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Direito Civil Contratos Teoria Geral
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Solução para conflitos normativos:
Regras x princípio: solução em favor dos princípios, respeitada a hierarquia normativa e a especificidade.
Princípio x princípio: ponderação de interesses.
Proporcionalidade, segundo Cristiano Chaves = a) princípio interpretativo (razoabilidade); ou b) técnica de solução de conflitos (ponderação de interesses).
Regra x regra: o conflito se resolverá através dos métodos hermenêuticos previstos na LINDB (hierarquia, anterioridade e especialidade).
Humberto Ávila (Teoria dos princípios), menciona o instituto norte-americano e germânico chamado defeasibility (“derrotabilidade” ou “superabilidade”) - possibilidade de não aplicação (episódica) de uma regra em um caso concreto com pouca probabilidade de repetição, de maneira a segarantir a sua própria finalidade - superando o modelo do all or nothing.
Teoria Geral dos Contratos II
6. Princípios fundamentais.
6.1 Generalidades.
6.2 Boa-fé objetiva.
Boa-fé objetiva é a ética mínima (eticidade) que se espera das partes de um contrato.
Não confundir éticidade (treu und globen = em tradução literal, lealdade e confiança) com moralismo. Ética é um sentimento coletivo, social; moral é um sentimento individual.
Boa-fé subjetiva (conhecimento; estado psicológico) [regra] X boa-fé objetiva (comportamento; confiança) [princípio].
Conclui-se que a cláusula da boa-fé objetiva implanta o valor confiança nas relações contratuais, com a função de flexibilizar o sistema a partir de disposição abstrata (norma-princípio).
Atenção - a boa-fé objetiva não possui qualquer relação com a correção de situações de posições de inferioridade ou hipossuficiência contratual -- não tutela apenas a parte mais fraca (sacrifício de posições de vantagem contratual).
6.4.1 Duty to mitigate the loss
* STJ, REsp. 758.518/PR
* Jornada 169
Variável parcelar da boa-fé objetiva: exigência de comportamento ético por parte do credor.
Ex.: Súmula 309, STJ - A dívida alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é a que compreende as três prestações anteriores ao juizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo.
Ex¹: Superendividamento - o credor contribuindo para o endividamento do consumidor.
Ex²: STJ, Resp. 1.075.142/RJ - na execução de astreintes.
6.4.2 Tríplice função da boa-fé objetiva
a) Interpretativa
Significa que toda e qualquer cláusula contratual deve ter o seu sentido e alcance definidos pela eticidade [art. 113, CC/02].
b) Integrativa - corresponde à função de estabelecer direitos anexos para a relação contratual (queiram as partes ou não).
Ex.: responsabilização civil do médico por violação ao dever de informação.
Atenção - através da boa-fé objetiva tornou-se fonte autônoma de obrigações. Com isto, existe um novo modelo de inadimplemento obrigacional = Violação positiva de contrato [Resp. 988.595/SP]: o descumprimento dos deveres anexos, mesmo que, eventualmente, os deveres contratuais principais tenham sido cumprimentos.
Ex.: Empresa de publicidade contratada para veicular vinte placas de outdoor de um produto para a classe A -- o que veiculou no subúrbio e periferia.
Ex²: Empresa contratada para transportar cavalo de corrida, que chegou gripado por conta da alta temperatura do meio de transporte.
Atenção - estes deveres anexos são exigíveis desde antes até depois da contratação. Deles decorrem dois conceitos até então desconhecidos: responsabilidade civil pré-contratual e pós-contratual [natureza extracontratual; aquiliana] não está limitada pelo valor do contrato.
c) Limitadora restritiva ou de controle - impede o exercício de direitos contratuais, ou não, que se mostrem abusivos por violar a eticidade.
Ex.: Anatocismo - o juiz pode controlar a abusividade nas taxas de juros: Resp 1.112.879/PR
Ex²: Substancial performance (adimplemento substancial ou inadimplemento mínimo).
O art. 475, CC/02 afirma que o contratante pode requerer a resolução do contrato quando o outro descumprir alguma obrigação. Contudo, o STJ vem dizendo que se o inadimplemento foi mínimo, requerer a resolução do contrato se mostra abusivo [abuso de requerer a resolução].
6.4.3 Figuras parcelares da boa-fé objetiva.
Venire contra factum proprium
o Sequência composta por dois comportamentos, isoladamente lícitos, na qual o segundo comportamento se revela abusivo por violação à confiança despertada pelo primeiro ato: 1) ato, comissivo ou omissivo, lícito; 2) ato comissivo lícito.
o Jornada 362.
o STF, RE 86.787/RS [1977]; STJ, Resp 95.539/SP [década de 1990].
o STJ passou a admitir o venire também no direito administrativo, nas relações de direito público: REsp. 524.811/CE.
Supressio (Verwirkung) e Surrectio (Erwirkung)
o Constituem uma variação do venire. Também há uma sequência lógica de dois comportamentos, todavia o primeiro é omissivo e o segundo comissivo.
o A vinculação entre eles decorre do decurso qualificado do tempo, gerando a expectativa de que o segundo comportamento não adviria.
o STJ, Resp 214.680/SP; STJ, REsp. 356.821/RJ.
o Art. 330, CC/02 - O pagamento reiteradamente feito em outro local faz presumir renúncia do credor relativamente ao previsto no contrato.
o Área comum de condomínio edilício não pode ser objeto de usucapião. Todavia, a ela aplica-se supressio/surrectio.
Tu quoque (ou cláusula de Estoppel)
o Primeiro comportamento ilícito seguido de um comportamento lícito - sendo este considerado abusivo em virtude da ligação com o primeiro.
o Ex.: “Exceptio non adiplenti contractus”.
o Ex¹: “Senatus consulto macedoniano”
6.4 Função social do contrato.
O instituto da função social surge a partir de duas referências literárias.
A primeira data da década de 1970, obra de Norberto Bobbio: “Da estrutura à função”. Nele, afirma o autor que o estudo sempre se voltou à estrutura do direito (“o que é o direito”). Ponderava, todavia, que, mais importante, é o estudo da sua função (“para quê serve?”).
Na exposição de motivos do Código Civil, Miguel Reale afirma que todos os seus institutos devem cumprir a missão da socialidade - para quê serve.
Socialidade aplicada aos contratos, de forma que o exercício de direitos contratuais não cause influência negativa no meio social ou sobre terceiros:
Enunciado 23 da Jornada - “A função social do contrato não aniquila a autonomia privada, mas atenua ou reduz o alcance desse princípio quando presentes interesses metaindividuais ou interesse individual relativo à dignidade da pessoa humana”.
6.5.1 Tríplice função da social do contrato
a) O contrato entre duas partes não pode prejudicar terceiros [terceiro lesado ou terceiro ofendido].
b) O contrato entre duas partes não pode prejudicar a coletividade.
c) Terceiros não devem prejudicar os contratos alheios [terceiro ofensor ou terceiro cúmplice].
Ex.: Súmula n. 308 do STJ - “O contrato de hipoteca entre a construtura e o banco não pode prejudicar os adquirentes do imóvel”.
Ex²: Art. 608, CC/02 - Aliciamento do prestador de serviços: “Aquele que aliciar pessoas obrigadas em contrato escrito a prestar serviço a outrem pagará a este a importância que ao prestador de serviço, pelo ajuste desfeito, houvesse de caber durante dois anos”.
Consequência material - passa a ser reconhecida uma tutela externa da relação contratual.
Consequência processual - terceiros passam a ter legitimidade para requerer ação de revisão ou de resolução de contratos.
Atenção - Se o terceiro ofendido for a coletividade, esta legitimidade recairá sobre o Ministério Público.
6.5.2 Eficácia Interna (Intrínseca) da Função Social do Contato
Trata-se da correlação com a dignidade da pessoa humana (Enunciado 360 da Jornada).
Súmula 302 do STJ: “É abusiva a cláusula que limita tempo de internação hospitalar”.
6.6 Equilíbrio econômico e financeiro dos contratos
Formulação de uma base contratual harmônica entre as partes.
Precedente: França, Lei Faillot (1918). Resgate da cláusula rebus sic stantibus, dando lugar a Teoria da Imprevisão.
Requisitos da imprevisão:
a) contrato de trato sucessivo;
b) onerosidade excessiva (desequilíbrio entre prestação e contraprestação)
c) álea extraordinária (evento imprevisível e extraordinário);
d) inexistência de culpa das partes.
A teoria da imprevisão apenas chegou ao Brasil nas décadas de 1940/50, através de contribuição doutrinária de Arnoldo Medeiros da Fonseca: “Teoria da imprevisão e caso fortuito”. Para o autor, a do pacta sunt servanda apenas deveria ter lugar em casos patológicos.
Já nas décadas de 1970/80, julgando questões relativas à inflação, a jurisprudência asfixiou a aplicação da teoria.
Discrepando dessa orientação, o CDC (artigos 4º e 6º) abraçou a teoria da base objetiva do contrato (ou da onerosidade excessiva pura), formulada por Karl Larenz. Não interessa a (im)presivibilidade do fato.
O Código Civil, em movimentação pendular, adotou a teoria da imprevisão qualificada, pois além de manter os tradicionais requisitos, passou a exigir também a correspondência entre a onerosidade excessiva sofrida por uma parte e a vantagem obtida pela outra - artigos 478 e 317.
Onerosidade excessiva + imprevisão qualificada
Autores há que buscam mitigar o rigor do texto legal através da afirmação de que “a imprevisibilidade não estaria na causa, mas na consequência”.
Questão processual Art. 479, CC/02 - A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar equitativamente as condições do contrato.
Esclarece Daniel Assumpção que o réu pode fazê-lo tanto por reconvenção quanto por exceção substancial (dentro da própria contestação).
Para o STJ, o juiz só deve decretar a resolução se não for possível a sua revisão - princípio do aproveitamento do contrato. De qualquer sorte, tanto a resolução quanto a revisão retroagem à data da citação.
Atenção - A onerosidade excessiva deve ser posterior à celebração do contrato. É que se esta for circunstância presente no momento da formação do contrato, não se afeta o plano de eficácia do contrato, mas a sua própria validade (anulabilidade no caso do CDC; anulabilidade no Código Civil).