns, Srta. Peterson. A senhorita tirou a sorte grande, não foi?

— Como disse?

— Agora sei por que a senhorita nunca estava no seu quarto. Vivia ocupada no quarto de lorde Knightsdale.

— O senhor está me insultando! — Stockley riu.

— Peço-lhe desculpas. Não tive a intenção. Todos devemos ficar de olho nas oportunidades que aparecem, não é mesmo? — Os olhos dele desceram para o pescoço de Emma. — Belo colar.

Ele olhava sem disfarçar, e teria sido embaraçoso se não fosse evidente que seu interesse era dirigido à jóia, e não ao colo que a sustentava.

— Obrigada.

— Foi presente de noivado?

— É parte das jóias dos Knightsdale.

— Sei.

A música recomeçou. Todas as vezes que Stockley se aproximava de Emma durante a quadrilha, seus olhos se fixavam nas safiras de Knightsdale. O que era muito estranho. Emma respirou aliviada quando a música terminou. Já estava começando a se sentir como uma vitrine de museu, apesar de duvidar que qualquer outro artefato pudesse despertar tanto o interesse de Stockley quanto o colar de safira.

Ela estava se abanando perto de uma das janelas que davam para o jardim, quando um criado lhe entregou um bilhete.

— Obrigada.—Emma apanhou o papel dobrado da bandeja.

Não reconheceu a caligrafia, mas não estava prestando tanta atenção nisso enquanto lia o bilhete. “Claire está precisando da senhorita no quarto de brinquedos. Venha depressa”.

Por que no quarto de brinquedos? Claire não deveria ter ido para lá a uma hora daquelas. O que poderia ser? Onde estava Nanny? Emma amassou o papel. Não importava. Se Claire a queria, ela precisava ir. Talvez a menina estivesse apenas querendo atenção ou um beijinho de boa-noite. Emma daria uma escapulida e veria o que estava acontecendo. Seria apenas um pouquinho. Ninguém iria perceber sua ausência. Ela correu escada acima.

— Claire? Claire, é mamãe Emma. Onde você está?

Mas o quarto estava quieto e escuro. Muito quieto. Havia algo errado. Emma prendeu a respiração. Deveria ter pedido a Charles que a acompanhasse. Pelo menos deveria ter dado uma passada no quarto de Nanny antes de subir. Emma se virou para ir embora.

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—Aonde pensa que vai? — A mão de Stockley pousou sobre a boca de Emma. Com o outro braço, segurou-a próxima ao corpo dele. Para um homem franzino, era muito forte.

— Tenho uma faca, Srta. Peterson.

Emma sentiu algo pontudo em seu lado esquerdo, logo abaixo do seio.

— E a usarei no primeiro pio que a senhorita der. Balance a cabeça se me entendeu.

Emma balançou a cabeça.

— Ótimo. — Stockley a soltou, porém manteve a faca no mesmo lugar. — Agora, com muito cuidado, tire o seu colar.

Ela apalpou a jóia.

— Era o senhor quem estava usando as passagens secretas?

— Sim, embora elas não tenham me ajudado muito. Vamos rápido.

— Estou tentando tirar. Mas não está fácil. — As mãos de Emma estavam muito trêmulas para conseguir abrir o fecho. — Claire está aqui?

— Claire?

— Recebi o recado...

— Aquilo foi somente para atraí-la. Até onde sei, a sua querida Claire está dormindo. Tire logo esse colar.

Emma sentiu a faca pressionando com mais força. Respirou fundo, fechou os olhos e se concentrou. Finalmente conseguiu abrir o fecho. No mesmo instante, Stockley agarrou o colar.

—Agora me conte onde estão as outras peças dos Knightsdale. — Ele acompanhou a pergunta com outra espetada de faca. — Onde fica o cofre?

— Eu não sei. Charles estava com o colar no bolso quando me deu. Nunca vi nenhum cofre.

—Hum. Acho que terei de perguntar a ele. — Stockley torceu o braço de Emma para trás, mantendo a faca no mesmo local.

— Penso que teremos uma conversa interessante. — Ela tentou não entrar em pânico.

— Não estou entendendo. Se o senhor é apenas um ladrão... — Emma ofegou ao sentir um puxão no braço.

—Não sou apenas um ladrão. Por sinal, não sou ladrão. Esse colar me pertence.

— O colar?

— Não apenas. — Ele a levou para os fundos da sala de brinquedos. —As outras peças também. Os brincos e os broches. Os anéis. A tiara. Não consigo encontrá-los. Já procurei por toda parte. Sei que devem estar aqui. Farei com que Knightsdale me diga onde estão. Mostrarei a ele o colar e direi que não verá a senhorita novamente até que me entregue às jóias. Acho que Knightsdale falará rapidinho. Já vi como ele olha para a senhorita.

Emma tentou diminuir o passo. Para onde o Sr. Stockley a estava levando?

— Ainda não entendo. O senhor está dizendo que existem jóias escondidas em Knightsdale?

— Sim. Randall as roubou de meu pai.

— Tem certeza...

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Emma olhou com o canto dos olhos para o candelabro sobre a estante de livros. Será que ela conseguiria? Stockley, porém, deu outro puxão em seu braço.

— Nem pense nisso. Eu preferia não ter de matá-la, mas, se for necessário, o farei. Já matei antes, portanto não pense que não tenho coragem para fazer isso.

Stockley empurrou a cadeira pesada que escondia a porta da passagem secreta.

— O senhor não pode ter matado lorde Randall. Era uma criança na época.

Ele empurrou Emma contra a parede, segurando-a com o peso do próprio corpo, enquanto com a mão esquerda tateava em busca da abertura.

— É claro que não o matei. Foi meu pai.

Emma sentiu uma onda de náusea. Stockley teria matado o homem que Charles encarregara de segui-lo?

— O senhor matou William?

— O lacaio? Não, eu apenas o pus fora de combate. Os homens, especialmente os grandalhões como William, costumam subestimar minha agilidade e força. Ele está bem trancado no meu armário.

A porta da passagem secreta se abriu. Emma olhou para a sujeira, a escuridão, a passagem cheia de teias de aranha. Stockley não estava pensando em mandá-la entrar ali, ou será que estava?

— Eu matei o irmão do atual marquês, é claro, e a esposa e os criados. Paguei para Atworthy segui-los. Ele me disse que eles tinham levado as jóias para a Itália. Desmontei a carruagem, procurei nas malas e nos corpos. Atworthy tinha mentido. Ele queria roubar as jóias sozinho. E admitiu isso antes de eu o furar com um espeto.

A faca de Stockley cutucou Emma novamente. Dessa vez ela teve certeza de que estava sangrando. Ele a empurrou para dentro da passagem escura.

—Espero que não tenha medo de escuro, Srta. Peterson. Pois não pretendo lhe deixar uma vela.

— Mas o senhor não pode...

— Ah, posso, sim!

Stockley fechou a porta sem piedade. Emma ouviu o ruído da cadeira pesada sendo arrastada contra a porta novamente. Ela mordeu o lábio inferior. Não daria a Stockley a satisfação de ouvi-la gritar.

Onde estaria Emma? Charles já tinha procurado em todo o salão de baile. Como pudera perdê-la de vista?

— Tia, a senhora viu Emma?

— Não. Talvez ela esteja na toalete.

Charles assentiu e saiu para cumprir sua função de anfitrião. Tirou a Srta. Russell para dançar, porém passou a maior parte da dança olhando em torno do salão, em busca de Emma. Com certeza nenhuma mulher permaneceria mais de trinta minutos na toalete.

Ele também não vira Stockley em parte alguma. Droga! Mas William estava de olho no sujeito, então não havia com que se preocupar. O lacaio era boxeador amador. Certamente daria conta do fracote Sr. Stockley. No fim da dança, Charles deixou a Srta. Russell em companhia das

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gêmeas Farthington e saiu em busca da duquesa de Alvord. Ele tinha pedido a Sarah que o ajudasse a procurar Emma. Sarah estava conversando com o marido e Robbie.

— Ah, o noivo mais recente. — James sorriu. — Meus parabéns, Charles. Sou o primeiro a recomendar o casamento.

Robbie revirou os olhos.

— Acho que terei de arranjar novos amigos. Os dois estão se transformando em verdadeiros chatos.

— Talvez você devesse considerar a possibilidade de se juntar a nós — James o provocou.

Robbie balançou a cabeça.

— Eu não. Sou jovem demais para cair nessa armadilha. — E riu.—Onde está Emma, Charles? Estou surpreso de não vê-la a seu lado.

— Eu estava pensando o mesmo. Nenhum de vocês a viu?

— Não. — Sarah franziu o cenho. — Você gostaria que eu desse uma olhada na sala de descanso?

— Por favor.

— Está preocupado que algo possa ter acontecido a Emma, Charles? — James perguntou assim que Sarah se afastou.

— Não. Bem, para dizer a verdade, sim. Não estou vendo Stockley também. — Charles lembrou-se que William estava no encalço do sujeito, mas isso não bastou para acalmá-lo.

— Não pode estar pensado que Emma preferiu Stockley a você, não é mesmo? — Robbie pegou uma taça de champanhe da bandeja de um garçom que passava. — Ela é uma mulher inteligente.

— Não estou pensando isso.

— Acha que Stockley representa algum tipo de ameaça? — O tom de James era grave.

— Talvez. — Charles tinha certeza de que James estava pensando em seu primo, Richard, que havia raptado e quase estuprado Sarah no último verão. — Claro que não se compara ao que você enfrentou, James. Eu apenas não gosto do sujeito.

— Porém é óbvio que algo mais está acontecendo e que você não quer nos contar.

Charles deu de ombros.

— Bem... aconteceram alguns fatos estranhos.

— Fatos estranhos? — James arqueou as sobrancelhas.

— Sim. Alguém tem usado as passagens secretas de Knightsdale.

Robbie engasgou com o champanhe.

— Eu não sabia que Knightsdale tinha passagens secretas.

— Nem eu — disse Charles. — Por isso, seja lá quem for que as estiver usando sabe mais do que eu.

—Bem, isso não me surpreende.—Robbie tomou outro gole. — Tanto seu pai quanto seu irmão sempre o mantiveram de lado.

— Para ser sincero, nunca me interessei por Knightsdale. — Charles sentiu uma batida no braço e, ao se virar, deparou com Sarah. Ela não encontrara Emma.

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— Sinto muito, Charles, mas não a vi. Perguntei a um criado. Ele me disse que Emma recebeu um bilhete e saiu há uma ou duas horas.

— Droga! Desculpe, Sarah.

Charles não gostava da idéia de Emma e Stockley estarem desaparecidos. Quem teria enviado o bilhete a Emma? Ele sentiu a mão de James em seu ombro.

— Podemos ajudar em alguma coisa, Charles? Robbie e eu podemos sair à procura de Emma.

— Ou de Stockley — Robbie completou.

— Não. Provavelmente é apenas uma coincidência que nenhum dos dois esteja por aqui. Creio que uma das minhas sobrinhas tenha mandado chamar Emma. Vou subir para verificar. Tenho certeza de que não aconteceu nada de preocupante.

— Está certo — James disse. — Mas se você não voltar em meia hora, Robbie e eu subiremos à sua procura.

— Eu voltarei. Mas, caso não tenha voltado, ficarei feliz em receber a ajuda dos dois.

Charles tentou andar calmamente pelo salão, pois não queria chamar a atenção de ninguém e muito menos causar tumulto. Mas assim que saiu pela porta, apressou o passo. Quando chegou à escadaria, já estava correndo e subiu os degraus de dois em dois. Ao pôr os pés na galeria principal, ele parou. Havia uma pistola apontada contra seu peito. Stockley sorriu.

— Era o homem que eu estava procurando — ele disse.

Emma contou lentamente até dez, então tateou na escuridão em busca da trava que Charles descrevera. Ele tinha dito que ficava mais abaixo, mas Charles era bem mais alto do que ela. Onde estaria a tal trava?

Algo rastejou pela sua mão. Emma gritou e pulou para trás, batendo a cabeça na parede. Aranhas! Não, a verdadeira aranha era Stockley. Se ela não mantivesse a calma, Stockley poderia arrastar Charles para sua teia. O homem era mau. E um assassino. Ela não podia perder a cabeça.

Aproximou-se da porta novamente e sentiu algo. Estava à direita: a trava. Charles dissera que bastava empurrar para cima, não para baixo. A trava se moveu com facilidade e a porta se abriu um pouco. Emma empurrou com todas as suas forças, mas não foi suficiente.

A porta não se moveu nem um milímetro. Estava bloqueada por algum móvel pesado. Ela poderia tentar gritar, mas aquele andar estava vazio. Ninguém poderia ouvi-la até que Nanny e as meninas subissem até ali na manhã seguinte. Então seria tarde demais. Stockley já teria fugido, e Charles... Emma nem queria pensar o que poderia acontecer a ele.

Precisava encontrar outra porta. Teria de caminhar por aquele caminho escuro, sujo e cheio de aranhas. Não podia esquecer que a vida de Charles dependia disso. Emma deslizou as mãos pelas paredes e seguiu adiante. Novamente desejou ter feito mais perguntas a Charles. Talvez houvesse outras portas naquele andar. Se a passagem havia sido feita para ajudar a família a escapar, isso era bem provável. Mas naquele andar não havia mais nenhum quarto. O que significava que ela teria de descer para o andar de baixo.

E assim seguiu tateando, em busca de uma saída. Queria se mover com mais rapidez, mas se esforçou para manter a calma. No minuto seguinte, ficou feliz com a própria cautela. Um de seus pés pisou em falso; Emma recuou rapidamente e se encostou na parede, com o coração disparado.

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Depois que suas pernas pararam de tremer, ela se inclinou e passou as mãos no chão. Havia uma escada. Emma se segurou firme e, com cuidado, desceu na escuridão profunda. Quando seu pé tocou o chão, ela suspirou, aliviada. Em seguida, se virou. E caminhou ao encontro de uma enorme teia de aranha.

Charles podia jurar ter ouvido o grito de Emma em algum lugar, apesar de Stockley não haver dado nenhum sinal de que também ouvira. Talvez fosse a sua imaginação.

— Onde está Emma? — Stockley deu de ombros.

— No andar de cima. Eu não a feri... ainda. Coopere e não será preciso.

Charles tentou controlar a raiva.

— O que você quer? — Se conseguisse manter o homem falando durante trinta minutos, Robbie e James iriam aparecer.

— Quero as jóias que Randall roubou de meu pai.

— Jóias? Stockley, não sei do que você está falando.

— Não minta!

— Não estou mentindo. Realmente não sei do que está falando. Eu tinha sete anos quando Randall morreu. Ele era meu tio-avô e passou em alto-mar a maior parte da vida. — Charles desviou-se do cano da pistola. — Você sabe mais de Knightsdale do que eu. As passagens secretas, por exemplo. Eu não sabia que elas existiam; você, por outro lado, parece muito familiarizado com elas. Como conseguiu?

Stockley ergueu os ombros, seguindo Charles em direção aos bustos de mármore dos Draysmith. Charles queria atraí-lo para perto dos bustos e acertá-lo na cabeça com um deles.

— Meu pai tinha um mapa das passagens secretas de Knightsdale. Ele e Randall eram sócios — Stockley zombou. — Meu pai foi tolo em confiar em alguém como Randall. Era para eles terem dividido as jóias. Mas Randall ficou com tudo. Bem, o sobrinho nobre não estava lá para ajudá-lo quando ele caiu do cais, estava?

— Eu acho que o pobre Randall teve uma ajudazinha para cair na água.

— Com certeza teve. Se meu pai tivesse bom senso, teria apanhado as jóias antes de acertar a cabeça de Randall.

— Mas isso foi há mais de vinte anos. Achei estranho seu interesse repentino.

Stockley estava parado ao lado do busto de Randall. Seria justo que exatamente aquela escultura fosse usada para derrubar o sujeitinho. Charles deu um passo à frente.

— Afaste-se! — Stockley apontou a pistola.

Charles recuou. Era loucura discutir com um homem armado.

— Não foi repentino. Meu pai morreu no verão passado. Foi surpreendente ele ter vivido tanto depois da vida miserável que levou. — Stockley franziu a testa. — Deus, o que nós poderíamos ter feito com aquelas jóias! Se eu soubesse sobre elas antes, pode ter certeza de que já teria vindo buscá-las. Mas eu não sabia. Descobri somente depois que encontrei alguns papéis que meu pai guardava embaixo da cama.

A voz de Stockley se transformou num murmúrio, mas ele manteve a arma apontada para Charles.

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—Maldição! Pensei que seu irmão estivesse com as jóias. Fui para a Itália, revirei aquela maldita carruagem procurando por elas. Knightsdale tentou bancar o herói, mas a esposa dele gritou, e eu tive de atirar nela para que calasse a boca. Fui obrigado a matar também os criados. E as malditas jóias não estavam lá. — Ele balançou a arma. — Elas têm de estar aqui, droga! Mas não sei por que não consigo encontrá-las.

Charles se aproximou mais um pouquinho do busto do tio.

— Eu falei para não se aproximar, seu maldito! — A arma de Stockley apontou diretamente para o peito de Charles. — Se quiser viver, diga onde estão as jóias!

Charles mediu a distância ente ele e o busto. Stockley estava parado bem ao lado, mas isso não facilitava muito as coisas. A menos que o sujeito fosse um péssimo atirador, Charles poderia morrer antes que tentasse encostar um dedo no busto de Randall. Pelo jeito, trinta minutos demoravam para passar; ele ainda não tinha ouvido nenhum sinal dos passos de Robbie e James subindo a escada para salvá-lo.

— Fale logo! — Charles respirou fundo.

— Acho que estamos com um pequeno problema, Stockley. Eu realmente não faço a menor idéia do paradeiro dessas jóias.

Stockley levantou a pistola e apontou entre os olhos de Charles.

—Você acabou de contar a sua última mentira, Knightsdale.

Aos poucos Emma foi recuperando a razão. Bateu as mãos para parar de tremer. Havia conseguido remover do rosto o último resquício de teia de aranha. Tinha de sair dali. Precisava encontrar Charles. Mas onde ela estava? Havia perdido totalmente o senso de direção ao trombar com a imensa teia. Quando sentira os fios grudentos por todo seu rosto, havia se sentido como um animal enlouquecido, gritando e pulando para tentar se libertar.

Agora precisava escolher uma direção. Qualquer direção. Iria o mais longe que conseguisse e então tentaria outro caminho.

Emma seguiu se esgueirando pela parede, até ouvir vozes masculinas. Pensou em bater na parede para tentar chamar a atenção deles. Poderia então contar-lhes sobre Stockley e pedir que alertassem Charles. As vozes estavam ficando mais altas. Graças a Deus! Ela estava indo na direção certa. Tateou um pouco mais até sua mão tocar uma elevação. Era uma porta. Emma se agarrou à porta, aliviada.

E então ouviu um grito. Ela pressionou a orelha contra a parede, na ânsia de escutar melhor. Era Stockley. Estava muito perto, logo do outro lado da parede. Ele falava de um modo ameaçador, parecia bravo. Em seguida, veio à resposta calma de Charles e Stockley gritou de volta.

Emma teve certeza de que algo muito ruim estava prestes a acontecer.

Começou a tatear por todos os lados em busca de uma trava, porém não conseguia encontrar. O pânico ameaçou invadi-la de novo, mas ela fez força para se concentrar apenas na porta. Lá estava a trava, um pouquinho para a direita. Emma a levantou. Nada. Aquela porta provavelmente não era aberta havia anos. Stockley gritou de novo. Dessa vez ela conseguiu ouvir com clareza o que ele disse.

— Você acabou de contar a sua última mentira, Knightsdale.

Emma correu contra o tempo. Desesperada, empurrou a trava mais uma vez, forçando a porta com o próprio corpo. A porta se abriu. Emma ouviu um estampido e então uma explosão quando conseguiu romper a passagem. E caiu no chão.

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Charles sabia que não conseguiria distrair Stockley por muito tempo mais. Esperava por um milagre e se preparou para mergulhar para o lado quando o homem puxasse o gatilho.

E o milagre aconteceu. Parte da parede se abriu logo atrás de Stockley, jogando o busto de Randall sobre a mão do sujeito no exato momento em que ele atirou. A bala atingiu o retrato do primeiro marquês. Charles atacou Stockley, acertando-o no estômago; em seguida, o imobilizou com o braço para trás.

— Droga! Perdemos toda a diversão, Robbie. — O duque de Alvord surgiu no topo da escadaria.

—Eu disse que seu relógio estava atrasado, James.—Robbie se voltou para Charles —Se ele tivesse me ouvido, já estaríamos aqui cinco minutos atrás.

— Eu me perguntei por que os dois estavam demorando tanto. — Charles torceu o braço de Stockley ainda mais quando o homem tentou desferir um pontapé. — Vocês poderiam me ajudar com este sujeito?

— Claro que sim. Não é mesmo, James? Mas o que aconteceu?

— Não sei ao certo. Se vocês segurarem Stockley...

— ...você poderá limpar a bagunça — uma voz feminina completou.

— Acho que estou entendendo o que aconteceu — disse James. — E muito desorganizada para conseguir manter todas as esmeraldas no lugar. Não é isso, Srta. Peterson?

Sentada no chão, coberta de poeira e teias de aranha, os cabelos esvoaçando sobre o rosto, Emma estava linda.

— Emma!

James segurou Stockley quando Charles saiu aos tropeços.

— Cuidado! — James avisou.

Charles finalmente olhou para outro ponto que não fossem os olhos de Emma. Sobre o chão, esparramados ao redor de Emma, havia tiaras, pulseiras, colares e anéis. Ouro e jóias. O busto do tio-avô Randall estava partido em dois pedaços, expondo todos os seus segredos.

— Bem—Charles disse —, parece que encontramos o tesouro do Sr. Stockley.

— Aquele foi um final interessante para a festa. — Emma estava sentada junto à lareira, secando os cabelos. Charles a havia ajudado a se levantar, dera-lhe um beijo maravilhoso e a encaminhara para seus aposentos. Em seguida, ele cuidou de Stockley e deu uma satisfação aos convidados curiosos. Alguns tinham até subido para verificar o que estava acontecendo, atraídos pelo disparo da arma.

Emma havia tomado um demorado banho quente, livrando-se de todos os resquícios de teias de aranha e poeira. Se a água não tivesse começado a esfriar, ela teria até ficado mais tempo na banheira. Então esperou por Charles. Não demorou muito para que ele subisse. Emma o ouviu no outro quarto, falando com o Sr. Henderson. Em seguida, ele dispensou o criado e foi para o quarto dela.

Emma sentiu vontade de abraçá-lo assim que ele entrou, mas se segurou. Charles estava com uma expressão distante. Ele se sentou na poltrona ao lado e fitou o fogo, as mãos nos bolsos do robe.

— O que você fez com o Sr. Stockley?

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— James está cuidando do infeliz. Ele irá a julgamento pela morte de meu irmão e de minha cunhada. Não tenho dúvida de que será condenado à forca.

Emma escovou os cabelos e estudou o perfil de Charles, cujos lábios formavam uma linha fina.

—Já foi horrível receber a notícia da morte de Paul, mas saber como ele foi assassinado...

Emma se inclinou e pousou a mão em seu joelho.

—Não pense nisso. Não há nada que possa fazer para mudar o que já aconteceu.

Charles largou-se na poltrona.

— Eu deveria ter feito mais perguntas. Deveria ter insistido com uma investigação mais detalhada assim que recebi a notícia.

— Para quê? Uma investigação não teria trazido ninguém de volta.

— Poderia ter revelado que a culpa era de Stockley. Então você não teria de passar por aqueles momentos desagradáveis com as aranhas.

— E você não teria de passar por aquele momento desagradável olhando para o cano da arma do Sr. Stockley. Mas passou, Charles, e não há mais nada que possamos fazer para mudar o passado.

Ele continuou olhando para o fogo.

— Fiquei tão aborrecido quando me contaram que Paul tinha morrido! Nem pensei muito em meu irmão. Só conseguia pensar nas conseqüências que a morte dele iria trazer para mim. Em como eu estava encurralado.

— Charles, não podemos controlar nossos sentimentos, apenas nossas ações. Você fez tudo que podia. Ninguém imaginou que a morte de Paul fosse algo mais além de um crime bárbaro. — Emma recostou-se na poltrona, torcendo a ponta da manta. —Se alguém deve se sentir culpado pelos próprios sentimentos, esse alguém sou eu. Tentei impedir que meu pai fosse feliz ao lado da Sra. Graham.

A fisionomia de Charles endureceu ainda mais. Ele desviou o olhar do fogo para Emma.

— O que você sentiu é natural.

— Meus sentimentos foram infantis e egoístas. Reconheço isso agora. Mas não posso voltar atrás para mudar tudo. Por mais que eu queira. Assim como você também não pode mudar a reação que teve quando soube da morte de Paul. Só podemos seguir em frente.

Os ombros de Charles pareciam pesados.

— Eu não sei...

— Eu sei. E por mais que não goste de dizer isso, acho que as suas sobrinhas ficarão melhor com você do que com o pai. Assim como será melhor para a propriedade. Você pretende ficar aqui, não?

— Parte do ano, sim.

— Apenas uma parte do ano? — Finalmente ele sorriu.

—Bem, acho que devo levar minhas obrigações mais a sério. Ocupar meu posto na Câmara dos Lordes. E você precisa conhecer Londres durante a temporada. As meninas vão adorar o Hyde Park e o circo de Astley. Creio que deixar Knightsdale apenas por uma parte do ano é aceitável, você não acha?

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— Sim. — Emma sorriu de volta. — Você pode se afastar de Knightsdale pelo tempo que quiser, contanto que não nos deixe sozinhas aqui.

— Não existe essa possibilidade, querida. — O sorriso de Charles se alargou. — Preciso arranjar um herdeiro, não é mesmo? Acho que não conseguiria cumprir com essa obrigação com você morando em Kent e eu em Londres.

Emma sentiu um friozinho no estômago. Ela certamente entendera o conceito agora. Charles se inclinou para frente.

— O quê? Você não vai atirar nada na minha cabeça desta vez? Não vejo nenhum cachorrinho de porcelana por aqui.

— Não.

Emma sorriu. Mas ainda havia tristeza nos olhos de Charles. Ela já imaginava o que ainda assombrava aquele belo olhar.

— Eu estava brava com você. Agora não estou mais.

— Não?

— Não. Mas estou sentindo outras emoções muito fortes.

— É mesmo? Isso é promissor.

— Exatamente. E por falar em promissor, você fez uma promessa no início da noite que ainda não cumpriu.

As sobrancelhas de Charles se ergueram.

— Fiz? O que eu prometi?

Emma se levantou, olhando diretamente para ele. E então deixou a manta deslizar pelos braços até o chão, ficando totalmente nua à luz da lareira. Em seguida sorriu, percebendo que as últimas sombras de preocupação nos olhos de Charles estavam sendo substituídas por desejo e amor.

— Você prometeu que iria se comportar muito mal.

Ele se aproximou para tocar nos seios convidativos, acariciou-lhe os quadris e as coxas. Emma abriu discretamente as pernas.

— Eu avisei — ela disse — que a minha imaginação está muito mais criativa.

Charles não podia falar. Mal conseguia pensar. Olhava para a brancura das coxas de Emma, para os cabelos escuros e sedosos. Suas mãos percorreram os quadris macios. Ela abriu as pernas, e ele a tocou na intimidade.

— Emma...

Ela se segurou nos braços da poltrona e se inclinou para frente a fim de beijá-lo. Sua língua deslizou sobre os lábios de Charles para, em seguida, penetrar em sua boca. Ele segurou os seios fartos e convidativos com as duas mãos. E os acariciou, sentindo os mamilos enrijecendo.

Emma soltou um leve gemido, abriu ainda mais as pernas e sentou-se no colo de Charles. Então, abriu a parte de cima do robe dele e deslizou as mãos pelo peito forte, sentindo o calor da pele.

Mas Charles não queria possuí-la na poltrona. Queria que fosse na sua cama. Na cama dos Draysmith. Ele precisava possuí-la naquela cama para se livrar de seus últimos fantasmas. Tocou o rosto de Emma com as duas mãos e o afastou.

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— Pensei que era eu que iria me comportar mal — Charles disse.

— O quê?

— Você disse que eu tinha prometido me comportar mal, mas, definitivamente, é você quem está se comportando muito mal, Srta. Peterson. Mais do que eu poderia imaginar.

Emma respondeu com um sorriso. Ele deu um tapinha no belo traseiro, e ela riu e mostrou a língua, que Charles sugou com carinho.

— Não vou permitir que você me seduza aqui, meu amor. — Ele a ergueu de seu colo e a colocou em pé. — Outro dia, mas não hoje. — Em seguida, tirou o robe. Emma sorriu e tocou na parte mais proeminente do corpo de Charles, mas ele a reteve, segurando-lhe o pulso.

— Comporte-se, minha querida.

Charles a ergueu nos braços, carregou-a para seu quarto e a colocou no centro da cama dos Draysmith. Emma riu e estendeu os braços para ele.

Quando Charles os sentiu em torno do seu corpo, soube que finalmente estava em casa.

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