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Bahrain World Trade Center, do escritório britânico Atkins, incorporou três turbinas eólicas, que geram 15% da energia consumida pelo edifício Sustentabilidade high tech Extravagantes, edifícios como os de Dubai e China tentam provar que são sustentáveis. Por isso, transformaram-se em grandes geradores eólicos e captadores fotovoltaicos. Mas isso é viável? Por Maurício Horta Nos parques de diversões da arquitetura contemporânea, a corrida tecnológica flerta agora o discurso ecológico. Turbinas eólicas incorporadas em arranha-céus em Bahrain, grandes painéis fotovoltaicos em Dubai, sistemas geotérmicos na China e imensas coberturas vivas na Califórnia vão bem além das exigências de certificações ambientais. Mas quanto esses recursos podem de fato contribuir para melhorar a eficiência das edificações - e mais, o quão próximo da realidade esses sonhos nas alturas chegam? Os fortes ventos trocados entre o Golfo Pérsico e o deserto levaram a uma escolha óbvia em países da Península Arábica: turbinas eólicas incorporadas na edificação. "No caso de arranha-céus, pode haver um potencial de aproveitamento. Estamos falando de mais de 100 m de altura, onde a velocidade do vento tende a ser mais alta do que no solo", diz o engenheiro Fernando Westphal, gerente de eficiência energética do Centro de Tecnologia de Edificações. Desde abril de 2008 três turbinas unidirecionais de 29 m de diâmetro giram entre as duas torres gêmeas de 240 m de altura e em forma de vela do Bahrain World Trade Center, criado pelo escritório britânico Atkins. O objetivo é que a brisa do Golfo Pérsico suprisse até 15% da energia consumida pelo prédio. Isso representaria 1,3 mil MWh por ano, suficientes para iluminar 300 casas e deixar de emitir 55 t de carbono anuais. Segundo a Atkins, o custo de até 30% do valor do projeto tornaria inviável a integração de turbinas de larga escala, tanto por conta da adaptação do projeto do prédio quanto das pesquisas de turbinas especiais. A solução foi usar turbinas convencionais sustentadas cada uma por um eixo horizontal de 50 t. A solução não foi a ideal - melhor seria que tivessem eixo vertical. "As turbinas eólicas de eixo vertical têm a vantagem da facilidade de manutenção, normalmente funcionam com vento vindo de todas as direções, sem a necessidade de possuírem mecanismos como leme para colocarem as pás na direção dos ventos", diz a professora Eliane Fadigas, do Page 1 of 13 Revista Téchne 31/8/2010 http://www.revistatechne.com.br/engenharia-civil/141/imprime119430.asp

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Bahrain World Trade Center, do escritório britânico Atkins, incorporou três turbinas eólicas, que geram 15% da energia consumida pelo edifício

Sustentabilidade high tech

Extravagantes, edifícios como os de Dubai e China tentam provar que são sustentáveis. Por isso, transformaram-se em grandes geradores eólicos e captadores fotovoltaicos. Mas isso é viável?

Por Maurício Horta

Nos parques de diversões da arquitetura contemporânea, a corrida tecnológica flerta agora o discurso ecológico. Turbinas eólicas incorporadas em arranha-céus em Bahrain, grandes painéis fotovoltaicos em Dubai, sistemas geotérmicos na China e imensas coberturas vivas na Califórnia vão bem além das exigências de certificações ambientais. Mas quanto esses recursos podem de fato contribuir para melhorar a eficiência das edificações - e mais, o quão próximo da realidade esses sonhos nas alturas chegam?

Os fortes ventos trocados entre o Golfo Pérsico e o deserto levaram a uma escolha óbvia em países da Península Arábica: turbinas eólicas incorporadas na edificação. "No caso de arranha-céus, pode haver um potencial de aproveitamento. Estamos falando de mais de 100 m de altura, onde a velocidade do vento tende a ser mais alta do que no solo", diz o engenheiro Fernando Westphal, gerente de eficiência energética do Centro de Tecnologia de Edificações.

Desde abril de 2008 três turbinas unidirecionais de 29 m de diâmetro giram entre as duas torres gêmeas de 240 m de altura e em forma de vela do Bahrain World Trade Center, criado pelo escritório britânico Atkins. O objetivo é que a brisa do Golfo Pérsico suprisse até 15% da energia consumida pelo prédio. Isso representaria 1,3 mil MWh por ano, suficientes para iluminar 300 casas e deixar de emitir 55 t de carbono anuais.

Segundo a Atkins, o custo de até 30% do valor do projeto tornaria inviável a integração de turbinas de larga escala, tanto por conta da adaptação do projeto do prédio quanto das pesquisas de turbinas especiais. A solução foi usar turbinas convencionais sustentadas cada uma por um eixo horizontal de 50 t.

A solução não foi a ideal - melhor seria que tivessem eixo vertical. "As turbinas eólicas de eixo vertical têm a vantagem da facilidade de manutenção, normalmente funcionam com vento vindo de todas as direções, sem a necessidade de possuírem mecanismos como leme para colocarem as pás na direção dos ventos", diz a professora Eliane Fadigas, do

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Departamento de Engenharia e Automação Elétricas da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. Mas o balde de realismo no deserto de fantasias fez com que sua incorporação custasse menos de 3% do projeto, segundo o escritório.

Para resolver o fato de a turbina ser fixa, a Atkins projetou para as torres um perfil elíptico que afunila o vento. Testes em túnel de vento mostraram que o desenho não apenas forma pressão negativa na parte de trás do prédio, o que acelera o vento entre as torres em até 30%, como também o desvia num percurso em formato de "S" cujo centro permanece quase perpendicular à turbina dentro de um azimute de 45º. Embora a idéia do BWTC tenha sido diminuir a dependência de reservas energéticas fósseis num clima desértico, seu projeto não tem estratégias de baixa emissão de carbono dos padrões europeus. Caro demais para o Brasil? Por enquanto, sim. Embora algumas regiões brasileiras como o litoral do Nordeste e o Rio Grande do Sul tenham um potencial eólico grande, "o preço da eletricidade praticada no Brasil em todos os setores consumidores faz ainda inviável economicamente a instalação tanto da tecnologia fotovoltaica quanto eólica em edificações nas áreas urbanas", diz Eliane.

Mas, segundo Westphal, não faltam recursos e razões para investidores bancarem essas tecnologias em empreendimentos de alto nível. "Certamente, o investidor vai tirar proveito como uma estratégia de marketing, mas a sociedade vai sair ganhando com o alívio proporcionado ao parque gerador de energia, o que diminui os impactos ambientais. Esse alívio pode ser ínfimo, se pensarmos em um ou dez prédios. Mas se a tecnologia for disseminada, o custo tende a baixar, mais empreendimentos passam a adquirir o sistema e aí começamos a ter benefícios significativos para todos."

Tecnologia dez, emissões zero A China, onde ficam 16 das 20 cidades mais poluídas do mundo, está correndo atrás para não sobrar como a vilã ecológica do século 21. Além de construções com certificação Leed do Green Building Council na Vila Olímpica de Pequim e da ecocidade Dongtan, em construção para servir de modelo de sustentabilidade na Expo-Xangai de 2010, está previsto para esse mesmo ano o primeiro arranha-céu com emissão zero de carbono do país - e do mundo. A americana Skidmore Owings & Merrill espera que o vento e o sol sejam capazes de abastecer toda a energia consumida pelo prédio projetado para a Guangdong Tobacco, em Cantão, iniciado em 2006.

Com as estratégias de redução e absorção de energia, o prédio deve consumir 65% menos que o previsto pelas leis chinesas.

Nas orientações Norte e Sul foi feito duplo fechamento em vidro low-E, com ventilação entre as duas lâminas, e instalada persiana automatizada; a Leste e Oeste, o fechamento foi triplo, protegido por brise soleil.

Contrariando o senso comum sobre prédios altos, a face mais larga da torre é a que recebe maior carga de vento. A estrutura curvilínea da torre ajuda a forçar o ar por quatro fendas na fachada, cravadas em dois andares mecânicos, onde estão instaladas turbinas eólicas de eixo vertical. Segundo a Skidmore, esse design deve forçar a velocidade em 2,5 vezes - compensando o fato de turbinas de eixo vertical serem, segundo Eliane, menos eficientes que as de eixo horizontal.

Um sistema baseado na inércia térmica do solo resfria a 25ºC no subterrâneo a água aquecida a 38ºC nas torres de resfriamento do prédio. No Brasil, embora haja pouca informação sobre o potencial geotérmico para a geração de energia, também é possível,

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Academia de Ciências da Califórnia, que recebeu certificado Leed Platina do Green Building Council americano; seus 10 mil m² de cobertura vegetal absorvem 14 milhões de litros de chuva por ano e contribuem com o isolamento térmico

segundo Westphal, usar a inércia térmica do solo para a climatização de ambientes internos. "Em São Paulo, se cavarmos um buraco de 6 m de profundidade, a temperatura do solo estará praticamente a 20ºC o ano inteiro. Esse potencial pode ser utilizado por meio de um sistema de tubos enterrados", diz. Tal sistema consiste de uma série de tubos que, quando adequadamente dimensionados a uma certa profundidade, podem resfriar o ar externo que passa em seu interior quando estiver acima de 20ºC antes de introduzi-lo no ambiente interno para a renovação de ar. Embora exija um consumo para ventilação, este é ainda bem menor que o de condicionadores.

Para tornar o arranha-céu energeticamente independente, a Skidmore incluiu ainda painéis fotovoltaicos no projeto. Embora vários prédios comecem a adotar esses painéis, seu uso em áreas urbanas, servidas por rede elétrica, ainda não é viável, segundo Eliane. "Sua eficiência está em torno de 13%. Porém, geram energia em corrente contínua, enquanto nossas cargas funcionam em corrente alternada, necessitando de outros componentes no sistema, entre eles os inversores. Assim, a eficiência total fica em torno de 10%." Mas, para a professora, esses módulos já são viáveis em áreas remotas onde não há viabilidade de estender a rede da concessionária.

Torres de vento O arquiteto alemão Eckhard Gerber e os engenheiros ambientais da DS-Plan também entraram na corrida da emissão zero, desta vez com um sistema de refrigeração da arquitetura persa: as torres de vento (veja ilustração). Na Burj al-Taqa, aberturas na fachada a cada cinco andares permitirão que a pressão negativa criada na face oposta à que recebe a carga de vento retire o ar quente das salas. Num poço subterrâneo com água do mar, o ar seco do deserto será refrigerado pela evaporação. Com o diferencial de pressão entre o interior do prédio e o poço causado pelos ventos, não será necessária nenhuma ventilação mecânica para trazer o ar fresco até os corredores e escritórios por meio de cinco átrios perimetrais transparentes e um central, nos quais serão instalados jardins suspensos.

Para evitar o aquecimento por radiação, um escudo solar cobrindo um segmento de 60º girará em torno do prédio entre as camadas da fachada dupla de acordo com o percurso do sol. Diferentemente de brises soleil estacionários, o escudo ficará somente onde e quando for necessário.

Segundo Gerber, esses e outros sistemas devem reduzir em 40% o consumo energético do prédio em comparação a semelhantes. Para torná-lo 100% auto-suficiente, foram previstos uma turbina eólica de eixo vertical tipo Darrieus de 60 m de altura no topo da torre, dois conjuntos de painéis fotovoltaicos no total de 15 mil m² e uma ilha flutuante de painéis solares de 17 mil m² sobre o mar. O excedente deve ser usado na eletrólise de água para obter hidrogênio, utilizado na geração de eletricidade à noite.

Rodas gigantes Na gincana tecnológica não basta mais que hélices girem. O prédio inteiro precisa fazer malabarismos. O arquiteto florentino David Fischer criou a Dynamic Tower - um projeto de edifícios de uso misto cujos andares giram independentemente numa velocidade de uma rotação por 1,5 hora em volta de um eixo central, onde estão instalados elevadores e tubulações elétrico-hidráulicas. Escondida entre cada andar está instalada uma turbina eólica horizontal que gira nesse mesmo eixo. Fischer espera que elas gerem toda a energia

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do edifício-carrossel, junto a células fotovoltaicas instaladas nas lajes de cada andar, que terão 20% da superfície exposta ao sol.

A primeira torre, com 80 andares espalhados em 420 m, está prevista para Dubai - onde apartamentos já podem ser reservados. A segunda deve ser construída em Moscou, com 70 andares e 400 m de altura.

Somente o eixo central deve ser construído no canteiro de obras. Já os apartamentos serão como um grande Lego, compostos de módulos em formato de fatias com acabamento e sistema elétrico-hidráulico prontos, industrializados na Itália. Os gastos com transporte estão muito longe de qualquer parâmetro de sustentabilidade, mas, por outro lado, a montagem in situ dos módulos por meio de guindastes é extremamente limpa.

Segundo Fischer, cada andar poderá ser completado em sete dias, com tempo de construção reduzido em aproximadamente 30%. De acordo com o arquiteto, a construção da Dynamic Tower precisaria de 600 operários e 80 técnicos no canteiro, comparados a 2.000 num projeto de mesma escala não pré-fabricado.

Os objetivos da pré-fabricação não são apenas reduzir o tempo de montagem e diminuir gastos na escala, mas também replicar o modelo e espalhar torres giratórias pelo mundo.

Alcir Moro, presidente da construtora curitibana Moro, não se mostra eufórico diante da idéia de David Fischer. "Esse projeto é apenas publicidade. Não há nada construído. A primeira verdadeira torre giratória construída no mundo está aqui, no Brasil", diz Moro.

Após dez anos de projeto e construção, foi concluído em 2004 em Curitiba seu Suíte Vollard. São duas torres interligadas de 11 andares: uma circular em que cada pavimento gira independentemente, propulsionado por um motor de ¾ de HP, na velocidade de uma rotação por hora, e outra fixa onde estão instaladas a circulação vertical e a parte hidráulica, como cozinha.

Até hoje, a rotação dos apartamentos não resultou em moradores. "Trata-se de um prédio conceitual, de um laboratório. Foram decorados quatro apartamentos para uma feira e, depois, desmontados", diz Moro. Hoje, passa por uma reforma que deve ser concluída em abril de 2009. Cada apartamento de 287 m² custará R$ 1,5 milhão - sem turbinas eólicas.

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Corte da praça

Jardins suspensos da Califórnia Quem visita o parque Golden Gate, São Francisco, nos Estados Unidos, encontra 10 mil m² de sua vegetação suspensa sobre colinas artificiais pontuadas por clarabóias. Abaixo dessas 1.200 toneladas de solo e plantas nativas foi inaugurado em setembro de 2008 o novo edifício da Academia de Ciências da Califórnia - complexo que reúne aquário, planetário e museu de História Natural. O prédio, que consome 35% menos energia do que o prescrito pelas leis da Califórnia, recebeu o certificado Leed Platina do Green Building Council americano.

Mas o quão longe vai o benefício proporcionado por esse tipo de cobertura? Neste caso, além de absorver 14 milhões de litros de água pluvial por ano, ela substituiu o isolamento térmico, ajudando a diminuir o uso de ar-condicionado. Os gastos com manutenção como irrigação, podas e reposição foram reduzidos com a escolha de plantas nativas, que melhor se adaptam ao clima da região.

Já em edifícios com áreas menores de cobertura, a contribuição é pequena. "Mas se a maioria dos prédios passar a adotar esse tipo de solução, o benefício para o ambiente urbano vale a pena, pois diminui o efeito de ilha de calor", diz Westphal.

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Sede da empresa de biotecnologia Genzyme; escritório Behnisch Architekten empregou heliostatos, espelhos fixos e cobertura prismática para direcionar raios solares até o átrio central do prédio, onde são redistribuídos por espelhos suspensos

Casa dos espelhos O escritório Behnisch Architekten recebeu da empresa de biotecnologia Genzyme um quebra-cabeça: encaixar 920 escritórios em 33 mil m² usando o mínimo de energia tanto para circulação vertical quanto para iluminação e climatização.

A resposta foi uma microcidade espalhada em 12 andares ao redor de um enorme átrio central, iluminada completamente com luz natural. Para isso, foram adotadas duas estratégias. No perímetro do prédio, venezianas motorizadas direcionam a luz natural para forros refletores das salas. Já no átrio, a luz entra e é dispersa por meio de uma cobertura de anteparos prismáticos móveis. Para aproveitar o máximo de iluminação durante o dia, heliostatos instalados na cobertura do átrio acompanham o movimento do sol para redirecionar os raios para espelhos fixos que, por

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Edifício Suíte Vollard, concluído em 2004; sua construtora, a curitibana Moro, afirma ser o primeiro no

sua vez, projetam os raios para o átrio. Dentro do prédio, candelabros de espelhos redirecionam os raios para as salas. O átrio central serve também para receber o ar quente dos escritórios, que sobe e sai por sua cobertura. Esse fluxo constante mantém os ambientes frescos e ventilados nas estações quentes. O prédio também recebeu o certificado Leed Platina.

Um projeto assim, no entanto, não pode ser transferido automaticamente ao Brasil, em cuja latitude o céu possui muito mais luminância. "Enquanto em países de clima temperado as grandes áreas envidraçadas se justificam pelo aproveitamento de luz natural, no Brasil elas apenas trazem problemas de ofuscamento de difícil controle", diz Westphal. "Não tem por que usar um peitoril transparente aqui, pois não há ganhos significativos em termos de luz natural. Há, sim, o aumento de carga térmica e desconforto por assimetria de radiação."

Para o engenheiro, mesmo os caros vidros de alto desempenho que permitem a execução de grandes áreas envidraçadas sem prejuízo ao conforto térmico não se justificam. "Aumentar custos não é a melhor solução do ponto de vista da engenharia. Não é sustentável."

Portanto, o melhor aqui seria diminuir a área de janelas e projetar proteções solares externas como brises, que permitem o bloqueio da radiação solar direta quando for indesejável no interior da edificação.

Seriam necessárias soluções mirabolantes dignas dos quadrinhos do professor Pardal para atingir a sustentabilidade? Não, segundo o engenheiro Nelson Kawakami, diretor-executivo do Green Building Council Brasil, organização gestora da certificação de sustentabilidade Leed (Leadership in Energy and Environmental Design), que já tem 79 construções registradas no País, a maioria - mas não todas - no eixo Rio-São Paulo.

"A tecnologia ajuda, mas não é essencial", diz Kawakami. "O principal para fazer um projeto sustentável é a vontade de fazê-lo, e não a sofisticação tecnológica. O prédio do Banco Sul Americano (1960/63) de Rino Levi, na Avenida Paulista, já era um prédio com conceito de sustentabilidade."

Kawakami cita como exemplo de construção sustentável brasileira o Cenpes (Centro de Pesquisas da Petrobras) no Rio de Janeiro, de Siegbert Zanettini e José Wagner Garcia, que deve ser concluído em 2010. "Ele traz tudo de interessante do ponto de vista de um projeto sustentável e sem grandes tecnologias", diz. Essencial para o projeto foi a integração de todas as disciplinas - arquitetura, sistemas de ecoeficiência, paisagismo, planejamento e produção da obra. Para Kawakami, não existe mais espaço para o arquiteto formalista na era da sustentabilidade.

Estatal verde O conjunto de 160 mil m² abrigará o maior centro tecnológico da América Latina, com 4.500 cientistas. Seu desenho, predominantemente horizontal, prevê um edifício central de escritórios com 300 m de comprimento e 50 m de largura do qual partirão prédios laterais, onde se abrigarão laboratórios, orientados a Norte e Sul para evitar a radiação direta.

O projeto foi fortemente influenciado pelo clima quente-úmido, detalhadamente

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mundo a girar. O recurso, que não tem propósito ambiental, elevou o custo das unidades a R$ 1,5 milhão

analisado a partir de um banco de dados climáticos feito pelo Labaut FAUUSP de cada uma das 8.760 horas de um ano, incluindo temperatura, umidade, direção e velocidade do vento, radiação solar e precipitação. Suas plantas estreitas com fachadas sombreadas favorecerão ventilação e iluminação naturais e a vista para o mar. Os edifícios serão conectados por espaços de transição entre interior e exterior, com jardins implantados no terraço do edifício central, entre os prédios laboratórios, nas áreas de convivência e nas passagens entre edifícios, criando microclimas.

Outro ponto positivo é a industrialização de seus componentes - ponto em que, segundo Kawakami, o Brasil ainda precisa evoluir, mas que grandes lideranças como o arquiteto João Filgueiras Lima, o Lelé, já desenvolveram sistematicamente.

O canteiro do Cenpes foi pensado como um local de montagem, e não construção. Com exceção de alguns pilares de apoio e fundações de concreto, privilegiou-se o uso do aço nas estruturas, enquanto o fechamento externo foi feito com painéis pré-moldados de concreto e as vedações internas, em drywall.

Além de um canteiro de obras limpo, isso permite uma grande flexibilidade para desmontar, transportar e montar as peças caso seja necessário reconfigurar o layout do prédio.

Outra unidade da Petrobras - um conjunto de 110 mil m² numa área arborizada da praia do Canto, Vitória (ES) - foi projetada pelo escritório de Sidonio Porto com estratégias ambientais.

Além de levar em consideração a orientação solar e usar um cinturão verde de árvores antigas, Sidonio Porto prevê microclimas mantidos por espelhos d'água e vegetação, brises de chapas perfuradas em branco, aletas que formam uma espécie de veneziana externa e vidros com pigmentação verde-claro. Isso não apenas protege da insolação como não impede a circulação do ar junto às fachadas. A previsão é que o ganho solar fique abaixo de 0,35.

Estudos de vento foram feitos a partir de dados do Ministério da Aeronáutica relativos ao aeroporto de Vitória. A combinação do arranjo dos edifícios e a topografia do terreno permitirão a incidência dos ventos sobre todo o conjunto. Nos edifícios que precisarem de ar-condicionado, a ventilação natural sobre as fachadas removerá parte do calor absorvido da radiação solar.

A maioria de seus prédios terá na laje um piso técnico aberto, como um hiato entre o volume construído e sua cobertura. Isso formará um espaço intermediário ventilado que cancelará ganhos advindos da radiação solar. Já a cobertura do auditório terá um terraço-jardim. Mas não são necessários os investimentos de uma megaestatal para construir verde.

Na capital paulista, o Eldorado Business Tower, do escritório Aflalo & Gasperini Arquitetos, obteve a pré-certificação Leed Platina do GBC-Brasil. Para isso, atingiu 50% de economia de água, 30% de energia e 75% de resíduos desviados de aterros sanitários.

Canarinho ecológico A Copa de 2014 deve botar em prática no Brasil mais estratégias simples a favor do meio ambiente. A Fifa exigiu que o estádio do Maracanã recebesse um estacionamento para pelo menos cinco mil carros na depredada região dividida entre o Maracanã e São Cristóvão pela linha de trem. O escritório Artetec Arquitetura propôs a transformação do lugar em uma estação multimodal ecologicamente correta, combinando as estações existentes de trem,

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metrô e ônibus, um estacionamento de carros sobre a linha de trem e outro para bicicletas. Todos os estacionamentos em volta do estádio devem ser transformados em parques para aumentar a permeabilidade do solo, freqüentemente inundado no verão. Também um reservatório subterrâneo será construído para armazenar as águas da chuva coletadas pela cobertura da estação, que depois devem ser usadas para irrigação.

Aberturas na cobertura da nova estação liberarão o ar quente, enquanto um jardim interno imenso abaixo do nível térreo contribuirá para o microclima e painéis solares na cobertura e no estacionamento gerarão energia. O projeto deve começar a ser realizado em agosto de 2009, mas já rendeu uma menção honrosa no prêmio Holcim de 2008 para a América Latina.

Com o pé mais no chão, estratégias podem ser adotadas nas mais simples construções. É o que mostrou um time do Laboratório de Eficiência Energética em Edificações da Universidade Federal de Santa Catarina liderado pela arquiteta Maria Andréa Triana e pelos engenheiros Roberto Lamberts e Marcio Antonio Andrade ao desenvolver uma torre de armazenamento, tratamento e aquecimento solar de água pluvial que pode ser incorporada tanto por moradias novas quanto existentes, mesmo em regiões onde predominam autoconstruções de grande adensamento. O projeto ganhou menção honrosa na premiação da Holcim.

Em uma porção inferior da torre de ferrocimento há uma cisterna que armazena água de chuva coletada pelo telhado da casa. Ela é utilizada, por exemplo, nas descargas. Um coletor solar aquece essa água, que é mantida quente em um tambor, para ser utilizada no banho. Ao substituir o chuveiro elétrico, um quarto do consumo de energia da casa pode ser reduzido. Já na parte superior é armazenada água tratada e potável, para as torneiras de pias.

Eliane considera os coletores solares para aquecimento de água uma das alternativas mais interessantes. "Infelizmente, seu uso no Brasil ainda é muito tímido. Agora que estão surgindo leis municipais e políticas de incentivos para essa tecnologia. Porém há muito por fazer pois não basta exigir seu uso. As edificações têm que estar preparadas para recebê-las", diz a professora.

Seja de alta ou baixa complexidade, disseminar tecnologias energeticamente eficientes é importante para que futuramente seus custos caiam. "Foi o que aconteceu com as lâmpadas fluorescentes compactas", exemplifica Westphal. "No início, eram caras e a economia não pagava o investimento em curto prazo." Com seu incentivo, ganharam credibilidade, seu uso cresceu, e sua oferta também. Resultado: hoje há lâmpadas compactas de qualidade por R$ 9,00 contra incandescentes comuns a R$ 2,00. "O custo é quatro vezes maior e a eficiência também. Ou seja, ela se paga."

E esse é o papel de certificações como o Leed - ou dos experimentos de "professores Pardais". Empresas que têm recursos instalam tecnologias inovadoras. Isso impulsiona a introdução dessas inovações no mercado, populariza os produtos e reduz os custos. No fim, todos saem ganhando.

Dubai International Financial Centre Lighthouse Dubai, Emirados Árabes Unidos

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Atkins > Altura: 400 m (66 andares) > Três turbinas eólicas de eixo horizontal de 29 m de diâmetro e 225 kW máximos com ventos entre 15 e 20 m/s > 4.000 painéis fotovoltaicos > Projeto conceitual

Burj al-Taqa, Bahrain Bahrain Gerber Architekten, DS Plan > Altura 322 m (68 andares) > Sistema de "torres de vento" > Turbina eólica de eixo vertical Darrieus de 60 m de altura no topo do edifício > 32 mil m² de painéis fotovoltaicos > Estação de hidrólise para produção de H2 > Brise giratório que acompanha o sol > Formato cilíndrico para diminuir a área exposta ao sol forte do Golfo Pérsico > Custo: US$ 406 milhões > Status: projeto

Academia de Ciências da Califórnia São Francisco, Califórnia, EUA Renzo Piano Building Workshop, Stantec Architecture, Arup, SWA Group > 10 mil m² de cobertura viva absorvem 14 milhões de litros de água pluvial por ano > 213 mil kWh gerados por ano por 60 mil células fotovoltaicas (5% a 10% do consumo do prédio) > 90% do entulho dos prédios antigos reutilizados na construção de uma estrada > 12 mil toneladas de aço recicladas e usadas na estrutura metálica do novo prédio > 50% de madeira certificada > 90% de espaços de ocupação intensa iluminados naturalmente > Isolamento termoacústico feito com algodão de jeans reciclado > Custo: US$ 429 milhões > Status: inaugurado (2008)

Genzyme Center Cambridge, Massachussetts, EUA Behnisch Architekten > 33 mil m² em 12 andares > Iluminação interna natural mantida por heliostato no teto que acompanha o sol e reflete

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raios sobre espelho, que por sua vez os projeta para o átrio do prédio > Redirecionamento de raios no átrio por meio de candelabros de espelhos > Venezianas motorizadas que direcionam automaticamente luz natural no perímetro do edifício de acordo com movimento do sol > 30 mil pontos de automatização controlados por um sistema central > Cobertura viva > 1/3 de fachadas duplas, separadas em 1,2 m com vão ventilado durante o verão > 18 jardins internos > Painéis fotovoltaicos > Status: inaugurado (2004)

Cenpes da Petrobras-RJ Rio de Janeiro (RJ) Siegert Zanettini, José Wagner Garcia (co-autor), Centro de Pesquisas da Petrobras, Labaut-FAU-USP Status: Projeto

Dez estratégias de sustentabilidade do Centro de Pesquisas da Petrobras 1 - Orientação solar adequada 2 - Forma arquitetônica adequada aos condicionantes climáticos locais 3 - Materiais construtivos das superfícies termicamente eficientes 4 - Superfícies envidraçadas com taxa de WWR (Window Wall Ratio) adequada 5 - Proteções solares externas adequadas às fachadas 6 - Ventilação natural 7 - Iluminação natural 8 - Uso da vegetação 9 - Sistema para uso racional e reúso de água 10 - Materiais de baixo impacto ambiental

Eldorado Business Tower São Paulo (SP) Aflalo & Gasperini Arquitetos > Resíduos destinados à reciclagem > Materiais utilizados na construção produzidos na região > Vagas no estacionamento destinadas a bicicletas e a veículos de combustível menos poluente > Água captada da chuva e da condensação do sistema de ar-condicionado usada na irrigação de áreas verdes permeáveis, no espelho d'água, em vasos sanitários do térreo e dos subsolos e na lavagem dos pisos das garagens > Janelas com vidros de alta transmissão luminosa e baixa emissividade (0,30) > Ar-condicionado com volume de ar variável (VAV) > Elevadores com ADC e frenagem regenerativa, que recupera para outros elevadores

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energia dissipada quando um pára numa descida > Luminotécnica noturna com lâmpadas fluorescentes atrás de fachada de vidro, evitando holofotes

Petrobras Vitória (ES) Sidonio Porto Arquitetos Associados > Áreas verdes e espelhos d'água entre os prédios, para manter microclimas > Relação janela-parede de 0,42 e aproveitamento de iluminação natural em 2/3 da profundidade das salas > Coletores solares para aquecimento de água para restaurante > Painéis fotovoltaicos > Uso de painéis em concreto pré-fabricado > Água pluvial armazenada em lagos para ser reutilizada em irrigação > Tratamento de esgoto para reúso em instalações sanitárias

Dynamic Tower Dubai, Emirados Árabes Unidos Dynamic Architecture (David Fischer) > Altura: 420 m (80 andares) > 79 turbinas eólicas de eixo vertical > Células fotovoltaicas > Montagem modular com pré-fabricados > Projeto conceitual, apartamentos sob encomenda Detalhamento: 20 primeiros andares: escritórios 21º ao 35º: hotel de luxo 36º ao 70º: apartamentos residenciais 71º ao 80º: mansões verticais

Nas entradas das mansões serão instaladas garagens, que os moradores mais afortunados acessarão por meio de elevadores para carros.

Cada unidade, de 124 m2 a 1.200 m2, deverá custar entre US$ 4 milhões e US$ 40 milhões.

Pearl River Tower Cantão, Guangdong, China Skidmore, Owings & Merrill > Altura: 309 m (71 andares) > Turbinas elólicas de eixo vertical (Darrieus) > Painéis fotovoltaicos > Base larga e estreita para captar mais vento > Torres d'água com resfriamento geotérmico > Em construção

Bahrain World Trade Center Bahrain

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Atkins > Altura: 240 m (50 andares) > Três turbinas eólicas de eixo horizontal de 29 m de diâmetro e 225 kW máximos com ventos entre 15 e 20 m/s > Status: construído > Geração: 1,3 mil MWh por ano

Melhores estratégias para um prédio energeticamente eficiente no Brasil > Uso de brises para promover a proteção solar nas horas mais críticas > Peitoris opacos, com tratamento térmico > Uso de vidros com baixo fator solar > Integração entre luz natural e artificial, por meio de sensores e controles que promovam o desligamento do sistema artificial quando a luz natural for suficiente > Sistemas de ar-condicionado com alta eficiência e adequadamente dimensionados > Ciclos economizadores integrados aos sistemas de ar-condicionado, quando o clima for propício > Sistemas de distribuição de ar e controle mais individualizados > Ventilação natural, quando o uso da edificação permitir > Simulação computacional do desempenho térmico e energético da edificação para definir as estratégias mais adequadas ao clima e dimensionar adequadamente os sistemas de ar-condicionado

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