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Sorria, mas suspirava, E ainda mais triste ficava, Como nem imaginais. Meu Deus, que criança aquela! Que tão precoce tristeza! Dizem-lhe um dia: «Teresa Sabes? A tua mãe morreu.» Fez-se pálida de morte... E, levando as mãos ao seio, Ia a falar, mas, no meio, Reprimiu-se e emudeceu. E desde então nunca a viram Mais com as suas companheiras; Ficava-se horas inteiras À sombra do laranjal. Surpreendiam-na sozinha Com os olhos fitos no espaço

Sorria

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Page 1: Sorria

Sorria, mas suspirava,

E ainda mais triste ficava,

Como nem imaginais.

Meu Deus, que criança aquela!

Que tão precoce tristeza!

Dizem-lhe um dia: «TeresaSabes? A tua mãe morreu.»

Fez-se pálida de morte...

E, levando as mãos ao seio,

Ia a falar, mas, no meio,

Reprimiu-se e emudeceu.

E desde então nunca a viram

Mais com as suas companheiras;

Ficava-se horas inteirasÀ sombra do laranjal.Surpreendiam-na sozinha

Com os olhos fitos no espaço

Page 2: Sorria

E esfolhando no regaço

As rosas do seu rosal.

As brisas, gemendo tristes

Por entre a verde folhagem,

Segredavam-lhe a linguagem

Sonora da solidão.

Essas mil vozes do campo,

Todas ela compreendia,

Que fadado para poesia

Fora aquele coração.

Ai, que infância tão de gelo!

Que madrugada da vida!Ai, pobre alma estremecidaPelas saudades da mãe!

Quantas vezes, alta noite,

A triste julgava vê-la

Page 3: Sorria

Em cada fúlgida estrela

Que o firmamento contém!

Um dia, ao cair da tarde,

E de uma tarde de Outono,

Acordou de um brando sono

E pôs-se a rir para mim.

«Já sorris? És salva, filha,

Enfim!» E a beijei contente.

Olhando-me ternamenteEla repetiu: «Enfim!»

Enfim!... mas que triste acento

Nessa palavra vertera!Foi como que se dissera