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Correspondência com filósofos argentinos
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7/18/2019 Sintomas do discurso
http://slidepdf.com/reader/full/sintomas-do-discurso 1/5
LEITURA SINTOMAL
A ocultação pode ser interpretada a partir de um paradigma do
ocultamento , apresentado por Marx como intrínseco à visão teórica daEconomia Clássica. Paradigma no sentido de que diversos autores
utilizam essa forma interpretada a seguir, particularmente Althusser e
Lacan, as principais referências aqui.
Como se sabe, credita-se a passagem da Economia Clássica para a
teoria marxista especialmente a um deslocamento de algum sentido
possível [se houver] de ‘valor do trabalho’ (principalmente Adam Smith)
para uma interpretação do que seja ‘valor da força de trabalho’:
1) negação do ‘valor do trabalho’ como valor essencial e
2) revelação [como pensamento oculto da Economia Clássica ] do
‘valor da força de trabalho’, que traz, para o primeiro plano, isto é,
estabelece um discurso declarado, sob forma de negação — a
noção de ‘mais-valia’ — fundamentalmente negada pelos
economistas clássicos, mas latente ou, como diz Marx,
inconsciente em suas próprias teorias. Um valor, malgrado não
declarado, efetivo.
A transição de ‘ valor do trabalho ’ para ‘ valor da força de trabalho ’,
denota o nó onde a nova teoria — a marxista — pode formular, dando
consequências inesperadas em uma relação entre causas e efeitos, epodendo revelar, através de falhas, o que ainda não havia sido pensado
mas já se encontrava lá.
A inconsciência [Bewußtlosigkeit] sobre esse
resultado de sua própria análise, a aceitação
sem crítica das categorias “valor do trabalho”,
“preço natural do trabalho” etc. como
expressões últimas adequadas da relação de
valor examinada, emaranhou a Economia
Política clássica, enquanto ofereceu àEconomia vulgar uma base segura de
operações para sua superficialidade,
dedicada principalmente ao culto das
aparências.
Pode-se dessa forma proceder finalmente a uma análise ideológica
através do juízo do valor do valor, para pensar o não pensado ainda.
Sobre essa forma de manifestação, que tornainvisível a verdadeira relação e mostra justamente o contrário dela , repousam
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todas as concepções jurídicas tanto do
trabalhador como do capitalista, todas as
mistificações do modo de produção capitalista,
todas as suas ilusões de liberdade, todas as
pequenas mentiras apologéticas da Economia
vulgar .(MARX 6, Livro I, Cap. XVII [XIX])
Procedimentos da interpretação sintomática do ‘valor da força detrabalho’ em Marx
Do enunciado tomado de Adam Smith e referido originalmente por Marx :
O valor do trabalho é igual ao valor dos meios
de subsistência necessários à manutenção e à
reprodução de trabalho.
A leitura sintomal deve permitir ver “o que o próprio texto clássico diz
não dizendo e o que não diz ao dizer ”, na medida em que nos faz ver,
nos interstícios do texto, que “seu silêncio são suas próprias palavras ” (ALTHUSSER 1 e 3 e ALTHUSSER; BALIBAR 4)
Marx nos faz ver o equívoco apontando a repetição do termo trabalho ,
isto é, a circularidade da referência e o vazio ontológico e essencial quefundamenta o valor.
O enunciado, segundo Marx , tenta se apresentar como um enunciado
pleno e completo, uma equação de comparação de valores onde se
podem introduzir algumas variáveis, representadas pelas reticências
(...) :
‘O valor de (...) trabalho’ é igual ao valor dos
meios de subsistência necessários à
manutenção e à reprodução de ‘ (...) trabalho’.
Ele introduz, em seguida, uma diferença que modifica o enunciado,
substituindo a referência ao trabalho, na segunda parte da frase, por
‘trabalhador’, ressaltando o equívoco e o desacordo:
O valor do trabalho é igual ao valor dos meios
de subsistência necessários à manutenção e à
reprodução do trabalhador.
Vê-se que o procedimento de leitura obedece, de fato, ao desvelamentode um sintoma, atestando o que mesmo Lacan já enunciara,
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magnificamente como: Marx, inventor do sintoma (LACAN 5: p. 234 –
“Do sujeito enfim em questão”).
Inventor do sintoma no seguinte sentido: a falha de um discurso, ou
algum problema ou vazio de referência revela, para além do defeito ou
vacuidade, uma verdade oculta que pode ser revelada em um novoescopo ou tratamento. Dessa forma, o sintoma “representa o retorno da
verdade como tal na falha de um saber”.
Se o valor do trabalho é equivalente ao valor da reprodução do trabalho,
onde reside o lucro e a reprodução do próprio capital? Seu valor seria
consumido apenas na manutenção do trabalhador, fosse ele o valor da
reprodução do próprio trabalhador. No entanto, o trabalhador se
reproduz e, além disso, existe o lucro, o aumento e reprodução do
capital e a produtividade: existe um excesso de trabalho, para além dasobrevivência do trabalhador.
O que se esconde aí, no discurso sobre a produção do valor segundo a
economia clássica, diz Marx, é a mais-valia: o discurso efetivo e não formulado de normatividade, que pode ser revelado ou reconhecido
através da negação de um valor como essencialidade — o do trabalho
— e como sintoma de que possa existir um outro valor
fundamentalmente ocultado — o da força de trabalho .
Ali mesmo onde Adam Smith pretende responder à questão do “valor do
trabalho ”, Marx nos faz ver que
Essa falta localizada, pela resposta, na
própria resposta, na proximidade da palavra
trabalho, nada mais é que a presença, na
resposta, da ausência de sua questão, nada
mais é que a falta de sua questão
(ALTHUSSER 2, pág. 21 e ALTHUSSER;
BALIBAR 4).
Marx pode “colocar a questão não enunciada ” no enunciado ― tal como
Freud pretende preencher as lacunas da memória no tratamento da
histeria lendo no discurso dos sonhos alguns sintomas ―
restabelecendo no enunciado o conceito de ‘força de trabalho’:
O valor da força de trabalho é igual aovalor dos meios de subsistêncianecessários à manutenção e à reproduçãoda força de trabalho.
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Desta maneira, a leitura sintomal torna evidente a equação pela qual,
ao vender livremente sua força de trabalho como uma mercadoria, o
trabalhador se vê tomado no circuito da exploração capitalista em que
sua liberdade se converte em dominação e sua produtividade em
alienação de sua força produtiva: a reprodução de sua subsistência
como trabalhador tem uma defasagem, ou DÉFICIT enorme com relação
à reprodução da força de trabalho , pois esta última deve contemplar
como face oculta de si a mais-valia e a própria taxa de reprodução do
Capital . A esse déficit se denomina ALIENAÇÃO .
Seu discurso esconde um processo de alienação fundamental .
Revelando, como sintoma das relações capitalistas, a produção da mais
valia como valor normativo não formulado .
Assim como esses, outros valores ocultos se revelam, por exemplo o
valor de troca :
A determinação do valor de mercado dos
produtos, portanto, também dos produtos da
terra, é um ato social, apesar de ser um ato
executado de maneira socialmente
inconsciente e não-intencional, que
necessariamente se baseia no valor de troca
do produto, não do solo e nas diferenças de
sua fertilidade. (MARX 6, Livro III, Sec VI, Cap.
XXXIX, pág. 155)
Herci 2013
Referências1. ALTHUSSER, Louis. L’unique tradition matérialiste (1985) . Lignes
[P ARIS ], , n. 8, p. 72–119, 1993a.
2. ALTHUSSER, Louis. Ler o capital . Rio de Janeiro: Zaar, 1979b.
3. ALTHUSSER, Louis. Para una cri tica de la pra ctica teo rica : respuestaa John Lewis . Madrid: Siglo XXI de Espan a Editores. [2a. ed.]. ed.,1974c.
4. ALTHUSSER, Louis; BALIBAR, Étienne. Lire Le apital I . Paris:François Maspero, 1973.
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5. LACAN, Jacques. Ecrits . Paris: Seuil, 1966.
6. MARX, Karl. O capital: Crítica da Economia Política [DAS KAPITAL - KRITIK DER POLITISCHEN KONOMIE]. Trad. Regis Barbosa e Flávio R.Kothe. (Regis Barbosa e Flávio R. Kothe, Trad.). São Paulo:
Editora Nova Cultural Ltda, 1996.
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