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GRUPOS EXCLUÍDOS, DIREITOS HUMANOS E MOVIMENTOS SOCIAIS Teoria do reconhecimento e Hegel

Teoria do reconhecimento e Hegel. Aspectos introdutórios “A teoria do reconhecimento (...) oferece uma matriz interpretativa atenta à dimensão moral dos

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GRUPOS EXCLUDOS, DIREITOS HUMANOS E MOVIMENTOS SOCIAISTeoria do reconhecimento e Hegel

Aspectos introdutriosA teoria do reconhecimento (...) oferece uma matriz interpretativa atenta dimenso moral dos conflitos sociais e capaz de perceber a complexidade de tais conflitos, em suas dimenses materiais, simblicas e legais. A noo de reconhecimento traz a intersubjetividade para o cerne da justia e destaca o carter relacional e agonstico da construo da sociedade. No entanto, alguns autores operam com a palavra reconhecimento de modo distinto, como se ela fosse um novo nome para lutas simblicas ou um novo jeito de falar de lutas pela valorizao de identidades. Seja para defender uma noo alternativa de reconhecimento como o fazem Nancy Fraser e Anna Galleotti ou para critic-la como o faz Patchen Markell , o que se v uma descaracterizao das idias que Taylor e Honneth buscam em Hegel para renovar a teoria crtica. O reconhecimento visto simplesmente como a luta de grupos minoritrios para alterar sentidos partilhados ou valorizar especificidades culturais. (MENDONA. Ricardo Fabrino. Dimenso intersubjetiva da auto-realizao: em defesa da teoria do reconhecimento. Rev. bras. Ci. Soc. vol.24 no.70 So Paulo June 2009, http://dx.doi.org/10.1590/S0102-69092009000200009)

Aspectos introdutriosA emergncia da ideia de reconhecimento na teoria poltica contempornea est ligada aos estudos sobre multiculturalismo. Foi marcante, nesse sentido, a palestra proferida por Charles Taylor na inaugurao do Princeton University's Center for Human Values, em 1990, na qual ele mostrou a riqueza da idia de reconhecimento intersubjetivo para lidar com os dilemas entre igualdade e diferena. Pouco depois, em 1992, Axel Honneth publica Kampf um Anerkennung (Luta por reconhecimento), obra em que busca atualizar alguns insights hegelianos por meio da psicologia social de Mead. Desde ento, a filosofia poltica tem sido palco de um frutfero debate. A palestra de Taylor foi publicada em um livro editado por Amy Gutmann e analisada por autores de peso como Habermas, Walzer e Appiah. Em 1995, Nancy Fraser se insere no debate, confrontando a idia de reconhecimento com a de redistribuio. A mesma autora desenvolve esses insights iniciais em um coerente quadro filosfico que vai se delineado em finais da dcada de 1990. Tambm importante nessa trajetria foi um colquio realizado em Londres em 1999, que contou com a participao de Scott Lash, Mike Featherstone, Zygmunt Bauman, Stuart Hall e Boaventura Santos, alm de Honneth e Fraser.2 Os anos 2000 assistem no s ao aprofundamento do debate entre Fraser e Honneth, mas s significativas contribuies de James Tully (2000, 2004), Anna Galeotti (2002) e Patchen Markell (2000, 2003, 2006). Tambm trazem novo flego as idias de Zurn (2003, 2005), Kompridis (2007), Seglow (2009), Forst (2007), Caill (2008) e Feldman (2002). No Brasil, alm de aplicaes e leituras do conceito, importante mencionar o rico trabalho de Jess Souza (2006, 2003) que investiga a Invisibilidade da desigualdade brasileira e a Construo social da subcidadania. (Idem).

Aspectos introdutriosComo j mencionado, o precursor da teoria do reconhecimento o filsofo Charles Taylor (1994) que revisita a obra de Hegel para propor uma renovada teoria da justia. Taylor (1997, 1994) est essencialmente preocupado com os processos de construo do self, defendendo que os indivduos dependem do reconhecimento intersubjetivo para se autorrealizarem. Em uma arqueologia filosfica, o autor demonstra como o mundo ocidental construiu uma "noo multifacetada de self" (Taylor, 1997, p. 273). Noo essa que atravessada por categorias como a racionalidade, a autonomia, a interioridade e a autenticidade, que foram construdas filosfica e praticamente ao longo de sculos. Caras aos indivduos ocidentais, essas categorias teriam possibilitado tanto a universalizao da noo de dignidade, como o surgimento da ideia de que os indivduos precisam ser verdadeiros consigo prprios. A ideia a de que todos merecem respeito, mas cada um tem uma identidade singular que ganha sua forma moral em associao com o ideal de autenticidade (Thompson, 2006, p. 23).Segundo Taylor (1994), o reconhecimento envolve, portanto, um misto de polticas universais e polticas da diferena. Para alcanar a possibilidade de autorrealizao, as pessoas lutam, simultaneamente, por dignidade e para que suas particularidades sejam reconhecidas. Fazem-no em esferas ntimas e pblicas de interao social. Taylor sugere que, nessas lutas, a diferena profunda deve ser submetida a comparaes de modo a promover fuses de horizontes, no sentido gadameriano do conceito. Isso depende da interao permanente com o outro. Tal como Taylor, Axel Honneth (2001a, 2003a, b e c) tambm embasa sua proposta na filosofia de Hegel, recorrendo, especificamente, aos seus escritos no perodo de Jena. Seu modelo terico assinala a gramtica moral que rege os conflitos sociais, buscando ultrapassar a ideia de que tais lutas so simplesmente governadas pela razo instrumental e pelo desejo de autoconservao. Para Honneth, por meio do reconhecimento intersubjetivo que os sujeitos podem garantir a plena realizao de suas capacidades e uma autorrelao ntegra, uma vez que as identidades so construdas relacionalmente. (Idem)

Aspectos introdutriosNo ms de maro de 2009, Axel Honneth participou como conferencista no Centro de Cultura Contempornea de Barcelona. Em fevereiro do mesmo ano j havia gravado entrevista com Daniel Gamper Sachse, professor do Departamento de Filosofia da Universidade Autnoma de Barcelona (UAB). Os dois eventos resultaram na publicao de Reconocimiento y Menosprecio: sobre la fundamentacin normativa de una teoria social, em 2010. O livro divide-se em duas partes. Na primeira, Honneth destaca o que ele chama de evoluo da filosofia poltica a partir de mudanas sutis e graduais nas orientaes tericas normativas. At o fim da dcada de 1980, havia uma hegemonia do marxismo na Europa e uma ampla repercusso das ideias de John Rawls, nos Estados Unidos. Em que pese diferenas entre esses pensadores, existia uma sintonia acerca da necessidade de eliminar as desigualdades sociais e econmicas, mas que, segundo Honneth, no com argumentos razoveis. Porm, mais recentemente, outra ideia de justia social comea a emergir no campo poltico-filosfico cujo foco no se radicaliza na eliminao rasa da desigualdade, mas na preveno da humilhao e do menosprezo. No bojo dessa perspectiva, as categorias centrais j no so a distribuio equitativa ou a igualdade de bens, seno a dignidade e o respeito humano (HONNETH, 2009, p.19). Dito de outro modo, Honneth deixa claro j ao incio da conferncia que o reconhecimento da dignidade das pessoas e dos grupos constitui o elemento central do que ele compreende

Aspectos introdutriospor justia social e que essa tese, em ltima anlise, a que ele defende. Adiante, Honneth discorre sobre os vrios tericos, alm de Hegel e Mead, que contriburam no desenvolvimento da categoria reconhecimento, revisitando desde a tica antiga, at Maquiavel, Hobbes, Rousseau, Fichte, Kant, Marx, chegando at Habermas. Faz tambm algumas observaes sobre Charles Taylor e Nancy Fraser, seus contundentes interlocutores, na atualidade. A segunda parte do livro apresenta a entrevista que Daniel Gamper realizou com Honneth. Nesse espao, Honneth responde questes de cunho terico e emite posies pessoais sobre temas como multiculturalismo, polticas de identidade, tolerncia s diferenas e o seu itinerrio intelectual dentro da sociologia e da filosofia. Ali, ele tambm distingue o seu conceito de reconhecimento dos de Charles Taylor e de Nancy Fraser. Honneth, (p.49), na contramo de seus interlocutores, j citados, defende que reconhecimento no tem a ver com reivindicaes de legitimidade da diversidade cultural, tampouco com normas de redistribuio reduzidas exclusivamente s relaes de produo esta viso simplificada de luta por reconhecimento no se ajusta aos meus objetivos, diz ele. Das es Paradoxien der Kapitalistischen ModerniIchimwiri , publicado em 2010, na Alemanha, contm quatro captulos que compilam vrios artigos, dentre esssierung. Ein Untersuchungsprogrammi, em coautoria com Martin Hartmann e Das Gewebe der Gerechtigkeit. ber die Grenzen des zeitgenssischen Prozeduralismusxxiii. Esses dois artigos, em particular, no so inditos. O primeiro est disponvel na lngua inglesa sob o ttulo Paradoxes of Capitalism.No primeiro captulo Honneth apresenta dois artigos que versam sobre os elementos essenciais da Filosofia prtica de Hegel. De certo modo se redime do peso exagerado que conferiu aos primeiros estudos hegelianos, em Jena, no seu livro Luta por Reconhecimento. No segundo captulo Honneth apresenta, em cinco artigos, a partir dos estudos hegelianos, uma sistematizao que contempla temas (...)Aspectos introdutrios(...) Por uma questo de atualizao, cita-se tambm a obra mais recente do professor Honneth, lanada na Alemanha em junho de 2011. Apresenta os estudos e resultados de suas pesquisas empreendidas nos ltimos cinco anos, no Instituto de Pesquisa Social, em Frankfurt. Sob o ttulo Das Recht der Freiheit. Grundrieiner demokratischen Sittlichkeitvi, o livro se compe de trs partes. A primeira faz uma apresentao histrica sobre o direito da liberdade. No segundo captulo ele menciona a possibilidade da liberdade, a liberdade jurdica e moral. No terceiro captulo o autor discorre sobre a realidade da liberdade a realidade social: o ns das relaes pessoais; amizade, relaes ntimas e famlia. Temas como mercado e moral, consumo, mercado de trabalho, esfera pblica democrtica, Estado de direito democrtico e cultura poltica tambm so temas desenvolvidos nessa obra. (FUHRMANN, Ndia. Luta por reconhecimento. Reflexes sobre a teoria de Axel Honneth e as origens dos conflitos sociais. Barbaroi, Santa Cruz do Sul, n. 38, jan/jun 2013, p. 79/96).Aspectos introdutriosIremos, portanto, analisar apenas a obra Luta por reconhecimento de Axel Honneth, publicada pela primeira vez no exterior em 1992 e, no Brasil, em 2003. Apenas cuidado com a advertncia anterior no sentido de que o autor revisitou a obra, com uma reviso em especial da parte em que cuida das influncias do jovem Hegel na sua teoria do reconhecimento e aprofundamento das questes de psicologia. No entanto, pela importncia da obra (com a qual muitos tericos brasileiros possuem dilogos em suas obras) e para entender especificamente os dados originrios da teoria, faremos anlise crtica apenas da obra Luta por reconhecimento nos moldes em que a teoria foi ali exposta.A opo se justifica, pois a despeito das alteraes na abordagem de aspectos especficos da obra (tentativa de se revisitar os pontos de influncia do jovem Hegel e uma abordagem mais intensa a partir da psicologia social, como mencionado acima), importante entender o caminho percorrido pela teoria do reconhecimento partir dos aspectos daquela obra onde h uma sistematizao importante para a compreenso de um pensamento estratgico para a teoria do reconhecimento. Ali os aspectos desta teoria esto expostos de forma orgnica e densa, como, a meu ver, em nem outro autor da teoria crtica (nem mesmo Taylor, no meu entendimento), o que nos facilita a sua compreenso.O texto utilizado foi publicado pela Editora 34, com primeira edio em 2003 e segunda edio em 2009. Faremos uso desta segunda.

Luta por reconhecimento: apresentao de Marcos NobreMarcos Nobre retoma no tempo a criao do instituto de Pesquisa Social, junto Universidade de Frankfurt (Main) por Max Horkheimer, Felix Weil e Friederich Pollok. O ano era 1924.Este instituto foi extremamente importante para a constituio, a partir de um referencial terico marxista, da conhecida Teoria Crtica e consolidada nos anos 1930 com a direo de Horkheimer do Instituto (que, muitos, confundem com a chamada Escola de Frankfurt - o que debatido por Marcos Nobre como no sendo coincidentes, apesar de expresso ter surgido apenas nos anos 50, ou seja, quando a teoria crtica j teria sofrido os influxos da Grande Guerra mundial e contar j com outros pesquisadores, que se somaram aos iniciais. Assim, enquanto esta expresso designaria uma atitude poltica poltico-intelectual no debate pblico do ps-guerra, a expresso Teoria Crtica abrangeria portanto campo terico mais amplo do que a configura histrica conhecida como Escola de Frankfurt). Nobre defende que, enquanto pertencente terceira gerao da Teoria Crtica, importante que entendamos um pouco da trajetria desta corrente do pensamento, para se situar a obra Luta por reconhecimento.Mencionar a obra fundamental para se compreender a evoluo histrica da Escola de Frankfurt. DOIS TEXTOS FUNDAMENTAIS: A imaginao dialtica histria da escola de Frankfurt e do Instituto de Pesquisas Sociais 1923-1950 de Martin Jay e A escola de Frankfurt Histria, desenvolvimento terico, significao poltica de Rolf Wiggershaus.

Luta por reconhecimento: apresentao de Marcos NobreAqui importante destacar artigo de 1937 de Horkheimer, segundo o qual a teoria crtica no se limitaria a descrever o funcionamento da sociedade, mas pretende fazer a sua leitura a partir de uma emancipao possvel e bloqueada pelo capitalismo. De Marx, extrai-se exatamente o comportamento crtico em relao ao conhecimento produzido na lgica de acumulao do capital.No entanto, a partir da dcada de 1940, Hokheimer e Adorno j comeam a distanciar do diagnstico e das solues propostas por Marx e pelo marxismo. Movimento seguido tambm por Habermas, que, como discpulo de Adorno, forma a conhecida segunda gerao da Teoria Crtica. No h um total abandono por parte de Horkheimer e Adorno de Marx, mas h uma guinada nas proposies marxianas.Como aparece Honneth nisto tudo? Ele foi assistente de Habermas na Escola de Frankfurt, tendo em maio de 2001 assumido a direo do Instituto de Pesquisa Social. Logo, se no h sentido em inclu-lo, a partir do que falamos acima na Escola de Frankfurt, h sim razo em localiz-lo na Teoria Crtica, ou mais especificamente na sua terceira gerao.Voltando no tempo para recuperar as trilhas do pensamento que levou a Honneth, mais especificamente no objeto de sua pesquisa, tem-se o seguinte.Luta por reconhecimento: apresentao de Marcos NobreComeando por Adorno e Horkheimer, em sua obra A dialtica do esclarecimento. O livro busca investigar a razo e as formas sociais da racionalidade, com especial ateno para a razo instrumental, forma estruturante e nica da racionalidade no capitalismo administrado. Aqui h uma reduo das pretenses da razo com o conformismo dominao dominante. No h alternativas a esta racionalidade instrumental, o que se apresenta como um impasse inclusive para a Teoria Crtica, j que as prprias formas de emancipao se encontram obstadas pela razo instrumental. Ao reconhecer esta limitao, Adorno e Horkheimer admitem a precariedade e limites da prpria crtica, que reconhece a sua precariedade.Para Habermas ancorar a teoria crtica em uma condio precria implica em reduzir a potencialidade da crtica em si e colocar em risco o projeto crtico, que tende exatamente emancipao. Ora, se no h possibilidade da produo de um pensamento emancipatrio, no h espao para qualquer crtica. Para Habermas, no sentido de se recuperar os limites da crtica, haveria que se ampliar os temas e encontrar um novo paradigma explicativo (ou seja, o paradigma marxiano, por si s, seria insuficiente).Para Habermas, portanto, so as prprias formulaes originais de Marx que tm de ser abandonadas (p. 12 da apresentao de Marcos Nobre da obra de Axel Honneth, Luta por reconhecimento - a gramtica moral dos conflitos sociais, 2009).

Luta por reconhecimento: apresentao de Marcos NobrePara Habermas a razo instrumental, acima mencionada, no deve ser simplesmente demonizada, mas precisa ter um freio em seu curso. Para tanto, formula uma teoria da racionalidade de dupla face em que a racionalidade instrumental convive com a racionalidade comunicativa.A ao instrumental aquela orientada para o xito, em que o agente calcula os melhores meios para atingir determinados fins previamente, sendo que aqui h dominao da natureza e a organizao da produo das condies materiais de vida, por meio do trabalho (p. 13). Veja-se que o trabalho, central ao pensamento marxiano e relevante para o processo de transformao da sociedade em Marx, j estaria capturado e no poderia ser mais a fonte da emancipao social o que levou Adorno e Horkheimer a um estado de prostrao na sua Dialtica do esclarecimento. OBSERVAO MINHA.Luta por reconhecimento: apresentao de Marcos NobreAo tentar fugir da prostrao do trabalho na produo, Habermas sugere uma outra racionalidade, ainda capturada, que a do tipo comunicativo. Trata-se de uma razo dirigida ao entendimento e no manipulao de pessoas e objetos no mundo da reproduo das condies materiais de vida. Esta razo comunicativa, portanto, uma vez orientada para o entendimento permite a reproduo simblica da sociedade, onde h uma real possibilidade de emancipao social.Aqui Habermas introduz a diferena entre sistema e mundo de vida (ambas no acolhidas quer por Honneth, quer por Charles Taylor, reconhecidamente os dois mais importantes exponenciais da teoria do reconhecimento). Esta distino responde a uma exigncia de racionalidade complexa, em que a racionalidade instrumental passa a ser limitada, de modo a no sufocar e obscurecer as estruturas comunicativas profundas presentes nas relaes sociais. Trata-se de um conceito de sociedade em dois nveis, em que a reproduo material obtida essencialmente por mecanismos de coordenao da ao tipicamente instrumentais (cuja lgica caracteriza o domnio social do sistema), e em que a reproduo simblica depende de mecanismos comunicativos de coordenao da ao (cuja lgica caracteriza o mundo da vida) (p. 13 de Marcos Nobre).Luta por reconhecimento: apresentao de Marcos Nobre interessante perceber que, se o circuito do sistema est dominado pela razo instrumental, portanto, o trabalho j est dominado na lgica da produo. H, no entanto, uma possibilidade emancipatria no entendimento do processo de reproduo cultural, nas instituies em que o indivduo socializado e nos processos de aprendizado e de constituio da personalidade. Neste mundo da vida, vige a racionalidade comunicativa, que nos permitir a emancipao. Assim, para Habermas o mundo da vida o espao de potencial emancipatrio, com as estruturas prprias da ao comunicativa, em oposio ao colonizado (pela razo instrumental) sistema.J possvel de se perceber, sem qualquer esforo maior, os limites de uma teoria que separa o sistema do mundo da vida, o trabalho capturado do restante das manifestaes da vida humana, com potencialidades para serem libertadas. Neste caminhar, Habermas teria se utilizado de elementos legados pelos prprios Adorno e Horkheimer, bem como do jovem Hegel do perodo de Jena.

Luta por reconhecimento: apresentao de Marcos NobrePercebe-se, algo que alertado por Marcos Nobre, como constante da teoria crtica, nas trs geraes que, a partir das ilaes da gerao anterior, a gerao posterior tenta descobrir as suas limitaes e avanar. Para tanto, costuma at mesmo fazer uso de caminhos que no foram escolhidos e aprofundados por seus antecessores. Assim, se deu no processo acima de Habermas em relao a Adorno, de quem foi aluno.Nesta mesma perspectiva que deve ser entendido Axel Honneth em relao ao seu antecessor Habermas. Seno vejamos.Nos seus primeiros escritos, havia mais proximidade de seus escritos com as primeiras geraes da Teoria Crtica, lembrando-se que, a despeito da posio anterior de Habermas, havia ainda entre este e as primeiras geraes algumas proximidades: partindo do diagnstico de que o capitalismo passou a ser regulado pelo estado, as potencialidades das ideias de Marx teriam sido neutralizadas. A diferena entre os pensamentos, como visto, no era de que no havia mais esperanas, mas no havia mais esperanas a partir da matriz marxiana.

Luta por reconhecimento: apresentao de Marcos NobreNo curso de sua trajetria, no entanto, Honneth passa a acreditar que o simples alargamento do conceito de racionalidade e de respectiva sua ao social no seria suficiente para dar conta de uma crtica de natureza emancipatria (proposta que, como visto, estava sempre nas diretrizes da Teoria Crtica). Para Honneth, na realidade, h um dficit da teoria crtica no que concerne ao poltica. Portanto, tendo centrado sempre na questo filosfica, para Honneth o problema da Teoria Crtica, at aquele instante (includo aqui Habermas), seria a falta de uma de uma base mais sociolgica para fundamentar a ao poltica. O dficit, portanto, seria de natureza sociolgica.Assim, se a proposio de Habermas conseguia dar conta do bloqueio emancipatrio posto pelos seus antecessores, no dava conta de uma ao poltica suficiente para a emancipao em si, na medida em que ignorava o mais importante: o conflito social. Desse modo, Honneth preferir partir dos conflitos e de suas configuraes sociais e institucionais para, a partir da, buscar as suas lgicas. Com isso, torna-se possvel, em princpio, construir uma teoria do social mais prxima das cincias humanas e de suas aplicaes empricas (p. 17). NOTA - Na realidade, do que percebi do texto, de certa forma esta postulao no foi atendida em sua inteireza j que, em algumas hipteses, o autor parte de premissas que entende como suficientes para a demonstrao de sua tese - em especial na dimenso afetiva e mais psicolgica de sua teoria do reconhecimento -, atribuindo a isto o nome de emprico. A meu ver, isto aparece no texto quase que como uma concesso formal razo instrumental que hoje ainda, embora com contornos mais especficos, domina a lgica do pensamento capitalista).

Luta por reconhecimento: apresentao de Marcos NobreO tal dficit sociolgico em Habermas estaria presente, por exemplo, na sua diviso entre sistema e mundo da vida e na noo de intersubjetividade comunicativa, que no estruturada a partir da luta e do conflito social. Isto tudo, em especial a diviso proposta, seria artificial e mecnica na perspectiva de uma teoria da evoluo social.Ao tentar tornar neutralizar normativamente o sistema, tornando-o infenso ao mundo da vida, Habermas tornou-se incapaz de pensar o prprio sistema e sua lgica instrumental como resultado de permanentes conflitos sociais, que o molda a partir da correlao de foras polticas sociais. A racionalidade comunicativa assim acabaria sendo prvia ao conflito, que ocupa um papel secundrio. Se Honneth concorda com Habermas sobre a necessidade de se construir a Teoria Crtica em bases intersubjetivas e com marcados componentes universalistas, defende tambm, contrariamente a este, a tese de que a base da interao o conflito, e sua gramtica, a luta por reconhecimento (p. 17).

Luta por reconhecimento: apresentao de Marcos NobreNeste compasso, justificvel que um dos referenciais tericos de Honneth sejao jovem Hegel, com a suas preocupaes com o desenvolvimento de uma intersubjetividade, ao mesmo tempo que busca a preservao do desenvolvimento do indivduo, do singular (p. 17 e 18).Assim, em Honneth estaria presente a ideia de conflito e de desrespeito social, de ataque identidade pessoal e coletiva, ou seja: A reconstruo da lgica dessas experincias do desrespeito e do desencadeamento da luta em sua diversidade se articula por meio da anlise da formao da identidade prtica do indivduo num contexto prvio de relaes de conhecimento. E isto em trs dimenses distintas, mas interligadas: desde de a esfera emotiva que permite ao indivduo uma confiana em si mesmo, indispensvel para os seus projetos de autorrealizao pessoal, at a esfera da estima social em que esses projetos podem ser objeto de um respeito solidrio, passando pela esfera jurdico-moral em que a pessoa individual reconhecida como autnoma e moralmente imputvel, desenvolvendo assim uma relao de autorrespeito. No entanto, somente nas duas ltimas dimenses que Honneth v a possibilidade de a luta ganhar contornos de um conflito social, pois na dimenso emotiva no se encontra estruturalmente, segundo ele, uma tenso moral que possa suscitar movimentos sociais, o que no faltaria s formas de desrespeito como a privao de direitos e a degradao de formas de vida, ligadas respectivamente s esferas do direito e da estima social (p. 18).

Luta por reconhecimento: prefcioA proposta do texto: Nesse escrito, proveniente de uma tese de livre-docncia, tento desenvolver os fundamentos de uma teoria social de teor normativo, partindo do modelo conceitual hegeliano de uma luta por reconhecimento (p. 23).A tese ter como referncia o jovem Hegel do perodo de Jena, que, como reconhece, tem uma matriz idealista. Pretende-se dar uma dimenso menos idealizada s proposies de Hegel e, para isto, far uso de uma inflexo emprica com recurso psicologia social de G. H. Mead.Nesta toada partir, para tanto, indispensvel a perspectiva das trs formas de reconhecimento: amor, direito e estima s quais correspondero tambm formas respectivas de desrespeito.Diz que, embora as correntes feministas tenham adotado o mesmo caminho da teoria do reconhecimento, renunciou a discuti-las, j que este intento extrapolaria o quadro argumentativo que desejava apresentar.

Luta por reconhecimento- Presentificao histrica: a ideia original de HegelEm Jena, Hegel defenderia, segundo o autor, a tese de uma luta dos sujeitos pelo reconhecimento de suas identidades como indispensveis existncia de instituies garantidoras da liberdade.Segundo o autor, esta preocupao deixa de existir a partir da Fenomenologia do esprito (a despeito mesmo do texto conhecido como dialtica do senhor e do escravo, que muitos conhecem como a referncia principal da teoria do reconhecimento o que mais exaltado em outros autores como Charles Taylor), sendo que aparece de forma mais relevante em textos anteriores do jovem Hegel, em especial nas obras como Sistema da eticidade (1802) e Realphilosophie (1803/1804).Luta por reconhecimento- Presentificao histrica: a ideia original de HegelEm Jena, aparece as primeiras incurses de Hegel na noo de uma sociedade eticamente integrada de cidados livres: Hegel acaba dando um passo decisivo alm de Plato e Aristteles, ao incluir na organizao institucional da eticidade absoluta uma esfera que ele define provisoriamente como um sistema de propriedade e direito; a isso est ligada a pretenso de mostrar que as atividades mediadas pelo mercado e os interesses dos indivduos particulares o que em seu todo ser sintetizado mais tarde sob o ttulo de sociedade civil burguesa (brgerlichen Gesellschaft) seriam uma zona realmente negativa, mas ainda assim constitutiva do todo tico; inflexo realista que desse modo Hegel procura dar a seu ideal de sociedade corresponde no texto tambm o fato de que, divergindo da teoria poltica antiga, o estamento dos no livres ser introduzido primeiramente como uma camada de cidados que produzem e trocam mercadorias (p. 41 e 42) NO SEI SE VALE A PENA COLOCAR ESTA PARTE NOS SLIDES.Para Hegel, neste instante, a teoria filosfica deve partir primeiramente dos vnculos ticos, que fazem os sujeitos se moverem de forma intersubjetiva.Luta por reconhecimento- Presentificao histrica: a ideia original de HegelJ em 1802, na obra Sistema da eticidade, Hegel retoma de forma positiva a teoria fichtiana do reconhecimento, para descrever com seu auxlio a estrutura interna das formas de relao tica, que el quis pressupor fundamentalmente a ttulo de um primeiro da socializao humana (p. 46).A estrutura de uma tal relao de reconhecimento recproco para Hegel, em todos os casos, a mesma: na medida em que se sabe reconhecido por um outro sujeito em algumas de suas capacidades e propriedades e nisso est reconciliado com ele, um sujeito sempre vir a conhecer, ao mesmo tempo, as partes de sua identidade inconfundvel e, desse modo, tambm estar contraposto ao outro novamente como um particular. Nessa lgica da relao de reconhecimento, porm, Hegel v inscrita ao mesmo tempo uma dinmica interna que lhe permite ainda dar um segundo passo alm do modelo inicial de Fichte: visto que os sujeitos, no quadro de uma relao j estabelecida eticamente, vm sempre a saber algo mais acerca de sua identidade particular, pois trata-se em cada caso at mesmo de uma nova dimenso de seu Eu que veem confirmada, eles abandonam novamente a etapa da eticidade alcanada, tambm de modo conflituoso, para chegar de certa maneira ao reconhecimento de uma forma mais exigente de individualidade; nesse sentido, o movimento de reconhecimento que subjaz a uma relao tica entre sujeitos consiste num processo de etapas de reconciliao e de conflito ao mesmo tempo, as quais substituem umas s outras. (p. 47).

Luta por reconhecimento- Presentificao histrica: a ideia original de Hegel Assim, diferentemente do que pensaria Hobbes, um contrato entre os homens no finda o estado precrio de um luta por sobrevivncia de todos contra todos, mas, inversamente, a luta como um mdium moral leva a uma etapa mais madura de relao tica. (p. 48)Depois em sua obra Sistema da Eticidade fala em estado mais natural desta, consubstanciado na famlia; um intermedirio, que se d relao entre proprietrios por meio do contrato e, por fim, no mximo da eticidade consubstanciada na solidariedade. Nas diversas etapas, o reconhecimento se faz presente com perfil e intensidade prprias. Neste processo, o papel do crime no olvidado, sendo a sua origem o fato de um reconhecimento ainda incompleto: nesse caso, o motivo interno do criminoso constitudo pela experincia de no se ver reconhecido de uma maneira satisfatria na etapa estabelecida de reconhecimento mtuo (p. 52 e 54).

Luta por reconhecimento- Presentificao histrica: a ideia original de Hegel O fato de as pretenses de identidade dos sujeitos implicados se ampliarem passo a passo na evoluo das trs etapas de conflitos sociais exclui uma posio meramente negativa dos atos destrutivos apresentados; ao contrrio, tomados em conjunto, os diversos conflitos parecem constituir justamente o processo que prepara a passagem da eticidade natural para a absoluta, provendo os indivduos das qualidades e dos discernimentos necessrios para tal. Hegel no quer apenas expor como as estruturas sociais do reconhecimento elementar so destrudas por atos de exteriorizao negativa da liberdade; ele quer, alm disso, mostrar que s por tais atos de destruio so criadas as relaes de reconhecimento eticamente mais maduras, sob cujo pressuposto se pode desenvolver ento uma comunidade de cidados livres efetiva. (p. 56 e 57). Este processo tem um cunho pedaggico, em que os sujeitos em luta, especialmente o que quer ser reconhecido pelo outro, mostra ao oponente que a sua personalidade digna de ser reconhecida.

Luta por reconhecimento- Presentificao histrica: a ideia original de Hegel OBJETO/MODO DE INDIVDUO PESSOA SUJEITO RECONHECIMENTO (carncias (autonomia (particularidade concretas) formal) individual) INTUIO FAMLIA (AFETIVO) (amor)

CONCEITO (COGNITIVO) SOCIEDADE CIVIL INTUIO (direito) INTELECTUAL (AFETO QUE SE TORNOU RACIONAL) ESTADO (solidariedade)

Luta por reconhecimento- Presentificao histrica: a ideia original de HegelO esquema anterior foi o que se desenhou na obra denominada Sistema da eticidade. Neste instante, a categoria da conscincia ainda aparece para a explicao das formas de eticidade.O problema aqui que os conceitos ainda no estavam bem claros, assim como o papel do crime na teoria da eticidade ainda era muito incipiente (p. 61). O criminoso traz para a coletividade, pelo ato de desonra, da violao, a percepo nos sujeitos da importncia de reconhecer coletivamente como membros de uma mesma comunidade. Logo, os criminosos possuem um papel construtivo no processo de formao tico, visto que so capazes de desencadear os conflitos sociais unicamente atravs dos quais os sujeitos se tornam atentos s relaes de reconhecimento subjacentes (p. 61). No entanto, Hegel no explicou de forma satisfatria como isto se daria de forma sistemtica, sem considerar as diferentes espcies de crime e sua participao distinta para aquele fim. Assim, resta claro que a insuficincia da obra Sistema da eticidade e da teoria do reconhecimento ali exposta ainda precisa de alguns aprimoramentos.

Luta por reconhecimento- Presentificao histrica: a ideia original de HegelNos anos de 1803/1804, este aprimoramento vem com a Realphilosophie. Aqui haver um maior cuidado com a filosofia da conscincia e os pressupostos tericos para o que a noo de esprito que nortear toda a obra futura de Hegel, inclusive o seu sistema. H a incluso do carter absoluto do esprito, que se dar na arte, religio e cincia. O fim do processo no mais o estado, mas sim o esprito absoluto. A teoria da eticidade perde espao para a filosofia do esprito (veja-se que, no processo de amadurecimento de Hegel, a eticidade apenas uma das etapas do processo de evoluo do esprito, mais especificamente a mais elevada no esprito objetivo que comea com o direito abstrato, passa pela moral e termina na eticidade, com a famlia, a sociedade civil e o estado. Depois deste estgio, teremos ainda o esprito absoluto, que evoluir no futuro para a arte, religio e a filosofia). Desse modo, Hegel mantm sem dvida, segundo a forma categorial, sua inteno original de reconstituir a formao do esprito no interior da esfera da conscincia humana at chegar ao ponto onde comeam a se delinear, na relao tica do Estado, as estruturas institucionais de uma forma bem-sucedida de socializao; no se pode explicar de outra forma o fato de ele ter continuado a intitular a ltima seo de sua exposio sistemtica com o termo constituio, que caracteriza basicamente, como no Sistema da eticidade, uma estrutura de instituies polticas (p. 71)

Luta por reconhecimento- Presentificao histrica: a ideia original de HegelEmbora em Jena j se apresente as etapas do esprito subjetivo, objetivo e absoluto, ainda na Realphilosophie se encontra presente, o que desaparecer depois, a teoria do reconhecimento, pelo menos na etapa referente ao esprito objetivo de forma que o reconhecimento aqui ainda percebido no sentido do percurso para a consolidao do esprito absoluto.Aqui, na fase referente famlia, o reconhecimento continua a ter base na relao amorosa, que inclui tambm, embora no apenas, o desejo sexual como primeira forma de experincia com a subjetividade oposta - considerado um reconhecimento natural: No diferentemente do Sistema de eticidade, Hegel concebe o amor como relao de reconhecimento mtuo na qual a individualidade dos sujeitos encontra primeiramente confirmao; no entanto, aqui atribuda a essa determinao, ainda mais claramente do que antes, o significado, oriundo da teoria da subjetividade, de que s na prpria experincia de ser amado o sujeito querente capaz de experienciar-se a si mesmo pela primeira vez como sujeito carente e desejante.

Luta por reconhecimento- Presentificao histrica: a ideia original de HegelO pensamento anterior sofisticado por Honneth em sentido no atribudo originariamente por Hegel: Para a relao de reconhecimento, isso s pode significar que est embutida nela, de certo modo, uma presso para a reciprocidade, que sem violncia obriga os sujeitos que se deparam a reconhecerem tambm seu defrontante social de uma determinada maneira: se eu no reconheo meu parceiro de interao como um determinado gnero de pessoa, eu tampouco posso ser reconhecido em suas reaes como o mesmo gnero de pessoa, j que lhe foram negadas por mim justamente aquelas propriedades e capacidades nas quais eu quis me sentir confirmado por ele. (p. 78) A relao amorosa aparece como um primeiro passo para o processo de formao da pessoa de direito.

Luta por reconhecimento- Presentificao histrica: a ideia original de HegelNo entanto, sob o ponto de vista inscrito na questo sobre as condies de constituio de uma pessoa de direito, a relao de reconhecimento do amor se revela ainda um domnio de experincia incompleto; pois, na relao amorosa com os membros da famlia, o esprito subjetivo no perturbado em princpio por conflitos do tipo que poderia obrig-lo a refletir sobre as normas abrangentes, gerais, da regulao do relacionamento social; mas, sem uma conscincia sobre essas normas universalizadas de interao, ele no aprender a se conceber a si mesmo como uma pessoa de direitos intersubjetivamente vlidos. Da Hegel ser forado mais uma vez a ampliar o processo de formao do sujeito, abarcando uma dimenso suplementar da relao prtica com o mundo. Para esse fim, ele retoma agora, no contexto de sua Realphilosophie, o meio construtivo de uma luta por reconhecimento. (p. 81 e 82)

Luta por reconhecimento- Presentificao histrica: a ideia original de HegelDepois o autor, nesta linha, reala a importncia do contrato, da constituio do sujeito de direito, para o reconhecimento, tratando-se de uma necessidade emprica dos seres humanos passarem da condio natural para a contratual: Sua linha de pensamento pode ser entendida do seguinte modo: se, em contraposio tradio predominante, deve ser mostrado que os sujeitos, mesmo sob condies sociais de concorrncia hostil, alcanam uma soluo jurdica do conflito como formulada na ideia de contrato social, ento a ateno terica deve ser deslocada para aquelas relaes sociais intersubjetivas atravs das quais um consenso normativo mnimo previamente garantido desde o comeo; pois apenas nessas relaes pr-contratuais de reconhecimento recproco, ainda subjacentes s relaes de concorrncia social, pode estar ancorado o potencial moral, que depois se efetiva de forma positiva na disposio individual de limitar reciprocamente a prpria esfera de liberdade. (p. 85) Afinal como diz o prprio Hegel, citado por Honneth: No reconhecer o si cessa de ser esse singular; ele est juridicamente no reconhecer, isto , no est mais em ser-ai imediato. O reconhecido reconhecido como vlido imediatamente, por seu ser, mas precisamente esse ser gerado a partir do conceito; ser reconhecido. O homem necessariamente reconhecido e necessariamente reconhecente. Essa necessidade a sua prpria, no o nosso pensamento em oposio ao contedo. Como reconhecer, ele prprio o movimento, e esse movimento supera justamente seu estado de natureza: ele reconhecer(p. 86, citando a Realphilosophie).

Luta por reconhecimento- Presentificao histrica: a ideia original de HegelComo o autor se afasta da utilizao da dialtica da conscincia independente e da conscincia dependente (mais comumente conhecida como dialtica do senhor e do escravo), para ele h que se mitigar a questo de se tratar, no processo de reconhecimento, de uma luta de vida e morte (p. 93 e 94). Acho que entendo o esforo, inclusive para afastar a fenomenologia das obras informantes da sua teoria do reconhecimento (neste ponto, inclusive diferente de Charles Taylor, que a inclui na sua teoria do reconhecimento). Se no reconhecimento houver morte de uma das partes, possvel que no seja mantida intacta a expresso da parte mais fraca da relao que pretende ser reconhecida. Assim, como se no houvesse qualquer morte como forma de se preservar, na ntegra, o que busca o reconhecimento na luta que se processa. Acho que a questo se resolveria pela questo da posse, a luta no se processa sem a intermediao do objeto. No entanto, neste caso, a luta se processa muito mais entre proprietrios do que entre grupos que postulam o reconhecimento. O grupo que proprietrio seria e realmente sempre- o que dita a forma de reconhecimento, baseada em regras ligadas propriedade. No entanto, isto infirmaria o reconhecimento em si, j que haver sempre um que ser mais livre do que o outro e parece que sobre que Hegel fala quando diz da dialtica da conscincia independente e da conscincia dependente.

Luta por reconhecimento- Presentificao histrica: a ideia original de HegelPara a vida social, a relao jurdica representa uma espcie de base intersubjetiva, porque obriga cada sujeito a tratar todos os outros segundo as suas pretenses legtimas; pois, diferentemente do amor, o direito representa para Hegel uma forma de reconhecimento recproco que no admite estruturalmente uma limitao ao domnio particular das relaes sociais prximas. Por isso, s com o estabelecimento da pessoa de direito dada numa sociedade a medida mnima de concordncia comunicativa, de vontade geral, que permite uma reproduo comum de suas instituies centrais; pois, s quando todos os membros da sociedade respeitam mutuamente suas pretenses legtimas, elas podem se relacionar socialmente entre si da maneira isenta de conflitos que necessria para a soluo cooperativa das tarefas sociais. Todavia, para isso, o mero princpio da relao jurdica com que at o momento tivemos de lidar no oferece ainda nenhuma base adequada, visto que, enquanto tal, ele deixa totalmente indefinido quais direitos o sujeito de fato dispe em particular; no ponto de interseo do ser-reconhecido abstrato, onde os processos de formao individual de todos os membros da sociedade acabam coincidindo por fim, permanece em aberto de certo modo em que aspecto e em que medida eles tm de se reconhecer reciprocamente como pessoas de direito. Por essa razo, Hegel reconstitui no segundo captulo de sua Filosofia do esprito a construo da realidade social como processo de formao atravs da qual a relao abstrata de reconhecimento jurdico se amplia pouco a pouco, abarcando contedos materiais; que procede da acumulao de formas sempre novas de concretizao da relao jurdica. (p. 96) MUITO IMPORTANTE, DESTACAR EM AULA.

Luta por reconhecimento- Presentificao histrica: a ideia original de HegelUma das fases importantes deste processo o reconhecimento da pessoa no contrato, que a a relao passa a ser institucionalizada. A violao do contrato, por sua vez, como uma forma de negao do outro, e a obrigao legal de que a palavra empenhada seja cumprida, com o uso das instituies para isto, faz parte do processo de reconhecimento. H um reconhecimento da pretenso do que sofreu a leso com a quebra contratual, passando o direito de uma abstrao para uma concretizao em que cuja esfera se d o reconhecimento.A quebra contratual, o crime e o criminoso, tudo isto, neste contexto seria, com a reao do sistema negao, uma forma de reconhecimento.

Luta por reconhecimento- Presentificao histrica: a ideia original de HegelO CRIME: O crime representa o ato deliberado de uma leso no ser-reconhecido universal; da parte do autor do crime, ele acontece com a conscincia irrestrita do fato de que ele lesa uma pessoa, um ser tal que reconhecido em si. Na qualidade de causa motivacional, subjaz a essa ao o sentimento de no ser reconhecido na particularidade da prpria vontade pelo emprego da coero jurdica; assim, efetua-se no crime, na etapa avanada do direito, o mesmo que na luta de vida e morte, sob as condies do processo de formao individual: um sujeito procura, mediante uma ao provocadora, levar o outro indivduo ou muitos associados a respeitar o que no foi ainda reconhecido nas prprias expectativas pelas formas de relacionamento social. No primeiro caso, o do processo de formao individual, aquela camada da personalidade ainda no reconhecida se compusera das pretenses que se dirigem disposio autnoma dos meios para reproduo da prpria vida; por conseguinte, o desfecho do reconhecimento bem-sucedido era acompanhado tambm de um progresso no modo de socializao, pois em seguida cada indivduo podia saber-se ao mesmo tempo como pessoa de direito autnoma e como membro social de uma comunidade jurdica. Por sua vez, no segundo caso, o do processo de formao da vontade geral, aquela camada do ainda no-reconhecido consiste visivelmente das pretenses que se referem realizao de finalidades individuais, sob as condies de direitos e deveres iguais; nesse sentido ainda muito vasto, possvel pelo menos entender o enunciado em que a afirmao prpria vontade qualificada como objetivo do crime.

Luta por reconhecimento- Presentificao histrica: a ideia original de HegelO CRIME: Mas Hegel dificulta ainda mais o que tem em vista porque de acrscimo associa a experincia do desrespeito da unicidade individual pressuposio do emprego da coero jurdica; pois o que significa que um sujeito deve sentir-se lesado em sua pretenso realizao da prpria vontade no instante mesmo em que legitimamente forado a cumprir seus deveres contratualmente combinados? Como no difcil de ver, com a resposta a esta questo j prejulgada ao mesmo tempo a maneira de interpretar a luta pelo reconhecimento para a relao do direito em seu todo. Com efeito, Hegel concebe o processo de formao da vontade geral, e por conseguinte a constituio da sociedade, como um processo de concretizao gradativa dos contedos do reconhecimento jurdico, no diferentemente do Sistema da eticidade, deve-se atribuir aqui ao ato do crime a funo catalisadora de uma provocao moral, atravs da qual a vontade geral dos sujeitos de direito associados compelida a dar um novo passo de diferenciao; mas em que consiste seu contedo em particular s possvel medir, por sua vez, pelas expectativas normativas que o sujeito desrespeitado procura expor sociedade na forma cifrada do crime. Da a resposta da questo acerca do papel que a luta por reconhecimento assume no nvel da realidade social depender da soluo das dificuldades de entendimento provocado pela tese de Hegel sobre a fonte interna do crime. (p. 101 e 102 SOBRE O CRIME)

Luta por reconhecimento- Presentificao histrica: a ideia original de HegelO CRIME - A soluo dada na seguinte frase: (...) visto que o crime representa o ato individualista de uma leso na vontade geral, a reao desta tem por objetivo, inversamente, fazer valer de novo seu poder intersubjetivo em face do indivduo desgarrado; mas isso, a inverso do ser-reconhecido universal lesado, s pode acontecer na forma de uma punio do criminoso, pela qual o seu ato revidado de tal modo que a relao destruda do reconhecimento jurdico restabelecida em seguida; no entanto, com a execuo da pena, entram no mundo dos fenmenos externos aquelas normas morais, que at o momento subjaziam vida social somente na qualidade de um elemento espiritual; da que, na execuo da penalidade, os sujeitos de direito associados contemplam pela primeira vez seus pontos normativos comuns na forma objetivada de uma lei; essa representa, por sua vez, a quintessncia de todas as prescries negativas atravs das quais as relaes jurdicas entre sujeitos so formalmente reguladas, sob a ameaa de sanes do Estado (p. 104). No entanto, o crime tem sua origem no sentimento de um desrespeito, cujas causas normativas, portanto, no podem ser realmente eliminadas pelas inovaes jurdicas que ele mesmo deve poder forar; pois para isso teriam sido necessrias aquelas alteraes com as quais seria corrigido o erro, seja de um uso demasiado abstrato, seja de um contedo demasiado formalista do direito (p. 104)

Luta por reconhecimento- Presentificao histrica: a ideia original de Hegel engraado reparar que o autor tangencia a luta pelo reconhecimento por parte do que comete o crime. Este poderia ser reconhecido. Embora esta questo fique sempre nas entrelinhas ela no , a meu ver, totalmente enfrentada por Honneth (ser que por questes morais, que atentariam contra a sua prpria tese, na forma como veremos a seguir?). A verdade, me parece, que haveria um sentido de se atribuir aqui a luta pelo reconhecimento no apenas como uma afirmao daqueles contra os quais foi cometido o crime, como maneira de, com a sano, ver reconhecidas as suas pretenses gerais como pretenses especficas tirando do quadro da generalidade e passando para o quadro mais individualizado. Mas o mesmo percurso poderia ser considerado para o criminoso, em busca de um reconhecimento contrrio ao que est posto pelo ordenamento jurdico. Parece interessante que, aps desprezar a luta de vida e morte, Honneth recupere o conceito nesta parte quase que o utilizando para a morte necessria do que comete o crime e com a vida, ou liberdade total, do que ganha a luta ou daquele contra quem foi cometido o ato criminoso. Esta interpretao parece no ter sentido se vista a obra de maturidade de Hegel. Na Filosofia do direito, h uma preservao interessante dos direitos do criminoso, contra quem, por exemplo, as penas de morte sero apenas excepcionais. O criminoso tambm tem personalidade jurdica, sendo que a quebra do direito faz parte apenas do processo de negao da dialtica, com a qual Hegel vive muito bem. DESENVOLVER MAIS ISTO P. 100 A 106 DA OBRA. Ser que no h motivos, mais do que cr o autor, para Hegel ter abandonado, segundo ele acredita, a teoria do reconhecimento na sua fase madura? De a conscincia tenha passado para o esprito subjetivo e no tenha sido tratada de forma semelhante nos espritos objetivo e absoluto?

Luta por reconhecimento- Presentificao histrica: a ideia original de HegelDo amor para o direito: do esprito como realizao amorosa para o esprito como realizao jurdica, falta apenas a passagem do reconhecimento para o plano superior, o da eticidade propriamente dita, o estado:Um conceito de eticidade prprio da teoria do reconhecimento parte da premissa de que a integrao social de uma coletividade poltica s pode ter xito irrestrito na medida em que lhe correspondem, pelo lado dos membros da sociedade, hbitos culturais que tm a ver com a forma de relacionamento recproco, da os conceitos fundamentais com que so circunscritas as pressuposies de existncia de uma tal formao da comunidade terem de ser talhados para as propriedades normativas das relaes comunicativas; o conceito de reconhecimento representa para isso um meio especialmente apropriado porque torna distinguveis de modo sistemtico as formas de interao social, com vista ao modelo de respeito para com a outra pessoa nele contido. (p. 108) No entanto, o autor lembra que esta unidade somente se realizaria, em Hegel, em torno do estado enquanto corporificao do esprito: so os hbitos culturais fundados em tal relao de autoridade que assumem inopinadamente em sua abordagem o papel que, na verdade, teria de ser desempenhado por certas formas extremamente exigentes de reconhecimento recproco, num conceito de eticidade prprio da teoria do reconhecimento (p. 109) Talvez aqui j se anteveja a razo pela qual o nosso autor no poder se utilizar apenas de Hegel para a sua teoria do reconhecimento, na medida em que o estado ser a instncia tica ltima em que o reconhecimento se daria de forma completa. Isto certamente traria problemas para uma teoria do reconhecimento que pretende reconhecer a importncia do papel dos movimentos sociais de luta para o reconhecimento dos seus direitos especficos.

Luta por reconhecimento- Presentificao histrica: a ideia original de HegelLANA A SEGUINTE CRTICA: Se ele tivesse seguido o mesmo processo de modo coerente at a constituio da comunidade tica, ento teria ficado patente tambm a forma de uma interao social na qual cada pessoa pode contar, para sua particularidade individual, com um sentimento de reconhecimento solidrio; alm disso, a experincia da morte, cujo significado emotivo para o encontro com o outro Hegel observou muito bem, poderia ter encontrado um lugar mais adequado do que na relao intersubjetiva cujo tema de conflito so os direitos do indivduo. Esse passo, porm, a guinada consequente para o conceito de eticidade prprio de uma teoria do reconhecimento, Hegel no o efetuou; no final, o programa da filosofia da conscincia obteve tanto predomnio sobre as intuies da teoria do reconhecimento que, na ltima etapa do processo de formao, at mesmo seu contedo material acabou sendo pensado inteiramente conforme o modelo de uma autorrelao do esprito. Mas, por isso, na Realphilosophie permanecem igualmente em suspenso, at o fim, dois pontos: o destino da vontade singular, ao qual o prprio Hegel se remetera em sua interpretao do crime, e as perspectivas daquela viso de uma comunidade genuinamente livre, da qual ele havia partido em seus escritos de Jena. Para a soluo dos dois problemas teria sido necessria a pressuposio de um conceito intersubjetivista de eticidade, do qual Hegel j no pode mais dispor, depois de quase consumada a passagem para a filosofia da conscincia. (p. 113).

Luta por reconhecimento- Presentificao histrica: a ideia original de HegelE FINALIZA DISCORRENDO SOBRE O ABANDONO DA TEORIA DO RECONHECIMENTO EM HEGEL A PARTIR DA FENOMENOLOGIA:Nunca mais Hegel retomou em sua forma original o programa esplndido que ele seguiu em seus escritos de Jena com abordagens sempre novas e tambm sempre fragmentrias. Na sua obra terica com que ele, logo depois da Realphilosophie, conclui seu trabalho em Jena e que define a rota de sua criao futura, encontra-se uma sistemtica destituda de um ponto decisivo: a Fenomenologia do esprito deixa para a luta por reconhecimento, que at ento foi a fora motriz que havia impulsionado o processo de socializao do esprito atravs de todas as etapas, to somente a funo nica de formar a autoconscincia; alm disso, restrita a esse nico significado, representado na dialtica do senhor e do escravo, a luta entre os sujeitos que pugnam por reconhecimento ligada to intimamente experincia da confirmao prtica no trabalho que sua lgica especfica acabou quase saindo inteiramente de vista. Por isso, a nova concepo da Fenomenologia, certamente superior do ponto de vista do mtodo, teve o efeito de um corte profundo na trajetria do pensamento de Hegel; ela lhe obstruiu da em diante o recurso mais forte de suas antigas intuies, o modelo, ainda inacabado, da luta por reconhecimento. Consequentemente, nas grandes obras que iriam se seguir, no se encontram seno sinais de uma reminiscncia do programa perseguido em Jena; mas nem o conceito intersubjetivista de identidade humana, nem a distino de diversos media de reconhecimento, nem a diferenciao correspondente de relaes de reconhecimento gradualmente escalonadas, nem muito menos a ideia de um papel historicamente produtivo da luta moral voltam a assumir uma funo sistemtica na filosofia poltica de Hegel (p. 113 e 114)

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A proposta do autor abandonar o idealismo hegeliano e dar uma guinada materialista na sua teoria do reconhecimento. Assim, se prope o desafio de criar uma teoria normativa social a partir do reconhecimento de Hegel, mas sem cair no seu idealismo, este seria o grande desafio e Honneth pensa se colocar a faz-lo (uma teoria que chama de ps-metafsica).Para tanto se prope as seguintes metas:o reconhecimento social deveria partir de premissas da psicologia social;tomar como ponto de partida diferentes formas de reconhecimento segundo as distintas autonomias dos sujeitos envolvidos no processo de reconhecimento;utilizao do horizonte histrico como fuga dos perigos idealistas.

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Para tanto ir fazer uso da psicologia social de George Herbert Mead, na medida em que seus escritos permitem traduzir a teoria hegeliana da intersubjetividade em uma linguagem terico ps-metafsica (p. 123).Mead aposta na psicologia social para acessar a soluo a problemas deixados pelo idealismo: A explicao de Mead toma seu ponto de partida na observao de que um sujeito somente dispe de um saber sobre o significado intersubjetivo de suas aes quando ele est em condies de desencadear em si prprio a mesma reao que sua manifestao comportamental causou, como estmulo, em seu defrontante: do que meu gesto significa para o outro, eu posso me conscientizar ao produzir em mim mesmo, simultaneamente, seu comportamento de resposta. Essa capacidade de desencadear em si mesmo o comportamento reativo causado no outro est ligada para Mead, porm, ao pressuposto evolucionrio do surgimento de uma nova forma de comportamento humano; pois, como Herder j tinha visto, e mais Gehlen, s ao gesto vocal, diferentemente de todos os meios no vocais de entendimento, cabe a propriedade especial de influir sobre o agente no mesmo momento e da mesma maneira que no seu defronte: Enquanto se sente apenas imperfeitamente o valor da prpria expresso facial ou do da prpria postura corporal para com os outros, escuta-se com os prprios ouvidos o gesto vocal, na mesma forma que ele possui para um prximo. Se um sujeito influir sobre o seu parceiro de interao por meio de seu gesto vocal, ele capaz ao mesmo tempo de desencadear em si mesmo a reao dele, visto que sua prpria expresso perceptvel a ele prprio como um estmulo vindo de fora; mas por isso seu gesto vocal, a que ele pode reagir da mesma maneira que qualquer outro ouvinte, contm para ele o mesmo significado que possui para seu destinatrio (p. 128 e 129).

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Trata-se de desdobramento da teoria do agir comunicativo. .Enfim, uma expresso do individualismo metodolgico, proveniente de uma matriz idealista como a hegeliana.Comea a analisar, em Mead, os conceitos de Me e de Eu, fundamentais sua teoria.O conceito de Me, que Mead emprega aqui caracteriza o resultado dessa autorrelao originria, deve tornar terminologicamente claro que o indivduo s pode se conscientizar de si mesmo na posio de objeto; pois o Self que entra em seu campo de viso quando ele reage a si mesmo sempre o parceiro da interao, percebido na perspectiva de seu defrontante, mas nunca o sujeito ativo das prprias manifestaes prticas. Por isso, Mead distingue do Me, que conserva minha atividade momentnea to somente como algo j passado, uma vez que ele representa a imagem que o outro tem de mim, o Eu, que a fonte no regulamentada de todas as minhas aes atuais. O conceito de Eu deve ser referido instncia na personalidade humana responsvel pela resposta criativa aos problemas prticos, sem poder jamais entrar como tal, porm, no campo de viso; no entanto, em sua atividade espontnea, esse Eu no s precede a conscincia que o sujeito possui de si mesmo do ngulo de viso do seu parceiro de interao, como tambm se refere sempre de novo s manifestaes prticas mantidas conscientemente no Me, comentando-as. Portanto, entre o Eu e o Me, existe na personalidade do indivduo, uma relao comparvel ao relacionamento entre parceiros de um dilogo. (p. 130)

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O processo contnuo formando, nas relaes com os outros, vrios Ms: Um sujeito s pode adquirir conscincia de si mesmo na medida em que ele aprende a perceber sua prpria ao da perspectiva, simbolicamente representada, de uma segunda pessoa (p. 131). Como se d no jovem Hegel, mas usando uma cincia emprica (ser?), Mead afirma a precedncia da percepo do outro como indispensvel para o desenvolvimento da autoconscincia (p. 131). A grande inovao de Mead que ele transfere este raciocnio para o plano da dimenso normativa do desenvolvimento individual, chegando a uma nova etapa da psicologia social. A relao Me e Eu passa a ser encarada de forma coletiva na perspectiva do conjunto das normas morais.

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Partindo do desenvolvimento das crianas, no plano das atividades ldicas (os jogos e das brincadeiras), Mead faz o mesmo exerccio para dizer como as crianas se desenvolvem a partir da percepo dos demais quer nos seus jogos, quer nas suas brincadeiras, e que isto ser indispensvel para a sua fase adulta. Assim, a partir desta perspectiva, a criana aprender a regular as suas expectativas tico-normativas na relao com as demais crianas, a partir das quais aprender, quer no jogo, quer nas brincadeiras, observando o comportamento da outra criana. A criana, por meio destas atividades, se reconhecer na outra criana, a partir de um dilogo entre o Me e o Eu. Isto se dar a partir de relaes subjetivadas, mas que iro operar em expectativas normativas generalizadas. No jogo e na brincadeira, cada um a sua maneira, a criana ir entender, a partir da atuao da outra criana (Me) e no da sua prpria (Eu), que, no entanto, importante para o processo dialgico de compreenso, o seu papel no mundo, includa aqui a diviso do trabalho. claro que, nesse contexto, as explicaes de Mead se aproximam bem mais do que foi visado por Hegel do que deixa supor a mera coincidncia do uso do termo reconhecimento; pois, no diferentemente de Hegel, ele tambm quer que a compreenso que aquele que aprende a conceber-se na perspectiva do outro generalizado tem de si mesmo seja entendida como a compreenso de uma pessoa de direito. Com a adoo das normas sociais que regulam as relaes de cooperao da coletividade, o indivduo em crescimento no aprende s quais obrigaes ele tem de cumprir em relao aos membros da sociedade; ele adquire, alm disso, um saber sobre os direitos que lhe pertencem, de modo que ele pode contar legitimamente com o respeito de algumas de suas exigncias: direitos so de certa maneira pretenses individuais das quais posso estar seguro que o outro generalizado as satisfar. Nesse sentido, pela concesso social desses direitos, possvel medir se um sujeito pode conceber-se como membro completamente aceito de sua coletividade; por isso que lhes cabe, no processo de formao do Eu prtico, um papel particularmente significante: Se algum quer manter sua propriedade na comunidade, de maior importncia que ele seja um membro dessa comunidade, uma vez que a adoo da atitude dos outros garante que os prprios direitos sejam reconhecido. (...) Com isso recebe-se uma posio, consegue-se a dignidade de ser membro da comunidade (p. 136 e 137) MUITO IMPORTANTE.

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IMPORTANTE: No por acaso que Mead fala nessa passagem de dignidade, com a qual um sujeito se v dotado no momento em que ele, pela concesso de direitos, reconhecido como um membro da sociedade; pois com a expresso est implicitamente associada a afirmao sistemtica de que corresponde experincia de reconhecimento um modo de autorrelao prtica, na qual o indivduo pode estar seguro do valor social de sua identidade. O conceito geral que Mead escolhe para caracterizar uma tal conscincia do prprio valor o de autorrespeito; ele refere-se atitude positiva para consigo mesmo que um indivduo pode adotar quando reconhecido pelos membros de sua coletividade como determinado gnero de pessoa. Por sua vez, o grau de autorrespeito depende da medida em que so individualizadas as respectivas propriedades ou capacidades para as quais o sujeito encontra confirmao por parte de seus parceiros de interao; visto que direitos so algo por meio do qual cada ser humano pode saber-se reconhecido em propriedades que todos os outros membros de sua coletividade partilham necessariamente com ele, eles representam para Mead uma base muito geral, embora slida, para o autorrespeito. (p. 137 e 138). Assim, alm do Me, em Mead, com a noo de autorrespeito entra em jogo o Eu. O Eu aparece como as possibilidades inesgotveis das identidades. Trata-se de uma constante tenso revelada no fato de que o Me fonte do prprio reconhecimento a partir do outro e o Eu fonte das identidades que cada um busca ver reconhecidas, sendo a existncia do Me fora o sujeito a engajar-se, no interesse do Eu, a engajar-se por novas formas de reconhecimento social. Assim, Mead elucida primeiramente a estrutura desses conflitos morais lanando mo de exemplos que se referem a pretenses internas cuja satisfao pressuporia uma ampliao dos direitos individuais. (p. 141 e 142)

Luta por reconhecimento- Atualizao sistemtica: a estrutura das relaes sociais de reconhecimento

E mais, buscando dar materialidade a tudo isto, Honneth explica que a relao acima se d no processo histrico, sendo que em toda poca histrica acumulam-se novamente antecipaes de relaes de reconhecimento ampliadas, formando um sistema de pretenses normativas cuja sucesso fora a evoluo social em seu todo a uma permanente adaptao ao processo de individualizao progressiva. Pois, uma vez que os sujeitos, mesmo aps a efetuao de reformas sociais, s podem defender as exigncias de seu Eu antecipando uma coletividade que concede mais espao de liberdade, origina-se uma cadeia histrica de ideais normativos que apontam na direo de um crescimento em autonomia pessoal. Sob a presso desse padro evolutivo, por assim dizer coletivamente antecipado, o processo de civilizao seguiu, como diz Mead, uma tendncia liberao da individualidade (p. 144) Ou seja, a partir do reconhecimento generalizado, na perspectiva histrica, h uma liberao das identidades que foram reprimidas, fazendo assim com que as individualidades pudessem se manifestar mais livremente. So alcanados novos patamares ticos (a tal eticidade de Hegel, portanto), com o aumento da autonomia pessoal. A liberao histrica da individualidade se efetua por isso, para os dois pensadores, como uma luta por reconhecimento de longo alcance (p. 145) No entanto, diferentemente de Hegel, Mead oferece para o processo evolutivo assim circunscrito uma explicao que o torna transparente em seus fundamentos motivacionais: as foras que impelem reiterada e inovadoramente o movimento de reconhecimento so representadas pelas camadas incontrolveis do Eu, que s podem se exteriorizar livre e espontaneamente quando encontram o assentimento de um outro generalizado. Porque os sujeitos, sob a presso do Eu, so compelidos a uma delimitao continua das normas incorporadas no outro generalizado, eles se encontram de certo modo sob a necessidade psquica de engajar-se por uma ampliao da relao de reconhecimento jurdica; a prxis social que resulta da unio de esforos por um tal enriquecimento da comunidade o que se pode chamar, na psicologia social de Mead, luta por reconhecimento. (p. 145)Luta por reconhecimento- Atualizao sistemtica: a estrutura das relaes sociais de reconhecimento

Outro elemento importante, destacado no reconhecimento, a necessidade de que a identidade social seja reconhecida pelos demais, o que se por meio da autorrealizao. A autorrealizao o processo em que o sujeito desenvolve capacidades e propriedades de cujo valor para o meio social ele pode se convencer com base nas reaes de reconhecimento de seu parceiro de interao, mas no no plano dos direitos e deveres, sendo que a autorrealizao individual requer poder entender-se a si prprio como personalidade nica e insubstituvel (p. 148). Exemplo: algum possui uma superioridade em relao aos outros em relao a uma qualidade que o distingue, tal como ser um bom advogado ou um cirurgio, provocando-lhe um sentimento, no apenas egostica, mas de que est a servio da sociedade. Para o processo de reconhecimento, a autorrealizao elemento no desprezvel, sendo que, para atribuir elemento mais socializante a esta, Mead a vincula noo de trabalho socialmente til, como a medida de reconhecimento demonstrada a um sujeito, que cumpre bem a funo atribuda a ele no quadro da diviso social do trabalho, basta para lhe proporcionar uma conscincia de sua particularidade individual (p. 150)E FINALIZA, QUANTO IMPORTNCIA DA DIVISO FUNCIONAL DO TRABALHO: Portanto, tomando isso em conjunto, a ideia de Mead representa uma resposta ps-tradicional ao problema hegeliano da eticidade: a relao do reconhecimento recproco, no qual os sujeitos, para alm de suas comunidades morais, podem saber-se confirmados em suas propriedades particulares, deve ser encontrada num sistema transparente de diviso funcional do trabalho.Luta por reconhecimento- Atualizao sistemtica: a estrutura das relaes sociais de reconhecimento

Enfim, agora est tudo esclarecido: o seu reconhecimento depende de seu valor na participao da produo da lgica capitalista: a mulher se autorrealiza e, consequentemente conhecida, por exemplo, na medida em que pode ser valorizada a partir da diviso social do trabalho. Nada mais do que a velha noo de meritocracia, camuflada na forma de reconhecimento de identidades. A partir de outros parmetros (o valor atribudo em cada sociedade importncia das atividades distribudas). O problema que surge, para Honneth, que a fase em que se d a eticidade, em ambos os autores, revela dificuldades. Seja da relao dialtica entre o amor e o direito, seja da psicologia social com as noes de Me e Eu, observada ainda a diviso social do trabalho, quando a questo se depara na perspectiva da eticidade, h um problema que significa a dificuldade da dimenso do que seria efetivamente a tica que envolve o reconhecimento um pouco mais objetivada em Mead com a sua diviso social do trabalho. No momento da eticidade, o reconhecimento aparece como um contedo vazio de expresso, sendo que o conceito de solidariedade que aparece nesta fase carece dedo fundamento dado por um contexto de experincia motivador (p. 154) Portanto, a materialidade continua a ser um problema no reconhecimento, em especial se considerarmos os aspectos materiais que o informam. Algo como a vagueza da expresso dignidade da pessoa humana, de certa forma, tambm habita a solidariedade que deve informar o reconhecimento (em especial se o considerarmos no na sua injuno ntima da famlia ou do aspecto delimitador do direito, consideradas as etapas anteriores dadas pelo prprio Hegel).

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A despeito da observao anterior, Honneth acredita que, com a sua noo de diviso social do trabalho e alguns dos aspectos anteriores, com os meios construtivos da psicologia social de Mead foi possvel dar teoria hegeliana da luta por reconhecimento uma inflexo materialista. No foi somente a premissa geral do primeiro Hegel, segundo a qual a formao prtica da identidade humana pressupe a experincia do reconhecimento intersubjetivo, que reapareceu em Mead na forma alterada de uma hiptese emprica de pesquisa; tambm foi possvel encontrar em sua obra os equivalentes tericos, oriundos de uma concepo ps-metafsica e naturalista, para a distino conceitual de diversas etapas de reconhecimento, e mesmo para a afirmao, de longo alcance, acerca de uma luta que medeia essas etapas. Portanto, com a incluso da psicologia social de Mead, a ideia que o jovem Hegel traou em seus escritos de Jena com rudimentos genais pode se tonar o fio condutor de uma teoria social de teor normativo; seu propsito esclarecer os processos de mudana social reportando-se s pretenses normativas estruturalmente inscritas na relao de reconhecimento recproco. (p. 155)

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Alguns enganos, a nosso ver, esto evidentes na constatao anterior. Primeiro, no se torna materialista algo apenas pela insero de um dado empirista. Assim, Honneth vtima da razo instrumental, to denunciada pela Teoria Crtica. O empirismo apenas tenta, a partir da eficincia tpica desta racionalidade, comprovar fatos por meio de suas demonstrao prticas da teoria no se confundindo com o materialismo histrico-dialtico. Ainda que consideremos (o que no fcil de se entender como tal) que a psicologia social de Mead tem as suas premissas demonstrveis pela prtica diria dos fatos (coisas como a demonstrabilidade do Me e do Eu e os reflexos no plano dos fatos sociais, observada a diviso social do trabalho, no algo, a meu ver, to simples assim), ainda assim isto no se confunde com uma inflexo materialista (talvez ps-metafsica sim, mas no materialista, em especial materialista-histrico dialtica). Por fim, em ambas as hipteses, em Hegel e Mead, a meu ver, continua a existir, mesmo que se considere o empirismo do segundo, uma certa generalidade que abstrai, tornando a expresso reconhecimento social um contedo formal e vazio que no preenchido, na forma como tomada por Mead, pela expresso histrica, mas por fatores psicolgicos que o determinam, ainda que aparentemente socializados. O contedo individualista, ainda que plural, mas individualista, o que revela o individualismo metodolgico de Mead se encontra na expresso autorrealizao, que esconde, na diviso do trabalho, um esforo dos grupos de se mostrarem merecedores do reconhecimento. De novo, o que se coloca como histrico, aparece com um fator que emerge como natural, atravessando de forma eterna os tempo, algo que informa, desde a sua origem, o capitalismo: a noo de meritocracia. Os indivduos, ainda que pertencentes a certos grupos, somente sero reconhecidos se merecerem o reconhecimento, ou seja, se demonstrarem o seu valor na lgica da diviso do trabalho. Luta por reconhecimento- Atualizao sistemtica: a estrutura das relaes sociais de reconhecimento

O mximo da razo instrumental travestida de razo comunicativa. Ou seja, o que denunciado, em certa medida, por Honneth em Habermas aparece novamente e de maneira sutil no primeiro. No possvel, enfim, como tentou demonstrar, mas tendo cado no mesmo equvoco, dividir de forma plena sistema e mundo da vida. No h como se dividir, de forma plena, quando se adota teorias como do reconhecimento, ainda que com o materialismo acrescentado por Mead, fazer uma separao entre o mundo do trabalho e o mundo da cultura, sob pena de se cair num idealismo que se APRESENTA como materialista. Ou seja, de novo se caiu na descontinuidade contnua, que j informava a passagem de Kant para Hegel. Ou seja Honneth continua, embora aparente descontinuidade, a trajetria de Habermas. No entanto, no se deve esquecer que, at o instante, Honneth ainda no deu a sua contribuio original s ideias do jovem Hegel e de Mead, apenas os fez se comunicarem, acreditando ter ultrapassado o idealismo hegeliano com o materialismo de Mead expresso na diviso social do trabalho . No obstante, como se ver a seguir, mesmo com a sua contribuio, persevera a descontinuidade contnua.Luta por reconhecimento- Padres de reconhecimento intersubjetivos: amor, direito e solidariedade

E exatamente aqui, nos parece, que o tom idealista da teoria proposta se apresenta bastante evidente. Ele se prope, ento, a clarificar a tipologia deixada por Hegel e Mead, pois ambos os pensadores, em igual medida, no estiveram em condies de definir de forma mais adequada a experincias sociais sob cuja presso a asseverada luta por reconhecimento deve se originar no processo histrico: tanto em Hegel como em Mead no se encontra uma considerao sistemtica daquelas formas de desrespeito que podem tornar experiencivel para os atores scias, na qualidade de um equivalente negativo das correspondentes relaes de reconhecimento, o fato do reconhecimento denegado. Por isso, no captulo subsequente, tentaremos fechar essa lacuna, diferenciando as diversas espcies de rebaixamento e de ofensa por que passam os homens; nesse contexto, a remisso tipologia das formas de reconhecimento resultar na tese segundo a qual as formas de desrespeito podem ser distinguidas lanando-se mo do critrio de saber qual nvel de autorrelao de uma pessoa, intersubjetivamente adquirida, elas respectivamente lesam ou chegam a destruir (p. 157).

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Portanto, passar, a estudar, a partir da premissa acima, as trs formas de reconhecimento recproco que ser, embora com algumas especificidades em um e em outro autor, a mesma em Hegel e Mead: amor, direito e solidariedade. Da mesma maneira, lembra que em ambos aparecem, nestas trs dimenses, as figuras da famlia, sociedade civil e estado embora em Mead mediadas pela diviso social do trabalho.AMOR -Para falar do amor no apenas no sentido restrito que o conceito recebeu desde a valorizao romntica da relao ntima sexual, recomenda-se primeiramente um modo de emprego neutro o mximo possvel: por relaes amorosas devem ser entendidas aqui todas as relaes primrias, na Luta por reconhecimento- Padres de reconhecimento intersubjetivos: amor, direito e solidariedade

medida em que elas consistam em ligaes emotivas fortes entre poucas pessoas, segundo o padro de relaes erticas entre dois parceiros, de amizades e de relaes pais/filhos. Essa proposta coincide com o emprego que Hegel faz do conceito, no sentido de que nele o amor tambm designa mais do que somente o relacionamento sexualmente preenchido entre homem e mulher; verdade que seus primeiros escritos esto ainda fortemente marcados pela caracterizao da ligao emotiva intersexual feita pelo primeiro romantismo, mas nossa interpretao havia mostrado que ele aplica o conceito tambm ao raelacionamento afetivo entre pais e filhos no interior da famlia, por exemplo. Para Hegel, o amor representa a primeira etapa de reconhecimento recproco, porque em sua efetivao os sujeitos se confirmam mutuamente na natureza concreta de suas carncias, reconhecendo-se assim como seres carentes: na experincia recproca da dedicao amorosa, dois sujeitos se sabem unidos no fato de serem dependentes, em seu estado carencial, do respectivo outro. Alm disso, visto que carncias e afetos s podem de certo modo receber confirmao porque so diretamente satisfeitos ou correspondidos, o prprio reconhecimento deve possuir o carter de assentimento e encorajamento afetivo; nesse sentido, essa relao de reconhecimento est tambm ligada de maneira necessria existncia corporal dos outros concretos, os quais demonstram entre si sentimentos de estima (p. 159 e 160).Luta por reconhecimento- Padres de reconhecimento intersubjetivos: amor, direito e solidariedade

A partir desta noo de amor o autor comea a fazer vrias digresses prenhes de psicologismo.Parte do beb e de sua dependncia materna, para demonstrar as primeiras fases do reconhecimento, descendo inclusive a detalhes sobre desvios no processo de formao do ego e do id de qualquer ser humano.No entanto, a partir da relao entre me e filho que tece os comentrios, a partir de dados empricos, sobre uma primeira fase do reconhecimento. Indo do incio do processo de dependncia absoluta do beb em relao me ao de sua independncia, passando pela dependncia relativa, como indispensveis para a consolidao do reconhecimento na fase adulta. Estes dados sero importantes tambm para o processo de denegao do reconhecimento, que sero analisados a partir desta primeira relao, que de cunho afetivo.Luta por reconhecimento- Padres de reconhecimento intersubjetivos: amor, direito e solidariedade

Comea de premissas como os trabalhos de Winnicott, que, partindo da teoria freudiana referente ao narcicismo primrio, diz que no s o bebe deve alucinar, tomando o comportamento cuidadoso materno como uma emanao da prpria onipotncia; tambm perceber todas as reaes de seu filho como o elemento de um nico ciclo de ao. Essa unidade originria do comportamento, reciprocamente vivenciada, para a qual ganhou cidadania na pesquisa emprica o conceito de intersubjetividade primria, suscita a questo com que Winnicott se ocupou principalmente durante sua vida: como se constitui o processo de interao atravs do qual me e filho podem se separar do estado do indiferenciado ser-um, de modo que eles aprendam a se aceitar e amar, afinal, como pessoas independentes? (p. 164 e 165).A seguir passa a descrever como se d este processo de independncia e como ele importante para que se possa chegar etapa seguinte do reconhecimento, que o direito (considerando-se aqui a vida adulta), em que so ultrapassadas as limitaes da dependncia filho/me.

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Aqui aparecem coisas como: Para a criana, resulta do processo de desiluso, iniciado quando a me j no pode estar sua disposio em virtude do novo aumento de sua autonomia de ao, um grande desafio, difcil de ser vencido: se a pessoa fantasiada at ento como parte de seu mundo subjetivo escapa gradativamente de seu controle onipotente, ela precisa comear a chegar a um reconhecimento do objeto como um ser com direito prprio (p. 168).H um deslocamento do olhar do filho, que, primeiro, reconhece o objeto por meio do olhar da me onipresente, e depois passa para o seu prprio olhar, medida em que a sua dependncia da me por um processo doloroso, mas necessrio, de separao se esvai.Luta por reconhecimento- Padres de reconhecimento intersubjetivos: amor, direito e solidariedade

O papel da me tambm importante, j que a criana, no processo de separao, ficar agressiva, sendo que a me deve sobreviver aos ataques destrutivos dele sem revidar: se a me sobrevive a seus ataques destrutivos sem revidar, ele se desloca praticamente, de certo modo, para um mundo no qual existem ao lado dele outros sujeitos. Nesse sentido, os atos destrutivos e lesivos no so a expresso de uma elaborao negativa de experincias frustrantes; eles formam os meios construtivos com base nos quais a criana pode chegar a um reconhecimento da me, isento de ambivalncia, como um olhar com direito prprio: se ela suportar seus atos destrutivos como pessoa capaz de resistncia, chegando at mesmo a lhe dar, com negativas, ensejo a erupes de fria, ento ele se torna capaz, atravs da integrao de seus impulsos agressivos, de am-la sem fantasias narcissticas de onipotncia. (p. 169) E mais adiante: com efeito, s na tentativa de destruio de sua me, ou seja, na forma de uma luta, a criana vivencia o fato de que ela depende da ateno amorosa de uma pessoa existindo independentemente dela, como ser com pretenses prprias (p. 170).

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Se a me soube passar pelo teste de seu filho, tolerando os ataques agressivos sem a vingana de priv-lo do amor, ento, da perspectiva dele, ela pertence de agora em diante a um mundo exterior aceito com dor; pela primeira vez, como foi dito, ele ter de tomar conscincia agora de sua dependncia em relao dedicao dela. Se o amor da me duradouro e confivel, a criana capaz de desenvolver ao mesmo tempo, sombra de sua confiabilidade intersubjetiva, uma confiana na satisfao social de suas prprias demandas ditas pela carncia; pelas vias psquicas abertas dessa forma, vai se desdobrando nela, de maneira gradual, uma capacidade elementar de estar s. Winnicott atribui a capacidade da criana de estar a ss, no sentido de que ela comea a descobrir de maneira descontrada sua prpria vida pessoal, experincia da existncia contnua de uma me confivel: s na medida em que h um bom objeto na realidade psquica do indivduo ele pode se entregar a seus impulsos internos, sem o medo de ser abandonado, buscando entend-los de modo criativo e aberto experincia (p. 173). Neste processo, a criana vai adquirindo autoconfiana, indispensvel para a vida adulta, alm do que estas relaes da primeira infncia constituir elemento indispensvel da estrutura comunicativa para o reconhecimento recproco. No apenas de si com a prpria me, mas no futuro em relao a todos os demais.

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Alm disso, visto que essa relao de reconhecimento prepara o caminho para uma espcie de autorrelao em que os sujeitos alcanam mutuamente uma confiana elementar em si mesmos, ela precede, tanto lgica como geneticamente, toda outra forma de reconhecimento recproco: aquela camada fundamental de uma segurana emotiva no apenas na experincia, mas tambm na manifestao das prprias carncias e sentimentos, propiciada pela experincia intersubjetiva do amor, constitui o pressuposto psquico do desenvolvimento de todas as outras atitudes de autorrespeito (p. 177)DIREITO Para o direito, Hegel e Mead perceberam uma semelhante relao na circunstncia de que s podemos chegar a uma compreenso de ns mesmos como portadores de direitos quando possumos, inversamente, um saber sobre quais obrigaes temos de observar em face do respectivo outro: apenas da perspectiva do outro generalizado, que j nos ensina a reconhecer os outros membros da coletividade como portadores de direitos, ns podemos nos entender tambm como pessoa de direito, no sentido de que podemos estar seguros do cumprimento social de algumas de nossas pretenses. (p. 179)

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Em Mead, o outro generalizado no direito tem um contedo normativo reduzido, na medida em que o sujeito individual alcana aqui reconhecimento a partir de uma qualidade legtima baseada na diviso do trabalho. Esta determinao, que para Honneth a dimenso histrica de Mead, no se encontra presente em Hegel, onde aparece com contedo mais universal, na medida em que nos reconhecemos reciprocamente na observncia, para todos e de forma igual, no cumprimento dos direitos e obrigaes recprocos.Percebe-se que onde h direito no implica haja respeito. H um desacoplamento das figuras do reconhecimento e estima social. Pelo direito, portanto, podemos reconhecer um ser humano sem necessariamente estim-lo. Mesmo no caso de Mead, esta estima no est necessariamente presente.

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H, portanto, um problema valorativo que, quer numa, quer noutra vertente, no resolvida imediatamente.H, ainda, uma importncia, revelada por Honneth, no procedimento pelo qual reconhecido o direito das pessoas nesse processo de luta.Quanto mais o procedimento de incorporao de direitos, nesta luta por reconhecimento, for informado pela democracia, mais ser possvel afirmar-se que o reconhecimento pelos direitos incorpora o elemento valorativo das pessoas reconhecidas. E neste passo importante entender o processo histrico das dimenses dos direitos nas lutas por reconhecimento, momento em que o autor passa para uma anlise das conquistas de direitos individuais, sociais e de solidariedade, sempre no sentido de que a ampliao cumulativa de pretenses individuais, com a qual temos de lidar em sociedades modernas, pode ser entendida como um processo em que a extenso das propriedades universais de uma pessoa moralmente imputvel foi aumentando passo a passo, visto que, sob a presso de uma luta por reconhecimento, devem ser sempre adicionados novos pressupostos para a participao na formao racional da vontade (p. 189)

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Diz da importncia do reconhecimento das pretenses jurdicas, no plano dos direitos individuais, como relevante para a teoria do reconhecimento, mas no como suficiente, sendo necessrios os demais direitos para que o reconhecimento se faa pleno. E mais ainda h necessidade que estes direitos (parece se referir em especial aos direitos sociais) tenham efeitos concretos na vida das pessoas, no valendo apenas como pretenses em tese.Neste contexto, colhe registrar que a denegao de direitos a certos grupos, pela experincia do direito denegado ou do desrespeito aos direitos j conquistados representa, na luta pelo reconhecimento, dado importante j que indicam conflitos em torno da ampliao tanto do contedo material, como do alcance social do status de uma pessoa de direito. (p. 194)

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(...) assim como, no caso do amor, a criana adquire a confiana para manifestar espontaneamente sua carncias mediante a experincia contnua da dedicao materna, o sujeito adulto obtm a possibilidade de conceber sua ao como manifestao da prpria autonomia, respeitada por todos os outros, mediante a experincia do reconhecimento jurdico. Que o autorrespeito para a relao jurdica o que a autoconfiana era para a relao amorosa o que j se sugere pela logicidade com que os direitos se deixam conceber como signos anonimizados de um respeito social, da mesma maneira que o amor pode ser concebido como expresso afetiva de uma dedicao, ainda que mantida distncia: enquanto este cria em todo ser humano o fundamento psquicos para poder confiar nos prprios impulsos carenciais, aqueles fazem surgir nele a conscincia de poder se respeitar a si prprio, porque ele merece o respeito de todos os outros. No entanto, s com a formao de direitos bsicos universais, uma forma de autorrespeito dessa espcie pode assumir o carter que lhe somado quando se fala de imputabilidade moral como o cerne, digno de respeito de uma pessoa; pois s sob as condies em que direitos universais no so mais adjudicados de maneira dspar aos membros de grupos sociais definidos por status, mas, em princpio, de maneira igualitria a todos os homens como seres livres, a pessoa de direito individual poder ver neles um parmetro para que a capacidade de formao do juzo autnomo encontre reconhecimento nela. (p. 195)

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Por fim, associa a conquista de direitos individuais noo de autorrespeito e sua ausncia ou descumprimento a experincias a de desrespeito. Menciona especificamente a situao envolvendo os negros nos EUA dos anos 50/60 encontrando-se ali o exemplo bom de desrespeito pelo no reconhecimento de direitos (segregao) e a luta pelo reconhecimento a partir da: o subprivilgio jurdico conduz a um sentimento paralisante de vergonha social, do qual s o protesto ativo e a resistncia poderiam libertar. (p. 198).SOLIDARIEDADE - ESTIMA SOCIAL

(...) para poderem chegar a uma autorrelao infrangvel, os sujeitos humanos precisam ainda, alm da experincia da dedicao afetiva e do reconhecimento jurdico, de uma estima socia