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Soluções para Recuperação de Encosta a Montante do Circuito de Geração da AHE Salto Pilão, Vale do Itajaí, após a Ocorrência de Debris Flow Cesar Schmidt Godoi Tractebel Engineering – Leme, Florianópolis, Brasil, [email protected] Márcia Collares Meirelles Tractebel Engineering – Leme, Florianópolis, Brasil, [email protected] Juliana Francisca Corrêa Tractebel Engineering – Leme, Florianópolis, Brasil, [email protected] Alexandre Conti ALTA Geotecnia, Rio de Janeiro, Brasil, [email protected] Renato Geraidine ALTA Geotecnia, Rio de Janeiro, Brasil, [email protected] Álvaro Viana ALTA Geotecnia, Rio de Janeiro, Brasil, [email protected] Evanio Travassos Prado Lopes CESAP / OPERSUL, Apiúna, Brasil, [email protected] RESUMO: Este trabalho descreve as soluções adotadas em projeto para contenção e recuperação da encosta, localizada a montante do circuito de geração da AHE Salto Pilão, situada no Vale do Itajaí, Santa Catarina, após a ocorrência de um debris flow com aproximadamente 600 m de extensão por 30 m de largura. Após uma análise detalhada do problema, envolvendo mapeamentos geológico- geotécnicos de campo e diversas análises de estabilidade, chegou-se a um conjunto de soluções envolvendo cortinas atirantadas, reconformação de taludes, demolição de blocos rochosos, muros de concreto ciclópicos, aplicação de bioengenharia, revegetação e a implantação de uma barreira dinâmica de alto impacto. PALAVRAS-CHAVE: Deslizamento de encosta, Debris flow, obras de contenção, Vale do Itajaí. 1 INTRODUÇÃO A ocorrência de grandes catástrofes naturais envolvendo grandes movimentos de massa são historicamente observadas no Estado de Santa Catarina, principalmente na região do Vale do Itajaí em função de suas condições geomorfológicas. Massad (2003) entende que as causas dos escorregamentos são, antes de tudo, “naturais”, pois uma tendência na natureza à peneplanização, ou seja, os solos das encostas tendem a descer para atingir um nível de base. Esse autor ainda cita que os fatores de segurança em encostas estão, em geral, próximos de 1.0, bastando uma chuva atípica ou uma pequena intervenção do homem para disparar o “gatilho” do escorregamento. Neste trabalho, estão apresentados os estudos e projetos que visam à recuperação de uma encosta localizada acima do circuito de geração da AHE Salto Pilão, no Vale do Itajaí, em Santa Catarina. O trabalho foi dividido de acordo com o Projeto de Recomposição da Encosta, inicialmente com as soluções conceituais e, em seguida, com os seus detalhamentos por ordem

Soluções Para Recuperação de Encosta_UHSP

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Artigo publicado no COBRAE 2013. Deslizamento de terra, contenção de encostas e taludes.

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  • Solues para Recuperao de Encosta a Montante do Circuito de Gerao da AHE Salto Pilo, Vale do Itaja, aps a Ocorrncia de Debris Flow Cesar Schmidt Godoi Tractebel Engineering Leme, Florianpolis, Brasil, [email protected] Mrcia Collares Meirelles Tractebel Engineering Leme, Florianpolis, Brasil, [email protected] Juliana Francisca Corra Tractebel Engineering Leme, Florianpolis, Brasil, [email protected] Alexandre Conti ALTA Geotecnia, Rio de Janeiro, Brasil, [email protected] Renato Geraidine ALTA Geotecnia, Rio de Janeiro, Brasil, [email protected] lvaro Viana ALTA Geotecnia, Rio de Janeiro, Brasil, [email protected] Evanio Travassos Prado Lopes CESAP / OPERSUL, Apina, Brasil, [email protected] RESUMO: Este trabalho descreve as solues adotadas em projeto para conteno e recuperao da encosta, localizada a montante do circuito de gerao da AHE Salto Pilo, situada no Vale do Itaja, Santa Catarina, aps a ocorrncia de um debris flow com aproximadamente 600 m de extenso por 30 m de largura. Aps uma anlise detalhada do problema, envolvendo mapeamentos geolgico-geotcnicos de campo e diversas anlises de estabilidade, chegou-se a um conjunto de solues envolvendo cortinas atirantadas, reconformao de taludes, demolio de blocos rochosos, muros de concreto ciclpicos, aplicao de bioengenharia, revegetao e a implantao de uma barreira dinmica de alto impacto. PALAVRAS-CHAVE: Deslizamento de encosta, Debris flow, obras de conteno, Vale do Itaja. 1 INTRODUO A ocorrncia de grandes catstrofes naturais envolvendo grandes movimentos de massa so historicamente observadas no Estado de Santa Catarina, principalmente na regio do Vale do Itaja em funo de suas condies geomorfolgicas. Massad (2003) entende que as causas dos escorregamentos so, antes de tudo, naturais, pois h uma tendncia na natureza peneplanizao, ou seja, os solos das encostas tendem a descer para atingir um nvel de base.

    Esse autor ainda cita que os fatores de segurana em encostas esto, em geral, prximos de 1.0, bastando uma chuva atpica ou uma pequena interveno do homem para disparar o gatilho do escorregamento. Neste trabalho, esto apresentados os estudos e projetos que visam recuperao de uma encosta localizada acima do circuito de gerao da AHE Salto Pilo, no Vale do Itaja, em Santa Catarina. O trabalho foi dividido de acordo com o Projeto de Recomposio da Encosta, inicialmente com as solues conceituais e, em seguida, com os seus detalhamentos por ordem

  • de prioridade de execuo. As Figuras 1 e 2 apresentam vistas de dois trechos do movimento, com detalhe para as grandes dimenses dos blocos rochosos remanescentes e a extensa mobilizao de terra, devastando toda a vegetao outrora existente.

    Figura 1. Cicatriz da corrida de massa.

    Figura 2. Detalhe da cicatriz do movimento, com a nfase

    para os grandes blocos de rocha encontrados. Atualmente foi iniciada a execuo dessas solues, sendo que as cortinas atirantadas e o retaludamento j foram finalizados, alm da recuperao do sistema de drenagem superficial e a realocao do sistema de cabeamento da Usina, que havia sido afetada pelo movimento de massa. 2 REA DE ESTUDOS A Usina de Aproveitamento Hidreltrico AHE Salto Pilo est localizada no Rio Itaja-Au. Suas composies se localizam nos municpios

    de Lontras, Ibirama e Apina, Estado de Santa Catarina. Os movimentos de massa que ocorrem no Vale do Itaja esto associados s suas condicionantes geolgicas, geomorfolgicas e hidrogeolgicas, caracterizadas por acentuados desnveis, vertentes abruptas e capas de solos sobre rochas pouco espessas. Em geral, eles ocorrem em perodos de intensa precipitao pluviomtrica. 2.1 Breve Descrio Geolgica A regio do AHE Salto Pilo compreende rochas pertencentes Bacia do Itaja, uma Bacia vulcano-sedimentar do final do Proterozico constituda por sequncias sedimentares de ambientes marinhos, rasos a profundos, como os arenitos, arcseos, folhelhos, siltitos, conglomerados e ritmitos, as rochas metamrficas de alto grau, como os gnaisses, gnaisses granulticos e granulitos, e corpos de rochas cidas resultante de vulcanismo concomitante histria de evoluo da Bacia, como o sienogranito e o riolito. Estas unidades esto em contato discordante com o corpo grantico da srie Subida. A coluna estratigrfica, de acordo com o Mapa Geolgico do Estado de Santa Catarina na escala 1:500.000 (DNPM, 1987), prev a ocorrncia da Formao Campo Alegre e da Sute Intrusiva Subida. Durante a investigao geolgica realizada, observou-se que a parte superior da encosta est desenvolvida sobre o macio rochoso do Granito Subida, o qual caracterizado por blocos e mataces, imbricados ou in situ, em meio a uma extensa cobertura de solos (residuais e transportados) de at 4 metros de espessura (IPT, 2005). Estes, por sua vez, esto sobrejacentes a solos de alterao da rocha matriz e horizontes saprolticos, os quais, segundo as sondagens, podem apresentar espessuras superiores a 30 metros em alguns locais. Na poro inferior da encosta, observou-se em campo afloramento de riolitos e metassedimentos da Formao Campo Alegre.

  • 2.2 Caracterizao do Movimento de Massa Segundo Cruden e Varnes (1996), o termo fluxo de detritos ou debris flow representa um fenmeno completo de movimento de massa (escorregamento e propagao de material grosseiro), o qual inclui o incio do deslocamento em uma declividade acentuada, escoando rapidamente em um canal confinado e se depositando em um leque de detritos. A Figura 3 apresenta um modelo esquemtico de debris flow, enquanto a Figura 4 mostra a geometria tpica do movimento.

    Figura 3. Modelo esquemtico de um fluxo de detritos

    (Highland e Bobrowsky, 2008).

    Figura 4. Geometria de um debris flow (Kobiyama et al,

    2010). O debris flow em questo se iniciou no alto da encosta, imediatamente a jusante da estrada de terra, uma rodovia municipal que d acesso usina, e percorreu cerca de 600 m de extenso carreando solos, blocos rochosos soltos e vegetao, at atingir a regio prxima ao circuito de gerao, na base da encosta, afetando parte da Ferrovia das Bromlias, a qual explorada para fins tursticos.

    A Figura 5 mostra a imagem de satlite com alguns pontos principais identificados, bem como a cicatriz de ruptura (em vermelho), locada por meio de levantamento planialtimtrico.

    Figura 5. Imagem de satlite detalhando o movimento

    (sobreposio de imagens do Google Earth). A estrada localizada na parte superior da encosta foi implantada em uma seo de corte. O trecho onde o movimento se iniciou est em curva e em declive, de modo que o escoamento superficial das guas das chuvas propiciou, ao longo do tempo, um intenso processo erosivo em pontos imediatamente a jusante, onde existe uma camada de 1 a 2 metros de solo coluvionar. A corrida de massa foi deflagrada por meio de uma ruptura planar ocorrida neste trecho. Os mataces enterrados na parte superior foram exumados e passaram a fazer parte do movimento, ganhando cada vez mais energia a partir do momento em que outros elementos, como rvores e o solo em forma de lama, tambm eram mobilizados. Isto aumentou consideravelmente o poder destrutivo do debris flow. meia encosta, ao encontrar knickpoints patamares e gargalos formados por afloramentos rochosos a corrida foi perdendo a fora e, assim, reduzindo sua energia. A encosta, com cerca de 450 metros de altura, foi mobilizada por 600 metros de distncia e 30 metros de largura por intermdio deste movimento.

  • 3 METODOLOGIA Para desenvolvimento do estudo e, consequentemente, dos projetos, foi realizado inicialmente um mapeamento geolgico-geotcnico ao longo de todo o escorregamento e entorno, com o objetivo de se compartimentar os domnios geolgicos predominantes, entender os principais mecanismos de instabilizao, e avaliar solues preliminares para cada ponto analisado. Para fins de orientao, utilizou-se o Projeto da Implantao da Usina, com as investigaes geotcnicas (campo e labratrio) e topografia realizadas, e os mapas geolgicos da regio. Em seguida, com base nos dados e informaes obtidas, modelou-se geotecnicamente cada um dos diferentes trechos da cicatriz, com nfase na crista, face e base da encosta. Foram utilizados para as anlises os perfis do terreno e os resultados dos ensaios triaxiais executados. Em alguns trechos, com a alterao das condioes estratigrficas em funo da corrida de massa, solicitou-se a complementao das sondagens. A Figura 6 apresenta um perfil representativo do subsolo na regio prxima crista do movimento.

    Figura 6. Perfil Estratigrfico da crista.

    Durante a fase de elaborao dos projetos, foram verificadas as diversas solues possveis para todos os pontos afetados. Como a rea afetada se apresentou durante o estudo bem mais ampla do que inicialmente estimada, adotou-se a metodologia de executar o projeto em etapas, levando em considerao a prioridade das solues, sob o ponto de vista de segurana e da concessionria, e o custo-benefcio de cada uma delas. Os dados obtidos em campo, conjugados com retroanlises, possibilitaram refinar a determinao dos parmetros de resistncia dos solos empregados nas anlises de estabilidade de cada trecho. Com isso, as solues concebidas preliminarmente foram ratificadas e, posteriormente, detalhadas. 4 SOLUES Em funo da presena de uma importante estrada de terra no topo da encosta, e da quantidade de blocos rochosos e material mobilizado remanescente ao longo do escorregamento, adotaram-se as seguintes solues, em ordem de prioridade:

    i. Recomposio do talude rompido a montante da estrada. Para este ponto, foi projetado um retaludamento buscando intervir o mnimo possvel na regio. Para analisar a soluo deste ponto, utilizou-se o Mtodo de Morgenstein-Price a partir do software Slope/W da GeoSlope, obtendo-se um fator de segurana mnimo de 1.40, conforme apresentado na Figura 7.

    ii. Recuperao e ampliao do sistema de drenagem existente na estrada de acesso a montante, de modo a prevenir novos processos erosivos e de instabilizao;

    iii. O terceiro item engloba a rea de tratamento para a realocao das caixas de passagens atingidas pelo escorregamento ocorrido em um dos caminhos redundante para uma rea de maior estabilidade.

  • 1.400

    Rocha Grantica - Riolito

    Solo Residual Maduro

    Solo Residual Jov em

    Superf cie de Ruptura Original

    1 V : 1HEixo da Rodov ia

    Distance420 430 440 450 460 470 480 490 500

    Elev

    atio

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    395

    400

    405

    410

    415

    420

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    430

    435

    440

    445

    450

    455

    460

    465

    470

    Figura 7. Anlise de estabilidade realizada para o

    retaludamento.

    iv. Estabilizao do talude a jusante da estrada de acesso, onde ocorreu o deslizamento, por meio da execuo de duas cortinas atirantadas;

    v. Projeto conceitual de barreira dinmica e caixa de reteno de lama na base da encosta, com a funo de conter qualquer material que possa se direcionar para este trecho, englobando inclusive a Ferrovia das Bromlias;

    vi. Projeto conceitual de solues de bioengenharia ao longo do trecho superior da encosta, onde ainda existe um extenso manto de solo remanescente do escorregamento. Estas solues auxiliaro na reduo de velocidade do escoamento superficial e na revegetao da rea, causando um aumento de resistncia no solo atravs da gama de razes;

    vii. Projeto conceitual de sete muros de concreto ciclpico ao longo dos trechos central e inferior da encosta, os quais serviro como conteno passiva dos solos e rochas remanescentes, auxiliando tambm na quebra de energia de uma possvel nova corrida. Para a construo dos mesmos, devero ser empregados os blocos existentes ao longo da encosta. Essas solues foram recomendadas para determinados plats analisados ao longo da encosta, como o apresentado na Figura 8;

    Figura 8. Plat indicado para execuo de muro de

    concreto ciclpico, com indicao de desmonte de bloco.

    A Figura 9 apresenta a distribuio esquemtica das solues adotadas no Projeto Conceitual para recomposio.

    Blocos indicados para desmonte

  • Figura 9. Seo ao longo do deslizamento de terra, com a indicao das solues adotadas

    .

  • 5 CONSIDERAES FINAIS At o momento, a concessionria executou as solues dos seguintes trechos:

    a) Itens i, ii e iii, da ordem de prioridades (Figura 10);

    Figura 10. Retaludamento e sistema de drenagem

    b) Item iv da ordem de prioridades

    (Figura 11).

    Figura 11. Vista geral da cortina atirantada e

    retaludamento. Os demais projetos executivos das solues v a vii ainda no foram realizados. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem ao CESAP Consrcio Empresarial Salto Pilo por autorizar a publicao deste artigo.

    REFERNCIAS ALTA Geotecnia (2012) Estudos Geolgico-

    Geotcnios na Encosta e Montante da Usina Hidreltrica Salto Pilo, situada no Vale do Itaja, Santa Catarina RT-120412-01-v03.

    CESAP (2012) Relatrio de Projeto Memria de Clculo e Desenhos Recomposio da Encosta. Projeto Tractebel Engineering Leme.

    Cruden, D.M., & Varnes, D.J. (1996) Landslides. Investigation and Mitigation. Editores Turner, A.K. and Schuster, R.L. Special Report 247. Transport Research Board, National Research Council, Washington D.C.

    Highland, L. M. e Bobrowsky P. (2008) The Landslide Handbook A Guide to Understanding Landslides. United States Geological Survey Geological Survey of Canada.

    IPT 2005 Reconhecimento e Caracterizao de feies geoestruturais na rea do AHE Salto Pilo, Rio Itaja Au, SC Relatrio tcnico 64.

    Kobiyama M., Goerl R. F., Corra G. P.; Michel G. P. (2010) Debris flow occurrences in Rio dos Cedros, Southern Brazil: meteorological and geomorphic aspects. Monitoring, Simulation, Prevention and Remediation of Dense and Debris Flows III.

    Massad, F. (2003) Obras de Terra: Curso Bsico de Geotecnia. So Paulo, Oficina de Textos, 2003.

    DNPM/CPRM 1987 Mapa Geolgico do estado de Santa Catarina. Escala 1:500.000