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Tendências da Pesquisa sobre Neopentecostalismo... ALVES & OLIVEIRA Revista Diálogos – N.° 10 – Novembro de 2013 259 Tendências da pesquisa sobre Neopentecostalismo no Brasil: um estudo comparativo 1 d.o.i. 10.13115/2236-1499.2013v1n10p259 Emanoel Magno A. de Oliveira 2 Adjair Alves 3 Resumo: A religiosidade é um desses fenômenos que possibilita a compreensão do humano em seus aspectos simbólicos e rituais. Em especial, a religiosidade de expressão popular, isto é, aquela que ocorre sob a égide da organização social popular, mesmo quando possuída de um sistema institucional ou clerical; os folguedos e festas religiosas, compreendidos enquanto fenômenos culturais Regionais. No presente artigo voltamos nossa atenção para o estudo de uma manifestação da religiosidade evangélica, que embora oriunda de uma tradição secular, possui aspectos específicos no contexto em que se aplica nos possibilitando conjecturar sobre a reinvenção da tradição, nesse contexto, dado 1 Este artigo é resultado do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) defendido em 2012.2, no curso de Graduação (Licenciatura) em História da Universidade de Pernambuco – UPE – Campus Garanhuns, sob a orientação do Professor Dr. Adjair Alves. O presente artigo faz parte do segundo capítulo do referente trabalho, que para publicação nesta revista sofreu algumas alterações. 2 Estudante de Mestrado em Antropologia pelo PPGA da Universidade Federal de Pernambuco UFPE. Graduado em Licenciatura em História pela Universidade de Pernambuco – UPE – Campus Garanhuns – pesquisador do grupo de pesquisa ARGILEA, registrado no CNPq. 3 Doutor e Mestre em Antropologia pela UFPE, Graduado em Filosofia, professor Adjunto da Universidade de Pernambuco e coordenador do grupo de pesquisa ARGILEA, registrado no CNPq.

Tendências da pesquisa sobre Neopentecostalismo no Brasil ......1950, tendo seu evangelismo centrado na pregação da cura divina. Desse grupo surgiram às igrejas: Brasil Para Cristo,

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Tendências da pesquisa sobre Neopentecostalismo no Brasil: um estudo comparativo1

d.o.i. 10.13115/2236-1499.2013v1n10p259

Emanoel Magno A. de Oliveira2

Adjair Alves3

Resumo:

A religiosidade é um desses fenômenos que possibilita a compreensão do humano em seus aspectos simbólicos e rituais. Em especial, a religiosidade de expressão popular, isto é, aquela que ocorre sob a égide da organização social popular, mesmo quando possuída de um sistema institucional ou clerical; os folguedos e festas religiosas, compreendidos enquanto fenômenos culturais Regionais. No presente artigo voltamos nossa atenção para o estudo de uma manifestação da religiosidade evangélica, que embora oriunda de uma tradição secular, possui aspectos específicos no contexto em que se aplica nos possibilitando conjecturar sobre a reinvenção da tradição, nesse contexto, dado

 1 Este artigo é resultado do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) defendido em 2012.2, no curso de Graduação (Licenciatura) em História da Universidade de Pernambuco – UPE – Campus Garanhuns, sob a orientação do Professor Dr. Adjair Alves. O presente artigo faz parte do segundo capítulo do referente trabalho, que para publicação nesta revista sofreu algumas alterações.  2 Estudante de Mestrado em Antropologia pelo PPGA da Universidade Federal de  Pernambuco  –  UFPE.  Graduado  em  Licenciatura  em  História  pela Universidade de Pernambuco – UPE – Campus Garanhuns – pesquisador do grupo de pesquisa ARGILEA, registrado no CNPq. 3  Doutor  e  Mestre  em  Antropologia  pela  UFPE,  Graduado  em  Filosofia, professor Adjunto da Universidade de Pernambuco e coordenador do grupo de pesquisa ARGILEA, registrado no CNPq.  

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as formas de ritos e símbolos das tradições milenares, que são revisitadas no interior das homilias dessas formas religiosas. Estamos falando, mais especificamente das igrejas neopentecostais e trazemos como recorte teórico as pesquisas mais recentes realizadas nesse campo, no Brasil. Fazendo um diálogo com a Sociologia e Antropologia, mais especificamente das produções brasileira, tendo como recorte específico os estudos sobre neopentecostalismo no Brasil e como pano de fundo às produções dos periódicos CAPES. Em outras palavras, objetiva-se aqui estabelecer o estado da arte dos estudos sobre neopentecostalismo no Brasil.

Palavras-chave: Neopentecostais. Religiosidade. Rituais. Experiência.

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Abstract:

Religiosity is one of those phenomena that further our understanding of the human in its symbolism and rituals. In particular, the expression of popular religiosity, this is those that occur under the aegis of the popular social organization, even when possessed of an institutional system or clerical, the festivals and religious celebrations, understood as cultural phenomena Regional. In this article we turn our attention to the study of an outbreak of evangelical piety which, although coming from a secular tradition, has specific aspects of the context in which it applies enabling us to conjecture about the reinvention of tradition, in this context, given the forms of rites and symbols of ancient traditions, which are revisited within the homilies of these religious forms. We're talking more specifically the neopentecostal churches and theoretical framework as we bring

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the latest research carried out in this field in Brazil. Making a dialogue with Sociology and Anthropology, specifically the Brazilian productions, with the specific focus studies on neopentecostalism in Brazil and in the background the productions of CAPES journals. In other words, the objective here is to establish the state of the art of studies on neo-Pentecostalism in Brazil.

Keywords: Neopentecostais. Religiosity. Rituals. Experience.

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I. Pentecostalismo e Neopentecostalismo: uma

apresentação relacional

O crescimento das igrejas evangélicas no Brasil dá uma nova forma ao mosaico religioso no país, um fenômeno recente que tem estimulado estudos nas mais variadas áreas do pensamento. Um desses fenômenos que tem dado ocasião a hipóteses e teses, das mais variadas, é o crescimento de um tipo específico de movimento protestante no Brasil; os novos pentecostais ou neopentecostais. Movimento que se formou a partir das dissidências no seio de igrejas pentecostais, mais tradicionais, em meados dos anos de 1970.

O neopentecostalismo teve seu início no Brasil, por volta da segunda metade da década de 1970 (MARIANO, 2004). Quando vários seguimentos das igrejas evangélicas de cunho pentecostais, IURD (Universal do Reino de Deus), Internacional da Graça de Deus, Comunidade Evangélica Sara Nossa Terra e Renascer em Cristo passaram a pregar a doutrina da renovação

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pentecostal (Idem). Esse movimento, como ficou conhecido, caracteriza-se por enfatizar a atualidade dos milagres divinos, a guerra contra o diabo e seus representantes aqui na terra, e a Teologia da Prosperidade, segundo a qual; os filhos de Deus, os cristãos devem ser prósperos e vitoriosos em seus empreendimentos terrenos. Doutrinas bastante difundidas entre seus seguidores, não importando a classe social a que pertençam, o que a fez crescer; ganhar visibilidade e seguidores no Brasil.

Embora o fenômeno do neopentecostalismo seja considerado recente, suas origens remontam o pentecostalismo “clássico”, que teve sua introdução e expansão no Brasil, início do século XX, mais precisamente a primeira década do século (MARIANO, 2004). O pentecostalismo “clássico” abrange as igrejas: Congregação Cristã no Brasil e Assembléia de Deus. Um segundo grupo de igrejas surge no Brasil a partir da década de 1950, tendo seu evangelismo centrado na pregação da cura divina. Desse grupo surgiram às igrejas: Brasil Para Cristo, Deus é Amor e Casa da Benção.

A crença central do pentecostalismo – na qual fundamenta-se todas as outras práticas religiosas – é a crença na aspiração do Espírito Santo, cujo sinal e ponto máximo é a imersão no próprio Espírito Santo que, caracteriza-se como uma presença ativa e toda especial no ritual do fogo do Espírito Santo (ROLIM, 1987), onde o fiel é acometido de um êxtase espiritual e passa a proferir uma linguagem estranha (glossolalia)4, sinal externo da presença e do batismo no Espírito Santo. Tal movimento foi difundido e ganhou visibilidade em todo país. No

 4 Nome pelo qual algumas denominações pentecostais e correntes religiosas como a Renovação Carismática Católica denominam a capacidade de reproduzir o fenômeno conhecido por dom de línguas, descrito no segundo capítulo dos Atos dos Apóstolos, embora no referido livro o fenômeno seja explicado não como a fala de uma  língua estrangeira, pura e simplesmente, pelos apóstolos, mas sim o fato de os estrangeiros presentes em Jerusalém entenderem em seu próprio idioma o que estes diziam. 

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caso do neopentecostalismo, sua repercussão maior é alcançada por meio dos programas de rádio e nos horários comprados na televisão, por onde circula a teologia e moral pentecostal. Nesse período intensificaram-se os trabalhos missionários, que percorriam todo território nacional com suas cruzadas evangelísticas, fundando inúmeras igrejas. Esse avanço por todo território nacional deve-se muito pelo fato da entrada maciça, logo no inicio da década de 1980, desse segmento religioso nos meios de comunicação de massa – principalmente rádio e TV – arregimentando assim inúmeros seguidores e fiéis. Como afirma Ronaldo de Almeida (2009, p. 39):

Além do rádio, a televisão tornou-se veículo de programação do Evangelho. Graças à influência dos pregadores norte-americanos, que invadiram a televisão brasileira nos anos 1980, diversos pastores e igrejas alugaram horários nas emissoras Bandeirantes, Manchete e SBT, com firme propósito de evangelizar o telespectador.

Em inicio da década de 1980 o neopentecostalismo que se encontrava circunscrito as grandes cidades e capitais, adentra as cidades do interior do país, graças aos meios de comunicação de massa. A propaganda em veículos de comunicação local faz parte constante e se tornam o meio mais comum e eficaz a propagação e expansão de sua doutrina. Há inclusive a compra de espaço na grade de horários em emissoras de TV (nas cidades que detém) e rádios locais, o que atinge um público considerável, fazendo com que haja um fenômeno e/ou movimento crescente de tais denominações religiosas pelo Brasil afora, sobretudo, a partir de então, no interior do país.

Os resultados do último censo demográfico feito no Brasil em 2010 mostra a tendência das décadas anteriores em

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relação ao perfil religioso dos brasileiros, uma maior dinâmica e diversidade nos grupos religiosos no país. Um crescimento considerável foi o número de protestante, passando de 15,4% registrado em 2000 para 22,2% em 2010 (cerca de 42,3 milhões). Desses 60% se declaram pentecostais – assim, divididos entre pentecostais e neopentecostais5. Assim o recorte que se apresenta, mostra que nas últimas décadas parcela significativa da população brasileira incorporou o estilo de vida pentecostal/neopentecostal. Um fator considerável, como característica social dessa população de convertidos é a classe econômica a qual faz parte sua maioria; as classes C e D, quando muito a classe média baixa.

Observa-se nessas igrejas, o discurso quanto ao mundo terreno e o extraterreno (concebido como o paraíso preparado para os crentes fiéis), o segundo sobrepondo-se ao primeiro onde o crente desfrutará de inúmeras bem-aventuranças, assemelhando-se aos dogmas cristãos pregados por outras vertentes do cristianismo. No entanto, é na sua relação com o primeiro (a saber, na vida terrena) que o fiel neopentecostal afasta-se de outras denominações e dogmas evangélicos, inclusive aquela da qual se originou: os pentecostais; ao conceber em seus preceitos e dogmas, veiculados pela pregação; que as bem-aventuranças nesse mundo já podem ser concedidas ao crente que for fiel a “mensagem” e as “promessas” de cristo6. Claro que o mundo natural (terreno) ainda é concebido, na visão do crente neopentecostal e, presentes nas pregações realizadas pelos líderes e reproduzidas pelos fiéis, membros da igreja, com certa adversidade. Mas quanto à prosperidade financeira, percebe-se que o fiel se engaja em um tipo de diálogo com “Deus”, pedindo em orações fervorosas as bem-aventuranças terrenas, estas entendidas e concebidas como prelúdio das bem-

 5 Fonte IBGE, disponível em: <http://www.ibge.gov.br>. Acesso em: 12 set. 2012. 6 Termo utilizado pelos líderes das igrejas e pelos próprios fiéis/membros. 

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aventuranças celeste numa vida futura – no paraíso7. Desta forma, o crente realiza uma (das muitas) forma de pertença ao reino de Deus, por meio da igreja, pertença confirmada pela realização da benção de Deus; a prosperidade.

II. Sobre o neopentecostalismo no Brasil: a perspectiva de

Ronaldo de Almeida.

Neste artigo voltamos nossa atenção para o estudo de uma manifestação da religiosidade evangélica, que embora oriunda de uma tradição secular, possui aspectos específicos no contexto em que se aplica nos possibilitando conjecturar sobre a reinvenção da tradição, nesse contexto, dado as formas de ritos e símbolos das tradições milenares, que são revisitadas no interior das homilias dessas formas religiosas. Estamos falando, mais especificamente das igrejas neopentecostais e, trazemos como recorte teórico as pesquisas mais recentes realizadas no Brasil, estabelecendo um diálogo entre as abordagens de Ronaldo de Almeida e Roberta Campos, incluindo, ainda, o sociólogo Ricardo Mariano, no que se referem as suas análises desse segmento religioso no país.

Uma das problemáticas mais comumente levantadas sobre o segmento religioso neopentecostal é referente ao crescimento e expansão pelo território nacional. Mas como afirma Francisco Cartaxo Rolim (1987, p. 44), não se deve levar o crescimento e essa dinâmica como fator em si mesmo, dito de outro modo, a expansão pela expansão. “O crescimento dos pentecostais é, sem dúvida, significativo. Mais significativa, entretanto, do que este aspecto quantitativo é a reprodução das

 7 Visita feita a algumas igrejas desse segmento no município de Lajedo-PE. 

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crenças pentecostais e o agente desta reprodução, que são as camadas pobres que a elas aderem”. Podemos então afirmar e/ou considerar o condicionante religioso no apelo à própria crença, protagonizado pelo fiel.

Observa-se no final da década de 1960 e inicio da década de 1970 um engajamento político dos participantes da religiosidade popular no país. Inclusive dos pentecostais. Os membros passaram a formar grupos organizados como as Ligas Camponesas (organizadas principalmente pela Igreja Católica em ação conjunta com estudantes católicos, operariado e trabalhadores rurais ligados à igreja) na luta pela terra. Ao longo de quase meio século, diz Rolim (Idem, p. 70), o pentecostalismo que se movia na órbita da estrita religiosidade, a partir de então passa a se preocupar com questões políticas e sociais. Começava-se a partir daí os primeiros sinais de mudanças nas denominações pentecostais. Nesse período alguns líderes de denominações pentecostais passam a engajar-se e, com isso a influenciar seus rebanhos, em questões político-sociais. Como afirma Rolim (Idem, p. 71):

[...] a partir da segunda metade dos anos 40, os pleitos eleitorais começaram a movimentar a sociedade brasileira. Os candidatos a presidente da República, a governadores de Estados, a deputados e vereadores foram ocupando seus espaços na arena política. Surgiam lideranças políticas com suas propostas e linguagem dirigidas às camadas populares. Foi quando, na segunda metade de 50, o pastor Manuel de Melo, fundador e líder de O Brasil para Cristo, orientou esta Igreja no sentido da participação direta nas campanhas eleitorais, apresentando candidatos próprios.

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Podemos afirmar que com a entrada em meios tão díspares e até então pouco conhecido por parte desse segmento religioso, indica-nos uma situação social inovadora, onde tais transformações ou mutações sociais passam a influir e/ou influenciar no comportamento desses grupos sociais até então fechados em si mesmo. Questões políticas não são mais alvos de satanização, há uma redefinição no campo da visão de mundo: o sagrado e o profano mesclam-se. A expansão de tal segmento se dá em terreno muito bem delimitado, política e ascensão social também são “coisas de Deus”. Esse é o mote do engajamento. Nesse sentido, a transição e a dinâmica social rompem com fronteiras à medida que as recriam.

Ao analisar os neopentecostais, Ricardo Mariano8 faz uma sociologia do novo pentecostalismo no Brasil – como sugeri o título de seu livro –; atesta a ruptura com o ascetismo do qual os crentes foram sempre estigmatizados, como também a progressiva acomodação em relação à sociedade; o que na visão do autor são mudanças significativas o que torna esse segmente protestante menos distinto (MARIANO, 2012).

Embora ainda haja aquele velho combate entre os neopentecostais e o catolicismo – já que desde os primórdios do protestantismo o principal alvo foi a Igreja Católica, e o pentecostalismo não fugindo a regra – e a rivalidade seja acirrada, seguindo os pentecostais e os protestantes históricos, há, no entanto um novo “inimigo” deflagrado: o combate central das igrejas, assim como da doutrina neopentecostal são de forma clara as religiões afro-brasileiras e as religiões mediúnicas. Há um redirecionamento, atesta Mariano, nos dogmas e rituais no interior das igrejas, podendo ser confirmado pelos cultos e o próprio discurso introjetado pelos líderes neopentecostais.

 8 Doutor em Sociologia pela FFLCH-USP e professor do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS). Autor do livro Neopentecostais: sociologia do novo pentecostalismo no Brasil, publicado pela editora Loyola. 

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Entretanto, no próprio combate contra o inimigo, as igrejas incorporam práticas muito próximas àquelas evidenciadas nas religiões afros e também no espiritismo. É também incorporada à eficácia da experiência, sendo a crença efetiva em um inimigo bem delimitado – o diabo. Desta forma, legitimado, o inimigo de Deus necessita existir! Afinal não se luta contra algo inexistente. Há a credibilidade por parte dos crentes em sua existência.

A linguagem é incorporada como resultado dos esforços no ritual do exorcismo praticados nas igrejas, pois na própria dinâmica do ritual são invocados pelos mesmos nomes os espíritos, orixás e guias das religiões afro-brasileiras. Os deuses e orixás africanos são chamados pelos seus nomes, e no próprio rito evocado e expulso em um ritual muito próximo com os das religiões afro, pois no meio do culto de libertação são incorporados pelos fiéis. O falar em línguas estranhas com os neopentecostais adquire uma nova dimensão, ao invés da marca distintiva dos segmentos pentecostais ser a glossolalia, no caso dos neopentecostais mais distintiva ainda torna-se o transe de possessão (Idem, p. 129).

Uma das questões cruciais no desenvolvimento da doutrina neopentecostal é sem dúvida quanto à prosperidade terrena. Essa é uma das problemáticas mais levantadas pelas pesquisas referentes ao neopentecostalismo. Com o forte apelo ao apego a bens materiais, ou seja, as bem-aventuranças terrenas originou-se no seio das igrejas pentecostais uma tensão do ponto de vista doutrinário. A esse respeito Ricardo Mariano (2012 p. 148) afirma que, “Enquanto seus fiéis foram esmagadoramente pobres e estiverem privados dos mais elementares bens materiais, culturais e educacionais, o sectarismo e o ascetismo não geram grandes tensões internas”. Mas à medida que o processo de modernização avançou no país – justamente a partir da década de 1970 – com a ascensão social de vários segmentos da sociedade até aquele momento a margem social – entre esses, membros das igrejas pentecostais – as tensões se intensificaram. Não mais se

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dá a separação entre esse mundo e o paraíso preparado para os crentes fiéis. O crente pode sim desfrutar das bem-aventuranças já aqui na terra, a cosmologia antes marcada e bem delimitada por fronteiras tão conhecidas – o paraíso divino e eterno versus o mundo pecaminoso e passageiro – agora estabelece novos marcos e novas fronteiras.

Mariano reconhece nessa transição para a modernidade tardia ou pós-modernidade um dos fatores primordiais a essa nova tendência do pentecostalismo. Logo se deram as cisões.

Com a promessa de que o mundo seria locus de felicidade, prosperidade e abundância de vida para os cristãos, herdeiros das promessas divinas, a Teologia da Prosperidade veio coroar e impulsionar a incipiente tendência de acomodação ao mundo de várias igrejas pentecostais aos valores e interesses do “mundo”, isto é, à sociedade de consumo (MARIANO, 2012, p. 149).

Agora muitos crentes engajam-se na busca pelas tais bem-aventuranças terrenas, sendo assim, substituíram algumas concepções de cunho teológicas ao adaptarem-se a nova doutrina. A nova doutrina passa a reinterpretar os ensinamentos do evangelho, o que gera um conflito ou uma tensão interna, e uma nova demanda de fiéis. Como essa nova demanda passa a valorizar a prosperidade – material ou espiritual – como meta, há uma tendência nesse segmento que se formara dessa cisão com o pentecostalismo tradicional para a acomodação ao mundo, bem como ao consumismo.

Práticas seculares passam a ser engendradas nesse segmento outrora avesso às acomodações mundanas. Para Mariano (2003) esse efeito deu-se pelo próprio processo de secularização do Estado e a adaptação à realidade moderna. Uma

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forte evidência a esse processo de secularização é a roupagem revestida pelos lideres dos segmentos neopentecostais, dotados de um caráter empresarial. “Mostram também que esse grupo religioso adaptou-se com extrema eficiência à situação pluralista e de mercado, o que vem se constituindo numa de suas principais vantagens competitivas sobre a concorrência” (Idem, p. 123). Fator que eleva a um grau de competitividade mercadológica entre as próprias igrejas.

Em sua análise, Mariano discorda que o neopentecostalismo seja portador de virtualidades modernizantes contidas na ética calvinista ao argumentar que o neopentecostalismo vem na realidade promovendo algumas acomodações sociais a sociedade vigente e se transformando em uma religiosidade cada vez menos ascética, ou seja, menos distinta do protestantismo histórico ou do pentecostalismo tradicional. Ao atestar que o futuro não será protestante9, enfatiza o crescimento do segmento neopentecostal na América-latina e no Brasil, o descaracterizando enquanto movimento protestante (atestando o declínio deste), pois cada vez menos dotado de uma fisionomia protestante-histórica, alega assim, que ao contrário das religiões neopentecostais e até mesmo pentecostais as denominações protestantes vem desencadeando um acentuado declínio registrado nas últimas décadas no Brasil e na América-latina. O que o faz entender (não de forma profética como ele mesmo diz, porém quase isso), que o futuro não será protestante não só no Brasil, assim como na América-latina.

Ao tentar fazer uma reconstrução histórica do movimento pentecostal no Brasil, Ronaldo Almeida10 na

 9 Artigo publicado na revista de Ciências Sociais e Religião, Porto Alegre, ano 1, n. 1, p. 89-114, set. 1999. 10 Doutor em Antropologia pela USP/SP, Pós-doutor pela École des Hautes en Sociales (EHESS) na França. Professor da Unicamp e pesquisador do CEBRAP; é autor do livro A Igreja Universal e seus demônios: um estudo

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realidade faz uma etnografia dos cultos de libertação da Igreja Universal do Reino de Deus; analisa como a mensagem neopentecostal adentrou e se difundiu por lugares, credos e segmentos dos mais variados da sociedade brasileira, tenta compreender a expansão e a própria forma da mensagem neopentecostal (ALMEIDA, 2009).

O maior objetivo talvez seja em compreender como se deu de forma tão rápida a expansão desse formato de pentecostalismo e qual a lógica dessa expansão. Identifica três tipos ou modos de expansão pela qual se deu o crescimento desse segmento religioso: primeiro o institucional, segundo das relações sociais entre os fiéis e o terceiro a expansão simbólica. Essa é a tônica a qual o autor investe em sua pesquisa e relato etnográfico.

A expansão institucional se dá pela fase de difusão e diversificação de sua doutrina. Nesse caso, além do proselitismo pentecostal, outro fator responsável pela expansão pentecostal teria sido a sua própria cisão em vários segmentos institucionais, o que possibilita um alcance maior no escopo de demandas e perfis religiosos. Demandas essas anteriormente discutidas. Segundo Almeida (2009 p. 36):

Como consequência do fracionamento em inúmeros grupos, e sob a liderança de certas figuras carismáticas, o pentecostalismo compôs um espectro mais amplo e com perfis diferenciados. A fragmentação acabou oferecendo maior grau de liberdade e autonomia às novas dissidências, permitindo-lhes a elaboração de uma mensagem de salvação que visa a um público-alvo específico.

 etnográfico que faz parte da coleção Antropologia Hoje, da editora Terceiro Nome.  

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Do ponto de vista das relações sociais entre os fiéis, verifica-se na lógica interna engendrada nas igrejas neopentecostais, diferentemente das igrejas pentecostais clássicas, que desenvolve uma prática religiosa congregacional, tendo por base as relações e redes familiares; no caso dos neopentecostais a prática dar-se pelo fluxo das massas, constituindo uma igreja ou comunidade de passagem (Idem). Essas comunidades, portanto são mais propensas a uma maior centralização do poder eclesiástico, onde os sacerdotes/pastores detém uma maior influência e, são mais que isso, sinônimos de referência. Diante disso vale ressaltar a argumentação de Almeida (Idem, p. 54):

Nas denominações mais tradicionais, caso mais específico dos segmentos batistas e da Assembléia de Deus, os templos possuem relativa autonomia financeira, isto é, a sua manutenção e o sustento dos seus pastores dependem dos recursos levantados na comunidade dos fiéis. Diferentemente destas, o dinheiro arrecadado na Universal migra para um “caixa único”, sujeito a decisões do Conselho de Bispos, o que possibilita ação mais coordenada e com maior racionalidade empresarial. Essa estrutura episcopal (entenda-se piramidal, cujo poder se encontra concentrado no topo) aproxima a Igreja Universal da forma de governo eclesial da Igreja Católica Romana e a afasta do modelo comunitário do tipo “congregacional” protestante.

Já no caso da expansão simbólica o foco direcionador é o objetivo estabelecido pelo conflito entre as entidades espirituais. Com isso evidencia-se a eficácia nos rituais e suas

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respectivas respostas quanto ao anseio na vida cotidiana dos fiéis, em um tipo de pragmatismo ritualístico. A guerra entre Deus e o diabo está no cerne da questão, sempre em evidência e, a vitória do primeiro sobre o segundo caracteriza-se como o fim do sofrimento e a consequente solução dos problemas. Ou seja, o sofrimento e a causa dos males têm uma origem, e a libertação desses males exige um tipo de busca ou engajamento que se torna sua consequente libertação. Sempre é evidenciada uma causa, origem e libertação para o sofrimento. Aqui, a oração serve como se fosse um espelho do qual o crente fica ciente dos seus problemas, se convence que precisa de libertação, que se efetivará na prática do exorcismo. Assim, o sentindo do culto converge para prática final: o exorcismo. Em sua descrição etnográfica Ronaldo de Almeida (2009 p. 67) atesta:

Os cultos dedicados ao exorcismo são realizados às sextas-feiras, dia da “corrente de libertação” do diabo e de sua ação sobre a vida dos fiéis. É interessante notar que a reunião é realizada na sexta-feira, dia associado pelo senso comum aos rituais de Umbanda e do Candomblé. Não se trata, porém, de mera coincidência. A Igreja Universal dedicou propositalmente, segundo declaração dos próprios pregadores, esse dia à “libertação” dos espíritos malignos que habitam os terreiros dessas religiões.

Todo esse ritual engendrado no interior da igreja servirá como pano de fundo para se separar o “joio do trigo”, as forças demoníacas das forças divinas; também como prova de qual denominação/igreja responde com maior eficácia aos problemas da vida diária dos fiéis. Toda base estrutural do neopentecostalismo – nesse sentido da IURD – mantêm-se desse eterno conflito: Deus e o diabo. Nessa perspectiva, caracteriza-se

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a continuidade entre o ritual de incorporação das entidades e o ritual de exorcismo. Há na realidade uma inversão simbólica nesses rituais (Idem) encontrados nos terreiros de Umbanda e do Candomblé, quer dizer, as entidades que são vistas enquanto deuses do panteão afro-brasileiro nos terreiros; são entendidos como forças demoníacas nas igrejas neopentecostais.

Mas os antagonismos, segundo Almeida (idem), param por aí; porque há uma continuidade e não ruptura no ritual de incorporação e exorcismo no interior das igrejas, mesmo que seja uma continuidade às avessas. Em tais rituais, ao negar as práticas exercidas pelas religiões afro-brasileiras, os neopentecostais assimilam as crenças dos terreiros, pois estas servem como elemento constitutivo de seu discurso dogmático. Nesse sentido, sem o demônio e seus ajudadores não haveria razão de existir a prática e o dogma neopentecostal. Dito de outro modo, o fim das religiões afro-brasileiras seria o fim do neopentecostalismo.

III. Sobre o neopentecostalismo no Brasil: a perspectiva de

Roberta Bivar e Eduardo Gusmão.

Segundo Roberta Bivar C. Campos11 e Eduardo Henrique Gusmão a fé é acionada pela comunidade pentecostal o que gera assim, a reorganização emocional e cognitiva do sujeito (CAMPOS; GUSMÃO, 2008), fazem assim uma análise quanto à eficácia da cura neopentecostal e em qual medida os cultos produzem uma reorganização emocional e cognitiva para com os membros das igrejas; o foco da análise: os rituais e os

 11 Doutora em Antropologia Social pela University of St. Andrews (Escócia). Professora ajunta da UFPE, vice-líder do núcleo de pesquisa sobre religiões populares (UFPE) e do núcleo de estudos sobre o cristianismo (UFRJ). 

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mecanismos litúrgicos no que tange a eficácia simbólica inseridas nos ritos.

O ritual assume uma característica de porta de entrada para uma vida saudável e próspera (Idem), onde há uma introjeção, por parte dos membros, emocional que consolida uma reorganização cognitiva na vida dos fiéis da igreja; engendrados a partir dos cultos na igreja desencadeados na vida cotidiana. Isto é, os ritos nas igrejas como uma forma de atribuir sentido a vida, numa sociedade contemporânea pós-moderna que se vê em volta da incerteza e/ou insegurança. Assim fica claro na afirmação de Campos e Gusmão quando cita Steil, “uma nova forma religiosa de atribuir sentido de viver sob a insegurança e a incerteza dentro de uma sociedade que deixa pouco espaço para a negociação” (STEIL apud CAMPOS; GUSMÃO, 2008, p. 93).

Embora as análises que envolvem a questão da reordenação social e simbólica a partir do ritual sejam ainda importantes, Campos e Gusmão buscam com a inserção dos elementos, corpo e emoção, ou ainda, performance, corpo e experiência, os elementos que incorporam a subjetividade dos atores sociais, são evidenciados as práticas corporais e emocionais nas análises do processo da cura ritualística. Além de uma abordagem do ponto de vista do reordenamento simbólico e social, passa-se também sob tal perspectiva a ser vislumbrada análises que focalizam o potencial que o ritual tem em transformar as atitudes e as disposições emocionais, bem como corporais (Idem). O enfoque desse tipo de abordagem situa-se justamente na capacidade de reestruturação dos procedimentos do ritual na vida diária e cotidiana dos fiéis; interpretando como os indivíduos se apresentam diante do mundo em sua práxis diária, através de um processo ou proceder simbólico (Idem, p. 95).

Diante de tal perspectiva, a possessão geralmente é encarada como uma experiência negativa do ponto de vista moral nas denominações neopentecostais (CAMPOS, 1995), nesse caso a pesquisadora observou o ritual da possessão na Igreja Universal

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do Reino de Deus do Recife, onde pode-se afirma que das igrejas neopentecostais a IURD seja talvez aquela que mais faça uso de tais práticas rituais, pelo menos sem dúvida foi uma das primeiras desse segmento no Brasil. Verifica-se desse modo um distanciamento no que se refere à práticas ritualísticas de outras religiões, como por exemplo o espiritismo e as religiões afro-brasileiras. Nas religiões neopentecostais o transe é entendido enquanto “sofrimento moral relacionado a uma experiência afetiva de vergonha” (Idem p. 101).

Outro fator observado são os sinais internos da própria possessão, isso quer dizer, quando esses sinais não são exteriorizados no culto na igreja. São considerados pelos membros como os piores sinais de possessão, pois para que esses sinais de possessão não venham à tona, não sejam exteriorizados os membros têm que cumprir diariamente um tipo de ritual de vigília. Quais são esses sinais? São sinais da vida cotidiana que o fiel tem por obrigação em observar: a ira, por exemplo, de uma mãe para com o filho, do esposo com a esposa, os possíveis conflitos familiares são todos sinais – que embora faça parte da vida cotidiana – internos da possessão que não são evidentes nem exteriorizados nos cultos e rituais nas igrejas. Vale dessa forma assinalar o que argumenta Campos e Gusmão (2008 p. 106) a respeito desses sinais:

O que se percebe nos depoimentos apresentados é a penetração performática dos rituais no cotidiano. [...] A cura que a IURD promete aos seus clientes e seguidores é, portanto, parte de um processo mais abrangente que envolve a redefinição de valores, mudanças de comportamento e atitudes.

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O ritual perpassa as portas e as paredes da igreja e chega até a casa e a vida cotidiana dos fiéis redefinindo os seus modos de vida e visões de mundo. O rito como tal, pode ser encarado – e o é – enquanto um desafio que os membros das igrejas enquadram-se num tipo de prova onde o fiel se coloca diante de Deus para obter sua vitória, marcado pelo conflito contra as forças das trevas. Esse desafio é marcado pelo entrelaçamento (Idem, p. 108) entre os membros que ao mesmo tempo em que desafiam, são desafiados por Deus. Tudo sendo mediado pelo pastor, ele (o sacerdote) que serve como ponte entre os fiéis e Deus. Trata-se de uma ordem, de uma linguagem que é fornecida num contexto em que emoções e sentimentos coletivos estão envolvidos (Idem, p. 109). Não se trata de uma fé esporádica, uma fé apenas momentânea; trata-se de uma fé definida por circunstâncias profundas onde não há o menor espaço para a dúvida, uma fé inabalável. É dessa fé que depende todo o ritual e sua consequente eficácia (Idem, p. 110).

Ora, é a eficácia da crença em seres totalmente opostos que faz com quê a própria crença prevaleça. Não poderia ou não haveria razão de existência – de Deus – sem sua força contrária, o diabo; do mesmo modo que, não poderia haver diabo sem Deus. Semelhante à ideia ou o conceito de sagrado e profano, há uma relação dialética entre ambos no imaginário simbólico. “Os deuses e os demônios existem – o fiel e a congregação bem sabem. O pastor é creditado socialmente a ministrar a expulsão” (Idem, p. 111).

Há por parte dos membros das denominações neopentecostais uma forma ou uma maneira de reinterpretação da vida cotidiana. Isso quer dizer, que os fiéis/membros dessas igrejas reinterpretam de forma consciente suas ações diárias diante dos problemas e dificuldades mundanos, sejam eles físicos ou espirituais, porque há uma relação entre ambos. A cura faz

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parte desse ritual diário, a ritualização da não reincidência12. “O fenômeno da cura como um evento inserido num processo terapêutico que tem início no templo, mas cuja continuação se dá no dia a dia” (Idem, p. 113). A reflexão sobre os rituais não são apenas introjetados no próprio ritual no interior dos templos, mas também engendrados no mundo da vida cotidiana.

IV. Tendências das pesquisas sociais sobre o

neopentecostalismo no Brasil

A tríade “prosperidade, cura e exorcismo” é, geralmente, o foco das pesquisas sobre o neopentecostalismo no Brasil. Podemos afirmar que os rituais mágicos vinculados à vida próspera e saudável ocupam lugar de destaque junto com advento desse segmento, bem como de seus líderes na política brasileira. Para alguns pesquisadores essa tríade serve como base de sustentação estrutural desse segmento religioso. Assim são enfocadas as batalhas espirituais junto com a cura no interior das igrejas e sua “posterior vida próspera” vivida pelo fiel após a cura; claro que, não deixando de lado a questão do envolvimento e proselitismo político por parte dos membros e sacerdotes (alguns inclusive se candidatando a cargos eletivos). Outra questão enfocada é a que remete a própria expansão do movimento religioso pelo território nacional e a sua veiculação massiva nos meios de comunicação de massa (rádio, televisão,

 12 Roberta Bivar C. Campos faz uma descrição de como os membros da Igreja Universal do Reino de Deus se colocam diante das dificuldades diárias e como esses reelaboram suas maneiras de lidarem com o mundo e suas respectivas “tentações”. O rito também se dá no cotidiano, a não reincidência aos antigos vícios, tabaco e alcoolismo, por exemplo, é uma vitória diária contra o fantasma da possessão. 

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jornais e revistas impressos, etc.) como um fator primordial ao lado do próprio proselitismo religioso exercido pelos membros das igrejas. Nesse sentido, um dos principais pesquisadores que enfoca a questão da expansão atualmente é Ronaldo de Almeida (2009) o qual acima já foi objeto de nossas análises.

Uma das problemáticas comumente levantadas por essas pesquisas são o foco direcionador desse segmento religioso para uma atividade de consumo e lazer adaptando-se a uma cultura de uma sociedade cada vez mais consumista e cômoda a realidade vigente, o descaracterizando enquanto uma doutrina pentecostal tradicional. Ricardo Mariano (2004; 2005) em suas pesquisas já apontava para essas questões. Quanto a isso, Wania Mesquita (2007) em um artigo intitulado “Um pé no reino e outro no mundo: consumo e lazer entre pentecostais” discute o caráter direcionador para o consumo e lazer entre os pentecostais e sua respectiva origem ou influência norte-americana (MESQUITA, 2007). Afirma que além de uma dimensão pautada pelo individualismo, há um reposicionamento do sagrado, uma forma de ajustamento ao mundo moderno, habituando-se as novas tendências. Em suas palavras os bens oferecidos pelas igrejas neopentecostais é, “esses discursos e práticas acerca do sagrado, pois são combinados com desejos e necessidades das pessoas” (Idem, p. 141-142).

A demonização das religiões afro-brasileiras entra no cerne dos debates em meio aos procedimentos ritualísticos. Para Ari Pedro Oro (1997, p. 32 - 4) são três os pontos chave nessa “guerra” deflagrada entre os neopentecostais e as religiões afros: 1º a heterofobia – fobia do outro em nome da diferença, ou seja, não entra aqui a questão do racismo, mas sim a recusa do outro, do diferente o que conduz a agressividade, em detrimento do outro e em proveito próprio justificam-se as agressões; 2º sobrevivência enquanto estratégia mútua para ambos, isto é, a lógica de sobrevivência para os dois grupos (neopentecostais e afro-brasileiros), onde há uma mútua referência mesmo em

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estado de guerra, os neopentecostais necessitam das religiões afro-brasileiras, enquanto as religiões afro estão percebendo que esta “guerra” não lhe está provocando tantas baixas – pelo contrário; 3º reciprocidade – a guerra santa estaria provocando a umbandização das religiões neopentecostais e a institucionalização das religiões afro-brasileiras, o que quer dizer, que quanto mais os neopentecostais combatem as religiões afros mais se aproxima delas e, para fazer frente aos ataques neopentecostais as religiões afro-brasileiras estão adotando cada vez mais o modelo institucional. O que talvez justifique a fraca reação por parte das religiões vítimas das acusações (Idem, p. 11), a saber, as religiões afro-brasileiras.

Os “rituais mágicos” configuram uma das principais discussões levantadas a respeito do segmento neopentecostal e, quando passa a ser vinculada a Teologia da Prosperidade torna-se pano de fundo ideal para as pesquisas. Em artigo intitulado “Neopentecostalismo: dinheiro e magia”, Ari Pedro Oro (2001) debate as controvérsias desencadeadas nos rituais no interior das igrejas; afirma que “as controvérsias desencadeadas por este segmento religioso resultam, sobretudo, do importante espaço reservado por ele às práticas mágicas e financeiras” (Idem, p. 74). As práticas do neopentecostalismo reacendem os debates éticos quanto aos objetivos ensejados. Esse segmento rompe e recriam fronteiras entre o religioso e o secular criando novas situações e controvérsias, fronteiras essas antes muito bem delimitadas. O sagrado e o profano, o religioso e o secular, o mágico e o religioso, a magia e a ética, até mesmo o significado do dinheiro é recriado nesse campo do religioso (Idem). Há um deslocamento do signo dinheiro nesse segmento religioso; nesse sentido, os neopentecostais provocam questionamentos, reelaborações e rupturas de fronteiras e consensos anteriormente estabelecidos. Uma ressemantização do dinheiro que segundo o autor provoca uma etinização e racionalização da religião aos moldes

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weberianos (ORO, 2001 p. 83), o que Ricardo Mariano (2004) discorda.

As pretensões políticos-eleitorais e a questão religiosa também são enfoque muito comum sobre a religiosidade neopentecostal. Carlos Smiderle (2011) busca entender sob o pano de fundo cosmológico construído pelos próprios líderes neopentecostais o engajamento político ao qual esse grupo insurge. Faz um panorama do engajamento político ligado à cosmologia pentecostal e certo padrão e posicionamento frente à realidade. Tenta entender essa lógica a partir da contradição: tradicional e contemporâneo, afinidades modernizantes e ao mesmo tempo não modernizantes (Idem, 2011). Se a marca distintiva da sociedade moderna, afirma ele, é a fragmentação do mundo social, para o evangélico pentecostal a tendência é encarar o mundo como uma totalidade lógica, regida pela vontade divina ou pela disputa entre este e seus adversários (Idem, p. 79). Segundo o autor o processo de pentecostalização do Brasil provocou ou provoca uma realidade dúbia ou contraditória: numa lógica contrária ao processo de modernização do país. Enquanto a sociedade civil-secular brasileira rema na maré da modernização, o segmento religioso pentecostal ou neopentecostal no Brasil rema em direção oposta. Divergindo assim da maioria dos autores que, caracterizam o fenômeno neopentecostal na sociedade brasileira como um segmento que se adaptou a realidade da sociedade pós-moderna.

Interessante são as novas tendências e campo de pesquisa que surgem sobre o campo religioso do neopentecostalismo. Pesquisas relacionadas a questões de gênero inauguram uma nova forma ou um novo olhar sobre esse segmento religioso. Pesquisa como a realizada por Daniela Bessa (2006), onde esta faz uma relação com o erotismo e o feminino como objeto de demonização. Percebe nos rituais de exorcismo nos contextos neopentecostais um presente movimento de batalha espiritual onde o “demônio” insiste em se manifestar em uma

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postura feminina (Idem, p. 48), as quais são – as mulheres – sempre objeto de restrições e submissão, por exemplo, diante dos maridos. Como afirma Bessa (Idem, p. 48): “Qualquer traço feminino que fuja da submissão é considerado influência maligna e o exorcismo é a estratégia para lidar com tal mal”. A submissão é o traço marcante da cura divina.

A própria pesquisa realizada por Roberta Campos e Eduardo Gusmão (2008) (a qual discutimos acima) trás a tona um novo leque de abordagens. Como afirma Campos e Reesink (2011), deve-se mudar o eixo e inverter o mapa, nesse sentido, as contribuições das pesquisas mais recentes sobre esse fenômeno religioso vislumbram novos olhares, assim como novas perspectivas. Também torna-se necessário a descentralização da pesquisa sobre a religião no Brasil, muito centrada ainda no eixo sul-sudeste, e alguns destes pesquisadores a abordam como se lá reproduzisse a tônica de uma tendência nacional.

O religioso – onde se insere o neopentecostalismo – deve ser vislumbrado enquanto identidade, sentido e poder; sentido e sentimento; enquanto um fator religioso (GEERTZ, 2001); enquanto fator performático cultural, vislumbrado no cotidiano dos fiéis: seus atores e agentes sociais. E a performance entendida enquanto performance realizada no cotidiano, em condições históricas e sociais não somente dadas, mas também concretas e materializada por cada agente ou grupo social.

Considerações finais

Conforme vimos, as pesquisas acerca do neopentecostalismo no Brasil tendem geralmente por uma ótica pautada pela tríade prosperidade, cura e exorcismo, não distanciando-se muito dessa tendência. Diante do fato desse segmento religioso, por intermédio do discurso propagado pelos seus líderes, se inserir em assuntos seculares – como a política – e

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orbitar por esferas e setores antes não orbitada pelos atores religiosos e se interessarem por assuntos que não os meramente de cunho religioso, mas também no que tange a questões do Estado, vários pesquisadores se endereçaram por esse caminho na tentativa de entender a lógica por trás do fenômeno neopentecostalismo no Brasil.

Nenhum problema há nisso, o problema reside na medida em que apenas essas questões sejam colocadas enquanto problemáticas pelos pesquisadores. Como se a questão religiosa não pudesse ser entendida nela mesmo e endereçada ao social. Clifford Geertz apontava para essas questões em meados da década de 1970. Georg Simmel13 no final do século XIX e início do XX já apontava para o fenômeno da religiosidade, antes da própria religião institucionalizada, enquanto um fenômeno intrínseco e imanente ao homem e o social. As abordagens sociais, políticas e econômicas são sim importantes, mas a religiosidade é um fenômeno por demais peculiar, e pode ser vislumbrado por uma ótica ou um olhar especifico. Outra questão – aí entra também o foco que se dá (foco praticamente central) a chamada Teologia da Prosperidade – é a vez e a voz que dão aos líderes/pastores desse segmento, praticamente silenciando-os ou deixando-os para um segundo plano os “atores ou agentes sociais”: os membros/fiéis que dão a tônica histórico-social a este segmento. Isso não quer dizer que a figura dos líderes não seja de suma importância, mas não existiria sacerdote sem seus seguidores ou fiéis; não pode existir pastor sem rebanho, pastor sem as ovelhas. É como se as ovelhas fossem unicamente alienadas e os pastores meros “espertalhões”. O estudo desse segmento religioso – que a cada dia cresce cada vez mais – apenas por essa ótica, torna a análise, do ponto de vista analítico, simplista e reducionista.

 13  Religião:  ensaios  volume  1/2.  São  Paulo:  Olho  d’Água,  2010.  Religião: ensaios volume 2/2. São Paulo: Olho d’Água, 2011. 

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Ao fazer uma análise sociológica sobre os neopentecostais, Ricardo Mariano (2004) parece tentar estabelecer uma teoria geral sobre essa vertente religiosa, centrando sua pesquisa em questões voltadas para o consumo, mercado e acomodação a uma normatividade mercadológica em uma sociedade em volta com a pós-modernidade, direcionada para o consumismo. Quer dizer, uma análise do ponto de vista do marketing empresarial, o que acaba por descaracterizar os neopentecostais. Ronaldo de Almeida (2009) faz uma etnografia da IURD em uma igreja localizada na cidade de São Paulo, estabelecendo nexos e generalizações, a partir dos dados coletados, para a posteriori compreender a lógica da própria expansão iurdiana. A partir de seu campo estabelece generalizações, cujo em outros campos sua teoria acaba por não se encaixar enquanto um modelo teórico, pois esse segmento não se caracteriza enquanto mera inversão das religiões afro-brasileiras como alude Almeida (Idem).

Algumas pesquisas como a de Roberta Campos e Eduardo Gusmão (2008), inauguraram nas Ciências Sociais – principalmente na Antropologia – uma forma inovadora na pesquisa sobre os neopentecostais no Brasil: o ritual vislumbrado sob a ótica dos sujeitos não somente nos templos, mas, sobretudo, como forma de reordenação do próprio mundo na vida cotidiana. Nesse sentido, vislumbra um novo olhar e/ou horizonte na pesquisa sobre este segmento religioso, à medida que redireciona seu olhar para além dos líderes/sacerdotes, e passa a estabelecer uma conexão direta com fiel/membro dessas denominações, um olhar direto para seus atores e/ou agentes sociais.

Referências

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