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AUGUSTO FARIA ROOS STAR WARS: Um estudo a partir da Psicologia Analítica e da Mitologia Faculdade de Psicologia Pontifícia Universidade Católica São Paulo 2008

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AUGUSTO FARIA ROOS

STAR WARS:

Um estudo a partir da Psicologia Analítica e da Mitologia

Faculdade de Psicologia

Pontifícia Universidade Católica

São Paulo 2008

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Pontifícia Universidade Católica

São Paulo

2008

AUGUSTO FARIA ROOS

STAR WARS:

Um estudo a partir da Psicologia Analítica e da Mitologia

Trabalho de conclusão como exigência

parcial para graduação no curso de

Psicologia, sob orientação

da Profa. Dra. Flavia Hime

Faculdade de Psicologia

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Agradecimentos:

Eu agradeço primeiramente a Profa. Dra. Flavia Arantes Hime, que orientou

e possibilitou esse trabalho, sempre disposta a ajudar e orientar, dando seu

grande apoio e incentivo, e ótima companhia. Agradeço imensamente a você, pelo

seu carinho e atenção.

Agradeço em especial minha namorada Joana, pela sua enorme paciência

e força, sem a qual esse trabalho não seria realizado.

Agradeço ao ex-professor Max, e a Viktor Salis, por suas recomendações

bibliográficas e inspiração. Obrigado.

Agradeço ao meu orientador de Seminários, Sergio Wajman, que me

ajudou a iniciar esse trabalho, passando-me importantes recomendações para eu

prosseguir na realização do mesmo.

Agradeço à Professora Marisa Penna, por ter aceitado avaliar esse

trabalho.

Agradeço à minha família e aos meus amigos, pela motivação e companhia.

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Área do conhecimento: Código 7.07.00.00 -1 – Psicologia

Star Wars: Um estudo a partir da Psicologia Analítica e da Mitologia

Augusto Faria Roos, 2008

Orientadora: Profa. Dra. Flavia Arantes Hime

Palavras-chave: Star Wars, Mito do Herói, Psicologia Analítica e Mitologia

Resumo:

O objetivo deste trabalho foi refletir sobre o arquétipo do herói sob a ótica

da Psicologia Analítica e da Mitologia. Para tanto foram analisados os três

primeiros filmes da saga Star Wars, utilizando-se o método da Psicologia Analítica,

que tem como recurso a amplificação simbólica.

Percebeu-se que ao assistir e analisar os filmes, são invocados símbolos

decorrentes das vivências dos personagens. Tais símbolos permitem que

entendamos o que se passou com a vida dos personagens, visto que os símbolos

tem sua origem arquetípica, logo comum a todos os seres humanos e passíveis de

serem compreendidos. O foco do filme é a compreensão da trajetória do

personagem Anakin Skywalker, considerado no trabalho como um herói mitológico

por corresponder com as características universais que compõe tal conceito. O

trabalho se atém a articular os conceitos do herói mitológico com o arquétipo do

herói. Tal arquétipo articula com uma série de conceitos da Psicologia Analítica,

apontando condições básicas do ser humano e a relevância dos mitos no

desenvolvimento humano, tanto no que se refere à construção da subjetividade,

quanto aos aspectos coletivos, vislumbrados nas manifestações dos arquétipos. O

mito do herói refere-se ao processo do ser humano rumo à individuação, e

também de suas múltiplas vicissitudes, assim como do movimento da humanidade

em seus esforços para lidar com as polaridades, ora cindindo-as, ora buscando o

equilíbrio.

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Sumário:

− Introdução ........................................ .........................................................pg.1

− Capítulo I ........................................ ........................................................... pg.3

Sobre o mito e sua relação com a Psicologia

− Capítulo II ....................................... ............................................................pg.15

O mito do herói

− Capítulo II a ..................................... ...........................................................pg.16

Características do herói

− Capítulo III ...................................... ............................................................pg.27

Sobre a Psicologia Analítica

− Capítulo III a .................................... ...........................................................pg.27

Conceitos de ego e self na Psicologia Analítica

− Capítulo III b .................................... .......................................................... pg.34

Sobre o processo de individuação na Psicologia Anal ítica

− Capítulo III c .................................... .......................................................... pg.44

Considerações sobre os conceitos de sombra e comple xo para a

Psicologia Analítica

− Capítulo III d .................................... .......................................................... pg.55

O bem e o mal para a Psicologia Analítica

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− Capítulo IV ....................................... ......................................................... pg.62

Método

− Capítulo V ........................................ .........................................................pg.64

Resultados

− Capítulo V a ...................................... .........................................................pg.64

A influência histórica subjacente aos filmes

− Capítulo V b ...................................... .........................................................pg.66

Sinopses

− Capítulo VI ....................................... ......................................................... pg.96

Análise e Discussão

− Capítulo VII ...................................... ........................................................pg.153

Considerações Finais

− Referências Bibliográficas ........................ .............................................pg.161

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Introdução:

A escolha do tema para esse trabalho de conclusão de curso de Psicologia

da PUC-SP deu-se a partir de um interesse pessoal de integrar conceitos da

Psicologia com as cenas da coleção de filmes Star Wars, cenas essas que

compõem uma elaborada e profunda trama e que podem ser significadas de

diferentes formas.

Pretendo, com esse trabalho, buscar reflexões e interpretações baseadas

na Psicologia e mitologia, no sentido de descrever e refletir sobre assuntos e

temas que configuram a trama. Tais temas se referem às mudanças transcorridas

pelo herói e os significados, condições e decorrências implicadas nessas

mudanças.

Desta maneira farei um recorte, dada a complexidade da narrativa. Meu

olhar se dirigirá ao personagem principal e à trama que se desenrola nos três

primeiros filmes.

No trabalho de análise do filme, pretendo intercalar aspectos da mitologia

presentes no filme com conceitos da Psicologia Analítica, para assim levantar

questionamentos sobre o ser humano, que são retratados no filme, assim como

deveu-se ao propósito do produtor cinematográfico George Lucas, que auxiliado

pelo famoso mitólogo Joseph Campbell, propôs-se a descrever um mito por meio

de uma extensa obra cinematográfica que descreve a cronologia da vida e morte

de um herói. Trata-se de um conjunto de seis filmes que desenrolam-se numa

seqüencia temporal, sendo que em cada episódio se retratam as principais

situações transformadoras da trama.

Este trabalho se restringirá aos filmes, uma vez que a obra Star Wars

possui uma extensa literatura e outras formas de continuidade como revistas em

quadrinhos, jogos de RPG, animações que narram eventos ocorridos entre alguns

filmes, e mesmo novas histórias. O foco de trabalho será o herói principal e

personagens e eventos retratados nos três filmes iniciais da saga.

Portanto o objetivo deste estudo é refletir sobre o arquétipo do herói sob a

ótica da Psicologia Analítica e da Mitologia. A organização do trabalho será como

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se segue: No primeiro capítulo abordarei o Mito e sua relação com a Psicologia.

No segundo,discorrerei sobre o mito do herói, apresentando suas características.

No terceiro, apontarei os conceitos da Psicologia Analítica mais relevantes à

consecução dos objetivos deste estudo além de discorrerer sobre o bem e o mal

segundo essa perspectiva. No quarto, apresentarei a metodologia, no quinto, os

resultados, que constarão da influência histórica presente nos filmes e das

sinopses destes. O sexto refere-se à análise e discussão e por final o sétimo trará

as considerações finais.

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Capítulo I - Sobre o mito e sua relação com a Psico logia:

“A mais antiga das interpretações da mitologia é o evemerismo (Evêmero, filósofo

grego do século IV antes de Cristo). Os mitos seriam a transposição de

acontecimentos históricos e de suas personagens para a categoria divina”.

(SILVEIRA, 2003:113).

Mitos são narrativas fundadas em culturas primitivas que contêm os

acontecimentos originários e reveladores do homem enquanto animal já

convertido em cultura e já vivendo suas próprias condições humanas, que seriam

de um ser mortal, sexuado e fazendo parte de uma comunidade. Sendo assim, o

mito já foi o registro originário de uma comunidade ou tribo que serviu para

explicar, ou mesmo inaugurar, as condições e questões existenciais do homem,

condições essas que seriam as características do homem enquanto ser no mundo.

Mesmo se os homens primitivos já indagassem sobre tentativas de definir os

preceitos e condições do homem, fosse para atingir um modelo invariável, fosse

para resolver insatisfações da vida, os mitos já estavam presentes e ofereciam a

"primeira versão". Segundo Mircea Eliade, em seu livro “Mito e Realidade” (1998),

a primitiva ou ancestral origem do mito remonta ao Sagrado, Deus ou Ente

sobrenatural, sendo por excelência ritualizado pela comunidade. Sendo assim, os

mitos são narrações do divino que ecoam desde tempos ancestrais; sua utilização

para a sociedade se presta a orientar os homens mediante as transformações da

vida e fornecer uma explicação sobre a origem do mundo.

A autora Nise da Silveira em seu livro “Jung – vida e obra” (2003) cita que

os mitos são modelos exemplares de todas as atividades humanas significativas.

A autora faz uma referência a Malinowski que por sua vez expõe que os mitos nas

sociedades primitivas “são a expressão de uma realidade original mais poderosa e

mais importante através da qual a vida presente, o destino e os trabalhos da

humanidade são governados”. (SILVEIRA, 2003:114)

Ao analisarmos a modernidade, algumas funções das sociedades arcaicas e

primitivas encontram seus correspondentes funcionais na sociedade atual.

Exemplo disso seriam o médico e o psicólogo, que substituíram os anciãos e

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sábios na função de prestar suporte aos “desajustes” pessoais e comunitários. O

autor Joseph Campbell no livro “O herói de mil faces”, menciona o psicanalista

como um agente com função análoga à do mito para os povos antigos: seria

semelhante à de um guia espiritual; ele menciona:

(...) o simbolismo perene da iniciação é produzido espontaneamente

pelo próprio paciente no momento de sua emancipação. Ao que

parece, há nessas imagens iniciatórias algo que, de tão necessário

para a psique, se não for fornecido a partir do exterior, através do mito

e do ritual, terá de ser anunciado outra vez, por meio do sonho, a

partir do interior - do contrario, nossas energias seriam forçadas a

permanecer aprisionadas num quarto de brinquedos, (...)

(CAMPBELL, 1997:22).

Ao longo dos séculos, os mitos foram sendo resignificados, ocorreram

mudanças na concepção de mito, que foi, por muito tempo, rotulado como fábula,

ilusão, ficção inventada. Tais significações atribuídas ao mito lhe retiraram o

caráter religioso e metafísico. Apesar das implicações históricas do mito, que o

descaracterizaram quanto à sua função social, removendo-o da esfera da

formação e manutenção do indivíduo, como veremos nas sociedades tribais ou na

Grécia clássica, ainda assim, os mitos sempre continuaram acompanhando a

humanidade e desempenhando sua função.

Segundo Maria Helena de Mendonça Coelho, para Adorno e Hockheimer em

“A Dialética do Esclarecimento” (COELHO, 2000:20), o mito se origina do terror e

desamparo do homem em relação à natureza e da tentativa de entender e explicar

o mundo. Muitos mitos são histórias que visam o esclarecimento da criação do

mundo e do desenvolvimento da civilização. Para tais autores o uso de mitos para

explicar o mundo é uma prática primitiva, uma vez que a sociedade ocidental atual

possui conceitos mais avançados para isso.

Ainda segundo Coelho (2000), os mitos revelam uma interação da

subjetividade humana com a natureza, interação essa que faz surgir dificuldades.

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Penso que a concepção de mito como sendo uma ciência primitiva que descreve e

explica a origem das coisas, leva em conta apenas uma crítica às explicações do

mito da origem, vistas como em defasagem e em lugar subordinado em relação às

explicações da ciência moderna sobre a origem. A autora enfatiza que segundo os

autores citados, os mitos seriam vestígios de uma fase primitiva de nossa cultura,

quando os seres humanos por se submeterem à natureza, não apresentavam

autoconsciência, devido à projeção da dimensão subjetiva na natureza, “O

sobrenatural, os espíritos e os demônios seriam imagens especulares dos

homens, que se deixam amedrontar pelo natural” (ADORNO – HOCKHEIMER

apud COELHO, 2000). A autora cita ainda que para esses autores a mitologia

como prática social resulta em um estado de imenoridade social por não fazer o

uso da razão, que é própria do humano, e que é o veículo para a ciência, logo

veículo para a formulação de uma sociedade mais harmoniosa. Ela completa

citando que para tais autores, deveríamos abandonar as explicações mágicas e

desenvolver a ciência e a razão, que por infelicidade acabaram se convertendo em

mito, “..., apoiando-se na ideologia, explicação enganosa própria das produções

mitológicas, acaba por se identificar com o mito, afirmam os autores de ‘Dialética

do Esclarecimento’” (COELHO, 2000:20). A citação acima se refere à falência da

razão e da ciência, que ao invés de seguirem um curso diferenciado, acabaram se

aproximando aos mitos.

Ao se observar mitos de diferentes lugares e épocas, é sempre possível

notarmos semelhanças, o que revela que os conteúdos dos mitos dizem respeito a

aspectos essenciais do ser humano. Sendo assim, mitos não contam histórias

exclusivas de um povo, eles apenas são criados por um povo, pois contam

histórias sobre o ser humano.

A narrativa do mito tem como conteúdo os aspectos coletivos e universais

do ser humano, que se repetem em todas as gerações e se atualizam a partir da

vida de cada um, uma vez que cada ser humano, a partir de sua experiência de

vida, virá a entrar em contato com esses conteúdos padrões que atingem a sua

psique. Esses padrões são conhecidos como arquétipos. “... o arquétipo é uma

fonte primária de energia e padronização psíquica. Constitui a fonte essencial de

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símbolos psíquicos, os quais atraem energia, estruturam-na e levam, em ultima

instância, à criação de civilização e cultura”. (STEIN, 2006:81).

Os aspectos essenciais do ser humano que o mito por sua vez captura nos

permitem a identificação do mito com o arquétipo (relação que logo será

desenvolvida), o que nos revela que o mito se constitui a partir dos elementos

ontológicos do homem, como nascimento, vida e morte. Por este motivo, já é

possível fundamentar as semelhanças entre os mitos nas diferentes culturas e

épocas. Como menciona Joseph Campbell: "a mitologia em todos os lugares é a

mesma" (CAMPBELL, 1997:15).

Farei uma pequena digressão sobre arquétipos e instintos, para melhor

apresentar as características definidoras dos mitos.

Segundo Nise da Silveira, “... arquétipos são possibilidades herdadas para

representar imagens similares, são formas instintivas de imaginar.” (SILVEIRA,

2003:68)

Cabe dizer que existe uma forte relação entre arquétipos e instintos. O

autor Murray Stein, em seu livro: Jung – o mapa da alma; desenvolve definições

de arquétipo e sua relação com os instintos.

“À medida que Jung ia penetrando cada vez mais profundamente

nas fontes do material inconsciente – primordialmente sonhos e

fantasias – apresentadas por seus pacientes e descobertas em seu

próprio trabalho introspectivo, ele foi levado a teorizar a respeito de

algumas estruturas gerais da mente humana, estruturas que

pertencem a todos os seres humanos, não só a dele ou ao paciente

que tem diante dele. À camada mais profunda da psique humana deu

o nome de ‘inconsciente coletivo’ e concebeu o seu conteúdo como

uma combinação de padrões e forças universalmente

predominantes, chamadas ‘arquétipos’ e ‘instintos’. Em sua

concepção, nada existe de individual ou único nos seres humanos

nesse nível. Todos temos os mesmos arquétipos e instintos. Quanto

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à individualidade, tem que ser procurada em outras áreas da

personalidade” (STEIN, 2006:83-84).

Segundo o autor, a individualidade se dá a partir de uma luta pessoal pelo

desenvolvimento e aquisição de consciência; e os arquétipos e instintos são dons

da natureza que são dados igualmente a todos os seres humanos.

Para o mesmo autor, a teoria dos arquétipos é fundamental para a

concepção global da psique proposta por Jung, que por sua vez concebia uma

profunda relação entre instinto e arquétipo, apesar de não separar a mente do

corpo e de concebê-los como sendo inter-relacionados. Irei definir a diferença

básica entre instinto e arquétipo por meio de uma analogia segundo a qual o

arquétipo estaria associado à mente e o instinto ao corpo, ou seja, tal analogia irá

separar conceitualmente a mente do corpo, porém irá proporcionar um

entendimento da distinção entre tais conceitos. Nesta analogia, o arquétipo

“carregaria” as mensagens da mente, ou seja, as imagens e idéias (conteúdos

psíquicos); enquanto que o instinto “carregaria” as mensagens corporais, que

seriam os níveis de ansiedade e outras reações químicas do funcionamento

fisiológico. No entanto, as dinâmicas desses dois conceitos se dão conjuntamente,

como partes que compõem uma unidade, sendo assim inseparáveis. Tais

dinâmicas atingem o sujeito devido a uma impressão causada na relação do

sujeito com o mundo, que por sua vez irá mobilizar conteúdos internos do sujeito,

ativando a unidade arquetípico-instintiva.

Outra analogia, concebida por Jung e mencionada por Murray Stein no

mesmo livro anteriormente citado, é de situar o arquétipo e o instinto em pólos de

um espectro.

“Na experiência prática e concreta, instintos e arquétipos encontram-

se sempre misturados e nunca em forma pura. As extremidades

arquetípicas e instintivas do espectro psíquico encontram-se no

inconsciente, onde se chocam e lutam entre si, entremisturam-se e

conjugam-se para formar unidades de energia e motivação que logo

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se manifestarão na consciência como necessidades imperativas,

desejos prementes, idéias e imagens”. (STEIN, 2006:95).

A autora Nise da Silveira relaciona arquétipos com mitos e ainda diz como

se originariam os arquétipos. Serão destacadas abaixo algumas citações de seu

livro: Jung – vida e obra.

“... produções do inconsciente, tais como visões, alucinações,

delírios, trazem sempre de permeio componentes míticos. A

constatação repetida dessas ocorrências, sem que conhecimentos

anteriores os pudessem explicar, levou Jung a admitir que devem

estar presentes nas profundezas do inconsciente os moldes básicos

para a formação dos mitos (arquétipos)”. (SILVEIRA, 2003:116).

“Resultariam do depósito das impressões superpostas deixadas

por certas vivências fundamentais, comuns a todos os seres

humanos, repetidas incontavelmente através de milênios. Vivências

típicas, tais como as emoções e fantasias suscitadas por fenômenos

da natureza, pelas experiências com a mãe, pelos encontros do

homem com a mulher e da mulher com o homem, vivências de

situações difíceis como a travessia de mares e de grandes rios, a

transposição de montanhas etc” (SILVEIRA, 2003: 68).

“Seriam disposições inerentes à estrutura do sistema nervoso que

conduziriam à produção de representações sempre análogas ou

similares. Do mesmo modo que existem pulsões herdadas para agir

de modo sempre idêntico (instintos), existiriam tendências herdadas

para construir representações análogas ou semelhantes” (SILVEIRA,

2003:68-69).

Segundo a autora, os mitos são os materiais básicos do ser humano, a

partir dos quais o mesmo estruturaria sua psique. Tais materiais seriam as

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características ontológicas que influenciam e mesmo regem a vida dos seres

humanos.

“A noção de arquétipo, postulando a existência de uma base

psíquica comum a todos os seres humanos, permite compreender

por que em lugares e épocas distantes aparecem temas idênticos

nos contos de fadas, nos mitos, nos dogmas e ritos das religiões, nas

artes, na filosofia, nas produções do inconsciente de um modo geral

– seja nos sonhos de pessoas normais, seja em delírios de loucos”

(SILVEIRA, 2003:69).

A passagem citada acima, assim como as demais dos outros autores,

revelam a capacidade do arquétipo de capturar conhecimentos que foram desde

os primórdios ou de tempos antigos da civilização, utilizados e pensados pelo

homem; e que outros seres humanos de diferentes locais e tempo, sem terem

entrado em contato direto com tais conhecimentos, puderam reproduzi-los e

expressá-los espontaneamente, em outro tempo e local. Isso é possível quando

determinado conhecimento está incluído no nível arquetípico, que é um nível de

consciência coletiva e intrínseca aos seres humanos, potencialmente acessível

aos mesmos em qualquer época e cultura.

Como foi citado anteriormente, o mito, assim como o arquétipo, remonta a

um ente sobrenatural e mesmo divino, que por sua vez inaugurou condições da

constituição psíquica e vida coletiva do ser humano. Essas condições

permanecem acessíveis aos humanos e são concebidas como características

presentes e mesmo essenciais ou ontológicas. Sendo assim, o mito é a revelação

desses conteúdos ontológicos.

No texto da autora Nise da Silveira, complementando as citações feitas, é

presente a questão do arquétipo como sendo uma força natural que surge nas

pessoas, exigindo delas uma reestruturação senão uma doença, sendo o

arquétipo, uma voz interna incessante e mesmo atormentadora que se apresenta

nos seres humanos no exercício de suas vidas.

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Joseph Campbell em seu livro "O herói de mil faces", menciona: "Não seria

demais considerar o mito a abertura secreta através da qual as inexauríveis

energias do cosmos penetram nas manifestações culturais humanas”

(CAMPBELL, 1997:15).

Segundo esse autor, as civilizações arcaicas e os povos tribais utilizavam a

mitologia para orientar as mudanças das fases na vida dos indivíduos e do grupo.

Para tal, costumeiramente se realizavam rituais ou ritos que tinham como função a

aplicação da mitologia dentro da cultura social. Estes ritos tinham a função de

relembrar ao povo os ensinamentos do mito.

No mesmo livro citado, o autor menciona que a função primária dos ritos e

da mitologia sempre foi a de fornecer símbolos para elevar e avançar o espírito

humano, para assim opor-se à reprodução das "fantasias humanas constantes

que tendem a levá-lo para trás" (CAMPBELL, 1997:21). Os rituais possuem forte

relação com a mitologia, pode-se dizer que eles eram a aplicação prática do mito

enquanto sendo um propósito de acompanhar fases de mudanças e

transformações.

Segundo o autor Edward C. Whitmont, as transformações se dão quando o

indivíduo atinge os núcleos arquetípicos de seus complexos, que por sua vez

seriam as condições que sustentam a condição anterior do sujeito. “Assim, o

centro nuclear de um complexo se apresenta caracteristicamente sob a forma de

imagens e representações mitológicas...” (WHITMONT, 2002:66). Tal autor cita

que essas representações mitológicas são nomeadas mitologemas, que são

temas com conteúdos primordiais que foram repetidos incontáveis vezes nas

manifestações humanas, sendo as estruturas básicas do ser humano com as

quais ele se depara para estruturar seu psiquismo. No entanto, tais conceitos

serão desenvolvidos mais adiante.

Recapitulando Joseph Campbell em seu livro “O herói de mil faces” (1997),

é ressalvado que os ritos realizavam transformações nas pessoas, auxiliando os

sujeitos a cruzarem difíceis limiares de transformação que resultava em mudanças

gerais no padrão psicológico dos mesmos. Esses ritos exerciam um rigoroso

rompimento de um padrão de vida e viam o sujeito como um aventureiro da vida

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que, após o rito, se reestruturava em um isolamento a fim de amadurecer seus

sentimentos relativos à sua nova situação, podendo assim retornar ao grupo como

se tivesse renascido.

Mircea Eliade em seu livro "Mito e Realidade" menciona:

Nos níveis arcaicos da cultura, a religião mantém a abertura para um

mundo sobre-humano, o mundo dos valores axiológicos. Esses

valores são “transcendente”’, tendo sido revelados pelos Entes

Divinos ou Ancestrais míticos. Constituem, portanto, valores

absolutos, paradigmas de todas as atividades humanas. Como

vimos, esses valores são veiculados pelos mitos aos quais compete

acima de tudo despertar e manter a consciência de um outro mundo,

do além,- mundo divino ou mundo dos Ancestrais. Esse “outro

mundo” representa um plano sobre-humano, “transcendente”, o

plano das realidades absolutas. É através da experiência do

sagrado, do encontro com uma realidade transumana, que nasce a

idéia de que alguma coisa existe realmente, de que existem valores

absolutos, capazes de guiar o homem e de conferir uma significação

à existência humana. É através da experiência do sagrado, portanto,

que despontam as idéias de realidade, verdade e significação, que

serão ulteriormente e sistematizadas pelas especulações

metafísicas.(ELIADE, 1998:123-124)

Segundo Eliade, o uso do mito nos rituais se presta a realizar a rememoração

e reatualização do evento primordial, a fim de ajudar o homem primitivo a

distinguir e a reter o real. O autor complementa que os rituais, devido às

constantes repetições, continuamente expõem as pessoas a situações

paradigmáticas, permitindo assim a manutenção e vinculação do sujeito com o

sagrado, ou com "outro mundo", possibilitando-lhe significar sua existência e

ajudando-o a construir sua realidade, "O ritual abole o tempo profano, cronológico,

e recupera o tempo sagrado do mito" (ELIADE, 1998:124).

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Pode-se dizer que as práticas rituais forneciam suporte para o

enfrentamento das transformações e fortaleciam o vínculo do sujeito com um

sentido da vida ou realidade própria. Na época moderna, não existe este suporte

espiritual efetivo, mas nem por isso não se dão as transformações. Na ausência

de uma mitologia padrão na cultura, nós ainda temos as manifestações

individuais, no mínimo em nossos sonhos, que, por sua vez, trazem símbolos que

podem ser empregados a serviço de uma transformação. Desta forma, existe uma

semelhança entre sonhos e mitos. Mesmo em se tratando de uma experiência

privada, os sonhos podem exercer grande influência no indivíduo.

Joseph Campbell (1997) em seu livro anteriormente citado faz uma analogia

interessante: “O sonho é o mito personalizado e o mito é o sonho

despersonalizado” (1997: 27). Em seguida, o autor menciona que tanto o mito

quanto o sonho simbolizam a dinâmica da psique, a diferença entre eles seria que

o sonho é deformado pelas particularidades do sonhador, enquanto que as

deformações do mito são válidas para toda a humanidade. (CAMPBELL, 1997:27).

Como já vimos, a narrativa do mito não se presta apenas a um relato

qualquer, mas sim a um relato profundo que transmite o divino. O mito abarca o

contato com o divino, por isso não se trata de uma história comum falada em

qualquer conversa de um grupo, mas sim de uma mensagem capaz de transmitir a

esse grupo o divino ou o sagrado. Podemos ver essa diferença entre relato

comum e mito ao observarmos como era feita a transmissão do mito. Na Grécia

antiga, os mitos eram cantados, recitados, enquanto em outras culturas a

transmissão do mito acontecia em um contexto ritualizado. Essa mensagem divina

se constata tanto no mito do herói quanto no mito da origem. Esses são os dois

tipos fundamentais de mitos. O mito da origem possui a função pré-científica de

explicar como se deu a origem do mundo, relatando a história da criação do

mundo. O outro tipo de mito é o mito do herói, de ordem psicológica, que descreve

as passagens de um herói que passa por transformações durante sua aventura ou

passagem da vida narrada. O mito do herói descreve as reações que o herói

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emitiu perante as situações a ele trazidas, relatando assim os enfrentamentos e

implicações externas e internas que conseqüentemente o atingem.

Segundo Murray Stein em seu livro: JUNG – o mapa da alma, o mito do

herói concede a ele o papel de criador da consciência. O autor ainda cita:

“O herói é um padrão humano básico – igualmente característico

tanto em mulheres quanto em homens – que exige o sacrifício da

‘mãe’, significando uma atitude infantil passiva, e que assume as

responsabilidades da vida e enfrenta a realidade de um modo adulto.

O arquétipo do herói exige o abandono desse pensamento fantasioso

infantil e insiste em que se aceite a realidade de modo ativo” (STEIN,

2006:86).

No livro “Mitologia Grega” de Junito Brandão (1999), o mito do herói é um

recurso que pode auxiliar o homem a conhecer as possibilidades de sua

consciência individual e coletiva, à medida que o mesmo pode se inspirar com as

transformações do herói, fazendo-o assim se dar conta da pujança e

potencialidade de sua personalidade. O autor nesse livro descreve a origem, a

estrutura ontológica e a etimologia do herói, que serão desenvolvidos em outro

capítulo. No prefácio deste livro são mencionados conceitos de C.G. Jung, que

concebe mito como arquétipo, logo muito importante para estruturação,

desenvolvimento e evolução de nossa personalidade, consciência individual e

coletiva; o que mais uma vez permite relacionar o mito com a psicologia. Segundo

o autor do prefácio, o herói é um arquétipo que está sempre constelado nas

grandes transformações (BRANDÃO, 1999:1-19).

Neste trabalho pretendo, por meio da análise do personagem central da

coleção de filmes Star Wars, refletir sobre as condições arquetípicas que

acompanharam o herói; e de como se articulou a questão da escolha e do destino

com o percurso de tal personagem. Conjuntamente à análise do filme, pretendo

discutir a relação entre arquétipo e escolha; e de que formas essas duas

dimensões se conciliam a favor do processo de individuação, conceito que será

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desenvolvido posteriormente. Além disso, pretendo refletir sobre as possibilidades

de controle que temos sobre o nosso próprio processo de individuação, quando o

resultado do mesmo não corresponde ao que fora desejado, seja devido a uma

incompatibilidade com a realidade ou com o arquétipo que o rege. Para tanto, será

enfocada a forma como o ambiente ou a sociedade influencia a posição subjetiva

de cada sujeito; e como tal disposição ou posição social designada interage e se

relaciona com as escolhas.

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Capítulo II - Mito do herói:

O mito do herói inaugura um novo foco em relação ao mito da origem.

Como cita Erich Neumann (1995:107), “a preponderância agora é o centro do

mundo como lugar onde está o homem”. Sendo assim, o foco não mais é a

história da criação do mundo e do homem, não se trata mais de assimilar e

acomodar o milagre da criação ou de responder às inquietações a respeito de o

que somos e de onde viemos, mas sim de olhar como um homem vive sua vida e

como encara sua morte. Esse “novo foco mitológico” apresenta uma via dupla,

podendo ser encarado tanto do ponto de vista do eu (herói) quando do ponto de

vista do outro (que observa ou interage com o herói). O herói é aquele que

“renova” o mundo e revela arquétipos do ser humano. Por isso, o mito do herói

inaugura uma fase de olhar um indivíduo em suas relações com o mundo. Nesta

fase, cujo foco é como um homem vive, é que se formam as figuras e as

personalidades humanas, que emergem da observação das individualidades e

personagens. Cabe pontuar que o mundo são as situações vivenciadas pelo herói,

sendo o ambiente e contexto das interações do mesmo (conforme a citação

acima, o lugar onde está o homem como sendo o centro do mundo).

Sendo assim, as figuras e personalidades humanas, se apresentam por

meio da trajetória do herói, e são “reveladas” a partir de uma experimentação ou

mesmo uma identificação com conteúdos que representam uma figura ou

personalidade humana. Pode-se pensar que esses aspectos pessoais

identificados pelo herói se configuram por meio de uma trama, na qual o herói é

afetado por conteúdos subjetivos com os quais se relaciona; tanto conteúdos

advindos de escolhas pessoais, quanto reações infligidas por um outro

personagem.

Esses conteúdos revelados pela trajetória do herói são possíveis por meio

da “captação” de arquétipos feita pelo mesmo. Tais “captações” se expressam no

mundo coletivo: os arquétipos mobilizam internamente o herói, que

consequentemente os expressa no mundo, afetando ou sendo notado pelos

outros. Tais conteúdos arquetípicos são elementos psíquicos veiculados pelo herói

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e que servem ao mesmo como um modo de operar, sentir e de perceber a si

mesmo e ao mundo.

“Assim sendo, o herói é o precursor arquetípico da humanidade em geral.

O seu destino é o modelo que deve ser seguido...” (NEUMANN, 1995:107).

Podemos pensar o mito heróico como sendo potencialmente parte constituinte da

personalidade de cada indivíduo.

Junito S. Brandão em seu livro “Mitologia Grega”, cita: “Não seria mais

simples dizer que o herói, seja ele de procedência mítica ou histórica, seja ele de

ontem ou de hoje, é simplesmente um arquétipo, que ‘nasceu’ para suprir muitas

de nossas deficiências psíquicas?” (BRANDÃO, 2002: 20). O autor complementa a

citação acima apontando para as correspondências e “similitude estrutural” entre

heróis nas mais diferentes culturas que não tinham comunicação entre si. Como

se a vinda do herói fosse uma demanda de desenvolvimento psíquico para a

comunidade, sendo assim, cada comunidade precisará de um herói para mobilizar

seus recursos psíquicos ou mesmo cumprir fases de desenvolvimento da psique

humana. É possível constatar em diferentes culturas e povos o mesmo mito, o que

pode sugerir uma direção do desenvolvimento da consciência humana comum em

diferentes povos, os quais realizam esse desenvolvimento independentemente,

por meio de seu funcionamento grupal e dos heróis.

Capítulo II a - Características do herói:

Joseph Campbell em seu livro O herói de mil faces, cita dois termos,

“separação” e “transfiguração”, que por sua vez possibilitam a elevação espiritual

e retomada do trabalho de criação desempenhadas pelo herói. A “separação”

seria, como cita o autor, “uma radical transferência da ênfase do mundo externo

para o mundo interno, do macrocosmo para o microcosmo, uma retirada, do

desespero da terra devastada, para a paz do reino sempiterno que está dentro de

nós” (CAMPBELL, 1997:27). Tal reino sempiterno é concebido pelo autor como o

inconsciente infantil, que por sua vez comporta as potencialidades não realizadas

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na vida adulta, cujos conteúdos possibilitam uma renovação e elevação na vida

adulta.

Sobre a “transfiguração”, o autor diz que é o retorno do herói ao nosso meio

para desempenhar a tarefa de ensinar a lição de vida renovada que aprendeu.

O autor cita ainda que o herói é aquele que se retira da “cena mundana dos

efeitos secundários” (1997:27), e se lança sobre as regiões causais da psique,

aonde se encontram as dificuldades, e se empenha em erradicá-las e esclarecê-

las em favor de si mesmo. Tal processo corresponde ao combate empenhado pelo

herói contra os demônios infantis de sua cultura local. O herói é, portanto, aquele

que passa por tal experiência assimilando-a diretamente e sem distorções daquilo

que C.G Jung denominou imagens arquetípicas. O autor complementa que tal

processo do herói é concebido pela filosofia hindu como sendo a discriminação

entre o verdadeiro e o falso; e que “Os arquétipos a serem descobertos e

assimilados são precisamente aqueles que inspiraram, nos anais da cultura

humana, as imagens básicas dos rituais, da mitologia e das visões” (CAMPBELL,

1997:27).

Campbell faz uma relação do herói com a dinâmica de ascensão e

desintegração das civilizações: um cisma no espírito ou um cisma no organismo

social não são resolvidos por uma retomada dos ideais e dos funcionamentos

passados, nem por rearranjos de elementos em deterioração ou planejamentos

ideais de futuro. Apenas o nascimento pode conquistar a morte, não o nascimento

de algo antigo, mas sim o do novo.

Existem variadas formas e configurações de heróis, cada um deles toca

distintos aspectos dos arquétipos, assim como existem variadas formas de rituais.

No entanto, é muito presente nos rituais a função de catarse, de viver uma

experiência limite e até mesmo trágica, para se renovar ou purificar os membros

da comunidade ou da tribo.

Os conteúdos que de certa forma compuseram os rituais são essenciais

para as culturas, uma vez que eles contêm as bases de como lidar com as etapas

da vida, como lidar com o grupo e de como pertencer a tal cultura. Dessa forma, é

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constatada a importância do conteúdo dos rituais, que, assim como os conteúdos

experimentados pelo herói, são arquetípicos.

O herói, após seu nascimento, deve engendrar na batalha primordial a luta

contra os “primeiros pais”. Tal batalha leva o herói a tirar suas amarras do

ambiente familiar, desobstruindo seu caminho ou potência a fim de estruturar sua

personalidade e também o mundo interno, os estágios superados e os que se

seguirão na trajetória do herói.

A natureza do herói se relaciona com o nascimento do mesmo, no qual se

encontra a “problemática dos pais duplos”. Essa característica configura o mito do

herói, visto que tal problemática se apresentou em diversas culturas. Além de o

herói ter pai e mãe pessoais, de criação, o mesmo possui também pai e mãe

divinos. “Essa dupla origem, com as suas figuras parentais pessoal e

suprapessoal opostas entre si, constela o drama da vida do herói” (NEUMANN,

1995:108).

O nascimento do herói revela uma peculiaridade, tornando-o um sujeito

incomum, diferente, gerado por algo incomum, um demônio ou divindade. A

experiência de parto é sentida intensamente pela mãe. “A experiência primária da

mulher com o nascimento é matriarcal. Não é o homem o pai do filho: o milagre da

procriação vem de Deus. Logo, a fase matriarcal não é regida por um ‘pai

pessoal’, mas por um progenitor ou poder suprapessoais” (NEUMANN, 1995:109).

Cabe dizer que nos primórdios da humanidade, ou seja, na época pré-histórica, as

mulheres davam à luz um bebê sem saberem que o homem era pai. Para essa

mãe pré-histórica, o bebê foi produzido por ela mesma, por um ser criador divino

ou forças da natureza, que de qualquer forma, faz dela a “Grande Mãe” e a

“Terra”, como sendo uma deusa que viveu uma experiência de milagre. Essa

significação da origem do filho exerce influência sobre o mito do herói, mesmo que

posteriormente tenha sido reconhecido o nexo causal da procriação por meio do

intercurso sexual com o homem.

A mãe do herói é sempre uma mãe virgem, Mãe Deusa ou então uma

“noiva de deus”.

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“Aqui a virgindade significa - como geralmente no mundo antigo-

não pertencer a nenhum homem específico, quer dizer, é

essencialmente sagrada, não como pureza física, mas como abertura

psíquica para Deus. Vimos que a virgindade é um aspecto importante

da Grande Mãe, do seu poder criador, que não depende de nenhum

parceiro masculino. Mas há também um elemento procriador

masculino agindo nela. No início, no nível urobórico, ele é anônimo;

posteriormente, torna-se subordinado e justaposto à Grande Mãe,

como energia fálica; e só relativamente mais tarde aparece ao seu

lado, como consorte. Por fim, no mundo patriarcal, ela é destronada

pelo seu príncipe consorte e, por sua vez, justaposta e subordinada.

Mas retém a sua eficácia arquetípica” (NEUMANN, 1995:108).

Segundo o autor, a crença do nascimento do herói a partir de uma virgem é

mundial, prevalecendo na América do Norte e na América do Sul, na Polinésia,

Ásia, Europa e África.

Devido ao herói ser diferente da norma humana, do comum, ele é

considerado pela humanidade como tal. A distinção do herói com relação às

outras pessoas o configura como único, despertando assim atenção e contraste

em relação aos demais. Ele tem um aspecto dual: ao mesmo tempo em que ele

vive entre os outros homens, ele se sente estranho perante o coletivo,

experimentando dentro de si algo incomum e divino. Durante seus feitos heróicos,

ele se sente extraordinário, como que sendo filho de uma divindade, como sendo

bem diferente de seu pai de criação, terreno.

A batalha contra os pais, desempenhada pelo herói, implica o

enfrentamento do que é humano, não sendo concebido apenas como um

sofrimento pessoal e indizível do herói, mas sim como sendo características do ser

humano, ou seja, arquetípicas. O herói é aquele que sofre e supera algo que é

humano, que posteriormente, quando se põe em questão, é tratado como sendo

algo de que todo mundo sofre. No entanto, parece ser só o herói quem realmente

passou por isso. Pode-se dizer que a tragédia do herói, além de ser uma

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experiência pessoal do mesmo, afeta toda a humanidade, marcando e

diferenciando o mundo mesmo após sua morte, visto que a tragédia passou a ser

reconhecida por cada sujeito como fazendo parte de si. Dessa forma, não é

necessário o herói estar vivo para representar algo humano, mesmo sendo o herói

um recipiente das projeções arquetípicas, as outras pessoas tomam a si mesmas

como recipientes, assim como o herói.

Segundo Viktor D. Salis (2002:12), “O herói é aquele que deve sobreviver

ao impacto e voltar à luz do dia, íntegro perante todas as contrariedades e

desilusões”. Deve superar as derrotas e prosseguir no caminho de sua

imortalidade, revelando o sentido original e genuíno de sua humanidade,

superando o medo da perda da individualidade para assim seguir ao encontro da

vontade universal cósmica.

O autor afirma que o mito exerce uma função mobilizadora de conteúdos

adormecidos no humano: o herói revela a paixão que impulsiona tais conteúdos.

Os talentos despertos que o herói desenvolve e deve aprimorar até o nível de

semelhança aos deuses, por fim podem lhe render a imortalidade, em

contrapartida da degeneração, criando-se assim, os mitos.

Ainda segundo Salis, para o pensamento antigo, o conceito de destino

corresponde ao máximo de liberdade responsável a que alguém poderia almejar,

uma vez que o destino seria o caminho para se compreender o sentido da própria

existência, o mistério e os propósitos da vida. Desta forma, ter o próprio destino

revelado seria uma dádiva dos deuses. O mesmo deveria ser cumprido, uma vez

que desta forma seria possível se consolidar os talentos da maneira mais plena. A

vida era tida como presente dos deuses, na qual cada um deveria ser si mesmo

do modo mais belo e pleno possível, para desta forma honrá-la, recriando os seus

talentos “educados e expandidos ao máximo” (SALIS, 2002:20).

O autor faz referência às escolas da Grécia antiga que adotavam o mito do

herói como ferramenta para a construção do homem pleno. O caminho do herói se

presta à reconquista do sagrado, sendo que a etimologia da palavra herói é aquele

que busca o sagrado. Essas escolas pregaram o caminho do herói, que não se

tratava de um caminho guerreiro, mas sim de um caminho da libertação do ser,

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libertação do mistério interior e do conhecimento dos deuses pelo homem. Em

contrapartida a isso existia um caminho de conquista do outro, dominação e

destruição, que não fomentavam a conquista de si mesmo, a libertação da alma e

a busca do conhecimento cósmico, como o fazia o caminho do herói segundo tais

escolas.

“Os homens vieram da raça de ouro (símbolo da eternidade e da

justiça) e decaíram para a raça de prata (símbolo da essência versus

a aparência). Foi quando aprenderam a mentir e a esconder a

verdade. Decaíram mais para a raça de bronze, que era o símbolo de

querer ser a verdade e a lei pelas próprias mãos. Decaíram mais

ainda para a raça de ferro, símbolo da condição mortal, pois o ferro

representa a vida que se corrói e se carcome. Era o nascer, crescer,

envelhecer e morrer, enfim, somos nós.” (SALIS, 2002:26).

O herói, segundo Salis, seria uma quinta raça, que se prestava a superar e

escapar do ciclo da degeneração, citado acima. O caminho do herói seria a

transposição das provas que cada etapa viria lhe impor, até atingir ou reconquistar

o ouro alquímico, que representava o divino e o ouro primordial, “símbolo da

eternidade e da verdade incorruptível” (SALIS, 2002:26-27).

Neste processo, o herói deveria despertar o Daimon, um gênio

intermediário entre o mortal e o imortal que nos habita e que nos impulsiona para

a imortalidade. Sendo assim, o caminho do herói se daria do mortal ao herói, do

herói ao Daimon, do Daimon aos deuses.

O autor cita a “Tábua das Esmeraldas”, item arqueológico atribuído ao deus

Hermes (deus mensageiro que auxiliava os heróis no caminho do sagrado) onde

foi encontrada a seguinte observação: “Descobre o gênio imortal que te habita

(Daimon), aquela energia apaixonada que te torna em algo e te impulsiona em

direção à tua missão aqui na Terra” (Tábua das Esmeraldas, apud SALIS 2000).

Segundo o pensamento antigo, os homens morriam para renascer

futuramente a partir do nível espiritual que atingiram na vida passada: devido a

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isso se almejava uma morte digna. Sendo assim, o herói pode ser considerado

como uma alma antiga que veio para terra já predestinado a realizar sua elevação

espiritual, o que caracteriza o herói messiânico, aquele que é o escolhido ou o

enviado dos deuses.

Segundo o mesmo autor, o caminho do herói era a luta entre a Dike e a

Hybris (Ouro, justa medida em oposição à Prata, desmedida). O herói era alguém

com vícios e virtudes, com qualidades e defeitos, e com uma disposição de

aperfeiçoamento de si mesmo por meio das provas superadas. Ainda assim são

recorrentes as manifestações desmedidas dos heróis, como os ataques de fúria

que marcaram a história de Hércules. Perante tais descomedimentos, o herói

deveria se redimir. Tal dinâmica aproxima o herói da condição humana,

caracterizada pela ambivalência.

Os heróis viveram em tempos remotos quando não havia normas sociais

suficientemente estabelecidas. Suas trajetórias revelam aspectos inacabados e

contraditórios de determinadas culturas. Por meio deles, desvelam-se aspectos do

homem e da sociedade que estavam encobertos, permitindo assim

transformações nos valores e na subjetividade das pessoas, no ambiente, na vida

e no coletivo, uma vez que os conteúdos revelados por meio do herói são

arquetípicos, logo humanos por excelência e passíveis de serem incorporados

pelo coletivo.

Junito S. Brandão em seu livro “Mitologia Grega” (2002) cita uma

característica comum entre muitos heróis: matar involuntariamente entes queridos

ou membros de sua própria família. Tais episódios são concebidos como

fatalidades ou enganos lamentados pelo herói. Além dos episódios de

assassinatos de familiares, o autor cita outros descomedimentos dos heróis, como

atitudes impulsivas ou de fúria e vingança. O autor se refere a tais contextos como

sendo uma ambivalência do herói, pois ele desempenha serviços extraordinários

em favor de uma comunidade, mostrando qualidades e virtudes, mas também

protagoniza episódios de violência e mesmo monstruosidade.

Assim sendo, apesar de os heróis se elevarem a um nível divino, eles

apontam sua humanidade, que se apresenta nos mitos. Estes permitem a

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identificação dos mortais com uma parte deste ser que atinge o sagrado, mas que

também mostra suas qualidades humanas e como as mesmas os influenciam.

A Hybris é uma crença de Sólon, antigo legislador Grego que concebia a

justiça como um princípio divino. Segundo Werner Jaeger (1969:277) a

abundância levava à Hybris, que por sua vez levava à ruína. Tal conceito ou

divindade é concebido como o perigo que reside na insaciabilidade do desejo, que

habita naquele que nunca se satisfaz com o que tem e sempre quer o dobro.

Segundo o mesmo autor (1969:281), “Assim, a felicidade e a fortuna não ficam

muito tempo nas mãos de quem as goza. É na própria natureza delas que a sua

perpétua mudança reside”. O autor cita a participação do divino no destino dos

homens e o nexo causal entre desventura e culpa do homem, sendo a desventura

uma atitude do homem que vai contra o princípio divino, tornando-o responsável

pela própria desventura. “O desenvolvimento da autoconsciência humana realiza-

se no sentido da progressiva autodeterminação do conhecimento e da vontade em

face dos poderes do alto. Daí a participação do homem no seu próprio destino e a

sua responsabilidade perante ele” (JAEGER, 1969:280).

O deixar-se seduzir pela Hybris, pode ser entendida como a sorte,

embriaguez da vitória, soberba, entre outros estados que almejam um sucesso e

que se transformam facilmente em profunda dor e castigo, sendo desempenhada

assim, uma força de justiça moral divina da qual os homens participam. O homem

tomado pela Hybris é levado ao seu próprio sacrifício, algo necessário para se

restaurar o equilíbrio da ordem divina. As conseqüências da Hybris se apresentam

no destino do homem, não como algo isolado, mas sim na trajetória de vida do

mesmo chegando a se prolongar para as futuras gerações de seus respectivos

familiares. Cabe dizer que essas concepções se referem ao pensamento religioso

politeísta da Grécia Antiga e que as religiões se transformaram estruturalmente no

transcorrer da história.

Dike é uma divindade reparadora, filha de Zeus que fica ao seu lado e

lamenta as injustiças cometidas pelos humanos, das quais a mesma deve prestar

conta. Dike significa o cumprimento da justiça, a justa medida, o meio pelo qual se

podem apoiar os que foram prejudicados pela Hybris. Significa dar a cada parte o

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que lhe é devido, “Assim se compendiava numa palavra só a decisão e o

cumprimento da pena. O culpado dá Dike, o que equivale originalmente a uma

indenização, ou compensação. O lesado, cujo direito é reconduzido pelo

julgamento, recebe Dike. O juíz reparte Dike” (JAEGER, 1969:125).

O autor citado acima, reflete sobre o conhecimento advindo da dor e do

sofrimento. O sofrimento para os antigos, trata-se da realização do divino na terra,

do triunfo da hybris que restitui a justa medida e a justiça divina e revela o

conhecimento advindo do sofredor. A hybris recai sobre os que mostraram-se

excessivamente confiantes, a mesma se realiza posteriormente na vida de

determinada pessoa, e revela para a humanidade o conhecimento advindo da dor

do mesmo. Os ditados populares podem ser vistos como consequências da hybris,

que transformaram-se em formulações sobre a vida e o ser humano.

No livro “Rei, Guerreiro, Mago, Amante: a redescoberta dos arquétipos do

masculino” (MOORE-GILLETTE, 1993:37), o herói é definido como um arquétipo

que orienta o menino a tornar-se homem, “auge das energias masculinas do

menino”.

“O herói começa achando que é invulnerável, que para ele só serve

o 'sonho impossível', que ele pode 'lutar contra o inimigo invencível' e

vencer. Mas se o sonho é realmente impossível, e o inimigo

realmente invencível, o herói vai ter problemas” (MOORE-GILLETE,

1993: 38).

O herói recebe a conotação de arquétipo do amadurecimento que rege a

transformação para a fase adulta. Pode-se destacar na passagem citada acima,

uma hybris intrínseca ao herói, devido ao fato dele ter um excesso de confiança

em si mesmo. Tal característica revela conteúdos infantis no herói, uma vez que o

mesmo precisa extrapolar-se para conhecer suas limitações.

“Como no caso de outros arquétipos masculinos imaturos, o Herói

está excessivamente ligado à Mãe. Mas tem uma forte necessidade

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de superá-la. Trava um combate mortal com o feminino, lutando para

conquistá-lo e afirmar a sua masculinidade. Nas lendas da Idade

Média sobre heróis e suas donzelas, quase nunca sabemos o que

acontece depois que o herói mata o dragão e se casa com a

princesa. Não nos contam o que aconteceu com o casamento deles,

porque o Herói, como arquétipo, não sabe o que fazer com a

princesa depois que a conquista. Não sabe o que fazer quando as

coisas voltam ao normal.

A derrocada do herói é que ele não conhece e é incapaz de aceitar

suas próprias limitações. O menino ou o homem dominado pelo

Herói da Sombra” não consegue realmente perceber que é um ser

mortal. A negação da morte – limitação fundamental da vida humana

– é a sua especialidade” (MOORE-GILLETE, 1993: 39).

O herói é aquele que não se deixa capturar por uma limitação, pois prefere

achar-se diante de infinitas possibilidades, ficando continuamente estruturando e

ativando suas potencialidades resistindo a ser uma pessoa que limitou sua vida a

um determinado desenvolvimento.

“O Herói lança o menino de encontro aos seus limites, contra o

aparentemente intratável. Encoraja-o a sonhar o sonho impossível,

que afinal de contas pode ser possível, se ele tiver coragem

suficiente. Dá-lhe poder para lutar contra o inimigo imbatível, que

será bem capaz de derrotar, se não estiver possuído pelo herói”

(MOORE-GILLETTE, 1993: 40).

O estar possuído pelo herói refere-se à prepotência em relação a

superação de uma tarefa. O arquétipo do herói pode motivar e encorajar um

sujeito a vencer seus bloqueios e realizar uma superação, em contrapartida pode

iludir o sujeito a se achar superior e invulnerável.

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No mito de Hércules, o arquétipo do herói desempenhou um processo de

lidar com seus limites, e apesar de sua força física superior, o mesmo teve que

usar de sua inteligência para superar os desafios, uma vez que quando ele

tentava resolver seus problemas com sua força bruta, ele sempre fracassava.

Neste herói, o arquétipo o impulsionou a um manejo das próprias potências em

prol de uma atitude mais segura e pensada, que mesmo assim, envolve muitos

riscos, com os quais Hércules soube lidar para superar suas provas. Hércules foi

um exemplo de herói que se aprimorou durante a vida, realizando grandes feitos e

amadurecendo com excelência. Quando era necessária uma atitude corajosa e

impensada ele a tinha, quando era necessária uma atitude de cautela ou traquejo

ele também a tinha, quando ele se sentia arrependido e culpado, ele buscava sua

cura, sentindo suas dores e pedindo orientações dos deuses. O mesmo foi-se

enriquecendo de qualidades e talentos conforme amadurecia, até que teve que

consentir com sua própria morte, que aceitou como sendo sua última prova a

superar. Ele construiu sua pira aonde voluntariamente foi incendiado encerrando

sua vida para repousar em sua eternidade junto aos outros deuses no Olimpo.

Portanto percebemos que, embora o herói seja predestinado e o escolhido

para cumprir uma missão, ele tem a possibilidade de escolher os caminhos a

trilhar, no sentido da individuação e da transformação de si-mesmo e da

comunidade, ou da derrocada, pela negação das suas limitações, que poderiam

lhe apresentar novas potencialidades rumo ao crescimento.

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Capítulo III - Sobre a Psicologia Analítica:

Carl Gustav Jung, fundador da Psicologia Analítica, nasceu em 26 de julho

de 1875 em Kesswil, aldeia da Turgóvia localizada na Suíça.

Jung fez todos os seus estudos na Universidade de Basiléia, concluindo o

curso médico no ano de 1900, aos 25 anos, se especializando em psiquiatria.

Jung após sua formação na Universidade, ocupou o cargo de segundo

assistente no hospital Burgholzli, de Zurique, período em que este hospital vivia

intensa atividade científica sob a direção de Eugen Bleuler, considerado um dos

maiores psiquiatras de todos os tempos.

Em 1902 defendeu sua tese de doutouramento que teve como título:

Psicologia e patologia dos fenômenos ditos ocultos. Em 1905, ele assumiu o posto

imediatamente abaixo de Bleuler na hierarquia do hospital, trabalhando junto do

mesmo como seu colaborador em experiências, nas quais elaborou seus métodos

próprios para estudar a esquizofrenia.

Jung, como já dito, foi criador da Psicologia Analítica, divergindo da

Psicanálise, criada por Freud, que o tinha como discípulo.

Segundo (SILVEIRA, 2003: 15), quando Jung escreveu em 1912 o livro:

“Metamorfose e símbolos da libido”, marcaram-se divergências doutrinárias que

separaram Jung de Freud, fortalecendo-se a criação Psicologia Análitica.

Neste capítulo serão vistos alguns dos conceitos desenvolvidos por Jung e

posteriormente estudados por autores da Psicologia Analítica.

Capítulo III a - Conceitos de Ego e Self da Psicolo gia Analítica:

“A descoberta de caráter mais fundamental e de maior alcance, de

Jung, é a do inconsciente coletivo ou psique arquetípica. Graças às

pesquisas que ele realizou, sabemos atualmente que a psique

individual não é apenas um produto da experiência pessoal. Ela

envolve ainda uma dimensão pré-pessoal ou transpessoal, que se

manifesta em padrões e imagens universais, tais como os que se

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pode encontrar em todas as mitologias e religiões do mundo. Jung

descobriu também que a psique arquetípica conta com um princípio

estruturador ou organizador que unifica os vários conteúdos

arquetípicos. Esse principio é o arquétipo central ou arquétipo da

unidade, ao qual Jung denominou o Si-mesmo” (EDINGER, 2000:

22).

Self ou Si-mesmo é o centro ordenador e unificador da psique total

consciente e inconsciente, que se relaciona com a consciência e personalidade,

cujo centro ordenador é o ego. Sendo assim, ego e self são dois centros

organizadores da psique, o primeiro conta com a participação ativa do sujeito,

sendo o seu eu, vontade, ego, e o segundo não requer a participação ativa do

sujeito, se trata de uma personalidade superior interna do sujeito e inapreensível

pelo mesmo. Pode ser concebida como a divindade interior “O Si-mesmo constitui,

por conseguinte, a autoridade psíquica suprema, mantendo o ego submetido ao

seu domínio” (EDINGER, 2000:22).

O autor citado faz uma seleção de símbolos que são associados ao self,

tais como: a unidade, a totalidade, a união dos opostos, o centro do mundo, o eixo

do universo, o ponto criativo aonde Deus e o homem se encontram, a eternidade,

a capacidade de gerar ordem a partir do caos, o elixir da vida.

O mesmo autor destaca a importância vital que exerce um eixo que conecta

o ego com o self, assegurando a integridade do ego e uma condição favorável

para o processo de individuação. No entanto, esse eixo não é algo pré-existente

do ser humano, mas sim um estado cultivado pela relação do ego com o self por

meio de movimentos de alternância do ego. No nascimento do ser humano o ego

existe como potência a ser constituída e estruturada, há apenas o self, o recém

nascido se encontra completamente identificado com o self, logo idêntico ao self.

Tal estado é denominado inflação e é a nossa condição inicial enquanto

seres humanos. O termo inflação faz referência a sentir-se amplo e importante, ou

seja, achar-se amplo e importante de uma maneira que não necessariamente

condiz com a realidade externa. Significa estar além dos limites das próprias

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medidas, podendo ser qualificado com adjetivos como orgulhoso, arrogante,

presunçoso etc. No entanto, ao nascermos, já possuímos o self, enquanto

totalidade funcional consciente e inconsciente, e devemos construir o ego. Para

tanto, o ego deve emergir do self (estado de alienação). Uma representação visual

seria de uma esfera menor saindo verticalmente de dentro de uma esfera maior,

mantendo seus centros alinhados, aonde seria o eixo ego-self (vinculo vital que

assegura a integridade do ego), estado concebido pelo autor como ideal e de

difícil obtenção devido às sutilezas do processo.

“Se esta for uma correta representação dos fatos, a separação

entre o ego e o si-mesmo e a crescente conscientização de que o

ego é dependente constituem, na realidade, dois aspectos de um

mesmo processo de emergência, que se estende por todo o período

que vai do nascimento à morte” (EDINGER, 2000: 26).

O autor ainda afirma que no decorrer do processo da vida até a morte,

ocorrem sucessivas oscilações: de imersão do ego no self, processo de que deriva

o estado de inflação; e de emersão do ego do self, de que deriva o estado de

alienação. O estado inicial de inflação é importante na medida em que a criança

possa entrar em contato direto com as realidades arquetípicas, estabelecendo

uma intimidade com seus aspectos divinos e criativos. Conseqüentemente, o ego

inflado inicial, assim como o estado de inflação, não reconhece os limites do

interior e exterior. É um estado sujeito a ser influenciado impulsivamente pelo

desejo (concebido, nesse caso, como a ordem do mundo), e pode ser

caracterizado como irresponsável e desmedido. Tais características advindas da

identificação com o self devem suceder sutilmente a um estado de alienação, de

modo que não se rompa ou se danifique além do necessário o eixo ego-self, uma

vez que deve-se manter raízes no self. Segundo o mesmo autor (2000:33), é

indispensável que se proporcione adequadamente para uma criança o estado de

inflação, uma vez que o mesmo é uma condição fundamental para o

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desenvolvimento da vida psíquica. Após esse estado proporcionado

adequadamente, o autor cita:

“Todavia, algum tempo depois, o mundo começa necessariamente

a rejeitar as exigências feitas pela criança. Nesse ponto, a inflação

original começa a se dissolver, mostrando-se insustentável diante da

experiência. Mas também tem início a alienação; o eixo ego-Si-

mesmo é danificado. É criada na criança uma espécie de ferida

psicológica incurável, ao longo do processo de aprendizagem de que

ela não é a deidade que acreditava ser. Ela é expulsa do paraíso,

sendo geradas uma ferida e uma separação permanentes”

(EDINGER, 2000:33).

Na vida adulta ocorrem repetidas experiências de alienação, tanto

advindas de encontros com a realidade, trazidas pela vida, quanto advindas de

suposições inconscientes do ego. No entanto, é necessária a contínua

aproximação com o self para não nos alienarmos de nosso próprio íntimo, ficando

assim expostos às enfermidades de caráter psicológico e ou orgânico.

Há necessidade de se manter uma integridade do eixo ego-self, ao mesmo

tempo em que se dissolve a identificação ego-self, uma vez que o ego não

experimenta do apoio fornecido pelo self enquanto estiver identificado com o

mesmo.

O autor cita exemplos de estados inflados (2000:37), como: as explosões

de ira, tentativas de se manipular o ambiente que motiva a ira; ânsia por

vingança, por se identificar com uma divindade vingadora; motivações para o

poder de todos os tipos, uma vez que fica implícita a onipotência, atributo apenas

de Deus; rigidez intelectual, por atribuir caráter universal e se supor onisciência; e

todas as operações regidas pelo desejo e prazer, por se atribuírem um valor

central com caráter transpessoal. “Na realidade, a colocação em si mesmo de um

excesso de qualquer coisa é indício de inflação, pois transcende os adequados

limites humanos” (EDINGER, 2000:37).

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Um exemplo básico da sucessão do estado de alienação sobre o de

inflação pode ser visto nos mitos de queda do homem, como no mito de Adão e

Eva. Neste mito, primeiramente eles viviam em um estado paradisíaco até

violarem a ordem de Deus, comendo do fruto proibido da árvore do conhecimento

do bem e do mal. Após esse passo de ampliação de consciência, os dois foram

expulsos do paraíso. Não comer da árvore do conhecimento era a condição para

se suspender o estado de inflação e seu subseqüente estado de alienação,

interrompendo-se o estado de comunhão e identidade com Deus, aonde não havia

conflito, pois tudo era uma unidade Homem-Deus. O pecado original se trata de

um pecado necessário para a evolução da consciência, se trata de uma mudança

primordial que contribuiu para a aquisição de recursos psíquicos humanos.

Segundo o mesmo autor (2000:42), Adão e Eva, eram originariamente

inflados como qualquer recém nascido, sendo assim, eram inflados passivamente.

No entanto, ao se deixarem seduzir pela serpente, que por sua vez dizia: “se

comerem este fruto, seus olhos se abrirão e você será como Deus”; neste ponto

eles exerceram uma inflação ativa. Foi quando se deu início o drama da tentação

e da queda, o ato voluntário de agir em prol do desejo de serem como Deus.

Consequentemente, eles foram expulsos do paraíso, caindo no mundo enquanto

seres humanos, mortais, que agora vivem o sofrimento, os conflitos, incertezas

etc. O processo de nascimento do ego deu-se por meio de um processo de

alienação, assim como o processo de expulsão do paraíso de Adão e Eva. O

paraíso pode ser simbolizado pela união do ego-self, vivenciado na vida intra-

uterina do bebê, assim como nos anos seguintes do nascimento.

“A obtenção da consciência é um crime, um ato de hybris contra os

poderes estabelecidos; mas é um crime necessário, que leva a uma

necessária alienação com relação ao estado natural de unidade. Se

desejamos ser, de alguma forma, leais ao desenvolvimento da

consciência, devemos considerá-lo um crime necessário. É preferível

ser consciente a permanecer no estado animal. Mas, para emergir, o

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ego é obrigado a colocar-se contra o inconsciente de que proveio e a

assegurar sua autonomia com um ato inflado” (EDINGER, 2000:50).

O autor complementa a citação acima utilizando exemplos de casos clínicos

de psicoterapia, nos quais as situações da vida pedem ao paciente que cometa

um “crime” para se desconfigurar uma situação aprisionadora na qual o mesmo

estaria vivendo.

Existem mitos nos quais a hybris é necessária e construtiva, como no caso

de Adão e Eva. No entanto, em muitos outros mitos retrata-se a hybris de forma

destrutiva, sendo o ego ativamente inflado que desencadeou conseqüências

desastrosas. Um exemplo é o mito de Ícaro, que voou alto demais com as asas

que seu pai construiu para fugirem de uma torre. O pai o havia advertido sobre a

conseqüência de se voar muito alto, que o sol derreteria as asas causando a

queda e morte. Ainda assim, Ícaro o fez e caiu para a morte. Tal situação não

gerou um aumento de consciência, pelo menos não para Ícaro. No entanto,

mostrou-se um conhecimento para os outros, humanidade, sobre os limites a

serem respeitados e suas conseqüências, e de como faz bem se seguir orientação

de pessoas mais sábias, advindas do outro.

“O mito pode ser visto, na verdade, como expressão simbólica da relação

entre o ego e o Si-mesmo” (EDINGER, 2000: 23).

O autor cita que muitas das religiões exerciam suporte para as pessoas

evitarem o estado de inflação, sendo sempre valorizada a personalidade não

inflada, ou seja, alienada, que por sua vez não toca nas questões sagradas,

deixando-as somente para Deus, uma vez que, ao se apossar de um estado

inflado, se estará transcendendo os limites humanos suportáveis ao ego.

“Logo, o tabu pode ser encarado como uma proteção contra a

inflação. Posteriormente, a idéia de tabu foi reformulada em termos

da vontade de Deus e do caráter inevitável de punição por

transgressões de Sua vontade. Mas a idéia de tabu e o temor à

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inflação ainda se manifestam por trás dessa nova fórmula”

(EDINGER, 2000: 60-61).

Sobre o estado de alienação, o autor cita que o ego não apenas deixa de

estar identificado com o self, mas também se desconecta dele. Apesar de ser

impossível se desconectar da totalidade e centro ordenador da psique, que é o

self, o ego deixa de obter segurança, energia e sentido fornecidos pelo self. Os

contatos com a realidade do mundo podem frustrar e danificar o eixo ego-self,

causando estranhamento ao ego, por sua vez, podendo se apresentar sintomas,

como a falta de auto-aceitação, por exemplo. Sobre a experiência de não ser

nutrido pelo self, o autor cita: “Quando a conexão se quebra, o resultado é o vazio,

o desespero, a falta de sentido e, em casos extremos, a psicose ou o suicídio”

(EDINGER, 2000: 72).

O autor complementa citando que sempre quando se faz presente o

desespero de uma profunda alienação, procede-se a violência, voltada de forma

tanto interna quanto externa, sendo os extremos dessa o suicídio e o assassinato.

Sendo assim, a origem da violência se dá devido à uma forte rejeição a si e ao

outro causada pela alienação do ego com o self.

O self é vivido pelo sujeito por meio suas relações com o mundo. Edinger

afirma que o self e o mundo são uma só e única coisa, ou seja, são a mesma

coisa. São citados exemplos de casos clínicos, dentre outros, de pacientes que

possuem manias de perseguição, que acham que fatos externos e independentes

do mundo lhes dizem respeito diretamente. Pode- se dizer que essa dinâmica que

determinados pacientes revelam nas suas relações com o mundo é um indicador

das relações que os mesmos exercem com seu self. Podemos dizer que esses

pacientes lidam com o self de forma persecutória, entendendo todos os conteúdos

que emergem do self como significando especificamente algo preconcebido pelo

ego. Sendo assim, self e mundo são análogos enquanto relações do ego. As

relações que temos com o self são iguais às relações que temos com o mundo.

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Capítulo III b - Sobre o Processo de Individuação n a Psicologia Analítica:

“De modo geral, é o processo pelo qual os seres individuais se formam e se

diferenciam; em particular, é o desenvolvimento de um individuo psicológico como

um ser distinto da psicologia geral e coletiva” (SHARP, 1993: 90).

O self contém a totalidade do sujeito, inclusive as características próprias

do mesmo a serem desenvolvidas. Cabe ao ego em individuação dar vazão para

tais conteúdos se manifestarem, os quais são articulados inconscientemente pelo

self. Desta forma, o sujeito estaria realizando a si mesmo, ou seja, o ego

correspondendo ao self.

Sobre a dinâmica ego-self: “... no conflito como na colaboração entre ambos

é que os diversos componentes da personalidade amadurecem e unem-se numa

síntese, na realização de um individuo específico e inteiro” (SILVEIRA, 2003: 77).

No processo de individuação, para o indivíduo tornar-se único, é

necessário primeiramente ou mesmo simultaneamente, a estruturação do ego.

Essa estruturação do ego não se trata apenas da diferenciação do ego em relação

ao self, mas também: do recolhimento dos conteúdos projetados na sombra a

serem integrados pelo ego; da diferenciação do ego com a persona; da

conscientização e elaboração dos complexos; da integração com a anima (no

homem) ou animus (na mulher). Tais processos configuram as condições ideais

para o ego proceder a individuação, na qual o ego exerce a conscientização de

suas condições psíquicas e realiza as demandas do si-mesmo. O ego estrutura

suas condições psiquicas, distinguindo-se da consciência coletiva, a qual tende a

identificar os sujeitos com uma massa e não enquanto individuo único, para então

se proceder a relação com o self. Serão explicitados os conceitos utilizados

acima, que são pressupostos teóricos da Psicologia Analítica, fundamentais a todo

ser humano em seu processo de individuação, logo, arquétipos que se articulam

no processo de individuação.

Segundo o dicionário junguiano, dirigido por Paolo Francesco Pieri (2002), o

processo de individuação é um processo simultâneo de diferenciação e

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integração. Apesar de parecer contraditório, a simultaniedade é exercida, tanto em

níveis diferentes, quanto, a diferenciação sendo seqüenciada pela sua integração,

simultânea ou posteriormente.

A diferenciação se presta a distinguir um conteúdo psíquico de um outro,

com os quais estaria inconscientemente identificado, a fim de realizar uma

discriminação. A integração seria a incorporação dos conteúdos diferenciados,

porém mantendo suas distinções. Sobre essas duas dinâmicas do processo de

individuação, o autor cita:

“Portanto, a diferenciação individuativa indica uma passagem

à independência e à autonomia da parte, quando se torna possível a

referência representativa ao estado originário de indiferenciação

psíquica e à sua conseqüente ineficaz dependência e heteronomia

em relação ao outro diferente de si próprio e do todo. A integração

individuativa indica, ao invés, uma passagem à dependência e à

heteronomia da parte, quando se tornar possível a referência, neste

caso, ao estado originário de oposição e de conflito e, portanto, de

ineficaz independência e autonomia em relação ao outro diferente de

si próprio e ao todo” (PIERI, 2002:256).

Uma conseqüência da individuação é a de estabelecer as diferenciações

entre distintas estruturas psíquicas, como a persona. Personas são expressões

da máscara psíquica que usamos nas relações com o mundo, que servem para

ocultar um estado interno e também para revelar traços parciais de nossa

personalidade: si-mesmo, centro ordenador da psique total, e ego, centro da

personalidade consciente. Para evitar que essas “estruturas psíquicas” estejam

inconscientemente identificadas entre si, a individuação, por meio da diferenciação

e integração, desenvolve uma articulação entre os distintos operadores da

dimensão do mundo interno, possibilitando assim a estruturação de um ser

humano “único” e organizado pelo seu próprio processo de integração. O autor

cita ainda:

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“ ‘É importante para a meta da individuação, isto é, da realização do

si-mesmo, que o indivíduo aprenda a distinguir entre o que parece

ser para si mesmo e o que é para os outros. É igualmente necessário

que conscientize seu invisível sistema de relações com o

inconsciente...’ ” (PIERI, 2002: 259).

Existem outras “estruturas psíquicas” na psicologia analítica, como sombra

e anima/animus, que serão desenvolvidas posteriormente e que também se

incluem no processo descrito acima de discriminação dos operadores do mundo

interno.

No mesmo volume destacado acima é salientado que no processo de

individuação nós nos tornarmos o nosso próprio si-mesmo. “‘Podemos pois

traduzir “individuação” como “tornar-se si-mesmo” ou “o realizar-se do si-mesmo” ’”

(PIERI, 2002: 259).

No constante balizamento do mundo interno, no qual o ego é a capacidade

de escolha e participação ativa, existem outras entidades internas que influem

com mesma ou até maior força. Sendo assim, o ego não tem força para realizar o

processo sozinho, pois tem que se articular com seus recursos internos, e nem

mesmo tem controle sobre qual é o objetivo a ser alcançado. Segundo (PIERI,

2002: 260), o ego deve realizar com o si-mesmo ou self uma relação, nem de se

opor nem de se submeter, mas sim de se conectar ao mesmo, permanecendo em

sua órbita. Segundo o autor, o self ou si-mesmo é da ordem do indescritível,

sendo assim, sobre a relação do ego com o mesmo e sobre o conteúdo do

mesmo, nada se pode afirmar. O autor usa a palavra sentir para fazer referência à

relação que o ego estabelece com o self, uma vez que ao ego o si-mesmo é

inapreensível, o que exige uma relação num nível irracional e mais sensorial.

Sendo assim, o self, de antemão, já bloqueia qualquer tentativa de manipulação

racional do ego.

Cabe destacar que a individuação tem importante valor tanto para se assegurar

quanto para proteger a individualidade mediante as pressões do externo exercidas

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pelo ambiente e meio coletivo. Além de oferecer proteção, a individuação fortalece

o ego a não recair no inconsciente ou sucumbir às coações advindas da ligação

entre o indivíduo e o ambiente.

Desenvolve-se na individuação: o aspecto interior e subjetivo de integração;

e o aspecto exterior objetivo na relação com o outro. Na individuação, o sujeito

além de dispor de uma organização articulada interna, empenha-se em uma

articulação externa com o outro.

Sobre o sujeito que se encontra no processo de individuação em relação ao

ambiente coletivo, o autor cita:

“Desta forma o nível interindividual da individuação é

considerado como distinção do Eu em relação aos modelos

(presentes no plano da ação interpsíquica além da representação

interpsíquica) e, portanto, como expressão da capacidade do

indivíduo de perceber-se não mais como executor automático das

normas coletivas externas ou dos hábitos já instaurados

internamente. Neste sentido pode-se dizer que, na individuação, o Eu

– retirando-se do assim chamado ‘coletivo’ – põe-se à margem dele e

constitui as bases para possível troca e verdadeira interação com

ele...” (PIERI, 2002: 261).

A autora Aniela Jaffé (1995, 76) diz: “O caminho natural para a

experiência pessoal do inconsciente coletivo é aberto pelos sonhos e, de

forma menos comum, pelas visões, alucinações, fenômenos

sincronísticos etc”.

A mesma afirma que no processo de individuação são “invocadas” imagens

do inconsciente que devem ser elaboradas conscientemente. O processo não se

trata apenas da sucessão dessas imagens, mas sim de uma complementação das

mesmas pela realidade exterior. Desta forma, ao se combinar uma imagem interior

com uma atitude em relação ao exterior, processa-se o desenvolvimento da

individualidade e destino. Como destino é entendido o desenvolver da

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individualidade no sentido mais elevado, jamais plenamente realizado e meta

contínua da individuação.

“A individuação consiste, basicamente, em tentativas

constantemente renovadas, constantemente exigidas, de combinar

as imagens interiores com a experiência exterior. Ou, dizendo de

outro modo, é o esforço no sentido de ‘fazer tornar-se inteiramente

nossa própria intenção aquilo que o destino pretende fazer conosco’ ”

(W. Bergengruen apud Jaffé, 1995: 79).

“Nos momentos bem-sucedidos, uma parte do self é realizada

como a unidade de interior e exterior. Então o homem pode repousar

em si mesmo, porque está auto-realizado e irradia o efeito da

autenticidade” (JAFFÉ, 1995: 79).

A autora complementa a citação acima fazendo uma consideração sobre a

condição numinosa e indescritível do arquétipo do self, e considera individuação

em linguagem religiosa como a realização do divino no homem.

“Pela conscientização das conexões e imagens transpessoais e

pela experiência de sua numinosidade, reconhecemos energias que

atuam por trás do nosso ser e de nossas ações, assim como por trás

da aparente casualidade dos acontecimentos” (JAFFÉ, 1995: 81).

As situações que nos exigem uma escolha, ou que nos fazem lembrar de

intimidades, medos e alegrias, mobilizam e atualizam nossa psique, que passará a

funcionar a partir deste engajamento. No entanto, nem sempre estamos certos

sobre nossas expectativas e por vezes nos frustramos. Esses estados de

disposições do sujeito, sempre se constituem de elementos internos psíquicos que

se agrupam e se apresentam para o ego, ou pelo mesmo são manejados. A partir

das expressões internas advindas das situações que vivemos, temos a

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oportunidade de nos dispor para uma ação, nos entender conosco, exercer nossa

criatividade e etc. Sendo assim, nossa situação interna sempre é nosso ponto de

partida, ou afinação, para as transposições das situações vividas. É o nosso fio

condutor, que quando é abalado deve prosseguir a partir desse abalo, ou quando

está estável, permanece a partir desse estado até suceder alguma mudança.

A anima, no homem, ou animus, na mulher, são arquétipos interiores que

nos revelam a totalidade dos conteúdos sobre o sexo oposto e funcionam como

guias da criatividade, permitindo-nos acessar e mesmo expressar articuladamente

nossos conteúdos inconscientes. No entanto, este trabalho não irá aprofundar

nem mesmo compor uma análise com esses conceitos, pela necessidade de

limitar e recortar nosso foco de estudo.

“Mais cedo ou mais tarde, a verdadeira individuação exige do homem

uma disposição de abandonar as pretensões da sua personalidade

em favor do self como autoridade supra-ordenada, e renunciar a elas

sem se perder. A individuação sempre encerra sacrifício, uma ‘paixão

do eu’. Mas ‘não significa exatamente deixar-se tomar; é um abrir

mão consciente e deliberado, que prova que se é capaz de dispor de

si mesmo, isto é, do seu próprio eu’. No entanto, somos conduzidos a

essa entrega livre ou voluntária de si pelo self, pelo seu impulso de

desenvolvimento e realização própria. A personalidade mais

abrangente toma o eu a seu serviço e este torna-se o representante

e o realizador do self no mundo da consciência” (JAFFÉ, 1995: 90)

Apesar de as exigências do self soarem como comandos externos, aos

quais se devem obedecer com continência, não se trata de uma relação vertical de

submissão, mas sim de uma escolha voluntária do eu em se corresponder com as

demandas do self. O self é também denominado, como já dito, como o si-mesmo.

Sendo assim, trata-se de um diálogo interno, de uma autoridade semelhante à

externa, mas sendo um aspecto interno superior da mesma pessoa, o que pode

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afirmar que uma pessoa que desempenha tal relação com o self, obedece a si

mesma.

A relação com o self ressalta uma distância do mesmo em relação ao ego,

advinda da separação primordial para a criação do ego, como foi descrito

anteriormente. Tal diálogo com o self parece impor ao ego as limitações e rédeas

a serem seguidas e guiadas. Sendo assim, o ego se dispõe ou não a ceder a tais

limitações, desempenhando, independentemente de sua escolha, uma luta

interna. Segundo a autora, a limitação “imposta” pelo self pode soar desagradável

e ameaçadora ao ego, o qual pode se assustar ao se deparar com a falta de

liberdade despertada. Ou, em outro caso, a limitação pode ser recebida como um

despertar da alma que finalmente chegou.

“O perigo de confundir a individuação com o tornar-se um homem-

deus ou um super-homem é evidente. As trágicas ou grotescas

conseqüências desse equívoco só podem ser evitadas se o ego-

personalidade puder conduzir o entendimento com o self, não

perdendo de vista a realidade das nossas limitações humanas e da

nossa mediocridade” (JAFFÉ, 1995: 81)

A autora destaca, após a citação acima, a necessidade do ego em resistir à

influência do self, para não ser tomado pelo mesmo, para somente assim poder

torná-lo consciente em sua divindade. Isso sugere a modéstia e cautela até que se

possa de fato se conter no ego uma forma de se relacionar com o self. É citada

ainda a necessidade de se abandonar as pretensões do ego, encerrando suas

paixões, exercendo assim um sacrifício a fim de se vincular e se relacionar com o

self, uma vez que as demandas do self podem não corresponder às aspirações e

desejos do ego.

“Como em todas as questões que confinam com o transcendental, a

única resposta que a psicologia pode dar é uma resposta

contraditória: o homem é livre e não é livre. Não é livre para escolher

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o seu destino, mas sua consciência lhe dá a liberdade para aceitá-lo

como uma tarefa que lhe foi atribuída pela natureza. Se ele toma a

responsabilidade pela individuação, submete-se voluntariamente ao

self – em linguagem religiosa, submete-se à vontade de Deus. No

entanto, a submissão não anula o sentimento de sua liberdade. Pelo

contrário, só o sacrifício o justifica e a responsabilidade por seus atos

e decisões lhe dá validade. O sacrifício é uma afirmação da tarefa

que a vida representa. Ele aponta para além do homem e, por isso,

pode levá-lo a uma autêntica experiência de significado” (JAFFÉ,

1995: 91).

No momento em que o ego escolhe se corresponder com o self, advêm os

devires, enquanto metas a serem identificadas para então serem cumpridas pelo

ego, uma vez que o ego orientado pelo self abrange suas questões existenciais,

tais como: sentido da vida, destino, etc. As implicações do ego no processo de

individuação despertam dificuldades e sentimentos irreconciliáveis. No self se

contém a totalidade e unidade, enquanto que no ego se contém as contradições e

fragmentos do self. No entanto, o ego não “sabe” ou não suporta integrar os

opostos, restando-lhe como alternativa “pedir auxílio” para o self, no intuito de se

obter uma totalidade ou de haver-se com uma resolução da contradição

despertada. As dificuldades, para conciliar tendêcias opostas constelam no sujeito

o embate entre liberdade e prisão.

“A liberdade e a prisão acompanham e condicionam a história da

evolução do homem. Sua consciência aumentou consideravelmente

de alcance, desde seu primeiro despertar, e adquiriu um forte

sentimento de liberdade” (JAFFÉ, 1995: 93).

A liberdade pode ser facilmente associada ao cumprimento dos anseios do

ego e obtenção da satisfação pelo mesmo, despertando-lhe a idéia de ser livre

para permanecer ou não em determinada situação conforme seu livre-arbítrio ou

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livre-escolha. Já a idéia de prisão pode ser facilmente associada com a restrição

de liberdade, com o confinamento e ausência de escolha, despertando a

inevitabilidade de uma situação.

A individuação é a forma pela qual se dá o desenvolvimento da psique

humana, por meio da correspondência do ego com o self. “A consciência,

ampliando-se ao longo dos milênios, é o prémio maior da evolução, especialmente

devido ao sentimento de liberdade que comunica” (JAFFÉ, 1995: 93). A autora

complementa dizendo que o maior acesso a liberdade tem como consequência o

distanciamento da natureza, que nos protegia dando-nos instintos mais resolutos;

e que, sem eles, temos que encontrar dentro de nós mesmos condições que nos

protejam, de maneira que não precisemos ficar diluídos nas massas e

agrupamentos coletivos, pois a coletividade oferece proteção e exerce influência

sugestiva sobre o indivíduo. A autora diz que a individuação tem como significado

social o meio pelo qual o sujeito não permanece massificado.

O processo de desenvolvimento e mesmo evolução da consciência humana

por meio da realização do self é relacionado pela mesma autora como sendo a

“individuação da humanidade” (JAFFÉ, 1995: 113). A individuação não ocorre,

portanto, apenas no nível pessoal, já que um sujeito pode tomar para si o

“problema dos outros”, ou seja, conteúdos projetados pelos outros ou coletivos,

que de alguma forma combinam com o sujeito alvo da projeção devido ao fato

dele assumi-los como “problemas seus”. Sendo assim, o sujeito pode identificar

seus conteúdos a serem trabalhados a partir de um apontamento exterior dirigido

a ele. Dessa forma, o indivíduo irá trabalhar tanto seus conteúdos interiores

quanto os conteúdos exteriores projetados nele pelos outros.

“A individuação do homem tomado como indivíduo não se realiza

separadamente da individuação coletiva, mas na verdade o espírito

do tempo se realiza no indivíduo, e a imagem de Deus, especifica de

uma época, está constelada no inconsciente dele como uma imagem

da totalidade” (JAFFÉ, 1995: 114).

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Cabe salientar que a relação abordada pela autora entre o self e Deus não

assimila os dois conceitos como significando a mesma coisa. Logo, o self não é

igual a Deus, ele apenas interage com o ego de forma semelhante a como a

humanidade se relacionou com a religiosidade e com a imagem de Deus, as quais

foram se transformando durante a história.

Apesar de tanto Deus quanto o self serem irrepresentáveis, existe a

diferença entre Deus, ou seja, objeto inapreensível, e imagem de Deus e

religiosidade, ou seja, objetos apreensíveis; assim como existe a diferença entre

self, arquétipo central inapreensível, e imagens arquetípicas, emanações do self

apreensíveis. Sendo assim, existe uma dinâmica semelhante entre os conceitos

de self e divindade no que concerne ao psiquismo do ser humano. Os conteúdos

que são expressos pelo self, imagens arquetípicas, são de uma profundidade que

só podem ser verdadeiramente assimilados se forem contemplados em suas

demandas emocionais e não apenas racionais, para assim serem assimiladas as

características numinosas ou sagradas desses conteúdos inconscientes.

É destacado pela autora que as religiões que as pessoas, desde os

primórdios até a atualidade, professavam e a representação que os mesmos

faziam de Deus ou divindade, correspondem ao processo de desenvolvimento do

self coletivo. A individuação visa à síntese dos opostos no self, concebidos de

maneira consciente pelo ego, que por sua vez engendra o processo de lidar com

as contradições até se atingir uma situação de resolução, desempenhando assim

o apaziguamento das contradições.

No processo de individuação, os ganhos obtidos se dão: na estruturação do

ego mediante as questões que o abalavam em determinada fase; e na sucessão

de estruturações a serem feitas conforme advierem novas “dificuldades interiores”.

Sendo assim, o ego que permanece no processo de individuação, durante sua

vida escala diversos níveis interiores, assimilando-os e tomando crescente

consciência de nossa realidade psicológica própria, adquirindo continuamente

auto-conhecimento. Além disso, o ego em contato com o self é guiado a levar

sua vida realizando seu “melhor destino possível”.

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Cabe destacar a função compensatória da psique, seu funcionamento padrão, à

qual tanto o processo de individuação quanto qualquer outro funcionamento

psíquico estão sujeitos. Trata-se do conflito subjacente a qualquer ação

psicológica na qual uma tese é contraposta pela sua antítese; e do choque entre

as duas cria-se a síntese, que por sua vez pode transformar-se em uma tese para

uma nova antítese e síntese. Esse é o mecanismo de auto regulação da psique,

na qual qualquer contexto exacerbado irá, como em uma balança, evocar seu

oposto, criando assim um conflito interno no qual a síntese seria a resolução e re-

estabelecimento de um equilíbrio temporário. A individuação não escapa desse

funcionamento, ela apenas prepara o ego para um “melhor desempenho” e

permite uma compensação na relação do ego com o self. Essa função

compensatória permite ainda a realização da síntese do self, ou seja, a resolução

proposta pelo self enquanto personalidade superior que ordena o ego em seus

balizamentos de tese e antítese.

Aniela Jaffé afirma que apesar de o ser humano ser diferente dos outros

animais por ter maior controle sobre seus instintos e por ter um eu consciente com

liberdade de decisão e outras, ainda assim, as ações e idéias do mesmo são

moldadas pelos arquétipos, e sua predisposição para vencer o inconsciente é

engendrada pelo self.

Capítulo III c: - Considerações sobre os conceitos de Sombra e Complexo

para a Psicologia Analítica:

Na medida em que o ego emerge e que não vive identificado com o self, o

indivíduo passa a criar sua sombra. Ainda que o mesmo permanecesse

identificado com o self, sua sombra se estenderia para sua “carência” de ego.

Sendo assim, a sombra se constitui das incompletudes e das experiências do

sujeito. A cada afirmação ou permanência, indubitavelmente se produz uma

sombra, uma vez que a mesma pode ser entendida como as não realizações do

sujeito, as quais se estendem continuamente para todo o sempre, uma vez que

em cada situação vivida apresenta uma escolha e inúmeras renúncias. Essas

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inúmeras renúncias são as possibilidades não escolhidas para uma situação, as

quais foram absorvidas ou projetadas na sombra. Uma condição básica do ser é o

não ser, pois é impossível ser todas as coisas ao mesmo tempo. Logo, todo o

infinito que continuamente se multiplica pelas escolhas rejeitadas de cada

momento “vai para” a sombra. Os conteúdos sombrios são as variadas

possibilidades não vividas pelo sujeito, que podem emergir para consciência

causando experiência de estranhamento ou mal-estar.

A sombra contém conteúdos indesejados, obscuros e ameaçadores para a

personalidade. Uma vez que o ego se configura concientemente em algo por ele

desejado, os conteúdos insconscientes que não “concordam” com a configuração

desejada são projetados na sombra. “‘o termo “sombra” se refere à parte da

personalidade que foi reprimida por causa do ideal de ego’” (WITHMONT apud

SANFORD,2007: 64).

O autor fala sobre o nexo entre o ideal de ego e as influências exercidas

pelo ambiente cultural, sociedade, família, laços sociais e regras religiosas, os

quais, por sua vez, podem operar inconscientemente no desenvolvimento do ego.

“Não há dúvida de que nossos pais são de extrema importância na

formação do ideal de ego, uma vez que eles reforçam certas

condutas, quando as aprovam, e rejeita outros tipos de

comportamento ou os punem, quando os desaprovam” (SANFORD,

2007: 65).

O autor complementa dizendo que as organizações de formação de caráter

e grupos com códigos de conduta e padrões de comportamento exercem uma

função importante na construção da personalidade consciente. À medida em que

se forma uma personalidade, cria-se uma sub-personalidade embutida na sombra.

Enquanto somos ignorantes a respeito de nossa sombra, a mesma leva uma vida

autônoma dentro nós. O autor cita que apesar de o ego não ter consciência sobre

a sombra, a mesma tem consciência de tudo o que se passa em nossa

consciência. Sendo assim, é favorável alguma canalização desses elementos

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sombrios pelo ego, a fim de amenizar um acúmulo dos mesmos, que por vezes

perturba o ego, tido como rejeitador de suas próprias expressões.

Uma das formas de expressão da sombra segundo o autor é o senso de

humor.

“... frequentemente, quem ri é a personalidade da sombra. Isto

acontece porque o humor expressa muito das nossas emoções

subjacentes, inferiores ou temidas. Por essa razão, um outro modo

de obtermos um conhecimento da nossa sombra é através da

observação do que induz o senso de humor, já que o riso faz com

que a sombra seja liberada sem perniciosidade” (SANFORD, 2007:

69).

A sombra não se trata apenas de um receptáculo do inconsciente que

contém todos nossos medos ou vergonhas, uma vez que a mesma pode exercer

um auxílio ao ego, que por sua vez pode obter consciência e conhecimento da

mesma. Um conhecimento possível de se obter da sombra poderia ser o

reconhecimento da desonestinade e maldade interna. Tal experiência seria

benéfica uma vez que possibilitaria a percepção ou malícia para não se deixar

prejudicar em uma transação financeira ou em uma situação de perigo, por

exemplo.

Os sentimentos de raiva, quando não reprimidos pelo ego, expressam o

estado interno despertado por determinada situação. É saudável a expressão

desses sentimentos, pois essas reações liberam energias para o ego realizar suas

demandas. Sendo assim, os conteúdos sombrios permitem uma aptidão ao ego,

fortalecendo-o e dando-lhe clareza, podendo colaborar para a estruturação de

uma personalidade mais resoluta. Isso indica uma função “positiva” da sombra,

por esta nos dar energia para sanar eventuais situações de insuportabilidade

interna, permitindo uma elaboração de “novos” conteúdos psíquicos ao invés de

reprimí-los.

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A personalidade sombria pode engendrar uma transformação no ideal de

ego, à medida que o ego entra em contato com outras possibilidades de ser.

Neste caso, a sombra revelaria ao sujeito suas potencialidades a serem

desenvolvidas. No entanto, ao lidar com a sombra, não se deve simplesmente

deixar fluir seus conteúdos em supressão ao ego, uma vez que o ego deve

interagir e não se submeter ou identificar-se.

“Individuação e totalidade tornam-se possíveis somente quando a

personalidade consciente tem uma certa atitude moral. Se as

pessoas se identificarem demais com seu lado trapaceiro, desonesto

e violento, sem um mínimo sentimento de culpa ou reflexão a esse

respeito, sua totalidade pode não acontecer” (SANFORD, 2007: 71).

O autor destaca uma importância especial exercida pelo vínculo entre pais

e filhos no desenvolvimento e elaboração do problema da sombra. A honestidade

das relações parentais no processo de criação dos filhos possibilita um

fundamento para a vida moral. Segundo o autor:

“… vida moral é fruto do passado e das ligações de uma pessoa,

assim como sua capacidade para ter sentimentos humanos. Em

algumas crianças esse vínculo nunca se estabelece e as defesas

emocionais necessárias contra o lado mais escuro da sombra

acabam não existindo ou são muito fracas. Isso acontece no

crescimento de personalidades criminosas ou sociopáticas, devido a

uma identificação do ego com a sombra” (SANFORD, 2007: 72).

A personalidade da sombra se torna mais perigosa conforme a

personalidade consciente perde o contato com ela. No entanto, não é saudável a

estimulação da personalidade sombria de forma impulsiva, mas sim, sua

estimulação sempre ponderada pela consciência moral, que dará vazão a esses

conteúdos mantendo-se a responsabilidade, consciência e independência do ego.

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O autor cita que por ser um arquétipo, a sombra estará sempre presente em

nossas vidas.

“De fato, algumas pessoas parecem estar fadadas a viver a

personalidade da sombra para o benefício do resto de nós...” “...

esses criminosos estão tão possuídos pelo arquétipo da sombra que

são compelidos a vivê-lo vida afora. Isso significa que, até que a

espécie humana se torne mais consciente da sombra, algumas

pessoas estarão fadadas a carregá-la” (SANFORD, 2007: 75).

Sendo assim, a presença de um sujeito identificado com sua sombra advém

de uma projeção outrora dirigida ao mesmo. Tal projeção se deu por meio de uma

negação de conteúdos sombrios de uma pessoa ou grupo, que projetam os

conteúdos no primeiro que, no caso, por sua vez se identifica com tais conteúdos

e passa a viver sobre tais condições. Essa negação, que tem como seqüência sua

projeção para o externo ou para o outro, ocorre devido à insuportabilidade de se

reconhecer esses conteúdos como pertencentes ao determinado sujeito, uma vez

que isso implicaria uma difícil tarefa espiritual e psicológica para o mesmo que, ao

ter se despertado para sua sombra, sentiria os incômodos de lidar com ela.

“Projeção é um mecanismo psicológico inconsciente que ocorre sempre que uma

parte de nossa personalidade, quando ativa, não tem relação com a consciência”

(SANFORD, 2007: 77).

A projeção impede que possamos ver o outro como ele realmente é,

restando-nos ver no outro, conteúdos de nós mesmos. Continuamente nós

projetamos conteúdos internos no mundo, no entanto nem sempre reconhecemos

alguns conteúdos como pertencendo a nós mesmos. Sendo assim, para se

estruturar o ego nas relações com o outro, torna-se necessário o recolhimento da

sombra projetada para assim se reconhecer os conteúdos negados pertencentes

ao eu e então entrar em contato com o outro.

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“Por essa razão, quando encontramos alguém que odiamos,

faremos bem em parar e perguntar a nós mesmos se nosso ódio não

teria emergido porque alguma coisa em nós, da qual não gostamos,

foi projetada sobre outra pessoa. Nem sempre será o caso. Às vezes

odiamos ou não gostamos de outras pessoas pelo fato de que elas

agem conosco de modo inconveniente, mas outras vezes este é o

caso e, quando isso acontece, o relacionamento com a outra pessoa

é severamente perturbado pelo nosso próprio inconsciente”

(SANFORD, 2007: 77).

No processo de estruturação do ego para lidar com o self,

consequentemente elabora-se a relação com o outro. Ambos os processos se

entrelaçam na mesma meta de ampliação de consciencia do processo de

individuação.

A sombra existe tanto no âmbito pessoal quanto no coletivo. O segundo

nível seriam as correspondências entre as sombras pessoais que compõem uma

massa, massa essa de pessoas que compactuam em suas projeções. “... à

medida que os indivíduos inseridos num grupo ou nação tornam-se idênticos à

consciência cultural, também eles pertencerão à sombra coletiva” (SANFORD,

2007:79).

A sombra coletiva se configura como uma conseqüência inevitável da

cultura. À medida que nos desidentificamos da sombra coletiva, damos passos

para a individualidade.

O autor diz que guerras geralmente advêm de um problema com a sombra.

Por meio da guerra obtemos um cenário ideal para projetarmos nossa sombra no

inimigo, destituindo-o de humanidade e despersonalizando-o para então matá-lo.

Os rituais de purificação impostos aos guerreiros que retornavam das guerras nas

culturas primitivas tinham o propósito de amenizar as projeções da sombra que se

encontravam exacerbados devido aos combates.

A sombra se faz presente na consciência quando o ego não tem condições

de por si próprio ter resolutividade sobre seus desejos e aspirações. Os

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esquecimentos de compromissos indesejáveis, os lapsos e os sonhos são formas

de a sombra exercer sua influência sobre o ego. Por mais que o ego seja

inconsciente das demandas da sombra, a mesma desponta suas intenções no

nível consciente a fim de expressar seus anseios e possibilitar uma resolutividade

que o ego não estaria suprindo. A sombra se expressa em nossas fantasias,

pensamentos, desejos, vontades que, no entanto, são reprimidos ou rejeitados,

pelo ego talvez por uma tentativa de esconder esses conteúdos até dele mesmo.

“Assim, se refletirmos sobre nossos lapsos de linguagem e esquecimentos

inconscientes, podemos percorrer o outro lado de nós mesmos que tem

pensamentos e planeja atitudes que, ao nível consciente, não somos capazes de

aceitar” (SANFORD, 2007: 80). Os conteúdos da sombra não identificados se

tornam projeções, que isentam e distanciam o sujeito de suas questões, que

passam a ser tidas como pertencentes ao outro.

O autor fala sobre a dificuldade do ego em lidar com sua sombra: mostra-se

resistente nessa relação devido a um sentimento de culpa despertado. Sendo

assim, o ego tende a evitar a desconfortável culpa de assumir partes sombrias a

ele pertencentes.

“Muitas pessoas carregam um considerável sentimento de culpa na

maior parte do tempo, mas trata-se de uma culpa falsa. Isso significa

que as pessoas se sentem culpadas pelas coisas erradas e não se

responsabilizam por aquilo que, em suas vidas, seria de sua

verdadeira responsabilidade. A falsa culpa nos paralisa, mas quando

assumimos o apropriado fardo da responsabilidade pela pessoa

imperfeita que somos, então não somos paralisados, mas nossa

personalidade efetivamente cresce e se aprofunda” (SANFORD,

2007:84).

A sombra contém os complexos, que são conteúdos psíquicos advindos

dos conflitos vivenciados e dos choques emocionais, conteúdos esses que

carregam forte carga afetiva. Tais conteúdos contidos na sombra exercem

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funcionamentos autônomos, reproduzidos pelo ego sem que o mesmo os tenha

sob controle. São funcionamentos da sombra que fazem emergir para o nível da

consciência os complexos, os quais por sua vez alteram o estado emocional do

ego, dispondo-o de uma carga afetiva de tom elevado. Essa carga afetiva elevada

se configura como impulsos autônomos que invadem o ego, podendo-o fazer agir

de forma impulsionada pelo complexo, ou seja, o ego sofre uma distorção em sua

percepção da realidade causada pela constelação de um complexo ou arquétipo.

Nas vivências de cargas afetivas elevadas, como irritação, raiva, ansiedade, o ego

ativa um complexo, o qual por sua vez pode regê-lo temporariamente.

Nas situações de testes psicológicos com palavras, nas quais um

entrevistado deve emitir sua resposta perante uma palavra a ele arbitrariamente

sugerida, mas por sua vez selecionada pelo entrevistador, é possível notarmos os

complexos quando ocorrem perturbações sensíveis ou pausas longas para a

emissão da resposta. Isso significa que o sujeito, ao se deparar com a palavra a

ele dirigida no teste, foi tocado por um complexo pessoal, tendo nele despertado

cargas afetivas, níveis de ansiedade, etc. Sendo assim, um complexo pode se

fazer presente no sujeito do teste ao se associar a ele alguma palavra estímulo.

Os complexos são conteúdos emocionais interiores dos sujeito, conteúdos

esses advindos de traumas vividos, situações intensas ou emotivas e,

principalmente, de conflitos internos vividos. Tais conteúdos se resguardam no

íntimo do sujeito e podem emergir perante algum estimulo que os ative, causando

assim uma rememoração do sujeito nos níveis sensitivos e simbólicos, racionais e

emocionais.

Quanto à autonomia exercida pelo complexo, pode se dizer que são

conteúdos sentidos como forçados ao ego, sendo que o ego não pode controlá-

los, pois eles se apresentam enquanto emoções sentidas pelo sujeito em sua

intimidade própria.

“A verdade é que não somos nós que temos o complexo, o complexo

é que nos tem, que nos possui. Com efeito, o complexo interfere na

vida consciente, leva-nos a cometer lapsos e gafes, perturba a

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memória, envolve-nos em situações contraditórias, arquiteta sonhos

e sintomas neuróticos. O complexo obriga-nos a perder a ilusão de

que somos senhores absolutos em nossa própria casa” (SILVEIRA,

2003: 30).

A autora citada acima diz que os complexos são agrupamentos de

conteúdos psíquicos carregados de afetividade e ordenados por um núcleo de

intensa carga afetiva; e que esse núcleo se associa com outros afetos comuns e

conteúdos, exercendo assim sua vida autônoma dentro de nós. No entanto, a

potência dos complexos varia.

“‘Alguns repousam tranqüilamente mergulhados na profundeza do

inconsciente e mal se fazem notar; outros agem como verdadeiros

perturbadores da economia psíquica; outros já romperam caminho

até o consciente, mas resistem a deixarem-se assimilar e

permanecem mais ou menos independentes, funcionando segundo

suas leis próprias’” (JACOBI apud SILVEIRA, 2003: 31).

No entanto, apesar de sua característica incômoda, os complexos podem

ser estímulos e aberturas para novas possibilidades de realização. Em

contrapartida, podem-se criar as patologias e situações de adoecimento conforme

os complexos tomam para si quantidades excessivas de energia psíquica.

A autora citada elabora ainda que para se assimilar um complexo, ou seja,

torná-lo consciente e articulável para o ego, é necessário a compreensão do

mesmo tanto no nível racional quanto no emocional. Em outras palavras, é

necessário uma descarga ou expressão emocional para que conjuntamente com

essa expressão mental ou racional sejam efetuadas devidamente a assimilação e

compreensão do complexo pela consciência e ego.

Os complexos, podem advir principalmente dos conflitos e traumas

emocionais da esfera pessoal, que segundo a autora: “A maior parte dos

conteúdos do inconsciente pessoal é constituída por complexos desse tipo”

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(SILVEIRA, 2003: 32). No entanto, são destacados pela mesma complexos de

outra natureza, por sua vez advindos de: “... feixes de forças contendo

potencialidades evolutivas que, todavia, ainda não alcançaram o limiar da

consciência e, irrealizadas, exercem pressão para vir à tona” (SILVEIRA, 2003:

33). Esse outro tipo de complexo, apesar de ser igualmente vivido pelo ego em

situações de conflito, leva dentro de si e se assenta sobre componentes

arquetípicos, os quais mobilizam no sujeito a necessidade de serem elaborados e

atualizados. Sobre tais tipos de complexos, diz a autora:

“Visto nesta perspectiva, por trás de suas características

exclusivamente pessoais, o complexo mostraria conexões com os

arquétipos, ou seja, haveria sempre uma ligação entre as vivências

individuais e as grandes experiências da humanidade” (SILVEIRA,

2003: 33).

Podemos ilustrar como exemplos de “grandes experiências da humanidade”,

o complexo materno que, advindo da relação com o arquétipo da Grande Mãe,

desponta várias indagações que tal arquétipo despertou na humanidade e de

como a luta pela separação da mãe e do ambiente familiar se trata de uma

situação criadora de complexos. Sendo assim, a existência de um complexo na

psique é algo natural do ser humano, uma vez que os complexos de natureza

arquetípica, como a saída do herói de seu ambiente familiar, por exemplo, implica

uma experiência de confronto emocional e de forte lembrança, assim como a

felicidade, perda, morte e outras situações que invariavelmente nos perturbam ou

emocionam, nos fazem sofrer ou sorrir e marcam nossa memória. “A palavra

complexo denota o elemento estrutural básico da psique objetiva, e o elemento

central do complexo é o arquétipo” (WHITMONT, 2002: 52).

O autor destacado cita o exemplo do complexo de autoridade, referindo-se

a um sujeito específico. Toda vez que o tal sujeito se deparava com uma figura

autoritária, ele se fascinava e repugnava simultaneamente. Sempre quando se

fazia presente de alguma forma a questão da autoridade, principalmente quando

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relacionada à paternidade, o sujeito se irritava e desafiava a todos, sempre

atribuindo a culpa ao outro. Tal sujeito possui um complexo de autoridade. O

mesmo é tomado por um impulso que o desgoverna, devido a estar identificado

com esse impulso. Apesar de o impulso ser sentido como pertencendo a ele em

seu nível mais íntimo, é necessário uma diferenciação do ego com os impulsos

advindos do complexo. Ser tomado pelo complexo, ou seja, agir compulsivamente,

nos faz assumir uma posição inflada e primitiva, geralmente só nos possibilitando

dar-nos conta depois de já termos feito algo. Um constrangimento como por

exemplo “o que deu em mim, como pude fazer isso!”. Apesar de nos

responsabilizarmos por nossas próprias atitudes, nem sempre nós as temos

conscientemente. Isso faz surgir o desafio ou necessidade de nos tornarmos mais

conscientes e de não assumirmos tais impulsos como pertencentes ao ego, nos

identificando. Quando nos identificamos com o impulso, é mais comum a reação

de atribuir a culpa ao outro e de não conceber ou esperar uma outra atitude vinda

de si mesmo.

“A capacidade para evoluir para a diferenciação e a

transformação do impulso não surgirá até que o estado de identidade

seja dissolvido. Isso exige a confrontação do impulso como um Tu,

como algo diferente do Eu, como algo separado de nós. Somente

nesse ponto é que pode começar o diálogo interior” (WHITMONT,

2002: 54).

Após a diferenciação, torna-se possível uma contenção e articulação do

ego frente seus impulsos, de maneira que este não é mais manipulado por eles. O

ego obtém a capacidade de escolha e responsabilidade consciente, seja por não

se deixar levar por impulsos, utilizá-los de forma positiva ou por qualquer outra

escolha tomada pelo ego, que passaria a ter participação ativa e consciente na

própria vida, não sendo levado a realizar a si mesmo de forma inconsciente e até

mesmo trágica.

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Por meio dos conflitos temos a possibilidade de desenvolver nossa

consciência,nos amadurecendo, ao ponto que quando não procedemos dessa

forma, somos impulsionados a ser e escolher, de forma inconsciente.

Capítulo III d - O bem e o mal na psicologia analí tica:

“O entrelaçamento de liberdade com falta de liberdade afeta o

homem de modo mais profundo no conflito entre o bem e o mal. Sou

livre para escolher o bem? Não sendo responsável por isso, estou

condenado a fazer o mal?” (JAFFÉ, 1995: 95).

O mal é tido como aspecto da sombra e sua força destrutiva interna, se não

resistida pelo ego, pode efetuar uma ação má e mesmo tornar o ego negativo ou

mau. No entanto, o bem e o mal são polaridades de uma mesma coisa e não duas

coisas diferentes. Todas as polaridades são integradas no self, encontrando-se

polarizadas apenas na percepção do ego. Sendo assim, a totalidade do bem e do

mal não estão dissociadas e o ego, nossa possibilidade de percepção, não tem

condições para perceber a totalidade.

O processo de individuação não tem como propósito a extirpação do mal,

mas sim a realização de um sujeito completo que comporte essas duas

polaridades. Como já foi descrito anteriormente, um sujeito que reprime suas

pulsões consideradas malignas, vive-as em sua sombra, as quais por vezes

podem perturbar o nível da consciência.

“Mesmo no cume mais elevado, jamais estaremos além do bem e do

mal...; pois, do mesmo modo que no passado, também no futuro todo

erro cometido, intencional ou imaginado, será vingado em nossa

alma, não importando que viremos ou não o mundo de cabeça para

baixo”.(JUNG apud JAFFÉ, 1995: 97-98).

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A autora salienta que bem e mal não são conceitos absolutos, mas sim

julgamentos morais que variam entre as diferentes culturas. Devido a tal

relatividade e incerteza, a solução do conflito moral entre bem e mal deve ser

buscada não apenas nos códigos morais e na consciência, mas também no

inconsciente e na voz interior.

Ao se tornar consciente da própria sombra, de que a escuridão e o mal

fazem parte da totalidade inconsciente de si mesmo, o sujeito é lançado para sua

individuação. Segundo a autora, faz-se necessário por vezes que o sujeito tome o

partido da sombra, embrenhando-se em antagonismos de vontades e obediência.

“Os choques de dever são marcos no caminho da individuação,

pois ‘nada amplia mais a consciência do que essa confrontação dos

antagonismos internos’. Ela pressupõe uma responsabilidade

consciente, que é mais diferenciada do que a observância obediente

das exigências da lei. A conscientização e a ética do homem não são

testadas no cumprimento lógico dos preceitos seculares e espirituais

coletivamente aceitos, mas no modo como ele se comporta e decide

ao se defrontar com os conflitos de dever” (JUNG apud JAFFÉ, 1995:

97).

O ser humano, por exercer sua consciência a partir do ego, lida sempre

com fragmentos de uma totalidade e por vezes depara-se com as oposições ou

polaridades, o que gera um grande conflito.

“A totalidade do ser humano se desenvolve na capacidade

voluntária e consciente de suportar o conflito, na solução dele

através de uma decisão ou de uma aceitação. A causa de ser

empurrado em duas direções, colocado entre o sim e o não, entre a

vontade e a contra-vontade, entre o bem e o mal, encontra-se no

arquétipo do self transcendental, onde os opostos estão preformados

potencialmente” (JAFFÉ, 1995: 99).

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Nas culturas e religiões passadas, recorrentemente foi dissociada a unidade

bem e mal, sendo cada uma das partes projetadas em divindades distintas,

geralmente antagônicas entre si.

“A separação entre um deus mau e um deus bom é ainda maior no

mito iraniano (ou persa) de Aura-Mazda e Arimã. Aura-Mazda é

quem derrama a vida, a luz, a verdade e as bênçãos sobre os

homens. De Arimã procedem a morte, as trevas, as mentiras e as

doenças dos seres humanos. O mundo onde vivem os homens é o

campo de batalha desses dois deuses, que disputam como prêmio

as almas humanas. Arimã não luta sozinho. Enquanto príncipe dos

demônios, ele comanda uma tropa de devas, seres malignos

devotados ao embuste e à falsidade. Assim como seu mestre, eles

se empenham em destruir o poder do bem que Aura-Mazda

representa e pretendem encaminhar a humanidade para o mal.

Antes, a oposição entre bem e mal ou entre luz e sombra nunca tinha

sido tão claramente configurada como na religião iraniana.”

(SANFORD, 2007: 28).

Na cultura descrita acima, as pessoas da comunidade eram avaliadas como

estando sob influência ou domínio de Arimã quando colaboravam para o mal,

enquanto que os outros que não recebiam a projeção do mal agiam sempre

passíveis a serem relacionados com a dinâmica dos dois deuses.

São apontadas pelo autor outras culturas e religiões com características

semelhantes às descritas acima. Religiões egípcias e escandinavas, por exemplo,

retratam deuses irmãos, um bom e o outro mau. O irmão mau tenta destruir o

bom, sempre conseguindo quando o bom assume uma posição inflada,

concebendo-se invulnerável. No entanto, a divindade do bem, quando vencida

pelo mal, sempre assume uma nova forma, mantendo-se enquanto divindade que

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se opõe ao mal, ou mesmo transformando-se em outra divindade, o que configura

uma transformação cultural religiosa, inovando as crenças de determinada cultura

ou comunidade.

Em muitas culturas de dois deuses, um representando o bem e outro o mal,

os mesmos eram concebidos como deuses criadores, em que um criava as coisas

belas e boas, como as árvores, lagos e campos e animais dóceis, enquanto o

outro criava as coisas más, como as montanhas escarpadas, os desertos, os

insetos e os animais vorazes. Um associado à vida e saúde; e outro à morte e

doença. As projeções do bem e do mal foram dirigidas à natureza, nas sensações

e conteúdos que a mesma despertava nos homens.

O mesmo autor destacado acima cita o maniqueísmo, doutrina criada por

Mani, nascido na Pérsia por volta do ano 215 d.C.

“Mani ensinava que a luz e treva, bem e mal, criação e destruição

estão em conflito constante. Como os gnósticos, ele relacionava o

mundo do espírito com o reino do bem, enquanto o mundo material

estava ligado à escuridão e ao mal. O homem vive aprisionado no

mundo das trevas e do mal porque ele vive preso em seu corpo. A

salvação do homem consiste em separar-se do seu corpo, através do

conhecimento verdadeiro, além da rejeição às paixões e ao apetite

sexual, que mantêm o ser humano cativo do mal, do principio

material” (SANFORD, 2007: 29).

O autor complementa a citação acima fazendo referência a santo

Agostinho, século IV d.C., enquanto pensador que fazia um contraponto ao

pensamento de Mani. O autor diz que santo Agostinho reformulou a idéia do mal

enquanto privação, ou ausência do bem. Como exemplo de mitologias e religiões

que não personificavam o mal na figura de uma divindade isolada, o autor cita o

politeísmo Grego, que por sua vez não atribuía a total projeção do mal em

qualquer divindade. O mal era um agente que percorria a todos os deuses quando

os mesmos exacerbavam em seus sentimentos de raiva, inveja, orgulho, etc.

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Sobre a religião persa anteriormente citada, o autor destaca: “Na linguagem

mitológica, não se pode reverenciar uma divindade benéfica, ligada à luz e ao

amor, e negligenciar a divindade-irmã das trevas e do mal. Exatamente quando

Aura-Mazda procura estabelecer sua hegemonia sobre o mundo é que Arimã

guerreia contra ele” (SANFORD, 2007:36). Sobre a religião dos gregos, o mesmo

cita: “Apenas entre os gregos não existe guerra entre os deuses – talvez disputas,

mas não guerras. Isso porque esses deuses e deusas eram sábios demais para

se pretenderem bons” (SANFORD, 2007: 36).

O autor reflete sobre a igualdade, que funciona como uma balança entre as

cargas de bondade e maldade. Quando se projeta muita luz em uma divindade,

necessariamente se projetará o mesmo coeficiente de sombra em uma outra

divindade que existirá conjuntamente à primeira, o que indica uma semelhança

entre o funcionamento psíquico com a mitologia, que personifica as forças

psíquicas arquetípicas. Relembramos que as personificações do bem e do mal

realizadas pelas culturas passadas, são denominadas pela psicologia moderna

como arquétipos ou complexos autônomos, os quais influem na sorte e destino

dos homens, ultrapassando a capacidade de apreensão pelos mesmos. “Se

ultrapassamos os limites de nossa capacidade natural para o amor e a bondade,

acabamos criando dentro de nós mesmos a parcela exata oposta de ódio e

crueldade” (SANFORD, 2007: 35).

Tal passagem destacada acima indica que sombra e luz compõem uma

totalidade, uma vez que ao se exacerbar na capacidade de amor e bondade, que

seria a parte correspondente à luz, cria-se a mesma quantidade de sombra, cuja

parte correspondente seria o ódio e crueldade. Devido à dinâmica de uma parte

ser compensada pela outra em parcelas iguais, pode-se pensar em se tratar de

duas partes que compõem uma totalidade, que poderia ser metaforicamente

pensado como a figura de uma balança que contém o mesmo peso em cada

prato, sendo a totalidade a unidade da figura de uma balança em equilíbrio. Toda

unidade, assim como a balança, pode representar metaforicamente a totalidade.

No entanto, a balança em equilíbrio representa partes iguais que se completam

em uma unidade, visto que partes iguais em uma balança, quando alteradas em

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alguma das partes, é compensada pela outra, indicando que uma parte afeta a

outra. O autor cita diversas culturas que não utilizavam os reguladores para o mal,

como os usados em religiões polarizadas com deuses perseguidores, ou nos

sistemas de lei e punição para manter-se a ordem. Ele cita tribos indígenas onde

a própria palavra e seu cumprimento mantinham a ordem, enquanto que os

“desonrados” eram punidos pelo ostracismo ou pela rejeição pela comunidade.

Na religião judaico-cristã, os conteúdos malignos e benévolos são

incorporados na figura do Deus único. Apesar de ser usada a figura do diabo

como aquele que reina no inferno punindo as almas dos maus, muitas passagens

da bíblia fazem menção ao deus único que contém em si tanto o bem quanto o

mal. “'Bem' e 'mal' são aspectos da imagem arquetípica de Deus e, juntos,

pertencem à totalidade do homem e da vida” (JAFFÉ, 1995: 101).

O mecanismo de projeção da sombra se dá quando o ego ainda não tem

condições de os assimilar. No entanto, enquanto o ego não recolhe e assimila

suas projeções, ele permanece em uma situação estagnada, não trazendo para si

e para o mundo o novo, mas sim suprimindo-o. No processo de individuação

desperta-se o herói, que enfrenta o desconhecido de si e do mundo e

posteriormente retorna energizado, trazendo o novo.

A projeção necessita do bode expiatório, que serve como justificativa para

permanecer-se confortável perante a não realização do novo, que se reconcilia

com o velho, dando-lhe continuidade e desenvolvimento.

Segundo Edward F. Edinger (2000), a unidade, ser sozinho e

indivisibilidade, constituem marcas de individualidade, enquanto que a

multiplicidade e a dispersão correspondem ao oposto da individualidade,

representando o processo de quebra da unidade, desmembramento e dispersão.

“A dispersão, ou multiplicidade, como condição psicológica, pode

ser vista do ponto de vista interno e externo. Vista a partir de dentro,

trata-se de um estado de fragmentação interna que envolve certo

número de complexos relativamente autônomos que, quando

tocados pelo ego, provocam mudanças de disposição e de atitude e

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levam o indivíduo a perceber que não é uno, mas múltiplo. Do ponto

de vista externo, a multiplicidade se manifesta através da

exteriorização ou projeção de partes da psique individual no mundo

exterior. Numa tal condição, a pessoa encontra seus amigos e

inimigos, esperanças e temores, fontes de apoio e ameaças de

fracasso concretizadas em pessoas, objetos e eventos externos.

Num tal estado de dispersão, não pode haver experiência de

individualidade essencial. Encontramo-nos sujeitos às ‘dez mil

coisas’” (EDINGER: 2000: 236).

Tal autor cita santo Agostinho, referindo-se à expressão “dez mil coisas” do

parágrafo destacado. “Agostinho diz:... ‘toda alma aferrada à amizade pelas coisas

perecíveis é desgraçada – despedaça-se quando as perde, e então percebe a

miséria em que estava mesmo antes de as perder’” (AGOSTINHO apud

EDINGER, 2000: 236).

O bem e o mal, além de concepções e atitudes frente a vida e aos outros,

tratam-se da disposição interna do sujeito, de como ele se percebe e como de fato

está sua situação. Sendo assim, esses dois opostos são atribuições valorativas,

qualidades que servem para julgarmos a nós mesmos e aos outros. No nível da

consciência do ego, são tidos como antagonismos, mas no self formam uma

unidade que compõe a totalidade. Sendo os julgamentos do ego passíveis de

estarem errados, podemos pensar estarmos de uma forma, mas na verdade

estamos de outra e nos surpreendemos por termos nos julgado errado. No

entanto, julgamentos são tentativas de compor uma totalidade, algo que o ego não

é capaz. Sendo assim, todos julgamentos são passíveis de estarem errados, pois

o bem e o mal no self são a mesma coisa. O self é capaz de fazer o julgamento da

totalidade, para tanto não é usado o bem e o mal, nem o certo e o errado, mais

sim a totalidade.

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Capítulo IV – Método:

O objetivo deste trabalho é refletir sobre o arquétipo do herói sob a ótica da

Psicologia Analítica e da Mitologia. Para tanto serão analisados os três primeiros

episódios da saga cinematográfica Star Wars, fazendo-se um recorte que

privilegie a compreensão dos aspectos psicológicos presentes no personagem

que encarna o Herói, Anakin Skywalker, que torna-se Darth Vader no final do

terceiro episódio. Embora meu interesse inicial fosse abordar os seis episódios

que compõem a saga completa, optei por reduzir meu propósito em função das

limitações de tempo, que obrigam freqüentemente o pesquisador a lidar com suas

frustrações impostas pela realidade concreta.

A tradução dos fatos ocorridos nos episódios visará a sua compreensão, de

modo a tornar conhecido o material desconhecido ou obscuro.

Será utilizado o método da Psicologia Analítica, que aborda os fenômenos

psíquicos de forma simbólica arquetípica, permitindo a integração entre aspectos

da subjetividade e da objetividade, assim como entre a individualidade e a

coletividade.

Segundo Penna, (2003): “Como ponte entre o mundo arquetípico, o mundo

da consciência e o mundo externo, o símbolo se constitui o fenômeno psíquico

apreensível e compreensível” (PENNA, 2003: 213).

Será feita uma intersecção entre fatos e acontecimentos recortados dos

filmes como relevantes à compreensão do herói, sua função, significado e

percurso, e os fundamentos teóricos desenvolvidos na parte inicial do estudo.

Utilizar-se-á a amplificação simbólica, técnica desenvolvida por Jung na

interpretação de sonhos de pacientes. Diz Penna (2003) que:

“O processo de amplificação simbólica proposto por Jung

consiste em ampliar e enriquecer os elementos do símbolo através

de associações e analogias que fluem numa cadeia contínua de

similaridade, visando a traduzir e interpretar o material desconhecido

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do símbolo. O ato de ampliar e enriquecer o símbolo, por meio de

analogias diversas, favorece a compreensão de seu significado

arquetípico pela diversidade de possibilidades oferecidas ao ego

para captar o aspecto oculto do símbolo e encontrar o significado que

mais sentido faça para a consciência atual” (Penna, 2003: 195).

Ainda segundo a autora “Os símbolos coletivos ou culturais, na

amplificação, revelam seus aspectos arquetípicos prospectivos, fornecendo um

entendimento ampliado da situação atual e futura da coletividade, além de sua

conexão com a história passada” (Penna, 2003: 197).

O método da Psicologia Analítica envolve uma participação ativa do

pesquisador: no caso deste estudo, houve a escolha do tema a ser pesquisado,

um recorte feito a partir desta escolha e a análise e discussão refletirá um diálogo

entre pesquisador e pesquisado, onde este se transformará. O conhecimento será

produzido nesta troca, que nos atingirá de forma consciente e inconsciente.

Portanto, é necessário um distanciamento que permita que se reflita sobre o

material produzido.

No capítulo que se segue, o da apresentação dos resultados, será abordada

brevemente a influência histórica presente nos filmes, e depois constarão as

sinopses dos três primeiros filmes.

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Capítulo V – Resultados :

Capítulo V a - A influência histórica subjacente ao s filmes:

Antes da apresentação das sinopses, serão destacadas algumas

passagens sobre estudos que foram realizados para a elaboração dos filmes.

A coleção de filmes que compõem a saga Star Wars contou com uma série

de estudos históricos para assim se compor o roteiro. Existe uma correlação entre

o roteiro do filme com eventos históricos passados. No livro: Star Wars e filosofia,

coordenado por Willian Irwin (2005), são apontados alguns desses elementos,

destacados abaixo:

“Os monges budistas viajando por toda a China, Coréia e Japão

partilhavam suas artes marciais com pupilos dignos. Cerca de meio

século depois da fundação de Shaolin Kung-fu, o rei Sila, na

península coreana, convidou monges budistas para treinar uma

ordem de guerreiros de elite, que seriam conhecidos como Hwa

Rang. Eles deveriam servir ao reino, garantir a justiça e manter a

ordem social. Eram uma ordem monástica treinada não só em artes

marciais, mas também nas artes de cura, em ch'i kung taoísta, nas

artes da liderança política e diplomacia, bem como na filosofia

budista. Assim como os Jedi, os Hwa Rang eram escolhidos em uma

idade bem jovem, treinados para terem uma mente pura e seguirem

um rígido código ético de lealdade, honra e serviço. Eles também

tinham autoridade sobre os demais militares, como acontece com os

Jedi em Ataque dos Clones.

O Budismo foi introduzido no Japão por meio da Coréia, trazendo

consigo as artes marciais budistas que formam a base do jiu-jitsu. No

Japão, os Sohei, uma ordem de monges guerreiros parecidos com os

Hwa Rang, foi criada. Eles viviam em mosteiros nas montanhas em

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torno da capital imperial de Kyoto. Seu considerável poder político

acabou criando-lhes problemas com o Xogum (governante militar da

classe guerreira, os samurais), culminando, no século XVI, com a

destruição por parte dos samurais do complexo monástico Sohei,

matando a maioria dos monges, de modo semelhante ao que ocorre

com os Jedi, que quase são dizimados em A vingança dos Sith.

Alguns Sohei se esconderam, misturando-se aos monges não-

militantes, e com o passar do tempo eles ensinaram suas artes

marciais a outros monges e a alguns samurais. Finalmente, as artes

marciais budistas se tornaram o centro do treinamento samurai.”

(IRWIN, 2005: 48)

“A espada é a alma de um samurai. O relacionamento que um

samurai tem com sua espada é como o de um Jedi com seu sabre de

luz. O nome 'Jedi' deriva da era samurai dos espadachins chamados

Jidai geki, cuja tradução literal seria 'a era do drama', referindo-se

aos cenários ou temas de inspiração samurai usados nas artes

dramáticas japonesas. A túnica em estilo de quimono do Jedi se

baseia, informalmente, nas vestimentas dos samurais, com o

acréscimo de um capuz medieval para dar mais um toque monástico.

O capacete e a armadura de Vader também se baseiam naqueles

usados pelos samurais. A luta de espadas na trilogia original de

Guerra nas Estrelas reflete o caminho da espada chamado Kendo,

derivado da tradição samurai. Já na trilogia inicial, vemos estilos de

luta de espada baseados mais em kung-fu.” (IRWIN, 2005: 48-49)

Tais passagens indicam que os filmes tiveram o propósito de retratar

questões do ser humano, visto que a elaboração dos mesmos foi baseada em

passagens históricas transcorridas no extremo oriente. Além do mais, o produtor

do filme, George Lucas, teve contato com o mitólogo Joseph Campbell, que por

sua vez traçou diversas semelhanças entre as diferentes culturas humanas,

levantando a questão do herói e do mito como sendo elementos universais e de

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relevância para o desenvolvimento da consciência, tema que concerne às ciências

humanas e à psicologia.

Capítulo V b - Sinopses:

Episódio I – A ameaça fantasma:

O filme começa com uma nave se aproximando de uma base espacial e

pedindo autorização para pousar. No painel da nave aparece um holograma do

líder da estação espacial, o piloto lhe fala que os representantes do embaixador

então a bordo e desejam pousar. O líder da estação espacial concede o pouso de

maneira suspeita e a nave pousa. Os representantes do embaixador são dois Jedi,

um mestre, Qui-Gon Jin, e seu aprendiz, Obi-Wan Kenobi. Eles são recepcionados

por um andróide e levados para uma sala de reunião para aguardarem. O líder da

estação espacial é o vice-rei da Federação do Comércio, uma entidade que

controla taxas comerciais da República Galáctica. Seu nome é Nute Gunray e sua

base espacial está bloqueando as relações do planeta Naboo. O andróide vai até

o líder da estação espacial e diz que os embaixadores são Jedi, o que deixa o

vice-rei muito surpreso e com medo, levando-o a contactar Sidious. Aparece então

um holograma com a imagem de Darth Sidious, um poderoso Sith. Os Sith são os

arquiinimigos dos Jedi. Sidious ordena que sejam desembarcadas as tropas para

invadir o planeta e que os Jedi sejam assassinados imediatamente. Nute proclama

em relação à aprovação do senado, mas Sidious lhe garante proteção e diz ter

controle do senado.

Os Jedi, já bastante desconfiados com a demora, repentinamente ouvem

uma explosão e se levantam de prontidão, ligando suas espadas lasers. O barulho

tinha sido a explosão da nave que os transportava por canhões da base espacial.

Os Jedi começam a ser caçados por dróides dentro da estação espacial e

desembarcam escondidos juntos com as tropas dróides na invasão no planeta

Naboo. Chegando ao planeta, em meio às perseguições dróides, os Jedi se

deparam com um nativo, Jar Jar Binks, membro de uma avançada comunidade

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subaquática da qual havia sido banido. O mesmo passou a perseguir os Jedi,

dizendo que os Deuses exigiam que ele agora fosse seu humilde servo, pois teve

sua vida salva pelos mesmos. De início os Jedis dispensam a oferenda de

servidão, mas devido a eles terem que se transportar até a capital de Naboo e

estarem muitos afastados e a pé, eles então exigem que Jar Jar Binks os levem

até sua cidade.

Logo após a chegada na cidade, os Jedis e Jar Jar Binks foram levados à

presença do líder da cidade que após contrariedades cedeu um transporte para

Naboo aos Jedi, no qual acabaram levando Jar Jar Binks junto, alegando que os

Deuses exigiam que sua vida fosse de Qui-Gon, por este tê-lo salvado a vida dos

tanques e lasers. Sendo assim os três personagens partem em um pequeno

veículo aquático cruzando o núcleo do planeta até chegarem a Naboo. Os Jedi

localizaram a líder de Naboo, a Rainha Amidala, sendo escoltada por dróides, eles

então destróem os dróides e fogem levando a Rainha, suas damas de companhia

e alguns soldados e pilotos, indo todos juntos em uma nave espacial até a capital

da República para denunciarem o crime da Federação do Comércio. No entanto

na saída do planeta a nave se depara com um bloqueio de várias naves dróides

atirando, o que causou danos na nave, que ainda assim conseguiu escapar graças

aos reparos feitos pelo dróide R2D2, contudo a nave não tinha condições de

chegar até a capital da República, tendo que pousar em Tatooine, um planeta

desértico e marginalizado pela República, para fazerem os reparos na nave.

O vice-rei Nute Gunray contacta Sidious, que por sua vez logo pergunta

onde estão os contratos de concessão assinados pela Rainha. Nute lhe diz que a

Rainha sumiu e que uma nave passou pelo bloqueio e agora estava fora do

alcance dele. Sidious lhe diz que enviará seu aprendiz Darth Maul para localizar a

nave.

Ao pousarem no planeta, Qui-Gon, R2D2, Jar Jar e a dama de companhia

da rainha Padmé, vão até a cidade para comprar as peças para a nave. Eles

entram em uma pequena loja de peças usadas, na qual encontram o que

precisam; no entanto o proprietário diz que o dinheiro da República não valia nada

naquele planeta e ainda diz que ninguém além dele iria ter aquelas peças. Qui-

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Gon então se retira enquanto a dama de companhia Padmé conversava com um

escravo do proprietário, um garoto de dez anos chamado Anakin. Qui-Gon chama

a todos e sai do recinto e Anakin completa rapidamente seu serviço e é liberado

para ir para casa. No caminho Anakin encontra Jar Jar que havia ficado para trás

do grupo e se envolvido em uma briga. Anakin neutraliza o conflito enquanto os

outros voltavam para buscá-lo. Começa uma tempestade de areia e Anakin

oferece abrigo para todos em sua casa. Todos o seguem até sua casa, aonde são

apresentados para sua mãe.

Anakin mostra para a dama de companhia Padmé e para o dróide R2D2,o

dróide que ele está montando, C3PO, e depois todos vão à mesa de jantar. Anakin

pergunta a Qui-Gon o que eles estavam fazendo em seu planeta e Qui-Gon diz

que está em uma importante missão, mas que sua nave quebrou. Anakin pergunta

se Qui-Gon é um Jedi, pois vira sua espada pendurada na cintura, Qui-Gon

confirma e Anakin diz ter sonhado que era um Jedi, e que ele libertava todos os

escravos de seu planeta. Anakin e sua mãe revelam que a única alternativa de

conseguir o dinheiro para as peças seria por meio das apostas em torno das

corridas de Pod. Anakin se propõe a correr na corrida e dar o prêmio para Qui-

Gon. Após algumas contrariedades a idéia é aceita e Qui-Gon negocia uma

aposta com o proprietário da loja de peças. Qui-Gon, em uma conversa com a

mãe de Anakin, pergunta quem era o pai do mesmo: a mãe revela que não houve

pai e que simplesmente ficou grávida e o concebeu e o educou. Ela ainda diz que

ele tem poderes especiais, que prevê as coisas antes que elas aconteçam. Todos

vão para a corrida. Anakin teve seu Pod (veículo de corrida) sabotado por um

adversário com quem tinha desavenças, mas mesmo assim supera várias

dificuldades da corrida e vence. Qui-Gon cobra o vendedor de peças e nos termos

da aposta estava a libertação de Anakin caso ele vencesse. Qui-Gon pega as

peças e diz que pegaria mais tarde o menino. Qui-Gon leva as peças para a nave

junto com Padmé, R2D2 e Jar Jar, e ordena que Obi-Wan as instale na nave, para

voltar sozinho e buscar Anakin. Qui-Gon chega junto com Anakin à casa de sua

mãe, dando para a mesma o dinheiro que sobrou da aposta. Qui-Gon diz para

Anakin na presença de sua mãe que ele não era mais um escravo, mas que não

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conseguiu libertar sua mãe. A mãe saúda seu filho, dizendo que agora ele estava

livre para realizar seus sonhos e que o lugar dela era naquele planeta; ela

pergunta para Qui-Gon se ele poderia levá-lo junto. Qui-Gon diz que o levaria e

que não foi por acaso que veio a tal planeta, diz que era a vontade da Força levar

Anakin e lhe oferecer um treinamento Jedi. Anakin aceita mesmo perante as

advertências de Qui-Gon sobre as dificuldades de ser um Jedi. Ele se despede de

sua mãe e parte junto com Qui-Gon. Perto da nave eles são atacados por Darth

Maul. Qui-Gon ordena que Anakin corra para a nave e que os mande levantarem

vôo. A nave passa por trás de Qui-Gon com a porta aberta e ele rapidamente pula

dentro da mesma deixando Darth Maul para trás.

Durante a viagem espacial Padmé fica ainda mais próxima de Anakin, que

sentia falta de sua mãe. Anakin lhe dá uma jóia que ele havia esculpido para ela

que lhe agradece.

A nave chega a Coruscant, a capital da República da Galáxia, um planeta

com a superfície inteiramente coberta por cidade. Na plataforma de pouso os

aguardavam o Senador Palpatine, consultor da rainha Amidala sobre as situações

do senado, e o Supremo Chanceler Valorum, líder do Senado. A Rainha é

saudada pelo Chanceler, que lhe diz que todos estão preocupados com a situação

e que havia convocado uma sessão especial do senado para ouvi-la. A Rainha

agradece e rapidamente se dirige para a sua nave de transporte acompanhada

pelo Senador Palpatine. Anakin fica sem saber aonde ir, visto que Qui-Gon ficou

para trás conversando com o Chanceler. Padmé chama Anakin e Qui-Gon sinaliza

para ele ir com ela.

A Rainha se retira para posteriormente se encontrar com o Senador

Palpatine. Neste encontro ele lhe fala que a República não funciona mais e que o

Senado não atuará contra a invasão de Naboo devido à falta de poder do

Supremo Chanceler, que não controla os burocratas. A Rainha pergunta quais são

as opções e Palpatine diz que primeiro deve-se forçar a eleição de um Chanceler

mais forte e que a Rainha poderia questionar a posição do Chanceler Valorum. A

Rainha desaprova e Palpatine diz que a outra opção seria submeter o pedido de

intervenção contra a invasão ao tribunal. A Rainha protesta dizendo que o tribunal

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tardaria muito na resolução e que seu povo não pode esperar. Palpatine a

aconselha a aceitar por ora o controle da Federação do Comércio.

Qui-Gon vai ao conselho Jedi para reportar os ocorridos. Diz sobre a

aparição de um guerreiro negro que o atacou e que ele pensa se tratar de um Sith.

Todos do conselho ficam surpresos e Mestre Mace Windu lhe diz que os Sith

foram extintos há milênios e que não voltariam sem o conhecimento do Conselho.

Mestre Yoda, a maior autoridade dos Jedis, diz que é difícil ver o lado negro. Qui-

Gon diz ter encontrado um ponto de convergência na força. Mace Windu pergunta

se foi em uma pessoa e Qui-Gon confirma, dizendo que é um menino que foi

concebido pelos midiclorians e que não foi coincidência tê-lo encontrado. O

Conselho lhe pergunta se trata da profecia do escolhido e Qui-Gon revela sua

opinião dizendo que sim e que o menino deveria ser testado. É marcado um

encontro para se avaliar Anakin perante o conselho.

Anakin é levado ao conselho Jedi para ser avaliado. Após passar nos

exames básicos de aptidão Jedi, Mestre Yoda lhe pergunta como ele se sente. Ele

responde que está com frio e sente falta de sua mãe. Yoda diz que sente muito

medo em Anakin.

Na sessão convocada do Senado, o Senador Palpatine introduz a Rainha

Amidala, que por sua vez diz que seu planeta foi invadido pela Federação do

Comércio. Rapidamente os mesmos levantam-se e respondem com indignação

dizendo que são mentiras e que recomendam que vá uma comissão à Naboo

investigar as acusações. O Supremo Chanceler aceita a recomendação perante a

pressão de Senadores e a Rainha proclama contra o senado dizendo que aquela

assembléia é incapaz de resolver imediatamente aquele ataque e que seu povo

não deveria aguardar uma comissão. A Rainha completa, momento em que o

senador Palpatine dá um malicioso sorriso, dizendo que a liderança do Chanceler

Valorum não é digna de confiança. Imediatamente a assembléia se exalta por

votações e o Chanceler se senta silenciosamente mostrando-se pasmo.

Após a sessão do senado a rainha se recolhe e posteriormente ouve Jar Jar

enquanto observa calada a vista de seu aposento. Jar Jar lhe diz que seu povo

possui um grande exército que jamais se entregam sem lutar. Entra

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repentinamente o Senador Palpatine. Palpatine diz ter se candidatado para

Chanceler e que toda essa situação irá lhe dar um voto a favor. A Rainha anuncia

que irá voltar para Naboo e que não assinará nenhum tratado e que irá se juntar

ao seu povo e sai rapidamente ordenando que seu guarda prepare sua nave.

Ao anoitecer Anakin volta ao Conselho na presença de Qui-Gon e Obi-Wan.

É anunciado que ele não seria treinado, pois o seu futuro do mesmo não estava

claro. Qui-Gon diz que aceita Anakin como seu discípulo. Yoda diz que ele já tem

um discípulo e que é impossível ter outro, pois o código proíbe. Qui-Gon diz que

Obi-Wan pouco tem a aprender com ele já estando pronto para os testes. Windu

diz que agora não era hora para isso, pois eles deveriam escoltar a Rainha

Amidala de volta a Naboo e investigar sobre o mistério dos Sith. Yoda diz que a

sorte do jovem Skywalker seria decidida depois.

A tripulação que havia partido de Naboo agora volta para embarcar na

nave. Obi-Wan questiona Qui-Gon sobre a atitude do mesmo frente o Conselho

Jedi e quanto à persistência em treinar o garoto que foi considerado perigoso. Qui-

Gon diz a Obi-Wan: “O destino dele é incerto. Ele não é perigoso. O conselho

decidirá o futuro dele. Satisfaça-se com isso. Embarque já”. Obi-Wan se dirige

calado para a nave. Anakin se aproxima de Qui-Gon e diz que não quer ser um

problema. Qui-Gon lhe diz que ele não será um problema e diz para ele não

esquecer que: “o seu foco determina a sua realidade”. Anakin lhe pergunta o que

são midi-clorians e Qui-Gon responde: “São formas de vida microscópica que

estão em todas as células vivas. Somos simbiontes com elas. Formas de vida

vivendo juntas para vantagens mútuas. Sem midi-clorians a vida não existiria... e

não conheceríamos a Força. Falam sempre conosco... nos dizendo da vontade da

Força. Quando aprender a se concentrar, irá ouvi-los. Com tempo e treinamento

você irá entender”.

Todos embarcam na nave e iniciam a viagem de volta para Naboo. Qui-Gon

questiona a Rainha, diz que não entendeu porque estavam voltando e que ele

apenas pode protegê-la e não lutar contra um exército. A Rainha chama Jar Jar e

pede para que ele dê as coordenadas de seu povo para se aliar ao exército deles

contra a Federação do Comércio.

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A nave chega a Naboo e pousa afastada da capital, perto da localidade do

povo Gungan. Jar Jar conduz todos ao encontro do seu povo, aonde são

recepcionados asperamente pelo líder e pai de Jar Jar. A Rainha toma a frente

dizendo sobre a invasão, mas Padmé a interrompe e revela que ela é que é a

Rainha de Naboo e que a outra era o seu disfarce de segurança. Ela então pede

ajuda dizendo que eles sempre viveram em paz até a chegada da Federação do

Comércio, e faz um pedido de ajuda ajoelhada dizendo que implora pela ajuda do

povo Gungan. O líder fica contente com o gesto de humildade e diz que todos

agora podem se tornar amigos. Posteriormente todos juntos elaboram o plano de

o exército Gungan afastar os dróides da cidade para uma guerra em campo

aberto, enquanto a rainha e seu grupo invadem a cidade para seqüestrarem e

forçarem Nute Gunray a um acordo.

A guerra começa entre os Gungan e os dróides enquanto a tropa da rainha,

incluindo os dois Jedi, Anakin e R2D2, invadem o Palácio. Ao chegarem a uma

pista de pouso interna, alguns pilotos pegam suas naves e partem para atacar a

base espacial da federação do comércio. Anakin e R2D2 sobem a bordo de uma

nave de combate para se protegerem dos tiros e Qui-Gon manda que eles fiquem

ali.

Todos são surpreendidos por Darth Maul, a Rainha e seus soldados

desviam para encontrarem com Nute Gunray. Qui-Gon e Obi-Wan lutam juntos

com suas espadas lasers contra Darth Maul. Anakin acidentalmente liga o piloto

automático da nave de combate e é levado até a zona de combate. Enquanto o

povo Gungan bate em retirada, perseguidos pelos dróides, Anakin entra com a

nave dentro da base espacial e com um tiro certeiro destrói o reator principal que

manda sinal para todas as unidades dróides, fazendo com que todo o exército

parasse de funcionar. A rainha Amidala consegue seqüestrar o vice-rei e forçar um

acordo. Enquanto os Jedi prosseguem o combate, Qui-Gon fica temporariamente

isolado de Obi-Wan por um campo de força, lutando com Darth Maul, que por sua

vez atinge fatalmente Qui-Gon com sua espada laser. Obi-Wan, que assistia a luta

se prepara, pois o campo de força iria abrir e ele logo iria combater Darth Maul.

Eles começam a luta e Obi-Wan perde sua espada e é empurrado em um

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profundo poço, ficando pendurado próximo da queda. Darth Maul aguarda alguma

idéia de como atingir Obi-Wan e de vencer o combate, mas Obi-Wan em uma

manobra inesperada salta por cima do inimigo enquanto usa o poder Jedi de atrair

objetos para a mão, atraindo a espada de Qui-Gon e então corta Darth Maul ao

meio.

Obi-Wan então corre para seu mestre, que estava caído no chão e o toma

em seus braços. Este por sua vez lhe fala carinhosamente que é tarde de mais.

Obi-Wan, lamentando não poder ajudá-lo, ouve suas últimas palavras: “Prometa

que treinará o garoto. Ele é o escolhido e trará equilíbrio para a Força. Treine o

garoto”. Qui-Gon morre nos braços de Obi-Wan.

Uma nave do Senado pousa em Naboo, enquanto a Rainha Amidala, ao

lado de Obi-Wan e Anakin, despacham o vice-rei, que por sua vez vai para a nave

do Senado. O Senador Palpatine, que havia recentemente sido eleito como

Supremo Chanceler, desce da nave acompanhado pela guarda especial do

Senado. Palpatine saúda Obi-Wan pela sua bravura e diz a Anakin: “E você,

jovem Skywalker, acompanharemos sua carreira com muito interesse”. Palpatine é

saudado pela Rainha, que o parabeniza pela eleição.

Ao por do sol Obi-Wan se encontra com mestre Yoda, que por sua vez lhe

concede o nível de cavaleiro Jedi, mas protesta dizendo que não concorda com o

treinamento do garoto. Yoda diz que Anakin pode ser o escolhido, mas que há

grande perigo em seu treinamento. Obi-Wan diz que deu sua palavra à Qui-Gon e

que irá treinar Anakin mesmo sem permissão se necessário. Yoda suspira

relutante e diz que o conselho concorda com Obi-Wan e lhe diz seriamente: “Seu

aprendiz Skywalker será”.

Logo após todos se reúnem para o funeral de cremação de Qui-Gon.

Anakin pergunta para Obi-Wan o que acontecerá com ele. Obi-Wan lhe diz que o

conselho concordou que ele o treinasse, e promete para Anakin que ele irá se

tornar um Jedi.

Yoda e Windu conversam durante o funeral: Windu fala que não há dúvidas

de que o guerreiro misterioso fosse um Sith. Yoda o diz: “São sempre dois deles.

Nem um a mais, nem a menos. Um mestre... e um aprendiz”.

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No dia seguinte ocorre uma festa em toda a cidade com um desfile do povo

Gungan. Todo o conselho Jedi está presente e no altar a Rainha entrega uma

homenagem ao líder dos Gungan. Anakin olha sorrindo e flertando para a rainha

que por sua vez lhe retribui com um longo sorriso. O filme termina com uma cena

de frente dos personagens enfileirados lado a lado no altar durante a celebração e

festa.

Episódio II - O ataque dos clones:

O filme começa com um cruzador de Naboo escoltado por duas naves

menores de combate chegando ao planeta Coruscant. Ao chegarem à pista de

pouso, enquanto os passageiros do cruzador desembarcavam, ocorre uma

explosão. Trata-se de uma tentativa de assassinato à ex-Rainha Amidala de

Naboo, que havia sido eleita Senadora da República. Foi colocada uma bomba

neste cruzador, o transporte oficial da Senadora, que explodiu com toda sua

tripulação. No entanto, a verdadeira Senadora estava disfarçada pilotando uma

das naves de escolta. Após a explosão ela corre para socorrer sua dedicada

agente disfarçada, que por sua vez falece em seus braços. O segurança dela, que

estava na outra nave de escolta a retira do local: ela mesma encontrava-se pasma

pelo ocorrido questionando se deveria ter voltado, mas seu segurança lembra-lhe

que ela viera para uma importante votação.

No “Palácio” do Senado, ocorre uma reunião, dos principais membros do

Conselho Jedi com o Chanceler Palpatine. Este fala aos Jedi sobre a força dos

separatistas que estão agregando sistemas planetários que pertenciam à

república. Palpatine diz que suas negociações não falharão, o que levaria a uma

cisão da República. Mestre Windu lhe diz que: “se as negociações falharem, não

haverá Jedi suficientes para proteger a república, somos guardiões da paz e não

soldados”. Palpatine pergunta para mestre Yoda se o mesmo achava que iria

ocorrer a guerra. Yoda lhe responde: “O lado negro da força a tudo obscurece.

Impossível prever o futuro”. Um holograma aparece na mesa de Palpatine

anunciando a chegada do Comitê Legalista. Palpatine pede ao holograma que os

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mandem entrar e se levanta dizendo aos Jedi que tratariam daquele assunto mais

tarde. Yoda se dirige até a porta para recepcionar a senadora Amidala dizendo

estar feliz por ela estar bem e lamentando a explosão ocorrida em sua

aterrissagem. Amidala lhe responde perguntando se tem idéia sobre quem está

por traz dos ataques; mestre Windu se introduz no diálogo dizendo que o serviço

secreto aponta para mineiradores descontentes de Naboo. Amidala responde,

dizendo achar que o Conde Dookan estaria por traz dos ataques, os Jedi

discordam dizendo que Dookan já foi um Jedi e portanto não mataria alguém.

Mestre Yoda adverte Amidala sobre o perigo que ela corre. Palpatine, que estava

aos fundos olhando pela janela, sugere que a Senadora seja colocada sob

proteção de Cavaleiros Jedi, ela contesta e Palpatine completa sua fala, que dizia

não achar que a situação fosse tão grave. Palpatine diz que ele acha que a

situação é grave, quando Yoda o olha desconfiado. Palpatine diz que entende que

a proteção possa lhe ser incomoda e que seria favorável um Jedi familiar, e

propõe que seja o mestre Kenobi. Mestre Windu responde prontamente dizendo

que é possível e que fará com que Obi-Wan Kenobi se apresente o mais rápido

possível.

Na parte do dia, nos aposentos da senadora, sobem Anakin Skywalker e

Obi-Wan Kenobi de elevador. Dentro do mesmo Obi-Wan diz a Anakin que não o

vê tão nervoso há tempos e que ele deveria relaxar. Anakin lhe responde

desconsolado: “Eu não a vejo há dez anos”. Obi-Wan meneia a cabeça sorrindo.

Eles chegam ao andar e são calorosamente recepcionados por Jar Jar e

levados até a Senadora Amidala ou Padmé. A Senadora vem sorridente para os

receber. Obi-Wan faz uma reverência dizendo ser um prazer reencontrá-la,

Amidala lhe responde que já faz muito tempo e então olha para Anakin e fala

surpresa: “Ani, meu deus você cresceu!”. Anakin a responde: “Você também, e

está mais bonita. Digo, para uma Senadora!” Obi-Wan franze o rosto constrangido.

Amidala sorri e diz que ele sempre será aquele garoto lindo que conheceu em

Tatooine e se vira caminhando, seguida pelos Jedi para sentarem-se. Obi-Wan lhe

diz: “Garanto que nossa presença aqui passará despercebida”. Amidala pergunta:

“Quero saber quem está tentando me matar”. Obi-Wan responde: “Viemos aqui

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para protegê-la, não para iniciar uma investigação”. Anakin diz: “Descobriremos

quem está tentando matá-la. Eu prometo”. Obi-Wan o olhou seriamente e disse.

“Não vamos exceder nossa missão, jovem aprendiz Padawan”. Anakin responde:

“Digo no intuito de protegê-la, mestre.” Obi-Wan responde firmemente: “Não

vamos insistir nesse assunto. Atente às minhas orientações”. Anakin pergunta:

“Por que?”. Obi-Wan responde perturbado: “Que?”. Anakin responde calmo e

desafiador: “Por que acha que fomos chamados, se não para encontrarmos o

assassino? Proteção é trabalho de seguranças, não dos Jedi. Isso é especial,

mestre. Investigar é a nossa função prioritária”. Obi-Wan responde: “Faremos

exatamente o que o conselho determinou. E você vai aprender a se comportar,

jovem”. Anakin abaixa a cabeça e silencia. Padmé fala: “Talvez sua mera

presença revele os mistérios que cercam esta ameaça. Agora se me derem

licença... (ela se levanta seguidamente por todos) eu vou me retirar”. Obi-Wan sai

andando em direção ao chefe da segurança que lhe passa algumas informações.

Jar Jar se aproxima de Anakin, que ficara olhando Padmé se retirando, ele

o fita longamente e diz: “Estou feliz por vê-lo de novo, Ani.” Anakin lhe responde

olhando para Padmé, que estava saindo do aposento: “Ela mal me reconheceu,

Jar Jar. Eu pensei nela todos os dias desde que nos separamos... e ela me

esqueceu completamente”. Jar Jar responde enquanto Obi-Wan se aproxima: “Ela

está feliz. Contente como não a via há muito tempo”. Obi-Wan fala aos dois: “Está

olhando pelo lado negativo. Cuidado com seus pensamentos. Ela ficou contente

de nos ver. Agora vamos checar a segurança”.

Obi-Wan e Anakin ficam no andar onde a Senadora dormia, fazendo a

segurança. Anakin fica na sacada e Obi-Wan pára próximo dele e diz: “Você

parece cansado”. Anakin: “Eu não consigo mais dormir bem”. Obi-Wan: “Por

causa da sua mãe”. Anakin faz sinal que sim com sua cabeça e diz: “Não sei por

que ainda sonho com ela”. Obi-Wan: “Os sonhos passam com o tempo”. Anakin:

”Preferiria sonhar com Padmé. Ficar perto dela de novo é embriagante” Obi-Wan:

“Cuidado com os pensamentos. Eles o traem. Você fez uma promessa à Ordem

dos Jedi que não é fácil quebrar. E ela é uma política. Eles não são confiáveis”.

Anakin: “Ela não é como os outros senadores.” Obi-Wan: “Os senadores só ligam

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para os que financiam suas campanhas. Esquecem as sutilezas da democracia

para obter dinheiro”. Anakin: “Não venha como mesmo discurso. Pelo menos não

o de política da economia”.

Enquanto os Jedi conversam, um robô voador se posiciona na janela do

quarto de Padmé e começa a cortar o vidro, deixando cair lá dentro as duas

centopéias venenosas. As centopéias se locomovem rapidamente pelo quarto

chegando até a cama de Padmé e os Jedis conversam sobre o Chanceler

Palpatine. Anakin o defende diante das formulações críticas de Obi-Wan. Anakin

diz que o Chanceler é um bom homem, e então, subitamente vira seu rosto para o

quarto de Padmé; Obi-Wan diz que também pressente perigo. Os dois correm

rapidamente para o quarto. As centopéias já estavam próximas do rosto de Padmé

quando Anakin com sua espada laser ligada, pula dando dois golpes de espada

matando as centopéias. Padmé Amidala se levanta assustada e Obi-Wan vê o

robô voador que ainda estava posicionado na janela e corre atirando-se,

quebrando a janela e se agarrando ao robô. Anakin sai correndo atrás de Obi-Wan

e o resgata em um carro conversível. O robô vai até a posição do assassino. Os

Jedi capturam a assassina. Anakin e Obi-Wan a interrogam e quando ela foi falar

quem a contratou, um dardo atingiu-lhe o pescoço, e os Jedi só conseguiram ouvir

que era um caçador de recompensas que a contratara. Obi-Wan retirou e guardou

o dardo tóxico.

No dia seguinte, Anakin e Obi-Wan se apresentam no conselho Jedi. Yoda

ordena que Obi-Wan localize o tal caçador de recompensas, e Mestre Windu

salienta que deve-se descobrir para quem ele trabalha. Obi-Wan pergunta como

ficaria a proteção da Senadora Amidala. Yoda lhe responde: “Cuidar disso o seu

Padawan irá.” Obi-Wan olha preocupado para Anakin, que por sua vez mostra-se

satisfeito e apto. Windu fala: “Anakin, leve a Senadora de volta ao planeta Naboo.

Estará segura lá. Não use transporte oficial. Viajem como refugiados”. Anakin

responde: “Como líder da oposição, será difícil tirá-la da Capital.” Yoda: “Até esse

assassino pegarmos... respeitar nossa posição ela deve.” Windu: “Anakin, vá ao

Senado. Peça a Palpatine para falar com ela.” Os dois Jedi fazem uma reverência

e saem.

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No Senado, Anakin se encontra com Palpatine, que lhe diz: “Falarei com

ela. Amidala não desobedecerá minha ordem. Eu a conheço bem para afirmar

isso”. Anakin: “Obrigado, Excelência”. Palpatine: “Então, finalmente lhe deram uma

missão. Sua paciência foi recompensada”. Anakin: “Sua orientação, mais que

minha paciência”. Palpatine: “Você não precisa de orientação, Anakin. Com o

tempo, aprenderá a confiar em seus sentimentos. Então, você será invencível. Eu

já disse que você é o Jedi mais talentoso que conheci”. Anakin: “Obrigado,

Excelência”. Palpatine: “Vejo que esta se tornando o maior de todos os Jedi. Até

mais poderoso que Mestre Yoda“.

No Templo Jedi, caminham e conversam juntos Yoda, Windu e Obi-Wan.

Obi-Wan: “Estou preocupado com meu Padawan. Ele não esta preparado para

essa missão”. Yoda: “O conselho confia na sua decisão”. Windu: “O rapaz tem

grandes habilidades”. Obi-Wan: “Mas ainda tem muito que apreender. Suas

habilidades o tornaram... arrogante”. Yoda: “Sim. Uma falha cada vez mais comum

entre os Jedi. Confiantes demais eles são. Mesmo os mais velhos e mais

experientes”. Windu: “Lembre-se que se a profecia for verdadeira... somente

Anakin pode trazer equilíbrio à força”.

Nos aposentos da Senadora Padmé, Anakin a aguarda. Padmé orienta Jar

Jar sobre sua ausência temporária e que ele deve representá-la no Senado.

Padmé dispensa Jar Jar e cruza com Anakin e dizendo em tom irritado: “Não

gosto de me esconder.” Anakin ( em tom presunçoso): “Não se preocupe. O

Conselho ordenou uma investigação. Mestre Obi-Wan encontrará o caçador de

recompensas”. Padmé: “Não trabalhei o ano todo para derrubar... o Ato de Criação

Militar e não poder votar”. Anakin: “As vezes temos que esquecer o orgulho e fazer

o que mandam”. Padmé: “Anakin... você amadureceu”. Anakin: “Só o Mestre Obi-

Wan não percebe. (pausa) Não me entenda mal. Obi-Wan é um grande mentor. É

tão sábio quanto Mestre Yoda... e tão poderoso quanto Mestre Windu. Fico muito

grato de ser aprendiz dele. Mas tem certos aspectos... em muitos aspectos... eu

sou superior a ele. Estou pronto para os testes. Mas ele me acha muito

imprevisível. Não me deixará ir adiante”. Padmé: “Deve ser frustrante”. Anakin: “É

pior! Ele é muito crítico. Nunca escuta. Ele não entende. Isso não é justo!”.

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Padmé: “Os mentores olham mais para nossos erros do que gostaríamos. É assim

que amadurecemos”. Anakin: “Eu sei”. Padmé: “Anakin... não tente amadurecer

tão rápido”. Anakin se levanta e fica próximo dela de frente e diz: “Mas eu estou

amadurecido. Foi você mesma que disse (dando um sorriso malicioso)”. Padmé

fala com um tom sério: “Não olhe pra mim desse modo”. Anakin responde aflito:

“Por que não?”. Padmé: “Eu fico constrangida”. Amidala se retira irritada, enquanto

Anakin diz com um sorriso malicioso: “Sinto muito Milady”.

Uma nave leva Anakin, Obi-Wan, Padmé, sua dama de companhia e seu

chefe de segurança até a estação de vôos interplanetários, aonde Anakin, Padmé

e R2 iriam embarcar para Naboo. Todos se despedem, Anakin ouve com pouco

interesse às recomendações de Obi-Wan e então partem para Naboo.

Obi-Wan vai visitar um velho amigo, dono de uma pequena lanchonete. Os

dois sentam-se juntos, Obi-Wan mostra-lhe o dardo tóxico retirado do pescoço da

assassina. Pergunta de onde veio o dardo, seu amigo lhe diz que pertence aos

clonadores do planeta Kamino e lhe dá coordenadas aproximadas. Obi-Wan vai

para a biblioteca para pegar o mapa com o caminho para Kamino. No entanto não

encontra os dados de que precisa e então vai ao Templo Jedi.

Na nave de viagem para Naboo, Anakin e Padmé conversavam. Padmé:

“Não deve ser fácil ter prestado juramento como Jedi. Não poder visitar os lugares

ou fazer coisas que gosta”. Anakin: “Ou estar com aqueles que amo”. Padmé:

“Tem permissão para amar? Achei que era proibido para um Jedi”. Anakin sorri e

diz: “A união é proibida. A posse é proibida. A compaixão, que eu definiria como

amor incondicional... é fundamental para um Jedi. Assim, poderia dizer que somos

estimulados a amar”. Padmé: “Você mudou muito”. Anakin: “E você não mudou

nada. Continua igual ao que era nos meus sonhos”. Os dois ficam intrigados um

com o outro e Anakin morde seus lábios excitado.

Obi-Wan vai ao Templo Jedi e entra em uma aula que Mestre Yoda dava para

crianças. Obi-Wan diz que está tentando localizar um planeta que não consta nos

registros. Mestre Yoda faz uma piada sobre Obi-Wan ter perdido um planeta e

pede para uma das crianças fecharem as cortinas para juntos acharem o planeta

que Mestre Kenobi perdeu. Obi-Wan coloca seu arquivo no leitor de mapas da

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sala, que simula as estrelas e os planetas dentro da sala. Ele aponta para aonde

deveria estar o planeta dizendo que a gravidade atrai todas as estrelas para

aquele local, mas que não há nada ali. Yoda pergunta se alguma das crianças

sabem ou acham algo. Um garoto diz: “Mestre? Porque alguém deletou da

memória do arquivo”. Yoda concorda com a criança e diz para Obi-Wan ir até o

centro de gravidade que encontrará o planeta, e diz que alguém deve ter apagado

os arquivos. Obi-Wan questiona dizendo que deveria ser impossível alguém

apagar isso. Yoda diz: “Perigoso e inquietante esse enigma é. Somente um Jedi

poderia deletar esses arquivos. Mas quem e por quê é difícil de responder. Meditar

sobre isso irei”.

A nave chega até Naboo. Eles desembarcam e continuam andando lado a

lado e conversando juntos. Padmé conta sobre sua trajetória na política, Anakin

diz que acha que a república precisa dela. Eles se reúnem com a Rainha de

Naboo e seus conselheiros, que conversam sobre a crise da República. Dizem

que nunca houve uma guerra desde a fundação da República e que as

negociações do Senado deveriam resolver isso para que não se aumentassem os

aliados da Federação do Comércio. A Rainha então propõe pensarem na

segurança de Padmé. O conselheiro pergunta: “O que sugere, Mestre Jedi?”.

Padmé o corta dizendo: “Anakin não é um Jedi. Ele ainda é aprendiz Padawan”.

Anakin interrompe: “Espere um instante”. Padmé: “Desculpe-me. Achei que ia ficar

na Terra Lacustre. É bem isolada”. Anakin, parando e botando as mãos na cintura:

“Desculpe-me. Sou o responsável pela segurança aqui”. Padmé: “Anakin, é o meu

planeta. Eu o conheço. Por isso estamos aqui. Seria sábio aproveitar meu

conhecimento em vista disso”. Anakin, nervoso e desconcertado e diante de

olhares desaprovadores da rainha: “Desculpe-me, Milady”. Rainha: “Perfeito.

Então, está resolvido”.

Obi-Wan chega na atmosfera de Kamino e desce até uma gigante base de

metal situada em um mar revolto. Ele é recepcionado por um alienígena do sexo

feminino, que lhe diz: “Mestre Jedi... o Primeiro-Ministro o está aguardando”. Obi-

Wan (surpreso): “Sou aguardado?”. Ela responde: “Naturalmente. Ele está ansioso

para vê-lo. Após todos esses anos... estávamos começando a pensar que não

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viria. Por aqui, por favor”. Obi-Wan caminha ao lado da recepcionista que o leva

até o primeiro ministro. Recepcionista: “Eu lhe apresento Lama Su... Primeiro-

Ministro de Kamino”. Ambos se saúdam inclinando o corpo. Recepcionista: “E este

é o Mestre Jedi...”. Obi-Wan: “Obi-Wan Kenobi”. Lama Su: “Estou seguro que irá

aproveitar sua estada. Por favor (sentam-se). E agora, vamos aos negócios.

Ficará satisfeito de saber que estamos dentro da programação. 200 mil unidades

estão prontas, com mais um milhão a caminho”. Obi-Wan: “Isso é uma... boa

notícia”. Lama Su: “Por favor, diga ao seu Mestre Zaifo Vias... que sua ordem será

cumprida dentro do prazo”. Obi-Wan: “Desculpe. Mestre...?”. Lama Su (irritando-

se): “Mestre Jedi Zaifo Vias ainda é... um dos principais lideres do Conselho dos

Jedi, não?”. Obi-Wan: “Mestre Zaifo Vias foi morto há quase dez anos”. Lama Su:

“Oh, eu lamento ouvir isso. Ficaria orgulhoso do exército que construímos para

ele”. Obi-Wan (surpreso): “Exército?”. Lama Su: “Sim, um exército de clones. E

devo dizer, um dos melhores que já criamos”. Obi-Wan: “A primeira vez que meu

mestre o contatou sobre o exército... ele disse para quem era?”. Lama Su:

“Naturalmente que disse. Este exército é para a República. Mas deve estar

ansioso para inspecionar as unidades”. Obi-Wan: “É por isso que estou aqui”. Eles

se levantam e começam a caminhar.

Em Naboo, Anakin chega junto com Padmé em uma canoa até um

palacete. Funcionários levam as malas enquanto Anakin ajuda Padmé a

desembarcar. Os dois caminham lado a lado pela varanda do palacete enquanto

Padmé conta que vinha àquele local na sua época de escola. Eles param em uma

sacada de frente para um grande lago. Padmé conta que na época que vinha ali,

ela nadava bastante e deitava na areia para secar-se ao sol. Anakin: “Eu não

gosto de areia. É áspera, desagradável, irritante... e fica em todo lugar. Não é

como aqui. Tudo aqui é macio... e suave”. Anakin começa a acariciar Padmé, que

por sua vez permite e depois o olha penetrante. Anakin sorri e começa a se

impulsionar timidamente para beijá-la, e então eles se beijam. Durante o beijo,

Padmé de forma repentina afasta-se dizendo: “Não. Eu não devia ter feito isso”,

fixamente olhando para frente. Anakin: “Desculpe”, ficando desorientado.

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Obi-Wan, junto com o primeiro ministro e sua secretária, caminham em uma

plataforma de vidro observando todos os procedimentos da construção do exército

clone. Lama Su conta para Obi-Wan sobre as vantagens dos clones perante os

dróides. Lama Su conta que os clones tem um programa de crescimento

acelerado e que são obedientes, recebem qualquer ordem sem contestar. E que

foram modificados geneticamente para serem menos independentes que o modelo

original. Obi-Wan pergunta quem é o modelo original e Lama Su responde que é

um caçador de recompensas chamado Jango Fett. Obi-Wan pergunta onde está

Jango Fett. Lama Su conta que eles o mantém ali, e que além do pagamento,

Jango pediu um clone de si próprio inalterado e sem crescimento acelerado. Obi-

Wan diz que quer conhecer Jango Fett e a secretária de Lama Su diz que será um

prazer conseguir isso.

Anakin sentado com Padmé em um campo com pequenas cachoeiras em

volta, conversam: Anakin pergunta para Padmé sobre seu primeiro namorado, ela

reluta mas conta e ele rapidamente pede para ela parar, dizendo: “Tudo bem, eu

já entendi”. Anakin pergunta o que aconteceu com o namorado. Padmé diz que ela

entrou para o serviço público e ele virou artista. Anakin diz que ele foi mais

esperto. Padmé diz: “Você não gosta mesmo de políticos”. Anakin: “Gosto de dois

ou três. Mas não estou certo sobre um deles. Não acho que o sistema funcione”.

Padmé: “Como o faria funcionar?”. Anakin: “Os políticos deveriam sentar, discutir o

problema... concluir o que é melhor para o povo, e fazer”. Padmé: “É o que

fazemos. Mas as pessoas nem sempre estão de acordo”. Anakin: “Deveriam ser

convencidas”. Padmé: “Por quem?”. Anakin: “Não sei. Alguém”. Padmé: “Você?”.

Anakin: “Claro que não”. Padmé: “Quem, então?”. Anakin: “Alguém sábio”. Padmé:

“Está me soando como uma ditadura”. Anakin: “Bem... se é o que funciona”.

Padmé (pausa e o olha): “Você está brincando comigo”. Anakin: “Não teria

coragem de brincar com uma Senadora”. Os dois brincam pelo campo, Anakin

simula ter se machucado por um animal de pasto, Padmé corre para ajudá-lo e ele

sorrindo a pega e os dois rolam juntos pela grama.

A secretária de Lama Su vai com Obi-Wan até os aposentos de Jango Fett,

e uma criança abre a porta. Secretária: “Boba, seu pai está aqui?”. Boba: “Sim”.

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Secretária: “Podemos vê-lo”. Boba: “Claro”. A criança chama seu pai e Obi-Wan

toma a frente para aguardá-lo.

Obi-Wan fica de frente com Jango Fett e faz um interrogatório informal. Obi-

Wan se despede e se retira junto com a secretária, Jango fica desconfiado e

ordena que o filho, clone, faça as malas para ambos partirem.

Anakin toma o café da tarde com Padmé e a noite eles se juntam na sala,

ambos ardentes. Anakin: “Desde que a conheci... em todos esses anos... não

houve um dia em que não pensei em você. E agora que estou ao seu lado... eu

me sinto angustiado. Quanto mais perto, pior vou ficando. A idéia de não estar

com você... faz com que eu não respire. Estou obcecado pelo beijo... que nunca

deveria ter me dado. Meu coração está batendo... esperando que aquele beijo não

vire uma cicatriz. Você está em minha alma, atormentando-me. O que devo fazer?

Farei qualquer coisa que me pedir”. Anakin a olha com uma pausa, e diz nervoso:

“Se você está sofrendo como eu, por favor, diga-me”. Padmé: “Eu não posso. Nós

não podemos. Isso é simplesmente impossível”. Anakin: “Qualquer coisa é

possível. Ouça...”. Padmé (nervosa, levantando-se): “Não, escute você. Vivemos

em um mundo real. Volte para ele. Está estudando para ser um Jedi. Eu sou uma

Senadora. Se nos deixarmos levar por seu desejo... chegaremos a algo que não

pode acontecer... apesar do que sentimos um pelo outro”. Anakin: “Então, você

sente alguma coisa”. Padmé: “Não vai sacrificar seu futuro por mim”. Anakin: “Está

me pedindo para ser racional. É algo que eu sei que não posso fazer. Eu gostaria

de poder ignorar meus sentimentos... mas não consigo”. Padmé: “Não vou me

entregar a isso”. Anakin se vira e começa a caminhar, pára e diz: “Sabe... não teria

que ser desse modo. Poderíamos manter em segredo”. Padmé: “Seria viver uma

mentira. Algo que não conseguiríamos manter. Eu não poderia fazer isso. E você?

Poderia viver assim?”. Anakin: “Não. Você tem razão. Iria nos destruir”.

Obi-Wan se despede da secretária e vai até sua nave. Ele fica de frente

para R4, o robô auxiliar da nave, e pede para se comunicar com o conselho Jedi.

Um holograma de Obi-Wan aparece em uma sala aonde estão Mestre Windu e

Mestre Yoda. Obi-Wan reporta sobre o exército de clones pedido por Zaifo Vias

dez anos atrás, e diz que encontrou o caçador de recompensas. Windu lhe diz que

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o conselho não autorizou a criação desse exército, e Yoda pede que Obi-Wan

traga o caçador de recompensas para ser interrogado. Obi-Wan diz que ligará

denovo quando o tiver, e é encerrada a transmissão.

Yoda: “Cego estamos... se a criação desse exército de clones não conseguimos

ver”. Windu: “O Senado precisa saber que não mais usamos tão bem a Força”.

Yoda: “Somente o Lorde Negro de Sith conhece nossa fraqueza. Se informado o

Senado for, aumentar os adversários irão”.

Anakin dormindo em seu aposento próximo ao da Senadora Amidala, fala durante

seu sono: “Não... mãe... não”. Anakin desperta assustado de seu pesadelo, e fica

de pé meditando em frente ao nascer do sol. Padmé já acordada, chega perto de

Anakin, mas decide não incomodá-lo. Anakin, de olhos fechados, pede para

Padmé ficar.

Padmé: “Teve outro pesadelo a noite passada”. Anakin: “Os Jedi não têm

pesadelos”. Padmé: “Eu ouvi”. Anakin: “Vi minha mãe. Ela está sofrendo, Padmé.

Eu a vi tão claramente como vejo você. Ela está sofrendo. Sei que estou

desobedecendo a ordem de proteger você... mas eu preciso ir. Tenho que ajudá-

la”. Padmé: “Eu irei com você”. Anakin: “Sinto muito, não tenho escolha”.

Obi-Wan, se encontra com Jango Fett quando ele estava embarcando para

fugir em sua nave. Os dois travam um árduo combate mas Jango foge e Obi-Wan

consegue grudar um localizador no casco da nave de Jango.

Anakin chega com Padmé e R2 em uma nave de Naboo até Tatooine.

Anakin junto com Padmé, vão até a antiga oficina onde Anakin trabalhava como

escravo. Anakin pergunta sobre Shmi Skywalker. Seu antigo patrão o reconhece.

Anakin firmemente pergunta novamente sobre sua mãe e seu antigo patrão lhe dá

a informação desejada.

Enquanto isso Obi-Wan persegue de nave Jango na órbita do Planeta

Geonnosis. Jango percebe a nave Jedi o perseguindo e se inicia uma batalha

espacial. Jango após vários tiros e bombas lançadas pensa ter destruído o Jedi

com uma explosão, mas Obi-Wan estava escondido, aguardou um tempo para

depois descer e explorar o planeta.

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Anakin pousa na região que lhe foi informada, um deserto, como o Planeta

todo. Eles desembarcam e Padmé pede que R2 fique com a nave. Os dois

caminham aproximando-se de uma casa. Próximo da casa encontram C3PO, que

por sua vez reconhece Anakin e Padmé. C3PO, animado, diz ter ficado contente

de vê-los, e que sabia que “Mestre Ani”, seu criador, iria voltar. Anakin diz que veio

ver sua mãe. C3PO responde: “Talvez seja melhor nós entrarmos”.

C3PO entra com os dois e os introduzindo, Anakin já toma a frente falando

seu nome, lhe responde também se apresentando: “Owen Lars. Está é minha

namorada, Beru”. Padmé se apresenta, e Owen Lars fala a Anakin: “Imagino que

sou seu meio-irmão. Sabia que iria aparecer um dia”. Anakin: “Minha mãe está

aqui?”. Outro que chegava lhe responde: “Não, ela não está. Cliegg Lars

(estendendo a mão e cumprimentando Anakin). Shmi é minha esposa. Acho

melhor entrarmos. Temos muito que conversar”. Eles entram e se sentam. Cliegg

Lars: “Foi pouco antes do amanhecer. Eles apareceram de repente. Um ataque do

'povo da areia'. Sua mãe tinha saído cedo... para apanhar os cogumelos que

crescem nos evaporadores. Pelos rastros, ela estava a meio caminho de casa...

quando foi levada. Aqueles seres andam como homens, mas são... violentos...

monstros insanos. Trinta de nós fomos atrás dela. Voltaram quatro. Eu teria ido

com eles, mas depois que perdi a perna... eu não posso mais me locomover... até

cicatrizar. Não tenciono desistir dela... mas ela se foi há um mês. Não há muita

esperança que esteja viva”. Anakin se levanta e começa a andar. Owen Lars

pergunta: “Aonde você vai?”. Anakin responde: “Encontrar minha mãe”. Cliegg

Lars: “Sua mãe está morta, filho. Deve se conformar”.

Anakin vai para fora da casa e fica um tempo sozinho. Padmé vai até ele,

que lhe diz: “Você tem que ficar aqui. São pessoa boas. Você estará segura”.

Padmé: “Anakin...” (e lhe dá um abraço). Anakin caminha para uma moto e diz que

não irá demorar. Ele monta na moto e sai a toda velocidade. Ele pede informação

para os Jawas, anões comerciantes que vivem em bases móveis pelo deserto.

Enquanto isso Obi-Wan explorava as instalações inimigas. Até que flagra

uma reunião dos líderes separatistas coordenada pelo ex-Jedi Conde Dookan.

Obi-Wan ouve os planos de Dookan de destruir os Jedi e a República.

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Anakin localiza durante a noite o acampamento do “Povo da Areia”. Ele se lança

de altos penhascos silenciosamente aproximando-se. Anakin anda pelo

acampamento entre cabanas esféricas e para diante de uma cabana maior para

abrir uma passagem com sua espada laser. Ao entrar ele vê sua mãe semi-

acordada amarrada em uma armação triangular de madeira. Ele começa a

desamarrá-la e a toma nos braços. Shmi: “Ani... é você?”. Anakin: “Estou aqui,

mãe. Você está segura”. Shmi: ”Ani? Você está tão bonito (sorrindo e o

acariciando). Meu filho. Meu filho adulto. Estou orgulhosa de você, Ani”. Anakin:

“Eu senti sua falta”. Shmi: “Agora estou completa. Eu amo v...”. Anakin: “Fique

comigo mãe, tudo vai ficar...”. Shmi: “Eu... Eu amo... (ela morre pendendo seu

pescoço pra trás). Anakin fecha os olhos dela e fica furioso, sai da cabana quando

estava amanhecendo e mata toda a tribo com sua espada.

Mestre Yoda, que meditava sozinho, ouvindo a voz de Qui-Gon aos gritos:

“Anakin! Anakin! Não!”. Mestre Windu entra na sala e senta-se ao lado de Yoda,

que o olha com lágrimas. Windu: “O que há?”. Yoda: “Dor... sofrimento... morte, eu

sinto. Alguma coisa terrível aconteceu. O jovem Skywalker está sofrendo. É uma

dor terrível”.

Obi-Wan vai até sua nave pousada aos arredores da base inimiga e tenta

ajustar seu comunicador para pedir ajuda. O comunicador está fora de alcance

para Coruscant, Obi-Wan tenta localizar Anakin em Naboo que é mais perto, mas

não encontra o sinal de Anakin, o que o deixa preocupado. Ele então aumenta a

freqüência e capta o sinal de Anakin em Tatooine. Obi-Wan: “O que diabos ele faz

lá? Eu o mandei ficar em Naboo”. Obi-Wan começa a fazer a transmissão para

Anakin.

Enquanto isso, Anakin traz o corpo de sua mãe para enterrá-la próximo à

residência de seu padrasto. Anakin se isola em um cômodo da casa antes do

enterro da mãe e Padmé vai até ele. Anakin se encontra em um estado de revolta,

lamentando por não ter conseguindo salvar a mãe, culpando Obi-Wan pelo

acontecido. Ele confessa que matou o povo da areia, inclusive mulheres e

crianças, e Padmé o consola. A família se reúne para o enterro, Anakin se

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aproxima do túmulo da mãe e diz: “Não fui forte para salvá-la, não tive forças, mas

eu prometo que não fracassarei de novo. Sinto demais a sua falta”.

Anakin vai para nave, a chamado de R2, e vê uma mensagem de Obi-Wan

pedindo ajuda, e vai até ele para salvá-lo, desobedecendo Mestre Windu que tinha

pedido que ele ficasse onde estava para proteger a Senadora. Ele retransmite a

mensagem para Coruscant como Obi-Wan lhe ordenou, deixando os Jedi a par da

situação.

Anakin e Padmé são capturados e levados para uma arena de combate, na

qual estava Obi-Wan. Antes de entrarem na arena, Padmé declara seu amor por

Anakin e eles se beijam. Os Jedi lutam e conseguem vencer as criaturas soltas na

arena.

Dookan envia tropas para a arena para matar os Jedi e a Senadora, mas

Mestre Windu aparece e ameaça um dos aliados de Dookan. Vários Jedi

aparecem e salvam os três. Os Jedi acabam acuados pela enorme quantidade de

dróides, mas nesse momento Yoda aparece com o exército de clones, resgatando

todos. Os dróides batem em retirada, pois agora eram minoria frente ao exército

de clones. Anakin e Obi-Wan vão atrás de Dookan para impedir que o mesmo

fugisse. Ao se iniciar a luta contra Dookan, Anakin parte sozinho para o ataque,

contrariando Obi-Wan que queria um ataque conjunto. Anakin é detido por um raio

de Dookan, ficando inconsciente. Obi-Wan luta sozinho, é derrotado, mas quando

vai receber o golpe fatal, Anakin interfere salvando Obi-Wan. Ambos lutam e

Dookan acaba por cortar o braço direito de Anakin. Yoda aparece e luta contra

Dookan. Dookan usa a força para derrubar um pilar em cima de Obi-Wan e

Anakin, que estavam caídos juntos. Yoda opta por salvar os Jedi, deixando

Dookan escapar.

Obi-Wan volta para o templo Jedi com Windu e Yoda, no qual conversam. Obi-

Wan fala para Windu: “Acredita no que Dookan disse... sobre Sidious controlar o

senado? Não é o que sinto”. Yoda: “Ao lado negro Dookan se juntou. Mentiras,

trapaças... criar mal entendidos são seus métodos agora”. Windu: “Contudo,

deveríamos vigiar de perto o senado. Onde está seu aprendiz?”. Obi-Wan: “A

caminho de Naboo, escoltando a Senadora Amidala até em casa. Devo admitir

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que sem os de clones não teríamos chegado à vitória”. Yoda: “Vitória?! Vitória,

você disse? Mestre Obi-Wan, não houve vitória. O manto do lado negro caiu. A

guerra dos clones começou”.

Na última cena, Anakin se casa em segredo com Padmé, tendo R2 e C3PO

como testemunhas, e já usando um braço mecânico. O filme termina na cena do

casamento.

Episódio III - A Vingança do Sith:

O filme começa com uma guerra no espaço, nas proximidades e órbita do

planeta Coruscant. O Chanceler Palpatine havia sido recentemente seqüestrado

pelo General Dróide Grievous, um andróide de combate que lidera o exército dos

dróides na Guerra dos Clones despertada no episódio II. Dois caças Jedi, um com

Anakin Skywalker e outro com General Obi-Wan Kenobi, voam dentro da guerra

em direção à nave de Griveous com a missão de resgatar o Chanceler. Anakin

aponta para Obi-Wan a localidade da nave de Griveous.

Um soldado aliado de escolta pede ajuda por terem naves atirando nele

por trás. Anakin se consulta com Obi-Wan, planejando resgatar o soldado em

apuros, mas Obi-Wan o adverte que não deveriam desviar da missão, que o

soldado está fazendo seu trabalho e que eles deveriam fazer o deles. Anakin

consente e o soldado é explodido por uma nave. Outra nave inimiga lança mísseis

sobre os dois Jedi, que fogem dos mesmos. Anakin consegue escapar do míssil

que o perseguia, no entanto Obi-Wan é atingido por um outro. O míssil espalha

vários robôs que começam a destruir a nave de Obi-Wan. Anakin se propõe a

salvá-lo, mas Obi-Wan lhe diz que a missão é salvar o Chanceler e que Anakin

deve cumpri-la, deixando-o para trás. Anakin se recusa e salva seu mestre dos

pequenos dróides. Os dois então invadem a nave de Griveous, destróem alguns

dróides e, graças a R2D2, localizam a posição do Chanceler. R2 projeta um

holograma da nave indicando a posição do Chanceler. Obi-Wan comenta que o

mesmo está no topo da torre de observação do gigante cruzador que era a nave

de Griveous. Anakin diz olhando em sua volta: “Eu sinto o Conde Dookan”. Obi-

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Wan: “Eu pressinto uma armadilha.” Anakin: “Qual o próximo passo?”. Obi-Wan

sorrindo: “Cair na armadilha”. Anakin comanda que R2 fique com a nave e Obi-

Wan lhe dá um comunicador dizendo-lhe para aguardar instruções. Os Jedi

correm até o elevador mediante combates com Dróides e sobem até o topo da

torre de observação.

Eles chegam até o local e vêem apenas o Chanceler nos fundos, algemado

num trono de observação. Se aproximam do Chanceler com cautela. Obi-Wan o

saúda formalmente enquanto Anakin pergunta se o mesmo estava bem. Palpatine

olhando para o elevador diz: “Conde Dookan”. Os dois Jedis se viram e vêem

Dookam e dois dróides chegando do elevador. Obi-Wan diz para Anakin: “Desta

vez, vamos lutar juntos.” Anakin responde: “Eu ia dizer a mesma coisa”. Eles

aguardam Dookan que se aproximava. Palpatine diz: “Peçam ajuda. Não são

páreo para ele. É um Lorde Sith”. Obi-Wan: “Chanceler Palpatine, Lordes Sith são

nossa especialidade”. Dookan: “Seus sabres, por favor. Não vamos criar confusão

diante do Chanceler”. Obi-Wan: “Desta vez não vai escapar, Dookan”. Os três

começam a lutar com suas espadas lasers. Dookan: “Tenho aguardado ansioso

por isso”. Anakin: “Meus poderes duplicaram desde o último encontro”. Dookan:

“Ótimo. Quanto maior o orgulho, maior a queda”. Palpatine observa admirando a

luta. Obi-Wan é jogado para trás e destrói os dois dróides de Dookan. Dookam

levita Obi-Wan e o lança fortemente contra a parede, deixando-o inconsciente.

Anakin procede sozinho à luta e eles travam suas espadas. Dookan: “Sinto um

grande medo em você, Skywalker. Você tem raiva, sente ódio... mas não usa isso

em seu favor”. Anakin em uma manobra sorrateira, amputa as duas mãos de

Dookan, o deixando de joelhos e tomando as duas espadas em suas mãos e as

cruzando no pescoço de Dookan. Palpatine rindo entusiasmado: “Muito bem,

Anakin, isso mesmo! Mate-o. Mate-o agora”. Anakin fica em conflito: “Não posso”.

Palpatine: “Mate!”. Anakin corta a cabeça de Dookan e mostra feições de

incerteza. Palpatine: “Você fez bem, Anakin. Ele era perigoso demais para

continuar vivo”. Anakin: “Era um prisioneiro desarmado. Eu não devia ter feito isso.

Não é atitude de um Jedi”. Palpatine: “É algo natural. Ele decepou seu braço e

você quis vingança. Não foi a primeira vez, Anakin. Lembra o que me contou

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sobre sua mãe e o Povo da Areia? Temos que ir embora antes que cheguem mais

dróides”. Palpatine caminha enquanto Anakin corre até Obi-Wan. Palpatine diz:

“Anakin, não há mais tempo. Temos que sair antes que seja tarde”. Anakin: “Ele

parece estar bem”. Palpatine: “Esqueça”. Anakin: “O destino dele será igual ao

nosso”. Anakin leva Obi-Wan em suas costas e foge levando o Chanceler. Obi-

Wan recobra sua consciência e Anakin ordena que R2 venha até ele. Griveous,

que os localizou, ativa escudos de força que os impedem de locomoverem-se. R2

chega para desativar os escudos de força, mas junto com ele chega um pelotão

de soldados dróides, que os rendem levando todos até a cabine de pilotagem da

nave, onde estava General Grievous. Os Jedi lutam contra Grievous, mas ele

acaba escapando e fugindo. Anakin consegue pousar a nave e todos são levados

ao Senado para deixarem o Chanceler Palpatine. Obi-Wan vai para o templo Jedi

e Anakin fica no Senado para acompanhar o desfecho. Padmé se encontrava

escondida atrás de um pilar esperando por Anakin. Ele vai até ela e diz querer

contar a todos que são casados. Padmé assustada discorda. Ela conta que está

grávida. Anakin fica empolgado com a notícia, dizendo ser o dia mais feliz de sua

vida e que eles não deviam se preocupar com nada por enquanto.

General Grievous foge e contacta Lorde Sidious, que lhe ordena que leve os

líderes separatistas a um determinado planeta, dizendo que planeja ter um novo

aprendiz e que a guerra está próxima do fim. Anakin e Padmé vão dormir. Anakin

acorda assustado no meio da noite, pois sonhara que Padmé morria durante o

parto. Ele conta seu sonho à Padmé, dizendo: “Não vou deixar que este vire

realidade”.

Anakin vai conversar com Yoda sobre seu sonho. Depois, Anakin se encontra

com Obi-Wan, que fala que Chanceler Palpatine solicitou a presença de Anakin.

Obi-Wan adverte Anakin para ter cuidado com Palpatine e diz estar se sentindo

apreensivo.

Anakin vai até Palpatine, que o elege como seu representante pessoal no

Conselho Jedi.

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Anakin vai até o Conselho informar a nomeação a ele concedida. O

Conselho aceita a nomeação mas não lhe concede o nível de Mestre, o que deixa

Anakin muito nervoso.

Anakin e Obi-Wan saem do Conselho. Anakin diz estar revoltado pois

considera uma insulta não terem lhe concedido o grau de Mestre Jedi. É decidido

no conselho que Yoda iria para o planeta dos Wookies que estava sendo invadido

pelos dróides. A sessão do Conselho é encerrada. Obi-Wan passa para Anakin a

missão de espionar Palpatine e reportar os passos do mesmo para o Conselho.

Anakin não concorda, tampouco aceita bem a missão.

Obi-Wan e Windu acompanham Yoda para ser transportado para a nave do

exército clone que iria para o planeta dos Wookies, eles conversam sobre Anakin

e ficam preocupados a respeito da profecia.

Anakin, junto a Padmé, questiona a ordem Jedi, enquanto Padmé questiona a

guerra e a república. Padmé abraça Anakin dizendo-lhe para abraçá-la como em

Naboo quando só o amor deles importava e nada mais.

Anakin vai até um concerto onde Palpatine o chamou, e Palpatine lhe conta sobre

a localização do General Grievous. Palpatine pede para ele sentar-se e comanda

que seus outros acompanhantes os deixem a sós. Palpatine conversa com Anakin

sobre semelhanças entre os Jedi e os Sith, e conta uma lenda Sith de um mestre

tão poderoso que conseguia impedir que os outros com quem se importava

morressem. Anakin mostra-se muito interessado nesse poder.

Anakin vai à reunião do conselho Jedi contar a localização do General

Grievous. Yoda, a distancia, diz que deveriam agir rápido e Anakin conta que o

Chanceler lhe pediu para que ele liderasse a campanha, mas todos discordam e

nomeiam Obi-Wan, por ser um mestre e por ter mais experiência, Anakin consente

silenciando-se e mostrando-se frustrado.

Anakin acompanha Obi-Wan até sua decolagem, ele diz para Obi-Wan que o

mesmo precisará da ajuda dele nessa missão. Obi-Wan concorda mas diz que a

informação pode estar errada tornando a perseguição inútil. Anakin ao se despedir

diz: “Mestre... eu desapontei o senhor. Não tenho sido muito dedicado ao seu

treinamento. Tenho sido arrogante e peço desculpas. Tenho tido grandes

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frustrações com o Conselho”. Obi-Wan: “Você é forte e sábio, Anakin. Estou muito

orgulhoso de você. Treinei você desde que era um menino. Ensinei tudo que sei.

Você se tornou um Jedi muito melhor do que eu esperava. Mas seja paciente,

Anakin. Em breve o Conselho vai fazer de você um Mestre Jedi”. Eles se

despedem, e apesar de a conversa com Obi-Wan ter melhorado o humor de

Anakin, logo quando Obi-Wan se foi, seu humor voltou a ficar como antes.

Anakin teve outro sonho com a morte de Padmé, no qual Obi-Wan a ajudava.

Anakin conversa com Padmé e diz que se sente perdido. Padmé o questiona e ele

responde: “Obi-Wan e o Conselho não confiam em mim. Alguma coisa está

acontecendo. Não sou o Jedi que deveria ser. Eu quero mais. E sei que não

deveria”. Padmé o acalma dizendo que ele espera muito de si mesmo. Anakin

continua: “Achei um meio de salvar você. Dos meus pesadelos. Não quero perder

você, Padmé”. Padmé: “Não vou morrer no parto. Eu prometo”. Anakin: “Não, eu é

que prometo”.

Mestre Windu, após receber a confirmação de que Obi-Wan estava em combate

com Grievous, pede que Anakin encaminhe essa mensagem ao Chanceler.

Anakin vai, enquanto Windu conversa com Yoda dizendo que sente um complô

para destruir os Jedi. Anakin vai até o Chanceler passar a informação. Anakin

confessa sua insatisfação com o Conselho. Palpatine consola Anakin,

engrandecendo-o e voltando-o contra os Jedi e confessando ser um Sith. Anakin o

desafia e diz que irá entregá-lo para o Conselho. Anakin conta para Windu sobre a

revelação e Windu sem se consultar com ninguém junta alguns Jedi e vai atrás de

Palpatine impedindo Anakin de ir junto. Contrariado, Anakin fica aguardando

Windu voltar, pensando no que Sidiuos lhe falou, até que decide ir até lá,

contrariando Windu. Quando ele chega, Windu e Sidious já estavam em combate:

Windu estava com vantagem. Sidious pede ajuda a Anakin e Windu diz que ele

deve ser destruído. Anakin fica contestando Windu. Quando Windu vai dar o golpe

fatal em Sidious, Anakin interfere cortando a mão de Windu e Sidious então

arremessa Windu pela janela com seus raios, matando-o. Anakin fica assustado

com o que fez, mas aceita ter passado para o lado negro da força, e torna-se

discípulo de Sidious que o nomeia Darth Vader. Palpatine, agora revelado Darth

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Sidious, ordena que Anakin vá ao Templo Jedi, matar todos os Jedi e depois ao

planeta Mustafar para matar os lideres separatistas, terminado assim a guerra.

Anakin cumpre a ordem, enquanto Sidious ordena que as unidades clone

destruam todos os Jedi, o que acontece de maneira desapercebida pelos Jedi,

surpreendidos e mortos pelo próprio exército clone. Yoda e Obi-Wan são os

únicos que conseguem escapar.

Senador Organa vai até o Templo Jedi, que estava em chamas, para

entender o que estava acontecendo. Ao tomar conhecimento da situação, Organa

retira-se, contactando Yoda e Obi-Wan para irem à sua nave.

Anakin vai até Padmé para acalmá-la e diz que os Jedi tentaram tomar o

poder da República e que ele permaneceria fiel ao Chanceler. Diz que vai à

Mustafar acabar com a guerra, pedindo que ela o espere.

Senador Organa é convocado para uma sessão especial no Senado, Yoda

e Obi-Wan voltam ao Templo Jedi. Lá, destróem os clones e descobrem que

Anakin estava por trás de tudo.

Enquanto isso, no Senado, Palpatine declara-se Imperador e todos aceitam.

Anakin destrói os líderes separatistas e permanece no planeta, aguardando

ordens de seu novo mestre. Yoda ordena que Obi-Wan mate Anakin, que havia se

tornado Darth Vader. Obi-Wan vai procurar por Anakin na casa de Padmé e conta

para a mesma que viu um holograma de segurança em que via Anakin matando

crianças, que ele havia passado para o lado negro. Padmé recusa-se a aceitar e

Obi-Wan descobre que Anakin é o pai do bebê que Padmé esperava. Ele se retira

e Padmé decide ir ate Anakin acompanhada apenas de C3PO. Sem que ela

perceba, Obi-Wan entra na nave e lá fica escondido.

Yoda vai até Sidious, com quem trava uma luta, enquanto Padmé encontra

Anakin. Ela diz o que Obi-Wan lhe havia contado e Anakin diz que não irá perdê-la

como perdeu sua mãe e que está fazendo tudo isso para poder protegê-la. Ela

propõe que ele abandone tudo e que fujam juntos para criar o filho. Ele diz que

não precisam fugir, pois agora ele pode fazer tudo da forma que quiser,

controlando a Galáxia. Padmé fica horrorizada, discordando dos planos de Anakin.

Obi-Wan aparece e Anakin estrangula Padmé a distancia usando a Força e

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fazendo-a desmaiar. Analkin grita com Obi-Wan dizendo que ele jogou Padmé

contra ele e Obi-Wan diz que Anakin mesmo fez isso, eles lutam ao mesmo tempo

que Yoda e o Imperador lutam. Yoda perde o combate e foge com o Senador

Organa. Sidious pressente que Darth Vader corre perigo e vai em sua busca.

Anakin, após um longo combate com Obi-Wan, se encontra em uma plataforma

dentro de um rio de lava enquanto Obi-Wan encontrava-se na margem, em terra

firme. Obi-Wan o adverte de que acabou o combate, pois ele estava em um nível

superior. Anakin diz exaltado: “Você subestima meu poder”. Obi-Wan o adverte a

não tentar, mas Anakin tenta saltar sobre Obi-Wan, que em um único golpe,

arranca-lhe um braço e duas pernas. Anakin começa a rolar para o rio de lava,

apenas segurando-se com o seu braço mecânico. Obi-Wan diz: “Você era o

escolhido! Deveria destruir o Sith e não se juntar a eles! Trazer equilíbrio à Força,

não deixá-la na escuridão!”. Anakin grita: “Eu odeio você!”. Obi-Wan: “Você era

meu irmão, Anakin. Eu amava você”.

Anakin começa a ser queimado pela lava, pois se encontrava bem próximo

à ela. Obi-Wan pega o sabre do mesmo e se retira, deixando o queimar vivo.

Obi-Wan volta para a nave, levando Padmé, R2 e C3PO.

Vader consegue escapar das chamas, ficando com seu corpo todo

queimado, e é socorrido por Sidious, que o recolhe e o leva para Coruscant em

uma cápsula médica.

Obi-Wan contacta Senador Organa e vai em seu encontro. Ele chega com

Padmé nos braços pedindo um médico. Ela dá luz a um casal de gêmeos,

batizando-os e falecendo em seguida. Vader é levado para uma sala de cirurgia

onde rapidamente é montado sobre ele um traje mecânico. Vader pergunta para

Sidious sobre Padmé e Sidious lhe responde: “Parece que, em sua raiva, você a

matou!”. Vader fica furioso e grita.

Yoda, Obi-Wan e Organa decidem que todos devem desaparecer e que as

crianças devem ser separadas e escondidas. Organa diz que levará a menina e

Obi-Wan pergunta sobre o menino. Yoda lhe responde: “Para Tatooine. Para sua

família deve mandá-lo”.

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Obi-Wan se compromete em levar o menino e cuidar dele. Organa se retira e

Yoda fala para Obi-Wan: “Em sua solidão em Tatooine, tenho um treinamento

para você. Um velho amigo aprendeu o caminho da imortalidade. Ele voltou do

reino dos mortos da Força. Seu antigo mestre”.

Obi-Wan surpreso, lembrando-se de Qui-Gon Jinn, ouve Yoda que ainda

lhe fala: “Como conversar com ele, eu vou ensinar a você”.

Padmé é velada em Naboo segurando em suas mãos o colar que Anakin

lhe fizera aos 10 anos de idade. Vader ao lado de Sidious olha de uma nave, a

construção de uma gigante base espacial do recém formado Império.

O filme termina com Obi-Wan entregando o menino Luke para o meio irmão

de Anakin e sua esposa.

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Capítulo VI – Análise e Discussão:

Episódio I – A ameaça fantasma

O título do filme que retrata o início da saga faz referência à condição

inconsciente dos Jedi em relação à existência dos Sith. Os Jedi representam o

bem, enquanto os Sith, o mal. O filme retrata a situação de os Jedi acharem que

os Sith tinham desaparecido e que não existiam mais, mas no filme ocorre a

revelação do Sith, que há milênios não se manifestava.

Neste episódio, um Sith é destruído por Obi-Wan Kenobi. No entanto, os

Jedi sabem que sempre há dois Sith, um Mestre e um aprendiz, ou seja, resta um

deles solto como um fantasma. Sendo assim, o título “A ameaça fantasma”, se

refere à situação dos Jedi, que se encontravam ameaçados sem saberem; visto

que o Sith estava tramando e usando seu poder para destruir os Jedi sem se

revelar. O Sith que agiu sem se revelar é o grande vilão do filme, o qual concluiu

futuramente seu golpe de destruir os Jedi, arquitetando um peculiar desfecho da

primeira parte da saga no episódio III - A vingança do Sith.

A “Ameaça Fantasma” representa, portanto, a condição inconsciente dos

Jedi, que concebiam o Sith como não mais existentes, mas que na verdade estava

operando inconscientemente. Mesmo posteriormente, quando os Jedi tinham

conhecimento da existência do Sith, eles permaneceram inconscientes na

condição de não saberem identificá-lo, capturá-lo ou destruí-lo. O Sith Darth

Sidious usou da estratégia de nunca se revelar para prosseguir operando

inconscientemente, semelhante à dinâmica do psiquismo inconsciente exercido

pela sombra no ego.

Darth Sidious disfarçou-se com o nome de Palpatine. Durante os primeiros

três filmes, não é revelado que Sidious é Palpatine, eles aparecem como dois

personagens diferentes, apenas no episódio III é que é revelada a verdade. Por

meio dessas duas personalidades, Sidious arquitetou toda a trama, ora sendo

Palpatine, um influente membro do Senado, ora Lorde Sidious, um aterrorizante

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vilão que manipulava os corruptos e criminosos a cometerem crimes contra o

Senado.

Palpatine foi “A ameaça fantasma”, nos três primeiros filmes da saga, os

quais serão analisados neste trabalho. O mesmo revelou-se só no terceiro filme,

situação que será desenvolvida mais adiante, e permaneceu exercendo seu papel

como imperador nos três filmes posteriores, que completam a saga de vida e

morte de Anakin Skywalker, personagem que é enfatizado neste trabalho. Anakin

Skywalker no terceiro filme torna-se Darth Vader, discípulo de Darth Sidious ou

Palpatine, permanecendo nesse papel nos três episódios seguintes. No entanto,

como já mencionado, serão analisados apenas os três primeiros filmes.

Os Jedi tem a crença de que devem destruir o Sith e possuem a profecia do

escolhido, que é o único que pode trazer o equilíbrio para a Força. No Episódio I,

os Jedi descobrem o escolhido, um menino de dez anos chamado Anakin. Anakin

Skywalker é o personagem principal e o mais influenciado pela trama, mas que,

por fim, acaba contra-influenciando a mesma. Tal personagem pode ser concebido

como um herói, visto que ele corresponde a todos os traços que compõem o herói

mitológico. O herói é um arquétipo que contém características que seguem um

padrão. Em heróis de diferentes culturas e tempos, podem-se traçar diversas

semelhanças, as quais configuram tal arquétipo e compõem as características

comuns do mesmo. A análise será construída a partir das características

universais que compõem o arquétipo do herói, que serão destacadas dentro dos

subtítulos abaixo.

Nascimento do herói:

O herói e protagonista dos filmes é Anakin Skywalker. Nascido em

Tatooine, um planeta coberto por deserto, marginalizado e fora da República,

Anakin é criado por sua mãe e desempenhava a condição e o expediente de

escravo em uma oficina mecânica, cujo proprietário era “Dono” dele e de sua mãe.

Anakin nasceu espontaneamente sem um pai progenitor, teve sua

concepção concebida naturalmente pela “Força”. Tal informação é destacada da

cena no episódio I, em que Qui-Gon Jinn, após perceber algo de especial no

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menino, pergunta para a mãe do mesmo quem era o pai; e ela responde: “Não

houve pai (Qui-Gon intriga-se). Levei-o no ventre. Dei-lhe vida e o eduquei. Não

sei como explicar”.

Segundo NEUMANN (1995: 108), a mãe do herói é sempre virgem, ou seja,

sagrada e dotada de abertura psíquica para Deus. O fato de não ter havido um pai

denota uma experiência de milagre, que a identifica com a Grande Mãe, Mãe

Terra, e Deusa Mãe. Escolhida e qualificada pela natureza para gerar o herói.

Segundo o autor, a Deusa Mãe que não precisou de um progenitor, não é regida

por um pai pessoal, mas sim por um poder suprapessoal que representa um

elemento procriador masculino internalizado e que a auxilia na maternagem e

educação do herói.

Todo herói mitológico é caracterizado por um nascimento peculiar,

geralmente sendo um parto com dificuldades ou com tentativas de “outros

poderosos” de destruir o filho enquanto ainda recém nascido e indefeso. No

entanto, o herói sempre supera as dificuldades iniciais impostas pelos

“adversários” ou pela própria natureza. No caso de Anakin, seu nascimento foi

diferenciado e especial, pois o mesmo fora concebido magicamente, “um milagre

da Força”. O nascimento do herói é diferenciado, seja por extremas dificuldades,

ou extremas facilidades, em todos os heróis mitológicos é presente no nascimento

a característica de ser especial. A característica especial do nascimento de Anakin

é o fato de não ter sido necessário um pai progenitor para se dar à gravidez,

podendo-lhe ser atribuído o status de “o enviado dos deuses”, entre outros.

O fato de não ter existido um pai pessoal, configura a distinção do herói,

que segundo NEUMANN (1995: 110), faz com que o herói se sinta estranho

perante os outros, experimentando dentro de si algo incomum e divino, fazendo-o

pensar que é filho de uma divindade. Segundo o pensamento antigo, o herói é

aquele que veio para a terra com uma missão, predestinado a realizar sua

elevação espiritual para ascender nos ciclos das reencarnações, o que o

caracteriza como o enviado dos deuses, recebendo projeções de messias,

salvador, o escolhido, entre outras.

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Com 10 anos de idade, Anakin teve subitamente nele projetado o “status de

o escolhido e referido na profecia Jedi” ao entrar em contato com Qui Gon, apesar

de sua mãe sempre o ter concebido como especial, como indica o filme.

Anakin suportou projeções da mãe, que cuidou dele concebendo-o especial

e, posteriormente, a projeção de o escolhido da profecia Jedi. Apesar de

inevitavelmente terem sido projetados nele outros conteúdos, as duas projeções

destacadas possuem uma importância que tange ao sagrado. Anakin teve, na sua

experiência com maternidade, um cuidado exercido pela sua mãe, de resguardá-lo

em uma vida normal apesar de saber que ele tinha poderes especiais futuramente

concebidos como atributos Jedi. Qui-Gon, em uma fala que será destacada

posteriormente, toma conhecimento a partir da mãe de Anakin, que ele tinha

poderes especiais, que seriam capacidades superiores Jedi inatas.

Anakin, logo de início em sua relação com Qui Gon, que por sinal foi uma

breve relação (devido ao mesmo ter morrido em duelo), se encaixou naturalmente

na projeção de herói redentor que veio ao mundo para trazer equilíbrio para a

Força.

Ainda assim, Anakin não tinha consciência, talvez nem mesmo Qui Gon, da

responsabilidade de assumir tal projeção. A relação entre ambos fluiu de forma

natural e Anakin não foi tratado como uma entidade divina, o que lhe permitiu não

estranhar a projeção a ele dirigida, prosseguindo assim em sua jornada.

Pode-se destacar a naturalidade com que Anakin encaixou-se na trama,

como sendo o seu destino. A nave de Qui Gon é atingida enquanto escapava de

um planeta que havia sido invadido e ele chega até o planeta Tatooine para fazer

os reparos. A nave teve que pousar no tal planeta, pois não tinha condições de

seguir adiante, logo foi uma ação de sobrevivência. O fato de ser uma ação de

sobrevivência configura a real necessidade e propósito da ação de pousar em

Tatooine para adquirir peças novas, que permite atribuir a tal ação, a qualidade de

“força do destino” já que é Anakin quem repara e quem possui as peças para o

conserto da nave. Se isso não acontecesse, não se daria à sobrevivência, logo, tal

sobrevivência teve que se dar para que a nave prosseguisse existindo

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futuramente, ou seja, o destino pode ser entendido, nesse caso, como sendo a

realização no presente que configurou o futuro.

A revelação do herói:

Ao chegarem a Tatooine, Qui-Gon e Obi-Wan concordam que sentem um

distúrbio na força. Tal sensação pode se referir tanto à influência dos Sith na

trama, quanto à anunciação da vinda do escolhido.

As peças que faltavam na nave estavam disponíveis apenas na pequena

oficina aonde Anakin trabalhava como escravo, ou seja, ele possibilitou a

aquisição das peças que faltavam. Tal configuração do problema que afligia a

nave tinha em Anakin sua solução, logo Anakin estava conectado à solução do

problema da nave. Quando estavam na mesa conversando, após Anakin os

abrigar da tempestade de areia, ele se propõe a participar da corrida de Pod para

ajudá-los, já que os Jedi precisavam de dinheiro e o vencedor ganharia uma certa

quantia, mas sua mãe discorda, assim como todos os outros que não o queriam

em perigo. No entanto, Anakin insiste para sua mãe, que então reconsidera e diz:

“Posso não gostar... mas ele poderá ajudar vocês. É o destino dele”. Qui Gon

então o olha profundamente. O mesmo posteriormente fala para Anakin e sua

mãe, que havia perguntado para Qui Gon se ele levaria Anakin para se tornar

Jedi: “Sim. Nosso encontro não foi coincidência. Nada acontece por acaso”.

Devido ao encaixe natural de Anakin com o problema da nave,

proporcionado pelo mesmo ter mostrado seu altruísmo, sua boa ação

inconscientemente tratava-se da ação de seu ego para que ele realizasse seu

destino de tornar-se um Jedi. Qui-Gon o libertou sem o mesmo saber e lhe

ofereceu a oportunidade de deixar seu planeta para tornar-se um Jedi. Pode-se

dizer que Qui-Gon acoplou na boa ação de Anakin, de forma inconsciente para o

mesmo, sua libertação e escolha de partir, o que configura o ato de ajudar a nave

como a abertura do self para o ego tornar-se um Jedi.

A naturalidade do “encaixe” entre a ajuda de Anakin e a necessidade de

ajuda da nave, além de poder ser concebida como “força do destino”, por

espontaneamente ter se dado à completude para se prosseguir a jornada, tal

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realização do destino, pode ser associado à realização de uma demanda do self,

correspondente ao processo de individuação.

Na mitologia, o destino é o que os deuses esperam dos homens, realizá-lo

é atingir o sagrado dentro de si e elevar a existência ao nível de excelência. Na

Psicologia Analítica, o self é a totalidade do sujeito, correspondendo

simbolicamente ao sagrado e aos deuses. O ato de realizar o self configura o

processo de individuação, que é o tornar-se si-mesmo, enquanto personalidade

superior potencialmente acessível ao ego. Pode-se traçar uma semelhança entre

a expressão: “realizar o destino”, e o conceito do processo de individuação.

Qui-Gon em uma fala comenta com a mãe de Anakin: “Deve orgulhar-se de

seu filho. Ele faz sem esperar recompensa”. A mãe lhe responde: “Ele não

conhece a ganância. Ele tem...”. Qui Gon completa sua fala: “Tem poderes

especiais. Prevê as coisas antes que aconteçam. Daí seus reflexos. É uma

característica Jedi”. A mãe lhe diz: “Merece vida melhor que a de escravo”. Qui

Gon: “Se tivesse nascido na República nós o teríamos identificado. A Força é

estranhamente poderosa dentro dele”.

Anakin estava cumprindo etapas de seu desenvolvimento concomitante

com a realização de seu destino e individuação, ele fazia suas boas ações sem a

ganância, que ainda não conhecia, mas sim motivado pela sua ligação e mesmo

identificação com o self. Uma vez correspondendo com os conteúdos advindo de

seu self e inconscientes, é que Anakin inicia sua trajetória, que o levou a ter que

abandonar sua mãe e partir para o mundo. O processo de realização do destino,

associado ao cumprimento do processo de individuação, pode ser referido como a

realização do si mesmo orientado pelo self, concomitante com o seu próprio

processo de desenvolvimento e amadurecimento. O processo de amadurecer é

uma conseqüência de viver no tempo, as realizações feitas no passado estruturam

a consciência do presente.

Anakin, assim como todo ser humano, desenvolve-se com o tempo, e

supera etapas de amadurecimento. No entanto, cada indivíduo tem sua própria

aptidão para amadurecer e corresponder ao “seu próprio” self. Anakin capta, dá

vazão e cumpre os conteúdos advindos de seu inconsciente. Seu ego até então

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apenas realiza o que lhe é inconscientemente dirigido, levando-o ao encontro com

o problema da nave que transportava os Jedi e a Rainha Amidala.

Anakin deu-lhes uma alternativa para que eles conseguissem dinheiro para

as peças que faltavam na nave, o que lhe rendeu inconscientemente sua partida

para o mundo.

A dinâmica de Anakin de participar da resolução da história demonstra sua

aptidão para realizar as demandas do self, visto que o mesmo desempenha várias

tarefas que por fim lhe abrem um caminho.

A característica de ser o escolhido predestina Anakin a ser diferente e o

assemelha a uma variada gama de possibilidades de herói, seja messiânico, como

já mencionado, seja redentor, seja guerreiro, de qualquer forma que Anakin se

desenvolvesse, necessariamente lhe seria incumbida a realização da profecia.

Anakin fora de forma inesperada colocado diante do chamado para a

aventura e responde como naturalmente apto. O mesmo mostrava qualidades

especiais, como seu dote para piloto de Pod, para consertar coisas e ajudar os

outros sem desejar nada em troca.

Seu gesto heróico e primeira grande façanha foi participar e vencer a

perigosa corrida de Pod, que lhe rendeu o prêmio das apostas e que pagou as

peças da nave. No entanto, Qui Gon apostou, sem o conhecimento de Anakin, sua

libertação e ganhando a corrida ele passou a não ser mais um escravo.

Qui-Gon desempenhou o papel do inconsciente do herói, ele planejava um

futuro para posteriormente oferecê-lo para Anakin.

Depois de feita a sua primeira grande façanha e benfeitoria heróica,

enquanto Obi Wan encaminhava o conserto da nave, Qui Gon foi até Anakin na

presença de sua mãe e anunciou a libertação e escolha de se tornar um Jedi.

Tal passagem foi um marco para Anakin, pois ele teve que fazer uma

escolha que mudaria seu destino. Apesar de o ego ser permissívo à influência do

inconsciente, o qual pode indicar qual escolha se fazer, desta vez, a escolha tinha

um alcance maior, pois tinha como conseqüência que o mesmo abandonasse seu

planeta e entrasse na instituição dos Jedi. Foi uma escolha que teve que ser

selada com o ego, o que implica a conseqüência de separar-se do inconsciente,

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responsabilizando-se agora o ego, que passa a assumir o controle paralelamente

ao inconsciente, que até então o guiava. O ego passou então a ser solicitado para

uma nova fase na qual o mesmo passaria a governar. Anakin até então seguia sua

vida conforme seu inconsciente lhe indicava, mas com essa escolha ele passou a

viver a partir de seu ego, pois ele havia abandonado sua condição inicial, saindo

do planeta Tatooine e da companhia de sua mãe. Tal saída representa a

separação primordial do ego com o self.

A separação do ego com o self, poderia ser descrita como o primeiro passo

para o processo de individuação. O self é o estágio inicial da psique, aonde não há

consciência e tudo é inconsciente. O ego deve emergir do self para se constituir o

eu, fundando-se assim a consciência. Tal separação é necessária para se dar o

desenvolvimento psíquico, o ego é uma estrutura que deve entrar em

funcionamento para que o indivíduo possa exercer sua vida de forma autônoma. A

permanência no self é a vivencia da totalidade, aonde não há o eu nem o outro,

aonde não há a escolha nem a individualidade, pois tudo é dissolvido na totalidade

e ordenado pelo self. No entanto, dentro do self contém o ego, o qual deve

emergir e se separar do self; ainda que invariavelmente o ego seja submetido ao

self, o mesmo pode exercer sua autonomia. Anakin estava identificado com o self,

mas escolheu partir e deixar sua mãe e seu planeta de origem, o que implica em

uma conseqüência e limitação que não cede ao seu desejo. O ego é uma parte do

self, logo compartilha da totalidade e completude do mesmo, mas levando uma

vida conscientemente limitada pelas suas escolhas, ao ponto que o self não tem

uma vida limitada pelas escolhas pois ele é a totalidade intemporal. O ego é o eu

que vive no tempo, na sucessão dos momentos presentes, enquanto que o self já

contém o futuro, o passado, o nascimento e a morte, ou seja, a totalidade do

sujeito.

Anakin escolheu ser um Jedi e partiu com Qui Gon para realizar sua

jornada e sonho. Anakin fala logo quando conhece Qui Gon sobre o sonho que

teve, no qual ele era um Jedi que libertava os escravos de seu planeta. Pode-se

destacar esse conteúdo profético em seu sonho, de ele ser um Jedi, fato que

ocorreu posteriormente, apesar de ele nunca ter voltado para Tatooine para

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libertar todos os escravos, visto que um Jedi segue as missões a ele passadas e

não traça suas próprias missões ou criações. Semelhante a um Samurai, um Jedi

tem um profundo compromisso em servir a Força e não aos seus próprios desejos.

Ainda assim, Anakin mostra ter uma conexão direta com seu inconsciente, uma

vez que ele colhe em seus sonhos suas futuras realizações, de forma que ele

realiza o que é inconscientemente esperado dele. Além de um guerreiro, piloto e

altruísta, todos seus dotes e feitos se apresentam precocemente. Tal precocidade

mostra sua excepcionalidade, o que é uma característica padrão do herói

mitológico - a de apresentar precocemente talentos excepcionais.

Anakin iniciou sua individuação de forma conivente com a atitude Jedi, de

corresponder à Força, e não conforme seu bel-prazer. O seguir a Força e não

seus próprios desejos podem ser associados ao processo de individuação, no qual

o sujeito deve seguir seu self e não seu ego, como será visto adiante quando o

mesmo abandona sua mãe.

Anakin mostra sua relação próxima com self ao se referir ao seu sonho. Os

sonhos são conteúdos advindos do self, com o propósito de nortear o ego. Anakin

aos dez anos parece já estabelecer uma relação madura com seus sonhos,

tratando-os como conteúdos sagrados constituídos pelo e para o sujeito, o que

mostra um dote psicológico do mesmo, de explorar seus recursos internos

mantendo-os em contato e ligação com sua vida externa. Tal característica atribui

a Anakin qualidades de herói com talentos psicológicos, pois sabe expressar e

realizar suas próprias demandas internas.

Os sonhos são produções do self, que contém as demandas do self, como

orientações a serem cumpridas em prol do processo de individuação. Anakin

mostra ter um elo fortalecido com seu self, pois estava realizando o que seu sonho

lhe tinha dirigido.

Anakin, por ter seguido o caminho que se abriu naturalmente para ele,

possui legitimidade e direito de estar ali. Apesar da possibilidade de ele não ser

aceito pelo mundo, ainda lhe resta seguir sua ordem interior. O mesmo não fora

induzido pelo por seu bel-prazer ou pela arbitrariedade do ego a chegar ali, visto

que ele se lançou ao chamado para a aventura, estruturado pelo self,

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abandonando sua mãe e planeta, para realizar-se enquanto personalidade

heróica. Anakin não pesou as suas possibilidades para fazer sua escolha de se

tornar ou não um Jedi, não escolheu de forma racional, apenas de acordo com a

consciência do ego, mas sim se deixou levar por algo que sentia que devia fazer.

Tal disposição de cumprir com seu senso de dever é outra característica que

identifica Anakin com o herói mitológico e o assemelha a um sujeito em processo

de individuação, uma vez que o mesmo faz inconscientemente a realização de seu

self, enquanto herói cumprindo seu destino e etapas de desenvolvimento. Sendo

assim, Anakin possui um vínculo com seu self, capaz de orientá-lo em sua vida

para o caminho do herói, de superar as provas, ampliar sua consciência e realizar

o seu destino.

No processo de individuação, o ego corresponde-se com o self, abrindo

mão de seu próprio desejo para realizar a demanda do self. Sendo assim, Anakin

iniciou sua individuação, igualmente de forma precoce, indicando sua

característica heróica associada ao processo de individuação, sendo tal traço uma

das muitas qualidades precoces que compõem esse herói.

Quando a nave fora atingida, foi Obi-Wan quem sugeriu o planeta Tatooine

para se fazer os reparos. Obi-Wan direcionou a nave para lá, logo o mesmo

estava ligado diretamente ao destino do herói Anakin.

Obi-Wan, como demonstrarão os outros filmes, é um personagem

intimamente ligado a Anakin. No final do episódio I, devido à morte de Qui-Gon,

Obi-Wan assume o papel de Mestre de Anakin, o escolhido.

Anakin mobilizou o seu ego de forma a realizar suas transformações e

atendendo ao chamado para a aventura. Ele teve que se despedir da sua mãe,

selando conscientemente seu destino de não saber quando voltaria a vê-la.

A partida do herói:

Anakin abandonou sua mãe, que por sua vez o incentivou a ter coragem

para tal. A mãe o incentiva a realizar-se, dando-lhe a escolha.

A escolha foi a invocação do ego de Anakin, que a partir de então estaria

separado do self. Anakin escolhe e Qui-Gon pede-lhe que arrume rápido suas

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coisas para partirem. Ele se despediu sem dificuldades de seu dróide C3PO e

então despediu-se de sua mãe, que não colocou barreiras para que seu filho se

fosse para ganhar seu mundo e realizar-se enquanto pessoa e herói. A mãe

conformou-se de que sua parcela na criação do herói estava encerrada e o deixou

partir. Após sua partida, ele foi estabelecendo novos laços com o mundo que se

abria, para dessa forma suplantar o abandono da mãe, planeta de origem e self.

Anakin, não mais identificado com o self, estava agora contando com seu ego.

Sua vida passada que lhe remetia ao mundo materno e self, que agora não mais

lhe ofereciam proteção e aconchego, pois agora tudo dependia dele mesmo,

enquanto ego responsável por suas ações e conseqüências. Geralmente o esforço

de partir e romper os laços familiares parte do herói, que usa a energia desse

arquétipo para se impulsionar para o mundo, vencendo a mãe possivelmente

dominadora ou super-protetora e cortando os laços. Anakin teve o mesmo destino,

mas de forma diferente, não a partir de sua vontade de romper os laços maternos,

mas sim se agarrando à oportunidade de partir. Ao partir com Qui Gon, Anakin

pára e olha para trás, para sua mãe que o observava partir. Anakin volta correndo

para abraçá-la e diz: “Eu não posso. Não posso, mamãe. Eu verei você outra

vez?”. Sua mãe responde: “O que diz o seu coração?”. Anakin responde: “Espero

que sim. Sim. Creio eu”. A mãe lhe responde sorrindo: “Então nos veremos outra

vez”. Anakin: “Virei libertar você, mamãe. Eu prometo”. Sua mãe o acaricia e diz:

“Agora, seja corajoso... e não olhe para trás. Não olhe para trás”. Anakin então

parte e sua mãe fica por se consolar com a partida necessária e padrão do destino

do herói.

Anakin, diferente do padrão do herói que deixa para trás as experiências

ultrapassadas, deseja ver sua mãe de novo, o que configura sua saída do

ambiente familiar marcada pela falta e desvinculação com a mãe de forma

dolorida. O mesmo ainda promete salvar a mãe, a primeira promessa de seu ego.

No entanto, o ego não tem o mesmo poder que o self, logo pode-se denunciar o

primeiro ato de hybris de Anakin, por se pensar capaz além de suas limitações.

Anakin, motivado por suas emoções, assume a postura do ego inflado para

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separar-se do self, prometendo libertar sua mãe por pensar ser uma capacidade

de seu ego.

Para o ego se separar do self, ele deve assumir uma posição inflada, no

qual se sente livre e tão poderoso quanto o self. Sendo assim a hybris de Anakin

foi uma expressão necessária para que ele pudesse suprir sua carência emocional

de perder a companhia da mãe, ele concebeu-se com o poder de voltar e libertá-

la, e então partiu.

Qui-Gon e a Rainha Padmé Amildala foram duas pessoas que estavam

inconscientemente designadas ao herói. Foram duas personalidades que

influenciaram o herói, que por sua vez manteve-se, como mostra o filme,

intimamente vinculado aos dois. Ele futuramente se casa com a Rainha Amidala e

permanece sendo um Jedi, inconscientemente vinculado a Qui-Gon, que o lançou

para esse destino, mesmo tendo morrido antes de Anakin ter sido oficialmente

aceito na Ordem dos Jedi. Estas são as duas figuras positivas que participaram

da retirada de Anakin do self e presença da mãe. Tais figuras foram importantes

estímulos que impulsionaram a partida do herói, pelo fato dele ter se sentido

seguro e acolhido para partir na companhia dos mesmos. Pode-se dizer que essas

duas figuras carregaram a projeção de Anakin de seu mundo materno, onde

existia o amor, segurança e totalidade, ou seja, características do self, diferente do

ego, que é marcado pelo conflito e insegurança.

Enfrentamentos do herói:

Anakin parte com Qui Gon; próximos da nave, Qui Gon corre seguido por

Anakin. Anakin grita para Qui Gon que o espere, pois está cansado, Qui Gon se

vira e vê um guerreiro negro se aproximando rápido em uma moto voadora. O

guerreiro negro é Darth Maul, discípulo de Sidious. Os dois lutam com seus sabres

lasers e Anakin corre para a nave. A nave passa com a porta aberta por traz de

Qui Gon e ele pula na nave fugindo.

Tal aparição do Sith foi finalmente revelada nos momentos antes de Anakin

chegar à nave. Anakin, ao se aproximar da nave, já passou por um grande perigo

e por uma revelação de consciência aos Jedi, visto que os Sith não apareciam há

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milênios e eram tomados como inimigos que deixaram de existir. Essa passagem

mostra que na partida do herói já se lançam grandes perigos e revelações

coletivas de ampliação de consciência.

O herói atualiza e aumenta a sua consciência, contribuindo para o aumento

de consciência do coletivo. Segundo BRANDÃO (2002: 20), o herói alavanca um

processo de transformação de consciência, suprindo as deficiências psíquicas de

seu grupo ou comunidade. CAMPBELL (1997: 27) cita os enfrentamentos que se

dão logo na saída do herói, perigos e dificuldades que o mesmo tem que enfrentar

antes de embarcar na aventura.

Anakin, durante a viagem para Coruscant, fica isolado num canto, quando é

atendido por Padmé. Anakin lhe dá um colar que ele mesmo esculpiu, dizendo que

é para que ela se lembre dele. Tal presente de Anakin tem o propósito de

simbolizar o vínculo dele com Padmé. Anakin lhe revela estar sentindo falta de

sua mãe.

Tal sentimento de falta logo ao abandonar a mãe foi uma manifestação

interna de Anakin que o mesmo acolheu em si; o herói geralmente não sente a

falta, pois é lançado ao mundo pelo propósito de abandonar a mãe, energizado

por tal superação e sendo rapidamente absorvido por outras questões. No

entanto, no caso particular de Anakin, deu-se a falta e ele se envolveu com seu

estado interno despertado, acolhendo-o e sentindo-o, visto que partiu tendo que

abandonar a mãe e não para abandonar a mesma. As ligações do herói com os

seus conteúdos internos mostram um vínculo real do mesmo, que o afeta e o

orienta, tornando-o intrinsecamente ligado ao seu estado interior. Anakin tem a

característica de corresponder ao seu estado interno, sendo sensível e implicado

consigo mesmo. Pode-se dizer que o ego, ao se desvincular do self, mantém-se

uma grande apreensão interna, buscando reconectar-se ao self, criando-se assim

o eixo ego-self, eixo que faz a ligação de Anakin com seu self, representado pela

sua infância em Tatooine e relação com a mãe. O sentimento de falta de Anakin

lhe permite manter o vínculo que integra sua personalidade, conectando-o com

seu passado e origens, e organizando-o para absorver o presente e o futuro,

mantendo sua essência originária.

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Segundo EDINGER (2000: 33), a separação do ego com o self, é

impulsionada pela atitude inflada do ego, e deve suceder para o estado de

alienação, aonde o ego perde a identidade com o self. O processo de alienação é

expressado pelo sentimento de perda, de abandono do self. Tal estado deve se

processar de forma sutil, para que assim se mantenha um eixo que liga o ego com

o self, o eixo ego-self, fundamental para se dar a vida criativa para o ego,

enriquecendo-o com características do self.

No entanto, como logo será visto, o sentimento de falta não é bem recebido

pela Ordem Jedi, que consideram o apego como um impasse para o

desenvolvimento. O sentimento de perda desperta o medo na Ordem Jedi. Para

tanto eles usam do tabu de não sentir a falta, pois a mesma é uma passagem para

o lado negro da “Força”. O tabu, segundo EDINGER (2000: 60-61), é uma

proteção contra a possibilidade de inflação do ego, que acarretaria uma

penalidade dos deuses ou do self.

Enquanto o Senador Palpatine arquiteta seu golpe para se tornar

Chanceler, os Jedi vão ao Conselho reportar a aparição do Sith. O Conselho

responde ao apontamento de Qui-Gon dizendo: “Impossível. Os Sith foram

extintos há milênios. Não creio que os Sith tivessem voltado sem nosso

conhecimento. Difícil ver o lado negro (diz Yoda). Usaremos nossos recursos para

desvendar o mistério. Descobriremos o agressor. Que a Força esteja com você”.

Os Jedi fazem uma saudação por ter sido encerrado o assunto e Obi-Wan se

retira, mas Qui-Gon permanece no lugar e conta sobre a revelação do escolhido,

pedindo-lhe treinamento.

Todos do Conselho ficam mobilizados ou assustados com a noticia e

marcam uma sessão só com o garoto.

Enquanto Palpatine realiza seu golpe de destituir o Chanceler para criar-se

eleições, Anakin é testado pelo Conselho Jedi. Um membro do Conselho diz a

Anakin que seus pensamentos se voltavam para sua mãe. Anakin responde:

“Sinto falta dela”. Yoda lhe diz: “Medo de perdê-la, não é?”. Anakin lhe responde:

“O que isso tem a ver com o resto?”. Yoda: “Tudo. O medo é a trilha para o lado

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negro. O medo leva à raiva. E a raiva leva ao ódio. O ódio leva ao sofrimento.

Sinto muito medo em você”.

À medida que o ego emerge e vive sua vida, cria-se a sombra, que no caso

de Anakin, voltava-se para o desejo de libertar sua mãe. A sombra é composta

das nossas não aceitações e não realizações. Anakin já tinha uma promessa para

realizar, e tinha seus sentimentos de perda. Tal situação interna de Anakin

despertou insegurança no Conselho Jedi, que não se sentiu confortável com a já

explicitada sombra de Anakin. O Conselho sentiu-se assombrado com o futuro de

Anakin, e projetou no mesmo suas próprias sombras, referentes a ter que

enfrentar o lado negro da Força. O medo em relação ao futuro de Anakin estava

contido na sombra de cada membro do Conselho, que estavam acomodados com

suas vidas como elas estavam. A presença e possibilidade de inclusão de Anakin

ameaçou a estrutura interna do Conselho, remexendo os conteúdos sombrios dos

mesmos.

Anakin não tinha medo em relação a seu futuro, tinha apenas o desejo de

rever sua mãe; no entanto, ao lidar com o Conselho, Anakin deparou-se com a

sombra dos Jedi, que não aceitavam a presença do medo. Pode se dizer que o

medo é a sombra do Conselho Jedi, visto que eles não aceitam a presença do

mesmo. Para Anakin, o medo provavelmente se tratava de um problema pessoal,

que cada um teria que lidar e superar. No entanto, ele viu que para a Ordem Jedi,

não era permitido o medo, pois senão ele seria rejeitado.

A rejeição da Ordem Jedi em aceitar Anakin fora um enfrentamento pelo

qual ele passou, pois teve que lidar com a insegurança e rejeição do Conselho em

relação à sua pessoa, assim como lidar com o medo e insegurança em relação ao

seu futuro, que dependia da Ordem Jedi. O Conselho defendeu-se com

formulações a respeito da subjetividade de Anakin: a tarefa de aceitação do

escolhido tocou conteúdos sombrios do Conselho, ameaçando as crenças nos

quais ele se baseava. O escolhido, como eles estavam avaliando, teria que

futuramente enfrentar seus medos, que correspondem aos medos do Conselho,

eles não aceitaram tal desafio e recuaram como forma de manter o status quo. A

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possibilidade de confronto com o lado negro da Força, ou, a ameaça de ter que

lidar com tal questão, serviu de fundamento para se rejeitar Anakin.

Obi-Wan proclama para Qui Gon sobre a insistência do mesmo em treinar o

garoto e o questiona quanto ao mesmo não seguir o código Jedi. Qui Gon diz para

Obi-Wan que ele ainda tem muito o que aprender. Posteriormente, antes de

retornarem a Naboo, Obi-Wan reluta sobre a atitude de Qui-Gon, dizendo que o

menino era perigoso. Qui-Gon o repreende e diz que o destino do mesmo era

incerto e que ele não é perigoso.

A projeção da sombra do Conselho sobre Anakin contou com o apoio de

Obi-Wan, que logo se identificou com o Conselho. Apenas Qui-Gon não projetava

sua sombra em Anakin, mantendo apenas a projeção de ele ser o escolhido, logo

ter que se tornar um Jedi.

A passagem destacada acima mostra a resistência de Obi-Wan em relação

a seu mestre não seguir o código ou o Conselho Jedi, mostrando uma opinião

própria e que diverge da de seu Mestre, não compactuando com o mesmo em

relação à Anakin. Não seguir o Código ou o Conselho, são conteúdos sombrios de

Obi-Wan, visto que ele se identifica com o cumprimento padrão da Ordem Jedi,

não recebendo bem qualquer ação que discorde do Conselho.

Palpatine se candidata a Chanceler, aproveitando-se de sua influência com

os problemas da rainha Amidala que foram denunciados no Senado. Amildala

decide voltar para Naboo para aliar-se com os Gungans e combater a invasão.

Anakin volta ao Conselho acompanhado por Qui-Gon e Obi-Wan. O Conselho

afirma que a Força é forte em Anakin, mas que seu futuro não estava claro,

portanto ele não seria treinado. Qui-Gon mesmo assim o aceita como discípulo e o

Conselho adia a resolução, visto que a Rainha precisaria ser protegida ao voltar

para Naboo, e que eles deveriam investigar sobre o mistério dos Sith.

Anakin teve entraves e dificuldades no caminho, que são as provas que o

herói deve superar. No caso dele, sua prova foi a não aceitação da Ordem dos

Jedi e a turbulenta situação da revelação do Sith. Tal cenário de chegada lhe

mostrou a existência de outras prioridades à frente da resolução de seu destino. O

ataque a Naboo e influência dos Sith, que em suas decorrências libertou Anakin e

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configurou sua situação de chegada, da mesma forma, tiveram influência na

resolução do Conselho sobre Anakin, que foi adiada devido ao retorno para Naboo

e devido à necessidade de se investigar o mistério de Sith. Anakin foi encaixado

em seu destino devido a um desvio de trajeto da nave da rainha Amilada; após

sua inclusão na nave ele prosseguiu sendo levado pelas situações despertadas

com sua vinda.

Anakin foi sendo levado pela aventura até se dar o desfecho da mesma,

que por fim deu-lhe a resolução em relação ao Conselho Jedi. O herói

permaneceu dentro da aventura, “sendo levado pela Força”, até se concluir um

ciclo, para após renascer uma nova fase.

CAMPBELL (1997: 27), faz a relação do herói com a dinâmica de ascensão

e desintegração das civilizações, fio que percorrerá toda a trajetória de Anakin nos

filmes. O autor cita que apenas o nascimento pode salvar a morte, sendo que para

se darem as transformações sociais, deve emergir o novo e não uma reprodução

de algo antigo. A transformação é o que liga o futuro com o passado, é a mudança

e o fechamento de um ciclo. O autor cita que o herói é aquele que está envolvido

nesse processo trazendo o novo para dar-se a transformação. Anakin

acompanhou uma grande mudança, sua presença e participação na trama

desencadearam o nascer de uma nova fase.

Grande feito do herói:

Ao chegarem em Naboo, Obi-Wan pede desculpas para seu Mestre,

dizendo que não cabe a ele discordar sobre o garoto. Qui-Gon contenta-se e

aponta qualidades de seu Padawan.

Sidious envia seu aprendiz Darth Maul para junto do vice-rei da Federação

do Comércio. Sidious, “disfarçado” de Palpatine, ficou sabendo diretamente pela

rainha Amidala que a mesma iria retornar a Naboo. Darth Maul é enviado para ser

o difícil adversário dos Jedi e para garantir rendição de Naboo para a Federação

do Comércio. Palpatine ou Sidious sempre enreda a trama colocando as

dificuldades e fatalidades a serem decorridas.

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Anakin foi uma importante peça para a vitória da batalha entre os gungans

e os dróides. Qui-Gon mandou que ficasse na nave-caça para se proteger. No

entanto, Anakin quis ajudar Padmé e seus guardas que estavam sendo atacados

por dróides. Ele usa a arma da nave para destruir os dróides que atiravam em

seus aliados e, ao mexer no gatilho, ativa a nave para ir junto das outras, que

estavam guerreando na órbita do planeta contra as naves dróides. Anakin é

levado até o local e com apenas um tiro certeiro e ao acaso, destrói a base

espacial, vencendo a guerra, já que o alvo que atingiu era o reator principal de

energia que mandava sinal para todas as unidades dróides.

O tiro certeiro e ao acaso de Anakin, de destruir o alvo que canalizava toda

a energia do conflito, demonstra a qualidade de redentor do mesmo, de encerrar o

conflito e trazer a ordem. Anakin tem a predisposição para atingir tal alvo de forma

inconsciente.

Cada personagem teve uma participação fundamental para se dar o

desfecho do filme. Tal arranjo eficiente que supriu todas as demandas que

advieram, superando-as, pode servir como analogia da organização interna, que

quando tendo todos seus elementos articulados, configuram a condição ideal para

o processo de individuação, e para desempenhar de forma bem sucedida os

enfrentamentos e dificuldades.

Enquanto a rainha Amidala emboscava o vice-rei da Federação do

Comércio para forçá-lo a um acordo de rendição e Anakin vencia as unidades

dróides, Qui-Gon e Obi-Wan lutavam conjuntamente contra Darth Maul. No

entanto, Qui-Gon não aguardou Obi-Wan para combater Maul, lutando contra o

mesmo sozinho. Qui-Gon é fatalmente ferido pelo adversário, Obi-Wan então o

substitui em combate. Obi-Wan se encontrava pendurado em um poço e Maul

bem mais acima, já se dando como vencedor, ficando apenas a observar a

desvantagem de Obi-Wan. A despreocupação de Maul foi sincronizada com a

bravura de Obi-Wan de saltar por cima do mesmo, atraindo a espada de Qui-Gon

às mãos e matando-o. Diferente do que ocorre no episódio III, quando Anakin

tomado por fúria cega (hybris) e alertado por Obi-Wan a não tentar, salta por cima

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de Obi-Wan e tem seus membros decepados. Tal passagem será vista mais

adiante.

Após a resolução do conflito e durante o despache do vice-rei da Federação

do Comércio, tido como responsável por todo o conflito, chega o recém-eleito

Chanceler Palpatine, ainda encoberto Darth Sidious, que parabeniza a todos pela

vitória e mostra seu interesse por Anakin. Chega a personalidade responsável por

todo o mal para prestigiar a vitória do bem, ficando disfarçado entre eles e já

interessando-se por Anakin.

A chegada do herói não transcorreu para uma situação acolhedora,

tampouco obteve uma atenção exclusiva. Ao contrário disso, a história se

encaminhou para sua resolução, que foi a morte de Qui-Gon, a retomada de

Naboo, agora unida aos Gungans, e a revelação da existência do Sith. Neste

desfecho, atendendo aos desejos de Qui-Gon e a persistência e lealdade de Obi-

Wan, deu-se a aceitação de Anakin na Ordem dos Jedi como sendo o escolhido.

Final do Filme:

Obi-Wan se propõe a treinar Anakin devido ao fato de ter dado sua palavra

a Qui-Gon, antes do mesmo morrer. Ao matar Maul, Obi-Wan corre e toma seu

Mestre ainda vivo em seus braços, que lhe diz: “Obi-Wan... Prometa... Prometa

que treinará o garoto”. Obi-Wan: “Prometo, Mestre”. Qui-Gon: “Ele... é o escolhido.

Ele trará o equilíbrio. Treine o garoto”.

Mesmo a contragosto, Yoda aceita Obi-Wan como Mestre de Anakin

Skywalker. Yoda adverte sobre um grande perigo no treinamento do escolhido e

diz que sente em Obi-Wan o desafio de Qui-Gon e que acha isso desnecessário,

mas mesmo assim ele cede.

É feita a cerimônia de cremação de Qui-Gon, onde Obi-Wan diz a Anakin

que o Conselho aceita que ele o treine e lhe promete que ele será um Jedi. Diante

da morte de Qui-Gon, que deixou Anakin inseguro e preocupado com seu futuro,

abriu-se uma nova fase, na qual Anakin obteve a segurança de que seria um Jedi.

Obi-Wan passou de discípulo para Mestre e o Conselho se viu diante da

existência do Sith.

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No entanto, Anakin começou sua lista de perdas posteriores à separação

da mãe, com a morte de Qui-Gon. Foi uma perda significativa por ser a principal

figura que acompanhou e motivou a partida do herói. Qui-Gon o acolheu e lhe

abriu o caminho para ser um herói. Por mais que Anakin já tivesse os quesitos

fundamentais, foi Qui-Gon quem lhe propôs o caminho do herói, permitindo assim

a realização de sua potencialidade. Se não fosse pela intervenção de Qui-Gon, tal

potencialidade se desenvolveria de outra forma, engendrada pelo self ou pelo

próprio ego do herói. Qui-Gon ofereceu o convite para a aventura no momento em

que Anakin estava pronto para partir e no contexto sincrônico da abertura do self.

Obi-Wan, assim como o Conselho, advertiram sobre Anakin ter passado da idade

padrão para se efetuar o treinamento. Mesmo assim, perante muitas

contrariedades, Anakin foi aceito.

O filme se encerra com a cerimônia da união entre Naboo e o povo

Gungan, momento em que Anakin, ao lado de seu Mestre Obi-Wan, já se encontra

com as vestimentas e o corte de cabelo padrão do Padawan, aprendiz de Jedi.

Anakin sorri flertando com Padmé, que corresponde, e então o filme termina.

O filme retrata as memórias iniciais que compuseram a chegada do herói.

As passagens e enfrentamentos do mesmo configuraram seu mundo interno,

criando seus complexos e traçando sua origem, a partir do que serão contrapostas

suas futuras experiências e elaborações, pois o filme foi uma passagem da vida

do herói que determinou sua noção de realidade. Os desafios do herói ficaram por

ser superados, pois dependiam não apenas dele,

mas também do coletivo, no caso, a Ordem dos Jedi. Anakin desenvolveu seu

complexo materno, pois abandonar sua mãe contou com seu primeiro conflito: ele

optou por partir para desenvolver-se enquanto herói, mas tal experiência

despertou-lhe conteúdos emocionais, os quais posteriormente foram reprimidos

pelo Conselho Jedi. A prova que Anakin ficou por superar foi sua relação com o

Conselho Jedi. Que seria a base de uma troca de confiança? Ou que seria

pautada na desconfiança devido à repressão originária em relação à sua mãe? Tal

resolução apenas pode ser vista no futuro, no caso, no episódio II.

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Episódio II – O ataque dos clones:

O título refere-se ao ponto nodal da cisão da República, o ataque dos

clones, que levou a República à guerra e futuramente possibilitou a instauração do

Império. O filme começa na situação de desagregação da República, pois muitos

sistemas foram se desconectando, dificultando a Ordem Jedi de manter a ordem e

paz na galáxia. A Senadora Amidala engendrava um movimento contra a criação

do exército da República, motivo pelo qual Sidious encomendava atentados contra

a vida da mesma. O filme se passa dez anos adiante do filme anterior, quando

Senadora Amidala se dirige para Coruscant para votar contra o ato de criação

militar no Senado. No entanto, em sua aterrissagem, sua nave explode devido a

uma tentativa de assassinato, então são convocados dois Jedi para protegê-la,

Obi-Wan Kenobi e Anakin Skywalker.

Nesse episódio, são retratados alguns retornos, realizações de ciclos e

novos começos e mudanças. Anakin volta a ver Padmé e declara seu amor por

ela, volta a ver sua mãe e a enterra, perde seu braço direito e casa-se em segredo

com Padmé. São essas as atualizações feitas pelo herói, que retorna a algumas

questões despertadas no episódio I e inova sua situação de vida, que irá exigir um

novo retorno e atualização no episódio III. Pode-se dizer que cada filme

representa uma transformação e “curva do destino” que marcaram e definiram a

vida do herói.

O episódio II mostra a relação do herói com seu Mestre Obi-Wan Kenobi,

marcada pela prepotência e pelo seu desejo de independência. No mesmo

episódio, Anakin recebe suas duas primeiras missões desacompanhado de seu

Mestre. A primeira foi a de proteger a Senadora Amídala: ele a leva para o planeta

Naboo no intuito de exercer o papel de guardião. No entanto, ele faz mais que

isso, pois declara seu amor para ela, violando o Código Jedi. Além disso, Anakin a

leva para seu planeta de origem em busca de sua mãe, por sonhar repetidas

noites que ela estava sofrendo. Anakin, em sua relação com Padmé, realiza suas

próprias demandas sem o auxílio de seu mestre, expressando o sentimento de

prisão que o mesmo lhe desperta. Em sua segunda missão sozinho, ao final do

filme, ele escolta a Senadora Amidala até seu planeta, situação em que se casa

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em segredo com ela. A necessidade de ser um casamento em segredo é porque,

se o mesmo for revelado, Anakin não poderá mais ser um Jedi. Entretanto, ele

continua sendo um Jedi, cumprindo seu importante papel de guerreiro protetor da

República, e secretamente é casado por ter uma grande afeição por Padmé.

Anakin tem uma relação de admiração por Palpatine, de ambivalência com Obi-

Wan e de dependência amorosa e afetiva com Padmé.

Tais passagens serão posteriormente desenvolvidas e analisadas de forma

mais detalhada, conforme o transcorrer das cenas.

Palpatine foi quem encomendou o assassinato da Senadora Amidala e

quem recomendou que a mesma fosse colocada sob proteção de Mestre Obi-Wan

Kenobi e seu Padawan. Ele é a ameaça pela qual se convocou a missão para os

Jedi e também quem fez formalmente o convite para que os Jedi assumissem tal

missão. Sendo assim, ele é a causa da trama e da história, pois manipula suas

ações para realizar seus objetivos, manipulando as pessoas e dissimulando-se

como vítima; no entanto, é ele quem elabora todas as maldades. No episódio I, o

mesmo atrelou Anakin à trama, já relacionando-o a até então rainha Amidala, que

era o foco consciente das manipulações do ego do vilão. No episódio II, ele

configura uma trama unindo Anakin e Amidala novamente. No entanto, o interesse

de atrair Anakin tem como propósito jogá-lo contra os Jedi e aproximá-lo

inconscientemente dos Sith.

Todos os filmes podem ser interpretados como uma obra do Sith, que

maliciosamente arquitetou e realizou o destino de toda uma geração, o que pode

associar Anakin como sendo uma obra do mal, aquele que veio predestinado a ser

a ferramenta do mal, o que acabou acontecendo. A mera influência de Palpatine

na trama sempre finaliza em uma fatalidade. No episódio I, a fatalidade foi a morte

de Qui-Gon por seu discípulo Darth Maul. No episódio II, Palpatine prossegue

sendo o Chanceler, que diz estar tentando manter a ordem na República, mas é o

maior responsável pelo fortalecimento dos separatistas, agindo como Darth

Sidious. A fatalidade é o início da guerra dos Clones e o fortalecimento do vínculo

entre Anakin e Palpatine.

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No entanto, apesar das maldades de Sidious, as mesmas sempre revelam

coisas boas, como a revelação do escolhido, a oportunidade deste ver novamente

sua mãe, entre outras aberturas e possíveis fechamentos que foram

apresentados, advindos das tramas de Sidious. O bem e o mal se entrelaçam no

construir de uma história, são forças que fazem se chocar os conflitos e se

processar as resoluções. Sidious é aquele que é dedicado a fazer o mal, ele

trabalha constantemente para configurar o cenário mundano em um caos para

assim obter mais poder e futuramente governar sua própria ordem na figura de um

ditador.

O sistema político, o Conselho Jedi, o Senado e a República representam a

ordem vigente, na qual os cidadãos vivem protegidos pela justiça, sustentada pelo

Senado e pelos Jedi. Sidious, no final do episódio III, destrói o sistema e instaura a

sua própria ordem, organizada em um império galáctico.

Situação interna e externa do herói:

Anakin é convocado junto de Obi-Wan para a missão de proteger a

Senadora Amidala. Tal situação o deixa ansioso devido ao mesmo ter sentido

muito a falta de Padmé e agora, finalmente seu serviço, reencontrou-a. Ao se

apresentarem à Senadora e se sentarem para conversar, Anakin diverge de Obi-

Wan, defendendo o dever de encontrarem o assassino, enquanto Obi-Wan

defende que o dever era apenas de proteção, como fora designado pelo

Conselho. Ele diz, repreendendo a atitude de Anakin: “Faremos exatamente o que

o Conselho determinou. Vai aprender a se comportar, jovem”. Obi-Wan reage

rigidamente com Anakin, considerando sua atitude desafiadora e descabida, o que

desponta uma relação conflituosa. De um lado, Obi-Wan, aquele que segue

devotamente a Ordem dos Jedi, e de outro Anakin, aquele que se deixa influenciar

por outras pulsões e devires advindos de seus sentimentos e ideais próprios.

A relação entre eles é diferente da que Obi-Wan tinha com seu Mestre, na

qual ele era devoto ao mesmo, que, por sua vez, assumia o lugar de Mestre com

excelência. Já a relação de Anakin com Obi-Wan não é tão formal e unilateral, o

que não impede que Obi-Wan exerça sua posição e autoridade; talvez pela

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diferença não tão grande de idade entre eles, foi possível uma relação mais

próxima e flexível. Anakin o tinha como Mestre, como pai e posteriormente como

irmão. Isso mostra uma relação na qual uma das partes pode mudar a qualidade e

o valor atrelado na relação, permitindo mudanças de projeções e

posicionamentos, renovando e atualizando o vínculo. Isso indica uma disposição

positiva de Obi-Wan na relação, visto que ele deixa à vontade seu pupilo para

expressar-se e estabelecer trocas de diferentes formas. Mesmo assim, devido ou

a uma característica de Obi-Wan, de não intervir ou contrariar, ou de Anakin, de

não respeitá-lo como Mestre, independentemente do motivo, Obi-Wan ocupava

uma posição passiva, apesar de sempre apontar ao seu Padawan todas as

limitações a serem respeitadas. A relação dos dois sugere uma maior abertura e

diálogo. No entanto, como será analisado mais adiante, Anakin mostrava-se

insatisfeito com tal relação, não usufruindo de tal abertura.

Obi-Wan deixava Anakin por conta própria, e Anakin usou dessa relação

para seguir suas pulsões internas e diferenças em relação à Obi-Wan.

Enquanto os dois fazem a guarda nos aposentos da Senadora, Obi-Wan diz

para Anakin que ele parece cansado, e ele lhe responde que não consegue mais

dormir. Obi-Wan pergunta se é por causa de sua mãe, Anakin meneia a cabeça

que sim e mostra-se insatisfeito de ainda estar sonhando com ela. Obi-Wan lhe diz

que os sonhos passam com o tempo, Anakin muda de assunto, dizendo que

preferiria sonhar com Padmé. Obi-Wan lhe adverte sobre o juramento de não

união amorosa prestado à Ordem Jedi, da dificuldade que seria quebrar esse

juramento e ainda comenta sobre Padmé ser uma política e que políticos não são

confiáveis. Eles debatem política e então a Senadora sofre um atentado que eles

conseguem impedir.

O diálogo deles sobre tal sonho mostra a qualidade de Obi-Wan de ser

atencioso ao reparar no cansaço de Anakin e deduzir que o mesmo não dormia

por causa de sua mãe. No comentário de Obi-Wan: “Sonhos passam com o

tempo”, ele aconselha Anakin a lidar com seu problema, pode-se inferir uma

tentativa de amansar Anakin e enquadrá-lo na Ordem Jedi, menosprezando seus

sentimentos e demandas por sentir a falta de sua mãe, demandas essas

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anteriormente já rejeitadas pelo Conselho no episódio I. Anakin muda o assunto

para seus sentimentos em relação a Padmé e Obi-Wan o coloca frente à realidade

do juramento prestado à Ordem Jedi, de forma amigável e franca, dando-lhe um

aviso sobre as conseqüências que ele enfrentaria se seguisse tal caminho. Anakin

em momento algum se abre com Obi-Wan, tendo em vista que age por si mesmo,

mostrando-se independente, não recorrendo ou procurando suporte em Obi-Wan.

No entanto, a forma de Obi-Wan colocar-se para Anakin, por mais agradável que

fosse, colocava Anakin frente às suas responsabilidades, pois Obi-Wan apenas

segue o Código Jedi, não se desviando do mesmo, e fornece amigavelmente para

Anakin apenas o mesmo suporte que tem para si, o Código Jedi.

Após os dois impedirem o atentado a Padmé, Obi-Wan lança-se

audaciosamente da janela para agarrar-se em um pequeno dróide voador, o que

indica um elo de confiança entre ele e Anakin, pois ele se jogou por saber que

Anakin o resgataria, e quando este o fez, Obi-Wan exclama: “Por que você

demorou tanto?”.

Obi-Wan e Anakin iniciam a perseguição do assassino após o atentado.

Anakin mostra coragem e habilidades elevadíssimas para tal captura, assim como

Obi-Wan, que igualmente mostra-se virtuoso. Porém, Anakin apresenta a

característica de ser extremamente ousado, o que perturba Obi-Wan. Exemplo

disso foi quando Anakin se lança do carro voador por intuir que o veículo que

perseguiam estava mais abaixo, que de fato estava. Ele agarra-se no veículo

perseguido o levando a fazer um pouso forçado. Obi-Wan suspira quando Anakin

inesperadamente pula do carro, dizendo: “Odeio quando faz isso”.

Quando Anakin perseguia ofegante a assassina que entrou num bar, Obi-

Wan grita para ele esperar e lhe entrega a espada que Anakin havia perdido

enquanto fazia o pouso forçado da nave da assassina. Obi-Wan lhe dá as

recomendações de ter paciência para encontrar a assassina, não indo tão

ofegante na busca, e diz para ele não perder novamente o sabre, dizendo em tom

bem humorado: “Essa arma é a sua vida!”. Eles entram no bar e Obi-Wan lhe

confessa: “Sinto que você vai acabar comigo”. Anakin lhe responde: “Não diga

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isso. Você é o mais próximo que eu tenho de um pai”. Obi-Wan: “Então, por que

não me ouve?”. Anakin: “Estou tentando”.

Tal diálogo expressa a situação entre ambos, na qual Anakin está tentando

adequar-se à relação enquanto Obi-Wan apenas deixa as coisas fluírem. A

irritação de Obi-Wan frente à audácia de Anakin aponta diferenças entre eles. Obi-

Wan expressa sua insatisfação com as divergências de seu Padawan, visto que

não concorda, tampouco entende as mesmas. As diferenças não reconhecidas

entre eles instauram uma relação de descompasso, na qual cada parte deverá

buscar em si mesmo entender o que representa o outro, visto que no contato

imediato ocorre uma comunicação desprovida de reconhecimento das diferenças.

No entanto, a relação entre eles é instituída como relação entre mestre e aprendiz,

na qual o mestre deve treinar e ensinar seu aprendiz.

Mesmo assim, para um Mestre poder instruir seu aprendiz, ele deve

primeiramente ver a individualidade do mesmo para então fornecer os

ensinamentos que lhe carecem. Sendo assim, independente da relação instituída

de mestre e aprendiz, é necessário o reconhecimento das diferenças e

individualidades. No entanto, as características de Anakin não se reduziam ao

Código Jedi, o que impediu que Obi-Wan reconhecesse as diferenças e

individualidade de Anakin, pois Obi-Wan adequava-se ao Código Jedi, e para

fornecer à seu Padawan uma completude, ele teria que não se ater apenas ao

Código Jedi, mas sim no ser Jedi que Anakin buscava. No entanto, Obi-Wan não

ajudou ativamente Anakin em seu processo de tornar-se Jedi, mas sim deixou

essa tarefa para o próprio Anakin. Ficando Obi-Wan, a conviver com Anakin, que

por sua vez deveria lidar com a Ordem Jedi por estar junto de Obi-Wan, a fim de

aprimorar-se até achar o seu lugar na Ordem Jedi.

O Conselho determina que Obi-Wan encontre o caçador de recompensas

que contratou a assassina e passa a função de proteger a Senadora para Anakin,

o que deixa Obi-Wan inseguro, pois era a primeira missão que Anakin recebia

sozinho. Mestre Windu ordena que Anakin vá ao Senado pedir para Palpatine

enviar Padmé para Naboo. Anakin vai até Palpatine, que começa a exaltá-lo

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enquanto sendo superior aos Jedi, dizendo que ele se tornaria o mais poderoso de

todos os Jedi.

Foi Mestre Windu quem proporcionou tal encontro, pois ele enviou Anakin

para a influência do desconhecido Sith, relação que Anakin já tinha proximidade,

devido que o mesmo já tinha um vínculo e admiração por Palpatine, no entanto tal

vínculo foi-se fortalecendo.

Obi-Wan conversa em particular com Yoda e Windu, dizendo achar que

Anakin não está preparado para essa missão. Yoda diz que o Conselho confia na

decisão de Obi-Wan, que por sua vez não volta atrás na missão de Anakin. Tal

passagem mostra uma contrariedade de Obi-Wan em deixar seu Padawan

desacompanhado dele ou especificamente nessa missão, o que indica que Obi-

Wan preferiria não enviá-lo para tal missão. No entanto Obi-Wan não intervém,

deixando Anakin ir, correspondendo ao desejo do mesmo e sendo passivo em

relação a seus próprios intuitos, deixando prevalecer a decisão do Conselho.

Palpatine saúda Anakin, dizendo que finalmente os Jedi lhe deram uma missão.

Ele faz isso com o propósito de fortalecer o lado de Anakin que quer separar-se de

Obi-Wan, destacando-o da Ordem Jedi.

Obi-Wan representava o aspecto de Anakin que treinava para se

transformar em um Jedi. No entanto, Obi-Wan deixa fluir segundo as decisões do

Conselho e da Ordem dos Jedi, confinando Anakin na mesma, que lhe serviam

como suporte. Anakin tinha em suas recordações primordiais a respeito do

Conselho e Ordem dos Jedi a rejeição à sua pessoa, como mostrou o episódio I,

em que o mesmo logo de chegada não é reconhecido e desperta insegurança e

desconfiança.

Anakin vai até os aposentos de Padmé para levá-la para Naboo. Ele a

consola, já que ela reclamava por ter que se retirar sem poder votar contra o ato

de criação militar. Ao ouvir Anakin, Padmé comenta para o mesmo que ele

amadureceu e Anakin lhe responde: “Só o Mestre Obi-Wan não percebe. Não me

entenda mal. Obi-Wan é um grande mentor. É tão sábio quanto Mestre Yoda... e

tão poderoso quanto Mestre Windu. Fico muito grato de ser aprendiz dele. Mas em

certos aspectos... em muitos aspectos... eu sou superior a ele. Estou pronto para

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os testes. Mas ele me acha muito imprevisível. Não me deixa ir adiante”. Padmé

lhe diz: “Deve ser frustrante”. Anakin responde: “É pior! Ele é muito crítico. Nunca

escuta. Ele nunca entende. Isso não é justo!”. Padmé lhe diz que os mentores

olham mais para nossos erros do que gostaríamos e que é assim que

amadurecemos. Anakin diz que sabe disso e Padmé lhe diz para que ele não tente

amadurecer muito rápido. Anakin então deixa-se levar por seu desejo amoroso por

Padmé e lhe diz que está amadurecido, olhando-a de maneira penetrante. Inicia-

se então uma atmosfera de intimidade entre os dois.

As falas de Anakin em relação à Obi-Wan, expressam sua necessidade de

reconhecimento. Ele aponta que só Obi-Wan não percebe o seu amadurecimento,

dizendo que já superou seu Mestre e que deseja deixar de ser um Padawan. Sua

relação com Obi-Wan lhe desperta o sentimento de prisão, que faz com que

Anakin se revolte. Quando ele diz que Obi-Wan nunca escuta e que isso é injusto,

pode-se destacar o tom exaltado de Anakin, o que indica conteúdos emocionais

que emergem de tal questão, configurando assim um novo complexo em Anakin.

Segundo SILVEIRA (2003: 30), os complexos são conteúdos psíquicos

carregados afetivamente e que exercem um funcionamento autônomo dentro de

nós, não partindo do ego. Os complexos atuam por meio de impulsos que levam o

sujeito a se comportar de determinada forma. Anakin começa a desenvolver um

complexo que se refere à sua relação com Obi-Wan, visto que quando evoca sua

relação com seu Mestre, ele se exalta e exprime fortes impulsos emocionais. Tais

impulsos e complexos estão contidos na sombra, visto que são inconscientes ao

ego. Por meio do dinamismo da sombra, os complexos permanecem sempre na

eminência de perturbarem o ego. Os complexos são criados tanto devido a

conflitos e traumas emocionais, quanto devido a emanações arquetípicas, que

seria a constelação no sujeito de um arquétipo, pertencente ao inconsciente

coletivo, logo acessível a toda a humanidade. SILVEIRA (2003: 33), diz sobre a

natureza desses complexos arquetípicos: “... feixes de forças contendo

potencialidades evolutivas que todavia, ainda não alcançaram o limiar da

consciência e, irrealizadas, exercem pressão para vir à tona”. Tais demandas

arquetípicas podem se tratar de grandes paradigmas da humanidade que se

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constelam em determinadas pessoas, funcionando como complexos à mercê da

compreensão do ego.

Anakin inicia uma relação com Padmé, mostrando já de início seu desejo de

troca de intimidade. Com Padmé, Anakin encontrará uma relação que não lhe

desperta o sentimento de prisão, despertado por Obi-Wan e a Ordem dos Jedi. A

Ordem Jedi impõe um código de conduta que Anakin já pretende quebrar em sua

relação com Padmé. Anakin se insinua sexualmente para Padmé, acentuando sua

diferença em relação à Obi-Wan. Como será visto adiante, Anakin assume a

personalidade do afoito enquanto Obi-Wan a do devoto.

Com Padmé, Anakin verbaliza pela primeira vez seus sentimentos e

indagações em relação à Obi-Wan, apesar de já ter sido possível notar alguns

entraves na relação; ele se expõe, pois a mesma fornece-lhe abertura para tal.

Essa nova relação de Anakin, com quem esperou dez anos para se reencontrar,

serviu-lhe como auxiliar para ele elaborar seus impasses. Com ela, ele sentia a

segurança e abertura para se expor, tal relação passou a ser um recurso para

Anakin procurar elaborar seus conflitos. No entanto, Padmé não exercia apenas

essa função de abertura e confiança para conversar assuntos pessoais, ela

também recebia a projeção do grande amor de Anakin. No episódio III, Anakin não

encontra mais em Padmé a função de abertura para elaborarb seus temas

emergentes, mas apenas o grande amor que jamais aceitará perder, como será

visto adiante.

Obi-Wan acompanha Anakin até o local onde ele iria embarcar com Padmé

e R2. Obi-Wan passa orientações para Anakin, dizendo-lhe: “Anakin, não faça

nada antes de consultar a mim ou ao Conselho”. No entanto, tanto Anakin quanto

Padmé já estavam empolgados com a viagem, não atentando muito para a

despedida. Obi-Wan mostra-se preocupado com as atitudes que Anakin poderia

ter em sua ausência. Anakin trata seu Mestre com desdém ao se despedir,

ouvindo as recomendações e preocupações do mesmo de forma impaciente e

irritada.

A partir de então, o filme se dá paralelamente, ora mostrando a missão de

Obi-Wan e ora a de Anakin. Isso nos faz entender o que um estava fazendo

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enquanto o outro fazia, mostrando-se o sincronismo entre eles, o processo e

experiência que cada um passou na ausência um do outro e como cada um deles

ocupou seu tempo, aprendizado e transformações. Serão destacados alguns

desses sincronismos abaixo, continuando na seqüência do filme.

Obi-Wan vai até o planeta Kamino, onde suas investigações o levaram. Lá,

ele revela as corrupções da República, que havia ordenado a criação de um

exército de clones sem o conhecimento do Conselho Jedi. Desta forma, Obi-Wan

desempenha o serviço de suprir a carência de informação da Ordem Jedi,

enquanto Anakin cria uma relação de trocas de intimidade com Padmé,

fomentando seu desejo de união amorosa. Anakin, mediante a responsabilidade

pela segurança da Senadora, procura exibir seu novo status, o que lhe rende um

constrangimento perante a rainha de Naboo, quando Padmé lhe retira sua suposta

autoridade, não deixando Anakin se gabar perante a corte.

Obi-Wan simula saber sobre o pedido de criação do exército enquanto

conversa com o primeiro ministro, procurando investigar e descobrir os dados

sobre o pedido de criação do exército e sobre o assassino por trás dos ataques à

Senadora. Obi-Wan se dirige ao desconhecido usando os recursos da

dissimulação para se extrair toda a informação de que precisa, ocultando sua

indignação perante a criação do exército e comportando-se como representante

da Ordem Jedi designado para inspecionar e checar os avanços da encomenda

feita. Enquanto isso, Anakin ruma ao desconhecido de si mesmo, seduzindo

Padmé e dando-lhe um beijo, que foi interrompido pela mesma. Anakin senta-se

no campo com Padmé, onde conversam, desfrutam da companhia um do outro,

divertem-se e rolam na grama agarrados.

Obi-Wan vai de encontro ao caçador de recompensas que havia contratado

a primeira assassina. O mesmo ficava hospedado em Kamino e Obi-Wan foi

surpreendê-lo. Os dois ficam cara a cara e Obi-Wan faz um interrogatório informal

e se retira para contactar o Conselho.

Enquanto isso, Anakin come à mesa com Padmé, conta suas histórias e

então usa a Força para levitar uma fatia de pêra e enviá-la ao outro lado da mesa

para Padmé, fazendo a “piadinha”: “Se Mestre Obi-Wan me pegasse fazendo isso,

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ficaria muito irritado”. Pode-se interpretar como uma “piadinha”, devido à

seriedade esperada de um Jedi perante o uso da Força e a forma como Anakin

usou a Força ao levitar a pêra - para impressionar Padmé.

Os dois vão para a sala, onde Anakin confessa seu amor e Padmé coloca a

impossibilidade do relacionamento, dizendo que apesar do que sentem um pelo

outro, ele não deveria sacrificar seu futuro por ela. Anakin responde: “Está me

pedindo para ser racional. É algo que eu sei que não posso fazer. Eu gostaria de

poder ignorar meus sentimentos... mas não consigo”. Ele propõe manterem um

relacionamento em segredo, ela discorda e ele concorda com ela, aceitando a

situação de não união entre os dois. Anakin, apesar de ter se mostrado impulsivo

para conquistar Padmé, tentando todas as possibilidades para tal, ainda assim,

mostrou-se compassivo com a resolução de não se unirem, respeitando e

entrando em acordo com tal resolução, o que demonstra uma capacidade do

mesmo de aceitar a frustração do desejo.

Obi-Wan contacta Windu e Yoda dizendo-lhes sobre suas descobertas e

pedindo orientação. Yoda pede que ele capture o caçador de recompensas para

ser interrogado pelos Jedi. A atitude de Obi-Wan demonstra a característica de ser

prudente e cauteloso, dando passos previamente pensados rumo ao

desconhecido.

Obi-Wan corre e encontra Jango, o caçador de recompensas, embarcando

para fugir. Eles travam um árduo combate. Obi-Wan não consegue capturá-lo,

mas coloca um localizador na nave do mesmo para posteriormente persegui-lo.

Anakin tem um pesadelo com sua mãe em que a vê sofrendo. Padmé lhe

diz que o ouviu durante a noite e Anakin diz que sabe que está violando sua

missão, mas que deve ir ajudar sua mãe. Padmé vai junto. Eles pegam uma nave

de Naboo e vão para Tatooine, indo até a oficina em que Anakin trabalhava como

escravo, onde pegam o novo endereço de sua mãe, que havia sido comprada por

um fazendeiro chamado Lars que a libertou e com ela se casou.

Anakin sentiu-se mobilizado com o sofrimento de sua mãe e percebeu que

seu sonho retratava algo real que estava acontecendo. Ele se viu diante do dever

de retornar ao seu planeta para rever sua mãe. Padmé lhe deu essa abertura e

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apoio indo acompanhá-lo. Tal atitude de Padmé a aproximou ainda mais de

Anakin, pois ela participou de sua partida e agora de seu retorno ao ambiente

familiar. Anakin teve que reaver suas origens e família, no caso apenas a mãe,

que o chamava por meio dos sonhos. Os sonhos de Anakin correspondiam à

realidade, o que reafirma sua característica de recolher nos sonhos suas futuras

realizações, e mostra que os sonhos de Anakin revelavam a realidade concreta. O

self de Anakin lhe enviou em seus sonhos a situação em que se encontrava sua

mãe, e Anakin atendeu a seu self indo em busca da mesma, sua única

representante de seu passado, infância e origem.

Anakin foi mobilizado por emoções despertadas pelo seu sonho, o que o

deixou preocupado e ansioso para ver a mãe. Ele atendeu ao chamado decidindo

comprovar o que estava acontecendo com a mesma, pois seu self lhe dizia que

ela estava sofrendo. O sonho e mensagem do self, que consequentemente dirigiu

Anakin de volta para seu planeta de origem, pode ser interpretado como uma

necessidade, que o self enviou ao ego de Anakin, de rever suas origens, de

Anakin visitar o seu passado e sua situação inicial de identificação com o self,

para se energizar e orientar o ego. No entanto, Anakin partiu para realizar seu

sonho ansiosamente no intuito de salvar sua mãe, lidando de forma concreta com

o self e não simbólica.

Obi-Wan segue o localizador, indo para um planeta em que estão alojados

os líderes separatistas e o exército dróide, enquanto Anakin vai até o local onde

vivia sua mãe e reencontra C3PO, conhece os Lars e descobre o que houve com

sua mãe. Anakin não se mostra disposto a conhecer sua família, mas sim parte

imediatamente para seu devir interno de resgatar a mãe que corria perigo. Ele

parte para resgatá-la, mesmo mediante desestimulações de Lars, que dizia para

ele se conformar com a morte dela.

Obi-Wan espiona as instalações inimigas e deflagra uma reunião dos

líderes Separatistas sendo liderada por Conde Dookan, Mestre do falecido Qui-

Gon Jinn, por sua vez Mestre de Obi-Wan. É revelado um inimigo que os Jedi não

concebiam ser possível. Obi-Wan descobre uma verdade que o deixa nervoso e

revoltado.

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Obi-Wan envia uma mensagem para Anakin, visto que seu comunicador de

longo alcance estava quebrado: na mensagem ele pede que Anakin repasse tudo

para Coruscant e conta todas suas descobertas, entretanto durante a mensagem

ele é capturado, e depois recebe uma visita de Dookan.

Dookan tenta tornar Obi-Wan um aliado, lhe explicando que os Jedi estão

sendo enganados por Darth Sidious e que junto com Obi-Wan ele conseguiria

destruir o Sith. Obi-Wan nem mesmo cogita fazer o que diz Dookan e o chama de

traidor dizendo que jamais se juntaria a ele. Dookan então entrega Obi-Wan à

morte enviando-o para ser devorado na arena. Obi-Wan mostra-se solidamente

como um Jedi que honra sua Ordem e não se deixa corromper pela facilidade para

escapar enganando Dookan.

Anakin resgata sua mãe com vida, mas ela morre em seus braços, satisfeita

e orgulhosa por ter o visto seu filho crescido e podendo dizer-lhe de seu amor.

Anakin, logo quando sua mãe morre, lamenta e então se enfurece, matando toda

a tribo.

Anakin sentiu fúria por ter perdido sua mãe e responsabilizou toda aquela

tribo pelo ocorrido, exterminando todos seus elementos. A vingança de Anakin

deu-se no intuito de expiar sua culpa de ter perdido a mãe e revidar a dura pena

que lhe fora infligida, o que mostra como ele foi abalado pelo que aconteceu com

sua mãe e pelo arrependimento de não a poder salvar.

Yoda sente à distância o que acontecera e responde para Windu com

lágrimas em seus olhos e demonstrando compaixão, que pressentia que o jovem

Skywalker estava sofrendo uma dor horrível.

Anakin perdeu sua mãe, maior representante de sua infância e self. O

mesmo se enfurece, pois não consegue aceitar ou impedir tal perda, mostrando

seu estado descompensado em relação a seu destino, pois as coisas não saíram

como ele queria ou precisava, ele não concordou com o que ocorreu, então puniu

uma tribo inteira por terem lhe causado tal dano. Seu ego não correspondeu com

o self, mas frustrou-se com o mesmo, lamentando não ter tido o poder para fazer

diferente. Tal passagem afasta Anakin do self e o aproxima do ego, afasta-o de

ser um Jedi e o aproxima de ser um Sith, pois o mesmo passa a estabelecer com

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o self uma relação de desconfiança, que lhe tira as coisas que ele mais valoriza, e

assume como solução para isso, que o ego deve ter grande poder para combater

o self.

A raiva de Anakin não é compreendida pelos Jedi, mas contou com a

compaixão de Yoda, que chora e lamenta pelo que houve com Anakin. Yoda,

apesar de sua rigidez de corresponder ao Código Jedi, lamenta o sofrimento de

Anakin.

Anakin chega com o corpo de sua mãe, todos vão rapidamente para fora

recebê-lo, mas ele os ignora e entra num aposento com o corpo, mostrando

feições de revolta. Padmé vai até ele, que logo se exalta por não ter conseguido

salvar sua mãe. Ela lhe diz: “Tem coisas que não têm conserto. Você não é todo-

poderoso”. Anakin responde: “Bem, deveria ser! Um dia, eu serei. Serei o mais

poderoso Jedi que já existiu. Eu lhe prometo. Aprenderei até a impedir que as

pessoas morram. É tudo culpa de Obi-Wan! Ele é ciumento! Ele está me

segurando! (joga coisas na parede)”. Padmé: “Qual é o problema, Anakin?”.

Anakin confessa (olhando para suas mãos): “Eu os matei. Matei todos eles. Estão

mortos. Cada um deles (exaltando-se em tom de fúria e indignação). E não só os

homens... mas as mulheres... e as crianças, também. São uns animais! E eu os

exterminei como animais! Eu os odeio! (gritando)”. Padmé o acolhe e diz: “Sentir

raiva é humano”. Anakin: “Eu sou um Jedi. Sei que sou melhor que isso”. Padmé o

consola, então todos se reúnem para o enterro.

A raiva de Anakin não corresponde à identidade Jedi. No entanto, ao dizer

que era um Jedi e melhor que isso, ele demonstra arrependimento por sua ação

de extermínio decorrente do sentimento de ódio, expressando assim sua vontade

e interesse de corresponder à identidade Jedi.

Anakin se ajoelha diante do túmulo, dizendo que não teve forças e que

falhou, ele promete que não fracassará de novo. Tal promessa parece não se

dirigir à sua mãe, visto que ela já estava morta e nada mudaria isso. Tal promessa

dirigiu-se para o próprio ego de Anakin, o qual deveria ser mais poderoso para

impedir as intercorrências do self. Anakin expressa seu grande abalo interno

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dizendo para o túmulo da mãe que sente muito a falta de dela – vínculo com

infância e de ligação com o self.

O ego que saiu de Tatooine no episódio I agora voltou e fez novamente

uma promessa que não poderia cumprir, configurando-se um novo ato de hybris e

de inflação do ego.

Anakin falhou com sua promessa feita no episódio I, de voltar para libertar a

mãe escrava, visto que ela obteve sua libertação sem ser salva por Anakin, mas

sim pelo seu futuro marido. No entanto, Anakin sente que devia tê-la salvo,

sentindo-se fracassado por não tê-lo feito. Anakin não cumpriu de forma concreta

com a promessa de libertar ou salvar a mãe, mas cumpriu de forma simbólica,

pois salvou o corpo de sua mãe, removeu-a com vida da tortura a tomou-a nos

braços, o que simbolicamente representa libertá-la e salvá-la. Ouviu as últimas

palavras dela e acompanhou o falecimento, o que simbolicamente representa

libertá-la da vida e tornar sua transição para a morte completa, pois a mesma

sentiu-se realizada por poder ver seu filho novamente e então morrer. Anakin não

reconhece o valor de seu feito para sua mãe, pois queria resgatá-la com vida não

a deixando falecer. Ele não se satisfaz com o que pôde fazer, concebendo como

uma falha sua em relação à mãe. Ele não reconhece a morte da mãe, não aceita

tal limite, pois queria que ela continuasse a viver. A culpa de ter deixado acontecer

daquela forma, como se coubesse a ele que sua mãe não morresse, e a negação

da morte da mãe, o impulsionam a prometer não falhar de novo. Anakin reforça

seu ponto fraco, assume promessas que o fixam em um funcionamento apegado e

onipotente, atualizando sua hybris de ser todo-poderoso e capaz de impedir que

as pessoas morram, assumindo capacidades além das suportáveis pelo ego.

MOORE- GILLETE (1993: 40), afirmam que o arquétipo do herói, assim como

outros arquétipos “imaturos”, são excessivamente ligados à mãe. Os autores

ainda dizem:

“A derrocada do herói é que ele não conhece e é incapaz de aceitar

suas próprias limitações. O menino ou o homem dominado pelo

Herói da Sombra não consegue realmente perceber que é um ser

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mortal. A negação da morte – limitação fundamental da vida humana

– é a sua especialidade” (MOORE- GILLETE, 1993: 37).

Anakin de início expressa sua incapacidade de aceitar a morte da mãe, ou

seja, a limitação para ele de que agora não tem mais a sua mãe. Pode se dizer

que em tal passagem, de encarar a morte da mãe, Anakin foi possuído pelo

arquétipo do herói.

R2 chega para o enterro trazendo uma mensagem de Obi-Wan. Anakin e

Padmé sobem a bordo da nave para ver a mensagem e já retransmitem para os

Jedi em Coruscant. A mensagem revela toda a descoberta de Obi-Wan, mas,

durante a transmissão, ele é atacado e capturado. Windu ordena que Anakin fique

onde está para proteger Padmé e diz que eles irão resgatar Obi-Wan.

Windu lhe dá essa ordem pelo motivo de ele ter que garantir a proteção de

Padmé, mas inconscientemente, Windu pede que Anakin repouse seu sofrimento

e permaneça ali para elaborar sua perda.

Padmé discorda de ficarem ali e convence Anakin de salvarem Obi-Wan,

pois chegariam mais rápido e os Jedi jamais chegariam a tempo. Padmé diz: “Vai

ficar sentado e deixá-lo morrer? Ele é seu amigo...”. Anakin responde: “Ele é como

meu pai! Mas o Mestre Windu mandou que eu ficasse aqui!”. Apesar da tentativa

de Anakin de obedecer Windu e de não assumir responsabilidades maiores do

que pode suportar, tentando evitar uma nova atitude de hybris, Padmé escolhe ir,

obrigando Anakin a acompanhá-la e ele aceita de bom grado. Eles partem para

salvar Obi-Wan levando junto C3PO.

Ao levarem C3PO, um dróide para relações diplomáticas criado por Anakin

em sua infância, eles resgatam um elemento da infância de Anakin integrando-o à

nave. Apesar de Anakin ter perdido sua mãe, ele recuperou seu dróide, que lhe

recebeu chamando-o de “meu criador mestre Ani”. Resgatar C3PO foi uma

integração de um elemento do self a partir de uma retomada ao universo infantil.

Joseph Campbell em seu livro “O herói de mil faces”, reflete sobre o

inconsciente infantil, como sendo a “estrutura” que: “comporta as potencialidades

não realizadas na vida adulta, cujos conteúdos possibilitam uma renovação e

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elevação na vida adulta” (CAMPBELL, 1997: 27). O autor afirma que o herói é

aquele que inicialmente deve se retirar da cena mundana para mergulhar em seu

inconsciente infantil, para após então lançar-se sobre as regiões causais e

conflituosas da psique, a fim de esclarecê-las em favor de si-mesmo.

Anakin de fato retirou-se da cena mundana e regressou para seu

inconsciente infantil, aonde teve a árdua experiência de perda da mãe. Anakin não

permaneceu por muito tempo no inconsciente infantil, pois rapidamente partiu para

resgatar Obi-Wan. Anakin viu-se diante do conflito de escolher entre permanecer

no inconsciente infantil para elaborar seu luto, ou salvar seu mestre Obi-Wan.

Padmé fez essa escolha aliviando Anakin, que seguiu sua jornada para resgatar

seu mestre, deixando para trás seu “inconsciente infantil”, mas levando consigo

seu antigo companheiro C3PO, que voltou para a vida de Anakin, que agora tinha

seus dois andróides de estimação, R2-D2 e C3PO, unidos e presentes,

representando símbolos de sua ligação com o self.

Anakin voltou para a ação, prosseguindo para a resolução da aventura,

deixando para trás suas recentes experiências e prosseguindo para o novo

fechamento de ciclo, sendo que cada filme retrata no final, uma transformação

geral na trama.

Após correrem risco de vida, eles são capturados e juntam-se a Obi-Wan. O

filme que se passava com os dois traçando seus caminhos paralelos, agora narra

novamente os dois juntos. Anakin e Padmé, antes de entrarem na arena de

combate para serem destruídos juntos com Obi-Wan para a diversão de uma

platéia, mudam o acordo de não viverem sua união e amor. Padmé se declara e

volta atrás no acordo; e Anakin se entrega de novo ao seu desejo, eles então se

beijam.

Padmé, diante da possibilidade de destruição de sua vida, situação a que já

estava acostumada devido a tantos atentados sofridos, diz que não tem medo de

morrer e decide embarcar no amor proibido com Anakin.

Os três lutam na arena e vencem as criaturas adversárias. Quando é dada

a ordem para os dróides os destruírem, chegam outros Jedi que iniciam uma

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batalha. Depois surge Yoda com o exército clone, obrigando os separatistas a

baterem em retirada.

Obi-Wan e Anakin vão atrás de Dookan para impedi-lo de fugir. Obi-Wan

queria um ataque conjunto, mas Anakin se precipita indo sozinho para o combate.

Ele é atingido por raios de Dookan, que o deixam invalidado. Anakin se precipitou,

sendo tomado pela raiva e partindo para o ataque de forma inflada e se achando

invulnerável, ele desconsidera e coloca em risco seu Mestre, agindo de forma

desmedida e impulsiva.

Anakin partiu para o ataque com excessiva confiança, cometendo um ato

de hybris e sofrendo imediatamente a consequência.

“O herói lança o menino de encontro aos seus limites, contra o

aparentemente intratável. Encoraja-o a sonhar o sonho impossível,

que afinal de contas pode ser possível, se ele tiver coragem

suficiente. Dá-lhe poder para lutar contra o inimigo imbatível, que

será bem capaz de derrotar, se não estiver possuído pelo herói”

(MOORE-GILLETE,1993: 40).

“O herói começa achando que é invulnerável, que para ele só

serve o 'sonho impossível', que ele pode 'lutar contra o inimigo

invencível' e vencer. Mas se o sonho é realmente impossível, e o

inimigo realmente invencível, o herói vai ter problemas” (MOORE-

GILLETE, 1993: 38).

Obi-Wan no episódio I já demonstrava seu estilo calmo, prudente e

meditativo; e Anakin começa a manifestar seu descontrole como um vício ou

impulso. Ele não efetuou um retiro ritual após a sanguinolência e luto da mãe, mas

sim engatou-se nas missões exercendo importante papel, mas deixando seus

impulsos adormecidos e inconscientes, logo não elaborados pela consciência do

ego. Em contrapartida, não houve tempo para uma estruturação interna, as coisas

foram se sobrepondo, o que configura o herói como sendo altamente solicitado

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pelo self. Sempre usando suas qualidade de guerreiro desempenhando

benfeitorias, salvando vidas e combatendo os perigos. O herói pode ser tido como

um instrumento das forças do bem. Tal arquétipo dá o impulso para o individuo

suportar o que para os outros é insuportável, levando adiante as realizações,

superando o insuportável e seguindo em frente.

Anakin não atende à recomendação e pedido de Obi-Wan, deixando-o

sozinho para a luta contra Dookan. Quando Dookan ia dar o golpe fatal em Obi-

Wan, que já estava derrotado, Anakin intervém salvando-o, mas tem seu braço

cortado por Dookan. Yoda chega, mas Dookan consegue fugir.

Edward F. Edinger, em seu livro “Ego e arquétipo”, cita sobre o

desmembramento:

“As mãos são o agente da vontade consciente. Assim, ter as

mãos cortadas corresponderia à experiência da impotência do ego.

Nas palavras de Jung, a experiência do si-mesmo é sempre uma

derrota para o ego” (EDINGER, 2000: 286).

Mesmo tendo Anakin assumido seu ego como capaz e poderoso, enquanto

duelava com Dookan, o self lhe desmembra, removendo-lhe o agente da ação,

seu braço direito.

Anakin recebe sua segunda missão de escoltar Padmé para retornar para a

Naboo, situação em que se casa em segredo, já portando um braço mecânico.

Obi-Wan, junto de Windu e Yoda, indagam sobre os ocorridos.

Sendo assim o filme finaliza com algumas atualizações, têm início a guerra

dos clones, o Sith novamente prega uma peça nos Jedi, Anakin se casa em

segredo, decidindo manter uma vida particular e escondida da Ordem dos Jedi.

Anakin teve enfrentamentos e superações que a vida foi-lhe solicitando

como retrata o filme. Ele foi botado à prova de proteger Padmé em sua primeira

missão sozinho. Tal prova obrigou-lhe a assumir uma posição, de corresponder ao

Código Jedi reprimindo seus impulsos e desejos, ou deixar-se levar pelos

mesmos. Anakin solucionou essa prova se entregando aos seus desejos e

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casando-se em segredo. Sendo assim, sua primeira missão sozinho já o destinou

a se casar e manter um segredo perante a Ordem Jedi. Anakin teve como

segunda prova, o retorno ao seu planeta para resgatar sua mãe. Missão essa não

designada pela Ordem Jedi, mas sim pelo seu self por meio dos sonhos. Anakin

teve que lidar com a perda da mãe infligida pelo self, o que marcou uma cisão

entre o ego de Anakin e seu self, visto que Anakin responsabiliza seu ego pelo

ocorrido, assumindo que cometeu um fracasso e prometendo não mais falhar.

Sendo assim, Anakin volta seu desenvolvimento pessoal para aprimorar seu ego,

a fim de não mais falhar e operar com sucesso nas coisas concretas, porém

deixando na sombra, seu vínculo como o self e a vida simbólica.

Episódio III - A vingança do Sith:

O título do filme refere-se ao final da saga do herói Anakin Skywalker, que

torna-se Darth Vader. Anakin torna-se Vader quando passa para o lado negro da

Força, voltando-se contra a Ordem dos Jedi e passando a servir o Lorde negro

Sith Darth Sidious. A vingança do Sith foi o resultado do longo golpe de Palpatine,

que atuava sem se revelar, portanto inconsciente aos Jedi. Palaptine influi sobre a

profecia dos Jedi, que esperava que o escolhido trouxesse equilíbrio para a Força

destruindo o Sith. No entanto, o escolhido se uniu ao Sith e destruiu a Ordem dos

Jedi.

O filme se passa alguns anos após o término do episódio II e começa com

Anakin e Obi-Wan indo resgatar Palpatine, que havia sido seqüestrado por

General Grievous do exército dróide.

Anakin não é mais um Padawan, lhe é concedido o nível de Cavaleiro Jedi,

mesmo assim ele acompanha sempre seu mestre nas missões.

Situação interna e externa do herói:

Anakin mantém seu casamento em segredo, conseguindo conciliar o

mesmo de forma satisfatória com sua identidade de Jedi. Ele desenvolve uma

relação mais confortável com Obi-Wan, os dois se relacionam como amigos ou

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irmãos, onde cada parte tem sua individualidade respeitada e reconhecida. Anakin

estruturou-se de forma que pudesse observar a si mesmo e medir suas reações

despertadas, o que lhe permitiu amadurecer nas suas relações com Obi-Wan e

com a Ordem Jedi, além de entender e controlar seus impulsos. Tal atitude denota

uma maior humildade e passividade de Anakin, que estava o ajudando a criar sua

própria identidade de Jedi. Logo no início do filme, Obi-Wan é atacado em sua

nave e diz para Anakin abandoná-lo e prosseguir com a missão de resgatar o

Chanceler, Anakin discorda de seu Mestre, salvando-o para irem juntos

resgatarem o Chanceler. O mesmo não vê mais Obi-Wan como uma figura que o

limita e aprisiona, passando a interagir com o mesmo sem nenhuma restrição,

expressando suas questões e ouvindo as que lhe são trazidas, ou seja,

estabelecendo uma interação verdadeira, apesar de reservar seu casamento em

sua vida pessoal e escondendo tal fato dos Jedi.

No episódio II, Anakin tinha uma relação conflituosa com Obi-Wan, pois não

expressava nem compartilhava suas questões internas, guardando e acumulando

dentro de si uma variedade de sentimentos que o faziam desejar separar-se de

Obi-Wan. Seu relacionamento com Padmé permitiu que ele expressasse suas

insatisfações relacionadas à Obi-Wan. Anakin anteriormente agia por conta

própria, sem consultar-se ou pedir ajuda, tanto internamente, tentando organizar

seus sentimentos, quanto externamente, partindo para um ataque sozinho contra

Dookan. No entanto, agora Anakin mostra-se mais aberto para entrar em contato e

receber a ajuda do outro.

Os dois vão até o Chanceler e travam combate com Dookan. Obi-Wan sofre

um ataque que lhe deixa inconsciente e Anakin luta sozinho contra Dookan. Ele

corta em um só golpe as duas mãos do oponente e fica a decidir o que fazer.

Palpatine lhe comanda que mate Dookan, Anakin reluta, mas pressionado por

Palpatine, ele então o mata. Tal situação demonstra a capacidade de Anakin de

controlar seus impulsos e manter uma situação de decisão. No entanto, o mesmo

cede facilmente à manipulação do outro, no caso, Palpatine.

Após Anakin decepar a cabeça de Dookan, ele demonstra-se incerto e diz

que não seguiu o modo Jedi, visto que era um prisioneiro desarmado. Palpatine

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lhe diz que Dookan era perigoso demais para continuar vivo e que Anakin agiu de

maneira natural, desejando vingança devido ao seu braço cortado. Palpatine ainda

diz que não foi a primeira vez, dizendo: “Lembra o que você me contou, sobre sua

mãe e o povo da areia”. Palpatine diz para se retirarem rápido. Anakin vai socorrer

Obi-Wan e Palpatine diz para Anakin abandoná-lo. Entretanto, nesse momento

Anakin não reluta e leva Obi-Wan em seus ombros.

Anakin demonstrou não estar possuído pelo arquétipo do herói, visto que

conseguiu vencer o “inimigo invencível”, algo que exige uma atitude não possuída

pelo herói, que parte para cima achando-se invulnerável e perde seu braço, mas

sim uma atitude mais contida. Antes de encontrar Dookan, Anakin lhe diz que seus

poderes dobraram desde o último encontro, fala em que Anakin mostra-se

confiante para o combate, não devido à ilusão de ser invencível, mas sim

confiante nas capacidades e poderes de seu ego.

Grievous escapa, dando continuidade à guerra, que passa a ter como

propósito de capturá-lo para assim se encerrar a guerra e se voltarem às

negociações, sendo que com a morte de Dookan, Grievous passou a ser o líder do

exército dróide.

Anakin mostra grande talento em aterrissar a gigante nave de Grievous,

realizando a missão de resgate do Chanceler com sucesso. Chegando ao Senado,

ele despede-se de Obi-Wan de forma agradável e recebe os agradecimentos de

Senador Organa. Vendo Padmé escondida atrás dos pilares, ele despede-se de

Organa e vai abraçá-la. Anakin a beija e Padmé o adverte que ali não era um local

apropriado. Anakin diz que está cansado de esconder e agora quer que todos

saibam que eles são casados. Padmé o repreende e Anakin pergunta o que

houve, pois ela estava tremendo. Padmé lhe diz: “Aconteceu uma coisa

maravilhosa. Ani, eu estou grávida”. Anakin responde: “Isso é... Isso é

maravilhoso. (sorrindo)”. Padmé preocupada diz: “O que agente vai fazer?”.

Anakin: “Não vamos nos preocupar com nada agora. Este é um dia de felicidade.

O dia mais feliz da minha vida”.

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Após a ação logo no começo do filme de resgatar o Chanceler, o resto do

filme se passa em conspirações em torno de Anakin e o conflito despertado no

mesmo por um sonho.

Griveous vai para o planeta onde os separatistas estavam refugiados e

rapidamente corre para contactar Sidious. Sidious lhe ordena que mande os

líderes separatistas para o planeta Mustafar, lhe diz que o final da guerra está

próximo e que a morte de Dookan foi uma perda necessária, pois em breve ele

terá um novo aprendiz, mais jovem e mais poderoso.

Anakin fica junto com Padmé, que estava penteando seu cabelo na

cobertura de seus aposentos, falando seus planos para a vinda do bebê. Anakin

lhe diz que ela é linda e que ele está muito apaixonado. Eles vão dormir e Anakin

sonha que Padmé morre no parto, pedindo-lhe ajuda. Anakin desperta assustado

e fica acordado, inquieto. Padmé vai até ele e lhe pergunta o que o estava

incomodando, mas Anakin desconversa, dizendo que lembrava-se quando tinha

dado o colar que ela usava, colar dado no episódio I. Padmé o pressiona e ele

conta que foi um sonho como aqueles que teve antes de sua mãe morrer. Padmé

pede que ele conte e ele reluta, mas acaba contando que o sonho era com ela,

que ela morria durante o parto, mas que ele não deixará este se tornar realidade.

Padmé diz que a vinda do bebê mudará suas vidas, que ela não poderá ficar mais

no Senado e se a Ordem Jedi souber, Anakin seria expulso. Ela pergunta se Obi-

Wan poderia ajudá-los, mas Anakin rapidamente diz que eles não precisam da

ajuda de Obi-Wan.

O sonho de Anakin o remeteu para o que lhe acontecera no episódio II,

quando sonhou que perdia sua mãe e teve que lidar com o fato de sua morte, teve

que se haver com o que o “self lhe armou”. Anakin fez com seu ego a promessa

de não falhar de novo, ou seja, não deixar o self agir. Com esse novo sonho, ele

teve que lidar com a aterrorizante idéia de perder Padmé. No entanto, o mesmo

não procurou entender do que se tratava o sonho, não demonstrando abertura

para entendê-lo. Ele rapidamente o tomou no sentido concreto, de que Padmé iria

morrer e ele deveria impedir que isso acontecesse.

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A situação do sonho fez emergir imediatamente o complexo de perda de

Anakin, despertado pela perda da mãe igualmente anunciada por um sonho.

Anakin despertou durante a noite e se pôs a pensar sobre o que ocorria. Seu self

voltou para assombrar o ego de Anakin. Padmé vai até ele, toma conhecimento do

que houve e pergunta se Obi-Wan poderia ajudá-los. Anakin é tomado pelo seu

outro complexo da sua relação com Obi-Wan. Ele diz que não precisam da ajuda

do mesmo. Quando Padmé lhe pergunta o que eles fariam, Anakin a consola e

alivia a preocupação da mesma. A atitude de consolo de Anakin expressa sua

praticidade e aptidão para lidar com as coisas concretas. Anakin entendeu seu

sonho como um desafio para seu ego, que deveria resolver tal ameaça, no

entanto, o inimigo que Anakin está declarando é ele mesmo, seu self. Anakin

assume a postura de ter que equipar seu ego para impedir que Padmé morra. O

preparo de Anakin se dá no nível concreto, das capacidades do ego, e não no

nível simbólico, que seriam as articulações internas feitas pelo ego. Anakin em sua

resolução conjunta com Padmé regrediu, pois reativou seus funcionamentos que o

regeram no episódio II, de não precisar de Obi-Wan e prosseguir operando com

seu ego para resolver seus conflitos de forma superficial e apenas no nível do

concreto.

Anakin fica completamente tomado por tal assunto e vai conversar com

Yoda, perguntando o que devia fazer. Yoda lhe diz que o medo da perda é uma

passagem para o lado negro da Força e que ele deve se alegrar com os que se

unem à Força sem jamais sentir a falta, e lhe responde que ele devia treinar a si

mesmo para se libertar de tudo o que tem medo de perder.

Anakin continua a lidar com tal questão apenas no plano do concreto, pode-

se inferir que ele tirou para si de sua conversa com Yoda, que teria que não se

importar com o que ocorreria com Padmé e deixá-la morrer, sendo que muitas

outras interpretações podem ser feitas, como se libertar de outras coisas que não

quer perder senão Padmé. A morte é um tema muito presente em Anakin. No

começo do filme, ele se propõe a salvar um soldado com dificuldades, para

impedir que ele morresse, mas Obi-Wan lhe convence de que o soldado estava

fazendo seu trabalho e Anakin mostra feições de desconforto, atendendo à

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orientação de Obi-Wan e prosseguindo na missão. Anakin fica compenetrado com

sua missão pessoal de salvar Padmé, o que pode ter lhe tirado uma percepção

mais refinada das situações que procederão.

Anakin, após falar com Yoda, apressa-se para a reunião dos relatórios da

guerra no Templo Jedi, para encontrar-se com Obi-Wan. Anakin chega e Obi-Wan

lhe adverte do atraso e resume o que foi dito. Anakin oculta de Obi-Wan o motivo

de seu atraso e Obi-Wan lhe diz que Chanceler Palpatine solicitou sua presença,

advertindo o mesmo a ter cuidado com o Chanceler. Anakin vai até Palpatine, que

lhe consagra a função de representante pessoal do Chanceler no Conselho Jedi.

Anakin se satisfaz com a idéia de se tornar um Mestre, ele pensa que se for aceito

no Conselho logo seria um Mestre, sendo que apenas Mestres que compõem o

Conselho, e com tal cargo ele poderia tentar resolver o seu problema do sonho

com Padmé, apesar de tal expectativa de entrar no Conselho para tentar resolver

seu sonho, não tenha sido destacada no filme. Ainda assim, tornar-se um Mestre

lhe traria mais poderes, e, Anakin tinha a concepção de que apenas com mais

poderes poderia impedir a morte de Padmé, impedir que seu sonho se tornasse

realidade.

Anakin demonstra uma relação persecutória com seu self, sendo que o ego

teria que obter todo o poder e controle para poder se impedir a ação do self.

No entanto, quando Anakin leva sua nomeação para o Conselho, Mestre

Windu lhe diz que ele está no Conselho, mas que não lhe seria concedido o nível

de Mestre. Anakin se enfurece, deixando os Jedi desconcertados com tal reação.

A reunião do Conselho decidiu que Yoda iria para o planeta dos Wookies para

levar um pelotão do exército clone e impedir a invasão dróide. Anakin fica

ressentido durante a reunião do Conselho por não ter sido nomeado Mestre.

Anakin não contava com a possibilidade de estar no Conselho sem ser um

Mestre, ele estava tão apegado à idéia de que se tornaria um Mestre, que quando

Windu não lhe concede tal nível, ele imediatamente se revolta. Anakin havia se

apegado ao seu raciocínio lógico, de que para estar no Conselho logo seria um

Mestre. Tal lógica sustentava uma grande expectativa de Anakin, e encobria um

desespero caso não se realizasse. Tal desespero é tamnho que Anakin o ignorou,

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por ser insuportável para sua consciência do ego. Anakin não concebia tal

possibilidade, o lhe causou revolta e a projeção no Conselho de eles terem sidos

injustos e responsáveis pela não obtenção da necessidade de Anakin.

As ações de Anakin não estavam sendo orientadas pelo seu bom senso,

mas sim pela sua missão pessoal de salvar Padmé, missão essa que ele não

contou para ninguém e foi levando-a paralelamente com as questões da guerra.

Saindo do Conselho, Anakin acompanha Obi-Wan e reclama para o mesmo

que a atitude do Conselho foi uma ofensa. Obi-Wan o acalma e lhe passa a

missão de espionar o Chanceler, reportando todos seus passos ao Conselho.

Anakin não aceita bem tal missão de trair seu amigo Palpatine, questionando Obi-

Wan por que ele estava lhe pedindo isso. Obi-Wan lhe responde que é o Conselho

que está pedindo.

Anakin questiona Obi-Wan sobre não ter sido eleito Mestre, mas não

explica qual seu interesse ou necessidade nisso, o que demonstra uma relação de

uso e não de troca que Anakin estava fazendo com Obi-Wan e o Conselho, pois o

mesmo não compartilhou da real necessidade que passava, por saber que o

Conselho não aceitaria a violação do Código, de ser casado, de estar esperando

um filho e estar tentando impedir a morte de sua esposa que seu sonho já

anunciara. No entanto, Anakin nem mesmo cogitou em revelar-se para o

Conselho, pois não tinha esperança que o mesmo pudesse ajudá-lo.

Anakin não recebeu nenhuma ajuda para lidar com seu estado interno.

Padmé não estava atenta para o estado de Anakin, ela lhe pede que use de sua

influência com o Chanceler para interromper a guerra e para voltarem às

negociações, depois lhe pede carinho, dizendo-o para abraçá-la como se não

existisse a guerra e nem as conspirações.

Anakin foi solicitado por Palpatine, que lhe deu a localização de Grievous,

dizendo que a inteligência clone o havia encontrado. Palpatine senta-se com

Anakin para uma conversa em particular e lhe conta que o Conselho planeja traí-

lo. Palpatine extrai a verdade de Anakin sobre sua missão secreta de espioná-lo.

Palpatine começa a questionar os Jedi, assemelhando-os aos Sith, dizendo que

todos que têm poder têm medo de perdê-lo, e então conta uma lenda Sith sobre

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um Mestre Sith tão poderoso que podia criar a vida e impedir que as pessoas com

quem se importava morressem. Anakin pergunta o que houve com ele e Palpatine

conta que ele ensinou tudo o que sabia para seu aprendiz, que o matou durante o

sono. Anakin interessado perguntou se era possível aprender esse poder e

Palpatine o responde que não de um Jedi.

Tal passagem retrata uma retaliação inconsciente à Anakin, que em sua

bondade, honra, pureza e honestidade é usado pelo Sith, que lhe prega maldade,

fazendo-se de vítima e usando da ingenuidade de Anakin para deixá-lo em “maus

lençóis” e manipulá-lo. Anakin ouve de Palpatine uma possibilidade de salvar

Padmé, a única opção que encontrou até então e que o deixa muito interessado,

apesar de tal opção estar no lado negro da Força. É uma cena que mostra Anakin

sendo inconscientemente corrompido pelo lado negro.

Anakin demonstra que não compactua com a Ordem Jedi a respeito de

rejeitar o lado negro, pois ao entrar em contato com o mesmo não opõe-se de

antemão, mas sim o avalia de “peito aberto”.

Sobre a lenda Sith contada por Palpatine, pode ser inferido que refere-se ao

Mestre de Sidious, sendo Sidious o discípulo que o matou enquanto dormia, o que

indica que Sidious, tem o poder de manter vivo quem ele quer e tem o poder de

criar a vida, o que pode indicar ser ele o pai biológico de Anakin, que nasceu

espontaneamente da Força.

Anakin leva para o Conselho a informação do Chanceler a respeito da

localidade do General Grievous, mas não conta sobre as outras coisas que

conversaram. Anakin diz que o Chanceler pediu que ele liderasse a campanha,

mas o Conselho recusou e enviou Obi-Wan, o que deixou Anakin frustrado e

abatido.

Anakin acompanha Obi-Wan até sua decolagem e pede desculpas ao

mesmo por como tem agido, dizendo que tem sido arrogante e não dedicado ao

treinamento, dizendo-lhe ainda que tem tido muitas frustrações com o Conselho.

Obi-Wan lhe exalta, dizendo que tem muito orgulho dele e para ele ter paciência,

pois logo o Conselho o tornaria um Mestre. Ouvir Obi-Wan animou Anakin, mas

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não por muito tempo, por ter suas feições alegres ido embora tão logo Obi-Wan se

foi.

Assim como no episódio II, Anakin e Obi-Wan, foram separados, Obi-Wan

parte para a importante missão de derrotar Grievous a fim de encerrar a guerra,

enquanto Anakin fica em Coruscant “reportando” os passos do Chanceler, que

seria a importante missão de revelar o Sith. Mas, na verdade, Anakin estava na

árdua missão de lidar com seus conflitos e com o seu inconsciente, tentando obter

segurança e clareza interna, tarefa que não estava desempenhando de forma bem

sucedida. Além do mais, Anakin não reportava ao Conselho sobre o conteúdo de

suas conversas com Palpatine, mantendo-as para si.

Anakin tem novamente um sonho com a morte de Padmé, no qual Obi-Wan

a ajuda. Anakin fica se remoendo a respeito de Obi-Wan e pergunta para Padmé

se o mesmo esteve ali e ela lhe confirma que sim. Anakin pergunta nervoso o que

Obi-Wan queria e Padmé lhe diz que ele estava preocupado e lhe falou que

Anakin está sobre muita pressão. Anakin desabafa com Padmé, dizendo que se

sente perdido e que Obi-Wan e o Conselho não confiam nele. Anakin diz: “Alguma

coisa está acontecendo. Não sou o Jedi que deveria ser. Eu quero mais. E sei que

não deveria”. Padmé o consola e Anakin continua: “Achei um meio de salvar você.

Dos meus pesadelos. Não quero perder você, Padmé”. Anakin promete para

Padmé que ela não irá morrer no parto.

Junto de Padmé, Anakin demonstra uma auto-reflexão sobre o que está lhe

acontecendo. Ele elabora sobre estar se sentindo perdido e sobre não ser o Jedi

que deveria ser. Tais elementos articulados por Anakin referem-se às limitações

externas que ele tem que se adequar, as quais não lhe dão perspectivas. Anakin

começa a atingir dentro de si a confirmação de que ele não é um Jedi, pois as

situações externas que ele colheu na Ordem Jedi não podem ajudá-lo a salvar

Padmé, sua maior prioridade e único projeto de realização. Sendo que Anakin foi

completamente absorvido por sua missão de lutar contra o self. Se Anakin quer

salvar Padmé e não encontra soluções sendo um Jedi, ele passa a questionar o

que ele tem que ser para poder salva-la. Ele diz querer mais, sabendo que não

deveria “querer mais”, o que não o permite ser um Jedi, pois os Jedi não devem

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“querer mais”. Apesar de Anakin ter como único objetivo salvar Padmé, ele não

abre mão de ser um Jedi. Ele não entendeu a situação de ter que fazer uma

escolha entre ser um Jedi ou ser um pai de família, como sendo a causa de seu

sofrimento, tampouco associou o significado do sonho da morte de Padmé como

estando atrelado a tal escolha pessoal.

Devido ao mesmo já ter a certeza de querer ser um pai de família, bastava

ele sair da Ordem dos Jedi. Anakin não fez essa leitura simbólica, pois acreditava

que a ocorrência da morte de Padmé não tinha relação com sua onipotência de

ser um Jedi e ser casado. A lei determina que ele pode ser uma coisa ou outra, e

não as duas. Anakin não teve como foco tal questionamento e não o relacionou

com o sonho e morte de Padmé, pois não elaborou no plano simbólico, ficando

apenas no concreto. Se Anakin assumisse conscientemente, selando um acordo

com seu ego que ele permaneceria sempre levando uma vida paralela secreta de

casado enquanto permaneceria sendo um Jedi, não haveria problemas, pois o ego

teria feito uma escolha e assumido o sacrifício consciente de ter uma vida secreta

para continuar sendo um Jedi. No entanto, Anakin não queria mais ter sua vida

secreta, ele queria não ter mais que esconder que é casado, tal nova escolha

exige uma revisão geral, pois entra-se em desacordo com a primeira escolha de

ter uma vida dupla. Dá-se então um conflito de desejos, que exige uma escolha e

um trabalho para se instalar suas relações. Acontece que Anakin

inconscientemente queria não mais esconder seu casamento. Apesar de ele ter

dito no começo do filme que está cansado de esconder que é casado e que deseja

falar para todos, ele nunca o fez, mas sim foi procurando alternativas, acumulando

e carregando dentro de si novos conflitos. Anakin diz para Padmé que os Jedi não

confiam nele, no entanto é verdade que Anakin não confia nos Jedi, por não

compartilhar com eles seus segredos, mesmo assim Anakin começa sua conversa

com Padmé dizendo sobre a desconfiança dos Jedi em relação a ele. Tal atitude

demonstra uma projeção da sombra de Anakin sobre os Jedi. Anakin não

questiona a si mesmo se deve merecer tal confiança, ele apenas acusa os Jedi de

serem injustos.

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Anakin por meio de sua projeção de sombra nos Jedi, como sendo injustos,

defende-se de ter que encontrar de que forma ele está sendo injusto. As relações

de Anakin com o Conselho eram superficiais, pois ele não entrava em contato com

a real demanda do Conselho, mas sim com sua projeção de sombra. Tal

comportamento de Anakin, pode denotar um complexo de aceitação e rejeição

pelos Jedi, visto que no episódio I, ele fora rejeitado por ter se mostrado como de

fato ele era, o que pode lhe ter sugerido que se ele se mostrasse de outra forma

ele poderia ser ter sido aceito.

A partir do momento em que o sujeito não se mostra como ele de fato é, ele

usa o recurso da persona. Persona é um conceito da Psicologia Analítica, são as

máscaras psíquicas que mostramos para o mundo para ocultar nosso estado

interno. É importante que tenhamos persona para limitarmos o que queremos que

o outro tenha contato, podendo assim resguardar conteúdos que não queremos

mostrar. No entanto é importante sabermos que a persona não é o ego, mas sim

uma forma de moderar nossas comunicações com os outros.

Anakin exercia uma relação de aparências, no nível da persona, e exigia

que sua persona fosse tratada como sendo o seu ego, frustrando-se com o outro

quando o mesmo não lhe correspondia. O esforço de se viver apenas na persona,

denota uma atuação controladora e manipuladora do ego, sendo que o ego ficaria

apenas a organizar sua comunicação para obter seus interesses.

A ação de ocultar seu casamento da Ordem dos Jedi, não perturbava em

níveis insuportáveis o ego de Anakin, no entanto a partir do momento em que ele

se viu ameaçado de perder sua esposa, seu ego passa a buscar mais poderes por

conceber que essa seria a única forma de salvar Padmé.

É feita uma nova reunião do Conselho, em que o comandante clone diz que

Obi-Wan estava em confronto com Grievous. Windu diz para Anakin levar o

relatório para o Chanceler e prestar atenção na reação do mesmo a fim de

descobrir suas intenções. Anakin se dirige ao Senado enquanto os Jedi ficam

desconfiados de um complô do Chanceler contra os Jedi.

Anakin encontra Palpatine e lhe diz que Obi-Wan estava em confronto com

Grievous, dizendo-lhe que deveria estar junto com ele e queixa-se de estar se

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sentindo excluído do Conselho. Palpatine lhe diz que o Conselho não confia em

Anakin, pois olham para o futuro do mesmo e vêem mais poder do que podem

controlar. Palpatine começa a jogar Anakin contra os Jedi e lhe propõe de ensinar

sobre as sutilezas da Força, dizendo que seu mentor lhe ensinou tudo sobre a

Força até mesmo a natureza do lado negro. Palpatine diz que junto dele, Anakin

teria mais poder que qualquer Jedi, inclusive o poder para salvar Padmé da morte

certa.

Palpatine diz que sabe o que está atormentando Anakin e lhe diz que pode

dar a Anakin todo o poder de que precisa.

Anakin obtém a certeza de Palpatine ser o Lord Sith e vai até Windu, para

entregá-lo. Windu parte rapidamente, levando alguns Jedi, e impede Anakin que

insistia querer ir junto para prender o Chanceler. Windu ordena que Anakin espere

no Templo até ele voltar. Anakin ouve à distancia a voz de Palpatine dizendo que

se algum Jedi o matar, qualquer chance de salvar Padmé estará perdida. Anakin

chora olhando no horizonte o prédio de Padmé, que por sua vez olhava de volta

para o Templo Jedi. Windu consegue derrotar Palpatine, mas Anakin chega no

momento crucial, ficando a tentar convencer Windu a não matar Palpatine, pois

precisava dele. Windu não lhe dá ouvidos e quando vai dar o golpe fatal, Anakin

intervém, cortando-lhe a mão. Sidious joga Windu com seus raios janela abaixo,

matando-o. Anakin torna-se discípulo de Sidious, que o batiza Darth Vader,

dizendo apenas que quer ajuda para salvar Padmé, pois não consegue viver sem

ela.

Anakin, por ter afirmado para si que apenas tendo poder para vigiar e

impedir a morte de Padmé, é que ela não morreria, foi levado até a situação limite

de passar para o lado negro. Anakin não consegue obter o poder sozinho, tendo

que procurar no outro. Os Jedi não lhe deram o poder e o Sith lhe ofereceu, sendo

assim, Anakin aliou-se com o Sith, rompendo sua relação com o self. Tal

passagem retrata o enfraquecimento de Anakin e o nascimento de Darth Vader. O

enfraquecimento de Anakin se deu devido ao vício do mesmo em solucionar seu

problema de forma concreta e não simbólica; tal “vício” acarretou a derrota do

herói, que não desenvolveu suas qualidades psicológicas precocemente

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constatadas no episódio I. Ele se opôs ao self e perdeu a luta contra o mesmo,

isolando o ego do self. O self quando tido como inimigo é realmente imbatível,

sem que haja herói ou homem capaz de vencê-lo, podendo no máximo, aliar-se a

ele. Anakin foi contra a realização do herói dotado de talento psicológico, pois não

se uniu ao self, tendo o mesmo como seu guia e totalidade que ampliaria sua

consciência e elevaria sua alma, ao contrário disso, ele viu o seu self como seu

inimigo, contra o qual devia lutar para impedir as mudanças indesejáveis. Anakin

passou a ser conjuntamente Darth Vader, no entanto para alguns, principalmente

para Padmé, Anakin ainda existia.

Anakin no episódio I, antes de abandonar sua mãe, lamenta ter que deixá-la

e diz que não quer que as coisas mudem. Sua mãe lhe responde que não

podemos impedir as mudanças assim como não podemos impedir o nascer do sol.

Anakin demonstra já de início uma desavença com o self, não aceitando o controle

do mesmo e desejando ter todo o poder para fazer os desejos do ego, e não os do

self.

Sidious dá a ordem para que os clones destruam todos os Jedi. Yoda sente

à distancia um distúrbio na Força, enquanto todos os Jedi eram mortos pelos

próprios soldados clones. Obi-Wan e Yoda sobrevivem, enquanto Vader,

seguindo a primeira missão que Sidious lhe deu, mata todos os Jedi do Templo,

inclusive os Padawan, jovens e crianças.

Senador Organa vai ao Templo e toma conhecimento da reviravolta do

exército clone, ele então vai para sua nave onde acolhe Yoda e Obi-Wan.

Vader vai até Padmé que estava preocupada pois vira de longe o Templo

em chamas. Vader consola Padmé e diz para a que os Jedi traíram a República e

que o Chanceler lhe deu a importante missão de ir para o planeta Mustafar e

acabar com a guerra. Vader pede para Padmé o aguardar e parte para sua

missão.

Senador Organa é chamado para uma sessão especial no Senado, aonde

Palpatine se declara imperador, e acusa os Jedi de traição. Enquanto Yoda e Obi-

Wan voltam para o Templo e descobrem que Anakin estava por trás dos ataques.

Yoda diz que precisam destruir o Sith e Obi-Wan reluta em ter que matar Anakin,

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dizendo que ele é como um irmão para ele. Yoda lhe diz que Anakin não existe

mais pois foi consumido por Vader e envia Obi-Wan. Yoda vai ao Senado para

confrontar Sidious, eles travam combate mas Yoda é derrotado, assumindo que

falhou e partindo junto de Organa.

Obi-Wan conta para Padmé o que Anakin tinha feito, mas Padmé não

entrega a localização de Anakin, Obi-Wan descobre que ele era o pai, pois Padmé

já estava visivelmente próxima do parto.

Padmé leva C3PO para ir até Anakin em Mustafar, mas Obi-Wan entra e

permanece escondido na nave.

Ao chegar lá, Padmé corre para abraçar Anakin e lhe diz que Obi-Wan lhe

havia dito coisas horríveis. Padmé propõe para Anakin de eles fugirem juntos e

abandonar tudo para criarem seus filhos. Anakin lhe diz que fez tudo isso para

protegê-la, que agora têm mais poder do que qualquer Jedi, e que eles não

precisam fugir pois agora tinham o controle da Galáxia. Padmé fica horrorizada

com o que ouve e Obi-Wan aparece na porta da nave. Anakin se enfurece com

Padmé por ter trazido Obi-Wan para matá-lo, e começa a enforcá-la a distancia.

Padmé, sendo estrangulada sem entender como Obi-Wan chegou e querendo

acalmar Anakin, desmaia. Os dois conversam e então começam a lutar. Após

longo combate, os dois lutam no meio de um rio de lava. Obi-Wan sai da lava indo

para terra firme, dizendo para Anakin que a luta tinha acabado, pois ele estava em

posição superior. Anakin, que estava em uma pequena plataforma de metal que

flutuava sobre a lava, mais abaixo de Obi-Wan, diz enfurecido: “Você subestima

meu poder”. Obi-Wan: “Não tente”. Anakin salta sobre Obi-Wan, que em um golpe

cortá-lhe suas duas pernas e o braço. Anakin fica apenas com seu braço

mecânico. Obi-Wan então diz gritando: “Você era o escolhido! Deveria destruir os

Sith, não se juntar a eles! Trazer equilíbrio à Força, não deixá-la na escuridão!”.

Anakin grita com toda a força: “Eu odeio você!”. Obi-Wan: “Você era meu irmão,

Anakin. Eu amava você”.

Obi-Wan com feições de angústia, observa Anakin, que de tão próximo à

lava começou a pegar fogo, Obi-Wan desvia o olhar para não vê-lo derreter o

corpo inteiro, e então pega a espada de Anakin, e se retira trocando seus últimos

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olhares com Anakin. Vader se arrasta para longe da lava enquanto Sidious

chegava em uma nave para resgatá-lo.

Vader demonstra-se frio e direto na conversa com Padmé, ao ver Obi-Wan

na nave ele se exalta, gritando com Padmé e a estrangulando. Tal passagem

mostra uma atitude irracional, de tentar matar o grande amor pelo que fez tudo,

inclusive ir para o lado negro da Força. Pode-se pensar que Vader não foi ao lado

negro apenas por Padmé, mas também por ter inclinação em seguir seu próprio

ego, livrando-se da prisão que o self lhe despertava.

Vader tentou saltar por cima de Obi-Wan, por achar-se mais poderoso do

que de fato é. Isso mostra a identificação do ego com o poder máximo e absoluto,

e é uma atitude semelhante a estar possuído pelo herói, mas agora não se tratava

de conhecer suas limitações, e sim um ego amadurecido e identificado com o

poder superior. No entanto Vader estava enganado e teve suas pernas e braço

amputados, e logo após, seu corpo queimado. O rio de lava pode representar o

estado de fúria, emoção e impulsos diluídos na qual Vader se assentava. Obi-Wan

saiu daquele estado indo para a terra firme, posição que lhe garantiu a vitória do

combate, da dura realidade que não lhe pareceu uma vitória. Obi-Wan, abatido

pelo ódio de Vader, se retira, deixando Vader desmembrado e queimando vivo.

Obi-Wan não teve o intuito de matar Vader; mesmo Yoda tendo-lhe designado a

missão de destruir o Sith, ele sentiu a certeza dentro si, orientado pelo self em

harmonia com o ego, e o deixou lá, levando consigo a espada de seu ex-discípulo

e ex-irmão, Anakin.

Vader é resgatado e passa pela transformação de ter montado, sobre seu

corpo, um traje mecânico, com uma roupa com botões para regular o

funcionamento do corpo, e uma máscara preta que lacra toda sua face. Tal roupa

é algo fixo e permanente, que agora fazia parte de Darth Vader. Ele teve seus

braços e pernas humanas substituídos por máquinas acopladas em si mesmo.

Isso pode representar que Vader deixou seus resquícios humanos para trás, como

se fosse uma nova fase que se iniciava, e sua humanidade fosse uma fase

ultrapassada, que não mais lhe diz respeito. No entanto, assim que sua operação

foi concluída, Sidious chega para acompanhá-lo. Vader lhe pergunta de Padmé,

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se ela estava bem. Sidious lhe responde: “Parece que em sua raiva, você a

matou”. Vader se enfurece destruindo os aparelhos a sua volta e solta um grito

metálico, como sua voz, que agora era auxiliada por uma máquina.

Vader quando pergunta por Padmé, pode simbolizar perguntando sobre seu

self, pois Padmé era o único elemento de seu self que ele queria salvar: ela era de

fato, o elemento do self que Anakin queria isolar para si, tomando-o para seu ego.

Salvar Padmé foi o que o levou a se tornar Darth Vader e cumprir tal destino. O

ego de Anakin articulou-se durante o filme para salvar Padmé, sendo a mesma

reconhecida por Anakin como seu vínculo indispensável para a vida. Anakin

projetava em Padmé seu self, e sua articulação com a consciência do ego o levou

a sua atual situação. Ao saber que Padmé morrera, o que contrariava o ego de

Anakin, que queria salvá-la e não matá-la, Vader perdeu seu último ponto de

contato com seu self, perdeu sua busca de sentido e frustrou sua expectativa de

ser. Anakin planejava ser aquele que salva e vive com Padmé. Tal opção de vida

já não mais existia, fora retirada pelo self. Vader passou a ser um ego que

rompeu, ou simbolicamente, destruiu o seu self. Destruir o self é de fato

impossível pois ele nos governa até nossa morte, mas no caso, Anakin morreu,

pois ninguém mais o reconhecia por tal nome, Obi-Wan o abandonou e Padmé

morreu, Anakin se foi e agora só restou Vader. Anakin é o verdadeiro nome de

Vader, logo, representa o self do mesmo, que se perdeu quando ele perde Padmé.

Segundo Edinger (2000: 236) a unidade representa a individualidade,

enquanto que a multiplicidade e a dispersão correspondem ao oposto da

individualidade, representando o processo de quebra da unidade,

desmembramento e dispersão. O autor diz:

“A dispersão, ou multiplicidade, como condição psicológica, pode ser

vista do ponto de vista interno e externo. Vista a partir de dentro,

trata-se de um estado de fragmentação interna que envolve certo

número de complexos relativamente autônomos que, quando

tocados pelo ego, provocam mudanças de disposição e de atitude e

levam o individuo perceber que não é uno, mas múltiplo. Do ponto de

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vista externo, a multiplicidade se manifesta através da exteriorização

ou projeção de partes da psique individual no mundo exterior. Numa

tal condição, a pessoa encontra seus amigos e inimigos, esperanças

e temores, fontes de apoio e ameaças de fracasso concretizadas em

pessoas, objetos e eventos externos. Num tal estado de dispersão,

não pode haver experiência de individualidade essencial.

Encontramo-nos sujeitos às 'dez mil coisas'” (EDINGER:2000: 236)

Obi-Wan leva a nave de Padmé, ainda desmaiada e junto de R2 e C3PO,

para uma base lunar aonde estavam Yoda e Organa.

Padmé é levada para um médico, que por sua vez diz que por razões

inexplicáveis ela estava morrendo, pois perdeu a vontade de viver. O médico diz

que deve operá-la para salvar os bebês, pois ela estava grávida de gêmeos.

Começa o trabalho de parto. Obi-Wan a ajuda dando os bebês a ela para serem

batizados, Luke e Léia. Padmé diz a Obi-Wan que sabe que ainda há bondade em

Vader, e morre.

Podemos perceber que há vários símbolos referentes a polaridades ou

duplicidades no filme: Anakin torna-se Vader, Palpatine é o Sith, e está em

oposição a Obi Wan, a Força tem um lado “claro” e um Negro. Muitas vezes há

movimentos de oposição entre essas forças, não como se fossem lados de uma

mesma moeda, mas como se, para uma prevalecer, a outra precisasse ser

eliminada. Esta dinâmica surge tanto no nível da subjetividade, como o Mal

subjugando o bem em Anakin que morre e renasce Vader, como no âmbito da

coletividade. Portanto, são forças arquetípicas que se manifestam como

possibilidades de integração, mas que, no filme, veiculam relações de poder.

Podemos pensar do dinamismo patriarcal, que se caracteriza por polaridades que

se excluem e não se integram, o que ocorrerá, possivelmente, quando estiver

presente o dinamismo da alteridade, para o qual a sociedade pós-moderna parece

se encaminhar.

O casamento entre Anakin e Padmé poderia representar uma tentativa de

harmonizar o Feminino e o Masculino, com todos os seus aspectos integrados,

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como ocorria no casamento sagrado. Entretanto, não há um reconhecimento

social por parte dos Jedi, que eram a referência e o grupo de pertinência de

Anakin, por não conceberem a possibilidade de um cavaleiro seu casar. Vemos

aqui também uma cisão entre a vida pública dos Jedi, e sua vida privada, no que

tange ao relacionamento amoroso. A falta de um ritual público mostra bem essa

não receptividade da comunidade Jedi ao casal, o que cria conflitos internos e

também dificuldades de elaborá-los na vida pública. O fato de nascerem gêmeos,

um menino e uma menina, também chama a atenção. Parece renascer a

possibilidade de um tornar-se dois, que tornam-se um, num movimento contínuo

de discriminação e integração pela composição de diferenças.

O filme termina com suas atualizações de ciclos. Anakin transforma-se em

Vader, perdendo sua humanidade e tendo sua pele queimada e coberta por uma

roupa permanente, o que simboliza a perda da sensibilidade representada pelo

contato da pele com o mundo. Até sua voz fica metalizada, como se a armadura

que o protege e recompõe também o desumanizasse. Ele definitivamente está

possuído e identificado com sua sombra, tornando-se o Mal. A República

transforma-se em um Império, a Ordem dos Jedi desaparece e todos os Jedis

vivos tornam-se inimigos da nova República, sendo caçados e mortos. O Sith se

revela, tornando-se Imperador da Galáxia. Obi-Wan é exilado no deserto, no

planeta natal de Anakin, Tatooine, para onde leva o bebê Luke para a família de

Anakin. Yoda vai para seu exílio, onde fica sozinho em um planeta inteiramente

coberto por um pântano. O pântano remete à desestruturação, ao informe, mas

pode ser a matéria que acolhe, preparando novos desenvolvimentos.

O desafio que fica para o herói é seguir adiante no seu recém-desperto

caminho das trevas. Não há nenhum desafio para o futuro, ele transformou-se no

ego poderoso que serve ao Império e obedece ao seu Mestre. As intercorrências

nos futuros filmes irão fazer com que se reviva a trama de Vader.

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Capítulo VII – Considerações Finais:

Os filmes retratam os principais acontecimentos que configuraram o destino

de um herói. São narradas diferentes fases da vida do personagem. Este contou

com alguns elementos especiais, genéticos e pessoais, referentes à sua história

de vida, que foram os atributos que o levaram a ser enquadrado na Ordem Jedi

com o status de “o escolhido”. Tal status era algo imanente ao personagem,

conseqüente de seu nascimento especial. No entanto, a partir da saída do herói

para o mundo, ele foi deixando de ter apenas atributos sagrados advindos de seu

nascimento e infância com a mãe, e passou a adquirir outras características

mundanas e não sagradas: ele saiu do mundo materno e foi para a realidade do

mundo externo à proteção do lar. Tal embate logo de início já marcou o herói com

traços e sentimentos humanos. Seu primeiro enfrentamento foi o abandono da

mãe, e depois a rejeição pela Ordem Jedi, o que já lhe causou a ativação de

complexos, marcando-o como humano e afastando-o do divino. Sendo assim,

mesmo os heróis com nascimento divino devem enfrentar a realidade, composta

por um arranjo social com suas normas e atravessadas pelas relações com os

outros.

George Lucas, produtor dos filmes, registrou depoimentos dizendo que Star

Wars o ajuda a lidar com o vazio da existência, preenchendo uma lacuna de

ausência de sentido e de inexplicável insatisfação. Ao ver esses filmes e criar

essas histórias ele preenche uma camada de sua vida que tange ao sagrado, pois

os filmes expressam conteúdos que não temos presentes na nossa vida cotidiana,

conteúdos da ordem do sagrado, que despertam um estado de contemplação e

beleza. Os filmes retratam aventuras em meio ao espaço sideral e planetas

desconhecidos, com belezas incompreensíveis pela imaginação. O produtor dos

filmes criou um universo fantástico, com seus próprios planetas, personagens,

raças, tecnologias, instituições e lei natural. O Universo Star Wars é regido por

uma Força, que são as decorrências e acontecimentos da Galáxia e do Universo,

são as coisas que acontecem, os destinos que se traçam.

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São retratados diversos personagem que compõe a trama em torno da

“Força”. A “Força” é um elemento que fica subjacente aos filmes e que se trata de

uma crença dos personagens centrais, sendo uma crença real em que se apóiam

os personagens. Nos filmes é retratado o duelo de duas entidades que

representam a Força, os Jedi e os Sith. Essas duas entidades possuem poderes

especiais, pois eles aprenderam técnicas e conhecimentos com a Força, que

representa Deus no Universo Star Wars. Com o conhecimento da Força eles

podem levitar objetos e corpos, podem influenciar as mentes fracas e mesmo

soltar raios dos dedos. Existem os Jedi, que representam o bem, e os Sith que

representam o mal. Esses dois representantes da Força vivem em eterno conflito,

no qual um deve destruir o outro. No episódio I, a Ordem Jedi desconsidera a

existência dos Sith, que por sua vez estavam conspirando para dar um golpe

certeiro, concluído no episódio III. O centro da trama se dá na relação de Obi-Wan

Kenobi (Mestre) e Anakin Skywalker (o escolhido e discípulo). Obi-Wan é um

devoto membro da Ordem Jedi e indivíduo comprometido em conhecer e usar a

Força, enquanto Anakin é um jovem que iniciou sua jornada na Ordem Jedi

desenvolvendo significante parceria com seu mestre e realizando com o mesmo

muitas aventuras e enfrentando perigos, além de viver seu mundo interno, sua

vida, devires, escolhas, sentimentos, memórias e desejos. Enquanto Obi-Wan se

desenvolve ganhando crescente importância na Ordem Jedi, Anakin se

desenvolve tentando conhecer a si mesmo, explorando seus recursos e realizando

seus desejos. Obi-Wan era adaptado ao Código Jedi, enquanto Anakin sofria com

as limitações que o Código lhe impunha, mas prosseguia escalando suas

conquistas pessoais e se sobressaia enquanto dotado de excelentes talentos Jedi.

Ainda assim, Anakin nunca atingia o status de Obi-Wan, pois não tinha a mesma

devoção e comprometimento. Anakin vivia respeitando as limitações que lhe eram

impostas, mas sempre em busca de suas próprias satisfações, que não eram

compartilhadas pela Ordem Jedi. Enquanto Obi-Wan desfrutava da vida junto à

Ordem Jedi, Anakin desfrutava ao menos em parte fora da mesma, em seu

casamento secreto. Anakin sustentava um segredo, mantia um casamento secreto

e jamais o revelando para não ter que supostamente deixar a Ordem Jedi. Ele

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sentia medo quanto à revelar a verdade sobre a sua violação ao Código Jedi, pois

tal revelação tinha como consequência a sua possível expulsão. O fato é que

Anakin não concebia, pelo menos segundo o que mostram os filmes, abandonar a

Ordem Jedi e seguir seu destino só com Padmé. Sendo assim, Anakin estava

dividido, diante da necessidade de ter duas coisas que juntas não são aceitas,

essa era sua condição que configurava sua situação de conflito. Anakin não tinha

família, os Jedi eram sua família e Padmé era sua esposa. Permanecer na Ordem

não era apenas realizar seu compromisso de ser “o escolhido”, mas era um elo

que sempre teve, embora nunca tendo achado o seu devido lugar. Por mais que

Anakin tivesse passado muito tempo “bem adaptado” à Ordem Jedi, ele nunca

estava de fato acomodado, ele escolheu não abrir mão de seu casamento com

Padmé e não deixar a Ordem Jedi e seu importante serviço de defensor da

Galáxia. A combinação das escolhas de Anakin não estavam em harmonia, sendo

que uma delas impossibilitava a outra, Anakin ocultava e sustentava sua situação

proibida. No episódio III, Anakin demonstra insatisfação quanto a manter seu

casamento em segredo, dizendo estar cansado e querendo que todos saibam que

ele é casado. Para tanto precisava da confiança, reconhecimento e status da

Ordem dos Jedi. Anakin sempre escondeu a verdade da Ordem, deixando desta

forma, que seu reconhecimento, confiança e status, não fossem articulados pelo

ego em se relacionando no nível da consciência com a Ordem, mas sim, deixando

tais conteúdos sob o funcionamento da sombra, no nível inconsciente, que o levou

para “o lado negro da Força”. xxxxxxxxxxxxxxxx

Os filmes despertam a contemplação devido ao fato de se entrar em

contato com cenários, mundos e realidades desconhecidas, assim como, devido

ao fato da trama se compor de conteúdos arquetípicos: estes remontam ao

sagrado, e refletem conteúdos básicos da existência, como as mudanças, a vida

se esvanecendo, a morte, a temporalidade e a possibilidade de se acessar uma

totalidade sobre esse universo assistido, uma forma de, por meio da fantasia, se

atingir o sagrado, ou algo profundo dentro de nós que não conseguimos nomear.

O mito é capaz de apresentar todas essas questões em uma narrativa, mas a

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dimensão do mito não se trata apenas da narração, e sim dos conteúdos e

emoções que esta desperta dentro de nós.

Darth Vader é um personagem que suscita no outro ou coletivo, conteúdos

e disposições como medo, admiração, curiosidade, encantamento, entre outros.

Ele atingiu um nível de personalidade que tange à figura, que por sua vez tange

ao arquétipo. No entanto, sua especificidade adveio da história de vida de Anakin

Skywalker. Este, por sua vez, quando suscita “conteúdos e disposições” no outro,

é justamente aquele quem recebe as projeções, e as permanecerá recebendo

mesmo depois de sua morte, por ter se transformado em um símbolo.

Simbolos não são arquétipos: Vader não se tornou um arquétipo, pois nada

forma uma arquétipo, visto que eles são preformados, eles pré-existem: podemos

formar símbolos, que tangem ao arquétipo por terem sido por este influenciados.

A criação ou obra do herói, que seria uma figura que se destaca do coletivo

recebendo projeções, é um símbolo que repousará no inconsciente, sendo

eventualmente trazido pela sombra ou pelo ego. Tal criação se torna imortal por

conter, dentro de um símbolo, sentimentos, percepções e conhecimento. As

informações são organizadas em um símbolo, que fica solto no inconsciente

coletivo, podendo, de maneira semelhante a um complexo, exercer um

funcionamento autonômo e inconsciente. O herói não precisa estar vivo para

apresentar-se, seu caminho e suas superações revelam o conhecimento que se

pode tirar deste destino e manifestação do self.

O destino ou manifestação do self é dirigido pelo ego, pelas escolhas do

sujeito. As escolhas variam conforme a consciência do ego, ou seja, de acordo

com o ponto de vista do ego orientado para uma realização do self, visto que o

self, enquanto totalidade, comporta todas as possibilidades. Cabe ao ego definir

como se conduzirá a história e qual faceta do self irá se concretizar pela ação do

ego. As escolhas delineiam o desfecho da história.

O ego está à mercê das influências externas do mundo, e das influências

internas, como os complexos autônomos que interferem na atuação consciente do

ego: cabe ao mesmo desempenhar suas escolhas e destino.

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No processo de individuação, o ego se estrutura para realizar seu self; no

entanto o self, devido ao fato de ser a totalidade, compõe-se tanto do bem quanto

do mal; segundo Sanford (2007: 35) o bem e o mal, assim como a luz e a sombra,

juntos formam uma unidade e totalidade, sendo que existem exatamente as

mesmas parcelas de bem e de mal. Sendo assim, não se pode superar ou vencer

o mal, assim como não se pode detruir o bem, tratam-se de dois elementos que

como em uma balança, tendem ao equilíbrio, por serem a mesma coisa no self,

sendo polaridades opostas apenas para a consciência do ego. O autor diz:

“Se ultrapassamos os limites de nossa capacidade natural para o

amor e a bondade, acabamos criando dentro de nós mesmos a

parcela exata oposta de ódio e crueldade” (SANFORD, 2007: 35).

A hybris, crença da Grécia antiga de que os deuses puniam os excessos do

homens, pode se pautar no mesmo princípio de um equilíbrio imposto pela

unidade do self, sendo que todas as polaridades e não só o bem e o mal, formam

uma unidade total no self. A unidade impõe seu equilíbrio natural, pois regula a

consciência parcial do ego, que por sua vez configura o estado interno do

indivíduo.

Darth Vader pode ser considerado como alguém que ultrapassou sua

capacidade natural para o bem, amor e bondade, e criou dentro de si a “parcela

exata de ódio e crueldade”.

A qualidade de ser “o escolhido”, o enviado dos deuses, ou, o orientado e

designado pelo self, e o escolhido pela “Força”, pré-determina que ele traga o

equilíbrio e a completude para se prosseguir a existência não só pessoal, mas

coletiva: sendo assim, o self do herói redentor corresponderia à um self coletivo.

Logo, o herói realiza uma demanda do inconsciente coletivo,

desempenhando benfeitorias para a Galáxia. No caso de Anakin, o herói não foi

apenas o elemento que realizou demandas da comunidade, mas foi também

aquele que procurou realizar a possibilidade de completude na totalidade.

Entretanto Anakin, enquanto realização da profecia, manteve a cisão entre os Jedi

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e os Sith. Na profecia ele deveria destruir o Sith, mas ele se alia ao suposto

inimigo, deixando de destruir o objeto de projeção do mal, conforme era dele

esperado. Assim concretiza a realização do mal, reafirmando a polarização entre

bem e mal. Na chegada do herói é retratada a situação de poder pleno da Ordem

dos Jedi, que concebiam que os Sith tinham desaparecido há milênios. Tal hybris

dos Jedi foi compensada no episódio III - A vingança do Sith. Anakin neste

episódio impede a destruição do Sith e conseqüentemente passa para o lado do

mesmo. Posteriormente, no episódio VI, Vader impede que Sidious destrua o bem,

aniquilando o mal, e morrendo como um agente do bem, e mais que isso, aquele

que realiza o equilíbrio da Força. Vader pode ser considerado como o agente

sagrado que pune a hybris dos “homens”, o enviado dos deuses que não escapou

de seu destino, oferecendo-se em sacrifício para redimir-se, redimindo a

humanidade.

Vader realizou a completude indo para o caminho das trevas, compensando

seu “irmão” Obi-Wan, que seguiu para o caminho da luz. Sua ida para o lado

negro da Força representa um equilíbrio de forças, visto que o par principal dos

filmes é a dupla Obi-Wan e Anakin: cada parte por fim representou um polo e

conjuntamente compunham a totalidade.

Anakin tinha um elo com seu self: a trama desenvolvida em cada filme

contou com um sonho seu. O sonho representa este elo, sendo Anakin o

representante mais intimamente ligado à “Força”. Anakin, diferentemente dos

outros personagens, levou sua vida sem um compromisso sério, verdadeiro de

alma, com a Ordem e seus princípios, ele ocupava-se consigo mesmo, com seus

desejos, dores, alegrias e lutas, advindos de seu próprio ego. Fez suas escolhas

quando chegou o momento decisivo e deu-se fatalmente seu destino.

O ser humano, enquanto consciência do ego, realiza sua psique no tempo.

A consciência do ego pode estar no presente, pode estar no passado ou estar na

projeção do eu para o futuro. Não temos a consciência do futuro, mas apenas uma

projeção simbólica sobre ele. No entanto, o self e ordenador do destino é uma

personalidade superior da qual o ego emerge e se diferencia para se constituir o

eu, e mantém um elo para se reconectar com a personalidade superior

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representada pelo self. O self é capaz de uma consciência do futuro, pois é

arranjado numa percepção de totalidade, ou seja, numa unidade viva composta

por tudo, capaz de não dissociar presente, passado e futuro, abrangendo e

percebendo a si e ao mundo em sua totalidade.

Bem e Mal, no self, são partes de uma mesma totalidade mas no ego

elas são separadas, ficando dissociadas em seus fragmentos depositados no eu,

no outro e no coletivo. Quando estão dissociadas uma da outra, e voltadas uma

contra a outra, enquanto forças em guerra, reproduzem assim, a dinâmica de uma

anular a outra, ou destruir a outra, ignorando assim a completude entre as

mesmas. O herói é aquele que tem uma falta interna, advinda da não completude

entre os opostos do mundo, é ele que engendra tal completude, por ter

internamente tal necessidade.

Sendo assim, o herói parece necessitar de um alimento para viver, pelo

qual luta ou morre. As metas pessoais do herói não dizem respeito apenas a ele,

pois ele realiza uma carência da consciência coletiva, dando-lhe a completude que

lhes falta.

Devido à carência que o ambiente coletivo lhe impõe ele luta para obter sua

condição de ser, mas morre para tanto, usando sua vida para conseguir se realizar

como pessoa, mas também para servir à necessidade de ampliação de

consciência do coletivo

O herói renova o mundo trazendo o novo, da mesma forma que luta para

nascer, saindo do útero para o mundo, e depois abandonando a mãe para ganhar

seu mundo. O herói luta para ser o que o mundo ainda não lhe oferece, chegando

até sua morte.

A vida do herói é a sua luta; há um desencaixe pela sua diferenciação e

singularidade, e ao mesmo tempo é-lhe oferecido um lugar a ocupar na

comunidade, uma missão a realizar em nome do coletivo. Afinal, ele é “o

escolhido”, não o sujeito da ação, mas aquele que recebe uma determinação.

Escolha ou destino? Deixar-se capturar por uma identidade pré-determinada ou

construir-se num movimento de construção-desconstrução, permanência-

impermanência? Como ser si-mesmo na busca pela integração rumo à totalidade?

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A riqueza do mito está não apenas no encontro de respostas, mas valida-se no

caminho percorrido na direção da completude na eterna busca do sentido, do

significado.

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