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SISTEMA SCLIAR DE ALFABETIZAÇÃO Fundamentos Leonor Scliar-Cabral Florianópolis, 2012 Editora Lili

SISTEMA SCLIAR DE ALFABETIZAÇÃO Fundamentos Outubro_2013/SISTEMA-SCLIAR-DE... · adquirida espontanea e compulsoriamente por determinantes biopsicólogicos da espécie, enquanto

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SISTEMA SCLIAR DE

ALFABETIZAÇÃO

Fundamentos

Leonor Scliar-Cabral

Florianópolis, 2012

Editora Lili

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SISTEMA SCLIAR DE ALFABETIZAÇÃO -

FUNDAMENTOS

Leonor Scliar-Cabral

Florianópolis, 2012

Editora Lili

Ficha técnica / ficha catalográfica

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Professor e professora,

Apesar de todos os esforços e empenho, o índice de analfabetismo funcional no Brasil

ainda é muito alto. Você está consciente disso e mais ansioso do que ninguém para que

seus alunos aprendam a ler de modo a compreender os textos que circulam a sua volta,

sejam eles o material escolar, jornais, livros, poemas, avisos, instruções ou informações

no computador; e a também redigir para que se façam entender quando tiverem que

enviar uma carta ou prestar um exame para conseguir um emprego, ou para entrar na

universidade.

Uma das explicações para estes altos índices de analfabetismo funcional é que o país

carece de materiais alinhados com as descobertas avançadas das neurociências. O

Sistema Scliar de Alfabetização vem prencher esta lacuna. Ele foi desenvolvido para

ajudar a prevenir o analfabetismo funcional, na convicção de que isso só será possível

se a batalha começar no início da aprendizagem da leitura e da escrita, mais

precisamente, na alfabetização.

Você, caro professor, e os educadores envolvidos com este desafio encontrarão nos

Fundamentos informação sólida e atualizada nos tópicos que se referem à linguagem

verbal oral e escrita e seu processamento, bem como as bases para a alfabetização para o

letramento. O material pedagógico fundamentado em tais tópicos compreende o livro do

aluno Aventuras de Vivi (SCLIAR-CABRAL, 2012) e o livro do professor Sistema

Scliar de Alfabetização – Roteiros para o professor: 1º Ano (SCLIAR-CABRAL,

2013). Os livros do aluno e respectivos roteiros para o professor, para o segundo e

terceiro anos, quando se completa a alfabetização, estarão disponíveis até o final de

2013.

Afinal, é bom saber o que se faz, por que se faz e como se faz! Com tal fundamentação,

você estará mais seguro para realizar as práticas em classe e organizar com eficiência

seu plano de aulas.

Ao ler e refletir sobre os fundamentos, você:

1. obterá melhores resultados com seus alunos. Eles se sentirão mais confiantes,

desenvolvendo o gosto pela leitura e pela escrita;

2. entenderá melhor as dificuldades de seus alunos e saberá como contorná-las;

3. saberá em que foi baseado o material de qualidade com o qual trabalhará em sala aula

e quais as mais recentes teorias e pesquisas sobre leitura, conhecendo para o que serve

cada atividade e como deve ser aplicada;

4. desenvolverá sua capacidade de aproveitar todas as oportunidades para consolidar a

unidade que será trabalhada, bem como enriquecerá o aprendizado com suas próprias

contribuições.

5. entenderá por que, na presente etapa, a ênfase é para com a leitura, sem descurar a

produção textual.

Todo o material já foi testado e aprimorado. Gostaria de registrar as valiosas

contribuições de Ana Cláudia de Souza, Mariléia Silva dos Reis e Otilia Lizete de

Oliveira Martins Heinig, que muito ajudaram no aperfeiçamento dos conceitos e

práticas aqui desenvolvidos.

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Boa leitura!

Leonor Scliar-Cabral

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Sumário

1. Introdução

2. Analfabetismo funcional, desafio para a escola

3. As neurociências na alfabetização e leitura

4. Desenvolvimento da língua verbal oral

5. Fundamentos da alfabetização integral e integrada

6. Métodos de alfabetização

7. As principais dificuldades na alfabetização

8. Outras dificuldades na alfabetização

9. A leitura e o sistema alfabético do português brasileiro

10. Critérios para a introdução dos grafemas

11. Como escolher o grafema para as atividades de ensino-aprendizagem

12. Quadro fonêmico das consoantes e das vogais do PB

13. Valores atribuídos aos grafemas, independentes do contexto grafêmico

14. Valores dos grafemas, dependentes do contexto escrito

15. Letras M m - N n em final de sílaba interna para nasalizar a vogal precedente e, em

final de vocábulo, depois de E e - A a, nasalizando e ditongando

16. Valores de C c - G g - Q q antes das vogais posteriores

17. Os dois valores do grafema R r dependentes do contexto grafêmico - o único valor

do grafema RR rr

18. Valores previsíveis e imprevisíveis do grafema X x

Anexos

Gabarito das avaliações de aprendizagem, com comentários

Referências Bibliográficas

Figuras e Quadros

Figura 1. Visão moderna das redes corticais da leitura (adaptação a partir de

DEHAENE, 2012, p. 78)

Quadro 1. Quadro fonêmico das consoantes do PB

Quadro 2. Quadro fonêmico das vogais do PB

Quadro 3. Valores dos grafemas, independentes do contexto

Quadro 4. Valores dos grafemas em início de vocábulo e de sílaba interna, entre letras

que representam vogais

Quadro 5. Valores em início de sílaba dos grafemas s depois de n, l, r; de r depois de

n, l, s; de x depois de n, ei, ou, ai Quadro 6. Valores dos grafemas em final de vocábulo e de sílaba interna

Quadro 7. Letras que nasalizam as vogais em final de sílaba interna e de vocábulo (com

ditongação opcional)

Quadro 8. Exemplos dos valores dos grafemas c, g, q, seguidos de grafemas que

representam as vogais posteriores ou a semivogal /w/ Quadro 9. Exemplos dos valores dos grafemas c, sc, xc, g e grafemas (dígrafos) gu e

qu, seguidos de grafemas que representam as vogais não posteriores

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1. Introdução

Ícone objetivos

Neste capítulo você conhecerá de forma resumida os fundamentos do Sistema Scliar de

Alfabetização que explicam as diferenças entre a aquisição da variedade oral da língua e

a aprendizagem da língua escrita, bem como as bases neuropsicológicas dessa última,

em particular, a dificuldade para os neurônios aprenderem a dissimetrizar os sinais

visuais e a segmentar a cadeia da fala. Aborda-se, também rapidamente, a questão

sociolinguística e a educação integral e integrada. Tais conteúdos serão aprofundados

em capítulos específicos.

O Sistema

O Sistema Scliar de Alfabetização está baseado no que há de mais avançado na teoria e

prática das ciências que se ocupam da linguagem verbal. Estes fundamentos podem ser

resumidos nos pontos a seguir.

Diferença entre aquisição oral e escrita

A aquisição do sistema oral se dá de forma natural e espontânea nas crianças que não

apresentem nenhum impedimento sensorial ou cognitivo para processar a fala. As

primeiras palavras ocorrem por volta de um ano de idade. O sistema escrito, no entanto,

é construído no contexto do ensino-aprendizagem de forma sistemática, intensiva,

quando a criança já atingiu certa maturidade cognitiva, linguística e emocional.

Enquanto a comunicação oral é questão de sobrevivência do ser humano, datando um

dos fósseis mais antigos (Lucy) há aproximadamente três milhões e meio de anos, a

escrita, entendida como um modo secundário, distinta da pintura, do desenho ou de

outros meios de memorização, apareceu muito recentemente (aproximadamente há

5.000 anos a.C.). Essa evidência da paleontologia demonstra que a comunicação oral é

adquirida espontanea e compulsoriamente por determinantes biopsicólogicos da espécie,

enquanto os sistemas de escrita são uma invenção tardia: na maioria dos casos, a criança

precisa vir à escola, principalmente, para aprender a ler e a escrever.

Foto com legenda. A escrita apareceu muito recentemente.

Ícone dicionário:

Maturidade Cognitiva: Ao nascer, o cérebro do bebê não está com os circuitos que o

constituem inteiramente prontos, nem com todos os conhecimentos linguísticos e do

mundo já armazenados em suas várias memórias. O amadurecimento é gradativo e

depende, também, da experiência.

Primeiro compreender, depois produzir

Em toda a aprendizagem, para saber produzir, deve-se saber compreender, isto é, antes

de falar, a criança deve compreender o que os adultos dizem para ela e assim começar a

dominar a língua, para depois poder dizer suas primeiras palavras. A mesma coisa

acontece com a língua escrita: sem saber ler, a criança não poderá compreender nem o

que ela própria “escreveu”.

Na prática

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Não comece a alfabetização pelo ensino isolado da escrita. Você pode até começar

quase simultaneamente com a escrita, desde que a criança aprenda a reconhecer as

diferenças entre as letras e os seus valores na leitura.

Reciclagem neuronal

Uma das grandes descobertas das neurociências é a de que os neurônios que processam

as imagens visuais são programados para simetrizar a informação. No entanto, para o

reconhecimento das letras, isto é, das diferenças que apresentam entre si, é necessário

reciclar os neurônios para que eles aprendam a distinguir a direção dos traços das letras.

A proposta de Montessori, uma importante pedagoga italiana, cuja abordagem é seguida

por centenas de escolas ao redor do mundo, já preconizava tal enfoque. Introduza cada

letra com comandos para que a criança a trace com o dedo, ao mesmo tempo em que diz

o som que ela representa. As informações sensoriais processadas pela visão, pela

audição, pelo tato e pela propriocepção se reforçam mutuamente.

Ícone dicionário

Simetrizar Informações: “Os neurônios da visão foram biologicamente programados

para simetrizar a informação. Cada vez que um hemisfério aprende uma informação

visual nova, este traço de memória é imediatamente transmitido ao outro hemisfério”

(DEHAENE, 2012, cap. 7).

Propriocepção: é a percepção do próprio corpo, sua postura, movimentos, mudanças

no equilíbrio, bem como a de suas respectivas sensações de movimento e posições.

O sistema escrito do português é alfabético

A maior dificuldade para uma criança se alfabetizar é a de que ela percebe a fala como

um contínuo, isto é, não há separação entre as palavras, nem entre consoantes e vogais.

Por exemplo, por que a criança, ao começar a escrever, coloca uma sucessão de sinais

numa linha, sem espaços em branco entre as palavras? Por que, mais adiante, escreverá

“zóio”, “zoreia”? Porque é assim que percebe a fala.

Para aprender a ler, a criança deverá compreender, aos poucos, que:

a escrita representa a fala, porém não exatamente tal como é percebida;

na escrita, as palavras são separadas por espaços em branco;

uma ou duas letras (para o professor, um grafema) têm o valor de um som (para o

professor, um fonema); às vezes, uma letra poderá ter sempre o mesmo valor, como f, mas outras vezes poderá ter mais de um valor como c, que antes das letras u, o, a tem o

valor de /k/, como em cubo, cor, cola e antes de i, e tem o valor de /s/, como em

cipó, cera.

Ícone Atenção!

Para reconhecer a palavra escrita, além de saber atribuir os valores a cada grafema (uma

ou duas letras), a criança deverá saber onde cai o acento mais forte (acento de

intensidade), pois, no português, o acento pode cair na última (oxítonas), penúltima

(paroxítonas) ou antepenúltima sílaba (proparoxítonas).

Sendo a maior dificuldade para uma criança se alfabetizar o fato de ela perceber a fala

como um contínuo, é preciso que você a ajude a analisar conscientemente a fala,

desmembrando a cadeia em palavras, essas em sílabas e, o que é mais difícil, separar as

consoantes das vogais. Essa aprendizagem, que se chama consciência fonológica, só é

possível, num contexto lúdico, associando cada fonema a um grafema (uma ou duas

letras), mostrando que, mudando um fonema por outro (igualmente seu grafema por

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outro), as palavras mudam de significado. Assim, a estratégia do ensino-aprendizagem

está baseada sobre um tripé de conceitos:

1. Reconhecer a direção dos traços que diferenciam as letras entre si;

2. Dominar os valores dos grafemas, associando-os aos fonemas que representam;

3. Utilizar as letras que realizam os grafemas dentro de palavras e estas em um texto.

Ícone dicionário

Grafema: Unidade de um sistema de escrita que, na escrita alfabética, corresponde a

uma ou mais letras para representar um dado fonema (no português, uma ou duas letras,

somente, com ou sem acentos gráficos); na escrita silábica, corresponde a uma sílaba.

Fonema: Classe de sons, com a função de distinguir significados. Por exemplo, o

fonema /R/, no português, engloba diferentes sons praticados em diferentes regiões do

Brasil, como no Rio de Janeiro, na fronteira do Rio Grande do Sul, no interior de Minas

Gerais ou de São Paulo, na Bahia, e assim por diante.

Dica (pode ser um ballon, com um professor; professora falando):

Trabalhar apenas com sons isolados, ou com os nomes das letras, não é suficiente para

preparar a criança para a alfabetização. Trabalhe sistematicamente onde cai o acento de

intensidade.

Variação sociolinguística A fala apresenta variação determinada por vários fatores: quando lê, a criança converte

o que lê a sua variedade sociolinguística, quando escreve, dá-se o inverso: o sistema

escrito é um só em todo o território nacional. Assim, em virtude da mobilidade social,

há alunos que vêm de regiões diferentes e, mesmo, de famílias que praticam em casa

outras línguas, como o italiano, o alemão ou o japonês. Também há diferenças

determinadas pelo nível de escolaridade e de educação dos pais. Por isso, na escola,

deve ser ensinado o respeito à diferença, evitando que essas crianças sejam

ridicularizadas quando falam ou leem em voz alta. Para ensinar a escrever, o professor

deve estar atento, porque as regras de conversão não são as mesmas. Assim como não se

escreve “nãum” ao invés de “não”, o professor deve mostrar, aos poucos, que quando se

diz [´fumu], se escreve “fomos”.

Ícone Na prática

Respeite a variedade sociolinguística da criança na leitura em voz alta.

Educação integral e integrada

A alfabetização integral parte do pressuposto de que o alvo é a educação plena do

indivíduo: cognição, afetos, sociabilidade, o físico e o estético, em vasos comunicantes,

deverão levá-lo ao exercício da cidadania e à realização pessoal, com a capacidade para

entender os textos escritos que circulam em sociedade e para produzir os de que

necessita. Isto significa que não se podem divorciar as ciências humanas das ciências

biológicas: o cultural não pode ser pensado sem o biológico, nem a especialização

cerebral sem ser plasmada pelo ambiente. A alfabetização integrada é aquela que

aproveita todos os espaços e tempos disponíveis para o ensino-aprendizagem da direção

dos traços que diferenciam as letras entre si, da constituição dessas em grafemas

associados aos seus respectivos valores (os fonemas). Ambos têm a função de distinguir

significados, portanto, devem estar inseridos em palavras e estas em textos

significativos para o educando, ou seja, a alfabetização integrada utiliza as disciplinas

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de matemática, ciências, estudos sociais, educação física, artes, lazer, e as atividades de

socialização, todas coerentemente entrosadas em torno de uma temática, com um

objetivo comum.

Ícone Na prática

Todas as unidades do livro Sistema Scliar de Alfabetização – Roteiros para o professor:

1º Ano possuem sugestões de atividades lúdicas como jogos, dramatização, música,

dança, poesia, desenho, narrativas e esportes para o desenvolvimento cognitivo

(matemática e demais linguagens), linguístico, físico, emocional, estético e social. Para

o livro do aluno Aventuras de Vivi, foi elaborada uma história, a fim de estabelecer a

empatia entre a criança e os personagens. Os temas ajudam a promover a integração

entre a escola, família e comunidade, a qual é essencial para o seu êxito como

alfabetizador. Lembre-se de explorar, também, os aspectos ecológicos.

Professor, você, com sua criatividade e engajamento, é parte fundamental para que o

Brasil acabe com o analfabetismo funcional!

Ícone Pontos importantes

Nesta unidade, você tomou conhecimento, de forma resumida, sobre os fundamentos do

Sistema Scliar de Alfabetização que são:

a aquisição do sistema oral se dá de forma natural e espontânea nas crianças que não

apresentem nenhum impedimento sensorial ou cognitivo para processar a fala, enquanto

o sistema escrito é construído no contexto do ensino-aprendizagem de forma

sistemática, intensiva, na maioria dos casos;

em toda a aprendizagem, para saber produzir, deve-se saber compreender: sem saber

ler, a criança não poderá compreender nem o que ela própria “escreveu”;

para o reconhecimento das letras, isto é, das diferenças que apresentam entre si, é

necessário reciclar os neurônios para que eles aprendam a distinguir a direção dos traços

das letras, isto é, é necessário ensiná-los a dissimetrizar;

as informações sensoriais processadas pela visão, pela audição, pelo tato e pela

propriocepção se reforçam mutuamente. Aplicam-se, pois, os ensinamentos de

Montessori sobre aprendizagem;

além de saber atribuir os valores a cada grafema (uma ou duas letras), a criança deverá

saber onde cai o acento mais forte;

na escola, deve ser ensinado o respeito à diferença, evitando que as crianças sejam

ridicularizadas quando falam ou leem em voz alta;

a alfabetização integral parte do pressuposto de que o alvo é a educação plena do

indivíduo;

a alfabetização integrada é aquela que aproveita todos os espaços e tempos disponíveis

para o ensino-aprendizagem da direção dos traços que diferenciam as letras entre si e da

constituição dessas em grafemas associados aos seus respectivos valores (os fonemas).

(bloco de anotações)

Sugestões para reflexão e pesquisa

O que são atividades multissensoriais?

O que é simetrização?

Por que não se deve começar a alfabetização pela escrita isoladamente?

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ícone Avaliação de aprendizagem

1. Uma das maiores dificuldades na alfabetização é ensinar os neurônios a

dissimetrizar. Por que isto ocorre?

a ( ) Porque os neurônios humanos não têm plasticidade para novas aprendizagens.

b ( ) Porque os neurônios só aprendem através do estímulo-resposta-recompensa.

c ( ) Porque os neurônios, por uma questão de sobrevivência, foram programados para

descartar as diferenças de direção para a esquerda e para a direita e, por isto, deverão ser

reciclados.

d ( ) Porque a noção de esquerda e direita depende da internalização do esquema

corporal.

e ( ) Porque perceber a direção dos traços para a esquerda ou direita não interessa para o

reconhecimento das letras.

2. Analfabetismo funcional, desafio para a escola

Ícone síntese

No primeiro capítulo, você tomou conhecimento sobre os fundamentos do Sistema

Scliar de Educação que explicam as diferenças entre a aquisição da variedade oral e a

aprendizagem da língua escrita, bem como as bases neuropsicológicas, em particular, a

dificuldade para os neurônios aprenderem a dissimetrizar os sinais visuais e a segmentar

a cadeia da fala. Abordou-se, também, a questão sociolinguística e a educação integral e

integrada. Como explicado, tais conteúdos serão aprofundados em capítulos específicos.

ícone objetivo

Neste capítulo você conhecerá dados alarmantes sobre o analfabetismo funcional no

Brasil e em outros países considerados desenvolvidos, como os EUA e o Reino Unido.

Você descobrirá quais são os conceitos de analfabetismo funcional e os vários níveis

estabelecidos pela UNESCO. Verá, também, como a Escócia conseguiu combater o

analfabetismo funcional com um programa exitoso, fonte de inspiração para o Sistema

Scliar de Alfabetização.

Breve histórico

Embora o Instituto Nacional de Alfabetismo Funcional (INAF) aplique suas pesquisas

domiciliares a uma população entre 15 e 64 anos de idade, residente em zonas urbanas e

rurais de todas as regiões do país e, portanto, não se restrinja àquela que esteja

frequentando a escola, oferece-nos dados sobre o alfabetismo dos que nela ainda estão

e/ou seus egressos.

Como pré-requisito, é necessário entender a classificação de alfabetismo adotada pelo

INAF (2009) de acordo com suas habilidades em leitura/escrita (letramento) e em

matemática (numeramento).

Analfabetos funcionais

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Analfabetismo - Corresponde à condição dos que não conseguem realizar tarefas

simples que envolvem a leitura de palavras e frases, ainda que uma parcela destes

consiga ler números familiares (números de telefone, preços etc.).

Alfabetismo rudimentar - Corresponde à capacidade de localizar uma informação

explícita em textos curtos e familiares (como um anúncio ou pequena carta), ler e

escrever números usuais e realizar operações simples, como manusear dinheiro para o

pagamento de pequenas quantias ou fazer medidas de comprimento usando a fita

métrica.

Alfabetizados funcionalmente

Alfabetismo básico - As pessoas classificadas neste nível podem ser consideradas

funcionalmente alfabetizadas, pois já leem e compreendem textos de média extensão,

localizam informações mesmo que seja necessário realizar pequenas inferências, leem

números na casa dos milhões, resolvem problemas envolvendo uma sequência simples

de operações e têm noção de proporcionalidade. Mostram, no entanto, limitações

quando as operações requeridas envolvem maior número de elementos, etapas ou

relações.

Alfabetismo pleno - Classificadas neste nível estão pessoas cujas habilidades não mais

impõem restrições para compreender e interpretar elementos usuais da sociedade

letrada: leem textos mais longos, relacionando suas partes, comparam e interpretam

informações, distinguem fato de opinião, realizam inferências e sínteses. Quanto à

matemática, resolvem problemas que exigem maior planejamento e controle,

envolvendo percentuais, proporções e cálculo de área, além de interpretar tabelas de

dupla entrada, mapas e gráficos.

Fonte: Inaf - evolução do indicador (2012)

Em pleno 2013, ficamos estarrecidos, ao constatar as cifras alarmantes de analfabetos

funcionais no Brasil e os baixos escores obtidos pelos alunos brasileiros, na faixa dos 15

anos, conforme o Relatório PISA (OCDE, 2011), que avalia as competências em

linguagem, em matemática e em ciências e constatados também pelo INAF, o Indicador

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de Alfabetismo Funcional, conduzido pelo Instituto Paulo Montenegro e pela ONG

Ação Educativa. Apesar do aumento significativo da matrícula escolar e dos anos de

escolaridade (FERNANDES, 2012), a porcentagem de analfabetos funcionais no país,

ainda é alarmante: conforme o Boletim INAF (2012), em 2012, na faixa etária dos

brasileiros de 15 a 64 anos, encontram-se 6% de “analfabetos absolutos”; no nível

rudimentar, 21%; no nível básico, 47% e apenas 26% conseguem o nível pleno.

Decididamente, 27% dos brasileiros não têm as condições mínimas para o exercício da

cidadania, nem para refazer a leitura de mundo, a partir da leitura da palavra (FREIRE,

2002, p. 54). Pode-se afirmar que 47% o fazem de forma precária e apenas 26% estão

aptos a compreender e refletir sobre os textos necessários ao exercício da cidadania de

forma plena e à ampliação da sua aptidão para competir no mercado de trabalho, com

auto-aprendizagem e educação continuada. Tais cifras também nos alertam para o fato

de que a desigualdade social não pode ser efetivamente combatida quando a maioria dos

indivíduos não domina a ferramenta que os habilite à qualificação profissional. Os

últimos dados apontam para discreta melhora.

O último relatório PISA, o Programa de Avaliação Internacional de Estudantes

realizado pela OCDE (2011), mostra que o Brasil teve uma pequena melhora nos

resultados, mas ainda ocupa uma das últimas posições quando se trata de proficiência

em leitura, ficando em 53º lugar dentre os sessenta e cinco países participantes, obtendo

412 pontos no quesito leitura, contra 393 de 2006. Dentre os países latino-americanos o

Brasil só ficou acima da Argentina e da Colômbia, sendo superado pelo México,

Uruguai e Chile. Pela primeira vez, o relatório levou em conta a capacidade de os

alunos lerem, compreenderem e utilizarem textos digitais.

Foto: (crianças e/ou papeis/escrita/ ou pessoa perdida no meio de placas/livraria)

Legenda: Mas o que é o analfabeto funcional?

Definições de analfabeto funcional

Existem muitas definições de analfabeto funcional.

(3 boxes, lado a lado?)

“O conceito de analfabeto funcional, como o próprio adjetivo indica, deve, contudo,

repousar sobre a falta de competência do indivíduo para ler e escrever os textos dos

quais necessita em sua vida cotidiana familiar, social e de trabalho” (SCLIAR-

CABRAL, 2003a).

“É funcionalmente letrada a pessoa que puder engajar-se em todas as atividades, nas

quais o letramento for condição para o desempenho efetivo no seu grupo e comunidade,

e também para permitir-lhe que continue a utilizar a leitura, a escrita e o cálculo para o

seu próprio desenvolvimento e o de sua comunidade” (UNESCO, 2007).

“Na leitura, ser letrado é entender, usar e refletir sobre textos escritos, a fim de alcançar

as próprias metas para desenvolver o conhecimento e as potencialidades e participar na

sociedade” (OCDE, 2007, trad. da autora).

Ícone dicionário

Analfabeto funcional: É o indivíduo que, apesar de ter frequentado a escola, não

consegue compreender, nem produzir os textos de que necessita.

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Convém, neste passo, retomar a reflexão sobre letramento. Na definição de letrado

funcional da UNESCO infere-se que o letramento efetivo pressupõe que a pessoa saiba

ler, isto é, compreenda os textos que circulam socialmente, permitindo o engajamento

do indivíduo em todas as atividades nas quais tais competências sejam necessárias.

Infere-se, igualmente, não haver uma oposição entre alfabetização e letramento,

porquanto só se torna efetivamente letrado quem estiver alfabetizado, havendo,

portanto, uma complementaridade entre ambos e não exclusão mútua. Magda Soares

(2004) discute em profundidade tais questões.

Há vários níveis de analfabeto funcional: o mais grave é aquele em que, por não ter sido

alfabetizado, o indivíduo não reconhece a palavra escrita. Ao ver uma sucessão de

caracteres ao lado de uma gravura de um gato diante de um prato com leite, “adivinha”:

O bichinho está lambendo o prato, ao invés de ler o que está escrito: O gato está

tomando leite.

Foto/desenho gato com leite e legenda: O gato está tomando leite.

É o que sucede com aqueles que foram “alfabetizados” pelo método global, ou aqueles

que foram alfabetizados, emparelhando uma palavra a uma figura e adivinham o que

está escrito. Segue-se aquele que consegue decifrar algumas letras, mas, ou foi

alfabetizado pelo nome das letras, ou não aprendeu que uma ou duas letras (os

grafemas) têm o valor de uma classe de sons (os fonemas), o qual, em alguns casos, vai

ser diferente conforme a letra que vem depois. Nesse segundo caso, tal aluno titubeia

diante das letras e sua leitura é penosa: não só o esforço é tal que ele perde qualquer

gosto pela leitura, como também a memória de trabalho não consegue processar as

palavras com fluência e a pessoa acaba não entendendo o que leu.

Uma classificação mais operacional em cinco níveis é a utilizada pelo LAMP (Literacy

Assessment and Monitoring Programme), programa de testagem e monitoria da

UNESCO (2007):

(fazer como uma escada ao lado, com destaque para os números. Colocar o nível um no

degrau mais baixo, e o 4 e 5 no mais alto)

Níveis 4 e 5: Os entrevistados demonstram domínio das habilidades para processar

informação mais complexa.

Nível 3: Mínimo adequado para dar conta das demandas diárias e de trabalho, numa

sociedade complexa. É o nível requerido para completar a escola secundária e entrar na

universidade.

Nível 2: Os entrevistados só conseguem operar tarefas e material escrito simples,

disposto com clareza. Conseguem ler, mas se saem mal nos testes de compreensão.

Podem ter desenvolvido habilidades de cópia para dar conta das demandas de escrita

mais corriqueiras, mas acham difícil enfrentar novos desafios como os exigidos no

trabalho.

Nível 1: O indivíduo possui habilidades muito pobres e pode nem ser capaz de

determinar a dose correta do remédio para dar ao filho, a partir do rótulo da embalagem.

(trad. da autora)

Dados alarmantes

O Departamento de Educação do Reino Unido em seu relatório de 2006 informou que

47% das crianças deixam a escola aos 16 anos sem ter adquirido o nível básico em

matemática funcional e 42% falham em alcançar o nível básico no inglês funcional

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(Guardian Unlimited, 10/07/2007). A cada ano, 100.000 alunos deixam a escola como

analfabetos funcionais no Reino Unido. Embora a taxa de letramento, nos Estados

Unidos, seja muito elevada, mensurada por no mínimo oito anos de escolaridade,

estatísticas recentes indicam a existência de aproximadamente 30 milhões de

analfabetos funcionais, cifra que vem aumentando (Civilliberties, 2007).

Foto aluno na escola:

Legenda: Frequentar a escola até completar o ensino fundamental não garante que o

indivíduo consiga entender e usar os textos escritos, nem refletir sobre eles.

Somente as instituições que investiram pesado na formação do magistério e adotaram

métodos e materiais advindos das pesquisas avançadas conseguiram resultados

satisfatórios no domínio da leitura e escrita por parte da população. A China, a

Finlândia, a Coreia, Hongkong, cidade-estado e Singapura, países que investiram

pesado em educação de qualidade, têm conseguido os melhores escores, ao contrário de

países como Azerbaijan ou Kyrgyzstan, nas últimas posições.

Outros dados preocupantes se referem aos anos de escolaridade da população, em

virtude das altas taxas de evasão escolar no Brasil, particularmente no nível médio, com

10% de abandono, em 2006, passando para 11% em 2008, enquanto países como o

Chile, Paraguai e Venezuela ostentam 3% (GOMIDE, 2010).

Como as Neurociências, a Psicolinguística e a Linguística podem contribuir para

reverter o quadro? Uma das possibilidades é conhecer quais as medidas que foram

tomadas em cenários que apresentavam taxas alarmantes de analfabetismo funcional e

que conseguiram baixá-las consideravelmente. É o que você verá a seguir.

O programa Inciativa de Intervenção Precoce

O programa Inciativa de Intervenção Precoce (Early Intervention Initiative, EII) foi

desenvolvido pelo Conselho do Condado Oeste de Dunbartonshire, na Escócia, que, em

junho de 2007, recebeu o prestigioso prêmio do Municipal Journal pela maior conquista

em assistência à criança no Reino Unido (West Dunbartonshire Council, 2007). É um

bom exemplo a ser seguido!

Confira como se deu a implantação do progama.

(fazer estilo linha do tempo)

1997 - Início do programa. Somente 5% das crianças que frequentavam a primeira série

da escola primária, que equivale ao Ensino Fundamental no Brasil, conseguiam escores

altos em leitura. Meta: acabar em 10 anos com o analfabetismo funcional.

1998 - Com um ano de aplicação, 45% das crianças conseguem escores altos em leitura.

2001 - Um em cada três alunos do secundário (28%) era analfabeto funcional. Depois

de ter frequentado sete anos do ensino fundamental, seu nível de leitura era o

equivalente ao de uma criança de nove anos e meio.

2005 - As crianças do programa começam a ingressar na escola secundária. O índice de

analfabetismo funcional cai para 6%.

Como isto foi obtido? Sem entrar em detalhes, que você conhecerá mais à frente,

observe, de saída, que o programa prioriza a educação infantil, desenvolvendo a

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consciência fonológica na pré-escola e utilizando basicamente o método fônico sintético

e o enfoque multissensorial de Montessori, com material pedagógico elaborado a partir

de pesquisas da proposta Jolly Phonics (WERNHAM; LLOYD, 1993, 2007). Também

conta com atividades de intervenção, com uma equipe de professores especialmente

treinados; avaliação e monitoria contínuas; tempo extra para a leitura no currículo,

assessoria às famílias e de quem cuida das crianças e a incrementação de um entorno de

letramento na comunidade (Guardian Unlimited, 2007).

Ícone Na Prática

Fatos e Números

Mais de 30 mil alunos foram individualmente testados.

Mais de 29 mil alunos foram testados em grupo.

As crianças com aproveitamento insatisfatório na aprendizagem da leitura,

escrita e cálculo são acompanhadas individualmente por especialistas até

superarem as dificuldades (Programa Toe By Toe/ Passo a Passo).

A vontade política da administração do condado, que investiu no projeto de

erradicar o analfabetismo funcional em 10 anos, fez a diferença.

Foram convocados especialistas como assessores.

A família e a comunidade foram envolvidas, com um trabalho para suplementar

o chamado currículo escondido.

Ícone dicionário

Currículo escondido: São os conhecimentos incorporados pela criança em lares em

que a informação escrita circula e por ter sido submetida a narrativas lidas, a jogos

educativos, à mídia e ao próprio discurso de familiares que convivem diariamente com

tal informação.

A efetividade de tais medidas para erradicar o analfabetismo funcional no Reino Unido

vem confirmada pelo comentário da Chefa dos Inspetores de sua Majestade, Christine

Gilbert (2007, p. 2) ao Relatório Anual de 2006/07. O relatório final, publicado em

2006, chamou a atenção para a importância fundamental do desenvolvimento da fala

das crianças. Também fez inúmeras recomendações chave para as escolas, sobre o

ensino da fônica. Em especial, recomendou que o trabalho sistemático com a fônica

fosse ensinado de modo destacado; em outras palavras, os professores deveriam destinar

um devido tempo todos os dias para que as crianças adquirissem o conhecimento, as

habilidades e a compreensão de modo a habilitá-las a decodificar (a ler) e a codificar (a

escrever/ortografar) a escrita. Também recomendou que o trabalho fônico de alta

qualidade fosse o enfoque privilegiado para ensinar as crianças a lerem, de modo que

pudessem se deslocar mais suavemente de “aprender para ler”, para “ler para aprender”.

Reflexões sobre o programa Inciativa de Intervenção Precoce

Dado o fato de que muitos projetos para a incrementação do letramento apresentaram

resultados tão insatisfatórios, uma das primeiras tendências é copiar, sem reflexão ou

adaptação a cenários diferentes, o que deu resultados noutros lugares.

É evidente que algumas medidas são indiscutíveis, por exemplo, a vontade política das

instituições responsáveis pela educação de convocar os especialistas em ensino-

aprendizagem da leitura e escrita para assessorarem em larga escala os educadores do

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ensino pré-escolar e fundamental, bem como os autores do respectivo material

pedagógico. Isso implica a presença não só de pedagogos e psicólogos altamente

especializados, como o concurso de neurocientistas, linguistas, psicolinguistas e

fonoaudiólogos, que deverão se ocupar da reformulação dos currículos, da formação

continuada do magistério, das práticas escolares, do material pedagógico, da avaliação

periódica e da recuperação dos alunos que apresentam dificuldades de aprendizagem da

leitura e escrita.

A compreensão por parte dos professores das bases científicas que fundamentam, por

exemplo, a fônica, impedirá a prática mecânica e inadequada dos exercícios, o que

redundaria no efeito inverso ao desejado. Neste livro, você encontará tais fundamentos e

saberá como vencer quatro grandes desafios.

Dica

Repetir mecanicamente os exercícios é um caminho que deve ser abandonado.

Desafio 1: A fala é percebida como um contínuo.

A razão primordial que fundamenta a fônica é que a base dos sistemas alfabéticos, ou

seja, os grafemas (formados por uma ou mais letras) representam um fonema (classe de

sons com função de distinguir significados). Ora, isto vai contra a percepção que o

indivíduo tem da fala antes de se alfabetizar. A fala é percebida como um contínuo,

residindo aí uma das maiores dificuldades na aprendizagem da leitura e da escrita.

Portanto, um trabalho sistemático tem que ser desenvolvido para que o indivíduo

reconstrua de modo consciente a percepção da fala e possa desmembrar a cadeia da fala

em palavras e a sílaba em seus constituintes. Além disto, até se alfabetizar, as imagens

visuais são processadas simetricamente, sem que a direção dos traços para a esquerda ou

direita seja diferenciada. Tanto os fonemas, quanto os grafemas que os representam, têm

a função de distinguir significados. Lembre-se de que tanto a língua oral, quanto a

escrita fazem parte dos sistemas semióticos e servem para comunicar pensamentos.

Desafio 2: É impossível articular isoladamente uma consoante oclusiva.

Outro risco decorrente da falta de conhecimentos de fonética para quem ensina fônica é

pensar que é possível ouvir ou articular isoladamente uma consoante oclusiva. Ora,

existe uma impossibilidade articulatória para a produção de tais sons, se não se

apoiarem numa vogal ou som vocálico precedentes e/ou subsequentes, uma vez que é

necessário romper o obstáculo (assinalado pelo silêncio) para que possa ser percebido

qualquer sinal.

Foto de boca

Legenda: Na língua portuguesa, encontram-se seis consoantes oclusivas: /p/, /b/, , /d/,

/k/ e /g/: tente produzi-las isoladamente e vai ver que é impossível!

Desafio 3: O nome da letra não representa seu valor.

Outra questão teórica é desconhecer que a decodificação precisa ser aprendida pelos

valores que as letras têm, muitas vezes condicionadas pelo contexto, e não por seus

nomes. Isto é particularmente grave no português com os grafemas c, g, h, m, n, q, s, x, z e todos os grafemas que representam as vogais, mas o princípio vale para todos os

grafemas.

Foto de bola.

Legenda: Evidentemente, a palavra “bola” não se lê como “be-ó-éli-a”.

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Desafio 4: Existência de guetos linguísticos.

Finalmente, além das questões que remontam à educação pré-escolar e fundamental e ao

preparo dos professores, a explosão lexical e semântica e de universos especializados,

ocasionada pelas revoluções científicas e tecnológicas aceleradas, determinou a

formação de verdadeiros guetos linguísticos, impermeáveis mesmo para os

considerados bons leitores. Isto vem determinando o fracionamento do conhecimento e

a impossibilidade de se compreenderem os inúmeros universos cognitivos: o ideal

humanístico se encontra cada vez mais distante. Talvez, um dos caminhos seja a

formação de um novo tipo de profissional capaz de traduzir o texto especializado para o

grande público, o que em parte vem sendo exercido pelo jornalista científico. Mas um

caminho, com certeza, é alfabetizar bem, para desenvolver a competência em leitura e,

assim, fazer com que as pessoas leiam cada vez mais universos de conhecimentos

diversificados e mais complexos.

Ora, você vai ver que a competência em leitura se desenvolve, à medida que o indivíduo

lê e, para tanto, o reconhecimento dos traços que diferenciam as letras entre si e a

articulação deles em grafemas, associados aos valores sonoros que eles representam,

ambos com a função de distinguir significados, têm que ser automatizados.

Foto: pessoa lendo livro.

Legenda. A automatização do reconhecimento dos traços que diferenciam as letras entre

si e dos valores dos grafemas libera o leitor para o entendimento do texto.

No próximo capítulo, você verá como as descobertas das neurociências podem ajudar a

desenvolver uma alfabetização, leitura e escrita mais competentes.

(ícone) Pontos importantes

Na segunda unidade foram examinados os seguintes pontos:

o conceito de analfabetismo funcional;

a classificação de alfabetismo adotada pelo INAF;

a evolução do alfabetismo no Brasil;

os cinco níveis de competência leitora;

dados alarmantes sobre analfabetismo funcional;

o programa Inciativa de Intervenção Precoce;

os quatro grandes desafios à alfabetização.

(bloco de anotações)

Sugestões para reflexão e pesquisa

Na sua avaliação, qual o problema mais grave no Brasil: o do analfabeto total ou o do

analfabetismo funcional? Realize na Internet uma pesquisa sobre o assunto, consultando

as estatísticas do IBGE.

O que é o Relatório PISA?

Consulte <www.uis.unesco.org/profiles/selectCountry_en.aspx> e reflita sobre o que

vem a ser competência em linguagem, matemática e ciências, e a importância da

competência em leitura para o desempenho em matemática e ciências.

Por que o analfabetismo funcional é fator de exclusão social?

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(ícone) Avaliação de aprendizagem

2. Analfabeto funcional é:

a ( ) o indivíduo que nunca frequentou a escola.

b ( ) o indivíduo que não sabe o nome das letras.

c ( ) o indivíduo que, mesmo tendo frequentado a escola, não compreende os textos

necessários à sua inserção na sociedade.

d ( ) o indivíduo que não fala corretamente.

e ( ) o indivíduo que só frequentou a escola até o 3º ano do Ensino Fundamental.

3. As neurociências na alfabetização e leitura

Ícone síntese

No segundo capítulo, você verificou que é alarmante o número de analfabetos

funcionais no Brasil e constatou que os alunos brasileiros têm obtido péssimos escores

na avaliação mais importante do mundo sobre competências em linguagem, matemática

e ciências. A reflexão foi encaminhada para a seguinte questão: por que não se aplicam

à alfabetização e ao ensino-aprendizagem da leitura e escrita as conclusões a que

chegaram as pesquisas de ponta no assunto, realizadas pelas neurociências, pela

psicolinguística e pela linguística?

ícone objetivos

Nesse capítulo você descobrirá como as neurociências estão contribuindo para que se

entendam os processos envolvidos na leitura e como se dá a reciclagem dos neurônios

em uma região específica do cérebro para o reconhecimento dos traços invariantes que

diferenciam as letras entre si. Também verá como a articulação de uma ou duas letras

(os grafemas), associados aos fonemas, possuem a função de distinguir significados.

Perceberá como o processamento da linguagem verbal e do significado se dão em

paralelo, com entradas e saídas simultâneas da informação.

Fundamentos

Graças à imagem por ressonância magnética (IRM), à eletroencefalografia (EEG) e à

magnetoencefalografia (MEG), pode-se rastrear como nosso cérebro trabalha durante a

leitura.

As principais conclusões de tais pesquisas são de grande valia para se repensarem os

métodos de alfabetização e o ensino-aprendizagem da leitura e escrita, além de nos

esclarecerem sobre as dificuldades que os alunos apresentam, decorrentes de distúrbios

de atenção ou da dislexia.

Ícone dicionário

Dislexia: é um distúrbio de ordem genética determinado pela migração, no feto, dos

neurônios desde a zona germinal ao redor dos ventrículos até a posição final nas

diferentes camadas do córtex, de que resulta uma dificuldade em reconhecer a palavra

escrita.

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A capacidade para aprender a ler e a escrever é exclusiva da espécie humana. Ela se

deve, fundamentalmente, aos seguintes fatores de como está estruturado e funciona o

sistema nervoso central, que você verá a seguir:

plasticidade dos neurônios para se reciclarem para novas aprendizagens, inclusive as

que vão de encontro à programação biopsicológica;

dominância e especialização das várias áreas secundárias para a linguagem verbal no

hemisfério esquerdo e integração nas áreas terciárias;

interconexão entre as várias áreas, mesmo distantes, inclusive as que processam a

significação, com as que processam em paralelo a linguagem verbal;

processamento das variantes recebidas nas áreas primárias, através do emparelhamento

com formas invariantes mais abstratas que os neurônios reconhecem nas áreas

secundárias;

arquitetura neuronal capaz de processar formas sucessivamente mais abstratas e

complexas. A função semiótica.

Mecanismos de retroalimentação simultâneos para autocorreção.

Memória permanente para registro dos esquemas e padrões aprendidos, o que garante o

acionamento do conhecimento prévio.

Complicado? Um pouco, mas examinando o cérebro fica mais fácil entender.

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Ao refazer, corrigir no quadro: occípito-temporal occipitotemporal

Figura 1. Visão moderna das redes corticais da leitura (adaptação a partir de

DEHAENE, 2012, p. 78).

Perceba que o cérebro é formado por muitas regiões, e cada uma delas tem sua função.

Nos processos de aprendizagem, várias regiões são utilizadas simultaneamente. Mas

como?

O que acontece quando nos deparamos com um texto escrito

Nossos olhos não abarcam uma linha inteira, em virtude das limitações de a única parte

da retina, realmente útil para a leitura, chamada fóvea, rica em células fotorreceptoras,

os cones, ocupar apenas 15º do campo visual. Por isso, nossos olhos correm pela linha,

em movimentos de sacada (quatro ou cinco por segundo). Durante estes movimentos,

não vemos nada. Só ao parar em um ponto, a fixação, a fóvea consegue abarcar 3 ou 4

caracteres à esquerda do centro do olhar, e 7 ou 8 à direita, nos sistemas de escrita com

direção da esquerda para a direita. Tais movimentos oculares são controlados pelos dois

colícolos superiores, situados abaixo do tálamo e rodeados pela glândula pineal do

mesencéfalo.

É preciso explicar que as regiões do cérebro que recebem a informação se dividem em

três grandes blocos. As áreas primárias, formadas por sensores sensoriais e

somestésicos, as áreas secundárias, especializadas para processamentos refinados que

dependem da especialização dos neurônios, através da experiência, para reconhecer as

invariâncias e as terciárias que fazem a integração dos resultados dos vários

processamentos. Com a visão é a mesma coisa. A área primária, para processar os sinais

luminosos, fica na parte posterior e central da região occipital de ambos os hemisférios.

Os sensores decompõem os sinais luminosos em miríades de pontos que,

metaforicamente, vamos chamar de píxeis. Só depois da recomposição em formas

invariantes que possam emparelhar com as dos respectivos neurônios estes sinais são

enviados para as áreas especializadas: esse primeiro processamento dura

aproximadamente 50 milissegundos. A distribuição preferencial para a região

especializada em reconhecer os traços das letras, isto é, a região occipitotemporal

ventral esquerda, já comprovada pelas pesquisas em neurociências, coloca uma pá de

cal nos métodos globais ou similares de alfabetização, pois o reconhecimento global ou

por configuração é efetuado, preferencialmente, pela região homolateral direita.

Ícone dicionário

Somestesia: é a capacidade que homens e animais têm de receber informações sobre as

diferentes partes do seu corpo. Conjunto de sensações corporais como tato, dor etc;

consciência corporal.

Esquema (fazer com ícones/iustraçao esquemática, dos três pontos: área de leitura,

movimento, fixação,conforme descrito a seguir)

Processo de Leitura

Olho marcando 15º. Legenda: Área de leitura –

Olhos com movimento Legenda: movimento de sacada -\

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Trecho de uma linha, com destaque para uma parte do texto, sendo que 3 ou 4 caracteres

à esquerda do centro do olhar, e 7 ou 8 à direita estão destacados em outra cor,

simulando um texto de jornal – O professor é muito importante. Legenda: Fixação na

leitura

Reconhecimento dos traços invariantes

Os neurônios da região occipitotemporal ventral esquerda reconhecem os traços

invariantes que compõem as letras, cujos valores são os mesmos, independentemente de

seu tamanho, da caixa (MAIÚSCULA ou minúscula), da fonte (imprensa,

manuscrita, itálico, negrito ou sublinhado, etc.), da cor, ou da posição que

ocupam na palavra.

O reconhecimento das invariâncias é possível e necessário por duas razões,

fundamentalmente:

porque, como mecanismo adaptativo, o sistema visual dos primatas deve reconhecer as

formas básicas do que se encontra na natureza, independentemente das variantes que o

olhar capta, conforme a distância, o ângulo de visão, a incidência da luz e sombra e a

parte em relação ao todo, etc.;

porque, e essa é especificamente humana, só essa explica a capacidade dos neurônios da

região occipitotemporal ventral esquerda em reconhecer os traços invariantes que

compõem as letras: na espécie humana, os respectivos axônios estão ligados a todas as

regiões que processam a linguagem verbal e simultaneamente à região que processa o

significado.

Icone dicionário

Axônios: Prolongamentos dos neurônios que levam a informação a outros neurônios

através do mecanismo denominado sinapse.

Desde o início do século XX que a linguística propôs o conceito de fonema, a unidade

que cobria todas as realizações possíveis tanto em nível da recepção quanto da

produção, com a função de distinguir significados. Um exemplo é o par mínimo /´karu/

oposto a /´kaRu/, independentemente do fato de /R/ poder se realizar como fricativa

velar surda, vibrante ápico-alveolar múltipla, uvular ou glotal aspirada. A noção de

fonema foi ampliada como sendo um feixe de traços distintivos (esses últimos também

invariantes).

Somente agora, através das técnicas de neuroimagem funcional (IRM), de

eletroencefalografia (EEG) e de magnetoencefalografia (MEG), mais conhecidas pelos

seus acrônimos, foi possível verificar que há neurônios especializados na região

occipitotemporal ventral esquerda para reconhecer os traços invariantes das letras e isso

é possível porque uma ou duas letras (os grafemas) estão associadas a um fonema,

ambos com a função de distinguir significados. A mesma diferença que você faz entre

/r/ e /R/, você faz entre r e rr, R e RR, R e RR e isso porque, por exemplo, caro e

carro têm significados diferentes.

Foto de carro.

Legenda: Um carro pode ser caro - e você não confunde carro com caro!

Icone dicionário

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Acrônimo: duas ou mais letras iniciais de palavras que constituem uma frase, que

passam a representar a respectiva referência, como, por exemplo, UFSC

Universidade Federal de Santa Catarina.

A verificação de que os neurônios na região occipitotemporal ventral esquerda

reconhecem as invariâncias dos traços que compõem as letras e de que eles aprendem a

reconhecê-las porque uma ou duas letras estão associadas aos fonemas, e os axônios de

tais neurônios se projetam em cadeias sucessivas até chegar à região que processa a

linguagem verbal, inclusive a que processa os significados, tem profundas implicações

sobre a metodologia da alfabetização, particularmente em sistemas alfabéticos como o

do português brasileiro em que, para a leitura, o sistema apresenta muita transparência.

Ícone na prática.

Trabalhe o reconhecimento dos traços que diferenciam as letras entre si sempre com os

valores que uma ou duas letras (grafemas) têm para representar os fonemas, ambos para

distinguir significados. Por exemplo, ao acrescentar um traço vertical à esquerda e outro

à direita da letra V, você distingue VALA de MALA. Ao mesmo tempo, sempre

pronuncie a palavra e, quando possível (o que é o caso, no exemplo), produza o som

isolado de [v] e [m], associado aos respectivos grafemas v e m. Ative, também, outras

regiões de reconhecimento tátil, motor e cinestésico, acompanhando a direção do

movimento da letra, o que reforça a aprendizagem dos neurônios. O corolário desse

princípio é o de que as letras não devem ser ensinadas isoladamente e, muito menos, por

seu nome. O mesmo se aplica a trabalhar com sons isoladamente, que não sejam a

realização de fonemas, portanto, fora da função de distinguir significados. Claro que

essa atividade é muito necessária nas aulas de música, mas não tem a ver com o

processo de alfabetização.

Quanto mais associações forem feitas com as diferentes regiões cerebrais que

processam a linguagem verbal (sempre no hemisfério esquerdo), tanto mais rápida e

profunda a aprendizagem. Esse princípio já havia sido compreendido por Montessori,

daí porque os métodos de alfabetização que utilizam atividades multissensoriais

favorecem a aprendizagem: observe-se, porém, que é para fixar as invariâncias dos

traços que distinguem as letras. Por isso, você deve também associar ao reconhecimento

visual da letra e ao seu valor sonoro gestos que acompanhem o traçado da letra, por

exemplo, na letra V, fazer com que a criança acompanhe com o dedo o movimento de

cima para baixo e, depois, de baixo para cima, pois, não só são quatro sensações (a

visual, a tátil, a cinestésica e proprioceptiva) a reforçar a aprendizagem dos neurônios,

como você estará trabalhando com a direção espacial, outra propriedade essencial à

leitura. A emissão simultânea do som (realização do respectivo fonema) acresce às

quatro sensações a auditiva e a proprioceptiva dos movimentos do aparelho fonador.

Foto de colar contas, ou criança enfiando contas em um fio.

Legenda: Uma coisa é acompanhar com o dedo o traçado da letra V de cima para baixo

e, depois, de baixo para cima, produzindo o som correspondente ao fonema que ela

representa. Enfiar contas numa linha, para desenvolver a psicomotricidade, não tem

nada a ver com ensinar os neurônios a reconhecer tal letra e depois poder escrevê-la!

Utilize um sistema cada vez mais complexo acompanhando o incremento das projeções

sinápticas. A cada uma das projeções sinápticas, cada vez mais distantes da região

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occipital primária, as unidades processadas vão se tornando mais complexas: sílabas,

morfemas, palavras, frases, orações, períodos e texto, graças ao que se denomina

arquitetura neuronal.

Falta falar ainda sobre o que as neurociências nos dizem sobre dois problemas que

afligem os educadores. A leitura e escrita espelhadas no início da alfabetização e a

dislexia.

Leitura e escrita espelhada

Para que se entendam a leitura e escrita espelhadas, no início da alfabetização, que, às

vezes, perduram por longo tempo, é necessária a explicação a seguir.

As projeções visuais são cruzadas

Os sinais luminosos que se apresentam à esquerda se projetam sobre a metade direita da

retina de cada olho, de onde a informação é enviada em direção às áreas visuais

primárias na região occipital do hemisfério direito; e os sinais luminosos apresentados à

direita se projetam sobre a metade esquerda da retina de cada olho e são tratados na

região occipital do hemisfério esquerdo. “Cada vez que um hemisfério aprende uma informação visual nova,

este traço de memória é imediatamente transmitido ao outro

hemisfério. Essa transferência passaria, por certo, pelo corpo caloso,

esse vasto feixe de fibras que liga as áreas correspondentes dos dois

hemisférios. Supondo que esse feixe liga, ponto a ponto, as áreas

visuais simétricas dos dois hemisférios, então a transferência entre os

hemisférios deveria inverter a direita e a esquerda” (DEHAENE,

2012, cap. 7).

Para que os neurônios reconheçam qualquer coisa como sendo a mesma, são

desprezadas, pois, as diferenças entre esquerda e direita, o que se denomina de

simetrização, quando a informação provinda de ambas as retinas atravessa o corpo

caloso: tanto faz a alça de uma xícara estar para a direita ou para a esquerda, você

reconhece a xícara como sendo a mesma.

Foto de uma xícara, em diferentes posições.

Legenda: Uma xícara é uma xícara, não importa a posição!

Ora, essa percepção terá que ser refeita durante a alfabetização, pois colocar as três

pequenas retas horizontais paralelas só pode ser à direita da reta vertical para formar a

letra E. Mais difícil, ainda, é reconhecer a diferença entre d e b, ou entre q e p, a qual

reside apenas no fato de as primeiras letras de cada par estarem com o semicírculo à

esquerda da haste e as segundas, inversamente, com o semicírculo à direita da haste

(espelhamento na horizontal). Outra diferença que os neurônios desprezam é a inversão

vertical: se a mesa estiver com o tampo para baixo e as pernas para cima, ainda assim

será reconhecida como uma mesa; o mesmo se pode dizer de um guarda-chuva ou de

um tomate. Mas com as letras isso não ocorre. A única diferença entre M e W é a

direção vertical (espelhamento vertical), o que ocorre também com o que diferencia b -p; d - q;e – a; u - n. Isso significa que, na alfabetização, os neurônios da região

occipitotemporal ventral esquerda terão que se reciclar para reconhecer a diferença entre

direção à esquerda e direção à direita e entre direção para cima e para baixo.

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Foto de uma mesa, com as pernas para baixo e para cima.

Legenda: Uma mesa continua sendo uma mesa, com as pernas para cima ou para baixo

- o mesmo não ocorre com as letras.

Trata-se de uma aprendizagem específica e, lembre-se, só ocorrerá se for ensinada com

a função de distinguir significados, como em bote/dote; bote/pote; dado/dedo.

Fotos de bote e pote, dado e dedo, com as sublegendas: bote, pote, dado, dedo.

Legenda: O espelhamento, às vezes, é a única diferença na leitura.

Essa reciclagem é muito difícil porque continua convivendo com o fato de que, para os

demais reconhecimentos, os neurônios que processam a visão continuam a desprezar as

diferenças entre à esquerda e à direita e entre em cima e embaixo. Por isso, as crianças

persistem na leitura e escrita espelhadas por algum tempo, em maior ou menor grau,

mas isso não significa que sejam disléxicas.

Icone dicionário

Dislexia: A dislexia é um distúrbio de ordem genética que se origina, segundo muitos

autores, quando se dá, no feto, a migração dos neurônios desde a zona germinal ao redor

dos ventrículos até a posição final nas diferentes camadas do córtex.

Alguns genes foram associados ao erro de migração dos neurônios que caracterizam a

dislexia, como o gene DYX1C1 sobre o cromossoma 15 e os genes KIAA0319 e

DCDC2, sobre o cromossoma 6 e o ROBO1 sobre o cromossoma 3. Esse erro de

posicionamento dos neurônios determina que, futuramente, tais indivíduos venham a ter

dificuldades no reconhecimento das letras, particularmente, quando está envolvido o

traço de espelhamento. Em consequência, tais sujeitos falham nos testes de consciência

fonológica. Está registrado que os disléxicos apresentam uma diminuição de atividade

na região temporal esquerda, responsável pelo processamento dos fonemas.

Atualmente, alguns programas têm se mostrado eficientes na recuperação dos

disléxicos: trata-se da reeducação através de jogos no computador, uma vez que eles

fascinam o educando. Os programas se baseiam na proposta de Vygotsky sobre zona

proximal de aprendizagem.

Icone dicionário

Zona proximal de aprendizagem: Trata-se de uma área de desenvolvimento da

cognição, na qual, usando uma metáfora espacial, define-se a distância entre a

capacidade atual de a criança sozinha resolver problemas e o nível de desenvolvimento,

avaliado pela resolução de problemas com o auxílio de adultos ou de colegas mais

adiantados (VYGOTSKY,1991).

(ícone) Pontos importantes

No capítulo 3 foram abordados os seguintes assuntos:

As recentes descobertas das neurociências, que podem ajudar na escolha do melhor

método para a alfabetização e para o desenvolvimento das competências em leitura e

escrita;

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Como os neurônios humanos são dotados de plasticidade para a aprendizagem de novos

reconhecimentos e que, no caso da leitura, esses neurônios se encontram numa região

denominada região occipitotemporal ventral esquerda;

Como a reciclagem é possível, pois porque tais neurônios aprendem a reconhecer os

traços invariantes das letras, inclusive o direcionamento para a esquerda ou direita e

para cima ou para baixo, que integram as letras, uma ou duas constituindo os grafemas,

associados aos fonemas, ambos com a função de distinguir significados;

Dessa região ocorrem projeções para todas as regiões que processam a linguagem

verbal, em níveis cada vez mais abstratos, até se chegar ao processamento do texto e

que esses processamentos ocorrem em paralelo, não unidirecionalmente, mas com

informações transportadas pelos axônios e acolhidas pelos dendritos, num fluxo

contínuo.

Icone dica:

Aprofunde seus conhecimentos lendo o livro Os Neurônios da Leitura, de Stanislas

Dehaene, da editora Penso, 2012, em especial, as páginas 282-302.

Para visualizar os neurônios, acesse:

<http://images.google.com.br/images?hl=pt-BR&q=neuronios &um=1&ie =UTF-

8&sa=X&oi=image_result_group&resnum=4&ct=title>

(bloco de anotações)

Sugestões para reflexão e pesquisa:

O que você entende por plasticidade e reciclagem neuronal?

O que você entende por áreas primárias, secundárias e terciárias no cérebro?

O que é espelhamento?

(ícone)

Avaliação de aprendizagem

3. O processamento da linha impressa se dá...

a ( ) durante os movimentos em sacada.

b ( ) abarcando a linha do início, à esquerda, até, o final à direita.

c ( ) abarcando toda a página, daí o êxito da leitura dinâmica.

d ( ) no momento da fixação, abarcando aproximadamente entre 10 a 12 letras.

e ( ) aleatoriamente.

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4. Desenvolvimento da língua verbal oral

Ícone síntese

No terceiro capítulo, você viu, fundamentalmente, que os neurônios humanos são

dotados de plasticidade para a aprendizagem de novos reconhecimentos e que, no caso

da leitura, esses neurônios se encontram numa região denominada região

occipitotemporal ventral esquerda. Agora, você aprofundará como a criança adquire sua

variedade sociolinguística oral.

ícone objetivo

Nesse capítulo, você verá os fatores que intervêm na aquisição da língua oral, mais

especificamente na sua variedade sociolinguística, uma vez que, sendo a aprendizagem

da leitura e da escrita secundária em relação à aquisição de sua variedade

sociolinguística oral, deve-se ter clareza sobre como esta é adquirida. Você verificará

que três fatores intervêm para a aquisição da língua oral: os inatos, os maturacionais e

os ambientais.

Fatores inatos

O que são fatores inatos? São os fatores biopsiquicamente determinados pela espécie,

em especial, a estrutura, o amadurecimento e o funcionamento do sistema nervoso

central, o qual, através de suas redes neurais, se coloca como o instrumento principal e

específico de sobrevivência. Dentre as várias funções para as quais o sistema nervoso

central é programado, sobressai a capacidade de operar com signos, principalmente os

signos verbais orais, que registram as informações na memória permanente, sejam as

que o próprio indivíduo vivencia, sejam as que lhes são transmitidas. A memória

cognitiva humana é programada para registrar os episódios individuais e coletivos na

forma de narrativas factuais ou fictícias. A língua verbal oral serve como moeda

corrente para a socialização e para a organização das ideias (o pensamento lógico).

Serve também como meio de expressão das emoções e como matéria para a produção

estética.

Foto pessoas

Legenda: Na maioria dos indivíduos, mesmo nos canhotos, o hemisfério nos quais as

redes se especializam para a língua verbal é o esquerdo.

Para que esta programação compulsória da espécie humana seja ativada, é necessária

uma alavanca, ou seja, a interação linguística, cujos dados deverão ser captados por um

canal de entrada e reconstruídos pela percepção.

Ícone Atenção

O canal de entrada privilegiado pela espécie humana para captar a língua verbal oral é o

auditivo, mas ele é reforçado pelas informações do chamado canal proprioceptivo que

reconhece os movimentos do trato vocal e também pela visão que faz a leitura dos

gestos dos lábios e maxilar inferior, sincronizados com o que a criança escuta.

Ícone dicionário

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Canal Proprioceptivo: É o canal que envia informações ao cérebro sobre os

movimentos realizados por nosso corpo, no caso, os realizados pelo aparelho fonador da

criança que está ensaiando suas primeiras falas.

O canal privilegiado para emitir a língua verbal, isto é, os gestos fonoarticulatórios, é o

aparelho fonador: pulmões, laringe, faringe, trato bucal e fossas nasais.

Conclusão: a criança que não apresenta nenhum impedimento sensorial ou cognitivo

para processar a fala nasce programada para operar com signos verbais, no devido

tempo, em virtude de como o sistema nervoso central está estruturado e funciona.

Problemas congênitos de má conformação e/ou que afetem os circuitos envolvidos no

processamento da língua verbal requerem o atendimento de especialistas, pois

dificilmente podem ser tratados por leigos.

Nesse ponto é preciso deixar bem claro que, embora a espécie humana seja programada

para a linguagem verbal, o alvo, naquilo que define sua essência, é, por um lado, a

compreensão das mensagens recebidas e, por outro, a produção de textos com sentido,

em situações temporalmente sempre novas. A mera repetição mecânica de enunciados,

mesmo com articulação aceitável, não se constitui em linguagem verbal conforme

definido.

Dica

Quando a criança nasce surda, se não houver comprometimentos nos centros do sistema

nervoso central envolvidos no processamento da língua verbal, e se a criança estiver

exposta a sistemas que utilizem outros canais como o vísuo-gestual (a língua brasileira

dos sinais, L.I.B.R.A.S., por exemplo), a língua verbal, tal como definida, poderá se

desenvolver.

Fatores maturacionais

Embora o feto possa ser gerado sem nenhum comprometimento, seu desenvolvimento

não deve sofrer nenhum acidente de percurso: enfermidades adquiridas pela gestante,

como a rubéola, ingestão de drogas durante a gravidez e, o que exige medidas de

profundidade, alimentação deficiente em proteínas durante os meses iniciais de

formação da criança, podem ter profundas repercussões.

Os circuitos que ligam os diversos centros do sistema nervoso central não nascem

prontos: os prolongamentos dos neurônios precisam ser recobertos por uma camada rica

em proteínas, processo conhecido como mielinização, para que se estabeleçam as

ligações de modo adequado e no momento certo.

Para produzir os primeiros enunciados, a criança vai calibrando, isto é, comparando o

que diz com o que quer dizer (auto-regulação total ou total feedback): recebe

simultaneamente em seu cérebro informações proprioceptivas dos gestos do aparelho

fonador, bem como imagens acústicas dos sons que emitiu. Conforme se pode

depreender, os circuitos interligados desempenham papel decisivo no desenvolvimento

da língua verbal.

Atenção!

A maturação dos circuitos envolvidos no processamento da língua verbal depende da

ativação e funcionamento dos mesmos, para a chamada especialização das funções

neuronais.

Fatores ambientais

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Uma vez que os programas inatos para o desenvolvimento da língua verbal oral e sua

maturação precisam ser ativados pela interação verbal, sobressai a importância dos

fatores ambientais, desde aqueles que cercam a gestante, os primeiros meses de vida do

infante, até o processo de socialização. A especialização dos neurônios nas áreas

secundárias depende da experiência.

Foto: Mãe lendo para criança.

Legenda: O fato de uma criança ouvir desde cedo narrativas recontadas ou lidas ativa o

desenvolvimento dos esquemas mentais.

Os aspectos culturais, socioeconômicos e afetivos decidirão, definitivamente, sobre a

variedade sociolinguística do falante e sobre seu idioleto.

O que é a variedade sociolinguística?

Apesar de o sistema alfabético do português brasileiro ser o mesmo para os falantes em

todo território, a conversão para os fonemas que uma ou mais letras (os grafemas)

representam não é a mesma para todos os indivíduos, isto por que eles não falam do

mesmo jeito.

As variedades sociolinguísticas são determinadas por vários fatores, dentre os quais se

destacam: o geográfico (por exemplo, a variedade praticada no Rio de Janeiro, em Porto

Alegre, em Florianópolis); o socioeconômico e cultural, também conhecido como

diastrático (por exemplo, na cidade de Florianópolis, filhos de pais que frequentaram a

universidade, que leem e convivem com pessoas das chamadas profissões liberais e, ao

mesmo tempo, têm amiguinhos no bairro e/ou na escola que pertencem ao mesmo

contexto, vão internalizar uma variedade sociolinguística distinta de crianças cujos pais

e/ou familiares não foram alfabetizados e cujos amiguinhos moram em bairros

periféricos); o profissional (em virtude da especialização, se estabeleceram verdadeiros

guetos linguísticos: mesmo que falem português, você não consegue entender o discurso

de um grupo de bioquímicos, ou de surfistas quando estão reunidos); o de geração (a

variedade praticada pelos jovens muitas vezes é incompreensível aos adultos) e assim

por diante.

Ícone Dicionário

Idioleto: É a variedade peculiar de um indivíduo, determinada por preferências

estilísticas, mas também por fatores de ordem emocional e biopsíquica.

Diferença entre variedade e registro

Dadas as profundas repercussões que o tema suscita entre os educadores envolvidos

com linguagem, convém fazer uma distinção entre variedades sociolinguísticas e

registros.

As variedades sociolinguísticas, conforme assinalei, decorrem das condições em que a

criança internaliza sua língua materna. O professor em sala de aula deve estar

consciente de que, diante da mobilidade social vigente, terá alunos praticando as mais

diferentes variedades, quer geográficas, quer socioculturais, para não falar dos filhos de

estrangeiros, que praticam um português influenciado pelos respectivos dialetos.

Quanto aos registros ou estilos, eles são determinados pelas condições do ouvinte ou

leitor para quem você se dirige: englobam as características de vocabulário, de sintaxe e

de tratamento, dependendes do suporte utilizado (oral ou escrito); do destinatário

(privado ou público; familiar ou distante); do status; da situação de comunicação (casa,

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trabalho, loja, delegacia etc.); do gênero (informativo, literário, argumentativo); das

intenções pragmáticas etc.

Na prática

Respeite a variedade praticada pelo educando.

Explique aos alunos o respeito às diferenças linguísticas, mesmo por que o próprio

professor pratica sua variedade sociolinguística que, nem sempre, é a norma

considerada de prestígio.

Lembre-se de que, como o aluno permanece em sala de aula três ou quatro horas,

dificilmente perderá os condicionamentos motores adquiridos no ambiente familiar.

Para tal, só se trabalhar conscientemente com este objetivo, ou se estiver profundamente

motivado: nunca por imposição e muito menos pelo ridículo.

Para a aprendizagem dos princípios do sistema alfabético do português brasileiro, você

deverá estar atento às realizações de seu aluno, pois os valores das letras (grafemas) não

serão os mesmos para todos: se uma criança de Florianópolis diz [si´tu´kEjS], o

professor terá que explicar pacientemente que nós não escrevemos como falamos

(escrever na lousa queres): (apontar para o qu) representa um som que não dá para

dizer isoladamente. Precisamos deste (apontar para e) que representa o som de é [E];

(apontar para as três letras que). Agora podemos pronunciar os dois primeiros sons que

aparecem em [´kEjS] antes do [E] o primeiro som se escreve (apontar na lousa para

qu, dígrafo, sem dizer o nome das letras); o [E] se escreve e; o [j] se escreve (apontar

na lousa re) e o [S] no final da palavra se escreve com (apontar na lousa s), na palavra

escrita queres.

Apesar de as pessoas somente dominarem uma variedade sociolinguística, conhecem

vários registros e estes podem e devem ser ampliados em sala de aula. Sendo assim,

quando falamos com uma criança, quanto menor for, usamos um registro que se chama

Fala Dirigida à Criança (em inglês, Children Directed Speech, CDS, expressão que

substituiu as anteriores Baby talk e Motherese); quando proferimos uma aula, utilizamos

o registro adequado, diferente de quando estamos fazendo compras. Da mesma forma, o

registro utilizado numa conversa na Internet, nos chats, não é o mesmo que o utilizado

num trabalho de conclusão de curso.

É, portanto, errôneo afirmar que devemos escrever como falamos porque houve

mudanças linguísticas.

Mudanças houve, sim, e ninguém vai pregar aos alunos que escrevam como Machado

de Assis (aliás, sempre foi um grande equívoco tal proposta), mas volto a afirmar que

não escrevemos como falamos, nem isto é possível.

Foto de grupo diverso.

Legenda. A fala muda conforme a situação. Não escrevemos como falamos.

Pontos Importantes

No capítulo 4, você constatou que:

os fatores que intervêm no desenvolvimento da língua verbal são o inato, o

maturativo e o ambiental;

a escola contribui com o fator ambiental para o desenvolvimento da língua

verbal, em particular, para tornar o aluno competente na utilização dos registros

ou estilos;

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o desconhecimento das bases teóricas e a má orientação por parte dos

professores podem atuar como fatores inibidores e até de bloqueio para a

comunicação linguística;

as variedades sociolinguísticas são determinadas por vários fatores, dentre os

quais: o geográfico, o socioeconômico e cultural, o profissional e o geracional;

a variedade linguística deve ser respeitada;

não se escreve como se fala: o registro escrito deve ser ensinado em sala de aula

para que o aluno possa obter os fins desejados quando no futuro tiver que usá-lo

para conseguir um emprego, para passar numa prova e até para escrever uma

carta de amor.

Dica

Leitura recomendada:

SCLIAR-CABRAL, L. Guia prático de alfabetização, baseado em Princípios do sistema

alfabético do português brasileiro. São Paulo: Contexto, 2003b, cap. 2.

(ícone bloco de anotações)

Sugestões para reflexão e pesquisa

O que é um fator inato?

O que são o fator maturativo e o ambiental?

Em quais dos fatores você situa sua atividade como educador?

AVALIAÇÃO DE APRENDIZAGEM

4. A aquisição da língua oral e a aprendizagem da leitura e da escrita...

a ( ) são a mesma coisa, portanto, deve-se usar também a expressão “aquisição

da leitura e da escrita”.

b ( ) não são a mesma coisa, pois, na criança que não apresenta nenhum impedimento

sensorial ou cognitivo para processar a fala, a aquisição da língua oral é espontânea e

até compulsória, enquanto a aprendizagem da leitura e da escrita é sistemática e

intensiva.

c ( ) são interdependentes porque a aquisição da língua oral depende da aprendizagem

da leitura e da escrita.

d ( ) ocorrem no mesmo momento na criança.

e ( ) ocorrem em sequência: primeiro a criança aprende a ler e a escrever.

5. Fundamentos da alfabetização integral e integrada

Ícone Síntese

No capítulo anterior, você examinou os fatores que intervêm na aquisição da língua

oral, mais especificamente na sua variedade sociolinguística, uma vez que, sendo a

aprendizagem da leitura e da escrita secundária em relação à aquisição de sua variedade

sociolinguística oral, deve-se ter clareza sobre como é adquirida. Você verificou que

três fatores intervêm na aquisição da língua oral: os inatos, os maturacionais e os

ambientais, cabendo à escola contribuir para a incrementação deste último, através do

desenvolvimento da competência no uso dos registros.

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ícone objetivo

Nesse capítulo, você será levado a refletir sobre os fundamentos filosóficos, científicos

e metodológicos da alfabetização integral e integrada. A principal integração consiste

em não divorciar as ciências humanas das ciências biológicas: o cultural não pode ser

pensado sem o biológico, nem a especialização cerebral sem ser plasmada pela

experiência. A alfabetização integral parte do pressuposto de que o alvo é a educação

plena do indivíduo: cognição, afetos, sociabilidade, o físico e o estético, em vasos

comunicantes deverão levá-lo ao exercício da cidadania e à realização pessoal, com a

capacidade para entender os textos escritos que circulam em sociedade e para produzir

os de que necessita. Ao final desse capítulo, você estará fundamentado para

compreender o Sistema e saberá escolher melhor o material didático e as estratégias em

sala de aula para alfabetizar.

Fundamentos filosóficos e científicos da alfabetização integrada

O fundamento filosófico e científico que norteia a alfabetização integrada é a

inseparabilidade entre as ciências humanas e as ciências biológicas: o cultural não pode

ser pensado sem o biológico, nem a especialização cerebral sem ser plasmada pela

experiência. Traduzido à alfabetização, esse fundamento significa, por um lado, que,

embora a invenção da escrita tenha ocorrido há aproximadamente 5.000 anos, sob a

pressão de condicionantes sociais, tal invenção e sua respectiva aprendizagem só foram

possíveis porque o aparato biopsicológico da espécie está apto à produção cultural,

mecanismo de sobrevivência, bem como à aprendizagem dos sistemas escritos, mais

especificamente, a relativa plasticidade dos neurônios permite sua adaptação para

captarem as articulações dos traços que diferenciam as letras entre si, organizando-as

em grafemas com seus respectivos valores (os fonemas), ambos com a função de

distinguir significados.

Substituir algo (a referência) por uma representação mental, ou seja, a função semiótica,

é privilégio da espécie humana. Assim também aconteceu com a escrita propriamente

dita, que passou a representar os sistemas orais de comunicação.

Por outro lado, a ciência demonstra que a aprendizagem do sistema escrito esbarra com

enormes dificuldades, em resumo:

a) a percepção da cadeia da fala como um contínuo, uma vez que não há separação entre

as palavras, como os espaços em branco na folha impressa, nem contraste entre os

segmentos que constituem a sílaba, condição para associá-los aos grafemas nos sistemas

alfabéticos (tais fatos são atestados no início da escrita numa cadeia contínua, ou na fase

silábica da escrita);

b) vocábulos átonos pouco perceptíveis na cadeia da fala, que determinam reanálises

silábicas, toda a vez que terminarem por consoante e o vocábulo seguinte iniciar por

vogal, como nos exemplos zoiu, zovidu, zoreia;

c) os neurônios que processam o sinal luminoso (neurônios da visão) são programados

para simetrizar a informação e desprezam as diferenças entre o que está direcionado

para a esquerda ou para a direita, para cima ou para baixo, conforme exemplifiquei com

o reconhecimento de uma mesa: tanto faz ela estar com as pernas para cima e o tampo

sobre o solo, ou vice-versa, sempre será reconhecida como mesa; outro exemplo: tanto

faz a alça da xícara estar voltada para a esquerda ou para a direita, você sempre a

reconhecerá como uma xícara. Mas, para reconhecer as letras, os neurônios têm que

aprender a dissimetrizar, como, por exemplo, reconhecer a diferença entre b e d; entre

b e p.

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Outro fundamento da alfabetização integrada diz respeito ao fato de que ela deveria

instrumentar o indivíduo de tal modo que ele estaria apto a ler, compreender, refletir

sobre e incorporar os conhecimentos veiculados pelos textos escritos que circulam

socialmente, apropriando-se dos avanços filosóficos, científicos, literários e culturais

que a humanidade produziu até hoje. Tal propósito de integração recebe o nome de

cultura humanística, ideal vigente na Renascença e durante o Iluminismo, quando

enciclopedistas, como Diderot, procuraram abarcar todos os conhecimentos da época na

Enciclopédia Francesa. Novamente nos encontramos diante de um impasse: no século

XX, o desenvolvimento científico e tecnológico foi de tal monta que ultrapassou a

massa de conhecimentos acumulados durante toda a passagem anterior do homem sobre

a Terra. Mais agravante foi a especialização, com subáreas de conhecimento cada vez

mais pulverizadas e compartimentalizadas. Vou explicar o que isso significa como

impasse para uma cultura integrada. Parto do pressuposto de que não existe uma palavra

nova para cada novo conhecimento, embora muitas sejam inventadas, pois isto

significaria uma sobrecarga insuportável para nossa memória de palavras. O

conhecimento é estruturado em nossa memória através de esquemas cognitivos, seja

através da experiência direta (conhecimento de mundo), seja através das linguagens, em

especial, a língua verbal oral e, com mais amplitude e profundidade, através da língua

escrita. As palavras estão estruturadas, num dicionário mental (não é o Aurélio ou o

Michaelis, nem estão em ordem alfabética!) e apontam para os seus vários significados

básicos, conforme o esquema cognitivo ao qual pertencem. Assim, a mesma palavra

ponte pode significar a ligação entre duas pontas de terra, como a ponte Rio-Niterói,

ou pode significar trajeto aéreo, como a ponte aérea Rio-São Paulo, ou ainda a ligação

entre dois dentes, como a ponte dentária. Já dá para você perceber que para

compreender um texto, você terá que ter um esquema mental mínimo para poder atribuir

a significação básica, depois de reconhecer uma palavra escrita.

O que está ocorrendo é que, em virtude da especialização vertiginosa, nenhum de nós

possui todos os esquemas mentais necessários à compreensão de todos os textos que

circulam socialmente.

Tal dilema coloca as seguintes indagações para a alfabetização integrada:

Na atualidade, é impossível integrar os saberes acumulados, atingindo o ideal

humanístico?

Na atualidade é possível atingir o ideal humanístico, substituindo o conceito de erudição

pelo de apreensão e síntese dos avanços seminais na filosofia, nas ciências e nas artes?

Quais os caminhos?

Opto por uma resposta afirmativa à segunda pergunta e sugiro alguns caminhos.

O primeiro deles e, a meu ver, prioritário passa pela alfabetização para o letramento.

A escola não pode continuar a fabricar analfabetos funcionais.

Mas a escola não está alfabetizando para o letramento. Para tal, é necessário buscar uma

nova metodologia de alfabetização, baseada nas experiências que deram resultado na

erradicação do analfabetismo funcional, incorporando o que há de mais avançado nas

neurociências da educação (DEHAENE, 2012), tal como defendo no presente livro.

Faz-se necessária a formação continuada de todo o pessoal envolvido com alfabetização

e o ensino-aprendizagem da leitura e da escrita, incluindo professores e autores do

material pedagógico para, em conjunto com familiares e a comunidade, fazer com que o

futuro leitor reconheça rapidamente qualquer palavra com a qual se defronte pela

primeira vez e, sem titubear, tenha uma leitura fluente, desenvolvendo o gosto pela

leitura e ampliando seus universos pela vida afora.

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Papel importante neste Sistema cabe à filosofia e ao jornalismo científico a fim de

sintetizar os avanços seminais das ciências, da tecnologia e das artes e de adequar o

vocabulário ininteligível ao nível da compreensão do leigo.

É preciso salientar, por fim, que a alfabetização integrada é aquela que aproveita todos

os espaços e tempos disponíveis para o ensino-aprendizagem da direção dos traços que

diferenciam as letras entre si, da constituição dessas em grafemas associados aos seus

respectivos valores, os fonemas, ambos com a função de distinguir significados,

portanto, inseridos em palavras e estas em textos significativos para o educando. Isto

significa a utilização das disciplinas de matemática, ciências, estudos sociais, educação

física, artes, lazer, e das atividades de socialização, todas coerentemente entrosadas em

torno de uma temática, com um objetivo comum.

Fundamentos filosóficos e científicos da alfabetização integral

Por serem mais difundidos entre os professores, reservei menor espaço aos fundamentos

filosóficos da educação (no caso, da alfabetização) integral que remontam aos gregos,

conforme o aforismo latino mens sana in corpore sano. Tais fundamentos, porém,

devem ser especificados, desdobrando-se na alfabetização que leve em consideração o

desenvolvimento harmônico da cognição e da linguagem, da percepção, do equilíbrio

emocional, da socialização, do corpo, da sensório-motricidade e da expressão estética.

A forma como isto pode ser operacionalizado se encontra na concepção dos conteúdos

didáticos e na sugestão das atividades a serem desenvolvidas em cada uma das unidades

do Sistema Scliar de Alfabetização - Roteiros para o professor: 1º Ano.

(ícone bloco de anotações)

Pontos Importantes

No capítulo 5, foram desenvolvidos os seguintes conteúdos:

o fundamento filosófico e científico da alfabetização integrada é a

inseparabilidade entre as ciências humanas e as biológicas;

a aprendizagem do sistema escrito esbarra com enormes dificuldades: a) a

percepção da cadeia da fala como um contínuo; b) vocábulos átonos pouco

perceptíveis e c) os neurônios que processam o sinal luminoso são programados

para simetrizar;

em conjunto com familiares e a comunidade, é necessário fazer com que o futuro

leitor reconheça rapidamente qualquer palavra com a qual se defronte pela

primeira vez e, sem titubear, tenha uma leitura fluente, desenvolvendo o gosto

pela leitura e ampliando seus universos pela vida afora;

papel importante no Sistema Scliar de Alfabetização cabe à filosofia e ao

jornalismo científico a fim de síntetizar os avanços seminais das ciências, da

tecnologia e das artes;

a alfabetização deve levar em consideração o desenvolvimento harmônico da

cognição e da linguagem, da percepção, do equilíbrio emocional, da

socialização, do corpo, da sensório-motricidade e da expressão estética.

Sugestões para reflexão e pesquisa

Como possibilitar que todos tenham acesso ao conhecimento produzido pelo

homem?

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Por que se pode afirmar que a maior exclusão atualmente é a exclusão da

informação?

Qual uma das principais causas do insucesso nas demais disciplinas que

integram o currículo do ensino fundamental?

(ícone avaliação)

5. O fundamento filosófico essencial à alfabetização integrada é:

a ( ) o método hipotético-dedutivo.

b ( ) o método indutivo.

c ( ) a interação completa entre as ciências humanas e as ciências biológicas.

d ( ) a indissolubilidade entre a física e a química.

e ( ) ser contemplada só pelas ciências humanas.

6. Métodos de alfabetização

Ícone síntese

No capítulo 5, você foi levado a refletir sobre os fundamentos filosóficos, científicos e

metodológicos da alfabetização integral e integrada, sendo o principal a integração entre

as ciências humanas e as biológicas. Viu-se que a alfabetização integral parte do

pressuposto de que o alvo é a educação plena do indivíduo: cognição, afetos,

sociabilidade, o físico e o estético, em vasos comunicantes, deverão levá-lo ao exercício

da cidadania e à realização pessoal, com a capacidade para entender os textos escritos

que circulam em sociedade e para produzir os de que necessita.

Ícone objetivo

Proponho-me neste capítulo, baseada nos recentes achados da neurociência,

desmistificar o método global, que ainda goza de muitos adeptos no Brasil, apesar de

sua condenação oficial em países como a França. Traçarei um breve histórico de seu

surgimento e desdobramentos, exemplificando o uso no Brasil com algumas cartilhas.

Retomarei, a seguir, evidências empíricas das neurociências sobre os limites biológicos

à captação pela retina de mais do que doze caracteres a cada fixação sobre a linha

impressa e sobre como a região especializada para tal, a região occipitotemporal ventral

esquerda, processa a informação escrita, demonstrando que o reconhecimento da

palavra não se dá por configuração. Demonstro que a opção por métodos fônicos não

implica ignorar a existência e necessidade de processamentos top-down e em paralelo, e

encerro com breves considerações sobre os métodos fônicos.

Introdução

Em reação aos métodos sintéticos de soletração, vigentes desde a antiguidade para

alfabetizar, surgiram os métodos globais, também denominados de analíticos, que

apresentavam, em comum, o fato de defenderem a ideia de que a criança aprende a

partir da percepção do todo, para depois decompô-lo em suas unidades. As variantes da

abordagem residiam no que consideravam como o todo, denominando-se,

respectivamente, método de palavração, de sentenciação ou global (MORAES

SCHEFFER et al., 2007).

Mencionarei marcos que projetaram o método global de alfabetização. A. Pierre, A.

Minet e A. Martin publicaram, em 1913, material pedagógico, denominado Méthode

Boscher, no qual preconizavam que a criança deveria memorizar frases com conteúdo

simples, as quais seriam depois decompostas em suas unidades menores (CHARTIER e

HÉBRARD, 2001). O adepto mais importante, porém, do método global foi Ovide

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Decroly, médico belga que resolveu dedicar-se à educação, fundando a escola

l’Ermitage (FERRARI, 2010). Apesar de não ter escrito de forma sistematizada o

método, suas ideias, aplicadas à alfabetização, resultaram na adoção do texto como

ponto de partida.

No Brasil, na reforma de educação em Minas Gerais de 1906, realizada por João

Pinheiro, a orientação analítica já era preconizada, mas a primeira cartilha a adotar o

método foi a Cartilha Analytica de Arnaldo Barreto, publicada em 1907 e difundida

entre vários estados (MORAES SCHEFFER et al., 2007).

Um dos estados brasileiros em que o método global foi implantado oficialmente, em

1927, foi Minas Gerais, durante a Reforma Francisco Campos. A educadora Lúcia

Casassanta participou ativamente do ideário, formando professores na Escola de

Aperfeiçoamento, então criada, ministrando a disciplina de Metodologia da Língua

Pátria (MORAES SCHEFFER et al., 2007).

Entre as cartilhas que adotaram o método global, utilizadas no que então foi

denominado de pré-livro, situam-se O Livro de Lili, de Anita Fonseca, lançado em

1930, que teve, pelo que pude compulsar, 83 edições (a partir de 1961, editado pela Ed.

do Brasil, São Paulo) e Os três porquinhos de Lúcia Casassanta, lançado em 1954.

De O livro de Lili, extraí a primeira lição, para se ter uma ideia:

PRIMEIRA LIÇÃO - Lili! Olhe para mim, eu me chamo Lili, eu comi muito doce,

vocês gostam de doce. Vocês gostam de doce de abacaxi?

Como o trecho era decorado, observem as características textuais. A primeira palavra é

um vocativo que está completamente deslocado do ponto de vista discursivo, uma vez

que é a própria Lili quem está falando. A mesma coisa acontece com “vocês gostam de

doce”, obviamente uma pergunta, com as marcas de pontuação totalmente inadequadas,

além de discordar da forma de tratamento da primeira oração. Nota-se, igualmente, que

não houve nenhuma preocupação com as dificuldades grafêmicas das primeiras palavras

a serem decoradas pelas crianças. A palavra “abacaxi” é uma das últimas a serem

usadas no meu livro de alfabetização, Aventuras de Vivi (Scliar-Cabral, 2012), pois o

contexto intervocálico torna totalmente imprevisível os valores do grafema “x” (aliás,

“x” é o último grafema a ser introduzido na minha proposta de alfabetização).

Subjacentes ao movimento da Reforma Francisco Campos, acima mencionada, estão as

ideias da Escola Nova, afim à Escola Moderna de Célestin Freinet, da qual derivará a

abolição do livro didático e, consequentemente, das cartilhas. Tal ideário terá profundas

repercussões sobre a orientação atualmente vigente no MEC, cujas consequências sobre

os níveis de letramento no país são por demais conhecidas. Para ilustrar tais

consequências, valho-me dos dados sobre o Índice de Desenvolvimento de Educação

para Todos (IDE), (INEP, 2012): Utilizado para monitorar o cumprimento dos objetivos de EPT pelos

vários países, o Índice de Desenvolvimento de Educação para Todos

(IDE) é composto por quatro indicadores: universalização da educação

primária, alfabetização de adultos, paridade e igualdade de gênero e

qualidade da educação... Na avaliação do cumprimento das metas de

Dacar segundo o IDE, o Brasil encontra-se entre os 32 países que

ocupam posição intermediária no alcance dos objetivos. Situado em

88º lugar, o Brasil só está acima dos 30 países cujas metas

educacionais são longínquas, em virtude da instabilidade provocada

por guerras civis e/ou “fragilidade político-institucional”.

Em resumo, conforme Frade (2005) os defensores do método global advogam os

seguintes princípios:

o de que a linguagem funciona como um todo;

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a criança primeiro percebe o todo para depois observar as partes;

prioridade à compreensão;

no ato de leitura, o leitor utiliza estratégias globais de reconhecimento;

as palavras devem ser familiares e possuir valor afetivo para a criança.

Apesar de concordar com um dos princípios defendido pelo método global, isto é, o

ponto 3 e, parcialmente com o ponto 5, todos os demais foram totalmente refutados

pelos experimentos em neuropsicologia e neurociência.

A seguir, alinharei os argumentos advindos de evidências da linguística,

psicolinguística, neuropsicologia e da neurociência que desconfirmam as alegações dos

defensores do método global.

A arquitetura cerebral da linguagem verbal sustenta seu funcionamento

Diferentemente de outros sistemas de reconhecimento por configuração, como é o caso

do reconhecimento de rostos, de casas e de artefatos, caracterizados por sua estrutura

global ou holística, a linguagem verbal apresenta uma arquitetura, pela qual suas

unidades são articuladas em diferentes níveis, que correspondem a circuitos cerebrais,

nos quais os neurônios se especializam para determinadas funções. A proposta de

arquitetura não implica, contudo, a impenetrabilidade dos níveis, uma vez que eles estão

conectados entre si. “De fato, quando abordarmos as bases cerebrais da leitura,

verificaremos que a organização em vias múltiplas e paralelas é um traço essencial da

arquitetura do córtex” (DEHAENE, 2012, p. 56).

Algumas propriedades desta arquitetura são as de que, quanto mais baixo o nível, menor

é o número de elementos que constituem seu paradigma, mais fechado à entrada de

novos elementos em cada sistema linguístico e mais compulsória sua automatização,

para que o processamento flua sem tropeços.

Sendo assim, no nível mais baixo da arquitetura subjacente ao processamento da

recepção auditiva está o paradigma constituído das invariâncias de uns poucos traços

fonéticos, bem como dos fonemas (incluída sua distribuição), cujo pareamento com o

que é extraído do sinal acústico da fala de uma dada variedade sociolinguística e, a

seguir, processado, permite perceber as diferenças entre as unidades dotadas de

significado (observe que as unidades do nível mais baixo não têm significado, mas

servem para diferenciar entre si as unidades dotadas de significado).

O nível a seguir é a memória lexical, onde estão as unidades dotadas de significado:

neste capítulo não há espaço para aprofundar a polêmica sobre o formato desta

memória, mas é certo que, no mínimo, está subdividida em dois blocos, um no qual

estão armazenadas as unidades que se referem à experiência externa à língua, seja ela

espiritual ou material e o outro no qual estão armazenadas as unidades que representam

as categorias gramaticais. O que diferencia estes dois blocos é que o primeiro está

aberto a receber novos itens, toda a vez que se tornar necessário rotular uma nova

experiência, podendo abrigar dezenas e até centenas de milhares de unidades enquanto o

segundo registra um número muito limitado de itens gramaticais e está fechado a

registrar unidades que não pertençam ao esqueleto daquela língua. Numa outra memória

está a maquinaria sintática de uma dada língua, também constituída de um número

muito limitado de regras que comandam as combinatórias possíveis e as hierarquias

numa dada língua. Em outro nível, estão estruturados os campos semânticos, nos quais

estão associadas as significações básicas disponibilizadas aos respectivos significantes

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pelos membros de uma mesma comunidade linguística, moeda de troca que possibilita a

intercomunicação. Somente os esquemas cognitivos, que servem de marco textual e

discursivo, em reconstrução constante na memória permanente, podem ser considerados

como balizadores globais dos processamentos que ocorrem nos diferentes níveis acima

descritos, integrando o sistema funcional da linguagem.

As evidências empíricas para os circuitos neurais especializados em cada um dos níveis

provêm, historicamente, da afasiologia, hoje aperfeiçoadas pelo acompanhamento

online do que acontece em cérebros normais quando a linguagem verbal é processada;

foram precedidas por dois marcos iniciais, respectivamente, os trabalhos de Broca e de

Wernicke. Paul Broca realizou exame post-mortem no cérebro de um paciente do

hospital Salpêtrière com grave distúrbio de fala e constatou a lesão do terço posterior do

giro frontal inferior esquerdo do paciente (LURIA, 1981), concluindo que uma área do

lobo frontal esquerdo estaria envolvida na produção da fala. Wernicke, por outro lado,

relatou, em 1873, casos em que a lesão do terço posterior do giro temporal superior

esquerdo resultava na perda da capacidade de entender a fala. Grosso modo, ambas as

regiões ficaram conhecidas como área de Broca e área de Wernicke.

Outro marco foi a teoria proposta por Ramón y Cajal (1852-1934) de que o sistema

nervoso é composto por células distintas e discretas (LAMBERT e KINSLEY, 2006).

Ilustrarei as contribuições da neurociência em favor da arquitetura cerebral para o

processamento da palavra escrita que desconfirmam o reconhecimento global de

enunciados escritos.

A arquitetura geral do sistema visual é estreitamente limitada e reproduzível, mas o

detalhe das respostas de cada neurônio depende de cenas visuais que o organismo

encontrou previamente. Mecanismos sofisticados de aprendizagem estatística detectam

regularidades do mundo exterior. Nosso cérebro está construído a fim de que certas

coincidências suspeitas – alinhamento de várias barras sobre a retina, presença da

junção em T, ou em L, sequências reproduzíveis de imagens, etc. – sejam extraídas e

internalizadas na arquitetura mesma das conexões do córtex temporal ventral

(DEHAENE, 2012, ps. 164/5).

Conforme argumentado no início deste tópico, uma das diferenças entre o

processamento da linguagem verbal e o de alguns sistemas holísticos e globais como o

dos rostos, das casas e artefatos, é que o primeiro é sequencial, articulando unidades em

diferentes níveis, reconhecidas no hemisfério esquerdo, especializado para tal. O

reconhecimento dos traços que compõem as letras, uma ou mais caracterizadas, a

seguir, como grafemas no sistema alfabético de uma dada língua, é realizado na

pequena área fusiforme situada no hemisfério esquerdo, a região occipitotemporal

ventral (vide o cap. 3), denominada por Dehaene “caixa das letras” do cérebro, ladeada

por áreas onde são reconhecidos de forma global rostos, casas e artefatos, porém,

preferencialmente nas regiões homólogas do hemisfério direito.

Em virtude da rapidez com que se dão tais processamentos, somente técnicas de

resolução muito apuradas, como a magnetoencefalografia, explorada desde 1968 por

David Cohen (1972) e seus colegas do M.I.T., conjugada com a eletroencefalografia,

permitem detectar onde se dão tais reconhecimentos: “o sinal magnetoencefalográfico é

da ordem do femtofard27a

, ou seja, um bilhão de vezes menos que o campo magnético

terrestre” (DEHAENE, 2012, p. 92). A rapidez com que tais processamentos se dão foi

um dos fatores que induziu ao erro de explicá-los como globais, erro sanado pelos

métodos que dispõem de precisão temporal, pois “a propagação da atividade

eletromagnética do cérebro até os captores é praticamente imediata” (op.cit. p. 92):

Assim, Antti Tarkiainen e seus colegas da Universidade de Helsinski

mediram a atividade magnética do cérebro quando da apresentação de

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palavras e rostos. Seus resultados revelam duas etapas principais de

tratamento visual no córtex. Numa primeira fase, observada em torno

de 100 milissegundos depois do aparecimento das imagens na retina,

os dois tipos de imagens não se distinguem: palavras e rostos ativam

regiões comparáveis do pólo occipital, bem atrás da cabeça. Essas

regiões efetuam uma primeira análise da imagem para extrair

provavelmente as formas elementares: traços, curvas e superfícies.

Nesse estágio do tratamento da informação, o cérebro não sabe ainda

de qual estímulo ele vai se ocupar. Mas apenas 50 milissegundos mais

tarde, começa a triagem da informação visual. As palavras evocam

uma resposta ampla, fortemente lateral no hemisfério esquerdo. A

eletroencefalografia permite igualmente medi-la sob a forma de

voltagens negativas que emergem de súbito, em torno de 170

milissegundos, na parte inferior e atrás da cabeça. Sua amplitude é

bem maior na parte acima do hemisfério esquerdo do que no direito.

Para os rostos, é o inverso: os potenciais dominam nitidamente a parte

acima do hemisfério direito (DEHAENE, 2012, ps. 92-94).

Limites de captação de caracteres pela fóvea

Outras fortes evidências que refutam o método global provêm dos experimentos que

demonstram os limites de captação da informação escrita pela única região do olho

capaz de fazê-lo, o centro da fóvea, onde estão os cones, células fotorreceptoras de

resolução muito alta, que ocupam aproxidamante 15º do campo visual, conforme já

examinado no cap. 3.

Esta limitação faz com que, durante a leitura, os olhos percorram a linha, nos chamados

movimentos de sacada, sem nada perceberem (ponto cego): somente no momento da

fixação é que são capturados, nos sistemas de escrita da esquerda para a direita, não

mais do que três ou quatro letras à esquerda do centro da fixação e sete ou oito à direita,

incluindo os espaços.

Conforme demonstraram McConkie e Rayner (1975), durante o movimento de sacada,

os cones não captam absolutamente nada.

O fato é que, dadas as limitações acima, é totalmente impraticável propor um método

que parta do reconhecimento do texto escrito como um todo, para depois prosseguir

decompondo-o, generalizando o princípio de que a percepção se dá do todo em direção

às partes constituintes.

Na prática pedagógica, o que ocorria era a memorização do texto ouvido, para

emparelhar cada palavra com o escrito, quase por advinhação. Com efeito, a estratégia

da advinhação, maquiada por uma nomenclatura pseudocientífica de “hipótese”, ainda

vem sendo largamente preconizada pelos críticos dos métodos fônicos, sobre o qual

discorrerei ao final.

Os métodos globais desconhecem como ocorre o reconhecimento da palavra escrita e,

em consequência, qual a melhor forma de alfabetizar:

As particularidades do sistema visual dos primatas, que começa

a se tornar bem conhecido, explicam por que as operações que

nosso cérebro realiza não têm nada em comum com um

reconhecimento “global” da forma das palavras. A visão dos

primatas não funciona por reconhecimento global – muito pelo

contrário, o objeto visual explode em miríades de pequenos

fragmentos que nosso cérebro se esforça em recompor, traço por

traço, letra após letra. Reconhecer uma palavra consiste,

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primeiramente, em analisar essa cadeia das letras e aí descobrir

as combinações das letras (sílabas, prefixos, sufixos, radicais das

palavras), para enfim associá-las aos sons e aos sentidos. É

somente porque as operações foram automatizadas em anos de

aprendizagem e porque se desenvolvem em paralelo, fora de

nossa consciência, que pode persistir durante tantos anos a

hipótese naîve de uma leitura imediata e global (DEHAENE,

2012, p. 21).

A desconfirmação das teorias subjacentes aos métodos globais, contudo, não significa,

como venho afirmando, descartar os processos em paralelo, nem a interconexão

obrigatória entre os neurônios da região occipitotemporal ventral esquerda com todas as

demais regiões do cérebro que processam a linguagem verbal. Em adendo, é de capital

importância esclarecer o papel do conhecimento prévio e enciclopédico, tanto na leitura,

quanto na alfabetização e demonstrar que a aceitação deste papel não entra em

contradição com a adoção dos métodos fônicos.

O papel do conhecimento prévio no reconhecimento da palavra escrita e na

alfabetização

Reconhecer a arquitetura cerebral dos sistemas linguísticos bem como os limites de

captação do número de caracteres da palavra escrita não implica descartar o papel que o

conhecimento prévio desempenha tanto na leitura quanto na alfabetização. Trata-se de

resolver a questão sugerida pela metáfora de “o que vem antes, a galinha ou o ovo”.

Pode-se, de saída, afirmar a necessidade de um tipo de conhecimento prévio, ou seja, de

uma língua natural, pois a língua escrita alfabética lhe é secundária. Obviamente, há um

contínuo nesta relação, uma vez que, em virtude das mudanças distintas nas diversas

variedades sociolinguísticas, algumas delas se afastam mais que outras da língua escrita

padrão, uma só para todo o território da língua em questão.

A importância do conhecimento prévio da língua oral na alfabetização pode ser

percebida na dificuldade dos usuários de LIBRAS para aprenderem os princípios do

sistema alfabético do português brasileiro, uma vez que, para eles serem efetivamente

incluídos no mundo da informação, eles teriam que ser fluentes na leitura dos textos que

circulam socialmente e nas instituições de ensino. Como estes textos utilizam um

sistema que não é a representação de LIBRAS, falta-lhes o conhecimento prévio, daí a

grande dificuldade de aprendizagem.

Para a leitura fluente, condição necessária à compreensão textual e discursiva, faz-se

necessário que o reconhecimento da palavra escrita seja muito rápido. Como já

explicado anteriormente, os cones não conseguem abarcar mais do que três ou quatro

letras à esquerda do centro da fixação e sete ou oito à direita. Isto significa que, após ter

havido o reconhecimento dos traços e das letras, sua representação mais abstrata em

grafemas e a lincagem aos respectivos fonemas, para o reconhecimento da palavra e o

acesso à significação básica, o resultado é provisoriamente registrado na memória de

trabalho, um buffer ou estacionamento muito breve, para poder acomodar os resultados

subsequentes dos processamentos seguintes e assim amalgamá-los para obtenção dos

significados frasais, oracionais e assim por diante.

Já deu para concluir que, se o indivíduo não tiver automatizado (e muito bem) o

reconhecimento dos traços que diferenciam as letras entre si e os valores que os

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grafemas têm, começará a tropeçar diante de palavras que estiver vendo pela primeira

vez e, quando chegar ao reconhecimento da palavra, a significação básica anteriormente

armazenada na memória de trabalho (se é que conseguiu chegar até esta etapa) se

esvaiu. Portanto, por mais que os adversários dos métodos fônicos torçam o nariz, é

forçoso admitir que, para se compreender o que se lê, incluindo aí palavras novas que

inundam o nosso cotidiano, o indivíduo não pode vacilar no reconhecimento das letras e

na atribuição dos valores que os grafemas têm.

Finalmente, o conhecimento prévio, na forma de esquemas cognitivos, é fundamental

para a construção dos sentidos.

Os esquemas cognitivos, em contínua reestruturação em nossa memória permanente,

registram de forma coerente nosso conhecimento de mundo e enciclopédico. São eles

que permitem a atribuição de um sentido novo a uma palavra velha conhecida. Na pré-

leitura, momento inaugural que precede a leitura do texto propriamente dito, após ter-se

identificado o tema, seleciona-se, dentre as dezenas ou centenas de esquemas, aquele

que vai balizar, permanecendo continuamente ativado, a construção do sentido das

palavras (o ato por excelência criativo da leitura).

É neste passo que se torna mais verdadeira a metáfora “o que vem antes, a galinha ou o

ovo”, porquanto, quem não tem o hábito da leitura, seja porque ela lhe é penosa, por ter

sido mal alfabetizado, ou por qualquer outro motivo, possui esquemas cognitivos pobres

ou até inexistentes, refletidos, igualmente, no vocabulário escasso para determinados

tópicos.

Para que se possam entender os textos, conforme estou expondo, é necessário conhecer,

no mínimo, 50% do vocabulário neles constante, pois, se o peso da informação nova for

excessivo, a sobrecarga para a construção dos sentidos novos se torna intransponível.

Eis por que as pessoas têm que ter o hábito de e o gosto pela leitura e isto só se adquire

quando ela for prazerosa e fluente, decididamente, quando muito exercício intensivo e

inteligente permitir que o dançarino flutue no espaço, sem esforço aparente, ou seja,

tudo começa numa boa alfabetização.

Esclarecimentos sobre os métodos fônicos

Os métodos fônicos podem ser silábicos ou fonológicos, mas ainda persistem muitas

confusões sobre suas bases teóricas e sobre suas aplicações. Deter-me-ei em algumas

delas, para que não pairem dúvidas que fortaleçam os argumentos dos defensores dos

métodos globais.

A primeira confusão decorre do falso argumento de que os métodos fônicos não se

preocupam com a principal finalidade da alfabetização que é compreender os textos.

Ora, da exposição anterior, deve ter ficado bastante claro para o leitor que o verdadeiro

método fônico tem por escopo a automatização do reconhecimento dos traços que

diferenciam as letras entre si, para chegar-se ao grafema, cuja função não é outra senão

distinguir uma palavra de outra, justamente porque substituir um grafema por outro

altera o significado. Viu-se, também, que é necessário dominar tais conhecimentos,

não como uma finalidade em si mesma, mas sim porque, sem este domínio, não é

possível a leitura fluente, condição para se chegar à compreensão textual, em virtude

dos limites temporais da memória de trabalho.

O falso argumento de que os autores dos métodos fônicos não se preocupam com a

compreensão é exemplificado caricatamente com exercícios mecânicos de

discriminação das diferenças entre sons, supostamente, instrumento para desenvolver a

consciência fonológica e/ou com as chamadas cartilhas matracas para alfabetizar.

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No primeiro caso, cabe esclarecer que exercícios para discriminar diferenças entre sons

isolados não têm nada a ver com desenvolvimento da consciência fonológica e se

alguém os aplica sob esta alegação está muito equivocado, pois o recém-nascido

demonstra sensibilidade para a percepção categorial, independente da exposição a uma

dada língua, conforme os experimentos com o paradigma HAS (high-amplitude

sucking), quando ficou comprovada a discriminação categorial da oposição [+] / [-son]

no par [ba] / [pa] desde um mês de idade (EIMAS et al., 1971), (SCLIAR-CABRAL,

2004, p. 79).

Logo, o bebê já discrimina a diferença entre sons. O que ele ainda não tem é

conhecimento para o uso dos fonemas e, muito menos, consciência fonológica: o

conhecimento para o uso se estabelece à medida que a criança adquire a sua variedade

sociolinguística e o uso de uma classe de sons (o fonema) ou de outra acarreta mudança

de significado. Já a consciência fonológica, a capacidade metalinguística para refletir

sobre as unidades que têm a função de distinguir significados, pressupõe o

desmembramento da sílaba em seus componentes, o que acontece lado a lado com a

aprendizagem dos princípios do sistema alfabético de uma dada língua.

Como se pode depreender, não existe a mínima possíbilidade de operar com o método

fônico, sequer de pensar em alfabetizar, trabalhando apenas com sons isolados, porque o

fundamento está em estabelecer a relação entre grafemas e fonemas, unidades que têm a

função de distinguir significados e estes só existem no seio de palavras.

(ícone bloco de anotações)

Pontos Importantes

No capítulo 6 foram tratados os seguintes conteúdos:

desmistificação do método global;

breve histórico do método global e seu uso no Brasil;

algumas evidências empíricas da neurociência sobre a arquitetura cerebral;

limites biológicos à captação pela retina de mais que doze caracteres a cada

fixação;

como a região occipitotemporal ventral esquerda processa a informação escrita;

o reconhecimento da palavra não se dá por configuração;

os métodos fônicos não implicam ignorar a existência e necessidade de

processamentos top-down e em paralelo;

fundamento do método fônico: estabelecer a relação entre grafemas e fonemas,

unidades que têm a função de distinguir significados.

Sugestões para reflexão e pesquisa

Quais os limites ao que os receptores da visão podem captar, de cada vez, que depõem

contra o método global?

A memória de trabalho registra primeiro o texto ou mesmo um período inteiro para

depois desdobrá-lo?

O método fônico significa trabalhar com a discriminação de sons isolados?

(ícone avaliação)

6. Qual a base para uma alfabetização efetiva para a leitura e a escrita?

a ( ) O método global, pois o cérebro processa o texto escrito como um todo.

b ( ) A nomeação das letras, pois, sem saber o nome das letras, os indivíduos não as

reconhecem.

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c ( ) A intuição do indivíduo para ir descobrindo sozinho os princípios dos sistemas

alfabéticos.

d ( ) As mais recentes descobertas científicas de que há neurônios especializados que

devem ser reciclados para reconhecer os traços das letras, associando-as aos fonemas,

ambos com a função de distinguir significados.

e ( ) O fato de que, seja qual for o método, o indivíduo se alfabetizará sem dificuldade.

7. As principais dificuldades na alfabetização: desmembrar a sílaba - encontros

vocálicos

(ícone síntese)

No capítulo 6, baseada nos recentes achados da neurociência, procurei desmistificar o

método global. Traçei um breve histórico de seu surgimento e desdobramentos,

exemplificando o uso no Brasil com algumas cartilhas. Retomei as evidências empíricas

da neurociência sobre os limites biológicos à captação pela retina de mais do que doze

caracteres, inclusive os espaços, a cada fixação sobre a linha impressa e sobre como a

região occipitotemporal ventral esquerda processa a informação escrita, demonstrando

que o reconhecimento da palavra não se dá por configuração. Demonstrei, também, que

a opção por métodos fônicos não implica ignorar a existência e necessidade de

processamentos top-down e em paralelo, e encerrei com breves considerações sobre os

métodos fônicos.

Ícone objetivo

No capítulo 7 começarei a analisar em profundidade as principais dificuldades que o

aprendiz deverá vencer. Como nosso sistema não é silábico e sim alfabético, para fazer

a associação entre o grafema e seu respectivo fonema, o indivíduo deverá desmembrar a

sílaba, quando ela for formada por dois, três ou mais segmentos. Eis aí a primeira

grande dificuldade com a qual se defronta o alfabetizando, uma vez que, até se

alfabetizar, ele percebe a fala como um contínuo e a sílaba como uma unidade

indecomponível. Trabalharei com você o conceito de fonema, de consciência fonológica

e os encontros vocálicos.

Desmembrar a sílaba para associar um fonema a um grafema

Com efeito, antes de se alfabetizar, o indivíduo percebe a cadeia da fala como um

contínuo: não há pausas entre as palavras, como os espaços em branco que as separam

na escrita, nem contrastes entre os sons que constituem as sílabas.

Primeiro vou examinar a dificuldade em perceber o contraste entre as unidades que

constituem a sílaba e, portanto, em desmembrá-la.

Por exemplo, não só as pistas acústicas que definem uma consoante e uma vogal

adjacente são interdependentes, como também seus respectivos gestos

fonoarticulatórios, em virtude da coarticulação. Faça o exercício a seguir diante do

espelho:

Ícone na prática

Pense em pronunciar a palavra pi e, antes de dizê-la, olhe como ficou sua boca.

Agora pense em pronunciar a palavra pó e, antes de dizê-la, olhe como ficou sua boca.

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Embora o fonema inicial seja o mesmo nas duas palavras, isto é, /p/ (que não pode ser

realizado isoladamente), quando você pensou em pronunciá-lo na palavra pi, seus lábios

fechados ficaram esticados horizontalmente (isto é, distensos), mas quando pensou em

dizer pó, seus lábios fechados fizeram um biquinho (isto é, ficaram arredondados). Isso

ocorreu porque o programa motor do cérebro envia os comandos aos músculos do

aparelho fonador por unidades silábicas: como a vogal [i] é distensa (tente pronunciá-la

na frente do espelho), ao pensar em dizer a palavra pi, os lábios já se preparam, no

fenômeno chamado de antecipação; mas a vogal [O] é arredondada e, por isso, ao pensar

em dizer pó, você arredonda os lábios, isto é, faz um biquinho.

Há outros traços das vogais que vão afetar a articulação do [p] e, portanto, as

respectivas pistas acústicas. Por exemplo, em [i], o maxilar inferior vai para frente e

puxa o dorso da língua de encontro ao palato duro: essa vogal é chamada de anterior ou

menos posterior, fechada e alta (além de distensa), enquanto em [O], o maxilar abaixa e

puxa o dorso da língua para trás. A vogal, então, é chamada de posterior, aberta e baixa

(além de arredondada).

Quando você pede a um não alfabetizado para dizer quantos sons escuta em casa, ele

responde que são dois e não consegue apagar a consoante inicial de uma sílaba.

Verifique você mesmo, aplicando o teste abaixo numa criança e num adulto, não

alfabetizados: observe que primeiro coloquei o teste de apagamento de uma vogal,

também uma sílaba, para demonstrar que a pessoa não consegue realizar o teste de

supressão da consoante não por não ter compreendido o comando, mas sim porque não

consegue desmembrar a sílaba.

Ícone na prática

Teste de Supressão da Vogal

Comando: -Agora eu vou dizer uma palavra que eu inventei e você vai tirar um

pedacinho, conforme eu vou explicar. Se eu disser aqui, /a´ki/, você diz qui, /ki/: 1. assu a´su 11. acã a´kã

2. atã a´tã) 12. afó a ´fO

3. acó a´kO 13. alum a´lu]

4. apim api] 14. akô a ´ko

5. achê a´Se 15. apém a´pe]j

6. afu a´fu 16. afô a ´fo

7. apom a´põ 17. adã a´dã

8. achu a´Su 18. agô a ´go

9. apu a´pu 19. afum a´fu]

10. afi a´fi 20. apô a´po

Teste de Supressão das Consoantes Comando: -Você vai tirar o pedacinho da frente.

Se eu disser far /faR/, você vai dizer ar /aR/. Vamos repetir?

1. fói fOj 11. fão fãw

2. fuim fu]j 12. faim fãj

3. fur fuR 13. fér fER

4. fãe fãj 14. fom fõ

5. féi fEj 15. fôs foS

6. fons fõS 16. fõe fõj

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7. fól fOW 17. fau faw

8. fois fojS 18. fêr feR

9. fens fe]jS 19. fem fe]j

10. fór fOR 20. fus fuS

Como você pode perceber, ao aplicar este teste, o processo de alfabetização é complexo

e implica o desenvolvimento de novas habilidades.

Por que é impossível ouvir ou pronunciar uma consoante oclusiva sozinha?

As consoantes oclusivas, ou [-contínuas], ou momentâneas, ou plosivas (são as várias

denominações encontradas na literatura para tais sons) são as consoantes, conforme

sugerem os rótulos, que resultam da ruptura pelas moléculas de ar de um obstáculo à

sua passagem, causando um efeito perceptual de explosão. Por isso, não podem perdurar

na prolação, sendo também chamadas de momentâneas. Na realidade, o gesto do

fechamento, ou obstáculo impede qualquer energia, resultando, portanto, no silêncio,

que só é rompido quando tal obstáculo também se rompe, ou seja, com o apoio de uma

vogal, como em [ta] e [tu] de [ta´tu] ou de uma consoante que permita a passagem das

moléculas de ar. Tente, por exemplo, emitir sozinho o som [t] que aparece duas vezes

em tatu: é impossível! No português brasileiro existem seis consoantes oclusivas ou

[-contínuas]: [p], [b], [t], [d], [k], [g].

Consciência fonológica

Cabe, em primeiro lugar, definir o que vem a ser consciência fonológica e, se tal

consciência é sobre unidades fonêmicas, o estatuto de tais unidades.

A consciência metalinguística e a consciência fonológica na qual ela se insere decorrem

de o ser humano poder se debruçar sobre um objeto, no caso, a linguagem, de forma

consciente, utilizando uma linguagem. O tema foi aprofundado por muitos autores,

dentre os quais destacaei Morais e Kolinsky (1995). Pallaoro Moojen (2003) coordenou

uma equipe que elaborou uma bateria para avaliar sequencialmente a consciência

fonológica. No caso particular da consciência fonológica, o objeto sobre o qual você se

debruça conscientemente são os fonemas, e a linguagem utilizada é o alfabeto.

Portanto, uma primeira distinção a ser feita é entre conhecimento para o uso, não

consciente, dos fonemas de uma língua, que todo o falante-ouvinte nativo tem,

independente ou não de ser alfabetizado, pois utiliza com propriedade, quer quando

escuta, quer quando fala, a diferença entre /´bala/ e /´mala/, e o conhecimento

consciente dos fonemas, ou consciência fonológica que se desenvolve lado a lado com a

aprendizagem do sistema alfabético da respectiva língua.

Se o objeto da consciência fonológica é o fonema, é preciso também ter claro o conceito

de fonema, pois muitos confundem fonema com som, ou colocam, dentro do objeto da

consciência fonológica, outras capacidades de lidar com os sons.

Ícone dicionário

Fonema: A definição clássica de fonema, estabelecida pelo linguista R. Jakobson

(1949), é: o fonema é um feixe de traços distintivos.

Vou clarear, ponto por ponto, o que está implícito na definição de Jakobson para

fonema.

O fonema tem uma função distintiva, isto é, serve para distinguir um significado básico

de outro, como no já citado exemplo de /´bala/ e /´mala/. Veja bem, o fonema não tem

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significado: serve para distinguir significados. Quer dizer que /b/ e /m/ não significam

nada, mas trocando um pelo outro no contexto /´_ala/, o significado se altera.

Se você observar bem, vai notar (e agora vou mencionar os traços que constituem os

dois fonemas) que:

no 1º traço ambos são consoantes [+cons];

no 2º traço /b/ é [+obstruinte], isto é, uma oclusiva, pois há um obstáculo à saída

do ar pelo trato vocal e /m/ é [-obstruinte], uma vez que o ar sai pelas narinas,

sem encontrar obstáculo;

no 3º traço /b/ não é continuo [-cont], e sim momentâneo, isto é, não pode

perdurar na prolação (e, por isso, não pode ser produzido isoladamente)

enquanto /m/ é [+cont], pois pode perdurar na prolação;

no 4º traço /m/ é [+nasal], pois as moléculas de ar ressoam nas fossas nasais e

/b/ é [-nasal], pois as moléculas de ar ressoam no trato bucal;

no 5º traço, não há oposição, pois em ambos os fonemas as pregas vocais

vibram, por isso, eles são sonoros [+son], embora esse traço seja redundante nas

consoantes nasais;

no 6º traço também não há oposição, pois ambos os fonemas são anteriores,

[+ant], uma vez que são articulados na parte mais anterior do trato vocal, ou

seja, com os lábios fechados;

no 7º traço também não há oposição, pois ambos não são coronais, [-cor], já que

não são articulados com a coroa da língua contra os alvéolos ou parte anterior do

palato duro.

Conforme se pode verificar, a diferença entre /b/ e /m/ não é in totum e sim apenas entre

os traços [+obstruinte], [-cont], de /b/ contra [-obstruinte], [+cont] e [+nasal] de /m/. O feixe de traços de /b/ é constituído de [+cons], [+obstruinte], [-cont], [+son], [+ant] e

[-cor]. Ele se diferencia de /p/ apenas porque esse fonema é [-son] e de /d/ apenas

porque esse é [+cor].

Por que o fonema não é som?

Porque o fonema é uma entidade psíquica. Assim como você não pode colocar uma

cadeira dentro de sua cabeça, as moléculas de ar que se comprimem e rarefazem para

produzir as ondas acústicas também não entram dentro dela. Lembra-se dos traços

invariantes das letras? Pois bem, o fonema é um feixe de traços invariantes, de natureza

abstrata, que são reconhecidos por sua função de distinguir significados, permitindo que

as pessoas se comuniquem através da linguagem verbal. Não importa como as pessoas

pronunciem o terceiro segmento que aparece na palavra carta, pois o som que o carioca

produz só tem de parecido com o que um gaúcho de Bagé diz pelo fato de que ambos

são consoantes, e só! Mas o fonema é o mesmo!

Ilustração de uma carta

Quando o bebê nasce, os neurônios das áreas primárias são sensíveis para discriminar as

diferenças categoriais entre quaisquer sons que possam existir em qualquer língua, mas

obviamente, não se trata de fonemas, pois, conforme expliquei acima, o fonema serve

para distinguir significados. Ora, ao nascer, o bebê ainda não está com as conexões

neurais estabelecidas com as áreas que processam as significações básicas, nem tão

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pouco teve experiência suficiente com a variedade linguística materna, para reorganizar

as pautas acústicas pertinentes a tal variedade (vide os três fatores que se conjugam para

a aquisição da variedade sociolinguística oral, no capítulo 4). São precisos alguns meses

para que se estabeleçam conexões entre as várias áreas do sistema nervoso central, pois

“certas áreas associativas específicas e não específicas do córtex, bem como as

conexões axônicas que as ligam”, jogam um papel principal nos aspectos semânticos da

linguagem receptiva e produtiva, em particular, o lóbulo parietal inferior (LECOURS,

1983, p.184).

Conforme se pode depreender, o fato de o infante ser capaz de, após condicionamento,

dar respostas diferenciadas a estímulos categoriais, no chamado paradigma HAS (High-

Amplitude Sucking, EIMAS et al., 1971), ou de ser capaz de emitir uma gama bastante

rica de sons (inarticulados), não significa, no primeiro caso, que ele já esteja

demonstrando qualquer tipo de consciência fonêmica, ou, no segundo, que ele já esteja

produzindo gestos fonoarticulatórios de uma dada língua.

Na prática

Decorrem destas evidências muitas implicações para o que se considera pertinente no

desenvolvimento da consciência fonológica:

o desenvolvimento da consciência fonológica pode ajudar o alfabetizando a

vencer a dificuldade em segmentar a sílaba;

tal desenvolvimento depende do domínio gradativo do sistema alfabético, pois,

para desenvolver a consciência fonológica, o indivíduo necessita de uma

linguagem e essa linguagem é o alfabeto;

não se deve confundir consciência fonológica com habilidades para discriminar

diferenças entre sons, pois o fonema é uma entidade que tem a função de

distinguir as significações básicas.

Em virtude das grandes confusões que circulam nos livros didáticos, inclusive das séries

iniciais, darei algumas explicações sobre a sílaba e os encontros vocálicos no PB.

A sílaba e os encontros vocálicos no PB

A sílaba no PB é uma unidade constituída obrigatoriamente por uma e apenas uma

vogal (o centro silábico) que pode vir acompanhada em suas margens à esquerda (o

aclive ou ataque) e à direita (o declive ou coda) por uma ou mais consoantes. O

movimento do trato vocal é de um fechamento para uma abertura (vogal) e dessa para o

fechamento. Como não há letras específicas para representar os grafemas semivocálicos,

ocorrem muitas confusões em sua identificação, agravadas pelo fato de as semivogais

praticamente só se diferenciarem de suas homorgânicas vogais por serem mais breves e

por sua função na sílaba: sempre são margem e nunca centro silábico.

Ícone dicionário:

Sons homorgânicos: São os sons produzidos no mesmo ponto de articulação, como,

por exemplo, a vogal [i] e a semivogal [j], a vogal [u] e a semivogal [w].

Sendo assim, a estratégia para identificar se a letra representa uma vogal ou uma

semivogal consiste em aplicar o princípio: tantas sílabas, tantas vogais (lembre que a

semivogal nunca pode receber o maior acento de intensidade).

Na prática

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Número de Vogais

Conte quantas sílabas tem o vocábulo e, em seguida, diga quantas são as vogais (o

número de vogais deve coincidir com o número de sílabas).

SÍLABAS VOGAIS SÍLABAS VOGAIS

1. confusões ( ) ( ) 6. suas ( ) ( )

2. muitas ( ) ( ) 7. mais ( ) ( )

3. que ( ) ( ) 8. pois ( ) ( )

4. feixe ( ) ( ) 9. inicia ( ) ( )

5. gaúcho ( ) ( ) 10. ressoam ( ) ( )

Cabe chamar a atenção para um grave erro constatado em livros didáticos e em provas

de concurso que consiste em confundir separação silábica com normas de translineação.

O que são normas de translineação? São normas que dizem como você deve separar as

partes de uma palavra, quando não há mais espaço na linha, para continuá-la na linha

seguinte. Essas normas, totalmente arbitrárias, mandam separar, por exemplo, dígrafos,

que não são outra coisa senão um só grafema! Assim, segundo essas normas, deve-se

separar car- na palavra carro e continuar ro na linha seguinte, ou cons- de

consciência, colocando ciência na linha seguinte. Ora, isto não tem nada a ver com

separação silábica! As duas sílabas de carro, na escrita são ca e rro /´ka/ /Ru/.

Atenção!

Encontros Vocálicos

HIATO é o encontro de duas vogais, portanto, em sílabas separadas. Ex.: caí /ka´i/ (duas sílabas, duas vogais).

DITONGO é o encontro de uma vogal e de uma semivogal na mesma sílaba.

Ex.: cai /´kaj/ (uma sílaba, uma vogal).

Os ditongos podem ser:

decrescentes - considerados perfeitos, porque não podem ser desmanchados,

isto é, o trato vocal decresce, porque a semivogal vem depois da vogal. Observe que a

semivogal pode estar codificada de várias formas e que as letras i ou u não estão

representando vogais. Exs.: dei, tem, têm, tens, perdeu, mau, mal, mais, mães, tonéis, lençóis, mão, choram.

crescentes - também chamados de imperfeitos, porque podem ser

desmanchados, transformando-se em hiato: trata-se de uma variante livre e, por isso,

questões que versem sobre sua identificação só podem cair em prova quando

contemplarem a possibilidade das duas variantes. Exemplos: vício /´visju/ (duas

sílabas) ou /´visiu/ (três sílabas); ansiar /ã´sjaR/ (duas sílabas) ou /ãsi´aR/ (três

sílabas); cueca /´kwEka/ (duas sílabas) ou /ku´Eka/ (três sílabas).

orais - o centro vocálico é uma vogal oral, arrastando, portanto, a semivogal,

como nos já citados exemplos: perdeu, mau, mal, mais.

nasais - o centro vocálico é uma vogal nasal, arrastando, portanto, a

semivogal, como nos já citados exemplos: tem, têm, tens, mães, mão, choram.

abertos (o centro vocálico é uma vogal baixa, obrigatoriamente oral).

Exemplos: céu, tonéis, dói, cai. Observe que, pelo Novo Acordo Ortográfico, se os

ditongos abertos /Ej/, /Oj/ figurarem em vocábulos paroxítonos, isto é, se não estiverem

no final do vocábulo (monossílabos tônicos ou oxítonos), não levam acento gráfico,

como no nome de pessoa Leia (que agora passa a se confundir com a 1ª e 3ª pessoas do

singular do presente do subjuntivo do verbo ler). Esse acordo ortográfico,

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definitivamente, significa um retrocesso que só interessa às editoras que saíram na

frente, publicando dicionários e livros didáticos para faturar. Uma das únicas

dificuldades para a atribuição dos valores aos grafemas no PB era, exatamente, a que

dizia respeito aos grafemas e - o, que a antiga regra de acentuação gráfica dos ditongos

abertos /Ej/ e /Oj/ atenuava, pois valia em qualquer posição no vocábulo. Voltarei ao

assunto quando tratar da ambissilabicidade.

fechados - o centro vocálico é uma vogal [-baixa], isto é, /i/, /e/, /u/, /o/ ou

uma vogal nasalizada, inclusive /ã/, que se realiza como fechada.

TRITONGO é o encontro de uma vogal entre duas semivogais na mesma sílaba

(continua valendo a estratégia, tantas sílabas, tantas vogais). Exemplos. Aguei, magoei. Como a primeira parte do tritongo é crescente, ela pode ser desmanchada e o ditongo se

transforma em hiato, portanto é uma variante livre. Aguei /a´gwej/ (duas sílabas,

duas vogais), ou /agu´ej/ (três sílabas, três vogais).

Alguns encontros vocálicos difíceis de identificar

Ditongo ou hiato?

Quando o centro silábico for a vogal /i/ ou /u/, conforme os casos a seguir:

navio /na´viu/: nesse caso, a melhor solução é tratar o encontro como hiato,

conforme o similar em Maria. Se io fosse ditongo, teria que ser obrigatoriamente

decrescente, porque o acento de intensidade maior cai no i e, em consequência, o

encontro não poderia ser desmanchado, o que não é o caso.

Ambissilabicidade

O que é ambissilabicidade? É quando a parte inicial de um som é a margem direita de

uma sílaba (declive) e a parte final dele é a margem esquerda da sílaba seguinte. Lembra

quando expliquei que a sílaba vai do fechamento para a abertura e dessa para o

fechamento? Pois bem, observe o vocábulo boia e acompanhe seus movimentos,

olhando-se no espelho: começa com os lábios fechados em bico [b], cujo fechamento se

rompe com o maxilar inferior vindo para baixo, arrastando a língua até atingir o

máximo de abertura necessária para produzir o centro silábico [O]; a seguir, o maxilar

inferior vai subindo, arrastando o dorso da língua de encontro à parte interna da arcada

dentária e do céu da boca, enquanto os lábios se distendem, decrescendo a abertura para

produzir a metade da semivogal [j] até o máximo de seu fechamento (portanto, um

ditongo decrescente), o qual, sem interrupção começa a se abrir, com o maxilar inferior

voltando para baixo e arrastando consigo a língua, até atingir o máximo de abertura para

realizar o [a] (portanto, então um ditongo crescente).

Como você está observando então, dinamicamente, ocorre primeiro um ditongo

decrescente que, gradativamente, vai se transformando em ditongo crescente, encontro

esse não contemplado pela NGB. Seguramente existem em boia duas vogais, portanto,

duas sílabas (a transcrição fonológica melhor dessa palavra seria /´bOjja/). Mesmo que

alguns autores prefiram analisar em tais ocorrências primeiro um ditongo decrescente,

seguido de uma vogal, esse encontro não é consignado pela NGB.

Ícone revisão

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No capítulo 7 foram tratados os seguintes conteúdos:

para fazer a associação entre o grafema e seu respectivo fonema, o indivíduo

deverá desmembrar a sílaba, quando ela for formada por dois, três ou mais

segmentos;

conceito de fonema, como feixe de traços distintivos;

conceito de consciência fonológica como a capacidade de refletir sobre os

fonemas;

encontros vocálicos, inclusive na ambissilabicidade.

Sugestões para reflexão e pesquisa

Quais são as principais dificuldades enfrentadas pelo alfabetizando?

Por que acha que desmembrar a sílaba é tão difícil?

Como você acha que deve ser desenvolvida a consciência fonológica?

(ícone avaliação)

7. A sílaba no PB é constituída de:

a ( ) duas vogais.

b ( ) uma e apenas uma vogal precedida e/ou seguida, ou não, por consoante(s).

c ( ) uma vogal e de uma consoante obrigatória.

d ( ) uma semivogal como centro silábico.

e ( ) uma vogal e de uma semivogal obrigatórias.

8. Outras dificuldades na alfabetização

(ícone síntese)

No capítulo 7 comecei a analisar em profundidade as principais dificuldades que o

aprendiz deverá vencer. Como nosso sistema não é silábico e sim alfabético, para fazer

a associação entre o grafema e seu respectivo fonema, foi examinado que o indivíduo

tem que desmembrar a sílaba, quando ela for formada por dois, três ou mais segmentos,

residindo aí a primeira grande dificuldade com a qual se defronta o alfabetizando, uma

vez que, até se alfabetizar, ele percebe a fala como um contínuo e a sílaba como uma

unidade indecomponível. Trabalhei, também, o conceito de fonema, de consciência

fonológica e os encontros vocálicos.

(ícone objetivo)

No capítulo 8, verificarei o problema da segmentação das palavras e a questão da

percepção dos vocábulos átonos, também chamados de clíticos, as dificuldades

semânticas e a reanálise silábica; abordarei em seguida a dificuldade em reconhecer os

traços que diferenciam as letras e encerrarei o capítulo com a questão das variedades

sociolinguísticas.

A segmentação das palavras

Conforme asseverei, antes da aprendizagem da leitura e da escrita, o indivíduo processa

a cadeia da fala como um contínuo. Além da não percepção dos contrastes entre as

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unidades que compõem a sílaba, conforme examinado no capítulo anterior, outra grande

dificuldade é identificar as palavras tais como estão separadas por espaços em branco no

sistema escrito, mas cujos limites são opacos na cadeia da fala. Vou assinalar três

grandes dificuldades aí envolvidas. A percepção dos vocábulos átonos, também

chamados de clíticos, o fato de os vocábulos átonos não apresentarem significações com

contrapartida referencial concreta e a reanálise silábica, quando um vocábulo termina

por consoante e o seguinte inicia por vogal, ou quando termina por vogal átona e o

seguinte incia por vogal, fenômeno conhecido como sândi externo, ou juntura externa

fechada.

Ícone dicionário:

Sândi ou juntura: Sândi ou juntura resultam do encontro entre dois sons separados por

uma fronteira de palavra ou de morfemas que formam uma palavra conforme as

características das vogais e/ou das consoantes que entram em contacto. Se a fronteira for

entre duas palavras, denomina-se sândi externo ou juntura externa e pode ser aberta, se a

fronteira entre as palavras permanecer bem nítida, como no encontro entre as duas

palavras meninos felizes; ou pode ser fechada, se a fronteira se tornar opaca, em

virtude das características dos dois sons em contato, como acontece toda a vez que uma

palavra termina em vogal e a seguinte também começa por vogal. Se forem idênticas,

ocorre uma crase, como em amiga amada /a´miga´mada/: percebe-se que há duas

palavras porque há dois acentos mais fortes em /´mi/ e /´ma/, mas a fronteira que

separava as duas palavras desapareceu. Se as duas vogais forem átonas, mas diferentes,

permanece apenas a da palavra seguinte, como em amiga ousada /a´migo´zada/. Por

isto, é muito dificíl para a criança separar as palavras por espaços quando está se

alfabetizando.

A percepção dos vocábulos átonos, também chamados de clíticos

Vocábulos átonos são aqueles que, na cadeia da fala, não possuem o acento de

intensidade mais forte. Em geral, são monossílabos e coincidem com classes

gramaticais como os artigos e grande parte dos pronomes, preposições e conjunções.

Em virtude de serem átonos, dependem fonologicamente no português brasileiro do

vocábulo seguinte (com exceção dos pronomes oblíquos que podem ocupar a posição

enclítica ou mesoclítica). Todos os substantivos, verbos, adjetivos e advérbios possuem

uma sílaba com o acento de intensidade mais forte e, por isso, os vocábulos átonos neles

ficam pendurados. Por isso, quando se coloca um vocábulo átono no final da frase, ele

não tem onde se apoiar e deixa de ser átono, passando a sujeitar-se às regras de

acentuação gráfica, como no exemplo: Queres me dizer por quê? Têm-se nessa frase

dois vocábulos átonos, me e por, o primeiro se apoiou no verbo dizer e o segundo no

vocábulo quê, que deixou de ser átono e passou a ser um monossílabo tônico terminado

em e, portanto, recebendo o acento circunflexo.

Por isso, a regra de ouro de atribuição do acento de intensidade durante a leitura, a

primeira a ser ensinada, por contemplar os vocábulos mais frequentes do PB (com

exceção dos átonos, que apresentam maior frequência de uso), deve ser: se os

substantivos, verbos, adjetivos ou advérbios tiverem duas ou mais sílabas e terminarem

pelas letras e, a, ou o, seguidas ou não de s, e NÃO tiverem nenhum acento gráfico,

leiam-se como paroxítonos.

Entende-se, pois, por que, ao substantivarmos qualquer vocábulo átono, na

metalinguagem, ele deixa de sê-lo. Por exemplo: O dê é uma preposição.

Já deu para perceber a importância de se trabalhar desde a Educação Infantil com a

percepção das distinções entre sílabas mais fortes e mais fracas num vocábulo.

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Os vocábulos átonos não apresentam significações com contrapartida referencial

concreta

Outra grande dificuldade para o alfabetizando em perceber os vocábulos átonos como

separados decorre do fato de eles não terem contrapartida referencial concreta, isto é,

eles têm significação puramente gramatical ou outras funções, mas não carregam o que

J. Mattoso Câmara Jr. denominou de significação externa. Por isso, deve-se ser

engenhoso em ajudar a criança a identificar tais vocábulos.

Você concluirá, por exemplo, que, para ajudar a criança a identificar os artigos

indefinidos e definidos, deve-se trabalhar com narrativas ficcionais, demonstrando que o

artigo indefinido serve para introduzir a informação nova, enquanto o definido é usado

para a informação conhecida. Você também poderá trabalhar com atividades que lhe

permitam verificar as preposições, trabalhando com procedência, direção para, estáticos,

companhia, e assim por diante.

A reanálise silábica

Quando um vocábulo termina por consoante e o seguinte começa por vogal, ou quando

os dois fonemas são idênticos, ocorre a reanálise silábica, tornando opacas a fronteiras

entre as palavras. Separe, por exemplo, lendo em voz alta as sílabas da frase os ouvidos.

Você notará que há uma contradição entre o que está escrito, com um espaço em branco

separando os de ouvidos e o que você disse, ao realizar /u - zo -´vi - duS/ (observe

que a realização do último segmento depende da variedade sociolinguística de quem

está lendo). Observe, também, que ficou totalmente opaco o morfema de plural que

passou para o início da palavra seguinte, o que não é a sua posição na língua

portuguesa! Além disso, na posição intervocálica, ele é realizado como sonoro.

Por esse motivo, é possível que a criança, quando começa a frequentar a escola, tenha

em seu léxico mental, ao invés de olhos, zoio; ao invés de ouvidos, zovido, ao

invés de orelhas, zoreia, e, ao invés de unhas, zunha. Tudo isso terá que ser refeito

no processo de alfabetização.

Na prática

Indico, a seguir, um exemplo de atividade para reconhecimento dos artigos indefinidos e

definidos, conforme já explicado.

Coloque na lousa, em letra de imprensa minúscula, à esquerda, os artigos indefinidos

(informação nova) e, à direita, os artigos definidos (informação já introduzida).

Em seguida, ao ler a narrativa de Malba Tahan, a cada aparecimento de um artigo, fazer

a seguinte pergunta: Isso já apareceu na história? Apontar na lousa o respectivo artigo.

OS VASOS PRECIOSOS

Malba Tahan

Um príncipe poderoso possuía vinte vasos de porcelana, belíssimos, que eram o

seu orgulho. Guardava-os em uma sala especial, onde ficava durante muitas horas a

admirá-los.

Um dia, sem querer, um criado quebrou um* dos** vasos.

O príncipe, enfurecido e inconsolável com a perda do** precioso objeto,

condenou à** morte o desastrado.

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Nessa ocasião, apresentou-se no** palácio um velho sábio que se propôs a

consertar o vaso de maneira a ficar perfeitamente igual aos*** outros, mas, para isso,

precisava ver todos juntos.

A sua proposta foi aceita. Sobre uma mesa coberta com riquíssima toalha,

estavam os dezenove vasos enfileirados. Aproximando-se, o sábio, como se tivesse

enlouquecido, puxou com violência a toalha e os vasos tombaram ao*** chão, em

pedaços.

O príncipe ficou mudo de cólera, mas antes que ele falasse, o sábio

tranquilamente explicou:

- Senhor, estes dezenove vasos poderiam ainda custar a vida a dezenove

infelizes, assim, dou por estes a minha, porque, velho como sou, para nada sirvo.

Refletindo, o príncipe compreendeu que todos os vasos do** mundo, por mais

belos e preciosos, não valiam a vida de um ser humano.

Perdoou o sábio e também ao*** servo desastrado.

* é numeral e não artigo indefinido.

** contrações de preposições com artigos

*** combinação da preposição a com artigo

Reconhecimento dos traços que diferenciam as letras

(fazer coincidir alta e baixa,certinho – A com a, B com b,etc.) A B C D E F G H I J K L M N O P Q R S T U V W X Y Z a b c d e f g h i j k l m n o p q r s t u v w x y z

A utilização de uns poucos traços articulados para formar uma letra,

diferenciando-a das demais, se insere nos princípios que governam o

processamento da escrita, que passo a expor. Iniciou-se pela letra de imprensa,

porque a ênfase, nesta etapa, é para com a leitura, na fonte predominante em que

os textos circulam socialmente.

Quanto mais baixo o nível de processamento, tanto mais deverá ser

automatizado durante a aprendizagem e, portanto, menor o número de traços que

compõem o paradigma (lista dos traços que são utilizados) e de cada feixe (no

caso, uma dada letra), para não sobrecarregar a memória.

Os traços mais elementares que constituem as letras são as retas e as curvas, cujo

reconhecimento, em suas formas invariantes, não é privilégio da espécie

humana. Porém, o que caracteriza a utilização dessas formas invariantes na

estruturação de um sistema alfabético é o desdobramento em pequenas

diferenças, o modo como se articulam e o acréscimo de outros traços

diferenciais, que são a relação com uma linha real ou imaginária (somente nas

minúsculas) e a direção para cima ou para baixo, e para a direita ou para a

esquerda (esse último, o mais complexo dos traços que diferenciam as letras

entre si, pois vai de encontro à programação natural dos neurônios para buscar a

simetria na informação visual).

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Em cada nível, as unidades do nível anterior vão sendo estruturadas numa ordem

de complexidade e quantidade crescente, conforme exposto a seguir.

1ª. ordem: É de traços articulados simultaneamente e não em cadeia, para

formar cada letra, cuja função é a de realizar um grafema.

2ª. ordem: É a do grafema, associado ao fonema que representa e constituído

de uma ou duas letras, cuja função é distinguir a significação básica das

unidades puramente gramaticais ou que se referem à significação externa.

3ª. ordem: É a das unidades cuja função é referenciar a significação puramente

gramatical ou externa,

4ª. ordem: É a das frases, com função nominal, verbal ou preposicional.

5ª. ordem: É a das orações, cuja função é proposicionar.

6ª. ordem: É a dos períodos, cuja função é articular as proposições.

7ª. ordem: É a ultima, é a do texto, cuja função é articular as ideias, de modo

coerente, em torno de uma unidade temática.

Articulação dos traços

No momento estou tratando das dificuldades com as quais o alfabetizando se defronta

para aprender a primeira ordem, a dos traços que se articulam para formar as letras.

Algumas letras são formadas por um só traço, como em I, C e O maiúsculos, e l, c e o

minúsculos.

Já mencionei que os traços mais elementares que constituem as letras são as retas e as

curvas, desdobradas em pequenas diferenças, abordadas a seguir.

Posição da reta: vertical, horizontal ou inclinada. Por exemplo, na letra E,

observam-se uma reta vertical e três horizontais, enquanto na letra V, observam-

se duas retas inclinadas.

Tamanho da reta. Você pode notar que os traços horizontais são sempre

menores que os verticais (sempre do mesmo tamanho, numa mesma fonte).

Compare, por exemplo, esses tamanhos nas letras E, F, H, L e T.

Relações entre os traços numa mesma letra: as relações podem ser entre retas

(em qualquer das posições), entre curvas ou mistas, variando o local onde os

traços menores se colocam em relação ao eixo principal e quantos são; assim, a

única diferença entre E/F está no fato de E ter um traço horizontal a mais na

base, e de ambos se diferenciarem de L porque esse só possui um traço

horizontal na base; já na letra T, o traço vertical tange bem ao meio o traço

horizontal que está no topo, enquanto no H, é o traço horizontal que liga duas

retas paralelas bem ao meio; observe, pois, que essas cinco letras maiúsculas

articulam exatamente os mesmos traços, diferenciando-se apenas pelas relações

que estabelecem entre si: L T F E H; encontra-se um exemplo de relação entre

curvas na letra maiúscula S e minúscula s com espelhamento duplo da curva c

de cima para baixo e da esquerda para a direita; esse grafema ainda apresenta

outras dificuldades, por apresentar valores fonológicos diferentes, conforme o

contexto gráfico e a variedade sociolinguística; o que ocorre mais são as relações

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mistas: uma pequena curva articulada com o traço vertical (na verdade, seu

prolongamento), ou o inverso, aparece em letras maiúsculas e minúsculas, como

J, a, f, g, h, j, m, n, r, t e u; uma articulação mais complexa ocorre no estilo

Times New Roman, usado para g minúsculo; outra articulação mista ocorre entre

a curva c e a reta, acrescida de uma das dificuldades maiores no reconhecimento

das letras que é a direção para a direita ou para esquerda, e para cima ou para

baixo (espelhamento) conforme as letras: B, D, P e R, nas maiúsculas, e b, d, p

e q, nas minúsculas.

Direção para a direita ou para esquerda, e para cima ou para baixo

(espelhamento): deixei para o final o que constitui a maior dificuldade para o

reconhecimento das letras, ou seja, a diferença entre a direção do traço para a

esquerda ou para a direita e, em menor escala, a diferença entre a direção do

traço de cima para baixo ou o inverso: o espelhamento. Como já afirmado

várias vezes, a percepção dessa diferença vai de encontro à programação natural

dos neurônios para buscar a simetria na informação visual, daí a grande

dificuldade de aprendizagem. Essa diferença é a única que existe entre os

seguintes pares: b/d, p/q (diferença para a direita ou para a esquerda) e entre

M/W, n/u, b/p e d/q (diferença de cima para baixo ou o inverso) e, em menor

grau, entre A/V, S/Z, a/e, s/z e f/j.

Variedades sociolinguísticas

Em virtude da mobilidade social, o professor se defrontará com alunos provindos das

mais diferentes regiões, ou, na mesma cidade, com alunos provenientes de ambientes

socioculturais muito distintos. Portanto, é necessário ter em mente que o código escrito

se caracteriza por um estado de inércia maior se comparado com as mudanças

diacrônicas mais rápidas que ocorrem nos sistemas orais. A variação sociolinguística

não afeta as letras que constituem o código escrito, o qual deverá abarcar todas as

variantes fonéticas de uma dada língua falada.

Uma vez que as línguas, das quais cada sistema alfabético é dependente, mudam mais

rapidamente do que sua contrapartida escrita, algumas relações fonêmico-grafêmicas

passam a ser cada vez mais opacas com o passar do tempo e somente as regras de

derivação morfológica ficam produtivas para algumas famílias de palavras; neste caso,

um léxico mental ortográfico precisa ser fixado de memória, o que torna de novo o

sistema antieconômico. Não significa, contudo, que por esta razão estes radicais devam-

se ensinar fornecendo os nomes de suas letras constituintes. Assim que a grafia dos

radicais básicos que estão em desacordo com as regras grafêmico-fonológicas é

aprendida, são globalmente relacionados ao léxico mental fonológico.

É necessário acrescentar que, tanto nos países desenvolvidos quanto nos em

desenvolvimento, existe uma discrepância adicional entre as diferentes variedades

sociolinguísticas orais. Embora não exista correspondência biunívoca entre qualquer das

variedades sociolinguísticas e a norma escrita, a distância é certamente maior se

examinarmos as variedades que são consideradas como não tendo prestígio: em geral,

os professores não estão preparados tanto para o encaminhamento das disparidades

sociolinguísticas individuais, quanto para estar atentos às diferenças fonético-

fonológicas e morfológicas relacionadas com o sistema alfabético adotado como única

norma. Não significa, contudo, que eu esteja aderindo às ideias ingênuas de Bernard

Shaw em favor tanto de uma escrita fonética quanto de uma miraculosa transformação

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de qualquer My fair lady. A diversidade sociolinguística oral é um fato inquestionável

em contraposição a um código escrito único para uma dada língua.

O que seria aconselhável a fim de reduzir as consequências de tais discrepâncias é: 1) a

adaptação periódica e gradual dos sistemas ortográficos às mudanças diacrônicas que

ocorrem no sistema oral; 2) uma atitude ideológica positiva por parte dos professores

para com as variedades sociolinguísticas que diferem das supostas normas de prestígio;

3) professores bem formados, particularmente nas primeiras séries do primeiro grau,

que possam descobrir a forma individual falada pelos estudantes a fim de que, em

conjunto, eles construam regras de correspondência fonológico-grafêmica.

Dica

Leitura recomendada:

MORAIS, J. A Arte de Ler. São Paulo: UNESP, 1996.

SOARES, M. Alfabetização e letramento. São Paulo: Contexto, 2006.

(ícone bloco de anotações)

Pontos Importantes

Os seguintes conteúdos foram abordados no capítulo 8:

o problema da segmentação das palavras e a questão da percepção dos vocábulos

átonos, também chamados de clíticos;

as dificuldades semânticas dos clíticos e a reanálise silábica;

traços que diferenciam as letras;

variedades sociolinguísticas.

Sugestões para reflexão e pesquisa

O que é um vocábulo átono e quais são eles no PB?

O que é juntura fechada externa no vocábulo e o que tem a ver com

alfabetização?

Desenhe os traços primários que constituem as letras e depois os combine para

formá-las, indicando como elas se diferenciam entre si.

AVALIAÇÃO DE APRENDIZAGEM

8. É difícil separar as palavras na escrita porque:

a ( ) a cadeia da fala é um contínuo em que não há silêncio separando as palavras entre

si.

b ( ) além de a cadeia da fala ser um contínuo, vocábulos muito frequentes são átonos e

são percebidos muito fracamente.

c ( ) além de terem pouca saliência perceptual, os vocábulos átonos se referem a noções

gramaticais.

d ( ) quando um vocábulo termina por consoante e o seguinte começa por vogal, ocorre

reanálise silábica e as fronteiras entre os vocábulos desaparecem.

e ( ) se o segmento final e o inicial dos vocábulos forem idênticos, ocorre reanálise

silábica e as fronteiras entre os vocábulos desaparecem.

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9. A leitura e o sistema alfabético do português brasileiro

Ícone síntese

No capítulo 8, verifiquei o problema da segmentação das palavras e a questão da

percepção dos vocábulos átonos, também chamados de clíticos, com as respectivas

dificuldades semânticas, bem como a reanálise silábica; abordei em seguida a

dificuldade em reconhecer os traços que diferenciam as letras, particularmente os que

envolvem espelhamento e encerrei o capítulo com a questão das variedades

sociolinguísticas.

(ícone objetivo)

No capítulo 9, abordarei o processamento da leitura pelo leitor já alfabetizado,

explicando as suas fases: motivação; pré-leitura; movimentos de fixação e sacada para

fatiar; reconhecimento dos traços das letras e sua articulação, para formar os grafemas,

associados aos valores sonoros e identificação do vocábulo (descodificação); acesso

lexical; busca da significação básica; construção do sentido no texto e retenção

temporária na memória de trabalho; articulação dos sentidos nas frases, cláusulas,

períodos, parágrafos e texto, com as respectivas retenções temporárias na memória de

trabalho; interpretação e retenção permanente nos esquemas da memória cognitiva.

Detalharei a fase de reconhecimento dos traços das letras e sua articulação, para formar

os grafemas, associados aos valores sonoros e identificação do vocábulo

(descodificação), ferramenta indispensável à alfabetização. Ao final desse capítulo, você

compreenderá por que, para atingir o alvo principal da leitura, é necessário ter sido bem

alfabetizado.

O processamento da leitura

Tratarei de analisar, de forma acessível, como se reconhecem as letras que compõem os

grafemas e a palavra escrita, convertendo-a ao vocábulo tal como estamos acostumados

a ouvi-lo. Este processo se chama descodificação. O objetivo é fundamentar os

professores sobre gradação dos conteúdos, escolha do material didático e das atividades

em sala de aula, bem como para detectar dificuldades, para prevenir o analfabetismo

funcional. Uma das causas mais importantes do insucesso escolar está nas dificuldades

que os alunos enfrentam para se tornarem eficientes em leitura, espinha dorsal para o

êxito nas demais disciplinas e para a sua integração numa sociedade letrada: quem não

sabe, pelo menos, ler, se sente marginalizado, tratando-se da maior exclusão na

sociedade da informação.

No afã de obterem melhores resultados em sala de aula, os professores aderem cheios de

esperança a métodos e teorias mais em voga, mas não alcançam o mínimo que seria de

esperar: uma média de alunos que saibam ler e produzir os textos adequados à sua fase

de desenvolvimento.

Concluo que uma das razões para o descompasso entre os esforços desenvolvidos e os

resultados obtidos é a falta de uma melhor fundamentação sobre o próprio processo da

leitura e sobre os princípios que sustentam o sistema de escrita e leitura do português

brasileiro.

Esta falta de fundamentação tem, pelo menos, como reflexo prático no ensino da leitura

a impossibilidade e/ou dificuldades para:

entender o processo da leitura;

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analisar e selecionar o material pedagógico a ser utilizado em sala de aula;

descobrir qual a finalidade das atividades e/ou exercícios desenvolvidos em sala

de aula (exemplificarei no decorrer do capítulo);

estabelecer a gradação dos conteúdos e respectivas atividades e/ou exercícios;

ordenar as prioridades a serem atacadas em leitura;

detectar onde estão as dificuldades mais importantes do aluno;

avaliar as razões do progresso, a fim de generalizar a experiência.

Deve ficar bem claro que o reconhecimento das letras e os valores atribuídos aos

grafemas para reconhecer a palavra escrita (descodificação) é apenas um passo, embora

necessário, no processo da leitura, cujo objetivo é chegar à compreensão e interpretação

do texto e consequente internalização dos conteúdos para ampliação e aprofundamento

do conhecimento.

Todos nós, mesmo as crianças bem pequenas, temos conhecimentos estruturados em

nossa memória, que podem ser denominados de esquemas, roteiros ou marcos.

Quando a criança vem à escola, já tem em sua memória esquemas como, família, casa,

banho, brinquedos (vários), refeições (várias), vestuário, bairro e assim por diante, bem

como narrativas sobre suas experiências passadas ou narradas, entre as quais se incluem

narrativas fictícias (histórias). Uma das principais funções da escola é ampliar e

aprofundar tais esquemas ou universos, o que ocorre, principalmente, através da leitura.

A criança que venceu a batalha de se alfabetizar pode se tornar um leitor fluente,

sentindo gosto pela leitura e descobrindo os universos proporcionados pelo texto

escrito. O leitor não tropeçará diante de grafemas cujos valores não internalizou,

impedindo-o de fazer uma leitura fluente e, assim, de construir o sentido de uma frase e,

consequentemente, do texto.

Você conhecera, a seguir, os processos envolvidos na leitura (alguns ocorrem

simultaneamente em virtude do processamento em paralelo).

1o. Motivação

Determina qual o texto a ser lido, como, por exemplo, notícia de jornal; capítulo de uma

disciplina; receita de bolo; seção de anúncios de emprego; novela policial; história em

quadrinhos; poesia; etc.

2o. Pré-leitura

Determina a seleção do esquema mental, que ficará ativado na memória de trabalho,

para elaboração do sentido adequado às palavras do texto. Por exemplo, determina o

sentido atribuído à palavra ponte, na frase A ponte quebrou, se puxarmos o esquema

dentes ou construção que liga duas margens. Há muitos sinalizadores para a pré-

leitura nos textos, desde os nomes das disciplinas, as seções que ocupam num jornal ou

revista, os títulos, subtítulos, as orelhas dos livros, as sinopses de livros, os resumos, as

palavras-chave e assim por diante.

3o. Movimentos de fixação e sacada para fatiar

São os movimentos controlados pelos dois colícolos superiores, situados abaixo do

tálamo e rodeados pela glândula pineal do mesencéfalo. Quando o indivíduo já está

alfabetizado, não fixa o olhar só numa letra: conforme você já viu, nossos olhos não

abarcam uma linha inteira, em virtude das limitações de a única parte da retina,

realmente útil para a leitura, chamada fóvea central, rica em células fotorreceptoras, os

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cones, ocupar apenas 15º do campo visual. Por isso, nossos olhos correm pela linha, em

movimentos de sacada (quatro ou cinco por segundo), quando não vemos nada, e param

num ponto, a fixação, quando, nos sistemas com direção da esquerda para a direita, a

fóvea consegue abarcar 3 ou 4 letras à esquerda do centro do olhar, e 7 ou 8 à direita,

inlusive espaços, decompondo os sinais luminosos em miríades de pontos que,

metaforicamente, chamei de píxeis e, só depois da recomposição em formas invariantes

que possam emparelhar com as dos respectivos neurônios, são enviadas para a área

especializada, a região occipitotemporal ventral esquerda: tal processamento dura

aproximadamente 50 milissegundos.

4o. Reconhecimento dos traços das letras e sua articulação,

Este reconhecimento permite formar os grafemas, associados aos valores sonoros e

identificar a palavra escrita (descodificação). O reconhecimento das letras é possível

porque se percebe a combinação de traços verticais, horizontais ou inclinados com

porções de círculos, em relação a uma linha real ou imaginária. A direção destas

combinações permite, ainda, outra grande economia no reconhecimento e identificação

das letras, conforme você verificou no capítulo 8, sendo o mais difícil dos traços aquele

que permite identificar a diferença de direção nas letras espelhadas, entre para a direita

ou esquerda ou entre para baixo ou para cima. De tais reconhecimentos, decorre o da

palavra escrita (descodificação), conforme já examinado, na região occipitotemporal

ventral esquerda. Um grafema é formado por uma ou mais letras, no PB, como o

grafema p, ou nh. A função dos grafemas é distinguir significados básicos, como, por

exemplo, se você substituir o b de bola por m. Sendo assim, não ocorrerá

aprendizagem se os valores dos grafemas forem ensinados fora de um texto ou se este

for um mero pretexto, os chamados textos matracas, que, a rigor, não considero texto.

Decorar o nome das letras não tem nada a ver com descodificação.

5o. Acesso lexical

Depois de reconhecida a palavra na região occipitotemporal ventral esquerda, ocorre o

acesso lexical. Há duas possibilidades: ou a palavra é conhecida e está registrada no

dicionário mental fonológico, ou o leitor a está vendo pela primeira vez. Se ocorrer a

primeira hipótese, tem-se o emparelhamento com uma forma conhecida e passa-se para

a etapa seguinte que é a busca da significação básica atribuída pelo grupo social. Caso

seja uma palavra nova, o leitor terá que construir o sentido, principalmente graças à

informação textual e, posteriormente, integrar a palavra nova ao dicionário mental.

6º. Busca da significação básica

Além do dicionário mental (rol de significantes), todo usuário de uma dada língua

possui a memória semântica, na qual as significações básicas, atribuídas pelo grupo

social ao qual o indivíduo pertence, estão organizadas em campos semânticos. É esta

memória semântica que, fundamentalmente, possibilitará a intercompreensão entre os

membros de uma mesma comunidade linguística.

7º. Atribuição do sentido às palavras, às frases e ao texto

No entanto, conforme é óbvio, não existe uma etiqueta lexical para cada uma de nossas

experiências. A explosão de conhecimentos desde o início do século XX determinou a

atribuição de novos sentidos às palavras em curso, sempre em aberto para recobrir

novos sentidos. Em decorrência, cabe ao leitor o ônus de construir os novos sentidos,

cruzando as informações advindas do texto com os conhecimentos prévios estruturados

em sua memória enciclopédica: é o momento mais criativo do ato de ler. Por

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inferências, o leitor depreende o novo sentido da palavra, alocado no buffer da memória

de trabalho.

Ícone dicionário:

Buffer: É uma estação onde provisoriamente é armazenado o resultado do

processamento de um item na memória de trabalho, até que possa ser articulado ao

resultado do processamento do item seguinte.

Depois de atribuídos os sentidos às palavras, eles são articulados no sentido da frase,

ficando provisoriamente armazenado, até que todas as frases, cláusulas, períodos e texto

sejam processados, repetindo-se o processo para se chegar à compreensão de todo texto.

Se o indivíduo não for bem alfabetizado, tropeçará no reconhecimento da palavra sem

poder construir seu sentido, a não ser por adivinhação: de qualquer forma o

reconhecimento tem que ser fluente, porque o tempo de armazenagem dos sentidos na

memória de trabalho (working memory) é muito curto.

8o. A interpretação

A interpretação do texto decorre do cruzamento de vários conhecimentos anteriores com

o que se colheu do texto, incluindo-se aí o posicionamento crítico. Os conhecimentos

anteriores tanto podem decorrer da experiência direta, quanto dos advindos de textos

orais e escritos, mas é fácil concluir que a diversidade e complexidade maior dos

conhecimentos advêm das leituras. Essa é a fase em que os alunos brasileiros de 15 anos

têm-se saído pior nos testes do PISA e nos demais testes aplicados pelo MEC.

9o. A retenção

Consiste em incorporar de forma estruturada os conhecimentos adquiridos na leitura de

um texto à memória permanente, aprofundando e ampliando os esquemas cognitivos.

Convém ressaltar alguns aspectos importantes no processamento da leitura: só somos

capazes de entender um texto, mesmo que bem alfabetizados, quando tivermos algum

conhecimento prévio sobre o assunto (ou seja, um esquema), que se mede pela rede

estruturada de significados que a ele se referem. Por isto, não se podem dar para a

criança textos para ler sobre temas totalmente desconhecidos para ela, como uma

Certidão de Nascimento. Por outro lado, os textos informativos devem ampliar e

aprofundar os conhecimentos que ela já possui.

O que estou afirmando não se refere ao texto poético, às histórias infantis que, repetidas,

não perdem o interesse, em virtude das peculiaridades do prazer estético.

Dos pontos referidos acima, no capítulo 9, me deterei no item 4, particularmente na

atribuição dos valores aos grafemas, desenvolvendo, em linguagem acessível, os

princípios do sistema alfabético do português brasileiro, ao mesmo tempo em que

sugerirei as suas repercussões pedagógicas.

O sistema alfabético do português

O sistema de leitura e escrita da língua portuguesa é o alfabético. Há línguas que

utilizam o sistema silábico, outras que utilizam primordialmente signos que representam

uma ideia (é esse, também, o utilizado no sistema numérico).

O alfabeto da língua portuguesa compõe-se de 26 letras que, sozinhas ou combinadas e

com alguns acentos gráficos, til e cedilha, representam os fonemas.

A evolução para o estabelecimento das normas do sistema alfabético do português foi

historiada no capítulo 4 do livro Princípios do sistema alfabético do português

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brasileiro, de Scliar-Cabral (2003c), ao qual será acrescido o Novo Acordo Ortográfico

que entrou em vigor, no Brasil, em 2009.

DICA

Acesse os seguintes sites para visualizar...

Uma aula sobre o mesencéfalo:

<http://videoaulas.uff.br/neuroanatomia-mesenc%C3%A9falo>

Explicações sobre a fóvea central:

<http://medical-dictionary.thefreedictionary.com/central+fovea+of+retina>

(ícone bloco de anotações)

Pontos Importantes

Os seguintes conteúdos foram abordados no capítulo 9:

o processamento da leitura;

as fases envolvidas: motivação; pré-leitura; movimentos de fixação e sacada

para fatiar; reconhecimento dos traços das letras e sua articulação, para formar

os grafemas, associados aos valores sonoros e identificação do vocábulo; acesso

lexical; busca da significação básica; construção do sentido no texto e retenção

temporária na memória de trabalho; articulação dos sentidos nas frases,

cláusulas, períodos, parágrafos e texto, com as respectivas retenções temporárias

na memória de trabalho; interpretação e retenção permanente nos esquemas da

memória cognitiva;

a fase de reconhecimento dos traços das letras e sua articulação, para formar os

grafemas, associados aos valores sonoros e identificação do vocábulo

(descodificação), ferramenta indispensável à alfabetização, de forma detalhada.

Sugestões para reflexão e pesquisa

Por que a leitura não começa do texto em direção a suas partes constituintes?

O que é memória de trabalho?

Como se ampliam os esquemas cognitivos?

AVALIAÇÃO DE APRENDIZAGEM

9. O processamento da leitura:

a ( ) não se restringe à decodificação.

b ( ) vai desde a motivação até a retenção da informação na memória permanente e ao

posicionamento crítico.

c ( ) pressupõe que o leitor tenha algum conhecimento prévio sobre o que vai ler.

d ( ) só é eficiente se o leitor não titubear diante de cada palavra nova.

e ( ) aciona várias regiões do cérebro em paralelo.

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10. Critérios para a introdução dos grafemas

(ícone síntese)

No capítulo 9, abordei o processamento da leitura, explicando as suas fases: motivação;

pré-leitura; movimentos de fixação e sacada para fatiar; reconhecimento dos traços das

letras e sua articulação, para formar os grafemas, associados aos valores sonoros e

identificação do vocábulo (descodificação); acesso lexical; busca da significação básica;

construção do sentido no texto e retenção temporária na memória de trabalho;

articulação dos sentidos nas frases, cláusulas, períodos, parágrafos e texto, com as

respectivas retenções temporárias na memória de trabalho; interpretação e retenção

permanente nos esquemas da memória cognitiva. Detalhei a fase de reconhecimento dos

traços das letras e sua articulação, para formar os grafemas, associados aos valores

sonoros e identificação do vocábulo (descodificação), ferramenta indispensável à

alfabetização.

(ícone objetivo)

No capítulo 10, começarei por revisar a definição de fonema, necessária à compreensão

da relação com o respectivo grafema, além de rever a diferença entre sons da fala e

fonema; a seguir, tratarei dos critérios para a introdução dos grafemas, exemplificados

com aplicações pedagógicas. Ao final desse capítulo, você compreenderá os critérios

que devem nortear a ordem de apresentação dos grafemas, representados por uma ou

duas letras, na leitura, e terá ideias para enriquecer suas atividades em sala de aula.

Diferença entre fonema e sons da fala, fonemas e grafemas

Um fonema, escrito entre barras / /, além da já mencionada definição de R. Jakobson

(1949), como um feixe de traços distintivos, é uma classe de sons, escritos entre

colchetes [ ]. O fonema serve para distinguir o significado básico entre as palavras,

como os fonemas /m/ e /b/ em /´mala/ e /´bala/. Os sons para a realização de um

mesmo fonema são muito diferentes, dependendo da região de quem fala, do grupo

social ao qual pertence e também da posição que ocupa na frase. O fonema /R/ em

/maR/, no final de uma sentença, pode ser pronunciado com o dorso da língua contra o

véu do paladar [max], como pelo carioca; pode ser pronunciado com a ponta da língua

voltada para o céu da boca, como na variedade caipira; pode ser pronunciado com

muitas batidas da ponta da língua contra a face interna dos alvéolos, como na fronteira

do Rio Grande do Sul [mar]. Porém, se depois de /maR/ vier na mesma frase uma

palavra iniciada por vogal, como /´aWtu/ alto, já se pronuncia com uma só batida

da língua contra a face interna dos alvéolos e, além disto, ocorre uma modificação na

distribuição das sílabas: [´ma´|aWtu] (pronúncia carioca) de mar alto. Observe que o

apóstrofo, na transcrição entre barras ou colchetes se refere à sílaba de maior

intensidade, vinda logo a seguir.

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Não existe, porém, uma letra para cada som. Uma, ou duas letras, os grafemas,

representam os fonemas. Assim, enquanto existe uma variedade muito grande de sons,

só existem 26 letras, para representar a língua portuguesa escrita.

A utilização dos sistemas alfabéticos se, por um lado, representa uma grande economia,

por outro, constitui uma grande dificuldade quando o indivíduo vai se alfabetizar,

porque ele percebe a sua fala como um contínuo, conforme exaustivamente examinado

no capítulo 6. É por isto que a criança, depois de descobrir a diferença entre o desenho e

a escrita, passa por uma fase em que escreve uma porção de símbolos sem espaços entre

si; passa, depois, a atribuir um símbolo para cada sílaba, porque consegue, então, a nível

consciente, dividir a cadeia da fala em sílabas. A dificuldade maior está em

compreender que uma ou mais letras não se referem a uma sílaba (a não ser quando ela

é constituída de uma só vogal) e sim a uma unidade menor. Esta dificuldade em

desmembrar uma sílaba a nível consciente é maior quando na sílaba entram as oclusivas

/p t k b d g/, porque elas não podem ser pronunciadas sozinhas, sem apoio de uma

vogal.

Critérios para a introdução dos grafemas

Os critérios para a escolha da ordem de complexidade crescente em que são

introduzidos os grafemas são:

simplicidade dos traços que compõem a(s) letra(s): por exemplo, sendo iguais

na maiúscula e minúscula;

representar um fonema cuja realização pode ser articulada sozinha, como não é

o caso das menos contínuas, isto é, das oclusivas: no caso delas, tomei a decisão de

introduzi-las por sílabas, começando pelo grafema T t, que representa o fonema /t/,

porque p, b e d ainda apresentam uma dificuldade a mais, por se diferenciarem entre si

apenas pela direção do semicírculo para a direita ou para a esquerda, em relação à haste,

como é o caso de b e d, ou entre para cima ou para baixo, como é caso de p e b, ou seja,

letras em espelho. Os fonemas /k/ e /g/ apresentam outro problema, pois os grafemas

que os representam têm seus valores determinados pelo contexto grafêmico;

ser biunívoco, isto é, um e apenas um grafema representa o mesmo fonema e

um e apenas um fonema é representado sempre pelo mesmo grafema, como é o caso de

V /v/ e não é o caso de s, ou do grafema g;

o fonema representado pelo grafema não apresenta variantes determinadas

pelo contexto fonético, como é o caso de /d/ e /t/, antes de /i/ ou /j/, nem variantes

determinadas pelas variedades sociolinguísticas, como é o caso de /R/.

É preciso compreender e explicar aos iniciantes e mesmo em anos mais adiantados, que

não escrevemos do mesmo jeito que falamos. A noção de recorte ou de segmentação é

fundamental na iniciação aos sistemas alfabéticos: é preciso que a criança se dê conta de

que aquilo que ela percebe como um todo, como um bololó vai ser dividido em pedaços

menores, as palavras, e estas em pedacinhos menores ainda (não é possível falar em

fonemas para uma criança pequena) que são representados por uma ou duas letras.

Como exemplo, o professor pode usar as palavras vela e/ou mela, pois cada uma de

suas unidades pode ser pronunciada sozinha. Além disto, se o professor usar fichas para

cada letra, que no caso também é um grafema, pode pedir às crianças que substituam a

primeira letra por (mostrando a ficha sem dizer o nome da letra e emitindo seu valor

sonoro) s, z, n e obterá novas palavras; também poderá substituir as vogais e obter

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vila, vala, vale, mala, mola, mula. Como as palavras não são usadas sozinhas, é

necessário que as crianças construam oralmente frases com elas. A função desta

atividade é demonstrar que as palavras são formadas por pedacinhos representados por

letras. Mudando uma pela outra, muda o significado.

Na prática

Exercício “Pedacinhos”

As palavras são formadas por pedacinhos representados por letras. Mudando

uma pela outra, muda o significado.

Material: Cada criança deverá ter uma caixa contendo fichas com as letras do alfabeto

(minúscula, de imprensa).

Observe que um dos princípios do Sistema Scliar de Alfabetização é não alfabetizar

pelo nome das letras e sim por seus valores. Portanto, aponta-se para a letra e se emite o

respectivo som que ela representa. Assim, neste exercício não se utilizam os grafemas

quando representam as oclusivas.

Comando: Escreva na lousa a palavra vela (em letra de imprensa minúscula, como está

no exemplo). À medida que for escrevendo cada letra, pronuncie o som do fonema que

ela representa: /v/, /E/, /l/, /a/.

Observe que a letra e pode representar, no mínimo, dois fonemas /E/, como em vela e

/e/ como em mesa. Isto é bastante difícil para a criança no começo, mas NÃO ensine

às crianças que no português existem cinco vogais, pois são sete vogais orais e cinco

nasalizadas, que você irá ensinando aos poucos como são representadas.

Peça para as crianças contarem uma pequena história sobre bolo de aniversário: cada

criança pode contribuir com uma frase. O professor pode comemorar o aniversário de

uma criança, pedindo a ela para apagar as velas.

A seguir, peça para as crianças formarem sobre sua carteira a palavra vela, com as

fichas. Faça depois um jogo para ver quem consegue formar mais palavras, substituindo

as fichas de modo a formar novas palavras, como mela, sela, nela, zela, vala, vila etc. A cada uma das palavras produzidas pelo aluno, ele deverá ler o que produziu,

formando uma frase. Escreva as palavras na lousa, em coluna (em letra de imprensa,

minúscula).

Este trabalho de conscientização resulta no desenvolvimento de uma das capacidades

que é chamada consciência fonológica, sobre a qual tratei no capítulo 6, muito

importante na aprendizagem da leitura e da escrita.

Exercício Respeitar a forma de falar de cada um.

Os alunos em sala de aula não falam todos do mesmo jeito. Gravar um pequeno diálogo

entre cada dupla de alunos exemplifica esta noção.

Material: Gravador e fita cassete.

Comando: - Agora vamos fazer uma experiência. Assim como cada um tem o seu

nome, cada um tem o seu jeito de falar. O Brasil é muito grande e foi formado por

muitas culturas diferentes: nós respeitamos todos e também sua maneira de falar.

Vamos ver como isto acontece?

Ligue o gravador, e dirija-se para a primeira dupla:

- ... (nome do aluno), como foi o final de semana?

Perceba que evitei o tratamento, pois aí já haverá bastante variação. Examine, depois, as

gravações e comente com os alunos as variações e a necessidade de respeitar as

diferenças: nunca ridicularizar.

Uma variante deste exercício é brincar de entrevista na televisão.

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Exercício “Diferenças entre escrita e fala”

Apesar das variações na fala, o sistema da escrita é um só em todo território nacional:

professor e aluno devem trabalhar juntos para aprender como se faz a ponte entre a fala

e a escrita. Por exemplo, falamos [´n«]w] e escrevemos não. Eu falo [u´zOLus], mas

pode ser que muitos de seus alunos digam [u´zOjju]: neste último caso, pouco a pouco,

inclusive com o ensino inteligente das funções que os vocábulos átonos têm, conforme

examinei em Os vasos preciosos de Malba Tahan, a criança deverá aprender a

colocar espaço entre o artigo e o substantivo e a colocar um s no final: os olhos. Além

disto, a cadeia da fala é um contínuo, ou como chamo, numa brincadeira, um bololó. Na

escrita, as palavras são separadas entre si por espaços em branco e, na letra de imprensa,

que é a mais empregada no material que as crianças vão ler, as letras também estão

separadas.

Material: Fita gravada com as falas dos alunos.

Comando: - Agora, nós vamos ouvir uma das falas de vocês. Eu vou escrever na lousa

a primeira frase.

Escreva em letra de imprensa minúscula, com exceção da primeira letra, quando você

pode começar a ensinar o primeiro uso da maiúscula. Suponhamos que a frase tenha

sido: Sábado, eu fui pescar com o papai. Mostre, a seguir, como as palavras são separadas entre si. Explique, ao nível da criança,

sobre as palavras que representam “coisas” (explicação provisória para substantivos) e

aquelas que representam o que se está fazendo, sentindo, pensando, querendo, etc.

(verbos) conforme o que estiver na frase. Mostre, depois, que há outras palavras que

servem para introduzir a informação nova e assinalar o que já foi dito (artigos). Quando

você explicar os artigos, mostre, tocando a fita, que eles são muito fraquinhos e por isto

ficam dependurados nos nomes, mas na escrita é preciso separá-los. Mostre a seguir que

a pessoa que fala usa eu e para a pessoa com quem falamos se usa tu ou você

(pronomes pessoais). Explique, aqui, a questão da variação social e geográfica.

Exercício de Separação

Material: A primeira frase que foi gravada e que você escreveu na lousa.

Comando: -Vamos fazer uma brincadeira de substituir palavras para ver o que

acontece. Vamos começar substituindo a primeira palavra: Sábado. Explique como a substituição de uma palavra pode alterar todo o sentido da frase,

obrigando a modificá-la.

(ícone bloco de anotações)

Pontos importantes (resumo)

No capítulo 10, foram examinados os seguintes conteúdos:

revisão da definição de fonema;

diferença entre sons da fala e fonema;

a seguir, critérios para a introdução dos grafemas exemplificados com aplicações

pedagógicas.

(bloco de anotações)

Sugestões para reflexão e pesquisa

Por que a escola é um dos espaços ideais para ensinar o respeito à diversidade

sociolinguística?

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O que significa a simplicidade dos traços que compõem a(s) letra(s)?

O que significa um grafema biunívoco?

AVALIAÇÃO DE APRENDIZAGEM

10. O ensino-aprendizagem dos grafemas na alfabetização para a leitura deve partir do

pressuposto de que:

a ( ) a criança descobre sozinha os princípios do sistema alfabético do PB e, portanto, o

material didático em sala é desnecessário.

b ( ) o material didático deve ser cuidadosamente elaborado, bem como as atividades

pedagógicas em sala de aula, ambos baseados nas descobertas mais recentes da ciência.

c ( ) a melhor ordem de apresentação é a alfabética.

d ( ) é necessário começar pela escrita, antes da leitura.

e ( ) deve-se começar pela letra A e terminar na letra Z.

11. Como escolher o grafema para as atividades de ensino-aprendizagem

Icone síntese

No capítulo 10, revisei a definição de fonema, necessária à compreensão da relação com

o respectivo grafema, além de rever a diferença entre sons da fala e fonema; a seguir,

tratei dos critérios para a introdução dos grafemas exemplificados com aplicações

pedagógicas. Foram expostos os critérios que norteiam a ordem de apresentação dos

grafemas, representados por uma ou duas letras, na leitura, com os quais você terá ideias

para enriquecer suas atividades em sala de aula.

(ícone objetivo)

O primeiro grafema a ser ensinado é o grafema V, que coincide com a mesma letra.

Detalharei os fundamentos e objetivos de cada atividade das unidades de Sistema Scliar

de Alfabetização – Roteiros para o professor: 1º Ano, pois o professor deve conhecê-

los, para atingir os alvos do ensino-aprendizagem. Ao final do capítulo 11, você terá

uma noção clara de como se aplicam os fundamentos que sustentam as atividades de

alfabetização e as estratégias a serem desenvolvidas no seu ensino-aprendizagem.

Por que o grafema V v foi escolhido como o primeiro a ser ensinado

O grafema V v foi o primeiro grafema a ser ensinado porque preenche vários critérios

que facilitam o aprendizado.

Simplicidade dos traços que compõem a sua letra, sendo iguais na maiúscula e

minúscula; há outras letras que apresentam essa característica, como é o caso de C c, O o, S s, X x, W w, mas os respectivos grafemas não preenchem os critérios 3 e 4,

que examinarei logo a seguir.

Representa um fonema cuja realização pode ser articulada sozinha. Não é o

caso das menos contínuas, isto é, das oclusivas; novamente, quatro dos cinco

grafemas acima mencionados representam fonemas cuja realização pode ser

articulada sozinha, mas, enquanto o grafema V v sempre representa o fonema /v/ e a

recíproca também é verdadeira (próximo critério, da biunivocidade). O mesmo não

ocorre com os grafemas O o, S s, X x e W w.

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É biunívoco, isto é, um e apenas um grafema representa o mesmo fonema e um e

apenas um fonema é representado sempre pelo mesmo grafema, como é o caso de

V/v/ e não é o caso de C c, O o, S s, X x, W w;

O fonema representado pelo grafema não apresenta variantes determinadas

pelo contexto fonético, como é o caso de /o/, nem fenômenos determinados pelas

variedades sociolinguísticas.

Estes são os quatro pontos que justificam a escolha deste grafema para introduzir o

processo de alfabetização.

Preceitos científicos aplicados à organização das atividades

Confira algumas atividades que podem e devem ser utilizadas para auxiliar o processo

de alfbetização.

Hora da novidade

É a primeira atividade do dia e tem a função de desenvolver os esquemas narrativos,

essenciais para a competência em leitura e escrita, pois os esquemas narrativos

permitem reportar sobre episódios e eventos ausentes do espaço e tempo dos

interlocutores, que é uma das propriedades da comunicação escrita: o esquema narrativo

é constituído de episódios e estes de eventos, relacionados entre si por nexos de

causalidade que permitem a progressão narrativa; cada episódio é introduzido por um

cenário explícito ou implícito, constituído pela introdução dos personagens e pela

descrição do tempo e espaço onde ocorre.

Multissensoriedade com a função de distinguir significados

Seguindo o preceito de Montessori de educar pelos sentidos e pelo movimento,

inclusive do aparelho fonador, para estimular a concentração e as percepções sensório-

motoras da criança, o reconhecimento da letra que realiza o grafema ocorre

acompanhando o traçado com o indicador, ao mesmo tempo em que o som que realiza o

fonema é emitido pela criança.

Cumpre observar, porém, que, ao contrário de outras propostas semelhantes, a letra

integra uma palavra, cujas letras também terão seu traçado acompanhado, com a

emissão do respectivo som que realiza o fonema. Eis por que, além do grafema

prioritário que está sendo trabalhado, V v, foi obrigatório também introduzir as vogais,

embora de grande complexidade, sem as quais não é possível construir palavras no

português brasileiro (PB). Essa estratégia foi adotada porque estou convicta de que a

aprendizagem só ocorrerá se as unidades traçadas tiverem a função de distinguir

significados. Na respectiva unidade, serão detalhados os comandos que o professor

deverá ler para os alunos. Poderão, às vezes, parecer maçantes tais comandos, mas eles

foram cuidadosamente estudados para a fixação da direção dos traços das letras, com o

objetivo de ensinar os neurônios a dissimetrizar.

Palavras dentro de um texto: a categoria da expectativa

A aprendizagem do reconhecimento das letras que constituem os grafemas, associados

aos seus respectivos fonemas, com a função de distinguir significados, por seu turno, só

será possível se as palavras fizerem parte de um texto com sentido para a criança e, mais

ainda, se o texto despertar o gosto pela leitura na criança.

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Por esse motivo, criei uma história, com personagens com os quais a criança poderá se

identificar, história essa em capítulos, criando na criança a expectativa do que virá a

seguir. O texto deverá ser lido por você, professor, com expressividade, com exceção

das palavras em negrito (antes das quais você fará uma breve pausa, acompanhada de

gesto) a serem lidas em coro, por toda a turma. A cada capítulo da história, as palavras

em negrito vão aumentando, até se chegar ao ponto em que todos os grafemas e as

respectivas letras que os compõem já foram aprendidos.

Atividade de escrita ao nível da criança

Como a criança ainda não sabe manuscrever (atividade bem mais complexa que a

leitura) utilizam-se fichas móveis, com as quais montará frases e depois as lerá para os

colegas. As crianças terão ao seu dispor uma caixinha ou envelope onde está escrito o

nome da Unidade em estudo e o número do exercício, contendo muitas fichas com as

letras que está aprendendo e as anteriores que já estudou. É fundamental que a criança

leia os textos produzidos, pois precisará demonstrar que compreende o que escreveu. No

entanto, se a escola dispuser de computadores, as crianças poderão aprender a compor

seus textos digitando. A aprendizagem da codificação é contemplada por ditados de

textos coerentes com cada unidade, igualmente realizados com fichas móveis.

Percepção do contraste entre as sílabas mais intensas e átonas no vocábulo e na

frase

O reconhecimento da palavra escrita sempre será acompanhado da verificação da sílaba

mais forte em contraste com a(s) mais fraca(s), o mesmo ocorrendo na frase. Essa

atividade tem por principal objetivo a identificação dos substantivos, adjetivos, verbos e

advérbios terminados pelas letras e, a, o, seguidas ou não de s (os mais frequentes do

português, salvo os vocábulos átonos) sem acento gráfico, que devem ser lidos como

paroxítonos. Tal atividade consiste em, após ter emitido os sons ao acompanhar o

traçado das letras que constituem as palavras, repeti-las, batendo palmas na sílaba mais

forte, ou sobre a mesa. Ao trabalhar o reconhecimento dos substantivos, adjetivos,

verbos e advérbios em negrito no texto, que têm sílaba mais forte, em contraste com os

vocábulos átonos, você também está preparando o aluno para escrever esses últimos

separados do vocábulo ao qual vêm grudados na fala.

Educação integral

Em quase todas as unidades do Curso haverá atividades de matemática, música, artes

plásticas, teatro, criação literária e esportes, não se descurando as ecológicas, visando à

educação integral da criança. A educação integral privilegia o indivíduo como um todo:

os aspectos cognitivos, físicos, afetivos, sociais e estéticos são contemplados de forma

harmônica e relacionada.

Educação integrada

Convocar a família e a comunidade para prevenir o analfabetismo funcional é uma das

propostas desse projeto. A atividade principal prevista para tal fim é convidar os avós

e/ou outros familiares das crianças para contarem histórias que farão parte de um livro a

ser divulgado num blog ou site que a escola deverá abrir na internet e/ou a ser publicado

pela comunidade.

Trabalhando com gêneros e desenvolvendo a educação integrada

Antes de encerrar a aula, o professor deve sempre ler e comentar para os alunos algum

texto, percorrendo os vários gêneros: uma história, um poema, uma notícia, um anúncio,

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um aviso, uma reportagem, uma carta, um texto de outra disciplina, uma crônica, uma

anedota. Trabalhar com gêneros não significa impor à criança aqueles sem nenhum

interesse ou função para ela como sua certidão de nascimento, ou carteira de identidade,

e sim aqueles que atendam suas necessidades lúdicas, cognitivas, emocionais, estéticas e

sociais, como narrativas, histórias em quadrinhos, instruções de jogos, anedotas,

adivinhas, letras de canções, poesias e assim por diante.

Aprender brincando

Foram previstas muitas atividades lúdicas para todas as unidades, com apoio em

músicas, jogos e brincadeiras do repertório infantil. A Dra. Otilia Lizete de Oliveira

Martins Heinig, que vem se especializando na área, contribuiu com grande parte desse

material. A riquíssima literatura infantil em português e a leitura expressiva pelo

professor devem estar sempre disponíveis em atividades diárias. Reproduzo as

sugestões da Dra. Heinig:

“A proposta é mesmo a de sugerir, permitindo que o professor, a partir de sua realidade,

possa criar novos materiais, especialmente jogos e brincadeiras, que possibilitem a

reflexão sobre a organização do sistema alfabético.

A produção de jogos não é algo simples, pois requer que o professor leve em

consideração uma série de aspectos. Para auxiliar, apresento algumas recomendações

que focam o que é necessário para preparar um jogo:

definir o objetivo que se pretende alcançar com o jogo;

conhecer a regra contextual ou a situação que pretende se focar no jogo;

levar em conta o sujeito aprendiz (idade, conhecimento prévio, facilidades); é preciso

também verificar a cronologia do trabalho, respeitando a inserção das letras no processo

de aprendizagem conforme definido no material;

selecionar palavras para criar um banco de palavras que atendam ao conteúdo do jogo:

neste caso, a cada unidade do material o professor deverá levar em conta a palavra

motivadora e o banco de palavras ali sugerido;

selecionar imagens compatíveis, daí a importância de trabalhar com elementos

concretos, pois estes são mais facilmente materializados em imagens;

redigir as regras do jogo com bastante clareza, pois o objetivo é que a criança jogue

com seu grupo. O papel do professor é o de mediador, provocando a reflexão sobre a

organização do sistema escrito;

organizar a caixa com o jogo e a regra;

testar com um grupo de crianças;

se o teste não for favorável, rever os aspectos problemáticos; se for favorável, é jogar e

aprender”.

(ícone bloco de anotações)

Pontos imortantes

No capítulo 11, foram apresentados os conteúdos a seguir:

o primeiro grafema a ser ensinado é o grafema V, que coincide com a mesma

letra;

fundamentos e objetivos de cada atividade das unidades do livro Sistema Scliar

de Alfabetização – Roteiros para o professor: 1º Ano;

como se aplicam os fundamentos que sustentam atividades de alfabetização;

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estratégias a serem desenvolvidas no ensino-aprendizagem.

(bloco de anotações)

Sugestões para reflexão e pesquisa

Quais os critérios a serem seguidos na gradação do ensino-aprendizagem dos

grafemas?

O que é um grafema biunívoco? Dê exemplos.

Como trabalhar com gêneros nas séries iniciais?

AVALIAÇÃO DE APRENDIZAGEM

11. Percorrer a letra com o indicador, ao mesmo tempo emitindo o som correspondente

ao valor do grafema, serve para:

a ( ) fixar a direção dos traços que diferenciam uma letra da outra.

b ( ) reforçar a aprendizagem, associando vários canais de entrada.

c ( ) associar o grafema ao fonema que ele representa.

d ( ) ensinar os neurônios a reconhecerem as letras.

e ( ) ensinar que, associando um grafema ao fonema, estamos lidando com unidades que

distinguem o significado.

12. Quadro fonêmico das consoantes e das vogais do PB

(ícone síntese)

No capítulo anterior você descobriu porque o primeiro grafema a ser ensinado é o V.

Também foi apresentado aos fundamentos e objetivos de cada atividade que constituem

o Sistema Scliar de Alfabetização – Roteiros para o professor: 1º Ano.Também

verificou algumas das estratégias que podem e devem ser utilizadas no processo de

ensino-aprenndizagem.

(Ícone objetivo)

Neste capitulo você verá, de forma sistemática, o quadro fonêmico das consoantes e das

vogais do português brasileiro (PB). Também se debruçará sobre a definição dos rótulos

conferidos aos traços que distinguem as consoantes e as vogais entre si e fará

umarevisão do conceito de fonema.

Por que você deve entender o sistema fonológico do PB?

Todos os que trabalham com alfabetização devem conhecer o sistema fonológico do

português brasileiro, porque o sistema de escrita adotado é alfabético e um dos mais

transparentes, particularmente para a leitura. O que significa transparência? Quanto

mais transparente o sistema, tanto mais existe biunivocidade, isto é, um e apenas um

grafema representa o mesmo fonema e um e apenas um fonema é representado sempre

pelo mesmo grafema, como é o caso de V /v/, ou, no caso de não havê-la, a maior

parte dos valores dos grafemas pode ser previsível. Até o Novo Acordo Ortográfico, que

passou à vigência no Brasil em 2008, praticamente, todos os valores dos grafemas eram

previsíveis, com exceção de alguns valores dos grafemas e, o, x. Com o Novo Acordo,

deixaram de ser previsíveis os valores dos grafemas ei e oi em vocábulos paroxítonos e

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do grafema u, nos grupos gu e qu, seguidos de e ou i. Mesmo assim, continua muito

grande a previsibilidade.

1. Quadro fonêmico das consoantes do PB

Fonte: Quadro fonêmico das consoantes do PB, conforme Lopez (1979), mais as

semivogais, exemplos e termos comparativos, seguindo Mattoso Camara Jr. (1975).

Neste quadro, substituí o símbolo x, referente à variedade carioca descrita por Lopez,

pelo símbolo R, mais genérico, adotado por Mattoso Camara Jr., por cobrir todas as

realizações nas variedades sociolinguísticas do PB. Desdobramento das abreviaturas:

cor = coronais; cont = contínuas; son = sonoras; cons = consoantes.

2. Quadro fonêmico das vogais do PB

Fonte: Sistema vocálico do português brasileiro, conforme o modelo de Quicoli (1990),

com acréscimo das vogais nasalizadas.

Já que o Sistema Scliar de Alfabetização adota como um de seus fundamentos que uma

ou duas letras (os grafemas) devam ser ensinadas por seus valores e não por seu nome,

+ant

-cor

(labiais)

+ant

+cor

(anteriores)

-ant

+cor

-ant

-cor

-post

-ant

-cor

+post

(posteriores)

+obstruinte

-cont

(oclusivas)

-son (surdas)

+son

p

b

t

d

k

g (galo)

+cont

(fricativas)

-son

+son

f

v

s

z S(chá)

Z (já)

R (rosa)

-Obstruinte

+nasal

m n ­(vinho)

(+vocálico)

+lateral

-lateral

-cons

(semivogais)

l

r (caro)

L (velha)

j (pai)

w (teu)

+Orais

-posterior

-arredondado

(anteriores)

+posterior

-arredonado

+posterior

+arredonado

+alta i u

-alta

-baixa

e o

+baixa E (pé) a O (pó)

-Orais

(nasalizadas)

+alta ĩ ũ

-alta ẽ õ

+baixa ã

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avulta a necessidade de se conhecerem os fonemas do português brasileiro, porque os

valores não são outra coisa senão tais fonemas e de como eles são realizados pelos

falantes, isto é, os respectivos sons.

Cada vez que uma ou duas letras forem traçadas pelo indicador, deverá ser emitido o

som correspondente, que é a realização do respectivo fonema ou o valor do grafema

(com exceção das não continuas ou oclusivas /p b t d k g/ que não podem ser emitidas

isoladamente e serão produzidas com ajuda de uma vogal).

Dois conceitos essenciais

Fonema não é som.

Já foi examinado várias vezes que o fonema tem a função de distinguir significados,

assim como o grafema que o representa. Repito aqui a explicação dada no capítulo 7:

Um fonema, escrito entre barras / /, além da já mencionada definição de R. Jakobson,

como um feixe de traços distintivos, é uma classe de sons, escritos entre colchetes [ ]. O

fonema serve para distinguir o significado básico entre as palavras, como os fonemas

/m/ e /b/ em /´mala/ e /´bala/. Os sons para a realização de um mesmo fonema são

muito diferentes, dependendo da região de quem fala, do grupo social ao qual pertence e

também da posição que ocupa na frase. O fonema /R/ em /maR/, no final de uma

sentença, pode ser pronunciado com o dorso da língua contra o véu do paladar [max],

como pelo carioca; pode ser pronunciado com a ponta da língua voltada para o céu da

boca, como na variedade caipira [maÇ]; pode ser pronunciado com muitas batidas da

ponta da língua contra a face interna dos alvéolos, como na fronteira do Rio Grande do

Sul [mar].

Por essa razão, os dois quadros acima não registram todos os sons possíveis de

realização dos fonemas (aliás, seria impossível), mas você deve estar atento para o fato

de que seus alunos, ao lerem, converterão os grafemas a seus respectivos fonemas e os

realizarão de acordo com sua variedade sociolinguística: esteja atento!

Distinção entre consoantes e vogais

Embora haja parâmetros articulatórios, acústicos e perceptuais para distinguir as

consoantes das vogais, o melhor critério é a função na sílaba, isto é, somente as vogais

podem ser centro silábico no PB, conforme já examinado: a sílaba no PB é uma unidade

constituída obrigatoriamente por uma e apenas uma vogal (o centro silábico), que pode

vir acompanhada em suas margens à esquerda (o aclive ou ataque) e à direita (o declive

ou coda) por uma ou mais consoantes. É por isso que as semivogais /j/ e /w/ figuram no

quadro das consoantes acima, pois não temos letras específicas para representar os

grafemas semivocálicos, acarretando muitas confusões em sua identificação.

Algumas explicações sobre os fonemas do PB

Obstruinte (oclusivas e fricativas), traço equivalente a [-sonante], resulta de o obstáculo

à saída do ar não permitir a vibração espontânea das pregas vocais.

A abreviatura cont se refere às [+contínuas], uma subdivisão das obstruintes, que se

aplica às fricativas, pelo fato de sua emissão poder perdurar, e às outras obstruintes, ou

seja, as oclusivas [-contínuas], que resultam de um obstáculo à saída do ar pelo trato

vocal, o qual deverá ser rompido para que se produza qualquer energia, como é o caso,

no português de /p b d t k g/. Por isto, a realização isolada destes últimos fonemas é

impossível, o que tem suas implicações pedagógicas quando seus respectivos grafemas

são introduzidos, conforme explicarei.

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A abreviatura son se refere à sonoridade que resulta da vibração das pregas vocais como

em /b/ e ausente em /p/.

As abreviaturas post e ant de posteriores e anteriores se referem à movimentação do

maxilar inferior, arrastando a língua, para frente ou para trás, para a produção dos sons

anteriores, isto é, [-posteriores] e posteriores, isto é, [+posteriores], respectivamente. No

caso das vogais, o traço vai ser essencial para a atribuição distinta dos valores aos

grafemas c, g. As vogais com o traço [+posterior], são representadas pelos grafemas u, o, a, com ou sem acentos gráficos, enquanto as vogais com o traço [-posterior], isto é,

as anteriores são representadas pelos grafemas i, e, com ou sem acentos gráficos.

A abreviatura cor se refere à coronal, resultante da elevação da coroa ou lâmina da

língua, como ocorre nos fonemas /t d s z n r l S Z/.

O traço [+arredondado] se refere ao arredondamento dos lábios, encontrado nas vogais

/u o O/, enquanto [-arredondado] é quando os lábios estão distensos, como em /i e E a/.

Dica

Para você verificar o aparelho fonador, consulte o site:

http://www.google.com.br/images?q=aparelho+fonador+imagem

(ícone) Pontos importantes

No capítulo 12, foram examinados os conteúdos a seguir:

quadro fonêmico das consoantes e das vogais do português brasileiro (PB);

definição dos rótulos conferidos aos traços que distinguem as consoantes e as

vogais entre si;

revisão do conceito de fonema.

(ícone bloco de anotações)

Sugestões para reflexão e pesquisa:

Por que o alfabetizador deve conhecer o sistema fonológico do português

brasileiro (PB)?

O que é transparência de um sistema de escrita?

Qual sua opinião sobre o Novo Acordo Ortográfico?

AVALIAÇÃO DE APRENDIZAGEM

12. As consoantes no PB são fonemas:

a ( ) que se realizam com um máximo até um mínimo de fechamento do obstáculo à

saída do ar.

b ( ) que só podem ocupar a margem na sílaba.

c ( ) que incluem as semivogais /j/ e /w/. d ( ) que se realizam com maior ou menor obstrução à saída do ar.

e ( ) que se opõem às vogais.

13. Valores atribuídos aos grafemas, independentes do contexto grafêmico

(ícone síntese)

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No capítulo 12 foram apresentados e explicados os quadros fonêmicos das consoantes e

das vogais do PB; a seguir, definiram-se os rótulos conferidos aos traços que distinguem

as consoantes e as vogais entre si.

(ícone objetivo)

Defino no capítulo 13 o que se entende por contexto grafêmico e examino os valores

atribuídos aos grafemas, independentes do contexto escrito, isto é, independentes da

posição ou da letra que vier antes e/ou depois: na leitura, será atribuído sempre o mesmo

valor àquele grafema.

Contexto grafêmico

O contexto grafêmico consiste dos grafemas realizados pelas letras que vêm antes e/ou

depois do grafema cujo valor está em jogo e/ou da posição que ele ocupa no vocábulo e

na sílaba escrita (se no início ou final do vocábulo, se no início ou final de sílaba

interna).

Por exemplo, os grafemas c, g podem ter dois valores, dependentes do grafema

vocálico ou semivocálico que vier depois: se representar vogal ou semivogal

[+posterior], o valor será, respectivamente /k/ e /g/, como em cala, gala; se representar

vogal ou semivogal [-posterior], o valor será, respectivaamente /s/ e /Z/, como em você,

gelo. O grafema r, em início de vocábulo, sempre terá o valor do fonema /R/, enquanto

o grafema m, em final de vocábulo, depois do grafema a, terá o valor da semivogal

nasalizada /w/. Alguns dos grafemas só podem ocupar uma posição, como é o caso de todos os dígrafos

que têm que estar, obrigatoriamente, no início da sílaba, entre grafemas vocálicos (com

exceção de ch, que também pode figurar no início do vocábulo), enquanto outros só

marginalmente podem ocupar a posição de final de sílaba, como os grafemas p b t d f v c g, que representam obstruintes.

Há, porém, grafemas cujos valores independem do contexto grafêmico. É o que se verá

a seguir.

Valores dos grafemas, independentes do contexto

Quadro 3. Valores dos grafemas, independentes do contexto

____________________________________________________________________

Grafema Valor Exemplos Grafema Valor Exemplos

____________________________________________________________________

p /p/ pato b /b/ bola

t tatu d /d/ dado

f /f/ café v /v/ uva

ss /s/ massa ç /s/ moça

sç /s/ desço ch /S/ chave

j /Z/ janela nh /­/ linha

rr /R/ carro õ /õ/ põe

ó /O/ óculos à /a/* à

á /´a/ água â /´ã/ lâmpada

ã /ã/ rã

____________________________________________________________________

Observe que, para a ordenação no ensino-aprendizagem, não me baseio somente no

critério de os grafemas terem sempre os mesmos valores, independentes do contexto,

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pois há outros critérios que precisam ser considerados, que já foram apresentados em

capítulos anteriores. Por exemplo, os grafemas d/b e b/p apresentam o maior problema

no reconhecimento das letras, pois se diferenciam entre si apenas pela direção para a

direita ou esquerda do meio-círculo em relação à reta e para cima ou para baixo

(espelhamento), além de o respectivo som não poder ser produzido sozinho. Note que

todas as letras que representam as vogais, salvo quando vierem com sinais gráficos

(chamados de diacríticos), poderão ter valores diferentes, dependendo da posição, do

acento de intensidade e/ou das letras que vierem depois. Por isto, havia uma intuição

dos alfabetizadores antigos, ao apresentarem como primeiras palavras-chave ovo, uva e

Ivo, embora elas não estivessem inseridas num texto e sim em frases soltas.

Ícone dicionário:

Diacrítico: Qualquer sinal gráfico acrescentado às letras para especificar-lhes algum

valor, como os acentos agudo, circunflexo e grave, o til e a cedilha.

Enfatizo que a descoberta dos valores dos grafemas seja conduzida dentro de um

contexto comunicativo e/ou de brincadeira ou jogo, trabalhando com textos.

Chamo a atenção para o fato de os valores dos grafemas p, b, t, d não poderem ser

pronunciados sozinhos, pois são oclusivos (isto é, [-cont]), portanto, não insista com

seus alunos para produzirem sons impronunciáveis sem apoio de vogal, mesmo que

surda. De resto, trabalhe sempre com palavras com sentido dentro de um texto.

Observe-se também que quando t, d estiverem antes da letra i ou da letra e lida como [i] ou semivogal [j], na maior parte das variedades sociolinguísticas africam e palatizam,

lendo-se como [dZ] e [tS], respectivamente, como em dia e tia.

A meia lua sobre a vogal é para assinalar que se trata de uma vogal átona, valor

atribuído à descodificação de à (crase da preposição /a/ com artigo definido feminino,

pronome ou demonstrativo iniciado pelo fonema /a/).

Embora ó, á sempre tenham o mesmo valor, independente do contexto, o mesmo não se

pode dizer de é, pois esse grafema poderá ter o valor da vogal [+oral], [-posterior], [-

arredondada], [+baixa], /E/, como em pé, ou de vogal nasalizada [-oral], [-posterior], [-

arredondada], [-alta], /ẽ/, como em contém.

Na realidade, a regra formal da descodificação de um grafema independente de contexto

é muito simples: f /f/, que se lê como: “O grafema f se descodifica como a

realização do fonema /f/” (produza só o som [fff].

(ícone) Pontos importantes

No capítulo 13 foram abordados os seguintes conteúdos:

contexto grafêmico;

valores atribuídos aos grafemas, independentes da posição ou da letra que vier

antes e/ou depois;

será atribuído sempre o mesmo valor ao grafema independente do contexto

escrito.

(bloco de anotações)

Sugestões para reflexão e pesquisa:

Por que não se deve pronunciar o nome das letras enquanto se alfabetiza?

Por que é importante estimular a criança a reproduzir o som, a fazer o

movimento com os dedos e a bater palmas?

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Por que o Sistema Scliar de Alfabetização começa com letra de imprensa

maiúscula e minúscula?

AVALIAÇÃO DE APRENDIZAGEM

13. Valores atribuídos aos grafemas, independentes do contexto

a ( ) são os valores que dependem das letras que os precedem.

b ( ) são os valores que dependem das letras que os sucedem.

c ( ) são os valores que dependem de onde cai o acento de intensidade.

d ( ) são os valores que dependem da variedade sociolinguística.

e ( ) são os valores que independem do contexto grafêmico circundante.

14. Valores dos grafemas, dependentes do contexto escrito

(ícone síntese)

No capítulo 13 explicou-se o que se entende por contexto grafêmico e examinaram-se

os valores atribuídos aos grafemas, independentes do contexto escrito, isto é,

independentes da posição ou da letra que vier antes e/ou depois, pontuando-se que, na

leitura, será atribuído sempre o mesmo valor àquele grafema.

(ícone objetivo)

Examinarei os valores dos grafemas dependentes do contexto escrito, isto é,

dependentes da posição das letras que vêm antes e/ou depois, explicando questões como

o arquifonema. Por que isto é tão importante para a alfabetização? Porque, graças à

visão de Gonçalves Viana, o idealizador do sisteama ortográfico do português, o

arquifonema ficou registrado em grafemas como R r, S s, L l, em muitas posições. Ao

término do capítulo, você compreenderá um dos conceitos mais abstratos da fonologia.

Valores dos grafemas de acordo com sua posição

Comentei, no capítulo anterior que os valores de alguns grafemas se alteram conforme a

posiação que ocupam no vocábulo e na sílaba. Apresento, na sequência, um quadro

resumido destes valores no PB:

Quadro 4. Valores dos grafemas em início de vocábulo e de sílaba interna, entre

letras que representam vogais ______________________________________________________________

No início do vocábulo de sílaba interna

Grafema Valor Exemplos Grafema Valor Exemplos

______________________________________________________________

s /s/ sala s /z/ casa

m /m/ mala m /m/ cama

z /z/ zero z /z/ reza

l /l/ lata l /l/ calo

n /n/ nata n /n/ cano

r |R| rato r /r/ caro

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x /S/ xis x (depois de e, /z/ exemplo

em início de vo-

cábulo)

h zero hora

______________________________________________________________

Salvo as letras s e r que têm dois valores diferentes, respectivamente, /s/ e |R| no início

do vocábulo e /z/ e /r/ entre vogais, as letras do quadro, m, z, l, e n, têm os mesmos

valores no início do vocábulo e entre vogais. A letra x não tem valor previsível entre

vogais, conforme explicarei mais adiante, mas no início do vocábulo sempre tem o valor

de /S/, como em xis e xícara, por exemplo, enquanto a letra h em início de vocábulo

tem o valor de zero.

O valor do grafema r, no início do vocábulo, apresenta inúmeras variantes, dependendo

da variedade sociolinguística praticada. Além disto, não é possível substituir o fonema

/R/ por /r/ no início do vocábulo, portanto a diferença entre ambos deixa de funcionar

nesta posição, constituindo um arquifonema, escrito com letra maiúscula entre barras

paralelas, conforme será explicado em detalhe logo a seguir. O valor /r/, conferido ao

grafema r quando entre vogais se estende às letras que representam as semivogais,

como em feira, cárie. Observe que os alunos que provêm de famílias que praticam os

dialetos italianos, muitas vezes só usam o /r/ em início de vocábulo e nunca o /R/.

Um valor previsível que o grafema x tem num contexto específico entre vogais merece

destaque, pois, fora este caso e outros (vide Quadros 5/6), entre vogais, os valores, de x

são imprevisíveis. Trata-se do x com valor de /z/ depois de e, em início de vocábulo,

como em exame. A anteposição de prefixos não invalida a regra, como em reexame.

É importante trabalhar este princípio em sala de aula (sempre em textos!), pois a

ocorrência é bastante frequente.

Quadro 5. Valores em início de sílaba dos grafemas s depois de n, l, r; de r, depois de n, l, s; de x, depois de n, ei, ou, ai ______________________________________________________________

Depois de Grafema Valor Exemplos

______________________________________________________________

n s /s/ ganso

r |R| enruga

x /S/ enxame

l s /s/ bolsa

r |R| melro

r s /s/ urso

s r |R| desrespeito

ei, ou, ai x /S/ deixa, trouxa, caixa

______________________________________________________________

Observe que os fonemas /s/, /n/ e /l/, representados pelos grafemas s, n e l nas posições

do Quadro 5 se realizam todos na mesma zona de articulação ápico-alveolar. O fonema

/R/, representado pelo grafema r, em algumas variedades ainda se realiza como ápico-

alveolar, mas em outras apresenta muitas variantes.

Observe que trouxeste e seus derivados (pret. m.- perf. do ind., pret. imperf. e fut. do

subj.) discrepam do valor de x depois do ditongo ou, pois a pronúncia usual é a

realização de /s/. Observe, igualmente, que em trans, o s seguido de vogal é lido como

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a realização de /z/ ao invés de /s/, como se trans fosse um radical (é uma ideia que o

grande linguista brasileiro Mattoso Camara Jr. defendeu em relação aos chamados

prefixos, diminutivos e ao formador de advérbios - mente. Os valores atribuídos a

esses componentes confirmam a proposta de Mattoso Camara Jr. Cabe, ainda, assinalar

que o grafema x, como /S/, depois de ei, ou, ai se refere ao contexto escrito, pois, na

fala, a semivogal é eliminada.

Quadro 6. Valores dos grafemas em final de vocábulo e de sílaba interna ______________________________________________________________

No final do vocábulo de sílaba interna

Grafema Valor Exemplos Grafema Valor Exemplos

______________________________________________________________

s |S| quis s |S| lesma, casca

z |S| fiz x, -x |S| texto, ex-voto

l |W| sal l |W| alma

r |R| mar r |R| carta

h zero Ah!

x k(i)S tórax

______________________________________________________________

No português brasileiro, poucas consoantes podem figurar em final de sílaba. A

tendência no Brasil é, na fala, apagar a consoante no final do vocábulo, se ele não for

monossílabo, como acontece no infinitivo dos verbos, ou com a marca de plural, que só

aparece no primeiro determinante da frase em muitas variedades sociolinguísticas, como

em vamu comprá us livru. Na escrita, porém, as letras não são apagadas. No quadro

6, apresento os valores de alguns grafemas que são arquifonemas. Observe que os

valores estão representados por letra maiúscula, entre barras paralelas, ou seja, um

arquifonema, que significa que vários fonemas poderiam estar naquela posição, sem

alterar o significado. Explicarei cada caso.

Na prática

Arquifonema |S|

Tape as orelhas com as mãos, feche os olhos e diga a frase Eu quis. A seguir, diga a

frase Eu quis dançar. Se você for gaúcho/a, vai ouvir o primeiro s como [s], isto é,

surdo e o segundo como [z], isto é, sonoro. Se você for carioca, vai ouvir o primeiro s como [S], tal como o primeiro som de chá, enquanto o segundo s será ouvido como

[Z], como o primeiro som de já. Isto significa que substituir um dos quatro fonemas /s/,

/z/, /S/ ou [Z] em final de sílaba, inclusive de vocábulo, não altera o significado,

portanto a diferença entre eles perdeu a função e disto resulta o que se chama

arquifonema. Faça o mesmo exercício com Eu fiz e Eu fiz de tudo. O valor da letra z é o mesmo que o valor da letra s em final de vocábulo (o que constitui uma grande

dificuldade para a escrita, mas nenhuma para a leitura). Em final de sílaba interna a letra

z não ocorre, a não ser nos derivados com mente e diminutivos, mas a letra x, sim.

Nesta posição, ela se comporta como s, como, por exemplo, em explicar e texto.

Antes de letras que representam as consoantes sonoras (raramente), ex- aparece com o

hífen, como em ex-voto.

Ou seja, se a letra s, em final de sílaba, inclusive em final de vocábulo, for seguida de

letra que represente uma consoante surda, como /p, /t/, /k/, /f/ ela vai ser pronunciada

como surda, como em caspa, testa, casca, Eu quis ficar. Se a letra s, em final de

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vocábulo for seguida por um vocábulo que inicie por letras que representem /s/, /z/, /S/

ou [Z], estes últimos valores se impõem, como em Eu quis subir, Eu quis zombar,

Eu fiz chá, Eu quis julgar.

Diante das letras que representam as demais consoantes, ela será pronunciada como

sonora, como em Eu quis botar, Eu quis deixar, esgoto, Eu fiz valer, lesma, asno, Eu quis lutar, Eu fiz reza.

A escolha entre os fonemas /s/, /z/, /S/ ou [Z] depende da variedade sociolinguística.

Se o vocábulo terminar por s ou z e for seguido por vocábulos iniciados por letra que

represente vogal, o valor será sempre sonoro, como em Ele fez amigos, além de

ocorrer a alteração na divisão da sílaba.

Arquifonema |W|

A letra l em final de sílaba, inclusive de vocábulo, tem o valor do arquifonema |W|,

pois, na maioria das variedades, as pessoas utilizam a semivogal /w/ nesta posição, ao

invés de /l/. A leitura de mal e de mau é a mesma, tornando-os homófonos.

No dialeto caipira, as pessoas leem mal e mar do mesmo jeito e assim neutralizam em

favor de |R|, que explicarei a seguir.

Arquifonema |R|

No arquifonema |R|, em final de sílaba, inclusive de vocábulo, a substituição de /R/ por

/r/ não altera o significado da palavra. Por exemplo, seja qual for a variedade

sociolinguística, se a pessoa ler Tomou banho de mar e O mar está azul, embora

mar tenha o mesmo significado, no primeiro exemplo a letra r será lida com o valor do

fonema /R/, enquanto no segundo será lida com o valor do fonema /r/.

A letra h que, em início de vocábulo, inclusive depois de hífen nas palavras compostas,

vale zero, não invalida este princípio: Fez hoje dez anos, Super-homem.

A letra x em final de vocábulo tem o valor de /kS/ (pronúncia erudita) ou mais

comumente o de /kiS/, como em tórax.

(ícone) Pontos importantes:

Neste capítulo, você viu que:

os valores dos grafemas dependentes do contexto escrito;

o arquifonema;

registro dos arquifonemas |R|, |S| e |W| no sistema escrito do português como R r, S s, L l.

(bloco de anotações)

Sugestões para reflexão e pesquisa

O que é um arquifonema? Cite os arquifonemas do português brasileiro.

Qual sua importância para a leitura?

Por que |R| é um arquifonema em início de vocábulo?

AVALIAÇÃO DE APRENDIZAGEM

14. “Valores dos grafemas dependentes do contexto escrito” significa que o valor do

grafema depende:

a ( ) de como se pronuncia a palavra.

b ( ) da posição das letras que vêm antes e/ou depois.

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c ( ) da Academia Brasileira de Letras.

d ( ) dos dicionários.

e ( ) de falar mais rápido ou mais devagar.

15. Letras M m - N n em final de sílaba interna para nasalizar a vogal precedente

(ícone síntese/alvo)

No capítulo 14, examinei os valores dos grafemas dependentes do contexto escrito, isto

é, dependentes da posição das letras que vêm antes e/ou depois, explicando questões

como o arquifonema. Você deve ter verificado como isto é importante para a

alfabetização. Você viu, também, que o arquifonema ficou registrado em grafemas

como R r, S s, L l, em muitas posições.

(ícone objetivo)

No capítulo 15, você compreenderá melhor uma das maiores dificuldades da criança na

descodificação, principalmente quando é alfabetizada pelo nome das letras: trata-se das

funções das letras M m, N n para nasalizar. Verá, também, como elas funcionam em

sílaba interna e em final de vocábulo e encontrará um quadro sintético com as letras que

nasalizam as vogais em final de sílaba interna e de vocábulo.

Função das letras M m, N n para nasalizar

M m, N n têm têm a mesma função do til (~) em sílaba interna e em final de vocábulo,

nasalizando a vogal precedente (e opcionalmente ditongando), como, por exemplo, em

pomba e em rim. Em final de vocábulo, M m, N n têm o valor da semivogal /j/

nasalizada, depois de E e com ou sem diacríticos, como em bem, hífen, vêm. Depois

de A a, somente M m tem o valor da semivogal /w/ nasalizada, como em faltam.

No quadro 7, apresento um resumo das letras que nasalizam as vogais em final de sílaba

interna e de vocábulo, com exclusão de M m, em final de vocábulo, depois dos

grafemas E e, A a.

Quadro 7. Letras que nasalizam as vogais em final de sílaba interna e de vocábulo (com

ditongação opcional)

Final do vocábulo depois de Final de sílaba interna Antes de

Grafema Valor Grafema Exs. Grafema Valor Exs. Grafema

m ~ u, o, i um m ~ bomba p, b

tampa

tom

rim

n ~ o, a, i (s) cólon n ~ ponta demais

tons consoantes

íman lenda

rins cinco

longo

~ entre u__s alguns confiar

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álbuns convite

inseto

cinza

inchar

injeção

honra

Assim, as letras M m, N n em final de sílaba interna nasalizam a vogal precedente. A

letra M m, com essa função, se escreve sempre antes de P p, B b, como em LIMPO, limpo, TOMBO, tombo, porque P p, B b representam fonemas bilabiais; o N n se

escreve antes das demais consoantes, como em PONTA ponta, LINDO lindo, ANGU angu, ENFEITE enfeite, INVEJA inveja. Assim, M m, N n têm a mesma função

que o til (~) e, por isso, o grafema (que é um dígrafo), nos exemplos acima é IM im, OM om, ON on, IN in, AN an, EN en, IN in. M m, N n, pois, em final de sílaba

interna, não são lidas como consoantes, como acontece no espanhol, no inglês ou no

alemão, portanto, esse princípio tem muita importância para o ensino da leitura para

estrangeiros.

Tabela 10. Grafemas que nasalizam E e, A a em final de vocábulo, ditongando.

________________________________________________________________

Final do vocábulo depois de

Grafema Valor Grafema Valor Exemplos

________________________________________________________________

m /j/nasalizado e, é, ê /e/nasalizado bem, ele vem, alguém,

ele detém, eles vêm,

eles detêm

m /w/nasalizado a /ã/ contam, escrevam

n(s) /j/(|S|) e, é /e/nasalizado tens, bens, hífen, deténs,

homens

Os grafemas M m e N n em final de vocábulo representam a semivogal /j/ nasalizada,

ditongando depois do grafema e, com ou sem diacríticos; depois do grafema a somente

M m representa a semivogal /w/ nasalizada: trata-se, pois, de ditongos nasalizados

decrescentes.

Observe que o acento agudo, circunflexo ou sua ausência nas 3ªs. pessoas dos verbos ter

e vir e seus derivados, no presente do indicativo, servem como marcas coesivas

(concordância) e anafóricas para a recuperação da referência quando o sujeito não vier

expresso ou se estiver expresso pelo pronome relativo que. A ausência do diacrítico, só

ocorre no monossílabo, na terceira pessoa do singular do presente do indicativo, como

nos exemplos ele tem, ele vem; o acento agudo só ocorre nos derivados na terceira

pessoa do singular do presente do indicativo, como nos exemplos ele contém, ele provém; o acento circunflexo só ocorre na terceira pessoa do plural do presente do

indicativo, tanto nos monossílabos, quanto nos derivados, como nos exemplos eles têm, eles vêm, eles contêm, eles provêm.

Veja, como, no exemplo a seguir, na oração subordinada adjetiva, a marca de terceira

pessoa do plural está unicamente no acento circunflexo.

As pessoas que provêm do hemisfério norte sofrem com o calor no Rio de Janeiro.

Resumo, então, as diversas possibilidades da letra N n: no início da sílaba, como

grafema, tem o valor do fonema /n/, como em nenê; no final de sílaba interna, antes de

letras que representem consoante, funciona como o til: nasaliza a vogal precedente,

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como em elenco, lenço, infeliz, lendo, encargo, injeção, enlutar, enquadrar, enrijecer, insatisfeito, lento, inválido, enxuto, isto é, antes de todas as letras que

representam consoante, menos p e b; no final de vocábulo a letra N n, se estiver depois

da letra e, ditonga, como em hífen; antes do h, forma um dígrafo, isto é, o grafema que

representa a consoante nasal palatal, como em lenha.

(ícone) Pontos importantes:

Neste capítulo ficou demonstrado que:

as letras M m, N n, na nasalização, têm a mesma função do til (~);

em sílaba interna e em final de vocábulo, nasalizama vogal precedente (e

opcionalmente ditongando), como, por exemplo, em pomba, rim;

M m, N n têm o valor da semivogal /j/ nasalizada, depois de E e com ou sem

diacríticos, como em bem, hífen, vêm;

depois de A a, somente M m tem o valor da semivogal /w/ nasalizada, como em

contam.

(bloco de anotações)

Sugestões para reflexão e pesquisa

Por que se usa M m para nasalizar a vogal precedente antes de P p, B b?

Quando M m, N n têm a mesma função do til?

Por que a alfabetização pelo nome das letras dificultaria internalizar a função de

M m, N n para nasalizar?

AVALIAÇÃO DE APRENDIZAGEM

15. As letras M m e N n em final de sílaba interna...

a ( ) representam os fonemas /m/ e /n/, respectivamente.

b ( ) são lidas como as consoantes [m] e [n] respectivamente.

c () têm a mesma função do til e servem para nasalizar a vogal precedente.

d ( ) devem ser ensinadas pelo seu nome eme e ene, respectivamente.

e ( ) não devem ser ensinadas nesta posição, pois a criança aprenderá sozinha esse valor.

16. Valores de C c - G g - Q q antes das vogais posteriores

(ícone síntese)

No capítulo 15, você compreendeu melhor uma das maiores dificuldades da criança na

descodificação, principalmente quando é alfabetizada pelo nome das letras: trata-se das

funções das letras M m, N n para nasalizar. Você verificou que elas têm a mesma

função do til (~). Expus como elas funcionam em sílaba interna, nasalizando a vogal

precedente (e opcionalmente ditongando), como, por exemplo, em pomba e em rim;

você verificou que M m, N n em final de vocábulo têm o valor da semivogal /j/

nasalizada, depois de E e com ou sem diacríticos, como em bem, hífen, vêm e que,

depois de A a, somente M m tem o valor da semivogal /w/ nasalizada, como em falam.

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(ícone objetivo)

No capítulo 16, examinarei uma importante distinção para atribuir valores aos grafemas

C c, G g, Q. A distinção entre os grafemas que os sucedem e que representam as

vogais (com ou sem acentos gráficos) e semivogal posteriores, como u, um, un, o, õ, om, on, a, ã, am, an e aqueles que representam as vogais (com ou sem acentos

gráficos) e a semivogal não posteriores (isto é, anteriores), como i, im, in, e, em, em).

Também examinarei os valores dos grafemas q GU gu, QU qu.

Entendendo os valores

O Quadro 8 apresenta a regularidade do efeito das vogais posteriores, representadas por

seus respectivos grafemas, sobre C c, G g e Q q. O grafema C c sempre terá o valor

de /k/, se ocorrer antes de um grafema que representar uma vogal ou semivogal

posterior. Leia-se a seguinte conversão:

C c, Q q /k/ /_V, SV [+post], ou seja, os grafemas C c, Q q têm o valor do fonema

/k/, no contexto escrito antes de vogal ou semivogal posterior.

G g /g/ /_V, SV [+post], ou seja, o grafema G g tem o valor do fonema /g/, no

contexto antes de vogal ou semivogal posterior.

Quadro 8. Exemplos dos valores dos grafemas c, g, q, seguidos de grafemas que

representam as vogais posteriores ou a semivogal /w/

____________________________________________________________________

Grafema Valor Grafema Valor Exemplos

seguinte ____________________________________________________________________

c /k/ u /u/ cura

g /g/ um, un /u/ algum, alguns

c /k/ úm /´u]/ cúmplice

g /g/ o /o/, /O/ o gosto, eu gosto

c /k/ ô /´o/ cômico

g /g/ ó /´O/ gótico

c /k/ õ, om, on /õ/ facões, compra, conta

g /g/ ôm, ôn /´õ/ gôndola

g /g/ a /a/ gato

c /k/ á /´a/ cárie

g /g/ ã, am, an /ã/ fogão, apagam, ancorar

c /k/ âm, ân /´ã/ cântico, lâmpada

g /g/ u /w/ aguenta

c /k/ u /w/ cueca

q /k/ u /w/ iníqua

Os grafemas que representam as vogais posteriores orais (/u/ /o/ /O/ /a/), como em

cura, ou nasalizadas (/´u]/ /õ/ /ã/), como em fogão e a semivogal /w/, como em

aguenta, condicionam os valores dos grafemas c, g, q, que passam a ter os valores

respectivamente de /k/, /g/ e /k/, conforme o Quadro exemplificativo acima. A retirada

do trema e do acento agudo nas formas verbais rizotônicas (isto é, cujo acento de

intensidade cai na última vogal u do radical) quando o u for precedido de g ou q e

seguido de e ou i, como, por exemplo, em frequência e tu arguis tornou o sistema

opaco para a leitura, pois tais formas passaram a ter homógrafas não homófonas.

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Examinarei, a seguir, a mudança de valores dos grafemas C c, SC sc, XC xc, G g e

dos dígrafos GU gu e QU qu, antes das vogais e semivogal não posteriores (com ou

sem acentos gráficos).

Os valores de C c, SC sc, XC xc, G g e dígrafos GU gu e QU qu, antes das

vogais não posteriores

O Quadro 9 apresenta a regularidade do efeito das vogais (com ou sem acentos gráficos)

e semivogal não posteriores, representadas por seus respectivos grafemas, sobre C c, SC sc, XC xc, G g e dígrafos GU gu e QU qu. Os grafemas C c, SC sc, XC xc sempre terão o valor de /s/, se ocorrerem antes de um grafema que representar uma

vogal não posterior (isto é, anterior), com ou sem acento gráfico). Leia-se a seguinte

conversão:

C c, SC sc, XC xc/s/ /_V, SV [-post], ou seja, os grafemas C c, SC sc, XC xc

têm o valor do fonema /s/, no contexto antes de grafema que represente vogal ou

semivogal não posterior.

Quadro 9. Exemplos dos valores dos grafemas c, sc, xc, g e dígrafos gu e qu,

seguidos de grafemas que representam as vogais (com ou sem acentos gráficos) e

semivogal não posteriores.

____________________________________________________________________

Grafema Valor Grafema seguinte Valor Exemplos

____________________________________________________________________

c /s/ i /i/ cine

sc /s/ í /´i/ fascínio

g /Z/ im, in /i]/ gincana

xc /s/ e /e/, /E/ exceção, exceto

c /s/ ê /´e/ cênico

sc /s/ em, en /e]/ nascente

c /s/ ên /´e]/ cêntuplo

g /Z/ é /E/ gélido

gu /g/ i /i/ guia

qu /k/ in /i]/ quinto

qu /k/ e /e/, /E/ querer, quero

gu /g/ em /ej]/ paguem

qu /k/ in /i]/ quíntuplo

c /s/ i /j/ Lúcia

sc /s/ i /j/ néscio

g /Z/ i /j/ egrégio

qu /k/ i /j/ relíquia

Os grafemas que representam as vogais e semivogal não posteriores orais ou

nasalizadas condicionam os valores dos grafemas c, sc e xc que passam a valer /s/, como em cento, fascínio, exceto, bem como condicionam g que passa a valer /Z/,

como em gente. A forma prática de atribuir tais valores é verificar se as letras seguintes

são e ou i, com ou sem sinais gráficos ou seguidas ou não de letras que nasalizam como

m ou n na mesma sílaba.

Os dígrafos gu e qu, seguidos de e ou i valem respectivamente /g/ e /k/, como em

guerra e quilo. Observe, pois, que com o Novo Acordo Ortográfico a identificação de

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gu e qu, seguidos de e ou i tornou-se problemática, pois não se sabe se funcionam

como dígrafo, representando respectivamente os fonemas /g/ e /k/ como em guerra e

quilo, ou se representam, respectivamente, dois fonemas /gw/ e /kw/ como em

aguenta e cinquenta.

(ícone) Pontos importantes:

No capítulo 16 você viu:

uma importante distinção para atribuir valores aos grafemas C c, G g, Q q, GU

gu, QU qu: a distinção entre os grafemas que os sucedem e que representam as

vogais (com ou sem acentos gráficos) e semivogal posteriores, como u, um, un,

o, õ, om, on, a, ã, am, an e aqueles que representam as vogais (com ou sem

acentos gráficos) e a semivogal não posteriores (isto é, anteriores), como i, im,

in, e, em, em);

a importância de não alfabetizar pelo nome das letras e sim pelos valores dos

grafemas;

que com o Novo Acordo Ortográfico a identificação de gu, qu, seguidos de e ou

i tornou-se problemática.

(bloco de anotações)

Sugestões para reflexão e pesquisa

Por que os dois valores que o grafema C c tem são mais um argumento de que

ele não deve ser ensinado pelo nome da letra?

Quais são os grafemas que representam as vogais [+posteriores]?

Quais são os grafemas que representam as vogais [-posteriores]?

(ícone)

Avaliação de aprendizagem

16. O valor do grafema C c depende do contexto grafêmico. Isto significa que:

a ( ) seu valor depende dos acentos gráficos.

b ( ) seu valor depende de os grafemas que o seguem representarem vogais posteriores

ou não posteriores.

c ( ) C c antes do grafema o tem o valor de /s/. d ( ) C c antes do grafema e tem o valor de /k/.

e ( ) C c antes de a tem o valor de /s/.

17. Os dois valores do grafema R r dependentes do contexto grafêmico – o único

valor do grafema RR rr (ícone síntese)

No capítulo 16, examinei uma importante distinção para atribuir valores aos grafemas C c, G g, Q q, GU gu, QU qu, a da distinção entre os grafemas que os sucedem e que

representam as vogais (com ou sem acentos gráficos) e semivogal posteriores, como u, um, un, o, õ, om, on, a, ã, am, an e aqueles que representam as vogais (com ou

sem acentos gráficos) e a semivogal não posteriores (isto é, anteriores), como i, im, in, e, em, em).

(ícone objetivo)

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Explicarei no capítulo 17 os dois valores do grafema R r dependentes do contexto

grafêmico e o único valor do grafema RR rr. Os valores dependentes do contexto

grafêmico, porém, são previsíveis: entre grafemas que representam vogais ou

semivogais, como em caro, feira e nos encontros consonantais, como em prato, bronca, o grafema R r tem sempre o valor do fonema /r/; em início do vocábulo, como

em roda, tem sempre o valor do arquifonema |R|; em final de vocábulo, seguido de

outro que inicie por grafema que represente consoante, como em mar baixo, bem

como em final de sílaba interna, como em porta, o valor é opcional entre /R/ ou /r/; se

o vocábulo iniciar por grafema que represente vogal, como em comer uva co –me –´ru –va, tem o valor do fonema /r/, com reanálise silábica.

O único valor do grafema RR rr Começarei com o valor do grafema (dígrafo) RR rr, porque ele é único: só pode ocorrer

entre grafemas que representam vogais ou semivogais, com o valor do fonema /R/,

como em carro.

Os dois valores do grafema R r

O grafema R r pode ter dois valores: o fonema /R/ ou o fonema /r/. O grafema R r tem

o valor do fonema /r/, que se realiza com uma só batida do dorso da língua contra os

alvéolos, nas seguintes posições: a) entre grafemas que representam vogais ou

semivogais, como em caro, feira; b) nos encontros consonantais, como em prato, bronca. O grafema R r tem o valor do arquifonema |R| que apresenta muitas variantes,

conforme as variedades geográficas, como é o caso de [x] do carioca, [r] da fronteira do

Rio Grande do Sul, ou o retroflexo da variedade caipira em início de vocábulo

(obrigatória), como em roda. Em final de vocábulo, ou de sílaba interna, como em

PORTA porta, o grafema R r, não seguido de vocábulo que inicie por grafema que

represente vogal, como em mar bravo, ou antes de sinal de pontuação, tem valor

opcional entre os fonemas /R/ e /r/. A tendência é o apagamento desta consoante em

posição final, salvo se o vocábulo for monossílabo. Caso o vocábulo seguinte comece

por vogal, o fonema que ocorre é o /r/, que se realiza com uma só batida, além de haver

uma reanálise silábica, como você pode verificar se contar as sílabas ao dizer de forma

fluente a frase comer uva co –me –´ru –va. É um desafio explicar tudo isto para

uma criança, mas vamos tentar aos poucos e com muita brincadeira.

(ícone) Pontos importantes:

Neste capítulo, pode-se observar que:

dois valores do grafema R r dependem do contexto grafêmico: entre grafemas que

representam vogais ou semivogais, como em caro, feira e nos encontros consonantais,

como em prato, bronca;

em início do vocábulo, como em roda, tem sempre o valor do arquifonema |R|;

em final de vocábulo, seguido de outro que inicie por grafema que represente

consoante, como em mar bravo, tem o valor do fonema /R/;

se o vocábulo iniciar por grafema que represente vogal, como em comer uva co –me –´ru –va, tem o valor do fonema /r/, com reanálise silábica;

em final de sílaba interna o valor é opcional.

(ícone)

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(bloco de anotações)

Sugestões para reflexão e pesquisa

Por que o grafema RR rr não é tão difícil de ensinar como parece?

Por que, embora a realização do fonema /R/ apresente muita variação sociolinguística,

podemos afirmar que se trata de um só fonema?

Por que será que, na aquisição da língua oral, as crianças apresentam maior

dificuldade em realizar o /r/ do que o /R/?

(ícone)

Avaliação de aprendizagem

17. O grafema RR rr... a ( ) só pode ocorrer no contexto entre grafemas que representam vogais.

b ( ) apesar de suas várias realizações possíveis, conforme a variedade sociolinguística,

o valor é sempre o fonema /R/.

c ( ) apesar da aparente complexidade, o valor é independente do contexto, pois sempre

será /R/.

d ( ) deve ser ensinado traçando as duas letras e, simultaneamente, emitindo o som,

conforme a variedade sociolinguística.

e ( ) deverá ser ensinado inserido em uma palavra.

18. Valores previsíveis e imprevisíveis do grafema X x

(ícone síntese)

No capítulo 17, expliquei os dois valores do grafema R r dependentes do contexto

grafêmico e o único valor do grafema RR rr. Mostrei que os valores dependentes do

contexto grafêmico, porém, são previsíveis: entre grafemas que representam vogais ou

semivogais, como em caro, feira e nos encontros consonantais, como em prato, bronca, o grafema R r tem sempre o valor do fonema /r/; em início do vocábulo, como

em roda, tem sempre o valor do arquifonema |R|; em final de vocábulo, seguido de

outro que inicie por grafema que represente consoante, como em mar bravo, tem o

valor do fonema /R/; se o vocábulo iniciar por grafema que represente vogal, como em

comer uva co –me –´ru –va, tem o valor do fonema /r/, com reanálise silábica;

em final de sílaba interna o valor é opcional.

(ícone objetivo)

No capítulo 18, trabalharei os valores previsíveis e imprevisíveis atribuídos ao grafema

X x. Conforme você vai verificar, para alguns valores, não há dúvida. Em posição entre

vogais, porém, não dá para prever o valor, então o aluno tem que memorizar como se

pronuncia a palavra. Nesse caso, recomendo trabalhar com as palavras de uso mais

frequente.

Valores previsíveis do grafema X x

O grafema X x apresenta muitos problemas para a atribuição de seus valores, em

virtude de tradicionalmente a alfabetização ocorrer pelo nome das letras. No entanto, se

o ensino ocorrer pelo valor que o grafema tem, muitas dúvidas poderão ser sanadas,

uma vez que alguns valores são totalmente previsíveis.

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X x tem o mesmo valor que ch no início de vocábulo, como em xícara; depois de n (enxame) e depois de ei (peixe); ou (trouxa); ai (caixa). Nos três últimos casos,

observe-se que, na fala, a semivogal tende a ser eliminada. Em muitas variedades como

a carioca, ou dos nativos de Florianópolis, também tem esse valor em final de sílaba,

antes das letras p, t, c, f, quando essas iniciam sílaba, como em explicar, texto, exclamar, exfoliar. Em outras variedades, na mesma posição, ao invés do valor do

grafema ch, tem o valor do fonema /s/.

X x tem o valor de /z/ quando a letra e inicia vocábulo e ele estiver iniciando sílaba,

como em exato. O prefixo não invalida a regra, como em inexato.

X x tem o valor de kiS ou kS em final de vocábulo, como em tórax. Ao último fonema

de /kiS/ ou /kS/ se aplica o princípio de que, em final de sílaba, antes das letras p, t, c, f, terão o mesmo valor que o grafema ch em muitas variedades como a carioca, ou dos

nativos de Florianópolis e, em outras variedades, na mesma posição, ao invés do valor

de ch, tem o valor do fonema /s/.

Valores imprevisíveis do grafema X x

No contexto entre letras que representam vogais (com exceção do e que inicia

vocábulo, conforme acima), os valores são imprevisíveis: podem ser /s/, como em

máximo; kiS ou kS, como em sexo, ou ter o valor de ch, como em abacaxi. Nesse caso, o aluno terá que memorizar o valor, portanto, o professor deve trabalhar

com as palavras de uso mais frequente.

(ícone) Pontos importantes:

No capítulo 17,você percebeu que:

se o ensino ocorrer pelo valor que o grafema X tem, muitas dúvidas poderão ser

sanadas, uma vez que alguns valores são totalmente previsíveis;

X x tem o mesmo valor que ch no início de vocábulo, como em xícara;

X x tem o mesmo valor que ch depois de ei (peixe); ou (trouxa); ai (caixa) ; n

(enxame);

X x tem o mesmo valor que ch em muitas variedades como a carioca, em final

de sílaba, antes das letras p, t, c, f, quando essas iniciam sílaba, como em

explicar;

em outras variedades, X x, em final de sílaba, antes das letras p, t, c, f tem o

valor do fonema /s/;

X x tem o valor de /z/ quando a letra e inicia vocábulo e ele estiver iniciando

sílaba, como em exato; o prefixo não invalida a regra, como em inexato;

X x tem o valor de kiS ou kS em final de vocábulo, como em tórax;

- no contexto entre letras que representam vogais (com exceção do e que inicia

vocábulo, conforme acima) os valores são imprevisíveis: podem ser /s/, como

em máximo; kiS ou kS, como em sexo, ou ter o valor de ch, como em abacaxi.

(ícone)

(bloco de anotações)

Sugestões para reflexão e pesquisa

Quais os fundamentos da alfabetização mais importantes que aprendi?

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Qual a aplicação mais importante da neurociência à alfabetização?

Qual a melhor forma de desenvolver o gosto pela leitura durante a alfabetização?

(ícone)

Avaliação de aprendizagem

18. Quando os valores de um grafema não são previsíveis, como é o caso do grafema X x entre vogais:

a ( ) não deve ser trabalhado em sala de aula

b ( ) só devem ser trabalhados os valores previsíveis, como em início de palavra.

c ( ) devem-se trabalhar as palavras de maior frequência de uso.

d ( ) deve-se trabalhar no início da alfabetização.

e ( ) deve-se começar pela escrita.

19. Palavras finais

Caríssimo professor,

Encerro aqui o Sistema Scliar de Alfabetização – Fundamentos, que teve como objetivo

fornecer-lhe as bases para entender a nova proposta, baseada nos achados mais

avançados da neurociência, da linguística e da psicolinguística, concernentes à

alfabetização. Acredito que esta fundamentação é necessária para que você, professor,

compreenda em profundidade quais são os processos envolvidos na aprendizagem de

um sistema alfabético como o nosso e possa fazer de seu aluno um cidadão participante

da sociedade da informação, apto a compreender os textos que circulam e a redigir os de

que necessita para sua realização.

Percorremos, juntos, uma jornada que iniciou com as motivações para a proposta:

prevenir o analfabetismo funcional, com vistas à inclusão de todos na sociedade da

informação. Mostrei como a neurociência ilumina as novas metodologias da

alfabetização e do desenvolvimento das capacidades de leitura e de escritura e procurei

esclarecer as diferenças entre a aquisição da língua oral e escrita a fim elucidar uma

série de equívocos sobre como desenvolver a consciência fonológica e, particularmente,

como tornar o aluno apto a compreender os textos que circulam socialmente e também a

produzir textos que atendam as suas necessidades pragmáticas.

Aprofundei, sobretudo, a noção de que, para se tornar letrado, o indivíduo necessita

reconhecer a palavra escrita sem titubear, lendo com prazer e fluentemente.

No livro Sistema Scliar de Alfabetização – Roteiros para o professor: 1º Ano, você verá

aplicados todos os fundamentos da proposta. Cada unidade apresenta as instruções de

como devem ser ministrados os grafemas, acompanhadas de uma série de atividades

para o desenvolvimento da consciência fonológica, da percepção da sílaba de

intensidade e dos vocábulos átonos. Dá-se ênfase à aprendizagem dos neurônios para

dissimetrizar, bem como ao desenvolvimento integral e integrado do educando. O livro

do aluno, Aventuras de Vivi, foi elaborado com todo o cuidado para que a criança se

alfabetize, desenvolvendo o gosto pela leitura.

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GLOSSÁRIO

Acrônimo: duas ou mais letras iniciais de palavras que constituem uma frase, que

passam a representar a respectiva referência, como, por exemplo, UFSC

Universidade Federal de Santa Catarina.

Africado: som que começa como oclusivo [-cont] e termina como fricativo, como é o

caso de [ts] na palavra tsetsé; também é o caso de [tS] e [dZ] quando t e d estiverem

antes da letra i ou da letra e lida como [i] ou semivogal [j], na maior parte das

variedades sociolinguísticas, como, respectivamente, em tia e dia.

Analfabeto funcional: Designa o indivíduo que não consegue ler ou escrever os textos

dos quais necessita em sua vida cotidiana familiar, social e de trabalho.

Censores somestésicos: estão espalhados pelo corpo todo, ao contrário dos órgãos

especiais, cujos receptores estão restritos à cabeça, e evocam as seguintes modalidades

perceptuais: Tato/Pressão e Vibração, Propriocepção, Dor e Sensação térmica.

Cinestesia: sensações e percepções que dizem respeito ao movimento, processadas a

partir dos receptores situados no labirinto.

Coarticulação: Em fonética articulatória, significa que os gestos para a produção dos

sons são imbricados: os gestos para cada som não são isolados, do que resulta uma das

maiores dificuldades na aprendizagem dos sistemas alfabéticos.

Codificação: na escrita, é o processo que resulta na transposição dos fonemas aos

grafemas, constituídos por uma ou duas letras no sistema ortográfico do PB, a fim de

escrever as palavras.

Consciência fonológica: é a capacidade de o indivíduo se debruçar sobre a cadeia da

fala, desmembrando a sílaba em suas unidades constituintes, através da utilização dos

grafemas (uma ou duas letras, no português brasileiro), que as representam.

Contínuo da fala: na cadeia da fala, as palavras não são separadas entre si por

silêncios, nem há contraste entre os sons que constituem as sílabas.

Córtex cerebral: é a camada mais externa do cérebro dos vertebrados, constituída pelos

neurônios que processam a informação. O córtex humano é responsável pela atenção,

percepção, linguagem, pensamento, consciência, por todos os tipos de memória e pelos

movimentos do corpo. É constituído por cerca de 20 bilhões de neurônios, que formam

a massa cinzenta.

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Descodificação: na leitura, é o processo que resulta no reconhecimento das letras,

identificação dos grafemas e sua associação ao respectivo fonema, para finalmente

reconhecer a palavra escrita.

Derivação morfológica: A derivação morfológica no PB pode ser por prefixação e/ou

por sufixação e por outros processos como perda de unidades, abreviaturas e acronímia,

entre outros, como, por exemplo, em fixar prefixar; belo beleza; belo

embelezar; fonoaudiologia fono; televisão TV.

Dislexia: distúrbio congênito que resulta em dificuldades maiores ou menores no

reconhecimento dos traços que diferenciam as letras.

Dominância e especialização do sistema nervoso central: na espécie humana, o

sistema nervoso central funciona dentro do princípio da divisão de trabalho. Um dos

hemisférios é o dominante: na maioria das pessoas é o esquerdo, onde é processada a

linguagem verbal. Em cada um dos hemisférios, as regiões se especializam para

determinadas funções, através da aprendizagem e graças à plasticidade neuronal. Para a

leitura, a região especializada é a occipitotemporal ventral esquerda.

Eletroencefalograma: consiste em mensurar, com um voltímetro muito sensível, as

diferenças de potencial da ordem de um microvolt que as correntes neuronais induzem

até a superfície do escalpo.

Enfoque multissensorial: estimulação dos vários sentidos para reforçar a

aprendizagem do reconhecimento das letras, conforme propunha Montessori.

Especialização dos neurônios: ocorre nas regiões secundiárias e terciárias, através da

experiência, para funções específicas, como são exemplo todas as funções da linguagem

verbal.

Estímulos categoriais: Nos experimentos de discriminação auditiva são aqueles que

permitem detectar quais as fronteiras entre os sons que o sujeito detecta para identificá-

los como diferentes.

Fonema: classe de sons, com a função de distinguir significados. Por exemplo, o

fonema /R/, no português, engloba diferentes sons praticados em diferentes regiões do

Brasil, como no Rio de Janeiro, na fronteira do Rio Grande do Sul, no interior de Minas

Gerais ou de São Paulo, na Bahia, e assim por diante.

Fonética: ciência que estuda os sons da fala do ponto de vista articulatório, acústico ou

perceptual.

Fonoaudiologia: ciência que se ocupa dos distúrbios da comunicação verbal e de como

preveni-los e tratá-los.

Fóvea central: é uma pequena depressão no centro da retina (mácula), a área da visão

que apresenta maior clareza e precisão, onde a luz incide diretamente nos cones.

Função semiótica ou semiológica: função que opera com signos. Distingue-se das

operações em nível do sinal, onde ocorre uma resposta contígua ao estímulo.

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Gestos fonoarticulatórios: resultam dos movimentos do aparelho fonador para a

produção dos sons da fala, como, por exemplo, a movimentação do maxilar inferior,

arrastando a língua, tanto para frente, quanto para trás, para a produção dos sons

anteriores, isto é, [-post] e posteriores, isto é [+post], respectivamente.

Grafema: unidade de um sistema de escrita que, na escrita alfabética, corresponde a

uma ou mais letras para representar um dado fonema (no português, uma ou duas letras,

somente, com ou sem acentos gráficos); na escrita silábica, corresponde a uma sílaba.

HAS (high-amplitude sucking): paradigma experimental através do qual se pode

mensurar o aumento do número de sucções do bebê diante de um estímulo novo e seu

decréscimo quando já está saciado.

Idioleto: variedade sociolinguística de cada indivíduo, marcada por características

estilísticas que o identificam em contraste com as de outros indivíduos pertencentes ao

mesmo grupo social de fala.

Imagem por ressonância magnética (IRM): detecta as regiões cerebrais onde a

atividade neuronal é intensa, por receberem, nos segundos seguintes, um afluxo de

sangue oxigenado.

INAF: Indicador de Alfabetismo Funcional, conduzido pelo Instituto Paulo Montenegro

e pela ONG Ação Educativa.

Inferenciação: processo cognitivo pelo qual o indivíduo chega a uma terceira

conclusão, após cruzar o conhecimento prévio do mundo obtido através de suas

experiências e/ou de textos ouvidos ou lidos com o conhecimento extraído do texto oral

ou escrito que está recebendo. O desenvolvimento da capacidade de inferenciar depende

fundamentalmente do acúmulo de leituras realizadas ao longo da vida.

Invariância: classe que abrange todas as realizações ou fenômenos de um mesmo

elemento, como, por exemplo, a letra a que, manuscrita, se realiza de n formas,

dependendo da caligrafia de quem escreve, ou o conceito de cadeira, que abrange todas

as cadeiras que existiram, existem ou existirão, ou suas diferentes representações.

Letramento: diz respeito às práticas sociais da leitura e da escrita em sociedades

letradas.

Linguística: ciência que tem por objeto o estudo da língua, em todos os seus aspectos.

Magnetoencefalografia: detecta as variações minúsculas do campo magnético

induzidas pelas correntes neuronais.

Maturidade Cognitiva: ao nascer, o cérebro do bebê não está com os circuitos que o

constituem inteiramente prontos, nem com todos os conhecimentos linguísticos e do

mundo já armazenados em suas várias memórias. O amadurecimento é gradativo e

depende de os prolongamentos dos neurônios serem recobertos por uma camada rica em

proteínas (mielinização) para poderem transmitir a informação, bem como para que se

estabeleçam as conexões entre as várias regiões do cérebro para permitirem a

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elaboração de perceptos de natureza cada vez mais complexa e abstrata; depende,

também, da experiência, para que os neurônios se reciclem e aprendam a processar as

informações oriundas da cultura.

Memória de trabalho: conforme a psicologia cognitiva, ela se refere às estruturas e

processos utilizados para armazenar, temporariamente estocar e manipular a

informação.

Memória permanente ou em longo prazo: memória onde estão registrados os

episódios marcantes na vida do indivíduo, os esquemas, marcos ou roteiros de suas

experiências cotidianas (o seu conhecimento de mundo), os conhecimentos adquiridos

através das várias linguagens (memória enciclopédica e semântica), a memória dos

rostos, vozes, sons, sabores, trajetos, etc.

Método fônico: iniciado pelo linguista L. Bloomfield, propõe que o alfabetizando

automatize a associação entre um grafema (formado por uma ou duas letras no PB) e

seu respectivo fonema, ambos com a função de distinguir significados. É errônea, pois,

a crítica de que tal método despreze o significado.

Método global: proposto por Nicolas Adam, o método global ou analítico, parte do

todo, seja ele um texto, uma oração ou uma palavra, para decompô-lo até chegar à letra.

Mielinização: processo de maturação dos neurônios, no qual eles são recobertos pela

substância proteica chamada mielina, formando uma bainha isolante que contribui para

aumentar a velocidade de propagação dos impulsos nervosos, atribuindo maior

eficiência à transmissão da informação e, com isto, favorecendo a aprendizagem.

Mudanças diacrônicas: são as mudanças de um estado de língua para outro que

ocorrem no decorrer do tempo, em virtude de vários fatores externos ou internos, tais

como a influência de outras línguas e as próprias tendências do sistema.

Neurociência: estuda a realização física do processo de informação no sistema nervoso

humano animal e humano. A área da neurociência que mais interessa aos processos

envolvidos na leitura e na escrita se denomina neuropsicologia, que estuda a relação

entre as funções neurais e psicológicas, ou seja, quais áreas específicas do cérebro

controlam esta ou aquela função psicológica.

Oclusiva ou consoante menos contínua: resulta de um obstáculo à saída do ar pelo

trato vocal, o qual deverá ser rompido para que se produza qualquer energia, como é o

caso, no português de /p b t d k g/.

Palatizado: som que começa como alveolar e termina como palatal, como acontece

com [d] e [t] antes de [i], tornando-se [dZ] e [tS], como em dia e tia.

PISA: Programa internacional de avaliação comparada, em mais de 60 países, cuja

principal finalidade é produzir indicadores sobre a efetividade dos sistemas

educacionais e de desempenho estudantil voltados às políticas educacionais, fornecendo

orientações, incentivos e instrumentos para melhorar a efetividade da educação na faixa

dos 15 anos; em 2008, também foi pré-testada, no Brasil, uma população cursando o

primeiro ano do ensino médio. O programa é desenvolvido e coordenado

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internacionalmente pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico

(OCDE).

Pistas acústicas na cadeia da fala: é o conjunto de sinais que os receptores auditivos

discriminam para perceber um traço de um fonema. Por exemplo, no traço de

sonoridade ou de voz, que possibilita a distinção entre um /p/ e um /b/ em pato e bato,

os receptores auditivos podem discriminar, entre outras, a diferença da duração para

romper o obstáculo (VOT) na realização de um /p/ (que é maior) e de um /b/; a

quantidade maior de ruído (aspiração) depois da ruptura num /p/ (que é maior) do que

num /b/; a vibração das pregas vocais no /b/, registrada na barra de sonoridade nos

espectrogramas e sua ausência no /p/ e assim por diante.

Píxel: menor ponto que forma uma imagem digital, sendo que o conjunto de milhares de

píxeis forma a imagem inteira.

Propriocepção: refere-se à percepção do próprio corpo: sua postura, movimentos,

mudanças no equilíbrio, bem como suas respectivas sensações de movimento e

posições. Depois de os sensores receberem os sinais, estes são transformados em

potenciais até chegarem à área somestésica (responsável pelo armazenamento de

informações proprioceptivas) (NETO, 2009).

Psicolinguística: ciência que reúne a psicologia e a linguística no que têm em comum,

para a pesquisa dos processos de recepção e produção das mensagens orais e escritas,

bem como da aquisição da língua e da aprendizagem da leitura e da escrita.

Reciclagem dos neurônios: resultado da aprendizagem dos neurônios para novos

reconhecimentos, graças à sua plasticidade.

Semiótica ou semiologia: ciência que estuda a vida dos signos no seio da sociedade. Os

sistemas semióticos podem ser verbais (objeto da linguística), musicais, pictóricos,

arquitetônicos, ou todos os conjuntos estruturados num dado tempo e espaço, cujos

elementos passam a ter os mesmos significados básicos para os membros de uma

mesma comunidade, num dado tempo, como é o caso da moda, do mobiliário, da

alimentação, etc.

Simetrizar: “Os neurônios da visão foram biologicamente programados para simetrizar

a informação. Cada vez que um hemisfério aprende uma informação visual nova, este

traço de memória é imediatamente transmitido ao outro hemisfério. Essa transferência

passaria, por certo, pelo corpo caloso, esse vasto feixe de fibras que liga as áreas

correspondentes dos dois hemisférios. Supondo que esse feixe liga, ponto a ponto, as

áreas visuais simétricas dos dois hemisférios, então a transferência entre os hemisférios

deveria inverter a direita e a esquerda” (DEHAENE, 2012, cap. 7).

Sinapses nervosas: contato entre as extremidades dos axônios e dentritos dos

neurônios, fazendo com que o impulso nervoso passe de um neurônio para o seguinte

por meio dos neurotransmissores.

Somestesia: é a capacidade que homens e animais têm de receber informações sobre as

diferentes partes do seu corpo. Conjunto de sensações corporais como tato, dor etc;

consciência corporal.

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Transparência dos sistemas alfabéticos: diz-se daqueles sistemas onde a relação entre

os grafemas e fonemas é mais ou menos biunívoca. Alguns sistemas são mais

transparentes, como o finlandês, o italiano, outros são bastante transparentes para a

leitura e menos para a escrita como o espanhol e o português e alguns são opacos, como

o inglês e o francês.

Vocábulos átonos ou clíticos: são os vocábulos sem sílaba mais intensa que, por isso,

dependem do vocábulo seguinte (no PB), com exceção dos pronomes oblíquos que

podem ocupar posição no final e até no meio do vocábulo com sílaba mais intensa. Por

exemplo, Gosto de música.

Zona proximal: proposta por Vygotsky, vem a ser a área potencial de desenvolvimento

cognitivo, isto é, a distância entre o nível atual de desenvolvimento da criança,

determinado pela sua capacidade de resolver problemas individualmente, e o nível

potencial, determinado pela resolução de problemas sob orientação de adultos ou em

colaboração com pares mais capazes (os mediadores).

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Gabarito das avaliações de aprendizagem, com comentários

1. Introdução

1. Uma das maiores dificuldades na alfabetização é ensinar os neurônios a dissimetrizar

porque...

a ( ) os neurônios humanos não têm plasticidade para novas aprendizagens.

Incorreta: os neurônios humanos têm plasticidade. Esta é a condição básica para a

aprendizagem.

b ( ) os neurônios só aprendem através do estímulo-resposta-recompensa.

Incorreta: esta é a concepção do Skinner.

c (x) os neurônios, por uma questão de sobrevivência, foram programados para

descartar as diferenças de direção para a esquerda e para a direita e, por isto,

deverão ser reciclados.

Correta.

d ( ) a noção de esquerda e direita depende da internalização do esquema corporal.

Incorreta: o reconhecimento da direção para a esquerda, para a direita, para cima e para

baixo se dá para distinguir as letras entre si, as quais constituem os grafemas e esta

distinção funciona para diferenciar os significados, como em bela/dela.

e ( ) perceber a direção dos traços para a esquerda ou direita não interessa para o

reconhecimento das letras.

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Incorreta. Vide explicação em d.

2. Analfabetismo funcional, desafio para a escola

2. Analfabeto funcional é:

a ( ) o indivíduo que nunca frequentou a escola.

Incorreta, porque a frequência à escola não é critério para caracterizar o analfabeto

funcional. Há alunos no 9º. ano do Ensino Fundamental que não compreendem o que

leem e são analfabetos funcionais.

b ( ) o indivíduo que não sabe o nome das letras.

Incorreta, porque o indivíduo pode recitar o nome das letras, decorado como numa reza,

sem saber seus valores.

c (x) o indivíduo que, mesmo tendo frequentado a escola, não compreende os textos

necessários à sua inserção na sociedade.

Correta.

d ( ) o indivíduo que não fala corretamente.

Incorreta, porque não diz respeito à leitura.

e ( ) o indivíduo que só frequentou a escola até o 3º. ano do Ensino Fundamental.

Incorreta: Embora este tenha sido e ainda é o critério adotado pelo IBGE, já verificamos

que se encontram analfabetos funcionais até no 9º. ano do Ensino Fundamental.

3. As neurociências na alfabetização e leitura 3. O processamento da linha impressa se dá...

a ( ) durante os movimentos em sacada.

Incorreta. Durante os movimentos em sacada, o olho fica cego.

b ( ) abarcando a linha do início à esquerda até o final à direita.

Incorreta, o limite é de 3 ou 4 letras à esquerda do centro do olhar, e de 7 ou 8 à direita.

c ( ) abarcando toda a página, daí o êxito da leitura dinâmica.

Incorreta. Vide b, o que descarta as promessas da leitura dinâmica.

d (x) no momento da fixação, abarcando aproximadamente entre 10 a 12 letras.

Correta.

e ( ) aleatoriamente.

Incorreta. Sem base científica.

4. Desenvolvimento da língua verbal oral

4. Os fatores que intervêm na aquisição da língua oral são:

a ( ) apenas um, o inato, pois só o ser humano pode adquirir a língua oral.

Incorreta, pois três fatores intervêm: o inato, o maturativo e o ambiental.

b ( ) apenas um, o ambiental, pois só a vida em sociedade garante a aquisição da língua

oral.

Incorreta, pois três fatores intervêm: o inato, o maturativo e o ambiental.

c ( ) apenas um, o maturativo, pois se os neurônios não amadurecerem normalmente, a

aquisição da língua oral não ocorrerá.

Incorreta, pois três fatores intervêm: o inato, o maturativo e o ambiental.

d ( ) a relação dialógica entre o bebê e a mãe.

Incorreta, pois três fatores intervêm: o inato, o maturativo e o ambiental; as relações

dialógicas entre o bebê e a mãe integram o fator ambiental.

e (x) o inato, o maturativo e o ambiental.

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Correta.

4. Desenvolvimento da língua verbal oral

4. A aquisição da língua oral e a aprendizagem da leitura e da escrita

a ( ) são a mesma coisa, portanto, deve-se usar também a expressão “aquisição

da leitura e da escrita”.

Incorreta, pois a aprendizagem da leitura e da escrita é sistemática e intensiva.

b (x) não são a mesma coisa, pois, na criança normal, a aquisição da língua oral é

espontânea e até compulsória, enquanto a aprendizagem da leitura e da escrita é

sistemática e intensiva.

Correta.

c ( ) são interdependentes porque a aquisição da língua oral depende da aprendizagem

da leitura e da escrita.

Incorreta, pois a aprendizagem da leitura e da escrita depende da aquisição da língua

oral, mas a recíproca não é verdadeira.

d ( ) ocorrem no mesmo momento na criança.

Incorreta, pois a aquisição da língua oral precede a aprendizagem da leitura e da escrita.

e ( ) ocorrem em sequência: primeiro a criança aprende a ler e a escrever.

Incorreta, pois a aquisição da língua oral precede a aprendizagem da leitura e da escrita.

5. Fundamentos da Alfabetização integral e integrada 5. O fundamento filosófico essencial à alfabetização integrada é:

a ( ) o método hipotético-dedutivo.

Incorreta: trata-se de um método e não de um fundamento filosófico.

b ( ) o método indutivo.

Incorreta: trata-se de um método e não de um fundamento filosófico.

c (x) a interação completa entre as ciências humanas e as ciências biológicas.

Correta.

d ( ) a indissolubilidade entre a física e a química.

Incorreta. Ambas as ciências são físicas.

e ( ) ser contemplada só pelas ciências humanas.

Incorreta: é um fundamento parcial.

6. Métodos de Alfabetização

6. Uma alfabetização efetiva para a leitura e a escrita deve basear-se:

a ( ) no método global, pois o cérebro processa o texto escrito como um todo.

Incorreta. A região occipitotemporal ventral esquerda reconhece as letras a partir de

seus traços invariantes e, num processo de análise e síntese chega aos grafemas,

associando-os aos fonemas; posteriormente as conexões chegam às unidades dotadas de

significado, às palavras, frases, sentenças e, finalmente, ao texto.

b ( ) na nomeação das letras, pois, sem saber o nome das letras, os indivíduos não as

reconhecem.

Incorreta: o reconhecimento da letra tem o objetivo de chegar ao grafema e ao seu

respectivo fonema, ambos com a função de distinguir significados. O que tem a ver o

nome agá da letra H, com o papel que ela desempenha no grafema lh na palavra

velha?

c ( ) apenas na intuição do indivíduo para ir descobrindo sozinho os princípios dos

sistemas alfabéticos.

Incorreta: sem a mediação de alguém preparado para ajudar o aprendiz a reciclar os

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neurônios e, assim, superar as barreiras à alfabetização, dificilmente se chega a bons

resultados.

d (x) nas mais recentes descobertas científicas de que há neurônios especializados

que devem ser reciclados para reconhecer os traços das letras, associando-as aos

fonemas, ambos com a função de distinguir significados.

Correta.

e ( ) no fato de que seja qual for o método, o indivíduo se alfabetizará sem tropeços.

Incorreta: há métodos que dificultam o processo de alfabetização, como o método

global.

7. As principais dificuldades na alfabetização: desmembrar a sílaba - encontros

vocálicos

7. A sílaba no PB é constituída de:

a ( ) duas vogais.

Incorreta, porque no PB apenas uma vogal pode figurar como centro silábico.

b (x) uma e apenas uma vogal precedida e/ou seguida, ou não, por consoante(s).

Correta.

c ( ) uma vogal e de uma consoante obrigatória.

Incorreta. A vogal é obrigatória, mas a consoante, não.

d ( ) uma semivogal como centro silábico.

Incorreta, porque no PB apenas uma vogal pode figurar como centro silábico.

e () uma vogal e de uma semivogal obrigatórias.

Incorreta, porque no PB a vogal é obrigatória, mas a semivogal, não.

8. Outras dificuldades na alfabetização 8. É difícil separar as palavras na escrita porque:

a (x) a cadeia da fala é um contínuo em que não há silêncio separando as palavras

entre si.

b (x) além de a cadeia da fala ser um contínuo, vocábulos muito frequentes são

átonos e são percebidos muito fracamente.

c (x) além de terem pouca saliência perceptual, os vocábulos átonos se referem a

noções gramaticais.

d (x) quando um vocábulo termina por consoante e o seguinte começa por vogal,

ocorre reanálise silábica e as fronteiras entre os vocábulos desaparecem.

e (x) se o segmento final e o inicial dos vocábulos forem idênticos, ocorre reanálise

silábica e as fronteiras entre os vocábulos desaparecem.

Todas corretas.

9. A leitura e o sistema alfabético do português brasileiro

9. O processamento da leitura:

a (x) não se restringe à decodificação.

b (x) vai desde a motivação até a retenção da informação na memória permanente

e ao posicionamento crítico.

c (x) pressupõe que o leitor tenha algum conhecimento prévio sobre o que vai ler.

d (x) só é eficiente se o leitor não titubear diante de cada palavra nova.

e (x) aciona várias regiões do cérebro em paralelo.

Todas corretas.

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10. Critérios para a introdução dos grafemas

10. O ensino-aprendizagem dos grafemas na alfabetização para a leitura deve partir do

pressuposto de que

a ( ) a criança descobre sozinha os princípios do sistema alfabético do PB e, portanto, o

material didático em sala é desnecessário.

Incorreta. A criança necessita da mediação de um professor, de um excelente material

didático e de atividades pedagógicas em sala de aula, todos baseados nas descobertas

mais recentes da ciência, para ultrapassar as dificuldades da alfabetização.

b (x) o material didático deve ser cuidadosamente elaborado, bem como as

atividades pedagógicas em sala de aula, ambos baseados nas descobertas mais

recentes da ciência.

Correta.

c ( ) a melhor ordem de apresentação é a alfabética.

Incorreta. A melhor ordem é a da complexidade crescente.

d ( ) é necessário começar pela escrita, antes da leitura.

Incorreta: sem feedback, não existe aprendizagem.

e ( ) deve-se começar pela letra A e terminar na letra Z.

Incorreta. A melhor ordem é a da complexidade crescente.

11. Como escolher o grafema para as atividades de ensino-aprendizagem

11. Percorrer a letra com o indicador, ao mesmo tempo emitindo o som correspondente

ao valor do grafema serve para:

a (x) fixar a direção dos traços que diferenciam uma letra da outra.

b ( x) reforçar a aprendizagem, associando vários canais de entrada.

c (x) associar grafema ao fonema que ele representa.

d (x) ensinar os neurônios a reconhecerem as letras.

e (x) ensinar que, associando um grafema ao fonema, estamos lidando com

unidades que distinguem o significado.

Todas certas.

12. Quadro fonêmico das consoantes e das vogais do PB 12. As consoantes no PB são fonemas:

a (x) que se realizam com um máximo até um mínimo de fechamento do obstáculo

à saída do ar.

b (x) que só podem ocupar a margem na sílaba.

c (x) que incluem as semivogais /j/ e /w/.

d (x) que se realizam com maior ou menor obstrução à saída do ar.

e (x) que se opõem às vogais.

Todas estão corretas.

13. Valores atribuídos aos grafemas, independentes do contexto grafêmico

13. Valores atribuídos aos grafemas, independentes do contexto...

a ( ) são os valores que dependem das letras que os precedem.

Incorreta, porque os valores independem do contexto.

b ( ) são os valores que dependem das letras que os sucedem.

Incorreta, porque os valores independem do contexto.

c ( ) são os valores que dependem de onde cai o acento de intensidade.

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Incorreta, porque os valores independem do contexto.

d ( ) são os valores que dependem da variedade sociolinguística.

Incorreta, porque os valores independem do contexto.

e (x) são os valores que independem do contexto grafêmico circundante.

Correta.

14. Valores dos grafemas, dependentes do contexto escrito

14. “Valores dos grafemas dependentes do contexto escrito” quer dizer que o valor do

grafema depende:

a ( ) de como se pronuncia a palavra.

Incorreta, pois não é a pronúncia que determina o valor de um grafema na leitura.

b (x) da posição das letras que vêm antes e/ou depois.

Correta.

c ( ) da Academia Brasileira de Letras.

Incorreta.

d ( ) dos dicionários.

Incorreta.

e ( ) de falar mais rápido ou mais devagar.

Incorreta, pois não é a pronúncia que determina o valor de um grafema na leitura.

15. Letras M m - N n em final de sílaba interna para nasalizar a vogal precedente

15. As letras M m e N n em final de sílaba interna

a ( ) representam os fonemas /m/ e /n/, respectivamente.

Incorreta: somente nasalizam a vogal precedente.

b ( ) são lidas como as consoantes [m] e [n] respectivamente.

Incorreta: somente nasalizam a vogal precedente.

c (x) têm a mesma função do til e servem para nasalizar a vogal precedente.

Correta.

d ( ) devem ser ensinadas pelo seu nome eme e ene, respectivamente.

Incorreta.

e ( ) não devem ser ensinadas nesta posição, pois a criança sozinha aprenderá esse valor.

Incorreta.

16. Valores de C c - G g - Q q antes das vogais posteriores

16. O valor do grafema C c depende do contexto grafêmico. Isto significa que:

a ( ) seu valor depende dos acentos gráficos.

Incorreta

b (x) seu valor depende de os grafemas que o seguem representarem vogais

posteriores ou não posteriores.

Correta.

c ( ) C c antes do grafema o tem o valor de /s/.

Incorreta: neste contexto tem o valor de /k/.

d ( ) C c antes do grafema e tem o valor de /k/.

Incorreta: neste contexto tem o valor de /s/.

e ( ) C c antes de a tem o valor de /s/.

Incorreta: neste contexto tem o valor de /k/.

Page 103: SISTEMA SCLIAR DE ALFABETIZAÇÃO Fundamentos Outubro_2013/SISTEMA-SCLIAR-DE... · adquirida espontanea e compulsoriamente por determinantes biopsicólogicos da espécie, enquanto

17. Os dois valores do grafema R r dependentes do contexto grafêmico – o único

valor do grafema RR rr 17. O grafema RR rr... a (x) só pode ocorrer no contexto entre grafemas que representam vogais.

b (x) apesar de suas várias realizações possíveis, conforme a variedade

sociolinguística, o valor é sempre o fonema /R/.

c (x) apesar da aparente complexidade, o valor é independente do contexto, pois

sempre será /R/.

d (x) deve ser ensinado traçando as duas letras e, simultaneamente, emitindo o

som, conforme a variedade sociolinguística.

e (x) deverá ser ensinado inserido em uma palavra.

Todas corretas.

18. Valores previsíveis do grafema X x 1. Quando os valores de um grafema não são previsíveis, como é o caso do grafema X x

entre vogais:

a ( ) não deve ser trabalhado em sala de aula.

Incorreta. Deve ser trabalhado no final da alfabetização.

b ( ) só devem ser trabalhados os valores previsíveis, como em início de palavra.

Incorreta, pois além de haver alguns valores previsíveis do grafema X x que ocorrem no

interior do vocábulo, mesmo os valores imprevisíveis do grafema X x das palavras de

maior frequência de uso devem ser ensinados. c (x) devem se trabalhar as palavras de maior frequência de uso.

Correta.

d ( ) deve-se trabalhar no início da alfabetização.

Incorreta, pois quando os valores de um grafema não são previsíveis, a dificuldade do

aprendizado é muito maior.

e ( ) deve-se começar pela escrita.

Incorreta, pois desde o início do Sistema Scliar de Alfabetização, explicamos que a

recepção (leitura) alimenta e é condição para a aprendizagem da escrita.