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COMARCA DE PORTO ALEGRE 4º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL FORO CENTRAL Processo nº: 001/3.12.0005991-0 Autora: LETÍCIA SOSTER ARROSI Ré: APPLE COMPUTER BRASIL LTDA. Data de publicação: 23 de abril de 2013 Juiz Leigo: Claudio Vinícius Tesainer Bonatto Vistos, etc. ... I – Relatório: Trata a presente demanda de ação de obrigação de fazer, cumulada com ação de cobrança e reparação por danos morais, onde diz a autora possuir um telefone modelo Iphone 3G, cuja versão é 4.2.1. Diz que seu telefone sempre funcionou perfeitamente mas, entretanto, ao viajar ao Uruguai, no final de 2012, percebeu que o aplicativo que mais utilizava, chamado “Watsapp” não estava mais funcionando. Sustenta que ao retornar ao Brasil resolveu deletar o aplicativo e adquiri-lo novamente junto à loja virtual da empresa-ré, chamada Apple Store, ao preço de U$ 0,99. Relata que para sua surpresa não obteve sucesso na compra pois para que este aplicativo voltasse a funcionar em seu aparelho, o mesmo deveria apresentar, no mínimo, o software IOS 4.3.

Sentença

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Page 1: Sentença

COMARCA DE PORTO ALEGRE

4º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL

FORO CENTRAL

Processo nº: 001/3.12.0005991-0

Autora: LETÍCIA SOSTER ARROSI

Ré: APPLE COMPUTER BRASIL LTDA.

Data de publicação: 23 de abril de 2013

Juiz Leigo: Claudio Vinícius Tesainer Bonatto

Vistos, etc. ...

I – Relatório:

Trata a presente demanda de ação de obrigação de fazer,

cumulada com ação de cobrança e reparação por danos morais, onde diz a

autora possuir um telefone modelo Iphone 3G, cuja versão é 4.2.1.

Diz que seu telefone sempre funcionou perfeitamente

mas, entretanto, ao viajar ao Uruguai, no final de 2012, percebeu que o aplicativo

que mais utilizava, chamado “Watsapp” não estava mais funcionando.

Sustenta que ao retornar ao Brasil resolveu deletar o

aplicativo e adquiri-lo novamente junto à loja virtual da empresa-ré, chamada

Apple Store, ao preço de U$ 0,99.

Relata que para sua surpresa não obteve sucesso na

compra pois para que este aplicativo voltasse a funcionar em seu aparelho, o

mesmo deveria apresentar, no mínimo, o software IOS 4.3.

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Salienta a autora que com o passar dos dias, também

percebeu que uma série de outros aplicativos como Mobo, Facebook, Facebook

Messenger, Mercado Livre, Linkedin, Localização, Instagram, Windows Live, Big

Bang Theory, etc., simplesmente não funcionaram mais pois necessitavam da

versão 4.3. ou superior para operarem.

Aduz que atualização alguma é disponibilizada pela

empresa-ré para seu telefone e que esta através de total arbitrariedade,

automaticamente, sem aviso prévio e sem que outro aparelho tenha sido

oferecido para troca, tornou o aparelho Iphone 3G praticamente inútil para seus

usuários ao não disponibilizar a atualização do software para a versão 4.3.

Por fim, diz que a empresa-ré ao invés de disponibilizar a

atualização de softwares dos aparelhos, cria novos smartphones, forçando os

consumidores a adquirir os modelos lançados no mercado.

É o breve relatório, embora dispensado por lei .

II – Fundamentação:

Primeiramente, por se tratar de lide envolvendo evidente

relação de consumo, determino a inversão do ônus da prova, com fundamento no

artigo 6º, inciso VIII, do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, em face da

verossimilhança das alegações da autora.

Através da análise dos documentos de prova juntados

aos presentes autos pela autora (fls. 16 a 26) , é plenamente possível de se

concluir que esta possui um telefone modelo Iphone 3G e que tentou, através da

loja virtual da empresa-ré atualizar seu telefone para a versão 4.3. ou superior a

fim de que conseguisse voltar a utilizar os aplicativos mais acessados por ela.

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Segundo o documento de fl. 16 , a autora somente

conseguiu atualizar seu telefone para a versão 4.2.1., versão esta que continua

sendo incompatível com uma série de aplicativos disponibilizados pela empresa-

ré, inclusive com aqueles mencionados pela autora em sua petição inicial.

Este Juiz-Leigo, a fim de sanar a controvérsia existente

no caso concreto, controvérsia esta que ainda não restou definitivamente

esclarecida pela atual jurisprudência, manteve contato telefônico com a empresa

SOMA Autorizada Apple, localizada na cidade de Porto Alegre (telefone nº 51 –

3012-6092), ocasião em que foi informado de que efetivamente, nem mesmo ela

enquanto assistência técnica e nem o Serviço de Atendimento ao Cliente (0800)

da empresa-ré conseguiriam resolver o caso da autora, pois o telefone Iphone 3G

está desatualizado, não existindo alternativa de atualização do mesmo, não

restando outro caminho à autora que não seja a aquisição de um modelo superior

(Iphone 4, Iphone 4S ou Iphone 5).

O Código de Proteção e Defesa do Consumidor, em seu

artigo 32, “caput” e parágrafo único, que analogicamente se entende aplicáveis

ao caso concreto, é claro ao definir exatamente o seguinte:

“Art. 32. Os fabricantes e importadores deverão assegurar a oferta de

componentes e peças de reposição enquanto não cessar a fabricação ou

importação do produto.

Parágrafo único. Cessadas a produção ou importação, a oferta

deverá ser mantida por período razoável de tempo, na forma da lei.”

Ora, ao que tudo indica e pela divulgação nos meios de

comunicação, o telefone Iphone 3G, ou seja, modelo idêntico ao que a autora

possui foi comercializado por empresas de telefonia deste País até bem pouco

tempo por preços extremamente acessíveis, o que faz com que a empresa-ré,

sem dúvida alguma, tenha que manter componentes (aqui incluídos os softwares

necessários para o funcionamento de aplicativos) enquanto o produto estiver

sendo fabricado ou deverá manter por período razoável de tempo a oferta dos

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mesmos componentes.

Entende-se como período razoável de tempo no caso de

um aparelho celular (smartphone) como o Iphone 3, período não inferior a 3

(três) anos, dadas as características e durabilidade do aparelho de alto padrão

internacional.

Aparelho smartphone é um bem durável e dele se espera

uma fruição por período razoável, o que está, certamente, relacionado com a

qualidade do produto adquirido. Os aparelhos smartphones tornam-se obsoletos

muito rapidamente, em função de novas tecnologias, contudo, devem manter o

funcionamento adequado dentro do modelo, da qualidade e funcionalidade que o

modelo adquirido promete.

Certo que não se pode esperar que o produto dure

indefinidamente, mas também é certo que a inviabilidade de atualização de

aplicativos do aparelho impossibilita seu uso.

Pois bem.

Em que pese a argumentação, não merece prosperar o

pedido da autora quanto à obrigação de fazer e nem mesmo quanto à cobrança

de um aparelho de modelo novo (Iphone 4) – fl. 26 .

Entretanto, com relação ao dano moral e a sua

indenização, importante salientar que estes são institutos jurídicos modernos

decorrentes da evolução dos tempos, que vêm exigindo da sociedade uma

busca constante ao respeito de valores pessoais que sempre devem ser

sobrepostos aos valores patrimoniais.

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Esta, a propósito, é a vocação da ordem jurídica a partir

da Carta da República de 1988, tida como a “Constituição Cidadã”. Não é à toa

que o seu artigo 1º, no inciso III, estabelece a dignidade da pessoa humana

como direito fundamental, dentre os demais elencados no mesmo artigo.

Em vista disso, a reparação pelos danos morais pleiteada

pela autora merece, sem dúvida alguma, prosperar, visto que afloram do contexto

probatório dos presentes autos evidências concretas no sentido de se concluir

pelos prejuízos de ordem moral experimentados em razão de toda a frustração

de expectativa, irresignação e desgaste físico e emocional da mesma visando a

solução de um caso que deveria ser simples para a empresa-ré mas que, tornou-

se impossível de ser solucionado pois somente com a aquisição de um novo

produto poderá a autora ter acesso aos componentes (softwares) atualizados

fornecidos de forma paga ou gratuitamente pela empresa-ré.

III – Dispositivo:

Diante do exposto, a sugestão de decisão é pela

PARCIAL PROCEDÊNCIA DA PRESENTE AÇÃO , condenando-se a empresa-ré

a indenizar a autora, pelos danos morais experimentados, no montante de

R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), corrigidos, monetariamente, pelo IGP-M e

com juros legais de 1% (um por cento) ao mês, ambos desde a presente decisão.

Sem custas ou honorários de sucumbência, em face do

disposto no artigo 55 da Lei nº 9.099/95.

Encaminhe-se à apreciação do Excelentíssimo Senhor

Doutor Juiz–Presidente do 4º Juizado Especial Cível do Foro Central da Comarca

de Porto Alegre - RS, para fins de homologação judicial, de acordo com o artigo

40 da Lei nº 9.099/95.

Page 6: Sentença

Registre-se. Publique-se.

Porto Alegre, 16 de abril de 2013.

CLAUDIO VINÍCIUS TESAINER BONATTO

Juiz Leigo