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sinopse

Após quatro anos de separação, Ahmad regressa a Paris vindo de Teerão, a pedido da sua mulher francesa, Marie, de maneira a pôr um ponto final no processo de divórcio. Durante a sua breve estadia, Ahmad apercebe-se da natureza conflituosa da relação entre Marie e a filha, Lucie. Os esforços de Ahmad para tentar melhorar esta relação acabarão por revelar um segredo do passado.

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Entre UMA SEPARAÇÃO e O PASSADO, esteve a trabalhar num projecto de outro filme. O que é que aconteceu?De facto, escrevi outro argumento logo a seguir a ABOUT ELLY, enquanto estive em Berlim. De-pois, filmei UMA SEPARAÇÃO e o meu distribui-dor francês, Alexandre Mallet-Guy, perguntou-me se podia ler o tal argumento. Ele gostou e disse que queria produzir o filme, quer fosse na Ale-manha ou em França. Após algumas viagens, decidi-me por Paris e comecei a trabalhar no projecto. Um dia, enquanto tomávamos café e conversávamos sobre o mesmo, lembrei-me de lhe contar que tinha outra história em mente. Não passava de uma sinopse mas, no momen-to em que comecei a contar a história, dei-me conta de que começava a desenvolver-se e a ganhar forma. Começava a surgir uma nova narrativa. Fomos gradualmente avançando para

esta história, desenvolvi-a e o projecto ficou concluído em pouco tempo. Foi assim que nas-ceu O PASSADO. Ter Paris como pano de fundo foi muito importante. Quando queremos contar uma história relacionada com o passado, é im-portante que esta tenha lugar numa cidade como Paris que transmite o passado. Esta história não podia passar-se num sítio qualquer.

Mas a Paris histórica não é mostrada no filme…Tive muito cuidado para não abusar da dimen-são histórica da arquitectura de Paris e tentei não abordá-la de forma turística. Decidi, desde muito cedo, que a casa da personagem principal, na qual grande parte do filme tem lugar, seria nos subúrbios e Paris apareceria em segundo plano, despercebida. A grande armadilha para os reali-zadores que filmam num cenário pouco familiar é darem destaque às coisas que mais lhes chamam

a atenção. Eu tentei fazer o oposto. Visto estar deslumbrado com a arquitectura da cidade, decidi olhar para além dela e descobrir outras coisas.

Como descreveria o seu processo de escrita? Como constrói a história?Todas as minhas histórias são escritas de forma não-linear. Não vão de um ponto A para um ponto B. Desenvolvo sempre várias histórias simul-taneamente que acabam por se unir numa situ-ação comum. Neste caso, havia a história de um homem separado da mulher, que estava a viver no estrangeiro há vários anos e que agora regressa para concluir o divórcio. Depois, havia a história de um homem, cuja mulher está em coma, e é ele que tem de cuidar do filho. Estes elementos começam por se expandir separadamente e de-pois convergem numa situação única. Escrevo de forma intuitiva. Começo pela sinopse e, logo

de seguida, ponho-me a questioná-la, tentando descobrir mais acerca da pouca informação que tenho. Dado que este homem voltou para tratar do divórcio, tenho de perguntar porque se foi embora há quatro anos. E agora que regressou à casa da esposa, o que é que ali se vai passar? Há tantas perguntas que surgem a partir destas poucas linhas que, ao dar-lhes resposta, a história vai sendo construída.

De que maneira é que a observação do estilo de vida francês influenciou o argumento?Reflecti muito sobre as diferenças. O que teria de diferente a história se se passasse no Irão? Nos meus filmes, as personagens exprimem-se indirectamente. Faz parte da minha cultura, mas uso-o também como recurso dramático. É menos habitual em França. É claro que depende do con-texto, mas falando genericamente, os franceses

entrevista com ASGHAR FARHADI

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são mais directos. Por isso, tive de ajustar o desenvolvimento das minhas personagens fran-cesas a esse novo parâmetro, o que não foi fácil e levou bastante tempo no meu processo de escrita.

Curiosamente, é a personagem iraniana que leva as outras a falarem…Ele é uma espécie de catalisador. Coloca os outros na disposição de falarem, de dizerem aquilo que há muito foi calado. Mas ele nem tem consciên-cia disso. Uma das minhas directrizes era não definir as personagens pela sua nacionalidade ou bandeira. O comportamento delas é determinado pela situação que estão a viver. Em situações críti-cas, as diferenças tendem a desaparecer.

Um dos seus actores disse que a ideia para o filme foi desencadeada por uma visita que fez a um amigo em coma...Não foi assim que as coisas se passaram. Fui visitar pacientes em coma durante a preparação do filme. Nunca tive nenhuma experiência pessoal com o coma, mas sempre associei este estado a uma sensação de incerteza, um interstício entre a vida e a morte, questionando-me se a pessoa estaria viva ou morta. O filme é construído totalmente em torno desta ideia de dúvida. As personagens estão constantemente a enfrentar dilemas, têm de es-colher entre duas opções. Em UMA SEPARAÇÃO, a personagem também enfrentava um dilema vul-gar, o difícil dilema entre o bem-estar do pai ou o da filha. Em O PASSADO, a questão é ligeiramente diferente: devemos ser fiéis ao passado ou desistir dele e avançar para o futuro?

Será que a complexidade da vida actual am-plia estes dilemas?É possível. É comum pensarmos que o futuro é pouco claro porque é ainda desconhecido. Mas julgo que o passado é ainda mais confuso e opa-co. Devia ser mais claro e próximo de nós, uma vez que guardamos vestígios do mesmo. Mas as fotografias e os emails não tornam o nosso passado mais claro. Hoje em dia, a vida tende a continuar, negligenciando o passado. Mas a

sombra do mesmo pesa sobre nós e retrai-nos. Isto parece ser verdade na Europa e no resto do mundo: não interessa quão determinados esta-mos em abraçar o futuro, o passado continua a ser um peso nas nossas mentes.

Como é que escolheu a Bérénice Béjo?Conhecia-a durante uma viagem aos EUA, andava ela a promover O ARTISTA. Achei logo que ela era afectuosa e genuína. É uma daquelas pessoas com quem estabelecemos uma ligação. O desem-penho dela em O ARTISTA confirmou que ela era uma actriz inteligente. Quando escolho um actor, estes dois traços de personalidade têm de estar presentes: ser inteligente e transmitir uma energia positiva no ecrã, uma pessoa cativante com quem os espectadores queiram passar tempo.

Ela disse que andava à procura de qualquer coisa no rosto dela no primeiro dia de ensaios. O que era?Dúvida, [um aspecto] fundamental na personagem de Marie. A Bérénice não é alguém que tenha grandes dúvidas. Mas numa fase inicial dos en-saios, ela provou que era capaz de transmitir dúvida.

É a personagem de Marie que provoca as situ-ações, que faz as coisas avançarem…Ela é quem mais está determinada em avançar e não ficar presa ao passado. Mas será ela capaz disso? Os homens carregam o peso do passado. Na última cena com Marie, ela avança na nossa direcção, na direcção da câmara. Ahmad está atrás dela e ela diz: “Não quero nunca mais olhar para trás.” De seguida, vira as costas para a câ-mara e para nós, espectadores. Ela também nos deixa para trás. Em certa medida, ela pode ser considerada a personagem mais progressista. Não sei porquê, mas nos meus filmes são as mulheres quem tem esse papel. Como em UMA SEPARAÇÃO.

Quais são as características de Tahar Rahim?Vi UM PROFETA no Irão e percebi imediatamente que ele era um actor excepcional com uma ampla

gama de capacidades interpretativas que lhe permitem aceitar papeis muito complexos. De-cidi que iria trabalhar com ele. Uma das carac-terísticas que mais apreciei nele durante a nossa colaboração é a ligação que ele tem à infância. As emoções e as reacções associadas à infância ainda estão muito vívidas.

Como é que escolheu o Ali Mosaffa?Há algo muito específico nele enquanto actor e, sem dúvida, também enquanto homem: uma introversão que surge no rosto, na forma de ele ser. Ele dá a impressão de ser um homem que tem uma vida interior muito rica que expõe muito pouco. É o tipo de pessoa que cativa os outros. Queremos saber mais acerca dele. Esta característica foi acrescentada à personagem porque escolhemos o Ali. Na realidade, tínhamos de escolher um actor profissional iraniano que falasse francês, o que limitava as nossas opções. Assim que o escolhemos, comecei a pensar que

as poucas semanas de preparação não seriam suficientes para ele dominar a língua. Mas todos aqueles que assistiram ao progresso dele no francês, entre a chegada a Paris e o primeiro dia de rodagem, ficaram muito impressionados.

Numa das versões do argumento, o Ahmad tinha qualquer coisa a ver com o cinema, como se ele fosse também quem escrevia as falas das outras personagens…Numa das primeiras versões do argumento, imaginei que o emprego dele poderia estar rela-cionado com o cinema, mas depois percebi que não queria que ele tivesse um emprego especí-fico. Não queria que houvesse nada de especí-fico acerca dele. Tínhamos de sentir curiosidade acerca dele, desejar saber mais. Mas não lhe é dada a oportunidade de fornecer mais infor-mação acerca de si próprio. Até quando ele tenta justificar o seu regresso ao Irão, o companheiro de cena impede-o de o fazer. Talvez ele seja um

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realizador, um documentarista, um fotógrafo… não saber, deixa todas as opções em aberto. Julgo que ele terá um emprego que não será compatí-vel com estar afastado de casa. Essa será uma das razões por que abandonou a França.

Ele é mais intelectual do que o Samir?É um homem que precisa de estar activo. Uma daquelas pessoas que chega a um sítio e está sempre a consertar coisas: uma bicicleta, o lava--loiças, ou um jantar… Sentem-se desconfortáveis quando estão fora do seu elemento, porque estar noutro lugar significa ficar inactivo. Para Ahmad, estar parado é doloroso. Entendemos, por tanto, porque é que ele enfrentou uma depressão quando teve de passar por um período de passividade.

Como é que dirigiu a Pauline, cujo papel é central na narrativa?Conheci várias raparigas da idade dela antes de escolher a Pauline. Vi um teste em que ela foi

filmada. Percebi imediatamente que ela traria a força necessária ao papel. O segredo do desem-penho dela está na motivação. A Lucie é miste-riosa e reservada, como o Ahmad. O facto de ambos serem introvertidos aproxima-os de certa maneira. A própria Pauline tem um olhar algo misterioso. No argumento, a Lucie não é filha de Ahmad, mas quis que eles transmitissem a impressão de serem familiares, como a relação de um pai com a filha. Uma espécie de cumpli-cidade. É ela quem mais sente a falta de Ahmad desde que ele se foi embora. Ela não perdeu ape-nas o marido da mãe, ela também perdeu um pai.

Truffaut dizia que as crianças não mentem nos filmes e transmitem uma verdade diferente dos actores adultos. Partilha desta ideia?Cheguei à conclusão que sou incapaz de fazer um filme que não inclua uma criança. Todavia, é difícil trabalhar com crianças. Mas acho que a presença delas abre a atmosfera dos filmes aos

afectos e às emoções que, por sua vez, acres-centam uma camada de sinceridade. Nos meus filmes, as crianças não mentem, a menos que os adultos as pressionem.

Serão as crianças testemunhas e vítimas dos adultos no filme?Há umas crianças que nunca vemos, aquela que Marie carrega. Ainda antes de sequer ter nas-cido, já o seu destino está a ser decidido por outros. O que será que contarão a esta criança acerca do seu passado e o que aconteceu antes de ter nascido.

Quais as diferenças entre filmar no Irão e em França?Para mim, não foi assim tão diferente. Trabalhei da mesma maneira nos dois países. Aqui há mais meios e o cinema é uma indústria. No Irão, o cinema é a convergência da criatividade individual, ao passo que aqui a criatividade é mais colectiva.

Em UMA SEPARAÇÃO, utilizou a câmara ao ombro, mas neste filme a câmara está muitas vezes imóvel. Porquê esta mudança estilística?Quando a história ganhou forma e comecei a visitar os locais de filmagem, dei-me conta que a história tinha de ser mais sóbria, utilizando uma câmara que se mexesse menos, que não trans-mitisse uma sensação de agitação. Em UMA SEPARAÇÃO, todos os acontecimentos impor-tantes tinham lugar no presente, perante o olhar dos espectadores. Aqui, os acontecimentos re- levantes tiveram lugar no passado e só vemos as consequências dos mesmos nas personagens. O filme é mais interiorizado e, portanto, mais calmo.

Considera-se um moralista?Não me vejo como moralista. Mas não nego que a moral está em jogo neste filme. Mas também se pode abordar o filme de uma perspectiva sociológi-ca ou psicológica. Mas é óbvio que muitas situações podem ser vistas a partir de um ângulo moral.

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Asghar Farhadi nasceu em 1972 em Isfahan (Irão). Percebeu, desde cedo, que tinha uma sensibilidade artística que o levou a estudar ar-gumento e o conduziu ao universo do teatro e do cinema. Após ter entrado na Sociedade de Cinema Jovem, prosseguiu os estudos na Universidade de Teerão, tendo terminado o curso em 1998 com um diploma em Direcção de Palco. O resul-tado de 10 anos de estudos foi prodigioso: rea-lizou seis curtas-metragens e escreveu e realizou duas séries de televisão.

Em 2001, as portas do cinema abriram-se graças a Ebrahim Hatamikia, com quem Asghar Farhadi colaborou na escrita de LOW HEIGHTS (ERTEFAE PAST, 2002), uma crónica do sudoeste iraniano que obteve êxito crítico e comercial. Pouco de-pois, escreveu e dirigiu a sua primeira longa--metragem, DANCING IN THE DUST (RAGHSS DAR GHOBAR, 2003), sobre um homem que é

obrigado a divorciar-se da esposa e vai para o deserto caçar cobras para conseguir pagar as dívidas aos sogros. O filme foi premiado nos fes-tivais de Fajr e Moscovo. Um ano depois, BEAUTIFUL CITY (SHAH-RE ZIBA, 2004) teve igual sucesso. O filme, que analisava as armadilhas do sistema judicial iraniano através da história de um jovem condenado à morte, foi premiado nos festivais de Fajr e Varsóvia.

Ao terceiro filme, FIREWORKS WEDNESDAY (CHAHAR SHANBE SOURI, 2006), Asghar Farhadi acompanha as atribulações de um casal através dos olhos da criada. O filme demonstra-va a singularidade da visão de Asghar Farhadi. Foi muito elogiado no Irão e internacionalmente, tendo ganhado o prémio par Melhor Filme no festival de Chicago e Melhor Argumento no Fes-tival des 3 Continents, em Nantes.

Realizador e argumentista prolífico, Asghar Farhadi começou a fazer-se rodear de uma famí-lia de actores. Taraneh Alidoosti desempenhou o papel principal no seu filme seguinte, ABOUT ELLY (DARBAREYE ELLY, 2009), assim assina-lando a terceira colaboração dos dois. O filme, graças ao supense psicológico, seduziu a crítica e o público iranianos. É o maior êxito interna-cional de Asghar Farhadi até à data: conquistou o Urso de Prata para Melhor Realizador no Festival de Berlim e sagrou-se Melhor Filme no festival de Tribeca. Foi também o candidato iraniano ao Óscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2009.

Com UMA SEPARAÇÃO (2011), distribuído pela Alambique, Asghar Farhadi voltou a juntar-se a uma série de actores de ABOUT ELLY, nome-adamente Peyman Moadi (no papel de Nader), Shahab Hosseini (no papel de Hodjat), e Merila

Zarei, que faz de Senhora Ghahraei, a professora da jovem Termeh, que mais não é do que a filha do realizador, Sarina Farhadi. Após ter conquis-tado os prémios mais importantes no festival de Fajrl, UMA SEPARAÇÃO arrebatou prémios na edição de 2011 do Festival de Berlim, onde ven-ceu o Urso de Ouro para Melhor Filme, o Urso de Prata para o conjunto de actrizes femininas, o Urso de Prata para o conjunto de actores mascu-linos, bem como o Prémio do Júri Ecuménico e o Prémio dos Leitores do jornal “Morgen Post”. Isto era apenas o início de uma longa lista de prémios. O filme obteve 70 prémios internac-ionais, incluindo o Globo de Outro para Melhor Filme em Língua Estrangeira, o César para Mel-hor Filme Estrangeiro e, por fim, o Óscar para Melhor Filme em Língua Estrangeira.

UMA SEPARAÇÃO foi vendido para todo o mun-do e foi um enorme êxito internacional, sem precedentes no Irão. Em França, o filme teve um milhão de espectadores, um resultado histórico. Nos Estados Unidos, onde o filme estreou em Dezembro de 2011, o resultado de bilheteira es-teve a par dos maiores êxitos de filmes em lín-gua estrangeira alguma vez estreados nos EUA.

Com O PASSADO (2013), Asghar Farhadi filmou em França e em língua francesa. O filme conta com as interpretações de Bérénice Bejo, Tahar Rahim e Ali Mosaffa, entre outros. O argumento venceu o Prémio Media da União Europeia. O PASSADO estreou em competição no Festival de Cannes, onde Bérénice Béjo conquistou o pré-mio para Melhor Actriz.

2013 O PASSADO2011 UMA SEPARAÇÃO 2009 ABOUT ELLY2006 FIREWORKS WEDNESDAY2004 BEAUTIFUL CITY2003 DANCING IN THE DUST

ASGHAR FARHADI

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Qual foi a sua primeira impressão quando leu o argumento de O PASSADO?Tive de esperar um mês para recebê-lo. Conheci o Asghar, depois fui para o estrangeiro de férias e ainda tive de esperar até saber se me iria dar a ler o argumento e se me ofereceria o papel. Quando, finalmente, lhe pus as mãos em cima, agarrei nele como se fosse uma pedra preciosa, um objecto raro que era uma sorte poder ter em minha posse. Encontrei ali tudo o que me tinha agradado nos filmes anteriores dele. Uma atmosfera, personagens densas que têm sempre um certo grau de mistério, e uma história complexa que obriga o espectador a mudar constante-mente de opinião. Estava encantada quando ter-minei a leitura.

Como correu o vosso primeiro encontro?Encontrámo-nos duas horas antes de embarcar

num voo, e nunca fiz um teste como aquele! O Asghar estava à procura de qualquer coisa no meu rosto, e eu não fazia ideia do que era. Pôs- -me algodão na boca, escureceu-me a testa, ajustou os cantos da minha boca. A certa altura, eu disse ao maquilhador: “Se ele quer mudar tanto a minha cara, mais vale ir à procura de outra pessoa.” Mal falámos no dia dos testes. Só um pouquinho acerca da personagem. E quando me fui embora, não sabia praticamente nada.

Quando ele descreveu a personagem, o que é que ele disse?“É uma mulher com duas filhas, que está apai-xonada por um homem que tem um filho, e que tem de se divorciar de outro homem”. Pergun-tou-me se tinha filhos. Respondi-lhe que tinha dois e que o meu companheiro também. Sou, portanto, mãe de 4, de 15 em 15 dias. Foi uma

maneira de lhe dizer: “Identifico-me com o que me estás a explicar, e talvez consiga encontrar semelhanças com a minha vida que resultem no ecrã.”

Asghar Farhadi gosta muito de organizar en-saios antes da rodagem. Quanto tempo é que duraram?Dois meses. Reuníamo-nos 3 ou 4 vezes por se-mana, às vezes ao sábado, e ensaiávamos 4 ou 5 horas. Nunca tinha feito nada assim, e deve ser parecido com a preparação que faz um ac-tor de teatro, quando trabalha com uma com-panhia. O Asghar punha-nos a fazer exercícios durante meia hora; dávamos voltas à sala, cor- -ríamos, descontraíamos, fazíamos abdominais. E ele exemplificava sempre os exercícios, re-clamando inequivocamente o papel de chefe da companhia. Depois disso, líamos o argumento, e às vezes improvisámos à volta dele. E fazíamos sempre todos o mesmo, mesmo quando a cena não nos incluía. Mais para o fim, comecei a ficar muito impaciente. Queria começar a filmar, so-bretudo porque as exigências do Asghar iam-se tornando cada vez mais rigorosas.

Essa precisão antes da rodagem assustou-a?Tive sobretudo receio de me fartar do texto e da história. Quando começámos a filmar, tive a sen-sação de já ter feito o filme! No cinema, a primei-ra montagem que o montador faz logo a seguir à rodagem chama-se “rough cut” [montagem em bruto]. Eu tive a sensação de ter feito essa mon-tagem! Quando somos actores, por vezes temos medo de ser pouco espontâneos, mas percebi que quanto mais trabalhamos mais espontanei-dade obtemos. Já conhecemos tão bem a per-sonagem que há coisas que nos escapam.

Então, como é que acabou por correr a rodagem?O Asghar tornou tudo fácil. Nunca senti dificul-dades, desempenhei sempre o papel de Marie com muita naturalidade porque a conhecia de cor. Não estou a dizer que não houve momentos

de dúvida, momentos em que tivemos de repetir “takes”, momentos em que andávamos todos às apalpadelas, mas vivi todos os acontecimentos da vida dela a partir do interior. Acontecia-me, à noite, dizer: “Não percebo. Sinto que tudo me surge tão naturalmente”. Era isso exactamente que o Asghar queria: que eu não intelectualizasse a personagem, que a vivesse a partir de dentro.

É parecida com a Marie?De maneira nenhuma. Essa é uma questão inte-ressante: quando estava a filmar cenas em que o Asghar me pedia isto ou aquilo, eu pensava: “É tão diferente de mim!”. Em nenhum momento, eu reagiria da mesma forma que Marie. É uma maravilha poder interpretar com tanta facilidade uma personagem que é o nosso oposto.

O que é que sabia da Marie quando os ensaios começaram? Construiu um passado para a personagem?Eu sabia que ela era farmacêutica em Paris, embora vivesse nos arredores. Não é lá muito claro, mas imaginei que ela era uma simples empregada de farmácia. Durante os ensaios, imaginámos a relação dela com Ahmad, como é que se conheceram, e também quem era o primeiro marido dela, com quem teve duas fi-lhas. E ainda por que razão Ahmad e Marie se separaram. Até ensaiámos alguns momentos da separação. Imaginámos que eles se separaram através de Skype. Ahmad veio-se embora di-zendo que voltaria, mas nunca regressou. Para mim, foi importante ensaiar essas cenas: criou--se uma espécie de ligação entre o Ali, que faz de Ahmad, e eu. Conseguia olhá-lo nos olhos, rir com ele, chorar – ele fazia parte do meu dia--a-dia. Também construímos o passado da per-sonagem interpretada pelo Tahar. Por exemplo, fizemos um exercício bastante interessante em que o Asghar nos pediu para olharmos para a câmara e dizer quem era a mulher do Samir. Eu dei a descrição física dela. A seguir, o Tahar fez a mesma coisa. Aos poucos, a imagem daquela mulher foi surgindo...

entrevista com BÉRÉNICE BÉJO

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O argumento estipula que houve um episó-dio complicado, que o Ahmad sofreu de depressão durante bastante tempo. Conver-saram sobre este período e imaginaram es-ses momentos?Não. O Asghar fala frequentemente sobre os imigrantes. Está sempre a dizer que a cultura iraniana é muito diferente da nossa, e que, mui-tas vezes, os iranianos que chegam a França não conseguem adaptar-se ao nosso estilo de vida. Ficam deprimidos e regressam a casa. Julgo que o Ahmad é um pouco assim. É alguém que tenta integrar-se numa nova sociedade, numa nova vida, e que se apaixona verdadeiramente. Mas, a dado momento, é demasiado para ele e prefere regressar a casa. A Marie entende o que se passou com Ahmad. Se está zangada, é porque ele não teve coragem de lho dizer na cara. Pode ver-se nos seus filmes que o Asghar acredita mais nas mulheres do que nos ho-mens; ele considera as mulheres mais fortes e mais expressivas.

A história é universal, mas revelará alguma coisa sobre a França de hoje?Não especialmente. Tem é alguma coisa a dizer sobre o mundo contemporâneo. Acerca das complicadas relaçõe entre os seres humanos, acerca das situações em que se vêem metidos, que são, muitas vezes, verdadeiramente absur-das. De facto, o Asghar gosta de fazer perguntas e colocar as pessoas em determinadas situ-ações, mas não contem com ele para fornecer respostas ou soluções. É assim que os filmes dele funcionam.

De certa maneira, a sua personagem tem o papel de provocar emoções, enquanto que as personagens masculinas são mais esquivas, ou cobardes.É verdade, a Marie está no centro da acção. É ela que faz as perguntas difíceis e que fica à es-pera das respostas. Mas, enquanto actriz, não senti isso, porque o Asghar tem uma maneira única de filmar, é muito meticuloso. A rodagem

foi muito longa. Às vezes, filmávamos cinco cenas num dia, ao passo que, noutros filmes, podemos chegar às 15. É tudo muito diluído e rigoroso.

Como é que se compreende uma personagem quando se trabalha fragmento por fragmento?É para isso que servem os ensaios. E depois também tenho confiança total no Asghar. Ele consegue ser muito, muito rigoroso. Algumas cenas são organizadas como se de uma coreo-grafia se tratasse. Por exemplo, era costume ele dizer: “Bérénice, faz isto, vai para ali, agora falas, e segues naquela direcção. E tu, Tahar, assim que ela começar a falar, vais para aquele lado”. E fazia todos os meus movimentos, os do Tahar, e dizia as nossas falas, mas sem re-presentar. No início, isto pode ser perturbante. Perguntamo-nos como será possível deixarmos a nossa marca. Mas, na realidade, nem sempre as coisas se passam como ele as exemplificou; ele limita-se a indicar o caminho. É a maneira de ele nos ajudar, de dizer: “Eu aponto-vos um caminho de forma a vocês sentirem-se apre-ciados, ajudados, vigiados, mas, daqui para a frente, a decisão é vossa”. E eu adoro isso. Ele é um manipulador, mas sem perversão.

O Asghar Farhadi não fala francês. Que con-sequências teve isso na rodagem?Durantes os dois meses de preparação, tive--mos tempo para nos habituar ao tradutor, o Arash. Ele fez um trabalho extraordinário, tra-duzia tudo. Quando o Asghar dizia: “Quero que vão para a esquerda, ou melhor, quero que vão para a direita”, o Arash repetia tudo, pala-vra por palavra. Ele transformou-se na voz do Asghar. No início, foi bastante desconcertante, mas, à medida que as coisas iam avançando, já nem me lembrava que o Asghar não falava francês. Em todo o caso, o Asghar é tão ex-pressivo, gesticula tanto, que já nem precisava que o Arash traduzisse. Já sabia o que é que ele queria.

BÉRÉNICE BÉJO (Marie)

Nascida na Argentina, Bérénice Bejo chegou a França com 3 anos. Tendo sido rapidamente introduzida no mundo do cinema pelo pai, o realizador Miguel Bejo, começou a carreira em 1998 em LES SOEURS HAMLET de Abdelkrim Bahlo. Gérard Jugnot ofereceu-lhe o papel de protagonista em MEILLEUR ESPOIR FÉMININ em 2000. Teve uma breve experiência nos EUA em CORAÇÃO DE CAVALEIRO, ao lado de Heath Ledger, e, de regresso a França, traba-lhou com realizadores como Laurent Bouhnik, Steve Suissa e Marie-France Pisier. Em 2006, apareceu ao lado de Jean Dujardin em AGENTE 117, realizado por Michel Hazanavicius.

Com o papel de Peppy Miller em O ARTISTA, es-crito e dirigido por Michel Hazanavicius, alcan-çou o reconhecimento internacional. Graças à

sua interpretação, recebeu um César para Melhor Actriz e várias nomeações em todo o mundo, in-cluindo o BAFTA para Melhor Actriz e o Globo de Ouro e o Óscar para Melhor Actriz Secundária.

Acabou de filmar o mais recente filme de Eric Barbier, LE DERNIER DIAMANT, onde contra-cena com Yvan Attal.

2013 O PASSADO Asghar Farhadi BONHEUR DES OGRES Nicolas Bary

2012 A DATILÓGRAFA Régis Roinsard

2011 O ARTISTA Michel Hazavanicius

2008 MODERN LOVE Stéphane Kazandjian

2006 AGENTE 117 Michel Hazavanicius

2003 24 HEURES DANS LA VIE D’UNE FEMME Laurent Bouhnik

2001 CORAÇÃO DE CAVALEIRO Brian Helgeland

2000 MEILLEUR ESPOIR FÉMININ Gérard Jugnot

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Inicialmente, estava previsto fazer outro filme com Asghar Farhadi. O que era e o que é que aconteceu?O Asghar tinha visto UM PROFETA e disse-me que esse filme era a razão para querer trabalhar comigo. Marcámos um encontro e ele falou-me do projecto. Isto parece ter-se passado há imenso tempo, mas lembro-me que havia um homem e uma mulher que se apaixonavam através da internet. O argumento encontrou um obstáculo muito específico: a utili-zação de uma webcam. Em todo o caso, marcámos nova reunião dali a três semanas, e, durante esse encontro, ele explicou-me a história de O PASSADO. Perguntei-lhe sobre o outro filme. Ele respondeu que preferia fazer este, porque era mais pessoal. Para mim, foi uma surpresa, mas como ainda não tínhamos começado a trabalhar…

Porque é que ele o escolheu?Em bom rigor, não sei. Mas julgo que o Asghar es-colhe os actores em função do seu potencial plástico.

Acho que ele gosta de transformar as pessoas. Não lhe interessa pegar num actor e pedir-lhe que faça apenas o que está habituado a fazer, e tem toda a razão. Ele queria limpar-me de todos os meus papeis anteriores. Ele tinha visto todos os meus filmes obsessivamente. Chegou ao detalhe do guarda-roupa. Se acontecia eu vestir um casaco parecido com outro que usara num filme, ele dizia “Não, já vi esse antes, não quero isso.”

O Asghar discutiu consigo as suas origens?Abordámos o tema mas concordámos que o filme não seria sobre isso. O filme é aquilo que é hoje a sociedade francesa – como nos vamos integrando nela, com altos e baixos, mas sem se colocar a questão da herança cultural, de sermos um casal com um passado de imigração, e por aí fora. O Asghar compreendeu que o país já está para lá disso.

Como descreveria a personagem de Samir?É um homem que está cansado da vida. Não con-segue livrar-se da culpa, está preso entre um amor

que perdura e um novo amor – entre uma vida pas--sada e o desejo de avançar para uma vida futura. E julgo que ele é um tipo que está constantemente deprimido, mas que mete tudo para dentro. Ele lá se vai aguentando, e isso é um sinal da sua maturidade. É um pouco mais velho do que eu – está na casa dos 30 – e levou alguma porrada da vida. Compreende--se que isso o tenha envelhecido rapidamente. O Asghar transformou-me, tornou o meu cabelo mais cinzento. Eu adoptei uma passada mais pesada, e movimentos mais lentos, quando, normalmente, sou muito mais leve.

Foi assim que imaginou desde logo a personagem?No início, imaginei-o mais sorridente, mais ligado à espontaneidade das coisas boas da vida. Mas o Asghar tinha uma visão diferente. Conversámos imenso sobre isso. Para ele, a personagem era muito semelhante à do pai em LADRÕES DE BICICLETAS. O Asghar pediu-me que visse o filme de De Sica.

Ele queria que eu compreendesse a relação quase adulta que um pai pode ter com um filho. A minha natureza e a minha educação fizeram-me gravitar em em direcção a alguém mais optimista, mas o Asghar acabou por ter razão.

O longo processo de ensaios foi uma coisa nova para si?Ensaiei bastante para o filme do Jacques Audiard. Mas eram ensaios diferentes; tinha a ver com en-contrar a personagem e construí-la. Com o Asghar, era sobre fazer as coisas à maneira dele. Ele queria tornar os actores maleáveis de forma a adaptá-los às indicações que dava.

O que é que ganhou com os ensaios?Ajudaram-me a entender melhor a personagem e a adaptar-me ao formato da rodagem usando o método do Asghar. Também me permitiram ana-lisar um pouco melhor os temas mais importantes

entrevista com TAHAR RAHIM

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do argumento e as relações entre as personagens. Talvez o mais importante tenha sido descobrir como o argumento, e a própria história, seriam valorizados pela realização. Surgiram coisas durante os ensaios que não existiam no argumento, nomeadamente as relações emocionais entre as personagens. Tudo se tornou mais complexo do que eu imaginava durante as leituras.

Pensou, com o Asghar, sobre aquilo que poderá ter sido o passado de Samir?Sim, trabalhámos imenso sobre esse aspecto. Lembro-me, em particular, de um exercício: o Asghar perguntou-me como é que eu tinha conhecido a minha mulher, qual era o aspecto dela, e o exercí-cio foi bastante interessante porque eu não estava preparado para ele. Foi completamente improvisado. Também fizemos exercícios de memória para apren-dermos a olhar uns para os outros com atenção. Tinha de fitar o jovem actor que faz de meu filho durante 30 segundos, depois virávamo-nos de cos-tas e tínhamos de descrever exactamente as roupas que tínhamos vestidas, as marcas no rosto de cada um de nós, e por aí fora. Estes eram os exercícios que o Asghar fazia quando era encenador, e é muito importante conhecer os elementos biográficos das personagens e integrá-los, para não termos de pen-sar neles durante a rodagem. Isto permitiu-me mer-gulhar noutra vida.

Durante os ensaios, também imaginou como é que o Samir e a Marie se tinham conhecido?Sim, foi quando ele foi aviar os medicamentos para a mulher à farmácia. Em momentos de ansiedade como estes, uns braços abertos podem ser pe-rigosos ou salvadores, depende de muita coisa. A Marie também foi à lavandaria deixar a roupa e o Samir encontrou alguém com quem falar naqueles momentos. É assim a vida.

Durante a rodagem, como é que se adaptou ao método de trabalho muito meticuloso de Asghar Farhadi?Adaptei-me e pronto! Comigo, a energia acaba sem-pre por se dissipar a dado momento – não consigo permanecer num estado constante o tempo inteiro, é impossível. A minha forma de descomprimir é relaxar

entre “takes”. E quando tenho uma cena difícil para fazer e tenho de me manter concentrado, tenho de ser mesmo rápido porque é difícil ser sincero e honesto numa emoção. Estou a lembrar-me de um pormenor que ilustra a precisão do Asghar. É numa das últimas cenas do filme: vemos o Samir através de uma janelinha numa porta. Tinham apertado comigo para conseguir chegar à composição que o Asghar queria. A seguir, filmou-se o contracampo, que era um plano bastante aberto em que sou apa-nhado de costas, e depois, como é óbvio, tiveram de retirar as bases onde eu estava apoiado. O Asghar pediu-me que desse dois passos atrás para que o ângulo desse a impressão correcta, fazendo parecer que eu estava no mesmo lugar. Mais ninguém teria reparado, mas para ele era importante.

Quais são os principais sentimentos que motivam o Samir? A tristeza? A culpa?Julgo que ambos, e também a indecisão. Além destes três sentimentos, há ainda o amor, claro, porque se não existisse amor, a sua situação ter-se--ia resolvido rapidamente. Por vezes, o amor conduz a situações complexas como esta.

Na sua opinião, qual é o papel da personagem de Ahmad?É um catalisador e, no fim, faz com que Samir e Marie se unam. Por vezes, podemos estar no meio do nevoeiro e, até levarmos um choque, não con-seguimos avançar. Pode ser necessário que um e-lemento exterior promova o diálogo quando este se tornou impossível.

O Samir não demonstra abertamente qualquer animosidade em relação a Ahmad, nem mostra nenhum sinal de verdadeiro afecto para com Marie: foi isso que o Asghar Farhadi lhe pediu?Sim, foi precisamente esse o pedido. Eu costumo ser um pouco mais expressivo, e tento ser mais afável. Mas o Asghar não queria isso. Dada a situ-ação do Samir, ele tinha razão: ele vive com uma pessoa doente com quem já não consegue co-municar. Ele está num limbo, e isso impede-o de alcançar a felicidade. Mais uma vez, o Asghar é o realizador mais meticuloso com quem já trabalhei. Graças a ele, foi a primeira vez que consegui juntar

o trabalho interno com o trabalho externo. Quando digo externo, refiro-me à cenografia teatral; por exemplo, movimentos muito precisos, quase co-reografados. Por vezes, o Asghar é uma espécie de bonecreiro que gosta de dar vida a marionetas. E eu gosto disso, sinto-me confiante.

TAHAR RAHIM (Samir)

Tahar Rahim obteve o primeiro papel protagonista em 2009 em UM PROFETA de Jacques Audiard (Grande Prémio – Festival de Cannes 2009).

O filme alcançou o reconhecimento da crítica e do público e ele recebeu os Césares para Actor Mais Promissor e Melhor Actor em 2010, e também um prémio Patrick Deweare. Em 2011, participou no seu primeiro filme em língua inglesa, THE EAGLE, de Kevin MacDonald, e noutros dois filmes seleccio-nados para os festivais de Cannes (FREE MEN de

Ismael Ferroukhi, com Michael Londsale) e Veneza (LOVE AND BRUISES, de Lou Ye). Interpretou de-pois o papel de Auda em BLACK GOLD, de Jean-Jacques Annaud.

Entretanto, prossegue uma carreira internacional: aparecerá no novo filme de Fath Akin, THE CUT, e participará também em GRAND CENTRAL, de Rebecca Zlotowski, distribuído pela Alambique.

2013 O PASSADO Asghar FarhadiGRAND CENTRAL Rebecca Zlotowski

2012 OS NOSSOS FILHOS Joachim Lafosse

2011 BLACK GOLD Jean-Jacques AnnaudLOVE AND BRUISES Lou YeLES HOMMES LIBRES Ismael FerroukhiA ÁGUIA DA NONA LEGIÃO Kevin Macdonald

2009 UM PROFETA Jacques Audiard

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Quando é que conheceu o Asghar Farhadi pela primeira vez?A primeira vez que vi o Sr. Farhadi foi quando ele se encontrou com a minha mulher, a Leila Hatami, para falarem sobre um argumento. Mas eu já seguia a carreira dele e tinha visto os seus filmes. Conhecia a obra dele. Conhecíamo-nos enquanto profissionais do cinema iraniano.

Quais são os seus antecedentes?Há 24 anos que participo em filmes iranianos. Co-mecei por acaso. Estava a ficar farto da faculdade e foi-me oferecido um papel num filme. Fui até lá só para arejar as ideias. O meu primeiro filme foi uma fita comercial de terceira categoria. Mas depois sur-giu o meu terceiro filme, PARI, realizado por Dariush Mehrjui e ser actor começou a ter outro significado para mim. Até aí, só tinha andado a divertir-me. Co-nhecer o Mehrjui fez-me levar o cinema a sério.

Como é que o Asghar Farhadi o convenceu a embarcar no projecto?Fui a várias audições. Um mês antes de a rodagem começar, não tinha a certeza de ter ficado com o papel. Era obrigatório saber falar francês. Estranhamente, continuo a não consi-derar-me um falante de francês. Mas a língua foi--me sempre familiar. Há uns anos, até comecei a aprendê-la, depois parei, depois recomecei e por aí fora. O francês tinha-se tornado uma doença crónica da qual não conseguia livrar-me! Um problema constante... A minha mulher fala francês em casa com os miúdos. Por isso, nos últimos anos, o francês tem tido um papel cres-cente na minha vida.

Como é que actuar em francês afectou o seu desempenho?Pensei muito sobre isso. Lembro-me de o Sr. Kiarostami ter referido qualquer coisa acerca

da sua experiência no Japão, quando estava a filmar actores cuja língua ele não compreendia. Disse que apesar de ter perdido uma ferramenta enquanto realizador, tinha ganhado uma forma única de avaliar as interpretações. Já não se deixava enganar pela língua. Tornara-se capaz de perceber mais rigorosa e profundamente a qualidade de uma interpretação. Isto também se pode aplicar aos actores. Quando actuamos numa língua diferente, perdemos a arma da nossa língua materna com que, normalmente, disfarçamos os pequenos defeitos da nossa inter-pretação, inflectindo a voz, um domínio que se vai conquistando ao longo dos anos. Sem esta arma, resta-nos basear a nossa actuação em elementos primitivos como, por exemplo, os nossos olhos.

Como descreveria o Ahmad?É um estranho em França. Apesar de a cultura

lhe ser familiar e de aqui ter vivido 4, 15 ou 20 anos, isso, julgo eu, não faz diferença nenhuma, porque ele continua a ser um forasteiro. Como tanta gente do Oriente, ele não expressa directa-mente os sentimentos. É assim que as suas reacções devem ser entendidas e interpretadas. Esta diferença entre iranianos e franceses pode causar muitos mal-entendidos. Quanto ao resto da personalidade dele, não sou o tipo de actor que tenta entender a complexidade das persona-gens antes de aceitar um papel.

Com o Asghar Farhadi, imaginou um passado para Ahmad? Como é que ele veio parar a França da primeira vez, como é que conheceu a Marie…Isso faz parte do método do Sr. Farhadi. Ele fala do passado das suas personagens. Deve ser fun-damental no processo de escrita. Nunca quero

entrevista com ALI MOSAFFA

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saber tudo acerca da personagem e nunca faço perguntas ao argumentista ou ao realizador. Jul-go que tentar explicar o comportamento da per-sonagem através do seu passado é apenas uma forma de justificar as suas contradições actuais. Mas penso que se deve aceitar essas contra-dições de forma a tornar a personagem realista. É inútil tentar eliminá-las. Tentar entender uma personagem a todo o custo não ajuda o actor a desempenhar o papel.

Será a função de Ahmad ajudar os outros a falar e a revelar certas coisas?A verdade é que o Ahamd gosta tanto destas pessoas que não consegue evitar ajudá-las a re-solver os problemas. Mas esta não é a natureza dele, ele não se envolve assim tanto nas vidas dos outros e não se sente capaz de ajudar a re-solver os 0problemas dos outros. Só se envolve por causa do carinho que nutre por eles. Esta é uma das contradições. Se ele se importa tanto com a vida de Marie, porque é que a deixou? É a personalidade dele. Ele talvez seja um símbolo de uma certa geração iraniana. Pessoas hones-tas que se preocupam com os outros e que gos-tavam de os poder ajudar. Mas os tempos não os encorajam nesse sentido. Sentem-se dividi-das. Ajudar os outros, sim, mas até que ponto? Tentam preservar as próprias vidas, mas foi-lhes ensinado a serem altruístas.

A maneira de Ahmad se expressar é muito suave…Se falo mais lentamente é porque me estou a expressar em francês. Mas a realidade é que, mesmo em farsi, falo lentamente e sou uma pes--soa com vagar. É a minha maneira de ser. Mas é também uma reacção. Acho que os franceses falam muito depressa. Não consigo evitar com-portar-me de forma diferente ao pé de actores que têm algo em comum. Por isso, quanto mais rápido falam, mais devagar me apetece falar, mesmo que saiba as falas e seja capaz de as dizer rapidamente.

A sua personagem será o porta-voz de Asghar Farhadi? Poderá ele, por exemplo, represen-tar o olhar de um homem iraniano sobre um casal francês?Não me parece que o Asghar Farhadi queira ter um porta-voz no filme. Tendo em conta o que conheço do trabalho dele e da sua abordagem, ele evitaria especificamente ter alguém a representá--lo, ou fazer um filme que fosse uma espécie de manifesto. Contudo, porque esta personagem é iraniana, ele deve ter transferido mais para ele do que para os outros.

Como foi trabalhar com actores franceses?O ambiente era amigável. Nunca senti que estava a trabalhar com estrangeiros. Não sei se é sem-pre essa a regra, mas com a Bérénice, o Tahar, e a Pauline, senti-me muito apoiado. Frequente-mente, quando dava um erro em francês ou me enganava numa fala e alguém me corrigia, a Bérénice tentava minimizar o meu erro, dizendo que eu tinha um sotaque adorável! Senti que eles estavam mesmo a cuidar de mim como colegas. Apreciei muito esta solidariedade profissional que senti no cinema francês.

Uma rodagem em França é diferente de uma rodagem no Irão?Os princípios são muito semelhantes. Devemos ter-nos baseado bastante no cinema francês. Contudo, aqui as coisas são mais formais, mais substanciais.

O PASSADO é uma história francesa ou iraniana?Julgo que a força deste argumento está em não ser nem francesa nem iraniana. É uma história humana.

ALI MOSAFFA (Ahmad)

Ali Mosaffa nasceu em Teerão (Irão). Licenciou--se em Engenharia Civil na Universidade de Teerão e começou a carreira de actor em 1991 com OMID, um filme de Kavosh.

No mesmo ano, recebeu o prémio de Melhor Actor no Festival de Fajr pelo seu papel em PARI, um filme de Darius Mehrjui. Em 1996, conhece a sua futura mulher, a actriz iraniana Leila Hatami, durante a rodagem de LEILA, também realizado por Darius Mehrjui.

Ali Mosaffa realiza as suas duas primeiras cur-tas-metragens INCUBUS e THE NEIGHBOR, bem como um documentário, THE DECEIT OF POESY. Em 2005, dirige uma primeira longa-metragem, PORTRAIT OF A LADY FAR AWAY, com a par-ticipação de Leila Hatami e Homayoun Ershadi. Foi galardoado com o Troféu Sutherland, no Festival de Londres BFI. A segunda longa-me-tragem, THE LAST STEP, com Leila Hatami, con-quistou o prémio FIPRESCI e o Globo de Cristal para Melhor Actriz no Festival de Karlovy Vary.

actor2013 O PASSADO Asghar Farhadi2012 THE LAST STEP Ali Mosaffa2011 ASEMAN E MAHBOOB Darius Mehrjui2010 THERE ARE THINGS YOU DON’T KNOW

Fardin Saheb-Zamani2006 WHO KILLED AMIR? Mehdi Karampoor2003 SOMEWHERE ELSE Mehdi Karampoor2001 MIX Darius Mehrjui2000 DOKTHAR DA’I GOM SHODE Darius Mehrjui

PARTY de Saman Moghadam1998 LEILA Darius Mehrjui1996 BORJ EL MINOO deEbrahim Hatamikia1995 PARI deDarius Mehrjui1992 SARA deEsmail Soltanian1991 OMID deHabib Kavosh

realizador e argumentista2012 THE LAST STEP2005 PORTRAIT OF A LADY FAR AWAY

(co-argumentista Safi Yazdanian)1999 THE DECEIT OF POESY (documentário)

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Farhadi propõe um trabalho na linha dos anteriores, baseado num argumento com múltiplos sentidos e numa direcção de actores magistral. Serge Kaganski – Les Inrockuptibles

Cativante como um thriller (…), O PASSADO produz tudo o que de melhor o cinema é capaz. Pascal Mérigeau – Le Nouvel Observateur

O realizador iraniano Asghar Farhadi chegou a Cannes com um filme absorvente e fascinante, embora ligeiramente calculista, um triângulo de amores perdidos com Bérénice Bejo, Ali Mosaffa e Tahar Rahim. Peter Bradshaw – The Guardian

(…) uma obra tremendamente bem escrita, com personagens de uma complexidade impressionante, e sucessivas cenas que enriquecem e aprofundam a nossa compreensão acerca das acções.Kevin Jagernauth - Indiewire

França, Itália | 2013 | Cor | 130 min.

Distribuído por AlambiqueMais informações em www.alambique.pt/filme/o-passado

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