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1 SUPLEMENTO DE ATIVIDADES NOME : N O : SÉRIE : ESCOLA : SENHORA JOSE DE ALENCAR Criador de uma literatura nacional e preocupado com a for- mação da identidade brasileira, José de Alencar propôs-se a fazer um painel da sociedade brasileira em todas as suas facetas. Senhora é considerado o mais bem-sucedido romance urbano do autor. Além disso, ele contempla críticas aos principais pro- blemas da sociedade que ocuparam José de Alencar ao longo de sua vida. As atividades a seguir pretendem ampliar a sua compreensão de Senhora e de seu tempo. Desenvolva-as após a leitura do livro, dos Diários de um Clássico, da Contextualização Histórica e da Entrevista Imaginária.

SUPLEMENTO LUCÍOLA

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Page 1: SUPLEMENTO LUCÍOLA

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Aponte algumas características de Senhora que tenham comoobjetivo a criação dessa identidade nacional brasileira.

Resposta pessoal. Sugestão: O tema das dissimulações e relaçõesentre amor e dinheiro foi abordado por diversos autores estrangei-ros, como Balzac, em seu O coronel Chabert, entre tantos outros.Porém, a maneira como tais relações se acentuam na sociedade bra-sileira serviu de matéria-prima para Alencar levar a cabo seu proje-to descritivo da fisionomia nacional. A senhora Aurélia pode servista como uma transgressora da ordem social fundada no homem,seja ele senhor de engenho ou bacharel, que sempre usou de seuestatuto para manter as desigualdades sociais e garantir privilégios,centralizando o poder. Em Senhora, temos uma inversão dessespapéis, sem haver, contudo, a minimização da crítica aos valoresvigentes, baseados no uso, na troca, no escambo, na manipulação ena transação de corpos e afetos humanos.

13. Leia um trecho de As emoções e o coração, de Madame deStaël, escritora e teorizadora do Romantismo na Alemanha.

AS EMOÇÕES E O CORAÇÃO

Observar o coração humano é mostrar a cada passo a influência damoral sobre o destino: há um único segredo na vida, que é o bem ouo mal que se fez; este segredo esconde-se sob mil formas enganadoras:alguém sofre por um longo período sem merecer, ou prospera durantemuito tempo por meios condenáveis, mas de repente a sorte decide-se,a palavra-chave do seu enigma revela-se, essa palavra que a consciên-cia já tinha pronunciado muito antes de o destino a ter repetido. Éassim que a história do homem deve ser apresentada nos romances; éassim que as ficções devem explicar-nos, por intermédio de nossas vir-tudes e dos nossos sentimentos, os mistérios da nossa condição.

STAËL, Madame de. “As emoções e o coração”. In: GOMES, ÁlvaroCardoso e VECHI, Carlos Alberto (orgs.). A estética romântica: textos

doutrinários comentados. São Paulo: Atlas, 1992.

CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA10

b) “Somente ela, tal como a epopéia, pode tornar-se reflexo datotalidade do mundo circundante, imagem da época.” Em quesentido essa frase tem relação com o projeto literário de José deAlencar?

José de Alencar tentou, em sua obra, dar um painel de toda a socie-dade brasileira, desde o seu aspecto histórico e mítico até os seusdilemas urbanos e atuais. É nesse sentido que sua obra ambiciona-va o mesmo que Schlegel diz que a poesia romântica ambiciona:forjar a totalidade do mundo circundante e dar-nos a imagem glo-bal de uma época.

Agora é com você, caro leitor.Valendo-se das orientações desta edição e das suas respostas àsatividades de leitura, elabore uma nova entrevista com o autor,mais ou menos como a Entrevista Imaginária do final do livro.Ainda que José de Alencar já não esteja entre nós, sua obra estáviva neste país que favorece poucos com o dinheiro de muitos eé administrado a distância. As polêmicas nas quais se envolveu,a variedade de gêneros literários que produziu, a viagem comtoda a família para a Europa, onde permaneceu oito meses embusca de tratamento para sua frágil saúde, não serão ingredien-tes suficientes para compor uma conversa com o autor? Os assuntos podem abordar a composição dos personagens, oRio de Janeiro dos séculos XIX e XXI, a recepção da obra peloscontemporâneos (lembrando que entre os críticos da época esta-vam Manuel Antônio de Almeida e Machado de Assis). Além disso, será possível perguntar a José de Alencar como elevê, hoje, o comportamento do brasileiro quando o assunto éBrasil. Nada melhor que a consideração de um especialista... Procure basear as perguntas e as respostas em afirmações dopróprio escritor ou em falas de personagens e narradores cria-dos por ele. Capriche e bom trabalho!

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SUPLEMENTODE ATIVIDADES

NOME:NO: SÉRIE:ESCOLA:

SENHORAJOSE DE ALENCAR

Criador de uma literatura nacional e preocupado com a for-mação da identidade brasileira, José de Alencar propôs-se a fazerum painel da sociedade brasileira em todas as suas facetas. Senhora é considerado o mais bem-sucedido romance urbanodo autor. Além disso, ele contempla críticas aos principais pro-blemas da sociedade que ocuparam José de Alencar ao longo desua vida. As atividades a seguir pretendem ampliar a sua compreensão deSenhora e de seu tempo. Desenvolva-as após a leitura do livro,dos Diários de um Clássico, da Contextualização Histórica e daEntrevista Imaginária.

14. Friedrich Schlegel foi um importante filósofo, teorizadorda estética romântica. Leia a seguir um trecho de sua autoria.

POESIA E EVOLUÇÃO

A poesia romântica é uma poesia universal que está em constante evo-lução. A sua missão não consiste apenas em reunir novamente todosos gêneros da poesia e em levar a poesia a estabelecer uma relação coma filosofia e com a retórica. Ela pretende e deve, além disso, misturarou fundir poesia e prosa, genialidade e crítica, poesia da arte e poesiada Natureza, tornar a poesia viva e sociável e a vida e a sociedade poé-ticas, poetizar o humor, encher e saturar as formas da arte de todasorte de material cultural e estimulá-las com as vibrações do humor.Ela abarca tudo o que seja meramente poético, desde o mais amplo sis-tema da arte que, por sua vez, engloba outros sistemas, até o suspiro eo beijo que a criança-poeta emite em seu canto espontâneo. Ela pode-ria perder-se, de tal modo, naquilo que seria de pensar que seu únicoobjetivo consiste em caracterizar indivíduos poéticos de todos os tipos;e, no entanto, ainda não existe nenhuma forma apta a exprimir intei-ramente o espírito do autor; por isso, muitos artistas que queriamescrever um único romance, eventualmente fizeram uma descrição desi mesmos. Somente ela, tal como a epopéia, pode tornar-se reflexo datotalidade do mundo circundante, imagem da época.

SCHLEGEL, Friedrich. “Poesia e evolução”. In: GOMES, Álvaro Cardoso e VECHI, Carlos Alberto (orgs.). A estética romântica: textos

doutrinários comentados. São Paulo: Atlas, 1992.

a) Em sua opinião, em síntese, qual a grande ambição da poesiaromântica, nas palavras de Schlegel?

Misturar a criação poética à própria vida. Todos os itens enumeradospelo filósofo vão nesse sentido. Trata-se de uma proposta que não éapenas de ordem estética e artística, mas que deita raízes em outrosdomínios da vida, e amplia assim nossa própria concepção de arte.

a) Em que sentido as idéias de Staël estão ligadas às concepçõesde Senhora?

O texto de Madame de Staël é exemplar, pois analisa alguns dospontos cruciais tratados por José de Alencar em Senhora: há o des-tino de Aurélia e a moral que dele advém. Seus atos, seus valores,sua condição; tudo está interligado ao seu destino, às escolhas queela fez para sua vida e ao modo como ela se relaciona com o amor.

b) O que a autora quer dizer com a frase: “a palavra-chave do seuenigma revela-se, essa palavra que a consciência já tinha pro-nunciado muito antes de o destino a ter repetido”?

Trata-se de uma equivalência entre consciência individual e desti-no. Como sabemos, a descoberta do indivíduo, a manifestação denosso eu mais autêntico, é uma das premissas românticas. E elanão equivale a um isolamento do mundo. Pelo contrário, o eu,como um caleidoscópio, é o espelho que traduz em si e sintetizatodas as coisas do mundo, toda a existência, todos os seres. Nessesentido, o destino (geral do mundo) já é conhecido pelo nosso des-tino particular, desde que conheçamos nosso eu profundo, a maté-ria-prima de nosso coração.

c) Para a autora, onde reside o mistério da condição humana?Como os romances devem mostrá-lo? E como Senhora o mostra?

O mistério reside na interioridade do homem. Para ela, em con-sonância com o ideário romântico, os romances devem trazer àluz essas verdades ocultas nos corações, e assim mostrar a facemoral (o bem e o mal) de nossos destinos. O romance de José deAlencar toma exatamente esse tema como fio condutor. Afinal, aprotagonista Aurélia é uma mulher cujos valores foram inverti-dos. A própria sociedade sustenta essa inversão do bem e domal, ao transformar o amor em uma mercadoria. Esse é o fatoque marca o destino de Aurélia, e também o motivo central desua redenção.

A NOVA DO CADÁVER - A SUA ENTREVISTA IMAGINÁRIA

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1. José de Alencar pretendeu, com Senhora, retratar umamulher fora dos padrões morais e dos costumes de seu tempo.Na sua opinião, qual era o objetivo do escritor?

Com a criação da personagem Aurélia, o escritor pretendeu fazer umacrítica aos valores mercadológicos de seu tempo. De certo modo,Alencar manifestava certa nostalgia em relação aos valores da tradição,da família e da Monarquia. Ver o mundo mergulhado em relações depoder e as relações reduzidas a mercadorias instilaram no escritor anecessidade de representar esse estado de coisas de maneira crítica.

2. Em que sentido Senhora pode ser vista como uma obra tipi-camente romântica? Explique por quê.

Senhora é uma obra tipicamente romântica não no sentido indianis-ta, nativista ou mítico, com uma idealização da natureza e das ori-gens ancestrais do homem, mas na medida em que propõe umideal: o amor. A faceta do amor comercializável é central na obra,mas o é apenas como a contraface crítica de uma sociedade repletade vícios. No final, a solução se revela no próprio amor, que conse-gue brotar do solo árido das disputas.

3. Quais as principais divisões e subdivisões da obra de José deAlencar? Como você situaria Senhora em relação às demaisobras desse autor?

A obra de José de Alencar pode ser dividida em três grandes corren-tes: 1. a nativista, mítica ou indianista, que trata da origem do Brasil,dos mitos fundadores, dos povos e das culturas que nos constituí-ram, tais como em Iracema, O guarani, Ubirajara; 2. a histórica, queaborda um período importante do processo de formação do Brasil,como em Minas de prata; 3. a vertente regional, que se subdivide emduas linhagens: a primeira, ligada às tradições, como no caso do

UMA OBRA CLÁSSICA 6. Por que o autor narra a origem humilde de Aurélia nasegunda parte do romance? Qual é a função dessas informaçõespara a obra?

O autor o faz para dar ao leitor uma espécie de biografia espiritual deAurélia. No fundo, é como se ele atenuasse a culpa pelo seu compor-tamento, focando-a mais nos valores da sociedade, que nos corrom-pem. Temos aqui bem exemplificada a dialética que o Romantismocria entre a natureza e a cultura, entre a bondade inata do homem eos valores sociais que a maculam. Aurélia era boa na infância, mas anecessidade de se inserir na roda-viva econômica a desvirtuou.

7. Qual é o tipo de estratégia narrativa utilizada em Senhora?

O narrador atua em terceira pessoa. Porém, mostra-se oniscienteem alguns momentos, vasculhando e mostrando ao leitor a intimi-dade e os pensamentos de alguns personagens. Esse recurso, mistode isenção e onisciência, era muito usado pelos escritores, paracompor uma cena ao mesmo tempo psicológica e social.

8. Em relação às técnicas usadas pelo narrador de Senhora,atribua V (verdadeiro) ou F (falso):

( ) Terceira pessoa( ) Onipresente( ) Onisciente( ) Primeira pessoa( ) Extensão entre autor/narrador( ) Terceira pessoa (plural)

1-V; 2-F; 3-V; 4-F; 5-F; 6-F

9. Como você vê o papel do tio Lemos na trama de Senhora?

Ele é o articulador, o intermediário entre a vontade de Aurélia e a“compra” de seu marido. É uma figura que ridiculariza os tiposambiciosos, que se valem das oportunidades para conseguir o quealmejam.

10. Podemos dizer que Aurélia é má? Por quê?

Não. Porque o enredo nos mostra que ela apenas se inseriu nosvalores viciados de seu tempo. A tônica recai sobre os problemasda época, não sobre os hábitos de Aurélia. Sua conduta, por exem-plo, destoa da conduta vigente das mulheres de seu tempo.Entretanto, ao conferir traços masculinos às ações de Aurélia, oautor quer com isso ressaltar os hábitos machistas que norteiam avida em sociedade.

11. Leia o texto abaixo, do filósofo francês Jean-JacquesRousseau, uma das prováveis inspirações de José de Alencar:

(...) O que há de mais cruel ainda é que, todos os progressos da espé-cie humana, distanciando-a incessantemente de seu estado primiti-vo, quanto mais acumulamos novos conhecimentos, tanto maisafastamos os meios de adquirir o mais importante de todos, e aindaque, num certo sentido, à força de estudar o homem, tornamo-nosincapazes de conhecê-lo.

ROUSSEAU, Jean-Jacques. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1978. p. XV.

NARRADOR

PERSONAGENS Podemos dizer que Senhora tematiza um afastamento do ladoprimitivo do homem? Em que sentido?

Da mesma forma que os romances indianistas de Alencar mostravama virtude em estado bruto, ou seja, mostravam que o homem em esta-do natural é bom, Senhora parece demonstrar que a sociedade o cor-rompe. No caso, tem-se a corrupção de Aurélia como foco, mas nofundo quase todos os personagens do romance têm algum vício,sendo todos eles integrantes de uma sociedade corrupta e mercantilis-ta. Nesse sentido, Rousseau não apenas inspirou os romances india-nistas ou nativistas do autor cearense, como também lhe mostrou oreverso da medalha: os males que a civilização causa aos homens.

12. Leia o trecho a seguir, de William Cereja e TherezaMagalhães:

Nas décadas que sucederam a Independência do Brasil, os roman-cistas empenharam-se no projeto de construção de uma culturabrasileira autônoma. Esse projeto exigia dos escritores o reconheci-mento da identidade de nossa gente, nossa língua, nossas tradiçõese também das nossas diferenças nacionais e culturais. Nessa buscado nacional, o romance voltou-se para os espaços nacionais, iden-tificados como a selva, o campo e a cidade, que deram origem, res-pectivamente, ao romance indianista e histórico (a vida primiti-va), ao romance regional (a vida rural) e ao romance urbano (avida citadina). José de Alencar, por exemplo, o maior romancistado nosso Romantismo, escreveu obras que enfocaram esses trêsaspectos, como O guarani, romance histórico-indianista, O gaú-cho, romance regional, e Senhora, romance urbano.

CEREJA, William Roberto e MAGALHÃES, Thereza Cochar. Literaturabrasileira: em diálogo com outras literaturas e outras linguagens,

3. ed. São Paulo: Atual, 2005. p. 238-239.

INTERTEXTUALIDADE

romance O gaúcho, e a segunda, mais cosmopolita e urbana, enfo-cando as relações sociais das grandes cidades, na qual se destacamLucíola, Diva, A pata da gazela e Senhora.

4. Qual seria o tema central de Senhora? Ele está ligado à sub-divisão da obra em capítulos? Por quê?

O cerne da obra é a mercantilização do amor, o papel do dinheirona sociedade moderna, capaz de tudo comprar. O tema centralpode ser demonstrado a partir dos subtítulos das partes nas quaiso romance está dividido: O Preço, Quitação, Posse e Resgate. Alémdisso, a própria estrutura do enredo e dos personagens salientaesse tema como nuclear.

5. Apenas as obras nativistas de José de Alencar contam comaspectos míticos? É possível dizer que Senhora também contacom alguns elementos míticos em sua estrutura narrativa?Exemplifique com algumas passagens.

Algumas abordagens críticas ressaltam também o aspecto mítico queaparece subliminarmente em romances como Senhora. Por exemplo,no primeiro capítulo da obra (I, I), Aurélia é retratada como um anjo,com tons de pureza e de virgindade. No mesmo capítulo, o autor dizque ela pisa uma víbora – trata-se da famosa imagem católica da vir-gem Maria, sobre o globo terrestre, esmagando a serpente demonía-ca com o pé. Mais adiante (I, II), há uma identificação dela com o sole, posteriormente (I, XIII), sua câmara nupcial se transforma em céu.

NARRATIVA

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1. José de Alencar pretendeu, com Senhora, retratar umamulher fora dos padrões morais e dos costumes de seu tempo.Na sua opinião, qual era o objetivo do escritor?

Com a criação da personagem Aurélia, o escritor pretendeu fazer umacrítica aos valores mercadológicos de seu tempo. De certo modo,Alencar manifestava certa nostalgia em relação aos valores da tradição,da família e da Monarquia. Ver o mundo mergulhado em relações depoder e as relações reduzidas a mercadorias instilaram no escritor anecessidade de representar esse estado de coisas de maneira crítica.

2. Em que sentido Senhora pode ser vista como uma obra tipi-camente romântica? Explique por quê.

Senhora é uma obra tipicamente romântica não no sentido indianis-ta, nativista ou mítico, com uma idealização da natureza e das ori-gens ancestrais do homem, mas na medida em que propõe umideal: o amor. A faceta do amor comercializável é central na obra,mas o é apenas como a contraface crítica de uma sociedade repletade vícios. No final, a solução se revela no próprio amor, que conse-gue brotar do solo árido das disputas.

3. Quais as principais divisões e subdivisões da obra de José deAlencar? Como você situaria Senhora em relação às demaisobras desse autor?

A obra de José de Alencar pode ser dividida em três grandes corren-tes: 1. a nativista, mítica ou indianista, que trata da origem do Brasil,dos mitos fundadores, dos povos e das culturas que nos constituí-ram, tais como em Iracema, O guarani, Ubirajara; 2. a histórica, queaborda um período importante do processo de formação do Brasil,como em Minas de prata; 3. a vertente regional, que se subdivide emduas linhagens: a primeira, ligada às tradições, como no caso do

UMA OBRA CLÁSSICA 6. Por que o autor narra a origem humilde de Aurélia nasegunda parte do romance? Qual é a função dessas informaçõespara a obra?

O autor o faz para dar ao leitor uma espécie de biografia espiritual deAurélia. No fundo, é como se ele atenuasse a culpa pelo seu compor-tamento, focando-a mais nos valores da sociedade, que nos corrom-pem. Temos aqui bem exemplificada a dialética que o Romantismocria entre a natureza e a cultura, entre a bondade inata do homem eos valores sociais que a maculam. Aurélia era boa na infância, mas anecessidade de se inserir na roda-viva econômica a desvirtuou.

7. Qual é o tipo de estratégia narrativa utilizada em Senhora?

O narrador atua em terceira pessoa. Porém, mostra-se oniscienteem alguns momentos, vasculhando e mostrando ao leitor a intimi-dade e os pensamentos de alguns personagens. Esse recurso, mistode isenção e onisciência, era muito usado pelos escritores, paracompor uma cena ao mesmo tempo psicológica e social.

8. Em relação às técnicas usadas pelo narrador de Senhora,atribua V (verdadeiro) ou F (falso):

( ) Terceira pessoa( ) Onipresente( ) Onisciente( ) Primeira pessoa( ) Extensão entre autor/narrador( ) Terceira pessoa (plural)

1-V; 2-F; 3-V; 4-F; 5-F; 6-F

9. Como você vê o papel do tio Lemos na trama de Senhora?

Ele é o articulador, o intermediário entre a vontade de Aurélia e a“compra” de seu marido. É uma figura que ridiculariza os tiposambiciosos, que se valem das oportunidades para conseguir o quealmejam.

10. Podemos dizer que Aurélia é má? Por quê?

Não. Porque o enredo nos mostra que ela apenas se inseriu nosvalores viciados de seu tempo. A tônica recai sobre os problemasda época, não sobre os hábitos de Aurélia. Sua conduta, por exem-plo, destoa da conduta vigente das mulheres de seu tempo.Entretanto, ao conferir traços masculinos às ações de Aurélia, oautor quer com isso ressaltar os hábitos machistas que norteiam avida em sociedade.

11. Leia o texto abaixo, do filósofo francês Jean-JacquesRousseau, uma das prováveis inspirações de José de Alencar:

(...) O que há de mais cruel ainda é que, todos os progressos da espé-cie humana, distanciando-a incessantemente de seu estado primiti-vo, quanto mais acumulamos novos conhecimentos, tanto maisafastamos os meios de adquirir o mais importante de todos, e aindaque, num certo sentido, à força de estudar o homem, tornamo-nosincapazes de conhecê-lo.

ROUSSEAU, Jean-Jacques. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1978. p. XV.

NARRADOR

PERSONAGENS Podemos dizer que Senhora tematiza um afastamento do ladoprimitivo do homem? Em que sentido?

Da mesma forma que os romances indianistas de Alencar mostravama virtude em estado bruto, ou seja, mostravam que o homem em esta-do natural é bom, Senhora parece demonstrar que a sociedade o cor-rompe. No caso, tem-se a corrupção de Aurélia como foco, mas nofundo quase todos os personagens do romance têm algum vício,sendo todos eles integrantes de uma sociedade corrupta e mercantilis-ta. Nesse sentido, Rousseau não apenas inspirou os romances india-nistas ou nativistas do autor cearense, como também lhe mostrou oreverso da medalha: os males que a civilização causa aos homens.

12. Leia o trecho a seguir, de William Cereja e TherezaMagalhães:

Nas décadas que sucederam a Independência do Brasil, os roman-cistas empenharam-se no projeto de construção de uma culturabrasileira autônoma. Esse projeto exigia dos escritores o reconheci-mento da identidade de nossa gente, nossa língua, nossas tradiçõese também das nossas diferenças nacionais e culturais. Nessa buscado nacional, o romance voltou-se para os espaços nacionais, iden-tificados como a selva, o campo e a cidade, que deram origem, res-pectivamente, ao romance indianista e histórico (a vida primiti-va), ao romance regional (a vida rural) e ao romance urbano (avida citadina). José de Alencar, por exemplo, o maior romancistado nosso Romantismo, escreveu obras que enfocaram esses trêsaspectos, como O guarani, romance histórico-indianista, O gaú-cho, romance regional, e Senhora, romance urbano.

CEREJA, William Roberto e MAGALHÃES, Thereza Cochar. Literaturabrasileira: em diálogo com outras literaturas e outras linguagens,

3. ed. São Paulo: Atual, 2005. p. 238-239.

INTERTEXTUALIDADE

romance O gaúcho, e a segunda, mais cosmopolita e urbana, enfo-cando as relações sociais das grandes cidades, na qual se destacamLucíola, Diva, A pata da gazela e Senhora.

4. Qual seria o tema central de Senhora? Ele está ligado à sub-divisão da obra em capítulos? Por quê?

O cerne da obra é a mercantilização do amor, o papel do dinheirona sociedade moderna, capaz de tudo comprar. O tema centralpode ser demonstrado a partir dos subtítulos das partes nas quaiso romance está dividido: O Preço, Quitação, Posse e Resgate. Alémdisso, a própria estrutura do enredo e dos personagens salientaesse tema como nuclear.

5. Apenas as obras nativistas de José de Alencar contam comaspectos míticos? É possível dizer que Senhora também contacom alguns elementos míticos em sua estrutura narrativa?Exemplifique com algumas passagens.

Algumas abordagens críticas ressaltam também o aspecto mítico queaparece subliminarmente em romances como Senhora. Por exemplo,no primeiro capítulo da obra (I, I), Aurélia é retratada como um anjo,com tons de pureza e de virgindade. No mesmo capítulo, o autor dizque ela pisa uma víbora – trata-se da famosa imagem católica da vir-gem Maria, sobre o globo terrestre, esmagando a serpente demonía-ca com o pé. Mais adiante (I, II), há uma identificação dela com o sole, posteriormente (I, XIII), sua câmara nupcial se transforma em céu.

NARRATIVA

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1. José de Alencar pretendeu, com Senhora, retratar umamulher fora dos padrões morais e dos costumes de seu tempo.Na sua opinião, qual era o objetivo do escritor?

Com a criação da personagem Aurélia, o escritor pretendeu fazer umacrítica aos valores mercadológicos de seu tempo. De certo modo,Alencar manifestava certa nostalgia em relação aos valores da tradição,da família e da Monarquia. Ver o mundo mergulhado em relações depoder e as relações reduzidas a mercadorias instilaram no escritor anecessidade de representar esse estado de coisas de maneira crítica.

2. Em que sentido Senhora pode ser vista como uma obra tipi-camente romântica? Explique por quê.

Senhora é uma obra tipicamente romântica não no sentido indianis-ta, nativista ou mítico, com uma idealização da natureza e das ori-gens ancestrais do homem, mas na medida em que propõe umideal: o amor. A faceta do amor comercializável é central na obra,mas o é apenas como a contraface crítica de uma sociedade repletade vícios. No final, a solução se revela no próprio amor, que conse-gue brotar do solo árido das disputas.

3. Quais as principais divisões e subdivisões da obra de José deAlencar? Como você situaria Senhora em relação às demaisobras desse autor?

A obra de José de Alencar pode ser dividida em três grandes corren-tes: 1. a nativista, mítica ou indianista, que trata da origem do Brasil,dos mitos fundadores, dos povos e das culturas que nos constituí-ram, tais como em Iracema, O guarani, Ubirajara; 2. a histórica, queaborda um período importante do processo de formação do Brasil,como em Minas de prata; 3. a vertente regional, que se subdivide emduas linhagens: a primeira, ligada às tradições, como no caso do

UMA OBRA CLÁSSICA 6. Por que o autor narra a origem humilde de Aurélia nasegunda parte do romance? Qual é a função dessas informaçõespara a obra?

O autor o faz para dar ao leitor uma espécie de biografia espiritual deAurélia. No fundo, é como se ele atenuasse a culpa pelo seu compor-tamento, focando-a mais nos valores da sociedade, que nos corrom-pem. Temos aqui bem exemplificada a dialética que o Romantismocria entre a natureza e a cultura, entre a bondade inata do homem eos valores sociais que a maculam. Aurélia era boa na infância, mas anecessidade de se inserir na roda-viva econômica a desvirtuou.

7. Qual é o tipo de estratégia narrativa utilizada em Senhora?

O narrador atua em terceira pessoa. Porém, mostra-se oniscienteem alguns momentos, vasculhando e mostrando ao leitor a intimi-dade e os pensamentos de alguns personagens. Esse recurso, mistode isenção e onisciência, era muito usado pelos escritores, paracompor uma cena ao mesmo tempo psicológica e social.

8. Em relação às técnicas usadas pelo narrador de Senhora,atribua V (verdadeiro) ou F (falso):

( ) Terceira pessoa( ) Onipresente( ) Onisciente( ) Primeira pessoa( ) Extensão entre autor/narrador( ) Terceira pessoa (plural)

1-V; 2-F; 3-V; 4-F; 5-F; 6-F

9. Como você vê o papel do tio Lemos na trama de Senhora?

Ele é o articulador, o intermediário entre a vontade de Aurélia e a“compra” de seu marido. É uma figura que ridiculariza os tiposambiciosos, que se valem das oportunidades para conseguir o quealmejam.

10. Podemos dizer que Aurélia é má? Por quê?

Não. Porque o enredo nos mostra que ela apenas se inseriu nosvalores viciados de seu tempo. A tônica recai sobre os problemasda época, não sobre os hábitos de Aurélia. Sua conduta, por exem-plo, destoa da conduta vigente das mulheres de seu tempo.Entretanto, ao conferir traços masculinos às ações de Aurélia, oautor quer com isso ressaltar os hábitos machistas que norteiam avida em sociedade.

11. Leia o texto abaixo, do filósofo francês Jean-JacquesRousseau, uma das prováveis inspirações de José de Alencar:

(...) O que há de mais cruel ainda é que, todos os progressos da espé-cie humana, distanciando-a incessantemente de seu estado primiti-vo, quanto mais acumulamos novos conhecimentos, tanto maisafastamos os meios de adquirir o mais importante de todos, e aindaque, num certo sentido, à força de estudar o homem, tornamo-nosincapazes de conhecê-lo.

ROUSSEAU, Jean-Jacques. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1978. p. XV.

NARRADOR

PERSONAGENS Podemos dizer que Senhora tematiza um afastamento do ladoprimitivo do homem? Em que sentido?

Da mesma forma que os romances indianistas de Alencar mostravama virtude em estado bruto, ou seja, mostravam que o homem em esta-do natural é bom, Senhora parece demonstrar que a sociedade o cor-rompe. No caso, tem-se a corrupção de Aurélia como foco, mas nofundo quase todos os personagens do romance têm algum vício,sendo todos eles integrantes de uma sociedade corrupta e mercantilis-ta. Nesse sentido, Rousseau não apenas inspirou os romances india-nistas ou nativistas do autor cearense, como também lhe mostrou oreverso da medalha: os males que a civilização causa aos homens.

12. Leia o trecho a seguir, de William Cereja e TherezaMagalhães:

Nas décadas que sucederam a Independência do Brasil, os roman-cistas empenharam-se no projeto de construção de uma culturabrasileira autônoma. Esse projeto exigia dos escritores o reconheci-mento da identidade de nossa gente, nossa língua, nossas tradiçõese também das nossas diferenças nacionais e culturais. Nessa buscado nacional, o romance voltou-se para os espaços nacionais, iden-tificados como a selva, o campo e a cidade, que deram origem, res-pectivamente, ao romance indianista e histórico (a vida primiti-va), ao romance regional (a vida rural) e ao romance urbano (avida citadina). José de Alencar, por exemplo, o maior romancistado nosso Romantismo, escreveu obras que enfocaram esses trêsaspectos, como O guarani, romance histórico-indianista, O gaú-cho, romance regional, e Senhora, romance urbano.

CEREJA, William Roberto e MAGALHÃES, Thereza Cochar. Literaturabrasileira: em diálogo com outras literaturas e outras linguagens,

3. ed. São Paulo: Atual, 2005. p. 238-239.

INTERTEXTUALIDADE

romance O gaúcho, e a segunda, mais cosmopolita e urbana, enfo-cando as relações sociais das grandes cidades, na qual se destacamLucíola, Diva, A pata da gazela e Senhora.

4. Qual seria o tema central de Senhora? Ele está ligado à sub-divisão da obra em capítulos? Por quê?

O cerne da obra é a mercantilização do amor, o papel do dinheirona sociedade moderna, capaz de tudo comprar. O tema centralpode ser demonstrado a partir dos subtítulos das partes nas quaiso romance está dividido: O Preço, Quitação, Posse e Resgate. Alémdisso, a própria estrutura do enredo e dos personagens salientaesse tema como nuclear.

5. Apenas as obras nativistas de José de Alencar contam comaspectos míticos? É possível dizer que Senhora também contacom alguns elementos míticos em sua estrutura narrativa?Exemplifique com algumas passagens.

Algumas abordagens críticas ressaltam também o aspecto mítico queaparece subliminarmente em romances como Senhora. Por exemplo,no primeiro capítulo da obra (I, I), Aurélia é retratada como um anjo,com tons de pureza e de virgindade. No mesmo capítulo, o autor dizque ela pisa uma víbora – trata-se da famosa imagem católica da vir-gem Maria, sobre o globo terrestre, esmagando a serpente demonía-ca com o pé. Mais adiante (I, II), há uma identificação dela com o sole, posteriormente (I, XIII), sua câmara nupcial se transforma em céu.

NARRATIVA

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1. José de Alencar pretendeu, com Senhora, retratar umamulher fora dos padrões morais e dos costumes de seu tempo.Na sua opinião, qual era o objetivo do escritor?

Com a criação da personagem Aurélia, o escritor pretendeu fazer umacrítica aos valores mercadológicos de seu tempo. De certo modo,Alencar manifestava certa nostalgia em relação aos valores da tradição,da família e da Monarquia. Ver o mundo mergulhado em relações depoder e as relações reduzidas a mercadorias instilaram no escritor anecessidade de representar esse estado de coisas de maneira crítica.

2. Em que sentido Senhora pode ser vista como uma obra tipi-camente romântica? Explique por quê.

Senhora é uma obra tipicamente romântica não no sentido indianis-ta, nativista ou mítico, com uma idealização da natureza e das ori-gens ancestrais do homem, mas na medida em que propõe umideal: o amor. A faceta do amor comercializável é central na obra,mas o é apenas como a contraface crítica de uma sociedade repletade vícios. No final, a solução se revela no próprio amor, que conse-gue brotar do solo árido das disputas.

3. Quais as principais divisões e subdivisões da obra de José deAlencar? Como você situaria Senhora em relação às demaisobras desse autor?

A obra de José de Alencar pode ser dividida em três grandes corren-tes: 1. a nativista, mítica ou indianista, que trata da origem do Brasil,dos mitos fundadores, dos povos e das culturas que nos constituí-ram, tais como em Iracema, O guarani, Ubirajara; 2. a histórica, queaborda um período importante do processo de formação do Brasil,como em Minas de prata; 3. a vertente regional, que se subdivide emduas linhagens: a primeira, ligada às tradições, como no caso do

UMA OBRA CLÁSSICA 6. Por que o autor narra a origem humilde de Aurélia nasegunda parte do romance? Qual é a função dessas informaçõespara a obra?

O autor o faz para dar ao leitor uma espécie de biografia espiritual deAurélia. No fundo, é como se ele atenuasse a culpa pelo seu compor-tamento, focando-a mais nos valores da sociedade, que nos corrom-pem. Temos aqui bem exemplificada a dialética que o Romantismocria entre a natureza e a cultura, entre a bondade inata do homem eos valores sociais que a maculam. Aurélia era boa na infância, mas anecessidade de se inserir na roda-viva econômica a desvirtuou.

7. Qual é o tipo de estratégia narrativa utilizada em Senhora?

O narrador atua em terceira pessoa. Porém, mostra-se oniscienteem alguns momentos, vasculhando e mostrando ao leitor a intimi-dade e os pensamentos de alguns personagens. Esse recurso, mistode isenção e onisciência, era muito usado pelos escritores, paracompor uma cena ao mesmo tempo psicológica e social.

8. Em relação às técnicas usadas pelo narrador de Senhora,atribua V (verdadeiro) ou F (falso):

( ) Terceira pessoa( ) Onipresente( ) Onisciente( ) Primeira pessoa( ) Extensão entre autor/narrador( ) Terceira pessoa (plural)

1-V; 2-F; 3-V; 4-F; 5-F; 6-F

9. Como você vê o papel do tio Lemos na trama de Senhora?

Ele é o articulador, o intermediário entre a vontade de Aurélia e a“compra” de seu marido. É uma figura que ridiculariza os tiposambiciosos, que se valem das oportunidades para conseguir o quealmejam.

10. Podemos dizer que Aurélia é má? Por quê?

Não. Porque o enredo nos mostra que ela apenas se inseriu nosvalores viciados de seu tempo. A tônica recai sobre os problemasda época, não sobre os hábitos de Aurélia. Sua conduta, por exem-plo, destoa da conduta vigente das mulheres de seu tempo.Entretanto, ao conferir traços masculinos às ações de Aurélia, oautor quer com isso ressaltar os hábitos machistas que norteiam avida em sociedade.

11. Leia o texto abaixo, do filósofo francês Jean-JacquesRousseau, uma das prováveis inspirações de José de Alencar:

(...) O que há de mais cruel ainda é que, todos os progressos da espé-cie humana, distanciando-a incessantemente de seu estado primiti-vo, quanto mais acumulamos novos conhecimentos, tanto maisafastamos os meios de adquirir o mais importante de todos, e aindaque, num certo sentido, à força de estudar o homem, tornamo-nosincapazes de conhecê-lo.

ROUSSEAU, Jean-Jacques. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1978. p. XV.

NARRADOR

PERSONAGENS Podemos dizer que Senhora tematiza um afastamento do ladoprimitivo do homem? Em que sentido?

Da mesma forma que os romances indianistas de Alencar mostravama virtude em estado bruto, ou seja, mostravam que o homem em esta-do natural é bom, Senhora parece demonstrar que a sociedade o cor-rompe. No caso, tem-se a corrupção de Aurélia como foco, mas nofundo quase todos os personagens do romance têm algum vício,sendo todos eles integrantes de uma sociedade corrupta e mercantilis-ta. Nesse sentido, Rousseau não apenas inspirou os romances india-nistas ou nativistas do autor cearense, como também lhe mostrou oreverso da medalha: os males que a civilização causa aos homens.

12. Leia o trecho a seguir, de William Cereja e TherezaMagalhães:

Nas décadas que sucederam a Independência do Brasil, os roman-cistas empenharam-se no projeto de construção de uma culturabrasileira autônoma. Esse projeto exigia dos escritores o reconheci-mento da identidade de nossa gente, nossa língua, nossas tradiçõese também das nossas diferenças nacionais e culturais. Nessa buscado nacional, o romance voltou-se para os espaços nacionais, iden-tificados como a selva, o campo e a cidade, que deram origem, res-pectivamente, ao romance indianista e histórico (a vida primiti-va), ao romance regional (a vida rural) e ao romance urbano (avida citadina). José de Alencar, por exemplo, o maior romancistado nosso Romantismo, escreveu obras que enfocaram esses trêsaspectos, como O guarani, romance histórico-indianista, O gaú-cho, romance regional, e Senhora, romance urbano.

CEREJA, William Roberto e MAGALHÃES, Thereza Cochar. Literaturabrasileira: em diálogo com outras literaturas e outras linguagens,

3. ed. São Paulo: Atual, 2005. p. 238-239.

INTERTEXTUALIDADE

romance O gaúcho, e a segunda, mais cosmopolita e urbana, enfo-cando as relações sociais das grandes cidades, na qual se destacamLucíola, Diva, A pata da gazela e Senhora.

4. Qual seria o tema central de Senhora? Ele está ligado à sub-divisão da obra em capítulos? Por quê?

O cerne da obra é a mercantilização do amor, o papel do dinheirona sociedade moderna, capaz de tudo comprar. O tema centralpode ser demonstrado a partir dos subtítulos das partes nas quaiso romance está dividido: O Preço, Quitação, Posse e Resgate. Alémdisso, a própria estrutura do enredo e dos personagens salientaesse tema como nuclear.

5. Apenas as obras nativistas de José de Alencar contam comaspectos míticos? É possível dizer que Senhora também contacom alguns elementos míticos em sua estrutura narrativa?Exemplifique com algumas passagens.

Algumas abordagens críticas ressaltam também o aspecto mítico queaparece subliminarmente em romances como Senhora. Por exemplo,no primeiro capítulo da obra (I, I), Aurélia é retratada como um anjo,com tons de pureza e de virgindade. No mesmo capítulo, o autor dizque ela pisa uma víbora – trata-se da famosa imagem católica da vir-gem Maria, sobre o globo terrestre, esmagando a serpente demonía-ca com o pé. Mais adiante (I, II), há uma identificação dela com o sole, posteriormente (I, XIII), sua câmara nupcial se transforma em céu.

NARRATIVA

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1. José de Alencar pretendeu, com Senhora, retratar umamulher fora dos padrões morais e dos costumes de seu tempo.Na sua opinião, qual era o objetivo do escritor?

Com a criação da personagem Aurélia, o escritor pretendeu fazer umacrítica aos valores mercadológicos de seu tempo. De certo modo,Alencar manifestava certa nostalgia em relação aos valores da tradição,da família e da Monarquia. Ver o mundo mergulhado em relações depoder e as relações reduzidas a mercadorias instilaram no escritor anecessidade de representar esse estado de coisas de maneira crítica.

2. Em que sentido Senhora pode ser vista como uma obra tipi-camente romântica? Explique por quê.

Senhora é uma obra tipicamente romântica não no sentido indianis-ta, nativista ou mítico, com uma idealização da natureza e das ori-gens ancestrais do homem, mas na medida em que propõe umideal: o amor. A faceta do amor comercializável é central na obra,mas o é apenas como a contraface crítica de uma sociedade repletade vícios. No final, a solução se revela no próprio amor, que conse-gue brotar do solo árido das disputas.

3. Quais as principais divisões e subdivisões da obra de José deAlencar? Como você situaria Senhora em relação às demaisobras desse autor?

A obra de José de Alencar pode ser dividida em três grandes corren-tes: 1. a nativista, mítica ou indianista, que trata da origem do Brasil,dos mitos fundadores, dos povos e das culturas que nos constituí-ram, tais como em Iracema, O guarani, Ubirajara; 2. a histórica, queaborda um período importante do processo de formação do Brasil,como em Minas de prata; 3. a vertente regional, que se subdivide emduas linhagens: a primeira, ligada às tradições, como no caso do

UMA OBRA CLÁSSICA 6. Por que o autor narra a origem humilde de Aurélia nasegunda parte do romance? Qual é a função dessas informaçõespara a obra?

O autor o faz para dar ao leitor uma espécie de biografia espiritual deAurélia. No fundo, é como se ele atenuasse a culpa pelo seu compor-tamento, focando-a mais nos valores da sociedade, que nos corrom-pem. Temos aqui bem exemplificada a dialética que o Romantismocria entre a natureza e a cultura, entre a bondade inata do homem eos valores sociais que a maculam. Aurélia era boa na infância, mas anecessidade de se inserir na roda-viva econômica a desvirtuou.

7. Qual é o tipo de estratégia narrativa utilizada em Senhora?

O narrador atua em terceira pessoa. Porém, mostra-se oniscienteem alguns momentos, vasculhando e mostrando ao leitor a intimi-dade e os pensamentos de alguns personagens. Esse recurso, mistode isenção e onisciência, era muito usado pelos escritores, paracompor uma cena ao mesmo tempo psicológica e social.

8. Em relação às técnicas usadas pelo narrador de Senhora,atribua V (verdadeiro) ou F (falso):

( ) Terceira pessoa( ) Onipresente( ) Onisciente( ) Primeira pessoa( ) Extensão entre autor/narrador( ) Terceira pessoa (plural)

1-V; 2-F; 3-V; 4-F; 5-F; 6-F

9. Como você vê o papel do tio Lemos na trama de Senhora?

Ele é o articulador, o intermediário entre a vontade de Aurélia e a“compra” de seu marido. É uma figura que ridiculariza os tiposambiciosos, que se valem das oportunidades para conseguir o quealmejam.

10. Podemos dizer que Aurélia é má? Por quê?

Não. Porque o enredo nos mostra que ela apenas se inseriu nosvalores viciados de seu tempo. A tônica recai sobre os problemasda época, não sobre os hábitos de Aurélia. Sua conduta, por exem-plo, destoa da conduta vigente das mulheres de seu tempo.Entretanto, ao conferir traços masculinos às ações de Aurélia, oautor quer com isso ressaltar os hábitos machistas que norteiam avida em sociedade.

11. Leia o texto abaixo, do filósofo francês Jean-JacquesRousseau, uma das prováveis inspirações de José de Alencar:

(...) O que há de mais cruel ainda é que, todos os progressos da espé-cie humana, distanciando-a incessantemente de seu estado primiti-vo, quanto mais acumulamos novos conhecimentos, tanto maisafastamos os meios de adquirir o mais importante de todos, e aindaque, num certo sentido, à força de estudar o homem, tornamo-nosincapazes de conhecê-lo.

ROUSSEAU, Jean-Jacques. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1978. p. XV.

NARRADOR

PERSONAGENS Podemos dizer que Senhora tematiza um afastamento do ladoprimitivo do homem? Em que sentido?

Da mesma forma que os romances indianistas de Alencar mostravama virtude em estado bruto, ou seja, mostravam que o homem em esta-do natural é bom, Senhora parece demonstrar que a sociedade o cor-rompe. No caso, tem-se a corrupção de Aurélia como foco, mas nofundo quase todos os personagens do romance têm algum vício,sendo todos eles integrantes de uma sociedade corrupta e mercantilis-ta. Nesse sentido, Rousseau não apenas inspirou os romances india-nistas ou nativistas do autor cearense, como também lhe mostrou oreverso da medalha: os males que a civilização causa aos homens.

12. Leia o trecho a seguir, de William Cereja e TherezaMagalhães:

Nas décadas que sucederam a Independência do Brasil, os roman-cistas empenharam-se no projeto de construção de uma culturabrasileira autônoma. Esse projeto exigia dos escritores o reconheci-mento da identidade de nossa gente, nossa língua, nossas tradiçõese também das nossas diferenças nacionais e culturais. Nessa buscado nacional, o romance voltou-se para os espaços nacionais, iden-tificados como a selva, o campo e a cidade, que deram origem, res-pectivamente, ao romance indianista e histórico (a vida primiti-va), ao romance regional (a vida rural) e ao romance urbano (avida citadina). José de Alencar, por exemplo, o maior romancistado nosso Romantismo, escreveu obras que enfocaram esses trêsaspectos, como O guarani, romance histórico-indianista, O gaú-cho, romance regional, e Senhora, romance urbano.

CEREJA, William Roberto e MAGALHÃES, Thereza Cochar. Literaturabrasileira: em diálogo com outras literaturas e outras linguagens,

3. ed. São Paulo: Atual, 2005. p. 238-239.

INTERTEXTUALIDADE

romance O gaúcho, e a segunda, mais cosmopolita e urbana, enfo-cando as relações sociais das grandes cidades, na qual se destacamLucíola, Diva, A pata da gazela e Senhora.

4. Qual seria o tema central de Senhora? Ele está ligado à sub-divisão da obra em capítulos? Por quê?

O cerne da obra é a mercantilização do amor, o papel do dinheirona sociedade moderna, capaz de tudo comprar. O tema centralpode ser demonstrado a partir dos subtítulos das partes nas quaiso romance está dividido: O Preço, Quitação, Posse e Resgate. Alémdisso, a própria estrutura do enredo e dos personagens salientaesse tema como nuclear.

5. Apenas as obras nativistas de José de Alencar contam comaspectos míticos? É possível dizer que Senhora também contacom alguns elementos míticos em sua estrutura narrativa?Exemplifique com algumas passagens.

Algumas abordagens críticas ressaltam também o aspecto mítico queaparece subliminarmente em romances como Senhora. Por exemplo,no primeiro capítulo da obra (I, I), Aurélia é retratada como um anjo,com tons de pureza e de virgindade. No mesmo capítulo, o autor dizque ela pisa uma víbora – trata-se da famosa imagem católica da vir-gem Maria, sobre o globo terrestre, esmagando a serpente demonía-ca com o pé. Mais adiante (I, II), há uma identificação dela com o sole, posteriormente (I, XIII), sua câmara nupcial se transforma em céu.

NARRATIVA

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Aponte algumas características de Senhora que tenham comoobjetivo a criação dessa identidade nacional brasileira.

Resposta pessoal. Sugestão: O tema das dissimulações e relaçõesentre amor e dinheiro foi abordado por diversos autores estrangei-ros, como Balzac, em seu O coronel Chabert, entre tantos outros.Porém, a maneira como tais relações se acentuam na sociedade bra-sileira serviu de matéria-prima para Alencar levar a cabo seu proje-to descritivo da fisionomia nacional. A senhora Aurélia pode servista como uma transgressora da ordem social fundada no homem,seja ele senhor de engenho ou bacharel, que sempre usou de seuestatuto para manter as desigualdades sociais e garantir privilégios,centralizando o poder. Em Senhora, temos uma inversão dessespapéis, sem haver, contudo, a minimização da crítica aos valoresvigentes, baseados no uso, na troca, no escambo, na manipulação ena transação de corpos e afetos humanos.

13. Leia um trecho de As emoções e o coração, de Madame deStaël, escritora e teorizadora do Romantismo na Alemanha.

AS EMOÇÕES E O CORAÇÃO

Observar o coração humano é mostrar a cada passo a influência damoral sobre o destino: há um único segredo na vida, que é o bem ouo mal que se fez; este segredo esconde-se sob mil formas enganadoras:alguém sofre por um longo período sem merecer, ou prospera durantemuito tempo por meios condenáveis, mas de repente a sorte decide-se,a palavra-chave do seu enigma revela-se, essa palavra que a consciên-cia já tinha pronunciado muito antes de o destino a ter repetido. Éassim que a história do homem deve ser apresentada nos romances; éassim que as ficções devem explicar-nos, por intermédio de nossas vir-tudes e dos nossos sentimentos, os mistérios da nossa condição.

STAËL, Madame de. “As emoções e o coração”. In: GOMES, ÁlvaroCardoso e VECHI, Carlos Alberto (orgs.). A estética romântica: textos

doutrinários comentados. São Paulo: Atlas, 1992.

CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA10

b) “Somente ela, tal como a epopéia, pode tornar-se reflexo datotalidade do mundo circundante, imagem da época.” Em quesentido essa frase tem relação com o projeto literário de José deAlencar?

José de Alencar tentou, em sua obra, dar um painel de toda a socie-dade brasileira, desde o seu aspecto histórico e mítico até os seusdilemas urbanos e atuais. É nesse sentido que sua obra ambiciona-va o mesmo que Schlegel diz que a poesia romântica ambiciona:forjar a totalidade do mundo circundante e dar-nos a imagem glo-bal de uma época.

Agora é com você, caro leitor.Valendo-se das orientações desta edição e das suas respostas àsatividades de leitura, elabore uma nova entrevista com o autor,mais ou menos como a Entrevista Imaginária do final do livro.Ainda que José de Alencar já não esteja entre nós, sua obra estáviva neste país que favorece poucos com o dinheiro de muitos eé administrado a distância. As polêmicas nas quais se envolveu,a variedade de gêneros literários que produziu, a viagem comtoda a família para a Europa, onde permaneceu oito meses embusca de tratamento para sua frágil saúde, não serão ingredien-tes suficientes para compor uma conversa com o autor? Os assuntos podem abordar a composição dos personagens, oRio de Janeiro dos séculos XIX e XXI, a recepção da obra peloscontemporâneos (lembrando que entre os críticos da época esta-vam Manuel Antônio de Almeida e Machado de Assis). Além disso, será possível perguntar a José de Alencar como elevê, hoje, o comportamento do brasileiro quando o assunto éBrasil. Nada melhor que a consideração de um especialista... Procure basear as perguntas e as respostas em afirmações dopróprio escritor ou em falas de personagens e narradores cria-dos por ele. Capriche e bom trabalho!

18

SUPLEMENTODE ATIVIDADES

NOME:NO: SÉRIE:ESCOLA:

SENHORAJOSE DE ALENCAR

Criador de uma literatura nacional e preocupado com a for-mação da identidade brasileira, José de Alencar propôs-se a fazerum painel da sociedade brasileira em todas as suas facetas. Senhora é considerado o mais bem-sucedido romance urbanodo autor. Além disso, ele contempla críticas aos principais pro-blemas da sociedade que ocuparam José de Alencar ao longo desua vida. As atividades a seguir pretendem ampliar a sua compreensão deSenhora e de seu tempo. Desenvolva-as após a leitura do livro,dos Diários de um Clássico, da Contextualização Histórica e daEntrevista Imaginária.

14. Friedrich Schlegel foi um importante filósofo, teorizadorda estética romântica. Leia a seguir um trecho de sua autoria.

POESIA E EVOLUÇÃO

A poesia romântica é uma poesia universal que está em constante evo-lução. A sua missão não consiste apenas em reunir novamente todosos gêneros da poesia e em levar a poesia a estabelecer uma relação coma filosofia e com a retórica. Ela pretende e deve, além disso, misturarou fundir poesia e prosa, genialidade e crítica, poesia da arte e poesiada Natureza, tornar a poesia viva e sociável e a vida e a sociedade poé-ticas, poetizar o humor, encher e saturar as formas da arte de todasorte de material cultural e estimulá-las com as vibrações do humor.Ela abarca tudo o que seja meramente poético, desde o mais amplo sis-tema da arte que, por sua vez, engloba outros sistemas, até o suspiro eo beijo que a criança-poeta emite em seu canto espontâneo. Ela pode-ria perder-se, de tal modo, naquilo que seria de pensar que seu únicoobjetivo consiste em caracterizar indivíduos poéticos de todos os tipos;e, no entanto, ainda não existe nenhuma forma apta a exprimir intei-ramente o espírito do autor; por isso, muitos artistas que queriamescrever um único romance, eventualmente fizeram uma descrição desi mesmos. Somente ela, tal como a epopéia, pode tornar-se reflexo datotalidade do mundo circundante, imagem da época.

SCHLEGEL, Friedrich. “Poesia e evolução”. In: GOMES, Álvaro Cardoso e VECHI, Carlos Alberto (orgs.). A estética romântica: textos

doutrinários comentados. São Paulo: Atlas, 1992.

a) Em sua opinião, em síntese, qual a grande ambição da poesiaromântica, nas palavras de Schlegel?

Misturar a criação poética à própria vida. Todos os itens enumeradospelo filósofo vão nesse sentido. Trata-se de uma proposta que não éapenas de ordem estética e artística, mas que deita raízes em outrosdomínios da vida, e amplia assim nossa própria concepção de arte.

a) Em que sentido as idéias de Staël estão ligadas às concepçõesde Senhora?

O texto de Madame de Staël é exemplar, pois analisa alguns dospontos cruciais tratados por José de Alencar em Senhora: há o des-tino de Aurélia e a moral que dele advém. Seus atos, seus valores,sua condição; tudo está interligado ao seu destino, às escolhas queela fez para sua vida e ao modo como ela se relaciona com o amor.

b) O que a autora quer dizer com a frase: “a palavra-chave do seuenigma revela-se, essa palavra que a consciência já tinha pro-nunciado muito antes de o destino a ter repetido”?

Trata-se de uma equivalência entre consciência individual e desti-no. Como sabemos, a descoberta do indivíduo, a manifestação denosso eu mais autêntico, é uma das premissas românticas. E elanão equivale a um isolamento do mundo. Pelo contrário, o eu,como um caleidoscópio, é o espelho que traduz em si e sintetizatodas as coisas do mundo, toda a existência, todos os seres. Nessesentido, o destino (geral do mundo) já é conhecido pelo nosso des-tino particular, desde que conheçamos nosso eu profundo, a maté-ria-prima de nosso coração.

c) Para a autora, onde reside o mistério da condição humana?Como os romances devem mostrá-lo? E como Senhora o mostra?

O mistério reside na interioridade do homem. Para ela, em con-sonância com o ideário romântico, os romances devem trazer àluz essas verdades ocultas nos corações, e assim mostrar a facemoral (o bem e o mal) de nossos destinos. O romance de José deAlencar toma exatamente esse tema como fio condutor. Afinal, aprotagonista Aurélia é uma mulher cujos valores foram inverti-dos. A própria sociedade sustenta essa inversão do bem e domal, ao transformar o amor em uma mercadoria. Esse é o fatoque marca o destino de Aurélia, e também o motivo central desua redenção.

A NOVA DO CADÁVER - A SUA ENTREVISTA IMAGINÁRIA

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Aponte algumas características de Senhora que tenham comoobjetivo a criação dessa identidade nacional brasileira.

Resposta pessoal. Sugestão: O tema das dissimulações e relaçõesentre amor e dinheiro foi abordado por diversos autores estrangei-ros, como Balzac, em seu O coronel Chabert, entre tantos outros.Porém, a maneira como tais relações se acentuam na sociedade bra-sileira serviu de matéria-prima para Alencar levar a cabo seu proje-to descritivo da fisionomia nacional. A senhora Aurélia pode servista como uma transgressora da ordem social fundada no homem,seja ele senhor de engenho ou bacharel, que sempre usou de seuestatuto para manter as desigualdades sociais e garantir privilégios,centralizando o poder. Em Senhora, temos uma inversão dessespapéis, sem haver, contudo, a minimização da crítica aos valoresvigentes, baseados no uso, na troca, no escambo, na manipulação ena transação de corpos e afetos humanos.

13. Leia um trecho de As emoções e o coração, de Madame deStaël, escritora e teorizadora do Romantismo na Alemanha.

AS EMOÇÕES E O CORAÇÃO

Observar o coração humano é mostrar a cada passo a influência damoral sobre o destino: há um único segredo na vida, que é o bem ouo mal que se fez; este segredo esconde-se sob mil formas enganadoras:alguém sofre por um longo período sem merecer, ou prospera durantemuito tempo por meios condenáveis, mas de repente a sorte decide-se,a palavra-chave do seu enigma revela-se, essa palavra que a consciên-cia já tinha pronunciado muito antes de o destino a ter repetido. Éassim que a história do homem deve ser apresentada nos romances; éassim que as ficções devem explicar-nos, por intermédio de nossas vir-tudes e dos nossos sentimentos, os mistérios da nossa condição.

STAËL, Madame de. “As emoções e o coração”. In: GOMES, ÁlvaroCardoso e VECHI, Carlos Alberto (orgs.). A estética romântica: textos

doutrinários comentados. São Paulo: Atlas, 1992.

CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA10

b) “Somente ela, tal como a epopéia, pode tornar-se reflexo datotalidade do mundo circundante, imagem da época.” Em quesentido essa frase tem relação com o projeto literário de José deAlencar?

José de Alencar tentou, em sua obra, dar um painel de toda a socie-dade brasileira, desde o seu aspecto histórico e mítico até os seusdilemas urbanos e atuais. É nesse sentido que sua obra ambiciona-va o mesmo que Schlegel diz que a poesia romântica ambiciona:forjar a totalidade do mundo circundante e dar-nos a imagem glo-bal de uma época.

Agora é com você, caro leitor.Valendo-se das orientações desta edição e das suas respostas àsatividades de leitura, elabore uma nova entrevista com o autor,mais ou menos como a Entrevista Imaginária do final do livro.Ainda que José de Alencar já não esteja entre nós, sua obra estáviva neste país que favorece poucos com o dinheiro de muitos eé administrado a distância. As polêmicas nas quais se envolveu,a variedade de gêneros literários que produziu, a viagem comtoda a família para a Europa, onde permaneceu oito meses embusca de tratamento para sua frágil saúde, não serão ingredien-tes suficientes para compor uma conversa com o autor? Os assuntos podem abordar a composição dos personagens, oRio de Janeiro dos séculos XIX e XXI, a recepção da obra peloscontemporâneos (lembrando que entre os críticos da época esta-vam Manuel Antônio de Almeida e Machado de Assis). Além disso, será possível perguntar a José de Alencar como elevê, hoje, o comportamento do brasileiro quando o assunto éBrasil. Nada melhor que a consideração de um especialista... Procure basear as perguntas e as respostas em afirmações dopróprio escritor ou em falas de personagens e narradores cria-dos por ele. Capriche e bom trabalho!

18

SUPLEMENTODE ATIVIDADES

NOME:NO: SÉRIE:ESCOLA:

SENHORAJOSE DE ALENCAR

Criador de uma literatura nacional e preocupado com a for-mação da identidade brasileira, José de Alencar propôs-se a fazerum painel da sociedade brasileira em todas as suas facetas. Senhora é considerado o mais bem-sucedido romance urbanodo autor. Além disso, ele contempla críticas aos principais pro-blemas da sociedade que ocuparam José de Alencar ao longo desua vida. As atividades a seguir pretendem ampliar a sua compreensão deSenhora e de seu tempo. Desenvolva-as após a leitura do livro,dos Diários de um Clássico, da Contextualização Histórica e daEntrevista Imaginária.

14. Friedrich Schlegel foi um importante filósofo, teorizadorda estética romântica. Leia a seguir um trecho de sua autoria.

POESIA E EVOLUÇÃO

A poesia romântica é uma poesia universal que está em constante evo-lução. A sua missão não consiste apenas em reunir novamente todosos gêneros da poesia e em levar a poesia a estabelecer uma relação coma filosofia e com a retórica. Ela pretende e deve, além disso, misturarou fundir poesia e prosa, genialidade e crítica, poesia da arte e poesiada Natureza, tornar a poesia viva e sociável e a vida e a sociedade poé-ticas, poetizar o humor, encher e saturar as formas da arte de todasorte de material cultural e estimulá-las com as vibrações do humor.Ela abarca tudo o que seja meramente poético, desde o mais amplo sis-tema da arte que, por sua vez, engloba outros sistemas, até o suspiro eo beijo que a criança-poeta emite em seu canto espontâneo. Ela pode-ria perder-se, de tal modo, naquilo que seria de pensar que seu únicoobjetivo consiste em caracterizar indivíduos poéticos de todos os tipos;e, no entanto, ainda não existe nenhuma forma apta a exprimir intei-ramente o espírito do autor; por isso, muitos artistas que queriamescrever um único romance, eventualmente fizeram uma descrição desi mesmos. Somente ela, tal como a epopéia, pode tornar-se reflexo datotalidade do mundo circundante, imagem da época.

SCHLEGEL, Friedrich. “Poesia e evolução”. In: GOMES, Álvaro Cardoso e VECHI, Carlos Alberto (orgs.). A estética romântica: textos

doutrinários comentados. São Paulo: Atlas, 1992.

a) Em sua opinião, em síntese, qual a grande ambição da poesiaromântica, nas palavras de Schlegel?

Misturar a criação poética à própria vida. Todos os itens enumeradospelo filósofo vão nesse sentido. Trata-se de uma proposta que não éapenas de ordem estética e artística, mas que deita raízes em outrosdomínios da vida, e amplia assim nossa própria concepção de arte.

a) Em que sentido as idéias de Staël estão ligadas às concepçõesde Senhora?

O texto de Madame de Staël é exemplar, pois analisa alguns dospontos cruciais tratados por José de Alencar em Senhora: há o des-tino de Aurélia e a moral que dele advém. Seus atos, seus valores,sua condição; tudo está interligado ao seu destino, às escolhas queela fez para sua vida e ao modo como ela se relaciona com o amor.

b) O que a autora quer dizer com a frase: “a palavra-chave do seuenigma revela-se, essa palavra que a consciência já tinha pro-nunciado muito antes de o destino a ter repetido”?

Trata-se de uma equivalência entre consciência individual e desti-no. Como sabemos, a descoberta do indivíduo, a manifestação denosso eu mais autêntico, é uma das premissas românticas. E elanão equivale a um isolamento do mundo. Pelo contrário, o eu,como um caleidoscópio, é o espelho que traduz em si e sintetizatodas as coisas do mundo, toda a existência, todos os seres. Nessesentido, o destino (geral do mundo) já é conhecido pelo nosso des-tino particular, desde que conheçamos nosso eu profundo, a maté-ria-prima de nosso coração.

c) Para a autora, onde reside o mistério da condição humana?Como os romances devem mostrá-lo? E como Senhora o mostra?

O mistério reside na interioridade do homem. Para ela, em con-sonância com o ideário romântico, os romances devem trazer àluz essas verdades ocultas nos corações, e assim mostrar a facemoral (o bem e o mal) de nossos destinos. O romance de José deAlencar toma exatamente esse tema como fio condutor. Afinal, aprotagonista Aurélia é uma mulher cujos valores foram inverti-dos. A própria sociedade sustenta essa inversão do bem e domal, ao transformar o amor em uma mercadoria. Esse é o fatoque marca o destino de Aurélia, e também o motivo central desua redenção.

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Aponte algumas características de Senhora que tenham comoobjetivo a criação dessa identidade nacional brasileira.

Resposta pessoal. Sugestão: O tema das dissimulações e relaçõesentre amor e dinheiro foi abordado por diversos autores estrangei-ros, como Balzac, em seu O coronel Chabert, entre tantos outros.Porém, a maneira como tais relações se acentuam na sociedade bra-sileira serviu de matéria-prima para Alencar levar a cabo seu proje-to descritivo da fisionomia nacional. A senhora Aurélia pode servista como uma transgressora da ordem social fundada no homem,seja ele senhor de engenho ou bacharel, que sempre usou de seuestatuto para manter as desigualdades sociais e garantir privilégios,centralizando o poder. Em Senhora, temos uma inversão dessespapéis, sem haver, contudo, a minimização da crítica aos valoresvigentes, baseados no uso, na troca, no escambo, na manipulação ena transação de corpos e afetos humanos.

13. Leia um trecho de As emoções e o coração, de Madame deStaël, escritora e teorizadora do Romantismo na Alemanha.

AS EMOÇÕES E O CORAÇÃO

Observar o coração humano é mostrar a cada passo a influência damoral sobre o destino: há um único segredo na vida, que é o bem ouo mal que se fez; este segredo esconde-se sob mil formas enganadoras:alguém sofre por um longo período sem merecer, ou prospera durantemuito tempo por meios condenáveis, mas de repente a sorte decide-se,a palavra-chave do seu enigma revela-se, essa palavra que a consciên-cia já tinha pronunciado muito antes de o destino a ter repetido. Éassim que a história do homem deve ser apresentada nos romances; éassim que as ficções devem explicar-nos, por intermédio de nossas vir-tudes e dos nossos sentimentos, os mistérios da nossa condição.

STAËL, Madame de. “As emoções e o coração”. In: GOMES, ÁlvaroCardoso e VECHI, Carlos Alberto (orgs.). A estética romântica: textos

doutrinários comentados. São Paulo: Atlas, 1992.

CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA10

b) “Somente ela, tal como a epopéia, pode tornar-se reflexo datotalidade do mundo circundante, imagem da época.” Em quesentido essa frase tem relação com o projeto literário de José deAlencar?

José de Alencar tentou, em sua obra, dar um painel de toda a socie-dade brasileira, desde o seu aspecto histórico e mítico até os seusdilemas urbanos e atuais. É nesse sentido que sua obra ambiciona-va o mesmo que Schlegel diz que a poesia romântica ambiciona:forjar a totalidade do mundo circundante e dar-nos a imagem glo-bal de uma época.

Agora é com você, caro leitor.Valendo-se das orientações desta edição e das suas respostas àsatividades de leitura, elabore uma nova entrevista com o autor,mais ou menos como a Entrevista Imaginária do final do livro.Ainda que José de Alencar já não esteja entre nós, sua obra estáviva neste país que favorece poucos com o dinheiro de muitos eé administrado a distância. As polêmicas nas quais se envolveu,a variedade de gêneros literários que produziu, a viagem comtoda a família para a Europa, onde permaneceu oito meses embusca de tratamento para sua frágil saúde, não serão ingredien-tes suficientes para compor uma conversa com o autor? Os assuntos podem abordar a composição dos personagens, oRio de Janeiro dos séculos XIX e XXI, a recepção da obra peloscontemporâneos (lembrando que entre os críticos da época esta-vam Manuel Antônio de Almeida e Machado de Assis). Além disso, será possível perguntar a José de Alencar como elevê, hoje, o comportamento do brasileiro quando o assunto éBrasil. Nada melhor que a consideração de um especialista... Procure basear as perguntas e as respostas em afirmações dopróprio escritor ou em falas de personagens e narradores cria-dos por ele. Capriche e bom trabalho!

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SUPLEMENTODE ATIVIDADES

NOME:NO: SÉRIE:ESCOLA:

SENHORAJOSE DE ALENCAR

Criador de uma literatura nacional e preocupado com a for-mação da identidade brasileira, José de Alencar propôs-se a fazerum painel da sociedade brasileira em todas as suas facetas. Senhora é considerado o mais bem-sucedido romance urbanodo autor. Além disso, ele contempla críticas aos principais pro-blemas da sociedade que ocuparam José de Alencar ao longo desua vida. As atividades a seguir pretendem ampliar a sua compreensão deSenhora e de seu tempo. Desenvolva-as após a leitura do livro,dos Diários de um Clássico, da Contextualização Histórica e daEntrevista Imaginária.

14. Friedrich Schlegel foi um importante filósofo, teorizadorda estética romântica. Leia a seguir um trecho de sua autoria.

POESIA E EVOLUÇÃO

A poesia romântica é uma poesia universal que está em constante evo-lução. A sua missão não consiste apenas em reunir novamente todosos gêneros da poesia e em levar a poesia a estabelecer uma relação coma filosofia e com a retórica. Ela pretende e deve, além disso, misturarou fundir poesia e prosa, genialidade e crítica, poesia da arte e poesiada Natureza, tornar a poesia viva e sociável e a vida e a sociedade poé-ticas, poetizar o humor, encher e saturar as formas da arte de todasorte de material cultural e estimulá-las com as vibrações do humor.Ela abarca tudo o que seja meramente poético, desde o mais amplo sis-tema da arte que, por sua vez, engloba outros sistemas, até o suspiro eo beijo que a criança-poeta emite em seu canto espontâneo. Ela pode-ria perder-se, de tal modo, naquilo que seria de pensar que seu únicoobjetivo consiste em caracterizar indivíduos poéticos de todos os tipos;e, no entanto, ainda não existe nenhuma forma apta a exprimir intei-ramente o espírito do autor; por isso, muitos artistas que queriamescrever um único romance, eventualmente fizeram uma descrição desi mesmos. Somente ela, tal como a epopéia, pode tornar-se reflexo datotalidade do mundo circundante, imagem da época.

SCHLEGEL, Friedrich. “Poesia e evolução”. In: GOMES, Álvaro Cardoso e VECHI, Carlos Alberto (orgs.). A estética romântica: textos

doutrinários comentados. São Paulo: Atlas, 1992.

a) Em sua opinião, em síntese, qual a grande ambição da poesiaromântica, nas palavras de Schlegel?

Misturar a criação poética à própria vida. Todos os itens enumeradospelo filósofo vão nesse sentido. Trata-se de uma proposta que não éapenas de ordem estética e artística, mas que deita raízes em outrosdomínios da vida, e amplia assim nossa própria concepção de arte.

a) Em que sentido as idéias de Staël estão ligadas às concepçõesde Senhora?

O texto de Madame de Staël é exemplar, pois analisa alguns dospontos cruciais tratados por José de Alencar em Senhora: há o des-tino de Aurélia e a moral que dele advém. Seus atos, seus valores,sua condição; tudo está interligado ao seu destino, às escolhas queela fez para sua vida e ao modo como ela se relaciona com o amor.

b) O que a autora quer dizer com a frase: “a palavra-chave do seuenigma revela-se, essa palavra que a consciência já tinha pro-nunciado muito antes de o destino a ter repetido”?

Trata-se de uma equivalência entre consciência individual e desti-no. Como sabemos, a descoberta do indivíduo, a manifestação denosso eu mais autêntico, é uma das premissas românticas. E elanão equivale a um isolamento do mundo. Pelo contrário, o eu,como um caleidoscópio, é o espelho que traduz em si e sintetizatodas as coisas do mundo, toda a existência, todos os seres. Nessesentido, o destino (geral do mundo) já é conhecido pelo nosso des-tino particular, desde que conheçamos nosso eu profundo, a maté-ria-prima de nosso coração.

c) Para a autora, onde reside o mistério da condição humana?Como os romances devem mostrá-lo? E como Senhora o mostra?

O mistério reside na interioridade do homem. Para ela, em con-sonância com o ideário romântico, os romances devem trazer àluz essas verdades ocultas nos corações, e assim mostrar a facemoral (o bem e o mal) de nossos destinos. O romance de José deAlencar toma exatamente esse tema como fio condutor. Afinal, aprotagonista Aurélia é uma mulher cujos valores foram inverti-dos. A própria sociedade sustenta essa inversão do bem e domal, ao transformar o amor em uma mercadoria. Esse é o fatoque marca o destino de Aurélia, e também o motivo central desua redenção.

A NOVA DO CADÁVER - A SUA ENTREVISTA IMAGINÁRIA

Page 10: SUPLEMENTO LUCÍOLA

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Aponte algumas características de Senhora que tenham comoobjetivo a criação dessa identidade nacional brasileira.

Resposta pessoal. Sugestão: O tema das dissimulações e relaçõesentre amor e dinheiro foi abordado por diversos autores estrangei-ros, como Balzac, em seu O coronel Chabert, entre tantos outros.Porém, a maneira como tais relações se acentuam na sociedade bra-sileira serviu de matéria-prima para Alencar levar a cabo seu proje-to descritivo da fisionomia nacional. A senhora Aurélia pode servista como uma transgressora da ordem social fundada no homem,seja ele senhor de engenho ou bacharel, que sempre usou de seuestatuto para manter as desigualdades sociais e garantir privilégios,centralizando o poder. Em Senhora, temos uma inversão dessespapéis, sem haver, contudo, a minimização da crítica aos valoresvigentes, baseados no uso, na troca, no escambo, na manipulação ena transação de corpos e afetos humanos.

13. Leia um trecho de As emoções e o coração, de Madame deStaël, escritora e teorizadora do Romantismo na Alemanha.

AS EMOÇÕES E O CORAÇÃO

Observar o coração humano é mostrar a cada passo a influência damoral sobre o destino: há um único segredo na vida, que é o bem ouo mal que se fez; este segredo esconde-se sob mil formas enganadoras:alguém sofre por um longo período sem merecer, ou prospera durantemuito tempo por meios condenáveis, mas de repente a sorte decide-se,a palavra-chave do seu enigma revela-se, essa palavra que a consciên-cia já tinha pronunciado muito antes de o destino a ter repetido. Éassim que a história do homem deve ser apresentada nos romances; éassim que as ficções devem explicar-nos, por intermédio de nossas vir-tudes e dos nossos sentimentos, os mistérios da nossa condição.

STAËL, Madame de. “As emoções e o coração”. In: GOMES, ÁlvaroCardoso e VECHI, Carlos Alberto (orgs.). A estética romântica: textos

doutrinários comentados. São Paulo: Atlas, 1992.

CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA10

b) “Somente ela, tal como a epopéia, pode tornar-se reflexo datotalidade do mundo circundante, imagem da época.” Em quesentido essa frase tem relação com o projeto literário de José deAlencar?

José de Alencar tentou, em sua obra, dar um painel de toda a socie-dade brasileira, desde o seu aspecto histórico e mítico até os seusdilemas urbanos e atuais. É nesse sentido que sua obra ambiciona-va o mesmo que Schlegel diz que a poesia romântica ambiciona:forjar a totalidade do mundo circundante e dar-nos a imagem glo-bal de uma época.

Agora é com você, caro leitor.Valendo-se das orientações desta edição e das suas respostas àsatividades de leitura, elabore uma nova entrevista com o autor,mais ou menos como a Entrevista Imaginária do final do livro.Ainda que José de Alencar já não esteja entre nós, sua obra estáviva neste país que favorece poucos com o dinheiro de muitos eé administrado a distância. As polêmicas nas quais se envolveu,a variedade de gêneros literários que produziu, a viagem comtoda a família para a Europa, onde permaneceu oito meses embusca de tratamento para sua frágil saúde, não serão ingredien-tes suficientes para compor uma conversa com o autor? Os assuntos podem abordar a composição dos personagens, oRio de Janeiro dos séculos XIX e XXI, a recepção da obra peloscontemporâneos (lembrando que entre os críticos da época esta-vam Manuel Antônio de Almeida e Machado de Assis). Além disso, será possível perguntar a José de Alencar como elevê, hoje, o comportamento do brasileiro quando o assunto éBrasil. Nada melhor que a consideração de um especialista... Procure basear as perguntas e as respostas em afirmações dopróprio escritor ou em falas de personagens e narradores cria-dos por ele. Capriche e bom trabalho!

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SUPLEMENTODE ATIVIDADES

NOME:NO: SÉRIE:ESCOLA:

SENHORAJOSE DE ALENCAR

Criador de uma literatura nacional e preocupado com a for-mação da identidade brasileira, José de Alencar propôs-se a fazerum painel da sociedade brasileira em todas as suas facetas. Senhora é considerado o mais bem-sucedido romance urbanodo autor. Além disso, ele contempla críticas aos principais pro-blemas da sociedade que ocuparam José de Alencar ao longo desua vida. As atividades a seguir pretendem ampliar a sua compreensão deSenhora e de seu tempo. Desenvolva-as após a leitura do livro,dos Diários de um Clássico, da Contextualização Histórica e daEntrevista Imaginária.

14. Friedrich Schlegel foi um importante filósofo, teorizadorda estética romântica. Leia a seguir um trecho de sua autoria.

POESIA E EVOLUÇÃO

A poesia romântica é uma poesia universal que está em constante evo-lução. A sua missão não consiste apenas em reunir novamente todosos gêneros da poesia e em levar a poesia a estabelecer uma relação coma filosofia e com a retórica. Ela pretende e deve, além disso, misturarou fundir poesia e prosa, genialidade e crítica, poesia da arte e poesiada Natureza, tornar a poesia viva e sociável e a vida e a sociedade poé-ticas, poetizar o humor, encher e saturar as formas da arte de todasorte de material cultural e estimulá-las com as vibrações do humor.Ela abarca tudo o que seja meramente poético, desde o mais amplo sis-tema da arte que, por sua vez, engloba outros sistemas, até o suspiro eo beijo que a criança-poeta emite em seu canto espontâneo. Ela pode-ria perder-se, de tal modo, naquilo que seria de pensar que seu únicoobjetivo consiste em caracterizar indivíduos poéticos de todos os tipos;e, no entanto, ainda não existe nenhuma forma apta a exprimir intei-ramente o espírito do autor; por isso, muitos artistas que queriamescrever um único romance, eventualmente fizeram uma descrição desi mesmos. Somente ela, tal como a epopéia, pode tornar-se reflexo datotalidade do mundo circundante, imagem da época.

SCHLEGEL, Friedrich. “Poesia e evolução”. In: GOMES, Álvaro Cardoso e VECHI, Carlos Alberto (orgs.). A estética romântica: textos

doutrinários comentados. São Paulo: Atlas, 1992.

a) Em sua opinião, em síntese, qual a grande ambição da poesiaromântica, nas palavras de Schlegel?

Misturar a criação poética à própria vida. Todos os itens enumeradospelo filósofo vão nesse sentido. Trata-se de uma proposta que não éapenas de ordem estética e artística, mas que deita raízes em outrosdomínios da vida, e amplia assim nossa própria concepção de arte.

a) Em que sentido as idéias de Staël estão ligadas às concepçõesde Senhora?

O texto de Madame de Staël é exemplar, pois analisa alguns dospontos cruciais tratados por José de Alencar em Senhora: há o des-tino de Aurélia e a moral que dele advém. Seus atos, seus valores,sua condição; tudo está interligado ao seu destino, às escolhas queela fez para sua vida e ao modo como ela se relaciona com o amor.

b) O que a autora quer dizer com a frase: “a palavra-chave do seuenigma revela-se, essa palavra que a consciência já tinha pro-nunciado muito antes de o destino a ter repetido”?

Trata-se de uma equivalência entre consciência individual e desti-no. Como sabemos, a descoberta do indivíduo, a manifestação denosso eu mais autêntico, é uma das premissas românticas. E elanão equivale a um isolamento do mundo. Pelo contrário, o eu,como um caleidoscópio, é o espelho que traduz em si e sintetizatodas as coisas do mundo, toda a existência, todos os seres. Nessesentido, o destino (geral do mundo) já é conhecido pelo nosso des-tino particular, desde que conheçamos nosso eu profundo, a maté-ria-prima de nosso coração.

c) Para a autora, onde reside o mistério da condição humana?Como os romances devem mostrá-lo? E como Senhora o mostra?

O mistério reside na interioridade do homem. Para ela, em con-sonância com o ideário romântico, os romances devem trazer àluz essas verdades ocultas nos corações, e assim mostrar a facemoral (o bem e o mal) de nossos destinos. O romance de José deAlencar toma exatamente esse tema como fio condutor. Afinal, aprotagonista Aurélia é uma mulher cujos valores foram inverti-dos. A própria sociedade sustenta essa inversão do bem e domal, ao transformar o amor em uma mercadoria. Esse é o fatoque marca o destino de Aurélia, e também o motivo central desua redenção.

A NOVA DO CADÁVER - A SUA ENTREVISTA IMAGINÁRIA