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SOCIEDADE ALTERNATIVA: A ANARQUIA NA OBRA DE RAUL SEIXAS Johnny Àtila Bragato [email protected] Orientadora: Profª.Mestre Ana Claudia Fernandes Gomes

SOCIEDADE ALTERNATIVA: A ANARQUIA NA OBRA DE RAUL … · 2010-11-26 · leitura sobre a biografia de Raul Seixas em centros culturais. Foram analisadas as obras de Raul Seixas, especialmente

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SOCIEDADE ALTERNATIVA: A ANARQUIA NA OBRA DE RAUL

SEIXAS

Johnny Àtila Bragato

[email protected] Orientadora: Profª.Mestre Ana Claudia Fernandes

Gomes

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Resumo

A proposta deste trabalho de pesquisa é discutir a anarquia nas letras musicais de Raul Seixas, analisar os conflitos políticos e suas letras filosóficas com fortes críticas ao governo. Raul Seixas foi um ícone na história da música brasileira, com seu jeito irreverente e único, foi exilado para os Estados Unidos devido à sociedade alternativa que Raul pensava em fundar, uma sociedade libertária com os conceitos e valores recriados. A anarquia prevalecia em Raul Seixas mesmo quando o regime governamental da época era ditatorial. Anarquia é um povo sem governo, o ser humano emancipado de qualquer tutela governamental, uma

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exigência à liberdade. No mundo, a primeira pessoa a se intitular anarquista foi Pierre Joseph Proudhon, mas foi no Brasil que houve uma das primeiras experiências anarquistas do mundo, nas margens da Baía de Babitonga no Rio de Janeiro em 1842. A proposta é analisar as obras de Raul Seixas, especificamente, a “Sociedade Alternativa” e relacioná-las ao conceito de anarquia.

Palavras-Chave: Anarquia; Música;

Liberdade e Revolução.

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“Ao eterno maluco beleza”

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SOCIEDADE ALTERNATIVA: A ANARQUIA NA OBRA DE RAUL SEIXAS

Johnny Àtila Bragato [email protected]

Orientadora: Profª Mestre Ana Claudia Fernandes Gomes

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Introdução

O presente artigo tem como

objetivo discutir a anarquia nas letras

musicais de Raul Seixas. Segundo o

escritor Essinger (2005), o músico é

considerado um poeta, um filósofo, um

artista, este é Raul Seixas. Uma figura

irreverente e única, conhecido como o

percussor do rock brasileiro. Nascido na

Bahia, em 1945, teve uma grande

carreira com vinte e seis álbuns e uma

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bibliografia feita pelo mesmo aos sete

anos de idade, (As aventuras de Raul

Seixas na cidade de Thor, 1983).

Uma vida extremamente marcada

principalmente por conflitos políticos,

devido suas letras polêmicas e

filosóficas, com fortes críticas ao

governo, a maior delas e de maior

repercussão até hoje, foi a letra da

música “Sociedade Alternativa”. Em

entrevista realizada no programa Jô

Soares no ano de 1989, entre muitas

frases ele diz que: Sociedade

Alternativa significava os conceitos e

valores completamente trocados, ”o

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advogado era o não advogado, o

policial era o não policial”.

Ainda na perspectiva de Essinger

(2005), com Raul Seixas a anarquia

prevalecia constantemente na sua

ideologia de “sociedade libertária”, o

que culminou com a sua retirada do país

durante o governo Geisel no ano de

1974, em que havia o regime ditatorial.

E qualquer movimento anarquista era

um manifesto totalmente subversivo.

O procedimento metodológico

desta pesquisa compreende vários

momentos: levantamento bibliográfico,

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leitura sobre a biografia de Raul Seixas

em centros culturais.

Foram analisadas as obras de Raul

Seixas, especialmente a “Sociedade

Alternativa”, e relacionadas ao conceito

de anarquia mostrando o intuito de Raul

Seixas, ao manifestar-se em suas letras

e frases com conteúdos anarquistas,

despertando um grito de liberdade de

maneira lúcida e inteligente, sem

qualquer ato de vandalismo ou

desrespeito ao próximo, criando uma

sociedade em que todos seriam livres e

tirar esse rótulo de que anarquia é

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sinônimo de bagunça e sim, uma

conquista por alguma coisa.

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Raul Seixas

Na perspectiva de Essinger (2005),

havia muito mais que um destino

corriqueiro esperando por aquele

garoto, Raul Santos Seixas, filho de

Raul Varella Seixas e Maria Eugênia

Santos Seixas, nascido em Salvador, na

manhã do dia 28 de junho de 1945. Aos

seis anos, logo após ter sido

alfabetizado, começaria a expressar

suas interrogações sobre o mundo, em

escritos. A educação formal, porém,

não seria o caminho a seguir, por mais

que o menino gostasse de ler e escrever,

e a repetência por três anos da segunda

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série do ginásio foram o seu destino

fatal. Algo que há de se entender, a loja

de discos da esquina estava mais cheia

de encantos do que a sala de aula. Aos

dezoito anos inicia-se sua carreira como

cantor, em uma banda chamada The

Panters, sendo oficializada mais tarde

em 1968, como Raulzito e os Panteras.

Segundo Thildo Gama (1995), foi

no festival Phono 73, que Raul Seixas

se consagrou como intérprete do rock.

A partir daí, com uma vida

extremamente marcada, não só pela sua

genialidade, mas, principalmente por

vários conflitos políticos, com fortes

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críticas ao governo e aos artistas

moralistas, que pregavam o que não era

a realidade naquele momento.

Para Tárik de Souza, Raul

descobriu quando menino, que “a vida é

um palito de fósforo que vai se

queimando até apagar para sempre”. Foi

daí então que surgiu a urgência,

juntando-se à angustia que fizeram com

que atravessassem anotações e poemas

desse mito messiânico, alvejado de

incertezas, junto de suas aventuras

destemidas de uma artista em busca de

sua iluminação. (apud Essinger, 2005,

p.1).

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Segundo Luciane Alves (1993),

criticar é característica de Raul Seixas,

principalmente tratando-se de governo

ditador, a maior de suas críticas e de

maior repercussão até hoje, foi a

chamada “sociedade alternativa”. Que

representava os conceitos e valores

completamente diferentes, uma

sociedade libertária de regime

governamental. Porém mediante a este

conflito direto, Raul Seixas e seu

parceiro Paulo Coelho tiveram que se

exilar do País em 1973, no período

ditatorial do governo de Ernesto Geisel

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em que nada que o insultasse podia ser

dito.

Em um show realizado por Raul

Seixas acompanhado de Paulo Coelho,

definiram em um panfleto, as regras de

tal sociedade alternativa, com um

manifesto altamente subversivo para o

sistema na época, com um modelo

social anárquico que dizia:

O espaço é livre, todos tem direito de ocupar seu espaço, o tempo é livre, todos tem que viver em seu tempo e fazer jus as promessas, esperanças e armadilhas, a colheita é livre, todos tem

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direito de colher e se alimentar do trigo da criação, a semente é livre, todos tem direito de semear suas idéias sem qualquer coerção da Inteligênzia ou da burricia não existe mais a classe dos artistas, todos nos somos capazes de plantar e de colher, todos nos vamos mostrar ao mundo e ao Mundo, a nossa capacidade de criação, todos nós somos escritores, donas de casa, patrões e empregados, clandestinos e caretas, sábios e loucos, e o grande milagre não será mais ser capaz de andar nas nuvens ou caminhar sobre as águas, o dia, de manhã até a noite seremos capazes de caminhar

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sobre a terra. (Revista caros amigos- Especial: o fenômeno Raul Seixas- Agosto, 1999).

Para Elton Frans (2000), o

idealismo forte com idéias geniais era

colocado por Raul Seixas em suas obras

com uma linguagem erudita, pois

mesmo com sua aparência popular

consegue atingir seu público tornando-

se um verdadeiro fenômeno da música

brasileira.

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Anarquia

Na perspectiva de Reclus (2002),

anarquia é um povo sem governo, o

indivíduo deve ser emancipado de

qualquer tutela governamental, uma

exigência à liberdade. O ser humano

não terá outras obrigações que sua

própria consciência imponha, possuindo

o ato de entregarem-se às inspirações

reflexivas de sua iniciativa pessoal,

possuindo o direito de tentar todas as

experiências que lhe pareçam

desejáveis ou fecundas.

O principal foco acaba por ser, um

segmento de sua própria consciência

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transportada para si de modo

encorajador e reflexivo, uma iniciativa

pessoal. Como ideal social e com

realização efetiva, anarquia quer dizer

uma maneira de viver na qual o

indivíduo, desembaraçado de toda

coação legal e coletiva que tenha

serviço de força pública, aceitará

livremente todos os acordos que lhe

liguem aos seus semelhantes, sempre de

caráter revogável, e não querendo que

ninguém sofra com sua autoridade

resistirá sofrer com a autoridade do

outro, seja quem seja. Assim, segue

dono soberano de si mesmo,

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direcionando sua vida da utilização das

suas faculdades, dos seus

conhecimentos, de suas relações de

simpatia, amizade e amor. O indivíduo

organizaria sua existência como melhor

lhe conviesse, desenvolvendo-se em

todos os sentidos à sua maneira, sem

mais limites que os assinalados pela

liberdade, plena e inteira, dos demais

indivíduos.

Como esse modo de viver implica

em um regime social no qual está

desterrada toda idéia do salário e

assalariado, do capitalista e proletário,

do amo e servo, de governante a

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governado, uma definitiva exigência à

liberdade de expressão do ser humano.

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Movimentos Anarquistas

Segundo Elisée Reclus (2002), no

mundo existiram diversas

manifestações anarquistas, mas a

primeira pessoa que intitulou-se

“anarquista” foi Pierre Joseph Proudhon

(1809/1865) que conseguiu melhor

definir esse conceito, que consiste na

subdivisão temporária ou permanente

de uma sociedade libertária, durante o

século XIX e início do século XX.

Ainda na visão de Reclus, anarquismo

era conhecido como uma ideologia que

pregava sempre os assassinatos e

explosões devido às ações de pessoas,

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como o russo Nechaiev e o francês

Ravachol. Existiram, no entanto, outros

anarquistas como Leon Tostoi que

acreditava que o caminho da anarquia

era a não-violência.

Segundo Ricardo Lombardi (2008,

p. 92-93), houve um movimento muito

importante, na década de 1960, que foi

a Revolta dos Estudantes Franceses,

descontentes com os regimes

totalitários na época da guerra fria, em

Paris.

Revoltados com o governo do

general Charles de Gaulle,

principalmente quando os militares

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recebem ordens para controlar o levante

na universidade Sorbonne em Paris, os

estudantes construíram uma barricada, e

mesmo estando em um número inferior,

romperam a pressão dos militares e

conseguindo exigir para seu povo o que

eles não tinham que era a própria

liberdade.

José Oiticica (2006) considera

que foi no Brasil que começou

realmente a experiência anarquia,

porém, não havia sido criado o termo

que chamamos de Anarquia. O episódio

ocorreu no Rio de Janeiro, nas margens

da Baía de Babitonga, próximo a uma

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cidade histórica chamada de São

Francisco do Sul. Em 1842, Dr. Benoit

Jules Mure, que o inspirou nas teorias

de Fourier, instalou o Falanstério do

Saí, reunindo os colonos franceses em

1841, houve dissidências e um grupo

dissidente, a frente do qual estava

Michel Derrion, constituiu outra

colônia a algumas léguas do Saí, em um

lugar chamado Palmital: “A Colônia do

Palmital”. Mure conseguiu apoio do

coronel Oliveira Camacho e do

presidente da província de Santa

Catarina, Antero Ferreira de Brito. Esse

apoio foi-lhe fundamental para

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posteriormente conseguir a ajuda

financeira do Governo Imperial do

Brasil para seu projeto. O movimento

anarquista não advoga em favor do

ateísmo ou agnosticismo. O problema,

portanto, se consolida de forma

institucional da fé religiosa, tornando-se

instrumento de exploração dos homens.

Raul Seixas e Anarquia

Analisando as obras de Raul Seixas,

especificamente a sociedade alternativa

e relacionando-as ao conceito de

anarquia, sociedade alternativa foi algo

muito discutido no Brasil enquanto

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Raul estava no auge de sua meteórica

carreira. Até os dias de hoje, as pessoas

almejam alcançar essa sociedade,

infelizmente, o que ela tem de fama tem

de escassez teórica. Para Raul Seixas,

não era tão importante elaborar

informações concretas sobre a

sociedade alternativa, isso só iria criar

mais regras, o que seria um contra-

senso. Segundo Essinger (2005),

”maluco beleza” foi o apelido que se

difundiu em 1977, após o lançamento

do álbum “o dia em que a terra parou”,

pois neste álbum havia uma música

composta por ele, que carregava suas

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características pessoais, chamada

“maluco beleza”. Raul defendia a

liberdade acima de tudo, onde cada um

poderia fazer o que quisesse. Uma

sociedade contendo regras, seu próprio

dinheiro, documentos não tem nada de

alternativa, e Raul não defendia a

criação de uma sociedade nesses meios,

e sim, uma revolução interna do ser

humano, uma sociedade livre, o porquê

quanto maior o número de regras,

menor a chance de alguém tornar-se

uma metamorfose ambulante. Portanto,

não tem como falar de Raul Seixas sem

mencionar anarquia, que significa uma

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ausência de coerção e de ordem, que

denomina-se sociedade alternativa.

O intuito de Raul Seixas ao

manifestar-se em suas letras e frases

com conteúdos anarquistas era de certa

forma um grito à liberdade, de maneira

lúcida e inteligente, sem hipótese

alguma com algum ato de vandalismo

ou desrespeito ao próximo, criando uma

sociedade em que todo mundo se ajude,

não iria faltar nada para ninguém, não

haveria violência, todos seriam livres,

tirar esse rótulo de que anarquia é

sinônimo de desordem e sim, trazer ao

povo a importância de nossa liberdade.

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Em 1974, Raul Seixas compôs a

letra Sociedade Alternativa. do álbum

Gîtâ que dizia:” Se eu quero e você

quer; tomar banho de chapéu; vou

discutir Carlos Gardel; Vou esperar

Papai Noel, então vá... Faz o que tu

queres, pois é tudo da lei.

Viva! Viva! Viva Sociedade

Alternativa!”

Em 1988, o cantor compõe

uma nova versão da mesma música

chamada “a lei, do álbum a pedra do

Gênesis” que diz: “Todo homem tem

direito de pensar; de dizer e escrever;

direito de viver, pela sua própria lei.

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Direito de amar; como e quem ele

quiser... Viva, a lei do forte! Viva, essa

é a nossa lei e a alegria do mundo!

Viva Sociedade Alternativa!”

No final de sua carreira,

Raul Seixas gera certa polêmica, pois

revive todas as repressões sofridas por

ele. Nessa letra, mesmo doente, ele

consegue atenção para sua tão sonhada

“Sociedade Alternativa”.

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Considerações Finais

De modo reflexivo, foram

analisados críticos da sociedade

libertária, foi percebido que a falta de

informações dos nossos direitos podem

levar-nos a um rumo confuso e perdido.

Os fatores que de forma direta ou

indireta possam fazer com que as

pessoas se contrariem em procurar

pelos seus ideais, devem ser analisados

e estudados seriamente. O direito de

viver já vem através de nosso

nascimento, ninguém pode nos impedir

de viver. A proposta de Raul Seixas e

anarquia se agrupam através do caos

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que o mundo se encontra diante de

situações adversas, a sociedade

alternativa proporciona ao homem a

opção de escolher de fato outra maneira

de viver.

Um lugar sem governo, sem

guerras, sem conflitos, sem fome e sem

orgulho, seriam os homens governantes

de si mesmo. Assim, sonhava Raul

Seixas, buscando sempre a liberdade

independente de quem cruzasse seu

caminho, lá estava ele se defrontando

novamente, com os regimes políticos

implantados.

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Viva Raul Seixas, viva o mundo

com liberdade e mais democracia, viva

a anarquia com inteligência e

propósitos de melhoria de vida, viva a

sociedade alternativa.

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Referências

ALVES, Luciane. Raul Seixas: E o

sonho da sociedade alternativa. 1

ed.São Paulo: Martin Claret, 1993

ESSINGER, Silvio. O baú do Raul

Revirado. 1ed. São Paulo: Ediouro,

2005

FRANS, Elton. Raul Seixas: A história

que não foi contada. 1 ed. São Paulo:

Irmãos Vitale Escritores, 2000

GAMA, Thildo. Raul Seixas:

Entrevistas e depoimentos. 1 ed. São

Paulo: Pen, 1997

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OITICICA, José. A doutrina

anarquista ao alcance de todos. 1 ed.

São Paulo: Achiamé, 2006

RECLUS, Élisée. A evolução, a

revolução e o ideal anarquista. 1

ed.São Paulo: Imaginário, 2002

REVISTA CAROS AMIGOS

ESPECIAL. O Fenômeno Raul Seixas.

São Paulo: Casa amarela. v1, n.01, Jul,

1999

REVISTA CARAS. A música do

século. São Paulo: Abril. v1, n.285,

Ago, 1997

40

REVISTA GUIA DO ESTUDANTE.

Atualidades. São Paulo: Abril:

Fundação Roberto Civita, v7, n.1, 1º

semestre, p. 92-93, 2008