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Terra à lua branco. A quebra de paradigmas para a abstração humana. J O Ã O V I T O R R O C H A em quadrado

Terra à Lua em Quadro Branco

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Estudo sobre Kazimir Malevich

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Terraà lua

branco.A quebra de paradigmas para a abstração humana.

J O Ã O

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R O C H A

em quadrado

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2_INTRODUÇÃO (DESTINO: A SUPREMACIA LUNAR) | 4_A TERRA É AZUL | 8_MA LEVICH COMEÇA SUA JORNADA À LUA | 14_CONCLUSÃO | 18_BIBLIOGRAFIA

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Destino: a supremacia lunar.

O marco inicial da época que passou a ser chamada de Primeira Era Espacial ocorreu em 1957 com o lançamento de Sputnik 1, pela antiga União Soviética. Com o passar dos anos e os êxitos das primeiras experiências espaciais, o interesse publico e científico foi aumentando, como também fora aumentando a disputa bipolar pela hegemonia espacial entre americanos e soviéticos que, na verdade, era somente um pretexto de atuação por trás dos panos da Guerra Fria.

O romance de Julio Verne, “Da terra a lua” (1865), talvez tenha sido o primeiro a tratar as viagens espaciais de tal maneira que a ida para a lua parecia um objeto de engenharia possível e não uma mera fantasia. Julio Verne citou o valor correto da velocidade necessária para escapar da gravidade terrestre, 11 quilômetros por segundo. Seu livro serviu de inspiração a todos os cosmonautas e astronautas, dentre eles os americanos: Neil Armstrong, Buzz Edwin Aldrin e Michael Collins que, 104 anos depois, realizam a dita impossível façanha de conquistar a lua, um mérito sem limites.

Sem limites também se pode dizer que foi a carreira e filosofia do artista ucraniano Kazimir Malevich (1878-1935) promovendo uma quebra de paradigmas artísticos entre a mimesis (representação da natureza ou sua imitação na arte) e a experiência da pura ausência de objetos.

Malevich chega ao limite da abstração com suas pinturas e ultrapassa todas as barreiras impostas pela própria arte e seus intelectuais. Em seguida a essa abstração, o próprio pintor é atingido por seu progresso e cai em desmotivação, continuando a fazer projetos paralelos em design na escola de Bauhaus.

Tendo em vista este fato, chega-se a seguinte questão: a abstração tem limites?

Esta questão será trabalhada através de um paralelo entre a aventura da Era Espacial e a filosofia de Malevich. A escolha da imagem-tema (ao lado) é de certa forma o ponto de fuga para toda a explicação desta trama e sairá também a partir dela o seu desfecho.

Foto: Astronauta na Lua | Autor: Neil Armstrong | Data: 1969

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Capa da revista TIME Yuri Gagarin (1961)

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“A terra é azul”

Foi com essa frase memorável que em 12 de abril de 1961 o major da Força Aérea Soviética, Yuri Gagarin, tornou-se o primeiro homem a viajar ao espaço. Este acontecimento foi o estopim mais forte na Era Espacial entre os soviéticos e americanos, soando como um sinal amarelo rumo à lua.

A Guerra Fria teve inicio logo após a 2ª Grande Guerra Mundial, onde União Soviética e Estada Unidos lutaram juntos para defender um interesse maior no momento, derrotar o nazismo alemão. Contudo, após o fim da guerra em 1945, o mundo encontrava-se bipolarizado. De um lado os socialistas defendendo seus ideais político-economico-sociais, assim como capitalistas americanos.

Nesse contexto, qualquer fato ou nova descoberta era motivo de disputa por parte das duas ideologias. E foi assim nas artes, na música, no cinema, na espionagem, nos conflitos da Coréia e Vietnã e, como não poderia de ser esquecida, na corrida espacial.

Menos de um mês depois, em maio de 1961, o comandante Alan Shepard Jr. Torna-se o primeiro norte-americano a subir ao espaço, com um vôo suborbital de 15 minutos. Mas o segundo lugar na corrida espacial significava também o último e isso era pouco para o orgulho nacional. A corrida toma repercussões mais sérias, uma vez que as conquistas de cada país significaram muito para a publicidade das duas nações. É quando, em 25 de maio do mesmo ano, que o presidente norte-americano John F. Kennedy faz um desafio e promete colocar um americano em solo lunar até o final da década de 60. Após este discurso intenso, o governo daquele país cria a National Aeronautics and Space Administration (NASA).

Os soviéticos mantiveram a liderança por muito tempo. Em agosto de 61 o cosmonauta, Gherman Titov passou o primeiro dia inteiro em órbita. Em 1962, o astronauta John Glenn faz o primeiro vôo orbital ao redor da terra. Naquele mesmo ano, os soviéticos tomam a dianteira colocando a primeira

John F. Kennedy

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mulher, Valentina Treshkova, no espaço. Em 1966 os americanos passam de vez a hegemonia espacial soviética fazendo o primeiro acoplamento de naves em órbita terrestre.

O sonho de Julio Verne estava se concretizando cada vez mais, assim como a promessa de Kennedy. Então, no dia 21 de Julho de 1969, o astronauta Neil Armstrong realiza a maior quebra de barreiras já feita pela humanidade, tornando-se o primeiro homem a pisar na lua.

Armstrong imortalizou o momento para centenas de milhões de espectadores na terra. Em seguida, o coronel Edwin Buzz Aldrin Jr. Juntou-se a Armstrong em uma caminhada exclusiva nos limites onde nenhum homem jamais esteve.

Na medida em que foram se familiarizando com a gravidade lunar, igual a um sexto da terrestre, eles começaram a saltar pela superfície marcada de crateras, entretendo toda a audiência planetária. Após colherem amostras de rochas e tirarem fotografias por duas horas, os astronautas retornam ao módulo lunar, permanecendo ali por mais 21 horas. Os três astronautas retornam em segurança a terra, realizando um sonho tão antigo quanto à imaginação humana.

Certamente, todos os envolvidos no programa Apollo da NASA souberam que estavam fazendo história viva e contada a toda população. A humanidade alcança uma barreira dita como intransponível e tal desafio também fora assim lançado ao pintor suprematista Kazimir Malevich com sua série de experimentos, desvencilhando a arte ao mundo da representação e imitação do natural, levando-a a novos universos e dimensões, finalmente liberados dos fins práticos e estéticos.

(Neil Armstrong, 1969)

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Malevich começa sua jornada à lua.

Kazimir Malevich nasceu em Kiev em 1878 e desde 1902 morou em Moscou estudando na Escola de Pintura, Escultura e Arquitetura da cidade, assim como na Escola de Ofícios. Entre os anos iniciais de sua carreira, o pintor, antes pós-impressionista, flerta com o art nouveau, rompendo depois com o folclore russo de Larionov e Goncharova, artistas que influenciaram o começo de sua carreira.

É convidado a expor em Munique, na segunda “Blaue Reiter”. A partir de então, passa a orientar-se pela simplificação geométrica de Léger e, em 1913, junto com o pintor russo Vladmir Tatlin, constrói as bases do manifesto futurista russo, fundamental para a desambiguação posterior de Malevich.O futurismo russo, assim como o italiano fundamentado pelo poeta Fillipo Marinetti, era baseado principalmente na velocidade e nos desenvolvimentos tecnológicos do final do século XIX. Talvez neste ponto também seja possível fazer uma ponte do futurismo com a corrida espacial dos anos 50 e 60 em plena Guerra Fria.

Contudo, o futurismo russo distancia do italiano no que tange ao discurso da exaltação a guerra e ao nacionalismo. Malevich estava interessado mais nas pesquisas metódicas sobre estruturas. Estudou Cézanne e Pablo Picasso com mais interesse e formula, através do cubo-futurismo, a base para sua filosofia suprematista, onde a abstração absoluta existe por meio de módulos formais geométricos. O artista nega tanto a utilidade social quanto para a estética da arte, rompendo com a linha artística construtiva de Tatlin.

Malevich defendeu uma arte livre de finalidades práticas e comprometidas com a pura visualidade plástica. Rompeu com a idéia de mimesis, com as formas ilusionistas, com a luz e as cores naturalistas do impressionismo e com qualquer referência que imagens cubistas ainda representavam. Defendeu pelo suprematismo o mundo não-subjetivo e junto com o matemático P.D. Ouspensky, formula a teoria da 4ª dimensão, que não é visível por olhos nus, está sim no âmbito do místico ou, assim como foi dito por eles, “energia espiritual abstrata”.

Kazimir MalevichSuprematist composition (1916)

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O Suprematismo de Malevich e o construtivismo de Tatlin foram as duas grandes correntes da vanguarda russa liderada pelo multimídia Vladmir Mayakovsky e oficialmente aprovada pelo governo de Lênin.

O artista realiza em 1915 o popular “Quadrado negro sob fundo branco”, que será comentado mais a frente.

Segundo o estudiólogo C.G. Argan, “desse modo, com uma operação por assim dizer oposta a de Duchamp, que retira do contexto um objeto de uso corrente e o declara arte, Malevich põe um quadrado negro sobre um fundo branco levando a pintura ao seu marco zero, propondo a pura ausência de objetos.

“Quadrado preto sob fundo branco”. Kazimir Malevich (1915).

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Malevich e Ouspensky escreveram em “O espelho suprematista” a seguinte linha de raciocínio:

1 – A ciência, a arte não tem limites, porque o que se conhece é ilimitado, inumerável e a ilimitação é igual à zero.

2 - Se as criações do mundo são os caminhos de Deus e seus caminhos são inescrutáveis, tanto ele como Deus e seus caminhos são iguais a zero.

3 – Se o mundo é a criação da ciência, do conhecimento e do trabalho e sua criação é infinita, então é igual a zero.

4 – Se a religião conheceu Deus, compreendeu o zero.

5 – Se a ciência compreendeu a natureza, compreendeu o zero.

6 – Se a arte compreendeu a harmonia, o ritmo e a beleza, compreendeu o zero.

7 – Se alguém compreendeu o absoluto, compreendeu o zero.

8 – Não há ser em mim, nem fora de mim; ninguém, nada pode mudar, porque não existe nada que possa mudar a si mesmo, e nada que possa ser mudado.

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Em 1917, Malevich chega ao opus de sua abstração não-objetiva pintando o “Quadrado branco sobre fundo branco”. O artista é acusado de subversivo e nos anos que se passaram foi continuamente atacado pela imprensa. Perdeu suas funções oficiais chegando a ser preso e torturado.

Depois de perder o estimulo de seguir em frente com suas abstrações, Malevich acredita ter chegado até seu máximo nível. O artista então decide trabalhar em design na escola de Bauhaus. Abandonado e pobre morre em 1935 na cidade de Leningrado, atual São Petesburgo, tendo toda sua obra esquecida por anos.

O reconhecimento do artista só ocorreu a partir dos anos 70. Desde então, numerosas retrospectivas pelo mundo consagram Kazimir Malevich como mestre da arte abstrata. Suas obras, assim como o triunfo do homem a lua, são méritos suprematistas incondicionais.

“Quadrado branco sob fundo branco”. Kazimir Malevich (1915).

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Astronautas Suprematistas

Depois de explanado o contexto da chegada do homem a lua e a influência e realização da obra de Malevich, chega-se o ponto de convergência para o paralelo destes fatos: a imagem retratada por Neil Armstrong de Buzz Aldrin na lua.

O astronauta está diante da superfície lunar, ainda com um plano de fundo mostrando o infinito espacial. O terreno lunar é um sedimento cinza e sem vida, pode ser observadas no plano de fundo, várias pegadas dos astronautas. É interessante a posição em que está prostrado o astronauta: de pé, ele olha para frente com seu braço esquerdo semi-levantado na altura da barriga, revelando no seu ombro a bandeira americana; num gesto de superioridade perante a União Soviética. Talvez ainda haja nessa ação um resquício do futurismo.

A corrida espacial e a eterna saga pelo desconhecido levaram as duas superpotências a uma obsessão sem limites. Enfim a ciência da era espacial chegara ao seu final apoteótico. O astronauta, ao pisar na lua, se encontra em um novo paradigma dissonante, ao mesmo tempo chega a seu tão conquistado objetivo, porém ele observa um ponto que ainda não pode desambiguar. Dessa mesma forma, Malevich chega a seu dilema, com o término de “Quadrado preto” e “Quadrado branco em fundo branco”.

Em “Quadrado preto”, Malevich deixa a superfície do quadro totalmente coberta por uma grossa camada de tinta negra que ainda tende a se despedaçar. Tal fato faz analogia à busca de americanos e soviéticos durante a primeira Era Espacial, com cada vez mais novas quebras de barreiras e lideranças. E assim foi camada após camada, conquistas após conquistas.

Então, quando é concebido o “Quadro Branco”, o artista realiza, assim como o desejo de Kennedy, Julio Verne e tantos outros, a abstração absoluta. Mas o que acontece após?

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Conclusão

O sonho romântico do escritor Julio Verne se torna real na mão de homens obstinados por seus ideais. Contudo, no final, toda a diversidade objetiva chega ao seu propósito único. E agora? Depois da lua o que mais falta ser abstraído?

A resposta da pergunta está contida nesta mesma figura retratada por Neil Armstrong. O gigantesco passo da humanidade está refletido no próprio capacete do astronauta Buzz Aldrin. A imagem revela o reflexo de Armstrong, o autor da foto, além da bandeira americana e o módulo lunar. A nova busca do homem começa justamente olhando para si, propondo o auto-conhecimento.

Somente quando permeados mente e corpo é que novamente o ser é capaz de transpor seus limites e sublimar.

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O psicólogo Abraham Maslow uma vez escreveu que o homem é movido por necessidades, podendo ela ser de caráter básico (alimentação, higiene, segurança) até chegar ao campo da psique (auto-conhecimento e auto-realização).

Para que os objetivos sejam atingidos, é necessária uma quebra de barreiras e desafios e para que todo este procedimento aconteça, o homem busca em seus arquétipos e mitos, a sustentação necessária para mente e corpo seguirem em frente com suas metas. Assim como Julio Verne inspirou os 3 bravos astronautas, certamente esses astronautas inspiraram uma geração inteira a sua frente.

O mesmo ocorreu com Kazimir Malevich que por muitos anos foi considerado, ironicamente, um lunático, entretanto foi o pioneiro da arte puramente abstrata. Influenciou e ainda influencia a muitos artistas e, porque não, a todas as pessoas que conhecem suas obras e opinam sobre as mesmas.

O ser humano pinta a todo o momento seus “quadros negros” e “quadros brancos”, a cada descoberta cientifica sobre células-troncas, ou então a preocupação ambiental crescente, enfim, toda descoberta, conquista, conscientização, constatação que gere um estalo no ser, é momento exato de sua abstração.

O desejo de que existam cada vez mais lunáticos soa neste momento como um clichê. Contudo são desses fatos personagens que fazem a motivação humana caminhar sempre à frente rumo ao conhecimento verdadeiro, ou como diria Malevich: ao ponto zero.

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A quebra de paradigmas para a abstração humana.Foto tirada de um close em boneco de brinquedo LEGO, fazendo analogia a criação de novos mitos que servem

de inspiração às novas gerações de astronautas.

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Bibliografia

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DUARTE, Rodrigo. FIGUEIREDO, V. “Mimesis e expressão”. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2001.

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Enciclopédia Itáu Cultural Artes Visuais - Suprematismo.

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