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A PROBLEMATIZAÇÃO COMO INSTRUMENTO DE REFLEXÃO E INTERVEN-
ÇÃO NA PRÁTICA PEDAGÓGICA DE PROFESSORES DE CIÊNCIAS NO CON-
TEXTO DE UM PROGRAMA DE FORMAÇÃO CONTINUADA.
Elizabet Aparecida Ayala Lazarotto¹
Daniela Frigo Ferraz²
Resumo: A prática de uma metodologia problematizadora permite uma participação
mais efetiva dos alunos no processo de ensino e aprendizagem por vincular seus
conhecimentos alternativos ao conhecimento científico e por permitir que o professor
posicione-se como um mediador na busca da informação e na construção do
conhecimento. Pesquisadores da área de Ensino de Ciências consideram que a
reflexão do professor sobre os encaminhamentos metodológicos adotados em suas
aulas constitui-se em um dos elementos que poderá contribuir para enriquecer a
qualidade do ensino da educação básica. Nesse sentido, a presente pesquisa
propõe uma análise crítico-reflexiva sobre a prática pedagógica em relação aos
encaminhamentos metodológicos adotados nas aulas de Ciências em uma Escola
Pública do Estado do Paraná, apontando como alternativa, uma proposta de ensino
com enfoque problematizador para a disciplina de Ciências, partindo do pressuposto
de que a questão metodológica está entre uma das principais causas da deficiência
da prática educativa. Para tanto, realizou-se a coleta de dados por meio de
entrevista áudio gravada e análise documental em forma de registros diários, o que
nos possibilitou constatar que a prática de uma metodologia problematizadora é
possível para o desenvolvimento de alguns conteúdos de Ciências, como por
exemplo, questões relativas ao aquecimento global.
Palavras Chave: Ensino de Ciências, Metodologia Problematizadora, Reflexão, Educação Básica.
___________________________ ¹Professora de Ciências da rede Estadual de Educação e participante do PDE 2008, atualmente está lotada no Colégio Estadual Dr. Mário Augusto Teixeira de Freitas - EFM, do município de Barracão, Núcleo Regional de Francisco Beltrão PR. E-mail: elizabet@seed. pr.gov.br; ²Professora Assistente do Curso de Ciências Biológicas/ CCBS / Unioeste – Campus de Cascavel – E-mail: [email protected]
1-Introdução
O problema da pesquisa de investigação que originou este artigo é decorrente
da experiência em sala de aula como professora de Ciências nas Escolas Públicas
do Paraná. Nesse contexto educacional, verifica-se que o livro didático é o principal
recurso adotado na prática docente e, que as propostas de trabalho da maioria deles
resumem-se basicamente em induzir o aluno a buscar nos textos respostas prontas,
sem que haja a oportunidade para que ele desenvolva habilidades cognitivas e
argumentativas. Constata-se ainda, que durante as reuniões pedagógicas, em
virtude do baixo rendimento escolar de alguns alunos, discute-se constantemente
sobre formas metodológicas alternativas que possam vir a contribuir para minimizar
os problemas relacionados ao insucesso escolar.
Carvalho et al (2006), consideram que é necessário o professor saber fazer
com que os alunos aprendam a argumentar, refletir sobre seus pensamentos e a
reformulá-los através da contribuição de seus pares, mediando conflitos pelo diálogo
e tomando decisões coletivas. Refletindo sobre a prática pedagógica e considerando
que existem alternativas diversificadas e que dependendo de como e em que
contexto forem utilizadas poderão possibilitar a superação de algumas dificuldades
encontradas durante o desenvolvimento do trabalho docente, norteamos esta
pesquisa em torno da possibilidade de adoção de uma alternativa metodológica
problematizadora para o ensino de Ciências, considerando que a ação de
problematizar proporciona uma aproximação entre as concepções alternativas do
aluno e o conhecimento científico a ser ensinado. Nesse sentido, realizou-se uma
reflexão critica sobre a prática pedagógica das professoras sujeitos da pesquisa
quanto à busca de alternativas para uma participação mais ativa no aperfeiçoamento
profissional e sobre a suposição de que o livro didático possa ser considerado um
dos fatores restritivos quanto à proposição de metodologias problematizadoras.
Partindo dessas considerações objetivou-se promover uma reflexão crítica
sobre os fins e propósitos do trabalho docente dos sujeitos envolvidos na pesquisa,
a partir de ações colaborativas em torno do estudo das características e etapas de
aplicação de uma metodologia problematizadora, a fim de incentivar sua adoção e
inserção permanente no plano de trabalho docente.
Com o intuito de implementar a pesquisa em sala de aula produziu-se uma
unidade didática abordando alguns conteúdos científicos contextualizando-os a um
tema social contemporâneo, o aquecimento global, em uma perspectiva
metodológica problematizadora.
Segundo Paraná (2006), é necessário ao professor de Ciências conhecer as
relações conceituais, interdisciplinares e contextuais que estão relacionadas à
produção de conhecimentos, como forma de superar a ideia reducionista da ciência
como mera transmissora de conceitos.
Nesse sentido, a escolha do tema aquecimento global, deu-se em função de
sua importância no contexto das discussões acerca de questões referentes à
interferência das atividades de origem antropogênica no meio ambiente. Esse tema
constantemente divulgado pela mídia, nem sempre tráz as informações necessárias
para que haja uma compreensão que possibilite aos alunos um verdadeiro
entendimento sobre o assunto, verifica-se ainda que, muitas vezes, as notícias são
sensacionalistas e fragmentadas. Entende-se que cabe à escola a função educativa
de promover um espaço para discussão das informações, as quais os alunos têm
acesso, para que haja uma compreensão mais coerente a partir da mobilização dos
conhecimentos científicos apreendidos na escola. Para Oliveira; Rezler (2006),
somente quando o professor trabalha as informações e proporciona um espaço em
sala de aula para a discussão de modo a permitir aos alunos relacionar o
conhecimento cotidiano ao conhecimento científico, é que de fato ocorrerá a
construção do conhecimento.
A partir das reflexões que ocorreram durante o desenvolvimento da presente
pesquisa pode-se afirmar que na medida em que avançava-se nos estudos, muitas
interrogações surgiram, dentre outras, destacam-se as seguintes: Por que o método
expositivo é o mais utilizado pelos professores? É possível mudar essa postura? O
que é necessário para que isso ocorra? Na perspectiva de obter respostas para tais
questionamentos é que se propôs a realização do presente estudo.
2- Referencial Teórico
2.1 - A Problematização e alguns de seus aspectos
Para Carvalho et al (1998), o ensino só se realiza quando o aluno aprende de
fato. Não existe um trabalho de ensino se os alunos não aprendem. O ensino e a
aprendizagem são duas faces de uma mesma moeda, sendo o ensino o fator que
potencializa a aprendizagem. Embora haja diferentes concepções com relação ao
significado de ensinar e aprender existe um consenso de que todo ato de ensino
contém o propósito de transmitir um conhecimento, de fazer com que o aluno se
aproprie de um conhecimento do qual não possuía inicialmente (Weissmann, 1998).
Tendo em vista os novos desafios da educação, pode-se considerar que a
reflexão do professor sobre sua prática em sala de aula constitui-se em um dos
elementos que poderá contribuir para enriquecer o processo de ensino-
aprendizagem. Segundo Carvalho et al (2006), os educadores não podem continuar
tendo a falsa impressão de que para ensinar basta conhecer o conteúdo e manter
os alunos prestando atenção, supondo que desta forma estejam aprendendo.
Pesquisas indicam que, em uma situação de ensino na qual se privilegiam as
oportunidades de discussão e de argumentação entre os pares, está-se a permitir
que os alunos desenvolvam habilidades de compreender os temas ensinados e os
processos de raciocínio envolvidos (Carvalho et al, 1998).
Partindo dessas considerações, faz-se necessário desenvolver argumentos
indicando uma proposta metodológica que tem como base de ensino a
problematização. Berbel (1999) argumenta que uma educação problematizadora
visa à libertação do ser humano pela mobilização do conhecimento, pela ampliação
da consciência. Considera ainda que uma metodologia problematizadora permite a
transformação do sujeito que dela participa, por associar inúmeras elaborações
intelectuais à percepção social, política ética, visto que, o sujeito é levado a olhar a
realidade, a pensar sobre ela, a refletir criticamente acerca dos problemas
observados e a propor ações capazes de modificar em algum grau essa realidade.
No âmbito de educação em Ciências, um estudo mais aprofundado e reflexivo
sobre uma metodologia de ensino problematizadora poderá ser, entre outras, uma
das alternativas metodológicas a ser adotada pelos professores em sua prática
pedagógica. Para Freire (1987), a educação deve servir para a libertação do ser
humano das várias formas de opressão, para que ocorra a transformação da
realidade, considerando que o homem só transforma a realidade quando ele mesmo
se transforma.
Em seus estudos Delizoicov; Angotti (2000) propõem três momentos
pedagógicos para o desenvolvimento de atividades problematizadoras:
- Problematização Inicial: São apresentadas para discussão com os alunos
questões e/ou situações. Fazendo a relação do conteúdo com situações reais que
os alunos conhecem ou presenciam. Neste primeiro momento, caracterizado pela
compreensão e apreensão da posição dos alunos frente ao assunto, é fundamental
que a postura do professor seja mais de questionar e lançar dúvidas do que de
responder e fornecer informações.
- Organização do Conhecimento: Neste momento, o conhecimento relacionado
ao conteúdo em questão será sistematizado sob a orientação do professor, para que
ocorra a compreensão da questão problematizada. Serão desenvolvidas definições,
conceitos relações. Com essas informações o aluno poderá perceber a existência
de outras visões e explicações para as situações e fenômenos problematizados, e,
de outro lado, a comparar esse conhecimento com o seu, para usá-lo numa
interpretação mais adequada daqueles fenômenos e situações.
- Aplicação do Conhecimento: Procura-se utilizar o conhecimento sistematizado
pelos alunos e professor para interpretar as situações problematizadas inicialmente.
Deste modo pretende-se que de uma forma dinâmica e evolutiva, o aluno perceba a
construção histórica do conhecimento e que este está disponível para o acesso de
todos os cidadãos, mas para que isso ocorra, o conhecimento deve ser apreendido.
Com relação à adoção de uma metodologia problematizadora, Berbel (1999,
p.195), considera que “o desafio maior, no entanto está na mudança de postura
educacional que essa metodologia requer”. Nesse sentido Carvalho et al (2006)
argumenta que nenhuma mudança educativa formal poderá ser efetivada com
sucesso se não houver a participação ativa dos professores.
Nesse sentido, na presente pesquisa adotou-se os três momentos
pedagógicos para trabalhar durante o desenvolvimento da unidade didática com os
professores sujeitos da pesquisa, visando promover uma melhoria de sua prática
pedagógica.
2.2 – Algumas considerações sobre a formação docente
Tendo em vista a necessidade de repensar a formação dos professores,
Tardif (2002) explica que o saber dos professores contém conhecimentos e um
saber fazer, cuja origem social é evidente, alguns deles provêm da família, da escola
que o formou e de sua cultura pessoal; outros vêm das universidades ou das
escolas normais, de instituições e de cursos de formação continuada. Nessa
perspectiva vale lembrar que antes mesmo de se tornarem profissionais, os futuros
professores vivem no seu local de trabalho por aproximadamente dezesseis anos.
Pesquisas indicam que esse saber herdado da experiência escolar anterior é muito
forte e que nem mesmo a formação universitária é capaz de transformá-lo e muito
menos abalá-lo.
A ideia de que o professor é um dos fatores essenciais do processo de ensino
e aprendizagem é antiga. Porém, até recentemente os estudos centravam-se nas
características do bom professor ou nas diferenças entre bons e maus professores.
Atualmente as pesquisas buscam saber quais são os conhecimentos que os
professores precisam adquirir para o exercício da profissão. No contexto da
disciplina de Ciências, Carvalho; Gil-Perez (1995) fazem alguns apontamentos
referentes às necessidades formativas dos professores de Ciências. Dentre outros
citados pelos autores, vamos destacar os seguintes:
- A falta de conhecimento da matéria, transforma o professor em um transmissor
mecânico dos conteúdos do livro de texto. Conhecer o conteúdo a ser ensinado
implica conhecimentos profissionais muito diversos, que vão além daqueles
adquiridos nos cursos universitários. É necessário que o professor conheça a
história das ciências, é muito importante que seus alunos conheçam as dificuldades
e obstáculos epistemológicos que tiveram que ser superados nas descobertas
científicas, bem como a evolução desses conhecimentos. Conhecendo a história
das ciências o professor terá a possibilidade de melhor compreender as dificuldades
encontradas por seus alunos em suas atividades em sala de aula. O conhecimento
sobre as orientações metodológicas empregadas na construção dos conhecimentos
e as interações entre ciência/tecnologia/saciedade são fundamentais para que o
professor e seus alunos compreendam que o trabalho científico é social, que pode
ser afetado pelos problemas e circunstâncias do momento histórico, do mesmo
modo que sua ação tem uma clara influência sobre o meio físico e social em que se
insere.
- Outro aspecto importante no ensino de Ciências é o conhecimento sobre os
desenvolvimentos científicos recentes e suas perspectivas que permite ao professor
transmitir aos alunos uma visão dinâmica, não fechada da Ciência. Do mesmo
modo, conhecer outras áreas do conhecimento para que dessa forma os alunos não
tenham uma visão das matérias como compartimentos estanques.
- Ter bom conhecimento da matéria requer do professor saber selecionar os
conteúdos mais adequados que proporcionem uma visão atual da Ciência, e que
sejam acessíveis e interessantes para seus alunos. Segundo Carrasco et al (citado
por Carvalho; Gil-Perez, 1995), os próprios alunos são extraordinariamente
sensíveis quanto ao domínio da matéria pelos professores, considerando este, como
fundamental para sua aprendizagem.
As concepções de senso comum que os professores têm do conhecimento
constituem um forte fator de impedimento quanto à busca de um ensino renovado. A
transformação das concepções e práticas docentes espontâneas exige um
tratamento teórico, ou seja, a elaboração de um corpo teórico coerente. No entanto,
há certa rejeição tanto dos professores em exercício como dos professores em
formação, frente às questões teóricas. Alguns não consideram importante usar
conhecimentos de psicologia da aprendizagem e desconsideram a influência dos
aspectos afetivos e motivacionais no processo de ensino. O que se percebe ainda, é
que mesmo havendo uma forte rejeição com relação ao ensino tradicional, há
evidências de que ainda hoje se continua fazendo nas aulas de Ciências
praticamente o mesmo que há 60 anos (Carvalho; Gil-Perez, 1995).
Estudos acerca da formação e da prática docente é alvo de constantes
debates e discussões, nas últimas décadas a formação docente vem sendo
analisada na interface das transformações que afetam a sociedade, a educação e a
escola propriamente dita. No caso do Brasil a formação docente vem sendo
direcionada no sentido de considerar a singularidade das situações de ensino, as
novas competências e os novos saberes que o ofício profissional docente requer
neste milênio (Brito, 2005).
Em relação à formação docente, vale lembrar que na década de 90 privilegia-
se a formação do professor-pesquisador, ressalta-se a importância da formação do
profissional reflexivo. Para melhor compreendermos o significado de reflexão,
Pimenta; Ghedin (2005) explicam que a reflexividade pode referir-se a uma auto
análise sobre nossas próprias ações, que pode ocorrer comigo mesmo ou com os
outros é, portanto, uma característica dos seres humanos, visto que todos pensam
sobre suas ações. Para Schön (2000), podemos refletir sobre a ação, pensando
retrospectivamente sobre a ação que realizamos, de modo a descobrir como nosso
ato de conhecer- na – ação pode ter colaborado para um resultado inesperado.
Quando a reflexão ocorre após o fato ou durante uma pausa no meio da ação, esta
não tem nenhuma conexão com a ação presente. Como alternativa podemos refletir
– na – ação, o que significa refletir no meio da ação, sem interrompê-la. Nesse
sentido, nossa reflexão serve para dar nova forma ao que estamos fazendo,
enquanto ainda o fazemos. A reflexão- na- ação tem imediata significação sobre a
ação, “o repensar de algumas partes de nosso conhecer – na- ação leva a
experimentos imediatos que afetam o que fazemos - na situação em questão e
talvez em outras que possamos considerar como semelhantes a ela” (Schön 2000,
p.34). O profissional que reflete na ação, torna-se um pesquisador em sua atividade
prática.
García (1995) apresenta uma análise das três atitudes necessárias ao ensino
reflexivo, conforme a proposta apresentada por Dewey. A primeira atitude refere-se
à mentalidade aberta. Esta requer do professor, escutar e respeitar diferentes pontos
de vista, a prestar atenção às alternativas disponíveis, a indagar das possibilidades
de erro, a analisar o que se passa em sala de aula, enfim, a refletir sobre a forma de
melhorar o que já existe. A segunda atitude do ensino reflexivo citada pelo autor,
consiste na responsabilidade intelectual, por considerar que esta assegura a
integridade e a harmonia daquilo que se defende. E finalmente a terceira e última
atitude é o entusiasmo, que significa a predisposição para encarar a atividade
docente com curiosidade, energia e capacidade de lutar contra a rotina.
Para Schön (1995), a reflexão na ação requer do professor a capacidade de
prestar atenção a um aluno, mesmo numa turma de trinta, tendo a noção de seu grau
de compreensão e das suas dificuldades.
Uma estratégia de trabalho coletivo entre equipes de professores, que poderá
possibilitar um trabalho mais reflexivo sobre a prática docente constitui-se na
elaboração de diários. Porlán; Martín (1997), explicam que em um primeiro
momento, a utilização de diários de forma sistematizada pelos professores, permite
uma melhor descrição da dinâmica das aulas. Dessa forma, pode-se começar com
relatos a respeito das atividades de ensino e dos momentos de aprendizagem dos
alunos. Essas observações levarão o professor, autor do diário, a perceber outros
aspectos relativos à organização de suas aulas, como por exemplo, o ambiente de
trabalho, materiais, controle da disciplina, ou seja, o objetivo deste primeiro momento
é obter uma visão geral e significativa da turma. Os problemas inicialmente
observados poderão ser superados gradativamente a partir de uma análise mais
sistemática e racional, que poderá ocorrer posteriormente ou paralelamente ao
desenvolvimento das atividades. Dessa forma aspectos mais preocupantes como os
problemas conceituais e práticos poderão ser trabalhados, pois à medida em que
ocorrem as interpretações e reflexões sobre os relatos diários, outros aspectos
problemáticos sobre a dinâmica da turma se definirão. Para os autores, as reuniões
de professores tratam em geral de problemas, burocráticos, organizacionais e gerais,
sendo assim não privilegiam a troca significativa de experiências profissionais sobre
atividades concretas de sala de aula. Nesse sentido, a elaboração de diários de
classe pelos professores, para posterior leitura e discussão durante as reuniões
pedagógicas, poderá facilitar a descoberta de obstáculos internos. Essa ação poderá
favorecer a implantação progressiva de uma estratégia de reflexão coletiva sobre a
ação docente em sala de aula, que conseqüentemente elevará o nível de
comunicação, que até o momento podemos considerar fragmentada, intuitiva e
baseada frequentemente em estereótipos pedagógicos.
A necessidade de repensar a formação para o magistério, entendendo que
esta, sempre esteve dominada pelos conhecimentos disciplinares que nunca
estabeleceram nenhuma conexão com a ação profissional, fez com que, nos últimos
dez anos, alguns países repensassem as reformas na formação de professores,
dando relevância à importância de articular os conhecimentos produzidos pelas
universidades e os saberes desenvolvidos pelos professores em suas práticas
cotidianas (Tardif, 2002).
Em uma pesquisa realizada pela Fundação Carlos Chagas (FCC), com base
nos currículos de noventa e quatro licenciaturas de todo o Brasil, constatou-se que o
tempo dedicado à aprendizagem de conhecimentos das várias áreas disciplinares é
maior do que o reservado ao ensino das didáticas, constatou-se também que mesmo
quando os saberes pedagógicos são privilegiados nos currículos, estes raramente
estão vinculados aos conteúdos, em outras palavras: o futuro professor aprende o
que ensinar, mas não como ensinar (Revista Nova Escola, nov./2008).
2.3 – A contextualização no ensino de ciências
A abordagem de conteúdos científicos de forma contextualizada contribui para
uma aprendizagem mais significativa, pois permite ao aluno problematizar e
apreender algo que inicialmente lhe parecia sem sentido. A contextualização de
conteúdos científicos na educação básica propicia a formação de sujeitos históricos
que mediante o conhecimento das disciplinas curriculares terão acesso à
compreensão referente às contradições e inconsistências presentes nas estruturas
sociais. No entanto, é importante salientar que ao trabalhar os conteúdos escolares
de forma contextualizada os professores precisam ficar atentos para que não haja
um esvaziamento com relação ao conhecimento cientificamente produzido, é, pois,
necessário compreender, que a contextualização é apenas o ponto de partida para a
abordagem de determinados conteúdos (Paraná, 2008).
Nessa perspectiva faremos a seguir algumas considerações sobre o tema
social contemporâneo, aquecimento global, o qual nos serviu como ponto de partida
para abordarmos, de forma contextualizada alguns conteúdos da disciplina de
Ciências durante a implementação do projeto de pesquisa na escola.
A queima de combustíveis fósseis (carvão mineral, petróleo, gás natural) é a
principal fonte de energia que movimenta os negócios no mundo inteiro. Essa
queima de combustíveis fósseis gera emissão de dióxido de carbono ou gás
carbônico na atmosfera terrestre. Com a Revolução Industrial a proliferação de
máquinas e motores a explosão transformou a queima de combustíveis fósseis em
uma quase necessidade e em um negócio bastante lucrativo, o que fez com que
ocorresse um grande aumento de gás carbônico na atmosfera terrestre. Ao longo
dos últimos 250 anos essa grande quantidade de gás carbônico lançada na
atmosfera passou a alterar significativamente o clima da Terra. A consequência é o
aumento do efeito estufa, que ocasiona o chamado aquecimento global (Revista
Ciência Hoje, jun./2007).
Alguns cientistas acreditam que o aquecimento global pode desencadear o
derretimento de parte das calotas polares, o que faria o nível do mar subir meio
metro ou mais nos próximos cinqüenta anos. O aumento da temperatura do Planeta
poderá causar desequilíbrios ecológicos, prejudicando a agricultura e causando a
extinção de muitas espécies. Estima-se que atualmente 7,7 gigatoneladas de dióxido
de carbono (CO2) sejam lançados – como conseqüência das atividades humanas -
por ano, na atmosfera terrestre. Do total de 7,7 gigatoneladas, 5,7 gigatoneladas
derivam da queima de combustíveis fósseis e 2 gigatoneladas provêm do
desflorestamento, principalmente em países tropicais como o Brasil (Revista Ciência
Hoje, jun./2007).
Enquanto em países desenvolvidos a maior parte dos gases de efeito estufa
vem do setor energético, no Brasil, o desmatamento para pastagens na região
Amazônica, é a maior fonte de gases de efeito estufa, contribui com
aproximadamente 50% do total. Pesquisas indicam que dependendo do método de
produção, o gado emite entre 156 e 293 gramas de metano por quilograma de carne
produzida, lembrando que o metano tem 23 vezes mais capacidade de aprisionar
calor que o gás carbônico, o que equivale à liberação na atmosfera de cerca de 3,6
kg a 6,7 kg de dióxido de carbono para um quilograma de carne produzida. Em
2006, uma pesquisa realizada pela Organização das Nações Unidas para a
Agricultura e Alimentação (FAO), constatou que nossos hábitos alimentares,
especificamente a carne da nossa dieta tem lançado mais gases de efeito estufa na
atmosfera que o transporte ou a indústria (Revista Scientific American, mar./2009).
Algumas pesquisas indicam que as mudanças climáticas podem reduzir a
disponibilidade de comida em algumas regiões do mundo, caso nenhuma medida de
adaptação for tomada. Até 2030 o aumento das temperaturas e o declínio das
chuvas em regiões do planeta que tem carência de alimentos, provavelmente
passarão por uma redução na produção de alimentos essenciais para a população
dessas áreas, o que pode diminuir ainda mais a disponibilidade de comida. No
Brasil, os maiores impactos serão sobre a produção de trigo, arroz, milho e
mandioca, é provável que a soja também seja afetada, porém em menor medida. O
emprego de fertilizantes, o melhoramento de sementes e o uso mais adequado da
terra são alguns exemplos de ações que poderão ser tomadas como medidas de
adaptação que poderão moderar a severidade dos impactos das mudanças
climáticas sobre a produção de alimentos (Revista Ciência Hoje, jan.2008).
Preocupados com os impactos das mudanças climática ocorridas em
consequencia do aquecimento global, pela primeira vez, no Brasil, onze das maiores
instituições de pesquisa do país se reuniram para mapear os efeitos do aquecimento
global na economia do país. Os resultados são alarmantes, pois os efeitos do
aquecimento global recaem consideravelmente sobre a produção agrícola. Em 2009
sete mil quilômetros quadrados de florestas foram derrubadas. A devastação
desenfreada das florestas fez do Brasil o quinto maior emissor de gases de efeito
estufa do mundo. Em longo prazo haverá uma mudança no mapa agrícola do Brasil,
o estado do Ceará, por exemplo, pode perder 80% da área fértil, já Piauí e
Pernambuco podem perder 60% a 70% da agricultura. Segundo as pesquisas 80%
da população vive nos centros urbanos, como conseqüência, os impactos são
percebidos nos sistemas públicos de educação, saúde e em tudo o que implica no
bem estar da população brasileira (http://g1.globo.com/bomdiabrasil).
O prazo e as metas de redução das emissões de dióxido de carbono capazes
de nos manter na zona de segurança são dados pela ciência, mas dependem da
política. A estrutura econômico-energética e a forte dependência do carvão de
países como a China e Índia, indicam que a redução de gases de efeito estufa, com
as tecnologias atuais, levará décadas. Entre os países emergentes somente o Brasil
tem possibilidade de redução desses gases com mais rapidez. Tem a vantagem da
matriz energética. A moratória do desmatamento reduziria significativamente nossas
emissões. O que se deve fazer hoje, é buscar formas de manter o aquecimento
global médio em 2º C até o final do século, e ainda assim os cientistas alertam que
esse aquecimento pode resultar em mudanças climáticas significativas, com efeitos
violentos em várias partes do Planeta ( Revista Scientific American, set. 2009).
A intensificação das emissões de gases de efeito estufa na atmosfera está
levando alguns cientistas a defender investimentos em projetos de geoengenharia,
que consiste em utilizar métodos artificiais que forçam a absorção de gás carbônico
pela natureza, como fertilizar os oceanos com partículas de ferro para aumentar a
quantidade de algas e até mesmo espalhar sulfato no ar para refletir de volta a luz
do Sol. As ideias de geoengenharia não são recentes, data de 1965, quando já se
falava que as emissões de dióxido de carbono de combustíveis fósseis poderiam
interferir no clima do Planeta e que essas interferências poderiam ser nocivas. Três
fatos recentes reacenderam essas ideias. O primeiro é que as emissões de dióxido
de carbono estão aumentando consideravelmente e a tendência é haver um
aumento crescente do uso de carvão. Segundo, o gelo polar está derretendo
rapidamente nos últimos tempos. E por fim, o fato de que o respeitado especialista
holandês em química da atmosfera, Paul J. Crutzen, publicou um ensaio em 2006,
revelando considerar urgente a aplicação de medidas de geoengenharia como forma
de minimizar os efeitos do aquecimento global. Apesar de existir um consenso de
que as ideias sobre a utilização da geoengenharia estão de volta, os especialistas
em clima concordam que mais pesquisas a respeito de seu uso são necessárias
para que sua aplicação seja efetivada (Revista Scientic American, dez, 2008).
3 - Aspectos Metodológicos
Considerando que a presente pesquisa está inserida no âmbito do Programa
de Desenvolvimento Educacional - PDE -, que tem sua importância enquanto política
de formação continuada e valorização dos Professores – da Rede Pública de Ensino
do Estado do Paraná, uma das atividades propostas aos professores integrantes do
programa em 2008, foi a produção de um material didático pedagógico que
atendesse às necessidades de aprendizagem dos alunos das escolas públicas do
Estado do Paraná. Optou-se pela produção de uma unidade didática, na qual se
desenvolveu alguns conteúdos científicos estabelecendo relação contextual com o
tema contemporâneo, Aquecimento Global, com enfoque metodológico
problematizador. A contextualização dos conteúdos científicos e do tema
Aquecimento Global, foram planejados objetivando sua implementação em turmas
de 5ª e 6ª séries.
Fizeram parte desta pesquisa duas professoras do Colégio Estadual Dr.
Mário Augusto Teixeira de Freitas do Município de Barracão – Paraná, que
desenvolveram a proposta metodológica da unidade didática em uma turma de 5ª
série e em uma turma de 6ª série.
Como instrumentos de coleta de dados utilizou-se a entrevista áudio gravada
por ser um dos principais instrumentos básicos para a coleta de dados e por ser
uma das principais técnicas utilizadas em pesquisas nas Ciências Sociais (Estrela,
1994); e análise documental em forma de registros diários que, segundo Porlán;
Martin (1997), representa uma estratégia de trabalho coletivo que poderá possibilitar
um trabalho mais reflexivo sobre a prática docente.
Para o desenvolvimento das aulas as professoras utilizaram como material
pedagógico, a unidade didática, a qual foi organizada de acordo com os três
momentos pedagógicos propostos por Delizoicov; Angotti (2000).
Na aplicação do primeiro momento pedagógico, problematização inicial, as
professoras lançaram para os alunos as seguintes questões problematizadoras,
orientando apenas para que respondessem de acordo com seus conhecimentos
prévios.
1- O que significa dizer que o Planeta Terra se tornou planeta vida?
2- Existe alguma diferença entre os gases que faziam parte da atmosfera primitiva e
da atual?
3- Que fatores possibilitaram a existência de vida na Terra?
4- Atualmente existem fatores que colocam em risco a existência de vida na Terra?
Argumente.
5- E o efeito estufa, é mocinho ou é bandido? Por quê?
6- Aquecimento global e efeito estufa, são a mesma coisa?
7- E se o aquecimento global fosse resfriamento global?
A efetivação do primeiro momento pedagógico deu-se com as respostas das
questões problematizadas e sua socialização para a turma, que culminou em uma
síntese das respostas e confecção de cartazes, os quais foram expostos na sala de
aula.
O segundo momento pedagógico, organização do conhecimento foi
trabalhado de acordo com os textos propostos na unidade didática. O conteúdo do
segundo momento pedagógico foi desenvolvido de modo a permitir a interpretação
científica das questões problematizadas. As aulas foram em sua maioria expositivas
– dialogadas em que o aluno teve oportunidade de participar, questionar, esclarecer
dúvidas. Alguns assuntos foram desenvolvidos em grupo com a utilização de
revistas, informações retiradas da internet e outros foram trabalhados a partir de
pesquisas realizadas pelos alunos.
O terceiro momento pedagógico, aplicação do conhecimento, foi trabalhado
mediante a retomada das questões problematizadas no primeiro momento
pedagógico. Inicialmente os alunos reelaboraram e discutiram suas respostas
iniciais, sendo que algumas respostas foram substituídas e outras melhor
explicadas. Para Delizoicov; Angotti (p. 68, 2000) “O importante é refletir sobre as
questões e tentar aproximar o novo conhecimento da interpretação de fenômenos
(naturais ou artificiais) da nossa convivência”.
A segunda atividade proposta aos alunos foi uma pesquisa de campo sobre
as transformações ambientais locais. Para realizar essa atividade os alunos foram
divididos em pequenos grupos e orientados para conversar com os moradores mais
antigos da cidade a fim de obterem informações sobre as transformações ambientais
locais. Os alunos também fizeram a coleta de fotos antigas de alguns locais da
cidade. Esse material foi levado à sala de aula e confrontado com a paisagem atual
da cidade. Realizaram-se painéis mostrando os resultados das pesquisas.
A terceira proposta de trabalho foi uma atividade experimental, a qual teve por
objetivo estabelecer relação entre aquecimento global e mudanças climáticas.
A última atividade proposta para o terceiro momento pedagógico, foi a
realização de uma pesquisa bibliográfica sobre as inovações tecnológicas que
contribuem para diminuir a dependência do ser humano com relação aos
combustíveis fósseis. Essa pesquisa objetivou compreender que existem fontes
alternativas de energia que causam menos impacto ambiental.
Para a análise dos dados, coletados na entrevista, em alguns casos,
utilizamos apenas os trechos de interesse para a pesquisa. Para tanto, adotamos
alguns códigos expressos no quadro seguinte:
SINAL SIGNIFICADOxxxx
...
......
Parte da fala foi suprimida por conter
elementos irrelevantes para a análise.
Pausa curta.
Pausa longa.
4 – Resultados e Discussão
Para Silva; Delizoicov (2005), uma metodologia de ensino problematizadora
parte do pressuposto de que o aluno sempre tráz conhecimentos anteriores sobre a
questão e/ou questões problematizadas. Nos seguintes relatos pode-se verificar que
as professoras realizaram o levantamento dos conhecimentos prévios dos alunos
oportunizando-lhes um momento para refletir e discutir sobre o tema em estudo.
Pode-se constatar pelos seguintes relatos nos diários:
Professora 1: “Os alunos debateram entre eles e às vezes até
discutiam com o colega afirmando que a resposta do mesmo
não estava certa”.
Professora 2: “a maioria dos alunos opinou, expôs seus
conhecimentos”.
Na problematização inicial o que mais chamou atenção das professoras foi a
constatação de que a maioria dos alunos não conseguiu expor com clareza suas
ideias sobre aquecimento global e efeito estufa.
“xxxxxxxxx Na problematização inicial, os alunos......Alguns
alunos achavam que o efeito estufa seria desnecessário para
a existência de vida no Planeta. Mas a partir do segundo
momento hummm...... eles chegaram à conclusão de que o
efeito estufa é natural e necessário”. (Professora 1)
“xxxxxxx A maioria dos alunos pensava que efeito estufa e
aquecimento global, tinham o mesmo significado, era a
mesma coisa. No primeiro momento, as questões
problematizadas, as respostas foram um pouco confusas. No
desenvolvimento do segundo momento pedagógico, através
das leituras de textos eles já questionaram mais.... sobre a
diferença entre efeito estufa e aquecimento global. Na
reelaboração das questões que foi lá.....no terceiro momento
eles conseguiram compreender o aquecimento global como
um aumento do efeito estufa”. (Professora 2)
Verifica-se que as professoras compreenderam que uma das características
da metodologia é justamente oportunizar ao aluno mobilizar seus conhecimentos
prévios, para que a partir do conhecimento sistematizado ocorra a reelaboração de
suas percepções iniciais sobre o conteúdo em estudo. Para Silva; Delizoicov (2005)
é fundamental que o educador perceba os conhecimentos prévios dos alunos, pois é
a partir deles que se fará o questionamento desses conhecimentos considerados de
senso comum, em que o erro assume um papel muito importante como essência do
processo de questionamento, que levará, em alguns casos, à superação da
percepção inicial, levando o aluno a uma explicação científica das questões
problematizadas.
Em entrevista, quando perguntamos às professoras o que haviam observado
quanto à participação dos alunos durante o desenvolvimento das atividades
problematizadoras suas considerações foram:
“Observei maior participação dos alunos. O desenvolvimento
de atividades problematizadoras possibilita um envolvimento
maior de cada aluno.” (Professora 2)
“Bom... ao realizar essa...essa atividade percebi que os
alunos...eles demonstraram interesse, questionaram entre si
também né, debateram entre os colegas e...demonstraram
maior interesse e participação.” (Professora 1)
Diante das respostas acima percebe-se que as professoras compreenderam
que uma metodologia problematizadora propicia um envolvimento maior de cada
aluno e como conseqüência será necessário dar espaço para que eles exponham
suas ideias. Para Carvalho et al (2006), quando os professores proporcionam aos
alunos um ambiente encorajador para que eles exponham suas ideias sobre os
conteúdos estudados, é possível que ocorra uma mudança na linguagem destes, ou
seja, de uma linguagem cotidiana para uma linguagem científica. A criação de um
espaço para a fala dos alunos nas aulas é fundamental para que ele tome
consciência de suas próprias ideias, e também para que passem a utilizar uma
linguagem com características científicas.
No desenvolvimento das aulas em que foi trabalhado a problematização
inicial, as professoras fizeram importantes apontamentos com relação à mudança de
postura, tanto do aluno como do professor, alguns de seus relatos foram as
seguintes:
“Várias vezes fui chamada para auxiliar, a maioria dos alunos
perguntava: está certo?”... “Os alunos estranharam quando eu
não disse se as suas respostas estavam certas ou erradas, eu
também fiquei numa situação diferente ao simplesmente
questioná-los, foi estranho.” (Professora 1)
“Várias vezes me perguntaram se a resposta estava certa, foi
uma situação diferente não ajudá-los nas respostas. Quando
eles me perguntavam alguma coisa eu lançava mais
questionamentos.” (Professora 2)
Nesse mesmo contexto em entrevista a professora 1 declarou:
“No primeiro momento houve uma participação maior por parte
dos alunos devido aos questionamentos. Hummm... as
dificuldades que tinham de responder essas... perguntas por
que eles... pela falta do livro didático, que para eles é um apoio.
Então eles questionavam bastante, querendo que eu desse a
resposta para eles.”
Constata-se que as professoras compreenderam que essa proposta
metodológica requer o constante questionamento durante a problematização inicial;
mesmo que considerem estranho não dar as respostas aos alunos, mas sim instiga-
los ainda mais. Frente ao exposto pode-se concordar com Freire (1997), quando ele
nos ensina que a tarefa do professor não é simplesmente a de dissertar sobre o
conteúdo a ser ensinado, de dá-lo, estendê-lo como se fosse algo já feito, elaborado
e acabado. A tarefa do professor é, sim, a de problematizar o conteúdo aos
educados. Dessa forma, o professor se encontrará igualmente problematizado.
Os posicionamentos das professoras em entrevista e em seus registros
diários demonstram que houve reflexão com relação às possibilidades de se utilizar
outras alternativas metodológicas para o ensino de Ciências.
“xxxxxxx eu considerei essa metodologia... é mais reflexiva,
mais provocadora, que desperta no aluno maior interesse pelo
assunto abordado. Através desse enfoque percebemos que os
alunos são capazes de refletir e buscar respostas em seus
próprios conhecimentos e que olha... esse conhecimento é
incorporado de forma diferente de quando a gente usa somente
o livro didático.” (Professora 2).
“xxxxxx com as atividades problematizadoras os alunos tornam-
se mais críticos podendo dar sua opinião, discutir e refletir sobre
o tema a ser abordado.” (Professora 1)
Em seus registros diários a professora 1 escreveu:
“Percebi que o interesse dos alunos foi maior com o método
utilizado do que quando o texto está no livro didático.”
Verifica-se que houve o entendimento de que uma proposta metodológica
problematizadora requer uma mudança de postura tanto do professor como do
aluno, que mesmo estando condicionados à utilização do livro didático, passarão a
valorizar no processo de ensino e aprendizagem, a reflexão e a discussão sobre os
temas a serem abordados em sala de aula. Com relação à reflexão docente, pode-
se afirmar que as reuniões semanais que ocorreram durante a implementação da
proposta, entre pesquisadora e professoras, foram muito importantes por
proporcionar momentos de reflexão acerca das experiências tidas em sala de aula,
as angústias vivenciadas, as perspectivas de mudanças e sobre as possíveis ações
que poderão contribuir para a melhoria do trabalho no cotidiano escolar. Nesse
sentido, Porlán; Martín (1997) sugerem a elaboração de diários, como estratégia de
trabalho coletivo entre equipes de professores. Para o autor a elaboração de diários
de classe pelos professores, para posterior leitura e discussão durante as reuniões
pedagógicas, poderá facilitar a descoberta de obstáculos internos. Essa ação poderá
favorecer a implantação progressiva de uma estratégia de reflexão coletiva sobre a
ação docente em sala de aula, que consequentemente elevará o nível de
comunicação, que até o momento podemos considerar fragmentada, intuitiva e
baseada frequentemente em estereótipos pedagógicos.
Quanto ao papel do professor ao desenvolver as aulas de Ciências dentro de
uma proposta metodológica problematizadora os pareceres das professoras foram:
“O professor fica mais motivado sendo um mediador, instigando
o aluno na busca do conhecimento.” (Professora 1).
“xxxxxxx é nesse momento que o professor torna-se um
provocador na busca de informações. Por isso essa
metodologia, facilita a aprendizagem e aproxima professor e
aluno.” (Professora 2).
Verifica-se que as professoras compreenderam que ao trabalhar dentro de um
enfoque problematizador, o professor deixa de atuar como um transmissor de
informações e que seu papel como mediador possibilita uma participação mais
significativa dos alunos no processo de ensino. Nesse sentido (Berbel, 1999), afirma
que o papel do professor numa perspectiva metodológica problematizadora, não se
restringe a simplesmente repassar o conteúdo, ele passa a atuar como um
provocador na busca da informação. O que não significa que o professor está
dispensado de seu papel e muito menos que o aluno aprenderá sozinho. O papel do
professor é intensificado como mediador da aprendizagem e no acompanhamento
contínuo do processo para que o aluno realmente aprenda.
Quanto à freqüência em relação ao emprego da metodologia em estudo as
professoras têm as seguintes opiniões:
“O ideal seria trabalhar sempre com atividades
problematizadoras, mas a carga horária, os horários da escola,
acabam dificultando o desenvolvimento dessa prática.”
(Professora 1)
“Deveria ser sempre... mas eu entendo que a partir do
momento em que o professor conhecer e entender esse
enfoque poderá desenvolver a maioria dos conteúdos... e eu
acredito que em todas as séries.” (Professora 2)
Como pode-se constatar, existe uma disponibilidade muito grande por parte
das professoras em relação à adoção de uma metodologia problematizadora para o
ensino de Ciências, no entanto existe também a consciência de que a adoção da
proposta nem sempre será possível, devido a alguns entraves existentes no
cotidiano escolar. Berbel (1999), explica que nem sempre uma metodologia
problematizadora é apropriada para todos os conteúdos. Nesse mesmo sentido,
Laburu; Arruda; Nardi (2003), afirmam que é questionável o uso exclusivo de um
único estilo didático, pois os estudantes variam em suas motivações e preferências
quanto ao modo de aprender, ritmos de aprendizagem, gosto por determinada
disciplina e experiências vividas pelo grupo social a que pertencem. A escolha da
estratégia metodológica a ser adotada em uma sala de aula, não pode atender
apenas as necessidades de um tipo particular de aluno ou alunos. Adotando um
modelo único de ensino, o professor está sujeito a cometer injustiças, por violar a
natureza individual do aluno, correndo o risco de podar suas potencialidades
criativas.
5 – Considerações Finais
A participação no programa PDE possibilitou a intervenção no processo de
ensino e aprendizagem, pois a necessidade de reflexão dos docentes, sobre os
encaminhamentos metodológicos adotados nas aulas de Ciências, constitui-se em
uma importante ação para que se possa repensar a prática pedagógica atual, de
maneira a contribuir, de forma mais eficaz, na melhoria da qualidade das aulas na
disciplina de Ciências. Pela análise dos dados, verificou-se que quando
proporcionado aos professores momentos para reflexão e discussão sobre seu
trabalho em sala de aula, a questão metodológica surge como um dos elementos
que mais lhes causa preocupação. Percebe-se e que existe entre os docentes, um
consenso quanto à necessidade de mudanças metodológicas em suas práticas.
As reuniões, realizadas semanalmente durante a implementação do projeto
de intervenção pedagógica, constituíram-se em momentos de reflexão e estudo
sobre os atuais encaminhamentos dos trabalhos em sala de aula. Constatou-se que
há uma deficiência muito grande em relação à abordagem metodológica dos
conteúdos e que essa é decorrente, em parte, pela precariedade na formação
acadêmica dos professores, pois os cursos de licenciatura, em sua maioria,
discutem os conteúdos, porém não os encaminhamentos no ato de ensinar. Outro
agravante é a forma como o sistema educacional se estrutura. Na carga horária dos
professores não há um tempo específico para o estudo coletivo visando a pesquisa
e implementação de metodologias alternativas e eficazes para suas aulas. Ressalta-
se que o tempo destinado às horas atividade não é suficiente para a grande
demanda de tarefas que o professor desempenha quando não está em sala de aula.
Esse tempo é geralmente utilizado para preparar e corrigir provas ou para realizar
algum tipo de pesquisa relacionada ao conteúdo científico.
Mediante a análise dos registros diários e entrevista com as professoras
envolvidas no processo, foi possível constatar que as mesmas compreenderam a
importância da aplicabilidade de uma proposta metodológica problematizadora para
o ensino de Ciências. Observou-se que, mesmo diante das dificuldades encontradas
no cotidiano escolar, os trabalhos em sala de aula foram desenvolvidos seguindo
todos os passos constantes na proposta. A análise crítico-reflexiva apontou a
viabilidade de sua inserção permanente no plano de trabalho docente para os
próximos anos, a ser aplicada a alguns conteúdos, previamente selecionados, pois a
proposta requer um maior número de aulas para seu desenvolvimento.
A opção por uma proposta metodológica problematizadora para o ensino de
Ciências é possível, no entanto, existe um consenso entre o grupo pesquisado, de
que uma mudança de postura metodológica requer uma constante reflexão entre os
pares para que se evite a superficialidade ao implementar a proposta. Alguns
professores afirmam, inadvertidamente, que já utilizam uma metodologia
problematizadora pelo simples fato de lançar algumas perguntas ao introduzir um
conteúdo. Nesse sentido, faz-se necessário proporcionar, aos demais docentes da
educação básica, um estudo mais aprofundado sobre metodologias alternativas de
ensino, proporcionando-lhes todos os recursos necessários para que as mudanças
possam, efetivamente, apresentar resultados no cotidiano escolar, ou seja, na
aprendizagem dos alunos. Isso posto, salienta-se que a participação de professores
da Rede Estadual de Educação do Paraná no Programa de Desenvolvimento
Educacional, constitui-se em uma excelente proposta de formação continuada com o
objetivo de enfrentamento aos desafios educacionais na contemporaneidade.
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