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O ESTUDO DA PLURALIDADE CULTURAL COMO INSTRUMENTO DE COMBATE À DISCRIMINAÇÃO RACIAL NA ESCOLA Francisco Marlon de Sousa 1 RESUMO Este trabalho visa reconhecer o estudo da pluralidade cultural como instrumento de combate à discriminação racial na escola, considerando que valorizar a diversidade cultural é atuar sobre um dos mecanismos de discriminação e exclusão, entraves à plenitude da cidadania para todos e, portanto, para a própria nação. Para viver democraticamente em uma sociedade plural é preciso respeitar os diferentes grupos e culturas que a constituem. O grande desafio da escola é reconhecer a diversidade como parte inseparável da identidade nacional e dar a conhecer a riqueza representada por essa diversidade etnocultural que compõe o patrimônio sociocultural brasileiro, investindo na superação de qualquer tipo de discriminação e valorizando a trajetória particular dos grupos que compõem a sociedade. Dessa forma, a escola deve posicionar-se criticamente em relação a esses fatos, mediante informações corretas, cooperando no esforço histórico de superação do racismo e da discriminação, e é essa a proposta desse trabalho, construído a partir de pesquisa bibliográfica com o objetivo de alertar para o processo de discriminação racial nas escolas. Palavras-Chave: Pluralidade Cultural, Discriminação Racial, Escola Introdução A sociedade brasileira caracteriza-se por uma pluralidade étnica, sendo esta produto de um processo histórico que inseriu num mesmo cenário três grupos distintos: portugueses, índios e negros de origem africana. Esse contato favoreceu o intercurso

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O ESTUDO DA PLURALIDADE CULTURAL COMO INSTRUMENTO DE COMBATE À DISCRIMINAÇÃO RACIAL NA ESCOLA

Francisco Marlon de Sousa1

RESUMO

Este trabalho visa reconhecer o estudo da pluralidade cultural como instrumento de combate à discriminação racial na escola, considerando que valorizar a diversidade cultural é atuar sobre um dos mecanismos de discriminação e exclusão, entraves à plenitude da cidadania para todos e, portanto, para a própria nação. Para viver democraticamente em uma sociedade plural é preciso respeitar os diferentes grupos e culturas que a constituem. O grande desafio da escola é reconhecer a diversidade como parte inseparável da identidade nacional e dar a conhecer a riqueza representada por essa diversidade etnocultural que compõe o patrimônio sociocultural brasileiro, investindo na superação de qualquer tipo de discriminação e valorizando a trajetória particular dos grupos que compõem a sociedade. Dessa forma, a escola deve posicionar-se criticamente em relação a esses fatos, mediante informações corretas, cooperando no esforço histórico de superação do racismo e da discriminação, e é essa a proposta desse trabalho, construído a partir de pesquisa bibliográfica com o objetivo de alertar para o processo de discriminação racial nas escolas.

Palavras-Chave: Pluralidade Cultural, Discriminação Racial, Escola

Introdução

A sociedade brasileira caracteriza-se por uma pluralidade étnica, sendo esta produto de um processo histórico que inseriu num mesmo cenário três grupos distintos: portugueses, índios e negros de origem africana. Esse contato favoreceu o intercurso dessas culturas, levando à construção de um país inegavelmente miscigenado, multifacetado, ou seja, uma unicidade marcada pelo antagonismo e pela imprevisibilidade (MENEZES, 2002).

Apesar desse intercurso cultural, esse contato desencadeou alguns desencontros. As diferenças se acentuaram, levando à formação de uma hierarquia de classes que deixava evidentes à distância e o prestígio social entre colonizadores e colonos. Os índios e, em especial, os negros permaneceram em situação de desigualdade situando-se na marginalidade e exclusão social, sendo esta última compreendida por uma relação assimétrica em dimensões múltiplas – econômica, política, cultural. Sem a assistência devida dos órgãos responsáveis, os sujeitos tornam-se alheios ao exercício da cidadania.

Esse acontecimento inicial parece ter de algum modo subsistido, contribuindo para o quadro situacional do negro. O seu cotidiano coloca-o frente à vivência de circunstâncias como preconceito, descrédito, evidenciando a sua difícil inclusão social. Sendo assim, busca-se por meio deste trabalho compreender como são construídas as relações raciais num dos espaços da superestrutura social do país, que é a escola, e como ela contribui para a formação da identidade das crianças negras.

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O estudo do racismo sob uma perspectiva educacional oferece uma possibilidade de colocar num mesmo cenário a problematização de duas temáticas de inquestionável importância. Ao contemplarmos as relações raciais dentro do espaço escolar, questionamo-nos até que ponto ele está sendo coerente com a sua função social quando se propõe a ser um espaço que preserva a diversidade cultural, responsável pela promoção da eqüidade. Sendo assim, aguardamos mecanismos que devam possibilitar um aprendizado mais sistematizado favorecendo a ascensão profissional e pessoal de todos os que usufruem os seus serviços.

O preconceito está pautado em um forte componente emocional que faz com que os sujeitos se distanciem da razão. O afeto que se liga ao preconceito é uma fé irracional, algo vivido como crença, com poucas possibilidades de modificação. O preconceito difere do juízo provisório, já que este último é passível de reformulação quando os fatos objetivos demonstram sua incoerência, enquanto os preconceitos permanecem inalterados, mesmo após comprovações contrárias (HELER, 1988).

Os sujeitos que possuem tal crença constroem conceitos próprios, marcados por estereótipos, que são os fios condutores para a disseminação do preconceito, pois se encontram em consonância com os interesses do grupo dominante, que utiliza seus aparelhos ideológicos para difundir a imagem depreciativa do negro, do índio etc. A conseqüência dessas construções preconceituosas é a manifestação da discriminação, uma ação que pode variar desde a violência física — quando grupos extremistas demonstram todo o seu ódio e intolerância pelo extermínio de determinada população — até a violência simbólica, manifestada por rejeições provenientes de uma marca depreciativa (estigma) imputada à sua identidade, por não estar coerente com o padrão estabelecido (branco/europeu).

Assim, é de suma importância a necessidade de se estudar e compreender como o sistema educacional brasileiro tornou-se excludente e “preconceituoso”, como também saber por que o número de negros (em idade escolar) é menor que o de brancos, nas instituições escolares, desde o ensino fundamental até o ensino superior, agravando-se ainda mais neste último. O discurso do professor em sala de aula e do corpo administrativo, na prática, não se concretiza, pois o discurso se distancia em muito das ações praticadas, revelando assim a sutileza da discriminação na escola e a falta de democracia.

1. O preconceito racial no Brasil

Segundo o discurso baseado em ideais utópicos de uma sociedade igualitária, “preconceito racial” é algo que não existe no Brasil, porém o que se observa é uma postura totalmente contrária, que se apresenta de forma mascarada, encoberta em atitudes inocentes e casuais que trazem disfarçadas uma forte carga de exclusão racial. A sociedade brasileira vive com vendas nos olhos, com uma cegueira a este respeito, sem querer discutir o problema. É preciso que se trate o assunto de frente, pois o racismo está de forma sutil, entranhado nos segmentos fundamentais da sociedade e na cultura brasileira e, conseqüentemente, o sistema educacional está incluído neste assunto. Vivemos num país onde a mistura de raças é extremamente significativa, convivemos com as mais variadas raças nos bancos escolares, no trabalho, enfim, no nosso cotidiano. É inadmissível, que nos dias atuais as pessoas possam se incomodar, com as diferenças raciais. Em todas as raças há pessoas boas e ruins, com bom ou mau caráter. A maldade e os defeitos não estão na raça, e sim, dentro da alma, assim como a bondade e a benevolência.

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É notória a existência de uma violência ‘encoberta’ e ‘normalizada’ que impossibilita o exercício democrático e, conseqüentemente, a gestão democrática, pois o princípio fundamental da democracia é a igualdade de direitos, sejam brancos, negros, amarelos, mulatos, etc. Para a compreensão melhor destes fatos e das conseqüências por eles provocadas, será preciso analisar qual a origem dos mesmos no contexto educacional, traçando a relação entre preconceito racial, educação e gestão democrática.

Para um melhor entendimento do preconceito em sala de aula é necessário reportar-se a um passado longínquo, ao período colonial, pós-abolicionista, pois alguns fatos da época terão que ser considerados, fatos estes referentes à especificidade da origem racial no Brasil. O problema, basicamente, começou e desenrola-se a partir da diferença de capital cultural entre negros e brancos que influenciou consideravelmente a construção da identidade de ambas as raças no Brasil de hoje.

A abolição da escravatura no Brasil não livrou os ex-escravos e/ou afro-brasileiros (que já eram livres antes mesmo da abolição em 13 de maio de 1888) da discriminação racial e das conseqüências nefastas desta, como a exclusão social e a miséria. A discriminação racial que estava subsumida na escravidão emerge, após a abolição, transpondo-se ao primeiro plano de opressão contra os negros. Mais do que isso, ela passou a ser um dos determinantes do destino social, econômico, político e cultural dos afro-brasileiros (SANTOS, 1997).

Dessa forma a trajetória social do negro no Brasil carrega em sua herança social uma bagagem de subordinação, condições de opressão e exclusão, sendo o mesmo oprimido e subjugado ao branco, desde suas raízes históricas até os dias atuais. Assim, de maneira sutil, o racismo vem sendo construído e coloca o negro em uma posição inferiorizada, sem voz, com o peso da pobreza. Estes são significados simbólicos, mediadores nas relações de poder de grupos e classes, e uma das causas das desigualdades entre negros e brancos na sociedade competitiva e de classes as quais pertencemos, esvaziando, assim, o discurso de uma sociedade igualitária e justa.

Essas influências marcaram profundamente a história da escola no Brasil, consolidando mentalidades e atitudes das quais freqüentemente o educador não se dá conta em seu cotidiano. Encontram-se manifestações discriminatórias entre alunos, educadores e funcionários administrativos. Um quadro perverso pelo que significa de desrespeito ao aluno na situação direta de sala de aula, criando expectativas preconceituosas em relação ao seu desempenho (BRASIL, 1998).

A escola vem legitimando a exclusão racial e, sutilmente, violentando e destruindo sonhos, oportunidades de muitas crianças que: [...] depois de um período de anos de experiências em instituições, nas quais os significados de raça e poder desempenham um papel tão importante, é quase destruído no processo (APPLE, 1999, p.14). A escola, como gerador de um espaço de encontro entre os diferentes modos de ser, de pensar, de sentir, de valorizar e de viver formas em um determinado tempo e espaço, estaria sendo referência na construção da identidade de indivíduos e grupos sociais, dignificando os mesmos.

O que se observa é que a escola reproduz exatamente o ‘capital cultural’ da classe dominante que em sua maioria é branca. Estes detêm os significados culturais, hoje, mais valorizados, promovendo assim a violência simbólica, tornando o racismo oficial, isto é, algo instituído como normal. Este conhecimento é visivelmente percebido e manifestado por meio de brincadeiras, apelidos referentes a cor, contribuindo para que a criança negra se torne tímida, por não saber enfrentar a discriminação, o preconceito, retraindo-se e se auto-discriminando, assumindo assim uma posição de diferente dentro da escola.

Esta situação é também um dos fatores a contribuir nos índices de analfabetismo, evasão e atraso escolar, apresentados, por essas crianças. Este fato se estende até a vida adulta dos indivíduos e colaboram para que o significado verdadeiro da democracia se esvaia, pois a

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violência – preconceito racial – exclui e impossibilita de certa forma, a gestão democrática e, conseqüentemente, a democratização da educação dentro da escola.

Segundo Rodriguez (1998) a escola, dentro da sociedade, tem o papel de combater o preconceito, preocupando-se em não reproduzir estereótipos que rotulem para desqualificar grupos raciais e étnicos, sendo um espaço democrático onde todos possam ser iguais tendo os mesmos direitos. Sua função poderia ter sentido no momento em que fosse capaz de preparar o aluno “para viver no meio de culturas diferentes, compreendendo as situações multiculturais, facilitando-lhe o domínio de outros costumes e formas de costumes diferentes dos próprios” (RODRIGUEZ, 1998, p. 4).

O racismo que se perpetua na sociedade brasileira é inegável. Mesmo os maiores adeptos do mito da democracia racial não conseguem explicar a exclusão da população negra das condições básicas de sobrevivência. Quando chegamos nessa conclusão, algumas questões nos sobrepujam: que instrumentos poderão contribuir na alteração desse quadro? Que alternativas tem-se apontado? Como tem fluído o debate sobre políticas reparatórias na sociedade?

1.1. Preconceito racial é crime

As diferentes concepções acerca de negritude, racismo, discriminação e preconceito delineiam o desenvolvimento do projeto da escola. E, neste movimento, elementos da cultura dominante são adotados, na maioria das vezes, como uma forma de sobreviver em meio a tantos conflitos e tentativas de destruição da imagem negra. Essa condição é, ao mesmo tempo, uma denúncia do quanto o racismo está fortalecido em nossa sociedade.

O contraponto para essa reflexão pode ser ilustrado pela reflexão de Peter McLaren(2000: 293): “(...) compreender como tanto a cultura oficial quanto as culturas populares fundem diferença e identidade em uma ideologia de pluralismo liberal e em uma visão iluminista e soberana de tolerância e inclusão (...)”

O problema é que as pessoas fecham os olhos para tudo, até mesmo para o crime cometido. Pois de acordo com o artigo 5° da Constituição Federal, nossa Lei Magna: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. A prática do racismo além de estar garantida pela Lei Maior, constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito o infrator à pena de reclusão, nos termos da Lei 10.639/03. O ofendido pode ingressar na Justiça contra o agressor dentro da esfera penal (amparado por leis federais que definem os crimes resultantes do preconceito de raça ou cor), como na cível, com indenização por danos morais.

O Brasil somente passou a punir o preconceito racial em 1951 (lei 1390/51). A lei 1390/51 (Lei Afonso Arinos) previa a pena de detenção. Posteriormente veio a lei 7716/89, que previa a pena de reclusão. De 1951 a 1989 apenas quatro casos de preconceito racial foram registrados, todos sem nenhuma condenação. O crime de preconceito racial pune a segregação, enquanto que o crime de injúria pune a ofensa. A criminologia pune o racismo.

2. O preconceito racial na escola

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Um entendimento do racismo no cotidiano da educação é condição para se arquitetar um novo projeto de educação que possibilite a inserção social igualitária e destravar o potencial intelectual, embotado pelo racismo, de todos os brasileiros, independentemente de cor, raça, gênero, renda, entre outras distinções. Tal fato contribuirá para o desenvolvimento de um pensamento comprometido com o anti-racismo, combatente da idéia de inferioridade e superioridade de indivíduos ou de grupos raciais e étnicos, que caminha para a compreensão integral do sujeito e no qual a diversidade humana seja formal e substantivamente respeitada e valorizada (CAVALLEIRO, 2000).

A ausência de uma reflexão sobre as relações raciais no planejamento escolar da educação brasileira tem impedido a promoção de relações interpessoais respeitáveis e igualitárias entre os agentes sociais que integram o cotidiano da escola. O silêncio sobre o racismo, o preconceito e a discriminação raciais nas diversas instituições educacionais contribui para que as diferenças de fenótipo entre negros e brancos sejam entendidas como desigualdades naturais. Mais do que isso, reproduzem ou constroem os negros como sinônimos de seres inferiores.

O silêncio escolar sobre o racismo cotidiano não só impede o florescimento do potencial intelectual de milhares de mentes brilhantes nas escolas brasileiras, tanto de alunos negros quanto de brancos, como também nos embrutece ao longo de nossas vidas, impedindo-nos de sermos seres realmente livres “para ser o que for e ser tudo” – livres dos preconceitos, dos estereótipos, dos estigmas, entre outros males.

No cotidiano escolar, considerável parcela de profissionais da educação diz não perceber os conflitos e as discriminações raciais entre os próprios alunos e entre professores e alunos. Por esse mesmo caminho, muitos também não compreendem em quais momentos ocorrem atitudes e práticas discriminatórias e preconceituosas que impedem a realização de uma educação anti-discriminatória. Porém, um olhar um pouco mais atento e preocupado com as relações estabelecidas na escola flagra situações que constatam a existência de um tratamento diferenciado que hierarquiza o pertencimento racial dos alunos. Essa diferenciação de tratamento, uma atitude anti-educativa, concorre para a difusão, a reprodução e a permanência do racismo no interior das escolas e na nossa sociedade como um todo.

De acordo com dados fornecidos por órgãos de pesquisas como o Pnad – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – é observado um contingente expressivo de uma trajetória escolar difícil, em que 40% das populações negras e pardas são analfabetas, ou seja, possuem menos de quatro anos de estudo funcional, acompanhado de um baixo rendimento, e índices de reprovação e evasão maiores do que os das crianças brancas.

Para compreender esse fato, poderemos pensar em alguns indicadores, tais como: a necessidade de ingresso no mercado de trabalho de modo precoce para complementar a renda familiar, ou ainda, a representação da escola, para muitas crianças, como um referencial de fracasso, já que "não conseguem aprender", embora isso não seja impedimento meramente cognitivo, mas uma possível dificuldade de inserção das crianças negras no espaço escolar, por se sentirem "excluídas" do mesmo; uma exclusão simbólica, já que a criança tem acesso à matrícula e à sala de aula, mas não é aceita no contexto mais amplo.

Diversos autores preocuparam-se com a relação entre racismo e educação, desenvolvendo pesquisas nessa linha. Uma delas foi realizada por Gusmão (1999), com crianças pobres de periferia urbana ou do meio rural, e tinha como objetivo verificar de que forma estigmas e estereótipos se fixam na vida do negro. Para tal, foram analisados desenhos nos quais foi possível observar como se estrutura o mundo simbólico e de que forma as crianças olham o mundo e são olhadas por ele.

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No universo investigado, incluiu-se também o sistema educacional. Por meio dos desenhos, foi possível observar qual a compreensão tida pelos dois mundos: brancos/negros. O branco foi representado como vinculado ao que é civilizado, urbano, bem apresentado, sorridente, enquanto o negro seria o inverso: meio rural ligado ao trabalho físico, desprovido de dinheiro e de possibilidades. A imagem do negro é mutilada de atribuições positivas, é representada pelas crianças como um mundo triste, marcado pela violência e pela distância real e simbólica entre branco-negros.

É possível observar que há uma aparente falta de intervenção por parte dos educadores em tal problemática. Alguns fatores que estariam implicados em tais questões seriam: I - Os educadores poderiam estar imbuídos de forte impregnação da ideologia dominante, que oprime e nega tudo aquilo que se distancia do padrão estabelecido, impossibilitando-os de pensar numa perspectiva multicultural. II - Mitificação da instituição Escola, acreditando que ela seria a detentora de um suposto saber e, por conseguinte, "dona da verdade", intimidando alguns educadores a não macular tal imagem, não questionando determinada postura ou a adoção de determinado material didático, permanecendo a sensação de mal-estar que não é significada, ou seja, não é falada, dando continuidade ao silêncio e à cumplicidade com determinadas atitudes. III - Falta de preparo dos professores para lidar com a questão racial em sala de aula, desencadeando a difusão da discriminação racial. Essa falta de preparo denota sinais de preconceito.

Em todos os grupos humanos, é possível observar a utilização de meios pedagógicos como forma de transmissão do saber, por meio dos quais os sujeitos compartilham conhecimentos, símbolos e valores. Em sociedades "modernas", criou-se uma sistematização desse saber, nas quais mediante modelos formais e centralizados as informações são transmitidas. Acreditava-se que essa seria a forma viável de adquirir polidez e desenvolver um conhecimento mais especializado. Esse locus de conhecimento foi denominado Escola, constituindo-se num sistema aberto que passou a fazer parte da superestrutura social formada por diversas instituições como: família, igreja, meios de comunicação. O sistema escolar é organizado para cumprir uma função social que, em geral, está de acordo com as demandas sociais.

O seu principal objetivo é formar um sujeito apto a assumir seu espaço na sociedade capitalista, ou seja, produtivo, submisso, tendo boa interação com o seu grupo social. Para isso, é necessário manter ativos os controles sociais, que são formados por regras aplicadas ao cotidiano escolar, "sanando" qualquer disfunção que venha impedir a efetuação do processo educativo. Para um controle mais eficaz, utilizam-se recursos que podem variar desde a retaliação ou punição até a segregação ou marginalização dos grupos considerados desviantes da norma. Essas regras institucionais operam de modo simbólico, repercutindo e legitimando outros espaços sociais que habitualmente estão de acordo com as instâncias de poder (ABRAMOVAY, 2002).

O papel da escola é o de uma instituição socialmente responsável não só pela democratização do acesso aos conteúdos culturais historicamente construídos, mas também o de co-responsável pelo desenvolvimento individual de seus membros (em todos os seus aspectos), objetivando sua inserção como cidadãos autônomos e conscientes em uma sociedade plural e democrática. Para isso, ela deve tomar para si a responsabilidade de também trabalhar o desenvolvimento das capacidades cooperativas ao mesmo tempo em que respeitando as diversidades das crianças. Este ambiente escolar, quando construído, permite a inserção de metodologias de trabalho em que professores respeitam em suas salas de aula o ritmo de aprendizado e de desenvolvimento de cada aluno, conscientes de que a diversidade leva a trocas significativas do sujeito consigo mesmo e com o meio à sua volta. Essas trocas mais livres e democráticas, quando os sujeitos têm a oportunidade de fato de colocar suas idéias, condutas e sentimentos em reciprocidade com os demais exercitam o funcionamento

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cognitivo dentro de situações reais do cotidiano e não em cima de situações clínicas artificiais, ou de conteúdos dissociados de sua realidade.

3. A temática da pluralidade cultural segundo os PCNs

Os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs constituem um referencial de qualidade para a educação no Ensino Fundamental em todo o País. Sua função é orientar e garantir a coerência dos investimentos no sistema educacional, socializando discussões, pesquisas e recomendações, subsidiando a participação de técnicos e professores brasileiros, principalmente daqueles que se encontram mais isolados, com menor contato com a produção pedagógica atual (BRASIL, 1997).

Os PCNs procuram nortear a elaboração dos mais variados Projetos Pedagógicos por todo o Brasil - possuem uma história enraizada no movimento social de educadores. Em função destas raízes, os PCNs, além de pontuarem os diversos conteúdos das disciplinas escolares, ocupam-se com a inserção da escola em um contexto social mais amplo: “Os conteúdos escolares que são ensinados devem, portanto, estar em consonância com as questões sociais que marcam cada momento histórico” (BRASIL, 2000, p.33).

Por sua natureza aberta, configuram uma proposta flexível, a ser concretizada nas decisões regionais e locais sobre currículos e sobre programas de transformação da realidade educacional empreendidos pelas autoridades governamentais, pelas escolas e pelos professores. Não configuram, portanto, um modelo curricular homogêneo e impositivo, que se sobreporia à competência político-executiva dos Estados e Municípios, à diversidade sociocultural das diferentes regiões do País ou à autonomia de professores e equipes pedagógicas.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL: 1997) que apresentam como tema transversal o tema da Pluralidade Cultural, suscitam preocupações ao proporem uma identidade nacional denominada brasilidade não questionando as bases etnocêntricas desta constituição dissemina a crença de que o conhecimento, por si só, transformará as bases racistas da sociedade. Apresentando propostas apenas no campo teórico (novos conteúdos) e moral (empatia e solidariedade aos que sofrem discriminação) que não rumam para alteração da estrutura educacional.

“A análise do documento ‘Pluralidade Cultural’, no contexto dos PCN’s (Brasil, 1997), levou a constatar as contradições discursivas pelas quais o tema é tratado, detectando-se desde propostas em uma linha intercultural crítica de desafio a estereótipos e preconceitos, até afirmações que reduzem a discriminação a uma manifestação psicológica de medo, a diversidade cultural a um conjunto de identidades ‘homogêneas’, a identidade nacional ao reflexo de uma ‘brasilidade’ idealizada e não problematizada, e a educação multicultural a um mero conhecimento de manifestações culturais e ritos diversificados”. (CANEN: 2000: 147)

Em virtude desta visão ampla do papel da escola, os PCNs propõem que sejam inseridos em todas disciplinas, os Temas Transversais - temáticas como cidadania, ética, pluralidade cultural, vida sexual, entre outras, que podem fazer parte dos conteúdos de todas as áreas, pois são passíveis de diferentes abordagens, de acordo com a conjuntura de cada escola, e de seu Projeto Pedagógico.

Dentre estes temas, esta pesquisa direcionou seu olhar para o tópico da Pluralidade Cultural, premente de ter suas aplicações educativas aprofundadas - em meio às novas formas de

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convivência humana, nem sempre harmônicas e muitas vezes violentas, torna-se fundamental o desenvolvimento do aprendizado da vida em conjunto. Segundo DELORS (2001):

(...) a modificação profunda nos quadros tradicionais da existência humana, coloca-nos perante o dever de compreender melhor o outro, de compreender melhor o mundo. Exigências de compreensão mútua, de entre ajuda pacífica e, por que não, de harmonia são, precisamente, os valores de que o mundo mais carece (DELORS, 2001, P.19)

Ou como reforça Morin (2001, p.17), uma das tarefas capitais da educação é colocar no centro de suas ações a questão da compreensão mútua entre os seres humanos, quer estes sejam próximos ou estranhos. Para ele, isto é “(...) vital para que as relações humanas saiam de seu estado bárbaro de incompreensão”.

Percebe-se assim que o tema transversal da Pluralidade Cultural se vincula diretamente com a questão da tolerância, problemática esta que, conforme aponta FISCHMANN (2001), vem sendo destacada mundialmente em diversas conferências internacionais promovidas pelas agências da ONU, na década de 1990. O documento sobre a Pluralidade Cultural dos PCNs é incisivo ao afirmar que esta temática.

(...) diz respeito ao conhecimento e à valorização das características étnicas e culturais dos diferentes grupos sociais que convivem no território nacional, às desigualdades sócio-econômicas e a crítica às relações sociais discriminatórias e excludentes que permeiam a sociedade brasileira, oferecendo ao aluno, a possibilidade de conhecer o Brasil como um país complexo, multifacetado e algumas vezes paradoxal (FISCHMANN, 2002, Pluralidade Cultural1).

A temática da Pluralidade Cultural diz respeito ao conhecimento e à valorização das características étnicas e culturais dos diferentes grupos sociais que convivem no território nacional, às desigualdades socioeconômicas e à crítica às relações sociais discriminatórias e excludentes que permeiam a sociedade brasileira, oferecendo ao aluno a possibilidade de conhecer o Brasil como um país complexo, multifacetado e algumas vezes paradoxal. (BRASIL, 1998).

Este tema propõe uma concepção da sociedade brasileira que busca explicitar a diversidade étnica e cultural que a compõe, compreender suas relações, marcadas por desigualdades socioeconômicas, e apontar transformações necessárias. Considerar a diversidade não significa negar a existência de características comuns, nem a possibilidade de constituirmos uma nação, ou mesmo a existência de uma dimensão universal do ser humano. Pluralidade Cultural quer dizer a afirmação da diversidade como traço fundamental na construção de uma identidade nacional que se põe e repõe permanentemente, e o fato de que a humanidade de todos se manifesta em formas concretas e diversas de ser humano.

Por trabalhar com a diversidade humana, comporta uma ampliação de horizontes para o professor e para o aluno, uma abertura para a consciência de que a realidade em que vivem é apenas parte de um mundo complexo, fascinante e desafiador, na qual o elemento universal subjacente e definidor das relações inter-sociais e interpessoais deve ser a Ética. Propicia, ainda, a percepção de que essa característica sociocultural é expressão de uma pluralidade dinâmica para além das fronteiras do Brasil, a qual tem sido benéfica e estimuladora na definição de valores universais.

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Oferece, também, elementos para a compreensão de que respeitar e valorizar as diferenças étnicas e culturais não significa aderir aos valores do outro, mas, sim, respeitá-los como expressão da diversidade, respeito que é, em si, devido a todo ser humano, por sua dignidade intrínseca, sem qualquer discriminação.

É importante, ao tratar este assunto, fazer-se a distinção entre diversidade cultural, a que o tema se refere, e desigualdade social. As culturas são produzidas pelos grupos sociais ao longo das suas histórias, na construção de suas formas de subsistência, na organização da vida social e política, nas suas relações com o meio e com outros grupos, na produção de conhecimentos, etc. A diferença entre culturas é fruto da singularidade desses processos em cada grupo social.

A desigualdade social é uma diferença de outra natureza: é produzida na relação de dominação e exploração socioeconômica e política. Quando se propõe o conhecimento e a valorização da pluralidade cultural brasileira não se pretende deixar de lado essa questão. Ao contrário, principalmente no que se refere à discriminação, é impossível compreendê-la sem recorrer ao contexto social em que acontece e à estrutura autoritária que marca a sociedade. As produções culturais não ocorrem “fora” de relações de poder: são constituídas e marcadas por ele, envolvendo um permanente processo de reformulação e resistência.

Ambas, desigualdade social e discriminação, se articulam no que se convencionou denominar “exclusão social”: impossibilidade de acesso aos bens materiais e culturais produzidos pela sociedade, e de participação na gestão coletiva do espaço público — pressuposto da democracia. [...] Por esse motivo, já se disse que, na prática, o Brasil não é uma sociedade regida por direitos, mas por privilégios. Os privilégios, por sua vez, assentam-se em discriminações e preconceitos de todo tipo: socioeconômico, étnico e cultural. Em outras palavras, dominação, exploração e exclusão interagem; a discriminação é resultado e instrumento desse complexo de relações (BRASIL, 1998, p. 121-122).

Entretanto, apesar da discriminação, da injustiça e do preconceito, que contradizem os princípios da dignidade, do respeito mútuo e da justiça, paradoxalmente o Brasil tem produzido também experiências de convívio e da interetnicidade, a reelaboração das culturas de origem, constituindo algo intangível que se tem chamado de brasilidade, que permite a cada um reconhecer-se como brasileiro. Encravada nas contradições de um sistema econômico e social que se constituiu historicamente de maneira injusta, o Brasil tem essa contribuição a dar: a possibilidade de uma singularidade múltipla, multifacetada, de uma relação também (ainda que não só) amistosa e calorosa com o mundo e aberta para ele.

Por isso, no cenário mundial, o Brasil representa uma esperança de superação de fronteiras e de construção da relação de confiança na humanidade. A singularidade que permite essa esperança é dada por sua constituição histórica peculiar no campo cultural. O que se almeja, portanto, ao tratar de Pluralidade Cultural, não é a divisão ou o esquadrinhamento da sociedade em grupos culturais fechados, mas o enriquecimento propiciado a cada um e a todos pela pluralidade de formas de vida, pelo convívio e pelas opções pessoais, assim como o compromisso ético de contribuir com as transformações necessárias à construção de uma sociedade mais justa.

A coexistência da ampla diversidade étnica, lingüística e religiosa em solo brasileiro coloca a possibilidade da pluralidade de alternativas. De certa forma, é como se o plural que se constata, seja no convívio direto, seja por outras mediações, evidenciasse e ampliasse o plural

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que potencialmente está em cada um. Assim, o princípio de liberdade se afirma nas possibilidades múltiplas de cada um, na polissemia subjetiva que permite escolhas e novos encontros.

Tratar da diversidade cultural, reconhecendo-a e valorizando-a, e da superação das discriminações é atuar sobre um dos mecanismos de exclusão — tarefa necessária, ainda que insuficiente, para caminhar na direção de uma sociedade mais plenamente democrática. É um imperativo do trabalho educativo voltado para a cidadania, uma vez que tanto a desvalorização cultural — traço bem característico de país colonizado — quanto a discriminação são entraves à plenitude da cidadania para todos; portanto, para a própria nação.

4. O combate à discriminação racial através do processo educacional

Não há como negar que o preconceito e a discriminação raciais constituem um problema de grande monta para a criança negra, visto que essa sofre direta e cotidianamente maus tratos, agressões e injustiças, os quais afetam a sua infância e comprometem todo o seu desenvolvimento intelectual. A escola e seus agentes, os profissionais da educação em geral, têm demonstrado omissão quanto ao dever de respeitar a diversidade racial e reconhecer com dignidade as crianças e a juventude negra.

O racismo e seus derivados no cotidiano e nos sistemas de ensino não podem ser subavaliados ou silenciados pelos quadros de professores. É imprescindível identificá-los e combatê-los. Assim como é pungente que todos os educadores digam não ao racismo e juntos promovam o respeito mútuo e a possibilidade de se falar sobre as diferenças humanas sem medo, sem receio, sem preconceito e, acima de tudo, sem discriminação.

No cotidiano escolar, considerável parcela de profissionais da educação diz não perceber os conflitos e as discriminações raciais entre os próprios alunos e entre professores e alunos. Por esse mesmo caminho, muitos também não compreendem em quais momentos ocorrem atitudes e práticas discriminatórias e preconceituosas que impedem a realização de uma educação anti-discriminatória. Porém, um olhar um pouco mais atento e preocupado com as relações estabelecidas na escola flagra situações que constatam a existência de um tratamento diferenciado que hierarquiza o pertencimento racial dos alunos. Essa diferenciação de tratamento, uma atitude anti-educativa, concorre para a difusão, a reprodução e a permanência do racismo no interior das escolas e na nossa sociedade como um todo.

O conflito e a discriminação raciais na escola não se restringem às relações interpessoais. Os diversos materiais didático-pedagógicos – livros, revistas, jornais, entre outros – utilizados em sala de aula, que, em geral, apresentam apenas pessoas brancas com e como referência positiva, também são ingredientes caros ao processo discriminatório no cotidiano escolar. Quase sem exceção, os negros aparecem nesses materiais apenas para ilustrar o período escravista do Brasil - Colônia ou, então, para ilustrar situações de subserviência ou de desprestígio social.

A utilização de recursos pedagógicos com esse caráter remonta a um processo de socialização racista, marcadamente branco-eurocêntrico e etnocêntrico, que historicamente enaltece imagens de indivíduos brancos, do continente europeu e estadunidense como referências positivas em detrimento dos negros e do continente africano. Afora isso, há outros fatores que, igualmente, favorecem a interiorização/cristalização de idéias preconceituosas e atitudes discriminatórias contra os alunos negros. Dissimulações, apelidos, xingamentos, ironias

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consolidam a perpetuação de preconceitos e discriminações raciais latentes. Situações nas quais estudantes negros (as) são tratados (as) por seus colegas e/ou professores (as) com termos preconceituosos e discriminatórios sinalizam a reiterada prática de investida contra a humanidade dos primeiros, numa tentativa de transformá-los em animais irracionais ou coisas, não sujeitos sociais: “urubu”, “macaco”, “picolé de asfalto”, “a coisa está preta”, “humor negro”, “carvãozinho”, “filhote de cruz-credo”, etc.

Todos os profissionais da educação que favorecem consciente ou inconscientemente a manutenção, a indução ou a propagação de racismo, preconceitos e discriminação raciais no espaço escolar devem ser questionados e se auto-questionar quanto ao exercício de sua profissão de educador. Buscar soluções para esses problemas não é um trabalho apenas em favor dos alunos negros, representa um trabalho em favor de todos os brasileiros, quer sejam pessoas pretas, pardas, indígenas, brancas ou amarelas. Uma educação anti-racista não só proporciona o bem-estar do ser humano, em geral, como também promove a construção saudável da cidadania e da democracia brasileiras.

Neste movimento, é possível afirmar que a instituição escolar nem sempre poderá ser classificada como mera reprodutora da discriminação, do preconceito racial e do racismo.Para Henrique Cunha Jr (1996: 153):

“(...) essas ações, individuais ou coletivas, têm colocado o ensino tradicional em questão, principalmente no tocante à revelação do alunado sobre as identidades étnicas. (...) São ações afirmativas das identidades afrodescentes e dos novos enfoques possíveis, principalmente sobre história e literatura, que resultam numa espécie de alerta geral sobre as deficiências da educação brasileira”.

Portanto, os educadores brasileiros, necessitam urgentemente contemplar no interior das escolas a discussão acerca das relações raciais no Brasil, bem como de nossa diversidade racial. Nessa linha, é preciso não só boa vontade e sensibilidade dos profissionais da educação, mas também o fornecimento de material didático-pedagógico anti-racista e recursos auxiliares aos professores para que possam ministrar aulas combatendo o preconceito e a discriminação raciais.

5. Metodologia

A metodologia se constitui como uma das partes fundamentais do trabalho acadêmico, considerando-se que esta, trata-se da explicação detalhada e minuciosa dos procedimentos do trabalho de pesquisa. Partindo desse pressuposto, foram desenvolvidos os seguintes processos metodológicos: pesquisa bibliográfica em textos, artigos, livros, jornais, revistas e em rede (internet) acerca da temática abordada que deu suporte para identificar novas referências sobre a formação de professores, questões étnico-raciais, preconceito racial, a Lei 10.639/03 e suas implicações na educação brasileira; realizaram-se estudos e debates a partir de vídeos e documentários assistidos, os quais trazem relatos de Professores Universitários, cidadãos/as, moradores de comunidades carentes, pessoas que sofrem discriminação desde o momento em que nascem. Foi realizado um estudo observacional, de delineamento transversal (prevalência-período) e de base populacional. O processo de amostragem aleatória proporcional se deu por estágios múltiplos e por conglomerados.

O trabalho resulta de reflexões sobre relatos de práticas de profissionais em torno de projetos na temática étnico/racial em unidades de ensino. As questões levantadas suscitaram um breve

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histórico e caráter de algumas leis pertinentes à população negra no país que, sendo multiculturais, suas políticas públicas antidiscriminatórias deveriam reconhecer a população negra como mais uma cultura que busca a libertação e requer o direito de ter reconhecido publicamente seu pertencimento étnico.

6. Considerações Finais

É possível que a escola, apesar de ser tradicionalmente excludente, passe a contribuir profundamente para a libertação e formação do indivíduo, é seu papel lutar contra todos os tipos de preconceito, não só o preconceito racial, mas as discriminações sexuais, lingüísticas e sociais. É assim que a escola proporcionará condições de aprender. É hora de a escola desvincular-se dos interesses sociais e políticos das classes dominantes para dar lugar à política das diferenças.

O ensino na escola, hoje, deve ser voltado à emancipação dos indivíduos, oportunizando os seus alunos “a construção de conhecimentos, destrezas, atitudes, normas e valores necessários para ser um bom cidadão” (Santomé, in Silva, 2005, p. 159). As ações que a escola desenvolve devem levar o educando à tomada de decisões, a debates, à defesa de opiniões, objetivando a formação de cidadãos críticos.

A escola deve respeitar cada um na sua individualidade, deverá priorizar condições iguais de aprendizagem, para que este seja o objetivo principal da escola. Valorização da cultura popular por parte da escola pode ser o ponto principal na luta contra o preconceito e as desigualdades.

É de suma importância que a efetivação de práticas democráticas, na qual todos tenham o mesmo direito e sejam respeitados independentemente da cor ou raça, comece dentro das salas de aula.

Nesse contexto, tornam-se muito importantes as atividades de pré-leitura, leitura e pós-leitura, que devem abordar os mais variados temas, principalmente aqueles que propõem uma reflexão sobre assuntos conflitantes. Ao professor cabe intermediar ações que possibilitariam solucionar os problemas apontados pelos alunos durante a reflexão e evitar que essas atividades terminem simplesmente em discussões polêmicas.

Não é chavão dizer que a escola é a principal porta de acesso à cidadania plena, mas é acreditar que a educação tem jeito, sim, e que, como educador, é possível lutar por um mundo melhor, mais digno, onde todos se sintam valorizados e respeitados.

Acreditamos numa educação que se busque o encontro com a alteridade, com outro em sua diferença, na perspectiva do diálogo, na perspectiva do intercultural e que aponte o transcultural. Falamos de uma educação que privilegie as coisas vividas pelos alunos, à história de vida do sujeito em suas relações semióticas. Uma educação que busque linhas de fuga, movimentos do desejo e que aposte na invenção, na criação.

Sem dúvida, um dos limites da pesquisa foi o de não ter conseguido reverter profundamente à conotação negativa da palavra negro/a, o que a meu ver demandaria mais tempo e outros processos concomitantes de amadurecimento. Apesar desses limites, a convivência nas oficinas sociopoéticas me propiciou inclusive às facilitadoras, maior autoconsciência dos preconceitos, pois, passei a refletir sobre os mesmos, notadamente sobre o Preconceito Racial.

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