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UNIVESIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO CENTRO DE TEOLOGIA E CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA CURSO DE FILOSOFIA A MÚSICA NO MOVIMENTO ARMORIAL A PARTIR DE ARIANO SUASSUNA Faustino dos Santos 1 José Edilson Maurício dos Santos 2 A Arte é assim, um acerto de contas com a realidade (Suassuna, 2000). O MOVIMENTO ARMORIAL Contextualização e Histórico Armorial que significa na língua portuguesa “livro de brasões” foi um movimento que surgiu na década de 70 idealizado por Ariano Suassuna 3 , porém o termo recebe outra conotação passando a ser visto como característica dos esmaltes (cores) da Heráldica (arte ou ciência de descrever brasões). Para entender o porquê da mudança de sentido do 1 Graduando do curso de licenciatura plena em filosofia na Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP) 2012. E-mail: [email protected] 2 Graduando do curso de licenciatura plena em filosofia pela Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP) 2012. E-mail: [email protected] 3 Literata, romancista, dramaturgo, filósofo e apaixonado pela cultura brasileira. Dedicou e dedica sua vida em defesa e resgate da cultura nacional. Foi grande influente e influenciador no meio cultural do estado de Pernambuco e no Brasil; combatente da massificação europeia e da inglória da cultura nacional. (Descrição feita pelos estudantes que desenvolveram o trabalho).

Sobre a música Armorial

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Análise estética da obra de Ariano Suassuna - O movimento armorial com ênfase ao aspecto musical.

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Page 1: Sobre a música Armorial

UNIVESIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCOCENTRO DE TEOLOGIA E CIÊNCIAS HUMANAS

DEPARTAMENTO DE FILOSOFIACURSO DE FILOSOFIA

A MÚSICA NO MOVIMENTO ARMORIAL A PARTIR DE ARIANO SUASSUNA

Faustino dos Santos1

José Edilson Maurício dos Santos2

A Arte é assim, um acerto de contas com a realidade (Suassuna, 2000).

O MOVIMENTO ARMORIAL – Contextualização e Histórico

Armorial que significa na língua portuguesa “livro de brasões” foi um movimento que surgiu na década de 70 idealizado por Ariano Suassuna3, porém o termo recebe outra conotação passando a ser visto como característica dos esmaltes (cores) da Heráldica (arte ou ciência de descrever brasões). Para entender o porquê da mudança de sentido do termo armorial é preciso saber qual a intenção do movimento. Portanto, afirma Ariano “o Movimento Armorial pretende realizar uma arte brasileira erudita a partir das raízes populares da nossa cultura”, com isso podemos perceber a intenção desse grande romancista e literata quando faz a relação do movimento com a arte de caracterizar brasões; portanto, para se descrever os brasões existe uma seleção minuciosa das cores que são puras, límpidas e nítidas, afim de que tal brasão identifique, seja uma marca e identidade de quem o pede pra fazê-lo, já o armorial enquanto movimento tem a intenção de deixar clara a marca artística (brasão) que identifica a arte brasileira.

Esse movimento, de resgaste e valorização da arte nacional, foi de certo modo a continuidade do movimento nacionalista que tinha o mesmo propósito de “independência

1 Graduando do curso de licenciatura plena em filosofia na Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP) 2012. E-mail: [email protected] Graduando do curso de licenciatura plena em filosofia pela Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP) 2012. E-mail: [email protected] 3 Literata, romancista, dramaturgo, filósofo e apaixonado pela cultura brasileira. Dedicou e dedica sua vida em defesa e resgate da cultura nacional. Foi grande influente e influenciador no meio cultural do estado de Pernambuco e no Brasil; combatente da massificação europeia e da inglória da cultura nacional. (Descrição feita pelos estudantes que desenvolveram o trabalho).

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cultural” do Brasil com a cultura e arte europeia “massificada”, é aí também que se começa o estreitamento dos laços entre o erudito e o popular na perspectiva folclórica e de raiz nacional como um todo na tentativa de se criar uma tradição musical e artística cultural.

Um dado interessante diz respeito ao fato de que é desde o século XIX com o movimento do Romantismo que começa a preocupação com ideia de uma cultura brasileira, porém o movimento não partiu somente de ideias puramente estéticas, mas de ideais políticos, foi um movimento que mais tarde seria importante para o armorial, houve, porém, grupos que mesmo com identidade dos românticos combateram algumas questões do movimento uma vez que se percebeu ainda a presença de “teorias raciológicas europeias - que previam um futuro inglório para o Brasil – ou o problema da afirmação da arte e da literatura brasileiras em relação à “alta cultura” europeia”. Mas “o movimento Armorial pode ser situado de certo modo, na linhagem dos diversos artistas e intelectuais que, desde o século XIX, vêm buscando respostas para as questões relativas ao problema da identidade e da cultura brasileiras”.

Ainda uma característica do movimento armorial é a inspiração nas expressões populares do Barroco do século XVIII que influenciou bastante a cultura brasileira. Afirma Ariano Suassuna:

Descobri que o nome “armorial” servia, ainda, para qualificar os “cantares” do Romanceiro, os toques de viola e rabeca dos Cantadores – toques ásperos, arcaicos, acerados como gumes de faca-de-ponta, lembrando o clavicórdio e a viola-de-arco da nossa música barroca do século XVIII. (Suassuna, 1974 p.9).

Além disso, Ariano afirma que o lugar propício para a busca das raízes da cultura nacional é o interior onde os costumes parecem ser mais bem preservados e a mudança parece acontecer mais lentamente, seria mais difícil, portanto, observar nos centros populares e no litoral os resquícios da música primitiva, diferentemente do sertão onde a tradição era mais bem preservada. Afirma ele:

A música sertaneja se desenvolveria em torno dos ritmos que a tradição guardou, não sendo penetrada por “influências externas posteriores ao período do pastoreio” e continuando “como uma sobrevivência arcaica coletiva que o Povo mantém heroicamente”. (Suassuna, 1974 p.59).

Os conceitos de raça e natureza como valorização do meio e mistura da etnia nacional são importantes para pensar a nossa cultura. Para tanto, foi o contato oral a fonte principal para conhecimento e firmamento dos dados que ajudaram e ajudam na construção dessa cultura rica e viva.

Embora a música tenha sido uma grande marca do movimento outras expressões artísticas também fazem parte dessa valorização ela é abrangente. Diz Ariano,

A Arte Armorial Brasileira é aquela que tem como traço comum principal ligação com o espírito mágico dos “folhetos” do Romanceiro Popular do Nordeste (Literatura de Cordel), com a música da viola, rabeca ou pífano que acompanha seus “cantares”, e com a Xilogravura que ilustra suas capas,

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assim como com o espírito e a forma das Artes e espetáculos populares com esse mesmo Romanceiro relacionados. (Suassuna, 1974 p. 7).

Dentre esses ele descreve o sonho de uma arte armorial na dança, teatro, artesanato, monumentos artísticos e arquitetônicos, enfim que não seja restrita, mas geral.

Diante desse apanhado histórico é importante destacar que o movimento armorial ainda é pouco explorado e pouco conhecido, ele possui algumas fazes como a Experimental (1970-1980), Romançal (1980-1995), Arraial (1995 em diante). Houve em 2010 um evento no Paço Alfândega do Recife antigo uma mostra celebrativa dos 40 anos do movimento armorial, e, Dantas Suassuna, artista e filho do Ariano, diz que com esse evento se tinha a pretensão de um novo momento do movimento uma vez que na década de 70 o Ariano Suassuna juntou artistas que tinham a linguagem armorial, mas que, agora era a etapa da estética armorial que tem a pretensão de continuar crescendo e fortalecendo a identidade da arte e cultura genuinamente brasileira, pois “é isso que é o sonho de todo artista armorial”.

Embora seja difícil pensar as partes da arte armorial isoladamente uma vez que um grande diferencial dessa arte reside no fato de que não é só um artista que elabora seus critérios, como na forma europeia, mas vários artistas que se juntam porque percebem características comuns a fim de contribuir para a elaboração e firmamento nossa cultura, e por isso esse movimento é considerado aberto, dedicaremos a partir de agora o foco na questão musical.

A MÚSICA ARMORIAL COMO RECRIADORA DA RAIZ CULTURAL (SONORA) NACIONAL

A música armorial como as demais formas de expressão artístico culturais do movimento armorial tem a pretensão de combater a massificação e a descaracterização da cultura brasileira por parte da indústria cultural que tem o ideal meramente comercial, ou seja, ela pretende firmar-se eruditamente a fim de resgatar, dar identidade e nome a forma de expressão cultural do Brasil, uma vez que foi difundida a forma de apreciação da música clássica que, como a cultura de massa, só visa à satisfação momentânea do indivíduo que a contempla. Além disso, a música armorial, diferente da música clássica, não tem pretensão de criar uma teoria, mas de criar a própria arte brasileira.

Portanto a idealização da música armorial por Ariano Suassuna tem a característica forte de combate a cultura musical europeia massificadora. Em análise vemos que esse combate parte da crítica de que a música erudita é contrária a qualquer expressão folclórica ou popular. Para tanto, Suassuna pensa a música armorial pela recriação da música popular a partir “dos elementos eruditos já contidos nela: músicas tradicionais dos romances ibéricos, frequentemente compostas por músicos da Corte que posteriormente foram assimilados pela cultura popular, música religiosa introduzida pelos jesuítas”, ainda por meio da assimilação das melodias barrocas preservadas pelo romanceiro popular, como os sons da viola, dos aboios, das rabecas dos cantadores, pífanos.

Na busca por esses elementos puros da música eram vistos nas músicas a sequencia melódica e harmônica que preservassem as características dos elementos já descritos. Para se

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chegar à composição da música armorial era preciso entender alguns caminhos que Suassuna descreve:

Partindo da simples imitação das formas populares, passará ela (a superação do popular) por uma fase de transposição para chegar finalmente à recriação, sua forma mais alta. A imitação é, no caso, o campo do compositor popular; a recriação, a do erudito; e a transposição, o de uma espécie intermediária, importantíssima para a criação de uma música nacional (SUASSUNA, 1951, p.44-45).

Diante disso era preciso entender a diferença da musica que se pretendia no movimento nacionalista e a que se propõe no movimento armorial: “A nacionalista parte de uma estrutura já estabelecida, europeia levando elementos da cultura popular. A armorial é o inverso: mergulha na música autêntica do Nordeste e traz alguns elementos da cultura erudita para si”. (Diário de Pernambuco, Recife, 16 de junho de 1997, CPM).

As características da Música Armorial foram definidas a partir de depoimentos de músicos do movimento como Antônio Madureira, Clóvis Pereira, Cussy de Almeida, Jarbas Maciel, Capiba, Guerra Peixe, Marlos Nobre e Camargo Guarnieri dentre outros que trabalharam no processo de pesquisa. Tais características são tidas a partir da melodia, forma e textura, ritmo, harmonia, afinação e timbre.

Sem o desejo de entrar em questões técnicas no que diz respeito a formação e composição da música armorial, percebe-se que ela na junção de instrumentos populares como a rabeca, gaita, pífano, viola nordestina, tambor, zabumba, matraca, caixa, ganzá, marimbau e berincelo tem o diferencial das demais músicas clássicas, pois ela tem um estilo próprio de ser. Guerra Peixe em entrevista para Vieira (1985) afirma que o que está escrito numa partitura não é suficiente para interpretar uma obra, ele diz que é preciso existir tradição de interpretação, bem como de composição, pois mesmo os músicos letrados não conseguem fazer o que aqueles de ouvido conseguem. “A intimidade com ‘as falas’ das nossas culturas, seus acentos, ritmos, entre outros aspectos musicais, são essenciais á interpretação das nossas músicas”.

Como a cultura brasileira é diversificada e rica no que diz respeito à pluralidade derivado de um processo de interações culturais o movimento armorial une a tradição oral e popular com a escrita e erudita por artistas cultos populares com a música (e outras expressões artísticas). A música armorial, levando em consideração esses aspectos, reflete as características do povo brasileiro, seus valores, atitudes e crenças. Ela tem a finalidade estética de recriar, a partir dos sons, o espaço imaginário que é vislumbrado pelos armorialistas.

Ariano com esse ideal tem a intenção não somente de ouvir e fazer os outros ouvirem o timbre dos instrumentos populares que tocam a música armorial, mas tem o desejo de ouvir e vislumbrar a paisagem sonora que a junção dos sons dos instrumentos evocam que é o cenário arcaico, com tons fortes do nordeste. Nisso talvez consista a dimensão da musica armorial, é fazer com que aquilo que com o tempo foi esquecido pela maioria e por influência da massificação seja relembrado e valorizado como sendo nossa raiz cultural.

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REFERÊNCIAS

ALBUQUERQUE JUNIOR, Durval Muniz de. A invenção do Nordeste e outras artes. 2. ed FJN, Ed. Massanguara. São Paulo: Cortez, 2001

LIMA, Ana Paula Campos. O movimento Armorial e suas fases. Bolsa de pesquisa. Curso de Comunicação Social. UNICAP, 2000.

NÓBREGA, Ariana Perazzo da. A música no movimento Armorial. Artigo on-line Disponível em http://www.anppom.com.br/anais/anaiscongresso_anppom_2007/musicologia/musicol_APNobrega.pdf> Acesso <25/05/2012, 10:20>

SUASSUNA, Ariano. O movimento Armorial. Recife: Editora Universitária – UFPE, 1974: 2 ed. Separata de Revista Pernambucana de Desenvolvimento. Recife: Condepe, jan-jun. 1977: 7.

_________________. Ao Sol da Prosa Brasiliana. In: Cadernos de Literatura Brasileira. Nov. de 2000, nº 10.

VENTURA, Leonardo Carneiro. Musica dos Espaços: Paisagem sonora do nordeste no movimento Armorial. Dissertação de mestrado no curso de Pós-Graduação em História. Natal. UFRN, 2007.

(Sem Descrição do Autor) Introdução de artigo. Disponível em < http://www2.dbd.puc-rio.br/pergamum/tesesabertas/0410541_06_cap_01.pdf > PUC-RJ Certificado Digital Nº: 0410541/CA.