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Lincoln Secco a batalha do livro

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2017 cem anos darevolução russa

Lincoln Secco

a batalha do livro

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Cotejar a recepção e difusão das ideias socialistas no Brasil é a contribuição que o professor Lincoln Secco propõe nesta presente obra. De maneira extremamente criativa, Lincoln estabelece como “fio condutor” o desenvolvimento das diferentes correntes de pensamento – e suas respectivas organizações – ao longo de quase um século e meio de narrativa, tomando como base o material impresso produzido.

Desde a divulgação dos primeiros escritos dos socialistas utópicos no Brasil do século XIX, o longo percurso “editorial” da esquerda brasileira é objeto da análise desta obra. É importante destacar que os “profissionais da palavra impressa” (tipógrafos, escritores, jornalistas) sempre tiveram destacada atuação nos movimentos revolucionários dos séculos XIX e XX. Tipógrafos – por exemplo – eram trabalhadores que além de se exigir uma grande habilidade manual, também tinham que ser alfabetizados. Formavam portanto uma “aristocracia operária”. Não é de se estranhar que o primeiro soviet (conselho) a se constituir na Revolução Russa de 1905 foi o dos tipógrafos de São Petersburgo. Pablo Iglesias Posse, fundador do Partido Socialista Obrero Español, PSOE, era tipógrafo. Aqui no Brasil a participação de trabalhadores gráficos e jornalistas era muito grande no movimento revolucionário.

No início do século XX, os anarcossindicalistas exerciam a hegemonia no movimento dos trabalhadores brasileiros. Destacavam-se pela produção de jornais e panfletos, que juntamente com os comícios, eram utilizados como principais meios de divulgação de seu ideário político. A partir da fundação do Partido Comunista Brasileiro – PCB, em 1922, os comunistas rapidamente passam a ser a principal organização da classe trabalhadora.

Livros, revistas, jornais, panfletos, comícios, cursos, são o principal “suporte” pelo quais as ideias revolucionárias circulavam entre as massas. As dificuldades eram muitas. Grande parte da população brasileira era analfabeta (68% em 1930), e os livros eram caros. Monteiro Lobato observou que em 1919 havia apenas 35 livrarias em todo o país. Desta forma o PCB teve um papel civilizador na sociedade brasileira. Traduziu, publicou, distribuiu tanto livros como inúmeras revistas, jornais e panfletos. Ministrou cursos onde – muitas vezes – a leitura era feita em voz alta, com o intuito de que o saber chegasse até os trabalhadores mais humildes de parca alfabetização.

O PCB destacou-se como a principal organização da classe operária brasileira ao longo do século XX. Sobreviveu à ditadura do Estado Novo (1937-1945), e tornou-se um partido de massas entre 1946 e 1964. Entretanto o golpe fascista de 1964, e a consequente instalação da ditadura militar no Brasil por duas décadas, levou o PCB a uma profunda crise.

A partir de então, o PCB se fragmenta. Surge uma nova esquerda. Apesar de uma acirrada repressão política exercida pela ditadura, uma nova constelação de autores passa a ser publicada, de maneira clandestina ou semiclandestina. Depois do final da ditadura, parte dos grupos de esquerda que sobreviveram à repressão ditatorial, acabou fundando o PT que inicialmente tinha um caráter de Frente Partidária.

Muitos acreditaram que o livro impresso tenderia a desaparecer com o advento das mídias digitais. Tal coisa não se verificou. Inclusive a existência da “rede mundial de computadores” tem incentivado o aumento da venda de livros impressos.

José R. Mao Jr.

Quem ousou sonhar com um Brasil melhor? Quem – camonianamente – lançou-se ao mar das ideias para chegar a esta distância, dispor de um cabo da Boa Esperança e alcançar uma promessa de vitória que tudo mudaria? Temos, senhores e senhoras, diante de nós um jovem historiador que se dispõe participar da tarefa, espalhada pela imensidade do Brasil.

O historiador Lincoln Secco se dispôs a iniciar uma longa travessia. A Batalha dos Livros não se debruça apenas sobre o desfecho desta história cultural, este momento de chegada da esquerda na luta contra as trevas. Não. Lincoln acende o archote da razão lá atrás, e intenta uma primeira aproximação da formação da esquerda no Brasil. Nos quatro capítulos que o livro possui, como diz José Mao Jr., começa com os “profissionais da palavra impressa” e vem até a luta pela formação política em escala de massas.

Imaginem um professor ou professora na sala de aula que, toda vez que enchesse o quadro-negro com seus esquemas, tivesse por detrás de si um ou mais funcionários a rapidamente ir tudo dali apagando… esta certamente se parecia com a luta pela educação que a esquerda tem feito no Brasil. Uma autoridade ruim estabelece funcionários alertas, cuja tarefa é apagar a última letra da razão. E, obviamente, amigo, em seguida extinguir qualquer luz na sala. Temos agora Lincoln na tarefa de ao menos acender a luz. Este livro é um ponto de partida.

Wilson do Nascimento Barbosa

Professor Titular de História Econômica na USP

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A Batalha dos LivrosFormação da Esquerda no Brasil

Lincoln Secco

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Comecei minha vida como hei de acabá-la, sem dúvida: no meio de livros.

Sartre, As Palavras.

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Dedico a Ozória, minha mãe,pasárgada na minha infância.

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Sumário

Luz para um outro Mundo – Wilson do Nascimento Barbosa 13

prefácio – Takao Amano 17

Introdução 23Ciclos Políticos do Livro 25; Depois de 1964 26

Capítulo 1. primeiras impressões (1830-1919) 29Evolução Política 30; Notícias 33; Espaços de Leitura 35; O Socia lismo Científico 37; Nú-cleos Socialistas 38; A Questão do Programa 41; Socialismo de Cátedra 42; O Anarquis-mo 45; Escola 47; Evolução Política 47

Capítulo 2. Sob o komintern 51Movimento de Leituras 52; Os Leitores 64; Tradutores 66; Escola 67; Como os Comunis-tas Liam 70; Conversão pela Leitura 73; Espaços de Leitura 75; A Economia do Livro 79; A Revolução de 1930 do Livro 81; O Negro 84; Queima de Livros 85; Anticomunismo 87; O Novo Vocabulário 89; As Mulheres 90; Evolução Política 92; Balanço 98

Capítulo 3. A Hegemonia Comunista 103Novas Leituras 107; Leitores 108; Economia do Livro 108; As Mulheres 109; Escola 112; Editoras 115; Rosa Luxemburgo 118; Outras Leituras 120; Literatura Proletária 120; Revistas Teóricas 121; Distribuição 123

Capítulo 4. A Hegemonia compartilhada 125Evolução Política 125; Leitores 128; Nova Oferta 131; Crítica das Armas 132; Leituras Pe-rigosas 134; Espaços de Leitura 137; Queima de Livros 139; Mulheres 140; Leituras da Di-versidade Sexual 142; Nova Oferta 143; Rosa Luxemburgo 146; Trotskismo 147; Tempos Novos para o Anarquismo 148; Balanço Comunista 150

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Capítulo 5. Autonomia 153Revistas Marxistas 155 Economia do Livro 157; Rumo à Autonomia 158; Leitores e Recur-sos 160; Anticomunismo 162

Conclusão 165

caderno de imagens 167

Apêndice Temas e Dados para a História da Formação Política 191

Fontes 197Fontes Primárias 199

Bibliografia 203

Índice remissivo 219

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Como disse famoso escritor ucraniano menos melhormente humorado, “não há fome onde sobram ossos”. E, certamente, ainda sobram muitos ossos por aí espalhados do que foi o movimento revolucionário brasileiro do recém--finado século XX. Ainda é possível, catando-se um fêmur aqui e um estribo acolá, recompor-se algo do que foi aquele magnífico movimento de luta, as-sassinado pela ditadura militar de 1964.

Recordo-me dos meus anos no exército, da frase constantemente expressa pelos oficiais superiores reacionários: “só existem três instituições no Brasil: a Igreja Católica, o Exército e o Partido Comunista. E o partido não é cristão. É preciso destruí-lo, não deixar cinza sobre cinza”. Talvez o único ponto do programa de repressão que se haja cumprido foi este, com extermínio físico de milhares de comunistas. Quanto ao “Brasil Grande”, a repressão o deixou como tarefa para a CIA e a rede Globo…

De qualquer modo, um bom arqueólogo forense ou historiador haverá de recolher todos, ou quase todos, fragmentos daquilo que foi o movimento revolucionário brasileiro e remontar-lhe a caveira, porque afinal, como diz a canção infantil, “aqui todo mundo bate osso...”

E temos, senhores e senhoras, diante de nós um jovem historiador que se dispõe participar desta tarefa, espalhada pela imensidade do Brasil. Quem ousou sonhar com um Brasil melhor? Quem – camonianamente – lançou-se ao mar das ideias para chegar a esta distância, dispor de um cabo da Boa Espe-rança e alcançar uma promessa de vitória que tudo mudaria?

Luz Para Um Outro MundoWilson do Nascimento Barbosa

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O historiador Lincoln Secco se dispôs iniciar a longa travessia. Depois de levar sua mente gramsciana a refletir sobre a formação e as lutas iniciais do Partido dos Trabalhadores, Lincoln voltou-se para um passado menos recente e procurou as primeiras pistas gerais, as marcas no solo e nas folhagens, de que de todo não pode se desfazer o persistente Tiranossauro Rex que atormenta a existência dos brasileiros, que de outro modo poderia ser livre. Sim, a caixa de ossos está espalhada por oito milhões e meio de quilômetros quadrados. Por toda parte os melhores brasileiros lutaram, sofreram, pagaram com a vida, nes-sa desagradável provação. Seja em Santana de Livramento, no 7o ou no 5o RC, seja nas encostas do Araguaia, ou nas ladeiras de Salvador, a gente de esquerda sofreu, reuniu, debateu, difundiu suas ideias e pagou um preço extraordinário; Lincoln busca seguir as pistas, recolher os ossículos, para resgatar a história cultural de uma militância que se foi, na luta por um Brasil melhor. Experiên-cia que hoje se vê temporariamente eliminada. Grassa agora, por toda parte, o jardim do Tiranossauro, com os corruptos frutos que mais lhe apetecem.

Mas a Batalha dos Livros não se debruça apenas sobre o desfecho desta história cultural, este momento de chegada da Esquerda na luta contra as tre-vas. Não. Lincoln acende o archote da razão lá atrás, e intenta uma primeira aproximação da formação da Esquerda no Brasil. Nos quatro capítulos que o livro possui, como diz José Mao Jr., começa com os “profissionais da palavra impressa” e vem até a luta pela formação política em escala de massas.

As delegacias de “ordem política e social” tinham, na “democracia” bra-sileira, a tarefa de, em todos os estados da federação, combater os “inimigos” do Brasil. Sua prioridade de fato sempre foi – e não é estranho! - impedir a educação política da classe trabalhadora e reprimir o negro e o indígena em suas práticas religiosas e culturais. Quanto aos terreiros de santo, a polícia os invadia, prendia, espancava e queimava os símbolos de culto, em associação prática com a Igreja Católica. Dessa maneira, destruiu o enorme patrimônio cultural afro-brasileiro, contribuindo para colocar em seu lugar variações do programa da Xuxa e da igreja pentecostal. Quanto à educação política do tra-balhador, queimou centenas de milhares de exemplares de livros, cadernos de aula, apostilas etc., com que os educadores iluministas e marxistas tentaram implantar a razão em nosso meio. Deve-se reconhecer que o êxito foi quase absoluto. Obtivemos como resultado do precioso labor o país que hoje temos, tornado apenas em lugar exótico, que dá lucros para o exterior e contém a “Amazônia”.

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Imaginem um professor ou professora na sala de aula que, toda vez que enchesse o quadro-negro (ou verde…) com seus esquemas, tivesse por detrás de si um ou mais funcionários a rapidamente ir tudo dali apagando… Esta certamente se parecia com a luta pela educação que a Esquerda tem feito no Brasil. Uma autoridade ruim estabelece funcionários alertas, cuja tarefa é apagar a última letra da razão. E, obviamente, amigo, em seguida extinguir qualquer luz na sala.

Temos agora Lincoln na tarefa de ao menos acender a luz. Este livro é um ponto de partida.